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ESTUDO DAS FALHAS Nomenclatura das Falhas A determinação do nome a ser utilizado para uma determinada falha implica no conhecimento da direção exata e do sentido do movimento relativo dos compartimentos. Esta determinação é impossível em duas dimensões e a figura à direita mostra que uma falha transcorrente pode, num plano vertical, parecer uma falha vertical. Neste caso, utiliza-se o termo separação antes do nome da falha (no exemplo ao lado, falha transcorrente sinistral com separação vertical), para caracterizar que se trata de uma classificação visual da falha, baseada num rejeito aparente. Terminologia complementar É possível observar no perfil vertical à esquerda, que as falhas normais podem provocar a omissão de camadas enquanto que as falhas inversas podem provocar a sua duplicação. As primeiras são ditas subtrativas, as últimas sendo aditivas. As falhas que provocam uma diminuição global do comprimento das camadas paralelamente à estratificação são falhas contracionais e as falhas que provocam um aumento global do comprimento das camadas paralelamente à estratificação são falhas extensionais. Quando uma falha inclinada recorta camadas também inclinadas, a falha é dita conforme (a) quando o seu plano e a camada mergulham na mesma direção, e contrária (b) quando eles mergulham em sentido oposto. Falhas que apresentam uma rotação interna (que caracteriza o movimento relativo dos blocos) e externa (que caracteriza a rotação das camadas) idênticas são falhas sintéticas (b). Quando rotações interna e externa são de sentidos contrários, as falhas são antitéticas (a).

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Material de estudo de Geologia Estrutural para o 5.o Período de Engenharia de Minas - FINOM. Estudo das falhas.

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ESTUDO DAS FALHAS

Nomenclatura das Falhas

A determinação do nome a ser utilizado para uma determinada falha implica no conhecimento da direção exata e do sentido do movimento relativo dos compartimentos. Esta determinação é impossível em duas dimensões e a figura à direita mostra que uma falha transcorrente pode, num plano vertical, parecer uma falha vertical. Neste caso, utiliza-se o termo separação antes do nome da falha (no exemplo ao lado, falha

transcorrente sinistral com separação vertical), para caracterizar que se trata de uma classificação visual da falha, baseada num rejeito aparente.

Terminologia complementar

É possível observar no perfil vertical à esquerda, que as falhas normais podem provocar a omissão de camadas enquanto que as falhas inversas podem provocar a sua duplicação. As primeiras são ditas subtrativas, as últimas sendo aditivas. As falhas que provocam uma

diminuição global do comprimento das camadas paralelamente à estratificação são falhas contracionais e as falhas que provocam um aumento global do comprimento das camadas paralelamente à estratificação são falhas extensionais. Quando uma falha inclinada recorta camadas também inclinadas, a falha é dita conforme

(a) quando o seu plano e a camada mergulham na mesma direção, e contrária (b) quando eles mergulham em sentido

oposto. Falhas que apresentam uma rotação interna (que caracteriza o movimento relativo dos blocos) e externa (que caracteriza a rotação das camadas) idênticas são falhas sintéticas (b). Quando rotações interna e externa são de sentidos contrários, as falhas são antitéticas (a).

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Determinação do sentido do movimento das falhas

A determinação da direção do movimento relativo dos compartimentos de falha é geralmente possível com a utilização das estrias. O sentido do movimento ao longo desta direção pode ser identificado utilizando-se vários indicadores. Os principais critérios que podem ser utilizados com esta finalidade estão representados nas figuras a seguir.

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Deslocamento relativo de um marcador: é a situação mais simples. Observa-se, de cada lado do plano de ruptura, um mesmo objeto (p. ex. uma camada), deslocado pelo falhamento, como na figura ao lado, que exibe um seixo deslocado por uma falha. É, entretanto, necessário ter um grande cuidado: num plano, observa-se apenas um rejeito aparente que não pode corresponder à realidade.

Dobras de arrasto (ou drag folds)

As dobras de arrasto são feições que acompanham frequentemente falhas que afetam materiais de plasticidade limitada (p. ex. ao se aproximar da transição rúptil/dúctil). A deformação inicia-se por um encurvamento das camadas e evolui posteriormente para uma ruptura. A forma da dobra de arrasto caracteriza o sentido do deslocamento.

Tectóglifos

Na ausência dos dois critérios anteriores, são utilizadas feições associadas ao plano de falha: os tectóglifos ou marcas tectônicas. A literatura geológica é rica em exemplos destas feições; entretanto, elas são de observação às vezes difícil e de interpretação frequentemente ambígua. A observação de critérios diversificados em vários planos cogenéticos é recomendada para se chegar a conclusões seguras. Os tectóglifos podem ser agrupados em várias famílias: - marcadores ligados a irregularidades do plano de falha: geralmente, a superfície de falha não é perfeitamente lisa. Em certos casos, ela pode se apresentar mais ou menos escalonada, com degraus milimétricos a decimétricos. Esses degraus, dependendo da sua orientação, tendem a ser eliminados pelo deslocamento da falha ou, pelo contrário, a ser preservados. Passando o dedo ao longo das estrias, a superfície parece lisa quando o movimento do dedo é idêntico ao da falha e áspera quando ele se desloca em sentido oposto ao dos blocos de falha. Frequentemente, os movimentos ao longo de planos irregulares provocam o aparecimento de aberturas, ou de zonas de superposição. As primeiras podem permitir a recristalização de lentes de minerais, muitas vezes fibrosos (quartzo, calcita, etc.); já,

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as zonas de superposição se transformam em zonas esmagadas ou são marcadas pelo aparecimento de estilólitos. Os degraus podem corresponder não a irregularidades iniciais do plano de falha, mas a material arrancado do plano no decorrer do movimento. Os relevos assim formados têm geralmente uma forma característica, semi-elíptica (meia lua). Em outros casos, enfim, os degraus podem ser formados a partir da torção da foliação da rocha quando ela apresenta uma certa obliqüidade em relação ao plano de falha. Nestas três situações, também, o aspecto dos degraus é característico do sentido do movimento. - marcadores ligados à elementos estriadores: objetos duros (minerais, fragmentos de rocha) podem provocar uma estriação do plano de falha. O objeto pode continuar preso no sulco que ele cavou ou pode ser progressivamente triturado e eliminado. Nos dois casos, a forma do sulco é característica do sentido do movimento. - fraturas de segunda ordem: associados aos planos de cisalhamento principais, desenvolvem-se frequentemente planos de cisalhamento de segunda ordem (Riedel e Skempton) e fendas de tração. A disposição destas feições, quando comprovadamente cogenéticas da falha, permite a delimitação do sentido do seu movimento. Muitas outras feições podem ser utilizadas como indicadoras para o sentido de cisalhamento, sempre com o devido cuidado.

As rochas formadas nas zonas de falha A movimentação dos blocos, no decorrer do falhamento, pode provocar profundas alterações nos materiais afetados, levando à formação de uma categoria específica de rochas, as rochas cataclásticas, enquadradas no conjunto das rochas metamórficas

(metamorfismo dinâmico). Essas rochas se formam por evolução de um microfraturamento inicial. A coalescência das microfraturas provoca uma partição da rocha em blocos angulosos de tamanho variável. Com o adensamento da rede de fraturas, o tamanho dos blocos tende a diminuir. Essa diminuição pode ser acompanhada de arredondamento progressivo dos elementos, induzido pela sua rotação em conseqüência da movimentação dos blocos de falha. Esse processo de trituração (crushing), totalmente frágil (rúptil), chamado cominuição ou cataclisação, leva à formação de rochas constituídas por uma matriz englobando fragmentos (clastos) da rocha inicial, conforme a figura ao lado.

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As rochas formadas nessas condições podem ou não sofrer uma litificação, apresentando-se coesas ou não. Em função da intensidade da deformação, tanto a proporção fragmentos/matriz como o tamanho dos fragmentos varia.

No caso de falhas sísmicas (falhas ligadas a terremotos, acompanhadas de uma movimentação muito rápida), a energia liberada pelo atrito dos blocos pode ser suficiente para provocar uma fusão parcial limitada nas rochas encaixantes ao longo do plano de falha. O material líquido assim formado, geralmente em volume pequeno, provoca um aumento de pressão que pode

gerar um fraturamento hidráulico das encaixantes. Esse material é injetado nas fraturas assim formadas, onde ele se resfria imediatamente, adquirindo uma textura vítrea. Por conta da semelhança com os taquilitos (vidros vulcânicos), como observado na figura acima, estas rochas são chamadas pseudotaquilitos. As rochas cataclásticas, agrupadas na série cataclástica, podem ser classificadas de acordo com a sua coesão, tamanho dos seus clastos e percentagem relativa clastos/matriz. Esta classificação dá uma ideia aproximada da intensidade da deformação. Observe, ao lado, a classificação das rochas formadas em zonas de falha, segundo Sibson.

O ESTUDO DAS FALHAS

De um ponto de vista estrutural aplicado, as falhas podem ser consideradas descontinuidades quaisquer e serem descritas como tais. A maior parte das observações aplicáveis às juntas podem também ser aplicadas às falhas. Algumas características, entretanto, são peculiares: - irregularidades características na superfície do plano (estrias, degraus, meia luas etc.); - associação frequente com rochas cataclásticas;

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- intensificação das juntas nas proximidades do plano de falha que se comporta como um corredor de fraturamento; - persistência e espaçamento geralmente maiores do que no caso das juntas; - geometria geralmente mais clara e analisável.

Representação Cartográfica das Falhas

Para tornar mais fácil a leitura e a interpretação das informações oferecidas pelos mapas e perfis geológicos, tornou-se necessária a utilização de uma simbologia complexa e rica.

Não existe, para representar feições estruturais em mapa, uma simbologia normalizada universalmente aceita, mas, no caso das falhas, alguns símbolos são de uso consagrado. Os principais deles estão representados na figura abaixo.

A figura abaixo mostra exemplos da utilização destes símbolos.

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No caso dos perfis, a situação é mais complexa: a simbologia não é específica do tipo de falha e indica apenas, por setas, o sentido do deslocamento relativo dos blocos (figura abaixo – a). A figuras b e c mostram que esta prática pode levar a leituras dúbias (na figura c, um trecho de falha inversa com movimento relativo a favor do mergulho pode ser interpretado como uma falha normal. O prolongamento do traçado da falha em linha tracejada acima da topografia, como foi feito na figura b, elimina qualquer dúvida).

Falhas que, pelo seu tamanho, não podem ser representadas no mapa, mas que, pela sua frequência, são consideradas relevantes, podem ser representadas, como as juntas, através de projeções estereográficas caracterizando os domínios homogêneos. É importante diferenciar, através de simbologias diversificadas, nestas projeções, os tipos básicos de falhas. Podem ser representados tanto os polos de planos de falha como as estrias, caracterizadas pelo seu sentido de movimento.

Geometria das Falhas em Regime Extensional

Os sistemas extensionais são geralmente geralmente caracterizados por associações de falhas normais, conjugadas ou não. Duas geometrias básicas de superfícies de falhas podem ser observadas:

- superfícies planas, correspondendo à geometria

em dominós (a) e

- superfícies curvas, caracterizadas por uma atenuação do mergulho com o aumento da profundidade, correspondendo à geometria lístrica (b).

Nos dois casos, o falhamento implica numa rotação do bloco falhado.

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É frequente o plano de falha apresentar variações locais de mergulho. As parte mais suaves são os patamares e as partes mais íngremes são as rampas, como se vê na figura ao lado

A rampas perpendiculares à direção do movimento são frontais; as paralelas são laterais e as demais são oblíquas. Na ilustração à direita observam-se rampas frontais associadas a falhas inversas.

Essas irregularidades locais do plano de falha tendem a ser eliminadas no decorrer do movimento pelo aparecimento de uma diverticulação do plano de falha original, um segmento deste passando a ser inativo. A imbricação assim formada é um duplex extensional, limitado por um cisalhamento de teto e um cisalhamento basal. Os duplexes podem ser formados por uma ou várias escamas, ou horses, imbricadas, conforme visto na figura à esquerda.

Existem feições comuns à maioria dos sistemas extensionais. A figura abaixo ilustra essas feições.

O limite entre o domínio estirado e o domínio não deformado é marcado por uma falha principal, o detachment. As falhas do sistema paralelas ao detachment são sintéticas, as falhas mergulhando em direção oposta são antitéticas.

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Frequentemente, as falhas formam escamas imbricadas, ou imbricações: os leques lístricos (que podem ser sintéticos ou antitéticos). As escamas (porção de terreno incluída entre duas falhas consecutivas) são chamadas risers. Duas falhas com mergulhos convergentes limitam um bloco rebaixado chamado graben, e duas falhas divergentes limiam um bloco chamado horst.

Apesar das falhas normais representarem as principais feições encontradas em sistemas extensionais, elas não são as únicas. É comum, por exemplo, encontrar, ao longo dos rifts, variações da taxa de extensão. Estas variações devem ser acomodadas por feições de transferência que permitem passar dos domínios mais estirados para domínios menos estirados. A figura ao lado mostra um exemplo dessas feições de transferência (neste caso, trata-se de uma falha transcorrente, feição extremamente comum em todo sistema extensional, onde elas recebem o nome consagrado de falha de

transferência (transfer fault).

Sendo geralmente desenvolvido em regime de cisalhamento puro, os sistemas extensionais apresentam-se originalmente quase simétricos. Entretanto, em certos casos, o sistema é caracterizado de um lado por um detachment e, do outro, por um simples arqueamento, formando um meio graben, conforme se vê na figura á esquerda.

O afinamento crustal ligado a um regime extensional, quando acentuado, leva à formação de uma depressão propícia à deposição de sedimentos e, geralmente, existe uma estreita associação entre falhamento e sedimentação nas bacias sedimentares. As falhas ativas durante a sedimentação são chamadas falhas de crescimetno (growth

fault). A associação dos processos de deposição, de compactação diferencial, de subsidência e deformacionais pode levar, no caso destas falhas, à geometrias complexas (variação de espessura das camadas, discordância angular progressiva ao longo do plano de falha etc.) A figura ao lado exemplifica de modo simples a evolução de falha de crescimento.

Os sistemas extensionais foram detalhadamente estudados no decorrer das últimas décadas, principalmente em função do seu potencial petrolífero e numerosos são os exemplos disponíveis na literatura. A figura a seguir mostra alguns desses exemplos.

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Referência:

Texto extraído e modificado a partir de ARTHAUD, Michel H. Elementos de Geologia

Estrutural. Fortaleza, 1998.