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Estrada livre

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Naila barboni

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Naila barboni

São Paulo, 2013

COLEÇÃO NOVOS TALENTOS DA LITERATURA BRASILEIRA

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2013IMPRESSO NO BRASILPRINTED IN BRAZIL

DIREITOS CEDIDOS PARA ESTA EDIÇÃO ÀNOVO SÉCULO EDITORA

CEA – CENTRO EMPRESARIAL ARAGUAIA IIAlameda Araguaia, 2190 - 11o andar

Bloco A – Conjunto 1111CEP 06455-000 - Alphaville Industrial - SPTel. (11) 3699-7107 – Fax (11) 3699-7323

[email protected]

Copyright © 2013 by Naila Barboni

Coordenação editorial Letícia Teófilo

Diagramação Claudio Tito Braghini Junior

Capa Monalisa Morato

Preparação Thiago Fraga

Revisão Mônica Vieira / Project Nine

Barboni, Naila Estrada livre / Naila Barboni. -- Barueri, SP : Novo Século Editora, 2013. (Coleção Novos Talentos da Literatura Brasileira) 1. Ficção brasileira I. Título. 13-09563 CDD-869.93

1. Ficção : Literatura brasileira 869.93

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

Índices para catálogo sistemático:

Texto de acordo com as normas do Novo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa (Decreto Legislativo no 54, de 1995)

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Para todos aqueles que, um dia, acreditaram em mim.Especialmente para minha mãe, Leandra, que lia para

mim quando eu era criança.

2013IMPRESSO NO BRASILPRINTED IN BRAZIL

DIREITOS CEDIDOS PARA ESTA EDIÇÃO ÀNOVO SÉCULO EDITORA

CEA – CENTRO EMPRESARIAL ARAGUAIA IIAlameda Araguaia, 2190 - 11o andar

Bloco A – Conjunto 1111CEP 06455-000 - Alphaville Industrial - SPTel. (11) 3699-7107 – Fax (11) 3699-7323

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Primeiramente, a Deus. Muito obrigada. Sem Ele, nada disso seria possível, nem mesmo poder agradecer aos seguintes:

Mãe e pai, Leandra e Clodoaldo, e minha irmã, Naiara. Vocês são minha base principal. Muitíssimo obrigada por tudo e desculpem qualquer coisa. Amo muito vocês.

Aos meus queridos amigos (não levem em con-sideração a ordem): Camila Aparecida da Silva, Bruna Vendrasco, Renan Sanches (integrante da banda Pote de Ouro, é melhor você comparecer ao meu próximo aniversá-rio), Paula Cibotto, Diego Lau, Rômulo Lopes, Heitor Zanardi, Ana Julia Silva e Giulia Cerquetani. Em especial à minha melhor amiga, Mariana Neris, inspiração para uma das personagens de Estrada Livre e confidente nas ho-ras vagas, você é muito importante para mim, mais do que posso dizer. Te amo muito!

À minha amiga e psicóloga, Leide Rotelli Gomes, umas das melhores pessoas deste mundo e que adoro tan-to. Você é uma das poucas pessoas que poderão identificar toda a minha vida nesta narrativa.

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Ao grande Marcelo Cárfora, o primeiro a ler o original completo, muitíssimo obrigada pelas dicas e pela espada de treino Bokuto, tudo foi maravilhoso.

Agradeço ao meu professor de redação, Michel Francisco, por todos os puxões de orelha por causa de meus finais óbvios. Você me ajudou bastante.

Aos meus professores de música, Ulises Cárdenas e Joyce Balieiro. Só tenho a agradecer a vocês pelo auxílio que me deram para eu superar a mim mesma cada vez mais.

A todos os escritores internacionais e nacionais que admiro. Para citar alguns (só alguns, porque não cabem todos): J. K. Rowling, Justin Somper, Rick Riordan, Laurell K. Hamilton, Raphael Draccon, André Vianco, Carolina Munhóz, Luiza Salazar. Vocês e muitos outros são uma gi-gantesca, esplendorosa e maravilhosa inspiração.

A todo o pessoal da Novo Século, principalmente àqueles do selo Novos Talentos da Literatura Brasileira. Vocês me aceitaram e isso é o sonho de todo escritor. Mui-to, muito obrigada. Mesmo, mesmo!

Peço mil desculpas caso tenha me esquecido de al-guém, mas, como mais livros virão, haverá espaço de so-bra para vocês.

Tenho o costume de dizer “pense sempre positivo”, então estou pensando positivo: terei muitos leitores e já os agradeço desde já. Vocês já são muito importantes para mim. Espero que eu possa ter lhes ajudado de alguma for-ma, mesmo que apenas para fugir por poucas horas de vida louca de hoje em dia.

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Desde a criação da humanidade, há milhares de anos, eles querem vingança. Acham que Deus renunciou a eles, e, então, quando houve A Queda, juntaram-se a alguém que prometeu ajudá-los com o que queriam. Por muitos anos, articularam planos e quando o puseram em ação, houve pessoas que conseguiram impedi-los, que, de alguma for-ma, foram poderosas o suficiente para combater aqueles que queriam vingança.

Como se isso não bastasse, ela tinha que sumir, a pri-meira das Sete Esposas, a mais poderosa. Por ser tão pode-rosa, conseguiu atingir seu objetivo: caminhar sobre a Terra em diferentes vidas humanas. Disse que cinco mil anos bas-tariam, que faria visitas durante esse tempo.

E ela as fez, mas ao final de cinco mil anos não voltou.Seus olhos brilharam quando finalmente tomou a de-

cisão de encontrá-la. Nem que para isso tivesse que acabar com a vida na Terra, humana ou não.

E, se fosse preciso, assim seria.

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19.09.2009

E mais uma vez senti um olhar em minhas costas.Desde que havia chegado, tinha a impressão de que

alguém me observava. Parei onde estava, olhando ao redor, procurando por um possível observador. Nada.

– O que tanto você olha? – ouvi um de meus amigos perguntar. Apenas balancei a cabeça, evasiva. Estávamos no Playcenter, um parque de diversões em São Paulo, durante a “Noite do Terror”, época em que contratados do parque fantasiavam-se de monstros. Este ano tinha como tema “A Noite Maldita”, baseado nos livros do escritor André Vianco. Éramos nove, no total.

Apesar de apreensiva com os olhares que eu acha-va receber, divertia-me com meus amigos. Estávamos no Beco dos Mulos, umas das atrações de terror do parque. Foi quando vi um garoto, lindo por sinal, e ele, um estranho, olhava-me fixamente.

Estranhamente, eu sentia que o conhecia de algum lugar.

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Apressando meus amigos, deixei o beco, evitando contato com o garoto alto que agora mexia com a mão nos cabelos negros e elaboradamente bagunçados. Ele tinha a pele branca, o rosto bem delineado e o maxilar firme.

Logo que saímos do beco, resolvemos ir à praça de ali-mentação e mais uma vez relaxei com meus amigos. Quan-do terminei de comer, levantei-me para jogar o lixo fora. Fui sozinha, já que era a única a ter acabado. Estava guardan-do a bandeja, quando senti um perfume almiscarado no ar. Muito bom. Ao me virar, deparei-me com a figura alta do meu observador. Por um segundo, fiquei encarando seus lá-bios finos. Ele era realmente lindo.

– Em que posso ajudar? – eu quis saber um tanto quanto seca voltando meu olhar para cima, para seus olhos castanho-claros. Consegui ser firme apesar de sua beleza de tirar o fôlego (eu não estava acostumada a ver pessoas tão bonitas pessoalmente). O fato era: eu não gostava de ser se-guida. Acho que ninguém gosta, na verdade.

– Preciso falar com você.– Me conhece, por acaso?– Relativamente. Não sei seu primeiro nome, mas sei

que é uma Barone – sua resposta deixou-me ainda mais aler-ta, poucas pessoas sabiam qual a relevância de minha des-cendência. Se ele fosse quem eu pensava, eu poderia estar com um problema.

– Quem é você? – perguntei na defensiva.– Bernardo Valfenir – respondeu.É, eu tinha um problema.– E o que o mais novo Patrono quer comigo? – nossas

famílias, Barone e Valfenir, conheciam-se há muito tempo e por algum motivo (eu não saberia dizer exatamente qual) brigaram e mantiveram essa rixa até hoje.

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– Preciso falar com você, já disse, mas não aqui. Pode se encontrar comigo em outro lugar?

– Ah, claro. Pode ter certeza que sim – retruquei sar-cástica, cruzando os braços.

– Não seja tão resistente. Sua família é conservadora? Não vejo por que continuamos com essa briga. Nem ao me-nos sei o motivo.

– Confio nos meus parentes. Grande parte mantém receios, não sei por que eu seria diferente. Agora, se me der licença, meus amigos estão me esperando. Adeus, Bernardo – falei, encerrando a conversa.

– Então, não vai conversar comigo, não é? – disse me seguindo. – Vou conseguir o que quero de outra maneira – ele me ultrapassou, dirigindo-se à mesa que meus amigos ocupavam. Quando tentei alcançá-lo, ele apressou o passo, chegando à mesa alguns passos antes de mim.

– Desculpe a intromissão. Cometi um erro e estou ten-do dificuldades em conseguir o perdão da amiga de vocês. Eu poderia ter algum tipo de ajuda? Admito, estou interessa-do nela – ele declarou, recebendo a atenção de meus amigos.

– O que você está fazendo?! – eu quis saber, brava.– Lilith, quem é ele? – Lana, uma de minhas amigas,

perguntou. Ótimo, agora ele sabia meu nome!– Um conhecido. Já está de saída – respondi estreitan-

do os olhos para ele.– Mas o que é isso, Líli? Venho até aqui só para encon-

trá-la e você nem me apresenta aos seus amigos? – eu tinha que admitir, ele era um bom ator.

– “Líli”? Ninguém nunca a chamou assim – Mariana, minha melhor amiga, disse levantando-se. – Mas, se você veio encontrá-la, deve juntar-se a nós. Quero saber mais so-bre o que ela tem que perdoá-lo.

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Levei as mãos à cabeça, frustrada. Agora não tinha como me livrar do Valfenir.

– Pois bem... – falei, me resignando. – Gente, este é Bernardo. Bernardo, meus amigos: Mariana, Lana, Renato, Ana, Giulia, Vinicius, Beatriz e Artur – apresentei-os, en-trando no papel de amiga de Bernardo.

– Desculpem-me mais uma vez por aparecer tão de repente. Foi o único modo que encontrei de me aproximar de Lilith – Bernardo explicou, olhando em meus olhos, pare-cendo genuinamente culpado. Ele estendeu a mão, tocando meu rosto com sua pele macia. Garoto ousado!

– Vá com calma – contestei afastando sua mão com a minha, não sem antes perceber um anel em seu dedo, mas sem ver os detalhes. – Ainda não o perdoei.

– Então – ouvi Renato interromper –, chega de conver-sa e vamos para algum lugar.

Sem demora, meus amigos levantaram-se e foram para fora da praça de alimentação. Fiquei alguns passos para trás, esperando Bernardo ficar também.

– O que você pensa que está fazendo? – questionei, baixando ligeiramente a voz.

– Novos amigos – respondeu sorrindo. Ele tinha um sorriso lindo. Seria mais fácil ficar brava com ele sem isso.

– Não faça nada com eles porque não têm nada a ver com nossas famílias.

– Não se preocupe. Meu interesse é em você – ele pis-cou. Revirei os olhos, alcançando meus amigos.

– O que ele fez para você? – Mariana me perguntou, sem que mais alguém ouvisse.

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– Um dia ele me convidou para sair – comecei a res-ponder, pensando rápido –, fomos a um shopping. Estava tudo indo muito bem até que uma amiga dele apareceu e eu fui praticamente descartada. Admito, fiquei com ciú-mes – menti.

– Meu Deus, isso é inédito, você gostando de alguém? – ela estava surpresa. Caíra na minha conversa. – Mas por que você nunca me falou sobre ele?

– Ahn... Não achei conveniente – falei rapidamente, vendo Bernardo passar por nós, indo conversar com Renato e Vinicius.

– Nossa, muito obrigada. Mas te conheço bem o bas-tante para saber que havia a possibilidade de não me contar coisas desse tipo, por isso não vou ficar muito brava com você – suspirei. – Ele é lindo, dá para ver por que está inte-ressada nele.

Tudo o que eu tinha vontade de fazer naquele mo-mento era bater em alguma coisa, ajudaria a descarregar a raiva. Era por isso que eu tinha um saco de pancadas em meu quarto. Infelizmente, ele estava muito longe.

– Deixe isso entre nós, por favor – pedi. Graças a Deus, Mariana era confiável e eu sabia que ela não ia contar nada.

– Tudo bem, até que parte você ouviu? – questionei Bernardo enquanto íamos para o primeiro par de bancos do brinquedo Cataclisma. Uma parte do grupo foi para a fila da montanha-russa Boomerang, mas eu, Bernardo, Giulia, Mariana, Ana e Vinicius preferimos o Cataclisma.

– Até a parte que você diz que não achou conveniente contar a Mariana sobre mim.

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– Ótimo, não preciso repetir a história.– Certo, me desculpe por aparecer de repente. Eu de-

veria ter sido mais cordial, mas você pode me dizer por que é tão agressiva comigo?

– Você é um Valfenir – antes que pudéssemos dizer qual-quer outra coisa, o brinquedo começou a funcionar, girando-nos de ponta-cabeça. Depois de uns minutinhos acabou. Eu adorei.

Saí meio tonta e Bernardo me seguiu, observando-me atentamente, como se eu pudesse cair. Quando eu estava caminhando, com minha cabeça girando, senti que por um instante o chão ficou mais próximo de mim. Isso foi antes de ter mãos fortes em minha cintura e depois estar sentada em um banco próximo.

– Você está bem? – Bernardo quis saber, sentando-se ao meu lado.

– Estou. Obrigada.– Não há de quê.– Li, o que aconteceu? – Ana questionou, quando se

aproximou.– Só uma pequena vertigem. Já passou, mas vou ficar

sentada um pouco, sim?– Tudo bem, a gente vai esperar o resto do pessoal sair

do Boomerang. Quer que alguém fique com você?– Fico com ela, Mari – Bernardo respondeu antes que

eu o fizesse. Maldição.– Então a gente já volta – Giulia disse e foi para a mon-

tanha-russa puxando os outros consigo.– Você está bem mesmo?– Está tentando me agradar? – perguntei acusadora.– Só quero saber se você está bem, nada demais. Acre-

dite, eu não queria estar aqui. Você me julga só por que sou um Valfenir? Está sendo preconceituosa.

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– Disseram-me que um Valfenir matou um Barone e desde então nossas famílias vêm brigando. Motivo suficien-te para eu não confiar em ninguém da sua linhagem.

– Não estou pedindo sua confiança tão prontamente. Mas, pense comigo, isso aconteceu há muito tempo, então como eu poderia ter tido alguma relação com o ocorrido?

– Você tem um ponto. Mas se minha família, ao lon-go dos anos, vem desconfiando da sua, por que eu deve-ria ser diferente?

– Porque você deve tirar as suas próprias conclusões.Eu não tinha respostas. Ele tinha razão.– Não vou me desculpar pela desconfiança – falei, enfim.– Não estou pedindo que se desculpe – ele sorriu, pas-

sando a mão esquerda em seus cabelos e olhando ao redor.– Posso ver seu anel? – pedi quando o notei novamen-

te. Ele o tirou e me entregou. Era de prata, com um pequeno coração cravado com uma pequena adaga; o punho desta continha minúsculos rubis. – Onde você conseguiu um des-ses? – eu quis saber, encantada. Eu adorava anéis. Na mão esquerda, tinha um duplo em formato de espada com uma pequena caveira sobre ela nos meus dedos anelar e médio; na direita, um solitário que costumava ser da minha mãe no dedo médio, uma caveira pirata com apenas um olho ver-melho no indicador e um terceiro no polegar direito.

– Minha avó fez para mim. Ela trabalhava com isso – neste momento, meus amigos voltavam, todos eles. Devol-vi-lhe o anel.

Levantamo-nos e fomos ao encontro deles, que haviam decidido ir ao elevador de queda livre do Playcenter, o Tur-bo Drop. Eles pareciam aceitar Bernardo, pareciam gostar dele. Eu provavelmente também gostaria se não fosse por minhas suspeitas, porém elas estavam começando a mudar.

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– Quantos anos você tem? – Bernardo perguntou en-quanto esperávamos por nossa vez de ir no elevador.

– Dezessete – respondi. – Mais alguns meses e poderei dirigir. Legalmente, digo.

– E você dirige ilegalmente?Merda. Quase me dei um tapa na testa por deixar essa

escapar.– Só manobro o carro para minha mãe de vez em

quando e dirijo no sítio da minha tia, nada demais – expli-quei. – Mas quantos anos você tem?

– Dezoito – disse presunçoso. – E eu fazia o mesmo que você antes de conseguir minha habilitação.

Mais alguns minutos e chegou a nossa vez. Bernardo estava sentado do meu lado direito e Lana do esquerdo ao iniciarmos a subida. Quando chegamos lá em cima, ouvi Lana rezando baixinho, de modo quase inaudível. Bernardo, por sua vez, segurava a barra de proteção com força, os nós dos dedos brancos e os olhos fechados com força. Dei um sorriso e subitamente despencamos. Todos gritaram menos Bernardo e eu (mas eu não tinha esse costume). Subimos no-vamente, mas não até o topo e voltamos a cair, ficamos qui-cando até diminuir a velocidade para podermos sair do brin-quedo. Assim que as travas foram soltas, pulamos para fora rindo. Para ser bem sincera, eu esperava mais do brinquedo. Bernardo não parecia muito bem, não ria e estava pálido.

– Você está bem? – examinei, ajudando-o a se levantar.– Acho que preciso me sentar – ele deu um sorriso fraco.– Venha – falei e o puxei para um banco. Faltavam uns

minutos para o encerramento, tempo suficiente para ele se recuperar. – Sua cor está começando a voltar.

– Valeu por me tirar de lá. Acho que não teria conse-guido sozinho.

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– Não se acostume. Mas, devo dizer, esse é um dos brinquedos mais calmos que já fui. Não tem emoção – ele revirou os olhos.

Assim que Bernardo melhorou, nos dirigimos para a Área 3 do parque onde aconteceria o encerramento da “Noi-tes do Terror”. A apresentação começou e terminou com muitos gritos e aplausos, mas eu não conseguia me divertir tanto quanto meus amigos. Além de ainda estar um pouco apreensiva com a presença de Bernardo, havia a questão de como eu iria embora. Meus pais haviam ligado há poucos minutos avisando que não tinham como me buscar porque o carro havia quebrado. Meus oito amigos tinham carona para casa, o tio de Lana tinha uma van e se oferecera para buscá-los. Para minha (má) sorte, a van estava lotada.

Assim que começamos a nos despedir, começou uma garoa fina, Lana saiu correndo para não estragar o alisamen-to nos cabelos, com meus amigos em seu encalço. Eu devia ter esperado algo do tipo dela, ela não tinha ido em nenhum brinquedo que molhava.

– Você vai embora com quem? – Bernardo perguntou quando começamos a caminhar para encontrá-los.

– Boa pergunta – respondi pegando meu celular e pen-sando em ligar para alguém que pudesse me buscar. Só não sabia quem. Talvez meu primo Eric, mas provavelmente ele estaria ocupado. Então, quem? – Acho que terei de chamar um táxi – aquela me parecera a única solução, mas não me agradava. Não me sentia à vontade ficar sozinha em carro de gente totalmente desconhecida.

– Eu levo você, se prometer se comportar – ele disse.– Aceito sua proposta se você se comportar – retru-

quei. Apesar de ele ser praticamente um estranho, aceitei. Eu estava muito curiosa a respeito dele.

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Não encontramos nossos amigos para nos despedir-mos, então fomos direto para o estacionamento. Eu sabia que mais tarde viria uma mensagem em meu celular de algum deles pedindo desculpas por terem me deixado sozinha.

– Espero que não se importe de andar de moto – Ber-nardo falou, parando ao lado de uma moto prata com deta-lhes em preto, um modelo esporte de corrida.

– Uma K 1300 S. Bela escolha.– Obrigado. Gosta de moto? – ele parecia surpreso

com meu gosto.– Prefiro carros, com certeza. Mas essa BMW em parti-

cular chamou minha atenção – ele subiu na moto, indicando o acento atrás de si e me entregando um capacete preto, igual ao dele. – Como descobriu que eu estaria aqui hoje? – quis saber, subindo na moto.

– Um dia conto. Se eu falar agora, parecerá maluquice – respondeu passando os braços para trás, pegando minhas mãos e colocando-as em sua cintura.

– Não se aproveite.– Não estou me aproveitando, só não quero que você

caia – apenas deixei minhas mãos onde estavam porque eu sabia a potência desse modelo esporte da BMW, não queria mesmo cair.

O que estava acontecendo comigo? Não sou o tipo de pessoa que pega carona com alguém que não conhece. Qualquer um que me conhecesse podia confirmar isso, mas meus oito amigos pensavam que eu e Bernardo já nos co-nhecíamos, então não havia ninguém para questionar por que eu estava fazendo uma provável bobagem além de mim mesma. E eu me questionava tarde demais.

Então, se eu ia me ferrar, ia pelo menos aproveitar um pouco. Quando Bernardo acelerou, tive a desculpa perfeita

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para abraçá-lo. Pude sentir os músculos de seu abdômen contra meus braços. Bernardo se tornava cada vez mais interessante.

Não precisei indicar o caminho para minha casa, ele parecia saber onde eu morava. Como? Isso me deixou um pouquinho mais preocupada. Mas algo dentro de mim, bem lá no fundo, achava que nada de ruim ia acontecer. Era mi-nha intuição, eu sabia, por outras experiências, que ela nun-ca estava errada. Foi o que me permitiu relaxar um pouqui-nho quando já tínhamos feito metade do caminho.

– Só para saber, a gente se conhece de algum lugar? Tenho a impressão de que já o vi – perguntei descendo da moto quando ele parou na frente da minha casa. – E isso não é uma cantada – completei. Ele riu antes de responder:

– Se tivesse visto eu lembraria, você é marcante.– Vou entender como um elogio. Obrigada pela carona –

eu disse. – Mas preciso de algumas respostas.– Vou dá-las quando se encontrar comigo.– Quem disse que vou me encontrar com você?– Você não tem nada a perder. O assunto é de seu inte-

resse, posso garantir.– Tudo bem – concordei depois de relutar um pouco.

– Quando e onde?– Eu ligo – disse sorrindo. Puxou-me rapidamente

para perto de si e me deu um beijo na bochecha. – Até mais, Líli – ele partiu sem que eu conseguisse dizer nada, e me deixou pensando em como conseguira meu telefone.

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