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Alexandre De Castro AlonsoAlexandre De Castro Alonso

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Ilustração de:Ilustração de: Alexandre Alonso, Gustavo Arrojo e Alexandre Alonso, Gustavo Arrojo e LuLu Bussamra Bussamra

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Agradecimentos: A minha mãe que eu amo muito.

Ao meu pai por ser dedicado.

Ligia, você é a melhor irmã do mundo.

Vivi obrigado por revisar a obra.

Gustavo Arrojo.

À Ana Bacellar e a doce Helô.

À Elci, mãe da querida Cá.

E a todas as pessoas do mundo que já sofreram de exclusão, que já tiveram seu coração partido, àquelas que conseguiram superar essas terríveis adversidades, e àquelas que infelizmente não suportaram.

Ao Lucas Sendacz Acher pelas oportunidades.

À Dóris e ao Rafael pelo apoio.

Agradeço também à Alice Kok, a carta que é jogada nos pés de nosso personagem é de autoria dela.

Juca Segall, você é demais.

Tia Claudia, você é sem comparação.

Guila Azevedo por revisar meu primeiro livro.

Aos meus amigos, resolvi os homenagear de uma forma diferente, colocando seus nomes e combinações deles para compor meus personagens, fiquem calmos, só os nomes e mais nada, este livro é uma obra de ficção.

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O que é o Bullying?

Bullying é um termo inglês utilizado para descrever atos de violência física ou psicológica, intencionais e repetidos,

praticados por um indivíduo (bully - «tiranete» ou «valentão») ou grupo de indivíduos com o objetivo de intimidar ou

agredir outro indivíduo (ou grupo de indivíduos) incapaz (es) de se defender. Também existem as vítimas/agressoras, ou

autores/alvos, que, em determinados momentos, cometem agressões, porém também são vítimas de bullying pela

turma.

Quais os tipos de Bullying?

Os bullies usam principalmente uma combinação de intimidação e humilhação para atormentar os outros. Abaixo,

alguns exemplos das técnicas de bullying:

Insultar a vítima; acusar sistematicamente a vítima de não servir para nada.

Ataques físicos repetidos contra uma pessoa, seja contra o corpo dela ou propriedade.

Interferir com a propriedade pessoal de uma pessoa, livros ou material escolar, roupas, etc., danificando-os

Espalhar rumores negativos sobre a vítima.

Depreciar a vítima sem qualquer motivo.

Fazer com que a vítima faça o que ela não quer, ameaçando-a para seguir as ordens.

Colocar a vítima em situação problemática com alguém (geralmente, uma autoridade), ou conseguir uma ação

disciplinar contra a vítima, por algo que ela não cometeu ou que foi exagerado pelo bully.

Fazer comentários depreciativos sobre a família de uma pessoa (particularmente a mãe), sobre o local de

moradia de alguém, aparência pessoal, orientação sexual, religião, etnia, nível de renda, nacionalidade ou qualquer

outra inferioridade depreendida da qual o bully tenha tomado ciência.

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Isolamento social da vítima.

Usar as tecnologias de informação para praticar o cyberbullying (criar páginas falsas sobre a vítima em sites de

relacionamento, de publicação de fotos, etc.)

Chantagem.

Expressões ameaçadoras.

Grafitagem depreciativa.

Usar de sarcasmo evidente para se passar por amigo (para alguém de fora) enquanto assegura o controle e a

posição em relação à vítima (isto ocorre com freqüência logo após o bully avaliar que a pessoa é uma "vítima perfeita").

Fazer que a vítima passe vergonha na frente de várias pessoas

Este ato violento acontece em muitos lugares, até no ambiente de trabalho, mas principalmente nas escolas.

Casos extremos podem levar ao suicídio ou mesmo a esquizofrenia (do grego σχιζοφρενία; σχίζειν, "dividir";

e φρήν, "phren", "phrenés", no antigo grego, parte do corpo identificada por fazer a ligação entre o corpo e a alma,

literalmente significa "diafragma") é um transtorno psíquico severo que se caracteriza classicamente pelos seguintes

sintomas: alterações do pensamento, alucinações (visuais, cinestésicas, e sobretudo auditivas), delírios e alterações no

contato com a realidade. Junto da paranóia (transtorno delirante persistente, na CID-10) e dos transtornos graves do

humor (a antiga psicose maníaco-depressiva, hoje fragmentada na CID-10 em episódio maníaco, episódio depressivo

grave e transtorno bipolar), as esquizofrenias compõem o grupo das Psicoses.

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PARTE 1

INTRODUÇÃO

Acho que sou um jovem comum. Ordinariamente comum, sem grandes atrativos.

Minha pele é levemente bronzeada, olhos verdes. Sobre meu corpo, bem, esse é um tópico

sobre o qual não me sinto muito à vontade de falar, pelo menos não por enquanto.

Minha história não tem vampiros, não tem personagens principais que se

transformam em lobos, e eu duvido que eu vá ficar com a mocinha no final. Já tentei escrever

histórias, mas não consigo, e isso se prova um fato. Descrever aquela paisagem de maneira

minuciosa, ou relatar os personagens com tanta precisão que acabaria conhecendo melhor a

eles do que a mim mesmo...

E na minha cabeça a pergunta: POR QUE DESTA VEZ SERÁ DIFERENTE? Não

parava de pular de um lado para o outro, mas sei a resposta exata para que esta vez seja

diferente de tudo o que já aconteceu antes.

Essa não é uma história comum, uma mediocridade que você vai esquecer assim que

fechar os olhos. Essa história é o meu diário, é a minha vida, é tudo que sobrou de mim, e eu

me recuso a aceitar que serei apagado tão facilmente, que serei uma vaga lembrança em

breve. Nessas próximas páginas você vai me conhecer melhor, vai saber do que gosto e

desgosto vai mergulhar em minha mente, no meu cotidiano e viver comigo meu dia a dia.

E, preciso admitir, muitas vezes ele se demonstra um tanto quanto sombrio...

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CAPÍTULO 1

“O primeiro dia”

Por mais reservado que eu seja, por mais que eu evite o contato com as outras

pessoas e insista em olhar sempre para baixo, meus segredos parecem cada vez mais

emergir das profundezas, o silêncio se torna aos poucos claustrofóbico, mas meu medo de

sair para o exterior vale o sofrimento interior.

Existe uma pessoa perfeita, com seus olhos tão azuis e sua pele branca. Seu sorriso

era mais do que uma estética bucal perfeita. Tinha um ar de deboche e ao mesmo tempo uma

sinceridade que, sempre que eu me fixava ali, naquela boca, naqueles dentes perfeitos,

esquecia de mim mesmo, mergulhado numa fantasia muito minha...

Seu nome é Beatriz (ela estuda em meu colégio). Ela não dá muita bola pra mim, e,

para ser sincero, acho que ela nem percebe minha existência. Fico sem ar ao falar com ela, e

acabo evitando-a para não passar por nenhum vexame.

Sento-me no último lugar da última fileira, de forma a passar os estudiosos,

ultrapassar os bagunceiros, e ficar totalmente isolado. A pessoa mais próxima de mim é Luiz,

que passa a aula inteira dormindo.

Sinto não só na escola, mas o tempo todo, um cansaço de dar desespero. Mas

desespero de verdade é a hora do almoço na escola, quando fico vagando pelo refeitório,

todos me olhando estranho, algumas pessoas comentam, outras evitam falar e algumas

acham que sou metido, pois um dos meus únicos amigos, ou talvez uma das únicas pessoas

que converso na escola, coincidiu de ser o garoto mais desejado de lá: Gustavo.

Gustavo recusou-se a namorar com Beatriz. Não fez isso por não achá-la interessante,

mas o fez porque sabia que eu gostava muito mesmo dela. Ele sabia que não era vontade de

ficar com ela por ficar, ele sabia que eu a amava incondicionalmente desde a quarta série, que

eu sempre ficava vermelho e sem ar quando a via passar, que eu acabava me atrapalhando

com o que quer que estivesse fazendo quando ela aparecia, que minha garganta secava, que

eu gaguejava ou perdia a voz, que tudo acontecia de forma a me entregar: ela tinha esse

poder sobre mim, causar um turbilhão de emoções que me confundiam, me atrapalhavam, me

fascinavam. Como uma pessoa podia ter tanto poder sobre a outra?

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Como eu adoraria não gostar dela, adoraria ser como qualquer outro cara do colégio

que só se importa em pegar no peito e na bunda das meninas, mas a verdade é que eu quero

beijá-las, dizer que as amo, dar- lhes flores e perguntar como estão se sentindo. Queria poder

enxugar as lágrimas de Bia quando ela chora, porque me destrói vê-la constantemente triste

devido a esses garotos que não se importam com seus sentimentos, que a tratam como um

lixo.

Teve a história daquele cara chamado Nicolas, que dizia que a amava, mas a exibia

como um troféu, beijava outras garotas e nunca perguntava como ela estava. Eu ficava com

muita raiva dele, porque eu queria estar ao lado dela, eu é que deveria estar cuidando dela,

abraçando-a, segurando sua mão, deveria ser eu sentindo o seu beijo, deveria ser eu....

A aula acabara e peguei o ônibus da escola. Minha mãe decidira-se pelo ônibus depois

de eu ter levado uma surra na antiga perua que me levava para casa. Apanhei até sangrar de

uns valentões, que se acham assim mesmo, valentões, mas só quando andam em

grupinhos... Engraçado como esses caras se fortalecem na presença dos amigos, e foi isso

que aconteceu naquele dia. Apanhei sem muito motivo da minha parte, mas por muitos da

parte deles. Meus pais ficaram muito chateados com isso. Não deve ser mesmo bom ver seu

filho apanhar e ser humilhado na escola, mas eles tinham um jeito todo especial de colocar

essa situação para mim: Diziam que eu era especial, diferente, que eu tinha uma sensibilidade

grande não só em relação às pessoas, mas também em relação às situações, e que isso

acabava intimidando as pessoas (os garotos, principalmente). Grande consolo. Acabaram me

colocando no ônibus, pensando que ali eu estaria “a salvo” das provocações e zombarias.

Estava sentado, meio deprimido, e Gabriela se aproximou de mim e realçou o que

meus pais haviam dito:

- Alex, acho que você não deve se preocupar tanto com o que vem acontecendo, sei

que não deve ser fácil lidar com as brigas, e boatos e tudo mais, mas acredito que você é

maior que isso.

- Obrigado mesmo.

Gabriela virou de lado e tirou de sua bolsa um livro que parecia ser relacionado a

‘’Wiccanismo’’. Curioso, ao chegar em casa, realizei certa pesquisa sobre o assunto no

computador.

Era tarde da noite, tranquei a porta do quarto, pus me a observar as estrelas pela

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janela. Eram fracas, não tinham muita visibilidade, mas tinha certeza de que estavam

brilhando no céu. Abri a porta do banheiro, liguei o chuveiro, arranquei minhas roupas e entrei

embaixo da ducha, sentei no chão e fui tomado por uma terrível sensação de raiva e tristeza

por tudo que vinha acontecendo comigo, o constante sentimento de ser o deslocado, o

estranho, o feio, o babaca, o que ninguém quer olhar nos olhos, o com a pele seca, o com a

estatura muito baixa, os olhos muito escuros, o com as roupas erradas, com as escolhas

erradas, com as notas muito altas para tentar ser normal, o que não pertence ao lugar, o que

não sente dor, por isso merece apanhar, merece ser apedrejado, comparado e ridicularizado,

o que nunca será notado. O excluído.

Eu queria muito ser uma das estrelas do time de futebol, ser forte e ter a garota dos

meus sonhos, todos iriam gritar meu nome: ALEX! ALEX!ALEX! ALEX!!!

Com toda certeza ia ser demais, eu não precisaria mais me esconder dos outros, e

nem ser excluído. Nem com os nerds posso ficar, eu sou apenas uma unidade em tudo isso,

não sou classificável, sou apenas Alex Alonso, nada mais nada menos, apenas aquele cara

que não quer ser notado, e que todos conhecem como a sombra escura de Gus.

Quando cheguei em casa, desci do ônibus amarelo e velho, e Carl, o motorista, sorriu,

acenou com a sua mão trêmula um tchau xoxo e inocente para mim, e eu sorri timidamente.

Apesar de me sentir um nada, um cara sem atrativos, sabia que tinha pelo menos um sorriso

atraente, resultado de anos de uso de aparelho nos dentes, os quais escovo obsessivamente

para mantê-los sempre brancos e limpos. Entrei em casa e encontrei Andrea, minha

funcionária, fazendo aquele bolinho de arroz que eu adoro. Comi a travessa inteira, e, me

sentindo-me mal por ter feito aquilo, corri para a ginástica.

Tenho problemas com comida. Nunca fui gordo, sou até magro demais, queria ter

músculos, por isso tento sempre fazer exercícios. Mas tinha exagerado nesse dia, e aproveitei

para queimar essa gordura toda (gordura não leva a músculos) e me preparar para o dia que

chegava.

Queria estar mais “aceitável” para meu aniversário, que na escola passaria

despercebido se não fosse por Gus, que todo ano insiste em cantar alto “parabéns” quando

entro, mesmo sabendo que isso me deixa totalmente constrangido. E por minha pele ser

clarinha, quando fico com a bochecha vermelha todo mundo percebe. Isso pode até parecer

“fofo” quando eu falo, mas faz com que eu me sinta como um bebê deslocado que deveria ter

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sido adotado mas ninguém quis.

Posso não me relacionar muito com as pessoas, mas as observo minuciosamente.

Sei ler cada movimento que vão fazer, o que estão pensando e o que sentem, tudo por uma

leve movimentação, ou inquietação. Uma pessoa muito interessante é Arieh, que vive

fazendo piadas e gracinhas, mas é muito esperto. As pessoas o tratam um pouco mal, mas

ele parece se sacrificar e ser leal a elas. O apelidaram de “Justin Bieber” falsificado, e pra ser

sincero, ele parece sim... AHHAHA... Mas sua personalidade parece meio apagada quando

comparada a personalidade da garota dos meus sonhos. Ela sim é alguém que observo o

tempo todo, de maneira detalhada, e como não poderia? Ela é encantadora. Age como se

fosse burra na escola, acho que é pra chamar a atenção dos outros.

Observo a Bia G, dividindo seu tempo entre respirar e chorar de amores por Justin

Bieber. E observo a garota dos meus sonhos, fingindo ir mal na escola para não chamar a

atenção para si mesma. Observo-a o tempo todo. Era para isso que ia à escola todos os dias.

Era para isso que acordava, que fazia exercícios, que “enfrentava” as provocações,

humilhações e os gigantescos trabalhos de casa que realizava com perfeição. Era para

Beatriz que minha vida se voltava.

CAPÍTULO 2

“Populares”

É mais um dia na escola. Passo despercebido, uma mancha cinza andando devagar

pelos corredores mal iluminados da escola. Cabeça baixa como sempre, tento passar pelos

“populares” com rapidez para não ser notado, mas sempre posso ouvir alguma risadinha,

notar algum olhar maldoso, mas continuo andando, ouvindo meu Ipod e vivendo em meu

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próprio mundinho, que queria que fosse diferente como já disse, mas nada parece mudar.

Entro na classe, vejo aquela fileira de cadeiras e mesas sem vida, ando devagar até o último

lugar com vontade de chorar e lá sento, prometendo a mim mesmo que esse dia será

diferente e que vou conversar com Bia.

Todos chegam à classe aos poucos, não ligo pra ninguém até vê-la chegar. Ela vem

andando até seu lugar e eu a observo em câmera lenta. Observo a maneira perfeita que seus

cabelos balançam soltos, como ela abre cuidadosamente sua mala para não quebrar a unha,

que ela deve ter pintado ontem, ela pintou de vermelho, minha cor preferida, gosto de

imaginar que ela pintou porque sabe que gosto desta cor, mas a verdade é que ela nem deve

saber meu sobrenome.

Gus ainda não chegou, o grupo popular acaba de entrar, e estão vindo para o final

da classe, não entendo o por que disso, eles chegam cada vez mais perto de mim até que um

deles começa a falar comigo:

-VOCÊ É RIDICULO, VOCÊ QUER SE PROMOVER COM A POPULARIDADE DO

GUS, VOCÊ É MUITO OTÁRIO, VOCÊ É UM EXCLUÍDO IDIOTA, VOCÊ DEVE SE ACHAR

GOSTOSO SÓ PORQUE É AMIGO DELE, MAS É UM BABACA ESCROTO, VOCÊ NEM

TEM CORAGEM DE FALAR COM A GAROTA QUE GOSTA, AH, DESCULPE, EU FALEI

ALTO, ESPERO QUE ELA NÃO TENHA OUVIDO, MAS FODA-SE, PORQUE A ESCOLA

INTEIRA SABE, TALVEZ OS ESQUIMÓS NO POLO NORTE JÁ SAIBAM, E ELES TAMBÉM

DEVEM RIR O DIA INTEIRO DA SUA CARA, EXISTEM PESSOAS QUE NASCERAM PARA

BRILHAR, PARA SEREM ALGUÉM OU SIMPLESMENTE ACHAR ALGUÉM PARA AMAR,

MAS NÃO PARECE SER SEU CASO. EU TENHO TANTA RAIVA DE GENTE ASSIM...VOCÊ

NÃO VAI CHORAR NÉ? VOCE É RIDÍCULO! VAMOS PESSOAL, ELE É MUITO OTÁRIO!

Saem da classe e eu seco meus olhos com a manga da blusa e fico segurando o

choro, mas a tentativa de segurar o choro faz a sensação de vontade de chorar só aumentar,

é como se estivesse acumulando para a qualquer segundo explodir como uma bomba

relógio... Bia me olhou e perguntou se eu estava bem, mas eu respondi baixinho que sim, só

que ela não ouviu e perguntou: “O que?” Então desmoronei e comecei a chorar. Todo mundo

me olhava e eu não queria que estivessem me olhando, mas não conseguia parar de chorar.

O ar me faltava, a visão estava embaçada, soluçava sem parar e o corpo tremia.

Por um minuto parecia que ela ia chegar perto de mim, mas ela só me olhou e virou

para frente, logo todo mundo parou de me olhar e eu tentei ficar sozinho, de novo, como

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sempre. Fiquei com medo que alguém fosse chegar perto de mim para conversar e eu

recomeçasse a chorar, mas ao mesmo tempo eu queria que chegassem, pois me sentia tão

sozinho, e meu único amigo não estava lá pra ficar ao meu lado.

Fiquei esperando que Gus aparecesse, mas ele não chegava então as aulas foram

passando, e na hora do almoço, quando estava indo para o refeitório, os populares me

olharam e um deles balançou o dedo de um lado para o outro com um sorriso maléfico no

rosto dizendo: “NÃO ENTRE AQUI”. Então recuei e fui correndo para a classe. Fiquei lá

sentado, pensando o por que de tudo isso acontecer comigo, porque as pessoas precisavam

ser tão más comigo, eu nunca havia feito nada de ruim para elas.

Então ouvi barulho de passos vindo em direção à classe, imaginei que alguém

tinha subido pra vir me humilhar de novo, mas era Gus. Ele sentou do meu lado e começamos

a conversar:

- O que houve Alex?

- Os populares , eles me zoaram, falaram que eu só sou seu amigo porque quero me

promover. Também falaram que eu gosto da Bia, na frente dela, isso não é justo! Por que

fizeram isso, eu nunca fiz isso com eles, eu nunca fiz essas coisas. Sabe que não faria essas

coisas, sabe que amo ser seu amigo, que estamos juntos desde que essa coisa de popular

não importava, sabe o quanto nossa amizade importa para mim.

- Eu sei.

- Por que as pessoas precisam me tratar assim? POR QUÊ?

- Elas são idiotas, não sabem o quanto você é legal e especial, Alex, é só isso,eles ainda não

perceberam, mas vão, um dia vão. Você vai ver.

Depois daquilo fiquei mais calmo e fui embora. Gus me acompanhou até o ônibus,

olhando pra todo mundo com um olhar bravo, um olhar nervoso, então eu entrei no ônibus e

fui pra casa. Fiquei pensando como não conheço as pessoas de verdade, como elas são um

mistério, fiquei olhando a paisagem passar pela janela, fiquei ali, comigo, triste, humilhado,

acovardado.

...

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CAPÍTULO 3

“Gus ,meu melhor amigo que não conheço “

É mais um dia nesse inferno, esses idiotas ficam me encarando, eu não agüento

esse lixo de escola, depois de ontem todos ficam comentando, eu tento ficar na minha, mas

esses idiotas não param de me olhar assim.

- Alex?

- Oi...

- Eu estava pensando, esse fim de semana, seria muito legal se você pudesse, não sei,

ir em casa.

- Jura?

- Sim.

- Você nunca convida ninguém, nunca convidou.

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- Eu sei, mas sei lá, queria que você fosse.

- Claro, fechou.

Por mais que fôssemos muito amigos, eu nunca havia ido até a casa de Gus. Quando

ele me fez aquele convite me dei conta que ele me escutava há anos, ficava do meu lado há

anos, mas eu não sabia nada sobre sua vida, e que ele era fechado, um completo estranho

para mim. Era como se cada pergunta tivesse sido desviada, cada informação apagada, não

sabia nada sobre ele, mas diferente do mundo, ele sabia tudo sobre mim, e essa era a

primeira vez que ele me convidava a entrar em seu “mundo”.

Achei que ele não me convidava para ir a sua casa, pois notava que eu olhava

sempre para seu shorts, e que, quando ficávamos de cueca no vestiário, eu perdia o fôlego ao

olhar para ele, com seu corpo definido, seus braços fortes e a barriga com tanquinhos

alinhados. Eu não o olhava com olhos de desejo, mas sim com inveja, pois ele ostentava toda

sua beleza, e o fazia com tanta força e ao mesmo tempo tanta naturalidade que eu quase tive

vontade de um contato físico. Mas depois do que aconteceu comigo, esse não parecia mais o

motivo.

Por outro lado, eu tinha vergonha de me despir e me trocar no vestiário. Todo mundo

amontoado, a situação de muitas pessoas ao mesmo tempo nunca me agradou, e a classe e

o vestiário eram os lugares onde eu mais precisava ficar ao lado das pessoas.

Normalmente nos jogos ninguém me escolhia, mesmo eu tendo habilidades esportivas.

Tem todo esse lance de eu não falar com ninguém, e isso dificulta muito na hora de entrar nos

times da Educação Física...

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CAPÍTULO 4

“ A casa”

Fiquei imaginando como seria sua casa, mas não acertei nenhum dos meus palpites.

Quando cheguei lá, vi aquela mansão imensa, toda branca com paredes de vidro, seu

tamanho chegava a causar certo desconforto, era surreal como aquela gigantesca construção

se contrapunha com árvores e pequenos flocos de neve que caíam na montanha... Desci do

carro e ele veio até mim, estava um frio congelante (eu vestia dois casacos.) e ele de shorts,

camisa e meia, todo vermelho, mas não parecia de frio, e sim de quente... Ele pegou minha

mochila, cumprimentou minha mãe e nós entramos na casa, linda... Eu não consegui me

segurar e acabei comentando, fiquei sem graça, minhas bochechas coraram como de

costume, mas ele não ligou.

Fomos assistir filmes de terror na sala, e eu perguntei onde estavam seus pais, ele

disse que haviam viajado e que só voltariam sexta-feira da próxima semana.

Ele foi até a cozinha e voltou com chocolate e porcarias, nós comemos um monte de

besteiras, a noite foi caindo aos poucos.

- Soube que você entrou para o time de futebol da escola.

- Sim, entrei.

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- Como são os treinos, você os curte?

- São bem legais, não são fáceis, precisa estar disposto, mas eu estou adorando.(O

rosto de Gustavo borbulhava felicidade.)

- E as animadoras de torcida, são muito gostosas, já pegou alguma?

- Então, sabe a Pamela?

- Aquela loira gostosa?

- Sim, então, “sipa” eu vou ficar com ela no intervalo do próximo treino, “sipa” não,

certeza, ela tá totalmente na minha.

- Podia jurar que ela tinha um namorado!

Gustavo fez certo silêncio, riu maliciosamente, então subimos para o quarto. Ele disse

que ia colocar seu pijama e já voltava, se levantou e foi andando em direção ao banheiro... a

seu lado sua sombra ia de distorcendo pelo efeito da luz até desaparecer quando ele adentrou

no banheiro e a porta se fechou.

Quando saiu do banheiro, meus olhos se arrastaram como ímãs, seus tanquinhos eram

extremamente bem desenhados, seu corpo era perfeito a ponto de dar muita inveja. Tentei

não olhar para ele, mas era como se houvesse um ímã nele, algo que provocasse em mim

não uma simples admiração, mas algo doentio, queria ser ele com todas as minhas forças,

queria poder ter todas as garotas, queria não pensar em tudo que penso, não recorrer a esses

loucos pensamentos, queria apenas olhar no espelho, piscar, sorrir, depois entrar no buraco

de uma arma e estourar em alta velocidade, arrasando corações.

Ele percebeu meu olhar, e perguntou se eu não ia colocar pijama, eu disse que sim,

então ele me olhou e deu um sorriso com o canto da boca, eu quase morri de vergonha, e ele

perguntou se eu queria navegar na net.

-Eu conheço um site muito foda, é legal, cola aí para eu te mostrar- disse Gustavo.

Nós sentamos na frente do computador e começamos a entrar naqueles sites pornôs,

tinha umas mulheres loiras muito gostosas, então eu fiquei de pau duro, Gus também ficou, e

tirou seu pau inteiro para fora da cueca, era bem grosso... eu comecei a me masturbar

também , ora olhava para o computador, ora olhava para Gustavo, ele percebeu, e então me

perguntou, se eu já havia batido para alguém, na hora gelei e meio gago disse que não, então

ele trouxe sua mão levemente até a minha perna e foi subindo devagar... Ele colocou a mão

no meu pênis e começou a me masturbar, e eu comecei a masturbá-lo também, aquele prazer

era intenso, e por mais errado que parecesse eu gostava daquilo, gostava muito. Eu o

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acariciava, então olhei para seus olhos azuis esverdeados e me aproximei dele, e comecei a

beijá-lo, sua boca era muito gostosa, ele beijava bem, sua língua fazia movimentos circulares

e massageava a minha, ele beijava de olho aberto mantendo um grande contato visual, isso

era incomum e estranho, mas não conseguia parar de olhar para ele, confesso que isso me

distraía e eu acabava beijando mal. Sentia-me uma criancinha, pois ele comandava tudo. Ele

parou de me beijar e sorriu, então voltamos a nos masturbar, eu disse que ia gozar, e gozei

um jato, então ele gozou também, nós saímos do computador e deitamos na cama. Fiquei

olhando seus cabelos loiros e perfeitos que balançavam devagar, (os cachinhos loiros eram

visualmente macios, e de perto podia se sentir um delicioso aroma.) ao efeito do vento que

invadia o quarto por uma fresta da janela. Fiquei observando com muito prazer, mas acabei

caindo no sono.

Na manhã seguinte ao acordar me senti diferente, achei que iria sentir culpa pelo que

tinha feito na noite anterior, achei que aquilo me faria sentir mal, mas não, eu encostei-me a

ele e comecei a cutucá-lo de leve.

Gus... Gus... Eu sussurrava. No começo ele não respondia, mas aos poucos foi

acordando, e levantando, agachou, puxou uma calça jeans do chão e colocou, não falou uma

palavra, talvez fosse o frio que se instalara naquele momento, ou a palidez que o quarto

tomou, mas eu e ele adotamos um grande silêncio e apenas vestimos nossas roupas, fizemos

isso de forma bem quieta, de forma a evitar cada mínimo barulho que pudesse dar margem a

um som, que pudesse dar liberdade a uma palavra que levaria a uma conversa que traria à

tona os acontecimentos da noite. Talvez ele não estivesse à vontade com o que acontecera,

talvez eu não devesse estar a vontade com o que acontecera, a verdade é que aconteceu, e o

que está feito, está feito, e por minha parte não me arrependia. Talvez não a ponto de

comentar ou tentar voltar atrás, mas todo cristão é destinado ao arrependimento, certo?

- Alex, vamos tomar café?

Aquela simples pergunta com um sorriso descompromissado significava que ele não só

havia não se arrependido da noite passada como havia passado... Minhas angústias, meus

medos, meus dilemas escorriam pelo ralo naquele momento, pois sabia que ele havia

gostado, suspirei internamente e sem muita comemoração ou surpresa confirmei o pedido:

- Sim.

Descemos as escadas, atravessamos a sala, passamos pela sala de jantar e entramos

na cozinha, pelo nosso olhar perdido era óbvio que ele estava se alimentando de comida de

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microondas e porcarias o fim de semana inteiro.

Eu pensei que poderíamos comer brigadeiro, mas não tinha a mínima ideia de como

fazer, então fomos até a dispensa e pegamos um monte de porcarias e comemos, ele mais do

que eu, pois não costumo ter fome pela manhã.

Ele comia descompromissado, olhava sem atenção e não demonstrava nenhuma

emoção. Era como se o envolvimento dos dois corpos nunca tivesse acontecido, como se

tivesse sido pura imaginação.

Minha relação com ele é complicada, não é só de amizade, pois é mais forte; não é de

irmão, pois tem o toque; é antiga pois começou na pré escola. Tinha tudo para acabar, mas

não, ela continua. Ele era meio tímido com as meninas e eu o ensinei como chegar perto

delas, ensinei o que falar, o que não falar, e ele acabou falando mesmo, e eu perdi meu tempo

o observando, observando os outros, e acabei por não me observar, por nunca me decifrar,

por nunca me olhar, ou me amar, me fiz imparcial e abri espaço para que jogassem pedras em

mim, e quando resolvi olhar para dentro de mim, me acolher dentro de mim, encontrei cacos

de vidro, me cortei, sangrei, e continuo sangrando...

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CAPÍTULO 5

“Rotina”

Na volta para casa não trouxe comigo só boas lembranças, mas também a

consciência de que voltava à vida real, normal.

Acordar cedo, aquela gritaria matinal, era sempre a mesma coisa, minha mãe e eu

sempre perdíamos a hora, eu tentava puxar algum papo durante o caminho mas ela não

queria abrir a boca, parecia que se ela fosse falar alguma coisa o tempo passaria mais rápido

e nos atrasaríamos ainda mais. Não costumo ficar tanto com ela, sempre fico mais com meu

pai, pois moro com ele, um homem sozinho, que teve algumas namoradas depois de minha

mãe, mas nunca quis se casar de novo. Vive em seu mundo, cuidando de seu bar, o “Latão”.

A vantagem de sempre chegar meio atrasado é que não preciso encontrar todo mundo

no portão, e o professor nem percebe quando eu entro na classe, e não é a miopia dele não, é

só que ele é um desleixado mesmo.

Às vezes fecho os olhos e começo a sonhar, imagino que tenho muitos amigos, imagino

que estou numa festa, imagino que estou no meio da pista de dança e todo mundo está

pagando o maior pau para o jeito que eu danço, eu faço movimentos elaborados e jogo

olhares para todas as garotas, em especial para aquela especial, e ela corresponde, ela se

aproxima e então..

- ALEX! ALEX!! RESPONDA-ME!

- Oi..

- É uma pergunta simples, tem três portas, atrás de uma delas tem um prêmio, o

jogador escolhe a porta “c”, o apresentador do programa abre a porta “a” e o prêmio não está

lá, é vantajoso trocar?

- Não sei..

-É claro que não sabe, como poderia saber, não presta a mínima atenção à minha

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aula, digo mais, muitas vezes acho que alucina, viaja para outro planeta no momento que

coloco meu corpo nesta sala.

Por mais que todos possam ter tirado sarro da minha cara agora, sei que ninguém

sabia a resposta dessa pergunta, sei que ele só me perguntou isso pois sabia que eu não

responderia certo, ele é como qualquer outra pessoa, é outro idiota.

Levantei de minha cadeira e saí da sala sob o pretexto de que iria ao banheiro. Estava

a andar pelos corredores da escola em passos cuidadosamente calculados para nenhum

barulho soar, quando vi alguns garotos bem altos cercando Pedrinho, um garoto raquítico,

baixo, pele fustigada, branca e quebradiça pelo vento frio, suas roupas de um tom

acinzentado e morto, olhos apontados para baixo, mãos tremendo, e o corpo indo de um lado

para o outro, com os altos sussurros cuspidos em seus ouvidos. Dei alguns passos para trás,

abaixei-me, encostei-me a uma parede e meus olhos correram pelo espaço à procura de

ajuda, mas a escola parecia abandonada, tanta soberba naqueles movimentos do rosto,

desenfreados, regados de mal, requintados com tamanha crueldade, as palavras

esbofeteavam o garoto aos prantos, chorando ainda mais por tentar reter suas emoções, o

mais impressionante não era o fato de tanta violência, mas de todos omitirem ajuda,

passarem longe, abaixarem a cabeça, fingirem que estava tudo bem, mesmo uma professora

que passou ao longe, quanto sinal de impotência das pessoas frente a isso...

Esperei e um certo tempo depois os quatro meninos deixaram o espaço, rindo de

maneira maldosa, o sinal tocou e os corredores foram se preenchendo de pessoas. Levantei-

me e olhei para o garoto, além de lágrimas estavam espalhados no chão, sentimentos,

tristezas, ambições e fragmentos de algo que um dia foi moral, ou mesmo autoestima. Envolto

por vergonha e comentários, com as mãos tampando o rosto, o pobre menino respirava com

dificuldade, pensei em me aproximar, um gesto de amizade talvez proclamar, mas o medo me

dominara, me senti monstruoso, tanto quanto aqueles agressores, havia escutado tudo em

silêncio, visto tudo em silêncio...

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CAPÍTULO 6

´”O pai”

Ao chegar em casa, meu pai notou que eu estava mais abatido que o habitual, e veio

conversar comigo. No começo recuei, mas ele me fitou com os olhos, e sem escolha fui

obrigado a, aos poucos, me descascar, e antes que percebesse, estava contando o que havia

acontecido na escola, o que o professor idiota havia dito, o que eu havia sentido, e ninguém

havia dito. Que ninguém havia me protegido, que tudo tem passado tão rápido, mas ao

mesmo tempo tem demorado uma eternidade, como se fossem cem anos de solidão. Ele

disse que tudo ficaria bem, e que eu brilharia como brilham meu olhos verdes, que eu tenho

tudo que ele sempre quis em um filho, e eu sorri, porque aquilo era tudo que eu precisava

ouvir.

Depois da minha conversa com meu pai me senti muito melhor, senti que podia me

abrir com ele, achei que ele não fosse me entender, mas ao dar uma chance ele me

entendeu, ele me compreendeu, e aquilo me ajudou muito mesmo, pude sentir que iria

encarar a escola de uma maneira totalmente diferente.

CAPÍTULO 7

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“ Contato imediato”

Poderia ser uma manhã qualquer, mas Bia olhava para mim de maneira nervosa,

cruzando seu olhar com o meu com frequência, e por mais que tentasse disfarçar, era claro

que ela queria falar alguma coisa comigo, só não sabia o que, então ela se virou e começou a

escrever algo freneticamente em uma folha de papel, que, algum tempo depois, foi jogado no

meu pé.

Ela empurrou a porta do corredor e correu para alcançá-lo. Segurou seu braço com

força o suficiente para fazê-lo parar, mas demorou um pouco antes de deleitar-se em suas

palavras incertas:

- Eu sei que acabou; eu sei disso. Mas eu detesto a visão que eu tenho de você agora.

E detesto mais ainda a ideia de você me odiando e agindo como se eu não existisse, ou pior

ainda, como se nada tivesse acontecido.

- Eu-não-te-odeio! – ele disse friamente.

Ela o encarou confusa, e perguntou angustiada:

- Então por que você continua agindo como se nunca houvesse me conhecido?

- Porque talvez... – ele demorou a prosseguir – talvez isso torne o futuro mais fácil, o

passado mais terno, e o presente menos doloroso. – Ele falou com um ar sincero, intenso e,

sobretudo,inseguro.

Ela finalmente soltou seu braço e deixou-o ir embora. Ele foi, e levou consigo qualquer

amor, qualquer carinho, ou consideração que ela ainda sentisse. De fato, ele nunca a odiara,

antes fosse; porque o contrário do amor, nunca foi o ódio. O contrário do amor, o tempo todo,

foi a indiferença.

Demorei um pouco para entender o significado daquela história da carta, e entendi,

pelo meu ponto de vista e não do dela, que ela dizia que todos a decepcionavam, e eu

também, por ser inseguro, e não ir até ela.

Gostaria de ter mais coragem de falar com a menina para quem dei meu coração, com a

menina que amo incondicionalmente, mas estou sempre me regrando, estou sempre

calculando meus movimentos, como se eu fosse um psicopata. Às vezes sinto falta de meus

sentimentos, pois tudo em minha vida parece calculado, eu sei a nota que vou tirar na escola,

eu sei quem vai me zoar, tudo que vai acontecer, mas quando se trata da Bia, não consigo

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calcular nada, é como se o chão fosse tirado de meus pés, e eu não pudesse mais calcular

cada movimento, e agora tudo fosse uma tremenda bagunça. Talvez eu não fale com ela,

porque sei que ela não tem regras como eu, que ela ama, chora, sem contar ou imaginar a

probabilidade, a porcentagem de algo dar certo ou errado, e eu tenho medo, muito medo do

incerto.

CAPÍTULO 8

“Motivação”

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Cheguei em casa, abri a pasta e comecei uma lição. Pensei no por que eu não deixava

uma página do livro em branco, por que eu tinha uma lista de notas impecáveis, porque eu

nunca havia atrasado um prazo, se eu não tinha amigos... De que me servia todas aquelas

notas se eu não sabia estabelecer contato social com as pessoas, se um simples “oi” requeria

de mim tremendo esforço e planejamento estratégico.

Tenho o hábito de observar aquelas pessoas que não ligam para o que os outros

dizem, de contemplar as pessoas lá no céu dentro dos aviões, seguindo seus próprios

caminhos...

Se tudo tem uma razão de ser, uma pretensão de existir, um alívio ao sucumbir, por

que eu tenho tanta dúvida da minha existência, da minha razão, das minhas pretensões e de

como vou sucumbir, por que eu tenho tanta dúvida, se tudo tem tanta razão?

CAPÍTULO 9

“Eles são meu tudo”

Às vezes penso no futuro, no que será de mim quando Gus partir, quando Bia for

embora, quando eu parar de amá-la, quando eu me graduar, para onde eu vou voar, para

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onde eles vão voar, quem vai me acompanhar, quem vai me ajudar, quem vai me abraçar,

quem vou admirar de longe, de perto, quem vou tocar, desejar, amar.

Gostaria que esse tempo que estou vivendo nunca tivesse existido, mas ao mesmo

tempo, desejo que ele nunca acabe. Nunca algo tão confuso pareceu tão certo para mim,

nunca desejei tanto poder congelar o tempo e impedir que tudo isso escorresse pelos meus

dedos, que eles estivessem ao meu lado como tenho desejado, eles são tudo para mim, são o

que me sustenta, são os únicos que me entendem.

São as pessoas que amo que me lembram o que significa amar, são as pessoas em

volta de mim que psicografam através de minhas ações atos bondosos, às vezes maléficos,

mas atos, carregados de sentimento... São as pessoas, que eu amo.

CAPÍTULO 10

“Notas”

Minhas notas sempre foram sinal de admiração para meus pais, os professores já

estavam acostumados a me dar boas notas, e sempre gostei de as tirar, pois a sensação era

maravilhosa, aquele gostinho de vitória sem precisar machucar nem agredir ninguém.

Sempre fui alvo de piadinhas e apelidos como “Cê-Dê-Efe”, puxa saco e coisas do

gênero, mas esse ano está pior, conforme eu fico mais velho, e conforme Gustavo fica mais

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popular, sou mais atacado.

Não faço o tipo do garoto que ninguém conhece e aí algum valentão chega para

machucar, faço o tipo daquele que todos conhecem, e todos querem machucar.

Eu não sei por que as pessoas gostam tanto de mexer com quem tem boas notas, e

principalmente de mexer comigo, eu sei que se levantasse, batesse em todo mundo e fosse

um valentão, tudo mudaria, se eu tivesse uma arma, todos iriam se curvar ao meu poder, eu

não seria mais um idiota, um indefeso.

Talvez se pensasse um pouco menos, seria capaz de fazer um pouco mais, se

planejasse um pouco menos, beijaria mais, se morresse rapidamente, viveria por mais tempo.

CAPÍTULO 11

“Eles gostam mesmo de mim?”

Às vezes me pego pensando se Bia não está apenas brincando comigo, se Gus não

está apenas preso a mim porque guardo os segredos dele, porque já o toquei como mais

ninguém (eu acho) o havia feito. Mas ser amigo dele, estar ao lado dele me faz mal. As

pessoas vêm atrás de mim por isso, minha vida se resume a ser uma sombra desprezada

dele, se resume à minha família nunca me alcançar, é como se eu estivesse envolto por uma

camada de vidro, é como se o mundo me visse, como se ele pudesse me atacar, mas minha

voz não saísse, ficasse lá, presa, e um grito fica por horas ecoando naquele espaço me

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perturbando, me provocando e se distorcendo de maneira demoníaca... É como se as

palavras de socorro tomassem um ar diferente, e se tornassem planos diabólicos de vingança,

idéias malvadas como as agressões cometidas contra mim.

Quando essas idéias surgem sinto grande desconforto, minha boca seca, sinto um nó

na garganta constante, sinto a ponta dos dedos formigarem.

Gostaria de não ter esses sentimentos, tentei hoje recorrer a um bilhete que Bia havia

escrito para mim na aula, mas não o achei, revirei as gavetas, gritei para saber se alguém o

havia pegado, mas nenhum sinal dele, é como se nunca tivesse existido, e isso me causou

terrível desconforto pois a desmaterialização do bilhete reapresentava que as palavras se

confundiriam em minha cabeça, que a lembrança seria alterada aos poucos, e que minha

certeza escorreria água abaixo em pouco tempo.

As coisas somem, vão de um lugar para o outro, culpamos muitas vezes seres que

não existem, santos que não realizam milagres, mas nunca culpamos nosso braço de segurar

com firmeza, nossos olhos de manter o foco e nossa cabeça de apagar tudo que permanece

em volta de nossas ações devastadoras.

CAPÍTULO 12

“Num tempo distante”

Tinha um tempo onde essas angústias eram algo que eu não tinha ideia que existiam,

tinha um tempo onde todos podiam sentar e brincar de igual para igual, eu não consigo me

lembrar muito bem dos dias que não me maltratavam, mas sei que eram muito melhores que

esses de agora, sei que todos eram amigos, que tudo era mais bonito, não havia malícia, não

tinha corpo certo e corpo errado, a televisão não mostrava mulheres perfeitas, os meninos

não precisavam ter muitos tanquinhos, eu não precisava passar o dia na academia para

chegar em casa e odiar meu corpo, não precisava ficar me penteando, quem me penteava era

minha mãe, sua mão em meu ombro, segurando com ternura meu corpo, que se balançava

devagar, o pente passava lentamente em meus cabelos, com carinho e perfeição, eu podia

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sentir toda sua concentração, podia ver no espelho as caras e caretas que ela fazia tentando

alcançar em meu cabelo a perfeição, tentando reproduzir naquela passada do pente toda

perfeição que via em mim, então me virava e com os olhos sempre controlando as lágrimas

me olhava no fundo, me puxava e me abraçava com força, beijava minha bochecha e me

levava pela mão até o portão, se despedia de mim enquanto a perua ia embora... Podia ver

em seus olhos que ela tentava parar o tempo, podia ver ela sumindo aos poucos atrás de

mim, agora nem consigo mais chegar perto dela, agora não nos alcançamos mais, apenas

sorrisos cinzas e comprimentos formais.

Naquele tempo, quando chegava à escola, tudo era novo, era como se estivesse lá pela

primeira vez, a mulher do portão me abraçava, todos sorriam, as cores corriam pelas paredes,

as aulas eram divertidas, o amor pairava no ar, agora ele parece uma velha lembrança do que

já passou.

Me pego pensando por que não posso ser uma criança para sempre, porque não

posso ser aquele ser privado de raiva, porque precisei crescer e me tornar esse vaso

transbordando em raiva, porque me converti nessa monstruosidade, porque ouço vozes tão

altas a me perturbar?

Por que não posso silenciar tudo, voltar ao passado e me abraçar, voltar ao passado

apenas eu e eu, o silêncio e a paz que não vejo há tanto tempo? Por que precisa ser tão difícil

crescer, por que preciso ser tão corrompido por tudo? Por que não posso voltar a algum lugar

quieto e descansar sem preocupações, sem loucuras, sem dores, sem ambição, apenas um

coração, puro e cheio de felicidade, queria voltar no tempo quando eu transbordava felicidade,

queria ser eterno no que passou tão rápido.

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CAPÍTULO 13

“Convite”

- Vamos ao “Rock Teen”?

Gus convidou-me com tanto entusiasmo que a resposta brotou

automaticamente:

- Tá.

- Então.. É, minha mãe vai comprar os dois ingressos hoje, e sexta-feira a gente cola

lá.

- Você acha que a Bia vai?

- Pergunta pra ela!

- Sério!! Fala aí, mano.

- Vai sim, relaxa. De boa?

- De boa.

Despedi-me de Gustavo e fui cantarolando na minha cabeça, o dia passou voando,

assim como minha atenção, tudo que eu podia pensar era em Beatriz, seu cabelo cheiroso,

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sua mão perfeitamente desenhada, sua boca suave, seu olhar certeiro.

Fechei meus olhos e comecei a imaginar seu rosto se aproximando, seu corpo colado

no meu, o volume em minha calça aumentando, enquanto ela roçava sua cocha devagar,

firmemente sem machucar, mas massageando, a ereção em minha calça se espalhava por

todo meu corpo, meu coração palpitava forte,

“PA.PA.PA.PA.PA.PA.PA!” O sinal tocava e todos deixavam a classe. Fiquei sentado esperando a ereção passar,

olhei para frente e vi chegando Marcelo, um dos valentões. Olhou-me com desprezo, voltou

seus olhos para a frente e continuou seu caminho olhando diretamente para o teto. Todas as

atitudes dele, as falas, mostram sensação de grandiosidade, de superioridade, tudo isso para

suprir seu ego colossal, sua gigantesca e grotesca baixa auto estima, e provavelmente seu...

PINTO PEQUENO!

Depois que ele foi embora, me virei, peguei todo meu material e atirei suavemente

dentro da mala, tive imensa dificuldade para fechar o zíper, ao terminar aquela insuportável

tarefa olhei em volta, tudo era silencioso, tudo era quieto, os barulhos externos eram

ofuscados por tamanha calmaria, que aqui prevalecia agora.

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CAPÍTULO 14

“A balada”

- Lele?

- Oi?

- O Gustavo está na porta!

- Que Gustavo?

- AAh! MULEKE! Gustavo Passarelli Panucci.

- Opa, hahaha, eu estava meio desligado, manda ele subir.

Gustavo fechou a porta, colocou a mão esquerda no corrimão e começou a subir a escada

lentamente, fazendo a madeira ranger baixinho. Continuei deitado na cama assistindo

’’Cachorro Molhado TV’’, ele entrou no quarto, jogou sua mala no chão, sentou na minha

cadeira, arrancou os tênis, jogou um para cada lado do quarto, mexeu os dedos do pé,

espreguiçou, e começou a ir de um lado para o outro com a cadeira, com as rodinhas

prendendo-se no carpete, arrancando fiapo por fiapo, criando aquele desgaste contínuo que

me tirava do sério, mas discutir isso com Gustavo seria como falar com uma porta, afinal

aquele barulhinho irritante era um dos sons que mais o acalmava.

Eu quebrei o gelo:

- Que horas começa a matinê?

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- Hahahahaha, Alex ,meu, se você continuar falando assim eu vou “golfar” (vomitar).

- Tá, que horas começa a “balada” então?

- Às sete e meia.

- Daqui a meia hora!

- Isso não é ópera, você pode se atrasar alguns minutinhos.

- Tá, anyway, vamos nos arrumar?

- Já “tô” arrumado.

- Então, para que esta mochila?

- Vou dormir na sua casa hoje.

- Obrigado por avisar, viu!

- Hahahahhaha, desculpe, mas tudo bem?

- Cara, você realmente acha que eu diria não para você?

- Acho difícil.

- Então, assunto encerrado, claro que pode.

Levantei-me da cama e fui sem nenhum entusiasmo até o armário, peguei a primeira

roupa limpa e joguei em cima da cama, tirei a roupa e me troquei rapidamente. Fui até o

espelho com Gustavo, eu joguei meu cabelo para o lado, ele, apenas checou se seus cachos

estavam perfeitamente cacheados e bem distribuídos, como de costume.

Descemos a escada, despedi-me rapidamente de minha mãe e entrei no carro da mãe

do Gustavo. Cumprimentei-a e nós três fomos o caminho inteiro quietos, vinte minutos que

deveriam ser intermináveis, mas que passaram voando para mim. Fiquei olhando a paisagem

fustigada pelo tempo, até chegar na porta da balada, confesso que estava com um pouco de

medo de ir lá, mas ao me deparar com a pouquíssima quantidade de gente do colégio me

senti mais confiante, eu iria entrar em um ambiente onde ninguém me conhecia, nem ninguém

iria me julgar mal logo de cara.

Saímos do carro e fomos até a porta da balada, respirei fundo e entrei, o ambiente era

barulhento, cheio de luzes e flashes, e as pessoas dançavam e bebiam euforicamente. Fui até

o banheiro que estava lotado, lavei meu rosto, sequei e fui ao encontro de Gus, mas no

caminho acabei esbarrando em uma menina, e, ao pedir desculpas, era ela, a Bia.

- Oi.

- Alex! E Aí, tudo bem?

- Sim e você, vem sempre aqui, digo, nesta balada?

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- Para falar a verdade não muito, são mais minhas amigas que me arrastam para estes

lugares, e você?

- Para falar a verdade é a primeira vez que venho em uma balada..

- Jura!? Ai que fofo!

- E onde estão suas amigas?

- Elas sumiram, e o Gus onde ele tá?

- Sumiu também.

- Acho então que a gente sobrou, vamos procurar um lugar para conversar?

- Achei que você tivesse vergonha de falar comigo.

- Tá na hora de perder a vergonha então! Vem comigo!

Bia agarrou meu braço e começou a me puxar num toque leve, quente e reconfortante.

Não havia nenhuma força física, e se não acompanhasse seus movimentos sua mão se

perderia da minha, o que tornava meu contato com ela mais superficial ainda, mas me

alegrava pois, apesar da superficialidade ter tanta emoção. Fomos até uma escadaria,

subimos e então abrimos uma porta que dava ao terraço, sentamos lá e começamos a

conversar. Por mais que eu tentasse prestar atenção no que ela falava, seus olhos tiravam

toda minha concentração, só conseguia olhar neles, mergulhar naquele mar, então sem que

eu mandasse meu corpo se aproximava do dela, que não hesitava e se mantinha parado, aos

poucos ela parou de falar, quando ia encostar meus lábios nos dela, ela se afastou, e pela

primeira vez avancei, coloquei minha mão em sua nuca e puxei e lhe roubei um dos beijos

mais suculentos que havia dado em minha vida. Ela percorreu sua mão por minhas costas e

repousou as duas mãos em meu ombro e aos poucos, relaxando, me beijou, foi com sua

cabeça de maneira bem lenta para a esquerda e para a direita, sua língua percorria minha

boca, massageava minha língua e seus lábios eram doces, o gloss que ela passara dava um

gosto de morango ao nosso beijo, que agora era de meu domínio... mas ela saiu do transe,

percebeu-se ali, foi se afastando... Ela disse que não podia fazer aquilo, levantou-se

tremendo um pouco e foi embora. Fiquei sentado naquele banco sem saber o que dizer,

pensei inúmeras vezes em levantar, pensei o que eu poderia dizer, perdido em todas as

minhas questões quanto àquela situação, perdi a noção do tempo, fiquei lá sentado tempo o

suficiente para vê-la ir embora, para perdê-la de vista. E me sentir um tremendo fracassado

sem reação.

Fiquei ali por um tempo que não sei precisar quanto, até que me levantei devagar da

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cadeira, olhei em volta com a cabeça baixa temendo que alguém tivesse visto o ocorrido,

desci as escadas, sai do salão, peguei meu celular e liguei para Gustavo. Ele não atendia, e

eu entrava em grande agonia, não queria mais estar ali, não suportava mais... Então sentei na

calçada e concentrei todas as minhas forças para não chorar. Fiquei lá parado até que uma

pessoa passou a mão no meu ombro, me virei e era Gus. Tentei falar mas não conseguia

emitir um som sem que as lágrimas saíssem dos meus olhos.

Gus me abraçou e eu comecei a chorar, disse que não poderia olhar para a Bia de novo,

que ela provavelmente deveria me odiar... Ele se levantou e acenamos para um táxi que

parou, nós dois entramos no carro e fomos embora de lá, tudo que eu conseguia pensar era

como eu era um fracassado, arruinara qualquer chance minha com a garota dos meus sonhos

e tinha fodido a noite do meu melhor amigo, eu não tinha controle nem pra segurar meu

choro, eu era uma pessoa deprimente, um inútil...

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CAPÍTULO 15

“Ressaca”

Abri lentamente meus olhos, e estranhei o teto, a maciez da cama. Reconheci aquele

cheiro e me virei de lado, Gus estava estirado, estávamos em sua casa, em sua cama,

provavelmente ele não quis me levar para casa devido ao meu estado, permaneci na cama

pensativo, até que não aguentando mais me levantei de maneira barulhenta e proposital, na

tentativa de acordá-lo, mas não deu certo, então fui até o banheiro, me olhei no espelho e

respirei fundo, coloquei a mão no rosto e lamentei por tudo que tinha errado, por tudo que

erro, e por tudo que ainda vou errar.

Olhei o espelho, entrei no fundo dos meus olhos e tive uma enorme dúvida se aquele

era realmente o meu olho, se aquele azul claro não era propriedade de outra pessoa.

Pensei nessa minha questão do choro, parece que ele se acumula em mim até um

momento crítico ser a queda da Bastilha interna e tudo virar fogo e sangue, e num estrondo

da lâmina, meus olhos silenciarem, o mundo se calar e uma carregada lágrima desabrochar.

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CAPÍTULO 16

“Ressaca parte 2”

Saí do quarto, coloquei meus pés descalços nos degraus gelados, deslizei degrau por

degrau, coloquei minha mão contra a parede, fui deslizando-a por toda a parede, passei pela

imponente sala gozada por obras de artes com um tom grotesco, cores fortes, os detalhes

agressivos deixavam claras as fortes pinceladas carregadas de sentimentos.

Sentei-me à mesa e lá estava Lillyan, mãe de Gustavo, parada, comendo. Devagar, então,

levantou seus olhos, inclinou a cabeça deixando seus cabelos balançarem devagar atrás da

cabeça e com um sorriso forçado, carregado de boa intenção deu um caloroso e

constrangedor bom dia em tom de voz médio.

- Gustavo ainda está dormindo?

- Sim, você sabe como é difícil acordar cedo no fim de semana.

- Depois acordo ele, mas por que está de pé tão cedo meu queridinho?

- Ah, pra ser sincero.. Sempre acordo meio cedo no fim de semana, não tem muito

como evitar, acontece sempre.

Pensei seriamente em dizer tudo aquilo enterrado em meu coração, em desabar em

lágrimas no colo dela, e por estes pensamentos e sentimentos tomarem conta de minha

cabeça percebi que meu nível de desespero era amedrontador, porém contive minhas

emoções, esbanjei naturalidade e respondi que estava muito bem, obrigado. Ela encarou

meus olhos por dois segundos, arregalou os olhos levemente e sorriu, inclinou novamente a

cabeça dessa vez para frente e voltou a ler o jornal.

Estendi meu braço, agarrei um pão, cortei-o e comecei a passar abundantemente

manteiga de chocolate, a manteiga brilhava, passei por todo o corpo do pão, preenchendo-o

por inteiro, o cheiro de chocolate subia e penetrava minhas narinas, podia senti-lo correndo

por todo meu corpo, e em uma dentada regada por gula a casquinha fez aquele delicioso

CRACK e o chocolate se espalhou por toda minha boca. Sempre fui fã de chocolate, mas até

aquele momento não tinha percebido o quanto chocolate pode ser reconfortante e mágico.

Quando terminei a refeição, pedi licença tão baixo que só eu ouvi, logo me autorizei,

saí andando rápido, subi as escadas, sentei na beira da cama, sem olhar para trás senti a

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presença de Gustavo atrás de mim. Costumo sentir a presença das pessoas, normalmente

transmitem um calor fraco, um cheiro leve, mas Gustavo e Bia eram muito diferentes, não

transmitiam calor como as pessoas normais, mas sim uma onda que distensionava meus

músculos, relaxando meu corpo por completo, deixando uma sensação de leveza nos ombros,

e neste momento podia sentir essa força subindo por toda minha espinha, saindo do lençol e

dominando meu corpo.

- Dormiu bem?

- Sim, e você? - respondeu Gustavo levando seus olhos devagar até o meu rosto.

- Também. - respondi com grande insegurança e deixando claro que não, de maneira

sutil.

- E quanto a ontem, como você está se sentindo?

- Estou melhor, obrigado por me trazer para a sua casa, você está sempre me

ajudando com tudo, até quando não precisaria.

Você é quem me ajuda, todas as pessoas da escola não estão interessadas no

bem estar dos outros, só querem ver...

O circo pegar fogo?

É isso.

Naquele minuto olhando dentro dos olhos de Gustavo começava a entender que eu não

era o único a se sentir ou estar sozinho, que no fundo todos estavam e se sentiam assim, seja

procurando holofotes, popularidade ou um cantinho para descansar, onde pudessem desfrutar

da paz, sem nenhuma cobrança, sem serem obrigados a agradar o olhar alheio, ninguém

realmente estava com a sensação de ter companhia, presos à verdade de que viemos

sozinhos e que no final estaremos sozinhos, e isso dói muito, rezo apenas para estar

enganado, para que toda essa argumentação pipocando em minha cabeça seja apenas algo

infundado, assim como todos meus medos, obra de olhares, gritos, palavras e cobranças.

- Pensei de a gente fazer alguma coisa hoje, sei lá, ir ao shopping?

- Não sei...

- Alex, eu sei que ontem foi uma merda, mas você vai se sentir muito melhor se tomar

um ar fresco.

- Ar fresco dentro do shopping?

Debochei, Gus virou os olhos, sorriu deliciosamente e respondeu:

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- Tá, então, vamos ao parque?

- Fechou.

- Vou falar com a minha mãe.

Gus voou pelas escadas, eu peguei umas roupas de seu armário, vesti e me sentei na

cadeira, respirando fundo, o cheiro de terra molhada que se instalara no quarto delatava a

forte tempestade que havia caído durante a noite.

Capítulo 17

´”Embalos de sábado à noite”

Coloquei o material escolar em cima da mesa, o silêncio que perdurava no ar foi

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quebrado pelo ranger da porta, esperei que alguém fosse entrar na classe, mas isso não

aconteceu. Olhei fixamente para a porta, mordi meu lábio, tomei forças, levantei da cadeira,

abri a porta e dei de cara com Pedro e Bia conversando. Ele olhou pra mim e disse:

- O que você quer hein?

Naquele exato momento Beatriz veio andando em minha direção, Pedro não

entendendo nada, assim como eu, ele saiu andando, ela chegou bem perto de mim e disse:

Oi.

Oi.

Desculpa por sábado – ela disse de maneira sincera.

Eu tentei, e foi errado, não deveria ter feito nada e...

Certo, eu queria apenas, é... eu combinei com o Gus de nos encontrarmos nessa

sexta-feira na casa dele, ele vai dar uma pequena reuniãozinha, eu sei que você não é muito

fã de socializar, mas eu queria muito que você fosse, precisamos mesmo conversar.

Mas eu achei que ele fosse viajar neste fim de semana – eu disse.

Não, só os pais dele é que vão – ela disse, percebendo minha hesitação.

Sei lá...- eu disse, indeciso de verdade.

Vai Alex, dá uma chance pra todo mundo te conhecer melhor. Tenho certeza que vão

gostar.

Ok, eu vou.

Obrigada.

Beatriz sorriu, virou, continuou seu caminho andando de maneira grandiosa,

convencida de que havia realizado uma grande façanha.

CAPÍTULO 18

“Eu, você e ele”

Ele disse:

- Por que você vai fazer uma festa na sua casa? perguntei a Gus.

Por que eu não faria? – Disse Gustavo com um ar cínico num tom de

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proteção.

Sei lá, você quer que eu converse com a Bia, você pediu para ela vir falar

comigo? – perguntei, com a esperança de ouvir que não, ele não tinha feito aquilo...

Eu pedi, você não ia! E ela quer conversar!

Você sabe muito bem porque ela aceitou, só vai porque você chamou!

Precisa parar de ser paranóico e idiota o tempo todo! Eu só quero ajudar!

Jura? Você chama isso de ajuda? Eu só tomei na cara desde que nos

tornamos amigos!

Jura?- ele me imitou. Só porque eu impedi que você se fodesse, o mundo ia

cair em cima de você?

Olha, eu não sei se quero isso, se quero falar com ela, não tenho coragem,

não vai dar certo.

Bem se você não avançar, eu avanço!

O que você quer dizer com isso?

Você sabe muito bem, Alex.

Eu tenho meu ritmo, porque todos precisam ficar me acelerando?

Porque você demora, porque ela não vai esperar por você o resto da vida.

Gustavo saiu andando batendo os pés, não com raiva mas força, pensei em

falar alguma coisa mas antes que tivesse a chance de gritar ele subiu as escadas se

distanciando demais.

Senti raiva, mas principalmente mágoa. Sentia que as pessoas me atropelavam, me

violavam por não respeitarem meu jeito, meu tempo para as coisas.

Passei a semana inteira sem conversar com Gustavo, todo nosso contato foi por

´´Orkiunt´´. Ele me mandou um depoimento apenas dizendo: “18:30”, indicando a hora da

festa, e o endereço que eu já conhecia. Ele já havia ficado estranho assim antes, mas nunca

havia sentido o que sinto agora, uma sensação estranha tomava conta de mim, um nervoso

particular, cansado, mas da maneira como foi imposto que eu deveria comparecer à festa

sexta-feira, não poderia aventar a hipótese de não ir.

Cheguei a minha casa, abri o armário, peguei algumas roupas, demorei até achar uma

roupa que me agradasse, vesti-me devagar, fui até o quarto de minha mãe mas não a

encontrei lá, senti um certo aperto no coração regado por saudade, aquela coisa que sentimos

quando sentimos que nunca mais vamos rever uma pessoa, rapidamente tentei ignorar, me

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virei, desci as escadas, agarrei uma maçã, coloquei a mala nas costas, abri a porta e deixei a

casa. Fui caminhando para escola, o vento frio e o clima nublado me davam uma sensação

sufocante, as árvores estalavam ao vento, os galhos secos pareciam muito delicados.

Cheguei inquieto na escola, todos como sempre não percebiam minha presença e quando o

faziam era sempre com olhares críticos. Podia sentir o desprezo nos olhos de todas aquelas

pessoas, quando pisei neste lugar pela primeira vez achei que ia ser legal, mas é tudo preto e

as pessoas me dão nojo.

Gustavo não veio à escola hoje, parecia muito ausente, cada vez mais distante. Ninguém

mexeu comigo, e por mais que eu me concentrasse, nada ao meu redor interferia

positivamente comigo, ouvia coisas no silêncio e questionava-me se era mesmo real. Se

minha existência não passa de puro acaso, imaginação que cria, destrói e recicla o ser

humano.

Tenho medo de olhar no espelho e ver uma criatura deformada, a pele decomposta

escorrendo pela boca, apodrecendo de fora para dentro, e de dentro para fora. Deste espelho

mostrar uma realidade que não conseguirei agüentar, me negarei a todo sempre a acreditar.

CAPÍTULO 19

“Festa”

Gus desceu as escadas, olhou toda a sala e se questionou se poderia organizá-la melhor.

Foi até o centro, empurrou os sofás até os cantos da sala, agarrou a mesa de vidro, levou até

um dos quartos, trouxe uma estante de madeira cerejeira de aproximadamente um metro e

pouco de altura, colocou bebidas alcoólicas no topo, e embaixo, garrafas bonitas e coloridas.

Tirou os tapetes e levou até a porta do depósito, se abaixou, puxou a porta mas ela não abria,

então deu dois chutes nela, e a mesma quebrou, caindo pelas escadas até atingir o fundo

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escuro. Gus jogou os tapetes dentro do buraco e foi até a cozinha, pegou o telefone e discou

o número de uma pizzaria, mas não chegou a realizar seu pedido, pois a linha telefônica

estava falhando, provavelmente por alguma interferência causada pela tempestade que

chegava aos poucos, mas bastante carregada.

Gustavo retornou à sala, agarrou os porta-retratos que havia em cima de uma

escrivaninha, arrastou a porta do terraço e trancou-a. Pegou uma caixa e repousou-a ao lado

do piano, que, vale a pena comentar, tem na parede logo em cima dele, um desenho feito em

um pano de uma mulher nua, com um fundo roxo muito poderoso, com gotas de um amarelo

meio cor de pele que lembram muito o ouro, destacando assim a preciosidade da musa da

foto.

O tempo não estava muito bom. Para falar a verdade, a tempestade de neve que se

aproximava tinha uma aparência devastadora, mas mesmo assim a maioria dos estudantes

sortudos que haviam sido convidados para a festa pegara seu carro, ou carona e subia com

bastante euforia a montanha para chegar na casa de Gustavo.

Beatriz se sentia um tanto quanto desconfortável, e pensava seriamente em não ir à

festa, mas fora fisgada segundos antes de entrar no quarto e desistir de tudo por uma

buzinada alta, era sua carona, e agora já era tarde para que desistisse de tudo.

Bia! Vem logo, a tempestade deve começar e não quero pegar neve!

Você pode dirigir o carro do seu pai? -gritou Beatriz pela janela.

Vem logo, Bia, sério! Não estou para brincadeira, olha para o céu, precisamos nos

apressar!

Ok, ok, já estou descendo.

Ela desceu as escadas da casa, vestia um vestido preto longo, com delicados

tamancos vermelhos, batia levemente os dentes, e fez questão de se apressar quando sentiu

o frio terrível que fazia no exterior da casa, então trancou a porta rapidamente e correu em

direção à enorme caminhonete azul.

Meu, que roupa é essa, você vai morrer de frio!

Não vou, na casa do Gus tem aquecedor.

Como você sabe? Pensei que você nunca tinha ido lá, achei que ninguém da

escola tinha ido lá! O que você andou aprontando?

Nada, foi só um palpite, agora você pode ir andando?

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Ok, ok, não precisa se irritar! Estava apenas brincando com você, querida...

A noite mal havia chegado, mas a coloração do céu se tornara escura, e o vento forte

causava calafrios mesmo em quem estava dentro de casa. Giulia ligou o rádio e começou a

ouvir o noticiário que recomendava que nenhum dos habitantes da cidade deixasse suas

casas, pois a tempestade de neve seria muito forte. Na hora Beatriz demonstrou medo, a

insegurança saltava aos olhos, Giulia olhou para o lado e começou a falar com pouco caso,

olhando ora para Beatriz, ora para a estrada:

- Querida, fica relaxada, devemos chegar em uns dez minutos, e além disso, todo

mundo vai dormir na casa dele!

Tá tentando me acalmar falando que uma multidão de garotos tarados vai dormir na

mesma sala que eu?

O que eu estou dizendo é que nada vai acontecer de ruim, sei que está nervosa, e

entendo que Gustavo esteja agindo estranho com você e com o mundo, mas talvez este seja

o pedido de desculpas dele por andar tão estranho ultimamente.

Gus correu em direção ao portão, o abriu e logo carros lotados de pessoas chegaram,

todos correram para dentro da casa sujando toda a entrada de neve.

Gus, como é frio aqui! - disse Pedro.

Eu tô ligado, eu vou lá dentro colocar a música e tal, você vai mandando quem chegar

entrar?

Vou sim, de boa!

Gus ligou o som no volume máximo, e quando saiu na porta, viu Beatriz descendo do

carro com um casaco cobrindo seu ombro, seus cabelos balançando ao vento. O coração de

Gustavo disparou, e os batimentos se espalhavam por todo seu corpo, o frio dissipou-se no ar,

e uma onda de calor começou a percorrer seu corpo, seus olhos perderam o foco em tudo à

sua volta e suas pupilas se dilataram. Ele sorriu, e ela sorriu de volta, então foi correndo em

sua direção.

Tá fazendo muito frio aqui fora, não sei onde estava com a cabeça quando escolhi me

vestir assim, podemos entrar?

Você está linda, e é claro, venha comigo.

Os dois entraram na casa, e foram direto até o quarto de Gus. Bia foi em direção à

cama, Gus virou lentamente a chave da porta, voltou e sentou-se ao lado dela.

- Queria te dizer que só estou dando essa festa para ter uma desculpa decente de te

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fazer vir até aqui.

Essa foi a coisa mais fofa que um menino já me disse sabia?

Eu gosto muito de você, e queria que tivesse rolado aquele dia.

Podemos fazer rolar.

Você sabe que não posso, não seria justo.

Esqueça o mundo, as pessoas, olhe nos meus olhos e diga que não é isso que você

quer!

Gus aproximou-se de Beatriz, colocou a mão em sua perna, inclinou a cabeça e começou

a beijá-la. Ela passou sua mão sobre o abdômen dele, e a repousou em cima de sua calça, o

beijo foi perdendo seu ar romântico e se tornando quente, urgente. O que de início era recato

se transformara em dois corpos que em questão de alguns segundos se encontravam em

cima da cama se atritando, num amor genuinamente proibido, carregado de muito tesão, as

mãos percorriam os corpos, a mão de Gustavo apertava firmemente a coxa de Beatriz, que

tomava fôlegos, gemia e beijava a boca de Gustavo fortemente, dando pequenas mordidas

em seus lábios, os corpos se esquentavam, já fora de controle.

Isso, vai, eu te amo, me beija!

Você é minha?

Sim, totalmente, inegavelmente sim!

Gus tirou a calça, arrancou a camisa de Beatriz, seus seios tinham pequenas estrias

devido a terem crescido rápido, e serem grandes, mas eram firmes e durinhos, ela se

aproximou de Gustavo e começou a acariciar seu membro peniano que logo se enrijeceu, ela

abaixou sua cueca e começou a masturbá-lo, seus olhos fechavam com força e abriam,

gemidos enrustidos procuravam uma saída por sua boca, espasmos musculares pulavam por

todo seu corpo, sua mão trêmula se aproximava do corpo de Beatriz, deslizava sobre sua

barriga, e subia até a altura de sua mama, então começou a estimular seus mamilos

delicadamente.

- Isso, desse jeito!

- Vo..cê, já, tinha masturbado um garoto antes? -perguntou ofegante

- Não... você é o primeiro!

Gustavo ejaculou, lambuzando toda a mão de Bia.

Os dois se deitaram na cama, respiraram fundo e olharam para o teto por algum

tempo. Observaram a pequena rachadura, ouviram o vento entrando pela fresta da janela, a

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neve acumulando, os pequenos pedaços de granizo ricocheteando no vidro, os dois fecharam

os olhos por um tempo e adormeceram.

Ao abrir os olhos, Beatriz achou que seria mais conveniente se descesse primeiro, a

fim de evitar comentários e fofocas que seriam tecidos pelos convidados se avistassem os

dois descendo as escadas juntos. Gustavo concordou, colocou sua roupa, deu um selinho

nela e sorriu. A garota desceu as escadas, e viu que seu temor era desnecessário já que

todos os convidados dançavam e bebiam loucamente. Não houve nenhuma chance de

alguém notar sua descida, mas mesmo assim seguiu o plano e se dirigiu até o banheiro.

Pedro Carneiro e todos os garotos descolados conversavam e dividiam entre si uma

garrafa de vodka. O comportamento não foi julgado ou mesmo notado pelas garotas que

pareciam maravilhadas pelo reflexo de seus rostos nas garrafas, então Caio se aproximou de

Michelle e os dois foram conversar na sala de televisão.

Nunca falei muito com você na escola, nunca tinha reparado o quão bonita você é!

Não vem com esse papo, sou diferente das outras garotas, só quer me beijar para

segunda-feira me exibir como um troféu na escola.

Não é nada disso, eu juro, você é diferente, desde a primeira vez que vi você senti

isso.

Ai...Que fofo! Juro, um garoto nunca falou essas coisas pra mim!

Tenho um pouco de vergonha, por ser sensível, e sou meio inexperiente nessas

coisas.

Não tem porque se envergonhar, você é lindo e meigo, e acho que quero te beijar.

A ingênua menina começou a beijar Caio mais rápido do que ele esperava,

normalmente ele demorava dez minutos com seu papo furado carregado de ilusões, mas

algumas meninas são fáceis de enganar, e ele espalharia para toda a escola que a beijou

quando o fim de semana chegasse ao fim, mas o destino planejava algo diferente para os dois

que agora se beijavam no sofá azul de três lugares, algo que seria muito mais comentado, e

por muito mais tempo.

Gustavo se levantou, e quando ia deixar o quarto se deparou com algo extremamente

perturbador em seu espelho, sua imagem ia se transformando aos poucos até tomar a forma

de Alex.

Finalmente as coisas se tornavam mais claras.

O que é isso? - Gustavo exclamou perplexo na frente do espelho.

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Sou você.

Não, eu sou popular, você é excluído, eu tenho amigos, você não tem amigos, eu

tenho tudo...

Mas sente que não tem nada, tem medo da cobrança, se acha imperfeito, não tem

amigos, tem companhias interesseiras, não se acha bonito mesmo sendo quase perfeito, viaja

nos pensamentos tão longe, que às vezes esquece-se de voltar, confunde sonho e realidade,

distorce a verdade.

Não!

Sabe que sim, e você sabe o que todas essas pessoas fizeram a você e a mim,

não sabe?

Eu não posso!

Mas é claro que pode! Eles estão te arruinando, me destruíram, olha o mal que me

causaram, olhe o quanto eles me machucaram!

Não podem fazer mal a você, não é real!

Ah, sou sim, sou tão real quanto seus medos, suas angústias e suas ambições,

mova seu braço, também moverei o meu, chore e irei me comover, sinta raiva e irei agir.

É loucura! Estou louco!

Não está, tudo que precisa fazer é solidificar essa loucura, colocar em ações e sua

imaginação vai se tornar real, tudo que precisa é me libertar.

O que pretende?

Retribuir tudo que eles nos fizeram.

Não irei machucar ninguém, nem mencionei tal, mas você sabia do que estava

falando, sabe que isso é o que tem acontecido a você, todos esses machucados precisam

sarar, Gustavo.

Você é um monstro!

NÓS SOMOS UM MONSTRO!

A imagem de Alex refletida no espelho se converteu em uma criatura horrenda, os

olhos se tornaram escuros e profundos, uma gigantesca onda de morbidade tingida de cor

negra começou a transbordar pelos cantos do espelho, manchando o chão de piche, o quarto

se tornara uma gigantesca ilusão, e num passe rápido Gustavo golpeou o espelho com seu

punho, mas ao chocar-se contra o reflexo distorcido seu braço congelou. Logo seu corpo, e

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todo o quarto explodiram em pedaços de vidro, seu corpo paralisado caiu sobre o chão e se

espatifou em pedaços minúsculos de vidro, reluzentes à luz, mais parecendo pó. Aos poucos

a escuridão caiu...

Luzes piscavam no ambiente, corpos se esfregavam, o som contagiante da barulhenta

musica, conduzia o ambiente vulgarmente, mãos de não sei quem no corpo de não sei quem

mais, olhares voando pela sala, sorrisos se rastejando e subindo aos poucos pelo corpo

daqueles que a noite deixavam dominar o corpo, aqueles que de sua libido se esqueceram.

Em especial um casal de duas meninas que se conheciam a algum tempo e agora estavam se

beijando e se pegando na sala, levando o público de seu espetáculo pessoal ao auge.

Havia tamanha naturalidade naquela ação, os lábios se atritando com tanto gosto, as mãos

escorregando pelo corpo, tudo parecia tão real que o fato de ser uma armação para despistar

atenção parecia soterrado agora.

Capitulo 20

“Enxerido”

Felipe ouvira gritos e resolvera checar. Atravessara a sala e fora até o quarto de

Gustavo, forçara a porta e quando esta se abriu ele deparou-se com um enorme silêncio.

Olhou em volta e nada de anormal parecia ter ocorrido, e prestes a deixar o quarto, notou o

espelho quebrado. Caminhou devagar em direção à parede e colocou delicadamente seu

dedo indicador sobre o espelho quebrado, então uma lasca caiu no chão, e quando se

abaixou para pegar viu um vulto. Virou-se rapidamente e deu um pulo quando foi acertado no

lado direito de seu rosto com uma ferramenta que segundos mais tarde se mostrou ser um

martelo. Seu rosto foi banhado por sangue, caiu deitado no chão. Antes do sangue entrar no

olho que lhe restara viu a imagem de Gustavo segurando o martelo. Não conseguiu falar, mas

seu batimento cardíaco acelerado ecoava por todo o quarto, assim como o som irritante e

constante que foi cessando, contínuas marretadas contra o crânio de Felipe, que se converteu

numa gosma avermelhada, o sangue escorrendo pelas paredes enchia a ‘’personalidade

Alex’’, de orgulho. O que acabara de fazer? Na sua maneira de interpretar os fatos, não era

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um crime, uma maldade, muito menos uma vingança, era sim um acerto de contas. Ele tinha

certeza de que estava coberto de razão, que a pessoa ensangüentada e morta no chão do

quarto merecia aquilo mais do que tudo.

Depois de contemplar o corpo estirado no chão escuro, Gustavo se virou e começou a

pensar: “Qual seria o próximo passo?” Calmamente tomou a pior decisão que poderia em toda

sua existência miserável.

Capitulo 21

“Onde Gustavo foi?”

Viu o Gustavo?

Não, por quê?

Não consigo falar com ele, desde que...

Desde o que?

Podemos falar disso num local mais reservado?

Ok.

Giulia e Bia se dirigiram até o quarto de hóspedes que se localizava próximo à sala.

Fecharam a porta do corredor, andaram um pouco e novamente fecharam uma porta, agora a

do quarto.

Não me julga?

Não, o que foi?

Eu beijei o Gustavo e...

E?

E masturbei ele.

Tá falando sério?

Sim, você sabe como eu gosto dele, queria ter esperado, mas na hora não pensei em

mais nada, não estava com nada na cabeça!

Não pensou no garoto que está namorando também?

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Não estamos namorando!

Olha, eu sou a primeira a desaprovar o Marcelo, mas quando descobrirem que você

ficou com o Gus enquanto estava com o Marcelo, você vai ficar com uma puta fama de

galinha, sério.

O que eu faço?

Eu não sei, você pode terminar com o Marcelo e dizer que ficou com o Gus depois de

terminarem.

Você só esqueceu de um detalhe.

Qual?

O Marcelo não está aqui na festa! Está uma tempestade enorme lá fora, meu telefone

não pega, e ele não atende! Você acha que sou idiota, eu já tinha pensado nisso!

Não, não pensou, você claramente não pensou em nada, nunca pensa!

O que você quer dizer com isso?

Quero dizer que não é a primeira vez.

Do que você está falando?

Eu vi você beijando o Gustavo na “Rock Teen”

Naquela época eu ainda nem estava ficando com o Felipe!

Olha, a quem você está tentando enganar? Você me chamou, e como amiga estou te

dando esse conselho, toma mais cuidado com o que faz e com quem fica, porque todo mundo

sempre vai ficar sabendo, se você quiser ficar puta, ou vier com aquele discurso que sou

conservadora pode vir, mas quando todo mundo ficar falando merda de você não venha dizer

que não avisei.

Giulia abriu a porta e saiu, fechando a porta. Beatriz se virou, sentou, se deitou de

lado, agarrou com firmeza e ternura o cobertor e pôs-se a chorar.

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CAPÍTULO 22

“Queda”

Gustavo desceu as escadas, agarrou uma garrafa de vodca, abriu o lacre e a virou de

lado, deixando que inundasse toda a mesa e a bancada. As bebidas ficaram cobertas pela

vodca, mas ninguém notou tal movimentação devido às luzes estarem baixas, uma verdadeira

orgia tomar conta do ambiente e o som, ensurdecedor. Gustavo fez então uma trilha com a

bebida até a cozinha e terminou na frente do gerador; abriu a porta do gerador, deu alguns

passos para trás contemplou a cena e riu por dentro, imaginou o que aconteceria e

comemorou sua tão esperada vingança.

Lançou a garrafa contra o gerador, que explodiu soltando faíscas que caíram na trilha

do álcool.

O gigantesco barulho e a falta súbita de energia fez todos olharem para a cozinha,

então desenhos com fogo foram se formando pelo chão, belos desenhos de fogo espalhavam-

se pelo chão, parecia tratar-se de um show de pirotecnia ou algo do gênero. O fogo foi

conduzido até a mesa de bebidas, que explodiu. Todas as pessoas que haviam se inclinado

para ver mais de perto tiveram a cara perfurada por cacos de vidro e aqueles que estavam em

pé tiveram suas roupas em chamas (e da cintura aos joelhos cacos afiados alojados

profundamente). A sala agora era o inferno real, labaredas subindo pelas cortinas, derretendo

tudo à sua volta, móveis, objetos, pessoas. Estas gritavam e se debatiam, na tentativa de se

livrarem do fogo, e seus movimentos promoviam mais chamas, mais cores.

Em meio à agonia da dor e do cheiro de carne queimada, dos corpos carbonizados,

dos olhares estarrecidos, olhares inconformados, da beleza se dissolvendo e da visão de

destruição que se apresentava, uma risada doente ecoava pelo ambiente, num olhar

deslumbrado, alheio, doente. Gus estava parado na porta, assistindo ao brutal e sangrento

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espetáculo que promovera.

Corpos se debatiam no chão, o fogo subia as paredes criando uma imagem

semelhante a de um portão, o inferno se estabelecera, as almas penadas sofriam portão

adentro com as labaredas fumegantes. Pedaços de pano em chamas se descolavam das

roupas que ardiam em chamas, gritos, respirações animalescas e choro generalizado.

Aqueles nos quais restara consciência, mesmo que estirados no chão totalmente

mutilados, puderam ouvir uma risada estridente ecoar grave e maléfica no ar, logo das

chamas saiu o garoto de olhos azuis e pele delicada com o rosto negro pelas cinzas e um

sorriso sádico. Ele andou na direção de Pedro e ficou lá, observando-o enquanto agonizava e

pedia em vão ajuda chorando, secas lágrimas.

- Todas as humilhações, os machucados, os olhares. Tanto foram seus, agora olha

pra você. Não da dó. Me enoja, no fim você é mesmo um franguinho, chorão. É

assim que costumava me chamar né?

Gustavo então ainda com ódio na ponta da língua destilou todo seu veneno no rosto

parcialmente carbonizado do jovem. Em seguida pisou com força em seu rosto esmagando o

crânio de Pedro aos poucos, massa cinzenta e borbulhante escorrendo pelas orelhas.

Gritos ecoavam pelo lugar, o cheiro de carne se misturava ao álcool que era conduzido por

toda a casa pela fumaça.

Beatriz estava ainda absorta em seus pensamentos fechada naquele quarto quando

tudo aconteceu. Foi quando ouviu gritos, e saiu de onde estava com cautela. Sua intuição

dizia para não se deixar ser vista. A visão que teve ao chegar ao final do corredor paralisou-a:

Gustavo, de costas para ela, sorria, olhando de um lado para outro, ora freneticamente, ora

focando-se em alguém. A sala estava em chamas, as pessoas se debatiam, a fumaça

começara a tomar conta de tudo, e o cheiro começou a lhe deixar enjoada. O medo que sentiu

, o cheiro, a visão das pessoas, a lembrança do que havia feito com Gustavo no quarto lhe

veio à tona: ela estava alucinando, não era real, não poderia ser real. Gustavo com ela, seu

beijo, seus desejos, aquele momento, não... Gustavo não era assim, ela não poderia ser

enganada tanto assim...

O medo a trouxe para a realidade; se Gustavo a visse, o que poderia acontecer com

ela? Em pânico, mas devagar, entrou no banheiro que havia no corredor. Pegou trêmula seu

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celular, e discou:

Marcelo! murmurou, aterrorizada de medo que Gus a ouvisse.

Oi?

Por favor! Me ajuda!

O que houve?

A casa do Gustavo tá pegando fogo!- não havia tempo de explicar tudo.

Sai da casa!

Não dá, estou com medo de abrir a porta e não dá, por favor, você precisa me ajudar,

não quero morrer!

Bia, pelo amor de deus Bia, fica calma, eu estou indo te ajudar, se mantenha longe da

fumaça e do fogo, eu já estou chegando!

Marcelo saiu correndo, pegou a chave do carro de seu pai em cima da mesa, abriu o

portão da garagem, com seu nervosismo abriu o portão pela metade e saiu na tempestade em

disparada, destruindo a porta e acordando seus pais, que chamaram a policia, pensando se

tratar de um roubo.

Subindo a montanha, a visibilidade era muito fraca. Marcelo pegou seu telefone e discou o

número de Beatriz, mas o celular escapou de sua mão e caiu no chão do carro. Sem pensar,

abaixou-se para pegá-lo, mas perdeu o controle da direção. O carro derrapou, Marcelo freou,

e o carro girou, girou, até sair da estrada, capotar três vezes e bater numa árvore.

...

Beatriz, após ligar para Marcelo, volta devagar para o quarto onde estava. A fumaça

tinha tomado conta da casa, e não foi difícil chegar ao quarto sem ser vista por Gus. Entrou e

se enrolou em si mesma no sofá, em choque. Perdeu a noção do tempo, até que...

Beatriz me deixa entrar! - Gustavo gritou eufórico.

O pânico tomou conta dela. Mas era uma questão de sobrevivência não demonstrar a ele que

sabia o que tinha feito, e que não tinha medo. Precisava fingir que estava a seu lado, que o

amava.

Estou abrindo, calma!

Gustavo entrou no quarto trancou a porta e abraçou firmemente Beatriz.

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Page 54: Excluido Pronto

Tá tudo bem, tá tudo bem, eles não vão mais machucar ninguém!

Sobre o que diabos você está falando?

Eu os silenciei.

O que? O que quer dizer?

Que nunca mais seremos interrompidos ou mesmo julgados.

Meu Deus, você fez isso!?

Mantenha a calma. Fiz isso por nós.

Não! Não!- lembrou-se de Giulia. A Giulia, não!

Ela não era sua amiga de verdade, mas eu posso ser, podemos ficar juntos, para

sempre, seremos inseparáveis.

Gustavo aproximou-se, e Beatriz pôde ler suas intenções em seus olhos... Ele queria mais,

queria terminar o que haviam começado no quarto dele momentos antes de tudo...

Fica longe de mim, seu doente filho da puta!

Beatriz se virou para fugir, mas Gustavo puxou seus cabelos, então ela se virou e

encravou suas unhas em seu rosto. Ele a jogou no canto do quarto, ela agarrou uma caneta e

encravou a mesma em seu peito, ele caiu desmaiado no chão.

O carro da polícia passava pela estrada à procura do carro denunciado, quando os

policiais perceberam no meio fio, um esportivo esmagado contra uma árvore. A policial que

dirigia desceu do carro, e armada com uma pistola, foi chegando perto do carro. Logo viu que

se tratava de uma vítima em estado grave, conseguiu desemperrar a porta junto com seu

parceiro e retirou-o do carro. A vítima tinha o rosto coberto de sangue, mas sua palidez era

visível mesmo assim. Tentando falar, mas sem conseguir, Marcelo, em sua última

demonstração de força, aponta para o topo da colina, e com certo esforço a policial conseguiu

ver o que parecia um foco de incêndio, não com muita certeza, pois um palmo à frente de seu

nariz poderia descartar qualquer detalhe importante da imagem.

O frio era terrivelmente cruel, a ponta de seus dedos começava a doer. A policial fitou o

rosto do jovem e retornou à viatura.

CAPÍTULO 23

“Entre quatro paredes”

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Page 55: Excluido Pronto

Se o clima de tensão dentro do quarto congelava Bia, a fumaça preta que entrava por

debaixo da porta despertava um sentimento muito forte, que levantava seus braços,

aumentava sua voz, inquietava seu corpo por inteiro, seu instinto de sobrevivência alcançava

um patamar animal, socos se tornavam patadas contra uma porta de acesso ao jardim.

Desesperada e tomada por uma súbita lombalgia e dor de cabeça, viu erguer-se,

ensangüentado, Gustavo. Bia saiu em disparada e quebrando a janela, gritando e chorando,

agarrou-se aos pequenos tijolos e começou a escalar a parede rumo ao topo da mansão. O

frio era grande mas a adrenalina parecia fazê-la não senti-lo. Beatriz lutava com todas as suas

forças para agarrar-se àquela parede, o vestido limitando seus movimentos, a estufa lá

embaixo. Gustavo vinha em sua cola, ensangüentado, alucinado. Ela sabia que sua loucura o

faria ter forças além das normais, por isso concentrava-se em cada movimento, cada apoio de

suas mãos e pés, que a essa altura, estavam esfolados, em carne viva.

Conseguiu escalar toda a parede e chegar ao topo da casa, que estava coberto por

uma poça de água negra, que se formara devido ao fogo que derretera toda a neve. Com

muitas dores nas mãos e nos pés, rastejou até o outro canto do telhado, se levantou tremendo

de frio, e logo viu a mão de Gustavo no parapeito da parede. Pensou em correr para derrubá-

lo, mas lhe custaria um tempo até retornar ao lado do telhado por onde ele subia.

Gustavo deu alguns passos lentamente, parou no meio do telhado e disse:

Todos os dias que eu botava meus pés naquela escola, todos os olhares vinham em

minha direção, todos estavam lá para me julgar, para me criticar!

Você não entende, não estavam lá te julgando, você era uma pessoa que os outros

tinham como exemplo, espelhavam-se em você! - retrucou Beatriz

Nunca se espelharam em mim, julgavam minha roupa, se era de marca eu era um

exibido, se não era, era porque eu era pobre. Se estava fazendo a coisa certa era certinho. Se

estava fazendo a coisa errada, era mal.

Você está delirando, meu Deus! Nós vamos morrer aqui em cima! Precisamos achar

uma maneira de descer daqui!

Não precisamos, esse é o nosso destino, você nunca me deu bola, agora estamos

juntos!

Você está louco, eu sempre fui atrás de você, Gustavo.

Meu nome não é Gustavo, meu nome é Alex! E eu é que sempre estive te procurando!

Você está louco, você não é Alex, seu nome é Gustavo, está doente, precisa de ajuda,

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olhe o que fez lá embaixo!

Gustavo olhou pensativo para Beatriz que chorava de maneira compulsiva, deu alguns

passos para frente, estes foram respondidos por dois passos para trás de Beatriz.

Se você é mesmo Alex, me diga uma coisa, onde está sua mãe? E seu pai?

Eu não sei!

E a mãe do Gustavo?

Viajando!

O pai dele?

Viajando!

Como entrou nessa casa?

Eu tenho uma das chaves!

Está uma tempestade gigantesca lá fora, são dezessete quilômetros da cidade até

aqui, se sua mãe está viajando, como você chegou aqui!

Eu não sei, eu não sei...

Naquele momento os olhos de Gustavo se encheram de lágrimas, a dúvida de quem

era o estrangulava, então ele se aproximou de Beatriz, olhou nos seus olhos e viu neles seu

reflexo, escurecido, viu que a imagem refletida não era de Alex, e sim de Gustavo, porém sua

lucidez se esgotara há tempos, então correu desnorteado pelo teto:

Gustavo! Onde você está? Gustavo! Gustavo!

Frio, o fogo queimando toda a estrutura da casa, a cena era dramática. Alex procurava

por Gustavo, tudo girava a seu redor. De repente, o garoto cessou de procurar a si mesmo,

parou no centro da laje, olhou para a menina fragilizada e trêmula:

Onde você colocou o Gustavo? Onde ele está!?

O tom da voz ia engrossando e aumentando, o rosto franzia, até que o nervoso subiu

por suas cordas vocais:

Onde ele está?Você o matou, o matou! Sua vadia!

Gustavo abriu sua boca, soltou um grito enorme, levantou sua mão, e o chão

desmoronou sobre seus pés. Em queda livre com todo o concreto à sua volta, naquele

momento tudo ficou em câmera lenta, podia ver a madeira, o concreto, as labaredas de fogo

voando à sua volta. Em flashes, em frações de consciência, pensou:

Se me sobrasse mais tempo teria sido diferente, se não houvesse preconceito teria

sido diferente, talvez a culpa seja minha, a aversão de lidar com a realidade criou um

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universo complexo em volta de mim, criou imagens, gerou sentimentos, alterou fatos, se

pudesse voltar atrás nunca teria aberto mão de minha lucidez, nunca teria abandonado

aqueles que amo, me revoltado com a realidade, poderia culpar o mundo e os maus tratos

por minhas decisões difíceis, se pudesse voltar atrás, se pudesse refazer a história, nunca

teria a alterado, se pudesse voltar no tempo, nunca teria perdido a noção das horas, se

tivesse apenas imaginado não seria vítima de minhas próprias armadilhas, não estaria

solitário, caindo em queda livre, esperando o fim.

Se pudesse congelar o tempo, em vez de apenas remediar o que vem por aí, não

haveria consequências, os meus atos seriam experimentações, não haveria remorso, não

haveria medo, consequentemente não haveria uma válvula para me impulsionar ao

desconhecido, não haveria pálpebras para me proteger, o vento frio não me causaria danos, a

monotonia lutaria constantemente com o amor, e dessa luta nasceria a insegurança, e da

insegurança nasceriam medos, que levariam a ações, cheias de consequências,

consequências me fariam pensar que tudo poderia ser diferente, mas após acontecer, iria

querer que me sobrasse mais tempo, que tudo fosse diferente...

Então ele fechou os olhos esperando que os vários metros de queda livre o deixassem

desacordado, mas foi empalado por um pedaço de madeira, repousando bruscamente e ainda

acordado no fogo. Ele gritou, seus olhos arderam como nunca, logo cessou de gritar pois não

conseguia mais respirar, podia sentir a pele grudando no chão, as bolhas que se formavam

em suas pernas estourarem, a visão escurecer, uma terrível dor de cabeça, e o inédito

sentimento que vem logo após o esgotamento. Era a morte. Podia sentir seu corpo morrendo,

da ponta dos pés até seu umbigo que repousavam totalmente no chão, em chamas, negros, e

seu rosto e peito, levemente levantados aos poucos, mas com brutalidade fugindo pelos

cantos, então após algum tempo de luta deixou que a morte lhe tirasse a única porcentagem

do que lhe sobrara. Sua dignidade.

...

No que restara do teto, Beatriz se equilibrava e tomava uma decisão difícil; se jogar à

sorte de olhos abertos, ou cair de olhos fechados dentro do inferno, então se desequilibrou e

caiu para fora da casa, num tempo suficiente para respirar fundo e fechar os olhos,

atravessando a estufa de vidro. Seus braços, pernas, peito e coxas foram perfurados, a pele

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levemente rasgada. Beatriz caiu justamente em cima de várias rosas, ainda cheias de

espinhos. Por uma obra do acaso, ou ironia do destino, tudo que restara era seu rosto intacto.

CAPÍTULO 24

“Beatriz”

Seus olhos se abriram lentamente. A neve caía devagar, menos densa, a tempestade

parecia ter ido embora. Seu corpo parecia adormecido. Ali mesmo, sem perceber a garota

pensava:

Por que a automutilação parece tão absurda para quem a assiste, mas tão plausível

para quem a executa? Por que certo nunca pode estar errado, se errado significa sempre

estar certo, porque existiria bem e mal em uma ação onde se equilibram elementos? Por que

a tristeza bate mais forte que a dor, que me lembra de que sem dor o destino que se aproxima

será a morte?

Beatriz não se sentia tão bem desde que era uma garotinha pequena e sem

preconceitos. Não precisava sorrir para saber se estava feliz, mesmo o frio não era capaz

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de atormentá-la naquele momento, o delicioso som de madeira estalando no fogo nunca

soara tão bem, e por mais que o cheiro no local fosse forte, a ventania haveria de dissipá-

lo. Toda aquela calma era preciosa, todos aqueles momentos de tensão tinham acabado,

assim como a paisagem, restando apenas no céu uma estrela, que aos poucos foi se

aproximando, perdendo sua cor, até tudo ficar escuro. As inquietações logo acabaram.

Tudo que sobrara era uma linda garota silenciada, mas sorridente, e embaixo de alguns

escombros, dentro da casa, um diário, que não havia sido escrito por Alex, ou Gustavo, por

uma pessoa ou outra, havia sido escrito pela obsessão que habitava naquelas duas

personalidades. O amor.

PARTE 2

14 de novembro de 2010

A velocidade com que o vento esculpia a fragilidade nas frestas de meus lábios

rachados engrandecia mais ainda minha inquietude. Em meus braços se encontrava um

jovem moribundo, as roupas de grife em seu corpo não foram capazes de disfarçar seu

estado. Ensangüentado, reuniu todas suas forças para erguer seu braço apontando para o

alto de uma montanha. Sem cautela alguma, dirigi meu olhar cansado e angustiado ao que

parecia um incêndio.

Convoquei minha equipe com gestos e gritos para que me ajudassem a retirar o garoto

dos escombros, assim poderia prosseguir ao holocausto de fogo que explodia no topo da

montanha. Esforços não foram poupados para a retirada rápida do jovem dos escombros,

que agora se encontrava inconsciente, provavelmente morto, mas minhas constatações neste

momento de nada serviriam a não ser atrasar a minha equipe que agora não tinha nem um

minuto a perder.

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Quando cheguei ao local, a tempestade começava a cessar. Era um grande

amontoado de paredes carbonizadas e corpos queimados. O que havia realmente acontecido

ali? Parecia não haver explicação plausível. Senti uma náusea tremenda com aquele cheiro

de queimado e podre. Caminhei pela casa, ou o que sobrara dela. Toda a estrutura havia

ruído, os únicos corpos que encontrei foram os da entrada. Demorei-me cerca de uma hora

analisando o local, e ao ser informada pela equipe de bombeiros de que uma garota havia

sido achada do lado de fora da casa e levada junto com paramédicos para o hospital,

suspeitei friamente de que a garota não teria chances de sobreviver.

Mesmo em meio a tanta destruição, a parte da copa e da cozinha estavam em melhor

estado do que o resto da casa. Por possuírem pisos “frios”, o fogo não tinha conseguido

destruí-las completamente. Mesmo assim, o quarto que ficava em cima da área da cozinha

desabara, e os escombros e entulho eram o que se podia ver. Pensei em vasculhar o lugar,

mas a fumaça era densa agora, resultado do contato do frio ao calor extremos. Desisti. Fui lá

pedir para a equipe de resgate fazer a remoção do material com cuidado. Assim, dei meia

volta, mas do lugar onde estava tinha que pisar sobre madeiras quebradas e pedaços de

parede, e numa pisada em falso escorreguei. O chão estava molhado, e caí machucando meu

braço. Por ironia do destino ou coincidência, fiquei ali por uns instantes, a dor em meu braço

pedindo calma. A equipe estava toda do outro lado, mais especificamente na sala, e eu não

queria gritar. Podia me virar sozinha. Apoiei a outra mão numa outra madeira, e ela

escorregou, e um livro de capa de couro apareceu. Em dourado, o único título que se

visualizava era: “Diário”. Levantei-me e peguei-o. Estava molhado, mas intacto. Guardei-o

junto ao meu corpo, logo entreguei na mão de um policial e solicitei que arquivasse o achado

na delegacia, como prova. Não imaginava o quanto ele era importante.

23 de abril de 2003

Foi em um caso de simonia (que terminara muito mal) que minha carreira como policial

explodiu como uma bomba, e meu nome e distintivo se tornaram assunto de destaque na

cidade.

...

Numa mão empunhava uma faca, na outra, segurava pela gola da camisa pólo azul

clara um menino de cabelos castanhos, pele levemente bronzeada, sardas nas bochechas,

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um metro e cinqüenta e nove de altura, e muito medo nos olhos.

...

Andréia se muda para minha casa.

...

Gritos abafados e gestos nervosos, em meio ao choro e comoção popular daqueles

que assistiam de pé a cena que ocorria ali, criavam um clima de tensão, no qual apenas

minha pessoa não havia sido contaminada. Com a arma empunhada na direção do tirano,

sem nenhuma hesitação, puxei o gatilho. A bala viajou em câmera lenta, posso jurar que a vi

percorrendo todo seu caminho orgulhosa e focada em acertar o homem impiedoso. Pois bem,

alojou-se na cabeça do padre, que largou o garoto e em seguida caiu como uma pedra no

chã. O menino de joelhos tentava se situar enquanto chorava e gaguejava freneticamente.

Andei devagar em direção aos dois, comecei a voltear o corpo do padre, em seguida levantei

o pobre garotinho do chão. Uma salva de palmas tomou conta do ambiente. Da multidão saiu

uma mulher desesperada, murmurando frases que me pareciam rezas venerando a Deus por

salvar seu filho. Ela agarrou o menino e os dois saíram abraçados do lugar. Não olhou para

trás, não parou.Fiquei parada pensativa, logo o som de um carro da patrulha denunciou que o

disparo de minha arma havia chamado muita atenção.

Na delegacia, o chefe de policia, Clark, me encarou nos olhos, e sem dizer nada fez

um gesto para que eu fosse até sua sala:

- Sente, por favor - disse o ex coronel.

- Obrigada - respondi com a voz baixa e trêmula.

- Veja, fui informado do caso na igreja, será questão de tempo, e tudo será arquivado,

sabe, tem muita burocracia envolvida quando o buraco é na pessoa - disse sorridente.

- Matei um homem, sei que isso é comum nesta profissão, mas me sinto como se o

mundo inteiro estivesse girando.

- Não me assusta, é completamente normal que se sinta assim. Coloque apenas na sua

cabeça o fato de que matou um assassino com antecedentes de pedofilia e agressão sexual,

que ficou impune até hoje, pois era um ‘’servo de Deus.’’

- Entendo.

- Vamos aguardar os trâmites da justiça, e receba minhas congratulações pelo ato de

bravura. Estarei atento aos procedimentos e você poderá contar comigo para o que precisar –

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disse Clark, num tom mais tranqüilo. Veja, tenho mais um assunto a tratar com você, e temo

não ser a hora certa para fazê-lo, mas vou aproveitar a oportunidade de você estar aqui. Há

uma promoção para você. Tenho observado seu desempenho e sua conduta e acredito ser

uma promoção merecida realmente. Quero que pense na proposta. Tire dois dias de folga,

aproveite seus quinze minutos de fama, e na segunda-feira venha até a minha sala para que

reconversemos.

Contive minha satisfação, saí da sala, caminhei rapidamente pelo saguão, peguei as

chaves de meu carro recém comprado e deixei o lugar. O cheiro de carro novo me fez

esquecer de toda a situação que acontecera e dirigi tentando esquecer de tudo à minha volta.

Cheguei em meu prédio, estacionei o carro muito mal, enfiei a chave na fechadura com

violência, abri a porta, fechei-a com o pé e cai na cama com vontade de dormir por semanas.

26 de agosto de 2004

Minha complicada relação com Andréia chegava a um nível de impaciência gigantesca.

Começamos como primas, passamos a melhores amigas. Ela morava no Rio de Janeiro, e

tínhamos perdido contato por cinco anos, quando numa tarde ela e a família sofreram um

assalto num farol. O pai acelerou o carro, vários disparos foram feitos contra o carro, e seu

pai, mãe e irmão foram baleados. O irmão resistiu bravamente por alguns dias no hospital,

mas veio logo a falecer. O pai e a mãe faleceram na hora com os tiros. Ainda com dezessete

anos, a menina precisava de um maior responsável, e aqui entro nessa história toda. Sem a

menor idéia do que era cuidar de uma jovem.

A convivência foi se mostrando complicada: Andréia era desleixada, desorganizada.

Passou a usar drogas e a beber, e seu estilo de vida estava afetando completamente o meu,

“a careta do pedaço”, como ela me chamava. E me sentia culpada, como poderia brigar com

uma menina que havia passado por tanta coisa? Mas a situação não podia continuar!

Não posso conviver com isso, a maneira como você vive, não consigo! - disse a ela

com raiva nos olhos, e um misto de culpa, por gritar com uma garota que passou por tanta

coisa.

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- Se você não era capaz de me assumir por que me adotou?

- Você sabe muito bem que te recebi de braços abertos depois do que aconteceu, fui eu

quem lutei para que você não fosse para qualquer lar adotivo.

- Não sabe como eu me sinto..

- Eu sei o quanto é difícil para você, sei o quanto tenho evitado tocar neste assunto, na

verdade nunca toquei nesse assunto desde que você botou os pés na minha casa.

- O que você quer, que eu suma da sua vida, como meus pais sumiram da minha?

- Quero estabelecer regras para que nossa convivência nesta casa não se torne um

verdadeiro inferno.

No momento em que finalizei minha frase meu celular tocou, me obrigando a deixar a

conversa inacabada. Às vezes, não há o que pensar, o que fazer, às vezes o mundo chove

vidro em cima de nossas cabeças, e na tentativa de proteger nossos rostos deixamos nossos

pulsos descobertos, nossas mãos nuas, e o sangue escorre, todos os traços que marcavam

quem éramos são picotados por algo sem sentimento, que atua influenciando cada um de

nossos sentimentos, o destino.

29 de outubro de 2004

Vivo em uma cidade pacata de trinta mil habitantes, meu cargo na polícia não inclui

perseguições em alta velocidade, e o único tiro que disparei foi no reverendo Marlow. Sou a

imagem da ordem, sou o distintivo, e toda minha obrigação, em suma, resume-se a manter a

ordem. Identificar e eliminar qualquer rastro de caos. Em uma cidade onde todos se

conhecem e superficialmente coexistem pacificamente, nunca poderia imaginar que o inferno

cairia sobre minha cabeça, que precisaria me esquivar para não sem empalada pelos troncos

afiados, em chamas, que despencariam do céu invertendo toda a ordem e colocando o inferno

em cima de mim.

Com tanta uniformidade, o cabresto em minha face se grudou na pele, tornando-me

uma pessoa pragmática, automatizada. Duas qualidades excepcionais para alguém como eu,

alguém que não precisa sentir, mas sim agir da forma mais matemática que exista, mantendo

a calma onde tudo se tornou o oposto dela. Em contrapartida, privou-me do sentimento de

dúvida, da curiosidade de indagar em alto e bom som em minha cabeça: “E se?”

Fiz grande esforço para que algo de original se mantivesse em mim, fiz grande esforço

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para que minha perspicácia se propagasse em minhas ações cotidianas, fiz de tudo para que

a conformidade não passasse batida, não fosse apenas parte de meu dia a dia, e falhei, falhei

em todos esses quesitos, e isso pode ter me custado muito mais que a criatividade.

30 de outubro de 2004

Hoje foi um dia puxado, exaustivo. Atravessei a sala e o corpo de Andréia estatelado

fedendo a vodca no chão. Arranquei a roupa do corpo, dei diversas voltas com a chave na

porta para garantir que ninguém adentrasse em minha solitária e pequena privacidade.

Chequei repetidas vezes se a porta estava trancada, senti um aperto no coração,

aparentemente sem motivo, me senti culpada, tantas pessoas sofrendo, e eu aqui, perfeita,

saudável me jogando no fogo cruzado, ajudando os outros para alimentar meu egoísmo, com

meu sujo sentimento de orgulho, tentando através da falsa humildade catar do chão pequenos

fragmentos de minha mutilada auto-estima, que pareciam cada vez mais escorrer pelo ralo.

Deitei na cama e pus-me a pensar na cor do teto, pensando em algo simples para não

pensar em nada. Mal sabia que o branco do teto me lembraria da bandeira branca, aquela

que significava redenção, vitória do adversário no campo de batalha. Fiquei gesticulando com

a boca como seria minha vitória contra um adversário, o que poderia dizer, aos poucos os

movimentos se suavizaram, o branco foi escurecendo, meus olhos involuntariamente

fechando e me entreguei a um sono pesado e necessitado por minha pessoa fazia muito

tempo, e muitos turnos.

14 de novembro de 2007

Levantei-me tomada por uma dor de cabeça insuportável. Fui em direção à pia do

banheiro, peguei um frasco de Vicodin e coloquei algumas pílulas na boca, engolindo-as sem

água. Abri a porta da geladeira, agarrei um pedaço de pão duro e velho, passei um pouco de

pasta de amendoim e deixei o apartamento propositalmente de maneira barulhenta para que

Andréia acordasse e arrumasse a bagunça que havia feito na noite anterior.

Nunca nenhum oficial havia ficado tão longe das ruas, e tão perto da burocracia como

eu. Passava os meus dias arrumando papéis e dando ordens secundárias a policiais

incompetentes, que não conseguiam mover um dedo sem que isso fosse ordenado. A raiva de

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como tudo acontecia, de maneira tão pacata não alimentava meu espírito aventureiro, e se

tornaria arrependimento por um dia ter desejado que os eventos que viriam à tona fossem

minha realidade. O dia pesado se arrastou, as horas teimavam em acabar, mantive o foco de

que logo estaria em casa, coloquei a cabeça na mesa e dormi.

Quando acordei estava escuro, tinha ‘’feito meu trabalho’’, estava livre.

Ao chegar ao apartamento, tudo estava limpo e arrumado. Sorri para Andréia como

uma forma de dizer obrigado sem falar nada, em seguida ela serviu o jantar, comemos e

conversamos sobre assuntos variados, me recolhi, deitei na cama e implorei que desta vez

não tivesse outro pesadelo.

...

Estou correndo por uma floresta, tem algo atrás de mim, mas tenho medo de me virar

para checar o que pode ser... Corro com muita velocidade até que atravesso uma porta, estou

em um ginásio escolar, muitas pessoas estão me rodeando, rindo e apontando, tem algo a ver

com meu sobrepeso, tenho doze anos de novo, ainda sou bem gorda, todos estão rindo da

minha cara, como posso ter doze anos, me lembro de toda minha vida, o que ...

17 de novembro de 2007

Acordei suando, assustada. Logo me senti aliviada, tudo fora um pesadelo. Mesmo

com todos meus receios, sabia que estava segura naquela cama, virei-me para o lado e

continuei dormindo, dormi por muitas horas, sem me preocupar com o relógio, apenas

curtindo aquele momento de paz.

15 de novembro de 2010

- Olívia, a garota está em coma, não temos como falar com ela por enquanto, mas logo

pela manhã todos vão saber, vão chover perguntas. (Clark exclamou com preocupação.)

- O que você sugere?

- Sugiro que você e sua equipe, que estavam no local, me expliquem o que diabos

aconteceu naquela casa!

- Quando chegamos tudo havia acontecido, pegamos a história pela cauda, nem eu nem

ninguém pode explicar ao certo o que aconteceu.

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- O que eu vou dizer a todas as emissoras de televisão, ou melhor, o que você vai dizer?

Esse departamento é seu, essa responsabilidade é sua.

- Quando me promoveu não disse que jogaria o departamento de homicídios em minha

mão.

- Ah, então isso é um homicídio? Você fez um ótimo progresso para alguém que não

tinha capacidade de me responder o que aconteceu dentro da casa. Mas me explique, por

que suspeita de um homicídio? - Clark perguntou agora tomado por um sentimento de

curiosidade, mas carregado de deboche e descrença.

- Porque as portas estavam trancadas, e parecia haver uma área mais afetada, o

gerador do local parecia propositalmente destruído. Não fiquei muito tempo no local, mas

tempo o suficiente para saber que isso não tem lá muita cara de acidente.

Deixei a sala enfurecida batendo o pé, tomei um caminho alternativo até os fundos da

delegacia, tentando assim evitar que fosse abordada por qualquer pessoa. Ainda enfurecida,

abri a porta com uma porrada, corri em direção a meu carro e entrei. Fiquei pensativa e decidi

que abriria uma investigação, aquele incidente não era um simples acidente, e sua resolução

me tomaria um tempo gigantesco.

16 de novembro de 2010

- Estou convencida de que alguém iniciou o incêndio naquela casa, e quero saber se foi

sem querer, ou por querer. Quero conversar com os alunos desta escola, algum deles vai abrir

o bico sobre o que diabos aconteceu.

- Acho difícil chegar a muitas conclusões da noite para o dia, e ainda exigir de mim uma

mobilização gigantesca, movida por um palpite.

- Bem, se me permite, não é apenas um palpite, eu pensei bastante nisso, e não estou

dizendo que seja um caso de homicídio ainda, mas considero seriamente essa hipótese

levando em conta vários fatores constatados no local do crime. Tenho o relatório da perícia, é

bastante incriminador, deveria folhear quando tivesse um tempo - disse de maneira cínica,

nervosa e debochada ao homem que se mantinha calado.

- A imprensa local já havia se mobilizado para cobrir cada passo que a polícia desse,

dificultando mais ainda meu trabalho e colocando todos em um estado de estresse

desgastante. Eu e Clark fomos até a escola dos alunos envolvidos no incêndio, nenhum

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grande avanço ocorreu, o mesmo papo furado de ‘’ A casa era do Gus!’’ ‘’Ele era muito

popular e lindo coitado.’’ Até que um garota de aparência pálida em sem vida senta

esbanjando um sorriso enrustido e se põe a falar comigo:

- “Gustavo era um garoto bonito, esperto e rico, nunca se deu muita conta disso, sei que

sua investigação é sobre o incêndio, mas o fato do nome ‘’Gus’’ se repetir tantas vezes, como

deve estar acontecendo, tem um motivo muito mais forte e importante do que o simples fato

do incidente ter ocorrido na casa dele. Ele pode ser culpado de muitas coisas ruins” - a garota

sorriu, e sem minha permissão se levantou e deixou a sala. Boquiaberta, tentava recuperar

minha fala, tentei não levar a sério o que ela dissera, mas aquele breve comentário teve um

gigantesco impacto sobre mim. Depois de algumas horas eu e Clark deixamos a escola de

maneira quieta, um pouco decepcionada por parte dele.

Preferi não anotar minha conversa com a garota. Me arrependi em parte, mas sei o quanto

minha opinião quanto ao que aconteceu seria reprimida caso viesse a público.

...

Era quase onze da noite, atravessei o apartamento, bati a porta de meu quarto e nem notei

a presença de Andréia que dormia no sofá, coisa que descobri apenas na manhã seguinte.

18 De novembro de 2010

Acordei, e por um minuto, esqueci da investigação, esqueci da dor de cabeça, esqueci

de Andréia, esqueci de meu chefe e fechei os olhos curtindo aquele silêncio. Rolei para o lado

esquerdo da cama, levantei-me, estralei o pescoço, fui em direção ao armário e peguei

minhas roupas. Depois de me vestir quase esqueci de pegar meu distintivo que estava em

cima de minha mesa de cabeceira, essa mesa por sinal, muito velha e repleta de manchas de

copos de água que ali ficaram sem nenhuma proteção, criando precipitada pela mudança de

temperatura e derrubando gotinhas na superfície. ISSO ME INCOMODA MUITO.

Entrei no carro, puxei o cinto, liguei o rádio e sintonizei em um canal de notícias.

Falavam sobre o caso, e foram mencionados possíveis acidentes envolvendo até raios, mas

nada sobre o incêndio ter sido obra de algum dos adolescentes, em especial Gustavo. Como

a menina havia mencionado, ele poderia ser o culpado por tremenda brutalidade, o culpado

pelas almas que queimaram de fora para dentro, culpado pelos gritos abafados, e pelas

profundas cicatrizes que consumiram a vida de tantas pessoas.

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Page 68: Excluido Pronto

Entrei na sala improvisada de interrogatório e esperei pela entrada de alguém.

Conversei com mais alguns jovens, não obtive muitas revelações, e comecei a ficar aflita. Se

não descobrisse nada, o caso seria arquivado como um acidente ou algo do gênero, e tinha

certeza de que não fora um acidente, sabia que alguém tinha causado tudo isso, e tinha que

descobrir se tinha sido o tal menino. Pedi que Clark assumisse, fui escondida até a sala do

diretor da escola, espiei e vi que ele estava conversando com a imprensa local, cheio de

pompa reverberando sobre algo que nem sabia ao certo. Abri a porta devagar e comecei a

fuçar as fichas dos alunos. Procurei pela de Gustavo mas não a achei, então deixei a sala

quieta, pensativa e instigada. Topei com o diretor no caminho e pedi o telefone de contato dos

pais do menino, que, a princípio se mostrou resistente, mas sob a acusação informal de estar

atrapalhando a investigação, acabou cedendo.

...

- Oi,me chamo Olivia, sou a policial encarregada da investigação do incêndio que

aconteceu em sua casa. Gostaria de conversar com você pessoalmente se for possível.

- Sobre o que você deseja conversar?

- Precisamos falar sobre seu filho.

- O que quer saber? Como ele morreu, quer me perguntar como é a dor de perder um

filho, quer me perguntar a última coisa que ele me disse? Meu Deus! - A mulher agora chorava

raivosa ao telefone.

- Não é isso senhora, o que preciso falar é de grande importância e preciso que a

senhora coopere comigo.

- Ok, ok, você pode vir ao meu apartamento?

- Certamente, qual melhor horário para a senhora?

- Às oito da noite.

- Ok.

Dirigi até o apartamento da mulher, agora uma humilde residência.Toda a dignidade,

toda a riqueza pareciam ter desaparecido junto com o fogo, com as perdas... Senti uma

pontada de pena da mulher, mas logo me foquei no que deveria fazer, bati na porta, ela

atendeu:

- Oi, pode entrar.

- Obrigada. disse enquanto sentava no sofá.

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Page 69: Excluido Pronto

- Então, o que queria me dizer?

- Queria saber, seu filho sofria algum tipo de exclusão na escola, alguma pressão?

- Meu filho, não, ele era perfeito, lindo, bonito, todos o admiravam, queriam ser como

ele.

- Não acha que isso causava uma grande pressão no menino?

- Um pouco, mas o que isso tem a ver?

- Olha, gostaria de dar uma olhada na ficha de seu filho, aquela que foi retirada dos

arquivos escolares.

- Por que deseja isso? O que acha que aconteceu, acha que ele tem envolvimento com

o que aconteceu?

- Eu não acho nada, não disse nada, quem esta falando é a senhora.

- Quanta ousadia - disse a mulher sem elevar a voz, mas gesticulando palavrões com o

movimento de sua face.

- Olha, estou te pedindo uma coisa simples, se a senhora não tem nada a esconder, por

que fazer todo esse drama?

- Drama? Meu filho está morto, vocês são uns incompetentes que não conseguem

resolver um simples caso de incêndio sem jogar a culpa na única pessoa com futuro dessa

cidadezinha de merda! Enfurecida, a mulher levantou e começou a apontar para a porta. Saia

de minha casa! Saia daqui agora, sua maldita, não importa se você é policial, precisa sair

daqui agora sua biscate, não sabe o meu sofrimento, e provavelmente nunca vai saber, saia

agora!

- Não vai omitir isso por muito tempo, você sabe do que eu sei, há pessoas esperando

por uma resposta, é questão de tempo até o laudo chegar, mas pode ficar calma, antes disso

venho bater à sua porta com um mandado de busca.

Levantei-me brava, tomando as rédeas que não tomava há muito tempo, bati a porta

do apartamento e com o coração quase pulando para fora da boca fui ao encontro de Clark

para conversar sobre o ocorrido. Estava tão nervosa que deixara cair meu celular no sofá da

mulher e não me dera conta na hora, nem na manhã seguinte. Erro fatal.

19 de novembro de 2010

Acordei enfurecida, o tratamento que aquela vadia havia me dado, porca pretensiosa...

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Page 70: Excluido Pronto

Clark ficara perturbado com minha teoria e fora até a delegacia revisar alguns fatos do caso.

Tinha feito uma descoberta gigantesca acerca do diário que eu havia achado no local do

crime. Rapidamente mandou uma mensagem em meu celular. Em minha casa, não me dei

conta da ausência do celular, e pela manhã apenas agarrei meu casaco, conversei um pouco

com Andréia que prometeu mudar seu comportamento e fui para a delegacia. Andréia me

contou que um colega havia passado muito mal e entrado em coma devido as drogas, o fato a

assustou, a menina chorou e disse que os pais dela não gostariam que ela se comportasse

desse jeito. Ela parecia convencida em seu novo estilo de vida.

Antes de chegar ao meu destino, ou comemorar a mudança da garota, fui informada

pelo rádio de uma tentativa de invasão na delegacia. Teriam acontecido disparos, estacionei o

carro e cautelosamente entrei no local. Vi o diário jogado no chão, a mãe do menino

ensangüentada e Clark apontando para o caderno ensangüentado e amassado. Logo me dei

conta do que deveria ter ocorrido, a mulher sabia que o filho tinha envolvimento no crime, e

sabia que o diário era a última peça do quebra cabeça, peguei o diário e comecei a ler:

Diário de Gustavo Passareli Panucci/Alexandre

Tomado pelas cobranças, pressões e a raiva que crescem cada vez mais dentro de

mim, preciso colocar no papel meu sentimento de descontentamento com o mundo, com o

modo com que as pessoas me tratam e pelo modo deformado e horrendo que me enxergo no

espelho, queria que não fosse assim, sei que não deveria ser assim, mas sei que meu destino

final logo se aproxima, talvez essas palavras dêem um pouco de sentido a tudo aquilo que

venho sentindo, toda essa dor que bate e rebate aqui no meu peito me causando tanta raiva.

Se as pessoas tivessem tido mais paciência, se tivessem percebido que sou humano, que

posso errar, que nunca serei perfeito, não teria de recorrer a esses loucos pensamentos. Tudo

isso me faz querer morrer, nunca serei bom o bastante, estou queimando vivo, toda vez que

olhos nos olhos de alguém sinto que quero morrer, todos bebem de minha alma, eu achei que

tinha de tudo, oportunidades que durariam para a eternidade, mas agora tudo me dá vontade

de morrer, nunca serei bonito o suficiente e isso me faz querer morrer, tudo isso me faz querer

desaparecer, faz com que me sinta tão deslocado e mal amado, me faz querer morrer, ainda

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sinto um pouco de amor, não próprio mas por alguém, mas sei que toda vez que olhar no

espelho vou ter vontade de morrer, porque tudo me faz querer morrer, tudo me faz querer

sofrer. Me faz querer morrer!

Seria um talento desperdiçado? Talvez um pobre coitado? Talvez ele caminhasse como

uma pessoa sem vida de brilho mais que ofuscado...

Em um caminho de sujos trapilhos, seu destino, fosse ele tão pequeno quanto sua

existência, de um passageiro, impacto constante e desagradável.

Seria um amor não correspondido, ou uma fácil entrega e desistência...

Poderia ela morrer com calma, sabendo que tudo que trouxe foi constante incômodo, e agora

ela se vai deixando apenas carne podre para urubus e vermes que a estraçalharam sem ao

menos seu nome saber...

“Apunhalada”

Quando abrimos nossos olhos, enxergamos uma névoa de poeira asfixiante, vemos

que tudo que atraímos era tristeza e o sofrimento de alguém que sempre se sacrificou por

nós, e agora a apunhalamos como alguém de coração frio. Nós a matamos com palavras

mais fortes que a morte, que por sua vez é suave e rápida. Nós percebemos que matamos

essa pessoa em vida e transformamos tudo que era colorido em um cinza profundo, uma

grande onda de pura melancolia nos embriagou com tristeza e não com álcool, cavamos um

túmulo e colocamos todas nossas emoções a sete palmos do chão, para que elas morram

conosco de maneira lenta e fria, morremos sozinhos sem o amor, apenas acompanhados da

frieza que tanto negamos e que agora com simplicidade aceitamos.

Que caminho nós aceitamos como inevitável? Que onda de choque nos desviou, sem

simplicidade, mas com vulgaridade à outra direção (sem coração?) Que fim nos espera? Será

o fim a última etapa? Poderíamos caminhar eternamente até que nossas lágrimas secassem

como o deserto, será que poderíamos enterrar nosso destino e deixá-lo sem rumo, procurar

uma paz em meio à tormenta perfeita e errônea que a vida nos propõe, poderíamos desafiar

as regras das regras e gritar em silêncio à liberdade, seria a liberdade mais uma regra? Não

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enxergo a liberdade, assim como um cego desconhece o colorido, tudo que sei é que nada

poderá mudar o que aconteceu e o futuro é inevitável, ele vem rápido e fugaz, no rastro da

bala seguem nossas lágrimas borradas de sangue...

A estrada é longa e traz consigo muitas tristezas e melancolias, mas desenterra velhas

lembranças daquele tempo que todos nós poderíamos descansar com paz. O único quesito

de preocupação era a felicidade do outro dia. Nós não percebíamos que a verdadeira

preocupação era o ciclo vicioso que nos envolvia em seu manto, obrigando nossos olhos a se

abrirem para a triste e fria verdade, tal melancolia nos atormenta como a pior das doenças e

ao mesmo tempo é suave e leve, afinal, o que seria sofrimento, teria o sofrimento graus de

impacto? É fácil chorar falsas lágrimas, difícil é parar de beber e chorar lágrimas profundas.

Difícil é dar de encontro com a verdade que nos julga com frieza e sem individualismo, nos

julga de maneira tão imparcial que seu manto é de puro vidro quebrado e tristeza daqueles

que lá se enrolaram esperando que ela os protegesse, e aquela falsa proteção os alucinava e

eles esqueciam que o vidro cortava sua pele como uma bala rasga uma lata suja de areia. Ele

os cortava de dentro para fora, e quando percebiam, eles já haviam morrido, mas morreram

em paz, por isso seria essa promessa de proteção verdadeira ou apenas a ilusão...

Coração partido:

Coração partido, choro meu coração partido que queima na brasa, desavenças e

tristezas caramelam esse amargo doce que sou obrigado a me deliciar, afinal, é o único doce

que eu tenho.

Meu coração partido chora sangue, vejo minha “anja” sem asas desaparecer na luz

branca, seus olhos azuis, sua pele branca dificultam ainda mais que eu corra atrás, vejo-a

partir, não a vejo sorrir, me vejo sucumbir e apunhalado meu amor partir...

O ATOR:

Tudo é perfeitamente incongruente e se encaixa de uma maneira perfeita, seja o drama e

as lágrimas que correm dos olhos surrados de um protagonista que confunde a vida real e se

questiona: seria a sanidade uma arte ou sua falta a realidade difundida no mais belo tom de

cores? Seria uma triste verdade ou um fim sem precedentes? A graça de vivenciá-lo para

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aquele homem era alternar seus sentimentos, viver diferentes vidas e diferentes papéis. A

graça de ser único, no meio de tantas pessoas parecidas... Ele sabia que nunca poderia

descansar feliz, pois a hora de cair morto no chão era certa e certeira (e o atingiria), e sua

única opção seria matar alguém que ele criou e agora diz adeus sem ao menos enxergar

aquele que tanto amou. Aquilo não era apenas um papel, e sim uma vida que passaria

despercebida, mas sua melancolia se escondia atrás do sucesso, atrás das rosas estavam

espinhos sujos de um sangue que não podia ser visto a olho nu, tudo que ele sabia é que a

lembrança ficaria, a lembrança de um sonho criado por sua louca imaginação, tudo que ele

sabia é que não era o tempo e sim a força de seu amor repreendido no meio de uma mágoa

negra, ele fazia força para chorar, mas não podia, nem seus olhos viriam a se avermelhar, ele

fez força mas seus olhos estavam dispostos a nunca mais derramar uma lágrima, e ele se

refugiou...no calibre de uma arma fria.

A mulher perfeita:

Aquele não era um sorriso comum. Ela nunca existiu, mas sempre foi meu objeto de

fixação, uma fixação louca, seus olhos perfeitos e sua pele intocável a tornavam a mulher

mais perfeita do mundo. Talvez ela não existisse mais. Se eu pudesse tocá-la, eu diria que a

amo. Ela mostrou que a beleza é intocável e só pode ser sentida com o amor, ela poderia ser

um sonho, mas mesmo assim ela seria real se eu acreditasse, ela seria linda, ela seria algo

que me foge às palavras e me faz estremecer, ela me faz repetir vulgarmente as palavras e

meus dedos borram o papel com a tinta, ela vai embora, mas deixa seu brilho marcado em

mim...

A ALMA:

O rastro da bala é certeiro, seus olhos agora se enchem de lágrimas e ela olha com

desprezo a vida que levou. Percebe que morreu nos braços daquele que nunca amou, ela

percebe que tudo mudou. Vê que a vida nos muda e que no último instante tudo poderia ter

sido diferente, mas foi igual, ela percebe que tudo foi inútil se sua lágrima não cair, se o

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silêncio for alto demais e ela morrer de olhos fechados, pois só de olhos abertos ela

continuará uma sonhadora, pois sua alma nunca esteve de verdade naquele corpo, a

verdadeira alma corre livre e só o corpo fica limitado...

Imagem borrada:

Seus olhos se apagaram de minha mente. Você virou uma lembrança borrada e perdida

entre meus pensamentos mais sombrios, você se descoloriu aos poucos, se transformou em

pura melancolia, se transformou em uma desagradável lembrança e por mais que tente me

lembrar de você, sua imagem continua a se apagar...

Seu brilho ofuscado me deixa poucas palavras, dolorosas, que me abatem como a

maior das melancolias, sua voz arranca sangue de mim e sua presença me desgasta aos

poucos até não sobrar nada.

A ARTE:

As pinceladas se arrastam pelo papel criando tanta expectativa, e os olhos daquele que

deveria sorrir olham com tamanha apreensão a arte se tornar pura realidade, tomando formas

abstratas ao seu julgamento... Ele as observa minuciosamente procurando algum defeito, na

arte ele se joga de cabeça sem enxergar a definição da arte. O que seria a arte? Ela existiria

sem a motivação? E será que ele um dia não foi aplaudido? Como pode manter sua cabeça

erguida, se não havia motivação, apenas um silêncio interno repreendido, que só poderia ser

libertado através de pinceladas fortes e suaves que transformavam aquela mera e medíocre

tela em uma obra de arte, estaria ai sua definição, seria a arte o amor verdadeiro ou a

repreensão?

Ela se despede:

Ela se transforma e a angústia toma conta de mim. As lágrimas secam e o rancor parece

dominar tudo. Aquela angústia que bate em minha porta e me persegue como louca atrás de

meu sofrimento, sugando toda minha felicidade que agora mais do que nunca está escassa e

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pobre, miserável, vai embora de cabeça baixa, sem olhar para trás. Ela não acena nem se

despede de mim, vai embora com raiva por eu não correr atrás dela, mas como poderia

correr se meus sentimentos estão mortos, agora vejo ela se afastar com frieza me deixando

apenas a tristeza...

A grande mentira:

As mentiras se tornam a mais pura realidade e me perseguem. Aquelas mentiras

desejam se tornar reais e sabem que são passageiras e incapazes de ficar em minha

memória. Ela me tortura e me confunde me levando a questionar: Seriam elas a realidade?

Seria a realidade uma distorção da mentira? E se a realidade fosse a mentira? Se a mentira

fosse a mais pura realidade, se confundindo no ar e disseminando sua matéria no ar, que

matéria teria ela, passageira mentira que me persegue?

Tudo que sempre quis:

Tudo que sempre quis foi te ver sorrir, tudo que sempre quis foi fazer com que fosse feliz,

tudo que sempre fiz foi brigar por você, tudo que sempre fiz foi observar você, sempre estive

lhe observando mesmo quando jurava que o mundo inteiro a havia abandonado, tudo que

sempre fiz foi me jogar ao vento e a sorte atrás de uma qualidade que fizesse com que você

me notasse, tudo que sempre fiz foi escrever cartas de amor sem destino, tudo que sempre fiz

foi pensando no quanto a amo, tudo que sempre fiz foi sabendo como tudo isso terminaria,

sempre soube que tudo seria uma catástrofe, uma bola de fogo, mas quero viajar ao quinto

dos infernos se for para estar ao seu lado.

Velhas lembranças:

Me faltam palavras, torno o público meu diário público, me apoio em minhas

palavras bambas e vejo o mundo cair aos poucos, vejo que a luz no fim do túnel é um

incêndio, vejo que tudo que era antes virou uma vaga e apagada lembrança de algo que um

dia foi felicidade, se tornam valiosas no momento que não posso mais vivê-las, no momento

que elas parecem estar perdidas...

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O BÊBADO:

Entre garrafas vazias e vidro quebrado choro lágrimas secas. O que me resta de

misericórdia própria asfixio com a fumaça do baseado. Mato aqueles sentimentos

mergulhados em um buraco eterno, dou-me ao luxo diante das circunstâncias que me

encontro. Afinal, de quem é a culpa? Poderia cair em cima de um pobre bêbado que vive a

cambalear e viver de suas palavras surradas, um miserável atrás de um terno de linha italiana

puída, um triste destino que acabaria em uma rua escura com o carro enfiado em um poste,

mas minha morte seria memorável e me tornaria no futuro mais do que esse anonimato.

Falso Manto:

De que serve esse manto que me cobre se ele é de falsas esperanças? O que poderia

ele pensar, ele é inanimado, assim como os sentimentos que fui perdendo aos poucos durante

essa veloz e repetitiva vida? Seria ele a encarnação de velhas memórias que deixei escapar

aos poucos, memórias que tentam falhadamente mudar a triste verdade, a de que elas são

apenas a mentira, pois nunca acontecerão e nunca foram libertadas, memórias que mais

parecem sonhos, angústias. Passam a mão na cabeça delas, e elas fecham os olhos e tentam

viver uma mentira para não arcar com a realidade, essas memórias são nossa sociedade,

passageira, triste e frágil....

Apagadas:

O tempo parece ter esgotado os bons momentos que restaram, deixando apenas

chulas memórias de um tempo esquecido por fortes emoções, que se tornaram a mais pura

tristeza caindo abatidas... O que parecia eterno se ofuscou até o ponto de se apagar,

deixando apenas o nada, um espaço.

Sozinho para chorar a perda das preciosidades da vida...

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Desafio muito mais que a boca dela:

Me encontro parado na frente de meu maior desafio, aquele que me atreveu a

enxergar além do que os olhos podem, aquele que me ensinou que não é errado cobiçar e

sim não aceitar o que se já tem, aquele que se opôs em minha frente como um inimigo e que

agora termino com amor e dedicação, um desafio que agora se deita ao meu lado, que agora

não é mais um desafio que deita ao meu lado, agora é um beijo na chuva, um beijo lento, um

indiscreto orgasmo que chama a atenção daqueles que o contemplam em volta, fazendo

silêncio.

Estrada:

Através dessas curvas me desviei até o suor secar. Caí no chão, vi tudo desabar e a

verdade se manter intacta e inativa em algum lugar longe de mim. Vi luzes e pessoas

passarem, vi todos irem e virem e poucos ficarem Vi que o inferno se sobrepôs sobre a

felicidade, mas o que afinal seria o inferno, o CeRto e O ERRadO, o que seria a verdade sem

a mentira, se tudo se difundisse de maneira a não voltar a se organizar, se o padrão fosse

quebrado, o que seria da sorte e do azar, o que seria do final dramático se a risada fosse

apagada por gritos abafados sem precisão, do que se tratavam, se tudo estivesse invertido e

a estrada estivesse agora em câmera lenta e eu me movendo de maneira rápida em direção à

morte, e o que seria está???

Verdades e simplicidades da melancolia:

Aqui jaz verdades e simplicidades de melancolia, estas que descansam sem nenhum

louvor, sem nenhum luxo, além do que essas poderiam conseguir em sua etapa inicial de

transição, entre aquilo que parecia ser o centro de sua existência, mas que agora, era uma

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etapa. Por mais que bem vivida, uma etapa, e se conformar com seus ganhos era um sinal de

humildade, entre a humilhação que em conjunto caminhava com essas verdades e

simplicidades que nada tinham a temer e a perder. Tudo que tinham era o talento amargurado

e ressentido, preso por uma vida inteira, um sentimento que as trazia de volta, e reduzia sete

palmos a grãos finos de terra. Estranho sentimento esse que poderia mudar tudo sem mudar

nada, agindo na sutileza mais refinada, causando um impacto que só poderia ser visto por

poucos e sentido por menos ainda, mas causando tamanho impacto que com certeza seria

algo a ser desconsiderado. Não considerar essa colisão não em massa, mas interna. Uma

colisão que abala estruturas emocionais e desmorona muros sólidos de tristeza e amargura,

sentimentos crucificados na alma daqueles sentimentos melancólicos que olham ao céu com

esperança de um dia serem mais que a tristeza, mais que a simplicidade banal que já se

aplica no cotidiano, eles sonham com o diferencial, sonham com a capacidade de mudança.

Ilusão perceptiva:

De que sentido tem a literatura se essa ecoar no silêncio, pois o silêncio não é ausência

de presença e sim de percepção e essa é a maior ausência que se reflete em nosso cotidiano,

que, afinal, sempre foi agitado de uma forma ou de outra. Mas as cicatrizes se curam e junto a

elas a lucidez se confunde, e esquecemos que aqueles momentos que pareciam ser bons

eram momentos de euforia e tristeza, eram momentos que deveriam ser recordados com

melancolia, mas se perdem no esquecimento passageiro, que se colide com a rapidez que é

exigida das cicatrizes para que essas se fortaleçam, afinal, amanhã poderão estar novamente

abertas e precisam de pelo menos uma noite para se iludirem com um final que nunca virá as

acalmar...

A melodia desgastada e a pluma pesada:

A mesma melodia se desgasta tocando a mesma melodia, e as letras balançam no

ar coreografando sem vida o que um dia já foi algo prazeroso, mas que agora é levado pelo

tempo por uma tempestade imprevisível, rápida, lenta, contraditória e sem sentido, que só

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confunde e distorce a realidade a tornando algo ainda mais indistinto do que está já é entre

nós. Que caminhamos aqui, quietos, esperando que a morte chegue, apreensivos, mas em

silêncio... Esperamos morrendo de medo do que virá, se este será leve como a mais pura

pluma ou pesada como a mais carregada tempestade. E se a pluma caísse em alta

velocidade tomando peso maior que seu tamanho, afinal, tudo é uma questão de proporção,

será que aos meus olhos minha morte ainda seria leve?

Desejo:

Quando a inveja não mata, ela consome, seduz. Por me mutilar, acabei por me

apaixonar pelo perfeito. Por ser o imperfeito, admirar tudo aquilo que é considerado bonito, já

que eu não sou, apenas cobiço, é desejo, desejo, não sexual, talvez apele às vezes, mas na

maioria das vezes é inveja deste mundo perfeito que não me encaixo, que não há molde que

eu me encaixe, sou consumido por remédios e doenças, repulsas chiques que acredito que

me levaram ao meu destino, perfeição e pura luxúria, não quero todas as mulheres do mundo,

mas quero ter o poder de sair como flecha arrasando o coração de todas elas.

O vagabundo:

De que serve a motivação, se o silêncio toma conta do ambiente com sutileza

indiscreta, e mostra a ele o fracasso? Quando chegava perto dele sentia tamanha euforia...

Como este poderia viver uma vida tão simples e fracassada, com um estigma grudado ao seu

próprio suor que muito pouco escorria, afinal, aquele só fingia estar se esforçando, pois o

esforço até que vinha, mas era falso. E de que isso adianta se passa o tempo escondido em

seu próprio mundo, sem ao menos reclamar suas poucas vitórias, que foram mais pela sorte

conquistada, que por seus olhos que pouco demonstrava a achar algo naquela “névoa” que

eu chamo de desafio? Eu me assustei com sua ignorância e falta de conhecimento, me

envergonhei em parte por sentir até nojo dele, mas me motivou a fazer ao máximo algo que

evitei, pois não poderia conviver com o fato de ser tão vagabundo daquele jeito, sem sonhar,

apenas procurando sem vontade um destino pobre que me traçaria aos poucos, uma espécie

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de estupro mental que derramaria meu tecido encefálico por todo o chão, que por sua vez

possuía muito pouco acabamento, aquele miserável com destino pequeno, me motivou mais

que qualquer coisa a seguir em frente para o futuro.

Esquivando-me de cacos de vidro e aço retorcido:

O destino se choca com palavras de vidro e aço retorcido e tenta se esquivar da

morte que vem despedaçada e aos poucos tomando forma e matando o destino de maneira

lenta. A tristeza se tornou a única felicidade presente em sua rotina, pobre destino que agora

começa a se cansar e nem ligar para os cortes que derramam seu orgulho no chão de

mármore e transforma aquele todo poderoso em um servo feudal, um mero camponês

obrigado a seguir caprichos sacrificantes, até que a foice desça e decepe de uma vez seu

pescoço, acabando com a dor interna de seu coração, o levando para longe, agora ele poderá

parar de se esquivar porque tudo que resta é um corpo morto sem vida.

A NOITE FRIA:

A noite é cheia de tormentas e mágoas que se propagam aos poucos, tomando formas

amedrontadoras que levam os lúcidos à loucura, transformando o certo em errado e

difundindo todas as cores, e excluindo-as uma a uma até que a ausência delas seja tudo que

resta até que mais nada possa se erguer e a morte seja a única mão estendida para aqueles

rejeitados e pobres que caíram na desgraça de ficarem expostos ao relento da noite. Aos

poucos, em passos que deslizam como a dança, cortam suas esperanças e reduzem as

migalhas, as transformando em meros grãos, e a beleza atrás da desgraça se mostra quando

a felicidade desses é liberada em um sorriso, quando morrem e sabem que nunca mais serão

acordados e que agora poderão viver seu sonho, mas na morte percebem que mesmo

dormindo em paz tudo continuará escuro como a noite, e novamente eles entrarão em

desespero, afinal, eles até poderiam queimar no inferno se o inferno tivesse luz e fogo como

prometido, assim poderia aquecê-los, mas o inferno se mostra frio e congelado, e suas almas

necrosadas procuram a luz em meio à escuridão...

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OBRA DE ARTE VIVA:

Vejo você de longe, seu sorriso. Minhas preocupações são “milionárias”, mas você

enxuga tudo e bota de lado quando sorri. Vejo seu corpo, vejo seus contornos, você é a obra

de arte mais bem desenhada que já vi. Passo a rasgar minha pele , não me conformo que

isso seja realidade, que você seja realidade, anja, anjo, luz, você é a luz, minha luz,

apaixonado, não queria estar, preferia apenas seu corpo desejar, mas a verdade é que algo

no seu perfume desperta uma sensação que nenhuma outra mulher desperta em mim, com

simplicidade você me leva em loucas viagens cheias de luxúria, todas as pessoas à minha

volta perdem a graça, ficam mais feias, mais cinzas e você as toma a cor, mas não sinta

culpa, contanto que o seu corpo deite ao meu lado esta noite, que você esteja disposta a ser

minha e de mais ninguém, amor da minha, vício da minha vida, razão da minha conturbada

existência.

Luxuosa:

Luxuosa, bela, se propaga no ar como a mais doce melodia a me leva a pensar como

tudo é perfeito e imperfeito, como o drama e a comédia andam juntas, como a variação das

diferentes formas de interpretar o dia-a-dia transformam a mera e medíocre tela em uma tela

de obra de arte, percebo que a música é muito mais que linda, é terapêutica, percebo que o

adeus significa olá muitas vezes, e que a contradição é a razão, que as luzes não dançam no

ar, mas meus olhos acompanham seus movimentos enquanto a melodia compõe a mais bela

arte e a felicidade me domina por completo.

O verde de terno e gravata:

Deixo as linguagens coloquiais de lado e observo minuciosamente as folhas se

remexendo ao redor de minha visão, desenhando o quadro mais famoso e pouco valorizado

que existe, a vida.As folhas pareciam criar tamanha expectativa em mim, e eu observava o

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movimento de tudo com muita cautela, o olhar artificial que antes lançava se encontrava em

algum lugar bem longe e inativo, a rotina banalizada, os ternos tomavam cores e os

sentimentos afloravam tomando formas agora mais que abstratas. Aquilo não era um filme,

não era a arte, era uma árvore de outono sendo acariciada pelos ventos, essa era minha

interpretação, é claro que poderia ser outra, poderia considerar que aquela árvore estava

sendo surrada, afinal, tudo é momentâneo e não faz sentido a menos que nós procuremos

algo para apoiarmos nossas teses e tentarmos compreender o inexplicável.

A música e sua influência:

A melodia se decompõe e as letras fluem com mais leveza, a música conduz minhas

mãos com suavidade, tornando as palavras belas melodias. A prosa e poesia percorrem o

papel com felicidade e ternura, a música torna realidade o que apenas era um distante sonho,

uma respiração mais profunda e suave como consequência, assistir ao show que eu mesmo

faço em silêncio com apenas o som me conduzindo e a mais bela poesia cantada, a mais

bela história narrada ao som, algo lindo e maravilhoso, a influência da música.

Palavras Filtradas:

As sombras passam, as pessoas parecem se aproximar e a distância se estabelecer, os

barulhos misturados no ar se diluem e aos poucos as idéias vão tomando forma, os sonhos e

a realidade se tornam mais simples, aos poucos meu entendimento se torna mais puro, e

através destas idéias posso voar, posso me libertar, me filtrar, achar meu eixo central, é algo

extraordinário como elas se encaixam tão bem no meu cotidiano, e me conduzem com leveza.

A energia:

Sinto uma energia que me percorre com velocidade, é fugaz e rasteira, corre por todo

meu corpo, insiste em destacar os pequenos atos, jogar o cabelo, virar os olhos, uma energia

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que toma conta de mim e diz que eu posso fazer tudo, ela guia meu corpo como uma valsa e

cada movimento parece perfeitamente coreografado, os meu pés deslizam pelo chão como se

eu pudesse voar, essa energia não tem nome nem identidade, mas me marca com

profundidade.

A puta mais bela de todas:

Eu a vejo caminhar desolada com os sapatos na mão. Para aqueles que passam rápido

ela é mais uma puta bêbada de rua, mas algo sutil em seus movimentos, a maneira com que

ela chamava a atenção, cambaleando bêbada rua abaixo... Queria poder ajudá-la, mas me

encontro parado observando minuciosamente seus movimentos em câmera lenta, eu a acho

corajosa, parece renegar tudo que é imposto à sua frente, ela domina minha cabeça, e só de

pensar que toda essa manipulação mental veio do simples caminhar de uma moça de rua,

agora, refletindo ,vejo que é algo pequeno que define uma grande personalidade.Será que um

dia eu a verei de novo, aquela mulher que bêbada cambaleava na rua afirmando ser apenas

uma miragem de minha conturbada imaginação?

Um milagre chamado Vanessa:

A imaginação se apaga como uma lâmpada quebrada, as cores e cheiros desaparecem

de maneira lenta, e talvez por isso pareça ter sido tão rápido, porque no processo de perda eu

me dei ao luxo de rir da ampulheta, dos ponteiros, e agora com sangue nas mãos, e muita

pouca imaginação, giro para trás os ponteiros na esperança de um milagre, na esperança de

a inspiração voltar pela porta que saíra, só assim eu poderia dizer quanto a amo, e sei que um

dia ela voltará, até lá tudo que posso fazer é chorar e retroceder com meu dedos, metal

enferrujado, na esperança de um milagre, um milagre chamado Vanessa.

Será o escuro?

Seria errado cobiçar mais do que se tem, seria errado olhar discretamente a amargura

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daqueles que sofrem e pouco se importam, será que eu poderia deixar que o mundo

queimasse em chamas enquanto fico parado observando seu fim, será que a minha

imobilidade causaria choque naqueles que correm desesperados, será que eu poderia

encarar os olhos desapontados de uma criança que pede socorro, será que eu poderia lhe

atirar um lenço e substituir por aquilo um plano de fundo preto? Mas se eu fizesse isso toda

hora minha vida iria se tornar mais escura que a noite, que tão iluminada tem com requinte

aumentado o dia e afirmado sua individualidade, que nada tem a ver comigo, pois o escuro

nunca apresenta desgaste ou aperfeiçoamento, ele é apenas a ausência de opinião. Será que

com tantas ações erradas eu poderia viver no escuro esperando a morte, e quando ela

chegasse, será que eu iria rir ou chorar, ou será que estaria imparcial como o escuro... Como

a morte poderia me levar se eu estivesse no escuro, talvez fosse esse meu castigo por uma

vida de pecados, andar eternamente no inferno da Terra enquanto queimo. O que me

restaram são lembranças, até que meu corpo caia no chão sem vida...

Conto de Fadas:

Vejo a chuva cair pela janela, conto de fadas...

Queria entrar pelo buraco do coelho...

Queria entrar pelo buraco da arma e sair em alta velocidade arrasando corações...

Conto de fadas, seria chuva, seria choro? Seria conto de fadas...

Lentidão com que o tempo passa, parece rápida demais para minha tristeza

acompanhar, então se apóia em melancolia e desespero, e em mais desespero, e navalha no

pulso.

Conto de fadas ora louco, (ora) sempre surreal, conto de fadas, pena que o meu há

de ser a sete palmos do chão...

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´´ Duvída ou dúvida de mim?´´:

Dúvida, eu tenho dúvida, será dúvida a engrenagem da sociedade ou seu parafuso

solto?

Será dúvida poesia, conto ou relato, dúvida!

ISOLA

LIBERTA

ACORRENTA

EXPERIMENTA?

DÚVIDA!

Vem e vai, mas nunca se apaga completamente, e dúvida vira raiva, calor, vira

angústia, pura angústia, que aos poucos me mata, será que me mata?

DÚVIDA!

Eu tenho muitas dúvidas, e você, duvida de mim?

LOUCA EUFORIA:

Louca euforia, não tem som, não tem fúria, não tem voz, tem apenas a inquietude,

que me leva de canto a canto.

Mas que louca euforia é esta, desacompanhada, sem voz, não é esquizofrenia, então

poderia jogar tudo para cima , e a euforia há de ir?

NÃO!

Insiste em ficar como um parasita maldito e eu pobre hospedeiro, louca euforia que

fica, e que fica sem me deixar, seria loucura, ela me afeta, me constrange, porque não é

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formal, não segue regras, não vê valores em costumes, ah, mas sem ela não vivo, porque por

mais louca, ela é e sempre será minha única companhia, minha louca euforia...

O VELHO SÁBIO:

Olha lá quem vem cheio de pose, é o grande sábio, de intelecto superior, ele se

gaba. O que ele não sabe é que em meio à sociedade seu intelecto se diminui e se adequa à

massa, agora ele é tão estúpido quanto um babuíno, tão incompreensível como o braile para

uma criança que vê cores em tudo. Agora ele é burro e incoerente.

Pobre sábio, que um dia foi fonte de inspiração, hoje há de ser minha grande

frustração, vejo-o catar migalhas de pão tentando reconstruir um velho sermão.

A MOÇA:

Vi uma moça andando, moça inusitada, observo seus movimentos em câmera lenta.

Nunca vi tamanha perfeição, em tamanha banalidade, não era paixão. Sem nenhuma razão,

apenas olhei, e olhei, até que sua imagem se tornasse uma turva pincelada nos meus olhos.

Eu pisquei, porém, mantive meus olhos fechados, não queria ver ela partir

novamente, queria ela sempre em minha mente, para sempre, sei que se aquela fosse a

minha última visão seria o homem mais feliz...

O ESCRITOR SONHADOR:

‘’Maldito tempo que varreu meus sentimentos e meus tempos, maldito tempo que fez

de mim mais frio, mais calculista, mas me diga, tempo, foi você que me fez diferente, ou foram

pílulas e drogas que me abatiam aos poucos me matando e deixando apenas uma velha alma

triste e enxuta dentro de mim? Mas que alma boa esta, esta alma que se aperfeiçoaria, esta

alma que focada poderia se realizar e a com a caneta, sonhos realizar.’’

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FUNERAL:

Hoje é seu funeral, não choro, não derramo uma lágrima, passo intacto pela morte. Já você

parece abatido. A chuva desenha lágrimas em meu rosto, molha seu caixão, destrói meus

sonhos e a terra se dissolve sobre meus sapatos e abaixo deles. Ela escorre sobre você, se

sobrepõe sobre você. Eu queria chorar, queria lamentar, queria estar triste assim como ,

imagino, você está, mas como eu poderia estar se fui eu que puxei o gatilho da arma que te

matou? Talvez tenha sido rápido para você, mas eu posso jurar que vi em ‘’bullet time’’ ela

viajando até pegar em seu coração. Vi seus olhos de tristeza, e naquele momento quis chorar,

não de tristeza, OU arrependimento mais sim de alívio, por ter você longe de mim, mas agora

não importa, já que no fim de minha reflexão você se encontra a sete palmos do chão.

OLHOS DE DIAMANTE:

Seus olhos são diamantes e refletiram a luz me deixando cego. Pareço caminhar

sem direção, mas sinto seu cheiro, seu perfume, sua excitação no ar, sinto você. Vejo na

escuridão flashes de luzes que me guiam, não parece ser amor, parece ser pura luxúria, puro

prazer, mas é o que quero ´´ fazer ´´ com você, você é puro prazer, só tenho olhos para você,

e não importa se estou cego, pois pretendo usar apenas o tato, pretendo embaçar as janelas

junto com você, mas preciso de confirmação, preciso sentir que você também quer, quero

você de qualquer jeito, de qualquer forma, me guie agora pois seus olhos de diamante me

cegaram.

INFLUENCIADO:

O que é certo e errado? Tento catar esses cacos de vidro do chão, mas acabo

sujando mais as coisas com o sangue que derramo. O que é preciso fazer quando nada é

“disposição”. O que se torna controvérsia, seria apenas padrão pré conceituado, o que eu

considero errado, o que eu julgo já pré conceituado, como posso saber se não estou sendo

influenciado por vozes ocultas que me perturbam durante a noite, por vozes cada vez mais

altas que gritam: FAÇA ISSO, FAÇA AQUILO! Será que eu não posso me decidir sem ser

influenciado, sem ser pré-conceituado?

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MARIPOSAS, BENDITO FRUTO QUE HÁ DE APODRECER EM MEU ROSTO:

Vejo seu sangue, vejo que as borboletas que voavam no meu quarto são malditas

mariposas sem cor, sujas. Maldita repulsa, tento me esquivar, mas elas continuam pousando

sobre meu lábio, me obrigando a silenciar as vozes. As vozes que me atormentam, malditas

mariposas, por que não podem ir embora, por que ficam sem parar de me atormentar, pego

uma por uma e as esmago, mas em vez de sangue de seus corpos caem malditas larvas, é o

maldito do ´´ bendito fruto ´´ da vida que passa adiante esta maldição! Seria a solução uma

faca, meu rosto arrancar para que elas pusessem suas crias em minha carniça apodrecida,

será que é isso que elas querem? Não posso dar meu corpo para elas, MALDITAS

MARIPOSAS QUE VOAM EM MINHA VOLTA ME ENLOUQUECENDO, MALDITAS,

MALDITAS, por que, por que precisam ser tão más, por que querem toda gota de sangue

minha arrancar? Vejo seu corpo morto no chão e vejo que você cedeu às mariposas, será que

eu também devo ceder? Será que eu também devo fazer de meu destino, de meu rosto, pura

carniça infestada de vermes, será que meu destino não é mais que o punhal torto desta faca?

MALDITAS MARIPOSAS QUE AO MEU REDOR VOAM, E NEM SEQUER PARAM DE

SUSSURRRARRR!SUSSURRRARRR! UM MINUTO, MARIPOSAS, MARIPOSAS, MARIPOSAS, TODAS NO

AR, A TODO INSTANTE, INSTIGANTES, COMO CONSEGUEM SEM SE CANSAR APENAS

ME ATORMENTAR!

COBERTO DE EXCREMENTO:

Sou louco, sou mesmo? Sou, acho que no fundo sou, de canto em canto me arrasto,

meio vivo meio morto, tem até palavra para isso, pareço mórbido, mas entenda, a culpa não é

minha, tem certa ironia nesta cascata de merda que cai sobre minha cabeça, sobre este fétido

cheiro que me persegue e que as pessoas evitam, mas no fundo gosto do cheiro e da bosta

em minha cabeça, da merda em meus lábios, porque este é meu consolo, será que se eu

estivesse são, limpo, as pessoas estariam mais próximas, ou outros defeitos elas achariam

para me crucificar? Ando coberto de excremento, mas pelo menos há de ser minha

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companhia, meu consolo de que eu não sou o erro, é ele, ele que afasta as pessoas, não sou

eu o pedaço de merda, e essa sensação de consolo é ótima, agora não venha dizer que eu

cuspo no prato que eu como, eu derramo merda nele mesmo, você derramam a merda em

mim e querem que não escorregue no prato?? AAAA MANHÃ HÁ DEE SER OUTRO DIA!

PARA SEMPRE JOVEM:

Gostaria de ser para sempre jovem, gostaria de ser para sempre jovem, queria viver para

sempre jovem gostaria de nunca precisar crescer, gostaria de nunca sofrer, queria nunca me

preocupar, nunca ter vontade de algo tomar, gostaria de ser para sempre jovem gostaria de

viver para sempre, sempre jovem, gostaria de ser para sempre jovem...

DUROS:

Amargura, raiva, este sentimentos te fortalecem, ou te destroem, parece óbvio, mas

acho que não é pois até o amor no fim lhe deixa frágil, lhe desmonta, então, que sentimentos

frios , que congelam o coração, esses sentimentos parecem bons de certo modo, parecem

endurecer o corpo e o coração, então presumo que na hora da queda aqueles frios e tristes

sejam mais fortes, mas também mais fracos para catarem o que se espalhar, fracos, muito

fracos, eles são de fato, pobres, não existe amor ou rancor, todos nos levam a um fim

inevitável, a auto destruição...

ESPERANÇAS E DESESPERANÇAS INCONGRUENTES:

Esperanças parecem despedaçadas, amores parecem velhos hábitos, a costumeira rotina

tirou a cor de tudo que me prestava, restando apenas ´´ la traviata ´´ para ouvir, até que o som

dela também se fosse, e junto com ela meus últimos momentos de felicidade, é uma pena que

o comodismo tenha feito de mim pessoa triste, homem infeliz, criança sem brinquedo, queria

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poder ver a felicidade, mas tudo que se reflete através de velhos e engordurados vidros de

acrílico metálico é a tristeza que se sobrepõe,e junto a ela falsas promessas, e aquele velho

manto que é feito de vidro, mas que para os infelizes um pouco de conforto há de trazer no

inverno, por mais que inundado de sangue...

Nunca parei realmente para analisar uma obra de arte, nunca realmente ouvi a tinta

soprar idéias através da tela para meus olhos, nunca apreciei o colorido como algo bonito,

nunca vi detalhes, nunca parei para pensar como tudo é perfeito, PERFEITAMENTE

INCONGRUENTE, nunca parei para pensar como me repito em minhas palavras e frases

mais famosas, olhe, nunca parei por um segundo, nunca paramos nem depois de mortos

conseguimos alcançar a paz que tanto buscávamos, esperanças e desesperanças, óperas e

cantigas que fazem de mim mais humano, ou menos, nunca parei para pensar como sou

incongruente..

VIDRO:

Posso ouvir você chegando devagar, os passos ecoarem pelas paredes, o som se

distorcendo pelo espaço, sua voz continuamente rebatendo nas paredes de minha cabeça,

mas não a enxergo, não a toco, mas sinto seu poder de destruição, sinto suas unhas

cravadas em minha carne, seu cheiro penetrando meu corpo, seus espinhos cortando meu

rosto, mas estou sozinho, você conduz meus movimentos, e aos poucos o pedaço de vidro se

aproxima de minha garganta, o sangue parece ser uma manta, me cobre por inteiro, é quente

e reconfortante, você se afasta, aos poucos o sangue esfria, e endurece, a dor parece ir

embora, a luz começa a nascer do nada, meus sentimentos começam a abrochar, um sorriso

em meu rosto, você me levou embora.

NO AR, VOCÊ, AMOR:

Toda vez que me aproximo de você me distancio, gostaria que você me notasse

assim como noto-a, gostaria de tê-la por inteiro, gostaria de vê-la sorrir para mim, acho que

preciso de você, vejo seu rosto me perseguir em sonhos, imagino e vivo cenas de amor no

meu subconsciente com você, mas na realidade você parece se mover em outro compasso,

em outro mundo, seu ritmo parece muito distante, tento alcançá-la, mas toda vez que eu

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chego você já faleceu, este pesadelo se repete noite após noite, corro desesperado na chuva

para lhe encontrar, mas não há jeito de chegar, o destino quis te reservar a solidão para

pairar.

MINHA PERFEIÇÃO ESCULPIDA:

Dirijo pelas ruas da loucura, atropelo os pedestres cegos e a nova tintura do meu

carro é à base de sangue, quero me divertir, a batida segue um ritmo louco, sigo desnorteado

pelas mesmas ruas que antes eram tão sem graça, onde costumava festejar... Me encontro

parado, vejo tudo queimar, e ao invés do fogo apagar, jogo lascas de papel para o aumentar,

dou risada, hahaha, afinal, a culpa há de cair em cima de um louco, é tão louco o jogo, tão

simples e tão complicado, tão controverso, tão humano, mas feroz como um animal raivoso,

dirijo, não sei onde vou chegar, mas sei que vou acelerar ao máximo, sei que mesmo que

haja um muro, a perfeição que estou esculpindo o há de esfaquear.

ESCRAVO DO VÍCIO:

Numa maca de um hospício em chamas, é esse meu constante pesadelo, seria a loucura

minha e mais próxima amiga, será que sou tão louco como mostram os espelhos distorcidos,

será que minhas lágrimas são tinta azul, não gosto de chorar, a tinta é tóxica, não faltam

sentimentos, mas entenda, com 900 gramas de anestésico babar e ficar pseudo fora de si é

algo extremamente saudável, e quando bate tristeza, não há do que reclamar, porque a dose

sempre há de poder aumentar, escravo do vício sou eu, mais um escravo do vício, assim

como outros minha lápide virá com anúncios.

O DIA QUE O VENTO ENTREGAR AS CARTAS À MULHER DE MINHA VIDA:

Vivo mutilado sem você, escrevo cartas de amor, infinitas cartas de amor que

mando sem destino ao destino, para que um dia o vento as leve até você, um dia que o tempo

há de colaborar com meu coração e meus sonhos realizar, um dia que tudo se tornará mais

claro, um dia que você virá buscar meu beijo de volta, o dia que eu achar o caminho de seus

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lábios, de seu corpo, te farei a mulher mais feliz do mundo, mas até lá me contentarei com

falsos orgasmos e falsas promessas de um vento que diz lhe entregar minhas cartas de

amor...

SEU CHAMADO:

Foi você que me mandou que eu ficasse em silencio, foi você que disse que não poderia me

amar, foi você que me transformou em um pesadelo, foi você quem me tirou o direito de amar

e ser amado, foi seu chamado que me tirou da estrada, que me apunhalou no coração, foi seu

chamado que me fez reparar que o gelo me necrosava.

ALGO NEGRO:

Algo negro corre em minhas veias, algo negro cobre meus olhos, algo negro desafia minhas

boas ações, algo negro afoga minha bondade, algo negro sorri maliciosamente para mim, algo

negro ensurdece meus ouvidos, algo negro me faz querer provar do proibido, algo negro me

faz brincar no escuro, algo negro me faz invencível, algo negro me faz poderoso, algo negro

destrói minha fragilidade, algo negro corrompe meus valores, algo negro me leva ao topo,

algo negro faz com que minhas mãos façam justiça, algo negro brilha dentro de mim,

transformando tudo em diamantes afiados, algo negro me corta por dentro, algo negro me

fortalece de solidão, algo negro possui meu corpo, mata minhas emoções...

PROMESSA:

Me diga se esta é uma promessa que pode manter, me diga que se as mentiras

não a afogarão e as rochas afiadas em mágoas não estraçalharam seu corpo, me diga se

suas promessas não são o veneno dissolvido na minha bebida, me diga que suas promessas

são aqueles minutos longos que mais parecem horas, me diga se suas promessas não são

as mãos do diabo costuradas em carne humana, tento lhe recompor, tento lhe santificar, tento

lhe regar e o bem lhe frutificar, mas você insiste em apodrecer , e tudo que há de restar é pura

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promessa...

Engrenagem:

Meus olhos estão doendo. A imagem está se distanciando, tomo este tempo não para

fazer poesia, mas sim para evitar minha autodestruição, esta que parece eminente, sim, criei

aversão gigantesca ao mundo à minha volta, estou com nojo deste mundo preconceituoso,

intolerante autodestrutivo, e ver que faço parte dele, e que sou engrenagem funcional dele,

faz de mim pessoa triste, pessoa chocada e deprimida. Não sou um homem realizado, não

tenho idade para isso, não sou um homem sábio, e do jeito que as coisas caminham não acho

que um dia sabedoria há de ser minha grande virtude, mas de uma coisa eu sei, sei que o

mundo se condena, se mata, vezes por baixo do pano, vezes por cima a olho nu mesmo, o

negócio é escroto e cheio de bosta, não tem o mínimo acabamento, e se tiver será feito se

sangue animal e humano ( é claro), o mundo se destrói, e com pílulas e pílulas de remédio

que tiram parte da coordenação motora de minha língua, mas me abatem psicologicamente,

tenho mais tempo para pensar; E foi esse maldito tempo extra que me revelou a grande

merda que tudo anda, e então eu pensei comigo mesmo, mas que droga, porque eu não viro

um emo e choro esse mundo? Porque faria parte desta engrenagem..

Por que eu não me encho de bebida e saio por ai a cambalear? Por que faria parte

desta engrenagem...

Porque eu não pego minha arma e saio atirando nas peças? Porque peça solta

quicando por ai, ainda é peça da engrenagem, mas peça solta quietinha, na cama, quase em

coma, sem movimento, quase estática, puta, essa nem parece engrenagem, parece enfeite,

então tá ai a solução, só a bosta da engrenagem de enfeite que dorme, no canto, inerte,

quieta, eufórica, louca para agir, mas sem movimento, porque não pode movimentar-se, este

é seu movimento, o silêncio, engrenagem solta e quieta, sem quicar, sem reclamar, apenas a

chorar, para dentro e se inundar, dos velhos rancores que guardou e agora se afoga em

lágrimas, pobre engrenagem, pode até sobreviver, mas agora que está molhada vai enferrujar.

LÁBIOS:

Quero roubar seus lábios para mim, o que alguém como você faz num lugar desses, se

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perdeu, nem imagina onde se meteu, agora não tem escapatória, esta presa no meu olhar,

agora você começa a flutuar, se da conta do que eu sou capaz, quero seus lábios, se

entregue pra mim, eu nunca serei o mesmo se nos encontrarmos de novo, esse sonho me

deixou muito acordado, mas se foi sonho porque ainda posso sentir o gosto do seu beijo?

DOR:

Como dói saber que você nunca poderá ficar ao meu lado, como dói saber que tudo está tão

destinado ao fracasso, queria poder olhar as estrelas, atravessar a camada de sujeira que

estupra o céu, e relaxar ao seu lado, como não posso me contento com o as brasas do fogo

que arde dentro de mim, desculpe se não faço sentido, mas tente o fazer enquanto queima de

dentro para fora para ver.

OLHOS:

De que servem os olhos,s e todos se recusam a ver, se tudo querem prever, em vez de o

presente viver, e com o passado aprender, de que servem os olhos se as lágrimas os borram,

de que servem os olhos se sempre choram, de que serve além da visão, porque ninguém aqui

quer ver a importância deles.

FEITIÇO :

Vou fazer um feitiço, me mudar de casa, de pais, de planeta, de universo, vou fazer um

feitiço, ser um príncipe mestiço, vou fazer fuzarca na seriedade, chutar a tristeza, viver

realizando as mais loucas proezas, vou fazer mágica com o cético, rir do crente, e no final

perceber que todo mundo é gente, assim, como, agente.

EQUILIBRISMO:

Tenho pouco tempo, a loucura já esta tomando conta do meu corpo, meu braço vai

para aquele lado e minha perna pra esse, meu olho esquerdo fecha, minhas lágrimas são

reconfortantes, deixam meu rosto mais quente, mas todos reclamam que eu choro, eu tento

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amar, eu procuro lábios para beijar, e romances eu poderia ilustrar, se um dia encontrar, mas

pura ilusão é acreditar que eu posso um dia encontrar minha princesa, não existe princesa,

não existe final feliz, meus sonhos se tornam antiquados, minhas poesias estão em transe e

perdem qualidade, vejo metade de uma carreira despencar e a outra queimar, antes mesmo

de começar, vejo decadência atrás de passos que parecem firmes, mas mais nada são que

puro equilibrismo.

AO MEU LADO:

Me diga o que é perfeição, lhe mostrarei o que é motivação, me dê liberdade, lhe mostrarei

as verdades, me defina, lhe mostrarei o quão fina é a camada que definiu, me chame de

burro, seus argumentos são nulos, me jogue no chão, nunca catarei as migalhas do seu pão,

me desafie, me machuque, corra de mim, mas entenda que não vive sem mim, vire os olhos

caminhe para longe, se sinta superior, tente afogar todo seu amor, pois no fim eu serei mais

forte, no fim eu terei encarado, no fim eu terei amado, me mostre todos os lados ruins da vida,

assim terei mais tempo de curtir os bons, se diminua na sua superioridade, mas saiba que

tem escolha, que pode mudar, que esse não precisa ser seu lugar, que não merece ser

apenas um corpo jogado a beira do amar, ainda posso sem nenhum esforço voltar a te amar.

A MODA:

"A moda virou uma piada. Os designers se esqueceram que existem mulheres dentro

das roupas. A maioria das mulheres se veste para os homens e quer ser admirada. Mas elas

também precisam andar, entrar num carro sem arrebentar a costura! Roupas têm que ter uma

forma natural."

Coco Chanel

Moda, nome curto de uma questão ampla, doentia marca registrada da sociedade

que preferia abordar e desbotar apenas com desgosto, mas apenas seria pura puxação de

saco do bem estar fazer isto.

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Aprecio a moda, aprecio a escandalização das cores e estampas que muitas vezes

não me fazem sentido, que muitas vezes até desafeto visual me causam, mas ignoro, afinal,

há de ser a moda, a nova tendência.

Certo e errado perdem nitidez em cima de uma passarela, aos meus medíocres

olhos tudo é igual, e ainda é mais difícil encontrar algo especial, afinal sou homem, e, há de

admitir, sou cego neste quesito.

Mas se como homem preciso me distanciar para enxergar com nitidez tudo, faço algo

que poucos fazem, tenho uma visão clara de todo o acontecimento, e não só fatos isolados.

Seria muito medíocre a moda se ela fosse apenas costura, não, não, ela não é apenas

costura, ela vai muito mais além, por isso sua compreensão há de ser tão difícil, porque ela

tem muitas faces, ela é muito mais que algo a ser abordado em uma folha de papel que se

decompõe, a moda não se decompõe.

Você pode dizer que moda é a tendência de consumo da atualidade.

A moda é abordada como um fenômeno sociocultural que expressa os valores da

sociedade - usos, hábitos e costumes - em um determinado momento. Já o estilismo e o

design são elementos integrantes do conceito moda, cada qual com os seus papéis

estritamente definidos. Que a moda é um sistema ocasionado e mutável, que se baseia em

fatos políticos, sociais, sociológicos.

PURA MERDA:

Compramos como loucos, vivemos eufóricos, vivemos em um tempo marcado por

decadência, não apenas atmosférica, mas uma decadência pessoal, onde maridos esperam

10 minutos no carro, onde evitamos contato social na rua, onde evitamos nos olhar no

espelho, onde evitamos falar a verdade, ou tecer elogios.

Entrou na moda se auto- mutilar e infelizmente nunca saiu de tendência, infelizmente

continuamos a nos cortar, a nos enterrar e aos poucos se calar sem ao menos se importar...

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Moda, doentia moda, vivemos na moda, se moda fosse apenas roupa, fosse apenas

costura, não teria graça, moda é muito mais, moda vem tachado e marcado na pele, não é

algo que possa cientificamente ser descrito, é algo que vem de dentro, pode vir de maneira

fria, doentia, e louca, mas vem de dentro...

EXCLUÍDO:

Me sinto totalmente desprotegido, sinto como se meu corpo fosse feito de vidro, e todos

pudessem ver através de mim, sinto me vazio, quase transparente, mas mesmo assim, todos

podem me ver, parece que estão olhando para mim, mas não estão, estão apenas olhando o

que estou protegendo, queria ser especial, desejo que fosse especial, mas sou feio, sou uma

aberração, sou um desprezado, sou o frágil espelho que o separa da realidade, e que aos

poucos vai se despedaçando, que parece frágil, mas quando eu estiver no chão, vai se

esquecer de mim, e será nessa hora que vou lhe cortar, será nessa hora que o que vem de

baixo o atingira.

PRESSÃO:

Com toda a pressão que venho sofrendo seria impossível não enlouquecer, fico apenas

pensando se esse meu começo de loucura já não se deu a muito tempo atrás, e fui o único

que não percebi, com toda a pressão que venho sofrendo me pergunto o que tenho feito,

como tenho feito, porque tenho feito, com toda essa pressão me pergunto, o que todos

pensam sobre mim, eles tem pena, tem raiva? Com toda essa pressão me pergunto se não

vou desmoronar em breve.

REFLEXO:

Me deparei com a perfeição para descobrir o quanto sou imperfeito, precisei chegar ao meu

limite para descobrir que estou apenas começando, precisei cair para entender que estou

apenas levantando, precisei chorar para me curar, precisei apanhar para aprender a brigar,

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precisei errar para voltar a acertar, precisei deixar de amar para beijar, precisei acabar com a

rima e a poesia para escrever sobre a verdade que aqui em meu coração habita, precisei me

deslocar de um lado para o outro para perceber que estou parado, precisei mentir para achar

a verdade, precisei matar para viver, precisei colocar os pés no chão para poder voar, precisei

deixar de escrever para viver, precisei deixar de viver para escrever...

DESCOBRI:

Descobri o sentido no sem sentido, descobri a rima onde não tinha, descobri a verdade

escondida no meio da mentira, descobri o amor no ódio, descobri a duplicidade de tudo que

nesta terra habita, precisei morrer para entender o que significa viver, precisei apagar meus

conceitos, precisei aprender todos os nomes para lembrar dos meus, precisei deixar de

enxergar com os olhos, tocar com os dedos, voar com os pensamentos, descobri que a

confusão tem sua própria organização e que o errado nunca erra, sempre acerta em errar.

ONDE VOCÊ FOI?

Fico te procurando, fico aqui largado chorando, fico aqui sem você me sentindo um lixo,

quebro coisas na parede, fico sem entender porque você foi embora, tento entender porque

fico tão sozinho, queria que soubesse que o tempo não passa sem você aqui, parece que

você me deixou a mil anos, fico te procurando, tentando reconstruir seu rosto com as pessoas

que passam na rua, fico reproduzindo seus braços no carinho de outro, queria estar ao seu

lado sem compromisso, sem pré conceito, sem terror, mas com muito amor, queria saber para

onde foi, sinto muito sua falta, parece que se foi para sempre, por favor volte para mim, por

favor não me deixe aqui, volte para mim.

CERTO:

Seu corpo se mexe devagar, o lugar esta certo, os movimentos certos, a musica certa, seu

cabelo esta certo, seus olhos brilham como nunca, todos sabem que esta certo, todos sabem

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que estamos avançando para o certo, e todos acham errado, mas não importa, vamos nos

beijar, por mais que não seja certo, o futuro pode agora descansar, quero este momento

aproveitar, pois sei que esse tempo não vai mais voltar, quero a noite toda dançar, encostar

meu corpo no seu, sei que o lugar esta certo, sei que o momento esta certo, mas de alguma

maneira todos acham errado, mas agora tanto faz.

ENCARAR:

Talvez o tempo não seja de mudar, mas sim de a verdade começar a aceitar, talvez não seja

tempo de sofrer, de arder, de morrer, mas sim de viver, de aproveitar cada momento, parar e

encarar, perceber que se esta mudando, que se esta melhorando, que a imperfeição não

passa de coisa do espelho, talvez não seja tempo de retrucar, mas de começar a aceitar,

talvez não seja hora de se rebelar, mas sim se revelar, se mostrar não mais forte, mas

compreensivo com o fato de que a incerteza será num futuro próximo a única certeza, talvez

seja tempo de finalmente se aceitar, de deixar de sonhar para acordar e uma doce realidade

contemplar.

MEUS SONHOS ESTÃO NO CHÃO:

Minhas asas estão quebradas e repousam em suas mãos, sinto suas palavras falando

dentro de mim, te daria tudo que eu tenho, todos meus sonhos estão despedaçados, alguém

me ajude, não importa quem ou como, mas fique ao meu lado, por favor, tenho esperado por

você. Eu vejo o mundo repousar em seu coração, eu sinto tudo quebrar por dentro, te daria

tudo que quisesse, todos meus sonhos estão despedaçados e estou pedindo, alguém me

salve, não importa como ou quem , mais alguém, por favor tenho te esperado.

QUERO ME LIBERTAR:

Começou tudo certo, éramos o casal perfeito, começou tudo de um pequeno momento,

começou tudo de um pequeno gesto, começou de uma pequena palavra, agora não posso

mais calcular o tamanho que tudo isso tomou, no começou eu gostava, mas agora começou a

me sufocar, e você vai me matar, e isso me recuso a deixar, quero me libertar de você, preciso

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me libertar, deus sabe que quero me libertar, eu me apaixonei, me apaixonei pela primeira

vez, e sabia que era de verdade, apenas não sabia que odiava amar, estranho sei que é, mas

tenho certeza que quero me libertar, eu quero me libertar, mas calma pois a vida continua, não

entenda mal, não quero viver sozinho, mas não quero ficar ao seu lado apenas para me ver

desmoronar.

ESCURO:

Espaços vazios, sons amedrontadores, olhares assustados, cantos escuros, heróis errados,

vibrações negativas, mas o show precisa continuar, mesmo que para isso tenha de abrir meu

coração, despedaçado, mesmo que para isso precise enxergar mais do que a imagem mostra,

me sinto nojento por dentro, mas o show precisa continuar, o show precisa continuar, dentro

de mim bate um coração despedaçado, dentro de mim vibra um terror sem limites e

precedentes.

MUNDO LOUCO:

O mundo é louco, mas quem liga, eu também sou, mas é bom que eu admita

assim sei que um pouco de lucidez me resta, pois o dia que de minha loucura renunciar ,sei

que minha paz nunca mais há de reinar..

Fico imaginando se foi o mundo que me enlouqueceu, ou se fui eu que enlouqueci o

meu mundo, tentando fazer tricô dei tantas agulhadas no meu dedo que mais pareço um

diabético, tentando frear o carro para não bater me lancei contra o vidro e consequentemente

o muro, vejo meu sangue escorrer pelo chão, nesse mundo louco tem um tom de cores

diferente, meu sangue é tão colorido quanto minha loucura, já que minha alma é cinza, cheio

de regras. Assim como eu o mundo é uma prisão, fico alucinando com um lugar livre, pura

ALUCINAÇÃO, puro desgaste do meu subconsciente, isso nunca vai acontecer, o mundo é

louco, e de pouco em pouco deixa todos loucos, não sou exceção, sou um a mais, um a

menos, mais um louco.

VOCÊ SABIA:

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Foi da maneira que disse que aconteceria, foi da maneira que você dizia, foi da maneira que

temia, foi da maneira mais abominável, sem amor nem gloria, sem herói no céu, foi horrível,

foi brutalmente cruel, foi um olhar carregado de desprezo que me derrubou, da maneira que

você me alertou, não me entenda mal, sempre confiei em você, mas me recusava a acreditar

que era tão excluído, tão odiado, desculpe se minha queda o afeta, se minha queda o

machuca, se minha personalidade se modifica demais, e acima de tudo se não consigo tirar

meus olhos do que mais me destrói, mas a tentação de acabar pelas mãos de uma outra

pessoa, parece mais digna, parece mais brava, pois vivi tempo demais de ações sem

coragem, de ações pequenas, me desculpe se a realidade se concretizou como você temia.

COISAS LOUCAS:

As coisas tem explicações loucas, na maioria das vezes não fazem sentido, mas tento as

seguir, lembro da primeira vez que a vi, seus olhos azuis brilhavam como nunca, e não havia

motivo de tanta bondade e beleza estarem na minha frente, nunca mereci tanto, o que fiz para

ganhar tanto, fui em sua direção, perdido, tinha toda a certeza do mundo que você era a

pessoa certa, a maneira com que seus cabelos balançavam com o vento podia jurar que já

havia a visto no céu, podia jurar que estive dançando em cima do céu quando a vi pela

primeira vez, podia jurar que você era uma miragem, e tenho quase certeza, pois quanto mais

corro, mais você se afasta, e na tentativa de não a fazer hesitar vi sua imagem borrar,

desaparecer.

AMIZADES:

Todos foram embora, meus romances se apagaram e se mutilaram, minhas conexões

foram para o espaço, será que sou tão insuportável, virei motivo de piada, adoeci,

enlouqueci.. Vi a garota dos meus sonhos virar uma vadia qualquer, meu melhor amigo um

esnobe que só me evita, talvez me auto-valorize, mas não mereço isso, talvez eu auto-

valorize os outros, pois vivo lambendo o chão deles, ver o mundo com clareza dói por isso

procuro me refugiar em alguns drinques e peço desculpas se por acaso eu cai em cima de

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alguém em alguma festa, mas até que é bom estar bêbado: dá pra passar a mão na bunda de

qualquer vadia e no máximo você toma um tapa, é mais um bêbado inconveniente, sem rumo,

triste, esnobado no mesmo círculo vicioso, mas a ressaca vai passar e novos amigos vão

chegar, até o dia que eles vão me decepcionar e eu vou me acabar.... NOVAMENTE...

São poucas as amizades que ficam, prometemos a eternidade a ventos passageiros,

este é, com certeza, um erro constante.

GAROTA ABERCROMBIE 2:

Você é a chama, estou vagando só no escuro e seus olhos azuis banham com luz o

meu caminho, você é distante em realidade, mas presente em meus sonhos, caminha longe

de mim, observo-a de longe, apenas me aproximo com pensamentos, você destrói e

reconstrói meu coração despedaçado, sangro de portas escancaradas ao relento, fico estático

à espera de um milagre, à espera de suas mãos, não para me erguer, mas para me chamar, e

me motivar a continuar...

A CASA:

As casas tem um tom cinza, as ruas não tem sujeira mas parecem cada vez mais

encardidas, o ar cada vez mais gelado e seco, os olhares mais nervosos, os super mercados

cada vez mais vazios, a janelas dos carros parecem cada vez mais escurecidas, e se

desviado o olhar se perde em meio a tantas arvores altas e imponentes que tentam invadir a

cidade, as montanhas parecem desertas cheias de neve, mas algo fica no topo, uma casa

sombria, uma casa grande, uma casa poderosa, inacessível, negra, errada, seria linda, mas

algo faz com que seja misteriosa, tão misteriosa que chama a atenção de qualquer um,

mesmo sabendo o perigo que lá habita.

O FIM:

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Fecho mais um capítulo de minha ainda rescém- nascida vida, através dessas páginas

errantes e poéticas revelo ao mundo meu abalado coração, meu esfarrapado coração que

caminha sem a quem poder dar as mãos. Não que eu seja pura tristeza, mas os canhões

armaram de atirar em mim em sincronia, e isso me fez cinza, mas é através deste cinza que

procuro revelar-me ao mundo. Espero que o mundo jogue cores de volta em mim, do mesmo

jeito que me arrancou e eu volte a tê-las. Interpretar essa daltonia forte, psicológica. Que ela

vá embora e eu volte a sorrir.

Sinto que através deste desabafo já posso desabrochar ao canto da boca um aliviado

sorriso... A libertação nunca esteve tão próxima. Preciso ir, hoje farei o que sempre quis fazer,

sempre quis ser a brasa que iniciou a explosão, ser a faísca que incendiou tudo, posso não

ser o centro das atenções dessa vez, mas sei que serei, assim que lerem isso, não era isso

que todos queriam, que eu fosse o perfeito, que eu fosse eternamente lindo, bem, terminamos

assim, que sua ultima visão de mim seja o garoto perfeito, ignore esse corpo carbonizado,

ignore essa alma ferida, ignore o holocausto de fogo que fiz de minha vida, ignore minhas

aflições, pois farei isso hoje. Apenas esta noite deixe que tudo corra livre, que não exista lei,

que não exista preconceito nem discriminação, que meu corpo perfeito queime no leito da

morte, esta noite deixo de ter um prazo de validade, essa noite alcanço o maior nível de

perfeição que poderia existir, morro com a alma purificada, com os arrependimentos se

desprendendo da pele. Apenas a noite onde jogarei tudo para cima, quando a luz e o fogo

atingirem seus olhos saiba que tudo é sua culpa, que tudo isso apenas aconteceu pois

exigiram tanto de mim, que era impossível não sucumbir, hoje viro lenda, perfeição, menino

dos olhos perfeitos convertido no bizarro mais belo que existe.

A beleza é subjetiva, assim como a morte, meu rosto perfeito pode ter escondido alguns de

meus conhecimentos, mas sei o quanto a beleza é passageira, por isso precisei imortalizá-la

esta noite, Alex me ajudou em tudo, posso até dizer que todo credito é dele, mas não vou

negar, estou louco para ver tudo queimar.

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FONTES: http://pt.wikipedia.org/wiki/Bullying

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Alexandre De Castro Alonso, nascido no ano de 1995, cursa o ensino médio e faz formação

profissional em teatro. Começou sua carreira literária no ano de 2008, rabiscos e poesias

originaram o livro ‘’Torno o público meu diário.’’ Em seguida vieram publicações esporádicas

no jornal ‘’Folha de São Paulo.’’ Junto a formação profissional Alex participa ativamente de

curtas metragens disponibilizados no ‘’You Tube’’, somando um total de mais de 300.000

exibições. A base em redes sociais e um blog que o acompanhou durante os anos de 2006 e

2007 tornaram possível a descoberta e aprimoramento de suas habilidades artísticas. Vive

atualmente com sua mãe em São Paulo, Brasil.

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Através desta obra, Alexandre Alonso mostra ao leitor brasileiro o Bullying de uma maneira

nunca antes vista em solo nacional, por meio de uma ficção com elementos reais do cotidiano

de muitos jovens. A história é ambientada em uma cidade fictícia, o clima da mesma é tão frio

quanto seus habitantes. Através de relatos ficcionais do personagem Alex, a realidade se

torna uma questão de percepção, e as discórdias de ser jovem na sociedade atual são

pautadas por sentimentos de angustia e uma tentativa de fuga dos sentimentos internos. A

jornada tem início no primeiro dia de aula, quando os portões da escola recebem os alunos,

cada um com uma recepção alternativa. Gustavo, Alex e Beatriz são a representação dos

estereótipos sociais, que por mais diferentes que sejam, se mostram muito semelhantes nas

questões internas e sócio afetivas. Um convite ao leitor para penetrar em uma leitura

aparentemente macabra, que esconde em suas manchas pretas um sentimento adormecido,

o amor.

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