etica de la información

240
ÉTICA DA INFORMAÇÃO CONCEITOS | ABORDAGENS | APLICAÇÕES Gustavo Henrique de Araújo Freire (Org.) Ideia João Pessoa 2010

Upload: miguel-angel-perez-alvarez

Post on 07-Mar-2016

221 views

Category:

Documents


2 download

DESCRIPTION

Trabajo presentadop en el Congreso de Etica de la Información celebrado en Paraiba, Brasil en marzo de 2010.

TRANSCRIPT

Page 1: Etica de la Información

ÉTICA DA INFORMAÇÃO

CONCEITOS | ABORDAGENS | APLICAÇÕES

Gustavo Henrique de Araújo Freire

(Org.)

Ideia

João Pessoa

2010

Page 2: Etica de la Información

Apoio:

NORMALIZAÇÃO

Ediane Toscano Galdino de Carvalho (UFPB/DCI)

Edilene Toscano Galdino dos Santos (UFPB/DCI)

 

Editoração  Eletrônica/Capa  

Magno  Nicolau  

 

 EDITORA  LTDA.  

(83)  3222-­‐5986  

[email protected]  

Simpósio Brasileiro de Ética da Informação (1. : 2010 : João Pessoa, PB).

Ética da Informação: conceitos, aboragens, aplicações / Organização, Gustavo Henrique de Araujo Freire, 18 a 19 de março de 2010. - João Pessoa: Ideia, 2010.

CD-ROM E-book do I Simpósio Brasileiro de Ética da Informação. ISBN 978-85-7539-524-0

1. Ciência da Informação – Ética. 2. Ética da informação. 3. Informação. I.

Título. II. Freire, Gustavo Henrique de Araújo.

CDU 02:17

Page 3: Etica de la Información

SUMÁRIO

Apresentação

Sobre a Ética da Informação, 5

1 Rafael Capurro

Desafíos téoricos y prácticos de la ética intercultural de la información, 11

2 Miguel Angel Pérez Alvarez

Teaching information ethics, 52

3 Lena Vania Ribeiro Pinheiro

Ética e os dilemas e impasses da informação: reflexão sobre a divulgação

científica ou popularização da ciência, 58

4 Isa Maria Freire

A consciência possível para uma ética da informação na sociedade

em rede, 78

5 Armando Malheiro da Silva

A pesquisa e suas aplicações em ciência da informação: implicações

éticas 106

6 Joana Coeli Ribeiro Garcia

Por uma ética da informação, 126

Page 4: Etica de la Información

7 Maria Nélida González de Gómez

Perspectivas em ética da informação: acerca das premissas, das questões

normativas e dos contextos da reflexão, 147

8 Gustavo Henrique de Araujo Freire

Ética e políticas de informação: uma ação de informação no programa de

cooperação acadêmica - novas fronteiras da CAPES, 164

9 Plácida L. V. Amorim da Costa Santos

Catalogação e ética no ambiente colaborativo e de empoderamento das

redes Informacionais, 184

10 Guilherme Ataíde Dias

Isa Maria Freire

Ciberespaço, redes sociais, agentes...: aspectos éticos para reflexão, 208

11 Júlio Afonso Sá de Pinho Neto

Ética, responsabilidade social e gestão da informação nas

organizações, 217

Page 5: Etica de la Información

Apresentação

SOBRE A ÉTICA DA INFORMAÇÃO

 

 

É consensual que as competências comunicativas nunca foram tão

fundamentais e diversificadas e, do ponto de visa das novas mídias, tão

igualmente básico o domínio das tecnologias digitais. A informação, noção em

si mesma difusa, está no centro da mudança mental e comportamental que ora

vivemos. Encontramo-nos em uma transformação comunicacional que alcança o

cerne da vida comunitária, da vida familiar, da educação, das carreiras

profissionais, da liberdade, da democracia.

Até recentemente, a realidade computacional, fenômeno básico ou comum

aos processos históricos atuais, era objeto apenas de disciplinas como a

informática, a cibernética, a semiótica, a mediologia e a ciência da informação;

entretanto, “atualmente, quase toda disciplina científica usa o conceito de

informação dentro de seu próprio contexto e com relação a fenômenos

específicos” 1.

O conceito de informação é interdisciplinar e indica o fenômeno

fundamental da nossa era tecnológica descrito por Capurro2 como o trânsito do

logos falado e escrito ao número, ou arithmos, digital. Isso suscita questões

                                                                                                                     

1 CAPURRO, Rafael, HJツTNCPF."Dktigt0"Q"Eqpegkvq"fg"Kphqtoc“ão. Trad. Cardoso, A., Ferreira, M. G., Azevedo, M. A. Perspectivas em Ciência da Informação, v.12, n.1, p.148-207, jan./abr., 2007. 2 CAPURRO, R. La Hermeneutica frente al Desafio de la Técnica Digital. Conferencia en el Centro de Estudos em Tecnologia, Artes e Comuni. Porto, 2007. Disponível em: http://www.capurro.de/hermeneutica_porto.html.

Page 6: Etica de la Información

como as das “da natureza do agente artificial e das realidades digitais, os

fenômenos da interação homem-computador, da comunicação mediada por

computadores, das comunidades eletrônicas”3, ou da “realidade da Internet,

como comunicação horizontalmente estruturada, [que] produz um feito histórico

único: a técnica de comunicação interativa do one to one, one to many, many to

one and many to many”4.

Vivemos em uma época que exige uma flexão ou uma plasticidade

interativa da racionalidade a partir da qual possamos enfrentar o universo das

novas questões éticas, políticas e legais que se acumulam diariamente nas

práticas científicas, empresariais, sociais e governamentais, na vida pública e na

vida privada. Como se isso não bastasse, há de considerar também que, vista de

perto, mesmo a transferência da inovação é fomentada na inter-relação de

diversos agentes sociais, representantes de não apenas valores e interesses

particulares, mas, sobretudo, provenientes de culturas discursivas distintas.

Assim, não haveria, em uma cultura progressivamente digital, um conceito

eficaz de gestão da inovação – ou de gestão tout court – sem uma ética que

Rafael Capurro chama ética intercultural da informação5.

Nesse contexto, para Capurro o surgimento dos “sistemas de compreensão

autônomos, ou robótica, dos sistemas híbridos biológicos, ou biônica, [ou] da

                                                                                                                     

3 FLORIDI, Luciano. What is the Philosophy of Information? In: The Blackwell Guide to the Philosophy of Computing and Information. UK: Blackwell. 2004. Disponível em: http://www.philosophyofinformation.net/blackwell/chapters/introduction.pdf. 4 TAKENOUCHI, Tadashi. “Capurro’s Hermeneutic Approach do Information Ethics; Ethos in the Inforrmation Society and the Development of ‘angeletics’”. International Journal of Information Ethics (IJIE), v.1, jun. 2004. Disponível em: http://www.i-r-i-e.net/inhalt/001/ijie_001_06_takenouchi.pdf. 5 O conceito de “ética intercultural da informação” pertence ao quadro geral da ética da informação, da qual Rafael Capurro é um dos pioneiros através do artigo, de 1988, Informationsethos und Informationsethik e com a fundação, em 1999, do International Center of Information Ethics (ICIE). Artigos e conferências do Prof. Dr. Rafael Capurro estão disponíveis em sua homepage: www.capurro.de/.

Page 7: Etica de la Información

manipulação digital da matéria em nível nano”6, não significa a emergência de

meros tópicos interdisciplinares da objetivação digital ou informacional. Esses

sistemas representam desafios que evidenciam a superação de modelos de

pesquisa e ensino tradicionais, requerendo uma profunda tomada de consciência.

Nesse sentido, impõe-se uma forma nova de capacitar os pesquisadores a fim de

atender à construção da autonomia e da cidadania planetárias em uma cultura

regida pela diversidade, na qual a “criação, dinâmica, administração e utilização

de fontes informacionais e computacionais tornaram-se vitais”7.

Podemos, aqui, avaliar preliminarmente as mais conhecidas implicações

éticas geradas pelo ato de informar, quer dizer, considerar os meios que nos

permitam situar, num primeiro momento reflexivo, a informação no contexto da

vida prática dos indivíduos avaliando os problemas morais, deônticos ou

axiológicos próprios ao ato de informar.

Sabemos que os sistemas e tecnologia da informação são fontes de novos

problemas morais. Uma ética da informação diz respeito aos dilemas deônticos

ou conflitos morais que surgem na interação entre os seres humanos e as

tecnologias e sistemas de comunicação e de informação a fim de refletir e,

sobretudo, disciplinar a criação, a organização e o uso das informações. A

primeira questão que salta aos olhos é aquela que consiste em saber se uma

sociedade da informação exige que se discuta a proposição de uma nova ética,

ou se podemos lançar mão das instâncias axiológicas e deontológicas já

existentes, apenas adequando-as aos novos desafios. Dito de outra forma: essa

morada que os gregos chamavam de ethos precisa de novos alicerces, ou o que

já dispomos se afiguram suficientes?

                                                                                                                     

6 CAPURRO, 2007. 7 FLORIDI, 2004.

Page 8: Etica de la Información

O fato é que não tem sido fácil encontrar respostas morais para os novos e

vertiginosos desafios impostos pelos sistemas e tecnologias da informação. A

privacidade da informação, a confidencialidade de dados, a segurança das

informações, a prática do spamming, o controle da Internet por parte de

governos em nome dos seus interesses políticos ou da “segurança nacional”, a

exclusão digital, a desumanização do usuário em razão da impessoalidade ou

despersonalização das práticas informacionais virtuais, a divulgação de

informações que podem antecipadamente criminalizar um indivíduo suspeito de

praticar um delito, são problemas éticos cujas soluções envolvem

interdisciplinaridade e transdisciplinaridade em um solo comum de

estabelecimento extremamente complexo.

Pode-se perguntar, em segundo lugar, se um homem melhor informado é

necessariamente um homem moralmente melhor. Ou então se uma sociedade

melhor informada é, com efeito, uma sociedade mais justa, ainda que seja

duvidoso que estejamos em condições de decidir sobre se é possível, e a que

preço, optar entre nos lançarmos nesse mundo como um Prometeu pós-moderno

conduzindo célere o fogo do progresso, ou, a exemplo de Ulisses, resistirmos ao

canto sedutor das sereias, ignorando o barulho tonitruante dos seus apelos. Ora,

a tradição do Esclarecimento nos fez acreditar que os homens mais instruídos

seriam necessariamente mais virtuosos e mais felizes. A partir disso devemos

concluir que a sociedade da informação torna o nosso agir mais virtuoso e a

virtude é o melhor caminho para a vida boa?

Entretanto, parece-nos inequívoco que devemos formar sujeitos não

apenas para assimilar ou consumir informação, mas também para produzi-la e

saber bem usá-la. Por isso, uma ética da informação deve significar uma ética

para a informação. Ou seja, trata-se de formar (moralmente) o agente ou o

sujeito da informação. A sociedade da informação, com seus avanços e

Page 9: Etica de la Información

conquistas, ainda não nos oferece respostas às perguntas: como transformar a

informação em conhecimento válido, seguro, verdadeiro? Que tipo de

conhecimento é passível de ser transmitido, e, o mais importante,

compreendido? E, em sendo compreendido, como torná-lo útil? Em que medida

é possível, no contexto societário em que vivemos, regular ou disciplinar a

informação? E ao fazê-lo, estaríamos limitando-a, cerceando-a?

Parece evidente que uma informação adequadamente assimilada produz

conhecimento e isso, claro, pode gerar desenvolvimento individual e bem-estar

social. O desafio consiste em espalhar e distribuir socialmente os engenhos,

avanços e conquistas das chamadas tecnologias da informação, ou seja, realizar

a chamada socialização da informação. Pode a globalização informacional ser

capaz de gerar um cosmopolitismo aberto e tolerante? Um mundo em que nos

transformamos em consumidores antes de sermos cidadão pode transformar

consumidores fascinados em cidadãos esclarecidos, vigilantes e críticos?

Nas últimas décadas vimos surgir a proliferação de éticas profissionais, o surgimento

da Bioética, da Ética Empresarial ou das Organizações, da Ética das Relações Internacionais,

da Ética Jornalística, etc. Este estado de coisas reflete certamente o volume de dilemas morais

produzidos pela civilização técnica nas culturas que ora assumem o conhecimento como meio

de coordenação social, de produção de bens e desenvolvimento sustentado. As soluções e os

caminhos a serem perseguidos podem apenas ser solidamente estabelecidos mediante o

diálogo intercultural que requer, por sua vez, o direito à comunicação e do direito à identidade

cultural ou autonomia. As práticas possíveis por tais direitos se dão “no horizonte de

diferentes culturas e de tradições morais que devem ser criticamente observadas pela ética

intercultural da informação”8.

Atualmente nos encontramos em um processo acelerado de hibridização cultural

decorrente da globalização digital, cuja formulação é ensaiada no neologismo ‘glocal’ (uma

mistura de global com local). Deste modo, a proposta de uma ética intercultural da

                                                                                                                     

8 CAPURRO, Intercultural Information Ethics, 2008, passim.

Page 10: Etica de la Información

informação por um lado ancora-se em um caráter elementar da razão, a sua pluralidade:

“constituímos um mundo comum sobre as bases de intercâmbio de práticas”9 . Por outro, sua

fundamentação “não pode ser oferecida por meras regras metodológicas ou meta-culturais,

i.e., por princípios lógico-formais ou as chamadas constantes antropológicas”10. E o momento

para discussão desses temas e problemas não pode esperar melhor oportunidade do que esta

que se criou para viabilizar o debate e a socialização do pensamento científico sobre ética da

informação, no campo da Ciência da Informação no Brasil.

 

 

                                                                                                                     

9 CAPURRO, Intercultural Information Ethics, 2008, passim. 10 CAPURRO, Intercultural Information Ethics, 2008, passim.

Page 11: Etica de la Información

DESAFÍOS TÉORICOS Y PRÁCTICOS DE LA ÉTICA

INTERCULTURAL DE LA INFORMACIÓN1

Rafael Capurro*

1 INTRODUCCIÓN

Las tecnologías de la información y la comunicación (TIC) son

actualmente un fundamento de la vida diaria, los métodos científicos, los

procesos industriales, las estructuras políticas y económicas y la cultura. Si bien

esta transformación de las sociedades industriales del siglo XIX y XX en

sociedades informatizadas se va dando a pasos acelerados esto no sucede igual

en todos los sitios ni con los mismos objetivos y prioridades. Como todo gran

invento tecnológico-cultural – pensemos en la escritura o la imprenta – la

revolución digital tiene también una profunda influencia en las normas,

principios y valores que subyacen a la vida social las cuales constituyen la moral

o ethos cultural de toda sociedad humana. Cuando tienen lugar cambios

tecnológico-culturales que atañen en particular a las estructuras, sistemas,

instituciones y normas de información y comunicación de una sociedad se

producen diversos tipos de crisis y cuestionamientos en el ethos que sustenta las

relaciones sociales, cuyo motor es justamente la comunicación. Dicho ethos

comunicacional se encuentra en parte codificado en forma de leyes nacionales

así como de acuerdos y declaraciones internacionales con distinto tipo de

obligatoriedad, ratificación legal y fundamentación teórica. Una crisis de las

                                                                                                                     

Page 12: Etica de la Información

morales locales y globales como la que estamos viviendo desde hace unos años

a raíz del desarrollo de las TIC lleva a corto o largo plazo a un cuestionamiento

de dichas leyes así como de las estructuras políticas y sus fundamentos de

legitimación.

Dicho cuestionamiento abre expectativas en vistas a cambios en las

relaciones de poder, en especial con respecto a las exigencias y esperanzas de

sociedades o grupos sociales oprimidos o marginados, y a nuevas formas de

creatividad y de concebir y practicar mejores condiciones de vida común

teniendo en cuenta singularidades históricas y culturales así como también

interacciones menos violentas y destructoras del medio ambiente que las

generadas por la sociedad industrial. Después de los horrores de las dos guerras

mundiales – sin olvidar las guerras y los conflictos subsiguientes y los actuales –

así como de los avances tecnológicos con impacto global como la energía

atómica, la biotecnología, la nanotecnología y las TIC, la humanidad

representada por las Naciones Unidas y otros organismos internacionales como

el Consejo de Europa se ha puesto a la búsqueda de principios y valores

morales comunes como fue el caso, tempranamente, de la Declaración Universal

de los Derechos Humanos y otras declaraciones subsiguientes especialmente en

el campo de la biotecnología (OVIEDO 1997, UNESCO 1997) y hace pocos

años también en el ámbito de las TIC con la Declaración de Principios de la

Cumbre Mundial de la Sociedad de la Información (WSIS 2003/2005).

Con el título de ética intercultural de la información (EII) me refiero a la

relación entre normas morales universalizables o universalizadas y tradiciones

morales locales. Un ejemplo de moral universalizada es la Declaración

Universal de los Derechos Humanos que surge como respuesta a la catástrofe de

la Segunda Guerra Mundial, pero que tiene raíces en el pensamiento del

iluminismo, la Revolución Francesa, las constituciones republicanas etc.

Page 13: Etica de la Información

La reflexión ética se mueve entre los polos de la universalización y la

concreción en una situación singular. Discutir sobre, por ejemplo, el tema de la

privacidad no es igual en una cultura que en otra y con un trasfondo histórico y

cultural determinado, como lo expondré mas adelante. Esto me parece evidente

tanto a nivel individual como social.

La EII surge en el momento en que el cuestionamiento teórico de la(s)

moral(es) se vuelve cada vez más urgente dado el profundo impacto práctico de

las TIC en la sociedad. Los conflictos que antes se daban a nivel local, se

transforman ahora rápidamente en conflictos globales y viceversa. La ética es un

síntoma de que normas y jerarquías de valores que se daban por descontado

entran en crisis. Ortega y Gasset decía que “las ideas se tienen” mientras que “en

las creencias se está” (ORTEGA, 1986, 17). Las morales son las creencias en las

que “estamos”. La ética es lo que “tenemos” cuando nos encontramos “sin

creencia firme” (ORTEGA, 1986, 41) a raíz, por ejemplo, de cambios

tecnológico-culturales de gran envergadura como lo fue, por ejemplo, la

invención de la imprenta en el siglo XV y actualmente la técnica digital.

En estas reflexiones quiero exponer los desafíos teóricos y prácticos de la

ética intercultural de la información. Los desafíos téoricos se refieren a las

discusiones en torno a una fundamentación del discurso ético que oscilan entre

posturas universalistas y relativistas. Los desafíos prácticos tienen que ver con la

búsqueda de un código global para la sociedad de la información promovida por

la Cumbre Mundial de la Sociedad de la Información (WSIS) y por la UNESCO.

El eje de mis reflexiones es la diferencia entre moral y ética es decir entre las

tradiciones morales vigentes – la moral vivida pero también su codificación en

forma de leyes y normas como expresión de un ideal – y una reflexión abierta y

problematizante de dichas tradiciones y codificaciones con sus respectivos

Page 14: Etica de la Información

valores y principios, teniendo en cuenta los contextos culturales y las estructuras

de poder que los sustentan.

La via regia metodológica que propongo es la de una reflexión crítica

comparada intercultural que presupone que existen diferencias tanto en las

tradiciones morales como en las fundamentaciones y problematizaciones éticas.

Esta reflexión comparada ha de llevarse a cabo en forma paciente sin perder de

vista el sentido crítico de dichos análisis en cuanto se trata no sólo de describir

diversidades culturales sino también de problematizar las normas subyacents a

los intereses y poderes locales o globales así como también de buscar valores y

principios comunes. Una reflexión ética tiene que pensar lo universal sin dejar

de lado la singularidad de formas de vida y las facticidades históricas y

geográficas. En tanto reflexión crítica tiene que problematizar, por ejemplo,

aspectos de justicia, participación política y social así como de protección del

medio ambiente. El problema de la ‘basura digital’ tiene una dimensión ética de

primer orden (FEILHAUER; ZEHLE 2009).

Los intereses de la ética se entrecruzan con los de la sociología, la ciencia

política, las ciencias del medio ambiente etc. diferenciándose de ellas por su

capacidad de abrir una brecha crítica en el ámbito moral normativo implícito o

explícito vigente. La tarea más noble de la ética consiste no sólo en fundamentar

normas de vida dadas – en este caso las que se refieren en especial al ámbito de

la comunicación humana pero sin restringrise a ellas, como lo veremos más

adelante – sino sobre todo en problematizarlas, abriendo nuevas perspectivas de

vida y pensamiento. Analicemos en primer lugar esta problemática a nivel

teórico y luego a nivel práctico.

Page 15: Etica de la Información

2 DESAFÍOS TEÓRICOS DE LA ÉTICA INTERCULTURAL DE LA

INFORMACIÓN

El cuestionamiento del ethos comunicacional e informacional – o sea de

las normas, principios y valores que fundamentan la comunicación y la

información en una determinada sociedad – gira actualmente en torno a temas

tan variados como la privacidad, la propiedad intelectual, el acceso libre al

conocimiento, el derecho a la expresión en las redes digitales, la censura, nuevas

definiciones de género, la identidad digital, las comunidades digitales, el

plagiarismo digital, la sobrecarga informacional, la brecha digital y el control

social digital (Himma y Tavani 2008; Van den Hoven y Weckert 2008).

Algunos de estos temas constituyen el meollo de la ética de la información como

se viene desarrollando desde principios de 1980 (Froehlich 2004) pero es recién

con el advenimiento de internet a mediados de la década del 90 cuando la ética

de la información se transforma en un tema político de gran envergadura así

como en una disciplina académica.

Si bien la diversidad de las posiciones éticas y los correspondientes

supuestos culturales ha dado siempre que pensar, el estudio de esta problemática

intercultural en relación a la ética de la información es muy reciente. Fue en un

simposio organizado por el International Center for Information Ethics (ICIE) y

promocionado por la Fundación Volkswagen que tuvo lugar en Karlsruhe

(Alemania) en el 2004 donde se tematizó por primera vez la problemática de una

ética intercultural de la información bajo el título “Localizing the Internet.

Ethical Issues in Intercultural Perspective”. Unos años más tarde, en 2007, se

publicaron las primeras monografías sobre EII, una editada por Soraj

Hongladarom (Tailandia) y Charles Ess (USA) con el título “Information

Technology Ethics: Cultural Perspectives” (HONGLADAROM; ESS 2007) y

Page 16: Etica de la Información

otra con una selección de los artículos presentados en el simposio del ICIE

(CAPURRO et al. 2007). Pasemos revista a algunas posiciones teóricas de este

debate que recién ha comenzado (Carbo y Smith 2008; Capurro 2008)

2.1 Charles Ess

Uno de los autores más destacados en la EII es sin duda el teólogo

norteamericano Charles Ess quien aborda la tensión entre la universalidad de los

principios morales y la pluralidad de las culturas con un enfoque en las

tradiciones de pensamiento del Extremo Oriente, en particular el confucianismo,

relacionándolas con corrientes y problemas de la ética de la información

contemporáneas en Occidente (Ess 2008, 2006). Su punto de partida es el

pluralismo ético que refleja un pluralismo moral, es decir, que las

fundamentaciones a nivel reflexivo surgen a partir de tradiciones morales tanto

en el Extremo Oriente como en el “Extremo Occidente”, usando el término del

sinólogo francés François Jullien (Jullien 2001), uno de los intérpretes más

profundos en la comparación del pensamiento chino clásico con la filosofía

occidental.

De acuerdo a Ess, ambas tradiciones, la china, en especial el

confucianismo, y la occidental, se basan en nociones como las de ‘resonancia’ y

‘armonía’ que permiten articular incluso otras posiciones éticas aparentemente

irreductibles. Ess sostiene que es posible pensar un pluralismo ético que no sea

ni un relativismo ni un dogmatismo. Ambas posiciones tienen como

consecuencia el que se impongan normas por la fuerza ya sea porque no hay

normas y principios comunes o porque una perspectiva considerada como

universal es impuesta a las otras. De acuerdo a Ess hay diversas formas de

pensar el concepto de pluralismo. Una de ellas consiste en concebirlo como un

estilo de vida que debe aceptarse sin más. Pero esto lleva en la práctica a

Page 17: Etica de la Información

conflictos permanentes y tensiones insolubles. Otra forma de pensar el

pluralismo es buscar principios éticos comunes. Pero este tipo de pluralismo

tiene a su vez la desventaja que dichos principios pueden ser interpretados

desde ángulos culturales muy diversos, con lo que pierden su pretendida

condición de ser comunes.

Ess prefiere una tercera forma de pluralismo que conserva las diferencias

unificándolas desde la perspectiva de su posible complementaridad o

coherencia, o, en términos preferidos por las culturas orientales, en vistas a su

resonancia y armonía. Estas no se basan en una aparente identidad de valores y

principios sino en una variedad de interpretaciones que a pesar de sus

diferencias pueden ser conectadas unas con otras. Ess utiliza el término

aristotélico pros hen es decir “hacia la unidad” para mostrar un camino

intermedio, analógico diría Aristóteles, entre una identidad que homogeneice y

una equivocidad que impida toda comprensión y comparación. Ess ve a este

“pluralismo interpretativo” enraizado tanto en la tradición occidental socrática

como en la tradición confuciana de la armonía y resonancia. Al mismo tiempo es

muy consciente de que este tipo de comparaciones ignora muchas veces la

complejidad y las dificultades que surgen cuando se consideran

complementarias, por ejemplo, la ética de las virtudes de Aristóteles y la noción

ética confuciana de ren que abarca la persona en su totalidad física, mental y

social (ESS, 2008, 209). El mismo problema surge, a mi modo de ver, cuando

Ess relaciona la phronesis aristotélica y el concepto platónico de cybernetes con

la armonía confuciana (ESS, 2008, 219). Esta última no está basada en

principios abstractos sino en ritos y relaciones sociales (FROESE, 2006, 2).

Ess considera que la tarea de la “global information ethics” es la de

preservar distintas culturas y tradiciones articulándolas entre sí (ESS, 2006),

teniendo en cuenta que nuestras identidades offline, es decir nuestros valores,

Page 18: Etica de la Información

comunidades, historias y experiencias, tienen una profunda influencia en la

manera cómo nos relacionamos online (ESS, 2008, 218).

El pensamiento de Ess ha sido criticado en cuanto a que la tendencia hacia

la unidad (pros hen) parece contradecir al concepto mismo de pluralidad en

cualquiera de sus interpretaciones (HIRUTA, 2006). Ess parece además

oponerse rotundamente a ciertas posibilidades éticamente intolerables como, por

ejemplo, la pornografía infantil en internet, trabajando en base a un diálogo

socrático con vistas a posibles posiciones teóricas y prácticas comunes, un

diálogo que no es fácil ni a nivel académico ni, mucho menos, a nivel político.

Para Ess dicho diálogo se basa en el espíritu de la parrhesía griega, es decir en

un tipo de comunicación y problematización directa y abierta que es muy propia

de la tradición filosófica y política occidental (CAPURRO, 2010).

2.2 Luciano Floridi

El filósofo italiano Luciano Floridi distingue entre una “ética de la

comunicación global” (“ethics of global communication”), y una “ética de la

información global” (“global-information ethics”) (FLORIDI, 2009). La primera

se refiere al diálogo y prácticas consensuales en la interacción entre diversas

culturas y generaciones. Pero tratándose de una postura meramente pragmática

deja de lado, según Floridi, preguntas más básicas como por ejemplo: ¿cuáles

son en este caso los principios éticos que se toman como base de dicho diálogo y

en qué se fundamenta dicha elección? ¿existe una ‘macro ética’ en el sentido de

un cierto tipo de consecuencialismo o deontologismo o contractualismo?

(Floridi 2009, 222). Estas preguntas son las que Floridi intenta responder con lo

que él llama “ética de la información global”.

Page 19: Etica de la Información

Un término clave de la teoría de Floridi es el de “ontología compartida”

(“shared ontology”). Haciendo referencia al dicho de Wittgenstein de que “si un

león pudiera hablar, no lo entenderíamos” (WITTGENSTEIN, 1984, 568, mi

traducción), Floridi considera el concepto de ‘ontología’ como un problema de

comprensión (o no comprensión) entre lenguajes y visiones del mundo locales

que se vuelven incapaces de resolver “el problema del león”. Este problema sólo

se puede resolver, afirma Floridi, presuponiendo una ontología básica “de vida y

muerte, comida y abrigo, angustia y protección” (FLORIDI, 2009, 224, mi

traducción) es decir de todo aquello que soporta la vida y que trata de evitar el

sufrimiento así como toda forma de destrucción de los entes puesto que todo

ente, por el hecho mismo de ser, tiene derecho a una forma específica de

respeto. Ens et bonum convertuntur afirmaba el adagio escolástico. Floridi llama

a esta ontología mínima “ontocéntrica” siendo aparentemente más radical que,

por ejemplo, la “biocéntrica” y la “antropocéntrica”. La ontología ontocéntrica

coloca en su centro no al agente sino al paciente de la acción incluyendo los

entes no vivientes extensión que constituye una tesis muy loable y de gran

relevancia ecológica actual.

Floridi se opone tanto a una teoría metafísica que afirme algo respecto al

ser de los entes – lo que sería una forma de “imperialismo ontológico” – como a

un mero relativismo que es incapaz de promover una interacción eficaz a nivel

global en vistas a problemas que afectan a todas las culturas. Esta “ética de la

información global” no quiere imponer una jerarquía de valores comunes, sino

permitir que estos se expresen en situaciones concretas con toda su

situacionalidad (“embededdness”) y materialidad (“embodiement”). En otras

palabras, Floridi opta por una ontología ligera y horizontal (“lite, horizontal

ontology”) como condición de posibilidad de interacción pragmática entre

culturas las cuales vistas en su densidad vertical o gruesa (“thick cultures”) son a

menudo irreconciliables. La diferencia entre culturas ligeras y gruesas puede

Page 20: Etica de la Información

relacionarse a la distinción del filósofo estadounidense Michael Walzer entre

argumentos éticos finos (“thin”) y gruesos (“thick”) según se los analice o no en

su profundidad cultural (WALZER, 1994).

A mi modo de ver, esta posición de Floridi es muy atractiva y útil a nivel

pragmático pero tiene el peligro de ignorar la necesidad de un análisis

intercultural grueso o vertical. No queda claro tampoco quiénes van a proponer

y a aceptar políticamente esta “minimal ontology” con el correspondiente

vocabulario. Floridi dice expresamente que la ética de la información, como él la

concibe, “no es la declaración de los derechos humanos” (FLORIDI, 2009, 229),

lo que debe interpretarse no como un rechazo de los mismos sino como una base

que resulta demasiado estrecha para poder resolver globalmente “el problema

del león”. Si todos los entes tienen una cierta dignidad esta no es sólo un

principio pragmático sino también ontológico en el sentido que está afirmando

algo sobre el ser de los entes. La ontología de Floridi ‘resuena’, diría Ess, con

otras ontologías occidentales como por ejemplo, con las ideas platónicas,

cuando se concibe al concepto de información como el medio común a todos los

entes, es decir como in-FORMA-ción (CAPURRO, 1978).

Floridi entiende al ser desde los entes. Él escribe: “Hay algo más

elemental que la vida, es decir el ser – que es la existencia y florecer de todos los

entes en su ambiente global – y algo más fundamental que el sufrimiento, es

decir la entropía.” (Floridi 2008, 47, mi traducción). ¿En qué sentido es la

entropía “algo más fundamental” que el sufrimiento? ¿No es éticamente

ineludible hacer una diferencia entre sufrimiento y entropía si se quiere evitar

una metáfora poco plausible? La “ética de la información global” quiere

solucionar un problema grueso eludiéndolo y presuponiendo una solución ligera

que es, en realidad, gruesa. El argumento es circular.

Page 21: Etica de la Información

2.3 Philip Brey y Ken Himma

Según el ético holandés Philip Brey, un diálogo ético intercultural tiene

que tomar en serio las diferencias interculturales (BREY, 2007). Brey usa el

concepto de ética de la información en el sentido ordinario de cuestiones éticas

relacionadas a las TIC pero incluyendo también la ética de la computación

(“computer ethics”) así como los medios de comunicación de masas (“media

ethics”) y el periodismo. Brey distingue entre un relativismo moral descriptivo y

uno normativo llamado también metaético. Este último aplicado a la ética de la

información encara la pregunta de si existen conceptos y principios con validez

universal o bien si la ética de la información es culturalmente relativa. Brey

defiende la necesidad de un relativismo descriptivo en la ética de la información

dado que si estas diferencias no existen la discusión en torno el relativismo

metaético no tiene sentido. Philip Brey analiza este relativismo en temas como

la privacidad, los derechos de propiedad intelectual, la libertad de información y

la diferencia entre una moral centrada en los derechos humanos como es el caso

de las sociedades occidentales modernas, de una centrada en las virtudes propia

de las culturas del “Extremo Oriente” influenciadas por el budismo así como

también por otros sistemas morales provenientes del confucianismo, el taoismo

y el maoismo que sobreponen a los derechos del individuo el bienestar y la

armonía de la sociedad. En conclusión, el relativismo descriptivo moral no es un

invento. Los valores en los sistemas morales de Occidente no son los mismos

que en Oriente (WONG, 2009).

Brey limita la tarea central de la EII al estudio comparado de sistemas

morales dejando de lado otros efectos que las TIC puedan tener en la sociedad,

como por ejemplo que puedan ser utilizadas como instrumentos de opresión o

liberación, lo que es objeto de estudio de las ciencias sociales. A mi modo de

ver, esta separación entre ética y ciencias sociales le quita a la ética su

Page 22: Etica de la Información

articulación crítica y a las ciencias sociales su articulación normativa. Si, como

dice Brey, la EII tiene que comprometerse en estudios críticos (“critical

studies”) comparados de sistemas morales relacionados con las TIC, estos a su

vez no pueden separarse de análisis sociológicos y viceversa. Brey delimita

también los estudios comparados (“interrelational studies”) en vistas a las

normas que permiten una interacción de modelos normativos entre diversas

culturas manteniendo sus diferencias.

Una posición opuesta a la de Philip Brey es la del filósofo estadounidense

Ken Himma quien defiende una moral objetivista (HIMMA, 2008). Para Himma

la EII comparativa forma parte de las ciencias sociales, a diferencia de lo que

afirma Brey. Además, según Himma, la comparación de éticas a nivel normativo

tiene como único objetivo el llegar a un acuerdo (“agreement”) y no, como lo

propone Brey, el proponer formas de interacción. Himma elabora buenos

argumentos para defender el objetivismo pero no desarrolla a partir de ellos un

sistema de normas objetivas de ética de la información.

2.4 Rafael Capurro

La oposición entre relativismo y objetivismo o universalismo en la ética,

como la he venido analizando anteriormente, tiene su origen en la idea que el

conocimiento y la emoción son dos fuentes supuestamente independientes de la

verdad de los juicios morales. Esta oposición es problemática a nivel de la

ciencia empírica como lo demuestra por ejemplo la obra del neurobiólogo

Antonio Damasio (1995). La fenomenología ha analizado cómo el ser-en-el-

mundo (Heidegger 1976) se nos hace explícito en diversos sentidos dependiendo

de afectos fundamentales. Pensemos en la tranquilidad, el odio, la alegría o la

tristeza, como los analiza, por ejemplo, el fenomenólogo Karl Baier (BAIER,

2006) y el psiquiatra suizo Medard Boss, fundador de la escuela del análisis

Page 23: Etica de la Información

existencial (“Daseinsanalyse”) inspirada en un largo contacto académico y

personal con Heidegger (BOSS, 1975, 288-299). Es bien conocido el análisis

heideggeriano de la angustia (“Angst”) como un afecto (“Stimmung”) que nos

abre el mundo y al mundo desde la facticidad de la existencia, es decir desde el

mero hecho de ser-en-el-mundo sin poder dar una razón suficiente ni de este

hecho ni de la existencia del mundo mismo, a diferencia del temor (“Furcht”)

que tiene un objeto de referencia concreto. Otro ejemplo de este análisis de la

relación entre afectos y conocimiento es aquella “experiencia clave” (“mein

Erlebnis par excellence”) descrita por Wittgenstein en su “Conferencia sobre

ética” con las siguientes palabras:

Esta experiencia, en el caso que la tenga, puede ser descrita, creo, con

palabras como: ‘estoy maravillado por la existencia del mundo’. Pero

luego tiendo a usar expresiones como: ‘qué extraño que el mundo

exista. (WITTGENSTEIN, 1989, 14, mi traducción).

Wittgenstein cree que sólo la existencia del lenguaje mismo es la

expresión apropiada de esta experiencia. El 30 de diciembre de 1929 anota

Wittgenstein:

Creo que puedo imaginarme lo que Heidegger quiere decir con ser y

angustia. Los seres humanos tienen la tendencia a correr contra los

límites del lenguaje. Piensa, por ejemplo, en el asombro de que exista

algo (...) La ética es este correr contra los límites del lenguaje.

(WITTGENTEIN, 1984a, 68, mi traducción).

Wittgenstein estaría muy asombrado al leer la solución Floridiana del

“problema del león” reductible a una ontología con distintos “niveles de

abstracción”. Lo que mueve al agente y paciente humano es la “condición de

arrojado” (“Geworfenheit”) del existir. Y esta se abre a través de afectos que

Page 24: Etica de la Información

fundamentan la llamada (“Ruf”) a tomar cuidado del ser-en-el-mundo en su

inabarcable, inagotable e inexpresable totalidad y contingencia. (Heidegger

1975, 274ss). Llamo angelética – del griego angelía, es decir mensaje – una

teoría filosófica que tematiza esta llamada, es decir que concibe al ser como

mensaje y que sirve de base a una ciencia empírica. (CAPURRO, 2003).

Somos, en verdad, originariamente pacientes, es decir receptores de la

llamada del ser-en-el-mundo. Es esta experiencia universal de facticidad la que

caracteriza la existencia humana dando lugar a respuestas desde ‘afectos

fundamentales’ (“Grundstimmungen”) diferentes. Baier muestra cómo en el

budismo se expresa una experiencia de la transitoriedad del mundo en forma de

afectos de tristeza y alegría movidos profundamente por el sufrimiento. Estos

afectos nos abren el mundo y al mundo de forma distinta al admirar griego

(thaumazein) al que aludía Wittgenstein. Baier indica que hay que tener cuidado

en no caer en estereotipos cuando se comparan, por ejemplo, culturas en Oriente

y Occidente. No existen diferencias absolutas ente las culturas ni tampoco

existen afectos fundamentales exclusivos de una u otra cultura. Esto muestra que

el “problema del león”, visto desde esta perspectiva, es un falso problema. Pero

sería también muy fácil sostener la premisa contraria, es decir que en el fondo

no existen diferencias culturales, postulando que estas son solamente ónticas,

para utilizar la terminología heideggeriana. Esta es una posición que Philip Brey

llama “absolutismo moral descriptivista” (BREY, 2007, 2) y que va, como

afirma Brey, contra la experiencia. Baier sugiere hacer un análisis profundo de

textos y objetos literarios, religiosos, artísticos y de la cultura diaria a fin de ver

lo más claramente posible la complejidad de los fenómenos, sus interacciones,

contradicciones, exclusiones etc. así como sus expresiones en diversas formas de

comprensión del ser-en-el-mundo no menos que en las instituciones y

materialidades en las que se fijan y fundamentan estructuras de poder

individuales y colectivas, locales y globales, sociales y ecológicas.

Page 25: Etica de la Información

Desde esta perspectiva podemos pensar la búsqueda de un fundamento

común pero no homogenizante para responder a la llamada ontológica del siglo

que recién ha comenzado, como originándose no sólo desde una finalidad (pros

hen), sino también desde un ‘desde donde’ (hothen) común, el ser-en-el-mundo,

como un origen que se refleja en forma diversa de acuerdo a afectos

fundamentales en distintos contextos culturales e históricos. Este origen puede

interpretarse también como una llamada del otro a la que alude, por ejemplo,

Emmanuel Lévinas mostrando cómo la experiencia de gratuidad y contingencia

se da en forma ejemplar en el rostro del otro (LEVINAS, 1968). Universalidad y

singularidad se condicionan mutuamente, puesto que el otro es siempre un otro

concreto, histórico, situado con todo su bagaje cultural y sus diversos afectos

fundamentales.

Si mi análisis del fenómeno actual de la globalización digital es correcto,

esta no se reduce al ámbito de la comunicación social sino que abarca también

todos los fenómenos en su posibilidad de ser digitalizados a lo que llamo

ontología digital. No es esta ni una posición metafísica que afirme que el ser de

los entes esta constitutído por bits, ni tampoco es una tesis epistemológica

dogmática que afirme que dicha perspectiva es la única posible y verdadera.

La respuesta a la pregunta por el ser, es decir al mensaje del ser y al ser

como mensaje, es siempre histórica y contingente. En nuestra época una

respuesta es la dada por la ontología digital siempre y cuando se la entienda en

su carácter de perspectiva posible de interpretar el ser de los entes y no como un

reduccionismo metafísico que afirmara que los entes son bits o que sólo tiene

sentido interpretarlos como bits, lo que sería un reduccionismo epistemológico

(CAPURRO, 2006). Si este diagnóstico de nuestra época es correcto, el desafío

Page 26: Etica de la Información

ético de las tecnologías globales, como es el caso de las TIC, es justamente de

carácter intercultural.

¿Cómo responden otras aperturas originarias del y al mundo basadas

desde otros “afectos fundamentales” al desafío cultural de las TIC? Este desafío

va, en efecto, más allá del campo de la comunicación y por tanto más allá de la

“ética de la comunicación global”. Yo hablo de una ética digital así como

también de una ética de la información digital en sentido amplio en la que los

entes son vistos como digitalizables, diferenciándola de la ética de la

información en sentido restringido al ámbito de la comunicación digital

(CAPURRO, 2009). Ambas pueden ser objeto de un análisis crítico

intercultural. La ética de la información digital en sentido amplio es a su vez

más restringida que la ética informacional de Floridi. A diferencia de esta

última, ella se plantea actualmente las consecuencias prácticas del horizonte

global de la digitabilidad de todos los fenómenos en el marco del actuar

humano. No pretende ser ni una metafísica digital – lo que Floridi llama

“ontología digital” – ni una ontología o, mejor, una metafísica universal a un

máximo nivel de abstracción.

La EII en sentido restringido, es decir relacionado a la comunicación

humana puede a su vez restringirse, como lo propone Philip Brey, al análisis

normativo de sistemas éticos de interpretación de morales dadas en vistas a su

validez y legitimidad. En este caso es necesario tomar como punto de partida al

ser-en-el-mundo compartido, pero percibido desde distintos “afectos

fundamentales”, buscando formas de pasaje, en el sentido de traducción,

transmisión y traslación, de una a otra perspectiva. Esto sólo es posible si no se

parte de la premisa de culturas cerradas sino de experiencias basadas en una

realidad común, que se expresa de diferentes maneras. Vista así, la red digital

comunicacional es una respuesta global a la llamada de concebirnos como

Page 27: Etica de la Información

humanidad. En las respuestas a esta llamada se entrecruzan evidentemente

singularidades históricas, geográficas, sociales y culturales. Pero es importante

recordar que hay otras llamadas universales como son la crisis ecológica, la

lucha contra la miseria, las enfermedades como el SIDA, la malaria, el hambre y

la desocupación. Me estoy refieriendo con esto a los Objetivos de Desarrollo del

Milenio de las Naciones Unidas.

3 DESAFÍOS PRÁCTICOS DE LA ÉTICA INTERCULTURAL DE LA

INFORMACIÓN

Analicemos ahora los desafíos prácticos de la ética intercultural de la

información a dos niveles. En primer lugar en torno a un tema concreto. Tomo a

modo de ejemplo la privacidad que es uno de los problemas éticos y legales más

acuciantes de las sociedades informatizadas. En segundo lugar voy a analizar las

actividades de los últimos años en torno de lo que se acostumbra a llamar ‘ética

global de la información’ un término que se usa para designar varios objetivos

entre otros el proyecto de la UNESCO referido a una declaración universal de

valores y principios para la sociedad de la información siguiendo la ruta abierta

en la Cumbre de la Sociedad de la Información.

3.1 La privacidad como tema intercultural

Charles Ess analiza interculturalmente la privacidad que es considerada en

general en Occidente como un valor instrínseco mientras que en las tradiciones

budistas y confucianas el sujeto es visto como algo negativo tanto en sí mismo

como en relación a la primacía de la comunidad sobre el individuo. Sin embargo

esta diferencia no quita que también en las culturas del “Extremo Oriente”,

como por ejemplo en Tailandia, la privacidad sea considerada como algo que se

Page 28: Etica de la Información

ha de respetar legalmente a pesar de estar enmarcada en un contexto cultural

diferente como es el de la tradición budista. Vista así, la privacidad es un valor

moral importado de Occidente que no podría ser considerado seriamente dentro

del contexto cultural budista aunque se lo respete legalmente en particular en el

ámbito de la sociedad de la información, es decir, de la comunicación digital

(KITIYADISAI, 2005). Sin embargo, el filósofo tailandés Soraj Hongladarom

ha mostrado que más allá de esta equivalencia legal entre Oriente y Occidente,

se puede pensar una fundamentación teórica de la privacidad basada en el

budismo pero no, como es el caso de Occidente, considerando la identidad de un

‘yo’ y su autonomía como un valor intrínseco, sino desde el punto de vista de la

ética budista de la compasión que ve a todos los seres, y por tanto también al

‘yo’, en su aparecer ‘fenomenal’ como objeto de cuidado y compasión

(HONGLADAROM, 2007; CAPURRO, 2008, 654-666). Más que de resonancia

creo que se debería hablar aquí de disonancia ética intercultural puesto que la

armonía se da sólo a nivel legal.

Algo semejante se produce con la hibridación de los conceptos de

privacidad y de autonomía en el Japón donde, como lo muestran Makoto

Nakada y Takanori Tamura (NAKADA; TAMURA, 2005), la dicotomía

occidental entre lo privado y lo público no resuena armónicamente con la

diferencia entre el concepto japonés de Ohyake (público) y Watakushi (privado).

Ohyake significa ‘casa grande’ y se refiere a la corte imperial y al gobierno,

mientras que Watakushi significa ‘no Ohyake’ en el sentido de algo moralmente

malo, secreto y egoísta. La noción de privacidad es, como en el caso de

Tailandia, una noción occidental importada que pertenece a un substrato de

moral occidental de la sociedad japonesa designado con el término de Shakai, el

cual es diferente de la moral tradicional japonesa denominada Seken

(CAPURRO, 2005).

Page 29: Etica de la Información

El ético chino Lü Yao-Huai ha mostrado que el concepto de privacidad ha

cambiado paulatina- pero radicalmente en China a partir de las reformas

económicas y políticas que comenzaron en 1980. Mientras que anteriormente la

privacidad era vista como algo moralmente negativo en el sentido de alguien que

busca sus intereses individuales egoístas, esto cambia de la forma siguiente: 1)

la libertad individual no es ya mas en la vida diaria un tema tabú o, en otras

palabras, no es mal visto si alguien dice: ‘esto es privado’; 2) hay una tendencia

a no interferir con la privacidad de otras personas; 3) el concepto chino de

privacidad (Yinshi = secreto vergonzoso) ha sido expandido, incluyendo ahora

todo tipo de información personal, sea ‘vergonzosa’ o no (LÜ, 2005,

CAPURRO, 2008, 654). Si consideramos tanto la política oficial del gobierno

chino con respecto a disidentes en internet así como las recientes tensiones

justamente relacionadas con la privacidad en relación a usuarios chinos de

Google, podemos ver que el confucianismo oficial es visto menos como algo

semejante a la moral occidental que como un esfuerzo de oponer una identidad

china frente a los valores occidentales. Estos desequilibrios y disonancias a nivel

político muestran, una vez más, la importancia de un paciente análisis ético

intercultural que no esté influenciado por posiciones preestablecidas ni tampoco

por una visión que no tome en serio las profundas diferencias en los contextos

culturales e históricos entre el “Extremo Oriente” y el “Extremo Occidente”.

Todo esto no quita la necesidad y urgencia de soluciones pragmáticas que

pueden ser aclaradas en sus fundamentos a través de un análisis intercultural

“grueso”. En otras palabras, se puede llegar a un acuerdo “fino” pero las razones

subyacentes pueden ser muy diferentes e incluso contradictorias. Siempre es

bueno tenerlas claras para evitar falsas conclusiones e interpretaciones.

Finalmente quisiera referirme a la problemática de la privacidad en el

contexto africano. Tomo como ejemplo la relación entre privacidad y ubuntu

que es un concepto o, mejor dicho, una visión del mundo vigente en muchas

Page 30: Etica de la Información

culturas africanas, que expresa el comunitarismo africano. Ubunto es un palabra

Zulú que quiere decir “humanidad” en el sentido de que “una persona es una

persona a través de otras personas” (OLINGER; BRITZ; OLIVIER 2005, 293).

Los éticos sudafricanos Olinger, Britz y Olivier han indicado que es muy común

que los sudafricanos vivan y practiquen dos culturas diferentes, siendo una la

cultura Ubuntu como es vivida en los contextos rurales y otra la cultura de los

valores occidentales como se la vive en los grandes centros urbanos. Ubuntu

como lo dice el filósofo sudafricano Johann Broodryk – quien fue el primero en

escribir una tesis de doctorado sobre la filosofía Ubuntu – es una visión del

mundo africana “basada en valores de un humanismo intenso, de cuidado,

respeto, compasión y valores afines en vistas a asegurar una vida comunitaria

feliz y cualitativamente humana en espíritu de familia” ( “based on values of

intense humanness, caring, respect, compassion, and associated values ensuring

a happy and qualitative human community life in a spirit of family”, Broodryk

2002, mi traducción). Es evidente que desarrollar una ética de la privacidad con

este presupuesto es algo diferente a los planteamientos occidentales que parten

generalmente del individuo y su autonomía.

3.2 Ética global de la información en la UNESCO

El término ‘ética global de la información’ se refiere en primer lugar al

objetivo de una serie de instituciones destinadas a promover la investigación y la

acción en el campo de la ética de la información a nivel global en base tanto a

un diálogo intercultural como a la búsqueda de normas morales universales

transculturales relacionadas con las TIC (VANDEKERCKHOVE et al. 2008).

Entre ellas se cuentan instituciones como la International Society of Ethics and

Information Technology (INSEIT) y el International Center for Information

Ethics (ICIE). Algunas instituciones están dedicadas a la globalización de la

Page 31: Etica de la Información

ética en general tales como la International Global Ethics Association (IGEA), la

Global Ethics Foundation del teólogo Hans Küng, así como la plataforma

Globethics.net. Dejo de lado en este análisis los institutos de ética universitarios

en los que se promueve la investigación en ética de la información, así como

también las revistas especializadas en este campo y un sinnúmero de

publicaciones especialmente en los últimos diez años (Visitar al respecto el sitio

del ICIE).

En lo que sigue, el término ‘ética global de la información’ tiene que ver con

las declaraciones de principios y el plan de acción de la Cumbre Mundial de la

Sociedad de la Información (WSIS) así como con las actividades desarrolladas

por la UNESCO en este campo. Estas datan desde los primeros congresos sobre

“infoética” que tuvieron lugar desde fines de la década del noventa del siglo

pasado hasta las actividades más recientes siguiendo las directivas de la Cumbre

Mundial y en particular la Línea de Acción (C10) sobre las “Dimensiones éticas

de la sociedad de la información” a cargo de la UNESCO.

En 2003 la Conferencia General de la UNESCO adoptó una recomendación

concerniente a la “promoción del multilingüismo y el acceso universal al

cyberespacio” estableciéndose que los estados miembros se comprometen en

apoyar el acceso universal a internet como instrumento para la promoción de los

derechos humanos (UNESCO 2003). Un objetivo importante de la UNESCO en

este respecto es la elaboración y adopción de un código global de ética para la

sociedad de la información basado en discusiones y acuerdos regionales. Con

esta finalidad han tenido lugar una serie de encuentros regionales organizados

por la UNESCO.

La primera conferencia regional tuvo lugar en Santo Domingo (República

Dominicana) del 6 al 9 de diciembre de 2006 (UNESCO 2006, FUNGLODE

Page 32: Etica de la Información

2008). Participaron en ella expertos de unos diez países latinoamericanos. Se

discutieron temas como la accesibilidad, la confidencialidad, los derechos de

propiedad intelectual, la promoción del respeto de los valores y principios

fundamentales y la protección de la privacidad. Los participantes produjeron la

“Declaración de Santo Domingo” en la que se recomienda entre otras cosas la

protección de la privacidad y los datos personales, ampliar el dominio público

de la información, dar acceso equitativo a la información y a los conocimientos,

mejorar el acceso a la educación y capacitar a los jóvenes en TIC.

La primera conferencia africana de ética de la información tuvo lugar del 5 al

7 de febrero de 2007 en Pretoria, Sudáfrica con el apoyo del Department of

Communications de Sudáfrica y bajo los auspicios de la UNESCO. Los

organizadores fueron la Universidad de Pretoria, la Universidad de Wisconsin-

Milwaukee, la Universidad de Pittsburgh y la Universidad de los Medios de

Stuttgart representada por el International Center for Information Ethics.

Participaron unos 100 académicos, entre ellos colegas de más de 20 países

africanos. El slogan de la conferencia fue “La alegría de compartir el

conocimiento”. Las actas de la conferencia fueron publicadas en la revista

International Review of Information Ethics (IRIE). Además se creó un portal

africano de ética de la información (ANIE) y en breve será publicado el “Africa

Reader on Information Ethics” (CAPURRO, et al. 2010). En esta conferencia

fue promulgada una declaración sobre ética de la información en Africa, como

un eslabón más en vistas a la creación del código global de ética de la

información de la UNESCO (UNESCO 2007). La “Declaración de Tshwane” –

Tshwane es el nombre autóctono de Pretoria – afirmó el derecho de las

sociedades africanas para desarrollar una sociedad de la información basada en

la Declaración Universal de los Derechos Humanos así como en un diálogo

africano sobre normas y valores en vistas a hacer realidad los Objetivos de

Desarrollo del Milenio de las Naciones Unidas que son: erradicar la pobreza

Page 33: Etica de la Información

extrema y el hambre, promover la educación universal y la igualdad entre los

géneros, reducir la mortalidad de los niños, combatir el VIH/SIDA, conseguir la

sostenibilildad del medio ambiente y fomentar una asociación mundial. En esta

declaración, inspirada por la visión de la Cumbre Mundial de una “sociedad de

la información centrada en la persona, integradora y orientada al desarrollo” se

recalcó también la importancia de la investigación en el campo de la ética de la

información para un desarrollo sostenible social, económico, técnico, cultural y

político en África.

Del 13 al 14 de setiembre de 2007 la UNESCO, la Comisión Francesa para la

UNESCO y el Consejo de Europa organizaron un encuentro regional sobre

“Ética y derechos humanos en la sociedad de la información” que tuvo lugar en

Estrasburgo (UNESCO 2007d). En la declaración final se recalcó la necesidad

de proclamar principios éticos universales en vistas al respeto de los derechos

humanos en el cyberespacio. Se indicó también la necesidad de la evaluación

ética del impacto social de las TIC y la creación de un foro europeo de

gobernabilidad de internet. Se hizo hincapié especial en los principios éticos de

dignidad y autonomía sobre todo en lo relacionado a la protección de los datos

personales y la vida privada, asegurando al mismo tiempo la libertad de

expresión en internet y la lucha contra la criminalidad. Por último se nombraron

los principios éticos de solidaridad y justicia social en relación a una política de

acceso universal, de incremento de la información en el dominio público, de la

promoción del conocimiento compartido, de la necesidad de buscar un balance

de intereses con respecto a la protección de la propiedad intelectual y la

promoción de expresión de todas las culturas y lenguas en internet (UNESCO

2007d).

Finalmente, la UNESCO, la Comisión nacional vietnamesa para la UNESCO

y otras organizaciones organizaron la Primera Conferencia Regional para Asia y

Page 34: Etica de la Información

la región del Pacífico sobre dimensiones éticas de la sociedad de la información”

en la que participaron 70 delegados oficiales así como miembros de la sociedad

civil y del sector privado. La conferencia tuvo lugar del 12 al 14 de marzo de

2008 en Hanoi (Vietnam). De acuerdo a la UNESCO, esta conferencia fue un

paso importante para identificar temas éticos como accesibilidad,

confidencialidad, privacidad, diversidad y respeto fundamental de los valores

humano (UNESCO 2008). El “Hanoi Statement” sobre dimensiones éticas de la

sociedad de la información está estructurado en tres temas, a saber: el acceso

universal a la información, la libertad de expresión y la protección de la

privacidad. En el tema del acceso universal se indica la necesidad de tener en

cuenta las condiciones de multilingüismo de la región, promoviendo la

expansión en calidad y cantidad del dominio público. En segundo lugar se

recalca la importancia de promover mayor libertad de acceso multiplicando los

canales existentes y trabajando en base a cooperaciones internacionales. En

tercer lugar se señala que existen diferentes concepciones de privacidad en los

diversos países y culturas de la región pero que se reconoce también que la

protección de la privacidad y seguridad individual es un valor universal por lo

que se sugiere introducir este tema en la educación y en la legislación.

Finalmente se rechaza toda forma de cyber criminalidad así como de

pornografía infantil, SPAM y otras formas de “conducta desviada“ (“deviant

behavior” (UNESCO 2007b).

Estas declaraciones revelan, a primera vista, una gran coincidencia con

respecto a ciertos principios y valores éticos sobre todo en relación a los

establecidos en la Declaración Universal de los Derechos Humanos. Pero si se la

analiza más detenidamente, ellas dejan ver puntos de posible disonancia

intercultural como en el caso de la privacidad. Las declaraciones afirman

además la necesidad de que los principios y valores éticos surjan de las

sociedades y culturas concretas, con sus lenguas, sus saberes autóctonos, sus

Page 35: Etica de la Información

condicionamiento económicos y sociales, sus tradiciones religiosas, su entorno

ecológico etc.

Los principios de solidaridad y justicia social tienen una relevancia

especial en las declaraciones de Africa y Latinoamérica. Lo que puede

entenderse, por ejemplo, como “conducta deviada” en la declaración de Hanoi,

será seguramente objeto de interpretaciones y aplicaciones diferentes. Lo mismo

se puede afirmar respecto al tema de la universalidad del acceso, del

multilingüismo. Principios como la autonomía y la dignidad del individuo, si

bien se encuentran en la mayoría de las declaraciones, están en el centro de la

declaración de Estrasburgo. Ellos también requieren un análisis intercultural a

fin de evitar conflictos subyacentes que aflorarán en casos concretos, faltando

entonces los fundamentos para un pasaje de una cultura a otra (Braidotti 2006).

Una declaración universal de ética para la sociedad de la información que aspire

a tener un impacto real en la vida, es decir en el ethos cultural de las sociedades,

necesita de forma imprenscindible un análisis intercultural ético-informacional

crítico y sostenible.

4 EII EN LATINOAMÉRICA Y EL CARIBE

4.1 Mistica

Uno de los pioneros en el campo EII en Latinoamérica, si bien no

utilizando este concepto que fue acuñado en la conferencia de Karlsruhe en 2004

(CAPURRO, 2007 et al.), fue la comunidad virtual MISTICA (Metodología e

Impacto Social de las Tecnologías de Información y Comunicación en América)

creada y coordinada por Daniel Pimienta. El contexto cultural latinoamericano

se manifiesta especialmente en el documento final “Trabajando la internet con

Page 36: Etica de la Información

una visión social” (MISTICA, 2002; PIMIENTA, 2007). En este documento la

red es vista no sólo como un asunto técnico o comercial sino primariamente

social. Los autores enfatizan la apropiación de la internet con la finalidad de la

transformación de las sociedades latinoamericanas “guiadas por valores

comunes como relaciones más equitativas, menos discriminatorias y que

promuevan la igualdad de oportunidades.” El tan discutido concepto de “brecha

digital” es visto como un asunto que debe abordarse colectivamente y que

concierno no sólo la estructura técnica sino la capacidad para usar internet con

vistas a mejorar las condiciones de vida y las relaciones de apoyo mutuo. Se

trata entonces de transformar las “brechas sociales” que se reflejan de diversas

maneras en la “brecha digital”. Se enfatiza además el rol de la internet para

generar conocimientos relevantes en contextos concretos y en su poder para una

transformación social de los mismos. Esta visión nace desde el suelo histórico y

social latinoamericano.

Pimienta es autor de numerosas publicaciones sobre ética de la

información entre las cuales quisiera resaltar la Coordinación del libro colectivo:

“Palabras en Juego: Enfoques multiculturales sobre las sociedades de la

información” (PIMIENTA, 2005) un libro de acceso libre en el que se encara

una amplitud de temas como el gobierno de internet, la diversidad cultural, el

acceso universal, expresión ciudadana, comunidades virtuales, bibliotecas

digitales, gestión de saberes, educación, derechos humanos, delito informático,

derechos de la comunicación, piratería, software libre y los desafíos del

multilingüismo (UNESCO 2003). Si bien en este libro el tema de la

interculturalidad es casi omnipresente, no se trata el problema de la ética de la

información desde un enfoque intercultural.

Page 37: Etica de la Información

4.2 Santo Domingo y Redes Latinoamericanas de EI

Entre las valiosas contribuciones a la conferencia regional de Santo Domingo

en 2006 quisiera destacar la de Ernesto Rodríguez sobre “Jóvenes, ética y

sociedad de la información en América Latina y el Caribe. La experiencia del

proyecto “Infoética en el Portal de la Juventud” (Rodríguez 2008). El “Portal de

Juventud de América Latina y el Caribe” es una experiencia piloto que merece

ser tomada como ejemplo para otras regiones del mundo. Este portal incluye un

proyecto “Infoética y Prevención del VIH-SIDA” cuyo impacto es admirable y

digno de ser tomado como ejemplo para otras regiones. Rodríguez escribe:

La ética importa mucho a todos los sectores poblacionales, pero los

jóvenes y las mujeres tienen – en este sentido – sensibilidades muy

particulares.

Las mujeres son más consecuentes que los hombres entre lo que se

dice desde la teoría y lo que se hace desde la práctica, mientras que los

jóvenes actúan mucho más radicalmente desde la ética que los adultos.

En ambos casos, el vínculo con la práctica del voluntariado social es –

históricamente – tan evidente como relevante.

Estamos – en todo caso – ante una práctica sumamente relevante para

la difusión de posturas éticas ante la vida, y América Latina tiene una

larga y fecunda tradición de trabajo en estos dominios. El Encuentro

Internacional “Movilizando el Capital Social y el Voluntariado en

América Latina”, celebrado en Santiago de Chile en mayo de 2003

(reuniendo a miles de delegados de todo el continente) mostró una

buena parte de dichas experiencias. (RODRÍGUEZ, 2008, 207-208)

Es claro que estas reflexiones en las que se habla de ‘ética’ pero que se

refieren a una moral o ethos, se hacen desde un contexto socio-cultural

específico como es el de Latino América y el Caribe. Una EII tiene que analizar

Page 38: Etica de la Información

estos presupuestos en forma detallada y diferenciada y conectarlos al impacto de

las TIC. Un aporte en este sentido es el de Francisco Mannuzza “Las culturas

indígenas venezolanas en el ciberespacio: reflexiones éticas” que parte de un

“reconocimiento del otro” en el sentido de atender “no la brecha digital, sino la

diferencia cultural” en relación a una población de unos 500 mil indígenas en

Venezuela (Mannuzza 2008, 231). Es claro que estos proyectos políticos

necesitan de un análisis ético-intercultural sólido. En su aporte a esta

conferencia, Anabella Giracca indica que

… la mayoría de países de América Latina son producto de una

historia que ha puesto obstáculos en el camino a la comprensión de

una realidad plural, basándose en propuestas que varían desde el

mestizaje, la homogeneización, la asimilación y la integración de los

diversos pueblos a una visión “occidental” o “modernizada”.

(GIRACCA, 2008, 82)

Y se pregunta además:

¿Cómo hablar de ética de la información en América Latina sin

evaluar interculturalmente el lenguaje digital con sus códigos y

símbolos “con los que no cuentan todas las culturas (sobre todo

indígenas)”? (GIRACCA, 2008, 86).

La conferencia de Santo Domingo tuvo como resultado la creación de la

“Red universitaria de ética en el ciberespacio” que se creó casi simultáneamente

a la “Red Latinoamericana de ética de la información” (RELEI). Ambas redes se

complementan y constituyen una base excelente para la comunicación y la

investigación en este campo.

Page 39: Etica de la Información

4.3 EII en Brasil

Tal vez la primera publicación latinoamericana dedicada a la EII es el

artículo de Ana Thereza Dürmaier “Ética Intercultural da Informação e

Sustentabilidade” (DÜRMAIER 2008). Dürmaier introduce la idea de

sostenibilidad de sociedades post-industriales que exigen

… una plasticidad interactiva de racionalidades a fin de poder

enfrentar el universo de nuevas preguntas éticas, políticas y legales

que se acumulan diariamente en las prácticas científicas,

empresariales, sociales y gubernamentales, en la vida pública y en la

vida privada. (DÜRMAIER, 2008, 115, mi traducción).

La EII tiene que tener como objetivo esta “plasticidad” en el plano ético.

Hay valiosos aportes interdisciplinarios brasileros sobre la cultural digital

como por ejemplo el libro editado por Henriette Ferreira Gomes, Aldinar

Martins Bottentuit y Maria Odaisa Espinheiro de Olivera: “A ética na sociedade,

na área da informação e da atuação profissional” (FERREIRA GOMES et al.

2009) así como el de Rodrigo Savazoni “CulturaDigital.BR” (Savazoni 2009).

Ambas publicaciones contienen ricos análisis bibliotecológicos, sociológicos,

políticos, económicos, culturales, artísticos y antropológicos que reflexionan el

estado actual de la cultura digital brasilera. Esta es una excelente base para un

diálogo con la EII.

5 PERSPECTIVAS

En un artículo del filósofo estadounidense John Ladd publicado en 1985

con el título “La búsqueda de un código de ética profesional. Una confusión

Page 40: Etica de la Información

intelectual y moral” (“The Quest for a Code of Professional Ethics. An

Intellectual and Moral Confusion”) escribe Ladd que la idea de un “código de

ética” (“code of ethics”) es una contradicción puesto que la ética es

esencialmente problemática (LADD, 1985). Lo que se puede codificar son

principios éticos entendidos como resultado temporario de una argumentación y

no establecidos por un mero consenso o “decision-making”. Para evitar

malentendidos es mejor usar el término de “códigos de práctica” (“codes of

practice”) lo cuales tienen sus pros y contras como es el caso, por ejemplo, de

códigos profesionales que pueden ser utlilizados tanto para promover una nueva

conducta como para provocar estado de autocomplacencia que incluso ayude a

ocultas conductas irresponsables. En algunos casos pueden servir incluso para

desviar la atención de los problemas realmente serios para concentrarla en

problemas de menor importancia. Lo contrario se podría pensar con respecto a

códigos universales que puedan también ser utilizados para provocar un estado

social de autocomplacencia así como para desviar la atención de los problemas

concretos y de mayor importancia.

El desafío ético no se restringe a crear un código sino a promover la

reflexión a nivel global y local sobre temas cuya complejidad no puede reducirse

a principios generales sino que requiere una interpretación constante de los

mismos cuando se trata de ponerlos en práctica (SCHWARZ, 1979). En otras

palabras, los principios aparentemente claros y objetivos se vuelven dogmáticos

si no son insertados en una reflexión ética prudencial. La prudencia es el

horizonte de alguien que es consciente de sus límites. Ella delimita el anti-

criterio ‘todo está permitido’ haciéndonos conscientes de situaciones

ambivalentes y evita que busquemos soluciones simplistas así como de pensar

que dos alternativas contradictorias pueden unificarse sin más. Una reflexión

ética prudencial tiene también como función la de despertar y preservar la

Page 41: Etica de la Información

sensibilidad ética, algo que es bueno promover a nivel local y global. Tal es la

tarea práctica más noble de la EII.

Necesitamos más que nunca un espacio abierto para compartir no sólo

local- sino también globalmente este tipo de reflexión. Es este el sentido más

profundo del término ‘ética global de la información’ entendida no como la

globalización de una moral y su codificación, sino como un espacio y un tiempo

que se puede crear en diversos contextos como el político, el académico, en las

escuelas, en de los medios de comunicación de masas y naturalmente en

internet. Esto presupone una concepción de la reflexión ética no limitada a la

fundamentación de normas morales dadas sino también a su problematización,

abierta a la interacción de las mismas con otras dimensiones de la vida social. Se

trata también de buscar no sólo normas sino formas de vida común que nos

permitan promover la variedad y la riqueza de las respuestas humanas a la

llamada del ser-en-el-mundo desde diferentes afectos fundamentales expresados

particularmente en la música, el arte y la literatura.

La EII tiene que asumir la responsabilidad de abrir una reflexión sobre

visiones y opciones de vida partiendo de los desafíos de un mundo que se une y

se separa cada día más intensamente en base a la comunicación digital. Pero esta

reflexión perdería su carácter propio de reflexión si se la identifica a la política y

la acción social. Su vínculo con la acción es el consejo prudencial no el

‘decision-making’.

Me permito terminar mencionando el libro “A Urgência da Teoria”, una

compilación de textos editados por la Fundação Calouste Gulbenkian y el Fórum

Cultural “O Estado do Mundo” que se abre con una conferencia de Homi

Bhabha, director del Centro de Humanidades de la Universidad de Harvard y

renombrado especialista en interculturalidad. Esta conferencia titulada “Ética e

Page 42: Etica de la Información

Estética do Globalismo: Uma Perspectiva Pós-Colonial” (BHABHA, 2007) hace

eco al espíritu de “insatisfacción” y de “duda global” de la poetisa Adrienne

Rich (RICH, 1991). Bhabha propone “una ética global de extensión de la

“hospitalidad” a aquellos que perdieron su lugar de pertenencia debido a un

trauma histórico, a la injusticia, al genocidio y a la muerte” (“uma ética global

de extensão da “hospitalidade” àqueles que perderam o seu lugar de pertença

devido ao trauma histórico, à injustiça, ao genocídio e à morte” Bhabha 2007,

44, mi traducción).

La ética intercultural de la información debe ser una ética hospitalaria no

sólo con respecto a las culturas con sus normas y principios morales sino

también con respecto a quienes han perdido pie en una cultura, quedando

marginados, olvidados, en medio de una sociedad globalizada por la tecnología

digital. La EII toma una posición crítica respecto a todas las formas de

destrucción del habitar, y el ‘habitat’, humano tanto de las que usan para ello a

las TIC como a las que excluyen a otros de su uso. La EII es una disciplina

humanística. “Las humanidades “ escribe Bhabha, “contribuyen en forma

singular a establecer – por medio del diálogo y la interpretación – comunidades

de intereses y climas de opinión.” (Bhabha 2010).

Resumiendo podemos decir que los desafíos téoricos y prácticos de la

ética intercultural de la información son de gran envergadura. Ellos necesitan un

amplio apoyo en las instituciones de educación e investigación con un esfuerzo

particular en crear redes locales y globales que permitan el intercambio abierto

de ideas y resultados. Es imprescindible también que los códigos internacionales

de ética de la información sean objeto de un constante análisis téorico y práctico.

La búsqueda de principios comunes no debe perder de vista la complejidad y

variedad de las culturas. Y éstas deben ser conscientes de su interdependencia la

cual les permite una transformación de sus identidadades. Lo esencial es aquello

Page 43: Etica de la Información

que está entre las culturas. Los fenómenos, a menudo violentos, de exclusión

cultural son un indicio de que un ethos cultural ha perdido el contacto con la

fuente común, cerrándose en sí mismo, incapaz de redefinir sus fronteras

tomando nuevos elementos ajenos en base a procesos comunicacionales e

informacionales abiertos. Es fácil ver que la unidad que supone dicha apertura y

la variedad reclamada por las diversas culturas están en permanente fluctuación.

La ética intercultural de la información tiene como objetivo primordial hacer

que dicha fluctuación sea sostenible tanto en la teoría como en la práctica.

Agradecimiento

El autor agradece a Oscar Krütli (Prov. de Córdoba, Argentina) y a José María

Díaz Nafría (Universidad de León, España) por sus invalorables críticas a este

texto.

REFERÊNCIAS

ANIE (Africa Network for Information Ethics). Disponível em

<http://www.africainfoethics.org/index.html>.

BHABHA, Homi K. Humanities Center at Harvard: Director’s Letter. 2010.

Disponível em: <http://www.fas.harvard.edu/~humcentr/about/directorsletter.shtml>.

BHABHA, Homi K. Ética e Estética do Globalismo: Uma Perspectiva Pós-Colonial. En

Fundaçao Calouste Bulbenkian y Fórum Cultural O Estado do Mundo (Eds.): A Urgência da

Teoria. Lisboa: Ed. Tinta-da-china, 2007. pp. 21-44.

BAIER, Karl. Welterschliessung durch Grundstimmungen als Problem interkultureller

Phänomenologie. En Daseinsanalyse 22, 99-109. 2006.

BOSS, Medard. Grundriss der Medizin und der Psychologie. Bern: Huber. 1975.

Page 44: Etica de la Información

BRAIDOTTI, Rosi. Transpositions. On nomadic Ethics. Cambridge, UK: Polity Press. 2006.

BREY, Philip. Global Information Ethics and the Challenge of Cultural Relativism. In:

European regional Conference on the “ethical dimensions of the information society”. 2007.

Disponível em: http://portal.unesco.org/ci/en/ev.php-

URL_ID=25455&URL_DO=DO_TOPIC&URL_SECTION=201.html

BROODRYK, Johann. Ubuntu: Life lessons from Africa. Ubuntu School of Philosophy.

Pretoria, 2nd. Print. National Library of South Africa. 2002.

CAPURRO, Rafael. Ethik der Informationsgesellschaft. Ein interkultureller Versuch. En:

Jahrbuch Deutsch als Fremdsprache – Intercultural German Studies. Munich: iudicium

Verlag, 2010. (en prensa). http://www.capurro.de/parrhesia.html

CAPURRO, Rafael. Digital Ethics. En Proceedings del 2009 Global Forum Civilization and

Peace. The Academy of Korean Studies and Korean National Academy for UNESCO (Eds.),

2009. pp. 207-216.

CAPURRO, Rafael. Intercultural Information Ethics. In: Kenneth Einar Himma and Herman

T. Tavani (Eds.): Handbook of Information and Computer Ethics. New Jersey: Wiley,

2008, pp. 639-665.

CAPURRO, Rafael (2006).Towards an Ontological Foundation of Information Ethics. In:

Ethics and Information Technology, v.8, n. 4, pp. 175-186.

CAPURRO, Rafael. Privacy. An Intercultural Perspective. En Ethics and Information

Technology 7 (1), pp. 37-47. 2005. Disponível em: <http://www.capurro.de/privacy.html>.

CAPURRO, Rafael. Angeletics – A Message Theory. En Hans H. Diebner, Lehan Ramsay

(Eds.): Hierarchies of Communication. An inter-institutional and international symposium on

aspects of communication on different scales and levels. ZKM - Center for Art and Media,

Karlsruhe: Verlag ZKM 2003. pp. 58-71. Disponível em:

<http://www.capurro.de/angeletics_zkm.html>

Page 45: Etica de la Información

CAPURRO, Rafael. Information. Ein Beitrag zur etymologischen und ideengeschichtlichen

Begründung des Informationsbegriffs. Munich: Saur. 1978. <http://www.capurro.de/info.html

CAPURRO, Rafael; Bothma, Theo; Britz, Johannes; Coetzee, (Eds.). Africa Reader on

Information Ethics. Pretoria. 2010

CAPURRO, Rafael; Britz, Johannes. In search for a global information ethics: the road ahead

and new horizons. In: Ethical Space 2010. (en prensa).

CAPURRO, Rafael; Frühbauer, Johannes; Hausmanninger, Thomas (Eds.). Localizing the

Internet. Ethical aspects in intercultural perspective. Munich: Fink. 2007.

CARBO, Toni and Smith, Martha M. Global information ethics: Intercultural perspectives on

past and future research. Journal of the American Society for Information Science and

Technology. Vol. 59, no. 7, pp. 1111-1123. 2008.

DAMASIO, Antonio. Descartes’ Error: Emotion, Reason, and the Human Brain. Putnam

Publishing. 1995.

DÜRMAIER, Ana Thereza. Ética Intercultural da Informação e Sustentabilidade. Kalagatos –

Revista de Filosofia, 5, 9, pp. 107-127. 2008. < Disponível em:

<http://www.uece.br/kalagatos/dmdocuments/V5N9_etica_intercultural_sustentabilidade.pdf

>

ESS, Charles. Culture and Global Networks. Hope for a Global Ethics? In: Jeroen van den

Hoven and John Weckert (Eds.): Information Technology and Moral Philosophy.

Cambridge University Press, 2008. pp. 195-225.

ESS, Charles. Ethical pluralism and global information Ethics. Ethics and Information

Technology, 8, pp. 215-226. 2006.

FEILHAUER, Matthias y Zehle, Soenke (Guest Editors). Ethics of Waste in the Information

Society. International Review of Information Ethics (IRIE), Vol. 11. 2009. Disponível em:

Page 46: Etica de la Información

<http://www.i-r-i-e.net/current_issue.htm>

FERREIRA Gomes, Henriette, Martins Bottentuit, Aldinar y Espinheiro de Oliveira, Maria

Odaisa (Eds.). A ética na sociedade, na área da informação e da atuação profissional.

Brasilia, DF: Conselho Federal de Biblioteconomia, 2009.

FLORIDI, Luciano. Information Ethics and Globalization. En Proceedings del 2009 Global

Forum Civilization and Peace. The Academy of Korean Studies and Korean National

Academy for UNESCO (Eds.), 2009. pp. 217-230

FLORIDI, Luciano. Information Ethics. Its Nature and Scope. En: Jeroen van den Hoven y

John Wecker (Eds.): Information Technology and Moral Philosophy. Cambridge

University Press, 2008. pp. 40-65.

FROEHLICH, Thomas. A brief history of information ethics. 2004. Disponível em:

<http://www.ub.es/bid/13froel2.htm>

FROESE, Katrin. Nietzsche, Heidegger and Daoist Thought. Crossing Paths In-Between.

State University of New York Press. 2006.

FUNGLODE (). Primera conferencia regional, latinoamericana y del Caribe sobre infoética en

el ciberespacio. Santo Domingo: Ed. Funglode, 2008. Disponível em:

<http://www.redciberetica.org/documentos?func=startdown&id= 1>

GLOBAL Ethics Foundation. Disponível em: <http://www.weltethos.org/dat-english/03-

declaration.htm#prinzipien>

Globeethics.net. Disponível em: <http://www.globethics.net/web/guest/home>

GIRACCA, Anabella (). El acceso a la información en países culturalmente diversos. En:

Primera conferencia regional, latinoamericana y del Caribe sobre infoética en el ciberespacio.

Santo Domingo: Ed. Funglode., 2008. pp. 79-87. Disponível em:

<http://www.redciberetica.org/documentos?func=startdown&id= 1>

Page 47: Etica de la Información

HEIDEGGER, Martin. 13 ed. Sein und Zeit. Tübingen: Niemeyer, 1976) (.)

HIMMA, Kenneth Einar (). The intercultural ethics agenda from the point of view of a moral

objectivist. Journal of Information, Communication & Ethics in Society, 6, 2, pp. 101-

115. 2008.

HIMMA, Kenneth Einar and Tavani, Herman T. The Handbook of Information and

Computer Ethics. Hoboken, New Jersey: Wiley. 2008.

HIRUTA, Kei. What pluralism, why pluralism, and how? A response to Charles Ess.

Ethics and Information Technology, 8, 2006. pp. 227-236.

HONGLADAROM, Soraj. Analysis and justification of privacy from a Buddhist perspective.

En Soraj Hongladarom y Charles Ess (Eds.): Information Technology Ethics: Cultural

Perspectives. Hershey: Pennsylvania, 2007. pp. 108-122.

HONGLADAROM, Soraj and Ess, Charles (Eds.). Information Technology Ethics: Cultural

Perspectives. Hershey: Pennsylvania. 2007.

ICIE International Center for Information Ethics. Disponível em: <http://icie.zkm.de>

IGEA International Global Ethics Association. Disponível em: <http://www.igea.ugent.be/>

INSEIT International Society for Ethics and Information Technology. Disponível em:

<http://www4.uwm.edu/cipr/collaborations/inseit/>

IRIE International Review of Information Ethics. Proceedings of the ICIE Symposium 2004.

Disponível em: <http://www.i-r-i-e.net/issue_2.htm>

JULLIEN, François (). Dépayser la pensée: un détour par la Chine. Propos recueillis par

François Ewald et Emanuel Oppenheim. Magazine littéraire, Paris, n. 398, pp. 98-103. 2001.

KITIYADISAI, Krisana. Privacy rights and protection: foreign values in modern Thai

context. Ethics and Information Technology, 7, pp. 17-26. 2005

Page 48: Etica de la Información

LADD, John. The quest for a code of professional ethics: an intellectual and moral confusion.

In Deborah G. Johnson and J. W. Snapper (Eds.). Ethical Issues in the Use of Computers.

Belmont, CA: Wadsworth, 1985. pp. 8-13.

LEVINAS, Emmanuel. Totalité et infini. Essai sur l’extériorité. The Hague: M. Nijhoff.

1965.

LÜ, Yao-Huai (). Privacy and data privacy in contemporary China. Ethics and Information

Technology, 7, pp. 7-15. 2005.

MANNUZZA, Francisco (). Las culturas indígenas venezolanas en el ciberespacio:

refléxiones éticas. En: Primera conferencia regional, latinoamericana y del Caribe sobre

infoética en el ciberespacio, Santo Domingo: Ed. Funglode, 2008. pp. 225-234. Disponível

em: <http://www.redciberetica.org/documentos?func=startdown&id= 1>

MISTICA. Working the Internet with a social vision. 2002.

<http://www.funredes.org/mistica/english/cyberlibrary/thematic/eng_doc_olist2.html>

NAKADA, Makoto y Tamura, Takanori. Japanese conceptions of privacy: an intercultural

perspective. Ethics and Information Technology, 7, pp. 27-36. 2005

OLINGER, Hanno N., Britz, Johannes J. y Olivier, Martin S. Western privacy and ubuntu:

influences in the forthcoming data privacy bill. En Philip Brey, Frances Grodzinsky y Lucas

Introna (Eds.): Ethics and New Information Technology, CEPE (Computer Ethics:

Philosophical Enquiry), Enschede, The Netherlands, pp. 291-306. 2005.

OBJETIVOS de desarrollo del Milenio. Disponível em:

<http://www.un.org/spanish/millenniumgoals/>

ORTEGA Y GASSET, José. Ideas y creencias. Madrid: Espasa-Calpe (publicada en 1942).

1986.

Page 49: Etica de la Información

OVIEDO (). The Council of Europe Convention on Human Rights and Biomedicine. 1997.

Disponível em: <http://www.coe.int/DefaultEN.asp>

PIMIENTA, Daniel. At the Boundaries of Ethics and Cultures: Virtual Communities as an

Open Ended Process Carrying the Will for Social Change (the “MISTICA” experience. En:

Capurro, Rafael; Frühbauer, Johannes; Hausmanninger, Thomas (Eds.). Localizing the

Internet. Ethical aspects in intercultural perspective. Munich: Fink, 2007. pp. 205-228.

PIMIENTA, Daniel (). Coordinación del libro colectivo: Palabras en Juego: Enfoques

multiculturales sobre las sociedades de la información, 2005, C&F Editions. 2005. Disponível

em: <http://vecam.org/article.php3?id_article=697&nemo=edm>

PORTAL de Juventud de América Latina y el Caribe. Disponível em:

<http://www.jovenesclac.org>

RED universitaria de ética en el ciberespacio. Disponível em:

<http://www.redciberetica.org/>

RED Latinoamericana de Ética de la Información (RELEI). Disponível em:

<http://redeticainformacion.ning.com/>

RICH, Adrienne. An Atlas of the Difficult World. New York: Norton. 1991

RODRÍQUEZ, Ernesto. Jóvenes, ética y sociedad de la información en América Ltina y el

Caribe. La expereiencia del proyecto “Infoética en el Portal de la Juventud. En: Primera

conferencia regional, latinoamericana y del Caribe sobre infoética en el ciberespacio, Santo

Domingo: Ed. Funglode, 2008. pp. 203-222. Disponível em:

<http://www.redciberetica.org/documentos?func=startdown&id= 1 >

SAVAZONI, Rodrigo (Ed.) (). CulturaDigital.Br. 2009.

<http://culturadigital.br/blog/2009/09/26/baixe-o-livro-culturadigital-br/>

SCHWARZ, Stephan (). Research, integrity and privacy. Notes on a conceptual complex,

Social Science Information, v.18, n.1, pp. 103-136. 1979.

Page 50: Etica de la Información

UNESCO () Ethical dimensions of the information society: Asia-Pacific Conference opens

this week in Hanoi. 2008. Disponível em: <http://portal.unesco.org/ci/en/ev.php-

URL_ID=26178&URL_DO=DO_TOPIC&URL_SECTION=201.html>

UNESCO . Conference on ethics of the information society opens today in Pretoria. 2007.

Disponível em: <http://portal.unesco.org/ci/en/ev.php-

URL_ID=23930&URL_DO=DO_TOPIC&URL_SECTION=201.html>

UNESCO. Hanoi Statement on the Ethical Dimensions of the Information Society. 2007.

Disponível em: <http://portal.unesco.org/ci/en/files/26324/12067116453Hanoi_Statement_-

_14_Mar_08.doc/Hanoi%2BStatement%2B-%2B14%2BMar%2B08.doc >

UNESCO. European regional Conference on the ethical dimensions of the information

society. Ethics and human rights in the information society. 2007. Disponível em: <

http://portal.unesco.org/ci/en/ev.php-

URL_ID=24772&URL_DO=DO_TOPIC&URL_SECTION=201.html>

UNESCO. European regional Conference on the ethical dimensions of the information

society. Ethics and human rights in the information society. Final Recommendations. 2007.

Disponível em:

<http://portal.unesco.org/ci/en/files/26941/12121514093FinalRecommendations_en.pdf/Final

Recommendations_en.pdf >

UNESCO . UNESCO organizes first Infoethics Conference for Latin America and the

Caribbean. 2006. Disponível em: <http://portal.unesco.org/ci/en/ev.php-

URL_ID=23533&URL_DO=DO_TOPIC&URL_SECTION=201.html>

UNESCO . Promotion and use of multilingualism and universal access to cyberspace. 2003.

Disponível em: <http://portal.unesco.org/ci/en/ev.php-

URL_ID=13475&URL_DO=DO_TOPIC&URL_SECTION=201.html>

Page 51: Etica de la Información

UNESCO . Universal Declaration on the Human Genome and the Rights of Man. 1997.

Disponível em: <http://portal.unesco.org/en/ev.php-

URL_ID=13177&URL_DO=DO_TOPIC&URL_SECTION=201.html>

VAN DEN HOVEN, Jeroen y Weckert, John (Eds.) . Information Technology and Moral

Philosophy. Cambridge University Press. 2008.

WALZER, Michael. Thick and Thin. Moral argument at home and abroad. University of

Notre Dame. 1994.

WITTGENSTEIN, Ludwig . Philosophische Untersuchungen. En L. Wittgenstein:

Werkausgabe I, Frankfurt am Main: Suhrkamp. 1984

WITTGENSTEIN, Ludwig. Zu Heidegger. En B.F. McGuiness (Ed.): Ludwig Wittgenstein

und der Wiener Kreis. Gespräche, aufgezeichnet von Friedrich Waismann. Frankfurt am

Main: Suhrkamp. 1984.

WITTGENSTEIN, Ludwig. Vortrag über Ethik. Frankfurt am Main: Suhrkamp. 1989.

WONG, Pak-Hang. What Should we Share? Understanding the Aim of Intercultural

Information Ethics. En Maria Bottis (Ed.): 8th International Conference Computer Ethics:

Philosophical Enquiry. Ionian University: Department of Archive and Library Sciences,

Department of Informatics, INSEIT. Athens: Nomiki Bibliothiki, pp. 873-884. 2009.

Disponível em: <http://bentham.k2.t.u-tokyo.ac.jp/ap-cap09/openconf/data/papers/25.pdf >

WSIS (2003/2005). World Summit on the Information Society. Disponível em:

<http://www.itu.int/wsis/index.html>

Page 52: Etica de la Información

TEACHING INFORMATION ETHICS

Miguel Angel Pérez Alvarez*

1 ANTECEDENTES

La llegada de primero las “salas” de chat como el MSN, y más tarde de

los blogs, wikis y del microblogging sentaron las bases del intercambio y

colaboración en tiempo real. En La actualidad herramientas como el Buzz o

Twitter, así como el Google Wave, generan oportunidades de trabajo colectivo

de manera sincrónica y por ende de la ubicuidad de la colaboración más allá de

las fronteras espaciales.

Esta revolución técnica que parece interminable, pese a las teorías de

Moore y similares en torno a los límites de la evolución de la tecnología

informática, trae aparejada una vasta cantidad de situaciones que impactan de

manera directa la manera en la que se producen las experiencias de aprendizaje.

Más allá de la visión corta o larga de los profesores, los estudiantes

colaboran y trabajan en línea sin importar si sus maestros aprueban esas formas

de intercambio y trabajo en grupo. Ello trae como consecuencia dos niveles de

reflexión: aquel que corresponde a las implicaciones para el ambiente de

aprendizaje y aquellas que tienen que ver con el ejercicio del control y del poder

dentro del aula por parte del maestro )y el corresponidente impacto en el primer

nivel, el del apreindizaje).

Page 53: Etica de la Información

2 COMUNIDADES EPISTÉMICAS

Este paper busca esclarecer la forma en la que las comunidades

epistémicas entrenan a los nuevos miembros en la adopción de un paradigma,

entendido en una de sus acepciones como la adopción de un marco axiológico

de una práctica científica. Tal adopción implica una forma práctica de la ética y

el establecimiento de un marco de valores que evidencia una preferencia de una

ética específica, la ética científica específica de cada comunidad epistémica.

El ambiente de aprendizaje en línea o en el ciberespacio es más que un

ecosistema. Es en términos metafóricos, es un entorno distinto del natural pues

las leyes que regulan su entropia o su equilibrio distan de parecerse a aquellas

que los biólogos y ecologos identifican como propios de un sistema

medioambiental. Por esta razón la organización, gestión e higiene de las

relaciones que se gestan administran, construyen y evalúan en un ambiente de

aprendizaje en línea o ciberambiente de aprendizaje requieren de un nuevo

modelado, concepción, legalidad, categorización.

Más allá de ser concebidos exclusivamente como repositorios de

información, los ciberambientes de aprendizaje exigen ser concebidos como un

refectorio de experiencias significativas pues quienes se acercan a través de

Internet a una experiencia de aprendizaje experimentarán en la soledad de su

habitación u oficina (o cualquiera que sea el espacio físico en el que se ubique la

computadora con la cuál acceden a un determinado ciberambiente de

aprendizaje) la sensación es similar a la de un monje que en silencio absoluto

come en la compañía de otros monjes. Como en los refectorios de los

monasterios benedictinos aparenterá a cualquier testigo que lo observe una

actitud hipnótica frente a una oferta variada de sabores y olores. El actual

estudiante que se adentra en una educación basada en ciberespacios de

Page 54: Etica de la Información

aprendizaje se muestra frente al testigo imparcial como un ser hipnotizado frente

a una pantalla. (TURKLE, 1995).

La vida en la pantalla de S. Turkle nos recuerda que este proceso

constituye una revolución cultural. Para mi es solamente la parte externa de una

experiencia infinitamente trascendente y similar a las de aquellos que se

enfrentaron por primea vez a un texto escrito y leyeron en silencio, sin mover

los labios y sin pasar el dedo por el renglón. Los primeros testimonios refieren a

este espectáculo como el de un ser hipnotizado. Pero los procesos intelectuales

más trascendentes son en apariencia (para un testigo) un simple acto de hipnósis,

mientras que para el protagonista son en realidad un rico y variado conjunto de

experiencias intelectuales en la que los procesos vividos al leer y realizar una

actividad desplegada mediante una computadora puede transformar su visión del

mundo, su habilidad para representar la realidad en su mente y las aptitudes que

este actor desarrolla en todo proceso intelectual.

El acto personalísimo de interacción con las actividades intelectuales que

se realizan con ayuda de una computadora conectada a la red de redes, implica

también un nivel de interacción social que aparentemente desaparece cuándo la

relación está mediada por una pantalla y un teclado. Quienes desarrollan

actividades en red colaboran de manera silenciosa. En ocasiones están frente a

frente físicamente, pero el correo electrónico, el chat o el acto de colaboración

instantáneo (como el Google Wave) los hace aparecer como distantes o

incomunicados.

La experiencia de colaboración en redes informáticas que vivimos desde

mediados de los noventa nos ha permitido analizar el papel que juegan los

valores compartidos (la “ética” en sentido lato) para este tipo de comunidades

que surgen alrededor de un interés común en Internet.

Page 55: Etica de la Información

3 EL CASO DE MISTICA

El caso prototípico en América Latina lo representa MISTICA, una red de

especialistas e interesados en la medición del impacto de las nuevas tecnologías

en la sociedad latinoamericana y caribeña. Durante más de diez años (1998-

2008) se desarrollaron en línea discusiones y proyectos que buscaban dotar a la

región de una visión pertinente sobre como gestionar el impacto de las nuevas

tecnologías en temas tan relevantes como el desarrollo sustentable, la salud, la

educación y las relaciones sociales. Con el patrocinio de organismos

internacionales y aganecias para el desarrollo, MISTICA produjo diversas

aplicaciones y enfoques relevantes para el desarrollo de una metodología de

análisis y gestión del impacto tecnológico.

Sin embargo uno de los efectos más relevantes y, por su naturaleza

intangible, menos estudiados de esta comunidad virtual es el papel que cumplió

como escaparate para identificar el código de ética no escrito que sirvió de base

para su construcción, funcionamiento, consolidación y desaparición como

comunidad epistémica.

Thomas S. Kuhn, el filósofo de la ciencia inglés, describió en sus obras,

especialmente en la Estructura de las Revoluciones Científicas (KUHN,207), el

papel que tiene en la construcción de un paradigma científico el código de ética

de una comunidad epistémica. Este, el paradigma, establece que porblemas es

pertinente plantear a la comunidad como dificultades a resolver y qué prácticas

epistémicas es pertinente realizar, desde que se genera o expresa una teoría hasta

que se dispone o despliega un experimento mental para confirmarla.

En el caso de MISTICA (cuyos debates y discusiones son asequibles en

línea: http://funredes.org ) es interesante revisar cómo las discusiones sobre

temas metodológicos y tecnológicos llevan implícita una discusión ética que

Page 56: Etica de la Información

tiene que ver sobre la pertinencia de las intervenciones, preguntas, soluciones y

consultas a la comunidad. El papel del moderador se transforma así en la de un

responsable de la observancia de ese código no escrito y contribuye a que la

propia comunidad epistémica se transforme en garante de la operación y éxito de

la comunidad.

Es curioso que a lo largo de los años, las discusiones celebradas por los

miembros de esta comunidad tenían en ocasiones referencias explicitas a la

pertinencia de las participaciones y al papel del moderador, más allá del

contenido mismo de esas participaciones. Una suerte de metaparticipaciones que

subyacía a la acción concreta de la discusión sobre los temas de la comunidad.

El último esfuerzo que realizó MISTICA cara a su autosustentabilidad fue

la de convertirse en una comunidad virtual de aprendizaje que sirviera como

modelo para la creación y gestión de una comunidad eìsteémica. Y se dieron

pasos relevantes como la ceración del Centro Virtual de Aprendizaje. La

carencia de financiamiento acabó por destruir ese esfuerzo, pero la intención

marca una camino por desarollar en la región.

4 CONCLUSIONES

La relevancia de contar con una comunidad virtual de aprendizaje al

interior de uma comunidad epistémica virtual es que garantiza y, al mismo

tiempo, posibilita un espacio para el desarrollo del criterio moral propio de toda

comunidad epistémica y que cad miembro adscrito debe desarrollar como

condición sine qua non.

Sin un nivel ético es imposible que ninguna comunidad epistémica

sobreviva pues toda práctica científica se desarrolla a través y a partir de ese

Page 57: Etica de la Información

elemento fundamental de un paradigma científico. Ello implica también a las

comunidades epistémicas (en sentido lato y no estricto) que se construyen,

interactúan y desarrollan su tarea académica en línea, de manera virtual o de

manera no presencial.

REFERÊNCIAS

Kuhn, Thomas, S. La Estructura de las Revoluciones Científicas. México, Fondo de

Cultura Económica, 2007.

Turkle, Sherry. La vida en la pantalla. Barcelona. Paidos transiciones, 1995.

Page 58: Etica de la Información

ÉTICA E OS DILEMAS E IMPASSES DA

INFORMAÇÃO: reflexão sobre a divulgação

científica ou popularização da ciência

Lena Vania Ribeiro Pinheiro*

1 INTRODUÇÃO

Quando somos chamados a discutir temas muito amplos, ao mesmo tempo

em que dispomos de uma miríade de abordagens que se entrecruzam e

perpassam a questão, a dúvida é, entre tantas perspectivas, qual trilhar? Claro

está que a opção sempre se relaciona com os nossos estudos desde sempre e se

apresenta como uma faceta ainda não explorada de assuntos que se arrastam pela

nossa vida afora, agora revestidos de novos componentes e cenários

transformados e transformadores. Assim, a abordagem desta comunicação é um

prolongamento de algumas idéias sobre a responsabilidade social na Ciência da

Informação (PINHEIRO, 2009), por sua vez profundamente vinculadas à

relação entre ciência e sociedade, saber e poder, em seus desdobramentos na

informação em Ciência e Tecnologia, tomando para exercício teórico a

divulgação científica ou popularização da ciência.

Na coletânea “Ética e cultura”, Renato Janine Ribeiro (2004) reflete sobre a

palavra poder e sua dupla representação gramatical como substantivo e verbo,

ressaltando alguns de seus aspectos. No primeiro caso poder é “coisa” ou dado

apreendido pelos sentidos, parado e tangível. No segundo, que importa

diretamente a esta comunicação, poder “é uma possibilidade, voltada para o

futuro, de ir-se além do que se é ou se está...”, no sentido de criação. Nessa

Page 59: Etica de la Información

direção, as ações de informação, mais do que a informação por si só estão

impregnadas, ao mesmo tempo, de poder e dessa possibilidade, desse futuro,

portanto, são ações políticas e a ética da política é a da responsabilidade, como

pensa Ribeiro (2004).

Além de tratar das ações de informação e suas fronteiras tecnológicas,

Gonzalez de Gómez (2004), inclui nesse contexto as transformações

ocasionadas por novas relações entre linguagem, tecnologias e informação. A

autora introduz o conceito de “dispositivo de informação” e o define como, “ um

modo de configuração do espaço-tempo ou do tempo que age como uma matriz

organizadora das operações concretas de geração, transmissão e uso de

informação”.

Nas ações de informação o poder, a responsabilidade e a ética são

interdependentes, e uma dessas ações particularmente se afina com o temática

desta comunicação, a divulgação científica. Esta disciplina, por estar fortemente

marcada e demarcada pelas relações entre ciência e sociedade, por sua vez

vinculadas ao poder, ao saber e à responsabilidade, se molda ao exercício teórico

pretendido. A divulgação científica tem por objetivo transmitir à sociedade, ao

público não-especializado (BUENO, 1995), conhecimentos gerados no âmbito

da ciência e tecnologia. Independente das discussões conceituais existentes e

enfocadas anteriormente por Pinheiro, Valério e Silva (2009), principalmente

entre jornalismo científico e divulgação científica, assumimos nesta

comunicação as características que Kreinz (1998), atribui ao primeiro, por

considerarmos válidas também para a divulgação cientifica: política, ideológica,

educativa, econômica, comunicativa, social e cultural, às quais acrescentamos a

informativa. É pois, neste conjunto de atributos que forjam a natureza da

divulgação científica, que pretendemos analisar a ética da informação,

interrelacionada à responsabilidade, predominantemente a social.

A temática deste Simpósio, de atualidade inquestionável, é mais uma

revelação das preocupações que invadem a Ciência da Informação,

Page 60: Etica de la Información

universalmente, presentes tanto na fundação do International Center for

Information Ethics- ICIE, por Rafael Capurro, em 1999, quanto por seus

desdobramentos em diferentes países e campos do conhecimento, aos quais se

junta este Simpósio. Por outro lado, pode ainda traduzir as mudanças de

paradigmas na Ciência da Informação, tal como traçadas por Capurro

(2003).Embora este pesquisador alerte para o que chamou de “simplificação

extrema” frente à “complexidade das proposições” que podem levar a

interpretações equivocadas, a passagem pelos paradigmas físico, cognitivo e

social reflete uma tendência cada vez mais acentuada de “... uma integração da

perspectiva individualista e isolacionista do paradigma cognitivo dentro de um

contexto social no qual diferentes comunidades desenvolvem seus critérios de

seleção e relevância”.

2 O SABER E O PODER E A ÉTICA DA RESPONSABILIDADE

No prólogo da segunda edição de seu livro “Ética y ciencia”, Mario Bunge

(1983) comenta sobre a juventude da época que questionava “a moralidade da

ciência” e atacava as máquinas em geral, particularmente os computadores. As

críticas chegavam ao “extremo de uma franca revolta contra o método científico

e, em geral, contra a cultura e a civilização centradas na ciência”.

Passados quase cinqüenta anos, novas gerações, agora vítimas do

desemprego, das drogas, da exclusão social, dos desastres ecológicos e tantas

outras mazelas do mundo contemporâneo, continuam bradando contra a ciência.

Algumas perguntas presentes nesse texto introdutório de Bunge (1976) não

perderam a atualidade: “O que é certo na crítica à ciência do ponto de vista

ético? O que é justificado na reação contra o modo científico de pensar e

produzir?

Page 61: Etica de la Información

As inquietações de Bunge retomam hoje até com mais intensidade e um

pesquisador brasileiro, Gilberto Dupas (2001), escreve sobre ética e poder na

sociedade da informação, com o objetivo de buscar “uma ética para os novos

tempos, necessária e possível, que possa introduzir o dever onde tudo é poder”.

O autor situa as questões no capitalismo global e alerta para o “estado de

inquietação” do início do século 21, em decorrência sobretudo da

autonomização da técnica, apesar do progresso e triunfo da ciência e assim

explica este sentimento:

as consequências dessa autonomização da técnica com relação aos

valores éticos e normas morais foram, dentre outras, o aumento da

concentração de renda e da exclusão social, o perigo da destruição do

habitat humano por contaminação e de manipulação genética

ameaçando o patrimônio comum da humanidade.

O que Dupas escreve em 2001, Japiassu (1977) já alertava há mais de 30

anos atrás, em artigo intitulado “as máscaras da ciência”, três segundo este

filósofo: ciência-que-conduz-necessariamente-ao-progresso; ciência-pura-e-

imaculada e a ciência sem deontologia. A primeira diz respeito ao julgamento

da ciência pelo valor social de seus resultados; na segunda a ciência é seu

próprio fim, “não tendo que prestar contas a nenhuma instância exterior”; e a

terceira tem relação com o saber gerado na ciência, no qual os fins não têm

relação com os cientistas, que não teriam responsabilidade social, seriam

neutros.

Japiassu (1977) também aborda a temível relação saber e poder, ao

admitir o “vínculo indissolúvel entre ciência e poder”, cujo resultado seria a

tanatocracia da ciência e da técnica:

Não tenhamos ilusão: a ciência hoje possui dois pólos: o saber e o

poder. O saber pelo saber está na base do desenvolvimento da ciência.

Page 62: Etica de la Información

Mas hoje em dia a ciência desempenha um papel tão importante no

desenvolvimento das forças produtivas, que há uma predominância

incontestável do saber para poder. A pesquisa científica e técnica

comanda diretamente o desenvolvimento econômico. (JAPIASSU,

1977)

Se analisarmos algumas questões de hoje identificamos certos alvos desse

questionamento como a biotecnologia, a agroindústria, os transgênicos, a

reprodução humana, entre tantas outros.

Ao refletir sobre o conceito de responsabilidade podemos constatar que

sua elaboração se dá no campo da ética e está fortemente vinculada à liberdade.

Este elo significa que o estudo da responsabilidade implica necessariamente

falar de ética, e como nesta comunicação ciência e tecnologia são o contexto do

debate, por sua vez associadas ao poder, a ética da responsabilidade não pode

ficar à parte num questionamento desta natureza.

O já mencionado Renato Janine Ribeiro (2004) traz uma contribuição

muito oportuna e o título do capítulo que escreve, no livro mencionado, por si só

traduz a sua pertinência aos propósitos desta comunicação – “Ética, ação

política e conflitos na modernidade”. Se o foco deste tema são a ciência e a

tecnologia, inerente ao seu aparato está a política, especialmente a científica e

tecnológica.

No centro da discussão encetada por Ribeiro (2004) está o pensamento de

Maquiavel (ética da responsabilidade, o social como resultante do político), em

contraposição ao de Mandeville (ética dos princípios). A ética da

responsabilidade é “aquela que se aplica à política”, a que tem valor para quem

“age politicamente”, ou mais explicitamente, “levando em conta as relações de

poder, pensando na construção do futuro”, ou “ética da ação política”. Para

Ribeiro (2004), a “política tem a ver com a construção do tempo”, no qual

pesam a duração, a continuidade, ou o efeito e resultados de seus atos que, por

sua vez “compartilham um sentido político”. Segundo o autor, o pensamento de

Page 63: Etica de la Información

Maquiavel é atual e sua atualidade foi ampliada no século XX pelo “caráter

imprevisto, e o criativo, de uma atividade que não tem como se pautar em

normas prévias”. Porque “a política não é mais essencial ou exclusivamente a

que se refere ao poder... exige uma ação criativa” e “não se confina mais no

político em sentido estrito, o das instituições”.

Este autor (RIBEIRO, 2004), em todo o seu texto correlaciona as questões

ao Brasil e faz oportunas observações como a dificuldade, em nosso País, em

associar liberdade e responsabilidade, pelo pensamento da economia

desconectada da política, embora exista a disciplina economia política, como

lembra. Da mesma forma ele afirma que “há enorme dificuldade, na cultura

brasileira, em compreender – ou em aceitar - uma ética da responsabilidade”,

isto é, a ética que “assume a perspectiva do poder”. Esta dificuldade tem

algumas origens, entre as quais uma de caráter mais profundo, que é a de

“entender a ação política”. Para Ribeiro (2004), o desafio é “articular o pessoal

e o social, o ético e o político, o privado e o público).

3 ÉTICA E AÇÃO POLÍTICA

No seu denso livro sobre “O princípio da responsabilidade: ensaio de uma

ética para a civilização tecnológica”, publicado na Alemanha em 1976 e

traduzido no Brasil em 2006, Hans Jonas (2006) percorre uma extensa

argumentação para a sustentação teórica da responsabilidade, fundamentado em

questões ontológicas, especialmente as idéias de Kant, Marx e Hegel. Numa

longa e inicialmente histórica abordagem do tema, ao enfocar a significação da

ética, o autor afirma que “toda ética tradicional é antropocêntrica”.

Como não poderia deixar de ser num estudo sobre essa temática, o caráter

político está presente no questionamento de Jonas (2006) e a projeção no tempo,

traduzido no capítulo “a responsabilidade do estadista com o futuro”, quando

Page 64: Etica de la Información

também inclui o legislador, na “preocupação previdente” de ambos com o “bem

futuro da comunidade”. Este dever para com o futuro trata da reivindicação que

“só surge daquilo que reivindica – daquilo que antes de tudo é”, expresso pela

seguinte declaração: “toda vida reivindica vida” (Jonas, 2006). Do ponto de

vista legal, “o agente deve responder por seus atos: ele é responsável por suas

consequências e responderá por elas, se for o caso”.

Ainda sob esta mesma visão, Jonas (2006) trata da responsabilidade

política e sua extensão para o futuro, estabelecendo uma diferença com a

responsabilidade paterna, para a qual há um tempo de término. A primeira,

considerando o caráter de seu objeto, está “sobrecarregada pelo excesso de

resultados, todos causais em detrimento do conhecimento prévio” e responde,

carrega as conseqüências. A extensão do tempo é vinculada ao imediato, à

necessidade de urgência na resposta

Para o autor, “uma das responsabilidades do homem público é garantir

que a arte de governar continue possível no futuro”, pois o princípio é que “toda

responsabilidade integral, com seu conjunto de tarefas particulares, é

responsável não apenas por cumprir-se, mas por garantir a possibilidade do agir

responsável no futuro”, o que abrange a política econômica, ecológica,

tecnológica, biológica, psicológica, às quais eu acrescentaria a política de

informação.

Esta responsabilidade pelo futuro, para Dupas (2001) se traduz num

“olhar à frente e planejar”, ações das quais são capazes apenas os seres

humanos.

Quanto ao futuro progresso técnico-científico, Jonas (2006) reconhece

uma “zona de penumbra”, daí a dificuldade em vislumbrar as fronteiras da

responsabilidade. Ainda nessa linha de pensamento aponta para o potencial de

destruição da civilização técnica, por ter se tornado “toda -poderosa”. Assim, o

futuro da humanidade teria como condição “sine qua non”, o futuro da natureza,

Page 65: Etica de la Información

e para o autor, o perigo decorre da “dimensão excessiva da civilização técno -

industrial, baseada nas ciências naturais...”

Nessa mesma linha Dupas (2001) reflete sobre a associação de ciência e

técnica, que vem revolucionando e surpreendendo, no entanto, a própria “ciência

vencedora começa a admitir que seus efeitos possam ser perversos”, como se o

ato do saber estivesse se tornando cada vez mais obscuro, pensamento próximo

da “zona de penumbra” de Jonas.

Há uma “ambivalência ética” no progresso técnico, ao atribuir à técnica

a capacidade de transformação do mundo, de determinar as “condições reais e

o modo de vida humano”. Para Jonas (2006), as condições naturais estão

relacionadas ao advento e com “o conteúdo projetado de uma utopia”.

Dupas (2001) evoca ainda o “saber-poder”, que ele denomina “utopia da

potência integral,” que leva todos nós à exigência de “um poder sobre o poder”,

por exigir também uma resposta plena “pelo ser da humanidade futura”. E

naturalmente vem a pergunta que ele se faz a partir de novos referenciais éticos:

quais os papéis da sociedade civil e do Estado, nas sociedades pós-modernas?

Este autor destaca como problema o fato de o Estado, indutor e regulador,

continuar em fase de desmonte nessas sociedades, e questiona se cabe a ele ou à

sociedade civil, por meio dele “definir padrões éticos que condicionem a

aplicação das técnicas e o exercício da hegemonia delas decorrentes”. Diante

desse impasse, como deve agir o cientista? Para Dupas (2001), os cientistas só

devem aceitar uma política de Estado justa, se assim a considerarem, e como

membros da sociedade civil podem em seu nome recusar – este seria o

caminho, segundo ele, para reencontrar a função crítica do saber.

Jonas (2006) não nega o progresso da civilização em todos os campos do

saber humano, acumulado, armazenado pela sociedade e parte do patrimônio

coletivo, não somente da ciência e da técnica, mas de toda a sociedade, aplicado

em diferentes instâncias – social, econômica, política e transmitidos para o bem

da sociedade e qualidade de vida.

Page 66: Etica de la Información

Entretanto, nas sociedades pós-modernas há um paradoxo apontado por

Dupas (2001) porque, “ao mesmo tempo que elas se libertam das amarras dos

valores de referência, a demanda por ética e preceitos morais parece crescer

indefinidamente. A cada momento um novo setor da vida se abre à questão do

dever”. E dando continuidade à suas reflexões Dupas (2001) reconhece que toda

essa discussão remete ao “princípio da responsabilidade”, quando evoca desde

os filósofos clássicos a pensadores contemporâneos como o próprio Jonas.

4 FRAGMENTAÇÃO DO SABER E DA VIDA

A fragmentação do saber conduz à discussão da especialização e, em

contraponto, da inter e transdisciplinaridade, naturalmente com repercussões

na sociedade. Neste tópico são mencionadas ou expostas e analisadas, de forma

sintética, idéias de alguns autores que são mais pertinentes à temática desta

comunicação.

A começar por Jonas ( 2006), muito presente no tópico anterior, para

quem a especialização seria como um prolongamento do progresso, o “preço”

pago pelo aumento do conhecimento e suas “subdivisões e seus métodos

especiais”, chegando à “fragmentação extrema do conhecimento total”.

No ano do lançamento da versão original do livro de Jonas, 1976, a

especialização começava a ser foco de críticas que já vinham a partir da

década anterior. Estudos e pesquisas em torno da questão, como de Piaget

(1960) Gusdorf (1967), Bastide ( 1968), Roqueplo (1970) e Jantsch (1972) Não

constam na lista de referências, foram crescendo em número e intensidade,

apoiados por órgãos internacionais como UNESCO – Organização das Nações

Unidas para a Educação, Ciências e Cultura e OCDE- Organização para

Cooperação e Desenvolvimento Econômico

Page 67: Etica de la Información

Na obra de Morin (2007) sobre o método, dos seis volumes um é dedicado

à ética e neste, no tópico intitulado “O problema de uma democracia cognitiva”,

ele critica a associação ciência e técnica, transformada em tecnociência, bem

como a disciplinaridade das ciências, que “não trouxeram somente as

vantagens da divisão do trabalho, mas também os inconvenientes da

hiperespecialização, do fechamento e da fragmentação do saber”, além do

domínio do conhecimento técnico pelos especialistas.

Este movimento contrário à especialização pode ser exemplificado, no

Brasil, com

Japiassu (1976) e seu famoso livro “Interdisciplinaridade e patologia do saber”.

É bem verdade que para estes esforços teóricos contribuiu a Epistemologia,

disciplina nascente cuja concepção e estatuto são sustentados pela crítica à

ciência.

Mais de 30 anos depois Japiassu (2006) lança outro livro, desta vez sobre

transdisciplinaridade, cujo título, “O sonho transdisciplinar e as razões da

filosofia”, expressa o seu pensamento e bases teóricas. Comparado à sua obra de

1976 sobre interdisciplinaridade, fundamentada e orientada pela Epistemologia,

o conceito de transdisciplinaridade se abre mais para o mundo da vida. O sentido

de saber adotado pelo autor é “mais amplo que o de ciência, não é um

conhecimento objetivo, neutro e universal, mas implica um processo de

apropriação e dominação de objetos” e, para tal, afirma:

não podemos confiar no conhecimento fragmentado nem na simples

apreensão holística. Porque o conhecimento deve efetuar, não só um

movimento dialético entre o nível local e o global, mas o de retroação

do global ao particular.

Japiassu (2006) reconhece que com o desenvolvimento do pensamento

complexo a transdisciplinaridade se tornou mais valorizada e “susceptível de

Page 68: Etica de la Información

instaurar um rico e fecundo diálogo entre as ciências naturais, as humanas e a

filosofia”, e destaca dois desafios contemporâneos, o da globalidade e do

“crescimento ininterrupto e galopante dos saberes tornando cada vez mais difícil

a organização de nossos conhecimentos em torno dos problemas fundamentais

da existência”.

5 A DIVULGAÇÃO CIENTÍFICA E NOVAS CONFIGURAÇÕES DA

RELAÇÃO PODER E SABER: A POLITIZAÇÃO E OS USOS SOCIAIS

DA INFORMAÇÃO

Alguns autores e dois em particular, Capurro e Bourdieu, orientam a

transposição das questões até agora expostas e discutidas, para a divulgação

científica, particularmente duas indagações.

A primeira pergunta, de Rafael Capurro, traduz bem os impasses da

Ciência da Informação, que se acentuam na divulgação científica:

A Ciência da Informação se situa entre a utopia de uma linguagem

universal e a loucura de uma linguagem privada. Sua pergunta chave

é: informação para quem? Em uma sociedade globalizada, na qual

aparentemente todos nos comunicamos com todos, esta pergunta vem

a ser crucial (CAPURRO, 2007).

Às duas linguagens, a universal e a privada, se junta outra linguagem, a

não- especializada, no caso da divulgação científica, que para alguns autores

seria um segundo discurso e, para outros um novo discurso. Esta discussão vem

ocorrendo na área de Lingüística, às vezes sustentada pela análise do discurso

(PINHEIRO; VALERIO; SILVA, 2009)

O segundo questionamento, de Bourdieu (2004), consta de um livro seu

sobre os usos sociais da ciência, no qual lança sobre a concepção de ciência e

Page 69: Etica de la Información

tecnologia as mesmas indagações de muitos pensadores, alguns citados nesta

comunicação, e faz uma pergunta crucial: “é possível fazer uma ciência da

ciência, uma ciência social da produção da ciência capaz de descrever e orientar

os usos sociais da ciência?” Para ele o conteúdo textual e o contexto social da

ciência estão muito distanciados e “é preciso escapar à alternativa de ‘ciência

pura’ totalmente livre de qualquer necessidade social, e da ‘ciência escrava’,

sujeita a todas as demandas político-econômicas”.

Como fruto das novas relações de ciência e sociedade, poder e saber, e

por suas injunções políticas, a divulgação científica pode ser questionada e,

inversamente, estimulada a enveredar, aprofundar ou intensificar algumas

perspectivas que lhe são abertas.

Ao levar até ao público em geral, amplo, informações e conhecimentos

científicos oriundos de pesquisas, numa decodificação do discurso da ciência

para uma linguagem comum e facilmente inteligível, a divulgação científica

cumpre um dever e responsabilidade social perante o cidadão, que pode ser um

aluno do ensino fundamental, médio ou técnico, um jornalista ou professor, um

indivíduo de uma determinada comunidade. Este objetivo reflete a aproximação

entre ciência e sociedade, construída ao longo dos anos e para a qual concorreu a

queda de alguns mitos como a neutralidade científica, além de representar uma

possível contribuição aos alicerces da cidadania, ao tentar direcionar ao cidadão

comum informações sobre os resultados de pesquisas que podem afetar direta ou

indiretamente a sua vida, possibilitando uma reação coletiva na tentativa de

reverter atividades e política científicas.

Naturalmente, algumas questões polêmicas da ciência e tecnologia como

os transgênicos, por exemplo, ou os níveis de intoxicação e doenças originados

dos agrotóxicos e poluição, além de tantas outras “criações” da ciência, bem

como a hegemonia e invasão das máquinas até a vida privada, particularmente

computadores, colocam em xeque a crença no progresso e na ciência a serviço

Page 70: Etica de la Información

da sociedade, do bem estar e a qualidade de vida do cidadão, numa visão

acrítica, conforme abordado no decorrer deste texto.

No novo panorama da Sociedade da Informação e do Conhecimento,

impulsionado pela globalização e as tecnologias da informação e da

comunicação (TICs), ao mesmo tempo em que as distâncias são encurtadas e

até deixam de existir, no ciberespaço, pela desterritorialização, e o acesso à

informação é facilitado, agilizado e ampliado, uma avalanche de informações

deve ser organizada, processada, disseminada e acessada, o que torna o

processo mais complexo.

Sobre essas tecnologias como recurso da divulgação científica, Noruzi

(2008) vislumbra uma relação entre a comunicação científica (do cientista para

o cientista) e a divulgação científica, na Internet, porque esta: “aumenta a

acessibilidade, a visibilidade e a popularidade da ciência e da pesquisa

científica, como conseqüência, também aumenta as citações e impactos da

pesquisa ou impactos educacionais de um periódico de divulgação ou um artigo

científico”.

De forma mais ampla, Massarani, Turney e Moreira ( 2005), estudiosos da

divulgação científica, estendem as repercussões das tecnologias ao papel da

ciência na sociedade:

a ciência, que hoje exibe também a face de tecnociência, é o grande

empreendimento do mundo moderno. Ela e sua parceira, agora

inseparável, a tecnologia, habitam nosso mundo material e intelectual,

presidem boa parte das relações econômicas e de poder entre os povos

e adentram nossas vidas individuais.

A partir daí, uma questão se impõe: até onde chegam as informações da

divulgação científica? Atingirão todo e qualquer cidadão? Ou ainda precisam de

mecanismos e procedimentos que viabilizem a concretização de sua função

social?

Page 71: Etica de la Información

Nesse sentido, o caráter educativo da divulgação científica é uma

dimensão a ser amplificada. Essa função é muito semelhante ao conceito de

alfabetização científica (“scientific literacy”), cujo significado está próximo de

“cultura científica” e “compreensão pública da ciência”, expressão em moda nos

círculos educacionais dos Estados Unidos e Inglaterra, segundo Durant (2005).

No Brasil, o papel educacional da divulgação científica é reconhecido por

diferentes autores, e há alguns anos atrás já era enfocado por aquele que é

considerado o pai da divulgação científica no Brasil, José Reis (apud Gonçalves

e Reis, 1999, p. 59), que identifica duas funções que se completam, uma de

ensinar, “suprindo ou ampliando a função da própria escola”, e outra de

fomentar o ensino, que se desdobraria no “...despertar o interesse público pela

ciência...”, no elevar o nível didático das escolas, e “despertar vocações e

orientá-las...”.

Do ponto de vista político, das decisões do poder, das políticas públicas,

podemos asseverar que a divulgação científica, inicialmente impulsionada no

Brasil pelos próprios cientistas, como José Reis, e com tímidas iniciativas nas

instituições de ensino e pesquisa, passou a ser incorporada nos planos

governamentais a partir da criação de um Departamento de Popularização e

Difusão da Ciência, na Secretaria de Ciência e Tecnologia para Inclusão Social -

SECIS, no Ministério da Ciência e Tecnologia-MCT, criado por decreto

sancionado em 9/6/2004. Sob a coordenação desse Departamento e promoção

dos institutos de pesquisa do MCT e instituições de pesquisa e ensino é

realizada a Semana Nacional de Ciência e Tecnologia, com atividades para o

público em geral, por todo o território nacional, muitas em ambientes abertos.

Não pode deixar de ser mencionado que a primeira cátedra em Divulgação

Científica no mundo, aprovada pela UNESCO, em janeiro de 2005, tem por sede

o Núcleo José Reis de Divulgação Científica (NJR), (VALERIO, 2005)

Outros fatos evidenciam a institucionalização da divulgação cientifica

no Brasil e até a inserção do nosso País na agenda internacional da questão, o

Page 72: Etica de la Información

que pode ser exemplificado com a realização no Rio de Janeiro, em 2004, do

Workshop para a Popularização da Ciência e Tecnologia, promovido pela

Organização dos Estados Americanos (OEA), em parceria com o MCT e tendo o

Museu de Astronomia (MAST) e Ciências afins como executor do evento.

(VALERIO, 2005, p.68). Algumas Instituições, como o citado MAST, se

anteciparam na promoção sistemática de ações para divulgação científica, o que

gradativamente foi sendo incorporado por outras entidades de pesquisa e ensino.

Sem contar cursos, associações, e o número cada vez maior de periódicos e

páginas de jornal, programas de rádio e televisão e portais sobre divulgação

científica.

O Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia (IBICT),

atualmente muito voltado à responsabilidade social da informação, no âmbito

dos projetos para inclusão tecnológica, informacional e social, também se

engajou nos compromissos da divulgação científica e lançou, em 2003, um

portal com esse propósito, o CanalCiência. Esta iniciativa se junta a muitas

outras de instituições de ensino e pesquisa, cada vez mais preocupadas e

desenvolvendo ações visando a divulgação científica.

Este Portal representa um dos novos serviços do mundo contemporâneo que

surgiram com a Sociedade da Informação e do Conhecimento, conforme

expresso por Noruzi (2008):

A popularização da ciência na sua forma eletrônica está estreitamente

relacionada ao surgimento e ao desenvolvimento da Web nos anos

1990 [...] a popularização da ciência foi cada vez mais envolvida com

a sociedade baseada na Web. Consequentemente, a Web se tornou um

importante suporte técnico para a popularização da ciência.

Mas a divulgação científica está muito além, transcende as tecnologias,

recursos poderosos em termos das possibilidades e vastidão de acesso, e de

Page 73: Etica de la Información

condições mais ricas, como a multimídia, para criar produtos e serviços de

informações motivadores e estimulantes da aprendizagem.

Nesse sentido, a noção de complexidade é fundamental. Quando Morin

(2007) fala sobre ética e política, faz oportunas observações, nas quais inclui

este conceito que lhe é tão caro e sobre o qual tanto tem produzido. Este

pensador contrapõe a não aceitação da dissolução da ética na política à política

serva da ética. Nesta relação, de complementaridade dialógica, há dificuldades,

incertezas e às vezes contradições:

Quanto mais a política atua no que a sociedade tem de complexo, mais

são imperiosos os imperativos éticos da liberdade e direitos: quanto

mais se degradam as solidariedades e comunidades, mas elas são

necessárias. Nesse sentido, uma política da complexidade carrega

permanente aporia.

Mais do que a complexidade, para a responsabilidade social e ética da

divulgação científica, a antropoética de Morin (2007) pode desvendar ou revelar

o cerne de sua função ou o seu papel essencial .A antropoética “é mediada pela

decisão individual consciente, pela auto-ética” Para tal , deve ser esclarecida

pela antropologia complexa ou “o modo ético de assumir o destino humano”.

Entre os pressupostos formulados, alguns são mais estreitamente ligados à

teoria e prática da divulgação científica, em relação à filosofia de sua concepção

e ações , ao pensar o público a que se dirige:

- “assumir uma razão dialógica entre a nossa razão e nossas paixões”;

- “civilizar nossa relação com as idéias mestras, que permanecem

monstros possessivos, autoritários, violentos”;

- “reconhecer no outro, ao mesmo tempo, a diferença e a identidade”;

- manter contra ventos e marés a consciência que nos permite,

simultaneamente, a autocrítica, a crítica e a compreensão”; e

Page 74: Etica de la Información

- saber que não existe piloto automático em ética, a qual sempre

enfrentará escolha e aposta e sempre necessitará de uma estratégia”.

Como exemplo podemos ressaltar que em 2008 começou a ser pensada,

no CanalCiência, uma dupla ação de mútuo reforço educacional, reunindo a

divulgação científica com a competência em informação (“information literacy”)

ou alfabetização informacional, o que pode ser considerado inovador em termos

de informação. A competência em informação “requer uma série de novas

habilidades, incluindo como localizar e usar a informação necessária para a

solução de um problema e para a tomada de decisão eficiente e efetivamente” ou

pode ser representada pela busca de informação como “um processo de

construção que envolve a experiência de vida, os sentimentos, bem como os

pensamentos e as atitudes de uma pessoa” (HASTSCHBACH, 2002 apud

PINHEIRO et alii, 2009).

Como instrumento desta nova ação foi elaborado no CanalCiência um

Guia informacional”, no qual para cada pesquisa divulgada, sinteticamente,

foram relacionadas questões visando a competência em informação,

principalmente na Web. O Guia está disponível na Internet e é apresentado

também em versão impressa e CD-Rom.

Esta dupla atividade vem sendo testada em Oficinas abertas a educadores e

alunos, que ocorrem especialmente durante a Semana Nacional de Ciência e

Tecnologia. Seu alcance pode ser constatado por um exemplo muito

significativo na fala de um aluno:

Fiquei muito feliz pela oportunidade de participar daquela Oficina, ela

tem sido muito importante pra mim, pra minha família e até pros meus

amigos que tem aproveitado com mais propriedade o acesso às

informações na Internet; - Nunca tinha pensado de verdade na

responsabilidade do uso da informação na Internet!; Aprendi muito,

porque não sabia usar a informação!

Page 75: Etica de la Información

Esta manifestação, uma no meio de muitas, vêm orientando e podem

sinalizar que ações de informação têm potencial para além da transmissão de

informação e conhecimento e podem interferir no futuro e ser transformadoras

da vida e do destino do cidadão.

REFERÊNCIAS

BOURDIEU, Pierre. Os usos sociais da ciência: por uma sociologia clínica do campo

científico. Trad. de Denice Barbara Catani. São Paulo: Editora UNESP , 2004. Conferência e

debate organizados pelo Grupo Sciences en Question, Paris, INRA, 11 de maço de 1997.

BUENO, Wilson da Costa. Jornalismo científico: conceitos e funções. Ciência e Cultura,

São Paulo, v. 37, p. 1420-1427, set. 1995.

BUNGE, Mario. Ética y ciência. 3 Ed. Buenos Aires: Rfovios , Ediciones Siglo Veinte,

1983. 111p.

CAPURRO, Rafael. Epistemología y Ciência de la Información. Enlace, v.4,n.1, Maracaibo,

abr. 2007.

CAPURRO, R. Epistemologia e Ciência da Informação. In: V encontro Nacional de Pesquisa

em Ciência da Informação - ENANCIB. Belo Horizonte, 10 de novembro de 2003.

Disponível em <http://www.capurro.de/enancib_p.htm>. CD-ROM.

DUPAS, Gilberto. Ética e poder na sociedade da informação: de como a autonomia das

novas tecnologias obriga a rever o mito do progresso. 2 ed. revista e ampliada. São Paulo:

Editora UNESP, 2001. 135p.

DURANT, John. O que é divulgação científica?. In: MASSARANI, Luisa; TURNEY, John;

MOREIRA, Ildeu de Castro. Terra incógnita: a interface entre ciência e público. Rio de

Janeiro: Casa da Ciência: Museu da Vida: Vieira & Lent, 2005. p.13-26.

GONÇALVES, Nair Lemos; REIS, José. Divulgação científica e o ensino. In: KREINZ,

Glória, PAVAN, Crodowaldo (orgs.). Idealistas isolados. São Paulo: Publicações NJR/ ECA

/USP, 1999. p. 47-66. (Divulgação científica, 2).

Page 76: Etica de la Información

GONZÁLEZ DE GOMEZ, Maria Nélida. Novas fronteiras tecnológicas das ações de

informação: questões e abordagens. Ciência da Informação, v.33, no.1, p . 55-67, 2004.

INTERNATIONAL CENTER FOR INFORMATION ETHICS- ICIE. Disponível em:

<http://icie.zkm.de>.

GUIA informacional para professores. Rio de Janeiro: IBICT, 2008.

Disponível em: <http://biblioteca.ibict.br/phl8/anexos/CanalCienciaGuiaProfessores.pdf>

HATSCHBACH, Maria Helena de Lima. Information literacy: aspectos conceituais e

iniciativas em ambiente digital. 2002. Dissertação (Mestrado em Ciência da Informação) –

CNPq/IBICT-ECO/UFRJ, Rio de Janeiro, 2002. Orientador: Gilda Olinto.

JAPIASSU, Hilton. Interdisciplinaridade e patologia do saber. Rio de Janeiro: Imago,

1976. 221 p. (Série Logoteca).

JAPIASSU, Hilton. As máscaras da ciência. Ciência da Informação, Rio de Janeiro, v.6,

n.1,p.13-15,1977.Disponível em: <http://revista.ibict.br/index.php/ciinf/article/view/1566>

JAPIASSU, Hilton. O sonho transdisciplinar e as razões da Filosofia. Rio de Janeiro:

Imago, 2006.

JONAS, Hans. O princípio da responsabilidade: ensaio de uma ética para a civilização

tecnológica. Rio de Janeiro: contraponto; Ed. PUC-Rio. 2006. 353p.

KREINZ, Gloria. Em busca do infinito. In: KREINZ, Gloria, PAVAN,

Crodowaldo. A espiral em busca do infinito: ensaios sobre o divulgador

científico José Reis. São Paulo: NJR:ECA/USP, 1998. p. 13-31

MASSARANI, Luisa; TURNEY, John; MOREIRA, Ildeu de Castro. . Terra incógnita: a

interface entre ciência e público. Rio de Janeiro: Casa da Ciência: Museu da Vida: Vieira &

Lent, 2005.

MORIN, Edgar. O método 6: ética. 3 ed. Porto Alegre: Sulina, 2007. 222 p.

NORUZI, Alireza. Science popularization through open access. Webology, v.5, n.1, March

2008.

PINHEIRO, Lena Vania Ribeiro. A responsabilidade social da Ciência da Informação. In:

ENCONTRO NACIONAL DA ASSOCIAÇÃO NACIONAL DE PESQUISA E PÓS-

GRADUAÇÃO EM CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO, 10., 2009, João Pessoa. Conferencia da

Abertura. João Pessoa: UFPb, 2009. Disponível em CD-Rom e na URL

<http://dci.ccsa.ufpb.br/xenancib/arquivos/oral_gt1.pdf>

Page 77: Etica de la Información

PINHEIRO, Lena Vania Ribeiro; SILVA, Márcia Rocha da; SOUZA, Sonia Burnier de;

BARROS, Flavia Rubenia da Silva. ; GUERRA, Claudia Bucceroni. Experiência inovadora

do CanalCiência como instrumento pedagógico para aproximar ciência e sociedade,

conhecimento e informação. DatagramaZero, Rio de Janeiro, v. 10, n. 4, set./out. 2009.

Trabalho apresentado no evento EDULEARN09-International Conference on Education and

New Lerarning Technologies, Barcelona, Spain, 6th -8th July 2009. Available: CD-ROM e em:

<http://www.iated.org/concrete2/paper_detail.php?paper_id=6346>

PINHEIRO, Lena V. R.; VALERIO, Palmira M.; SILVA, Márcia R. Marcos históricos e

políticos da divulgação científica no Brasil. In: BRAGA, Gilda Maria; PINHEIRO, Lena

Vania Ribeiro (Orgs.). Desafios do impresso ao digital: questões contemporâneas de

informação e conhecimento. Brasília: IBICT; Unesco, 2009. p. 259- 289

REIS, José, GONÇALVES, Nair Lemos. Veículos de divulgação científica. In: KREINZ,

Glória, PAVAN, Crodowaldo (orgs.). Os donos da paisagem. São Paulo: Publicações NJR,

2000. p. 7-69. (Divulgação científica, 3).

RIBEIRO, Renato Janine. Ética, ação política e conflitos na modernidade. In: MIRANDA,

Danilo Santos de (org.). Ética e cultura. São Paulo: Perspectiva: SESC São Paulo, 2004.

p.65-88 ( Debates, 299)

VALERIO, Palmira Maria Caminha Moriconi. Periódicos científicos eletrônicos e novas

perspectivas de comunicação e divulgação para a ciência. 2005. Tese (Doutorado Ciência

da Informação)- CNPq/IBICT-ECO/UFRJ, Rio de Janeiro, 2005. Orientadora: Lena Vania

Ribeiro Pinheiro

Page 78: Etica de la Información

A CONSCIÊNCIA POSSÍVEL PARA UMA ÉTICA DA

INFORMAÇÃO NA SOCIEDADE EM REDE

Isa Maria Freire*

1 INTRODUÇÃO

Nosso propósito, neste trabalho, é seguir o fio das reflexões já realizadas

em trabalhos anteriores a propósito da responsabilidade social dos profissionais

da informação, de modo a tecer uma rede conceitual onde se entrelacem as

idéias de ética da informação, inteligência coletiva e utopias planetárias, no

contexto do regime de informação da sociedade em rede. Nessa abordagem, o

padrão que une a trama desses fios é a possibilidade de inclusão social mediante

a difusão das tecnologias digitais de informação e comunicação (TICs),

especialmente para comunidades economicamente carentes.

Os construtos e procedimentos que usamos para construir a tessitura do texto

estão disponíveis em Araújo (1994; 2001), Araujo; Freire, 1999, Assmann (2000),

Castells (1999; 2003), Freire (1996; 2001; 2004; 2005; 2006; 2008), Ginzburg (1989),

Goldmann (1970; 1979), González de Gómez (1999; 2003; 2004), Lazarte (2000),

Lévy (1999; 2000), Mattelart (2002), Pinheiro (2009), Quéau (2001), Rondelli (2003),

Wersig (1993) e Wersig e Neveling (1975).

Os indícios da relevância das tecnologias digitais de informação e

comunicação (TICs), na economia e no cotidiano da população brasileira, são

Page 79: Etica de la Información

revelados nas estatísticas do Comitê Gestor da Internet (2007) e da Pesquisa

Nacional de Amostra por Domicílios (2006), bem como no mapa da inclusão

digital do Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia (2008), e

estão disponíveis para consulta na Internet1.

O tema da inclusão digital, por sua vez, já adentrou no imaginário popular

brasileiro, como se pode observar na letra do samba enredo da Portela para

2010, onde as ideias e os vocabulários da informática e das utopias planetárias

se fazem presente о destacando-se a metáfora da ‘ciência como luz’ о e se

entrelaçam num discurso apoteótico, como mostramos no quadro a seguir:

Portela segue os passos da

evolução...

Liberdade!

Num clique derruba barreiras

Deleta fronteiras da realidade

Desperta o bem social

Acessa o amor digital

Faz da criança inspiração

Pro futuro da nação

Na rede nossas vidas vão se

transformar

Do ventre mais um ser nascerá

O Dia de Graça que o mestre

cantou

Já raiou!

O meu pavilhão é minha paixão!

Povos, raças, em comunhão

Vai meu verso ao mundo

ensinar

É preciso navegar!

Brilhou no céu mais um

sinal

Cruzando o espaço sideral

Portela... Portal cultural de

um país

Um link com a nossa raiz

Rainha da Passarela

Revela um Rio de paz pra

viver

A senha de um amanhecer

Mais feliz

Minha águia guerreira

                                                                                                                     1 Ver endereços em Referências.

Page 80: Etica de la Información

A luz da ciência é ela...

É samba, é jaqueira que não vai

tombar

Sou Portela!

Mãos unidas pela inclusão

Vai voar... Viajar!

Pousar no sonho de ganhar

o carnaval

E conquistar o mundo

virtual!

Quadro 1 – NOGUEIRA et al. 2010.Negrito e itálico nossos.

Disponível em: <http://www.youtube.com/watch?v=w4XiVoIe69k>

Esperamos que o contexto criado em nosso tear interdisciplinar, possa

contribuir para revelar os indícios de uma consciência possível para a utopia

planetária sobre uma ética da informação, na sociedade contemporânea.

2 A TECNOLOGIA DA SOCIEDADE EM REDE

A teia mundial da informação é o objeto das reflexões do sociólogo

Manuel Castells (2003, p.8), que refraseia MacLuhan para expressar as

possibilidades de comunicação na Galáxia da Internet: “a rede é a mensagem”.

A relevância da Internet para a sociedade contemporânea seria tal que ele a

define como “o tecido de nossas vidas”, especialmente por constituir a urdidura

tecnológica para “a forma organizacional da Era da Informação: a rede”. Nesse

processo, a diferenciação entre os que têm e os que não têm acesso à Internet,

acrescentou uma nova forma de desigualdade e exclusão social às já existentes,

a exclusão digital.

Em janeiro de 2003 (p.3), a Revista Inteligência Empresarial abordou o

problema da inclusão digital com uma mensagem de alerta: “a distância entre os

providos e os desprovidos digitais está se alargando”, entre e intra países. Essa

distância, denominada por Sorj (2003, p.13) de “brecha digital”, resultaria da

Page 81: Etica de la Información

“distribuição desigual [..] dos recursos associados às tecnologias da informação

e da comunicação”. E embora essas tecnologias não representem uma “solução

mágica” para o complexo problema da desigualdade, sem dúvida “constituem

[atualmente] uma das condições fundamentais da integração na vida social”

(SORJ, 2003, p.15). Em estudo pioneiro, Néri et al. (2003, p.5), relacionaram as

políticas de inclusão digital e a lei de Moore2 com o objetivo de “subsidiar o

entendimento de campanhas de doação de computadores”, definidas pelos

autores como ações que buscam difundir o sucesso obtido pela tecnologia de

ponta em grupos economicamente desfavorecidos, na premissa de que o

“analfabetismo digital, ao afetar a capacidade de aprendizado, a conectividade e

a disseminação de informações, gera conseqüências virtualmente em todos os

campos da vida do indivíduo”.

Para Rondelli (2003), entretanto, a alfabetização digital é apenas uma

parte do processo de inclusão digital, constituindo “a aprendizagem necessária

ao indivíduo para circular e interagir no mundo das mídias digitais como

consumidor e como produtor de seus conteúdos e processos”. Também para

Lazarte (2000, p.51), os elementos necessários para inclusão não devem

contemplar apenas o acesso físico à infra-estrutura e a conexão em rede e

computadores, mas, especialmente, a capacitação das pessoas para utilizar estes

meios de comunicação da informação e, principalmente, para criar a

“possibilidade de uma incorporação ativa no processo todo de produção,

compartilhamento e criação cultural”, os chamados conteúdos. Nesse contexto,

Castells (2003, p.18) aponta que

A questão crítica é mudar [...] para o aprendizado-de-aprender, uma

vez que a maior parte da informação [estará] on-line e o que realmente

                                                                                                                     2 Segundo essa lei, nos últimos 30 anos a unidade de potência dos computadores tem dobrado a cada 18 meses. Nesse cenário, a alta obsolescência tecnológica dos computadores levaria à possibilidade de doação de equipamentos computacionais em bom estado a grupos sociais economicamente carentes. (NÉRI et all., 2003)

Page 82: Etica de la Información

[será] necessário é a habilidade para decidir o que procurar, como

obter isso, como processá-lo e como usá-lo para a tarefa específica

que provocou a busca de informação. Em outras palavras, o novo

aprendizado é orientado para o desenvolvimento da capacidade

educacional de transformar informação e conhecimento em ação

(DUTTON, 1999)3.

Pois na medida em que permitem que se estabeleçam relações

descentralizadas e verticalizadas entre produtores e consumidores de informação

e conhecimento, as mídias digitais possibilitam que ambos possam permutar

suas funções e papéis sociais, ora como produtores, ora como consumidores dos

processos e conteúdos que circulam na mídia digital. Por isso mesmo, Rondelli

(2003) entende que “processos de inclusão só ocorrem se a ampliação do acesso

à qualquer uma das mídias existentes for acompanhada da inserção dos

indivíduos em um universo cultural e intelectual mais rico que os motivem a

utilizá-las [...]”. Ademais que, como coloca Morin (1991, p.75),

[..]. a cultura constitui um sistema generativo de alta complexidade

[...] Neste sentido, a cultura deve ser transmitida, ensinada, aprendida,

quer dizer, reproduzida em cada novo indivíduo no seu período de

aprendizagem, para poder se autoperpetuar e para perpetuar a alta

complexidade social.

É nesse sentido que Assmann (2000, p.15) destaca que “as políticas

públicas podem fazer a diferença”, de modo a favorecer o crescimento de uma

sociedade da informação onde todos tenham “acesso a uma quota parte mínima

dos novos serviços e aplicações” das tecnologias digitais de informação e

comunicação. Isto se torna necessário e urgente, porque

                                                                                                                     3 Sobre o conceito de informação como “conhecimento em ação” no campo da Ciência da Informação, ver: ARAUJO; FREIRE, 1999.

Page 83: Etica de la Información

As novas tecnologias da informação e da comunicação já não são

meros instrumentos no sentido técnico tradicional, mas feixes de

propriedades ativas. São algo tecnologicamente novo e diferente. As

tecnologias tradicionais serviam como instrumentos para aumentar o

alcance dos sentidos (braço, visão, movimento etc.). As novas

tecnologias ampliam o potencial cognitivo do ser humano (seu

cérebro/mente) e possibilitam mixagens cognitivas complexas e

cooperativas. (ASSMANN, 2000, p.15)

Desse modo, uma parceria cognitiva se estabelece entre o ser humano e as

máquinas inteligentes, uma vez que o papel das tecnologias de informação e

comunicação

[...] já não se limita à simples configuração e formatação, ou, se

quiserem, ao enquadramento de conjuntos complexos de informação.

Elas participam ativamente do passo da informação para o

conhecimento. Está acontecendo um ingresso ativo do fenômeno

técnico na construção cognitiva da realidade. Doravante, nossas

formas de saber terão um ingrediente [...] derivado da nossa parceria

cognitiva com as máquinas que possibilitam modos de conhecer

anteriormente inexistentes. Em resumo, as novas tecnologias têm um

papel ativo e coestruturante das formas do aprender e do conhecer. Há

nisso, por um lado, uma incrível multiplicação de chances cognitivas,

que convém não desperdiçar, mas aproveitar ao máximo.

(ASSMANN, 2000, p.11)

Por isso mesmo, a democratização do acesso às tecnologias digitais de

informação e comunicação deveria ser vista como elemento fundamental nas

políticas inclusão social. Nesse sentido, Assmann (2000, p.6) aponta para a

necessidade de formulação de políticas públicas que possam ajudar as

populações economicamente carentes a se beneficiarem das vantagens do

progresso tecnológico, promovendo “o acesso universal à info-alfabetização e à

Page 84: Etica de la Información

info-competência” de modo a reforçar o caráter democrático da sociedade da

informação e difundir a cultura emergente. Contudo, Dürmaier (2009, p.142)

aponta que,

[..] passada uma década da aprovação da Declaração do Milênio, no

transcurso da qual foram estabelecidos os diversos pactos mundiais da

Sociedade da Informação, a controvérsia sobre o papel das TICs na

promoção da democracia, da justiça e do bem comum [...] permanece

como desafio para países em desenvolvimento substanciar

conceitualmente e prover quantitativamente políticas de inclusão

plenas4.

Sendo este um problema socialmente significativo, Néri et al. (2003, p.5)

assinalam que “é preciso desenvolver tecnologias para o uso da tecnologia da

informação no combate à pobreza e à desigualdade”, uma vez que

[...] o acesso à informação torna-se um fator-chave na luta contra a

pobreza, a ignorância e a exclusão social [e por essa razão] não se

pode deixar apenas nas mãos das forças do mercado o cuidado de

regular o acesso aos conteúdos das ‘autovias da informação’. Pois são

esses conteúdos que vão tornar-se o desafio fundamental do

desenvolvimento humano nos âmbitos da sociedade da informação.

(QUÉAU, 2001, p.476)

Com relação a esse desafio, lembramos as sugestões de Araújo (2001,

p.12) no que diz respeito à atuação dos cientistas e profissionais da informação,

na sociedade em rede:

                                                                                                                     4 Pereira (2009) identificou que as ações derivadas de políticas públicas de inclusão, em geral, não ultrapassam o nível de simples acesso à Internet.

Page 85: Etica de la Información

[...] criar tecnologias, construir ferramentas [intelectuais] e sistemas

mais eficazes, não só para gerenciar informação, mas, também para

facilitar ao ser humano a transformação da informação em

conhecimento e, conseqüentemente, em ação na sociedade.

Entretanto, como fazê-lo de forma distributiva e democrática?

A nosso ver, a tarefa depende menos da nossa ação no mundo, como

sujeitos individuais ou coletivos, e muito mais da nossa conscientização sobre o

poder transformador da informação,

[Pois] se a informação é a mais poderosa força de transformação do

homem [o] poder da informação, aliado aos modernos meios de

comunicação de massa, tem capacidade ilimitada de transformar

culturalmente o homem, a sociedade e a própria humanidade como um

todo. (ARAUJO, 1994. p.84)

E aqui se revela um pressuposto na nossa abordagem: a responsabilidade

dos profissionais da informação na sociedade contemporânea, muito menos no

que diz respeito à competência no uso das tecnologias e muito mais no que

representa como uma visão de mundo5. Essa visão nos remete à aposta de Pascal

retomada por Lucien Goldmann (1954) como fundamento da filosofia dialética:

[...] A aposta é fundamentalmente a expressão do paradoxo do homem

e sua condição. Para que o homem viva como homem, ele deve

engajar sua vida sem reservas, na esperança de um valor autêntico

cujo sinal mais claro é que ela é realidade. É o paradoxo fundamental

                                                                                                                     5 Conforme Goldmann (1979, p.99 citado por FREIRE, 2001, p.72), as visões do mundo são fatos sociais e as obras filosóficas e artísticas configuram “expressões coerentes e adequadas dessas visões do mundo”. São expressões individuais e sociais ao mesmo tempo. (GOLDMANN, 1979, p.140 citado por FREIRE, 2001, p.73) Uma visão de mundo também pode ser abordada como expressão da “consciência possível” de um grupo ou sujeito coletivo da sociedade (GOLDMANN, 1970; FREIRE, 1996).

Page 86: Etica de la Información

da condição humana: a união dos contrários, a união do espírito e da

matéria, [...] porque essa realidade dupla é encarnação.

[...]

[Em Georg Lukàcs,] reaparece essa idéia de que ser homem significa

engajar sem reservas sua existência na afirmação eternamente

improvável de uma relação possível entre o dado sensível e o sentido,

entre deus e a realidade empírica atrás da qual ele se esconde, relação

[...] que não se pode demonstrar e na qual, entretanto, é necessário

engajar toda sua existência. (GOLDMANN, 1979, p.194-196. Em

itálico, no original)6

Goldmann (1979) aposta na capacidade dos indivíduos construírem uma

verdadeira comunidade humana no futuro e fundamenta nossa reflexão sobre o

papel dos profissionais da informação, o qual, a nosso ver, seria o de contribuir,

de um lado, para ampliar a teia mundial de comunicação da informação e, de

outro, para diminuir a exclusão digital, aumentando as possibilidades de livre

acesso aos estoques de informação. Isso porque, a partir do século XXI,

O acesso à informação torna-se um fator-chave na luta contra a

pobreza, a ignorância e a exclusão social. Por essa razão não se pode

deixar apenas nas mãos das forças do mercado o cuidado de regular o

acesso aos conteúdos das “autovias da informação”. Pois são esses

conteúdos que vão tornar-se o desafio fundamental do

desenvolvimento humano nos âmbitos da sociedade da informação.

(QUÉAU, 2001, p.479)

Neste modelo, “o futuro é agora” (FREIRE, 2003), pois não estamos mais

no espaço territorial, mas no ciberespaço7, cenário construído a partir das                                                                                                                      6 O texto original é datado de 1954. Sobre a “aposta” de Goldmann no campo da Ciência da Informação, ver FREIRE, 2001. 7 “[...] palavra de origem americana, empregada pela primeira vez pelo autor de ficção científica William Gibson, em 1984 no romance Neuromancien. [...] designa ali o universo das redes digitais, como lugar de encontros e de aventuras, [...] nova fronteira econômica e

Page 87: Etica de la Información

tecnologias digitais de informação e comunicação em rede criadas no início dos

anos 1980 e que se tornaram um fenômeno econômico e cultural: redes mundiais

de universitários e pesquisadores, redes empresariais, correios eletrônicos,

comunidades virtuais e outras. Nesse contexto,

[...] tendências fundamentais, já atuantes há mais de 25 anos, farão

sentir cada vez mais seus efeitos [...]. O atual curso dos

acontecimentos converge para a constituição de um novo meio de

comunicação, de pensamento e de trabalho para as sociedades

humanas. (LÉVY, 2000, p.11. Em itálico, no original.)

Na visão de Wertheim (2001, p.32),

[...] o ciberespaço está vindo à luz numa explosão ante nossos próprios

olhos [...] Estamos testemunhando o nascimento de um novo domínio,

um novo espaço que simplesmente não existia antes. [...] temos aqui

uma versão digital da expansão cósmica de Hubble, um processo de

criação de espaço. [...] Em meados de 1998, cem milhões de pessoas

estavam se conectando regularmente com a Internet e estima-se que na

próxima década haverá perto de um bilhão de pessoas on-line. Já com

trezentos milhões de páginas, a World Wide Web está crescendo em

um milhão de páginas por dia. Esse espaço formou-se, a partir do

nada, em pouco mais de um quarto de século, o que faz dele o

‘território’ de mais rápido crescimento da história.

Nesse processo, a cibercultura

[...] acompanha o desenvolvimento da Internet, do ciberespaço, mas

também de novas técnicas de representação (imagens numéricas,

                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                         

cultural. [Hoje,] designa menos os novos suportes de informação do que os modos originais de criação, de navegação no conhecimento e de relação social, por eles propiciados” (LÉVY, 1999. p.104. Em itálico, no original).

Page 88: Etica de la Información

realidade virtual, televirtualidade, comunidades virtuais...). Ela é

fundamentalmente ligada à mundialização em curso e às mudanças

culturais, sociais e políticas, [e] apóia-se sobre esquemas mentais,

modos de apropriação social, práticas estatísticas muito diferentes das

que conhecíamos até agora [criando] uma enorme quantidade de

comportamentos inovadores cujas conseqüências sociais e culturais

ainda não puderam ser suficientemente estudadas. (QUÉAU, 2001,

p.478)

Assim, a nosso ver, mais do que criar tecnologias intelectuais inovadoras

o verdadeiro desafio do campo da informação seria contribuir para criar, na

sociedade em rede, uma consciência da imensa riqueza coletiva, em escala

mundial, que o acesso gratuito ao domínio público mundial da informação

representa. É nesse sentido que

No centro da cibercultura se tece um desafio profundamente ético.

Bem mais do que definir um código de conduta para a Internet ou uma

regulação para o comércio eletrônico, trata-se de um debate

necessariamente democrático sobre o futuro da sociedade mundial,

com a participação mais ampla possível dos interessados, isto é, dos

seis bilhões de cidadãos planetários. (QUÉAU, 2001, p.479)

E, com essas colocações, nos aproximamos do padrão que [re]une nossa

rede conceitual nesta comunicação sobre uma ética da informação para a

sociedade presente e futura, cujos indícios logramos encontrar n’A inteligência

coletiva de Pierre Lévy (2000) e na História da utopia planetária de Armand

Mattelart (2002).

Page 89: Etica de la Información

3 A UTOPIA PLANETÁRIA DE PIERRE LÉVY

Embora não seja citado nas 432 páginas do livro, a proposta da

inteligência coletiva8 de Pierre Lévy apresenta muitas das características de

utopias planetárias citadas por Mattelart (2002) e identificadas ao longo da

história humana registrada.

Para Lévy (2000, p.60) podemos estar vivendo “um desses momentos

extremamente raros em que uma civilização inventa a si própria,

deliberadamente [de modo que] em pouco tempo, teremos passado [...] de uma

humanidade a outra”. Nesse processo, “escolhas políticas e culturais

fundamentais abrem-se diante dos governos, dos grandes atores econômicos, dos

cidadãos. Não se trata apenas de raciocinar em termos de impacto [...] mas

também em termos de projeto” (LÉVY, 2000, p.13. Em itálico, no original).

Esse projeto seria coletivo, representando a oportunidade para o exercício de um

novo humanismo, que inclui e amplia o ‘conhece-te a ti mesmo’ (do Oráculo de

Delfos, adotado por Sócrates) para um ‘aprendamos a nos conhecer para

pensarmos juntos’, generalizando o ‘penso, logo existo’ (de Descartes) para um

‘existimos eminentemente como comunidade’ (que, por sua vez, reflete a visão

de Kant), sugerindo, para Lévy (2000), a hipótese da emergência de um novo

espaço antropológico9.

Nesse modelo, Lévy (2000, p.22) assinala que ao longo do tempo

histórico as sociedades humanas desenvolveram espaços antropológicos a partir

da possibilidade do primeiro grande espaço (a Terra) aberto à nossa espécie: “só

os seres humanos vivem sobre a Terra; os animais habitam em nichos

ecológicos”. Os modos de conhecimento específicos desse primeiro espaço são

os mitos e os ritos: a identidade “se inscreve ao mesmo tempo no vínculo com o

                                                                                                                     8 Publicada originalmente em 1994. 9 Definido como “um sistema de proximidade (espaço) próprio do mundo humano (antropológico) e, portanto, dependente de técnicas, de significações e das emoções humanas” (LÉVY, 2000, p.23).

Page 90: Etica de la Información

cosmo e na relação de filiação ou de aliança com outros homens” (LÉVY, 2000,

p.23). O segundo espaço, o Território, teria emergido com o neolítico e suas

inovações sócio-culturais: a agricultura, a cidade, o estado e a escrita. Neste

espaço os modos de conhecimento dominantes já se baseiam na escrita: “começa

a história e o desenvolvimento dos saberes de tipo sistemático, teórico ou

hermenêutico” e surgem as instituições orientadas por lógicas de pertencimento

ou de exclusão. O terceiro espaço, das Mercadorias, tem o fluxo como princípio

organizador: fluxo de energias, de matérias-primas, mercadorias, capitais, mão-

de-obra, informações. Este espaço não elimina os anteriores, contudo,

[...] supera-os em velocidade. É o novo motor da evolução. A riqueza

não provém do domínio das fronteiras, mas do controle dos fluxos.

Daí por diante reina a indústria, no sentido amplo de tratamento da

matéria e da informação. A ciência experimental moderna é um modo

de conhecimento típico do novo espaço [...] Desde o fim da Segunda

Guerra Mundial ela passa a dar lugar a uma ‘tecnociência’, movida

por uma dinâmica permanente da pesquisa e da inovação econômica.

(LÉVY, 2000, p.24)

É nesse contexto que emerge, na sociedade contemporânea, o espaço

caracterizado pela “inteligência e [...] saber coletivos, cujo advento definitivo

não está em absoluto garantido por certas ‘leis da história’” (LÉVY, 2000, p.24)

e que teria a vocação de comandar os demais espaços. Nesse espaço do saber, as

tecnologias digitais de informação e comunicação nos permitem criar e percorrer

mundos virtuais, colocando sobre novas bases os problemas do laço social e

abrindo possibilidade não somente para pensarmos coletivamente a aventura

humana, mas, principalmente, para influenciá-la “mediante invenção de formas

de pensar e se relacionar que contribuam para fazer emergir inteligências

coletivas na humanidade” (LÉVY, 2000, p.33). Na sociedade contemporânea,

Page 91: Etica de la Información

que conjuga o futuro no presente, isto se tornaria inadiável porque “o saber

tornou-se a nova infra-estrutura” (LÉVY, 2000, p.19).

Para Lévy (2000, p.18), a nova dimensão da comunicação humana no

espaço do saber deveria nos permitir “compartilhar nossos conhecimentos e

apontá-los uns para os outros, o que é a condição elementar da inteligência

coletiva”. O problema da inteligência coletiva, nesse contexto, seria inventar

uma linguagem “para além da escrita”, ou um processo de comunicação “para

além da própria linguagem”, de tal modo que o “tratamento da informação

pudesse ser distribuído e coordenado por toda parte” (LÉVY, 2000, p.18). Por

sua vez, no espaço do saber seria necessário “engajar a singularidade, a própria

identidade pessoal na vida profissional”, numa dupla mobilização subjetiva,

“bastante individual, de um lado, mas ética e cooperativa, de outro” (LÉVY,

2000, p.23. Em itálico, no original).10 Nesse contexto, a inteligência coletiva

representaria a possibilidade de uma sociedade humana mundialmente conectada

em rede e fundada no “reconhecimento e enriquecimento mútuo das pessoas”

(LÉVY, 2000, p.27). Contudo, o autor esclarece que

[...] a inteligência coletiva não é um conceito exclusivamente

cognitivo. Inteligência deve ser compreendida aqui como na expressão

‘trabalhar em comum acordo’ [...] Trata-se de uma abordagem de

caráter bem geral da vida em sociedade e de seu possível futuro. [...]

Essa visão de futuro organiza-se em torno de dois eixos

complementares: o da renovação do laço social por intermédio do

conhecimento e o da inteligência coletiva propriamente dita. (LÉVY,

2000, p.26. Em itálico, no original)

Uma inteligência distribuída por toda parte: eis o axioma proposto por

Lévy. Para ele, a inteligência coletiva tem início com a cultura e cresce com ela,

                                                                                                                     10 Nesse ponto, e a nosso ver, encontramos na utopia de Lévy (2000), indícios da filosofia de Pascal, conforme descrita por Lucien Goldmann (1979).

Page 92: Etica de la Información

pois pensamos “com idéias, línguas, tecnologias cognitivas recebidas de uma

comunidade” que nos antecedeu (LÉVY, 2000, p.29). Em um coletivo

inteligente, a comunidade assumiria como objetivo a “negociação permanente da

ordem estabelecida, de sua linguagem, do papel de cada um, o discernimento e a

definição de seus objetos, a reinterpretação de sua memória” (LÉVY, 2000,

p.31). Desse modo, o projeto da inteligência coletiva coloca-se como um

“processo de crescimento, de diferenciação e de retomada recíproca das

singularidades”, e nele uma engenharia do laço social torna-se extremamente

relevante podendo ser vista como “a arte de suscitar coletivos inteligentes e

valorizar ao máximo a diversidade das qualidades humanas” (LÉVY, 2000,

p.32. Em itálico, no original). O núcleo da engenharia do laço social é a

economia das qualidades humanas e sua ação implica uma ética da inteligência

coletiva, encarnada num grupo da humanidade que Lévy chama de justos

(LÉVY, 2000, p.33).

Para exemplificar essa ética e seus praticantes, Lévy (2000, p.35) usa uma

história bíblica bem presente no imaginário ocidental, como segue:

[...] Gênesis, capítulos 18 e 19. Um grande clamor se ergue contra

Sodoma e Gomorra devido a seus pecados. Tendo Deus resolvido

destruir essas cidades, nas quais se cometiam muitas injustiças, decide

falar primeiro a Abraão. [...] o patriarca enceta com o Eterno uma

extraordinária sessão de negociação: “Talvez haja cinqüenta justos na

cidade! [...]) Sucederia ao justo o mesmo que ao culpado?” [Na

negociação,] Deus concede a Abraão a salvação da cidade, caso ali se

encontrassem [...] dez justos apenas.

Ao cair da noite, dois anjos chegam às portas de Sodoma. Nada, em

sua aparência, indica que sejam enviados de Deus. Para todos, são

pessoas de passagem [...] Lot, que estava sentado à entrada da cidade,

convida esses estrangeiros à sua casa [...] segundo as regras da

hospitalidade. Eles ainda não haviam se deitado quando a população

Page 93: Etica de la Información

de Sodoma se reúne em torno da casa de Lot e pede para ver os

estrangeiros, ‘para deles abusar’. Lot se recusa a entregar seus

hóspedes [...] A demonstração permitiu contar o número de justos em

Sodoma: apenas um. [...]”

Na interpretação de Lévy (2000, p.36 a 39 passim. Em itálico, no

original), o texto mostra

[...] a força de pessoas vivas e ativas, os ‘justos’, capazes de trabalhar

para a existência do mundo humano.

Qual o crime de Sodoma? A recusa à hospitalidade. [...] Ora, a

hospitalidade representa eminentemente o sustentáculo do laço social,

concebido segundo a forma da reciprocidade: o hóspede é tanto aquele

que recebe como o que é recebido. E cada um deles pode se tornar

estrangeiro. [...] A hospitalidade consiste em atar o indivíduo a um

coletivo. Contrapõe-se inteiramente ao ato de exclusão. O justo inclui,

“insere”, reconstitui o tecido social. Em uma sociedade de justos, e

segundo a forma de reciprocidade, cada um trabalha para incluir os

outros. [No mundo contemporâneo] onde tudo se move, onde todos

são levados a mudar, a hospitalidade, moral dos nômades e migrantes,

torna-se moral por excelência.

Por que é preciso ao menos dez justos para que a cidade seja poupada?

[...] Porque é preciso uma força coletiva para manter um coletivo. [...]

Dez é o início do anonimato. São necessários pelo menos dez, pois os

justos devem ter passado pela prova da sociedade dos justos. [...] Os

justos só são eficazes, só conseguem manter a existência de uma

comunidade constituindo uma inteligência coletiva.

Abraão é o justo por excelência.[(...] Ao negociar com Deus [...] ele

valoriza e desdobra ao máximo o potencial do bem; chama atenção

para a bondade dos outros. [E] inventa a engenharia do laço social.

Page 94: Etica de la Información

Assim, a negociação de Abraão com Deus representaria a primeira

tecnologia de otimização dos efeitos das menores qualidades positivas presentes

em um coletivo humano: seja em nível das empresas, das administrações, ou

ainda das regiões ou nações, na sociedade em rede as necessidades econômicas

deverão se associar à exigência ética, pois “na economia do futuro, o capital será

o homem total” (LÉVY, 2000, p.42). Nesse contexto, “a transmissão, a

educação, a integração, a reorganização do laço social deverão deixar de ser

atividades separadas. Devem realizar-se do todo da sociedade para si mesma, e

potencialmente de qualquer ponto que seja de um social móvel a qualquer outro”

(LÉVY, 2000, p.45. Em itálico, no original)11.

Essa visão humanista do futuro nos leva de volta à História da utopia

planetária de Mattelart (2002, p.230), que reconhece Paul Otlet e Henri La

Fontaine como “visionários da universalidade do conhecimento humano”.12 O

autor assinala que o texto de Otlet e La Fontaine sobre o ‘conhecimento

universal’ é ao mesmo tempo um programa de ação e uma síntese do espírito das

realidades do ‘internacionalismo’, um termo que nesta perspectiva não seria

mais exclusivo do socialismo (MATTELART, 2002, p.232).

Na sua História, Mattelart (2002, p.233) descreve o campo privilegiado de

ação de Otlet e La Fontaine como ‘documentação’, e esclarece que

                                                                                                                     11 Aqui, novos indícios da visão de Pascal, considerado por Goldmann como criador do pensamento dialético: “[...] as partes do mundo têm todas tal relação e tal encadeamento entre si que acho impossível conhecer uma sem conhecer outra e sem conhecer o todo... Portanto, sendo todas as coisas causadas e causadoras, auxiliadas e auxiliadoras, mediatamente e imediatamente, e todas se intersustentando por um vínculo natural e insensível que une as mais afastadas e as mais diferentes, considero impossível conhecer as partes sem conhecer o todo, do mesmo modo que conhecer o todo sem conhecer particularmente as partes” (PASCAL, Fragmento 72, citado por GOLDMANN, 1979, p.177). 12 Mattelart (2002, p.47-48) considera Otlet e La Fontaine como fundadores de uma “nova ciência da organização sistemática da documentação”, iniciativa que, a seu ver, “é produto de um espírito visionário”, característica que Figueiredo (1996, p.15) já havia ressaltado, em texto sobre Otlet e o Centenário da Federação Internacional de Informação e Documentação.

Page 95: Etica de la Información

[...] apesar de não ter cunhado o termo, eles fazem dele a base de uma

nova ciência, tendo criado, em 1895, o Instituto Internacional de

Bibliografia, com o objetivo de estudar ‘as questões concernantes ao

Livro e à organização sistemática da Documentação em bases

internacionais e universais’.

Esse Instituto promoveu, em 1910, o primeiro congresso mundial das

associações internacionais, onde se decidiu o lançamento da revista La Vie

internacionale, que seria porta-voz de uma recém criada União das Associações

Internacionais, à qual aderiram de imediato 32 organizações. A perspectiva

social da União era indicada no programa: “Contribuir para desenvolver as

relações além das fronteiras, para crescer a solidariedade humana e para

assegurar a paz entre as nações” (MATTELART, 2002, p.233 e 234); sua

“expressão lírica” foi transcrita como: “Fazer do mundo uma só cidade e de

todos os povos uma só família”. A proposta de Otlet e La Fontaine tinha como

objetivo não somente a universalização do conhecimento, mas, especialmente,

que todos tivessem acesso à informação, a qual representaria a possibilidade de

realização do conhecimento no indivíduo, no seu grupo e na sociedade. Nesse

sentido, é possível entender como visionária “a idéia de bibliografia como

registro, memória do conhecimento científico, desvinculada dos organismos,

como arquivos e bibliotecas, e de acervos” (PINHEIRO, 1997, p.28), assim

como identificar nas atividades do Instituto a origem da Ciência da Informação

no contexto da emergência do espaço do saber.

E aqui, relacionamos a utopia planetária de Otlet e La Fontaine ao

conceito de inteligência coletiva de Lévy e ambos ao contexto da Internet13, a

qual engendra um mundo virtual que propicia possibilidades reais para criação

de novas formas de universalização do conhecimento humano. Nesse sentido,

temendo que o ciberespaço seja reservado à elite, Lévy (2000, p.65) destaca a

                                                                                                                     13 Ver FREIRE, 2005.

Page 96: Etica de la Información

necessidade e urgência de democratizar o acesso às tecnologias digitais de

informação e comunicação, de modo a oferecer “a uma coletividade o meio de

proferir um discurso plural, sem passar por representantes”. Suas previsões são

de que

[...] a capacidade mínima para navegar no ciberespaço se adquirirá

provavelmente em tempo muito menor que o necessário para aprender

a ler e, como a alfabetização, será associada a muitos outros

benefícios sociais, econômicos e culturais além do acesso à cidadania.

[...] A democracia em tempo real visa a constituição do ‘nós’ mais

rico.14 (LÉVY, 2000, p.63 e 67)

Como acredita que as redes de comunicação e as memórias digitais serão,

em breve, suporte para a maioria das representações e mensagens em circulação

no planeta, Lévy (2000) defende a hipótese de que é possível, e até desejável,

produzir dispositivos que encarnem ou materializem efetivamente a inteligência

coletiva:

[...] temos em mente vastas redes digitais, memórias, informáticas,

interfaces multimodais interativas, rápidas e nômades das quais os

indivíduos poderão se apropriar facilmente. Imaginamos, sobretudo,

uma relação com o saber diferente da que hoje prevalece, a

instauração de um espaço de comunicação não-midiático, uma

profunda renovação das relações humanas [...] uma reinvenção da

democracia. (LÉVY, 2000, p.94).

                                                                                                                     14 A propósito do sujeito coletivo (‘Nós’), observem o que diz Goldmann: “[...] Quase nenhuma ação humana tem por sujeito um indivíduo isolado. O sujeito da ação é um grupo, um ‘Nós’, mesmo se a estrutura atual da sociedade, pelo fenômeno da reificação, tende a encobrir esse ‘Nós’ e a transformá-lo numa soma de várias individualidades distintas e fechadas umas às outras. Há entre os homens uma outra relação possível além da relação de sujeito a objeto ou da de Eu e Tu: é uma relação de comunidade que chamaremos o ‘Nós’, expressão de uma ação comum sobre um objeto físico ou social” (GOLDMANN, 1979, p.18-19. Em itálico, no original).

Page 97: Etica de la Información

Desse modo, Lévy (2000, p.208 e 147) termina por afirmar sua

inteligência coletiva como “uma utopia do instável e do múltiplo”, que

responderia “a uma ética do melhor, mais que a uma moral do Bem”, definindo

os coletivos intelectuais como “meios humanos que encorajam as subjetividades

a se singularizar continuamente”. Para ele, “o projeto da inteligência coletiva

não adia a [possibilidade da] felicidade para mais tarde [dando] seqüência à

proposta de emancipação da filosofia das Luzes” (LÉVY, 2000, p.209). É esse

quadro referencial que nos permite situar a inteligência coletiva de Lévy (2000)

no âmbito das utopias planetárias e, como corolário, indício de uma consciência

possível para uma ética na sociedade em rede. Na Figura 1, a seguir,

desenhamos a rede do texto, tendo como atrator conceitual (WERSIG, 1993) o

construto inteligência coletiva:

Page 98: Etica de la Información

Figura 1 – Rede conceitual do texto. FREIRE, 2010.

Adaptado de WERSIG, 1993; FREIRE, 2001.

Legenda: Linha contínua = a urdidura da rede; Linha pontilhada = os fios da trama

Inteligência  coletiva  

[uma  inteligência  distribuída  por  

Tecnologia  da  informação  

[feixes  de  propriedades  ativas  na  

cognição,  Araujo,  2001;  Assmann,  2000;  

Lazarte,  2000;  Wersig,  1993]  

Sociedade  em  rede  

[possibilidade  de  acesso  à  informação  e  de  

comunicação,  Araujo,  1994;  Araujo  e  Freire,  1999;  

Inclusão  digital  

[possibilidade  de  inclusão  social,  Freire,  2005,  

2006a;  Néri  et  al.,  2003;  Rondelli,  2003;          Sorj,  

2003]    

Regime  de  informação  

[contexto,  González  de  Gómez,  1999;  

2003;  2004;  Unger;  Freire,  2008]  

Responsabilidade  Social  CI  

[facilitar  a  transmissão  do  conhecimento,  

Freire,1995;  2001;  2006b;  Wersig  e  Neveling,  1975]  

Consciência  possível  

[visão  de  mundo,  Freire,  1996;  2001;  2004;  

Goldmann,  1970]  

Ética  da  informação  

[Freire,  2004,  2005;  Goldmann,  1979;  Lévy,  2000;  Quéau,  2001]  

Campo  científico  da  informação:  

Construtos  teóricos  e  metodológicos  

Utopia  planetária  

[o  padrão  que  une,  Freire,  2001;  2005;    

Ginzburg,  1989;  Mattelart,  2002]  

Paradigma  indiciário  

[procedimentos,  Freire,  2001;  

2008;  Ginzburg,  1989]  

Page 99: Etica de la Información

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Nesse cenário de transformações reais, cresce a responsabilidade social

dos profissionais da informação, tanto como produtores de conhecimento no

campo científico quanto como facilitadores na comunicação da informação para

usuários que dela necessitem, na sociedade, independentemente dos espaços

sociais onde vivem e dos papéis que desempenham no sistema produtivo.

Crescem, também, as possibilidades de serem criados instrumentos para efetiva

comunicação da informação e do conhecimento, de modo a apoiar atividades

que fazem parte do próprio núcleo de transformação da sociedade: “Pois embora

a informação sempre tenha sido uma poderosa força de transformação, o capital,

a tecnologia, a multiplicação dos meios de comunicação de massa e sua

influência na socialização dos indivíduos deram uma nova dimensão a esse

potencial” (ARAUJO, 2001, p.15).

Essa visão pode significar um novo olhar sobre a prática, os conceitos e

tecnologias disponíveis no campo da Ciência da Informação. Um olhar que

contemple verdadeiramente o nosso ‘outro’, o usuário, e possa se traduzir no

desenvolvimento de uma práxis1 que nos aproxime, o mais possível, das pessoas

e grupos nos quais a informação que produzimos poderá se manifestar como

possibilidade de conhecimento.

Pois atualmente estamos presenciando a ‘nova relevância de um

fenômeno antigo’, a informação, cuja área de ação e atuação, ao longo do século

XX, cresceu de tal modo a identificar-se com a sociedade contemporânea,

                                                                                                                     1 Conforme Konder (1992, p.97-115 passim), no grego antigo a palavra “designava a ação que se realizava no âmbito das relações entre as pessoas, a ação intersubjetiva, a ação moral, a ação dos cidadãos. [No pensamento marxista,] é a atividade concreta pela qual os sujeitos humanos se afirmam no mundo, modificando a realidade objetiva e, [nesse processo,] transformando-se a si mesmos. É a ação que [...] precisa da reflexão, do autoquestionamento, da teoria; e é a teoria que remete à ação, que enfrenta o desafio de verificar seus acertos e desacertos, cotejando-os com a prática”.

Page 100: Etica de la Información

qualificada como ‘sociedade da informação’. Neste contexto, acrescentamos a

contribuição de Quéau (2001, p.480) ao quadro das utopias planetárias, quando

coloca que “o mundo precisa de uma visão, de um projeto que possa levar em

conta [todos os indivíduos], especialmente os mais pobres e mais deserdados”.

Como Lévy (2000), ele elege o estrangeiro o símbolo da diferença por ser a

imagem do ‘outro’, lembrando que existem muitos ‘outros’: “o desempregado, o

pobre ou o iletrado. [Estes,] quase por natureza, são excluídos da sociedade da

informação” (QUÉAU, 1998, p.270).

Enfim, encerrando essas breves reflexões, podemos considerar que no

caso de uma ética para a sociedade da informação não há um manual de

procedimentos a ser consultado, nem tampouco um mapa do caminho a seguir.

O que, de certo modo, representa uma oportunidade histórica para a discussão e

o posicionamento dos cientistas e profissionais da informação sobre formas de

atuação como inteligência coletiva, no sentido de pensar e desenvolver modos e

meios para inclusão digital de populações social e economicamente carentes,

pari passu com ações pela cidadania e inclusão social. Como a vivência de uma

ética pessoal e coletiva que considere a possibilidade de contribuir para o acesso

livre à informação pelos mais diferentes grupos sociais.

Transportar, nas asas da informação2, o conhecimento para todos aqueles

que dele necessitem: esta seria, a nosso ver, a parte que nos cabe na tarefa

coletiva de construir uma sociedade em rede democrática e justa.

Porém, este é um trabalho que as utopias planetárias podem até inspirar, e

um sujeito coletivo como a Ciência da Informação pode até tomar como mote.

Mas que caberá aos sujeitos individuais realizarem no anonimato existencial de

cada vida, desde que vivida para apostar na unidade do gênero humano e numa

filosofia de mútua reciprocidade e solidariedade. Para não esquecer que o

‘outro’ sou eu, na dupla hélice do DNA.                                                                                                                      2 Uma metáfora que criamos para o conceito de informação como “representação do conhecimento” proposto por Farradane (1980), e que usamos para ilustrar a proposta de Wersig e Neveling (1975) sobre a responsabilidade social da Ciência da Informação.

Page 101: Etica de la Información

REFERÊNCIAS

ARAUJO, V.M.R.H. de. Miséria informacional. O paradoxo da subinformação e

superinformação. Revista Inteligência Empresarial, n.7, abril 2001.

ARAUJO, V.M.R.H. de. Sistemas de recuperação da informação: nova abordagem teórico-

conceitual. Rio de Janeiro, 1994. Tese (Doutorado em Comunicação e Cultura). Escola de

Comunicação da UFRJ, 1994.

ARAUJO, V.M.R.H. de; FREIRE, I.M. Conhecimento para o desenvolvimento: reflexões

para o profissional da informação. Informação & Sociedade: Estudos, v.9, n.1, 1999.

ASSMANN, H. A metamorfose do aprender na sociedade da informação. Ciência da

Informação, v. 29, n. 2, 2000.

BOURDIEU, P. O campo científico. In: ORTIZ, R. (Org.). Sociologia. 2. ed. São Paulo:

Ática, 1994.

CASTELLS, M. A galáxia da Internet: reflexões sobre a Internet, os negócios e a sociedade.

Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2003.

CASTELLS, M. A sociedade em rede. São Paulo: Paz e Terra, 1999.

COMITÊ GESTOR DA INTERNET NO BRASIL (CGI). Pesquisa Sobre o Uso das

Tecnologias da Informação e da Comunicação no Brasil: TIC domicílios e TIC empresas

2006. São Paulo, 2007. Disponível em: <http://www.cetic.br/tic/2006/indicadores-2006.pdf>.

Acesso em: jan. 2008.

DÜRMAIER, A.T.M. C. Do conceito e da medida da pobreza de informação e comunicação.

Informação & Sociedade: Estudos, v.19, n.3, 2009.

DUTTON, W.H. Society on the Line: Information Politics in the Digital Age. New York:

Oxford Press University, 1999.

Page 102: Etica de la Información

FARRADANE, J. Knowledge, information and information science. Journal of Information

Science, v.2, 1980.

FIGUEIREDO, N. Paul Otlet e o centenário da FID. In: IBICT. Organização do

conhecimento e sistemas de classificação. Brasília: IBICT, 1996.

FREIRE, I.M. Um olhar sobre a produção científica brasileira na temática epistemologia da

ciência da informação. Tendências da Pesquisa Brasileira em Ciência da Informação, v.1,

n.1, 2008.

FREIRE, I.M. Janelas da cultura local: abrindo oportunidades para inclusão digital de

comunidades. Ciência da Informação, v.35, n.3, 2006a.

FREIRE, I.M. Acesso à informação e identidade cultural: entre o global e o local. Ciência da

Informação, v.35, n.2, 2006b.

FREIRE, I. M. A utopia planetária de Pierre Lévy: uma leitura hipertextual d’a inteligência

coletiva. Perspectivas em Ciência da Informação, v.10, n.2, 2005.

FREIRE, I.M. O desafio da inclusão digital. Transinformação, v.16, n.2, 2004.

FREIRE, I.M. O futuro é agora. Revista Você S/A, agosto de 2003.

FREIRE, I.M. A responsabilidade social da ciência da informação e/ou O olhar da

consciência possível sobre o campo científico. 2001. Tese (Dout. Ciência da Informação).

Rio de Janeiro: IBICT – UFRJ, 2001.

FREIRE, I.M. O desviante secreto: um exercício conceitual. Ciência da Informação, v.25,

n.3, 1996.

FREIRE, I.M. Informação; consciência possível; campo. Um exercício com construtos

teóricos. Ciência da Informação, v. 24, n.1, 1995.

GINZBURG, C. Mitos, emblemas, sinais: morfologia e história. SP: Cia. das Letras, 1989.

Page 103: Etica de la Información

GOLDMANN, L. Dialética e cultura. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1979.

GOLDMANN, L. Importância do conceito de consciência possível para a informação. In:

COLÓQUIOS FILOSÓFICOS DE ROYAUMONT. O conceito de informação na ciência

contemporânea. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1970.

GONZÁLEZ DE GÓMEZ, M.N. Novas fronteiras tecnológicas das ações de informação:

questões e abordagens. Ciência da Informação, v.33, n.1, 2004.

GONZÁLEZ DE GÓMEZ, M.N. Escopo e abrangência da Ciência da Informação e a Pós-

Graduação na área: anotações para uma reflexão. Transinformação, v. 15, n. 1, 2003.

GONZÁLEZ DE GÓMEZ, M.N. Da política de informação ao papel da informação na

política contemporânea. Revista Internacional de Estudos Políticos, v.1, n.1, p.57-93, 1999.

INCLUSÃO DIGITAL: a brecha para que o Brasil se aproxime de seus excluídos. Revista

Inteligência Empresarial, n.14, janeiro 2003.

INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA (IBGE). Pesquisa

Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD): síntese de indicadores: 2006. Rio de Janeiro,

2006. Disponível em:

http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/trabalhoerendimento/pnad2006/comentarios2006.pdf.

Acesso em: set. 2007.

INSTITUTO BRASILEIRO DE INFORMAÇÃO EM CIÊNCIA E TECNOLOGIA (IBICT).

Mapa de Inclusão Digital. 2008. Disponível em: <http://inclusao.ibict.br>. Acesso em: dez. 2008.

KONDER, L. O futuro da filosofia da práxis: o pensamento de Marx no século XXI. Rio de

Janeiro: Paz e Terra, 1992.

LAZARTE, L. Ecologia cognitiva na sociedade da informação. Ciência da Informação,

v.29, n.2, 2000.

Page 104: Etica de la Información

LÉVY, P. A inteligência coletiva: por uma antropologia do ciberespaço. SP: Loyola, 2000.

LÉVY, P. Cibercultura. São Paulo: Ed. 34, 1999.

MATTELART, A. História da utopia planetária: da cidade profética à sociedade global.

Porto Alegre: Ed. Sulina, 2002.

MORIN, E. O paradigma perdido: a natureza humana. 5ed. Lisboa: Europa-América, 1991.

NERI, M.; CARVALHAES, L.; NERI, A.L.; PIERONI, A. Lei de Moore e Políticas de

Inclusão Digital. Revista Inteligência Empresarial, n.14, jan. 2003.

PEREIRA, P.M.S. Necessidade e uso de informação no contexto da inclusão digital: uma

visão da política de inclusão digital de Quissamã/RJ. 2009. Dissertação (Mestr. Ciência da

Informação). Niterói: UFF : IBICT, 2009.

PINHEIRO, L.V.R. A Ciência da Informação entre sombra e luz: domínio epistemológico

e campo interdisciplinar. 1997. Tese (Dout. em Comunicação e Cultura). Rio de Janeiro:

UFRJ/Escola de Comunicação, 1997.

QUÉAU, P. Cibercutlura e info-ética. In: MORIN, E. (Org.). A Religação dos Saberes: o

desafio do século XXI. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2001.

QUÉAU, P. A revolução da informação: em busca do bem comum. Ciência da Informação,

v.27, n.2, 1998.

RONDELLI, E. Quatro passos para a inclusão digital. Em www.icoletiva.com.br, 2003

SORJ, B. [email protected]: a luta contra a desigualdade na Sociedade da Informação. Rio

de Janeiro: Jorge Zahar Ed.; Brasília: Unesco, 2003.

Page 105: Etica de la Información

UNGER, R.J.G.; FREIRE, I.M. Regimes de informação na sociedade da informação: uma

contribuição para a gestão da informação. Revista Digital de Biblioteconomia e Ciência da

Informação, n.2. 2008.

WERSIG, G., NEVELING, U. The phenomena of interest to information science. The

Information Scientist, v.9, n.4, 1975.

Page 106: Etica de la Información

A PESQUISA E SUAS APLICAÇÕES EM CIÊNCIA DA

INFORMAÇÃO: Implicações éticas

Armando Malheiro da Silva*

1 Da Epistemologia à Ètica

O desafio, lançado através do convite a participar no I Simpósio Brasileiro

de Ética da Informação, teve como consequência imediata sentirmos,

claramente, a necessidade de reflectir sobre a concepção epistemológica, que de

há uns anos vimos traçando para a Ciência da Informação, ensinada e debatida

no âmbito das iniciativas científico-pedagógicas (Licenciatura e Mestrado),

levadas a cabo, em parceria, pelas Faculdades de Engenharia e de Letras da

Universidade do Porto. Convém frisar que esta comunicação marca quer o início

de uma trajectória que, certamente, será retomada e prosseguida, quer a

pertinência de se dotar um projecto epistemológico, como o que foi esboçado no

livro Das “Ciências” Documentais à Ciência da Informação (SILVA;

RIBEIRO, 2002) e tem sido desenvolvido e aperfeiçoado desde então, de uma

análise de cariz ético. Análise essa que tem de permitir evidenciar as

implicações de ordem ética, patentes tanto no plano da pesquisa, elaborada pela

C.I., como no dos efeitos e das consequências provocados pelas aplicações que

uma ciência social aplicada, categoria em que é incluída a C.I., naturalmente

tende a gerar e a estimular nos mais diversos sectores de actividade e em

articulação operacional com outros domínios científicos e tecnológicos. Esse

plano dos efeitos concretos das aplicações revela-se no campo profissional e aí

Page 107: Etica de la Información

temos o imperativo dos códigos deontológicos, que regulam e balizam as

attitudes e práticas comportamentais dos agentes e colaboradores.

Até agora, temo-nos focado e preocupado com a reflexão e a indagação

sobre as condições internas e externas do conhecimento científico, produzido e

acumulado no decurso da “existência útil” da C.I. Em sentido amplo,

epistemologia é definida como um ramo da Filosofia que trata dos problemas

filosóficos relacionados com a crença e o conhecimento: investiga a origem, a

estrutura, os métodos e a validade do conhecimento. Nesta acepção radical e

ampla, a epistemologia é equivalente a outros termos e expressões como

filosofia do conhecimento, teoria do conhecimento ou ainda gnoseologia,

inscrevendo-se, aí, algumas questões axiais ou “clássicas”: será que o ser

humano conseguirá algum dia atingir realmente o conhecimento total e genuíno,

fazendo-nos oscilar entre uma resposta dogmática ou empirista? Haverá

realmente a distinção entre o mundo cognoscível e o mundo incognoscível? Por

quais faculdades atingimos o conhecimento? Haverá conhecimento certo e

seguro em alguma concepção a priori? A busca de respostas adequadas a estas e

outras questões correlatas processa-se, há milénios, no interior da Filosofia,

enquanto mais recentemente, a partir de meados do séc XIX, a fulgurante

ascensão da Ciência Moderna e a sua crise, posta a nu, muito especialmente,

pelos dois conflitos ocorridos na Europa e com ramificações noutras latitudes do

planeta (a Grande Guerra, 1914-1918 e a II Guerra Mundial, 1939-1945), tornou

inevitável uma especificação da espistemologia, isto é, a sua ressignificação em

sentido restrito: a reflexão crítica sobre a origem, a natureza, a evolução e os

limites do conhecimento produzido por cada ciência. Usando uma metáfora, que

nos parece sugestiva, esta epistemologia localizada e instrumental é uma espécie

de dispositivo de controlo, que instalado num carro, faz o monitoramento do

motor e de todos os componentes do veículo, indicando de imediato algum

problema ou avaria, sua localização precisa, e possibilitando, assim, que a

mesma seja resolvida e superada. Não se deve, pois, estranhar, tendo em conta

Page 108: Etica de la Información

esta metáfora, que os epistemólogos da Física tenham sido e sejam físicos, ou

que os teóricos da história sejam historiadores, embora esta tendência não

exclua, antes coexiste com o interesse dos filósofos pelos problemas epistémicos

“particulares” das diversas ciências. E é, óbviamente, este o tipo de

epistemologia em foco na presente intervenção…

Quanto à Ética, partamos já da ideia básica de que se trata de outro ramo

ou disciplina filosófica, cujo sentido nuclear podemos entreabrir pela via

etimológica: a palavra vem do grego ethos, que significa modo de ser, carácter;

no latim, mos ou mores (plural) significa costumes e daí derivou o termo moral.

Ética e moral confundem-se em nível semântico, mas também não tem faltado

quem as ouse distinguir. E entre várias distinções possíveis trazemos, pela sua

razoabilidade, uma à colação: a Ética trata/estuda o que é bom para o indíviduo

e para a sociedade, tendo em vista qual a natureza dos deveres na interacção

pessoa e sociedade; a Moral é o conjunto de normas, princípios, preceitos,

costumes e valores que guiam a conduta do indivíduo dentro do seu grupo

social. A Moral é normativa, enquanto a Ética é teórica, procurando explicar e

justificar os costumes de uma sociedade, bem como ajudar na resolução dos seus

dilemas mais comuns. E, se é possível distinguir Ética de Moral, mais fácil e

necessário se torna distingui-la da lei, embora esta tenha por base, natural e

frequentemente, princípios éticos. Decorre, desta distinção, outra, que é

subsequente: Ética não é deontologia e muito menos código deontológico, mas

este será tanto melhor e oportuno, quanto mais e fundas raízes tiver na Ética.

Fernando Savater, na sua Ética para um jovem (Ética para Amador, na versão

espanhola e original), quase a finalizar o capítulo cinco, sintetiza bem o que,

aqui, importa

deixar claro:

Creio que a primeira e indispensável condição ética é a de estarmos

decididos a não viver de qualquer maneira: estarmos convencidos de que

Page 109: Etica de la Información

nem tudo vem a dar no mesmo, embora, mais tarde ou mais cedo, tenhamos

que morrer. Quando se fala de “moral” pensa-se habitualmente nas ordens e

costumes que é hábito respeitar, pelo menos na aparência e muitas vezes

sem que se saiba bem porquê. Mas talvez o busílis da questão não esteja em

submetermo-nos a um código ou em contrariar o estabelecido (o que é

também submetermo-nos a um código, só que às avessas) mas em tentar

compreender. Compreender porque é que certos comportamentos nos

convém e outros não, compreender o que é a vida e o que é que pode fazê-la

“boa” para nós, seres humanos (SAVATER, 1998, p. 68).

O popular filósofo e especialista espanhol em Ética, através deste

extracto, ajuda-nos a esclarecer que não nos preocupa discutir a deontologia do

profissional da informação, assunto, sem dúvida, importante, tanto mais que um

código deontológico pode e deve ser uma extensão bem conseguida de um sério

debate ético, mas como estamos a abrir caminho por terreno que até agora não

ousaramos explorar, o que realmente nos interessa é compreender as

implicações éticas do processo de pesquisa e dos modos como as aplicações

práticas são percebidas e assimiladas nos contextos a que se destinam. Neste

sentido, torna-se necessário subdividir a Ética da Informação, que centraliza o

título deste primeiro Simpósio, em um tópico específico reservado à Ética

implicada no estudo científico do processo info-comunicacional. Para bem se

perceber a diferença, que estamos a introduzir, valerá a pena destacar o

esclarecimento com que Adam D. Moore e Kristene Unsworth decidiram abrir a

introdução da obra colectiva Information Ethics: privacy, property and power:

Information ethics is a relatively new area of study comprised of several

distinct yet interrelated disciplines including applied ethics, intellectual

property, privacy, free speech, and societal control of information. The

various issues addressed within these disciplines, along with the rise of

technology-based information control, have lead many to understand these

domains as interconnected. For example, when a photographer captures the

Page 110: Etica de la Información

image of a nude girl running from a napalm attack, questions arise that are

related to each of these areas. Does the photographer own the picture in

question? Does the girl have a privacy right that overrides the

photographer’s ownership claims? Given that important information might

be contained in the photograph, do free speech concerns play a role in

deciding the moral issues surrounding the publication of the picture?

Finally, if there were some reason to suppress the publication of the

photograph, independent of privacy – perhaps publication would turn public

sentiment against some governamental interest, for example – would such

interests provide a compelling justification for suppression? Obviously, the

justifications and answers we give in one area of study will impact the

arguments and policy decisions in other areas. (MOORE, 2005, p. 11).

Seguindo, pois, pelo caminho escolhido, temos que explicar qual a

concepção de C.I. que defendemos e rematamos este prazeiroso, mas árduo

exercício, com as mais importantes questões e tópicos implicados na agenda de

pesquisa teórico-prática da C.I. – um desiderato que iniciativas como a do livro

A Ética na Sociedade, na área da Informação e da atuação profissional,

organizado por Henriette Ferreira Gomes, Aldinar Martins Bottentuit e Maria

Odaísa Espinheiro de Oliveira (GOMES, BOTTENTUIT; OLIVEIRA, 2009),

visam atingir, embora haja nesse livro apenas um texto – Sociologia e valores,

os valores da Sociologia, por Bernardo Sorj – que mais de perto se assemelha ao

propósito da nossa comunicação.

2 De que Ciência da Informação falamos?

Há critérios seguros para definir a CI como ciência? Como se manifesta o

objecto desta ciência e que métodos usam os seus cientistas? Quem são? Onde

estão? Há um método próprio da CI? Ou ela é parasita dos métodos das Ciências

Sociais? A CI é uma ciência social? Questões tão fundamentais, quanto difíceis

Page 111: Etica de la Información

de serem respondidas, porquanto a eventual ausência de resposta seria, por si só,

a assunção da impossibilidade científica deste campo disciplinar. Justifica-se,

assim, todo o empenho em traçar rumos e perspectivas de cientificidade, e é

importante assumir posicionamentos claros, ainda que controversos e sujeitos a

análises críticas construtivas.

A concepção de CI, que vimos tecendo e consolidando, é diversa da que

continua a ser propalada, por exemplo, no Brasil, e que tem a ver com uma

disciplina surgida nos EUA, em plena “sociedade pós-industrial”, e centrada no

processamento automatizado da informação científica e técnica (LINARES

COLUMBLÉ, 2005, p. 3-32). Esta CI norte-americana seria paralela à

Documentação, à Biblioteconomia e à Arquivística. Paralela e autónoma. A

nossa concepção, por seu turno, constrói-se como resposta, necessária e

possível, a um conjunto de questões fundamentais que permanecem em aberto e

alimentam um inesgotável debate: inspirada na citadíssima, ainda que pouco

seguida, definição do artigo de Harold Borko (1968) e na proposta unitária e

interdisciplinar de Yves Le Coadic (1994; 1997), a nossa concepção de CI é

transdisciplinar, ou seja, constitui um estádio epistemológico evolutivo,

resultante da interacção e integração das disciplinas práticas supracitadas.

Mantém, naturalmente, a sua vocação interdisciplinar, que ocorre por níveis de

proximidade, acontecendo, em primeiro lugar, no campo emergente das Ciências

da Informação e Comunicação e, em seguida, no campo mais vasto das Ciências

Sociais Aplicadas. Convoca um Método típico da investigação social, qualitativa

e anti-positivista - trata-se do Método Quadripolar (SILVA; RIBEIRO, 2002, p.

84-121; SILVA, 2006, p. 15-31) formulado, em 1974, por Paul De Bruyne,

Jacques Herman e Marc De Schoutheete, todos da Universidade de Louvain,

Bélgica. E precisa, ainda, de uma metateoria explicativa, baseada em dois

paradigmas essenciais: o custodial, patrimonialista, historicista e tecnicista, que

surge a partir do séc. XVIII até à Era da Informação em que vivemos; e o pós-

custodial, informacional e científico, que tenderá a formatar o modo de ver, de

Page 112: Etica de la Información

pensar e de agir de gerações de cientistas e profissionais da informação, ao

longo do séc. XXI (SILVA, 2006, p. 158-159). A transição de um paradigma

para outro não ocorre por ruptura, é gradual, tensa e está em curso.

O paradigma custodial e patrimonialista desenvolveu-se, sobretudo, a

partir de uma formação localizada e centrada no locus profissional (Arquivos,

Bibliotecas e Museus), com suas tarefas e exigências práticas que se

sobrepunham a eventuais preocupações teóricas e reflexivas. Estabelecimentos

de ensino modelares, dentro deste paradigma, como a École National des

Chartes (1821), junto da Sorbonne, em Paris, ou, para o caso português, o Curso

Superior de Letras, em Lisboa primeiro e, depois, a Faculdade de Letras da

Universidade de Coimbra, onde ficou fixado, de 1935 a 1982, o Curso de

Bibliotecário-Arquivista, curso de especialização pós-graduada, com duração de

dois anos, não escuraram os conhecimentos teóricos, mas estes emanavam

directamente da Filologia, das Línguas Clássicas, da Literatura e da História,

com os seus ramos auxiliares, como a Arqueologia, a Paleografia, a

Diplomática, a Numismática, a Epigrafia, etc., gerando-se um imparável défice

de base teórica, para indagações e interpretações, na dimensão especificamente

arquivística e biblioteconómica. Os documentos eram objectos físicos e, ao

mesmo tempo, fontes indispensáveis à produção de ciência e à valorização da

cultura de um povo. Guardar os documentos antigos e raros tornou-se a missão

primeira e última dos profissionais, colocados nas instituições culturais, criadas

e assumidas pelo Estado-Nação após a Revolução Francesa, o que,

naturalmente, permitiu associações fáceis e imediatas, como a de cultura com

património, e separações perversas, como o fosso cavado entre cultura “erudita”

e “popular” – legado paradigmático reproduzido por gerações. Por outro lado, a

consciência do acesso aos conteúdos, que decorria da função original

consignada, para Arquivos e Bibliotecas, nas leis revolucionárias de setecentos,

era contraditória (os documentos deviam estar acessíveis a todos, mas nem todos

os mereciam...) e esbarrou em obstáculos de diversa ordem, nomeadamente

Page 113: Etica de la Información

sócio-culturais (taxas elevadíssimas de analfabetismo), tecnológicos (as

limitações físicas da impressão em papel e a degenerescência das fotocópias e de

outros produtos reprografados), sócio-económicos (desigualdade econômica no

acesso a níveis superiores de ensino) e administrativos (a imposição de limites

de idade e de regras aos utilizadores, francamente desestimuladores da

consulta), que a atrofiaram até ao surgimento da Era da Informação em que já

estamos em pleno.

Tendo em conta estas características gerais do paradigma custodial, fica

mais fácil perceber que ele se ajusta à génese e evolução do Estado-Nação

liberal e capitalista que desembocará, graças aos contributos diversos e

convergentes do comunismo e do fascismo/nazismo, no Estado Cultural, que

teve, em França, com a dupla De Gaulle-Malraux, a sua consagração

democrática e “cultualista” (SILVA, 2007, p. 219-228; SILVA, 2009, p. 637-

662; FUMAROLI, 1999). Arquivos, Bibliotecas e Museus surgiram e evoluíram

como lugares da memória (Pierre Nora), intrínsecos à estratégia de um

nacionalismo identitário essencial à assimilação dos efeitos vários das 1ª e 2ª

vagas de industrialização, na dinâmica social e nas condutas individuais.

Lugares da memória úteis ao Poder liberal e capitalista, que se afirma na Europa

Ocidental e no Novo Mundo, mas, também, paradoxalmente, em ruptura com

algumas necessidades vitais do novo Poder – o seu centralismo burocrático

(Max Weber) exigia cada vez mais uma atenção ao fluxo documental

administrativo e técnico (SILVA, 2009a: 654-658). Daí o aparecimento, bastante

nítido no espaço anglo-americano, de Archives (Arquivos Públicos) e de

Records (Arquivos Administrativos), ou a oposição entre Bibliotecas eruditas e

Bibliotecas Especializadas/Centros de Documentação, voltados para publicações

actuais e específicas, tratadas e ordenadas segundo novas técnicas bibliográficas

e pela CDU. A transição do Estado-Nação (liberal, burguês e capitalista), para o

“Estado Cultural” intervencionista do pós-II Guerra Mundial, foi acompanhada

pela co-existência dos Arquivos Públicos ou Históricos e dos Administrativos

Page 114: Etica de la Información

(ínsitos às mais diversas Organizações). O Estado Cultural, no espaço da Europa

democrática e social-democrata, confunde-se com o Estado Providência,

promotor e utilizador dos equipamentos culturais para massificarem e

democratizarem a fruição do património material e imaterial; implica “políticas

públicas”, entendidas como decisões conformadoras de cariz inovador, que são

acompanhadas das medidas necessárias para a sua continuidade e execução; e

preservou o paradigma custodial e patrimonialista, mas ao mesmo tempo, foi

propiciando a substituição da tutela da História e de outras Ciências Humanas e

Sociais pela Técnica Documental, materializada num conjunto de normas,

procedimentos e orientações práticas centradas na descrição dos documentos

(objectos físicos) e na indicação de pontos de acesso controlados ao conteúdo

desses objectos. E, deste modo, foi sendo gerado um novo paradigma – o pós-

custodial, informacional e científico – que só pôde “nascer” na segunda metade

de novecentos, em consequência da génese e expansão da “Sociedade da

Informação” ou da “Sociedade em Rede” (Manuel Castells), expressões que

podem ficar subsumidas numa outra, mais apropriada do ponto de vista do longo

prazo ou estrutural, a Era da Informação (CASTELLS, 2002-2003).

No paradigma pós-custodial, não se pode proclamar a “morte do

documento”, porque não é sequer pensável a equivocada desmaterialização da

informação (JEANNERET, 2000, p. 68-79), na medida em que quando alguém

externaliza o que pensa, o que sente, o que precisa ou o que quer tende a buscar

um suporte material que veicule e registe/preserve as suas palavras, números,

desenhos ou imagens. Mas, se é verdade que o documento, entendido como

informação (conjunto estruturado de representações mentais e emocionais

codificadas... – SILVA, 2006, p. 150) mais suporte (seja qual este for, tem

sempre um sentido intrínseco e suscita possíveis e diversas leituras), é e

continuará sendo incontornável, também é evidente que o aparecimento das

Tecnologias de Informação e Comunicação (as TIC) introduziu uma dinâmica

inteiramente nova na reprodução e na comunicabilidade dos

Page 115: Etica de la Información

conteúdos/informação, contribuindo para que esta coexista, sem alterações

estruturais internas, em dois ou mais suportes diferentes. Perante esta

multiplicação de documentos, com idêntico conteúdo, a informação sobressai

como a “substância” a “destacar” e, a seguir, porquanto continuará sendo

reproduzida e posta, sem limites, a “circular”. E isto é, obviamente, o oposto de

custodiar ou guardar, de fechar, de esconder... O conceito de informação

convoca, deste modo, o de comunicação e ambos se reportam a um fenómeno

humano e social que tem a ver com a capacidade simbólica de cada pessoa e

com a necessidade de uma interagir com outra ou outras. Esta conceituação abre,

também, espaço para que se instaure não mais abordagens práticas e

instrumentais voltadas para o primado de descrever os documentos (objectos

culturais e patrimoniais conservados em instituições custodiadoras, como são os

Arquivos e as Bibliotecas), mas um esforço de cientificidade que compreenda e

explique os modos e os contextos de produção informacional, os imperativos e

as formas de mediação plasmadas nas estratégias de organização e representação

de conteúdos, em especial, nas bases de dados e diversas plataformas digitais e

os múltiplos aspectos e nuances do comportamento individual e colectivo, em

face à busca e uso da informação.

O paradigma pós-custodial, informacional e científico implica, também,

uma mudança de postura epistemológica fundamental: da ênfase nas abordagens

instrumentais, práticas, normativas e prevalecentemente descritivas dos

documentos-artefactos tem de se passar para a compreensão e a explicação do

fenómeno info-comunicacional, patente num conjunto sequencial de

etapas/momentos intrínsecos à capacidade simbólico-relacional dos seres

humanos - origem, colecta, organização, armazenamento, recuperação,

interpretação, transmissão, transformação e utilização da informação. Trata-se,

claramente, do imperativo da cientificidade diante dos desafios imensos e

incertos que se erguem na actual Era da Informação, que se está estruturando de

forma diversificada e complexa, e em que a internet assume a função de

Page 116: Etica de la Información

ferramenta de construção de projectos individuais desenvolvidos a partir de

diferentes dimensões (...) a Internet é na sua constituição e apropriação flexível,

interactiva, dotada de ubiquidade, global, acessível e não depende dos poderes

passados ou existentes (CARDOSO, 2006, p. 37). A CI que brota deste novo

paradigma é um projecto emergente, com fragilidades e com potencialidades,

sintonizado com o universo dinâmico das Ciências Sociais e centrado na

compreensão do social e do cultural, com influência directa no processo

formativo dos futuros profissionais da informação. Assim sendo, convém

enfatizar o dispositivo teóricometodológico, desta ciência emergente, preparado

para atender às exigências de um enfoque que só, subsequentemente, é que é

comunicacional, ou seja, o foco incide, antes de tudo, na produção

informacional (em situações, contexto(s) e meio ambiente), seguindo-se ou não

a dinâmica da partilha, da interacção ou da acção comunicante. Não se pode, por

isso, negar a presença, no objecto construído sobre o fenómeno info-

comunicacional, de uma problemática do sentido que implica o recurso à

hermenêutica, ainda que esta se empregue apenas para tecer a interpretação do

“processo” da infocomunicação e não dos discursos e seus interstícios.

1. O “olho” da Ética na actividade científica

Baseamo-nos na sinopse exposta para formularmos as questões e os

tópicos de Ética que é possível ir identificando no processo de pesquisa e de

aplicações práticas. E, para tanto, parece-nos adequado usar o Método

Quadripolar (esquema abaixo), concebido para as Ciências Sociais (“puras” e

aplicadas) e que vimos propondo, desde 1999 (SILVA et al., 1999), como

próprio da CI, na concretização do objectivo traçado.

Page 117: Etica de la Información

Consideremos, pois, o plano geral da pesquisa, activando o Método

Quadripolar, no primeiro e mais fundamental pólo que é o epistemológico, em

que se inscreve o paradigma

Método quadripolar de investigação: interacções entre os pólos

(ou modo de ver, pensar e abordar o objecto próprio da respectiva disciplina

cientifica) que

condiciona o sujeito-pesquisador e o obriga a assumir essa influência

paradigmática, operando, na medida do possível, a adequada vigilância crítica.

No que concerne, especificamente, à CI, o paradigma custodial,

patrimonialista, historicista e tecnicista, sumariado no ponto anterior e surgido

no séc. XVIII, está em crise e tende a ser substituído, a prazo, pelo paradigma

emergente – pós-custodial, informacional e científico, também sumariado atrás.

O sujeito-pesquisador começa por se posicionar perante um destes dois

paradigmas, assumindo os valores que lhe são inerentes. O paradigma custodial

Page 118: Etica de la Información

enfatiza a memória documental como traço essencial à afirmação da identidade

de um grupo, comunidade ou povo/nação. Guardar é a condição sine qua non

para que o Bem Comum seja satisfeito, considerando que este depende da

salvaguarda da memória e da identidade colectivas. A defesa do património

converte-se num valor ético evidente até que a sua prática degenere num desvio

ou perversão nociva a terceiros. Sobre esta eventual possibilidade temos a

eloquentíssima caricatura de Umberto Eco no seu precioso opúsculo A

Biblioteca:

No início, no tempo de Assurbanípal ou de Polícrates, talvez fosse uma

função de recolha, para não deixar dispersos os rolos ou volumes. Mais

tarde, creio que a sua função tenha sido de entesourar: eram valiosos, os

rolos. Depois, na época beneditina, de transcrever: a biblioteca quase como

uma zona de passagem, o livro chega, é transcrito e o original ou a cópia

voltam a partir. Penso que em determinada época, talvez já entre Augusto e

Constantino, a função de uma biblioteca seria também a de fazer com que as

pessoas lessem, e portanto, mais ou menos, de respeitar as deliberações da

UNESCO que pude encontrar no volume que chegou hoje às minhas mãos,

e onde se diz que uma das finalidades da biblioteca consiste em permitir que

o público leia os livros. Mas depois creio que nasceram bibliotecas cuja

função era de não deixar ler, de esconder, de ocultar o livro. É claro que

essas bibliotecas também eram feitas para permitir que se encontrasse.

Surpreende-nos sempre a habilidade dos humanistas do século XV em

encontrarem manuscritos perdidos. Onde é que os encontram? Encontram-

nos na biblioteca. Em bibliotecas que em parte serviam para esconder, mas

que também serviam para se achar (ECO, 1998, p. 15-16).

Nessas instituições e serviços feitos para esconder, para ocultar, para

dificultar ao máximo a vida ao leitor surge gigantesca e medonha a má

biblioteca, com seus requintes de

Page 119: Etica de la Información

malvadez e de irritação capaz de “virar do avesso” o mais paciente e fleumático

utilizador. Nessa má biblioteca, os catálogos devem estar divididos ao máximo,

separando-se com cuidado o catálogo dos livros do das revistas e levando o

capricho ao extremo de manter ortografias antigas e estranhas; os temas devem

ser escolhidos pelo bibliotecário; as cotas devem ser intranscritíveis e de tal

modo concebidas que o leitor que preencher a ficha [de requisição da obra]

nunca tenha espaço para escrever a última denominação e a considere

irrelevante (ECO, 1998, p. 18); a demora na entrega do livro deve ser muito

prolongada; só pode ser entregue um livro de cada vez; deve ser desencorajada a

leitura cruzada de vários livros porque causa estrabismo; a ausência de máquinas

fotocopiadoras deve ser total, mas se por algum acaso existir uma, o acesso a ela

deve ser muito demorado e cansativo, os preços superiores aos da livraria e os

limites de cópias reduzidos a não mais de duas ou três cópias (ECO, 1998: 19);

o leitor deve ser considerado pelo bibliotecário como um inimigo, um vadio

(senão estaria a trabalhar), um ladrão potencial (ECO, 1998, p. 19); quase todo

o pessoal deve ser afectado por limitações de ordem física (ECO, 1998, p. 19);

não deve ser facilitado o empréstimo de livros; o empréstimo inter-bibliotecas

deve ser impossível ou, então, demorar meses; em contrapartida, o furto deve ser

facilitado; os horários de funcionamento têm de coincidir com os de trabalho,

porque o maior inimigo da biblioteca é o estudante-trabalhador e o seu melhor

amigo é Don Ferrante, alguém que tem a sua biblioteca pessoal, que não

precisa, portanto, de ir à biblioteca e que, quando morre, a deixa em herança

(ECO, 1998: 22); deve ser proibido restaurar as energias na biblioteca e nem

fora dela, pelo menos, enquanto não forem devolvidos todos os livros

requisitados; tem de ser impossível encontrar o mesmo livro no dia seguinte;

tem de ser impossível saber quem levou emprestado o livro em falta; de

preferência, há que abolir os sanitários; e, um último quesito, e talvez o mais

cabal que dispensaria todos os outros, tem a ver com a proibição do utente entrar

na biblioteca, mas admitindo, no usufruto caprichoso e antipático de um direito

Page 120: Etica de la Información

que lhe foi concedido com base nos princípios de oitenta e nove [referência ao

ano de 1789 e à Revolução Francesa, que aprovou a Declaração dos Direitos do

Homem e do Cidadão] mas que, todavia, não foi ainda assimilado pela

sensibilidade colectiva, em todo o caso não deve, nem deverá nunca, à excepção

das rápidas travessias da sala de leitura, ter acesso aos penetrais das estantes

(ECO, 1998, p. 22-23).

A iluminista e oitocentista biblioteca custodial e patrimonialista virou, em

pleno séc. XX, a má biblioteca, denunciada com fulminante e humorado

realismo por Umberto Eco, e o paradigma custodial e patrimonialista, que

formou gerações de bibliotecários e de arquivistas, sob a tutela científica da

História, convertidos em mediadores-profissionais e zeladores da Memória

Nacional, foi alvo de um movimento corrector, em que pontificaram, entre

outros, Paul Otlet e Ranganathan. Através da normalização bibliográfica e

catalográfica e de “técnicas” de classificação e de indexação, capazes de uma

recuperação fina e rápida dos conteúdos dos documentos, operou-se uma

inversão valorativa: o primado do acesso sobrepôs-se ao da guarda ou custódia.

Mas se esta inversão foi imposta, sobretudo no pósguerra (1945) e plasmada

como programa no Manifesto da UNESCO para as bibliotecas públicas, nos

Arquivos públicos e nos serviços de Arquivo de instituições da Administração

central e local e de organizações, as mais diversas, o direito à confidencialidade

e à propriedade das “informações” continuou e permanece, dentro da

legitimidade ética, porquanto esses quesitos são essenciais ao Bem da instituição

ou da empresa. E, no entanto, há sempre uma fronteira tênue que separa a boa

conduta da acção perversa e negativa: a confidencialidade pode, por exemplo,

ser evocada para garantir a opacidade de órgãos públicos que têm de estar ao

serviço de todos os cidadãos e da comunidade que os institui e não dos agentes

que neles trabalham...

No paradigma custodial e patrimonialista, o sujeito-pesquisador não se

assume ainda como cientista e tende, quando muito, a estabelecer um equilíbrio

Page 121: Etica de la Información

entre a valorização da Memória colectiva, materializada ou documentada, e o

acesso possível. Mas, no paradigma pós-custodial emergente, há, forçosamente,

uma mudança de postura axiológica: o sujeitopesquisador identifica-se com o

princípio de que a informação produzida deve ser comunicada e difundida,

sendo, assim, garantido um direito básico de todo e qualquer cidadão e

respeitada uma elementar condição de cidadania – a liberdade de busca e de uso,

o mais amplo que possa ser, das representações (sígnicas e simbólicas)

individuais e colectivas. Reconhece-se, pois, essa identificação e assunção ética

que tem de ser “gerida” através do dispositivo metodológico da “vigilância

crítica” e pela dinâmica própria da cientificidade: o sujeito-pesquisador não

julga e muito menos condena situações de custódia e, também, o seu propósito

não deve ser o de fazer a apologia do acesso, mas, muito naturalmente,

compreender e explicar as condições contextuais em que ele se processa, limites

e efeitos positivos e/ou negativos. O posicionamento do cientista da informação

só pode, pois, ser este, embora não possamos negar que ele, ao assumir-se

dentro do paradigma emergente e póscustodial, é ensinado a valorizar a

liberdade do acesso em detrimento da posse/propriedade dos documentos e a

enfatizar a comunicação, o mais possível gratuita, em vez da aceitação do valor

mercadológico da bibliofilia ou do coleccionismo. É ainda ensinado a perceber

que tem de haver limites claros à “segurança do Estado” ou “aos segredos de

Estado” e que a informação administrativa, custodiada no Serviço de Arquivo,

pode ser sujeita a um período de “reserva” ou à “interdição do acesso público”,

mas que a perpetuação aleatória ou indefinida desse período significa opacidade,

ocultação e sonegação da informação ao legítimo conhecimento de todos. Em

última instância, só o pleno acesso é ético, salvaguardado, claro está, o direito ao

respeito e ao bom nome de qualquer cidadão. Na gênese da internet, nos seus

textos fundadores (FLICHY, 2001), o princípio ético da liberdade aparece como

o alpha e ômega de uma revolução tecnológica que visa o utópico desiderato de

possibilitar que todos, independentemente do local de nascimento, sexo, cor de

Page 122: Etica de la Información

pele, grau de escolaridade, condição econômica e social, usufruam da

informação/conhecimento qualquer que ele seja.

Imperioso é reconhecer, sem prejuízo do esforço de objectividade e de

rigor que a actividade científica pressupõe, o cientista da informação, modelado

no paradigma póscustodial, é um nativo da Era Digital em que já estamos, e

partilha, consequentemente, os valores éticos próprios deste novo ciclo

estrutural.

Entremos, agora, na operacionalização dos dois pólos cruciais da

actividade científica: o teórico e o técnico. O sujeito-psquisador tanto pode

estudar problemas, como optar por uma abordagem de “investigação-acção” ou

de estudo de caso. Em conformidade com a abordagem escolhida tem de optar

pelas “técnicas” ou operações metódicas mais adequadas, impondo-se deveres

éticos elementares: na concepção e na aplicação de questionários assegura o

anonimato dos inquiridos e das respostas, como nas entrevistas e na observação

participante, por exemplo, não deve divulgar a identidade nem da

instituição/organização, sem omitir o tipo de actividade ou do negócio

respectivo, nem dos agentes entrevistados e analisados. Esta conduta assegura o

respeito que o sujeito-pesquisador exibe pelo objecto estudado, mas comportar-

se, assim, não significa que deva, no pólo morfológico (publicação dos

resultados), omitir ou alterar os resultados, faltando à verdade epistémica, que se

impõe a si mesmo, atingir. A busca da verdade ou, dito de outro modo, a

descrição e a interpretação do que foi possível observar e descobrir constitui a

ponte natural entre a Epistemologia e a Ética: a busca de um conhecimento

verdadeiro é, em simultâneo, um desiderato epistemológico e ético, mesmo

assumindo-se a impossibilidade de uma verdade absoluta.

E, se agora entrarmos num domínio mais concreto, perspectivando-se a

conduta do sujeito-pesquisador no campo das aplicações ou da implementação

dos modelos teóricopráticos que lhe compete desenvolver, disponibilizando-os a

todos os que, em cada contexto específico, assumem a obrigação profissional de

Page 123: Etica de la Información

lhes conferirem utilidade, percebemos que entramos numa zona de mudança de

éticas: passamos da científica para a profissional. O uso e integração, numa

organização, de um modelo sistémico de organização e de recuperação da

informação é sujeito aos fins de rentabilidade econômica e de auto-proteção

dessa entidade, devendo os implementadores e profissionais da informação

regerem-se por um código que concilie princípios éticos universais e valores

conformes com o sucesso e sobrevivência organizacionais.

Quando passamos do plano da pesquisa para o da aplicação contextual,

entramos nos meandros da mediação (SILVA, 2009b; SILVA; RIBEIRO, 2010):

o “bom” bibliotecário terá de ser aquele que se distancia da má biblioteca de

Umberto Eco e assume a sua função disseminadora num registo de mediação

claramente pós-custodial, assim como o bom arquivista terá de ser, não obstante

o cumprimento de prescrições e restrições temporárias ao acesso a certos

“conteúdos”, o que facilita o fluxo info-comunicacional, não o obstruindo e

facilitando, deste modo, que ele seja a “seiva” que garante o bom e pleno

funcionamento da instituição/organização. Radica, então, neste plano a

pertinência do código deontológico que pode ter ajustamentos e justaposições

aos chamados “código do servidor público” ou ao “código da empresa x ou y”.

Tratam-se de especificações éticas que não podem, porém, entrar em

contradição com os fundamentos gerais.

Nesta intervenção, o foco não se centrou nessas éticas específicas, sendo

certo que a atenção dispensada ao comportamento ético dos profissionais da

informação tem sido bem maior do que a que merece o desenvolvimento da

pesquisa em CI, Ora, entre os dois planos, podendo haver algumas diferenças

operacionais e éticas, não há, certamente, rupturas ou hiatos essenciais. Há, sim,

uma estreita continuidade.

Page 124: Etica de la Información

ABSTRACT

Housed in a panel headed by Information Ethics, this text addresses the issue in focus from

the nature and dynamics of research developed in the field of information science, as is taught

and practiced at the University of Porto. A transdisciplinary Information Science and, at the

same time, working within a interdisciplinary space, as is the Sciences of Information and

Communication (CIC) field, has a complex subject and permeated by a variety of issues,

problems and cases. Their mode of approach is predicated significant ethical issues and the

results and the consequent implementation of solutions implemented or applicational again

raise doubts and care from ethical nature. It starts, as here, the scientific practice to reflections

of more philosophical touch, though deeply in a register "pragmatic" and not speculative.

Keywords: Information Science Research; Ethics

Referências

CARDOSO, Gustavo. Os Media na sociedade em rede. Prefácio de Manuel Castells.

Lisboa: Serviço de Educação e Bolsas; Fundação Calouste Gulbenkian. 2006. ISBN 972-31-

1155-1.

CASTELLS, Manuel. A Sociedade em rede. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2002.

v. 1. ISBN 972-31-0984-0

__________. O Poder da identidade. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2003. v. 2.

ISBN 972-31-1008-3.

__________. O Fim do milênio. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2003. v. 3. ISBN

972-31-1055-5.

ECO, Umberto. A Biblioteca. 4ª ed. Lisboa: Difel, 1998. ISBN 972-29-0174-5.

FLICHY, Patrice. L’Imaginaire d’Internet. Paris: Éditions de La Découverte, 2001. ISBN

2-7071-3637-2.

GOMES, Henriette Ferreira; BOTTENTUIT, Aldinar Martins; OLIVEIRA, Maria Odaísa

Espinheiro de (org.) (). A Ética na Sociedade, na área da Informação e da Atuação

Profissional: o olhar da Filosofia, da Sociologia, da Ciência da Informação e da Formação

Profissional do Bibliotecário no Brasil. Brasília, DF: Conselho Federal de Biblioteconomia;

Comissão de Ética Profissional, 2009. Disponível em:

<http://groups.google.com/group/biblios/browse_thread/thread/da9f0a21adac5d00/61cbaf262

b013648> . Acesso em: 11 mar. 2010.

Page 125: Etica de la Información

JEANNERET, Yves. Y a-t-il (vraiment) des technologies de l’information? Villeneuve

d’Ascq: Presses Universitaires du Septentrion, 2000. ISBN 2-85939-632-2.

LE COADIC, Yves-François. A Ciência da Informação. Brasília, DF: Briquet de Lemos-

Livros, 1996. ISBN 85-85637-08-0 (trad. brasileira de La Science de l’Information. 2 ème ed.

Paris: Presses Universitaire de France, 1994).

LINARES COLUMBLÉ, Radamés. Ciência de la información: su historia y epistemologia.

Bogotá: Rojas Eberhard Editores, 2005. ISBN 958-9121-79-9.

MOORE, Adam D. (ed.). Information ethics: privacy, property and power. Seatle; London:

University of Washington Press, 2005. ISBN 0-295-98489-9.

SAVATER, Fernando. Ética para um jovem.5 ed. Lisboa: Editorial Presença, 1998. ISBN

972-23-1657-5.

SILVA, Armando Malheiro da. Os Arquivos e o acesso global à informação. Fórum. Braga,

2007. 41 (Jan.-Jun.), p. 219-257.

SILVA, Armando Malheiro da. Capítulo 37 – O Retorno às origens e a relação entre as

políticas e as práticas arquivísticas: para uma releitura crítica e prospectiva. In SERRÃO, José

Vicente; PINHEIRO, Magda de Avelar; e FERREIRA, Maria de Fátima Sá e Melo (org.).

Desenvolvimento econômico e mudança social: Portugal nos últimos dois séculos:

homenagem a Miriam Halpern Pereira. Lisboa: Imprensa de Ciências Sociais, 2009. ISBN

978-972-671-237-4. p. 637-662.

SILVA, Armando Malheiro da. A Informação: da compreensão do fenômeno e construção

do objecto científico. Porto: CETAC.Media; Edições Afrontamento, 2006. ISBN 978-972-36-

0859-5.

SILVA, Armando Malheiro da. Mediações e mediadores em Ciência da Informação.

Prisma.Com. Porto, 2009. 9 (Jul.-Dez.). Disponível em:< http://prisma.cetac.up.pt.>. Acesso

em: 11 mar. 2010.

SILVA, Armando Malheiro da; RIBEIRO, Fernanda. Das “Ciências” documentais à ciência

da informação: ensaio epistemológico para um novo modelo curricular. Porto: Edições

Afrontamento, 2002. ISBN 972-36-0622-4.

SILVA, Armando Malheiro da; RIBEIRO, Fernanda. Recursos de informação: serviços e

utilizadores. Lisboa: Universidade Aberta, 2010. ISBN 978-972-674-672-0.

SILVA, Armando Malheiro et al. Arquivística: teoria e prática de uma ciência da

informação. Porto: Edições Afrontamento, 1999. v. 1, ISBN 972-36-0483-3.

Page 126: Etica de la Información

POR UMA ÉTICA DA INFORMAÇÃO

Joana Coeli Ribeiro Garcia Professora Associada da Universidade Federal da Paraíba

e-mail: [email protected]

1 INTRODUÇÃO

Ética da informação, formalmente, é uma disciplina recente na Ciência da

Informação, praticada na Universidade Federal da Paraíba, especificamente, nos

cursos de graduação em Biblioteconomia e Arquivologia, e no Programa de Pós-

graduação em Ciência da Informação (PPGCI), em linha de pesquisa e disciplina

com igual denominação: Ética, gestão e políticas de informação. Nas

graduações, a disciplina tem menos de dois anos, e na Pós-graduação, surge com

a aprovação do PPGCI em 14 de julho de 2006, portanto com pouco mais de três

anos de existência. Anteriormente, estudava-se o código de ética do profissional

bibliotecário, que era ministrado em disciplina introdutória na graduação,

inexistindo referências à ética na pós-graduação. Por isso, é importante e

necessário “refletirmos sobre as oportunidades e problemas ocasionados pelas

tecnologias para realizar uma boa vida, seja em nível global ou local”, ou sobre

ética da informação, de acordo com CAPURRO (2009, p.44, citando a

Declaração de Princípios da Cúpula Mundial sobre a Sociedade da Informação).

A despeito dessa contextualização, a ética ocupou e permanece ocupando

nossos estudos e reflexões acadêmicas, o que nos levou a incluí-la nos cursos e

em programa especificados. E não poderia ser de maneira diversa, pois, nos

tempos atuais, a sociedade, cotidianamente, refere-se à ética. Ela está cada vez

Page 127: Etica de la Información

mais presente no dia a dia e ocupa o lugar de destaque nas mídias impressa,

televisiva e eletrônica e encontra justificativa na economia globalizada, com

preocupação decorrente de princípios éticos e valores morais em instituições,

empresas e na sociedade, devido à necessidade da empresa manter uma boa

imagem perante o público e esse, esperar atuação em concordância com o perfil

proposto.

Princípios éticos e valores morais culminam com o estabelecimento de

atividades, obedecem a critérios sociais e éticos e surgem como atribuições de

categorias profissionais, em comportamentos adotados por empresas e por

indivíduos, é o que nos faz entender Veloso (2006). Tanto é assim que, para

oferecer elementos à sociedade brasileira e aos profissionais da informação, o

Conselho Federal de Biblioteconomia, em 2009, por intermédio da Comissão de

Ética Profissional, publicou uma coletânea sobre ética na sociedade, na

perspectiva da Filosofia, da Sociologia e da Ciência da Informação, com

capítulos que abordam a ética da informação, a deontologia e os

comportamentos éticos no desempenho profissional.

Sem explanações conceituais sobre ética nem sobre as razões que nos

conduzem a agir desse ou de outro modo, propomos uma reflexão sobre a ética

da informação, tomando como base três pressupostos. O primeiro se refere aos

aspectos que perpassam o fluxo da informação, desde a geração da ideia, até a

disseminação quer em mídia impressa, eletrônica ou digitalizada, disponível

para ser utilizada desde que acessível a todos. Esse ciclo, Wilson (2006)

denomina de ciclo de vida estendido, pois compreende a geração de

conhecimento, o fluxo de gestão da informação e o seu uso. Embora ele

considere que uso e geração não se inserem na etapa de gestão, admite que o uso

da informação tem competência para gerar nova criação e uso e, assim, o ciclo

recomeça.

Em segundo lugar, mesmo sem considerar as questões deontológicas,

baseamo-nos nas ideias de Fourez (1995), ao considerar a inexistência de

Page 128: Etica de la Información

normas de condutas éticas eternas ou indicativas de situações indistintas e

gerais, porque elas são históricas, culturais, evolutivas, atendem a determinada

comunidade, em um determinado contexto, em um tempo também definido.

Assim, o espaço brasileiro é escolhido, mesmo que, em determinadas situações,

invoquemos autores de maior amplitude geográfica exatamente para justificar

ações dos que usam a informação, atuam nela e lidam com ela.

Por último, reforçamos as ideias de Morin (2005) e como ele percebe a

autoética e a ética com o outro, como princípio altruísta de inclusão, como apelo

de solidariedade em relação aos seus e à comunidade. Para o autor, a autoética

impõe-se na perda da certeza absoluta; no enfraquecimento da voz interior, que

aponta para o bem ou para o mal; na impossibilidade de decidir sobre os fins,

visto que não os conhecemos para além da vida; nas contradições e nas

incertezas éticas; na consciência de que ciência, economia, política e artes têm

finalidades não intrinsecamente morais. A autoética forma-se no nível da

autonomia individual, e esta autonomiza a ética. A tomada de decisão e de

reflexão próprias à autoética só é possível se o indivíduo experimenta a

exigência moral; a autoética alimenta-se de fontes vivas - psicoafetivas,

antropológicas, sociológicas, culturais etc. Paradoxalmente, a autonomia ética é

frágil e difícil a partir do momento em que o indivíduo experimenta a angústia

das incertezas éticas mais do que a plenitude da responsabilidade.

Nas orientações de Morin, há aspectos que nos interessam para lidar com

a informação e desenvolver práticas sociais em consonância com autonomia e

liberdade de espírito, pois é na prática e em seus invólucros, nos dilemas

existentes, nas etapas que formam o ciclo, anteriormente denominado e descrito,

que necessitamos assumir atitudes para que, como profissionais da informação,

possamos organizá-las e disponibilizá-las nos sistemas, de forma a possibilitar

acesso a todos, porque acreditamos que essas discussões interessam

sobremaneira a quantos se envolvem com a informação.

Page 129: Etica de la Información

Passemos então às questões que interferem nas etapas do ciclo de vida

estendido, com o objetivo de nos encontrarmos a refletir sobre ou por uma ética

da informação, o que, de certa forma, constitui os aspectos desenvolvidos nas

disciplinas ministradas na graduação e na pós-graduação e que têm a ver com o

que Capurro (2001) apropriadamente denomina de gerenciamento empresarial

da informação. Integram sua proposta, publicada no Brasil, os planos micro,

meso e macrodimensional da segunda unidade de sua disciplina obrigatória e

também a terceira unidade, quando se refere aos aspectos da pesquisa. Como

chamamos a atenção, a discussão focaliza autores brasileiros, paradoxalmente,

utilizando os aspectos difundidos por Wilson (2006).

2 ÉTICA NA PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO

É voz comum que a produção do conhecimento, no Brasil, ocorre em

cerca de 90% das instituições de ensino superior, isto é, os pesquisadores das

universidades, principalmente os envolvidos nos programas de pós-graduação,

são os responsáveis pelo desenvolvimento da ciência. Ainda que com base na

sua autonomia, o pesquisador possa tomar decisões sobre o que estudar, como e

por que, utilizando, para o alcance dos objetivos, uma teoria e metodologia que

se coadunem ao problema estudado, algumas vezes, ele depende dos que

respondem aos questionários e aceitam partilhar seus conhecimentos por meio

de entrevistas. Isso significa que as escolhas são inerentes à subjetividade dos

indivíduos e da familiaridade que possam ter com autores e métodos e que a

ciência se desenvolve pelo movimento de aprovação/refutação das teses, sem

que haja uma única verdade científica, o que combina com a ideia de Fourez

(1995) sobre ética universal.

Questionários respondidos geram resultados quantitativos, e entrevistas

concedidas, estudos qualitativos, cujas análises e conclusões revelam novidades.

Page 130: Etica de la Información

Assim, o pesquisador/ cientista/autor inclui outras vozes e outros textos em sua

criação, mas devem tomar precauções éticas ao fazê-lo. Garcia e Targino (2008)

sintetizam os cuidados do autor a aspectos como: respeito à autoria das fontes

utilizadas; autenticidade dos dados relatados; texto esteticamente cuidado e

fidedigno ao pensamento dos demais especialistas; fidelidade às informações

recebidas e divulgadas; atendimento aos comitês de ética e comprometimento

com o depósito dos resultados na(s) instituição(ões) às quais se vinculam os

pesquisados. Consideremos, portanto, que, quando o cientista exercita a ética

com a informação, ele pratica a autoética e a ética para com os semelhantes e se

torna, por via de conseqüência, responsável pela Ciência.

Atendida a etapa da pesquisa em si, segue-se a da divulgação dos

conhecimentos produzidos que, no sentido lato do termo, refere-se à publicação

do conhecimento gerado, sem o qual o ciclo não se completa e não se formam os

estoques de informação. Invocando Rousseau (2006) e seu contrato social, os

pesquisadores tacitamente se comprometem a divulgar os conhecimentos

resultantes de suas pesquisas, pois são frutos de financiamento concedido pelo

Estado. Assim, eticamente, permitem que a sociedade, de um lado, avalie a

adequação da utilização dos recursos e, de outro, usufrua, em seu próprio

benefício, da ciência produzida.

Para divulgar seu trabalho, o pesquisador, na condição de autor, relaciona-

se com editores e avaliadores das editoras comerciais e/ou científicas, para dar

visibilidade ao conhecimento que acaba de produzir. A publicação é uma das

características imprescindíveis da Ciência e conduz à respeitabilidade do veículo

de divulgação, do autor e da instituição à qual o veiculo pertence (PACKER;

MENEGHINI, 2006).

Definida essa relação, tratemos da ética do editor, pessoa que realiza a

editoração, mecânica ou eletrônica, concebida como um conjunto organizado de

atividades, com o objetivo de registrar e, por conseguinte, armazenar e/ou

perpetuar informações e conhecimentos, mediante a preparação técnica de

Page 131: Etica de la Información

originais para publicação. Ele é o responsável pela supervisão e preparação de

textos em distintas publicações, pelo ato de publicar textos de qualquer natureza

- estampas, partituras, discos etc. Em qualquer acepção, seja o editor de arte

(projeto gráfico-visual das publicações) ou o editor de som e/ou de videotape

(VT, edição de materiais sonoros na produção de filmes, programas televisivos

ou radiofônicos, peças teatrais, textos eletrônicos e outros produtos), o editor de

imagem (inserção de ilustrações nas obras), o editor literário (organização e

publicação de textos de um ou diferentes autores) ou o editor crítico (edição

crítica de textos, de forma a atrair o interesse dos leitores), o fato é que, não

obstante as diferentes denominações e os diferentes contextos, o editor é,

essencialmente, quem concretiza atividades de editoração, mais ou menos

complexas (TARGINO; GARCIA, 2008).

Como é responsável pelo avanço tecnológico e da mercantilização

crescente da produção intelectual e cultural, científica e tecnológica, ele assume

novas feições, entre elas, a de lidar com a comercialização dos produtos, sem

perder de vista sua qualidade, e de enfrentar as questões éticas que permeiam as

relações entre os atores sociais presentes na editoração. Na maioria dos casos,

como relatado por Garcia e Targino (1999), os editores são docentes que, com

frequência, extrapolam as funções intrínsecas ao cargo de editor e assumem a

intermediação entre editor e livreiro, além da distribuição dos exemplares, por

doação, permuta ou venda. Nesse mix de papéis, o editor deve estar atento à

busca de excelência e à manutenção de padrões éticos e justos, ao exercer ações

de criador e gestor de políticas e de projetos editoriais; autor e incentivador da

produção intelectual e científica dos públicos que integram o veículo; árbitro

justo e transparente, conselheiro e defensor da liberdade editorial.

Para desempenhar suas atividades com ética e a contento, o editor recebe

ajuda dos avaliadores, que para Davyt e Velho (2000), compara-se à função dos

juízes (em inglês referee) encarregados de analisar e manter o desempenho dos

sistemas sociais. Julgar é uma ação inerente ao ser humano, e o que define a

Page 132: Etica de la Información

excelência, a mediocridade ou a má qualidade dos títulos de periódicos é

exatamente a forma mais ou menos rígida, mais ou menos criteriosa, mais ou

menos científica como os artigos são analisados.

Como natural, o julgamento por pares apresenta pontos positivos e

negativos, como admitem clássicos da editoração de periódicos científicos, que

têm na publicação de C. T. Bishop, How to edit a scientific journal, 1984,

referência máxima e atual. De início, é possível questionar a confiabilidade, o

valor e a necessidade do processo como um todo, alegando que a decisão de

poucos sobre a produção de muitos é perigosa, porque acarreta efeitos que

afetam a vida dos iniciantes, o status quo das especialidades e os rumos do

saber. Por sua vez, pensar em divulgar todos os trabalhos à espera da aceitação

ou do repúdio da comunidade científica é comprometer a literatura científica e,

por extensão, a ciência.

O processo avaliativo nunca é tranquilo. A ingerência de editores e a

adoção de critérios implícitos e camuflados influenciam o julgamento, com

rebatimento na área do conhecimento, época e lugar, o que tem a ver com o

argumento de autoridade em ciência. Editores e avaliadores tendem a acatar,

sem tanto rigor, contribuições advindas dos “medalhões”, enquanto os artigos

oriundos de pesquisadores iniciantes ou vinculados a instituições de pequeno

porte são metricamente analisados e dissecados. Meadows (1999, p. 60) afirma

que os “editores estão sempre ansiosos para garantir que os artigos sejam aceitos

por seu mérito, e não, porque seu autor tem renome.” Em outras palavras, se há

queixas de autores e editores em relação aos avaliadores, o inverso também é

visível. Os atores envolvidos com a produção científica, em geral, reconhecem a

responsabilidade ética e social do avaliador frente ao avanço da área a que

pertence e à credibilidade das revistas. Estão em suas mãos os rumos de sua

disciplina ou de campos afins, o que pressupõe mais conhecimentos e/ou mais

experiência do que os avaliados, além de ser capaz de exercitar, no cotidiano, os

preceitos éticos intrínsecos à C&T.

Page 133: Etica de la Información

Portanto, ao longo do processo de produção e divulgação do

conhecimento, cabe a autores, editores e avaliadores adotarem, acima de tudo, a

prática da autoética, de forma a atingir a ética para com o outro. Todos devem

estar conscientes da utopia de julgamentos uníssonos, tal como ocorre com fatos

do cotidiano, com maior ou menor repercussão midiática.

3 ÉTICA NA GESTÃO DA INFORMAÇÃO

Ao refletir sobre o fluxo da gestão da informação, com as funções

indicadas por Wilson (2006), é forçoso entender que, nessa etapa, estão aquelas

que dizem respeito à prática do profissional da informação, mais

especificamente, do bibliotecário. Choo (2003) nos apresenta as atividades de

gestão da informação nas organizações, sustentadas por três grandes pilares:

constituir significado, retirar a ambiguidade da informação e tomar decisões. No

fluxo da gestão e nos pilares, surgem os momentos em que o profissional da

informação é questionado ou se questiona sobre a ética de suas ações. Como

mediador entre os estoques de informação e o cliente que a usa para gerar

conhecimento, nas atividades de aquisição, armazenagem, organização, acesso,

recuperação e empréstimo surgem dilemas em que, nas tomadas de decisões, a

angústia das incertezas parece, no mais das vezes, ser a única certeza.

3.1 Aquisição

Para atender à tríplice função (compra, doação e permuta) a contento, o

lema, Bibliotecário: informar tudo a todos, é um elemento de reflexão. Senão

vejamos: só posso informar se souber onde localizar a informação. Só localizo

se ela houver sido adquirida e existir num estoque, mesmo contando com

buscadores eletrônicos. Isso significa informações selecionadas, adquiridas,

Page 134: Etica de la Información

organizadas e armazenadas para serem recuperadas. Em qual

organização/sistema é possível encontrar tudo o que o cliente deseja? A

informação que se constitua em significado, ou seja, a desejada? A que atende à

necessidade do cliente, portanto, sem ambiguidade? Para tomar decisões sobre o

assunto e a forma que ele tem em mente satisfaça a sua necessidade? São

questões com as quais lidamos e para as quais não temos apenas uma resposta

ética.

Mas também é hora de perguntar se a seleção não constitui, ainda que de

forma velada, pelos critérios adotados, um ato de censura. E, em assim sendo,

onde se estabelece o direito do cliente de conhecer tudo? Em que bases legais a

aquisição é feita? Guardadas as exceções, tem uma vida boa ou uma boa vida

quem participa dos processos licitatórios e realiza a aquisição por compra? São

dilemas éticos que nos cercam, como autonomia ética que, ao mesmo tempo em

que nos autonomiza nos oferta dificuldades, relativas às incertezas éticas

comentadas por Morin (2005).

3.2 Armazenagem

A armazenagem nos conduz a refletir sobre o espaço e tem uma relação

muito estreita com critérios de seleção relativos a ele, à área do conhecimento, à

atualidade das informações, entre outras questões. Esses critérios são adotados

tanto para os materiais que ocupam espaços físicos quanto para os que

constituem os bites dos bancos e das bases de dados, das bibliotecas eletrônicas,

virtuais, digitais que se não armazenam tudo ao menos se conectam uns aos

outros possibilitando disponibilização abundante.

Diante do volume crescente de informações produzidas, não há como

negar que os meios eletrônicos conseguem reunir, armazenar e disseminar com a

mesma rapidez com que são geradas. A tecnologia dos computadores e suas

memórias inverteram a situação tradicional de espaço, com máquinas cada vez

Page 135: Etica de la Información

menores, com capacidade real de armazenar volume de informação cada vez

maior. O sonho de Tim Berners-Lee cria a web, e a teia que conecta o mundo

permite que internautas naveguem com apenas um toque no mouse. Abundância

e excesso são termos que indicam a quantidade de informações que se

encontram armazenadas nas memórias eletrônicas.

Se o que existe é transformado em bites e pode entrar na memória dos

computadores, é possível armazenar todo o conhecimento e eliminar a

intermediação dos bibliotecários com a seleção e a aquisição do material. São os

autores, produtores de conhecimento, que incluem suas obras diretamente na

rede e as disponibilizam por meio de bases de dados, sites, portais, blogs, open

archives, bibliotecas digitais, virtuais, eletrônicas etc. A rapidez tanto é causa

quanto consequência da produção e, certamente, só os meios eletrônicos

armazenam quantidades abundantes de informação em espaços diminutos.

Porém, excesso de informação significa realmente informação, ambiguidade ou

nenhuma informação? Excesso aumenta o fosso entre países ricos e os pobres de

informação. Situando-nos na segunda condição, não temos soluções para

apresentar, pois ainda nem resolvemos outra questão mais premente - o direito

dos brasileiros a uma alimentação diária!

3.3 Organização

Refletir sobre a organização da informação passa, necessariamente, pela

representação dos materiais que vão constituir os estoques de informação.

Repetindo, abundância e excesso indicam quantidade de informações

armazenadas nas memórias eletrônicas. Sobre essa temática, os textos de

Guimarães e colaboradores (1994, 2006, 2008) nos esclarecem, cada vez mais,

sobre a ética da representação. Eles afirmam que a representação é o cerne da

organização, porquanto dela dependem a recuperação e o uso das informações

ou, em outras palavras, a localização ou não do que o cliente solicita, busca,

Page 136: Etica de la Información

deseja, necessita. Para organizar, baseamo-nos em sistemas concebidos por

pessoas que neles deixam transparecer sua ideologia, suas verdades, aquilo em

que acreditam, em detrimento daquelas que são seus opostos e, por isso,

negados.

Admitamos, com os autores que estudam ética em organização e

representação do conhecimento, que o que realizamos é fruto de nossa

arbitrariedade, revestida de boa vontade e/ou maquiavelicamente travestida de

bem para a sociedade. Assim, questionemos se somos éticos quando

privilegiamos uma área do conhecimento, uma religião, uma raça, uma cor da

pele, uma profissão, uma preferência sexual, um gênero, etc. com maior número

de itens nos códigos ou nos sistemas de classificação, em detrimento de

nenhuma indicação ou de indicações mínimas.

Batles (2003) toca em outro aspecto que também nos afeta e se refere à

descrição dos conteúdos dos documentos. Enfatiza que não descrevemos

realmente o conteúdo das obras e que, ao atendermos às questões de

produtividade que são exigidas em algumas organizações, não amiúde, apenas

escondemos os livros nas estantes. E complementa que, perdidos nas estantes,

podem ser as obras ou os clientes que não as encontram. Isso nos conduziria a

aceitar o conceito dicionarizado e admitir que recuperar seria exatamente

encontrar algo perdido. A metáfora utilizada por Matthew Batles indica que, ao

não descrevermos os documentos com especificidade, amplia-se a ambiguidade

da informação, razão pela qual, na maioria das vezes, a informação fica mesmo

tão diversamente codificada e escondida que nós e nossos clientes desistimos de

buscá-la ou a substituímos por outra.

Batles (2003) toca em outro aspecto que também nos afeta e se refere a

descrição dos conteúdos dos documentos. Enfatiza que não descrevemos

realmente o conteúdo das obras, e que ao atendermos as questões de

produtividade que, exigidas em algumas organizações, não amiúde, apenas

escondemos os livros nas estantes. E, complementa que perdidos nas estantes

Page 137: Etica de la Información

podem ser as obras ou os clientes que não as encontram. Isso nos conduziria a

aceitar o conceito dicionarizado e admitir que recuperar seria exatamente

encontrar algo perdido. A metáfora utilizada por Matthew Batles indica que, ao

não descrevermos os documentos com especificidade, amplia-se a ambigüidade

da informação, razão pela qual na maioria das vezes, a informação fica mesmo

tão diversamente codificada e escondida que, nós e nossos clientes, desistimos

de buscá-la ou a substituímos por outra.

Ainda é Batles (2003) quem afirma, ainda, que, desde os tempos de

Melvil Dewey, e hoje não é diferente, por deficiências na classificação, o leitor

não é conduzido, com eficiência, à fonte correta da informação. Ao contrário

disso, o cliente é alienado, confundido por classificações, que enfatizam o

conhecimento do profissional que criou o sistema e que o adotou. E vai mais

além na sua crítica, comparando bibliotecários e escribas da Idade Média,

quando não se limitam a armazenar e classificar, mas criam seus próprios textos,

na forma de sites de buscas, concordâncias em CD-ROM, outros textos

eletrônicos e guias de estudo e bibliografias impressas. (BATTLES, 2003)

E o fazemos com a melhor das intenções, “colocando o usuário como o

foco de nossas atividades” é assim que fomos convencidos pelos mestres que

nos antecederam, por outro lado, de que assim agindo facilitamos a vida dos

usuários ou lhes oferecemos uma vida boa. Aprendemos que os fins justificam

os meios, embora os meios, nem sempre, sejam éticos e resolvam todas as

situações que se nos apresentam.

3.4 Acesso, recuperação e empréstimo

Chegamos à etapa do ciclo que trata do acesso à recuperação da

informação e ao empréstimo. Necessário aclarar que empréstimo, recuperação e

acesso não podem ser confundidos com uso. No caso dos serviços tradicionais,

essa fase padece as consequências dos métodos de organização que não são

Page 138: Etica de la Información

apreendidos com facilidade pelo usuário e da armazenagem que, ao ocupar

grandes espaços físicos, dificulta a localização e, por via de consequência, a

recuperação da informação, comentados anteriormente.

Recuperar informação é uma preocupação do belga Paul Otlet, desde o

Século XIX, que idealizou o “mundaneum”. Objetivando tornar acessível o

conhecimento disponível àqueles que dele necessitam, utiliza-se do conceito

expandido de documentação e da tecnologia disponível para abordar os

principais problemas bibliográficos, por entender que registros bibliográficos

não se resumem a livros. Dedica sua vida a desenvolver métodos que registrem

o máximo de informações para tornar o conhecimento disponível e para que se

possa facilmente encontrar o que se busca.

A recuperação da informação é, entre as funções profissionais, a que Du

Mont (1991), estudando o continuum da responsabilidade social do profissional

da informação, categoriza como de segundo, terceiro e quarto estágios. Ela

concebe que, para recuperar, convém que, em primeiro lugar, desenvolvam-se e

se mantenham os estoques/acervos. A partir de então, os profissionais se

ocupam do atendimento às necessidades de informação dos recursos humanos da

corporação onde a unidade de informação está inserida, mas também com a

sociedade, incluindo usuários e não usuários - inclusão social.

Para os profissionais da informação, é difícil admitir, mas é

imprescindível. Nós, bibliotecários, profissionais da informação, devemos

refletir a respeito do conceito de recuperação. E o começo pode estar na

autocrítica, na autoanálise para desenvolver a solidariedade ética com o outro,

refletindo e ajudando os que constroem e usam sistemas, os que estabelecem e

usam as classes e, ao final, oferecem possibilidades conflitantes para os mortais

que desejam a informação.

Embora esses sistemas se anunciem como democráticos, deve-se entender

democracia, quase que tão somente, quanto à facilidade de uso, proporcionada

pelos argumentos visuais, visto que, tanto quanto os sistemas tradicionais, eles

Page 139: Etica de la Información

podem ser elitistas, porquanto sabemos que, nas sociedades modernas, as

informações não são totalmente compartilhadas (todas as informações são para

todos?), ao contrário, são distribuídas por agências de produção, organização e

disseminação, no mais das vezes, cobrando altos preços pelo seu acesso e

empréstimo. Recentemente, Santos e Carvalho (2009) reúnem e comentam sobre

os vários projetos brasileiros dedicados à inclusão digital e expõem sobre a

preocupação governamental com acesso apenas à tecnologia e não aos

conteúdos o que levaria ao uso da informação.

Como visto, a gestão do fluxo de informação preocupa profissionais que

se dedicam à formação dos estoques, à armazenagem, ao tratamento da

informação, ao atendimento de quantos necessitam da informação e ao uso que

dela fazem. Nos tempos atuais, o meio eletrônico nos apresenta soluções e nos

socorre, na maioria das vezes, pelas coes dos motores de busca com quase

sucesso total. O desenvolvimento de ontologias é uma expectativa de solução

dos problemas relativos à representação, facilitando, portanto, a recuperação.

4 ÉTICA NO USO DA INFORMAÇÃO

O texto de um professor pernambucano, apresentado no Segundo

Simpósio sobre hipertexto e tecnologias na Educação, intitulado: O que fazer

quando eu recebo um trabalho crtl c + ctrl v?, Abranches (2008), seu autor,

discute uma situação vivida pelos professores em relação aos desafios que lhes

são postos e que consideramos sob o ponto de vista da ética no uso da

informação. Situações como a do título acima são entendidas, no contexto da

cibercultura, como resultado da popularização das tecnologias e do acesso a

elas.

Fazem parte da cibercultura elementos tais como: a facilidade com que os

textos estão disponíveis; a necessidade de conhecimento dos processos de

Page 140: Etica de la Información

navegação na internet; a certeza inegável de que jovens e adolescentes nasceram

em época dominada pela tecnologia; a prática cotidiana no trânsito por caminhos

virtuais; as opções no mundo virtual, que geram dispersão, dificultam o

acompanhamento do que está sendo feito, favorecem a ideia de algo pronto e de

qualidade. E Abranches (2008) continua sua análise sob o ângulo da tecnologia:

o mundo digital é mutável, manipulável; um texto é transformado, modificado,

iludindo o leitor quanto à autoria; a geração copyバcola é uma realidade. Ela toma

forma, ocupa espaço nas práticas pedagógicas, por isso não se pode ignorá-la,

mas também não se pode atribuir responsabilidade somente aos alunos e às

tecnologias, desconsiderando o contexto pedagógico.

Sob esse aspecto, Targino (2005) é enfática, quando se refere ao âmbito

nacional, afirmando que a banalização e o desrespeito à autoria têm origem no

ensino fundamental e no médio e prossegue na educação superior. São os

célebres trabalhos de equipe, em que constam nomes alheios à sua construção.

São as denúncias frequentes de plágio em monografias de final de curso de

graduação. Exemplos contabilizados, que mostram o risco dos jovens

alcançarem a pós-graduação ou conquistarem o status de pesquisadores ou

autores sem discernir os limites éticos.

É verdade que isso não ocorre somente com os jovens ou com autores

científicos, tampouco apenas na geração copy-cola. A prática é a mesma de

quando se faziam cópias das antigas enciclopédias juvenis, continua Abranches

(2008). E se as gerações não são as mesmas, as diferenças situam-se na forma e

na dinâmica, mais do que no conteúdo ou na aprendizagem. Ao receber tal

trabalho, o professor deve se perguntar sobre o que foi proposto ao aluno e o

modo como foi solicitado. Sem dúvida, os motivos estarão relacionados à

proposta e, portanto, a questão não se resume a uma atividade e a um trabalho

acadêmico.

Na realidade, o citado autor não busca culpa nem culpados, até porque a

legislação já se ocupa de tais casos, tão somente procura alternativas para

Page 141: Etica de la Información

entender a questão pelo aspecto da pedagogia, mas poderia ser entendida pela

vertente ética do desrespeito com os autores. Afirma, ainda, que a proposta

pedagógica orienta a prática pedagógica. Assim, o processo de produção do

conhecimento por parte do aluno é elemento central para a consecução de uma

proposta que vise valorizar o aluno como autor, usando a informação de maneira

a dar voz aos autores que o antecederam, adotando, em sua criação, os cuidados

sintetizados por Garcia e Targino (2008). Por outro lado, a troca e a reflexão

conjunta se constituem em elemento privilegiado de uma prática que suscita a

participação, a cooperação e a colaboração. Como se percebe, são proposições

para uma vida boa, reflexões sobre ética da informação, como prefere Capurro

(2009).

Abranches (2008) encerra sua reflexão, considerando a prática atual dos

professores, particularmente daqueles da educação básica, que enfrentam parcas

condições do seu trabalho, com enorme quantidade de atividades e ritmo, em

oposição a uma remuneração muito baixa. Sem dúvida, esse fato dificulta

qualquer mudança que exija maior dedicação e uma atenção mais particularizada

aos alunos. Por outro lado, à medida que o processo de compreensão do papel da

educação, no contexto da cibercultura, toma forma objetiva em projetos

didáticos próprios, o professor vai assumindo outra posição, descobrindo novas

formas para o seu fazer pedagógico, o que já é uma exigência que a nova

configuração social nos apresenta.

Especialmente, por estarmos numa academia, é importante que nossa

proposta pedagógica tenha relação direta com nossa prática pedagógica, em

outras palavras, devemos ser éticos. Mas, sem ilusões nem enganos, adultos

também praticam o copy-cola, adultos também plagiam, adultos, assim como

jovens, usam as vozes dos autores como se fossem a sua própria e assumem

trabalhos de outros como se fossem seus. Felizmente, as tecnologias de

informação e comunicação nos forneceram os meios para descobrir o engodo,

com mais rapidez e velocidade, que, anteriormente, com apenas uma “googada”.

Page 142: Etica de la Información

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Afirmamos que o exercício recém-findo foi, em si mesmo, revestido de

ética, mas, certamente, podemos avançar em seu conteúdo e práticas, tornando-o

sistemático no contexto acadêmico, principalmente na Ciência da Informação,

em que estão as disciplinas referidas inicialmente. Sua inserção nos cursos e

programas demonstra que estamos vigilantes para os problemas que a tecnologia

desenvolveu, e a globalização visivelmente ampliou. Eles nos impulsionam a

buscar soluções ou explicações na ética da informação. Como as colocações de

Gerard Fourez, Edgar Morin e Letícia Veloso deixam antever, as questões éticas

alcançam todos os setores da vida em sociedade, incluindo a política, a religião,

a indústria, a informação etc., mesmo que essa discussão se restrinja aos polos

microdimensionais, ou seja, os que se referem a nossa responsabilidade diante

dos clientes, como definido por Capurro (2009).

A articulação entre política e ciência é fundamental, de forma que a

difusão da ciência e a produção científica assumem relevância vital. Em se

tratando da produção científica, há facetas complexas, distintas e diversificadas,

envolvendo, sobretudo, autores, editores e avaliadores como discutido. São

nuanças “ricas” e questionáveis do ponto de vista da ética e da

responsabilidade. Autor, editor e avaliador, junto com os demais partícipes da

produção, assumem responsabilidade ética perante o avanço da ciência, porque a

publicação é uma espécie de prestação de contas à sociedade, no que concerne

aos insumos recebidos. Numa sociedade marcada pelo predomínio da C&T, a

divulgação científica tem nítidas repercussões sociopolíticas, como Fourez

(1995) reitera.

A articulação entre política e ciência é fundamental, de forma que a

difusão da Ciência e a produção científica assumem relevância vital. Em se

tratando da produção científica, há facetas complexas, distintas e diversificadas

Page 143: Etica de la Información

que envolvem, sobretudo, autores, editores e avaliadores, como já discutimos.

São nuanças “ricas” e questionáveis, do ponto de vista da ética e da

responsabilidade. Autor, editor e avaliador, junto com os demais partícipes da

produção, assumem responsabilidade ética perante o avanço da Ciência, porque

a publicação é uma espécie de prestação de contas à sociedade, no que concerne

aos insumos recebidos. Numa sociedade marcada pelo predomínio da C&T, a

divulgação científica tem nítidas repercussões sociopolíticas, como Fourez

(1995) reitera.

Consideramos, neste texto, a criação do autor; a editoração impressa,

eletrônica, ou qualquer outro meio de registro que divulgue as ideias aos

leitores; a seleção e a consequente formação de estoques; a organização e a

representação da informação; o acesso, a recuperação e o empréstimo; por fim, a

utilização da informação, com os objetivos citados inicialmente, focando a ética

em cada uma das ações aqui resgatadas. Na verdade, essa divisão é tão somente

para efeitos didáticos, pois, como se percebe pelos questionamentos expressos,

eles perpassam várias ações, sem que haja uma única possibilidade de resposta

ou solução.

Isso é compreensível, porquanto assumir decisões, em qualquer nível, não

é tarefa fácil e existe sempre o risco de acerto e/ou de erro, de atendimento a uns

e de desagrado a outros. No entanto, qualquer ser humano obriga-se a elas e,

mais ainda, quem assume atividades de gestão da informação. Há exemplos

maravilhosos vividos e contados. Há histórias sofridas vividas e contadas. Há de

tudo, na tentativa de se vencerem os dilemas que perpassam o ciclo estendido da

gestão. Afinal, o mundo da Ciência é constituído por seres humanos e, assim,

permeado por informações, por contradições e por incertezas. No momento da

recuperação, há uma tendência a se valorizar o ator que a possibilitou – o

profissional da informação – mais do que o autor e os parceiros envolvidos em

todas as etapas. E isso porque o sucesso da busca permite a satisfação do

Page 144: Etica de la Información

usuário. Em outras palavras, a recuperação para empréstimo e uso da

informação, se tudo conspirar a favor!

Nesse território “movediço”, é necessário caminhar entre produtores,

gestores e usuários da informação, adotando uma postura humana suscetível de

ser qualificada como ética, e primar por regras de conduta impregnadas de

respeito, dentro da ética da cordialidade estimulada por Morin (2005). E isso não

significa estabelecer-se na boa vida, vez que a ética, como luta do dia a dia, está

permanentemente se renovando. Surgem novos dilemas e novas

responsabilidades, cada um a exigir decisões específicas. É a confirmação das

premissas de Fourez (1995), que insiste em afirmar que não existem códigos de

ética que comportem todas as situações presumíveis ou das incertezas éticas de

que fala Morin (2005).

Seres humanos assumem atitudes ambíguas: a vaidade de uns se

contrapõe à humildade de outros; a prepotência de alguns destoa da gentileza de

pessoas sociáveis. No Brasil, boa vida é muito diferente de vida boa. No Brasil,

vivemos entre dois traços culturais enraizados: de um lado, um que valoriza a

idoneidade das relações sociais, a vida boa (CAPURRO, 2009); do outro, a

lógica do “jeitinho brasileiro” que tudo consegue - a boa vida. No Brasil, a

cultura organizacional nacional está sofrendo mutações. Por sua vez, a

responsabilidade, apoiada na ética, sofre interveniências da globalização e da

revolução digital e iniciam-se discussões ampliadas.

Tendo em vista as injunções impostas pela globalização da maior

visibilidade dos princípios éticos e dos valores morais, da complexidade

crescente dos contextos culturais, dos dilemas e das incertezas que circundam o

ciclo estendido da vida, não há como desmerecer o trabalho exercido por

quantos têm na informação seu objeto de trabalho.

Page 145: Etica de la Información

REFERÊNCIAS

ABRANCHES, S.P. O que fazer quando eu recebo um trabalho ctrl c + ctrl v? autoria,

pirataria e plágio na era digital: desafios para a prática docente. In Simpósio Hipertexto e

Tecnologias na Educação: Multimodalidade e ensino. Anais eletrônicos... Recife: Núcleo de

Estudos de Hipertexto e Tecnologia Educacional, 2008.

BATTLES, Matthew. A conturbada história das bibliotecas. São Paulo: Planeta do Brasil,

2003. 239p.

CAPURRO, R. Ética para provedores e usuários da informação. In: KOLB, Anton;

ESTERBAUER, Reinhold; RUCKENBAUER, Hans Walter (Orgs.). Ciberética –

responsabilidade em um mundo interligado pela rede digital. São Paulo: Loyola, 2001.

CAPURRO, R. Ética intercultural de la informacion. In: GOMES, H.F.; BOTTENTUIT, A.

M.; OLIVEIRA, M.O.E. de (Orgs.) A ética na sociedade, na área da informação e da

atuação profissional: o olhar da Filosofia, da Sociologia, da Ciência da Informação e da

formação e do exercício profissional do bibliotecário no Brasil. Brasília: CFB, 2009. p. 43-64.

CHOO, Chun Wei. A organização do conhecimento: como as organizações usam a

informação para criar significado, construir conhecimento e tomar decisões. São Paulo: Ed.

Senac, 2003. 425p.

DAVYT, A.; VELHO, L. A avaliação da ciência e a revisão por pares: passado e presente.

Como será o futuro? História, Ciências, Saúde. Rio de Janeiro, v.7, n.1, p.93-116, mar./jun.

2000.

DU MONT, Rosemary Ruhig. Ethics in librarianship: a management model. Library Trends,

p. 201-215, Fall 1991.

FOUREZ, G. Como articular ciência e ética? In:______. A construção das ciências:

introdução à filosofia e à ética das ciências. São Paulo: Unesp, 1995. p.297-306.

MORIN, E. O método 6: ética. Porto Alegre: Sulina, 2005.

GARCIA, J.C.R. Responsabilidade social com a ciência. Datagramazero, v.8, n.2, abr.

2007.

GARCIA, J.C.R.; TARGINO, M.G. Reestruturação de Informação & Sociedade: Estudos;

periódico do Curso de Mestrado em Ciência da Informação da Universidade Federal da

Paraíba. Informação & Sociedade: Estudos, João Pessoa, v. 9, n.1, p. 87-135, 1999.

GARCIA, J.C.R.; TARGINO, M.G. Responsabilidade ética e social na produção de

periódicos científicos. Perspectivas em Ciência da Informação, v.13, n.1, p.33-54, abr. 2008.

Page 146: Etica de la Información

GUIMARÃES, J.A.C.; PINHO, F.A. Aspectos éticos em organização e representação do

conhecimento (ORC). In: FUJITA, M.S.L.; MARTELETO, R.M.; LARA, M.L.G. A

dimensão epistemológica da Ciência da Informação e suas interfaces técnicas, políticas e

institucionais nos processos de produção, acesso e disseminação da informação. São Paulo:

Cultura Acadêmica Ed.; Marília: Fundepe Editora, 2008. p.67-85.

GUIMARÃES, J.A.C.; PINHO, F.A. Aspectos éticos em organização e representação do

conhecimento (ORC): uma reflexão preliminar. IN: GONZÁLEZ DE GÓMEZ, M.N.; DILL

ORRICO, E.G. (Orgs.) Políticas de memória e informação: reflexos na organização do

conhecimento. Natal, EDUFRN, 2006. p. 237-264.

GUIMARÃES, J.A.C.; A ética na formação do bibliotecário: uma reflexão. Palavra Chave,

São Paulo, Associação Paulista de Bibliotecários, n.8, out. 1994, 5-8.

MEADOWS, A.J.A comunicação científica. Brasília: Briquet de Lemos Livros, 1999. 268 p.

MORIN, Edgar. O método 6: ética. Porto Alegre: Sulina, 2005. 222p.

PACKER, A.L.; MENEGHINI, R. Visibilidade da produção científica. In: POBLACION, D.

A.; WITTER, G.P.; SILVA, J. F. M. da. Comunicação &produção científica: contexto,

indicadores e avaliação. São Paulo:Angellara, 2006. p. 237-259.

ROUSSEAU, J.J. Do contrato social. Campinas: Russell, 2006.

SANTOS, P.L.V.A.C; CARVALHO, A.M.G. Sociedade da informação: avanços e

retrocessos no acesso e no uso da informação. Informação & Sociedade: Estudos, João

Pessoa, v.19, n.1, p.45-55, jan./abr. 2009.

TARGINO, M.G.; GARCIA, J.C.R. O editor e a revista científica: entre o feijão e o sonho. In:

FERREIRA, S.M.S.P.; TARGINO, M.G. (Org.). Mais sobre revistas científicas: em foco a

gestão. São Paulo: Ed. Senac, 2008. p.41-72.

TARGINO, M.G. Artigos científicos: a saga da autoria e co-autoria. In: FERREIRA,

S.M.S.P.; TARGINO, M.G. (Org.). Preparação de revistas científicas: teoria e prática. São

Paulo: Reichmann & Autores Ed., 2005. P.35-54.

VELOSO, L.H.M. Ética, valores e cultura: especificidades do conceito de responsabilidade

social corporativa. In: ASHLEY, Patrícia Almeida. (Org.). Ética e responsabilidade social

nos negócios. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2006. p.2-16.

WILSON, T.D. A problemática da gestão do conhecimento. In: TARAPANOFF, K. (Org.).

Inteligência, informação e conhecimento. Brasília: IBICT, UNESCO, 2006.

Page 147: Etica de la Información

PERSPECTIVAS EM ÉTICA DA INFORMAÇÃO:

acerca das premissas, das questões normativas e

dos contextos da reflexão

Maria Nélida González de Gómez

1 INTRODUÇÃO

Para pensar nas perspectivas de um desenvolvimento indagativo de uma

Ética da informação, encontramos o que poderíamos considerar três momentos:

Num primeiro, seria importante a reflexão sobre as premissas meta-

teóricas, do ponto de vista da Ética, acerca do que se entende por informação,

suas dimensões epistemológicas, as pressuposições ontológicas dessa acepção.

Num segundo momento, estabelecer alguma forma de discriminação acerca

de quais práticas e ações de informação implicariam critérios ou demandas

éticas e morais.

Num terceiro momento, indicar algumas zonas de tensão em que conflitos

de valorização, assimetrias de distribuição ou reconhecimento, as fariam

merecedoras de pesquisa teórica e aplicada para o desenvolvimento de uma ética

da informação situada, crítica e apta para incoprorar suas reflexões nos fóruns

deliberativos da acadêmica e da sociedade em geral.

                                                                                                                     

Ministério da Ciência e Tecnologia/Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia (IBICT). E-mail: Né[email protected]

Page 148: Etica de la Información

2 AS PREMISSAS

Entender quais as normas, motivações ou efeitos de caráter moral, no

domínio da informação, requer, no ponto de partida, lidar com questões que

precedem e condicionam a indagação ética, e dizem respeito às pressuposições

ontológicas e epistemológicas acerca do que concebemos como informação e

como comportamentos ou ações de informação. Exemplos desses plurais pontos

de partida, os encontraríamos na ética ontocêntrica de Floridi (2008) e na ética

intercultural de Capurro (2004).

Algumas premissas meta-teóricas acerca da informação serão

constitutivas das reflexões éticas, seja de modo implícito ou reflexivo.

Entre essas premissas, destacaríamos aquelas que respondem à questão da

agência, não só do ponto de vista dos indivíduos ou dos atores sociais que

poderiam assumir preferências, avaliações, julgamentos ou compromissos

morais, em torno da informação, mas também considerando agenciamentos

heterogêneos1, de modo que efeitos morais de ou sobre a informação podem

resultar da intervenção de agentes não-humanos, como em certos usos da

robótica, ou ainda, podem ser atribuídos a manifestação de estruturas

ontológicas primárias,sua preservação ou destruição о como parece ser a

proposta de Floridi (2008).

Outras questões, preliminares à abordagem ética, resultam da

consideração da informação como insumo ou produto do conhecimento;

associada a um principio epistêmico, seria da ordem exclusiva da razão e ficaria

                                                                                                                     1 Nos remetemos neste ponto ao conceito de “assemblage”, retomada, com mudanças de interpretação, do conceito de “gestell” de Heidegger. Conforme Frohmann (2008), “Deleuze and Latour directly addresses the idea of assemblages, Deleuze in his concept of agencement, translated either as ‘‘assemblage’’ or ‘‘arrangement’’, which provides a useful lens for focussing on the intensities, capacities, or powers of bodies in their arrangements with other bodies…, and Latour in his concept of ‘‘reassembling the social’’,which refers to systems of associations between heterogeneous elements—including documents and documentation—that build ways of living together (Latour, 2005)”.

Page 149: Etica de la Información

sujeita a avaliações veritativas, mas não a motivações, preferências, escolhas

ou avaliações morais.

Finalmente, deveria considerar-se, no ponto de partida, um certo paradoxo

entre as condições que definem certas normas como morais, tal como a

aspiração a serem incondicionadas e universais (tal como no imperativo

categórico kantiano e, em geral, na ética deontológica), sendo que a informação,

enquanto remita à produção de sentido, estaria ancorada nos contextos

narrativos de tradições culturais e comunidades de interpretação. Conforme as

éticas deontológicas, tal como a de Kant2, o princípio formal de universalidade

seria o critério central para estabelecer a eticidade de ações ou normas. Alguns

princípios éticos substantivos, como os direitos humanos, demandam também

legitimidade universal. Do ponto de vista reflexivo, a questão da extensão de

uma moldura normativa em que se sustentam avaliações e escolhas

informacionais, em torno da justiça e da vida boa seria já uma questão

prioritária.

Nas sociedades contemporâneas, ao mesmo tempo, são vivenciados

problemas de cunho informacional que as interpelam e demandam ações e

processos avaliativos e de tomada de decisão, de diversa ordem, mas numa

escala e extensão renovada, tal como aqueles que resultam da convergência e

expansão das tecnologias digitais (ver CAPURRO, FLORIDI, BRAMAN, entre

outros).

As novas junções da informática e das telecomunicações e sua

configuração em redes interativas de comunicação computadorizadas e à

distancia, estão hoje imbricadas em todos os processos sociais de produção de

sentido e em seus efeitos narrativos, operacionais e materiais. A digitalização

subsume uma série de fenômenos de convergência entre a comunicação,

processos sociais e componentes materiais, tais como aconteceria com a escrita,                                                                                                                      2 “El imperativo categórico es, pues, sólo uno y es este: obra solo según aquella máxima de la cual al mismo tiempo puedas querer que se convierta en norma Universal”. (KANT, 1961, p.112)

Page 150: Etica de la Información

o rádio, o cinema, a televisão, a telefonia móvel, a Internet e, finalmente, a

convergência entre tecnologias digitais e o mundo orgânico, incluindo o corpo

humano (BRAMAN, 2005, p.3).

As tecnologias digitais seriam justamente denominadas meta-tecnologias

por seu modo de operar com e sobre a dimensão simbólica de qualquer outra

operação, processo ou função, podendo aplicar-se assim a todo outro dispositivo

tecnológico que, a sua vez, vai a intervir sobre a matéria, a vida, o

conhecimento, a comunicação.

Ficaria constituído assim um novo paradoxo a ser esclarecido pela

reflexão ética, agora entre as proposições de universalidade do digital e as mais

exigentes condições de universalidade dos princípios morais, que se definem

como incondicionadas, ainda que sejam de frágil força de aplicação.

3 QUESTÕES NORMATIVAS

Após estabelecidas premissas e pontos de partida, a reflexão ética acerca

da informação encontrará algumas tradições que oferecem suas molduras

teóricas para conduzir as investigações, algo assim como o “cañamazo” que

conduz a mão das bordadeiras.

Escolhemos neste trabalho acompanhar a Habermas3, quando trata de

esclarecer as plurais modalidades de uso da razão prática que darão resposta à

pergunta sobre “Que devo fazer”, em diferentes situações.

Antes de tudo, gostaria de diferençar o uso da razão prática tendo

como fio condutor os modos pragmático, ético e moral de pôr a

questão. Sob os aspectos daquilo que é adequado a fins

(Zwechnässiges), do bom e do justo, espera-se, respectivamente,                                                                                                                      3 Trata-se, porém, de um uso metodológico de suas estruturas argumentativas, sem pretensão de apresentar ou debater, agora, sua Teoria da Ética Discursiva.

Page 151: Etica de la Información

desempenhos diferentes da razão prática. De acordo com eles, altera-

se a constelação entre razão e vontade nos discursos pragmáticos,

éticos e morais. A formação da vontade individual encontra, por fim,

seus limites no fato de abstrair da realidade da vontade alheia.

HABERMAS, 1989,p.4

Habermas vai diferenciar assim três grandes tipos de resposta à pergunta

"Que devo fazer?":

a) Os problemas práticos, que requerem as competências de uma razão

orientada a fins, o apoio de informações empíricas, e que exigem ações

instrumentais eficientes, para encontrar “técnicas, estratégias ou

programas adequados” (HABERMAS, 1989,p.6). Neste contexto, a

informação entraria como recurso e deveria atender as demandas de

confiabilidade e objetividade: a dimensão cognitiva pareceria predominar

sobre preferências e valores morais.

b) Em outros casos, porém, as decisões a serem tomadas implicam

“valorizações fortes”, como quando trata-se de escolher uma profissão

(Habermas pensa em, por exemplo, decidir ser um editor científico); são

decisões que se inserem num contexto de auto-compreensão, cujo “núcleo

valorativo” tem duas fases: uma, descritiva, que seria a re-apresentação

genealógica da biografia dos implicados; outra, normativa, a idealização

daquilo que se quer ser. Implica assim “apropriar-se” da biografia, das

tradições e dos contextos culturais de formação de identidade

(HABERMAS, 1999). Neste caso, a questão de que devo (devemos) fazer,

é uma questão ética; porque dessa decisão autêntica ou ilusória dependerá

ter uma vida boa. E essa exigência de auto-compreensão fica ancorada nas

redes de escolhas e possibilidades que constituem uma forma de vida, o

horizonte sócio-cultural onde se processam ao mesmo tempo a

individuação e a socialização. Nesta modalidade da pergunta sobre “que

Page 152: Etica de la Información

devo fazer”, as questões de informação teriam que manter as escolhas nas

redes nutrientes das memórias locais e os contextos biográficos, memórias

incompletas e perdidas, os futuros ilusórios, as preferências que excluem

ou precarizam identidades e vivências, retaliando reconhecimento e

estima.

c) Ao estabelecer metas para uma vida boa, no que Habermas chama agora

uma numa ética de bens (HABERMAS, 2000), ainda predominariam

condicionamentos de cunho egocêntrico ou etnocêntrico, dado que as

valorizações estariam ancoradas nos contextos locais, nas interpretações

compartilhadas de uma tradição cultural.O que denomina “normas

morais” deveriam ter o caráter universal e incondicionado de um

imperativo categórico4. Esta seria a instância em que a moralidade vai

alem da definição do que seja “a vida boa”, para estabelecer princípios de

justiça.

Neste ponto, cabe destacar duas propostas diferenciais habermasianas.

Uma, a transformação do imperativo kantiano num princípio intersubjetivo,

ancorado nas mesmas pressuposições pragmáticas de validade que para ele são

pressuposições inevitáveis da cão social como do agir comunicativo. Outra, o

papel que tem “o outro” como princípio definidor da universalidade, já que antes

que por uma extensão formal o ideal de um sujeito moral, a universalidade

remete à presença e participação de todos os envolvidos, na formulação e

aceitação de uma norma moral.                                                                                                                      4 O imperativo categórico, segundo o qual uma máxima é justa apenas se todos podem querer que ela seja seguida por cada um em situações comparáveis, é o primeiro a romper com o egocentrismo da "regra de ouro" ("Não faças a ninguém aquilo que não queres que te façam"). Cada um "tem de" (muss) poder querer que a máxima de nossa ação se torne uma lei universal. Apenas uma máxima capaz de universalização a partir da perspectiva de todos os envolvidos vale como uma norma que pode encontrar assentimento universal e, nesta medida, merece reconhecimento, ou seja, é moralmente impositiva. HABERMAS, 1989, p.11

Page 153: Etica de la Información

Seria possível pensar com tal vigor e extensão as normas próprias a uma

justiça da informação?

4 CONTEXTOS DA REFLEXÃO E TAREFAS

Para pensar nos cenários contemporâneos que contextualizam nossa

reflexão sobre uma ética da informação, recorremos de novo a Habermas. No

desenvolvimento de sua teoria social, concebida como teoria da ação

comunicativa, oferece outras linhas de reflexão, que podem ser ilustrativas dos

contextos em que devemos formular e responder as perguntas sobre “que devo

fazer”. Referimo-nos agora a sua concepção das formações sócio-culturais, as

que o autor descreve numa matriz de dupla entrada, constituída assim por

processos formativos ou de reprodução: reprodução cultural, integração

social, socialização; e componentes estruturantes: cultura, sociedade,

personalidade (quadro1). Nesse quadro, categorizamos modalidades das ações

comunicativas que buscam estabelecer planos coordenados de ação coletiva,

através da busca do entendimento mútuo dos participantes.

Page 154: Etica de la Información

Componentes

Estruturantes

Processos

de reprodução

CULTURA

SOCIEDADE

PERSONALI

DADE

Reprodução Cultural

Tradição,

crítica,

aquisição do

saber cultural

Renovação do

saber efetivo para

a legitimação

Reprodução

do

conhecimento

eficaz nos

processos de

formação

Integração Social

Imunização de

um núcleo de

orientações

valorativas

Coordenação das

ações através de

demandas de

validade

intersubjetivame

nte reconhecidas

Reprodução de

padrões de

pertencimento

societário

Socialização

Enculturação;

Realizações

interpretativas

Internalização de

valores

Formação da

identidade

Quadro 1. Funções das ações orientadas ao entendimento mútuo.

Fonte: Jurgen Habermas, 2004, p. 204

Page 155: Etica de la Información

Nas sociedades em que a integração por meios (poder, dinheiro)

predomina sobre as formas de interação que mantêm como pressupostos as

condições de validação e reciprocidade das ações comunicativas, aconteceriam

distúrbios que afetam aos atores sociais em todas as dimensões de realização de

suas vidas individuais e sociais.

Nos processos de transmissão cultural, geram-se efeitos de perda de

sentido e desativação de formas de validação dos conhecimentos; nos processos

de integração social, efeitos de anomia e fragilização da solidariedade entre os

membros da comunidade; nos processos de individuação e socialização, a

desestruturação da personalidade e de suas motivações para agir conforme as

normas sociais.

Page 156: Etica de la Información

Componentes

estruturais

Processos

orientados

à sua

reprodução

CULTURA

SOCIEDADE

PERSONALIDA

DE

DIMENSÕES

DE

AVALIAÇÃO

Reprodução

Cultural

Perda de

sentido

Retrocessos da

Legitimação

Crises na

educação

Racionalidade

do

conhecimento

Integração

Social

Instabilidade da

identidade

colectiva

Anomia

Objetificação

dos sujeitos

conforme a

relações

coordenadas por

meios

administrativos e

de poder

Solidariedade

entre os

membros das

comunidades

Socialização

Ruptura com a

tradição

Enfraqueciment

o das

motivações para

agir conforme as

normas

Distúrbios

psicopatológico

s

Responsabilidad

e individual

Quadro 2. A crises nos processos de reprodução cultural: manifestações dos

disturbios (a partir de Habermas, 1985, p. 143)

Page 157: Etica de la Información

Ora, nas sociedades contemporâneas, ao mesmo tempo em que as

tecnologias digitais e nomâdicas oferecem possibilidades inúmeras de

desenvolvimento econômico e social, enquanto as inovações tecnológicas

ficarem sujeitas ao predomínio dos mecanismos de mercado e de formas de

valorização capitalista, a produção, circulação e apropriação de informações

ignoraria as metas do bem estar social e da justiça social. Questões referentes à

confidencialidade, privacidade, propriedade intelectual, segurança, censura,

movimentos de código aberto, liberdade de expressão, referem-se a

procedimentos seletivos de informação e desinformação e à operação de

mecanismos exteriorizados de regulamentação e de controle acerca da geração,

circulação e acesso/uso de informação.

Consideramos, assim, que a investigação de uma ética da informação teria

como tarefa indagar as possíveis distorções comunicativo- informacionais que

afetam tanto a realização de metas de uma vida boa, como de justiça social, a

partir de nossas comunidades e de sua inserção nas formas globais da cultura, a

economia e a política.

Acompanhando a modelização habermaseana dos distúrbios normativos

das sociedades contemporânea, consideramos que existiriam três grandes zonas

de tensão que involucram condições ético-informacionais para sua superação.

Page 158: Etica de la Información

Eixo das

estruturações

Eixo dos processos

formativos

CULTURA

SOCIEDADE

PERSONALIDADE

REPRODUÇÃO

CULTURAL

CRISES

VALIDAÇÃO E

CREDENCIAME

NTO

INTEGRAÇÃO

SOCIAL

EXCLUSÃO

SOCIAL

E

INFORMACIONA

L

SOCIALIZAÇÃO

FRAGILIZAÇÃO

MECANISMOS DE

IDENTIFICAÇÃO

E DE

RECONHECIMEN

TO

Quadro 3. Zonas de tensão normativa informacional

A crise das modalidades de validação e credenciamento dos

conhecimentos teria como uma de suas principais manifestações a crescente

Page 159: Etica de la Información

preocupação com questões normativas e critérios avaliativos que encontramos

nos discursos, saberes e organizações que lidam com a produção em uso de

conhecimentos nas mais diversas áreas: saúde, produção intelectual, ciência e

tecnologia em geral, direito. A afirmação do caráter performático dos

enunciados científicos é outro lado das novas experimentações em torno da

validade dos conhecimentos. A poli-nomia das mensagens em redes digitais leva

a explorar novas formas de construção de legitimidade ou a reformular

procedimentos prévios, como as Wiki’s. A pertinência e relevância da questão

para uma ética da informação é abordada em ângulos diferentes, seja pelos que

consideram que se trata de um problema de qualidade e de verificabilidade, a

nível epistêmico, aos que aderem às éticas cognitivas como caminho de uma

ética da informação.

Trata-se de uma responsabilidade de reflexão que agregaria, entre outros,

especialistas; das organizações que atuam em educação, ciência e tecnologia;

das agências de fomento e avaliação da pesquisa

A fragilização dos mecanismos de identificação e de reconhecimento,

que afetam tanto os processos de individuação como de socialização, tem nas

redes sociais tanto o locus de superação como o locus de sua manifestação. As

redes digitais, frágeis, leves, possibilitadas e ordenadas pelas disponibilidades de

software e de hardware, são o espaço vicariante das praças, das várzeas, das

tradições. A pergunta, quiçá, seria, neste ponto, o que podemos fazer com o que

temos à disposição. Caberia a todos e a cada um a responsabilidade moral de

construção e renovação de vínculos.

A integração por meios, em lugar da inclusão disciplinar de que nos

falam pensadores como Foucault (a produção homogeneizada de sujeitos

institucionalizados), gera instabilidade das relações sociais e das posições dos

sujeitos nas configurações do poder. A exclusão, o que Agambem chama a “vida

nua”, sem as redes protetoras ainda que imperfeitas da cidadania plena,

acompanhou a expansão dos modelos neoliberais e das figuras mercadológicas

Page 160: Etica de la Información

da revolução informacional. Caberia aqui uma reunião produtiva da ética, do

direito e da política. A ética, porque coloca a dignidade humana como crivo de

valorização do valor; a política, porque constrói um “nós” de compromissos

abrangentes, o direito, porque da uma forma positiva as proposições solidárias

mas sem força de aplicação das normas éticas e morais.

REFERÊNCIAS

BRAMAN, Sandra. The emergent global information policy regime, pp. 12-37. In:

BRAMAN, Sandra (Ed.). The emergent global information policy regime. Houndsmills,

UK: Palgrave Macmillan. 2004.

BOWKER, Geoffrey; BAKER, Karen; MILLERAND, Florence; RIBES, David. Towards

Information Infrastructure Studies:Ways of Knowing in a Networked Environment.

International Handbook of Internet Research, J.Hunsinger, M.Allen, L.Klasrup (eds),

2006.

CAPURRO, R. Etica de la información: Un intento de ubicación. Códice : Revista de la

Facultad de Sistemas de Información y Documentación. Vol. 1, no. 2, 2005; p. 87-95.

Traducción de un artículo en alemán publicado en la International Review of Information

Ethics (1/2004).

______. Ethics and public policy within a digital environment. ETHICOMP 2002: The

Transformation of Organisations in the Information Age, Universidade Lusiada, Lisbon,

Portugal, November 13-15, 2002.

______. Intercultural Information Ethics. International ICIE Symposium 2004, Localizing

the Internet: ethical issues in intercultural perspective. Karlsruhe, Germany: Center for Art

and Media, October 4-6, 2004. P.1-34. Disponível em: <http://www.capurro.de/iie>.

Acessado em 02-03-2005.

Page 161: Etica de la Información

______. On Floridi’s metaphysical foundation of information ecology. Ethics and

Information Technology. 10:167–173, 2008.

CAPURRO, R & HJØRLAND, B. The Concept of Information. Annual Review of

Information Science & Technology, Vol. 37, Chapter 8, pp. 343-411.2003.

http://www.capurro.de/infoconcept.htm.

CASTRO, César Augusto. Biblioteca como lugar de memória e eco de conhecimento: um

olhar sobre “O nome da rosa”. Revista Digital de Biblioteconomia e Ciência da

Informação, v.4, n. esp., p.1-20, 2006.

DÜRMAIER, A.. Do conceito e da medida da pobreza de informação e comunicação.

Informação & Sociedade: Estudos, João Pessoa, v.19, n.3, p. 133-143, set./dez. 2009.

ESS, Charles. Ethical Pluralism and Global Information Ethics. In Luciano Floridi and Julian

Savulescu (eds.), Information Ethics: Agents,Artifacts and New Cultural Perspectives. Ethics

and Information Technology, 8(4: November): 215–226.2006.

______. Luciano Floridi’s philosophy of information and information ethics: Critical

reflections and the state of the art. Ethics and Information Technology (2008) 10:89–96

FALLIS, Don. On Verifying the Accuracy of Information: Philosophical

Perspectives.Library Trends. v.52, n.3, p. 463-487. 2004.

FERNÁNDEZ-MOLINA, Juan Carlos LA INFORMACIÓN EN EL ENTORNO DIGITAL:

principales áreas con implicaciones éticas. In: A ética na sociedade, na área da informação

e da atuação profissional: o olhar da Filosofia, da Sociologia, da Ciência da Informação e da

formação e do exercício profissional do bibliotecário no Brasil. Henriette Ferreira Gomes,

Aldinar Martins Bottentuit e Maria Odaisa Espinheiro de Oliveira (Orgs.). – Brasília, DF:

Conselho Federal de Biblioteconomia, 2009.

FLORIDI, L. Information Ethics: An Environmental Approach to the Digital Divide.

Philosophy in the Contemporary World, 9(1), 39–45; 2002.

Page 162: Etica de la Información

______. Information Ethics: Its Nature and Scope. In Jeroen van den Hoven and JohnWeckert

(eds.), Moral Philosophy and Information Technology, 40–65. Cambridge: Cambridge

University Press. 2008.

______. Information Ethics: On the Theoretical Foundations of Computer Ethics. Ethics and

Information Technology, 1(1), 37–56; 1999.

______. Information Technologies and the Tragedy of the Good Will. Ethics and

Information Technology,v. 8, no.4, p. 253–262, 2006. Disponível em:

http://www.philosophyofinformation.net/

______. On the Intrinsic Value of Information Objects and the Infosphere. Ethics and

Information Technology, 4(4), 287–304; 2003.

FROELICH, Thomas J. Ethical considerations of information professionals. Annual Review

(ARIST), 1992, Vol. 27, Pages: 291-324

FROHMANN, Bernd. Documentary ethics, ontology, and politics. Arch Sci, 2008. 16 p.

HABERMAS, Jürgen. Para o uso pragmático, ético e moral da razão prática. Estud. av., Dez

1989, vol.3, no.7, p.4-19

______. A inclusão do outro. São Paulo, Ed. Loyola, 2002

______. Aclaraciones a la ética del discurso. Madrid, Ed. Trotta, 2000.

______. Consciência Moral e Agir Comunicativo. Rio de Janeiro, Tempo Brasileiro, 1989.

______. Direito e democracia: entre faticidade e validade. Rio de Janeiro: Tempo

Brasileiro, 1997. 2 v.

______. La ética del discurso y la cuestión de la verdad. Bs. As., Paidós, 2004a.

Page 163: Etica de la Información

______. Mudança estrutural da esfera Pública. Rio de Janeiro, Tempo Brasileiro, 1984.

______. Teoría de la Acción Comunicativa: Complementos y Estudios Previos. Madrid,

Cátedra, 1994.

______. Valores e normas. Sobre o pragmatismo kantiano de Hilary Putman. In: Habermas e

o uso público da razão. Rainer Rochlitz (Org.) RJ, Tempo Brasileiro, 2005. Pg.169-200.

______. Aclaraciones a la ética del discurso. Madrid, Editoral Trotta, 2000.

______. Verdade e Justificação. São Paulo, Loyola, 2004a.

HONGLADAROM, Soraj. The Digital Divide, Epistemology and Global Justice. In:

Information Ethics. Computer Indian Siocety, 2005.

KANT, Immanuel. Cimentación para la metafísica de las costumbres. Buenos Aires:

México, Aguilar, 1961.

RIEH, S. Y. & DANIELSON, D. R. Credibility: A multidisciplinary framework. In B.

Cronin (Ed.), Annual Review of Information Science and Technology. v.41, p. 307-

364. Medford, NJ: Information Today. 2007.

SMITH, Martha Montague. Information ethics. Annual Review (ARIST), 1997, Vol. 32, p.

339-366.

STAHL, Bernd C. Discourses on information ethics: The claim to universality.

Ethics and Information Technology, v.10, p.97–108, 2008.

Page 164: Etica de la Información

ÉTICA E POLÍTICAS DE INFORMAÇÃO: uma ação

de informação no Programa de Cooperação

Acadêmica - Novas Fronteiras da CAPES

Gustavo Henrique de Araujo Freire Professor e pesquisador do Departamento de Ciência

da Informação e do Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação

Universidade Federal da Paraíba

E-mail: [email protected]

1 INTRODUÇÃO

Este trabalho é o ponto de partida de nossa pesquisa a ser desenvolvida

nos próximos quatro anos no âmbito do PROCAD1, qual seja construir uma rede

de cooperação e aprendizagem entre os PPGCIs da UFPB e da UNESP/Marília.

A construção desta rede traz a necessidade de se refletir acerca da ética que

envolve as ações de informação relacionadas a políticas públicas.

No nosso escopo, trata-se de promover o “conhecimento em ação”

(WERSIG, 1993) na Ciência da Informação de modo a intervir sobre o regime

de informação dos programas envolvidos no PROCAD. Nesse sentido,

estaremos, também, colaborando para implementar um dos objetivos específicos

daquele projeto, qual seja o de “Contextualizar e discutir com a comunidade

propostas para políticas públicas locais de informação, nas áreas de Educação e                                                                                                                      1 Proposto à CAPES, pela Universidade Federal da Paraíba (UFPB), em associação com a Universidade Estadual Paulista (UNESP), campus de Marília, no âmbito do Programa de Cooperação Acadêmica - Novas Fronteiras, o projeto Rede de Cooperação e Aprendizagem na Ciência da Informação. O projeto representa uma oportunidade histórica para realizar uma atividade conjunta de pesquisa, de aprendizagem e de formação na área de Ciência da Informação.

Page 165: Etica de la Información

Cultura”. E, neste trabalho, agregando a discussão sobre a aplicação da ética às

ações de informação.

A ética é um conceito eminentemente humano, pois envolve atitudes,

pensamentos e ações construídas em um dado contexto cultural, social e moral.

A informação que interessa à Ciência da Informação é uma informação criada e

comunicada em relações de trocas comunicacionais que envolvem indivíduos,

em nossa pesquisa específica, a saber: professores dos programas de Pós-

Graduação em Ciência da Informação da Universidade Federal da Paraíba e da

Universidade Estadual de São Paulo, campus de Marília, que fazem parte do

PROCAD. É assim que a Ciência da Informação, enquanto ciência que estuda a

informação como padrão que une (FREIRE, 2001), incorpora à sua definição a

noção de uma ação que remete seus atores sociais aos contextos onde ocorrem

(GONZÁLEZ DE GÓMEZ, 2002).

A abordagem metodológica se pauta na construção participativa de um

instrumento com diretrizes para uma política pública de gestão de recursos de

informação, em âmbito local, que será o eixo motivacional e operatório da

pesquisa.

2 SOBRE GESTÃO E POLÍTICAS DE INFORMAÇÃO

Nossa premissa básica é que a construção de uma rede de cooperação e

aprendizagem nos leva a pensar sobre os aspectos éticos que permeiam as

relações entre os atores que participam desta rede. Nesse sentido, a pesquisa irá

trabalhar no sentido de construir um ambiente virtual que propicie aos atores

uma comunicação interativa e a disponibilização de acervos de informação

relevantes para os temas abordados nos projetos a serem desenvolvidos por cada

pesquisador.

Page 166: Etica de la Información

Para González de Gómez (1999, p. 69), a gestão da informação envolve

“o planejamento, instrumentalização, atribuição de recursos e competências,

acompanhamento e avaliação das ações de informação e seus desdobramentos

em sistemas, serviços e produtos”. Nesta perspectiva, a gestão estabelece a

mediação entre as políticas de informação de um setor e a ação informada dos

atores sociais envolvidos, sejam eles “o Estado, o Governo, ou comunidades

usuárias de bens e serviços de informação ou atingidas em seus processos

cognitivos e deliberativos pela disponibilização ou omissão de informações”

(GONZÁLEZ DE GÓMEZ, 1999, p. 69).

Para Japiassu e Marcondes (1996, p. 215), o termo política refere-se a

“tudo aquilo que diz respeito ao cidadão, aos governos e aos negócios públicos”.

A natureza normativa da política estabelece “os critérios da justiça e do bom

governo, e examinado as condições sob as quais o homem pode atingir a

felicidade (o bem-estar) na sociedade, em sua existência coletiva” (JAPIASSU e

MARCONDES, 1996, p. 215). Pode-se perceber que tanto o conceito de

informação quanto o de política possuem o mesmo sentido de ordem e regulação

que, reunidos, formam o conceito de “políticas de informação”: conjunto de leis,

regulamentos e políticas que estimulam ou regulam a geração, o uso, o

armazenamento e a comunicação de informação.

Como política pública, a política de informação assenta-se sobre

“interesses e metas políticas e burocráticas, não necessariamente congruentes,

manifestando-se para além do aparato governamental” (BRANCO, 2001, p. 87).

Nesse sentido, a expressão de uma política de informação ultrapassa o campo

formal das leis e regulamentos, pois também engloba as práticas e ações

informais de um determinado contexto “em que se misturam pessoas,

instituições e interesses, cujas manifestações nem sempre se revelam por

mecanismos formais” (BRANCO, 2001, p. 89). Dessa forma, a política de

informação deve ser um instrumento regulador entre a sociedade e os avanços

científicos e tecnológicos, e deve atuar de forma participativa. Assim praticada,

Page 167: Etica de la Información

segundo Silva (1991), ela contribuirá para a melhoria do nível educacional,

cultural e político, elementos básicos para o exercício pleno da cidadania.

3 A PERSPECTIVA DO REGIME DE INFORMAÇÃO

Para González de Gómez (2002, p. 35), o “escopo e a abrangência dos

estudos em torno da política de informação se multiplicam e se fragmentam” em

todas as abordagens da Ciência da Informação. Neste enfoque, definir políticas

de informação implica em ultrapassar esse contexto interdisciplinar da Ciência.

Por isso, a autora propõe-se utilizar um conceito de política de informação que

“tratará de resgatar a amplidão e complexidade do campo, permitindo a

consideração das macro e micro-políticas, bem como das políticas locais,

regionais, nacionais e globais” (GONZÁLEZ DE GÓMEZ, 2002, p. 67).

Nossa abordagem de políticas de informação utiliza como base o conceito

de regime de informação, o qual é definido por González de Gómez (2002, p.

34) como

...conjunto mais ou menos estável de redes sociocomunicacionais

formais e informais nas quais informações podem ser geradas,

organizadas e transferidas de diferentes produtores, através de muitos

e diversos meios, canais e organizações, a diferentes destinatários ou

receptores, sejam estes usuários específicos ou públicos amplos. ... [o

qual] está configurado, em cada caso, por plexos de relações plurais e

diversas: intermediáticas; interorganizacionais e intersociais. [Sendo

constituído, assim,] pela figura combinatória de uma relação de forças,

definindo uma direção e arranjo de mediações comunicacionais e

informacionais dentro de um domínio funcional (saúde, educação,

previdência, etc.), territorial (município, região, grupo de países) ou de

sua combinação.

Page 168: Etica de la Información

No conceito de regime de informação, a relação entre a política e a

informação ficaria em observação, permitindo incluir tanto as políticas tácitas e

indiretas quanto as explícitas e públicas, micro e macropolíticas, assim como

permitiria articular, “em um plexo de relações por vezes indiscerníveis, as

políticas de comunicação, cultura e informação” (GONZÁLEZ DE GÓMEZ,

2002, p. 70).

No âmbito da Ciência da Informação no Brasil, a temática das políticas de

informação encontra-se fundamentada, principalmente, nos estudos de González

de Gómez. A autora define a Ciência da Informação como uma “disciplina que

estuda fenômenos, processos, construções, sistemas, redes e artefatos de

informação” (GONZÁLEZ DE GÓMEZ, 2004, p. 60) . Nesta perspectiva, a

informação é definida como “ações de informação, que remetem seus atores aos

contextos onde estas ocorrem” (GONZÁLEZ DE GÓMEZ, 2004, p. 61). A

informação enquanto Ação de Informação refere-se a um conjunto de estratos

heterogêneos e articulados, que se manifestam através de três modalidades:

a) ação de mediação: a ação fica atrelada aos fins e orientação de

uma outra ação;

b) ação formativa: a ação está orientada à informação não como um

meio, mas como sua finalização;

c) ação relacional: a ação busca intervir em uma outra ação para

obter direção e fins (GONZALEZ DE GOMEZ, 2004).

Nesse contexto, as ações de pesquisa e as ações de informação integrarão

um mesmo domínio de orientações estratégicas e, em conseqüência, a política e

a gestão da informação formarão parte do mesmo plano decisional e prospectivo

ao qual pertence a política e a gestão da ciência e da tecnologia (C&T).

Page 169: Etica de la Información

Como política pública, a política de informação assenta-se sobre

“interesses e metas políticas e burocráticas, não necessariamente congruentes,

manifestando-se para além do aparato governamental” (WEINGARTEN citado

por BRANCO, 2001). Nesse sentido, a expressão de uma política de informação

ultrapassa o campo formal das leis e regulamentos, pois também engloba as

práticas e ações informais de um determinado contexto “em que se misturam

pessoas, instituições e interesses, cujas manifestações nem sempre se revelam

por mecanismos formais” (WEINGARTEN citado por BRANCO, 2001). A

política de informação deve ser um instrumento regulador entre a sociedade e os

avanços científicos e tecnológicos, e deve atuar de forma participativa. Assim

praticada, segundo Silva (1991), ela contribuirá para a melhoria do nível

educacional, cultural e político, elementos básicos para o exercício pleno da

cidadania.

González de Gómez (1999, p.63) propõe quatro definições de políticas de

informação no contexto do regime de informação, definindo-a primeiramente

como “um conjunto de ações e decisões orientadas a preservar e a reproduzir, ou

a mudar e substituir um Regime de Informação, e podem ser tanto políticas

tácitas ou explícitas, micro ou macropolíticas”.

A segunda definição de política de informação é direcionada para

diferenciar gestão de política de informação:

Falamos de Políticas de Informação quando, tratando-se de uma

questão colocada num domínio coletivo de ação, existem conflitos

entre as diferentes formulações de objetivos, planos, atores e recursos

atribuídos às ações do domínio e em conseqüência, com respeito ao

alcance, às prioridades e às metas das ações de informação, de modo

que aqueles conflitos não poderiam ser equacionados ou resolvidos

por meios técnicos ou instrumentais e requerem a reformulação

deliberativa de princípios, fins e regras para a concretização de planos

Page 170: Etica de la Información

coletivos e coordenados de ação, ou a mudança das relações de força

dos atores envolvidos. (GONZÁLEZ DE GÓMEZ, 1999, p.71)

Na terceira definição, as políticas são abordadas como orientações com

relação a fins, valores e objetivos das políticas de Informação, designando “as

figuras decisionais e normativas do que seja desejável e prioritário para um

sujeito coletivo (organização e, regiões, Estado Nacional, etc.) acerca da

geração, circulação, tratamento e uso da informação” (GONZÁLEZ DE GÓMEZ,

1999, p.71).

Na quarta e última definição, as políticas atuam como uma “ação dirigida

a consolidar a autonomia informacional dos sujeitos coletivos”, considerando

que A constituição dos universos de informação parte sempre do ‘nós’ de

um sujeito situado, localizado, territorializado, para o qual algo faz ou

não faz sentido como informação. Em cada contexto histórico, em

cada espaço de ação coletiva, existe um saber local, um sentimento

territorializado ou um desejo do que seja um bem coletivo, que

formam parte das razões bem fundadas para priorizar, justificar, gerar

ou aderir a um valor de informação. (GONZÁLEZ DE GÓMEZ,

1999, p.71)

Implica dizer aqui que, embora a Sociedade da Informação seja um

fenômeno mundial, uma política de informação deve privilegiar, antes de tudo, a

estrutura informacional do local visando a sua inserção no global, pois

... a partir do potencial integrativo do novo padrão tecnológico, o

local redefine-se, ganhando em densidade comunicacional,

informacional e técnica no âmbito das redes informacionais que se

estabelecem em escala planetária. ... a dimensão cultural do local atua

na globalidade como um fio invisível que vincula os indivíduos ao

espaço, marcando uma certa idéia de diferença ou de distinção entre

Page 171: Etica de la Información

comunidades. Assim, o local constitui-se em suporte e condição para

as relações globais. É nele que a globalização se expressa

concretamente e assume especificidades. (ALBAGLI, 1999, p.186-187).

Assim, qualquer que seja a forma de proporcionar o acesso a redes de

informação global, como a Internet, por exemplo, esta deverá estar integrada às

condições locais existentes, tanto em termos de suas organizações quanto em

seus referenciais culturais, e a produção cultural deve estar centrada nos valores

significativos locais. No contexcto atual, para González de Gómez (2003),

... a sociedade da informação poderia ser entendida como aquela em

que o regime de informação caracteriza e condiciona todos os outros

regimes sociais, econômicos, culturais, das comunidades e do Estado.

Nesse sentido, a centralidade da comunicação e da informação

produziria a maior dispersão das questões políticas da informação,

perpassada e interceptada por todas as outras políticas: as públicas e as

informais, as tácitas e as explícitas, as diretas ou indiretas.

(GONZÁLEZ DE GÓMEZ, 2003, p. 61).

A informação seria, então, o elemento que unificaria a “dispersão” das

questões relacionadas às políticas da informação presentes em cada um dos

regimes de informação, independente de serem políticas “públicas, informais,

tácitas, explícitas, diretas ou indiretas” (GONZÁLEZ DE GÓMEZ, 2003, p. 61).

Uma política de informação pode ser elaborada sob duas abordagens: a

básica e a específica. A primeira refere-se aos aspectos gerais da produção de

informação, como aqueles ligados à tecnologia de informação, às

telecomunicações e à política internacional, dentre outros. Já a política

específica de informação, conforme Branco (2001), diz respeito aos aspectos

característicos de determinado setor de atividade como, por exemplo, uma

política para gestão da informação que contemple a produção de conteúdos de

Page 172: Etica de la Información

identidade cultural e o acesso livre a fontes de informação relevantes na Internet.

Neste caso, a política de informação estará voltada para objetivos e metas

específicos, que lhe darão contornos próprios e inerentes ao respectivo espaço

ou regime de informação.

A nosso ver, nesse contexto cabe à Ciência da Informação dar o

embasamento teórico para proposição e discussão de ações de informação que

contribuam para promover políticas de informação que possam ser utilizadas

como instrumentos de gestão de recursos de informação.

De acordo com o exposto, a gestão de recursos de informação contidas em

uma rede de cooperação e compartilhamento de informações no ciberespaço

pode facilitar a construção de um conhecimento coletivo por parte dos membros

dos dois programas de Pós-Graduação envolvidos no PROCAD. Na perspectiva

de nossa pesquisa, isto pode ser visto como instrumento de uma política de

informação local que pode orientar as ações necessárias para o aumento da

produção científica na área da Ciência da Informação .

Neste sentido, defendemos a tese de que a criação desse instrumento de

comunicação da informação em ambiente virtual (a rede de cooperação e

compartilhamento de informações e conhecimentos científicos) pode ser vista

como uma política de informação localizada, já que irá intervir no regime de

informação dos programas de Pós-Graduação envolvidos. Nesse processo, estão

envolvidos os produtores de informação por excelência, tais como professores;

os receptores e produtores em potencial de informação, como, por exemplo, os

alunos; e os canais que são utilizados para a comunicação das pesquisas, tais

como congressos, anais, periódicos, livros, sites entres outros elementos que

compõem o regime de informação dessa comunidade. E é nosso propósito, neste

projeto, construir essa rede de cooperação e compartilhamento com a

participação daqueles que serão seus maiores beneficiários о" pq" ecuq." c"

comunidade científica a qual faz os PPGCIS envolvidos no PROCAD.

Page 173: Etica de la Información

4 PESQUISA-AÇÃO PARA CONSTRUÇÃO PARTICIPATIVA DE UMA

POLÍTICA DE INFORMAÇÃO

A escolha da pesquisa-ação traduz a tentativa de abordar a comunicação

da informação como ação transformadora, no sentido que lhe atribui Araújo

(1994), criando espaço para intervenção empírica em uma dada situação. A

pesquisa-ação supõe uma participação e uma forma de ação planejada que atinja

os vários elementos das atividades humanas, estando diretamente relacionada à

presente proposta, na medida em que viabiliza a ação coletiva pautada pela

resolução de problemas e por objetivos de transformação.

Segundo Thiollent (1997), a pesquisa-ação “consiste essencialmente em

acoplar pesquisa e ação em um processo no qual os atores implicados

participam, junto com os pesquisadores, para chegarem interativamente a

elucidar a realidade em que estão inseridos” (THIOLLENT, 1997, p. 15). Nessa

perspectiva, entende-se por “ator” qualquer grupo de pessoas dispondo de certa

capacidade de ação coletiva consciente em um contexto social delimitado,

podendo designar tanto os grupos informantes no meio de uma organização

quanto os grupos formalmente constituídos, e “participação” é encarada como

propriedade emergente do processo e não como a priori. Este será o caminho

com os participantes do PROCAD entre os PPGCIs da UFPB e da

UNESP/Marília.

Buscando uma visão sintética, Dubost (1987) examinou várias concepções

de pesquisa-ação vinculadas à tradições norte-americanas e européias,

formulando sua própria definição como “ação deliberada visando a uma

mudança no mundo real, realizada em escala restrita, inserida em um projeto

mais geral e submetida a certas disciplinas para obter efeitos de conhecimento e

de sentido”. (DUBOST, 1987 citado por THIOLLENT, 1997, p. 35). No

presente projeto integramos à abordagem de Dubost a visão cooperativa de

Desroche (1990), que define a pesquisa-ação como uma pesquisa

Page 174: Etica de la Información

... na qual os autores de pesquisa e os atores sociais se encontram

reciprocamente implicados: os atores na pesquisa e os autores na ação.

No limite, esses dois papéis tendem a identificar-se em uma só

instância de operação. ... na pesquisa-ação os atores deixam de ser

simplesmente objeto de observação, de explicação ou de interpretação.

Eles tornam-se sujeitos e parte integrante da pesquisa, de sua

concepção, de seu desenrolar, de sua redação e de seu

acompanhamento. (DESROCHE, 1990 citado por THIOLLENT,

1997, p.36)

Utilizaremos, também, a metodologia da pesquisa-participante, utilizada

por Freire (1998) e Espírito Santo (2003), em suas respectivas dissertações de

Mestrado em Ciência da Informação, e por Freire (2006) em sua pesquisa sobre

inclusão digital. O termo “pesquisa-participante” foi criado por pesquisadores

norte-americanos e europeus envolvidos com projetos de intercâmbio com

países de terceiro mundo, na área de Ciências Sociais. A pesquisa-participante

combina:

...técnicas de pesquisa, processos de ensino-aprendizagem e

programas de ação educativa que ... apontam para [a

promoção]:

a) da produção coletiva de conhecimentos, rompendo o

monopólio do saber e da informação, permitindo que

ambos se transformem em patrimônio dos grupos

marginalizados;

b) da análise coletiva na ordenação da informação e no uso

que dela se possa fazer;

c) da análise crítica, utilizando a informação ordenadas e

classificada, a fim de determinar as raízes e as causas dos

problemas e as vias de solução para os mesmos; [e o]

Page 175: Etica de la Información

d) estabelecimento de relações entre problemas individuais

e coletivos, funcionais e estruturais, como parte da busca

de soluções para os problemas enfrentado

(FREIRE,1998, p. 16).2

A construção participativa de um instrumento com diretrizes para uma

política de gestão de recursos de informação digitais, no âmbito do PROCAD

UFPB – UNESP/Marília, será o eixo motivacional e operatório da pesquisa.

Para construção desse instrumento com a comunidade de pesquisadores-

docentes e alunos no Mestrado em Ciência da Informação dos respectivos

Programas, optamos, também, por incluir o uso da metodologia da pesquisa-

participante, que envolve contato permanente entre os participantes da pesquisa

(docentes e discentes dos PPPGCIs), sendo que o primeiro momento é dedicado

ao conhecimento preliminar da realidade, de modo a identificar o que Goldmann

(1970) denomina “informação prévia”. Desta ação, resulta a formação de um

grupo de trabalho que, no segundo momento, identifica, na comunidade, os

“temas geradores” do conteúdo do instrumento. Nesse sentido, a pesquisa-

participante oferece oportunidade para que a comunidade científica envolvida no

PROCAD possa participar da análise da sua própria realidade. Assim, a

pesquisa-participante pode ser vista como uma abordagem “que poderia resolver

a tensão contínua entre o processo de geração de conhecimento e o uso deste

conhecimento, entre o mundo acadêmico e o irreal, entre intelectuais e

trabalhadores, entre ciência e vida” (DEMO, 1986, p. 126). Nesse processo, o

objeto de estudo se torna sujeito da ação e partícipe da discussão do seu próprio

destino, no caso suas necessidades de informação e os recursos possíveis para

seu atendimento.

                                                                                                                     2 O resultado do trabalho de Freire (1998) pode ser visto no sítio http://ghafreire.sites.uol.com.br.

Page 176: Etica de la Información

A nosso ver, nesse contexto cabe à Ciência da Informação desenvolver o

embasamento teórico para proposição e discussão de ações de informação que

contribuam para promover políticas de informação a serem utilizadas como

instrumentos de gestão de recursos de informação.

4.2 A construção da rede de cooperação e aprendizagem

Os processos de aprendizagem e o trabalho cooperativo sempre fizeram

parte da história humana, como temos chamado à atenção. A partir do momento

em que a nossa espécie passa a viver em grupos para depois se transformar em

sociedades culturalmente mais organizadas, a experiência de trocas entre os

participantes de um determinado grupo social e a união entre os participantes

deste em torno de um objetivo comum são atitudes que, com certeza,

possibilitaram avançarmos até os nossos dias.

A aprendizagem está estreitamente ligada à evolução humana, à

transmissão de conhecimentos, em princípio em linguagem oral, pois não havia

ainda o registro das informações, permitindo o distanciamento, no tempo e no

espaço, das partes envolvidas no processo de comunicação da informação. No

paradigma tecno-econômico atual, em que a informação é considerada um fator

de suma importância para o desenvolvimento social, o capital humano está se

valorizando cada vez mais, principalmente nos espaços de produção e

comunicação de informação que levam ao desenvolvimento científico e

tecnológico, em nosso caso específico os Programas de Pós-Graduação que

fazem parte do PROCAD.

Nesse sentido, a construção de uma rede de cooperação e aprendizagem

(RECAP) pode ser vista como uma estratégia para que se possa desenvolver

uma inteligência coletiva entre os atores participantes desses programas.

Segundo Lévy, no processo de construção de uma inteligência coletiva no

Page 177: Etica de la Información

ciberespaço se destacam dois elementos (que Levy chama dispositivos). O

primeiro é o

Informacional, que “qualifica a estrutura da mensagem ou o modo de

relação dos elementos de informação”. (LEVY, 1999, p. 62)

Este elemento se refere ao modo como os repositórios de informação se

estruturam e como podem se relacionar com outros estoques, ou seja, diz

respeito ao fato da informação estar disponibilizada, organizada de várias

maneiras (resumos, tesauros, catálogos...) e relacionada com outras informações

de forma específica.

O segundo dispositivo é o

comunicacional, que “designa a relação entre os participantes da

comunicação”. As categorias de dispositivos comunicacionais são três:

um-todos; um-um; todos-todos. (LEVY, 1999, p. 63)

A emergência do ciberespaço vai possibilitar o surgimento de dois

dispositivos informacionais originais: o mundo virtual (que dispõe a

informação em um espaço contínuo) e a informação em fluxo (dados em estado

contínuo de modificação), e isto nos leva à idéia de infinito (espaço que nunca

será completamente preenchido e que se encontra em um estado permanente de

mudança).

Assim, o ciberespaço apresenta a possibilidade de penetrarmos em uma

nova realidade, que nos abre possibilidades de experimentar ações de

informação que contribuam para facilitar a construção de um conhecimento

coletivo criado entre os participantes da RECAP no âmbito dessa nova

realidade, a realidade virtual. Sob esse prisma, a elaboração de uma rede de

Page 178: Etica de la Información

cooperação e aprendizagem em ambiente virtual precisa levar em consideração

algumas características da “sociedade informacional” que já estão presentes em

nosso convívio social, quais sejam:

A velocidade de criação e de renovação dos conhecimentos, através do

uso intensivo de informação. Esse processo leva a um aumento

potencial de conhecimento, tendo como conseqüência novas aplicações

e acumulação de informações e conhecimentos na sociedade. Os

processos de aprendizagens são fundamentais para que a comunicação

se concretize e a informação continue a possibilitar a criação de novos

conhecimentos.

A nova natureza do trabalho, cada vez mais ligado ao conhecimento.

Nos países capitalistas centrais, crescem os segmentos do PIB ligadas à

produção do conhecimento e às atividades de informação3. No Brasil,

ainda não chegamos a esse estágio, por causa de diversas barreiras

políticas, econômicas e sociais, no entanto se pode reconhecer que

estamos caminhando nessa direção, inclusive o governo apresenta

políticas nesse sentido.

A capacidade do ciberespaço4 lidar com as tecnologias intelectuais5

que “amplificam, exteriorizam e modificam funções cognitivas                                                                                                                      3 Segundo Rifkin (2001), “as novas indústrias baseadas na informação о" hkpcpças, entretenimento, comunicação, serviços e educação о"lá formam mais de 25% da economia norte-americana. Grande parte de seu valor está empatado em ativos intangíveis e, portanto, não é apresentado com exatidão em sua contabilidade”. 4 Segundo Levy (1999), “o ciberespaço (que também chamarei de rede) é o novo meio de comunicação que surge da interconexão mundial dos computadores. O termo especifica não apenas a infra-estrutura material da comunicação digital, mas também o universo oceânico de informações que ela abriga, assim como os seres humanos que navegam e alimentam esse universo”. (LEVY, 1999. Sublinhado, no original) 5 Seguindo o modelo de Levy (1993), consideramos “tecnologias intelectuais tanto as formas de expressão simbólica (que, p.ex., evoluíram das narrativas míticas às equações quânticas)

Page 179: Etica de la Información

humanas” (LEVY, 1993). Isso se concretiza através da possibilidade

de agregar novas informações através de links que permitem

comentários, da participação em chats e listas de discussão, do

trabalho cooperativo à distância, da transferência de dados, texto e

imagens.

A emergência histórica e cultural do ciberespaço possibilita o

surgimento de dois dispositivos informacionais originais: o mundo

virtual6, que dispõe a informação em um espaço-tempo contínuo, e a

informação em fluxo7, dados em estado contínuo de modificação.

Esse contexto nos leva à idéia de infinito, espaço que nunca será

completamente preenchido e que se encontra em um estado

permanente de mudança e, à idéia de rede.

A informação é um fenômeno que ocorre no campo social e pressupõe,

para a sua existência, algumas condições básicas, tais como:

                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                         

quanto as tecnologias de informação em si mesmas (p.ex., a escrita em tabuinhas de barro, as iluminuras medievais, a imprensa e os computadores). Podemos chamá-las, também, de tecnologias soft em contraponto às tecnologias de produção material (que evoluíram, p.ex., desde o machado de pedra até os satélites de comunicação)”. Segundo o autor, essas tecnologias intelectuais “situam-se fora dos sujeitos cognitivos, como este computador sobre minha mesa ou este livro em suas mãos. Mas elas também estão entre os sujeitos como códigos compartilhados, textos que circulam, programas que copiamos, imagens que imprimimos e transmitimos por via hertziana. As tecnologias intelectuais estão ainda nos sujeitos, através da imaginação e da aprendizagem”. (Grifo nosso. Esta última parte é a que nos interessa, para fins deste trabalho.) 6 Segundo Levy (1999), “o mundo virtual dispõe as informações em um espaço contínuo, e não em uma rede, e o faz em função da posição do explorador ou de seu representante dentro deste mundo”. 7 “A informação em fluxo designa dados em estado contínuo de modificação, disperso entre memórias e canais interconectados que podem ser percorridos, filtrados e apresentados ao cibernauta de acordo com suas instruções, graças a programas, sistemas de cartografia dinâmica de dados ou outra ferramentas de auxílio à navegação”. (LEVY, 1993)

Page 180: Etica de la Información

Ambiente social - Contexto que possibilita a comunicação de

informação. Esse ambiente se caracteriza sempre pela existência de

uma possibilidade de comunicação. Ele decorre do impulso primeiro,

arquetípico que nos levou como espécie à necessidade de materializar

o pensamento em uma mensagem dirigida a um semelhante, um

movimento primordial de transmissão da informação;

Agentes - No processo de comunicação, os agentes são o emissor,

aquele que produz a informação, e o receptor, o que recebe a

informação. Os agentes emissores são responsáveis pela existência dos

estoques de informação, em um processo contínuo em que as funções

produção e transferência se alternam, ou seja, o receptor de hoje

poderá ser um produtor da informação amanhã;

Canais - Os canais estão relacionados aos meios por onde as

informações circulam. Os agentes produtores de informação escolhem

os canais mais adequados para circulação da sua informação, que

podem utilizar-se de meios impressos, como jornais, revistas,

periódicos científicos, livros, além de rádio, televisão, Internet,

congressos, feiras e outros tipos de eventos científicos e comerciais;

Essas são as condições que tornam possível o processo de comunicação

entre emissor e receptor da informação se estabelecer. O ambiente humano é

fundamental, sem ele não seria possível a existência e atuação dos agentes de

informação e no qual princípios éticos estão presentes. Em nossa pesquisa o

ambiente são os PPGCIS da UFPB e da UNESP/Marília, e as relações sociais e

institucionais que envolvem os dois programas – relações essas que serão

mediadas pelo ciberespaço. Os agentes são os professores dos dois Programas,

assim como os alunos. Os canais envolvem os espaços de comunicação por onde

Page 181: Etica de la Información

circulam a produção docente e discente, quais sejam, a participação em

congressos, os trabalhos publicados em anais desses congressos, artigos em

periódicos, livros e capítulos de livros...

Assim, a construção da RECAP deve levar em consideração a informação

contida em repositórios estáticos (artigos, livros...), recuperáveis através de

tecnologias intelectuais e digitais; e o conhecimento que ainda não foi

transformado em informação, recuperável apenas através de contato pessoal

direto, ou presencial, e indireto. Neste último, se faz necessário a criação de

elementos interativos que possibilite a comunicação entre os participantes da

RECAP, como, por exemplo, lista de discussão.

Nesse âmbito, torna-se fundamental pensar em redes digitais de

comunicação como redes de cooperação e aprendizagem de informações para o

processo de construção de uma inteligência coletiva no contexto dos Programas

de Pós-Graduação em Ciência da Informação participantes da rede de

cooperação e aprendizagem. E é desse modo, a ética deve tornar-se uma prática

que permeie as relações e trocas entre os indivíduos participantes da rede e

possa estabelecer as bases para o desenvolvimento de atitudes em prol de um

conhecimento compartilhado.

REFERÊNCIAS

ALBAGLI, S. Globalização e espacialidade. O novo do local. In: Globalização & Inovação

localizada: experiências de sistemas locais no Mercosul. Brasília: IBICT/MCT, 1999.

ARAUJO, V.M.R.H. Sistemas de recuperação da informação: nova abordagem teórico

conceitual. Tese. (Dout. Com. Cult.). Rio de Janeiro: UFRJ/ECO, 1994.

Page 182: Etica de la Información

BARRETO, A. A. A Oferta e a demanda de informação: condições técnicas, ecônomicas e

políticas. Ciência da Informação, Braília, v. 28, n. 2, p. 167-177, 1999.

BRANCO, M.A.F. Política Nacional de Informação em Saúde no Brasil: um olhar

alternativo. Tese (Dout. Méd. Social). Rio de Janeiro: Instituto de Medicina

Social/Universidade do Estado do Rio de Janeiro, 2001.

DEMO, P. Elementos metodológicos de pesquisa participante. In: BRANDÃO C.R., (org.)

Pesquisa participante. 6.ed. São Paulo: Brasiliense, 1986.

DESROCHE, H. Entreprendre d’apprendre: d’une autobiographie raisonnée aux projets

d’une recherché-action. Paris: Ed. Ouvrières, 1990.

DUBOST, J. L’intervention psycho-sociologique. Paris: PUF, 1987.

ESPÍRITO SANTO, C. do. “Quissamã somos nós”: pesquisa participante para construção de

hipertexto sobre identidade cultural. 2003. Dissertação (Mestr. Ci. Inf.). Rio de Janeiro:

IBICT – UFRJ, 2003.

FREIRE, G.H. de. Construção participativa de instrumento de política pública para gestão e

acesso à informação. Perspectivas em Ciência da Informação, v.13, n.3, 2008.

FREIRE, G.H. de. A construção de instrumento para comunicação de informação sobre

saúde. Dissert. (Mestr. Ci. Inf.). Rio de Janeiro: IBICT – UFRJ, 1998.

FREIRE, I.M. Janelas da cultura local: abrindo oportunidades para inclusão digital de

comunidades. Ciência da Informação, v.35, n.3, 2006.

FREIRE, I. M. A responsabilidade social da ciência da informação e/ou O olhar da

consciência possível sobre o campo científico. Tese (Dout. Ci. Inf.). Rio de Janeiro: IBICT

– UFRJ, 2001.

Page 183: Etica de la Información

GOLDMANN, L. Importância do conceito de consciência possível para a informação. In:

Colóquios Filosóficos de Royaumont. O conceito de informação na ciência

contemporânea. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1970.

GONZÁLEZ DE GÓMEZ, M.N. Novas fronteiras tecnológicas das ações de informação:

questões e abordagens. Ciência da Informação, v.33 n.1, 2004.

GONZÁLEZ DE GÓMEZ, M.N. Escopo e abrangência da Ciência da Informação e a Pós-

Graduação na área: anotações para uma reflexão. Transinformação, v. 15, n. 1, p. 31-43,

2003.

GONZÁLEZ DE GÓMEZ, M.N. Novos cenários políticos para a informação. Ciência da

Informação, v.31, n. 1, p. 27-40, 2002.

GONZÁLEZ DE GÓMEZ, M.N. Da Política de informação ao papel da informação na

política contemporânea. Revista Internacional de Estudos Políticos, v.1, n.1, 1999

JAPIASSU, H.; MARCONDES, D. Dicionário básico de filosofia. Rio de Janeiro: Zahar

1996.

SILVA, Terezinha Elizabeth da. Política de informação na pós-modernidade: reflexões sobre

o caso do Brasil. Informação & Sociedade: Estudos, João Pessoa, v. 1, n. 1, 1991.

THIOLLENT, M. Pesquisa-Ação nas organizações. São Paulo: Atlas, 1997.

WERSIG, G. Information science: the study of postmodern knowledge usage. Information

Processing & Management, v.29, n.2, 1993.

Page 184: Etica de la Información

CATALOGAÇÃO E ÉTICA NO AMBIENTE

COLABORATIVO E DE EMPODERAMENTO DAS

REDES INFORMACIONAIS

Plácida L. V. Amorim da Costa Santos*

1 INTRODUÇÃO

Nos processos de transformação da informação em um mundo regido

pelas Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC) ocorrem rearticulações

das relações sociais e de produção em torno destas que têm papel significativo

nas transformações econômicas e sociais da segunda metade do século XX e dos

primeiros anos do século XXI, anos de globalização.

Nesse contexto, a sociedade contemporânea tem que buscar soluções para

a real consolidação da propagada sociedade da informação, considerando

principalmente políticas públicas de educação a serem desenvolvidas em seu

interior para o reconhecimento e a apropriação dessa nova situação. O

investimento em modelos de transferência de informação baseados nas novas

tecnologias só se justifica pela idéia de que a apropriação de novos

conhecimentos e de ferramentas possa desenvolver consciência histórica,

política e ética, associada a ações cidadãs para transformação social.

A configuração rizomática da Internet tem potencial como lócus e veículo

de expressão da diversidade cultural e de desenvolvimento de práticas

Page 185: Etica de la Información

capacitadoras inclusivas que utilizem recursos da Web 2.0 e se projetem na

arquitetura do ciberespaço como um imenso tecido heterogêneo de redes.

O acesso e o uso da informação geram o poder de organização e

impulsionam o desenvolvimento e ações criadoras, promovendo o

empoderamento individual e coletivo das pessoas envolvidas na vida

comunitária, a partir de premissa de que o desenvolvimento deve relacionar-se

com o crescimento da qualidade de vida das pessoas e não com objetos, pois as

necessidades básicas do homem não mudam; o que muda são as coisas que as

sociedades geram para satisfazer tais necessidades ou para incrementar a

sensação de novas necessidades.

Novas formas sociais determinam estruturas mentais distintas com

matrizes de inteligência e comportamento, que tornam importante a investigação

sobre as estratégias do empoderamento como ação coletiva desenvolvida pelos

indivíduos quando participam de espaços privilegiados de decisões e de

consciência dos direitos sociais.

Fundamental é a articulação entre a ideia de rede e os processos de

produção, de tratamento, de difusão, de recuperação e de (re)uso da informação

para o empoderamento, o que torna imprescindível a percepção de redes

informacionais estruturadas como modelos de ambientes colaborativos de

inteligência coletiva como favorecedoras do fortalecimento das competências,

da confiança e da capacidade humana.

A possibilidade de construção de um saber colaborativo é caracterizada

pela potencialização de uma inteligência e de uma consciência coletivas em

ações sociais de transferência de informação, com as redes sociais como

ambiente antropológico de possibilidades. A transferência de informação

Page 186: Etica de la Información

presume a existência de um valor da informação partilhado pelos participantes, e

requisita a utilização de procedimentos técnicos, expressivos ou normativos de

dimensões cognitivas e comunicacionais no contexto de formação e preservação

de memórias e na socialização do conhecimento.

A tríplice convergência entre as tecnologias do pequeno (ou

nanotecnologia), do vivo (ou biotecnologia), e do conhecimento (ou

neurociências, ciências da cognição e ciência da informação) é impulsionada por

novas visões do próprio conceito de tecnologia que irá regular progressivamente

a informação entre os variados setores.

A difusão das idéias, a existência das coisas, a criação de opiniões, o

sentido que o homem dá a sua existência são os construtores da realidade social.

As relações que se estabelecem na sociedade são as relações de poder exercido

em diversas esferas por meio da capacidade de agir e de interagir para alcançar

objetivos e interesses que dão sentido à existência humana. Nessa perspectiva, o

poder se caracteriza como um fenômeno social estabelecido tanto por

instituições quanto pelas relações entre indivíduos em seu cotidiano.

Nesse cenário, e considerando que a Ciência da Informação (CI) se

consolida e se legitima no contexto da sociedade contemporânea, que se

encontra em processo acelerado de transformações e rupturas, sob o signo do

acesso à informação e da detenção da mesma, as transformações exigem

definições e redefinições dos métodos que valorizem e destaquem os aspectos

importantes da relação de disseminação, recuperação e compartilhamento de

conhecimentos e informações.

O conhecimento do fluxo da informação, a percepção do ambiente

informacional, a destreza no manuseio e no uso de recursos tecnológicos que

Page 187: Etica de la Información

favoreçam o acesso, o tratamento, a recuperação, o uso, o reuso e a preservação

de informações facilita a geração de novos conhecimentos.

Assim, cabe destacar que as redes, como sistemas organizacionais, são

capazes de reunir indivíduos e instituições, de forma democrática e participativa,

em torno de objetivos comuns, por meio de estruturas flexíveis e cadenciadas.

Elas se estabelecem por relações horizontais, interconexas e em dinâmicas que

supõem o trabalho colaborativo e participativo e constituem um local em que,

das relações, emergem questões de responsabilidade, de direitos e deveres, nas

quais deve prevalecer à ética1.

Na prática, redes são comunidades virtual ou presencialmente constituídas

a partir de uma estrutura social estabelecida de forma orgânica, na qual a

convivência entre os integrantes e o estabelecimento de laços de afinidade serão

definidos a partir de pactos sociais ou padrões de relacionamento. Cada nó da

rede representa uma unidade, e cada fio um canal por onde essas unidades se

articulam por meio de diversos fluxos.

Um princípio básico dessa noção de rede é a possibilidade de

funcionamento com um sistema aberto que se multiplica como reação de ações

externas, que realiza suas próprias necessidades na mesma medida em que gera

um novo ciclo de demandas. Podemos recorrer ao exemplo das citações em um

documento, que geram uma demanda e nos levam a outros documentos, aos

                                                                                                                     1 O termo ética deriva do grego ethos (caráter, modo de ser de uma pessoa). Ética é um conjunto de valores morais e princípios que norteiam a conduta humana na sociedade e permite um equilíbrio e bom funcionamento social, possibilitando que ninguém saia prejudicado. Neste sentido, a ética, embora não possa ser confundida com as leis, está relacionada com o sentimento de justiça social. A ética é construída por uma sociedade com base nos valores históricos e culturais. Do ponto de vista da Filosofia, a Ética é uma ciência que estuda os valores e princípios morais de uma sociedade e seus grupos. Cada sociedade e cada grupo possuem seus próprios códigos de ética.

Page 188: Etica de la Información

catálogos coletivos e à catalogação cooperativa como produto e processo

resultantes de ações cooperativas e de compartilhamento.

O desenvolvimento da cooperação na coletividade necessita de ambientes

de compartilhamento que permitam a colaboração entre múltiplos sujeitos

dispersos geograficamente, e que por meio de suas ações interagem no

ambiente, o que requer uma nova dimensão do sentido ético devido às novas

concepções e implicações.

Uma estrutura em rede tem seus integrantes ligados horizontalmente a

todos os demais, diretamente ou por meio dos que os cercam, resultando em

uma malha de múltiplos fios, que pode se espalhar indefinidamente para todos

os lados, sem que nenhum dos nós seja considerado principal ou central, nem

representante dos demais. Nessa estrutura há uma vontade coletiva de realizar

determinado objetivo (WITHAKER, 1998), o que resulta em uma inteligência

coletiva decorrente da sinergia existente entre competências, os recursos e

projetos, a constituição e manutenção de dinâmicas de memórias em comum, e a

ativação de modos de cooperação flexíveis e transversais, pautados na

assimilação ética dos integrantes de uma rede, como enfatiza Pierre Lévy

(2000), pois a aprendizagem e o serviço colaborativo e cooperativo pressupõem

o envolvimento e o comprometimento com responsabilidade do fortalecimento

de uma inteligência coletiva.

O fortalecimento das redes colaborativas e cooperativas de informação,

marcado pelo uso intensivo de recursos tecnológicos, entretanto, consolida o

movimento de multiplicação sob os princípios da intensividade, extensividade,

diversidade, integralidade e agregação, pois terão poder suficiente para

promover uma revolução sociocultural a partir: da socialização e produção de

conhecimento científico e tecnológico; da difusão de políticas de

Page 189: Etica de la Información

disponibilização e acesso à informação; da difusão do conhecimento pelas mais

diversas linguagens promovendo a livre expressão, e da utilização dos mais

variados mecanismos de comunicação, possibilitando a cada pessoa exercer um

papel ativo no processo de geração, emissão, recepção e uso de informações.

As unidades de informação, como espaços documentais e informacionais

e agentes catalisadores da cultura das comunidades nas quais estão inseridas,

precisam ser efetivamente reconhecidas e utilizadas como instrumentos para a

construção coletiva e para o empoderamento, atuando constritamente como um

nó em uma rede que possibilita a formação, a interação e a integração social,

cultural, política, tecnológica e mesmo individual, contribuindo assim para o

desenvolvimento de um amplo plano social.

Em redes, cada integrante é um nó de interação, e a diversidade existente,

quando manifesta, leva à criatividade para soluções por vezes simples, outras

mais elaboradas, e os integrantes alocados em distintas regiões podem de forma

síncrona ou assíncrona, trocar informações e conhecimentos, ato que faz surgir

naturalmente a inovação do conhecimento.

No ambiente multidisciplinar em que hoje se desenvolvem as tarefas de

informação, o catalogador tem a vantagem intelectual de ser o conhecedor da

essência dos processos de análise e tratamento do conhecimento registrado. Mas

tem, entretanto, de estar apto para apropriar-se das ferramentas tecnológicas

disponíveis para aperfeiçoamento e agilização de processos decisivos para o

estabelecimento da organização e do tratamento da informação.

Como já indicavam, no final do século XX, Mercier, Plassard e Scardigli

(1985, p.20),

Page 190: Etica de la Información

Os chips eletrônicos estão invadindo nossa vida cotidiana, e sua

fecundidade se anuncia fulminante. Nestes momentos só nos

surpreendem ou irritam. Porque estão vazios, porque carecem de

sentido. O único problema consiste em saber que...<alma> lhes

estamos dando. (tradução livre)

O que os autores denominam de “alma” pode ser aqui considerado

“projeto ético-político-pedagógico”. De qualquer forma, trata-se de uma

realidade exterior aos princípios do mero aplicativo da técnica, o que exige uma

discussão da própria tecnologia a partir dos aspectos a priori político e ético,

uma constante em toda relação humana, seja ela com outros homens, seja com

algum equipamento.

As redes de informação formais ou informais digitais são potencialmente

um bom recurso a ser utilizado pela comunidade no seu caminho de

empoderamento social.

Neste momento histórico, temos como características o desenvolvimento

de novas formas de tecnologia e informação, a ampliação da difusão da

informação e uma mudança nos paradigmas da produção do conhecimento. As

transformações com as quais estamos convivendo na realidade contemporânea

são evidentes. As atividades e serviços oferecidos mediante o mercado de

informações são como alavancas propulsoras da competência e do incentivo

para a ampliação do acesso à informação, nos mais diversos formatos de

apresentação, como sons, imagens, textos e metodologias multimídia, o que

facilita a construção e a aplicação do conhecimento nos mais diversos setores

sociais e culturais.

Page 191: Etica de la Información

Nesse ambiente se inserem as tecnologias que podem ser usadas para

instigar as habilidades cognitivas dos sujeitos, auxiliando-os a desenvolver seu

conhecimento e a transferi-los para a resolução de novos problemas.

As Tecnologias de Informação e Comunicação oferecem diversas

possibilidades para o desenvolvimento de estratégias de ações de trabalho e de

disseminação da informação. As informações podem ser examinadas de modo

não linear e a utilização de uma variedade de recursos informacionais envolve

signos de diferentes categorias, que exercem efeitos distintos sobre o receptor de

uma mensagem, possibilitando explorar não só os aspectos intelectivos e

racionais da aprendizagem como também os aspectos afetivos e motivacionais, e

tal diversidade possibilita também compreender os recursos tecnológicos como

uma interface que favorece a exploração ativa dos múltiplos aspectos a partir da

intersemiose.

Nesse aspecto, retomam-se as questões sobre ética e empoderamento a

partir das redes de informação, pois estas favorecem a inclusão dos sujeitos em

comunidades por pressuporem a participação e o envolvimento significativo,

crítico e ativo nas decisões abrangendo tanto componentes individuais quanto

coletivos em um processo que contempla quatro níveis: cognitivo, psicológico,

econômico e político, para o desenvolvimento de habilidades necessárias para

que se participe e se obtenham reais transformações sociais.

Do ponto de vista social, o empoderamento se refere ao acesso dos mais

desamparados aos meios de produção, à sua participação efetiva nas mais

variadas instâncias políticas e ao incremento de suas capacidades individuais.

Page 192: Etica de la Información

Do ponto de vista empresarial, o empoderamento é a ação que possibilita

a potencialização da capacidade individual para maior autonomia e

autossuficiência nas tomadas de decisão e participação.

Tais situações nos levam a postular que o acesso e o uso de recursos

informacionais, como unidades básicas na formação e no desenvolvimento de

bases de conhecimento, são fundamentais para o crescimento individual na

participação coletiva em ambientes em que se destacam a colaboração e

cooperação.

No ambiente cooperativo, o que se espera é aumentar o potencial do

grupo, fazendo com que o resultado seja maior que a soma das contribuições

individuais de cada membro do grupo. Todavia, chegar a este estado sinérgico

no grupo não consiste em uma tarefa fácil. A cooperação surge quando todos se

comprometem com um objetivo concreto comum, e nessa proposta um trabalho

envolvendo várias pessoas não se caracteriza necessariamente como um trabalho

cooperativo. O que se espera é a interação harmônica e realmente cooperativa

entre os membros, fazendo com que cada serviço e/ou produto revele as idéias

do grupo como um todo.

O entendimento entre os participantes necessita de quatro elementos

determinantes: a comunicação entre os envolvidos - reside na existência de

ligações entre eles, realizada por meio de canais de comunicação direta, como

troca de mensagens e reuniões, e por canal indireto, por meio da memória de

grupo, quando a construção e o compartilhamento do conhecimento comum

podem ser considerados interfaces de comunicação; a coordenação das

atividades - refere-se ao gerenciamento e ao acompanhamento das atividades

realizadas pelo grupo e individualmente por cada participante; a memória do

grupo - registra todo o processo de interação do grupo, como a própria

Page 193: Etica de la Información

comunicação realizada e os passos desencadeados, bem como todos os produtos

gerados por esta cooperação, que é a documentação da história, das orientações

e das decisões do grupo; e a percepção do grupo no que diz respeito ao contexto

do trabalho – atividades individuais contextualizadas pela compreensão das

atividades realizadas pelos demais. (DIETRICH, 1996; HOLLINSWORTH ;

WHARTON, 1994)

A colaboração e a cooperação efetivas exigem que as pessoas

compartilhem informações, e envolvem ações éticas nos processos de

negociação, de correalização e de compartilhamento.

Nesse contexto, apresentam-se as redes bibliográficas estruturadas no

trabalho de construção de metadados para implementação e alimentação de

bancos de dados bibliográficos desenvolvidos e aplicados aos ambientes

informacionais digitais em formato de catálogos públicos on-line como

ferramentas indispensáveis nos processos de localização, acesso, uso e reuso dos

recursos informacionais, unidades primárias no processo de empoderamento.

2 CATALOGAÇÃO E ÉTICA

A Catalogação, nesse momento histórico, passa por um período

importante de reflexão, de (re)dimensionamento de sua identidade, e conta com

a colaboração de profissionais de áreas afins, num processo de discussão inter e

transdisciplinar.

Como disciplina e prática profissional, ela tem como missão construir

formas de representação para alimentação de catálogos a partir da descrição

padronizada de recursos informacionais, contemplando sua forma, seu conteúdo

Page 194: Etica de la Información

e o seu arranjo em acervos, de modo a tornar a unidade informacional única e

multiplicar os pontos de acesso para a sua identificação, localização e

recuperação; faz uso das tecnologias disponíveis nos mais diversos momentos

históricos, na tentativa de descobrir caminhos para o aperfeiçoamento e

otimização do trabalho cooperante e colaborativo.

A catalogação cooperativa suportada por computador pode ser descrita

como um processo multidisciplinar que envolve várias tecnologias e conceitos

que contribuem para satisfazer os seus objetivos, como interação homem-

computador, hipertexto, inteligência artificial, sistemas distribuídos e redes de

computadores. Ela serve como mecanismo de comunicação e produtividade

usando computadores voltados à construção e à alimentação de bases de dados

bibliográficos.

Analisando a função do catalogador como facilitador da aprendizagem e

da troca de dados e informações interagindo com os indivíduos em diversos

ambientes, visualizamos a sua ação propulsora para a adequação e a estimulação

no processo de recuperação de informações, que permite uma interação efetiva

do usuário com o ambiente, do usuário com o usuário e grupos de usuários com

outros grupos e com o ambiente.

O catalogador é um dos responsáveis, mesmo que não visível, por unir as

pessoas e colocar à disposição delas recursos de comunicação, de informação e

de produção de conhecimento, por meio do processo de construção das

representações das informações esquematizadas e estruturadas em formatos

legíveis por máquinas que permitem a identificação, a localização e a

recuperação automática das informações e propiciam, por meio dos padrões, a

interoperabilidade entre sistemas de informação.

Page 195: Etica de la Información

Entretanto, o processo, os esquemas, as estruturas e os modelos de

tratamento descritivo da informação (TDI) não são neutros, uma vez que trazem

no seu interior a visão de seus idealizadores e refletem posições ideológicas e

políticas; além de, no processo de construção de formas de representação de

informações, os recortes e as segmentações serem uma constante e uma

característica na representação.

São as representações que garantem a visibilidade do recurso

informacional no momento da busca e da recuperação, acarretando mediação

entre a informação registrada (documento ou recursos informacionais) e o

usuário. Quanto mais específicas, completas e detalhadas forem essas

representações, mais pontos de acesso ao recurso elas fornecerão, e melhor será

a sua recuperação. Uma representação mais detalhada do recurso proporcionará

sua maior identificação, individualizando-o, tornando-o único entre muitos,

multiplicando as formas de acesso a ele e possibilitando, assim, uma

recuperação mais precisa.

Cada comunidade determinará o tipo de padrão de metadado a ser

utilizado; entretanto, não basta garantir somente a representação dos recursos

informacionais, pois diante da variedade de padrões de metadados que está

sendo utilizada por comunidades distintas, é preciso garantir também a

interoperabilidade dos dados para a troca de informações.

A interoperabilidade se constitui como um fator de ordem a ser tratado em

ambientes informacionais digitais e pode ser definida como a capacidade de

interação, de operação em conjunto, de compartilhamento de informações entre

softwares, independente da estrutura de armazenamento dos dados usada em seu

banco de dados.

Page 196: Etica de la Información

O compartilhamento de informações é uma necessidade que tem

desafiado profissionais de várias áreas, principalmente em ambientes altamente

distribuídos e heterogêneos como a Web, onde estão ambientadas as redes

bibliográficas e informacionais digitais. A promoção da interoperabilidade

esbarra em questões de integração de recursos, no uso de ferramentas que

auxiliem a troca de informações, tais como o uso de padrões de metadados,

linguagens de marcação mais adequadas e principalmente as arquiteturas de

metadados.

O papel desempenhado pela Catalogação, nesses ambientes, é estratégico,

considerando-se o desenvolvimento do conhecimento coletivo, e do aprendizado

contínuo, tornando mais fácil o compartilhamento de problemas, perspectivas,

idéias e soluções. Entretanto, para atingir esse objetivo, dois aspectos essenciais

necessitam de destaque:

As estratégias para desenvolvimento do conhecimento devem ser focadas

na criação de mecanismos que permitam a interação e a manutenção de

contatos, a facilitação de troca de experiências, de trabalho em conjunto, e

de mapeamento e acompanhamento da participação de cada um, e não

apenas a captura e a disseminação centralizada de informação;

As ferramentas tecnológicas de suporte ao conhecimento devem ser

flexíveis e fáceis de usar, dando a maior autonomia possível aos membros

das comunidades de trabalho, com um mínimo de interferência, pois as

tecnologias úteis para a gestão do conhecimento são aquelas que

propiciam a integração das pessoas, que facilitam a superação das

fronteiras, que ajudam a prevenir a fragmentação das informações e

permitem criar redes globais para o compartilhamento do conhecimento.

Page 197: Etica de la Información

Isso é fundamental para a criação de bases de dados e para o

entendimento do comportamento do usuário.

Em suma, as Tecnologias da Informação e Comunicação devem ser

utilizadas para facilitar as atividades essenciais do trabalho de gestão do

profissional da informação e para a evolução da unidade de informação, tais

como a solução de problemas e a inovação, com o uso de ferramentas e métodos

flexíveis e de fácil entendimento.

Nesse sentido, é interessante retomar os apontamentos do escritor ítalo-

cubano Ítalo Calvino, “Seis propostas para o próximo milênio” (1990), que

elegeu alguns valores literários a serem preservados neste século.

As propostas de Calvino transcendem as questões da literatura e oferecem

apontamentos instigantes sobre o desenvolvimento e a cultura mundiais. As

qualidades apresentadas por ele permeiam a forma como devemos lidar com a

informação no seu tratamento, organização, armazenamento, disponibilização e

acesso, como criamos métodos e como nos propomos transformar a informação

em conhecimento.

É nessa concepção que as considerações de Calvino sobre Leveza se

encaixam com perfeição na Ciência da Informação, e especificamente no

processo de Catalogação, pois no cenário estratégico de um mundo competitivo

onde a informação é vital, o jogo pela sobrevivência nunca foi tão pesado. O

peso também é uma característica de muitas das soluções da organização da

informação às quais as unidades de informação recorrem; o peso da

complexidade está presente na formação e na estrutura dos acervos e estoques

informacionais, nas estruturas de hardware e software e nas redes de informação

e comunicação.

Page 198: Etica de la Información

Os processos de representação da informação e os sistemas de

alimentação de catálogos e bases de dados não são soluções leves, envolvem

técnicos, especialistas, investimentos, treinamentos, implantações, adaptações e

replanejamentos. O problema da importação de dados bibliográficos e

catalográficos em ambientes cooperativos e colaborativos, que sugeria um

ambiente de processos mais leves, para muitas unidades de informação,

transformou-se em um grande peso, resultando em projetos de prazos e custos

indefinidos.

O desafio da leveza está na sensibilização das pessoas, em tirar o peso dos

ombros dos que se consideram ou estão desatualizados, no envolvimento e na

participação dos que conhecem o funcionamento do sistema.

A Rapidez, o segundo valor apontado pelo autor, é muitas vezes

deturpada no atendimento das necessidades informacionais, porque a rapidez e a

velocidade dos fatos precisam ser vivenciadas à luz de tempos diferentes; não

deve existir a velocidade pela velocidade. Faz-se necessária uma priorização e

definição de estratégias de curto, médio e longo prazos, faz-se necessário

conhecer a riqueza de recursos existentes, e de modo adequado tratar absurdos

como prazos impossíveis de serem cumpridos, pois o tempo é o tipo de recurso

que não se pode comprar, talvez o único recurso verdadeiramente não renovável.

Na maioria das áreas, e a CI não fica fora, vive-se o presente; o futuro está

pautado nas metas de curto prazo e o passado é, muitas vezes, esquecido. Nesse

círculo, ficamos condenados a repetir erros, pois abandona-se a memória, a

história das iniciativas anteriores é esquecida, e a queima de etapas e a

simplificação do caminho acabam inexistindo, pela ausência de uma memória

ativa, estruturada e acessível a partir da qual seria possível uma velocidade de

Page 199: Etica de la Información

maior ação futura, com menos tempo de planejamento.

É na CI que encontramos respaldo metodológico para transformar dados

em informações, de modo a permitir e facilitar a construção do conhecimento,

por meio do desenvolvimento de ferramentas e estruturas metodológicas que

vasculhem, organizem, representem e disponibilizem informações, a partir do

agrupamento, da identificação de padrões, da utilização e desenvolvimento de

formas de representação e de cálculos para trabalhar com a informação, de modo

a atender qualitativamente às necessidades informacionais. Entretanto, é

necessário considerar que, para transformar informação em conhecimento,

precisamos de tempo, pois a reflexão, que leva à compreensão, exige tempo de

maturação.

Hoje, as TICs expõem as pessoas, por diversas mídias, a uma avalanche

de dados e informações. Somos inundados por fatos novos todos os dias, e

poucos conseguem articular relações inteligentes de causa-efeito durante o curto

espaço de tempo entre uma informação e outra.

Ao falar da Exatidão, Calvino (1990) apresenta como objeto de discussão

a busca da expressão adequada dos fatos. O autor (p.88) diz:

[...] busca da exatidão se bifurcava em duas direções. De um lado, a

redução dos acontecimentos contingentes a esquemas abstratos que

permitissem o cálculo e a demonstração de teoremas; de outro, o

esforço das palavras para dar conta, com maior precisão possível, do

aspecto sensível das coisas. (...) São duas pulsões distintas no sentido

da exatidão que jamais alcançam a satisfação absoluta: em primeiro

lugar porque as línguas naturais dizem sempre algo mais em relação

às linguagens formalizadas, comportam sempre uma quantidade de

rumor que perturba a essencialidade da informação; em segundo,

Page 200: Etica de la Información

porque ao se dar conta da densidade e da continuidade do mundo que

nos rodeia, a linguagem se revela lacunosa, fragmentária, diz sempre

algo menos com respeito à totalidade do experimentável.

A busca do profissional da informação também se dá em dois sentidos, o

de revelar os problemas de informação relacionados aos interesses do usuário e

o de traduzir essas demandas em estruturas e informações que sejam passíveis

de tratamento e formas de representações documentárias, tanto no sentido

descritivo como temático, o que significa estar constantemente trabalhando com

a linguagem natural e com a linguagem formalizada representativa da área, em

uma atuação constante no sentido de manter um relacionamento entre pessoas e

sistemas. Trata-se de um ambiente de constantes agitações e iniciativas

imprevisíveis, em contraponto com as estruturas dos estoques informacionais,

um mundo em que tudo se baseia em ordem, padrões, estruturas e relações

definidas por códigos, tabelas e formatos, e que ao ser apresentado às pessoas,

torna necessárias considerações como estas:

[...] as margens de um livro jamais são nítidas nem rigorosamente

cortadas: além do título, das primeiras linhas e do ponto final, além de

sua configuração interna e da forma que lhe dá autonomia, ele está

preso em um sistema de remissões a outros livros, outros textos,

outras frases: um nó em uma rede. (FOUCAULT, 1995, p.26)

O valor de Visibilidade apontado por Calvino remete à questão de como

pode o profissional da informação construir formas de representação para os

estoques documentais de modo que as informações e os documentos disponíveis

sejam acessíveis, dando ao usuário a possibilidade de confrontar seus

marcadores de memória com os atributos definidos para representar um recurso

informacional. Essa é uma atividade cotidiana nas unidades de informação, no

processo de tratamento das informações e que acaba, muitas vezes,

Page 201: Etica de la Información

comprometendo a interação entre os profissionais, as informações disponíveis e

os usuários.

O ponto fundamental da visibilidade está na capacidade de tornar visível

aquilo que parece impossível, inviável, inalcançável. Pensar por imagens e

comunicar-se por meio delas, em um mundo dominado por elas, tem se tornado

uma competência fundamental. A capacidade de construir imagens com

significado, nítidas e mobilizadoras, permitirá novas combinações, conexões não

tradicionais que levarão à ruptura de fronteiras e ao deslocamento de sentidos.

Assim, um desafio importante para a Ciência da Informação é dar

visibilidade ao conhecimento e favorecer a transformação do conhecimento

tácito em conhecimento explícito. (NONAKA; TAKEUCHI, 1997)

Os documentos e as informações descritos por meio das formas de

representação desenvolvidas e adotadas pela CI se constituem em imagens para

a disseminação, a recuperação e o uso de informações, proporcionando a

geração de novos conhecimentos. Os caracteres alfanuméricos, pontos, vírgulas,

traços, parênteses, sinais de alinhamento e separação, descrevendo e

representando a multiplicidade discursiva dos estoques documentais, estarão em

uma estrutura sempre igual e ao mesmo tempo sempre diversa, como um nó em

uma rede que remete para outro nó, que ao mesmo tempo individualiza um

documento e multidimensiona as possibilidades de acesso a ele, permitindo sua

relação com outros textos.

Isso nos conduz ao valor da Multiplicidade apontado por Ítalo Calvino,

pois as configurações sociais e organizacionais hoje são marcadas por uma

variedade imensa de vínculos, conexões, saberes e perspectivas. É em meio a

Page 202: Etica de la Información

essas conexões que se realizam as trajetórias profissionais, em especial, no que

diz respeito ao acesso e ao uso de informações.

O valor da multiplicidade exige uma consideração efetiva da necessidade

de multiplicar as formas de acesso às informações disponíveis e a

disponibilização de diversas formas de representação, com o objetivo de

considerar pontos de vista diferentes e, principalmente, o trabalho em equipe, a

cooperação e o compartilhamento de recursos materiais e humanos, implicando

a tolerância com as diversas visões do mundo.

A Consistência como valor que Calvino pretendia apresentar é facilmente

transposta para o processo de Catalogação, pois em qualquer tomada de decisão

sabe-se o preço da inconsistência das informações. A consistência nos remete à

integridade, ao aperfeiçoamento e à completude das informações. Nas unidades

de informação, esses são valores essenciais.

Nesse sentido, a capacidade organizacional e pessoal é ampliada com a

utilização das tecnologias para o gerenciamento das informações em três pontos:

na comunicação entre os sujeitos institucionais e usuários na troca fácil e rápida

de mensagens; na economia, com a possibilidade de partilhar recursos e de

expansão econômica do sistema informático da organização, com a compra e a

ligação em rede de computadores econômicos; e na organização, pois as

tecnologias de informação contribuem para a criação de grupos de trabalho,

rompendo as barreiras de tempo e espaço, e facilitam a gestão de recursos da

organização, tanto humanos como materiais, com consistência, exatidão,

visibilidade e rapidez, favorecendo a multiplicidade e a leveza no processo de

geração e uso de informações.

Page 203: Etica de la Información

Pode-se concluir que o desafio maior está em perceber, conforme aponta

Moran (2001, p. 18), que  

O conhecimento não é fragmentado mas interdependente, interligado,

intersensorial. Conhecer significa compreender todas as dimensões da

realidade, captar e expressar essa totalidade de forma cada vez mais

ampla e integral. Conhecemos mais e melhor conectando, juntando,

relacionando, acessando o nosso objeto de todos os pontos de vista,

por todos os caminhos, integrando-os da forma mais rica possível.

Essa percepção se faz necessária na tentativa de aumentar a capacidade

operacional da Ciência da Informação de “saber tecer em conjunto os diversos

saberes e os diversos códigos em uma visão pluralística e multifacetada do

mundo” (CALVINO, p.127), considerando as atribuições e as responsabilidades

relacionadas com os dados, as informações e o conhecimento em um cenário de

incerteza tecnológica, ritmo acelerado de mudanças, gap de desenvolvimento da

infraestrutura, preços desfavoráveis de equipamentos e software, integrações

complexas e mudanças na força de trabalho, gerando uma atuação profissional

que privilegie a consonância discursiva dos profissionais e dos usuários,

demonstrando uma harmonia visível e consistente entre a prática discursiva e a

prática não discursiva de todo o processo de gestão da informação, conforme

procura demonstrar o diagrama a seguir.

Page 204: Etica de la Información

Discurso das Prática Discurso do

Instituições não discursiva Usuário

RECURSOS SUJEITOS INSTITUCIONAIS

INFORMACIONAIS (gestor da informação) TECNOLOGIAS da

INFORMAÇÃO e

COMUNICAÇÃO

Multidiversidade discursiva elaboração de pontes “findability” –

metafóricas entre o acervo e acesso aos registros

sujeitos psicossociais do conhecimento

humano

Figura 1: Práticas discursivas institucionais

Completando essa reflexão, observa-se que o perfil necessário para o

profissional da CI é variado. O conhecimento específico sobre metodologias e

técnicas para a gestão da informação e do conhecimento é fundamental, mas

espera-se uma capacidade de gerenciamento que combine o conhecimento

teórico com o conhecimento técnico, o conhecimento profundo na área de

atuação aliado a uma ampla visão, a competência abrangente na especialidade

em interação com uma ampla cultura geral, confiabilidade, criatividade, ética e

honestidade, como forma de garantir uma sintonia com a moderna prática

discursiva da Ciência da Informação.

A construção das redes de informação tem no processo de catalogação um

grande aliado, pois este contempla uma arquitetura bem definida no uso de

Page 205: Etica de la Información

tecnologias, linguagens de marcação e agentes de software, que potencializam a

identificação, a unicidade, o armazenamento, a busca, o acesso, a recuperação, a

preservação, o uso e o reuso de recursos informacionais.

As redes informacionais, em sua estrutura e aplicação, estão pautadas nos

conceitos fundamentais da Ciência da Informação, indo além das questões de

uso da tecnologia, principalmente na adoção de metodologias advindas da

Biblioteconomia e da Ciência da Informação, da fundamentação teórica e

técnica de tratamento, da representação e de recuperação de unidades

informacionais, da inclusão e do empoderamento social.

Nesse sentido, a Catalogação é peça importante no repasse de sua

experiência de construção de formas de representação e descrição dos recursos

informacionais, estruturados de acordo com métodos, normas e padrões

biblioteconômicos para a recuperação de informação, como um modelo

consolidado de tratamento e recuperação de informação, em uma estrutura

organizacional cooperativa e colaborativa.

O uso de formas de representação e descrição dos recursos informacionais

disponíveis nas redes informacionais garante a existência de ambientes

informacionais interoperáveis, pautados em uma filosofia de cooperação,

colaboração, compartilhamento e intercâmbio de informações, permitindo o

acesso a uma variedade de recursos informacionais e ampliando,

consequentemente, as possibilidades de compartilhamento de conhecimentos e

recursos informacionais em comunidades de interesses específicos.

A Web se constitui como ambiente adequado para a persistência de redes

informacionais, pois segundo Bernes-Lee (2007), o idealizador da Web, a

habilidade da rede em permitir que as pessoas construam links a transforma em

Page 206: Etica de la Información

um espaço abstrato de informação digital sobre todos os aspectos da vida,

continuamente recriada hipertextualmente.

Destaca, entretanto, que a Web é sustentada por protocolos tecnológicos e

convenções sociais. Os protocolos tecnológicos determinam como os

computadores interagem e as convenções sociais determinam as regras de

engajamento, e como as pessoas gostam e estão possibilitadas a interagir.

Isso nos leva a concluir que os métodos e as técnicas de Catalogação

proporcionam uma metodologia para a construção de formas de representação

com uma lógica de descrição representativa que oferece maiores possibilidades

de busca, localização, recuperação e amplitude no acesso, no uso e no reuso dos

recursos informacionais, o que favorece a interoperabilidade entre ambientes

informacionais distintos, minorando ações de retrabalho no tratamento

documentário, atuando assim nos protocolos de descrição da Web.

E, por fim, que o tratamento dos recursos informacionais que se

caracterizam como unidades básicas fundamentais na formação e ampliação de

bases de conhecimento individuais e coletivas e que representam importante

papel no processo de desenvolvimento sustentável, é imprescindível para a idéia

de empoderamento: o acesso efetivo à informação representa grande

significação na mobilização dos sujeitos em comunidades nas quais ações de

inclusão e de capacitação individual estão presentes nas agendas tanto do setor

público como do privado, e se caracterizam pela participação, respeito,

colaboração e cooperação, definidas pelas convenções sociais.

REFERÊNCIAS BERNES-LEE, Timothy. Testimony of sir Timothy Berners-Lee. In: Digital future of the United States: Part I - The future of the world wide web. Massachusetts Institute of

Page 207: Etica de la Información

Technology. Disponível em: <http://dig.csail.mit.edu/2007/03/01-ushouse-future-of-the-web> Acesso em: 10 ago. 2007. CALVINO, I. Seis propostas para o próximo milênio: lições americanas. 2.ed. São Paulo: Companhia da Letras, 1990. DIETRICH, Elton. Projeto de um sistema de suporte à autoria cooperativa de hiperdocumentos. Porto Alegre: CPGCC/UFRGS, 1996. Dissertação de mestrado. FOUCAULT, M. A arqueologia do saber. 4.ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1995. HOLLINSWORTH, David; WHARTON, Peter. An architeture for developing CSCW. In: SPURR, Kathy; LAYZELL, Paul; JENNISON, Leslie; RICHARDS, Neil. Computer support for co-operative work. Chichester, EUA: John Wiley, 1994. LÉVY, P. A inteligência coletiva: por uma antropologia do ciberespaço. 3. ed. São Paulo: Loyola, 2000. MERCIER, P. A., PLASSARD, F., SCARDIGLI, V. La sociedad digital. Barcelona: Ariel, 1985. MORAN, José Manuel. Ensino e aprendizagem inovadores com tecnologias audiovisuais e telemáticas. In: MORAN, José Manuel (org.). Novas tecnologias e mediação pedagógica. 3.ed. Campinas: Papirus, 2001. NONAKA, I.; TAKEUCHI H. Criação de conhecimento na empresa: como as empresas japonesas geram a dinâmica da inovação. 5.ed. Rio de Janeiro: Editora Campus, 1997. WITHAKER, Francisco (1998). Redes: Uma estrutura Alternativa de Organização. Disponível em: <http://www.rits.org.br/redes_teste/rd_estrutalternativa.cfm>. Acesso em: 28/07/2007.

Page 208: Etica de la Información

CIBERESPAÇO, REDES SOCIAIS, AGENTES...:

aspectos éticos para reflexão

Guilherme Ataíde Dias

Isa Maria Freire**

Tiger, Tiger, burning bright

In the forests of the night,

What immortal hand or eye

Could frame thy fearful

symmetry?

(William Blake)

1 INTRODUÇÃO

Relembrar que as Tecnologias Digitais da Comunicação e Informação

(TDICs) alteraram ou estão alterando o modo de pensar e agir de nossa

sociedade contemporânea pode parecer lugar comum. Contudo, por mais que

estejam internalizadas em nossa consciência, estas mudanças, o impacto das

mesmas resulta em mudança de paradigmas que nos obrigam a refletir de forma

contínua sobre a natureza das transformações e desafios que nos aguardam.

                                                                                                                     

Professor do Departamento de Ciência da Informação e do Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação da Universidade Federal da Paraíba. Pesquisador do CNPq. ** Professora do Departamento de Ciência da Informação e do Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação da Universidade Federal da Paraíba. Pesquisadora do CNPq.

Page 209: Etica de la Información

Dentre as TDICs que mais causaram impactos, indicamos especificamente

as tecnologias que possibilitaram o desenvolvimento da Internet e das

tecnologias a elas associadas. A revolução causada pela universalização da

Internet ainda não está completa, nem podemos precisar com certeza quais serão

os novos serviços que surgirão nos próximos anos, pois exercícios de futurologia

são meras especulações. A única máxima a que podemos nos apegar é a certeza

da constante incerteza.

Dos desafios apresentados pelas TDICs podemos destacar, como

oportunidade de estudo, os fenômenos comportamentais relacionados à ética dos

usuários perante a interação com as aplicações que possibilitam interação no

ciberespaço. Este texto não tem a ousadia de apontar soluções para algumas

situações apresentadas, mas apenas materializar determinados contextos que nos

levem a refletir sobre possíveis abordagens teóricas conceituais sobre o espaço

em rede, ou ciberespaço.

2 REDES NO CIBERESPAÇO

O conceito de ciberespaço que adotamos é baseado no próprio criador do

termo, William Gibson na obra Semimal Neuromancer. Conforme Gibson

(1984, p. 51):

Ciberespaço. Uma alucinação consensual experimentada

diariamente por bilhões de usuários legítimos, em cada nação,

por crianças a quem são ensinadas conceitos matemáticos[...].

Uma representação gráfica de dados abstraída dos repositórios

de cada computador do sistema humano. Complexidade

inimaginável. Linhas de luz alinhadas no não espaço da mente,

Page 210: Etica de la Información

agregados e constelações de dados. Como as luzes da cidade

esvaindo-se [...]1

A definição de ciberespaço apresentada por Gibson (1984, p. 51) é

deveras subjetiva e carece de formalismo, mas entendemos que a mesma é

suficiente para construirmos a idéia de ciberespaço, especialmente se utilizarmos

como alicerce o período “[...] uma representação gráfica de dados abstraída dos

repositórios de cada computador do sistema humano [...]”.

Dentro do contexto apresentado por Gibson (1984), entendemos que as

redes sociais tornadas acessíveis através de desktops, notebooks, netbooks,

celulares e outros dispositivos – que podemos considerar como aparelhos

provedores de interfaces2 para o ciberespaço – são instâncias do mesmo, ou seja,

que podemos construir a proposição de que redes sociais mediadas pelos

dispositivos mencionados sejam um subconjunto possível do ciberespaço.

Tomaél e Marteleto (2006, p. 75) entendem que as redes sociais

“expressam o mundo em movimento” e as definem como “conjunto de pessoas

(ou organizações ou outras entidades) conectadas por relacionamentos sociais,

motivados pela amizade e por relações de trabalho ou compartilhamento de

informações”, que constroem e reconstroem a estrutura social através dessas

relações. As autoras defendem a análise de redes sociais como “recurso que

respalda a gestão organizacional, identificando os atores mais influentes na

rede”, que estaria “se tornando cada vez mais um recurso estratégico na

                                                                                                                     1 Tradução nossa. 2 Johnson (2001, p.17) conceitua interface como “[...] softwares que dão forma à interação entre usuário e computador. A interface atua como uma espécie de tradutor, mediando entre as duas partes, tornando uma sensível para a outra. Em outras, a relação governada pela interface é uma relação semântica, caracterizada por significado e expressão, não por força física”.

Page 211: Etica de la Información

estruturação e criação de ligações importantes” (TOMAÉL; MARTELETO,

2006, p. 77).

Para Marteleto (2001, p. 73), “estudar a informação através das redes

sociais significa considerar as relações de poder que advêm de uma organização

não-hierárquica e espontânea e procurar entender até que ponto a dinâmica do

conhecimento e da informação interfere nesse processo”.

O conceito de rede social apresentado por Tomaél e Marteleto (2006, p.

75) pode ser instanciado para as relações existentes no mundo virtual, e a mesma

definição sugerida adequa-se às redes sociais encontradas no ciberespaço, das

quais, dentre as mais populares atualmente, podemos elencar, sem atribuir

ordem de importância, as seguintes: Facebook3, Orkut4, MySpace5, Twitter6,

entre outras.

Algumas situações de cunho ético desabrocham a partir da imersão dos

usuários nas redes sociais disponibilizadas no ciberespaço. Dentre algumas

possíveis situações faremos a devida contextualização e apresentaremos alguns

questionamentos.

Ploug (2009, p. 5) apresenta um experimento realizado nos Estados

Unidos em que emergem diferenças no comportamento ético das pessoas quanto

ao proceder no mundo real e no ciberespaço. Nesse experimento (Legal Tender

Experiment), pessoas ao acessarem uma determinada página da Web eram

presenteadas com um par de notas de cem dólares supostamente reais e passíveis

de serem acessadas através de tecnologia robótica. Depois de devidamente

                                                                                                                     3 Disponível a partir da URL: http://pt-br.facebook.com/ 4 Disponível a partir da URL: http://www.orkut.com.br 5 Disponível a partir da URL: http://br.myspace.com/ 6 Disponívek a partir da URL: http://twitter.com/

Page 212: Etica de la Información

cadastradas, eram dadas às pessoas a possibilidade de furar ou queimar as notas

remotamente. Ao aceitar o experimento os participantes eram informados de que

a lei americana considera crime atos que por ventura venham danificar o papel

moeda, incorrendo em penalidades pecuniárias ou de privação de liberdade.

Explicados da ilegalidade os participantes tinham a opção de clicar em um botão

no qual aceitavam a responsabilidade pela mutilação das notas e podiam

continuar com o experimento. Após a condução do experimento, os envolvidos

eram consultados sobre a veracidade do teste onde a maioria discordava que o

teste fosse real. Ploug (2009, p. 6) esclarece que este simples teste parece

evidenciar que o comportamento ético das pessoas no mundo físico muda

quando a interação ocorre no ciberespaço.

Uma premissa proposta por Ploug (2009, p. 7) infere que “a interação no

ciberespaço difere eticamente da interação ocorrida fora do ciberespaço por

força dos agentes eventualmente procedendo de forma pelas quais eles não

teriam agido tivesse a interação ocorrida em ambiente diverso do ciberespaço”.7

Baseado no apresentado, pode-se questionar se a interação “face a face” no

mundo físico é diferente da interação no ciberespaço e quais os motivos que

eventualmente levam o indivíduo agir de forma ética diversa nos dois meios. ]

Nesse sentido, qual a razão que levam os usuários a assumir outras

personalidades no Ciberespaço? Um caminho para tais questionamentos é

apontado ainda por Plough (2009, p. 4) ao indicar que o trabalho do filósofo

Frances, Emmanuel Levinas pode contribuir para esclarecer as dinâmicas entre a

interação física “face a face” e dinâmicas emergentes da interação originada no

ciberespaço.

                                                                                                                     7 Tradução nossa.

Page 213: Etica de la Información

Um segundo aspecto que questionamos é o da interação de usuários com

entidades que mimetizem o comportamento humano, interação esta realizada em

uma rede social ou qualquer outra instância do ciberespaço. De forma a

apresentar a questão faz-se necessário fazermos algumas explicações.

Apresentaremos a seguir um teste conhecido como o Teste de Turing, definindo

a seguir o conceito de agentes e chatterbots.

O matemático britânico Alan Mathison Turing (1950) propôs um teste

para determinar a capacidade de uma máquina em demonstrar inteligência, este

teste é conhecido como Teste de Turing e pode ser explanado da seguinte forma:

O teste é realizado com dois humanos, um deles o juiz do experimento, e uma

máquina, prosseguindo com uma conversação em linguagem natural entre o juiz,

o outro humano e a máquina. Tanto os humanos como as máquinas estão

remotamente separados e a conversação está limitada ao texto digitado em um

teclado e apresentado em um terminal. No caso do juiz não conseguir distinguir

quem é o humano e quem é a máquina, considera-se que a máquina passou no

teste. Até o momento máquinas não passaram no Teste de Turing, mas muitas

conseguem interagir com o juiz humano de maneira bastante fidedigna.

A partir da explanação da idéia do Teste de Turing prosseguimos com

mais definições antes de apresentarmos outro questionamento ético.

Introduzimos agora o conceito de agente.

Segundo Johnson (2000, p. 135) “Como o nome sugere, os agentes são

delegados, representantes. Fazem coisas para nós”, entendemos um agente como

sendo uma entidade que age como um procurador realizando tarefas em nome de

outra entidade. Nosso interesse recai sobre os agentes de software, que segundo

Jennings e Wooldridge (1996) pode ser entendido informalmente “como um

programa autônomo capaz de controlar sua própria tomada de decisão e agir

Page 214: Etica de la Información

com base na percepção de seu ambiente na busca de um ou mais objetivos”8.

Entendemos que o conceito de agente no mundo não virtual pode ser

transplantado para o ciberespaço sem grandes problemas conceituais, mas o que

muda é apenas o espaço de atuação da entidade.

Chatterbots são programas de computador que tentam simular

conversações com os usuários, com o objetivo de, pelo menos temporariamente,

levar um ser humano a pensar que está conversando com outra pessoa (LAVEN,

2003). Essa possibilidade de se dar a uma máquina habilidade para interagir com

o ser humano, através da compreensão e simulação do seu comportamento, tem

sido, há muito tempo, alvo de pesquisas na área de inteligência artificial

(LEONHARDT, 2005).

Dias, Henn e Silva (2007, p. 5) esclarecem que as aplicações mais comuns

de chatterbots na web são para entretenimento (manter o usuário durante mais

tempo no site), ajudar o (tirar dúvidas do usuário quanto ao site ou empresa),

comércio (auxiliar o usuário em compras, inclusive sugerindo produtos) e o

ensino a distância (esclarecer dúvidas, orientar exercícios propostos, efetuar

demonstrações, etc.).

Um chatterbot é um tipo de agente, sendo encontrado em diversas

instâncias do ciberespaço. Um questionamento que nos intriga seria de que

chatterbots estão disseminados como auxiliares de usuários nas mais diversas

instâncias do ciberespaço prestando auxílio em diversas atividades conforme

explicitado. Uma vez que muitos destes chatterbots possuem condições de

mimetizar a conversação com um ser humano, não descartando a possibilidade

de algumas dessas entidades vir a passar no Teste de Turing em um futuro ainda

indeterminado, mas possivelmente a médio prazo, indagamos: Qual seria o                                                                                                                      8 Tradução nossa.

Page 215: Etica de la Información

direito do usuário saber que estão relacionando como uma entidade não

humana? Quais seriam os aspectos éticos emergentes desta relação, uma vez que

diversas ações podem ser tomadas pelo usuário a partir da interação com o

chatterbot?

3 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Como dito na introdução, estas e outras questões não são respondidas no

presente texto, mas se colocam como aspectos de uma agenda para discussão

sobre a responsabilidade ética e social dos profissionais da informação. Pois

pertencemos ao domínio dos profissionais que criam e disponibilizam as

tecnologias da informação que revelam ou escondem o humano nos meandros

das máquinas. Onde e quando os “auxiliares” podem vir a assumir os papéis dos

seres humanos, são questões a serem respondidas a partir de um posicionamento

dos criadores sobre o verdadeiro caráter de suas criaturas.

É nosso dever ético e nossa responsabilidade profissional, perante a

sociedade contemporânea que se denominada “da informação”, estarmos atentos

para essas e outras questões decorrentes da nossa ação sobre o mundo. De modo

a vivermos no ciberespaço a verdadeira aventura humana, qual seja a de

construir redes de relações que conduzam ao crescimento das possibilidades de

diálogo e interação entre humanos.

Page 216: Etica de la Información

REFERÊNCIAS

DIAS, Guilherme Ataíde; HENN, Gustavo; SILVA, José Wendell de Morais. Tecnologia da

informação e serviços de referência eletrônicos: uma proposta de aplicação baseada em

chatterbots e ontologias. Encontros Bibli: Revista Eletrônica de Biblioteconomia e Ciência

da Informação, Florianópolis, v.12 n.23, p.47-61, 2007.

GIBSON, William. Neuromancer. New York, Ace Books, 1984.

JENNINGS, Nick e WOOLDRDIGE, Michael. Software Agents. IEE Review, p.17-20,

1996.

JOHNSON, Steven. Cultura da Interface: como o computador transforma a nossa

maneira de criar e comunicar. Rio de Janeiro, Jorge Zahar Editor Ltda, 2001.

LAVEN, S. What is a chatterbot? The Simon Laven Page. Disponível em:

<http:// http://www.simonlaven.com/ >. Acesso em: 09 de mar. 2010.

LEONHARDT, M. D. Um estudo sobre Chatterbots. 2005. Trabalho individual –

Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, Rio Grande do Sul, 2005.

MARTELETO, R. M. Análise de redes sociais – aplicação nos estudos de transferência da

informação. Ciência da Informação, Brasília, v.30, n.1, p.71-81, jan./abr. 2001.

PLOUG, Thomas. Ethics in Cyberspace: How Cyberspace May Influence Interpersonal

Interaction. Springer, 2009.

TOMAÉL, M. I; MARTELETO, R. M. Redes sociais: posições dos atores no fluxo da

informação. Encontros Bibli, Santa Catarina, especial, 1o semestre, p.75-91, 2006.

TURING, Alan Mathison. Computing Machinery and Intelligence. Mind, Oxford, v.LIX,

n.236, p.433-460, 1950.

Page 217: Etica de la Información

ÉTICA, RESPONSABILIDADE SOCIAL E GESTÃO DA

INFORMAÇÃO NAS ORGANIZAÇÕES

Júlio Afonso Sá de Pinho Neto1

1 INTRODUÇÃO

Nossa contemporaneidade possui uma grande demanda por critérios

éticos, capazes de orientar políticas de informação com o objetivo de promover

a inclusão social, priorizando aquelas informações realmente capazes de educar

para a cidadania, para a melhoria da qualidade de vida e maioridade política de

grandes parcelas da população que vivem diferentes situações de exclusão

social.

Vivemos em meio a um excesso de informações que paradoxalmente

representa um grande obstáculo à informação. Essa aposta no excesso investe

contra a qualidade e legitimidade dos conteúdos, que muitas vezes defendem

apenas interesses privados e beneficiam – de forma dissimulada – os objetivos

dos grandes mercados e monopólios. Este fenômeno faz parte também de um

processo de estetização e espetacularização (DEBORD, 1997;

BAUDRILLARD, 1992) de diversos domínios da vida humana. Surge a

tendência de não buscarmos mais a informação nos meios de comunicação

disponíveis, mas torná-la um espelho de nós mesmos: “a internet torna-se um

                                                                                                                     1 Professor do Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação da Universidade Federal da Paraíba. E-mail: [email protected]

Page 218: Etica de la Información

espelho de nós mesmos. Em vez de usá-la para buscar notícias, informação ou

cultura, nos a usamos para SERMOS de fato, a notícia, a informação, a cultura”

(KEEN, 2009, p. 12).

Torna-se, mais do que nunca, necessária a intervenção dos profissionais

da ciência da informação, que, orientados sob uma perspectiva ética, sejam

capazes de gerenciar tais excessos, privilegiando as informações que reafirmem

a prática da reflexão, da crítica e da democracia. Devem garantir espaço para

múltiplas vozes, com o escopo de salvaguardar os direitos inalienáveis do

homem e das sociedades com base nos valores da informação, reafirmando sua

dimensão social e humana (SARACEVIC, 1996).

Resta a pergunta, tão bem formulada por Wersig e Nevelling (1975):

Que exigências sociais devem ser atendidas pela ciência da informação?

Certamente aqui vêm em relevo os critérios e fundamentos éticos, pois percebe-

se hoje, de forma majoritária, uma aposta na pura performance e obtenção de

resultados, revelando um flagrante distanciamento das práticas dialógicas que

devem questionar e orientar as atividades dos profissionais da informação.

Tal perigo apresenta-se a partir de uma tendência em suprimir a crítica

por considerá-la contrária à eficiência e também um obstáculo à produtividade.

Dá-se, então, um crescente vazio no que diz respeito ao pensamento e à reflexão,

o que nos expõe a uma cultura onde grassa a estetização, o amadorismo, a

banalidade e a desinformação.

Por outro lado, há a possibilidade de defender a perspectiva da gestão da

informação como um recurso capaz de fornecer o conhecimento necessário para

suprir demandas de informação de grupos sociais diversos. Tal entendimento

nos faz crer que a responsabilidade social é o grande objetivo da ciência da

informação (WERSIG; NEVELLING, 1975). Tal discernimento nos esclarece

que no âmbito de qualquer organização haverá sempre a necessidade de

Page 219: Etica de la Información

conhecer as necessidades de informação dos seus diversos públicos2, atendendo

assim seus interesses. Este processo requer o estabelecimento de um intercambio

de informações a partir de relações bilaterais. É preciso auscultar o que os

públicos têm a dizer sobre a organização para em seguida levar tais informações

à administração superior que analisará a possibilidade de corrigir condutas ou

mudar comportamentos e procedimentos. As críticas, sugestões, dúvidas e

esclarecimentos, oriundos da opinião dos públicos, viabilizam um profícuo

trabalho preventivo com o objetivo de evitar conflitos. E todas as disputas

representam a possibilidade do surgimento de futuras crises, caso sejam

negligenciadas pelo trabalho de gerenciamento da informação.

Assim, dentre as atividades do profissional de Ciência da Informação

(CI), ressaltamos a gestão dos recursos informacionais das organizações com o

objetivo de fortalecer a democracia e a organização da sociedade através da

análise das suas necessidades de informação (MARCHIORI, 2002). Não há,

destarte, como falar de gestão da informação sem um embasamento ético. A

ética deve principalmente garantir que os grupos sociais, ou públicos de uma

organização, sejam agentes participativos nesse processo de gestão, fazendo

com que eles possam contribuir para definir as políticas de informação através

da manifestação de suas opiniões, críticas, anseios e demais contribuições.

                                                                                                                     2 Público é aqui entendido como um grupo social organizado e afetado pelo desempenho de uma empresa ou organização. Conforme os diferentes graus de interesse, dependência e relações econômicas, estes públicos podem ser classificados como internos, mistos e externos (Cf. FRANÇA, 2004).

Page 220: Etica de la Información

2 PÚBLICO INTERNO, ÉTICA E RESPONSABILIDADE SOCIAL NA

GESTÃO DA INFORMAÇÃO

Diante de um mercado bastante competitivo, as organizações se veem

obrigadas a seguir novos modelos de administração que possuam as estratégias

necessárias para garantir a sua própria sobrevivência. Esses modelos,

necessariamente, exigem um planejamento estratégico do processo de

informação que deve atender a interesses muito bem explicitados na missão e

visão de uma instituição, sem, contudo, deixar de considerar as demandas da

sociedade como uma das prioridades da administração. As instituições sofrem

variadas pressões de grupos sociais organizados que reclamam seus direitos e

exigem um compromisso e envolvimento destas nos problemas sociais

contemporâneos.

Num cenário de profunda exclusão e desigualdade social, pesa, sobre

cada empresa e organização uma hipoteca social, como bem nos explicita João

Paulo II na Carta Encíclica “Laborem Exercens” (1981), que aborda questões

referentes aos meios de produção:

Estes não podem ser possuídos contra o trabalho, como não podem

ser possuídos para possuir, porque o único título legítimo para a sua

posse — e isto tanto sob a forma da propriedade privada como sob a

forma da propriedade pública ou coletiva — é que eles sirvam ao

trabalho; e que, consequentemente, servindo ao trabalho, tornem

possível a realização do primeiro princípio desta ordem, que é a

destinação universal dos bens e o direito ao seu uso comum.

Sob essa perspectiva, a propriedade é entendida a partir de um princípio

de responsabilidade social e não como um direito particular excludente. Se a

própria existência de uma empresa passa a ser entendida como responsabilidade

Page 221: Etica de la Información

social, todo o resto, tal como projetos, ações, investimentos, filosofia

administrativa, etc., devem ser concebidos a partir desse compromisso com o

desenvolvimento social. Têm-se, aqui, uma visão macro da responsabilidade

social que não se limita a ações ou estratégias pontuais, mas orienta e justifica a

própria razão de ser de uma instituição. “Neste contexto, tanto os processos

administrativos [...] são mecanismos facilitadores para a otimização de

processos que levam, idealmente à comunicação efetiva da informação entre

indivíduos e grupos” (MARCHIORI, 2002, p. 75).

Assim, a responsabilidade social e a forma pela qual a organização a

entende e põe em pratica, constitui-se em um elemento estratégico no que diz

respeito aos fluxos de informação que se estabelecem no ambiente

organizacional. Todos os processos administrativos devem ser entendidos

mecanismos facilitadores que têm como objetivo maior proporcionar uma

efetiva comunicação da informação entre indivíduos e grupos (MARCHIORI,

2002).

A partir de tais premissas, surgem importantes questões: Que filosofia de

responsabilidade social uma instituição deve adotar, uma vez que suas ações

nesse campo contribuirão de forma decisiva na construção do conceito que essa

quer possuir diante da sociedade? Em que medida deve-se dar publicidade a tais

projetos e iniciativas? Qual o objetivo ético maior que fundamenta tais práticas?

Essas são questões éticas que envolvem o profissional de Ciência da Informação

(CI) e que demandam um diagnóstico preciso, sob pena de interferirem de

maneira negativa no conceito que a organização possui diante da opinião

pública.

Quando falamos da construção de um conceito é necessário lembrar que

o mesmo não pode significar a mera criação de uma imagem institucional; ele

deve corresponder verdadeiramente às escolhas e opções valorativas que

orientam determinada filosofia administrativa. Para tanto, é necessário

desenvolver inicialmente um trabalho voltado para os públicos internos de uma

Page 222: Etica de la Información

organização. Este servirá como prova de que os valores que orientam as

políticas de responsabilidade social foram verdadeiramente internalizados e

adotados como princípios e não como instrumentos de marketing, capazes

apenas de fabricar imagens com forte impacto e visibilidade na mídia.

O público interno representa um importante termômetro das instituições

em matéria de ética, responsabilidade social e mesmo qualidade dos produtos

e/ou serviços oferecidos por uma empresa ou organização; é através do trabalho

desenvolvido junto a esse público que o gestor da informação vai colher dados

essenciais para o planejamento da sua atividade.

Através de diferentes métodos de pesquisa de opinião serão obtidos os

dados necessários para propor e sugerir mudanças em todas as políticas

elaboradas por uma instituição. Sem deixar de mencionar que os dados obtidos

internamente às organizações são valiosíssimos, pois para muitos públicos

externos – tais como clientes, imprensa, acionistas, fornecedores, governo,

dentre outros – as manifestações, opiniões e depoimentos dos funcionários

constituem-se em fonte de informação decisiva no momento de conhecer o

desempenho administrativo e mercadológico de uma organização.

No Brasil, infelizmente, por questões culturais, são negados ao público

interno o investimento e as políticas necessárias para firmá-lo como peça-chave

da administração organizacional. Tal negligência acaba por obstruir o

importante e necessário trabalho de gestão da informação e comunicação

interna. Tal equívoco acaba por privilegiar apenas ações voltadas para a área de

marketing (com todas suas estratégias de persuasão), já que no imaginário do

empresariado brasileiro esta atividade desponta muitas vezes como a única

forma de se obter um retorno financeiro fácil e rápido no que diz respeito aos

investimentos em matéria de responsabilidade social.

Um exemplo bastante eloquente desse panorama em que vivemos no

Brasil é a pesquisa realizada por Govatto (2007) com 131 anúncios publicitários,

veiculados na mídia impressa e eletrônica, pertencentes a 59 empresas filiadas

Page 223: Etica de la Información

ao Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade Social; o resultado

demonstrou que a maior parte dos anúncios contrariava as regras prescritas pelo

Conselho Nacional de Auto-Regulamentação Publicitária (CONAR) e pelo

Código de Defesa do Consumidor. Segundo o trabalho de Govatto, 39% dos

anúncios possuíam informações incorretas sobre a oferta de serviços ou o uso de

produtos; 36% foram classificados como propaganda abusiva ou enganosa e

10% apresentavam informações que chegavam a por em risco a segurança ou a

saúde dos consumidores.

3 A GESTÃO DA INFORMAÇÃO INTERNA COMO PONTO DE

PARTIDA PARA AS TRANSFORMAÇÕES DA CULTURA

ORGANIZACIONAL E ADOÇÃO DE NOVOS PARADIGMAS ÉTICOS

Cumpre ao profissional da ciência da informação, “analisar os processos

de produção, comunicação e uso das informações” (LE CODIAC, 2002, p. 25)

no âmbito organizacional. Desta forma, quando as organizações se mobilizam

para adotar políticas e projetos de responsabilidade como diferencial

competitivo, devem fazê-lo a partir de referenciais éticos. Vantagem competitiva

não pode dissociar-se da ética, principalmente quando se deseja, a partir de um

compromisso social, alcançar o status de organização socialmente responsável.

O caminho a seguir é internalizar verdadeiramente esses valores, princípios e

comportamentos, além de conclamar todos da instituição – a começar pelos

colaboradores – para a construção de um projeto coletivo nessa área.

Dentro dessa perspectiva de uma empresa cidadã, capaz de entender a

responsabilidade social como resultado de uma construção coletiva, a gestão da

informação em nível interno torna-se fundamental devido ao seu papel de

promover o envolvimento de todos seus colaboradores no processo

administrativo. Esse é um tipo de trabalho que necessariamente deve provocar

Page 224: Etica de la Información

mudanças, ou seja, deve ir muito além do mero discurso propagandístico que

visa apenas alardear as benesses e o compromisso ético da empresa para com a

sociedade. Não basta, contudo, apenas conhecer o público interno, levantando

suas insatisfações e reivindicações, mas deve-se ir além, com o objetivo de

torná-lo agente desse processo de administração organizacional.

Este é um trabalho que não pode ser feito sem operar mudanças

estruturais que envolvem a transformação de antigos modelos administrativos.

Sob esta perspectiva deve-se valorizar o capital humano como o bem maior da

organização, evitando-se a subordinação do bem-estar ou das necessidades

humanas a qualquer objetivo meramente lucrativo. Assim, o lucro, ainda que

essencial para a sobrevivência de uma organização, só deve ser considerado

como satisfatório se o compromisso com a ética for aceito e assimilado como

um valor inalienável.

O gestor da informação, atuando junto ao público interno deverá,

destarte, comprometer-se com a criação de uma política que seja capaz de

ocupar-se prioritariamente com a melhoria da qualidade de vida dos seus

colaboradores. Paralelamente a isto, a divulgação de informações relacionadas à

atuação da organização junto a projetos de responsabilidade social nunca pode

vir dissociada de um compromisso genuinamente ético; jamais deve servir como

mera oportunidade de exibição ou exposição midiática visando – de forma

oportunista – obter maior visibilidade junto aos seus clientes ou usuários. Esse

trabalho é importante e prioritário justamente por demonstrar o interesse real da

administração em produzir resultados a partir do diálogo com o público interno;

ele demonstra, antes de tudo, uma concepção da gestão da informação como

instrumento capaz de produzir resultados a médio e longo prazos, justamente

porque envolve algo que requer tempo e maturação: uma interação dialógica

com essa parcela de público. Assim, um compromisso com ética deve se iniciar

com a revisão e transformação de modelos administrativos equivocados que

Page 225: Etica de la Información

ferem direitos e limitam oportunidades daqueles que atuam no interior das

organizações.

Devemos lembrar que do ponto de vista ético é um contrassenso alardear

qualidade, responsabilidade social, preservação ambiental ou apoio cultural sem

antes promover, de fato e através de ações, o público interno como elemento

prioritário de uma organização.

O que queremos ressaltar é que não basta conceber a gestão apenas como

um conjunto de processos que envolvem a organização, distribuição e controle

da informação tendo em vista provocar ganhos na produtividade e no

desempenho financeiro das organizações. É necessário, antes de tudo, promover

mudanças de ordem cultural, pois a gestão da informação está atrelada a toda

uma cultura organizacional, que por sua vez é perpassada por valores,

princípios, hábitos, visões de mundo e ideologias. Há a necessidade, assim, de

realizar pesquisas voltadas para a cultura organizacional (CURVELLO, 2002)

como condição para que sejam propostas mudanças do ponto de vista ético. Sem

essas transformações no ambiente macro – aquele dos princípios, valores e

modelos administrativos – torna-se inócuo exasperar-se no planejamento e na

execução de políticas de informação visando a “participação” dos funcionários.

Deve-se entender que a cultura organizacional pressupõe uma leitura da

organização como um todo inter-relacionado (MARCHIORI, 2006), o que faz

vir em relevo a interdisciplinaridade da ciência da informação.

Até mesmo o status de “público”, aplicado aos funcionários, exige como

condição básica para sua existência que tal coletivo de pessoas interaja de forma

dialógica, debatendo assuntos de interesse comum a partir das controvérsias

existentes. Esse comportamento exige uma maioridade política e o profissional

de CI deve atuar como elemento fomentador desse comportamento dialético.

Trata-se de um trabalho que antecede a aplicação de todo o instrumental de

gestão da informação; antes trabalha questões culturais, pedagógicas e sociais. A

cultura organizacional revelará o perfil político e o grau de cidadania dos seus

Page 226: Etica de la Información

públicos internos ao mesmo tempo em que permitirá conhecer os valores e

normas que orientam a instituição desde a sua fundação até o estabelecimento de

suas metas mais arrojadas. É este o trabalho de consultor que deve ser exercido

pelo profissional de CI, o qual irá exigir-lhe uma gama de conhecimentos em

áreas afins, capazes de torná-lo apto a interpretar o ambiente macro no qual a

organização está inserida.

Esta revisão ética, que brota do conhecimento aprofundado da cultura

organizacional, pode e deve ser considerada a melhor forma de se elaborar uma

política de informação eficaz, ou, melhor dizendo, uma verdadeira política de

informação. Muitas vezes a inexistência desse norte capaz de rever valores,

hábitos, princípios, comportamentos e visões de mundo, relega a gestão da

informação à mera execução de atividades que, ainda que planejadas, são

concebidas de forma meramente funcional, desconsiderando os vícios e práticas

estruturais presentes nas esferas administrativas que permanecerão impedindo o

êxito na consecução das metas e objetivos tão bem traçados nos planos e

programas ligados à gestão da informação.

Por outro lado, é importante ressaltar que esta atividade não pode

limitar-se a trabalhar de forma restrita, pois o processo de planejamento, gestão

e distribuição da informação exige do profissional o exercício da sua função de

consultoria junto à cúpula administrativa, o que deve levá-lo a atuar de forma

onipresente em todos os setores da organização, com a finalidade de detectar

necessidades e demandas de informação por parte dos diferentes públicos.

Negligenciar essa realidade é deixar a porta aberta para situações de conflitos ou

crises que certamente repercutirão negativamente no processo de gerenciamento

da informação, trazendo danos ao conceito que a organização possui na

sociedade.

Page 227: Etica de la Información

4 O PÚBLICO INTERNO COMO FATOR PRIMORDIAL PARA A

LEGITIMAÇÃO DOS PROJETOS DE RESPONSABILIDADE SOCIAL

É inegável que cada vez mais a garantia de existência das organizações

passa por um processo de aprovação da sociedade civil organizada. Ela deve

apresentar uma contrapartida social e ambiental para legitimar sua atuação.

Longe da visão liberal que reservava ao Estado a preocupação com as questões

sociais, hoje, alguns (PERAZZO, 2009) já concebem a organização empresarial

como o principal agente de transformação da sociedade.

A responsabilidade social é um tema por demais controverso e um dos

conceitos mais frequentemente utilizados é o expresso por Ashley (2002, p. 6),

que a define como sendo “o compromisso que uma organização deve ter para

com a sociedade, expresso por meio de atos e atitudes que a afetem

positivamente, de modo amplo, ou a alguma comunidade na sociedade e sua

prestação de contas para com ela”. Ora, aqui percebemos uma compreensão

equivocada da responsabilidade social que tende a privilegiar ações executadas

para os públicos externos, ainda que sejam comunidades vítimas de qualquer

forma de exclusão social. O que é importante complementar é que o êxito de um

trabalho dessa natureza só será completo se for desenvolvido com o público

interno. Outra distorção a ser evitada é imaginar que essa parcela de público

pode permanecer fora do raio de ação de uma política de responsabilidade social

elaborada pelas organizações.

Um conceito também muito em voga hoje é o de “sustentabilidade

corporativa” (ALMEIDA, 2009), que aposta num envolvimento de toda a

organização na conquista da legitimidade social a partir do equilíbrio entre

lucro, meio ambiente e sociedade. Esta nova leitura confirma o entendimento de

que todos os públicos necessitam participar da elaboração dos projetos, políticas

e ações desenvolvidas junto a setores da sociedade civil que têm como objetivo

proporcionar à população um desenvolvimento econômico e social de forma

Page 228: Etica de la Información

sustentável, sem comprometer o desempenho financeiro da organização, a

qualidade de vida da sociedade e sem produzir nenhuma forma de agressão ao

meio ambiente.

Esse envolvimento de todos os públicos de uma instituição deixa claro

que qualquer iniciativa que não contemple um esforço conjunto deve ser

refutada como contrária ao princípio de sustentabilidade. Sendo assim, não há

lugar para interpretações falaciosas da responsabilidade social que muitas vezes

apostam no mero assistencialismo ou filantropia, contemplando unicamente o

público externo. É paradoxal que uma empresa ou organização esteja

preocupada com questões sociais, desenvolvendo projetos nesse sentido, e que

no seu intramuros trate seus funcionários de maneira indigna, negligenciando-

lhes a garantia de direitos básicos. A inexistência de políticas que visem propor

ascensão funcional, benefícios, qualificação, treinamento e até mesmo

participação nos lucros, muitas vezes convive lado a lado com projetos de

responsabilidade social que alardeiam garantir a melhoria de condições de vida a

parcelas de excluídos da sociedade.

Há uma visão quase unânime de que a empresa não pode viver

exclusivamente com o objetivo de produzir lucro, pois cumpre também um

objetivo social, uma vez que não há como desvincular totalmente interesses

públicos de interesses privados. Atualmente as organizações se deparam com a

necessidade da aprovação social do seu direito de gerar lucro e riqueza, pois há a

cobrança de uma contrapartida que assegure melhorias na vida da comunidade

na qual está inserida. Prova disso é o despontar dos indicadores de investimento

em responsabilidade social, tão bem expressos nas propostas de divulgação do

“Balanço Social”.

Sabemos que a publicação do Balanço Social3 é um recurso ligado à

gestão da responsabilidade social. Contudo, sua elaboração, além se servir como

                                                                                                                     3 No Brasil, os modelos mais utilizados são o do Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (IBASE)

Page 229: Etica de la Información

instrumento de avaliação e planejamento, tem como objetivo proporcionar a

transparência necessária das ações desenvolvidas pelas organizações,

facilitando, assim, a abertura de canais de comunicação com a sociedade.

Através das informações contidas no Balanço Social a sociedade será capaz de

avaliar o desempenho das organizações no quesito responsabilidade social. Este

mecanismo nada mais é que um conjunto de informações sobre os investimentos

e ações sociais efetuados por uma instituição; algo extremamente importante do

ponto de vista do planejamento estratégico, pois tais dados terão uma

contribuição decisiva na construção do conceito organizacional perante a

sociedade e devem, por isso mesmo, possuir uma consistente fundamentação

ética.

Uma ferramenta como esta não pode conter apenas informações

quantitativas sobre as diversas ações da organização voltadas para a melhoria da

qualidade de vida de segmentos da sociedade onde está inserida. Deve, antes de

tudo, expressar um compromisso, externar valores e políticas que foram

internalizadas a partir do seu núcleo gerencial; sendo assim, não se trata de uma

preocupação contabilística, essencialmente quantitativa, mas de uma mudança

cultural que aponte para um crescimento ético que deve ter início na adoção de

novos modelos e paradigmas administrativos. Não basta apenas disponibilizar

informações, estas devem refletir a adoção de novos valores e procedimentos.

O Balanço Social no Brasil, apesar de contar com um projeto de lei que

há anos tramita no parlamento brasileiro, é estimulado através de diferentes

mecanismos de incentivo e premiação. É inegável também que a atribuição de

organização ou empresa socialmente responsável garante considerável

visibilidade junto à opinião pública, o que acaba por estimular muitos dirigentes

a investir nesse segmento. Contudo, uma das grandes questões continua ser a

conscientização do que venha a ser verdadeiramente a responsabilidade social.

                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                         

e do Instituto Ethos.

Page 230: Etica de la Información

Segundo o Fórum Permanente de Balanço Social, mantido pela

Fundação Instituto de Desenvolvimento Empresarial e Social – FIDES4, o

Balanço Social não deve ser instrumentalizado como mais um estratagema

visando reforçar os esforços de marketing por meio de uma divulgação maciça

de ações sociais promovidas pela instituição. Pelo contrário, a genuína

responsabilidade social pressupõe o envolvimento das organizações com a

transformação social, algo diametralmente oposto da utilização de projetos dessa

natureza como mero chamariz de novos clientes capazes de estimular a

comercialização de produtos ou serviços.

O verdadeiro termômetro para verificar o tipo de entendimento e a

qualidade das políticas de responsabilidade social das organizações são os

indicadores do Balanço Social voltados para o público interno, tais como:

- tempo de trabalho na empresa;

- grau de escolaridade;

- sexo;

- cor;

- faixa etária;

- percentagem de mulheres em cargos de chefia;

- número total e valor das horas-extras trabalhadas;

- gastos com alimentação do trabalhador (tíquete-refeição, lanches,

restaurantes, cestas básicas etc.);

- valor dos gastos com educação (treinamento, estágios, bolsas,

bibliotecas etc.);

- gastos com saúde planos de saúde; assistência médica; programas

de medicina preventiva; programas de qualidade de vida e outros

gastos com saúde;

                                                                                                                     4 www.fides.org.br/balanco_social_forum.htm

Page 231: Etica de la Información

- valores gastos com segurança no trabalho: valor dos gastos com

segurança no trabalho, especificando os equipamentos de proteção

individual e coletiva na empresa;

- gastos com a previdência, tais como planos especiais de

aposentadoria; fundações previdenciárias; complementações e

benefícios aos aposentados;

- outros benefícios tais como seguros, empréstimos, transportes,

creches, atividades recreativas etc.

Tais dados descritos acima constam do modelo de Balanço Social do

IBASE e também do Projeto de Lei (PL) n 0032 de 1999, apresentado pelo

deputado federal Paulo Rocha (PT/PA). Este Projeto de Lei é a reapresentação

do PL n 3.116/97 de autoria das deputadas Marta Suplicy (PT-SP), Conceição

Tavares (PT-RJ) e Sandra Starling (PT-MG). Cabe ressaltar que os indicadores

de gênero, etnia e faixa etária estão claramente relacionados com posturas

discriminatórias adotadas por algumas organizações, representando um estímulo

à mudança e supressão de tais práticas abusivas.

É interessante notar que essa concepção legalista do Balanço Social,

presente nos dois projetos de lei citados, está sendo substituída por propostas de

incentivo e premiação. Um exemplo dessa nova tendência foi a aprovação, em

agosto de 2008, pela Comissão de Assuntos Econômicos do Senado Federal

(CAE), do Projeto de Lei n 224/07 – atualmente em tramitação na Comissão de

Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) – de autoria da senadora Lúcia Vânia

(PSDB/GO)5 que cria um modelo oficial para o balanço social das empresas

brasileiras e também institui o Selo Empresa Responsável a ser concedido às

empresas que divulgarem o Balanço Social.                                                                                                                      5 < www.senado.gov.br/sf/atividade/materia/detalhes.asp?p_cod_mate=80839>.

Page 232: Etica de la Información

O Projeto de Lei apresentado pela Senadora Lúcia Vânia tem a intenção

de padronizar, através de um modelo oficial, o balanço social que atualmente já

é publicado no Brasil por inúmeras empresas e organizações. Já o Selo Empresa

Responsável deverá ser emitido pelo Ministério do Desenvolvimento Social e

Combate à Fome como forma de incentivo e premiação às empresas que já

divulgam o documento.

A padronização das informações torna-se importante para que se possa

estabelecer uma isonomia na avaliação das organizações que praticam o balanço

social. Este documento em muito contribuirá para legitimar as ações das

instituições comprometidas com o desenvolvimento social através de projetos

voltados para a educação, preservação ambiental, inclusão social e resgate da

cidadania. Tal normatização fornecerá ainda a isenção e imparcialidade

necessárias para que o governo possa avaliar inúmeros pedidos de

financiamento.

É oportuno lembrar que na concessão do Selo Empresa Responsável

estarão de fora aquelas que praticaram crimes ambientais, fizeram uso de

qualquer forma de trabalho escravo, exploraram mão de obra infantil ou

adotaram práticas discriminatórias. A punição desses procedimentos nocivos se

estende a toda cadeia produtiva, como fornecedores, distribuidores, rede

varejista etc.

Temos que ressaltar, porém, que a responsabilidade social, conforme nos

alertam Melo Neto & Froes (2001), deve possuir sempre duas dimensões: uma

abordagem voltada para o público interno e outra dirigida para a comunidade.

Este é o fundamento essencial para a prática de um modelo de responsabilidade

social calcado na ética, construído a partir de numa revisão de posturas e

práticas administrativas abusivas que para serem detectadas necessitam de um

estudo aprofundado da cultura organizacional. Os autores citados acima chegam

a ser taxativos ao descreverem a incongruência de possuir um esforço de

responsabilidade social de forma parcial:

Page 233: Etica de la Información

Há casos de empresas que são mais eficazes e atuantes em apenas uma

das dimensões. Por exemplo, fazem doações para obras e campanhas

sociais do governo, e demitem muitos empregados pagam mal e não

possuem quaisquer programas de benefícios (MELO NETO; FROES,

2001, p. 83).

Podemos perceber, destarte, que a responsabilidade social exige

mudanças na cultura organizacional. Para Fernandes (2002), a simples adoção

de ações de cunho assistencialista voltadas para grupos sociais não é suficiente

para que haja transformações no comportamento político das lideranças, nem

mesmo é capaz de interferir na adoção de valores éticos nos negócios. É

necessário conceber a política de responsabilidade social a partir de um processo

que envolva todos os funcionários da organização. Este é o primeiro passo a ser

dado, pois será capaz de legitimar a participação dos demais públicos no

processo. A legitimidade virá do envolvimento coletivo e para isso é necessário

obter e acatar as contribuições de cada um dos públicos na discussão dos

métodos a serem adotados, na escolha das entidades a serem beneficiadas, na

definição das prioridades da região, e ainda a respeito da consonância dos

projetos com os produtos ou serviços oferecidos pelas empresas ou

organizações. Como se vê, trata-se de um trabalho coletivo que envolve

motivação, participação e negociação.

É diante desse quadro que percebemos o papel do gestor de informação

desde o planejamento até a execução de uma política de responsabilidade social.

Isto porque estamos diante de uma empreitada que exige mudanças na cultura

organizacional, envolvimento e negociação com os públicos, a começar pelo

público interno, e ainda planejamento a médio e longo prazo para que possa ser

uma das bases do conceito organizacional. O oposto disso são ações realizadas

sem critério algum, com puro interesse em um rápido e crescente aumento nas

vendas ou na projeção política de seus dirigentes.

Page 234: Etica de la Información

Também é inegável que um trabalho consistente nessa área produzirá

seus efeitos na fidelização dos clientes, no lucro e fortalecimento da marca, no

desempenho dos funcionários e na popularidade dos dirigentes. Mas tudo isso

deve surgir como conseqüência e não como um fim em si mesmo, pois assim

estaríamos adotando uma ética do interesse próprio, destituída do verdadeiro

interesse e responsabilidade com as necessidades sociais. Essa postura

responsável deve sempre estar comprometida com a transformação social, com a

melhoria da qualidade de vida e com a garantia da cidadania de todos os

públicos que interagem com a organização.

Trata-se de um trabalho que deve ser iniciado com o público interno,

para que possamos estendê-lo para o extramuros da organização. É necessário,

entretanto, sedimentar uma boa imagem e um bom conceito da instituição

perante seus colaboradores; somente assim haverá uma política de

responsabilidade social construída a partir de mudanças estruturais capazes de

envolver a própria cultura organizacional, o que certamente implicará na

substituição de alguns tipos de modelos administrativos avessos à participação e

compromisso coletivos. Esse envolvimento conjugado imporá um caráter de

autenticidade aos trabalhos desenvolvidos nessa área, pois eles carregarão

consigo a chancela da organização como um todo. Será um trabalho de

responsabilidade social planejado e gerido por toda a organização, longe de ser

um projeto concebido apenas nas cúpulas administrativas.

A responsabilidade social é um exercício de cidadania corporativa, logo,

é necessário que os todos os empregados participem desse processo como

membros ativos. È necessário construir uma política de responsabilidade social a

partir de uma efetiva participação de todos os integrantes da organização.

Page 235: Etica de la Información

5 AS AÇÕES DE RESPONSABILIDADE SOCIAL VOLTADAS PARA A

INCLUSÃO DE MINORIAS E VALORIZAÇÃO DA DIVERSIDADE A

PARTIR DO PÚBLICO INTERNO

As organizações, nos últimos anos têm fomentado bastante o

desenvolvimento de políticas de inclusão dirigidas a segmentos sociais

considerados vítimas de algum tipo de discriminação, seja de origem social,

cultural, étnica, de gênero ou relacionada a algum tipo de deficiência física.

A idéia é incluir pessoas desses grupos nos quadros funcionais das

organizações, o que se constitui numa clara resposta às transformações sociais

ocorridas no mundo contemporâneo. Trata-se de uma “resposta simbólica, via

cultura organizacional [...] procurando estabelecer com os indivíduos uma

relação de referência” (FREITAS, 2000, p. 09).

Estas iniciativas têm como objetivo estabelecer um elo entre o público

interno e os diferentes setores da sociedade. Ao investir no respeito às

diferenças, no exercício da tolerância, aderindo ao princípio do diálogo e do

trabalho colaborativo, as organizações se beneficiam de uma série de ganhos

advindos de tais práticas, como a aproximação com a imprensa, a construção de

um bom conceito diante da comunidade, o reconhecimento pelo público

consumidor, um melhor desempenho financeiro, maior produtividade, equilíbrio

na rotatividade da mão de obra, satisfação por parte dos empregados e menor

vulnerabilidade frente à legislação trabalhista.

Enfim, o incentivo e a promoção da diversidade a partir do público

interno legitimam as ações de responsabilidade social que serão desenvolvidas

perante a sociedade. Torna-se, assim, clara, a assimilação consciente desses

valores pela organização; uma comprovação inconteste das estratégias voltadas

para atingir a comunidade a partir de transformações culturais produzidas no

ambiente interno das organizações.

Page 236: Etica de la Información

Tais práticas se tornam imprescindíveis para que a organização conte

com a legitimidade ética necessária para fazê-la sobreviver no mercado atual.

Tais esforços devem, contudo, ter início a partir do público interno, como bem

observa Myers (2003):

A promoção da diversidade e a aquisição de competências cross-

culturais são fundamentais para o relacionamento da empresa não

somente com os consumidores, mas também com todas as partes

interessadas, da comunidade local até os governos estrangeiros nos

países onde a empresa tem negócios. A vantagem competitiva de uma

empresa será determinada em grande medida pela qualidade da

relação que ela mantém com as pessoas, interna e externamente.

Ao possuir uma política que privilegie acatar a diversidade, a instituição

respeita a sociedade na qual está inserida e com ela encontra um maior espaço

para o diálogo, negociação e aceitação de seus serviços ou produtos, ganhando

credibilidade e competitividade.

Fica evidenciado que os programas de responsabilidade social põem em

relevo a necessidade de haver um alinhamento entre os projetos voltados para o

público interno com aqueles dirigidos ao público externo. Este é o único

caminho capaz de tornar a organização exitosa no desenvolvimento de

atividades nessa área. Tais diretrizes produzirão a aprovação desses esforços

pela sociedade, que poderá constatar que a responsabilidade social é um valor e

um princípio ético, não fazendo parte apenas dos discursos institucionais, mas

sendo vivenciada internamente pelas organizações para depois trasbordar para o

seu exterior.

Page 237: Etica de la Información

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Atualmente o público interno desponta cada vez mais como um público

estratégico na gestão das organizações, pois as transformações exigidas pela

contemporaneidade devem prontamente atingir os colaboradores de uma

empresa ou organização. Estes devem tornar-se o objetivo maior das políticas

organizacionais, bem como a verdadeira medida e o sustentáculo da

credibilidade institucional em diversas iniciativas, como os programas de

qualidade, os projetos de desenvolvimento sustentável e as políticas de

responsabilidade social.

Podemos perceber, então, que a informação repassada à sociedade pelos

empregados sempre possuirá maior credibilidade em relação a qualquer outro

meio ou estratégia que tenha como objetivo informar consumidores, clientes,

governo, acionistas ou meios de comunicação. As informações produzidas por

este público podem produzir consequências graves nas relações da organização

com seus interlocutores, chegando a suscitar conflitos e crises que muitas vezes

poderão comprometer sua própria existência. Aos olhos dos públicos situados

externamente à organização, o funcionário será sempre a melhor testemunha dos

valores e do comportamento ético desta.

Diante de problemas contemporâneos tão efervescentes, que dizem

respeito à segurança e privacidade da informação, há a necessidade cada vez

maior de promover um debate ético consistente, permeado por questões

referentes à qualidade, confiabilidade e legitimidade da informação.

E no que se refere à responsabilidade social, não basta produzir

informações quantitativamente expressivas e elencar um sem número de ações

voltadas para a melhoria da qualidade de vida, assistência médica e social, apoio

à cultura, investimentos na educação ou financiamento de projetos de

preservação ambiental. O importante é realizar as mudanças culturais

necessárias que possibilitarão às organizações seguir valores éticos, capazes de

Page 238: Etica de la Información

produzir a adoção de novos paradigmas e modelos administrativos, tudo isso

orientado por uma abordagem sistêmica das organizações onde os objetivos

globais, de grupo e individuais possam estar em contínua inter-relação.

Sob essa perspectiva sistêmica (SENGE, 2006), cada organização

constitui-se em um conjunto de sistemas e subsistemas perfeitamente

interconectados e ligados a um macrossistema que os envolve por completo.

Assim, a informação é o resultado de uma rede de interconexões que perpassa a

organização no âmbito interno e externo, num contínuo processo de

retroalimentação. Gerir a informação num contexto dessa envergadura, com a

necessária fundamentação e legitimidade ética, é fazer uso de recursos e

instrumentos dialógicos, como a pesquisa de opinião, comunidades de prática,

comitês de fábrica, grupos de trabalho colaborativo, dentre outros, objetivando

garantir a participação e a contribuição de diferentes públicos nas mudanças

estruturais pelas quais a organização terá que passar.

REFERÊNCIAS

ALMEIDA, Fernando. Experiências empresariais em sustentabilidade: avanços,

dificuldades e motivação de gestores e empresas. Rio de Janeiro: Campus, 2009.

ASHLEY, Patrícia Almeida (org.). Ética e responsabilidade social nos negócios. São Paulo:

Saraiva, 2002.

BAUDRILLARD, Jean. A transparência do mal: ensaio sobre os fenômenos extremos.

Campinas, SP: Papirus, 1992.

BARROS FILHO, Clóvis de. (org.) Ética e comunicação organizacional. São Paulo: Paulus,

2007.

Page 239: Etica de la Información

CURVELLO, João José Azevedo. Comunicação interna e cultura organizacional. São

Paulo: Scortecci, 2002.

DEBORD, Guy. A sociedade do espetáculo: comentários sobre a sociedade do espetáculo.

Rio de Janeiro: Contraponto, 1997.

FRANÇA, Fábio. Públicos: como identificá-los em uma nova visão estratégica. São Caetano

do Sul, SP: Yendis Editora, 2004.

FREITAS, Maria Ester de. Contexto social e imaginário organizacional moderno. Revista de

Administração de Empresas. São Paulo, Abr/Jun. 2000, v. 40, n. 2, p. 6-15.

FERNANDES, Rubem César. Privado, porém público: o terceiro setor na América Latina.

Rio de Janeiro: Relume Dumará, 2002.

FÓRUNS de Balanço Social. Disponível em

<http://www.fides.org.br/balanco_social_forum.htm>. Acesso em 03.03.2010.

GOVATTO, Ana Cláudia M. Propaganda responsável: é o que todo anunciante deve fazer.

São Paulo: Editora SENAC, 2007.

JOAO PAULO II. Carta Encíclica Laborem Exercens (Sobre o trabalho humano), 14 de

setembro de 1981. Disponível em: <

http://www.vatican.va/holy_father/john_paul_ii/encyclicals/documents/hf_jp-

ii_enc_14091981_laborem-exercens_po.html>. Acesso em: 01 mar. 2010.

KEEN, Andrew. O culto do amador: como blogs, Myspace, Youtube e a pirataria digital

estão destruindo nossa economia, cultura e valores. Rio de Janeiro: Zahar, 2009.

LE CODIAC, Yves-François. A ciência da informação. Brasília: Briquet de Lemos, 2004.

MARCHIORI, Patrícia Zeni. A ciência e a gestão da informação: compatibilidades no espaço

profissional. Ciência da Informação, Brasília, v. 31, n. 2, p. 72-79, maio/ago. 2002.

Page 240: Etica de la Información

MARCHIORI, Marlene. Cultura e comunicação organizacional: um olhar estratégico sobre

a organização. São Paulo: Difusão Editora, 2006.

MELO NETO, Francisco Paulo de; FROES, César. Gestão da responsabilidade social

corporativa: o caso brasileiro. Rio de Janeiro: Qualitymark, 2001.

MYERS, Aron. O valor da diversidade racial nas empresas. Estud. afro-asiát. vol.25 n. 3 Rio

de Janeiro, 2003. Disponível em:

<http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0101-546X2003000300005>.

Acesso em: 28 fev. 2010.

PERAZZO, Alberto Augusto. Uma visão empresarial ética e socialmente responsável.

2009. Disponível em <www.fides.org.br/artigo09.pdf>. Acesso em 03.03.2010.

PROJETO de Lei do Senado, n 224 de 2007. Disponível em:

<www.senado.gov.br/sf/atividade/materia/detalhes.asp?p_cod_mate=80839>. Acesso em: 26.

fev. 2010.

SARACEVIC, Tefko. Ciência da informação: origem, evolução e relações. Perspectiva em

Ciência da Informação, Belo Horizonte, v.1, n.1, p. 41-62, jan./jun. 1996.

SENGE, P. A quinta disciplina: arte e prática da organização que aprende. Rio de Janeiro:

Best Seller, 2006.

WERSIG, G; NEVELING, U. The phenomena of interest to information science. The

Information Scientist, v. 9, n. 4, 1975.