estudo da charge e tirinha

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Os gneros das histrias em quadrinhos

Figura 1.1 Tira da srie Classificados, de Laerte.

A histria acima ilustra bem a dificuldade que envolve os gneros ligados s histrias em quadrinhos. s observar os diferentes nomes atribudos a essa narrativa de humor: tira, tira

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cmica, tira em quadrinhos, tira de quadrinhos, tirinha, tira de jornal, tira diria, tira jornalstica. O vestibular de 2006 da PUC-SP (Pontifcia Universidade Catlica de So Paulo) chamou uma histria semelhante de duas formas diferentes em duas questes da mesma prova: ora como charge, ora como tira de quadrinhos. O jornal Folha de S.Paulo usa o rtulo quadrinhos no espao do caderno de cultura que publica tiras assim. H at quem as chame de piadas ou piadinhas. Muitas vezes, esse excesso de nomes conseqncia de um desconhecimento das caractersticas das histrias em quadrinhos e de seus diferentes gneros. Sem saber direito do que se trata, escolhe-se um termo provisrio e sem muito critrio. Do ponto de vista do leitor, essa pluralidade de rtulos pode at atrapalhar a leitura. Charge e tira cmica, por exemplo, so textos unidos pelo humor, mas diferentes no tocante s caractersticas de produo. Para ficar em apenas uma distino: a charge aborda temas do noticirio e trabalha em geral com figuras reais representadas de forma caricata, como os polticos; a tira mostra personagens fictcios, em situaes igualmente fictcias. Ter uma noo clara do que se trata cada gnero contribui muito para uma leitura mais aprofun- Trabalhamos nesta obra dada e crtica dos quadrinhos e ajuda com um conceito de gnero semelhante ao proposto por na elaborao de prticas pedaggicas Bakhtin (2000): so tipos relana rea da educao. A proposta deste tivamente estveis de enunciado usados numa situao captulo iniciar um debate sobre as comunicativa para intermediar o processo de interao. caractersticas de tais gneros. Dizemos iniciar porque temos plena cincia de que tema para um estudo mais aprofundado e detalhado. Acreditamos, no entanto, ser possvel mapear a essncia do que define algumas das formas de apresentao dos quadrinhos,

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de modo que se possa entender melhor cada uma delas e, ao mesmo tempo, distinguir uma da outra. Mas, antes de uma discusso sobre o assunto, preciso entender o que exatamente uma histria em quadrinhos e, principalmente, o que ela no .

Uma linguagem autnoma muito comum algum ver nas histrias em quadrinhos uma forma de literatura. Adaptaes em quadrinhos de clssicos literrios como ocorreu com A Relquia, de Ea de Queirs, e O Alienista, de Machado de Assis, para ficar em dois exemplos ajudam a reforar esse olhar. Chamar quadrinhos de literatura, a nosso ver, nada mais do que uma forma de procurar rtulos socialmente aceitos ou academicamente prestigiados (caso da literatura, inclusive a infantil) como argumento para justificar os quadrinhos, historicamente vistos de maneira pejorativa, inclusive no meio universitrio. Quadrinhos so quadrinhos. E, como tais, gozam de uma linguagem autnoma, que usa mecanismos prprios para representar os elementos narrativos. H muitos pontos comuns com a literatura, evidentemente. Assim como h tambm com o cinema, o teatro e tantas outras linguagens. Barbieri (1998) defende a premissa de que as vrias formas de linguagem no esto separadas, mas, sim, interconectadas. O autor usa uma metfora para explicar seu ponto de vista. A linguagem seria como um grande ecossistema, cheio de pequenos nichos distintos uns dos outros (que chamou de ambientes). Cada nicho (ou ambiente) teria caractersticas prprias, o que garantiria autonomia em relao aos demais. Isso no quer dizer, no entanto, que no possam compartilhar caractersticas comuns.

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Transpondo o raciocnio para a prtica: o cinema, o teatro, a literatura, os quadrinhos e tantas outras formas de linguagem comporiam ambientes prprios e autnomos. Mas todos compartilhariam elementos de outras linguagens, cada um sua maneira. Para Barbieri, os quadrinhos dialogam com recursos da ilustrao, da caricatura, da pintura, da fotografia, da parte grfica, da msica e da poesia (trabalhadas por ele de forma integrada), da narrativa, do teatro e do cinema. Isso no significa que os comics, termo usado por ele, no A leitura de que os quaconstituam um nicho prprio e audrinhos constituem uma lintnomo. Pelo contrrio. O ambiente guagem autnoma comquadrinstico j teria se emancipado partilhada com outros autores, caso de Cirne (1970), e constitudo h mais de um sculo Eisner (1989), Acevedo (1990) possibilidades prprias de linguagem. e Eco (1993). Essa interpretao permite inferir que os recursos dos quadrinhos nada mais so do que respostas prprias a elementos constituintes da narrativa. O espao da ao contido no interior de um quadrinho. O tempo da narrativa avana por meio da comparao entre o quadrinho anterior e o seguinte ou condensado em uma nica cena. O personagem pode ser visualizado e o que ele fala lido em bales, que simulam o discurso direto. As histrias em quadrinhos representam aspectos da oralidade e renem os principais elementos narrativos, apresentados com o auxlio de convenes que formam o que estamos chamando de linguagem dos quadrinhos. Temos de ressaltar, no entanto, que h casos em que a separao entre as linguagens pode ser sutil, como nos livros infantis. As ilustraes integram as pginas da histria ou apenas exemplificam trechos da parte escrita? No que esse recurso difere dos quadrinhos que usam imagens e frases no fim de cada cena?

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Um caminho para a resposta no deixar de lado os aspectos sociointeracionais de cada texto. Quem produz a obra tem uma inteno ao escrev-la. O leitor, ao entrar em contato com o texto, cria uma expectativa de leitura, que no pode ser ignorada. Comprar uma obra como histria em quadrinhos, vendida numa banca de jornais ou na seo de histria em quadrinhos de uma livraria, estabelece ao menos duas inferncias na pessoa (fruto de conhecimentos prvios): estou adquirindo uma obra em quadrinhos e o que vou ler quando folhear as pginas da publicao. Um raciocnio semelhante pode ser aplicado aos livros infanto-juvenis. Na prtica, no h diferena no tocante ao uso dos recursos de linguagem em ambos os casos. A distino de ordem extratextual. O importante fixar a idia de que quadrinhos e literatura so linguagens diferentes, que abrigam uma gama de gneros diferentes. Entendido o que os quadrinhos no so, falta detalhar o que eles efetivamente so. Ramos (2007), com base na anlise de obras em quadrinhos e de estudos sobre a rea, identificou algumas tendncias: diferentesgnerosutilizamalinguagemdosquadrinhos; predominanashistriasemquadrinhosaseqncia ou tipo textual narrativo; ashistriaspodemterpersonagensfixosouno; anarrativapodeocorreremumoumaisquadrinhos, conforme o formato do gnero; emmuitoscasos,ortulo,oformato,osuportee o veculo de publicao constituem elementos que agregam informaes ao leitor, de modo a orientar a percepo do gnero em questo; atendncianosquadrinhosadeusodeimagens desenhadas, mas ocorrem casos de utilizao de fotografias para compor as histrias.

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Com base nesse levantamento, o autor definiu histrias em quadrinhos como um grande rtulo que une as caractersticas apresentadas anteriormente, utilizadas em maior ou menor grau por uma diversidade de gneros, nomeados de diferentes maneiras. Todos esses gneros teriam em comum o uso da linguagem dos quadrinhos para compor um texto narrativo dentro de um contexto sociolingstico inte- O termo hipergnero por Maingueneau em racional. Por essa definio, caricatura usadode uma obra (2004, mais e ilustrao, por no constiturem nar- 2005, 2006). O lingista defende que se trata de um rativas, no so vistas como gneros rtulo que daria as coordenadas para a formatao dos quadrinhos. textual de vrios gneros Quadrinhos seriam, ento, um que compartilhariam digrande rtulo, um hipergnero, que versos elementos. Ooautor cita como exemplo caso agregaria diferentes outros gneros, do dilogo, presente em vrios gneros. cada um com suas peculiaridades.

Os diferentes gnerosH uma tendncia na literatura cientfica sobre os quadrinhos de classific-los por gneros. Os poucos estudos lingsticos existentes a respeito costumam seguir caminho semelhante, com maior ou menor profundidade. O cuidado que se deve ter com essas abordagens que nem sempre apresentam as mesmas concluses. possvel identificar pelo menos trs comportamentos tericos: oquevosquadrinhoscomoumgrandertuloque abriga diferentes gneros; oquevinculaosgnerosdecunhocmicocharge, cartum, caricatura e tiras (em alguns casos, chamadas

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de quadrinhos) num rtulo maior, denominado humor grfico ou caricatura (usada neste segundo momento num sentido mais amplo); oqueaproximapartedosgneros,emespecialas charges e as tiras cmicas, da linguagem jornalstica (linha apoiada no fato de serem textos publicados em jornal). As trs abordagens, importante registrar, so perfeitamente vlidas. A escolha por uma opo terica ou outra vai depender muito do objeto que se quer estudar. Se o interesse da pesquisa for, por exemplo, os desenhos dos vrios sales de humor existentes no pas, interessante enquadrar a anlise na linha do humor grfico. Caso o foco do estudo esteja no teor jornalstico das produes, a melhor opo metodolgica observ-las dentro do vis jornalstico. Seguimos, neste estudo, a linha terica que v os quadrinhos como um grande rtulo que Essa viso trabalhada agrega vrios gneros que comparti- por Cagnin (1975), Mendona (2002) e, de forma mais delham uma mesma linguagem em tex- talhada, por Ramos (2007). tos predominantemente narrativos. Podem ser abrigados dentro desse grande guarda-chuva chamado quadrinhos os cartuns, as charges, as tiras cmicas, as tiras cmicas seriadas, as tiras seriadas e os vrios modos de produo das histrias em quadrinhos. Expomos a seguir, de forma bem resumida, as principais caractersticas de produo de cada um deles e de como tendem a ser vistos pelo leitor dentro do processo de interao sociocognitiva. A charge um texto de humor Romualdo (2000) v na que aborda algum fato ou tema li- relao intertextual um dos elementos constituintes da gado ao noticirio. De certa forma, charge. O tema do desenho ela recria o fato de forma ficcional, pode ser pautado por notcias reportadas de forma estabelecendo com a notcia uma verbal, visual (caso das fotos) ou verbo-visual. relao intertextual.

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Os polticos brasileiros costumam ser grande fonte de inspirao (no por acaso que a charge costuma aparecer na parte de poltica ou de opinio dos jornais). Um exemplo:

Figura 1.2 Charge de Cludio ironiza Lula e Fernando Henrique.

A charge foi publicada no jornal paulistano Agora nos meses iniciais do primeiro mandato do presidente Luiz Incio Lula da Silva (o primeiro mandato dele foi de 2003 a 2006). O texto usa o humor para fazer uma crtica poltica econ-

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mica adotada por Lula na poca. A brincadeira se baseia na premissa de que as medidas propostas por ele para manter a inflao sob controle (alta na taxa de juros e reduo na oferta de crdito para inibir o consumo) so as mesmas do governo anterior, administrado por Fernando Henrique Cardoso. Ao seguir o mesmo modelo econmico, Lula se torna Fernando Henrique, como mostrado na ltima cena do desenho. O leitor, para entender o texto, deveria recuperar os dados histricos da poca e inferir que os personagens mostrados na charge so caricaturas dos dois presidentes. O tema do humor presente na narrativa, como se v, est atrelado ao noticirio poltico do incio do ano de 2003. No estar vinculado a um fato do noticirio a principal diferena entre a charge e o cartum. No mais, so muito parecidos. Para ilustrar essa distino, veja a imagem a seguir, feita pelo argentino Quino:

Figura 1.3 No cartum de Quino, carimbo marca vrias tentativas de se matar uma aranhinha.

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A cena mostra vrias marcas de carimbo na mesa, no cho e na parede. Seriam as muitas tentativas de matar a aranha at que ela fosse definitivamente derrubada (como indica a posio dela no cho, no canto direito inferior do desenho). Mesmo sendo mostrado em apenas um quadro, o cartum consegue sintetizar uma seqncia entre um antes e um depois, elementos mnimos da estrutura narrativa. Infere-se que o antes seriam a descoberta da aranha na parede e as vrias carimbadas; o depois, a cena em si, tal como foi desenhada. importante observar que o humor advm de uma situao corriqueira: a tentativa de matar uma aranha. No se trata de um assunto do noticirio jornalstico. No custa reforar: essa a principal diferena entre charge e cartum. O formato to presente na composio da tira que foi incorporado ao nome do gnero. A mais conhecida e publicada a tira cmica, tambm chamada por uma srie de outros nomes, j apresentados no incio deste captulo. Por ser a mais difundida, muitas vezes vista como sinnimo de tira, interpretao que tambm seguimos nesta obra. A tira cmica a que predomina nos jornais brasileiros e tambm nos da maioria dos pases. A temtica atrelada ao humor uma das principais caractersticas do gnero tira cmica. Mas h outras: trata-se de um texto curto (dada a restrio do formato retangular, que fixo), construdo em um ou mais quadrinhos, com presena de personagens fixos ou no, que cria uma narrativa com desfecho inesperado no final. Para Ramos (2007), o gnero usa estratgias textuais semelhantes a uma piada para provocar efeito de humor. Essa ligao to forte que a tira cmica se torna um hbrido de piada e quadrinhos. Por isso, muitos a rotulam como sendo efetivamente uma piada.

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A tira de Classificados, lida no incio do captulo, pode servir de exemplo de tira cmica. A situao inesperada, que leva ao humor, o assaltante inexperiente tentar roubar dois policiais fortemente armados. O tom cmico reforado pela resposta de um deles: Certo; ento deixa eu ensinar umas coisinhas. Outro exemplo:

Figura 1.4 Narrativa de Garfield provoca desfecho inesperado, caracterstica do gnero tira cmica.

O humor da tira est num pensamento inesperado do gato Garfield, conhecido por ser excessivamente folgado e comilo. O trecho prepare algo para voc tambm, presente no ltimo quadrinho, gera no leitor a inferncia de que Garfield vai comer as 40 dzias de biscoitos que sero assadas pelo dono, fato mostrado na primeira cena. Por ser uma tira de personagem fixo, cabe a quem l a tarefa de acionar as caractersticas que constroem a personalidade marcante do gato para produzir o sentido pretendido pelo autor, Jim Davis. outra semelhana com as piadas. Algumas delas tambm possuem personagens fixos, como o portugus ou a loira, para ficar em dois casos. Apesar de a tira cmica ser a forma mais conhecida, no o nico gnero de tira existente. H pelo menos dois outros: as tiras cmicas seriadas e as tiras seriadas. As tiras seriadas (podem ser chamadas tambm de tiras de aventuras), como o prprio nome sugere, esto centradas

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numa histria narrada em partes. um mecanismo parecido com o feito nas telenovelas. Cada tira traz um captulo dirio interligado a uma trama maior. Se as tiras forem acompanhadas em seqncia, funcionam como uma histria em quadrinhos mais longa. muito comum o material ser reunido posteriormente na forma de revistas ou livros. Foi o que ocorreu com a seqncia a seguir, de Dick Tracy:

Figura 1.5 Tira seriada de Dick Tracy, de 29 de julho de 1952.

A tira foi publicada nos jornais norte-americanos em 29 de julho de 1952. A cena dava seqncia ao iniciada no dia anterior. Dick Tracy passeia com a famlia numa lancha e se torna alvo de um atirador. A ltima cena mostra que um tiro foi disparado em direo a ele. A aventura continuou no dia seguinte:

Figura 1.6 Tira seriada de Dick Tracy, de 30 de julho de 1952.

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A ao iniciada segundos antes do desfecho do dia anterior. A primeira cena mostra Dick Tracy de perfil na mira do atirador. Somente no segundo quadrinho que o tiro acerta o protagonista da tira de aventuras. O captulo do dia termina com o personagem caindo no mar. O mistrio continuou no jornal do dia seguinte:

Figura 1.7 Tira seriada de Dick Tracy, de 31 de julho de 1952.

O primeiro quadrinho traz uma espcie de resumo da trama at aquele momento. O desenrolar da histria s vai ocorrer nas cenas seguintes. E nos dias seguintes. Em geral, uma histria assim dura semanas ou at mesmo meses, como foi o caso dessa. interessante notar que, isoladamente, tais tiras seriadas formam um gnero autnomo, com diferentes temticas, que produzido e lido em captulos. Mas, quando organizadas em seqncia em livro, ficam mais prximas das histrias em quadrinhos convencionais do que de tiras seriadas propriamente ditas. Merece meno o fato de que esse gnero quase inexiste no Brasil, embora j tenha sido muito popular no pas. Ainda produzido nos Estados Unidos e, at alguns anos atrs, na Argentina tambm. A tira cmica seriada fica na exata fronteira que separa a tira cmica da tira seriada. Trata-se de um texto que usa elementos prprios s tiras cmicas, como o desfecho inesperado da narrativa, que leva ao efeito de humor, mas, ao

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mesmo tempo, a histria produzida em captulos, assim como ocorre com a tira de aventuras. Ed Mort, personagem criado por Luis Fernando Verissimo e Miguel Paiva, um dos melhores exemplos nacionais do gnero:

Figura 1.8 O detetive Ed Mort em uma de suas investigaes.

No exemplo, o detetive que d nome tira faz um interrogatrio para saber se o rato gigantesco se chama Mickey e se o pato Donald (referncia aos personagens de Walt Disney). A brincadeira inesperada no fim que Ed Mort diz conhecer os dois. O outro colega que o acompanha no interrogatrio ironiza, dando a entender que Mickey Mouse e Pato Donald sejam amigos do detetive. Pensei que eu fosse o seu amigo mais estranho..., diz na ltima cena. o que provoca o humor. A histria continuava desse ponto na tira publicada no jornal do dia seguinte:

Figura 1.9 Ed Mort: tira continua do ponto onde parou no dia anterior.

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O fato de a pessoa interrogada conhecer Mickey e Pato Donald levou o detetive a inferir que ela acompanhara crianas Disneyworld, nos Estados Unidos. Note que o leitor que no tivesse lido o captulo do dia anterior no teria o conhecimento prvio do que se tratava a histria. Mas isso no o impediria de entender a piada do dia. Ed Mort diz que qualquer imbecil entende qual a ligao entre a presena da moa na Disneyworld com as esmeraldas. Mas a leitura sugere que nem ele nem seu interlocutor conseguem dizer qual essa relao. Para no assumir a falha, optam por chamar um verdadeiro imbecil, o garom. Ocorre com a tira cmica seriada o mesmo comportamento visto na tira seriada: se reproduzida em seqncia em um livro, pode ser lida como uma histria em quadrinhos mais longa. Essa histria em quadrinhos mais longa, como temos chamado, a base de uma srie de outros gneros. Em comum, esses textos tm a caracterstica de serem publicados em suportes que permitem uma conduo narrativa maior e mais detalhada. o que ocorre com as revistas em quadrinhos, com os lbuns (nome dado a edies parecidas com livros) e com a pgina dominical (termo usado para definir as histrias de uma pgina s publicadas em geral nos jornais). A diversidade de gneros, nesse caso, est atrelada a uma srie de fatores, como a inteno do autor, a forma como a histria rotulada pela editora que a publica, a maneira como a trama ser recebida pelo leitor, o nome com o qual o gnero foi popularizado e que o tornou mais conhecido junto ao pblico. um assunto complexo e que precisa de um estudo mais aprofundado. Mas podem-se ver algumas tendncias. Parece haver um maior interesse em rotular tais gneros pela temtica da histria: super-heris, terror, infantil, detetive, faroeste, fic-

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o cientfica, aventura, biografia, humor, mang (nome dado ao quadrinho japons e a seus diferentes gneros), ertica, literatura em quadrinhos (adaptaes de obras literrias), as extintas fotonovelas, o jornalismo em quadrinhos (reportagens feitas na forma de quadrinhos). Seguramente h mais temas possveis e outros mais ainda surgiro. Mas o importante frisar que cada um pode constituir um gnero autnomo, publicado em diferentes formatos e suportes.

A necessidade de novos estudosA leitura dos gneros dos quadrinhos feita neste captulo est longe de ser uma classificao rgida e imutvel. Temos cincia de que o que foi exposto no esgota o assunto, por mais detalhada que procurou ser sua apresentao. Mas um comeo de debate para necessrios estudos lingsticos sobre o tema. A proposta foi mostrar as tendncias de produo e recepo dos gneros dos quadrinhos de modo a facilitar sua identificao e, principalmente, sua leitura. Ler quadrinhos ler sua linguagem. Domin-la, mesmo que em seus conceitos mais bsicos, condio para a plena compreenso da histria e para a aplicao dos quadrinhos em sala de aula e em pesquisas cientficas sobre o assunto. Vergueiro (2006) vai mais alm: fala da necessidade de uma alfabetizao na rea, de modo a melhor compreendla, assim como se fala em alfabetizao digital neste incio de sculo XXI. As caractersticas da linguagem dos quadrinhos, necessrias a essa alfabetizao, sero vistas nos prximos captulos.