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Mestrado em Tecnologia de Diagnóstico e Intervenção Cardiovascular II Edição Área de Especialização - Ultrassonografia Cardiovascular ESTUDO DA FUNÇÃO VENTRICULAR POR STRAIN OBTIDO POR SPECKLE TRACKING EM DOENTES COM CARDIOMIOPATIA HIPERTRÓFICA Mário Rui Antunes Lourenço Lisboa, Dezembro de 2013

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Mestrado em Tecnologia de Diagnstico e Interveno

Cardiovascular II Edio

rea de Especializao - Ultrassonografia Cardiovascular

ESTUDO DA FUNO VENTRICULAR POR STRAIN

OBTIDO POR SPECKLE TRACKING EM DOENTES COM

CARDIOMIOPATIA HIPERTRFICA

Mrio Rui Antunes Loureno

Lisboa, Dezembro de 2013

Mestrado em Tecnologia de Diagnstico e Interveno

Cardiovascular II Edio

rea de Especializao - Ultrassonografia Cardiovascular

ESTUDO DA FUNO VENTRICULAR POR STRAIN

OBTIDO POR SPECKLE TRACKING EM DOENTES COM

CARDIOMIOPATIA HIPERTRFICA

Mrio Rui Antunes Loureno

Orientadora:

Dra. Olga Azevedo

ESTUDO DA FUNO VENTRICULAR POR STRAIN OBTIDO POR SPECKLE TRACKING EM DOENTES COM

MIOCARDIOPATIA HIPERTRFICA

iii

AGRADECIMENTOS

dra. Olga Azevedo, um agradecimento sentido pela orientao e constante

disponibilidade no desenrolar deste trabalho. Na prtica diria pela inspirao e

contnuo estmulo para fazer mais e melhor que me tem permitido um maior

crescimento pessoal e profissional.

Ao Centro Hospitalar do Alto Ave, na pessoa dos seus Exmos. Directores, por

permitirem a utilizao do laboratrio e equipamentos para a realizao e anlise dos

exames.

dra. Isabel Quelhas pela disponibilidade e compreenso demonstradas e pelo apoio

contnuo na elaborao deste trabalho.

A todos os elementos do laboratrio de ecocardiografia do Centro Hospitalar Alto Ave

que de uma forma ou outra contriburam para a colheita dos dados e a execuo do

trabalho.

A todos os meus colegas cardiopneumologistas no CHAA, especialmente a tcnica

Isabel Nogueira por ser uma fonte inesgotvel de apoio e pelo incentivo formao

profissional.

A todos os meus amigos mais chegados por me ajudarem sempre a ultrapassar os

momentos de maior stress e trabalho.

Aos meus pais pelo apoio incondicional sempre demonstrado, por nunca me deixarem

baixar os braos e pela dedicao e interveno na minha formao pessoal e

profissional.

minha irm por estar sempre comigo em todos os momentos e em mais uma etapa

esteve sempre presente para me apoiar.

Sara pela enorme compreenso, pacincia e carinho que me ajudaram muito na

concluso desta etapa. Partilhou comigo muito do stress derivado deste trabalho e

privou-se de algum tempo livre para me ajudar. Sem o seu apoio constante teria sido

bem mais rdua a tarefa de concluir este trabalho.

ESTUDO DA FUNO VENTRICULAR POR STRAIN OBTIDO POR SPECKLE TRACKING EM DOENTES COM

MIOCARDIOPATIA HIPERTRFICA

iv

RESUMO

Introduo: A Miocardiopatia Hipertrfica (MCH) uma miocardiopatia caracterizada

pela presena de hipertrofia ventricular esquerda (HVE) e disfuno diastlica.

Disfuno sistlica subclnica tambm ocorre apesar da fraco de ejeco se manter

frequentemente conservada at uma fase tardia da doena. A avaliao

ecocardiogrfica da deformao miocrdica permite detectar e compreender melhor a

disfuno sistlica subclnica que ocorre na MCH.

Objectivo: Avaliao da funo ventricular de doentes com MCH atravs de strain

obtido por speckle tracking, com maior nfase no twist ventricular.

Metodologia: Estudo prospectivo incluindo 20 doentes com MCH, 16 doentes com

HVE secundria hipertenso arterial e 17 controlos. Colhidos dados demogrficos e

clnicos. Efectuado ecocardiograma transtorcico com avaliao da deformao

miocrdica por speckle tracking 2D, incluindo o twist ventricular.

Resultados: Os valores globais de strain e strain rate longitudinais foram menores na

MCH que nos outros grupos de indivduos. O twist ventricular estava aumentado nos

doentes com MCH comparativamente aos controlos. Mais especificamente, o twist

estava aumentado nos doentes com MCH obstrutiva, em comparao com os doentes

com MCH no obstrutiva e os controlos, nos quais o twist estava preservado

(27.99.0 vs. 15.34.4 vs. 15.95.8; p=0.001; p=0.001). O aumento do twist nos

doentes com MCH obstrutiva deveu-se a um aumento da rotao quer basal quer

apical do VE. O gradiente de presso na cmara de sada do VE foi preditor

independente do twist nos doentes com MCH.

Concluses: O twist ventricular est aumentado nos doentes com MCH obstrutiva por

aumento da rotao quer basal quer apical do VE.

Palavras chave: Miocardiopatia Hipertrfica; speckle tracking; strain; twist

ESTUDO DA FUNO VENTRICULAR POR STRAIN OBTIDO POR SPECKLE TRACKING EM DOENTES COM

MIOCARDIOPATIA HIPERTRFICA

v

ABSTRACT

Introduction: Hypertrophic cardiomyopathy (HCM) is a cardiomyopathy characterized

by left ventricular hypertrophy (LVH) and diastolic dysfunction. Subclinical systolic

dysfunction also develops in spite of preservation of left ventricular ejection fraction

until a late stage of the disease. Echocardiographic evaluation of strain allows the

detection and better understanding of the subclinical systolic dysfunction that occurs in

HCM.

Aim: Evaluation of left ventricular function in patients with HCM using strain obtained

by speckle tracking, particularly ventricular twist.

Methods: Prospective study including 20 patients with HCM, 16 patients with LVH

secondary to arterial hypertension and 17 healthy controls. Demographic and clinical

data were obtained. Transthoracic echocardiogram was performed with evaluation of

strain by 2D speckle tracking, including ventricular twist.

Results: Global longitudinal strain and strain rate were lower in HCM than in the other

groups of individuals. LV twist was increased in patients with HCM, when compared to

controls. More specifically, LV twist was increased in patients with obstructive HCM,

when compared to patients with nonobstructive HCM and controls, in whom LV twist

was preserved (27.99.0 vs. 15.34.4 vs. 15.95.8; p=0.001; p=0.001). The increase

of LV twist in patients with obstructive HCM was due to an increase of basal and apical

LV rotation. The pressure gradient on the outflow tract was an independent predictor of

LV twist in patients with HCM.

Conclusion: LV twist is increased in patients with obstructive HCM due to an increase

of basal and apical LV rotation.

Key-words: Hypertrophic cardiomyopathy; speckle tracking; strain; twist

ESTUDO DA FUNO VENTRICULAR POR STRAIN OBTIDO POR SPECKLE TRACKING EM DOENTES COM

MIOCARDIOPATIA HIPERTRFICA

vi

INDICE

1. INTRODUO 1

1.1 Miocardiopatia Hipertrfica

a. Definio

b. Epidemiologia

c. Gentica

d. Fisiopatologia

e. Curso Clnico

f. Diagnstico

1

1

1

2

2

3

4

1.2 Ecocardiografia

a. Introduo

b. Avaliao da Hipertrofia Ventricular Esquerda

c. Avaliao da Funo Diastlica

d. Avaliao da Funo Sistlica

5

5

5

7

11

1.3 Deformao Miocrdica 12

1.4 Deformao Miocrdica na Miocardiopatia Hipertrfica

a. Strain longitudinal

b. Strain radial e circunferencial

c. Torso ventricular

d. Strain da AE

20

20

22

23

24

2. OBJECTIVOS 25

3. METODOLOGIA

3.1 Tipologia do Estudo e Mtodo de Abordagem

3.2 Populao e Amostra

3.3 Instrumento de recolha de dados

3.4 Procedimentos de Recolha de Dados

3.5. Reprodutibilidade Variabilidade inter-observador

3.6. Mtodos de Anlise de Dados

3.7. Consideraes ticas e Legais

26

26

26

32

33

37

38

39

4. RESULTADOS 40

5. DISCUSSO 56

6. CONCLUSO 64

7. REFERNCIAS 65

ESTUDO DA FUNO VENTRICULAR POR STRAIN OBTIDO POR SPECKLE TRACKING EM DOENTES COM

MIOCARDIOPATIA HIPERTRFICA

1

1. INTRODUO

1.1. MIOCARDIOPATIA HIPERTRFICA

a. Definio

As Miocardiopatias so doenas primrias do miocrdio. Elliott et al., em nome

da Sociedade Europeia de Cardiologia, propuseram uma classificao para as

miocardiopatias em 2008,em que a miocardiopatia hipertrfica (MCH) definida como

a presena de hipertrofia ventricular esquerda (HVE), com aumento da espessura da

parede ou da massa ventricular, na ausncia de condies de sobrecarga

hemodinmica (nomeadamente hipertenso arterial ou doena valvular) suficientes

para o seu desenvolvimento(1). Esta classificao puramente morfolgica polmica,

pois no diferencia patologicamente a hipertrofia miocrdica da infiltrao intersticial

ou da acumulao intracelular, desta forma incluindo dentro da definio de MCH

doenas sistmicas como a amiloidose ou as doenas de armazenamento do

glicognio.

Por sua vez, Gersh et al. nas guidelines para o diagnstico e tratamento da

MCH, publicadas em 2011 pela American College of Cardiology Foundation/American

Heart Association, definem a MCH como um estado de doena caracterizado por HVE

inexplicada, associada a cmaras cardacas no dilatadas, na ausncia de outras

doenas cardacas ou sistmicas que por si seriam suficientes para causar a

magnitude da HVE existente num dado doente. Nestas guidelines, o termo MCH

refere-se apenas a HVE causada por mutao sarcomrica ou, no caso de estudo

gentico inconclusivo, a HVE na ausncia de manifestaes extracardacas ou

metablicas. Habitualmente os doentes com MCH apresentam uma espessura

mxima da parede ventricular esquerda (VE) 15mm, sendo os casos com 13 e

14mm considerados borderline. Contudo, necessrio fazer a ressalva dos doentes

com MCH poderem ser genotipicamente positivos e fenotipicamente negativos, ou

seja, ainda sem HVE manifesta(2).

b. Epidemiologia

A MCH a miocardiopatia gentica mais comum, com uma prevalncia

estimada de 0.2% (ou seja 1:500) na populao geral(3). Esta elevada prevalncia na

populao geral excede grandemente o pequeno nmero de indivduos que se

apresentam na prtica clnica cardiolgica, implicando assim que a maioria dos

doentes com MCH no se encontram identificados(2). Marian, numa reviso recente,

chama ainda a ateno para o facto da prevalncia da MCH poder ser ainda maior que

a identificada nos estudos de rastreio ecocardiogrfico realizados em jovens, pois a

ESTUDO DA FUNO VENTRICULAR POR STRAIN OBTIDO POR SPECKLE TRACKING EM DOENTES COM

MIOCARDIOPATIA HIPERTRFICA

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penetrncia pode ser incompleta e muitos doentes podero apenas apresentar HVE

ligeira ou de incio tardio(4).

A MCH uma doena global, afectando as vrias raas(5, 6) e com uma

distribuio idntica quanto ao gnero(7).

c. Gentica

A identificao da MCH como uma doena gentica ocorreu h mais de 25

anos. Em 1989, Jarcho et al. descreveram a primeira mutao causal de MCH num

gene de uma protena sarcomrica(8). Ao longo do tempo, outras mutaes causais

foram identificadas nos genes que codificam protenas sarcomricas (9, 10, 11), tendo

mais recentemente sido identificados casos de MCH associados a mutaes das

protenas da linha Z e de protenas envolvidas noutras funes do micito (como o

fosfolambo e a viniculina)(12).

A MCH assim uma doena gentica heterognea, tendo sido j identificadas

mais de 1400 mutaes causais em 14 genes(13). Contudo, actualmente o estudo

gentico apenas identifica mutaes em cerca de 50-70% dos doentes com MCH(9).As

mutaes nos genes da cadeia pesada da -miosina e da protena C ligada miosina

so identificadas em cerca de 80% dos casos(13).

O padro de hereditariedade da MCH na maioria dos casos autossmico

dominante(13). Charron et al., num documento de consenso da Sociedade Europeia de

Cardiologia, recomendam o rastreio familiar atravs da realizao de estudo gentico.

Nos casos em que o estudo gentico positivo, o ecocardiograma deve ser realizado

para pesquisar a presena do fentipo de MCH. Nos casos em que o fentipo ainda

negativo, est indicado o follow up regular com ecocardiograma(14). Nos casos em que

o estudo gentico negativo, o rastreio familiar deve prosseguir com a realizao de

ecocardiograma. O ecocardiograma deve ser realizado a partir dos 10 a 12 anos, cada

1-2 anos dos 10 aos 20 anos e cada 2-5 anos a partir dos 20 anos e at aos 50 a 60

anos.

d. Fisiopatologia

A MCH uma doena primria dos micitos cardacos que caracterizada por

hipertrofia e desarranjo dos micitos, fibrose intersticial, hipertrofia e hiperplasia da

camada mdia das artrias coronrias intramurais e anomalias dos folhetos valvulares

mitrais. O desarranjo dos micitos cardacos a marca patolgica essencial da MCH e

frequentemente afecta mais de 20% da massa VE(15).

Marian apresentou um modelo explicativo para a hipertrofia presente na MCH.

As mutaes afectam a estrutura ou o nvel de expresso das protenas sarcomricas,

ESTUDO DA FUNO VENTRICULAR POR STRAIN OBTIDO POR SPECKLE TRACKING EM DOENTES COM

MIOCARDIOPATIA HIPERTRFICA

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o que interfere com a interaco da actina com a miosina e com a actividade da

ATPase miofibrilar, levando activao de vrias vias sinalizadoras e expresso de

vrios marcadores envolvidos na hipertrofia(4).

Losi et al. apresentaram um modelo que relaciona a fisiopatologia da MCH com

a disfuno diastlica (Figura 1). No seu modelo, estabelecem como contribuintes para

a disfuno diastlica a alterao da sensibilidade ao clcio, o desarranjo das fibras

musculares cardacas, o aumento da matriz extracelular, a hipertrofia, a obstruo da

cmara de sada do ventrculo esquerdo (CSVE) e a presena de isquemia

miocrdica(16).

Figura 1 Mecanismos da disfuno diastlica

e. Curso Clnico

A MCH uma doena com um curso clnico heterogneo, podendo apresentar-

se em todas as faixas etrias desde a infncia at ao muito idoso(2). A maioria dos

doentes com MCH tem uma esperana de vida normal, sem grande limitao da sua

qualidade de vida(15). Esto contudo identificadas complicaes significativas que se

podem associar MCH(2):

Morte sbita devida a taquiarritmias ventriculares, com um risco de

cerca de 1% no global dos doentes com MCH, sendo contudo mais

frequente nos jovens com menos de 35 anos;

Insuficincia cardaca secundria a HVE e disfuno diastlica,

caracterizada por dispneia de esforo (com ou sem dor torcica), que

pode ser progressiva apesar da funo sistlica preservada e da

presena de ritmo sinusal. A disfuno sistlica ocorre num estadio

terminal de remodelagem VE caracterizado por extensa fibrose

miocrdica;

ESTUDO DA FUNO VENTRICULAR POR STRAIN OBTIDO POR SPECKLE TRACKING EM DOENTES COM

MIOCARDIOPATIA HIPERTRFICA

4

Fibrilao auricular (FA) com um risco aumentado de tromboembolismo

sistmico e acidente vascular cerebral (AVC).

A MCH pode condicionar obstruo da CSVE, o que contribui para as

manifestaes clnicas dos doentes, nomeadamente as queixas de insuficincia

cardaca(2). Estudos realizados por Maron et al. mostraram que a obstruo existe em

cerca de 1/3 dos doentes em repouso e em mais 1/3 dos doentes em relao com o

exerccio fsico(17).

O mecanismo fundamental que actualmente se aceita como explicativo da

obstruo da CSVE o movimento sistlico anterior (SAM) da vlvula mitral.

Inicialmente julgava-se que era causada pela contraco local do septo basal

hipertrofiado. Posteriormente demonstrou-se que o posicionamento anormal do

aparelho valvular mitral, que atravs de um efeito de draga leva a que os folhetos

mitrais sejam puxados de encontro ao septo basal, condicionando assim a

obstruo(18). Pollick et al. demonstraram, j h algumas dcadas, a existncia de uma

correlao positiva entre a severidade do SAM e a severidade da obstruo da CSVE

avaliada invasivamente(19).

Para responder a estas formas de apresentao clnica existe uma variedade

de intervenes teraputicas que alteram o curso natural da doena, tais como

teraputicas farmacolgicas, miectomia septal cirrgica, ablao septal alcolica,

implantao de pacemaker e/ou CDI e transplante cardaco(20).

f. Diagnstico

O diagnstico da MCH baseado na ecocardiografia convencional(21). Este

diagnstico morfolgico estabelecido na presena de uma espessura de parede VE

15 mm, sendo espessuras de 13 e 14 mm consideradas borderline(2). A MCH

assume mais frequentemente um padro de HVE assimtrica de predomnio septal,

sendo a razo da espessura do septo/parede posterior superior a 1.3 em doentes

normotensos e a 1.5 em indivduos hipertensos(22).

Contudo, no existe nenhum parmetro da ecocardiografia convencional que

permita o diagnstico diferencial entre a MCH e a HVE associada HTA. O Doppler

tecidular tem-se mostrado til nesta diferenciao, observando-se velocidades mais

baixas de contrao e relaxamento miocrdico na MCH, sendo portanto a disfuno

diastlica e a disfuno sistlica subclnica mais graves na MCH que na HVE

secundria a HTA(23). Mais recentemente, as tcnicas de deformao miocrdica tm-

se mostrado promissoras neste diagnstico diferencial(24).

ESTUDO DA FUNO VENTRICULAR POR STRAIN OBTIDO POR SPECKLE TRACKING EM DOENTES COM

MIOCARDIOPATIA HIPERTRFICA

5

A ressonncia magntica (RM) cardaca tambm pode ser til no diagnstico

de MCH, especialmente quando a MCH envolve apenas um segmento da parede

ventricular esquerda(21, 25) ou no diagnstico diferencial entre MCH e fenocpias, como

a amiloidose e a doena de Fabry. O padro tpico de realce tardio da MCH situado

nos pontos de insero do VE no SIV contrasta com o padro tpico de realce tardio

subendocrdico difuso da amiloidose e com o padro tpico de realce tardio infero-

lateral basal da doena de Fabry(26). Por outro lado, a HVE secundria a HTA no se

associa presena de realce tardio, pelo que na ausncia de realce tardio o

diagnstico diferencial permanece por resolver(21).

O estudo gentico poder contribuir para o diagnstico diferencial entre a MCH

e a HVE secundria HTA ou fenocpias, uma vez que a identificao de uma

mutao causal de MCH confirma o seu diagnstico. Contudo, a base gentica da

MCH ainda no completamente conhecida, pelo que o estudo gentico identifica

mutaes em apenas 70% dos doentes com MCH. Assim, a ausncia de identificao

de uma mutao causal no permite a excluso do diagnstico de MCH(27).

1.2. ECOCARDIOGRAFIA

a. Introduo

A ecocardiografia uma tcnica de imagem que compreende vrias

modalidades que permitem um extenso e aprofundado estudo anatmico e funcional

cardaco. O ecocardiograma transtorcico um exame disponvel, seguro, de baixo

custo e que fornece informao de forma rpida, fivel e reprodutvel, permitindo o

diagnstico, a compreenso da fisiopatologia, o seguimento, a orientao teraputica

e a avaliao do prognstico dos doentes com MCH(28).

b. Avaliao da Hipertrofia Ventricular Esquerda

Os primeiros critrios diagnsticos ecocardiogrficos de MCH foram

estabelecidos utilizando o Modo M e incluam: (i) hipertrofia assimtrica do septo

interventricular (SIV), (ii) SAM da vlvula mitral, (iii) VE pequeno, (iv) imobilidade septal

e (v) encerramento prematuro da vlvula artica(16).

A hipertrofia assimtrica do SIV implicava uma espessura 15 mm e uma

relao entre a espessura do septo e da parede posterior >1.3(29). O SAM da vlvula

mitral facilmente visualizado no Modo M como um movimento abrupto do folheto

anterior da vlvula mitral em direco ao SIV que atinge o seu mximo antes do pico

do movimento sistlico da parede posterior(30) (Figura 2). A hipertrofia septal

assimtrica e o SAM da vlvula mitral foram inicialmente assumidos como

ESTUDO DA FUNO VENTRICULAR POR STRAIN OBTIDO POR SPECKLE TRACKING EM DOENTES COM

MIOCARDIOPATIA HIPERTRFICA

6

patognomnicos da MCH(16). Contudo, mais tarde foi demonstrado que estas

caractersticas poderiam estar presentes noutras formas de HVE, como a HTA(31),

Doena de Fabry(32) ou glicogenoses(33).

Figura 2 - SAM da vlvula mitral em doente com MCH obstrutiva

Segundo as associaes americana e europeia de ecocardiografia, a

determinao da espessura das paredes VE e dos dimetros telediastlico e

telessistlico do VE deve ser realizada na incidncia paraesternal eixo longo, a partir

do modo M ou bidimensional(34) (Figura 3). Valores acima de 15mm so utilizados no

diagnstico de MCH(22). Em termos prognsticos, a presena de hipertrofia mxima

extrema (espessura do SIV 30 mm)foi identificada como preditor de morte sbita nos

doentes com MCH(35), constituindo indicao para a implantao de CDI(2).

Figura 3 - Fentipo de MCH em ecocardiograma 2D (janela paraesternal eixo longo)

A massa VE considerada o melhor parmetro para a quantificao da HVE.

Contudo, a distribuio heterognea da hipertrofia na MCH constitui uma limitao

aplicao dos algoritmos habitualmente utilizados na ecocardiografia 2D para

ESTUDO DA FUNO VENTRICULAR POR STRAIN OBTIDO POR SPECKLE TRACKING EM DOENTES COM

MIOCARDIOPATIA HIPERTRFICA

7

quantificar a massa do VE(34). Por esse motivo, vrios indexes ecocardiogrficos 2D

foram desenvolvidos para a quantificao da hipertrofia na MCH, sendo disso

exemplos os scores propostos por Wigle et al.(36) e por Spirito et al.(37). Contudo, a

ecocardiografia tridimensional (3D) a tcnica ecocardiogrfica mais fidedigna e

reprodutvel na quantificao da massa do VE(38), apresentando uma boa correlao

com a RM cardaca que considerada o gold standard(21).

A magnitude da HVE tambm no pode ser usada para diferenciar a MCH da

HVE hipertensiva, pois tambm neste caso a HVE pode ser significativa,

especialmente nos mais idosos(39).

A maioria dos doentes com MCH apresentam uma hipertrofia ventricular

assimtrica com envolvimento do septo anterior, mas mais raramente a hipertrofia

simtrica ou confinada ao pex do VE(40). Esta diversidade de padres de HVE nos

doentes com MCH torna impossvel a sua diferenciao de outras formas de HVE,

como a HTA ou outras fenocpias, baseada no padro morfolgico evidenciado pela

ecocardiografia bidimensional(2).

c. Avaliao da Funo Diastlica

A MCH cursa com disfuno diastlica secundria a hipertrofia, desarranjo da

arquitectura dos micitos, fibrose intersticial e isquemia(16).

Segundo as recomendaes europeias de 2009, a avaliao ecocardiogrfica

da funo diastlica na prtica clnica dever incluir a avaliao do volume e funo da

AE, do fluxo transmitral, do fluxo venoso pulmonar e das velocidades diastlicas do

Doppler tecidular(28).

Dimenso e Funo da Aurcula Esquerda

Nos doentes com MCH, ocorre dilatao da AE secundria a disfuno

diastlica, obstruo da CSVE e insuficincia mitral(16).

A avaliao da dilatao da AE frequentemente realizada atravs da medio

do seu dimetro linear no eixo longo paraesternal em modo M ou 2D. Nistri et al.

demonstraram que o dimetro da AE est relacionado com o risco de FA,

desenvolvimento de insuficincia cardaca e mortalidade cardaca, em especial se for

superior a 48mm(41). Woo et al. demonstraram ainda que o dimetro da AE um

preditor de sobrevivncia ps-miectomia em pacientes com MCH obstrutiva(42).

Num outro estudo, Briguori et al. determinaram que a fraco de encurtamento

da AE permitia estimar a presso telediastlica do VE(43). Alguns anos mais tarde, Losi

et al. determinaram que a reduo da fraco de encurtamento da AE para valores

ESTUDO DA FUNO VENTRICULAR POR STRAIN OBTIDO POR SPECKLE TRACKING EM DOENTES COM

MIOCARDIOPATIA HIPERTRFICA

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ESTUDO DA FUNO VENTRICULAR POR STRAIN OBTIDO POR SPECKLE TRACKING EM DOENTES COM

MIOCARDIOPATIA HIPERTRFICA

9

aumento da presso de enchimento do VE. A dificuldade de execuo apropriada da

manobra e a introduo do Doppler tecidular diminuram contudo a utilizao desta

tcnica. Finalmente, surge o padro restritivo caracterizado por uma relao E/A>2,

TD 0.5cm dentro da veia pulmonar

superior direita na incidncia apical de 4 cmaras permite obter a velocidade da onda

sistlica (S), a velocidade da onda diastlica (D), a relao S/D, a fraco de

enchimento sistlico (integral tempo-velocidade de S / integrais de tempo-velocidade

S+D) e a velocidade e durao da onda telediastlica (Ar)(28).

A relao S/D maior que 1 em indivduos normais com idade >40 anos,

diminuindo para valores 35cm/s sugere aumento da presso telediastlica

do VE. Contudo, a diferena de durao Ar-A o nico parmetro independente da

ESTUDO DA FUNO VENTRICULAR POR STRAIN OBTIDO POR SPECKLE TRACKING EM DOENTES COM

MIOCARDIOPATIA HIPERTRFICA

10

idade e o primeiro indicador de aumento da presso telediastlica do VE, permitindo a

diferenciao de indivduos com alterao do relaxamento VE em indivduos com

presso telediastlica do VE normal e indivduos com presso telediastlica

aumentada mas com presso AE normal. Todos os outros parmetros de padro

pseudonormal j indicam aumento da presso da AE e uma fase mais avanada de

disfuno diastlica(28).

A principal limitao destes ndices est relacionada com a aquisio de curvas

adequadas que permitam as medies precisas, especialmente da onda Ar(28).

Doppler tecidular

O Doppler tecidular uma modalidade ecocardiogrfica que avalia o

movimento de grande amplitude e de baixa velocidade do tecido miocrdico. Durante o

ciclo cardaco, o pex mantem-se estacionrio relativamente aos segmentos basais,

pelo que os movimentos detectados ao nvel do anel mitral relativamente ao pex em

sstole e em distole so indicadores da contraco e relaxamento longitudinal do

VE(54). Aplicando o Doppler tecidular pulsado no miocrdio ventricular, imediatamente

adjacente ao anel mitral, a nvel septal ou lateral, e com um ngulo do feixe de

ultrassons em relao ao movimento cardaco 12 indica aumento da presso de

enchimento do VE. Nos doentes com MCH, Nagueh et al. demonstraram uma boa

correlao entre a relao E/E (utilizando o E da parede lateral) e a presso de

enchimento do VE(51). No entanto, noutro estudo mais recente, Geske et al. mostraram

ESTUDO DA FUNO VENTRICULAR POR STRAIN OBTIDO POR SPECKLE TRACKING EM DOENTES COM

MIOCARDIOPATIA HIPERTRFICA

11

que existe apenas uma modesta correlao entre a relao E/E e a presso da AE

medida invasivamente. Neste estudo, cerca de 25% dos doentes com relao E/E >15

tinham presso da AE

ESTUDO DA FUNO VENTRICULAR POR STRAIN OBTIDO POR SPECKLE TRACKING EM DOENTES COM

MIOCARDIOPATIA HIPERTRFICA

12

Este parmetro do Doppler tecidular tambm til para diferenciar a MCH de

outras variantes de HVE, nomeadamente a hipertensiva. Num estudo realizado por

Vinereanu et al. envolvendo pacientes com MCH, HVE hipertensiva, atletas e

controlos, a velocidade da onda S permitiu discriminar a hipertrofia fisiolgica das

variantes patolgicas, enquanto a heterogeneidade das velocidades sistlicas no anel

mitral permitiu diferenciar os pacientes com MCH (velocidades baixas e alta

heterogeneidade) dos pacientes com HVE hipertensiva (velocidades baixas mas baixa

heterogeneidade)(23).

Nos doentes com MCH estabelecida, a reduo da velocidade da onda S foi

identificada como preditora de morte e de hospitalizao por progresso da

insuficincia cardaca(62).

Contudo, o Doppler tecidular apresenta algumas limitaes importantes. Esta

tcnica permite a quantificao da velocidade de contraco miocrdica desde que o

vector esteja alinhado paralelamente ao feixe de ultrassons, o que restringe a sua

aplicao aos planos apicais. Por outro lado, uma tcnica que mede velocidades

absolutas e no a deformao miocrdica intrnseca, sendo influenciada pelos

movimentos de tethering e translao cardaca(63).

1.3. DEFORMAO MIOCRDICA

A avaliao da deformao miocrdica pode ser realizada atravs do Doppler

tecidular ou da tcnica de Speckle Tracking. Esta avaliao permite-nos obter os

seguintes parmetros:

Deslocamento, d, designa a distncia que um determinado ponto se move

entre duas frames consecutivas no ciclo cardaco. medido em centmetros (cm).

Velocidade, v, traduz o deslocamento por unidade de tempo e medida em

centmetros por segundo (cm/s).

Strain, e, representa deformao miocrdica, ou seja, a variao da

distncia (L1) entre dois pontos pr-definidos em relao sua distncia original (L0).

calculado pela seguinte frmula: L1-L0 / L0. Pode apresentar valores positivos (no

caso de um alongamento da distncia entre os pontos) ou negativos (no caso de um

encurtamento). Esta medida no tem unidades, pelo que apresentada na forma de

percentagem (ex: um strain de -50% significa que a distncia entre os dois pontos

encurtou 50%, ou seja, passou a metade da distncia original).

Strain rate, SR, designa a taxa a que o strain se altera e expresso em 1/s

ou s-1 (64).

a. Componentes da deformao miocrdica

ESTUDO DA FUNO VENTRICULAR POR STRAIN OBTIDO POR SPECKLE TRACKING EM DOENTES COM

MIOCARDIOPATIA HIPERTRFICA

13

Strain longitudinal diz respeito ao movimento das fibras miocrdicas na

direco longitudinal, com encurtamento e movimento da base em direco ao pex

durante a sstole e movimento oposto durante a distole. Por se tratar de um

encurtamento, o strain longitudinal sistlico expresso em valores negativos.

Strain radial diz respeito ao movimento de contraco das fibras miocrdicas

em direco ao eixo que passa pelo centro da cavidade ventricular em sstole e

movimento oposto em distole. Por se tratar de um alongamento, o strain radial

sistlico expresso em valores positivos.

Strain circunferencial diz respeito ao movimento de contraco das fibras

miocrdicas que resulta na diminuio da circunferncia da seco ventricular em

sstole e respectivo aumento em distole. Por se tratar de um encurtamento, o strain

circunferencial sistlico expresso em valores negativos.

Rotao designa o movimento rotacional do miocrdio volta do longo eixo do

VE durante a sstole e expresso em graus (). No subendocrdio, a base roda em

sentido anti-horrio e o pex no sentido horrio. Pelo contrrio, no subepicrdio, a

base roda em sentido horrio e o pex em sentido anti-horrio. Como o raio de rotao

do subepicrdio maior que o do subendocrdio, o torque do subepicrdio maior,

pelo que a rotao cardaca depende sobretudo das fibras subepicrdicas, seguindo o

sentido horrio na base e o sentido anti-horrio no pex(65) (Figura 4 e 5).

Figura 4 - Rotao basal e apical no subepicrdio e no subendocrdio (65)

ESTUDO DA FUNO VENTRICULAR POR STRAIN OBTIDO POR SPECKLE TRACKING EM DOENTES COM

MIOCARDIOPATIA HIPERTRFICA

14

Figura 5 - Rotao basal e apical do corao (65)

O valor absoluto da diferena da rotao do pex para a base designa o Twist,

tambm expresso em graus (). A Torso corresponde ao gradiente base-pex do

ngulo de rotao ao longo do longo eixo do VE, e expressa em graus por

centmetro (/cm)(66) (Figura 6).

Figura 6 - Conceitos de Twist e Torso ventricular(66)

O Untwist refere-se ao processo de recoil do twist, que contribui para a suco

diastlica, facilitando o enchimento ventricular precoce. Ocorre predominantemente na

fase de relaxamento isovolumtrico e termina na fase de enchimento ventricular

precoce, precedendo assim o alongamento longitudinal e radial. J o twist ocorre na

sstole simultaneamente com o encurtamento longitudinal e radial(64).

b. Relevncia da orientao das fibras miocrdicas para a deformao

miocrdica

A orientao das fibras miocrdicas um determinante fundamental para a

deformao miocrdica.

Na regio subendocrdica, as fibras miocrdicas esto orientadas quase

longitudinalmente a cerca de um ngulo de 80 em relao direco circunferencial,

ESTUDO DA FUNO VENTRICULAR POR STRAIN OBTIDO POR SPECKLE TRACKING EM DOENTES COM

MIOCARDIOPATIA HIPERTRFICA

15

apresentando assim uma orientao em mo direita. Desta forma, a regio

subendocrdica contribui essencialmente para a deformao longitudinal.

O ngulo de orientao das fibras miocrdicas diminui progressivamente at 0

na regio mesomiocrdica e continua a diminuir at -60, assumindo uma orientao

em mo esquerda, na regio subepicrdica. Desta forma, as regies mesomiocrdica

e subepicrdica contribuem predominantemente para a rotao (Figura 7).

Figura 7- Relevncia da orientao das fibras para a deformao miocrdica(65)

A regio subendocrdica a mais vulnervel leso miocrdica. A leso da

regio subendocrdica afecta a funo sistlica, resultando em diminuio do strain

longitudinal, mas com strain circunferencial e twist preservados e Fej do VE

preservada. Na presena de disfuno subendocrdica, a rotao subendocrdica

diminui, diminuindo assim a oposio rotao subepicrdica, o que pode resultar

num aumento da rotao cardaca e portanto do twist ventricular (Figura 8). A funo

diastlica tambm fica comprometida, com diminuio do strain longitudinal diastlico

precoce e untwisting reduzido e atrasado.

Figura 8 - Aumento da rotao ventricular na disfuno subendocrdica(65)

J a leso transmural resulta em disfuno concomitante das regies

mesomiocrdica e subepicrdica, com consequente diminuio do twist e do strain

ESTUDO DA FUNO VENTRICULAR POR STRAIN OBTIDO POR SPECKLE TRACKING EM DOENTES COM

MIOCARDIOPATIA HIPERTRFICA

16

circunferencial e radial, para alm do strain longitudinal, o que resulta em diminuio

da Fej do VE(64).

c. Valores de normalidade da deformao miocrdica

Os valores de normalidade de strain variam muito com a tcnica usada para a

sua medio e a marca do equipamento usada, assim como com a idade, condies

de carga e frequncia cardaca(64).

Os valores de normalidade obtidos por Doppler tecidular num estudo europeu

de grande dimenso foram os seguintes: strain longitudinal -18.5%; strain rate

longitudinal -1.0 s-1; strain radial 44.5%; e strain rate radial 2.45 s-1 (67).

Numa recente meta-anlise de Yingchoncharoen et al., foram definidos os

valores de normalidade obtidos por Speckle Tracking: strain longitudinal -18.9 a -

20.4%; strain rate longitudinal -0.94 a-1.01 s-1; strain radial 43.6 a 51.0%; strain rate

radial 2.23 a 2.52 s-1; strain circunferencial -22.1 a -24.6%; e strain rate circunferencial

-1.12 a -2.2 s-1 (68).

Os valores de strain longitudinal e circunferencial so maiores nos segmentos

apicais e mdios que nos segmentos basais. Usando uma tcnica diferente do speckle

tracking, o feature tracking, Bussadori et al. Encontraram valores de strain e de strain

rate longitudinal progressivamente maiores da base para o pex (-12.95 6.79 vs. -

14.87 6.78; p = 0.002; -0.72 0.39 vs. -0.94 0.48, p= 0.0001, respectivamente). A

mesma variao foi documentada para o strain e o strain rate circunferencial (-21.32

5.15 vs. -27.02 5.88, p = 0.002; -1.51 0.37 vs. -1.95 0.57, p = 0.003,

respectivamente)(69). Tambm Carasso et al., usando a tcnica do Velocity Vector

Imaging, documentou um aumento do strain longitudinal de 10% e circunferencial de

33% da base para o pex(70).

O strain longitudinal obtido por speckle tracking diminui com a idade, ao

contrrio do que acontece com o strain circunferencial, reflectindo uma diminuio da

funo subendocrdica com o envelhecimento(71). Este achado tambm foi confirmado

no estudo de Bussadori et al. comparando crianas e adultos pela tcnica de feature

tracking (strain longitudinal 22.18 3.06 vs. -19.05 3.05 p = 0.002, strain rate

longitudinal -1.30 0.20 vs. -1.07 0.19, p = 0.015; e strain rate circunferencial -1.83

0.60 vs. -1.67 0.55, p = 0.040)(69).

Os valores normais de twist dependem da idade e das condies de carga

ventricular, assim como da tcnica utilizada para a sua medio e da localizao da

regio de interesse (subendocrdio vs. subepicrdio)(64).

O twist aumenta ao longo da idade, desde a infncia precoce (5.81.3),

infncia tardia (6.82.3), adolescncia (8.82.6), meia idade (13.83.3)(72). Um outro

ESTUDO DA FUNO VENTRICULAR POR STRAIN OBTIDO POR SPECKLE TRACKING EM DOENTES COM

MIOCARDIOPATIA HIPERTRFICA

17

estudo de grande dimenso em indivduos saudveis documentou valores normais de

twist de cerca de 7.73.5. Este valor mostrou tambm um aumento com a idade,

sendo 6.72.9 nos indivduos com < 40 anos, 8.03.0 nos indivduos com 40-60 anos

e10.8 4.9 nos indivduos com > 60 anos(73). Na infncia, este aumento do twist

parece dever-se transio da rotao basal que deixa de ser em sentido anti-horrio

para passar a ser no sentido horrio. Posteriormente, o twist aumenta essencialmente

devido a um aumento da rotao apical com a idade(72). Deste modo, o twist ventricular

depende sobretudo da rotao apical, pelo que uma alterao da motilidade apical

altera significativamente o twist do VE. Com a idade h tambm uma reduo da taxa

e da magnitude do untwisting(74).

d. Strain obtido por Doppler Tecidular

O Doppler Tecidular permite a medio das velocidades de contraco e

relaxamento do miocrdio. Estas velocidades podem ser obtidas atravs de Doppler

pulsado ou Doppler de cor. O Doppler pulsado caracterizado por maior frame rate do

que o Doppler de cor, permitindo determinar as velocidades mximas, ao passo que

as velocidades obtidas por Doppler de cor representam velocidades mdias. Deste

modo, as velocidades obtidas por Doppler pulsado so cerca de 20 a 30% maiores

que as obtidas por Doppler de cor.

Contudo, o Doppler de cor apresenta a vantagem sobre o Doppler pulsado de

permitir ajustar o sample volume de forma a fazer o tracking de uma mesma regio de

interesse ao longo de todo o ciclo cardaco. Alm disso, permite a avaliao das

velocidades de vrias regies miocrdicas de interesse simultaneamente ao longo do

ciclo cardaco.

Aplicando o Doppler Tecidular, verifica-se que existe um gradiente de

velocidades da base (onde a velocidade maior) para o pex (onde a velocidade

nula). Existe ainda um gradiente de velocidades do endocrdio (onde a velocidade

maior) para o epicrdio (onde a velocidade menor).

A integrao temporal da velocidade permite-nos obter o deslocamento. O

strain rate representa o gradiente de velocidade entre dois pontos normalizado para a

distncia entre eles (r). calculado pela seguinte frmula: SR = V2 V1 / r. O strain

o integral temporal do strain rate.

A grande vantagem desta tcnica na avaliao do strain a melhor resoluo

temporal(64).

Limitaes do Strain obtido por Doppler Tecidular

ESTUDO DA FUNO VENTRICULAR POR STRAIN OBTIDO POR SPECKLE TRACKING EM DOENTES COM

MIOCARDIOPATIA HIPERTRFICA

18

O mtodo de avaliao do strain por Doppler Tecidular apresenta limitaes

importantes, que impedem a sua utilizao na prtica clnica diria.

O Doppler Tecidular avalia o movimento de um ponto em relao a outro ponto

que externo caixa torcica e que a sonda. Deste modo, as velocidades obtidas

por este mtodo so potencialmente enviesadas, podendo reflectir movimentos de

translao (movimento do corao na caixa torcica ao longo do tempo) ou de

tethering (movimento de uma regio acintica ao ser arrastada pela contrao de

uma regio contrctil), em vez de reflectir uma real contraco miocrdica da regio de

interesse. Este problema pode no entanto ser minorado com a utilizao de um menor

tamanho da amostra e a aquisio das imagens em apneia.

Por outro lado, o Doppler tecidular uma tcnica altamente dependente do

ngulo, sendo necessrio alinhar correctamente a regio de interesse a analisar com o

feixe de ultrassons para obter a determinao mais correcta das velocidades. Um

ngulo >20 resulta numa subestimativa importante das velocidades e numa alterao

dos timings dos eventos cardacos. Este problema pode ser minorado por um correcto

alinhamento da regio de interesse com o feixe de ultrassons e pela reduo da

largura do sector. Por este mesmo motivo, no possvel avaliar por Doppler tecidular

as velocidades em determinados segmentos (ex: segmentos infero-septais ou laterais

em curto eixo), pois no possvel alinhar estas regies com o feixe de ultrassons.

A avaliao do pex tambm est prejudicada por frequentes artefactos e

deficiente resoluo espacial proximal.

A integrao que usada para obter o strain rate resulta num shift da baseline,

obrigando a uma correco linear denominada drift compensation.

As curvas de strain e strain rate tm frequentemente rudo, dificultando a sua

interpretao, o que torna este mtodo pouco reprodutvel.

Outra limitao importante o facto de ser time-consuming(64).

e. Strain obtido por Speckle Tracking

Os speckles so padres acsticos nicos criados pela interaco dos

ultrassons com o miocrdio.

Blocos ou kernels de speckles podem ser seguidos frame by frame ao longo do

ciclo cardaco, em mltiplas regies num mesmo plano de imagem, sendo possvel

determinar o seu deslocamento, que ao longo do tempo se traduz em velocidade. A

variao da distncia entre dois pontos em relao distncia original que os unia

traduz o strain e a taxa a que este fenmeno ocorre representa o strain rate.

A obteno do strain pela tcnica de Speckle Tracking apresenta vrias

vantagens. Pode ser aplicada a imagens gray scale previamente adquiridas. uma

ESTUDO DA FUNO VENTRICULAR POR STRAIN OBTIDO POR SPECKLE TRACKING EM DOENTES COM

MIOCARDIOPATIA HIPERTRFICA

19

tcnica semi-automatizada e por isso muito menos time-consuming e mais

reprodutvel. Permite a apresentao da informao na forma de bulls-eye, facilitando

a interpretao e anlise dos dados segmentares e globais.

Embora, tal como o Doppler Tecidular, tambm avalie o movimento das

estruturas em relao a um ponto externo que a sonda, esta tcnica, ao contrrio do

Doppler tecidular, muito menos dependente do ngulo, sendo possvel avaliar o

strain em todas as direes (e no apenas ao longo do feixe de ultrassons). Deste

modo, possvel avaliar o strain, nomeadamente o radial e o circunferencial, em todas

as regies miocrdicas num determinado plano de imagem, independentemente da

sua direco. Esta independncia do ngulo no no entanto completa, verificando-se

que o Speckle Tracking funciona melhor quando aplicado ao longo do feixe de

ultrassons.

A tcnica de Speckle Tracking apresenta maior resoluo lateral, permitindo a

avaliao selectiva do strain nos diferentes nveis do endocrdio, mesocrdio e

epicrdio(64).

Limitaes do Strain por Speckle Tracking

As desvantagens da tcnica de Speckle Tracking incluem uma frame rate mais

baixa (cerca de 50-90 fps) do que o Doppler tecidular (cerca de 100-250fps). Por esse

motivo, eventos mais rpidos do ciclo cardaco, como a contraco isovolumtrica,

podem no ser to bem detectados e a determinao das velocidades mximas e dos

picos de strain rate pode estar subestimada, sobretudo na presena de taquicardia.

Esta tcnica de avaliao de strain depende de uma boa qualidade da imagem

adquirida, ficando gravemente comprometida na presena de foreshortening do pex

ou de eixos curtos apicais no circulares.

Concretamente na avaliao do twist, podem surgir problemas na avaliao do

eixo curto do VE a nvel basal, devido necessidade de uma maior largura de sector a

esse nvel e ao movimento fora do plano da imagem que ocorre medida que a base

desce em direco ao pex na sstole. Ao nvel apical, fundamental garantir um eixo

curto circular para uma determinao correcta da rotao a esse nvel.

A tcnica do Speckle Tracking 2D pressupe que seja possvel fazer sempre o

tracking dos speckles de frame para frame, o que nem sempre possvel se existir

movimento fora do plano da imagem. Este problema poderia ser ultrapassado com a

avaliao do strain por Speckle Tracking 3D, que tem ainda a vantagem de permitir

uma avaliao ainda mais rpida e completa que em 2D, evitando o foreshortening

apical ou outras limitaes relacionadas com a aquisio dos planos 2D. A maior

ESTUDO DA FUNO VENTRICULAR POR STRAIN OBTIDO POR SPECKLE TRACKING EM DOENTES COM

MIOCARDIOPATIA HIPERTRFICA

20

desvantagem da tcnica em 3D reside na frame rate que mais baixa que em 2D e no

facto da tcnica no estar ainda validada numa srie de cenrios clnicos.

Outra limitao implementao desta tcnica na prtica clnica a falta de

standardizao entre equipamentos de diferentes marcas(64).

f. Aplicaes clnicas das medidas de Deformao miocrdica

Potenciais aplicaes clnicas das medidas de strain incluem:

Avaliao da funo VE sistlica global e regional e deteco de disfuno

ventricular subclnica

Deteco de isquemia e viabilidade no ecocardiograma de stress

Pesquisa de dissincronia intraventricular, avaliao da resposta ao CRT e

determinao da localizao ideal para a sonda VE do CRT

Deteco de cardiomiopatia pr-clnica

Diagnstico diferencial de MCH vs. Corao de atleta

Diagnstico diferencial de Miocardiopatia restritiva vs. Pericardite constritiva

Avaliao da funo diastlica do VE

Avaliao da funo sistlica do ventrculo direito

Avaliao da funo auricular e do risco de FA(64)

1.4. DEFORMAO MIOCRDICA NA MCH

a. Strain longitudinal

i. O strain longitudinal permite distinguir MCH de outros tipos de HVE,

corao de atleta e controlos

Nos doentes com MCH, o strain longitudinal o tipo de strain mais estudado e

mais utilizado na prtica clnica.

Afonso et al. relataram que o strain longitudinal global tem uma excelente

capacidade discriminatria para distinguir os doentes com MCH dos doentes com HVE

secundria a hipertenso ou corao de atleta(75).

Richand et al. tambm demonstraram que o strain longitudinal pode ser

utilizado para distinguir MCH de corao de atleta e de controlos(76). Butz et al.

sugerem que um strain longitudinal global >-10% tem uma sensibilidade de 80% e

uma especificidade de 95% para distinguir MCH de corao de atleta e de controlos(77).

Num estudo baseado no Doppler tecidular, foi demonstrado que o strain

longitudinal da parede septal e posterior normal nos atletas, independentemente da

presena ou no de HVE(78). Outro estudo demonstrou ainda que os valores de strain

no diferem entre atletas e controlos(79).

ESTUDO DA FUNO VENTRICULAR POR STRAIN OBTIDO POR SPECKLE TRACKING EM DOENTES COM

MIOCARDIOPATIA HIPERTRFICA

21

ii. O strain longitudinal permite distinguir os doentes gentipo

positivo/fentipo negativo de MCH dos controlos

Yiu et al. sugerem que o strain longitudinal basal anteroseptal est diminudo

nos doentes com gentipo positivo/ fentipo negativo de MCH, podendo ser utilizado

para distingui-los dos controlos(80).

Tambm De S et al. no constataram nenhuma diferena no strain longitudinal

global entre doentes com gentipo positivo/fentipo negativo e controlos, mas

detectaram nos portadores em comparao com os controlos uma diminuio no strain

longitudinal basal septal e um aumento do strain longitudinal nos segmentos basal e

mdio posteriores(81).

iii. Existe uma correlao entre o strain longitudinal e a presena de

fibrose miocrdica

Chang et al. identificaram a espessura das paredes e a quantidade de realce

tardio regional como preditores independentes do strain longitudinal regional do VE

nos doentes com MCH. Relataram ainda que o ndice de massa do VE e o volume

total de realce tardio foram identificados como preditores independentes do strain

longitudinal global do VE(82). Tambm Ghio et al. tinham detectado uma associao

entre realce tardio e strain sistlico obtido por Doppler tecidular(83). Foi ainda

documentada uma associao entre o strain longitudinal do VE e o n de segmentos

fibrticos e a fibrose total(84).

Weidemann et al. demonstraram que os segmentos do VE que exibiam realce

tardio na RM cardaca apresentavam um sinal caracterstico, o double peak sign, no

traado do strain rate, constitudo por um pico precoce sistlico seguido por um

declnio rpido para valores prximos de zero e posteriormente por um segundo pico

no relaxamento isovolumtrico. A presena deste double peak sign parece constituir

um meio de diagnstico de fibrose regional(85).

Tambm Yajima et al. mostraram que nos doentes com MCH o strain

longitudinal pode ser utilizado para distinguir a natureza de uma leso detectada em

TC multicorte, sendo que o strain longitudinal est mais reduzido nas leses

miocrdicas fibrticas do que nas no fibrticas(86).

iv. Existe uma correlao entre o strain longitudinal e os dados

hemodinmicos invasivos

Garceau et al. encontraram uma associao entre a relao do strain rate

diastlico precoce para o strain rate sistlico (SrE/SrS) e a presso telediastlica do

VE. Neste estudo, a relao SrE/SrS tinha uma sensibilidade de 87% e uma

ESTUDO DA FUNO VENTRICULAR POR STRAIN OBTIDO POR SPECKLE TRACKING EM DOENTES COM

MIOCARDIOPATIA HIPERTRFICA

22

especificidade de 75% para detectar uma presso telediastlica do VE elevada

(>15mmHg)(87).

v. Existe uma correlao entre o strain longitudinal e a ocorrncia de

eventos clnicos cardacos

O strain longitudinal global est mais diminudo nos doentes com realce tardio

e nos doentes com eventos cardacos major(88).

Noutro estudo, Correia et al. identificaram o strain longitudinal global como

preditor de taquicardias ventriculares no sustentadas. Os doentes com estas

disritmias tinham piores valores de strain longitudinal global e regional localizado nos

segmentos mdio e apical do septo e segmento apical lateral. Um valor de strain

longitudinal no segmento mdio-septal >-10.5% era preditor de taquicardia ventricular

no sustentada(89).

J Di Salvo et al. encontraram reduo do strain longitudinal nos segmentos

basal e mdio septais e basal antero-septal nos doentes com MCH e taquicardia

ventricular no sustentada. Neste estudo, um strain longitudinal global >-10% foi

preditor de taquicardia ventricular no sustentada(90).

b. Strain radial e circunferencial

i. Na MCH existe tambm diminuio do strain radial e circunferencial

Os doentes com MCH assimtrica septal assim como os doentes com MCH

apical tm diminuio dos strains longitudinal, radial e circunferencial globais(91).

Abozquia et al. tambm mostraram que especificamente nos doentes com MCH no

obstrutiva tambm h uma diminuio dos strains longitudinal, radial e circunferencial

globais em comparao com os controlos. Os strains longitudinal, radial e

circunferencial globais do VE esto diminudos na MCH, mesmo na ausncia de

fibrose(84).

O exerccio aumenta significativamente todos os tipos de strain nos controlos,

enquanto que nos doentes com MCH esse aumento moderado e apenas se verifica

para o strain longitudinal(92).

ESTUDO DA FUNO VENTRICULAR POR STRAIN OBTIDO POR SPECKLE TRACKING EM DOENTES COM

MIOCARDIOPATIA HIPERTRFICA

23

c. Torso ventricular

i. Na MCH existe um aumento da torso ventricular e um atraso do

untwist

Young et al., num dos primeiros estudos baseados na deformao miocrdica

avaliada por RM cardaca, mostraram que os doentes com MCH tm um aumento da

torso do VE(93).

Saito et al., comparando doentes com MCH, hipertrofia hipertensiva e

controlos, demonstraram que a torso est aumentada quer nos doentes com MCH

quer nos doentes com hipertrofia hipertensiva. J o untwist est reduzido e atrasado

(94). Tambm Takeuchi et al. demonstraram nos doentes com HVE secundria HTA

que o twist est preservado e o untwist est reduzido e atrasado(95).

Especificamente nos doentes com MCH assimtrica septal, o twist tambm

est preservado nos doentes com Fej preservada, mas est prolongado, determinando

um atraso no incio do untwist(91, 96).

Nos doentes com MCH septal, o twist est aumentado em comparao com os

controlos aparentemente devido a um aumento da rotao basal. O twist parece ainda

variar de acordo com a morfologia do septo, sendo que os doentes com uma curvatura

septal sigmide tpica, em comparao com os doentes com curvatura septal reversa,

tm maior twist ventricular e maior rotao apical(96).

Usando a tecnologia de strain 3D, Urbano et al. demonstraram que os doentes

com MCH tinham um aumento do twist em relao aos controlos, essencialmente

custa de um aumento da rotao apical nos doentes com MCH obstrutiva. Tambm

neste estudo se mostrou que a torso nos doentes com MCH mais prolongada e o

untwist est atrasado(97).

No estudo de Wang et al., em doentes com MCH obstrutiva, o twist e o untwist

rate no so diferentes dos controlos, mas tambm neste estudo se mostra que o

untwist est atrasado, o que contribui para uma presso de enchimento do VE mais

elevada, um menor volume ventricular e menor tolerncia ao exerccio(98).

Especificamente nos doentes com MCH no obstrutiva, Abozquia et al. tambm

mostraram que, em comparao com os controlos, h um atraso do untwist, que est

associado a menor tolerncia ao exerccio(99).

Num dos primeiros estudos de torso ventricular avaliada por Speckle Tracking

2D, abrangendo doentes com hipertenso arterial, MCH ou amiloidose, verificou-se

que os doentes com disfuno diastlica ligeira tinham aumento da torso, enquanto

que os doentes com disfuno diastlica moderada ou grave tinham torso normal ou

reduzida(100).Noutro estudo comparando doentes com MCH e controlos, verificou-se

que a velocidade pico de untwisting e o untwist rate esto aumentados nos doentes

ESTUDO DA FUNO VENTRICULAR POR STRAIN OBTIDO POR SPECKLE TRACKING EM DOENTES COM

MIOCARDIOPATIA HIPERTRFICA

24

com disfuno diastlica ligeira e diminudos nos doentes com disfuno diastlica

moderada ou severa(101).

Os doentes com MCH apical, em comparao com os controlos, apresentaram

uma diminuio da torso devido diminuio da rotao apical(102).

Notomi et al. demonstraram que quer em controlos quer em doentes com MCH

o untwisting contribui para gerar um gradiente de presso intraventricular da base para

o pex, ou seja, uma suco diastlica ventricular que contribui para o enchimento

ventricular precoce. Segundo estes autores, existe uma relao linear entre a taxa de

untwisting e o gradiente pico de presso de suco diastlica(103).

Num dos primeiros estudos da torso ventricular avaliada por Doppler em

indivduos saudveis, verificou-se que o untwisting ocorre normalmente durante a fase

de relaxamento isovolumtrico e enchimento precoce do VE. O exerccio fsico nos

indivduos saudveis resulta num aumento da torso e da velocidade do untwisting e

num aumento do gradiente intraventricular, facilitando a suco ventricular. Nos

doentes com MCH, a torso est aumentada e o untwist est atrasado em repouso,

mas nenhum deles aumenta com o exerccio fsico(104).

Soullier et al. tambm mostraram que nos doentes com MCH o twist est

aumentado em comparao com os controlos e que o exerccio leva a um untwist

reduzido e mais tardio(92).

d. Strain da AE

i. Na MCH ocorre diminuio do strain da AE, o que parece ser um

preditor de FA

Gabrielli et al. mostraram que o strain e o strain rate da AE esto

significativamente diminudos nos doentes com MCH em comparao com atletas e

controlos(104, 106). Um cut-off de strain da AE de -10.82% permite distinguir MCH de

outras causas de HVE com uma sensibilidade de 82% e especificidade de 81%(107).

Eshoo et al. tambm demonstraram que o strain rate diastlico tardio da AE obtido por

Doppler tecidular permite distinguir doentes com MCH de doentes com HTA e de

controlos(108).

Noutro estudo, o strain rate diastlico tardio foi identificado como preditor

independente da presena de sintomas de insuficincia cardaca(104). Girasis et al.

detectaram uma associao entre o strain rate da AE e a existncia de FA paroxstica

nos doentes com MCH(109). O strain da AE foi identificado como preditor de eventos

cardacos, incluindo hospitalizao por FA(110).

ESTUDO DA FUNO VENTRICULAR POR STRAIN OBTIDO POR SPECKLE TRACKING EM DOENTES COM

MIOCARDIOPATIA HIPERTRFICA

25

2. OBJECTIVOS

O objectivo geral deste estudo a avaliao da funo ventricular de doentes

com MCH atravs de strain obtido por speckle tracking, com maior nfase para o twist

ventricular.

Os objectivos especficos do trabalho so:

Caracterizao da funo ventricular de uma populao de doentes com

MCH por tcnicas de strain obtido por speckle tracking (incluindo strain

longitudinal, radial e circunferencial e twist ventricular) e sua comparao

com uma populao controlo;

Caracterizao da funo ventricular de uma populao de doentes com

MCH por tcnicas de strain obtido por speckle tracking (incluindo strain

longitudinal, radial e circunferencial e twist ventricular) e sua comparao

com uma populao de HVE secundria a HTA;

Avaliao do twist ventricular em doentes com MCH obstrutiva e no

obstrutiva;

Avaliao do twist ventricular em doentes com MCH e diferentes graus de

disfuno diastlica;

Determinao dos preditores independentes do twist ventricular em doentes

com MCH;

Estudo de variabilidade inter-observador na avaliao do twist ventricular.

ESTUDO DA FUNO VENTRICULAR POR STRAIN OBTIDO POR SPECKLE TRACKING EM DOENTES COM

MIOCARDIOPATIA HIPERTRFICA

26

3. METODOLOGIA

3.1. Tipologia do Estudo e Mtodo de Abordagem

O presente estudo um estudo de amostragem, sendo os critrios de seleco

da amostra previamente definidos pelo investigador.

Este estudo do tipo observacional, pois no pressupe a realizao de uma

interveno controlada pelo investigador, no existindo assim uma interferncia directa

na evoluo dos doentes estudados.

Neste estudo foi utilizada uma metodologia transversal, pois a amostra

estudada num ponto determinado do tempo, sendo a quantificados todos os

parmetros previamente definidos, no existindo um seguimento ao longo do tempo.

Foi efectuado de forma prospectiva com a aplicao do protocolo de avaliao

pr-definido no incio do estudo a todos os doentes e controlos seleccionados.

Trata-se ainda de um estudo descritivo e comparativo, pois so descritas e

comparadas as variveis previamente definidas entre os vrios grupos de indivduos

(doentes com MCH, doentes com HVE secundria a HTA e controlos).

O mtodo comparativo utilizado foi o mtodo quantitativo, tendo-se aplicado o

estudo estatstico mais adequado para quantificar e avaliar a existncia de

associaes entre as variveis estudadas nos diferentes grupos de indivduos.

3.2. Populao e Amostra

A populao alvo deste estudo so os indivduos adultos (18 anos) com

diagnstico de MCH. Por conseguinte, foram recrutados para este estudo todos os

doentes adultos com diagnstico conhecido de MCH que eram seguidos na consulta

de cardiologia no Centro Hospitalar do Alto Ave (CHAA) - Guimares.

Foram ainda definidos dois grupos de comparao, totalizando assim 3

amostras diferentes:

- Grupo 1: Doentes com MCH

- Grupo 2: Doentes com HVE secundria HTA

- Grupo 3: Controlos

O grupo de doentes com HVE secundria HTA foi seleccionado a partir dos

doentes adultos hipertensos consecutivos que foram submetidos a monitorizao

ambulatria da presso arterial (MAPA) no perodo de Janeiro de 2009 a Dezembro de

2011. Deste grupo de doentes hipertensos, foram recrutados para este estudo apenas

aqueles que tinham realizado previamente ecocardiograma e que apresentavam HVE

documentada nesse ecocardiograma prvio. Estes indivduos foram ento submetidos

ESTUDO DA FUNO VENTRICULAR POR STRAIN OBTIDO POR SPECKLE TRACKING EM DOENTES COM

MIOCARDIOPATIA HIPERTRFICA

27

ao ecocardiograma do estudo, tendo sido includos no estudo apenas os que

mantinham critrios de HVE no ecocardiograma.

O grupo de controlos, representando a populao de indivduos saudveis, foi

seleccionado aleatoriamente a partir da populao de funcionrios do Centro

Hospitalar do Alto Ave Guimares. Desta amostra aleatria, apenas os funcionrios

saudveis foram submetidos a ecocardiograma, tendo sido includos no estudo apenas

os que no apresentaram HVE.

3.2.1. Critrios de incluso e excluso

Todos os indivduos includos deram consentimento informado por escrito antes

da realizao do ecocardiograma.

3.2.1.1. Grupo 1: Doentes com MCH

Critrios de Incluso

Foram includos neste estudo todos os indivduos adultos (18 anos), seguidos

na consulta de cardiologia do Centro Hospitalar do Alto Ave Guimares, com

diagnstico prvio de MCH.

Entende-se por doentes com MCH, todos aqueles que cumpriam os critrios

morfolgicos de diagnstico de MCH, tais como definidos no documento de consenso

sobre a Classificao Europeia das Miocardiopatias do Grupo de Estudos das

Doenas do Miocrdio e Pericrdio da Sociedade Europeia de Cardiologia (1). Desta

forma, foram includos os doentes que apresentavam no ecocardiograma um padro

de HVE com espessura mxima da parede VE 15mm, que no era clinicamente

justificvel por condies de sobrecarga, tais como HTA ou doena valvular. Do

mesmo modo, foram includos os doentes com formas apicais de MCH.

Critrios de Excluso

Foram excludos deste grupo os indivduos que cumpriam um dos seguintes

critrios:

1) HVE secundria a HTA;

2) HVE secundria a doena valvular;

3) HVE secundria a doena sistmica ou metablica estabelecida;

4) Diagnstico de MCH duvidoso ou que no esteja completamente

estabelecido;

5) MCH j submetida a miectomia ou ablao septal;

ESTUDO DA FUNO VENTRICULAR POR STRAIN OBTIDO POR SPECKLE TRACKING EM DOENTES COM

MIOCARDIOPATIA HIPERTRFICA

28

6) Doena coronria significativa;

7) Doena valvular moderada ou severa;

8) Cardiopatia congnita;

9) Ritmo de fibrilhao/flutter auricular, pacemaker ou outro ritmo que no o

sinusal;

10) Bloqueio auriculo-ventricular de 2 ou 3 grau.

3.2.1.2. Grupo 2: Doentes com HVE secundria HTA

Critrios de Incluso

Foram includos neste estudo os indivduos adultos (18 anos) que cumpriam

todos os seguintes critrios:

1) Diagnstico prvio de HTA (definida como um mnimo de 3 medies da

tenso arterial sistlica 140 e/ou diastlica 90mmHg);

2) Realizao prvia de MAPA no perodo de Janeiro de 2009 a Dezembro

de 2011;

3) HVE j conhecida e documentada em ecocardiograma prvio;

4) Ecocardiograma do estudo mostrando HVE com espessura mxima da

parede VE 13mm.

Critrios de Excluso

Foram excludos deste grupo os indivduos que cumpriam um dos seguintes

critrios:

1) HVE secundria a doena valvular;

2) HVE secundria a doena sistmica ou metablica estabelecida;

3) HVE com estudo gentico positivo para mutao de protenas

sarcomricas ou histria familiar de MCH;

4) Atribuio duvidosa da HTA como causa da HVE;

5) Doena coronria significativa;

6) Doena valvular moderada ou severa;

7) Cardiopatia congnita;

8) Ritmo de fibrilhao/flutter auricular, pacemaker ou outro ritmo que no o

sinusal;

9) Bloqueio auriculo-ventricular de 2 ou 3 grau.

ESTUDO DA FUNO VENTRICULAR POR STRAIN OBTIDO POR SPECKLE TRACKING EM DOENTES COM

MIOCARDIOPATIA HIPERTRFICA

29

3.2.1.3. Grupo 3: Controlos

Critrios de Incluso

Foram includos como controlos indivduos adultos (18 anos), funcionrios do

CHAA, que cumpriam todos os seguintes critrios:

1) Indivduos sem histria de doena cardaca e assintomticos do foro

cardiovascular;

2) Ausncia de HVE no ecocardiograma.

Critrios de Excluso

Foram excludos deste grupo os indivduos que cumpriam um dos seguintes

critrios:

1) HTA;

2) Doena valvular, coronria ou outra doena cardaca significativa;

3) Doena sistmica, metablica, congnita, neoplsica ou qualquer

disfuno orgnica grave (renal, respiratria, neurolgica ou outra).

3.2.2. Dimenses e Categorias do Estudo

Este estudo envolve trs grandes dimenses:

- Variveis Demogrficas e Clnicas

- Estudo Ecocardiogrfico/Doppler Convencional

- Estudo da Deformao Miocrdica por Speckle Tracking

Dentro da dimenso do estudo ecocardiogrfico/Doppler convencional definem-

se vrias categorias de estudo:

- Estudo ecocardiogrfico 2D + Modo M

- Estudo de Doppler pulsado

- Estudo de Doppler tecidular

Dentro de cada categoria ainda possvel definir vrios grupos de variveis.

ESTUDO DA FUNO VENTRICULAR POR STRAIN OBTIDO POR SPECKLE TRACKING EM DOENTES COM

MIOCARDIOPATIA HIPERTRFICA

30

3.2.3. Variveis

As variveis definidas neste estudo so qualitativas e quantitativas.

Tabela 1 Variveis Demogrficas e Clnicas.

VARIVEIS CATEGRICAS

Varivel Tipo Categorias

Gnero Nominal M/F

HTA Nominal S/N

Diabetes mellitus Nominal S/N

Dislipidemia Nominal S/N

Tabagismo Nominal S/N

Obesidade Nominal S/N

Doena coronria Nominal S/N

Doena valvular Nominal S/N

Doena cardaca congnita Nominal S/N

Ritmo de flutter/fibrilhao auricular Nominal S/N

Ritmo de pacemaker Nominal S/N

Bloqueio auriculo-ventricular de 2 ou 3 grau Nominal S/N

CDI Nominal S/N

CRT Nominal S/N

Doena cerebrovascular Nominal S/N

Doena arterial perifrica Nominal S/N

Doena pulmonar Nominal S/N

Doena renal Nominal S/N

Doena neurolgica Nominal S/N

Doena metablica Nominal S/N

Neoplasia Nominal S/N

Outra doena Nominal S/N

Sintomas Nominal S/N

Dispneia Nominal S/N

Classe NYHA Nominal S/N

Dor torcica Nominal S/N

Sncope Nominal S/N

Holter 24h realizado Nominal S/N

Taquicardia ventricular sustentada no Holter Nominal S/N

Taquicardia ventricular no sustentada no Holter Nominal S/N

Taquicardia supraventricular no Holter Nominal S/N

Fibrilhao/Flutter auricular no Holter Nominal S/N

Bloqueio de ramo esquerdo no Holter Nominal S/N

Bloqueio auriculo-ventricular de 2 ou 3 grau no

Holter

Nominal S/N

Ecocardiograma de esforo realizado Nominal S/N

Obstruo latente no ecocardiograma de esforo Nominal S/N

RM cardaca realizada Nominal S/N

Realce tardio na RM cardaca Nominal S/N

ESTUDO DA FUNO VENTRICULAR POR STRAIN OBTIDO POR SPECKLE TRACKING EM DOENTES COM

MIOCARDIOPATIA HIPERTRFICA

31

Estudo gentico realizado Nominal S/N

Estudo gentico alterado Nominal S/N

Teraputica com beta-bloqueante Nominal S/N

Teraputica com antagonistas dos canais de

clcio/outros antiarrtmicos

Nominal S/N

Teraputica com IECA/ARA II/Antagonistas dos

receptores da aldosterona

Nominal S/N

Teraputica com diurticos Nominal S/N

VARIVEIS NUMRICAS

Varivel Tipo Unidades

Idade Contnua anos

rea de superfcie corporal Contnua m2

ndice de massa corporal Contnua Kg/m2

Tabela 2 - Variveis da Ecocardiografia Convencional - 2D e Modo M

VARIVEIS CATEGRICAS

Varivel Tipo Categorias

HVE Nominal S/N

MCH Nominal S/N

Padro de HVE Nominal Assimtrica Simtrica

Apical No aplicvel

VARIVEIS NUMRICAS

Varivel Tipo Unidades

Espessura do SIV Contnua mm

Espessura da parede posterior Contnua mm

Dimetro telediastlico do VE Contnua mm

Massa do VE Contnua g

Massa do VE indexada rea de superfcie

corporal

Contnua g/m2

Dimetro da AE Contnua mm

Volume da AE Contnua mL

Volume da AE indexado rea de superfcie

corporal

Contnua mL/m2

Fej do VE Contnua %

Tabela 3 - Variveis da Ecocardiografia Convencional - Doppler

VARIVEIS NUMRICAS

Varivel Tipo Unidades

Velocidade da onda E Contnua m/s

Velocidade da onda A Contnua m/s

Relao E/A Contnua -

ESTUDO DA FUNO VENTRICULAR POR STRAIN OBTIDO POR SPECKLE TRACKING EM DOENTES COM

MIOCARDIOPATIA HIPERTRFICA

32

TRIV Contnua ms

TD Contnua ms

Velocidade da onda S Contnua m/s

Velocidade da onda D Contnua m/s

Velocidade da onda Ar Contnua m/s

Durao Ar A Contnua ms

Velocidade da onda E

(a nvel septal e lateral, mdia)

Contnua m/s

Velocidade da onda A

(a nvel septal e lateral, mdia)

Contnua m/s

Velocidade da onda S

(a nvel septal e lateral, mdia)

Contnua m/s

Relao E/E Contnua -

Gradiente de presso na CSVE Contnua mmHg

Tabela 4 - Variveis de Deformao Miocrdica

VARIVEIS NUMRICAS

Varivel Tipo Unidades

Global Longitudinal Strain Contnua %

Global Longitudinal Strain Rate Contnua s-1

Global Radial Strain Contnua %

Global Radial Strain Rate Contnua s-1

Global Circumferential Strain Contnua %

Global Circumferential Strain Rate Contnua s-1

Rotao da base Contnua

Rotao do pex Contnua

Twist do VE Contnua

3.3. Instrumento de recolha de dados

Para a realizao deste estudo, foi considerado que o instrumento de recolha

da informao mais adequado seria o formulrio. Foram assim construdos dois

formulrios, um para a recolha dos dados demogrficos e clnicos (Apndice 1) e outro

para a recolha dos dados ecocardiogrficos (Apndice 2).

ESTUDO DA FUNO VENTRICULAR POR STRAIN OBTIDO POR SPECKLE TRACKING EM DOENTES COM

MIOCARDIOPATIA HIPERTRFICA

33

3.4 Procedimentos de Recolha de Dados

A recolha de dados foi efectuada conjuntamente pelo mdico cardiologista e

pelo tcnico de cardiopneumologia no momento da realizao do ecocardiograma no

Centro Hospitalar do Alto Ave Guimares.

Os dados demogrficos e clnicos foram colhidos atravs de questionrio

dirigido ao indivduo e de consulta do respectivo processo clnico. Os dados obtidos

foram registados num formulrio devidamente criado para esse efeito.

Todos os indivduos participantes no estudo foram submetidos a um

ecocardiograma segundo um mesmo protocolo previamente definido. Os dados

ecocardiogrficos foram analisados e posteriormente registados num formulrio

devidamente criado para esse efeito (Figura 9).

Figura 9 Fluxograma do desenho do estudo

ESTUDO DA FUNO VENTRICULAR POR STRAIN OBTIDO POR SPECKLE TRACKING EM DOENTES COM

MIOCARDIOPATIA HIPERTRFICA

34

Protocolo de ecocardiograma

Todos os indivduos seleccionados para participar no estudo foram submetidos

a um ecocardiograma transtorcico realizado num ecgrafo GE Vivid 7,com sonda

multifrequncia M3S (1.5-4.3 MHz). O ecocardiograma foi realizado segundo as

recomendaes da Sociedade Europeia e Americana de Ecocardiografia (34). Foi

aplicado o seguinte protocolo ecocardiogrfico a todos os indivduos (Apndice 3):

1. Aquisio de cineloops de dois ciclos cardacos em modo bidimensional, na

janela paraesternal esquerda eixo longo, com frame rate superior a 50 fps;

2. Aquisio de cineloops de dois ciclos cardacos em modo bidimensional, na

janela paraesternal esquerda eixo longo, com Doppler de cor;

3. Aquisio de imagem em modo M na janela paraesternal esquerda eixo

longo ao nvel da vlvula mitral para pesquisa de SAM da vlvula mitral;

4. Aquisio de cineloops de dois ciclos cardacos em modo bidimensional, na

janela paraesternal esquerda eixo curto (a nvel dos grandes vasos, vlvula

mitral, msculos papilares e apx), com frame rate superior a 50 fps;

5. Aquisio de imagem de Doppler de cor na janela paraesternal esquerda

eixo curto a nvel dos grandes vasos e de Doppler pulsado ao nvel da

cmara de sada do ventrculo direito;

6. Aquisio de cineloops de dois ciclos cardacos em modo bidimensional, na

janela apical de 4 cmaras, mostrando quer as 4 cmaras quer os

ventrculos, com frame rate superior a 50 fps;

7. Aquisio de cineloops de dois ciclos cardacos em modo bidimensional,

com Doppler tecidular de cor, na janela apical de 4 cmaras, mostrando

quer as 4 cmaras quer os ventrculos;

8. Aquisio de cineloops de dois ciclos cardacos em modo bidimensional, na

janela apical de 4 cmaras, com Doppler de cor;

9. Aquisio de imagem de Doppler contnuo ao nvel da vlvula artica e

pulsado ao nvel da CSVE na janela apical de 4 cmaras para pesquisa de

obstruo ejeco ventricular;

10. Aquisio de imagem de Doppler contnuo ao nvel da vlvula tricspide na

janela apical de 4 cmaras para anlise do gradiente de presso entre o

ventrculo direito e a aurcula direita;

11. Aquisio de imagem de Doppler pulsado na janela apical de 4 cmaras ao

nvel dos tips da vlvula mitral para anlise do enchimento ventricular

esquerdo e ao nvel do anel mitral para determinao da durao da onda A;

12. Aquisio de imagem de Doppler pulsado na janela apical de 5 cmaras ao

nvel da CSVE junto do folheto anterior da vlvula mitral, de modo a registar

ESTUDO DA FUNO VENTRICULAR POR STRAIN OBTIDO POR SPECKLE TRACKING EM DOENTES COM

MIOCARDIOPATIA HIPERTRFICA

35

simultaneamente o fluxo de enchimento ventricular e o fluxo da CSVE e

assim obter o TRIV;

13. Aquisio de imagem de Doppler pulsado na janela apical de 4 cmaras ao

nvel da veia pulmonar superior direita para anlise do fluxo venoso

pulmonar;

14. Aquisio de imagem de Doppler tecidular na janela apical de 4 cmaras

com a amostra colocada ao nvel do lado septal e lateral do anel mitral para

anlise das velocidades de contraco e relaxamento miocrdico do VE;

15. Aquisio de imagem de modo M na janela apical de 4 cmaras ao nvel do

anel tricspide;

16. Aquisio de imagem de Doppler tecidular na janela apical de 4 cmaras

com a amostra colocada ao nvel do anel tricspide para anlise das

velocidades de contraco e relaxamento miocrdico do VD;

17. Aquisio de cineloops de dois ciclos cardacos em modo bidimensional, na

janela apical de 2 cmaras, mostrando quer as 2 cmaras quer o VE, com

frame rate superior a 50 fps;

18. Aquisio de cineloops de dois ciclos cardacos em modo bidimensional,

com Doppler tecidular de cor, na janela apical de 2 cmaras, mostrando

quer as 2 cmaras quer o VE;

19. Aquisio de cineloops de dois ciclos cardacos em modo bidimensional, na

janela apical de 2 cmaras, com Doppler de cor;

20. Aquisio de cineloops de dois ciclos cardacos em modo bidimensional, na

janela apical de 3 cmaras, mostrando quer as 3 cmaras quer o VE, com

frame rate superior a 50 fps;

21. Aquisio de cineloops de dois ciclos cardacos em modo bidimensional, na

janela apical de 3 cmaras, com Doppler de cor;

22. Aquisio de cineloops de dois ciclos cardacos na janela subcostal, quer

em modo bidimensional quer em modo M da veia cava inferior;

23. Armazenamento da imagem digital em formato raw data e posterior anlise

dos dados em estao de trabalho Echopac (GE);

24. Todas as medies ecocardiogrficas convencionais foram realizadas trs

vezes, tendo sido utilizada a mdia das trs medies;

25. Em anlise ps-processamento, foram determinadas a espessura das

paredes ventriculares e a massa ventricular pelo mtodo de Devereux; a

dimenso linear e o volume da AE; a fraco de ejeco e os volumes

telessistlico e telediastlico do ventrculo esquerdo pelo mtodo de

ESTUDO DA FUNO VENTRICULAR POR STRAIN OBTIDO POR SPECKLE TRACKING EM DOENTES COM

MIOCARDIOPATIA HIPERTRFICA

36

Simpson; o gradiente de presso na cmara de sada do VE; e a presso

sistlica estimada da artria pulmonar;

26. Tambm em anlise ps-processamento foram determinadas as

velocidades das ondas E e A, a relao E/A, o TRIV, o TD, as velocidades

das ondas S, D e Ar, a diferena de durao da onda Ar-A, as velocidades

das ondas E, A e S e as suas mdias e a relao E/E;

27. A anlise por speckle tracking da deformao miocrdica tambm foi

efectuada em ps-processamento, tendo sido utilizado um sistema semi-

automtico de tracking do miocrdio, com correco manual do bordo

endocrdico em telessstole e ajustamento da regio de interesse. A partir

do registo de Doppler pulsado do fluxo artico, foram marcados os

momentos de abertura e encerramento da vlvula artica. Foram analisados

18 segmentos em cada indivduo, tendo sido includos apenas para efeito de

anlise da deformao miocrdica aqueles cuja qualidade do tracking

miocrdico foi considerada adequada simultaneamente pelo sistema de

anlise automtica e pelo operador (mediante avaliao visual);

28. A partir das imagens das janelas apicais de 4, 2 e 3 cmaras, obtiveram-se

os valores no pico da sstole de strain e strain rate longitudinais globais

(Figura 10).

Figura 10 Strain longitudinal nas janelas apicais de 4, 2 e 3 cmaras e em formato bulls-eye num doente

com MCH obstrutiva

ESTUDO DA FUNO VENTRICULAR POR STRAIN OBTIDO POR SPECKLE TRACKING EM DOENTES COM

MIOCARDIOPATIA HIPERTRFICA

37

29. A partir das imagens da janela paraesternal esquerda eixo curto ao nvel da

vlvula mitral, msculos papilares e pex do VE, obtiveram-se os valores no

pico da sstole de strain e strain rate radiais e circunferenciais globais

(Figura 11). A partir das imagens da janela paraesternal esquerda eixo curto

ao nvel da vlvula mitral e pex do VE, obtiveram-se os valores de rotao

basal e apical e do twist ventricular (Figura 12).

Figura 11 Deformao miocrdica radial da base e do pex do VE

Figura 12 - Curvas de rotao basal (magenta) e apical do VE (azul) e de twist ventricular (branca) num

doente com MCH obstrutiva

3.5. Reprodutibilidade Variabilidade inter-observador

A reprodutibilidade depende da concordncia conseguida entre resultados

independentes obtidos pela mesma metodologia. A ecocardiografia uma tcnica

muito dependente do operador, pelo que a experincia fundamental para minimizar a

variabilidade inter-observador, que poder decorrer quer da tcnica de aquisio das

imagens quer da medio efectuada nas imagens adquiridas.

ESTUDO DA FUNO VENTRICULAR POR STRAIN OBTIDO POR SPECKLE TRACKING EM DOENTES COM

MIOCARDIOPATIA HIPERTRFICA

38

O mestrando desta tese apresenta uma grande experincia profissional quer na

aquisio das imagens quer na realizao das medies por ecocardiografia

convencional, apresentando contudo uma experincia mais reduzida na avaliao da

deformao miocrdica por speckle tracking. Por outro lado, algumas medidas

ecocardiogrficas, nomeadamente relacionadas com a deformao miocrdica,

acarretam maior variabilidade inter-observador, mesmo entre observadores

experientes.

Por estes motivos, logo aps a realizao do ecocardiograma, foi realizado um

segundo ecocardiograma por um operador mais experiente a um grupo aleatrio de 10

indivduos, de modo a avaliar a variabilidade inter-observador.

3.6. Mtodos de Anlise de Dados

Os dados colhidos foram inseridos numa base de dados criada para esse efeito

no programa de anlise estatstica SPSS (Statistical Package for Social Sciences)

verso 20.0.

Foi efectuada inicialmente uma anlise estatstica descritiva. Para as variveis

qualitativas, foram determinadas as frequncias e para as variveis quantitativas foram

determinadas as mdias, medianas, desvios padro e varincias.

Para os dados ecocardiogrficos, foi determinada a variabilidade inter-

observador, tendo-se optado pelo clculo da percentagem de variabilidade das

medies, obtida pela diviso da diferena absoluta pela mdia das duas medies.

Posteriormente foi efectuada uma anlise comparativa entre o grupo dos

doentes com MCH e o grupo dos doentes com HVE secundria HTA; e entre o grupo

dos doentes com MCH e o grupo dos controlos. Do mesmo modo tambm foi

efectuada uma anlise comparativa de doentes com MCH assimtrica obstrutiva vs.

no obstrutiva, MCH com disfuno diastlica grau I vs. grau II ou III e MCH com idade

inferior vs. superior mediana .

Para a comparao das variveis qualitativas foi utilizado o teste do Qui-

Quadrado, sendo definido um nvel de significncia de 95%.

Para as variveis quantitativas contnuas, foi avaliada a normalidade da

distribuio de cada varivel e dado que o n de cada grupo inferior a 50 optou-se

pela aplicao do Teste de Shapiro-Wilk. Para as variveis com distribuio normal, foi

aplicado o teste t de Student com um nvel de significncia de 95%. Para as variveis

que no apresentaram uma distribuio normal, foi aplicado o teste no paramtrico

de Mann-Whitney, tambm com um nvel de significncia de 95%.

ESTUDO DA FUNO VENTRICULAR POR STRAIN OBTIDO POR SPECKLE TRACKING EM DOENTES COM

MIOCARDIOPATIA HIPERTRFICA

39

Foi efectuada ainda uma anlise multivariada usando o mtodo de regresso

linear para identificar se a idade, massa do VE, espessura do SIV e gradiente de

presso na CSVE so preditores independentes do twist ventricular.

Os resultados da anlise estatstica dos dados foram organizados sob a forma

de tabelas e grficos.

3.7. Consideraes ticas e Legais

O investigador deste trabalho regeu-se pelas boas prticas ticas e legais.

O estudo foi submetido e autorizado pelo Conselho de tica do Centro

Hospitalar do Alto Ave - Guimares (Apndice 4).

Foi dada informao adequada sobre o estudo a todos os indivduos

participantes e obtido o seu consentimento informado por escrito (Apndice 5).

O anonimato dos dados foi garantido atravs da atribuio de um cdigo

numrico aos participantes, no constando assim dos formulrios ou da base de

dados informtica qualquer elemento identificativo dos mesmos.

Neste estudo foram respeitadas as recomendaes constantes das

Declaraes de Helsnquia e Tquio, da OMS e da Comunidade Europeia, bem como

a constante no DL 118/04 de 19 de Agosto, DR I Srie.

ESTUDO DA FUNO VENTRICULAR POR STRAIN OBTIDO POR SPECKLE TRACKING EM DOENTES COM

MIOCARDIOPATIA HIPERTRFICA

40

4. RESULTADOS

4.1. Caractersticas demogrficas e clnicas dos indivduos

Este estudo incluiu prospectivamente 20 doentes com MCH, 16 doentes com

HVE secundria HTA e 17 controlos.

As caractersticas demogrficas no eram significativamente diferentes entre

os doentes com MCH e os doentes com HVE secundria HTA. Os controlos eram

predominantemente mulheres, ao contrrio dos doentes com MCH que eram

predominantemente homens. Os controlos tambm eram indivduos mais jovens do

que os doentes com MCH. Estas diferenas aproximaram-se da significncia

estatstica, embora esta no tenha sido atingida. Os controlos por definio eram

indivduos saudveis, o que se reflecte num menor ndice de massa corporal (IMC)

(Tabela 5).

Tabela 5 Caractersticas demogrficas dos doentes com MCH, doentes com HVE secundria HTA e

controlos

CARACTERSTICAS DEMOGRFICAS

MCH

(n=20)

HVE HTA

(n=16)

CONTROLOS

(n=17)

p1 p2

Sexo masculino 14 (70%) 7 (43.8%) 6 (35.3%) 0.212 0.075

Idade (anos) 6013 6111 544 0.803 0.093

IMC (Kg/m2) 29.64.0 29.83.9 26.44.5 0.919 0.032 MCH, miocardiopatia hipertrfica; HVE HTA, hipertrofia hipertensiva; IMC, ndice de massa corporal p1, MCH vs. HVE HTA; p2, MCH vs. Controlos

Os doentes com HVE secundria HTA tinham todos por definio HTA, mas

de salientar que a HTA era tambm uma comorbilidade frequente nos doentes com

MCH (55%), possivelmente explicada pela idade mdia destes doentes.

Quanto s restantes caractersticas clnicas cardiovasculares, no foram

encontradas diferenas entre os doentes com MCH e os doentes com HVE secundria

HTA. Quer os doentes com MCH, quer os doentes com HVE secundria a HTA

apresentavam ainda histria de outras doenas no cardiovasculares, nomeadamente

do foro tiroideu, neoplsico ou psiquitrico (Tabela 6).

Os controlos eram por definio indivduos saudveis sem histria de doena

cardiovascular ou outra.

ESTUDO DA FUNO VENTRICULAR POR STRAIN OBTIDO POR SPECKLE TRACKING EM DOENTES COM

MIOCARDIOPATIA HIPERTRFICA

41

Tabela 6 Caractersticas clnicas dos doentes com MCH, doentes com HVE secundria HTA e

controlos

CARACTERSTICAS CLNICAS

MCH

(n=20)

HVE HTA

(n=16)

p

HTA 11 (55%) 16 (100%) 0.007

Diabetes mellitus 4 (20%) 1 (6.3%) 0.484

Dislipidemia 10 (50%) 10 (62.5%) 0.680

Tabagismo 4 (20%) 1 (6.3%) 0.484

Obesidade 3 (15%) 6 (37.5%) 0.245

Histria de fibrilhao auricular 3 (15%) 3 (18.8%) 1.000

Doena cerebrovascular 1 (5%) 3 (18.8%) 0.441

Doena arterial perifrica 1 (5%) 1 (6.3%) 1.000

Doena pulmonar crnica obstrutiva 1 (5%) 1 (6.3%) 1.000

Outra doena no cardiovascular 11 (55%) 5 (31.3%) 0.245 MCH, miocardiopatia hipertrfica; HVE HTA, hipertrofia hipertensiva; HTA, hipertenso arterial

Apenas os doentes com MCH apresentavam sintomas cardiovasculares,

nomeadamente sncope (20%), dor torcica (35%) ou dispneia (50%), sendo que

metade dos doentes se encontrava em classe I e a outra metade em classe II NYHA.

Apenas os doentes com MCH tinham histria de hospitalizaes por motivo

cardiovascular (40%), sendo os motivos mais frequentes a dor torcica (25%) e a

fibrilhao auricular (10%).

O ecocardiograma mostrava obstruo em repouso em 8 doent