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Estudos do Trabalho Ano VIII Número 16 2015 Revista da RET Rede de Estudos do Trabalho www.estudosdotrabalho.org 116 ACIDENTES DE TRABALHO FATAIS ENTRE OS TRABALHADORES PRÓPRIOS E TERCEIRIZADOS DA CADEIA DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL, NO MUNDO Luís Geraldo Gomes da Silva 1 RESUMO Este artigo foca-se na questão da subnotificação de acidentes de trabalho fatais (ATF). O objetivo é identificar a subnotificação dos ATF da Indústria de Petróleo e Gás Natural (IPG). A pesquisa se estabeleceu nas análises das estatísticas sobre ATF no grupo upstream da IPG. Entre 2005-2013, dos 815 ATF notificados no mundo, 127 foram de trabalhadores próprios e 688 de trabalhadores terceirizados. Os principais elementos da subnotificação são os tipos de contratos de trabalho, o anonimato dos dados sobre ATF nas companhias e empreiteiras, as metodologias de formatação dos bancos de dados e a falta de dados da cadeia completa. A subnotificação é um mecanismo político e técnico contra a vida dos trabalhadores. Politicamente é necessário se instituir políticas públicas internacionais. Tecnicamente é necessário se construir bancos de dados com as etapas da cadeia de energia. Palavras-Chave: Indústria de Petróleo e Gás Natural; Acidente de Trabalho Fatal; Subnotificação; Banco de Dados das Etapas da Cadeia de Energia. ABSTRACT This article focuses on the issue of underreporting of fatal work accidents (ATF). The goal is to identify the underreporting of ATF Oil and Natural Gas Industry (IPG). Research was established in the analysis of statistics on ATF in the upstream of the IPG group. Between 2005-2013, 815 of the ATF reported worldwide, 127 were its own workers and 688 contract workers. The main elements of underreporting are the types of employment contracts, the anonymity of the data on ATF in companies and contractors, the formatting methods of the databases and the lack of complete chain of data. Underreporting is a political and technical mechanism against the lives of workers. Politically it is necessary to provide for international public policy. Technically it is necessary to build databases with the energy chain steps. Keywords: Industry Petroleum and Natural Gas; Fatal work accident; Underreporting; Database Steps of the Energy Chain. 1 Técnico Eletrotécnico em Subestação Elétrica 88kV (indústria automobilística no ABC) e doutorando em Energia na Universidade Federal do ABC (UFABC), e-mail: [email protected]r

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Estudos do Trabalho Ano VIII – Número 16 – 2015

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116

ACIDENTES DE TRABALHO FATAIS ENTRE OS TRABALHADORES PRÓPRIOS E

TERCEIRIZADOS DA CADEIA DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL, NO MUNDO

Luís Geraldo Gomes da Silva1

RESUMO Este artigo foca-se na questão da subnotificação de acidentes de trabalho fatais (ATF). O objetivo é identificar a

subnotificação dos ATF da Indústria de Petróleo e Gás Natural (IPG). A pesquisa se estabeleceu nas análises das

estatísticas sobre ATF no grupo upstream da IPG. Entre 2005-2013, dos 815 ATF notificados no mundo, 127 foram

de trabalhadores próprios e 688 de trabalhadores terceirizados. Os principais elementos da subnotificação são os

tipos de contratos de trabalho, o anonimato dos dados sobre ATF nas companhias e empreiteiras, as metodologias de

formatação dos bancos de dados e a falta de dados da cadeia completa. A subnotificação é um mecanismo político e

técnico contra a vida dos trabalhadores. Politicamente é necessário se instituir políticas públicas internacionais.

Tecnicamente é necessário se construir bancos de dados com as etapas da cadeia de energia.

Palavras-Chave: Indústria de Petróleo e Gás Natural; Acidente de Trabalho Fatal; Subnotificação; Banco de

Dados das Etapas da Cadeia de Energia.

ABSTRACT This article focuses on the issue of underreporting of fatal work accidents (ATF). The goal is to identify the

underreporting of ATF Oil and Natural Gas Industry (IPG). Research was established in the analysis of statistics on

ATF in the upstream of the IPG group. Between 2005-2013, 815 of the ATF reported worldwide, 127 were its own

workers and 688 contract workers. The main elements of underreporting are the types of employment contracts, the

anonymity of the data on ATF in companies and contractors, the formatting methods of the databases and the lack of

complete chain of data. Underreporting is a political and technical mechanism against the lives of workers.

Politically it is necessary to provide for international public policy. Technically it is necessary to build databases

with the energy chain steps.

Keywords: Industry Petroleum and Natural Gas; Fatal work accident; Underreporting; Database Steps of the

Energy Chain.

1 Técnico Eletrotécnico em Subestação Elétrica 88kV (indústria automobilística no ABC) e doutorando em Energia na Universidade Federal do ABC (UFABC), e-mail: [email protected]

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1. INTRODUÇÃO

O mercado de trabalho da Indústria de Petróleo e Gás Natural (IPG) é dividido em três

grandes grupos: upstream (extração e produção), midstream (transporte e refino) e downstream

(distribuição). Para a Organização Internacional do Trabalho (OIT) as poucas estatísticas de

acidentes de trabalho mundiais disponíveis da IPG são as do grupo upstream. Para os midstream

e downstream não existem estatísticas globais disponíveis (Graham, 2010). Desde 1985, o

desempenho de segurança do upstream é publicado no relatório anual “OGP safety performance

indicators” da “International of Oil & Gas Producers” (OGP). A OGP recolhe em todo o mundo,

os dados sobre acidentes de trabalho fatais (ATF) das suas empresas associadas.

Não obstante, das subnotificações as notificações do upstream revelam a ampla diferença

entre os ATF ocorridos com os trabalhadores das companhias petrolíferas (os trabalhadores

próprios) e os acidentes ocorridos com trabalhadores das empreiteiras que prestam serviços as

companhias petrolíferas (os trabalhadores terceirizados). Entre 2005-2013 dos 815 acidentes de

trabalho fatais notificados no grupo upstream, 127 foram de trabalhadores próprios e 688 de

trabalhadores terceirizados (OGP, 2006-2014).

Na Suíça o banco de dados de energia “Energy-related Severe Accident Database”

(ENSAD)2 se concentra em analisar acidentes em energia a partir do critério de cinco ou mais

mortes em um único evento, estes tipos de acidentes são denominados de “Acidentes Maiores”

(AM). O ENSAD se justifica em analisar AM devido às precárias informações sobre os ATF com

energia. Para o ENSAD Os ATF são muito pouco relatados (Eckle; Burgherr, 2013).

No mundo, entre 1970 e 2008, os 984 AM da IPG mataram 32.651 pessoas, que

trabalhavam e/ou moravam em torno de suas plantas produtivas (Burgherr; Hirschberg, 2014). As

2 Banco de Dados de Acidentes Graves Relacionados à Energia.

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32.651 mortes causadas pela IPG são classificadas como mortes ocupacionais e/ou mortes de

público. A subnotificação dos ATF com energia colabora para a escassez de ações científicas

com fins de suprimir este tipo de acidente.

Nesse contexto socioeconômico da IPG este artigo foca-se na questão da subnotificação

de ATF. Especificamente na sua subnotificação ou notificação vaga, mecanismos que impedem

que condições de trabalho inadequadas possam ser corrigidas e parem de causar danos à vida de

milhares de trabalhadores. O objetivo deste artigo é identificar os elementos da subnotificação

dos ATF na IPG.

2. METODOLOGIA

A metodologia desta pesquisa se estabeleceu a partir das análises das estatísticas sobre

ATF coletadas nos relatórios “OGP safety performance indicators” publicados entre 2006-2014,

referente ao período de 2005-2013. Especificamente, analisaram-se os dados que corroboram na

avaliação dos ATF ocorridos com trabalhadores próprios e terceirizados do grupo upstream. Na

identificação dos elementos formadores da subnotificação, em seguida com base nestas análises

foram enumerados os elementos da subnotificação e evidenciados os elementos da notificação

relacionados à formatação de um banco de dados que cubra os ATF na cadeia completa de

petróleo e gás natural no mundo.

3. RESULTADOS

3.1 Análise dos relatórios da OGP

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Os relatórios anuais do mundo3 no grupo upstream entre 2005-2013 confirmam que, dos

815 ATF notificados, 127 foram de trabalhadores próprios e 688 de trabalhadores terceirizados.

A disposição dos dados nas Tabelas 1 a 7 permitem a verificação dos ATF e suas relações

variáveis por regiões do mundo, por atividades em terra (onshore) ou no mar (offshore), por ano e

por paridades entre trabalhadores próprios e terceirizados.

Tabela 1 – ATF no grupo upstream da África (2005-2013)

Ano Próprio

onshore

Próprio offshore Terceirizado

onshore

Terceirizado

offshore

Força de

trabalho

2005 1 1 21 1 24

2006 1 0 26 0 27

2007 1 0 13 4 18

2008 2 0 16 4 22

2009 0 1 8 3 12

2010 1 1 9 8 19

2011 0 0 5 2 7

2012 0 1 12 4 17

2013 9 0 4 14 27

Total 19 154 173

Fonte: OGP, 2006-2014.

Tabela 2 – ATF no grupo upstream da Ásia e Oceania (2005-2013)

Ano Próprio

onshore

Próprio offshore Terceirizado

onshore

Terceirizado

offshore

Força de

trabalho

2005 0 0 0 3 3

2006 0 0 6 4 10

2007 0 1 3 1 5

2008 1 0 2 4 7

2009 3 0 4 4 11

3 Os relatórios anuais foram organizados com informações de 45 e 50 companhias petrolíferas, sobre suas atividades realizadas entre 98 e 100 países.

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2010 15 0 10 5 30

2011 5 0 11 4 20

2012 0 1 8 1 10

2013 0 0 4 4 8

Total 26 78 104

Fonte: OGP, 2006-2014.

Tabela 3 – ATF no grupo upstream da Europa (2005-2013)

Ano Próprio

onshore

Próprio offshore Terceirizado

onshore

Terceirizado

offshore

Força de

trabalho

2005 0 0 6 1 7

2006 3 0 5 1 9

2007 2 0 3 9 14

2008 9 0 4 0 13

2009 1 0 18 2 21

2010 3 0 0 0 3

2011 0 0 1 2 3

2012 1 0 0 1 2

2013 2 0 1 6 9

Total 21 60 81

Fonte: OGP, 2006-2014.

Tabela 4 – ATF no grupo upstream da Antiga União Soviética (2005-2013)

Ano Próprio

onshore

Próprio offshore Terceirizado

onshore

Terceirizado

offshore

Força de

trabalho

2005 4 0 19 1 24

2006 4 0 20 0 24

2007 1 0 15 0 16

2008 6 0 12 0 18

2009 4 0 6 1 11

2010 2 0 8 0 10

2011 1 0 6 0 7

2012 0 0 2 0 2

2013 1 0 2 0 3

Total 23 92 115

Fonte: OGP, 2006-2014.

Tabela 5 – ATF no grupo upstream do Oriente Médio (2005-2013)

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Ano Próprio

onshore

Próprio offshore Terceirizado

onshore

Terceirizado

offshore

Força de

trabalho

2005 2 0 8 2 12

2006 3 0 11 1 15

2007 5 0 15 1 21

2008 1 0 18 1 20

2009 1 0 21 0 22

2010 0 0 9 2 11

2011 2 0 10 0 12

2012 3 0 10 0 13

2013 0 0 4 0 4

Total 17 113 130

Fonte: OGP, 2006-2014.

Tabela 6 – ATF no grupo upstream da América do Norte (2005-2013)

Ano Próprio

onshore

Próprio offshore Terceirizado

onshore

Terceirizado

offshore

Força de

trabalho

2005 0 0 3 0 3

2006 0 0 8 2 10

2007 0 0 2 1 3

2008 0 0 5 0 5

2009 0 0 4 10 14

2010 0 0 3 12 15

2011 1 0 5 0 6

2012 6 0 36 0 42

2013 1 2 5 4 12

Total 10 100 110

Fonte: OGP, 2006-2014.

Tabela 7 – ATF no grupo upstream da América do Sul (2005-2013)

Ano Próprio

onshore

Próprio offshore Terceirizado

onshore

Terceirizado

offshore

Força de

trabalho

2005 0 0 10 1 11

2006 4 0 13 3 20

2007 1 0 7 2 10

2008 1 0 9 8 18

2009 3 0 4 1 8

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2010 1 0 5 0 6

2011 0 1 5 4 10

2012 0 0 2 0 2

2013 0 0 14 3 17

Total 11 91 102

Fonte: OGP, 2006-2014.

3. 2 Elementos da subnotificação

3.2.1 Os tipos de contratos de trabalho

Os contratos de trabalho fragilizados sofrem restrições quanto ao Direito Internacional do

Trabalho. Conforme Coutinho (2015), não há transparência na produção de “dados sobre

acidentalidade dos terceirizados”, mesmo os Estados-nacionais que ratificaram convenções da

OIT, sobre a criação de política pública para a garantia da segurança e saúde dos trabalhadores

não cumprem estas convenções. Os trabalhadores terceirizados são subnotificados nas várias

dimensões sociais. As pesquisas sociais e econômicas divulgadas por estes Estados-nacionais os

ignoram, não destinam informações consistentes sobre esse modo “de utilização do trabalho

humano”.

3.2.2 A falta de dados estatísticos de desempenho de saúde e segurança dos trabalhadores

Conforme a OIT as companhias petrolíferas e suas federações não têm a obrigatoriedade

dentro e/ou fora de seus territórios nacionais de fornecerem dados estatísticos sobre as diferenças

de desempenho de saúde e segurança do trabalho entre seus trabalhadores próprios e terceirizados

(Graham, 2010).

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3.2.3 O anonimato dos dados sobre acidentes de trabalho das companhias

Os relatórios da OGP que anualmente fornecem os indicadores globais sobre os acidentes

de trabalho no grupo upstream usam códigos para preservar “o anonimato das empresas”

fornecedoras dos dados (OGP, 2006-2013). Os mecanismos de anonimato criados por

organizações como a OGP ou ainda por Estados-nacionais agem no sentido de proteger as

companhias. Estes mecanismos impossibilitam a determinação fidedigna de quais companhias

mais matam seus trabalhadores.

3.2.4 O anonimato dos dados sobre acidentes de trabalho das empreiteiras

Os mecanismos de anonimato como forma de proteção das companhias se estendem à

proteção das suas empreiteiras. O grupo upstream é realizado por um número de empreiteiras que

executam diversos processos de trabalho (Tabela 8).

Tabela 8 – Empregos nas maiores empreiteiras da IPG, 2008-2009

Empreiteira Matriz Número de

empregados

Países que se encontram

Aker Solutions Noruega 26.000 30

Baker Hughes EUA 39.800 90

BJ Services EUA 18.000 *NI

Chiyoda Corporation Japão 6.300 30

Halliburton EUA 57.000 70

Hyundai Heavy Industries (HHI) Coréia do Sul 26.000 *NI

JGC Corporation Japão 2.069 70

KBR Engineering EUA 27.000 70

Nabors Industries Bermudas 26.912 EUA, Canadá, Arábia Saudita,

Rússia e China

Saipem Itália 30.000 100

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Schlumberger EUA 77.000 140

Technip França 22.000 *NI

Transocean EUA 21.000 *NI

Weatherford EUA 40.000 100

* NI = não informado

Fonte: Graham, 2010; Debela, 2014.

Na maioria das vezes as operações de perfurações em grande escala da BP, ExxonMobil

ou Shell são frequentemente empreitadas pela Baker Hughes, sendo que no mesmo campo de

extração de petróleo e/ou gás natural à própria Baker Hughes contrata outra empreiteira, por

exemplo, a Schlumberger para fornecer os dados analíticos, os equipamentos e a manutenção

(Bridge, 2008). Alguns exemplos:

No Brasil a atividade de mergulho profundo sempre foi uma atividade realizada pela

empresa Stolf Offshore contratada pela Petrobras. Mas algumas empresas contratadas valem-se

do intermédio de “cooperativas de recrutamento de mão-de-obra” para os postos de trabalho

operacionais, na maioria dos casos, essas empresas são criadas unicamente para concorrer em um

contrato (pode-se falar neste caso da quarteirização da mão de obra). Deste modo não oferecem

garantias de cumprirem com o pagamento de encargos trabalhistas, estas empresas se diferenciam

pelos “baixíssimos” valores cobrados pelo custo dos futuros serviços prestados (Figueiredo et al.,

2007).

Além da mão de obra oferecida por empresas contratadas, a atividade de mergulho

profundo exige uma complexa rede de equipamentos e instrumentação como capacete com fonia,

válvulas, lanternas, o Bail Out System (BOS)4, a roupa de borracha (onde circula água quente).

Todos os equipamentos são desenvolvidos pela empresa Stold Comex Seaway, empresa que

detém a tecnologia submarina mundial da indústria petrolífera offshore5. As atividades de

4 Equipamento transportado pelo mergulhador que é acionado quando há pane no suprimento de gás. 5 Know how na confecção de roupas offshore credenciou a Stold Comex para desenvolver protótipos de roupas utilizadas por astronautas.

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mergulho profundo são realizadas em situação de “alto risco e de confinamento ao longo de 28

dias” em condições hiperbáricas, com pressão atmosférica que podem alcançar 32 vezes o valor

da pressão atmosférica normal (Figueiredo; Athayde, 2005).

Quando se protegem as grandes companhias petrolíferas está-se também protegendo as

grandes empreiteiras que, sequencialmente se está protegendo as subempreiteiras nacionais de

cada país, que efetivam a quarteirização do trabalho. Os mecanismos de anonimato na realidade

ocultam a responsabilidade da companhia, da empreiteira e da subempreiteira diante do ATF.

3.2.5 As metodologias de formatação dos bancos de dados

A falta de obrigatoriedade de notificação internacional ao mesmo tempo institui as

contestações das escalas entre relatórios estatísticos. Por exemplo, os dados recebidos pela OGP

entre 2005-2008 ratificam que ocorreram 389 ATF no grupo upstream no mundo, sendo 54 com

trabalhadores próprios e 335 com terceirizados (OGP, 2006-2009). O “Bureau of Labor

Statistics” dos EUA divulgou que entre 2005-2008, na mineração de petróleo e gás natural do

país ocorreram 465 ATF (Tabela 9). Os números oficiais pelos EUA são inúmeras vezes

superiores aos números notificados pela OGP à América do Norte no mesmo período, que

totalizaram 21 ATF, todos com trabalhadores terceirizados (OGP, 2006-2009).

Tabela 9 – ATF na mineração dos EUA (2005-2008)

Mineração 2005 2006 2007 2008 Total

Petróleo e Gás Natural 98 125 122 120 465

Outras minerações 61 67 61 56 245

Total 159 192 183 176 710

Fonte: Bureau of Labor Statistics U. S. Department of Labor, 2010. Disponível: <www.bls.gov>.

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Outro aspecto verificado na estatística oficial dos EUA e que ela não informa o número de

ATF com trabalhadores próprios e terceirizados. Para se chegar neste número tem-se que recorrer

aos estudos acadêmicos. Segundo Witter et al. (2014) na extração do petróleo e gás natural dos

EUA, entre 2003-2009 a taxa de mortalidade foi maior para as empreiteiras de perfuração,

seguida das empreiteiras de serviços (ensaio, manutenção, gestão etc.) e a menor taxa registrada

ficou para as companhias contratantes.

No caso brasileiro, a Petrobras para o período entre 2005-2008 notifica a ocorrência de 57

ATF ocorridos em seu sistema (Tabela 10), seis de trabalhadores próprios e 51 de trabalhadores

terceirizados (Petrobras, 2008-2009).

Tabela 10 – ATF na Petrobras (Brasil)

Ano Acidentes próprios Acidentes terceirizados Acidentes com a força de trabalho

2005 0 15 15

2006 1 8 9

2007 1 14 15

2008 4 14 18

2009 1 6 7

2010 3 7 10

2011 3 13 16

2012 0 13 13

2013 0 4 4

Total 13 94 107

Fonte: Petrobras, 2007-2014.

Por outro lado, para o Anuário Estatístico de Acidentes do Trabalho (AEAT), na extração

e produção de petróleo e gás natural no Brasil, em 2005 ocorreram dois ATF; em 2006 dois; em

2007 cinco e em 2008 seis. Totalizando 15 ATF entre 2005-2008 no país (Brasil, AEAT, 2007-

2010).

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O AEAT é o banco de dados oficial brasileiro, elaborado em conjunto pelo Ministério do

Trabalho e Emprego (MTE) e pelo Ministério da Previdência Social (MPS). O AEAT considera

as informações da Classificação Nacional de Atividades Econômicas (CNAE) como fonte de

coleta de seus dados (Brasil, 2007-2010). A metodologia do AEAT, somente contabiliza os

trabalhadores próprios das empresas associadas ao CNAE da extração de petróleo e gás natural.

Conforme Coutinho (2015) não há no Brasil controles eficazes sobre a veracidade da

atividade econômica efetivamente desenvolvida pelas empresas que declaram participar de

determinado CNAE. Ao não contabilizar os trabalhadores terceirizados da extração de petróleo e

gás natural o AEAT acaba por pulverizar as informações sobre os acidentes ocorridos com a

maioria da força de trabalho da extração de petróleo e gás natural no Brasil.

Diferentemente da estatística oficial brasileira entre 2005-2008, só no grupo upstream

offshore da Bacia de Campos foram contabilizadas 27 ATF, nove de trabalhadores próprios e 18

de terceirizados (Tabela 11). Este saldo está na base de dados do Sindicato dos Petroleiros do

Norte Fluminense (SINDIPETRO-NF). A estatística do SINDIPETRO-NF é organizada com

base nas Comunicações de Acidentes de Trabalho (CATs) Fatais (Alvarez et al., 2010).

Tabela 11 – ATF no grupo upstream da Bacia de Campos (Brasil)

Trabalhadores 2005 2006 2007 2008 Total

Próprios 3 2 3 1 9

Terceirizados 3 3 5 7 18

Total 6 5 8 8 27

Fonte: Alvarez et al., 2010.

Por conseguinte, se observa nas estatísticas da OGP, do EUA, do AEAT, da Petrobras e

do SINDIPETRO-NF, que os procedimentos utilizados nas formatações dos bancos de dados são

adotados conforme os métodos de cada uma destas instituições. As metodologias de agrupamento

Estudos do Trabalho Ano VIII – Número 16 – 2015

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de dados não proporcionam espaços adequados para a notificação obrigatória e sim espaços

adequados para as subnotificações. No entanto, mesmo com subnotificações as atuais

informações da OGP (2006-2009), Petrobras (2008-2009), Witter et al. (2014) e Alvarez et al.

(2010) trazem que a maioria dos ATF ocorreu com os trabalhadores terceirizados.

3.2.6 A falta de informação anual sobre o número efetivo de trabalhadores por companhia

As companhias petrolíferas enviam para a OGP os dados sobre suas horas efetivamente

trabalhadas, nomeada internacionalmente na área de saúde do trabalhador como “Hora-homem”,

hora-homem de exposição ao risco de acidentes, entre 2009-2013 a média anual informada foi

3,583 milhões de hora-homem. Estas horas são as somatórias das horas em que os empregados

estão à disposição do empregador nos locais de trabalho.

No grupo upstream as horas efetivas trabalhadas são computadas no caso de operações

onshore, no momento de sua permanecia na planta de trabalho, para os trabalhadores offshore as

horas são calculadas em um dia de trabalho de 12 horas. A média de horas trabalhadas por ano

varia de 1.600-2.300 horas por trabalhador, média arbitrada de 2.000 horas-homem (OGP, 2005-

2013).

A falta de informações sobre o número de trabalhadores próprios e terceirizados

efetivamente contratados e/ou subcontratados em cada ano pelas companhias e empreiteiras é o

outro componente formador da subnotificação. Sem os números reais da força de trabalho

algumas variáveis relacionadas aos ATF de trabalho são apenas estimadas e/ou aproximadas

(taxa de mortalidade, freqüência, gravidade etc.).

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A partir das informações entregues pelas companhias à OGP sobre a exposição aos riscos

de acidentes horas-homem para trabalhadores próprios e terceirizados entre 2009-2013 e do

critério adotado por estas mesmas companhias petrolíferas, para este artigo estimou-se o número

de trabalhadores próprios e terceirizados com vínculos empregatícios (Hora-homem em

milhões/2.000).

Tabela 12 – Força de trabalho e ATF no grupo upstream global

Ano Próprios

estimados

Acidente

fatal:

próprios

Terceirizados

estimados

Acidente fatal:

terceirizados

Força de

trabalho

estimada

Acidente

fatal: força

de trabalho

2009 411.120 13 1.381.801 86 1.792.921 99

2010 350.275 23 1.344.725 71 1.695.000 94

2011 376.550 10 1.351.489 55 1.728.039 65

2012 410.368 12 1.429.632 76 1.840.000 88

2013 410.428 15 1.474.845 65 1.885.273 80

Total 73 353 426

Fonte: os dados sobre os acidentes de trabalho fatais são da OGP (2006-2014); a média de trabalhadores próprios e

terceirizados foi estimada com base nos dados sobre hora-homem em milhões fornecidos igualmente pela OGP.

3.2.7 A falta de dados da cadeia completa

As estatísticas analisadas tratam das notificações entregues entre 2005-2013 para a OGP e

tão-somente dos dados do grupo upstream. Para os grupos midstream e dowstream ainda não há

estatísticas globais. Deste modo, tanto as estimativas da força de trabalho como as estatísticas dos

ATF notificados representam apenas uma parte do valor total da força de trabalho e dos ATF

ocorridos na cadeia de petróleo e gás natural no mundo.

4. NOTIFICAÇÃO DOS ACIDENTES DE TRABALHO

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Os dados do grupo upstream entre 2005-2013 confirmam que, 15.5% dos ATF foram de

trabalhadores próprios e 84,4% foram de trabalhadores terceirizados (OGP, 2006-2014). Os

dados estatísticos revelam a técnica de terceirização como elemento basilar à alta taxa de

mortalidade de trabalhadores, portanto, a reversão deste quadro passa pela supressão da

terceirização do trabalho (Silva, 2013).

É necessário que os órgãos nacionais e internacionais ligados à saúde e ao Direito do

Trabalho criem a obrigatoriedade paras as companhias petrolíferas e empresas correlatas

constituam estatísticas sobre o desempenho de saúde e segurança do trabalho entre seus

trabalhadores e que as disponibilizem publicamente (número de trabalhadores efetivos; ATF

fatais e não fatais; doenças do trabalho, afastamento; profissões; riscos que são submetidos os

trabalhadores, ações de segurança etc.).

As entidades públicas e/ou privadas responsáveis pela organização e publicação dos

relatórios anuais de indicadores globais sobre os acidentes de trabalho das empresas, também

devam ter a obrigatoriedade de demonstrar os resultados associados às companhias, empreiteiras

e empresas correlatas sem os mecanismos atuais de “preservação do anonimato”, mecanismo que

se justifica não pela saúde e segurança do trabalho, mas por interesses econômicos contrários as

ações de preservação das condições de trabalho.

4.1 Metodologias de formatação dos bancos de dados

As desmedidas diferenças nas formatações das estatísticas dos bancos de dados nacionais

e internacionais como foi visto anteriormente criam espaços para a prática da subnotificação.

Portanto, órgãos nacionais e internacionais ligados à saúde do trabalhador e ao Direito do

Trabalho devem adotar uma plataforma mínima na construção de estatísticas que tenham como

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função a notificação completa, a caracterização dos riscos em energia e como consequência a

diminuição dos acidentes de trabalho e preservação da vida do homem que vive do trabalho.

Para Colli et al. (2009) caracterizar riscos em energia é formar uma síntese e/ou resumo das

informações de uma situação potencialmente perigosa, a fim que esta situação potencial seja

conhecida (ou reconhecida) por tomadores de decisões, por trabalhadores de energia e demais

partes interessadas no sentido de eliminá-la.

4.2 Dados da cadeia completa

Do ponto de vista da supressão do número de acidentes de trabalho em toda a cadeia

produtiva do setor de energia, é necessário observar esta variável em todas as suas etapas. As

companhias devem eliminar o número de acidentes de trabalho em suas etapas. A IPG grosso

modo é dividida em três grandes grupos: upstream, midstream e dowstream. Porém, para um

estudo de redução dos acidentes de trabalho e a adequação em banco de dados estes grandes

grupos devem ser decompostos em etapas: E1 – Etapa de projeto do aproveitamento do petróleo e

gás natural; E2 – Etapa de transporte de cargas e de trabalhadores; E3 – Etapa de obtenção de

insumos naturais; E4 – Etapa de obtenção de insumos industriais; E5 – Etapa de construção da

infraestrutura; E6 – Etapa de extração; E7 – Etapa de processamento; E8 – Etapa de transporte do

petróleo e gás natural para à usina; E9 – Etapa de geração de calor e/ou energia elétrica; E10 –

Etapa de transmissão de energia; E11 – Etapa de distribuição de energia; E12 – Etapa de uso final;

E13 – Etapa de tratamento e disposição de rejeitos; E14 – Etapa de descomissionamento.

Estas etapas são complexas e abrangem uma multiplicidade de serviços e fornecimentos.

Deste modo é necessário devido à amplitude de atividades do trabalho em energia, após a

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caracterização completa dos riscos na IPG de antemão associá-los as atividades de cada etapa da

cadeia e aos trabalhadores que executam tais atividades (Silva; Moreira, 2014).

A modelo do ENSAD o banco de dados de acidentes de trabalho em energia deve ser um

banco de dados relacional em formato MS Access, no qual cada registro recebe uma identificação

única, o banco tem várias categorias e subcategorias que recebem as informações sobre datas,

local, classificação, detalhes, consequências, meta-informação, log de alteração, dados

específicos sobre todas as etapas onde são relacionados às atividades operacionais da etapa com

as especialidades dos trabalhadores envolvidos, além disso, os riscos de acidentes de trabalho,

por exemplo, na etapa de extração de petróleo e gás natural:

Atividades operacionais: Localizações das jazidas, análise do solo e subsolo; aplicações

dos conhecimentos de geologia e geofísica, montagem de acampamento (trabalho de

campo), perfuração do poço pioneiro (sondas, brocas, tubos, coluna de perfuração, torres

etc.), segmentação dos processos sísmicos, perfuração, perfilagem, testes; processos

mecânicos para bombear o petróleo para a superfície onshore ou offshore (plataformas,

navios-sonda) para o processamento; separação do gás natural (água, hidrocarbonetos

em estado líquido, partículas solidas), dessulfurização, rejeição do gás lift (finalidade de

aumentar a recuperação do petróleo do reservatório), separação dos componentes em

produtos específicos para o processamento.

Trabalhadores envolvidos: Geólogo; geofísico; engenheiro de solos, hidrologia, petróleo

e gás, mineração, ambiental; técnico civil, em águas subterrâneas, em mineração, de

perfuração, de operação em refino, de obras de infraestrutura; mergulhador; auxiliar da

produção do petróleo; operador de perfurações e brocas, controle, rede, equipamento, de

ROV (Remotely Operarated Underwater Vehicle), de plataformas, de compressor na

extração, de sondas, de processamento, industrial, de transferência e estocagem, de

utilidade; sondador de poços de petróleo; auxiliar industrial etc.

Riscos de acidentes: Confinamento e isolamento nas operações de campo, regime de

embarques (offshore), condições de alojamento e alimentações precárias, estado de

vigília, desastres naturais, vazamento, intoxicação, exposição a ruídos e as emissões

química, física, biológica, incêndio, explosão, colisão (navios com plataformas,

helicóptero com plataforma), afundamento de navio-sonda e plataformas, derramamento,

erupção de gases, colapso estrutural (rompimento de estrutura), afogamento,

adernamento (inclinação em graus de uma embarcação para um dos seus bordos),

naufrágio, queda, rompimento de material e tubulações, choques mecânicos e elétricos,

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lesões com esmagamento, operação subaquática, com guindaste, contato com corpos

estranhos e superfície quente e/ou escorregadia (irregular), radiação (perfilagem de

poços pelo processo de radiação), jornadas de trabalho prolongadas, riscos à saúde

mental, trabalho repetitivo etc.

Um banco de dados de acidentes de trabalho deve permitir que a partir de dados

selecionados se obtenha o rastreamento de eventos e desenvolvimento de estudos comparativos

entre os acidentes com determinadas energias primárias. Além disso, buscar a qualidade e

integridade dos dados primários de cada cadeia completa com novas ferramentas para o

desenvolvimento metodológico de suas avaliações, como sistemas de informações geográficos,

avaliação probabilística, estimativas de custos, avaliação de novas tecnologias entre outras

(Burgherr; Hirschberg, 2014).

Segundo Burgherr e Hirschberg (2014) as comparações de cadeia de energia devem

buscar indicadores de risco compreensíveis e significativos a fim de cobrirem uma grande gama

de aspectos envolvidos. Por exemplo, O ENSAD utiliza indicadores normalizados (convertidos)

expressos na unidade de produção de eletricidade “Gigawatt-elétrico-ano”.

Os dados devem ser agrupados e seus critérios devem ser demonstrados através dos

métodos adotados, investigações criteriosas da distribuição em todas as etapas da cada cadeia de

energia levam a identificação dos riscos específicos da cadeia; indicadores de taxa de acidente,

taxa de mortalidade (mortes por unidade de produção de energia elétrica), cálculo das curvas

cumulativas e outras. O ENSAD registra na cadeia de petróleo, que os AM entre 1970 e 2008

tiveram como causas principais (da maior a menor) as etapas de transporte, armazenamento,

extração e exploração, refinamento e processamento, aquecimento e/ou geração elétrica. Para a

cadeia de gás natural os maiores registros são para as etapas de extração e exploração (Burgherr;

Hirschberg, 2014).

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5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Na IPG morrem por ATF os trabalhadores próprios e terceirizados. Todavia, morrem mais

terceirizados do que próprios, então a supressão da terceirização deve ser a primeira ação tomada

no campo de defesa da saúde do trabalho6.

A partir das privatizações, reestruturação produtiva, predominância de novos contratos de

trabalho, descobrimento de novos campos petrolíferos, utilização de novas tecnologias etc., várias

noções tomaram outros contorno em relação às décadas anteriores na IPG. Mas, em relação aos

ATF têm-se um quadro com precárias informações e transformações. Se os riscos continuam

intrínsecos e prováveis de acontecerem deviam estar sendo “previstos e combatidos sem trégua” e

não permitidos, ou ainda induzidos pelas próprias empresas, que deveriam ser responsáveis pela

“totalidade dos efeitos dos seus empreendimentos” (Sevá Filho, 2000).

Quando os riscos não são de antemão previstos, caracterizados e/ou dominados pelos

responsáveis ou co-responsáveis de direito, os ATF acontecem em qualquer etapa da cadeia.

Quando os ATF não são estudados cientificamente ou ao contrário são subnotificados e/ou

notificados sem detalhamento, isto é, disponibilizados em banco de dados, sem as correlações

processadas entre os aspectos técnicos, sociais, econômicos, educacionais, médicos e de

organização do trabalho envolvidos nas causas destes ATF, eles continuam a acontecer.

A subnotificação é um mecanismo político e técnico contra a vida de trabalhadores

próprios e terceirizados. No campo político é necessário se instituir políticas públicas

internacionais que garantam aplicações de notificações, como, por exemplo, a obrigatoriedade

das informações perante sansões. No campo técnico é necessário se construir bancos de dados

que apresentem as especialidades laborais dos trabalhadores e o risco de acidentes nas várias

6 No Brasil várias pesquisas relacionam ATF e terceirização, ver entre outras, Silva, 2013; Koury, 2014, Coutinho, 2015, Filgueiras, 2015.

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etapas da cadeia de energia, o banco de dados deverá identificar as especialidades das atividades

realizadas pelos trabalhadores (Silva; Moreira, 2014).

Para Silva e Moreira (2014) uma das dificuldades encontradas para se pesquisar os ATF

são os acessos às estatísticas confiáveis. As estatísticas dos bancos de dados sobre ATF são

definidas pelos múltiplos interesses e conflitos implicitamente existentes entre as organizações

que as produzem: os setores industriais, Estados-nacionais, organizações nacionais e

internacionais etc.

O banco de dados sobre acidentes de trabalho deve ser aberto ao público, ter número de

registro para todo o evento de acidente, permitir realização de análises abrangente nos

rastreamentos, apresentar a taxa de mortalidade em relação à energia produzida (GWe/ano),

oferecer as taxas de mortalidade ajustadas por importação (Burgherr et al., 2012). No contexto

global da IPG, quando se importa e/ou exporta petróleo e gás natural se está importando e/ou

exportando ATF.

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