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Minerva, 5(1): 45-52 ESTUDO DA ADERÊNCIA DE PLACAS DE ROCHAS ORNAMENTAIS COM ARGAMASSA COLANTE Lizandra Nogami Mestre do Programa de Pós-graduação em Geotecnia – EESC/USP, Av. Trabalhador São-carlense, 400, CEP 13566-590, São Carlos, SP, e-mail: [email protected] Antenor Braga Paraguassú Professor Titular, Departamento de Geotecnia – EESC/USP, Av. Trabalhador São-carlense, 400, CEP 13566-590, São Carlos, SP, e-mail: [email protected] José Eduardo Rodrigues Professor Titular do Departamento de Geotecnia – EESC/USP, Av. Trabalhador São-carlense, 400, CEP 13566-590, São Carlos, SP, e-mail:[email protected] Resumo Nos revestimentos de paredes, a fixação de placas de rochas pode ser feita com inserts metálicos ou por aderência com argamassas. Nos assentamentos com argamassas, os valores de aderência, por norma, devem ser superiores a 1 MPa e a altura máxima do revestimento não pode ultrapassar 3 m. No presente trabalho foram feitos ensaios com ladrilhos de três tipos de granitos visando comparar a aderência de argamassa específica para granitos existentes no mercado com uma argamassa colante para porcelanatos, de mesmo custo de produção, desenvolvida por pesquisadores do Departamento de Arquitetura da Escola de Engenharia de São Carlos da Universidade de São Paulo. O ensaio de aderência por tração, normatizado para cerâmica, foi realizado tanto na face rugosa como na face polida dos ladrilhos. Os resultados mostraram a excelente qualidade da argamassa colante desenvolvida em laboratório e que sua aderência está relacionada à rugosidade e à mineralogia dos granitos. Palavras-chave: cimento, argamassa colante, rochas ornamentais. ainda não comercial desenvolvida para fixação de porcelanato, levando em conta a influência da rugosidade das placas e as características petrográficas da rocha. Materiais Rochas ornamentais Do ponto de vista comercial, as rochas orna- mentais são subdivididas basicamente em mármores e granitos, numa designação mais ampla do que os termos petrológicos tradicionais (Brandão et al., 1991). Os mármores englobam todas as rochas carbonatadas, enquanto os granitos abrangem, genericamente, as rochas silicatadas (granitos, sienitos, charnoquitos, gabros, basaltos, arenitos, dioritos, etc.). Alguns outros tipos litológicos, incluídos no campo das rochas ornamentais, são os quartzitos, serpentinitos e ardósias, também muito importantes setorialmente. Introdução Nas construções, as rochas ornamentais e de revestimento destacam-se pela durabilidade, resistência mecânica, efeitos estéticos e funcionais, representando importante setor da economia de diversos países. O Brasil, destacado por sua espetacular geodiversidade, com mais de 1.000 tipos de rochas ornamentais, tornou- se um dos grandes produtores e exportadores mundiais. Os sistemas de revestimentos de edificações ainda baseiam-se no empirismo, pois inexistem especificações metodológicas tanto para a rocha quanto para os materiais utilizados na fixação. Por essa razão, o presente trabalho trata da fixação das placas de rocha utilizando argamassas colantes, processo que ultimamente tem apresentado grande crescimento. O objetivo principal é o de comparar a aderência de argamassa existente no mercado, específica para granitos, com uma argamassa

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ESTUDO DA ADERÊNCIA DE PLACAS DE ROCHAS ORNAMENTAIS ... 45

ESTUDO DA ADERÊNCIA DEPLACAS DE ROCHAS ORNAMENTAIS

COM ARGAMASSA COLANTE

Lizandra NogamiMestre do Programa de Pós-graduação em Geotecnia – EESC/USP,

Av. Trabalhador São-carlense, 400, CEP 13566-590,São Carlos, SP, e-mail: [email protected]

Antenor Braga ParaguassúProfessor Titular, Departamento de Geotecnia – EESC/USP,

Av. Trabalhador São-carlense, 400, CEP 13566-590,São Carlos, SP, e-mail: [email protected]

José Eduardo RodriguesProfessor Titular do Departamento de Geotecnia – EESC/USP,

Av. Trabalhador São-carlense, 400, CEP 13566-590,São Carlos, SP, e-mail:[email protected]

ResumoNos revestimentos de paredes, a fixação de placas de rochas pode ser feita com inserts metálicos ou por

aderência com argamassas. Nos assentamentos com argamassas, os valores de aderência, por norma, devem sersuperiores a 1 MPa e a altura máxima do revestimento não pode ultrapassar 3 m.

No presente trabalho foram feitos ensaios com ladrilhos de três tipos de granitos visando comparar aaderência de argamassa específica para granitos existentes no mercado com uma argamassa colante para porcelanatos,de mesmo custo de produção, desenvolvida por pesquisadores do Departamento de Arquitetura da Escola deEngenharia de São Carlos da Universidade de São Paulo.

O ensaio de aderência por tração, normatizado para cerâmica, foi realizado tanto na face rugosa como naface polida dos ladrilhos. Os resultados mostraram a excelente qualidade da argamassa colante desenvolvidaem laboratório e que sua aderência está relacionada à rugosidade e à mineralogia dos granitos.

Palavras-chave: cimento, argamassa colante, rochas ornamentais.

ainda não comercial desenvolvida para fixação deporcelanato, levando em conta a influência da rugosidadedas placas e as características petrográficas da rocha.

MateriaisRochas ornamentais

Do ponto de vista comercial, as rochas orna-mentais são subdivididas basicamente em mármorese granitos, numa designação mais ampla do que ostermos petrológicos tradicionais (Brandão et al., 1991).Os mármores englobam todas as rochas carbonatadas,enquanto os granitos abrangem, genericamente, asrochas silicatadas (granitos, sienitos, charnoquitos,gabros, basaltos, arenitos, dioritos, etc.). Alguns outrostipos litológicos, incluídos no campo das rochasornamentais, são os quartzitos, serpentinitos e ardósias,também muito importantes setorialmente.

IntroduçãoNas construções, as rochas ornamentais e de

revestimento destacam-se pela durabilidade, resistênciamecânica, efeitos estéticos e funcionais, representandoimportante setor da economia de diversos países. OBrasil, destacado por sua espetacular geodiversidade,com mais de 1.000 tipos de rochas ornamentais, tornou-se um dos grandes produtores e exportadores mundiais.

Os sistemas de revestimentos de edificações aindabaseiam-se no empirismo, pois inexistem especificaçõesmetodológicas tanto para a rocha quanto para osmateriais utilizados na fixação. Por essa razão, o presentetrabalho trata da fixação das placas de rocha utilizandoargamassas colantes, processo que ultimamente temapresentado grande crescimento. O objetivo principalé o de comparar a aderência de argamassa existente nomercado, específica para granitos, com uma argamassa

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Os granitos são bem aceitos no mercado mundial,principalmente os brasileiros, por conta da grandevariedade cromática e textural. O fator estético, muitasvezes decisivo na escolha, é resultado da harmonia entrecores, tamanhos, formas e arranjos entre os minerais.

No presente trabalho foram escolhidos três tiposde granitos, comercialmente conhecidos como PretoIndiano (Figura 1), Vermelho Brasília (Figura 2) eVerde Labrador (Figura 3), por sua alta aceitação nosmercados interno e externo.

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Figura 1 Preto Indiano (migmatito).

Figura 2 Vermelho Brasília (sienogranito).

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ArgamassasNo mercado há argamassas colantes específicas

para granitos, mármores e ardósias. Neste trabalhofoi utilizada a argamassa específica para granitos,aqui chamada de argamassa industrializada, que foicomparada com uma argamassa desenvolvida noDepartamento de Arquitetura da USP, São Carlos(Almeida, 2005), para porcelanato, chamada deargamassa A4. A escolha se deve ao fato de oporcelanato e o granito possuírem uma característicaem comum, a baixíssima porosidade (< 3%), querestringe a aderência mecânica (penetração daargamassa nos poros – ancoragem). Por essa razão,a aderência se processa apenas por ligações químicasou forças intermoleculares (físicas). Essa argamassatem a seguinte composição: 5% de sílica, 20% delátex, relação at/c = 0,4 (em que at = água total,incluindo a água proveniente do látex polimérico; c= cimento), proporção cimento:areia de 1:1,5 emmassa e 1% de superplastificante em relação à massado cimento.

O mecanismo de aderência entre a argamassa eo porcelanato é promovido por forças intermoleculares(ligação de Van der Waals) entre o filme poliméricoe os compostos hidratados.

MétodosDeterminação da rugosidade dos corpos-de-prova

O desdobramento de blocos (serragem) realizadoem teares é tradicional e amplamente difundido. É aoperação mais complexa da indústria da pedra, e as

chapas obtidas apresentam maior ou menor rugosidadeem função das características da rocha, dos insumosutilizados e das condições operacionais. A rugosidadedas superfícies das chapas determina o volume dematerial a ser removido nas etapas de polimento, sendotambém importante sua determinação no assentamentodas placas com argamassa dada a sua influência naaderência.

Para relacionar a rugosidade das placas dosgranitos estudados com os valores de aderência, foinecessário medi-la utilizando-se um perfilômetroportátil (Figura 4) projetado e construído por Ribeiro(2005).

Por questões práticas, executaram-se medidas darugosidade das superfícies não polidas dos corpos-de-prova antes de eles serem extraídos dos ladrilhos pormeio de coroas diamantadas. A Figura 5 mostra osperfis (linhas) onde estão delimitados os corpos-de-prova de diâmetro de 3 cm.

Com o perfil de rugosidade dos corpos-de-prova,foi determinado o parâmetro de rugosidade (Rt), quecorresponde à maior altura entre pico-vale ao longodo comprimento avaliado (Figura 6).

Determinação da resistência de aderência à traçãoPara avaliação da resistência de aderência das

argamassas adotou-se a NBR 14084 (1998), queespecifica um método de ensaio de laboratório paradeterminação da resistência de aderência paraargamassas colantes para cerâmica. No desenvol-vimento da pesquisa as etapas a seguir foram adotadas.

Figura 3 Verde Labrador (charnoquito).

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Figura 4 Avaliador de rugosidade de chapas – ARC (Ribeiro, 2005).

Figura 5 Medição da rugosidade dos ladrilhos de granito nos quais estão desenhados círculos donde posteriormenteserão extraídos os corpos-de-prova.

Figura 6 Definição de Rt (Sandvik, 1994, apud Spínola, 1998).

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Os corpos-de-prova (bolachas) de 3,0 cm dediâmetro foram ensaiados tanto com a superfície rugosaquanto com a superfície polida em contato com aargamassa. O brilho da superfície polida/retificada foipreviamente removido em retífica de rebolo diamantado(Figura 7).

Os corpos-de-prova assentados com as argamassasdescritas foram mantidos em condições normais de curaespecificadas na norma (temperatura de 23°C e umidaderelativa do ar de 65%) por 28 dias.

O equipamento utilizado para o arrancamentoé do tipo manual, mostrado na Figura 8, em que 1 é omanômetro e 2 é um cilindro metálico, conectado aoequipamento e colado com araldite no corpo-de-prova 3.

ResultadosOs resultados dos ensaios de resistência de

aderência à tração na face rugosa e na face polida/retificada, assim como os valores de rugosidade (Rt)dos corpos-de-prova, são apresentados e discutidosa seguir.

Resistência de aderência à tração na face rugosaOs Gráficos 1, 2 e 3 mostram os valores de

resistência de aderência à tração dos corpos-de-provafixados com a argamassa industrializada e a arga-massa A4. Para todas as rochas ensaiadas, a aderênciada argamassa A4 é aproximadamente o dobro daargamassa industrializada.

Figura 7 Detalhamento da retificação dos corpos-de-prova no torno mecânico com retífica.

Figura 8 Equipamento utilizado no ensaio de resistência de aderência à tração.

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Gráfico 1 Resistência de aderência à tração do sienogranito Vermelho Brasília.

Gráfico 2 Resistência de aderência do charnoquito Verde Labrador.

Gráfico 3 Resistência de aderência à tração do migmatito Preto Indiano.

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O sienogranito Vermelho Brasília apresentoumaior valor de aderência, seguido do charnoquito VerdeLabrador e do migmatito Preto Indiano, respecti-vamente.

Nos Gráficos 4 e 5 são mostradas as relaçõesentre a aderência e a rugosidade. Verificou-se influênciada rugosidade, uma vez que a resistência de aderênciavariou de forma diretamente proporcional com osvalores de Rt (mm), evidenciando, neste caso, que aaderência ocorreu por interação física (ligação de Vander Waals).

Resistência de aderência à tração na face polida/retificada

Os ensaios de aderência à tração na super-fície polida/retificada das rochas foram realizadospara observar a influência da mineralogia/texturados tipos de rochas estudados. Os valores deresistência de aderência são apresentados nos Grá-ficos 6 e 7.

Observa-se que o charnoquito Verde Labradorapresentou maior aderência, seguido pelo migmatitoPreto Indiano e o sienogranito Vermelho Brasília, oque sugere uma influência da mineralogia, uma vez

que o Verde Labrador possui a menor porcentagemde quartzo (14%) das rochas ensaiadas.

A resistência de aderência à tração da argamassaA4 é aproximadamente o triplo da obtida com aargamassa industrializada para qualquer dos granitosensaiados com a face polida/retificada.

ConclusõesA argamassa industrializada apresentou valores deresistência de aderência à tração dentro da norma(≥ 1 MPa).A argamassa A4 (desenvolvida em laboratório paraporcelanatos) apresentou valores de aderência de,aproximadamente, o dobro da obtida para aargamassa industrializada nos ensaios com assuperfícies rugosas das rochas estudadas.A resistência de aderência, como esperado, estáintimamente ligada à rugosidade (força intermo-lecular – interação física).Nos ensaios de aderência das argamassas com assuperfícies não rugosas (polidas/retificadas), aaderência foi inversamente proporcional à quan-tidade de quartzo, sugerindo influência mineralógica.

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Gráfico 4 Resistência de aderência × rugosidade com a argamassa industrializada.

Gráfico 5 Resistência de aderência × rugosidade com a argamassa A4.

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Gráfico 6 Resistência de aderência da argamassa industrializada com os granitos ensaiados.

Gráfico 7 Resistência de aderência da argamassa A4 com os granitos ensaiados.

Referências BibliográficasALMEIDA, A. E. S. Estudo da influência das adiçõesde sílica ativa e copolímeros estireno acrílico naspropriedades de argamassa para o assentamento deporcelanato. 2005.ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNI-CAS. NBR 14082: Argamassa colante industrializadapara assentamento de placas de cerâmica: execuçãodo substrato padrão e aplicação de argamassa paraensaio. 2004.ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNI-CAS. NBR 14084: Argamassa colante industrializadapara assentamento de placas de cerâmica: determinaçãoda resistência de aderência. 2004.BRANDÃO, W.; SARDDOU FILHO, R.; QUEIROZ,E. T. Mármores, granitos e outras rochas ornamentaisno Brasil. In: SCHOBBENHAUS, C.; QUEIROZ, E.T.; COELHO, C. E. S. (Eds.). Principais depósitos

minerais do Brasil. Brasília: D.N.P.M., 1991. v. IV,Parte A, p. 371-372.RIBEIRO, R. P. Influência das característicaspetrográficas de granitos no processo industrial dedesdobramento de blocos. 2005. Tese (Doutorado) –Programa de Pós-graduação em Geotecnia, Escola deEngenharia de São Carlos, Universidade de São Paulo,São Carlos.SPÍNOLA, S. V. P. A. C. Influência da qualidade daserragem de granitos no consumo energético dodesbaste. 1998. 138 f. Dissertação (Mestrado) –Instituto Superior Técnico, Universidade Técnica deLisboa, Lisboa.