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Universidade Federal de Santa CatarinaBacharelado em Letras-Libras na Modalidade a Distncia
Lautenai Antonio Bartholamei JuniorMaria Lucia Vasconcellos
Estudos da Traduo IISBN: 978-85-60522-19-4
Florianpolis
2008
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SUMRIO ESTUDOS DA TRADUO I
APRESENTAO UNIDADE 1 -O nome e a natureza dos Estudos da Traduo: mapeamentodo campo disciplinar
UNIDADE 2 - Os tipos de formao que os Estudos da Traduo podemoferecer aos seus membros e os tipos de competncias necessrias aos profissionais darea
UNIDADE 3 A questo da fidelidade: uma abordagem terico/emprica UNIDADE 4 - Algumas distines e decises iniciais envolvidas na tarefatradutria
APRESENTAO
Dando continuidade disciplina Introduo aos Estudos da Traduo, esta disciplina,
Estudos da Traduo I, tem por objetivo geral inserir as reflexes sobre o conceito de
traduo, os tipos de traduo e a distino entre traduo e interpretao no campo
disciplinar1 denominado Estudos da Traduo, para, a partir dessa insero, discutir
questes ligadas formao do profissional que a atua, prpria atividade de traduzir e,
finalmente, a uma problematizao do critrio mais comumente utilizado na avaliao da
qualidade de tradues, qual seja, a 'fidelidade'. Assim, no decorrer do curso, vamos
discutir:
(i) o que o campo disciplinar denominado Estudos da Traduo e o seu mapeamento
(Unidade 1);
(ii) os tipos de formao que os Estudos da Traduo podem oferecer aos seus membros
e os tipos de competncias necessrias aos profissionais da rea (Unidade 2);
(iii) a questo da fidelidade (unidade 3) ;
(iv) algumas distines e decises iniciais envolvidas na tarefa tradutria (Unidade 4).
Para isso, vamos partir dos conhecimentos adquiridos no curso anterior e construir
novos conhecimentos calcados nessa primeira base.
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UNIDADE 1 -O nome e a natureza dos Estudos da Traduo: mapeamento docampo disciplinar
Nesta unidade, vamos estudar o nome e a natureza dos chamados Estudos da
Traduo e vamos ver alguns mapeamentos desse campo disciplinar, a partir de alguns
tericos, desde a dcada de 1970, concluindo com percepes atuais, conforme
veiculadas em stios representativos da rea, tanto em nvel internacional, quanto em
nvel nacional.
Na primeira disciplina de traduo deste curso, 'Introduo aos Estudos da
Traduo', vocs conheceram vrios autores que refletiram sobre a traduo, ao longo
do tempo, cujas contribuies ainda hoje permanecem vlidas. Por exemplo, vocs se
lembram de Dolet (1509-1546), que no sculo XVI escreveu sobre A maneira de bem
traduzir de uma lngua para outra (1540). Lembram-se, tambm, de Dryden (1631-
1700) que, no seu Prefcio s Cartas de Ovdio (1680), prope trs tipos de traduo:
(1) Metfrase: verter palavra por palavra; (2) Parfrase: traduo do sentido; (3)
Imitao: recriao. Viram, ainda, as reflexes de Tytler (17471813), que escreveu em
1791, The principles of translation [Os princpios da traduo], estabelecendo trs
princpios: (1) a traduo deve fazer uma transcrio completa da idia da obra original;
(2) o estilo e o modo da escrita devem ser os mesmos do original; (3) a traduo deve
conservar toda a naturalidade do original. J no sculo IX, o alemo Friedrich
Schleiermacher (1768-1834), em seu importante ensaio intitulado Sobre os diferentes
mtodos de traduo, de 1813, discutiu duas possibilidades em relao traduo: ou o
tradutor deixa o autor em paz e leva o leitor at ele ou o tradutor deixa o leitor em paz e
leva o autor at ele. No sculo XX, Lawrence Venuti (tradutor e terico da traduo
talo-americano), empregou, na avaliao das tradues, as expresses traduo
estrangeirizadora traduo domesticadora, de clara inspirao schleiermacheriana.
Vocs se lembram, ainda na metade do sculo XX, da voz do lingista russo-americanoRoman Jakobson, em seu artigo On linguistic aspects of translation [Os aspectos
lingsticos da traduo] (1959/ 1988), que estabeleceu a distino entre os trs tipos
possveis de traduo, lembrando, traduo intra-lingual, traduo inter-lingual e
traduo intersemitica. No contexto brasileiro, foi apresentado a vocs o poeta e
tradutor Haroldo de Campos, que se ancorou nas teorias de Jakobson e outros, para
propor o conceito de recriao na traduo potica.
No curso inicial, vocs puderam constatar, ainda, que a traduo uma atividadeque existe 'desde sempre' (lembram-se da Torre de Babel?). No se sabe quando a
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primeira traduo foi feita, mas, com certeza isso se deu em tempos imemoriais, sempre
que povos, culturas e lnguas diferentes estiveram em contato.
Essa caracterstica de existir desde sempre pode ser aplicada a outras reas do
saber. Por exemplo, no campo disciplinar conhecido hoje como ARQUITETURA, as
atividades artsticas sempre foram exercidas pelo arteso, no contexto de uma prtica
tcnica e oficional. Lentamente, esse arteso se transformou no arquiteto. E as artes
desse ofcio foram, lentamente, se consolidando como um agrupamento moderno de
artes, passando a constituir a forma estabelecida do Campo Disciplinar da Arquitetura,
como nos conta o Professor do Departamento de Anlise Crtica e Histrica da
Arquitetura da Escola de Arquitetura da UFMG, Carlos Antnio Leite Brando2, em seu
artigo A inveno do campo disciplinar da Arquitetura: contribuies e contraposies
renascentistas3: o campo disciplinar da arquitetura no foi propriamente inventado e
intencionalmente proposto, mas construdo lentamente, na medida em que a prtica
tcnica e oficional ganhou uma dimenso intelectual, ou seja, o fazer passou a ser
acompanhado do pensar sobre o fazer. Em outras palavras, o campo disciplinar passou
a se constituir como tal, quando aconteceu uma investida terica e institucionalizada
prtica da atividade especfica.
Um processo semelhante ocorreu com a traduo: tradutores e intrpretes tm
traduzido desde sempre e alguns pensadores, como os que vocs conheceram, tm
refletido sobre esse ofcio. No cenrio brasileiro, a prpria histria do Brasil uma
histria de traduo, como nos conta Heloisa Barbosa e Lya Wyler, as autoras do
verbete The Brazilian Tradition4, da Routledge Encyclopaedia of Translation
Studies5, editada por Mona Baker e publicada, em primeira edio, em 1998. Segundo
essas autoras, o primeiro documento oficial sobre o Brasil a Carta de Pero Vaz de
Caminha ao Rei Manuel I narra o descobrimento de novas terras e registra um ato de
traduo: descreve como os portugueses e os ndios tentavam se comunicar por meiode gestos e como um membro da frota de Cabral, Afonso Ribeiro, foi deixado com os
ndios para aprender sua lngua e, a partir de ento, servir como intrprete nas
interaes. Curiosamente, esses intrpretes eram conhecidos como os lnguas (p. 326).
Vejamos uma imagem que ilustra um lngua em plena atividade de intrprete, na tela
Descobrimento do Brasil de Oscar Pereira da Silva.
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Conforme amplamente discutido no primeiro curso, vrias importantes
contribuies apresentaram reflexes sobre o traduzir e a traduo, refletindo sobre os
mtodos utilizados pelos vrios tradutores. Vocs puderam ver, ento, como o assunto
foi tratado ao longo do tempo e onde as reflexes eram publicadas: tipicamente, osprprios tradutores escreveram sobre sua maneira de traduzir no prefcio de suas
tradues. At a segunda metade do sculo XX, as reflexes em forma de artigo
acadmico eram publicadas de forma aleatria, espalhadas em peridicos de campos
disciplinares j estabelecidos (por exemplo, a Lingstica Aplicada ou a Literatura
comparada), ainda no constituindo um conjunto de conhecimentos agrupados num
campo especfico. O que faltava, ento, at a segunda metade do sculo XX, era a
constituio desse campo de estudos que tem como objeto de investigao a traduo aqui entendida em seu sentido mais amplo como um campo disciplinar
institucionalizado.
Tal situao foi percebida por um pesquisador chamado James S. Holmes que,
em um congresso de lingstica aplicada, sediado em Estocolmo, em 1972, apresentou
um trabalho hoje reconhecido pela comunidade acadmica como texto fundacional,
no sentido mesmo de constituir a fundao desta rea do conhecimento em que
sugeriu um nome para esse campo de investigao cientfica: Estudos da Traduo.
Esse trabalho de Holmes The name and nature of Translation Studies [O nome e a
natureza dos Estudos da Traduo] apresentado oralmente em 1972 s chegou a ser
publicado 16 (dezesseis) anos depois, em 1988. Recentemente, foi includo entre os
textos considerados centrais da rea, reunidos em um volume organizado por Lawrence
Venuti6, no ano 2000. importante lembrar que o fato de o trabalho de Holmes ter sido
includo nessa coletnea uma evidncia de seu reconhecimento como texto
fundacional, pela comunidade cientfica da rea.
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Holmes fez um mapeamento do novo campo disciplinar como uma cincia. Seu
mapeamento foi desenhado por vrios pesquisadores. Abaixo, o mapa de Pagano &
Vasconcellos7, publicado em 2003, na revista Delta8 e apresentado no III Congresso
Interamericano de Traduo e Interpretao CIATI- 2004, transcrito como uma
forma de visualizao da proposta de Holmes.
A relevncia de se fazer o mapeamento de um campo disciplinar pode ser
argumentada em, pelo dois menos, dois aspectos: (i) a insero do praticante em um
campo disciplinar especfico, contribuindo para a constituio de seu status de
profissional, e (ii) a conscientizao desse profissional com relao aos possveis
desdobramentos e expanses do campo disciplinar no qual est inserido. Com relao
aos desdobramentos, observe-se, por exemplo, na figura acima, que, em 1972, Holmes
no mencionou estudos de traduo baseados em tecnologia (traduo apoiada por
computador), nem mesmo a interpretao. Claro, as tecnologias no estavam ainda
desenvolvidas e o ofcio de intrprete no tinha, ainda, se institucionalizado, de forma a
merecer a ateno dos pensadores da rea. No entanto, algumas poucas dcadas depois,
novos mapeamentos sugerem possibilidades de sub-campos sequer vislumbrados no
mapeamento de Holmes. Vejamos, por exemplo, os resultados de um mapeamento feito
no contexto brasileiro, a partir de pesquisa em universidades pblicas e particulares, em
2003. Aqui, neste novo mapa, novos desdobramentos surgem, sob a denominao geral
Estudos da Traduo.
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Como pode ser observado, neste 'mapa' j aparecem os Estudos Intersemiticos
sobretudo relacionados a tradues de romances para teatro; no ramo aplicado da
disciplina, sub-reas como 'Traduo e computador' j aparecem em cena; no ramo
descritivo, por exemplo, entram em cena os Estudos baseados em corpus eletrnico,
outra novidade no prevista por Holmes, decorrente dos desenvolvimentos tecnolgicos.
interessante observar que os estudos de Interpretao tambm no se fazem
presentes nesse mapa.
Mas, os desdobramentos no param por a. Vejamos, por exemplo, a proposta de
mapeamento de Williams & Chesterman, 2002, em seu livro The Map9, (literalmente,
O Mapa), proposta aqui 'desenhada' para facilitar a visualizao.
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O mapeamento de Williams & Chesterman divide o 'territrio da traduo' em
12 (doze) reas, que contemplam, agora, a rea 'Interpretao' rea 9 estabelecida e
consolidada no campo disciplinar Estudos da Traduo. Cumpre observar que, na
descrio dessa rea 9 Interpretao os autores agrupam os diferentes tipos de
interpretao em tpicos; um deles Tipos Especiais de Interpretao
interpretao de lnguas de sinais e interpretao para surdos.
Se fizermos uma rpida visita ao stio daquela que , talvez, a mais importante
editora de obras vinculadas aos Estudos da Traduo no mundo ocidental St. Jerome
Publishing10, vamos verificar que novos interesses disciplinares emergem, adquirindo
importncia e sendo apresentados como reas sistematizadas e consolidadas, como o
caso de interpretao de lnguas sinalizadas (signed languages), que passam a
constituir ramos do campo disciplinar na atualidade. As vrias reas apresentadas no
referido stio, em visita no dia 08 de maio de 2008, so transcritas abaixo, em traduo
para o portugus brasileiro:
1 Traduo Multimdia e Audiovisual2 Traduo Religiosa e Bblica3 Bibliografias
4Interpretao para a Comunidade/ Interpretao de Dilogo/Interpretao para Servio Pblico
5 Interpretao Simultnea e de Conferncia6 Estudos Comparativos e Contrastivos7 Estudos Baseados em Corpus
8 Interpretao Legal e Jurdica9 Avaliao /Qualidade /Avaliao /Testes
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10 Histria da Traduo e Interpretao11 Estudos Inter-Culturais12 Estudos de Interpretao13 Traduo Literria
14 Traduo (auxiliada) por Computador15 Trabalhos de Mltiplas Categorias16 Estudos Orientados ao Processo17 Metodologia de Pesquisa18 Interpretao de Lnguas Sinalizadas19 Traduo Tcnica e Especializada20 Terminologia e Lexicografia21 Gnero e Traduo22 Traduo e Ensino de Lnguas
23 Traduo e Poltica24 Traduo e a Indstria da Lngua25 Polticas de Traduo26 Teoria de Traduo27 Formao de Tradutor e Intrprete
Observando-se a lista acima, possvel verificar que os
desdobramentos atuais dos ramos dos Estudos da Traduo cobrem um
repertrio mais amplo de interesses disciplinares e refletem desenvolvimentosrecentes, para alm das reas mais tradicionais de pesquisa. interessante
observar que a interpretao, enquanto ramo consolidado dos Estudos da
Traduo, citada em 07 (sete) das 27 (vinte e sete) entradas: (4) Interpretao
para a Comunidade/ Interpretao de Dilogo/ Interpretao para Servio
Pblico; (5)Interpretao Simultnea e de Conferncia; (8) Interpretao Legal
e Jurdica; (10) Histria da Traduo e Interpretao; (12) Estudos de
Interpretao; (18) Interpretao de Lnguas Sinalizadas; e (27) Formao de
Tradutor e Intrprete.
Se compararmos os vrios mapeamentos aqui apresentados, podemos
verificar a trajetria da interpretao em direo a um espao institucionalizado
dentro dos Estudos da Traduo. Vale uma observao com relao ao item (18)
Interpretao de Lnguas Sinalizadas (em ingls, Signed Language
Interpreting): existe uma distino em estudos de lnguas de sinais entre as
lnguas sinalizadas e as lnguas de sinais11, que, aparentemente, passou
desapercebida.O Dictionary of Translation Studies12 invoca os tericos Brennan &
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Brien13 (1995, p. 117) para explicar lnguas sinalizadas [SIGN SUPPORTED
LANGUAGES] por exemplo, o ingls sinalizado como lnguas faladas
transmitidas visualmente, que se diferenciam de lnguas de sinais por exemplo, a
Lngua de Sinais Americana (ASL) como lnguas que possuem estrutura
independente prpria, totalmente desenvolvida e que funcionam como a lngua
nativa ou primeira lngua de indivduos que so surdos de nascena. Assim,
enquanto uma lngua sinalizada tenta repetir a estrutura de uma lngua oral (por
exemplo, o portugus), por meio de gestos e sinais, uma lngua de sinais uma
lngua formal e independente que tem uma estrutura prpria. Quando dizemos que
parece ter havido falta de entendimento da distino por parte da St. Jerome
aparentemente usando signed language como sinnimo para sign language,
estamos nos baseando em evidncia oferecida pela prpria editora St. Jerome:
embora sua lista de categorias dentro dos Estudos de Traduo tenha mencionado
signed language (lngua sinalizada), esta mesma editora acaba de lanar uma srie
nova intitulada The Sign Language Translator and Interpreter14, cujo volume 1,
nmero 1 foi publicado em 2007 o que comprova a emergncia de um novo ramo
de investigao Sign language e no Signed language. Um dos artigos do volume
refere-se Interpretao de Lnguas de Sinais15 (em ingls, Sign Language
Interpreting) com um territrio ainda no descrito no mapa (p. 16) (traduo
nossa). Observe-se que a metfora do mapa para delinear os contornos e construir
a identidade de um campo disciplinar tem sido constantemente utilizada pelos
pesquisadores.
Em consonncia com a situao no contexto internacional ocidental (aqui
representado pela St. Jerome Publishing), em que a rea de Interpretao em
Lnguas de sinais adquire proeminncia, no contexto brasileiro, especificamente no
contexto da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), o intrprete da lnguabrasileira de sinais Libras adquire visibilidade nunca antes conseguida: no
recente evento da posse do novo Reitor da UFSC, na cerimnia ocorrida em 10 de
maio de 2008, uma equipe de intrpretes de Libras solicitada pela reitoria e, no
incio dos trabalhos, o Mestre de Cerimnia apresenta oficialmente esses intrpretes
audincia, agradecendo sua participao.
interessante observar que a rea 27 Formao de Tradutor e Intrprete se
mantm como preocupao desse campo disciplinar, que busca desenvolver, nomomento atual, recursos institucionalizados para a preparao de seus futuros membros
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(os futuros tradutores e intrpretes) e para sua insero no mercado de trabalho. Sobre a
institucionalizao dos Estudos da Traduo e a criao de cursos universitrios para a
formao de tradutores e intrpretes, sugerimos a leitura os artigos agrupados sob a
denominao Os caminhos da institucionalizao dos Estudos da Traduo no Brasil,
trabalhos organizados por Joo Azenha Jr.: (i) A institucionalizao dos Estudos da
Traduo no Brasil: o curso de Letras, Tradutores e Interpretes da Unibero, escrito por
Adauri Brezolin e (ii) O curso de traduo na Universidade de So Paulo (USP):
algumas reflexes sobre seu momento fundador, escrito por Joo Azenha Jr.. Esses
artigos esto disponibilizados no stio do Grupo de Trabalho de Traduo GT de
Traduo da ANPOLL16 [Associao Nacional de Ps-Graduao em Letras e
Lingstica].
Ainda publicado pela St. Jerome Publishing, o primeiro volume em 2007
intitulado The Sign Language Translator & Interpreter [Traduo & Interpretao
de Lngua de Sinais] Volume 1 2007 e o Volume 2 em 2008, editado por Thierry
Haesenne e Lorraine Leeson, membros do Institut Libre Marie Haps [Institudos de
Libras Marie Haps] da Blgica e Centre for Deaf Studies [Centro de Estudos Surdos]
de Dublin respectivamente. Isso demonstra o crescimento da pesquisa em traduo e
interpretao de lnguas de sinais no campo disciplinar dos estudos da traduo.
Aps toda essa reflexo, voc j percebeu a distino entre traduo e/ou
interpretao e Estudos da Traduo enquanto campo disciplinar estabelecido.
Como foi dito anteriormente, o mapeamento de um campo disciplinar contribui para a
construo da identidade profissional de seus membros e possibilita sua formao, em
bases consolidadas.
Em termos da formao do profissional do campo disciplinar, quais seriam os
tipos de cursos que os Estudos da Traduo enquanto disciplina estabelecida
podem oferecer aos seus futuros profissionais? O que voc esperaria de um curso detraduo formal, em uma instituio superior de ensino, como a Universidade Federal
de Santa Catarina? Essas so as questes que iremos discutir na Unidade II de nosso
curso.
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UNIDADE 2 - Os tipos de formao que os Estudos da Traduo podem oferecer aosseus membros e os tipos de competncias necessrias aos profissionais da rea
Nesta unidade, vamos estudar os tipos de formao que os Estudos da Traduo
podem oferecer aos seus membros e os tipos de competncias necessrias aosprofissionais da rea. Inicialmente, ser feito um levantamento quanto s suas
expectativas e crenas, no que diz respeito aos tipos de saberes/conhecimentos a serem
construdos em um curso de traduo. A partir de uma anlise de suas respostas, vamos
discutir algumas propostas relativas s competncias a serem desenvolvidas pelo
tradutor/intrprete.
Na Unidade 1, voc se familiarizou com os Estudos da Traduo enquanto
campo disciplinar estabelecido e consolidado e tomou conhecimento dos vrios ramosdessa disciplina, sempre em constante expanso, em atendimento s necessidades do
mundo moderno. No final da unidade, ficamos com perguntas a respeito dos
conhecimentos especficos dos Estudos da Traduo e a respeito das maneiras de formar
futuros tradutores, intrpretes e pesquisadores: Quais seriam os tipos de saberes a serem
construdos neste campo disciplinar? Que tipo de formao os Estudos da Traduo
podem oferecer aos seus futuros profissionais por meio de instruo formal? Antes de
partirmos para uma tentativa de responder essas perguntas, vamos, inicialmente, refletirsobre as suas expectativas quanto a um curso de traduo formal, instalado em uma
grade curricular de um Bacharelado em Letras Libras no Brasil. Faremos essa
reflexo, neste momento inicial, tratando a traduo e a interpretao enquanto reas
irms, do mesmo campo disciplinar Estudos da Traduo, concordando com alguns
tericos, como por exemplo, Daniel Gile17 (1995), que a formao, tanto de tradutores
quanto de intrpretes, calcada em conceitos bsicos, comuns aos dois tipos de
atividade tradutria.
Para as reflexes iniciais, vamos partir de um questionrio que voc deve
responder, com base em sua experincia. Este questionrio foi inspirado no livro de
Williams & Chesterman (2002) The Map A Beginners Guide to Doing Research in
Translation Studies, j mencionado na Unidade 2.
Aps ter respondido ao questionrio e ter refletido sobre as questes nele
includas vamos agora, comparar/examinar as respostas que emergiram dos
questionrios com a proposta de um terico quanto aos possveis tipos de curso que os
Estudos da Traduo podem oferecer.
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Veja a tabela com um sumrio desta proposta.
Como voc pode observar na tabela, Mossop18 (1994)sugere 03 (trs) tipos de
cursos. Repare que ele menciona cursos de Teoria de Traduo, o que, neste nossocontexto, equivale a Estudos da Traduo, uma vez que teorizar para Mossop (ibid.)
e para os ministrantes deste curso faz parte do olhar sobre a prtica e da
institucionalizao do ofcio, portanto, constituindo a natureza dos Estudos da
Traduo. Entretanto, para fazer uma distino entre estudos desenvolvidos em nvel de
graduao e estudos desenvolvidos em nvel de ps-graduao, Mossop reserva a
expresso Estudos da Traduo para os ltimos. Mossop fez essa manobra
metodolgica; porm, conforme vimos na Unidade 1, o nome Estudos da traduo foiadotado para o campo disciplinar que inclui tanto estudos de graduao, como estudos
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de ps-graduao, bem como a prtica e a reflexo sobre ela, diferentemente do uso que
ele fez.
Os trs tipos sugeridos so:
Tipo 1: Mtodos de traduzir
Tipo 2: Estudos da Traduo
Tipo 3: Conceitos de tradutor
Observe, na tabela, que, na primeira coluna esquerda, o autor lista as categorias
que vai usar para descrever os cursos, a saber: (i)Audincia e Objetivos; (ii)Metas; (iii)
Conceito de Teoria que informa o curso; (iv) Perguntas Tpicas; (v) Tarefas a serem
executadas pelos alunos; e, finalmente, as (vi) Leituras Recomendadas. Passemos,
agora, a considerar os Tipos de Cursos, luz dessas categorias.
Segundo (i) Audincia e Objetivos, o Tipo 1 e o Tipo 3 compartilham as
caractersticas de serem direcionados a alunos de graduao (como vocs) e de terem
como objetivo formar os profissionais da rea; nesse mesmo quesito, o Tipo 2 se destina
a alunos de ps-graduao e tem como objetivo formar pesquisadores e professores,
perfil no qual voc, neste momento de sua formao, no se enquadra. Assim, vamos
concentrar nossa ateno nos cursos do Tipo 01 e Tipo 03, para termos uma perspectiva
mais pontual dos contedos a serem desenvolvidos emnosso curso.
As categorias (ii) Metas e (iv) Perguntas Tpicas so importantes para explicar
nossos trabalhos. Com relao a (ii) Metas, do curso Tipo 1, vamos explorar a meta
aprender solues disponveis para categorias de problemas, ao discutirmos as
maneiras de definir, estruturar e lidar com o que se constitui como problema de traduo
para cada tradutor/intrprete individual; do curso Tipo 3, j exploramos a meta
questionar crenas sobre traduo quando discutimos os resultados dos
questionrios e vamos explorar as metas refletir sobre o que fazem os tradutores... e
aprender um conjunto de conceitos e termos para discutir a traduo. Com relao a(iv) Perguntas Tpicas, do curso Tipo 1, vamos explorar a meta qual a melhor maneira
de traduzir este texto? ao tratarmos a questo da fidelidade, na Unidade 3.
A proposta de Mossop (ibid.) foi trazida para nossas discusses para nos
possibilitar uma comparao ou exame das respostas de algumas das perguntas do
questionrio aplicado, com um quadro de possveis contedos de cursos em Estudos de
Traduo. Aps toda essa discusso sobre tipos de curso e as possibilidades reais de
nosso curso, vamos refletir sobre os tipos de competncias necessrias aos profissionaisda rea dos Estudos da Traduo. Que tipos de saberes esses profissionais devem
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construir?
Vamos lidar com essa pergunta com a ajuda de dois pesquisadores brasileiros, j
que estamos tratando de cursos no contexto nacional. O primeiro um professor da
Universidade de so Paulo USP, Francis Aubert, cujo pensamento est expresso no
livro As (In)Fidelidades da Traduo: servides e autonomia do tradutor19, publicado
em 1993. O segundo um jovem pesquisador da Universidade Federal de Ouro Preto
UFOP, MG, Jos Luiz Gonalves, que, em co-autoria com Ingrid Nunes Machado,
publicou um artigo intitulado Um panorama do ensino de traduo e a busca da
competncia do tradutor20, publicado no peridico Cadernos de Traduo XVII 2006-
121.
Aubert (ibid.), no seu livro, afirma que a traduo envolve, no mnimo, dois tipos
de competncias, a saber: (i) competncia lingstica e (ii) competncia referencial.
Embora suas reflexes estejam diretamente ligadas traduo (enquanto atividade
tradutria escrita, de textos escritos), elas podem ser estendidas interpretao
(enquanto atividade tradutria oral, de textos orais), uma vez que tratam de
competncias comuns s duas modalidades. A competncia lingstica diz respeito ao
domnio dos cdigos lingsticos que esto em contato no ato tradutrio, incluindo
entendimento, por parte do tradutor/intrprete, de questes ligadas ao lxico, sintaxe,
morfologia, etc. importante salientar que essa competncia deve ser desenvolvida para
as duas lnguas em contato: a lngua que, para o tradutor/intrprete estrangeira L2
e aquela que lhe materna, L1. Esse comentrio fundamental porque, tipicamente, o
domnio da lngua materna relegado a um segundo plano, uma vez que se assume esse
conhecimento como um fato dado, como se apenas ser falante nativo de uma lngua j
conferisse ao falante o saber especializado sobre sua lngua. A competncia lingstica
uma condio essencial ou seja, sem ela no possvel realizar um ato tradutrio
mas no suficiente ou seja, apenas o conhecimento dos dois cdigos no faz de umindivduo um tradutor/intrprete. O que mais seria necessrio ao exerccio da atividade
tradutria?
Francis Aubert (ibid.) menciona, ento, a competncia referencial. Para
entendermos o que Aubert quer dizer por essa, precisamos entender o termo
referencial, conforme usado nesse contexto. Para tanto, vamos nos remeter ao conceito
de signo, proposto por Ferdinand de Saussure, o lingista suo cujas elaboraes
tericas propiciaram o desenvolvimento da lingstica enquanto cincia. Em seu Coursde Linguistique Gnrale (Curso de Lingstica Geral, obra publicada em 1915 e ainda
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hoje leitura obrigatria para estudantes e pesquisadores de lingstica), o lingista
definiu signo como uma combinao de um conceito (significado signifi, em
francs) com uma imagem (significante signifiant, em francs). Em termos simples,
o signo est ligado ao referente, que o objeto real (ou uma realidade abstrata) a que o
signo se refere. Para entender o conceito de referente, veja um exemplo, retirado do stio
http://criarmundos.do.sapo.pt/Linguistica/pesquisalinguagem001.html: o signo
rvore constitudo pela palavra escrita rvore e pelo conceito de rvore (uma
planta com um tronco e ramos grossos, coberta por um nmero incontvel de folhas
verdes), que qualquer pessoa poder apontar no mundo real (objeto fsico e real) como
referente.
Segundo Aubert (ibid.), a competncia referencial se refere ao desenvolvimento
da capacidade de buscar conhecer e se familiarizar com os referentes dos diversos
universos em que uma atividade de traduo/interpretao pode ocorrer. Em outras
palavras, um tradutor/intrprete pode no tercompetncia referencial no universo da
medicina, por exemplo, mas pode aprender a buscar esse conhecimento por meio de
estratgias especficas. Algumas formas de adquirir o domnio dessas estratgias sero
exploradas na Unidade 4 de nosso curso. Aubert (ibid.) faz uma distino entre a
situao ideal e a situao real da reao de tradutores/intrpretes com suas
respectivas competncias.
Relao IDEAL dos tradutores/intrpretes comsuas competncia: domnio semelhante do(s)
cdigo(s) e dos referentes.Domnio do cdigo fonte: Excelente
Domnio do referente fonte: ExcelenteDomnio do cdigo alvo: Excelente
Domnio do referente alvo: Excelente
Relao REAL dos tradutores/intrpretes com suascompetncias: domnio diferenciado do(s) cdigo(s)
e do(s) referente(s).H um desequilbrio de competncias
O domnio dos cdigos22 e do referente no sosempre excelentes
O que se observa, nas situaes de trabalhoprofissional, a situao representada abaixo:
Competncia lingstica > competncia referencial
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Para minimizar os efeitos dessa diferena de competncias, o tradutor/intrprete
pode desenvolver estratgias de busca, o que, como sinalizado acima, ser parte do
contedo da Unidade 4 de nosso curso.
O segundo pesquisador brasileiro que estamos convocando para nos ajudar a
entender as competncias do tradutor/intrprete Jos Luiz Gonalves, que, em co-
autoria com Ingrid Nunes Machado, buscou apresentar um panorama do ensino de
traduo no Brasil e, sobretudo, tentou contribuir para o entendimento da competncia
tradutria, em artigo publicado em Cadernos XVII 2006.1 p. 57. Em seu estudo, esses
autores chegaram ao quadro de competncias transcrito nesta figura.
Como pode ser observado na figura, os autores apresentam dezessete categorias
de competncias. Vamos salientar algumas dentre essas categorias, que sero relevantes
para nosso curso e para os outros cursos de Estudos de Traduo que voc ir fazer.
Veja a categoria 1 Competncia lingstica na lngua materna; e veja a
categoria (3) Competncia lingstica a ser desenvolvida na lngua estrangeira. Essas
duas categorias foram mencionadas acima, quando da discusso da competncia
lingstica: o importante aqui lembrar que saber apenas a lngua estrangeira como uma crena comum entre iniciantes e entre leigos no suficiente; necessrio,
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tambm, um conhecimento slido da primeira lngua lngua nativa ou L1 do
tradutor/intrprete, j que, traduzir/interpretar produzirtexto, habilidade essa que no
vem, automaticamente, com o conhecimento de falante nativo
Observe agora a categoria (8) Terminologia; e veja a categoria (11)
Conhecimentos relacionados ao uso de fontes de documentao. Que relao voc pode
estabelecer entre a categoria (8) e a competncia referencial, mencionada por Aubert
(ibid.)? E o que essa categoria teria a ver com a categoria (11)? Como seria possvel
usar as fontes de documentao para colaborar com a categoria (8)?
Se explorarmos a categoria (12) Tecnologias que podem ser aplicadas
traduo como podemos fazer uso de tecnologias para auxiliar em (8) e (11)? Essas
categorias sero exploradas no curso Estudos da Traduo II.
Por sua vez, a categoria (6) Conhecimento de ambas as culturas das lnguas de
trabalho ser explorada no curso Estudos da Traduo III.
Finalmente, cumpre salientar que a categoria (13) Conhecimentos operativos
/procedimentais ser explorada em outra unidade que ir discutir um elenco de
conhecimentos que podem ser construdos e ativados para possibilitar a voc o
reconhecimento, a definio e a estruturao de seu problema de traduo, e o uso de
estratgias para solucion-lo.
Para finalizar nossa unidade, vamos retomar as questes que abriram nossas
reflexes: Quais seriam os tipos de saberes a serem construdos neste campo
disciplinar? Que tipo de formao os Estudos da Traduo podem oferecer aos seus
futuros profissionais por meio de instruo formal? Voc vai poder refletir sobre estas
perguntas ao fazer as atividades referentes Unidade 2.
Antes de concluirmos, convidamos voc a dar mais um passo adiante em sua
formao como tradutor/intrprete: voc convidado a pensar sua responsabilidade
em termos da autonomia quanto distncia entre o texto que voc esttraduzindo/construindo na lngua de chegada o texto de chegada e o texto que serviu
de fonte par sua produo textual -o texto de partida (texto original). Ficamos, ento,
com as perguntas: A que devemos ser fiis quando realizamos uma traduo? Como
nosso contexto histrico-social vai afetar nossa produo do texto traduzido? Que tipo
de interveno podemos fazer e ainda estar produzindo uma representao fiel do
texto de partida? Essas e outras questes sero tratadas na prxima unidade.
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UNIDADE 3 - A questo da fidelidade: uma abordagem terico/emprica
Nesta unidade, vamos visitar um conceito comumente usado como categoria
para definir a qualidade de trabalhos de traduo/ interpretao: a fidelidade. Para
tanto, vamos nos valer de (i) as discusses de cunho mais filosfico da pesquisadora
brasileira Rosemary Arrojo (1986), que a partir do final da dcada de 80, problematizou,
de forma rigorosa e marcante, o conceito de fidelidade, e (ii) um experimento realizado
pelo pesquisador canadense, Daniel Gile (1995), que props um conjunto de conceitos e
modelos bsicos para a formao de tradutores e intrpretes. Em seu Captulo 4 A
questo da fidelidade Arrojo (ibid.) discute os principais problemas tericos que
envolvem a pergunta: a que devemos ser fiis quando realizamos uma traduo? A
pesquisadora questiona a possibilidade de uma traduo ser inteiramente fiel ao texto
original, propondo uma redefinio do conceito. Em seu Captulo 3 Fidelity in
Interpreting and Translation [Fidelidade em Interpretao e Traduo] Gile (ibid.)
prope uma abordagem emprica questo da fidelidade, resultado de seu trabalho com
alunos de curso de traduo e interpretao, no contexto alemo. O objetivo da unidade,
portanto, contribuir para o entendimento da natureza do conceito de fidelidade de tal
forma a possibilitar o entendimento da autonomia do tradutor/intrprete cuja leitura
do texto de partida , inevitavelmente, um produto de sua poca, suas concepes
tericas, suas realidades.
Na Unidade 2, voc se familiarizou com os tipos de formao que os Estudos da
Traduo podem oferecer aos seus membros e com alguns tipos de competncias
necessrias aos profissionais da rea. Voc teve a oportunidade de pensar e repensar
suas crenas quanto traduo/interpretao e quanto s suas expectativas em relao a
cursos formais de traduo/interpretao. E, finalmente, dialogou com alguns tericos,
que se debruaram sobre a questo das competncias tradutrias. Ao final da unidade 2,
voc foi convidado a dar mais um passo adiante, no sentido de pensar suaresponsabilidade enquanto tradutor/ intrprete em termos de sua autonomia quanto
distncia entre o texto de partida (texto original) e o texto que est sendo construdo
na lngua de chegada (texto de chegada).
Nesse contexto vamos visitar um conceito comumente usado como categoria
para definir a qualidade de trabalhos de traduo/ interpretao: a fidelidade.
O Dictionary of Translation Studies23 (1997) se refere a esse conceito no verbete
Faithfulness (ou Fidelity), usando os dois termos faithfulness e fidelity comosinnimos, afirmando que qualquer distino entre eles seria artificial: Termos gerais
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usados para descrever at que ponto um texto traduzido (Target Text TT) pode ser
considerado uma representao justa de um texto fonte (Source Text ST), segundo
algum critrio (itlicos adicionados). A considerao dos dois termos como
sinnimos24 tambm aparece no dicionrio do stio answer.com.
No verbete do Dictionary of Translation Studies (ibid.), os autores afirmam que,
em discusses de cunho mais tradicional, o conceito de fidelidade provavelmente tem
sido a medida mais usada para se falar de qualidade de traduo/interpretao. Voc
mesmo j deve ter se visto em situaes em que comentou sobre alguma traduo, ou
alguma legenda de filme, dizendo: Esta traduo melhor do que as outras porque
mais fiel.... Se isso aconteceu com voc, voc no est sozinho: tradicionalmente, a
fidelidade tem sido invocada para marcar uma aderncia literal ao texto de partida, o
que tem sido considerado como valor positivo. Entretanto, o que tipicamente acontece
que os usurios do termo fidelidade no se preocupam em defini-lo, o que vem por
conferir uma qualidade generalista e, sobretudo, vaga a qualquer avaliao nele
baseada: o conceito , geralmente, associado a apenas um dos aspectos da traduo, qual
seja, sua relao com um texto de partida. Se observarmos na definio retirada do
verbete do Dictionary of Translation Studies, as partes salientadas ressaltam essa
necessidade de definio: seria fundamental, no mnimo, dizer at que ponto, segundo
qual critrio, seria possvel afirmar que uma traduo ou interpretao boa porque
fiel. Afirmar que um trabalho de traduo bom por ser fiel, como voc pode ver,
fidelidade um conceito mais complexo do que inicialmente imaginado, portanto
merecedor de nossa ateno.
Para fins do trabalho nesta unidade, vamos nos valer de duas abordagens
questo da fidelidade: (i) a primeira, de cunho conceitual, faz uma discusso filosfica
do conceito, com ancoragem no pensamento da terica brasileira, Rosemary Arrojo,
sobretudo a partir de um livro da Srie Princpios25, publicado em 1986, cujo Captulo4 trata, especificamente, da questo da fidelidade; (ii) a segunda abordagem, de cunho
mais emprico, buscar replicar um experimento feito pelo terico canadense, Daniel
Gile, relatado no livro Basic Concepts and Models for Interpreter and Translator
Training26, publicado em 1995, no qual o autor prope um conjunto de conceitos e
modelos bsicos para a formao de tradutores e intrpretes, levando em conta o
contexto em que comunicao onde a traduo/interpretao ocorre.
Vamos iniciar, ento, com o pensamento de Arrojo (ibid.). Essa terica discuteo processo de construo de significado, mostrando que uma palavra no tem um
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sentido fixo e nico, imediatamente decifrvel por qualquer indivduo. Assim, no
existe uma linguagem capaz de neutralizar as ambigidades, os duplos sentidos, as
variaes de interpretao, as mudanas trazidas pelo tempo ou pelo contexto (p. 17).
Ao trazer essa discusso para a traduo, Arrojo (ibid.) questiona o conceito de
fidelidade enquanto transferncia total dos significados de um texto em uma lngua,
para outro texto em outra lngua, argumentando que nenhuma traduo capaz de
recuperar a totalidade do original, j que revela, inevitavelmente, uma leitura, uma
interpretao desse texto e no o transporte de seu contedo para uma nova lngua:
(...) o que acontece no uma transferncia total de significado, porque o prprio
significado do original no fixo ou estvel e depende do contexto em que ocorre (p.
23). Aubert (1993), cuja obra j foi introduzida na Unidade 2 tambm problematiza o
conceito de fidelidade, ao questionar o que ele chama de diversas servides a que o
tradutor est submetido, ele mostra a impossibilidade de esse tradutor ser um canal livre
de obstrues passagem plena do texto original sua nova configurao lingstica
(p. 7). Na disciplina Introduo aos Estudos da Traduo, voc teve contato com os
pensamentos de Borges, que, em linhas similares, v a traduo como criao.
Se admitirmos, com esses tericos, que o tradutor no poder evitar que seu
contato com os textos seja mediado por suas circunstncias, suas concepes e seu
contexto histrico e social (Arrojo, p. 38), como fica a questo da fidelidade? Arrojo
(ibid.) responde essa pergunta com um exemplo de uma situao imaginria: um
concurso de fantasias realizado em So Paulo, em meados da dcada de 20, durante uma
festa, cujo ttulo proposto pela autora Clepatra, Rainha do Nilo. Esses exemplos
esto no livro Oficina de Traduo, na sub-seo Uma Clepatra melindrosa27.
Como suas reflexes demonstram, cada Clepatra ser fiel concepo do contexto
scio-histrico-temporal da dcada de 20, quando est acontecendo o concurso.
Ento, como fica a questo da fidelidade? Arrojo (ibid.) prope uma redefiniodo conceito. Leia o segmento retirado das pginas 42-45, de seu livro, sobre A
fidelidade redefinida28.
Aps a leitura dos textos fica a pergunta proposta no incio da unidade: a que
devemos ser fiis quando realizamos uma traduo?
A discusso filosfica do conceito de fidelidade apoiada no pensamento de
Arrojo (ibid.) serviu de base terica para comearmos a problematizar uma noo que
parecia bvia e simples, antes de comearmos esta unidade. Como sugerimos, oconceito complexo e merece nossa ateno. Aubert29 (1989, p. 116) nos lembra que
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(...) o compromisso de fidelidade no se define to somente na direo do original. (...)
o tradutor h de ter (...) um compromisso de fidelidade tambm para com as
expectativas, necessidades e/ou possibilidades dos receptores finais. Ou, mais
apropriadamente, com a imagemque tal tradutor faz de tais expectativas, necessidades
e possibilidades. Observe que tambm Aubert (ibid.), como Arrojo (ibid.), nos aponta
que, inevitavelmente, construmos imagens da realidade no caso da citao,
representamos aquilo que imaginamos que sejam as expectativas, necessidades e
possibilidades do pblico-alvo de nossa traduo e produzimos um texto que busque
atender a esse novo contexto. Mas, atender como? At onde podemos ir nas
intervenes feitas durante a a construo do texto de chegada?
Passemos, ento, abordagem de cunho mais emprico, para replicar o
experimento realizado por Gile (1995). O autor abre o captulo comentando que a
fidelidade o conceito mais invocado para avaliar tradues e mostra que o problema
mais bvio com essa atitude est no fato de as lnguas no serem isomrficas, ou seja,
no existe correspondncia par-a-par entre os seus elementos constitutivos. Alm desse
problema, existe a questo da inevitvel interveno do tradutor/intrprete, como
conseqncia de seu contexto histrico-scio-temporal.
Entretanto, conforme menciona Gile (ibid., p. 49-50), os alunos encontram
dificuldade em aceitar a idia de que mudar uma construo ou adicionar ou apagar
palavras durante a traduo no significa uma quebra de fidelidade. Chegam
universidade com a idia congelada de fidelidade-como-correpondncia-um-a-um. A
conseqncia que tendem a ser conservadores em seu processo-de-tomada-de-deciso
ao traduzir/interpretar. Ser que isso acontece com voc tambm? o que vamos
descobrir a seguir.
Para questionar essa postura conservadora, Gile (ibid.) realiza um experimento
para ajudar seus alunos a entender a fidelidade, sugerir estratgias para lidar com oconceito durante a tarefa tradutria e para ao final demonstrar a possibilidade de
certo grau de liberdade no processo de traduo, sem culpa ou sensao de
infidelidade por parte do tradutor/intrprete. Vamos replicar esse experimento aqui
com algumas adaptaes para ver como voc responde. Voc ser solicitado a fazer
uma traduo intersemitica, conforme a definio de Jakobson (1958) com a qual voc
teve contato na primeira disciplina de traduo de seu curso.
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Veja a figura abaixo e leia as instrues:
Voc tambm participar desse experimento numa das atividades referentes
unidade 3. Vejamos, agora, a natureza das verbalizaes estudadas pelo autor. Mas, para
esta parte do trabalho, vamos precisar de uma linguagem comum, para nos
entendermos. Vamos utilizar um conceito de Gile (ibid.), o conceito de Mensagem (M)
para nos referirmos informao que um falante queira comunicar a outro e ao redor da
qual a declarao verbal a fala construda. Se aplicarmos esse conceito situaodo experimento que acabamos de realizar, vemos que a Mensagem (M) simples e, em
sua forma mais bsica, poderia ser verbalizada com um segmento como Paris a 50 km.
Entretanto, a mesma M, apresentada sob condies exatamente iguais, ao mesmo
tempo, a indivduos que tm a mesma lngua materna (portugus), poder ser expressa
com falas (fragmentos, sentenas, oraes complexas, etc.) semelhantes ou diferentes.
Algumas (i) podem conter apenas o ncleo ou a informao bsica da M; outras (ii)
podem expandir esta informao bsica, acrescentando segmentos de natureza variada(M + .....); outras, ainda, (iii) podem at mesmo omitir a M!!! Essa variao pode ser
IImmaagine que voc est sentado no interior do carro, ao lado do motorista. A certa altura,
voc v a placa de sinalizao, na estrada. Sem comentar com nenhum colega, escreva
em portugus exatamente o que voc falaria ao motorista para contar a ele o que a
placa diz ou seja, escreva o que voc verbalizaria.
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explicada pela diferena na maneira como cada indivduo percebe a M, pelas
suposies que faz com relao ao nvel e grau de entendimento de seu interlocutor ou
pela diferena na maneira como, dadas as suas circunstncias pessoais (histrico-scio-
temporais), esse indivduo decide verbaliz-la.
Alguns exemplos retirados de mais de trinta experimentos anteriores, realizados
pelo prprio Gile (ibid. p. 50), em mais de treze pases, e alguns exemplos retirados de
experimentos realizados em disciplinas de traduo do Curso de Letras da Universidade
Federal de Santa Catarina UFSC, nos ltimos seis anos, podem ajudar a entender
melhor a variao na forma de expressar a M. Veja a lista abaixo, contendo diferentes
verbalizaes da mesma M:
1. 50 km para Paris.2. S mais 50 km e chegamos a Paris.3. Vamos chegar a Paris daqui a 50 km.4. Paris est a 50 km daqui.5. Estamos quase l! Mais meia hora!6. Puxa, ainda falta tanto para Paris!7. Olha s! A placa diz que Paris est a 50 km daqui.
Por essa pequena amostra, vemos que emergem diferenas entre as sentenas.
Podemos observar que algumas das sentenas explicitam em sua forma bsica ou de
maneira expandida o ncleo da informao sobre a distncia at Paris (50 km); outras
apenas mencionam o destino (Paris), omitindo a informao sobre a distncia; outras
deixam transparecer o fato de que h mais de uma pessoa dentro do carro; outras, ainda,
acrescentam algum tipo de avaliao do falante seu alvio ou seu cansao com
relao ao fato de Paris estar a 50 km; finalmente, uma verbalizao no menciona o
destino ou a distncia. Em outras palavras, as sentenas diferem umas das outras em
termos de seu contedo informacional, em termos da relao do falante com esse
contedo e em termos daquilo que o falante imagina ser de conhecimento de seu
interlocutor.
Gile (ibid., p. 55) explica tais diferenas em termos de ganhos e perdas de
informao. Para ele, ganhos ocorrem quando as verbalizaes apresentam informaes
que no estavam presentes no texto de partida no caso da traduo intersemitica
realizada no experimento, o texto de partida a figura. Perdas, para ele, ocorrem quando
as informaes estavam presentes no texto de partida e so omitidas na produo dotexto de chegada.
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Gile (ibid.) se concentra nos ganhos de informao que ele denomina
Informao Secundria, em oposio Informao Primria expressa no ncleo
Mensagem (M) e busca, ento, classificar tais ganhos ou Informao Secundria,
respondendo pergunta: Por que alguns tradutores/intrpretes adicionam informao
M? A resposta a essa pergunta possibilitou ao pesquisador canadense classificar a
Informao Secundria em trs categorias diferentes: (i) Framing Information FI
[Informao Contextualizadora]; (ii) Linguistically Induced Information LII
[Informao Induzida/Motivada por questes Lingsticas]; (iii) Personal Information
PI [Informao Pessoal]. Passemos a uma explicao de cada uma delas.
Na primeira, (i) Framing Information FI [Informao Contextualizadora] a
palavra framing usada na expresso, sugere o acrscimo de informao para ajustar;
compor; enquadrar; emoldurar o significado da M, com o propsito de contextualizar o
significado sugerido no texto de partida, para o leitor de chegada. Da nossa sugesto da
traduo Informao Contextualizadora para a categoria de Gile (ibid.). Entretanto,
para facilitar nossa conversa sobre o tpico e para lembrar que estamos usando as
categorias desse terico, optamos por manter a sigla FI, para esse tipo de Informao
Secundria. No exemplo (7) acima Olha s! A placa diz que Paris est a 50 km daqui
o segmento sublinhado pode ser classificado como FI, uma vez que explicita a M e d
um claro contexto para ela. A FI um tipo de Informao Secundria muito usada
quando se trata de traduzir/interpretar termos culturalmente amarrados, como no
exemplo de traduo do portugus brasileiro para ingls, retirado do stio Maria-
Brazil30:
Docinhos brasileiros Served at birthday parties, weddings, and
any festive occasion, these are marvelous concoctions of eggs, sugar,and/or sweetened condensed milk, and a variety of fruits and nuts,
including coconut, dates, prunes, walnuts, Brazil nuts, peanuts, etc.
Observe que, em vez de optar por uma traduo literal algo do tipo Brazilian
sweets, o stio preferiu fazer uso de uma FI,com base no que imagina que o receptor
conhece da cultura brasileira.
Outros exemplos de insero de FI podem ser visualizados na tabela abaixo:
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Poltica doCaf-com-Leite
Coffee-and-Milk Policy, a policy of joint action in political and economicterms between the States of So Pauloand Minas Gerais, in the 1930s; theformer was the main coffee producer
and the latter the main milk producer.
[Poltica do Caf-com-Leite, umapoltica de unio de aes em termospolticos e econmicos entre osestados de So Paulo e MinasGerais, nos anos 30; era formado
pelo principal produtor de caf (SP)e pelo principal produtor de leite(MG).]
A FI adicionada, consciente ou inconscientemente, para ajudar o receptor da
M a entender a Mensagem a partir das formulaes verbais, muitas vezes com o suporte
visual, como no exemplo dos docinhos acima. Essa uma das razes pelas quais textos
de chegada (traduzidos) tendem a ser mais longos do que textos de partida. A esse
respeito, sugerimos ver a Hiptese de Explicitao, proposta por Blum-Kulka31
(1986,p. 19): Blum-Kulka conclui que (...) pode ser que a explicitao seja uma estratgia
universal inerente ao processo de mediao lingstica, conforme praticada tanto por
aprendizes de lnguas, como por tradutores profissionais e no-profissionais (traduo
nossa).
A segunda categoria de Informao Secundria, (ii) Linguistically Induced
Information LII [Informao Induzida/Motivada por questes Lingsticas]
refere-se ao tipo de informao cuja adio motivada por questes de adaptao ao
sistema lingstico de chegada. Ou seja, trata-se de fazer ajustes necessrios para que o
texto traduzido/interpretado esteja de acordo com as regras e convenes de uso
praticadas na lngua de chegada. Nesse caso, no o tradutor/intrprete que decide fazer
os ajustes eles so demandados por regras do sistema lingstico. No exemplo (3)
acima Vamos chegar a Paris daqui a 50 km o segmento sublinhado pode ser
classificado como LII, uma vez que ajusta a M s convenes da lngua portuguesa
coloquial informal: freqentemente se observa a omisso do pronome reto em Lngua
Portuguesa32; isso se d porque as formas verbais marcam, atravs de suas desinncias,
as pessoas do verbo indicadas pelo pronome reto (ex.: Dormi cedo ontem; Fizemos boa
viagem). Lembremos que, para facilitar nossa conversa sobre o tpico e para lembrar
que estamos usando as categorias de Gile, optamos por manter a sigla LII para nos
referirmos a esse tipo de Informao Secundria.
Como a LII no adicionada por deciso do tradutor/intrprete, no reflete o
seu estilo individual; adicionada para garantir a produo de um texto lingisticamente
aceitvel e compreensvel pelos receptores da lngua de chegada. Usando a terminologia
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de Aubert (1993), podemos dizer que a LII tem a ver com a competncia lingstica em
L2, condio necessria, embora no suficiente, para o exerccio da atividade tradutria.
Na terceira categoria de Informao Secundria, (iii) Personal Information PI
[Informao Pessoal] a expresso se refere a informaes adicionadas M
associadas ao estilo do tradutor/intrprete ou outras idiossincrasias33 que revelam sua
personalidade, seu background scio-cultural, ou ainda, suas pressuposies quanto ao
grau de conhecimento do leitor de seu texto em relao ao tpico em questo. Nos
exemplos acima, (6) Puxa, ainda falta tanto para Paris! e (7) Olha s! A placa diz que
Paris est a 50 km daqui so ilustraes dessa categoria: os segmentos adicionados
resultam, apenas, da individualidade de quem os produziu, e no da necessidade de
contextualizao da M, ou das exigncias de regras da lngua portuguesa.
No contexto canadense e na UFSC tm uma repercusso direta para a atividade
tradutria interlingual: se, em uma situao de traduo intersemitica, a mesma
Mensagem M pode gerar verbalizaes diferentes, o mesmo vlido para uma
situao de traduo interlingual: a Mensagem M na lngua fonte pode gerar sentenas
diferentes na lngua alvo, que podem ser consideradas, com legitimidade, tradues.
Gile (ibid.) chegou a essa concluso aps a fase B do seu experimento na qual solicitou
aos seus sujeitos que traduzissem suas verbalizaes para lngua inglesa, obtendo, com
resultado, sentenas ainda mais distantes da figura inicial, e diferentes entre si.
Nessa linha de raciocnio a fidelidade no se reduz a uma correspondncia
forma da M, mas ao seu contedo informacional, acrescido da maneira como o
tradutor/intrprete a expressa e em resposta ao contexto em que a nova comunicao
ocorre. Com base nessa reflexo, Gile (ibid. p. 59) consegue estabelecer o que ele
denomina Princpio de Fidelidade Mnima, que orienta a reformulao de M: a
Fidelidade Mnima deveria, necessariamente, garantir a presena do ncleo
informacional da M, de tal forma que a re-formulao seja uma representao legtimade seu contedo.
Veja o resumo34 das idias principais que o prprio Gile (ibid.) apresenta no final de
seu captulo sobre fidelidade.
Aps toda essa discusso, voc j est em condies de retomar a pergunta que
orientou as discusses desta unidade a que devemos ser fiis quando realizamosuma traduo?
TTeexxttoo AAllvvoo == MM ++ FFII ++ LLIIII ++ PPII
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Ao final dessa unidade, que discutiu o conceito de fidelidade tanto em termos
mais tericos quanto em termos mais empricos, participe do frum que ir discutir a
seguinte pergunta: Que relaes voc estabelece entre as reflexes de Arrojo (1986) e a
proposta de Gile (1995), no que concerne a questo da fidelidade?
A ltima unidade de nossa disciplina, a Unidade 4, buscar, j levando em
considerao todo o conhecimento construdo at o presente momento, explorar a tarefa
tradutria como um processo de tomada-de-deciso, que vai exigir de voc mais uma
competncia: a identificao, definio e estruturao de seu problema de traduo, e
o uso de estratgias para solucion-lo.
UNIDADE 4 - Algumas distines e decises iniciais envolvidas na tarefa tradutria
Nesta unidade, vamos explorar a tarefa tradutria como um processo de tomada-
de-deciso, que vai exigir de voc mais uma competncia: a identificao, definio e
estruturao de seu problema de traduo, bem como o uso de estratgias para
solucion-lo. O objetivo da unidade ajud-lo a (re)conhecer, de maneira consciente, e
formular, explicitamente, o que voc faz ao traduzir/interpretar, buscando torn-lo capaz
de verbalizar a lgica por detrs de suas decises. Esta unidade est baseada na
convico de que tradutores/intrpretes necessitam possuir a competncia defalar sobre
suas aes (a seus colegas, supervisores e clientes) de maneira sistematizada, de forma
a desenvolver seu auto-conhecimento enquanto profissionais e assumir
responsabilidades pelos processos de identificao e soluo de problemas na
traduo/interpretao.
Na Unidade 3, voc teve a oportunidade de discutir o conceito de fidelidade,
comumente usado como critrio para definir a qualidade de trabalhos de
traduo/interpretao. Para tanto, a unidade 3 teve o apoio terico da pesquisadora
brasileira Rosemary Arrojo, sobretudo em seu livro de 1986, e do pesquisador
canadense, Daniel Gile, sobretudo em seu livro de 1995. Ao responder a questo a
que devemos ser fiis quando realizamos uma traduo? a unidade buscou contribuir
para o entendimento da natureza do conceito de fidelidade de tal forma possibilitar a
compreenso do alcance e do grau da autonomia do tradutor/interprete.
Nesta unidade 4, a ltima de nossa disciplina, vamos considerar a traduo como
um processo-de-tomada-deciso, desta vez com o auxlio de um estudioso alemo
Hans P. Krings35 em um texto escrito em 1986. Neste texto, Krings (ibid.) apresenta
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um relato de um estudo que desenvolveu com alunos alemes aprendizes de francs
como lngua estrangeira, em um curso de traduo, com o objetivo de buscar um
modelo psicolingstico do processo de traduo, com referncia especfica s noes
de problema e estratgia, no contexto de aquisio de competncia tradutria. O
texto de Krings (ibid.): Problemas e Estratgias de Traduo de Aprendizes Alemes em
um Curso Avanado de Francs (L2)36 est traduzido para voc. Voc vai ser solicitado
a ler algumas de suas sesses, mas, por enquanto, vamos refletir um pouco sobre sua
posio quanto ao que voc define como problema e estratgia.
Como voc define um problema?
Em uma rpida busca no dicionrio Aurlio da Lngua Portuguesa37, dentre as
definies de problema propostas, ressaltamos duas: (i) Questo no solvida e que
objeto de discusso; (ii) Qualquer questo que d margem a hesitao ou
perplexidade, por difcil de explicar ou resolver (p.1394).
Aparentemente, essas explicaes resolvem o nosso problema de definio
do conceito: afinal, esto publicados em um dicionrio legitimado pela comunidade
cientfica, no contexto nacional! Entretanto, ambas deixam de mencionar um elemento
que nos parece central na construo do que seria um problema: o indivduo que
representa a questo como sendo de difcil explicao ou soluo. Assim, as explicaes
do dicionrio apresentam o problema como uma realidade autnoma concreta, parte da
realidade externa algo na realidade externa se constitui como uma questo no
solvida e que objeto de discusso ou uma qualquer questo que d margem a
hesitao ou perplexidade, por difcil de explicar ou resolver, independentemente de
ser assim percebido por algum.
Para melhor entendimento do argumento que estamos desenvolvendo,
imaginemos uma situao em que duas pessoas uma delas jovem, acostumada
realidade virtual e que com habilidades computacionais, e a outra de mais idade, quefoi educada em uma poca na qual o computador no existia e que no desenvolveu
habilidades computacionais estejam diante da necessidade de enviar um documento
grande por e-mail para algum. Provavelmente, o jovem com habilidades
computacionais no ver a situao como uma questo que d margem a hesitao ou
perplexidade, por difcil de explicar ou resolver, uma vez que, para ele, a tarefa se
apresenta como factvel; provavelmente, esse jovem diria: no existe problema aqui.
Imagine, agora, como a outra pessoa de mais idade, educada em uma poca em que
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o computador no existia e que no desenvolveu habilidades computacionais
responderia mesma situao: provavelmente, diria: existe um problema aqui.
Esse simples exemplo serve para ilustrar um ponto central na definio do que
vem a ser um problema: o problema tem dono!! No , portanto, uma realidade
autnoma concreta, nem pode ser definido como questo de difcil soluo, de maneira
absoluta, mas depende, sempre, do sujeito que reconhece a necessidade de adaptao de
uma situao, representada como carecendo de interveno! Essa abordagem ao
conceito de problema est calcada no pensamento de um pesquisador do campo
disciplinar denominado Cincia da Deciso (veja voc que o processo de tomada de
deciso tambm se constitui como um campo disciplinar!), chamado Landry38,
sobretudo em um artigo publicado em 1995, em um peridico ligado rea negcios e
organizaes. Na discusso do conceito de problema, esse pesquisador chama a
ateno do leitor para o fato de que definir um problema uma construo mental;
portanto, no se pode assumir um conceito homogneo de problema, o que leva
Landry (ibid.) a falar ento do dono do problema.
Voc pode estar se perguntando o que isso tudo tem a ver com traduo. Na
verdade, Krings (ibid.)vai falar, em seu modelo, de problema de traduo e, ao ser
apresentado a esse modelo, voc vai ser solicitado a estruturar seu problema de
traduo. Ou seja, voc vai ser solicitado a formular uma representao explcita
daquilo que, para voc, se apresenta como uma situao de traduo de difcil soluo.
Que ser um problema seu, mesmo que coincida com o problema de outrem. S a partir
da estruturao de seu problema de traduo, ser, ento, possvel a voc fazer uma
interveno consciente para resolv-lo. Em outras palavras, ser possvel voc usar uma
estratgia de traduo.
O conceito de estratgia utilizado por Krings (ibid.), que tambm adotamos,
inspirado na definio de estratgias de comunicao de Faerch e Kasper39 (1983):estratgia consiste em um conjunto de planospotencialmente conscientes para resolver
o que,para um indivduo, se apresenta como um problema, na busca por alcanar uma
meta comunicativa especfica. Nessa definio, salienta-se a natureza individual do
problema e a caracterstica consciente de estratgia. Estendendo a definio para os
Estudos da Traduo, podemos, ento, dizer que uma estratgia consiste em um
conjunto de planos potencialmente conscientes para solucionar o que, para um
indivduo, se apresenta como um problema de traduo/interpretao.
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Veja, a seguir, o segmento do modelo de Krings (ibid.) que mostra essa situao de
traduo feita de forma fluente, sem problemas, situao essa em que o processamento
das informaes do texto fonte no ofereceu dificuldades.
Um exemplo simples serve para ilustrar a situao. Digamos que voc tenha de
traduzir para o portugus o pequeno trecho escrito na lngua inglesa, transcrito abaixo,
retirado de um livro escrito para tradutores em formao, de autoria de Fbio Alves,
Adriana Pagano e Clia Magalhes Traduzir com autonomia. Estratgias para o
tradutor em formao40
:Contexto do segmento: Reciclagem
Mug Tree Give a wooden mug tree a new life. Use it as aplace for all your headbands and scrunchies. Its a great placeto hang them on and keep in the bathroom.
Provavelmente, a traduo da palavra tree no ttulo do texto no traria
dificuldades e, no modelo de Krings (ibid.), o processo seria direto, como visualizado
acima. J o grupo nominal mug tree poderia ser representado por voc como sendodifcil, causando, portanto, um problema, o mesmo acontecendo com o termo
scrunchies. Muitas vezes dizemos que uma traduo difcil, mas a pergunta que se
coloca : difcil por qu?
em momentos tradutrios como esses dois que, como Krings (ibid.) sugere,
voc deveria tentar fazer uma declarao explcita de seu problema, representando
para si prprio a dificuldade, em termos claros. No caso especfico, voc pode estar
diante de um problema de compreenso, pois, como mostra Magalhes (2000),Traduzir com autonomia: Estratgias para o tradutor em formao, uma pesquisa
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nos dicionrios bilnges e monolnges disponveis mostra que no h verbetes para os
termos mug tree e scrunchies. As palavras de Clia Magalhes so uma ilustrao
do que significa, no contexto do modelo de Krings (ibid.), fazer uma declarao
explcita de seu problema.
Outras vezes, usando como exemplo o mesmo trecho acima, seu problema no
se encontra na compreenso, mas na maneira de re-textualizar/recriar os termos na
lngua de chegada. Voc diria, ento: sei o que o termo significa, mas no consigo
traduzir. Ao formular sua dificuldade assim, estar, de novo, fazendo uma declarao
explcita de seu problema.
Resumindo, ento, importante fazer uma distino entre esses dois tipos de
problemas: (i) problema de compreenso e (ii) problema de traduo propriamente dita
(a esse segundo, Krings (ibid.) chama de rendering problem o que tem sido
traduzido em portugus, em forma decalcada, como problema de renderizao (por
associao com tradues semelhantes que acontecem, sobretudo, na rea de
informtica, como deletar, pingar, resetar). Vamos adotar problema de
renderizao como linguagem comum para significar, ento, dificuldades de encontrar
o termo (ou o sinal, no caso de interpretao de lnguas de sinais) para recriar a idia ou
situao na lngua de chegada. O recorte do modelo de Krings (ibid.) que visualiza esse
momento tradutrio apresentado abaixo. Ao final, vamos reunir todos esses recortes e
montar o modelo total.
Somente a partir do levantamento e explicitao do problema que seu,
podendo tambm ser, ou no, de outras pessoas voc est diante da possibilidade de
fazer uma interveno consciente, visando solucion-lo. Ou seja, est diante de um
processo consciente de tomada-de-deciso e passar a utilizar uma estratgia detraduo.
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Retomemos o texto que estamos usando para ilustrao:
Mug Tree Give a wooden mug tree a new life. Use it as aplace for all your headbands and scrunchies. Its a great placeto hang them on and keep in the bathroom.
Digamos que, seguindo o modelo de Krings (ibid.), voc est no eixo problema
de compreenso. Como pode verificar, no modelo, est no momento de utilizar
estratgias de compreenso para responder a pergunta: o que voc pode fazer para
resolver seu problema? Veja o recorte do modelo transcrito abaixo:
Krings (ibid.) sugere a existncia de cinco grupos de estratgias principais
envolvidas quando se est lidando com problemas de traduo. O primeiro grupo est
associado resoluo de problemas de compreenso: (i) estratgias de compreenso,
que vamos explorar a seguir. Os quatro grupos restantes esto associados a resoluo de
problemas de renderizao: (ii) estratgias de busca; (iii) estratgias de monitorao;
(iv) estratgias de tomada de deciso e, finalmente, (v) estratgias de reduo.
Vamos tratar cada uma delas em separado.
Estratgias de compreenso como j sugerimos surgem como conseqncia
dos problemas de compreenso: quando encontrados num texto a ser traduzido,
problemas de compreenso, eles nos levam, inevitavelmente, a problemas de traduo.
Os principais subtipos de estratgias de compreenso encontrados no estudo de Krings
(ibid.) foram inferncia e o uso de livros de referncia: muitos dos sujeitos fizerem
uso de dicionrios quando encontraram itens lexicais que desconheciam. Outra
estratgia particularmente freqente no estudo consistiu em encontrar um item
desconhecido em um dicionrio bilnge e depois verificar o equivalente apropriado em
um dicionrio monolngue. Quanto s estratgias de inferncia, essas apareceram
quando, por alguma razo, o uso de livros de referncia tornava-se impossvel ou
ineficaz. As estratgias de inferncia buscavam preencher os vazios no entendimento depassagens do texto da lngua fonte com base nos conhecimentos interlingstico,
intraligstico e extralingstico. Exemplos contextuais s vezes podem nos levar a bons
palpites. Uma estratgia de compreenso que pode, tambm, ser muito explorada o
uso da internet como fonte de recursos para resolver problemas de compreenso.
Vejamos o que Magalhes (2000) sugere, na busca por soluo de problemas de
compreenso do texto que estamos usando como ilustrao:
Conforme nossa discusso ao longo deste captulo, temos,ento, algumas alternativas de decises a serem tomadas para
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resolver esse problema detectado. Uma delas a consulta aespecialistas (...). A anlise do uso dessas palavras [mug tree escrunchies] com base no contexto em que esto inseridas nosoferece algumas dicas. O mug tree, segundo o texto, pode serreciclado, mudando sua funo original para passar a ser
suporte para faixas (headbands) e scrunchies. Sabemos,assim, que um mug tree um objeto que serve de suporte eque, dentre os objetos que podem ser colocados nele, termosfaixas e objetos semelhantes. Os componentes da expressotambm podem ser analisados, para termos maiores dicas:mug um caneco; tree uma rvore. A combinao seriarvore de canecos, provavelmente um suporte para canecos.Para confirmar nossas hipteses e obter uma idia mais precisado significado dessas palavras, podemos agora fazer umaconsulta via Internet, utilizando mug tree e scrunchies comopalavras-chaves.
Como vemos na citao, Clia Magalhes sugere o uso da internet para
confirmar hipteses que levantamos sobre o significado dos termos que nos causam
problemas de compreenso. Vamos, ento, seguindo a orientao dela, visitar um site
para confirmar, de forma visual, o entendimento da expresso mug tree41:
Ao fazer a atividade sugerida, voc acaba de utilizar uma estratgia de busca.
O termo estratgias de resgate ou busca ( como usado no modelo de Krings ( ibid.),
refere-se a uma tentativa consciente do aprendiz para resgatar um item lexicalconhecido, ou tentar buscar, de alguma forma, uma expresso no cdigo de chegada
para o referente em questo. Esther Glahn42 (1980), por exemplo, diferencia seis tipos
de procedimentos de resgate: (i) esperar que um termo aparea; (ii) apelar para
similaridade formal; (iii) resgatar reas semnticas; (iv) procurar por outras lnguas; (v)
resgatar situaes de aprendizagem; (vi) procedimentos sensoriais (uso de imagens,
sons). Um segundo grupo de estratgias de busca pode ser identificado como recurso a
itens semanticamente relacionados. No estudo de Krings (ibid.), caso nenhumaassociao interlingual de palavras pudesse ser resgatada, os sujeitos faziam uso de
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sinnimos, parfrases, termos gerais e etc., para criar equivalentes em potencial; em
outros casos, equivalentes potenciais foram achados por meio de dicionrios, atravs de
lnguas estrangeiras previamente aprendidas, ou via procedimentos de busca situacional.
Veja o recorte do modelo referente a essas estratgias de busca:
De posse das imagens de uma mug tree e de scrunchies (na linguagem usada
por Francis Aubert (1993), os referentes, os objetos no mundo), voc solucionou o seu
problema de compreenso, mas... lembrando a distino entre (i) problema de
compreenso e (ii) problema de traduo propriamente dita (problema de
renderizao), voc ainda tem o problema de recriar essas imagem no cdigo de
chegada, a lngua portuguesa falada no Brasil! Vai partir, ento, para o uso de uma
estratgia de busca ou de resgate de um termo que possa significar esse referente no
universo de chegada, o contexto brasileiro.
Ao utilizar as estratgias de busca, voc, provavelmente, conseguiu alguns
equivalentes potenciais ou seja, alguns termos em portugus que poderiam ser
usados. Estar, ento, respondendo pergunta: Encontrou algum equivalente
potencial? Se a resposta for SIM, voc passar ao eixo das estratgias de
monitoramento.
As estratgias de monitoramento que emergiram com maior freqncia no
estudo de Krings (ibid.) foram (i) monitoramento por meio de regras gramaticais; (ii)
estratgia de marcar a diferena por meio da comparao dos itens da lngua fonte e
da lngua alvo, os sujeitos observaram as diferenas entre eles, para perceber diferenas
no significado, conotao, estilo ou uso, para tomar a deciso de escolha do candidato a
equivalente, ou seja, um equivalente, selecionado entre os vrios equivalentespotenciais. Concordamos com Clia Magalhes (ibid.) que o uso da internet pode ser
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uma boa estratgia para testar as nossas hipteses quanto aos candidatos a equivalente
que conseguimos levantar na fase anterior. Por exemplo, voc pode verificar a
pertinncia de sua hiptese quanto a termos como pendura-caneco ou porta-caneco,
por meio de buscas na internet. Se voc resolver essa questo do monitoramento de seus
candidatos potencias, ento, v direto produo de seu texto alvo, como pode ser visto
no recorte do modelo abaixo:
Mas, caso voc fique em dvida na hora de tomar a deciso, entre equivalentes
potenciais que competem para serem selecionados como adequado, voc pode usar,
ento, as estratgias de tomada-de-deciso. Veja o recorte abaixo:
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No estudo de Krings (ibid.), surgiram complicaes quando dois ou mais
equivalentes potenciais pareciam ser igualmente apropriados ou inapropriados. Quando
as possibilidades de recuperao foram esgotadas e o monitoramento dos equivalentes
potenciais no deu indicao clara sobre qual equivalente escolher, a maioria dos
sujeitos tendeu a apelar para tipos especficos de estratgias de tomada de deciso que
poderiam ser denominadas princpios de traduo. Essas estratgias podem ser
respostas a imperativos encontrados em livros de teoria de traduo, tais como: Se
todos os equivalentes potenciais concorrentes provam ser igualmente apropriados ou
inapropriados, considere o mais literal! Ou, alternativamente: Considere o menor!
Um princpio adicional relacionado a livros de referncia que afirmam: Esse
princpios so, entretanto, subordinados a outros fatores, tais como: a definio de
traduo adotada, a distncia do texto de partida em que o tradutor se permite estar
(segundo os princpios que orientam sua prtica e segundo, at mesmo, a sua pauta
poltica, etc.), o pblico alvo do texto traduzido, as convenes que regem o gnero/tipo
textual, etc. Os princpios adotados nesse momento iro, portanto, variar, a cada tradutor
e a cada tarefa de traduo. O fundamental que os princpios tericos sirvam de apoio
ao decisor (tradutor/intrprete), no momento de escolher o candidato potencial a ser
selecionado como traduo adequada.
Finalmente, resta, ainda, o caso em que, nenhum candidato potencial foi
encontrado. Neste caso, Krings (ibid.) sugere o uso de outro grupo de estratgias que
emergiram de seu estudo: as estratgias de reduo.
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A noo de estratgias de reduo refere-se queles casos em que o problema
de traduo pode ser resolvido por meio de reduo formal ou funcional. O caso mais
freqente de estratgia de reduo consiste em desistir da linguagem marcada ou do
carter metafrico de um item do texto da lngua fonte e substitu-lo por um
equivalente no-marcado ou no-metafrico.
Em virtude de sua caracterstica de ser consciente, uma estratgia s ir
emergir em situaes nas quais a traduo/interpretao no pode ser feita
automaticamente, ou seja, quando o tradutor/intrprete individual se defronta com uma
situao que, para ele, representada como um problema de traduo/interpretao.
Caso contrrio, a traduo/interpretao procede fluentemente, do texto fonte para o
texto alvo. Veja abaixo o modelo total de Krings (ibid.):
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Finalmente, aps todo o processo, o tradutor ir, espera-se, produzir seu texto de
chegada, de maneira consciente e profissional.
Obviamente, o modelo de Krings (ibid.) descreve o processo de traduo em
detalhes, recortando cada estgio, para fins metodolgicos. Da mesma maneira como,
quando voc aprendeu a dirigir, o seu instrutor lhe dava a seqncia de passos, de forma
bem detalhada: (i) pise no pedal da embreagem; (ii) engate a primeira marcha, etc.
Obviamente, aps o aprendizado e a consolidao do conhecimento e da habilidade
adquiridos, voc dirige um carro sem parar para pensar a cada instante qual o prximo
passo a seguir. O mesmo acontece aqui: com o auxlio do modelo de Krings ( ibid.)
tivemos a oportunidade de ver o processo, vagarosamente, passo-a-passo.
O objetivo da unidade foi, como anunciado na abertura, ajud-lo a (re)conhecer,
de maneira consciente - e formular, de maneira explicita - o que voc faz ao
traduzir/interpretar, sendo capaz de verbalizar a lgica por detrs de suas decises.
Esta unidade foi baseada na convico de que tradutores/intrpretes necessitam possuir
a competncia de falar sobre suas aes (a seus colegas, supervisores e clientes) de
maneira sistematizada, de forma a desenvolver seu auto-conhecimento enquanto
profissionais e assumir responsabilidades pelos processos de identificao e soluo de
problemas na traduo/interpretao. Krings (ibid.) nos ofereceu umquadro conceitual
para ajud-lo a reconhecer as caractersticas de seus procedimentos de traduo e, a
partir da, poder verificar quais estratgias voc pode usar, quais j usa e pode melhorar,
quais usa sem muito sucesso e pode, portanto, abandonar. Acreditamos que esse
conhecimento pode ser uma valiosa contribuio para o crescimento gradual de sua
competncia tradutria.
CONCLUSO
A disciplina ESTUDOS DA TRADUO I, que voc acaba de concluir, buscou
dar continuidade disciplina Introduo aos Estudos da Traduo. O objetivo geral
de Estudos da Traduo I foi inserir as reflexes sobre o conceito de traduo, os tipos
de traduo e a distino entre traduo e interpretao no campo disciplinar
denominado Estudos da Traduo, para, a partir dessa insero, discutir questes ligadas
formao do profissional que a atua, prpria atividade de traduzir e, finalmente, auma problematizao do critrio mais comumente utilizado na avaliao da qualidade
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de tradues, qual seja, a fidelidade. Assim, no decorrer do curso, discutimos: (i) o
que o campo disciplinar denominado Estudos da Traduo e o seu mapeamento
(Unidade 1); (ii) os tipos de formao que os Estudos da Traduo podem oferecer aos
seus membros e os tipos de competncias necessrias aos profissionais da rea (Unidade
2); (iii) a questo da fidelidade (Unidade 3); e, finalmente, (iv) algumas distines e
decises iniciais envolvidas na tarefa tradutria (Unidade 4). Para isso, partimos dos
conhecimentos adquiridos no curso anterior Introduo aos Estudos da Traduo e
construmos novos conhecimentos calcados nessa primeira base.
Na Unidade 1 O nome e a natureza dos Estudos da Traduo:
mapeamento do campo disciplinar estudamos o nome e a natureza dos chamados
Estudos da Traduo e vimos alguns mapeamentos desse campo disciplinar, a partir de
certos tericos, desde a dcada de 70, culminando com percepes atuais, conforme
veiculadas em sites representativos da rea, tanto em nvel internacional, quanto em
nvel nacional.
Na Unidade 2 Os tipos de formao que os Estudos da Traduo podem
oferecer aos seus membros e os tipos de competncias necessrias aos profissionais
da rea estudamos os tipos de formao que os Estudos da Traduo podem oferecer
aos seus membros e os tipos de competncias necessrias aos profissionais da rea.
Inicialmente, fizemos um levantamento quanto s suas expectativas e crenas, no que
diz respeito s competncias envolvidas no ato tradutrio e, a partir das discusses
iniciais, foi possvel conversar sobre os tipos de saberes a serem construdos neste
campo disciplinar e sobre o tipo de formao que os Estudos da Traduo podem
oferecer aos seus futuros profissionais por meio de instruo formal.
Na Unidade 3 A questo da fidelidade: uma abordagem emprica
visitamos um conceito comumente usado como categoria bsica para definir a qualidade
de trabalhos de traduo/interpretao: a fidelidade. Para tanto, apoiamos nossasdiscusses (i) na pesquisadora brasileira Rosemary Arrojo, que a partir do final da
dcada de 80 problematizou, de forma rigorosa e marcante, o conceito de fidelidade, e
(ii) em um experimento, portanto de cunho emprico, realizado pelo pesquisador
canadense Daniel Gile, que, em 1995, props um conjunto de conceitos e modelos
bsicos para a formao de tradutores e intrpretes. O objetivo da unidade foi contribuir
para o seu entendimento da natureza do conceito de fidelidade de tal forma a
possibilitar a compreenso de sua autonomia enquanto tradutor/intrprete cuja leiturado texto de partida , inevitavelmente, um produto de sua poca, suas concepes
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tericas, suas realidades.
Finalmente, na ltima unidade de nosso curso, a Unidade 4 Algumas
distines e decises iniciais envolvidas na tarefa tradutria exploramos a tarefa
tradutria como um processo de tomada-de-deciso, que exigiu de voc mais uma
competncia: a identificao/representao, definio e estruturao de seu problema
de traduo, bem como o uso de estratgias para solucion-lo. O objetivo da unidade foi
ajud-lo a (re)conhecer, de maneira consciente, e formular, explicitamente, o que voc
faz ao traduzir/interpretar, de tal forma a torn-lo capaz de verbalizar a lgica por
detrs de suas decises. Essa unidade foi baseada na convico de que
tradutores/intrpretes necessitam possuir a competncia de falar sobre suas aes (a
seus colegas, supervisores e clientes) de maneira sistematizada, de forma a desenvolver
seu auto-conhecimento enquanto profissionais e assumir responsabilidades pelos
processos de identificao e soluo de problemas na traduo/interpretao.
Armados desses conceitos discutidos nas duas disciplinas iniciais, acreditamosque voc esteja preparado para a prxima disciplina de Estudos de Traduo de seu
curso, que ir, de uma perspectiva mais prtica, fazer uma iniciao ao uso deferramentas de apoio traduo e interpretao, estabelecendo distino entre
Traduo Automtica (TA) e Programas de Apoio Traduo (PATs).
1 A expresso campo disciplinar um grupo nominal que inclui a noo de "disciplina", termo
derivado do grego - maqhma (estudo, cincia, conhecimento), que designa uma cincia enquanto objetode aprendizagem ou de ensinamento. Constituir um campo disciplinar implica definir o territrio que prprio de tal disciplina, definir parmetros, conceitos, limites e um repertrio determinado capaz de sertransmitido, aprendido objetivamente e modificado; e, tudo isso em uma linguagem comum aospraticantes da atividade especfica, passvel de ser escrita, transmitida, aprendida e compartilhada pelosmembros da comunidade que a exerce. Assim,fazer um mapeamento de um campo disciplinar, significa,em ltima instncia, estabelecer os contornos e identidades de seu territrio, traando a trajetria desdesua origem at sua institucionalizao.2 BRANDO, C. A. L. A inveno do campo disciplinar da Arquitetura: contribuies e contraposiesrenascentistas. Morus, Campinas, v. 2, n. 2, 2005. p. 65-83.3 http://www.arquitetura.ufmg.br/ia/IA7online/artigobrandaook.html4 A histria do Brasil uma histria de tradues e de mudanas lingsticas. Sua documentao inicia-
se com o desembarque da frota portuguesa na costa brasileira, comandada por Pedro lvares Cabral(14671520) em 21 de abril de 1500, a primeira visita dos europeus ao Brasil sem disputas [...] Os ndiosbrasileiros falavam milhares de lnguas e dialetos diferentes, as quais foram classificadas pelos lingistase antroplogos em 102 grupos de lnguas e em trs grandes famlias lingsticas: Tupy, Macro-Ge eArawak. Essas variedades lingsticas, as quais eram acompanhadas por de culturas igualmentevariadas, religies, cosmogonias e tradies orais, conduzida ao desenvolvimento de no mnimo duaslnguas franca: Abanheenga, falada na costa, e Kariri, falada nas zonas de influncia do nordeste.Dado que as lnguas em questo carece de sistemas escritos, quaisquer trocas lingsticas que tomaramlugar entre as tribos indgenas provavelmente esto includas na traduo oral.5 BAKER, M. The Routledge Encyclopedia of Translation Studies, London, New York, Routledge,1998.6 VENUTI, L. (Org.). The Translation Studies Reader. Routledge, London, New York, 2000.7 PAGANO, A; VASCONCELLOS, M. L. Estudos da traduo no Brasil: reflexes sobre teses edissertaes elaboradas por pesquisadores bra