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ESTUDOS SOBRE DESENVOLVIMENTO REGIONAL

EM EXPERIÊNCIAS DE SANTA CATARINA, PARANÁ E

MATO GROSSO DO SUL

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APOIO: Este livro teve o apoio financeiro para publicação da

Os recursos referem-se ao Edital Pró-Eventos, Chamada Pública N. 06/2015 -

Pró-Eventos 2016/Fase 2 - Termo de Outorga N. 2016TR2035. O presente livro compõe o Volume 2 dos Anais do IV Seminário Internacional de

Integração e Desenvolvimento Regional e IV Workshop sobre Desenvolvimento Regio-nal no Território do Contestado, coordenado pelo Prof. Dr. Alexandre Assis Tomporos-ki e Prof. Dr.Valdir Roque Dallabrida, cujo evento ocorreu nos dias 26 a 28 de outu-bro/2016. O evento está vinculado ao Programa de Mestrado em Desenvolvimento Regional.

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Alexandre Assis Tomporoski Valdir Roque Dallabrida

(Organizadores)

ESTUDOS SOBRE

DESENVOLVIMENTO REGIONAL EM EXPERIÊNCIAS DE

SANTA CATARINA, PARANÁ E MATO GROSSO DO SUL

1ª edição

LiberArs São Paulo - 2016

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Estudos sobre desenvolvimento regional em experiências de Santa Catarina, Paraná e Mato Grosso do Sul. © 2016, Editora LiberArs Ltda.

Direitos de edição reservados à Editora LiberArs Ltda. ISBN 978-85-9459-027-5 Editores Fransmar Costa Lima Lauro Fabiano de Souza Carvalho Revisão Ortográfica Os organizadores Editora LiberArs Revisão técnica Cesar Lima Editoração e capa Simone Alauk

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação – CIP

Todos os direitos reservados. A reprodução, ainda que parcial, por qualquer meio, das páginas que compõem este livro, para uso não individual, mesmo para fins didáticos, sem autorização escrita do editor, é ilícita e constitui uma contrafação danosa à cultura.

Foi feito o depósito legal.

Editora LiberArs Ltda. www.liberars.com.br

[email protected]

Tomporoski, Alexandre Assis

Estudos sobre desenvolvimento regional em experiências de Santa

Catarina, Paraná e Mato Grosso do Sul / Alexandre Assis Tompo-

roski, Valdir Roque Dallabrida (orgs.) – São Paulo: LiberArs, 2016.

ISBN 978-85-9459-027-5

1. Desenvolvimento Regional – Santa Catarina 2. Desenvolvimento

Regional – Paraná 3. Desenvolvimento Regional – Mato Grosso do

Sul 4. Desenvolvimento Territorial – atividade econômica I. Título

CDD 338.9

CDU 338

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SUMÁRIO

PRIMEIRA PARTE DESAFIOS, POSSIBILIDADES E PROSPECÇÕES SOBRE

DESENVOLVIMENTO NO TERRITÓRIO DO CONTESTADO

TERRITÓRIO DO CONTESTADO: ASPECTOS HISTÓRICOS DO

PROCESSO DE MARGINALIZAÇÃO

Sandro Luiz Bazzanella ........................................................................................................ 15 CICATRIZES DO CONTESTADO: A ESTATIZAÇÃO DA

SOUTHERN BRAZIL LUMBER AND COLONIZATION COMPANY

E O ADVENTO DO CAMPO DE INSTRUÇÃO MARECHAL HERMES

Alexandre Assis Tomporoski Ana Claudia de Lemos Flenik ............................................................................................ 23

SERTÃO É TERRA ONDE PERU DÁ COICE, CANDEEIRO

DÁ CHOQUE E O CISCO FAZ A CURVA: BREVE ANÁLISE

SOBRE O “SERTÃO” NA HISTORIOGRAFIA CLÁSSICA BRASILEIRA E DO

CONTESTADO

Eloi Giovane Muchalovski................................................................................................... 39 A POBREZA NO PLANALTO NORTE CATARINENSE: REPRESENTAÇÕES

SOCIAIS E IMPLICAÇÕES NO DESENVOLVIMENTO REGIONAL

Maria Luiza Milani Pollyana Weber da Maia Pawlowytsch ........................................................................ 57

O TURISMO NO TERRITÓRIO DO CONTESTADO: POTENCIALIDADES

PAUTADAS EM ASPECTOS

HISTÓRICOS E POLÍTICAS PÚBLICAS

Alexandre Assis Tomporoski Sandro Luiz Bazzanella Ivone Mazutti de Geroni ...................................................................................................... 85

SIGNOS DISTINTIVOS TERRITORIAIS: INDICAÇÃO GEOGRÁFICA,

MARCAS COLETIVAS E SUA RELAÇÃO

COM O DESENVOLVIMENTO TERRITORIAL

Karine Rohrbacher Cilmara Corrêa de Lima Fante Valdir Roque Dallabrida ................................................................................................... 103

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QUESTÕES AMBIENTAIS ATUAIS: COMPREENDÊ-LAS, É PRECISO. UMA

VISÃO HISTÓRICA DA FORMAÇÃO DOS PROBLEMAS AMBIENTAIS

ATUAIS

Danielle de Ouro Mamed Jairo Marchesan Sandro Luiz Bazzanella ..................................................................................................... 115

PROGRAMA ENSINO MÉDIO INOVADOR: EXPECTATIVAS

DOS ESTUDANTES E ARTICULAÇÕES COM O DESENVOLVIMENTO

REGIONAL

Janete Paiter de Souza Argos Gumbowsky Maria Luiza Milani ............................................................................................................... 119

IDEB: IMPORTANTE MECANISMO PARA PERCEBER A EDUCAÇÃO EM

DIFERENTES CONTEXTOS

Rosimari de Fátima Cubas Blaka .................................................................................. 123 SEGUNDA PARTE DESAFIOS, POSSIBILIDADES E PROSPECÇÕES SOBRE

DESENVOLVIMENTO EM OUTROS ESTADOS DO BRASI

PERCEPÇÃO DA SOCIEDADE SOBRE A IMPORTÂNCIA DO TURISMO NO

DESENVOLVIMENTO LOCAL:

UMA ANÁLISE DO MUNICÍPIO DE PIRAQUARA/PR

Jorge Amaro Bastos Alves ................................................................................................ 129 VALORIZAÇÃO DA TERRA NA REGIÃO OESTE DO PARANÁ: AINDA

VALE A PENA INVESTIR EM TERRAS NA REGIÃO?

Guilherme Asai Moacir Piffer ........................................................................................................................... 153

ECONOMIA CRIATIVA E MERCADO DE TRABALHO:

UMA ABORDAGEM INTRODUTÓRIA TENDO O

MATO GROSSO DO SUL COMO REFERÊNCIA

Fabrício A. Deffacci Leoncio E. dos Santos Junior Weronica D. Adamowski Rafael Moreno ....................................................................................................................... 161

QUEREMOS INVESTIR EM ARMAZENAGEM DE GRÃOS?

ESTUDO COM PRODUTORES RURAIS DE PONTA PORÃ/MS

Igor Lopes Pereira / Francis Regis G.M. Barbosa Thiago Quinhones Carlos Otávio Zamberlan ................................................................................................. 167

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A SUCESSÃO RURAL COMO FONTE DE REPRODUÇÃO SOCIAL: ESTUDO

NO ASSENTAMENTO DORCELINA FOLADOR

Gianete Paola Butarelli Paulo Roberto da Silva Raquel EberhardBuss Carlos Otávio Zamberlan ................................................................................................. 171

ANÁLISE DO DESAMPARO DIGITAL NOS ASSENTAMENTOS RURAIS E

SEU DESSERVIÇO AO DESENVOLVIMENTO REGIONAL

Aline Robles Brito Carlos Otávio Zamberlan Edson Pereira de Souza Romildo Camargo Martins .............................................................................................. 175

ARANDUASSU DIGITAL: UNA PROPUESTA DE INCLUSIÓN DIGITAL EN

ÁREAS REMOTAS

Carlos Busón Buesa Carlos Octavio Zamberlan ............................................................................................... 179

ANÁLISE DOS RESULTADOS E METAS DO IDEB DA REDE PÚBLICA DO

MUNICÍPIO DE PONTA PORÃ/MS

Juliana Faoro Gomes Brissov Carlos Otávio Zamberlan ................................................................................................. 183

DINÂMICA ECONÔMICA E ESPACIAL DAS EXPORTAÇÕES

DE PRODUTOS DE BASE FLORESTAL EM SANTA CATARINA. UMA

ANÁLISE PARA O PERÍODO DE 2005 – 2014.

Ivo Raulino .............................................................................................................................. 187

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APRESENTAÇÃO

Apresentamos aos leitores o Volume 2 dos Anais do IV Seminário Inter-

nacional de Integração e Desenvolvimento Regional e IV Workshop sobre

Desenvolvimento Regional no Território do Contestado, como uma coletânea

de artigos, na forma de E-book. Os eventos em questão foram realizados du-

rante os dias 26, 27 e 28 de outubro de 2016, no Campus de Canoinhas da

Universidade do Contestado (UnC), como promoção do Programa de Mestrado

em Desenvolvimento Regional.

A coletânea é composta por dezessete artigos, os quais foram apresenta-

dos nos eventos referidos, ou fizeram parte de mesas de debate. Trata-se de

textos que reproduzem estudos, na sua maioria já com resultados finais, ou-

tros ainda em andamento, como inovações em termos de alternativas de de-

senvolvimento para regiões ou municípios dos estados do Mato Grosso do Sul,

Paraná e Santa Catarina (Brasil).

Assim, o livro está estruturado em duas partes. Na primeira parte, os

primeiros nove textos, apresentam desafios, possibilidades e prospecções

sobre desenvolvimento no Território do Contestado, recorte territorial inseri-

do nos estados de Santa Catarina e do Paraná. Na segunda parte, os outros oito

textos estão centrados em estudos que focam desafios, possibilidades e pros-

pecções sobre desenvolvimento em outros estados do Brasil, em especial,

Mato Grosso do Sul e Paraná.

Com esta publicação, o Programa de Mestrado da UnC, dá mais uma con-

tribuição para o debate do tema desenvolvimento regional, nos municípios de

sua região de Santa Catarina e outros estados.

Desejamos a todos uma boa leitura!

Prof. Dr. Valdir Roque Dallabrida

Prof. Dr. Alexandre Assis Tomporoski

ORGANIZADORES

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PRIMEIRA PARTE

DESAFIOS, POSSIBILIDADES E PROSPECÇÕES SOBRE

DESENVOLVIMENTO NO TERRITÓRIO DO CONTESTADO

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TERRITÓRIO DO CONTESTADO: ASPECTOS HISTÓRICOS DO PROCESSO DE

MARGINALIZAÇÃO

Sandro Luiz Bazzanella1

1. INTRODUÇÃO

Para colocarmos em debate aspectos históricos do processo de margina-

lização do Território do Contestado, trazemos ao centro da cena reflexiva o

filósofo alemão Walter Benjamin, tomando como referência e pressuposto

reflexivo algumas das teses apresentadas pelo pensador em seu famoso texto:

“Sobre o conceito de história”. Este texto foi redigido na aurora de 1940, nos

anos iniciais da II Guerra Mundial e, pouco antes de Benjamin empreender

uma tentativa de escapar da França, sob o regime colaboracionista de Vichy,

em que refugiados alemães judeus e marxistas eram entregues às autoridades

da Gestapo. A tentativa de fuga foi frustrada. Capturado pela polícia franquista

na fronteira espanhola Walter Benjamin opta pelo suicídio em setembro de

1940.

Evidentemente, não se trata aqui de uma explanação do pensamento de

Benjamin, muito menos de uma abordagem das teses de sua filosofia da histó-

ria lida a contrapelo no referido texto: “Sobre o conceito de história”, ou mes-

mo dos pressupostos teológicos e filosóficos que compõe a concepção de his-

tória de Benjamin, mas a partir de algumas concepções presente nas teses

apresentadas no documento supracitado pensar refletir e, sobretudo, reme-

morar as condições que implicam no processo de marginalização do Território

do Contestado.

2. A QUESTÃO DOS CONCEITOS

Preliminarmente, ressalte-se que a temática proposta parte do pressu-

posto de que o Território do Contestado encontra-se em condição de margina-

lização. Portanto, tal proposição sugere que a situação de marginalização é

algo questionável, não desejável, ou que necessita ser superado e, de que tal

condição pode, ou deve ser compreendida a luz do processo histórico que o

1 Doutor em Ciências Sociais, com atuação no Programa de Mestrado em Desenvolvimento Regional da

Universidade do Contestado. E-mail: [email protected]

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conformou e o conformam em suas dimensões sociais, políticas, econômicas e

culturais contemporâneas.

Neste contexto, a precisão conceitual em torno do termo marginalização

assume importância decisiva, o que nos remete a uma consulta aos dicionários

da língua portuguesa, que remetem o termo marginalização ao verbo margina-

lizar: 1. “Impedir que participe de; por a margem de uma sociedade, de um

grupo, da vida pública.” Assim, a definição de marginalização sugere uma ação

marcada pela violência perpetrada por indivíduos, que impedem que outros

indivíduos participem de determinado âmbito de relações individuais, ou

sociais. Sugere por extensão, ação violenta de grupos, ou de instituições que

cerceiam a participação de outros grupos, de setores da sociedade da vida

social de uma comunidade, de um território, ou mesmo de um país.

3. A CONCEPÇÃO DE HISTÓRIA DE WALTER BENJAMIN E A COMPREENSÃO DO PROCESSO HISTÓRICO DE MARGINALIZAÇÃO DO CONTESTADO

É a partir destes pressupostos que as variáveis da concepção de história

de Walter Benjamin podem contribuir com nosso esforço de compreensão dos

processos históricos de marginalização do Território do Contestado. Assim, é

inerente a concepção benjaminiana de história a crítica ao historicismo e sua

visão de tempo derivado da historiografia iluminista marcado pela aposta no

continuum de um tempo rumo ao progresso, ou de seu homônimo contempo-

râneo de um tempo marcado pela ansiedade pelo desenvolvimento.

Benjamin visa a mesma concepção de “tempo homogêneo e vazio”, esse tempo indiferente e infinito que corre sempre igual a si mesmo, que passa engolfan-do o sofrimento, o horror, mas também o êxtase e a felicidade. A historiografia que se baseia nesta concepção trivial do tempo como cronologia linear opera a partir de princípios cujo fundamento se assenta num conceito totalmente em-botado de causalidade histórica, como se a sucessão cronológica fosse sinôni-mo de uma relação substancial de necessidade histórica: “O historicismo con-tenta-se em estabelecer um nexo causal entre os diversos momentos da histó-ria. Mas nenhum fato, por ser causa, já é, só por isso, um fato histórico. A isso Benjamin opõe um conceito pleno de “tempo de agora”, ao mesmo tempo sur-gimento do passado no presente e “evento do instante daquilo que começa a ser... que deve, pelo seu começo, nascer a si, advir a si, sem partir de lugar ne-nhum”. O instante imobiliza esse desenvolvimento temporal infinito que se esvazia e se esgota e que chamamos – rapidamente demais – de história. Ben-jamin opõe a exigência do presente, que ela seja o exercício árduo da paciên-cia ou risco da decisão (GAGNEBIN, 2009, p. 96/97).

Ou seja, para Benjamin a “história que se lembra do passado também é

sempre escrita no presente e para o presente. A intensidade dessa valorização

e renovação quebra a continuidade da cronologia tranquila, imobiliza seu

fluxo infinito, instaura o instante e a instância da salvação” (GAGNEBIN, 2009,

p.97). Assim, o pensador nos propõe um tempo presente que não se apresenta

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como o resultado necessário de um passado que se atualiza no presente, nem

mesmo como transição para outro tempo futuro, mas como um tempo que se

mantém imanente na absolutidade de seu presente vital. Ainda nesta perspec-

tiva, para Benjamin argumenta:

O passado não se entrega a nós; ele só nos envia sinais cifrados, que dão conta, misteriosamente, de seus anseios de redenção. Cada geração recebe uma es-cassa força messiânica para perceber esses anseios do passado. É a partir de nossa luta no presente que podemos entrever a verdade das lutas que ocorre-ram antes. A recuperação do passado se dá na forma de recordações que cinti-lam num momento atual de perigo (KONDER, 1999, p. 105).

Ou seja, se compreende se age suficientemente diante das estruturas so-

ciais, políticas e econômicas e de seus processos de marginalização que con-

formam no presente limites e ameaças a vida humana e ao mundo na medida

em que capta os sinais, os acontecimentos passados que circunscrevem o pre-

sente. “A afinidade que temos com os que nos precederam passa pelo perigo,

em que nos encontramos, de ceder diante da opressão" (KONDER, 1999, p.

105). Nas palavras de Benjamin presentes na Tese VI: “Articular o passado

historicamente não significa conhecê-lo “tal como ele propriamente foi”. Signifi-

ca apoderar-se de uma lembrança tal como ela lampeja num instante de perigo.

(...) Em cada época é preciso tentar arrancar a transmissão da tradição ao con-

formismo que está na iminência de subjugá-la” (LÖWY, 2005, p.65).

Sob tais pressupostos é preciso atenção para o fato de que “O passado

acena para nós, de longe, mas só poderemos aproveitar a riqueza das energias

humanas encerradas nele se formos capazes de agir, no presente, com genuína

paixão libertadora” (KONDER, 1999, p. 105), com vontade crítica e, compro-

metida com as experiências vividas pelos seres humanos que conformam o

mundo em que nos circunscrevemos. Assim, questionar a condição de margi-

nalização do Território do Contestado a luz dos processos históricos significa

a partir de perspectivas da filosofia da história de Benjamin assumir uma tare-

fa ética inadiável.

Tarefa ética implícita no simples fato do nascimento de um cidadão do

Território do Contestado e o necessário reconhecimento social de uma dívida.

Dívida com sua subsistência, com a possibilidade de reconhecer-se herdeiro

de uma tradição comunitária e territorial e, por decorrência de ter assegurado

uma condição vital de pertencimento a terra, a cultura em que se circunscreve

e se circunscreverá sua visão de mundo e sua existência.

Na extensão da tarefa ética, apresenta-se necessariamente a tarefa políti-

ca de comprometer-se com a afirmação da liberdade como ponto de partida, a

partir do qual todo ser humano tem direito à vida, e a realização de sua potên-

cia vital individual e, em âmbito social. O reconhecimento no tempo presente

da tarefa ético-política revela-se no compromisso de afirmar uma sensibilida-

de estética adequada ao território, à seres humanos marginalizados, de quem

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lhes foi retirado e negado o acesso à terra, as condições dignas de vida e de

exercício de sua liberdade de pensamento e ação e, por extensão a possibili-

dade de rememorar suas lutas, suas derrotas, suas vitórias, seu modo de ver e

se situar no mundo.

4. AUTORITARISMO E A NEGAÇÃO DA PALAVRA

Sob tais pressupostos, advindos da perspectiva benjaminiana de tempo e

de história, apresenta-se oportuno rememorar aspectos históricos constituti-

vos do processo de marginalização do Território do Contestado, cujas marcas

se apresentam em nosso modo de entendimento vivas e atuantes no presente.

O autoritarismo e sua variável extrativista.

O autoritarismo é marca registrada da conformação social e política bra-

sileira. Donos de Capitanias hereditárias, Senhores de engenho, Capitães do

mato, Generais, Coronéis, Doutores, Juízes, entre outras denominações são

alguns dos personagens que moldaram nossa sociedade de castas, reverbe-

rando tal condição em linguagem popular, ou em ditos populares, tais como:

“Manda quem pode, obedece que tem juízo”; “Aqui cada um sabe seu lugar”.

Assim, se pode partir do pressuposto de que o autoritarismo como um

dos aspectos determinantes do processo histórico de marginalização do Terri-

tório do Contestado se manifesta em dois momentos constitutivos de um con-

tinuum de práticas autoritárias. Primeiro na “Questão do Contestado”, em que

o Estado de Santa Catarina e o Estado do Paraná entraram em litígio, ou con-

testaram a posse destas terras e de traçados fronteiriços.

O que estava em jogo prioritariamente era o domínio territorial de cada

um destes entes federados. Os vínculos comunitários constitutivos da ocupa-

ção destas terras pela população nativa e, que transcendem o mero traçado de

fronteiras e a garantia de domínio de largas porções de terra por parte dos

dois estados não entraram nos cálculos dos interesses estratégicos da disputa

estatal. Fato que se evidencia na forma da condução jurídica da questão junto

ao Supremo Tribunal Federal da época e, sua solução por meio da intervenção

do então presidente da República, Venceslau Brás em abril de 1916, exigindo

dos referidos estados a assinatura de acordo. Assim, talvez se possa afirmar

que a questão do contestado foi tão somente uma questão de estado na qual os

seres humanos, a população do contestado, seu abandono por parte do estado,

suas mazelas, sua marginalização não foi incluída na contenda entre os esta-

dos, muito menos no acordo celebrado.

Ato contínuo, num segundo momento, a manifestação do autoritarismo

se manifesta na Guerra do Contestado. No que concerne ao conhecimento do

contexto de época, das causas da Guerra, do desenvolvimento e, desdobra-

mentos do conflito nos mais diversos âmbitos, o trabalho realizado pelos his-

toriadores é revelador e desautoriza quem vos fala a incursões nesta seara.

Mas, nos compete reconhecer as heranças autoritárias do conflito que se ma-

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nifestam no processo histórico de marginalização contemporânea do Territó-

rio do Contestado.

Neste contexto, talvez se possa afirmar e, mesmo rememorar que a mar-

ginalização do Território do Contestado continua a manifestar-se na sutileza

de práticas autoritárias que promovem o silêncio em torno da Guerra do Con-

testado. A despeito dos avanços, dos estudos, das pesquisas e publicações em

torno do conflito, majoritariamente em âmbito acadêmico é fato de que a soci-

edade brasileira desconhece significativamente a existência do conflito, sua

intensidade, profundidade e, sobretudo as sequelas na conformação antropo-

lógica, política, econômica e cultural do Território do Contestado.

Ou por outra perspectiva, talvez seja possível reconhecer na estratégia

autoritária de promoção do silêncio em torno do conflito, o fato de apresentá-

lo como informação secundária em livros didáticos e manuais de história. Mais

recentemente, esta estratégia de silenciar o conflito e as contradições que lhe

são inerentes se apresenta na forma de apresentá-lo com produto turístico a

ser ofertados para os ávidos consumidores apressados em vivenciar novas e

instantâneas experiências numa infinidade de selfies descontraidamente de-

sinteressados de qualquer compreensão em relação a implicâncias éticas,

políticas e estéticas do processo de marginalização vivenciado cotidianamente

pelo Território do Contestado.

Assim torna-se urgente reconhecer que é inerente as práticas autoritá-

rias constitutivas da sociedade brasileira, promover senão patrocinar o silên-

cio, o esquecimento em torno das contradições, da violência de suas práticas

políticas, econômicas e sociais. Talvez, se possa afirmar que tais práticas auto-

ritárias circunscrevem a natureza humana, ou mesmo a condição humana,

apresentando-se em suas especificidades nos mais variados povos e culturas.

Mas, invariavelmente é preciso ter presente que fazer silenciar um fato, um

acontecimento, um ser humano, ou todo um território significa negar-lhes a

palavra. Negar a palavra é negar a possibilidade da narrativa, do testemunho

do que aqui ocorreu, do direito a rememoração dos fatos e acontecimentos

que envolveram as gerações que nos antecederam e, que conformaram as

bases históricas de marginalização do Território do Contestado na atualidade.

A imposição do silêncio ao Território do Contestado em relação a expressão

de suas fraturas, de suas contradições e conflitos conformou-se como estraté-

gia de mantê-lo a margem, marginalizado impedindo o reconhecimento de si

mesmo a partir de suas origens e, por extensão, de que este reconhecimento

se circunscrevesse como variável constitutiva da conformação da sociedade

brasileira.

Mas, é preciso também reconhecer que o silêncio é uma das formas que

assume a linguagem humana. No silêncio de um indivíduo, de uma comunida-

de, ou de um Território reside uma narrativa de resistência. A imposição do

silêncio, do esquecimento, ou mesmo a negação da palavra pode retardar a

manifestação do discurso e da ação por gerações, mas não impede que a nar-

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rativa se inscreva nas entrelinhas do discurso e na ação autoritária no tempo

presente.

Na perspectiva aristotélica o que caracteriza o ser humano é sua condi-

ção política. Assim, o homem é um animal político por ser um animal falante,

por possuir uma linguagem que lhe permite compartilhar a multiplicidade de

possibilidades que o mundo lhe apresenta cotidianamente. A política é sua

condição de ser no mundo, de agir conjuntamente com outros seres humanos

na conformação de um mundo que acolha dignamente a condição humana.

A ação política resulta dos laços de confiança entre homens, comunida-

des e territórios. Sob tais pressupostos, atentemos para o fato de que a ação

autoritária de imposição do silêncio, por meio da intensidade da narrativa

oficial em suas mais diversas formas (citadas em momento anterior deste

discurso), significa negar a palavra. A negação da palavra incide na impossibi-

lidade da ação política comum na constituição de laços de confiança comunitá-

rios e territoriais, fundamentais e necessários a afirmação de uma visão de

mundo que transcenda a marginalização.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Sob tais pressupostos, talvez nos seja possível reconhecer contempora-

neamente no processo histórico de marginalização do Território do Contesta-

do, as seguintes variáveis advindas da negação da palavra, da memória, da

rememoração das narrativas de um modo de vida comunitário, de suas alegri-

as, de suas lutas, de sofrimentos constitutivos do Território e, que, por exten-

são em maior ou menor grau, se apresentam como características da socieda-

de brasileira como um todo.

1. A dificuldade de tomarmo-nos como objeto, de compreender a

natureza de nossa condição e de nossas contradições societárias,

uma vez que nos falta o domínio da profundidade da palavra

como expressão de nossa visão de mundo, de pensamento e de

reflexão sobre nossa condição de ser e estar e compartilhar o

mundo.

2. A dificuldade de estabelecermos laços de confiança societários

que nos permitam a ação política comum promovendo o bem

comum, o espaço público como condição sine qua nom para as-

segurar o desenvolvimento humano e social.

3. A dificuldade de constituirmos instituições que se apresentem

como expressão de práticas societárias democráticas e, que por

sua natureza coíbam acordos e interesses de grupos que lesam

os interesses comunitários e societários e territoriais.

4. A dificuldade de superarmos práticas econômicas e políticas an-

coradas no extrativismo, que se caracteriza pelo descomprome-

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timento com o desenvolvimento do território e, que por reverso

beneficiam interesses isolados.

5. A dificuldade de superarmos a desconfiança característica de

nossa conformação societária marcada pelo autoritarismo extra-

tivista de nossa condição.

Desta forma, a concepção de história advinda de Walter Benjamin nos

apresenta a urgência da rememoração dos processos históricos de marginali-

zação do Planalto Norte Catarinense, marcados pela manifestação passada e

presente do autoritarismo e de seu correlato, o extrativismo. O extrativismo

que se caracteriza antropologicamente pela fragilidade dos laços de pertenci-

mento ao Território desdobrando-se na dimensão econômica, social e humana

de baixo comprometimento com a distribuição equitativa da riqueza material

produzida, bem com a valorização do bem comum, dos laços confiança comu-

nitários e sociais. Tal condição apresenta-se imprescindível para a constitui-

ção de uma dimensão pública e de bem viver, que acolha e promova a digni-

dade dos seres humanos atuantes neste espaço, apresentando-se também

como garantia de vida e dignidade para as gerações futuras.

Esta tarefa pertence ao tempo de agora, ao tempo presente, ao tempo que

resta. É inadiável!

REFERÊNCIAS

GAGNEBIN, J. M. História e Narração em Walter Benjamin. São Paulo: Perspectiva,

2009.

KONDER, L. Walter Benjamin: o marxismo da melancolia. Rio de Janeiro: Civilização

Brasileira, 1999.

LÖWY, M. Walter Benjamin: aviso de incêndio – uma leitura das teses “Sobre o Con-

ceito de história”. Tradução de Wanda Nogueira Caldeira Brandt. Tradução das te-

ses Jeanne Marie Gagnebin; Marcos Luiz Müller. São Paulo: Boitempo, 2005.

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CICATRIZES DO CONTESTADO: A ESTATIZAÇÃO DA SOUTHERN BRAZIL

LUMBER AND COLONIZATION COMPANY E O

ADVENTO DO CAMPO DE INSTRUÇÃO

MARECHAL HERMES1

Alexandre Assis Tomporoski2

Ana Claudia de Lemos Flenik3

INTRODUÇÃO

O ano de 2016 encerra o período de rememoração do centenário do Mo-

vimento Sertanejo do Contestado (1912-1916). Os últimos quatro anos foram

marcados por uma intensa agenda positiva sobre o tema, proposta e desen-

volvida tanto pelo público acadêmico - mediante atuação de pesquisadores de

diversas universidades brasileiras, dentre as quais, A UDESC, UFSC, UFSM,

UFFS e UNC -, quanto pela população em geral, especialmente nos municípios

do Planalto Norte Catarinense, que ainda convivem com as consequências

daquele processo histórico.

Ato contínuo ocorreu a ampliação do interesse em relação ao assunto.

Durante este período, a notoriedade obtida pelo tema se evidencia pela profí-

cua produção acadêmica, literária e audiovisual sobre o Contestado4.

1 O presente texto, na sua primeira versão, foi publicado na revista Desenvolvimento Regional em

debate, v. 6, n. 3 (2016). 2 Mestranda do Programa de Mestrado em Desenvolvimento Regional da Universidade do Contestado

em Canoinhas/SC. 3 Professor do Programa de Mestrado em Desenvolvimento Regional da Universidade do Contestado

(UnC), Santa Catarina, Brasil. Doutor em História pela Universidade Federal de Santa Catarina. E-mail:

[email protected] 4 No ano de 2012 ocorreu o lançamento do documentário "O Contestado: restos mortais", do cineasta

Sylvio Back. Em 2015 foi lançado outro documentário, intitulado "Terra Cabocla", da cineasta Márcia

Paraíso. Esta obra se propõem a encontrar os descendentes dos rebeldes do Contestado nos dias atuais.

A obra, além de esteticamente encantadora, consiste em importante documento sobre a vida no Contestado nos dias atuais. Entre a produção literária, merece destaque a obra "Caboclos Rebeldes: uma

aventura pela Guerra do Contestado", de Ricardo Campos. O autor produziu uma obra direcionada ao

público infanto-juvenil a partir das pesquisas mais recentes sobre a temática, contribuindo assim para a superação de um dos principais problemas enfrentados pelos pesquisadores atualmente: viabilizar que o

conhecimento acadêmico seja disponibilizado ao público em geral que, mesmo na região do conflito,

ainda desconhece sua própria história.

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Especificamente em relação à produção acadêmica, revigorada a partir

do início dos anos 2000, constata-se que nos últimos anos vem ocorrendo a

consolidação dessa área de pesquisa, principalmente em decorrência das ses-

sões do Simpósio Nacional sobre o Centenário do Movimento do Contestado,

evento que vem reunindo pesquisadores de diferentes universidades e de

distintas áreas do conhecimento5. Os estudos sobre o Contestado, além de

abundantes, – realizados a partir de uma instrumentalização teórica ampla e

sofisticada, que considera intensa busca e utilização de fontes inéditas –, esta-

beleceram novas abordagens e interpretações acerca daquele movimento

social, as quais vêm superando preconceitos e estereótipos que, a título de

exemplo, definiam os rebeldes revoltosos como "fanáticos" ou "jagunços"6.

O avanço das pesquisas desvelou a complexidade do movimento, com su-

as especificidades, a heterogeneidade e a regionalização de suas causas. Cabe

lembrar que os estudos mais recentes não se restringem ao período do confli-

to, transcendendo o recorte cronológico tradicional. Esses incipientes estudos

vêm proporcionando a instauração de outro profícuo campo de pesquisa, qual

seja, o exame das consequências da Guerra do Contestado para aquela região,

cuja população ainda convive com os ecos do passado.

O período que precedeu o conflito foi caracterizado pela ampliação do

controle da terra, seja pela atuação do capital estrangeiro, representado tanto

pela ferrovia de propriedade da Brazil Railway Company, quanto pela madei-

reira operada por sua subsidiária, a Southern Brazil Lumber and Colonization

Company, seja pela atuação dos coronéis ou grandes comerciantes. Naquele

contexto, dada a privatização da terra e, por conseguinte, a proibição de aden-

trar as matas para realizar a coleta da erva mate, a situação dos pequenos

posseiros e sitiantes tornara-se insustentável. É plausível afirmar que, ao me-

nos no território do planalto norte de Santa Catarina, esse fator influenciou

decisivamente a adesão daquela população marginalizada ao movimento ser-

tanejo do Contestado.

Dentre as causas para o início do movimento sertanejo, adquire relevân-

cia as consequências suscitadas pela atuação de companhias estrangeiras, dos

setores ferroviário e madeireiro. Ambas, municiadas com a típica voracidade

do capital, avançaram sobre a região, exaurindo os recursos naturais, exter-

minando vidas e aniquilando as esperanças – de milhares de pessoas pobres

5 A primeira edição do Simpósio Nacional sobre o Centenário do Movimento do Contestado foi

realizada no ano de 2012, na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), em Florianópolis. Desde então o evento é realizado regularmente, congregando pesquisadores e interessados na temática, o que

vem ampliando e fortalecendo esta área de pesquisa. 6 É razoável afirmar que a obra de Paulo Pinheiro Machado, Lideranças do Contestado, publicada no

ano de 2004, marcou o início de uma nova fase de estudos sobre o movimento do Contestado.

Paralelamente, a abertura de novos programas de pós-graduação, a ampliação de vagas nos programas

existentes e o incremento de recursos destinados a bolsas de pesquisa, ocorrido a partir do início dos anos 2000, permitiu o aumento do número de pesquisadores dedicados ao tema, produzindo dissertações

e teses, destacando-se os trabalhos de: Oliveira (2006); Welter (2007); Rodrigues (2008); Valentini

(2009); Carvalho (2012); Espig (2012); Karsburg (2012); Tomporoski (2013).

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do interior do planalto meridional brasileiro – de que era possível viver em

um mundo repleto de justiça e equidade.

Após o término dos combates, as companhias estrangeiras permanece-

ram naquela região. A Lumber Company operou em Três Barras até o ano de

1940, quando foi estatizada por Vargas, durante o Estado Novo. Posteriormen-

te, no local em que aquela empresa atuou, ocorreu a formação de um campo

de manobras do exército brasileiro, resultando em outro processo de expro-

priação de pequenos proprietários rurais, famílias que ainda hoje lutam para

reaver as terras que lhes foram subtraídas injustamente.

O presente artigo pretende examinar a articulação política da companhia

e as consequências de sua atuação por mais de cinco décadas, até sua transfe-

rência para o Ministério da Guerra e posterior transformação num campo de

manobras do exército brasileiro.

Dessa forma, a análise não se restringe tão somente ao período de insta-

lação e operação da companhia, examinando, também, os impactos resultantes

da presença da Lumber Company, inclusive, os eventos sucedidos após sua

desativação.

METODOLOGIA

Objetivando compreender as mudanças ocorridas na região do Contesta-

do, suscitadas pela presença da Lumber Company, seja no período em que

esteve sob controle do capital estrangeiro, seja após sua estatização e posteri-

or controle pelo Ministério da Guerra, o artigo utiliza sugestões teórico-

metodológicas que convergem às perspectivas da História Social Inglesa –

especialmente as noções sugeridas por Thompson – aplicáveis aos estudos

que optam por uma análise que valoriza uma “história de baixo”, a qual pro-

põe que os mais pobres também demonstram (mesmo que muitas vezes tal

fato seja ignorado) o desenvolvimento de uma consciência das condições soci-

ais e políticas de sua marginalização.

É importante destacar que, o enfoque proposto pela história social ingle-

sa também expõe a necessidade premente de desenvolver uma “história de

cima”, visando complementar a “história de baixo”, evitando-se, assim, negli-

genciar uma perspectiva relacional, ou seja, é preciso valorizar as relações

mútuas, e considerar a reciprocidade entre a classe trabalhadora e as classes

dominantes, além de suas relações com o Estado (THOMPSON, 1978, p.31).

A LUMBER COMPANY

O advento da Southern Brazil Lumber and Colonization Company, conecta-

se ao processo de construção de uma ferrovia que interligaria os estados do

sul do Brasil. Para este fim, o governo brasileiro firmou contrato com a Brazil

Railway Company, empresa responsável pela construção da estrada de ferro

que cruzaria o Planalto Norte Catarinense, tendo como pontos de partida e de

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chegada as cidades de Itararé em São Paulo e de Santa Maria, no Rio Grande

do Sul, respectivamente.

O contrato para a construção da ferrovia estabelecia que a empresa res-

ponsável pela empreitada – a Brazil Railway Company – teria o direito de ex-

plorar as terras adjacentes à linha tronco, numa extensão de até quinze qui-

lômetros do leito da linha férrea. Essas terras eram cobertas por milhões de

pinheiros ou araucárias, imbuias, canelas pretas, cedros e cabriúvas. Objeti-

vando extrair e comercializar essa madeira de alto valor econômico e, mais

tarde, vender parte daquelas terras a imigrantes europeus, a Brazil Railway

Company constituiu uma subsidiária, a Southern Brazil Lumber and Colonizati-

on Company. Em 1910, a Lumber instalou em Três Barras, então território

paranaense contestado por Santa Catarina, uma moderna serraria. A empresa

instituiu um processo industrial altamente mecanizado, com elevada organi-

zação técnica, tornando-se a maior madeireira da América do Sul (CARVALHO,

2010).

A construção desta grande linha férrea alterou o modo de vida das popu-

lações residentes nas regiões por ela atravessadas, elevando o valor econômi-

co das terras, agravando problemas sociais e influenciando diretamente a

deflagração do movimento sertanejo do Contestado, entre os anos de 1912 a

1916, na região fronteiriça entre os estados do Paraná e de Santa Catarina.

A Brazil Railway Company atuou durante quase trinta anos sob controle

do capital estrangeiro, até sua estatização através da publicação do Decreto-

Lei n.º 2.346, de 22 de julho de 1940, assinado por Getúlio Vargas, em plena

vigência do Estado Novo.

A estatização ocorreu em favor dos “interesses nacionais”. Essa foi a justi-

ficativa apontada pelo decreto presidencial. A expressão tem um forte viés

econômico e financeiro. O fato da Brazil Railway Company e suas filiais contro-

larem setores de fundamental importância para o Brasil, tais sejam, ferroviá-

rio, portuário, energético e de colonização, contribuiu para a estatização. En-

tretanto, os problemas decorrentes da má gestão nas companhias do grupo

Farquhar influenciavam, sobremaneira, a economia nacional. Os atrasos no

cumprimento de obrigações com credores de capitais – alavancados em bolsas

europeias – geraram descontentamento e abalaram a confiança dos investido-

res estrangeiros na economia nacional. Isso constrangia a administração pú-

blica do país7. Com base nessa justificativa, o primeiro artigo do decreto in-

corporou ao patrimônio da União os bens e direitos tanto da Brazil Railway

Company – existentes em território nacional – quanto de suas dependentes,

caso da Southern Brazil Lumber and Colonization Company, além de outras

onze companhias8.

7A título de exemplo, a Brazil Railway Company encontrava-se sob regime de concordata, a qual não

fora homologada pela Justiça brasileira, desde 18 de julho de 1917. 8Decreto-Lei n.º 2.346, de 22 de julho de 1940.

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Conforme será examinado posteriormente, em determinado momento,

após a estatização, o Ministério da Guerra assumiu definitivamente o controle

da Lumber Incorporada, o que significou mudanças no modus operandi adota-

do pela companhia. Alguns antigos costumes foram banidos. Fumar durante o

trabalho, por exemplo, foi proibido, inclusive para os chefes de seção. Os rela-

cionamentos, anteriormente imbuídos pelo lúdico, sofreram a imposição de

certa disciplina militar. A intransigência dos oficiais em suas relações com o

pessoal da Lumber gerou conflitos e contribuiu para o agravamento dos pro-

blemas que assolaram a empresa ao longo da década de 1940. O ex-operário

da Lumber, Leopoldo Padilha, rememorou um episódio que exemplifica esse

processo. Segundo ele, “o pessoal fumava, brincava e o Coronel não queria. Um

dia ele pegou o cachimbo de um feitor e jogou no fogo, na frente de todo mun-

do”9. Para Leopoldo, após a estatização da companhia e o controle exercido

pelo exército, “mudou muita coisa”, pois na “época dos americanos”, o “pessoal

trabalhava direitinho” e após a chegada dos militares “a coisa foi fracassan-

do”10.

Ao longo da década de 1940, após os militares assumirem o domínio da

Lumber, obrigações legais inerentes aos contratos de trabalho deixaram de ser

cumpridas.

No período compreendido entre os dias 15 e 20 de outubro de 1948, o

promotor público, Rubem Moritz da Costa, remeteu para avaliação do juiz da

comarca de Canoinhas, Euclides Cerqueira Cintra, um conjunto de requeri-

mentos impetrados por trabalhadores acidentados e não indenizados11.

Os operários e a operária vitimados por acidentes de trabalho foram pre-

teridos pela administração da Lumber Incorporada. Em um dos casos, embora

transcorridos seis meses desde o acidente, o operário não tivera acesso ao

atendimento médico e aos direitos assegurados pela legislação trabalhista, até

a denúncia ao juiz da comarca. Nas audiências, a companhia declarou que não

contestava os acidentes, mas sim os direitos dos (a) acidentados (a). É preciso

considerar que o exército, apesar da atribuição institucional, não reconhecia a

imputação de responsabilidade para com os trabalhadores da antiga Lumber e,

por conseguinte, as indenizações decorrentes de acidentes de trabalho.

Os casos localizados tiveram decisões favoráveis aos trabalhadores, asse-

gurados os tratamentos médicos e os pagamentos das indenizações.

O inquérito do operário polonês Estefano Schlapak é emblemático. Este-

fano “de início trabalhou nas matas da companhia, sujeito ao tempo, não pa-

rando o serviço mesmo em caso de chuva”. Em consequência da arduidade

9Entrevista com o ex-operário da Lumber, Leopoldo Padilha, de 96 anos. Realizada em Três Barras, no

dia 03 de setembro de 2005. 10Idem.

11Ação Trabalhista: Santilha Rodrigues Faria versus Southern Brazil Lumber and Colonization

Company Incorporada. Três Barras, 24 de abril de 1948; Ação Trabalhista: Sizenando Naizer versus

SBLCC Incorporada. Três Barras, 07 de julho de 1948; Ação Trabalhista: Estefano Schlapak versus

SBLCC Incorporada. Três Barras, 20 de outubro de 1948. Arquivo Histórico Municipal de Canoinhas.

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desse serviço, adoeceu. Antes de abandonar o trabalho, em função das dores

abdominais insuportáveis, Estefano trabalhava no serviço de maquinista do

guincho. Nessa ocasião, Estefano já havia dedicado 25 anos de trabalho à em-

presa, na qual começou aos 15 anos de idade e pela qual foi abandonado sem

atendimento ou indenização.

Considerando a intempestividade entre as datas de ocorrência dos aci-

dentes citados e as datas de avaliação pela Justiça, conclui-se que não houve o

cumprimento das determinações da legislação trabalhista, situação que evi-

dencia o abandono dos trabalhadores acidentados à mercê da própria sorte,

sem sequer o adjutório do tratamento médico condizente. O fato da Lumber

Incorporada declarar não reconhecer os direitos dos acidentados e não pres-

tar os atendimentos básicos imputados pela legislação, foi algo representativo

do modo como o pessoal da Lumber seria tratado pela nova gestão. Os traba-

lhadores precisariam continuar a resistir.

O edital

No ano de 1949, foi aberto um edital de concorrência pública, cujo objeto

consistia na venda dos bens da Lumber Incorporada. Inicialmente, não houve

apresentação de propostas, contudo, em dezembro de 1950, três firmas ad-

quiriram o acervo. As três empresas, Cia. Terra e Pinho Ltda., Groppe S.A., Cia.

Madeiras Del Alto Paraná, eram controladas pelo mesmo indivíduo, Alberto

Dalcanale12, empresário que atuou na colonização do sudoeste do Paraná e

oeste de Santa Catarina.

O acervo era constituído por um extenso rol de bens, dentre os quais:

uma propriedade em Calmon, com quinze mil alqueires13 de terras e trezentos

e cinquenta mil pinheiros adultos; na região da Serra do Espigão, então muni-

cípio de Canoinhas, outros duzentos mil pinheiros adultos; remanescentes de

‘propriedades loteadas’, entre os quais muitos lotes que haviam sido vendidos

entre as estações ferroviárias de Canivete e Valões (atual Irineópolis); um

terreno com mais de dez mil metros quadrados, em São Francisco do Sul; na

região da Barra Funda, em São Paulo, um “palacete”, quatro casas menores e

um terreno com dez mil metros quadrados; uma propriedade com seiscentos

e cinquenta alqueires no então distrito canoinhense de Papanduva (atual mu-

nicípio de Papanduva); um terreno – com cerca de nove alqueires – onde esta-

va instalada a serraria, fábrica de caixas, laminadora, oficinas, casas, arma-

zéns, e hospital; aproximadamente quarenta e três quilômetros de linha férrea

assentada, além de maquinário da indústria de madeira, locomotivas, cerca de

quarenta vagões e plataformas para transporte de madeira pela ferrovia14.

12Diário do Congresso Nacional. Brasília, 23 de maio de 1953. Página 4374.

13Um alqueire representa, na região sob análise, 2,42 hectares. 14Diário do Congresso Nacional. 23 de maio de 1953. Página 4390.

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Conquanto tenha sido efetivada a alienação do acervo, depreende-se que

houve irregularidades, seja no edital de concorrência pública, seja na posteri-

or partilha dos bens da Lumber. A proposta vencedora foi a única que consig-

nou preço superior ao mínimo estipulado no edital, correspondente a cin-

quenta milhões de cruzeiros, embora o excedente tenha sido de apenas

Cr$100.000,00 (cem mil cruzeiros). Apesar do edital de concorrência pública

não admitir a divisão dos bens da Lumber, após a negociação, uma parcela do

acervo foi celeremente escriturada em nome de terceiros.

Naquele contexto, também é preciso considerar o interesse do Ministério

da Guerra em instalar um Campo de Manobras na 5ª Região Militar, o que se

coadunou com a obtenção dos bens da antiga Lumber, após a estatização. Ou-

tro fator preponderante consistiu na atuação do governo do estado de Santa

Catarina, chefiado por Irineu Bornhausen, que colaborou decisivamente para

o processo de instalação do campo militar em Três Barras, inclusive assumin-

do o compromisso de cessão de terras – evidentemente após as desapropria-

ções – num total de dez mil hectares, na região de Papanduva, limítrofe ao

perímetro da Lumber.

No mês de março de 1951, um representante da 5ª Região Militar, cuja

sede do comando localizava-se em Curitiba, procurou o governo do estado de

Santa Catarina visando obter apoio para identificar uma área de terras entre

três e quatro mil alqueires. Tal área deveria estar localizada nas proximidades

da Lumber, em Três Barras, entre os rios Canoinhas, São João e Rio das Antas.

Em correspondência ao comandante da 5ª Região Militar, à época o General

Tristão de Alencar Pires, o governador catarinense, o udenista Irineu Bor-

nhausen, manifestou enlevo pela ideia, segundo ele, “visando o progresso que

advirá para Três Barras com o estabelecimento, ali, de uma Unidade do Exér-

cito Nacional”15. O governador enviou instruções ao prefeito municipal de

Canoinhas, orientando-o para que, juntamente com o representante da Com-

panhia de Madeiras Del Alto Paraná, empresa compradora do acervo da Lum-

ber, compusesse uma comissão com o objetivo de localizar uma área de terras

que atendesse aos interesses dos militares.

Transcorrido pouco mais de um mês, em nova correspondência do go-

verno catarinense destinada ao comando da 5ª Região Militar, o chefe do exe-

cutivo estadual ratificou sua intenção em colaborar com os interesses dos

militares, acerca da instalação do campo de manobras no município de Canoi-

nhas. O entusiasmo de Irineu Bornhausen com a negociata levou-o a declarar

que estava “(...) disposto a tomar todas as providências no sentido de desa-

propriar as terras necessárias à instalação, no município de Canoinhas, do

campo de Instruções e Manobras da 5ª Região Militar, na área escolhida pela

15Ofício N.º 85 – Florianópolis/SC, 12 de março de 1951. Do Governador do Estado de Santa Catarina

ao Comandante da 5ª Região Militar. Correspondências e Minutas do Palácio do Governo de Santa

Catarina para o Ministério da Guerra. Arquivo Público do Estado de Santa Catarina.

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Comissão designada por esse comando”16. Dessa forma, o então governador do

estado de Santa Catarina, delegou a responsabilidade pela escolha de uma

área de terras a uma comissão constituída por representantes do Ministério

da Guerra e pelo controlador das empresas que haviam adquirido os bens que

integravam o acervo da antiga Lumber. Nesse contexto, estranha o fato dessa

atribuição para escolher e desapropriar terras ter sido transferida a uma co-

missão que apresentava, entre seus membros, representantes de empresas

privadas.

Na mesma correspondência, o governador Irineu Bornhausen, com o ob-

jetivo de “reduzir os custos com as indenizações” decorrentes das desapropri-

ações, apresentou uma proposta para permuta das novas áreas de terras, que

seriam desapropriadas pelo estado catarinense, com áreas de terras outrora

pertencentes à antiga Lumber, transferidas ao Ministério da Guerra após a

estatização daquela companhia. O General Tristão, atônito, afirmou não ter

compreendido a proposta, afinal, segundo ele, o patrimônio total da Lumber,

elencadas as terras, instalações e reservas florestais, estaria avaliado em cin-

quenta milhões de cruzeiros, enquanto as áreas de terrenos que o exército

receberia, caso aquiescesse com a permuta, “embora mais extensas, são, po-

rém, de valor incomparavelmente bem mais reduzido do que aquelas terras da

Lumber”17. A tentativa do governador catarinense em ludibriar o Ministério da

Guerra, através de uma ardilosa proposta de permuta fundiária, foi pronta-

mente rechaçada pelo comando militar. Contudo, esse revés nos planos para

utilização do acervo da Lumber em prol de interesses privados, não significou

o abandono do projeto.

No dia 29 de maio de 1951, foi realizada uma reunião da Comissão Regi-

onal de Escolha de Imóveis para o Ministério da Guerra, na sede da Lumber

Company, em Três Barras, município de Canoinhas18. Entre os presentes, en-

contravam-se os militares componentes da Comissão19, os delegados da Supe-

rintendência das Empresas Incorporadas ao Patrimônio Nacional20 e os repre-

sentantes da Companhia de Madeiras Del Alto Paraná21.

O empresário Alberto Dalcanale declarou abrir mão, em favor do Ministé-

rio da Guerra, de área sob controle da Cia. de Madeiras do Alto Paraná, situada

16Ofício N.º 161 – Florianópolis/SC, 20 de abril de 1951. Do Governador do Estado de Santa Catarina

ao Comandante da 5ª Região Militar. Correspondências e Minutas do Palácio do Governo de Santa Catarina para o Ministério da Guerra. APESC. 17Ofício N.º 93 – SER/5ª R. M. Curitiba/PR, 27 de Abril de 1951. Do Comandante da 5ª Região Militar

ao Governador do Estado de Santa Catarina. APESC. 18Ata da Reunião realizada pela Comissão Regional de Escolha de Imóveis para o Ministério da

Guerra. Três Barras, município de Canoinhas, 29 de maio de 1951. APESC. 19General Sady Martins Vianna, Tenentes Coronéis Carlos Queiros Falcão e Murat Guimarães,

Capitães Basílio Marques dos Santos Sobrinho e Dr. José Alvarenga Moreira, sob a presidência do

primeiro. 20Hortencio Alcantara Filho e Ary d’Leary Paes Leme. 21Alberto Dalcanale e Wilen B. Martins.

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na região compreendida entre os rios Canoinhas, Jangada, Papanduva, bem

como de glebas situadas nas regiões de Valões, São João da Barra e Toldo de

Cima, “exceção feita da área de reflorestamento da gleba de Valões”. Dalcanale

concordou com a transferência integral das instalações e maquinarias existen-

tes na sede da Lumber, em Três Barras, ao Ministério da Guerra22. Evidente-

mente, as cessões dos bens não foram motivadas por um patriotismo exacer-

bado por parte de Dalcanale. A transferência das áreas supracitadas (com

exceção feita àquelas povoadas por pinheiros) consistiu em um estratagema

que objetivou desatar os bens de menor valor e transferir os trabalhadores da

antiga Lumber para uma instância pública – no caso, o Ministério da Guerra –

desincumbindo as empresas de Dalcanale das obrigações referentes aos salá-

rios, encargos trabalhistas e de contingências resultantes de indenizações aos

operários da companhia incorporada.

Após a efetivação da transferência, prosseguiram as negociações para a

doação, pelo governo catarinense, de terrenos que complementariam a área

necessária para instalação de um campo militar. O governador de Santa Cata-

rina, Irineu Bornhausen, propôs uma solução, aceita pelo então ministro da

guerra, general Henrique Teixeira Lott, que consistiu na utilização dos recur-

sos consignados na emenda n.º 157, no montante de Cr$ 40.000.000,00 (qua-

renta milhões de cruzeiros), para fins de complementação da dotação orça-

mentária do Ministério da Guerra, visando prover recursos para pagamento

das indenizações decorrentes das desapropriações de terras necessárias à

composição do campo militar em Três Barras23. Portanto, a atuação de Bor-

nhausen foi decisiva para a instalação do campo militar, inclusive dispondo-se

a desapropriar novas áreas de terra necessárias à composição do campo, o

que, de fato, consistiu num compromisso formal, contudo destituído de ônus

para o governo catarinense. Através de manobra astuta, embora obscura, tan-

to os encargos trabalhistas quanto o ônus e o desgaste político, inerentes ao

processo de desapropriação de terras na região de Três Barras, foram transfe-

ridos ao Ministério da Guerra. Os empecilhos à maximização dos lucros das

empresas controladas por Dalcanale haviam sido removidos, incrementando a

expectativa de auferir vantagens – lícitas ou não – àqueles que apoiaram ou

contribuíram decisivamente para o desfecho do negócio.

Após a reunião realizada em Três Barras, e, por conseguinte, do desenla-

ce dos trâmites jurídicos, a partir do dia 11 de setembro de 1952, a área onde

22Ofício n.º 913. Florianópolis/SC, 31 de julho de 1957. Do Governador do Estado de Santa Catarina –

Jorge Lacerda – ao Comandante da 5ª Região Militar – general Aurélio Lyra Tavares. Além do Superintendente das Empresas Incorporadas ao Patrimônio da União, a reunião de transferência teve a

presença de um representante do Ministério da Guerra, membros da Comissão de Levantamento e

Avaliação, representante do governo catarinense e dos compradores dos bens da Lumber, “tudo de

conformidade com os entendimentos havidos entre o Ministério da Guerra, a Superintendência, os

adquirentes do acervo da Lumber e o Estado de Santa Catarina”. 23Idem.

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outrora funcionara a Southern Brazil Lumber and Colonization Company foi

transferida ao controle do exército brasileiro.

Nos anos subsequentes, a área da antiga Lumber permaneceu sob contro-

le do exército, porém a configuração do campo militar continuava indefinida

em função da necessidade de ampliação da área total, o que seria viabilizado

somente após os processos de desapropriações de terras dos camponeses

situados em áreas adjacentes à sede da antiga serraria, local que também

abrigaria o comando do futuro campo militar.

“Quem parte e reparte fica com a melhor parte”24

O acervo da antiga Lumber foi alvo de negócios espúrios. O processo de

encampação dos bens pertencentes à Lumber Company esteve envolto em

irregularidades, escopo de estratagemas que objetivavam a divisão dos bens.

Os bens que integravam o acervo foram vendidos em concorrência pública,

por valores muito aquém daqueles vigentes no mercado, em desobediência ao

edital. Aqueles bens que apresentavam valores vultosos foram desmembra-

dos, e a serraria de Três Barras, que em determinada época fora a maior da

América do Sul e uma das maiores do mundo, tornou-se obsoleta, além de

padecer com a escassez de matéria prima em seu entorno. Dessa forma, a

Lumber transformou-se em um “presente de grego” para o Exército Nacional25.

Aqueles bens que exibiam potencial para otimizar a geração de lucros –

dentre os quais uma ingente propriedade em Calmon, a fazenda São Roque,

com duas serrarias, desvios ferroviários, trezentos e cinquenta mil pinheiros,

imbúias, etc., edifícios em São Paulo e Paraná e vastos pinheirais na Serra do

Espigão, em Santa Catarina – permaneceram sob controle das empresas ad-

quirentes controladas por Alberto Dalcanale, e sua exploração gerou, imedia-

tamente, acentuado retorno econômico-financeiro. Em contrapartida, a serra-

ria de Três Barras – transferida por Dalcanale ao Ministério da Guerra – per-

manecia praticamente imobilizada, analogamente ao grupo de antigos traba-

lhadores da Lumber, que ficara sob responsabilidade do exército. Os custos

estimados para amortização dos encargos decorrentes de eventuais demis-

sões dos trabalhadores poderia atingir a cifra de quinze milhões de cruzei-

ros26. Ainda no decorrer do ano de 1953, o então deputado federal Saulo Ra-

mos, apresentou um relatório – que fora submetido a uma Comissão Parla-mentar de Inquérito – no qual detalhou as irregularidades envolvendo a Lum-ber Company. O relatório sustentava que a Companhia Pinho e Terras Ltda., detentora da propriedade Calmon, com cerca de 350 mil pinheiros, além dos três edifícios na região da Barra Funda, em São Paulo, cujos preços atingiam o

24Diário do Congresso Nacional. 23 de maio de 1953. Página 4391.

25Barriga Verde. Ano XVI. Nº 839. Canoinhas, 24 de março de 1954. Biblioteca Pública do Estado de

Santa Catarina. 26Barriga Verde. Canoinhas, 24 de março de 1954. Idem.

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montante de Cr$8.500.000,00 (oito milhões e quinhentos mil cruzeiros), ime-diatamente após a concretização da negociação, realizou a venda dos imóveis localizados na Barra Funda, recebendo a importância de Cr$ 10.000.000,00 (dez milhões de cruzeiros). Sem dúvida um excelente negócio. Além disso, as centenas de milhares de pinheiros possuíam valor estimado entre Cr$ 100 e Cr$ 200 (cem e duzentos cruzeiros) a unidade, ou seja, após seu corte e venda, também poderiam auferir lucro de dezenas de milhões de cruzeiros27.

À empresa Groppe S.A., coube a parcela industrial do acervo, além de fai-xas de terras marginais à Rede Viação Paraná Santa Catarina. Esses consisti-ram nos itens do acervo que posteriormente foram transferidos ao Ministério da Guerra.

A terceira empresa que compunha o consórcio, a Cia. De Madeiras Del Al-to Paraná S.A., obteve os pinheirais da Serra do Espigão, uma propriedade na localidade de Felipe Schmidt, município de Canoinhas, e uma área de dez mil metros quadrados, em São Francisco do Sul.

O referido relatório estimava que o valor real dos bens e direitos da Lum-ber atingiria o montante de Cr$ 100.000.000,00 (cem milhões de cruzeiros). No entanto, o preço básico fora definido em apenas Cr$ 50.000.000,00 (cin-quenta milhões de cruzeiros). Segundo o relatório, o preço dos pinheiros e das propriedades fora subavaliado, em valores aquém das cotações do mercado, na mesma época e nos mesmos locais.

Ao tomar conhecimento do interesse do Ministério da Guerra em compor um campo militar na região de Três Barras, o proprietário das três empresas consorciadas que adquiriram os bens da Lumber, Alberto Dalcanale, prontifi-cou-se em ceder a propriedade de seiscentos e cinquenta alqueires, além da parte industrial, maquinários, ferrovia, edifícios e algumas propriedades em São Francisco do Sul. Certamente, um notório empresário do setor fundiário, madeireiro e colonizador, não obtinha fortuna realizando doações motivadas por seu patriotismo. Juntamente com a parcela do acervo, de interesse do exército, Dalcanale transferiu os duzentos e sessenta e quatro trabalhadores da Lumber e os correspondentes encargos trabalhistas. O jornal Barriga Verde, em março de 1953, denunciou aquilo que definiu como “uma das mais negras manobras para saquear a Fazenda Nacional”. Segundo o jornal, os dirigentes das Empresas Incorporadas ao Patrimônio da União e os compradores do acervo da Lumber Company, entre eles Irineu Bornhausen, então governador do estado de Santa Catarina, pressionaram o Ministério da Guerra para que assumisse os encargos trabalhistas, objetivando isentar os compradores do acervo28.

No dia 04 de fevereiro de 1954, a filha de Alberto Dalcanale, Ivete Terezi-nha29, e o filho do governador Irineu Bornhausen, Paulo Konder Bornhausen, contraíram matrimônio. Enquanto as famílias Dalcanale e Konder Bornhausen

27Diário do Congresso Nacional. 23 de maio de 1953. Página 4390.

28Barriga Verde. Ano XVI. Nº 752. Canoinhas, 19 de março de 1953. BPESC.

29O nome de Ivete recebeu grande atenção no ano de 2003, quando uma investigação apontou a

realização de lavagem de dinheiro pelo Banco Araucária, do Paraná, controlado pelo seu irmão e

sobrinhos.

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celebravam sua união por intermédio do casamento de Paulo e Ivete, os du-zentos e sessenta e quatro trabalhadores da Lumber e suas famílias, num total de aproximadamente mil e duzentas pessoas, padeciam com o segundo perío-do de atrasos no recebimento dos salários. Surgiam os “flagelados de Três Barras”.

“OS FLAGELADOS DE TRÊS BARRAS”30

Os duzentos e sessenta e quatro trabalhadores da Lumber Company que

se encontravam em atividade quando da estatização da companhia, foram

transformados em moeda de troca, pela Superintendência da União, pelo Mi-

nistério da Guerra e, principalmente, pelos compradores do acervo da empre-

sa. Ambos os envolvidos nas negociações fizeram o possível para se livrar da

responsabilidade sobre os trabalhadores, seus encargos trabalhistas e indeni-

zações decorrentes de eventuais demissões.

Após a transferência do segmento industrial da Lumber ao Ministério da

Guerra, ocorrida em julho de 1952, foi firmado um acordo entre as partes

interessadas, através do qual concordaram que as obrigações salariais do

pessoal da Lumber seriam arcadas pela Superintendência da União, até que o

Ministério da Guerra detivesse verbas para essa finalidade.

No entanto, a partir do mês de setembro de 1952, cessaram os pagamen-

tos dos salários, momento a partir do qual as duzentas e sessenta e quatro

famílias de trabalhadores da Lumber Incorporada iniciariam uma longa e an-

gustiante jornada, cuja primeira etapa duraria catorze meses! Os pagamentos

retroativos foram realizados somente no mês de dezembro de 1953, após

árdua batalha travada pelos trabalhadores e sua organização, a Sociedade

União Operária, com o apoio do Sindicato dos Oficiais Marceneiros e Traba-

lhadores nas Indústrias de Serrarias e Móveis de Madeira de Canoinhas, em

aliança com o advogado da Lumber, além de políticos da região.

A maioria dos trabalhadores recebia salários situados na faixa entre Cr$

600,00 (seiscentos cruzeiros) e Cr$ 900,00 (novecentos cruzeiros).

Os salários em atraso foram quitados após delicada negociação, que con-

tou com a participação do Ministro do Trabalho, João Goulart. Os salários pa-

gos correspondiam ao período de setembro de 1952 até dezembro de 1953.

Infelizmente, reincidências de atrasos nos pagamentos dos salários afligiriam

os trabalhadores da Lumber Incorporada e suas famílias, em períodos subse-

quentes. Todavia, além das questões trabalhistas, as desapropriações que

seriam realizadas no entorno da antiga serraria, objetivando a composição do

campo militar, também iriam suscitar sacrifícios dos camponeses que cultiva-

vam as terras contíguas à Lumber Incorporada.

AS DESAPROPRIAÇÕES

30Barriga Verde. Ano XVI. Nº 751. Canoinhas, 15 de março de 1953. BPESC.

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O decreto n.º 50.570, de 18 de dezembro de 1956, autorizou a desapro-

priação de 7.614 (sete mil, seiscentos e catorze) hectares, atingindo oitenta e

nove lotes de pequenos agricultores, num total de sessenta e oito famílias.

O decreto de desapropriação apresentava diversas falhas técnicas. A títu-

lo de exemplo, não delimitava a localização da área desapropriada, apenas

referenciava terrenos situados no Estado de Santa Catarina. Além disso, não

descrevia os limites de cada propriedade, conforme a discriminação nas pró-

prias escrituras e, por fim, também não definia um dispositivo que permitisse

verificar os critérios de avaliação e validar os cálculos das verbas indenizató-

rias. Na etapa de arrolamento dos bens, a comissão do exército não conside-

rou pastos e ervais na composição das verbas indenizatórias, apenas as ben-

feitorias. Portanto, recursos imprescindíveis à subsistência daqueles campo-

neses, abruptamente lhes foram retirados, sem que houvesse a indenização

justa. Ademais, os valores das indenizações, consignados no decreto, apresen-

tavam acentuada defasagem, pois se referiam ao período em que o levanta-

mento da área de desapropriação fora efetuado. Ao considerar os índices de

inflação acumulada de 22,6% (vinte e dois inteiros e seis décimos por cento) e

12,7% (doze inteiros e sete décimos por cento) nos anos de 1956 e 1957, res-

pectivamente, depreende-se que os valores estabelecidos para as indeniza-

ções sofreram rápida perda de poder aquisitivo. No início da década de 1960,

os valores constantes no decreto sequer representavam 3% (três por cento)

do valor de mercado das terras (SCHIOCHET, 1988, p. 86).

Nesse mesmo período, os militares recrudesceram o tratamento dado aos

camponeses, que continuavam a morar nas terras desapropriadas. Proibiu-se

a retirada da madeira e da erva mate, recursos importantes para a subsistên-

cia dos pequenos agricultores, tendo sido formada, inclusive, uma comissão

para averiguar as eventuais transgressões a essa determinação. Além disso,

deu-se início às operações e manobras militares, que obrigavam os agriculto-

res desapropriados a se afastarem periodicamente de suas casas, uma eviden-

te estratégia para forçá-los a se retirarem definitivamente.

Em 1963, o poder judiciário concedeu títulos de posse provisória das ter-

ras desapropriadas ao exército, medida que lhe possibilitou assumir o domí-

nio das terras, embora ainda não tivesse efetuado o pagamento das indeniza-

ções, cujos valores seriam reavaliados em processo de revisão.

Não obstante o processo de revisão das indenizações, a atuação do exér-

cito, durante a remoção das famílias desapropriadas, marcou indelevelmente

aquelas pessoas. Diga-se de passagem que isto representa um vetor profícuo à

ampliação da pesquisa.

Na década de 1980, desapropriados e herdeiros se organizaram no Mo-

vimento dos Desapropriados de Papanduva. Sua atuação foi marcada, desde o

início, pela interposição de diversas ações judiciais, manifestações mediante

greves de fome e da organização de acampamento, na localidade de Poço

Grande, ao lado do Campo de Instrução Marechal Hermes. O acampamento foi

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denominado de João Maria. O movimento também ocupou a sede do INCRA

(Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária), em Florianópolis, du-

rante um ano, entre 1986 e 1987. Em 1987, também foi realizada a 2ª Romaria

da Terra/SC, que reuniu cerca de 20 mil pessoas (FAVARIN, 2009, p. 114). No

ano de 2007, o MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra) reali-

zou uma ocupação e promoveu um debate acerca das terras do campo militar

serem improdutivas ou subutilizadas (em função do reduzido número de ma-

nobras realizadas). Além disso, houve denúncias de arrendamentos realizados

pelo exército, de áreas do campo, para o cultivo de grãos de soja por fazendei-

ros da região31.

O processo de desapropriação gerou enorme tensão social, pois os colo-

nos desapropriados sentiram-se lesados, haja vista que, segundo eles, o go-

verno federal estabeleceu preço irrisório pelas terras desapropriadas, destitu-

ído de isonomia, pois com terras que apresentavam de igual qualidade similar

foram sendo avaliadas com oscilações de até 100% (cem por cento) no valor

do hectare.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A presença da Lumber Company afetou, de modo direto e indireto, em vá-

rias instâncias e em diferentes épocas, a região sob sua influência, no territó-

rio Contestado. Seja sob controle do capital estrangeiro, expandindo seu do-

mínio fundiário, expulsando milhares de pequenos posseiros das terras, exau-

rindo a madeira nobre, influenciando os eventos na Guerra do Contestado

(1912-1916) e, nos anos seguintes à guerra, cooptando autoridades e furtiva-

mente esquivando-se de suas obrigações decorrentes de acidentes de traba-

lhos. Da mesma forma, sob controle do governo, após sua estatização, a partir

de 1940, na suspeição que recai sobre o processo de venda do acervo da com-

panhia, mediante atuação parcial de autoridades públicas, utilizando-a como

embuste e cedendo-a, a partir de 1952, ao controle dos militares, momento a

partir do qual suas centenas de trabalhadores e familiares iniciaram um longo

e angustiante período com ausência de recebimento de salários, até seu desfe-

cho surpreendente, no qual o local da sede da companhia fora transformado

em um campo de instrução militar, por sua vez influenciando – novamente! –

desapropriações de terras adjacentes, gerando uma nova onda de injustiças

que reverbera até os dias atuais. Indubitavelmente, a presença da Lumber

Company – uma empresa – influenciou sobremaneira, outrora e hodiernamen-

te, o curso dos eventos, de modo direto e indireto, na região sob sua influência,

impactando no processo de desenvolvimento regional, não só na dimensão

econômica, mas gerando descontentamentos e conflitos sociais, logo, situa-

ções de marginalização socioeconômica.

31Correio do Norte. Ano 65. Edição n.º 3033. Canoinhas, 13 de Abril de 2012.

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Acerca de sua influência indireta, já em seus derradeiros momentos, ou

seja, as desapropriações de terras realizadas para complementar a área neces-

sária à composição do campo de instrução militar, cuja sede coincidiu com o

local de instalação da companhia, nos dias atuais, muitos descendentes dos

antigos proprietários ainda mantém contendas judiciais, com o objetivo de

reaver as terras ou, ao menos, obter a reparação justa pelas verbas indeniza-

tórias defasadas pagas aos seus antepassados. Muitos acresceram suas dívidas

ao captar empréstimos para quitação dos honorários advocatícios e, ao rece-

berem suas indenizações, perceberam que a inflação havia corroído os valo-

res, impossibilitando a aquisição de outras áreas, semelhantes àquelas das

quais foram removidos.

Por conseguinte, em retrospectiva, tanto os duzentos e sessenta e quatro

trabalhadores da Lumber (e suas famílias), vinculadas ao quadro do Ministério

da Guerra – que padeceram com o descumprimento das obrigações salariais

de forma recorrente –, quanto os desapropriados do campo militar e seus

herdeiros, materializam alguns dos capítulos mais injustos da atuação das

classes dominantes, com o agravante da conivência do Estado em detrimento

dos interesses dos mais pobres.

Há que se considerar que muitos processos contundentes de exclusão

dos mais pobres, permanecem vigentes em toda a região do Contestado. Con-

quanto, em perspectiva, percebe-se um longo processo de exploração e exclu-

são, uma leitura diametralmente oposta permite vislumbrar que a resistência,

a organização e a luta dos excluídos, em prol do reconhecimento e cumpri-

mento de seus direitos, constitui uma tradição sólida, a qual atingiu seu auge

no movimento sertanejo do Contestado (1912-1916), nas décadas subsequen-

tes reinventada de modo dinâmico e ininterrupto.

São desafios que ainda precisam ser enfrentados, para amainar os impac-

tos de processos históricos de exploração e marginalização social do povo do

Contestado, com vistas aos avanços necessários no processo de desenvolvi-

mento das regiões atingidas.

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SERTÃO É TERRA ONDE PERU DÁ COICE, CANDEEIRO DÁ CHOQUE E O CISCO FAZ A

CURVA: BREVE ANÁLISE SOBRE O “SERTÃO”

NA HISTORIOGRAFIA CLÁSSICA BRASILEIRA E

DO CONTESTADO

Eloi Giovane Muchalovski1

INTRODUÇÃO

Segundo um antigo provérbio nordestino o “sertão é terra onde peru dá

coice, candeeiro dá choque e o cisco faz a curva”. Esta frase, de caráter popular,

expressa com notoriedade a significância do termo “sertão” para o imaginário

social brasileiro, atribuindo toda uma gama de características que o fazem

representar diferentes e, às vezes, adversas acepções dos espaços físico e cul-

tural.

Não é de hoje que a categoria “sertão” tem sido objeto de problematiza-

ção de variados ramos da ciência como a Antropologia, Sociologia, Literatura,

Geografia e História. No caso específico da Geografia, é apreensível que, por

meio do surgimento da Geografia Humana na década de 1970, os estudos do

espaço, do regional, e suas relações com os sujeitos que nele estabelecem prá-

ticas, passaram a ganhar significativa força. A História trilhou um caminho

bastante símil, iniciado na primeira metade do século XX através dos avanços

teóricos e metodológicos que a escola do Annales2 empreendeu na historiogra-

fia, onde as fontes e a análise destas alcançaram uma visão diferenciada da-

quela interprendida pela escola positivista.

Vale aqui destacar a crítica que os teóricos marxistas realizaram frente

aos positivistas, questionando-os sobre a parcialidade de seu método de estu-

do histórico. Método que privilegiava fontes ditas oficiais, político-

administrativas: dos governantes, das elites, dos heróis; deixando de ver os

1 Graduado em História, discente do Programa de Mestrado em História e Regiões da Universidade

Estadual do Centro-Oeste/UNICENTRO – Paraná. Brasil. E-mail: [email protected] 2 A Escola dos Annales foi um movimento historiográfico estabelecido pela revista francesa Annales

d'histoire économique et sociale, a qual incorporou uma série de métodos das Ciências Sociais à

pesquisa histórica, procurando avançar para além do pensamento positivista até então predominante.

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sujeitos que não constavam nesses documentos: operários, camponeses, es-

cravos, indígenas, enfim, os vencidos; fato denunciador da análise positivista

materializar-se em uma visão míope da história, parcial e incompleta, ao passo

que deixava a margem uma série de elementos que seu método simplesmente

negligenciava.

Em processo contínuo, a historiografia se pulverizou atingindo variados

elementos da atividade humana. Nesse contexto, o espaço foi reivindicado

pela História, a qual passou a empreender intensa reflexão intelectual sobre o

conceito de região e suas categorias. Reflexão ainda em curso, evidenciada

pelo expressivo número de programas de mestrado e doutorado existentes no

Brasil que apadrinharam a problemática do regional em suas áreas de concen-

tração. Nessa acepção, o “sertão” ganhou certo destaque, se fazendo problema

de historiadores em diversas partes do país, em busca constante de sua deli-

mitação para além daquele simples designativo atribuído a uma das quatro

sub-regiões geográficas do Nordeste brasileiro.

Posto isso, o intento deste ensaio será demonstrar uma linearidade na

ideia de “sertão” desenvolvida nos primórdios da historiografia brasileira e

seu respectivo uso pelos “historiadores de farda”3. Para tanto, se fará uso da

metodologia de análise de discurso tendo como objeto obras de alguns impor-

tantes intelectuais que iniciaram uma tentativa de narração do Brasil enquan-

to nação, sendo eles: Francisco Adolfo de Varnhagen, Capistrano de Abreu e

Sergio Buarque de Holanda. Neste desígnio, se realizará algumas ponderações

das valiosas contribuições da Literatura, em especial efetivadas por Guima-

rães Rosa e Euclides da Cunha, haja vista que estes escritores são basilares ao

se pensar o “sertão”. Nada obstante, a espinha dorsal do texto ombrear-se-á na

análise das obras “Contestado” de Alcibí ades Miranda, e “Campanha do Contes-

tado: episódios e impressões” de Demerval Peixoto. Os referidos autores parti-

ciparam como combatentes do exe rcito durante a Guerra Sertaneja do Contes-

tado4, deixando em seus textos um considera vel conjunto de discursos que

evidenciam viso es sobre o “serta o”, coeficiente que justifica sua escolha neste

trabalho.

Ao final, discorrer-se-a sobre algumas reflexo es quanto aos recentes es-

tudos acerca do espaço, da regia o e sua correlaça o com o pu bere conceito de

desenvolvimento, tentando assim direcionar para possí veis encaminhamentos

que a Histo ria oferece a queles que pretendem utilizar-se dela para empreen-

der pesquisas de cara ter regional, ou mesmo de Histo ria Regional.

3 O termo “historiador de farda” é empregado pelo historiador Rogério Rosa Rodrigues (2012, p. 249)

para nomear oficiais que se dedicaram à pesquisa histórica sobre o Contestado, não sendo aceitos nessa

categoria oficiais que apenas produziram obras de memórias ou relatórios técnicos sobre o Contestado. Cabe aqui ressaltar que Alcebíades Miranda não é contemplado pela análise de Rodrigues, fato que,

desta forma, não me dá autoridade para assim nomeá-lo.

4 Utilizo aqui a nomenclatura Guerra Sertaneja do Contestado por concordar com a observação feita pelo historiador Paulo Pinheiro Machado (2004, p. 36), onde mesmo aponta ser esta mais adequada e,

por sua vez, já utilizada pelo sociólogo Maurício Vinhas de Queiroz (1977), indiretamente fazendo

referência a outras guerras e movimentos sertanejos brasileiros.

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A ETIMOLOGIA DO “SERTÃO”

Etimologicamente, o “sertão” é uma categoria que atravessou o Atlântico.

A quem defenda que o termo tem origem numa noção de deserto, derivado da

palavra “desertão”. Contudo, ao que parece, sua real constituição está longe

disso – apesar algumas pesquisas etimológicas sugerirem tal, devido sua se-

melhança estrutural – há uma concepção que entende o “sertão” como um

elemento empregado para dizer sobre o interior, dizer o longe, o longe de

Portugal, o outro, ou seja, o espaço além das redondezas. Tal raciocínio está

inserido no pensamento de Janaína Amado (1995), onde a autora tenta reali-

zar um contraponto com a História, enfatizando que esse sentido do “sertão”,

o qual existira em Lisboa, já não mais existe no Velho Mundo, sendo ele trans-

ferido para o Brasil. Destarte, “sertão” é uma palavra que trespassou o Atlânti-

co, deixando de ser empregado em Portugal para servir de conceito em terras

brasileiras, muito pela ideia de um espaço vazio, um espaço longe.

O “Vocabulario portuguez & latino” do padre Raphael Bluteau, publicado

entre os anos de 1712 e 1728, é considerado por muitos com o primeiro dici-

onário da língua portuguesa, nele “sertão” está grafado como “sertaõ”, apre-

sentando este como significado de uma “região apartada do mar, & por todas

as partes, metida entre terras” (BLUTEAU, 1712-1728, p. 613). Já, o intelectual

Gustavo Barroso (1947), professor e romancista – dentre outras várias ativi-

dades que exercera – apresenta o “sertão” derivado de “mulcetão”, palavra que

teria sido abreviada para “certão”, significando o termo latino locus mediter-

raneus, que quer dizer o interior, longe da costa, oposto ao marítimo. O mesmo

Barroso (1947) apresenta ainda a possibilidade de “sertão” ser uma derivação

da língua bunda (angolana), especificamente das palavras “celtão” ou “certão”,

significado de “mato”.

Todavia, também é possível que a categoria tenha sido utilizada desde o

século XII, grafado como “sertão” ou “certão”, em referência a locais distantes

de Lisboa, ou ainda, advindo do latim clássico “serene”, “sertanum”, “desertum”.

Foi com frequência usada pela Coroa portuguesa e no Brasil fartamente en-

contrado na documentação oficial (AMADO, 1995, p. 4-5).

Enfim, existem muitos estudiosos da etimologia que ainda se debruçam

sobre estes aspectos, o que não é exatamente o foco da História, dos estudos

de cunho histórico. O que realmente compete ao ofício do historiador é apre-

ender a aplicação dos conceitos dentro da temporalidade, especificamente

quanto uma determinada palavra como “sertão”, por exemplo, passa a ser

volumosamente utilizada e significada, modificando seu sentido e sua aplica-

ção. Nessa perspectiva, cabe aqui ressaltar a importância da “história dos con-

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ceitos”5, área teórica multidisciplinar das ciências humanas que se propõe a

investigar as mudanças nos significados de certos termos e palavras no tempo,

com intuito de demonstrar como que uma categoria pode associar-se a distin-

tos significados, o que permite captar a propagação dos discursos no imaginá-

rio social.

Portanto, uma das linhas possíveis de investigação conceitual se insere

na análise historiográfica, na captura das continuidades e rupturas presentes

nos discursos históricos, possibilitando ao historiador empreender um enten-

dimento sobre os espaços. Pois, como alude Agnes Heller (1993, p. 197), “a

historiografia reconstrói as idades passadas-presentes numa dimensão espa-

ço-temporal”.

O “SERTÃO” NA HISTORIOGRAFIA CLÁSSICA6 BRASILEIRA

Entendendo que historiografia é episteme, é conhecimento verdadeiro

(HELLER, 1993, p. 95), um hábito de seleção, o qual é dever do historiador

fazê-lo, talvez o primeiro a apontar ou a estabelecer essa contraposição seja,

no caso do Brasil, a figura de Francisco Adolfo Varnhagen. Há sempre na histo-

riografia alguns textos que são fundadores, pioneiros, esse é o caso de Var-

nhagen (REIS, 2006, p. 23). Seu trabalho sobre a história do Brasil7 é precur-

sor de uma imagem, uma representação daquilo que é o “sertão”. Imagem que

passou a partir de então ser consolidada na historiografia brasileira, posto que

seu material foi visto, lido, enfim, utilizado para compor manuais escolares,

integrando a forma de ensinar como também a forma de se pesquisar. Em

suma, os trabalhos subsequentes se utilizaram substancialmente de Varnha-

gen.

Portanto, para este intelectual, o “sertão” além da ideia de interior, é um

elemento que precisa ser ocupado, uma vez que pode conter riquezas, mesmo

sendo antagônico, e um paradoxo ao litoral. É importante entender que Var-

nhagen escreve sua narrativa no século XIX, é um ser deste período, alguém

que pensa ideologicamente seu tempo, um tempo aristocrático, onde “sertão”

5 No que tange a história conceitual ou história dos conceitos, no caso específico do estudo histórico,

destaco a figura do historiador alemão Reinhart Koselleck. Intelectual que contribuiu significativamente

para a superação da tradicional história das ideias, expondo que o estudo dos conceitos deve estar

sempre relacionado a uma dada realidade social. Sugiro assim, como leitura introdutória e aprofundamento da reflexão de Koselleck, o artigo de Julio Bentivoglio (2010): A história conceitual de

Reinhart Koselleck; texto que sintetiza muito bem as contribuições deste importante historiador. 6 Atribuo aqui o termo “historiografia brasileira clássica” por entender que a abordagem, neste trabalho

realizada, não abrange todo o cabedal da historiografia brasileira, uma vez que para isso haveria a

necessidade de incluir vários outros importantes historiadores nesse tratamento, como Gilberto Freyre e

Caio Prado Junior. Sendo assim, a denominação clássica, por mim utilizada, não se configura em um termo recorrente, mas sim uma maneira particular para delimitar três das principais obras escritas no

início da construção de uma narrativa da história nacional. 7 Obra publicada ordinalmente em dois volumes; o primeiro em 1854 e o segundo em 1857; sob o título

de História Geral do Brazil. Texto em que Varnhagen (monarquista declarado), procurou realizar um

trabalho de construção de Brasil independente, identificado com sua história e orgulhoso de suas

riquezas geográficas e naturais.

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é um elemento do interior, de difícil penetração, desabitado, o qual precisa ser

civilizado, ocupado efetivamente. Entretanto, no discurso deste estudioso, o

ponto mais importante, que aqui interessa, é que o “sertão” não é desenvolvi-

do.

A obra de Varnhagen como um todo está a serviço da construção do Estado nacional brasileiro, da ideia de nação, da nacionalidade e da delimitação do território brasileiro. Para o autor tanto a história quanto a literatura deveriam tratar de forma incisiva de todas essas questões, tornando-as dessa maneira “úteis” para o império (GONÇALVES, 2008, p. 95).

A falta do desenvolvimento, é um dos aspectos que perpetuam dentre os

múltiplos significados do “sertão” e, assim sendo, ele pode deixar de existir,

uma vez que há a possibilidade de desenvolver-se, perdendo dessa maneira

sua característica principal.

Outro ponto central do pensamento de Varnhagen, diz respeito à pericu-

losidade do “sertão”, vislumbrando um espaço sem lei, onde os criminosos

podem fugir, refugiar-se, onde impera a violência sem que prevaleça a justiça.

Percebe-se que este é um texto fundador na perspectiva conceitual do “sertão”

dentro da historiografia, especialmente por inserir ideias antes não atribuídas

ao termo. Mesmo com todos seus problemas, Varnhagen é muito mais que um

militar e diplomata, é um historiador, seu trabalho tem um compromisso de

caráter histórico.

Se o expediente de Varnhagen tem um sentido de fundação, há outro tex-

to que ao tratar do “sertão” teve a capacidade de hierarquizar. Este é a obra

“Os Sertões” de Euclides da Cunha, ele está na maior parte dos trabalhos que

tratam de “sertão”, pelo menos em uma nota de rodapé ou na bibliografia.

Falar do tema sem falar de Euclides da Cunha é ímprobo.

Euclides é fundamental por ter a capacidade de sistematizar seu pensa-

mento. Sua narrativa é, além de literária, uma narrativa problematizadora da

realidade. Foi um estudioso da Geografia, da Geologia e da sociedade como um

todo, crítico político. Tinha uma posição social e uma postura muito bem esta-

belecida, dando a seu trabalho, além de um aspecto inovador, uma capacidade

de hierarquizar e consolidar uma dada imagem do “sertão”. Imagem que põe

esta categoria fora da História, fora da escrita, consequentemente, assim como

Varnhagen, um espaço da violência.

A concepção de Euclides da Cunha é a que será empregada por muitos

dos estudiosos que o sucederão, utilizando o “sertão” como espaço de violên-

cia, o que é, em contrapartida, reflexo da sua exclusão aos olhos da História, da

política, do interesse público, ou seja, da forma como o litoral se punha ao

interior.

Euclides viu o sertão como reflexo do litoral: a barbárie estaria por toda parte. Criticou as jornadas jacobinas no Rio de Janeiro, em março de 1897, quando multidões reagiram à notícia da derrota da terceira expedição contra Canudos

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com a destruição de jornais monárquicos e o assassinato de um jornalista (VENTURA, 1998, p. 68).

Nesse sentido, se o litoral é o progresso, o “sertão” é a sua falta. Sendo o

espaço próximo ao mar o local urbanizado e civilizado, o interior é seu o opos-

to, onde tudo é mais difícil, mais longe. Onde seus habitantes não têm a mesma

capacidade intelectual e organizacional do que os do litoral. O interessante é

que Euclides não coloca isso em tom de julgamento, de menosprezo – apesar

dessa concepção, dessa maneira de ver o interior, de ver o sertanejo como um

sujeito rude, bárbaro – ele consegue vislumbrar alguns elementos nestes su-

jeitos. Vê o espaço como responsável pelas dificuldades, um sentido etimoló-

gico bastante similar com ideia de “desertão”, uma vez que o deserto é um

local de difícil adaptação, de sobrevivência, é isolado e vazio. Essa imagem é

fundadora e hierarquizante, com preponderância de que a civilização, a socie-

dade tem uma responsabilidade com os espaços. O “sertão” é um problema a

ser resolvido pelo litoral.

Outro importante estudioso a problematizar o “sertão” é Capistrano de

Abreu. Um intelectual que surge na historiografia como um indivíduo capaz de

autorizar, de dar respaldo, preocupado com a questão geográfica, muito seme-

lhante ao trabalho desenvolvido pela primeira geração dos Analles, especial-

mente na figura de Marc Bloch8. Uma concepção de História que vai além,

onde o “sertão” pode configurar uma região de pouca fauna (o que é hoje pos-

sível visualizar quando se fala da caatinga, por exemplo). Mas, para Capistra-

no, o “sertão” pode também ser um local de muita mata, contudo, é vazio, de

difícil penetração; direcionando para uma ideia de lugar para onde se pode

fugir, criando a imagem de que o “sertão” é o local dos marginais, dos que

precisam esconder-se, daqueles que estão fora da História.

Um dos aspectos mais marcantes do texto de Capistrano de Abreu está

em inaugurar uma narrativa histórica que coloca o brasileiro no centro do

processo, do desenvolvimento. Segundo Reis (1998):

Capistrano será um dos iniciadores da corrente do pensamento histórico bra-sileiro que “redescobrirá o Brasil”, valorizando o seu povo, as suas lutas, os seus costumes, a miscigenação, o clima tropical e a natureza brasileira. Ele atribuirá a este povo a condição de sujeito da sua própria história, que não deveria vir mais nem de cima e nem de fora, mas dele próprio. O futuro do Brasil torna-se tarefa do povo brasileiro e, para melhor vislumbrá-lo, Capis-trano recupera o passado deste povo em suas lutas e vitórias. Capistrano foi pioneiro na procura das identidades do povo brasileiro, contra o português e o Estado Imperial e as elites luso-brasileiras.

8 Marc Léopold Benjamim Bloch (1886-1944), historiador medievalista francês, pertenceu à primeira

geração da Escola dos Analles, deu os primeiros encaminhamentos do olhar geográfico para a História, assim como propôs uma a interdisciplinaridade nos objetos das ciências. Sugiro o texto de Guilherme

Ribeiro (2009): A Geografia testemunha a História – paisagem, região e interdisciplinaridade em Marc

Bloch, para elucidar melhor esta questão.

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Entendo a lógica de um povo sujeito da sua própria história, logo aquilo

que para Capistrano era o desabitado, desconhecido, isolado, marginal, o peri-

goso; passa também ser possível de riquezas, um espaço que necessita ser

civilizado. Logo, passa também a ser passível de confronto, de beligerância. A

análise empreendida por Capistrano dá a factível condição de a historiografia

entender as regiões como espaços de disputa, de conflito; justamente em um

momento que as antigas províncias passavam a ter status de Estados autôno-

mos e soberanos.

Apesar de o “sertão” ter bandidos, marginais, ele precisa, no pensamento

da época, ser percorrido e civilizado, ser desenvolvido. O “sertão”, na concep-

ção de Capistrano de Abreu, necessita ser povoado por colonizadores. Até

mesmo os bandeirantes, quando se fixavam em determinados locais, passa-

vam de devastadores a colonizadores, vivendo com aquilo que o “sertão” lhes

fornecia (REIS, 1998, p. 76).

Por fim, inclui-se neste debate Sergio Buarque de Holanda. Um historia-

dor que consegue inserir o “sertão” em uma categoria polivalente, uma vez

que seus textos podem ser lidos de inúmeras maneiras. Um intelectual de

obras muito dispersas, as quais foram aglutinadas9, mas que mesmo assim foi

muito significativo para a historiografia brasileira, principalmente no que

tange o “sertão”. Sua contribuição foi seguida por inúmeros profissionais da

História, que, mais de quarenta anos depois, ainda seguem um caminho defi-

nido por Holanda.

Para este autor, o “sertão” é decorrente da pobreza da população. Ele

surge em decurso da existência de uma população extremamente pobre, assim

como a pobreza também pode surgir da presença do “sertão”. Não obstante,

para Holanda o remédio da penúria é o “sertão”, ou seja, quando parte da soci-

edade, marginalizada do capital, não consegue participar do sistema, é para o

“sertão” que estas pessoas correm. É a pobreza o motor da busca e da constru-

ção do “sertão”.

Para Sergio Buarque de Holanda (1945), especificamente em seu texto

“Monções”, o “sertão” é ocupado pela canoa, pelas vias fluviais. São as mon-

ções10 que se alastram pelo interior povoando as margens dos rios, ocupando

os espaços como linhas de transporte. Holanda considera que para a época

(segunda década do século XVIII e a primeira metade do século XIX), os rios

eram as estradas dos colonizadores, vias fluviais que aos poucos constroem

uma rede de ocupação do espaço que passam a fazer duplo sentido, ou seja,

9 Posso aqui destacar três principais obras que compõem a grande contribuição de Sergio Buarque de

Holanda para a historiografia brasileira, são elas: Raízes do Brasil (1936), Monções (1945) e Visão do Paraíso (1959). 10 Cabe esclarecer que as “monções”, aqui referenciadas, não têm relação com termo da Geografia

usado para categorizar determinados ventos sazonais. Foram expedições fluviais que mantiveram

comunicações entre São Paulo e Mato Grosso nos séculos XVIII e XIX.

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trazem e levam mercadorias e serviços. A interiorização do “sertão” se dá com

as vias fluviais.

Todavia, um importante ponto de sua narrativa, refere-se ao fato do “ser-

tão” ser o elemento de adaptação do homem. Holanda faz um trabalho etno-

gráfico, gastando todas suas veias de aproximação antropológica para mostrar

essa capacidade de adaptação do homem. É dessa adaptação, sugerida no iní-

cio do século XX por Euclides da Cunha, que, agora, na década de 1950, melhor

trabalhada por Holanda, que se vê na historiografia brasileira a figura do ser-

tanejo, de pele sofrida, que anda sempre em companhia de sua arma, passan-

do o dia inteiro montado num cavalo e que usa roupas rústicas. Aqui está ma-

terializada uma figura que é a do mameluco, do bandeirante. É esse tipo de

sujeito que é adaptado àquelas condições do “sertão”, um local difícil, hostil,

mas que é passível de amoldamento para a sobrevivência de determinadas

pessoas. Como aponta Reis (2006, p. 118):

Se, durante o século XIX, a realidade social excluía e o pensamento a legitima-va, agora a realidade continuava excluindo, mas sem a legitimação cúmplice do pensamento brasileiro. Este passou a defender a inclusão de negros, índios, mulheres, pobres de todo tipo, enfim, de todos os marginalizados da socieda-de oligárquica, do passado, os quais deverão ser integrados à sociedade brasi-leira no futuro. O Brasil não teria futuro excluindo a sua própria população do gozo dos direitos da cidadania.

Para Holanda, não é fácil viver no “sertão”, ele é duro, é hostil, porém foi

possível dominá-lo, e isso é mérito do português, na figura do bandeirante,

que soube se adaptar as condições adversas, soube entender que era melhor

para sua vida andar de sandálias do que com as pesadas botas que trazia da

Europa, soube descobrir que, em alguns casos, os alimentos utilizados pelos

indígenas eram muito melhores do que a comida portuguesa que estava acos-

tumado a fazer. É a adaptação do homem que propicia o domínio e, conse-

quentemente, o alastramento pelo “sertão”.

Desta forma, o “sertão” passa a ser conduzido, passa a ser tomado por

uma perspectiva de abertura. O sujeito que se mete pelo interior é um aventu-

reiro, um destemido, corajoso, mas, acima de tudo organizado, pois este espa-

ço desbravado passa a ser organizado metodicamente. Fato materializado em

viagens em que se estabeleciam pontos de paradas, as quais aos poucos se

tornavam pontos de apoio, depois pontos de abastecimentos, até tornarem-se

vilas. Uma viagem que antes era aventureira, agora se transformara em uma

viagem de estada, um percurso recorrente.

Contudo, o ponto fundamental do pensamento de Sergio Buarque de Ho-

landa consiste em povoar o “sertão” de aspectos sobrenaturais. Ele consegue

ver ali uma série de aspectos que não são apenas político, econômico, físico, ou

material, e sim sobrenatural. Ou seja, existe uma série de elementos que são

decorrentes das lendas, das crenças. O sertanejo precisa extravasar esse des-

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conhecido, acreditando em determinadas coisas que permitem vencer as difi-

culdades, povoando o “sertão” do sobrenatural: um “sertão” mítico.

Guimarães Rosa é outro autor da Literatura que tem uma forma diferente

de abordar o “sertão”: virando-o do avesso; dando distinto caminho para o

termo, que é um percurso trilhado por outros posteriormente. O “sertão” pas-

sa a ser um elemento muito mais simbólico – ele é físico, mas também é sim-

bólico – podendo estar em todo lugar e, ao mesmo tempo, não estar. As suas

frases traduzem que “sertão” é “sertão”, ele é pulverizado em vários sentidos.

O que Guimarães Rosa faz e, de certa maneira, a historiografia também

efetiva, é aplicar no espaço e no tempo dilemas que são humanos, como o

poder, por exemplo, onde as disputas do bem e do mal se fazem presentes,

permeando o imaginário humano do sobrenatural. É esse o percurso que a

literatura consolidou e que, de certa forma, a História vem trilhando. O “ser-

tão” é físico e é imaginário, essa é a capacidade que Literatura tem ao consoli-

dar uma narrativa ideológica dos espaços, onde o “sertão” se mostra represen-

tado como um local de disputa. Assim, na historiografia, passa a ser muito

mais recorrente, principalmente nas décadas de 1970 e 1980, muito por inte-

grar as reflexões do espaço. Quando a História começa a pensar sobre as sin-

gularidades e as representações do espaço, ela encontra o “sertão”, o fazendo

cotidiano.

Durante longo tempo a historiografia dedicou-se a estudar as grandes

disputas políticas no litoral, já que seria lá que elas em sua maioria ocorreri-

am. A historiografia empreendeu uma visão em que o espaço político poderia

existir para além do litoral, refletindo sobre as singularidades dos espaços,

descobrindo assim os “sertões”. Após a década de 1970 a História passou a

reivindicá-los, impingindo a ideia de que os historiadores precisavam pensar o

conceito de região em condições diferenciadas, não ficando mais condicionado

aos palácios, a casas grandes, mas também ao espaço do aldeão, do camponês.

Destarte, a História encontrou o caboclo, o sertanejo, enfim, o “sertão do Con-

testado”.

O “SERTÃO” NA HISTORIOGRAFIA CLÁSSICA DO CONTESTADO

De imediato, um dos erros possíveis e suscetível de crítica a este traba-

lho, constitui-se na seleção das obras memorialistas sobre o Contestado que

compõe a análise aqui empreendida, no caso, os textos: “Contestado” de Alcibí -

ades Miranda, e “Campanha do Contestado – episódios e impressões” de Demer-

val Peixoto.

Deixou-se de lado uma copiosa produção realizada por outros oficiais

combatentes do movimento que, ao findar da beligerância, empreenderam

intensa produção escrita de suas memórias. Dentre eles destaca-se o “Relató-

rio” do General Setembrino de Carvalho (1916), “A campanha do Contestado:

as operações da Columna Sul” (1917-18) de Herculano Teixeira d’Assumpção,

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“Apontamentos para a história: o Contestado”11 (1920) e “Guerra em sertões

brasileiros: do fanatismo à solução do secular litígio entre o Paraná e Santa

Catarina” (1931) ambas de José Octaviano Pinto Soares, “O Contestado entre

Paraná e Santa Catarina” (1918) de Ezequiel Antunes, “A jornada de Taquaru-

çu: feito guerreiro” (1936) de Antônio Alves Cerqueira e “Reminiscência do

Contestado: subsídio para a história” (1918) de José Vieira da Rosa.

Salienta-se, porém, que para uma abrangência total necessitar-se-ia de

uma abordagem muito mais extensa, a fim de dar conta de sua amplitude.

Sendo assim, um recorte se fez necessário, contudo, um recorte metodologi-

camente pensado, onde a escolha realizada se justifica pelo fato destes dois

trabalhos supracitados terem, cada um, uma peculiaridade.

Entre todas as obras passíveis de problematização do “sertão”, a escolha

por Alcebíades Miranda e Demerval Peixoto se fez por dois motivos. O primei-

ro, devido o texto de Peixoto ter sido, no ano de 1995, reeditado em três vo-

lumes, os quais se fazem presentes em muitas escolas da rede pública do Pa-

raná e Santa Catarina, o que o torna um dos materiais de maior acesso aos

estudantes de nível fundamental e médio sobre a temática do Contestado. O

segundo motivo, diz respeito a Miranda, especificamente por este não figurar

muito nas discussões historiográficas recentes. Márcia Janete Espig (2008),

historiadora que faz uma excelente discussão historiográfica do Contestado,

em sua tese de doutorado não apresenta Miranda em seu debate, apenas o cita

nas referências bibliográficas. Rogério Rosa Rodrigues (2012), que publicou

elucidativo capítulo sobre as narrativas históricas dos historiadores de farda

na obra “Nem fanáticos nem jagunços: reflexões sobre o Contestado (1912-

2012)”, também não o cita. Contudo, é importante esclarecer que Alcebíades

Miranda apesar de ter concluído seu trabalho ainda em 1939, uma publicação

somente veio acontecer em 1987, o que pode ter impactado para sua não cos-

tumeira presença nos debates historiográficos12.

Miranda era capitão do 10º Batalhão do 4º Regimento de Infantaria, se-

diado na cidade de Curitiba, quando participou das operações do exército no

Contestado. Segundo o próprio, teria decidido registrar diariamente o que

com ele se passasse quando completou trinta e cinco anos de idade. Fato este,

a indicar sua consciência sobre a importância que teria para a temporalidade,

tanto que fez questão de mencionar em seu texto o desejo de que seu trabalho

prestasse algum serviço à história da sua pátria (MIRANDA, 2012, p. 12).

Não se sabe o que verdadeiramente motivou-o e redigir a obra, entretan-

to, Alcebíades coloca, de maneira pincelada, algumas sugestões ao longo da

11 Espig (2008, p. 36) esclarece que o livro de Pinto Soares tem uma errata em que o título da obra foi

corrigido para Subsídios para a história – o Contestado, fato este que deve ser apreendido com cuidado

ao passo de se não se fazerem confusões quanto a busca de Soares nas bibliografias, uma vez que

determinados pesquisados o citam com uma nomenclatura e, outros, com outra. 12 Importante considerar que não realizei nenhum tipo de pesquisa sobre a esporádica abordagem de

Alcebíades Miranda na historiografia, apenas aqui apresento uma constatação sem qualquer

aprofundamento mais detalhado.

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redação. Já de início, estabelece forte crítica aos escritos dos oficiais que o

antecederam, numa tentativa de apresentar-se muito mais fiel aos documen-

tos e comprometido com a verdade histórica.

Os documentos consultados, variadíssimos, foram, porém tão discordes no modo de narrar e mesmo de apreciar os acontecimentos tão cheios de lendas e de fantasias, que resolvi fazer uma colheita geral, dentro dos estritos liames da verdade e com dados seguros traçar uma “Notícia” dessa campanha, que traduzisse o que de fato ocorrera, relegando para outros destinos a invencio-nice, a lenda, os delírios literários, as fantasias dos escritores antecedentes (MIRANDA, 2012, p. 10).

Em vários outros momentos atenua os méritos do General Setembrino de

Carvalho na vitória sobre os caboclos, enaltecendo a figura do Capitão Tertuli-

ano Potiguara, haja vista que “[...] não foram os seis mil homens do general

Setembrino que deram o golpe de morte nos fanáticos do Contestado, [...] fo-

ram os bravos comandados de Potiguara” (MIRANDA, 2012, p. 24).

Em Miranda, assim como em vários outros memorialistas do Contestado,

o “sertão” é recorrente na narrativa, apresentado geralmente na introdução

do trabalho, situação esta muito comum nos textos históricos da primeira

metade do século XX, onde a necessidade da contextualização geográfica se

fazia necessário. O palco, os espaços em que os fatos aconteciam, necessitava,

para a prática da época, serem dimensionados, narrados, imaginados, muitas

das vezes com excessivas explicações sobre o solo, o clima, a fauna, a flora, etc.

Em síntese, um recorte de trabalho geográfico colado em um texto de História.

Por conseguinte, os conceitos eram empregados. A análise destes corro-

bora com a ideia de Horst Walter Blanke (2006), quando o autor descreve as

funções da historiografia, demonstrando com clareza o quanto que o esforço

analítico dos trabalhos existentes sobre um determinado tema, contribui sig-

nificativamente para a superação de determinadas visões de mundo. De tal

maneira, que ao pensarmos o “sertão do Contestado” em Miranda, vemos um

espaço pouco conhecido, no qual nem mesmo os mapas sobre a região eram

passíveis de crédito, pois os erros eram grosseiros13.

O “sertão” em Miranda materializa-se como uma região pouco palmilha-

da, onde predomina a mata virgem, riscada por um ou outro trilho de carguei-

ros em que tão somente transitavam pessoas a pé, geralmente criminosos e

fugitivos das mais variadas circunstâncias. Vê-se neste aspecto um discurso

muito semelhante aquele utilizado por Capistrano de Abreu, em que o “sertão”

é um local de criminosos e marginais, mas que pode ser também um espaço a

ser desenvolvido.

13 Miranda (2012, p. 22) aponta que o “sertão” era tão pouco conhecido que um mapa de possível

autoria de Caetano Valões, bandeirante fundador da então vila de Valões, hoje município de Irineópolis,

trazia a menção que o rio Timbó era afluente de rio Pelotas.

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Para Alcebíades Miranda, o “sertão” é o efeito do abandono político. A

criminalidade e ignorância são resultados da incúria dos governantes, os quais

tão somente preocuparam-se com a região litorânea do Brasil, deixando o

interior do país a margem das iniciativas.

Nesse sentido, o do abandono político, se estabelece na narrativa uma

constante necessidade de comparação entre Canudos e o Contestado, materia-

lizados como fenômenos de morbidez social. Locais onde as situações crimi-

nógenas são parecidas, com absoluta falta de assistência, mas que necessitam

diferenciação e analogia, especialmente quanto ao ambiente e aos sujeitos que

os habitam.

Lá o mato é carrasquento, as bibocas acentuadas, o sertão é mais vasto e mais agreste, o calor é intenso e a seca tortura os habitantes. Aqui os bosques não são espessos e impenetráveis, mas sim vales férteis, circundados de matas, re-gados por límpidos cursos líquidos, onde não raramente são aproveitadas as quedas d’água para moverem rodas de moendas e de serranias em embrião. [...] Assim sendo, a vida do sertanejo do norte e a do sertanejo do sul diferem sensivelmente, no tocante à parte material. [...] São, entretanto, no ponto de vista moral, perfeitamente análogos: ignorância, fanatismo, espírito de inde-pendência e um certo comunismo aí imperam (MIRANDA, 2012, p. 14-15).

A chave para Miranda empreender a análise entre Canudos e Contestado,

é certamente a eminente necessidade de se fazer referência a Euclides da Cu-

nha, de se buscar de alguma maneira fazer crítica ao texto do escritor carioca.

Miranda deprecia Euclides afirmando que ele não teria realizado uma devida e

necessária comparação entre os “sertões” do norte e, os de Santa Catarina e

Paraná ao chamar o gaúcho de sertanejo. Para Alcebíades Miranda, no Rio

Grande do Sul não existem propriamente “sertões”, e que os “paralelos estabe-

lecidos entre os teatros das operações do vaqueiro e do gaúcho se referem

mais especificamente no chão do nordeste e ao pampa rio-grandense” (MI-

RANDA, 2012, p. 14). Acrescenta que com relação aos “sertões” catarinenses e

paranaenses a coisa é outra, “são análogos aos do norte, quanto à solidão e ao

quase abandono em que se ostentam a vegetação” (MIRANDA, 2012, p. 14).

A citação a Euclides da Cunha é quase que capital nos textos dos historia-

dores de farda, geralmente com crítica. Segundo Rodrigues (2012, p. 251):

Embora militarmente vencedor, o que se cristalizou no imaginário nacional, acerca da atuação do exército, foi a imagem de despreparo e da violência des-medida. Tal fama deve muito à obra seminal de Euclides da Cunha, publicada em 1902. Como defendido por Belthod Zilly, o sucesso de Os sertões reside an-tes na capacidade literária de universalizar os feitos e personagens de Canu-dos que na pesquisa histórica, ou mesmo nas teses sociológicas incorporadas ao texto. A esta análise, mais um fator poderia ser acrescentado: a conjuntura política e social enfrentada no país, em especial no contexto militar. Até as primeiras duas décadas do século XX, as forças armadas eram vistas como ins-tituições que abrigavam vagabundos e desordeiros, além de possuírem a fama de manter práticas do tempo da escravidão, como os castigos corporais. É con-

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tra essa representação social que os historiadores de farda lutaram. Isso ajuda a compreender a presença marcante de Os sertões em suas narrativas.

Para Susan Aparecida de Oliveira (2006, p. 13), as interpretações do Con-

testado na primeira metade do século XX, revelaram-se pautadas pela polari-

zação entre “sertão” e cidade, entre barbárie e civilização, sendo que o modo

como Euclides da Cunha apresentou seu texto, efetivando a crença de um rea-

lismo e uma confiança em seu testemunho, incitou os oficias memorialistas,

como Miranda, à intencionalmente ou não, imitá-lo para garantir determinado

realismo na narrativa. Por outro lado, também houve uma tentativa de faze-

rem-se heterogêneos, na procura de recuperar uma imagem do Exército, em

certa medida deteriorada por Os sertões.

Tal polarização, mencionada por Oliveira (2006), surge no discurso de

Miranda quando este estabelece uma diferenciação visual que teria feito

quando participou das operações no Contestado, como também em vista pos-

terior a região. Para ele, haveria uma vida nômade no “sertão”, comprovada

pelo raro encontrar de uma construção de alvenaria. Quase tudo se construíra

com a madeira, incluindo as estações de trem. Na sua visão, nos próprios cen-

tros mais habitados do norte do Paraná predominava a construção com o

madeiro (MIRANDA, 2012, p. 17).

Em suma, o “sertão” para Alcebíades Miranda constitui um espaço em

que predomina a criminalidade e a ignorância. Mas, não uma ignorância bus-

cada, premeditada; e sim responsabilizada, efetivada pelos seus governantes

que historicamente o negligenciaram. Um espaço habitado por sujeitos desas-

seados, que se nutrem mal, o que, porém, não lhes causam maiores prejuízos.

Sertanejos que não amam o trabalho, libertinos e supersticiosos. Todavia, um

local que pode ser diferente, de paz reinante, obtido com a efetiva presença de

escolas nas mais remotas paragens e recônditas regiões, e firmado com o cas-

tigo às “[...] autoridades que abusam dos cargos para perseguir desafetos de

qualquer classe” (MIRANDA, 2012, p. 23).

Como já apresentado, outro memorialista em debate neste expediente é

Demerval Peixoto, oficial que esteve na região de conflito entre setembro de

1914 a abril de 1915, junto à expedição de Setembrino de Carvalho (RODRI-

GUES, 2012, p. 242) e que, logo ao findar do conflito, sob o pseudônimo de

Criveláro Marcial14, escreveu a obra “A campanha do Contestado: episódios e

impressões”. Trabalho publicado em três volumes, lançados em anos diferen-

tes, sendo o primeiro em 1916, o seguinte em 1918 e o terceiro em 1920, este

último acrescido das duas primeiras partes abarcando todos os volumes em

um único livro.

14 Segundo observação de Rodrigues (2008, p. 139), Demerval Peixoto certamente utilizou-se do

pseudônimo Cliveláro Marcial devido à proximidade e envolvimento na campanha do Contestado,

procurando assim não ter seu nome ligado diretamente ao conflito.

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A obra de Peixoto foi, à época, muito bem recebida pela crítica, compro-

vando que a rede de sociabilidade dos oficiais escritores não estava limitada

apenas a classe militar. A imprensa nacional teceu elogios ao trabalho, desta-

cando-o como brilhante, de alta cultura literária, digna dos mais calorosos

louvores (RODRIGUES, 2012, p. 249-250). Nada obstante Peixoto,

[...] não levou adiante a vida como intelectual, restringindo-se, além dos três volumes sobre a Guerra do Contestado (1916-1920), a redigir o livro [...] Me-mórias de um velho soldado (1960) e a tradução de outro sobre infantaria, chamado O que é preciso saber sobre infantaria, de M. Abadie (1928) (RODRI-GUES, 2008, p. 142).

É certo afirmar que não mais se sustenta a ideia, por tempo propagada,

de que o Contestado não teve um destaque na mídia, um vulto de importância

como teve Canudos, por falta de um Euclides da Cunha15. As obras publicadas,

já após a assinatura do acordo de limites, foram numerosas, seguindo um

crescente que atingiu certamente um ápice após a publicação, em 2004, do

trabalho de Paulo Pinheiro Machado: “Lideranças do Contestado”; obra que

trouxe uma série de aprofundamentos ao tema. Somado a isso, é considerável

assinalar que, agora, com a passagem do centenário da guerra (2012-2016),

está em curso um aumento ainda maior no número de trabalhos sobre o Con-

testado, uma vez que datas comemorativas, de cem ou cinquenta anos de de-

terminados fatos históricos, acabam motivando um avolumar nos expedientes.

Se, Peixoto foi merecedor de elogios, o “sertão” em sua narrativa de certo

modo também teve a mesma sorte. Para ele os aspectos naturais da região

eram verdadeiros tesouros, especialmente o pinho e o mate, riquezas que

poderiam fazer daquele espaço uma nova Canaã, à medida que a República o

fazia ressurgir do abandono (PEIXOTO, 1920, p. 10).

Assim como em Miranda (2012), “A campanha do Contestado: episódios e

impressões” (1920) inicia com a busca da contextualização geográfica, porém,

não em termos naturais, mas sim abordando seus núcleos habitados. Segundo

Luís Roberto Soares, o qual redigiu a introdução da edição de 1995 da respec-

tiva obra, a narrativa de Demerval Peixoto é de inspiração positivista, advinda

da Escola Militar do Rio de Janeiro, escola que formava as vanguardas das

elites dirigentes da época. Escola preocupada com a construção de um Estado

Nacional forte, enaltecendo as qualidades pátrias e com um forte ideal civiliza-

tório.

Sendo assim, as primeiras páginas objetivam dar ao leitor uma visão ge-

ral dos centros “urbanos” da região. Várias vilas e municípios são descritos

evidenciando seu atraso e pobreza. Somente duas municipalidades escapam

15 Opinião apresentada por Paulo Pinheiro Machado em palestra intitulada Contestado na sala de aula

– reflexões e possibilidades para o Desenvolvimento Regional. Palestra esta proferida durante o I

Seminário sobre Educação e Desenvolvimento Regional: os planos de educação e os desafios, realizado

na cidade de Canoinhas entre os dias 16 e 20 de maio de 2016.

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de sua crítica: Ponta Grossa e Curitiba. Entretanto, é de se salientar que estes

centros não foram palco dos conflitos e são certamente mencionados pelo

autor no intuito de estabelecer comparação entre os tão próximos e díspares

vilarejos.

Os rios também se destacam na redação, suas nascentes e cursos são de-

talhados com cuidado, deixando claro que, para este intelectual militar, o “ser-

tão” não é um espaço árido, de pouca flora ou carente de chuvas, é um “sertão”

muito mais constituído de práticas, conceituado pela atividade humana, na

concepção “certeauriana”: um espaço praticado (CERTEAU, 1994).

O “sertão” para Peixoto apresenta-se muito mais como um ambiente de

causa e efeito do humanal do que do geográfico. Há uma perceptível preocu-

pação com os sujeitos que empreendem relações naquele ambiente, sejam elas

de caráter social, cultural, econômica ou militar. Nesse sentido, e no que con-

cerne esta problematização, o sertanejo talvez seja um dos elementos mais

constantes em toda a narrativa, um elemento que vivera em total abandono,

espoliado pelos prepotentes, os quais por vezes podem se tornar vítimas des-

tes rancorosos e vingativos sertanejos (PEIXOTO, 1920, p. 11).

Em momentos euclidianos, Peixoto tece elogios condenatórios aos serta-

nejos (RODRIGUES, 2008, p. 146). A dicotomia de seu discurso é recorrente,

ao passo que deseja justificar a ação militar, mas também não ser duro para

com os seus irmãos de pátria:

No sertanejo do Contestado tinha-se assistido a reprodução da brutalidade da coragem dos caipiras dos sertões nortistas. Ante as vidas preciosas de officia-es e de soldados do exército, ceifadas na guerrilha cruenta, depois da victória é justo render-se a homenagem merecida: - crueis na luta os infelizes irmãos das matas, eram dignos de admiração pela ouzadia com que enfrentaram as tropas regulares e, ainda mais dignos de piedade pela loucura com que se de-fendiam, excedendo a furia dos javalis, a agilidade dos tigres e a valentia estoi-ca do rei das féras. Rendamos essa homenagem merecida aos nossos irmãos

enlouquecidos das selvas (PEIXOTO, 1920, p. 739)16.

Enfim, Demarval Peixoto entende o “sertão” como um espaço inculto, es-

te é o termo mais utilizado por ele para exprimir sua visão. Não é isolado, não

é despovoado, tanto que pode ser formado por núcleos habitados, o que ele

chamaria de “cidade sertã” (PEIXOTO, 1920, p. 127). É uma área que possui

riquezas, a qual poderia ser uma das regiões mais pujantes no início do século

XX, fato este não ocorrido pelo “fanatismo” e pela opressão coronelista.

Como há de se perceber, os discursos memorialistas do Contestado são

bastante ricos de conceituações e de representações sobre os espaços, sobre

os elementos humanos que neles empreendem sociabilidades, o que faz o

“sertão”, por exemplo, extravasar a concepção física, geográfica, adentrado ao

16 Nota dos Organizadores: por se tratar de escrito de épocas passadas, algumas citações deste e outros

textos contêm erros de ortografia, considerando as normas atuais.

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sobrenatural, aos espaços sociais, exprimindo, especialmente em Peixoto, uma

ideia de que ele pode apresentar-se em toda parte. Pode ser a expressão do

desconforme, daquilo que é diferente, desigual do modelo esteticamente con-

cebido como o padrão.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Durval Muniz de Albuquerque Júnior (2008), ao discorrer sobre o concei-

to de região, alerta para o crescente número de programas de pós-graduação

que inserem a problemática regional em suas linhas de pesquisa e áreas de

concentração, observando e levantando questionamentos sobre a pouca dis-

cussão e problematização do conceito nestes programas.

O provável grande erro em vários dos trabalhos de conceituação, situa-se

no isolamento da análise empreendida pelas diversas ciências, pois, em varia-

dos casos, geógrafos ensejaram por um referencial apenas geográfico, outros,

tão somente pelo sociológico, e os historiadores utilizando apenas o histórico

(MUCHALOVSKI, 2008, p. 13). O medievalista Marc Bloch, no início século

passado, já alertava para a necessidade da interdisciplinaridade dos estudos

de História, pregando isto como instrumento de renovação e aperfeiçoamento

(RIBEIRO, 2009, p. 10).

Na mesma medida que os conceitos surgem como ponto chave de qual-

quer tema enquanto conhecimento científico, a história conceitual emergiu

como área teórica a inserir estes debates no seu cerne, tornando-os objeto,

problema, no que tange a ação das palavras, dos termos, dos conceitos dentro

da temporalidade.

Como apresentado neste artigo, o “sertão” – uma ramificação possível do

conceito de região – mostrou-se um elemento de múltiplas concepções, visto

de volúveis formas dentro da análise historiográfica aqui empreendida. Po-

rém, o ponto central a ser pensado insere-se no quanto o discurso sobre o

“sertão”, no contexto do Contestado – agora pensado geograficamente, atrela-

do ao elemento basilar da Geografia, o território – impôs, ou ainda impõe en-

traves àquilo que se chamaria de desenvolvimento, uma vez que, conforme se

pode ver, a ideia do desenvolvimento é presente no pensamento sobre o “ser-

tão”.

Conforme exposto, Varnhagen confere o “sertão” como algo não desen-

volvido. Euclides da Cunha aponta a dicotomia sertão/litoral, argumentando

este último ser o progresso, enquanto o outro: o atraso; todavia, um atraso a

ser resolvido pelo litoral. Capistrano de Abreu coloca o brasileiro no centro do

desenvolvimento, o elemento responsável por empreendê-lo, de promover o

progresso. Para Sergio Buarque de Holanda, o “sertão” é a pobreza, é para lá

que as pessoas se dirigem na dificuldade e de lá que se foge na ostentação.

No que concerne o espaço do Contestado, as obras aqui problematizadas

demonstraram um aspecto interessante e equipolente: tanto para Alcebíades

Miranda quanto para Demerval Peixoto, o atraso, a ausência do desenvolvi-

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mento17 do “sertão”, é resultado do abandono político. Miranda inclusive su-

gere a falta de escolas como promotor de tal. Apesar de estes oficiais escrito-

res produzirem uma narrativa fortemente preconceituosa, positivista e elitis-

ta, ainda assim apontaram as falhas da esfera política como agente conseguin-

te da segregação social. Agora, passados mais de cem anos da Guerra do Con-

testado, muitos dos discursos ainda são os mesmos, o próprio termo “sertão”

perpetua, utilizado para referir-se a determinadas regiões de Santa Catarina

(AMADO, 1995, p. 1).

Neste território do planalto catarinense persiste o abandono. Dados do

ranking de IDH do Brasil de 2010, publicado no Atlas de desenvolvimento

Humano do Brasil de 2013, apontam para a discrepância entre regiões em de

Santa Catariana. Se Joinville, ao norte do estado, ocupa a posição de número

21, São Miguel do Oeste a 37, Tubarão a de número 67 e Florianópolis a posi-

ção 3. No Contestado, Três Barras está na 1720ª, Timbó Grande na 2924ª e

Lebon Regis na 3136ª posição (MUCHALOVSKI, 2015, p. 10). Dados que pode-

riam muito bem ser contemporâneos a Euclides da Cunha, quando este já

afirmava ser o litoral o espaço da riqueza e o interior o seu avesso.

Hoje, no centenário da Guerra Sertaneja do Contestado, o “sertão” parece

continuar. Se outrora o esquecimento e a falta de investimentos já eram per-

cebidos pelos seus críticos mais tendenciosos e elitistas, atualmente o que

mudara? Pensar sobre o processo histórico, os discursos, os conceitos, pode,

quem sabe, materializar-se num mecanismo para o entendimento do “sertão

do Contestado”, no intuito de ser amparo para a criação de medidas que pro-

movam o “desenvolvimento”, não necessariamente econômico, mas social.

Onde a parcela historicamente menos favorecida da população seja protago-

nista dos investimentos públicos, e não apenas referência nos discursos que,

dia após dia, ano após ano e eleição após eleição, prometem mudança no qua-

dro estabelecido, mas que, demonstram ser incapazes de efetivarem mudan-

ças substanciais. Os estudos estão sendo feitos, as alternativas estão sendo

levantadas, o material intelectual já é consideravelmente relevante, cabendo

aos que, detêm o poder da mudança, pô-las em prática.

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17 Obviamente que considero aqui a ideia de desenvolvimento de cada autor, não sendo este conceito

analisado em profundidade no discurso, servindo apenas de apontamento. Pois, o próprio conceito de

desenvolvimento é muito jovem, debatido com maior intensidade após o fim da Segunda Guerra Mun-

dial.

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A POBREZA NO PLANALTO NORTE

CATARINENSE: REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E

IMPLICAÇÕES NO DESENVOLVIMENTO

REGIONAL1

Maria Luiza Milani2

Pollyana Weber da Maia Pawlowytsch3

INTRODUÇÃO

O objetivo do estudo foi o de analisar as representações sociais dos sujei-

tos que vivem em condição de pobreza no Planalto Norte de Santa Catarina.

Assim, este texto evidencia como os usuários da transferência de renda – Pro-

grama Bolsa Família – do Planalto Norte Catarinense expressam suas repre-

sentações sociais de pobreza para que se possa considerar entre as implica-

ções para o desenvolvimento regional. A problemática da pobreza tem atraído

atenção e preocupações em nível mundial, com estudos e reflexões acerca da

desigualdade de renda, a inclusão e exclusão social. Estes aspectos têm se

mostrado temas cada vez mais centrais, pois a pobreza e a desigualdade social

se apresentam em índices que retratam o processo histórico da sociedade

brasileira nas sucessivas gerações, destacando sua persistência como fator de

destaque e preocupações.

Em linhas gerais a pobreza é entendida como estado de privação, não

apenas material, quando um sujeito tem seu bem estar comprometido. A po-

breza pode se expressar por meio de formas distintas e explica uma proble-

mática social. Historicamente a pobreza no Brasil passou a ser destacada a

partir das décadas de 1977 e 1998, nas análises das Pesquisas Nacionais por

Amostragem de Domicílios (APNAD), realizadas pelo Instituto Brasileiro de

Geografia e Estatística (IBGE). Com estes estudos é que se tornou possível

formar indicadores sociais com o objetivo de sustentar as reflexões sobre a

1 O presente texto, na sua primeira versão, foi publicado na revista Desenvolvimento Regional em

debate, v. 6, n. 3 (2016). 2 Doutora em Serviço Social, com atuação no Programa de Mestrado em Desenvolvimento Regional da

Universidade do Contestado (UnC). E-mail: [email protected] 3 Psicóloga, Mestre em Desenvolvimento Regional no Mestrado em Desenvolvimento Regional da

UnC.

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distribuição de renda ou os padrões de vida e seus dos indivíduos da socieda-

de brasileira.

Os cenários da pobreza no Brasil são expostos pelos meios de comunica-

ção, os quais divulgam este problema decorrente da sociedade produtiva e

social, organizada em classes sociais. A condição de miséria e pobreza é vivida

por mais de 16,27 milhões de pessoas no Brasil, isto é o equivalente a 8,5% da

população (IBGE, 2013).

O IBGE revelou que no ano de 2013, dos 16,27 milhões de brasileiros que

viviam em condição de extrema pobreza, 4,8% não possuíam nenhuma renda

e, os demais 11,4 milhões possuíam rendimento per capita de R$ 1,00 a R$

70,00. A linha da pobreza no Brasil é delineada nesse parâmetro (renda per

capita de até R$ 70,00). Nesse caso a identificação das pessoas vivendo em

condições proporcionadas por essa renda é reconhecida pela condição de

pobreza extrema.

Os fatores que envolvem a miséria e a pobreza envolvem a responsabili-

dade social do Estado, o desemprego; a baixa escolaridade; restritas oportuni-

dades de capacitação profissional, trabalho e renda; exclusão social de seg-

mentos dos resultados da produção social. Nesse contexto o próprio sujeito

representa sua baixa estima, desvalorização pessoal, falta de confiança do

sujeito e da própria sociedade sobre ele.

Sob as abordagens teóricas pode-se entender que a pobreza está intima-

mente relacionada com o nível de renda de um grupo social, parâmetro que

expõe os cenários de uma sociedade. Entende-se que a linha de pobreza está

relacionada com o desenvolvimento de determinada sociedade, logo, pode

existir relação entre a existência da pobreza e o desenvolvimento de uma re-

gião.

Desta forma, pode-se entender que a existência de situações de pobreza

pode provocar um círculo de ruptura e isolamento pelo qual o pobre passa a

ser visto pela sociedade como alguém vulnerável, humilhado, destituído de

dignidade, de igualdade de oportunidades, autonomia e fundamentalmente

promotor de uma ausência constante de participação social.

O que representa para a sociedade não ter emprego, ter um trabalho mal

remunerado, possuir uma casa sem capacidades para satisfazer as necessida-

des básicas, não trazem apenas carência de recursos e impossibilidade de

adquirir bens de consumo; mas trazem também ao próprio indivíduo sensa-

ção de inutilidade, incapacidade de se realizar. Sensação esta, que impede os

indivíduos de usufruírem do mundo. É a partir desta percepção que se enten-

de a necessidade de estudar a pobreza e a exclusão social.

A exclusão social é uma problemática recorrente nas discussões em par-

ticular quando o recorte é a fome, em particular quando se evidenciam os

paradoxos nas nações ricas economicamente como é o caso brasileiro, os

quais fundamentam a formulação das políticas públicas em especial as de

enfrentamento a pobreza.

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É neste contexto que se inserem as políticas públicas de assistência social

que dentre seus programas e ações promovidas, destaca-se os recursos estra-

tégicos de minimizar e erradicar a fome, a pobreza e a desigualdade social.

Esse recurso estratégico das políticas públicas e da assistência social, os pro-

gramas de transferência de renda (desenvolvidos a partir de política pública)

apresentam-se como estratégia do Estado para enfrentar a pobreza. Neste

estudo o Programa Bolsa Família brasileiro.

O Bolsa Família é um programa de transferência direta de renda que be-

neficia famílias em situação de pobreza e de extrema pobreza no Brasil desde

o ano de 2003. O Planalto Norte Catarinense apresenta um total de 34.612

famílias inscritas no Bolsa Família (PBF) atingindo um percentual de 9,69% da

população total da região (IBGE, 2013).

A lógica deste programa é que o acesso a uma renda mínima associada à

oferta de serviços básicos existentes nos municípios deveria possibilitar auto-

nomia às famílias pobres. Frente a esta discussão, pode-se entender a pobreza

como um conceito socialmente construído e definido por sua história, muitas

vezes associado a padrões estabelecidos pela mesma sociedade, em dados

momentos de seu desenvolvimento.

Ainda, na mesma perspectiva de construção social, a temática da pobreza

sob a concepção subjetiva, leva à identificação do reflexo social na produção

de pobreza, pela qual o sujeito passa a ser reconhecido no seu espaço como

pessoa com história e necessidades além das financeiras. Muitas vezes ao se

estudar o ambiente onde os sujeitos em condição de pobreza estão inseridos

observa-se comportamentos sociais de exclusão, de segregação social e de

pouco reconhecimento social por parte das próprias pessoas pertencentes a

este contexto.

Para tanto, o estudo teve como problemática: quais são as representa-

ções sociais dos sujeitos que vivem em condição de pobreza e sua interferên-

cia ao desenvolvimento no Planalto Norte Catarinense?

Na perspectiva de responder a esse problema, o objetivo geral do estudo

portanto, foi o de evidenciar as representações sociais dos sujeitos beneficiá-

rios no Bolsa Família no Planalto Norte Catarinense sobre sua condição de

pobreza e como tanto pobreza como o auto reconhecimento do sujeito pobre

implicam no desenvolvimento da região.

O texto deste é descrito na seguinte ordem: em um primeiro momento é

apresentado o referencial teórico estruturado com os principais temas que

abrangem este estudo, no segundo momento os procedimentos metodológicos

para a sua construção são descritos, para proporcionar entendimento dos

resultados e discussão que são apresentados em um terceiro momento e por

fim, este estudo conclui-se com a apresentação das considerações finais.

POBREZA

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A pobreza pode ser entendida sob diversos aspectos, como privação em

termos de materiais, na forma de fome ou na baixa qualidade de moradia,

tratando-se de termos econômicos, pode ser entendida sob forma de inade-

quação de renda e em termos sociais, é definida como isolamento da comuni-

dade ou sentimento de baixa autoestima (VINHAS, 2006).

Esta problemática tem alcançado patamares cada vez mais elevados em

todo o mundo; no Brasil nas últimas décadas vem se observando cada vez

mais desigualdade na distribuição de renda e significativos níveis de pobreza

(SILVA, BANDEIRA e LOPES, 2011). Logo, explicar este fenômeno exige um

esforço para o seu entendimento no campo das determinações sociais.

Para melhor entendimento sobre o fenômeno pobreza faz-se necessária a

identificação de abordagens que o descrevem. A literatura especifica identifica

quatro abordagens fundamentais para sua compreensão no âmbito social,

sendo as elas: as culturalistas; as estruturalistas; as liberais-neoliberais; e, as

abordagens que concebem a pobreza como fenômeno multidimensional (SIL-

VA, 2004).

As abordagens culturalistas da pobreza concebem-na como decorrência

de fatores internos, comportamentais e valorativos defendidos pelos pobres,

nos quais o fator cultural é entendido como único determinante da pobreza no

mundo. Oscar Lewis (1983) um dos principais defensores desta teoria é citado

por Paugam (2003, p.51).

A cultura da pobreza é ao mesmo tempo, uma adaptação e uma reação dos pobres à sua posição marginal em uma sociedade de classes estratificada, ex-tremamente individualizada e capitalista. Representa um esforço para comba-ter os sentimentos de desespero que surgem quando os pobres compreendem o quanto é improvável que tenham êxito concebido segundo valores e objeti-vos da sociedade em que vivem. [...]. A cultura da pobreza não é somente uma adaptação a uma série de condições objetivas do conjunto da sociedade. Uma vez que se manifeste, tende a se perpetuar de geração em geração, em razão do efeito que produz nas crianças. Quando as crianças dos cortiços atingem seis ou sete anos, em geral já assimilaram os valores básicos e os hábitos de sua sub-cultura, e não se encontram em condições psicológicas para aprovei-tar plenamente a evolução ou os progressos possíveis de acontecer durante sua vida.

Este tipo de concepção tem sido adotado no Brasil como base para a ela-

boração de políticas públicas de enfrentamento da pobreza desde os anos de

1970. Já as abordagens estruturalistas, cuja discussão predominava nos anos

de 1950, se posicionam inversamente as abordagens culturalistas, uma vez

que concentra nas explicações sobre a pobreza em fatores externos e estrutu-

rais, entendendo o comportamento dos pobres como consequência e não co-

mo causa da pobreza (JESUS e COSTA, 2007).

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A tese estrutural, consequentemente opera uma mudança de perspectiva: se os mais desfavorecidos são afastados temporária ou definitivamente do mer-cado de trabalho e das instituições oficiais, isso não ocorre porque se desinte-ressam pelos valores da sociedade em geral, mas porque na ausência de renda estável, de poder e de instrução, reconhecem que suas chances de promoção social são comprometidas e que estão condenados a viver por mais ou menos tempo em um contexto cultural no limite da exclusão social (PAUGAM, 2003, p.52).

Esta vertente tem suas bases no marxista que concebe e explica a socie-

dade capitalista pelos processos de exploração do trabalho pelo capital. Jesus

e Costa (2007) complementam esta concepção descrevendo que a corrente

estruturalista a qual propõe que se considerem as questões estruturais que

definem o ambiente dos pobres e que os comportamentos descritos por Lewis

(1981) sejam definidos como consequência da pobreza e não como causa

como propôs a teoria culturalista.

Já a abordagem liberal-neoliberal dos anos de 1970 converge com a cul-

turalista. Aquela identifica as causas da pobreza e não concorda com inter-

venções sobre a pobreza realizadas pelo Estado. Para essa abordagem a inter-

venção do Estado sobre a pobreza poderia desestimular o indivíduo buscar no

trabalho a condição de interação social. Para os liberais ortodoxos, não deve-

ria ocorrer nenhuma intervenção do Estado sobre a pobreza. Aqueles qualifi-

cam o pobre como o indivíduo incapaz de competir no mercado. Mas um gru-

po de liberais aceitou a necessidade da intervenção do Estado desde que fosse

pontual e em circunstâncias bem definidas (SILVA, 2000).

Por fim, a abordagem da pobreza enquanto fenômeno multidimensional

provoca a discussão na qual se defende a pobreza de forma complexa, levando

em conta juízos de valor em termos relativos ou absolutos.

Crespo e Gurovitz (2002, p.3) descrevem que “a pobreza pode ser estu-

dada apenas do ponto de vista econômico ou incorporada a aspectos não

econômicos à análise, sendo contextualizada de forma dependente ou não da

estrutura sócio política da sociedade”. Esta abordagem tem como proposta

central contestar as concepções de pobreza por visões homogêneas e dicotô-

micas. A abordagem multidimensional define a pobreza a partir de três esfe-

ras que se inter-relacionam: a pobreza como juízo de valor, a pobreza relativa

e a pobreza absoluta (SILVA, 2007).

Crespo e Gurovitz (2002, p.03) dizem que a pobreza como juízo de valor:

[...] quando se trata de uma visão subjetiva, abstrata, do indivíduo, acerca do que deveria ser um grau suficiente de satisfação de necessidades, ou do que deveria ser um nível de privação normalmente suportável. O indivíduo ex-pressa sentimentos e receitas, de caráter basicamente normativo, do que de-veriam ser os padrões contemporâneos da sociedade quanto à pobreza. Não leva em conta uma situação social concreta, objetivamente identificável, ca-racterizada pela falta de recursos. Desse modo, tal enfoque não esconde sua

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fragilidade, embora seja bastante óbvio que mesmo uma conceituação objeti-va da pobreza não se furta à presença de algum juízo de valor.

Silva (2000) descreve que a concepção de pobreza a partir de um juízo de

valor, por vezes pode dar base à interpretação empírica do fenômeno, defen-

dendo que a compreensão a partir de uma visão dualista pode explicar melhor

as manifestações empíricas da pobreza. Ainda, a autora aponta que a noção de

insuficiência dos níveis de vida e a de desigualdade na distribuição de renda

sustenta a explicação mais frequentemente utilizada para esclarecer a pobre-

za, a partir das definições de pobreza absoluta e pobreza relativa.

Crespo e Gurovitz (2002) ao descreverem que as percepções de pobreza

relativa se fazem a partir de cunho macroeconômico, assim como o conceito

de pobreza e dizem que:

A pobreza relativa tem relação direta com a desigualdade na distribuição de renda. É explicitada segundo o padrão de vida vigente na sociedade que define como pobres as pessoas situadas na camada inferior da distribuição de renda, quando comparadas àquelas melhor posicionadas. O conceito de pobreza rela-tiva é descrito como aquela situação em que o indivíduo, quando comparado a outros, tem menos de algum atributo desejado, seja renda, sejam condições favoráveis de emprego ou poder. Já o enfoque absoluto na conceituação da pobreza se observa quando da fixação de padrões para o nível mínimo ou su-ficiente de necessidades, conhecido como linha ou limite da pobreza, determi-nando a percentagem da população que se encontra abaixo desse nível. Esse padrão de vida mínimo, apresentado sob diferentes aspectos, sejam nutricio-nais, de moradia ou de vestuário, é normalmente avaliado segundo preços re-levantes, calculando a renda necessária para custeá-los (CRESPO e GUROVITZ, 2002 p.03-04).

O enfoque de pobreza absoluta é utilizado como um instrumento para a

concepção de intervenções do Estado que fixa padrões para o nível mínimo ou

suficiente de necessidades dos indivíduos, padrão conhecido como linha ou

limite de pobreza que determina o percentual da população que se encontra

abaixo deste nível.

]Vinhas (2006) escreve que para o estabelecimento dos limites de pobre-

za são considerados três enfoques: o enfoque biológico que define a pobreza a

partir de requisitos nutricionais mínimos da dieta alimentar; o enfoque das

necessidades básicas considera a alimentação, a moradia, vestuário e serviços

essenciais de água, saneamento, transporte público, serviços médicos e de

educação como necessários; e o ultimo enfoque definem a ideia o salário mí-

nimo que defende a ideia de um salário mínimo inicial deva ser dinheiro ne-

cessário para suprir um nível de vida mínimo.

Já a definição de pobreza relativa se mantém a partir da noção de desi-

gualdade e da ausência de condições que permite aos pobres participarem de

um padrão mínimo de sobrevivência oferecido, com um padrão de renda que

atenda às condições mínimas de vida para o indivíduo (SILVA, 2000).

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Considerando essas diferentes abordagens sobre pobreza no decorrer do

século XX três novas concepções foram desenvolvidas: a concepção de sobre-

vivência, de necessidades básicas e de privação relativa.

Durante os séculos XIX e XX até a década de 1950 o enfoque de sobrevi-

vência predominou. Teve origem no trabalho de nutricionistas inglesas que

apontavam que a renda do mais pobre não era suficiente para a manutenção

do rendimento físico de um indivíduo. Este enfoque tinha como objetivo pre-

servar a ênfase no individualismo compatível com o ideário da teoria liberal

(apresentada acima neste estudo). A partir deste ponto de vista e com a utili-

zação de medidas estatísticas formulou-se o primeiro modelo de proteção

social para o Estado de bem estar fundamentado em políticas nacionais de

assistência (SILVA, 2007).

A partir de 1970, novas exigências como serviços de água potável, sane-

amento básico, saúde, educação e cultura passaram a serem consideradas

necessidades mínimas para a sobrevivência e por esta razão a pobreza rece-

beu a conotação relacionada com as necessidades básicas (PEREIRA-PEREIRA,

2000).

Rocha (2006, p. 19) expõe que a adoção da “abordagem de necessidades

básicas insatisfeitas significa ir além daquelas de alimentação para incorporar

uma gama mais ampla de necessidades humanas, tais como educação, sanea-

mento, habitação” em contingencia dos direitos sociais previstos pela Consti-

tuição Federal Brasileira de 1988.

Por esta razão a noção de pobreza abrange outros aspectos da vida coti-

diana dos sujeitos, considerando que estes não só se alimentam como também

se relacionam e trabalham.

Somente nos anos de 1980 é que a pobreza foi vista por outro enfoque

mais abrangente e rigoroso, com maior direcionamento para se definir as

interferências sobre a pobreza, que passou a ser entendida como privação

relativa. Este conceito introduziu ao estudo da pobreza variáveis mais amplas,

que a conduziram para o entendimento de que os sujeitos podem sofrer priva-

ções em diversas esferas da vida, não implicando somente na privação materi-

al. Estas privações sofridas pelas pessoas determinavam o seu posicionamento

em todas as esferas sociais (CRESPO e GUROVITZ, 2002).

Outra forma de se entender a pobreza e que ampara a estruturação deste

estudo a citada por Silva (2007). Esta autora considera a pobreza enquanto

expressão objetiva ou subjetiva. A primeira expressão se refere às manifesta-

ções concretas do fenômeno na vida dos pobres, por outro lado a dimensão

subjetiva da pobreza diz respeito ao como o fenômeno é percebido pela socie-

dade em geral, inclusive pelos próprios sujeitos da pobreza.

Conforme Silva (2007) a pobreza é perceptível em diversos lugares e si-

tuações. Captar sua dimensão é complexo e subjetivo, uma vez que ela apre-

senta uma multidimensionalidade, podendo ser explicada de forma absoluta,

relativa e subjetiva.

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Um dos parâmetros mais conhecidos para a determinação da pobreza e

que indica a pobreza extrema é o parâmetro estabelecido pelo Banco Mundial

o qual estabelece que pobres extremos são os que viviam com menos de 1

dólar por dia. Este parâmetro é criticado por atender uma perspectiva limita-

da da problemática, ou seja, mensura renda e consumo na perspectiva econô-

mica, uma vez que a pobreza vem se mostrando cada vez mais multifacetada.

Em complemento aos critérios e situações da pobreza e da pobreza ex-

trema no Brasil, apontados no início deste estudo o IBGE identificou também

que a predominância da população nestas condições localizava-se no meio

rural e que os estados do nordeste concentram a maior parte dos sujeitos

extremamente pobres (9,61 milhões), a região sudeste possui 2,72 milhões de

sujeitos nestas condições, seguido pelo norte com um contingente de 2,65

milhões, no sul são 715,96 mil sujeitos em condições de extrema pobreza (IB-

GE, 2013).

A criação de um indicador que sintetizasse a pobreza em suas mais di-

versas dimensões surgiu no ano de 1990 pelo Programa das Nações Unidas

para o Desenvolvimento (PNUD) e denominou-se Índice de Pobreza Humana

(IPH) no ano de 1997. Este índice tem sido utilizado desde então em estudos

sobre o desenvolvimento humano (IPEA, 2007).

A definição e respectiva caracterização de desenvolvimento humano têm

por objetivo aferir o avanço da qualidade de vida de uma população conside-

rando suas características econômicas, culturais, sociais e políticas. Esta abor-

dagem procura focar diretamente para as pessoas, suas oportunidades e capa-

cidades.

A definição do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) foi criado pela

Organização das Nações Unidas (ONU) para avaliar a qualidade de vida e o

desenvolvimento econômico da população. Este índice varia de zero (quando

não apresenta nenhum desenvolvimento) até 1 (hum) (quando é considerado

que há desenvolvimento humano total). Por este parâmetro, é elaborado rela-

tório sobre o desenvolvimento humano de 187 países, pelo Programa das

Nações Unidas (PNUD). No ano de 2013 o Brasil manteve-se nesse ranking

mundial no 85° lugar apresentando o IDH de 0,73 (PNUD, 2013). O Brasil nas

últimas décadas veio demonstrando tendência de aprofundamento da desi-

gualdade pela distribuição de renda gerando elevados níveis de pobreza.

Neste estudo da pobreza se trata ela a partir de uma perspectiva social,

pela qual o sujeito pobre se relaciona com os atores sociais. Portanto, é neces-

sário estudar o pensamento social do que é pobreza e de que forma ela está

representada na sociedade a partir da visão do próprio sujeito pobre é descri-

ta neste estudo sob orientação das representações sociais.

A desigualdade social em especial carrega consigo a pobreza como condi-

ção social e historicamente produzida, porém, o seu enfrentamento faz parte

das estratégias da superação da desigualdade, que vem por meio da transfe-

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rência de renda, que no Brasil é prevista por programas sociais, tais como o

Bolsa Família.

O Programa Bolsa Família4 é um programa de transferência de renda di-

reta para as famílias, vinculado a um auxílio financeiro para famílias que se

encontram em condições de pobreza extrema.

Este programa foi criação a partir da medida provisória número 132 de

20 de outubro de 2003, posteriormente convertida na lei número 10.836 de

09 de janeiro de 2004. É gerenciado pelo Ministério de Desenvolvimento Soci-

al e Combate à Fome (MDS). É o mais relevante programa no desenvolvimento

histórico entre os programas de transferência de renda no Brasil.

A seleção das famílias para receberem o benefício do PBF ocorre pela

sua inclusão no cadastro único para programa Socais (CadÚnico) que é pre-

enchido nos municípios, utilizando-se de uma ferramenta eletrônica. A partir

dos dados cadastrados, o MDS seleciona sistematicamente as famílias que

serão incluídas no PBF.

No estado de Santa Catarina eram 134.132 famílias beneficiadas pelo

PBF, destas 4.501 famílias (3,35%) fazem parte do recorte amostral deste

estudo por pertencem aos municípios estudados (Mafra, São bento do Sul,

Irineópolis e Três barras) (MDS, 2014).

REPRESENTAÇÕES SOCIAIS

A definição de representação social5 vem sendo discutida com mais fre-

quência a partir dos últimos 40 anos. Um dos fatores desencadeadores dessa

discussão pode ser atribuído ao interesse em estudos acerca de fenômenos de

domínio simbólico. Mesmo com a emergência de outros conceitos oriundos da

sociologia em busca de uma definição deste simbólico, é na psicologia social

que a representação social vem sendo fundamentada teoricamente, a partir de

Serge Moscovicci6 (ARRUDA, 2002). A psicologia social aborda as representa-

ções sociais a partir da relação sujeito sociedade, acreditando que os indiví-

4O Programa Bolsa Família pauta-se em três dimensões essenciais a superação da fome e da pobreza,

sendo elas a promoção do alivio imediato da pobreza a partir da transferência de renda às famílias classificadas pobres ou extremamente pobres; o exercício dos direitos sociais básicos nas áreas de saúde

e educação através das condicionalidades e a coordenação de programas complementares que tem por

objetivo possibilitar as famílias beneficiadas pelo Programa Bolsa Família consigam superar a situação de vulnerabilidade e pobreza (MDS, 2013). 5 A psicologia social aborda as representações sociais no âmbito do seu campo, do seu objeto de estudo,

da relação indivíduo-sociedade e de um interesse pela cognição, embora não situado no paradigma clássico da psicologia. Esta abordagem se reflete sobre como os indivíduos, os grupos, os sujeitos

sociais, constroem seu conhecimento a partir da sua inscrição social, cultural, de forma a se compreen-

der como a sociedade se dá a conhecer e constrói esse conhecimento com os indivíduos. 6 Romeno naturalizado francês Serge Moscovici é dono de uma obra considerável, tão importante para

a psicologia (seu campo de formação e atuação) como para a história e as ciências sociais. Seus traba-

lhos e sua teoria das representações sociais (TRS) têm influenciado ao longo das últimas quatro décadas pesquisadores tanto na Europa como nas Américas, incluindo o Brasil. Entre sua vasta obra – doze

livros individuais e quatorze que ele organizou ou escreveu em conjunto com outros autores –, apenas

dois foram traduzidos para o português.

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duos, grupos e sociedade constroem seus conhecimentos a partir de uma ins-

crição social e cultural.

Alves-Mazzotti (2008, p.21) conceitua representações sociais, dizendo

que

Nas sociedades modernas, somos diariamente confrontados com uma grande massa de informações. As novas questões e os eventos que surgem no hori-zonte social frequentemente exigem, por nos afetarem de alguma maneira, que busquemos compreendê-los, aproximando-os daquilo que já conhecemos, usando palavras que fazem parte de nosso repertório. Nas conversações diá-rias, em casa, no trabalho, com os amigos, somos instados a nos manifestar sobre eles procurando explicações, fazendo julgamentos e tomando posições. Estas interações sociais vão criando “universos consensuais” no âmbito dos quais as novas representações vão sendo produzidas e comunicadas, passan-do a fazer parte desse universo não mais como simples opiniões, mas como verdadeiras “teorias” do senso comum, construções esquemáticas que visam dar conta da complexidade do objeto, facilitar a comunicação e orientar con-dutas.

As produções teóricas de Moscovicci surgem em 1961, na França, pro-

duzindo impacto nos meios sociais devido a seu direcionamento e principal-

mente por contrariar o behaviorismo, paradigma dominante da Psicologia que

buscava na época através da experimentação estabelecer o que era cientifico.

O direcionamento teórico de Moscovicci era para fenômenos marcados

pelo subjetivismo, que possuíam metodologias ainda diferentes do que se

considerava ciência na época, que dependia da interpretação do pesquisador

para a sua análise (ARRUDA, 2002).

Moscovicci (2003, p.172) descreve que:

A teoria das representações sociais é singular, parece-me devido ao fato de es-ta teoria tender mais e mais, na direção de se tornar uma teoria geral dos fe-nômenos sociais e uma teoria especifica dos fenômenos psíquicos. Este para-doxo não se dá por acaso, ele provem da natureza profunda das coisas. É uma teoria geral a medida que dentro do que lhe compete uma sociedade não po-deria ser definida pela simples presença de um coletivo que reuniu indivíduos através de uma hierarquia de poder por exemplo, ou através de intercâmbios baseados em interesses mútuos.

Pode-se entender então que as teorias das representações sociais opera-

cionalizam um conceito para se analisar com o pensamento social em sua

dinâmica e em sua diversidade7

Ainda Moscovicci juntamente com Nemeth (1974), apud Moscovicci

(2003), afirmam que as representações sociais são conjuntos dinâmicos que

7 A teoria das Representações Sociais parte da premissa de que existem formas diferentes de conhecer e

de se comunicar, e estas diferenças são guiadas por guiadas por objetivos sociais diferentes, gerando à

este sujeito social a compreensão de seu universo a partir do que lhe é definido pela sociedade que

pertence (ARRUDA, 2004).

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provocam a produção de comportamentos e relações como meio de modificar

o outro, de forma lógica, própria, em uma linguagem particular não se trans-

formando nem em opiniões sobre objetos ou imagens, mais sim teorias ou

ciências coletivas que se destinam a interpretação da realidade atual.

Desta forma o estudo das representações sociais provoca uma releitura

do saber popular, do conhecimento do cotidiano e do conhecimento pré-

teórico de que falam Berger e Luckmann (1978), de forma que o conhecimen-

to sobre a realidade torne-se socialmente construído. Esta construção se dá a

partir do saber do sujeito interligado com a sua inscrição social. A isso Mosco-

vicci (1961) dá o nome de processo social (ARRUDA, 2002).

Moscovicci (1961, p.26) descreve que processo social

[...] é um processo de familiarização pelo qual os objetos e os indivíduos vêm a ser compreendidos e distinguidos na base de modelos ou encontros anterio-res. A predominância do passado sobre o presente, da resposta sobre o estí-mulo, da imagem sobre a realidade tem como única razão fazer com que nin-guém ache nada de novo sob o sol. A familiaridade constitui ao mesmo tempo um estado das relações no grupo e uma norma de julgamento de tudo o que acontece.

Estudar a Teoria das Representações Sociais na interface da ciências so-

ciais, sobre aspectos psicológicos e sociológicos, tem se mostrado uma alter-

nativa de plasticidade em busca da compreensão de fenômenos sociais, uma

vez que estes são móveis e voláteis. A partir desta perspectiva vê-se a impor-

tância de estudar as representações sociais a partir da vivencia de sujeitos que

se encontram em condição de pobreza e extrema pobreza. Identificando o

papel das políticas públicas neste cenário a partir do desenvolvimento de

programas sociais.

Para o entendimento de pobreza relaciona-se algum tipo de privação seja

ela material, cultural ou social em face aos recursos disponíveis de um sujeito,

tem-se a necessidade de maior exploração deste universo científico uma vez

que entende-se importante que o sujeito reconhecido como pobre possa con-

tribuir com estes dados de forma que o mesmo aponte pelo seu discurso as

características da exclusão social que sofre.

A exclusão social historicamente produzida no Brasil desde a época do

Brasil Colônia passou a ser mais observada a partir da década de 1970, mo-

mento em que foi relacionada com o crescimento econômico brasileiro.

Sendo assim estudar a pobreza mostra-se relevante tanto para fins cientí-

ficos, como para identificar políticas públicas, ou mesmo constituir novas

políticas públicas que objetivem o enfrentamento da exclusão. Este estudo

ainda é relevante para entender os fins sociais na busca por uma condição

mais justa e humana para a garantia dos direitos a todas as pessoas indiferen-

te de sua condição econômica e social. É neste contexto, que o presente estudo

busca contribuir para um melhor entendimento sobre as representações soci-

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ais dos indivíduos que vivem em condição de pobreza no Planalto Norte Cata-

rinense.

PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

A pesquisa foi desenvolvida na região denominada Planalto Norte Catari-

nense, na qual vivem 357.039 habitantes (IBGE, 2013, composta pelos muni-

cípios de Bela Vista do Toldo, Canoinhas, Irineópolis, Itaiópolis, Mafra, Major

Vieira, Monte Castelo, Papanduva, Porto União e Três Barras. Desse universo,

foram definidos quadro municípios para a pesquisa de campo tendo-se como

critério de definição, serem os dois municípios de maior IDH – M regional e

dois de menor IDH – M regional.

Participaram deste estudo 115 mulheres com idade entre 18 e 63 anos,

dos municípios de São Bento do Sul (N-31), Mafra (N-36), Irineópolis (N-18) e

Três Barras (N-30). Essa amostra foi constituída por mães inscritas no Pro-

grama Bolsa Família desses quatro municípios, integrantes dos grupos do

Programa de Convivência e Fortalecimento de Vínculos dos Centros de Refe-

rências de Assistência Social (CRAS), no mês de setembro do ano de 2013.

Como critério de inclusão utilizou-se a assinatura no Termo de Consentimento

Livre e Esclarecido.

Das 115 entrevistadas, 91,29% possuíam escolaridade de até o primeiro

grau concluído, fator que julgam ser o influenciador da dificuldade de inserção

no mercado de trabalho. Somente 23,47% destas mães encontravam-se inse-

ridas no mercado de trabalho, ainda que informal.

Todas as pesquisadas para este estudo, beneficiárias do Programa Bolsa

Família (principal programa de transferência de renda desenvolvido pelo

estado para enfrentar a pobreza e a pobreza extrema) tinham renda per capita

inferior a um (1) salário mínimo (33,04%, R$ 724,00) e 66,96% recebiam

renda de um (1) salário mínimo.

Tabela 1 - Apresentação dos participantes do estudo

Municípios partici-pantes do estudo

Participantes do encon-tro no dia da coleta de

dados

Participantes beneficiá-

rios convidados para participar

Participantes beneficiá-

rios que aceitaram participar

São Bento do Sul 52 49 31 (63,26%)

Mafra 48 41 36 (87,80%)

Irineópolis 33 25 18 (72%)

Três Barras 40 35 30 (85,71%)

Total de sujeitos que aceitaram participar do estudo 115

Fonte: Dados do estudo (2014).

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O estudo desenvolvido foi orientado pelos procedimentos metodológicos

da abordagem qualitativa e explicativa. A pesquisa de campo foi desenvolvida

pela aplicação de uma entrevista semidirigida para mulheres, conforme amos-

tragem descrita acima.

O roteiro da entrevista era composto por sete (7) perguntas e o local da

coleta de dados foi a residência dos sujeitos, quando de visita realizada pela

pesquisadora durante os meses de agosto a outubro de 2014. A entrevista

teve duração média de 30 minutos e foi realizada em local da casa escolhido

pelo pesquisado. Este cuidado foi tomado em virtude de a gravação das res-

postas não fosse afetada. Para a análise dos dados deste estudo utilizou-se

como procedimento metodológico a análise do discurso do sujeito coletivo

(LEFÈVRE, LEFÈVRE e TEIXEIRA, 2000). A entrevista semidirigida foi gravada

após autorização das participantes da pesquisa de campo e os discursos cole-

tados foram transcritos na íntegra para seguidamente ser realizada a análise

pela técnica do Discurso do Sujeito Coletivo (DSC).

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Participaram deste estudo 115 mulheres com idade entre 18 e 63 anos,

dos municípios de São Bento do Sul (N-31), Mafra (N-36), Irineópolis(N-18) e

Três Barras (N-30).

Considerando características sociais e demográficas da região, pode-se

afirmar que das entrevistadas, 50,43% (N-58) possuíam escolaridade de 1º

grau incompleto, 40,86% (N-47) possuíam o 1º grau completo, 7,82% (N-9)

possuíam o 2º grau incompleto e nenhuma entrevistada possuía o 2º grau

completo ou qualquer curso técnico ou profissionalizante.

Em outra questão identificou-se a relação das pesquisadas com o merca-

do de trabalho. Então 23,47% (N-27) encontravam-se ativas no mercado de

trabalho informal, 76,53% (N-88) encontravam-se fora do mercado de traba-

lho seja ele formal ou informal e nenhuma da pesquisadas estava inserida no

mercado de trabalho formal.

Devido ao estudo tratar de famílias beneficiárias do Programa Bolsa Fa-

mília e os sujeitos do estudo tratarem-se de mães, levantou-se também o nú-

mero de integrantes dos grupos familiares de cada pesquisada. Foi possível

apontar que 33,91% (N-39) dos participantes possuem famílias compostas

com até 3 integrantes, 45,21% (N-52) dos participantes possuem famílias

compostas por 4 ou 5 integrantes e 20,86% (N-24) tinham famílias compostas

com mais de 6 integrantes.

No que se refere a renda per capita das pesquisadas, identificou-se que

66.95% (N-77) possuem renda de 1 salário mínimo; 33,05% (N-38) afirmou

possuir renda per capita inferior a 1 salário mínimo e nenhuma entrevistada

possuía renda superior a 1 salário mínimo.

Os questionamentos realizados em toda entrevista apresentaram respos-

tas bastante semelhantes nos quatro municípios nos quais foi realizada a pes-

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quisa de campo. Desta forma se apresenta uma única análise do DSC para os

participantes deste estudo.

O quadro abaixo apresenta o primeiro questionamento realizado aos su-

jeitos que consiste em buscar o entendimento do que é pobreza para as entre-

vistadas.

Quadro 1 - Análise do Discurso do Sujeito coletivo frente ao questionamento do que é pobreza

O que é Pobreza para você?

Expressões Chaves

Sujeito 25 (S Bento do Sul): “pobreza é não ter nada e não ver saída desta situação, é tão difícil de

dizer que nem consigo colocar tudo que penso, imagine é tudo de ruim que você possa imaginar [...]”

Sujeito 7 (Mafra): “pobreza é ver meus filhos sentindo a mesma dificuldade que eu senti quando era

criança, é ter que repetir para eles o que eu ouvia da minha mãe (“isso não é coisa para pessoas po-bres”) hoje repito para minhas filhas, para mim pobreza é a falta de tudo, é a necessidade de ter que

depender das outras pessoas (dinheiro, roupa, comida)”

Sujeito 11 (Irineópolis): “é a falta de dinheiro, sem dinheiro falta todo o resto, não se tem comida,

roupa nova, coisas para oferecer para seus filhos, acho que tudo se resume em falta de tudo... até de

esperança [...] o meu mundo é muito diferente o seu”

Sujeito 3 (Três Barras): “pobreza é ser visto de forma diferente pelas pessoas, sentir vergonha por não

conseguir ser melhor do que o dia de ontem e saber que os próximos amanhãs serão todos iguais, sem dinheiro, tem trabalho, sem vida digna me sinto preso a esta condição ”.

Ideia Central

Pobreza é a falta de tudo, dinheiro, esperança, é ter que depender de outras pessoas é sentir vergonha de ser visto diferente pela sociedade.

Discurso Síntese:

A pobreza é não se ter dinheiro, não conseguir oferecer melhores coisas para seus filhos, é depender

da ajuda de outras pessoas sempre. É sentir que se é tratado de forma diferente pela sociedade, muitas vezes deixado de lado, quando as oportunidades vão ficando cada vez mais difíceis de serem encon-

tradas, isso só faz com que sejamos mais pobres. Até parece que ser pobre é bom, e que não queremos

melhorar, as pessoas com mais dinheiro devem pensar que não queremos crescer como elas, até queremos mais não temos a mesma oportunidades, o nosso mundo é diferente não se tem a mesma

liberdade de quem tem dinheiro.

Fonte: Dados do estudo (2014).

É possível observar nos depoimentos do quadro acima que a pobreza

também é compreendida pelo sujeito entrevistado a partir de uma leitura

multidimensional, pela qual a falta de dinheiro, e os recursos adquiridos com

ele, muitas vezes é apresentada como primeira condição de pobreza Porém

verifica-se um reconhecimento da falta de oportunidade, da indiferença social

e liberdade.

Freire (2011) descreve que a abordagem multidimensional da pobreza

pode ser definida como privação de capacidades, ou seja, privação de liberda-

de de escolha entre diferentes alternativas de modo de vida e este fator pode

impedir as pessoas pobres conduzirem sua vida possuindo razões de valoriza-

ção.

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Já o autor Sen (2000), compreende a pobreza de forma mais completa,

descrevendo-a como uma ausência de funcionamento (habilidade de realiza-

ções) e de capacidades (liberdade para realizar), propondo principalmente

que a pobreza não deve ser vista como uma questão apenas econômica e indi-

vidual, mas sim como um conceito social, de forma que a pobreza possa ser

analisada a partir de estados e ações humanas.

Desta forma pode-se identificar no discurso deste grupo a ausência de li-

berdade de escolha, fator que os mantém na condição de pobreza, pois estes

podem até escolher não serem sujeitos pobres ou não estarem em condição de

pobreza, principalmente devida as condições que estão expostas os priva da

liberdade de simplesmente mudar de vida, ao buscarem oportunidades (fator

presente no discurso individual de muitos participantes), falta-lhes espaço e

aceitação na sociedade.

Santos (2007) descreve que a pobreza quando definida como privação de

capacidades acaba por refletir na liberdade das pessoas e Sen (2001) classifica

três razões distintas para liberdade; (1) a que por si só gera bem-estar, (2) a

que permite a realização de funcionamentos relevantes para o bem-estar e (3)

a que possibilita ao indivíduo a realizar a condição de agente social. Desta

forma a privação de liberdade pode contribuir para o empobrecimento dos

sujeitos.

Outro questionamento levantado por este estudo buscou por um enten-

dimento referente ao porque existem pessoas em situação de pobreza. Abaixo

é possível identificar os relatos apresentados.

Quadro 2 - Discurso do Sujeito Coletivo frente ao questionamento do porquê existem pessoas em condição de pobreza

Por que existem pessoas em condição de pobreza?

Expressões Chaves

Sujeito 12 (S Bento do Sul): “falta de oportunidades desde criança, não estudei, fui morar com uma

pessoa muito nova, para sair de casa, hoje tenho 5 filhos destes 2 pequenos, estou sozinha, não

consigo trabalhar. Mais resumo tudo em falta de estudo e isso leva a falta de oportunidade, sem

estudo não tem trabalho. Pense, tenho 39 anos estudei até a 5ª série e tenho 5 filhos, você acha que

alguém vai me dar trabalho?”

Sujeito 21 (Mafra): “não tem emprego, já andei a cidade toda atrás de um mais ninguém precisa, na

verdade eu sei e sinto que ninguém quer contratar pessoas mais velhas com pouco estudo, não sei falar bonito, não tenho roupas boas, isso conta muito. Hoje eu trabalho por dia, mais sabe como é

né, hoje tem e manhã não tem. Mas é como vou levando a vida e dando de comer e vestir para meus filhos. Hoje sinto a importância do estudo”.

Sujeito 2 (Irineópolis): “não sei dizer com certeza, mas eu estou assim porque não estudei. Só consigo trabalho por dia, quando alguém dá, do tipo, limpar uma casa ou outra, mais não fico muito

tempo, logo as pessoas não querem mais. Sou pobre porque não consigo ver formas de deixar de ser

pobre”

Sujeito 18 (Três Barras): “falta de trabalho, não estudei. Hoje o estudo conta muito, sem ele não se

consegue fazer serviço nenhum. Não terminei a oitava série, sei ler e sei escrever mais é pouco e já tenho 40 anos. Hoje está cheio de gente mais nova, com muito mais estudo. Tenho feito alguns

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cursinhos profissionalizantes para ver se ajuda, mais a professora já falou, se eu não voltar estudar não vou conseguir”

Ideia Central

A falta de estudo leva a falta de oportunidade de trabalho, fator que impede a superação da condi-

ção de pobreza.

Discurso Síntese:

Existem pessoas em condição de pobreza porque não estudaram, a falta do estudo atrapalha para

conseguir trabalho, sem trabalho não tem dinheiro, a falta de estudo provoca a falta de condições de trabalho digno, sem trabalho digno não tem experiência sem experiência e com idade avançada aí

situação fica pior.

Fonte: Dados do estudo (2014).

O discurso apresentado acima aponta o direcionamento para a falta de

estudo como principal provocador da falta de oportunidade. Logo, estar em

condição de pobreza. Este direcionamento no discurso pode ser relacionado

com dados já identificados nas características demográficas apresentadas

anteriormente as quais mostram percentual de 91,29% com escolaridade de

até o 1º grau concluído.

Pontili (2004) descreve que muitas pesquisas já foram realizadas na área

da economia, e os resultados têm apontado a importância da escolaridade

como fator desencadeador de uma melhoria da qualidade de vida dos sujeitos.

Deve-se considerar então que a educação ao compor um dos direitos

fundamentais do sujeito, visa o seu preparo para o exercício da cidadania e a

qualificação para o trabalho (BRASIL 1998).

Ao se perceber no discurso dos sujeitos participantes deste estudo que a

falta de escolaridade é um fator provocador da falta de oportunidades, princi-

palmente de trabalho na vida destes sujeitos, é possível identificar pelos dis-

cursos o sentimento das entrevistadas sobre a responsabilidade que possuem

sobre sua condição de pobreza, quando 11,30% (N-13) manifestaram não se

sentirem responsáveis por sua condição atual, repassam essa responsabilida-

de ao estado que não oferecia melhores condições de vida e principalmente de

mais trabalho. Mas 88,70% (N-102) assumiu para si a responsabilidade pela

sua condição. Este resultado justifica-se pelos com os dados do quadro 2,

quando foi questionado o porquê da existência da pobreza e o discurso coleti-

vo identificado pauta-se na falta de escolaridade. A tabela abaixo apresenta o

discurso individual de sujeitos que complementaram sua justificativa sobre

sua condição de pobreza.

Tabela 2 - Discurso individual de sujeitos sobre a responsabilidade pela sua condição de pobreza

SIC “sou pobre porque não estudei, nunca gostei da escola desde pequeno e meus pais não me manda-

vam ir, isso fez com que eu desistisse muito cedo (estudei até a 5ª série), pois achava que ir para a

escola era perca de tempo, naquela época eu gostava mesmo de brincar, depois o tempo foi passando,

passei a trabalhar nas casas para ter um dinheirinho, e quando comecei buscar serviço de verdade, vi

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que devia ter estudado mais, e que ia ser difícil ter um trabalho bom” (Sujeito 22 município de Mafra)

SIC ”sou muito responsável sim, tanto que hoje obrigo meus filhos irem para escola, pois sei qual vai

ser o futuro deles se não estudarem [...]” (Sujeito 28 Três Barras)

SIC “ quando vi que devia ter estudado mais para conseguir trabalho, voltei a estudar, estas escolas

especiais, mais não consegui acompanhar. Hoje não consigo trabalhar registrada, pois não tenho a oitava série e não adianta, não consigo aprender as coisas, já estou muito velha”. (Sujeito 11 São Bento

do Sul)

SIC “ sem estudo não tem trabalho, sem trabalho não tem dinheiro, sem dinheiro sou pobre” (Sujeito 3

Irineópolis)

Fonte: Dados do estudo (2014).

Outro dado importante manifestado pelas entrevistadas para a composi-

ção deste estudo tratou da possibilidade de superarem a situação de pobreza

que se encontravam. O quadro abaixo mostra numericamente entendimento

da superação da própria condição de pobreza.

Quadro 3 - Entendimento sobre a possibilidade de sair da condição de pobreza que se encontram

Municípios SIM NÃO

Freq (%) Freq (%)

São Bento do Sul 28 90,32 3 9,68

Mafra 34 94,44 2 5,56

Irineópolis 18 100 0 0

Três Barras 24 80 6 20

Total 104 90,43 11 9,56

Fonte: Dados do estudo (2014).

Foram 90,43% (N104) dos sujeitos que entendiam possível saírem da si-

tuação de pobreza atual, mas 9,57% (N11) entendia haver limitações para

ultrapassarem essa condição. A tabela 3 apresenta o discurso individual de

sujeitos ao complementarem o questionamento da entrevista.

Tabela 3 - Entendimento sobre a possibilidade de saírem da condição de pobreza que se encon-tram

SIC “existe possibilidade sim, mais depende muita coisa, voltei a estudar, também estou participando de alguns cursos profissionalizantes oferecidos pela prefeitura, queria ter certeza que é só isso, para que eu

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possa trabalhar registrada e daí possa ser feliz, sem me preocupar se amanhã vou ter dinheiro para comprar comida ou roupa para meus filhos, vou andar na rua de cabeça erguida, me sentindo igual a

todo mundo” (Sujeito 12 município de Mafra)

SIC “já estou fazendo meus filhos irem para escola, não deixo perder um dia, se meus pais tivessem

feito isso comigo talvez eu estivesse melhor de vida, mais agora não dá para olhar para traz, tenho que olhar para frente e não deixar que meus filhos tenho a mesma vida que eu” (Sujeito 8 Três Barras)

SIC “ estou certa que dá para melhorar, até porque já melhorei muito, eu já fui muito pobre, sem ter luz e água em casa, roubava água de noite nos vizinhos para poder tomar durante o dia, hoje eu estou

estudando, faço uma matéria por vez porque não tenho mais cabeça para acompanhar, mais logo termi-no, daí vou buscar emprego igual a todo mundo”. (Sujeito 19 São Bento do Sul)

SIC “eu não vejo forma de deixar de ser pobre, nunca fui diferente, meus pais tinham menos do que eu,

acho que enquanto a sociedade não olhar melhor para nós vamos ser sempre os necessitados, eu não

tenho esperança de ver as coisas mudar, acho que morro antes” (Sujeito 11 Irineópolis)

Fonte: Dados do estudo (2014).

É possível observar nos discursos individuais apresentados que estraté-

gias já estavam sendo utilizadas na tentativa de mudar de situação. As entre-

vistadas buscavam a liberdade de escolherem em que condições quereriam

viver. Isso pode ser identificado nos discursos dos sujeitos do município de

Mafra, Três Barras e São Bento do Sul, quando apontaram alternativas tais

como: voltar a estudar, participar de cursos profissionalizantes oferecidos

pelos Programas de Fortalecimentos de Vínculos, manterem seus filhos na

escola.

Sob os argumentos de Amartya Sen é possível analisar nos discursos

acima apresentados que há necessidade dos sujeitos entrevistados terem a

liberdade para usufruírem e realizarem aquilo que pode agregar valor, pelo

trabalho e reconhecimento social. Esta afirmativa converge com a abordagem

seniana pela qual a liberdade é considerada intrinsecamente importante por

enriquecer a vida humana, a partir do favorecimento de oportunidades das

pessoas terem resultados e participação social.

Santos (2007) complementa essa ideia dizendo que a expansão da liber-

dade deve ser vista como principal fim8 e principal meio9 do desenvolvimen-

to.

8 O papel constitutivo está associado às liberdades substantivas que inclui a capacidade de evitar a

fome, a subnutrição, doenças que podem ser prevenidas, morte prematura, bem como as liberdades associadas à instrução, à participação política, à liberdade de expressão, etc. As liberdades substantivas

devem ser consideradas importantes independentemente do interesse individual em exercê-las ou não:

mesmo que uma pessoa não tenha vontade de exercer sua liberdade de expressão, por exemplo, seria uma privação se ela não pudesse ter a escolha por manifestar-se ou não. Essas liberdades são parte

integrante do enriquecimento da vida humana. (SANTOS, 2007, p.38). 9 Já as liberdades instrumentais são importantes na medida em que contribuem para promoção de outros

tipos de liberdades (liberdade política, facilidades econômicas, oportunidades sociais, garantia de trans-

parência e segurança protetora), que se inter-relacionam entre si, permitindo uma liberdade global do

sujeito (SANTOS, 2007).

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Na entrevista se indagou aos sujeitos sobre o que poderia contribuir para

que saíssem desta situação.

Quadro 4 - Discurso do Sujeito Coletivo sobre o questionamento do que poderia contribuir para o entrevistados sair da condição de pobreza

O que poderia contribuir para você sair desta situação?

Expressões Chaves

Sujeito 23 (S Bento do Sul): “mais emprego”

Sujeito 21 (Mafra): “mais oportunidade de trabalho digno, não é por que sou pobre que não posso ter

um trabalho bom, em um lugar limpo, parece que as pessoas esperam que os pobres façam o trabalho

ruim e o rico o trabalho bom, agora estou trabalhando em lugar ruim porque ainda estou estudando, ainda sou pobre, mais quero ir trabalhar em um lugar bom ”.

Sujeito 2 (Irineópolis): “duas coisas, mais trabalho e melhorar a renda do benefício, pois é muito baixa e não dá para fazer muita coisa, tenho 5 filhos dar de comer e vestir todo mundo, não é barato ”

Sujeito 18 (Três Barras): “mais oportunidade para trabalhar, na medida que as pessoas vejam que com

o trabalho dá para deixar de ser pobre e começarem a trabalhar e não ficar dependendo só de ajuda as

coisas melhoram. Vejo muita gente que mora perto da minha casa que fica esperando a ajuda cair do céu, veja, tenho 4 filhas, meu marido foi embora... o que eu posso fazer, buscar trabalho para dar

coisas para elas e ensinar elas serem diferentes ou ficar em casa esperando ajuda igual a muita gente e

ensinar minhas filhas fazer a mesma coisa amanhã. ”

Ideia Central

Mais oportunidade de trabalho digno

Discurso Síntese

Com mais oportunidade de trabalho, ficaria mais fácil sair desta condição.

Fonte: Dados do estudo (2014).

Na análise dos dados acima se direciona para a relação trabalho e renda

como alternativa de superação da condição da atual condição de pobreza. Mas

esta relação pode acontecer devido ao sentimento de privação, quando a falta

de dinheiro leva a falta de outras estratégias. Como o dinheiro tem uma rela-

ção direta com o trabalho, entende-se que se tiver trabalho se tem dinheiro,

logo mais condições e menos privação.

Albuquerque (1995) escreve que existe uma dependência familiar relati-

vamente grande das rendas dos chefes de família e esta dependência ocorre

principalmente a partir da sub utilização da força de trabalho familiar.

O apontamento do autor acima é apropriado quando se relaciona ele ao

questionamento de quantas pessoas da família se encontravam trabalhando

(formal ou informalmente). Identificou-se que dos grupos familiares estavam

inseridos no mercado de trabalho 23,47% (N27), e apenas um membro famili-

ar trabalhando informalmente, o restante dos sujeitos entrevistados, 76,52%

(N88) encontravam-se fora do mercado de trabalho.

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Considerando que todos os integrantes do estudo, inseridos ou não no

mercado de trabalho, eram beneficiários do Programa Bolsa Família, a ques-

tão recaiu sobre o conhecimento dos entrevistados sobre os programas para o

enfrentamento da pobreza oferecidos por seu município. Pode-se observar

que 80,87% (N93) disseram conhecer a existência de programas de enfrenta-

mento a pobreza oferecidos em seu município e 19,13% (N22) assumiram não

conhecer programas oferecidos com esta finalidade, mesmo estando inseridos

e estarem sendo beneficiados pelo PBF.

Tabela 4 - Programas de enfrentamento a pobreza oferecidos nos municípios onde ocorreu o estudo

São Bento do

Sul

Mafra Três Barras Irineópolis

Programa Bolsa Família 1126 1643 1047 685

BPC – Idosos 251 157 30 137

BPC - PCD 335 398 88 03

Renda Mensal Vitalícia 18 09 01 00

Fonte: Ministério do Desenvolvimento Social (maio/2014).

Na identificação dos programas oferecidos pelos municípios onde acon-

teceu a pesquisa, com o propósito de enfrentamento a pobreza, foram menci-

onados pelas entrevistadas.

Quando comparados com dados anteriores sobre o conhecimento dos

participantes do estudo frente aos programas oferecidos, observa-se que os

Benefício de Prestação Continuada (BPC) - Idosos, o Benefício de Prestação

Continuada (BPC) Pessoa com deficiência e a Renda Mensal Vitalícia, não fo-

ram apontados. Isso pode ser relacionado ao fato de que os entrevistados

consideraram como programas existentes somente os programas aos têm

acesso.

A entrevista encerrou-se com um questionamento referente à percepção

das entrevistadas sobre sua condição de vida após a inclusão em um programa

social.

Identificou-se que 100% (N115) assumiram ter melhorado sua condição

de vida a partir da entrada em programas sociais, que para as entrevistas re-

sumiu-se no PBF.

Quadro 5 - Discurso do Sujeito Coletivo frente ao questionamento sobre a especificação das me-lhorias vivenciadas a partir da inclusão no PBF

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Qual melhoria foi percebida em sua condição de vida após a sua inclusão no PBF?

Expressões Chaves

Sujeito 16 (S Bento do Sul): “pude comprar mais coisas, não são muitas, mas já dá para oferecer

o mínimo para meus filhos, de vez em quando trabalho de faxineira e já entra um pouco mais de dinheiro (R$ 50,00 dia), com isso atendo as necessidades da minha família”

Sujeito 29 (Mafra): “consegui melhorar algumas coisas em minha casa, comprei TV, uma cozi-nha nova, fico muito feliz quando estou em casa e vejo que as coisas estão melhorando, bem

devagar, mais a 5 anos atrás eu morava de favor no quartinho de uma amiga, tinha uma pia e dois

colchões, hoje tenho até TV, sou muito feliz ”.

Sujeito 2 (Irineópolis): “consigo comprar as coisas, pouquinhas, mais não falta mais comida, o restante as outras pessoas ajudam, com roupas que não usam mais, ou moveis que iam jogar fora,

é assim que eu vou conseguir as coisas. O bolsa família me ajuda com a comida necessária para a

sobrevivência, tomara que eu nunca perca. ”

Sujeito 18 (Três Barras): “como melhorei, não preciso mais dizer não para tudo para meus filhos,

me sinto mais importante quando vou no mercado e consigo comprar e pagar minhas compras, sinto que não devo nada para ninguém, me sinto mais digna.”.

Ideia Central

Aquisição de bens materiais, dignidade e autonomia.

Discurso Síntese

O PBF ajuda muito, consegui comprar coisas para a casa, oferecer necessidades mínimas para meus filhos, me sinto mais importante e capaz de me manter sozinha, sem ficar pedindo tudo.

Fonte: Dados do estudo (2014).

Pelo discurso acima é possível identificar a percepção de melhoria na

condição de vida após ter acessado o benefício do Programa Bolsa Família, e

que esta melhoria refere-se a aquisição de bens materiais, ficando claro no

discurso acima que a principal melhoria incide autonomia e no sentimento de

dignidade.

Em análise pautada na teoria de Sen (2000) pode-se relacionar este sen-

timento de dignidade e autonomia com a liberdade exposta por este autor.

Freire (2011) aponta a importância da liberdade na vida dos indivíduos e

explica-as a partir da teoria de Sen (2000) Este identifica a liberdade por meio

de três principais formas, a pobreza econômica, a carência de serviços públi-

cos e assistência social e a negação de liberdade política e civil.

Ao analisar o discurso acima, pode-se identificar que a inclusão destas

famílias no PBF ameniza a ausência de dois dos tipos de liberdades propostos

por Sen (2000). A liberdade provocada pela pobreza econômica caracterizada

pela ausência de recursos econômicos (impede a aquisição de bens essenciais

como alimento, moradia, vestuário). Isso é identificado quando em discursos

individuais destacam-se essencialmente a aquisição de alimentos, roupas e

bens materiais.

Porém, um segundo tipo de liberdade revela-se amenizada para estes su-

jeitos após o acesso ao Programa. Trata-se da liberdade política e civil, que se

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caracteriza pela restrição da participação das pessoas em determinados gru-

pos sociais ou econômicos. Identifica-se que as pessoas beneficiadas podem

passar participar mais ativamente na sociedade em que vivem, quando em

discursos individuais entrevistados se manifestam dizendo que “hoje não

tenho vergonha de andar na rua, sempre te recebo aproveito para comprara

as coisas que estão faltando, e faço isso me sentindo importante, igual as ou-

tras pessoas” (SIC).

A partir do discurso dos sujeitos pesquisados para este estudo, quando

perguntados sobre o que é pobreza, do porquê existem pessoas nesta condi-

ção, quais fatores contribuíram para que a condição destas pessoas fosse esta,

de que forma o Estado contribui para a superação desta condição e, que me-

lhorias foram identificadas nas suas vidas a partir do momento em que foram

incluídos em programas sociais de erradicação à pobreza, objetivou-se o en-

tendimento de uma possível relação entre a pobreza dos sujeitos pesquisados

para o estudo e as condições de desenvolvimento da região na qual vivem.

O estudo foi desenvolvido no território do Planalto Norte Catarinense

que é constituído por 13 municípios. A seleção dos municípios envolvidos no

estudo considerou dois municípios com maior IDHM (São Bento do Sul e Ma-

fra) e dois municípios com o menor IDHM (Irineópolis e Três Barras).

A partir desta definição realizou-se uma pesquisa buscando caracterizar

a pobreza na região estudada. O Planalto Norte Catarinense é tido nas mensu-

rações estaduais como um território de concentração de pobreza. O quadro

abaixo apresenta os números encontrados relacionado com os quatro municí-

pios estudados.

Quadro 6 - Representação da pobreza nos municípios estudados

São Bento do

Sul

Mafra

Três Barras

Irineópolis

IDHM 0,76 0,73 0,70 0,69

População Municipal –

habitantes

74.801 52.912 18.129 10.448

Cad Único10 4.293 6.991 3.177 1.377

Pobreza Extrema 527 1.021 647 479

Programa Bolsa Família 1.126 1.643 1.047 685

Benefício Social de Pobre-

za Extrema (BSPE)

169 306 649 42

BPC – Idosos 251 157 30 25

BPB – Pessoas com Defici-

ência

335 398 88 137

Fonte: MDS (maio 2014).

10 Famílias Cadastradas no Cadastro Único (2013)

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Ao se observar os dados do quadro acima se constata que o município de

São Bento do Sul possui 1,5% da sua população como beneficiária do PBF, o

município de Mafra possui 3,10% da sua população na condição de beneficiá-

ria do PBF, o município de Três Barras possui 5,77% de sua população na

condição de beneficiária do PBF e o município de Irineópolis possui 6,55% de

sua população na condição de beneficiários do Programa Bolsa Família.

Estes dados permitem a relação do estudo com afirmativa de Amartya

Sen (2000) quando este escreve que a visão do que é ser pobre é influenciada

pela determinação do espaço em que esta pobreza é apreciada. É possível

verificar pelo quadro que os municípios de Irineópolis e Três Barras possuem

o menor IDHM do grupo estudado e consequentemente apresentam um maior

percentual de pessoas beneficiárias pelo Programa Bolsa Família.

Este fator nos remete ao pensamento de que quanto menor foi o IDHM

maior é a confirmação da existência da pobreza e da exclusão. Pois para se

analisar o nível de desenvolvimento é preciso considerar a relação de altos

índices de pobreza, as condições e as possibilidades de melhoria da sociedade.

DESAFIOS DA POBREZA PARA O DESENVOLVIMENTO NO PLANALTO NORTE CATARINENSE

Superar o cenário de região não desenvolvida é o desafio ao Planalto

Norte Catarinense, que comprovadamente é uma região de condições vulne-

rabilizadoras tanto é que se tornou objeto da implementação do Programa

governamental Territórios da Cidadania.

Os municípios do Planalto Norte Catarinense muito pouco se diferem en-

tre si em termos sócio produtivos, mesmo com que tenha um certo diferencial

de desenvolvimento nos extremos dessa região. Porto União e Rio e Negrinho

e São Bento do Sul formam dois nichos com certo desenvolvimento, nos quais

a produção e a indústria se destacaram e se tornaram atrativos aos trabalha-

dores da região, fazendo com que o êxodo rural-urbano-urbano acontecesse

produzindo consequências, entre elas o formação de bolsões de pobreza.

Ainda no que tange aos desafios essa região preserva projetos societários

sustentados em uma herança de diversidades (multirracial, cultural, política,

ética e ambiental), como síntese das ações e pensamentos dos migrantes atra-

ídos pelo atrativo da potencial economia eficaz regional.

Frente a essas reflexões constata-se que a pobreza nas sociedades capita-

listas e uma questão central, não importa o potencial atrativo econômico que

se apresente. Portanto, o enfrentamento da pobreza como uma direção social

e política brasileira no pós constituição de 1988, foi um dos recursos estraté-

gicos para o desenvolvimento, pois no Planalto Norte Catarinense em 2013,

34.612 famílias estavam inscritas no Bolsa Família (PBF) atingindo um per-

centual de 9,69% da população total da região (IBGE, 2013).

Isto é, em realidades com essas condições o desafio perpassa pelo deline-

amento de intervenções que deveriam promover desfechos ao desenvolvi-

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mento nas dimensões sociais, econômicas, educacionais, culturais e também

políticas. Trata-se de acionar transformações societárias em que os atores

possam reconhecer-se, conjugarem-se, corresponsabilizarem-se e coparticipa-

rem do redirecionamento ético-político da classe trabalhadora.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Concluídas as etapas nestas considerações finais, responder as questões que nortearam a problemática pode-se destacar quais são as representações sociais dos sujeitos que vivem em condição de pobreza e sua implicação na desenvolvimento no Planalto Norte Catarinense.

A pesquisa revelou que os sujeitos pobres entendem que existem pessoas nesta condição principalmente devido à falta de estudos, que leva a falta de oportunidade de trabalho digno, bem como os entrevistados sentiram-se res-ponsáveis pela situação quem se encontravam. Apontaram a falta de estudo e a falta de oportunidade de trabalho como os principais fatores provocadores desta realidade. No entanto na análise do discurso dos sujeitos, a possibilidade de saírem desta situação se faz presente no discurso de 90,43% dos sujeitos e também no comportamento de muitos deles quando afirmam que retomaram seus estudos e que participam de cursos profissionalizantes oferecidos pelo Programa de Fortalecimento de Vínculos de seu município.

A oportunidade de trabalho digno esteve presente no discurso dos sujei-tos quando apontados os fatores que poderiam contribuir para que os mes-mos saíssem da situação em que se encontram.

Quanto aos programas de enfrentamento a pobreza, oferecidos pelos municípios pertencentes ao território estudado, verificou-se no discurso de 80,87% dos participantes o conhecimento sobre o Programa Bolsa Família, porém os demais já citados anteriormente (BPC – Idosos/BPC Pessoas com Deficiência e RMV) não se fizeram presentes durante o discurso. Logo pode-se concluir que 19,13% dos participantes do estudo são beneficiários do Pro-grama Bolsa Família, porém este apontamento não faz parte do discurso dos mesmos como um programa de enfrentamento à pobreza.

Este estudo tratou da pobreza a partir da visão de privação de capacida-des básicas, quando a renda baixa é um fator reconhecido como uma das prin-cipais causas da pobreza, porém não a única. Acredita-se que a pobreza deve ser vista a partir de um entendimento de privação de liberdade, pois uma renda mais alta permite maiores condições de liberdade de escolha.

Agora, quando pensamos na forma de como as representações sociais, ou seja, o entendimento que os sujeitos possuem sobre o sentimento de ser pobre se relaciona com o desenvolvimento da região do Planalto Norte Catarinense, podemos apontar que os sujeitos conseguem fazer uma relação de seu desen-volvimento pessoal com o desenvolvimento de seu município, isso mostra-se evidente durante na análise das entrevistas quando se identifica em fragmen-tos dos discursos dos sujeitos participantes uma relação direta da ausência de oportunidades com a realidade que observam no espaço que vivem.

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Apontando muitas vezes que existem muitas pessoas na mesma condição que eles, ou até mesmo pior, pois quando não estavam inseridos em nenhum programa de benefício social a pobreza se fazia bem mais evidente. Estes en-trevistados assumem poder ajudar as outras pessoas em condição mais com-prometida que a sua, pois hoje já estão menos pobres.

O sentimento de não ser mais pobre, ou estar em uma condição de po-breza menor atualmente, justifica-se quando se analisa que as beneficiadas com um programa e estarem participando de uma circulação comunitária e social as faz entenderem-se como alguém que já venceu alguns obstáculos, sentirem-se mais livres para fazer escolhas no contexto social. A compreensão de pobreza e a autodefinição de pobreza nesta situação acaba por ser supera-da pelo fato de que agora possuem um pouco mais de condição de atender suas necessidades mínimas.

Verificou-se em fragmentos do discurso dos sujeitos participantes do es-tudo que a sua condição acaba indiretamente refletindo no crescimento de sua cidade (principalmente a partir de uma leitura de renda versus poder de com-pra) e também a partir da percepção de condição de estudo versus oportuni-dade de trabalho.

Desta forma conclui-se que os elementos identificados neste estudo re-forçam a visão de que o desenvolvimento da região também está relacionado com a sensação de liberdade de escolhas e de envolvimento social de seus sujeitos, permitindo que as entrevistadas passem a e sentir-se ativos no pro-cesso de crescimento pessoal e crescimento de sua região. A ausência de en-tendimento sobre o seu crescimento pessoal impede a leitura de crescimento de região.

REFERÊNCIAS

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O TURISMO NO TERRITÓRIO DO

CONTESTADO: POTENCIALIDADES

PAUTADAS EM ASPECTOS HISTÓRICOS E

POLÍTICAS PÚBLICAS

Alexandre Assis Tomporoski1

Sandro Luiz Bazzanella2

Ivone Mazutti de Geroni 3

CONSIDERAÇÕES INICIAIS

O objetivo deste artigo consiste em examinar os principais aspectos per-

tinentes ao turismo enquanto estratégia de desenvolvimento aplicável ao

território do Contestado. A abordagem considera a prerrogativa do estado em

intervir nos segmentos da sociedade, através de políticas públicas capazes de

fomentar o desenvolvimento da atividade turística pela iniciativa privada.

O Território do Contestado abrange, preponderantemente, a região norte

e centro-oeste do estado de Santa Catarina. Conforme será examinado, neste

território eclodiu, entre os anos de 1912 e 1916, um dos maiores movimentos

sociais da história brasileira, que se transformou em uma guerra civil de gran-

des proporções, e ceifou dezenas de milhares de vidas.

Entretanto, anteriormente à deflagração da Guerra do Contestado, no

território sob análise, ocorreu um processo incisivo de concentração da pro-

priedade da terra, agravado pelo advento do capital estrangeiro no início do

século XX, o qual, além de intensificar a concentração fundiária, também pro-

moveu a instauração do extrativismo de produção.

Portanto, a formação histórica do Território do Contestado culminou em

uma conjuntura que ainda hoje se manifesta, caracterizada pela concentração

fundiária e pela perpetuação do modelo econômico amparado no extrativis-

mo. Neste contexto, urge examinar estratégias alternativas, que permitam

1 Doutor em História, com atuação no Programa de Mestrado em Desenvolvimento Regional da

Universidade do Contestado (UnC). E-mail: [email protected] 2 Doutor em Ciências Sociais, com atuação no Programa de Mestrado em Desenvolvimento Regional da

UnC. 3 Possui graduação em Turismo, mestranda em Desenvolvimento Regional pela UnC e atualmente

Prefeita Municipal de Calmon SC.

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fomentar o desenvolvimento sustentável e, assim, amenizar os impactos de-

correntes deste processo histórico.

Dentre as possíveis estratégias de desenvolvimento, advém o turismo

pautado na herança imaterial do Contestado. Com este propósito, cabe exami-

nar, a priori, o papel do Estado no estabelecimento de políticas públicas que

permitam viabilizar, de fato, o turismo.

Dada a relevância, incumbe ao poder público intervir e regulamentar a

atuação da iniciativa privada. Assim, torna-se imprescindível analisar a evolu-

ção das relações entre o poder público e o turismo, além das competências

que lhe são inerentes, a fim de promover a efetiva implementação da atividade

turística.

ASPECTOS HISTÓRICOS DO TERRITÓRIO DO CONTESTADO

O povoamento do Território do Contestado remonta, em seus primór-

dios, à população humana nativa, constituída por grupos indígenas, das tribos

Xoklengs e Kaingangs.

Contudo, este contexto transformou-se a partir do ano de 1728, quando

ocorreu a abertura da Estrada de Tropas, caminho que interligava os estados

do Rio Grande do Sul e São Paulo, e estabeleceu o início do processo de povo-

amento da região. Dadas as necessidades primárias de descanso e alimenta-

ção, os tropeiros, durante sua longa jornada, transportando produtos e ani-

mais comercializados principalmente na feira de Sorocaba (São Paulo), reali-

zavam paradas e, nestes locais, ao longo do Caminho de Tropas, paulatina-

mente foram surgindo povoados, que mais tarde originaram alguns dos muni-

cípios que atualmente integram o Território do Contestado.

Além do Caminho de Tropas, o povoamento da região foi influenciado pe-

la chegada dos imigrantes, oriundos, em grande proporção, do continente

europeu. O ano de 1829 registra a chegada dos primeiros imigrantes, de ori-

gem alemã, ao município de Rio Negro (PR).

Posteriormente, sucessivas levas de imigrantes adentraram a região, e, a

partir dos anos 1890, acentuou-se a chegada de imigrantes provenientes de

diversos países europeus, destacando-se aqueles de nacionalidade alemã,

polonesa e ucraniana.

No Território do Contestado ocorreu a manifestação do coronelismo4, fe-

nômeno através do qual fazendeiros e comerciantes, proprietários de grandes

latifúndios, exerciam influência sobre o poder político local. Essa influência

política advinha não somente do latifúndio e da correspondente riqueza que o

4 O termo “coronel” vem da extinta guarda nacional imperial, que lutou nas guerras do Prata, do

Uruguai e do Paraguai, entre os anos de 1851 a 1870, convertendo-se em termo meramente decorativo

após as mencionadas guerras e abolido na Primeira República. No Império, cada município possuía um regimento da guarda nacional, o posto de “coronel” era concedido ou vendido ao chefe político deste

município, que normalmente era o mais rico comerciante, industrial ou fazendeiro (MACHADO, 2004,

p. 93).

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mesmo poderia gerar, mas, também, do contingente de agregados que residi-

am no entorno da propriedade, representados pelos peões, homens de confi-

ança e pelos fazendeiros de menor expressão, posseiros e lavradores dos ar-

redores, que ofereciam apoio e lealdade ao coronel. Essa capacidade de dispor

de significado contingente de homens, proporcionava ao coronel a possibili-

dade de exercer funções de polícia, acentuando ainda mais seu domínio.

Todavia, com o advento da República, ocorreu o fortalecimento do poder

político local, exercido pelos mandatários legitimamente eleitos, implicando

na gradativa decadência da influência política dos coronéis.

Neste território, um recurso altamente relevante para a população pobre,

em grande medida constituída por caboclos, consistia na extração da erva-

mate, que proporcionava, ao menos, a subsistência daquelas pessoas.

Entretanto, a partir da vigência da lei nº 601, de 18 de setembro de 1850,

sancionada por Dom Pedro II, conhecida como a “Lei de Terras”, houve uma

transformação gradual na relação entre os coronéis e a população cabocla. A

Lei de Terras, na tentativa de organizar a propriedade privada no Brasil, aca-

bou por privilegiar os grandes fazendeiros e proprietários de latifúndios, pois,

com a legitimação da propriedade, as maiores e melhores áreas que haviam

sido obtidas através da posse, permaneceram sob controle dos grandes fazen-

deiros. Estes, com o decorrer do tempo, passaram a proibir o acesso dos cabo-

clos aos ervais nativos de suas propriedades, restringindo-os de recursos an-

teriormente disponíveis. Esta conjuntura acentuou o processo de exclusão da

população pobre.

Não obstante a atuação dos coronéis, o advento e a inserção do capital es-

trangeiro, a partir da primeira década do século XX, contribuiu decisivamente

para concentração da propriedade privada, e, por conseguinte, para o agra-

vamento da tensão social.

O governo brasileiro, com o objetivo de construir uma ferrovia que inter-

ligasse os estados do sul do Brasil, assinou um contrato com a Brazil Railway

Company, companhia responsável pela construção da rede ferroviária, tendo

como pontos de partida e de chegada as cidades de Itararé em São Paulo e de

Santa Maria, no Rio Grande do Sul. No ano 1910, foi concluída a construção do

trecho que atravessava o território catarinense, num total de trezentos e oi-

tenta quilômetros, entre a cidade de União da Vitória, no Paraná, e Marcelino

Ramos, no Rio Grande do Sul, às margens do rio Uruguai.

Entrementes, o contrato para construção da ferrovia estabelecia que a

companhia responsável pela empreitada – a Brazil Railway Company – teria o

direito de explorar as terras adjacentes à linha tronco, numa extensão de até

quinze quilômetros do leito da linha férrea. Essas terras eram cobertas por

milhões de pinheiros ou araucárias, imbuias, canelas pretas, cedros e cabriú-

vas. Objetivando extrair e comercializar essa madeira de alto valor econômico

e, mais tarde, vender parte daquelas terras a imigrantes europeus, a Brazil

Railway Company constituiu uma subsidiária, a Southern Brazil Lumber and

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Colonization Company. Em 1910, a Lumber instalou, em Três Barras, então

território paranaense contestado por Santa Catarina, uma moderna serraria. A

empresa instituiu um processo industrial altamente mecanizado, tornando-se

a maior madeireira em atividade na América do Sul (CARVALHO, 2010).

Com o avanço de suas atividades, a Southern Brazil Lumber and Coloniza-

tion Company instaurou um incisivo processo de expansão fundiária, em mui-

tos casos utilizando-se de seu corpo de segurança (contingente de homens

armados) para obter as terras almejadas. Além disso, o processo fabril, inicia-

do nas densas matas, através do arraste das árvores tombadas por guinchos,

dentre as quais pinheiros araucárias, imbuias, canelas pretas, cedros e cabriú-

vas, destruía toda a vegetação existente no percurso, ou seja, árvores menores,

espécies economicamente menos interessantes e também grandes quantida-

des de árvores de erva-mate, cuja extração, como já relatado, consistia em

recurso preponderante para a sobrevivência da população pobre que habitava

a região.

Depreende-se, portanto, que naquele contexto histórico, caracterizado

pelo controle da terra exercido pelos grandes proprietários de latifúndios, ou

seja, os coronéis, e, concomitantemente, pelo capital estrangeiro, representa-

do pela Brazil Railway Company e sua subsidiária, a Southern Brazil Lumber

and Colonization Company, a situação da população cabocla, formada por pe-

quenos posseiros e sitiantes, tornara-se insustentável, dada a privatização da

terra e a proibição de explorar a erva-mate. Assim, esse processo de exclusão

e marginalização contribuiu decisivamente para a adesão dos caboclos aos

redutos e influenciou peremptoriamente a deflagração do movimento sertane-

jo do Contestado (1912-1916), comumente denominado Guerra do Contesta-

do.

Embora a disputa entre os estados do Paraná e de Santa Catarina – a

Questão de Limites – tenha assumido, durante muito tempo, a condição de

causa principal para a eclosão da Guerra do Contestado, o avanço das pesqui-

sas explicitou uma diversidade de motivações e de objetivos, conforme a regi-

ão da zona contestada e dos setores sociais que aderiram ao movimento. Ma-

chado assim sintetiza:

Para os habitantes de Taquaruçu e Perdizes, locais de origem do movimento, a rebelião foi o caminho trilhado após a violência que os coronéis e o governo, em sua totalidade, haviam praticado contra o monge José Maria. Para os siti-antes e posseiros dos vales do Timbó, Tamanduá e Paciência, era um meio de combater a presença cada vez mais agressiva dos coronéis Fabrício Vieira e Arthur de Paulo e Souza, que desejavam estender suas propriedades e sua in-fluência política sobre aquelas regiões. Para as oposições políticas formais aos chefes municipais de Curitibanos e Canoinhas, significava uma oportunidade ímpar de minar o poder do coronel Albuquerque e do Major Vieira. Para os an-tigos maragatos de todo o planalto, a “guerra santa” significava a volta à ativa e uma chance de desforra contra os pica-paus (MACHADO, 2004, p. 259).

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Ao analisar as motivações dos integrantes do movimento sertanejo do

Contestado, podemos atribuir ao mesmo um caráter de conflito social, no qual

os alvos dos rebeldes revoltosos demonstraram a racionalidade intrínseca do

movimento: o capital estrangeiro; o domínio político e fundiário dos coronéis;

a exclusão da população nacional em detrimento do assentamento de estran-

geiros; a injustiças praticadas por aqueles que ocupavam cargos nos governos

das esferas estadual e federal.

CONSEQUÊNCIAS DA FORMAÇÃO HISTÓRICA DO TERRITÓRIO CONTESTADO

Embora no ano de 2016 transcorra o centenário de encerramento do

movimento do Contestado, constata-se, na memória da população do Territó-

rio do Contestado, a permanência de uma interpretação negativa sobre os

eventos ocorridos no início do século XX. Este fato é um indicativo de que os

impactos decorrentes do conflito ainda subsistem. Subsequentemente ao tér-

mino do conflito, a condenação do movimento, seja pelas elites, seja pelos

governantes, imputou ao Contestado estigma pejorativo, motivado pelo fato

dos ocupantes daquele território aderirem à luta contra as injustiças desenca-

deadas pelo establishment. O trauma, a ferida e o medo, marcaram indelevel-

mente a população do Território do Contestado, e a análise desse contexto

poderá contribuir para explicar os inúmeros problemas que o território ainda

enfrenta.

Portanto, transcorrido um século, o Território do Contestado continua

enfrentando sérios entraves à superação de injustiças históricas. Vários fato-

res podem ser elencados para esclarecer as causas dessa conjuntura. Um as-

pecto relevante consiste no incisivo processo de concentração da propriedade

da terra. Tanto os grandes proprietários rurais, quanto as ingentes empresas

multinacionais, ampliaram seu domínio fundiário, expandindo a cultura de

grãos (especialmente a soja) e a silvicultura. A partir do final dos anos 1960,

em substituição à araucária, deu-se o fenômeno da introdução de novas espé-

cies de vegetação, árvores exóticas, como o Pinus illiottii, e, desde então, essas

árvores têm sido destinadas como fonte primária de matéria-prima às indús-

trias de celulose, papel e móveis.

A introdução do pinus resultou na continuidade do processo de extrati-

vismo de produção e, por conseguinte, na ampliação do processo de concen-

tração fundiária.5 Além disso, a utilização desta espécie exótica ocasionou

outras perturbações ao processo de desenvolvimento sustentável do territó-

5 Atualmente, os estabelecimentos com menos de 50 hectares constituem 82,7% da área ocupada por

propriedades rurais, contudo, essas propriedades ocupam somente 28,6% da área total. Por outro lado, aqueles estabelecimentos agropecuários com mais de 500 hectares representam apenas 1,2% da área

ocupada por propriedades rurais, mas ocupam 32,2% da área territorial, praticamente um terço da área

total (SOUZA, 2009).

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rio. A disseminação dos reflorestamentos, privilegiando esta monocultura,

reduz as áreas que poderiam ser utilizadas para diversificação produtiva.

Cabe destacar, também, que sobreveio a intensificação da exploração

comercial da erva-mate, pelas médias e grandes ervateiras que dominam o

setor, restringindo o acesso a elemento historicamente fundamental para

subsistência dos setores socialmente mais fragilizados. Esse domínio desesti-

mula a busca, por exemplo, pela agregação de valor à erva-mate, matéria-

prima de altíssima qualidade produzida na região.

De todo o exposto anteriormente, é razoável delimitar três fatores vigen-

tes no Território do Contestado que geram entraves à implementação de es-

tratégias de desenvolvimento territorial sustentável: o trauma associado ao

conflito social e ao genocídio praticado contra os caboclos, impondo, à popula-

ção que reside naquele território, sentimentos de vergonha e consequente

silenciamento; a expansão fundiária, outrora já vivenciada, que promove a

concentração da propriedade da terra, sob controle de grandes proprietários

rurais e de empresas multinacionais; a perpetuação do modelo econômico

baseado primordialmente no extrativismo.

Em meados da segunda década do século XXI, o contexto atual caracteri-

za-se, no Território do Contestado, pela concentração exacerbada da riqueza

por grupos minoritários, que assim o fazem há gerações; a precarização das

condições de vida dos trabalhadores urbanos e rurais; os empecilhos à organi-

zação e atuação política da população empobrecida do Território do Contesta-

do; a degradação do patrimônio material e imaterial, particularmente aquele

associado à memória das populações tradicionais e de seus remanescentes,

bem como dos segmentos empobrecidos da região; o processo de concentra-

ção da propriedade da terra por companhias madeireiras e do setor de celulo-

se, algumas estrangeiras, que monopolizam o acesso à terra – tal qual ocorreu

no passado – e disseminam espécies vegetais exóticas, desestimulando a con-

tinuidade das atividades na pequena propriedade, ignorando os limites dos

recursos ambientais e socializando detritos danosos ao meio ambiente, resul-

tantes de sua produção industrial; a continuidade do processo centenário de

exclusão e marginalização das populações tradicionais – indígenas, grupos

afrodescendentes (caso dos quilombolas), sertanejos, caboclos, além dos des-

cendentes daqueles que estiveram nos redutos da Guerra do Contestado – que

agora incide sobre seus remanescentes, grupos estes que permanecem impe-

didos de acessar a fração justa da riqueza produzida no território, em grande

medida, pelos próprios braços.

Ademais, ressaltam-se as dificuldades para superação do modelo econô-

mico vigente, amparado em produtos primários, os quais não necessitam de

beneficiamento, reduzindo o valor agregado e desestimulando o crescimento

econômico. Uma consequência diretamente observável, decorrente da conti-

nuidade desse modelo, virtualmente esgotado, consiste na proliferação dos

problemas sociais que afligem o Território do Contestado, o qual, embora

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integre um dos estados mais desenvolvidos da federação, destaca-se pelos

índices decepcionantes de desigualdade social.

Conquanto o crescimento econômico e a expansão dos programas sociais

permitirem amenizar desigualdades históricas da sociedade brasileira, os

municípios que integram o Território do Contestado apresentam, hodierna-

mente, alguns dos mais baixos índices de desenvolvimento humano do estado

de Santa Catarina (IBGE, 2010), de acordo com sua classificação no IDHM

(Índice de Desenvolvimento Humano dos Municípios), compondo um bolsão

de pobreza e exclusão, precipuamente nas áreas onde a luta sertaneja foi mais

intensa.

É preciso salientar que, países ou territórios, caracterizados pela vigência

de uma matriz produtiva baseada no extrativismo, apresentam carências no

setor exportador, impossibilitando a obtenção de excedentes em divisas, vi-

sando a execução de investimentos em infraestrutura e nos setores básicos da

sociedade. No território do Contestado, manifestam-se essas carências. Suas

exportações resultam de produtos primários da agricultura e das atividades

das indústrias extrativistas, mormente a silvicultura direcionada à produção

de celulose. Todavia, nesses setores – vinculados à produção de commodities

– os preços são controlados pelos países dominantes ou por grandes corpora-

ções. Por conseguinte, dada a exploração maciça dos recursos naturais, eleva-

se a concentração fundiária e se produz acentuado impacto ambiental, especi-

almente a degradação do solo e dos mananciais, gerando, em contrapartida,

retorno econômico desproporcional à sociedade do entorno.

Destas questões, suscita a problemática que este projeto visa examinar: É

possível contribuir para a construção de um processo de desenvolvimento

territorial em bases alternativas, mediante proposta que considere a identida-

de territorial e os recursos materiais e imateriais do território, contrapondo-

se às práticas que ainda se manifestam entre as políticas públicas e empreen-

dimentos econômicos, que impedem a superação de um modelo que promove

a dilapidação dos recursos ambientais, além da concentração da riqueza e

perpetuação da miséria e exclusão social?.

Conforme será analisado neste artigo, especificamente no Território do

Contestado, uma estratégia altamente promissora consiste na revitalização do

turismo.

A INTERVENÇÃO DO PODER PÚBLICO

O poder público não pode permanecer indiferente ao turismo, tendo em

vista os impactos econômicos desta atividade, dentre os quais o aumento no

volume dos negócios, o incremento de recursos provenientes de transporte,

diversões, espetáculos, entre outros, e a participação na geração de empregos

e renda, de forma direta e indireta. Além disso, cabe destacar os efeitos cultu-

rais e a integração entre países. Admitindo o fato de que o poder público não

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pode permanecer alheio ou indiferente à atividade turística, deve-se definir as

condições e delimitar o espaço de implementação.

Incumbe ao setor público promover a expansão e a captação de correntes

turísticas; a adequação e regulamentação normativa do funcionamento das

empresas; o estímulo e facilidade ao desenvolvimento da oferta turística, me-

diante determinadas planificações, bem como mediante a disponibilização de

canais creditícios apropriados, e o estabelecimento de estímulos fiscais. Tam-

bém corresponde ao setor público ditar normas visando regular a exploração

dos valores e atrativos existentes. Neste contexto, cabe destacar a relevância

do tratamento adequado da ordenação urbanística, a defesa da paisagem e a

criação de infraestrutura, tanto de acesso e comunicação, como de serviços

urbanos. SEDETUR/RS. Turismo estratégia gaúcha. (1998, p. 18).

O poder público, atuando dentro de sua esfera, pode manter uma postura

de subsídio e de complementação às ações desenvolvidas pelo setor privado,

no que concerne a atividade turística. Justifica-se sua presença em decorrência

dos seguintes fatores:

Insuficiência da iniciativa privada, por falta de interesse em

operações a longo prazo, risco excessivo, carência de mentalida-

de e consciência dos problemas enfocados;

Necessidade de favorecer estímulos à iniciativa privada, tanto

nos aspectos econômicos da exploração, como na tecnologia pro-

fissional, investigação, planificação e programação;

Carência de inversões do setor privado na execução de planos

considerados mais adequados ao desenvolvimento da atividade

turística;

Falta de rentabilidade ou inapropriada destinação de recursos

privados, o que exige a adoção de medidas de caráter fiscal e fi-

nanceiro;

Inadequação das atividades privadas às funções de planejamen-

to geral ou regional, seguindo princípios de concentração ou dis-

tribuição geográfica que estudos econômicos indicam de escassa

ou contraproducente viabilidade;

Regulamentação do funcionamento das empresas do setor pú-

blico em matéria de turismo, mediante ações: normativa, sancio-

nadora, de ajuda e estímulo, de gestão direta em caso de insufici-

ência da iniciativa privada (SESSA, 1968. P. 158).

Na hipótese de intervenção do poder público, deduz-se que é necessária a

instauração de condições apropriadas, que permitam atuar convenientemen-

te, de forma eficiente e eficaz, diante das demandas de implementação e ges-

tão de atividades turísticas. Por outro lado, essa ação ou intervenção do poder

público não pode e não deve se estender indefinidamente.

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Segundo Sessa (1968), após a Segunda Guerra Mundial, independente-

mente do sistema político adotado pelas nações, verificou-se uma intervenção

cada vez mais acentuada dos governos nos vários setores de atividades das

nações. O turismo, com todos os efeitos que suscita no campo cultural, social,

político, de balanço de pagamento, não poderia ser exceção. Assim, o poder

público poderá adotar duas atitudes perante a realidade turística:

1ª atitude contrária: Um país ou uma região pode encontrar-se num con-

texto desfavorável, de tal modo que o desenvolvimento da atividade turística

torna-se inviável naquela conjuntura. Isto é, o país ou a região pode não pre-

encher os pré-requisitos da viabilidade turística. Nesse caso, suscitam dificul-

dades em incorporar o turismo como uma atividade a mais na administração

municipal, estadual ou nacional. Poderá acontecer, também, que a nação pre-

encha todos os pré-requisitos da viabilidade turística, porém o poder público

não considera o desenvolvimento dessa atividade em detrimento de outras

mais importantes. A atitude contrária do poder público também pode estar

relacionada aos seus efeitos predatórios. De fato, o turismo tem ocasionado a

devastação de paisagens, usos e costumes. Os exemplos que podem confirmar

tal afirmativa são inúmeros.

Além disso, tem-se verificado que algumas sociedades mais fechadas re-

sistem em aderir a este fenômeno de massa, contudo, outros segmentos tem

se posicionado negativamente em relação ao turismo. Ultimamente, observa-

se que países que já estiveram no topo do ranking internacional estão redu-

zindo o seu desenvolvimento turístico, dados os aspectos predatórios que o

mesmo envolve. É preciso salientar que a decisão desses países deve servir de

alerta às nações que estão projetando na atividade turística possibilidades de

contribuição para suas estratégias de desenvolvimento. Tais países ao consta-

tarem sua viabilidade turística, ao verificarem que preenchem os pré-

requisitos exigidos, se lançam à conquista dos mercados, no intuito de equili-

brar as suas contas através do ingresso de divisas. Nesse contexto a palavra

“divisas” assume importância e urgência para países, povos e comunidades.

Se, por um lado, países que assim se comportaram foram recompensados

através do incremento significativo de divisas, as consequências, em termos

ecológicos e culturais, foram incalculáveis. Apresenta-se algo complexo a um

morador nativo sentir-se estrangeiro em seu próprio país, constatar seus usos

e costumes sacrificados na ânsia da arrecadação de divisas. Diante das consi-

derações anteriores, dois aspectos podem ser analisados: a) Um país que pro-

jeta possibilidades através da intensificação da atividade turística. O seu de-

senvolvimento através do turismo deve estar devidamente preparado para o

impacto que ele proporciona; b) Os recursos turísticos que atraem os turistas

aos centros receptores são, com o passar do tempo, deteriorados. Nesse caso,

tanto o turista quanto o nativo são prejudicados, pois, o turista perde o incen-

tivo, senão o interesse, em se deslocar a polos turísticos descaracterizados; o

nativo, por sua vez, perde o visitante que consistia em sua fonte de renda.

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Sobre tais pressupostos, é preciso definir uma política de turismo que em

fase inicial eduque ou instrumentalize o seu povo para a prática do turismo. Se

isso for levado a termo, talvez poder-se-á transitar de uma atitude contrária a

outra favorável ao desenvolvimento do turismo, em que todas as partes en-

volvidas sejam beneficiadas.

2ª atitude favorável: O poder público incorpora a atividade turística em

sua estratégia de desenvolvimento. Cada país ou região atribui ao turismo

uma determinada importância, que repercutirá em sua política econômica. É a

partir destas perspectivas que o turismo poderá se organizar e se estruturar.

Segundo Tocqueville (2004), não é verdade dizer que os homens que vi-

vem na era democrática sejam naturalmente indiferentes às ciências, às letras

e às artes, cumpre somente reconhecer que eles a cultivam à sua maneira, e

introduzem nesse âmbito as qualidades e os defeitos que lhe são próprios.

Afirma, também, que na América, a paixão pelo bem estar material nem

sempre é exclusiva, porém é generalizada; nem todos a experimentam da

mesma maneira, contudo todos a sentem. A preocupação em satisfazer as

menores necessidades do corpo e de prover as pequenas comodidades da

vida, assume importância universal aos espíritos.

Nos povos democráticos, os indivíduos são muito fracos, mas o estado

que os representa e os mantém em seus domínios, é muito forte. Em nenhum

outro lugar os cidadãos parecem menores do que numa nação democrática.

Em nenhum outro lugar a própria nação se parece maior e seu espírito reper-

cute com facilidade em um vasto quadro. Nas sociedades democráticas, a ima-

ginação dos homens se reduz quando eles pensam em si mesmos; ela se es-

tende indefinidamente quando pensam no estado. Decorre desse fato que os

mesmos homens que vivem pequenamente em casas apertadas, com frequên-

cia, visam ao gigantesco quando se trata de monumentos públicos (TOCQUE-

VILLE, 2004).

Os americanos estabeleceram o local em que desejavam constituir sua

capital: o ressinto de uma cidade imensa, que, ainda hoje, não é mais povoada

do que Pontoise, mas que, segundo eles, deve conter um milhão de habitantes;

já arrancaram as árvores num raio de dez léguas com medo de que viessem a

incomodar os futuros cidadãos dessa metrópole imaginária. Ergueram no

centro da cidade um palácio magnífico, para servir de sede ao congresso e lhe

deram o pomposo nome de Capitólio.

A questão do turismo é uma das temáticas de maior interesse nos últimos

tempos. Fala-se muito em turista e constituem-se entes públicos em governos

municipais, estaduais, nacionais para se ocuparem dessa atividade. Porém, o

que se verifica é que, apesar dos entes públicos serem constituídos, a ativida-

de do turismo não se apresenta em toda sua intensidade nas políticas econô-

micas do governo. Esses entes ou organismos públicos, relegados a uma con-

dição secundária no interior da política econômica, estão fadados a inoperân-

cia e a ineficácia, sobretudo no caso específico do turismo, atividade que exige

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ação. O poder público adotará uma atitude proativa face ao turismo a partir do

momento em que atribuir a essa atividade prioridade em sua política econô-

mica.

Adotar uma política propositiva em relação ao turismo significa acompa-

nhar a situação conjuntural, executando medidas ágeis e adequadas. A capaci-

dade de resposta do setor público às exigências impostas pelo turismo, em um

dado momento, deve ser quase imediata, pois as decisões devem gerar ações

efetivas.

EVOLUÇÃO DO PODER PÚBLICO E TURISMO

Segundo Boschi (2000), a partir de uma análise histórica da evolução em

suas relações com o poder público, o turismo transitou por três etapas, repre-

sentando uma mera vigilância ou cuidado do poder público para com o turis-

mo, englobando um conjunto de proibições relativas ao setor. Integra uma

primeira fase, aquele conjunto de normas que regulamenta as condições que

devem ser preenchidas pelo turista ao ingressar no país. No tocante aos recur-

sos turísticos históricos, culturais e naturais, bem como à infraestrutura de

alojamento e transporte, o poder público limitou-se a especificar algumas

determinações no que se refere a edificações, conservação de monumentos

históricos, ou a uma série de prescrições relativas à saúde pública e segurança.

Cabe observar, ainda, que nessa primeira fase o setor público ateve-se aos

aspectos quantitativos do turismo. Ou seja, a sua política turística visava o

ingresso de muitos viajantes. Alguns países, entre os quais a Espanha, França,

Estados Unidos e Itália, estão entre os mais visitados do mundo, e oportuni-

zam a criação de muitos empregos e o melhor equilíbrio da balança de paga-

mento através do aporte de divisas.

Uma segunda fase caracterizou-se pela atividade de fomento e produção

do turismo. Nessa etapa, registrou-se uma mudança de perspectiva. O poder

público concede estímulos ao incremento da infraestrutura turística, como a

construção de meios de hospedagem, agências de turismo, financiamentos

especiais e isenção de impostos.

Já a terceira etapa fundamenta-se no intervencionismo. Nessa etapa, o

Estado não se limita a estabelecer proibições ou a participar da atividade tu-

rística através do fomento e da produção. O poder público se engaja, ele mes-

mo, em atividades turísticas, principalmente através de autarquias ou empre-

sas estatais. No Brasil, a partir dos anos 1970, surgiram em todos os estados

da união organismos oficiais de turismo para se incumbirem especificamente

do setor. Quanto maior for à importância do turismo na economia, maior o

grau de intervenção do poder público.

O intervencionismo é explicado através do princípio da subsidiariedade,

que consiste no pressuposto de que aquilo que o indivíduo pode fazer por si

mesmo, não deve ser feito pelo Estado. Ou seja, não cabe ao Estado intervir na

solução de problemas, a não ser que um grupo social ou um indivíduo sejam

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incapazes de resolvê-lo. Caso haja a necessidade de intervenção do poder

público, esta deve se extinguir a partir do momento que determinado grupo

ou individuo possam alcançar soluções adequadas, independente da ação do

Estado. Portanto, a intervenção é de caráter transitório. Isso porque não cabe

ao Estado assumir a condição de empresário, a não ser nos casos específicos

em que a iniciativa privada não encontre estímulos para agir, ou, por questões

de interesse nacional. Assim, o princípio da subsidiariedade demonstra os

limites da intervenção do estado no desempenho das atividades humanas,

fornecendo limitações à condução desse intervencionismo.

No que concerne à atividade turística, segue-se o mesmo raciocínio. De-

ve-se, contudo, ressaltar que o princípio da subsidiariedade pode explicar os

limites do intervencionismo em países que apresentam economias liberais, ou

capitalistas. Porém, este não é o caso dos países socialistas, onde o estado

assume todas as iniciativas, cabendo a ele planejar, executar e administrar os

diversos programas, entre os quais, o turismo. Caracterizado e definido o in-

tervencionismo do poder público na atividade turística, cabe analisar a ques-

tão das competências.

COMPETÊNCIAS

As atividades turísticas abrangem um conjunto de variáveis, de tal forma

que as competências se pulverizam, incorporam-se em várias atividades soci-

oeconômicas do país. Os insumos do produto turístico estão sob a responsabi-

lidade de vários organismos ou entes públicos. Por exemplo, ao se examinar

um hotel ou uma agência de viagem, verifica-se que existem diversos orga-

nismos que interferem na sua atividade. A problemática atual do turismo é

muito intensa, e suas soluções afetam uma enorme variedade de serviços do

setor público.

No desenvolvimento das atividades socioeconômicas de um país, inde-

pendentemente de sua caracterização, existe entre elas um inter-

relacionamento e, inclusive, uma interdependência. Essa é a dinâmica que

caracteriza a vida econômica dos países. Na medida em que surge a necessi-

dade de conferir ordenamento a todas essas atividades, visando um melhor

desempenho, procura-se agrupar aquelas afins, vinculando-as a um organismo

específico. Desse modo, as atividades educacionais estão vinculadas a um

organismo que se ocupa prioritariamente com a problemática que afeta este

tipo de atividade. As atividades agrícolas, industriais, financeiras e turísticas

obedecem à mesma diretriz. Elas são organizadas e designadas a um organis-

mo que se incumbirá de conduzi-las.

Nesta perspectiva, o tratamento dispensado as diferentes atividades des-

ses diferentes organismos, está relacionado com a posição que ocupam na

hierarquia administrativa. Se uma atividade for contemplada com um Ministé-

rio em nível nacional, ou com uma secretaria no âmbito do quadro administra-

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tivo estadual, isso significa que esta atividade possui um status equivalente ao

mais alto nível hierárquico na esfera da administração pública.

É importante ressaltar que a determinação do grau hierárquico do orga-

nismo incumbido da atividade turística, é diretamente proporcional à sua

importância dentro do contexto das demais atividades. Assim, para equacio-

nar a pulverização das atividades turísticas nos diferentes segmentos, inde-

pendentemente das atribuições e responsabilidades, é necessário cooperação

entre as diversas instâncias. As atividades se inter-relacionam e para que o

estado, através de seu governo, possa obter harmonia e conduzir suas ações

com eficiência e eficácia, faz-se necessário desenvolver uma mentalidade, bem

como fomentar o espírito de cooperação entre os organismos de um país,

estado ou município.

Em decorrência deste espírito de cooperação, resultam ações integradas,

fundamentais para se atingir a maximização dos esforços e dos recursos fi-

nanceiros. Na teoria, essas ideias encontram um campo fértil para a discussão,

contudo, na prática, torna-se difícil viabilizar o espírito de cooperação e as

ações integradas, haja vista que existem muitos interesses e ambições pesso-

ais que se colocam acima dos interesses dos próprios organismos. Essa distor-

ção tem causado entraves e estrangulamentos ao pleno e eficiente curso das

atividades de um país. No que se refere ao turismo, existe um certo agravante,

pois geralmente se apresenta subordinado a outro organismo. Assim enqua-

drado administrativamente, o setor turístico geralmente não recebe a devida

atenção. Além disso, a esses organismos frequentemente são designados pro-

fissionais que não possuem a devida qualificação técnica. . Nesse cenário, a

condução política da administração do tempo livre sofre uma dupla crise,

devido aos seguintes aspectos: a) A centralização teórica do poder num orga-

nismo sem, contudo, exercê-lo, porque esse poder repetidas vezes é comparti-

lhado com os outros organismos pressupostamente mais poderosos; b) O

suposto incremento na eficiência, que resultaria da descentralização do poder

em delegacias regionais, encarregadas de aplicar as políticas e ações voltadas

ao turismo, é inviabilizada pela ausência de respaldo legal e de recursos finan-

ceiros e humanos, além do escasso apoio dos comitês de coordenação inter-

departamentais, devido a sua pouca operacionalidade (BOULLIÓN, 2009).

A intervenção do poder público em matéria do turismo pode advir de di-

versas motivações: (i) Políticas: Para um determinado país, a valorização dos seus recursos

naturais, históricos, culturais e artísticos, pode se constituir em prestígio. Na verdade, o turismo é um dos meios mais eficazes para tornar conhecidos to-dos esses valores. Outra causa que justifica a intervenção do poder público, diz respeito à atuação desordenada das empresas de turismo, inclusive podendo afetar as relações internacionais entre os países. Daí a necessidade de fiscali-zar a atuação dessas empresas, através de legislação específica emanada dos poderes públicos, visando assegurar aos turistas as garantias almejadas.

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(ii) Econômicas: Relativas à renda nacional, às oportunidades de empre-go e aos seus efeitos multiplicadores. O turismo tem se constituído em ele-mento propulsor do desenvolvimento e do crescimento econômico de alguns países e regiões, contribuindo com elevados percentuais na receita nacional bruta. É inegável sua contribuição, e na redistribuição de todos esses benefí-cios, o poder público não poderia se omitir.

(iii) Sociais: A prática do turismo atinge os mais variados segmentos da sociedade. O poder público, que deve zelar pelo bem estar de todos esses ci-dadãos, não pode permanecer alheio a todos os anseios e às necessidades decorrentes desta atividade.

(iv) Meios de ação: A intervenção do poder público na área do turismo ocorre de variadas formas. Todo o conjunto de leis, decretos, resoluções, visa proporcionar o ordenamento da atividade turística. É precisamente essa base legal que torna possível o ordenamento turístico.

A atuação do poder público deve direcionar a ação da livre iniciativa, no sentido de resguardar o bem público ou os interesses majoritários da socieda-de. O objetivo do lucro, que caracteriza a iniciativa privada, ofusca, por vezes, a sua função pública. O poder público também possui a capacidade de deses-timular a iniciativa privada, mediante instrumentos legais que negligenciem a essência da atividade. O turismo, como uma atividade dinâmica, precisa cons-tantemente ser analisado e ordenado. Desse fato decorre constante reformu-lação de todo o aparato legal. Alguns países, onde a atividade turística encon-tra-se mais desenvolvida, apresentam verdadeiros tratados sobre o direito aplicado ao turismo.

Ao analisar o fenômeno turístico, enfocam-se os aspectos econômicos, sociais, ecológicos e jurídicos. Sem adentrar nas minúcias que uma análise abrangente requereria, o turismo é uma atividade condicionada aos instru-mentos legais emanados dos poderes públicos. Justifica-se a partir do pressu-posto que o direito de locomoção está ligado a liberdade da pessoa humana. Ao examinar a legislação dos mais diferentes países, encontra-se em toda a prerrogativa de salvaguardar o direito de locomoção dos seus cidadãos. O turismo é uma forma de exercitar essa liberdade.

AS POTENCIALIDADES TURÍSTICAS DO TERRITÓRIO DO CONTESTADO

A atividade turística pode ser concebida sob a perspectiva de oportuni-

dade, capaz de fomentar estratégias de desenvolvimento, com o intuito de

obliterar o ciclo recorrente da pobreza, em âmbito nacional e territorial. As

potencialidades latentes do turismo poderão contribuir eficientemente para

um crescimento econômico duradouro e sustentável. Portanto, ao contrário

das commodities, o setor de turismo pode operar desvinculado das grandes

multinacionais e dos países estrangeiros. Além disso, sua implementação pode

ocorrer em territórios menos desenvolvidos, paralelamente a outras ativida-

des que visem o incremento do desenvolvimento.

Por conseguinte, no Território do Contestado, é plausível segregar as po-

tencialidades no âmbito da atividade turística em: (i) o turismo histórico am-

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parado na herança imaterial do Contestado; (ii) o turismo decorrente dos

ativos naturais inseridos no território.

O potencial endógeno do Território do Contestado, em velar pela história

de um movimento social consiste em recurso que admite sua utilização para

finalidades turísticas. Neste contexto, o turismo histórico pode abranger a

herança imaterial decorrente da religiosidade; dos episódios épicos da Guerra

do Contestado trespassados por conflitos bélicos, incluindo-se, neste caso, a

visitação aos locais históricos em que ocorreram os combates e, inclusive, a

representação artística das batalhas mediante personagens figurados entre

soldados e revoltosos; passeios de trem mediante revitalização de trechos da

linha férrea construída pelo capital estrangeiro no início do século XIX e que

constituiu fator preponderante a para eclosão da Guerra do Contestado; visi-

tação aos museus que salvaguardam os registros históricos da Guerra do Con-

testado; práticas e costumes seculares inerentes à cultura e à culinária. Cada

aspecto pode ampliar uma gama variada de opções, por exemplo, no que tange

à religiosidade, há muitos locais em que se atribui milagres ao monge São João

Maria, até hoje considerados verdadeiros santuários, que merecem a visitação,

seja pela fé religiosa, seja pela beleza inegável da natureza.

Ao contrário dos aspectos singulares propiciados pelo turismo histórico

com amparo na herança imaterial, que fornecem atributos exclusivos e o dife-

renciam de outros polos turísticos existentes fora do território, o turismo

decorrente dos ativos naturais inseridos no Território do Contestado poderá

abranger, principalmente, o turismo rural, cujas principais atrações são a na-

tureza e a culinária

Cabe destacar que ambas as opções exigem investimentos adequados pa-

ra viabilização. No que tange ao turismo histórico pautado na herança imate-

rial, o investimento primário consiste na educação, mediante disseminação da

história do Contestado dentre os habitantes do território. Esse é um processo

sinérgico, aonde o conhecimento assume papel preponderante e pode resultar

no incremento do interesse pelo turismo histórico.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O ano em que vivemos demarca o centenário do término da Guerra do

Contestado. Embora transcorridos cem anos, muitos fatores que influenciaram

a deflagração do conflito ainda permanecem vigentes no Território do Contes-

tado. A análise histórica permite compreender que a concentração fundiária e

o processo extrativista de produção, este último inicialmente promovido pelo

capital estrangeiro, resultaram em um grave processo de exclusão social, que

ainda hoje incide sobre os municípios que integram o Território do Contesta-

do. Ademais, há cem anos, as oligarquias que dominavam e exerciam o poder,

em prol de seus interesses, se apressaram em condenar o movimento sertane-

jo do Contestado, fato que imbuiu na população, gradativamente, um senti-

mento pejorativo, inclusive uma espécie de vergonha perante os acontecimen-

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tos históricos que moldaram o Contestado. Diante de tal realidade, o instru-

mento fundamental para alterar este estado de coisas é a educação, mediante

a disseminação do conhecimento amparado em pesquisas recentes, que de-

monstram a nobreza de valores assumidos pelos revoltosos que aderiram às

trincheiras durante a Guerra do Contestado.

A educação e a disseminação do conhecimento poderão, paulatinamente,

contribuir para a obliteração deste sentimento pejorativo e, por sua vez, o

turismo também possui enorme potencial para auxiliar a suprimir as errôneas

concepções arraigadas na consciência coletiva da população residente no Ter-

ritório do Contestado.

Além deste nobre atributo, o turismo também representa uma atividade

que pode propiciar alternativas de desenvolvimento sustentável do território.

Cabe ressaltar que a articulação entre turismo e desenvolvimento produz

resultados positivos, tais como aporte de recursos para investimentos, mu-

dança dos padrões de comportamento, estímulo ao processo de cosmopoliti-

zação, etc. Contudo, o sucesso desta empreitada e a obtenção de suas conse-

quências benéficas, dependem primordialmente de planejamento e, em última

instância, da política que será aplicada ao setor.

Ademais, as características específicas da atividade turística – o fato de se

amparar em relações pessoais, exigir o consumo no espaço local, possibilitar

sua vinculação a outros setores da economia, etc., a tornam especialmente

apta para induzir processos de desenvolvimento em determinados territórios,

particularmente aqueles historicamente alijados, que apresentam contingen-

tes populacionais ainda excluídos do acesso aos benefícios da sociedade mo-

derna.

A elaboração do planejamento demanda o envolvimento do Estado, o

qual, através de políticas públicas, viabilizadas por meio de instrumentos pre-

cisos, deve almejar objetivos voltados ao desenvolvimento e, ao mesmo tem-

po, evitar consequências perniciosas que poderão eventualmente sobrevir.

Dentre as ações efetivas, destaca-se a importância do incentivo à constituição

de empresas oriundas do próprio território, dentre as quais, aquelas compro-

metidas com a atividade turística.

A intervenção do setor público na atividade turística pode ser necessária,

porém não deve se restringir a uma simples função reguladora ou fiscalizado-

ra da atividade. Apesar da progressiva implantação da filosofia liberal, verifi-

cada nos últimos anos, em que o setor privado assume a condição de protago-

nista, cabe ao setor público estabelecer as condições adequadas para que as

pequenas empresas turísticas possam desenvolver com eficácia suas ativida-

des econômicas.

O desenvolvimento turístico ocorre em consequência de uma política de

planejamento meticulosa, baseada na atividade econômica e no desenvolvi-

mento humano e social de comunidades e povos. Deve estruturar-se sobre

ideais e princípios de bem estar e de felicidade das pessoas. Os problemas

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sociais de uma comunidade não poderão ser solucionados na ausência de uma

economia forte e, o turismo, pode contribuir para alcançar este objetivo.

O turismo desenvolvido através da integração entre a sociedade civil e o

interesse público, ultrapassa conceitos de gestão pública e pode assegurar

maior flexibilidade e distribuição equitativa de lucros, que eventualmente

possa gerar em determinada localidade.

As questões da regionalização, sob a concepção de que regional não se

restringe a limites físicos ou geográficos, tampouco ao caráter político admi-

nistrativo, corresponde, acima de tudo, às afinidades e consequente constru-

ção de identidades culturais.

O poder público pode e deve cumprir seu papel no desenvolvimento do

turismo, conscientizando as populações das ações executadas e as sensibili-

zando em todos os aspectos relevantes, pois a atividade turística só pode ser

desenvolvida de maneira sustentável – econômica e ambientalmente – caso

resulte em benefícios para a localidade.

No âmbito do Território do Contestado, há potencialidades que podem

ser exploradas em prol da atividade turística. O principal fator se relaciona à

herança imaterial do Contestado, que se traduz em aspectos históricos, religi-

osos e culturais, capaz de propiciar atrações turísticas de interesse regional

ou, inclusive, nacional. Além da singularidade inerente à herança imaterial do

Contestado, os ativos naturais do território também possuem potencial para

se transformarem em atrações de interesse turístico, desde que ocorram in-

vestimentos adequados em sua estruturação e promoção.

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SIGNOS DISTINTIVOS TERRITORIAIS:

INDICAÇÃO GEOGRÁFICA, MARCAS

COLETIVAS E SUA RELAÇÃO COM O

DESENVOLVIMENTO TERRITORIAL

Karine Rohrbacher1

Cilmara Corrêa de Lima Fante2

Valdir Roque Dallabrida3

RESUMO

O tema signos distintivos territoriais e sua relação com o desenvolvimen-

to remete à valorização dos aspectos que possam tornar reconhecidos os ele-

mentos identitários de um determinado território. Quanto aos signos, entre

eles estão os que representam produtos ou serviços que, pela sua especifici-

dade, notoriedade e/ou tradição, torna reconhecido o território em que são

produzidos. Neste caso, avaliza a aplicação dos institutos da Indicação Geográ-

fica ou Marcas Coletivas. A pesquisa da qual resultou o presente texto teve por

objetivo elucidar os aspectos legais sobre Indicações Geográficas e Marcas

Coletivas, por meio de pesquisas bibliográficas, pela consulta de livros, leis e

artigos científicos, além de estabelecer relações com o desenvolvimento terri-

torial. O estudo elucidou aspectos conceituais e as principais diferenciações

existentes entre esses dois institutos, além de fazer prospecções sobre a con-

tribuição dos signos distintivos no desenvolvimento territorial.

INTRODUÇÃO

É oportuno o reconhecimento da importância dos signos distintivos, no

mundo comercialmente competitivo, visto que distinguem produtos e serviços

quanto à sua procedência, fabricação e características, garantindo a qualidade

1 Graduanda em Direito na Universidade do Contestado (UnC), bolsista de Iniciação Científica no

Projeto de Pesquisa Signos Distintivos Territoriais e Indicação Geográfica: um estudo sobre os desafios

e perspectivas como alternativa de Desenvolvimento Territorial, financiado pelo CNPq. Este texto resume estudos do projeto de Iniciação Científica, junto com os orientadores. E-

mail: [email protected]. 2 Graduada em Direito, mestranda no Programa de Mestrado em Desenvolvimento Regional da UnC.

3 Geógrafo, Doutor em Desenvolvimento Regional, professor e orientador no Mestrado em

Desenvolvimento Regional da UnC. E-mail: [email protected]

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esperada pelo consumidor. O instituto da Indicação Geográfica (IG) e Marcas

Coletivas (MC), além de proteger os produtos e serviços, conferem informa-

ções referentes à origem e qualidades dos mesmos. O resultado esperado é

que tal processo contribua na agregação de valor ao produto ou serviço prote-

gido, gerando um ganho para a coletividade envolvida, com isso, contribuindo

no desenvolvimento territorial do local em que se inserem.

O presente artigo pretende analisar os temas signos distintivos territori-

ais, com destaque para a Indicação Geográfica e Marcas Coletivas, focando-se

em questões de ordem legal, estabelecendo relações com o desenvolvimento

territorial, evidenciando os aspectos relevantes para a proteção e obtenção

dos direitos inerentes a esses institutos.

A pesquisa é explicativa, pois se preocupa em identificar os fatores que

contribuem para a ocorrência de certos fenômenos, como por exemplo, qual a

importância dos signos distintivos, como as IG e MC, no desenvolvimento ter-

ritorial. Utiliza-se de estudos bibliográficos.

Como resultado, buscou-se situar o tema signos distintivos territoriais e

os institutos da Indicação Geográfica e Marcas Coletivas no direito internacio-

nal e brasileiro. Oportunizou identificar os diferenciais entre estes institutos,

além de fazer prospecções sobre a contribuição dos signos distintivos no de-

senvolvimento territorial.

Assim, o presente texto, além desta introdução, é composto por outras

quatro partes. Assim, inicialmente, (i) dá-se destaque aos conceitos de territó-

rio, signos distintivos e desenvolvimento territorial, (ii) resume-se os princi-

pais aspectos conceituais e legais sobre Indicação Geográfica e Marcas Coleti-

vas, (iii) destacam-se os diferenciais entre esses dois institutos, além de, fi-

nalmente, (iv) serem feitas considerações finais.

1 TERRITÓRIO, SIGNOS DISTINTIVOS E DESENVOLVIMENTO TERRITORIAL

O território, concebido como espaço de relações entre sociedade e natu-

reza e os diferentes grupos sociais, é onde ocorrem dinâmicas socioeconômi-

cas, histórico-culturais e ambientais, das quais decorrem os processos de de-

senvolvimento territorial (DALLABRIDA, 2016). Alguns territórios possuem

características que facilitam sua identificação por meio de signos e, ao mesmo

tempo, servem como forma de identificação e/ou distinção. Tratam-se dos

signos distintivos territoriais (DALLABRIDA, PULPÓN e TABASCO, 2016).

A alusão ao território é para referir-se a uma fração do espaço instituída

pela relação entre atores sociais, econômicos e institucionais que atuam no

âmbito espacial em referência, sustentadas em motivações políticas, sociais,

ambientais, econômicas, culturais ou religiosas (DALLABRIDA, 2006). O terri-

tório vai além de uma base física formada pela relação entre indivíduos e em-

presas, pois também acolhe uma organização complexa composta por laços

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que não se restringem aos atributos naturais, mas levam em conta também

raízes históricas, políticas e identidades (ABRAMOVAY, 2010).

Saquet (2015) associa-se a outros autores que consideram o território

uma construção social, histórica, relacional, sempre vinculada a processos de

apropriação do espaço, que atingem pessoas ou grupos sociais. Portanto, para

o autor,

O território é resultado e determinante da reprodução da relação sociedade-natureza e da concomitante territorialização. Os territórios são produzidos espaço-temporalmente pelo exercício do poder por determinado grupo ou classe social e por suas respectivas territorialidades cotidianas (SAQUET, 2015, p. 45).

Desde a antiguidade os signos distintivos são utilizados para identificar e

diferenciar a origem de bens, sua propriedade, origem comercial ou geográfi-

ca. Desse modo, elucida Bruch (2011, p. 21):

Um signo é qualquer coisa que, de um lado, é assim determinada por um obje-to e, de outro, assim determinada por uma ideia na mente de uma pessoa; esta última determinação que denomina o interpretante do signo é, desse modo, mediatamente determinada por aquele objeto. O objeto é o local, a cultura e a tradição, os fatores naturais e humanos que compõem a origem geográfica. O signo representa tudo que constitui essa origem geográfica.

Segundo a legislação vigente no Brasil, os signos distintivos são sinais

usados no mercado para identificar e distinguir produtos ou serviços, empre-

sas, estabelecimentos, regiões ou localidades. São eles: (a) marca; (b) nome

empresarial; (c) títulos de estabelecimento; (d) indicações geográficas; (d)

nomes de domínio (GONÇALVES, 2007). Esses institutos são aplicados com o

fim de diferenciar produtos ou serviços colocados no mercado, sendo que, no

caso da IG e MC, são regulamentados pela Lei 9.279/964.

No caso da IG trata-se de um signo distintivo que representa a cultura, a

tradição, ou o terroir5, de um território, distinguível dos demais. Temos então,

como resultado, o que convencionamos chamar de signos distintivos territori-

ais6, ou seja, signos que distinguem produtos ou serviços que tem origem em

um território específico (DALLABRIDA, PULPÓN e TABASCO, 2016).

A valorização do território, incluídos seus ativos e recursos, ou mais pre-

cisamente, seu patrimônio territorial (DALLABRIDA, 2016)7, resultante do

4 Adiante, faz-se referência aos aspectos legais.

5 Que pode ser traduzido como meio físico natural específico, que, por isso, atribui ao produto

características únicas. 6 Bruch (2011) prefere denominar de "signos distintivos de origem".

7 Em Dallabrida (2016), patrimônio territorial é concebido como o conjunto de ativos e recursos,

materiais e imateriais, genéricos e específicos, disponíveis em um determinado território. Assim, os

elementos constitutivos do patrimônio territorial são considerados referentes para as pessoas que

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reconhecimento de um produto ou serviço na forma de signo distintivo terri-

torial, tem maior potencial para contribuir no desenvolvimento territorial.

Sobre desenvolvimento, assumimos aqui a concepção expressa em Dalla-

brida (2015, p. 235):

O desenvolvimento territorial é entendido como um processo de mudança continuada, situado histórica e territorialmente, mas integrado em dinâmicas intraterritoriais, supra territoriais e globais, sustentado na potenciação dos recursos e ativos (materiais e imateriais, genéricos e específicos) existentes no local, com vistas à dinamização socioeconômica e à melhoria da qualidade de vida da sua população.

O desenvolvimento territorial, consiste na valorização do território atra-

vés da atividade da população que nele habita, utilizando-se dos recursos e

ativos disponíveis e das habilidades dos agentes locais (DALLABRIDA, 2016).

Os signos distintivos são um meio utilizado para valorizar as característi-

cas próprias, tanto do território quanto dos produtos que nele se encontram.

Estes são distinguidos dos demais existentes, demonstrando sua originalidade

e características próprias. Assim, um signo distintivo territorial tem potencial

de contribuir no desenvolvimento de um território ou região, por difundir o

conhecimento tradicional, favorecer a reputação do meio rural, certificando a

origem do produto, valorizando os fatores naturais locais, como clima, solo,

temperatura, ou fatores humanos, como o modo de produzir. Isso remete à

abordagem sobre IG e MC.

2 INDICAÇÃO GEOGRÁFICA E MARCAS COLETIVAS: QUESTÕES CONCEITUAIS E LEGAIS

Faz-se menção, a seguir, dos dois principais institutos relacionados aos

signos distintivos territoriais: Indicação Geográfica e Marcas Coletivas.

2.1 INDICAÇÃO GEOGRÁFICA

A IG constitui um direito de propriedade intelectual autônomo reconhe-

cido nacional e internacionalmente, a exemplo de uma patente ou de uma

marca. No Brasil é reconhecida pela Lei de Propriedade Industrial nº 9.279, de

14 de maio de 1996 (BRASIL,1996). Internacionalmente é reconhecida pelo

Acordo sobre Aspectos dos Direitos de Propriedade Intelectual Relacionados

ao Comércio (em inglês, Trade Related Aspects of Intellectual Property Rights –

TRIPS), da Organização Mundial do Comércio.

A IG é o nome geográfico que distingue um produto ou serviço de outros

semelhantes, devido às características diferenciadas que estão relacionadas à

sua origem geográfica, devido a aspectos naturais e/ou humanos. As IG no

habitam determinado território, que, ao mesmo tempo as identificam e servem como potencialidades no

processo de planejamento do futuro desejado, o projeto político de desenvolvimento territorial.

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Brasil se dividem em duas espécies: Indicação de Procedência (IP) e Denomi-

nação de Origem (DO). Essa divisão permite distinguir os produtos ou serviços

que recebem uma indicação ligada somente a sua procedência, que designa o

lugar onde acontece a fabricação ou prestação de um serviço, daqueles produ-

tos ou serviços que também apresentam características específicas, incluindo

fatores naturais e humanos.

O artigo 177 da Lei 9.279/96 (BRASIL, 1996), bem como o artigo 2º, §1º

da Instrução Normativa nº 25/2013 (BRASIL, 2013) estabelecem o que consti-

tui a IP ou DO. A IP remete a um produto ou serviço, indicando o local onde

são produzidos ou prestados, independentemente de outros fatores, ou seja,

não precisando necessariamente que as condições geográficas interfiram. Ou

seja, a IP denota uma localidade que se tornou conhecida pela produção de um

determinado produto ou serviço, que associado à sua procedência acaba lhe

agregando valor. Já a DO indica ser o nome geográfico do país ou região que

designe um produto ou um serviço, cujas qualidades específicas estejam rela-

cionadas ao meio geográfico, incluindo os fatores naturais e humanos.

A DO possui um diferencial em relação à IP, por trazer maior complexi-

dade, uma vez que um produto ou serviço necessita apresentar certos requisi-

tos para possuir tal classificação, envolvendo os fatores geográficos, naturais e

humanos. Ou seja, é necessário que o meio geográfico em que acontece a pro-

dução ou prestação de serviços seja responsável pelas características específi-

cas, não sendo obrigatório que exista notoriedade do local. Já a IP se relaciona

com o aspecto de notoriedade, o qual contribui para a reputação e reconheci-

mento de um local devido às qualidades dos produtos fabricados, que serão

reconhecidos pelos consumidores.

Pimentel (2013), simplifica, explicando que a IP compreende a IG que te-

nha se tornado conhecida como centro da fama de um determinado produto e

a DO designa o próprio produto. Igualmente, a proteção estender-se-á à repre-

sentação gráfica ou figurativa da IG, bem como, à representação geográfica de

país, cidade, região ou localidade de seu território, cujo nome seja IG. Em ou-

tras palavras, na DO não basta que o produto tenha se tornado conhecido

pelas pessoas como de determinado local; é imprescindível que suas caracte-

rísticas sejam únicas devido às condições geográficas e/ou, inclusive, devido

ao savoir faire (saber fazer tradicionalmente dominado pelas pessoas do local

envolvidas).

A proteção jurídica, prevista para o instituto da IG, em primeiro lugar, vi-

sa impedir terceiros, que não cumprem os requisitos legais, de fabricar, im-

portar, exportar, vender, expor ou oferecer à venda ou ter em estoque produto

que se apresente como IG. Em segundo lugar, impede terceiros de usar, em

produto, recipiente, invólucro, cinta, rótulo, fatura, circular, cartaz ou em ou-

tro meio de divulgação ou propaganda, termos retificativos, tais como tipo,

espécie, gênero, sistema, semelhante, sucedâneo, idêntico, ou equivalente, não

ressalvando a verdadeira procedência do produto. E, em terceiro lugar, impe-

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de terceiros de usar marca, nome comercial, título de estabelecimento, insíg-

nia, expressão ou sinal de propaganda ou qualquer outra forma que indique

procedência que não a verdadeira, ou vender ou expor à venda produto com

esses sinais. Importante destacar que o registro das IG é de natureza declara-

tória, uma vez que implica no reconhecimento de condições pré-existentes,

seja da reputação ou da influência do meio geográfico no produto (PIMENTEL,

2013).

O reconhecimento de um produto com IG se trata de uma estratégia de

qualificação, valorizando a diversidade e a singularidade de produtos enraiza-

dos em territórios específicos, podendo constituir-se em processo catalisador

de novas dinâmicas de desenvolvimento territorial, podendo ser entendido

como um processo de inovação institucional (NIEDERLE, 2014). Ou seja, a

proteção concedida a um produto ou serviço através de seu reconhecimento

como IG confere vantagens ao produtor, ao consumidor e à economia da regi-

ão, pela valorização dada ao produto, reputação do local de origem e aumento

da renda destinada ao produtor, além de atestar os níveis de qualidade de

produtos relacionados ao meio, de uma determinada área geográfica, com

impactos no desenvolvimento territorial.

2.2 MARCAS COLETIVAS

A Lei 9.276/96 em seus artigos 122 e seguintes traz a previsão legal rela-

cionada às marcas, onde preceitua que pode ser registrado como marca um

sinal distintivo visualmente perceptível, não compreendido nas proibições

legais (BRASIL, 1996). As marcas representam uma categoria múltipla de

signos distintivos compreendidos nos direitos de propriedade intelectual,

subdividindo em marcas de produtos ou serviços, marcas de certificação e

marcas coletivas. Neste estudo faz-se menção às Marcas Coletivas (MC).

O sinal distintivo denominado como marca possibilita a identificação de

um produto pelos consumidores, de modo a distingui-lo de outros semelhan-

tes. A utilização das marcas tende a ser algo vantajoso para as estratégias

empresarias, uma vez que além de diferenciar produtos ou serviços de outros

existentes no mercado, transmite confiabilidade aos consumidores. Conforme

o artigo 131 da Lei 9279/96 (BRASIL, 1996), a proteção abrange o uso da

marca em papéis, impressos, propaganda e documentos relativos à atividade

do titular, sendo que, as marcas presentes no mercado possuem formas varia-

das, impostas aos produtos como etiquetas, adesivos, rótulos, embalagens,

entre outros.

Ressalta-se que a proteção concedida às marcas é restrita ao território

nacional em que é requerida, de acordo com o princípio da territorialidade,

bem como, o pedido de marca deverá ser solicitado juntamente com a indica-

ção de quais produtos ou serviços deverá assinalar (BARBOSA; DUPIM; PE-

RALTA, 2016).

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Com relação à proteção de marcas, regulamentada pela Lei 9.279/96, há

a previsão das MC que podem ser consideradas subespécie da categoria mar-

ca. No artigo 123, III, da Lei 9.279/96 encontra-se expresso ser Marca Coletiva

“[...] aquela usada para identificar produtos ou serviços provindos de mem-

bros de uma determinada entidade” (BRASIL, 1996).

Uma MC geralmente pertence a uma associação ou cooperativa cujos

membros podem utilizar a mesma para comercializar os seus produtos. A

associação, geralmente, estabelece uma série de critérios, direitos e obriga-

ções para o uso da marca coletiva (por exemplo, padrões de qualidade) e auto-

riza cada empresa associada a utilizar a marca desde que respeite tais crité-

rios. As MC podem ser um meio eficaz para a comercialização conjunta dos

produtos de um grupo de empresas para as quais seria mais difícil levar os

consumidores a reconhecer as suas próprias marcas e/ou levarem os princi-

pais distribuidores a aceitar a comercialização dos seus produtos (BRASIL,

2013).

A MC necessita que o pedido de registro contenha o regulamento de utili-

zação, que dispõe sobre as condições e proibições de uso da marca. Tal regu-

lamento deve ser apresentado no prazo de 60 dias após o depósito, quando

este não acompanhar o pedido, nos termos do artigo 147 da Lei 9.279/96

(BRASIL, 1996). Sobre o tema, é importante transcrever os apontamentos de

Cerdan et al. (2010, p. 78):

A Marca Coletiva identifica produtos ou serviços provindos de membros de uma determinada entidade. Este tipo de marca também tem uma função dife-renciadora. Ela pode ser utilizada por Associações ou Cooperativas, por exemplo, cujos associados ou cooperados elaboram produtos que são dispo-nibilizados no mercado com uma mesma marca. Isso pode garantir uma maior visibilidade e força à marca, o que não aconteceria se cada um dos associados ou cooperados utilizasse uma marca própria.

Em relação às causas de extinção do registro, conforme o artigo 151 da

lei 9.279/96, a MC extingue-se quando a entidade deixar de existir, ou a marca

for utilizada em outras condições que não aquelas previstas no regulamento

de utilização (BRASIL, 1996). De acordo com o disposto nos artigos 152 e 153

da Lei 9.279/96, só será admitida a renúncia do registro de MC quando reque-

rida nos termos do contrato social ou estatuto da própria entidade, ou con-

forme o regulamento de utilização.

Ainda, a caducidade do registro será declarada se a MC não for usada por

mais de uma pessoa autorizada. Entretanto, nos termos do Artigo 154 da refe-

rida lei, mesmo se houver caducidade, a MC que já tenha sido usada e cujo

registro tenha sido extinto não poderá ser registrada em nome de terceiro,

antes de expirado o prazo de cinco anos, contados da extinção do registro.

Desse modo, as MC podem se tornar instrumento hábil para fins de pu-

blicidade de produtos ou serviços, uma vez que atestam e asseguram a quali-

dade destes. Podem ser utilizadas também como ferramenta de inovação, de

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desenvolvimento tecnológico e econômico, contribuindo para o crescimento

de pequenas e médias empresas, devido, por exemplo, ao aumento da cliente-

la, através dos laços de confiança formados entre o empresário, seus produtos

e o consumidor.

3 ANÁLISE COMPARATIVA ENTRE OS INSTITUTOS DA INDICAÇÃO GEOGRÁFICA E AS MARCAS COLETIVAS

Além da contextualização do tema aqui referido, por meio da revisão da

bibliografia, se teve o propósito de explicitar as principais diferenças entre os

dois institutos que servem para distinguir produtos ou serviços. A primeira

dimensão do propósito, a contextualização, está transcrita no item anterior.

Na sequência, faz-se menção às diferenças entre IG e MC.

Tanto as IG, quanto as Marcas Coletivas são sinais distintivos que possu-

em características próprias. A IG tem a função de proteger o nome geográfico,

diferenciando produtos que possuem uma origem geográfica específica de

outros semelhantes. Já a MC é usada para identificar produtos ou serviços

provindos de membros de uma determinada entidade, como por exemplo, os

que provêm de uma cooperativa ou associação.

A principal função de uma MC é identificar produtos ou serviços da enti-

dade coletiva titular da marca, tendo o direito de usá-la os membros ou asso-

ciados à entidade requerente. Após se efetuar o registro de uma MC, se garan-

te a titularidade à entidade ou associação representativa da coletividade que a

requereu, devendo tal registro ser precedido por um regulamento que conte-

nha todas as diretrizes a serem seguidas por quem decidir utilizar a marca em

seus produtos. Ademais, a vigência da proteção é de dez anos renováveis inde-

finidamente (BARBOSA; DUPIM; PERALTA, 2016).

Por outro lado, a função da IG é identificar a procedência de produtos e

serviços cuja reputação, qualidade ou outra característica se deva ao seu local

de origem, sendo de titularidade dos produtores e prestadores de serviços

locais estabelecidos no local e que satisfaçam as condições de cada espécie de

IG.

Os direitos de uso estão restritos aos produtores ou prestadores de ser-

viços estabelecidos no local, com atendimento aos requisitos de qualidade, no

caso de DO. Ainda, a vigência da proteção é indefinida enquanto existir as

condições previstas para cada espécie de IG, independente de renovação

(BARBOSA; DUPIM; PERALTA, 2016).

Para resumir as diferenças entre os dois institutos, Indicações Geográfi-

cas e Marcas Coletivas, utiliza-se contribuição de Dupim e Hasenclever (2016),

resumindo outros estudos, conforme Quadro 1.

Quadro 1- Diferenciais entre os institutos da Indicação Geográfica e Marcas Coletivas

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Características Indicações Geográficas Marcas Coletivas

Legislação em

vigor Lei 9279/96 e Instrução Normativa 25/2013.

Lei 9279/96 e Instrução Normativa 25/2013.

Função

Identificar a procedência de produtos e serviços

cuja reputação, qualidade ou outra característica se deva ao seu local de origem.

Identificar produtos e servi-

ços da entidade coletiva titular da marca.

Titularidade

Produtores e prestadores de serviços locais

estabelecidos no local e que satisfaçam as condi-

ções de cada espécie de IG.

Entidade coletiva representa-tiva de coletividade.

Condições para

registro

Apresentar regulamento de uso, delimitação da

área geográfica e comprovações relacionadas à

espécie de IG solicitada.

Apresentar regulamento de utilização.

Direito de uso

Restrito aos produtores ou prestadores de servi-ços estabelecidos no local e atendimento aos

requisitos de qualidade, no caso de Denominação de Origem.

Membros ou associados à

entidade titular da marca.

Vigência da

proteção

Indefinida enquanto existir condições previstas

para cada espécie de IG, independente de reno-

vação.

Dez anos, renováveis indefi-nidamente.

Fonte: Adaptado pelos autores, de Dupim e Hasenclever (2016, p. 170-171).

Por fim, segundo Niederle (2014), o número de IG reconhecidas no país

cresce de forma acelerada, respondendo aos anseios de produtores, técnicos e

pesquisadores em criar alternativas de diferenciação nos mercados alimenta-

res, bem como, às expectativas sociais de novos grupos de consumidores em

busca de alimentos de qualidade e origem reconhecida. Assim sendo, entende-

se que, tanto as IG quanto as MC, constituem-se em um potencial à dinamiza-

ção socioeconômica dos territórios atingidos, logo, refletindo-se no desenvol-

vimento territorial.

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente trabalho teve por objetivo elucidar o tema relacionado aos

signos distintivos territoriais, Indicação Geográfica e Marcas Coletivas, refe-

rindo questões de ordem conceitual e legal, fazendo comparativos entre os

dois institutos, além de estabelecer relações com o desenvolvimento territori-

al. Os resultados foram mais efetivos no que se refere às duas primeiras di-

mensões, a elucidação do tema e a comparação entre os dois institutos, este

último aspecto resumido no Quadro 1. Quanto à relação com o desenvolvi-

mento territorial, o estudo apenas permitiu fazer prospecções, já que não

foram analisados dados estatísticos.

Os indicativos feitos por Dupim e Hasenclever (2016) podem servir de

parâmetro para referendar tais prospecções. Tais autores, resumindo contri-

buição do International Trade Centre, se referem à interação entre os institu-

tos da IG ou MC e os impactos sociais e econômicos nos territórios atingidos.

Destacam os autores que os impactos podem ser de diferentes categorias: (i)

na economia, estimulando a produção local, aumentando a demanda e o re-

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torno financeiro; (ii) na empregabilidade, gerando empregos diretos e indire-

tos e diminuindo o êxodo rural; (iii) na cultura e qualidade, contribuindo na

preservação do saber fazer e melhoria da qualidade de vida; (iv) na governan-

ça do território (ou governança territorial)8, fortalecendo a cooperação regio-

nal, bem como, as instituições locais, além do aumento da capacidade de coor-

denação entre os atores do território (sociais, econômicos e/ou institucio-

nais).

Essa argumentação é reforçada por Pimentel (2013), quando afirma que

os dois institutos são promissores no fortalecimento da cooperação e promo-

ção do território, reunindo esforços, dividindo responsabilidades, otimizando

investimentos e compartilhando diferentes experiências na busca de um obje-

tivo comum. Desse modo, segundo argumenta o autor, os signos distintivos

colaboram no desenvolvimento territorial, por difundir o conhecimento tradi-

cional de determinadas regiões, melhorar a reputação do meio rural, trazendo

benefícios para a região, econômicos, culturais, bem como, ambientais, na

medida em que preservam a biodiversidade, os recursos genéticos locais e o

meio ambiente.

Ou seja, indubitavelmente, em graus diferenciados, a proteção, distinção

e maior divulgação regional e internacional de produtos e serviços com espe-

cificidade territorial, por meio dos institutos da IG ou MC, Tem potencial signi-

ficativo de promover impactos positivos na economia, na empregabilidade, na

cultura, na qualidade de vida e na governança dos âmbitos espaciais atingidos.

Em próximos estudos, pretende-se aprofundar o tema, utilizando informações

estatísticas que representem os aspectos indicados por Dupim e Hasenclever

(2016).

Por fim, é importante ressaltar que o reconhecimento ou registro de

qualquer desses signos distintivos, por si só, não é capaz de consolidar os

benefícios acima apontados, nem mesmo outros que também podem ser al-

cançados. Para tanto, faz-se necessária a participação direta de todos os atores

envolvidos, nas ações envolvidas na IG e MC, de forma integrada com o pro-

cesso de planejamento e gestão do desenvolvimento territorial.

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8 "A governança territorial corresponde a um processo de planejamento e gestão de dinâmicas territori-

ais que dá prioridade a uma ótica inovadora, partilhada e colaborativa, por meio de relações horizontais. No entanto, esse processo inclui lutas de poder, discussões, negociações e, por fim, deliberações, entre

agentes estatais, representantes dos setores sociais e empresariais, de centros universitários ou de inves-

tigação. Processos desta natureza fundamentam-se num papel insubstituível do Estado, numa noção qualificada de democracia, e no protagonismo da sociedade civil, objetivando harmonizar uma visão

sobre o futuro e um determinado padrão de desenvolvimento territorial" (DALLABRIDA, 2015, p.

325).

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as Pequenas e Médias Empresas. Rio de Janeiro, 2013. NIEDERLE, P. A. Desen-

volvimento, Instituições e Mercados Agroalimentares: os usos das Indicações Geo-

gráficas. Desenvolvimento Regional em debate, v.4, n.2, p. 21-43, jul./dez. 2014.

PIMENTEL, L. O. Os desafios dos aspectos legais na prática de estruturação das Indicações

Geográficas. In: DALLABRIDA, V. R. Território, identidade territorial e desen-

volvimento regional: reflexões sobre Indicação Geográfica e novas possibilidades

de desenvolvimento com base em ativos com especificidade territorial. São Paulo:

LiberArs, p. 135-143, 2013.

SAQUET, M. Por uma geografia das territorialidades e das temporalidades. Uma con-

cepção multidimensional voltada para a cooperação e para o desenvolvimento terri-

torial. 2ª. Edição revisada e ampliada. Rio de Janeiro: Ed. Consequência, 2015.

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QUESTÕES AMBIENTAIS ATUAIS: COMPREENDÊ-LAS, É PRECISO. UMA VISÃO

HISTÓRICA DA FORMAÇÃO DOS PROBLEMAS

AMBIENTAIS ATUAIS1

Danielle de Ouro Mamed2

Jairo Marchesan3

Sandro Luiz Bazzanella4

INTRODUÇÃO

O presente trabalho visa compreender que a racionalidade ecológica atu-

al demanda um esforço teórico no sentido de vislumbrar as raízes que com-

põem sua construção. Da antiguidade até a modernidade, notadamente, foram

construídos e modificados os discursos sobre as relações entre sociedade e

natureza, culminando no pensamento ecológico atual, que se reflete nas políti-

cas públicas voltadas a esta finalidade. Diante disto, busca-se analisar alguns

aspectos sobre a reflexão das sociedades humanas a respeito da natureza,

desde a antiguidade, com a ideia de physis na Grécia antiga, até as transforma-

ções trazidas pela modernidade, para então analisar as tendências da ecologia

atual. A partir de tais análises, busca-se vislumbrar quais os principais com-

ponentes da lógica ambiental na contemporaneidade.

CONCEITOS TEÓRICOS E SUA COMPREENSÃO

No que tange à compreensão da natureza na antiguidade, destaca-se a

noção de physis grega. Segundo Koike (1999, p. 167), esta ideia é apresentada

1 Esta pesquisa é parte integrante do Estágio Pós-Doutoral da primeira autora, no âmbito do Programa

de Mestrado em Desenvolvimento Regional, na Universidade do Contestado, com financiamento da CAPES. 2 Advogada. Doutora em Direito Econômico e Socioambiental (PUCPR). Professora em estágio pós-

doutoral na Universidade do Contestado (UnC) – Programa de Mestrado em Desenvolvimento Regio-nal. Santa Catarina. Brasil. E-mail: [email protected] 3 Graduado em Estudos Sociais. Doutor em Geografia pela Universidade Federal de Santa Catarina,

Professor na Universidade do Contestado (UnC) – Programa de Mestrado em Desenvolvimento

Regional (Santa Catarina. Brasil.) e professor efetivo da Escola Estadual de Educação Básica Professor

Olavo Cecco Rigon em Concórdia (Santa Catarina, Brasil). E-mail: [email protected] 4 Filósofo. Doutor em Desenvolvimento Regional, com atuação no Programa de Mestrado em

Desenvolvimento Regional da UnC. Santa Catarina. Brasil. E-mail: [email protected]

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em tempos atuais como natureza, não sendo este, no entanto, o sentido atribu-

ído pelos antigos. De acordo com o autor, é possível pensar que a physis grega

designava a própria realidade ou manifestação do real, porém numa dimensão

muito mais abrangente, já que contempla aspectos metafísicos como a gênese,

a essência, a substância e a forma das coisas, incluindo componentes psíquicos

e espirituais (1999, p. 167-176). A participação desses elementos de natureza

metafísica, no entanto, é fragilizada com o advento da modernidade.

Como parte das transformações proporcionadas pelo pensamento mo-

derno a respeito da natureza destaca-se a fragmentação das ciências, retiran-

do qualquer caráter subjetivo que pudesse a elas estar vinculado. Nesse senti-

do, Prigonine e Stengers (1991, p. 1) concluem que o ser humano assume a

posição de um estranho ao mundo que descreve. A partir da modernidade, fica

latente a ideia nuclear de que as ciências devem servir à construção de um

conhecimento hegemônico voltado à dominação e modificação da natureza.

Deste modo, a metamorfose da ciência consiste na perda de interesse pelos

fenômenos imutáveis ou estáveis, para dar lugar ao debate diante das evolu-

ções, crises e instabilidades (PRIGONINE e STENGERS, 1991, p. 4), focando-se

na finalidade explícita de modificar a natureza conforme os interesses das

sociedades.

Como componente do pensamento ecológico atual, há que se considerar

que há uma influência de alguns ciclos históricos que podem ser resumidos,

grosso modo, como: a) o ideário de superação do atraso pela tentativa de inte-

grar-se na economia pela exploração primária dos recursos naturais; b) Após

séculos de exploração, a influência que rege as questões ambientais volta-se à

identificação e superação dos problemas ambientais, cuja solução advém de

uma proposta inserida por um agente externo: primeiramente, as políticas

preservacionistas e, após a verificação de sua inviabilidade, as políticas de

desenvolvimento sustentável; c) Visualizada a sua insuficiência, vê-se a cria-

ção de novas e velhas soluções, sendo a mais atual a economia verde e sua

ideologia de mercantilização da natureza (MAMED, 2016).

OBJETIVO DO ESTUDO

Analisar a formação e influência do pensamento na antiguidade e na mo-

dernidade e seus reflexos nas relações entre sociedades e natureza contempo-

rânea, identificando os alcances e limites das questões ambientais contempo-

râneas.

PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

A presente pesquisa utilizou-se de me todo dedutivo, adotando-se o pro-

cedimento monográfico e a pesquisa bibliográfica para lograr o objetivo pro-

posto. O presente texto reflete parte dos estudos realizados no âmbito de Es-

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tágio Pós-Doutoral, que embasarão a pesquisa principal, a ser apresentada ao

término do período.

ANÁLISES E RESULTADOS

A concepção utilitarista da natureza a partir da modernidade representa

uma ruptura com o pensamento antigo de physis que incluía a essência da

existência em suas análises. Tal desligamento é refletido de forma clara, no

pensamento ecológico contemporâneo, o que fica demonstrado mesmo nas

concepções atuais de desenvolvimento sustentável, cujo ideário busca vincu-

lar o cuidado com o meio ambiente às necessidades sociais e aos interesses

econômicos, com um acentuado predomínio dos interesses de mercado frente

à preservação do meio ambiente.

Na análise da conformação do pensamento ecológico atual, portanto, de-

monstra-se a presença de um ou outro elemento refletindo este histórico em-

bate entre diferentes concepções de natureza ao longo da história, incluindo a

persistente separação entre humanidade e natureza. Desde a antiguidade, as

sociedades debatem-se sobre sua condição de parte indissociável ou agente

externo ao meio natural, oscilação observada ao longo da história e refletida

nos modos de ser, fazer e viver das sociedades, refletidos na ecologia contem-

porânea. Na sociedade atual, vê-se algumas tentativas de recuperar o vínculo

com a essência da natureza, ao mesmo tempo que em que é observada a tenta-

tiva de impor uma racionalidade cada vez mais especializada e que pressupõe

a mercantilização dos elementos ambientais.

PRINCIPAIS CONCLUSÕES

Não há como se pretender analisar o status quo atual da questão ambien-

tal sem considerar a gênese da ideologia que o sustenta. Realizar tal análise é

uma tarefa extremamente complexa e que demanda um esforço de resgatar

concepções de longa data que surgiram e se repetem ao longo da história. Da

análise realizada, vê-se que o antigo dilema do ser humano de se incluir como

parte da natureza ou como agente exterior a ela continua latente na humani-

dade. A ideologia hegemônica, ao mesmo tempo que se apresenta como inter-

pretação da realidade, também se mostra como imposição que busca criar

soluções para a conflituosa relação entre ser-humano e natureza. Pensar como

tais conflitos precisam ser resolvidos na sociedade atual talvez seja um cami-

nho para superar a crise ecológica do tempo presente.

POSSÍVEIS CONTRIBUIÇÕES PRÁTICAS

A reflexão proposta traz como contribuição prática o despertar das ciên-

cias para a compreensão da gênese do pensamento ambiental através de uma

perspectiva histórica. Muito se fala da questão ambiental e dos dilemas que

esta impõe à sociedade, porém, comumente as análises se restringem a aspec-

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tos pontuais que não contemplam a origem dos problemas enfrentados. Deste

modo, pensar a questão ambiental através de um resgate do pensamento eco-

lógico ao longo do tempo é um esforço que poderá contribuir para o necessá-

rio aprofundamento da temática e para a busca de soluções realmente eficazes

para a gestão dos recursos naturais.

REFERÊNCIAS

KOIKE, K. Aspectos da physis grega. In: Revista perspectiva filosófica. V. VI, n. 12, jul-

dez, 1999.

MAMED, D. O. Pagamentos por Servicos Ambientais e mercantilizacao da natureza na

sociedade moderna capitalista. Paraná, 2016. Tese (Doutorado em Direito) – Pon-

tifícia Universidade Católica. Curitiba, 2016.

PRIGONINE, I.; STENGERS, I. Nova Aliança: Metamorfose da ciência. Brasília: Editora

Universidade de Brasília, 1991.

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PROGRAMA ENSINO MÉDIO INOVADOR:

EXPECTATIVAS DOS ESTUDANTES E

ARTICULAÇÕES COM O DESENVOLVIMENTO

REGIONAL1

Janete Paiter de Souza2

Argos Gumbowsky3

Maria Luiza Milani4

INTRODUÇÃO

A premência da melhoria na qualidade do tempo e espaço da aprendiza-

gem do aluno estipulou uma nova investida no Ensino Médio em 2010, com a

criação do Ensino Médio Inovador (EMI). O Programa de Educação Integral,

atendendo ao Decreto Federal nº 7.083/2010, no seu artigo 1º, em adição às

Diretrizes Nacionais do Ensino Médio, alvitra a visão da educação interdimen-

sional como espaço exclusivo do exercício da cidadania e propõe o protago-

nismo juvenil como um traço importante de sua estratégia educativa.

Aliado a este cenário, tem-se a crise educacional cujas raízes históricas

estão efetivadas na evasão e reprovação escolar que, em sua essência metodo-

lógica e conteudista, confronta-se com as tendências da educação no século

XXI.

OBJETIVOS E PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

O presente relato é resultado de pesquisa que versou sobre a implanta-

ção do Programa Ensino Médio Inovador (ProEMI) em duas escolas públicas

de Educação Básica na 25ª Gerência de Educação (GERED). Teve por objetivo

analisar como se desenvolveu a operacionalização do Programa Ensino Médio

Inovador nas escolas públicas da 25ª GERED.

1 Estrato da Dissertação intitulada: Um olhar sobre a implantação do Programa Ensino Médio Inovador

(ProEMI) em duas escolas públicas da 25ª Gerência de Educação: uma análise 2 Pedagoga. Mestre em Desenvolvimento Regional pela Universidade do Contestado. E-mail:

[email protected] 3 Doutor em Educação e professor do Programa de Mestrado em Desenvolvimento Regional da

Universidade do Contestado. E-mail: [email protected] 4 Doutora em Serviço Social e professor do Programa de Mestrado em Desenvolvimento Regional da

Universidade do Contestado. E-mail: [email protected]

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Tratou-se de um estudo bibliográfico, de campo, exploratório, documen-

tal, quali e quantitativo. Utilizou-se a escala de Likert. Relata-se o resultado da

pesquisa realizada com 317 alunos de 1ª, 2ª e 3ª séries do Ensino Médio Ino-

vador da EEB Almirante Barroso e; EEB Santa Cruz de em Canoinhas-SC.

ANÁLISE E RESULTADOS

As novas Diretrizes Curriculares do Ensino Médio e o Decreto Federal nº

7.083/2012, foram acolhidos pela Secretaria de Estado da Educação de Santa

Catarina (SED), a partir de 2012. Viabilizou-se a ampliação e a consolidação do

Ensino Médio Integral em 95 escolas da rede de ensino pública estadual. No

ano de 2010, quando 18 escolas iniciaram as atividades do ProEMI, o número

de alunos somava 2.246 matriculas; em 2014, 130 escolas catarinenses ofere-

ciam esta modalidade contando com 16.370 alunos.

Os estudantes ao serem questionados sobre as expectativas em relação

aos estudos ou trabalho, após a conclusão do Programa Ensino Médio

Inovador, evidenciaram: 32,8% concordam plenamente que o EMI contribui

para a formação de jovens conscientes para o exercício da cidadania; 38,2%

que promove melhores perspectivas de inclusão dos jovens no mercado de

trabalho; 41% que propicia melhores perspectivas para ingresso no Ensino

Superior; 47% que melhora o desempenho do Exame Nacional do Ensino Mé-

dio (ENEM); 30,9% dos Jovens avaliam que o curso contriubui com intenções

futuras em interagir e contribuir para o desenvolvimento regional; apenas

28,7% consideram que estimula o empreendedorismo.

O desenvolvimento de uma região está também vinculado ao processo

educacional. A sociedade contemporânea baseia-se no conhecimento e suas

variações. A concepção de educação deve voltar-se ao desenvolvimento local.

Nesta perspectiva, cabe indagar se a educação está formando pessoas que

atendam às necessidades da territorialidade.

O sentido de educação inovadora voltada ao desenvolvimento regional

reporta-se aos estudos educativos da comunidade e região, onde as vivências

baseadas no cotidiano resultam em questionamentos e estudos desses espa-

ços em sala de aula. Através das viagens de estudos oferecidas aos alunos que

frequentam o ProEMI, é possível estimular o educando a desenvolver sua

autonomia, espírito crítico e curiosidade na construção do conhecimento de

sua região.

De acordo com Miranda (2010, p. 623), “[...] a geração de significados e

sentidos que conformam identidades e pressupõem aprendizagens, a partir de

experiências com o espaço urbano, assumem papel fundamental”. Assim, para

modificar o espaço onde vive, é necessário conhecê-lo, o que propõe Dietzsch

(2006, p. 734), quando afirma que:

Se pensarmos a cidade menos como cidadela, e mais como fonte e núcleo de irradiação cidadã, como tarefa pedagógica de todos e de cada um, talvez pos-

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samos avançar um pouco mais. Por enquanto seria precipitado concluir que a educação vem enfrentando, a contento, o desacordo citadino. Porque não bas-ta ensinar na cidade; é preciso ensinar a cidade.

Dietzsch (2006) explicita seu pressuposto: é preciso conhecer o território

onde vive para poder participar, interagir e ajudar a transformar. Em adição,

propõe-se discutir de forma propositiva a função da educação na promoção do

desenvolvimento, problematizando a educação na égide do desenvolvimento

da região.

Espera-se que a escola cumpra com seu papel social para a formação da

cidadania. O percurso formativo envolve perspectivas dos jovens na dimensão

histórica e social, nas quais o fazer pedagógico precisa estar em consonância

com os sujeitos. A necessidade de formar cidadãos capazes de interagir no seu

entorno promove iniciativas de origens variadas e complexas, das quais a

educação é o trampolim necessário para essa transformação.

Em síntese, o desafio de mesclar a educação na história do desenvolvi-

mento de uma região torna-se cada vez mais difícil e necessário. Efetivamente,

a educação para o desenvolvimento é um processo dinâmico e participativo,

que envolve a triangulação de escola, sociedade e governo.

REFERÊNCIAS

BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Básica. Programa: Ensino Médio

Inovador – Documento Orientador. Brasília, set. 2009.

______. Portaria nº 971, de 09 de outubro de 2009. Institui o Programa Ensino Médio Ino-

vador. Diário Oficial da União. Brasília, 13 out. 2009. ______. Presidência da República. Casa Civil. Decreto nº 7.083, de 27 de janeiro de 2010.

Institucionaliza o Programa Mais Educação. Brasília, DF, 2010. Diário Oficial da

União - Seção 1 - Edição Extra - 27/1/2010, p. 2.

DIETZSCH, M. J. M. Leituras da Cidade e Educação. Caderno de Pesquisas. São Paulo,

v.26, n.129, p.5-14, set./dez. 2006.

ESCOLA DE EDUCAÇÃO BÁSICA SANTA CRUZ. Projeto Político Pedagógico - Canoi-

nhas, junho de 2012.

MIRANDA, S. R. Olhares sobre a cidade, atravessados pelo tempo: o urbano em seus sub-

terrâneos educativos. In: SANTOS, L. L. C. P. et al. (Org.). Convergências e ten-

sões no campo da formação e do trabalho docente. Belo Horizonte: Autêntica,

2010.

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IDEB: IMPORTANTE MECANISMO PARA

PERCEBER A EDUCAÇÃO EM DIFERENTES

CONTEXTOS

Rosimari de Fátima Cubas Blaka1

INTRODUÇÃO

O tema Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB) aborda os

resultados da qualidade do ensino por meio da avaliação em larga escala rea-

lizada nos 03 (três) últimos processo educacionais nos municípios integrantes

do Planalto Norte Catarinense: Canoinhas, Bela Vista do Toldo, Major Vieira e

Três Barras. A observação destes municípios ocorre pelo curso de pedagogia

da Universidade do Contestado (UnC), Campus Canoinhas (SC), que contempla

maior abrangência de acadêmicos em sua formação pedagógica.

A partir da década de 90 o Ministério da Educação - MEC instituiu através

do INEP o Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (SAEB) e a Prova

Brasil que são avaliações externas que verificam os resultados das políticas

educacionais implementadas para melhorar a qualidade da educação. A Prova

Brasil é uma medida de avaliação comum a todas as unidades escolares e alia-

da as taxas de rendimento do Censo Escolar, que norteiam o IDEB.

De acordo com Freitas (2007, p. 19), “A avaliação é uma atividade orien-

tada para o futuro. Avalia-se para tentar manter ou melhorar nossa atuação

futura”. Essa é a base da distinção entre medir e avaliar. Medir refere-se ao

presente e ao passado e visa obter informações a respeito do progresso con-

quistado pelos estudantes. Avaliar refere-se à reflexão sobre as informações

obtidas com vistas a planejar o futuro.

As avaliações externas, consideradas em larga escala, realizadas pelo

MEC a cada 02 (dois) anos, oferecem dados que não avaliam individualmente

o aluno, mas a classe como um todo, informando a etapa e nível de ensino, por

escola, rede de ensino e sistema escolar, possibilitando amplos objetivos para

a melhoria da qualidade do ensino, de acordo com CENPEC (2007, p.10):

As avaliações nacionais são cada vez mais comuns na maioria dos países da América Latina. Embora seus resultados ainda pouco influenciem as políticas educacionais adotadas, é possível observar que as avaliações têm uma inten-ção nobre: acompanhar como anda o direito de aprender dos alunos.

1 Pedagoga, Professora e Coordenadora do Curso de Pedagogia. Mestre em Desenvolvimento Regional.

pela Universidade do Contestado. E-mail: [email protected].

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OBJETIVOS E PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

O objetivo deste estudo é apresentar os últimos resultados do IDEB 2011,

2013 e 2015 dos 04 (quatro) municípios integrantes do Planalto Norte Catari-

nense de abrangência da UnC – Canoinhas, citando Canoinhas, Bela Vista do

Toldo, Major Vieira e Três Barras.

Para obtenção dos dados utilizou-se de pesquisa investigativa e biblio-

gráfica, buscando indicadores que apresentam os avanços obtidos pelos muni-

cípios na Educação Básica Pública, Ensino Fundamental - anos iniciais e finais;

como também, os desafios a serem superados pelas redes de ensino Estadual e

Municipais e as metas a serem atingidas a cada etapa de avaliação. Os resulta-

dos proporcionam mecanismos importantes para a gestão pública planejar e

investir em melhorias na organização administrativa e pedagógica. E que estes

podem ser utilizados como parâmetros para o acompanhamento e a avaliação

da qualidade do ensino e aprendizagem.

ANÁLISE E RESULTADOS

Os procedimentos adotados para pesquisar e identificar os resultados do

IDEB dos municípios citados estão pautados nos dados oficiais do INEP/MEC.

O que se busca com esse processo amplo de avaliação é a complementa-

ridade entre a avaliação individual, realizada pelo professor em sala de aula e

a avaliação educacional que demonstra, amplamente, as competências de

aprendizagem adquiridas pelos alunos através dos indicadores do IDEB. Para

obtenção desses resultados conta-se com a Prova Brasil, realizada no ensino

fundamental, 5º e 9º anos, finalizando cada etapa deste nível de ensino, utili-

zada para o acompanhamento da aprendizagem coletiva dos alunos.

Mediante a análise dos dados dos 04 (quatro) municípios estudados e su-

as respectivas avaliações, e observando os dados disponibilizados pelo INEP

sobre o número de participantes na Prova Brasil, percebe-se avanços nos re-

sultados e até superação das metas projetadas nos municípios de Canoinhas e

Três Barras, entretanto, verifica-se também que houve número de alunos

insuficientes nos municípios de Bela Vista do Todos e Major Viera para a reali-

zação das provas, não sendo possível obter resultados, como se pode observar

no Quadro 1.

As possibilidades de análises das informações sobre o IDEB dos municí-

pios pesquisados são amplas, multifacetadas e diversificadas. Mediante as

etapas do processo de pesquisa, pode-se destacar o contexto socioeconômico

das comunidades envolvidas, baixo Índice de Desenvolvimento Humano Mu-

nicipal - IDHM, bem como, os percentuais de professores habilitados para

atuar na Educação Básica de acordo com o INEP/MEC. Também ficam eviden-

tes os desafios que precisam ser superados através de atividades pedagógicas

e administrativas direcionadas a cada contexto educacional, nos municípios

referenciados. Diante dessa realidade entende-se que há necessidade de in-

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vestimento púbico financeiro e de formação para atingir amplamente todos os

municípios, pois as dificuldades de conseguir crescimento nos índices educa-

cionais não é realidade somente dos municípios pesquisados, e sim, situação

comum da educação básica nacional.

Quadro 1- Situação do IDEB nos municípios estudados

Anos Iniciais Anos Finais

Ensino Fundamental Ensino Fundamental

MUNICÍ-

PIOS

IDEB

2011

IDEB

2013

IDEB

2015

Meta

2015

Meta

2021

IDEB

2011

IDEB

2013

IDEB

2015

Meta

2015

Meta

2021

Canoinhas 5.8 5.9 6.4 5.8 6.5 4.7 4.6 5.3 5.3 6.0

Bela Vista

do Toldo

5.1 * ** 5.6 6.3 4.7 * ** 4.8 5.5

Major

Vieira

5.3 * 5.8 5.3 6.1 4.5 4.2 5.1 5.0 5.8

Três Barras 4.9 4.6 5.2 5.2 6.0 4.2 3.8 4.2 4.5 5.3

Fonte: INEP/MEC * Número de participantes na Prova Brasil insuficiente para que os resultados sejam divulgados.

** Sem média na Prova Brasil 2015: Não participou ou não atendeu os requisitos necessários para ter o desempenho calculado.

REFERÊNCIAS

BRASIL. Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep).

Disponível em www.inep.gov.br. Acesso em 30 de Setembro 2016.

CENPEC. A Prova Brasil na escola: material para professores, coordenadores pedagógicos e

diretores de escolas de ensino fundamental. São Paulo, 2007. Disponível em:

http://coordenacaoescolagestores.mec.gov.br/ufsc. Acesso em: 10 de julho de 2016.

FREITAS, L. C.; FERNANDES, C. O. Indagações sobre currículo: currículo e avaliação.

Brasília: Ministério da Educação, Secretaria de Educação Básica, 2007 (Organização

do documento: Jeanete Beauchamp; Sandra Denise Pagel; Aricélia Ribeiro do Nas-

cimento).

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SEGUNDA PARTE

DESAFIOS, POSSIBILIDADES E PROSPECÇÕES SOBRE

DESENVOLVIMENTO EM OUTROS ESTADOS DO BRASIL

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PERCEPÇÃO DA SOCIEDADE SOBRE A

IMPORTÂNCIA DO TURISMO NO

DESENVOLVIMENTO LOCAL: UMA ANÁLISE

DO MUNICÍPIO DE PIRAQUARA/PR

Jorge Amaro Bastos Alves1

INTRODUÇÃO

Este artigo buscou identificar a contribuição do turismo no desenvolvi-

mento local e preservação da paisagem e mananciais. Fez-se um estudo no

sentido de se analisar como a sociedade piraquarense vê a atividade turística

no município de Piraquara, localizado no estado do Paraná, na porção leste da

Região Metropolitana de Curitiba (RMC), e também, de que forma o turismo

pode contribuir para se firmar como uma das estratégias relevantes de desen-

volvimento local.

Em termos metodológicos, analisou-se o tema com intuito de levantar

dados e formular análises utilizando-se de pesquisa bibliográfica realizada em

livros, periódicos especializados e outras publicações, pertinentes ao tema, de

pesquisa documental em arquivos da Prefeitura Municipal de Piraquara e

também da pesquisa descritiva, pois os fatos foram registrados, classificados e

interpretados, sem interferência do pesquisador. Os dados analisados foram

extraídos de um estudo monográfico feito pelo autor mediante coleta de dados

primários junto a sociedade piraquarense baseado no critério de relevância

para a pesquisa. A amostra foi estratificada entre os representantes dos Pode-

res Legislativo e Executivo do município, membros da iniciativa privada –

proprietários de estabelecimentos ligados a economia do turismo – e cidadãos

vinculados direta ou indiretamente com o turismo no município. A população

da pesquisa constou de um total de 17 entrevistados dentre 22 questionários

entregues em mãos e/ou via e-mail. Utilizou-se como instrumento de coleta de

dados um questionário contendo 14 questões sendo 5 abertas, 7 fechadas e 2

mistas2 (ALVES, 2008).

1Economista (UFSC), Doutorando em Ciência e Tecnologia Ambiental (UNIVALI), Mestre em

Desenvolvimento Regional (UnC) e Especialista em Planejamento e Gestão do Turismo (UFPR). E-

mail: [email protected] 2 Estudo monográfico realizado no curso de especialização em Planejamento e Gestão do Turismo da

Universidade Federal do Paraná disponível em: https://works.bepress.com/jorgeab_alves/11/download/.

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Julga-se relevante esse estudo, dado que, o desenvolvimento turístico de

uma região se torna desafio para os gestores públicos e privados, e cada vez

mais, a sustentabilidade de um destino turístico depende de uma gestão com-

partilhada entre o setor privado, o Estado e a comunidade local. Importante

frisar que, o tema desse estudo tem “o turismo como objeto de estudo [que] é

constituído por um centro no qual as diferentes disciplinas se entrelaçam”,

promovendo assim, um encadeamento de conhecimentos interdisciplinares

(DENCKER, 1998).

Atinente a isso, destaca-se que, os princípios indutores do desenvolvi-

mento do turismo são intrínsecos ao desenvolvimento econômico, e nesse

sentido, a diferenciação básica entre os conceitos de desenvolvimento e cres-

cimento econômico são caracterizados respectivamente pelos aspectos da

qualidade e da quantidade. Portanto, o desenvolvimento das cidades e regiões

é estabelecido, entre outras coisas, pelas transformações que ocorrem no re-

gime econômico em vigor ao longo do tempo, meneado principalmente pela

economia do país, e, principalmente em tempos de globalização, pela mundial.

Ademais, o turismo pode contribuir na geração de emprego, renda, de-

senvolvimento local e preservação da paisagem e mananciais, o que acarreta

numa rede de causas e efeitos entre a ecologia, a economia, e particularmente,

o turismo, envolvendo principalmente a indústria turística, defensores do

meio ambiente e comunidade (OMT, 2003). Diante disso, as tradicionais des-

crições do turismo (características dos visitantes, motivações de sua visita,

etc.) têm sido complementadas – e se tornando mais interessantes para a ad-

ministração pública e para a sociedade – em função da importância da realiza-

ção de estudos com caráter econômico.

Não obstante, devido à preocupação com a qualidade de vida presente

nas sociedades pós-industriais o turismo juntamente com o lazer, a cultura, as

artes, o esporte pode ser, conforme Barros (2005), a única alternativa para o

desenvolvimento local, sendo seriamente considerado por governos, estudio-

sos e comunidades.

Assim, crê-se que os gestores devam almejar em analisar o turismo sob a

ótica do Desenvolvimento Local, ou seja, verificar que tipos de turismo devem

ser desenvolvidos para que estes proporcionem desenvolvimento no sentido

amplo da palavra, no que concernem as diversas dimensões do desenvolvi-

mento sustentável, quais sejam, a econômica, a social, institucional e a ambi-

ental.

Em razão disso, esse artigo se mostra atual e importante, cuja temática

assentada no desenvolvimento local e turismo sustentável vêm despertando

interesse de estudiosos do turismo, bem como, de outros profissionais afetos a

sua multidisciplinaridade.

Estruturou-se esse artigo em quatro seções além dessa introdução, sendo

que na primeira se abordam as motivações para o turismo e na segunda seção

pontua-se a questão do turismo como atividade econômica. A terceira seção

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abrange a administração pública, a questão ambiental e a sustentabilidade da

atividade turística, enquanto na quarta parte se faz uma análise do desenvol-

vimento do turismo no município de Piraquara, seguindo-se as considerações

finais.

MOTIVAÇÕES PARA O TURISMO

Num conceito abrangente, o turismo é dito como sendo um fenômeno

que envolve viagens. Porém, quando se pesquisa sua origem, o turismo é fla-

grado já em tempos remotos da civilização do homem. Um dos motivos consti-

tutivos para esse aparecimento primitivo do turismo segundo Alves (1987, p.

14) é que, “A curiosidade, inata no ser humano, fez dele um turista, mesmo

antes de existir o turismo organizado.” Além disso, complementa o autor, o

homem na antiguidade era também motivado a viajar por interesses político e

comercial ou por sentimentos religiosos.

A expansão do turismo notadamente como atividade econômica se inten-

sificou a partir do final da Segunda Guerra Mundial, em função de alguns fato-

res, tais como, a evolução da legislação social (tempo de trabalho, repouso

semanal, férias anuais remuneradas, etc.); a elevação do nível educacional,

com a abordagem de conhecimentos que passaram a despertar o interesse por

conhecer outros lugares no mundo e melhoria nos sistemas de transportes,

incluindo a evolução da aviação comercial e dos acessos rodoviários e ferrovi-

ários (GARRIDO, 2001).

Nos dias de hoje, a demanda turística se estabelece, não só pelo sentido

de lazer do homem, mas também, pelo fato da modernidade e o desenvolvi-

mento tecnológico, aliado a crescente disputa mercadológica do homem pela

busca de sua sobrevivência econômico-financeira, imporem um ritmo de tra-

balho exaustivo ao homem moderno. Esse contexto guinda o turismo a uma

posição de atividade profícua, pela simples razão que o homem necessita pe-

riodicamente renovar sua mente e energia, para que possa mantê-las saudá-

veis.

Nesse contexto, surgiram demandas por novos interesses de viagens, a

exemplo de diferentes formas de esportes e lazer, intercâmbio cultural, visita

a sítios históricos revitalizados e a parques naturais, desencadeando o proces-

so de segmentação do turismo, que colabora grandemente para a expansão e

especialização do setor. Para Barros (2005), esses novos motivadores princi-

palmente nas sociedades pós-industriais fizeram com que o turismo se desen-

volvesse até se tornar atualmente, uma das atividades econômicas mais im-

portantes em nível regional e global.

Nesse aspecto, o caráter econômico do turismo é sem dúvida eloquente,

mas a inegável e clara importância das demais variáveis que perfazem o tu-

rismo levou a Organização Mundial de Turismo (OMT) a estabelecer uma de-

finição mais ampla e holística do turismo que “[...] compreende as atividades

que realizam as pessoas durante suas viagens e estadas em lugares diferentes

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ao seu entorno habitual por um período consecutivo inferior a um ano com

finalidade de lazer, negócios ou outras” (OMT, 2001, p. 3).

A ECONOMIA DO TURISMO

No que tange a atividade econômica, cabe frisar que o turismo envolve a

prestação de serviços, que o caracteriza como uma atividade terciária, não

permitindo conceituá-lo como indústria, uma vez que no turismo, a matéria-

prima, no caso os atrativos turísticos, não são processados, ou seja, na indús-

tria a matéria-prima obtém-se de recursos naturais e no turismo é fornecida

pelos atrativos.

Isto não significa, no entanto, que os atrativos não agreguem valores ao

se transformarem em produtos competitivos e estimularem fluxos de pessoas,

sendo, portanto, uma complexa atividade socioeconômica, que gera a produ-

ção de bens e serviços para o homem, visando à satisfação de diversas neces-

sidades básicas e secundárias.

Em termos econômicos, duas dimensões importantes podem ser estabe-

lecidas no contexto do turismo: a primeira se refere à chamada “indústria do

turismo”, formada pelo conjunto de empresas prestadoras de serviços (hos-

pedagem, alimentação, transporte, agenciamento, entretenimento entre ou-

tros) que compõem o produto turístico e atendem às necessidades de seus

consumidores, os turistas. Nessa dimensão são estabelecidas as relações seto-

riais diretas de produção; a segunda dimensão é denominada “economia do

turismo”, que assume um aspecto mais amplo, pois, relaciona-se direta e indi-

retamente com outros setores produtivos, na condição de induzidor ou pro-

vedor de demandas, gerando agregados à renda e ao produto nacional (GAR-

RIDO, 2001, aspas no original).

Para Petrocchi (2001), o turismo é uma atividade econômica geradora de

emprego e renda e tornou-se um fenômeno que compreende vários aspectos

da sociedade. Sendo assim, o turismo sofre influência de variáveis sociais,

políticas, econômicas, demográficas, geográficas, culturais, entre outras, tanto

da região de destino como da região de origem do turista.

No ano 2009, as atividades características do Turismo no Brasil geraram

um total de R$ R$ 213,3 bilhões de valor bruto da produção (VBP)3. Como são

atividades de serviços, é possível medir sua participação no total do valor

bruto da produção de serviços no país que foi de 7,3%. Na comparação com o

total da economia brasileira, a produção das Atividades Características do

Turismo representou 3,9% (IBGE, 2012). No que tange a ótica da atividade econômica, o turismo é definido “[...] a

partir da perspectiva de demanda, ou seja, como o resultado econômico do

3 VBP é a expressão monetária que soma todos os serviços turísticos produzidos no país. Nesse valor

tem a chamada “dupla contagem”, pois soma os produtos finais com os insumos usados em sua

produção. É diferente, portanto, do Valor Agregado Bruto (VAB), que é o valor da produção sem

duplicações, que se obtém descontando do VBP, o valor dos insumos utilizados no processo produtivo.

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consumo dos visitantes” (IBGE, 2008, p. 9). Assim, é possível avaliar o impacto direto e indireto gerado pelo turismo na economia de um país ou região, utili-zando-se métodos que permitem quantificar os gastos efetuados pelos turis-tas. Uma das técnicas é o efeito multiplicador do gasto turístico que se baseia no número de vezes que esse gasto circula na economia local.

A matriz do efeito multiplicador elaborada por Inskeep (1991, p. 388) apud Garrido (2001, p. 34), a partir de informações provenientes da OMT, aponta três modalidades de gastos turísticos: gastos diretos, isto é, serviços ou produtos comprados diretamente pelo turista, gastos efetuados pelas empre-sas turísticas e, os beneficiados finais, ou seja, os diversos prestadores de ser-viços que representam as atividades econômicas que indiretamente estão incorporadas na atividade turística (FIGURA 1).

Figura 1 – Matriz de Inskeep

Fonte: Garrido (2001, P. 34).

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PLANEJAMENTO PÚBLICO, MEIO AMBIENTE E SUSTENTABILIDADE

O desenvolvimento das cidades e regiões é estabelecido, entre outras coi-

sas, pelas transformações que ocorrem no regime econômico em vigor ao

longo do tempo, meneado principalmente pela economia do país, e, princi-

palmente em tempos de globalização, pela economia mundial. Outros fatores

importantes para o desenvolvimento local e regional são o planejamento e as

políticas públicas adotadas pelo poder público.

O turismo é um fenômeno que tem forte impacto positivo na economia,

porém, a despeito dos benefícios econômicos, a atividade turística pode pro-

vocar uma série de efeitos indesejáveis. Entre esses efeitos, pode-se citar a

concentração de renda, descaracterização de culturas frágeis, discriminação

social, impactos ambientais negativos e ainda conflitos entre turistas e a co-

munidade anfitriã local.

Por conseguinte, no que tange ao meio ambiente, o desenvolvimento tu-

rístico de forma geral também é conflitante, podendo causar problemas ambi-

entais, como, destruição da paisagem, impactos ecológicos sequenciais, polui-

ção das águas, entre outros.

Assim, para haver turismo que traga além de benefícios econômicos, a

conservação e preservação do patrimônio natural, é necessário uma infraes-

trutura, não necessariamente grande, mas, que seja eficaz. Todavia, para que o

gestor público possa fazer frente a isto, faz-se necessário um planejamento,

que uma vez elaborado, terá esse gasto provisionado em seu orçamento. Nes-

se contexto, Boullón (2002) ressalta que a estrutura turística proporcionada

pelo setor público, em geral, enfrenta problemas decorrentes da falta de or-

çamento, o que dificulta a realização de investimentos necessários à manuten-

ção ou qualificação da infraestrutura urbana e turística.

É fato, que o turismo quando planejado corretamente, contempla os re-

cursos naturais de maneira a causar o mínimo impacto possível, interage bem

com a população local e obviamente, torna-se uma atividade rentável para os

proprietários dos recursos que geram as atividades turísticas. A junção desses

três fatores denomina-se turismo sustentável4.

Diante disso, três aspectos devem ser considerados, quando se menciona

a complexidade do fenômeno turístico, conforme Magalhães (2002): o primei-

ro diz respeito à satisfação das necessidades dos turistas; o segundo se refere

à população residente, no que tange aos custos e benefícios que o turismo

pode lhe trazer, e por último, a conservação dos patrimônios culturais e ambi-

ental que, na maioria das vezes, é o motivo do deslocamento do turista. É fun-

damental, portanto, que para um município obter sucesso na dinamização

4 Turismo Sustentável é definido pelo Acordo de Mohonk (New Paltz/EUA), como sendo aquele que

busca minimizar os impactos ambientais e socioculturais, ao mesmo tempo que promove benefícios

econômicos para as comunidades locais e destinos - regiões e países (ECOBRASIL, 2016).

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econômica e turística em seu território deve colocar o turismo como parte do

debate no planejamento municipal.

É necessário, por conseguinte, entender o turismo segundo uma nova vi-

são estratégica de desenvolvimento que visa maximizar as potencialidades

locais que sejam capazes de aproveitar esse fenômeno e transformá-lo em

uma alavanca de crescimento econômico para toda a sociedade.

Cabe aqui, então, pontuar uma questão intensamente discutida tanto no

meio científico como pelo mercado: pode o turismo ser manejado e desenvol-

vido localmente de forma sustentável? Com efeito, evidencia-se que a ativida-

de turística segundo Rodrigues (2002, p. 49) “[...] permite e facilita o uso fugaz

e intenso do território como parte integrante do ideal da modernidade que

considera o desenvolvimento como uma meta a ser atingida, medida e media-

da pela produção de mercadorias.”

Deste modo, é perceptível que o turismo na sua essência é incompatível

com a ideia de desenvolvimento sustentável5, pois, a prática turística busca

sempre o consumo dos lugares belos e com natureza abundante [...], transfor-

mando-os para serem “comercializáveis”, nos padrões de “conforto e qualida-

de de vida do mundo moderno”, ou seja, o turismo como atividade acaba sa-

cralizando a natureza e submetendo-a ao mundo da mercadoria (RODRIGUES,

2002, p. 49, aspas no original).

Nesse pensamento Rabahy (1990) apud Barros (2005, p. 31), afirma que

“a busca e o contato direto com a natureza tem sido características da deman-

da turística contemporânea, porém os recursos naturais são limitados e a

atividade turística se localiza preferentemente em áreas onde estes recursos

são mais disponíveis.”

Pode-se afirmar, portanto, que o turismo, é um “consumidor da nature-

za”, haja vista, que essa é condição sine qua non para que exista a atividade

turística. Todavia, embora isso seja fato, o turismo possui em seu bojo, carac-

terísticas e ferramentas que podem efetivamente contribuir para o desenvol-

vimento local, podendo deixar de ser apenas, um instrumento mercantilista

voltado para a satisfação do turista, como usualmente se sucede.

Quando uma região fomenta o desenvolvimento do turismo em seu terri-

tório, a consequência imediata é o realce de seus atrativos turísticos. O reflexo

natural deste estímulo se traduz em aumento do fluxo turístico, que com fre-

quência, suscita o surgimento do que literatura econômica chama de externa-

lidades6. Diga-se a propósito, que é inevitável que uma localidade seja desco-

5 O conceito de desenvolvimento sustentável foi cunhado em 1987 quando da conclusão do documento

intitulado Nosso Futuro Comum, conhecido como “Relatório Brundtland”, elaborado pela Comissão Mundial das Nações Unidas para o Meio Ambiente e Desenvolvimento como sendo aquele que atende

as necessidades do presente sem comprometer a possibilidade de as gerações futuras atenderem as suas

próprias necessidades (BRUNDTLAND, 1991). 6 Efeitos externos positivos ou negativos sobre terceiros gerados por atividades de empresas que im-

põem benefícios ou prejuízos a outras ou às populações circundantes sem que estas recebam indeniza-

ções pelos prejuízos causados.

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berta pelo turista, pois, este é ávido por descobrir novos lugares como comen-

ta Bahl (2004, p. 32) porque, “o ser humano – turista em potencial – busca

facilidades para a realização de seus deslocamentos, gerando um processo de

escolhas e seleção de localidades a visitar, motivado pela propaganda ordena-

da e muitas vezes verbal.”

Figura 2 – Valores e Princípios do Turismo Sustentável

Fonte: Hall (2001), Apud Barros (2005, P. 40).

Para atender uma demanda crescente de turistas, faz-se mister, que o tu-

rismo seja planejado de modo que, suas externalidades negativas sejam redu-

zidas a um patamar aceitável, para que não causem maiores danos aos ecos-

sistemas. Assim, para que o turismo se apresente como a melhor alternativa

vindoura, deve-se buscar seu planejamento e gerenciamento de forma inte-

grada no que tange aos seus sistemas econômicos, sociais e ambientais (Figu-

ra 2). Em outras palavras, Ruschmann (2001), frisa que a atividade turística

proporciona efeitos favoráveis nas localidades receptoras se houver uma pla-nificação adequada dos governos, das empresas e das comunidades envolvi-das. Esta planificação deve estar diretamente vinculada com a visão da susten-tabilidade dos projetos e ações turísticas, fundamentais para o sucesso e a minimização dos impactos negativos. Salienta ainda, que oferecer oportunida-de e acesso a um maior fluxo de pessoas, contrapõe-se a tarefa de proteger e evitar a descaracterização dos locais privilegiados pela natureza e do patri-mônio cultural das comunidades.

Diante desse contexto, um dos pontos importantes quando se pensa em desenvolvimento local é, ponderar a participação da sociedade local no plane-

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jamento da ocupação do espaço, principalmente no tocante ao fomento da atividade turística, que Ruschmann (2001, p. 163), reputa como:

O maior problema da ausência do planejamento em localidades turísticas re-side no seu crescimento descontrolado, que leva à descaracterização e à perda da originalidade das destinações que motiva o fluxo dos turistas, e o empre-endimento de ações isoladas, esporádicas, eleitoreiras e desvinculadas de uma visão ampla do fenômeno turístico.

Ou seja, ao colocar-se o turismo como uma opção sustentável, torna-se imperioso, que haja um planejamento turístico que determine os investimen-tos necessários para norteando assim, a atuação econômica para obter maior lucro, bem como, definindo claramente o objetivo ecológico de preservar e fazer uso do conceito de turismo sustentável.

Dessa forma, para que haja um desenvolvimento do turismo como uma atividade sustentável que agregue valor para o município e seu entorno, faz-se necessário pensar primeiramente na elaboração de um planejamento integra-do, principalmente em tempos globalizados, onde o que passa a influenciar cada vez mais o desenvolvimento de um município são fatores externos.

À medida que a cidade esteja planejada de forma integrada, as questões turísticas podem ser mais bem organizadas e discutidas, haja vista, que o de-senvolvimento turístico de uma região é composto por distintos desafios para o gestor público e privado, tais como, a questão da pobreza, a conservação ambiental e patrimonial, além dos demais impactos da atividade turística nas comunidades locais. Ou seja, são situações diferentes e oriundas de vários ambientes, que devem ser previstas e discutidas por planejadores de diversas áreas.

O planejamento do turismo, dessa forma, deve envolver as pessoas que vivem no local, além do governo e da classe empresarial local, buscando res-peitar a cultura e os recursos naturais da área. Para a Secretaria de Estado do Turismo do Paraná, um Plano Municipal de Desenvolvimento Sustentável do Turismo

É um documento do planejamento onde estão reunidas propostas globais que deverão nortear o processo de desenvolvimento sustentável do turismo no município. Estas propostas possuem um pequeno grau de detalhamento e são definidas em função do diagnóstico da situação atual do Município (SETU, 2005, p. 40).

Um projeto de planejamento turístico começa com a realização de um in-ventário turístico, ou seja, uma análise integrada do ambiente externo, do meio ambiente e dos atrativos naturais no seu entorno, da sociedade, e da economia (SETU, 2005). Quando se sabe a oferta7 turística existente, pode-se então, desenvolver estratégias para atingir a demanda correta.

7 Assim como ocorre em outras atividades industriais e profissionais, a existência de uma maior

segmentação da demanda acarretou numa maior especialização da oferta. Alguns segmentos turísticos

são: religioso, vinícola, negócios, esportivo, gastronômico, cultural, melhor idade, rural, entre outros.

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Já o objetivo final do planejamento, de acordo com Bernardi (2007), deve ser melhorar a qualidade de vida das pessoas que moram naquele ambiente urbano, mantendo equilíbrio ambiental e preservando seus recursos para as futuras gerações.

Não obstante, outros instrumentos mais específicos e contemporâneos que já vêm sendo adotados por muitos municípios são os Conselhos Munici-pais de Meio Ambiente e os Conselhos Municipais de Turismo, onde a popula-ção local, juntamente com os setores privado e público, debate e decide os rumos das políticas locais (SALVATI, 2004).

Concluindo essa parte, turismo se for implantado dentro dos princípios da sustentabilidade definidos pela SETU (2005, p. 39), ou seja, “sem degrada-ção e destruição dos recursos naturais e artificiais; planejado e gerido de mo-do a melhorar a qualidade de vida da comunidade local e que envolve repre-sentantes da iniciativa pública e privada”, tornar-se-á uma fonte potencial de entrada de divisas podendo gerar novas oportunidades de emprego e estimu-lar a demanda por produtos e indústrias locais.

O DESENVOLVIMENTO DO TURISMO NO MUNICÍPIO DE PIRAQUARA/PR

Piraquara está localizada nas encostas da Serra do Mar estando a apro-ximadamente 22 km da capital, e faz parte da “Rotas do Pinhão” roteiro turís-tico que envolve um misto de aventura, história, gastronomia, paisagens bucó-licas e rurais (PARANÁ, 2016). Seus limites geográficos são (figura 3): ao norte com o município de Quatro Barras, a leste com Morretes, ao sul com São José dos Pinhais e a oeste com Pinhais. Seu território ocupa uma área de 224,12 km², com altitude média de 897 metros acima do nível do mar e está inserido no Setor Leste da Mesorregião Metropolitana de Curitiba (RMC) (PMP, 2016).

Figura 3 – Mapa de Localização do Município De Piraquara

Fonte: Tesseroli (2008, p.11).

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O turismo no município de Piraquara é essencialmente voltado para a

exuberância de suas riquezas naturais. Parte de seu território é considerado

Área de Proteção Ambiental (APA)8 onde estão localizados mananciais de

abastecimento público de interesse de municípios vizinhos.

Assim, o desenvolvimento de atividades economicamente produtivas no

município se torna restrito pelo fato de seu território abrigar várias áreas de

proteção ambiental, fator que reflete diretamente na arrecadação tributária.

Portanto, pode-se dizer que uma das opções viáveis para o desenvolvimento

sustentável de Piraquara passa pelo turismo ser praticado de forma sustentá-

vel associado à conservação do ecossistema, contribuindo assim para garantir

o suprimento de água para as atividades humanas.

O município (figura 4), conta hoje com cerca de 100 mil habitantes é o

maior fornecedor de água dos municípios próximos, e, no entanto, sofre com o

crescimento populacional oriundo principalmente, de famílias que se instalam

aqui pelo baixo custo de vida, e que trabalham em Curitiba e outras cidades no

entorno (COMATUR, 2008; ROTEIRO 2008; TESSEROLLI, 2008).

Figura 4 – Vista Aérea do Município de Piraquara/PR

Fonte: Prefeitura Municipal de Piraquara (2008).

8 Unidade de conservação de uso sustentável, estabelecida pela Lei Federal n.º 6902/81, constituída por

terras públicas ou privadas (IBAMA, 2016).

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No que tange a crescimento populacional, entre 1991 e 1996, segundo

Hardt e Hardt (2007, p. 5303) “[...] Piraquara registrou a maior taxa de cres-

cimento anual da [...] [RMC], 10,9% a.a. [...] com o estabelecimento de ocupa-

ções irregulares e geração de bolsões de pobreza [...]. Um dos motivos foi o

aumento das ocupações irregulares em áreas de preservação ambiental, como

é o caso da região do Guarituba. Essa região concentra a área de maior pobre-

za no município, abrigando atualmente mais de 42.000 pessoas, contingente

significativamente superior ao total da população urbana em 2000, bem como,

o bairro é mais populoso que a maioria dos municípios paranaenses (HARDT;

HARDT, 2007; TESSEROLLI, 2008).

Salienta-se que, uma parceria entre os governos federal, estadual e muni-

cipal realizou na região do Guarituba, um dos maiores processos de regulari-

zação fundiária do Brasil com realocação de famílias de áreas impróprias para

habitação, construção de habitações populares, saneamento básico, drenagem,

pavimentação, entre outros (TESSEROLLI, 2008). Além desse bairro hoje estar

com outro aspecto em termos socioambientais, a prefeitura está presente no

local através de uma unidade administrativa9 para atender a população da

região.

Outro aspecto relevante desse aumento populacional no município foi a

valorização mobiliária da capital Curitiba que ao crescer e se modernizar mo-

tivou um contingente populacional a ‘orbitar’ no seu entorno próximo bus-

cando áreas de baixo valor comercial, o que na maioria das vezes significava

áreas de interesse ou risco ambiental, poupadas pelo mercado imobiliário

formal ou com proibição de atividades, especialmente o uso habitacional, por

parte do poder público. Dessa forma, formaram-se grandes e precários bol-

sões urbanos, sem qualquer infraestrutura de serviços como coleta de lixo ou

esgoto, degradando o meio ambiente e contaminando o solo (SZUCHMAN;

OBA; HARDT, 2006, [n.p.]).

O contexto da dimensão de volume dos mananciais no território de Pira-

quara é muito significativo, pois, 93% do seu território são considerados áreas

de manancial, formadas por cinco bacias que produzem água para a RMC e,

principalmente, para Curitiba, cuja população é de mais de 1,7 milhão de pes-

soas. Na RMC são consumidos 7.200 litros de água por segundo e Piraquara

sozinha fornece 3.200 litros por segundo, ou seja, praticamente a metade da

água consumida (Clavisso apud LOPES, 2007). Dessa forma, o município busca

alternativas que promovam o desenvolvimento sustentável, e, entre essas, o

turismo vem sendo seriamente considerado e desenvolvido.

Um outro fator que pesa negativamente no desenvolvimento econômico

do município é a proximidade de Curitiba que de certa forma prejudica o co-

mércio local, aliado a características de cidade-dormitório (TESSEROLLI,

2008).

9 Inaugurada em 25 de junho de 2016.

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No que concerne ao orçamento público municipal, quando se compara a

estimativa de receitas de Piraquara com alguns municípios da RMC que pos-

suem uma população equivalente, percebe-se que a restrição legal para o de-

senvolvimento imposta pelos mananciais onera significativamente Piraquara.

O município de Araucária por exemplo, possui orçamento cerca de dez vezes

maior, sendo um município fortemente industrializado e produtor de efluen-

tes líquidos potencialmente poluidores dos corpos hídricos; o município de

Pinhais que foi desmembrado de Piraquara na década de 1980 tem orçamento

cerca de três vezes maior, e possui em seu território empresas potencialmente

poluidoras (Clavisso, apud LOPES, 2007).

Apesar desse aspecto orçamentário, o município tem conseguido realizar

importantes investimentos e o fluxo de turismo no município vem aumentan-

do progressivamente. “Quase todo fim de semana, o município recebe ônibus

com turistas - a maioria procedente de Curitiba - que vem para conhecer nos-

sas belezas naturais e as trilhas ecológicas existentes.” (ZAITER, 2008 apud

ALVES, 2008). Esse fluxo crescente de turistas e visitantes, talvez seja motiva-

do pela fuga do stress e do caos urbano que impera no cotidiano das grandes

cidades, pressionando cada vez mais as pessoas a buscarem paraísos ecológi-

cos como Piraquara.

Nesse pensamento, Ruschmann (2001) afirma que a degeneração da qua-

lidade de vida nos grandes conglomerados urbanos e seu impacto psicológico

aliado a busca pelo verde, incentivam as viagens de férias e de fins de semana.

A paisagem captada pelo turista quando visita o município de Piraquara,

que fica na sua lembrança, de acordo com Zaiter (2008) apud Alves (2008),

“são as montanhas e a presença da água que é abundante; a região possui

atualmente três trilhas ecológicas catalogadas que recebem fluxo constante de

visitantes”. Portanto percebe-se que a imagem que marca a região é definida.

Nesse sentido, Boullón (2002, p. 80) cita que:

A melhor forma de determinarmos um espaço turístico é recorrermos ao mé-todo empírico, por meio do qual podemos observar a distribuição territorial dos atrativos turísticos e do empreendimento, a fim de detectarmos os agru-pamentos e as concentrações que saltam à vista.

O patrimônio histórico e cultural é outro importante atrativo de Piraqua-

ra, pois a cidade congrega a única colonização de trentino-tiroleses do Paraná

que chegaram em 1878, no município com 59 famílias totalizando 300 pesso-

as, que formaram a Colônia Imperial Santa Maria do Novo Tirol da Boca da

Serra (PIRAQUARA, 2016).

O turismo étnico também se destaca. Foi criada em 2007 a reserva indí-

gena Aldeia Araçaí que estabelece uma área em Piraquara como reserva indí-

gena municipal. A aldeia é composta por cerca de 90 índios da tribo Guarani

que mantém tradições e rituais vividos pelos ancestrais, como a prática de

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caça e pesca, e os rituais de danças e cura de doentes. Os 40 hectares de terra

da aldeia ficam às margens da barragem do Piraquara I (ALVES, 2008).

De fato, a conjuntura da riqueza principalmente do patrimônio natural e

histórico-cultural de Piraquara impressiona e se constitui no grande atrativo

turístico (Figura 5).

Figura 5 – Imagens de alguns atrativos turísticos de Piraquara

Fonte: Tesserolli (2008, p. 34).

Entretanto, o município carece de equipamentos e serviços turísticos que

são “o conjunto de edificações, instalações e serviços indispensáveis ao desen-

volvimento da atividade turística; são constituídos pelos meios de hospeda-

gem, alimentação, entretenimento, agenciamento, informações e outros servi-

ços voltados para o atendimento aos turistas” (OLIVEIRA, 2002, p. 66).

De fato, o município ainda tem um longo caminho a percorrer nesse con-

texto; sublinha-se que ainda não tem um planejamento turístico, existindo

apenas um inventário turístico10. Não obstante, os poucos equipamentos exis-

tentes, esses em geral têm boa qualidade, o que permite iniciar um planeja-

mento turístico para adequar a demanda a infraestrutura local.

Diante do exposto, pode-se afirmar o turismo no município depende pra-

ticamente das suas belezas naturais que enchem os olhos dos visitantes e dos

turistas como por exemplo, a Serra da Baitaca, uma unidade de conservação

com 3.053,21 hectares que tem como finalidade garantir a conservação da

10 Elaborado na gestão municipal 2001-2004.

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diversidade biológica. No período de 2007 a 2012 houve crescimento expres-

sivo de visitantes, com uma variação de 29,7% (PARANÁ, 2014).

Os turistas e visitantes utilizam como ponto de referência o Centro de In-

formações Turísticas (CIT), inaugurado em 2006. A percepção do autor desse

artigo11 é que o município vivencia um clima de otimismo e a administração

pública e os empresários locais ligados ao turismo vêm realizando alguns

esforços que começam a surtir efeito. O município desde os anos 2010 está

também na rota do enoturismo – baseado na apreciação dos vinhos, da cultura

e tradições dos locais onde a bebida é produzida – haja vista, que “[...] um au-

dacioso e inovador projeto... [...] A Cave Colinas de Pedra é um empreendimen-

to com características únicas, que abriga em um mesmo local a exuberância da

mata atlântica, parte da história da centenária estrada de ferro Curiti-

ba/Paranaguá, além de boa gastronomia e degustação de vinho espumante.”

(PIRAQUARA, 2015, [n.p]).

Em termos de eventos, a Festa do Carneiro no Rolete tornou-se uma das

mais conhecidas em toda a região e a Festa Trentina relembra a história da

imigração. A cidade também fortaleceu o polo gastronômico nas proximidades

da antiga estação de trem no centro (PIRAQUARA, 2016).

Figura 6 – Interior do trem de luxo

Fonte: Serra Verde Express (2016).

Aliás, quando se fala em trem, este está fortemente ligado ao turismo no

município. A operadora “Serra Verde Express”12 oferece um passeio periódico

de Litorina, saindo de Curitiba com destino a Piraquara para um jantar típico

11 O autor é residente e domiciliado no município de Piraquara desde 2008. 12 A Serra Verde Express detém a concessão do trem de passageiros no trecho Paranaguá - Curitiba.

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no restaurante franco-italiano “Obra Prima”. Além disso, Piraquara está na

rota do primeiro trem de turismo de luxo do Brasil (figura 6), o que traz re-

cursos e gera empregos em localidades onde o trem para, pois incrementa a

economia do turismo trazendo ganhos ao comércio local.

Nos últimos oito anos a administração pública municipal vem adotando

uma postura de priorizar obras e políticas públicas que visem o desenvolvi-

mento econômico local e o bem-estar social. Isso reflete indiretamente na

atividade turística do município, haja vista, que antes de ser bom para o turis-

ta, a cidade deve ser proporcionar uma vida saudável para seus cidadãos.

Importante salientar que a cidade já conta desde 2006 com um Conselho Mu-

nicipal de Meio Ambiente, Agricultura e Turismo (COMATUR), sendo a ques-

tão ambiental o grande diferencial do município.

Nesse sentido, entre as várias obras realizadas nos últimos anos, cabe

destacar a construção do Teatro Municipal e do Parque das Águas com espaço

para lazer e esportes, pista de caminhada, lâmina d’água, palco para apresen-

tações e paisagismo. Além disso, o principal acesso da capital para o municí-

pio, a rodovia PR-415 está sendo duplicado o que certamente ajudará no de-

senvolvimento da cidade, dado que com maior facilidade de acesso, haverá um

aumento do fluxo de visitantes proveniente da Grande Curitiba, fomentando a

economia e o turismo.

A fim de se analisar como o Turismo é visto pela administração pública,

fez-se uma apreciação da Lei Orgânica Municipal (LOM) e do Plano Diretor

Municipal (PDM) que juntos constituem o arcabouço legal do município de

Piraquara.

A lei orgânica do município de Piraquara13 no capítulo V, prevê medidas e

leis capazes de instrumentalizar sobre o meio ambiente (PIRAQUARA, 1990).

Considerando-se que o turismo, como qualquer outra atividade, pode ameaçar

a ordem pública, inclusive, podendo se tornar uma atividade abusiva e preju-

dicial à comunidade, a LOM pode prever medidas que regulem essa atividade.

No entanto, destaca-se que até o presente momento, a LOM não prevê nenhum

dispositivo que fiscalize e assegure o desenvolvimento e as possíveis implica-

ções do turismo.

No que tange ao Plano Diretor Municipal, Piraquara o elaborou em parce-

ria com a Companhia de Saneamento do Paraná (Sanepar), documento que foi

amplamente discutido com a comunidade em 12 reuniões e, posteriormente,

aprovado pela Câmara de Vereadores (AEN, 2004). O Plano Diretor entrou em

vigor em outubro de 2006 e norteará a gestão do município pelos próximos 30

anos.

Nesse contexto, Alves (2008) destaca que, segundo a Constituição Fede-

ral e o Estatuto da Cidade, o Plano Diretor é o instrumento básico de política

13 Lei promulgada em 05 de abril de 1990. Disponível em:

<http://www.camarapiraquara.pr.gov.br/imagens/downloads/c9f0f895fb98ab9159f51fd0297e236d.pdf>

.

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urbana. Ademais, o PDM é fundamental para que haja um balanço legal apon-

tando os limites na relação dinâmica entre o desenvolvimento turístico sus-

tentável, o meio ambiente e o crescimento econômico necessário.

Fazendo-se uma análise dos principais trechos do PDM que abordam o

Turismo, destaca-se o seguinte:

A finalidade do PDM que está expressa no art. 6 é o incentivo ao

turismo rural e ecológico no Município, também definida no art.

47, inciso IV;

No art. 8, inciso VIII, está descrito que o objetivo é dinamizar o

turismo ecológico-rural a partir do aproveitamento da estrutura

existente no que concerne ao patrimônio histórico, cultural e de

recursos naturais tendo por metas como:

a) reforçar os elementos identificadores e diferenciadores do Mu-

nicípio que tenham ou possam vir a ter potencial turístico;

b) implantar equipamentos de infraestrutura turística;

c) estimular a construção da cidadania e o compromisso do cidadão

com a sua cidade;

d) adotar práticas de comunicação social que evidenciem os atrati-

vos turísticos do Município.

O Turismo é considerado como área estratégica para o desenvol-

vimento econômico e social do município, conforme expresso no

art. 29, que é específico sobre o turismo como fator desenvolvi-

mento econômico;

O art. 24 estabelece diretrizes de desenvolvimento econômico

via integração entre o Poder Público, a sociedade civil e o setor

privado;

O art. 67 prevê implantação de áreas de lazer e de apoio ao tu-

rismo nos vazios urbanos.

Posto isso, observou-se que o município cumpriu com alguns compro-

missos firmados no Plano Diretor, notadamente, através de medidas compen-

satórias promovidas pela Sanepar, decorrentes de um termo de compromisso

para promover algumas obras de caráter indenizatórias em função da inunda-

ção de área no município para a construção da Barragem Piraquara II inaugu-

rada em 29 de setembro de 200814. Do total investido na obra da barragem, R$

5 milhões foram destinados para aplicação em 12 ações compensatórias para

o município, as quais se destacam (AEN, 2006, grifos nosso):

a) Plano Diretor do município o qual visa planejar o crescimento

sustentável;

b) Três trilhas no Parque Marumbi com objetivo de incrementar

o turismo ecológico foram executadas obras de recuperação e

14 A obra contou com investimentos na ordem de R$ 74 milhões, tem capacidade para reservar 21

milhões de metros cúbicos de água. A barragem tem 17 metros de altura, 670 metros de comprimento, e

exigiu, para a construção do aterro, 364 mil metros cúbicos de terra compactada (SANEPAR, 2008a).

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manejo das trilhas dos mananciais da serra. Foram projetadas

dentro de conceitos modernos para utilização e manutenção sus-

tentável das trilhas ecológicas e possuem três categorias de es-

forço físico - fácil (trilha Chaminé/dois mil metros); médio (Salto

da Caixa/1.200 metros); moderado a difícil (Morro do Ca-

nal/1.600 metros); c) Salão de Eventos da Colônia Santa Maria, local tradicional-

mente conhecido por abrigar a Festa do Carneiro, realizada anu-

almente em junho que foi totalmente remodelado;

d) Casa de Guarda e o Centro de Visitantes do Instituto Ambi-

ental do Paraná (IAP) localizados na Unidade de Conservação

do Instituto Ambiental na Floresta Metropolitana, visitado por

professores e estudantes da região.

e) Instalação do Centro de Informações Turísticas na antiga Es-

tação Ferroviária de Piraquara para divulgação do turismo;

f) Placas indicativas turísticas: No total, 50 totens orientativos e

placas de sinalização do Caminho Trentino foram instalados em

toda a bacia do Rio Piraquara, onde orientam e divulgam os di-

versos produtos e seus produtores da região.

g) Cooperativa Trento Transforma: construção de uma “Vila

Agroecológica” que funciona dentro de padrões ambientalmente

corretos, ou seja, vai permitir que os produtores desenvolvam

diversas atividades permitidas pela legislação numa área de pro-

teção ambiental. O trabalho recebe apoio e assistência técnica do

Instituto Paranaense de Assistência Técnica e Extensão Rural

(Emater) e da Prefeitura de Piraquara, e é fiscalizado pelo IAP. O

complexo é equipado com abatedouro de pequeno porte para

caprinos, ovinos, suínos e peixes; uma unidade de produção

agroartesanal, outra para produção de mel; vinícola de pequeno

porte; unidade de laticínios e processamento de produtos de ori-

gem animal. Estima-se que 200 produtores rurais da região da

Bacia do Piraquara são beneficiados diretamente, e indiretamen-

te os cerca de 100 mil habitantes do município.

h) Reforma da Igreja Colônia Santa Maria - Polo Turístico Cul-

tural e Histórico desenvolvido na Colônia Santa Maria do

Novo Tirol: igreja instalada no século XIX tem imagens trazidas

da região do Trento, da Itália.

i) Dois portais instalados na PR-415, portais que identificam o

município como “A Capital da Água”.

Findando essa parte, fica patente que quando existe bom senso, as parce-

rias são producentes. Nota-se, no entanto, que os investimentos devem tam-

bém se ater a parte de talento humano tão necessária para uma gestão qualifi-

cada que faça jus aos recursos públicos empregados.

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RESULTADOS E DISCUSSÕES DA PERCEPÇÃO DA SOCIEDADE EM RELAÇÃO AO TURISMO

Com base na pesquisa realizada, pode-se afirmar que para a sociedade

piraquarense o turismo é um fator relevante para o desenvolvimento do mu-

nicípio. Porém, para se ter o turismo de fato como importante gerador de ri-

quezas no município, será necessário que novos projetos reforcem as caracte-

rísticas singulares da região. Para que isso aconteça, o município deve elabo-

rar um Plano Municipal de Desenvolvimento Sustentável do Turismo, e isso foi

ratificado na sua pesquisa por 100% da amostra qualitativa da sociedade pi-

raquarense (ALVES, 2008).

Com isso, se desenvolverá um turismo profissional que certamente atrai-

rá para a região, os segmentos de público que valoriza os atrativos e as rique-

zas que o município possui, isto é, o “verde” e a água em abundância. Assim,

esses turistas não hesitarão em deixar seus recursos, que entrarão na econo-

mia da cidade girando a roda do desenvolvimento local quando perceberem

uma cidade dotada de valores históricos, artísticos e culturais expressivos, e

possuidora de qualidade de vida expressiva. Junte-se a isso um clima de mon-

tanha e belezas naturais que favorecem atividades de contemplação e intera-

ção com a natureza, e existirá então um município em harmonia com o visitan-

te. Esse é o cenário que deve ser buscado por Piraquara.

Também é importante pontuar a falta de equipamentos turísticos que

continua a ser um problema sério, muito embora, algumas iniciativas isoladas

por parte de alguns empresários sejam louváveis. Nesse aspecto, cabe ao em-

presário capitanear essa questão, e não apenas esperar inciativas do poder

público, pois, empresário que não corre riscos, não deve permanecer no mer-

cado. Correr riscos é inerente a atividade empresarial e empreendedora, as-

sim como, o lucro também o é.

Nesse contexto, 94,1% da amostra da sociedade piraquarense acham que

em termos de estrutura turística, o município tem como destaque apenas os

bons atrativos turísticos naturais, mas, como é sabido, o turismo não se de-

senvolve apenas com belezas naturais (ALVES, 2008).

Assim, ficou patente que a falta de infraestrutura turística é crucial para o

desenvolvimento do turismo, notadamente a hospedagem que para 88,2%

dos entrevistados a qualificam como ruim e 11,8% regular. Outro destaque

negativo foi a gastronomia, que 70,6% reputam como regular, 17,6% ruim e

apenas 11,8% boa. Por consequência, o atendimento ao turista no que con-

cerne a mão-de-obra especializada, 64,7% dos entrevistados julgam ser ruim e

29,4% regular. Chama a atenção também a conservação do patrimônio his-

tórico-cultural, que para 56, 3% é qualificada como ruim e 31,3% a conside-

ram regular (ALVES, 2008).

Respeitante ao enunciado acima, pode-se dizer que Piraquara ainda não é

um produto turístico, ou seja, o que nasce da oferta turística – aquela que tem

seus elementos de atrativos (naturais e culturais) – combinado a uma estrutu-

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ra de utilidade pública e geral e serviços turísticos. Sem essa combinação e

sem a interação de seus agentes, os elementos que formam o produto turístico

passam a não ter o mesmo valor para o Turismo.

Conclui-se afirmando, que a percepção que a sociedade do município de

Piraquara tem acerca da importância do turismo é alta, porém, a atividade

turística ainda é incipiente em termos de receita proveniente da sua cadeia

produtiva.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Através das pesquisas realizadas foi possível chegar a alguns resultados

relevantes que permitem concluir que as políticas públicas do município vol-

tadas para o turismo são bem formuladas e suficientes para o desenvolvimen-

to da atividade turística.

Contudo, é visível que falta em nosso entendimento, um melhor planeja-

mento dessas políticas públicas, as quais deveriam estar contidas em um Pla-

nejamento Turístico que se integre aos demais documentos normatizadores

existentes em outras áreas como a Lei Orgânica e o Plano Diretor, haja vista,

que o Plano Diretor do município em estudo identifica e analisa as caracterís-

ticas físicas e espaciais da cidade, as atividades turísticas predominantes, as

vocações turísticas e as potencialidades para o bom desenvolvimento do tu-

rismo. Nesse pensamento, crê-se que a falta de um modelo de desenvolvimen-

to turístico no município não possibilita que esta cidade alcance uma maior

competitividade no turismo regional, pois, esse planejamento reuniria propos-

tas em âmbito macro que norteariam o processo de desenvolvimento susten-

tável do turismo no município.

Por fim, destaca-se que o turismo no município vem se desenvolvendo –

embora ainda de maneira tímida – em parte devido a ações empreendedoras

de alguns empresários, e por outro lado, em razão de alguns esforços envida-

dos pelo poder público municipal para fomentar a atividade turística e princi-

palmente realizando ações pontuais em diversas outras áreas que beneficiam

diretamente os moradores da cidade e indiretamente favorecem o turista.

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153

VALORIZAÇÃO DA TERRA NA REGIÃO OESTE

DO PARANÁ: AINDA VALE A PENA INVESTIR

EM TERRAS NA REGIÃO?

Guilherme Asai1

Moacir Piffer2

INTRODUÇÃO

Com a consolidação de áreas de agricultura como aconteceu na região sul

do Brasil nas décadas de 1950 e 1960 e no centro-oeste em meados de 1990,

abre-se espaço para novas fronteiras agrícolas como a região do MAPITOBA

(área compreendida entre os estados do Maranhão, Piauí, Tocantins e Bahia).

A vantagem em se investir nas novas áreas de fronteira agrícola advém

desde o baixo valor na compra de terras até sua possível valorização. Gurgel e

Asai (2014) concluíram que as terras em novas fronteiras agrícolas, como o

MAPITOBA, vê atraindo a instalação de empresas do agronegócio, ocasionan-

do uma valorização rápida dessas áreas.

Tal fato pode ser explicado pela teoria da oferta e demanda. Segundo Va-

rian (2006) preço de um determinado bem está no equilíbrio entre a quanti-

dade ofertada e a quantidade demandada, sendo no equilíbrio a quantidade

demandada é igual à ofertada, no mercado de terras está máxima também é

válida.

Para um investidor, a diversificação de investimentos apontada por

Markowitz (1952) na moderna teoria de portfólios, descreve a diversificação

de investimentos através de títulos que proporcionam um máximo de retorno

esperado associada à diminuição do risco. Aliado a esta teoria, Marcus, Bodie,

e Kane (2000) indicam o ouro e os imóveis fornecem proteção da hiperinfla-

ção, com vantagem para os imóveis no longo prazo. Sayad (1977) alerta que o

investimento em terras apresenta uma fonte alternativa de ganhos, o processo

produtivo.

Outros autores como Sayad (1977), Reydon e Plata (2000), Dias, Vieira e

Amaral (2001) e Rahal (2003) apontam a valorização da terra como parte do

1 Aluno de doutorado em Desenvolvimento Regional e Agronegócio da Universidade Estadual do Oeste

do Paraná – Unioeste/Toledo. 2 Professor do doutorado em Desenvolvimento Regional e Agronegócio da Universidade Estadual do

Oeste do Paraná – Unioeste/Toledo.

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154

processo ligado as atividades agropecuárias, ou seja, o preço das terras é in-

fluenciado pela atividade ligada a ela, mais do que a teoria econômica.

Ferro e Castro (2013) concluem que as o preço da terra está diretamente

relacionado à renda que se pode obter dela, onde o preço da soja indica a ren-

da obtida da terra para todas as regiões pesquisadas pelos autores. Relacio-

nando as áreas consolidadas com as áreas de fronteira, Ferro e Castro (2013)

indicam que existe uma maior possibilidade de especulação devido ao maior

potencial de crescimento, entretanto as áreas consolidadas ainda apresenta

valorização positiva dependendo da quantidade ofertada em cada região.

Dentro desse contexto, as áreas onde a agricultura é uma atividade con-

solidada devem ter uma taxa de valorização inferior às áreas de fronteira,

contudo, será que os investimentos em terras nessas áreas ainda podem ser

rentáveis?

Este trabalho tem o objetivo de apontar a oscilação no valor das terras na

Região Oeste do Paraná (ROP) observando se houve valorização nos preços e

indicar se o investimento em terras na região ainda é rentável em uma área

agrícola já consolidada. Adicionalmente, pretende-se avaliar o risco desse

investimento, apontando o risco-retorno das terras na região e em qual (is)

município (s) da ROP apresenta maior rentabilidade com menor risco.

O presente trabalho está dividido em cinco partes, incluindo esta de in-

trodução. A segunda parte irá apresentar de forma breve a ROP, a terceira irá

descrever os dados e a metodologia empregada no trabalho, a quarta parte

tratará dos resultados obtidos e a última será dedicada as considerações fi-

nais.

1 REGIÃO OESTE DO PARANÁ

No período compreendido entre 1950 e 1960, a ROP sofreu um cresci-

mento populacional advindo de um processo migratório para setor rural, dife-

rentemente do que ocorria no restante do país, dado que a expansão da pro-

dução era baseada na incorporação de novas terras (WILLERS, LIMA, STADU-

TO, 2008).

Com o passar dos anos e o advindo da tecnologia empregada na agricul-

tura, a ROP tornou-se destaque na produção agropecuária. Para Lima et al.

(2006), o estado do Paraná apresentou um perfil de uso de solo para as lavou-

ras temporárias e pastagens naturais no período de 1975 a 1995.

Até 1970 a estrutura fundiária da ROP estava em expansão porque ainda

existiam terras para serem ocupadas, esgotando-se cinco anos depois, em

1975, tornando a agricultura mais intensiva. Evoluindo na estrutura fundiária

da região, em 1999, 36,36% do total das terras estavam em mãos dos mini e

pequenos produtores (propriedades até 10 hectares) e 59,99% eram proprie-

dade de médios produtores (de 10 a 100 hectares), indicando uma concentra-

ção de terras e criação de latifúndios (RIPPEL et al., 2006).

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155

Por se tratar da última fronteira do Paraná a ser ocupada, Alves et al.

(2007) apontam que a atividade agrícola na ROP expandiu-se rapidamente na

década de 1980, com o surgimento e crescimento de agroindústrias e coopera-

tivas. Para Lima, Eberhardt e Barros (2011), de 1999 a 2005, municípios do

ROP tinham suas economias voltadas para o setor primário.

Tanto Rippel et al. (2006), quanto Alves et al. (2007) apontam que a po-

pulação da região é urbanizada nos polos de Toledo, Cascavel e Foz do Iguaçu,

mas as modificações do perfil da população nas últimas décadas não se faz

possível a caracterização como região agrícola.

Desta forma, a ROP apresenta uma distribuição de população tanto na

faixa rural, quanto na urbana e apresenta uma concentração de terras para os

médios proprietários, com ênfase no plantio de lavouras temporárias como

grãos, tendo estas terras agricultáveis como objeto desde estudo.

2 METODOLOGIA

O trabalho apresenta caráter quantitativo com dados secundários obti-

dos junto ao Departamento de Economia Rural (Deral) da Secretaria de Estado

da Agricultura e do Abastecimento (SEAB) do Estado do Paraná. Estes dados

são relativos aos preços médios de terras agrícolas municipais, onde foi extra-

ído o conjunto de dados relativos aos municípios do ROP no período de 1998 a

2015.

Para expurgar o efeito inflacionário no período compreendido de análise,

os preços médios das terras foram deflacionados – base 2015 – utilizando o

Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) do Instituto Brasileiro

de Geografia e Estatística (IBGE).

Para analisar os retornos obtidos no investimento com as terras na ROP,

no período analisado, a técnica adotada neste trabalho será o cálculo do Com-

pound Anual Growth Rate (CAGR). Trata-se de uma medida de crescimento

geométrica constante, ou seja, o CAGR calcula uma taxa de retorno uniforme

anual do período considerado.

O Compound Anual Growth Rate pode ser considerado como uma média

anual da taxa de retorno de um investimento e é calculado seguindo a Equação

(1).

𝐶𝐴𝐺𝑅 = (𝑉𝑎𝑙𝑜𝑟𝐷𝑎𝑡𝑎 𝑓𝑖𝑛𝑎𝑙

𝑉𝑎𝑙𝑜𝑟𝐷𝑎𝑡𝑎 𝑖𝑛𝑖𝑐𝑖𝑎𝑙)

(1

𝑛)

− 1

(1)

Como forma de se mensurar o risco implícito no investimento em terras,

irá se adotar a volatilidade como medida de risco, assim a volatilidade dos

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156

preços das terras indicará o quão arriscado seria o investimento em terras em

determinando município. O uso da volatilidade representa a variação no preço

do ativo ao longo do tempo, cuja maior volatilidade indica maio risco.

Logo, a volatilidade é mensurada de acordo com a Equação (2):

𝜎 = √1

𝑛−1∑ (ui − ū)2𝑛

𝑖=1

(2)3

Tanto a volatilidade, quando o CAGR, são indicativos históricos e podem

não representar o comportamento do preço de terras no futuro, isto se deve a

diversos fatores, como o acaso, por exemplo, que podem ocasionar distúrbios

e alterações no cenário impedindo o comportamento natural e previsível no

valor das terras.

Vale ressaltar que neste trabalho não considerou custos, taxas e impos-

tos, entre outros que podem interferir na valorização do imóvel. Ainda não

foram considerados ganhos provenientes do uso da terra, como o lucro em

plantações e criações de animais. Portanto, a valorização considerada foi so-

mente aquela da própria valorização temporal da terra.

4 A VALORIZAÇÃO DA TERRA NA ROP

O encerramento da fase de fronteira agrícola da ROP que, segundo Alves

et al. (2006), aconteceu em 1980. A consolidação da região fez com que Lima

et al. (2006) e Lima et al. (2011) indicassem a ROP como um importante polo

de desenvolvimento econômico.

Dentro desse contexto, torna-se natural a valorização das terras, tanto

agrícolas como urbanas dessa região. De acordo com o Gráfico 1, todos os 50

municípios que compõe a ROP tiveram valorização real no preço de suas ter-

ras. Destaca-se os municípios de Guaraniaçu, Diamante do Sul, Diamante

D'Oeste, Lindoeste e Iguatu com valorizações acima dos dez por cento ao ano

dentro do período analisado.

O Gráfico 1 ilustra a valorização individual de todos os municípios da Re-

gião Oeste do Paraná.

3 Em que: 𝑢𝑖 = ln (

𝑆𝑖

𝑆𝑖−1); i intervalo de tempo (i = 0, 1, 2, ... ,n); S é o preço do ativo; n + 1 = número de

observações.

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157

Gráfico 1. Valorização (CAGR) do preço das terras dos municípios da Região Oeste do Paraná.

Fonte: elaboração própria.

Com uma média de valorização, por município, superior a 7,5% ao ano a

ROP demonstra que os investimentos em terras agrícolas ainda podem ser

rentáveis para a região. Em termos de preços médios das terras agrícolas, o

aumento de preços foi significativo, passando de R$ 9.519 por hectare em

1998 para R$ 33.466 por hectare em 2015, representando um crescimento de

mais de 250%.

5,16%5,29%5,43%5,52%5,54%5,75%5,79%5,88%5,94%5,95%6,17%6,31%6,32%6,33%6,46%6,55%6,61%6,67%6,68%6,70%6,74%6,77%6,78%6,88%6,91%6,94%7,00%7,02%7,16%7,29%7,49%7,57%

8,10%8,13%8,34%8,39%

8,83%9,04%9,05%9,05%9,12%9,34%9,49%9,65%9,91%10,04%10,15%

10,61%11,21%11,29%

0,00% 2,00% 4,00% 6,00% 8,00% 10,00% 12,00%

Marechal Cândido Rondon

Jesuítas

Matelândia

Pato Bragado

Assis Chateaubriand

Terra Roxa

Cafelândia

Nova Santa Rosa

Itaipulândia

Ramilândia

Cascavel

Ouro Verde do Oeste

Serranópolis do Iguaçu

Santa Terezinha de Itaipu

Mercedes

Corbélia

Catanduvas

Missal

Três Barras do Paraná

São José das Palmeiras

Capitão Leônidas Marques

Santa Lúcia

Anahy

Diamante do Sul

Lindoeste

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158

O Gráfico 2 ilustra os padrões médios de preço na região.

Gráfico 2. Nível médio de preço das terras dos municípios da Região Oeste do Paraná.

Fonte: elaboração própria.

Segregando os municípios em microrregiões, a microrregião de Toledo

foi a que obteve menor valorização no valor de suas terras com um CAGR mé-

dio dos municípios de 6,57% ao ano. Já a microrregião de Cascavel foi a que

obteve a maior valorização média, com 8,85% ao ano, enquanto a microrregi-

ão de Foz do Iguaçu apresentou valorização de 7,1% ao ano no período de

1998 a 2015.

Nota-se que dos municípios que tiveram maiores taxas de valorização de

suas terras agrícolas, a exceção de Diamante D'Oeste, todos estão localizados

na microrregião de Cascavel, denotando a melhor performance da microrregi-

ão de Cascavel região frente às outras.

Ao que se refere ao risco, à dinâmica se altera e a microrregião de Toledo

é a que tem menor risco em se investir em terras, baseado na volatilidade de

seus preços. A microrregião de Toledo teve menor volatilidade com 19,53%

de oscilação, enquanto a microrregião de Cascavel a maior volatilidade com

22,82%.

A Tabela 1 indica os retornos e os riscos de cada microrregião.

Observando os resultados da taxa de retorno e do risco, a máxima de

“quanto maior o risco, maior o retorno” é observada nos investimentos com

terras na Região Oeste do Paraná. As microrregiões que obtiveram maiores

retornos, também tiveram maiores riscos nos preços das terras.

Dado o efeito nulo da inflação no período analisado, as performances al-

cançadas com a valorização da terra apresentaram-se, no período de 1998 a

2015, formas de investimento com taxa real superiores a 6,5% anual.

9.519

33.466

1998 2015

Valores médios

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159

Tabela 1- Risco e retorno para cada microrregião da ROP

Microrregião Taxa de retorno

(CAGR)

Risco (volati-

lidade)

Toledo 6,57% 19,53%

Cascavel 8,85% 22,83%

Foz do Iguaçu 7,10% 21,21%

Fonte: elaboração própria.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O objetivo deste trabalho foi apontar a oscilação no valor das terras na

Região Oeste do Paraná para verificar se houve valorização nos preços e aferir

se o investimento em terras na região ainda é rentável em uma área agrícola

consolidada.

Conforme comentado por Ferro e Castro (2013) o potencial de valoriza-

ção nas áreas de fronteira agrícola tornam-se maiores do que em áreas conso-

lidadas, fato indicado no estudo de Gurgel e Asai (2014).

Neste ponto, o presente estudo indica que as áreas agrícolas consolida-

das da ROP tiveram valorização positiva e, quando dada à possibilidade de

investimento, tiveram valorização real média para as microrregiões – de Cas-

cavel, Toledo e Foz do Iguaçu – de mais de 7% ao ano no período de 1998 a

2015, indicando ganhos sucessivos no período analisado.

Assim, mesmo passada a fase de fronteira agrícola da região que se en-

cerrou nos anos de 1980 é possível afirmar que, para a ROP, os investimentos

em terras ainda são rentáveis e possibilitam ganhos reais, além da preserva-

ção do patrimônio.

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160

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161

ECONOMIA CRIATIVA E MERCADO DE

TRABALHO: UMA ABORDAGEM

INTRODUTÓRIA TENDO O MATO GROSSO DO

SUL COMO REFERÊNCIA1

Fabrício A. Deffacci2

Leoncio E. dos Santos Junior3

Weronica D. Adamowski4

Rafael Moreno5

INTRODUÇÃO

A capacidade produtiva está relacionada diretamente ao desenvolvimen-

to do capital humano. A existência das forças produtivas depende, mesmo

frente da tecnologia, da capacidade humana de executar as tarefas. Segundo

Florida (2011, p. 4), “[...] a força motriz é a ascensão da criatividade humana

como agente central na economia e a vida em sociedade”. As tecnologias, seu

uso e criação, foram baseados em extensões do conhecimento humano.

Essa mudança conceitual fomentou a busca por novas soluções para a

criação/geração de emprego e renda. O Estado, como queria Keynes (1996),

não teve condições de inserir toda a mão de obra efetiva no mercado de traba-

lho. As políticas públicas não foram suficientes para suprir as demandas. Con-

comitantemente as mudanças conceituais, o avanço das tecnologias a partir da

década de 1950, transformaram a sociedade pós-industrial (HARVEY, 1999).

Diante disso, os conceitos de Economia Criativa podem contribuir na inovação

no mercado de trabalho. Segundo o Ministério da Cultura do Brasil, os setores

criativos são aqueles cujas atividades produtivas têm como processo principal

1Pesquisa prévia, realizada com apoio da Fundação de apoio ao Desenvolvimento do Ensino, ciência e

tecnologia do Estado de Mato Grosso do Sul. 2 Doutor em Ciências Sociais, docente do Programa de Pós-graduação em Desenvolvimento Regional e

Sistemas Produtivos da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul. 3 Mestrando do Programa de Pós-graduação em Desenvolvimento Regional e Sistemas Produtivos da

Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul. 4Mestranda do Programa de Pós-graduação em Desenvolvimento Regional e Sistemas Produtivos da

Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul. 5 Mestrando do Programa de Pós-graduação em Desenvolvimento Regional e Sistemas Produtivos da

Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul.

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162

um ato criativo gerador de um produto, bem ou serviço, cuja dimensão simbó-

lica é determinante do seu valor, resultando em produção de riqueza cultural,

econômica e social (MIC, 2011). Mas como definir as áreas? Segundo A Confe-

rência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento - UNCTAD

(2010) podem ser assim caracterizados os diversos setores da Economia Cria-

tiva (Figura 1).

Figura 1 – Classificação dos Setores Criativos.

Fonte: UNCTAD (2010).

OBJETIVOS E PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

O presente texto tem o objetivo de identificar no mercado de trabalho de

Mato Grosso do Sul o índice de participação na Economia Criativa, no período

de 2004 a 2013. Com isso, pretende-se uma visualização ampla destes núme-

ros contribuindo de forma significativa no crescimento dos Estados. Neste

trabalho introdutório, evidenciam-se as questões com autores que tratam

sobre o referido tema. Posteriormente, a representação deste mercado de

trabalho ficara demonstrada em pesquisa a ser realizada nos órgãos públicos

e instituições privadas que permitem aos leitores identificar as pesquisas já

existentes sobre Economia Criativa. Identificou-se que no Mato Grosso do Sul

os trabalhadores empregados em funções denominadas no conceito de Eco-

nomia Criativa representam 1% do mercado de trabalho nacional. Outro dado

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163

a ser considerado exemplifica o índice relativo ao nível salarial, de acordo com

o qual o Estado também fica abaixo da média. A construção da pesquisa se deu

por meio de dados primários (bibliográficos). Posteriormente foram usados

dados secundários com o suporte da metodologia quantitativa. Na conclusão

são feitas as discussões dos resultados obtidos, averiguando no Estado de

Mato Grosso do Sul em comparativo aos demais Estados, um crescimento

inferior, todavia possibilitando identificar nestes resultados novas perspecti-

vas para a Economia Criativa, com sugestões e indicativos para o seu cresci-

mento.

ANÁLISE E RESULTADOS

A importância de diagnosticar e demonstrar os números servirá de fo-

mento não apenas ao aprofundamento de novas pesquisas, utilizando outras

variáveis, mas também, utilizar os resultados como ferramentas de incentivo a

projetos de políticas públicas e de iniciativa privada.

No primeiro gráfico aborda-se a realidade do Brasil com relação a Eco-

nomia Criativa e participação desta no PIB nacional (Gráfico 1).

Gráfico 1- PIB Criativo Estimado no Brasil, comparado ao PIB total

Fonte: Fonte: Sistema Firjan – Mapeamento da Indústria Criativa no Brasil – 2014.

O primeiro gráfico ajuda a entender a evolução contínua na Economia

Criativa no Brasil. Em uma década, saiu de uma representação de 2,09% do

PIB nacional para 2,60%. Se considerado de forma empírica que o PIB nacio-

2,09

2,2

2,26

2,21

2,37

2,38

2,46

2,49

2,55

2,6

0 0,5 1 1,5 2 2,5 3

2004

2005

2006

2007

2008

2009

2010

2011

2012

2013

PIB Criativo Estimado e sua participação no PIB total Brasileiro 2004 - 2013

Participação PIB total BR Linear (Participação PIB total BR)

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164

nal também manteve um crescimento continuo, os resultados serão maiores.

No entanto, pela quantidade de profissões que abrangem a Economia Criativa,

verificamos um potencial que futuramente poderá ser explorado.

Gráfico 2- representa a participação da Economia Criativa nos Estados.

Fonte: Sistema Firjan – Mapeamento da Industria Criativa no Brasil – 2014.

No entanto, de forma a delimitar a pesquisa, podemos indicar a realidade

de Mato Grosso do Sul com os 05 (cinco) Estados da nação com maior repre-

sentatividade. No comparativo com o Estado de São Paulo que em 2004, 2%

de sua mão de obra empregada representava os profissionais da Economia

Criativa. O aumento para 2,5% em 2013 deve também ser interpretado.

2

1,8

1,5

1,6

1,4

0,9

2,5

2,3

2

1,9

1,7

1

0 0,5 1 1,5 2 2,5 3

SP

RJ

SC

RS

DF

MS

Participação dos Empregados Criativos no total de empregados no Estado de 2004 e 2013

2013 2004 Linear (2013)

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165

Gráfico 3- Remuneração média mensal no setor criativo

Fonte: Sistema Firjan – Mapeamento da Industria Criativa no Brasil – 2014.

O Gráfico 3 evidencia a disparidade de Mato Grosso do Sul com os Esta-

dos comparados. Mesmo com o crescimento remuneratório no período estu-

dado, a diferença para o Estado de Rio de Janeiro que está em primeiro lugar

na pesquisa, está em mais de 100%.

Após um breve levantamento, foi possível identificar a disparidade entre

os Estados pesquisados. Mato Grosso do Sul, em todos os quesitos, está com

uma diferença elevada no comparativo.

REFERÊNCIAS

FIRJAN. Mapeamento da indústria criativa no Brasil, 2014. Disponível em

http://www.firjan.com.br/EconomiaCriativa/pages/default.aspxAcesso em:

14/09/2016.

FLORIDA, R. A ascensão da classe criativa e seu papel na transformação do trabalho, do

lazer, da comunidade e do cotidiano. Porto Alegre: L&PM Editores, 2011.

HARVEY, D. Condição Pós-Moderna. São Paulo: Editora Loyola, 2007.

6.348,00

5.307,00

4.956,00

4.234,00

3.464,00

2.504,00

8.682,00

6.925,00

5.851,00

5.240,00

5.127,00

3.437,00

0,00 1.000,002.000,003.000,004.000,005.000,006.000,007.000,008.000,009.000,0010.000,00

RJ

DF

SP

AM

SE

MS

Remuneração

Títu

lo d

o E

ixo

Remuneração média mensal dos Profissionais Criativos, por Estado

2013 2004

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166

KEYNES, J. M. A teoria geral do Emprego, do Juro e da Moeda. São Paulo: Editora Nova

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MIC - MINISTÉRIO DA CULTURA. Plano da Secretaria da Economia Criativa: políticas.

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Report 2010: creative economy– a feasible development option. Geneva: United Na-

tion, 2010. Disponível em: http://unctad.org/pt/docs/ditctab20103_pt.pdf. Acesso

em: 10/09/2016.

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167

QUEREMOS INVESTIR EM ARMAZENAGEM DE

GRÃOS? ESTUDO COM PRODUTORES RURAIS

DE PONTA PORÃ/MS1

Igor Lopes Pereira2

Francis Regis G.M. Barbosa3

Thiago Quinhones4

Carlos Otávio Zamberlan5

INTRODUÇÃO

A agricultura, segundo Santos (2009), é definida como a arte de cultivar a

terra. Arte essa decorrente da ação do homem sobre o processo produtivo à

procura da satisfação de suas necessidades básicas. A agricultura é fundamen-

tal para a sobrevivência do ser humano e ao longo dos anos houve um intenso

aperfeiçoamento no setor fazendo com que novas tecnologias fossem aplica-

das junto à produção o que auxiliou no crescimento, não só da produção, mas

da produtividade. Esse fato contribui para pensar a agricultura dentro de um

sistema nada simples, que envolve vários atores e serviços dentro de uma

complexa cadeia de produção, repleta de atividades relacionadas com aspec-

tos de agregação de valor ao produto oriundo do campo. Dentro desse proces-

so se encontra a gestão logística e dentro dela a atividade de armazenamento.

A capacidade estática de armazenamento de grãos no Brasil compreende cer-

ca de 15,1% nas propriedades rurais (CONAB, 2005), ou seja, de tudo o que e

produzido em grãos apenas esse percentual indicado tem a possibilidade de

ser estocado em sistemas de armazenamentos de grãos, o restante da produ-

ção é escoado no momento da safra.

1 Pesquisa financiada com recursos provenientes do CNPq (edital universal/2013)

2 Acadêmico de Curso de Graduação em Administração da UEMS/Unidade de Ponta Porã.

[email protected] 3 Mestre em Agronegócios pela UFGD e Professor do Curso de Ciências Econômicas da UEMS e-mail:

[email protected] 4 Bacharel em Administração pela UEMS/ Unidade de Ponta Porã, Aluno Especial do PPGDRS. E-mail

[email protected] 5 Doutor em Economia pela UFRGS e Professor do Mestrado em Desenvolvimento Regional e de

Sistemas Produtivos da UEMS_PPGDRS/UEMS e-mail: [email protected]

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168

OBJETIVOS E PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

O Armazenamento na propriedade rural é importante para dar vazão ao

sistema logístico, pois possibilita a manutenção do produto, a comercialização

em períodos propícios, onde o preço é mais elevado, e o transporte com me-

nor custo em virtude da oferta, por não coincidir com períodos de safra. Por-

tanto o mote é identificar a propensão de investimentos em sistemas de arma-

zenagem a nível de propriedade rural pelos produtores de soja filiados ao

sindicato rural de Ponta Porã/MS.

Para alcançar esse objetivo fez-se uso de uma pesquisa descritiva e de le-

vantamento com uma amostra de 51 produtores de uma população de 84

sojicultores filiados ao sindicato rural de Ponta Porã/MS. A amostra foi aleató-

ria onde se aplicou um questionário com questões fechadas em escalas nomi-

nais e intervalares que permitiram uma análise descritiva com análise de ten-

dência central e por frequência. A coleta de dados se deu pela técnica de en-

trevista. O questionário foi dividido em três blocos, o primeiro para identificar

a propriedade rural, o segundo para identificar o produtor rural e, por fim, o

terceiro para ver a propensão ao investimento em sistemas de armazenagem

de grãos. A análise foi através da estatística descritiva com ênfase em tendên-

cia central auxiliada pelo programa IBM SPSS 23.

ANÁLISE E RESULTADOS

Os 51 produtores analisados possuem unidades de produção com média

de 854,35 hectares, tendo como moda 700 hectares. Em relação a propriedade

das terras, em média 486,66 hectares são terras arrendadas, frente aos 854,35

ha. plantados.

A produtividade mínima relatada foi de 50 sacos de soja por hectare e a

máxima de 66 sacos por hectare. Com relação aos maquinários, 92% dos pro-

dutores possuem maquinário próprio. Quanto ao sistema logístico, 27,45%

dos produtores entrevistados possuem sistema de armazenagem própria,

indicando que os filiados ao Sindicato Rural de Ponta Porã/MS se destacam

em relação ao padrão brasileiro, os demais se utilizam de sistemas de armaze-

namentos de grãos terceirizados. Ainda nota-se que 45% dos produtores são

ligados a cooperativas, e se utilizam delas para sanar essa deficiência logística,

pois depositam sua safra em seus sistemas de armazenagem. Ainda na logísti-

ca, 54% dos produtores rurais afirmaram terceirizarem o transporte. A dis-

tância média entre a unidade produtora e o sistema de armazenagem terceiri-

zado é de 14,27 km.

Com relação à venda do grão, os produtores comercializam 25,88% da

sua produção antes da colheita, 7,95% comercializam durante o período de

colheita e 66,17% dos grãos são comercializados após a safra.

Algumas variáveis analisadas foram correlacionadas, sendo uma delas,

possuir sistema de armazenagem vs tamanho da unidade produtiva, verificou-

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169

se que os produtores que possuem armazenagem própria cultivam áreas

iguais ou superiores a 600 hectares. A maior parte dos produtores que planta

acima de 1000 hectares possui armazenagem própria. No entanto, as duas

maiores áreas não possuem esses sistemas.

O estudo concluiu que os 51 produtores rurais entrevistados tem uma

percepção similar, quanto se diz respeito ao sistema de armazenagem, a nível

de propriedade rural

Com relação à estrutura de armazenagem/transporte obteve-se uma mé-

dia 4,76, em uma escala entre 0 a 10, ou seja, os produtores indicaram que

estrutura de armazenagem e transporte atual não é suficiente para atender a

demanda, um gargalo no sistema produtivo da cultura de soja e ocasiona mai-

ores custos, e consequentemente uma menor lucratividade para o produtor.

Quando se trata do investimento em sistema de armazenagem, em nível

de unidade produtiva, a média obtida foi 9,01 em uma escala de 0 a 10, indi-

cando que os produtores percebem a vantagem em investimentos em siste-

mas de armazenagens em suas propriedades. Quando indagados sobre a ideia

em investir, os produtores pretendem ampliar as estruturas de armazenagem

e aqueles com maior área plantada que ainda estão filiados à cooperativa indi-

caram vontade em efetuar investimento nesses sistemas.

Concluiu-se, a partir disso que existe propensão dos produtores a inves-

tir em sistema de armazenamento na unidade produtora, mas isso está relaci-

onado com a quantidade de hectares utilizados para o plantio da soja.

REFERÊNCIAS

COMPANHIA NACIONAL DE ABASTECIMENTO. CONAB, 2013. Série Histórica.

Disponível em < www.conab.br > (último acesso em: 03/08/2015).

SANTOS, G. J. Administração de custos na agropecuária. 4. Ed. – São Paulo: Atlas,

2009.

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171

A SUCESSÃO RURAL COMO FONTE DE

REPRODUÇÃO SOCIAL: ESTUDO NO

ASSENTAMENTO DORCELINA FOLADOR

Gianete Paola Butarelli1

Paulo Roberto da Silva2

Raquel EberhardBuss3

Carlos Otávio Zamberlan4

INTRODUÇÃO

Mato Grosso do Sul desde sua colonização teve exploradas as potenciali-

dades da agricultura e o direcionamento, ainda quando estado de Mato Gros-

so, a desenvolver a agricultura de grande porte na modalidade de extensos

latifúndios de terra (ALBANEZ, 2013).

Entretanto, a evidência do estado limita-se à esfera econômica do Agro-

negócio de exportação, de forma que as questões consideradas “menores”

continuam revestidas de invisibilidade perante parte da sociedade. Todavia,

Mato Grosso do Sul vem, ao longo dos últimos anos, desenvolvendo caracterís-

ticas importantes que possibilitam a inserção da agricultura familiar como

modalidade produtiva.

De acordo com Sangalli e Schlindwein (2013) a agricultura familiar exer-

ce uma função vital para promover o desenvolvimento regional, pois assegura

o acesso a políticas de crédito dentre outros benefícios. Segundo a FAO (2012)

a agricultura familiar auxilia a garantir a segurança alimentar da população

em âmbito local, regional e até mundial. Como as atividades são voltadas para

a produção de alimentos, recai sobre a categoria produtiva familiar a tarefa de

suprir a lacuna não desenvolvida pelo grande produtor rural.

1 Mestranda do Programa de pós-graduação em Desenvolvimento Regional e Sistemas Produtivos da

Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul, PPGDRS/UEMS. E-mail: [email protected] 2 Mestrando do Programa de pós-graduação em Desenvolvimento Regional e Sistemas Produtivos da

Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul, PPGDRS/UEMS. E-mail: [email protected] 3 Mestranda do Programa de pós-graduação em Desenvolvimento Regional e Sistemas Produtivos da

Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul, PPGDRS/UEMS. E-mail: [email protected] 4 Doutor em Economia e Professor do Mestrado em Desenvolvimento Regional e Sistemas Produtivos

da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul, PPGDRS/UEMS. E-mail: [email protected]

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172

As discussões acerca da agricultura familiar tomaram dimensão no esta-

do sobretudo a partir da política recente de distribuição de terras, com a ins-

talação da reforma agrária e o consequente estabelecimento de assentamen-

tos rurais. Essa nova modalidade de ordenamento do território passou a ser

considerada como um caminho capaz de induzir as interfaces social, ambien-

tal e econômica do desenvolvimento.

A partir dessas possibilidades contemporâneas surgem novas e desafia-

doras problemáticas a serem pesquisadas e discutidas. Em se tratando das

problemáticas existentes no âmbito da agricultura familiar merece destaque o

êxodo rural entre os jovens, questão que, segundo Abramovay (1998), deve

ser necessariamente considerada pelas regiões que pretendam o fortaleci-

mento desse modelo.

Para Weisheimer (2005) o êxodo rural entre os jovens se origina na invi-

sibilidade a eles imposta. Em movimento cíclico, da invisibilidade emerge a

migração que fortalece a invisibilidade, e deste modo o problema se sustenta.

Kummer e Colognese (2013), constataram que as pesquisas enfocadas na

juventude rural se debruçam exclusivamente sobre as dinâmicas de saída

(êxodo, migração) e permanência (sucessão, reprodução social) dos jovens no

meio rural. Entretanto, enquanto a dinâmica de saída é vastamente explorada

por pesquisadores, a de permanência se constitui como pontual lacuna na

produção científica.

OBJETIVO E PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

O objetivo deste trabalho é compreender a sucessão familiar entre os as-

sentados rurais com sucessores, a partir da perspectiva dos jovens que per-

manecem no meio rural. Foram enfocados como objeto de pesquisa as unida-

des familiares do assentamento Dorcelina Folador, município de Ponta Porã –

MS, que apresentam em sua composição familiar jovens de 14 a 29 anos. Tal

intervalo etário foi definido através da categorização estabelecida por Abra-

movay (1998) conjugada às disposições da Organização Mundial da Saúde

(OMS) que caracterizam “juventude” e “juventude rural”.

Para a consecução do objetivo foram coletados dados primários através

de entrevistas e aplicação de questionários aos representantes de estabeleci-

mentos rurais que, em primeira seleção, apresentaram a existência de jovens

em sua composição familiar. Posteriormente foram reunidas as informações

coletadas a campo, analisadas e interpretadas por meio de análises lexicais.

RESULTADOS E DISCUSSÕES

Constatou-se que 86% dos jovens rurais pesquisados consideram existir

diferenças entre o jovem urbano e o rural. Os aspectos recorrentes utilizados

pelos pesquisados nessa percepção foram: poucas oportunidades de estudo,

trabalho e lazer para o jovem rural, ao contrário das oportunidades assegura-

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das ao jovem urbano; inserção precoce do jovem rural no trabalho / trabalho

pesado.

Sobre as motivações existentes para que os jovens migrem em direção ao

meio urbano os pesquisados apontaram a falta de trabalho como o principal

aspecto que desencadeia a migração, seguido da busca por melhores condi-

ções de estudo.

Como fatores que motivaram a permanência dos entrevistados no meio

rural foram apontados de forma equilibrada a “tranquilidade/afinidades com

o campo” e a “família”. A população jovem pesquisada direcionou significativa

importância à família, fato que pode indicar um diferencial presente na estru-

tura social familiar dos jovens que almejam reproduzir o modo de vida rural.

Do total dos pesquisados 55% afirmaram ter projeto de vida possível de ser

realizado no assentamento rural. Pode-se considerar que os jovens que per-

manecem no assentamento gostam do campo, sobretudo pela tranquilidade

desse modo de vida, próximos à família, orientados por uma rotina de ritmo

próprio.

REFERÊNCIAS

ABRAMOVAY, R. et al. Juventude e agricultura familiar: desafios dos novos padrões

sucessórios. Brasília: UNESCO, 1998.

ALBANEZ, J. L. Ervais em queda: transformações no campo no extremo sul de mato grosso

(1940-1970). Dourados-MS: Ed. UFGD, 2013.

BRUMER, A. A problemática dos jovens rurais na pós-modernidade. In: CARNEIRO,

Maria José; CASTRO, E. G. (Orgs.). Juventude rural em perspectiva. Rio de Janei-

ro: Mauad X, 2007.

FAO - Organização das nações unidas para a alimentação e agricultura. Representação da

FAO no Brasil. O aumento populacional e os desafios da segurança alimentar: FAO

debate produção e demanda mundial por alimentos no Fórum SEBRAE de Conhe-

cimento. Brasília, 2012. Disponível em: www.fao.org.br/apdsa.asp com acesso em

29 junho 2016.

KUMMER, R; COLOGNESE, S. A. Juventude rural no Brasil: entre ficar e partir. Tempo

da ciência, volume 20, número 39, 2013.

SANGALLI, A. R; SCHLINDWEIN, M. M. A contribuição da agricultura familiar para o

desenvolvimento rural de Mato Grosso do Sul – Brasil. REDES, Santa Cruz do Sul,

v. 18, n. 3, p. 82-99, set./dez. 2013.

WEISHEIMER, N. Juventudes Rurais: mapa de estudos recentes. Brasília: MDA, 2005.

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ANÁLISE DO DESAMPARO DIGITAL NOS

ASSENTAMENTOS RURAIS E SEU DESSERVIÇO

AO DESENVOLVIMENTO REGIONAL1

Aline Robles Brito2

Carlos Otávio Zamberlan3

Edson Pereira de Souza4

Romildo Camargo Martins5

INTRODUÇÃO

O desenvolvimento de novas tecnologias que favorecem e agilizam o

acesso às informações revigora a necessidade de políticas públicas ou priva-

das voltadas a Inclusão Digital, sob pena de ocasionar um distanciamento

ainda maior das populações excluídas deste processo revolucionário que a

tecnologia propõe.

Se por um lado as Tecnologias Digitais da Informação e da Comunicação

(TDICs) têm provido uma série de transformações positivas em diversos seto-

res da sociedade, por outro, tem suscitado uma realidade social marcada por

novas formas de dominação, desigualdades e exclusões (GROSSI et al., 2013).

Nesta ótica, Assumpção e Mori (2006) reforçam que os programas de in-

clusão digital devem ser estabelecidos de forma que a tecnologia seja utilizada

na melhoria da qualidade de vida das pessoas, extrapolando o usual aprendi-

zado da informática. Os autores propõem o uso da tecnologia para solução de

problemas básicos percebidos na saúde, saneamento e meio ambiente; na

formação de redes cooperativas entre pessoas com o uso da tecnologia; na

produção e circulação de informações locais, como jornais e outros veículos de

comunicação comunitários; no registro e difusão da cultura local por meio das

tecnologias, entre outros.

De fato, há de se reconhecer a existência de políticas de inclusão digital,

desenvolvidas pela esfera federal (como o Projeto Inclusão Digital Rural –

1Projeto de pesquisa, apoiado pela FUNDECT. 2 Mestranda do PPGDRS – UEMS. E-mail: [email protected]

3Prof. Dr. em Economia – UEMS. E-mail: [email protected]

4 Mestrando do PPGDRS – UEMS. E-mail:[email protected] 5 Mestrando do PPGDRS – UEMS. E-mail:[email protected]

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176

SENAR), entretanto estas, em geral se apresentam pontuais e descontínuas. A

percepção de falha nesse processo esperta nova propositura, que objetiva

estabelecer o empoderamento do conhecimento (informação) como ferra-

menta de libertação, de estímulo a criatividade e a reflexão.

Dentro deste entendimento, o desenvolvimento de novas tecnologias

transforma o risco de um fracionamento digital em oportunidade, ao transfe-

rirem os benefícios da computação, da internet e das tecnologias relacionadas,

para todos os segmentos da população, até mesmo para aqueles que estejam

em desvantagem devido à educação, gênero, idade, etnia ou que vivem em

regiões remotas (como em aldeias e assentamentos rurais), ou seja, em áreas

geograficamente distantes dos centros urbanos (TAKARASHI, 2000).

Uma vez que a desigualdade social e a exclusão digital coexistam, e a se-

gunda amplia este desequilíbrio, exigem-se novas percepções e posturas, que

permitam então amenizar este quadro. A assimilação destas dicotomias digi-

tais e suas consequências induzem a diversos questionamentos: O uso das

Tecnologias Digitais da Informação e da Comunicação (TDICs) contribuiria

para o aprimoramento da capacidade criativa e reflexiva dos assentados?

Como o empoderamento consubstanciado através das TDICs poderia refletir

positivamente no cotidiano dos assentados? Quais as consequências da exclu-

são digital para o desenvolvimento social e econômico nos assentamentos

rurais?

OBJETIVOS E PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

No contexto questionador explanado anteriormente, tais indagações in-

duzem ao objetivo deste estudo, que pretende descrever as consequências

sociais e econômicas causadas pelo desamparo digital à população do Assen-

tamento Rural “Itamarati I”, localizado no município de Ponta Porã-MS.

Tratar-se-á de uma pesquisa descritiva, bibliográfica e de natureza explo-

ratória, onde os dados coletados, através da pesquisa de campo, serão anali-

sados em caráter quali-quantitativo.

RESULTADOS ESPERADOS

O desamparo digital é uma definição que faz analogia ao termo “exclusão

digital” e que pretende dar sinonímia a ausência de políticas públicas e de

iniciativas privadas de inclusão digital em assentamentos rurais. Por meio

desta definição pretende-se evidenciar o estado de abandono, além de incitar

novas discussões sobre o tema. Trata-se de um assunto relevante, pois a de-

mocratização do acesso às novas tecnologias pode consubstanciar em melho-

res condições de vida, aos residentes rurais.

As TDICs em conjunto com a rede mundial de computadores ou World

Wide Web – também conhecida WWW ou Web – tem ampliado o fluxo infor-

macional, estabelecendo novos patamares de interação e conectividade mun-

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dial, onde nesta “subordinação virtual” é quase inaceitável conjugar o verbo

“desconectar”. Aliás, as TDICs, têm-se infiltrado no cotidiano das pessoas e das

organizações. Tornando possível, por intermédio delas, realizar compras e

efetuar vendas, registrar e discutir opiniões, realizar negócios, fazer pesquisas

e buscar informações, entre outras atividades, sendo inúmeras as possibilida-

des.

Dessa forma, evidencia-se aqui que apesar da existência de programas de

inclusão digital por meio da iniciativa federal, os resultados ainda não são

perceptíveis no assentamento Itamarati I, especificamente, e é nesse sentido

que esta pesquisa se faz de suma importância, ao visar observar desde como

essa inclusão digital acontece e se acontece, caracterizando quais são as ex-

pectativas desta população rural frente às TDIC’s, além de identificar quais

seriam as consequências deste desamparo digital, e de que maneira as novas

tecnologias poderiam vir a contribuir para o desenvolvimento social destas

comunidades, compreendendo se haveria o interesse destas em participarem

dessa interação e inclusão tecnológica.

Os construtos da pesquisa serão formados com base nesses aspectos e

seriam direcionados para os assentados, visando analisar sob a percepção

deles acerca da realidade que vivenciam, descrevendo as consequências deste

desamparo digital e como a inclusão tecnológica pode favorecer o desenvol-

vimento regional, minimizando assim seus desserviços e as barreiras físicas

que os distanciam dos grandes centros.

Ademais, pretende-se ao final incitar novas discussões acerca deste as-

sunto, possibilitando o envolvimento dos agentes e dos atores locais, seja na

indicação de novas oportunidades de inclusão e/ou no aprimoramento daque-

las existentes, a luz dos resultados da pesquisa.

REFERÊNCIAS

GROSSI, M. G. R. Estudo das características de software e implementação de um sof-

tware livre para o sistema de gerenciamento de bibliotecas universitárias fede-

rais brasileiras. 2008. 253f. Tese (Doutorado em Ciência da Informação). Univer-

sidade Federal de Minas Gerais, Escola de Ciência da Informação, 2008.

MORI, Cristina; ASSUMPÇÃO, Rodrigo. Inclusão digital: discursos, práticas e um longo

caminho a percorrer. [S.l.; s.n.], 2006. Disponível em:

http://www.egov.ufsc.br/portal/sites/default/files/resumo_e-

desenvolvimento_pdf_final. Acesso em: 15set 2016.

TAKARASHI, T. Sociedade da informação no Brasil: Livro Verde. MCT, Brasília, 2000.

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179

ARANDUASSU DIGITAL: UNA PROPUESTA DE

INCLUSIÓN DIGITAL EN ÁREAS REMOTAS

Carlos Busón Buesa1

Carlos Octavio Zamberlan2

INTRODUCCIÓN

Si queremos plantear una propuesta educativa creíble, debemos de tener

en cuenta la íntima relación que existe entre el mundo del trabajo, la tecnolo-

gía y la educación, las tres variables están íntimamente relacionadas, depen-

diendo una de la otra, conocerlas permitirá definir mejor nuestros objetivos.

No es ningún secreto saber el motivo de la insistencia en desarrollar ob-

jetivos, recomendaciones, publicación de informes, y evaluaciones de orga-

nismos, como son la Unión Europea, la OCDE, el Banco Mundial, el Foro Eco-

nómico Mundial, la UNESCO, etc., que insisten en la necesidad de un cambio en

el modelo educativo vigente, adaptándolo a las nuevas necesidades de la so-

ciedad, se insiste en potenciar el desarrollo de competencias digitales, esto

está íntimamente relacionado con la “economía del conocimiento”.

Son necesarios trabajadores e profesionales preparados para esta nueva

economía. Esto requiere la adaptación de la educación a los nuevos modelos

económicos, lo que sin duda puede aumentar aún más la brecha entre países

ricos de los que están en vías desarrollo y aquellos que en este momento se

encuentran por debajo de los umbrales de pobreza. Así como generar dichas

brechas dentro de las sociedades desarrolladas, si los estudiantes no tienen

las oportunidades de beneficiarse de ella. La educación nunca es un gasto, es

una inversión, fundamental y estratégica, para el crecimiento económico, so-

cial y cultural de un país.

La llegada de la tecnología al medio educativo antes estaba limitada a una

cuestión de equipamiento, esto, en muchos casos ya no es un problema, se

disponen de los medios técnicos necesarios. Ahora, lo que es indispensable

desarrollar son los métodos para usar dichas tecnologías, el problema actual

ya no son los medios, es una cuestión de métodos de enseñanza, y para ello

hay que formar a los docentes. Echeverría (2000) propone la necesidad de

1 Doutor em educação e Comunicação pela UNED/Madri/Espanha, Pós-doutorando pelo

PPGDRS/UEMS E-mail: [email protected] 2 Doutor em Economia pela UFRGS e professor do Mestrado em Desenvolvimento Regional e de

Sistemas Produtivos - PPGDRS/UEMS. E-mail: [email protected]

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180

desarrollar políticas adaptadas a los nuevos entornos en los países desarrolla-

dos, sin olvidar de extenderlas a todas las naciones más desfavorecidas para

que reduzcan las brechas digitales y sociales entre los pueblos.

No dejamos de insistir que pese a todas las posibilidades tecnológicas,

debemos tener en cuenta que dicha tecnología no está disponible para todo el

alumnado y profesorado. La brecha digital existe, pero no debemos olvidar

que en nuestro mundo existen muchas más brechas, algunas muy profundas.

OBJETIVOS Y MÉTODOS

Desarrollamos un proyecto de inclusión digital “El ARANDUASSU DIGI-

TAL”, inspirándonos en los parámetros de la Agenda 2030, de desarrollo sos-

tenible de las Naciones Unidas, la educación de calidad y la reducción de

desigualdades. Decidimos adaptar nuestro proyecto de forma que permita

que permita desarrollar la inclusión digital en aquellas comunidades más

vulnerables. Como son, en nuestro caso, las aldeas indígenas, los asentamien-

tos rurales, así como las escuelas rurales, así como todos aquellos que se en-

cuentran desconectados de Internet por cuestiones de infraestructura tecno-

lógica. Es prioritario desarrollar proyectos de inclusión digital en todos los

entornos, sobre todo en aquellos menos favorecidos. Según el BANCO MUN-

DIAL (2015, 12) los pueblos indígenas no se han beneficiado en la misma me-

dida del aumento exponencial y la democratización de las nuevas tecnologías.

La brecha digital refuerza formas preexistentes de exclusión, pues el acceso a

nuevas tecnologías se ha convertido en un aspecto fundamental del capital

social en sociedades latinoamericanas cada vez más globalizadas.

Desde el PPGDRS3 de la UEMS4 con sede en Ponta Porã, había la inquietud

de desarrollar mecanismos de desarrollo local que pudieran incidir positiva-

mente en el crecimiento económico, social y cultural. Por todo ello se empezó

a gestar a finales de 2015 y 2016 un proyecto que abarcase todos estos ámbi-

tos.

Lo proyecto parte de crear un sistema modular de aprendizaje digital que

puede adaptarse y modificarse dependiendo de las necesidades. Seria imple-

mentado mediante facilitadores locales, en nuestro caso alumnos universita-

rios de dichas comunidades. Hemos optado por desarrollarlo íntegramente en

software libre. En un primer momento queremos llevar información digital

básica, fundamentalmente materiales de consulta como libros, enciclopedias y

otros materiales útiles en la educación. Los datos previos nos indican un esca-

so uso de libros en dichas comunidades, sobretodo por su alto coste y dificul-

tad en obtenerlos. Lo que dificulta la difusión del conocimiento. Optamos por

distribuir materiales libre y gratuitos como la Wikipedia, el Wikidicionario, la

3 Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Regional e de Sistemas Produtivos. 4 Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul

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181

biblioteca Gutemberg, entre otros, en un soporte offline sin necesidad de recu-

rrir a Internet.

ANÁLISIS Y RESULTADOS ESPERADOS

El proyecto pretende desarrollar una comunidad de aprendizaje. Las co-

munidades de aprendizaje son un término ampliamente utilizado en la comu-

nidad educativa, resultado de la colaboración entre entes y personas que per-

ciben el potencial de desarrollo mutuo. Para Torres5 (2001), una Comunidad

de Aprendizaje es una comunidad humana organizada que construye y se

involucra en un proyecto educativo y cultural propio, para educarse a sí mis-

ma lo que implica revisar la distinción convencional que existe entre escuela y

comunidad, así como entre educación formal, no-formal e informal, y los mo-

dos convencionales de ver y concretar las vinculaciones entre ellas.

Nuestro proyecto pretende asimismo desarrollar una investigación del

uso de dichos materiales, antes y después de la misma, para observar su acep-

tación, utilización, los puntos positivos, así como, las dificultades observadas

de forma que podamos desarrollar nuevas versiones mejor adaptadas a los

contextos que queremos llegar.

REFERENCIAS

BANCO MUNDIAL (2015, 12) Banco Mundial. 2015. Latinomérica Indígena en el Siglo

XXI. Washington, D.C.: Banco Mundial. Licencia: Creative Commons de Recono-

cimiento CC BY 3.0 IGO.

ECHEVERRÍA (2000) Derecho a la educación y sociedad globalizada por Javier Echever-

ría. - Consultado el 05-09-2016, en Internet

<http://www.oei.es/salactsi/entorno3.htm>

TORRES (2001) Documento presentado en el “Simposio Internacional sobre Comunidades

de Aprendizaje”, Barcelona Forum 2004, Barcelona, 5-6 Octubre 2001. - Consultado

el 05-09-2016, en Internet

< http://www.udlap.mx/rsu/pdf/1/RepensandoloEducativodesdeelDesarrolloLocal.pdf>

5 Documento presentado en el “Simposio Internacional sobre Comunidades de Aprendizaje”,

Barcelona Fórum 2004, Barcelona, 5-6 Octubre 2001. - Consultado el 20-11-2010, en

Internet<http://www.udlap.mx/rsu/pdf/1/RepensandoloEducativodesdeelDesarrolloLocal.pdf>

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183

ANÁLISE DOS RESULTADOS E METAS DO IDEB1

DA REDE PÚBLICA DO MUNICÍPIO DE PONTA

PORÃ/MS2

Juliana Faoro Gomes Brissov3

Carlos Otávio Zamberlan4

INTRODUÇÃO

Segundo Paulo Freire (1996) a educação é uma forma de intervenção no mundo” principalmente quanto às suas ideologias: o ser, o pensar, o agir, o viver em sociedade e a construção do saber. A dificuldade se verifica no estado em que se compreende no Brasil como forma ideológica de dominantes e do-minados. Como então avaliar a qualidade de ensino no Brasil a partir desses pensamentos? A oportunidade escolar é realmente para todos, como propõe o princípio das leis, diretrizes e bases (Lei 9394/96)5?

Para avaliar o saber/conteúdo, a qualidade educacional no Brasil aplica-se um exame padronizado bianualmente para os alunos do final de cada etapa de ensino (4ªsérie/5ºano, 8ªsérie/9º ano e 3ª série do ensino médio) em to-das as escolas, tanto públicas (federais, estaduais e municipais),como priva-das, a partir das disciplinas de Língua Portuguesa e Matemática, combinado à taxa de aprovação e permanência dos estudantes nas escolas durante este período, resultando no indicador de Índice de Desenvolvimento da Educação Básica – IDEB6. Por abranger amplas responsabilidades, a educação propõe o

1 Índice de Desenvolvimento da Educação Básica.

2 Projeto de Pesquisa apoiado pela Fundect. 3 Mestranda do Programa de Pós-graduação em Desenvolvimento Regional e Sistemas Produtivos -

PPGDRS pela Universidade Estadual do Mato Grosso do Sul – UEMS. 4 Doutor em Economia e professor, coordenador do Programa de Pós-graduação em Desenvolvimento

Regional e Sistemas Produtivos - PPGDRS pela Universidade Estadual do Mato Grosso do Sul – UEMS. E-mail: [email protected] 5 Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, decretada pelo Congresso Nacional e sancionada pelo

Presidente da República Fernando Henrique Cardozo que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. 6 “O Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) é o indicador objetivo para a verificação do

cumprimento das metas fixadas no Termo de Adesão ao Compromisso Todos pela Educação, eixo do Plano de Desenvolvimento da Educação que trata da educação básica. O Ideb será calculado e

divulgado periodicamente pelo Inep, a partir dos dados sobre aprovação escolar, obtidos no Censo

Escolar, e médias de desempenho nas avaliações do Inep, o Saeb – para as unidades da federação e para o país, e a Prova Brasil – para os municípios”.

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desenvolvimento quando conceituado numa dimensão multifuncional e inter-disciplinar na esfera social, política, econômica, humana e sustentável (SAN-TOS et al., 2012). Assim sendo, pode expandir ou limitar o conhecimento quando avaliado de forma interdisciplinar ou monodisciplinar, resultando no progresso ou deterioramento de toda uma sociedade.

OBJETIVOS E PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

O presente resumo pretende a partir do sistema avaliativo de educação entender as limitações e a integração do desenvolvimento regional analisando os resultados e metas divulgadas pelo IDEB no município de Ponta Porã, Mato Grosso do Sul. Os resultados divulgados pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira – INEP7referem-se aos dez últimos anos (2005 a 2015) e as metas projetadas até 2021, não foram observados os resultados e metas da 3ª série do ensino médio e da rede privada, pelo não fornecimento dos dados no site do INEP.

ANÁLISE E RESULTADOS

No município de Ponta Porã/MS, os resultados divulgados pelo IDEB abrangem a rede pública de ensino (federais, estaduais e municipais) nos anos iniciais (4ª série/5º ano) e anos finais (8ª série/9º ano) do ensino fundamen-tal.

Gráfico 1- Resultados do IDEB em Ponta Porã - 1

7 “O Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) é uma autarquia

federal vinculada ao Ministério da Educação (MEC), cuja missão é promover estudos, pesquisas e

avaliações sobre o Sistema Educacional Brasileiro com o objetivo de subsidiar a formulação e implementação de políticas públicas para a área educacional a partir de parâmetros de qualidade e

equidade, bem como produzir informações claras e confiáveis aos gestores, pesquisadores, educadores e

público em geral”.(INEP)

2005 2007 2009 2011 2013 2015 2017 2019 2021

Resultados 3,3 4 4,5 5 5,2 5,7

Metas 3,3 3,7 4,1 4,4 4,7 5 5,3 5,5

0

2

4

6

IDEB - Resultados e metas ponta porã/ms - anos iniciais

Resultados Metas

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Fonte: Dados organizados pelos autores com base no Instituto Nacional de Pesquisas Educacio-nais Anísio Teixeira (Inep)/ Ministério da Educação (MEC).

Observando o gráfico pode-se perceber uma tendência na melhora dos

resultados do indicador, sempre próximo e superior a meta estabelecida. En-

tão, pode-se concluir que há uma melhora da qualidade de ensino nas séries

iniciais, pois o último resultado em 2015 foi superior ao observado nos anos

anteriores.

Gráfico 1- Resultados do IDEB em Ponta Porã - 2

Fonte: Dados organizados pelos autores com base no Instituto Nacional de Pesquisas Educacio-nais Anísio Teixeira (Inep)/Ministério da Educação(MEC).

O gráfico acima mostra que nos anos finais, as metas foram projetadas

em 2007 com a média 3.1, e o resultado só foi superior a meta em 2007 e

2009. Já em 2011foi igual, mas em 2013 e 2015 os resultados foram pouco

inferiores à meta estabelecida. Com isso, constatou-se o declínio na qualidade

de ensino em relação ao que foi percebido nos anos iniciais.

Observa-se a decadência no nível do ensino fundamental dos anos finais

para os anos iniciais. Entretanto, segundo o INEP a média de países desenvol-

vidos é 6.0 esclarecendo que o Ensino Fundamental não atingiu a média, con-

cluindo que ainda se possui uma fraca educação na região. A partir desta rea-

lidade, para impulsionar o desenvolvimento local no município de Ponta Porã

no que tange a educação, os governantes e a comunidade escolar deverão

propor mudanças fundamentais nas políticas públicas de educação, realizando

uma análise aprofundada das questões locais, a fim de proporcionar o pro-

2005 2007 2009 2011 2013 2015 2017 2019 2021

Resultados 3,1 3,4 3,6 3,6 3,8 4,2

Metas 3,1 3,3 3,6 4 4,3 4,6 4,9 5,1

0

2

4

6

IDEB - Resultados e metas ponta porã/ms - anos finais

Resultados Metas

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186

gresso da região, uma vez que, a educação e o desenvolvimento são agentes

integradores e propulsores da emancipação democrática.

REFERÊNCIAS

BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Lei número 9394, 20 de de-

zembro de 1996. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9394.htm Acesso em:

14 de setembro de 2016.

FREIRE, P. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. São

Paulo: Paz e Terra, 1996.

INEP. Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira

http://portal.inep.gov.br/conheca-o-inep Acesso em: 15 de setembro de 2016.

SANTOS, E. L.; BRAGA, V.; SANTOS, R. S.; BRAGA, A. M. S. Desenvolvimento: um

conceito multidimensional. Desenvolvimento Regional em debate. Ano 2, n. 1, p.

44-61, jul. 2012.

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DINÂMICA ECONÔMICA E ESPACIAL DAS

EXPORTAÇÕES DE PRODUTOS DE BASE

FLORESTAL EM SANTA CATARINA. UMA ANÁLISE PARA O PERÍODO DE 2005 – 2014.

Ivo Raulino1

1. Introdução

As exportações constituem-se numa importante alternativa de cresci-

mento das empresas, evitando capacidade produtiva ociosa. Ao contrário do

que se supõe geralmente, não são as exportações que estimulam o crescimen-

to e o desenvolvimento, mas é o crescimento interno da economia que acaba

gerando excedentes exportáveis, cujos impactos serão observados nos muni-

cípios, pois é lá que geralmente encontramos as bases produtivas das empre-

sas. Neste sentido, ao discutir-se a dinâmica espacial e econômica das expor-

tações das empresas de base florestal, procurou-se verificar basicamente se as

modificações nas exportações, para mais ou para menos, deve-se basicamente

às variáveis macroeconômicas, como a taxa de câmbio, ou se há outros fatores

determinantes da competitividade externa, expressa nas exportações, que de

alguma forma estejam relacionados com atributos construídos pelas empre-

sas, e que de alguma forma estejam relacionados os municípios nos quais en-

contram-se inseridos.

2. Cadeia produtiva de base florestal

O Setor Florestal Brasileiro (SFB) é marcado por uma amplitude de in-

dústrias e de produtos, sendo composto, basicamente, por três cadeias produ-

tivas : da madeira industrial (papel e celulose e painéis de madeira constituí-

da), do processamento mecânico da madeira (serrados e compensados) e da

madeira para energia ( lenha, cavaco e carvão vegetal).

De todos os segmentos produtivos do SFB, o de celulose e papel tem mai-

or expressão, contribuindo de forma relevante para o desenvolvimento do

Brasil. A cadeia produtiva deste setor abrange as etapas de produção de ma-

deira, energia, papel e celulose, conversão em artefatos de papel e papelão,

1 Economista e Doutor em Geografia Econômica pela USP. Pesquisador vinculado

ao Instituto Ignácio Rangel. E-mail: [email protected].

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reciclagem de papel, produção gráfica e editorial, além de atividades de co-

mércio, distribuição e transporte.

O segmento de madeira reconstituída é composto por uma gama variada

de produtos, muito embora os mais conhecidos sejam o MDF (Medium Density

Fibreboard), o aglomerado, o OSB (Oriented Strand Board ) e as chapas de

fibras, destinados às fábricas de móveis, à construção civil, à fabricação de

outros produtos e à exportação. Já a indústria do processamento mecânico

corresponde às serrarias, às produtoras de lâminas para a indústria de com-

pensados, as de lâminas decorativas e as produtoras de Produtos de Maior

Valor Agregado ( PMVA). Dentre os principais PMVA produzidos no país, ain-

da que com foco no mercado externo, podem ser citados os blocks, blanks,

molduras, fence, pisos, janelas e outros, enquanto os voltados ao setor move-

leiro são principalmente os pré- cortados, componentes estruturais, EGP (

Edge Glued Panel) e outros.

A cadeia produtiva de base florestal catarinense, em 2015, representada

por 14.821 empresas, empregava 91.500 trabalhadores.

Figura Nº 01: Nº de empresas do setor florestal em SC por atividade em 2015.

Fonte: Anuário Estatístico de base florestal SC 2016.

Santa Catarina apresenta ampla variedade de empresas ligadas à indús-

tria de base florestal, as quais foram atraídas, em especial pela sua extensa

área e ampla distribuição do maciço florestal. O eixo central do Estado, repre-

sentado principalmente por Caçador e Lages, está entre as principais regiões

produtoras de serrado em SC, enquanto que Rio Negrinho e Canoinhas são

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destaque na produção de compensado, assim como Três Barras, Otacílio Costa

e Correia Pinto se destacam no segmento de celulose e papel.

Dentro do segmento da indústria madeireira, as atividades de serrarias

com o desdobro de madeira em tora, bem como a produção de artefatos de

madeira ( exceto móveis ) são as que possuíam em 2015 o maior número e

empresas ativas.

Já com relação ao número de empregos nas atividades industriais de base

florestal, SC responde por 14% dos postos de trabalho do setor florestal ma-

deireiro nacional. O setor é um importante empregador de mão de obra direta

e formal do Estado, contribuindo na geração de empregos que estão distribuí-

dos, na sua maioria, nas diferentes regiões e municípios catarinenses.

Figura Nº 02: Evolução do nº de empregos formais e diretos em SC no setor florestal por segmentos.

Fonte: Anuário Estatístico de base florestal SC 2016.

Entre 2006-2014, a taxa de crescimento anual do número de empregos

no setor em SC foi da ordem de 0,57% ao ano, alcançando neste último ano

92,6 mil postos de trabalho. Deste total em 2014, 32.106 ( 35%), estão con-

centrados nos seguintes municípios em ordem de importância : (1) Caçador;

(2) São Bento do Sul; (3) Lages; (4) Rio Negrinho; (5) Três Barras; (6) Santa

Cecília ; (7) Mafra; (8) Blumenau; (9) Canoinhas; e (10) Otacílio Costa.

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Figura Nº 03: Nº de empregos formais diretos em SC nos dez municípios mais expressivos.

Fonte: Anuário Estatístico de base florestal SC 2016.

A geração de empregos formais relativos à atividade de silvicultura (

produção florestal), está concentrada principalmente nos municípios de Caça-

dor e Lages. Já a indústria de Celulose e Papel concentra o maior número de

empregos nos municípios de Três Barras, Caçador, Otacílio Costa e Lages. A

indústria madeireira, por sua vez, está pulverizada no Estado, com concentra-

ção quanto ao maior número de empregos gerados nos municípios de Caça-

dor, Lages e Santa Cecília.

3. A dinâmica das exportações

Tabela Nº 01: Santa Catarina. Exportações de produtos de base florestal – 2005– 2014. Em US$ mil FOB.

Produto 2005 2007 2009 2011 2013 2014

Madeira e obras de

madeira

566.358 620.319 349.382 390.124 479.383 574.788

- Madeira serrada 87.470 91.806 58.203 76.118 68.199 101.746

-Madeira laminada 2.190 8.082 497 2.615 5.639 5.656

-Madeira perfilada 33.938 36.722 9.950 18.293 37.844 46.134

-Painéis madeira reconsti-

tuída

(MDF e aglomerado)

14.074 16.294 9.053 4.990 8.656 18.153

-Painéis madeira compen-

sada

129.918 144.916 95.973 91.652 117.667 123.770

- Molduras de madeira 18.642 11.369 10.613 13.516 25.825 33.835

- Caixas, engradados e

paletes

726 1.931 5.550 8.798 20.236 19.228

- Ferramentas, armações e

cabos

28.978 29.104 20.102 30.537 21.404 27.316

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- Portas, janelas, assoalhos

e obras de marcenaria e

carpintaria

199.671 233.166 122.283 126.410 146.018 152.969

- Outras madeiras e obras

de madeira

50.749 38.698 17.158 17.195 27.894 46.381

Papel e celulose 176.386 202.166 150.153 226.517 201.431 235.805

- Pasta de celulose e papel

sanitário

29.772 3.498 1.662 9.778 10.676 10.965

- Embalagens e pasta

“quate”

25.437 42.976 37.355 50.032 55.086 51.819

- Papel e cartão kraft,

kraftliner

116.627 148.109 111.120 163.551 130.601 167.310

- Outras pastas e papéis 4.549 7.293 16 ----- ----- 5.711

Móveis de madeira 415.314 342.486 240.680 187.895 173.951 190.878

- Móveis madeira p/

escritório

20.115 14.950 5.698 3.031 2.231 2.104

- Móveis de madeira p/

cozinha

15.241 24.659 13.718 9.270 7.665 8.705

- Móveis de madeira p/

quartos

171.965 130.063 106.964 94.698 90.063 107.103

- Outros móveis de madeira 170.711 140.098 90.921 62.735 58.946 58.633

- Componentes p/ móveis

de madeira

36.824 31.562 22.381 16.263 14.718 14.333

- Outros ----- 1.018 999 1.705 329 -----

Total Produtos Florestais 1.159.158 1.173.366 754.250 810.464 862.249 1.001.471

Fonte : Tabela elaborada pelo autor com base nos dados do MDIC.

Na tabela nº 01 apresenta-se as exportações de produtos de base flores-tal para o período 2005-2014.

De forma geral, observa-se três grandes grupos de produtos: madeira e obras de madeira, papel e celulose e móveis de madeira.

Considerando-se o período 2005-2014, constata-se uma queda de 13,5% nas exportações agregadas, passando de US$ 1.159.158 em 2005 para US$ 1.001.871 em 2014.

No entanto, ao considerar-se o comportamento dos três grandes grupos de produtos, observa-se comportamentos distintos. O grupo madeira e obras de madeira praticamente manteve em 2014 seu nível de exportações pratica-do em 2005. Já o grupo papel e celulose apresentou, no período em considera-ção, crescimento da ordem de 33,6%, ou seja, um crescimento médio anual da ordem de 3,3%, impulsionado basicamente pelas exportações de papel e car-tão kraft.

Por outro lado, o grupo móveis de madeira foi o que apresentou o pior resultado no período, passando de US$ 415.314 de exportações em 2005 para US$ 190.878 em 2014. Uma queda da ordem de 54,0%. Praticamente todos os tipos de móveis de madeira sofreram queda nas suas exportações.

Outra importante análise das exportações de produtos de base florestal pode ser realizada sob a perspectiva espacial das mesmas.

Embora em praticamente todo o Estado de Santa Catarina existam em-presas que utilizam a madeira como matéria prima, sabe-se que a cadeia pro-dutiva, envolvendo desde a produção de matéria prima (reflorestamentos), até a produção de artigos de base florestal, concentra-se basicamente no Pla-nalto Norte, região Serrana e parte da região do Contestado.

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Inicialmente cabe aqui uma importante observação. Ao discutir-se a di-nâmica espacial das exportações, considerar-se-á a participação dos municí-pios neste processo. Para tanto, selecionou-se os quinze municípios mais ex-pressivos em termos de exportações de produtos de base florestal.

Com efeito, do ponto de vista da dinâmica espacial, o período 2005 – 2014 apresentou mudanças significativas nas exportações.

Inicialmente constata-se que os mesmos praticamente mantiveram sua participação percentual ao longo do período em consideração, passando de 67,7% em 2005 para 71,7% em 2014, revelando significativo grau de concen-tração espacial.

No entanto, analisando-se cada município em particular, percebe-se, de imediato, algumas mudanças significativas.

Com efeito, a mudança mais expressiva ocorreu com o município de São Bento do Sul, que apresentou queda nas suas exportações da ordem de 60%, passando de US$ 216.211 mil em 2005 para US$ 87.893 mil em 2014, confor-me dados da tabela nº 02.

Ainda com relação à queda nas exportações, vale destacar os municípios de Canoinhas, com redução nas exportações da ordem de 57,0% e Rio Negri-nho, que reduziu suas exportações em 31,5%.

Por outro lado, dentre os municípios que apresentaram crescimento em suas exportações estão Campos Novos (265%), Três Barras (148%), Vargem Bonita (89%), Curitibanos (49%), e Salete (40%).

Essa mudança na dinâmica espacial encontra explicações basicamente no tipo de produto de base florestal exportado por cada município.

Tabela Nº 02: Exportações do complexo Agro florestal de SC por municípios – 2005 -2014. Em US$ Mil FOB.

Municípios Anos

2005 2007 2009 2011 2013 2014

São Bento do Sul 216.211 145.583 111.787 88.467 75.527 87.893

Caçador 113.664 105.370 74.362 95.461 125.387 129.282

Rio Negrinho 84.920 92.432 31.655 33.477 49.034 58.291

Otacílio Costa 79.856 105.821 64.268 96.078 86.841 87.064

Lages 55.304 50.727 38.386 41.654 53.955 50.018

Canoinhas 50.743 50.108 34.862 23.828 20.433 21.903

Santa Cecília 40.625 36.804 36.848 34.374 45.046 44.053

Mafra 27.238 30.607 23.805 20.518 19.854 20.412

Três Barras 24.274 27.532 25.742 28.265 29.306 60.283

Salete 16.000 15.937 10.733 11.846 16.846 22.326

Pouso Redondo 17.218 18.454 6.518 4.212 6.868 5.009

Campos Novos 10.569 22.196 21.251 39.777 34.206 33.948

Timbó Grande ----- ----- ----- 14.504 20.607 21.424

Curitibanos 37.589 31.187 19.001 26.335 25.251 55.993

Vargem Bonita 11.052 14.248 12.914 19.749 21.389 20.873

A – Total (1+2+..15) 785.263 747.006 512.132 578.545 630.550 718.772

B – Total de SC 1.159.158 1.173.366 754.250 810.464 862.249 1.001.871

Participação % A/B 67,7% 63,7% 67,9% 71,4% 73,1% 71,7%

Fonte : Tabela elaborada pelo autor com base nos dados do MDIC.

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193

No Planalto Norte de SC concentra-se cerca de 80% da produção de mó-

veis de madeira, em torno dos municípios de São Bento do Sul, Rio Negrinho,

Mafra e Campo Alegre.

Os municípios de São Bento do Sul e Rio Negrinho foram os que apresen-

taram as maiores quedas nas suas exportações. Em 2005, os dois municípios

respondiam por 63,6% de todas as exportações de móveis de madeira em

Santa Catarina, passando para algo em torno de 44,5% do total exportado pelo

Estado em 2014. Uma redução na participação sobre o total da ordem de vinte

pontos percentuais. No caso de São Bento do Sul, as alterações foram dramáti-

cas. Para que se tenha uma melhor compreensão do problema, em 2005, a

Industria Artefama, maior empresa exportadora de móveis do município, ex-

portou U$ 31.202 mil o que representava 14,5% do total de móveis exporta-

dos pelo município. Em 2015, a empresa praticamente não exporta mais, en-

contrando-se em recuperação judicial a partir do ano de 2012. O caso da Arte-

fama nos dá uma dimensão das consequências econômicas e sociais sobre

determinados setores da economia voltados basicamente ao setor externo,

quando são afetados por mudanças na política macroeconômica do Governo

Federal.

Por outro lado merece destaque o município de Caçador, que apresentou

crescimento nas exportações de móveis de madeira da ordem de 51%, pas-

sando de US$ 22.848 mil em 2005 para US$ 34.451 mil em 2014.

Considerando-se o total das exportações do complexo agroflorestal de

Caçador, percebe-se que o município apresentou ligeiro crescimento entre o

período 2005 – 2014 da ordem de 13,5%. Entre os anos de 2005 e 2009 apre-

sentou redução nas exportações totais, iniciando um movimento de recupera-

ção a partir do ano de 2010, chegando em 2014 com um volume de exporta-

ções da ordem de US$ 129.282 mil. Esse dinamismo exportador do município

deve-se ao fato de que o mesmo apresenta uma diversificação nas suas expor-

tações de produtos de base florestal, fruto de uma diversificação industrial

baseada no uso da madeira como matéria – prima.

Ao contrário de São Bento do Sul, Mafra, Rio Negrinho e Campo Alegre,

cujas exportações concentram-se basicamente nos móveis de madeira, Caça-

dor possui uma diversificação maior, que inclui móveis de madeira, portas e

janelas e molduras de madeira, além de papel e celulose.

Com relação às molduras, o município é o maior exportador nacional do

produto, com volume de US$ 21.703 mil em 2014.

Nas exportações de móveis de madeira, há em Caçador duas empresas,

que são a Temasa Ind. de Móveis Ltda e a Ind. de Móveis Rotta Ltda, que res-

pondem por 90% das exportações. Estas duas empresas têm sido responsá-

veis pela ascensão de Caçador como um novo centro produtor de móveis em

série. Já com relação às exportações de portas e janelas, o município expor-

tou, em 2014, US$ 55.685 mil , o que corresponde a 45% do total exportado

pelo Estado de Santa Catarina. Há em Caçador três grandes empresas expor-

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tando portas e janelas: a Frameport, a Adami Madeiras e a Sincol S/A. Vale

destacar que a Frameport exporta praticamente 100% de sua produção para

mercados na Europa, EUA e Ásia.

Também merecem destaque a ascensão dos municípios de Curitibanos e

Timbó Grande. O primeiro manteve seu ritmo nas exportações até 2013, ex-

portando neste ano algo em torno de vinte e cinco milhões de dólares de pro-

dutos como madeira serrada e cabos de madeira para ferramentas. Encon-

tram-se no município como principais exportadores a Malinski Madeiras Ltda,

a Madescur Ind. Com. Madeiras Ltda, a Madeiras Brocardo Ltda, a Madeiras

Marisol Ltda e a Latina Sul Madeiras Ltda. No entanto, a partir de 2014 o mu-

nicípio deu um salto nas suas exportações. Isso deve-se ao fato de que o muni-

cípio é sede da Berneck S/A, uma gigante do complexo agroflorestal, que pro-

duz MDF para o mercado interno e externo, e que começou a exportar a partir

de Santa Catarina. Inicialmente, em 2013, a empresa exportou algo em torno

de cinco milhões de dólares. Mas, em 2014 a empresa exportou cerca de trinta

milhões de dólares e em 2015 chegou a exportar quarenta e dois milhões de

dólares em MDF.

Já quanto ao desempenho de Timbó Grande, o município passou a expor-

tar a partir de 2010, de forma tímida, mas já em 2014 apresentou exportações

na casa de vinte milhões de dólares. Essa ascensão do município deve-se ao

fato de ser sede de uma filial da empresa Lavrasul S/A Compensados e Lami-

nados, que começou a exportar a partir de Timbó Grande em 2010. Isso justi-

fica em parte o declínio nas exportações de Canoinhas a partir de 2010. A sede

da Lavrasul S/A fica em Canoinhas e tudo leva a crer que a empresa decidiu

ampliar as suas exportações a partir de sua filial em Timbó Grande.

Também é importante destacar a participação de Santa Cecília nas expor-

tações de produtos de base florestal. Neste sentido, percebe-se de que o muni-

cípio conseguiu manter o seu nível de exportações no período em considera-

ção, apresentando basicamente dois produtos em sua pauta de exportações:

madeira compensada e móveis de madeira., O município é sede da Guararapes

Indústria de Compensados, que exportou em 2014 U$ 34.219 mil, o que cor-

responde a 77,6% de todas as exportações do município naquele ano. A em-

presa tem como destino no exterior basicamente o mercado americano, para o

qual fornece madeira compensada para o setor da construção civil.

Concluindo a análise da dinâmica espacial, cabe mencionar o desempe-

nho dos municípios de Campos novos, Vargem Bonita e Três Barras, ambas

sedes de grandes empresas de celulose e papel. Em Três Barras temos a Rige-

sa, que no período 2005-2014 ampliou em 162% as suas exportações. Em

Campos novos temos a Iguaçu Celulose e Papel, que no mesmo período tam-

bém ampliou as suas exportações, passando de modestos nove milhões de

dólares para mais de trinta milhões de dólares em 2014.

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195

Em Vargem Bonita está a sede da Irani Papel e Celulose, que no período

em consideração apresentou crescimento da ordem de 86% nas suas exporta-

ções.

Foram estas três grandes empresas, cuja produção é fortemente vertica-

lizada, as responsáveis pelo aumento das exportações de celulose e papel em

Santa Catarina, já que a outra grande empresa, que é a Klabin, manteve prati-

camente seu nível de exportações no período em consideração. A Klabin em

Santa Catarina exporta a partir de três municípios, onde mantém unidades

produtivas : Correia Pinto, Lages e Otacílio Costa. O desempenho exportador

das principais empresas de papel e celulose em Santa Catarina está na tabela

nº 03 abaixo.

Tabela Nº 03: Exportações de papel e celulose das principais empresas de SC. Em Mil US$ FOB.

Empresas Anos

2005 2007 2009 2010 2011 2012 2013 2014

Klabin 103.539 134.009 95.241 102.771 128.592 107.617 118.285 132.153

Irani 21.499 33.283 26.693 23.329 21.225 19.901 21.819 39.728

Iguaçú 9.206 19.857 19.739 26.787 38.617 33.461 31.646 30.750

Rigesa 15.182 18.016 16.869 20.935 21.600 12.663 14.504 39.912

Primo Tedesco

10.325 8.167 3.684 7.807 8.420 6.227 5.133 2.181

Totais 159.751 213.332 162.226 181.629 218.454 179.869 191.387 244.724

Fonte: Tabela elaborada pelo autor com base nos dados do MDIC.

A compreensão da dinâmica espacial das exportações passa pelo enten-

dimento acerca da dinâmica econômica . Nesse sentido, no Brasil, a partir de

meados dos anos 1990, inicia-se um processo de maior abertura comercial,

num contexto de avanço da globalização, o que acaba expondo de forma mais

intensa as empresas brasileiras à concorrência externa.

A Globalização, tratada por alguns autores como a mundialização do capi-

tal ( Chesnais,1996), ou como um estágio mais avançado do processo histórico

de internacionalização das economias ( Coutinho, 1992), tem provocado im-

portantes e rápidas mudanças econômicas e sociais, que afetam tanto as for-

mas concorrenciais, as estruturas produtivas, assim como os padrões de con-

sumo.

Para Gonçalves (1998), a globalização produtiva caracteriza-se por três

processos: avanço do processo de internacionalização da produção, acirra-

mento da concorrência internacional e uma maior integração entre as estrutu-

ras produtivas das economias nacionais.

Nessa mesma linha de raciocínio, Baumann (1996), destaca a convergên-

cia das características do processo produtivo nas diversas economias.

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Pressionado pelo avanço da globalização, a partir de janeiro de 1999, o

Governo brasileiro passa a adotar o regime de câmbio flutuante, o que faz com

que até 2002 houvesse uma forte desvalorização na taxa de câmbio. No entan-

to, a partir de 2004, já no governo Lula, começa a ocorrer uma constante e

gradual valorização nominal da taxa de câmbio, fenômeno que vai até 2011,

quando o dólar chegou ao patamar de R$ 1,88 ( gráfico 01).

Gráfico nº 01 : Taxa nominal de câmbio para o período 2001-2015.

Fonte: Elaborada pelo autor a partir de dados do BACEN.

O contexto dessa forte valorização do real frente ao dólar é marcado por

uma política de combate à inflação apoiada na taxa de câmbio, que se valoriza

como reflexo da política de juros elevados, que passou a atrair para o Brasil

um elevado fluxo financeiro, capital tipicamente especulativo , aplicado em

Bolsa de Valores e no sistema financeiro.

Os efeitos fazem se sentir sobre a balança comercial do país, com redução

nas exportações e aumento nas importações.

Do ponto de vista das exportações, sabe-se que a valorização do real fren-

te ao dólar provoca efeitos negativos sobre as exportações de várias empresas

dos mais diferentes setores da economia nacional. Neste sentido, os números

indicam que as exportações de produtos de base florestal não fogem à regra.

Se considerarmos as exportações de base florestal de Santa Catarina à

partir do ano de 2002, percebe-se que até 2006 houve aumento de 52,6%,

com notável crescimento médio da ordem de 10,5% ao ano nas exportações

de produtos florestais, com reflexos em toda a cadeia de base florestal. Não

por acaso é exatamente nesse período em que ocorrerá uma forte desvalori-

zação na taxa de câmbio, o que fez aumentar a competitividade externa das

empresas nacionais, incluídas aí as empresas catarinenses do setor.

2,32

3,53

2,892,65

2,34 2,141,77

2,34

1,74 1,67 1,88 2,042,34

2,65

3,91

0

1

2

3

4

5

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15

R$

/US$

ANOS

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197

No entanto, a partir de 2006 inicia-se no país um processo de apreciação

cambial, que irá afetar as exportações nacionais. Em Santa Catarina as expor-

tações de base florestal também foram afetadas, com impacto mais significati-

vo sobre as exportações de móveis de madeira e, com menor intensidade as

exportações de Madeira e obras de madeira.

A taxa de câmbio é um importante elemento da política comercial de um

país, na medida em que é através dela que as empresas nacionais irão se de-

frontar com seus concorrentes nos mais diferentes mercados externos. É tam-

bém um importante elemento de medida do grau de competitividade externa

das empresas nacionais no exterior. No entanto, não é o único elemento de-

terminante da competitividade externa.

De forma ampla, é preciso dizer de que a competitividade está ligada à

capacidade de competir, o que numa abordagem geral pode ser resultante de

vários fatores que permitem que os agentes tenham maiores chances de “ga-

nhar” o jogo econômico, mesmo que por um determinado período de tempo.

A grande diversidade de conceitos e abordagens sobre a competitividade

tem origem nas diferentes correntes teóricas que estão centrando esforços em

compreender o crescente aumento da competição capitalista.

A noção de competitividade depende da perspectiva em que a corrente

teórica vislumbra a competição. Neste sentido, as abordagens ligadas ao “ma-

instream”, que entendem a racionalidade econômica como a maximização de

uma função maximização como lucros, vendas ou crescimento, costumam

entender a competitividade como um resultado, uma relação “ex post”. As

empresas que apresentarem um melhor desempenho revelado são as que se

apresentam mais competitivas.

Por outro lado, as correntes ligadas ao enfoque neo-schumpeteriano, cos-

tumam entender a competitividade como algo dinâmico. As decisões tomadas

hoje, em ambiente de incerteza, poderão refletir em uma maior capacidade de

competir.

Kupfer (1991) detalha melhor esta divisão dos conceitos de competitivi-

dade:

i) competitividade como desempenho : nessa vertente, a competitividade é de alguma forma expressa na participação no mercado (“market-share”) alcan-çada por uma firma em um mercado em um momento do tempo [...]para os que advogam a versão desempenho, competitividade, como um fenômeno “ex-post”, é o resultado de um vasto conjunto de fatores, dentre os quais a eficiên-cia técnica produtiva é apenas um deles e nem sempre o mais importante. ii) competitividade como eficiência : nessa versão, busca- se de alguma forma traduzir a competitividade através da relação insumo produto praticada pela firma, i.e., na capacidade da empresa de converter insumos em produtos com o máximo de rendimento [...] para os que seguem a vertente “eficiência”, por sua vez, competitividade é um fenômeno “ex ante”, i.e., é um grau de capacita-ção detido pelas firmas, que se traduz nas técnicas por elas praticadas. O de-

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sempenho no mercado seria uma provável conseqüência [sic] da competitivi-dade e não sua expressão ( p. 262 – 264 ).

Por outro lado, de acordo com Possas (1996),

[...] se o “locus” da concorrência é, por definição, o mercado, seu agente é, na-turalmente, a empresa, mediante a formulação e execução de estratégias competitivas. No entanto, como competitividade pressupõe capacidade inova-tiva (“lato sensu”), as condições específicas (tecnológicas, produtivas e de mercado) da indústria considerada e do ambiente econômico num sentido mais amplo (externalidades físicas, sociais, técnico-científicas; condições insti-tucionais; aparato regulatório) são decisivas para que as empresas desenvol-vam seu potencial competitivo, naturalmente diferenciado e assimétrico ( p. 73).

O ponto de partida, portanto, é o estudo das estratégias adotadas pelas

empresas. Neste sentido, Possas (1999), entende que a busca pela vantagem

competitiva deve centrar-se em dois tipos de estratégias. São elas: vantagens

de custos e vantagens de diferenciação de produtos. Segundo a autora, a em-

presa deve escolher uma destas duas estratégias por ser muito difícil conse-

guir ganhos em todas as áreas.

As vantagens de custos têm as seguintes dimensões, segundo Possas

(1999): a) economias de escala; b) economia de escopo; c) capacidade de fi-

nanciamento da firma; d) patentes e licenciamento de tecnologia; e) relações

com fornecedores e(ou) garantia de matérias-primas; f) relações com a mão-

de-obra; g) organização da produção; h) eficiência administrativa e i) capaci-

tação.

Já as vantagens de diferenciação de produto são conseguidas com: a) es-

pecificação; b) desempenho ou confiabilidade; c) durabilidade; d) ergonomia e

“design”; e) estética; f) linhas de produto; g) custo de utilização do produto; h)

imagem e marca; i) formas de comercialização; j) assistência técnica e suporte

ao usuário; k) financiamento aos usuários e l) relações com usuários.

A firma, ao escolher sua estratégia básica, deve empreender ações dentro

destas dimensões para que consiga vantagens sobre as demais. As dimensões

têm caráter setorial, ou seja, para cada setor uma determinada dimensão tem

maior importância. Ao mesmo tempo, as dimensões da concorrência devem

ser analisadas dentro de uma perspectiva temporal. Estas dimensões, por sua

vez, tem caráter histórico:

[...] nunca é demais lembrar o caráter histórico do processo competitivo, tanto pelo surgimento de novas dimensões da concorrência e perda da importância de outras, como pelo fato de que esse processo só tem importância funda-mental numa sociedade capitalista como a nossa, que em principio não há por que julgar eterna (POSSAS, 1999, p. 98).

É o caráter temporal das dimensões da concorrência que faz dos autores

neoschumpeterianos apontarem a competitividade como um fator “ex-ante”.

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Por outro lado, Ferraz et al. (1997) propõe que a análise da competitivi-

dade deve ser centrada em três fatores principais. Estes fatores englobam

diversos aspectos que vão desde os internos às empresas até aqueles que se

referem à inter-relação do país com o mundo. Os fatores propostos são: a)

empresariais; b) estruturais; c) sistêmicos.

Nos fatores empresariais estão incluídos a idade e a produtividade do ca-

pital fixo, as técnicas de gestão e produção, as estratégias de “marketing” e

logística, pesquisa e desenvolvimento e treinamento de pessoal. São os fatores

empresariais que consideram as ações das empresas, enquanto, participantes

ativos do processo econômico. As decisões de uma empresa hoje a capacita

para poder auferir melhor desempenho no futuro, porém, sobre ambiente de

incerteza. Ou seja, somente posteriormente é que se saberá se as medidas

foram acertadas.

Os fatores estruturais são aqueles sobre os quais a capacidade de inter-

venção da empresa é limitada pela mediação do processo de concorrência,

estando por isso apenas parcialmente sobre sua área de influência. Desta for-

ma, o tamanho do mercado, o grau de integração da cadeia produtiva e o pro-

cesso de terceirização devem ser analisados como componentes dos fatores

estruturais. Porém, os fatores estruturais não são baseados apenas no padrão

de concorrência. Vê- se que já existem algumas externalidades com as quais as

empresas devem lidar. No entanto, estas externalidades podem sofrer alguma

influência por parte das empresas. Por exemplo, as exigências dos consumido-

res é algo totalmente externo às empresas, mas campanhas publicitárias po-

dem afetar positivamente esta externalidade.

Os fatores sistêmicos envolvem, por sua vez, os seguintes aspectos que

são totalmente externos às empresas: a) macroeconômicos; b) político institu-

cionais; c) legais -regulatórios; d) infraestruturais; e) sociais; e f) internacio-

nais. O aspecto macroeconômico apresenta quesitos como taxa de câmbio,

carga tributária, taxa de juros, política salarial, dentre outros. Já o aspecto

político-institucional está ligado à estrutura política e como esta determina as

políticas governamentais, tais como política tributária, políticas de incentivos

regionais e/ou setoriais e outros. Os parâmetros legais regulatórios são refle-

xos da estrutura jurídica do Estado, quer seja com leis de proteção à proprie-

dade industrial, quer seja com leis de preservação ambiental ou até mesmo de

defesa da concorrência. A infra-estrutura, por outro lado, pode afetar a com-

petitividade pelos custos extras que podem representar. Desta forma, insumos

como energia, transportes, telecomunicações e outros são chaves para a análi-

se deste parâmetro dos fatores sistêmicos.

Dentro dos fatores sociais encontram-se, principalmente, aqueles relati-

vos à mão- de- obra, quais sejam: sua abundância/escassez, nível de educação,

estrutura sindical e seguridade social. Por fim, os aspectos internacionais po-

dem afetar tanto o mercado consumidor da empresa, quanto suas fontes de

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recursos. Assim, o comportamento do comércio mundial e os fluxos internaci-

onais de capital são fatores que podem afetar a competitividade.

Em pesquisa realizada na indústria de base florestal da região de Lages,

Hoff et al. (2006), buscando verificar a competitividade do setor, selecionou

um universo de 60 empresas, todas filiadas ao Sindimadeira, das quais 20

foram efetivamente visitadas para a aplicação de um questionário, em setores

como serrarias, laminadoras, fábricas de painéis de madeira, fábricas de mó-

veis, artefatos de madeira, além das fábricas de celulose e papel. Estas por

sinal foram excluídas da pesquisa, por razões não especificadas pelos autores.

Embora os autores não tragam dados empíricos sobre o desempenho das

empresas sobre o setor objeto da pesquisa, os mesmos concluem que muitos

dos padrões competitivos estabelecidos pelo referencial teórico adotado pe-

los autores não estão sendo seguidos, o que faz deste um setor pouco competi-

tivo nos mercados nacional e internacional. Para os autores, o que mantém o

setor ainda produzindo é, principalmente, o baixo custo de produção, propor-

cionado pela produtividade da matéria prima e pelo baixo investimento nas

plantas industriais (p. 131) (sic), embora os autores do estudo não tenham

apresentado nenhum indicador empírico do desempenho das firmas, como

por exemplo, as exportações, que são um importante indicador para avaliar-se

o desempenho externo das empresas de qualquer setor. Quais foram as em-

presas pesquisadas não sabemos, já que os autores decidiram optar pelo uso

de metodologia que omite o nome das empresas.

As conclusões dos autores não se aplicam de forma generalizada às de-

mais empresas no estado de Santa Catarina. Com efeito, observando-se os

dados da tabela nº 01, com relação às exportações de Madeira e obras de ma-

deira, é provável que exportações de produtos mais simples como madeira

serrada, laminada ou perfilada, seja de fato realizada por empresas cuja van-

tagem competitiva seja de fato proveniente de baixo custo de produção, pro-

veniente de produtividade da matéria prima. No entanto, ainda dentro deste

grupo de exportações, quando observamos as exportações de portas e janelas

e painéis de madeira reconstituída (MDF e Aglomerados), a competitividade

de empresas como a Frameport, a Sincol, a Adami, a Rhoden, a Guararapes, a

Lavrasul e a Berneck, em boa medida é resultado do forte processo de vertica-

lização da produção, desde a matéria prima, até aos bens finais, gerando aqui-

lo que (CHANDLER, 1990), chama de economias de escala e com posteriores

economias de variedade ou escopo, além de outros atributos apontados pelo

referencial teórico acima adotado. São todas grandes empresas, com partici-

pação expressiva nas exportações, e que mesmo num contexto de forte valori-

zação cambial não apresentaram queda em suas exportações, o que evidencia

forte capacidade competitiva em mercados externos, em razão de atributos

construídos internamente por estas empresas.

Por lado, quando consideramos o setor produtor de móveis de madeira,

constata-se que a taxa de câmbio parece ter sido um problema sério para uma

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boa parte das empresas catarinenses exportadoras de móveis, como é o caso

da indústria moveleira de São Bento do Sul. A propósito das exportações de

São Bento do Sul, importante análise sobre as empresas deste município foi

realizada por (COMERLATTO, 2007), que já em 2007 apontava também a taxa

de câmbio como um entrave à continuidade das exportações de móveis pelas

empresas de São Bento do Sul. No entanto, o autor vai além e detecta outro

fator importante. Em sua pesquisa realizada junto a dez empresas exportado-

ras de móveis, constatou-se que todas elas exportavam 100% de sua produ-

ção, principalmente para o mercado americano. E o que é pior : as empresas

exportavam com marca dos compradores e não com marca própria, ou seja, as

exportadoras de móveis produziam o que na literatura se chama de private

label , ou seja, quando as empresas produzem bens de consumo para outras

empresas comercializarem como sendo produção sua. Além disso, o autor

detectou também o fato de que as empresas de São Bento do Sul encontram-se

numa cadeia produtiva global comandada pelo que (GEREFFI, 1994) chama de

Buyer- Driven , ou seja, a produção e exportação destas empresas é comandada

por grandes redes de compradores no exterior, principalmente nos EUA, que

encomendam estes móveis que são produzidos em São Bento do Sul mas ex-

portados com a marca do comprador nos EUA, fazendo com a maior parte do

valor gerado ao longo da cadeia produtiva seja apropriado pelos compradores

nos EUA e não pela indústria moveleira em São Bento do Sul. Neste contexto,

as grandes redes de compradores no exterior exigem principalmente preços

competitivos, pressionando em muito as margens de lucros das empresas

produtoras. Segundo (COMERLATTO, 2007), a inserção da indústria de móveis

de São Bento do Sul na cadeia mercantil global de móveis se dá de forma am-

plamente dependente e subordinada aos interesses dos compradores estran-

geiros. Este fato, aliado a já mencionada forte valorização da taxa de câmbio,

foram os fatores determinantes na debaclê da indústria moveleira de São

Bento do Sul. Há que se frisar também de que grande parte destas empresas

de São Bento do Sul não optou pelo mercado interno, mesmo num período de

crescimento da economia brasileira, quando se observou o crescimento da

renda per capta nacional, o que poderia se constituir numa válvula de escape

para períodos de crise nas exportações. Percebe-se que foi um erro de estra-

tégia empresarial.

Estratégia diferente parece ter sido adotada por outras empresas no es-

tado de SC, como é o caso da Móveis Rotta de Caçador e da móveis Rennar de

Fraiburgo, que inicialmente voltaram-se para o mercado interno, passando a

buscar o mercado externo somente num segundo momento, quando já haviam

se consolidadas como grandes empresas produtoras nacionais. Além disso, a

forma de inserção das duas empresas no mercado externo não se deu de for-

ma subordinada a nenhuma rede de compradores. Em 1998, a duas empresas

resolveram constituir uma empresa responsável pela comercialização dos

seus móveis, no exterior, principalmente nos EUA, onde no estado da Carolina

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do Norte, criaram a Brazil Furniture Global (BFG). Esta empresa trata de co-

mercializar nos EUA a produção das duas empresas, que procuram se inserir

cada vez mais no mercado americano, mas cada qual produzindo e vendendo

as suas marcas próprias, apropriando-se, portanto, dos ganhos decorrentes

desta inserção na cadeia global de produção e comercialização de móveis.

Cabe mencionar que a Móveis Rotta, ao lada da Móveis Temasa, ambas de

Caçador, são empresas fortemente verticalizadas, produzindo inclusive a pró-

pria matéria prima, através de reflorestamentos próprios de pinus, o que pro-

porciona a estas empresas significativos ganhos de escala de produção, além

das economias de variedade.

Finalmente, uma análise do desempenho do setor de celulose e papel em

Santa Catarina, permite afirmar de que o setor não sofreu os impactos da forte

valorização cambial. A exceção parece ter sido a Primo Tedesco, de Caçador,

cujas exportações reduziram-se significativamente. A Klabin S/A, maior em-

presa do setor em Santa Catarina e maior exportadora, manteve seu nível de

exportações, apresentando inclusive leve crescimento da ordem de 2,85% ao

ano. Também com relação à Irani papel e celulose, também se constata que a

empresa manteve sua participação nas exportações. Já com relação à Rigesa

S/A e à Iguaçu Papel e Celulose, observa-se notável aumento na participação

das exportações do setor em Santa Catarina. A Rigesa apresentou crescimento

de 162,8% em suas exportações, o que lhe confere uma taxa média anual de

crescimento da ordem de 16,3%. Expressivo também foi o desempenho da

Iguaçu, no período em consideração aumentou suas exportações em 234%, o

que lhe confere uma taxa média anual da ordem de 23,4% em suas exporta-

ções de papel. São todas empresas fortemente verticalizadas em seu processo

de produção, inclusive sendo detentoras de enormes áreas de reflorestamen-

tos, que produzem a principal matéria prima para o setor, o que lhes confere

vantagens competitivas via ganhos de escala. Analisando as exportações de

celulose e papel nacionais para o período de 2001-2011, (COELHO et al.,

2013), aponta que em função do crescimento da demanda mundial por parte

da Europa e da China, os preços vem aumentando, tornando o mercado exter-

no ainda mais atrativo, embora o nível de competição do setor de papel seja

muito mais acirrado e as empresas mundiais, tais como a International Paper,

a Union Comp., a Weyyerhauser e a Mcmillan Bloend, apresentam elevadas

escalas de produção, canais de distribuição preferenciais e custos de capital

reduzido. No entanto, a indústria de celulose e papel nacional apresentou um

acréscimo na participação do comércio internacional com aumento das expor-

tações, consubstanciado pela existência de importantes vantagens comparati-

vas e variações discretas no preço médio.

4. Considerações Finais

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As mudanças nas exportações de produtos de base florestal por parte dos

municípios considerados, mostrou-se sensível às modificações na taxa de

câmbio, para alguns, ao passo que para outros não chegou a constituir-se num

problema, na medida em que as empresas, responsáveis pelas exportações

destes bens de consumo, apresentavam outros atributos competitivos para

opor-se a um eventual processo de valorização da taxa de câmbio.

Para municípios como São Bento do Sul e Rio Negrinho, cuja atividade

econômica predominante é a indústria moveleira, a valorização da taxa de

câmbio foi determinante para o declínio das atividades exportadoras, embora

se constate de que foi também a forma como as empresas moveleiras optaram

por exportar seus produtos, basicamente através de agentes exportadores e

na forma de private label, outro fator explicativo importante para a queda

drástica nas exportações das empresas destes municípios.

Por outro lado, constatou-se que, embora a taxa de câmbio seja a mesma

para todos os agentes econômicos, vários municípios conseguiram ampliar

sua participação nas exportações, em função de que as empresas, baseadas

nestes municípios, construíram historicamente outros atributos que lhes

permitiram ampliar sua capacidade competitiva externa, como é o caso das

empresas de Caçador, principalmente.

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