eutanasia e o novo codigo de etica medica

4
Jus Navigandi http://jus.uol.com.br/ Eutanásia e o novo Código de Ética Médica http://jus.uol.com.br/revista/texto/13754 Publicado em 10/2009 Luiz Flávio Gomes O Conselho Federal de Medicina, por meio da Resolução 1.931, de 17 de setembro de 2009 (texto publicado no DOU de 24.09.09), aprovou o seu novo Código de Ética Médica. Apesar da atualidade da discussão em torno da eutanásia, ortotanásia e morte assistida (suicídio assistido), sobre esses controvertidos temas o novo Código de Ética nada disse. No seu Capítulo I, que cuida dos Princípios Fundamentais, proclamou o seguinte: "XXII Nas situações clínicas irreversíveis e terminais, o médico evitará a realização de procedimentos diagnósticos e terapêuticos desnecessários e propiciará sob sua atenção todos os cuidados apropriados". No Capítulo V, que trata da relação com pacientes e familiares, ficou estabelecido o seguinte: É vedado ao médico (art. 41) "abreviar a vida do paciente, ainda que a pedido deste ou de seu representante legal". No parágrafo único se lê: "Nos casos de doença incurável e terminal, deve o medido oferecer todos os cuidados paliativos disponíveis sem empreender ações diagnósticas ou terapêuticas inúteis ou obstinadas, levando sempre em consideração a vontade expressa do paciente ou, na sua impossibilidade, a de seu representante legal". O novo Código de Ética Médica, em síntese, nada disse sobre a eutanásia ou ortotanásia ou morte assistida. Mandou evitar a distanásia e ainda recomendou a sedação paliativa. Para se compreender tudo quanto acabamos de escrever, vamos aos conceitos: (a) eutanásia (morte boa): é a prática pela qual se abrevia a vida de um enfermo incurável (terminal ou não), a seu pedido e em razão do seu insuportável sofrimento, de maneira controlada e assistida. O ato que causa a morte é praticado por um terceiro; (b) ortotanásia (ou eutanasia passiva): é a prática pela qual se abrevia a vida de um enfermo incurável (terminal ou não), a seu pedido e em razão do seu insuportável

Upload: direitouem2011

Post on 11-Jul-2015

445 views

Category:

Education


2 download

TRANSCRIPT

Page 1: Eutanasia e o novo codigo de etica medica

Jus Navigandi

httpjusuolcombr

Eutanaacutesia e o novo Coacutedigo de Eacutetica Meacutedica httpjusuolcombrrevistatexto13754

Publicado em 102009

Luiz Flaacutevio Gomes

O Conselho Federal de Medicina por meio da Resoluccedilatildeo 1931 de 17 de

setembro de 2009 (texto publicado no DOU de 240909) aprovou o seu novo Coacutedigo de

Eacutetica Meacutedica Apesar da atualidade da discussatildeo em torno da eutanaacutesia ortotanaacutesia e

morte assistida (suiciacutedio assistido) sobre esses controvertidos temas o novo Coacutedigo de

Eacutetica nada disse No seu Capiacutetulo I que cuida dos Princiacutepios Fundamentais proclamou o

seguinte

XXII ndash Nas situaccedilotildees cliacutenicas irreversiacuteveis e terminais o meacutedico evitaraacute a realizaccedilatildeo de

procedimentos diagnoacutesticos e terapecircuticos desnecessaacuterios e propiciaraacute sob sua atenccedilatildeo todos os

cuidados apropriados

No Capiacutetulo V que trata da relaccedilatildeo com pacientes e familiares ficou estabelecido

o seguinte Eacute vedado ao meacutedico (art 41) abreviar a vida do paciente ainda que a pedido

deste ou de seu representante legal

No paraacutegrafo uacutenico se lecirc Nos casos de doenccedila incuraacutevel e terminal deve o

medido oferecer todos os cuidados paliativos disponiacuteveis sem empreender accedilotildees

diagnoacutesticas ou terapecircuticas inuacuteteis ou obstinadas levando sempre em consideraccedilatildeo a

vontade expressa do paciente ou na sua impossibilidade a de seu representante legal

O novo Coacutedigo de Eacutetica Meacutedica em siacutentese nada disse sobre a eutanaacutesia ou

ortotanaacutesia ou morte assistida Mandou evitar a distanaacutesia e ainda recomendou a sedaccedilatildeo

paliativa

Para se compreender tudo quanto acabamos de escrever vamos aos conceitos

(a) eutanaacutesia (morte boa) eacute a praacutetica pela qual se abrevia a vida de um enfermo

incuraacutevel (terminal ou natildeo) a seu pedido e em razatildeo do seu insuportaacutevel sofrimento de

maneira controlada e assistida O ato que causa a morte eacute praticado por um terceiro

(b) ortotanaacutesia (ou eutanasia passiva) eacute a praacutetica pela qual se abrevia a vida de

um enfermo incuraacutevel (terminal ou natildeo) a seu pedido e em razatildeo do seu insuportaacutevel

sofrimento mediante o desligamento de aparelhos ou a cessaccedilatildeo de procedimentos

terapecircuticos ou da medicaccedilatildeo ou da alimentaccedilatildeo O ato do desligamento ou da cessaccedilatildeo

eacute tambeacutem praticado por um terceiro

(c) morte assistida (ou suiciacutedio assistido) eacute a praacutetica (ou seja o auxiacutelio) pela qual

se abrevia a vida de um enfermo incuraacutevel (terminal ou natildeo) a seu pedido e em razatildeo do

seu insuportaacutevel sofrimento O ato da morte eacute gerado pela proacutepria viacutetima que eacute auxiliada

por um terceiro

(d) sedaccedilatildeo paliativa natildeo abrevia a morte da viacutetima apenas lhe daacute certo

conforto evitando (ao maacuteximo) a dor e o sofrimento

(e) distanaacutesia eacute a continuaccedilatildeo (ou prolongamento) por meios artificiais de um

tratamento ou de uma medicaccedilatildeo que visa a manter vivo um enfermo incuraacutevel (terminal

ou natildeo)

(f) mistanaacutesia (ou eutanaacutesia social) eacute a morte do miseraacutevel por falta de

assistecircncia (a viacutetima ou nem sequer ingressa no sistema de sauacutede ou ingressa e natildeo

recebe a assistecircncia devida)

(g) eutanaacutesia eugecircnica eacute a morte da viacutetima por razotildees eugecircnicas de raccedila (isso

ocorreu durante o nazismo com o holocausto)

No ano de 2006 por forccedila da Resoluccedilatildeo 180506 o Conselho Federal de

Medicina no dia 09 de novembro chegou a aprovar a suspensatildeo dos tratamentos e

procedimentos que prolongam a vida dos doentes terminais sem chance de cura O texto

aprovado foi interpretado como permissivo da ortotanaacutesia (que gera a abreviaccedilatildeo da vida

mediante a suspensatildeo ou cessaccedilatildeo dos procedimentos desnecessaacuterios ou inuacuteteis) O

Ministeacuterio Puacuteblico ingressou com accedilatildeo civil puacuteblica e conseguiu na Justiccedila Federal de

Primeira Instacircncia a suspensatildeo em sede de liminar da validade da referida resoluccedilatildeo

Comentando essa decisatildeo Alexandre Magno F M Aguiar (no site Jus

Vigilantibus) com todo acerto escreveu

A fundamentaccedilatildeo da decisatildeo foi o fato de que na visatildeo do magistrado a ortotanaacutesia

parece ser um homiciacutedio Trata-se de um conceito bem fraacutegil para uma decisatildeo liminar que exige

o juiacutezo de verossimilhanccedila (Coacutedigo de Processo Civil art 273) E haacute argumentos bastante soacutelidos

em sentido contraacuterio2

Nesse ponto eacute inevitaacutevel lembrarmos de Joseacute Saramago que em seu livro As

Intermitecircncias da Morte3 narra uma situaccedilatildeo em que a morte simplesmente deixou de ocorrer em

determinado paiacutes Todas as pessoas mantinham-se vivas mesmo os pacientes terminais Formou-

se rapidamente uma multidatildeo de moribundos pessoas que mesmo contra sua proacutepria vontade

ficavam indefinidamente em um limbo entre a vida e a morte

A autonomia do indiviacuteduo eacute desprezada em nome de uma ilusoacuteria proteccedilatildeo De acordo

com esse pensamento de matriz esquerdista nunca seriacuteamos capazes de decidir nada pois

estariacuteamos sempre a mercecirc de algum fator externo principalmente de caraacuteter social ou econocircmico

Nem o consentimento livre e informado do paciente seria suficiente

Os regimes totalitaacuterios esmeraram-se em cuidar de cada aspecto da vida das pessoas

Tudo deveria ser determinado pelo Estado inclusive o que sentir e o que pensar4 Comumente o

Estado vecirc-se tentado a considerar as pessoas como menores que requerem proteccedilatildeo e passa a

legislar sobre aspectos miacutenimos da vida de cada um Proibir a ortotanaacutesia eacute uma dessas tentaccedilotildees

Temos que viver a qualquer custo porque o Estado por razotildees quase esoteacutericas diz que isso eacute

melhor para noacutes Essa ideologia transparece de forma assustadora na peticcedilatildeo inicial da accedilatildeo civil

puacuteblica in verbis

Devem ser analisados todos os casos mas caso a caso de forma que mesmo de lege

ferenda determinar se uma conduta meacutedica ou dos representantes legais do paciente terminal

consciente ou natildeo capaz ou natildeo DEVE OBRIGATORIAMENTE passar pelo crivo dos entes

legitimados constitucionalmente para dar a uacuteltima palavra sobre o fim de uma vida O Ministeacuterio

Puacuteblico e o Judiciaacuterio (grifou-se)

Assim natildeo importando se o paciente estaacute consciente ou natildeo eacute considerado capaz ou

incapaz De qualquer maneira ele natildeo tem condiccedilotildees de decidir sobre como e quando seraacute o fim de

sua vida Quem tem esse poder eacute o Estado na figura do magistrado e do membro do Ministeacuterio

Puacuteblico Seriacuteamos todos absolutamente incapazes agrave espera do Grande Irmatildeo que viesse dizer o

que eacute melhor para noacutes

Desde que os filoacutesofos partidaacuterios da secularizaccedilatildeo (separaccedilatildeo entre o Estado e

a Igreja entre o Direito e a religiatildeo) destacando-se dentre eles Descartes que

sentenciou Penso logo existo (penso por mim e existo para mim natildeo para Deus) natildeo haacute

mais espaccedilo (para os que natildeo creem em nenhum Deus) para a compreensatildeo da vida

senatildeo a partir da visatildeo antropocecircntrica do mundo O homem eacute o centro do universo A

visatildeo teocecircntrica (tudo centrado em Deus) natildeo pode ter a pretensatildeo de dominar todos os

seres humanos (porque a todos eacute permitido ter a crenccedila que melhor lhe convier ) As

ideologias totalitaristas tampouco podem pretender acabar com a autonomia humana

Num mundo laico e tolerante jaacute natildeo existe espaccedilo para crenccedilas e convicccedilotildees

fundamentalistas ou totalitaristas O Direito justo (constitucional e humanista) natildeo pode

governar todas as pessoas (os que creem e os que natildeo creem) sob a eacutegide de uma uacutenica

norma sectarista O melhor eacute preponderar a toleracircncia (e deixar que as pessoas desde

que de modo razoaacutevel ou seja natildeo arbitraacuterio cuidem do seu destino inclusive o final)

Nem o Estado nem a religiatildeo podem revogar a visatildeo antropocecircntrica do mundo que deve

tolerar as distintas crenccedilas e convicccedilotildees enquanto natildeo prejudiquem terceiros

Sobre o autor Luiz Flaacutevio Gomes

Diretor geral dos cursos de Especializaccedilatildeo TeleVirtuais da LFG Doutor em Direito Penal

pela Faculdade de Direito da Universidade Complutense de Madri (2001) Mestre em

Direito Penal pela Faculdade de Direito da Universidade de Satildeo Paulo USP (1989)

Professor de Direito Penal e Processo Penal em vaacuterios cursos de Poacutes-Graduaccedilatildeo no

Brasil e no exterior dentre eles da Facultad de Derecho de la Universidad Austral

Buenos Aires Argentina Professor Honoraacuterio da Faculdade de Direito da Universidad

Catoacutelica de Santa Maria Arequipa Peru Promotor de Justiccedila em Satildeo Paulo (1980-1983)

Juiz de Direito em Satildeo Paulo (1983-1998) Advogado (1999-2001) Individual expert

observer do X Congresso da ONU em Viena (2000) Membro e Consultor da Delegaccedilatildeo

brasileira no 10ordm Periacuteodo de Sessotildees da Comissatildeo de Prevenccedilatildeo do Crime e Justiccedila

Penal da ONU em Viena (2001)

httpwwwblogdolfgcombr

Como citar este texto NBR 60232002 ABNT

GOMES Luiz Flaacutevio Eutanaacutesia e o novo Coacutedigo de Eacutetica Meacutedica Jus Navigandi Teresina ano

14 n 2310 28 out 2009 Disponiacutevel em lthttpjusuolcombrrevistatexto13754gt Acesso em 11

abr 2011

Page 2: Eutanasia e o novo codigo de etica medica

sofrimento mediante o desligamento de aparelhos ou a cessaccedilatildeo de procedimentos

terapecircuticos ou da medicaccedilatildeo ou da alimentaccedilatildeo O ato do desligamento ou da cessaccedilatildeo

eacute tambeacutem praticado por um terceiro

(c) morte assistida (ou suiciacutedio assistido) eacute a praacutetica (ou seja o auxiacutelio) pela qual

se abrevia a vida de um enfermo incuraacutevel (terminal ou natildeo) a seu pedido e em razatildeo do

seu insuportaacutevel sofrimento O ato da morte eacute gerado pela proacutepria viacutetima que eacute auxiliada

por um terceiro

(d) sedaccedilatildeo paliativa natildeo abrevia a morte da viacutetima apenas lhe daacute certo

conforto evitando (ao maacuteximo) a dor e o sofrimento

(e) distanaacutesia eacute a continuaccedilatildeo (ou prolongamento) por meios artificiais de um

tratamento ou de uma medicaccedilatildeo que visa a manter vivo um enfermo incuraacutevel (terminal

ou natildeo)

(f) mistanaacutesia (ou eutanaacutesia social) eacute a morte do miseraacutevel por falta de

assistecircncia (a viacutetima ou nem sequer ingressa no sistema de sauacutede ou ingressa e natildeo

recebe a assistecircncia devida)

(g) eutanaacutesia eugecircnica eacute a morte da viacutetima por razotildees eugecircnicas de raccedila (isso

ocorreu durante o nazismo com o holocausto)

No ano de 2006 por forccedila da Resoluccedilatildeo 180506 o Conselho Federal de

Medicina no dia 09 de novembro chegou a aprovar a suspensatildeo dos tratamentos e

procedimentos que prolongam a vida dos doentes terminais sem chance de cura O texto

aprovado foi interpretado como permissivo da ortotanaacutesia (que gera a abreviaccedilatildeo da vida

mediante a suspensatildeo ou cessaccedilatildeo dos procedimentos desnecessaacuterios ou inuacuteteis) O

Ministeacuterio Puacuteblico ingressou com accedilatildeo civil puacuteblica e conseguiu na Justiccedila Federal de

Primeira Instacircncia a suspensatildeo em sede de liminar da validade da referida resoluccedilatildeo

Comentando essa decisatildeo Alexandre Magno F M Aguiar (no site Jus

Vigilantibus) com todo acerto escreveu

A fundamentaccedilatildeo da decisatildeo foi o fato de que na visatildeo do magistrado a ortotanaacutesia

parece ser um homiciacutedio Trata-se de um conceito bem fraacutegil para uma decisatildeo liminar que exige

o juiacutezo de verossimilhanccedila (Coacutedigo de Processo Civil art 273) E haacute argumentos bastante soacutelidos

em sentido contraacuterio2

Nesse ponto eacute inevitaacutevel lembrarmos de Joseacute Saramago que em seu livro As

Intermitecircncias da Morte3 narra uma situaccedilatildeo em que a morte simplesmente deixou de ocorrer em

determinado paiacutes Todas as pessoas mantinham-se vivas mesmo os pacientes terminais Formou-

se rapidamente uma multidatildeo de moribundos pessoas que mesmo contra sua proacutepria vontade

ficavam indefinidamente em um limbo entre a vida e a morte

A autonomia do indiviacuteduo eacute desprezada em nome de uma ilusoacuteria proteccedilatildeo De acordo

com esse pensamento de matriz esquerdista nunca seriacuteamos capazes de decidir nada pois

estariacuteamos sempre a mercecirc de algum fator externo principalmente de caraacuteter social ou econocircmico

Nem o consentimento livre e informado do paciente seria suficiente

Os regimes totalitaacuterios esmeraram-se em cuidar de cada aspecto da vida das pessoas

Tudo deveria ser determinado pelo Estado inclusive o que sentir e o que pensar4 Comumente o

Estado vecirc-se tentado a considerar as pessoas como menores que requerem proteccedilatildeo e passa a

legislar sobre aspectos miacutenimos da vida de cada um Proibir a ortotanaacutesia eacute uma dessas tentaccedilotildees

Temos que viver a qualquer custo porque o Estado por razotildees quase esoteacutericas diz que isso eacute

melhor para noacutes Essa ideologia transparece de forma assustadora na peticcedilatildeo inicial da accedilatildeo civil

puacuteblica in verbis

Devem ser analisados todos os casos mas caso a caso de forma que mesmo de lege

ferenda determinar se uma conduta meacutedica ou dos representantes legais do paciente terminal

consciente ou natildeo capaz ou natildeo DEVE OBRIGATORIAMENTE passar pelo crivo dos entes

legitimados constitucionalmente para dar a uacuteltima palavra sobre o fim de uma vida O Ministeacuterio

Puacuteblico e o Judiciaacuterio (grifou-se)

Assim natildeo importando se o paciente estaacute consciente ou natildeo eacute considerado capaz ou

incapaz De qualquer maneira ele natildeo tem condiccedilotildees de decidir sobre como e quando seraacute o fim de

sua vida Quem tem esse poder eacute o Estado na figura do magistrado e do membro do Ministeacuterio

Puacuteblico Seriacuteamos todos absolutamente incapazes agrave espera do Grande Irmatildeo que viesse dizer o

que eacute melhor para noacutes

Desde que os filoacutesofos partidaacuterios da secularizaccedilatildeo (separaccedilatildeo entre o Estado e

a Igreja entre o Direito e a religiatildeo) destacando-se dentre eles Descartes que

sentenciou Penso logo existo (penso por mim e existo para mim natildeo para Deus) natildeo haacute

mais espaccedilo (para os que natildeo creem em nenhum Deus) para a compreensatildeo da vida

senatildeo a partir da visatildeo antropocecircntrica do mundo O homem eacute o centro do universo A

visatildeo teocecircntrica (tudo centrado em Deus) natildeo pode ter a pretensatildeo de dominar todos os

seres humanos (porque a todos eacute permitido ter a crenccedila que melhor lhe convier ) As

ideologias totalitaristas tampouco podem pretender acabar com a autonomia humana

Num mundo laico e tolerante jaacute natildeo existe espaccedilo para crenccedilas e convicccedilotildees

fundamentalistas ou totalitaristas O Direito justo (constitucional e humanista) natildeo pode

governar todas as pessoas (os que creem e os que natildeo creem) sob a eacutegide de uma uacutenica

norma sectarista O melhor eacute preponderar a toleracircncia (e deixar que as pessoas desde

que de modo razoaacutevel ou seja natildeo arbitraacuterio cuidem do seu destino inclusive o final)

Nem o Estado nem a religiatildeo podem revogar a visatildeo antropocecircntrica do mundo que deve

tolerar as distintas crenccedilas e convicccedilotildees enquanto natildeo prejudiquem terceiros

Sobre o autor Luiz Flaacutevio Gomes

Diretor geral dos cursos de Especializaccedilatildeo TeleVirtuais da LFG Doutor em Direito Penal

pela Faculdade de Direito da Universidade Complutense de Madri (2001) Mestre em

Direito Penal pela Faculdade de Direito da Universidade de Satildeo Paulo USP (1989)

Professor de Direito Penal e Processo Penal em vaacuterios cursos de Poacutes-Graduaccedilatildeo no

Brasil e no exterior dentre eles da Facultad de Derecho de la Universidad Austral

Buenos Aires Argentina Professor Honoraacuterio da Faculdade de Direito da Universidad

Catoacutelica de Santa Maria Arequipa Peru Promotor de Justiccedila em Satildeo Paulo (1980-1983)

Juiz de Direito em Satildeo Paulo (1983-1998) Advogado (1999-2001) Individual expert

observer do X Congresso da ONU em Viena (2000) Membro e Consultor da Delegaccedilatildeo

brasileira no 10ordm Periacuteodo de Sessotildees da Comissatildeo de Prevenccedilatildeo do Crime e Justiccedila

Penal da ONU em Viena (2001)

httpwwwblogdolfgcombr

Como citar este texto NBR 60232002 ABNT

GOMES Luiz Flaacutevio Eutanaacutesia e o novo Coacutedigo de Eacutetica Meacutedica Jus Navigandi Teresina ano

14 n 2310 28 out 2009 Disponiacutevel em lthttpjusuolcombrrevistatexto13754gt Acesso em 11

abr 2011

Page 3: Eutanasia e o novo codigo de etica medica

Nesse ponto eacute inevitaacutevel lembrarmos de Joseacute Saramago que em seu livro As

Intermitecircncias da Morte3 narra uma situaccedilatildeo em que a morte simplesmente deixou de ocorrer em

determinado paiacutes Todas as pessoas mantinham-se vivas mesmo os pacientes terminais Formou-

se rapidamente uma multidatildeo de moribundos pessoas que mesmo contra sua proacutepria vontade

ficavam indefinidamente em um limbo entre a vida e a morte

A autonomia do indiviacuteduo eacute desprezada em nome de uma ilusoacuteria proteccedilatildeo De acordo

com esse pensamento de matriz esquerdista nunca seriacuteamos capazes de decidir nada pois

estariacuteamos sempre a mercecirc de algum fator externo principalmente de caraacuteter social ou econocircmico

Nem o consentimento livre e informado do paciente seria suficiente

Os regimes totalitaacuterios esmeraram-se em cuidar de cada aspecto da vida das pessoas

Tudo deveria ser determinado pelo Estado inclusive o que sentir e o que pensar4 Comumente o

Estado vecirc-se tentado a considerar as pessoas como menores que requerem proteccedilatildeo e passa a

legislar sobre aspectos miacutenimos da vida de cada um Proibir a ortotanaacutesia eacute uma dessas tentaccedilotildees

Temos que viver a qualquer custo porque o Estado por razotildees quase esoteacutericas diz que isso eacute

melhor para noacutes Essa ideologia transparece de forma assustadora na peticcedilatildeo inicial da accedilatildeo civil

puacuteblica in verbis

Devem ser analisados todos os casos mas caso a caso de forma que mesmo de lege

ferenda determinar se uma conduta meacutedica ou dos representantes legais do paciente terminal

consciente ou natildeo capaz ou natildeo DEVE OBRIGATORIAMENTE passar pelo crivo dos entes

legitimados constitucionalmente para dar a uacuteltima palavra sobre o fim de uma vida O Ministeacuterio

Puacuteblico e o Judiciaacuterio (grifou-se)

Assim natildeo importando se o paciente estaacute consciente ou natildeo eacute considerado capaz ou

incapaz De qualquer maneira ele natildeo tem condiccedilotildees de decidir sobre como e quando seraacute o fim de

sua vida Quem tem esse poder eacute o Estado na figura do magistrado e do membro do Ministeacuterio

Puacuteblico Seriacuteamos todos absolutamente incapazes agrave espera do Grande Irmatildeo que viesse dizer o

que eacute melhor para noacutes

Desde que os filoacutesofos partidaacuterios da secularizaccedilatildeo (separaccedilatildeo entre o Estado e

a Igreja entre o Direito e a religiatildeo) destacando-se dentre eles Descartes que

sentenciou Penso logo existo (penso por mim e existo para mim natildeo para Deus) natildeo haacute

mais espaccedilo (para os que natildeo creem em nenhum Deus) para a compreensatildeo da vida

senatildeo a partir da visatildeo antropocecircntrica do mundo O homem eacute o centro do universo A

visatildeo teocecircntrica (tudo centrado em Deus) natildeo pode ter a pretensatildeo de dominar todos os

seres humanos (porque a todos eacute permitido ter a crenccedila que melhor lhe convier ) As

ideologias totalitaristas tampouco podem pretender acabar com a autonomia humana

Num mundo laico e tolerante jaacute natildeo existe espaccedilo para crenccedilas e convicccedilotildees

fundamentalistas ou totalitaristas O Direito justo (constitucional e humanista) natildeo pode

governar todas as pessoas (os que creem e os que natildeo creem) sob a eacutegide de uma uacutenica

norma sectarista O melhor eacute preponderar a toleracircncia (e deixar que as pessoas desde

que de modo razoaacutevel ou seja natildeo arbitraacuterio cuidem do seu destino inclusive o final)

Nem o Estado nem a religiatildeo podem revogar a visatildeo antropocecircntrica do mundo que deve

tolerar as distintas crenccedilas e convicccedilotildees enquanto natildeo prejudiquem terceiros

Sobre o autor Luiz Flaacutevio Gomes

Diretor geral dos cursos de Especializaccedilatildeo TeleVirtuais da LFG Doutor em Direito Penal

pela Faculdade de Direito da Universidade Complutense de Madri (2001) Mestre em

Direito Penal pela Faculdade de Direito da Universidade de Satildeo Paulo USP (1989)

Professor de Direito Penal e Processo Penal em vaacuterios cursos de Poacutes-Graduaccedilatildeo no

Brasil e no exterior dentre eles da Facultad de Derecho de la Universidad Austral

Buenos Aires Argentina Professor Honoraacuterio da Faculdade de Direito da Universidad

Catoacutelica de Santa Maria Arequipa Peru Promotor de Justiccedila em Satildeo Paulo (1980-1983)

Juiz de Direito em Satildeo Paulo (1983-1998) Advogado (1999-2001) Individual expert

observer do X Congresso da ONU em Viena (2000) Membro e Consultor da Delegaccedilatildeo

brasileira no 10ordm Periacuteodo de Sessotildees da Comissatildeo de Prevenccedilatildeo do Crime e Justiccedila

Penal da ONU em Viena (2001)

httpwwwblogdolfgcombr

Como citar este texto NBR 60232002 ABNT

GOMES Luiz Flaacutevio Eutanaacutesia e o novo Coacutedigo de Eacutetica Meacutedica Jus Navigandi Teresina ano

14 n 2310 28 out 2009 Disponiacutevel em lthttpjusuolcombrrevistatexto13754gt Acesso em 11

abr 2011

Page 4: Eutanasia e o novo codigo de etica medica

Num mundo laico e tolerante jaacute natildeo existe espaccedilo para crenccedilas e convicccedilotildees

fundamentalistas ou totalitaristas O Direito justo (constitucional e humanista) natildeo pode

governar todas as pessoas (os que creem e os que natildeo creem) sob a eacutegide de uma uacutenica

norma sectarista O melhor eacute preponderar a toleracircncia (e deixar que as pessoas desde

que de modo razoaacutevel ou seja natildeo arbitraacuterio cuidem do seu destino inclusive o final)

Nem o Estado nem a religiatildeo podem revogar a visatildeo antropocecircntrica do mundo que deve

tolerar as distintas crenccedilas e convicccedilotildees enquanto natildeo prejudiquem terceiros

Sobre o autor Luiz Flaacutevio Gomes

Diretor geral dos cursos de Especializaccedilatildeo TeleVirtuais da LFG Doutor em Direito Penal

pela Faculdade de Direito da Universidade Complutense de Madri (2001) Mestre em

Direito Penal pela Faculdade de Direito da Universidade de Satildeo Paulo USP (1989)

Professor de Direito Penal e Processo Penal em vaacuterios cursos de Poacutes-Graduaccedilatildeo no

Brasil e no exterior dentre eles da Facultad de Derecho de la Universidad Austral

Buenos Aires Argentina Professor Honoraacuterio da Faculdade de Direito da Universidad

Catoacutelica de Santa Maria Arequipa Peru Promotor de Justiccedila em Satildeo Paulo (1980-1983)

Juiz de Direito em Satildeo Paulo (1983-1998) Advogado (1999-2001) Individual expert

observer do X Congresso da ONU em Viena (2000) Membro e Consultor da Delegaccedilatildeo

brasileira no 10ordm Periacuteodo de Sessotildees da Comissatildeo de Prevenccedilatildeo do Crime e Justiccedila

Penal da ONU em Viena (2001)

httpwwwblogdolfgcombr

Como citar este texto NBR 60232002 ABNT

GOMES Luiz Flaacutevio Eutanaacutesia e o novo Coacutedigo de Eacutetica Meacutedica Jus Navigandi Teresina ano

14 n 2310 28 out 2009 Disponiacutevel em lthttpjusuolcombrrevistatexto13754gt Acesso em 11

abr 2011