extensao rural no periodo socialista

16
UNIVERSIDADE EDUARDO MONDLANE CENTRO DE ESTUDOS AFRICANOS II CONFERÊNCIA INTERNACIONAL Os intelectuais Africanos face aos desafios do século XXI Em Memória de Ruth First (1925-1982) e por ocasião do 50º aniversário da Universidade Eduardo Mondlane Local: Complexo Pedagógico da UEM, Maputo Data: 28-29 de Novembro, 2012 A Extensão rural no período do socialismo 1 Wilson Adão 2 1 O presente trabalho é uma versão modificada de um dos capítulos da Tese de Mestrado sob orientação do Prof. Doutor Castilho Amilai, sem ao qual, não seria possível a materialização do mesmo. 2 Mestrando em Ciências Agrárias, Faculdade de Agronomia e Engenharia Florestal da Universidade Eduardo Mondlane FAEF/UEM.

Upload: wilson-adao

Post on 16-Apr-2015

121 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: Extensao Rural No Periodo Socialista

UNIVERSIDADE EDUARDO MONDLANE

CENTRO DE ESTUDOS AFRICANOS

II CONFERÊNCIA INTERNACIONAL

Os intelectuais Africanos face aos desafios do século XXI

Em Memória de Ruth First (1925-1982)

e

por ocasião do 50º aniversário da Universidade Eduardo Mondlane

Local: Complexo Pedagógico da UEM, Maputo

Data: 28-29 de Novembro, 2012

A Extensão rural no período do socialismo1

Wilson Adão2

1 O presente trabalho é uma versão modificada de um dos capítulos da Tese de Mestrado sob orientação

do Prof. Doutor Castilho Amilai, sem ao qual, não seria possível a materialização do mesmo.

2 Mestrando em Ciências Agrárias, Faculdade de Agronomia e Engenharia Florestal da Universidade

Eduardo Mondlane – FAEF/UEM.

Page 2: Extensao Rural No Periodo Socialista

Introdução

Desde a década 60, influenciado pelos efeitos de II Guerra Mundial e também em reposta

às crescentes críticas, incongruências e falhas de projectos reducionistas e disciplinares de

desenvolvimento rural direccionado aos pequenos agricultores promovidos pelo modelo

difusionista e clássico da extensão rural, países do mundo inteiro desdobram-se na procura de

novas formas de intervir no espaço rural.

Em função desse acontecimento, esses países, com particularidade subdesenvolvidos,

principalmente os da América Latina, começaram a reestruturar os serviços de extensão rural, e,

segundo Fonseca, citado por Karam e Freitas3, sempre faziam em parcerias com agências de

extensão e pesquisa rural norte-americana.

Nos finais da década 80 e princípios de 90, foram particularmente dois aspectos que

marcaram a efervescência da época. Por um lado, a incontornável introdução do enfoque

sistémico no campo da agricultura e por outro lado, a prerrogativa dada ao conceito de

sustentabilidade nos debates em torno do desenvolvimento, uma vez que se aponta uma série de

problemas ocasionados pelo tipo de desenvolvimento em curso, adoptado até então pelos países

capitalistas.

Influenciado por estes aspectos, a extensão rural começa a “respirar novos ares”

passando, todavia, a atender a demanda dos movimentos sociais do meio rural, em particular a

ligada à agricultura familiar; evidenciam também a preocupação com os problemas ambientais.

Desde então, a extensão rural começa actuar em bases democráticas seguindo processos

participativos, valorizando o conhecimento das populações rurais, até então excluídas.

Portanto, é neste prisma que se enquadra o presente trabalho que pretende, como

principal objectivo: traçar a experiencia da extensão rural nem Moçambique no período

socialista, 1977-87.

3 Karam e Freitas, 2008.

Page 3: Extensao Rural No Periodo Socialista

Página 1

1. Contextualização

O Golpe de Estado em Portugal, a 25 de Abril de 1974, que culminou com a derrocada do

Imperialismo Salazarista, teve uma manifesta importância na intensificação do processo de

descolonização das colónias portuguesas, em particular Moçambique, facto que impulsionou o

acordo de Lusaka realizado a 7 de Setembro de 1974, culminando com a proclamação da

independência do país a 25 de Junho de 1975, constituindo-se então a Republica Popular de

Moçambique.

Nesta altura, as populações encontravam-se dispersas em todo o país obedecendo, ainda,

como fruto de herança colonial, um ordenamento que ia de acordo com os interesses do

colonialismo-capitalista português, desde então inexistente.

No que concerne a agricultura, esta era desenvolvido por dois sectores: O sector familiar

e privado. O primeiro, constituído maioritariamente por nativos, produzia para sua subsistência

produtos da primeira necessidade para além de uma grande variedade de cultura comercializável.

Este sector, também constituía uma fonte de mão-de-obra para outros sectores e principalmente

os de sistema capitalista quer seja no país quer no estrangeiro, com particular enfoque na África

de Sul enquanto o segundo sector, o privado, segundo Ministério de Finanças (1978), albergava

agricultores capitalistas (especialmente os ex-colonos) e semi-capitalistas (alguns pequenos

agricultores moçambicanos) que produziam, geralmente e por regra, culturas de exportação com

maior destaque para a produção de algodão, chá, copra, cana-de-açúcar, sisal, cereais para além

de carne e lacticínios. Este sector, também empregava a mão-de-obra assalariada.

2. Estratégia adoptada pelo Governo: O Socialismo

Diante do quadro socioeconómico que o país se encontrava se afigurava pertinente

(re)estruturar a ordem socioeconómica do pais, organizando a produção e mobilizar os

trabalhadores na reconstrução económica e na luta contra o subdesenvolvimento. E é, também,

tendo em conta essa situação que foi realizado o III congresso da FRELIMO onde se confirmou a

Page 4: Extensao Rural No Periodo Socialista

Página 2

opção socialista4 do desenvolvimento, sobre a égide da qual são traçadas as orientações políticas,

socioeconómica do país.

3. Características do país à partir de 1977

Uma das principais políticas que marcou acentuadamente o período é a política de

centralização que teve como um dos instrumentos para a sua materialização o Decreto nº. 1/75,

de 27 de Julho e o Decreto nº. 4/81, de 10 de Junho.

As implicações desta política impactaram sobretudo na organização social e nos serviços

de agricultura.

A nível de organização social, se definiram dois (2) eixos fundamentais de/para

orientação dos planos de desenvolvimento: aldeias comunais e produção em moldes colectivos.

Embora formadas por diversas situações, as aldeias comunais passaram a constituir a

“coluna vertebral” do processo de sociabilização de campo e, portanto, foram estabelecidas as

normas da sua estruturação e funcionamento.

O Comité Central, na sua 8a sessão fez um finca-pé no modelo de produção colectivo e

traça os princípios sobre os quais dever-se-iam reger. Particularmente no que Concerne a

distribuição de produtos, postula que a produção deverá assegurar reservas para as campanhas

seguintes em sementes e alimentos em caso de seca, financiar os serviços sociais, pagar as

despesas contraídas e criar um excedente. Este excedente, por sua vez, será destinado a

constituição de um fundo de acumulação – 20% - e o restante será distribuído pelos membros das

aldeias segundo as suas “capacidades e o trabalho”. E sobre o trabalho, afirma que este deverá

4 A opção marxista resultou das condições históricas do colonialismo português e do contexto

internacional caracterizado pela Guerra-Fria e da proliferação do movimento dos países não-alinhados.

Chipenembe (2004:76).

Page 5: Extensao Rural No Periodo Socialista

Página 3

ser organizado em brigadas e equipes de trabalho fazendo balanços e sintetizando as

experiências.

A nível dos serviços de agricultura, é importante ressalvar que centralização política

impactou tanto a nível estrutural como funcional.

Em termos estruturais, houve, em 1976, através da Portaria n.º 116/76, de 24 de Julho,

uma reestruturação do Ministério da Agricultura.

A nível de base, são criados Centros de Apoio ao Desenvolvimento Cooperativo que, por

si, constituíam a materialização de apoio diversificado aos produtores, de entre os quais

destacam-se: Gabinete de Organização e Desenvolvimento das Cooperativas (GODCA), Centro

Rural de Experimentação e Desenvolvimento (CRED’s), Centro de Apoio ao Desenvolvimento

Cooperativo (CODECO).

Ainda a nível da estrutura, de referir que passou a existir no país quatro (4) sectores de

produção nomeadamente: as empresas públicas/estatais, cooperativas de produção, o sector

privado e o sector camponês, sendo as duas primeiras, as formas colectiva de produção, as quais

dava-se mais atenção.

Em termos funcionais, há a referir que embora não se fizesse menção a extensão rural,

nesse período, pela complexidade de concretização do programa de Cooperativização, parte dos

projectos elaborados pelo Ministério da Agricultura bem como os centros supracitados, para

além de se referirem a ela, implicitamente, já a exerciam e contava com os seguintes principais

tipos de actividades: i) acompanhamento técnico de campanhas agrícolas; ii); formação; iii)

planificação da produção; iv) introdução de tecnologias e, v) aprovisionamento;

No que diz respeito a introdução de tecnologias, chamava-se atenção ao facto dela ter de

ser feita de forma gradual tendo sempre em consideração, o grau de organização e de

conhecimento dos produtores, os recursos existente a nível local, as condições naturais,

acompanhando-se essa introdução com acções de formação que permitissem aos produtores,

principalmente os cooperativistas, o domínio dessa tecnologia.

Page 6: Extensao Rural No Periodo Socialista

Página 4

A política de centralização era apenas um dos principais acontecimentos que

caracterizava a contexto nacional e, aliado a ele, estava a crise de entendimento reflectida pela

guerra

Em termos financeiros, a ajuda a essa guerra, era dada pelo regime da Rodésia de Ian

Smith e da África do sul e de grupos económicos em Moçambique com algum interesse no país.

Com o fim da guerra na Rodésia do Sul (actual Zimbabwe) e a sua posterior proclamação

a independência em 1980, a África de Sul assumiu às rédeas dessa guerra em nome do anti-

comunismo moçambicano (Darch, 1992). Desde então, os alicerces que fundamentavam os

discursos da guerra estavam assentes no “anti-comunismo” e “democracia” ganhando, desta

forma, apoio até de certas igrejas protestantes e de alguns antigos colonos portugueses

ressentidos com a independência nacional e a ideologia que o Estado adoptara.

Contudo, fortificaram-se os instrumentos de desestabilização5 usados e, por conseguinte,

intensificaram-se os ataques a aglomerados populacionais, destruição de infraestruturas sociais,

económicas, educacionais e de saúde.

Paralelamente a este acontecimento desenrolava no país, as calamidades naturais. Em

1977, as cheias, particularmente nas regiões dos rios Limpopo e Incomáti e no ano de 1978, a

cheia de rio Zambeze afectando directamente as províncias de Manica, Sofala, Tete e Zambézia,

para além de devastarem uma grande área no país causando perda de culturas, destruição de

infraestruturas de comunicação, de comercialização, de educação e saúde, equipamentos, perdas

de vidas humanas e obrigando a migração afectou , também, a economia, como não deixaria de

ser.

Juntam-se a essas calamidades, e com efeito de menor dimensão na economia do país, os

ciclones, quedas irregulares das chuvas e a seca.

5 Uma mistura de coerção económica e agressão militar.

Page 7: Extensao Rural No Periodo Socialista

Página 5

4. Impacte dos eventos do período de Socialismo na Extensão rural

Como se constacta, no Moçambique pós-independente, o período que sucede ao ano 1977

é marcado por eventos/situações que o caracterizam, para além de terem uma forte implicação

em toda uma estratégia desenvolvimentista da época. Esses acontecimentos, devido o seu

impacte a nível da estrutura e funcionamento dos serviços agrários podem ser considerados como

sendo de dois (2) tipos nomeadamente o intrínseco: a centralização, e extrínseco: a guerra e

calamidades naturais.

Atinente aos eventos de ordem extrínseca especialmente a guerra, Brück et al (2000:13)

refere que ela, “ao contrário das catástrofes naturais que têm menos impacto na capacidade

produtiva e deixam intacto o capital humano (aparte as vítimas mortais, como é evidente) e o

capital organizacional, destrói todas as formas de capital e a incerteza que reduz, radicalmente, o

investimento”. Por esta mesma razão que a nossa análise centrar-se-á apenas neste evento.

4.1. Impacte dos eventos extrínsecos nos serviços de extensão rural

Brück (1998), afirma que, em contexto de guerra, “quanto mais claro se torna o objectivo

do oponente/adversário em assumir a liderança, mais o Governo se preocupa em colocar o

esforço de guerra acima de todas outras políticas”.

Entretanto, não constituindo uma excepção no caso de Moçambique, este esforço

ressentiu-se a nível da economia na medida em que as despesas governamentais com salários,

bens e serviços decresceram 60% e as despesas reais em investimento públicos caíram para um

quinto (1/5) do seu valor máximo em apenas três (3) anos, desde 1983, tudo em benefício dos

gastos com a defesa, que por sua vez aumentaram mais do que o dobro, em termos reais, entre

1980 e 1984.

Page 8: Extensao Rural No Periodo Socialista

Página 6

Como consequência directa da diminuição dos investimentos públicos, aliado também a

questão de insegurança particularmente no sector da agricultura, houve uma diminuição da oferta

dos serviços de extensão rural passando, desde então, a serem oferecidos a áreas com uma

segurança relativa. E ainda assim, mesmo nestas zonas, aliado ao factor de obsolescência e/ou

destruição de material e equipamentos, infraestruturas, fraco incentivo, estes serviços tornaram-

se ineficazes e ineficientes;

A redução de investimentos públicos, que fez-se também sentir por parte do sector

privado, teve como consequência directa a redução de número de programas e projectos agrários

e particularmente programas de extensão. E assim sendo, houve, de forma quase que

proporcional, uma redução na oferta bem como na provisão dos serviços de extensão.

Os ataques aos centros populacionais foram umas das principais estratégias adoptadas

pelos fazedores da Guerra e muitas vezes culminaram com a morte ou mesmo desaparecimento

de alguns chefes de família. Em situações como estas, as mulheres é que tinham a obrigação de

tomar o lugar do chefe-de-família. Todavia, as diferenças em níveis educacionais bem como suas

perspectivas para a acumulação do capital, a discriminação cultural, as diferenças de restrições

de tempo, as diferenças no acesso a infraestrutura económica e sociocultural contribuíram em

grande para baixo nível de participação destas em programas de extensão.

A questão dos ataques aos centros populacionais, que geralmente culminavam em saque

de produtos agrícolas alimentares, gados ou de outra espécie de produtos (que serviam muitas

das vezes para alimentar as tropas), aliados a existência de zonas minadas (algumas destas zonas

com grande potencial agrogeológico) constituíram um elemento fundamental, não somente para

a limitação da intervenção extensionista mas também para a redução da área de produção. Desta

forma, ao reduzirem-se as áreas de produção, reduz, de forma proporcional, a procura pelos

serviços de extensão.

Por ora, é importante notar que a redução da área de produção, por sua vez, teve como

consequência directa a baixa produtividade e a consequente carência alimentar. A prevalência

desta situação foi um dos factores que minou a participação da população rural visto que, em

situação que se encontravam, somente lhes interessava atividades com efeitos/retornos a curto

Page 9: Extensao Rural No Periodo Socialista

Página 7

prazo, contrariamente aos projectos agrícolas levados a cabo pelo Governo, através de seus

extensionistas.

Ainda na senda dos ataques a aglomerados populacionais, estes resultaram em mortes não

apenas da população civil campesina, como já referenciamos acima, mas também de

agentes/funcionários do Estado como professores, médicos e extensionistas. Por conseguinte,

reduziu o efectivo dos extensionistas que, de princípio, já era muito reduzido. A redução do

número de efectivo de extensionistas, reduz-se também a oferta e a qualidade dos serviços de

extensão.

A situação de guerra a que o país se encontrava levou a que se desse muita atenção a

questão de segurança quer em recursos humanos quer em recursos financeiros e materiais em

detrimento de muitos outros sectores e particularmente ao sector agrário. Em consequência desta

directiva, o sector agrário, assim como muitos outros, deixa de ser dada a devida atenção em

termos de assistência e manutenção o que levou a degradação das condições de trabalho, de

infraestruturas, de maquinarias ou equipamentos, etc. afectando os serviços de extensão nas suas

componentes de oferta e provisão.

4.1.1. Impacte dos eventos intrínsecos nos serviços de extensão rural

No contexto da Politica de Centralização, os planos anuais e plurianuais constituíam um

documento orientador de toda a economia e, por conseguinte, eram elaborados a nível central do

Governo. Tais planos, para além de definirem/estabelecerem produção agrícola concentravam a

afectação de recursos da economia, priorizavam investimentos entre outros.

Relativamente a produção agrícola, que muitas das vezes extrapolava as reais realidades e

condições de produção da população ou da cooperativa, a planificação6 não tomou em

6 “O processo de planificação era composto, regra geral, pelas seguintes fases: primeiramente, os órgãos

de tutela estabeleciam as metas nacionais e com base nestas, atribuíam-se os volumes a produzir por

empresas. Seguia-se o processo de elaboração do documento do plano nas empresas que poderiam contra

propor os volumes «sugeridos» pelos órgãos do estado. As propostas eram analisadas em primeiro lugar

Page 10: Extensao Rural No Periodo Socialista

Página 8

consideração as diferenças sociais inerentes a estratificação social quer a nível de sexo, idade ou

tribo; de igual maneira, não tomou em consideração as suas prioridades em termos de culturas

alimentares, nas forcas de trabalho7, nos termos de organização social ou seja seu modus vivendi

e operandi (relações de poder, relações económicas, religiosas, etc) e todos os aspectos dai

decorrente. Este procedimento, aliado aos métodos militares de trabalho em comunicação

descendente para além de ter como consequência directa a limitação da participação das

populações levaram a uma construção/concepção ideológica8, particularmente no seio do povo,

de um Estado “explorador” que procura tirar dividendos da força de trabalho campesinato/rural.

E essa situação fez com que diminuísse, por parte da população, a procura pelos serviços

prestados pelo Estado, e muito em particular a procura pelos serviços de extensão.

Tendo estatizado todos os sectores da economia nacional e estando consciente do

contexto internacional, regional e nacional que vinham então tendo uma forte implicância na

direcção politica do novo Estado emergente criando uma situação de desconfiança politica e de

constate alerta, principalmente contra os inimigos internos e com vista a selecionar os membros

que passariam então a constituir o quadro técnico do Aparelho do Estado em quase todos os

no Governo da província através da DPA e posteriormente no Ministério. No caso de as contrapropostas

serem diferentes das inicialmente orientadas pelo órgão central, havia alguma discussão prevalecendo

quase sempre a decisão da estrutura hierarquicamente superior em relação ao qual a empresa dependia

directamente. O documento era feito em função das últimas decisões e submetidos à CNP integrado no

plano sectorial do Ministério. Seguia-se a execução do plano que assumia o estatuto de lei depois da

aprovação formal na Assembleia Popular a quem era submetido pelo conselho de Ministros que era a

quem efectivamente decidia” (Mosca;2011:57).

7 Van de Loo (1984), refere que “as cooperativas na zona sul tinham um crescimento gradual em membros

e áreas desde a independência até o ano de 1981 mais ao menos em que a relação entre a forca de trabalho

(número de membros) e a área trabalhada variava entre 1 até 4 há cada membro, resultando muita das

vezes numa fraca produção por ter planificado áreas demasiadas grandes, o problema mais característico

destas cooperativas.”

8 A esta concepção ideológica contribuiu também o facto de ser o próprio Estado quem estabelecia os

preços dos produtos no mercado, os salários a serem pagos, etc.

Page 11: Extensao Rural No Periodo Socialista

Página 9

sectores da economia o Estado decide adoptar critérios9 não muito claro/subjectivos como:

qualidade e confiança política, posição na hierarquia do partido, experiência militar, a não

vinculação com práticas “subversivas”, “liberalistas”, “reacionárias” ou “obscurantistas”. As

implicações destas medidas, por um lado, reflectiram-se na qualidade dos quadros técnicos,

extensionistas, que ocupavam os cargos para os quais foram seleccionados: baixa qualidade de

formação na área, sendo que alguns tinham apenas as experiências do trabalho nas zonas

libertadas, muito embora cientes dos embargos com os quais se deparariam, dado terem a

consciência de tratar-se de contextos diferente10

; reflectiram-se também nos métodos de trabalho

empregue, militarista11

: rígido, hierarquizado, obediência linear e acrítica; por outro lado,

conduziu a um elevado nível de burocratização e também a uma baixa na eficiência dos serviços

agrários, com forte implicação na gestão administrativa, o que traduziu-se de uma forma

genérica, entre outros aspectos, nas entregas tardias dos factores de produção às cooperativas e

também as empresas estatais.

9 Relativamente às cooperativas, MINAG (1982) ressalva que “Deve-se trabalhar no sentido de

garantir que, pelo menos 15% dos membros de cada cooperativa sejam membros do partido

FRELIMO e/ou Deputados das Assembleias do Povo Locais”. “Torna-se ainda importante

engajar neste processo quadros da F.P.L.M., sobretudo os antigos combatentes, com a vista a

beneficiar às cooperativas das suas ricas experiencias de mobilização e organização das

massas”.

10 Vide Casal (1991)

11 Os grupos de trabalho possuíam nomes militares, por exemplo, brigada, companhia, pelotão,

etc., para designar um sector de produção ou uma equipa de trabalhadores com funções

relacionadas com a Protecção de plantas, mecanização, etc. Os trabalhadores deslocavam-se

em fila e muitas vezes a passo de marcha militar, entre outros exemplos Mosca (1999:124)

citado em Mosca (2011).

Page 12: Extensao Rural No Periodo Socialista

Página 10

5. Considerações finais

Embora durante o período de socialismo não se fizesse menção a extensão rural,

conhecimentos técnicos assim como as actividades inerentes a este serviço eram difundidas aos

produtores rurais. Não obstante a medida politica centralizadora tomada após a adopção do

modelo socialista de desenvolvimento, a situação nacional que era caracterizada pela guerra e

por calamidades naturais constituíram os pólos (re)orientadores das actividades de serviços de

extensão rumo a um fracasso. Por conseguinte, algumas questões são aqui trazidas para debate:

Que modelo de desenvolvimento seguir? Socialismo?! Capitalismo!? Ou criação de um

modelo Moçambicano de desenvolvimento?

Que actores, políticas de (des)centralização e (des)concentração para os serviços

públicos, especialmente para o sector agrário e para os serviços de extensão rural?

Que tipo de abordagem a desenvolver para extensão rural?

Page 13: Extensao Rural No Periodo Socialista

Página 11

6. Bibliografia

ABDULA, Amir Ebrahimo (2006). O processo de reforma institucional do ministério da

agricultura no âmbito da estratégia global de reforma do sector público: estudo caso numa

instituição pública de moçambique; Maputo: Instituto Superior Politécnico e Universitário.

ADÃO, Wilson (2010); A representação do espaço social na poesia e na música:

Craverinha e Azagaia. Trabalho apresentado na Conferencia internacional sobre

Desenvolvimento e Diversidade Cultural em Moçambique; Maputo, 17 e 18 de Novembro de

2010

AMILAI, Castilho M (2003). A reinstalação dos agricultores e a intervenção das ONG´s

em Moçambique. Vila Real (Tese de Mestrado)

ANSELMO, Jorge M (2000). Agricultura e métodos de comunicação na Extensão rural:

Caso do distrito de Angónia. Maputo: Universidade Eduardo Mondlane (Tese de Licenciatura)

CASAL, Adolfo Yánez (1991). Legitimação Politico-ideológica da socialização rural

em Moçambique (FRELIMO, 1965-1984). In Revista Internacional de Estudos Africanos, Nos

8 e

9, pp 35-75;

CUAHELA, Ambrósio (1998). Análise da Estratégia da FRELIMO para o

Desenvolvimento integrado: experiencia em Namarrói (1975-1983); Maputo: Universidade

Eduardo Mondlane (Tese de Licenciatura)

CNP (1984). Economic Report; Maputo

DARCH, Colin (1992). A Guerra e as mudanças sociais recentes em Moçambique

(1986-1992): Cenários para futuro; Trabalho apresentado ao II Congresso Luso-Afro-Brasileiro

de Ciencias Sociais, São Paulo, 4 a 7 de Agosto de 1992.

Page 14: Extensao Rural No Periodo Socialista

Página 12

VAN DE LOO, Anthony (1984). Análise do Movimento cooperativo na área de

influência do Programa CRED. Maputo

BOOF, Maeth Domingos (1985). Apontamentos sobre a situação das cooperativas

agrícolas do distrito de Moamba, 1983/1984. Maputo

BRÜCK, T., E. V. K. FITZGERALD and A. GRIGSBY (2000). Enhancing the Private

Sector Contribution to Post-War Recovery in Poor Countries. QEH Working Paper Series.

Oxford, Queen Elizabeth House. 45.

BRÜCK, Tilman (2000). The economics of civil war in Mozambique. The eeconomics of

regional security: NATO, The Mediterranean and Southern Africa . Jurgen Brauer and Kaith

Harthley. Amsterdam, Overseas Publisher Association, pp.191-215

BRÜCK, Tilman (1998), Guerra e desenvolvimento em Moçambique. In Análise Social,

vol. xxxiii (149), 1998 (5 oed), 1019-1051;

CHIZIANE, Eduardo (sd). As tendências de re-centralização Administrativa em

Moçambique. Disponível em: www.fd.ul.pt/LinkClick.aspx?fileticket=hC6h3moeTU8%3D.

Acesso em: 23.05.2012.

FORTES, Lucília Madeira (2003); A Participação Comunitária no [processo de

desenvolvimento: o caso da aldeia de Nacholi, distrito de Angónia, 1987-2002. Maputo:

Universidade Eduardo Mondlane (Tese de Licenciatura)

GEFFREY, C (1991). A Causa das Armas; Porto: Edições Afrontamento.

GEMO, Hélder (2009); Extensão Rural em Moçambique: Evolução, desafios e

perspectiva (1975-206); in ALMEIDA, Jalcione (2009); Politicas Públicas e desenvolvimento

rural: Perceções e perspectiva no Brasil e em Moçambique. Porto Alegre.

HABERMEIER, Kurt (1981). Algodão: das concentrações à produção colectiva. In

Estudos Moçambicanos 2; Maputo

Page 15: Extensao Rural No Periodo Socialista

Página 13

KONSUMGENOSSENCHAFTEN, Verban; (1986); Cooperative Information note

Mozambique. Rome

LOURENÇO, Victor André (2007); Entre Estados e Autoridades Tradicionais em

Moçambique: Velhas aporias ou novas possibilidades Políticas? in Revista Lusofona de Ciência

Política e Relações Internacionais 2007, 5/7 pp195-207.

MINISTÉRIO DA AGRICULTURA; (1982); Contribuição para o Programa de

Cooperativização de campo. Maputo: Ministério da agricultura

MOSCA, João (2011). Politicas Agrárias de (em) Moçambique (1975-2009). Escolar

Editora

MOSCA, João (2008); Agricultura de Moçambique pós-independência: da experiência

socialista à recuperação do modelo colonial”. Revista Internacional em Língua Portuguesa, III

Série, Nº 21, pp.47-66. Lisboa, Associação das Universidades de Língua Portuguesa.

MOSCA, João (1996): Evolução da Agricultura Moçambicana no período pós-

independência. 3a edição. Lisboa: Instituto Superior de Agronomia.

MOSCA, João (1999): A Experiencia socialista de Moçambique (1975-1986). Lisboa.

Instituto Piaget. ISBN: 972-771-817-5.

MUCAVELE, Firmino Gabriel; (1986); Uma breve análise dos factores que afectam o

desenvolvimento económico das cooperativas agrícolas. Maputo: Universidade Eduardo

Mondlane

DE SOUSA, Clara, (1999); Rebuilding Rural Livelihoods and Social Capital:

Mozambique’s Experience,’ paper presented at the UNU/WIDER project meeting on

Underdevelopment, Transition and Reconstruction in Sub-Saha-ran Africa, Helsinki, 16–17

April 1999.

Page 16: Extensao Rural No Periodo Socialista

Página 14

OLSON, Thomas (1990). Africa do Sul e seus vizinhos: Estratégias regionais em

confrontação. CEA: Maputo

RIBEIRO, Fernando Bessa (2004); Sistema mundial, Manjacaze e fábricas de caju: uma

etnografia das dinâmicas do capitalismo em Moçambique. Vila Real, Universidade de Trás-os-

Montes e Alto Douro (tese de doutoramento).

ROESCH, Otto (1992). Socialism and rural development in Mozambique: The case of

Aldeia Comunal 24 de Julho. Toronto, University of Toronto (Tese de Doutoramento)

TIBANA, Roberto J (1992). Estratégias e politicas de desenvolvimento económico em

Moçambique independente: impactos estruturais e economia política. Maputo

VIEIRA, Sérgio (1990). Africa Austral: Conflitos, perceções e perspectivas na arena

internacional. CEA: Maputo