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ÉTICA ~ TRABALHO

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  • TICA ~TRABALHO

  • SENAC - Servio Nacional de Aprendizagem Comercial

    Conselho NacionalAntonio Oliveira Santos

    Presidente

    Departamento NacionalRoberto Rgnier

    Diretor-Geral

    Editores ResponsveisMaria Helena Barreto Gonalves

    Centro Tcnico-Pedaggico/DFP

    Sonia Kritz

    Coordenadoria de Tecnologia

    Educacional/DFP

    Pesquisa e Tratamentodo ContedoMaria Helena Barreto Gonalves

    Nely Wyse

    Sistematizao e Redao

    Metodolgica

    Maria Helena Barreto Gonalves

    EditoraoMarlia Pessoa

    Centro de Produo de Material

    Impresso/DMM

    Projeto Grfico e Execuo

    Ampersand Comunicao Grfica

    Claudia Fleury, Carlos Henrique Viviane &

    Raquel Teixeira

    Ilustrao

    Ampersand Comunicao Grfica

    Luiz Baltar

    Reviso

    Maria Elisa Sankuevitz

    SENAC.DN. tica e trabalho'; Maria H.B. Gonalves;Nely Wyse. Rio de Janeiro: SENAC/DN/DFP, 1996.

    96 p. 11. Inclui bibliografia.tica; Comportamento; Trabalho; Histrico; Desenvol-

    vimento; Relaes de trabalho; Administrao de

    empresas.

    SENAC / DN 1996SENAC / Departamento NacionalRua Dona Mariana, 48 BotafogoRio de Janeiro RJ CEP 22280-020 ISBN 85-85746-21-1

  • APRESENTAO

    - I A lUGAR COMUM DI~ER O QUANTO AS CRIANAS SO CURIOSAS. QUALQUER UM DE~ NOS TERA UMA HISTORIA A CONTAR SOBRE O EMBARAO CAUSADO POR UMA OU

    OUTRA PERGUNTA INFANTIL. A CRIANA EST SEMPRE QUERENDO SABER MAIS E MAIS, AT

    QUE NOSSA IMPACINCIA OU NOSSO ABORRECIMENTO ANTE A INSISTNCIA A FAZ DESISTIR.

    PARA NS TUDO TO BVIO ...

    ISSO MESMO, TEMOS TANTAS CERTEZAS! ESTAMOS CERCADOS DE COISAS, VIVEMOS

    FENMENOS, ACONTECIMENTOS, EMOES. AS EDIFICAES DA CIDADE ONDE MORAMOS, AS

    RUAS PELAS QUAIS TRAFEGAMOS, OS UTENSLIOS DE QUE DISPOMOS NO NOSSO DIA-A-DIA,

    TUDO NOS PARECE TO SLIDO, TO FAMILIAR QUE NEM NOS PERGUNTAMOS POR QUE SO

    DESSE JEITO E NO DE OUTRO. A MISRIA, A VIOLNCIA, A INJUSTiA, A M-F, A INFIDELIDADE

    DE UM AMIGO PROVOCAM EM NS AS MAIS VARIADAS REAES: DE INDIGNAO, REVOLTA,

    TRISTEZA. ESSAS REAES PARECEM MUITO NATURAIS. MAS NO SER O CASO DE

    PERGUNTARMOS QUAL O SEU SIGNIFICADO? O QUE ELAS REPRESENTAM? O QUE NOS LEVA A

    DEMONSTRAR INSATISFAO COM AES DESSE TIPO? POR QUE NO NOS SO INDIFERENTES?

    O MESMO ACONTECE COM O MUNDO DO TRABALHO, ONDE PASSAMOS GRANDE PARTE DE

    NOSSA VIDA. ISSO SE TORNA TO ROTINEIRO QUE J NO NOS PERGUNTAMOS O QUE

    REPRESENTA PARA NS. SER QUE ISSO MESMO QUE QUEREMOS? POR QUE NO USAMOS

    'IlOSSO TEMPO DE MANEIRA DIFERENTE? ENFIM, QUAL O SIGNIFICADO DO TRABALHO EM

    ,

  • ESSAS E OUTRAS QUESTES PERTENCEM ORDEM DOS VALORES DO COMPORTAMENTO

    HUMANO EM SOCIEDADE - A ORDEM DA TICA - E CONSTITUEM MATRIA DESTE LIVRO. NELE,

    MUITO MAIS DO QUE RESPOSTAS PRONTAS A ESSAS QUESTES, VOC ENCONTRAR ELEMENTOS

    DE REFLEXO, QUE ESPERAMOS POSSAM CONTRIBUIR PARA REAVIVAR AQUELA CURIOSIDADE

    PERDIDA.

    TICA E TRABALHO SO DIMENSES DE ORDEM PRTICA. ISSO SIGNIFICA QUE SE

    MANIFESTAM NUMA AO CONCRETA, TRANSFORMADORA DO MUNDO E DA REALIDADE.

    PRECISAMOS, POIS, CONSIDER-LAS PRODUTOS DE UMA POCA HISTRICA, DE UMA VISO

    DE MUNDO DETERMINADA PELA POLTICA, PELA ECONOMIA E PELA CULTURA DAS SOCIEDADES

    ONDE SE DO.

    ENTENDER O MUNDO DO TRABALHO EM SUAS MLTIPLAS FACETAS, BEM COMO PERCEBER-

    SE PARTE DESSA TOTALIDADE, CONTRIBUINDO, PARTICIPANDO, AUTORIZANDO E RECUSANDO

    DIFERENTES PRTICAS SOCIAIS A EXIGNCIA FEITA AO TRABALHADOR-CIDADO, TANTO EM

    SUA VIDA PROFISSIONAL QUANTO NA PRPRIA CONSTITUiO DE SUA IDENTIDADE.

    CERTAMENTE NO COINCIDNCIA NEM MODISMO A DEMANDA DA SOCIEDADE POR

    COMPORTAMENTOS TICOS. A EXIGNCIA DE TICA NA POLTICA, NA MEDICINA, NO DIREITO,

    BEM COMO A REJEiO UNNIME DA CORRUPO EM SUAS DIFERENTES MODALIDADES

    SIGNIFICAM A BUSCA DE QUALIDADE DE VIDA, PASSANDO NECESSARIAMENTE PELA FORMAO

    TICA DOS INDiVDUOS E, CONSEQENTEMENTE, POR UMA SOCIEDADE PAUTADA POR

    COMPORTAMENTOS TICOS.

    E O QUE NOS PARECE MAIS IMPORTANTE: ESSA PROCURA TO NECESSRIA, TO LEGTIMA,

    TO BEM-VINDA, QUE NO PRECISA SER IMPOSTA POR ALGUM TIPO DE AUTORIDADE. ELA

    COINCIDE COM O NOSSO DESEJO E COM A NOSSA RAZO, ALM DE REFLETIR O DESEJO E A

    RAZO DE TODA A SOCIEDADE.

    ESTE O CONVITE QUE ESTAMOS FAZENDO A VOC - NOSSO ALUNO, INDIVDUO,

    PROFISSIONAL E CIDADO -, PARA QUEM ESTE LIVRO FOI PRODUZIDO .

    ~

  • ISUMRIO

    TICA: EIS A QUESTO 9

    EXERCCIOS 16

    TICA: UM BREVEHISTRICO 19

    Antiguidade: a associao entre tica e Poltica 19

    Sociedade medieval: a tica da interioridade 21

    Sociedade moderna: a tica do trabalho 23

    EXERCCIOS 27

    A EVOLUO DO MUNDO DO TRABALHO 30

    Das manufaturas industrializao 30

    A administrao cientfica da produo 33

    Evoluo tecnolgica e flexibilizao do processo produtivo 35

    EXERCCIOS 39

  • M

    A CRISE DOS VALORES NA MODERNIDADE 42

    Repensando os valores da modernidade 45

    EXERCCIOS 52

    A DIMENSO TICA NA EMPRESA 56

    Da responsabilidade e do compromisso com a comunidade 58

    Compromissos e responsabilidades do administrador 60

    EXERCCIOS 69

    GABARITO DOS EXERCCIOS 73

    BIBLIOGRAFIA 90

  • ,ETICA:

    EIS A QUESTO

    No ESTUDO DESTE CAPTULO voc ter oportunidade de delimitar a questotica, relacionando-a produo e ao domnio das normas e valores que

    regulam a sociabilidade ou a convivncia dos homens em sociedade.

    o homem um ser social, pois vive em sociedade.Mas o que sociedade? Voc j parou para pensar sobre isso?

    Num sentido mais amplo, sociedade a reunio de seres que vivem

    em grupo. Assim, as abelhas formam uma sociedade; os homens

    formam uma sociedade.

    Num sentido mais restrito, sociedade o conjunto de pessoas que vi-

    vem em determinada faixa de tempo e de espao - seguindo normas co-

    muns - e que so unidas pelo sentimento de conscincia do grupo. Como

    exemplos, podemos citar a sociedade medieval, a sociedade moderna.

    Pois bem. A partir da constatao de que vivemos em sociedade, en-

    contramos regras, leis e normas que regulam as relaes entre os homens.

    E por que existem essas regras, leis e normas? Quem as elabora?

    Elas so necessrias porque a sociabilidade humana - a convivncia

    dos homens em sociedade - precisa acontecer dentro de uma certa ordem.

  • T I C A TRABALHO

    importante considerar que a ordem humana no natural como ,por exemplo, a ordem existente na comunidade das formigas ou das

    abelhas. Essas comunidades desenvolvem uma srie de comportamentos

    de reao e adaptao natureza. Assim criam uma ordem que perma-

    nece ao longo do tempo, porque produzida pelos comportamentos

    naturais, herdados geneticamente e passados de gerao a gerao.

    A ordem humana bem diferente. Ela artificial. O homem no a re-

    cebe pronta, como herana gentica. Ele tem que invent-Ia, constru-Ia e

    reconstru-Ia; dar-lhe uma forma satisfatria ao atendimento de suas ne-

    cessidades e aspiraes, que mudam ao longo da histria. Por isso mesmo,

    na sociedade atual, a ordem to diferente daquela vivida pelos homens

    da antiguidade.

    POR ORDEM HUMANA ENTENDE-SE O CONJUNTO DE NORMAS, REGRAS, LEIS, os VALO-

    RES, OS MODOS DE RELACIONAMENTO - SEJA NO TRABALHO, NA FAMLIA OU ENTRE

    AMIGOS.

    E, depois de inventada uma certa ordem, reconhecida como justa e

    verdadeira para uma determinada poca, so os homens que julgam seus

    prprios comportamentos - e o do outro - avaliam se esto de acordo ou

    contra o que est estabelecido.

  • T I C A: E I 5 A QUE 5 T

    importante compreender que esse julgamento se d em diferentes

    esferas.

    Uma das esferas de julgamento do comportamento humano a das

    leis jurdicas, de carter objetivo ou positivo, porque a cada perturbao

    da ordem fazem corresponder, concretamente, uma sano ou punio.

    Consideremos, por exemplo, o homicdio. Trata-sede um comportamento que

    causa repulsa e indignao. E a ele corresponde uma punio, objetivamen-

    te determinada pela legislao, que varia apenas em funo dos motivos eda sociedade onde se d o crime. Estamos no campo do Direito.

    Uma outra esfera de julgamento do comportamento humano de ordem

    subjetiva. Nesse caso, o sujeito individual, sua conscincia moralque atribui valores aos atos humanos, pronunciando-se sobre a correo

    ou a incorreo da atitude tomada em determinada situao.

    CONSCINCIA MORAL A CAPACIDADE INTERNA QUE o INDiVDUO TEM DE REAGIR

    AO CERTO E AO ERRADO, A CAPACIDADE DE DISTINGUIR ENTRE O BEM E O MAL.

    As NORMAS MORAIS SO MUITO ANTERIORES AO DIREITO. ELAS DESEMPE-

    NHAM UMA FUNO SOCIAL VITAL E SO CUMPRIDAS POR CONViCO NTIMA, POR

    ADESO. DIFERENTEMENTE, AS NORMAS JURDICAS SO UMA IMPOSiO DO ESTADO

    E, POR ISSO, SO CUMPRIDAS MESMO QUANDO NO ESTAMOS CONVENCIDOS DE QUE

    SEJAM JUSTAS.

    Para exemplificar, tomemos o caso da mentira. Trata-se de um compor-

    tamento tambm considerado indigno, mas a ele no corresponde nenhu-

    ma punio objetiva, a no ser o desmerecimento ou descrdito do indiv-

    duo no grupo a que pertence. Eesse desmerecimento resultado do julga-

    mento do grupo em relao ao comportamento inadequado do indivduo.

    Estamos aqui nos referindo a um julgamento subjetivo, ditado pelo sujeito,

    por sua conscincia moral. Estamos no campo da tica.

    Falar sobre tica falar sobre valores e virtudes. Valor e virtude, por

    sua vez, se referem a comportamento humano. Ento, o campo tico

    constitudo, de um lado, por comportamentos e, de outro, por juzos de

    valor, pela apreciao sobre esses comportamentos.

  • T C A TRABAlr

    Pinquio um personage~ ::a

    literatura clssica mfam, i,

    criado pelo italiano Car,o Caoa.

    Ele personifica um bo~ecQ e.

    portanto, no tem co~sc:nc;a moral.

    O crescimento do nar'z ce PH,quio

    foi o recurso utilizado pe!io autor

    da histria para s!na;;za' a falta

    cometida pelo boneco - a mentira.

    O nariz funcionaria corre a

    conscincia moral co personagem,

    como o juiz de sa fata

    ou transgresso.

    A reflexo tica passa justamente por essa questo: o estabelecimentode juzos de valor para o que est conforme ou contrrio s normas deconvivncia dos homens em sociedade. Da serem to comuns as expres-

    ses tico e antitico, quando nos referimos a certas atitudes dos indiv-duos em sociedade.

    Secretaria de Obras do municpiosuborno da empresa responsvel pelConsultado sobre o episdio, orevoltante esse tipo de expedienteramo.

    alina recebe proposta deo do aude na cidade.

    rio declarou considerardo por muitas firmas do

    Sevoc leu essa notcia com ateno, deve ter observado que a primeira

    afirmao expressa um juzo de fato, juzo que se refere a um aconte-cimento, a uma situao ocorrida concretamente. J a segunda expressa

    um juzo de valor, uma apreciao, uma avaliao sobre o acontecimento.A tica, enquanto estudo dos juzos de apreciao da conduta hu-

    mana - os juzos de valor -, encontra-se freqentemente diante do conflitode ter de decidir entre o que o Bem e o que o Mal.

    E como fazer essa distino? De que critrios ou parmetros dispomos

    para decidir sobre o Bem e o Mal?

  • T I C A: E I 5 A QUE 5 T

    Essa questo, de soluo aparentemente difcil, pode ser esclarecida

    se considerarmos a prpria natureza humana.

    E o que queremos dizer com isso?

    Queremos dizer que os indivduos possuem algumas caractersticas que

    so prprias de todos os homens. E quando refletimos sobre essas carac-

    tersticas, podemos compreender melhor porque ele se comporta de uma

    maneira ou de outra.

    Vamos agora parar para refletir sobre dois casos reais que ficaram

    famosos na poca em que aconteceram.

    Um deles sobre um rapaz norte-americano que congelava cadveres.

    Esse caso causou repugnncia s pessoas. Comer carne humana?! Matar

    para comer as vtimas!!! Um horror! O fato que o rapaz foi julgado e

    condenado priso perptua.

    O outro caso aconteceu com sobreviventes de um desastre areo. En-

    quanto aguardavam resgate, os sobreviventes comiam carne humana. Ao

    tomarem conhecimento desse fato, as pessoas sentiram pena, discutiram

    sobre a situao, mas ningum condenou os sobreviventes do desastre. A

    atitude deles era justificvel em nome do instinto de sobrevivncia, carac-

    terstica natural do ser humano. O assassino norte-americano foi condenado

    porque seu motivo era outro: perverso, inverso total de valores.

    Ora, o homem se mostra, por natureza, um ser dividido: racional,

    mas tambm animal; consciente, mas tambm inconsciente; pblico,

    mas tambm tem uma dimenso privada, particular. A questo tica apre-

    senta-se, assim, como um conflito entre o que ele deve fazer e o que

    quer fazer.Por outro lado, esse ser contraditrio - o homem - tem como condio

    bsica estar extremamente insatisfeito com sua situao. Ele convive e

    vive muito mais com o que deve ser do que com o que ele de fato.

    E justamente porque desejamos realizar um projeto de vida diferente

    - a busca daquilo que queremos ser - que recusamos a realidade de nos-

    sas imperfeies, bem como as imperfeies do sistema em que vivemos.

    Por isso contemplamos o universo tico, o universo da construo de um

    homem idealizado, bem como de uma sociedade ideal, mais humana, na

  • I T I C A TRABALHOqual igualdade e liberdade prevaleam como valores supremos.

    ~ EXIST~NCIA TICA , SEMPRE, UM DESAFIO, UM CONVITE PARA

    REALIZARMOS O PROJETO DE NOS TORNARMOS MAIS HUMANOS.

    porque queremos nos tornar mais humanos que buscamos construiruma sociedade possvel, melhor do que a sociedade real. Por isso a di-

    menso moral do homem compreende, alm da esfera individual, privada,

    a esfera pblica, a vida social, a ao do cidado.

    Pode-se concluir, ento, que somente na relao com os outros ho-

    mens que os comportamentos individuais podem ser avaliados como vir-

    tuosos ou no-virtuosos - como ticos ou no-ticos.

    ~ MBORA A CONSCINCIA MORAL SEJA DE ORDEM INDIVIDUAL,

    APENAS EM GRUPO, EM SOCIEDADE, NUMA ORGANIZAO,

    NA RELAO COM OUTROS HOMENS QUE SE PODE SER

    TICO OU ATICO.

    Logo, para pensar a origem da tica tem-se que pensar tanto a ordem

    racional como a ordem poltica e social. Isso significa que a dimenso ti-

    ca, apesar de orientada pela razo individual, est sempre voltada para a

    vida pblica dos homens.

    A prtica tica deve, portanto, fazer coincidir o plano do individual e do

    coletivo, uma vez que, para ser virtuosa, a ao deve visar o bem co-

    mum, indo ao encontro do interesse da coletividade.

    Entretanto, a sociedade ocidental contempornea tende a pensar atica apenas na dimenso do indivduo particular.

    FALAMOS DE SOCIEDADE OCIDENTAL CONTEMPORNEA PORQUE ESSA SOCIEDADE

    REPRESENTA NOSSO PADRO DE CULTURA, O MODO COMO NOS RELACIONAMOS.

    OUTRAS SOCIEDADES - AS INDGENAS, AFRICANAS OU DO EXTREMO ORIENTE, POR

    EXEMPLO - POSSUEM OUTROS PADRES DE COMPORTAMENTO, OUTROS VALORES, OUTRA

    FORMA DE SE RELACIONAR COM A PRODUO DE BENS E DE SERViOS.

  • T I C A: E I 5 A QUE 5 T

    disso que falamos quando nos referimos crise dos valoreshumanistas: uma sociedade marcada pelo egosmo das relaes sociais,

    pela valorizao do "tirar vantagem", pela ausncia de solidariedade hu-

    mana, pela indiferena para com a misria alheia e pela tolerncia com a

    corrupo e a impunidade.

    Mas ser que foi sempre assim?

    No, os valores se modificam no tempo e sofrem influncia das relaes

    de poder existentes na sociedade. isso que voc ver a seguir, no captu-lo 2, num breve percurso pela histria das idias ticas.

  • EXERCCIOS

    1 LEIA, COM ATENO, A AFIRMAO A SEGUIR:

    No mundo animal, semelhana do que acontece no mundo humano,

    as aes de cada um dos membros de uma comunidade se desenvolvem

    segundo uma certa ordem em direo aos objetivos perseguidos.

    A diferena entre uma e outra ordem que, no mundo animal ela natural, e, no mundo humano, artificial.

    EXPLIQUE O QUE CARACTERIZA A NATURALIDADE DA ORDEM ANIMAL E A ARTIFICIALlDADE

    DA ORDEM HUMANA.

    2 TANTO A CONSCINCIA MORAL COMO AS LEIS JURDICAS SO ESFERAS DE JULGAMENTO DO

    COMPORTAMENTO HUMANO EM SOCIEDADE.

    ESTABELEA A DISTINO ENTRE A ESFERA DE JULGAMENTO MORAL E A JURDICA, INDICANDO

    AS CARACTERSTICAS DE CADA UMA.

  • 3 REFLITA SOBRE ESSA SITUAO:

    Isolado numa ilha deserta, sem qualquer contato com a civilizao,

    Alfredo viveu, durante anos, do que a natureza lhe proporcionou como

    meio de subsistncia, at ser resgatado pela tripulao de uma em-

    barcao de pesquisa oceanogrfica.

    AGORA RESPONDA:

    DURANTE O TEMPO EM QUE PASSOU POR ESSA EXPERINCIA, SERIA POSSVEL A ALFREDO

    VIVENCIAR O QUE CONSIDERAMOS A DIMENSO TICA DOS HOMENS? TERIA ELE TIDO

    CONDiES DE MANIFESTAR VALORES, COMPORTAMENTOS QUE POSSAM SER CONSIDERADOS

    TICOS?

    JUSTIFIQUE SUA OPINIO.

    4 LEIA COM ATENO O TRECHO A SEGUIR:

    Cansado e abatido, aps ser liberado da priso em Castela, na Espanha,

    onde esteve em conseqncia do fracasso das primeiras tentativas de

    colonizao espanhola do Novo Mundo, Colombo encontra-se com um

    dos conselheiros da rainha, que sempre tramou contra seus projetos de

    conquista. Mal disfarando o rancor, o conselheiro o aborda, ini-

    ciando-se o seguinte dilogo:

    - No s nada, diz o conselheiro da rainha. No passas de um simples

    sonhador.

  • - Olha para fora, responde Colombo. O que vs?

    - Vejo torres, igrejas, palcios, edifcios to altos que quase encontram

    o cu. A civilizao!

    - Essascoisas que vs, diz Colombo, no existiriam no fossem pessoas

    iguais a mim. A diferena entre ns apenas uma: eu sonhei, eu fiz. E

    tu? Que fizestes?

    (Trecho de cena do filme "1492 - A conquista do Paraso",

    que relata, de forma romanceada, a descoberta da Amrica)

    O DILOGO ENTRE COLOMBO E O CONSELHEIRO DA RAINHA FAZ REFERNCIA A UM DOS

    TRAOS HUMANOS FUNDAMENTAIS AO EXERCCIO DA DIMENSO TICA. A PARTIR DO

    DILOGO, IDENTIFIQUE QUE TRAO ESSE.

    5 MUITO FREQENTEMENTE TOMAMOS CERTAS ATITUDES, DESENVOLVEMOS COMPORTAMENTOS

    QUE NO CORRESPONDEM, EXATAMENTE, AOS NOSSOS DESEJOS, IMPt;lSOS to SATISFAO

    MOMENTNEA.

    PENSE SOBRE ISSO E DEPOIS RESPONDA:

    POR QUE ESSE UM TIPO DE COMPORTAMENTO TO COMUM ENTRE OS HOMENS? O QUE

    OS LEVARIA A AGIR DESSA FORMA?

  • ,ETICA:

    UM BREVE HISTRICO

    ESTE CAPTULO PROPORCIONAR a voc um breve percurso pela histria das

    idias ticas, oportunidade em que voc poder perceber a estreita relao

    existente entre a evoluo do mundo material (econmico) e o mundo das

    idias e valores da sociedade.

    ANTIGUIDADE:A ASSOCIAO ENTRE TICA E POlTICA

    A Grcia antiga, onde seoriginaram as reflexes ticas, acentua o carter pblicodas questes relativas aos valores. Os gregos entendiam que os juzos sobre o

    bem, a verdade, a justia eram ditados pela conscincia moral (individual), mas

    decididos de maneira livre e racional em praa pblica, na plis.

    A PLlS ERA, PARA os GREGOS, O LUGAR ONDE os HOMENS, POR MEIO DO DEBATE,

    DO DILOGO, PELO USO DA PALAVRA EXERCITAVAM SUA CIDADANIA, OU SEJA, DECI-

    DIAM SOBRE O DESTINO COMUM: QUAL A MELHOR LEI, A MELHOR FORMA DE GOVER-

    NO, SE A CIDADE DEVE IR GUERRA, QUAL A MELHOR FORMA DE COMRCIO, ENFIM,

    TUDO QUE DIZ RESPEITO COISA PBLICA, AO BEM COMUM.

  • I T C A R A B A L H O

    Para os gregos, portanto, o mundo tico - dos valores - era o mundo

    da racionalidade e da liberdade, que se realizam plenamente na plis,pela prtica poltica. Consideravam, ainda, que a condio para o pleno

    exerccio da cidadania que o dilogo fosse travado entre homens livres e

    iguais. Isso quer dizer que um comportamento s pode ser tico quando

    livre de qualquer constrangimento, necessidade ou determinao.

    A GRCIA ANTIGA CARACTERIZAVA-SE COMO UMA SOCIEDADE ESCRAVISTA. NESSE TI-

    PO DE SOCIEDADE AS RELAES DE PODER ERAM POLARIZADAS ENTRE SENHORES E

    ESCRAVOS. Aos PRIMEIROS, RESPONSVEIS PELO PENSAR, PELO TRABALHO INTELECTUAL,

    ESTAVA RESERVADO O DIREITO CIDADANIA, O DIREITO AO JULGAMENTO DO DESTINO

    COMUM. OS ESCRAVOS, AS MULHERES E CRIANAS, A QUEM CABIA O TRABALHO MA-

    NUAL, NO PARTICIPAVAM DO ESPAO PBLICO DAS DECISES, FICANDO-LHES RESER-

    VADO O UNIVERSO DO PRIVADO QUE REPRESENTAVA O ESPAO DO CONSTRANGIMENTO,

    DA OBEDINCIA, DA OBRIGAO.

  • T I C A: U M B R E V E

    SOCIEDADE MEDIEVAL:A TICA DA INTERIORIDADE

    Na Idade Mdia, os princpios da tica antiga sofrem uma significativa

    mudana.

    Em funo do poder exercido pela Igreja, as normas de convivncia so-

    cial da Idade Mdia passam a ser reguladas pelos princpios do cristianismo.

    Ora, as duas virtudes capitais do cristianismo so a f e a caridade,

    que se traduzem em sentimentos e intenes, virtudes internas, de or-

    dem privada dos indivduos. Desse modo, a dimenso tica j no se ma-

    nifesta na ao, no comportamento, no agir social, mas nas boas intenes

    e no desejo de alcanar o bem para atender vontade divina.

    Se antes os valores ticos deveriam nortear as relaes humanas em

    busca do bem comum, na tica crist a finalidade da prtica dos valores

    encaminhar as relaes dos indivduos para com Deus, supremo juiz das

    aes humanas: Ele que pode observar a conscincia e saber as intenes

    dos homens. Desse modo, o que passa a ser avaliado a interioridade, a

    conscincia.

    Para controlar a interioridade, cria-se a idia de culpa pessoal. A culpa

    funcionaria como um juiz particular que sabe quando a f foi insuficiente,

    a adeso no-sincera. esse juiz, implacvel na avaliao, que tira a paz

    dos indivduos, fazendo com que eles paguem, desde agora, por suas

    faltas.

    Essamudana de finalidade marca o rompimento do vnculo entre tica

    e Poltica. Ea conduta tica, que era decorrente da vontade, livre e racional

    (crtica), apresenta-se, agora, como capacidade de obedincia lei divina,

    ordem dada, determinao da autoridade.

    Com a vigncia desses princpios, desvaloriza-se a autonomia e a

    deliberao humanas. D-se a decadncia e a fragilizao da respon-

    sabilidade pessoal. Isso porque se acreditamos que tudo j est pre-

    determinado por uma ordem superior, divina, limitamos nossa pos-

    sibilidade de escolha, de deciso. E se no escolhemos, como vamos

    nos responsabilizar?

  • A R A A

    A IDADE MDIA SE ORGANIZA SEGUNDO O MODELO DE PRODUO FEUDAL. NESSE

    MODELO AS RELAES SOCIAIS CARACTERIZAM-SE POR RGIDA HIERARQUIA ENTRE OS

    SENHORES - PROPRIETRIOS DAS TERRAS - E OS SERVOS - AQUELES QUE AS CULTIVA-

    VAM. A ESSES LTIMOS CABIA, EM TROCA DO TRABALHO, APENAS A PARTE DA PRODU-

    O NECESSRIA SUBSISTNCIA FAMILIAR. OS SERVOS DEVIAM OBEDINCIA AOS SE-

    NHORES, MAS, DIFERENTEMENTE DOS ESCRAVOS, POSSUAM DIREITO VIDA E PROTE-

    O DOS SENHORES EM CASO DE GUERRA. IGREJA, DETENTORA DO SABER, COMPE-

    TIA A MANUTENO DOS PRINCPIOS DE OBEDINCIA QUE REGULAVAM ESSAS RELAES.

    Na passagem da Idade Mdia para o perodo correspondente mo-

    dernidade ocorreram grandes transformaes (a intensificao do comr-

    cio, o descobrimento de novas terras, importantes invenes) que intro-

    duziram mudanas radicais na ordem econmica e, conseqentemente,

    na ordem das idias e valores da sociedade.

    CONSIDERA-SE O TEMPO DECORRIDO ENTRE O SCULO XIII E O SCULO XVI COMO

    REFERNCIA PARA INDICAR O PERODO DE DESAGREGAO DA ANTIGA ORDEM FEUDAL.

    Com a intensificao do comrcio, os servos libertos saem do campo

    para os burgos, onde passam a dedicar-se atividade comercial. No desenvol-vimento dessa atividade, eles comeam a estabelecer relaes mais

    igualitrias fundadas nos valores do trabalho, da honestidade, da palavra

    empenhada. Surge ento uma nova classe social - a dos burgueses, assimchamados porque viviam nos burgos.

    OS BURGOS, NA IDADE MDIA, ERAM PEQUENAS VILAS FUNDADAS BEIRA DAS ESTRADAS

    POR SERVOS QUE ESCAPAVAM DO SENHOR FEUDAL. ESSAS VILAS TINHAM SUA BASE

    ECONMICA NO COMRCIO E MUITAS DELAS VIERAM A TRANSFORMAR-SE EM CIDADES.

    A BURGUESIA, CLASSE SOCIAL NASCIDA A PARTIR DA, COM O TEMPO VEIO A DIVERSIFICAR-

    SE EM ALTA BURGUESIA - DETENTORA DOS MEIOS DE PRODUO - E EM MDIA E

    PEQUENA BURGUESIAS - DESIGNADAS, NO SCULO XX, COMO CLASSE MDIA.

    Novas relaes econmicas e sociais tm origem, favorecendo a

  • E T I C A: U M B R E V E

    passagem da antiga ordem feudal para o capitalismo moderno. Instaura-

    se uma nova tica.

    CAPITALISMO O SISTEMA SOCIOECONMICO CENTRADO NA PROPRIEDADE PRIVADA

    DOS MEIOS DE PRODUO - MATRIA-PRIMA E INSTRUMENTOS DE TRABALHO. NESSE

    SISTEMA, A PRODUO EST ORGANIZADA ENTRE AQUELES QUE DETM O CAPITAL, OU

    SEJA, A MATRIA-PRIMA E OS INSTRUMENTOS DE TRABALHO, E OS QUE, EM TROCA DE

    SALRIO, EMPREGAM SUA FORA DE TRABALHO PARA IMPULSIONAR A PRODUO.

    SOCIEDADE MODERNA:A TICA DO TRABALHO

    Ao surgimento e fortalecimento de uma nova classe social - a burguesia -

    corresponde o desenvolvimento de uma nova ordem de valores, que passa

    a nortear as relaes entre os homens.

    Os interesses dessa nova classe, dependentes do desenvolvimento da

    produo e da expanso do comrcio, exigiam mo-de-obra livre ededicao ao trabalho capazes de aumentar a produtividade e decontribuir para a prosperidade dos negcios.

    A nova classe em ascenso tem como caractersticas as virtudes de labo-

    riosidade, honradez, puritanismo, amor ptria e liberdade, em contraposioaos vciosda aristocracia - desprezo ao trabalho, ociosidade, libertinagem.

    O trabalho, na modernidade, passa a ser reconhecido como fato social deter-

    minante da prpria humanizao do homem (fator que o distingue do animal)

    e elemento capaz de modificar ascondies de existncia da prpria sociedade.

    ANTES, O TRABALHO SEMPRE FOI VISTO DE FORMA NEGATIVA. NA SUA ORIGEM, A

    PALAVRA TRABALHO VEM DO LATIM TRIPALlUM, QUE SIGNIFICAVA UM INSTRUMENTO

    DE TORTURA. MESMO NA BBLIA O TRABALHO PROPOSTO COMO CASTIGO PELA

    CULPA DE ADO E EVA (NOS TERMOS BBLICOS, O HOMEM CONDENADO A TRABA-

    LHAR E A GANHAR O PO COM O SUOR DO SEU ROSTO, FICANDO A MULHER CONDE-

    NADA AO TRABALHO DE PARTO). NA GRCIA ANTIGA E NA IDADE MDIA, DESVA-

    LORIZADO POR ESTAR RESERVADO AOS ESCRAVOS E AOS SERVOS.

  • I , ! C A TRABALHOA sociedade moderna declara o trabalho uma expresso de liberdade,

    uma vez que, por meio dele (seja pela fora fsica, pela cincia, pelas ar-

    tes) o homem modifica a natureza, inventa a tcnica, cria nova realidade,

    enfim, altera o curso das coisas, alterando a si prprio e a sociedade

    onde ele vive.

    Identifica-se o trabalho como fator econmico, salrio, poder aquisitivo,

    mas tambm como necessidade psicolgica da humanidade, j que

    determina o status de uma pessoa, fazendo-a pertencer a um grupo,levando-a a estabelecer laos comunitrios e de solidariedade, permitindo-

    lhe realizao e felicidade pessoal e social.

    Com base no papel atribudo atividade humana, a sociedade moderna

    desenvolve uma tica do trabalho.

    ~ TICA DO TRABALHO CONSISTE EM ENTENDER ESSA ATIVIDADE

    - O TRABALHO - COMO FATOR FUNDAMENTAL CONSTRUO

    DA IDENTIDADE E DA REALIZAO PESSOAL

    E AO ESTABELECIMENTO DE UMA ORDEM SOCIAL,

    ONDE PREVALEAM RELAES FUNDADAS NA DIGNIDADE,

    NA LIBERDADE E NA IGUALDADE ENTRE OS HOMENS.

  • T I C A: U M B R E V E

    Paralelamente a essa viso idealizada, ao trabalho so ainda

    relacionados outros valores, como disciplina, subordinao, aplicao

    e segurana pessoal. Esses so os valores que manifestam o esprito do

    capitalismo. Como voc pode observar, eles so diferentes e at mesmo

    se contrapem s idias de trabalho como expresso de liberdade, criao,

    solidariedade e princpio de transformao do prprio homem e da

    sociedade.

    Ao lado do valor POSitiVO do trabalho, a modernidade afirma que a

    igualdade e a liberdade entre os homens so condies prprias da natureza

    humana, consideradas fatores necessrios ao pleno desenvolvimento da tica

    do trabalho.

    NESSECONTEXTO,CRIAM-SEOS DIREITOSCIVIL, POLTICOE SOCIAL. O DIREITOCIVIL

    TEM COMO REGRAMXIMA o PRINCPIODEQUE TODOS SO IGUAIS PERANTEA LEI;

    O DIREITOPOLTICODETERMINAO PLURALISMOPARTIDRIOE AS ELEiESLIVRES;O

    DIREITOSOCIALASSEGURAO TRABALHOREMUNERADO,A PREVIDNCIASOCIAL, SADE

    E EDUCAO.

    Mas ser que, por natureza, os homens so realmente iguais entre

    si? No isso que percebemos. Os homens naturalmente apresentam

    diferenas - de sexo, raa, estatura, fora fsica, desejos, aspiraes, etc.

    Para firmar uma postura tica basta-nos promover a igualdade de direitos

    entre os homens, sem, entretanto, deixar de reconhecer a diferena natural.

    E por que, ento, o homem moderno afirma a igualdade como natural?

    Isso acontece porque afirmar a naturalidade da liberdade e da igualdade

    til aos interesses da sociedade moderna.

    COMO VOC J SABE, A SOCIEDADEHUMANA ARTIFICIAL, CRIADA PELOHOMEM

    PARA ESTABELECERUMA CERTAORDEMQUE RESPONDEA SEUSINTERESSES.

    Na defesa desses interesses, o homem moderno lana mo de uma

    teoria - a teoria liberal - que utiliza os conceitos de igualdade e de

    liberdade natural para justificar sua prtica social;sua ordem econmica

  • T I C A TRABALHO

    e, inclusive, a forma de organizao do Estado moderno.

    Para entender melhor esse movimento, voc conhecer os princpios da

    teoria liberal e seus desdobramentos prticos na ordem econmica e poltica

    da sociedade moderna.

    Segundo os princpios da teoria liberal, a economia regulada por leis

    prprias, leis naturais que garantem o equilbrio das relaes e meca-

    nismos de mercado. Assim, as relaes econmicas deveriam desenvolver-

    se livremente, sem controle ou interveno do Estado ou de qualquer

    outra ordem, para garantia do seu prprio desenvolvimento e do desen-

    volvimento da sociedade.

    Segundo essa teoria, o Estado ideal deve ser mnimo, tendo sua funo

    limitada a recolher impostos e dar amplas diretrizes para a economia. Ao

    Estado liberal no cabe intervir nos preos das mercadorias, nem nos alu-

    guis, nem nas mensalidades escolares ou em qualquer outro servio que

    possa ser prestado pela iniciativa particular.

    Os princpios da teoria liberal servem, assim, para justificar, por exemplo,

    as relaes de mercado, que seriam reguladas pela liberdade entre as

    partes interessadas, uma vez que cada uma teria, teoricamente, liberdade

    para comprar e vender. A questo do valor (preos) tambm seria equili-

    brada devido a esse princpio bsico.

    O mesmo raciocnio aplicado para justificar os contratos de trabalho: es-

    tes seriam justos, se firmados entre homens livres e iguais que podem, por is-

    so, fazer escolhas, decidir sobre a ordem social e poltica, sobre salrios etc.

    I ENTRETANTO, A REALIDADE NO BEM ASSIM. COMO OS CONTRATOS DE TRABALHOSO ESTABELECIDOS EM CONDiES ECONMICAS DESIGUAIS, A LIBERDADE DOCANDIDATO RELATIVA: OU ACEITA AS CONDiES PROPOSTAS OU FICA DESEMPREGADO.Vale perguntar, ento, at que ponto a sociedade moderna foi capaz

    de concretizar a proposta contida na tica do trabalho.

    A anlise da evoluo do mundo do trabalho, sob o sistema capitalista

    de produo, fornece elementos para o entendimento dessa questo.

    Voc ver, a seguir, no captulo 3, como se deu essa evoluo.

  • EXERCCIOS

    1 A SOCIEDADE DOS ANTIGOS GREGOS ESTABELECIA RIGOROSA DISTINO ENTRE O ESPAO

    PBLICO E O ESPAO PRIVADO.

    EXPLIQUE EM QUE CONSISTE ESSA DISTINO.

    2 Os VALORES DOMINANTES NA GRCIA ANTIGA NO PERMITIAM QUE SE DISSOCIASSE TICA

    DE POLTICA.

    INDIQUE OS VALORES DA SOCIEDADE GREGA QUE JUSTIFICAM ESSA LIGAO.

  • T I ( A TRABALHO

    3 POR QUE SE AFIRMA QUE A TICA CRIST TERIA MARCADO A DECADNCIA DA AUTONOMIAE DA DELIBERAO HUMANAS?

    4 As MUDANAS QUE SE OPERAM NA ORDEM ECONMICA SO FATORES QUE INFLUENCIAM A

    ORDEM DAS IDIAS E OS VALORES DA SOCIEDADE.

    D EXEMPLOS HISTRICOS QUE ILUSTREM ESSA AFIRMAO.

    5 LEIA O TEXTO A SEGUIR:

    "As mais insignificantes aes que afetam o crdito de um homem de-

    vem ser consideradas. O som de teu martelo s cinco da manh, ou s

    oito da noite, ouvido por um credor o far conceder-te seis meses a

    mais de crdito; ele procurar, porm, por seu dinheiro no dia seguinte,

    se te vir em uma mesa de bilhar ou escutar tua voz, em uma taverna,

    quando deverias estar no trabalho; exigi-Io- de ti antes de que possas

    dispor dele.

    Isto mostra, alm do mais, que ests consciente do que possuis; far

    com que pareas um homem to cuidadoso quanto honesto e isto ainda

    aumentar mais o teu crdito."

    (Retrato da Cultura Americana, Benjamin Franklin)

    Voc PODE PERCEBER QUE O TEXTO MANIFESTA VALORES QUE O AUTOR ATRIBUI AO

    TRABALHO. Aps ESSA CONSTATAO, RESPONDA:

    A QUAIS SO ESSES VALORES?

  • B AT QUE PONTO ESSES VALORES SO COMPATVEIS COM AQUELES PROPOSTOS PELA TICA

    DA MODERNIDADE (TICA DO TRABALHO)?

    6 NA SOCIEDADE MODERNA D-SE UMA MUDANA RADICAL NO MODO DE ENTENDER A

    ATIVIDADE PRODUTIVA: A VISO NEGATIVA, PREDOMINANTE NAS SOCIEDADES QUE A ANTE-

    CEDERAM, SUBSTITUDA POR UMA VISO POSITIVA DO TRABALHO.

    NA SUA OPINIO, O QUE JUSTIFICARIA A IMPORTNCIA ATRIBUDA AO TRABALHO LIVRE

    NA MODERNIDADE?

    7 EM TODO LUGAR, OBSERVA-SE UM TRATAMENTO DIFERENCIADO ENTRE AS PESSOAS, SEJA PORRAZES DE SEXO, RAA, CLASSE SOCIAL, ETC. A LIBERDADE HUMANA TAMBM SOFRE

    CERCEAMENTO POR TODA PARTE.

    COM BASE NESSA CONSTATAO, EXPLIQUE POR QUE A MODERNIDADE AFIRMA A IGUALDADE

    E A LIBERDADE ENTRE OS HOMENS COMO CONDiES PRPRIAS DA NATUREZA HUMANA.

    (NA SUA RESPOSTA PROCURE IDENTIFICAR OS INTERESSES QUE ESSES VALORES BUSCAVAM

    JUSTIFICAR. )

  • A EVOLUO DOMUNDO DO TRABALHO

    As IDIAS QUE COMPEM este captulo permitiro que voc acompanhe asmudanas ocorridas na organizao do processo de produo, de modo a

    favorecer sua compreenso das diferentes formas de organizao do mun-

    do do trabalho e do valor atribudo a essa atividade, ao longo da histria.

    DAS MANUFATURAS INDUSTRIALIZAO

    Como voc viu no captulo anterior, a desintegrao do sistema feudal

    deu lugar ordem econmica do capitalismo moderno.No incio do perodo correspondente sociedade moderna, a produo

    dos antigos servos, agora dedicados atividade comercial, esteve orga-

    nizada em torno das corporaes e manufaturas.

    As MANUFATURAS CORRESPONDEM AO ESTGIO EM QUE A PRODUO ERA FEITA MO, SEM o RECURSO S MQUINAS. NELAS, OS TRABALHADORES ORGANI-ZAVAM-SE EM CORPORAES DE OFCIOS, ONDE AS HABILIDADES ERAM REPASSA-

    DAS DE UM TRABALHADOR A OUTRO, A EXECUO DA PRODUO ERA REALIZADA

    COOPERATIVAMENTE E ONDE SE DESENVOLVIA A DEFESA DOS INTERESSES COMUNS.

  • Nessessistemas domsticos de produo, o trabalhador mantinha familiarida-

    de com o produto de seu trabalho - ele era proprietrio dos instrumentos de

    produo e participava de todas as suas etapas, desde a concepo do projeto

    at sua execuo e colocao no mercado.

    Ao mesmo tempo em que se desenvolviaa produo manufatureira, no entanto,

    a; comerciantespromoviam o estmulo navegao,em busca de novos mercados.

    As viagens, alm da esperada conquista de mercados, favoreceram o contato

    com importantes invenes, possibilitando a ampliao do conhecimento, o aper-

    feioamento das tcnicas e a acumulao de capital. E isso permitiu a compra de

    matria-prima e de mquinas, logo introduzidas no processo de produo. Erao

    incio do sistema fabril de produo.

    Ao emprego de maquinrio correspondeu o aparecimento das futuras fbricas,

    o que provocou mudanas fundamentais na ordem econmica e nos valores da

    sociedade.

    Em que consistiram essas mudanas?

    A utilizao de mquinas - inicialmente o tear mecnico - proporcionou a

    agilizao da produo. Isso fez com que muitas famlias dedicadas ao trabalho

    domstico nas antigas coorporaes e manufaturas fossem agora obrigadas,

    para sobreviver, a dispor de

    seus instrumentos de tra-

    balho e a vender sua

    fora de trabalho.

    Com a implantao do

    sistema fabril d-se a or-

    ganizao do capitalismo

    propriamente dito: os tra-

    balhadores j no dis-

    pem da matria-prima

    nem dos instrumentos

    de trabalho. Ficainstituda a

    diviso social do trabalho,com ritmo e horrios pre-

    estabelecidos.

  • T C A R A B A o

    ENTENDE-SE POR DIVISO SOCIAL DO TRABALHO A DISTRIBUiO DAS TAREFAS PRPRIAS

    PRODUO DE ACORDO COM AS DIFERENAS DE CONHECIMENTO, HABILIDADE E

    FORA FSICA NECESSRIOS SUA EXECUO. ESSA DIVISO, NA SOCIEDADE MODERNA,

    SE FAZ SEGUNDO O PRINCPIO DA DIFERENCIAO ENTRE O FAZER E O PENSAR, DA

    DISTINO ENTRE OS TRABALHADORES QUE CONCEBEM E AQUELES QUE EXECUTAM A

    PRODUO.

    Tem origem, assim, uma nova classe social: o proletariado.

    PROLETRIO, VEM DO LATIM PROLETARIU, QUE SIGNIFICA" CIDADO POBRE, TIL

    APENAS PELA PROLE, ISTO , PELOS FILHOS QUE GERAVA". DA O TERMO PROLETARIADO,

    QUE SIGNIFICA A CAMADA SOCIAL FORMADA POR INDiVDUOS CARACTERIZADOS POR

    SUA QUALIDADE PERMANENTE DE ASSALARIADOS E POR SEUS MODOS DE VIDA, ATITUDES

    E REAES DECORRENTES DE TAL SITUAO.

    A introduo dessa diviso social do trabalho modificou radicalmente

    as relaes de produo, alterando, igualmente, a vinculao do trabalha-

    dor com o produto de seu trabalho. Por ter sua atividade limitada execu-

    o de tarefas bem especficas, o trabalhador ficou excludo de qualquer

    participao nas decises referentes ao processo de trabalho.

    Na Inglaterra do sculo XVIII ocorreram novas modificaes na ordem

    econmica, o que, mais uma vez, determinou a reorganizao do processo

    produtivo. A utilizao da mquina a vapor promove a mecanizao da in-

    dstria txtil e, por causa disso, um extraordinrio crescimento da produo

    da indstria de tecidos acontece. D-se, tambm, o desenvolvimento do se-

    tor de metalurgia. Nesse perodo, o peso da economia se desloca do se-

    tor primrio (agricultura) para o setor secundrio (indstria). a chamadaRevoluo Industrial.

    Ao grande progresso material que se seguiu a essa revoluo no cor-

    respondiam condies dignas de trabalho. A questo social manifesta-

    va-se nas jornadas de 16 a 18 horas de trabalho por dia; na falta de direito

    a frias ou a qualquer outro benefcio; na utilizao de mulheres e crianas

    como mo-de-obra barata; e nas condies insalubres de trabalho.

  • A EVOLUO

    Ao processo de industrializao seguiu-se o fenmeno conhecido como

    revoluo ps-industrial, caracterizada pela ampliao dos servios, que

    passam a compreender o setor tercirio da economia. Essa ampliao,

    iniciada em meados do sculo XIX, uma decorrncia direta tanto da

    evoluo tecnolgica como da prpria complexidade das organizaes

    industriais, cujas atividades passam a depender, cada vez mais, das tcnicas

    de informao e comunicao.

    A ADMINISTRAOCIENTFICA DA PRODUO

    Quando, no princpio do sculo XX, Henry Ford introduziu na indstria

    automobilstica o sistema de linha de montagem, tm incio novas

    modificaes no processo produtivo.

    Nesse sistema, a produo passa a ser administrada cientificamente,

    com base em teoria elaborada por Frederick Taylor.

    Para Taylor, o trabalhador preguioso e usa inadequadamente os

    movimentos - fatores responsveis pelo desperdcio de tempo e, portanto,

    pela diminuio da produtividade nas empresas. Para ele, assim, o controle

    racional do processo de produo seria absolutamente necessrio para

    garantir essa produtividade.

  • I T I C A TRABALHOPartindo desses princpios, Taylor prope o controle dos tempos e mo-

    vimentos necessrios fabricao de unidades de produtos, garantindo,

    desse modo, o aumento da produtividade, porque assim se evita o des-

    perdcio de tempo, de movimentos, de gestos e comportamentos desne-

    cessrios execuo das tarefas.Conhecido como modelo taylorista-fordista - numa referncia ao

    autor da teoria e ao empresrio que primeiramente a adotou - esse sistema

    de gerenciamento da produo provoca a intensificao da diviso social

    do trabalho.

    Tal fato se caracteriza por rigorosa separao entre as fases de con-

    cepo e execuo do processo produtivo, rgida hierarquia funcional

    e extremo controle e burocratizao, gerando dois nveis bastante di-

    ferenciados de trabalhadores: de um lado, os operrios, que apenas exe-

    cutam a produo; do outro, os gerentes, responsveis pelo planejamento

    e especializados em treinar e fiscalizar o desempenho das tarefas neces-

    srias execuo da produo.Em funo disso, o modelo taylorista-fordista de produo acaba por fa-

    vorecer a desqualificao do trabalhador, reduzindo-o a um autmato,

    repetidor de gestos mecnicos e rotineiros. Retira-lhe a possibilidade de aces-

    so ao conhecimento -

    que fica restrito aos n-

    veis de gerncia -, a

    criatividade, o sentimen-

    to, a emoo, o desejo

    e, portanto, a perspec-

    tiva de realizao pes-

    soal pela atividade pro-

    dutiva. E essa mudana

    contribui decisivamente

    para o desmoronamen-

    to da crena nos valores

    que caracterizam a tica

    do trabalho.

  • A EVOLUO

    A organizao cientfica do trabalho corresponde a uma etapa do capi-

    talismo em que a quantidade - a produo padronizada em srie - era

    tida como fator de competitividade, ou seja, de conquista de mercado, de

    acumulao capitalista.

    EVOLUO TECNOLGICAE FLEXIBILIZAO DO PROCESSO PRODUTIVO

    o avano cientfico-tecnolgico, que se acentuou a partir da dcada de70, veio alterar os padres de concorrncia das empresas, permitindo que

    fossem repensadas as formas de organizao da produo.

    Sem alterar os custos e a produtividade das empresas, a tecnologia de

    base microeletrnica permite produzir menor quantidade de artigos para

    atendimento a demandas fracionadas ou individualizadas, conforme as

    exigncias do consumidor. Ao invs da quantidade, o padro de compe-

    titividade passa a ser, a partir de ento, a qualidade, a despadronizao,

    a personalizao da produo.

    Para se tornarem mais competitivas, as empresas se organizam em blo-

    cos, dando origem aos fenmenos conhecidos como o/igopo/izao de

    mercados e g/oba/izao da economia. Assim passam a buscar novas for-

    mas de gerenciamento ou administrao da produo.

    CARACTERIZA-SE UM OLIGOPLIO QUANDO EMPRESAS PRODUTORAS DE UM MESMO

    BEM ASSOCIAM-SE EM OPERAO NICA, VISANDO A OBTENO DE MELHOR PREO

    NO MERCADO. ASSIM COM A INDSTRIA AUTOMOBILSTICA NO BRASIL. OUTRO

    EXEMPLO DE OLIGOPLIO O FENMENO CONHECIDO COMO GLOBALlZAO DA

    ECONOMIA: PASES - GERALMENTE VIZINHOS - SE ORGANIZAM EM BLOCOS, E, POR

    MEIO DE ACORDOS ESPECIAIS, ESTABELECEM PREOS E OUTRAS VANTAGENS QUE

    FAVOREAM A COLOCAO DE SEUS PRODUTOS NO MERCADO DE MODO MAIS

    COMPETITIVO. EXEMPLOS DE GLOBALlZAO DA ECONOMIA ESTO NO MERCOSUL

    - QUE RENE OS MERCADOS DO BRASIL, ARGENTINA, PARAGUAI, URUGUAI E

    POSSIVELMENTE O CHILE - E NA UNIO EUROPIA.

  • I T I C A TRABALHOA exigncia de uma nova forma de gerenciamento, decorrente das ino-

    vaes tecnolgicas e da globalizao da economia, vem substituir o mo-

    delo taylorista-fordista de produo por uma administrao baseada no

    uso da informao e na flexibilizao dos processos de trabalho.

    Essa nova forma de administrao da produo introduz dois aspectos

    fundamentais reorganizao do mundo do trabalho: a reduo da di-

    viso social do trabalho - que, como voc viu, era extremamente rgida

    no modelo de administrao taylorista-fordista - e a. exigncia de ele-

    vao da qualificao do trabalhador.

    So esses dois aspectos do atual modelo de produo flexvel que do

    margem a interpretaes otimistas quanto s possibilidades de revalo-

    rizao do trabalho e do trabalhador.

    No mbito dessas interpretaes, afirma-se que uma economia baseada

    na automao e orientada no sentido de alcanar a qualidadejdespadro-

    nizao da produo passa a necessitar de uma mo-de-obra crtica e cria-

    tiva, com aptido para o trabalho em equipe e capacidade para executar

    tarefas variadas e de responsabilidade. Isso reduziria significativamente a

    separao entre o fazer e o pensar, como tambm o controle e a burocracia

    do processo de produo.

    Por outro lado, a automatizao provocaria a diminuio da fora de

    trabalho necessria produo direta, criando uma crescente demanda

    por mltiplos servios que passariam a absorver recursos humanos com

    alta qualificao cientfica e tecnolgica.

    Tambm no se pode perder de vista que o alto ndice de automao

    tende a transformar as tarefas manuais de execuo em tarefas de infor-

    mao e comunicao, tarefas complexas que exigem do trabalhador o

    desenvolvimento da capacidade de abstrao para ler e interpretar dados,

    diagnosticar problemas e apontar solues.

    Assim, o conhecimento cientfico e tecnolgico - que no modelo de

    produo em srie era dispensvel para a grande maioria dos trabalhadores

    - torna-se fundamental numa economia baseada na automao.

    Do mesmo modo, no modelo de administrao flexvel torna-se funda-

    mentai uma maior participao do trabalhador no processo de produo,

  • A EVOLUO

    o que lhe permitiria recuperar sua autonomia, sua fora de coeso social,

    sua iniciativa e criatividade - valores fundamentais dignidade do tra-

    balho e do trabalhador.

    Paralelamente s interpretaes antes referidas, desenvolvem-se anlises

    pessimistas, muitas vezes alarmantes, sobre a nova organizao do mundo

    do trabalho.

    Essas anlises partem da constatao de que a flexibilizao dos pro-

    cessos de trabalho impe s empresas a introduo de um conjunto de

    medidas que, longe de valorizar a atividade produtiva, configurariam uma

    crise da sociedade do trabalho.

    Para reduzir custos e garantir competitividade e produtividade, as em-

    presas tm sido levadas adaptao da jornada de trabalho a situaes

    especficas, realizao de trabalho em tempo parcial e ao estabelecimento

    de contratos de durao determinada e curta. So tambm levadas a en-

    xugar sua estrutura e a terceirizar um conjunto de atividades que noconstituem o objetivo especfico de seu negcio.

    A PRTICA DA TERCEIRIZAO CONSISTE EM DELEGAR A PESSOAS QUE NO PERTENCEM

    AO QUADRO FIXO DA EMPRESA (TERCEIROS) ATIVIDADES NECESSRIAS ORGANIZAO,

    MAS QUE NO SO SEU OBJETIVO PRINCIPAL. NAS EMPRESAS MODERNAS COMUM,

    POR EXEMPLO, A TERCEIRIZAO DE SERViOS DE LIMPEZA, VIGilNCIA, ESCRITURAO,

    ENTRE OUTROS. ESSE ESQUEMA TEM CONTRIBUDO PARA o EXTRAORDINRIO

    CRESCIMENTO DO SETOR TERCIRIO (DE SERViOS) NAS lTIMAS DCADAS.

    (... ) nA indstriafoitiovamente uma das principais responsveis pelomaior nmero de des.empregados ..As empresas desse segmento da economiadispensaram 138 mil empregados em janeiro, o que correspondeu a umaqueda de 7,6% sobre a mo~de-obra do mesmo perodo de 1995. A rea deservios contraton 169mil trabalhadores, com alta de 5,1%, e o comrcioadmtiu 20 mil pessoas, com crescimento de 1,6%. 'Est havendo umatransferncia de pessoas da indstria para os servios. Mas isso representauma diminuio na renda, pois mnitos trabalhavam antes em empresas ecom carteira assinada' (...)" - Jornal do Brasil, 27/02/96

  • T I C A TRABALHO

    Pelo que voc leu na notcia, deve ter observado que essas medidas,

    associadas crise econmica, muito tm contribudo para o aumento do

    desemprego e para tornar mais informais as relaes contratuais de tra-

    balho: vrios postos de trabalho so eliminados, aumentando, considera-

    velmente, a massa de trabalhadores sem carteira assinada, subempregados,

    trabalhadores em tempo parcial e pessoas que desenvolvem atividades

    por conta prpria.

    Hoje, alm da flexibilizao dos processos de trabalho, j se fala em

    flexibilizao dos direitos trabalhistas. Esseprocesso, amplamente discutido

    na imprensa, consistiria em reduzir a folha de pagamento das empresas

    mediante a excluso do pagamento de direitos j adquiridos, como 13

    salrio, frias, repouso semanal remunerado. Tudo isso para aumentar a

    oferta de emprego.

    "Um trabalhador com carteira assmldade seu salrio, como dizem osdas frias e do abono de frias, erealmente pagamento a mais. (...) Quno deixa de empregar porque oscontrata. Mas que diferena fariser contratado se ele no tivsalrio, Fundo de Garantia e Pum contrato de trabalho?

    Ao acompanhar as diferentes .fases da organizao do mundo do tra-

    balho, podemos concluir que o estgio atual da economia capitalista, alm

    das exigncias de reorganizao de ordem interna e externa s empresas,

    traz grandes desafios para os governos e para a sociedade em geral.

    E quais seriam esses desafios?

    liRATA-SE DE BUSCAR FORMAS ALTERNATIVAS DE CONVIVNCIASOCIAL, DE REDIMENSIONAR UMA TICA DO TRABALHO

    E OS PRPRIOS VALORES DA MODERNIDADE.

  • EXERCCIOS

    1 Ao EMPREGO DO MAQUINRIO NO PROCESSO DE PRODUO CORRESPONDEM IMPORTANTES

    MUDANAS, TANTO NA ORDEM ECONMICA COMO NOS VALORES DA SOCIEDADE.

    DIGA QUAIS AS MUDANAS MAIS IMPORTANTES OCORRIDAS NESSE ESTGIO DE DE-

    SENVOLVIMENTO ECONMICO:

    A NA ORDEM ECONMICA:

    B NA ORDEM DOS VALORES.

    2 INDIQUE AS CARACTERSTICAS DO MODELO TAYLORISTA-FORDISTA DE PRODUO.

  • I A A A o3 NA DCADA DE 70, INICIA-SE UMA MUDANA RADICAL NOS PADRES DE COMPETITIVIDADE

    E, CONSEQENTEMENTE, NOS PROCESSOS DE PRODUO E ADMINISTRAO DAS EMPRESAS.

    ESSAS MUDANAS SUBSTITUEM O MODELO TAYLORISTA-FORDISTA PELO MODELO FLEXVEL

    DE ADMINISTRAO DA PRODUO.

    PARTINDO DESSA AFIRMAO, APONTE OS FATORES QUE CONTRIBURAM PARA O

    ESGOTAMENTO DO MODELO TAYLORISTA-FORDISTA DE PRODUO.

    4 A NOVA CONFIGURAO DO MUNDO DO TRABALHO, DECORRENTE DA EVOLUO

    TECNOLGICA E DA GLOBALlZAO DA ECONOMIA, PASSA A EXIGIR UMA ADMINISTRAO

    DA PRODUO BASEADA NA FLEXIBILIZAO DO PROCESSO DE TRABALHO.

    COM BASE NESSA CONSTATAO, DIGA QUAIS AS CONSEQNCIAS DO MODELO FLEXVEL

    DE ADMINISTRAO DA PRODUO, INDICANDO AS VANTAGENS E AS DESVANTAGENS

    DESSE FENMENO PARA O TRABALHO E O TRABALHADOR.

    5 NA ATUAL FASE DA ECONOMIA CAPITALISTA, AS EMPRESAS, PARA GARANTIR PRODUTIVIDADE

    E COMPETITIVIDADE, SO LEVADAS A TOMAR UM CONJUNTO DE MEDIDAS, ENTRE AS QUAIS

    A TERCEIRIZAO DE SERViOS QUE NO CONSTITUEM O OBJETIVO PRINCIPAL DE SEUS

    NEGCIOS.

    RELACIONE AS CONSEQNCIAS QUE ESSA MEDIDA ACARRETA PARA O TRABALHO E PARA O

    TRABALHADOR.

  • o6 A EVOLUO TECNOLGICA E A GLOBALlZAO DA ECONOMIA AVANAM PARA ALM DA

    FLEXIBILIZAO DOS PROCESSOS DE TRABALHO. HOJE J SE DISCUTE A FLEXIBILIZAO DOS

    PRPRIOS DIREITOS TRABALHISTAS.

    "O mInIstro do Trabalhotrabalhistas (como o FGTS ecom dois anos de durao,

    Jornal do Brasil, 11/2/96

    MANIFESTE SUA OPINIO SOBRE ESSA QUESTO.

    a reduo de encargosem contratos de trabalho

    o desemprego."

  • IA CRISE DOS VALORESNA MODERNIDADE

    No DECORRER DO ESTUDO DESTE captulo, voc encontrar elementos dereflexo sobre os fatores que, na modernidade, contriburam para a desva-

    lorizao do trabalho e do trabalhador; poder, pela anlise da chamada

    crise da sociedade e da tica do trabalho, caracterizar suas conseqncias,

    assim como identificar possibilidades apontadas como alternativas de supe-

    rao dessa crise.

    No resta dvida de que, no decorrer da histria moderna, especial-

    mente ao final do sculo XIX, os trabalhadores alcanaram importantes

    conquistas sociais: direito previdncia, a frias, ao repouso remunerado,

    ao adicional por insalubridade, educao, entre outros. A conquista des-

    ses direitos, entretanto, no se compara s perdas decorrentes da des-

    valorizao do trabalho no perodo.

    A evoluo do processo produtivo um exemplo claro da histria des-

    sa desvalorizao, principalmente quando se constata que os princpios

    da tica do trabalho, embora muito teis consolidao da ordem eco-

    nmica, nunca chegaram a se integrar prtica concreta dos homens.

    A crescente separao entre trabalho manual e intelectual impediu que

  • o trabalhador tivesse acesso ao conhecimento, excluindo-lhe a autonomia,

    o desenvolvimento da solidariedade e a expresso da liberdade indispen-

    svel ao exerccio da cidadania. Mais recentemente, a onda de desemprego

    e o desmoronamento das relaes contratuais decorrentes da globalizao

    da economia e da flexibilizao do processo de produo anunciam uma

    crise da sociedade do trabalho.

    Essacrise caracteriza-se pelo declnio da tica do trabalho, manifestado

    na descrena de que a atividade produtiva seja fonte de justia social, de

    dignidade e de realizao social.

    PESQUISAS TM DEMONSTRADO QUE A PROFISSO E O CONFLITO DE INTERESSES SOCIAIS

    J NO FAZEM PARTE DAS PREOCUPAES DOS JOVENS. MOSTRAM, TAMBM, QUE OS

    VALORES RELACIONADOS AO TRABALHO, TAIS COMO DISCIPLINA, SUBORDINAO, APLI-

    CAO E SEGURANA SALARIAL, VM SENDO SUBSTITUDOS, PELOS EMPREGADOS COM

    MENOS DE 35 ANOS, POR VALORES NOVOS, COMO AUTO-REALIZAO, CRIATIVIDADE,

    AUTONOMIA E LIBERDADE DE DECISO.

    Mas, ao refletir sobre a chamada crise da sociedade do trabalho, no

    se pode pens-Ia isoladamente. Ela se inscreve numa situao mais geral

    de crise dos prprios valores da modernidade.

    Na sociedade em que vivemos, torna-se ntida a falncia dos valores

    cristos-capitalistas e a ausncia de verdades e modelos que orientem a

    viso de mundo, tanto dos indivduos como da sociedade.

    Esse momento de ruptura da ordem de valores que estamos viven-

    do vem sendo amplamente estudado e avaliado e at j recebeu o

    nome genrico de ps-modernidade, denominao usada para signi-

    ficar ausncia de valores, verdades e modelos que unifiquem e orien-

    tem nossa viso de mundo.

    E como explicar esse estado de falncia dos valores da modernidade?

    Para entender essa questo preciso refletir sobre as bases tericas que

    deram sustentao e modelaram as relaes sociais no mundo moderno.

    Vivendo sob a ordem econmica capitalista, regida pela lei do mximo

    lucro, os homens da modernidade cultivaram a tendncia a acumular bens,

  • I T I C A TRABALHOgerar.do uma mora: prpria, acima dos princpios estabelecidos. Esse tipo

    de eco~amla favoreceu o desenvolvimento do esprito de posse, o egosmo

    e o :!"!o:vldualismo exacerbado.

    Por outro lado, a tica da modernidade herdou do cristianismo o con-

    ceito de liberdade privada, transformando-o em liberdade econmica.

    E isso retira da idia de liberdade sua dimenso filosfica mais autntica.

    FILOSOFICAMENTE, O CONCEITO DE LIBERDADE ENCERRA A IDIA DE QUE PRPRIA

    DO HOMEM A POSSIBILIDADE DE ESCOLHER SEM COAO OU CONSTRANGIMENTO IN-

    TERNO OU EXTERNO. E NESSE SENTIDO, A LIBERDADE ENTENDIDA COMO A CAPACIDADE

    DE MUDAR O CURSO DAS COISAS, DAR-LHE OUTRO RUMO; PROMOVER NOVO SENTIDO

    AO QUE PARECIA FATALIDADE, TRANSFORMANDO UMA SITUAO DADA EM NOVA

    REALIDADE, CRIADA PELO CONHECIMENTO E PELA AO HUMANA.

    o Estado moderno que, como voc viu no captulo 3, organizou-se combase nos princpios da teoria liberal, lanou mo do conceito de liberdade

    para justificar a ordem econmica. Assim, a liberdade de que fala a

    modernidade a liberdade de comprar e de vender, de estabelecer con-

    tratos e preos de mercadorias e salrios.

    Desse modo, quando manifestada na vida concreta dos homens, a li-

    berdade passou a ser encarada como caracterstica de cada um, do

    indivduo com sua conscincia autnoma, em defesa de sua seguran-

    a pessoal, de sua propriedade e dos seus direitos livre negociao.

    Orientada segundo esses princpios, a prtica social deu lugar a um

    fenmeno conhecido como individualismo possessivo, comportamento

    que exalta a ordem do privado, dos direitos individuais e da liberdade pes-

    soal, muitas vezes utilizado contra o interesse do bem pblico, do exerccio

    da cidadania, do comprometimento social.

    Mais uma vez (isso j tinha ocorrido na sociedade medieval), a tica des-

    viou-se do que lhe mais prprio: a dimenso pblica, comum, social das

    normas e regras que norteiam as relaes entre os homens em sociedade.

    Retomar a questo tica na sua dimenso pblica apresenta-se, hoje,

    como o grande desafio dos homens da modernidade; como um caminho

  • possvel para o estabelecimento de formas mais humanas de convivncia

    social, uma vez que favoreceria o exerccio da cidadania, da participao

    nas decises que afetam os interesses da comunidade e, desse modo,

    propiciaria a consolidao de valores como a liberdade e a solidariedade

    entre os homens.

    REPENSANDOOS VALORES DA MODERNIDADE

    A proposta de que a questo tica seja retomada na sua dimenso pblica

    impe o reconhecimento de que o ser humano capaz de exercer sua

    conscincia moral e de responsabilizar-se pelos seus atos. Isso significa

    entender que o homem capaz de fazer um juzo crtico da realidade,ou seja, capaz de avaliar a situao, consultar as normas estabelecidas

    pela sociedade, interiorizar algumas como suas, rejeitar outras, enfim, de

    decidir, de fazer escolhas e de assumir responsabilidade pelas escolhas

    feitas. Nesse sentido, a conscincia moral se confunde com a liberdade.

    Mas no podemos esquecer que o exerccio da conscincia moral e,

    portanto, da liberdade no uma funo preestabelecida, natural da esp-

    cie humana, como , por exemplo, a funo reprodutora. Pelo contrrio,

  • I T I C A TRABALHOesse exerccio pressupe determinadas condies, que precisam ser com-

    preendidas e observadas na nossa prtica cotidiana.

    E quais seriam essas condies? Quais seriam os pressupostos bsicos

    ao exerccio da conscincia moral, ao exerccio da liberdade?

    Para que possamos exercer a liberdade, precisamos reconhecer nossas

    limitaes e possibilidades; precisamos no sofrer qualquer coao,

    imposio de fora interna ou externa; necessrio crer na soluo

    democrtica.

    Essas so as condies necessrias ao exerccio da conscincia moral.

    Voc vai ver a seguir, detalhada mente, a significao de cada uma delas.

    o CONHECIMENTOo pressuposto bsico que orienta a conscincia moral e, portanto, o exer-ccio da liberdade o conhecimento. Com isso queremos dizer que o ho-

    mem ignorante, dotado de uma conscincia ingnua, imediatista e sim-ples age determinado por necessidades particulares. Ele no problematiza,

    no pe em questo a realidade sua volta. Logo, no exercita sua li-

    berdade de escolha, de deciso.

    o TERMO IGNORNCIA AQUI USADO PARA INDICAR AUSNCIA DE CONHECIMENTO,FALTA DE INFORMAES, DE DADOS QUE PERMITAM AO INDiVDUO TOMAR UMA

    POSIO COERENTE COM A SITUAO COM A QUAL SE DEPARA.

    Mas importante saber que, se por um lado somos seres j determina-

    dos biolgica e socialmente, por outro podemos decidir, fazer escolhas,

    modificar o j existente.E como que convivemos com essa situao, que parece to con-

    traditria?

    Com clareza, identificamos certas determinaes vindas do nosso pr-

    prio corpo. Ele exige que suas privaes e carncias sejam atendidas. No

    podemos, por exemplo, nos privar de comer, respirar, reproduzir, herdar e

    transmitir caractersticas genticas.

  • Do mesmo modo, irrecusvel o fato de que nascemos numa certa

    poca histrica, numa cultura (com seus valores e crenas), num pas (com

    suas circunstncias poltica e econmica), numa famlia. Somos todos

    ocidentais, fazendo a passagem para o terceiro milnio, vivendo a revoluo

    tecnolgica. Some-se a isso a herana das culturas ndia e negra, o fato de

    que vivemos num pas em fase de desenvolvimento - mas parte do terceiro

    mundo -, moramos numa metrpole ou no interior e pertencemos a uma

    famlia pobre ou de classe mdia.

    Essa primeira ordem de conhecimento fundamental ao exerccio da

    liberdade. Somente o homem consciente de suas determinaes (limita-

    es, obstculos) pode exercer sua conscincia crtica e, por meio dela,

    modificar a ordem existente, escolher viver no da forma que est posta,

    mas de outra.

    Veja s: por natureza o homem no tem asas, mas isso no o impede de

    voar; no tem nadadeiras como os peixes, mas nada; no tem a fora do

    leo, mas levanta pesos imensos. Tudo isso no natural, tudo isso foi

    construdo: o mundo do conhecimento, das idias, das representaes,

    da ao transformadora do homem sobre a natureza.

    Pense, ainda, no

    exemplo do bacilo da

    tuberculose, que at a

    dcada de 50 matava

    as pessoas. Quando o

    bacilo foi identificado,

    quando se conheceu a

    causa da doena pde-

    se combat-Ia, liber-

    tando milhares de pes-

    soas da morte. Assim

    ser com a AIDS, com

    o cncer e outras mo-

    lstias que hoje nos

    ameaam.

  • I T I C A TRABALHOo desafio da liberdade diante da natureza passa sempre pelo conheci

    mento da determinao (daquilo que uma limitao, um obstculo).

    Isso significa que podemos mudar a realidade ou nos submeter a ela, mas

    qualquer dessas opes um ato de conscincia crtica, de exerccio da

    liberdade e, portanto, de cidadania.

    tambm pelo conhecimento que podemos exercer nossa responsa-bilidade moral: aquele que ignora as circunstncias, a natureza ou as con-

    seqncias de suas aes no pode ser responsabilizado por elas. Por isso,

    a ignorncia um fator que isenta o indivduo de responsabilidade moral.

    Pensemos num acontecimento recente que abalou o pas: o caso do

    csio 137, elemento radioativo que provoca danos muito graves - s vezes

    fatais - quando espalhado no meio ambiente. Recolhido em um ferro-

    velho na cidade de Goinia, estado de Gois, provocou perdas irreparveis

    naqueles que estiveram sob seu efeito. Isso caracterizou uma tragdia de

    propores ainda no completamente avaliadas, j que a radioatividade

    produz efeitos a longo prazo. A cpsula contendo a substncia despertou

    a curiosidade de um trabalhador do ferro-velho, homem simples que

    desconhecia completamente o material com que estava lidando. Podemos

    atribuir-lhe a responsabilidade pela tragdia? No seria mais apropriado,

    nesse caso, procurar os responsveis entre os proprietrios da clnica de

    onde se originaram as cpsulas? Ou procurar as entidades a quem compete

    fiscalizar a utilizao e o manuseio desse tipo de material? Aqui vale lembrar

    que a clnica usava o csio no desenvolvimento de seu trabalho, mas

    ningum teve o cuidado de providenciar o acondicionamento adequado.

    importante destacar que para nos eximirmos da responsabilidade denossos atos no basta afirmar nossa ignorncia a respeito de sua natureza

    e conseqncias. preciso comprovar que no somos responsveis por

    nossa ignorncia, ou seja, que no podamos e no tnhamos a obrigao

    de conhecer aquele fato, aquela norma ou regra.

    Assim, por exemplo, um motorista que se choca com um carro

    enguiado numa curva de rodovia poderia alegar no t-lo visto (ignorava

    a sua presena), porque a luz de seus faris era muito fraca. Essa desculpa

    no moralmente aceitvel, uma vez que ele poderia e deveria, como

  • obrigao moral de quem vai fazer uma viagem rodoviria noite,

    providenciar a reviso dos faris de seu carro. Nesse caso, o motorista

    podia e devia no ignorar.

    A RECUSA DA VIOLNCIA

    Um outro princpio que fundamenta uma ordem tica (conforme o bem

    comum, a justia, a verdade) o da recusa da violncia. Essa a segunda

    condio para que se possa responsabilizar uma pessoa por seus atos: cer-

    tificar-se de que, ao praticar uma ao, ela no esteja submetida a uma

    coao externa. No se pode responsabilizar algum por uma ao co-

    metida sob fora ou ameaa externa, logo, executada contra sua vontade.

    Esse o verdadeiro critrio para pautar as relaes humanas que, dife-

    rentemente do mundo animal, no precisam ser reguladas pela fora fsica,

    pelo poder do mais forte.

    Entende-se como violncia uma agresso integridade fsica ou psquica

    de algum. Uma violncia acontece quando subjugamos uma pessoa, quan-

    do a obrigamos a fazer alguma coisa que lhe causa danos fsicos ou morais.

    Assim, por exemplo, a injustia social, bem como o roubo, a tortura, o as-

    sassinato, o seqestro, o estupro so violncias em qualquer cultura.

  • T C A TRABALHO

    No mundo humano, onde existe a linguagem, as relaes sociais so

    estabelecidas num processo comunicativo, onde cabem a negociao, os

    acordos, os consensos que so estabelecidos, no pela fora fsica, mas

    pela capacidade de argumentao dos sujeitos envolvidos.

    AQuI VALE LEMBRAR A IMPORTNCIA DE QUE o TRABALHADOR BUSQUE AMPLIAR

    SEUS CONHECIMENTOS, DESENVOLVER SUA CAPACIDADE DE COMUNICAO, DE

    ARGUMENTAO, DE DILOGO, FATORES QUE CONTRIBUEM PARA A QUALIDADE DAS

    RELAES E A MELHORIA DOS PROCESSOS DE TRABALHO, MAS TAMBM PARA UMA

    PARTICIPAO MAIS EFETIVA NAS NEGOCIAES. A HUMANIZAO DO TRABALHO

    EST RELACIONAD.A S QUESTES DE ORDEM ECONMICA E AO PRPRIO PROCESSO DE

    PRODUO, MAS PASSA TAMBM PELA MELHOR FORMAO DO TRABALHADOR.

    A CRENA NA SOLUO DEMOCRTICA

    A terceira condio de restabelecimento de uma existncia tica, nas so-

    ciedades modernas, a crena na soluo democrtica.

    Numa sociedade complexa como a nossa, o engajamento numa poltica

    de direitos humanos, a ampliao do processo participativo, a agregao

    das aspiraes da maioria - principalmente dos

    excludos - so fundamentais para uma

    existncia tica.

    A concretizao dos direitos hu-

    manos - os clssicos direitos vida,

    liberdade, busca da felicidade e valorizao do trabalho como fonte de

    realizao da pessoa humana - no

    ser possvel sem o pleno exerccio da

    cidadania e o conseqente fortalecimento

    da sociedade civil.

    Uma via possvel de instaurao de uma tica

    fundada nos valores de justia social , sem dvida, o deslocamento de

    nossa ateno e energia - hoje concentradas na vida privada, afetiva,

  • particular - para a vida comunitria, a associao de classe, o sindicato, o

    partido poltico.

    As recentes iniciativas da sociedade civil - campanhas contra a fome e

    a misria, organizaes de apoio pequena e mdia empresas, campa-

    nhas de preservao da natureza, esforos de grupos de empresrios para

    uma melhor qualificao do trabalhador, no-reeleio de candidatos en-

    volvidos com corrupo - so indicadores da existncia de um movimento

    de construo de uma sociedade pautada por novos valores.

    Pode-se dizer que o esforo de repensar os valores da modernidade

    torna-se, hoje, condio de sobrevivncia da prpria sociedade e est a

    exigir a participao de todos os grupos e instituies que compem o

    tecido social.

    E qual a contribuio das organizaes e do prprio trabalhador, nesse

    esforo de construo de novos valores que possam nortear uma sociedade

    tica? o que voc vai ver a seguir, no captulo 5.

  • IEXERCCIOS

    1 No DECORRER DA HISTRIA DA SOCIEDADE CAPITALISTA MODERNA, AS PERDAS DOS

    TRABALHADORES FORAM SUPERIORES S CONQUISTAS ALCANADAS NO PERODO. COM

    BASE NESSA OBSERVAO, IDENTIFICA-SE, HOJE, O ESGOTAMENTO DE CERTOS VALORES QUE

    MANIFESTAM A EXISTNCIA DE UMA CRISE DA SOCIEDADE E DA TICA DO TRABALHO.

    QUE VALORES SE TERIAM ESGOTADO DE MODO A CARACTERIZAR UMA CRISE DA TICA DO

    TRABALHO?

    2 A CHAMADA CRISE DA TICA DO TRABALHO DECORRE, SEGUNDO ANALISTAS DO ASSUNTO,

    DE UM CONFLITO ENTRE OS VALORES CONTIDOS NESSA TICA E OS PRINCPIOS QUE, NA

    PRTICA, ORIENTAM AS RELAES SOCIAIS DO HOMEM MODERNO.

  • oJUSTIFIQUE ESSA AFIRMAO, IDENTIFICANDO OS FATORES GERADORES DO CONFLITO ENTRE

    A TICA DO TRABALHO E A PRTICA CONCRETA DOS HOMENS DA MODERNIDADE.

    3 HOJE, CADA VEZ MAIS GENERALIZADA A INDIGNAO COM COMPORTAMENTOS ANTITICOS,

    MANIFESTADA NAS MAIS VARIADAS FORMAS DE ATUAO SOCIAL.

    D EXEMPLOS DE ACONTECIMENTOS, NO MBITO INTERNACIONAL, NACIONAL OU REGIONAL,

    QUE CONFIRMEM ESSA AFIRMAO.

    (ALGUMAS SUGESTES: SELECIONE NOTCIAS DE JORNAIS, RDIO, TELEVISO; PESQUISE

    SUA VOLTA E DEBATA COM SEU GRUPO DE TRABALHO, OU EM SALA DE AULA, SOBRE O

    SIGNIFICADO TICO DE CADA ACONTECIMENTO QUE TENHA DESPERTADO SUA ATENO.)

    4 J SE TORNOU USUAL EM NOSSO PAs, NOS PERODOS QUE ANTECEDEM AS CAMPANHAS

    ELEITORAIS, O OFERECIMENTO DE BENS MATERIAIS (ALIMENTOS, CULOS, MATERIAL ESCOLAR,

    DINHEIRO, ETC.) EM TROCA DE VOTOS, ESPECIALMENTE NAS REGiES DO INTERIOR.

    REFLITA SOBRE A SITUAO MENCIONADA E MANIFESTE SUA OPINIO, RESPONDENDO S

    SEGUINTES QUESTES:

    A QUAIS AS IMPLICAES TICAS DESSA PRTICA?

    B QUE CIRCUNSTNCIAS A FAVORECEM?

  • I A A A oc No CASO DE DEFINIR RESPONSABILIDADE MORAL DAS PESSOAS ENVOLVIDAS (CANDIDATO E

    ELEITOR), A QUEM VOC ATRIBUIRIA TAL RESPONSABILIDADE? POR QU?

    5 SECRETRIA COMPROVADAMENTE COMPETENTE NO QUE SE REFERE AO CONHECIMENTO DA

    FUNO, DEDICAO E AO CUMPRIMENTO DO DEVER, MARLUCE RECEBE A COR-

    RESPONDNCIA DIRIA E, COMO DE COSTUME, ANTES DE REPASS-LA, FAZ UMA SELEO

    PARA DEFINIR A PRIORIDADE DE LEITURA DO CHEFE. Ao FINAL DO EXPEDIENTE, POR ELE

    CHAMADA. EXTREMAMENTE EXALTADO, COBRA-LHE O FATO DE TER ABERTO UMA

    CORRESPONDNCIA CONFIDENCIAL. MARLUCE DESCULPA-SE, EXPLICANDO QUE A

    CORRESPONDNCIA NO CONTINHA NENHUMA INDICAO QUE INFORMASSE O CARTER

    DO DOCUMENTO.

    IRRITADO, O CHEFE ENCAMINHA A DISPENSA DE MARLUCE AO DEPARTAMENTO DE PESSOAL,

    ALEGANDO INDISCRiO.

    AVALIE A RESPONSABILIDADE MORAL DE MARLUCE NA SITUAO DESCRITA.

    6 A INSTAURAO DE UMA ORDEM DE VALORES QUE GARANTA O EXERCCIO DA CIDADANIADEPENDE, ENTRE OUTROS FATORES, DA LIBERDADE DOS INDiVDUOS, CUJA EXPRESSO

    DEPENDE, POR SUA VEZ, DO CONHECIMENTO.

    JUSTIFIQUE ESSA AFIRMAO.

  • o7 O NOTICIRIO DA IMPRENSA NOS TEM CONTEMPLADO COM NOTCIAS ACERCA DE AGRESSES

    FSICAS OCORRIDAS NO PLENRIO DO CONGRESSO FEDERAL, DURANTE VOTAO DE MEDIDAS

    ESSENCIAIS REGULAMENTAO DE QUESTES DO INTERESSE DA NAO.

    ESSE COMPORTAMENTO CRIA UMA IMAGEM ABSOLUTAMENTE NEGATIVA DO CONGRESSO E

    CONTRARIA UMA DAS CONDiES BSICAS AO EXERCCIO DA TICA NA SUA DIMENSO

    PBLICA.

    INDIQUE A QUE CONDiO NOS REFERIMOS E JUSTIFIQUE SUA IMPORTNCIA PARA O

    DESENVOLVIMENTO DA DIMENSO PBLICA DA TICA.

  • IA DIMENSO TICANA EMPRESA

    o ESTUDO DESTE CAPTULO proporcionar a voc uma viso geral das expec-tativas sociais hoje criadas em torno da empresa moderna, a partir do que

    ser possvel identificar os compromissos e responsabilidades da organizao

    empresarial, assim como dos trabalhadores, na construo de uma tica

    comprometida com a humanizao do mundo do trabalho.

    Voc j sabe que a face atual da economia capitalista criou um clima

    favorvel ao surgimento de inmeras interpretaes - tanto otimistas como

    pessimistas - quanto ao futuro da sociedade do trabalho.

    Sabe, tambm, que o conhecimento uma condio indispensvel ao

    exerccio da liberdade e, portanto, da cidadania. Por isso no podemos

    desconhecer que a possibilidade de estend-lo grande massa dos traba-lhadores (durante tanto tempo excludos de seu acesso) cria perspectivas

    de que se venha a resgatar o valor do trabalho. E isso permite instituir uma

    nova tica nas empresas e na sociedade como um todo.

    hoje uma tendncia cada vez mais constante na organizao das fbricasa tomada de conscincia sobre a importncia de que o trabalho seja estrutura-

    do a partir de tarefas globais. Elasseriam executadas por equipes de profissio-

  • A DIMENSO TICA NA

    nais suficientemente qualificados para dar conta de um mximo de atividades e

    para assumir responsabilidades com autonomia e criatividade.

    Essaforma de estruturao do trabalho no s representa o rompimento

    com o taylorismo, como tambm anuncia uma nova orientao relativa poltica de recursos humanos. Tal poltica visa autodeterminao e ao

    crescimento de todos os envolvidos no processo de trabalho nas or-

    ganizaes.

    Mas seria ingnuo acreditar que a revalorizao e o futuro da sociedade

    do trabalho dependeriam exclusivamente de uma poltica de recursos

    humanos voltada para a qualifificao do trabalhador.

    Sabe-se que, numa economia globalizada, com um processo de produ-

    o flexvel, a qualificao do trabalhador no garantia de emprego e

    nem o cria. No entanto, no resta dvida de que, no atual quadro econ-

    mico, os novos empregos passaro a absorver os trabalhadores mais qua-

    lificados.

    Nessas circunstncias, uma reflexo sobre a dimenso tica nas empre-

    sas dever passar necessariamente pelo resgate da qualificao profissional,

    mas incluir outros aspectos organizacionais, fundamentais ao resgate da

    dimenso pblica da tica e, conseqentemente, ao resgate da cidadania.

  • T I C A TRABALHO

    DA RESPONSABILIDADEE DO COMPROMISSO COM A COMUNIDADE

    Para pensar a questo tica nas organizaes empresariais necessrio,

    antes de tudo, definir o objetivo desse tipo de organizao.Uma organiz.ao empresarial, utilizando determinada tecnologia,

    produz algum bem ou servio, para ser comercializado em funo do aten-

    dimento a demandas da sociedade.

    Cabe empresa desempenhar com qualidade sua misso especfica.

    Assim, por exemplo, espera-se de uma universidade que ela prepare o

    profissional do futuro; de um hospital, que cuide da doena; de uma in-

    dstria automobilstica, que produza bons carros; de um restaurante, que

    oferea boa comida.

    Por outro lado, esse desempenho no pode estar dissociado de seu

    objetivo principal, que a obteno de lucro.

    LUCRO O PERCENTUAL QUE EXCEDE AS DESPESAS COM MATRI-PRIMA, TECNOLOGIA,

    SALRIOS E QUE SE FAZ EMBUTIR NO PREO FINAL DO PRODUTO.

    Mas no se pode perder de vista que uma organizao empresarial

    est localizada numa comunidade. Ela oferece emprego aos moradores,

    paga impostos e a tecnologia que utiliza causa algum impacto sobre essa

    comunidade.

    Logo, ao refletir sobre a dimenso tica na empresa, precisamos com-

    preender que, alm dos compromissos relativos ao seu funcionamento in-

    terno, a organizao empresarial possui compromissos externos, de ordem

    social.

    E quais so esses compromissos? Como honr-los?

    Vamos analisar, inicialmente, a questo do lucro, seu objetivo primeiro.

    Essa, que parece uma questo de interesse exclusivo da empresa, tem

    tambm importantes repercusses sociais.

    A primeira responsabilidade de uma empresa apresentar um bom

    desempenho econmico, de forma a cobrir custos e acumular capital. A

  • A DIMENSO T I C A N A

    conseqncia do seu sucesso econmico tende a se desdobrar socialmente

    em empregos, melhores salrios e arrecadao de impostos, preos mais

    adequados ao consumidor, e qualidade dos servios - fatores relacionados

    justia social.

    O objetivo de obter lucro , portanto, absolutamente legtimo. Isso por-que uma empresa falida, no-lucrativa m empregadora, malvista na

    comunidade e no gera capital para a criao de empregos futuros.

    O comprometimento social da empresa se expressa, ainda, no seu en-

    gajamento com programas culturais e filantrpicos de interesse da comu-

    nidade, nos seus projetos de preservao ambiental, especialmente porque,

    nesse ltimo caso, a tecnologia por ela utilizada costuma causar impactos

    sobre o meio ambiente.

    Na medida em que no mundo contemporneo a economia est pre-

    dominantemente organizada com base na iniciativa privada, torna-se in-

    dispensvel o comprometimento amplo das organizaes com as questes

    sociais. Hoje, poltica social e ambiental escapam do mbito do governo,

    tornando-se responsabilidade de organizaes empresariais e no-go-

    vernamentais.

    O compromisso das organizaes empresariais , hoje, muito mais amplodo que a prpria relao empregado-empregador: ele envolve questes

    raciais, de sexo, de distribuio de renda, manuteno do meio ambiente,

    enfim, os problemas mais gerais que afligem a sociedade.

    A TICA DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA IMPEDIR A EMPRESA DE FAZER QUALQUER

    TIPO DE DISCRIMINAO POR UMA VISO PRECONCEITUOSA DE RAA OU DE SEXO.

    ATUANDO COM BASE NO VALOR DA DIGNIDADE DA PESSOA, A EMPRESA NO DEFINIR,

    POR EXEMPLO, UMA POLTICA SALARIAL FUNDAMENTADA NESSAS DIFERENAS. A

    QUESTO DO ASSDIO SEXUAL SER TAMBM UMA PREOCUPAO SUA.

    Hoje, o que se pe em questo o desenvolvimento de uma prtica

    coerente com uma tica pblica, em que fiquem preservados os interesses

    da organizao, sem comprometimento das aes que contribuam para

    o bem-estar e o desenvolvimento da sociedade como um todo.

  • I T I C A TRABALHOt

    fPara abordar os demais compromissos que uma organizao precisa

    assumir de modo a ser conceituada como tica necessrio pensarmos

    nos atores ou agentes do processo organizacional, aqueles que fazem a

    empresa, que so responsveis pelo desenvolvimento de sua poltica e

    das atividades necessrias ao alcance de seus objetivos. Nesse caso, esta-

    mos falando de empregadores (que passamos a identificar como o admi-

    nistrador) e empregados.

    COMPROMISSOS E RESPONSABILIDADESDO ADMINISTRADOR

    As rQsponsabilidadQs da Qmpresa passam pelo sUjeito humano que

    responde pela organizao: o administrador. nessa funo que esto

    concentrados os compromissos ticos, e sobre esse indivduo (ou grupo

    de indivduos) que se tem expectativas ticas.A qualquer ao empresarial corresponde a seguinte questo: qual o

    mbito de responsabilidade da administrao?

    A resposta a essa questo implica compreender o mbito de atua-

    o do administrador, saber quais as suas funes e principais atribui-

    es. o que voc vai ver a seguir. E para facilitar sua anlise, es-

    sas funes e atribuies sero apresentadas, sempre que possvel,

    separada hierarquicamente.

    PLANEJAMENTO E ORGANIZAO DO TRABALHO

    A primeira funo/atribuio da administrao de uma empresa a

    elaborao de um bom planejamento.

    O planejamento um instrumento de trabalho fundamental. Por-

    tanto, sua elaborao deve ser precedida de um estudo minucioso do

    momento econmico e social, para que a empresa possa construir um

    cenrio da realidade onde atua e, assim, definir prioridades de in-

    vestimento.

    Pelo planejamento, podero ser traadas as metas a atingir, definida a

  • A DIMENSO TICA NA

    estrutura necessria para sua execuo e distribudas as tarefas, de m~o"

    a tornar o trabalho mais produtivo e o trabalhador mais realizado e'empreendedor.

    a planejamento pressupe, enfim, uma ordenao lgica do trabalho.Euma empresa preocupada com as relaes de trabalho buscar estrutur-

    lo de m.odo a torn-lo mais produtivo e satisfatrio ao trabalhador. Alis,

    a satisfao do trabalhador hoje entendida como condio de produti-

    vidade.

    No contexto das empresas modernas, onde a flexibilizao do processo

    produtivo j realidade e necessidade, a estratgia utilizada no sentido

    de associar produtividade e satisfao ao trabalho tem consistido na reunio

    de vrias operaes ou no agrupamento de tarefas afins, de modo que se

    possa realiz-Ias em equipe.

    A implantao dessa estratgia de trabalho baseia-se na compreenso

    da dinmica da atividade. Esta parte do princpio de que trabalhos repe-

    titivos produzem fadiga e resistncia e, portanto, qualquer pessoa trabalha

    melhor se todo o corpo - msculos, sentidos e mente - estiver empenhado

    na tarefa.

    A diversidade de tarefas executadas com liberdade e segundo o ritmo

    determinado pela equipe passa, assim, a ser considerada fator de pro-

    dutividade.

    Essa idia de diversidade de tarefas e de ritmo de trabalho mais

    compatvel com o exerccio da liberdade, indispensvel ao desenvolvi-mento da iniciativa, competncia hoje exigida do trabalhador.

    A CONCEPO DO TRABALHO

    Um outro aspecto fundamental da administrao a concepo de

    trabalho proposta pela empresa.

    a trabalho pode ser visto como lugar de auto-realizao do homem,extenso de sua per?onalidade, espao de criatividade, onde ele fala de si,

    mostra-se diante do seu grupo social, expressa sua identidade, presta um

    servio social e contribui para o bem comum. Mas tambm pode ser en-

  • I T I C A TRABALHOcarado como uma maldio, lugar de tortura, suportado pela necessidade

    do salrio ao final do ms.

    claro que uma empresa na qual circule a primeira concepo de tra-balho tem uma cultura muito mais positiva e estimulante para a produo.

    As culturas que valorizam o trabalho e o trabalhador criam no sujeito

    uma dimenso social da atividade produtiva, inferior apenas da famlia.

    Nelas so criados vnculos sociais e comunitrios, relaes interpessoais e

    afetivas fundamentais vida das pessoas.

    A QUESTO SALARIAL

    A questo salarial deve receber do administrador uma ateno especial.

    Alm de ser o fundamento de sua vida econmica, o salrio reflete o

    prprio valor do trabalhador.

    a item salrio uma varivel extremamente importante dentro dasorganizaes, funcionando como um dos fatores de motivao e parti-

    cipao, determinantes da produtividade.

    Consciente da relao existente entre salrio e produtividade nas

  • A DIMENSO TICA NA

    I~~'"oo

  • I T I C A TRABALHOSabe-se, hoje, que o medo s produz resistncia e que ningum aprende

    melhor a sabotar a produo do que o trabalhador ameaado.

    Por outro lado, o incentivo econmico, originalmente utilizado a ttulo

    de recompensa, torna-se, com o passar de certo tempo, direito incorporado,

    perdendo a fora de instrumento administrativo de estmulo motivao.

    Uma postura tica das empresas com relao questo salarial , semdvida, a implantao de um plano de cargos e salrios. A adoo desse

    instrumento propicia uma deciso mais justa sobre um assunto sensvel

    totalidade dos que esto envolvidos com os trabalhos da empresa. Por

    meio de um plano criteriosa mente elaborado, os trabalhadores so justa-

    mente recompensados com promoes sistemticas. Isso contribui para a

    melhoria do desempenho e, conseqentemente, para a maior produti-

    vidade da organizao.

    Um outro tipo de motivao consiste na oferta dos chamados "salrios

    indiretos". Subsdio das cotas de pagamento de planos de sade, auxlio-

    alimentao, bolsas de estudo so apenas alguns exemplos.

    Ainda no rol dos benefcios econmicos eticamente recomendveis

    destaca-se a implantao de projetos de treinamento para funcionrios

    demitidos, como forma de viabilizar sua reabsoro pelo mercado de

    trabalho. Da mesma forma, o direito dado ao ex-funcionrio, de menor

    salrio, de receber cesta bsica at ter resolvida sua situao funcional.

    A QUALIFICAO PROFISSIONAL

    Como j vimos, as empresas capitalistas passam por uma reestruturao pro-

    funda no que diz respeito s relaes hierrquicas e trabalhistas e reformu-

    lao das tcnicas gerenciais e de gesto. Essamudana o que tem permi-

    tido transformar o trabalhador - antes passivo, cumpridor de tarefas rotinei-

    ras e montonas - em sujeito ativo e participante das decises empresariais.

    As exigncias de maior responsabilidade e comprometimento do traba-

    lhador no controle dos produtos, na verificao da qualidade e na intro-

    duo de aperfeioamentos e correes no processo de produo pro-

    porcionam uma nova dimenso ao treinamento nas empresas.

  • A DiMENSO TICA NA

    A poltica de recursos humanos nas empresas, habitualmente desen-

    volvida com vistas formao para o desenvolvimento das habilidades es-

    pecficas de uma ocupao, hoje se mostra preocupada em oferecer

    educao geral e mais abrangente aos trabalhadores.

    A mudana de direcionamento da formao do trabalhador, seja no

    interior das empresas, seja nas entidades de formao profissional, aponta

    para a perspectiva de que o trabalho, no atual contexto empresarial, possa

    ser retomado como local privilegiado ao desenvolvimento da subjetividade

    do trabalhador, isto , como local de desenvolvimento de sua identidade

    e realizao pessoal.

    o TRABALHADORA construo de uma cultura, de crenas e valores propcios consolidao

    da dimenso tica na empresa e na sociedade como um todo passa pela

    reflexo sobre o papel do prprio trabalhador.

    Se a prpria dinmica do capitalismo cria espaos de maior participao

    do trabalhador, cabe a este levar s ltimas conseqncias tal tendncia,

    buscando uma participao crescente nas decises, nos processos de

  • I T I C A TRABALHOnegociao, de modo a viabilizar salrios mais dignos, a qualificao para

    todos e, enfim, a humanizao do mundo do trabalho.

    Para enfrentar esse desafio, caber ao trabalhador apropriar-se das

    bases cientficas e tecnolgicas de sua ocupao, desenvolver as com-

    petncias comunicativas bsicas que lhe permitam negociar os interesses

    individuais e coletivos, dentro e fora do mundo do trabalho.

    importante destacar que a participao do trabalhador tanto maiorquanto maior for a conscincia de sua responsabilidade, de seus com-

    promissos com os objetivos da organizao, com sua produtividade e com

    a qualidade dos servios oferecidos.

    Para um exerccio profissional tico no basta, entretanto, apenas a

    competncia tcnica. fundamental o estabelecimento de relaes de

    confiabilidade entre o trabalhador e a gerncia e tambm entre ele e seus

    pares.

    Esse tipo de relao, entretanto, no se d num vazio: preciso que a

    empresa preencha as condies mnimas de respeito dignidade do tra-balhador para que ele se sinta efetivamente integrado ao ambiente de

    trabalho e confiante nos propsitos de sua administrao. Com isso quere-

    mos dizer que no se pode esperar posturas individualmente ticas nas

    empresas no-ticas.

    A seriedade e a responsabilidade profissional so decorrentes da satis-

    fao, da realizao pessoal, o que no ser conseguido sem orgulho ou

    mesmo vaidade pessoal pelo trabalho desenvolvido e pela organizao

    onde ele feito.Por isso, pode-se dizer que a cultura tica das organizaes passa por

    uma certa compreenso do trabalho, pela compreenso de que este um

    modo de o homem viver em sociedade, de exercer sua cidadania, sua

    humanidade. E a condio para a construo de relaes baseadas nessa

    compreenso apenas a da integridade, tanto da administrao empre-

    sarial como do trabalhador.

    A empresa que tem o hbito de enganar, de mentir ou roubar, de no

    cumprir sua palavra, que trata seus clientes com desprezo ou seus funcio-

    nrios de maneira injusta dificilmente ter um corpo funcional tico.

  • A DIMENSO TICA NA

    Tambm ter menores chances de ser bem-sucedida.

    A conscincia dessa situao faz com que a questo da tica venha-se

    tornando, cada vez mais, uma preocupao no meio empresarial.

    Os estudos realizados a respeito do conta de que ter uma conduta

    tica , atualmente, do interesse de toda empresa que pretenda alcanar

    o objetivo de aumentar seu patrimnio. Tal interesse surge da constatao

    de que os melhores funcionrios e fornecedores, as melhores fontes de

    financiamento tendem a p