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SOCIEDADES SIMPLES

Fábio Ulhoa Coelho

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SOCIEDADES SIMPLES

Fábio Ulhoa CoelhoAdvogado no ramo do Direito Empresarial em São Paulo e Professor titularde Direito Comercial da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.

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O Instituto de Registro de Títulos e Documentos e de Pessoas Jurídicas doBrasil, o Centro de Estudos e Distribuição de Títulos e Documentos de São Paulo, oRegistro Civil das Pessoas Jurídicas do Rio de Janeiro consultam-me sobre o alcancede alguns dos dispositivos do novo Código Civil (Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002)atinentes ao direito de empresa que dizem respeito ao registro das sociedades simples.

Como sabido, uma das significativas inovações do Código Reale se encontra naintrodução, no direito brasileiro, da figura da “sociedade simples”, disciplinada nos arts. 997a 1.038 e em outros dispositivos do Livro II da Parte Especial. Trata-se de mudança derelevo, que tem despertado dúvidas que os consulentes desejam aclarar. Estas dúvidascentram-se, fundamentalmente, na sociedade que, embora venda bens e preste serviços,não o faz empresarialmente, nas sociedades holding puras que não adotam a forma deanônima e cooperativas.

Os consulentes submetem-me quesitos, que são apresentados e respondidos nofinal do Parecer. Para bem alicerçar as respostas dadas, convém sejam examinados algunstemas fundamentais do direito empresarial: a teoria da empresa, sua introdução no direitobrasileiro e a distinção entre sociedades simples e empresárias.

PARECER

1. A teoria da empresaAté a Segunda Grande Guerra, o es-

pírito de integração econômica e união polí-tica que viceja hoje na Europa era simples-mente impensável. Além de viverem em cons-tante estado de beligerância, competindo porcolônias fornecedoras de matéria prima econsumidoras de produtos industrializados,os principais povos europeus procuravam sedistanciar uns dos outros no plano cultural,marcando ou acentuando características quereivindicavam como únicas. As leis e a dou-trina jurídica de direito privado, nesse con-texto, serviam de campo fértil para as mani-festações de afirmação nacional. O CódigoCivil alemão, que entrou em vigor no dia 1ºde janeiro de 1900, revestiu de uma estrutu-ra peculiar, notavelmente diversa da do mo-numental Código Napoleão, de 1804. Naque-le, ademais, um dos conceitos nucleares é ode “negócio jurídico” (Rechtsgeschäft), cujadiferença em relação ao de “ato jurídico” (actejuridique), construído pela doutrina francesa,é extremamente sutil (1 ). Não se trata, comoquerem alguns autores, de noções cientifi-

camente evoluídas uma da outra, mas ape-nas de diferentes modos de cuidar do mes-mo assunto, dando ênfase a aspectos distin-tos. Ainda hoje, aliás, ensina-se direito civilem França sem a menor referência ao con-ceito de “negócio jurídico” (2 ).

A Itália daquele tempo também bus-cou na lei e na teoria jurídica de direito priva-do elementos de afirmação da nacionalida-de, em contraposição aos demais povos demaior presença econômica e cultural da Eu-ropa. Assim, ao reformular seu Código Civilem plena guerra, em 1942, produziu um di-ploma afastado tanto da estrutura francesaquanto da alemã, em que se apresenta comoparticular inovação a disciplina de matériasaté então afetas, na cultura jurídica européia,ao direito comercial (e tratadas, por isto, emcódigos próprios).

A teoria da empresa deve ser compre-endida neste contexto de afirmação da naci-onalidade italiana, num mundo em que a Eu-ropa ainda não tinha se deparado com a ne-cessidade de um processo de integraçãoeconômica e progressiva unidade política.

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Esta teoria se contrapõe à dos atos de co-mércio – de origem francesa e parcialmenteadotada pelo Código de Comércio do Reinoda Itália de 1882 – como critério distintivo doâmbito de incidência do direito comercial (3 ).

Na Itália, a bipartição da disciplina pri-vada das atividades econômicas começa apreocupar a doutrina jurídica ainda no finaldo século passado, sendo significativa a esterespeito a defesa por Vivante, na aula inau-gural de seu curso na Universidade de Bolo-nha, em 1892 (4 ), da tese do fim da autono-mia do direito comercial. Suscitou, então, cin-co argumentos em favor da superação da di-visão básica no direito privado. De início,questionou a sujeição de não-comerciantes(os consumidores) a regras elaboradas a partirde práticas mercantis desenvolvidas peloscomerciantes e em seu próprio interesse.Como cidadão, deplorou o fato de o CódigoComercial, considerado por ele lei de classe,perturbar a solidariedade social, que deveriaser o objetivo supremo do legislador. Em se-gundo lugar, lembrou que a autonomia do di-reito comercial importava desnecessária liti-giosidade para a prévia discussão da nature-za civil ou mercantil do foro, na definição deprazos, ritos processuais e regras de compe-tência. Outra razão invocada para a supera-ção da dicotomia foi a insegurança decorren-te do caráter exemplificativo do elenco dosatos de comércio. Uma pessoa, que pensavaexercer atividade civil, podia ser surpreendi-da com a declaração de sua falência, inclusi-ve em função de inesperados desdobramen-tos penais. Também pretendia Vivante que aduplicidade de disciplinas sobre idênticos as-suntos era fonte de dificuldades. Por fim, aautonomia do direito comercial atuava nega-tivamente no progresso científico, na medidaem que o estudioso da matéria comercial per-dia a noção geral do direito das obrigações(5 ).

Em 1942, o Código Civil italiano pas-sou a disciplinar, como afirmado, tanto a ma-téria civil como a comercial, criando, assim,uma estrutura única para o diploma básicodo direito privado, que o diferenciava de seuscongêneres francês e alemão (6 ). A teoria daempresa passou a ser vista como a consa-

gração da tese da unificação do direito priva-do (7 ).

A teoria da empresa, contudo, bemexaminada, apenas desloca a fronteira entreos regimes civil e comercial.

No sistema francês, excluem-se ativi-dades de grande importância econômica –como a prestação de serviços, agricultura, pe-cuária, negociação imobiliária – do âmbito deincidência do direito mercantil, ao passo que,no italiano, reserva-se disciplina específicapara algumas atividades de menor expres-são econômica, tais as dos profissionais li-berais ou dos pequenos comerciantes.

A teoria da empresa é, sem dúvida,um novo modelo de disciplina privada da eco-nomia, mais adequado à realidade do capi-talismo superior. Mas através dela não se su-pera, totalmente, um certo tratamento dife-renciado das atividades econômicas. O acen-to da diferenciação deixa de ser posto no gê-nero da atividade e passa para a medida desua importância econômica. Por isso é maisapropriado entender a elaboração da teoriada empresa como o núcleo de um sistemanovo de disciplina privada da atividade eco-nômica e não como expressão da unificaçãodos direitos comercial e civil.

O sistema italiano de disciplina priva-da da atividade econômica, sintetizado pelateoria da empresa, acabou superando o fran-cês, baseado na teoria dos atos de comér-cio; ou seja, legislações de direito privado,nos países de tradição românica, sobre ma-téria econômica, a partir de meados do sé-culo XX, não têm mais dividido os empreen-dimentos em duas categorias (civis e comer-ciais), para submetê-los a regimes distintos.A isso, têm preferido os legisladores criar umregime geral para a disciplina privada da eco-nomia, excepcionando algumas atividades demenor expressão econômica.

A teoria dos atos de comércio vê-se,então, substituída pela teoria da empresa,ainda que não se adotem, na lei ou na doutri-na, exatamente estas designações para fa-zer referência, respectivamente, ao modelofrancês de partição das atividades, ou ao ita-liano, de regime geral parcialmente excepci-onado. Até mesmo em França, onde nasceu,

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o sistema de dupla disciplina privada das ati-vidades econômicas se encontra hoje bas-tante descaracterizado, já que se submetemà jurisdição comercial, independentemente deseu objeto, as sociedades anônimas (desde1893), de responsabilidade limitada (desde1925) e as em nome coletivo e em comandi-ta (desde 1966), o que, concretamente, apro-xima a legislação francesa ao modelo italia-no.

Para bem compreender o alcance dasignificativa mudança operada pela evoluçãoda teoria francesa para a italiana, é impres-cindível esclarecer o conceito de empresa,matéria ao qual se volta o item seguinte des-te Parecer.

2. Conceito de empresaConceitua-se empresa como sendo

atividade, cuja marca essencial é a obtençãode lucros com o oferecimento ao mercado debens ou serviços, gerados estes mediante aorganização dos fatores de produção (forçade trabalho, matéria-prima, capital e tecnolo-gia). Esse modo de conceituar empresa, emtorno de uma peculiar atividade, embora nãoseja totalmente isento de imprecisões, é cor-rente hoje em dia entre os doutrinadores (8 ).No passado, contudo, muito se discutiu so-bre a unidade da noção jurídica da empresa,que era vista como resultante de diferentesfatores, objetivos e subjetivos (9 ). Certo en-tendimento bastante prestigiado considera-va-a, em termos jurídicos, um conceito pluri-valente.

Para um dos expoentes da doutrinaitaliana sobre a empresa, Alberto Asquini (10 ),não se deve pressupor que o fenômeno eco-nômico poliédrico da empresa necessaria-mente ingresse no direito por um esquemaunitário, tal como ocorre na ciência econômi-ca. No emaranhado de teorias jurídicas nadoutrina comercialista italiana da primeira me-tade do século passado, Asquini encontra oque parecia ser a chave para a questão: aconsideração da empresa como um “fenôme-no econômico poliédrico”. Dizia o jurista itali-ano:

O conceito de empresa é o conceitode um fenômeno econômico poliédrico, o qual

tem sob o aspecto jurídico, não um, mas di-versos perfis em relação aos diversos ele-mentos que o integram. As definições jurídi-cas de empresa podem, portanto, ser diver-sas, segundo o diferente perfil, pelo qual ofenômeno econômico é encarado.

(11)

Baseando-se, então, no multifaceta-do fenômeno econômico da empresa, Asqui-ni distinguia quatro perfis: subjetivo, funcio-nal, patrimonial (ou objetivo) e corporativo.

Pelo primeiro perfil, a empresa é vistacomo empresário, isto é, como o exercentede atividade autônoma, de caráter organiza-tivo e com assunção de risco. Neste caso, apessoa (física ou jurídica) que organiza a pro-dução ou circulação de bens ou serviços éidentificada com a própria empresa. Corres-ponde este perfil subjetivo a certo uso colo-quial da palavra (“a empresa faliu”, “a empre-sa está contratando pessoal” etc). SegundoAsquini:

Na economia de troca o caráter pro-fissional da atividade do empresário é um ele-mento natural da empresa. O princípio da di-visão do trabalho e a necessidade de repartirno tempo as despesas da organização inici-al, de fato, orientam naturalmente o empre-sário, para especializar sua função atravésde uma atividade em série, dando lugar a umaorganização duradoura, normalmente, comescopo de ganho. (12 )

Pelo perfil funcional, identifica-se aempresa à própria atividade. Neste caso, oconceito é sinônimo de empreendimento edenota uma abstração (13 ), um conjunto deatos racionais e seriais organizados pelo em-presário com vistas à produção ou circula-ção de bens ou serviços. É este perfil daempresa que a evolução doutrinária da teo-ria irá prestigiar. Para Asquini, porém, ele éapenas um dos conceitos jurídicos atribuíveisao fenômeno:

Em razão da empresa econômica seruma organização produtiva que opera por de-finição, no tempo, guiada pela atividade doempresário, é que, sob o ponto de vista fun-cional ou dinâmico, a empresa aparece comoaquela força em movimento que é a ativida-de empresarial dirigida para um determinadoescopo produtivo. (14 )

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Pelo terceiro perfil, a empresa corres-ponde ao patrimônio aziendal ou estabeleci-mento. É o conceito objetivo, muitas vezescorrespondente ao uso coloquial do termo(“vou à empresa”, “a empresa fica em SãoPaulo”, etc), que a identifica com o local emque a atividade econômica de produção oucirculação de bens ou serviços é explorada.Neste sentido, Asquini pondera:

O fenômeno econômico da empresa,projetado sobre o terreno patrimonial, dá lu-gar a um patrimônio especial distinto, por seuescopo, do restante patrimônio do empresá-rio (exceto se o empresário é pessoa jurídi-ca, constituída para o exercício de uma de-terminada atividade empresarial, caso em queo patrimônio integral da pessoa jurídica ser-ve àquele escopo). (15 )

E, por fim, pelo perfil corporativo, a em-presa é considerada, na formulação asquini-ana, uma instituição, na medida em que reú-ne pessoas — empresário e seus emprega-dos — com propósitos comuns. Asquini re-putava que:

O empresário e os seus colaborado-res dirigentes, funcionários, operários, nãosão de fato, simplesmente, uma pluralidadede pessoas ligadas entre si por uma somade relações individuais de trabalho, com fimindividual; mas formam um núcleo social or-ganizado, em função de um fim econômicocomum, no qual se fundem os fins individu-ais do empresário e dos singulares colabora-dores: a obtenção do melhor resultado eco-nômico na produção. (16 )

A visão multifacetária da empresa pro-posta por Asquini, sem dúvida, recebeu apoioentusiasmado da doutrina. Para Sylvio Mar-condes, por exemplo:

Estes perfis jurídicos do conceito eco-nômico de empresa são obra do grande co-mercialista italiano Alberto Asquini, que re-solveu uma pendência na doutrina italiana,dividida em inúmeras correntes, cada qualpretendendo que a sua fosse a verdadeiraconceituação de empresa, em termos jurídi-cos. A tese de Asquini, hoje generalizadamen-te acolhida, é de que a empresa tem um con-ceito unitário econômico, mas não um con-ceito unitário jurídico, porque a lei ora a trata

como uma, ora, como outra. (17 )

É certo que a teoria asquinia-na da empresa como conceito multifacetadoainda repercute na doutrina produzida atual-mente nos países de tradição românica (18 ).Mas dos quatro perfis delineados por Asqui-ni, a rigor, apenas o funcional realmente cor-responde a um conceito jurídico próprio. Aevolução da teoria da empresa, porém, im-plicou a paulatina desconsideração dos per-fis subjetivo, objetivo e corporativo. Concen-traram-se, com efeito, os autores no perfilfuncional como sendo o conceito jurídico maisapropriado para a empresa.

Os perfis subjetivo e objetivo não sãomais que uma outra denominação para osconhecidos institutos de sujeito de direito (em-presário) e estabelecimento. O perfil corpo-rativo, por sua vez, sequer corresponde a al-gum dado de realidade, pois a idéia de iden-tidade de propósitos a reunir na empresa pro-letários e capitalista apenas existe em ideo-logias populistas de direita, ou totalitárias(como a fascista).

Segundo Francisco Ferrara:O problema [do conceito de empresa]

foi analisado deste modo por Asquini, que fezuma cuidadosa investigação sobre o assun-to, chegando ao resultado de que a palavraempresa tem no Código diferentes significa-dos, usados em acepções diversas: umasvezes para indicar o sujeito que exercita aatividade organizada; outras, o conjunto debens organizados; outras, ainda, o exercícioda atividade organizada e, finalmente, a or-ganização de pessoas que exercitam em co-laboração a atividade econômica. Todavia,(...) nenhuma norma se pode encontrar, comsegurança, em que a palavra empresa pos-sa ser utilizada no último sentido, de organi-zação de pessoal, porque, na realidade, osquatro sentidos do termo – os quatro perfisde que falou Asquini – se reduzem a três.Pode-se observar, porém, que, fora dos ca-sos em que a palavra se emprega em senti-do impróprio e figurado de empresário ou deestabelecimento, e que deve o intérprete re-tificar, a única significação que resta é a daatividade econômica organizada (...). (19 )

De fato, como destaca Waldírio Bul-

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garelli:Não há dúvida (...) de que o perfil que

ganhou mais relevo foi o da atividade econô-mica organizada, que veio merecendo os fa-vores da doutrina, inclusive da mais atual enão só na Itália (...), que decididamente nelaassenta a construção da teoria jurídica da em-presa, deduzida do conceito de empresárioe vinculada à do estabelecimento. (20 )

Na verdade, no direito brasileiro “em-presa” deve forçosamente ser definida comoatividade, uma vez que há conceitos legaispróprios para empresário (CC, art. 966) e es-tabelecimento (CC, art. 1.142) (21 ). Estas fa-ces do poliédrico fenômeno descrito por As-quini, entre nós, devem ser adequadamentereferidas pelos termos que o legislador a elasreservou. Ademais, como deflui do conceitolegal de empresário, “empresa” só pode serentendida mesmo como uma atividade reves-tida de duas características singulares: é eco-nômica e é organizada. O significado destascaracterísticas será objeto do próximo itemdeste Parecer.

3. A teoria da empresa no direito brasilei-ro

O legislador brasileiro, a exemplo doitaliano que o inspirou em muitos aspectos,não define empresa, mas sim empresário. Se-gundo o art. 966, caput, do Código Civil:

Art. 966. Considera-se empresárioquem exerce profissionalmente atividade eco-nômica organizada para a produção ou a cir-culação de bens ou serviços.

É possível extrair-se, deste conceitolegal de empresário, o de empresa. Se em-presário é definido como o profissional exer-cente de “atividade econômica organizadapara a produção ou a circulação de bens oude serviços”, a empresa somente pode ser aatividade com estas características.

Destacam-se da definição de empre-sa as noções de atividade econômica orga-nizada e produção ou circulação de bens ouserviços. Convém examinar com mais vagarcada uma delas.

Começo por aclarar o que a empresanão é; isto se faz necessário porque, na lin-guagem cotidiana, mesmo nos meios jurídi-

cos e até na lei, usa-se freqüentemente a ex-pressão “empresa” com significados diferen-tes de atividade.

Se se afirma, por exemplo, que “a em-presa faliu” ou que “adquiriu estoque”, a ex-pressão é empregada erradamente, de for-ma não-técnica. A empresa, sendo ativida-de, não pode ser confundida com o sujeitode direito que a explora, o empresário. É estapessoa (física ou jurídica) que pode ter a fa-lência decretada ou realizar negócio jurídicode compra de mercadorias. Como destaca-do no item anterior, “empresa” não é o con-ceito jurídico apropriado para se referir ao seuperfil subjetivo. Quando se pretende fazer re-ferência ao sujeito de direito que organiza aempresa, deve-se usar, quando explorada aatividade individualmente, “empresário indi-vidual”; e, quando explorada por pessoa jurí-dica, “sociedade empresária”.

Similarmente, se alguém exclama “aempresa está pegando fogo!” ou constata “aempresa foi reformada, ficou mais bonita”,está também se valendo do termo “empresa”equivocadamente. A empresa, sendo ativida-de, não se confunde com o local em que éexercida. Já se deu ênfase à impropriedadede se chamar de “empresa” o que Asquiniconsiderava ser o seu aspecto objetivo. Oconceito correto, neste caso, é o de “estabe-lecimento empresarial”.

Por fim – e aqui trato de equívoco bas-tante usual nos meios jurídicos que, a partirda entrada em vigor do novo Código Civil,convém descartar –, também é inapropriadoo uso da expressão “empresa” como sinôni-mo de “sociedade”. Tecnicamente, não sedeve dizer “separam-se os bens da empresae os dos sócios em patrimônios distintos”,mas “separam-se os bens sociais e os dossócios”; não é correto falar “fulano e beltranoabriram uma empresa”, mas “eles contrata-ram uma sociedade” (22 ).

Quanto a este uso não-técnico da ex-pressão, convém, aliás, atentar-se às liçõesde Rubens Requião:

A principal distinção, e mais didática,entre empresa e sociedade comercial é a quevê na sociedade o sujeito de direito, e naempresa, mesmo como exercício de ativida-

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de, o objeto de direito. Com efeito, a socie-dade comercial, desde que esteja constituí-da nos termos da lei, adquire categoria depessoa jurídica. Torna-se capaz de direitos eobrigações. A sociedade comercial, assim, éempresário, jamais empresa. É a sociedadecomercial, como empresário, que irá exerci-tar a atividade produtiva. (23 )

Feitas estas distinções (quer dizer,relembrando o que a empresa não é) e reto-mando o conceito de empresa que se podeconcluir do art. 966 do Código Civil, destacoque ele se refere à atividade econômica or-ganizada.

A primeira característica da empresa(ser uma atividade “econômica”) não costu-ma despertar dificuldades: a atividade empre-sarial é econômica no sentido de que é aptaa gerar lucro para quem a explora (24 ). Ou,nos termos propugnados por Sylvio Marcon-des (redator do Livro II do projeto do CódigoCivil):

Este conceito [do Projeto de 1965]conjuga, ou nele se conjugam, três elemen-tos que formam a noção de empresário. Emprimeiro lugar, trata-se de atividade econô-mica, isto é, atividade referente à criação deriquezas, bens ou serviços. A economicida-de da atividade está na criação de riquezas;de modo que aquele que profissionalmenteexerce qualquer atividade que não seja eco-nômica ou não seja atividade de produçãode riquezas, não é empresário. (25 )

Já a delimitação dos contornos da se-gunda característica da empresa (ser uma ati-vidade “organizada”) é um tanto mais com-plexa.

A empresa é atividade organizada nosentido de que nela se encontram articula-dos, pelo empresário (que a organiza), osquatro fatores de produção: capital, mão-de-obra, insumos e tecnologia.

Waldírio Bulgarelli adverte:O que caracteriza, em termos pragmá-

ticos, a empresa, não é a própria organiza-ção em si, mas a forma de produzir organiza-damente, o que não é o mesmo que organi-zação da atividade de produção. Em termoshistóricos, por exemplo, é incontestável quea perspectiva pela qual se deve ver a empre-

sa é justamente a da evolução das técnicasde produção, portanto, forma de produzir quede rudimentar familiar e artesanal, passou aser mecanizada ou maquinizada, com mãode obra alheia e com maior grau de organi-zação, já que esta última sempre existiu eexiste em qualquer tipo de trabalho. (26 )

A noção de organização, ínsita à idéiade empresa, envolve, portanto, um certo graude sofisticação da produção ou circulação debens ou serviços. Sylvio Marcondes é claroao definir esta característica da atividadeempresarial, em prosseguimento à lição aci-ma transcrita:

Em segundo lugar, esta atividade deveser organizada, isto é, atividade em que secoordenam e se organizam os fatores da pro-dução: trabalho, natureza, capital. É a conju-gação desses fatores, para a produção debens ou de serviços, que constitui a ativida-de considerada organizada, nos termos dopreceito do Projeto. (27 )

Rubens Requião, por sua vez, sinteti-za:

O empresário assim organiza a suaatividade, coordenando os seus bens (capi-tal) com o trabalho aliciado de outrem. Eis aorganização. Mas essa organização, em si,o que é? Constitui apenas um complexo debens e um conjunto de pessoal inativo. Es-ses elementos – bens e pessoal – não se jun-tam por si; é necessário que sobre eles, de-vidamente organizados, atue o empresário,dinamizando a organização, imprimindo-lhesatividade que levará à produção. Tanto o ca-pital do empresário como o pessoal que irátrabalhar nada mais são isoladamente do quebens e pessoas. A empresa somente nascequando se inicia a atividade sob a orientaçãodo empresário. Dessa explicação surge níti-da a idéia de que a empresa é essa organi-zação dos fatores de produção exercida, pos-ta a funcionar, pelo empresário. Desapare-cendo o exercício da atividade organizada doempresário, desaparece, ipso facto, a empre-sa. (28 )

Assim, não é empresário quem explo-ra atividade de produção ou circulação debens ou serviços sem alguns desses fatoresde produção. O comerciante de perfumes que

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leva ele mesmo, à sacola, os produtos até oslocais de trabalho ou residência dos potenci-ais consumidores explora atividade de circu-lação de bens, fá-lo com intuito de lucro, ha-bitualidade e em nome próprio, mas não éempresário, porque em seu mister não con-trata empregado, não organiza mão-de-obra.O feirante que desenvolve seu negócio va-lendo-se apenas das forças de seu própriotrabalho e de familiares (esposa, filhos, ir-mãos) e alguns poucos empregados, tambémnão é empresário porque não organiza umaunidade impessoal de desenvolvimento deatividade econômica. O técnico em informá-tica que instala programas e provê a manu-tenção de hardware atendendo aos clientesem seus próprios escritórios ou casa, o pro-fessor de inglês que traduz documentos parao português contratado por alguns alunos ouconhecidos deste, a massagista que atendea domicílio e milhares de outros prestadoresde serviço – que, de telefone celular em pu-nho, rodam a cidade – não podem ser consi-derados empresários, embora desenvolvamatividade econômica. Eles não são empre-sários porque não desenvolvem suas ativi-dades empresarialmente, não o fazem medi-ante a organização dos fatores de produção.

Por fim, apenas para finalizar os ele-mentos componentes do conceito de empre-sa extraível da definição legal de empresá-rio, anote-se que produção de bens é a fabri-cação de produtos ou mercadorias em mas-sa (toda grande indústria é, por definição, em-presarial), produção de serviços é a presta-ção de serviços (banco, seguradora, hospi-tal, escola, estacionamento, provedor deacesso à internet, etc); circulação de bens éa atividade de intermediação típica do comér-cio em sua manifestação originária (ir buscaro bem no produtor para trazê-lo ao consumi-dor); e circulação de serviços é a intermedia-ção da prestação de serviços (a agência deturismo não presta os serviços de transporteaéreo, traslados e hospedagem, mas, aomontar um pacote de viagem, os intermedeia,pondo-os em circulação).

O conceito legal de empresário nãorecobre todas as atividades econômicas. Per-manece, no interior da teoria da empresa, a

classificação destas em empresariais ou não-empresariais. No item subseqüente, serãodelimitados os contornos de cada uma de-las.

4. Atividades econômicas empresariais eatividades econômicas não-empresariais

A adoção da teoria da empresa nãoimplica a superação da bipartição do direitoprivado, que o legado jurídico de Napoleãotornou clássica nos países de tradição roma-na. Altera o critério de delimitação do objetodo Direito Comercial — que deixa de ser osatos de comércio e passa a ser a empresari-alidade —, mas não suprime a dicotomiaentre o regime jurídico civil e comercial.

A partir da teoria da empresa, o Direi-to Comercial (empresarial, de empresa, dosnegócios – é indiferente a denominação quese lhe dê) deixa de ser o ramo jurídico apli-cável à exploração de certas atividades (aslistadas como atos de comércio) e passa aser o direito aplicável quando a atividadeé explorada de uma determinada forma(qual seja, a forma empresarial) (29 ).

Assim, de acordo com o Código Civilde 2002, continuam excluídas da disciplinado direito comercial algumas atividades eco-nômicas. São as atividades não-empresari-ais, cujos exercentes não são empresário enão podem, por exemplo, impetrar concor-data, nem falir. São quatro as hipóteses deatividades econômicas não-empresariais queo direito positivo brasileiro contempla.

A primeira atividade econômica não-empresarial a considerar é a explorada porquem não se enquadra no conceito legal deempresário. Se alguém presta serviços dire-tamente, mas não organiza uma empresa,mesmo que o faça profissionalmente (comintuito lucrativo e habitualidade), ele não éempresário e o seu regime não será o de Di-reito Comercial. Aliás, com o desenvolvimentodos meios de transmissão eletrônica de da-dos, estão surgindo atividades econômicasde relevo exploradas sem empresa, em queo prestador dos serviços trabalha sozinho emcasa.

As demais atividades econômicasnão-empresariais que existem no direito bra-

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sileiro são as dos profissionais intelectuais,dos empresários rurais não registrados naJunta Comercial e as das cooperativas.

Quanto aos exercentes de profissãointelectual, importa destacar que eles não seconsideram empresários por força do pará-grafo único do art. 966 do Código Civil:

Parágrafo único. Não se consideraempresário quem exerce profissão intelectu-al, de natureza científica, literária ou artísti-ca, ainda com o concurso de auxiliares oucolaboradores, salvo se o exercício da pro-fissão constituir elemento de empresa.

Vale a pena atentar, desde logo, paraa locução “ainda com o concurso de auxilia-res ou colaboradores”. Por que teria o legis-lador se preocupado em fazer tal esclareci-mento? A resposta é simples: a caracteriza-ção da empresa como atividade econômicaorganizada pressupõe, como assinalado, aarticulação dos fatores de produção, entre osquais, a mão-de-obra. Quis o legislador dei-xar bem claro, no parágrafo único do art. 966,que os profissionais intelectuais não são em-presários mesmo que organizassem o traba-lho de empregados, porque seria apenasneste caso que a possibilidade de confusãoexistiria. O profissional intelectual que nãoconta com o concurso de auxiliares ou cola-boradores nunca poderia ser consideradoempresário porque não se enquadraria noconceito legal estabelecido pelo caput domesmo dispositivo. Uma vez mais, confirma-se que a lei não quer atribuir a qualidade jurí-dica de empresário a quem não articula osfatores de produção.

Os profissionais intelectuais exploram,portanto, atividades econômicas não sujeitasao Direito Comercial. Entre eles se encon-tram os profissionais liberais (advogado, mé-dico, dentista, arquiteto etc.), cujo serviço éintrinsecamente ligado à própria pessoa doprestador e independe da estrutura organi-zada para dar-lhe suporte. Para Jorge Manu-el Coutinho de Abreu, parece ser:

mais ajustado sustentar que, em re-gra, os escritórios, consultórios, estúdios dosprofissionais liberais não constituem empre-sas. O que aí avulta é a pessoa dos profissi-onais (com específica capacidade técnico-ci-

entífica para a prestação de serviços), nãoum objectivo complexo produtivo; o conjuntodos instrumentos de trabalho não têm auto-nomia funcional nem identidade própria, nãomantém idêntica ‘eficiência’ ou ‘produtivida-de’ na titularidade de terceiro (profissional damesma especialidade); a actividade do su-jeito exaure praticamente o processo produ-tivo (de prestação de serviços). (30 )

Também se consideram exercentes deprofissão intelectual os escritores e artistasde qualquer expressão (plásticos, músicos,atores etc.) bem assim os técnicos com al-guma formação profissional específica (téc-nicos em contabilidade, em eletrônica, eminformática, corretor de seguros, de imóveis,etc.).

Há uma exceção, prevista no mesmodispositivo legal (parágrafo único do art. 966),em que o profissional intelectual se enqua-dra no conceito de empresário. Trata-se dahipótese em que o exercício da profissãoconstitui elemento de empresa, ou seja, sem-pre que o exercente de profissão intelectualdedicar-se mais à atividade típica de empre-sário (organização dos fatores de produção)do que propriamente à função científica, lite-rária ou artística (31 ).

Atividade econômica rural, por suavez, é a explorada normalmente fora da ci-dade. Certas atividades produtivas não sãocostumeiramente desenvolvidas em meiourbano, por razões de diversas ordens (ma-teriais, culturais, econômicas ou jurídicas).São rurais, por exemplo, as atividades eco-nômicas de plantação de vegetais destina-das a alimentos, fonte energética ou maté-ria-prima (agricultura, reflorestamento), a cri-ação de animais para abate, reprodução,competição ou lazer (pecuária, suinocultura,granja, eqüinocultura) e o extrativismo vege-tal (corte de árvores), animal (caça e pesca)e mineral (mineradoras, garimpo).

As atividades rurais, no Brasil, são ex-ploradas em dois tipos radicalmente diferen-tes de organizações econômicas. Tomando-se a produção de alimentos por exemplo, en-contra-se na economia brasileira, de um lado,a agroindústria (ou agronegócio) e, de outro,a agricultura familiar. Naquela, emprega-se

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SOCIEDADES SIMPLES

tecnologia avançada, mão-de-obra assalari-ada (sempre numerosa, por vezes permanen-te ou temporária), especialização de cultu-ras, grandes áreas de cultivo; na familiar, tra-balham o dono da terra e seus parentes, umou outro empregado, e são relativamentemenores as áreas de cultivo (32 ).

Atento a esta realidade, o Código Ci-vil de 2002 reservou para o exercente de ati-vidade rural um tratamento específico. Dis-põe o art. 971:

Art. 971. O empresário, cuja atividaderural constitua sua principal profissão, pode,observadas as formalidades de que tratam oart. 968 e seus parágrafos, requerer inscri-ção no Registro Público de Empresas Mer-cantis da respectiva sede, caso em que, de-pois de inscrito, ficará equiparado, para to-dos os efeitos, ao empresário sujeito a regis-tro.

Deste modo, se o exercente de ativi-dade econômica rural requerer a inscrição noregistro das empresas (Junta Comercial),será considerado empresário e submeter-se-á às normas de Direito Comercial. Esta é, nor-malmente, a opção adotada pelo agronegó-cio. Caso, porém, o exercente de atividadeeconômica rural não requeira a inscrição nes-te registro, não se considera empresário eseu regime será o do Direito Civil. Esta últi-ma deverá ser a opção predominante entreos titulares de negócios rurais familiares.Neste caso, se os exercentes de atividaderural se unirem numa sociedade, ela terá anatureza de simples.

Finalmente, em relação às cooperati-vas, convém registrar que, desde o tempo emque a delimitação do objeto do Direito Co-mercial era feita pela teoria dos atos de co-mércio, sempre houve duas exceções a as-sinalar no contexto do critério identificadordesse ramo jurídico. De um lado, a socieda-de por ações, que sempre se reputou comer-cial, independentemente da atividade explo-rada. De outro, as cooperativas, que são ne-cessariamente sociedades exercentes de ati-vidades civis (integram a categoria das “so-ciedades simples”), independentemente daatividade que exploram. A este respeito pre-ceitua o art. 982 e seu parágrafo único do

Código Civil:Art. 982. Salvo as exceções expres-

sas, considera-se empresária a sociedadeque tem por objeto o exercício de atividadeprópria de empresário sujeito a registro (art.967); e, simples, as demais.

Parágrafo único. Independentementede seu objeto, considera-se empresária a so-ciedade por ações; e, simples, as cooperati-vas.

As cooperativas, normalmente, dedi-cam-se às mesmas atividades dos empresá-rios e costumam atender aos requisitos le-gais de caracterização destes (profissiona-lismo, atividade econômica organizada e pro-dução ou circulação de bens ou serviços),mas, por expressa disposição do legislador,que data de 1971, não se submetem ao regi-me jurídico-empresarial. Quer dizer, não es-tão sujeitas à falência e não podem impetrarconcordata. Ela é, sempre, uma sociedadesimples e nunca, empresária.

Cabe, agora, para encerrar as consi-derações gerais deste Parecer, distinguir umade outra daquelas categorias de sociedade.No próximo item, em suma, tratarei das soci-edades simples e das empresárias.

5. Sociedades empresárias e sociedadessimples

A sociedade simples é uma das maissignificativas novidades do Código Reale (33 ).Cuida-se de figura de larga importância por-que cumpre três diferentes funções.

Em primeiro lugar, a sociedade sim-ples é um dos vários tipos societários que alei põe à disposição dos que pretendem ex-plorar atividade econômica conjuntamente.Presta-se bem, por sua simplicidade e agili-dade (34 ), às atividades de menor envergadu-ra. É o tipo societário adequado, por exem-plo, aos pequenos negócios, comércios ouprestadores de serviços não-empresários(isto é, que não exploram suas atividades em-presarialmente), aos profissionais liberais (àexceção dos advogados, cuja sociedade temdisciplina própria na Lei nº 8.906, de 4 de ju-lho de 1994), aos artesãos, artistas etc.

A segunda função que o Código Rea-le reservou para a sociedade simples foi a

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SOCIEDADES SIMPLES

de servir de modelo genérico para os demaistipos societários contratuais. A disciplina dasociedade simples, que se encontra nos arts.997 a 1.044 (Capítulo I do Subtítulo II do Tí-tulo II do Livro II da Parte Especial), aplica-setambém, em caráter subsidiário, à socieda-de em nome coletivo (art. 1.040), em coman-dita simples (arts. 1.040 e 1.046) e, em re-gra, à sociedade limitada (art. 1.053, caput).É também a disciplina supletiva das socieda-des cooperativas (art. 1.096).

Mas, é a terceira função da socieda-de simples que interessa a este Parecer. Alémde tipo societário e de modelo geral, ela é,finalmente, uma categoria de sociedades.Pelo art. 982 do Código Civil, transcrito aci-ma, as sociedades se consideram simples senão tiverem “por objeto o exercício de ativi-dade própria de empresário sujeito a regis-tro”. As sociedades desta categoria podemadotar, como autoriza o art. 983 do CódigoCivil, qualquer um dos tipos das sociedadesempresárias (exceto os de sociedades porações: anônima e comandita por ações) e,se não o fizer, subordinar-se-á às regras quelhe são próprias.

Então, a expressão “sociedade sim-ples” é, em decorrência da primeira e últimafunções assinaladas, ambígua. Em sentidoestrito designa um tipo de sociedade(ombreia-se, neste caso, à limitada, anôni-ma, comandita por ações etc.); em sentidolato, designa a categoria das sociedades não-empresárias.

Quer dizer, de acordo com o sistemaadotado pelo Código Reale, as sociedadespersonificadas se classificam, inicialmente,em empresárias e simples (não-empresárias).As empresárias podem adotar um de 5 tipos:nome coletivo, comandita simples, limitada,anônima e comandita por ações. As simples(em sentido lato), por sua vez, também po-dem adotar um de 5 tipos (em parte, diferen-tes): nome coletivo, comandita simples, limi-tada, cooperativa e simples (em sentido es-trito).

Enquanto designação de categoria desociedades, as sociedades simples são defi-nidas legalmente por exclusão. São aquelasque não têm por objeto o exercício de ativi-

dade própria de empresário sujeito a regis-tro. Será, portanto, a partir dos contornos dadefinição de empresário que se delimitarão,por exclusão, as sociedades em regra enqua-dradas nesta categoria (35 ).

Como examinado anteriormente, a ati-vidade típica de empresário não se define porsua natureza, mas pela forma com que é ex-plorada. Quando a atividade econômica é ex-plorada de forma organizada (ou seja, medi-ante a articulação dos fatores de produção),então tem-se uma empresa; quem a exerceé empresário; e, se pessoa jurídica, uma so-ciedade empresária.

Tome-se por exemplo o comércio dealgum bem qualquer: peixe. Tanto o super-mercado como o feirante adquirem peixe parao revender ao consumidor. A atividade eco-nômica tem, nos dois casos, a mesma natu-reza. O supermercado, porém, será, via deregra, uma empresa, porque se trata de co-merciante que não consegue operar a nãoser através da organização de trabalho alheioem estabelecimento adequado, de porte, como emprego de controles e tecnologias apura-das. O feirante, por sua vez, pode explorar amesma atividade sem dotar necessariamen-te desta organização. É claro que se for umfeirante bem sucedido, titular de concessãoem feira de grande movimento localizada embairro de alto poder aquisitivo, é possível queseu movimento justifique organizar uma em-presa. Não se verificando tais pressupostos,entretanto, aquela atividade comercial pode-rá ser adequada e inteiramente exploradasem a organização dos fatores de produção;ou seja, com o trabalho pessoal e da família,sem sofisticados controles operacionais, deestoque e de caixa, sem estabelecimentocomplexo.

Não é, deste modo, a natureza da ati-vidade que define o empresário, mas, em re-gra, a forma pela qual é explorada.

Quando não houver exploração em-presarial de certa atividade – isto é, quandoa atividade econômica não for organizada –e o exercente for uma sociedade, não se en-contram os pressupostos que o art. 982 doCódigo Civil estabeleceu para lhe atribuir aclassificação de sociedade empresária. Se

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não há empresa, a sociedade que se dedicaà atividade econômica em questão, perten-ce à categoria das simples (sentido lato).

Apenas dois tipos societários não sesubmetem à regra assinalada: de um lado,as sociedades por ações, que serão sempreempresárias, ainda que não explorem seuobjeto empresarialmente; de outro, as coo-perativas, que serão sempre simples, aindaque organizem de forma empresarial seunegócio.

As sociedades simples são registra-das no Registro Civil das Pessoas Jurídicas,e não no Registro de Empresas (Juntas Co-merciais), segundo o preceituado no art.1.150 do Código Civil:

Art. 1.150. O empresário e a socieda-de empresária vinculam-se ao Registro Pú-blico de Empresas Mercantis a cargo dasJuntas Comerciais, e a sociedade simples aoRegistro Civil das Pessoas Jurídicas, o qualdeverá obedecer às normas fixadas paraaquele registro, se a sociedade simples ado-tar um dos tipos de sociedade empresária.

Esta disposição aplica-se a qualquerum dos tipos da sociedade simples, em es-pecial ao tipo que é necessariamente sim-ples, a cooperativa.

Em relação ao registro apropriadopara as sociedades cooperativas, dúvidas po-deriam surgir em razão de dois preceitos: oart. 1.093 do Código Civil, que “ressalvou alegislação especial” e o art. 18 da Lei nº 5.764/71, que menciona a intervenção da JuntaComercial no processo de autorização defuncionamento das cooperativas. Com efei-to, uma leitura superficial destes dois dispo-sitivos poderia levar o intérprete menos atentoà conclusão de que as cooperativas, apesarde sua classificação como sociedades sim-ples, deveria ser registrada na Junta Comer-cial, contrariamente ao que dispõe o art. 1.150do Código Civil.

Não se pode, porém, esquecer que ocitado dispositivo da lei das cooperativas nãovigora mais desde a promulgação da Consti-tuição Federal de 1988. Entre os direitos egarantias fundamentais (art. 5º), o constitu-inte assegura que:

XVIII – a criação de associações e,

na forma da lei, a de cooperativas indepen-dem de autorização, sendo vedada a interfe-rência estatal em seu funcionamento.

Em razão deste preceito constitucio-nal, os arts. 17 a 20 da Lei nº 5.764/71 nãoforam recepcionados pela ordem inaugura-da em 1988. Como o constituinte estabele-ceu que a criação de cooperativas indepen-de de autorização e vedou a interferência doestado em seu funcionamento, as normas delei ordinária pré-dispostas a operacionaliza-rem a autorização e controle do funcionamen-to das cooperativas simplesmente perderamsua validade. Não foram, em suma, recepci-onadas pela Constituição Federal.

Modesto Carvalhosa, em recentíssimaobra de comentários ao novo Código Civil,ensina acerca da trajetória evolutiva da dis-ciplina legal sobre cooperativismo no Brasil:

Com o advento da atual Lei de Coo-perativas (Lei n. 5.764, de 16-12-1971) ini-ciou-se um período de renovação, tendenteà mitigação da intervenção estatal no setor.Diz-se ‘mitigação’ da presença estatal, pois,em diversos pontos da lei, percebe-se que aintenção foi a de flexibilizar gradativamenteas estruturas do cooperativismo, e não a deromper em definitivo com o controle estatal.Nesse sentido, merece destaque negativo apersistência da autorização prévia de funcio-namento, antecedida por um procedimentolento e demasiadamente complexo, que con-tinuava a obstar a constituição de novas co-operativas. Esse período de renovação gra-dativa desaguou na atual fase de liberaliza-ção das cooperativas, iniciada com a Consti-tuição Federal de 1988, que, em seus arts.5º, XVIII, e 174, §§ 2º, 3º e 4º, claramenteestimula o desenvolvimento de um coopera-tivismo independente, isentando-as, por con-seguinte, da autorização prévia e do controleestatal, uniformizando seu tratamento tribu-tário e dispondo de forma mais específicasobre certas espécies de cooperativa, taiscomo aquelas voltadas às atividades de ga-rimpo. Com isso, alguns dos dispositivos daainda vigente Lei n. 5.764/71 claramente nãoforam recepcionados pela Constituição Fe-deral, tais como os arts. 17 a 20, por exem-plo, que dispõem sobre a referida autoriza-

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ção prévia de funcionamento. (36 )

Em 1988, verificou-se a não-recepçãopela Constituição Federal do art. 18 da Leinº 5.764/71. Em princípio, teria sido elimina-da, naquela oportunidade, a anacrônica sis-temática, desprovida de sentido, de uma so-ciedade civil ser registrada na Junta Comer-cial. Sucessivas normas do registro comerci-al, contudo, mantiveram a previsão (porexemplo, o art. 32, II, a, da Lei nº 8.934/94).Com novo Código Civil, entram em vigor dis-positivos de lei expressos e claros, que qua-lificam as cooperativas como sociedades sim-ples e indicam-lhe o Registro Civil das Pes-soas Jurídicas para o registro de seus atosconstitutivos e societários. As normas do re-gistro comercial incompatíveis com o novoCódigo Civil não são específicas da coope-rativa e, por isto, não se encontram ressalva-das pelo art. 1.093.

Assim, não sobram dúvidas de que associedades simples, qualquer que seja o tipoadotado (limitada, cooperativa, simples, etc.),são sempre registradas no Registro Civil dasPessoas Jurídicas, e não na Junta Comerci-al.

6. Respostas aos quesitos

1. Com a entrada em vigor do novoCódigo Civil, desapareceram as socieda-des civis e comerciais e, conseqüentemen-te, a necessidade de distingui-las atravésdo objeto social (civil ou comercial)?

O novo Código Civil introduziu, no di-reito positivo brasileiro, a teoria da empresa.Como referido ao longo do Parecer, diferen-temente da teoria dos atos de comércio, ateoria da empresa não lista um conjunto deatividades econômicas para qualificá-las esubmetê-las ao direito comercial. Na verda-de, a teoria da empresa qualifica a atividadeeconômica em função da forma como é ex-plorada.

Desde a entrada em vigor do novo Có-digo Civil, portanto, as atividades econômi-cas são classificadas em empresariais ounão-empresariais.

Empresariais são as atividades eco-nômicas organizadas como empresas. Sem-

pre que ao produzir ou circular bens ou servi-ços, alguém combina os quatro fatores deprodução do capitalismo superior (mão-de-obra, insumos, tecnologia e capital), confereà sua atividade uma organização específica.O nome desta organização é empresa.

Não-empresariais, por sua vez, são asatividades econômicas exploradas indepen-dentemente da articulação dos fatores deprodução. Quando quem produz ou circulabens ou serviços não contrata senão algunspoucos empregados, não adquire nem de-senvolve sofisticadas tecnologias, não faz cir-cular insumos ou não tem relevante capital,falta-lhe empresarialidade.

Em vista disto, pode-se afirmar que odireito brasileiro não mais distingue socieda-des comerciais de civis pelo seu objeto, massim distingue sociedades empresárias e sim-ples pela forma com que exploram a ativida-de econômica.

2. A distinção entre as sociedadessimples e empresária se dá tão somentepela forma com que se exerce a atividadeeconômica?

O art. 982 do Código Civil considera“empresária a sociedade que tem por objetoo exercício de atividade própria de empresá-rio sujeito a registro”.

Como visto ao longo do Parecer, é aorganização empresarial da atividade econô-mica que define a atividade própria do em-presário, e não a natureza desta atividade.

Uma mesma atividade econômicapode ser explorada empresarialmente ounão-empresarialmente. Esta é uma noçãoque não se aplica a apenas alguns poucosramos da economia. Um banco só se explo-ra empresarialmente; assim também umaseguradora ou operadora de plano privadode assistência à saúde, além de exercentesde outras atividades cuja complexidade exi-ge uma empresa. Na maioria dos casos, con-tudo, tanto o comércio como a prestação deserviços podem ser explorados empresarial-mente ou não.

Quando se está diante desta hipótese– atividades econômicas que podem ou nãoser exploradas de forma empresarial – se os

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exercentes se unem numa sociedade, elapoderá ser empresária ou simples.

Será empresária se o objeto for ex-plorado com a organização típica da empre-sa; será simples, se for explorado sem tal or-ganização.

A distinção entre sociedade simples eempresária dá-se, portanto, exclusivamenteem função da forma com que se exerce a ati-vidade econômica. É esta a regra. Estabele-ce a lei que, independentemente da formado exercício da atividade econômica, os de-dicados às atividades intelectuais, de arte-sanato ou artísticas, bem como as cooperati-vas sempre se consideram sociedades sim-ples.

3. As sociedades simples são ape-nas aquelas cuja atividade venha a corres-ponder ao exercício de profissão intelec-tual, de natureza científica, literária ou ar-tística, com fundamento no parágrafo úni-co do art. 966 do Código Civil?

Não. Os exercentes de profissão inte-lectual de natureza científica, literária ou ar-tística, quando unidos em sociedade que nãoadote a forma por ações, contratam neces-sariamente uma sociedade simples. Isto por-que a lei ressalvou expressamente, no dis-positivo citado no quesito, a hipótese. Elesexercem, assim, atividades não-empresariais.

De se anotar que não precisa ser uni-profissional a sociedade de exercentes deprofissão intelectual para caracterizar-secomo simples. Se um arquiteto e um enge-nheiro se unem em sociedade para prestaros serviços que são comuns às duas ativida-des intelectuais, simples será a sociedade.

Mas não se esgotam nesta hipóteseos casos de sociedades simples.

Qualquer exercente de atividade eco-nômica que não a organiza empresarialmen-te, sendo pessoa jurídica, será uma socieda-de simples.

Deste modo, as sociedades simplesnão são apenas aquelas cujo objeto se en-contra referido no parágrafo único do art. 966do Código Civil.

4. As sociedades simples, já que

se destinam ao exercício de atividade eco-nômica (com bens e serviços), podem terpor objeto a prestação de serviços em ge-ral e o pequeno comércio, pequena indús-tria e artesãos, de um modo geral?

As sociedades simples podem ter porobjeto prestação de serviços, artesanato ecomércio.

Como visto, não é a natureza da ativi-dade econômica que define se a sociedadeque a explora deve ser simples ou empresá-ria, mas sim a forma como a atividade é ex-plorada.

Desde que no ato constitutivo ou eminstrumento apartado, o interessado declareque a sociedade é simples (porque não ex-plora a atividade econômica pertinente ao seuobjeto de forma empresarial), é esta sua clas-sificação jurídica.

Não tem importância, note-se, a di-mensão do negócio. Normalmente, não seconsegue explorar atividade econômica devulto sem a organização empresarial. Masnão há relação necessária entre um e outrovetor. Tanto assim que pequenos negóciospodem ser explorados empresarialmente. Odecisivo é a forma com que se explora a ati-vidade: com ou sem empresarialidade.

5. Há alguma vedação que impeçaas sociedades simples de exercer essasatividades de bens e serviços referidas noquesito anterior?

Não há vedação nenhuma que impe-ça a sociedade simples de ter por objeto ativi-dade econômica de prestação de serviços,artesanato ou comércio.

Para ser classificada como simples,basta que a sociedade não explore seu obje-to empresarialmente. Se assim o fizer, e nãose constituir regularmente como sociedadeempresária, estará exposta às conseqüênci-as da irregularidade, como, por exemplo, aperda da personalidade jurídica. É a mesmaconseqüência que se manifesta, aliás, se asociedade simples (de tipo limitada, por exem-plo) levar a registro seus atos constitutivosna Junta Comercial.

Esta, porém, é uma outra questão. En-quanto a sociedade simples explora seu ob-

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jeto de forma não-empresarial, ela será re-gular, exatamente por inexistir qualquer ve-dação que a impeça de ter, como objeto, oartesanato, comércio e prestação de servi-ços.

Há somente algumas poucas ativida-des que a sociedade simples não pode terpor objeto. São, em geral, as atividades paracuja exploração a lei exige a forma de socie-dade anônima. É o caso de bancos e segu-radoras, que apenas se podem constituir porsociedades empresárias.

6. Seria imprescindível que do atoconstitutivo da sociedade constasse refe-rência expressa à natureza simples ouempresária da sociedade?

Não exige a lei que conste do ato cons-titutivo da sociedade uma referência expres-sa à sua natureza simples ou empresária.

Na verdade, a exata classificação dequalquer sociedade personificada é umaquestão de fato.

Se a sociedade explora empresarial-mente a atividade própria de seu objeto, masnão se organiza como sociedade empresá-ria, ela está em situação irregular e sofreráas conseqüências disto (perda da personali-dade jurídica, impossibilidade de impetrarconcordata, etc.). Estará, em outros termos,na mesma condição em que se encontrariauma sociedade simples que inadvertidamentese registrasse na Junta Comercial.

Uma referência, no instrumento cons-titutivo, da classificação da sociedade comosimples não teria valor apenas se ela, de fato,for empresária. Não havendo, contudo, dis-crepância entre o declarado no ato societá-rio levado a registro e a realidade de fato dasociedade, a declaração terá plena validadee eficácia.

Mas a declaração do interessado (noato constitutivo ou em instrumento apartado)no sentido de ser simples a sociedade leva-da a registro representa cautela altamente re-comendável para os consulentes admitiremregistrarem o contrato de uma sociedade sim-ples (seja ela do tipo limitada ou do tipo sim-ples).

7. Para efeito de admissão no ór-gão de registro competente (os RegistrosCivis das Pessoas Jurídicas e os Regis-tros de Empresas), qual o critério a seradotado para classificar a natureza jurídi-ca de uma sociedade e a conseqüentecompetência registral?

A exata classificação de uma socie-dade personificada (simples ou empresária)é, como acentuado na resposta ao quesitoanterior, uma questão de fato. Quer dizer, sea atividade econômica correspondente ao ob-jeto social está sendo explorada com a orga-nização típica dos empresários, a sociedadeé empresária; caso contrário, é simples.

O Registro Civil das Pessoas Jurídi-cas, evidentemente, não é responsável pelacertificação deste fato. Se a sociedade sim-ples efetivamente explora seu objeto socialorganizada como empresa ou não é circuns-tância que o registro não afirma, nem nega.

Deste modo, cabe ao interessado naconstituição de uma sociedade simples fa-zer, perante o órgão de registro, a declara-ção correspondente a este tipo societário. Avista desta declaração, o registro pode serfeito, a menos que outras circunstâncias (va-lor do capital social, elevada quantidade desócios etc.) recomendem encaminhar o inte-ressado à Junta Comercial.

8. É correto afirmar que as socie-dades cooperativas serão registradas noRegistro Civil das Pessoas Jurídicas?

Como mencionado no item 4 desteParecer, o registro das cooperativas nas Jun-tas Comerciais, na data da entrada em vigordo Código Civil, estava previsto no art. 18 daLei nº 5.764/71 (lei do cooperativismo) e noart. 32, II, a, da Lei nº 8.934/94 (lei do regis-tro de empresas).

O Código Civil contempla dispositivoque ressalva a vigência da legislação espe-cial das cooperativas (art. 1.093, in fine).

Esta ressalva, porém, não alcançounem o art. 18 da lei do cooperativismo, nemo art. 32, II, a, da lei do registro de empresas.

O art. 18 da lei do cooperativismo, em-bora abrigado em legislação especial das co-operativas, não tem mais vigência desde

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1988, porque não foi recepcionado pelaConstituição Federal. O Texto Fundamental,no art. 5º, XVIII, veda a lei exigir da coopera-tiva a autorização prévia do estado para fun-cionar. O dispositivo em foco trata, na verda-de, dos procedimentos de autorização e men-ciona a participação da Junta Comercial nes-tes procedimentos. Sendo, com a ordem fun-damental inaugurada em 1988, inconstituci-onal qualquer previsão de autorização gover-namental para o funcionamento da coopera-tiva, deixaram de ser recebidos os preceitosabrigados nos arts. 17 a 20 da lei do coope-rativismo.

O Código Civil não poderia ressalvara vigência de norma inconstitucional, ou me-lhor, de norma não recepcionada pela Cons-tituição de 1988.

Já o art. 32, II, a, da lei do registro deempresas não é, obviamente, norma especí-fica das cooperativas. E por esta razão nãose encontra ao abrigo da ressalva do art.1.093 do Código Civil.

As Juntas Comerciais apenas conti-nuariam a ser o órgão competente para o re-gistro das cooperativas se o Código Civil nãotrouxesse, claramente, a classificação des-tas sociedades no conjunto das simples e avinculação deste ao Registro Civil das Pes-soas Jurídicas. O art. 32, II, a, da lei do regis-tro de empresas (assim como todas as nor-mas esparsas não específicas das coopera-tivas) está revogado pela nova sistemáticaintroduzida pelo Código Civil.

As sociedades cooperativas, portan-to, devem ser registradas no Registro Civildas Pessoas Jurídicas, e não nas Juntas Co-merciais.

9. A autoridade de registro estáobrigada a fiscalizar a observância dasprescrições legais concernentes ao ato?Quais as conseqüências jurídicas do re-gistro de uma sociedade em registro in-competente, para a sociedade e para o ór-gão de registro, respectivamente? Os atosregistrados em registro incompetente sãonulos, anuláveis ou inexistentes?

O Registro Civil das Pessoas Jurídi-cas ou a Junta Comercial têm o dever de não

aceitar para registro atos constitutivos de so-ciedades que não se refiram à respectivacompetência.

Se, por exemplo, o Registro Civil dasPessoas Jurídicas registrar uma sociedadeanônima ou se a Junta Comercial registraruma sociedade cooperativa, elas estão des-cumprindo o dever prescrito no dispositivolegal lembrado pelo quesito e terão, eviden-temente, responsabilidade por terem extra-polado os limites legais de suas competênci-as.

As conseqüências jurídicas do regis-tro de uma sociedade por órgão incompeten-te, para a sociedade, são as da irregularida-de. Uma sociedade registrada em órgão in-competente encontra-se na mesma situaçãode uma sociedade sem registro.

A sociedade que funciona sem o re-gistro exigido em lei tem sua disciplina, hoje,centrada na figura da “sociedade em comum”.

Deste modo, uma sociedade empre-sária registrada no Registro Civil das Pesso-as Jurídicas deve ser tratada como uma so-ciedade irregular. Concretamente falando, elanão tem personalidade jurídica própria dis-tinta da de seus sócios e estes respondemilimitadamente pelas obrigações sociais (CC,art. 990). Outras conseqüências: elas nãopodem impetrar concordata (LF, art. 140) e,se tiverem sua falência decretada, ela seráreputada ilícita (LF, art. 186, VI). Além do mais,ela não poderá usar em juízo seus livros efichas contábeis para fazer prova em seu fa-vor, porque faltará um dos requisitos extrín-secos que é a autenticação pelo órgão com-petente (CC, art. 226).

Em relação ao órgão de registro queextravasou sua competência, as conseqüên-cias serão de ordem civil e administrativa. Noplano civil, o órgão pode ser responsabiliza-do por eventuais danos que venham a sersuportados pelos particulares, provada, evi-dentemente, sua culpa ou dolo no evento. Noplano administrativo, caberão as sançõescorrecionais próprias.

Convém assinalar, porém, que os atossocietários registrados em registro incompe-tente não são nulos, nem anuláveis, nem i-nexistentes. Possuem inegavelmente um ví-

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cio, mas este não é de monta a lhes retirar avalidade. O ato continuará válido, a despeitoda incompetência do registro. Continuará, ou-trossim, existente.

Para que a incompetência do registroimplicasse a nulidade ou anulabilidade do atoseria necessário que a lei tivesse condicio-nado sua validade ao registro. Não é este ocaso. Uma sociedade sem contrato socialregistrado no órgão competente não é inváli-da (é “em comum”).

Por outro lado, para que a ausênciado registro no órgão competente subtraíssea existência do ato seria necessário que a leia condicionasse à formalidade. E também nãoé este o caso. Uma sociedade sem contratosocial registrado no órgão competente existe(é disciplinada, em lei, pelas regras da “soci-edade em comum”).

O ato societário objeto de registro por

órgão incompetente é, sem dúvida, viciado,irregular. Mas por não condicionar o direitobrasileiro nem a existência nem a validadedo ato societário ao registro no órgão com-petente, segue-se que o vício comprometeapenas a eficácia do registro.

Uma sociedade empresária registra-da no Registro Civil das Pessoas Jurídicasou uma sociedade simples registrada na Jun-ta Comercial estão, como afirmado, na mes-ma situação de uma sociedade sem registro;são, no linguajar do novo Código Civil, umasociedade em comum. Os seus atos consti-tutivos, por não terem sido levados a registrono órgão competente, não produziram os efei-tos que deles se esperava, isto é, os de ge-rar uma sociedade regular; apenas isto.

São Paulo, 6 de agosto de 2003

Fábio Ulhoa Coelho

Notas1 O que o negócio jurídico tem de es-

pecífico em relação ao ato jurídico é a inten-cionalidade do sujeito. O negócio jurídico é oato jurídico em que o sujeito quer produzir aconseqüência prevista na norma. Em outrostermos, o ato jurídico é sempre voluntário, istoé, algo que o sujeito de direito faz por suavontade. Produz, ademais, sempre efeitosprevistos em lei, já que a ação voluntária ir-relevante para o direito (espreguiçar-se an-tes de levantar da cama, por exemplo) nãose a considera sequer fato jurídico. Pois bem,se o efeito pré-disposto na norma jurídica équerido pelo sujeito, denomina-se negóciojurídico o ato. Neste caso, o resultado jurídi-co previsto na norma só se operou porque osujeito de direito o quis, enquanto que nosatos não negociais, os efeitos são simplesconseqüências que a norma jurídica liga adeterminados fatos, independentemente daintenção dos sujeitos envolvidos. As diferen-ças entre a teoria francesa dos atos jurídicose a alemã dos negócios jurídicos são tão su-tis que escaparam a Clóvis Bevilacqua. Após

noticiar que a sistemática alemã distinguiaatos jurídicos de declarações de vontade, deupor encerrado o assunto, anotando que “ge-ralmente as duas expressões se consideramequipolentes”. Aproveitou-se, então, de liçõessobre negócio jurídico para discorrer sobreatos jurídicos (Teoria Geral do Direito. Rio deJaneiro, Editora Rio, 1980, 2ª edição, pág.213). A sutileza das diferenças possibilitou,também, a alguns doutrinadores brasileiros,como Caio Mário da Silva Pereira, entre ou-tros, sustentarem que a proximidade entre onosso conceito legal de ato jurídico (o doCódigo de 1916) e as lições da doutrina ale-mã sobre negócio jurídico era tão expressi-va, que cabia dar-se preferência a esta nodesenvolver das lições de direito civil (Insti-tuições de Direito Civil. Rio de Janeiro, Fo-rense, 1976, vol. 1, 5ª edição, pág. 414).

2 Conferir nos manuais mais utilizadospelas faculdades francesas: Jean Carbonni-er, Droit Civil – introduction, Paris, PUF, 1999,26ª edição; Christian Larroumet, Droit Civil,Paris, Economica, 1998, 3ª edição; Michel

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Juglart et al, Cours de Droit Civil - manuel,Paris, Montchrestien, 1999, vol. 1, 15ª edi-ção; Pierre Voirin e Gilles Goubeaux, DroitCivil, Paris, LGDJ, sem ano, 20ª edição.

3 Deve-se destacar que também a ide-ologia fascista contribuiu para o surgimentode uma teoria como a da empresa. Comoproponho em meu Manual de Direito Comer-cial, deve-se atentar “para o local e ano emque a teoria da empresa se expressou pelaprimeira vez no ordenamento positivo. Omundo estava em guerra e, na Itália, gover-nava o ditador fascista Mussolini. A ideologiafascista não é tão sofisticada como a comu-nista, mas um pequeno paralelo entre ela e omarxismo ajuda a entender a ambientaçãopolítica do surgimento da teoria da empresa.Para essas duas concepções ideológicas,burguesia e proletariado estão em luta; elasdivergem sobre como a luta terminará. Parao marxismo, o proletariado tomará o poderdo estado, expropriará das mãos da burgue-sia os bens de produção e porá fim às clas-ses sociais (e, em seguida, ao próprio esta-do), reorganizando-se as relações de produ-ção. Já para o fascismo, a luta de classestermina em harmonização patrocinada peloestado nacional. Burguesia e proletariadosuperam seus antagonismos na medida emque se unem em torno dos superiores objeti-vos da nação, seguindo o líder (duce), que éintérprete e guardião destes objetivos. A em-presa, no ideário fascista, representa justa-mente a organização em que se harmonizamas classes em conflito” (São Paulo, Saraiva,2003, 14ª edição, págs. 8/9).

4 Waldírio Bulgarelli, Direito Comerci-al. São Paulo, Atlas, 1991, 8ª edição, pág.59.

5 Trattato di diritto commerciale. Milão,Francesco Valardii, 1922, vol. 1, 5ª edição,págs. 1 a 25. Vivante, no entanto, não insis-tiu nessas críticas à autonomia do direito co-mercial; em 1919, após ser nomeado presi-dente da comissão de reforma da legislaçãocomercial na Itália, abandonou a tese da uni-ficação e elaborou um projeto de Código

Comercial específico.

6 Noto que a uniformização legislativado direito privado já existia em parte na Suí-ça, desde 1881, com a edição de código úni-co sobre obrigações, mas será o texto italia-no que servirá de referência doutrinária por-que, embora posterior, é acompanhado poruma teoria substitutiva à dos atos de comér-cio. Com certeza, não basta a reunião da dis-ciplina privada das atividades econômicasnum mesmo diploma legal, para que se eli-minem as diferenças de tratamento entre ascomerciais e as civis. É necessária ainda umanoção teórica capaz de se constituir o mode-lo para esta disciplina, um sistema que secontraponha ao francês e o supere. Se a le-gislação suíça já não apresenta diferençasentre as atividades dos comerciantes e a dosnão-comerciantes, sob o ponto de vista dadisciplina das obrigações, não veio a inova-ção acompanhada de uma reflexão doutriná-ria mais abrangente, que projetasse seus efei-tos no mundo jurídico de tradição românica.

7 Para Ascarelli, “à unificação do direi-to das obrigações corresponde, assim, a fi-gura geral do empresário, não como funda-mento de uma nova autonomia do direitomercantil (...), mas como característica geralde quem exerça uma atividade econômica(...)” (Corso de Diritto Commerciale – intro-duzione e teoria dell’impresa. Traduzido daversão espanhola publicada em Barcelona,1964, pág. 127).

8 Sobre as imprecisões conceituais deempresa, ver Waldírio Bulgarelli, A Teoria Ju-rídica da Empresa. São Paulo, 1985, RT,págs. 113 e seguintes. Sobre o acento no as-pecto da “atividade”, este autor anota: “a fal-ta de um especial relevo quanto [à atividade]é explicável pela quase inexistência então deestudos específicos da doutrina jurídica a seurespeito, o que só seria feito a seguir, até comcerto pioneirismo, por Tullio Ascarelli” (pág.124).

9 Confrontar com Giuseppe Fanelli,Introduzione alla teoria giuridica dell’impresa.

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Milão, Giuffrè, 1950, págs. 73/75.

10 Perfis da Empresa. Tradução deFábio Konder Comparato publicada na Re-vista de Direito Mercantil vol. 104, outubro-dezembro de 1996, págs. 109/126.

11 Obra citada, págs. 109/110.

12 Obra citada, pág. 111.

13 Para Rubens Requião, “o conceitode empresa se firma na idéia de que é ela oexercício de atividade produtiva. E do exer-cício de uma atividade não se tem senão umaidéia abstrata” (Curso de Direito Comercial.São Paulo, Saraiva, 1991, vol. 1, 20ª edição,pág. 57).

14 Obra citada, pág. 116.

15 Obra citada, pág. 118.

16 Obra citada, pág. 122.

17 Questões de Direito Mercantil. SãoPaulo, Saraiva, 1977, págs. 7/8.

18 Jorge Manuel Coutinho de Abreu,professor da Faculdade de Direito de Coim-bra, leciona em obra publicada em 1999:“penso ser legítima a utilização sinonímicados dois vocábulos [empresa e estabeleci-mento] – e tomando em conta quer o espaçojurídico-mercantil quer outros domínios. Comefeito, as leis não se opõem a tal equipolên-cia. É certo: ‘empresa’ denota preferencial-mente o ‘perfil subjectivo’ do fenómeno e o‘institucional’; por sua vez, ‘estabelecimento’anda tradicionalmente ligado ao ‘perfil objec-tivo’. Não obstante, ‘estabelecimento’ podetambém ligar-se, uma vez ou outra, àquelesdois perfis, tal como ‘empresa’ serve muitobem para significar ainda a dimensão objec-tiva do fenómeno – a empresa como instru-mento ou estrutura produtiva de um sujeito,e objecto (...) de relações jurídicas” (Da Em-presarialidade – as empresas no direito. Co-imbra, Almedina, 1999, págs. 4/5.

19 Confrontar com Francisco Ferrara,la teoria giuridica dell’azienda. Firenze, IlCastellacio, 1945, págs. 90/91. Transcrevo atradução de Rubens Requião, obra citada,págs. 53/54.

20 A Teoria .... obra citada, pág. 142.

21 Oscar Barreto Filho, com clareza,assinala: “ao conceito básico de empresáriose ligam as noções, também fundamentais,de empresa e de estabelecimento. São trêsnoções distintas, mas que na realidade seacham estreitamente correlacionadas. O em-presário, como vimos, é um sujeito de direi-to, e a empresa é a atividade por ele organi-zada e desenvolvida, através do instrumentoadequado que é o estabelecimento. A figurado empresário é determinada pela naturezada atividade por ele organizada e dirigida; sobeste aspecto, a noção de empresário é, logi-camente, um corolário da noção de empre-sa” (Teoria do Estabelecimento Comercial.São Paulo, Saraiva, 1988, 2ª edição, pág.115).

22 “Somente se emprega de modo tec-nicamente adequado o conceito de ‘empre-sa’ quando tiver o sentido de ‘empreendimen-to’. Se alguém reputa ‘muito arriscada a em-presa’, está certa a forma de se expressar: oempreendimento em questão enfrenta con-sideráveis riscos de insucesso, na avaliaçãodesta pessoa. Como ela se está referindo àatividade, é adequado falar em ‘empresa’.Outro exemplo: no princípio da preservaçãoda empresa, construído pelo moderno Direi-to Comercial, o valor básico prestigiado é oda conservação da atividade (e não do em-presário, do estabelecimento ou de uma so-ciedade), em virtude da imensa gama de in-teresses que transcendem os dos donos donegócio e gravitam em torno da continuida-de deste; assim os interesses de emprega-dos quanto aos seus postos de trabalho, deconsumidores em relação aos bens ou servi-ços de que necessitam, do fisco voltado àarrecadação e outros” (meu Manual de Direi-to Comercial. São Paulo, Saraiva, 2003, 14ªedição, pág. 13).

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23 Obra citada, pág. 58.

24 O lucro pode ser o objetivo da pro-dução ou circulação de bens ou serviços (fi-nalidade), ou apenas o instrumento para al-cançar outros objetivos (meio). “Religiosospodem prestar serviços educacionais (numaescola ou universidade) sem visar especifi-camente o lucro. É evidente que, no capita-lismo, nenhuma atividade econômica se man-tém sem lucratividade e, por isso, o valor to-tal das mensalidades deve superar o dasdespesas também nesses estabelecimentos.Mas a escola ou universidade religiosas po-dem ter objetivos não lucrativos, como a di-fusão de valores ou criação de postos deemprego para os seus sacerdotes. Nestecaso, o lucro é meio e não fim da atividadeeconômica” (meu Manual .... obra citada, pág.13).

25 Questões de Direito Mercantil. SãoPaulo, Saraiva, 1977, pág. 10. Os conceitosde empresário do Projeto de Código das Obri-gações de 1965, do Projeto de Código Civilde 1975 e da lei em vigor são idênticos.

26 Teoria.... obra citada, pág. 149.

27 Obra citada, págs. 10/11.

28 Obra citada, pág. 57.

29 Waldemar Ferreira ensina que “aempresa constitui, atualmente, o verdadeirocritério da comercialidade. O Direito Comer-cial deve ser o das empresas. Essa idéia ounifica. Restitui-lhe seu caráter profissional,sem que se regresse ao direito de casta e deformalismo antigo. Ligam-se-lhes as noçõesde atos de comércio e de comerciante. OComerciante é o chefe da empresa, indiví-duo ou sociedade, conforme o caso. Quantoaos atos de comércio, eles se reputam mer-cantis pela teoria do acessório, salvo alguns,verdadeiramente objetivos” (Tratado de Direi-to Comercial. São Paulo, Saraiva, 1960, vol.1, pág. 212).

30 Obra citada, pág. 102.

31 “Para compreender este conceito,convém partir de um exemplo. Imagine o mé-dico pediatra recém-formado, atendendoseus primeiros clientes no consultório. Jácontrata pelo menos uma secretária, mas seencontra na condição geral dos profissionaisintelectuais: não é empresário, mesmo queconte com o auxílio de colaboradores. Nestafase, os pais buscam seus serviços em ra-zão, basicamente, de sua competência comomédico. Imagine, porém, que, passando otempo, este profissional amplie seu consul-tório, contratando, além de mais pessoal deapoio (secretária, atendente, copeira etc.),também enfermeiros e outros médicos. Nãochama mais o local de atendimento de con-sultório, mas de clínica. Nesta fase de transi-ção, os clientes ainda procuram aqueles ser-viços de medicina pediátrica, em razão daconfiança que depositam no trabalho daque-le médico, titular da clínica. Mas a clientelase amplia e já há, entre os pacientes, quemnunca foi atendido diretamente pelo titular,nem o conhece. Numa fase seguinte, crescemais ainda aquela unidade de serviços. Nãose chama mais clínica, e sim hospital pediá-trico. Entre os muitos funcionários, além dosmédicos, enfermeiros e atendentes, há con-tador, advogado, nutricionista, administradorhospitalar, seguranças, motoristas e outros.Ninguém mais procura os serviços ali ofere-cidos em razão do trabalho pessoal do médi-co que os organiza. Sua individualidade seperdeu na organização empresarial. Nestemomento, aquele profissional intelectual tor-nou-se elemento de empresa. Mesmo quecontinue clinicando, sua maior contribuiçãopara a prestação dos serviços naquele hos-pital pediátrico é a de organizador dos fato-res de produção. Foge, então, da condiçãogeral dos profissionais intelectuais e deve serconsiderado, juridicamente, empresário”(meu Manual... obra citada, págs. 16/17).

32 Consultar, a respeito: Agriculturafamiliar – realidades e perspectivas (JoãoCarlos Tedesco, organizador, Passo Fundo,UPF, 2001, 3ª edição), Gestão Agroindustrial(Mário Otávio Batalha, coordenador, SãoPaulo, Atlas, 2001, 2ª edição) e Economia e

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Gestão dos Negócios Agroalimentares (Dé-cio Zylbersztajn e Marcos Fava Neves, orga-nizadores, São Paulo, Pioneira, 2000).

33 Infelizmente, as normas do CódigoCivil italiano sobre società semplice não po-dem servir de subsídios ao estudo das soci-edades simples do direito brasileiro. Lá, osempresários são classificados em comerci-ais e não-comerciais e as sociedades sim-ples são as reservadas a estes últimos em-presários. Não existe, portanto, no direito ita-liano, como claramente dispôs o legisladorbrasileiro, a contraposição entre sociedadessimples e empresárias. Sobre a matéria, con-sultar Francisco Ferrara Jr., Gli Impreditori ele Società, Milão, 1994, Giuffrè, 9ª edição,especialmente os capítulos II e IX.

34 A simplicidade e agilidade das soci-edades simples, em especial quando adota-da o tipo societário simples, são característi-cas facilmente identificáveis. Em primeiro lu-gar, embora possam, por cláusula inseridano contrato social, limitar validamente a res-ponsabilidade dos sócios pelas obrigaçõesda sociedade (CC, art. 997, VIII), não estãoobrigadas às formalidades societárias perió-dicas, previstas, por exemplo, para as socie-

dades limitadas. Tais formalidades, que exi-gem, por exemplo, a realização de assem-bléia ou reunião de sócios anual para sim-plesmente registrar a aprovação das contas,não precisam ser observadas pelas socieda-des simples. Além disso, admitem a figura dosócio que integraliza sua participação socie-tária com serviços (CC, art. 997, V), espéciede contribuição inadmissível nas sociedadeslimitadas (CC, art. 1.055, § 2º). Em terceirolugar, não se submete à restrição que o art.977 do CC estabeleceu para os sócios casa-dos em regime de comunhão universal ouseparação obrigatória. Aliás, é bastante pro-vável que, em vista do significativo aumentoda complexidade das sociedades limitadas,estas acabem sendo a opção de negóciosde algum porte econômico, tendendo a soci-edade simples a ser a escolha dos micro,pequenos e médios negócios.

35 Disse “em regra” porque as socie-dades dedicadas a atividades intelectuais, porexemplo, são sempre enquadradas na cate-goria de sociedades simples (CC, art. 966,parágrafo único).

36 Comentários ao Código Civil. SãoPaulo, Saraiva, 2003, vol. 13, págs. 395/396.

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