famigerado, de joão guimarães rosa

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 11/03/2015 Famigerado, de João Guimarães Rosa http://www.recantodasletras.com.br/contos/3318339 1/5 Criar conta | Entrar | Filtro f amil iar:seguro Texto Textos > Contos Famigerado, de João Guimarães Rosa Foi de incerta feita — o evento. Quem pode esperar coisa tão sem pés nem cabeça?  Eu estava em casa, o arraial sendo de todo tranquilo. Parou- me à porta o tropel. Cheguei à janela.  Um grupo de cavaleiros. Isto é, vendo melhor: um cavaleiro rente, frente à minha porta, equiparado, exato; e, emboiados, de banda, três homens a cavalo. Tudo, num relance, insolitíssimo. Tomei-me nos nervos. O cavaleiro esse — o oh- homem-oh — com cara de nenhum amigo. Sei o que é influência de isionomla. Saíra e viera, aquele homem, para morrer em guerra. Saudou-me seco, curto pesadamente. Seu cavalo era alto, um alazão; bem arreado, ferrado, suado. E concebi grande dúvida.  Nenhum se apeava. Os outros, tristes três, mal me haviam olhado, nem olhassem para nada. Semelhavam a gente receosa, tropa desbaratada, sopitados, constrangidos — coagidos, sim. Isso por isso, que o cavaleiro solerte tinha o ar de regê-los: a meio-gesto, desprezivo, intimara-os de pegarem o lugar onde agora se encostavam. Dado que a frente da minha casa reentrava, metros, da linha da rua, e dos dois lados avançava a cerca, formara-se ali um encantoável, espécie de resguardo. Valendo-se do que, o homem obrigara  "Poemas ao Vento" Jani Brasil USD19,67 Minha filha... Autista? Lu Ar R$32,00 CAMINHANTE:PROSA S E RIMAS AO VENTO MARCIA TIGANI R$25,00 "Razões em Minhas Rimas". Edson Freire R$20,00 Sinais de Mim Elzana Mattos R$43,40 VITRINE

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Conto de Guimarães

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    Textos>Contos

    Famigerado, de Joo Guimares Rosa

    Foi de incerta feita o evento. Quem pode esperar coisato sem ps nem cabea? Eu estava em casa, o arraial sendo de todo tranquilo. Parou-me porta o tropel. Cheguei janela. Um grupo de cavaleiros. Isto , vendo melhor: um cavaleirorente, frente minha porta, equiparado, exato e, emboiados,de banda, trs homens a cavalo. Tudo, num relance,insolitssimo. Tomei-me nos nervos. O cavaleiro esse o oh-homem-oh com cara de nenhum amigo. Sei o que influncia de isionomla. Sara e viera, aquele homem, paramorrer em guerra. Saudou-me seco, curto pesadamente. Seucavalo era alto, um alazo bem arreado, ferrado, suado. Econcebi grande dvida. Nenhum se apeava. Os outros, tristes trs, mal me haviamolhado, nem olhassem para nada. Semelhavam a gentereceosa, tropa desbaratada, sopitados, constrangidos coagidos, sim. Isso por isso, que o cavaleiro solerte tinha o arde reg-los: a meio-gesto, desprezivo, intimara-os depegarem o lugar onde agora se encostavam. Dado que a frenteda minha casa reentrava, metros, da linha da rua, e dos doislados avanava a cerca, formara-se ali um encantovel,espcie de resguardo. Valendo-se do que, o homem obrigaraos outros ao ponto donde seriam menos vistos, enquanto

    "PoemasaoVento"JaniBrasilUSD19,67

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    VITRINE

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    os outros ao ponto donde seriam menos vistos, enquantobarrava-lhes qualquer fuga sem contar que, unidos assim, oscavalos se apertando, noo dispunham de rpida mobilidade.Tudo enxergara, tomando ganho da topografia. Os trsseriam seus prisioneiros, no seus sequazes. Aquele homem,para proceder da forma, s podia ser um brabo sertanejo,jaguno at na escuma do bofe. Senti que no me ficava tildar cara amena, mostras de temeroso. Eu no tinha arma aoalcance. Tivesse, tambm, no adiantava. Com um pingo no ,ele me dissolvia. O medo a extrema ignorncia em momentomuito agudo. O medo. O medo me miava. Convidei-o adesmontar, a entrar. Disse de no, conquanto os costumes.Conservava-se de chapu. Via-se que passara a descansar nasela decerto relaxava o corpo para dar-se mais ingentetarefa de pensar. Perguntei: respondeu-me que no estavadoente, nem vindo receita ou consulta. Sua voz se espaava,querendo-se calma a fala de gente de mais longe, talvez so-franciscano. Sei desse tipo de valento que nada alardeia,sem farrona. Mas avessado, estranho, perverso brusco, podendodesfechar com algo, de repente, por um s-no-s. Muito demacio, mentalmente, comecei a me organizar. Ele falou: "Eu vim preguntar a vosmec uma opinio sua explicada..." Carregara a celha. Causava outra inquietude, sua farrusca, acatadura de canibal. Desfranziu-se, porm, quase que sorriu. Da, desceu docavalo maneiro, imprevisto. Se por se cumprir do maior valor de melhores modos poresperteza? Reteve no pulso a ponta do cabresto, o alazo erapara paz. O chapu sempre na cabea. Um alarve. Mais os nvios olhos. E ele era para muito. Seria de ver-se:estava em armas e de armas alimpadas. Dava para se sentiro peso da de fogo, no cinturo, que usado baixo, para elaestar-se j ao nvel justo, ademo, tanto que ele se persistiade brao direito pendido, pronto menevel. Sendo a sela, denotar-se, uma jereba papuda urucuana, pouco de se achar, naregio, pelo menos de to boa feitura. Tudo de gente brava.Aquele propunha sangue, em suas tenes. Pequeno, mas duro,grossudo, todo em tronco de rvore. Sua mxima violnciapodia ser para cada momento. Tivesse aceitado de entrar eum ct6, calmava-me. Assim, porm, banda de fora, sem a-graas de hspede nem surdez de paredes, tinha para seinquietar, sem medida e sem certeza. "Vosmec que no me conhece. Damzio, dos Siqueiras...Estou vindo da Serra. Sobressalto. Damzio, quem dele no ouvira? O feroz deestrias de lguas, com dezenas de carregadas mortes,homem perigosssimo. Constando tambm, se verdade, que depara uns anos ele se serenara evitava o de evitar. Fie-se,porm, quem, em tais trguas de pantera? Ali, antenasai, demim a palmo! Continuava:

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    mim a palmo! Continuava: "Saiba vosmec que, na Serra, por o ultimamente, secompareceu que um moo do governo, rapaz meio estrondoso...Saiba que estou com ele revelia... C eu no quero questocom o governo, no estou em sade nem idade... O rapaz,muitos acham que ele de seu tanto esmiolado... Com arranco, calou-se. Como arrependido de ter comeadoassim, de evidente. Contra que a estava com o fgado em ms margens pensava,pensava. Cabismeditado. Do que, se resolveu. Levantou as feies. Se que se riu: aquela crueldade de dentes. Encarar, no meencarava, s se fito meia esguelha. Latejava-lhe um orgulhoindeciso. Redigiu seu monologar. O que frouxo falava: de outras, diversas pessoas e coisas,da Serra, do So o, travados assuntos, insequentes, comodificultao. A conversa era para teias de aranha. Eu tinha deentender-lhe as mnimas entonaes, seguir seus propsitos esilncios. Assim no fechar-se como jogo, sonso, no me iludir,ele enigmava. E p: "Vosmec agora me faa a boa obra de querer me ensinaro que mesmo que : fasmigerado... faz-me-gerado...famisgeraldo... familhas-gerado... Disse, de golpe, trazia entre dentes aquela frase. Soata comriso seco. Mas, o gesto, que se seguiu, imperava-se de toda arudez primitiva, de sua presena dilatada. Detinha minha resposta, no queria que eu a desse deimediato. E j a outro susto vertiginoso suspendia-me:algum podia ter feito intriga, invencionice de atribuir-me apalavra de ofensa quele homem que muito, pois, que aqui elese famanasse, vindo para exigir-me, rosto a rosto, o fatal, avexatria satisfao? "Saiba vosmec que sa 'ind-hoje da Serra, que vim, semparar, essas seis lguas, expresso direto pra mor de lhepreguntar a pregunta, pelo claro... Se srio, se era. Transiu-se-me. "L, e por estes meios de caminho, tem nenhum ningumciente, nem tm o legitimo o livro que aprende as palavras... gente pra informao torta, por se fingirem de menosignorncias... S se o padre, no So o, capaz, mas compadres no me dou: eles logo engambelam... A bem. Agora, seme faz merc, vosmec me fale, no pau da peroba, noaperfeioado: o que que , o que j lhe perguntei?" Se simples. Se digo. Transfoi-se-me. Esses trzes: Famigerado? "Sim senhor..." e, alto, repetiu, vezes, o termo, enfimnos vermelhos da raiva, sua voz fora de foco. E j me olhava,interpelador, intimativo apertava-me.Tinha eu que descobrir a cara. Famigerado? Habiteiprembulos. Bem que eu me carecia noutro nterim, em

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    prembulos. Bem que eu me carecia noutro nterim, emindcias. Como por socorro, espiei os trs outros, em seuscavalos, intugidos at ento, mumumudos. Mas, Damzio: "Vosmec declare. Estes a so de nada no. So daSerra. Vieram comigo, pra testemunho... S tinha de desentalar-me. O homem queria estrito ocaroo: o verivrbio. Famigerado nxio, clebre, notrio, notvel. Vosmec mal no veja em minha grossaria no noentender. Mais me diga: desaforado? caovel? dearrenegar? Farsncia? Nome de ofensa?" Vilta nenhuma, nenhum doesto. So expresses neutras,de outros usos. Pois.., e o que que , em fala de pobre, linguagem de emdia-de-semana? Famigerado? Bem. : importante, que merece louvor,respeito... Vosmec agarante, pra a paz das mes, mo naEscritura? Se certo! Era para se empenhar a barba. Do que o diabo,ento eu sincero disse: Olhe: eu, como o senhor me v, com vantagens, hum, o queeu queria uma hora destas era ser famigerado bemfamigerado, o mais que pudesse!... Ah, bem! ... soltou, exultante. Saltando na sela, ele se levantou de molas. Subiu em si,desagravava-se, num de afogaru. Sorriu-se, outro.Satisfezaqueles trs: Vocs podem ir, compadres. Vocsescutaram bem a boa descrio... e eles prestes separtiram. S a se chegou, beirando-me a janela, aceitava umcopo d'gua. Disse: No h como que as grandezas machasduma pessoa instruda! Seja que de novo, por um mero, setorvava? Disse: Sei l, s vezes o melhor mesmo, pra essemoo do governo, era ir-se embora, sei no... Mas maissorriu, apagara-se-lhe a inquietao. Disse: A gente temcada cisma de dvida boba, dessas desconfianas... S praazedar a mandioca... Agradeceu, quis me apertar a mo.Outra vez, aceitaria de entrar em minha casa. Oh, pois.Esporou, foi-se, o alazo, no pensava no que o trouxera, tesepara alto rir, e mais, o famoso assunto.

    GuimaresRosa

    EnviadoporGerminodaTerraem05/11/2011Cdigodotexto:T3318339Classificaodecontedo:seguro

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    semadevidapermissodoautor.

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    GerminodaTerraPatydoAlferesRiodeJaneiroBrasil,59anos

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