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1 “Eu não Faço Adm, eu Faço Empresa Júnior”: Compreendendo uma EJ por meio da Análise Crítica do Discurso Autoria: Cléria Donizete da Silva Lourenço Resumo: O objetivo deste trabalho é analisar o discurso dos empresários juniores acerca de uma Empresa Júnior de consultoria administrativa. Para tanto, utilizou-se da perspectiva da teoria social do discurso de Norman Fairclough (2001). Foram identificados 18 objetos discursivos que foram agrupados em 6 formações discursivas. Além destas, foram identificados dois aspectos silenciados: padronização de comportamentos e busca por poder. Foi possível também o reconhecimento de uma ordem de discurso – ideologia do management – que possibilitou a reflexão sobre formação do administrador e papel da universidade. A primeira parte do título sintetiza a concepção dos EJs acerca da empresa júnior.

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“Eu não Faço Adm, eu Faço Empresa Júnior”: Compreendendo uma EJ por meio da Análise Crítica do Discurso

Autoria: Cléria Donizete da Silva Lourenço

Resumo: O objetivo deste trabalho é analisar o discurso dos empresários juniores acerca de uma Empresa Júnior de consultoria administrativa. Para tanto, utilizou-se da perspectiva da teoria social do discurso de Norman Fairclough (2001). Foram identificados 18 objetos discursivos que foram agrupados em 6 formações discursivas. Além destas, foram identificados dois aspectos silenciados: padronização de comportamentos e busca por poder. Foi possível também o reconhecimento de uma ordem de discurso – ideologia do management – que possibilitou a reflexão sobre formação do administrador e papel da universidade. A primeira parte do título sintetiza a concepção dos EJs acerca da empresa júnior.

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1 Introdução

Nos últimos anos, houve uma rápida expansão do ensino superior. Esta expansão, entre outros fatores, fez com que o foco da discussão se deslocasse da necessidade de oferta de vagas para a qualidade do ensino. Assim, tem-se, cada vez mais, alardeado a necessidade de uma formação superior de mais qualidade. No bojo destas discussões, tem sido destacada a preocupação com a harmonia na articulação entre teoria e prática.

No que se refere, especificamente, ao ensino de Administração, tem-se se destacado a necessidade de diminuir a distância entre o que se ensina em sala de aula e a prática no ambiente organizacional. Para minimizar esse suposto descompasso, utilizam-se várias alternativas para que o estudante se insira numa atmosfera onde ele vivencie o ambiente de trabalho, ao mesmo tempo em que reflita sobre o que está aprendendo nas aulas.

Aliado à crescente percepção das Instituições de Ensino Superior (IES) do descompasso entre a formação oferecida e as habilidades e atitudes necessárias para um exercício profissional condizente – seja ele no mercado ou na academia – as atividades extracurriculares têm sido apontadas como importantes estratégias pedagógicas para superar esta cisão entre o que se ensina na academia e o que acontece no mundo real das organizações. Dentre as diversas possibilidades de atividades complementares podem ser elencadas a realização de estágio curricular; a consultoria em empresas juniores (EJs); a participação em programas de IC (Iniciação Científica), em incubadores de empresas e no PET (Programa de Educação Tutorial), entre outros.

Conforme discute Costa (2010, p.11), hoje, as EJs são vistas como o “espaço por excelência da prática”. Dada a esse caráter, elas passam a adquirir relevância e a incorporar as estratégias das IES como mais um elemento de aproximação, alinhamento e adequação entre práticas acadêmicas e práticas de mercado. Contudo, a autora alerta que a temática das EJs não tem merecido a atenção da área acadêmica no sentido de investigá-las de forma mais crítica. Ao invés de questionamentos, o que pode ser identificado nas análises é um movimento de valorização, privilegiando-se, apenas, enfoques e abordagens que ressaltam os resultados positivos e benéficos desta prática para estudantes e IES.

Este trabalho representa um contraponto e tem por objetivo analisar o discurso dos empresários juniores acerca de uma Empresa Júnior. Sua contribuição – na mesma linha de Bicalho (2009) e Costa (2010) – consiste em fazer coro ao debate que evidencia as implicações de se pertencer a uma EJ. Portanto, a contribuição insere-se em um contexto maior de tentativa de promoção de um avanço na literatura crítica de ensino superior de administração.

2 Análise crítica do discurso: aspectos teóricos

A Análise Crítica do Discurso (ACD) é uma abordagem da Teoria Social do Discurso desenvolvida por Norman Fairclough. Trata-se de uma proposta teórico-metodológica aberta ao tratamento de diversas práticas na vida social.

Segundo Orlandi (2001, p.15), “a palavra discurso, etimologicamente, tem a ideia de curso, de percurso, de correr por, de movimento. O discurso é assim palavra em movimento, prática de linguagem: com o estudo do discurso observa-se o homem falando”. Dessa forma, pode-se entender discurso não como um fenômeno fechado, podendo este ser produzido, reproduzido, resistido, mudado e negociado.

De acordo com Fairclough (2001, p.93), o discurso contribui para construir as relações sociais entre as pessoas, mas, no entanto, “não emana de um livre jogo de ideias nas cabeças das pessoas, mas de uma prática social que está firmemente enraizada em estruturas sociais materiais, concretas”, reificada em instituições e organizações. Nessa direção,

A análise de discurso considera que a linguagem não é transparente. Desse modo ela não procura atravessar o texto para encontrar um sentido do outro lado. A questão que ela coloca é: como este texto significa? (...) Para responder, ela não trabalha com os textos apenas como ilustração ou como documento de algo que já está sabido em outro lugar e que o texto exemplifica. Ela produz um conhecimento a partir do próprio texto, porque

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o vê como tendo uma materialidade simbólica própria e significativa, como tendo uma espessura semântica: ela o concebe em sua discursividade. (ORLANDI, 2001, p.17). Sendo assim, por meio da ACD, pode-se investigar como os textos contribuem para

privilegiar determinados grupos em detrimento de outros, desnaturalizando crenças que servem de suporte às estruturas de dominação. Ainda cabe destacar que a ACD busca uma consciência crítica para analisar aspectos do mundo contemporâneo por meio da linguagem e parte do princípio que, de forma geral, os indivíduos não têm consciência do papel do discurso no controle e modelagem da vida social (FAIRCLOUGH, 2001).

Conforme discute Costa (2010), muitas vezes sem nos darmos conta – a nossa fala nos encaminha para conjuntos de falas hegemônicas. Escolhemos, ou somos levados a escolher, ideias que fazem parte do nosso dia a dia e que aparentemente apenas estão na moda (ou seja, seriam passageiras, fluidas ou efêmeras) mas que, no entanto, carregam em si relações discursivas que efetivamente privilegiam, deformam e/ou silenciam outras ideias.

As formações discursivas são entendidas, em uma dada formação ideológica, como o que pode e o que deve ser dito em determinado tempo e espaço (FAIRCLOUGH, 2001). Essas regiões do dizível (ORLANDI, 2001), refletem diferenças ideológicas, ou seja, as posições dos sujeitos em lugares sociais representados e desigualmente acessíveis.

Sendo assim, a análise do discurso com orientação crítica se presta a revelar questões ideológicas sustentadas pelos discursos, porém não conscientes para as pessoas em suas práticas sociais: “implica mostrar conexões e causas que estão ocultas” (FAIRCLOUGH, 2001, p.28). Nesse sentido, Brandão (2004, p.11), explica que

A linguagem enquanto discurso não constitui um universo de signos que serve apenas como instrumento de comunicação ou suporte de pensamento; a linguagem enquanto discurso é interação, e um modo de produção social; ela não é neutra, inocente e nem natural, por isso o lugar privilegiado de manifestação da ideologia (BRANDÃO, 2004, p.11). Ao admitir isso, compreendemos a linguagem como mediadora da relação entre os

indivíduos e a realidade não podendo esta, de acordo com Brandão (2004, p.11), “ser estudada fora da sociedade, uma vez que os processos que a constituem são histórico-sociais (...)[Ou seja] seu estudo não pode estar desvinculado de suas condições de produção” (BRANDÃO, 2004, p.11). Conforme explica Costa (2010, p.16), a busca por uma maior compreensão das condições de produção do discurso é importante para que se possa identificar: o(s) sentido(s) produzido(s); a identificação do caráter utilitário do discurso; a aceitação de que o discurso possui intrinsecamente uma rede simbólica de relações de dominação ideológica e de poder; e o questionamento de uma visão naturalizadora e ahistórica do tema. Nessa linha pensamento, a ACD é um modo de questionamento crítico, onde a teoria e a metodologia são intrinsecamente ligadas uma a outra (COSTA, 2010).

3 Análise crítica do discurso: aspectos metodológicos

Adotando-se a orientação epistemológica interpretativista, esta pesquisa tem um caráter qualitativo. A unidade de análise foi uma empresa júnior de consultoria administrativa de uma Instituição de Ensino Superior do estado de Minas Gerais.

Para a coleta de dados utilizou-se entrevistas individuais e em profundidade visando à construção do corpo de dados. Em relação aos sujeitos de pesquisa, foram selecionados alunos que eram membros efetivos, alunos na condição de trainee e alunos que haviam se desligado da EJ recentemente totalizando 18 entrevistas. Todas foram gravadas e transcritas por inteiro, com uma média de 10 páginas por entrevista. É importante destacar que estas entrevistas são provenientes de uma pesquisa etnográfica feita na empresa júnior durante um ano. Assim, as entrevistas foram realizadas de forma concomitante com a observação participante. As anotações do diário de campo constituíram-se em uma fonte rica de informações que auxiliaram substantivamente na compreensão das práticas sociais da EJ. Portanto, os resultados apresentados neste artigo são provenientes da análise dos discursos dos EJs, mas fortemente influenciada pelo trabalho etnográfico – observação participante.

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O período de permanência no campo (etnografia) compreendeu dois semestres letivos completos – 2013/1 e 2013/2, ou seja, cerca de um ano. A escolha por semestres letivos deu-se em função de querer acompanhar o cotidiano e os eventos da EJ em diferentes momentos: planejamento das atividades do semestre, processo seletivo de novos membros, efetivação ou não dos trainees, mudanças de diretorias, realização do encontro regional, entre tantos outros.

No que refere à análise dos dados, o autor escolhido como orientação foi Norman Fairclough (2001). A sua Teoria Social do Discurso pressupõe a utilização de um esquema tridimensional de análise: dimensão textual, análise das práticas discursivas e análise das práticas sociais.

A primeira dimensão está relacionada com a compreensão do discurso como texto assumindo que qualquer tipo de texto é potencialmente significativo. Na análise textual examinam-se os signos – palavras em sequências mais longas de texto que consistem de um significado combinado com uma forma – por meio da análise do conteúdo, da estrutura e do significado do texto (FAIRCLOUGH, 2001). Na análise desta dimensão é importante estar atento à força dos enunciados.

A segunda dimensão está relacionada com a compreensão do discurso como contexto, isto é, do discurso como prática discursiva. Conforme Fairclough (2001), os textos são produzidos e distribuídos de formas particulares em contextos sociais específicos. Uma instância de prática discursiva pressupõe a análise da interação discursiva usada para comunicar significados e crenças e a ideia de que um texto apenas não produz a realidade social e sim as relações entre diversos textos que constituem o fenômeno social. É nessa ideia de interação que a intertextualidade e a interdiscursividade ganham relevância.

A terceira dimensão está relacionada com a compreensão do discurso como prática social e pressupõe considerações acerca do contexto social no qual os discursos são construídos. É esta dimensão que media as articulações mais ou menos duráveis dos diversos elementos sociais que constituem as seleções e ordenações sociais possíveis de existirem em determinado contexto histórico (no tempo e no espaço) (FAIRCLOUGH, 2001). É essa dimensão que permite a compreensão do discurso como representativo de ideologias.

Em termos mais específicos, convém informar que a operacionalização ocorreu por meio da identificação dos objetos discursivos alocando-os em formações discursivas que não foram definidas à priori, mas sim, a posteriori. As formações discursivas foram nomeadas de acordo com as expressões dos próprios EJs.

Após a análise dos textos, das práticas discursivas e das práticas sociaisi – processo de análise crítica de discurso – os resultados da pesquisa permitiram a identificação e a seleção de um conjunto de objetos discursivos vinculados à empresa júnior presentes nos discursos dos empresários juniores. Inicialmente, os objetos discursivos foram categorizados de forma separada. Em seguida, eles foram agrupados em torno de categorias analíticas maiores – formações discursivas – com base em suas intertextualidades. Em um terceiro momento, reconhecendo as intertextualidades por meio das conexões e dos silêncios dos objetos discursivos, foi possível identificar práticas discursivas que, inseridas em práticas sociais, possibilitaram explicitar uma ordem de discursoii que propiciou reflexões importantes sobre o contexto educacional de administração. As ordens de discurso são a totalidade das práticas discursivas (produção, distribuição e consumo de textos) dentro de uma instituição ou sociedade e suas articulações que vinculam-se às formações discursivas (FAIRCLOUGH, 2001). 4 A empresa júnior no discurso de seus membros

O agrupamento dos objetos discursivos em categorias analíticas (formações discursivas) foi feito conforme quadro a seguir:

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Quadro 1: Formações discursivas OBJETOS DISCURSIVOS DESCRIÇÃO CATEGORIAS

Supremacia da prática Esta categoria evidencia a grande valorização que os EJs dão à prática e como a EJ antecipa o aprendizado por meio da prática.

“Outra graduação dentro da

EJ” Antecipação dos conteúdos do curso

Dedicação incondicional Esta categoria torna-se possível a compreensão do significado que a EJ tem para os EJs.

“Eu não faço Adm, eu faço

EJ” Motivação Salvação Autodidatismo Abrir mão da vida pessoal Esta categoria agrupa objetos

discursivos que permite conhecer as implicações de se pertencer à EJ.

“A gente dá o sangue por esta paixão”

Cansaço, sofrimento, estresse Visão dos amigos e familiares Trabalho árduo Nesta categoria, são apresentados e

discursivos os objetos discursivos que permitem compreender os valores da EJ.

“Somos júnior só no nome” Engajamento e comprometimento

Profissionalismo

“Caneladas” Esta categoria possibilita conhecer a imagem que os EJs desenvolvem ao abandonarem os estudos na busca pela prática.

“Caneladas” de sucesso Sucesso é tudo

Currículo superior Esta categoria agrupa objetos discursivos que permitem compreender os motivos pelos quais os EJs entram e permanecem na EJ.

O “Deus” mercado Diferencial para o mercado Ponte/alavanca para o mercado Antecipação de conhecimento sobre o mercado

“Outra graduação dentro da EJ”

A primeira categoria diz respeito a um dos aspectos centrais evidenciados na pesquisa: a concepção da EJ como um espaço da prática. Dois objetos discursivos são contemplados nesta categoria: a supremacia da prática, antecipação dos conteúdos do curso.

O primeiro objeto discursivo – supremacia da prática – está relacionado com a ideia de que, na prática, tudo é mais interessante, real, desafiador e significativo. Já na teoria, tudo seria distante da realidade dos alunos. Sendo assim, o curso é concebido como o espaço da teoria e a EJ [de maneira quase isolada do curso] como o espaço da prática. Nesse contexto, o professor seria o teórico e, o EJ o prático ou o aluno empresário. Conforme explica Costa (2010), é como se aprender a fazer na prática, no dia a dia, pudesse prescindir da educação formal para isto.

“As disciplinas? Contribui para indicar caminhos, eu falar que eu aprendo, que tô pronta para assumir não é muito não. Os professores, eu acho que muitos, não tem esse suporte da prática, de ter vida prática, nunca trabalharam, sabe? Vivem da teoria, então o que eu levo da aula mesmo é a teoria e, às vezes, algum material, que algum professor indica, que me dá o caminho, não é nem o que o professor fala, mas é uma literatura que ele indica” (EJ2). “O meio acadêmico hoje eu acho que tá criando gente pra dar aula sabe? Não é assim, tem gente que não tem paciência de ficar fazendo artigo científico [tom de ironia], entendeu? Não gosto, eu gosto de pegar e atuar mesmo e conhecer novas empresas, acho que os professores não entendem isso” (EJ14). “Na EJ, a contribuição é imensa, eu diria que é uma graduação na [universidade] e outra graduação dentro da EJ, que lá dentro eu digo que aprendi assim, na prática” (EJ4).

O segundo objeto discursivo que compõe essa categoria diz respeito à antecipação dos conteúdos do curso. Neste está presente a ideia de que a EJ antecipa os conteúdos do curso uma vez que o aluno que está em períodos iniciais entra em contato com conteúdos de disciplinas que são oferecidas em períodos mais avançados. Assim, os EJ veem, na EJ, uma oportunidade de se antecipar ao curso e aprender – antes dos demais alunos e antes que um professor ensine – conteúdos que seriam relevantes para o mercado.

“Todo o conteúdo abordado em sala de aula, a gente tem a oportunidade de aprender antes de ser demandado por eles [professores] por causa da prática. (...) Quando a gente tem oportunidade de ter experiência na prática, a gente chega na teoria e consegue ver muito claro quando o professor passa para os tópicos” (EJ1).

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“Já me deparei com a necessidade de desenvolver algumas atividades [na EJ] que eu não tinha nem a base teórica na faculdade, então, eu tive que aprender na marra, de ir atrás de professor em tal disciplina, de ter que adiantar algum tipo de conhecimento. A gente [membros da EJ] tem de se desenvolver numa velocidade maior que da universidade” (EJ16).

Está muito presente no discurso dos EJs a ideia de que a EJ é outra graduação. Isso é ouvido com bastante frequência no dia a dia da empresa. Dada a sua força, ela serve como atrativo para os alunos uma vez que simboliza o quanto a participação na EJ pode ser significativa para o aluno aprender mais do que dentro do curso, ou seja, ele tem a oportunidade de “fazer outra graduação” o que implicaria em uma maior preparação para o mercado de trabalho e um diferencial em relação aos concorrentes. Assim, além de aprender mais, ele aprenderia antes dos outros alunos. Isso nos leva a segunda formação discursiva. “Eu não faço adm, eu faço EJ”

Esta segunda categoria diz respeito à prioridade que os EJs dão à EJ considerando as atividades inerentes à empresa como superiores ao curso. Quando são questionados se a EJ é uma prioridade, entre as demais atividades oferecidas e exigidas pela universidade, são raros os alunos que dão uma resposta negativa. Esta categoria contempla quatro objetos discursivos: dedicação incondicional, motivação, salvação e autodidatismo.

O primeiro objeto discursivo desta categoria esta relacionado à dedicação incondicional dos EJs à empresa júnior.

“a gente trabalha que nem um condenado e não ganha nem um centavo (...) meu tempo de estudo é muito pequeno e eu não posso parar porque eu tenho várias atividades diárias da empresa que eu tenho que fazer. Algumas reuniões que eu não posso simplesmente desmarcar porque eu tenho prova amanhã” (E1). “Eu fico exausta, quase morro, final de semana? Não tenho isso. Acho que eu só estou namorando porque o [namorado] é da EJ também [risos], senão, não tinha namorado, mas é porque a EJ é prioridade na minha vida hoje” (E2). “A EJ, infelizmente, sempre foi prioridade. É até meio vergonhoso falar isso pra você [pelo fato de ser professora dele], eu sempre dei prioridade pra Empresa Júnior” (E4).

Muitos EJs, inclusive, não veem esta prioridade como positiva o que fica claro no discurso deles por meio da expressão utilizada (infelizmente). Contudo, a força dos enunciados [não posso, tenho que fazer, quase morro] evidencia um caráter de obrigatoriedade no cumprimento das atividades. Percebe-se, muitas vezes, que eles dão tanta prioridade para as atividades da EJ em detrimento das demais atividades que a universidade oferece porque foi na EJ que eles encontraram uma motivação maior para permanecerem no curso. Esta constitui o segundo objeto discursivo que compõe esta categoria.

“o aprendizado que você tem lá dentro é o que mais motiva. Cada dia você tem um desafio novo você, tem que buscar conhecimento, você tem que correr atrás, então é esse desafio que mais motiva” (EJ4). “a EJ abre a sua mente e te mostra se é isso realmente o que você quer fazer, te dá aquela certeza, porque no curso você vem nas aulas, você faz as atividades, você cumpre com o que é proposto, você faz 60 pontos para passar: isso é muito fácil, é muito simples, é aquela mesmice. A EJ não, ela é dinâmica!” (EJ3). “eu já deixei de ir em aulas porque tinha que atender cliente, colocava em primeiro lugar a empresa sim. Mas a gente também tem que pensar ‘não, tem a empresa, mas a gente também tem que ir pra faculdade’, a gente até brinca às vezes: ‘gente, também tem que lembrar que a gente tem faculdade’” (EJ9). Fica claro no discurso dos entrevistados que, algumas vezes, a EJ representa mais do que

motivação para o aluno, ela representa a salvação, ou seja, o fator que leva o aluno a permanecer no curso. A salvação constitui o terceiro objeto discursivo apresentado nesta categoria.

“eu julgo que 80% do meu aprendizado é decorrente da EJ. O curso é bem teórico e não dá pra gente aplicar muito. Pra mim, foi fundamental acho que eu nem teria continuado no curso se eu não tivesse entrado na EJ. Eu amo estar aqui dentro, Nossa Senhora! Eu deixo tudo da [universidade] pra lá e eu vou me concentrar nas coisas da EJ (...) como não consigo conciliar o tempo, eu já reprovei em duas matérias” (EJ5). “Então você fica curioso pra saber se você tá no caminho certo, se é isso mesmo que você quer. A EJ te oferece resposta e sem isso, se eu tivesse só com o curso eu ia ficar nessa dúvida até entrar” (EJ15). Percebe-se, ainda, que a dinamicidade da EJ ressaltada pelos EJs e os desafios que ela

oferece estão relacionados ao autodidatismo que representa o último objeto discursivo desta categoria.

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“aqui na EJ, a gente não vai facilitar a vida de ninguém, só não vai dificultar. Todo mundo desde que entrou na empresa não teve nada de mão beijada, tem que se virar, correr atrás do conhecimento” (EJ12). “às vezes eu podia tá fazendo um estágio, mas não estaria aprendendo tanto quanto eu tô aprendendo aqui [na EJ], porque aqui a gente estuda, aqui a gente trabalha, aqui a gente aprende muita coisa, então, eu acho muito bom. Eu até acho bacana que é só estudante, não tem um professor pra ficar cobrando a gente se tá fazendo direito” (EJ9). “eu falo que eu não faço administração, eu faço EJ. A administração [curso] é que está complementando a EJ” (EJ2). Os quatro objetos discursivos apresentados nesta categoria são interessantes para evidenciar

a força que a EJ tem no imaginário dos alunos e, consequentemente, os leva a priorizar as atividades desenvolvidas nela e colocarem em segundo plano o próprio curso. Esta dedicação incondicional e a colocação do curso em segundo plano ultrapassam os limites da universidade uma vez que os EJs deixam de lado amigos, família, diversão e até mesmo a saúde física. Para discutir esses aspectos, foi desenvolvida a próxima categoria.

“A gente dá o sangue por esta paixão”

Esta terceira categoria traz à tona, por meio de três objetos discursivos – abrir mão da vida pessoal; cansaço, sofrimento e estresse; visão dos amigos e familiares – a discussão sobre o preço que os EJs pagam para estar na EJ.

O primeiro objeto discursivo diz respeito ao fato de que eles abrem mão da vida pessoal para poderem permanecer na EJ desenvolvendo suas atividades.

“preciso terminar o inglês, mas realmente, com a EJ fica muito complicado. Meu pai está pagando inglês, está sendo o maior sacrifício e eu deixo o inglês em segundo plano, vou sempre nas atividades da EJ. Não é fácil, mas a gente tem paixão pelo que faz” (EJ5). “para as festas teve uma limitação, no dia que eu ia sair falei ‘gente do céu’ parece que você fica louco, você tá na festa e fica pensando no que tem para fazer lá [na EJ], é muito estranho, você fica com isso na cabeça, tipo ‘o que eu estou fazendo aqui? eu preciso tanta coisa da EJ para fazer’, então é muito complicado, é um limite pra sair para festas” (EJ6). “eu me afastei um pouco das minhas amizades por conta assim de trabalho, eu decidi me dedicar mais à EJ porque eu sou apaixonado por isso aqui” (EJ4). “foi uma fase [programa trainee] muito sobrecarregada: eu não dormia, não alimentava direito, eu não tinha tempo de ir pra casa. Minha vó tinha operado do coração tinha uns dois meses e eu não tinha tempo de ir visitá-la. (EJ18)

O segundo objeto discursivo analisado nesta categoria é cansaço, sofrimento e estresse e está vinculado às sensações que os EJs experimentam em função da participação nas atividades. Em alguns casos, os EJs avaliam a sua sensação simplesmente como cansaço, em outros, fica clara a sensação de sofrimento e, em alguns outros, eles entendem que estão mesmo estressados.

“às vezes a gente prioriza muito a EJ e, assim, acaba com uma imagem ruim perante os professores porque a gente falta muito nas matérias, dorme na sala de aula, mas é questão de esgotamento mesmo”. Com tantas reuniões na EJ, eu fico tão cansado que eu nem consigo acordar pra ir pra aula” (EJ16). “eu tinha uma reunião toda semana, às onze horas da noite [se referindo à participação como membro da FEJEMG], e ia até mais de meia noite sendo que no outro dia eu tinha aula às sete da manhã e, assim... aquilo me sugou muito, fiquei muito estressada naquela época” (EJ5). “o Dia D [evento promovido pela FEJEMG, mas organizado pelas EJs] me deixou estressado a ponto de eu não conseguir respirar, minha casa tava com 30 pessoas, eu não consegui dormir em uma cama. Foi terrível! foi a pior experiência da minha vida e eu peguei trauma, literalmente eu peguei trauma, nunca mais quero ouvir falar” (EJ7).

O projeto trainee é um rito de passagem muito intenso dentro da EJ porque o sucesso ou fracasso dos EJs, nesta etapa, representa a sua efetivação ou não na empresa. Por isso, para os trainees, parece que as sensações de sofrimento e de estresse são ainda mais fortes. Isso é admitido, inclusive, pela presidente da EJ conforme discurso abaixo.

“a apresentação dos projetos dos trainees, no sábado, foi uma choradeira, todo mundo morrendo porque foi muito desgastante” (EJ2). “por causa da realização do projeto trainee, foi bem pesado nos últimos dias, tava todo mundo muito estressado. A gente chegava muito cedo e saía tarde da [universidade] e essa correria contribuiu, pelo menos pra mim, muito para o estresse” (EJ3).

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“o comprometimento é o valor norteador para os membros estarem aqui, se eles não tiverem comprometidos, eles não vão permanecer lá. É um pensamento da própria empresa, quem não está comprometido, engajado com as atividades da empresa não irá permanecer por muito tempo porque a gente tem uma vontade de aprender muito grande, a gente dá o sangue” (EJ1).

A última frase do parágrafo anterior: “a gente dá o sangue” é bastante ilustrativa do sacrifício que os EJs fazem pela EJ. Mas o que pensa quem está de fora? Este último objeto discursivo está relacionado à opinião dos amigos e familiares dos EJs com relação à participação dos mesmos na EJ.

“Eu cheguei toda feliz e eufórica para a minha irmã para contar que eu tinha sido aprovada para a Brasil Júnior e ela simplesmente disse assim: “ah é? Mas já que você tem um cargo tão alto assim porque você ainda não tá rica?’. (...) Meu pai com a minha mãe não dão apoio nenhum pra eu tá aqui, eles pensam que eu tô indo mal na faculdade por causa da EJ, eles acham que tudo de ruim que acontece é por causa da EJ. Mas é porque eles não conhecem, então acham que a EJ prejudica” (EJ5). “Os meus colegas sempre olham pra gente que está lá dentro e falam: ‘meu Deus, vocês se esforçam demais, trabalham demais” (EJ6). Nota-se, ao analisar esta categoria – “A gente dá o sangue por esta paixão” – que apesar dos

EJs abrirem mão da vida pessoal, se sentirem muito cansados, entenderem que há motivos para sofrimento dentro da EJ e até mesmo se considerarem estressados, ainda assim eles acham que vale apena continuar ali mesmo sem o apoio dos amigos e dos familiares. Isso foi algo intrigante durante o trabalho etnográfico. Por isso, procurou-se aprofundar a compreensão deste fenômeno e ela veio dos valores da EJ que compõe a quarta categoria. “Somos júnior só no nome” Tendo permanecido quase um ano observando, de forma participante, o cotidiano dos EJs, foi possível conhecer todas as atividades que são desenvolvidas na EJ: planejamento estratégico, processo seletivo para novos membros, programa trainee, efetivação dos membros, desligamento de membros, candidatura aos cargos, troca de gestão, avaliação de desempenho, treinamentos diversos, desenvolvimento de projetos de consultoria, gestão das pessoas, advertências e punições, participação nos eventos da FEJEMG como reuniões presenciais e Dia D, promoção do evento regional, entre outras. Este grande volume de atividades para serem desenvolvidas ao longo do semestre letivo faz com que os EJs trabalhem de maneira extremamente [usando o termo sem medo de exagerar] árdua. Mais intrigante do que o fato de eles darem conta de tudo isso, é a forma como estão comprometidos e engajados no cumprimento de tantas atividades deixando, inclusive, de lado, o curso e a vida pessoal conforme já discutido em categoria anterior. Na análise dos valores da EJ, foram identificados três valores que correspondem aos três objetos discursivos que compõem esta categoria. São eles: trabalho árduo; engajamento e comprometimento; profissionalismo. É importante, entretanto, esclarecer que os valores aqui mencionados não são os mesmos que estão nos documentos da EJ até porque a maioria dos entrevistados e a própria presidente da EJ não conseguiu se lembrar dos valores na hora da entrevista. Isso demonstra que os valores formalizados no planejamento estratégico não são exatamente os mesmos aqui identificados.

O trabalho árduo é o primeiro objeto discursivo desta categoria. Este é um valor muito arraigado na cultura da EJ e está relacionado à quantidade de tempo que os EJs dedicam à EJ.

“vou gerenciando meu tempo porque uma coisa que eu aprendi é dormir menos de oito horas por noite, que hoje em dia se eu pego o final de semana pra dormir mais de oito horas por noite eu não dou conta, se eu durmo muito já me da dor de cabeça, acho que meu organismo já acostumou com isso, então horário de almoço é assim, eu almoço, descanso uns 15 minutinhos e volto, não faço hora na verdade e volto para EJ” (EJ2). “na primeira semana do programa trainee foram treinamentos diretos então foi uma semana que eu sai daqui da [universidade] mais ou menos onze horas da noite todos os dias. Mas acho que foi uma das melhores pra mim” (EJ6).

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“minha mãe reclama e fica brava demais comigo dizendo: ‘nossa! mas você estava até agora na universidade, é uma hora da manhã, você estava até agora em reunião?’ Fica mais brava ainda quando pergunta: ‘você já comeu? Você já jantou?’ e eu responde que não porque não deu tempo ainda” (EJ8). Apesar de ser um trabalho árduo, os EJs não reclamam e mesmo aqueles que reclamam da

falta de tempo livre, continuam lá. Entretanto, conforme discurso de uma das alunas que desistiu, eles sentem desgaste, apesar de não admitirem.

“Tudo que eu sentia de desgaste, todos os membros sentem, mas eles não admitem, eles não admitem! Então assim, você vê pessoas com problemas de saúde, pessoas se arrastando, você vê o desempenho da pessoa caindo, sabe? Mas, então decidi que não queria isso pra mim” (EJ18).

O segundo objeto discursivo a ser tratado nesta categoria diz respeito ao comprometimento e engajamento dos EJs com as atividades da EJ.

“Nosso maior valor é o engajamento, paixão, porque a gente não recebe um tostão pelo que a gente faz e a única coisa que a gente recebe em troca é capacitação pro mercado. O pessoal do MEJ costuma falar muito assim: ‘hoje a gente não ganha nada, mas cada dia que você fica na EJ, você vai ficando mais caro pro mercado’” (EJ2). “Eu digo que eu tenho orgulho e paixão de trabalhar lá hoje (...) a gente não recebe nada, por isso, tem que ter muita motivação pra continuar lá dentro. Você tem que ter paixão pelo que você faz, mas o reconhecimento é muito legal assim pelos colegas de trabalho, é uma motivação (EJ4). “é uma relação de paixão mesmo, porque as pessoas que tão ali dentro pela carga de trabalho que a gente tem, você não faz se não tiver paixão, não é só pra incrementar o currículo, não é só pra ter vivência empresarial não, pra mim é um sentimento de paixão tá ali dentro” (EJ15). Essa paixão, entretanto, é uma paixão incondicional que leva os EJs a aceitarem as

condições que lhes são oferecidas sem questionarem. Chegam até mesmo a considerarem que comportamentos como esses é que são apropriados aos EJs.

“a gente percebe muitos alunos se desligarem da graduação pra viver somente a EJ, mas isso pra mim é irracional sabe? Muitas pessoas da EJ acham legal dizerem: ‘ah! não dormi essa noite, ‘ah! eu não almocei’, ‘ah! eu deixei de ir pra casa pra fazer reunião’. Quem não faz isso vira ET, é como se ir pra casa [dos pais nos finais de semana] fosse uma coisa de outro mundo, como se você não estivesse comprometido, como se você estivesse fazendo um crime. Então a gente sentia que em algumas pessoas tinham resistência e eu sempre valorizei muito a família, eu sempre gostei de ir muito pra casa, então assim todo final de semana, por eu também ter namorado lá. Daí eu desisti da EJ” (EJ18). Esse comprometimento e engajamento faz com que os EJs passem muito tempo juntos nas

atividades da EJ, a convivência é muito intensa. Isso os leva a considerarem a EJ como uma família. Mas muitos reclamam que o espírito de família estaria se perdendo na busca por profissionalismo - último objeto discursivo que compõe esta categoria.

“Antes a EJ tinha uma ideia muito assim: ‘é família, venha entrar para a família EJ’. Ainda é família porque o laço que a gente cria aqui é muito grande, mas a empresa tá muito mais profissional agora, sabe? A gente vai tocar o menino pra fora da empresa porque o desempenho dele não está satisfatório, mesmo depois de um monte de feedback, e essa responsabilidade é minha, eu que tenho que chegar para um pessoa muito próxima, até da minha família, entendeu? (...) a imagem de EJ família? o pessoal perdeu um pouco (EJ14). Nem sempre os EJs, especialmente aqueles que estão em cargos de direção veem essa

metáfora da família como positiva tendo o receio de que a amizade atrapalhe o profissionalismo que, para eles, é um valor fundamental.

Eu vejo muito profissionalismo, como valor, a gente não aceita gente que esta ali pra brincar e não está levando a sério, não é só pela estrutura da empresa, é por todo mundo que a gente influencia, todos nossos stakeholders (...) a gente é júnior, mas é júnior só no nome, não tem nada de brincadeira. Não gosto das coisas erradas e não relevo, já dei bronca no [meu namorado], entendeu? Eu não consigo relevar, então, não sei se sou eu que estou cobrando demais, ou se é a empresa que está mais consciente de que a gente esta aqui para se preparar para o mercado e o mercado não perdoa” (EJ2).

Tendo percebido as dimensões que esse impasse – ser família ou ser profissional – tomou no ambiente da EJ, procurou-se aprofundar a análise a respeito da imagem da EJ. Para tanto, durante o trabalho etnográfico, procurou-se conversar com os EJs, ouvir a opinião de alunos, servidores e professores do departamento que abriga a EJ. As anotações no diário de campo auxiliaram no entendimento dos discursos dos EJs a respeito da imagem da EJ. Com isso, foi desenvolvida a próxima categoria.

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“Caneladas” de sucesso Esta categoria contempla dois objetos discursivos: “os caneladas” e sucesso é tudo. O fato

de os EJs terem tantas atividades da EJ para desenvolverem, faz com eles passem muito tempo juntos. O excesso de atividades os impede de participarem de outros grupos dentro da universidade. Com isso, eles acabam se distanciando dos outros alunos que não participam da EJ e por isso são chamados de “panelinha” e de “metidos”. Os EJs alegam que estão tentando mudar essa imagem e tem conseguido. No entanto, há outra imagem que, segundo eles, está sendo difícil de mudar é a imagem de “caneladas” que adquiriram junto aos professores e aos colegas de curso. Este aspecto constitui o primeiro objeto discursivo desta categoria.

“O pessoal tem uma imagem ruim da EJ por causa dos alunos que participam dela, o pessoal daqui [da EJ] não é tão exemplar na sala de aula. Tem professor que acha a gente canelada” (EJ10). “vejo muita gente sendo reprovada, indo mal, por estar fazendo as atividades aqui (...) por causa de tudo que a gente tem de fazer aqui na EJ, a gente talvez não tenha um desempenho muito bom em sala de aula, aí talvez os professores podem pensar que a EJ está prejudicando a gente” (EJ5).

Esse abandono dos estudos para focar a prática também está presente na pesquisa de Costa (2010). Essa imagem de “canelada” não é, necessariamente, vista como negativa por parte dos EJs. Em alguns casos, ela é mesmo vista como necessária, pelo menos na opinião da atual presidente.

“Nossa, é bem complicado, porque é assim, a maioria quando entra na EJ acaba dando prioridade pra empresa, isso não pode acontecer, a gente orienta pra não deixar de lado a faculdade, mas acaba realmente deixando: chega atrasado nas aulas, toma pau por falta, abaixa a nota. Com isso, a gente vê que realmente com os professores a gente não tem uma imagem muito boa. A EJ não é igual ao PET que precisa ter um coeficiente alto pra se manter lá, a gente não precisa disso. Se a gente pegar as pessoas corretas, não tô falando que nós não somos corretos, mas se seguisse certinho dentro da faculdade, como a gente já teve dois trainees que eram realmente corretos, tinham horário pra estudar, para comer, horário pra dormir – estes não conseguem ficar dentro da empresa, porque você precisa dessa flexibilidade. A gente tem reunião domingo as dez horas da noite, ninguém aguenta, você tem que as vezes sair de reunião e ir estudar, as vezes acaba nem estudando. A pessoa certinha acaba dando prioridade pra estudar e não pra reunião. Teve dois casos de trainees que eram assim, eram super corretos na faculdade e não ficaram eles iam ser efetivados, eram muito bons, mas não ficaram, então a gente sempre fala assim ‘a gente precisa ter uns canelas no meio, porque senão, não vai pra frente’ porque você tem que abrir mão de algumas coisas da faculdade pra tá fazendo pela empresa” (EJ8).

Apesar de achar necessária a presença de alguns “caneladas” na EJ, reconhece-se que a EJ orienta seus membros com relação a isso.

“Então a gente orienta, fala: ‘olha, você tá saindo de aula pra fazer coisas da EJ, é sua responsabilidade, não envolve o nome da empresa’. A gente tá tentando limpar o nome da empresa aqui no [departamento] porque as gestões anteriores teve muito problema com o departamento e com os professores por uma questão de arrogância. A gente realmente não tem uma imagem muito boa (EJ2).

É importante observar que a orientação não é direcionada para que os EJs melhorem suas notas, mas sim para que eles não prejudiquem a imagem da EJ, ou seja, o problema não é os EJs irem mal no curso, mas sim levar o nome da EJ junto. Fica claro no discurso dos EJs que eles têm consciência dessa imagem de “caneladas”, mas isso não representa um problema tendo em vista que a prática (a EJ) é mais importante do que a teoria (o curso). Eles não se preocupam em irem bem (tirarem notas boas) no curso porque, para eles, a EJ, por si só, é suficiente para que eles se preparem para o mercado de trabalho e obtenham sucesso na carreira. Esse sucesso é algo muito forte no discurso dos EJs e é muito disseminado por meio de uma cultura de valorização do sucesso. O “sucesso é tudo” (o que está implícito e, algumas vezes, explícito no discurso dos alunos é a concepção de que não precisa ser bom aluno para obter sucesso na carreira desde que ele tenha prática). Essa ideia é alimentada pela mídia de negócios conforme explica Costa (2010). Nessa direção, o segundo objeto discursivo ajuda a complementar a discussão que se propôs fazer nesta categoria, ou seja, não importa ser “canelada” desde que tenha sucesso.

“um amigo meu passou na Vale e ele falou que quando ele virou e falou que foi diretor de projetos já olharam pra ele com outros olhos e com mais interesse. Outra pessoa que conheço da [outra EJ] falou também que passou na Monsanto. Ele tinha feito intercâmbio e estágio, mas ninguém nada disso na entrevista e eles perguntaram só da EJ. E agora mesmo eu tava conversando com uma amiga minha que tá trabalhando na Falconi e eles também falaram da EJ. Estão pegando muito no ponto EJ, então tá sendo algo assim muito importante, que eles não querem pessoas cruas, entendeu?” (EJ9).

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“teve membro nosso que saiu e foi trabalhar na Google, deve ter uns seis na Alcoa” (EJ2). “Aqui toda hora eles [EJs] dão exemplo de gente que conseguiu ir para grandes empresas, outros para o exterior, teve um EJ que foi pro Canadá” (EJ10).

A força do processo de socialização fica bastante evidente no discurso de uma das EJs entrevistada que demonstra ter uma visão diferente dessa valorização do sucesso.

“Tem gente da EJ que vai trabalhar em pequenas empresas porque não querem ir pra uma grande empresa, não é porque eu estou lá que eu consigo usar isso no meu currículo e ser uma CEO. Pra falar verdade, eu não acho que eu esteja a frente de outra pessoa no curso (...) tem gente que acha que estar na EJ é coisa de outro mundo, sabe? Eu não acho que eu sou a última bolacha do pacote porque eu estou lá não. (...) Acho que é mais por causa da propaganda da empresa de falar assim ‘esse é o seu diferencial’, daí todo mundo acha que tem esse diferencial e não tem. Então é mais questão deles acreditarem nisso” (EJ10).

Os exemplos de sucesso são reforçados por meio do processo de socialização e por meio de práticas cotidianas da EJ como o Mural da Fama que é um espaço onde são divulgadas notícias dos egressos da EJ. Há EJ que chega até mesmo a atribuir a nota do curso no Guia do Estudante à existência da EJ no departamento: “O curso aqui tem cinco estrelas hoje por causa da empresa júnior” (EJ2). Os objetos discursivos apresentados nessa categoria reforçam a ideia de que a EJ constitui-se como uma oportunidade de desenvolvimento do tão almejado diferencial. Esse diferencial é alcançado por meio da prática e esta prática é o passaporte para o mercado de trabalho. Por isso, a EJ vira uma religião que oferece o caminho para o sucesso. Nessa direção, é apresentada a última categoria analítica. O “Deus” mercado

Esta categoria evidencia a ideia de que a aproximação com o mercado de trabalho é primordial para que o aluno possa ter uma formação adequada. Esta categoria contempla quatro objetos discursivos: currículo superior, diferencial para o mercado, ponte/alavanca para o mercado, antecipação de conhecimento sobre o mercado.

O primeiro objeto discursivo – currículo superior – diz respeito ao entendimento que os EJs têm da EJ como uma oportunidade de melhorarem seu currículo. Os alunos que participam da EJ, além de desenvolver projetos de consultoria, têm a oportunidade de participarem de várias atividades como cursos de capacitação (informática, oratória, elaboração de currículo, comunicação, etc), organização de eventos, entre outros. Algumas vezes, são ouvintes outras vezes ministram alguns cursos. Ao fazerem isso, eles consideram que estão “fazendo” currículo, ou seja, estão se preparando para a inserção no mercado de trabalho. Esta ideia é tão forte que serve como justificativa para a entrada e para a permanência na EJ.

“primeiro, eu acho que é questão de currículo. Por exemplo, o meu já está muito bem rico. Acho que se não fosse a EJ, meu currículo estaria em branco, não teria nada pra colocar, nunca trabalhei (...) já me deu uma estrutura boa pra eu competir com outras pessoas” [EJ5]. Mas é preciso se atentar para o fato de que eles não querem apenas se preparar para o

mercado, eles querem se diferenciar dos demais alunos que serão seus futuros concorrentes depois da formatura, ou seja, querem ter um currículo superior. Isso conduz ao segundo objeto discurso que compõe esta categoria.

O objeto discursivo “diferencial para o mercado” identificado nos discursos analisados diz respeito à concepção de que ter um currículo que, na visão deles é superior (“rico”), torna um diferencial na hora de competir por uma vaga nas empresas.

“Para mim, participar da EJ é me diferenciar no mercado, eu entrei na universidade muito focada em me formar muito bem e eu vi dentro da EJ essa oportunidade” (EJ1). “Eu participei [da EJ] porque eu vi muita notícia relacionada à importância de uma EJ durante a graduação. Tem muita empresa que contrata estagiário, trainee – aqueles que participaram de uma EJ, então eu me senti interessado por ser um diferencial já durante a graduação” (EJ6). “Eu sou diferenciado comparado aos meus colegas de classe que não participam de EJ ou fazem apenas graduação isso eu tenho plena noção” (EJ4). Essa ideia de diferencial não está presente apenas nos discursos de quem está dentro da EJ,

mas também na fala de quem quer entrar. No momento das entrevistas – a última etapa do processo

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seletivo – quase todos, senão todos os candidatos dizem que este é o motivo pelo qual se interessaram em entrar para a EJ. Além de estar muito forte nos discursos dos entrevistados, essa visão é reforçada por meio do processo de socialização que ocorre entre ao EJs que já saíram e os que ainda estão na EJ. Inclusive, essa é uma das práticas bastante valorizadas pelos EJs: trazer os egressos para contar suas experiências após a saída da universidade. Assim, os egressos da EJ que estão trabalhando alimentam e reforçam a concepção de que eles são diferentes e isso traz grandes benefícios, especialmente o de transpor algumas “barreiras” para entrada nas empresas.

“eu estava conversando com [fulano] e ele conseguiu estágio em uma empresa lá em Brasília. Daí ele disse que a empresa tinha todo aquele processo né, para você se tornar trainee e depois funcionário, aquelas fases todas: prova, entrevista, dinâmica... Quando ele falou que ele já tinha sido da Brasil Júnior e da FEJEMG, o cara, o gestor já contratou ele para emprego em si, ele já pulou todas aquelas fases e já tá empregado, e ganha muito bem. Então olha o diferencial né?” (E5). “você vai criando uma rede, sabe, e é muito importante. Tem gente que já foi pra Alcoa, tem gente que já foi pra empresa e gente que já conseguiu estágio. Elas voltam para dar relato da experiência, eles voltam e contam pra todos integrantes, então todo mundo vai desenvolvendo esse seu lado, que mostra que muitas portas lá na frente podem se abrir por questão de você participar da empresa” (E6). “Aqui na EJ, a gente lida com clientes reais, eu vejo a EJ como oportunidade de abrir portas pra mim no mercado de trabalho” (EJ8). Dessa forma, a participação na EJ é entendida como uma ponte/alavanca para o mercado –

terceiro objeto discursivo que compõe a categoria “O Deus mercado”. O que é mais interessante de perceber é que essas ideias vão passando, por meio do processo de socialização, de geração em geração de EJs. Como último objeto discursivo desta categoria tem-se a antecipação de conhecimento sobre o mercado.

“Eu acho que a EJ me mostrou o que eu vou enfrentar no mercado (...) a EJ me mostrou claramente quais são os desafios que eu vou enfrentar no mercado, então, eu tô enfrentando aqui, aprendendo aqui, para chegar lá no mercado e estar muito mais preparada para enfrentar essas dificuldades e conseguir superá-las” (EJ16). “a EJ para mim tem o sentido de saber realmente como funciona o mercado de trabalho e o mundo dos negócios. Quando você realiza um projeto você vive a realidade de uma empresa, então você sabe todos os problemas que passam dentro daquela empresa. (...) é também a questão do mercado de trabalho, a gente consegue sentir na pele como realmente funciona e o que é a competitividade” (EJ4). “o que a gente fala não é mentira, ser uma empresário Júnior, hoje, é ser um diferencial no mercado porque você cria uma vivência de mercado antes mesmo de sair da faculdade para mercado de trabalho. Quando a gente aplicou questionário para todos os EJs, foi unânime a opinião de que a EJ é oportunidade de se ter vivência de mercado antes de sair da faculdade, de ter experiência empresarial” (EJ8). Esse discurso está coerente com o entendimento de Tolfo e Schmitz (2005, p.28) para quem

a EJ é um laboratório de aprendizagem que visa, “prioritariamente, o aprendizado anterior ao ingresso no mercado de trabalho dos estudantes envolvidos na empresa”.

A força desta ideia é que nos levou a denominar esta categoria de “o Deus mercado” porque tem-se a ideia de que tudo é válido e justificável para se preparar para tal mercado – tirar notas ruins, não realizar nenhuma outra atividade extracurricular além da EJ, colocar a sua formação universitária em segundo plano, comprometer a saúde, deixar de lado a família e os amigos etc. Os EJs fariam tudo isso “a fim de evitar a exclusão do mercado de trabalho” (BICALHO, 2009, p.65).

5 Aspectos silenciados no discurso dos EJs

Um primeiro silêncio identificado diz respeito à padronização de comportamentos. Todos os projetos desenvolvidos pela EJ pesquisada são para micro e pequenas empresas locais e às vezes, regionais. Mas a sua estrutura como empresa está organizada nos moldes de uma grande. Ao analisar os documentos da EJ – estatuto, regimento, manual de conduta, manual de qualidade, entre outros, qualquer pessoa sentir-se-ia dentro de uma grande empresa com presidência, conselho, várias diretorias, núcleos, comissões etc. Conforme explicam os EJs, a adoção desse modelo de estrutura organizacional tem o objetivo de profissionalização, o que levaria a uma maior credibilidade. Na busca por compreender melhor essa profissionalização que está presente no discurso dos EJs e especialmente daqueles que compõem a diretoria executiva, observou-se que a

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profissionalização caminha na direção da padronização que vai desde os processos até o comportamento do EJs. Com relação aos processos, a EJ tem orientações claras nos seus manuais para tudo: atendimento ao telefone, apresentação de projetos, gestão de projetos, avaliação de desempenho, processo seletivo entre outros. As consequências dessa padronização refletem no dia a dia da EJ e foi facilmente percebida durante o trabalho de campo. Nas apresentações de projeto, cursos de capacitação, candidatura para diretorias e em todas as atividades que envolvem utilização de slides, verificou-se a exigência de se seguir o mesmo padrão com fontes, tamanhos, tipo de gráfico, etc. Assistindo a apresentação dos planos de ação dos candidatos aos cargos de diretoria, verificou-se que todos os candidatos, sem exceção, utilizaram uma frase de efeito no final das apresentações. Esse é apenas um dos vários exemplos registrados no diário de campo. Essa padronização, portanto, extrapola os limites dos processos e chega até o comportamento das pessoas. Percebe-se que os EJs utilizam até as mesmas expressões e mesmos gestos. A EJ oferece diversos cursos de capacitação que caminham na direção do “como” fazer: como falar em público, como fazer apresentações em power point, como se comportar em uma RP (reunião presencial da FEJEMG), como gerenciar projetos, como gerenciar o tempo. A concepção implícita e silenciada no discurso dos EJs é a de que há um perfil ideal de EJ. Seu processo seletivo é altamente concorrido e temido pelos alunos. A exigência desse perfil que seria de alguém proativo, empreendedor, visionário, etc., faz com que a “inovação” seja uma busca constante dos EJs. A consequência disso é que, todo momento, tem um EJ propondo coisas novas: novas planilhas para gestão de projetos, novos cursos de capacitação, novo questionário para avaliação de desempenho, novas ferramentas gerencias, etc. – é assim que se demonstra pro-atividade. Mais intrigante do que o excesso de novidade é a facilidade com que toda proposta “inovadora” é aceita e aplaudida pelos EJs sem nenhum questionamento a respeito da necessidade de implantação de tal proposta. Isso cria um círculo vicioso de novas tarefas a serem cumpridas o que implica em dispêndio de mais tempo de dedicação à EJ e uma estrutura organizacional mais engessada ainda. Mas é preciso ressaltar que o EJ que não cumpre alguma de suas tarefas, recebe punição, por parte do Conselho, que vai desde advertência até o desligamento dependendo da importância da atividade não realizada. Em uma discussão (na reunião geral da EJ) a respeito do excesso de atividades que um EJ teria de dar conta, eis que alguém apresenta a solução para todos os problemas: um curso para os EJs aprenderem a gerenciar o tempo. Essa proposta é aplaudida, aceita e colocada em prática. Com isso, fica explícita a ideia de que o problema não é o excesso de atividades, mas sim a incompetência dos membros em gerenciar o seu tempo. A EJ que propôs o referido curso ganhou o prêmio de Destaque do mês (política de reconhecimento da EJ) por causa dessa proposta. O segundo silêncio – camuflado pelo discurso de sede de conhecimento – é a busca por poder. No discurso dos EJs eles alegam que querem ser diretores ou coordenadores de núcleos porque é uma oportunidade de aprender mais. Mas, há mais motivos além desse como a busca por poder que ocorre por meio da disputa por cargos dentro da EJ.

“Eu sempre quis ser diretora [se candidatou três vezes] desde que entrei na EJ: era um objetivo meu, às vezes eu penso que eu fui até um pouco, assim..., egocêntrica. Mas eu queria o cargo, eu via como é legal, como experiência, eu queria ter uma equipe minha porque eu vi que no projeto eu não me dei bem como membro da equipe, quem sabe como diretora eu poderia né? Eu também me candidatei por duas vezes consecutivas ao cargo de consultora na FEJEMG, mas não tive sucesso. Depois me candidatei para membro da Brasil Júnior e ganhei” (EJ5).

Não é a busca pelo cargo que é um silêncio no discurso desta EJ diretora, mas o silêncio está nos seus objetivos implícitos, ou seja, ela não se deu bem sendo liderada, mas acha que poderia se dar bem comandando uma equipe. Além da diretoria interna na EJ, ela se candidatou a cargos maiores e mais cobiçados dentro do MEJ. O cargo, além de possibilitar a liderança dentro da EJ permite que o EJ se destaque em relação aos colegas de curso.

“Acho legal isso de ter a responsabilidade. Teve um momento sim que eu precisei me impor mais. Eu estava no curso e tive que comandar uma equipe de alunos do 6º período, eu não me sentia a vontade e pensava

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‘quem sou eu pra falar alguma coisa pra eles, né?’, mas eu vi assim: aqui dentro da empresa cada um com seu cartão [cargo] então isso eu acho que a gente vai adquirindo com o tempo” (EJ9). Observa-se que, o cargo concede poder ao EJ, ou seja, mesmo estando cursando períodos

iniciais do curso, se ele tiver o cargo, poderá cobrar dos outros, é aceitável que cobre ainda que, supostamente, quem está em períodos mais adiantados do curso, saberia mais, teria mais conhecimento. Portanto, o poder não está relacionado à bagagem de conhecimento do aluno, mas sim ao cargo. O que se pretende afirmar aqui, com estes exemplos, mas que está mais forte, ainda, nos diversos momentos narrados no diário de campo é o aspecto da ascensão rápida que a EJ proporciona aos seus membros. Vários EJs, assim que terminam o processo de trainee, logo em seguida já se candidata ao cargo de diretor e muitas vezes ganha. Isso é muito sedutor para o aluno especialmente aqueles que estão começando o curso. Sabe-se que os alunos do curso de administração tendo seu imaginário alimentado pela cultura do management (ITUASSU; TONELLI, 2014; WOOD JR.; PAES DE PAULA, 2002), são iludidos e deslumbrados com a possibilidade de trabalharem em altos cargos nas grandes empresas. Ao chegarem na EJ, os alunos já começam tendo seu ego alimentado por meio de várias políticas de reconhecimento, são promovidos de imediato ao cargo de diretores e este cargo lhe dá autoridade para comandar. É por isso que o aluno vê a EJ como uma motivação para permanecer no curso e até mesmo como salvação no sentido de não deixá-lo desistir. Mais do que isso, quando eles afirmam que se identificaram com o curso por meio da EJ, eles dizendo que se identificaram com a imagem que a mídia de negócios produz do que é o administrador, o business man. A imagem de sucesso que a mídia de negócios produz e alimenta é reforçada pela EJ por meio do seu uniforme e de eventos que ela promove. Seu uniforme carrega uma carga simbólica altíssima. Uma cena presenciada é bastante ilustrativa nesse sentido: um aluno que tinha acabado de ser aprovado no processo seletivo, chega na EJ no seu primeiro dia de trabalho e a primeira coisa que ele faz é pedir a camiseta da EJ alegando que estava ansioso para vesti-la.

“Eu sei que muita gente vê status, a gente viu isso, porque até em processo seletivo a gente reparou que muitos falavam do glamour porque vê a gente com roupa pretinha, calça social e a blusa social (...) já teve gente que falou assim: ‘eu quero estar na empresa pra usar essa roupa preta’ e eu falei: ‘nossa tem gente que acha até ruim essa roupinha’. Não é porque a gente queria fazer bonito, mas a gente precisa ficar todo arrumadinho em dias importantes” (EJ9).

A vestimenta a qual EJ se refere é o uniforme preto social que é usado em dias especiais como eventos, visita e apresentação de projetos aos clientes, candidatura a cargo de diretoria, etc. Mas o glamour não está presente somente nos ocasiões como estas. Há um ritual muito valorizado e esperado, com ansiedade, pelos EJs que é a Troca de gestão. Nesse dia, os diretores passam a diretoria, fazem a troca de gestão para os futuros diretores. É um momento de muita pompa. As meninas usam maquiagem, saltos altos, vestidos de festa e penteados. Já os meninos estão todos de barba feita, roupa social e, geralmente, de grife. Este ritual é carregado de emoção, muito choro e muitas fotos que são postadas nas redes sociais quase em tempo real. Além do uniforme, há um momento máximo, ou seja, há um momento que representa o ápice do sucesso para os EJs: o evento regional que eles organizam e que conta com a presença de muitos alunos e alguns empresários além de parceiros como o Sebrae e Associação Comercial. Para esse evento, todos os EJs trabalham mais intensamente do que em qualquer outra época do ano. A cada ano um palestrante de renome é convidado para a palestra principal. Na palestra, o conteúdo da fala vai desde aspectos de exemplos de sucesso e heroísmo até auto-ajuda. Aspectos estes bastante presentes na cultura do management. Quando o palestrante – sempre alguém muito bem sucedido e popular – faz o seu discurso, o EJ sente que eles estão no caminho certo porque eles identificam o conteúdo deste discurso com o que é praticado na EJ. Essa imagem de glamour e status cultivada pela EJ está virando um “tiro no pé” conforme concepção do psicólogo que auxiliou os EJs no processo seletivo 2013/1. O psicólogo alertou os EJs que muitos alunos estão procurando a EJ somente por causa desse status e não necessariamente porque está em busca de aprendizado. Interessante destacar também que alguns egressos da EJ optaram pela vida acadêmica e estão matriculados em importantes programas de pós-graduação do

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país. Contudo, no Mural da Fama da EJ e em nenhum outro meio de divulgação da empresa foi feita menção ao “sucesso” destes egressos na carreira. O que estaria implícito nesse silêncio? Pode-se perceber nos discursos dos EJs e também por meio da convivência prolongada com os mesmos que eles consideraram como exemplo de sucesso somente os casos de egressos que foram trabalhar em grandes empresas do mercado como aqueles já exemplificados ao longo deste trabalho. Este resultado é coerente com os resultados da pesquisa de Costa (2010). Mas, de onde viria tal concepção? Para tentar responder a essa indagação, recorrer-se-á à análise da ideologia. 6 A ideologia do managementiii na formação do administrador

A permanência prolongada no campo decorrente da pesquisa etnográfica e também a análise dos discursos dos EJs conduziram a um aspecto que é central na EJ: a prática. Contudo, é importante atentar para o significado do termo no contexto da EJ. Em suma, o que está oculto e às vezes explícito no discurso dos EJs seriam os seguintes aspectos: i. a EJ é uma oportunidade de o aluno vivenciar a prática que é pouco oferecida pelo curso de

administração uma vez que, na concepção dos EJs, ele é muito teórico. Dada à importância da prática e a intensidade com que as atividades práticas são realizadas pelos EJs, é como se eles fizessem “outra graduação dentro da EJ”;

ii. para essa outra graduação que se configura pelo autodidatismo, desafio e dinamicidade, o EJ se dedica de maneira incondicional uma vez que ele se sente motivado por algo superior ao curso. Assim ele pode afirmar que faz um novo curso: “eu não faço Adm, eu faço EJ”;

iii. as características desse “novo curso” o deixa apaixonado ao ponto de ele abrir mão da vida pessoal, se sacrificar e chegar ao limite do estresse dando o “sangue por essa paixão”.

iv. mas tudo isso é necessário uma vez que é preciso trabalhar arduamente, se comprometer, se engajar para que alcançar a profissionalização. Afinal, aqui não há brincadeira uma vez que os EJs “são júnior só no nome”;

v. carregar o nome EJ é garantia de sucesso uma vez que a medida de avaliação e sucesso do mercado não são as mesmas da universidade. Portanto, posso ser “canelada” de sucesso;

vi. tudo é válido na EJ porque lá o aluno pode enriquecer o seu currículo e conseguir um grande diferencial; ao adquirir esse diferencial o aluno “fica mais caro para o mercado de trabalho” (para a empresa); ficando mais caro, a chance de ele obter sucesso está garantida. Sendo assim, o aluno vive a EJ/prática como religião e cultua o “Deus” mercado. Esse imaginário torna a EJ muito sedutora para os alunos e ao alimentar esse imaginário, ela

garante a sua perpetuação para as futuras gerações de alunos. Contudo, aqui caberiam algumas indagações e a evidenciação de importantes aspectos silenciados nos discursos dos EJs: o que prática? Um currículo rico significa formação de qualidade pensando em termos de qualidade formal e política? O que é sucesso? Quais são as implicações desse cenário presente no contexto educacional de muitas universidades brasileiras? Não se pretende apresentar respostas para essas questões, apenas instigar a reflexão sobre o que estamos chamando de formação dentro do curso de administração.

Nessa perspectiva, a ordem de discurso identificada neste trabalho diz respeito à ideologia do management que influencia o modo de pensar e de agir do aluno na universidade levando-o a privilegiar a prática. Prevalece a ideia de que a preparação se dá por meio da prática. Há que se atentar, contudo, para o fato de que ‘preparação’ é apenas um termo e formação é um conceito. Enquanto preparação remete a algo pontual, localizado e específico, formação pressupõe um processo.

Sendo somente a prática o que interessa, o curso de administração não mais precisa oferecer disciplinas voltadas para a formação humana. Na concepção de Paes de Paula (2012), isso já está ocorrendo tendo em vista que os conhecimentos humanistas estão perdendo espaço para disciplinas performáticas e profissionalizantes (PAES DE PAULA, 2012). Nessa ótica, não se aprende mais para a vida e sim para o mercado, para o exercício de uma profissão.

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Para Costa (2010, p.249), uma questão que não é discutida é a de qual seria o papel das IES – no geral – e das EJs – em particular – na formação do aluno. Nessa direção, a autora pergunta: “Educar é educar para o mercado?”. Sua resposta é: “nos casos das empresas juniores analisadas (...) estamos preparando nossos jovens exclusivamente para o mercado de trabalho” (p.258).

Nas palavras de Dias Sobrinho (2012, p. 601), houve um deslocamento das referências centrais da educação superior: “[...] das humanidades às disciplinas técnicas, e da sociedade ao mercado.” A educação superior estaria, então, envolvida na passagem de um modelo preocupado com a formação geral, em termos políticos, humanísticos e éticos dos alunos, para um referenciado exclusivo ou predominantemente na transmissão de conhecimentos performáticos e úteis ao exercício profissional. Para Paes de Paula (2012, p. 60), estar-se-ia vivenciando um momento em que a “educação desinteressada” perde espaço para a profissionalização e o adestramento cultural, a formação se transforma em semiformação e o indivíduo não mais pode se converter em sujeito, não mais pode se emancipar. O que estaria por trás desse discurso da prática (no seu significado reduzido) é a preparação que reduz o papel da universidade e acaba por produzir e reproduzir o discurso hegemônico que faz uso de modelos que legitimam um espírito capitalista. Assim, conforme discute Costa (2010), o modelo neoliberal proposto pelas nações dominantes – consubstanciado nos discursos acerca das práticas empresariais – parece ter alcançado um status de consenso. Esse modelo está sendo transposto para a educação. Na área da administração especialmente, as condições de produção do discurso são favoráveis ao fortalecimento dessa lógica de mercado devido, entre outros fatores, à cultura do management. Esta cultura ultrapassou a esfera econômica, que foi seu berço, e se espalhou por diferentes domínios da vida social (WOOD JR.; PAES DE PAULA, 2002).

Quando professores e alunos consomem a literatura pop-management fortalecem a cultura do management reforçando o imediatismo, o glamour, o trabalho árduo, os heróis, etc. deixando de fora outras dimensões importantes da vida. Essa cultura é tão sedutora que não sobra espaço para os alunos se interessarem por outras coisas menos fantásticas. A EJ acaba sendo o elo que os liga ao mundo fantástico, ao mundo do faz de conta.

Conforme entende Fleury (1989), a função especial da ideologia não é apenas mascarar as relações sociais de produção, mas reforçar a dominação e conseguir a exploração dos trabalhadores. A diferença no contexto de ensino de administração é que os donos do capital (empresas) estariam se antecipando na difusão da ideologia desejada: não mais se espera que o aluno chegue ao mercado de trabalho para que nele sejam inculcados certos valores, mas faz-se isso enquanto ele está, ainda, na sua fase de formação na universidade.

A formação acadêmica do administrador, por conseguinte, foi orientada para os interesses do capital, seguindo a constituição de sujeitos mercadorias, por intermédio de um processo que formata os indivíduos em conformidade com o mercado de trabalho, inculcando neles a ideologia da administração, a fim de enquadrá-los. O sucesso torna-se, então, seu Deus e a ideologia da administração, sua oração (BICALHO, 2009, p.69). É nesse contexto que as EJs ganham visibilidade porque ajudam a fortalecer a ideologia da

administração.

6 Considerações finais Este trabalho teve como objetivo analisar o discurso dos empresários juniores acerca da

participação na Empresa Júnior. Por meio da análise crítica do discurso, foram identificados 18 objetos discursivos que foram agrupados em seis formações discursivas acerca da empresa júnior. Contudo, além do que está explícito no discurso dos EJs, foram identificados dois aspectos silenciados: padronização de comportamentos e busca por poder. Além desses silêncios, foi possível o reconhecimento de uma ordem de discurso que possibilitou a reflexão sobre a formação do administrador e o papel da universidade. Uma das coisas que mais chamou a atenção após a realização desta pesquisa é a semelhança dos seus resultados com os resultados das pesquisas de Bicalho (2009) com EJ da região Sudeste do Brasil e Costa (2010) com EJ do Rio de Janeiro. Há várias semelhanças entre as EJs estudadas por

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Costa e a EJ que é analisada aqui: sacrifício pessoal dos EJs, dedicação incondicional, valorização da prática, competição, busca por poder, proatividade, diferencial para o mercado, questão do status, a prioridade pelas atividades da EJ, engajamento, paixão, exemplaridade dos ex-membros. Há semelhanças até mesmo no que se refere aos silêncios existentes no discurso dos EJs. Já com relação aos resultados da pesquisa de Bicalho (2009), também são encontradas várias semelhanças: formalismo, profissionalismo, padronização de comportamentos e postura, valores entre outros. Mesmo sendo as três pesquisas realizadas em diferentes EJs, há semelhanças até no vocabulário empregado pelos EJs.

As semelhanças chegam a ser intrigantes. Mas quando se atenta para as condições de produção do discurso, fica mais fácil compreender o porquê, ou seja, todas as EJs pesquisadas por diferentes pesquisadores e em lugares específicos, estão imersas nas mesmas condições de produção do discurso. Conforme explica Fairclough (2001, p.93), o discurso “não emana de um livre jogo de ideias nas cabeças das pessoas, mas de uma prática social que está firmemente enraizada em estruturas sociais materiais, concretas”, reificada em instituições e organizações.

Para finalizar, convém admitir que este artigo não deixa de ser o discurso de um(a) pesquisador(a) representando, portanto, a sua visão a respeito das EJs. Assim, ainda que seja um discurso produzido a partir dos discursos dos EJs, ele não está livre de ideologias e, portanto, não é isento e nem neutro. Como sugestão para futuras pesquisas acredita-se, assim como Costa (2010), na relevância de se pesquisar o MEJ por entender que esse movimento exerce uma influência muito grande no cotidiano das EJs e, consequentemente, na forma de aprendizado ali existente. Além disso, sugere-se a realização de pesquisas em outras instâncias de formação como os PETs. Seriam estes permeados também pela lógica de mercado? Ou será que eles representam uma alternativa viável para um ensino que tenha como objetivo também a formação cidadã e emancipatória?

Referências BICALHO, R. A. Das Histórias de Violências em uma Empresa Junior à Reprodução da Ideologia da Administração. Dissertação de Mestrado. UFMG, Belo Horizonte, 2009. BRANDÃO, H. H. N. Introdução à análise do discurso. Campinas, SP: Editora da Unicamp, 2004. COSTA, A. de S. M. da C. convergências, divergências e silêncios: o discurso contemporâneo sobre o empreendedorismo nas empresas juniores e na mídia de negócios. Tese de Doutorado. FGV, Rio de Janeiro, 2010. DIAS SOBRINHO, J. Políticas y conceptos de calidad: dilemas y retos. Avaliação, Campinas, v. 17, n. 3, p. 601-618, nov. 2012. FAIRCLOUGH, N. Discurso e Mudança Social. Brasília: UnB, 2001. FLEURY, M. T. L., O desvendar da cultura de uma organização: uma discussão metodológica. In: FLEURY, M. T. L., FISHER, R. M. (Coords.). Cultura e Poder nas Organizações. 2 ed. São Paulo: Atlas, 1996. ITUASSU, C. T.; TONELLI, M. J. Sucesso, mídia de negócios e a cultura do management no Brasil. Cad. EBAPE.BR, v. 12, nº 1, p.86-111, Rio de Janeiro, Jan./Mar. 2014. ORLANDI, E P. Análise de Discurso: princípios e procedimentos. Campinas: Pontes, 2001. PAES DE PAULA, A. P. Estilhaços do real: o ensino da administração em uma perspectiva benjaminiana. Curitiba: Juruá, 2012. TOLFO, S. R.; SCHMITZ, S. A formação de consultores em uma empresa júnior. Revista ANGRAD. v. 6, n. 2, pp. 25-40, Abr./Mai./Jun. 2005. WOOD JÚNIOR, T.; PAES DE PAULA, A. P. Pop-management: contos de paixão, lucro e poder. Organização & Sociedade, v. 9, n. 24, p. 39-51, maio/ago. 2002.                                                             i Devido às dificuldades em separar os aspectos de identificação de um discurso como texto e como prática discursiva (FAIRCLOUGH, 2001), optou-se, a exemplo do que fez Costa (2010), por não dividir os tópicos analíticos ítem à ítem. A única divisão feita foi no que diz respeito à identificação dos objetos discursivos e às suas respectivas categorizações.  ii Há quatro elementos que compõe as ordens de discurso (gênero, tipo de atividade, estilo, discurso) que corresponde “aproximadamente às dimensões dos textos (...) em termos de conteúdo, significados ideacionais, tópicos, assuntos, e assim por diante” (FAIRCLOUGH, 2001, p.164). Nesta pesquisa, o foco no elemento discurso. iii Para uma maior compreensão deste tema, sugere-se a leitura da edição especial do Cad. EBAPE.BR, v. 12, nº 1, Rio de Janeiro, Jan./Mar. 2014.