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*Enfermeira especialista em cardiologia e mestranda do programa de Enfermagem da UFC FEBRE REUMÁTICA É verdade que uma dor de garganta pode se transformar em um problema cardíaco? Uma amigdalite bacteriana estreptocócica (infecção de garganta) tratada incorretamente pode desencadear a febre reumática, doença inflamatória sistêmica, o que em alguns casos agride as valvas cardíacas, levando a défices na qualidade de vidas das crianças e adolescentes. Por Nayana Maria Gomes de Souza* EPIDEMIOLOGIA É considerada como problema de saúde pública, sendo mais frequente em países em desenvolvimento. A maior prevalência ocorre em crianças na faixa etária de cinco a 15 anos. NÚMEROS novos casos de FR, no mundo, 10 a 20 milhões faringoamigdalites/ano: no Brasil, 10 milhões novos casos/ano de FR: no Brasil, 30 mil novos casos/ano de cardiopatia reumática: no Brasil, 15 mil

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Page 1: Febre reumática - denascenca.com.br · A febre reumática, como doença crônica, traz a necessidade de um acompanhamento médico contínuo e o uso também regular de injeções

*Enfermeira especialista em cardiologia e mestranda do programa de Enfermagem da UFC

FEBRE REUMÁTICA

É verdade que uma dor de garganta pode se transformar em um problema cardíaco?Uma amigdalite bacteriana estreptocócica (infecção de garganta) tratada incorretamente pode

desencadear a febre reumática, doença inflamatória sistêmica, o que em alguns casos agride as

valvas cardíacas, levando a défices na qualidade de vidas das crianças e adolescentes.

Por Nayana Maria Gomes de Souza*

EPIDEMIOLOGIA

É considerada como problema de saúde pública,

sendo mais frequente em países em desenvolvimento.

A maior prevalência ocorre em crianças na faixa etária de cinco a 15 anos.

NÚMEROSnovos casos de FR, no

mundo,

10 a 20milhões

faringoamigdalites/ano: no Brasil,

10milhões

novos casos/ano de FR: no Brasil,

30 milnovos casos/ano de

cardiopatia reumática: no Brasil,

15 mil

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Prevalência de Febre ReumáticaSOBRE

INTERNAÇÕES

Febre Reumática Aguda

Brasil: 6.349 intern/ano

Nordeste: 2.372 intern/ano

Febre Reumática Crônica

Brasil: 23.482 intern/ano

Nordeste: 5.548 intern/ano

E CUSTOS

Febre Reumática Aguda

Brasil: R$ 1. 505.159,00/ano

Nordeste: R$ 561.650,00/ano

Febre Reumática Crônica

Brasil: R$160.504.826,00/ano

Nordeste: R$ 28.757.256,00/ano

FEBRE REUMÁTICA, UM PROBLEMA DE SAÚDE PÚBLICA

No mundo, estima-se que ocorram de dez a 20 milhões de

novos casos /ano de febre reumática, especialmente entre as

populações desfavorecidas4.

No Brasil , é di f íc i l determinar a incidência de

faringoamigdalites bacterianas causadas pelo EBHGA. Para

tanto, seriam necessários profissionais treinados e

testes para a detecção da bactéria, bem como um

sistema de informação eficiente. Não obstante, seguindo

a projeção do modelo epidemiológico da Organização

Mundial de Saúde (OMS), e de acordo com o último

censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

(IBGE), estima-se que anualmente no Brasil ocorram

cerca de dez mi lhões de far ingoamigda l i tes

estreptocócicas, perfazendo o total de 30 mil novos casos

de FR, dos quais cerca de 15 mil poderiam evoluir com

acometimento cardíaco5.

ResultadosCIRURGIA CARDÍACA

26% das c i rurg ias cardíacas realizadas no Brasi l são de causa reumática.

31% do total de gastos com cirurgia cardíaca ocorreu por valvopatias reumáticas.

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FONTE: MS(SIH/SUS) 2005-2007

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Febre reumáticaCRITÉRIOS (JONES)

PARA DIAGNÓSTICO

Maiores:

cardite

poliartrite

coreia de Sydenham

eritema marginatum

nódulos subcutâneos

Menores:

febre

artralgia

PR no ECG alargado

VHS ou PCR aumentados

Essa doença atinge as articulações (joelhos, cotovelos, tornozelos e

punhos), o coração e o cérebro, pode ocorrer em conjunto ou

separadamente – podendo deixar sequelas graves nas valvas cardíacas,

com algumas consequências por toda a vida. Aparece de 15 a 21 dias

depois de um episódio de infecção de garganta.

Sabe-se é que existe predisposição genética, porém não há nenhum

exame específico para identificar que crianças irão desenvolver ou não

a doença, fazendo que o cuidado em relação às infecções de garganta

deva ser redobrado nas famílias onde existam pessoas portadoras de

febre reumática.

Para o diagnóstico da febre reumática de teor agudo são

utilizados alguns critérios, como descritos ao lado.

!"#$%&'"($")#*)+,'"-."'#$+*)!*/01+$2"

Diagnóstico FR aguda

Infecção pelo Streptococcus do Grupo A nas últimas três

semanas que antecederam o início dos sintomas.

Dois critérios maiores ouum critério maior e dois

menores

PREFERE

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Faringites• • •

É neces sá r io d i fe renc i a r

infecção de garganta causada

por vírus - que não ocasiona a

febre reumática, nem precisa

tratamento com antibiótico -

das infecções bacterianas, que

podem causar a febre reumática

q u a n d o n ã o t r a t a d a

adequadamente.

TIPOS DE AGENTES

Viral

Bacteriana

!"#$%&$'(ViralBacteriana

!"#$%&$'(Viral

Bacteriana

INFECÇÃO MAIS COMUM NO MUNDO

De 3 a 4% das crianças que tiveram faringoamidalite desenvolvem doença reumática.

De 30 a 40% dessas crianças desenvolvem doença reumática de natureza grave.

Idiopática 30 a 65%

Viral 30 a 60%

Bacteriana 5 a 10%%Mais comum entre 5 e

15 anos de idadeViral (rinovirus,

adenovirus)

Bacteriana (Streptococcus A)

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Prevenção

A prevenção dessa doença é conseguida

pelo tratamento das infecções bacterianas

da garganta (prevenção primária). Pode ser

feita com a administração de antibióticos

orais (sob prescrição médica), entretanto

o tratamento mais adequado para a

infecção de garganta estreptocócica é com

dose única de penicilina benzatina

(medicamento injetável por via intramuscular).

Nos casos em que a doença já se

estabeleceu (prevenção secundária), a

criança ou adolescente deverá fazer uso

regular da penicilina benzatina (droga

indicada nesse caso) de 21/21 dias

(dependendo do caso) até no mínimo a

idade adulta.

Vale ressaltar que esse tratamento é longo,

doloroso e de adesão difícil, o que muitas vezes favorece o seu abandono e, conseqüentemente,

possibilita o agravamento da doença.

O uso sistemático de penicilina G benzatina (PGB), adotado oficialmente desde 1954 pela OMS para

profilaxia da FR, é um exemplo de eficácia de intervenção preventiva, em razão dos excelentes resultados observados.

PENINCILINA

A febre reumática, como doença crônica, traz a necessidade

de um acompanhamento médico contínuo e o uso também

regular de injeções de penicilina benzatina.

ATENÇÃO! Se seu filho manifestar sintomas de infecção na

garganta, esta poderá se tornar um problema de saúde mais

sério se não tratado adequadamente.

Prevenção Primária

Tratamento da faringite

Penicilina G benzatina :

600.000 U ( < 27 kg )

1.200.000 U ( > 27 kg )

Penicilina V :

VO , 10 dias

250 a 500 mg, 2-3x/dia

Alérgicos a penilicina:

eritromicina por 10 dias, VO

azitromicina por 5 dias , VO

PROFILAXIA SECUNDÁRIA

PROFILAXIA SECUNDÁRIAGRUPODURAÇÃO DA PROFILAXIA SECUNDÁRIA

FRA (sem cardite)Mínimo de 5 anos após o última FRA, ou até

18 anos de idade (o que ocorrer por último)

Cardite leve a moderada (ou cardite curada) Mínimo de 10 anos após o última FRA, ou até

25 anos de idade (o que ocorrer por último)

Cardite severa, Cardiopatia Reumática Crônica e após CirurgiaPor toda a vida

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Cardiopatia Reumática

Quando a febre reumática atinge o coração

(cardiopatia reumática), a criança ou adolescente

pode apresentar cansaço aos esforços (falta de ar),

mesmo que nunca tenha manifestado problemas

respiratórios.

Com infecções repetidas, o coração é o órgão mais

atingido, ficando com sequelas graves nas suas valvas

que levam, não raramente, à necessidade de

intervenções cirúrgicas.

As valvas mais acometidas, em ordem de frequência

são: mitral, aórtica e tricúspide.

O tratamento cirúrgico das valvopatias reumáticas

oferece: reparo valvar, o que chamamos de plastias

valvares; substituição valvar utilizando-se

próteses biológicas ou metálicas, homoenxertos

(valvas humanas doadas) e autoenxertos.

Prótese biológica fabricada com pericárdio bovino ou valva de porco. Vantagem - não necessita do uso de antigoagulação no pós-operatório. Desvantagem - necessidade de troca por disfunção (calcificação), principalmente em jovens.

Valva mitral com doença reumática.Observar acentuada calcificação dos folhetos.

Homoenxerto Valva humana doada e submetida a processo de preservação. Vantagens - durabilidade, boa performance hemodinâmica, resistente a infecção, não necessita anticoagulação Desvantagens - número de doações não atende a demanda, cirurgia mais complexa.

Autoenxerto

Valva do próprio paciente usada em outra posição - valva pulmonar usada para substituir a valva aórtica. Vantagens - durabilidade, boa performance hemodinâmica, resistente a infecção, não necessita anticoagulação, potencial de crescimento do enxerto. Desvantagens - cirurgia mais complexa por envolver o implante da valva pulmonar em posição aórtica e implante de

SUBSTITUTOS VALVARES

Prótese metálica fabricadas com carbono pirolítico. Vantagem - maior durabilidade. Desvantagens - ruído(barulho no funcionamento) e necessidade de anticoagulação

Plastia da valva mitral

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Referências

1. Gibofsky A, Kerwar S, Zabriskie JB. Rheumatic fever. The relationship between host,

microbe and genetics.Rheum Dis Clin North Am [Internet]. 1998 [acesso em: 10 jan 2016];

24:237-259. Disponível em: http://dx.doi:10.1016/S0889-857X(05)70007-7

2. Stollerman GH, Rusoff JH, Hirschfield I. Prophylaxis against Group A streptococci in

rheumatic fever. The use of single monthly injections of benzathine penicillin G. N Engl J

Med. 1955; 252 (10): 787-92.

3. World Health Organization (WHO). Rheumatic fever and rheumatic heart disease:report

of a WHO expert consultation on rheumatic fever and rheumatic heart disease.Geneva:

WHO, 2004

4. Diretrizes brasileiras para o diagnóstico, tratamento e prevenção da febre reumática. Arq.

Bras. Cardiol. [Internet]. 2009 [acesso em: 10 jan 2016]; 93 (3): 3-18. Disponível em:

http://dx.doi.org/10.1590/S0066-782X2009002100001.

5. Mota,CCC,Muller,R. Febre reumática. In: Croti, UA,Mattos, SS, Pinto Júnior, VC, Aiello,

VD. Cardiologia e cirurgia cardiovascular pediátrica. São Paulo: Roca, 2012.

6. Xavier RMA et al. Programa de Prevenção da Febre Reumática - PREFERE.Instituto

Nacional de Cardiologia.Rio de Janeiro, 2009.