estratÉgias de leitura com histÓrias em quadrinhos · 2017. 4. 19. · a história em quadrinhos...
TRANSCRIPT
ESTRATÉGIAS DE LEITURA COM HISTÓRIAS EM QUADRINHOS. Victor
Hugo Casagrande. Silvana Ferreira de Souza Balsan. Renata Junqueira de Souza.
UNESP/PRUDENTE. [email protected].
[email protected], [email protected]
Eixo Temático: Leitura e Escrita.
READING STRATEGIES WITH STORIES COMICS
Resumo: Este trabalho visa discutir como as Histórias em Quadrinhos (Hqs) podem ser
um importante gênero para o processo de formação leitora, uma vez que o mesmo permite
o desenvolvimento e o uso das estratégias de leitura pelos leitores. Focamos nossos
estudos nas Histórias em Quadrinhos (Hqs), pois elas se constituem a partir do texto
verbal e não verbal e trazem em seu interior elementos culturais atuais e históricos que
possibilitam que as crianças ativem a estratégia de conhecimentos prévios e estabeleçam
diferentes relações entre a história lida e seu repertório pessoal, fazendo conexões que
permitam ao leitor compreender o texto. Faz-se necessário então proporcionar a leitura
desse gênero textual no interior escolar e que o docente seja o mediador da aprendizagem
no interior da sala de aula. Desta forma, o presente texto se dividi em quatro partes, sendo
que nas três primeiras apresentaremos nossa discussão teórica sobre a história em
quadrinhos ao longo da história e suas características, depois nossas concepções sobre o
ato de ler e as estratégias de leitura e por último descrevemos uma experiência realizada
com crianças do 5º Ano de uma escola municipal de uma cidade do interior de São
Paulo/SP. Os resultados parciais demonstram que esse gênero possibilita que o leitor
utilize suas estratégias e estabeleça relações com o mundo no qual está inserido, além de
ampliar o conhecimento dos envolvidos a partir das interações realizadas.
Palavras-chave:. Estratégias de Leitura. Ensino Fundamental. Histórias em quadrinhos.
Abstract: This work aims to discuss how the Comics (Hqs) can be an important genre
for the process reader training, since it allows the development and use of reading
strategies by readers. We focus our studies in Comics (Hqs) because they are from the
verbal and non-verbal text and bring inside current and historical cultural elements that
allow children to activate the strategy of previous knowledge and establish different
relations between the read history and his personal repertoire, making connections that
allow the reader to understand the text. It is necessary then to provide the reading of this
genre in the school interior and the teacher is the learning mediator within the classroom.
Thus, this text is divided into four parts, with the first three present our theoretical
discussion about comics throughout history and its characteristics, then our conceptions
of the act of reading and reading strategies and last we describe an experiment with
children of the 5th year of a municipal school in a city in São Paulo / SP. Partial results
show that this kind enables the reader to use their strategies and establish relations with
the world in which it is inserted, in addition to expanding the knowledge of those involved
from the interactions carried out.
Key words:. Reading strategies. Elementary School. Comics.
Introdução
Atualmente fazemos parte de uma sociedade que proporciona aos leitores muito
contato com textos que se constituem a partir da linguagem verbal e não-verbal
(AGUIAR, 2004). Se andarmos pelas ruas de uma cidade de porte médio ou grande
encontraremos outdoors que trazem uma mensagem significativa constituída a partir de
imagens e palavras. Se entrarmos em um consultório médico ou em uma repartição
pública encontraremos uma revista ou um jornal que trará em seu interior uma propaganda
ou uma charge que discute a realidade social e que debate os problemas de nossa
sociedade a partir do desenho e da escrita. Desta forma, se os textos com os quais nos
deparamos atualmente exigem uma leitura mais ampla do leitor, buscando compreender
a relação entre essas duas linguagens, faz-se necessário que os leitores em formação
tenham acesso aos diferentes textos produzidos historicamente pelo homem e, que se
constituem por códigos verbais e não-verbais. Por esse motivo nos últimos anos houve
um aumento significativo de docentes que introduziram a leitura de histórias em
quadrinhos e de tirinhas nas salas de aulas do Brasil com o intuito de formar os leitores
na Unidades Escolares.
1. As Histórias em Quadrinhos ao longo da história.
A História em Quadrinhos surgiu no ano de 1895 com a primeira tirinha que
estipulou a linguagem dos quadrinhos tal qual como nós a conhecemos hoje. As histórias
em quadrinhos estão associadas a uma narrativa que se estrutura a partir do diálogo entre
o código verbal e o código não verbal (AGUIRAR, 2004) que se complementam e
permitem ao leitor compreender o significado da trama. Este gênero por ser mais popular
entre crianças e adolescentes, foram por muito tempo rotulados como um subgênero.
A primeira história em quadrinho que se tem notícia foi escrita pelo americano
Richard Outcault, em 1985. Os quadrinhos que conhecemos hoje com personagens fixos,
que demonstram ações, com balões de texto e ilustrações foi inaugurada por Outcault, nas
tirinhas de jornais de Nova York, chamada The Yellow Kid e o sucesso foi tanto que elas
foram disputadas por jornais de renome.
O gênero História em Quadrinhos, que em países da língua inglesa são chama de
“comic”, surgiram na mesma época do cinematográfico, entretanto as comic nem sempre
foram vistas de forma positiva, porque durante um longo período as Hqs receberam várias
críticas, pois foram consideradas uma “má influência” para crianças e adolescentes. Já na
década de 60 houve uma mudança, pois eles invadiram o universo acadêmico, e por isso
acabaram ganhando a simpatia de professores e estudantes.
No decorrer do século XIX, com a evolução da indústria tipográfica e com
surgimento de grandes cadeias jornalísticas, as (Hqs) passam a ser conhecido como “meio
de comunicação em massa”. (VERGUEIRO, 2006. p. 10). Neste sentido, apesar dos
quadrinhos terem se espalhado pelo mundo, foi nos Estados Unidos que eles ganharam o
status de comunicação em massa.
É possível afirmar que o ambiente mais propício para seu florescimento
localizou-se nos Estados Unidos do final do século XIX, quando todos
os elementos tecnológicos e sociais encontravam-se devidamente
consolidados para que as histórias se transformassem em um produto
de consumo massivo (VERGUEIRO, 2006, p. 10).
O sucesso deste gênero nesta época aconteceu principalmente porque os
quadrinhos retratavam a vida de super-heróis, o que fez com que ele ganhasse uma
projeção internacional e conquistasse gente do mundo inteiro. Essas narrativas relatavam
eventos históricos, traziam para o leitor algo do passado, ampliando sua capacidade de
conhecer de forma ilustrada o os conhecimentos históricos. Ainda hoje este fato se repete,
pois muitas vezes os acontecimentos que ocorrem no Brasil e no mundo são relatados em
quadrinhos, que é uma forma diferente de transmitir as notícias e eventos atuais.
Até a década de 1920 os quadrinhos passaram por diversas transformações, seus
personagens se tornaram cômicos, também disseminaram a visão norte-americana de
mundo, uma vez que propagaram a cultura e os valores do EUA para o restante do mundo
através de diversos gêneros, tais como aventuras, terror e suspense. De acordo com
Vergueiro (2006) durante a Segunda Guerra Mundial surgiram heróis como Super-man,
Batman e o Capitão América que ampliaram o consumo dos quadrinhos e popularizaram
os “comic books” entre os jovens americanos.
Ainda de acordo com o autor durante muito tempo as histórias em quadrinhos
foram consideradas vilãs, pois havia uma ideia geral de que elas influenciavam de forma
ruim os jovens. Por esse motivo as Hqs foram abolidas dos meios sociais, e somente nas
últimas décadas do século XX os quadrinhos restabeleceram seu prestigio, em
decorrência dos estudos desenvolvidos pelas Ciências da Comunicação que elevaram o
status das História em Quadrinhos, que passaram a ser vistas como uma manifestação
artística.
Este fato resultou no combate aos preconceitos referentes as histórias em
quadrinhos e despertou o interesse e a valorização desse gênero textuais e de suas
especificidades narrativas.
Foi a partir de 1970, que os quadrinhos adentraram o âmbito escolar e passaram a
ser vistos como um apoio lúdico para os temas escolares tornado o processo de
aprendizagem mais agradável para os leitores, em especial para as crianças.
As histórias em quadrinhos chegaram ao Brasil e surgiram os primeiros
quadrinistas brasileiros, tais como Ziraldo, com o Pererê; Daniel Azulay, com a Turma
do Lambe-Lambe; e é claro, o mais conhecido na atualidade Maurício de Sousa, com o
sucesso “Turma da Mônica”. O sucesso dos personagens de Mauricio não se limitaram
aos gibis, mas também expandiu-se para a televisão e o cinema. Além disso, suas
personagens estampam uma variedade de produtos, que vão desde materiais de limpeza,
alimentos e brinquedos. Destacamos ainda essas mesmas personagens “cresceram” e
ganharam a versão jovem da turma que Mauricio de Sousa criou em quadrinhos.
2. O Gênero Histórias em Quadrinhos e suas características.
Quando falamos de histórias em quadrinhos lembramos de divertidos gibis que
acompanhamos em nossa infância e que se caracterizam por serem narrativas pois trazem
“[...] uma história contada por uma sucessão de imagens” (VERGUEIRO, 2006, p. 09) e
elas constituem um sistema narrativo “composto por dois códigos que atuam em constante
interação: o visual e o verbal. Cada um desses ocupa, dentro dos quadrinhos, um papel
especial, reforçando um ao outro e garantindo que a mensagem seja entendida em
plenitude” (IBIDEM, 2006, p. 31). No entanto, conforme afirmam Aguiar (2004),
Vergueiro (2006) e Amarilha (2006) os sentidos das mensagens em quadrinhos é
percebida por meio da interação entre esses dois códigos.
Conforme Amarilha (2006) as histórias em quadrinhas adentram o ambiente
escolar na maioria das vezes com objetivo de propor entretenimento como forma de
interagir, divertir, causar humor, em virtude das imagens atraentes. Entretanto os docentes
em relação as histórias negligenciam as mesmas e não lançam um “olhar mais profundo,
que dê real atenção ao que a linguagem dos quadrinhos podem proporcionar”
(AMARILHA, 2006, p. 93).
Neste sentido, reafirmamos que os quadrinhos podem ser para entretenimento
sim, mas também trazem em seu interior uma série de informações e são um reflexo da
cultura, história e sociedade da época na qual foram criados. Outras tantas são escritas
para alertar à sociedade, tais como as campanhas comunitárias a respeito de doenças como
Dengue, Gripe, Hepatite, e temas atuais como a falta de água, os problemas no trânsito.
A história em quadrinhos possuí características especificas, como por exemplo a
imagem desenhada, pois ela é um elemento básico da mesma, conforme afirma Vergueiro
(2006). Outros elementos ainda de acordo com o autor é o quadrinho (também chamado
de vinheta) e que dentro deste “podem ser expressos vários momentos, que vistos em
conjunto, dão a ideia de uma ação especifica” (VERGUEIRO, 2006, p. 35). As tiras
recebem normalmente por título o nome do protagonista no alto da página à esquerda para
chamar a atenção do leitor e sua leitura é realizada da esquerda para a direita.
Já em relação ao código verbal que também constitui a história em quadrinhos,
parte da mensagem é trazida ao leitor por meio da linguagem verbal para expressar a fala
ou o pensamento dos personagens, que são colocadas em caixas ou balões. As caixas são
usadas para demarcar a fala do narrador e a conversa entre as personagens são envoltos
por balões.
Segundo Vergueiro (2006) o balão se transforma em um verdadeiro hibrido de
imagem e texto, ou seja, ele “é a intersecção entre a imagem e a palavra” (2006, p. 56).
O balão é um importante elemento desse gênero, além de indicar qual personagem está
falando, possuí diferentes formatos, como por exemplo o balão de fala que tem um
rabicho apontando para quem está falando. Além disso, o balão indica a ordem de quem
está falando e até o formato da linha destes já são lidos antecipadamente pelo leitor, pois
representam ideias diferentes, tais como cochicho, grito, etc. Apresentam ainda
pontuações são variadas, como quando os personagens reforçam a voz, indicando seus
sentimentos, se ele está triste, alegre, com dor ou com raiva.
E também temos ainda neste gênero textual uma grande presença de
onomatopeias, “que são signos convencionais que representam ou imitam um som por
meio de caracteres alfabéticos” (VERGUEIRO, 2006, p. 62). Nas histórias em quadrinhos
encontramos na forma de barulhos (buuum para representar uma explosão, por exemplo)
e o zzz, para sono e entre outros. Neste sentido, as onomatopeias se tornaram ao longo do
tempo uma convenção das hqs.
Agora que nós já conhecemos a história dos quadrinhos destacamos a necessidade
de trazer esse gênero para a sala de aula. Assim sendo, é preciso ter um planejamento para
utilizar esse gênero em conjunto com a estratégia de leitura visando auxiliar o aprendizado
dos leitores do Ensino Fundamental.
3. As estratégias de leitura.
Abordamos o presente trabalho a partir de uma concepção de leitura na qual o
sujeito constrói o significado do texto a partir do momento que o mesmo constrói e/ou
usa suas estratégias de leitura no ato de ler que são os como “procedimentos de caráter
elevado, que envolvem a presença de objetivos a serem realizados, o planejamento das
ações que se desencadeiam para atingi-los, assim como sua avaliação e possível
mudança” (SOLÉ, 1998, p. 69-70).
A estratégia de leitura então é o emprego de esquemas ou procedimentos,
realizada por um leitor, para obter, avaliar e servir-se de uma informação presente em um
texto que permitirá que o aluno planeje sua tarefa geral de leitura e sua própria localização
– motivação, disponibilidade – diante dela, facilitando assim a comprovação, a revisão, e
o controle do que ele lerá e a tomada de decisões adequadas em função dos objetivos que
ele almeja alcançar.
Segundo Solé (1998) o ato de ler ocorre em três momentos distintos: antes, durante
e depois da leitura e que para que haja aprendizagem da leitura faz-se imprescindível o
processo de interação entre o leitor, a obra e o contexto no qual estão inseridos, uma vez
que:
[...] para ler, é necessário dominar as habilidades de decodificação e aprender
as distintas estratégias que levam à compreensão. Também se supõe que o
leitor seja um processador ativo do texto, e que a leitura seja um processo
constante de emissão e verificação de hipóteses que levam à construção da
compreensão do texto e do controle desta compreensão – de comprovação de
que a compreensão realmente ocorre. (SOLÉ, 1998, p. 24).
Por meio dos estudos teóricos de Owochi (2003) e Girotto e Souza (2010)
concebemos o ensino de estratégias de metacognição de leitura, que são aquelas que
levam o aluno a pensar sobre o pensar; que auxiliam os leitores em formação a adquirirem
maior consciência sobre o processo de compreensão dos textos e, consequentemente,
contribuem para a formação progressiva da autonomia do leitor.
Desta forma, a partir dos nossos estudos podemos afirmar que a escola precisa
oferecer condições para o desenvolvimento de ambas as estratégias de conhecimento:
cognitivas e metacognitivas.
Embora a atividade de natureza metacognitiva seja individual, é possível propor
práticas, a partir da experiência com diversos tipos de texto, que desenvolvam e
aprimorem esses procedimentos, familiarizando o aluno com as estratégias, pois,
[...] se os leitores proficientes são capazes de descrever suas próprias
estratégias, então há pelo menos a possibilidade de se ensinar essas estratégias
aos leitores que não as possuem embora a atividade de natureza metacognitiva
seja individual é possível propor práticas, a partir da experiência com diversos
tipos de texto, que desenvolvam e aprimorem estas estratégias familiarizando
o aluno com as mesma. (LEFFA, 1996, p. 53).
Destarte podemos dizer que para ler de forma eficaz, os estudantes precisam
entender quais estratégias eles têm disponíveis e ter noção sobre quais delas são as mais
adequadas para utilizar naquele momento especifico do ato de ler.
De acordo com Girotto e Souza (2010), baseadas nos estudos de Harvey e Goudvis
(2000) apontam que bons leitores utilizam as seguintes estratégias: conhecimento prévio,
conexão, inferência, visualização, perguntas ao texto, sumarização e síntese
Neste texto focaremos apenas a estratégia de conhecimento prévio e conexões. As
autoras Girotto e Souza (2010), afirmam que o conhecimento prévio é considerado por
vários autores como a estratégia “guarda-chuva”, pois o leitor ativa conhecimentos que
já possui com relação ao que está sendo lido a todo o momento. O fato de o leitor ativar
essas informações interfere, diretamente, na compreensão durante a leitura e resulta na
formulação de hipóteses baseadas no conhecimento prévio do leitor sobre o que trata e
do que se trata a narrativa. Todas as hipóteses levantadas pelo leitor iniciam o processo
de compreensão dos significados do texto e serão confirmadas ou não durante a leitura
do livro.
Já a estratégia de conexão: o sujeito faz conexões entre o conhecimento que ele já
possui e o que está lendo, ou seja, permite ao leitor relembrar e relacionar fatos
importantes de sua vida, de outros textos lidos e de outras situações que estão ocorrendo
no mundo, em seu país ou sua cidade, ajudando assim o indivíduo a compreender melhor
o texto em questão.
Assim sendo, podemos afirmar então que “A criança forma-se como leitora, ao
construir seu saber sobre texto e leitura, conforme as atividades que lhe são propostas
pelo mediador durante o processo de planejar, organizar e implementar atividades de
leitura literária.” (GIROTTO; SOUZA, 2010, p. 54) e por isso é importante que a escola
assuma esse papel pois, “trabalhar com as estratégias de leitura permite ao leitor ampliar
e modificar os processos mentais de conhecimento, bem como compreender um texto.”
(GIROTTO; SOUZA, 2010, p. 108).
E é partir de nossas reflexões até aqui que propomos aos alunos uma proposta de
leitura com uso de estratégias de leitura em consonância com a história em quadrinhos
intitulada “Magali em tipos de gatos”.
4. A prática dos leitores em formação.
A presente proposta foi realizada com uma turma de 10 alunos dos 5º anos de uma
escola da rede municipal de ensino da cidade de Dracena/SP, que fazem parte de um
grupo de alunos de um projeto de leitura realizado na escola e que eles solicitaram a
continuidade do grupo pois, participaram de uma pesquisa no ano de 2015 e deram
continuidade ao trabalho neste ano de 2016.
Iniciamos a atividade retomando com as crianças as estratégias de conhecimento
prévio e de conexão para que elas pudéssemos avaliar oralmente se sabiam o que era e
constatamos que muitas ainda conseguiam se lembrar e até dar exemplos. Em seguida,
solicitamos que os discentes se sentassem individualmente, pois assim poderiam
expressar somente os conhecimentos prévios deles mesmos, sem a interferência de outro
colega.
Em seguida entregamos uma folha se sulfite colorida na qual cada criança anotou
seu nome e explicamos aos estudantes que nós iríamos ler uma história em quadrinho e
todas as vezes que encontrássemos um post-it (etiqueta colorida) pararíamos e eles
anotariam aquilo que viesse as mentes de acordo com as informações solicitadas.
Assim sendo, começamos a leitura e paramos no quadrinho abaixo:
Figura 1
Aproveitamos a fala da personagem Magali e questionamos os alunos se eles
também conheciam outras histórias que tivessem gatos legais. Enfatizamos que poderia
ser de filmes, livros, etc. Nosso objetivo aqui era que as crianças ativassem sua estratégia
de conhecimentos prévios, pois os conhecimentos anteriores ajudariam os sujeitos
envolvidos a relacionar algum fato, conteúdo ou aspecto do texto presente com um outro
texto lido anteriormente.
Registramos os conhecimentos anotados pelos alunos na tabela abaixo:
Ao analisarmos as respostas dos discentes constatamos que as crianças citaram os
nomes de personagens de histórias de literatura infantil, mas também de desenhos
animados e jogos de sites da Internet, ou seja, todos os diferentes textos com os quais os
alunos tem contato fizeram com que eles despertassem seus conhecimentos prévios.
De acordo com Solé (1998) essa situação inicial coloca a criança em estado de
leitura, ou seja, auxilia a mesma a levantar hipóteses sobre o que irá tratar a história e
possibilita que a criança entre no “jogo” da leitura.
No decorrer do enredo do texto selecionado são citados diferentes gatos famosos
que tem em comum o fato de serem protagonistas de outros textos. Além disso, a Hq
selecionada traz no texto verbal diversas “pistas” que servem de gatilho para o
acionamento do conhecimento prévio dos alunos e permitindo assim a realização de
conexões ao ler a história.
Ao chegarmos neste ponto paramos a leitura novamente e questionamos as
crianças se elas conheciam aquele gato e quais pistas do texto as ajudaram a identificar a
personagem:
1 Gatinha que é personagem do jogo Talking Angela 2 Personagem do Livro “O Gato Xadrez” de Isa Mara Lando
LEITOR CONHECIMENTO PRÉVIO LISTADO – QUADRINHO 8
01 Gato de Botas, Garfield, Tom e Angela1
02 Gato de Botas, Garfield, Tom
03 Gato de Botas, Tom, Angela, Mingau
04 Gato Xadrez2, Gato de Botas, Tom e Jerry
05 Gato de Botas, Tom, Angela
06 Gato de Botas
07 Gato de Botas, Garfield
08 Gato de Botas, Garfield
09 Gato de Botas, Garfield
10 Gato de Botas, Garfield, Tom
Figura 2
Destacamos que os leitores 01,02,07,08,09 e 10 já haviam destacado o Garfield
em suas respostas anteriores, entretanto o que queremos enfatizar são as respostas dos
alunos a seguir, uma vez que os mesmos não haviam listado o felino em seus
conhecimentos prévios:
Mesmo não se referindo ao Garfield antes, a partir da leitura do texto os educandos
relacionaram seus conhecimentos prévios com as “pistas” trazidas no texto e conseguiram
estabelecer a conexão entre os dois textos, a história em quadrinhos e o desenho animado
da personagem.
Já o leitor 03 fez a seguinte anotação sobre esse trecho: “Igual a Magali por causa
da lasanha porque ela é muito gulosa.” Ao lermos o texto escrito constatamos que a
criança conectou o texto lido com a personagem principal do Mauricio de Sousa na
história em quadrinhos.
Outro gato presente no enredo e muito lembrado pelas crianças foi “O Gato de
Botas”, da seguinte forma na história em quadrinhos:
LEITOR CONEXÃO REALIZADA
04 Garfield, porque ele é gordo, é laranja (colorimos o texto
ampliado) e porque ele gosta de comer
05 Garfield, porque ele é gordão, comilão, dorminhoco e adora
lasanha.
Figura 3
O que mais chamou nossa atenção em relação a ativação de conhecimentos foi
que nove crianças citaram o trecho “o olhar pidão” como a parte do texto que serviu de
pista, isto que, que ajudaram os alunos a fazerem a conexão texto-texto. Este fato revela
que a personagem marcou mais as crianças por causa da sua aparição na animação3 do
que pelo Conto de Fadas escrito por Charles Perrault.
Essa informação revela que muitos dos conhecimentos adquiridos pelos alunos
vem de experiências extra escolares, por meio da televisão e do cinema. No entanto, se
não houver um espaço em sala de aula para que os alunos façam uso desse conhecimento,
eles ficam com a impressão que não os tem, pois a escola não faz uso destes ao fazer com
que eles não se expressem oralmente.
Desta forma a mediação do professor é importante, pois se cada pessoa é única,
com experiências e origens diversas, de modo que os olhares e vozes que se cruzam no
momento das leituras a interpretação e o significado gerado pelo leitor será diferente.
Outros felinos famosos aparecem na história da Magali, tais como misterioso
“Gato de Cheshire” ou Gato Que Ri de Alice no País das Maravilhas; o Manda-Chuva de
Hanna-Barbera; o famoso felino dos livros de Dr. Seuss “O Gatola da Cartola Tem De
Tudo na Cachola” (The Cat in the Hat Knows a Lot About That!), que podemos ver em
desenhos animados e em filme; o também o muito citado pelas crianças no primeiro
momento da atividade o gato Tom criado para a Metro-Goldwyn-Mayer que vive em
eterna rivalidade com o seu arquiinimigo Jerry.
Entretanto, gostaríamos de salientar neste texto a importância da estratégia de
conhecimento prévio para o entendimento do leitor, por isso ressaltaremos a seguir os
3 O olhar do Gato de Botas tornou-se famoso por causa da participação da inserção dessa personagem na
animação norte-americano de 2004 “Sherek 2”, produzido pela DreamWorks Animation.
quadrinhos das personagens que as crianças em sua maioria não conseguiram arrolar, o
que gerou dificuldades na produção de sentidos pelos leitores.
O primeiro personagem que as crianças apresentaram dificuldades foi a Hello
Kitty 4, pois do total de 10 crianças, a metade reconheceu a gatinha por causa da roupa e
do lacinho.
Figura 4
Entretanto, os outros 50% não conseguiram conectar a personagem aos seus
conhecimentos prévios, e a única criança que arriscou foi o Leitor 05 que disse que era
“a gatinha Marie, por ela ser branquinha e usar vestido rasa e é fofa, eu vi na capa do
caderno de minha amiga”. Ao final da proposta de leitura quando discutimos e
socializamos as respostas dadas por todos, o Leitor 1 disse “Eu não sabia que a Hello
Kitty era uma gata!”. Tal fato justifica o aluno não ter relacionado a imagem do
quadrinho aos seus conhecimentos precedentes.
Outro personagem que causou estranheza aos discentes foi o Gato Félix5, uma vez
que as crianças não reconheceram a personagem por ser muito antiga.
4 Personagem criada pela empresa japonesa Sanrio e hoje é uma marca mundialmente conhecida como uma
gata. Apesar do bigode, das orelhas e do nome ("kitty" é um termo equivalente a "gatinho", em inglês),
Hello Kitty não é uma gatinha, ela é definida pela Sanrio como uma garotinha, uma amiga.
http://oglobo.globo.com/cultura/hello-kitty-um-ser-humano-nao-um-gato-dizem-criadores-13748639
5 Personagem de desenho animado mudo criado em 1920.
Figura 5
O próprio autor da história em quadrinhos brinca com este fato no decorrer da
apresentação da personagem, pois aparece a onomatopeia “Cri,cri!” que atualmente é
utilizada para indicar que alguém não entendeu alguma informação ou situação. Se
observarmos o segundo quadrinho verificamos que quando a personagem apresenta-se
ela é recebida por uma onomatopeia de sons de grilos, ou seja, o leitor da história não
entendeu quem ele é. E no terceiro quadrinho o gato verbaliza o fato de ninguém conhece-
lo, pois ele não é da época da Magali.
De todas as crianças apenas o Leitor 02 conhecia o Félix e relatou que: “Conheço
o Gato Félix porque o meu pai comprou para mim um monte de desenho velho quando
eu era pequeno.” Este fato valoriza as experiências individuais, pois são elas que
permitem ao leitor fazer uso de suas estratégias leitoras possibilitando ao mesmo a
compreensão do texto.
As autoras Girotto e Souza (2010, p. 66-67) afirmam que “o conhecimento prévio
que as crianças trazem para a leitura sustenta todos os aspectos da aprendizagem e
entendimento. Se os leitores não têm nada para articularem à nova informação, é bem
difícil que construam significados”.
Diante de tudo que descrevemos até aqui reafirmamos a importância do papel da
ativação do conhecimento prévio para a compreensão do novo conhecimento uma vez
que o leitor utiliza seus primeiros conhecimentos para constituir suas conexão, em
especial a texto-texto que trabalhamos nesta prática.
4. Finalizando nossas reflexões...
Encerramos o presente texto destacando alguns pontos importantes em relação ao
que discutimos até aqui. Primeiramente destacamos o valor das histórias em quadrinhos
para o processo de aprendizagem de leitura das crianças do Ensino Fundamental.
Um segundo ponto a ser enfatizado é o ensino de leitura a partir das estratégias de
leitura, cujo professor pode ser fazer a mediação da aprendizagem das estratégias de
leitura, e que os alunos precisam aprender dentro da sala de aula com o auxílio constante
do professor.
Além disso, salientamos que a estratégia de conhecimento prévio é vista como a
base para o uso das diferentes estratégias de leitura, pois quando o leitor relacionar os
conhecimentos adquiridos ao longo de sua vida com os novos atribuirá sentidos para a
leitura que está perpetrando.
Para isso ocorra os discente precisam ter diversos conhecimentos que envolvam o
contato com textos variados e que esse tenha sido significativo, a fim de que eles possam
buscá-los na memória e ligá-los ao que está lendo. Desta forma, o estudante pode fazer
conexões a partir de temas, personagens ou problemas abordados em outros textos, livros
ou histórias etc.
Neste sentido, reafirmamos então que os leitores em formação nas salas de aula
do Ensino Fundamental precisam vivenciar a leitura de diferentes gêneros literários e de
situações de uso de estratégias de leitura significativas para que se tornem leitores que
compreendam o significado de suas leituras.
Referências
AMARILHA, Marly. Alice que não foi ao País das Maravilhas: a leitura crítica na sala de aula.
Petrópolis/RJ: Editora Vozes, 2006.
COELHO, Betty. Contar histórias: uma arte sem idade. São Paulo: Ática, 2001.
ESCOLA KIDS. História em Quadrinhos. Disponível em:
<http://escolakids.uol.com.br/historia-em-quadrinhos.htm> Acesso em: 10 jun 2016.
GIROTTO, Cyntia Graziella Guizelim Simões. SOUZA, Renata Junqueira de. Estratégias de
leitura: para ensinar alunos a compreenderem o que lêem. In: SOUZA, Renata Junqueira de (org.)
Ler e compreender: estratégias de leitura. Campinas, Mercado de Letras, 2010.
LEFFA, Vilson Jose. Aspectos da leitura. Porto Alegre: Sagra - DC Luzzatto, 1996
MAURICIO DE SOUSA PRODUÇÕES LTDA. MAGALI. Nº 10, Mauricio de Sousa
Editora/Panini Comics, Fevereiro/2016.
MUNDO EDUCAÇÃO. História da História em Quadrinhos. Disponível em:
<http://mundoeducacao.bol.uol.com.br/literatura/historia-historia-quadrinhos.htm> Acesso em:
08 jun 2016.
OWOCHI, Gretchen. Comprehension – Strategic. Intruction for K-3 Students. Portsmouth:
Hernemann, 2003.
SOLÉ, Isabel. Estratégias de Leitura. Porto Alegre: Artmed: 1998.
SOUZA, Renata Junqueira de. MENIN, Ana Maria da Costa. Nas Teias do Saber: Vivências
da leitura na escola. 1. ed. Presidente Prudente: Gráfica Apollo, 2006.
VERGUEIRO, Waldomiro. Uso das HQS no ensino. In: VERGUEIRO, Waldomiro (org.)
Como usar as Histórias em Quadrinho na sala de aula. São Paulo: Contexto, 2006.
LISTA DE FIGURAS
1 – SOUSA, Mauricio de. Retirada da revista MAGALI. Nº 10 ............................. p. 04
2 – ________. Retirada da revista MAGALI. Nº 10 ................................................ p. 06
3 – ________. Retirada da revista MAGALI. Nº 10 ................................................ p. 07
4 – ________. Retirada da revista MAGALI. Nº 10 ................................................ p. 07
5 – ________. Retirada da revista MAGALI. Nº 10 ................................................ p. 08