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A NECESSÁRIA INSTITUCIONALIZAÇÃO DO CONSELHO MUNICIPAL DE SALVADOR E ÀS CONDIÇÕES PARA SUA

EFETIVA ESTRUTURAÇÃO

Fagner Cordeiro Dantas Chefe do Setor de Implementação dos Instrumentos de Política Urbana da Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbano, Habitação e Meio Ambiente e Presidente da comissão instituída para regulamentar o Conselho Municipal de Salvador. Diretor da Sociedade Brasileira de Urbanismo (SBU). Bacharel em Urbanismo (UNEB); Bacharel em Direito (UFBA); Mestre em Administração (NPGA/UFBA). [email protected]

RESUMO

Este artigo busca mostrar a importância do processo de institucionalização de instâncias de participação popular para o planejamento urbano da cidade. A participação tem sido apontada como importante fator de ampliação da eficiência do planejamento e da gestão urbana, sendo, no entanto, cada vez mais vista com ressalvas pelo baixo impacto modificativo que vem tendo sobre as práticas autocráticas que caracterizam a maioria das administrações municipais, principalmente das pequenas cidades. O artigo busca resgatar aspectos positivos da participação e encarar os principais desafios da sua implementação. Para isso, descreve alguns aspectos da experiência de implantação do Conselho Municipal de Salvador, destacando os motivos que tornam essa implantação importante e as condições necessárias para torná-la efetiva. Ao final, conclui abordando a necessária integração entre poder público e sociedade civil.

PALAVRAS-CHAVE :

Conselho Municipal de Salvador; Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano de Salvador; Participação Popular; Prefeitura de Salvador; e Planejamento Urbano.

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A NECESSÁRIA INSTITUCIONALIZAÇÃO DO CONSELHO MUNICIPAL DE SALVADOR E ÀS CONDIÇÕES PARA SUA EFETIVA ESTRUTURAÇÃO

1. INTRODUÇÃO

O Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano – PDDU de Salvador (Lei Municipal n.º 7.400, publicada em 20 de fevereiro de 2008), foi alvo de ferozes críticas por parte de alguns setores da sociedade civil organizada, imprensa e academia. Não obstante tais críticas tenham as mais diferentes motivações e não esquecendo o fato de que uma parte delas pode efetivamente contribuir tanto para o aperfeiçoamento da própria lei quanto do seu processo de implementação, não tem sido dedicada a mesma atenção a algumas inovações positivas trazidas por este plano.

Dentre estes avanços inquestionáveis (seja essa falta de questionamento por conta da excelência do conteúdo ou simplesmente do desconforto em enaltecer o que só se quer desdenhar) destacam-se:

1) a Política Municipal de Habitação de Interesse Social, contribuição advinda das discussões prévias capitaneadas pela Secretaria Municipal de Habitação, à época sob a tutela da professora Ângela Gordilho, referência nacional na questão;

2) a Política Municipal de Saneamento Básico, construída com importante aporte conceitual e operacional do Mestrado em Engenharia Ambiental e Urbana da UFBa, trazida para o bojo do processo participativo de elaboração do PDDU, durante uma de suas audiência públicas, pelo professor Luís Roberto Moraes, reconhecido como um dos maiores especialistas na matéria. Cabe destacar que, diferente da Dra. Gordilho, o Dr. Moraes não mantinha qualquer vínculo funcional com a administração municipal, tendo a contribuição trazida por ele a marca indelével do comprometimento cidadão com o futuro da sua cidade e de seus coabitantes;

3) A Política Institucional de Gestão Urbana, cujo conteúdo foi resgatado de um extenso processo de pesquisa e análise sobre a estrutura administrativa de Salvador em contraposição aos novos paradigmas da administração das cidades, que compôs os estudos preparatórios para o Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano de 2004, mas cujas diretrizes foram censuradas por uma administração cuja matriz de estratégia governamental não priorizava o empoderamento da população como um todo. Esse material e as diretrizes que instituíam um novo modelo de governança mais condizente com os ventos democratizantes que assolavam o país desde 2002, reforçados localmente em 2004, foram resgatados e reforçados pelo exame das experiências contemporâneas de participação popular em todo o país, de modo a construir um Sistema Municipal de Planejamento e Gestão plenamente conectado com o paradigma participativo da gestão urbana atual. Esse trabalho foi liderado pela Dra. Heloisa Araújo, de longa e reconhecida atuação no planejamento municipal, sendo, à época do PDDU/04, responsável pelos estudos e proposições da estrutura institucional, e, no processo de elaboração do PDDU/08, atuando como consultora para reavaliar e reinserir todo esse material, desta vez de forma irrestrita, no corpo do texto legal. Esse novo modelo de gestão urbana participativa, apresentado para representantes de diversos segmentos da sociedade civil organizada pela primeira vez durante as

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reuniões preparatórias da III Conferência Municipal das Cidades, ocorrida em agosto de 2007, foi efusivamente recepcionado pelos mesmos, demonstrando que atendia (ou, como foi dito por eles à época, “excedia”) os anseios populares de participação nos desígnios da cidade do Salvador.

Caberia certamente uma ampla análise do impacto positivo que terão esses novos elementos trazidos pelo PDDU/2008, às expensas do interminável e repetitivo relicário de imperfeições que lhe são atribuídas (como se algum plano pudesse sequer almejar à perfeição, postura imprópria quando se reconhece, sem ingenuidades postiças, o plano como o produto de um processo necessariamente conflituoso), no tecido social da cidade. No entanto, dentre tais elementos, haveremos aqui de destacar, não pela sua preponderância intrínseca sobre os demais, mas pela sua urgência e relevância na própria implementação das duas outras políticas setoriais, aquele que julgamos merecedor de uma atenção e um esforço especiais nesse momento em que se inicia o processo de consolidação do PDDU/2008 como marco regulatório do desenvolvimento municipal e como pacto sócio-territorial em torno de um projeto de cidade: a política institucional. E dentro desta, daremos especial atenção neste artigo ao Conselho Municipal de Salvador, órgão central da citada política.

O presente artigo, apesar de não prescindir da hoje extensa literatura teórica sobre gestão democrática e conselhos de controle social de políticas públicas, busca retratar um olhar interno à administração municipal e a preocupação daqueles que terão a tarefa de operacionalizar, dentro dos limites conhecidos da máquina governamental local, uma grande conquista que, até então, apenas figura no texto legal. O autor vale-se, para isso, da condição de agente participante, enquanto urbanista, servidor municipal e membro da equipe técnica responsável pela elaboração do PDDU/2008. Estabelecido o objetivo e as circunstâncias do presente artigo, o mesmo encontra-se assim estruturado. No tópico 2, estabelece-se as bases para a necessidade de institucionalização da gestão urbana democrática. No tópico 3, apresenta-se o Sistema Municipal de Planejamento e Gestão como instrumento de gestão democrática, destacando neste o Conselho Municipal de Salvador - CMS, que tem o seu papel comparado com o do Conselho de Desenvolvimento Urbano – CONDURB, motivo de controvérsia para a instalação do primeiro. No tópico 4, estabelecida a importância da institucionalização do CMS, apresenta-se os passos operacionais para tanto. No tópico conclusivo, fazemos as considerações finais sobre os desafios e perspectivas que se colocam diante da instalação do CMS.

2. A IMPORTÂNCIA DA INSTITUCIONALIZAÇÃO DA PARTICIP AÇÃO POPULAR NO PLANEJAMENTO E NA GESTÃO URBANA.

“Institucionalizar” significa, a partir da criação de uma instituição, retirar um elemento, um estado ou um processo de uma possível zona de indeterminação gravitacionada por atos de vontade, medidas de ocasião ou pressões conjunturais. No momento em que determinado arranjo empoderador é entendido como indispensável às práticas políticas, seja como atribuição prévia de legitimidade ou como garantia posterior de efetividade, é prudente que esse arranjo migre da esfera dos felizes alinhamentos espontâneos ou socialmente construídos para o âmbito das instâncias gerenciais da máquina pública. A importância dessa institucionalização, que tem larga trajetória, é apontada por Mauro Santos (2011, p. 255): “A

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institucionalização de mecanismo e instrumentos de gestão democrática da cidade é adotada desde a Constituição de 1988 como um princípio fundamental para a democratização da sociedade brasileira.” Por outro lado, não podemos fechar os olhos para importantes alertas acerca das limitações dessa institucionalização. Alertas como o de Ermínia Maricato (2011, p. 93): “Ocorre uma atração muito forte pelo espaço institucional ou pela institucionalização de práticas participativas, como se isso constituísse um fim em si.” OU como o de Marcelo Lopes de Souza (2006, p. 33): “Não se deve atribuir aos instrumentos, às técnicas e às rotinas a responsabilidade de instaurar maior justiça social ou criar condições para uma melhor qualidade de vida.” Assim, ao tempo em que enaltecemos a institucionalização de instrumentos participativos como os que serão aqui discutidos, não devemos ter ilusões quanto ao seu alcance por si só, ou seja, caso não sejam apropriados pelos cidadãos.

Nesse sentido, cabe observar que não basta multiplicar os espaços de diálogo entre Poder Público e Sociedade Civil ou ampliar os momentos de troca de ideias entre os diferentes agentes produtores do espaço urbano. A intersecção que se quer garantir entre a visão governamental e a visão popular decorre de uma mudança de ordem qualitativa e não quantitativa. Implica no cultivo das reentrâncias, existentes ou a prospectar, entre as duas esferas mencionadas, ou, em outras palavras, assume-se, por um lado, a ênfase sobre o quê o governamental tem de social, qual seja, a sua condição de partícipe e não artífice da realidade vivida, e, por outro, a ênfase sobre o quê a sociedade tem de governo, ou seja, a sua condição de concedente da autoridade pública exercida por via de mandato.

Reescalonar relações de poder historicamente condicionadas é encargo de sublime orquestração, que carece sim de batuta firme, mas muito mais de ouvido aguçado para perceber acordes dissonantes em meio a aplausos de exaltação, antes que os mesmos conjuguem-se numa cacofonia esteticamente imprestável, a ser coroada de apupos. A reconstrução da fala perdida, o redimensionamento da autoridade meramente reverencial e a horizontalização do binômio Administração/administrado, permitindo que, ainda que fitando em direções diferentes, os olhares se cruzem e dialoguem, são processo que, não obstante contra-inerciais, são absolutamente imprescindíveis à consubstanciação de um novo modelo gerencial. Como bem coloca Regis Fernandes de Oliveira (2002, p. 109):

A democracia, hoje, não é só vista como o governo da maioria. Caso fosse assim, bastaria a eleição. É muito mais que isso. É a manutenção das regras do jogo. É o respeito à minorias. É a participação na tomada de decisões. É uma interação perfeita entre o eleito e os eleitores. É o intersubjetivismo de ações e reações como forma de sentir o pulsar da coletividade e a tomada de decisões passa a ser um processo complexo. Não apenas o movimento anímico de dizer sim ou não, mas a busca dos efetivos sentimentos que pulsam no interior da sociedade.

Essa nova forma de encarar a democracia, ainda que mais almejada do que real, não somente deve cogitar de uma permeabilidade da deliberação pública em face não mais dos anseios (nutriente do paternalismo que nos é tão próprio), mas dos argumentos ideológicos e posturas políticas da sociedade civil, mas principalmente fomentar uma cultura de co-responsabilização sócio-estatal, fértil em produzir o mais importante liame fundamental na efetivação das políticas públicas: o comprometimento. Sobre o tema, já tivemos oportunidades de ressaltar a sua importância nos seguintes termos:

Comprometimento, etimologicamente, significa uma promessa recíproca, ou seja, uma relação de confiança mais do que de império ou submissão. A dimensão

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humana, praticamente expurgada do modelo burocrático de administração, retoma aqui sua melhor condição de influenciar positivamente a condução da coisa pública, não sob o ponto de vista do favorecimento e da prevaricação, como era vista na crítica webberiana, mas sim sob a perspectiva da emancipação cidadã e a sua recondução para o centro da esfera pública (DANTAS, 2009, p. 45). .

Com o comprometimento entre os construtores das políticas públicas, o que implica dizer o reconhecimento e a aceitação das regras do jogo deliberativo, as divergências eventuais e necessárias florescem e esgotam-se no interior do processo discursivo em prol da manutenção das instâncias de deliberação efetiva. Se assim não for, estas instâncias podem implodir em decorrência do desgaste natural pelo atrito entre suas peças. Mas, mais perigoso ainda e com o mesmo efeito danoso para o novo paradigma participativo, estão as acusações de inoperância dessas instâncias por parte daqueles que querem reeditar a acessibilidade seletiva garantida pelos meandros protocolares e seu intransponível corpo de assessores. O comprometimento forjado no interior da instância deliberativa legítima faz com que todos sejam corresponsáveis pelas decisões tomadas, sem supostas alegações de autoritarismos de um lado e alijamentos de outro. Ônus e bônus serão debitados e creditados na conta de todos.

Diante dessa premissa básica, os atores sociais e governamentais, que nesse momento irmanam-se na condição de construtores coletivos das políticas públicas em questão, certamente envidarão todos os esforços necessários, bem como mobilizarão as suas respectivas bases de sustentação, para garantir que tais políticas sejam não só efetivadas, atestando a sua eficiência, quanto bem sucedidas, denotando a sua eficácia na condução compartilhada dos desígnios da cidade. A eficácia das políticas públicas não é uma meta simples, de acordo com o quadro negativo exposto por Ribeiro & Grazia (2002, p. 46): “São inúmeras as normas e os ideários que, por não corresponderem à organização social, aumentam o domínio da forma sobre o conteúdo das relações societárias, atrasando a efetiva vivência da democracia.” Esse quadro ressalta o ganho de eficácia proporcionado por um planejamento a muitas mãos, como sintetiza Lubomir Ficinsky, citado por José Afonso da Silva (1995, p. 98), ao dizer que “outro resultado, nunca negligenciável no planejamento democrático, é que a discussão pública gera o apoio – se o plano é bom, evidentemente – e esse apoio público garante a sua execução.”

Mas como diz o ditado popular, “de boas intenções, o inferno está cheio.” É necessário, por sob os louros do reconhecimento tácito de uma irreversibilidade do paradigma participativo e pela igualmente flagrante insubsistência de um autoritarismo anacrônico e politicamente auto-fagocitário, assumir o trabalho árduo de cimentar o caminho ainda imberbe, pois, como faz ver Marcelo Lopes de Souza (2008, p. 386-387): “Implementar processos participativos não é fácil. O administrador público e a força política que se dispuserem a contribuir para uma maior democratização do Estado, introduzindo mecanismos e instâncias de participação, esbarrarão em alguns obstáculos.” No mesmo diapasão segue o alerta de Mauro Santos (2011, p. 276-277): “Mesmo que os mecanismos de participação estabelecidos nos Planos Diretores sejam colocados em funcionamento, é muito difícil e improvável que o município se coloque em campanha permanente consiga manter mobilizados os diferentes segmentos sociais.”

Neste ponto, retomamos a necessidade de conjugar adequadamente o verbo institucionalizar. No caso do Título IX do PDDU/2008, o itinerário do seu conteúdo revela o grau de amadurecimento do seu processo de institucionalização. Se, num primeiro momento, ainda no final dos anos 90 e início dos anos 2000, quando concluso o Diagnóstico Institucional que

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serviu de subsídio para o PDDU/2004, a carga axiológica sobre a questão da participação popular na gestão pública ainda pôde ser solapada pelas engrenagens já carcomidas de um mecanismo hermético de apossamento da coisa pública, não há de se negar, pela quantidade de material reunido nesse diagnóstico e, principalmente, pela sequência de diretrizes propostas para integrar o plano e que estruturariam um sistema participativo de gestão pública, que o paradigma participativo já reluzia no horizonte das administrações municipais brasileiras. Por outro lado, a abertura do processo de revisão do PDDU/2004, que deu origem a dois anos de discussões nos mais diferentes fóruns sob qualquer aspecto (territorial, temático, público-alvo, etc.) e, principalmente, o resgate desse material, sua atualização e sua posterior inscrição no texto final do PDDU/2008 sem restrições quanto à participação da comunidade na gestão pública, mostram que o paradigma participativo está sim consolidado no âmbito do planejamento urbano em Salvador, seja como reverberação no marco regulatório nacional desse planejamento, qual seja, o Estatuto da Cidade (Lei n.º 10.257/01), seja como produto da coalizão de forças sociais que já não acatam a passividade cúmplice do silêncio cômodo ou o niilismo roto da relação pedra/vidraça, típico do exercício da “engenharia de obra pronta”.

3. O SISTEMA MUNICIPAL DE PLANEJAMENTO E GESTÃO E O CONSELHO MUNICIPAL DE SALVADOR

Cabe observar que o PDDU/2008 tem uma série de indicações para a implementação da gestão democrática da cidade, estando essa entre os princípios dirigentes da Política Urbana do município. Esse princípio não esgota sua aplicação apenas nos preceitos traçados no Título IX do PDDU/2008. A questão da participação popular na gestão urbana aparece, entre outros pontos do texto legal, nas seguintes colocações:

• Como finalidade do PDDU/2008: Art. 3º, VI; • Como princípio de Políticas Públicas como a de Meio Ambiente (Art. 18, III) e a

de Cultura (Art. 46, IV); • Como um campo de atuação específico na Política de Habitação: Capítulo IV do

Título VI.

No entanto, entendendo que o paradigma participativo deve ir além da sua incorporação ao modus operandi das secretarias e do governo municipal como um todo, o plano diretor avança no sentido de, com o efeito esperado que se abreviou no tópico anterior, institucionalizar a participação na gestão urbana através da conformação do que se chamou Sistema Municipal de Planejamento e Gestão – SMPG. Dentre os instrumentos de otimização do processo de planejamento e gestão municipal (art. 288), o SMPG destaca-se como veículo de internalização do paradigma participativo, haja vista que entre seus objetivos está “assegurar a participação dos cidadãos e de suas associações representativas no planejamento e gestão da política urbana” (art. 290, V). Duas são as unidades centrais do SMPG: os órgãos de planejamento e gestão da administração municipal e o Conselho Municipal de Salvador – CMS (art. 292). Com relação aos órgãos de planejamento e gestão, o principal requisito operacional para sua inserção dentro do âmbito do SMPG proposto pelo Plano Diretor é a implantação, em cada Unidade da Administração Municipal, de um núcleo de planejamento que articulará as políticas setoriais com o Plano Diretor e com o órgão de planejamento em si.

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Não se subestima aqui a importância desse planejamento em rede. Porém, por uma questão de relevância e urgência com relação a deflagração do paradigma participativo como um todo, ressaltamos aqui o necessário processo de estruturação institucional do Conselho Municipal de Salvador - CMS. Nesse sentido, o PDDU/2008 atendeu ao disposto no guia do Ministério das Cidades para a elaboração de planos diretores participativos (MINISTÉRIO DAS CIDADES, 2005, p. 32):

A lei do Plano Diretor deve estabelecer a estrutura e o processo participativo de planejamento para implementar e monitorar o Plano Diretor. O monitoramento compreende avaliações, atualizações e ajustes sistemáticos, que devem estar definidos na lei. O Plano Diretor deve definir também as instâncias de discussão e decisão do monitoramento como o conselho da cidade, sua composição e suas atribuições.

É importante verificar que a institucionalização do CMS representa uma ruptura significativa em relação ao modelo de participação anteriormente instituído na cidade de Salvador. O órgão preexistente que mais se aproxima da figura do CMS é o Conselho de Desenvolvimento Urbano – CONDURB, criado em 1975. Mesmo com a superveniência da Lei do Processo de Participação no Planejamento Urbano, surgido no bojo da experiência do PLANDURB, na década de 70, e aprovada em 1983 (Lei n.º 3.345), não houve a substituição do CONDURB na função de auscultar a sociedade soteropolitana a cerca das decisões de peso envolvendo grandes investimentos privados ou intervenções e políticas públicas que impactassem a dinâmica urbana da capital.

É fácil observar que o contexto ditatorial (1964-1985) se reflete na natureza consultiva, nas competências e na composição do CONDURB. O seu decreto de regulamentação trata de explicitar o seu caráter consultivo (art. 2º do Decreto 4.913/76) nas decisões do Poder Público, preenchendo a lacuna sobre isso na lei de criação do CONDURB (art. 3º da Lei 2.739/75). Quanto às competências, fica claro esse mesmo caráter, uma vez que essas competências são configuradas através de ações vagas como “sugerir”, “recomendar”, “assessorar”, “opinar” e “aconselhar” (art. 3º da Lei 2.793/75) direcionadas aos estudos e decisões do Poder Público. Quanto à composição, a lei de criação do CONDURB intitula-o “órgão de integração Prefeitura-Comunidade” (art. 3º da Lei 2.793/75). No entanto, essa “Comunidade” era representada por integrantes de entidades previamente indicadas, conforme o contexto da época, e não escolhidas no âmbito da sociedade civil organizada, como é hoje comum. Assim, ao invés de refletir a grande maioria da população urbana da cidade, entidades como “Associação Comercial da Bahia”, “Lyons Clube”, “Rotary Clube”, entre outras (Art. 1º da Lei 2.793/75), congregavam sim a elite social e econômica da época, ou seja, uma parcela ínfima do que a lei de criação do CONDURB chamou de “Comunidade”.

Já o Conselho Municipal de Salvador, tal qual o CONDURB, reflete totalmente o contexto de sua época, ou seja, o período de consolidação do paradigma participativo. Nesse sentido, o processo de conformação do modelo final do CMS seguiu um trâmite estritamente democrático, sendo inclusive apresentado, ainda em uma versão preliminar, a diversas lideranças que compunha, à época, a Comissão Organizadora da III Conferência Municipal de Salvador. Essas puderam ponderar sobre a melhor forma de verem representada, dentro da administração municipal, a opinião popular. No entanto, mais do que isso, e mais do que era esperado pelas próprias lideranças comunitárias, o CMS já nasce com uma natureza essencialmente diferente daquela do CONDURB. Se nesse, a condição consultiva era

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exclusiva, no CMS, o caráter consultivo é a exceção, visto que só será consultivo nas matérias que não tratarem dos eixos temáticos que integram a Política Nacional de Desenvolvimento Urbano: Planejamento e Gestão do Uso do Solo; Habitação; Saneamento Ambiental; e Mobilidade Urbana (Art. 297 da Lei n.º 7.400/08). Essa distinção, no caso do Conselho Municipal de Salvador, é ressaltada pelo resultado da pesquisa nacional sobre planos diretores comentada por Mauro Santos (2011, p. 260):

Mesmo que grande parte dos Planos não defina o caráter das decisões do Conselho, é possível perceber a predominância de Conselhos de caráter consultivo ou de natureza híbrida (consultivo e deliberativo), que na maioria das vezes garantem algumas atribuições deliberativas específicas e não permitem que a sociedade debata e delibere sobre planos, programas e projetos de desenvolvimento urbano. Ou seja, a participação da sociedade tem apenas caráter opinativo na maioria dos Planos Diretores avaliados nos estados.

É importante ressaltar nesse ponto que a Política Nacional Planejamento Urbano, inaugurada a partir da instituição do Ministério das Cidades em 2003, definiu entre suas bases fundamentais a questão da participação popular no planejamento das cidades. Sendo assim, no processo de construção deflagrado pelo MCidades por meio das Conferências Municipais, Estaduais e, finalmente, da Conferência Nacional das Cidades, realizadas pela primeira vez também em 2003, já ficou clara a proposta de ampliar o universo discursivo em torno das políticas públicas relativas ao desenvolvimento dos centros urbanos brasileiros. A constituição, nesse mesmo processo, do Conselho Nacional das Cidades já dava as mesmas indicações nesse sentido. A recomendação para que estados e municípios, por sua vez, também procedessem à formação de seus próprios conselhos, reforça o momento atual de institucionalização do CMS (Art. 296, Parágrafo Único da Lei n.º 7.400/08). O estado da Bahia já fez o seu “dever de casa” ao instituir, mediante a Lei 10.704/07, o seu Conselho Estadual das Cidades, que já se encontra em pleno funcionamento, estando a Secretaria de Desenvolvimento Urbano do Estado da Bahia – SEDUR dando-lhe suporte operacional. É importante destacar que o governo do estado, através de esforços da SEDUR, reconhece a precariedade dessa situação, já havendo articulações no sentido de autonomizar o Conselho Estadual das Cidades, tornando-o uma unidade orçamentária própria, com uma equipe dedicada exclusivamente a atender as demandas do conselho e dos conselheiros. Os avanços nesse sentido tanto por parte do Conselho Nacional das Cidades quanto do Conselho Estadual das Cidades já abreviam que esse procedimento também deve ser adotado o quanto antes pelo Conselho Municipal de Salvador, dentro das etapas posteriormente descritas aqui.

Porém, alguns outros elementos precisam ser destacados no processo de institucionalização do CMS. Uma questão importante é o reconhecimento de que o CMS não pode ser identificado com um órgão da Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbano, Habitação e Meio Ambiente - SEDHAM1. Não obstante ele tenha um foco específico nos quatro eixos da Política Urbana, onde recai o seu caráter deliberativo, a sua referência mais ampla é o desenvolvimento urbano como um todo. Daí a sua composição (art. 299 da Lei 7.400/08) incluir diversas secretarias municipais e autarquias que atuam sobre aspectos específicos da realidade urbana. Além disso, integram ainda o CMS órgãos estaduais e federais cujas

1 À época da aprovação do PDDU/2008, essa vinculação era com a Secretaria Municipal de Planejamento, Urbanismo e Meio Ambiente – SEPLAM. A partir da reforma administrativa de 2009, a SEPLAM foi unificada com a Secretaria Municipal de Habitação – SEHAB, tornando-se a atual Secretaria de Desenvolvimento Urbano, Habitação e Meio Ambiente – SEDHAM.

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competências têm o potencial de interferir diretamente na dinâmica urbana da cidade. A natureza da sua composição condiciona o bom funcionamento do CMS a uma articulação muito mais da administração pública como um todo do que apenas a um esforço da própria SEDHAM. Não escapa, porém, às obrigações da SEDHAM, até porque o CMS será presidido pelo seu titular (art. 299, §1º), deflagrar o processo para a sua instalação, o que implica também nessa articulação governamental, principalmente no sentido de comprometer os titulares dos demais órgãos envolvidos, o que terá efeito direto na efetividade do caráter deliberativo do CMS.

Um último elemento fundamental que deve ser destacado antes de serem detalhados os aspectos operacionais para a institucionalização do CMS é a necessidade de preservar e ampliar a legitimidade que o CMS tem, concedida eminentemente pela presença das principais lideranças e entidades sociais ligadas às lutas históricas em torno das questões urbanas da cidade. Os vinte quatro membros do CMS (60%) foram escolhidos livremente pelos seus segmentos durante a III Conferência da Cidade de Salvador, em um processo amplamente democrático e transparente. Tais entidades conferem uma legitimidade insubstituível ao CMS. Não bastasse a importância intrínseca dessa legitimidade, as experiências com conselhos sociais em todo o Brasil têm mostrado de forma incontestável que a efetividade desses conselhos é diretamente proporcional à legitimidade que os mesmos tem junto à sociedade como um todo. Ou seja, aqueles conselhos cuja composição mostra-se comprometida com as posições do Poder Público inviabilizam as suas possibilidades de tornarem-se espaços de livre deliberação, onde divergências possam aflorar, mostrando diferentes alternativas, a serem devidamente depuradas pela coletividade com o foco na melhor opção para a cidade. Nesse sentido, tanto esse processo inicial de convocação e de instalação do CMS quanto principalmente as garantias para o seu funcionamento posterior devem ser executado com extrema habilidade por parte da SEDHAM, de modo a não provocar suscetibilidades, mas, pelo contrário, angariar ainda mais apoio popular para lastrear as deliberações emitidas pelo CMS.

4. PASSOS PARA INSTITUCIONALIZAÇÃO DO CMS

4.1. CRIAÇÃO DE UMA UNIDADE ORÇAMENTÁRIA (ART. 297, PAR. 4º)

Está previsto no texto do Plano Diretor, no parágrafo quarto do artigo 297, que o Poder Executivo Municipal garantirá todo o suporte necessário ao pleno e regular funcionamento do Conselho Municipal de Salvador – CMS. Mais que isso, o texto da lei conclui determinando que o CMS passe a constituir uma unidade orçamentária. É importante verificar a dimensão que assume o CMS no momento em que o mesmo se torna uma unidade orçamentária dentro da relação de despesas públicas. Há clara distinção entre o CMS receber o apoio operacional da secretaria, que tem um orçamento para a realização de diversas ações; e o CMS ter o seu próprio orçamento para empreender as ações da sua programação interna. Não obstante a SEDHAM tenha efetivamente que capitanear o processo de articulação e deflagração das tratativas para a instalação do CMS, e ainda que a mesma possa dar o suporte técnico necessário para as primeiras reuniões, essa situação não pode ser sustentada por muito tempo, seja pela outras atribuições da SEDHAM, seja pela natural autonomização do CMS em

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decorrência da sua consolidação como espaço de construção coletiva das políticas públicas de desenvolvimento urbano, intensificando a demanda sobre a sua estrutura.

Esse processo de autonomização passa necessariamente pela criação da unidade orçamentária “Conselho Municipal de Salvador” dentro do escopo do orçamento municipal. A sua condição acessória ao orçamento da SEDHAM certamente é um impeditivo para a consolidação completa do CMS enquanto um espaço de diálogo entre Poder Público e Sociedade Civil. No momento em que a dependência (direta ou indireta) com a SEDHAM pode colocar esse órgão e, por extensão, os representantes do Poder Público, em uma posição mais vantajosa em relação aos representantes da Sociedade Civil, perde-se a imprescindível isonomia entre os participantes de um diálogo, tornando-o um monólogo oficial sacramentado liturgicamente pelas vozes silenciadas de um plenário refém da sua presidência, exercida, conforme a lei do PDDU/2008, pelo titular da SEDHAM que, nessas condições, passa a ser também o dono da “chave do cofre”. Marcelo Lopes de Souza lembra bem a importância do suporte financeiro para a manutenção do planejamento urbano democrático:

É óbvio que a escassez de recursos sabota a participação, por desestimulá-la ou esvaziá-la de grande parte da sua importância; por outro lado, quanto mais ampla e efetiva for a participação política (e, neste ponto, não se tem em mente só o interior dos canais formais abertos por iniciativa estatal), mais chances terá ela de modificar as regras do jogo que afetam escassez de recursos para investimentos e restringe a margem de manobra do Estado local.

A criação da unidade orçamentária “Conselho Municipal de Salvador”, não só reforça o papel do CMS para além de um órgão associado à SEDHAM, passando a ser visto como um órgão de governo, mas, principalmente, permite o pleno funcionamento do conselho, no momento em que há uma maior flexibilidade no gerenciamento dos recursos próprios. Essa flexibilidade é essencial no momento em que o CMS deve responder a demandas diversas ao longo da sua atuação, como reuniões extraordinárias, cursos de capacitação, necessidade de perícias técnicas ou translado de especialistas. Por fim, a criação de uma unidade orçamentária própria para o CMS marca a sua institucionalização no momento em que desvincula a sua existência de qualquer orientação política por parte do titular da SEDHAM ou mesmo do Prefeito. Fundamentado no texto legal e ancorado em um orçamento próprio, o CMS tem as condições mínimas para se consolidar.

4.2. CRIAÇÃO DE CARGOS PARA A SECRETARIA EXECUTIVA DO CMS

Não basta, no entanto, a determinação legal e os recursos orçamentários para garantir o funcionamento do CMS. É crucial providenciar os recursos humanos para dar o suporte necessário a todas as reuniões do CMS, bem como dar os devidos encaminhamentos a partir das deliberações tomadas. Não basta a boa condução por parte do presidente ou a atuação responsável por parte dos conselheiros. Diversas atividades são acessórias ao funcionamento normal do CMS, como a relatoria das reuniões, auxílio no controle do tempo das falas, providências quanto à alimentação durante as reuniões, etc. Além dessas atividades mais corriqueiras, existem outras que requerem uma equipe interna capacitada, como a preparação de apresentações técnicas, sistematização e envios de documentos (atas, resoluções, etc.), estruturação de capacitações para os conselheiros, articulação para vinda de especialistas

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requeridos por alguma pauta específica do CMS, etc. Todas essas tarefas dão conta de que para garantir a consolidação do CMS e a excelência de sua atuação, é fundamental ter uma equipe interna e permanente.

Ao se dizer “permanente” implica em, preferencialmente, estabelecer uma carreira funcional para os cargos de apoio ao CMS e, caso isso não seja efetivamente possível, estabelecer os cargos comissionados necessários para dar esse suporte. É importante observar que os cargos comissionados colocados à disposição do CMS não são a melhor opção pelo mesmo motivo da necessidade de uma unidade orçamentária própria, ou seja, garantir a autonomia e a isenção daqueles envolvidos nas atividades do conselho. No caso de cargos comissionados, de livre escolha e demissíveis a qualquer tempo, essa autonomia fica bastante limitada. Na impossibilidade de se estabelecer as funções de suporte ao CMS como carreiras do quadro de funcionários municipais, o preenchimento de tais cargos comissionados deveria pelo menos dar prioridade aos funcionários de carreira da própria SEDHAM. De qualquer modo, sejam carreiras, sejam cargos comissionados, o mais importante é que possa haver uma dedicação exclusiva às demandas do CMS. O que descarta a opção de utilizar o corpo técnico existente, com suas atribuições já definidas, para efetuar, de forma improvisada, tais funções. Ainda que isso possa acontecer num primeiro momento, o importante é que essa situação temporária não se torne perene.

Para determinar o perfil da equipe de apoio às atividades do CMS, é necessário observar a estrutura do mesmo. Assim, de acordo com o art. 298 da Lei 7.400/08, a estrutura básica do CMS é formada pelo Plenário, pela Secretaria Executiva e pelas Câmaras Temáticas. Detalhando um pouco mais, temos que o Plenário constitui o grande momento de trabalho do CMS, ou seja, o momento de deliberação sobre as questões que estão na pauta do conselho. Para tal, é necessária uma reunião organizada, objetiva, dotadas dos serviços e equipamentos necessários ao seu perfeito encaminhamento. Por outro lado, as câmaras temáticas são em número de quatro: planejamento e gestão do uso do solo; saneamento ambiental, habitação e mobilidade urbana. Essas debruçar-se-ão mais detidamente sobre assuntos específicos, preparando as matérias e as decisões em primeira instância, para então levar ao conhecimento do plenário para sua aprovação ou retificação. Sendo assim, também as reuniões das câmaras temáticas precisam ter toda a infraestrutura necessária para o seu bom desenvolvimento.

Nesse bojo, ganha especial importância avaliarmos o papel da Secretaria Executiva dentro do funcionamento do CMS. Cabe à Secretaria Executiva, de acordo com a minuta de decreto de regulamentação elaborada, em seu art. 12, dar o suporte administrativo e operacional ao CMS, elaborar a sua proposta orçamentária, fornecer aos conselheiros informações sobre matéria legal, análises e estudos e apoio a comissão preparatória da Conferência Municipal de Salvador, entre outras funções. Sendo assim, a Secretaria Executiva, como o nome já abrevia, tem, em síntese, a função de executar todas as tarefas para o bom funcionamento do CMS. Portanto, o corpo técnico do CMS deve estar essencialmente ligado à Secretaria Executiva.

Pelo que se pode observar da estrutura do CMS, além da função de Secretário Executivo do Conselho, tem ainda lugar numa equipe técnica mínima para o pleno funcionamento das funções desse órgão um Secretário Administrativo, um Assistente Técnico e um secretário oficial. Ao Secretário Executivo cabe coordenar os trabalhos dessa equipe, bem como se responsabilizar pelo bom encaminhamento de todas as funções da Secretaria Executiva. É ainda importante observar que o Secretário Executivo pode receber delegações de outras

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atribuições por parte do Presidente do CMS, conforme reza o art. 8º, III da minuta do decreto de regulamentação do CMS. Nesse mesmo diapasão, poderá inclusive substituir o presidente do CMS na ausência desse. Ao Secretário Administrativo cabe controlar as finanças e despesas do CMS, elaborando sua proposta orçamentária, bem como dar todo o suporte no trâmite de todo o tipo de documentação. Tanto para dar suporte a atuação do Secretário Executivo quando do Secretário Administrativo em suas diversas atividades, é prudente a presença de um Assistente Técnico e de um secretário oficial. Aos dois caberiam, respectivamente, o apoio técnico e a relatoria das reuniões do CMS e das Câmaras Temáticas, entre as outras funções que tenham que desempenhar no suporte aos Secretários Executivo e Administrativo.

Como dito anteriormente, o ideal seria que tais funções fossem exercidas dentro de uma carreira específica, através de funcionários concursados especialmente para tais cargos. Na impossibilidade disso, os cargos deveriam preferencialmente ser exercidos por funcionários de carreira da SEDHAM. Uma última opção seria a indicação de outros profissionais de diferentes origens, à escolha do titular da SEDHAM. De qualquer modo, seja mediante concurso próprio, seja mediante escolha de funcionários de carreira ou não, devem ser observados os perfis profissionais demandados por cada um dos cargos em questão. No caso do Secretário Executivo, deve ser alguém que, além de um perfil prático no sentido de garantir todos os aspectos logísticos das reuniões e atividades do CMS, tenha também um approach político e bom trânsito entre os conselheiros, bem como um razoável conhecimento técnicos dos temas tratados, caso precise, na ausência do presidente, exercer o voto decisivo em alguma das deliberações do CMS. Com relação ao Secretário Administrativo, caberia alguém com amplo conhecimento em matéria de finanças públicas, especialmente no que tange a orçamento municipal, haja vista a função de preparação da proposta orçamentária do CMS. Para o Assistente Técnico, é importante ter o mesmo perfil prático e dinâmico que caberia ao Secretário Executivo. Para o Secretário Oficial, é importante ter conhecimento em relatoria, agendamentos, articulação para marcação de reuniões. Outras qualidades que possam se mostrar importantes certamente aparecerão no decorrer das atividades do CMS.

4.3. DISPONIBILIZAÇÃO DE ESTRUTURA MÍNIMA PARA FUNCIONAMENTO DO CMS

Em termos de instalações físicas e equipamentos necessários para o pleno funcionamento do Conselho Municipal de Salvador, algumas questões precisam ser observadas. Em primeiro lugar, é fundamental garantir um auditório para a realização das reuniões ordinárias e extraordinárias do CMS. Uma vez que Lei n.º 7.400/08, em seu art. 298, §3º, estabelece a possibilidade de, além das reuniões ordinárias bimensais, o CMS poder ser convocado extraordinariamente pela Secretaria Executiva ou por 1/3 dos conselheiros, deve-se pensar desde já num auditório exclusivo ou, no mínimo, com prioridade garantida para o CMS, uma vez que uma reunião extraordinária, necessariamente urgente, não poderá estar submetida à pauta concorrida de um auditório multiuso.

Esse alerta vem no sentido das limitações decorrentes da utilização de uma opção imediata para sediar as reuniões do CMS que seria o auditório da própria SEDHAM. Como se sabe, tal auditório é utilizado para diversas atividades distintas, o que poderia inviabilizar a sua

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utilização nas reuniões extraordinárias do CMS. O funcionamento do Conselho de Meio Ambiente – COMAM neste auditório apenas autoriza a considerar que o CMS pode ter um dia da semana fixo para suas reuniões ordinárias (como o COMAM tem as sextas-feiras). Mas permanece a dúvida quanto às reuniões extraordinárias. Daí desde já considerarmos a possibilidade de utilização do auditório da SEDHAM para sediar as reuniões do CMS uma boa opção, devido a sua infraestrutura e localização, porém ressaltando o seu caráter provisório por conta das dificuldades enunciadas. Outro fator a ser considerado ainda quanto ao local das reuniões do CMS é a possibilidade de uma maior pluralidade de salas e não apenas a presença de um auditório, haja vista a possibilidade de reunião das câmaras técnicas simultaneamente. Essa é uma deficiência que a estrutura física da SEDHAM hoje não pode suprir, o que reforça a necessidade de se pensar em um espaço especialmente projetado para as necessidades do CMS, ao invés da utilização “adaptada” de um espaço preexistente. Essa ideia de uma “arquitetura da participação” é bem exposta em duas ocasiões por Marcelo Lopes de Souza:

Uma vez produzidas assim ou assado, para atender a tal ou qual finalidade, as formas espaciais facilitarão certas atividades e dificultarão ou mesmo impedirão outras tantas. Colocando a questão para além da leitura u tanto instrumental de “facilitar” ou “dificultar” ações, a influência das formas espaciais do substrato, mediada pelas imagens e representações socialmente produzidas sobre cada espaço, pode exercer-se como condicionamento de mentalidades, comportamentos e hábitos. (SOUZA, 2006, P. 320).

Outro aspecto interessante, além da geometria circular, é a posição do orador, menos ou mais elevada que a dos ouvintes: é sintomático que, nas estruturas em concha da democracia grega da Antiguidade, o orador, que era apenas u igual entre iguais na ecclesia, situava-se no centro do círculo (ou semicírculo) para ser ouvido, mas, por isso mesmo, em uma posição inferior. (SOUZA, 2008, p. 376).

Outra questão que tem que ser considerada para a completa institucionalização do CMS diz respeito aos equipamentos necessários às suas atividades. Para a realização das reuniões são fundamentais os equipamentos de projeção de imagem e gravação e reprodução de som. No que tange aos primeiros, devem haver computadores e projetores compatíveis para apresentações em datashow, além de vídeos e outros materiais gráficos necessários à apresentação dos temários a serem discutidos pelo plenário ou pelas câmaras técnicas. Além da parte de vídeo, deve-se ter especial cuidado com os registros das discussões e deliberações das reuniões. Ainda que já nos tenhamos pronunciado a cerca da função do secretário oficial de fazer as anotações devidas para composição das atas das reuniões do CMS, a possibilidade de contarmos com o recurso da gravação de voz.

Com a criação de uma unidade orçamentária para o CMS, com a montagem de uma equipe técnica para se desincumbir do funcionamento do conselho e com as instalações físicas e equipamentos necessários para suas reuniões, o Conselho Municipal de Salvador tende a se consolidar como uma referência nacional no que tange à construção democrática de políticas públicas de desenvolvimento urbano.

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5. CONCLUSÃO

Ao final da presente discussão, cabem alguns ensinamentos. Deve-se, primeiro, dissociar a ideia de participação popular da mera construção e abertura dos espaços de diálogo, o que tem sido decisivo para comprometer a possibilidade de real deliberação por parte da comunidade atendida, que fica refém de uma estrutura de canais de comunicação com a Administração Pública que não domina e da qual não pode fazer o melhor uso para argumentar em favor dos seus próprios interesses. Destaque-se que, do ponto de vista do Poder Público, é muitas vezes entendido como estrategicamente cômodo a criação de instâncias participativas sem a prévia e necessária capacitação dos participantes destas, uma vez que isso permitiria conduzir as discussões sem ser acusado de impedir de forma direta a participação da população. Essa conduta, obviamente condenável, deve ser revertida, proporcionando à população para a qual se abrem as portas da participação direta na gestão urbana a devida instrumentalização. Neste sentido, é fundamental recompor uma base mínima de dados acerca de algumas questões mais eminentemente técnicas no campo do planejamento urbano, abreviando o tempo gasto com esclarecimentos e otimizando o caráter discursivo e principalmente deliberativo destes espaços de diálogo que caracterizarão uma gestão urbana de cunho mais popular.

Essa necessidade de uma nova cultura de gestão urbana popular reflete as mudanças contemporâneas na forma do Poder Público exercer o seu poder de império junto à Sociedade Civil. Assim, como já suscitam algumas vozes dissonantes do Pacto da Mediocridade do Planejamento Urbano, calcado na impossibilidade de um planejamento participativo por falta de marcos jurídicos impositivos, observa-se que as regras do jogo favorecem, pelo menos formalmente, a participação, cabendo investigar a sua fragilidade em aspectos mais socioculturais do que meramente institucionais. No caso em apreço, a institucionalização do Conselho Municipal de Salvador já está posta. O que se necessita agora é transpor essa vitória da orla jurídica para a orla fática.

Entende-se que o aprofundamento desta discussão, tendo por eixo a implementação do Conselho Municipal de Salvador em uma plataforma cada vez mais pautada pelo paradigma da participação popular, permitirá a constituição de um conjunto dinâmico de estratégias que se apresentem de forma a romper o distanciamento entre o cotidiano da cidade e a atividade de planejamento, em que todos os agentes que constroem a cidade tornem-se signatários, coautores e, por isso mesmo, corresponsáveis por cada intervenção, programa, plano ou política urbana implementado no município, respondendo igualmente pelos seus erros e acertos. Por outro lado, a qualquer atividade de planejamento urbano não se poderá dar seguimento sem que haja a necessária internalização da variável comunitária, respondendo essa pelo expurgo de qualquer tecnicismo ou desconsiderações das peculiaridades locais da área de intervenção e da natureza da cidade como um todo.

Tais elementos aqui colocados certamente corroboram com a premissa básica desse texto: o avanço do paradigma participativo no planejamento e na gestão urbana é inexorável. O nível de maturidade da sociedade brasileira, baiana e soteropolitana, em que pese todas as suas fragilidades, não coaduna mais nem com o imobilismo, por um lado, nem com cooptações baratas, por outro. Ainda que a instalação do Conselho Municipal de Salvador ainda dependa de tantas ações práticas para sair do papel, a sua permanência neste estado certamente não é algo que contará com o silêncio ou a conivência dos movimentos sociais de Salvador.

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6. REFERÊNCIAS

DANTAS, Fagner C. “A Participação Popular na Administração Pública, no Planejamento Urbano e na Gestão Urbana: uma aproximação.” Revista do Observatório do Milênio de Belo Horizonte. V. 2, pp. 43-60, 2009. MARICATO, Ermínia. O Impasse da Política Urbana no Brasil. Petrópolis: Vozes, 2011. MINISTÉRIO DAS CIDADES. Plano Diretor Participativo: guia para a elaboração pelos municípios e cidadãos. 2ª. Brasília: Ministério das Cidades, 2005. RIBEIRO, Ana Clara Torres. GRAZIA, Grazia de. “A Democratização da Vida Urbana: cidade e cidadania.” FÓRUM NACIONAL DE REFORMA URBANA. Instrumentos de Democratização e Gestão Urbana. 2ª Ed. Quito: Programa de Gestão Urbana, 2002. pp. 45-51. SANTOS, Mauro Rego Monteiro dos. “O Sistema de Gestão e Participação Democrática nos Planos Diretores Brasileiros.” SANTOS JUNIOR, Orlando Alves dos; MONTANDON, Daniel Todtmann. (Orgs.). Os Planos Diretores Municipais Pós-Estatuto da Cidade: balanço crítico e perspectivas. Rio de Janeiro: Letra Capital: Observatório das Metrópoles: IPPUR/UFRJ, 2011. pp. 255-279. SILVA, José Afonso da. Direito Urbanístico Brasileiro. 2ª Ed. São Paulo: Malheiros, 1995. SOUZA, Marcelo Lopes de. A Prisão e a Ágora: reflexões em torno da democratização do planejamento e da gestão das cidades. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2006. ---------------. Mudar a Cidade: uma introdução crítica ao planejamento e à gestão urbanos. 5ª Ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2008.