estruturas: uma abordagem arquitetônica

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ESTRUTURAS UMA ABORDAGEM ARQUITETÔNICA Daiçon Maciel da Silva André Kraemer Souto 5 a edição

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De Daiçon Maciel da Silva e André Kraemer Souto. 5ª edição.

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ESTRUTURASUMA ABORDAGEM ARQUITETÔNICA

Daiçon Maciel da SilvaAndré Kraemer Souto

5a edição

ESTRUTURASUMA ABORDAGEM ARQUITETÔNICA

Daiçon Maciel da SilvaAndré Kraemer Souto

5a ediçãoPorto Alegre, 2015

ReitorTelmo Rudi Frantz

Pró-Reitora de GraduaçãoLaura Coradini Frantz

Pró-Reitora de Pesquisa, Pós-Graduação e ExtensãoMárcia Santana Fernandes

Coordenadora do Curso de ArquiteturaMaria Fátima Rosa Beltrão

Coordenador do Curso de EngenhariaJosé Luiz Finger

CURSO DE ARQUITETURA E URBANISMORua Orfanotrófio, 555 - Bairro Alto TeresópolisCEP 90840-440 – Porto Alegre – RSFone/Fax: (51)3230 3333www.uniritter.edu.brE-mail: [email protected]

ENTIDADE MANTENEDORASociedade de Educação Ritter dos Reis Ltda

© Daiçon Maciel da Silva e André Kraemer SoutoEstruturas: uma abordagem arquitetônica 5ª edição - 2015 - Uniritter

Conselho Científico da Editora UniRitter: Prof. Dr. Beatriz Daut Fischer (Unisinos), Prof. Dr. Bernardo Subercaseaux (Universidad de Chile), Prof. Dr. Diego Rafael Canabarro (UFR-GS), Prof. Dr. Elias Torres Feijó (Universidade de Santiago de Compostela), Prof. Dr. Gilber-to Ferreira da Silva (Unilasalle), Prof. Dr. Günther Richter Mros (Universidade Católica de Brasília), Prof. Dr. Jaqueline Moll (MEC), Prof. Dr. Júlio Van der Linden (UFRGS), Prof. Dr. Lucas Kerr de Oliveira (Universidade Federal da Integração Latino-Americana), Prof. Dr. Marizilda Menezes (UNESP Bauru), Prof. Dr. Taisy Weber (UFRGS)

Conselho Editorial: Anna Paula Canez, Ana Paula Ávila, Gladimir de Campos Grigoleti, Hericka Zogbi Jorge Dias, Isabel Cristina Siqueira da Silva, Jacqueline Schaurich dos Santos, Josué Emílio Möller, Júlio César Caetano, Laurise Pugues, Lia C. Hallwass, Luciano Reolon, Marc Antoni Deitos, Maria Luíza de Souza Moreira, Regina da Costa da Silveira, Roger Luiz da Cunha Bundt e Rejane Pivetta

Editor Chefe: Marcelo SpaldingArte Capa e Planejamento Gráfico: Tâmisa TrommerRevisão Linguística: William Moreno Boenavides

S586 Silva, Daiçon Maciel da Estruturas : uma abordagem arquitetônica / Daiçon Maciel da Silva, André Kraemer Souto. – Porto Alegre: UniRitter Ed., 2015.

148 p. : il.

ISBN 978.85.60100.09.51. Engenharia de estruturas. 2. Teoria das estruturas. 3. Estruturas – Arquitetura I. Souto, André Kraemer II. Título.

CDU 624.01

Ficha catalográfica elaborada por Angela Morel Nitschke - CRB 10/1587.

AGRADECIMENTOS

Ao Centro Universitário Ritter dos Reis, na pessoa de seu Reitor, Telmo Rudi Frantz, pelo apoio a esta edição.

Ao Engenheiro Ruy Cremonini, pelas sugestões.À Tâmisa Trommer, por emprestar o seu talento na atualização e modernização dos

desenhos que compõem esta edição, pelo projeto gráfico que tão bem expressa a bela feição arquitetônica da arte de representar.

À Professora Regina da Costa Silveira, pela primeira revisão dos textos.

SUMÁRIO

PREFÁCIO

INTRODUÇÃO

MORFOLOGIA DAS ESTRUTURAS

ESTRUTURAS 21DEFINIÇÃO 22FATORES MORFOGÊNICOS 22EVOLUÇÃO DAS FORMAS ESTRUTURAIS 24SISTEMAS ESTRUTURAIS FUNDAMENTAIS 25

A ESTRUTURA E A ARQUITETURA

ARQUITETO: MESTRE EM ESTRUTURAS 29ESTRUTURA NA CONSTRUÇÃO: SITUAÇÃO NOVA 29ESTRUTURA TÉCNICA: MEIOS DE HUMANIZAÇÃO 30NECESSIDADE DA ESTRUTURA 30CONHECIMENTO ESTRUTURAL 31EVOLUÇÃO HISTÓRICA 32A ARQUITETURA E A ESTRUTURA - O ARQUITETO E O ENGENHEIRO 35ESTRUTURAS E INTUIÇÃO 37

CONCEITUAÇÃO DAS ESTRUTURAS

EQUAÇÕES DE EQUILÍBRIO DA MECÂNICA RACIONAL 41ESTRUTURA E CLASSIFICAÇÃO DOS ELEMENTOS ESTRUTURAIS 43APOIOS ESTRUTURAIS E CLASSES DE APOIO (VÍNCULOS) 44

GRAU DE ESTATICIDADE DAS ESTRUTURAS 45ESTATICIDADE INTERIOR DOS RETICULADOS PLANOS (TRELIÇAS) 46CRÍTICA AO MÉTODO PARA A DETERMINAÇÃO DA ESTATICIDADE INTERIOR 47DETERMINAÇÃO DE ESTATICIDADE INTERIOR PELO SISTEMA DE TRIÂNGULOS 48

CARGAS QUE ATUAM NAS ESTRUTURAS

FINALIDADE DAS ESTRUTURAS 53CARGAS 53CARGAS PERMANENTES 55CARGAS ACIDENTAIS 56CARGAS VARIÁVEIS 56CARGAS DINÂMICAS 60COMBINAÇÕES DE AÇÕES 60

MATERIAIS E EXIGÊNCIAS ESTRUTURAIS

CARACTERÍSTICAS IMPORTANTES DOS MATERIAIS, MELHORES MATERIAIS DE CONSTRUÇÃO E O AVANÇO DAS MODERNAS TÉCNICAS DE CONSTRUÇÃO 63PROPRIEDADES ESSENCIAIS DOS MATERIAIS USADOS EM ESTRUTURAS 64CONSTANTES ELÁSTICAS DOS MATERIAIS 65COEFICIENTE DE SEGURANÇA DOS MATERIAIS 67MATERIAIS ARTIFICIAIS MODERNOS 68EXIGÊNCIAS BÁSICAS 70ESTRUTURAS ÓTIMAS 76

ESTADOS BÁSICOS DE TENSÃO E SOLICITAÇÕES

ESTADOS BÁSICOS DE TENSÃO 81SOLICITAÇÕES SIMPLES 82SOLICITAÇÕES COMBINADAS 88ASPECTOS DELICADOS DO COMPORTAMENTO ESTRUTURAL 92

ESTRUTURAS SUBMETIDAS À TRAÇÃO E COMPRESSÃO

CABOS 97TRELIÇAS PLANAS 98ARCOS FUNICULARES 101COBERTURAS COM CABOS 101TRELIÇAS ESPACIAIS 103

VIGAS

ESTRUTURAS SUBMETIDAS À FLEXÃO E CISALHAMENTO 109OUTRAS CARACTERÍSTICAS DAS VIGAS EM BALANÇO 111VIGAS SIMPLESMENTE APOIADAS 111VIGAS ENGASTADAS E VIGAS CONTÍNUAS 113TENSÕES SECUNDÁRIAS DE FLEXÃO 114

PÓRTICOS E ARCOS

PILAR-E-VIGA 119PÓRTICO SIMPLES 119PÓRTICOS MÚLTIPLOS 121PÓRTICOS DE DUAS ÁGUAS 122ARCOS 123COBERTURAS EM ARCO 124

ENTRAMADOS, PLACAS E GRELHAS

TRANSFERÊNCIA DE UMA CARGA EM DUAS DIREÇÕES 127ENTRAMADOS RETANGULARES 127ENTRAMADOS OBLÍQUOS 129PLACAS 129LAJES NERVURADAS 131PLACAS DOBRADAS 132

MEMBRANAS

CARACTERÍSTICAS GERAIS 137MEMBRANAS PNEUMÁTICAS 138TENSÕES NAS MEMBRANAS 139

CASCAS DELGADAS

ESTRUTURAS RESISTENTES PELA FORMA 143CURVATURAS E CARACTERÍSTICAS GEOMÉTRICAS 144AÇÃO DE MEMBRANA EM CÚPULAS CIRCULARES 145TENSÕES DE FLEXÃO EM CÚPULAS 146AÇÃO DE MEMBRANA EM CILINDROS 148TENSÕES DE FLEXÃO NOS CILINDROS 148CASCAS DE OUTROS TIPOS 149PROBLEMAS NA CONSTRUÇÃO DE CASCAS DELGADAS 150

BIBLIOGRAFIA

LISTA DE FIGURAS

Fig. 1 | Corpo submetido à ação de um sistema de “n” forças 41Fig. 2 | Vínculos 42Fig. 3 | Vínculo de primeira ordem 42Fig. 4 | Vínculo de segunda ordem 42Fig. 5 | Vínculo de terceira ordem 43Fig. 6 | Estruturas hipostáticas 43Fig. 7 | Viga simplesmente apoiada 44Fig. 8 | Viga em balanço ou Cantilever 44Fig. 9 | Pórtico 45Fig. 10 | Estrutura com dois graus de hiperestabilidade 45Fig. 11 | Estrutura com três graus de hiperestabilidade 46Fig. 12 | Viga contínua com dois hiperestáticos 46Fig. 13 | Determinação da estaticidade interna de um sistema reticulado 46Fig. 14 | Estaticidade de um sistema 47Fig. 15 | Justaposição de triângulos 47Fig. 16 | Reticulado composto por triângulos 47Fig. 17 | Estrutura exposta à variação de temperatura 56Fig. 18 | Comportamento elástico 64Fig. 19 | Comportamento elástico linear 64Fig. 20 | Comportamento plástico 65Fig. 21 | Estrutura em concreto sob tração 68Fig. 22 | Estrutura em concreto protendido sob tração 68Fig. 23 | Equilíbrio à translação 70Fig. 24 | Equilíbrio de rotação (gangorra) 70Fig. 25 | Efeito de tombamento 70Fig. 26 | Tração simples 82Fig. 27 | Tensão de tração 83Fig. 28 | Compressão simples 83

Fig. 29 | Flambagem 84Fig. 30 | Cisalhamento 85Fig. 31 | Deformação de corte em uma viga engastada 86Fig. 32 | Torção 88Fig. 33 | Flexão pura 88Fig. 34 | Flexão simples 89Fig. 35 | Flexão composta 90Fig. 36 | Flexo-compressão e flexo-tração 91Fig. 37 | Flambagem 91Fig. 38 | Estrutura de cabos 97Fig. 39 | Carga aplicada num cabo 97Fig. 40 | Ponte pensil 98Fig. 41 | Treliça plana 98Fig. 42 | Treliças simples 99Fig. 43 | Treliças com banzo superior curvo 99Fig. 44 | Treliças de contorno triangular: 100Fig. 45 | Arco em forma parabólica 101Fig. 46 | Roda de bicicleta 101Fig. 47 | Teto de cabos protendidos de Viera 102Fig. 48 | Teto tipo roda de bicicleta do Auditório de Utica, Nova Iorque 102Fig. 49 | Ponte com cabos. Arquiteto Santiago Calatrava. Sevilha, Espanha 103Fig. 50 | Reticulado espacial 104Fig. 51 | Flexão de uma viga em balanço 109Fig. 52 | Influência da forma da seção na deformação da viga 109Fig. 53 | Momento de inércia de vigas 110Fig. 54 | Deformações devidas a cargas concentradas e distribuídas 110Fig. 55 | Esforço cortante em vigas 111Fig. 56 | Influência do vão sobre a deformação 111

Fig. 57 | Influência da altura e espessura na deformação 112Fig. 58 | Influência do tipo de material na deformação 112Fig. 59 | Influência da posição da carga na deformação 113Fig. 60 | Influência do tipo de carregamento na deformação 113Fig. 61 | Deformação e diagramas de momentos fletores (estudo comparativo) 114Fig. 62 | Deformação e diagramas de momentos fletores 115Fig. 63 | Deformação e diagramas de momento fletor para uma viga contínua (carga concentrada) 115Fig. 64 | Sistema de pilar - e - viga 119Fig. 65 | Pórtico simples 119Fig. 66 | Pórticos múltiplos 120Fig. 67 | Edifício Sears Tower (Chicago, EUA) 121Fig. 68 | Pórtico de duas águas 122Fig. 69 | Arco atirantado 122Fig. 70 | Ponte em arcos múltiplos 123Fig. 71 | Estrutura em arcos radiais 123Fig. 72 | Transferência de cargas em uma direção 127Fig. 73 | Transferência de cargas em duas direções 127Fig. 74 | Entramado retangular 128Fig. 75 | Entramados retangular e oblíquo 128Fig. 76 | Placa com transferência de carga em duas direções 130Fig. 77 | Laje cogumelo ou laje plana 130Fig. 78 | Laje nervurada 131Fig. 79 | Placa dobrada de altura “a” e espessura “e” 133Fig. 80 | Membranas 138Fig. 81 | Balão, exemplo de membrana pneumática 138Fig. 82 | Mecanismo de funcionamento estrutural de uma membrana 140

Fig. 83 | Estrutura resistente pela sua forma 143Fig. 84 | Cobertura em cascas 143Fig. 85 | Casca esférica 144Fig. 86 | Casca cilíndrica 144Fig. 87 | Casca cilíndrica contínua 145Fig. 88 | Mecanismo do funcionamento estrutural das cascas 145Fig. 89 | Deformação de flexão numa casca, próximo a apoio rígido 147Fig. 90 | Cobertura cilíndrica de grande comprimento em relação à largura 149Fig. 91 | Esforços predominantes em cilindros curtos e longos 149Fig. 92 | Superfície cônica ondulada 151

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PREFÁCIO

O ensino de estruturas nas Escolas de Arquitetura é, e sempre foi, uma dessas áreas onde a interface de duas profi ssões – a do arquiteto e a do engenheiro – tem revelado a sua mais perversa faceta. O entendimento equivocado desse assunto tem dividido profundamente a forma de ação desses dois atores de construção. A divergência metodológica e conceitual a respeito do papel da tecnologia estrutural e sua apropriação na concepção da obra arquitetô-nica acentuou-se, extraordinariamente, entra as duas profi ssões após a Revolução Industrial, notadamente a partir de meados do século passado. O desenvolvimento do aço e da mecânica racional – ao lado dos engenheiros – e o obstinado apego à tradição artística e ao academi-cismo – pelo lado dos arquitetos – tem cavado um poço enorme no arcabouço conceitual e profi ssional dessas duas áreas.

Ainda hoje há quem distinga a Engenharia da Arquitetura, pensando aquela como prática, e esta como tendo a missão divina para ser efetiva. Esses dois pensamentos são, na atualidade, duas doutrinas divergentes que, assim entendida, não estarão aptas a colaborar no avanço da tecnologia da construção do espaço arquitetônico. Apesar da lucidez de alguns que jamais se equivocaram e sempre entenderam a tecnologia como um processo criativo, as contingências históricas foram mais fortes. Os equívocos metodológicos entre as duas áreas aconteceram, ora por extraordinário cientifi cismo, ora por uma estéril e estereopatia dos métodos que se infi ltraram no ensino.

Os professores Daiçon Maciel da Silva e André Kraemer Souto, por sua ação docente, aju-daram a construir uma ponte por esse fosso e, agora, de forma ainda mais signifi cativa ao es-creverem este Estruturas: Uma abordagem arquitetônica jogaram luz em seu interior. Com este livro dão um largo passo sobre esta ponte, na busca de um melhore entendimento da “gata borralheira” em que se transformou o ensino de estruturas em nossas escolas.

Este livro, escrito por engenheiros, representa um importante gesto de integração concei-tual e profi ssional entre o pensamento e a ação da Engenharia e da Arquitetura. Trata-se de uma obra de rara dedicação à causa do ensino de estruturas, ou seja, à formação tecnológica dos nossos jovens arquitetos, e por que não admiti-lo, dos engenheiros também. A obra é uma contribuição inequívoca para aqueles que pretendem estudar o assunto, sem preconceito, a a partir de uma visão abrangente, aplicada e direta.

16 PREFÁCIO

Há grande escassez de livros didáticos que tratem do assunto nos moldes do pensamento conceitual e do funcionamento da tipologia estrutural disponível para a construção de edifi -cações. Esta obra perseguiu como determinação esse intento e logrou êxito. Estruturas: Uma abordagem arquitetônica constitui uma inegável contribuição ao ensino de tecnologia estru-tural. É escrito em linguagem direta e simples, apresenta o essencial para a correta e expedita apropriação daqueles que se iniciam no aprendizado do repertório estrutural dentro do pro-cesso de concepção arquitetônica.

Escrever livros didáticos é uma tarefa difícil, ainda mais sobre assunto controverso e que tem abrangência científi ca, tecnológica e estética. Com certeza, a obra dos professores Daiçon e André satisfará plenamente aqueles que buscam compreensão do universo dos sistemas estruturais, na construção, sob o seu ponto de vista físico, intuitivo, bem como, cognitivo e interpretativo.

Percebe-se, nitidamente, no contexto da obra, a saudável infl uência de notáveis mestres no assunto, como Mário Salvadori e Robert Heller que, pioneiramente, defrontaram-se com esse desafi o – qual seja, o de escrever de modo estimulante, objetivo e claro sobre tema tão intrincado, complexo e recorrente – sem se enredarem em extensas demonstrações. Desa-fortunadamente, na maioria das obras, os autores se expressam sob impenetrável manto de criptografi as desesperantes, mesmo aos iniciados. Nesse aspecto Estruturas: Uma aborda-gem arquitetônica é uma obra cristalina, como devem ser os livros que objetivam abrir o horizonte ainda limitado dos estudantes, sobre um assunto essencial no processo criativo. Os professores Daiçon Maciel da Silva e André Kraemer Souto, da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo UniRitter, estão dando uma inestimável contribuição ao ensino da Arquitetura com esta obra oportuna e bem-vinda para aqueles que advogam a congruência dos objetivos técnicos e estéticos do pensar arquitetônico.

Arq. Erico WeidleUniversidade de Brasília - UnB

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INTRODUÇÃO

Segundo o dicionário de Aurélio Buarque de Holanda, o conceito de estrutura (na Arquitetura) é “o conjunto das partes de uma construção que se destinam a resistir cargas; armação, esqueleto, arcabouço”. Esta defi nição é incompleta por não incluir alguns fatores, tais como organização do espaço, custo, otimização, forma do espaço, fun-ção de uso, tipo de material, durabilidade, segurança, geometria, estética, etc. Segundo o Professor Érico Weidle (Universidade de Brasília) em curso de especialização proferido na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo de Porto Alegre - Ensino e Pesquisa na Arquitetu-ra- “estrutura, em arquitetura, é o sistema material da edifi cação capaz de transmitir car-gas e absorver os esforços de modo a garantir a estabilidade, a segurança e a integridade da construção, sob o compromisso da organização espacial e sua expressão no contexto cultural e social, mediante o adequado emprego dos materiais, suas técnicas e processos e de acordo com os recursos econômico-fi nanceiros.”

Os métodos científi cos não servem e em nada contribuem ao ensino de estruturas; o ato de conceber independe do conhecimento científi co (da ciência); o conhecimento apenas facilita a compreensão. Segundo o Professor Weidle, existem algumas orientações que devem nortear o ensino das estruturas para estudantes da graduação em Arquitetura: o tipo e o conteúdo das informações técnicas a serem ministradas aos estudantes de Ar-quitetura durante seu curso devem ser apresentados na forma de necessidades específi cas dos arquitetos com vistas à concepção do espaço arquitetônico. O desenvolvimento da in-tuição estrutural e da avaliação construtiva deve ter um objetivo concreto. As estruturas devem ser ensinadas no contexto do projeto arquitetônico.

Há três domínios do conhecimento tecnológico distintos, mas interdependentes: ini-cialmente absorver conhecimento básico e geral sobre a tipologia estrutural para depois desenvolver o senso do que é apropriado e está ao alcance das possibilidades, depois, fi nal-mente, compreender esses conceitos básicos num nível mais específi co (estática, mecâ-nica elementar, características de resistência dos materiais, condições de carregamento, normas técnicas, procedimentos de projeto). O estudo das estruturas deve ser fundamen-tado na teoria geral, tratando em conjunto a questão do espaço arquitetônico em seu con-texto cultural, de construção e detalhamento como coisas indissociáveis. A abordagem

18 INTRODUÇÃO

dos cursos deve ser de ordem prática e estes devem ter seu propósito principal dirigido sobre situações reais. O típico relacionamento entre a aula expositiva e o laboratório, no qual este é usado apenas para ilustrar e evidenciar a preleção, é de fato inadequado. O estudo das estruturas indeterminadas é crucial, visto que é nestas que câmbios sutis na estabilidade alteram a distribuição das forças e consequentemente das formas.

Todo trabalho deve ser feito sobre modelação, mediante o emprego dos modelos tridi-mensionais ou computacionais.

Nota: Nesta 5ª edição foram inseridas novas fotos. Tal medida deve-se ao interesse em mostrar aplicações em obras e edifi cações contemporâneas com destaque arquitetônico dos diversos sistemas estruturais abordados neste livro.

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Jockey ClubeArquiteto: Román Fresnedo SiriPorto Alegre - 1952

MORFOLOGIADAS ESTRUTURAS

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Jockey ClubeArquiteto: Román Fresnedo SiriPorto Alegre - 1952

MORFOLOGIADAS ESTRUTURAS

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MORFOLOGIA DAS ESTRUTURAS

ESTRUTURAS

A palavra estrutura tem signifi cado de considerável amplitude. De modo genérico, signifi ca a maneira especial por que estão dispostas, em relação umas às outras, as diferentes partes de um corpo. Assim, dizemos estrutura atômica para a distribuição dos átomos na molécula. De modo fi gurado, serve para designar a ordem, a disposição ou a distribuição das diversas partes que compõem uma obra literária, artística ou conceito fi losófi co. De maneira especial, entretanto, a palavra estrutura é usada para designar a composição, construção, organização e disposição arquitetônica de um edifício.

Nesse conceito, estrutura compreende todas as partes que compõem o edifício, desde os revestimentos, a pintura, até a sua medula, o seu âmago. De modo ainda mais particu-larizado, quando falamos de estrutura, em Engenharia Civil, por defi nição, designamos as partes que suportam as cargas de uma construção e as transmitem às fundações. Neste caso, estamos diante da estrutura resistente, ou simplesmente estrutura.

Frequentemente, os alunos de Arquitetura recebem os primeiros conhecimentos re-lativos às estruturas analisando uma peça estrutural isolada, um pilar ou uma viga, sem considerar o conjunto de elementos que compõem todo o sistema. Parece-nos importante a visão total, partindo da síntese: o conhecimento introdutório de todas as formas estru-turais, quanto a suas concepções lógicas, diante do emprego econômico dos materiais; a origem e a evolução das formas em função das culturas e do progresso tecnológico; a sua fi nalidade e estética. É proveitoso, também, o estudo das formas estruturais desenvolvidas nos seres vivos: a natureza nos ensina processos de otimização em todas as suas manifes-tações.

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MORFOLOGIA DAS ESTRUTURAS

ESTRUTURAS

A palavra estrutura tem signifi cado de considerável amplitude. De modo genérico, signifi ca a maneira especial por que estão dispostas, em relação umas às outras, as diferentes partes de um corpo. Assim, dizemos estrutura atômica para a distribuição dos átomos na molécula. De modo fi gurado, serve para designar a ordem, a disposição ou a distribuição das diversas partes que compõem uma obra literária, artística ou conceito fi losófi co. De maneira especial, entretanto, a palavra estrutura é usada para designar a composição, construção, organização e disposição arquitetônica de um edifício.

Nesse conceito, estrutura compreende todas as partes que compõem o edifício, desde os revestimentos, a pintura, até a sua medula, o seu âmago. De modo ainda mais particu-larizado, quando falamos de estrutura, em Engenharia Civil, por defi nição, designamos as partes que suportam as cargas de uma construção e as transmitem às fundações. Neste caso, estamos diante da estrutura resistente, ou simplesmente estrutura.

Frequentemente, os alunos de Arquitetura recebem os primeiros conhecimentos re-lativos às estruturas analisando uma peça estrutural isolada, um pilar ou uma viga, sem considerar o conjunto de elementos que compõem todo o sistema. Parece-nos importante a visão total, partindo da síntese: o conhecimento introdutório de todas as formas estru-turais, quanto a suas concepções lógicas, diante do emprego econômico dos materiais; a origem e a evolução das formas em função das culturas e do progresso tecnológico; a sua fi nalidade e estética. É proveitoso, também, o estudo das formas estruturais desenvolvidas nos seres vivos: a natureza nos ensina processos de otimização em todas as suas manifes-tações.

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22 MORFOLOGIA DAS ESTRUTURAS

DEFINIÇÃO

Diante dos conceitos expostos, podemos defi nir morfologia das estruturas como o estudo das estruturas resistentes sob o ponto de vista da forma, considerando as suas origens (morfogênese) e evolução, tendo como objetivo dar aos alunos conhecimentos básicos para síntese, análise e concepção de estruturas que respondam aos anseios fun-cionais, técnicos e culturais.

FATORES MORFOGÊNICOS

Os fatores morfogênicos são as razões determinantes de certas formas estruturais, tanto no conjunto do sistema como em cada uma de suas partes constitutivas. O corpo humano, por exemplo, é um tipo de estrutura que denominamos de arcabouço: possui um esqueleto que permite à estrutura manter-se em pé. Existe correlação perfeita entre todas as peças, não só do esqueleto, mas também entre este e o restante da estrutura, os músculos e todos os órgãos. Esta correlação permite aos arqueólogos, diante de um fêmur fóssil, avaliar a forma do ser original completo, pois o ser apresenta forma compatível com a sua especialização. Muitos fatores cooperam na geração e defi nição dessa forma; a estes, denominamos fatores morfogênicos.

A condição precípua de uma estrutura resistente é manter a construção em pé. A esta-bilidade da construção deve manifestar-se não só através de cálculos estáticos, mas tam-bém pela forma comunicada visualmente. E a forma só poderá ser considerada verdadeira quando é expressão franca e espontânea de todas as raízes morfogênicas que lhe deram origem.

É praticamente impossível tentar enumerar toda a morfogênese estrutural. Para efeito didático, entretanto, podemos classifi car os fatores morfogênicos em três grupos: funcio-nais, técnicos e estéticos.

Fatores Funcionais

Os fatores funcionais são os preponderantes na defi nição da forma estrutural. Todos os outros elementos morfológicos estão subordinados a estes. A Arquitetura, dentro do seu amplo campo de atividade, necessita construir estruturas para as mais variadas fun-ções, apresentando formas particulares diferenciadas correspondentes. Todas as estrutu-ras estão subordinadas, direta ou indiretamente, às dimensões humanas: o ser humano é

23ESTRUTURAS | uma abordagem arquitetônica

a escala, pois é ele a medida de todas as coisas. As obras estruturais da Arquitetura se des-tinam às seguintes funções fundamentais: habitação, tráfego, condução e contenção.

a • Habitação - Considerada, neste caso, como toda a estrutura que se destina ao abrigo do homem e de seus pertences (residência, escritório, armazém, indústria, etc.), apresenta elementos estruturais comuns, paredes de vedação, paredes portantes e cobertura. É a estrutura mais ligada à Arquitetura e, indubitavelmente, de maior riqueza formal.

b • Tráfego - São consideradas as estruturas das construções destinadas a facilitar a circulação de pessoas, animais, veículos e materiais em modo geral. Elas apresentam formas particulares, entretanto variadas. Estão incluídas as estruturas destinadas a vias (caminhos, ruas, estradas, ferrovias, teleféricos, cremalheiras, hidrovias), revelando as estruturas de túneis e viadutos. Especialmente os viadutos, utilizando variados sistemas e materiais estruturais, possibilitam a realização das mais belas formas de Arquitetura.

c • Condução - A função de condução de líquidos e gases é fator morfogênico característico. Para os líquidos, canais e tubos; para os gases, dutos e chaminés.

d • Contenção - A função de contenção defi ne, de acordo com o conteúdo, as mais diversas formas estruturais: reservatórios, silos, barragens, escoras e arrimos.

Fatores Técnicos

Depois dos fatores morfogênicos funcionais, os fatores técnicos seguem a ordem de importância como determinantes formais. Os fatores técnicos de maior importância são os decorrentes dos materiais utilizados na construção das estruturas: a técnica de cons-trução empregada, o estágio dos processos de cálculo estrutural e a economia diante dos recursos disponíveis. A evolução da sociedade humana, em todos os sentidos (cultural, tecnológico, etc.), determina, evidentemente, maiores exigências nas soluções construti-vas, tanto no que concerne aos aspectos funcionais quanto técnicos. Como exemplo, po-demos citar um dos fatores técnicos, o cálculo estrutural, como morfogênico. O adven-to e posterior desenvolvimento da teoria matemática da elasticidade, nos fi ns do século XVIII, permitiu avaliar com maior precisão os esforços e tensões das peças e do conjunto estrutural submetidas a determinadas forças. Hoje tanto a Teoria da Plasticidade como o Método dos Elementos Finitos ocupam um papel preponderante nessa questão. Assim, a “materialização” dos valores obtidos através de análise estrutural matemática pode apre-sentar formas esbeltas, ao mesmo tempo estáveis e econômicas, diante das características particulares de cada material empregado.

24 MORFOLOGIA DAS ESTRUTURAS

Fatores Estéticos

A estrutura resistente é o elemento construtivo de maior força estética na composição arquitetônica. A condição precípua de qualquer constru-ção é que seja estável, isto é, que suporte as cargas às quais será submetida. A estrutura resistente, resolvida com lógica e simplicidade (por qualquer meio disponível, com materiais de alta ou baixa resistência), comunica ao observador sensações de equilíbrio e estabilidade que confortam. A mate-rialização de formas geométricas puras - como a catenária de uma ponte pênsil - desperta por si só sensação estética. Em todos os tempos, as obras notáveis de Arquitetura mostram, de modo fundamental e até ostensivo, a sua estrutura resistente. Os chamados elementos decorativos, como mol-duras e ornatos, nada mais são do que apêndices aos elementos estruturais, que dão maior simplicidade às estruturas racionais ou clássicas e passam à maior complexidade nas arquiteturas fl orais ou barrocas.

Por outro lado, é necessário salientar que uma simples e imediata solu-ção estrutural não defi ne, por si só, boa Arquitetura. Devem ser levadas em conta a escala e as proporções dos espaços, sempre vinculadas às dimen-sões do ser humano, dimensões estas de ordem física e, especialmente, psicológica.

EVOLUÇÃO DAS FORMAS ESTRUTURAIS

Para efeito didático, convém que as formas estruturais sejam estudadas diante de cada sistema fundamental construtivo de modo evolutivo histó-rico. Este procedimento faz com que os estudantes, de modo interessante, acompanhem o raciocínio evolutivo dos povos, diante das correspondentes necessidades funcionais e recursos técnicos. A evolução das abóbadas, por exemplo: sabemos que vários povos foram os “inventores” desde o período neolítico; seria conveniente mostrar que aqueles povos também estavam diante de problemas de ordem funcional e técnica e puderam vencer maio-res vãos sem formas ou cimbramentos, com materiais que suportam espe-cialmente forças normais de compressão.

Deveriam ser mostradas desde as estruturas dos nuragues; as abóba-das sumérias e egípcias; as cúpulas com “trompas” persas; as cúpulas mi-

1 | Estrutura de Forma Ativa, Palácio Vergara, Viña Del Mar, Chile.

2 | Estrutura de Vetor Ativo, Centro George Pompidou, Paris, França.

25ESTRUTURAS | uma abordagem arquitetônica

cênicas; as cúpulas romanas, bizantinas, renascentistas, até as modernas cascas.

SISTEMAS ESTRUTURAIS FUNDAMENTAIS

A seguir, procurou-se dar uma classifi cação aos sistemas estruturais dentro do estágio tecnológico atual. Os pilares, embora constituam, a ri-gor, elemento e não sistema estrutural, foram assim introduzidos a fi m de estabelecer a ligação entre as vigas, para defi nir os chamados pórticos.

Com base nessa realização, a questão da extensão e do conteúdo dos conhecimentos exigidos pelo arquiteto no projeto estrutural pode ser res-pondida precisamente. Desde que seja admitido que a essência do projeto estrutural é o desenvolvimento de um sistema de forma material que diri-ge as forças para certas direções e as conduz às fundações com o máximo de estética e efi ciência material e com o mínimo de observação do espaço interior, o conhecimento do arquiteto nesse assunto deve prender-se então predominantemente a:

• Conhecimento do mecanismo que faz as forças mudarem sua direção;• Conhecimento dos sistemas para cobrir espaços e resistir a

deformações.Esta meta não somente conduz a uma limitação saudável do vasto cam-

po da Engenharia Estrutural, como também ao estabelecimento estrutural de uma organização simples e convincente dos sistemas de estrutura ar-quitetônica:

a • Estruturas que atuam principalmente através de sua forma material: sistemas de estruturas de forma ativa ou sistemas estruturais em estado de tração simples. Exemplos: cabos e tirantes.

b • Estruturas que atuam principalmente por meio de composição de elementos com compressão e tração: sistemas estruturais de vetor ativo ou sistemas estruturais com tração e compressão concorrentes. Exemplos: treliças e planas e espaciais.

c • Estruturas que atuam principalmente por massa e continuidade material: sistemas estruturais de massa ativa ou sistemas estruturais em estado de fl exão. Exemplos: vigas e placas.

d • Estruturas que atuam principalmente por continuidade de superfície: sistemas estruturais de superfície ativa ou sistemas

3 | Estrutura de Massa Ativa, Estrutura de Vigas e Lajes de Uma Residência em Guaíba, RS, Projeto Estrutural do Engº André Kraemer Souto.

4 | Residência da foto 3 na fase fi nal da obra.

26 MORFOLOGIA DAS ESTRUTURAS

estruturais de tensão de membrana. Exemplos: membranas e cascas delgadas.

e • Estruturas que atuam principalmente por transmissão vertical de carga: sistemas estruturais verticais. Exemplo: pilares e colunas de um edifício.

De fato, em cada sistema estrutural deve-se sempre encontrar, além da maior distinção, uma combinação de qualidades que sejam diferentes das de outros sistemas estruturais. Se for considerada, contudo, a maior ação resistente, cada estrutura pode ser facilmente classifi cada em apenas um dos cinco tipos de sistemas estruturais. Esta classifi cação tem, mais adian-te, sua justifi cativa. Já que a forma e o espaço são menos infl uenciados por essas qualidades secundárias, mas adquirem caráter e distinção predomi-nantemente pelo sistema que provoca a maior tensão, essas qualidades se-cundárias podem ser desprezadas no conceito estrutural inicial de uma construção e na discussão teórica dos sistemas estruturais.

Isso possibilita também colocar as estruturas de arranha-céus na ca-tegoria de sistemas estruturais verticais. Uma vez que a primeira função dessas estruturas é a transferência da carga vertical e sua maior distinção é dada pelos sistemas particulares de absorção e transmissão de carga, bem como de estabilização lateral, sem relacionamento com o fato de que esses sistemas têm que empregar, necessariamente, para a reorientação das for-ças, um mecanismo que pertença à categoria de um dos quatro sistemas anteriormente enumerados.

De acordo com essa subdivisão, podem se tornar acessíveis ao arquite-to inúmeras possibilidades estruturais. Já que esta estrutura é organizada exclusivamente na base de sistemas principais que podem mudar a direção das forças, é de se esperar que o arquiteto seja bastante astuto, principal-mente nesta fase de realização estrutural, que, por sua alta signifi cância para o espaço arquitetônico, não é de muito interesse para o engenheiro estrutural, mas pertence à função primária do arquiteto. De fato, delegar essa função a outros equivalerá a desistir totalmente do projeto.

5 | Estrutura de superfície Ativa, Membranas – Construção da “Plaza de Abastos Y Pérgolas de las Flores” Próxima ao mercado Público, Secretaria de obras públicas do Governo do Chile, Santiago, Chile.

6 | Estrutura de Edifícios Altos, Edifício Costaneira Center com 101 pavimentos em construção. Santiago, Chile.

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Indústrias MemphisArquitetos: Cláudio Luiz Araújo e Cláudia Obino FrotaPorto Alegre - 1976

A ESTRUTURAE A ARQUITETURA

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Indústrias MemphisArquitetos: Cláudio Luiz Araújo e Cláudia Obino FrotaPorto Alegre - 1976

A ESTRUTURAE A ARQUITETURA

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A ESTRUTURA E A ARQUITETURA

ARQUITETO: MESTRE EM ESTRUTURAS

“Como um Arquiteto prático e como um Arquiteto educador, tenho me relacionado tanto com a teoria quanto a prática. Há muito

percebi que os métodos normais de apresentar e ensinar estruturas arquitetônicas aos jovens Arquitetos têm sido insatisfatórios, muito

complicados e geralmente confusos e mal orientados. Falham no estabelecimento de relações com a ação integral do Projeto

Arquitetônico, e não do tipo que estimula a aplicação criativa das bases estruturais por parte do jovem projetista. Com a convicção de

que a participação ativa nas construções atualmente representa fortes impulsos, especialmente no ensinamento de cada assunto específi co

do treinamento arquitetônico, considero o Arquiteto prático, progressista na concepção e com talento e interesses especiais em dado assunto o mais qualifi cado para apresentar uma matéria de

assunto especializado ao jovem Arquiteto.”(Ralph Rapson)

ESTRUTURA NA CONSTRUÇÃO: SITUAÇÃO NOVA

De todos os elementos componentes que contribuem para a existência da forma ma-terial rígida (casa, máquina, árvores ou seres animados), a estrutura é o principal. Sem estrutura, a forma material não pode ser preservada e, sem preservação da forma, o orga-nismo interno não pode funcionar. Sem estrutura material não há, portanto, organismo animado ou inanimado.

Para a Arquitetura, há, naturalmente, muitos elementos que constituem uma constru-ção, mas sua presença não é vital para a existência. Uma construção pode existir sem pin-tura e sem aquecimento; porém, não pode existir sem estrutura. Ainda que uma simples

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Indústrias MemphisArquitetos: Cláudio Luiz Araújo e Cláudia Obino FrotaPorto Alegre - 1976

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A ESTRUTURA E A ARQUITETURA

ARQUITETO: MESTRE EM ESTRUTURAS

“Como um Arquiteto prático e como um Arquiteto educador, tenho me relacionado tanto com a teoria quanto a prática. Há muito

percebi que os métodos normais de apresentar e ensinar estruturas arquitetônicas aos jovens Arquitetos têm sido insatisfatórios, muito

complicados e geralmente confusos e mal orientados. Falham no estabelecimento de relações com a ação integral do Projeto

Arquitetônico, e não do tipo que estimula a aplicação criativa das bases estruturais por parte do jovem projetista. Com a convicção de

que a participação ativa nas construções atualmente representa fortes impulsos, especialmente no ensinamento de cada assunto específi co

do treinamento arquitetônico, considero o Arquiteto prático, progressista na concepção e com talento e interesses especiais em dado assunto o mais qualifi cado para apresentar uma matéria de

assunto especializado ao jovem Arquiteto.”(Ralph Rapson)

ESTRUTURA NA CONSTRUÇÃO: SITUAÇÃO NOVA

De todos os elementos componentes que contribuem para a existência da forma ma-terial rígida (casa, máquina, árvores ou seres animados), a estrutura é o principal. Sem estrutura, a forma material não pode ser preservada e, sem preservação da forma, o orga-nismo interno não pode funcionar. Sem estrutura material não há, portanto, organismo animado ou inanimado.

Para a Arquitetura, há, naturalmente, muitos elementos que constituem uma constru-ção, mas sua presença não é vital para a existência. Uma construção pode existir sem pin-tura e sem aquecimento; porém, não pode existir sem estrutura. Ainda que uma simples

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Indústrias MemphisArquitetos: Cláudio Luiz Araújo e Cláudia Obino FrotaPorto Alegre - 1976

30 A ESTRUTURA E A ARQUITETURA

estrutura não constitua Arquitetura, esta pode tornar-se possível, tanto no que se refere ao primitivo abrigo, quanto ao moderno arranha-céu.

O signifi cado de estrutura para a construção e seu projeto sugere um novo caminho e justifi ca reconsiderar os pontos básicos subordinados aos conceitos de estrutura arquitetônica e projeto estrutural. A análise do que essencialmente é a estrutura técnica e de que papel desempenha na criação da Arquitetura dará uma base sólida para uma sugestão sobre o que o arquiteto deve saber sobre estruturas e sobre quanto ele deve conhe-cê-la.

ESTRUTURA TÉCNICA: MEIOS DE HUMANIZAÇÃO

Toda humanização é, essencialmente, uma extensão da estrutura inte-lectual. O homem, antes de sua tentativa de coordenar o meio ambiente com seu próprio ser, estuda as ações necessárias para isso e as ordena em um sistema de interdependência: ele forma uma estrutura intelectual para suas ações, isto é, planeja. Tal estrutura intelectual, quando imposta por outra, natural, torna-se estrutura técnica.

Técnica, portanto, é qualquer estrutura do meio ambiente humanizado que produz e preserva uma forma; técnica é também a estrutura que con-duz à existência do homem civilizado, distinguindo-o do selvagem.

O papel que a estrutura técnica desempenha na formação da Arquitetu-ra está intimamente associado à função da Arquitetura: criação do espaço humanizado. Somente através da estrutura o espaço pode ser medido, de modo que a vida do indivíduo, família ou sociedade possa se desenvolver; através da estrutura, o espaço pode ser controlado, de modo que o homem possa viver seguramente, mover-se e trabalhar; através da estrutura, esse espaço pode ser enriquecido, avaliado e receber qualidade estética. A es-trutura é, então, instrumental e integral para o espaço arquitetônico.

NECESSIDADE DA ESTRUTURA

A estrutura é uma necessidade da Arquitetura. Sem estrutura, não existe Arquitetura. Através do projeto estrutural, as cargas gravitacionais, as forças externas e as tensões internas são mantidas sob controle e cana-lizadas ao longo de trajetos previstos; a intenção é mantê-los num sistema

7 | Estação de hospedagem “Mirador Del Plomo Restaurant”, Parque Nevada, Chile

31ESTRUTURAS | uma abordagem arquitetônica

de ação e reação interdependente que dê o equilíbrio a cada componente individual, assim como ao sistema estrutural como um todo. Através do projeto estrutural, essas forças são impedidas de atingir uma concentração destrutiva e são mantidas sob controle. O projeto estrutural é estratégia, é o planejamento intelectual de um sistema dinâmico que luta com uma multiplicidade de forças. De fato, o projetista, quando está desenvolvendo um sistema estrutural, encontra-se no papel de um comandante de campo, que precisa enfrentar as diversas forças inimigas e maquinar um plano estratégico para controlá-las. O modo como ele luta com as forças adversárias - quão racional é o entrosamento mate-rial, quão engenhoso é o esquema e quão longe vão as consequências fi nais - distingue o planejador medíocre do genial, seja ele uma corporação militar ou do tipo técnico.

A estratégia do projeto estrutural é multiforme, como o é o caráter específi co que cada estratégia pode exprimir: a suavidade das superfícies que uniformemente distribuem as forças, de modo que sua intensidade decresce a um valor não prejudicial (cascas), a arti-culabilidade multicomponente que distribui as forças em diversas direções nas quais elas podem ser medidas (treliças), a leveza evasiva que orienta o caminho natural das forças a pontos em que elas não possam ser prejudiciais (tetos suspensos), etc. Basicamente, todas são simples dispositivos mecânicos de controle de forças, mas, na variedade, intensidade e universalidade dessas expressões, todos os requisitos devem também ser encarados como arte. Finalmente, estas forças serão absorvidas e dirigidas ao solo, onde não há confl ito de direções (necessidade de espaços para movimentação do homem), uma vez que aí não há espaço para movimento.

CONHECIMENTO ESTRUTURAL

Delineação da forma estrutural básica, dimensionamento global de seus componentes, introdução de rigidez lateral, comprovação dos possíveis efeitos de variações térmicas, assentamentos de fundações, condições de carga e envelhecimento e, fi nalmente, escolha do material da estrutura e do método construtivo: nenhuma dessas fases diferenciadas de desenvolver um sistema estrutural requer o uso de fórmulas matemáticas. Isso quer dizer que nenhuma fase na formação de uma ideia estrutural é dependente do uso da matemática. Somente depois que todas as fases tiverem sido examinadas separadamente e o sistema estrutural assim concebido em seus elementos essenciais, pode-se e deve-se aplicar fórmulas matemáticas para testar o sistema, dimensionando cuidadosamente seus componentes e garantindo, desse modo, a segurança e a economia.

É certo que alguns rudimentos de conceitos estruturais, como resistência, braço de alavanca, centro de gravidade, momento de inércia ou equilíbrio podem ser melhor com-

32 A ESTRUTURA E A ARQUITETURA

preendidos ao se usar uma simples álgebra. Mas é contestável que o conhecimento da análise estrutural matemática seja exigido para que se possa compreender o funciona-mento das estruturas, ou que este conhecimento estimule a aplicação criativa de concei-tos estruturais.

Para entender o mecanismo de um sistema estrutural, não é necessário confi ar em escalas absolutas. O mesmo se aplica à construção material. O funcionamento básico (embora não a grandeza dos esforços e a ordem dos vãos econômicos) de um sistema es-trutural é independente de suas dimensões e do material que o constitui. Os mecanismos numa casca cilíndrica de concreto de 7,50m de vão são essencialmente os mesmos que em uma casca de plástico com 15,00m de vão. Qualquer vinculação entre vão e material necessita de dados defi nidos de projeto. Isso pode tornar individual ao invés de universal o modelo ou desenho e não vai acrescentar nada à compreensão básica.

As estruturas são exemplos e, por conseguinte, acessórios de projeto. Os sistemas estruturais são ordenações e, portanto, princípios de projeto.

EVOLUÇÃO HISTÓRICA

Antigamente, o vocabulário do projeto estrutural era limitado a relativamente poucos sistemas, padrões e técnicas artesanais; ambos limitavam as possibilidades da forma e do vão e exerciam um controle saudável. Atualmente, a ciência da Engenharia e as técni-cas construtivas já removeram as barreiras naturais da impossibilidade estrutural. Qua-se toda forma pode ser executada, e qualquer contradição estrutural pode ser feita para existir, apoiar e durar.

Antigamente, o conhecimento da forma estrutural correta era empírico e vago. Além disso, a técnica artesanal sempre convidava à modifi cação pessoal da forma convencional. Atualmente, a teoria matemática e as técnicas construtivas determinam precisamente a forma e a expressão estruturais e permitem a variação individual apenas às custas da economia. As formas estruturais tornaram-se padrões absolutos e incontestáveis da Ar-quitetura.

Antigamente, a falta de variedade de sistemas estruturais conhecidos ia além da livre execução das ideias do Arquiteto. Era inevitável um lapso entre a estrutura possível e a forma, e era escassa a economia. Atualmente, inúmeras formas estruturais bem ensaia-das permitem que qualquer espaço arquitetônico seja precisamente sincronizado com uma forma estrutural positiva que realce a ideia arquitetônica. A forma estrutural e o envolvimento espacial têm apenas pequena tolerância e podem mesmo alcançar a indivi-dualidade.

33ESTRUTURAS | uma abordagem arquitetônica

Antigamente, o sistema estrutural de um edifício desempenhava apenas um papel me-nor ou indireto na experiência estática da Arquitetura. Estruturas simples eram raramen-te empregadas como forma estética, ou mesmo experimentadas como tal. Atualmente, o homem deriva cada vez mais a sensação estética da pura compreensão intelectual de um sistema lógico e, consequentemente, experimenta a lógica da forma estrutural como fonte de sensação estética.

Antigamente, havia poucas grandes construções e, em razão de sua importância so-cial, o projeto estava rigorosamente ligado às considerações de ordem econômica, e a escolha de seu esquema estrutural não era limitada. Atualmente, a grande civilização necessita de uma proporção cada vez maior de edifícios com muitas unidades e em grande escala, havendo de sujeitar sua construção a um pressuposto afi nado e, necessitando de uma enorme resistência estrutural, o conceito estrutural é de proeminente importância para o espaço e em função do edifício e, consequentemente, um assunto de projeto arqui-tetônico primário.

“A estrutura é, e tem sido sempre, um componente essencial da Arquitetura. Ao construir residências, igrejas, edifícios comerciais e

públicos, o homem tem necessidade de dar forma a certos materiais e usá-los em determinadas quantidades, a fi m de que sua Arquitetura

se mantenha de pé, resistindo à atração da terra e a outras cargas perigosas. É imprescindível resistir ao vento, descargas atmosféricas,

terremotos e incêndios, e é possível resisti-los com um razoável custo de mão-de-obra e materiais, tendo em conta a disponibilidade

de ambos. E, como desde os primeiros tempos de sua existência o homem teve um sentido inato de beleza, toda a construção se

concebeu conforme certos postulados estéticos que, muitas vezes, impuseram à estrutura exigências muito mais estritas que as de

resistência e economia. Poder-se-ia então pensar que sempre se tem dado importância à estrutura e que, em certo sentido, ela tem ditado o tipo de Arquitetura. Não é assim, em regra geral. Na Antiguidade,

criaram-se edifícios magnífi cos com uma notável despreocupação com a estrutura correta. Muitas formas estruturais em mármore, sob o ponto de vista estrutural, deveriam ter sido construídas em

madeira. Na realidade, a madeira é um material resistente a esforços de tração, e é correto construir com ela elementos horizontais, que

necessitam resistência tanto à tração quanto à compressão. A pedra resiste somente a esforços de compressão, e é possível construir

34 A ESTRUTURA E A ARQUITETURA

elementos horizontais com ela somente diminuindo o seu vão e apoiando-a em elementos verticais (pilares ou colunas). Logo,

concluímos que os elementos horizontais de pedra são inadequados. Por outro lado, as catedrais góticas podiam vencer grandes vãos usando o arco, elemento estrutural curvo no qual não se geram

esforços de tração. Assim, a pedra é o material correto para a estrutura tipo arco (abóbada). Alguns historiadores da Arquitetura

(e também alguns engenheiros especializados em estruturas) têm argumentado que a grande preocupação da resistência estrutural conduzirá inevitavelmente à beleza. É inegável que uma estrutura

correta satisfaz o olho do espectador e, ao contrário, uma estrutura incorreta ofende o ponto de vista estético. No entanto, é difícil

demonstrar que a estética depende da estrutura. Por outro lado, é fácil demonstrar que algumas estruturas incorretas são encantadoras,

enquanto algumas estruturas corretas não satisfazem esteticamente. Será mais prudente dizer que a correção de uma estrutura é, na maioria das vezes, uma condição necessária da beleza. Podemos

concluir que o conhecimento das estruturas por parte dos arquitetos é ao menos altamente desejável e que uma estrutura correta só pode

contribuir para a beleza da Arquitetura.”(Mario Salvadori)

“Nos últimos anos, surgiu uma importante evolução no projeto estrutural das edifi cações. Além do desenvolvimento de novos

materiais, a aplicação de modernas técnicas de construção, o emprego dos computadores e a concepção de princípios avançados de projeto,

o maior estímulo para uma nova era no projeto estrutural é o interesse e a vontade dos arquitetos em exprimir a forma lógica e a

beleza de uma estrutura bem proporcionada.” (Hannskarl Bandel)

35ESTRUTURAS | uma abordagem arquitetônica

A ARQUITETURA E A ESTRUTURA - O ARQUITETOE O ENGENHEIRO

Nos últimos anos, a especialização chegou ao campo da Arquitetura e diferentes pessoas exercem diversas funções outrora reunidas em uma única. Duas são essenciais para a construção de uma obra importante: o arquiteto e o engenheiro civil. Atualmente, nenhum arquiteto se atreveria a projetar um edifício, ainda que de tamanho modesto, sem consultar um Engenheiro especialista em estruturas. As raízes dessa relação de depen-dência surgiram da crescente importância dos fatores econômicos, da ten-dência de nossa cultura e, sobretudo, da necessidade de grandes estruturas que tem nossa civilização de massas.

Esse tema provoca um sério desafi o ao arquiteto, porque o público adquire consciência da importância da Arquitetura em sua própria vida através do número crescente de grandes obras, tais como estádios, igrejas, teatros, etc. Nesse saudável clima de interesse público, os especialistas se reúnem para resolver problemas novos, difíceis, que chegam ao povo em geral.

“Embora existam diferenças de formação, são duas profi ssões que se completam. Enquanto o arquiteto é essencialmente criativo, o engenheiro é tecnicamente

inventivo. Portanto, para que algo seja criado é indispensável que seja inventado um processo racional

e científi co para transformá-lo em realidade. O ideal, na verdade está plenamente comprovado, é o perfeito

entrelaçamento entre as duas profi ssões. O trabalho realizado harmonicamente, formado por equipe

dessas atividades liberais, trará sempre os melhores resultados conforme demonstram as grandes obras da arquitetura e da engenharia. Grande e profundo

deve ser o conhecimento humanístico dos arquitetos e engenheiros para poderem, irmanados num mesmo

ideal, projetar e construir em perfeita harmonia de técnica e beleza, sem alterar o ambiente natural.

Entretanto, sendo o homem sociável por excelência não é possível considerar o indivíduo apenas em

8 | Fotografi a dos prédios da Rua Rosário Norte, obtida do Parque Arauto – o prédio da esquerda (1º plano) é do Banco do Chile, Santiago.

36 A ESTRUTURA E A ARQUITETURA

função de si mesmo, mas em relação à sua vivência comunitária, onde sonha, projeta e vive em íntima correlação com a natureza e com seus

semelhantes. Não unicamente na edifi cação, mas também em todas as obras de construção civil, enfi m, em todo e qualquer lugar onde o

homem em coletividade, labuta, viaja, diverte-se ou repousa, a função social dos arquitetos e engenheiros é notória, valiosa, imprescindível.”

Conhecer a origem estrutural da Arquitetura é básico para a profi ssão de arquiteto. Contudo, enquanto o construtor primitivo podia facilmente resolver os poucos proble-mas estruturais de sua construção com um conhecimento baseado na experiência e na tradição, o arquiteto em desenvolvimento, para resolver os problemas estruturais de sua construção, defronta-se com um campo tão extenso que um simples engenheiro não teria a pretensão de ser hábil em todos os seus diversos assuntos.

O mais difícil para o arquiteto será atingir o nível de conhecimentos no campo da Engenharia Estrutural de modo a qualifi cá-los, a formular ideias estruturais e propor sis-temas estruturais. Há muitas construções projetadas por engenheiros que se qualifi cam como exemplos marcantes de boa Arquitetura. Mas a excelência dessas construções não se dá em virtude de seu sistema estrutural, e sim porque tiveram êxito ao gerar espaço arquitetônico. Esses engenheiros não se distinguem por suas qualidades de engenheiros, mas por sua visão arquitetônica, que os torna aptos a trazer suas ideias estruturais na correta dependência do objetivo arquitetônico.

Todo arquiteto ou estudante de Arquitetura está convencido da importância do co-nhecimento estrutural, mas sua aquisição é mais difícil do que esperava. O rápido desen-volvimento de técnicas construtivas baseadas no uso de materiais como alumínio, con-creto armado e protendido, assim como as difi culdades matemáticas inerentes ao projeto de novas formas estruturais, torna quase impossível a uma pessoa de formação artística conhecer todos os métodos de projeto e construção. O arquiteto deve estar familiarizado com a estética, Engenharia, Sociologia, Economia e planejamento. Seu conhecimento de Matemática, Física e Química é limitado. Um diálogo entre eles resulta praticamente im-possível, pois carece de um vocabulário comum a ambos. Como esse diálogo é necessário, deve-se saber quem será o líder da equipe construtiva, e essa tarefa cabe ao arquiteto, sendo o calculista somente um prestador de serviços.

Surge, então, uma questão: será possível o Arquiteto (ou qualquer pessoa inteligente) compreender os problemas estruturais que apresenta um problema técnico sem o co-nhecimento profundo das ciências físicas e matemáticas? A resposta a esta pergunta é afi rmativa, se se estabelecer uma clara distinção entre a compreensão dos conhecimentos estruturais básicos e o conhecimento cabal da análise de estruturas.

37ESTRUTURAS | uma abordagem arquitetônica

ESTRUTURAS E INTUIÇÃO

“Ao criar o homem, Deus, o Supremo Construtor, projetou o mundo, e a par da beleza das fl ores,

deu-lhe o calor do sol, e a visão do luar e de uma noite estrelada, proporcionou-lhe a tranquilizadora

segurança do solo fi rme... Dosou os elementos de acordo com as necessidades e recursos do ser criado e, o homem, desde os tempos mais remotos, usou a

intuição e a inteligência para extrair do seu ‘habitat’, a satisfação de seus instintos e aspirações. A construção

deverá reunir sempre num mesmo amplexo criador, o corpo e a alma; o ideal e a prática; a beleza e a

segurança; pois o homem, por sua própria condição de indivíduo racional, não se satisfaz somente com o prazer físico que lhe proporciona uma edifi cação confortável. A estética que cada um de nós possui

como qualidade inerente, exige uma composição tão artística e harmoniosa, quanto sólida e durável. Pode-

se mesmo afi rmar que o encontro da arquitetura e engenharia é a ponte que liga o soma ao psíquico e a

ligação deverá ser tão íntima que se refl ita no indivíduo em seu todo, proporcionando-lhe o bem-estar geral.

(Nelson L.M.Bruck) Para inventar uma estrutura e dar-lhe proporções exatas, deve-se seguir

tanto o caminho intuitivo como o matemático. As grandes obras do passa-do, construídas em uma época em que não existiam as teorias científi cas, atestam a efi cácia e o poderio da intuição. Em nossa época, desenvolvem-se sem cessar teorias modernas, e seu acerto tem-se verifi cado na construção de estruturas maiores e mais ousadas. Se a invenção estrutural há de per-mitir a solução efi ciente de novos problemas que aparecem diariamente, devido ao crescimento de atividades da construção, deve chegar a ser uma combinação harmônica de nossa intuição pessoal com uma ciência estru-tural impessoal, objetiva, realista e rigorosa.

Em outras palavras, a teoria deve encontrar na intuição uma força ca-paz de dar vida às fórmulas, de torná-las mais humanas e compreensíveis e

9 | vv Gabriela Mistral, Localizado na Av. Libertador Bernardo O’higgins, Santiago do Chile.

38 A ESTRUTURA E A ARQUITETURA

de minorar sua impessoal fragilidade técnica. Por outro lado, as fórmulas devem nos dar os resultados exatos necessários para obter o termo médio, pois esse é o objetivo fi nal de todas as atividades humanas. É particularmente útil estudar e refl etir sobre o problema estrutural, pois, mesmo quando se pode confi ar o cálculo de uma estrutura a um especia-lista, primeiro deve-se ser capaz de inventá-la e dar-lhe proporções corretas. Só então terá nascido uma estrutura sã, vital e, se possível, esbelta.

A análise de uma estrutura completa, com o alto grau de perfeição exigido pela tec-nologia moderna, só é acessível a um subgrupo de profi ssionais: o dos especialistas em estruturas. Muitas vezes, eles se especializam de acordo com o material utilizado, ou seja, concreto armado, protendido, aço, alumínio, madeira, pneumático, etc. Recorre-se a esses especialistas em busca de assessoramento sobre um determinado tipo de estrutura.

Na vida cotidiana, todos estamos, em certo grau, familiarizados com estruturas. Sa-bemos em que ângulo devemos colocar uma escada de mão para que suporte nosso peso; sabemos que um pedaço de madeira colocado sobre uma vala se romperá quando cami-nharmos sobre ele; sabemos se a corda é sufi cientemente forte para içar um balde de água do fundo de um poço, assim como se o vento fará voar a nossa barraca. Absorvendo tais experiências e sistematizando esse conhecimento, poderemos compreender o comporta-mento de uma estrutura, imprescindível ao arquiteto. Uma vez captados os fundamentos, ele deve chegar a dominar os pontos úteis da teoria das estruturas. Isso lhe permitirá aplicar com inteligência uma grande quantidade de novas ideias e métodos.

Essa liberdade de idéias e métodos, entretanto, apresenta o perigo evidente da anar-quia (limitações). Embora hoje seja possível construir praticamente qualquer estrutura, existem limitações provocadas por difi culdades técnicas e econômicas.

O nosso livro tem a intenção de introduzir o estudante no campo das estruturas, sem recorrer ao conhecimento formal de Matemática e Física. Isso não quer dizer que trata-remos as estruturas de maneira elementar, incompleta ou simplifi cada. Os conceitos es-truturais apresentados deverão ser captados e reconhecidos em situações arquitetônicas, sobre uma base puramente intuitiva. O maior conhecimento do comportamento das es-truturas conduzirá o estudante interessado a uma melhor compreensão dos pontos mais delicados do projeto estrutural.

03

Clube do Professor GaúchoArquitetos: Moacyr Moojen Marques e João José VallandroPorto Alegre - 1966

CONCEITUAÇÃODAS ESTRUTURAS

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Clube do Professor GaúchoArquitetos: Moacyr Moojen Marques e João José VallandroPorto Alegre - 1966

CONCEITUAÇÃODAS ESTRUTURAS

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CONCEITUAÇÃO DAS ESTRUTURAS

EQUAÇÕES DE EQUILÍBRIO DA MECÂNICA RACIONAL

Consideremos um corpo submetido à ação de um sistema formado por “n” forças, conforme mostrado na Fig. 1.

A resultante do sistema é uma força “R” e a sua ação é sentida em um ponto O do corpo. Em um ponto O1 que não seja pertencente ao suporte da resultante, o sistema das “n” forças aplicadas torna-se equivalente a uma força equipolente da resultante, aplicada no ponto, e um momento “M”, atuante no plano defi nido pelo suporte da resultante e pelo ponto conside-rado. Tanto a resultante “R”, deslocada para o ponto O1, como o momento “M” relativamente a esse, podem ser decompostos segundo o estado tridi-mensional, sendo X, Y e Z as componentes de “R” e Mx, My e Mz os mo-mentos componentes de “M”. Podemos considerar, também, que X é igual ao somatório das componentes, segundo a direção Ox, de todas as forças “F”, integrantes do sistema inicial. Procedendo analogamente para Y e Z e, ainda, para os momentos Mx, My e Mz, podemos escrever as seguintes expressões:

X = Σxi = x1 + x2 + x3 + ... + xn

Y = Σyi = y1 + y2+ y3 + ... + yn

Z = Σzi = z1 + z2 + z3 + ... + zn

n

i = 1

n

i = 1

n

i = 1

Mx = Σmxi = mx1 + mx2 + mx3 + ... + mxn

My = Σmyi = my1 + my2 + my3 + ... + myn

Mz = Σmzi = mz1 + mz2 + mz3 + ... + mzn

n

i = 1

n

i = 1

n

i = 1

A condição de equilíbrio do corpo é satisfeita quando, para qualquer ponto dele, são nulos tanto a resultante do sistema de forças aplicadas, como o momento resultante relativamente ao ponto. Assim, torna-se ne-cessário que sejam satisfeitas as equações:

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Clube do Professor GaúchoArquitetos: Moacyr Moojen Marques e João José VallandroPorto Alegre - 1966

M

R

R

F1

F2

F3

F4 Fn

O O1 O O1

Fig. 1 | Corpo submetido à ação de um sistema de “n” forças

41

CONCEITUAÇÃO DAS ESTRUTURAS

EQUAÇÕES DE EQUILÍBRIO DA MECÂNICA RACIONAL

Consideremos um corpo submetido à ação de um sistema formado por “n” forças, conforme mostrado na Fig. 1.

A resultante do sistema é uma força “R” e a sua ação é sentida em um ponto O do corpo. Em um ponto O1 que não seja pertencente ao suporte da resultante, o sistema das “n” forças aplicadas torna-se equivalente a uma força equipolente da resultante, aplicada no ponto, e um momento “M”, atuante no plano defi nido pelo suporte da resultante e pelo ponto conside-rado. Tanto a resultante “R”, deslocada para o ponto O1, como o momento “M” relativamente a esse, podem ser decompostos segundo o estado tridi-mensional, sendo X, Y e Z as componentes de “R” e Mx, My e Mz os mo-mentos componentes de “M”. Podemos considerar, também, que X é igual ao somatório das componentes, segundo a direção Ox, de todas as forças “F”, integrantes do sistema inicial. Procedendo analogamente para Y e Z e, ainda, para os momentos Mx, My e Mz, podemos escrever as seguintes expressões:

X = Σxi = x1 + x2 + x3 + ... + xn

Y = Σyi = y1 + y2+ y3 + ... + yn

Z = Σzi = z1 + z2 + z3 + ... + zn

n

i = 1

n

i = 1

n

i = 1

Mx = Σmxi = mx1 + mx2 + mx3 + ... + mxn

My = Σmyi = my1 + my2 + my3 + ... + myn

Mz = Σmzi = mz1 + mz2 + mz3 + ... + mzn

n

i = 1

n

i = 1

n

i = 1

A condição de equilíbrio do corpo é satisfeita quando, para qualquer ponto dele, são nulos tanto a resultante do sistema de forças aplicadas, como o momento resultante relativamente ao ponto. Assim, torna-se ne-cessário que sejam satisfeitas as equações:

03

Clube do Professor GaúchoArquitetos: Moacyr Moojen Marques e João José VallandroPorto Alegre - 1966

M

R

R

F1

F2

F3

F4 Fn

O O1 O O1

Fig. 1 | Corpo submetido à ação de um sistema de “n” forças

42 CONCEITUAÇÃO DAS ESTRUTURAS

Σxi = 0

Σyi = 0

Σzi = 0

R = 0 N = 0n

i = 1

n

i = 1

n

i = 1

n

i = 1

n

i = 1

n

i = 1

Σmxi = 0

Σmyi = 0

Σmzi = 0

I

2

3

4

5

6

Então, no caso tridimensional (caso mais geral), as equações de equi-líbrio da mecânica racional podem ser representadas por duas equações vetoriais ou por seis equações algébricas. O primeiro grupo exprime que a resultante geral do sistema é nula e, consequentemente, que a soma das projeções de todas as forças, sobre três eixos quaisquer, é nula (equações 1, 2 e 3). O segundo grupo exprime que o momento do sistema é nulo e, portanto, nulas são as somas dos momentos de todas as forças em relação a três eixos coordenados (equações 4, 5 e 6).

Se todas as forças do sistema se situam num único plano (por exemplo, o plano xy), as equações 3, 4 e 5 perdem a razão de ser, pois cada força individualmente terá projeção nula sobre o eixo z e momentos nulos em relação aos eixos x e y, coplanares com a força. Os momentos em relação ao eixo z (únicos que subsistem) se confundem, portanto, com os momentos em relação à origem das coordenadas, que é um ponto arbitrário no plano das forças. Assim, as seis equações (três de forças e três de momentos) que constituem as equações de equilíbrio da mecânica racional reduzem-se a três: duas de projeção e uma de momento em relação a um ponto O1 qual-quer do plano, isto é:

Σxi = 0

Σyi = 0

R = 0 N = 0n

i = 1

n

i = 1

n

i = 1Σmzi = 0I

2

3

Sempre que for possível, os problemas relacionados ou que envolvem o cálculo estrutural deverão ser convertidos para o estado plano, também denominado duplo, facilitando sobremaneira a agilização do processo de solução. Mais ainda: se todas as forças, além de se situarem num único plano, convergirem num único ponto - que é o caso dos sistemas reticu-

A

y

x

F

VB

MB

HA

VA

MA

B HB

Fig. 2 | Vínculos

VA

VA = 0

Fig. 3 | Vínculo de primeira ordem

A

VA

HA = 0

HA

VA = 0

Fig. 4 | Vínculo de segunda ordem

43ESTRUTURAS | uma abordagem arquitetônica

lados (treliças de um modo geral, que podem ser planas ou espaciais) - as equações se reduzem a duas, pois, neste caso, o centro de redução O1 (ori-gem das coordenadas) pode ser tomado no próprio ponto de convergência, perdendo a equação 3 sua razão de ser, uma vez que cada força, individual-mente, terá momento nulo em relação ao ponto, ou seja, O1:

Σxi = 0

Σyi = 0

R = 0n

i = 1

n

i = 1

I

2

Isso signifi ca que, se isolarmos cada nó de um sistema reticulado plano, de modo a transparecerem os esforços nas suas barras, teremos um siste-ma de forças concorrentes num ponto único. Cada nó está, portanto, em equilíbrio sob a ação de um sistema de forças complanares e concorrentes.

ESTRUTURA E CLASSIFICAÇÃO DOSELEMENTOS ESTRUTURAIS

Peças ou elementos estruturais são todos os sólidos dotados de proprie-dades elásticas, capazes de receber e transmitir cargas. A associação de elementos estruturais convenientemente ligados constitui uma estrutura. Os elementos estruturais podem ser classifi cados em lineares, de super-fície e de volume.

a • Elementos Lineares: São gerados por uma superfície plana na qual o baricentro percorre uma curva plana, ou reversa, cujo comprimento é consideravelmente maior que as dimensões da superfície. São exemplos a viga, o arco, a mola, o pilar, as árvores de transmissão (eixos), a escora, o tirante, o cabo, o pórtico, etc.

b • Elementos de Superfície: Caracterizam-se por duas dimensões consideravelmente maiores que a terceira (espessura). São exemplos a viga-parede, a placa, a casca, a membrana, etc.

c • Elementos de Volume: Nestes, as três dimensões são consideráveis e, em geral, as cargas são predominantemente compressivas. São exemplos os blocos de fundação, as sapatas, os blocos de coroamento (sobre estacas de fundação), etc.

A

VA

HA = 0

HA

VA = 0

MA = 0

F

Fig. 5 | Vínculo de terceira ordem

Hipostáticainternamentepela falta de

barra hachurada

A

VA

HA

A B

VA VB

PP

P

A B

VA VB

Fig. 6 | Estruturas hipostáticas

44 CONCEITUAÇÃO DAS ESTRUTURAS

APOIOS ESTRUTURAIS E CLASSES DE APOIO (VÍNCULOS)

Uma estrutura constituída de peças componentes (colunas, vigas, lajes, etc.) é interligada por elementos de apoio, também denominados vínculos. Através deles, as cargas são transmitidas aos demais órgãos participan-tes da estrutura, podendo os apoios reagirem diferentemente às ações das forças e dos momentos aplicados. O vínculo ou apoio fi ca, então, caracte-rizado por reações as quais impedem ou restringem o deslocamento da seção de apoio da peça ou sua rotação, isto é, impedem ou restringem os deslocamentos lineares ou angulares.

Para melhor entendimento das defi nições da classifi cação das classes de apoio, consideremos a estrutura formada por uma viga apoiada nas ex-tremidades (Fig. 2). A carga oblíqua F atuante na viga AB induz, nas seções de extremidade, forças e momentos que podem ou não ser transferidos aos apoios de sustentação da viga.

Vínculo de Primeira Ordem

É assim denominado porque oferece reação às forças aplicadas numa única direção, comumente a direção y. Signifi ca que não impede desloca-mentos lineares na direção x, nem angulares (ou rotações) decorrentes da aplicação de momentos no plano xy. É conhecido como apoio simples ou, ainda, charlot. Sua representação simbólica é dada na Fig.3.

Vínculo de Segunda Ordem

Oferece reações às forças N e Q, respectivamente, nas direções x e y; todavia, não reage aos momentos atuantes no plano xy. Impede desloca-mentos lineares; porém, não impede rotações. É comumente denominado de rótula. Sua representação simbólica é dada na Fig.4.

Vínculo de Terceira Ordem

Apresenta reações tanto às forças como aos momentos atuantes no pla-no xy. Consequentemente, impede deslocamentos lineares e rotações. Tem o nome de engaste, podendo, em tal caso, ser concebido por uma conexão

A

VA

HA

VB

F

Fig. 7 | Viga simplesmente apoiada

VA

HA

F

Fig. 8 | Viga em balanço ou Cantilever

45ESTRUTURAS | uma abordagem arquitetônica

rígida, sendo denominado de vínculo perfeito. Restringe todos os movi-mentos do apoio. Sua representação simbólica é dada na Fig.5.

GRAU DE ESTATICIDADE DAS ESTRUTURAS

Como vimos, no estado duplo ou plano, a mecânica racional institui duas equações de equilíbrio para forças e somente uma para os momentos. Quando os apoios envolvidos nas estruturas possuem reações em número inferior, igual ou superior ao número de equações, diz-se que as estruturas são hipostáticas, isostáticas ou hiperestáticas, respectivamente. Veja-mos as respectivas defi nições e exemplos sobre cada caso.

Estruturas Hipostáticas

São aquelas em que o número de reações vinculares é inferior ao nú-mero de equações de equilíbrio, caracterizando o excesso de equações em relação ao número de reações (o número de vínculos é incapaz de manter o equilíbrio). Diz-se, então, que o sistema apresenta “n” soluções e, portanto, não serve como proposta de solução estrutural. Sistemas estruturais dessa espécie não devem ser utilizados como proposta estrutural nos projetos de Engenharia Estrutural. Quatro exemplos justifi cam essa categoria na Fig. 6.

Estruturas Isostáticas

São aquelas em que os apoios envolvidos possuem reações em número igual ao número de equações. Nesse caso, diz-se que as estruturas são isos-táticas ou determinadas, posto que, sendo as reações incógnitas a serem levantadas, é possível a formação de um sistema perfeitamente determi-nado, caracterizado por equações de forças e de momentos. Os elementos estruturais representados nas Fig. 7, 8 e 9 são casos típicos de estruturas isostáticas.

P

P

P

P

1 3

2

V1 V3

H3

Fig. 9 | Pórtico

A

VA

HA

MA

F

HB

B

VB

Fig. 10 | Estrutura com dois graus de hiperestabilidade

46 CONCEITUAÇÃO DAS ESTRUTURAS

Estruturas Hiperestáticas

Quando o número de reações é superior ao número de equações de equilíbrio, tais estruturas são chamadas de hiperestáticas. O excesso das reações em relação às equações caracteriza o grau de hiperestaticidade. O levantamento da hiperestaticidade é possível mediante a utilização de re-lações especiais, condicionadas a deslocamentos ou deformações elásticas dos elementos estruturais, por princípios instituídos pela Resistência dos Materiais. As Fig. 10 e 11 são exemplos de estruturas hiperestáticas.

Por exemplo (Fig. 12), se o problema contém cinco incógnitas e a está-tica fornece três equações, são necessárias duas equações complementares para suplementá-las (que podem ser duas equações de deslocamentos, uma de deslocamento e outra de deformação, ou as duas serem de deformações).

ESTATICIDADE INTERIOR DOS RETICULADOS PLANOS (TRELIÇAS)

O que foi abordado anteriormente está associado tão-somente à estati-cidade externa. O que vimos foi se a estrutura era externamente hipostá-tica, ou externamente isostática, ou externamente hiperestática. Nos reti-culados planos, a análise da estaticidade interna recairá sobre as treliças, de grande interesse nas aplicações da Engenharia Estrutural. Não será feita a apreciação das treliças no espaço tridimensional, pois o desenvolvimen-to prático do cálculo estrutural para as treliças desse tipo merece uma orientação teórica profunda e a utilização de processos computacionais apropriados, o que não é o objetivo, neste momento.

Há, evidentemente, um problema preliminar de estática exterior que deve ser resolvido inicialmente, isto é, deve ser o ponto de partida, e este é um problema elementar que não pode oferecer a menor difi culdade, pois toda a abordagem anterior foi sobre aquele assunto. Assim, as fi guras apre-sentadas sequer fazem menção aos tipos de vínculos (apoios) externos das treliças apresentadas.

Chamemos de “n” o número de nós de um reticulado, e de “b” o nú-mero de barras. O reticulado apresenta-se, portanto, interiormente, com “b” incógnitas, que são os esforços nas barras. Em cada nó, como vimos em item anterior, temos duas equações disponíveis. Nos “n” nós teremos,

A

VA

HA

MA MB

F

HB

B

VB

Fig. 11 | Estrutura com três graus de hiperestabilidade

HA

F

B

VB

A

VA

C

VC

D

VD

Fig. 12 | Viga contínua com dois hiperestáticos

b = 17 (números de barras)

2n - 3 = (2x10) - 3 = 17

n = 10 (números de nós)

1

2

4

3

6

5

8

7

10

9II VI XI XIV

IV IX XII XVII

III VII XVVIIIV X XIII XVII

Fig. 13 | Determinação da estaticidade interna de um sistema reticulado

47ESTRUTURAS | uma abordagem arquitetônica

então, 2n equações disponíveis. Como três delas devem ser usadas para a determinação das reações de apoio, restam-nos 2n-3 equações suscetíveis de serem utilizadas exclusivamente na determinação dos esforços nas bar-ras. Logo, a condução de estaticidade interior (isto é, a condição capaz de nos informar se um reticulado, com as reações de apoio já calculadas, pode ser resolvido unicamente com as equações da estática) é:

b = 2n - 3Se essa relação for observada, teremos um sistema de 2n - 3 equações, a “b = 2n - 3” incógnitas, que é, em geral, passível de solução unívoca,

qualquer que seja o carregamento plano exterior. O reticulado é, então, interiormente isostático. Se b > 2n - 3, teremos mais incógnitas do que

equações, e não pode ser resolvido exclusivamente com os recursos da es-tática. O reticulado é, então, interiormente hiperestático. Mede-se o grau

de hiperestaticidade justamente pela diferença entre os dois membros:

g = b - (2n - 3) = b - 2n + 3

Se, fi nalmente, b < 2n - 3, o equilíbrio só é possível mediante certas condições, e, neste caso, o reticulado é interiormente hipostático.

CRÍTICA AO MÉTODO PARA A DETERMINAÇÃO DA ESTATICIDADE INTERIOR

Não se pode aplicar a expressão estabelecida no item anterior com rigor absoluto. Diz-se que as expressões b = 2n - 3, b > 2n - 3 e b < 2n - 3, sob o ponto de vista matemático, são necessárias, mas não sufi cientes. De fato, a discussão dos sistemas de equações lineares nos ensina que um sistema de “n” equações a “n” incógnitas nem sempre tem solução. O sistema só é bem determinado quando seu determinante é diferente de zero. A discussão que fi zemos estabeleceu apenas a condição básica para que o número de equações (2n - 3) seja igual ao número de incógnitas (b). Pode acontecer, evidentemente, que a condição básica se verifi que sem que o reticulado seja isostático internamente. Observemos, por exemplo, o caso represen-tado pela Fig. 13.

Sistemahiperestático

Sistemadeformável

Sistemaisostático

Fig. 14 | Estaticidade de um sistema

D

C

B

A1

2

4

3 5II

N

IIII

Fig. 15 | Justaposição de triângulos

Barra Supérflua

Fig. 16 | Reticulado composto por triângulos

48 CONCEITUAÇÃO DAS ESTRUTURAS

Se 2n - 3 = b; logo, estaríamos dizendo que o reticulado é isostático internamente, o que não é verdade. Um exame detido da questão nos mostra que ele é a combinação de um reticulado hiperestático com um isostático (Fig. 14).

Em certos casos, como no exemplifi cado, é fácil reconhecer a priori que o sistema é apenas aparentemente isostático. Em algumas treliças complexas, entretanto, só o estudo circunstanciado do problema permite uma conclusão defi nitiva, que também não é o ob-jeto neste momento. No item seguinte, melhora-se o aspecto comprobatório da verifi ca-ção da estaticidade interna dos reticulados planos; porém ainda não em defi nitivo, já que ainda há as excepcionalidades (Adhemar Fonseca, 1967).

DETERMINAÇÃO DE ESTATICIDADE INTERIOR PELO SISTEMA DE TRIÂNGULOS

Se, partindo de um triângulo (que é a fi gura mais simples), construirmos um reticu-lado, de tal modo que cada novo ponto seja exclusivamente agregado ao conjunto por intermédio de duas barras somente, o sistema obtido será estaticamente determinado in-teriormente, de vez que as novas incógnitas introduzidas (esforços nas barras) encontram sempre, para sua determinação, as duas equações de equilíbrio referentes ao novo ponto agregado.

A sequência de tal formação leva, em geral, a uma justaposição de triângulos (Fig. 15), sendo fácil estabelecer uma relação entre o número de vértices e de lados.

Se, partindo da barra AB, quisermos agregar o nó C, devemos introduzir as barras 2 e 3. Formamos, assim, o triângulo I. Se agora quisermos agregar ao conjunto o nó D, devemos utilizar as barras 4 e 5, fi cando formado o triângulo II, e assim sucessivamente. Durante esta formação, observamos:

triângulos

IIIIIIIV...N

vértices

33+13+23+3

...3+(N-1)

lados

33+2x13+2x23+2x3

...3+2(N-1)

Número de

49ESTRUTURAS | uma abordagem arquitetônica

Chamando, então, de “n” o número de nós (ou vértices), e de “b” o número de barras (ou lados), teremos: n = 3 + (N - 1) e b = 3 + 2(N-1), onde N - 1 = n - 3 e b = 3 + 2(n - 3) = 2n - 3; logo, b = 2n - 3, que é a relação estabelecida anteriormente.

Portanto, toda vez que a relação acima se verifi car e o reticulado for composto exclusi-vamente de triângulos suscetíveis de serem justapostos, de acordo com a lei de formação citada (Fig. 15), estaremos diante de um sistema interiormente isostático (há sistemas de triângulos hiperestáticos, como o da Fig. 16, em que as duas barras diagonais estão justapostas, não criando um nó no centro do reticulado, não seguindo, portanto, a lei de formação exposta).

04

Ponte da Avenida João PessoaArquiteto: Christiano de la Paix GelbertPorto Alegre - 1938

CARGAS QUE ATUAM NAS

ESTRUTURAS

04

Ponte da Avenida João PessoaArquiteto: Christiano de la Paix GelbertPorto Alegre - 1938

CARGAS QUE ATUAM NAS

ESTRUTURAS

53

CARGAS QUE ATUAM NAS ESTRUTURAS

FINALIDADE DAS ESTRUTURAS

As estruturas se constroem sempre para cumprir uma fi nalidade defi nida. A fi nalida-de principal da estrutura é suportar cargas de elementos que delimitam espaços, ainda que, em certas ocasiões, sua fi nalidade seja unir dois pontos, como no caso de pontes e elevadores, ou para resistir à ação de forças naturais, como a ação do vento, empuxos de terras, a ação do próprio peso, etc.

As estruturas arquitetônicas, em particular, delimitam o espaço, a fi m de torná-lo útil para uma função determinada. Sua utilização é, em geral, a separação (total ou parcial) entre um espaço assim delimitado e os fatores atmosféricos e pode não requerer o seu fechamento completo; o teto em balanço de um estádio protege os espectadores das in-clemências climáticas sem fechá-los em um espaço.

Finalidades diferentes servidas por espaços diferentes exigem estruturas diferentes. Todas as estruturas, porém, pelo simples fato de sua existência, estão submetidas à ação de diversas cargas, e devem resistir a elas. Em geral, as cargas são um “mal necessário” e inevitável.

CARGAS

Nem sempre será fácil legar a cada elemento de um sistema estrutural proposto uma simples e específi ca tarefa, como a uma laje, a transmissão da carga vertical às vigas por fl exão; ou a uma viga, a transmissão da reação da laje à coluna; ou ainda a uma coluna, a transmissão das cargas das vigas às fundações. A tarefa tornar-se-á ainda mais difícil quando não se conhece a natureza dessas cargas, as quais, certamente, podem apresentar características que, por serem desconhecidas, podem também pôr em perigo a vida de uma estrutura.

A determinação das cargas que atuam sobre uma estrutura é um problema complexo. A natureza das cargas varia fundamentalmente com o projeto, com os materiais e com a função da estrutura. As condições de carga de uma mesma estrutura podem se modifi car

04

54 CARGAS QUE ATUAM NAS ESTRUTURAS

de tempos em tempos, ou variar rapidamente de um instante a outro. De um modo geral, as cargas podem ser classifi cadas, quanto ao seu modo de atuação sobre as estruturas, em estáticas ou dinâmicas.

As cargas mais importantes que suportam uma estrutura arquitetônica não sofrem variações bruscas: são denominadas estáticas e constituem a base para o projeto da estru-tura. A carga a que deve resistir o piso de um edifício varia com a quantidade de ocupan-tes, a distribuição dos móveis, o peso das máquinas ou o armazenamento de mercadorias, de tal forma que as normas as representam por uma carga equivalente.

As cargas especifi cadas nas normas são cargas convencionais: a carga sobre um piso pode-se supor igual a um número constante de kN/m², ainda que, na prática, a carga sobre um piso nunca seja uniforme. Analogamente, pode-se supor que a ação do vento sobre um edifício é constante no tempo e se distribui de maneira uniforme sobre sua superfície; na verdade, o vento sopra em rajadas, e a carga transmitida varia de um ponto a outro do edifício. Também neste caso as normas simplifi cam o procedimento do projeto, tomando em conta as variações do vento em forma estatística e sugerindo cargas convencionais seguras.

Quando as cargas que atuam sobre um edifício não estão consideradas em normas e apresentam características que podem pôr em perigo a vida de uma estrutura, devem ser determinadas de forma exata por meio de experiências de laboratório. O efeito de fura-cões, por exemplo, deve ser medido por meio de ensaios aerodinâmicos realizados com modelos reduzidos em um túnel de vento. Nem sempre basta que o projetista considere somente as cargas específi cas em norma. A perspicácia e o bom senso são fundamentais em tal situação. Exemplos: vibrações provocadas pela proximidade de um aeroporto, so-brecargas de montagem, carga de neve nas regiões do país onde ela existe, etc.

Dessa forma, as cargas classifi cam-se nos seguintes tipos: permanentes, acidentais, térmicas, estáticas, dinâmicas, variáveis, etc. Chama-se a atenção para o fato de que a de-nominação das cargas não apresenta uma terminologia universal, pois, em geral, em cada país existe a tendência natural de os projetistas estruturais adotarem uma nomenclatura própria. A unifi cação das normas técnicas resolveria não só os aspectos das unidades das grandezas físicas, bem como possibilitaria a adoção de terminologias comuns. É oportu-no salientar que essa tendência já existe, sendo comum, no meio técnico, o emprego das Regles Unifi cies Communes Aux Diff erents Types d’Ouvrages et de Materiaux, bem como o emprego do Code-Modele CEB-FIP Pour les Structures en Beton. No Brasil, as normas na área da Engenharia Estrutural estão paulatinamente se adaptando às regras unifi cadas e ao código-modelo do CEB-FIP.

55ESTRUTURAS | uma abordagem arquitetônica

A seguir, procurar-se-á dar, além daqueles já anteriormente defi nidos, os conceitos gerais das cargas mais relevantes nas estruturas.

CARGAS PERMANENTES

O peso próprio da estrutura e de todas as cargas aplicadas constante-mente sobre ela é inevitável e constitui sua carga permanente. Devemos, pois, conhecer de antemão esta carga, a fi m de projetar a estrutura, e essa carga não pode ser determinada exatamente sem que se tenha projetado a estrutura.

As dimensões de um elemento estrutural dependem fundamentalmen-te das cargas que atuam sobre ele e uma delas é a carga permanente, que, por sua vez, depende das dimensões do elemento. O projetista está obri-gado a iniciar o cálculo de uma estrutura fazendo hipóteses de suas di-mensões e, portanto, de sua carga permanente. Logo, ao efetuar a soma de todas as demais cargas e verifi car sua resistência, no fi nal de seu cálculo, descobrirá se sua hipótese foi correta.

O peso próprio é, em alguns casos, a carga mais importante aplicada em uma estrutura. Pode superar várias vezes a todas as demais cargas, so-bretudo em estruturas de grande porte e nas construídas com material pe-sado (pontes, viadutos e coberturas). Alguns materiais, como o aço de alta resistência, diminuem a importância do peso próprio em relação a outras cargas, mas de forma alguma deve-se desprezá-lo. Os principais materiais estruturais têm os seguintes pesos próprios:

Concreto armado ......................... 25 kN/m³Aço................................................... 78 kN/m³Alumínio......................................... 26 kN/m³Madeiras (pinho do Paraná)...... 5,4 kN/m³

A diferença de peso dos diversos materiais infl ui sobre as dimensões dos elementos estruturais, mas o fator essencial para verifi car sua efi ciência é a relação entre o peso próprio e a sua resistência mecânica. A NBR-6120 da ABNT (cargas para o cálculo de estruturas de edifi cações) adota a seguinte defi nição para a carga permanente: “Este tipo de carga é constituído pelo peso próprio da estrutura e pelo peso de todos os elementos construtivos fi xos e instalação permanente”.

10 | Monumento dos cubos junto ao largo “Landes Museum Württemberg”, Stuttgart, Alemanha.

56 CARGAS QUE ATUAM NAS ESTRUTURAS

CARGAS ACIDENTAIS

Conforme a NBR-6120 da ABNT, todas as demais cargas denominam-se cargas acidentais. Essa categoria inclui a carga correspondente a pesso-as, máquinas, móveis, chuva, vento, neve, empuxo da terra, etc. Já se disse que muitas dessas cargas têm valores incertos. A NBR-6120 da ABNT re-gulamenta os valores de cargas acidentais e os procedimentos que devem ser adotados em nosso país. A mesma norma adota a seguinte defi nição para as cargas acidentais: “É toda aquela que pode atuar sobre a estrutura de edifi cações em função do seu uso (pessoas, móveis, materiais diversos, veículos, etc.)”.

CARGAS VARIÁVEIS

Em verdade, todas as cargas acidentais deveriam ser denominadas vari-áveis, pois a defi nição fi caria melhor caracterizada em relação direta com o próprio nome. No entanto, na normatização técnica existente, essa adoção por parte dos grandes projetistas estruturais ainda não foi ofi cialmente ratifi cada. Mais interessante seria chamar de carga acidental aquela decor-rente de casos realmente acidentais, tais como impactos, furacões, neve (em regiões onde não ocorre), ressonância, etc.

Para exemplifi car, vamos adotar as ações variáveis defi nidas por Wal-ter Pfeil em seu livro Concreto Armado (Vol.1), que defi ne: “As ações va-riáveis são as que variam frequentemente, e de maneira mais sensível, com o tempo”. Elas compreendem:

a)as cargas úteis (pesos e efeitos colaterais como frenagem, efeitos dinâ-micos, força centrífuga, etc.);

b)os pesos, empuxos e pressões de líquidos cujo nível é variável (as pres-sões dinâmicas da água corrente de um rio);

c)as cargas não permanentes aplicadas durante a construção (equipa-mentos, depósitos de materiais, etc.);

d)as ações naturais (vento, temperatura, neve, etc.).O mesmo autor defi ne como ações acidentais “as de tempo praticamen-

te nulo em relação à vida útil da obra”. Elas se produzem muito raramen-te, via de regra em decorrência de um acidente, donde o qualifi cativo de acidentais. Como exemplo, podem ser citados: choques de veículos contra

90 m

Carga deCompressão

1,65º C

33 m

+35º C

33 mCompressãoCarga deCompressãoCarga deCompressãoCarga de33 m

-35º C

Fig. 17 | Estrutura exposta à variação de temperatura

57ESTRUTURAS | uma abordagem arquitetônica

pilares de viadutos; choques de barcos contra pilares de pontes; choques de elementos duros em pilares dentro do leito dos rios (toras, pedaços de madeira, etc.); explosões; ter-remotos, etc.

Vento e neve

As pressões horizontais do vento sobre as edifi cações são tratadas na Norma Brasileira NBR-6123 (forças devidas ao vento em edifi cações) e dependem da forma e da posição da superfície exposta ao vento, da situação topográfi ca da obra, do efeito de rajadas; às vezes, são bastante difíceis de determinar.

A carga da neve depende do clima da região onde se ergue a edifi cação. Poucas são as regiões do país onde a neve ocorre com alguma intensidade. As cargas de neve não estão incluídas nas normas brasileiras por ser a incidência de neve no Brasil inexpressiva. Nos Estados Unidos, as cargas de neve são baseadas na análise de valores medidos, adotan-do-se um período de recorrência (T) igual a 50 anos. As cargas mínimas adotadas nos projetos variam entre 0,25 e 0,50 kN/m² (estados do sul e oeste) e entre 1,0 a 2,0 kN/m² (estados do nordeste), podendo atingir 4,0 kN/m² no extremo nordeste (Estado de Maine).

Enfi m, as cargas de vento e neve seguem regulamentações próprias de cada região fi -xadas nas pertinentes Normas Técnicas dos respectivos países. Além das cargas variáveis do vento e da neve, existem outras mais complicadas, muitas vezes de difícil quantifi ca-ção, que são as cargas térmicas, as cargas de assentamento, os empuxos de terras e os empuxos de líquidos.

Cargas Térmicas

As variações de temperatura podem atuar sobre as estruturas de duas formas diferen-tes: produzindo alongamentos ou encurtamentos dos elementos (variação uniforme de temperatura), ou produzindo curvaturas nos elementos (variação diferencial de tempera-tura, na direção transversal das peças).

As variações uniformes de temperatura dependem do local da obra e das dimensões das peças. Os cálculos dos efeitos da variação uniforme de temperatura podem ser dis-pensados em peças permanentemente envolvidas em terra ou água e em edifícios de es-trutura contínua com dimensões em planta não superiores a 30m (NBR-6118).

Todas as estruturas estão expostas a variações de temperatura, de acordo com o ciclo de temperaturas diurnas e noturnas, como também ao ciclo mais prolongado de inverno e verão, infl uindo ambos na sua forma e nas suas dimensões. Uma viga metálica de uma

58 CARGAS QUE ATUAM NAS ESTRUTURAS

ponte sofre alongamentos e encurtamentos consideráveis devido a este fato (Fig. 17). Os efeitos da variação de dimensões devidos à dilatação e à retração térmica equivalem a grandes cargas, as quais podem resultar muito perigosas por serem invisíveis. As normas de cálculo de estruturas específi cas de cada material nos instruem sobre esse problema, sugerindo-nos a adoção de juntas de dilatação, ou seja, a interrupção do prédio ou a cons-trução em duas ou mais partes distintas (no concreto armado, a maior dimensão sem junta de dilatação é de 30m, sem levar em conta, no cálculo, a variação de temperatura).

Uma forma prática de solucionar esse problema, em certos tipos de estruturas (como pontes), é o apoio sobre roletes, o que permite, então, a alteração livre do comprimento. Análoga condição de dilatação térmica, de consequências distintas, mas igualmente pe-rigosas, encontra-se nas grandes cúpulas. Quando a temperatura exterior aumenta ou diminui, a cúpula tende a se dilatar ou se contrair. Como os apoios subterrâneos se man-têm à temperatura constante, impedem tanto uma coisa como outra, e a cúpula se desloca fundamentalmente para cima e para baixo (“respira”). O perigo se elimina usando um tipo de apoio deslizante. Durante o ciclo térmico diário, quando um lado aquece mais que outro, desenrolam-se em toda a cúpula cargas térmicas mais complicadas. A cúpula troca de forma de maneira assimétrica: os esforços devidos a tal deformação podem ser elevados, e sua avaliação resulta difícil.

Esses exemplos mostram que toda estrutura é sensível às variações de temperatura, devido à sua forma, às condições de apoio e aos materiais. Quando uma estrutura deve resistir a cargas pesadas e pequenas variações de temperatura, pode ser rígida; caso con-trário, deve ser fl exível. A estrutura deve ceder às variações de temperatura e nunca com-batê-las.

As vigas contínuas de pontes estão sujeitas à incidência direta do sol sobre as faces superiores, enquanto as faces inferiores das vigas permanecem na sombra. Esse fato dá origem a diferenças de temperatura da ordem de 15°C a 25°C entre as faces das vigas, produzindo curvatura das mesmas e momentos fl etores na estrutura contínua. Moderna-mente, as normas de cálculos de pontes consideram a temperatura diferencial como um caso de carregamento, para análise da obra sob as cargas em serviço.

Em reservatórios para líquidos aquecidos, ou silos para cimento ou cereais, existem diferenças de temperatura entre as faces interna e externa das paredes. Essas diferenças são levadas em conta no dimensionamento das armaduras, tendo em vista sobretudo a análise da fi ssuração.

59ESTRUTURAS | uma abordagem arquitetônica

Cargas de Assentamento (Recalques e Deslocamentos Diferenciais dos Apoios)

Outra condição, com efeitos nocivos à estrutura, é o assentamento irregular das fun-dações de uma edifi cação submetido ao peso de um edifício; um solo de resistência não--uniforme pode ceder mais em uma parte do que em outra. Os movimentos do solo redu-zem o apoio das fundações em certas áreas e parte do edifício situado sobre ela se separa do resto por escorregamento ou recalque diferencial. O assentamento não-uniforme não carrega o edifício com nenhuma carga adicional, mas sua parte apoiada suporta uma car-ga maior e diferente da que foi calculada.

Ainda que todas as fundações de uma obra sejam dimensionadas com o mesmo crité-rio, elas poderão apresentar recalques diferentes devido à heterogeneidade do terreno. As pressões admissíveis nos solos, utilizadas para dimensionar as fundações diretas, podem dar origem a recalques diferenciais da ordem de 1cm entre duas fundações. Nas funda-ções profundas, ocorrem também recalques diferenciais, normalmente menores que nas fundações superfi ciais.

As estruturas têm, em geral, sufi ciente poder de adaptação para aceitar os recalques diferenciais mencionados acima sem necessidade de uma verifi cação específi ca. Uma aná-lise criteriosa das solicitações provocadas por recalques diferenciais só é feita no caso de fundações sujeitas a deslocamentos maiores,que podem provocar diferenças da ordem de vários centímetros nos recalques.

Na Europa, existem obras viárias (pontes) colocadas sobre terrenos carboníferos, nas quais se verifi cam recalques diferenciais bruscos de até dezenas de centímetros. Nesses casos, as estruturas são projetadas isostáticas (podendo acomodar os deslocamentos sem provocar solicitações internas), prevendo-se ainda a utilização de macacos hidráulicos para corrigir os desníveis verifi cados.

Empuxos de Terras

Os empuxos e as pressões de terras, de sólidos ou líquidos cujos valores sejam pratica-mente constantes com o tempo devem ser considerados como ações permanentes, e não como ações variáveis. As pressões laterais das terras dependem da rigidez da estrutura. Nas estruturas com grande rigidez horizontal (muros de gravidade), as terras exercem pressão lateral em repouso, representada por diagramas aproximadamente trapezoidais.

Havendo fl exibilidade sufi ciente de estrutura, as pressões laterais se reduzem, chegan-do-se a uma plastifi cação do terreno que produz um diagrama triangular de pressões.

60 CARGAS QUE ATUAM NAS ESTRUTURAS

Empuxos de Líquidos

Os empuxos dos líquidos produzem diagramas triangulares de pressões normais às paredes.

CARGAS DINÂMICAS

Todas as cargas até agora consideradas foram do tipo estático. As cargas cujo valor varia com rapidez ou se aplicam de forma brusca denominam-se dinâmicas. Devido à alta periculosidade, é necessário conhecer claramente a sua forma de ação. As cargas dinâ-micas atuam sobre as estruturas de diversas maneiras: sob a forma de carga de impacto, como num martelete industrial; sob a forma de carga ressonante, nas vibrações de uma máquina ou no badalar de um sino. Um fenômeno natural, do qual estamos livres (pelo menos até o momento), é o de movimentos sísmicos (terremotos). Nos locais onde tais fe-nômenos podem ocorrer, as edifi cações devem receber reforço estrutural para resistirem a essas cargas dinâmicas imprevisíveis.

O vento produz fenômenos de ressonância bastante complicados. Podemos fazer tal verifi cação quando, de dentro de um automóvel em movimento, soltamos pela janela um pedaço de tecido, mantendo-o seguro somente por uma das pontas. O movimento total-mente irregular do tecido chama-se oscilação aerodinâmica. Esse fenômeno provocou a queda da ponte pênsil de Tacoma, em Washington, em 1940. As pressões dinâmicas que ocorrem na face exposta ao vento podem provocar a ruptura dos vidros prédio adentro. As sucções que ocorrem na face oposta à da ação do vento podem provocar a ruptura dos vidros prédio afora.

Todos os fenômenos dinâmicos são complexos. Ao projetista, cabe ter consciência de sua ação e saber quais as cargas estáticas equivalentes sugeridas pelas normas, se estas existirem.

COMBINAÇÕES DE AÇÕES

Tendo em vista que as ações não atuam simultaneamente com seus valores mais des-favoráveis, há necessidade de estudar o comportamento das estruturas sob o efeito de diferentes combinações de ações, consideradas as compatibilidades das mesmas e as res-pectivas probabilidades de incidência concomitante.

Em princípio, distinguem-se dois tipos de combinações de cargas: o primeiro, visando à análise da segurança da obra (o estado-limite último, ou de ruína); o segundo, para es-tudo do comportamento da mesma durante sua utilização (estados-limite de utilização).

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Centro AdministrativoArquitetos: Charles René Hugaud, Ivânio Fontoura, Leopoldo Constanzo e Luiz Carlos Macchi SilvaPorto Alegre - 1972

MATERIAIS E EXIGÊNCIAS

ESTRUTURAIS

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Centro AdministrativoArquitetos: Charles René Hugaud, Ivânio Fontoura, Leopoldo Constanzo e Luiz Carlos Macchi SilvaPorto Alegre - 1972

MATERIAIS E EXIGÊNCIAS

ESTRUTURAIS

63

MATERIAIS E EXIGÊNCIAS ESTRUTURAIS

CARACTERÍSTICAS IMPORTANTES DOS MATERIAIS, MELHORES MATERIAIS DE CONSTRUÇÃO E O AVANÇO

DAS MODERNAS TÉCNICAS DE CONSTRUÇÃO

Todo o progresso na Engenharia está intimamente ligado ao desenvolvimento de me-lhores materiais. O aperfeiçoamento dos materiais está especifi camente dirigido ao au-mento de resistência, ou à redução de peso, ou, idealmente, à combinação de ambos. Um exemplo marcante disso é o alumínio: com uma relação de peso de 1/3 do aço, a resis-tência do aço comum foi igualada. A leveza do alumínio, combinada com a durabilidade e excelente resistência à corrosão, é a vantagem mais importante e a razão que explica seu uso tão difundido (principalmente fora do Brasil). Mas o aumento da resistência dos aços especiais, nos últimos anos, é também notável, uma vez que tais aços duplicaram sua capacidade de resistência em comparação ao aço estrutural comum.

Maiores resistências e menores pesos têm também surgido de uma pesquisa intensiva com o concreto, a alvenaria e a madeira laminada. Mas, como feito mais importante, o desenvolvimento de materiais plásticos reforçados com fi bra de vidro abriu um mundo completamente novo ao projeto arquitetônico e estrutural, em virtude de sua leveza, mol-dabilidade, resistência à corrosão e durabilidade. Ainda para exemplifi car, ao lado do de-senvolvimento de melhores materiais, a maior transformação do projeto estrutural resul-tou também do emprego de outras técnicas de construção e da descoberta de alternativas de emprego de sistemas estruturais avançados, tal como é o caso da técnica do concreto protendido. Essa técnica foi desenvolvida e tornada prática e econômica, principalmente por causa do aumento da resistência do aço. Os fi os de aço (cordoalhas ou cabos) de alta resistência protendem o concreto, tornando o material, normalmente usado na compres-são, capaz de resistir a grandes quantidades de esforços de tração que, de outra maneira, poderiam levá-lo à destruição. É bem sabido que o processo de pré-tensão ou pós-tensão (especialmente nos modernos projetos de pontes) tem levado à cobertura de vãos que, antigamente, eram considerados impossíveis de cobrir com o concreto. Também no pro-jeto de edifícios, ao usar sistemas protendidos, o espaçamento entre colunas tem sido

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64 MATERIAIS E EXIGÊNCIAS ESTRUTURAIS

duplicado excessivamente. O maior desenvolvimento atualmente é o CAD (concreto de alto desempenho) fazendo com que países com cultura em aço (como EUA e Japão) tenham aumentado a sua utilização.

A demanda pelas vigas protendidas de vários tipos criou, de fato, uma nova indústria de elementos estruturais pré-fabricados que é quase com-parável aos laminadores da indústria do aço.

Mas de nada adianta se, além do desenvolvimento de novos materiais, a aplicação de modernas técnicas de construção, o emprego dos computa-dores e a concepção de princípios avançados de projeto, o maior estímulo dos engenheiros e arquitetos para uma nova era no projeto estrutural não estiver atrelado ao interesse e à vontade de exprimir a forma lógica e a be-leza de uma estrutura bem proporcionada.

PROPRIEDADES ESSENCIAIS DOS MATERIAIS USADOS EM ESTRUTURAS

Nas estruturas arquitetônicas, emprega-se uma grande diversidade de materiais: a pedra, os blocos vazados, o tijolo, a madeira, o aço, o alumínio, o concreto armado e protendido e os plásticos, entre outros. Todos eles possuem em comum certas propriedades essenciais e características que permitem resistência às cargas. Qualquer que seja a atuação das cargas, de forma permanente ou variável, a deformação da estrutura não deve au-mentar de forma indefi nida; além disso, deve desaparecer, uma vez cessada a ação das cargas. Quando o material se comporta dessa maneira, diz-se que ele se comporta de maneira elástica (Fig. 18).

Todos os materiais estruturais são elásticos em certo grau. Alguns, no entanto, quando as cargas são muito grandes, têm uma deformação re-sidual. Com o incremento de novas cargas, essa deformação residual vai aumentando, até inutilizar a estrutura. Portanto, nenhum material estru-tural é perfeitamente elástico, pois as deformações permanentes são inevi-táveis quando as cargas ultrapassam certos valores.

No regime elástico, a deformação é diretamente proporcional à carga, e a maior parte dos materiais estruturais é usada dentro de seu regime de proporcionalidade (regime elástico), até seu limite de elasticidade (Fig. 19). Os materiais que apresentam deformações permanentes comportam-se de forma plástica, e isto acontece além do limite de elasticidade (Fig. 20). A

P

P = 0d = 0

d

Fig. 18 | Comportamento elástico

P

d

2P

2d

P = 0d = 0

Fig. 19 | Comportamento elástico linear

65ESTRUTURAS | uma abordagem arquitetônica

carga sob a qual o material começa a se comportar de maneira claramente plástica denomina-se carga de escoamento.

Não se deve pensar que o comportamento plástico torna o material inapto para fi ns estruturais. Assim, por exemplo, enquanto o material tra-balha no regime elástico, suas deformações aumentam proporcionalmente às cargas, enquanto que, acima do limite de elasticidade, as deformações aumentam com maior rapidez que as cargas, e por último seguem aumen-tando quando estas não mais aumentam. O aço tem uma zona elástica linear de utilização, seguida por uma zona plástica.

A 35°C abaixo de zero, o aço torna-se frágil e a 372°C acima de zero, es-coa, devido à alta temperatura. Ao se usar o aço em construção, sua segu-rança em incêndios depende de proteção. Alguns materiais têm uma zona de trabalho elástico bastante limitada e se comportam de forma plástica sob a ação de cargas reduzidas: são os plásticos, assim denominados corre-tamente. O de maior aplicação estrutural é a fi bra de vidro.

Um material cuja resistência não depende da direção de aplicação das cargas chama-se isotrópico. Exemplo: o aço. O mesmo não ocorre com a madeira, que tem diferentes resistências, de acordo com a direção da apli-cação da carga. A madeira laminada colada é uma forma de minimizar essa defi ciência do material. Os materiais estruturais podem resistir aos esforços básicos de tração, compressão e cisalhamento. Alguns, como o aço, resistem da mesma forma a esforços de tração e compressão. Outros, como a pedra e o concreto, mostram diferentes resistências a esforços dis-tintos; seu uso limita-se necessariamente a cargas e formas que não te-nham esforços de tração. Os materiais capazes de resistir à tração resis-tem, também, na maioria dos casos, a esforços de corte; e, ao contrário, os que somente resistem a esforços de compressão não possuem grande resistência ao corte.

CONSTANTES ELÁSTICAS DOS MATERIAIS

Em geral, os materiais que se usam para fi ns estruturais são escolhidos de maneira que se comportem elasticamente nas condições ambientais e conforme o tipo de carga (intensidade) que irá atuar durante a vida da es-trutura. Dessa forma, as grandezas que avaliam determinadas caracterís-ticas dos materiais são obtidas em ensaios de laboratório e medidas dentro

d

3P

3d

P = 0d = 0

Fig. 20 | Comportamento plástico

66 MATERIAIS E EXIGÊNCIAS ESTRUTURAIS

da zona linear de trabalho elástico dos materiais. Mesmo no regime elástico, diferentes materiais sofrem deformações distintas quando submetidos à mesma carga.

Por exemplo, ao se aplicar um peso de 5 kN a um arame de aço de 20m de compri-mento e 6mm de diâmetro, esse alongar-se-á em 17mm. O mesmo arame, porém, feito de alumínio, alongar-se-á três vezes mais, isto é, 50mm. Diz-se, então, que um material é mais rígido que outro, e essa medida de rigidez é uma propriedade de cada material, denominada de módulo de deformação longitudinal, ou simplesmente conhecida como módulo de elasticidade. Defi nimos, então, a primeira constante elástica dos materiais, em geral pela letra E, a qual, para os materiais abaixo, apresenta os valores médios do quadro a seguir:

Concreto(*)........................................................................................... 25.549 MPa(255.490 kgf/cm2)Aço................................................................................................... 210.000 MPa (2.100.000 kgf/cm2)

Alumínio............................................................................................... 70.300 MPa (703.000 kgf/cm2)

Madeira Pinho do Paraná na direção das fibras ..........................10.500 MPa (105.000 kgf/cm2)

Madeira Pinho do Paraná na direção perpendic. às fibras ............2.100 MPa (21.000 kgf/cm2)

(*) - Valores referenciais a módulo por compressão, que em geral diferem do módulo por tração.

O aço e o alumínio têm módulos iguais à tração e à compressão. Já o módulo à tração do concreto tem valor diferente do apresentado (menor) e tem escassa importância, por ser a sua resistência à tração em geral desconsiderada no cálculo das estruturas de con-creto armado.

Portanto, pode-se dizer que o módulo de deformação longitudinal é a força teorica-mente capaz de esticar um arame cuja secção transversal tem uma área de 1mm² até um comprimento igual ao dobro do comprimento original (isso sob o ponto de vista teórico, pois, na prática, o arame se romperá antes de chegar a esse alongamento).

Mais outras duas constantes elásticas são importantes: o módulo de deformação trans-versal (representado pela letra G) e o coefi ciente de Poisson (representado pela letra grega ν). Essas constantes elásticas também variam de material para material, são obtidas atra-vés de ensaios de laboratório e podem ser calculadas a partir das seguintes expressões:

(0 < υ ≤ 0, 5)

εt = deformação específica transversalε = deformação específica longitudinal

2(1+υ)E

ευG e == εt

67ESTRUTURAS | uma abordagem arquitetônica

Obs.: em que ambas as expressões são mostradas pela resistência dos materiais, cujo interesse prático estará associado ao estudo da secção transversal do material em apre-ciação.

COEFICIENTE DE SEGURANÇA DOS MATERIAIS

As estruturas, quando projetadas para os diversos elementos estruturais calculados, não são dimensionadas com os materiais em seu “limite máximo de capacidade resisten-te”, isto é, trabalha-se com os esforços aquém dos valores de seu limite elástico (a uma fra-ção destes). Nem poderia ser diferente, pois, ao tratarmos com os diversos materiais, tra-balhamos com uma série de fatores de incerteza que nos obrigam a impor uma segurança estrutural. Tais fatores, entre outros, são: materiais não-homogêneos; dimensões das sec-ções das peças executadas diferentemente do projetado; incertezas nas propriedades elás-ticas e de resistência dos materiais; alterações de uso da edifi cação; não-horizontalidade e não-verticalidade das peças; incertezas nas cargas e nos esforços; modelo matemático de cálculo inadequado, etc. Assim, tais fatores levam-nos a introduzir o que chamamos de coefi ciente de segurança. Esse fator de segurança tem grande importância, porém nem sempre é fácil quantifi cá-lo, isto é, ele é muito difícil de ser exatamente determinado, mas é absolutamente necessário. As normas técnicas de cada país, específi cas de cada mate-rial, orientam sobre a adoção de valores realmente confi áveis. A fi nalidade da edifi cação, por exemplo, é um fator de grande importância sob o ponto de vista social; a segurança de um grande salão é mais decisiva do que de uma habitação unifamiliar, portanto deve ser avaliada com um critério certamente mais conservador.

Na atualidade, os coefi cientes de segurança para edifícios de dimensões excepcionais, que estariam ocupados por grande quantidade de pessoas, estabelecem-se de maneira que resulte sumamente improvável a morte de um número de pessoas (por pequeno que fosse) devida a falhas estruturais ocorridas durante a vida útil da estrutura. O cálculo de tais coefi cientes de segurança, nesse caso, implica usar a teoria das probabilidades e conduz a resultados que podem e devem ser medidos em termos de vidas humanas.

A noção de segurança, avaliada através de um coefi ciente, poderá estar associada à base do ponto de fl uência (quando perfeitamente defi nido), ou ainda avaliada através da capacidade limite de resistência, ou ainda poderá ser avaliada pela resistência última do material (tensão de ruptura), ou por outra forma considerada extremamente confi -ável. Nos dias atuais, os códigos de edifi cação (regulamentos, recomendações e normas técnicas) adotam como critério o cálculo das estruturas no estado limite último (se-gundo a NBR6118 corresponde ao estado de ruína por ruptura, por deformação plástica

68 MATERIAIS E EXIGÊNCIAS ESTRUTURAIS

excessiva ou por instabilidade da estrutura ou parte dela), com majora-ção das cargas (ou solicitações) e a minoração da resistência dos mate-riais objeto de uso no sistema estrutural em dimensionamento. Ainda a NBR6118 (Projeto e Execução de Estruturas de Concreto Armado) indica que as estruturas devem ser projetadas levando-se em consideração não só o aspecto da segurança quanto ao estado limite último, mas também sob enfoque de sua durabilidade quanto aos estados limites de utilização. Estes abrangem as questões relacionadas à deformação excessiva, à formação de fi ssuras e à fi ssuração inaceitável. É uma situação nova, de grande avanço tecnológico, que, de forma clara e simples, embute no cálculo estrutural a segurança estrutural, tão necessária e indispensável no dimensionamen-to dos sistemas estruturais propostos.

MATERIAIS ARTIFICIAIS MODERNOS

A pedra e o ferro são usados com fi ns estruturais há vários séculos, sobretudo em combinação com outros materiais. Como as propriedades do ferro à tração e as da madeira à compressão eram bem conhecidas, as coberturas das naves das igrejas medievais usavam uma combinação mis-ta: nas partes em compressão da treliça (perna), usava-se a madeira, e nas partes em tração (linha), tensores de ferro. Os crescentes conhecimentos de Metalurgia, Química e Física têm melhorado sensivelmente nos últimos 400 anos as propriedades dos materiais estruturais, que vêm se constituin-do em ligas ou outras descobertas denominadas de materiais artifi ciais modernos, entre eles o aço, o alumínio, o concreto armado, o concreto protendido, materiais plásticos reforçados com fi bra de vidro, etc.

Fabricam-se atualmente aços de elevada resistência, aços inoxidáveis de modo a eliminar a oxidação, o alumínio com resistência próxima à do aço convencional (pesando três vezes menos e eliminando os aspectos in-desejáveis da corrosão), madeiras praticamente isotrópicas (pelo simples emprego de adesivos plásticos) e fi bras óticas (monocristais em forma de agulha ou fi lamento de alguns microns de diâmetro, muito utilizadas em cabos telefônicos), assim como outros exemplos de avanços tecnológicos que poderiam ser citados.

Um material interessante é concreto armado (Fig. 21) e, em nível su-perior, o concreto protendido (Fig.22), já referenciado anteriormente, pois

Fig. 21 | Estrutura em concreto sob tração

bainhaarmadura protendida

Fig. 22 | Estrutura em concreto protendido sob tração

69ESTRUTURAS | uma abordagem arquitetônica

combina a resistência à compressão do concreto com a resistência à tração do aço, poden-do-se obter uma grande diversidade de formas. As propriedades do aço dependem de um cuidadoso controle metalúrgico, enquanto as propriedades do concreto dependem, além dos fatores relacionados com a mão-de-obra, da qualidade e quantidade dos elementos que intervêm na mistura: granulometria da areia e da pedra (brita ou seixo), a qualidade do cimento e a quantidade de água adicionada à mistura, etc. Logo, como o concreto é tão sensível a variações de mistura, é necessário determinar um traço adequado (quan-tifi cação dos materiais envolvidos na mistura: cimento, água, areia e agregados) de ma-neira cuidadosa e até, às vezes, científi ca, preferencialmente em laboratórios especializa-dos. Grandes cuidados devem também ser tomados quando do amassamento, transporte, lançamento, adensamento, cura, etc. O controle de qualidade não deve ser relegado, pois ensaios de compressão simples em corpos de prova moldados com o próprio concreto em lançamento são um bem que não deve ser evitado. Fabrica-se, já de forma até normal, con-creto com resistência à compressão acima de 50 MPa (500 kgf/cm2). Este valor de resis-tência é avaliado para o corpo de prova em ensaio aos 28 dias de “idade”. Faz-se, também, em geral, a avaliação de resistência aos 7 e 14 dias. Há, também, concretos de pega rápida e concretos com agregados leves incorporados à mistura.

Como complementação das características mencionadas na abertura deste capítulo, no que se refere ao concreto protendido, outras referências interessantes são: o concreto resulta comprimido pela ação da protensão dos cabos de aço, dando ideia de que uma viga de concreto protendido, sem carga, parece não estar submetida a tensão alguma, mas os esforços incorporados pela protensão comprimem o concreto e tracionam o aço.

A tração desenvolvida na viga, pela ação das cargas, reduz (ou, no pior dos casos, anu-la) a compressão inicial do concreto, de modo que esse nunca se acha submetido à tração e, consequentemente, não tende a se fi ssurar. Os primeiros investigadores do concreto armado já sabiam dessa vantagem; porém, infelizmente, nenhum dos aços conhecidos na época tinha um limite de fl uência sufi cientemente elevado, de modo que pudessem ser esses pesquisadores autores da criação do concreto protendido.

Outras combinações de materiais estruturais já foram testadas e realizadas com êxito. Tais foram os casos de Nervi e Torroja. O primeiro foi o inventor da argamassa arma-da (chamada, na época, de ferrocimento), utilizando uma combinação de argamassa de cimento e malhas de aço. O segundo pesquisador foi o descobridor da combinação das propriedades de coesão da elevada compressão dos “cerâmicos” com a resistência à tração dos aços, criando um material de comportamento similar ao concreto armado (alvenaria estrutural).

70 MATERIAIS E EXIGÊNCIAS ESTRUTURAIS

O uso adequado dos materiais estruturais é fundamental para um pro-jeto correto, pois os materiais disponíveis limitam a seleção dos sistemas estruturais em todos os problemas importantes. As estruturas como ca-bos protendidos e membranas pneumáticas são sistemas recentes, mas já comprovaram sua efi ciência e economia nos poucos casos em que foram aplicados, gerando grandes possibilidades de uso em projetos e pesquisas futuras, especialmente no que se refere aos materiais de membranas pneu-máticas.

EXIGÊNCIAS BÁSICAS

Os modernos avanços na produção de material, técnicas construtivas e métodos de análise têm introduzido nova fl exibilidade no projeto arquite-tônico, ampliando consideravelmente seu alcance. Essas novas liberdades não eximem as estruturas modernas da obrigação de satisfazer determina-dos requisitos básicos que têm constituído sempre os fundamentos da boa Arquitetura, e que podem se dividir nas seguintes categorias: equilíbrio, estabilidade, resistência, funcionalidade, economia e estética.

Equilíbrio

A exigência fundamental do equilíbrio relaciona-se com a garantia de que a edifi cação (ou qualquer uma de suas partes) não se moverá. Como é evidente, esta exigência não pode se impor de forma estrita, e certo grau de movimento não somente é inevitável como, às vezes, também necessário; porém, comparados com suas dimensões, os deslocamentos admissíveis em um edifício são, em geral, tão pequenos que, à vista, a edifi cação parece estar imóvel e sem deformação alguma.

É fácil representar algumas condições elementares que asseguram o equilíbrio de estruturas mais simples. A tração do cabo que sustenta o elevador, que corre com o mesmo em movimento, deverá ser igual ao peso do elevador, de modo que as forças se anulem; dizemos, então, que há equi-líbrio na direção do movimento. Dois homens que puxem uma corda com forças iguais não se movem: a corda está em equilíbrio (Fig. 23); porém, se um deles exerce maior força do que o outro, este afastará aquele de sua posição, e tanto os homens quanto a corda se moverão - nesse instante,

0,75 kN 0,75 kN

FORÇAS HORIZONTAIS

Fig. 23 | Equilíbrio à translação

0,45 kN 0,30 kN0,75 kN

1,8 m1,2 m

Fig. 24 | Equilíbrio de rotação (gangorra)

Pressão do vento

Peso

Fig. 25 | Efeito de tombamento

71ESTRUTURAS | uma abordagem arquitetônica

inexiste o equilíbrio, isto é, o equilíbrio foi rompido. Analogamente, ao se colocar sobre uma coluna (pilar) uma carga, aquela exerce sobre esta uma força de intensidade igual e contrária; se a coluna exerce uma força menor, isto é, não oferece resistência sufi ciente, a carga se moverá para baixo, e haverá uma falta de equilíbrio. Exemplos elementares como esses põem de manifesto que um corpo não se move em uma determinada direção se as forças a ele aplicadas nesta direção se anulam: a toda força aplicada em uma dada direção, deve se opor uma outra força de igual magnitude e direção, aplicada em sentido contrário. Quando isto ocorre, dizemos que há equilíbrio nessa direção.

O equilíbrio de uma ponte, quando sobre ela passa um veículo, apresenta uma situa-ção ligeiramente mais complicada. Vamos admitir, nesse caso, que a ponte seja apoiada somente em pilares externos e que seja desprezado o seu peso próprio. Quando o veículo se encontra no meio da ponte, cada pilar suporta a metade de seu peso, isto é, o peso do veículo acha-se equilibrado pelas reações de apoio, que são iguais. No entanto, quando o veículo entra na ponte pela esquerda, é o pilar desse lado que resiste quase exclusiva-mente ao seu peso. À medida que ele se desloca sobre a ponte, a reação do apoio esquerdo diminui e a do direito aumenta, até se igualarem quando o veículo se encontra no centro. A partir deste momento, a reação do pilar direito continua aumentando e a do esquerdo, decrescendo, de forma que o primeiro irá suportar a quase totalidade do peso do veículo quando esse se encontrar pronto a abandonar a ponte. Assim, conclui-se que a ponte transmite aos pilares de apoio o peso do veículo, qualquer que seja a sua posição; para haver equilíbrio vertical, a soma de duas reações deve ser sempre igual a esse peso, porém as reações têm valor distinto, segundo a posição do veículo.

Outra situação similar de equilíbrio, semelhante à anterior, pode ser ilustrada através da gangorra com duas pessoas sentadas em posições extremas e opostas. O apoio da gan-gorra equilibra verticalmente os pesos das pessoas e reage com uma força de baixo para cima e igual à soma dos pesos das pessoas. Como efeito, o equilíbrio de rotação requer que o produto do peso pelo braço de alavanca de ambas as pessoas seja o mesmo (Fig. 24).

Esses simples princípios de equilíbrio aplicam-se a todas as estruturas: forças de igual intensidade e sentidos contrários garantem o equilíbrio em uma direção dada; produções de igual magnitude e de sentido contrário entre forças e braços de alavancas garantem o equilíbrio rotatório (Fig. 24). As primeiras aplicações do equilíbrio (direcional ou rotató-rio) encontram-se no estudo da exigência estrutural seguinte: estabilidade.

72 MATERIAIS E EXIGÊNCIAS ESTRUTURAIS

Estabilidade

A exigência de estabilidade de corpo rígido se relaciona com o perigo de movimentos inaceitáveis da edifi cação em sua totalidade. Quando um furacão atua sobre um edifício alto e este não se acha adequadamente engastado no solo ou equilibrado por seu peso próprio, pode girar sem se desintegrar, isto é, o edifício não é estável sob o ponto de vista rotatório (Fig.25). O perigo da instabilidade rotatória existe também quando um edifício não está bem equilibrado e apoia-se sobre um solo de resistência não uniforme. Se o solo sofre assentamentos desiguais (recalques diferenciais), o edifício pode se inclinar, como é o caso da Torre de Pisa, que, em algum momento, não tomadas as providências necessá-rias de reforços e escoramentos adequados, tombará. Da mesma forma, um edifício cons-truído sobre uma ladeira de uma montanha íngreme pode ter a tendência de deslizar, às vezes, e somente pela ação do seu peso próprio, principalmente quando o solo é argiloso e com possibilidade de infi ltração d’água, transformando a argila em um material resva-ladiço, como um sabão.

Assim, preferencialmente, para tais situações, deve ser proposta a execução de fun-dações sufi cientemente profundas e perfeitamente “ancoradas” em solo fi rme e rochoso. Todos esses casos de instabilidade se relacionam com um tipo de solo e com o tipo de fun-dação do edifício. Do ponto de vista da economia e uso, as fundações são um mal neces-sário; cabe aos arquitetos e engenheiros orientarem os proprietários dessas edifi cações, pois somente em raríssimas vezes estes possuem consciência de sua importância e custo. Para o conhecimento prévio do solo, antes do início da construção, devemos providenciar as sondagens de reconhecimento do terreno, as quais darão o exato conhecimento do perfi l geológico do solo, bem como darão as condições técnicas necessárias para a escolha do tipo de fundação apropriada: alicerces, sapatas, estacas, tubulões, blocos, radiers, etc. Às vezes, é necessário fazer a consolidação do solo (usando métodos químicos, físicos, etc.) e/ou a escolha de fundações adequadas; porém, a mecânica dos solos é uma arte incerta e difícil, pois até hoje a maior parte dos danos sofridos pelas edifi cações provém de fundações defeituosas, ainda que seu custo tenha alcançado, às vezes, 10% ou mais do custo total da obra.

Resistência

O requisito de resistência consiste na integridade da estrutura e de cada uma de suas partes, submetidas a quaisquer cargas e a todas as cargas possíveis. Para alcançá-lo, pri-meiro se escolhe o sistema estrutural e se estabelecem as cargas que atuarão sobre ele;

73ESTRUTURAS | uma abordagem arquitetônica

após, determina-se o estado de tensões em pontos signifi cativos da estrutura e compa-ra-se com o tipo e magnitude das tensões a que o material pode resistir sem perigo. O coefi ciente de segurança, como vimos anteriormente, de magnitude diversa, é o modo de levar em conta as incertezas inerentes à avaliação correta das propriedades dos materiais. Certos tipos de debilidade estrutural podem provocar danos moderados, enquanto outros podem chegar a produzir a ruptura da estrutura. Portanto, o projetista deve verifi car a resistência em distintas situações de carga (hipóteses de carga), a fi m de obter a pior con-fi guração de tensões em pontos signifi cativos da estrutura.

Os otimistas inclinam-se a crer que uma estrutura se rompe somente se os defeitos de projeto se unem a defeitos de construção, e tudo isso se agrega como sendo um “ato de Deus”. Os pessimistas, cautelosos, creem, entretanto, que as estruturas se rompem à menor “excitação”. Na prática, as estruturas se rompem (se bem que não seja tão frequen-te) devido ao comportamento dos materiais estruturais, e, na maioria das vezes não se produz de forma repentina, bem como não tira vidas humanas.

Em geral, estima-se a resistência de uma estrutura conforme as regras e recomenda-ções dos códigos de edifi cações. Esse procedimento é, em geral, seguro, mas pode resultar antieconômico quando não acompanha as técnicas de recente aplicação e os materiais empregados nos últimos tempos.

A responsabilidade pela escolha dos materiais recai sobre os ombros do profi ssional especializado em estruturas. Sua tarefa cresce dia a dia em complexidade e também em segurança, devido ao maior conhecimento teórico e das ferramentas perfeitas com que conta. Entre essas ferramentas, merecem destaque os computadores eletrônicos, que per-mitem realizar, em poucos segundos, grandes cálculos, que resultariam impossíveis de outra maneira. Com o aparecimento da Informática, os computadores possibilitaram a repetição de cálculos, permitindo considerar diversas combinações de formas, tamanhos, cargas e materiais e encontrar a melhor otimização dos problemas estruturais; enfi m, encontrar, entre as várias alternativas apreciadas, o melhor projeto. Quando for possível realizar com rapidez e economia a análise matemática de um problema excepcionalmente difícil, o projetista pode resolvê-lo ensaiando o modelo proposto através de pesquisas de laboratório. A construção de modelos em escala reduzida requer o conhecimento cabal das propriedades do material utilizado, das relações apropriadas para reproduzir compri-mentos e espessuras na escala escolhida (denominada de escala de semelhança) e das relações corretas para reproduzir, nessa escala, as cargas estáticas e dinâmicas. Existem no mundo vários laboratórios bem equipados e com pessoal sufi ciente (em qualidade e quantidade) para realizar ensaios em modelos estruturais: represas, grandes cúpulas, di-ques, barragens e outras estruturas excepcionais são projetadas em princípios norteados

74 MATERIAIS E EXIGÊNCIAS ESTRUTURAIS

nos estudos de semelhança física e mecânica. Excepcionalmente, são feitos ensaios em modelos em escala natural.

Funcionalidade

A funcionalidade estrutural refere-se às infl uências da estrutura sobre a fi nalidade para a qual se constroem as edifi cações. Além das referências já feitas no item “Fatores Mor-fogênicos” (capítulo 1), podemos dizer que, para exemplifi car, a excessiva fl exibilidade de uma estrutura pode prejudicar sua funcionalidade, se as deformações oriundas das cargas aplicadas forem incômodas aos veículos e transeuntes que sobre ela transitem. Condições piores podem surgir por ação de cargas ressonantes: uma corrente de trânsito pode pro-duzir uma vibração contínua e incômoda em toda a estrutura, afetando seriamente sua utilidade. Salas de desenho em locais onde existem efeitos vibratórios, advindos da pouca rigidez da estrutura ou de defeitos externos, são indesejáveis e desaconselhadas para o uso e para a produção da arte.

Economia

A economia nem sempre é uma exigência da Arquitetura. Alguns edifícios são cons-truídos com fi ns monumentais ou simbólicos, para enaltecer os proprietários aos olhos do público ou venerar valores espirituais. O custo destes edifícios guarda escassa relação com seu valor fi nanceiro.

O caráter utilitário da estrutura é, porém, tão fundamental que a economia infl ui. Em outras palavras, sempre é necessário obter-se um pressuposto estrutural estrito, a menos que a estrutura constitua um display publicitário, isto é, a relação custo-benefício esteja sendo avaliada. Na maior parte dos casos, o engenheiro especialista em estruturas faz estudos comparativos de custo e de forma igual aos demais fatores, escolhe a estrutura mais econômica. Em um edifício moderno, outros custos técnicos, sobretudo os relativos a instalações (calefação, ar condicionado, eletricidade, instalações hidro-sanitárias, etc.), superam em muito o custo da estrutura, que em geral não representa mais do que 20% a 30% do custo total do edifício. Portanto, uma diminuição substancial da estrutura rara-mente representa uma economia superior a uma pequena porcentagem do custo total. Ao estabelecer o custo estrutural, devemos considerar o de projeto, que representa somente 1% a 2% do custo total da edifi cação, valendo, portanto, devido ao baixo custo, saber es-colher um bom projetista.

75ESTRUTURAS | uma abordagem arquitetônica

Os fatores mais importantes no custo de uma estrutura são os materiais e a mão-de--obra. A esse respeito, hoje encontramos no mundo dois tipos básicos de economia. No primeiro, usual nos países industriais mais avançados, o custo dos materiais é relativa-mente baixo e o de mão-de-obra, relativamente alto. No segundo, corrente nos países menos desenvolvidos ou subdesenvolvidos, essa relação se inverte. A relação entre o custo do material e o da mão-de-obra infl ui de maneira fundamental na solução do problema da estrutura. No primeiro tipo de economia citado, utilizam-se equipamentos sofi stica-dos (gruas, correias transportadoras, escavadoras, compressores, ferramentas elétricas e materiais pré-fabricados) para reduzir os custos de mão-de-obra e acelerar a construção. No segundo tipo de economia, usa-se de forma abundante a mão-de-obra, tanto para o transporte como para a construção e empregam-se elementos pequenos para reduzir ao mínimo o uso de equipamentos pesados. Os materiais típicos são ladrilhos, tijolos e con-creto moldado no próprio local.

Outros fatores mais fúteis podem infl uir também de maneira decisiva no custo, tais como: exigências impostas nas normas técnicas (por exemplo, restrição ao uso de deter-minados materiais, as imposições relativas à segurança, ao fogo, etc.), a conservação da estrutura, a rapidez de construção, as imposições políticas e governamentais, o prazo de fi nanciamento, etc. Enfi m, a economia se obtém mediante o jogo recíproco de muitos e variados fatores, os quais devem ser avaliados com muito cuidado, a fi m de desenvolver o método mais apropriado de construção para cada conjunto de condições.

Estética

Não se pode negar a infl uência da estética sobre a estrutura. Ao impor seus postulados estéticos, o Arquiteto fi xa limitações essenciais ao sistema estrutural. Em realidade, o arquiteto sugere o sistema que crê mais adequado para expressar seu conceito de edifício, e raras vezes o engenheiro se acha em condições de modifi car radicalmente a proposta daquele. Em alguns casos (e assim sempre deveria proceder), o arquiteto consulta o en-genheiro desde o começo de seu projeto e este participa na concepção da obra, fazendo da Engenharia parte da expressão arquitetônica. O equilíbrio de objetivos e meios assim alcançados há de produzir, sem dúvida, uma melhor estrutura e uma Arquitetura mais satis-fatória. Uma estrutura totalmente genuína e correta conduz a resultados estéticos favoráveis; porém, alguns Arquitetos inclinam-se a ignorar por completo a estrutura como fator impor-tante à estética arquitetônica. Por exemplo, no projeto de um edifício relativamente pequeno, a importância da estrutura é limitada, sendo possível alcançar os resultados estéticos deseja-dos fazendo-se inclusões irracionais ou forçando à estrutura uma antieconomia; no extremo

76 MATERIAIS E EXIGÊNCIAS ESTRUTURAIS

oposto, os edifícios de tamanho excepcional dependem fundamentalmente da estrutura, isto é, o sistema estrutural é a razão da expressão de sua Arqui-tetura. Aqui, um enfoque incorreto da estrutura, a falta completa de sensi-bilidade e o uso equivocado de materiais ou métodos de construção podem colocar por terra, de maneira defi nitiva, a beleza do edifício, quando acabado. Tanto prevalece a infl uência da estrutura sobre a Arquitetura moderna que alguns arquitetos se perguntam: o campo do desenho arquitetônico não fi -cará, por último, nas mãos dos engenheiros? Não. Mesmo que o engenheiro participe de forma criadora do processo de desenho, sabe-se que, em uma sociedade de grupos como a nossa, seu papel se limita a colaborar com o chefe da equipe, e, em Arquitetura, o chefe é e sempre será o Arquiteto.

A estrutura, portanto, deve fazer parte integral da expressão arquitetôni-ca. Deixá-la à margem é não desejar a presença do especialista em estruturas no processo criativo.

ESTRUTURAS ÓTIMAS

O estudo dos requisitos básicos das estruturas, discutido anteriormente de forma efusiva, conduz, como é natural, a perguntar se é possível satisfazer a todos esses requisitos e obter a melhor estrutura para um problema arqui-tetônico dado. Para responder a esta pergunta, devemos saber primeiro para quem será melhor esta estrutura. Para o proprietário seria, provavelmente, a de menor custo. Para os empreiteiros, aquela que empregasse a máxima quantidade de homens/hora. Para o vendedor de um material específi co, a melhor estrutura seria aquela que utilizasse o tal material em grandes quan-tidades. Para o engenheiro especializado em estruturas, poderia ser a mais fácil de analisar, a mais digna de estudar, a mais ousada, a que lhe interes-sasse mais sob o ponto de vista de benefício monetário, a da destreza teórica ou aquela que lhe traria a satisfação, a fama pessoal. Do ponto de vista dos requisitos básicos considerados nos itens anteriores, a melhor estrutura pode ser a mais estável, a mais resistente, a mais funcional, a mais econômica ou a mais harmoniosa. Assim, pois, como é evidente, o problema de determinar a melhor estrutura não admite uma resposta única e simples. Por exemplo, a solução ótima em Engenharia Aeronáutica é sempre aquela que admite o peso mínimo como o único critério para julgar os elementos estruturais.

11 | Fachada principal do Museu Mercedes-Benz. Benz – origem do nome Carl Benz, Mercedes – origem do nome da fi lha de Carl Benz (criado por necessidade de dar nome a uma prova de competição entre carros), Stuttgart, Alemanha.

12 | Estrutura de sustentação do prédio em suas fachadas (colunas de concreto). Museu da Mercedes, Stuttgart, Alemanha.

77ESTRUTURAS | uma abordagem arquitetônica

Um problema que preocupa a todos é determinar o sistema estrutural mais leve que cubra a maior distância com o mínimo peso de material. Às vezes, um sistema parece mais leve que outro; porém, quando se aprecia a sua fl exibilidade, observa-se a necessidade de material adicional para conferir-lhe rigidez e funcionalidade.

A evolução dos sistemas estruturais é um processo lento e delicado. Isso não deve desa-lentar o estudioso na investigação de novas possibilidades, nem o engenheiro na adoção de novas técnicas. Esses devem saber, simplesmente, que um campo tão antigo e tão transitado como o das estruturas não dá novos frutos sem o aporte de um trabalho incomparavelmente maior que o necessário na aplicação corrente de princípios estabelecidos.

Afora os diversos aspectos discutidos até aqui, o mais notável e importante desenvolvi-mento da Engenharia moderna é provavelmente a busca de um modo de combinar os di-ferentes elementos de uma estrutura em um conjunto resistente às cargas, complexo, mas integrado: um contínuo. As razões para essa tendência no projeto, já conhecidas, são:

a • Economia: como resultado do emprego de uma quantidade mínima de material.b • Fator de Maior Segurança: os elementos integrantes ajudam-se entre si; assim, o

estágio fi nal do aproveitamento da capacidade resistente será alcançado com uma carga muito maior.

c • Computadores Eletrônicos: os computadores abriram uma nova dimensão para os cálculos numéricos, conduzindo a uma melhor compreensão da ação interna dessas estruturas integrais.

d • Engenheiros: há o desejo dos engenheiros de criar novas e melhores estruturas, depois de haverem experimentado uma nova liberdade e entendimento com os arquitetos contemporâneos.

Como exemplo de contínuo, entre outros, cita-se o seguinte: ao invés de legar a cada elemento estrutural uma simples, isolada e específi ca tarefa, como a uma laje a transmissão da carga vertical às vigas por fl exão, ou como a uma viga a transmissão da reação da laje à coluna, ou ainda como a uma coluna a transmissão da carga das vigas às fundações, o con-tínuo tem como objeto unir todos os elementos estruturais e, por meio de conexões fi rmes, empregar um único elemento estrutural como um órgão multidirecional de transmissão de cargas em uma estrutura.

A busca da perfeição do contínuo necessitará de um íntimo intercâmbio de idéias entre as duas profi ssões (engenheiro e arquiteto). Afora isso, o sistema estrutural mais efi ciente ditará a forma externa e o espaço interno do edifício resultante. Por esse motivo, é possível que os novos conceitos do projeto de estruturas infl uenciem a criação arquitetônica em seu conjunto, conduzindo assim a novos conceitos no projeto arquitetônico dos edifícios.

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SOLICITAÇÕES

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ESTADOS BÁSICOS DE TENSÃO E SOLICITAÇÕES

ESTADOS BÁSICOS DE TENSÃO

As estruturas deformam-se quando submetidas à ação das cargas. Mesmo que estas deformações não possam ser apreciadas a olho nu, raras vezes observadas à simples vista, as tensões correspondentes têm valores mensuráveis. As distribuições de tensão podem, muitas vezes, ser muito complexas, porém oriundas de “solicitações isoladas” ou de “so-licitações combinadas”. As primeiras são chamadas de solicitações simples, e as outras são derivadas da combinação correspondente à soma das solicitações isoladas, também conhecidas como solicitações compostas.

A partir do conhecimento das cargas (ações) atuantes, está o projetista apto a quanti-fi car os esforços solicitantes, para depois determinar as seções transversais dos elementos estruturais em análise. No caso mais geral, as tensões que atuam em uma seção são de dois tipos: normais à seção e tangenciais à mesma. As primeiras são chamadas de solici-tações produtoras de tensões normais, geralmente representadas pela letra grega o. Para exemplifi car, temos as solicitações axiais (tração e compressão) e dos momentos fl etores (fl exão). Já com referência às solicitações simples produtoras de tensões tangenciais, po-demos citar os esforços de corte (cisalhamento convencional e fl exão simples) e torção (momentos torsores). Assim, conclui-se que os estados básicos de tensão são três: tração, compressão e corte (cisalhamento), sabendo-se que a compressão e a tração, em distintas fi bras do mesmo elemento estrutural, denominam-se fl exão, a qual desempenha um papel fundamental na maioria dos sistemas estruturais.

A seguir, passaremos a defi nir os estados básicos de tensão para as respectivas solici-tações correspondentes.

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ESTADOS BÁSICOS DE TENSÃO

As estruturas deformam-se quando submetidas à ação das cargas. Mesmo que estas deformações não possam ser apreciadas a olho nu, raras vezes observadas à simples vista, as tensões correspondentes têm valores mensuráveis. As distribuições de tensão podem, muitas vezes, ser muito complexas, porém oriundas de “solicitações isoladas” ou de “so-licitações combinadas”. As primeiras são chamadas de solicitações simples, e as outras são derivadas da combinação correspondente à soma das solicitações isoladas, também conhecidas como solicitações compostas.

A partir do conhecimento das cargas (ações) atuantes, está o projetista apto a quanti-fi car os esforços solicitantes, para depois determinar as seções transversais dos elementos estruturais em análise. No caso mais geral, as tensões que atuam em uma seção são de dois tipos: normais à seção e tangenciais à mesma. As primeiras são chamadas de solici-tações produtoras de tensões normais, geralmente representadas pela letra grega o. Para exemplifi car, temos as solicitações axiais (tração e compressão) e dos momentos fl etores (fl exão). Já com referência às solicitações simples produtoras de tensões tangenciais, po-demos citar os esforços de corte (cisalhamento convencional e fl exão simples) e torção (momentos torsores). Assim, conclui-se que os estados básicos de tensão são três: tração, compressão e corte (cisalhamento), sabendo-se que a compressão e a tração, em distintas fi bras do mesmo elemento estrutural, denominam-se fl exão, a qual desempenha um papel fundamental na maioria dos sistemas estruturais.

A seguir, passaremos a defi nir os estados básicos de tensão para as respectivas solici-tações correspondentes.

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82 ESTADOS BÁSICOS DE TENSÃO E SOLICITAÇÕES

SOLICITAÇÕES SIMPLES

Tração Simples

Consideramos um reboque sendo puxado por um automóvel (Fig. 26). A corda utilizada estará submetida à tração. Tração é o estado de tensão no qual as partículas do material tendem a se separar, isto é, a carga atuante age segundo a direção do próprio eixo do elemento estrutural em apre-ciação, cujo par corresponde ao esforço normal axial de tração (Fig. 27). Como vimos, esta solicitação é produtora de uma tensão normal de tração defi nida por:

ANσ =

N = esforço normal axial de tração atuante (equivalente à carga aplicada no extremo do elemento)

A = área da seção transversal correspondente

Esta expressão traduz uma distribuição uniforme de tensões nos pon-tos da seção A considerada. Devemos notar que, pela primeira vez, atin-gimos um dos objetivos da Resistência dos Materiais, qual seja, calcular as tensões em função das solicitações. Tal expressão é válida desde que as tensões não ultrapassem o regime elástico, dependendo, então, somente da seção transversal e da magnitude da carga. Da mesma forma, devemos ob-servar que também não é válida a distribuição uniforme de tensões quan-do se verifi car a possibilidade de concentração de tensões, isto é, elementos estruturais com variação brusca de seção, peças com furos e zonas próxi-mas à aplicação das cargas.

Para exemplifi car a atuação do estado básico de tração simples, vamos analisar o comportamento dos cabos de suspensão de um elevador. Sob a ação do peso, os cabos se alongam, sendo, portanto, o alongamento tí-pico da tração atuante. O alongamento de tração, correspondente a um comprimento unitário, denomina-se deformação específi ca longitudinal à tração, defi nido por ε = ∆L/L, sendo ∆L = NL/AE, cujas grandezas já foram defi nidas neste capítulo ou foram através do estudo da Resistência dos Materiais. Quanto maior o diâmetro do cabo, menor será a deforma-ção unitária, ou seja, o alongamento é proporcional à carga por unidade de área da seção do cabo ou à tensão de tração do cabo. A relação entre ten-

T

Fig. 26 | Tração simples

83ESTRUTURAS | uma abordagem arquitetônica

são e deformação por tração é uma característica do material, denominada módulo da deformação longitudinal à tração (módulo de elasticidade à tração), defi nida por:

εE = σCertos materiais, como o concreto, rompem-se facilmente por tração;

outros, como o aço, por exemplo, são mais resistentes. O alongamento não é a única deformação que acompanha a tração. Uma medição cuidadosa do cabo, antes e depois da aplicação da carga, põe de manifesto que, ao aumento da carga, corresponderá uma diminuição da seção (redução do diâmetro). O físico francês Poisson foi o descobridor deste fato (alonga-mento do cabo x encurtamento da seção), cuja relação entre deformação transversal e longitudinal recebeu seu nome, denominada coefi ciente de Poisson, dado por:

Para o aço, seu valor está ao redor de ⅓(=0,3), e para o concreto, de ⅕ (=0,2).~

~ευ= εt

Compressão Simples

Consideremos uma pessoa sentada sobre um cadeira, os pés da mes-ma estarão submetidos à compressão (Fig. 28). Compressão simples é o estado de tensão no qual as partículas do material se aproximam entre si, ou seja, um processo inverso do estado básico de tensão anterior, isto é, a carga atua na direção do eixo da peça, porém comprime-o. Vale, portanto, a relação o = (-)N/A, onde o sinal negativo para N indica ser uma força de compressão, resultando, também, o sinal negativo para as tensões de compressão (convenção clássica da Resistência dos Materiais). Da mesma forma, a aplicação de tal relação fi ca limitada às mesmas condições da si-tuação anterior, acrescida do fenômeno de possibilidade de instabilidade do equilíbrio (fl ambagem), quando se trata de compressão em elementos estruturais cujo comprimento é muito maior do que as dimensões da se-ção transversal (peças esbeltas). Esta situação tem merecido constantes es-tudos especiais, não podendo ser abordada com a expressão referenciada.

T = 1kN

σ = 1kN / cm2

= 10 MPa = 100 kgf/cm2

Área = 1cm2

T

Fig. 27 | Tensão de tração

Fig. 28 | Compressão simples

84 ESTADOS BÁSICOS DE TENSÃO E SOLICITAÇÕES

Para exemplifi car a presença do esforço normal axial de compressão, podemos citar um pilar sobre o qual apoia-se uma viga: sua altura diminui por efeito da ação da carga oriunda da viga. O encurtamento é um fenô-meno típico da compressão; para um comprimento unitário, é, neste caso, denominado de deformação específi ca longitudinal à compressão. A re-lação entre tensão de compressão e deformação por compressão chama-se módulo de deformação longitudinal à compressão (também conhecido por módulo de elasticidade à compressão).

As deformações provocadas por compressão são de sentido contrário às produzidas por tração; há um encurtamento na direção da carga e um au-mento das dimensões da seção transversal, devido ao efeito de Poisson. Os elementos estruturais submetidos à compressão simples são, sob o ponto de vista teórico, muito comuns, pois, em última instância, todas as cargas devem se transferir ao solo. No entanto, nos dias de hoje, não é admitida de forma genérica nos cálculos estruturais a adoção da centralização das car-gas no eixo das peças comprimidas (por exemplo, nos pilares, admite-se a excentricidade das cargas, de modo a abrigar possíveis erros de construção e até mesmo de não-verticalidade absoluta de um pilar).

Os materiais incapazes de resistir à tração são, em geral, resistentes à compressão: pedras, tijolos cerâmicos e outros materiais, bem como con-creto, mármore e outras rochas artifi ciais podem absorver tensões de compressão muito elevadas. Os materiais modernos de elevada resistên-cia à compressão, tais como o aço e o alumínio, podem ser usados para a construção de pilares muito mais esbeltos do que em concreto ou pedra; porém, como foi visto, a esbeltez introduz um novo tipo de limitação: a fl ambagem. Quando uma pessoa se apoia com todo o seu corpo sobre uma esbelta bengala, esta se curva (Fig. 29). Quando a carga de compres-são aumenta lentamente, chega a um valor no qual o elemento esbelto, em vez de se limitar a diminuir seu comprimento, fl amba (encurva-se) e se rompe. Este perigoso valor chama-se carga crítica de fl ambagem do ele-mento, a qual depende fundamentalmente do material empregado, do seu comprimento, da forma da sua seção transversal e da sua vinculação dos extremos. Deve-se compreender que, do ponto de vista teórico, a coluna se curvará mesmo que seja perfeitamente homogênea e ainda que a carga se ache perfeitamente centrada. Na prática, toda pequena imperfeição na cen-

2 = Compressão

21

1 = Tração

Fig. 29 | Flambagem

85ESTRUTURAS | uma abordagem arquitetônica

tragem da carga ou toda falha existente no material facilita a instabilidade do equilíbrio, isto é, acelera o processo do aparecimento da fl ambagem.

A carga de fl ambagem é inversamente proporcional ao quadrado do comprimento de fl ambagem da coluna, e diretamente proporcional ao mó-dulo da deformação longitudinal do material e ao momento de inércia da seção; logo, quanto maior E e I, tanto maior será a carga crítica de fl amba-gem, também conhecida por carga crítica de Euler.

(lfl)2

π2EINcrit =Uma coluna de comprimento igual a duas vezes a outra e com idêntica

seção transversal tem uma resistência à fl ambagem igual a 1/4 da segunda, e uma coluna de aço tem uma resistência à fl ambagem igual a três vezes a de uma coluna idêntica, porém de alumínio.

A efi ciência à fl ambagem depende do momento de inércia I da seção e, portanto, da forma desta. A técnica é distribuir o material na seção de modo a obterem-se grandes valores de momentos de inércia, com o empre-go de quantidades mínimas - daí a razão do emprego de seções compostas (tê, duplo tê, etc.).

A carga de fl ambagem aumenta com as restrições impostas aos extre-mos do elemento comprimido. Uma coluna com um extremo livre fl amba como a metade de uma coluna de comprimento igual ao dobro da primei-ra, apoiadas em ambos os extremos; por conseguinte, sua carga crítica de fl ambagem é igual a 1/4 da carga correspondente à mesma coluna com apoio simples. Logo, um elemento com extremos engastados é mais efi -ciente do que um com extremos rotulados ou livres.

Corte Simples (Cisalhamento Convencional)

Corte ou cisalhamento é o estado de tensão no qual as partículas do material deslizam com movimento relativo umas em relação às outras. Em uniões parafusadas, os parafusos tendem a se cortar (Fig. 30). Uma perfu-radora emprega o corte para produzir furos em uma folha de papel. O peso de uma viga em balanço engastada em uma parede tende a cortar a viga junto ao engaste.

Q

Q

Fig. 30 | Cisalhamento

86 ESTADOS BÁSICOS DE TENSÃO E SOLICITAÇÕES

O cisalhamento provocado pela força de corte (força cortante) intro-duz deformações capazes de modifi car a forma de um elemento retangu-lar, convertendo-o em um paralelogramo inclinado. A distorção é medida pelo ângulo de inclinação do retângulo deformado, e não pela variação do comprimento do material, tal como sucede no caso de tração e compres-são visto anteriormente. Como mostra a Fig. 31, as forças que produzem esta deformação atuam nos planos nos quais se produz o deslizamento; sua medida, por unidade de superfície, denomina-se tensão tangencial, isto é:

AQ A = área da seção resistente ao cisalhamento,

tangente à força de corte QQ = força de corte

τ =No intervalo de comportamento elástico, a deformação é proporcional

à força e, por conseguinte, a distorção é proporcional à tensão de corte. A relação entre esta tensão e a distorção denomina-se módulo de deforma-ção transversal (módulo de elasticidade tangencial), defi nida por:

γτG =

É uma característica do material, e seu valor é aproximadamente a me-tade do módulo de deformação longitudinal à tração ou à compressão. No aço, este valor é inferior à metade, isto é:

2(1+υ)210.000 80.000 MPa

2 (1+0,33)~

E = 210.000 MPaυ = ⅓ = 0,33

EG = = =Em princípio, sob o ponto de vista teórico, a fórmula τ = Q/A não é cor-

reta para exprimir a distribuição das tensões nos pontos da seção A. En-tretanto, a experiência tem demonstrado que a adoção de tal fórmula em certas aplicações de Engenharia tem resolvido com razoável aproximação certos problemas práticos, dentro do critério de exigência de economia e segurança. Junte-se a isso o fato de que a expressão correta é relativamente complexa sob o aspecto matemático. Esta relação tem apresentado ótimos

Extremoem balanço

Distorção

Enga

ste

Deflexãode corte

γ

Fig. 31 | Deformação de corte em uma viga engastada

87ESTRUTURAS | uma abordagem arquitetônica

resultados para as ligações rebitadas, soldadas, parafusadas, etc., isto é, em ligações nas quais admite-se a distribuição uniforme das tensões τ, neste caso denominadas de cisa-lhamento convencional. Nestes problemas, os valores de τ devem ser interpretados como índices de comportamento ao cisalhamento, e não propriamente como tensão tangencial de valor constante nos pontos de seção.

Uma característica fundamental do corte é produzir deslizamento não em um só pla-no mas sim em dois planos, sempre perpendiculares entre si. Ao isolarmos um elemento retangular pertencente à seção junto ao apoio de uma viga em balanço, observa-se que, devido à ação do peso próprio, atuam forças de corte verticais sobre suas faces verticais. Estas forças tendem também a fazer girar o retângulo e, para que haja o equilíbrio à ro-tação, devem atuar sobre as faces horizontais do retângulo forças de igual magnitude e sentidos contrários. As forças horizontais necessárias para manter o equilíbrio produzem também uma tendência ao corte em planos horizontais. Assim, pois, o corte em planos verticais implica, necessariamente, em corte nos planos horizontais, e vice-versa.

A existência de forças horizontais de corte (ou de cisalhamento) pode ser vista anali-sando-se também a deformação do elemento retangular. A inclinação do elemento pro-duz um alongamento em uma de suas diagonais e um encurtamento na outra. Como o alongamento acompanha uma tração e o encurtamento, uma compressão, a mesma de-formação poderia ser obtida comprimindo o elemento na direção da diagonal maior. As-sim, pois, o corte pode ser considerado uma combinação de tração e compressão, normais entre si, em direções que formam ângulos de 45o com a direção de corte. A consideração da compressão e tração que ocorre devido ao corte é de grande importância prática. Um material de baixa resistência à tração não pode ser resistente ao corte, pois se romperá por tração em uma direção inclinada a 45o com respeito ao corte. Analogamente, uma membrana não pode ter resistência ao corte, pois fl ambará na direção do esforço de com-pressão equivalente.

A tendência do deslizamento, característica do corte, encontra-se em elementos estru-turais torcionados por ação das cargas aplicadas. Vamos considerar uma barra de seção circular e, sobre sua superfície, desenhar um quadriculado de circunferências e retas (re-ticulado). Ao se torcionar esta barra de modo que uma seção extrema gire com relação à outra, os quadrados desenhados sobre a superfície transformam-se em quadriláteros inclinados, produzindo distorção e, portanto, tensões de corte na seção da barra para manter o equilíbrio, originando-se também tensões de corte nos planos perpendiculares à seção. Este estado de tensão, ainda que cisalhamento puro, denomina-se torção. Quan-do uma dona de casa torce um pano molhado, observa-se que a compressão introduzida pela torção expulsa a água contida no pano (Fig. 32).

88 ESTADOS BÁSICOS DE TENSÃO E SOLICITAÇÕES

A rigidez à torção relaciona-se com o módulo por corte, e as seções mais efi cazes contra a torção são as ocas, que dão tensões de corte o máxi-mo braço de alavanca possível em relação ao eixo da barra.

SOLICITAÇÕES COMBINADAS

Já se disse anteriormente que todos os estados complexos de tensão são combinações de somente três estados básicos: tração, compressão e cor-te. Também vimos que o corte pode ser obtido a partir da combinação dos estados básicos de tração e compressão, sendo, portanto, a tração e a compressão os estados básicos de tensão fundamentais na maioria dos sistemas estruturais.

Os três estados básicos de tensão, combinados, dão origem à solicita-ção de fl exão, que pode ser subdividida em fl exão reta e fl exão desviada (também chamada de fl exão oblíqua), conforme o plano do momento fl e-tor coincidir ou não com o eixo principal de inércia da seção.

A compressão e a tração em distintas fi bras do mesmo elemento estru-tural denomina-se fl exão e desempenha um papel fundamental na maio-ria dos sistemas estruturais. Considera-se uma tábua apoiada em duas pe-dras, com vão central maior do que os dois vãos iguais porém em balanço. Se duas pessoas de igual peso situarem-se em ambos os extremos da tábua, estes extremos se deslocarão para baixo, enquanto a parte compreendida entre as duas pedras se curvará para cima (Fig. 33). Todas as fi bras da tábua devem se curvar: as superiores se afastam e as inferiores se aproximam, en-quanto as centrais formam o eixo neutro (também conhecido como linha neutra). Chama-se de linha neutra a reta cujos pontos têm todos tensão nula. A posição da dita reta não é conhecida “a priori”, e sua determinação constitui o principal problema do cálculo das seções. Se a fl exão é reta, conhece-se ao menos a direção da linha neutra (perpendicular ao plano de simetria) e, se é oblíqua, a determinação será bem mais delicada. Portanto, a fl exão na tábua provoca tração nas fi bras superiores e compressão nas inferiores. Além disso, a tração e a compressão aumentam em proporção direta à distância das fi bras à linha neutra.

A fl exão pode ser considerada um mecanismo estrutural capaz de ca-nalizar cargas verticais em direção horizontal. O peso das pessoas colo-cadas sobre a tábua transmite-se horizontalmente às pedras que servem

Fig. 32 | Torção

Fig. 33 | Flexão pura

89ESTRUTURAS | uma abordagem arquitetônica

de apoio à tábua. Em vista da resistência à compressão da maior parte dos materiais usados em estruturas, é relativamente fácil canalizar as cargas verticalmente ao solo; o problema fundamental é transferir as cargas ver-ticais, horizontalmente, quando se necessita de grandes vãos entre apoios verticais. A fl exão, como se vê, é fator de importância primordial como mecanismo estrutural. Quanto à fl exão, um bom material deve ter resis-tências praticamente iguais à tração e à compressão. Isto explica o predo-mínio da madeira, entre os materiais estruturais naturais, e o papel do aço, sem rival, nas estruturas modernas. O concreto armado é o único material com propriedades à fl exão comparáveis à do aço. A resistência à compres-são do concreto ocorre nas fi bras comprimidas, enquanto a resistência à tração ocorre nas fi bras tracionadas. Se, na tábua, pudéssemos colocar re-forços de aço, colocaríamos tais reforços na parte superior.

Após defi nir o que seja exatamente a fl exão, estamos aptos a identifi car o que seja fl exão reta e fl exão oblíqua.

Flexão Reta

A fl exão é dita reta quando o plano do momento fl etor coincide com um eixo principal de inércia da seção, onde a defi nição dos eixos principais de inércia se refere ao estudo da geometria das massas, geralmente abordado em Mecânica Racional. De forma explícita, entende-se por eixos princi-pais de inércia (são dois eixos perpendiculares entre si e baricêntricos) aqueles eixos onde ocorrem os valores máximo e mínimo do momento de inércia da seção considerada. Em se tratando de tensões, isto equivale a afi rmar que tais eixos defi nem a posição do ponto da seção do elemento estrutural analisado que está submetido aos valores máximo e mínimo de tensão.

A fl exão reta pode subdividir-se em:a • Flexão Pura: diz-se que uma seção está submetida a uma

solicitação de fl exão pura quando sobre ela atua tão-somente um momento fl etor M, isto é, não existe o esforço normal axial N, e também é nulo o esforço cortante Q. Uma peça submetida à solicitação de fl exão leva geralmente o nome de viga, cujo estudo será amplamente abordado em capítulo próprio. A fl exão pura se

Compressão

Tração

Fig. 34 | Flexão simples

90 ESTADOS BÁSICOS DE TENSÃO E SOLICITAÇÕES

verifi ca nas zonas das vigas onde não existe esforço cortante, isto é, onde o momento fl etor é constante.

b • Flexão Simples: diz-se que uma seção está submetida a uma solicitação de fl exão simples quando nela atuam um momento fl etor M e um esforço cortante Q, não existindo o esforço normal axial N, isto é, N=0. O estudo destas duas solicitações é feito separadamente, donde não haver necessidade de distinção entre fl exão pura e fl exão simples, para efeito de dimensionamento à fl exão (Fig. 34).

c • Flexão Composta: em contraposição, chama-se solicitação de fl exão composta a formada por um momento fl etor M e um esforço normal N (Fig. 35), ou, o que é equivalente, a solicitação produzida por uma resultante normal excêntrica, podendo ou não coexistir ainda o esforço cortante Q. As fl exões compostas podem ser de grande ou pequena excentricidade, conforme predomina o momento fl etor ou a força normal, respectivamente. As seções submetidas a uma solicitação de fl exão composta podem, segundo sua forma de trabalho, encontrar-se em três estados distintos: estado de compressão composta (se todas as fi bras da seção estão comprimidas, a resultante é uma compressão excêntrica; este estado também é conhecido por fl exo-compressão), estado de tração composta (se todas as fi bras da seção estão submetidas a uma deformação de tração, a este estado corresponde uma resultante de tração excêntrica; este estado também é conhecido por fl exo-tração) e estado de fl exão composta (se, na seção, há fi bras comprimidas e outras tracionadas, a resultante pode ser de tração ou de compressão, sendo os dois estados anteriores derivativos deste; assim, este estado é o que normalmente é chamado de fl exão composta, por ser mais geral).

A fl exo-compressão e a fl exo-tração de grande excentricidade (Fig. 36) são estudadas através de raciocínios análogos aos da fl exão. A fl exo-com-pressão de pequena excentricidade é correlacionada com a compressão simples (pilares), enquanto a fl exo-tração de pequena excentricidade é analisada sob as luzes da teoria da fi ssuração, isto é, fi ca correlacionada ao fenômeno da tração simples (tirantes). As seções de vigas estão geralmente

EsforçoNormal

TensãoUniforme

MomentoFletor

MáximaTensão deCompressão

MáximaTensão deTração

Fig. 35 | Flexão composta

91ESTRUTURAS | uma abordagem arquitetônica

submetidas à fl exão simples, enquanto os pilares estão submetidos à fl exão composta.

Flexão Oblíqua

É também conhecida por fl exão composta oblíqua, ou simplesmente por fl exão desviada, na qual o plano de atuação da solicitação não coinci-de com um dos eixos principais da inércia da seção. Portanto, denomina-se fl exão composta oblíqua aquela em que o esforço normal axial N atua com excentricidade em relação aos dois eixos principais de inércia da seção. Para as aplicações práticas, há interesse em reduzir os problemas de fl exão composta oblíqua à fl exão composta reta. Estudos comparativos com so-luções racionais do problema permitem deduzir regras empíricas aproxi-madas para esta fi nalidade, ou então por processo manual grafo-numérico, ou em programas de computação eletrônica. A solução do problema por processo rigoroso é muito trabalhosa, só sendo abordável, praticamente, com auxílio de programas de computação eletrônica específi cos.

Flambagem na Flexão Composta e na Flexão Oblíqua

O fenômeno da fl ambagem pode ou não ser considerado na análise de peças submetidas à fl exão.

a • Sem Efeito de Flambagem: em geral admitida para peças de pequena esbeltez, sendo o índice de esbeltez avaliado pela relação:

lfl = comprimento efetivo de flambagem da peça em compressãoi = raio de giro da seção consideradaI = momento de inércia da seção em relação ao eixo principal de inércia considerado

A = área da seção transversal considerada

ii

AIlfl == , sendoλ

b • Com Efeito de Flambagem: admitida para peças esbeltas (de grande esbeltez) cujo índice de esbeltez seja superior a um determinado índice λ estabelecido pelas normas, sendo necessário

Compressão Compressão

Compressão

Compressão

Tração Tração

TraçãoTração

Tração Tração

Fig. 36 | Flexo-compressão e fl exo-tração

P

Fig. 37 | Flambagem

92 ESTADOS BÁSICOS DE TENSÃO E SOLICITAÇÕES

considerar, também, os efeitos das deformações transversais sobre as solicitações e o dimensionamento (chamados de efeitos de primeira e segunda ordem). (Fig. 37)

A razão de transformar um problema de projeto e/ou de verifi cação de fl exão com-posta desviada para fl exão composta reta (em uma ou para as duas direções principais) deve-se atribuir à complexidade e ausência, até tempos muito recentes, de métodos prá-ticos para seu tratamento. Entretanto, pode-se dizer que esta situação já foi superada, principalmente após o advento do computador eletrônico.

ASPECTOS DELICADOS DO COMPORTAMENTO ESTRUTURAL

Será feita a abordagem de outros aspectos relevantes, além dos já mencionados nos itens anteriores deste capítulo, que são: até que ponto é simples uma tensão simples e procura do ponto de tensão máxima.

Até que Ponto é Simples uma Tensão Simples?

Os sistemas estruturais do tipo cabo, reticulados (treliças), vigas, arcos e pórticos po-dem ser considerados simples devido ao estado de tensão simples originado da ação das cargas externas. Por exemplo: um cabo desenvolve tração simples; um arco, compressão simples; uma treliça, tração e compressão simples; uma viga, fl exão simples ou combinada com corte simples.

Um estudo mais detalhado do modo como se transferem realmente as cargas demons-trará que as tensões desenvolvidas em uma estrutura nem sempre são tão fáceis de serem quantifi cadas como parecem, isto é, nem sempre são simples assim. Por exemplo: uma barra de uma treliça submetida à tração tem dimensionamento fácil por nela agir tão-so-mente o esforço normal axial de tração; porém, o dimensionamento da união desta barra com outra (nó de ligação) é uma tarefa já bem mais cuidadosa do que o dimensionamento puro e simples da barra. Admitindo-se que a ligação entre as barras seja com rebites, estes desenvolvem tensões de compressão na superfície interna de contato com a barra e ten-sões de corte nos rebites.

Portanto, é necessário ter em conta que a barra não trabalha somente a tração simples, sendo importante toda a atenção à complicada confi guração das tensões que surgem nos elementos de ligação. Os elementos estruturais, para serem corretamente projetados, de-vem levar em conta as complicadas confi gurações de tensão que porventura possam apa-

93ESTRUTURAS | uma abordagem arquitetônica

recer nesses elementos. Se for possível convertê-los em estados simples de tensão, melhor; porém, nem sempre isto é possível.

Procura do Ponto de Tensão Máxima

Também outra tarefa difícil; porém, quando descoberto, a condição de segurança a ele imposta dará a certeza de que todos os demais pontos das seções do elemento estarão também em segurança, por apresentarem tensões menores e, consequentemente, maior segurança do que aquela imposta no ponto de máxima tensão.

De um modo geral, os problemas de Resistência dos Materiais resumem-se a dois: a verifi cação e o projeto. No projeto, devemos conhecer as cargas e os materiais a serem utilizados, e impor os coefi cientes de segurança necessários, para, a partir de então, de-terminar a geometria das seções dos elementos estruturais que compõem a estrutura propriamente dita, lançada como concepção no projeto arquitetônico. Já num problema de verifi cação, conhecemos a estrutura, suas dimensões, o carregamento e o material uti-lizado na construção; resolver o problema de verifi cação consiste, então, em determinar o menor coefi ciente de segurança para a estrutura, isto é, calcular o coefi ciente de segu-rança no ponto mais solicitado, ou seja, encontrar nos elementos estruturais os pontos de máxima tensão.

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Mercado PúblicoArquiteto: Friedrich Heydtmann, 1861Restauro: Arq. Octacílio Rosa Ribeiro e equipe, 1989Porto Alegre - 1976

ESTRUTURAS SUBMETIDAS À

TRAÇÃO E COMPRESSÃO

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Mercado PúblicoArquiteto: Friedrich Heydtmann, 1861Restauro: Arq. Octacílio Rosa Ribeiro e equipe, 1989Porto Alegre - 1976

ESTRUTURAS SUBMETIDAS À

TRAÇÃO E COMPRESSÃO

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ESTRUTURAS SUBMETIDAS À TRAÇÃO E COMPRESSÃO

CABOS

A elevada resistência à tração, combinada com a efi ciência da tração simples, faz do cabo de aço o elemento estrutural ideal para cobrir gran-des distâncias. Os cabos são fl exíveis, devido às suas pequenas dimensões transversais em relação ao seu comprimento. A fl exibilidade indica uma limitada resistência à fl exão (Fig. 38).

Para compreender o mecanismo por meio do qual um cabo sustenta cargas verticais, devemos considerar primeiramente um cabo entre dois pontos fi xos, com somente uma carga aplicada em seu ponto médio. Sob a ação da carga, o cabo adota uma forma simétrica, triangular, e cada apoio recebe metade da carga, por tração simples ao longo de ambas as metades (Fig. 39).

Nos apoios, existe ainda o empuxo horizontal. Se os apoios não esti-verem fi xos contra deslocamentos horizontais, mover-se-ão pela ação do empuxo, e as duas metades do cabo colocar-se-ão em posição vertical úni-ca. Faça essa experiência, segurando os extremos de um cordão com um peso fi xo no meio; você verifi cará, fi sicamente, que o cordão não desenvol-ve empuxo horizontal quando você une as mãos, e desenvolve um empuxo crescente quando as separa, reduzindo, dessa maneira, a fl echa. Você veri-fi cará, também, que a tensão é inversamente proporcional à fl echa: quanto menor a fl echa, maior a tensão de tração e maior o esforço no cabo e a força que você faz. Economicamente, a fl echa ótima é aquela igual à metade da distância entre apoios, correspondente a uma confi guração simétrica com um ângulo de 45o no ponto de aplicação da carga, e empuxo e reação ver-tical iguais à metade desta. Continue a experiência deslocando a carga do ponto médio e verifi cará que o cabo troca de forma. Os dois apoios têm

07

13 | Pavilhão de Portugal: Estrutura de cabos associada a um material rígido - concreto, executada num único vão curvo de 67,50m x 50m, convexa como uma lona deitada, sustentada apenas nas extremidades longitudinais, com altura variável de 10m no centro e 13 metros nos apoios e com espessura constante de 20cm.

14 | Ponte Vasco da Gama, a maior da Europa, com comprimento de 17,2km, 10 dos quais sobre o Rio Tejo. Foi inaugurada em 4 de abril de 1998.

Mercado PúblicoArquiteto: Friedrich Heydtmann, 1861Restauro: Arq. Octacílio Rosa Ribeiro e equipe, 1989Porto Alegre - 1976

Fig. 38 | Estrutura de cabos

P

Flecha

Fig. 39 | Carga aplicada num cabo

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ESTRUTURAS SUBMETIDAS À TRAÇÃO E COMPRESSÃO

CABOS

A elevada resistência à tração, combinada com a efi ciência da tração simples, faz do cabo de aço o elemento estrutural ideal para cobrir gran-des distâncias. Os cabos são fl exíveis, devido às suas pequenas dimensões transversais em relação ao seu comprimento. A fl exibilidade indica uma limitada resistência à fl exão (Fig. 38).

Para compreender o mecanismo por meio do qual um cabo sustenta cargas verticais, devemos considerar primeiramente um cabo entre dois pontos fi xos, com somente uma carga aplicada em seu ponto médio. Sob a ação da carga, o cabo adota uma forma simétrica, triangular, e cada apoio recebe metade da carga, por tração simples ao longo de ambas as metades (Fig. 39).

Nos apoios, existe ainda o empuxo horizontal. Se os apoios não esti-verem fi xos contra deslocamentos horizontais, mover-se-ão pela ação do empuxo, e as duas metades do cabo colocar-se-ão em posição vertical úni-ca. Faça essa experiência, segurando os extremos de um cordão com um peso fi xo no meio; você verifi cará, fi sicamente, que o cordão não desenvol-ve empuxo horizontal quando você une as mãos, e desenvolve um empuxo crescente quando as separa, reduzindo, dessa maneira, a fl echa. Você veri-fi cará, também, que a tensão é inversamente proporcional à fl echa: quanto menor a fl echa, maior a tensão de tração e maior o esforço no cabo e a força que você faz. Economicamente, a fl echa ótima é aquela igual à metade da distância entre apoios, correspondente a uma confi guração simétrica com um ângulo de 45o no ponto de aplicação da carga, e empuxo e reação ver-tical iguais à metade desta. Continue a experiência deslocando a carga do ponto médio e verifi cará que o cabo troca de forma. Os dois apoios têm

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13 | Pavilhão de Portugal: Estrutura de cabos associada a um material rígido - concreto, executada num único vão curvo de 67,50m x 50m, convexa como uma lona deitada, sustentada apenas nas extremidades longitudinais, com altura variável de 10m no centro e 13 metros nos apoios e com espessura constante de 20cm.

14 | Ponte Vasco da Gama, a maior da Europa, com comprimento de 17,2km, 10 dos quais sobre o Rio Tejo. Foi inaugurada em 4 de abril de 1998.

Mercado PúblicoArquiteto: Friedrich Heydtmann, 1861Restauro: Arq. Octacílio Rosa Ribeiro e equipe, 1989Porto Alegre - 1976

Fig. 38 | Estrutura de cabos

P

Flecha

Fig. 39 | Carga aplicada num cabo

98 ESTRUTURAS SUBMETIDAS À TRAÇÃO E COMPRESSÃO

reações verticais diferentes e empuxos horizontais iguais, pois o equilíbrio horizontal continua a existir. Coloque agora outra carga, de mesmo valor, em situação simétrica à anterior. O cabo assumiu nova confi guração, e as reações verticais são novamente iguais. Continue aumentando o número de cargas, até o cabo assumir a forma de um polígono funicular: é a forma natural necessária para suportar cargas por tração. À medida que aumenta o número de cargas, o polígono funicular toma um número crescente de lados menores, até chegar a uma curva uniforme; ele se converteu em uma curva funicular, mais conhecida como parábola. A fl echa ótima para um cabo parabólico é igual à terça parte do vão. A maior aplicação dos cabos parabólicos é em pontes pênseis, chegando-se a construir vãos de cerca de 1.300m com grande economia (Fig. 40).

Essa efi cácia e economia são limitadas por um problema derivado da adaptabilidade dos cabos às cargas variáveis (ventos). Os cabos são ins-táveis, e a estabilidade constitui um dos requisitos básicos dos sistemas estruturais. Por outro lado, um cabo não constitui uma estrutura auto-portante, e seu empuxo deve ser absorvido por ancoragens em blocos de concreto, ou por outro tipo de material junto às fundações.

TRELIÇAS PLANAS

Caracterização Genérica

Considere-se agora uma estrutura alterando a posição do cabo para cima (invertendo a fi gura 39) e reforçando seus tramos, a fi m de conferir-lhe resistência à compressão. A fl echa negativa modifi ca a direção de todas as tensões, e o cabo invertido se converte, então, em uma estrutura de compressão pura. Sobre os apoios, atuam forças verticais iguais à metade da carga e empuxos dirigidos para fora. Combinando triângulos elemen-tares como na Fig. 41, obtêm-se reticulados capazes de cobrir grandes dis-tâncias por meio de elementos submetidos a tração e compressão.

Assim, por exemplo, na Fig. 41, representa-se uma treliça de reticu-lado triangular, com as barras do banzo superior e os montantes verti-cais submetidos à compressão, e as barras do banzo inferior e diagonais submetidas à tração. A carga central P1 transfere-se segundo as diagonais tracionadas até os pontos superiores A e B (o montante 00’ não transmite

Fig. 40 | Ponte pensil

P4 P2 P1 P3 P5

Banzo superior

Banzo inferiorMontantes

Diagonais

L G C O D H N

I E A O’ B F M

Fig. 41 | Treliça plana

99ESTRUTURAS | uma abordagem arquitetônica

carga alguma, pois seria impossível equilibrá-lo com as forças horizontais das barras 0’A e 0’B). A barra superior de compressão AB absorve o empu-xo, enquanto os montantes comprimidos AC e BD transmitem aos pontos C e D as reações verticais, iguais à metade de P1. A diagonal de tração CE transmite ao ponto E a reação e a carga adicional P2, e introduz tração no elemento CO do banzo inferior. A barra de compressão EA absorve o em-puxo, e o montante comprimido EG transfere a reação vertical a G. Esse mecanismo de transmissão ocorre em todas as barras, até que os últimos montantes IL e MN transfi ram o peso total da treliça aos apoios L/N. Se as cargas se aplicam somente nos nós, todas as barras estarão traciona-das ou comprimidas. Caso isso não ocorra, haverá também alguma fl exão. Agora inverta a direção das diagonais da treliça da fi gura, e verifi que o que ocorrerá com as barras. Os esforços normais axiais atuantes nas barras, também, inverter-se-ão para as montantes diagonais.

Tipos Estruturais

As treliças planas denominam-se isostáticas quando os esforços nas barras podem ser determinados pelas equações de equilíbrio da Estática, conforme visto no Capítulo 3. As treliças planas isostáticas podem ser de três categorias:

• Simples: formadas a partir de três barras ligadas em triângulo, juntando-se a estas duas novas barras para cada novo nó rotulado (Fig. 42);

• Compostas: formadas pela ligação de duas o mais treliças simples, por meio de rótulas ou barras birrotuladas (Fig. 44e);

• Complexas: treliças isostáticas que não obedecem às regras de formação de treliças simples e compostas.

As treliças mais empregadas na prática são as simples e compostas. Na Fig. 42 veem-se três tipos usuais de treliças simples, conhecidas pelos no-mes dos engenheiros que as popularizaram. Esses tipos são utilizados fre-quentemente na construção de pontes.

A treliça Howe apresenta as diagonais comprimidas e os montantes tracionados. Na treliça Pratt, as diagonais são tracionadas e os montantes comprimidos. A treliça Warren apresenta parte das diagonais comprimi-das e parte tracionada.

a

b

c

Fig. 42 | Treliças simplesa - treliça Howeb - treliça Pratt ou Nc - treliça Warren

a

b

Fig. 43 | Treliças com banzo superior curvo

100 ESTRUTURAS SUBMETIDAS À TRAÇÃO E COMPRESSÃO

Na construção de vãos grandes, obtém-se economia dando ao banzo superior da treliça uma forma curva, cujo efeito de arco reduz as solicita-ções das peças da alma (montante ou diagonais) (Fig. 43).

Para a construção de coberturas, é comum o emprego de treliças com banzo superior inclinado. Na Fig. 44, veem-se esquemas de treliças desse tipo. A treliça da Fig. 44a é muito usada para cobertura de pequenos vãos. O banzo superior e as diagonais são comprimidos, o montante vertical e o banzo inferior são tracionados. A treliça da Fig. 44b apresenta também as diagonais comprimidas, sendo os montantes tracionados, características análogas às da treliça Howe da Fig. 42a. Na treliça da Fig. 44c vê-se uma treliça cujas diagonais são tracionadas, sendo os montantes comprimidos, características análogas às da treliça Pratt da Fig. 42b.

Para reduzir o efeito da fl ambagem do dimensionamento de montantes ou diagonais, há interesse que as peças comprimidas sejam mais curtas. Sob esse aspecto, a treliça Pratt apresenta vantagem sobre a treliça Howe.

Na Fig. 44d, vê-se a treliça conhecida como do tipo belga, na qual os montantes comprimidos são perpendiculares ao banzo superior, sendo as diagonais tracionadas. Observe-se que os montantes são mais curtos que as diagonais. A mesma característica favorável se nota na treliça composta, vista na parte e da fi gura Fig. 44e e conhecida como treliça Polonceau ou Fink.

Um outro tipo de treliça triangular muito utilizada é o da Fig. 44f, deno-minada vulgarmente tesoura, devido ao cruzamento dos banzos inferiores.

A altura econômica para as treliças triangulares é da ordem de 1/6 do vão.

Disposições Construtivas

As treliças servem para cobrir grandes vãos quando dispostas parale-lamente e podem ter forma geométrica variada. Os materiais mais conve-nientes para seu uso são o aço, o alumínio e a madeira. Seu inconveniente estático é a possibilidade de ocorrência de fl ambagem nas barras compri-midas, devido à sua pequena secção. Seu inconveniente construtivo é a execução dos nós, local de encontro de várias barras, o que se consegue mediante a utilização de elementos acessórios (solda, parafusos, rebites).

a

b

c

d

e

f

Fig. 44 | Treliças de contorno triangular:a - treliça Howe de montante principalb - treliça tipo Howec - treliça tipo Prattd - treliça belgae - treliça Polonceau ou Finkf - treliça tipo tesoura

101ESTRUTURAS | uma abordagem arquitetônica

Os pormenores construtivos das treliças são muito infl uenciados pelos tipos de ligações utilizadas nos nós.

As barras das treliças podem ser simples ou múltiplas. As barras sim-ples são as mais convenientes para as peças comprimidas. No dimensio-namento das barras, são considerados dois efeitos que dependem dos nós, a saber: enfraquecimento da seção causado por entalhes ou furos e excen-tricidade das cargas axiais. As dimensões transversais de peças simples ou múltiplas devem obedecer a valores mínimos construtivos, especifi cados nas respectivas normas.

As treliças são calculadas como estruturas rotuladas nos nós. Na rea-lidade, os nós das treliças são em geral rótulas imperfeitas. Para reduzir o grau de imperfeição das rótulas, os eixos das hastes devem cruzar-se em um ponto, e a ligação deve ser compacta. Desse modo, são pequenos os momentos provocados pela rigidez dos nós.

ARCOS FUNICULARES

Invertendo-se a forma parabólica que toma um cabo sobre o qual atu-am cargas uniformemente distribuídas, obtém-se a forma ideal de um arco submetido a tensões de compressão. Os arcos são utilizados para cobrir grandes vãos, e são utilizados há muitos séculos. A forma ideal de um arco é a de uma curva funicular invertida. Estaticamente, a semicircunferência é a forma ideal para resistir a cargas radiais.

A forma parabólica é a mais usada, devido à facilidade de execução e estética (Fig. 45).

COBERTURAS COM CABOS

A efi ciência excepcional dos cabos de aço aconselha-nos seu uso na construção de grandes coberturas. Isso tem conduzido a uma grande quan-tidade de soluções engenhosas, nas quais os cabos de tração constituem os elementos essenciais de um sistema estrutural bastante complexo. A mais simples cobertura de cabos consiste em uma série destes, colocados desde a parte superior dos pilares, fl exionados entre eles, até serem ancorados no solo. A mesma estrutura da fi gura 38 poderia ter os cabos ligados entre si por meio de vigas ou placas retas, criando, assim, uma superfície poligonal

Fig. 45 | Arco em forma parabólica

Fig. 46 | Roda de bicicleta

102 ESTRUTURAS SUBMETIDAS À TRAÇÃO E COMPRESSÃO

ou teto de barril invertido. A simplicidade e o baixo custo desse sistema deveriam contribuir na sua difusão, mas os elementos retos usados para conectar os cabos são, em geral, leves, e tendem a oscilar sob a ação do vento. Para evitar este fenômeno, o material de cobertura deve ser relativa-mente pesado, e os cabos, contraventados entre si.

Um exemplo notável de estrutura construída mediante cabos de tração radiais, um arco de tração e outro de compressão, é a roda de bicicleta. Os raios se submetem à tração entre o tubo circular, também tracionado, e o anel externo, comprimido. Forma-se assim uma estrutura com elevadas tensões aprisionadas, estável ante a ação de cargas tanto radiais quanto transversais (Fig. 46).

Em Nova Iorque, construiu-se um auditório circular com duas séries de cabos conectando o anel de compressão externo aos bordos inferior e superior do cilindro central. Os cabos mantêm-se separados e tracionados por meio de montantes de altura variável. Cada par de cabos pode se sub-meter à tração adequada, por meio de regulagens. A cobertura foi feita com chapas metálicas pré-fabricadas, eliminando-se a oscilação devido à alta tensão a que os cabos estão submetidos (Fig. 47).

Em Montevidéu, Viera construiu um estádio eliminando as duas séries de cabos da roda de bicicleta, constituindo um sistema relativamente eco-nômico e apropriado para cobrir grandes áreas circulares. Uma série de ca-bos conecta um anel de aço tracionado a um anel exterior de compressão, este último de concreto armado, apoiado na estrutura exterior cilíndrica do estádio. A cobertura consiste em um grande número de lajes pré-fabri-cadas em forma de cunha, apoiadas sobre os cabos radiais. Para reduzir a instabilidade, cada placa foi carregada com sacos de areia, aplicando, dessa maneira, uma tração maior temporária nos cabos, e os espaços radiais e circunferenciais foram preenchidos com concreto; uma vez curado este concreto, todo o teto se converteu em um prato monolítico de concreto. Retirou-se então a sobrecarga de areia, com o que os cabos tendem a se encurtar, mas não podem fazê-lo devido ao teto monolítico ao qual estão aprisionados. A cúpula invertida tem, assim, rigidez, devido à pré-tensão dos cabos, e tem pouca tendência a oscilar (Fig. 48).

Outras soluções foram adotadas nos últimos tempos. Enquanto no vão máximo coberto por uma estrutura de cobertura a compressão chegou a 210m (cascas de concreto), as coberturas tracionadas podem cobrir sem

Fig. 47 | Teto de cabos protendidos de Viera

Fig. 48 | Teto tipo roda de bicicleta do Auditório de Utica, Nova Iorque

Livre

Apoio

Apoio

Fig. 49 | Ponte com cabos. Arquiteto Santiago Calatrava. Sevilha, Espanha

103ESTRUTURAS | uma abordagem arquitetônica

ou teto de barril invertido. A simplicidade e o baixo custo desse sistema deveriam contribuir na sua difusão, mas os elementos retos usados para conectar os cabos são, em geral, leves, e tendem a oscilar sob a ação do vento. Para evitar este fenômeno, o material de cobertura deve ser relativa-mente pesado, e os cabos, contraventados entre si.

Um exemplo notável de estrutura construída mediante cabos de tração radiais, um arco de tração e outro de compressão, é a roda de bicicleta. Os raios se submetem à tração entre o tubo circular, também tracionado, e o anel externo, comprimido. Forma-se assim uma estrutura com elevadas tensões aprisionadas, estável ante a ação de cargas tanto radiais quanto transversais (Fig. 46).

Em Nova Iorque, construiu-se um auditório circular com duas séries de cabos conectando o anel de compressão externo aos bordos inferior e superior do cilindro central. Os cabos mantêm-se separados e tracionados por meio de montantes de altura variável. Cada par de cabos pode se sub-meter à tração adequada, por meio de regulagens. A cobertura foi feita com chapas metálicas pré-fabricadas, eliminando-se a oscilação devido à alta tensão a que os cabos estão submetidos (Fig. 47).

Em Montevidéu, Viera construiu um estádio eliminando as duas séries de cabos da roda de bicicleta, constituindo um sistema relativamente eco-nômico e apropriado para cobrir grandes áreas circulares. Uma série de ca-bos conecta um anel de aço tracionado a um anel exterior de compressão, este último de concreto armado, apoiado na estrutura exterior cilíndrica do estádio. A cobertura consiste em um grande número de lajes pré-fabri-cadas em forma de cunha, apoiadas sobre os cabos radiais. Para reduzir a instabilidade, cada placa foi carregada com sacos de areia, aplicando, dessa maneira, uma tração maior temporária nos cabos, e os espaços radiais e circunferenciais foram preenchidos com concreto; uma vez curado este concreto, todo o teto se converteu em um prato monolítico de concreto. Retirou-se então a sobrecarga de areia, com o que os cabos tendem a se encurtar, mas não podem fazê-lo devido ao teto monolítico ao qual estão aprisionados. A cúpula invertida tem, assim, rigidez, devido à pré-tensão dos cabos, e tem pouca tendência a oscilar (Fig. 48).

Outras soluções foram adotadas nos últimos tempos. Enquanto no vão máximo coberto por uma estrutura de cobertura a compressão chegou a 210m (cascas de concreto), as coberturas tracionadas podem cobrir sem

Fig. 47 | Teto de cabos protendidos de Viera

Fig. 48 | Teto tipo roda de bicicleta do Auditório de Utica, Nova Iorque

Livre

Apoio

Apoio

Fig. 49 | Ponte com cabos. Arquiteto Santiago Calatrava. Sevilha, Espanha

difi culdades vãos superiores a 300m, com o que se espera um aumento de sua utilização (Fig. 49).

TRELIÇAS ESPACIAIS

Quando uma cobertura apoia-se em uma série de treliças paralelas, transmite as mesmas cargas que essas logo transferem aos apoios. Essas treliças paralelas formam a estrutura principal e suportam toda a carga, pois os elementos transversais (estrutura secundária) não as podem supor-tar, por serem fl exíveis. Pode-se dizer então que a ação portante de cada treliça ocorre fundamentalmente em seu próprio plano. Pode-se obter um comportamento mais integral e mais efi ciente de uma cobertura desse tipo conectando as treliças paralelas por meio de outras treliças transversais tão rígidas quanto aquelas e sem elementos fl exíveis. Nesse caso, a defor-mação de uma treliça transmite-se às adjacentes, e toda a estrutura “tra-balha” em forma mais ou menos monolítica. Essa combinação de treliças principais conectadas por treliças secundárias é muito difícil se separar, pois praticamente os dois sistemas perpendiculares entre si possuem al-gumas barras da estrutura em comum. Tais sistemas espaciais de barras articuladas denominam-se reticulados espaciais e dão-nos uma solução econômica para cobrir grandes superfícies retangulares (Fig. 50).

Os reticulados espaciais dividem-se em categorias, segundo a forma do elemento ou módulo básico utilizado para a sua geração. O mais comum e econômico é a pirâmide de base quadrada, na qual as diagonais têm o mesmo comprimento do lado da base.

Os reticulados espaciais são mais rígidos que os sistemas de treliças paralelas e podem ser menos altos. Enquanto a altura de uma treliça com banzos superior e inferior horizontais é da ordem de 1/10 do vão, nos espa-ciais ela é da ordem de 1/20 a 1/30 do vão.

Quando a superfície a cobrir é circular e o teto tem forma de cúpula, é possível subdividir a superfície desta em um número determinado de triângulos ou de polígonos regulares, cujos lados são barras articuladas. Um desenvolvimento moderno desse tipo de cobertura constitui a cúpula geodésica, na qual se usam triângulos ou pentágonos para se obter uma subdivisão em função de barras de igual comprimento. As cúpulas de re-ticulados são estruturas leves e permitem cobrir grandes vãos com uma

104 ESTRUTURAS SUBMETIDAS À TRAÇÃO E COMPRESSÃO

redução de materiais. Seu único inconveniente são as conexões entre as barras, difíceis de calcular e de construir e bastante dispendiosas.

Em superfícies circulares ou poligonais, empregam-se também - como solução de cobertura - treliças radiais conectadas mediante cilindros tra-cionados, que absorvem o empuxo horizontal.

Fig. 50 | Reticulado espacial 15 | Cobertura em treliça metálica espacial do pavilhão da área internacional na Expo 98, em Lisboa, Portugal.

16 | Estrutura metálica tubular da cobertura do Terminal 9 do aeroporto de Stuttgart, Alemanha

17 | Torre Vasco da Gama: estrutura de aço de 145 metros, construída no Parque das Nações, em Lisboa, para a Expo 98 - a Exposição Mundial de 1998. Foi projetada pelo arquiteto Regino Cruz. A construção no alto da torre é um restaurante com vista panorâmica sobre o rio Tejo e a cidade de Lisboa, projetada pelo arquiteto Nuno Leónidas.

18 | Cobertura da Estação do Oriente, articulando metrô, trem, ônibus, táxi em Lisboa, Portugal.

105ESTRUTURAS | uma abordagem arquitetônica

redução de materiais. Seu único inconveniente são as conexões entre as barras, difíceis de calcular e de construir e bastante dispendiosas.

Em superfícies circulares ou poligonais, empregam-se também - como solução de cobertura - treliças radiais conectadas mediante cilindros tra-cionados, que absorvem o empuxo horizontal.

Fig. 50 | Reticulado espacial 15 | Cobertura em treliça metálica espacial do pavilhão da área internacional na Expo 98, em Lisboa, Portugal.

16 | Estrutura metálica tubular da cobertura do Terminal 9 do aeroporto de Stuttgart, Alemanha

17 | Torre Vasco da Gama: estrutura de aço de 145 metros, construída no Parque das Nações, em Lisboa, para a Expo 98 - a Exposição Mundial de 1998. Foi projetada pelo arquiteto Regino Cruz. A construção no alto da torre é um restaurante com vista panorâmica sobre o rio Tejo e a cidade de Lisboa, projetada pelo arquiteto Nuno Leónidas.

18 | Cobertura da Estação do Oriente, articulando metrô, trem, ônibus, táxi em Lisboa, Portugal.

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Instituto Ritter dos ReisArquitetos: Charles René Hugaud e Cairo Albuquerque da SilvaPorto Alegre - 1980

VIGAS

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Instituto Ritter dos ReisArquitetos: Charles René Hugaud e Cairo Albuquerque da SilvaPorto Alegre - 1980

VIGAS

108

VIGAS

ESTRUTURAS SUBMETIDAS ÀFLEXÃO E CISALHAMENTO

As vigas fi guram entre os elementos estruturais de uso mais comum. Como a maior parte das cargas são verticais e a maioria das superfícies utilizadas são horizontais, as vigas são abundantemente usadas para trans-mitir, em direção horizontal, cargas verticais. Seu mecanismo implica uma combinação de fl exão e cisalhamento.

Um fator geométrico importante na deformação é a forma da seção. A defl exão do extremo carregado da viga em balanço deve-se à deformação do elemento originalmente reto, o qual passa a ser curvo (Fig. 51). Essa deformação requer o alongamento das fi bras superiores e o encurtamento das inferiores, ou seja, fl exão. As tensões de fl exão variam livremente des-de um valor máximo de tração na fi bra superior até um valor máximo de compressão na inferior, passando pelo eixo neutro, onde seu valor é nulo. Estas tensões tendem a girar a seção da viga. Quanto maior é o braço de alavanca (ou seja, a altura da viga), maior a resistência à fl exão. Portanto, um aumento de altura é mais proveitoso que o de largura, pois a primeira cresce com o cubo da altura (Fig.52).

Concluímos, primeiramente, pois, que as vigas devem ser bem mais al-tas do que largas. No entanto, as vigas retangulares desperdiçam material, uma vez que as tensões de fl exão variam. Próximo ao eixo neutro, a área da seção pode diminuir proporcionalmente às tensões. Essa inefi ciência pode ser remediada dispondo-se a maior parte do material da viga próximo às partes superior e inferior desta. Isso conduz a uma seção “duplo tê”, com a maior parte dos materiais nas mesas superior e inferior, unidas por uma “alma” de pequena espessura.

Outra seção efi ciente à fl exão e também à torção é a do tipo “caixão”, ou melhor, uma viga retangular vazada. Como em uma viga de concreto

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Instituto Ritter dos ReisArquitetos: Charles René Hugaud e Cairo Albuquerque da SilvaPorto Alegre - 1980

P

T

C

e

eTensão máximade compressão

Linhaneutra

Tensão máximade tração

Resultantede tensõesda flexão

L

L

h2/3h

h

2/3h

Fig. 51 | Flexão de uma viga em balanço

Fig. 52 | Infl uência da forma da seção na deformação da viga

109

VIGAS

ESTRUTURAS SUBMETIDAS ÀFLEXÃO E CISALHAMENTO

As vigas fi guram entre os elementos estruturais de uso mais comum. Como a maior parte das cargas são verticais e a maioria das superfícies utilizadas são horizontais, as vigas são abundantemente usadas para trans-mitir, em direção horizontal, cargas verticais. Seu mecanismo implica uma combinação de fl exão e cisalhamento.

Um fator geométrico importante na deformação é a forma da seção. A defl exão do extremo carregado da viga em balanço deve-se à deformação do elemento originalmente reto, o qual passa a ser curvo (Fig. 51). Essa deformação requer o alongamento das fi bras superiores e o encurtamento das inferiores, ou seja, fl exão. As tensões de fl exão variam livremente des-de um valor máximo de tração na fi bra superior até um valor máximo de compressão na inferior, passando pelo eixo neutro, onde seu valor é nulo. Estas tensões tendem a girar a seção da viga. Quanto maior é o braço de alavanca (ou seja, a altura da viga), maior a resistência à fl exão. Portanto, um aumento de altura é mais proveitoso que o de largura, pois a primeira cresce com o cubo da altura (Fig.52).

Concluímos, primeiramente, pois, que as vigas devem ser bem mais al-tas do que largas. No entanto, as vigas retangulares desperdiçam material, uma vez que as tensões de fl exão variam. Próximo ao eixo neutro, a área da seção pode diminuir proporcionalmente às tensões. Essa inefi ciência pode ser remediada dispondo-se a maior parte do material da viga próximo às partes superior e inferior desta. Isso conduz a uma seção “duplo tê”, com a maior parte dos materiais nas mesas superior e inferior, unidas por uma “alma” de pequena espessura.

Outra seção efi ciente à fl exão e também à torção é a do tipo “caixão”, ou melhor, uma viga retangular vazada. Como em uma viga de concreto

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P

T

C

e

eTensão máximade compressão

Linhaneutra

Tensão máximade tração

Resultantede tensõesda flexão

L

L

h2/3h

h

2/3h

Fig. 51 | Flexão de uma viga em balanço

Fig. 52 | Infl uência da forma da seção na deformação da viga

110 VIGAS

armado, a resistência do concreto à compressão é aproximadamente igual à 20a parte da resistência do aço à tração, a superfície de concreto deve ser muito superior à superfície de aço. Esse raciocínio conduz à seção em for-ma de “tê”, que, nas vigas em balanço, deve ser um “tê” invertido.

A rigidez fl exional de uma seção é medida pelo momento de inércia, que é proporcional à área da seção, e o quadrado da distância das áreas, ao eixo neutro (Fig. 53). As cargas concentradas nos extremos de balanços provocam maiores valores de fl exão do que uma carga distribuída ao longo da viga cuja resultante seja equivalente à da concentrada. Como o valor do momento fl etor aumenta ao se aproximar do engaste, até nele atingir o seu maior valor, as seções resistentes podem ser diferentes (Fig. 54).

Duas técnicas são usadas: a primeira é a variação na altura, desde um valor mínimo no balanço até um máximo no engaste; a segunda é a va-riação da largura no mesmo sentido. Ocorre que vigas com seção “duplo tê” de altura podem apresentar, devido à imprecisão na posição das cargas (excentricidade), torções provenientes da fl ambagem lateral da alma. Logo, precauções devem ser tomadas, como a colocação de barras de traveja-mento.

Até aqui, temos somente considerado os efeitos de fl exão numa viga engastada e em balanço. Nela, as cargas também tendem a cortar a viga no ponto de engastamento. Na realidade, a tendência ao cisalhamento apa-rece em todos os pontos da viga, e é independente do seu comprimento. Podemos realizar uma experiência (Fig. 55), tratando de levantar uma fi lei-ra de livros: não poderemos levantá-los se não os comprimirmos, criando entre eles um grau de fricção que impeça o deslizamento. A função essen-cial da alma em uma seção “duplo tê” consiste em desenvolver tensões de cisalhamento necessárias para que as duas mesas trabalhem juntas. Sem alma, cada mesa atuaria como uma viga independente, de pequena espes-sura. Vê-se, então, que a transmissão dos esforços de corte através da alma é fundamental para a ação de fl exão das mesmas e que o cisalhamento e a fl exão são interdependentes.

Em uma viga retangular, as tensões de cisalhamento se distribuem se-gundo uma lei parabólica, com o valor máximo no eixo neutro. Em uma viga em balanço com carga distribuída e uniforme, as tensões de corte aumentam desde o extremo livre até um máximo no engaste.

3x3x32x2x3 421x1x3

84

3x3x32x2x3 421x1x3

3x3x32x2 321x1

64

3x3x32x2 321x1

3x3x52x2x1 501x1x1

100

3x3x52x2x1 501x1x1

Fig. 53 | Momento de inércia de vigas

d

P kNL

3/8d

p kN/m

pL=PCarga concentradaresultante

L

L/2

Fig. 54 | Deformações devidas a cargas concentradas e distribuídas

111ESTRUTURAS | uma abordagem arquitetônica

OUTRAS CARACTERÍSTICAS DAS VIGAS EM BALANÇO

Ao segurarmos uma régua de pequena espessura entre os dedos, pode-mos verifi car que:

1 • A deformação do extremo carregado da régua em balanço aumenta rapidamente com o comprimento livre. Ao duplicar-se o comprimento, a deformação multiplica-se por 8, ou seja, pelo cubo do comprimento (Fig. 56);

2 • Quando se mantém horizontal o lado maior da régua, as deformações são muito maiores do que quando se mantém horizontal sua espessura. As deformações são inversamente proporcionais ao lado horizontal da seção e ao cubo de seu lado vertical (Fig. 57);

3 • Duas réguas idênticas, fabricadas com materiais distintos (por exemplo, aço e alumínio), submetidas à mesma carga, mostram deformações inversamente proporcionais aos módulos de elasticidade dos materiais (Fig. 58);

4 • Por último, a deformação do extremo em balanço aumenta à medida que a carga se desloca desde o engastamento até o extremo (Fig. 59).

VIGAS SIMPLESMENTE APOIADAS

Diz-se que uma viga está simplesmente apoiada quando apoia-se em ambos os extremos, de modo que esses extremos têm liberdade de girar, e a viga pode se dilatar ou se retrair em direção longitudinal. Uma carga aplicada em seu ponto médio transmite a metade para cada apoio. A viga fl exiona e se deforma devido à simetria; a seção média se desloca para bai-xo, mas se mantém na vertical. Portanto, cada metade da viga atua como um balanço invertido, com comprimento igual à metade do da viga e com uma carga igual à metade da carga total aplicada em seu extremo.

Uma viga simplesmente apoiada é mais resistente e mais rígida que um balanço de igual comprimento: pode resistir ao quádruplo de carga concentrada e, para esta carga maior, sua deformação será a quarta parte da que acusaria o balanço. Quando a mesma carga distribui-se uniforme-mente sobre a viga, as tensões se reduzem à metade e as deformações a

+

-

Fig. 55 | Esforço cortante em vigas

Pd

P2L

L

8d

a

b

a

b

Fig. 56 | Infl uência do vão sobre a deformação

112 VIGAS

5/8 dos valores que se observam com a carga concentrada e aplicada no ponto médio (Fig. 60). Em uma viga carregada com carga uniformemente distribuída, as tensões de fl exão são máximas no ponto médio. O esforço cortante é máximo junto aos apoios e anula-se no ponto médio.

A combinação do momento fl etor máximo e do esforço cortante nulo em um mesmo ponto é uma característica do comportamento das vigas simplesmente apoiadas, qualquer que seja seu tipo. As cargas distribuídas de maneira não-uniforme produzem efeitos de fl exão e corte similares. As cargas concentradas próximas dos apoios exercem escassa infl uência de fl exão, mas aumentam sua ação de corte. À medida que uma carga se apro-xima de um dos apoios, transfere a esse uma fração maior de seu valor, enquanto o outro apoio recebe uma fração cada vez menor.

Em ponto anterior, observou-se que o esforço cortante é uma combina-ção de tração e compressão perpendiculares entre si. A presença de tensões máximas de corte junto aos apoios provoca o aparecimento de fi ssuras a 45o junto aos apoios de vigas de concreto armado, devido ao inadequado reforço contra o esforço cortante. As fi ssuras são sempre perpendiculares à direção das tensões de tração, e os ferros devem ser colocados na direção destas.

As vigas de grande vão têm, em geral, alturas variáveis quando de con-creto armado e espessuras de mesas diferentes quando de aço. Essas va-riações têm a fi nalidade de evitar desperdício de material. As vigas sim-plesmente apoiadas nos extremos desenvolvem tração nas fi bras inferiores e compressão nas superiores. Nas de concreto, as barras de reforço colo-cam-se na parte inferior, e, caso necessário, aumenta-se o seu número ou sua área no centro do vão. Nas vigas de aço, as tensões de compressão, particularmente elevadas no ponto médio, podem produzir fl ambagem da mesa superior e da parte superior da alma, originando, assim, uma tração em toda a seção.

As vigas devem ser projetadas de acordo com os critérios de resistência e deformação. O segundo critério refere-se ao aspecto construtivo do apa-recimento de fl echas. Quando as vigas têm grandes vãos e cargas, devem ser construídas com uma contrafl echa, ou seja, uma deformação provoca-da para cima.

L

4d

a

b

a

b

P21

LP

21

d

Fig. 57 | Infl uência da altura e espessura na deformação

AÇOMódulo de elasticidade

210.000 MPa

ALUMÍNIOMódulo de elasticidade

70.000 MPa

PL

3d

PL

d

a

b

Fig. 58 | Infl uência do tipo de material na deformação

113ESTRUTURAS | uma abordagem arquitetônica

VIGAS ENGASTADAS E VIGAS CONTÍNUAS

Na seção anterior, observou-se que uma viga simplesmente apoiada e submetida a uma carga uniformemente distribuída não é efi ciente, pois as tensões de fl exão alcançam o valor admissível só no ponto médio, apre-sentando a curvatura máxima nesse ponto. Uma maneira de melhorar a efi ciência de uma viga consiste em deslocar os apoios para o centro do vão. A viga adquire, assim, dois balanços, e a carga aplicada sobre eles equilibra a carga atuante entre os apoios. A deformação no ponto médio diminui, e a curvatura sobre os apoios se inverte. Quando a relação entre o vão em balanço e o vão entre apoios é 1:3, as tensões sobre os apoios são de igual valor e sentido oposto ao do ponto médio e equivalem a 1/6 das registradas na mesma viga apoiada em seus extremos. Essa é a melhor distribuição de tensões que podemos obter (Fig. 61).

Uma viga engastada nos dois extremos e carregada uniformemente apresenta as tensões máximas de fl exão nos extremos. Estas tensões são iguais ao dobro das registradas no ponto médio. Sempre que uma viga pode desenvolver tensões de tração ou compressão em suas partes supe-rior e inferior, resistirá a uma carga 50% superior à que suporta uma viga idêntica simplesmente apoiada, quando não prevalece o esforço cortante (viga duplamente armada). A viga engastada é 5 vezes mais rígida que a simplesmente apoiada, ou seja, sua fl echa é 5 vezes menor (Fig. 62).

O eixo deformado de uma viga com extremos engastados inverte sua curvatura em dois pontos chamados pontos de infl exão. Neles anula-se a solicitação de fl exão e invertem-se as tensões. A ausência de tensões de fl e-xão nesses pontos indica que a viga se comporta como se estivesse simples-mente apoiada neles, pois essas tensões anulam-se nos extremos de uma viga simplesmente apoiada. Assim, uma viga com extremos engastados comporta-se como uma viga simplesmente apoiada, com um vão menor e dois extremos em balanço, e isso explica sua maior capacidade de carga e sua maior rigidez à fl exão.

As vigas com extremos engastados apresentam a vantagem adicional de uma maior resistência à torção (fl ambagem lateral) quando submetidas à compressão. Isso ocorre porque as fi bras superiores não estão compri-midas ao longo de todo o comprimento, diminuindo, portanto, o com-primento de fl ambagem, onde os extremos são engastados. Ela é 4 vezes

PL/2L/2

d

PL

1,43d

a

b

Fig. 59 | Infl uência da posição da carga na deformação

dPL

P/2 P/2

P/2 P/2

5/8d

p kN/mL

a

b

Fig. 60 | Infl uência do tipo de carregamento na deformação

114 VIGAS

mais resistente que a simplesmente apoiada. A continuidade com os outros tramos inverte a curvatura sobre os apoios e restringe a rotação dos extre-mos comuns a dois tramos. De acordo com a grandeza do vão e a rigidez dos diversos tramos, a rotação será impedida em maior ou menor grau, e cada tramo desenvolve tensões e deformações em função dessas caracte-rísticas. A continuidade de uma viga sobre vários apoios introduz novas características em seu comportamento (Fig. 63). Se cada tramo estivesse simplesmente apoiado e só um deles carregado, as tensões de fl exão e corte neste tramo resistiriam à carga. Ao restringir a rotação de seus extremos, a continuidade torna mais rígido o tramo carregado. Toda a viga participa de um mecanismo importante, e parte da carga pode-se considerar como transmitida aos tramos não carregados. As tensões devidas à continuidade vão se anulando (ou diminuindo) à medida que aumenta a distância do tramo carregado (mais carregado). A curvatura da viga contínua é máxima debaixo da carga. A continuidade aumenta a resistência de uma viga com cargas concentradas, mas seu efeito diminui com rapidez, conforme Fig. 63.

TENSÕES SECUNDÁRIAS DE FLEXÃO

Em algumas situações, as tensões de tração e compressão principais são acompanhadas por tensões secundárias. Isso ocorre em casos especiais, tais como barras de treliças metálicas soldadas, recalque diferencial em somente um apoio, deformações do sistema de pórticos de um edifício, infl uência da temperatura, etc. Essas tensões são da ordem de 20% do valor das tensões principais, e geralmente desprezadas no cálculo, devendo ser consideradas em estruturas de grandes vãos.

M

δ

p kN/m

L

L/2L/2

Deformação

Diagrama domomento fletor

M/6M/6

δ/6δ/6

p kN/m

L

Deformação

Diagrama domomento fletor

0,60L0,20L 0,20L

a

b

Fig. 61 | Deformação e diagramas de momentos fl etores (estudo comparativo)

LDiagrama domomento fletor

M

δ

p kN/m

L

L/2L/2

Deformação

Diagrama domomento fletor

M/3

2M/3

δ/5

p kN/m

Pontos deInflexão

0,58L0,21L 0,21L

Deformação

a

b

Fig. 62 | Deformação e diagramas de momentos fl etores

4P/10 7P/101,5P/10

0,5P/10

L

L/3 L/3 L/3

Diagrama do momento fletor

Deformação P

Fig. 63 | Deformação e diagramas de momento fl etor para uma viga contínua (carga concentrada)

115ESTRUTURAS | uma abordagem arquitetônica

mais resistente que a simplesmente apoiada. A continuidade com os outros tramos inverte a curvatura sobre os apoios e restringe a rotação dos extre-mos comuns a dois tramos. De acordo com a grandeza do vão e a rigidez dos diversos tramos, a rotação será impedida em maior ou menor grau, e cada tramo desenvolve tensões e deformações em função dessas caracte-rísticas. A continuidade de uma viga sobre vários apoios introduz novas características em seu comportamento (Fig. 63). Se cada tramo estivesse simplesmente apoiado e só um deles carregado, as tensões de fl exão e corte neste tramo resistiriam à carga. Ao restringir a rotação de seus extremos, a continuidade torna mais rígido o tramo carregado. Toda a viga participa de um mecanismo importante, e parte da carga pode-se considerar como transmitida aos tramos não carregados. As tensões devidas à continuidade vão se anulando (ou diminuindo) à medida que aumenta a distância do tramo carregado (mais carregado). A curvatura da viga contínua é máxima debaixo da carga. A continuidade aumenta a resistência de uma viga com cargas concentradas, mas seu efeito diminui com rapidez, conforme Fig. 63.

TENSÕES SECUNDÁRIAS DE FLEXÃO

Em algumas situações, as tensões de tração e compressão principais são acompanhadas por tensões secundárias. Isso ocorre em casos especiais, tais como barras de treliças metálicas soldadas, recalque diferencial em somente um apoio, deformações do sistema de pórticos de um edifício, infl uência da temperatura, etc. Essas tensões são da ordem de 20% do valor das tensões principais, e geralmente desprezadas no cálculo, devendo ser consideradas em estruturas de grandes vãos.

M

δ

p kN/m

L

L/2L/2

Deformação

Diagrama domomento fletor

M/6M/6

δ/6δ/6

p kN/m

L

Deformação

Diagrama domomento fletor

0,60L0,20L 0,20L

a

b

Fig. 61 | Deformação e diagramas de momentos fl etores (estudo comparativo)

LDiagrama domomento fletor

M

δ

p kN/m

L

L/2L/2

Deformação

Diagrama domomento fletor

M/3

2M/3

δ/5

p kN/m

Pontos deInflexão

0,58L0,21L 0,21L

Deformação

a

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Fig. 62 | Deformação e diagramas de momentos fl etores

4P/10 7P/101,5P/10

0,5P/10

L

L/3 L/3 L/3

Diagrama do momento fletor

Deformação P

Fig. 63 | Deformação e diagramas de momento fl etor para uma viga contínua (carga concentrada)

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Viaduto Otávio RochaArquiteto: Manuel ItaquiPorto Alegre - 1928

PÓRTICOSE ARCOS

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Viaduto Otávio RochaArquiteto: Manuel ItaquiPorto Alegre - 1928

PÓRTICOSE ARCOS

118

PÓRTICOS E ARCOS

PILAR-E-VIGA

Há muito tempo, usa-se o sistema pilar-e-viga (Fig. 64), que é um sis-tema aporticado mais sensível, com a separação das funções portante e protetora. A viga suporta a carga de cobertura, e os pilares, submetidos à compressão, suportam as cargas transmitidas pela viga e as cargas hori-zontais do vento, que provocam uma fl exão lateral. Os pilares transmitem as cargas às fundações (sapatas, estacas, tubulões, etc.) e, estas, ao solo.

O sistema pilar-e-viga pode ser construído um sobre o outro para le-vantar edifícios de muitos pisos. Neste caso, as vigas apoiam-se em colu-nas verticais ou em paredes de alvenaria. Este último tipo de construção pode resistir bem a cargas verticais; porém, não ocorre o mesmo com as horizontais, pois os elementos de alvenaria possuem escassa resistência à fl exão, e não se estabelece facilmente uma forte conexão entre os elemen-tos estruturais horizontais e verticais.

PÓRTICO SIMPLES

A ação do sistema pilar-e-viga modifi ca-se substancialmente ao se criar uma união rígida entre eles. Esta estrutura, o pórtico rígido simples ou de uma nave (Fig.65), comporta-se de maneira monolítica e é mais resisten-te tanto às cargas verticais como às horizontais. Submetida a uma carga uniforme, a viga de um sistema pilar-e-viga deforma-se, e seus extremos giram livremente em relação aos pilares, que se mantêm verticais.

A fi m de compreender a ação do pórtico rígido submetido à mesma carga, devemos considerar primeiro a viga horizontal como engastada e os pilares como rigidamente conectados aos extremos dela, de modo a afastarem-se em posição retilínea. Para restabelecer os pés das colunas em sua posição original, é necessário deslocá-los para dentro mediante forças

09

Sapata

Pilar

Viga

Fig. 64 | Sistema de pilar - e - viga

Sapata

Pórtico

Fig. 65 | Pórtico simples

Viaduto Otávio RochaArquiteto: Manuel ItaquiPorto Alegre - 1928

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PÓRTICOS E ARCOS

PILAR-E-VIGA

Há muito tempo, usa-se o sistema pilar-e-viga (Fig. 64), que é um sis-tema aporticado mais sensível, com a separação das funções portante e protetora. A viga suporta a carga de cobertura, e os pilares, submetidos à compressão, suportam as cargas transmitidas pela viga e as cargas hori-zontais do vento, que provocam uma fl exão lateral. Os pilares transmitem as cargas às fundações (sapatas, estacas, tubulões, etc.) e, estas, ao solo.

O sistema pilar-e-viga pode ser construído um sobre o outro para le-vantar edifícios de muitos pisos. Neste caso, as vigas apoiam-se em colu-nas verticais ou em paredes de alvenaria. Este último tipo de construção pode resistir bem a cargas verticais; porém, não ocorre o mesmo com as horizontais, pois os elementos de alvenaria possuem escassa resistência à fl exão, e não se estabelece facilmente uma forte conexão entre os elemen-tos estruturais horizontais e verticais.

PÓRTICO SIMPLES

A ação do sistema pilar-e-viga modifi ca-se substancialmente ao se criar uma união rígida entre eles. Esta estrutura, o pórtico rígido simples ou de uma nave (Fig.65), comporta-se de maneira monolítica e é mais resisten-te tanto às cargas verticais como às horizontais. Submetida a uma carga uniforme, a viga de um sistema pilar-e-viga deforma-se, e seus extremos giram livremente em relação aos pilares, que se mantêm verticais.

A fi m de compreender a ação do pórtico rígido submetido à mesma carga, devemos considerar primeiro a viga horizontal como engastada e os pilares como rigidamente conectados aos extremos dela, de modo a afastarem-se em posição retilínea. Para restabelecer os pés das colunas em sua posição original, é necessário deslocá-los para dentro mediante forças

09

Sapata

Pilar

Viga

Fig. 64 | Sistema de pilar - e - viga

Sapata

Pórtico

Fig. 65 | Pórtico simples

Viaduto Otávio RochaArquiteto: Manuel ItaquiPorto Alegre - 1928

120 PÓRTICOS E ARCOS

horizontais, e os extremos da viga devem girar para trás. Em sua posição fi nal, tanto a viga como as colunas do pórtico curvam-se e desenvolvem tensões de fl exão. A viga tem extremos elasticamente engastados e com-porta-se como o vão central de uma viga contínua com 4 apoios.

O ato de conectar rigidamente os elementos horizontais e verticais do pórtico produz, de imediato, três consequências:

1 • A viga tem extremos elasticamente engastados, torna-se mais rígida e pode resistir a maior carga à fl exão;

2 • Os pilares estão submetidos não somente à carga de compressão, como também a tensões de fl exão devidas à continuidade da viga;

3 • Para manter o pórtico em equilíbrio sob a ação de cargas verticais, é necessária uma nova força horizontal, o empuxo, que devolve às colunas sua posição vertical e introduz compressão na viga (esse empuxo obtém-se pela própria resistência da rocha da fundação ou pela construção de contrafortes, tensores ou estacas inclinadas).

Os três elementos do pórtico simples estão submetidos à fl exão e à com-pressão. A primeira predomina nas vigas, e a segunda, nas colunas. O pé da coluna pode ser rotulado ou engastado. Em geral, a primeira solução usa-se em pórticos de aço e a segunda, em concreto. Nas colunas rotuladas, as tensões de tração aparecem nas fi bras externas e as de compressão, nas fi bras internas.

As deformações que sofre um pórtico engastado no extremo inferior demonstram que as colunas desenvolvem um ponto de infl exão, ou seja, um ponto onde não se desenvolvem tensões de fl exão. Por conseguinte, ele é mais rígido que o rotulado, e não requer valor tão alto de empuxo.

Os pórticos são mais resistentes às cargas verticais do que o sistema pilar-e-viga, mas seu comportamento apresenta ainda maiores vantagens quando se trata de resistir a cargas laterais. Um pilar submetido à ação de uma carga horizontal atua como uma viga em balanço, sem colaboração da viga ou do outro pilar. O pórtico, devido à continuidade do pilar com a viga, transfere parte da carga à coluna oposta; dessa forma, metade da car-ga passa à coluna oposta, e as tensões de fl exão reduzem-se pela metade. Como as vigas ligam-se rigidamente com as colunas, passam a oferecer também uma restrição adicional. É dessa forma que o pórtico suporta as

a

b

Fig. 66 | Pórticos múltiplos

121ESTRUTURAS | uma abordagem arquitetônica

cargas provenientes do vento. Em ambos os tipos de pórticos, é necessário considerar que as cargas laterais podem atuar em qualquer dos lados, de modo que o dimensionamento do pórtico deve prever tal fato.

Uma forma de minorar as deformações do pórtico é usar diagonais de tração ou compressão, com reduzido aumento de material.

PÓRTICOS MÚLTIPLOS

As vantagens da continuidade podem ser aproveitadas usando-se pórti-cos múltiplos, nos quais utilizam-se 3 ou mais colunas para suportar uma viga horizontal, e esta, por sua vez, conecta-se rigidamente com as colunas. Dada a rigidez dos elementos comprimidos em um pórtico múltiplo, as deformações das colunas são pequenas, tanto na direção lateral quanto na vertical (Fig. 66).

Os pórticos múltiplos absorvem cargas laterais com bastante efi ciência. A rigidez da viga ante cargas de compressão faz com que os deslocamentos laterais de todas as colunas resultem praticamente idênticos. Todas as co-lunas do pórtico recebem partes iguais da carga lateral e funcionam como uma viga em balanço. Os pórticos múltiplos com uma viga podem cobrir grandes vãos e resistir a grandes cargas. Os pórticos onde o número de vigas é superior a um melhoram ainda mais a efi ciência estrutural, e são empregados em edifícios (quando a estrutura cobre grandes vãos), sendo fundamental contar com vãos sem colunas intermediárias (vigas Vieren-deel).

Em estruturas altas, usam-se pórticos de plantas múltiplas, com naves superiores. Ante a ação de cargas verticais, esses comportam-se do mesmo modo que os pórticos simples, com a vantagem de que as vigas horizontais atuam ao mesmo tempo como elementos portantes para um piso determi-nado e como tensores para o pórtico imediatamente superior. À medida que aumenta a largura e a altura do edifício, torna-se prático aumentar o número de naves nos dois sentidos, reduzindo-se assim o vão das vigas e absorvendo as cargas horizontais de maneira mais econômica. A estrutura resistente do edifício converte-se, desse modo, em um pórtico com uma série de malhas regulares, que permitem a livre circulação em seu interior e é capaz de resistir tanto a cargas horizontais como verticais. Uma sé-rie desses pórticos, nas duas direções paralelas entre si e unidos por vigas

Pavimentos-tipo

Fig. 67 | Edifício Sears Tower (Chicago, EUA)

122 PÓRTICOS E ARCOS

horizontais, constitui a estrutura tipo janela, que encontramos hoje na maioria dos edifícios de aço ou de concreto armado. Esses pórticos tri-dimensionais atuam integralmente contra cargas horizontais de qualquer direção, pois suas colunas podem ser consideradas como parte de um ou outro de dois sistemas de pórticos perpendiculares entre si.

O Empire State Building, um dos edifícios mais altos do mundo, tem 102 pavimentos e uma altura de 442m, e foi construído nesse sistema es-trutural, com o material aço, em 1930. Em concreto armado, chega-se até a altura de 260 m. Outro exemplo que pode ser citado é o edifício Sears Tower (Chicago, EUA). Com 443m de altura, 110 pavimentos, 362.000m2 de área construída e concluído em 1974.

As cargas verticais aplicadas nos pisos desses edifícios acumulam-se desde a parte superior até a inferior, exigindo colunas de maior tamanho à medida que se aproximam do pavimento térreo. As cargas horizontais do vento sobre arranha-céus fazem com que os mesmos trabalhem como se fossem balanços engastados nas fundações e, consequentemente, o extre-mo superior do edifício oscila alguns centímetros.

As colunas e as vigas de uma estrutura porticada constitui seu esquele-to resistente. A estrutura dos pisos consiste em vigas largas que conectam os pórticos principais, vigas secundárias ou contraventamentos entre as principais e lajes de concreto armado.

PÓRTICOS DE DUAS ÁGUAS

Sob a ação de cargas verticais, os três elementos de um pórtico simples acham-se submetidos a esforços de compressão e fl exão. As cargas apli-cadas na viga produzem compressão nas colunas, e estas ainda fl exionam devido ao engaste que as conecta rigidamente àquelas. A viga fl exiona, e o empuxo no pé das colunas as comprime. Nas dimensões usuais de vigas e colunas, a compressão predomina nas últimas e a fl exão, nas primeiras (Fig. 68).

Sempre que, por motivos funcionais, o elemento superior do pórtico deva ser horizontal, esse tipo de solução resulta efi ciente e econômico, mas é possível melhorá-lo quando o elemento pode ser curvo. Nos pórticos de duas águas, o elemento superior consiste em duas vigas inclinadas. Se elas estiverem articuladas em seus extremos superior e inferior, atuarão como

Fig. 68 | Pórtico de duas águas

Tensor

Fig. 69 | Arco atirantado

123ESTRUTURAS | uma abordagem arquitetônica

barras comprimidas de uma treliça. A continuidade entre a parte superior e as colunas introduz fl exão, de sorte que o pórtico transmite as cargas mediante uma combinação de compressão e fl exão de todos os seus ele-mentos. Quanto mais inclinado o par de vigas, maior será a compressão e menor a fl exão.

ARCOS

O princípio aplicado nos pórticos acima pode se ampliar. É possível sec-cionar as colunas e dobrar a parte superior, de forma a obter mais de dois lados retos, com o que aumenta a compressão e diminui a fl exão. O pórtico com um número infi nito de tramos curtos converte-se em um arco. No arco, ainda existirá sempre uma combinação de compressão e fl exão.

Nos arcos de aço, devido à alta resistência à tração do material, rara-mente a fl exão tem importância crítica. Quando o material da fundação ou o sistema de apoio não é apropriado para absorver o empuxo, isso pode ser feito mediante um tensor (Fig. 69). Sob o ponto de vista puramente es-trutural, o arco gótico é o mais vantajoso. Praticamente, usam-se os arcos parabólicos. Quanto menor a fl echa do arco, maior será seu empuxo.

Os arcos podem ter apoios engastados ou articulados, sendo que os úl-timos permitem a rotação junto aos apoios, ante a ação das cargas e as va-riações de temperatura, sendo relativamente fl exíveis e com baixas tensões de fl exão. Os arcos engastados são mais rígidos e sensíveis a qualquer mo-vimento da estrutura. Sendo hiperestáticos, podem ter menores dimen-sões. Os arcos de concreto são deste grupo, enquanto os de madeira e aço podem ser dos dois tipos.

Para evitar problemas de temperatura e recalque, é necessário intro-duzir uma terceira articulação na coroa do arco, formando, assim, o arco triarticulado, tipo mais comum em nosso meio, o que facilita sua execu-ção.

Existem arcos construídos cobrindo vãos de mais de 500m, donde con-cluímos ser essa uma boa solução para cobrir grandes vãos (Fig. 70).

Fig. 70 | Ponte em arcos múltiplos

Fig. 71 | Estrutura em arcos radiais

124 PÓRTICOS E ARCOS

COBERTURAS EM ARCO

Uma das combinações mais simples para coberturas é uma série de ar-cos paralelos, conectados mediante elementos transversais (terças) e co-bertos por telhas. Os elementos de conexão transferem a carga das telhas aos arcos, e estes as transferem para as fundações.

Em áreas retangulares, os arcos são dispostos segundo as diagonais e/ou segundo a menor dimensão. Em áreas circulares ou de contorno curvo, os arcos são convergentes e unidos, no ponto mais alto, por um anel (Fig. 71).

Uma série de arcos paralelos, obliquamente dispostos em relação aos lados de uma área retangular, interceptando outra série de arcos oblíquos, constitui um sistema efi ciente, pois entre as séries obtém-se uma ação recí-proca. Esse sistema prescinde de vigas destinadas a conectar entre si os ar-cos paralelos e constitui um pórtico espacial curvo (lamelas). Tal efi ciência ocorre particularmente quando os lados do retângulo não diferem muito em dimensão, pois em tal caso os arcos próximos aos ângulos do retângulo possuem vãos pequenos e são muito rígidos, reduzindo o vão efetivo dos arcos que se apoiam sobre eles. As coberturas de lamelas empregam-se para criar tetos em abóbadas.

19 | Cobertura metálica da Cobertura da Estação Central de Santiago, Chile.

20 | Vista interna do Shopping Vasco da Gama em Lisboa, Portugal.

21 | Vista da fachada do Shopping Vasco da Gama em Lisboa, Portugal.

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PlanetárioArquitetos: Fernando Gonzales e Walter BeredPorto Alegre - 1971

ENTRAMADOS, PLACAS E GRELHAS

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PlanetárioArquitetos: Fernando Gonzales e Walter BeredPorto Alegre - 1971

ENTRAMADOS, PLACAS E GRELHAS

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ENTRAMADOS, PLACAS E GRELHAS

TRANSFERÊNCIA DE UMA CARGA EM DUAS DIREÇÕES

Os elementos estruturais considerados até agora (cabos, vigas, arcos, pórticos, vigas contínuas) têm em comum a propriedade de transferir car-gas em uma só direção: denominam-se estruturas resistentes unidimen-sionais.

Para cobrir uma área retangular, pode-se usar esses elementos, mas tal procedimento em geral resulta pouco prático e inefi ciente. A transferência de cargas produz-se sempre segundo a direção das vigas, e as cargas são absorvidas pelas duas paredes transversais, enquanto as paredes paralelas às vigas não suportam carga alguma (Fig. 72).

Essas considerações sugerem que, do ponto de vista estrutural, seria mais efi ciente ter uma transferência bidirecional de carga, o que se obtém mediante entramados, placas ou grelhas, estruturas resistentes bidimen-sionais que atuam em um plano.

ENTRAMADOS RETANGULARES

Duas vigas idênticas simplesmente apoiadas, perpendiculares entre si, colocadas uma sobre a outra e aplicando-se em sua intersecção uma car-ga concentrada, transferem aos apoios extremos de ambas as vigas aquela carga, ou seja, transferem em duas direções (Fig. 73). Desde que uma viga maior apoie-se sobre a menor, ambas sofrem igual deformação e, como são idênticas, cada uma deve resistir à metade da carga. Portanto, cada uma das reações de apoio é igual à quarta parte da carga, e a transferência em duas direções reduz as cargas nos apoios à metade do valor que teriam com a transferência em uma só direção.

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p. L/2

P

p. L/2

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Fig. 72 | Transferência de cargas em uma direção

P

P/4P/4

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Fig. 73 | Transferência de cargas em duas direções

PlanetárioArquitetos: Fernando Gonzales e Walter BeredPorto Alegre - 1971

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ENTRAMADOS, PLACAS E GRELHAS

TRANSFERÊNCIA DE UMA CARGA EM DUAS DIREÇÕES

Os elementos estruturais considerados até agora (cabos, vigas, arcos, pórticos, vigas contínuas) têm em comum a propriedade de transferir car-gas em uma só direção: denominam-se estruturas resistentes unidimen-sionais.

Para cobrir uma área retangular, pode-se usar esses elementos, mas tal procedimento em geral resulta pouco prático e inefi ciente. A transferência de cargas produz-se sempre segundo a direção das vigas, e as cargas são absorvidas pelas duas paredes transversais, enquanto as paredes paralelas às vigas não suportam carga alguma (Fig. 72).

Essas considerações sugerem que, do ponto de vista estrutural, seria mais efi ciente ter uma transferência bidirecional de carga, o que se obtém mediante entramados, placas ou grelhas, estruturas resistentes bidimen-sionais que atuam em um plano.

ENTRAMADOS RETANGULARES

Duas vigas idênticas simplesmente apoiadas, perpendiculares entre si, colocadas uma sobre a outra e aplicando-se em sua intersecção uma car-ga concentrada, transferem aos apoios extremos de ambas as vigas aquela carga, ou seja, transferem em duas direções (Fig. 73). Desde que uma viga maior apoie-se sobre a menor, ambas sofrem igual deformação e, como são idênticas, cada uma deve resistir à metade da carga. Portanto, cada uma das reações de apoio é igual à quarta parte da carga, e a transferência em duas direções reduz as cargas nos apoios à metade do valor que teriam com a transferência em uma só direção.

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Fig. 72 | Transferência de cargas em uma direção

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Fig. 73 | Transferência de cargas em duas direções

PlanetárioArquitetos: Fernando Gonzales e Walter BeredPorto Alegre - 1971

128 ENTRAMADOS, PLACAS E GRELHAS

Duas vigas perpendiculares entre si devem sofrer, em sua intersecção, igual deformação, ainda que tenham distintos comprimentos ou distintas seções. Sem dúvida, requer-se uma carga maior para produzir igual defor-mação em uma viga mais rígida que em uma mais fl exível. Uma viga mais rígida, portanto, absorverá uma maior parte da carga que a viga fl exível, e as cargas nos apoios não serão iguais. Vemos, então, que a transmissão em duas direções é efi ciente se ambas as vigas são de igual (ou quase igual) ri-gidez. Se uma delas é muito mais rígida que a outra, absorve a maior parte da carga, e a transmissão se produz quase que em uma só direção. Para se obter uma transmissão efi ciente em duas direções, tratando-se de vãos desiguais, a viga maior deve ter uma seção consideravelmente mais rígida, isto é, ter maior momento de inércia.

A distribuição de uma carga concentrada entre duas vigas pode se am-pliar a uma série de cargas, dispondo-se uma viga sobre duas ou mais vigas perpendiculares, uma sob cada carga. (Fig. 74)

É possível cobrir uma área retangular por meio de um entramado de vigas perpendiculares entre si e obter-se transferência de carga em duas direções, em qualquer das intersecções do entramado. Se todas as vigas de uma direção forem dispostas sobre as da outra direção, as primeiras atu-am como vigas contínuas sobre apoios fl exíveis, constituídos pelas vigas inferiores. Obtém-se melhor ação recíproca entre os dois sistemas de vigas alternando-se os apoios, de modo que suas posições relativas invertam-se em cada intersecção.

Os sistemas entramados são particularmente efi cientes para transferir cargas concentradas, fazendo com que toda a estrutura participe da ação portante. Essa efi ciência ocorre não somente na melhor distribuição das cargas sobre os apoios, como também na relação altura/vão dos entrama-dos retangulares. Essa relação nos sistemas de vigas paralelas empregadas na construção comum varia entre 1/10 e 1/20, de acordo com o material das vigas. As vigas de aço podem ter menor altura que as vigas de concreto protendido; as de concreto armado terão maior altura, e será ainda maior a altura das vigas de madeira; mas a relação altura/vão não pode ser muito inferior a 1/20 para que as vigas sejam praticamente aceitáveis do ponto de vista de resistência e deformação. Os sistemas de entramados retangulares podem se projetar de forma econômica com a relação altura/vão desde

0,095P

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Fig. 74 | Entramado retangular

aa b

Fig. 75 | Entramados retangular e oblíquo

129ESTRUTURAS | uma abordagem arquitetônica

1/30 até 1/40. Acumulada em um grande número de pavimentos, essa redução implica uma diminuição do custo da estrutura.

ENTRAMADOS OBLÍQUOS

Podemos ter uma economia adicional na altura de pisos e nos custos totais de um edifício empregando entramados oblíquos, cujas vigas não são paralelas aos lados do re-tângulo, ou seja, formando um ângulo com esses lados (Fig. 75).

No caso de áreas retangulares com um lado muito maior que outro, os dois sistemas de vigas do entramado oblíquo não cobrem vãos muito distintos, e diminuem bastante as perdas da ação bidirecional. As vigas correspondentes aos vértices do retângulo são mais curtas e mais rígidas que as demais e proporcionam apoio mais resistente às vigas que se cruzam. Para cargas concentradas no centro da placa, e inclusive para cargas uniforme-mente distribuídas, esses apoios rígidos produzem uma inversão na curvatura das vigas maiores, que se comportam como se estivessem engastadas nos extremos, ao invés de se acharem simplesmente apoiadas. Como toda viga de extremos engastados submetida a cargas uniformes tem uma capacidade superior em 50% à de uma viga idêntica, mas sim-plesmente apoiada, os entramados oblíquos possuem o dobro de efi ciência estrutural. Em geral, a relação altura/vão chega a ser da ordem de 1/40 a 1/60.

Constroem-se também pórticos espaciais segundo o princípio do entramado oblíquo. Os arcos dos tetos lamelares, que se cruzam formando ângulos diferentes de 90o, esten-dem o princípio dos entramados aos elementos curvos. A rigidez das uniões introduz tor-ção nos arcos, agregando assim outro mecanismo resistente aos de compressão e fl exão.

PLACAS

A ação bilateral dos entramados de viga deve-se à união pontual em suas intersecções. Esse efeito é ainda mais pronunciado quando os espaços dos entramados são preenchidos com lajes ou placas, fazendo do teto ou do piso uma estrutura quase monolítica. As van-tagens de uma estrutura totalmente monolítica com ação bidirecional em todos os pontos seriam ainda mais pronunciadas. Uma placa ou laje é um elemento estrutural monolítico de espessura relativamente pequena, usado para cobrir uma área geralmente de forma retangular, conectadas em sua periferia. A placa comporta-se como um conjunto de vigas soldadas que transferem a carga aos apoios mediante as menores tensões possíveis (Fig. 76).

130 ENTRAMADOS, PLACAS E GRELHAS

Observa-se, então, que toda placa é capaz de desenvolver a ação de en-tramado em qualquer direção. Pode-se conceber, pois, qualquer ponto da placa como a intersecção de duas vigas pertencentes a um sistema de en-tramado retangular e que, por um ponto de uma placa, passa um número qualquer de sistemas de entramados retangulares. O cálculo das tensões de fl exão em um ponto demonstra que existem duas direções para as quais as tensões de fl exão são, respectivamente, máxima e mínima, e o corte é nulo: são as direções principais. Os momentos fl etores, nos cantos das placas de concreto armado, provocam fi ssuras paralelas à bissetriz na face inferior e perpendiculares a ela na face superior. As barras de reforço de-vem ser colocadas perpendicularmente às fi ssuras.

Em item anterior, viu-se que os sistemas retangulares de entramados perdem a maior parte de seu efeito bidirecional quando um dos lados do retângulo é muito maior que o outro. As placas mostram conduta análoga.

A deformação central da placa é somente 15% menor que a deformação das vigas transversais paralelas a seus lados menores. A tensão máxima da placa é somente 20% menor que na viga curta equivalente. A maior parte da carga transmite-se aos apoios dos lados maiores, pois o vão menor é muito mais rígido que o maior. As condições de apoio podem diferir nos quatro lados de uma placa. Esta pode ter dois lados paralelos simplesmente apoiados e dois bordos paralelos engastados. Nesse caso, a maior rigidez dos lados maiores, devido ao fato de serem fi xos, pode compensar a grande relação entre dimensões dos lados: a placa mostra comportamento bidi-recional comparável ao de um quadrado com quatro lados simplesmente apoiados. Analogamente, uma placa pode ter dois lados adjacentes sim-plesmente engastados e dois outros sem apoio algum, e assim por diante.

As placas retangulares podem se apoiar em mais de um bordo. Em pro-jetos de edifi cação ou de pavilhões industriais, é comum apoiar as lajes de piso sob uma parede exterior ou sob uma série de colunas e no núcleo interno, dentro do qual se dispõem os elevadores, condutores de ar con-dicionado e outros elementos dos sistemas mecânico, elétrico e sanitário. Obtém-se, desta maneira, uma zona de piso totalmente livre.

O bordo de uma placa pode ter diversas formas. Ao invés de cobrir uma área retangular, pode cobrir uma poligonal ou circular. Seus comporta-mentos não diferem substancialmente do correspondente a uma placa quadrada. As lajes podem se apoiar também em colunas bem engastadas

Fig. 76 | Placa com transferência de carga em duas direções

Fig. 77 | Laje cogumelo ou laje plana

131ESTRUTURAS | uma abordagem arquitetônica

nestas; nesse caso, são chamadas lajes cogumelo (Fig. 77). A união en-tre colunas e lajes deve se projetar para absorver o efeito de punção das colunas e requer, em geral, o uso de capitéis ou placas intermediárias de distribuição.

As lajes de concreto armado apoiadas em colunas de aço ou de concreto armado moldam-se com facilidade no solo, e depois faz-se o içamento das mesmas por meio de guindastes. Trata-se de sistemas de lajes pré-molda-das no local (sistema lift-slab).

LAJES NERVURADAS

A efi ciência estrutural das placas vê-se diminuída devido à distribuição linear de tensões em sua espessura. Somente as fi bras inferior e superior da placa, no ponto e na direção de maior tensão, podem desenvolver ten-sões iguais às admissíveis. No caso de vigas, essa inefi ciência é remediada dispondo-se a maior quantidade possível de material a certa distância do eixo neutro, obtendo assim seções “duplo tê”: idêntica solução adota-se nas lajes. Parte do material pode-se afastar do plano médio ou neutro da placa e ser usado para criar nervuras em uma ou duas direções. A laje nervurada (Fig. 78) apresenta as vantagens da continuidade, devido à laje, e da espes-sura, devido às suas nervuras.

Uma solução econômica do problema de lajes para pisos retangulares com vãos relativamente pequenos obtém-se por meio de uma estrutura mista de concreto armado e material cerâmico. Dispõem-se vigotas de concreto armado ou protendido, afastadas entre si. Entre elas, são colo-cados tijolos vazados, apoiando-se sobre as vigotas. O acabamento é re-alizado através de uma capa de 3cm de concreto, com uma armadura de distribuição em malha.

Uma laje nervurada em duas direções denomina-se grelha (Fig. 78). As grelhas são usadas para cobrir áreas quadradas e projetam-se com dois sis-temas idênticos de nervuras perpendiculares entre si. Quando os lados da área retangular diferem sobremaneira, é possível usar nervuras de maior altura em uma direção, ou, no caso do concreto armado, dar a ambos os sistemas a mesma altura, reforçando as armaduras das nervuras mais so-licitadas. Também é possível dispor nervuras efi cientes em placas poligo-nais ou circulares; em tais casos, têm direções radial e circunferencial.

Fig. 78 | Laje nervurada

22 | Laje nervurada em Prédio, no Parque das Nações, em Lisboa, Portugal.

132 ENTRAMADOS, PLACAS E GRELHAS

PLACAS DOBRADAS

Como vimos, a efi ciência estrutural das placas pode ser aumentada se a reforçarmos com nervuras, eliminando, assim, parte do material da zona próxima do eixo neutro. Idêntico resultado obtém-se dobrando uma placa (Fig. 79a). Uma folha de papel sustentada por um de seus lados não resiste ao seu peso próprio, pois sua reduzida espessura não tem braço de alavan-ca sufi ciente para absorver as tensões de fl exão. Dobrando a folha, o ma-terial da seção afasta-se do eixo neutro e aumenta o braço de alavanca das tensões de fl exão. Na prática, duas placas que formam ângulo equivalem a uma viga de seção retangular, com altura igual à das placas e com base igual à soma da projeção horizontal das espessuras (Fig. 79b).

As placas dobradas podem ser feitas de madeira, aço, alumínio ou concreto armado. Estas são particularmente econômicas, pois é possível preparar suas formas com painéis retos ou até fabricá-las previamente (pré-fabricadas). Nessas placas, a carga se transfere às pregas por meio das lajes, atuando como vigas em direção transversal. Um teto uniformemente carregado, formado por um grande número de placas dobradas, desenvol-ve iguais deformações em todas as placas, salvo as mais próximas a seus limites externos.

As placas dobradas podem ter seções diversas. O aumento de rigidez devido ao dobramento pode se estender às pregas não-longitudinais. Para cobrir áreas circulares, podem-se usar placas dobradas poligonais ou cir-culares; nesse caso, as placas são mais elevadas no centro, e sua espessura diminui. Cada elemento radial da placa dobrada comporta-se como uma treliça ou um arco, desenvolvendo um empuxo geralmente absorvido por um tensor periférico, podendo considerar-se articulado no ponto mais alto, pois a reduzida espessura existente nesse ponto impossibilita o de-senvolvimento de tensões de fl exão.

As placas dobradas são usadas principalmente como estruturas de co-bertura; porém, sua aplicação em pisos resulta prática quando sua espessu-ra pode ser usada para alojar sistemas mecânicos. As placas dobradas po-dem ser usadas também como muros verticais, para resistir a cargas tanto verticais quanto horizontais. No fechamento de grandes espaços, usa-se a combinação de coberturas e paredes em forma de placas dobradas. Seu

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Fig. 79 | Placa dobrada de altura “a” e espessura “e”

133ESTRUTURAS | uma abordagem arquitetônica

PLACAS DOBRADAS

Como vimos, a efi ciência estrutural das placas pode ser aumentada se a reforçarmos com nervuras, eliminando, assim, parte do material da zona próxima do eixo neutro. Idêntico resultado obtém-se dobrando uma placa (Fig. 79a). Uma folha de papel sustentada por um de seus lados não resiste ao seu peso próprio, pois sua reduzida espessura não tem braço de alavan-ca sufi ciente para absorver as tensões de fl exão. Dobrando a folha, o ma-terial da seção afasta-se do eixo neutro e aumenta o braço de alavanca das tensões de fl exão. Na prática, duas placas que formam ângulo equivalem a uma viga de seção retangular, com altura igual à das placas e com base igual à soma da projeção horizontal das espessuras (Fig. 79b).

As placas dobradas podem ser feitas de madeira, aço, alumínio ou concreto armado. Estas são particularmente econômicas, pois é possível preparar suas formas com painéis retos ou até fabricá-las previamente (pré-fabricadas). Nessas placas, a carga se transfere às pregas por meio das lajes, atuando como vigas em direção transversal. Um teto uniformemente carregado, formado por um grande número de placas dobradas, desenvol-ve iguais deformações em todas as placas, salvo as mais próximas a seus limites externos.

As placas dobradas podem ter seções diversas. O aumento de rigidez devido ao dobramento pode se estender às pregas não-longitudinais. Para cobrir áreas circulares, podem-se usar placas dobradas poligonais ou cir-culares; nesse caso, as placas são mais elevadas no centro, e sua espessura diminui. Cada elemento radial da placa dobrada comporta-se como uma treliça ou um arco, desenvolvendo um empuxo geralmente absorvido por um tensor periférico, podendo considerar-se articulado no ponto mais alto, pois a reduzida espessura existente nesse ponto impossibilita o de-senvolvimento de tensões de fl exão.

As placas dobradas são usadas principalmente como estruturas de co-bertura; porém, sua aplicação em pisos resulta prática quando sua espessu-ra pode ser usada para alojar sistemas mecânicos. As placas dobradas po-dem ser usadas também como muros verticais, para resistir a cargas tanto verticais quanto horizontais. No fechamento de grandes espaços, usa-se a combinação de coberturas e paredes em forma de placas dobradas. Seu

a

be 2e

a

Vão

Fig. 79 | Placa dobrada de altura “a” e espessura “e”

colapso só pode ser provocado pela fl ambagem das lajes pouco espessas, nas áreas onde existe compressão.

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Auditório Araújo VianaArquitetos: Carlos Maximiliano Fayet e Moacyr Moojen MarquesPorto Alegre - 1960

MEMBRANAS

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Auditório Araújo VianaArquitetos: Carlos Maximiliano Fayet e Moacyr Moojen MarquesPorto Alegre - 1960

MEMBRANAS

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MEMBRANAS

CARACTERÍSTICAS GERAIS

Uma membrana é uma peça tão delgada que, para todos os fi ns prá-ticos, não pode resistir à compressão, fl exão e corte, e somente resiste à tração. Não obstante, a inconsistência das membranas quanto à maior par-te dos estados de tensão, tem-se encontrado maneiras e meios de utilizar membranas para fi ns estruturais, sobretudo devido ao seu baixo peso. A lona de um circo é uma membrana capaz de cobrir dezenas de metros, sempre que a mesma esteja sustentada por montantes de compressão esta-bilizados por pedestais de tração. A membrana resiste à pressão do vento, com o inconveniente de mover-se sob a ação de cargas variáveis. Devido ao seu escasso peso, a membrana vibra, e por isso, sua utilização ocorre em coberturas temporárias.

A ação estrutural de uma membrana melhora bastante submetendo-a à tração antes da aplicação da carga. É o que fazem os bombeiros, utilizando uma lona circular esticada e presa a um aro periférico para recolher pes-soas em incêndios de altos edifícios. A peça delgada absorve o impacto da pessoa que cai, fl exiona elasticamente e, em virtude de sua fl exibilidade e resistência, salva quem saltou. A combinação de lona e aro, ainda sem cargas, tem tensões incorporadas. As membranas dos bombeiros são ele-mentos protendidos típicos (cama elástica).

O guarda-chuva constitui outro exemplo de membrana protendida com tensões incorporadas. As nervuras curvas de aço, impulsionadas para fora e apoiadas nos elementos de compressão conectados ao cabo, submetem o tecido à tração e dão a ele uma forma apta para resistir às cargas. Dentro de certos limites, a membrana pode absorver pressões de baixo e de cima, invertendo as tensões na armação de aço quando se inverte a ação do ven-to, mas, em ambos os casos, a membrana se acha tracionada.

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Auditório Araújo VianaArquitetos: Carlos Maximiliano Fayet e Moacyr Moojen MarquesPorto Alegre - 1960

Observação: Esta cobertura em membrana foi substituída por outra rígida em 2012

23 | Membranas na “Praça FIL” (Parque das Nações Expo 98), baseada num plano arquitetônico conhecido por “technologic sailing ship”, tem 105m de comprimento e 66m de largura.

24 | 35 coberturas de aproximadamente 13m x 13m e altura de 8m, membrana de poliéster com revestimento de PVC.

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MEMBRANAS

CARACTERÍSTICAS GERAIS

Uma membrana é uma peça tão delgada que, para todos os fi ns prá-ticos, não pode resistir à compressão, fl exão e corte, e somente resiste à tração. Não obstante, a inconsistência das membranas quanto à maior par-te dos estados de tensão, tem-se encontrado maneiras e meios de utilizar membranas para fi ns estruturais, sobretudo devido ao seu baixo peso. A lona de um circo é uma membrana capaz de cobrir dezenas de metros, sempre que a mesma esteja sustentada por montantes de compressão esta-bilizados por pedestais de tração. A membrana resiste à pressão do vento, com o inconveniente de mover-se sob a ação de cargas variáveis. Devido ao seu escasso peso, a membrana vibra, e por isso, sua utilização ocorre em coberturas temporárias.

A ação estrutural de uma membrana melhora bastante submetendo-a à tração antes da aplicação da carga. É o que fazem os bombeiros, utilizando uma lona circular esticada e presa a um aro periférico para recolher pes-soas em incêndios de altos edifícios. A peça delgada absorve o impacto da pessoa que cai, fl exiona elasticamente e, em virtude de sua fl exibilidade e resistência, salva quem saltou. A combinação de lona e aro, ainda sem cargas, tem tensões incorporadas. As membranas dos bombeiros são ele-mentos protendidos típicos (cama elástica).

O guarda-chuva constitui outro exemplo de membrana protendida com tensões incorporadas. As nervuras curvas de aço, impulsionadas para fora e apoiadas nos elementos de compressão conectados ao cabo, submetem o tecido à tração e dão a ele uma forma apta para resistir às cargas. Dentro de certos limites, a membrana pode absorver pressões de baixo e de cima, invertendo as tensões na armação de aço quando se inverte a ação do ven-to, mas, em ambos os casos, a membrana se acha tracionada.

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Auditório Araújo VianaArquitetos: Carlos Maximiliano Fayet e Moacyr Moojen MarquesPorto Alegre - 1960

Observação: Esta cobertura em membrana foi substituída por outra rígida em 2012

23 | Membranas na “Praça FIL” (Parque das Nações Expo 98), baseada num plano arquitetônico conhecido por “technologic sailing ship”, tem 105m de comprimento e 66m de largura.

24 | 35 coberturas de aproximadamente 13m x 13m e altura de 8m, membrana de poliéster com revestimento de PVC.

138 MEMBRANAS

O emprego de membranas protendidas permite criar tetos de formas interessantes, pois são mais rígidos e mais estáveis (Fig. 80).

MEMBRANAS PNEUMÁTICAS

O protendido dos cascos dos dirigíveis Zepelim obtinha-se por dois métodos separados: uma armação interna sustentava a membrana à tração por efeito da pressão do hidrogênio; a rigidez obtida por esta combinação permitia que o casco resistisse a severas cargas dinâmicas impostas por bolsões e turbulências do ar.

As membranas podem se submeter à tração por efeito de uma pressão interna, quando encerram por completo um volume ou uma série de volu-mes separados. Elas constituem as estruturas pneumáticas (Fig. 81). As es-truturas de membranas consistentes em um volume fechado usam-se, por exemplo, em botes: o ar infl ado do exterior é sufi cientemente rígido para servir de aro de compressão à membrana que forma o fundo (membrana não submetida à tensão).

As membranas plásticas que cobrem piscinas ou outras instalações temporárias podem se infl ar mediante uma pequena pressão, criando cú-pulas plásticas. Uma sobrepressão de somente 1/1000 a 2/1000 MPa (1/100 a 2/100 kgf/cm2) basta para sustentar essas estruturas, nas quais se en-tra por portas comuns, pois, dado o grande volume, a perda de pressão é desprezível, mesmo quando a porta se abre com frequência; as perdas se repõem em forma intermitente com o controle da pressão através de ma-nômetros.

As grandes cúpulas usadas para cobrir instalações de radar constroem-se segundo o mesmo princípio, por meio de membranas plásticas muito delgadas, que não interferem na recepção e transmissão de ondas eletro-magnéticas. O diâmetro das mesmas pode atingir 40m.

Koch e Weidlinger construíram um teatro de verão, com teto em globo, de forma lenticular, cobrindo 45m e que se infl a com uma sobrepressão de quase 0,1 MPa (1 kgf/cm2); tem-se uma abertura circular na parte supe-rior e, através dela, introduz-se continuamente ar novo, a fi m de reduzir o aquecimento e as constantes variações da pressão do ar. Em menos de 20 minutos, iça-se o teto até a parte superior de seu aro de sustentação, que é de aço, e inicia-se o processo de entrada de ar. A forma é insensível aos ven-

Fig. 80 | Membranas

Fig. 81 | Balão, exemplo de membrana pneumática

139ESTRUTURAS | uma abordagem arquitetônica

tos permanentes: o globo não tende a “voar”. A membrana infl ada pode ser usada como cimbramento (forma) de uma cúpula de concreto armado, que se tornará permanente. Os cimbramentos em forma de globo foram usados também na construção das chamadas casas iglu. A membrana infl ada sustenta uma malha de aço, sobre a qual se aplica uma capa de concreto cuja espessura alcança 25mm. Uma vez curado o concreto, a membrana se desinfl a e é retirada pela abertura existente.

Os balões usados nas festas infantis adquirem, uma vez infl ados, tanta rigidez que po-dem desenvolver ações de compressão e fl exão. A pressão interna torna os balões possuí-dos de tensões de tração em direções circunferencial e longitudinal (a tensão circunferen-cial denomina-se também tensão de aro, por analogia as tensões de tração incorporadas dos aros de um barril). Os balões infl ados resistem a cargas de compressão (como uma coluna) até o momento em que a compressão devida à carga iguala-se à tração longitudi-nal devida à pressão interna: a membrana fl amba.

Analogamente, o mesmo, usado como viga horizontal, resiste a cargas até o momento em que as tensões de compressão nas fi bras superiores da viga igualam-se às de tração, produzidas pela pressão interna. Ainda que os elementos pneumáticos tenham sido pou-cas vezes usados nas estruturas arquitetônicas, cabe conhecer sua pronta difusão, devido ao aparecimento de membranas plásticas delgadas com resistência à tração excepcional-mente alta (poliéster).

Os tetos de membrana são construídos também em aço, alumínio e concreto armado. As membranas metálicas adaptam-se muito bem à transferência de cargas, mediante ten-sões de tração, mas geralmente constituem solução antieconômica. O concreto pode ser armado ou protendido para se adaptar ao desenvolvimento de tensões de tração. As es-truturas metálicas leves têm tendência a vibrar, fato que não acontece com as membranas de concreto mais pesadas. Assim, como as placas desenvolvem certa ação de membrana quando se deformam sob a ação das cargas aplicadas, as membranas desenvolvem certa ação de placas devido à sua pequena espessura. Dada a maior efi ciência da ação de mem-brana, esta deve conservar uma espessura mínima, desde que sua forma e seus desloca-mentos resultem funcionalmente aceitáveis.

TENSÕES NAS MEMBRANAS

Ainda que a membrana seja uma estrutura resistente bidimensional, não desenvolve tensões apreciáveis de placa (fl exão e corte), pois sua espessura é muito pequena compara-da ao vão. Portanto, a capacidade de carga das membranas tem sua causa em outros tipos de tensões. Um cabo pode sustentar cargas à tração, porque se deforma, e suas tensões de

140 MEMBRANAS

tração se distribuem de maneira uniforme em toda a sua seção transver-sal. Uma membrana tem mecanismo similar, e apresenta o mesmo tipo de efi ciência estrutural (Fig. 82).

A análise do comportamento dos cabos demonstrou que as tensões desenvolvidas são inversamente proporcionais à relação vão/fl echa. Inver-samente, para uma tensão admissível dada, quanto maior a fl echa, maior será a carga a que o cabo pode resistir com segurança. Considerando o comportamento de uma membrana como o dos cabos, observa-se que a direção com maior relação vão/fl echa absorve uma carga maior que a dire-ção com menor relação (menor curvatura). No caso da esfera, a curvatura é igual em todas as direções, e uma membrana esférica submetida a uma pressão uniforme transfere sua carga, metade numa direção, metade nou-tra. No caso de um cilindro submetido a pressão uniforme normal à sua superfície, as geratrizes retas não absorvem carga alguma, pois não têm curvatura, e toda a carga é resistida pelas linhas de curvatura perpendicu-lares ao eixo do cilindro.

Como as tensões de fl ambagem são proporcionais ao quadrado da rela-ção espessura/vão, as membranas fl ambam sob a ação de tensões de com-pressão relativamente baixas. Logo, para fi ns práticos, as membranas não podem desenvolver tensões de compressão. Seu comportamento, enfi m, reduz-se a uma rede de cabos. Quando varia a carga, também varia a for-ma da membrana e adaptam-se as curvaturas aos valores necessários para resistir à nova carga. Tal como nos cabos, as membranas são instáveis: é necessário estabilizá-las pela ação de um esqueleto interno, pela tração produzida por forças externas ou por uma pressão interna. A protensão permite à membrana desenvolver tensões de compressão até valores capa-zes de equilibrar as tensões de tração a ela incorporadas.

Cabe observar que, como as tensões de uma membrana são, quase em sua totalidade, de tração, elas se distribuem de maneira uniforme em sua espessura. As deformações por tração são sempre pequenas, comparadas com as deformações por fl exão, de sorte que as deformações da membrana devidas às cargas são, em geral, pequenas. Essas deformações não devem ser confundidas com os deslocamentos da membrana devidos às variações da carga, que podem ser muito grandes. Assim, pois, dada a maneira de sua ação portante, as membranas são leves, econômicas e rígidas, quando submetidas a cargas permanentes. Seu uso, em tais casos, tem-se limitado exclusivamente à sua mobilidade.

T2

T2

T1

T1

P

Fig. 82 | Mecanismo de funcionamento estrutural de uma membrana

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CEASA, Pavilhão dos ProdutoresArquitetos: Carlos Maximiliano Fayet, Cláudio Luiz Araújo e Carlos Eduardo Dias ComasPorto Alegre - 1970

CASCAS DELGADAS

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CEASA, Pavilhão dos ProdutoresArquitetos: Carlos Maximiliano Fayet, Cláudio Luiz Araújo e Carlos Eduardo Dias ComasPorto Alegre - 1970

CASCAS DELGADAS

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CASCAS DELGADAS

ESTRUTURAS RESISTENTES PELA FORMA

A folha de papel que sustentamos em uma mão se curva, incapaz de suportar seu próprio peso. A mesma folha de papel dobrada em um ponto e com uma ligeira curvatura para cima suporta seu próprio peso e uma pe-quena carga adicional. A nova capacidade portante não se obtém aumen-tando a quantidade de material, mas dando-lhe forma adequada. A curva-tura para cima aumenta a rigidez, pois dispõe parte do material afastado do eixo neutro, com o que aumenta substancialmente a rigidez da folha à fl exão, ou, o que é o mesmo, aumenta seu momento de inércia em relação ao eixo horizontal (eixo neutro) (Fig. 83).

Denominam-se estruturas resistentes pela forma aquelas cuja resis-tência se obtém dando forma ao material, segundo as cargas que deve su-portar. As membranas dependem da curvatura para suportar cargas; per-tencem à categoria de estruturas na qual a forma permite resistir a cargas de tração. Uma membrana invertida e submetida às mesmas cargas para as quais se deu forma originalmente desenvolveria compressão e também pertenceria a esse tipo de estruturas. Chama-se, neste caso, de casca del-gada. Essas são estruturas resistentes pela forma, sufi cientemente delga-das para não desenvolver tensões apreciáveis de fl exão, mas também su-fi cientemente grossas para resistir a cargas de compressão. Devido à sua forma, em certas situações, pode resistir ao corte e à tração. Mesmo que tenham sido construídas de madeira, aço e materiais plásticos, são ideais para serem construídas de concreto armado. As cascas delgadas permitem a construção econômica de cúpulas e outros tetos curvos de formas di-versas, de grande beleza e excepcional resistência mecânica, devido à sua curvatura (Fig. 84).

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Fig. 83 | Estrutura resistente pela sua forma

Fig. 84 | Cobertura em cascas

CEASA, Pavilhão dos ProdutoresArquitetos: Carlos Maximiliano Fayet, Cláudio Luiz Araújo e Carlos Eduardo Dias ComasPorto Alegre - 1970

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CASCAS DELGADAS

ESTRUTURAS RESISTENTES PELA FORMA

A folha de papel que sustentamos em uma mão se curva, incapaz de suportar seu próprio peso. A mesma folha de papel dobrada em um ponto e com uma ligeira curvatura para cima suporta seu próprio peso e uma pe-quena carga adicional. A nova capacidade portante não se obtém aumen-tando a quantidade de material, mas dando-lhe forma adequada. A curva-tura para cima aumenta a rigidez, pois dispõe parte do material afastado do eixo neutro, com o que aumenta substancialmente a rigidez da folha à fl exão, ou, o que é o mesmo, aumenta seu momento de inércia em relação ao eixo horizontal (eixo neutro) (Fig. 83).

Denominam-se estruturas resistentes pela forma aquelas cuja resis-tência se obtém dando forma ao material, segundo as cargas que deve su-portar. As membranas dependem da curvatura para suportar cargas; per-tencem à categoria de estruturas na qual a forma permite resistir a cargas de tração. Uma membrana invertida e submetida às mesmas cargas para as quais se deu forma originalmente desenvolveria compressão e também pertenceria a esse tipo de estruturas. Chama-se, neste caso, de casca del-gada. Essas são estruturas resistentes pela forma, sufi cientemente delga-das para não desenvolver tensões apreciáveis de fl exão, mas também su-fi cientemente grossas para resistir a cargas de compressão. Devido à sua forma, em certas situações, pode resistir ao corte e à tração. Mesmo que tenham sido construídas de madeira, aço e materiais plásticos, são ideais para serem construídas de concreto armado. As cascas delgadas permitem a construção econômica de cúpulas e outros tetos curvos de formas di-versas, de grande beleza e excepcional resistência mecânica, devido à sua curvatura (Fig. 84).

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Fig. 83 | Estrutura resistente pela sua forma

Fig. 84 | Cobertura em cascas

CEASA, Pavilhão dos ProdutoresArquitetos: Carlos Maximiliano Fayet, Cláudio Luiz Araújo e Carlos Eduardo Dias ComasPorto Alegre - 1970

144 CASCAS DELGADAS

CURVATURAS E CARACTERÍSTICAS GEOMÉTRICAS

A fi m de compreender seu comportamento estrutural, devemos conhe-cer primeiro suas características geométricas.

Superfícies de Revolução

As superfícies de revolução defi nem-se pela rotação de uma curva plana em torno de um eixo vertical (Fig.85). O plano ou curva meridiana pode ter formas diversas, o que dá lugar à grande diversidade de formas de cúpulas, aptas para fechar áreas circulares, sendo de uso mais corrente a esférica. As seções verticais de uma casca de revolução denominam-se meridianos, e as seções horizontais, todas de forma circular, paralelos; o paralelo de maior tamanho denomina-se equador (Fig. 88). Em geral, usam-se esferas completas sobre pilares para armazenamento de produtos líquidos.

As cúpulas elípticas defi nem-se pela rotação de uma elipse em torno de seu eixo vertical. Seu comportamento não é tão efi ciente quanto o de uma cúpula esférica, pois a parte superior da casca é mais plana e a diminuição de curvatura introduz maiores tensões. Em contrapartida, a cúpula para-bólica pode ter maior curvatura na parte superior, e apresenta vantagens estruturais, mesmo comparada com a esfera.

Superfícies de Translação

A superfície de uma casca de translação obtém-se fazendo deslizar uma curva plana sobre outra curva plana, em geral perpendicular à primeira (Fig. 86). Um cilindro se obtém deslocando uma reta horizontal sobre uma curva vertical, ou deslocando uma curva vertical ao longo de uma reta horizontal perpendicular à primeira. Segundo as características da curva, o cilindro pode ser circular, parabólico ou elíptico.

Pode-se também obter combinações dessas superfícies, originando ou-tras, tais como o parabolóide elíptico e o parabolóide hiperbólico. Ou-tros tipos de superfícies podem ser geradas pelo deslocamento dos extre-mos de um segmento de reta sobre duas curvas separadas. A partir disso, podemos obter os conóides, hiperbolóides, etc.

eixo de rotação

curva

Fig. 85 | Casca esférica

eixo de translação

curva

Fig. 86 | Casca cilíndrica

145ESTRUTURAS | uma abordagem arquitetônica

Superfícies Complexas

As superfícies elementares defi nidas geometricamente na seção ante-rior podem se combinar de distintas maneiras para obter superfícies mais complexas (Fig. 87). Uma série de cilindros paralelos com curvatura alter-nada para cima e para baixo dão origem a um teto ondulado similar a uma placa corrugada. Qualquer das formas elementares pode ser ondulada para se obter cascas estruturais mais atrativas e, às vezes, mais efi cientes. Tam-bém é possível ondular as cúpulas esféricas com igual fi nalidade.

Não há motivo para limitar as cascas delgadas às formas facilmente defi nidas por meio de fórmulas geométricas. É possível inventar formas livres, estruturalmente sãs. Mas a imaginação do projetista resulta mera fantasia se não está familiarizado com o comportamento estrutural das formas geométricas básicas.

As cascas delgadas são elementos estruturais de extraordinária efi ci-ência, e são as considerações estruturais que devem ditar funcionalmente suas formas

AÇÃO DE MEMBRANA EM CÚPULAS CIRCULARES

A ação estrutural de uma cúpula de revolução ou circular submetida à ação de cargas verticais simétricas em relação ao seu eixo (como o peso próprio) é uma consequência de suas características geométricas. As se-ções meridianas e as perpendiculares a elas constituem as seções princi-pais de curvatura e de tensão. Nelas, as tensões podem ser de compressão e de tração e distribuem-se uniformemente em sua pequena espessura (Fig.88).

As tensões de compressão aparecem na direção dos meridianos e têm valor constante ao longo do paralelo, pois a cúpula e as cargas são simé-tricas em relação ao eixo. Cada meridiano se comporta como se fosse um arco funicular de cargas aplicadas, ou seja, resiste às cargas sem desenvol-ver tensões de fl exão. Os meridianos de uma cúpula são funiculares para qualquer sistema de cargas simétricas. Essa é a diferença essencial entre o comportamento estrutural dos arcos isolados, que carecem de apoio la-teral, e os meridianos da cúpula, que têm o apoio nos paralelos, os quais restringem seu deslocamento lateral, desenvolvendo tensões de tração.

Fig. 87 | Casca cilíndrica contínua

meridianoparalelo

Fig. 88 | Mecanismo do funcionamento estrutural das cascas

146 CASCAS DELGADAS

Pode-se considerar que uma cúpula de pouca altura se comporta como uma série de arcos meridianos elasticamente apoiados nos paralelos; desenvolve tensões de compres-são, tanto ao longo dos meridianos como dos paralelos, e teoricamente é possível cons-truí-la com materiais incapazes de absorver tensões de tração.

Quando a cúpula é de grande altura, sob a ação de cargas, os pontos mais altos se movem para dentro, enquanto os mais baixos se movem para fora, isto é, afastando-se do eixo. Os paralelos inferiores alargam-se e desenvolvem tensões de tração; estes res-tringem a si mesmos tal movimento. Segundo o tipo de carga, um paralelo determinado conserva invariável seu comprimento, enquanto todos os superiores desenvolvem com-pressão e todos os inferiores, tração.

Qualquer que seja a sua altura, um arco sobre o qual atuam cargas simétricas tende a se abrir e a produzir um empuxo para fora. Assim, pois, a ação de uma cúpula difere substancialmente da de um arco: depende da sua altura para que o empuxo seja para fora ou para dentro, ao longo de seu contorno.

Como as tensões desenvolvidas por uma cúpula são meramente de compressão e tra-ção, e as deformações correspondentes são muito pequenas, as cúpulas circulares têm uma rigidez excepcional. Essa rigidez se explica porque é possível reduzir sua espessura da ordem de 1:300 entre espessura e vão. As cúpulas de aço atingem a relação 1:1000, en-quanto a casca de um ovo de galinha alcança somente 1:30.

Numa cúpula delgada, quando as tensões, segundo os meridianos e paralelos, não po-dem absorver toda a carga, entra em funcionamento um terceiro mecanismo para equi-librar a diferença: o mecanismo de corte. Desde que não excedam as tensões admissíveis, as tensões normais e as de corte repartem e equilibram a carga total que atua sobre um elemento de cúpula esférica, de tal forma que resistem às cargas laterais de pressão e suc-ção do vento.

TENSÕES DE FLEXÃO EM CÚPULAS

Uma cúpula esférica de grande altura tende a se abrir em seu equador: o bordo se des-loca para fora. As reações que sustentam a cúpula são verticais, ou seja, seguem a direção dos meridianos. As reações em qualquer outra direção produzem momentos de fl exão na cúpula. A fi m de ter, na casca, um estado puro de tensão de membrana, o bordo tem de contar com a liberdade necessária para deslocar-se para fora, e as reações devem atuar sempre na direção dos meridianos. Na prática, isso é impossível. Na verdade, reforça-se o equador da casca por meio de um aro rígido que impede quase totalmente o movimento do bordo para fora e sua rotação e introduz um empuxo para dentro e uma fl exão no

147ESTRUTURAS | uma abordagem arquitetônica

equador. A casca, que, por ação das tensões de membrana devidas à carga, se abriria no equador, desenvolve em troca uma repentina curvatura e, por conseguinte, tensões de fl exão junto ao bordo. A perturbação assim intro-duzida no bordo não se propaga ao resto da casca: limita-se a uma faixa estreita próxima àquela. Esse amortecimento das perturbações de bordo, outra característica útil das cascas delgadas, deve-se ao fato de que os pa-ralelos restringem os deslocamentos de fl exão dos meridianos, os quais poderiam ser grandes, dada a pequena rigidez da casca à fl exão (Fig. 89a).

As perturbações de fl exão são, em geral, mais severas que as devidas às cargas, e são produtos de fenômenos térmicos. Quando a exposição à luz solar aumenta a temperatura da casca, toda a cúpula troca de forma, aumentando o seu raio de maneira uniforme (Fig. 89b).

Quando as reações de bordo não são tangentes aos meridianos, na pro-ximidade daquelas aparecem tensões de fl exão. Assim, por exemplo, se uma cúpula se apoia sobre colunas dispostas a intervalos uniformes, e não sobre toda a sua periferia, a distribuição de tensões varia: as colunas, então, introduzem reações horizontais no bordo, e a cúpula desenvolve tensões de fl exão. Em geral, é necessário aumentar a espessura das cascas para impedir a fl ambagem. Todo elemento estrutural delgado submetido a ten-sões de fl exão pode fl ambar, e as cascas não constituem exceção à regra. Para uma cúpula delgada, a carga de fl ambagem é proporcional ao módulo de elasticidade do material e ao quadrado da relação espessura/raio. Com relações tão pequenas, como 1/300 a 1/400, a carga crítica de fl ambagem pode resultar excepcionalmente baixa.

Para uma cúpula cujo diâmetro é de 30m e espessura de 75 mm, esta carga importa aproximadamente 7,50 KN/m2: com um coefi ciente de se-gurança de 2,5, a carga máxima sobre a cúpula não pode superar os 3,00 KN/m2, o que equivale ao peso próprio da casca, incluindo a cobertura ou materiais isolantes, e não tem em conta a possibilidade de uma carga acidental.

A resistência de uma cúpula à fl ambagem pode ser aumentada subs-tancialmente sem aumentar a sua espessura de maneira uniforme, empre-gando-se nervuras dispostas segundo os paralelos e os meridianos. Essa prática se presta muito bem ao reforço das cúpulas de aço, nas quais a es-pessura necessária pela ação de membrana pode ser muito pequena, dada a resistência do material à tração e à compressão. As cúpulas de concreto

Fig. 89 | Deformação de fl exão numa casca, próximo a apoio rígido

a

b

Sol

P

aro de rigidez

148 CASCAS DELGADAS

raras vezes são reforçadas por meio de nervuras, devido ao alto custo das formas; iguais resultados podem ser obtidos por meio de ondulações que aumentam o custo das formas, mas também podem contribuir para realçar o aspecto estético da casca.

Uma cúpula deve satisfazer às três condições abaixo para desenvolver a ação de casca delgada:

1 • A cúpula deve ser delgada, com isto resultará incapaz de desenvolver fl exão em grau substancial;

2 • Deve ter curvatura adequada, dessa maneira será resistente e rígida, devido à resistência derivada de sua forma;

3 • Deve ter apoio adequado, pois dessa maneira desenvolverá uma pequena fl exão numa porção limitada da casca.

Essas três condições são essenciais para a ação de casca delgada, seja qual for a sua forma e as cargas que atuem sobre ela.

AÇÃO DE MEMBRANA EM CILINDROS

As cascas cilíndricas são usadas para cobrir áreas retangulares e apoiam-se geralmen-te em pórticos extremos, rígidos em seu próprio plano e fl exíveis em direção normal a ele. Seu comportamento pode ser considerado como combinação da ação da viga em direção longitudinal e de um efeito particular de arco funicular em direção transversal.

Em um cilindro de grande comprimento em relação à largura (Fig.90), as tensões lon-gitudinais de membrana são similares às desenvolvidas em uma viga. A casca delgada tem sua resistência na forma curva e trabalha como uma viga transversal curva. As tensões longitudinais de membrana distribuem-se de forma linear através da espessura do cilin-dro; as fi bras superiores são comprimidas e as inferiores, tracionadas.

A ação da viga transmite a carga aos pórticos extremos. Devido à sua fl exibilidade, estes não podem reagir em direção longitudinal; as tensões longitudinais anulam-se no extremo da casca, tal como se anulam no extremo de uma viga simplesmente apoiada. A carga transfere-se aos pórticos extremos por ação de corte.

TENSÕES DE FLEXÃO NOS CILINDROS

À medida que o cilindro diminui seu comprimento, começa a aparecer a ação de arco e, por último, a ação de placa. Podemos considerar o comportamento das cascas cilín-dricas curtas como devido à ação de arcos apoiados sobre vigas longitudinais. Na parte superior do cilindro, desenvolvem-se tensões transversais de compressão, típicas do arco,

149ESTRUTURAS | uma abordagem arquitetônica

e essas tensões vão desaparecendo até os bordos longitudinais. As tensões de compressão devidas ao efeito de arco introduzem fl exão nas zonas pró-ximas aos pórticos extremos. Os deslocamentos térmicos e a retração do concreto durante a cura podem ocasionar, nos elementos de rigidez, per-turbações de fl exão muito superiores às produzidas pelas cargas. Em geral, essas perturbações são as que determinam o aumento de espessura dos bordos desses elementos.

As cascas cilíndricas mostram claramente que, para uma casca, é es-sencial ter apoio apropriado, a fi m de desenvolver somente tensões de membrana. Um cilindro longo, apoiado em pórticos extremos de rigidez, transfere as cargas por tensões longitudinais de tração, compressão e corte transversal, isto é, ação de viga. O mesmo cilindro, apoiado em bordas lon-gitudinais, desenvolve essencialmente aço de arco, pois cada franja trans-versal pode ser considerado como um arco apoiado em seus extremos e capaz de desenvolver o empuxo necessário (Fig.91). As cascas cilíndricas não são tão rígidas como as cúpulas, pois sua única curvatura faz com que se comportem como vigas.

Assim como a mesa superior de um perfi l “duplo tê” pode fl ambar quan-do submetida à compressão, as fi bras superiores de uma casca cilíndrica de grande comprimento podem fl ambar quando submetidas à compressão na direção longitudinal. Nesse caso, a resistência à fl ambagem é maior nas cúpulas, pois as tensões de compressão se desenvolvem essencialmente em apenas uma parte da casca e apenas em uma direção. Nas cascas cilíndricas largas, o perigo de fl ambagem exige o aumento de sua espessura. Quando a espessura necessária provoca tanta resistência à fl ambagem, resulta mais econômico dispor nervuras transversais, usadas principalmente em cascas de aço, pois, no concreto armado, aumenta muito o seu custo.

CASCAS DE OUTROS TIPOS

É possível obter cascas de formas interessantes, conforme as necessida-des estruturais ou exigências estéticas. Tem-se construído cúpulas circu-lares de grande diâmetro ondulando uma superfície esférica, com o fi m de aumentar a sua resistência à fl ambagem. A ondulação dos paralelos dimi-nui consideravelmente sua ação; essas cascas comportam-se como uma sé-rie de arcos que se cruzam na parte superior da cúpula e fi cam articulados

zona de compressão

zona de tração

tirante

Fig. 90 | Cobertura cilíndrica de grande comprimento em relação à largura

Fig. 91 | Esforços predominantes em cilindros curtos e longos

150 CASCAS DELGADAS

nesse lugar. As coberturas tipo shed constroem-se economicamente por meio de cascas delgadas. Seu comportamento estrutural é similar ao de uma viga de seção transversal curva e de pequena espessura, cujo eixo neutro não seja horizontal.

Algumas das maiores cascas do mundo foram construídas para resistir principalmen-te a cargas horizontais. Os muros de contenção, submetidos ao empuxo da terra, podem ser construídos em forma de cilindros. O mesmo se faz em tanques cilíndricos para con-tenção de água, petróleo, etc., barragens com altura de até 250 m, com curvatura tanto nas seções verticais como nas horizontais, e espessuras de somente poucas dezenas de centímetros.

Resulta quase impossível mencionar todas as formas empregadas nas cascas delgadas. As possibilidades estéticas, arquitetônicas e estruturais desse tipo de construção são pra-ticamente ilimitadas (Fig. 92).

PROBLEMAS NA CONSTRUÇÃO DE CASCAS DELGADAS

A excepcional efi ciência estrutural popularizaria ainda mais seu emprego, se não se encontrassem uma série de problemas práticos.

O problema de formar superfícies curvas para cascas de concreto armado tornou seu uso antieconômico, devido ao alto custo do cimbramento. Diversas tentativas de minimi-zar o custo já foram realizadas, tais como aceleração da cura do concreto e reaproveita-mento rápido das formas, utilização de elementos pré-moldados, bombeamento do con-creto, andaimes móveis e membranas infl áveis como formas para sustentar o aço, sobre os quais se aplica o concreto bombeado.

A impermeabilização dos tetos curvos tem causado grandes problemas em nosso meio, devido às bruscas variações de temperatura. Dependendo da sua utilização, as cas-cas também têm problemas quanto à acústica, além de gerarem problemas psicológicos, por provocar sensações de claustrofobia.

A forma apropriada da casca depende, portanto, de um grande número de fatores: eco-nômicos, construtivos, estruturais, estéticos e psicológicos. Só a satisfação de todos esses requisitos pode traduzir um bom projeto de uma casca.

Fig. 92 | Superfície cônica ondulada

151ESTRUTURAS | uma abordagem arquitetônica

nesse lugar. As coberturas tipo shed constroem-se economicamente por meio de cascas delgadas. Seu comportamento estrutural é similar ao de uma viga de seção transversal curva e de pequena espessura, cujo eixo neutro não seja horizontal.

Algumas das maiores cascas do mundo foram construídas para resistir principalmen-te a cargas horizontais. Os muros de contenção, submetidos ao empuxo da terra, podem ser construídos em forma de cilindros. O mesmo se faz em tanques cilíndricos para con-tenção de água, petróleo, etc., barragens com altura de até 250 m, com curvatura tanto nas seções verticais como nas horizontais, e espessuras de somente poucas dezenas de centímetros.

Resulta quase impossível mencionar todas as formas empregadas nas cascas delgadas. As possibilidades estéticas, arquitetônicas e estruturais desse tipo de construção são pra-ticamente ilimitadas (Fig. 92).

PROBLEMAS NA CONSTRUÇÃO DE CASCAS DELGADAS

A excepcional efi ciência estrutural popularizaria ainda mais seu emprego, se não se encontrassem uma série de problemas práticos.

O problema de formar superfícies curvas para cascas de concreto armado tornou seu uso antieconômico, devido ao alto custo do cimbramento. Diversas tentativas de minimi-zar o custo já foram realizadas, tais como aceleração da cura do concreto e reaproveita-mento rápido das formas, utilização de elementos pré-moldados, bombeamento do con-creto, andaimes móveis e membranas infl áveis como formas para sustentar o aço, sobre os quais se aplica o concreto bombeado.

A impermeabilização dos tetos curvos tem causado grandes problemas em nosso meio, devido às bruscas variações de temperatura. Dependendo da sua utilização, as cas-cas também têm problemas quanto à acústica, além de gerarem problemas psicológicos, por provocar sensações de claustrofobia.

A forma apropriada da casca depende, portanto, de um grande número de fatores: eco-nômicos, construtivos, estruturais, estéticos e psicológicos. Só a satisfação de todos esses requisitos pode traduzir um bom projeto de uma casca.

Fig. 92 | Superfície cônica ondulada

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