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Expansão do Consumo no Brasil: Para Onde Vamos? Sinopse Entre 2004 e 2013, o Brasil vivenciou seu decênio de maior crescimento desde o milagre econômico dos anos 70. Com renda em alta e crédito abundante, os brasileiros foram às compras, expandindo o consumo a uma taxa média de 4,7% ao ano no período. Uma combinação de fatores domésticos e externos foi fundamental para que os brasileiros pudessem beneficiar-se de tamanha prosperidade. A estabilização econômica e as reformas estruturais nos anos 90 aumentaram a previsibilidade da economia e propiciaram a expansão dos investimentos, do crédito e do emprego. A ampla oferta de fatores de produção existente no início do ciclo permitiu ao país crescer por anos acima de seu potencial sem gerar pressões inflacionárias. No âmbito externo, o Brasil foi beneficiado por um choque positivo e duradouro em seu balanço de pagamentos, que possibilitou ao país expandir sua demanda doméstica acima das taxas de crescimento do PIB sem gerar desequilíbrios macroeconômicos. O objetivo deste artigo é avaliar a contribuição desses fatores no ciclo de crescimento do consumo, além de inferir como a normalização da política monetária americana, a desaceleração chinesa e as políticas econômicas em vigor no Brasil podem influenciá-lo nos próximos anos. No ano em que a estabilização econômica completa 20 anos, julgamos oportuna a análise do legado desse ciclo econômico e das oportunidades de investimento que surgirão durante o processo de ajuste da economia brasileira às mudanças em curso no cenário externo, na política de desenvolvimento e na dinâmica demográfica do país. Luís Cezario e Rodrigo Noel Luís Cezario Estrategista da Equipe de Gestão de Fundos de Retorno Absoluto. É formado em Ciências Econômicas pela FEA/ USP e mestrando em Economia pelo INSPER. Trabalha há 13 anos com pesquisa macroeconômica e estratégia de investimentos financeiros. Rodrigo Noel Especialista em Portfólio da Equipe de Gestão Fundos de Retorno Absoluto. É formado em Engenharia de Produção na UFRJ, com MBA em finanças pela FGV-RJ. Possui mais de 15 anos de experiência em gestão de fundos multimercados.

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Page 1: Expansão do consumo no Brasil...3 Expansão do Consumo no Brasil cresceu aproximadamente 10 p.p. entre os anos de 2003 e 2009. Da mesma forma, o percentual da população na classe

Expansão do Consumo no Brasil: Para Onde Vamos?

Sinopse

Entre 2004 e 2013, o Brasil vivenciou seu decênio de maior crescimento desde o milagre econômico dos anos 70. Com renda em alta e crédito abundante, os brasileiros foram às compras, expandindo o consumo a uma taxa média de 4,7% ao ano no período.

Uma combinação de fatores domésticos e externos foi fundamental para que os brasileiros pudessem beneficiar-se de tamanha prosperidade. A estabilização econômica e as reformas estruturais nos anos 90 aumentaram a previsibilidade da economia e propiciaram a expansão dos investimentos, do crédito e do emprego. A ampla oferta de fatores de produção existente no início do ciclo permitiu ao país crescer por anos acima de seu potencial sem gerar pressões inflacionárias. No âmbito externo, o Brasil foi beneficiado por um choque positivo e duradouro em seu balanço de pagamentos, que possibilitou ao país expandir sua demanda doméstica acima das taxas de crescimento do PIB sem gerar desequilíbrios macroeconômicos.

O objetivo deste artigo é avaliar a contribuição desses fatores no ciclo de crescimento do consumo, além de inferir como a normalização da política monetária americana, a desaceleração chinesa e as políticas econômicas em vigor no Brasil podem influenciá-lo nos próximos anos.

No ano em que a estabilização econômica completa 20 anos, julgamos oportuna a análise do legado desse ciclo econômico e das oportunidades de investimento que surgirão durante o processo de ajuste da economia brasileira às mudanças em curso no cenário externo, na política de desenvolvimento e na dinâmica demográfica do país.

Luís Cezario e Rodrigo Noel

Luís Cezario

Estrategista da Equipe de Gestão de

Fundos de Retorno Absoluto. É formado

em Ciências Econômicas pela FEA/

USP e mestrando em Economia pelo

INSPER. Trabalha há 13 anos com

pesquisa macroeconômica e estratégia

de investimentos financeiros.

Rodrigo Noel

Especialista em Portfólio da Equipe de

Gestão Fundos de Retorno Absoluto. É

formado em Engenharia de Produção

na UFRJ, com MBA em finanças pela

FGV-RJ. Possui mais de 15 anos de

experiência em gestão de fundos

multimercados.

Page 2: Expansão do consumo no Brasil...3 Expansão do Consumo no Brasil cresceu aproximadamente 10 p.p. entre os anos de 2003 e 2009. Da mesma forma, o percentual da população na classe

2 Expansão do Consumo no Brasil

Introdução

Os anos 90 não foram fáceis para o Brasil: depois de debelar a hiperinflação com a introdução do Plano Real, o país foi submetido a uma sequência de choques externos: as crises financeiras do México em 1995, dos Tigres Asiáticos em 1997 e da Rússia em 1998. Em 1999, a crescente vulnerabilidade externa levou o Brasil a alterar a sua política econômica, adotando o regime de câmbio flutuante e o sistema de metas de inflação. A combinação destes dois elementos à política fiscal austera formou o tripé de política econômica que deu sustentação à estabilização econômica iniciada em 1994. Novamente, choques negativos colocaram a estabilização em teste. Entre 1999 e 2002, o Brasil sofreu os impactos da recessão americana, da moratória argentina, do racionamento de energia elétrica e da crise de confiança na transição política de 2002. Depois

de tantos percalços, iniciou-se um longo período de prosperidade, impulsionado pelos benefícios da estabilização macroeconômica e por um cenário internacional amplamente favorável.

A aceleração do crescimento, a partir de 2003, construiu as bases para um período de notável melhora no poder de compra dos brasileiros. A estabilidade econômica criou condições para maiores investimentos e uma queda acentuada da taxa de desemprego. Concomitantemente, o cenário externo favorável permitiu a implementação de políticas econômicas expansionistas e o aprofundamento dos programas de transferência de renda, sem gerar desequilíbrios no balanço de pagamentos. A elevação da renda per capita e as políticas públicas de transferência de renda geraram uma notável diminuição da pobreza e a expansão da classe média no Brasil. Segundo dados da Comissão para Definição da Classe Média¹ , a classe média brasileira

1. Grupo de trabalho multidisciplinar da Secretaria de Assuntos Estratégicos do Governo

Federal, coordenado pelo economista Ricardo Paes de Barros. http://www.sae.gov.br/site/

wp-content/uploads/Relatório-Defi nição-da-Classe-Média-no-Brasil1.pdf

A estabilização

econômica e

condições externas

favoráveis criaram

as bases para uma

notável melhora no

poder de compra dos

brasilieiros.

Cerca de 25 milhões

de brasileiros

ascenderam à classe

média na última

década. Mais que

toda a população de

países como Chile e

Austrália.

Page 3: Expansão do consumo no Brasil...3 Expansão do Consumo no Brasil cresceu aproximadamente 10 p.p. entre os anos de 2003 e 2009. Da mesma forma, o percentual da população na classe

3 Expansão do Consumo no Brasil

cresceu aproximadamente 10 p.p. entre os anos de 2003 e 2009. Da mesma forma, o percentual da população na classe baixa caiu cerca de 15 p.p. no período. Em termos absolutos, cerca de 25 milhões de brasileiros ascenderam à classe média, mais que toda a população de países como Chile ou Austrália (Gráficos 1 e 2).

Com emprego e renda em alta, inflação cadente e maior acesso ao crédito, os brasileiros foram às compras. A chegada deste enorme contingente de novos consumidores trouxe uma vasta demanda reprimida por bens e serviços. O consumo das famílias, que crescera em média 1,7% do 1º trimestre de 1996 ao 3º trimestre de 2003, passou a sustentar um ritmo médio de expansão de 4,7% a partir de então² (Gráfico 3).

A forte expansão do consumo observado na última década não foi um fenômeno restrito ao Brasil. Processo semelhante ocorreu na maioria dos países latino-americanos, sobretudo naqueles que mantiveram políticas econômicas consistentes. A sincronização dos ciclos econômicos reforça a importância de fatores globais comuns por trás do recente período de forte expansão do consumo no Brasil (Gráfico 4).

Fonte: SAE, Presidência da República - Comissão para Defi nição da Classe Média Elaboração: IAM

Fonte: IBGE Elaboração: IAM Fonte: Haver Elaboração: IAM

2. Série trimestral dessazonalizada do consumo das famílias, divulgada pelo IBGE.

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1996

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Crescimento do Consumo das Famílias

Variação ano sobre ano Média 96-03Médias 03-13 Média 96-11Média 11-13

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Classe Média Brasileira (% população total)

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Diminuição da Pobreza no Brasil

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2011

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Consumo Privado na América Latina (% PIB)

Brasil México Chile Peru

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4 Expansão do Consumo no Brasil

Fonte: IBGE, BCB Elaboração: IAM

Determinantes da Era do Consumo Exuberante

Para avaliarmos as perspectivas da expansão do consumo dos brasileiros, é necessária uma melhor compreensão sobre os principais fatores que contribuíram para seu crescimento na última década. Neste contexto, destacamos a importância de quatro fatores: (i) estabilização macroeconômica; (ii) choque positivo no balanço de pagamentos; (iii) reformas microeconômicas e (iv) ampla disponibilidade dos fatores de produção.

(i) Estabilização Macroeconômica

A história brasileira ilustra de forma clara os custos decorrentes da instabilidade econômica e os

benefícios associados às políticas macroeconômicas comprometidas com a estabilidade. Ao fim de um período de forte crescimento econômico na década de 70³ , o Brasil entrou na década de 80 excessivamente endividado, com déficits fiscais e inflação elevados e uma economia pouco exposta à competição internacional.

Após malograr 13 anos de baixo crescimento e inflação elevada4, o país iniciou a construção dos alicerces para um período de prosperidade a partir de 1994. O sucesso do Plano Real reduziu substancialmente a inflação, diminuiu a indexação de preços e salários e saneou o sistema bancário. A estabilização consolidou-se a partir da disciplina fiscal, formalizada por meio da Lei de Responsabilidade Fiscal5.

3. A partir da segunda metade dos anos 60 até o fi m dos anos 70, o PIB sustentou uma taxa de expansão média de 8,5% ao ano.

4. Crescimento do PIB e infl ação médios de 1,6% e 469% ao ano, respectivamente, no periodo de 1981 a 1993.

5. Lei complementar nº 101, aprovada em 4 de maio de 2000, que estabelece normas para a condução da política fi scal.

6. A infl ação tem um efeito perverso sobre a renda das parcelas mais pobres da população que, em geral, têm menos acesso ao sistema bancário. Dessa

forma, estes indivíduos têm menos acesso a instrumentos fi nanceiros que provêem proteção contra a infl ação.

A queda da inflação (Gráfico 6) foi fundamental para que o país deixasse sua década perdida para trás e criasse as bases para a aceleração do crescimento. Destacamos cinco fatores que beneficiaram a economia com o fim da hiperinflação: (i) um ambiente de maior previsibilidade, crucial para que os agentes tomassem suas decisões de investimento e consumo em horizontes mais longos; (ii) o desenvolvimento

do mercado de crédito e capitais; (iii) a redução das distorções de preços relativos, trazendo melhora na alocação de recursos na economia; (iv) a queda do imposto inflacionário6, melhorando a distribuição de renda e (v) a migração do debate econômico para outros fatores além da estabilização, como a melhora da educação, infraestrutura e competitividade.

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1988

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1995

1998

2002

2005

2008

2012

Crescimento Brasileiro - Variação em 12 meses e médias

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5 Expansão do Consumo no Brasil

A compreensão da

interação entre

choques externos

e crescimento da

demanda doméstica

é essencial para a

análise prospectiva da

expansão do consumo.

A valorização da taxa

de câmbio e a melhora

nos termos de troca

permitiram que o

Brasil sustentasse

um crescimento do

consumo acima do

PIB por anos, sem

gerar desequilíbrios

externos ou pressões

inflacionárias.

Fonte: BCB Elaboração: IAM

* CDI over / IPCA, acumulado em 12 meses

Fonte: BCB Elaboração: IAM

(ii) Choque Positivo no

Balanço de Pagamentos

Os choques externos foram importantes para viabilizar o crescimento mais acelerado da demanda doméstica no Brasil e demais países produtores de commodities durante a última década. A compreensão da interação entre choques externos e crescimento da demanda doméstica é essencial para a análise prospectiva da expansão do consumo nos próximos anos.

Os ventos externos tornaram-se favoráveis para os países

produtores de commodities a partir da primeira metade da década de 2000. Ao final de 2001, dois eventos importantes ocorreram: (i) a entrada da China na OMC e (ii) o fim da recessão americana. Com isso, a atividade econômica global e a corrente de comércio mundial entraram em um prolongado período de expansão acelerada.

Com o mundo crescendo de forma sincronizada e a China vivenciando um rápido processo de urbanização e industrialização, houve um forte crescimento da demanda por materiais básicos, especialmente commodities metálicas e alimentos,

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1998

2000

2002

2004

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2009

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0%

30%

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1995

1997

1999

2001

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2007

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2011

2013

Juro Real Brasileiro (ex-post*)

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6 Expansão do Consumo no Brasil

Fonte: World Development Indicators; base 100 = 2000 Elaboração: IAM

Fonte: BCB Elaboração: IAM

Fonte: FUNCEX, BCB Elaboração: IAM

Fonte: BCB Elaboração: IAM

que resultou em grande aumento nos volumes exportados pelos países produtores, além da escalada em seus preços. A forte elevação dos termos de troca (Gráfico 8) e da corrente de comércio melhorou os saldos comerciais e em conta corrente nos países produtores de commodities. Adicionalmente, o aumento nos retornos esperados na produção de commodities atraiu grandes fluxos de capitais. Este conjunto de choques positivos no balanço de pagamentos resultou em brutal transferência de renda dos países consumidores para os produtores de commodities, forte aumento na oferta de moeda estrangeira e persistente pressão de apreciação em suas taxas de câmbio.

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2001

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2007

2008

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2011

Choque Positivo nos Termos de Troca

Brasil Austrália ChileColombia Nova Zelândia RussiaAfrica do Sul Venezuela

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110

120

130

140

2000

2001

2002

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2006

2008

2009

2010

2012

2013

Termos de Troca do Brasil

-6%

-5%

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-3%

-2%

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1%

2%

3%

1990

1994

1997

2000

2003

2006

2009

2013

Saldo em Transações Correntes no Brasil

(% PIB)

-50

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300

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1998

2000

2002

2004

2006

2008

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2014

Saldo Acumulado do Balanço de

Pagamentos no Brasil (US$ Bilhões)

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7 Expansão do Consumo no Brasil

No Brasil, o choque externo elevou os termos de troca em aproximadamente 30%7 (Gráfico 9) e o saldo comercial de US$ 2,7 bilhões em 2001 para US$ 46,5 bilhões em 2006, gerando forte impacto no saldo em conta corrente. Em paralelo, houve aumento expressivo nos fluxos de capitais, com destaque para os investimentos estrangeiros diretos e em carteira, que possibilitaram que o país seguisse acumulando superávits no balanço de pagamentos, mesmo com a conta corrente voltando a apresentar saldo negativo (Gráfico 10). Este quadro externo extremamente benigno permitiu ao Banco Central iniciar em 2006 uma estratégia de acúmulo de reservas internacionais, buscando melhorar os fundamentos externos do país e suavizar a apreciação da taxa de câmbio (Gráfico 11 e 12).

Fonte: BCB Elaboração: IAM

Fonte: BCB Elaboração: IAM

A valorização dos termos de troca e da taxa de câmbio permitiu que o país sustentasse taxas de crescimento da demanda doméstica superiores às do PIB por anos, sem gerar desequilíbrios externos ou pressões inflacionárias. O gráfico 13 ilustra a importância da relação entre os choques externos e o vigor da demanda doméstica, sugerindo que o crescimento do consumo na última década não seria factível sem um quadro externo tão benigno.

7. Média dos 36 meses terminados em Dez/13 em relação à média entre 2000 e 2003; Funcex.

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2001

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2013

Exportações Líquidas no Brasil (% PIB)

Preços de 2000 Preços Correntes

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2002

2004

2005

2006

2008

2009

2010

2012

2013

Reservas Internacionais Brasileiras (USD Bilhões)

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8 Expansão do Consumo no Brasil

Melhorias no ambiente

institucional e

microeconômico

aumentaram a

produtividade, o

acesso ao crédito

e o crescimento

potencial na última

década.

8. Instituído a partir da medida provisória nº 2.221, de 4 de setembro de 2001, para assegu-

rar os direitos dos compradores de unidades condominiais em construção, separando cada

incorporação dos demais ativos da incorporadora. A introdução desta legislação aumentou

a segurança jurídica nas incorporações imobiliárias e teve um importante papel na forte

expansão do crédito imobiliário.

(iii) Reformas Microeconômicas

Além da estabilização macroeconômica e do ambiente externo favorável, o crescimento econômico brasileiro foi favorecido pela melhora institucional e do ambiente microeconômico ocorrida nos anos 90 e inicio da década passada. Destacamos os seguintes avanços: (i) privatizações, quebras de monopólios e concessões de serviços públicos à iniciativa privada; (ii) criação de uma estrutura regulatória favorável à iniciativa privada e agências reguladoras autônomas; (iii)

reformas microeconômicas no mercado de crédito, como a criação e regulação do crédito consignado e da instituição do regime de afetação patrimonial8.

Estas reformas permitiram ao Brasil reduzir ineficiências, aumentar a competição, ampliar o acesso aos serviços financeiros, ao crédito (Gráficos 14 e 15) e melhorar a alocação de capital, propiciando o aumento da produtividade e do crescimento potencial, com impactos positivos sobre a renda real e, consequentemente, sobre o consumo.

Fonte: BCB Elaboração: IAM

*Pessoas físicas com relacionamento bancário ativo.

Fonte: BCB Elaboração: IAM

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2000

2001

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2004

2006

2007

2009

2010

2011

2013

Evolução do Crédito no Brasil (% PIB)

Total Consignado Imobiliário

0%10%20%30%40%50%60%70%80%

70

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90

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2005

2006

2007

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2009

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2012

2013

Inclusão Bancária no Brasil *

Milhões de pessoas (esq.); % da População Total (dir.)

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9 Expansão do Consumo no Brasil

(iv) Ampla disponibilidade de fatores de produção

Após sucessivas crises, o Brasil chegou ao início dos anos 2000 com elevadas taxas de desemprego e baixos níveis de utilização da capacidade instalada na indústria. A ampla ociosidade dos fatores de produção constituiu um ponto de partida favorável para o ciclo iniciado em 2003 e permitiu taxas robustas de crescimento do PIB por anos, sem gerar pressões sobre salários e a inflação (Gráficos 16 e 17).

O Brasil também se beneficiou do bônus demográfico nos últimos anos. Como podemos ver no gráfico 18, as elevadas taxas de natalidade observadas nas décadas de 1960, 70 e 80 fizeram com que um grande contingente de jovens ingressasse no mercado de trabalho a partir dos anos 90. Consequentemente, houve um aumento de cerca de 10 pontos percentuais na população em idade ativa como proporção do total, além de queda na taxa de dependência9 (Gráfico 19 e 21). Este fenômeno ampliou a oferta de mão-de-obra e evitou que este importante fator de produção se tornasse precocemente escasso em um ambiente de demanda aquecida.

Fonte: FMI Elaboração: IAM

Fonte: FGV Elaboração: IAM

9. Taxa de Dependência: razão entre parcela da população tipicamente fora da idade ativa

(indivíduos entre zero a 14 anos e acima de 65 anos) e aqueles em idade ativa (entre 15 e 65

anos).

A ampla ociosidade nos

fatores de produção

constituiu um

ponto de partidade

favorável para o ciclo

de expansão iniciado

em 2003.

Um bônus demográfico

ampliou a oferta de

mão-de-obra nos

últimos 10 anos.

A alta do emprego

impulsionou a massa

salarial, a demanda

por crédito e o

consumo.

74%

76%

78%

80%

82%

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86%19

94

1996

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2012

2014

Utilização da Capacidade Instalada no Brasil

(média móvel de 12 meses)

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2011

2012

Taxa de Desemprego

Austrália Brasil China México Chile

Page 10: Expansão do consumo no Brasil...3 Expansão do Consumo no Brasil cresceu aproximadamente 10 p.p. entre os anos de 2003 e 2009. Da mesma forma, o percentual da população na classe

10 Expansão do Consumo no Brasil

De forma análoga, a baixa alavancagem do setor privado e a demanda reprimida gerada pela escassez do crédito permitiram que empresas e consumidores ampliassem por anos seus endividamentos, sem preocupação com seus balanços e restrições orçamentárias, o que também contribuiu para a sustentação de taxas elevadas de crescimento do consumo e investimento.

Fonte: Banco Mundial Elaboração: IAM

*Nações Unidas, World Population Prospects, 2012 - Projeções a partir de 2010

Fonte: ONU* Elaboração: IAM

Fonte: ONU* Elaboração: IAM Fonte: ONU* Elaboração: IAM

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60%

65%

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2000

2010

2020

2030

2040

2050

2060

População Idade Ativa (% total)

Desenvolvidos Zona do EuroLatam BrasilAmérica do Norte

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2000

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2050

2060

Taxa de Dependência

Desenvolvidos Zona do EuroLatam BrasilAmérica do Norte

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2000

2010

2020

2030

2040

2050

2060

População Brasileira

(Milhões de habitantes por faixa etária)

0-14 anos Idade Ativa > 65 Anos

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Fertilidade (Filhos por mulher)

Brasil China LatamEUA Zona do Euro

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11 Expansão do Consumo no Brasil

10. Estímulos governamentais não refl etidos diretamente no resultado primário, como o

crédito subsidiado concedido por bancos públicos.

Fatores estruturais

domésticos e um

ambiente externo

mais adverso levaram

à deterioração das

contas externas e ao

desaquecimento da

demanda doméstica.

No Brasil, o ajuste

no balanço de

pagamentos já

começou.

Fim do Ciclo e Ajuste das Contas Externas

Nos últimos anos, surgiram evidências de exaustão no ciclo de exuberância econômica. No gráfico 5 é possível ver a mudança do ritmo de crescimento: após sustentar expansão média de 1,6% ao ano no período 1980-93 e 2,4% entre 1993 e 2003, o PIB brasileiro acelerou, ostentando taxa média de 4,2% anualizado entre o 3º trimestre de 2003 e o 3º trimestre de 2011. Contudo, a partir de então o crescimento desacelerou, oscilando em torno de 1,6% ao ano. O mesmo padrão pode ser observado no consumo das famílias, que triplicou de 1,7% para 5,1% ao ano e desacelerou para 3,0% nos períodos descritos acima. Esta forte desaceleração do consumo ocorreu a despeito da execução de políticas monetária e fiscal expansionistas (Gráfico 22), evidenciando a influência de fatores estruturais em sua moderação.

Fonte: STN Elaboração: IAM

O desaquecimento recente foi causado por uma conjunção de fatores, todos relacionados à discussão da seção anterior. De uma forma geral, avaliamos que os mesmos continuarão limitando a expansão do consumo nos anos vindouros.

No âmbito doméstico, o mercado de trabalho operando a pleno emprego e a inflação em alta indicam que a massa salarial real continuará crescendo em ritmo lento. As famílias permanecem endividadas, o Banco Central tem apertado a política monetária e o governo começa a retirar, gradualmente, os estímulos fiscais e quasi-fiscais10.

No âmbito externo, a diminuição dos fluxos de capitais e a desaceleração da China têm causado deterioração no balanço de pagamentos de vários países emergentes, levando à depreciação de suas moedas e ao desaquecimento das demandas domésticas. Avaliamos que este processo

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Resultado Fiscal no Brasil

Resultado Primário Resultado Primário (Ex- receitas não-recorrentes)

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12 Expansão do Consumo no Brasil

se intensificará nos próximos anos, em virtude do aprofundamento das mudanças em curso nas duas maiores economias do planeta: (i) a normalização da política monetária nos EUA; e (ii) o rebalanceamento da economia chinesa.

A seguir, exploraremos o impacto destes dois temas sobre as perspectivas de crescimento do PIB e do consumo no Brasil.

(i) Normalização da Política Monetária Americana

Após cinco anos de ajustes e baixo crescimento, a economia americana está preparada para acelerar. O balanço do setor privado está bem mais saudável do que no início da crise: as empresas apresentam baixa alavancagem (Gráfico 23), lucros recordes e liquidez em nível historicamente elevado. As famílias, da mesma forma, encontram-se menos alavancadas, com menor exposição a empréstimos hipotecários e beneficiadas pela valorização de seus ativos (financeiros e imóveis) (Gráfico 24). Adicionalmente, espera-se que o aperto fiscal seja substancialmente menor ao longo dos próximos anos.

Fonte: Haver Elaboração: IAM Fonte: Haver Elaboração: IAM

(Ativos - Dívidas)/Renda Anual

Deste modo, acreditamos que o consumo e os investimentos acelerarão, impulsionando o crescimento neste e no próximo ano. O fortalecimento da economia continuará reduzindo a taxa de desemprego e a ociosidade do setor produtivo. Neste contexto, antevemos que o banco central americano prosseguirá na estratégia de normalização da política monetária, encerrando o programa de compra de ativos (QE3) até o final de 2014, além de preparar os mercados para o início de um ciclo de alta de juros a partir de meados de 201511.

Com a economia americana se fortalecendo e taxas de juros em elevação, os investidores globais privilegiarão as oportunidades de investimento nos EUA. A elevada competitividade em setores de alta tecnologia e a revolução energética em curso12 tendem a reforçar a migração dos fluxos de capitais para a economia americana. Com isso, acreditamos que os investidores continuarão reduzindo suas alocações em países emergentes, sobretudo naqueles com maiores vulnerabilidade em suas contas externas.

11. De acordo com a mediana das expectativas dos membros do FOMC divulgadas em dezembro de 2013.

12. A descoberta de importantes jazidas de gás natural em formações de xisto nos EUA a partir dos anos 2000 tem feito desta uma fonte relevante

de energia naquele país, atraindo investimentos em energia. Antes uma fonte irrelevante de energia, atualmente já corresponde a aproximadamente

20% da produção de gás natural daquele país.

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Alavancagem das Empresas nos EUA

Crédito Corporativo/Valor de MercadoCrédito Corporativo/Patrimônio

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Riqueza das Famílias

Riqueza Média desde 1952 Média últ 20 anos

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13 Expansão do Consumo no Brasil

(ii) Rebalanceamento do Crescimento Chinês

Os desafios da economia chinesa são enormes: é preciso diminuir a taxa de investimento e reorientar a economia para o consumo; reduzir a alavancagem das empresas estatais e governos regionais; sanear o sistema bancário e abrir a economia ao capital estrangeiro. Por fim, é necessário diminuir a repressão financeira13 e os excessos regulatórios que distorcem a alocação de capital.

A história econômica mostra que processos de rebalanceamento em economias com taxas de investimento muito elevadas tendem a gerar desaceleração do crescimento14. Os riscos existentes tornam-se mais relevantes pelo tamanho da economia chinesa, que responde atualmente por cerca de 15% do PIB global, tendo contribuído com aproximadamente 1,1 ponto percentual para o crescimento global de 201315.

Além da redução da taxa de investimento, fatores demográficos16 limitarão a oferta de mão-de-obra ao longo dos próximos anos (Gráfico 25). Com a inevitável queda da contribuição dos fatores capital e trabalho, a economia chinesa dependerá essencialmente

de ganhos de produtividade para sustentar suas elevadas taxas de crescimento. Este diagnóstico ressalta a importância do processo de reformas estruturais para aumentar a eficiência da economia. Parece improvável, no entanto, que o efeito positivo das reformas e a aceleração do consumo consigam compensar integralmente os ventos contrários vindos da demografia e redução dos investimentos. Ademais, há riscos de implementação na ambiciosa agenda de reformas anunciada pela nova liderança chinesa. Acreditamos que uma execução bem sucedida das reformas reduzirá o risco de um pouso abrupto, mas dificilmente impedirá que a China desacelere o seu ritmo de crescimento.

Além de crescer menos, a composição da demanda chinesa mudará substancialmente nos próximos anos. Dada a enorme participação da construção civil na economia chinesa, é inevitável que a redução da taxa de investimento diminua sua demanda por commodities metálicas. Por outro lado, o aumento do salário real, impulsionado pelo aumento da produtividade e pela apreciação cambial, deve manter aquecida a demanda por commodities agrícolas, proteínas animais e papel e celulose.

Fonte: ONU* Elaboração: IAM - projeções a partir de 2010

13. Termo cunhado por John G. Gurley e Edward S. Shaw para descrever a distorção criada pelo governo no livre fl uxo de capitais na economia, através da limitação

da remuneração dos poupadores e em benefício dos tomadores, em geral, o próprio governo.

14. O caso da súbita desaceleração do Japão a partir da década de 1980 é um bom exemplo.

15. De acordo com as projeções do FMI publicadas em outubro de 2013, o PIB global e chinês cresceram 3,2% e 7,6% respectivamente em 2013. http://www.imf.org/

external/pubs/ft/weo/2013/02/weodata/download.aspx

16. Com a população envelhecendo e baixas taxas de natalidade, a ONU estima que a população chinesa em idade ativa atingirá um pico nesta década e contrairá a

partir de então. Adicionalmente, o aumento da urbanização ocorrido nas últimas décadas indica que migração de trabalhadores rurais para centros urbanos deverá

desacelerar ao longo dos próximos anos.

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População Chinesa (Milhões de habitantes por faixa etária)

0-14 anos Idade Ativa > 65 Anos

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14 Expansão do Consumo no Brasil

Efeitos do Ajuste sobre o Brasil

As mudanças em curso nas duas maiores economias do planeta trarão impactos significativos sobre a economia global e a alocação de capitais nos mercados internacionais. Para a América Latina e o Brasil em particular, a alta de juros nos EUA e a desaceleração estrutural da China representam dois potenciais choques negativos para o balanço de pagamentos: queda nos fluxos de capitais e piora dos termos de troca. A ocorrência destes dois choques imporá um processo de ajuste a estas economias, que tanto se beneficiaram da liquidez abundante e da escalada dos preços das commodities. Neste contexto, taxas de câmbio real terão que depreciar mais, para ajustar as contas externas e promover um rebalanceamento do crescimento de suas demandas agregadas, a favor do setor exportador e contra os setores não-comercializáveis. Neste contexto, os governos da região terão que calibrar suas políticas macroeconômicas para moderar a expansão de suas demandas domésticas. A adoção de políticas fiscais mais restritivas é recomendável para suavizar os efeitos sobre a demanda privada e reduzir o tamanho do aperto monetário que se fará necessário. Caso os países afetados não ajustem suas politicas macroeconômicas, a inflação acelerará na região, corroendo o poder de compra dos salários e retardando o ajuste do câmbio real.

O processo de ajuste já se iniciou no Brasil. Com alguma queda dos termos de troca e a desaceleração das exportações, o déficit em conta corrente se ampliou de 2,1% do PIB em 2011 para 3,7% do PIB em novembro de 2013. Adicionalmente, as perspectivas de normalização da política monetária americana e as crescentes incertezas com a condução da politica econômica no Brasil reduziram os fluxos de capitais. Desta forma, o saldo no balanço de pagamentos brasileiro deteriorou-se significativamente atingindo um déficit de US$ 12 bilhões no ano de 2013. Este fenômeno explica em parte a desvalorização do real, que se depreciou 48% de julho de 2011 a dezembro de 2013 e levou o câmbio real para um patamar mais próximo de sua média histórica (Gráfico 26). Para impedir que a inflação

superasse o teto da meta, o banco central iniciou em abril de 2013 um ciclo de alta de juros.

Fonte: BCB Elaboração: IAM

A despeito do ajuste já realizado, o processo deve prosseguir nos próximos anos. Os vetores externos que atuam nesta direção devem continuar impactando negativamente o balanço de pagamentos. Assim, as políticas econômicas terão que se tornar mais restritivas para desacelerar a demanda doméstica, atenuar pressões inflacionárias e permitir um câmbio real mais depreciado. Isto significa que os juros reais continuarão subindo, os bancos públicos terão que moderar a expansão de suas carteiras de crédito e a política fiscal terá que se tornar contracionista para evitar uma sobrecarga na política monetária. Neste contexto, antevemos uma moderação adicional da expansão do consumo das famílias nos próximos anos.

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Câmbio Real no Brasil

Câmbio Real Câmbio Real ajustado pela produtividadeMédia+ 1 Desvio-padrão- 1 Desvio-padrão

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15 Expansão do Consumo no Brasil

Apesar dos Desafios, Há Oportunidades de Médio Prazo

Após um longo período de pujança econômica, é natural que a economia brasileira passe por ajustes cíclicos, que podem ampliar a volatilidade gerada por mudanças estruturais na economia global. As mudanças no cenário externo adicionam incerteza neste período de transição. Com reservas internacionais próximas a US$ 375 bilhões e baixo endividamento externo, o Brasil apresenta bons fundamentos externos para suavizar os custos econômicos deste processo (Gráfico 27). Contudo, o país precisará ajustar suas políticas econômicas de forma a preservar a estabilidade de preços e o equilíbrio fiscal. Adicionalmente, a retomada de uma agenda de reformas que vise o aumento da produtividade e propicie um ambiente mais favorável ao capital privado seria recomendável para preparar a economia para um novo ciclo de crescimento.

Desafios usualmente trazem oportunidades. No caso brasileiro, a desaceleração do consumo abrirá espaço para um rebalanceamento da demanda agregada,

com maiores oportunidades no setor exportador e nos investimentos em infraestrutura. Ademais, temas estruturais oferecerão boas oportunidades de investimento em setores específicos.

A seguir, exploraremos de forma mais detalhada algumas das alternativas de investimentos listadas acima:

(i) Oportunidades relacionadas ao ajustamento do

setor externo:

Avaliamos que a mudança de preços relativos em curso favorecerá setores expostos à demanda externa, sobretudo aqueles que se beneficiarão da aceleração do crescimento nos EUA e na Europa. Exportadores de bens industrializados com exposição a estes mercados tendem a se beneficiar mais do que aqueles voltados aos mercados chinês e latino-americano. Outra forma de explorar este tema de investimento é alocar recursos em empresas que tenham suas receitas positivamente correlacionadas à taxa de câmbio, em detrimento daquelas cujas receitas são basicamente denominadas em reais e/ou as com alto endividamento em moeda estrangeira. Devido à desaceleração chinesa, julgamos prudente evitar grande exposição a empresas produtoras de commodities metálicas. No caso de empresas produtoras de commodities com grande parte de suas receitas provenientes do mercado doméstico, é recomendável a avaliação da capacidade de repasse de eventuais altas na taxa de câmbio e no preço internacional das commodities em questão para o preço final de seus produtos.

Por outro lado, empresas dependentes da manutenção do crescimento elevado da renda real e do crédito devem se deparar com um ambiente mais desafiador. Este é o caso de empresas ligadas ao consumo e algumas prestadoras de serviços. Três fatores fundamentam esta avaliação: (i) Acreditamos que o crescimento do consumo neste e nos próximos anos será inferior ao projetado pela média dos analistas de mercado; (ii) o comércio sofrerá pressão por compressão de margens, tanto pelo lado da indústria, que buscará o repasse da desvalorização cambial,

Fonte: BCB Elaboração: IAM

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Gráfico 27:

Endividamento externo e reservas (%PIB)

Reservas Passivo Externo Líquido Proporção

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16 Expansão do Consumo no Brasil

quanto do consumidor final, que verá o salário real crescendo menos que no passado recente e (iii) boa parte das ações ligadas ao consumo doméstico apresenta múltiplos elevados17.

(ii) Oportunidades relacionadas à necessidade de investimentos em

infraestrutura:

Com a aceleração do crescimento, houve forte aumento na demanda por transportes, serviços de logística, geração e distribuição de energia e tecnologia da informação. De forma geral, os investimentos em infraestrutura não acompanharam o crescimento da demanda, gerando gargalos importantes à sustentação de taxas mais aceleradas de crescimento.

2003 2012 Variação

Tráfego Aéreo (Milhões de passageiros) 37 107 188%

Tráfego Marítimo (Milhões de toneladas de conteiners) 42 71 71%

Tráfego Rodoviário de Veículos Leves* 94 156 66%

Tráfego Rodoviário de Veículos Pesados* 111 159 43%

Fonte: Índice ABCR dessazonalizado, base 100 = 1999

A deficiência existente no setor de infraestrutura reflete as baixas taxas de investimento e da poupança doméstica observadas no Brasil. Em larga medida, estes indicadores estão relacionados à politica fiscal praticada no país. Por um lado, a alta carga tributária reduz substancialmente a poupança do setor privado, limitando a capacidade de investimentos. Por outro, os gastos do governo priorizam as despesas correntes e a transferência de renda em detrimento dos investimentos públicos. A combinação destes fatores leva a economia a um equilíbrio de consumo elevado, baixa poupança doméstica e investimentos limitados.

O governo tem procurado direcionar volumes crescentes de recursos orçamentários e crédito subsidiado18 ao setor de infraestrutura, além de acelerar o processo de concessões à iniciativa privada19. Neste contexto, acreditamos que o governo priorizará investimentos em portos, aeroportos, rodovias, ferrovias e energia nos próximos anos. Considerando-se a baixa capacidade de investimento do Estado, avaliamos que o governo incentivará a participação crescente do setor privado em obras de infraestrutura. Desta forma, o setor deverá oferecer boas oportunidades de investimento, mesmo em um ambiente de crescimento moderado.

17. Segundo expectativas da IAM para o crescimento de lucros de empresas ligadas ao

consumo doméstico, o PE médio do setor para 2014 encontrava-se em torno de 19 no fi nal de

janeiro de 2014. Algumas empresas, no entanto, negociavam na faixa de 20 a 22 vezes o lucro, o

que julgamos injustifi cável à luz de nosso cenário-base para o crescimento do consumo.

18. PSI – Programa de Sustentação do Investimento do BNDES que estimula, via créditos sub-

sidiados, a aquisição de bens de capital.

19. Destacam-se os recentes leilões de rodovias e aeroportos, além da concessão de áreas de

exploração de petróleo na região do pré-sal.

O rebalanceamento

da economia brasileira

criará oportunidades

de investimentos nos

setores exportadores,

de infraestrutura,

educação e saúde.

A deficiência de

infraestrutura

no Brasil reflete

as baixas taxas de

poupança doméstica e

investimento.

Page 17: Expansão do consumo no Brasil...3 Expansão do Consumo no Brasil cresceu aproximadamente 10 p.p. entre os anos de 2003 e 2009. Da mesma forma, o percentual da população na classe

17 Expansão do Consumo no Brasil

(iii) Educação: a base para a aceleração

da produtividade

Após 10 anos de queda acentuada, a taxa de desemprego estabilizou-se em patamares historicamente baixos. Com fortes evidências de que o mercado de trabalho brasileiro tem operado próximo do pleno emprego, o debate do país tem se voltado para políticas que gerem ganhos de produtividade e propiciem um crescimento potencial mais acelerado. Nesta agenda, acreditamos que o setor educacional ganhará importância crescente na discussão das políticas públicas e trará boas oportunidades de investimentos.

Em termos quantitativos, o Brasil avançou bastante nas últimas décadas, ampliando o acesso ao ensino básico. Entre 1992 e 2009, o número de indivíduos

com idade entre 15 e 17 anos matriculados no ensino fundamental cresceu 218% (Gráfico 28). No entanto, o percentual de indivíduos com ensino médio completo e que concluem o ensino superior ainda é baixo, para parâmetros mundiais (Gráfico 29). Adicionalmente, como mostra o Relatório de Desenvolvimento Humano da PNUD20, o país possui poucos engenheiros, cientistas e registros de patentes quando comparado aos países desenvolvidos e em nível similar de desenvolvimento.

Em termos qualitativos, a pesquisa PISA feita pela OECD21 mostra avanços nas notas obtidas nas avaliações de leitura, matemática e ciências. Contudo, vemos que o país ainda apresenta notas muito abaixo da média quando comparado aos demais países avaliados, o que evidencia a necessidade de melhorias na qualidade do ensino (Gráficos 30 e 31).

20. http://hdr.undp.org/sites/default/fi les/reports/14/hdr2013_en_complete.pdf

21. Programme for International Student Assessment (PISA). Pesquisa trianual de avaliação do grau de instrução de estudantes de 15 anos de idade.

http://www.oecd.org/pisa/keyfi ndings/PISA-2012-results-brazil.pdf

Fonte: MEC, IBGE, OCDE Elaboração: IAM

Fonte: PISA, OECD Elaboração: IAM

Fonte: MEC, INEP, IBGE, OCDE Elaboração: IAM

Fonte: PISA, OECD Elaboração: IAM

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Matemática: pontuação média

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Leitura: pontuação média

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Jovens entre 15 e 17 anos matriculados no

ensino fundamental (Milhões de estudantes)

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Brasil México ChileM édiaOECD

EUAR ússiaC oréia

Penetração da Educação

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18 Expansão do Consumo no Brasil

22. Fundo de Financiamento Estudantil – Programa federal de fi nanciamento educacional para estudantes do ensino superior matriculados em universidades privadas.

23. Programa Universidade para Todos, do Governo Federal para estimular o ensino superior, oferecendo bolsas de estudo integrais e parciais a estudantes de baixa renda.

24. Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego, do Governo Federal. Trata-se de um conjunto de iniciativas para estimular, em várias frentes, os agentes

envolvidos no ensino técnico e profi ssionalizante.

Os desafios existentes no setor educacional demandarão políticas públicas de longo prazo e investimentos crescentes no setor. A boa notícia é que o governo e a sociedade têm se mobilizado em busca de medidas que fomentem o desenvolvimento da educação. Por exemplo, para ampliar o acesso ao ensino técnico e superior o governo tem investido no modelo de financiamento estudantil através do FIES22, além das políticas públicas de subsídio ao setor como PROUNI23 e PRONATEC24. Mesmo com o forte crescimento recente de estudantes atendidos por estes programas (Gráfico 32), o financiamento estudantil no Brasil ainda se encontra em níveis muito abaixo dos encontrados em países desenvolvidos como os EUA, onde cerca de 40% dos estudantes contam com algum tipo de financiamento.

Pelo lado da demanda, avaliamos que a tendência de redução do tamanho das famílias, o aumento da renda per capita e a maior disponibilidade de crédito estudantil possibilitarão aos brasileiros aumentarem seus gastos per capita com educação no médio prazo.

Dessa forma, concluímos que a prestação de serviços de educação seguirá apresentando crescimento bem acima da média da economia, representando boa oportunidade de investimentos.

(iv) Oportunidades relacionadas à demografia:

Projeções demográficas feitas pela ONU indicam que a taxa de dependência seguirá em queda no Brasil e na

Fonte: Censo MEC/INEP 2010, IBGE, Hoper e PraValer Elaboração: IAM

Fonte: ONU* Elaboração: IAM

Fonte: Banco Mundial Elaboração: IAM

América Latina até o final da década. Esta projeção é uma boa notícia não apenas em termos absolutos, mas também relativos. Quando comparado aos países desenvolvidos e à China, vemos que a América Latina será a única região onde se espera que as taxas de dependência sigam em queda nos próximos 10 anos (Gráfico 33).

Outra tendência importante delineada pelos demógrafos é que a população brasileira envelhecerá rapidamente a partir dos próximos anos.

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2010 2011 2012

Financiamento Estudantil

Esse fenômeno reflete a forte queda nas taxas de fertilidade observadas a partir da década de 1970 e o notável aumento da expectativa de vida dos brasileiros.

Neste contexto, apesar de esperar um crescimento mais baixo da economia nos próximos anos, acreditamos que mudanças do padrão de consumo da população causadas pela demografia sustentarão a expansão de setores como seguros, planos de saúde e medicamentos.

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Expectativa de Vida (anos)

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2005

2010

Expectativa de Vida ao Nascer (Anos)

Brasil China LatamEUA Zona do Euro

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19 Expansão do Consumo no Brasil

Conclusão

Nos últimos 10 anos, uma conjunção de fatores domésticos e externos favoráveis permitiu ao Brasil sustentar taxas elevadas de crescimento, reduzir substancialmente o desemprego, ampliar o crédito e distribuir renda. Contudo, as mudanças em curso no cenário externo, o alto endividamento das famílias e a baixa ociosidade no mercado de trabalho indicam que a economia brasileira passará por um período de ajustes neste e nos próximos anos.

Neste processo, a taxa de câmbio real terá que se depreciar para reequilibrar o balanço de pagamentos e alterar os preços relativos da economia, de modo a incentivar o setor exportador. Para que o ajuste seja bem sucedido e a estabilidade de preços seja preservada, o governo terá que apertar suas políticas monetária, fiscal e de crédito público. Consequentemente, a demanda doméstica desacelerará.

O cenário que se desenha para 2014 é desafiador para os setores mais dependentes da expansão do consumo doméstico. Contudo, oferece oportunidades de investimento em setores que se beneficiarão do rebalanceamento da economia brasileira. Neste contexto, acreditamos em um melhor desempenho dos investimentos em exportadores expostos aos mercados americano e europeu, mas evitaríamos grande

exposição a setores que apresentem dependência elevada da demanda chinesa.

Temas estruturais apontam para boas oportunidades em alguns setores domésticos. Os incentivos governamentais à educação e os programas de concessão de obras de infraestrutura oferecem oportunidades atrativas de investimentos em empresas destes setores. Além disso, as carências existentes nestes segmentos e a importância crescente de ambos na agenda de desenvolvimento do país indicam que os investimentos em educação e em infraestrutura apresentarão crescimento acima da média ao longo dos próximos anos. Por fim, fatores demográficos devem levar a um envelhecimento da população brasileira, o que elevará substancialmente a demanda por produtos e serviços voltados para a terceira idade.

Em suma, acreditamos que a economia brasileira passará por mudanças estruturais importantes ao longo dos próximos anos. O rebalanceamento deslocará o polo dinâmico da economia, desaquecendo setores que lideraram a expansão nos últimos anos, e gerando oportunidades naqueles voltados à demanda externa e à expansão da oferta agregada. O correto entendimento dos fatores que sustentam este processo é crucial para que os investidores possam traçar suas estratégias e aumenta a importância de uma gestão ativa e focada nas mudanças estruturais de longo prazo na economia.

Page 20: Expansão do consumo no Brasil...3 Expansão do Consumo no Brasil cresceu aproximadamente 10 p.p. entre os anos de 2003 e 2009. Da mesma forma, o percentual da população na classe

20 Expansão do Consumo no Brasil

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