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FACULDADE SUDOESTE PAULISTA Instituição Chaddad de Ensino CURSO DE BIOMEDICINA AMANDA DO NASCIMENTO VIEIRA DOENÇA HEMOLÍTICA DO RECÉM-NASCIDO RELACIONADO AO SISTEMA RH: UMA REVISÃO DA LITERATURA ITAPETININGA-SP 2017

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FACULDADE SUDOESTE PAULISTA

Instituição Chaddad de Ensino

CURSO DE BIOMEDICINA

AMANDA DO NASCIMENTO VIEIRA

DOENÇA HEMOLÍTICA DO RECÉM-NASCIDO RELACIONADO AO SISTEMA RH:

UMA REVISÃO DA LITERATURA

ITAPETININGA-SP

2017

AMANDA DO NASCIMENTO VIEIRA

DOENÇA HEMOLÍTICA DO RECÉM-NASCIDO RELACIONADO AO SISTEMA RH:

UMA REVISÃO DA LITERATURA

Trabalho de conclusão de curso apresentado à Faculdade Sudoeste Paulista de Itapetininga – FSP – ao curso de graduação em Biomedicina como requisito parcial para a obtenção do título de bacharel em Biomedicina.

Orientador: Prof. Dr. Thiago de Souza Candido

ITAPETININGA-SP

2017

VIEIRA, Amanda do Nascimento

Doença Hemolítica do Recém- Nascido Relacionado ao Sistema RH: uma

revisão da literatura. Amanda do Nascimento Vieira – Itapetininga, 2017, 51p.

Monografia – FSP – Faculdade Sudoeste Paulista – Biomedicina:

Orientador: Prof. Dr. Thiago de Souza Candido

1. Doença Hemolítica 2. Feto 3. Incompatibilidade Sanguínea

4. Aloimunização 5. Sensibilização

AMANDA DO NASCIMENTO VIEIRA

Doença Hemolítica Do Recém-Nascido Relacionado Ao Sistema Rh: uma

revisão da literatura

Trabalho de conclusão de curso apresentado à Faculdade Sudoeste Paulista de

Itapetininga – FSP – ao curso de graduação em Biomedicina como requisito parcial

para a obtenção do título de bacharel em Biomedicina.

Orientador: Prof. Dr. Thiago de Souza Candido

BANCA EXAMINADORA

________________________________________

Orientador: Prof. º Dr. Thiago de Souza Candido

________________________________________

Prof. ª Ms. Lígia Maria Micai Gomide

________________________________________

Prof. º Ms. Heverson Felipe Pranches Carneiro

Itapetininga, 07 de Dezembro de 2017.

Dedico este trabalho aos

meus pais por todo apoio e

incentivo.

AGRADECIMENTOS

Gostaria de agradecer primeiramente a Deus por ter me dado a oportunidade

de realizar uma faculdade, por toda força e coragem que me concedeu para

continuar e passar por cada obstáculo que surgiram no decorrer destes quatro anos.

Agradeço aos meus pais, minhas irmãs e ao meu namorado pela paciência, pelo

estímulo, por nunca me deixar abalar e por me encorajar em todos os momentos de

dificuldades, bem como pelas inúmeras vezes que me ajudaram. Agradeço aos

meus colegas de sala pelo companheirismo e pelos diversos momentos

inesquecíveis que passamos nesses quatro anos. Agradeço a minhas amigas

Angela e Sarah em particular pela amizade que construímos, pelos diversos

momentos que superamos juntas, por toda ajuda e apoio que me deram no decorrer

do curso. Agradeço também as minhas colegas de trabalho Tamires e Débora, pelos

conselhos e ajudas que me deram no decorrer do último semestre.

Agradeço particularmente ao meu orientador, professor Dr. Thiago pelas

orientações, pelas contribuições decisivas, por sua amizade e pela grande ajuda que

me forneceu no decorrer deste trabalho. Não poderia deixar de agradecer também

aos demais professores que mostraram-me o mundo da biomedicina, fornecendo

diversos conhecimentos sobre esta incrível área. Obrigada a todos que se fizeram

presente e me ajudaram no decorrer desses quatro anos.

VIEIRA, AMANDA N. Doença Hemolítica do Recém-Nascido Relacionado ao

Sistema Rh: uma revisão da literatura. 51 págs. Monografia – Faculdade

Sudoeste Paulista, Itapetininga, 2017.

RESUMO

A doença hemolítica do recém-nascido (DHRN) consiste na destruição precoce dos eritrócitos fetais devido a passagem de anticorpos maternos através da barreira placentária. Esta doença leva a casos de hidropisia, kernicterus, anemia fetal e compromete a maturação das hemácias levando ao aumento de eritroblastos, eritrócitos imaturos, na circulação do feto. Isto ocorre devido a incompatibilidade dos grupos sanguíneos do sistema ABO ou do sistema Rh entre a mãe e o feto, sendo o sistema ABO o mais comum porém possui um caráter benigno na maioria dos casos, e o sistema Rh o principal fator que leva a DHRN. Dentre os antígenos do sistema Rh o mais implicado na aloimunização é o antígeno D, pois possui um potencial maior para estimular a produção de anticorpos. Os métodos de prevenção e diagnóstico desta doença podem ser realizados em consultas pré-natal ou após o nascimento do feto, através da pesquisa do histórico gestacional e transfusional, testes de Coombs indireto e direto, tipagem sanguínea dos sistemas ABO e Rh, amniocentese, ultrassonografia, cordoncentese e através da coleta das vilosidades coriônicas. O tratamento da sensibilização materna pode ser feito através da administração de imunoglobulinas anti-D, que irão destruir as células Rh D positivas presentes na circulação materna, prevenindo assim a produção de anticorpos anti D pelas células maternas. Outros possíveis métodos de tratamento são a exanguineotransfusão, processo onde será removido os produtos gerados da hemólise e os anticorpos maternos da circulação fetal, transfusão intrauterina e a fototerapia. Quando a DHRN está relacionada ao sistema Rh, surge a indagação de como o sistema imunológico materno irá afetar a saúde do feto? Muitas mães não sabem o quão importante é a realização da tipagem sanguínea antes de engravidar ou ao descobrir que está grávida, e como isso pode afetar a saúde do feto se houver uma incompatibilidade do sistema Rh. Este, possivelmente, é o principal motivo do alto índice de casos de fetos com a DHRN. Outro fator que pode agravar é a conduta médica, alguns médicos podem não solicitar os devidos exames no início da gestação para detectar a presença de uma sensibilização materna com o objetivo de evitar o quanto antes que o feto seja muito afetado e apresente várias sequelas. O objetivo geral deste trabalho foi demonstrar a relação da DHRN com a incompatibilidade do sistema Rh entre a mãe e o feto, tendo como objetivo específico demostrar como esta incompatibilidade pode gerar uma reação imunológica nas hemácias fetais levando a problemas em sua saúde, bem como as possíveis manifestações clínicas que podem surgir, visando também explicar como pode ser descoberta e tratada. Para compor este trabalho foi utilizado uma pesquisa de natureza básica, com abordagem na problemática qualitativa, com o objetivo de pesquisa exploratória e ponto de vista dos procedimentos técnicos de pesquisas bibliográficas. Com isso pode-se concluir que a forma mais grave da doença está relacionada com sistema Rh, onde o principal antígeno envolvido é o D. Palavras chave: Doença hemolítica. Feto. Incompatibilidade sanguínea. Aloimunização. Sensibilização.

VIEIRA, AMANDA N. Hemolytic Disease of the Newborn Related to the Rh System: a review of the literature. 51 pages. Monography - Faculty Southwest Paulista, Itapetininga, 2017.

ABSTRACT Hemolytic disease of the newborn (DHRN) consists of the early destruction of fetal erythrocytes due to the passage of maternal antibodies through the placental barrier. This disease leads to cases of hydrops, kernicterus, fetal anemia and compromises the maturation of erythrocytes leading to the increase of erythroblasts, immature erythrocytes, in the fetal circulation. This is due to the incompatibility of the blood groups of the ABO system or the Rh system between the mother and the fetus, with the ABO system being the most common but having a benign character in most cases, and the Rh system the main factor leading to DHRN. Among the antigens of the Rh system most implicated in alloimmunization is the D antigen, since it has a greater potential to stimulate the production of antibodies. The methods of prevention and diagnosis of this disease can be performed in prenatal consultations or after the birth of the fetus, through the investigation of the gestational and transfusional history, indirect and direct Coombs tests, ABO and Rh blood typing, amniocentesis, ultrasonography, cordoncentesis and through the collection of chorionic villi. Treatment of maternal sensitization can be done by administering anti-D immunoglobulins, which will destroy the Rh D positive cells present in the maternal circulation, thus preventing the production of anti-D antibodies by maternal cells. Other possible methods of treatment are exchange transfusion, a process in which the products generated from hemolysis and maternal antibodies from the fetal circulation, intrauterine transfusion and phototherapy will be removed. When DHRN is related to the Rh system, does the question arise as to how the maternal immune system will affect the health of the fetus? Many mothers do not know how important blood typing is prior to becoming pregnant or finding out they are pregnant, and how this can affect the health of the fetus if there is an incompatibility of the Rh system. This is possibly the main reason for the high index of fetal cases with DHRN. Another factor that may aggravate medical conduct is that some physicians may not request screening in the early stages of pregnancy to detect the presence of maternal sensitization in order to avoid as early as possible that the fetus is severely affected and has several sequelae. The general objective of this study was to demonstrate the relationship between DHRN and the incompatibility of the Rh system between the mother and fetus, with the specific objective of demonstrating how this incompatibility can generate an immunological reaction in the fetal RBCs leading to problems in their health, as well as possible clinical manifestations that may arise, in order to explain how it can be discovered and treated. To compose this work, a basic research was used, with an approach in the qualitative problem, with the objective of exploratory research and point of view of the technical procedures of bibliographical researches. With this, it can be concluded that the most severe form of the disease is related to Rh system, where the main antigen involved is D. Keywords: Hemolytic disease, fetus, blood incompatibility, alloimmunization, sensitization.

LISTA DE TABELAS

Tabela 1- Passo a passo da tipagem sanguínea ABO pela prova direta ................. 34

Tabela 2 - Passo a passo da tipagem sanguínea ABO pela prova reversa .............. 35

Tabela 3- Passo a Passo da tipagem sanguínea RhD ............................................. 36

Tabela 4- Passo a Passo da tipagem sanguínea RhD para determinação de

variantes .................................................................................................................. 37

Tabela 5- Passo a passo dos procedimentos necessários para a realização do teste

de Coombs .............................................................................................................. 39

Tabela 6 - Passo a passo dos procedimentos necessários para a realização do teste

de Coombs Indireto .................................................................................................. 41

LISTA DE FÍGURAS

Figura 1 - Genes e Antígenos do Sistema Rh ......................................................... 17

Figura 2 - Esquema do Desenvolvimento da DHRN ................................................ 19

Figura 3 - Comparação das proteínas do D fraco e D parcial com D normal ........... 22

Figura 4 - Variantes Proteicos do D fraco e D parcial .............................................. 23

Figura 5 - Perfil fetal normal .................................................................................... 28

Figura 6 - Coluna Vertebral Normal ......................................................................... 28

Figura 7 - Simetria normal dos átrios e ventrículos fetais ........................................ 29

Figura 8 - Ultrassonografia de um feto com hidropisia na região do couro cabeludo

................................................................................................................................. 29

Figura 9 - Coleta do líquido amniótico com o auxílio de ultrassom .......................... 30

Figura 10 - Coleta do sangue do cordão com o auxílio da ultrassonografia. ............ 31

Figura 11 - Coleta das vilosidades coriônicas pela via transcervical ........................ 32

Figura 12 – Interpretação dos resultados da tipagem sanguínea ABO .................... 34

Figura 13 - Tipagem Sanguínea ABO de indivíduo do grupo A ............................... 35

Figura 14 - Tipagem Sanguínea RhD positivo ......................................................... 36

Figura 15- Teste de Coombs Direto ........................................................................ 38

Figura 16 - Teste de Coombs Indireto ..................................................................... 40

LISTA DE SIGLAS

DHRN - Doença Hemolítica do Recém - Nascido

SNC - Sistema Nervoso Central

TIU - Transfusão Intrauterina

EDTA - Ácido Etilenodiaminotetracético

NaCl: Cloreto de Sódio

PEG: Polietilenoglicol

LISTA DE ABREVIATURAS

Anti- anticorpo

Rh - Rhesus

IgM - Imunoglobulina M

IgG - Imunoglobulina G

IgA - Imunoglobulina A

IgD - Imunoglobulina D

IgE - Imunoglobulina E

kDa - Quilodalton

mg - Miligramas

dl - Decilitro

ml - Mililitros

g - Gramas

Hb - Hemoglobina

Rpm - Rotações por minuto

µg - Micrograma

Rev - Revista

Bras - Brasil

Ver - Versão

Ed - Edição

Vol - Volume

v - Volume

n – número

Num. - número

p. - Páginas

f. - folhas

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................... 11

2 OBJETIVO ............................................................................................................ 14

2.1 Objetivo geral ................................................................................................... 14

2.2 Objetivo específico .......................................................................................... 14

3 METODOLOGIA ................................................................................................... 15

4 DESENVOLVIMENTO .......................................................................................... 16

4.1 Antígenos Eritrocitários de Superfície ........................................................... 16

4.2 Doença hemolítica do recém-nascido (DHRN) ............................................... 17

4.3 Aloimunização .................................................................................................. 20

4.4 Transferência da Imunoglobulina G (IgG) ...................................................... 20

4.5 Destruição das Hemácias Fetais ..................................................................... 20

4.6 Antígeno D ........................................................................................................ 21

4.6.1 Antígenos D fraco ........................................................................................... 22

4.6.2 Antígenos D parciais ....................................................................................... 22

4.7 Principais Manifestações Clínicas da DHRN .................................................. 23

4.7.1 Icterícia ........................................................................................................... 24

4.7.2 Kernicterus ...................................................................................................... 25

4.7.3 Anemia ............................................................................................................ 25

4.7.4 Hidropisia Fetal ............................................................................................... 26

4.8 Diagnósticos Laboratoriais da DHRN ............................................................. 27

4.8.1 Conhecimento do histórico gestacional ........................................................... 27

4.8.2 Pesquisa de incompatibilidade sanguínea entre os pais ................................. 27

4.8.3 Pesquisa de evidência de aloimunização ........................................................ 27

4.8.4 Ultrassonografia .............................................................................................. 28

4.8.5 Amniocentese ................................................................................................. 30

4.8.6 Coleta do sangue fetal do cordão umbilical ..................................................... 31

4.8.7 Coleta de amostras de vilosidades coriônicas ................................................. 32

4.8.8 Diagnóstico clínico .......................................................................................... 33

4.8.9 Imunohematológico ......................................................................................... 33

4.8.10 Teste de Coombs .......................................................................................... 37

4.8.10.1 Teste de Coombs Direto............................................................................. 37

4.8.10.2 Teste de Coombs Indireto .......................................................................... 40

4.9 Métodos De Tratamento da DHRN .................................................................. 42

4.9.1 Imunoglobulina Anti-D ..................................................................................... 42

4.9.2 Transfusão Intrauterina ................................................................................... 43

4.9.2.1 Intraperitoneal .............................................................................................. 44

4.9.2.2 Intravascular................................................................................................. 45

4.9.3 Exanguineotransfusão ..................................................................................... 45

4.9.4 Fototerapia ...................................................................................................... 46

5 CONCLUSÃO ....................................................................................................... 47

REFERÊNCIAS ....................................................................................................... 48

11

1 INTRODUÇÃO

A doença hemolítica do recém-nascido (DHRN), resulta da passagem de

eritrócitos fetais para a circulação materna através da placenta, quando a mãe

possui tipagem Rh negativo e o feto Rh positivo (VIEIRA, 2013). Foi descrita

primeiramente em 1609, na França, pela parteira Loyse Bourgeois, que relatou o

parto de um casal de gêmeos. A primeira nasceu hidrópica, falecendo poucas horas

depois, o segundo, aparentemente saudável, apresentou icterícia falecendo alguns

dias após seu nascimento (VALENTE, 2009). Desde então, outras manifestações

clínicas foram descritas, sendo somente em 1932, demonstrado que a hidropisia,

icterícia grave e o kernicterus, um dano severo ao sistema nervoso central (SNC)

gerado pelo acúmulo de bilirrubina indireta nos tecidos nervosos, estão relacionados

com um mesmo processo acompanhado de anemia hemolítica, eritropoiese

extramedular, hepatoesplenomegalia e pela presença de eritroblastos (MACHADO

et al., 2006). Devido a presença dos eritrócitos imaturos na circulação fetal,

denominados de eritroblastos, posteriormente a DHRN também começou a ser

chamada de Eritroblastose Fetal (MACHADO et al., 2006).

Em 1939, foi identificada uma mulher que deu à luz a um feto com DHRN que

nasceu morto. A mulher foi submetida a uma transfusão sanguínea utilizando o

sangue do marido após o parto, tendo como reação uma hemólise severa. Ela

possuía tipagem Rh negativo e o marido Rh positivo, seu soro aglutinou com o

sangue dele, mas não aglutinava com hemácias Rh negativas. Levine identificou

assim que, o sangue da mulher foi sensibilizado pelos antígenos Rh do feto, que

foram herdados pelo pai (VALENTE, 2009). O mecanismo imunológico e o antígeno

responsável pela isoimunização que levam à DHRN, foram confirmados em 1940

por Weiner, Landsteiner e Levine através da realização de inoculações do sangue

de coelhos em hemácias de macacos Rhesus. Os sangues dos coelhos possuíam

anticorpos que se ligavam aos antígenos das hemácias do macaco Rhesus agindo

contra elas. Foram observados aglutinação em cerca de 85% das hemácias

testadas, sendo consideradas do tipo Rh positivo. Os 15% que não apresentaram

aglutinação foram chamadas de Rh negativo. Tempos depois, Landsteiner e Levine

demostraram assim que as pacientes reportadas em 1939 com casos de reações

sanguíneas, possuíam a tipagem Rh negativa tendo em seu sangue o anticorpo anti-

Rh capaz de reagir com as hemácias de seus maridos e filhos se possuírem uma

tipagem Rh positivo (VALENTE, 2009).

12

Esta reação normalmente ocorre na segunda gestação quando o primeiro

filho apresentou Rh positivo, porém pode ocorrer na gestação do primeiro filho

quando a mãe Rh negativo já entrou em contato com um sangue do tipo Rh positivo

durante uma transfusão sanguínea errônea, gerando o estímulo da produção de

anticorpos contra o antígeno Rh tornando a mãe sensibilizada (VIEIRA, 2013). Isto

se deve ao fato de que, em uma primeira exposição ao antígeno do feto, o sistema

imune materno é estimulado a produzir anticorpos do tipo IgM, que não são capazes

de atravessar a placenta e atingir os antígenos do feto devido ao seu alto peso

molecular (GATTI et al., 2014). Em uma segunda exposição a esse antígeno, o

sistema imune materno irá produzir de uma maneira rápida e intensa, anticorpos do

tipo IgG que, por possuírem baixo peso molecular, são capazes de atravessar a

placenta se ligando aos antígenos eritrocitários do feto, levando à destruição do

mesmo gerando uma hemólise (GATTI et al., 2014). Em consequência de um

período prolongado desta hemólise, o feto pode vir a desenvolver uma anemia

severa ou uma carência de eritrócitos, culminando em uma grande presença de

eritroblastos na circulação fetal (VIEIRA, 2013).

Nos dias atuais, existem diversos fatores pré-natais importantes para o

diagnóstico, controle da imunização materna e para determinar o grau de severidade

da DHRN. Alguns dos métodos e técnicas mais importantes são: ter o conhecimento

da história gestacional, ultrassonografia detalhada, amniocentese, biópsia das

vilosidades coriônicas e a coleta do sangue fetal por meio de cordocentese

(VALENTE, 2009). Um dos métodos que podem ser utilizados como uma tentativa

de diminuir o risco de uma sensibilização materna é a administração de

imunoglobulinas anti-D. Outros métodos como a transfusão intrauterina,

exanguineotransfusão e a fototerapia podem ser utilizados para realizar o tratamento

da DHRN (MANOLO et al., 2004).

Quando a DHRN está relacionada ao sistema Rh, surge a indagação: como o

sistema imunológico materno irá afetar a saúde do feto? Isto ocorre devido o contato

do sangue materno com o sangue fetal, levando assim a estimulação da produção

de anticorpos que irão atingir os antígenos do feto ao atravessar a placenta,

podendo gerar uma anemia, hidropisia, icterícia e kernicterus.

Atualmente um índice baixo de mulheres em idade fértil tem conhecimento

sobre a DHRN e sobre as consequências que esta patologia pode representar para

o feto em uma segunda gestação ou pós sensibilização. Por falta de conhecimento,

13

poucas mães se atentam ao fato da importância da realização da tipagem sanguínea

antes de engravidar ou ao relatar a gravidez.

Possivelmente ainda há muitos casos de fetos com a DHRN, pois muitas

mães não conhecem os tipos de complicações que se pode ter em casos de

incompatibilidades sanguíneas. Outro fator que pode agravar é a conduta médica,

alguns médicos podem não solicitar os devidos exames no início da gestação para

detectar a presença de uma sensibilização materna com o objetivo de evitar o

quanto antes que o feto seja muito afetado e apresente várias sequelas.

14

2 OBJETIVO

2.1 Objetivo geral

Este trabalho se objetivou em demonstrar a relação da DHRN com a

incompatibilidade do sistema RH entre a mãe e o feto, apresentando os principais

métodos de tratamento e diagnóstico

2.2 Objetivo específico

Teve como objetivo específico demostrar como esta incompatibilidade pode

gerar uma reação imunológica nas hemácias fetais gerando problemas em sua

saúde, bem como as possíveis manifestações clínicas que podem surgir, visando

também explicar como pode ser descoberta e tratada.

15

3 METODOLOGIA

Para compor este trabalho foi utilizado uma pesquisa de natureza básica, com

abordagem na problemática qualitativa, com o objetivo de pesquisa exploratória e

ponto de vista dos procedimentos técnicos de pesquisas bibliográficas. Os artigos

foram retirados do Google Acadêmico e do Scielo.

16

4 DESENVOLVIMENTO

4.1 Antígenos Eritrocitários de Superfície

As células do sangue humano possuem muitos antígenos de superfície,

estruturas macromoleculares que podem ser de natureza carboidrato, proteína ou

glicoproteína (BONIFÀCIO, 2009), sendo que os mais importantes pertencem ao

sistema ABO e ao Rhesus (Rh) (PACHECO, 2013). Os antígenos do sistema ABO

não estão restritos somente a membrana eritrocitária, mas também podem ser

encontrados na saliva e outros líquidos biológicos, exceto no fluido espinhal.

Possuem quatro tipos de antígenos: A, B, AB e O, que são expressos desde a 5º

semana de vida intrauterina (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2014). Estes antígenos são

sintetizados na membrana dos eritrócitos devido a adição de carboidratos a uma

cadeia glicoproteica (STINGHEN et al., 2016).

O sistema Rh consiste em várias proteínas, sendo o antígeno D o mais

relevante e o mais implicado nos casos de aloimunização por possuir maior

antigenicidade, capacidade de estimular o sistema imune a provocar formação de

anticorpos, como reação à presença de substâncias estranhas no organismo

(BAIOCHI, 2009). Os antígenos Rh fetais começam a surgir na 6ª semana de vida

(GIRALDO, 2009), é o mais complexo dos sistemas eritrocitários e o segundo mais

importante na medicina transfusional, depois do sistema ABO, sendo encontrados

exclusivamente nas hemácias (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2014). São proteínas

codificadas por dois genes homólogos o RHD e RHCE, que estão localizados no

cromossomo 1 com 10 exóns cada (Figura 1) (BONIFÀCIO, 2009). Estes genes estão

muito próximos uns dos outros, porém são orientados em direções opostas

(STINGHEN et al., 2016). O RHD irá expressar o antígeno D e o RHCE os antígenos

C, c, e, E, que podem possuir várias combinações (BONIFÀCIO, 2009). Tanto o

sistema ABO como o Rh são determinados geneticamente, por esta razão o feto

pode herdar o tipo sanguíneo da mãe e do pai (PACHECO, 2013).

A exposição do antígeno Rh na superfície dos eritrócitos, irá depender da

presença da glicoproteína Rh associada, produto do gene RHAG localizado no

cromossomo 6 (BONIFÀCIO, 2009). Quando o indivíduo possuí o tipo sanguíneo Rh

negativo são expostas a qualquer quantidade de sangue Rh positivo, seu organismo

poderá gerar uma reação imunológica, chamada de aloimunização Rh (BAIOCHI,

2009).

17

Figura 1 - Genes e Antígenos do Sistema Rh

Fonte: STINGHEN et al., 2016, p. 397

Tal exposição pode ocorrer após uma transfusão sanguínea, um contato com

seringas contaminadas ou durante uma gestação do feto Rh positivo, em questão da

hemorragia feto materna (BAIOCHI, 2009). O fenótipo dos eritrócitos se caracteriza

pela presença ou ausência do antígeno D presente na superfície das hemácias.

Pode ser identificado mediante técnicas de aglutinação, onde a presença do

antígeno D é caracterizada como fenótipo Rh positivo e sua ausência como Rh

negativo (SCHMIDT, 2010).

4.2 Doença hemolítica do recém-nascido (DHRN)

A doença hemolítica do recém-nascido (DHRN), consiste na redução da vida

média dos eritrócitos do feto, devido a ação dos anticorpos eritrocitários maternos,

que irão se ligar aos antígenos eritrocitários fetais causando sua destruição, levando

a uma anemia fetal (VALDÈS et al., 2000). Isto ocorre devido a incompatibilidade

dos grupos sanguíneos entre a mãe e o feto (GATTI et al., 2014). Com relação as

diversas formas clínicas que são mediadas pela imunoglobulina IgG, a DHRN é

considerada a mais complexa pois envolve a produção de anticorpos em um

indivíduo e a destruição celular em outro individuo (GIRALDO, 2009).

Algumas situações, como a amniocentese, remoção manual da placenta,

cesárias, rompimento da placenta, transfusões sanguíneas com eritrócitos Rh

positivos, entre outras situações podem levar à pequenas quantidades de sangue

fetal na circulação materna, estimulando a produção de anticorpos (GIRALDO,

2009). O principal tipo de contato do sangue materno com antígenos eritrocitários Rh

positivos é devido a gravidez. Esta passagem pode ocorrer em qualquer momento

18

da gestação após a 16ª semana, sendo que a quantidade de células e a frequência

da exposição tendem a aumentar após o parto quando se tem a maior concentração

de eritrócitos fetais em contato com a circulação materna (RAVEL, 1997). Na

primeira gravidez a sensibilização é rara, ocorrendo somente em torno de 0,8 % a

1,5 % dos casos, por ser a primeira exposição a antígenos considerados estranhos

ao organismo da mãe, tendo apenas o estímulo da produção dos anticorpos, não

levando assim, a destruição dos eritrócitos fetais (BAIOCHI, 2009). Nem todas as

mães se tornam sensibilizadas durante a gravidez, o risco de sensibilização é em

média 10-13%, com a presença de Rh incompatível em mães não sensibilizadas.

Entre 5-10% dos primeiros filhos são afetados devido a mãe ter sido exposta aos

antígenos Rh positivos antes da gestação, ou devido ao fato da mãe ser muito

sensível ao estímulo de um sangue Rh positivo durante uma gravidez normal

(RAVEL, 1997).

A DHRN causada pela incompatibilidade do feto com os antígenos do sistema

ABO materno é mais comum, porém possui um caráter benigno por ser raramente

grave, provocando especialmente uma anemia. Já o grupo sanguíneo do sistema Rh

é o responsável por 95% dos casos da doença (BAIOCHI, 2009). Se a mãe possuir

Rh positivo ou o pai, assim como a mãe, possuir uma tipagem Rh negativo,

teoricamente o feto não possui um risco de desenvolver a doença (RAVEL, 1997).

O sistema Rh é muito amplo possuindo cerca de cinquenta antígenos já

descritos, porém apenas cinco estão envolvidos de forma clinicamente significante

na DHRN, sendo eles: D, C, c, E, e (BAIOCHI, 2009).

Os anticorpos maternos são transferidos para a circulação do feto através da

placenta, sendo a imunoglobulina G (IgG) a única capaz de atravessar a barreira

placentária, por possuir baixo peso molecular (Figura 2) (VALDÈS et al., 2000). Ao

atravessar a placenta, estes anticorpos irão atingir a circulação fetal levando a

destruição de seus eritrócitos (RAVEL, 1997).

A partir da 10ª semana da gestação, os anticorpos IgG que passam pela

placenta para destruir as hemácias fetais Rh D positivas, irão desencadear um

processo de hemólise que irá resultar em uma anemia fetal (BAIOCHI, 2009). O grau

desta anemia irá depender da intensidade da hemólise, podendo levar a um

aumento da eritropoiese medular, seguida de um recrutamento de sítios

extramedulares, como fígado, baço, placenta, rins e suprarrenais, até o momento em

que ocorrer uma congestão hepática, obstrução do sistema porta, redução da

19

pressão oncótica e se instale uma insuficiência cardíaca e hidropisia fetal (BAIOCHI,

2009).

Figura 2 - Esquema do Desenvolvimento da DHRN

Fonte: ROBBINS & COTRAN, 2005, p. 508

A doença pode levar a condições severas onde o feto irá apresentar uma

anemia intensa, culminando em hidropisia, hiperbilirrubinemia, icterícia, kernicterus

ou até mesmo levar ao óbito (VALDÈS et al., 2000). Mesmo após o nascimento, os

anticorpos maternos que foram transferidos ao feto continuam causando hemólise,

pois os eritrócitos possuem uma meia vida de noventa dias (BAIOCHI, 2009).

A reação imunológica inicia-se pelos anticorpos IgM, que são produzidos ao

longo das semanas de gestação, não sendo capazes de atravessar a barreira

placentária devido ao seu alto peso molecular. Uma resposta secundária pode

ocorrer após uma segunda exposição a um determinado antígeno sendo constituído

pelo anticorpo IgG, que são capazes de atravessar a placenta (BAIOCHI, 2009).

O quadro clínico e a gravidade da doença irão depender do tipo de anticorpo

produzido, seu nível no sangue materno e a duração da exposição no feto,

determinando o grau de hemólise, a capacidade da eritropoietina e do tratamento

aplicado intrauterino (BAIOCHI, 2009). A DHRN possui três estágios: aloimunização

20

materna, transferência de imunoglobulina G (IgG) materna ao feto e a destruição das

hemácias fetais (VALDÈS et al., 2000).

4.3 Aloimunização

A aloimunização consiste na formação de anticorpos após uma exposição a

antígenos não próprios considerados estranhos ao organismo. No caso da DHRN, a

mãe produz anticorpos contra os antígenos de superfície dos eritrócitos fetais que

não estão presentes em seus eritrócitos, o antígeno D (VALDÈS et al., 2000). Nesse

caso, o feto irá expressar apenas antígenos de origem paterna, que podem chegar a

circulação materna durante a gestação ou no momento do parto levando a produção

de imunoglobulinas especificas (BAIOCHI, 2009). As imunoglobulinas são proteínas

responsáveis pela resposta imunológica do sistema humoral originadas de células

plasmáticas (KALLAUR et al., 2007). Tipos diferentes de imunoglobulinas são

secretadas, podendo ser IgG, IgA, IgM, IgD ou IgE (MARTINEZ et al., 1999). A

imunoglobulina do tipo IgG é o principal anticorpo produzido durante uma resposta

imunológica secundária do sangue (KALLAUR et al., 2007).

4.4 Transferência da Imunoglobulina G (IgG)

No momento que os linfócitos B materno identificam os antígenos

eritrocitários fetais, uma imediata produção de IgM é estimulada (LAMBERTINO et

al., 2014). As imunoglobulinas do tipo IgM possuem uma vida média curta, sendo de

em média 5 dias (MARTINEZ et al., 1999). A medida que os níveis de IgM declinam,

concomitantemente, os níveis de IgG aumentam (LAMBERTINO et al., 2014). Por

possuir um baixo peso molecular de 150 kDa (MARTINEZ et. al., 1999), após serem

atraídos pelos antígenos eritrocitários do feto, a IgG atravessa a barreira placentária

atuando como anticorpos anti-D, levando à destruição dos eritrócitos fetais

culminando em um quadro anêmico (LAMBERTINO et al., 2014).

4.5 Destruição das Hemácias Fetais

Após a fixação dos anticorpos maternos aos eritrócitos fetais, ocorre dois po-

ssíveis mecanismos que são capazes de causar danos (LAMBERTINO et al., 2014).

O primeiro é mediado pelo sistema complemento, onde um conjunto de proteínas

sintetizadas, principalmente no fígado, são ativadas e irão dar início a uma série de

reações, produzindo diferentes tipos de fragmentos proteicos que serão capazes de

21

provocar diferentes efeitos biológicos, como por exemplo a destruição das

membranas celulares, aumento da atividade fagocitária celular e a introdução de

reações inflamatórias. (MARTINEZ et al., 1999). É frequente na presença de anti-A e

anti-B, onde ocorrerá um dano marcado de membrana resultando em uma hemólise

intravascular com hemoglobinúria e hemoglobinemia, esta membrana é fragmentada

e fagocitada no fígado pelo sistema reticuloendotelial (LAMBERTINO et al., 2014). O

segundo mecanismo não irá depender do sistema complemento, sendo observado

com frequência na presença do anti-D, a destruição é mais sutil e leve, porém

também irá levar a uma hemólise ocorrendo principalmente no fígado

(LAMBERTINO et al., 2014). Os macrófagos são atraídos por quimiotaxia (processo

de migração das células em direção a um gradiente químico) após a união do

antígeno com o anticorpo, onde irá se ligar aos glóbulos vermelhos formando

rosetas. A membrana celular também é atacada sendo retirado as porções que se

selam através do deslocamento, deformando o glóbulo vermelho dando a ele uma

maior rigidez. Mesmo que os eritrócitos entrem em processo de fuga do macrófago,

ainda levarão danos devido a fragilidade osmótica adquirida (LAMBERTINO et al.,

2014).

4.6 Antígeno D

Foi descrito em 1939, por Levine e Stetson através de um caso de uma

mulher que após dar à luz a uma criança com DHRN, sofreu uma hemorragia,

necessitando receber uma transfusão utilizando o sangue incompatível do marido,

apresentando em seguida uma reação transfusional grave (MINISTÉRIO DA

SAÚDE, 2014). O anti-D, anticorpo correspondente ao antígeno D, foi identificado

em 1940 por Landsteiner e Wiener, após observarem que o soro do coelho

imunizado com hemácias do macaco Rhesus também aglutinava cerca de 80% das

hemácias humanas (SCHMIDT, 2010).

É um dos cinquenta antígenos do sistema Rh mais importantes do grupo

sanguíneo em humanos, altamente polimórfico e imunogênico, sendo que mais de

50% dos casos da DHRN são causados por este antígeno (SCHMIDT, 2010). Por

possuírem um extenso polimorfismo, podem se apresentar com uma fraca

expressão, sendo este o antígeno D fraco, ou com um antígeno D modificado, o

antígeno D parcial (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2014). Estes tipos de polimorfismos

podem causar dificuldades na classificação do Rh em negativo e positivo, pois

22

possuem baixa expressão na superfície das hemácias quando comparados com o

antígeno D, apresentando diferentes tipos de proteínas em sua superfície (Figura 3)

(BONIFÀCIO, 2009). Seu reconhecimento irá depender do tipo de método e da

qualidade do reagente anti-D utilizados (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2014). Indivíduos

Rh negativos que apresentam o polimorfismo parcial ou enfraquecido podem possuir a

formação de anti-D, assim como indivíduos Rh positivos que apresentam o antígeno

parcial também podem possui-lo se exposto ao antígeno D (MINISTÈRIO DA SAÚDE,

2014).

Figura 3 - Comparação das proteínas do D fraco e D parcial com D normal

Fonte: STINGHEN et al., 2016, p. 399

4.6.1 Antígenos D fraco

São variações quantitativas do antígeno D, possuem expressão enfraquecida

que reagem com os anticorpos anti-D (OLIVEIRA, 2013). Esta variação ocorre

devido a substituição de aminoácidos na região intracelular ou transmembranária da

proteína D, o que leva a diminuição do número de sítios dos antígenos D presentes

na membrana eritrocitária (STINGHEN et al., 2016). Nos testes sorológicos eles são

detectados somente por meio de tratamento enzimático das hemácias e através da

técnica de Coombs Indireto, um teste que consiste na identificação dos anti-D. As

hemácias que apresentam o antígeno D fraco devem ser consideradas Rh positivas,

pois podem provocar uma aloimunização transfusional ou feto-materna (OLIVEIRA,

2013).

4.6.2 Antígenos D parciais

Os antígenos D parciais se caracterizam pela ausência de um ou mais

epítopos do antígeno D, que são substituídos por epítopos do antígeno CcEE

(MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2014). Esta alteração ocorre devido às modificações

moleculares no gene codificador do antígeno D, que leva a substituição dos

aminoácidos, principalmente na porção extracelular da proteína D. Devido a

23

presença de diferentes aminoácidos, vários epítopos apresentam-se alterados

(MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2014). Indivíduos que necessitam de transfusão

sanguínea, ou gestantes que possuem o antígeno D parcial, podem ser

sensibilizados se expostos aos antígenos D positivos, pois podem levar a produção

de anti-D (STINGHEN et al., 2016). Por esta razão investe-se cada vez mais em

obter reagentes capazes de detectar todos os tipos de antígenos D variantes

(MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2014). Estas alterações podem ser qualitativas quando

ocorre a perda ou ganho de um epítopo da proteína D ou pode ser quantitativa

quando relacionado a redução do número dos sítios do antígeno de membrana

eritrocitária (Figura 4) (STINGHEN et al., 2016). Alguns antígenos D parciais

possuem baixa densidade antigênica apresentando também uma expressão fraca,

outros apresentam uma alta densidade antigênica, semelhantes ao antígeno D

normal (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2014).

Figura 4 - Variantes Proteicos do D fraco e D parcial

Fonte: STINGHEN et al., 2016, p. 398

4.7 Principais Manifestações Clínicas da DHRN

A partir da hemólise e do aumento da produção das hemácias fetais para

compensar as perdas, surgem algumas manifestações clínicas relacionadas a

DHRN (ROUX, 2000). Quanto maior for a reação da hemólise e a compensação das

hemácias com o aumento de sua produção, mais grave serão as manifestações

clínicas e maiores serão os danos, principalmente no Sistema Nervoso Central

(SNC) devido ao grande aumento de bilirrubina no sangue (ROUX, 2000). As

principais manifestações clínicas relacionada DHRN consistem em uma anemia e

em uma icterícia que se desenvolvem rapidamente, porém ao atingirem seu estado

grave outras manifestações podem surgir (RAVEL, 1997).

24

4.7.1 Icterícia

A icterícia surge devido a incapacidade do feto em eliminar a bilirrubina

(ROUX, 2000). É apresentada como uma coloração amarelada na pele devido a

deposição da bilirrubina nesse local, onde é possível encontrar seus níveis elevados

no plasma caracterizado assim como hiperbilirrubinemia (RAMOS, 2002). Os níveis

de bilirrubina no sangue estão relacionados com a intensidade da coloração

amarelada da pele. Quando os níveis de bilirrubina no sangue estão ao redor de 5 a

6 mg/dl a icterícia na pele torna-se visível. A icterícia pode refletir em alguns

transtornos na produção ou em alguns passos do metabolismo e da excreção da

bilirrubina (RAMOS, 2002).

A bilirrubina é um pigmento amarelo, derivada do grupo heme da

hemoglobina liberada da quebra das hemácias, onde cada grama que será

degradada se transforma em 35 mg (miligramas) de bilirrubina (ROUX, 2000). Este

processo ocorre ao final da vida das hemácias, no interior das células do sistema

reticuloendotelial (RAMOS, 2002). A icterícia é resultado do aumento da bilirrubina

devido a processos hemolíticos, podendo ser agravada pela imaturidade hepática.

Após o nascimento, a icterícia surge dentro das primeiras vinte e quatro horas de

vida, alcançando seu nível máximo em até três ou quatro dias de vida quando não

tratada (ROUX, 2000).

É necessário que o paciente seja examinado em um ambiente com uma luz

adequada natural, pois em pouca claridade ou com a utilização de uma iluminação

artificial, pode ser difícil perceber a coloração amarelada que corresponde a icterícia.

Os locais onde a icterícia pode ser mais percebida é na conjuntiva ocular e na pele

(RAMOS, 2002). É possível detecta-la quando a concentração sanguínea da

bilirrubina ultrapassa 2 a 3 mg/100 ml, sendo que os valores considerados normais

são de 0,3 a 1,0 mg/100 ml (RAMOS, 2002). Em situações normais, as bilirrubinas

fetais são apuradas pelo fígado materno, por esta razão a maioria dos recém-

nascidos não apresentam icterícia (ROUX, 2000). Como consequência disto, os

recém-nascidos apresentam icterícia após o parto apenas em casos mais graves.

Em casos mais leves pode vir a aparecer durante horas ou até 24 horas.

Normalmente está acompanhada de anemia quando presente em recém-nascidos, e

em alguns casos de eritroblastos circulantes (RAVEL, 1997).

25

4.7.2 Kernicterus

A elevada acumulação da bilirrubina no tecido nervoso leva a danos no SNC,

caracterizando o kernicterus, também conhecido como encefalopatia bilirrubina,

onde ocorre um comprometimento no núcleo da base do encéfalo (RAMOS, 2002).

A bilirrubina indireta que circula no plasma ligada à albumina é lipossolúvel, ou seja,

solúvel em gordura e insolúvel em água (ROUX, 2000). Quando a capacidade de

união da albumina é muito alta, surge a presença de bilirrubina livre no plasma,

sendo possível a sua migração aos tecidos se fundindo a eles por difusão,

favorecidos pela bicamada lipídica das membranas celulares (ROUX, 2000). Em

algumas situações a bilirrubina pode estar fortemente aumentada, o que poderá

prejudicar alguns tecidos, principalmente do SNC (RAMOS, 2002). Os tecidos

nervosos possuem membranas com uma maior quantidade de lipídeos quando

comparadas com os outros tecidos, por esta razão a bilirrubina indireta possui maior

afinidade a eles (ROUX, 2000).

Em geral, 10% dos recém-nascidos que possuem sinais e sintomas de

kernicterus não sobrevivem, pois apresentam retardo mental severo, paralisia

cerebral, surdez, estrabismo, alteração na função das mitocôndrias neuronais e,

consequentemente, a uma morte neural (ROUX, 2000). Nas últimas quatro décadas

a incidência da kernicterus tem variado muito devido aos critérios de diagnóstico

bem como os tipos de cuidados ao recém-nascido (RAMOS, 2002).

4.7.3 Anemia

Anemia é definida como uma redução no número total dos eritrócitos

circulantes. Fetos que apresentam a DHRN, podem vir a apresentar uma anemia

hemolítica, que resulta da destruição precoce das hemácias devido a uma hemólise

extravascular ou intravascular (ROBBINS & COTRAN, 2005). A hemólise

extravascular consiste na destruição das hemácias no interior das células presentes

no sistema fagócito do baço, sendo que o aumento desta atividade pode causar uma

esplenomegalia (ROBBINS & COTRAN, 2005). A hemólise intravascular consiste em

uma lesão mecânica, fixação do complemento, infecção por parasitas intracelulares

ou por fatores tóxicos exógenos. Com relação a DHRN, a hemólise intravascular é

gerada pela fixação do complemento, onde as células são fixadas por anticorpos

oriundos de uma transfusão sanguínea incompatível ou através de um contato com

sangue incompatível (ROBBINS & COTRAN, 2005).

26

Dentre as diversas causas da anemia fetal, a mais comum é a aloiminização

das hemácias (CUNNINGHAM et al., 2016). O grau de gravidade da anemia irá

depender da capacidade da medula óssea em produzir hemácias para responder a

hemólise (ROUX, 2000). O grau da anemia fetal pode ser definido também de

acordo com a concentração de hemoglobina, onde o nível menor ou igual a 7 g/dl é

considerado um caso grave, níveis de 7 a 10 g/dL são os casos de anemia

moderada, e níveis entre 10 e 12 g/dL os casos de anemia leve (TAVEIRA et al.,

2004).

A maioria dos recém-nascidos apresentam ao nascer uma anemia leve e uma

discreta hepatoesplenomegalia (aumento no fígado e no baço), sendo relativamente

normal (ROUX, 2000). Alguns recém-nascidos, entre 25% e 30%, apresentam uma

anemia moderada e uma eritropoiese insuficiente para que os níveis de hemoglobina

fetais sejam adequados mantidos. Na anemia severa, ele pode apresentar uma

falência severa nos órgãos, bem como uma hidropisia fetal (ROUX, 2000).

4.7.4 Hidropisia Fetal

O termo hidropisia refere-se ao grande acúmulo de líquido no corpo

(CUNNINGHAM et al., 2016). A hidropisia fetal consiste no acúmulo anormal de

líquido no espaço extravascular e nas cavidades corporais do feto, sendo designada

como uma redução da pressão oncótica na circulação juntamente com um aumento

da pressão dos capilares venosos em razão da insuficiência cardíaca (ROBBINS &

COTRAN, 2005). Pequenos grupos de células originadas da estimulação do

hormônio eritropoietina, irão se localizar na circulação hepática, gerando uma

obstrução portal e umbilical que darão origem a uma hipertensão portal capaz de

provocar uma interferência na função dos hepatócitos (ROUX, 2000). Com isso

ocorre uma diminuição na produção de albumina levando a uma diminuição da

pressão osmótica, dando origem ao desenvolvimento de um edema generalizado,

ascite e de um derrame do pericárdio e pleural (anasarca) (ROUX, 2000).

A causa mais comum da hidropisia fetal é a anemia hemolítica, devido a

incompatibilidade de grupos sanguíneos do sistema Rh entre a mãe e o feto,

também conhecida como hidropisia imune (ROBBINS & COTRAN, 2005). Entre 20%

e 25% dos fetos que apresentam uma anemia severa desenvolvem hidropisia fetal

no útero, de 10% a 12% apresentam antes da 34ª semana de gestação e a outra

metade apresenta depois dessa época (ROUX, 2000). Inicialmente era

27

diagnosticada após o parto, porém nos dias atuais é possível realizar o diagnóstico

através do uso da ultrassonografia (CUNNINGHAM et al., 2016) e da pesquisa de

anticorpos eritrocitários no soro materno com o teste de Coombs (FRITSCH, 2012).

A hidropisia teve uma grande redução após a utilização da imunoglobulina anti-D e

com a imediata transfusão fetal (CUNNINGHAM et al., 2016).

4.8 Diagnósticos Laboratoriais da DHRN

É de extrema importância que os exames capazes de detectar a doença

sejam realizados rapidamente, para que seja possível impedir o avanço da doença

(ROUX et al., 2000). Os procedimentos e exames responsáveis pelo diagnóstico da

DHRN são:

4.8.1 Conhecimento do histórico gestacional

Consiste em saber o histórico de outras gestações, se já passou por partos ou

gestações de fetos que apresentaram hidropisia e icterícia, bem como se apresentou

abortos no primeiro trimestre da gravidez. Também é importante ter o conhecimento

de transfusões anteriores e se a mãe apresentou algum tipo de reação transfusional

(ROUX et al., 2000).

4.8.2 Pesquisa de incompatibilidade sanguínea entre os pais

Consiste na realização da tipagem do ABO e Rh nos pais. Uma complicação

com relação ao sistema ABO que pode levar ao feto a desenvolver a DHRN, é

quando a mãe possui o antígeno O e o pai o antígeno A ou B. No sistema Rh a

condição clássica, e mais frequente, onde o feto apresenta a DHRN é quando a mãe

é Rh negativa e o pai Rh positivo (ROUX et al., 2000).

4.8.3 Pesquisa de evidência de aloimunização

É o principal fator do diagnóstico. Toda gestante que apresenta o antígeno Rh

negativo deve realizar o teste de Coombs Indireto (vide adiante), um teste que

permite identificar a presença de anticorpos anti-Rh e outros, para que seja avaliado

se houve algum tipo de contato com um sangue Rh positivo, tornando-a imunizada

(ROUX et al., 2000).

28

4.8.4 Ultrassonografia

Atualmente é possível realizar o diagnóstico de algumas anomalias fetais

utilizando a ultrassonografia devido aos avanços da resolução dos aparelhos. Este

exame permite a visualização de qualquer malformação com relação ao crescimento

dos órgãos, realizar acompanhamento de algumas regiões fetais ou até mesmo

identificar algum atraso no seu desenvolvimento (Figuras 5 e 6) (JUNIOR, 2002).

Figura 5 - Perfil fetal normal

Fonte: CUNNINGHAM et al., 2016, p. 205

Figura 6 - Coluna Vertebral Normal

Fonte: CUNNINGHAM et al., 2016, p. 201

29

Não é um método invasivo, permitindo avaliar a função e o tamanho da área

cardíaca (Figura 7), tamanho anatômico, área hepática, esplênica e placentária bem

como avaliar o volume do líquido amniótico. A técnica pode também indicar a

presença de uma hidropisia fetal (Figura 8) (ROUX et al., 2000).

Figura 7 - Simetria normal dos átrios e ventrículos fetais

Fonte: CUNNINGHAM et al., 2016, p. 209

Figura 8 - Ultrassonografia de um feto com hidropisia na região do couro cabeludo

Fonte: CUNNINGHAM et al., 2016, p. 318

30

4.8.5 Amniocentese

Consiste na punção do líquido amniótico com o auxílio da ultrassonografia

(Figura 9), com o objetivo de identificar o índice de hemólise intrauterina e verificar o

estado do feto com relação ao nível do pigmento biliar. Através da

espectrofotometria, é possível determinar a concentração da bilirrubina presente no

líquido amniótico e a gravidade da anemia fetal (ROUX et al., 2000). Como o líquido

amniótico contém bilirrubina indireta na maioria dos casos de hipebilirrubinemia fetal,

através de sua análise é possível identificar a DHRN (RAMOS, 2002). Antes de

realizar a punção é importante avaliar o feto de uma maneira geral, visualizando

suas medidas e movimentos, pois com isso é possível identificar um local ideal para

realizar a coleta, bem como, detectar qualquer anomalia prévia antes de se realizar

a amniocentese (JUNIOR, 2002). A agulha é posicionada para a região da bolsa

com maior quantidade de líquido amniótico, devendo evitar atingir o feto e o cordão

umbilical, bem como não atravessar a placenta. Normalmente é realizada entre 15ª

e 20ª semana de gestação, porém também pode ser realizada em outras semanas

(CUNNINGHAM et al., 2016). Em casos onde a mãe não está sensibilizada, deve

ser administrado a imunoglobulina anti-D após o procedimento, para evitar que a

mesma se torne sensibilizada após o contato com o sangue fetal (CUNNINGHAM et

al., 2016).

Figura 9 - Coleta do líquido amniótico com o auxílio de ultrassom

Fonte: CUNNINGHAM et al., 2016, p.299

31

4.8.6 Coleta do sangue fetal do cordão umbilical

Através da cordocentese é possível retirar uma amostra do sangue fetal

presente no cordão umbilical, estabelecendo um diagnóstico com mais segurança

pois permite realizar análises hematológicas e bioquímicas do sangue do feto

(ROUX et al., 2000). Esta técnica foi desenvolvida por Daffos em 1983, na França,

contando hoje com o auxílio da ultrassonografia para localizar a região de

implantação do cordão na placenta e acompanhar o processo de punção do sangue

(JUNIOR, 2002). Permite o acesso direto a circulação do feto, possibilitando obter

dados importantes com relação ao hematócrito, bem como realizar o teste de

Coombs Direto (vide adiante) para identificar se há a presença de anticorpos

maternos na superfície dos eritrócitos fetais, tipagem sanguínea fetal, verificar os

níveis de reticulócitos e realizar análise da bilirrubina total (GIRALDO, 2009). Através

do controle direto da ultrassonografia, a agulha é introduzida na veia umbilical e o

sangue é aspirado lentamente (Figura 10) (CUNNINGHAM et al., 2016). Por ser um

exame mais demorado do que a amniocentese e a coleta das vilosidades coriônicas,

pode ser realizado a administração de um anestésico local. Após a punção é

necessário verificar os batimentos cárdicos fetais e deve-se examinar o local da

punção para verificar se está ocorrendo sangramentos (CUNNINGHAM et al., 2016).

Figura 10 - Coleta do sangue do cordão com o auxílio da ultrassonografia.

Fonte: CUNNINGHAM et al., 2016, p. 301

32

Em algumas situações, pode ser encontrado a presença de sangue materno no

sangue puncionado do cordão, sendo necessário utilizar determinados marcadores

para detectar a presença de hemoglobinas fetais (Hb fetal) e diferenciar o sangue

materno do sangue fetal (ROUX et al., 2000).

4.8.7 Coleta de amostras de vilosidades coriônicas

A coleta é realizada com o auxílio da ultrassonografia, através da inserção de

um cateter na região intrauterina em uma determinada via, podendo ser

transabdominal ou transcervical (Figura 11) (JUNIOR, 2002). A amostra pode ser

obtida entre a 8ª e 9ª semana de gestação. Quando as vilosidades são rompidas é

possível obter eritrócitos fetais para realizar a caracterização dos antígenos (ROUX

et al., 2000). Tem sido também proposto como um método capaz de determinar o

tipo de Rh fetal (GIRALDO, 2009). A ultrassonografia irá direcionar o cateter para o

interior da placenta ainda em formação, aspirando em seguida as vilosidades para

dentro da seringa que contém um meio de cultura específico para tecidos

(CUNNINGHAM et al., 2016). Por ser considerado um exame invasivo, deve ser

indicado apenas para mulheres onde o marido possui a tipagem Rh positivo, pois

existe um risco de ela ser imunizada e de ocorrer uma hemorragia feto-materna, ou

Figura 11 - Coleta das vilosidades coriônicas pela via transcervical

Fonte: CUNNINGHAM et al., 2016, p.300.

33

pode ser indicada em casos de outras gestações onde o feto apresentou uma DHRN

(ROUX et al., 2000). Em casos onde a mãe não está sensibilizada, deve ser

administrado a imunoglobulina anti-D após o procedimento para evitar que a mesma

se torne sensibilizada após o contato com o sangue fetal (CUNNINGHAM et al.,

2016).

4.8.8 Diagnóstico clínico

É realizado no recém-nascido, onde será avaliado seu aspecto físico

buscando identificar palidez, taquicardia e taquipneia oriundas de uma anemia ou

devido a derrames pleurais (ROUX et al., 2000). Avalia também se o recém-nascido

apresenta um quadro de hepatoesplenomegalia secundária ou alguma falha

cardíaca como consequência de uma hemólise extravascular, hematopoiese

extramedular, petequeias, purpuras e icterícia, podendo identificar também danos

neurológicos devido ao kernicterus. Outros sintomas incluindo vômito, febre e

hipertonia também podem ser identificados (ROUX et al., 2000).

4.8.9 Imunohematológico

Os exames imunohematológicos fazem a confirmação do tipo sanguíneo e da

imunização após o nascimento do feto (ROUX et al., 2000). As provas de

confirmação consistem na tipagem dos sistemas ABO e Rh, os exames de

confirmação consistem no teste de Coombs, onde o método indireto é realizado afim

de determinar os aloanticorpos maternos e sua especificidade e o método direto

para identificar os anticorpos eritrocitários (ROUX et al., 2000).

A tipagem do ABO é realizada através de uma prova direta, que irá pesquisar

os antígenos A e B, ou através de uma prova reversa que irá detectar os anticorpos

A, B e O. Nas Tabelas 1 e 2 está demostrado os passos necessários para a

realização das respectivas provas. A prova direta consiste no teste dos eritrócitos do

paciente com os anticorpos monoclonais específicos, anti-A e anti-B (STINGHEN et

al., 2016). Nesta prova os eritrócitos do paciente são colocados em contato com um

soro conhecido contendo anti-A e anti-B, com o objetivo de identificar a presença ou

a ausência dos antígenos A ou B nos eritrócitos, permitindo definir assim qual a

tipagem sanguínea ABO do paciente, se é A, B, AB ou O (Figura 12) (MINISTÉRIO

DA SAÚDE, 2014).

34

Figura 12 – Interpretação dos resultados da tipagem sanguínea ABO

Fonte: MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2014, p. 30

Tabela 1- Passo a passo da tipagem sanguínea ABO pela prova direta

Passos Procedimentos

1º Passo Identificar os tubos de ensaio em A e

B

2º Passo Pingar uma gota do soro anti-A no

tubo A e do soro anti-B no tubo B.

3º Passo Inserir as hemácias do paciente nos

tubos

4º Passo Centrifugar os tubos em 3.400 rpm

(rotações por minuto) por 15 segundos

5º Passo Identificar a presença ou ausência de

aglutinação

Fonte: MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2014, p. 29

A prova reversa irá pesquisar os anticorpos anti-A e anti-B presentes no soro

ou plasma do paciente, sendo testados com hemácias reagentes fenotipados A e B

(Figura 13). Esta prova deve ser realizada sempre que se tem a necessidade de

confirmar a tipagem sanguínea dos doadores de sangue que já foram fenotipados

(STINGHEN et al., 2016). A prova consiste em colocar o soro do paciente em

contato com eritrócitos conhecidos contendo antígenos A e B, permitindo assim

identificar a presença ou ausência dos anticorpos produzidos contra esses antígenos

(MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2014). Se o sangue aglutinar a reação é positiva (Figura

13) (STINGHEN et al., 2016).

35

Tabela 2 - Passo a passo da tipagem sanguínea ABO pela prova reversa

Passo Procedimentos

1º Passo Identificar os tubos em A e B

2º Passo Pingar duas gotas do soro da amostra

nos tubos

3º Passo

Adicionar no tubo A uma gota das

hemácias A e no tubo B uma gota das

hemácias B

4º Passo Centrifugar os tubos em 3.400 rpm por

15 segundos

5º Passo Identificar a presença ou ausência de

aglutinação

Fonte: MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2014, p. 30

Figura 13 - Tipagem Sanguínea ABO de indivíduo do grupo A

Fonte: STINGHEN et al., 2016, p.395

A tipagem do sistema Rh utiliza o anti-D como controle do Rh. Este teste

possui métodos de procedimento semelhantes ao da tipagem ABO direta (Tabela 3).

Se o sangue aglutinar a reação é positiva (Figura 14), quando apresentar

aglutinação na tipagem Rh significa que o paciente possui Rh positivo e a ausência

da aglutinação significa que o paciente é Rh negativo (STINGHEN et al., 2016).

36

Figura 14 - Tipagem Sanguínea RhD positivo

Fonte: STINGHEN et al., 2016, p.401

Tabela 3- Passo a Passo da tipagem sanguínea RhD

Passos Procedimentos

1º Passo Identificar o tubo como RhD

2º Passo Pingar uma gota do reagente

anti-D

3 º Passo Inserir uma gota dos eritrócitos do

paciente

4º Passo Homogenizar e centrifugar o tubo

a 3.400 rpm por 15 segundos

5º Passo Identificar a presença ou

ausência de aglutinação

Fonte: MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2014, p. 40

É possível realizar também as provas de determinação das variantes do

antígeno D já que os mesmos podem ser considerados Rh positivos. A diferença da

realização desta prova com a realização da tipagem sanguínea RhD, consiste na

necessidade de incubar o tubo em um banho maria e realizar a lavagem dos

eritrócitos com uma solução salina (Tabela 4) (ROUX et al., 2000).

37

Tabela 4- Passo a Passo da tipagem sanguínea RhD para determinação de variantes

Passos Procedimentos

1º Passo Incubar o tubo identificado como RhD

por 15 minutos em banho maria a 37ºC

2º Passo Lavar os eritrócitos três vezes em uma

solução salina fisiológica

3º Passo Decantar os tubos por inversão rápida

4º Passo Inserir duas gotas do soro de coombs

5º Passo Centrifugar o tubo a 3.400 rpm por 15

segundos

6º Passo Identificar a presença de aglutinação

Fonte: MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2014, p. 41

4.8.10 Teste de Coombs

O teste de Coombs, também conhecido como teste de antiglobulina humana,

utiliza anticorpos anti-imunoglobulinas, que foram inicialmente desenvolvidas por

Robins Coombs, possibilitando detectar os anticorpos que levam a DHRN

(MURPHY, 2014). Este teste realiza a pesquisa de anticorpos e proteínas presentes

no sistema complemento, possuindo a sensibilidade de detectar entre 150 a 500

moléculas de IgG por eritrócito (STINGHEN et al., 2016). Existem dois tipos de teste

da antiglobulina humana: direto e indireto.

4.8.10.1 Teste de Coombs Direto

Este teste tem como objetivo detectar a presença de anticorpos presentes na

superfície dos eritrócitos, que estão levando a doença (RAVEL, 1997). Utiliza anti-

imunoglobulinas humanas para detectar de forma direta os anticorpos ligados à

superfície dos eritrócitos fetais, os IgG (MURPHY, 2014). Os reagentes utilizados na

reação são preparados a partir da injeção de globulinas humana gamaglobulina

(IgG), não-gama (IgM) ou a partir de uma mistura das duas em coelhos. O coelho irá

produzir anticorpos contra está globina humana injetada, pois seu soro contém

anticorpos anti-globulina, sendo este o soro de coombs (RAVEL, 1997). Como o

anticorpo humano consiste em globulina, geralmente gamaglobulina, a adição do

soro de coombs, oriunda do coelho, em qualquer tipo de solução que contém

anticorpos humanos irá resultar em uma combinação entre os anticorpos (RAVEL,

38

1997). O teste consiste na adição de um soro de coombs poliespecífico ou

monoespecífico em eritrócitos previamente lavados com uma solução salina

(STINGHEN et al., 2016). Esta lavagem tem como objetivo remover as proteínas do

sangue que são inespecíficas (RAVEL, 1997). Após a lavagem é adicionado anti-

imunoglobulinas que irão aglutinar as células ligadas aos IgG, indicando um

resultado positivo (Figura 15) (MURPHY, 2014). Um resultado positivo para este

teste significa que os antígenos dos eritrócitos analisados estão sensibilizados,

podendo ser devido a uma incompatibilidade entre os grupos sanguíneos analisados

(STINGHEN et al., 2016). Para se realizar o teste se utiliza o sangue total (RAVEL,

1997).

Figura 15- Teste de Coombs Direto

Fonte: STINGHEN et al., 2016, p.409

Quando realizado o teste de coombs direto a partir de uma amostra do

sangue fetal, se o mesmo apresentar a DHRN, o resultado em sua grande maioria

será positivo, assim também quando a amostra for retirada do sangue periférico. O

teste de Coombs Direto permite detectar a presença de anticorpos in vivo que estão

na superfície dos eritrócitos, porém não permite identificar qual é o anticorpo

responsável (RAVEL, 1997). O teste é realizado seguindo os passos apresentados

na Tabela 5.

“Reagentes utilizados neste teste: Soro do Coombs monoespecífico (anti-

IgG) e soro de coombs poliespecífico (anti-IgG + anti-C3d), solução salina (NaCl

0,9%) e tubo com EDTA para coleta da amostra” (STINGHEN et al., 2016, p.421).

39

Tabela 5- Passo a passo dos procedimentos necessários para a realização do teste de Coombs

Direto

Passos Procedimento

1º Passo Identificar quatro tubos de ensaio como I, II, III e IV

2º Passo Dispensar 1,5 de solução salina no tubo I

3º Passo

Preparar uma suspensão de eritrócitos no tubo I utilizando o

sangue coletado do paciente no tubo com EDTA, pipetando com o

auxílio de uma pipeta Pasteur um pequeno volume dos eritrócitos

dispensando uma gota no tubo I

4º Passo Homogenizar a suspensão de eritrócitos

5º Passo Dispensar duas gotas da suspensão de eritrócitos do tubo I nos

outros tubos

6º Passo Lavar o tubo II e III três vezes com solução salina

7º Passo Centrifugar os tubos por um minuto a 3.400 rpm

8º Passo Após a última lavagem decantar toda a salina em papel absorvente

9º Passo Adicionar duas gotas de soro de Coombs monoespecífico no tubo II

e duas gotas de soro de coombs poliespecífico nos tubos III e IV

10º Passo Homogenizar

11º Passo Centrifugar por um minuto a 1000 rpm

12º Passo Agitar suavemente os tubos e verificar se há a presença de

aglutinação ou hemólise.

Fonte: Adaptado de STINGHEN et al., 2016, p. 421

“Interpretação dos resultados: Aglutinação no tubo II representa a presença

de anticorpo IgG no eritrócito; Aglutinação no tubo III representa a presença de IgG;

Ausência de aglutinação nos tubos II e III significa que não ocorreu reação”

(STINGHEN et al., 2016, p.421).

Em casos onde não se tem a formação de aglutinação deve-se adicionar uma

gota do controle de Coombs e centrifugar por um minuto a 1000 rpm (rotações por

minuto), em seguida deve-se homogenizar suavemente os tubos que não

aglutinaram para observar a formação de aglutinação. Neste caso deve-se ter a

presença de aglutinação para validar a lavagem da salina e o soro de Coombs. Se o

controle de Coombs apresentar um resultado negativo, o teste é invalidado

(STINGHEN et al., 2016).

40

4.8.10.2 Teste de Coombs Indireto

Tem como objetivo realizar a detecção de anticorpos anti-D em gestantes

(MURPHY, 2014), pesquisando anticorpos irregulares ou proteínas do sistema

complemento presentes no soro ou no plasma da paciente, os IgG que não

aglutinam em solução salina (STINGHEN et al., 2016). Este teste consiste em duas

etapas. A primeira é realizada in vivo onde os eritrócitos que possuem um antígeno

conhecido são expostos a um soro com anticorpos desconhecidos (RAVEL, 1997).

Se este anticorpo se ligar aos eritrócitos significa que há a presença de anticorpos

na circulação que se dirigem aos antígenos presentes nos eritrócitos. Devido ao fato

dos antígenos eritrocitários serem conhecidos, é possível identificar qual o tipo de

anticorpo presente (RAVEL, 1997). Na segunda fase o soro ou plasma é inicialmente

incubado com reagentes de triagem, que irão se ligar ao anticorpo anti-Rh. Em

seguida as células são lavadas com o objetivo de remover as imunoglobulinas que

não estão ligadas aos eritrócitos, e então o soro de Coombs é adicionado aos

eritrócitos (MURPHY, 2014). Se um anticorpo específico estiver presente na

superfície dos eritrócitos, o soro de Coombs irá atacá-los levando a aglutinação das

células (Figura 16) (MURPHY, 2014).

O teste de Coombs Indireto também permite que sejam detectadas

incompatibilidade de Rh que podem levar a DHRN, permitindo que a doença seja

prevenida (MURPHY, 2014). Este teste é realizado utilizando o soro, pois os

anticoagulantes podem vir a interferir nos resultados do teste (RAVEL, 1997).

Figura 16 - Teste de Coombs Indireto

Fonte: STINGHEN et al., 2016, p. 404

41

“Reagentes Utilizados: Hemácias reagentes fenotipadas, soro do Coombs

monoespecífico (anti-IgG), solução salina (NaCl 0,9%), eritrócitos sensibilizados com

IgG, aditivo polietilenoglicol (PEG) ” (STINGHEN et al., 2016, p.419). O teste é

realizado seguindo os passos apresentados na Tabela 6.

Tabela 6 - Passo a passo dos procedimentos necessários para a realização do teste de Coombs

Indireto

Passos Procedimento

1º Passo Identificar dois tubos de ensaio como I e II

2º Passo Pipetar uma gota de hemácias reagentes fenotipadas

em cada tubo

3º Passo Pipetar duas gotas de soro ou plasma com o auxílio de

uma pipeta Pasteur em cada tubo

4º Passo Homogenizar os tubos e centrifugar por um minuto a

1000 rpm

5º Passo Agitar suavemente os tubos e verificar se há a presença

de aglutinação ou hemólise

6º Passo

Em caso de aglutinação identifica-se a presença de

anticorpo frio, quando se tem a ausência de aglutinação

continua-se o teste

7º Passo Adiciona-se duas gotas de PEG em cada um dos tubos

8º Passo Incubar os dois tubos por 15 minutos a 37ºC

9º Passo Lavar os tubos quatro vezes com solução salina

10º Passo Centrifuga os tubos por um minuto a 3.400 rpm

11º Passo Após a última lavagem, decantar toda a salina em papel

absorvente

12º Passo Adicionar duas gotas do soro de coombs

monoespecífico e homogeneizar

13º Passo Centrifugar por um minuto a 1000 rpm

14º Passo Agitar suavemente os tubos verificando se há a

presença de aglutinação ou hemólise.

Fonte: Adaptado de STINGHEN et al., 2016, p. 419

“Interpretação dos resultados: Se houver a presença de aglutinação em

42

qualquer um dos tubos, se tem a presença de IgG” (STINGHEN et al., 2016, p.419).

Assim como no teste de Coombs Direto, em casos onde não se tem a

formação de aglutinação deve-se adicionar uma gota do controle de Coombs e

centrifugar por um minuto a 1000 rpm, após homogeniza-se suavemente os tubos

que não aglutinaram para observar a formação de aglutinação. Neste caso deve-se

ter a presença de aglutinação para validar a lavagem da salina e o soro de Coombs.

Se o controle de Coombs apresentar um resultado negativo, o teste é invalidado

(STINGHEN et al., 2016).

4.9 Métodos De Tratamento da DHRN

A pesquisa para o tratamento da DHRN tem passado por várias etapas,

sendo a indução do parto prematuro uma primeira alternativa para o tratamento dos

fetos que possuíam um alto risco de desenvolver uma hidropisia após a 32ª e 34ª

semana de gestação. Porém com o avanço das pesquisas e a introduções de novos

tratamentos, esse método já não é mais tão empregado (ROUX, 2000).

Para realizar o tratamento deve ser determinado através da coleta do sangue

do cordão umbilical a tipagem ABO e Rh, realizar o teste de Coombs Direto e

determinar a quantidade de hemoglobina, hematócrito, bilirrubina direta e total

apresentadas pelo feto (ROUX, 2000).

Em 1941, alguns pesquisadores demostraram que os recém-nascidos teriam

uma melhora através da administração de sangue, por esta razão a transfusão

sanguínea acabou se tornando um dos principais tratamentos da DHRN, assim

como a introdução de imunoglobulina anti-D (ROUX, 2000).

4.9.1 Imunoglobulina Anti-D

A aplicação de imunoglobulina anti-D tem como objetivo evitar a

sensibilização materna ao destruir os eritrócitos fetais presentes em sua circulação,

além de eliminar as chances da produção de anticorpos maternos (RAVEL, 1997).

Pesquisadores da Inglaterra e dos Estados Unidos, realizaram alguns estudos

de 1960 a 1966, que os levaram concluir ser possível prevenir a aloimunização Rh

utilizando a imunoglobulina G anti-D (BAIOCHI, 2004). Todas as mães não

sensibilizadas com problemas de incompatibilidade Rh podem ser protegidas contra

a sensibilização pelo feto através da “vacina” composta de gamaglobulina com alto

título de anticorpos anti-Rh (RAVEL, 1997).

43

Em 1968 ela foi licenciada nos EUA, sendo adicionada como um programa de

saúde público em 1970 para o tratamento da DHRN (BAIOCHI, 2004). A injeção com

dose de 10 mg de anti-D para cada mililitro de sangue do feto Rh positivo, foi eficaz

em evitar a aloimunização, mas seu mecanismo de ação ainda não está

completamente elucidado. A concentração de dose mínima de anti-D recomendada

pode variar entre alguns países (BAIOCHI, 2004).

Nos dias atuais toda imunoglobulina anti-D produzida é um derivado policlonal

do plasma humano (GIRALDO, 2009). Porém, alguns estudos estão sendo

realizados utilizando anticorpos monoclonais, produzidos pela engenharia genética.

No Brasil todo o soro anti-D utilizado é importado (BAIOCHI, 2004). A maioria dos

doadores do plasma são mulheres que estão no período pós menopausa e já foram

imunizadas por gestações passadas, ou por homens Rh negativos voluntários a

serem imunizados, sendo mantidos em estado hiperimune recebendo reaplicações

de pequenas doses de hemácias Rh positivas (BAIOCHI, 2004).

Com a introdução e o amplo uso da imunoglobulina anti-D, houve uma grande

diminuição na incidência da DHRN pelo fator Rh (FRITSCH, 2012). Utilizar 300 µg

da imunoglobulina em mulheres Rh negativas não sensibilizadas na 28º semana de

gestação e no período pós-natal, tem reduzido a aloimunização em até 96% das

mulheres de risco nos países desenvolvidos (MACHADO et. al., 2006). Esta dose é

capaz de neutralizar até 15 ml de eritrócitos Rh positivos, sendo cerca de 30 ml do

sangue fetal total. É conveniente que uma segunda unidade da dose seja

administrada 72 horas após o parto (RAVEL, 1997).

Mulheres Rh negativas que não realizam este tratamento apresentam uma

incidência de 10% de serem sensibilizadas. Realizar a administração após o parto

diminuiu a incidência de sensibilização em 1-2%, e no período pré-natal juntamente

com a administração feita pós-parto diminui cerca de 0,1-0,2% (RAVEL, 1997).

4.9.2 Transfusão Intrauterina

As técnicas de transfusão sanguínea têm sido aprimoradas desde 1941. Em

1947 Diamond fez a proposta de realizar a transfusão utilizando a via umbilical e

Liley propôs a transfusão intrauterina (TIU) através da via intraperitoneal. A partir de

1976, a TIU foi melhorada por Hobbins e outros pesquisadores através da

introdução da ultrassonografia. Em 1981 Rodeck e outros pesquisadores fizeram

uma nova proposta utilizando a via intravascular (ROUX, 2000).

44

A TIU é uma das principais opções terapêuticas em casos de anemia fetal

grave devido a aloimunização pelo sistema Rh. É recomendável realizar a técnica

antes que o feto desenvolva uma hidropisia (SOUSA et. al., 2013). Normalmente

este método é escolhido quando é necessário a retirada do feto antes da 32ª

semana de gestação, porém ele é imaturo para o nascimento, tendo como objetivo

tratar a anemia. É indicado quando a quantidade de hematócrito fetal for menor ou

igual a 30% (ROUX, 2000).

O sangue utilizado para transfusão não deve exceder quatro dias desde o

momento de sua extração e não deve possuir plasma. As hemácias que serão

inseridas devem possuir tipagem ABO compatíveis com o receptor, antígenos

negativos para o anticorpo que está causando problema, não devem possuir

hemoglobina S e devem ser compatíveis com o soro da mãe (ROUX, 2000). Antes

de realizar a transfusão, deve-se adicionar as hemácias em 10 a 12 ml de uma

solução salina estéril para diminuir sua viscosidade e facilitar a transfusão. Os

hematócritos que forem ser transferidos devem estar entre 0,85 e 0,95 (ROUX,

2000).

A TIU pode ser realizada por duas vias: intraperitoneal ou intravascular

(ROUX, 2000).

4.9.2.1 Intraperitoneal

Esta técnica consiste em inserir as hemácias transfundidas na cavidade

peritoneal que será absorvido pelo sistema linfático fetal. Tem como objetivo a

restauração lenta da hemoglobina fetal (Hb S) e pode ser indicada em casos de

DHRN grave sendo realizada a transfusão antes da 18ª e 20ª semana de gestação,

onde o acesso venoso é de um pequeno diâmetro da veia umbilical (SOUSA et al.,

2013). Em casos onde o feto não apresenta hidropisia, 10 a 12% das hemácias irão

ser absorvidas de maneira normal (ROUX, 2000).

A técnica também pode ser associada a transfusão intravascular, permitindo

obter um hematócrito mais estável devido a reserva extravascular de hemoglobina

fetal. Uma desvantagem desta técnica é a necessidade de realizar duas punções,

podendo ser impossível determinar o hematócrito fetal antes e depois da transfusão

(SOUSA et al., 2013).

45

Esta via foi utilizada por um determinado período para o tratamento de

crianças com talassemia, sendo substituída pela transfusão intravascular tempos

depois devido apresentar algumas desvantagens (ROUX, 2000).

4.9.2.2 Intravascular

A utilização desta via foi descrita por Rodeck e outros pesquisadores que

realizaram o uso de um fetoscópio, um endoscópio de fibra óptica, para acompanhar

a transfusão sendo substituída mais tarde pela ultrassonografia. A principal veia

utilizada é a umbilical, porém utiliza-se também a artéria umbilical e a placenta para

transferir as hemácias (ROUX, 2000).

Algumas vantagens deste método é a possibilidade de medir o hematócrito

antes e depois da transfusão, o aumento que terá nos níveis de hemoglobina e a

possibilidade de realizar a transfusão na 20ª semana de gestação (ROUX, 2000).

Com esta técnica é possível reverter a hidropisia do feto ainda no útero,

conseguindo o parto de um recém-nascido sem hidropisia reduzindo assim, as

complicações neonatais. (ROUX, 2000).

4.9.3 Exanguineotransfusão

Esta técnica foi introduzida em 1945 por Wallestein, com objetivo de realizar o

tratamento da DHRN severa, corrigindo a anemia, eliminando as hemácias que

estão unidas as imunoglobulinas, assim como eliminar as imunoglobulinas livres e

reduzir a carga de bilirrubina ao remover os produtos liberados da hemólise, bem

como os anticorpos maternos (ROUX, 2000). Em 1951 a técnica foi aperfeiçoada por

Diamond, que introduziu no método a utilização da veia umbilical para a retirada de

substâncias agressoras ao organismo, oferecendo outras substâncias necessárias

para a sobrevivência do paciente. É um procedimento invasivo onde existe a troca

de sangue do paciente para a de um doador (JUNIOR et al., 1999). Normalmente o

sangue doador se recombinam ente um a dois volumes de sangue fetal. Quando

recombinados com dois volumes cerca de 90% das hemácias afetadas são

removidas e quando recombinadas com um volume são removidos cerca de 70%

(ROUX, 2000). A indicação desse método em casos de hemólise irá depender da

velocidade da destruição das hemácias, sendo variável de acordo com o peso de

nascimento e da idade (em horas) do recém-nascido e da quantidade do nível de

bilirrubina indireta que ele apresenta (JUNIOR et al., 1999).

46

É o único método de tratamento que irá reduzir de maneira rápida os níveis

sanguíneos da bilirrubina, mesmo que nos dias atuais seja possível obter bons

resultados com o uso da fototerapia intensiva (RAMOS, 2002). Em casos de DHRN

deve-se colocar o recém-nascido em fototerapia de alta intensidade independente

de qual seja o nível de bilirrubina, enquanto aguarda a exanguineotransfusão

(RAMOS, 2002). Recém-nascidos que apresentarem hidropisia fetal, necessitam de

um atendimento prioritário, pois podem apresentar problemas respiratórios,

hemodinâmicos, problemas de hemostasia e no metabolismo hepático (RAMOS,

2002).

4.9.4 Fototerapia

A fototerapia é utilizada como tratamento da icterícia onde a bilirrubina, que

possui uma natureza lipossolúvel, sofre uma transformação devido a ação da luz,

tornando-se mais hidrossolúvel, podendo assim ser eliminada do organismo sem a

necessidade de conjugação hepática (RAMOS, 2002). Para o tratamento ser

eficiente, irá depender da luz emitida por um aparelho específico e ter o espectro de

emissão próximo ao local de absorção da bilirrubina. Dependerá também da idade

pós-natal do recém-nascido, da idade gestacional, do peso de nascimento, da causa

da icterícia e do nível de bilirrubina no início do tratamento. Quanto maior a

intensidade da luz emitida, maior a eficiência da fototerapia (RAMOS, 2002).

47

5 CONCLUSÃO

A DHRN surge devido ao feto possuir antígenos eritrocitários que a mãe não

possui, os quais irão estimular a produção de anticorpos maternos quando o sangue

fetal entrar em contato com a circulação da mãe ao ultrapassar a placenta. Isto

ocorre devido a incompatibilidade entre o sistema ABO e RH materno com o do feto.

A forma mais grave da doença está relacionada com sistema Rh, onde o principal

antígeno envolvido é o D. A doença se desenvolve devido ao contato dos antígenos

Rh fetais com o sague materno, gerando assim uma reação imunológica onde a mãe

produzirá anticorpos que irão destruir os antígenos eritrocitários fetais, levando ao

feto a quadros de icterícia, anemia hemolítica, hidropisia e kernicterus. Os principais

métodos de diagnóstico capazes de auxiliar na identificação da DHRN mais

utilizados atualmente consistem no teste de coombs indireto, onde é possível

identificar a presença de anticorpos anti-D permitindo assim verificar se a mãe já

está sensibilizada, e na realização da tipagem sanguínea, onde é possível identificar

o tipo de Rh materno e paterno, permitindo assim ter uma probabilidade dos riscos

de ocorrer uma sensibilização. O principal método de tratamento aplicado nos dias

atuais é a administração da vacina anti-Rh, onde ocorrerá a eliminação dos

anticorpos Rh produzidos pela mãe evitando que o mesmo entre em contato com os

antígenos fetais levando a sua destruição, desencadeando algumas manifestações

clínicas relacionas com a DHRN. Mesmo este sendo o principal tratamento

realizado, a exanguineotransfusão tem se mostrado eficiente sendo capaz de tratar

fetos com DHRN. Com a realização dos devidos métodos de diagnóstico e seguindo

corretamente os métodos de tratamento, é possível prevenir e tratar a DHRN antes

ela se desenvolva ou se agrave, possibilitando assim que o feto venha a nascer o

mais saudável possível podendo ter uma vida normal.

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REFERÊNCIAS

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