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Mapeamento de Baixo Guandu
Estação Cultural
Estação Cultural
Textos Júlia MottaFotos Marcela Pin
Mapeamento de Baixo Guandu
Rio de Janeiro2017
100 páginas. Tiragem: 300 exemplares. Distribuição gratuita.
Motta, Júlia, 1981-Estação Cultural: Mapeamento de Baixo Guandu / Júlia Motta.
- Rio de Janeiro : Movida Produções, 2017. 108 p. ; 21 x 15 cm.
ISBN 978-85-94408-00-6
1.História do Brasil 2. Etnologia 3.Cultura 4.Mapeamento Cultural 5.Espírito Santo 6.Baixo Guandu I. Título
CDD 300
CIP - Brasil. Catalogação-na-fonteSindicato Nacional dos Editores de Livros, RJ
© Fundação ValeTodos os direitos reservados.
1ª edição2017
Com base no princípio de que todo cidadão tem
direito à cultura, a Fundação Vale busca contribuir para a
democratização do acesso aos bens culturais, valorizando o
patrimônio material e imaterial brasileiro. Nesse contexto, atua
na implantação e gestão de equipamentos culturais e projetos
que colaboram com o desenvolvimento dos indivíduos e da
sociedade.
Esta publicação é fruto do comprometimento da Fundação
em contribuir com a valorização da identidade cultural de
locais onde a Vale está presente. Para sua realização, foram
mapeadas algumas manifestações culturais do município de
Baixo Guandu, no Espírito Santo, além da mobilização dessas
pessoas para contar suas histórias.
Esperamos que a publicação Estação Cultural: Mapeamento
de Baixo Guandu contribua para o reconhecimento da
identidade cultural do município e que sua população se
perceba como parte dessa identidade.
Apresentação Índice
Transver a cidade
História de Baixo Guandu
Memória de algum lugar
ArtesanatoArtes VisuaisMúsicaEquipamentos CulturaisFeiras e MercadosSaboresFestas e EventosLazer
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101434385464728092
Fundação Vale
Estação Cultural: Mapeamento de Baixo GuanduEstação Cultural: Mapeamento de Baixo Guandu
É no cair da tarde das quintas-feiras que os guanduenses têm um
encontro marcado: a Praça São Pedro, no Centro da cidade. Lá é
possível escutar a risada das crianças brincando no parquinho,
onde os jovens – de idade e de espírito – se desafiam em partidas
de vôlei de areia. Nesse mesmo local, as pessoas consideradas
da melhor idade dividem-se entre dominó e bocha. Outros já
preferem sentar para comer, beber e jogar conversa fora. É onde
os moradores vão fazer feira. Sim, uma feira noturna para aliviar o
calor. Música é outro elemento que não pode faltar nesse encontro:
uma expressão cultural presente no conjunto da cidade, que é
embalada por diversos sons.
Manoel de Barros, em seu Livro sobre o Nada, destaca que
“o que o olho vê, a lembrança revê e a imaginação transvê”. Nas
páginas a seguir, um convite para “transver” a cultura de Baixo
Guandu, que tem na selaria e na cavalgada outro ponto forte. A
partir dessa leitura, é possível descobrir um pouco mais sobre as
manifestações culturais do município, suas personagens e suas
histórias – que se confundem com a própria história do local.
Estação Cultural : Mapeamento de Baixo Guandu é o resultado
de um trabalho de pesquisa de campo que identificou oito áreas:
artesanato, artes visuais, música, equipamentos culturais, feiras e
Transver a cidade
mercados, sabores, festas e eventos e lazer. Dentro desses setores
mapeados, foram catalogados 31 itens a partir de dezenas de
entrevistas com moradores, representantes do governo e equipe
técnica tanto do governo municipal quanto estadual.
Por estas páginas será possível viajar por uma cultura rica e
singular do município capixaba e deixar a imaginação transver.
Este mapeamento cultural dá visibilidade a diversas tradições,
costumes, pessoas e crenças. Cria a possibilidade de um encontro
de seus moradores com sua história e consigo mesmos. Torna-se
uma ferramenta importante para a gestão da política pública. É um
legado não só para a cidade mapeada, mas para a cultura do país.
Gera um espaço de significações e ressignificações da identidade
de um local, servindo de modelo para outros municípios.
E, para esses fazedores de cultura, este livro torna-se uma
ferramenta para novas propostas de projetos de lei que valorizem
essas manifestações e facilitem o acesso a elas. É preciso estimular
mais a articulação dos grupos entre si para que eles se reconheçam
como cultura e passem a atuar em conjunto para reivindicar pautas,
melhorar a divulgação de suas atividades e fornecer subsídios para
alcançar maior visibilidade e reconhecimento.
É preciso transver Baixo Guandu! Boa leitura.
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Estação Cultural: Mapeamento de Baixo GuanduEstação Cultural: Mapeamento de Baixo Guandu
O povoado que deu origem ao município de Baixo Guandu
começou a se formar em 1866, quando chegaram ao local o major
veterano da Guerra do Paraguai José Vieira de Carvalho Milagres
e seu filho Francisco de Carvalho Milagres, ambos fazendeiros
em Cantagalo, no Rio de Janeiro. Eles fixaram-se nas terras que
margeavam os Rios Guandu e Doce e, em 1872, trouxeram
em definitivo seus familiares para o local, tornando-se grandes
empreendedores no comércio e na navegação do Rio Doce.
Antes do major e de seu filho se estabelecerem no que hoje é
reconhecido como Baixo Guandu, há registros de outras tentativas
de permanência na localidade. No entanto, houve muita defesa
dos índios que viviam à margem do Rio Doce: os botocudos. Eles
resistiram durante décadas à tentativa de colonização do Rio Doce,
mas foram duramente perseguidos e mortos depois que o governo
de dom João VI resolveu efetivamente fazer a ocupação da região.
1 In: Revista Baixo Guandu – Edição Especial 150 Anos de Colonização, abril/2016.
O território passou por uma violenta tentativa de pacificação para
que pudesse se tornar uma aldeia destinada a abrigar viajantes e
comerciantes. Esse processo contou com o apoio político e militar da
coroa portuguesa, numa campanha conhecida como Aldeamento
do Mutun. O Quartel do Porto de Souza foi construído próximo à foz
do Rio Guandu, e, em 1813, duramente atacado e destruído pelos
índios. Em apenas um século, entre 1800 e 1900, os botocudos foram
praticamente dizimados da região do Vale do Rio Doce.
A colonização do local, iniciada pelo major Milagres, teve
sua base sedimentada no trabalho de imigrantes europeus de
várias procedências no núcleo colonial de Afonso Pena, hoje
Ibituba, um dos distritos de Baixo Guandu. Em 1879, o Rio Doce
viu surgir a navegação a vapor, impulsionando o comércio de
produtos, como fumo, toucinho, carne-seca, mel e café.
No entanto, a partir de 1907, com a chegada da Estrada
de Ferro Vitória a Minas, as marias-fumaças tornaram-se um
novo meio de transporte de mercadorias muito mais rápido e
econômico. Como consequência, houve o declínio da navegação
pelo Rio Doce. Esse novo ciclo também é exemplo do processo
de urbanização que acompanha esse crescimento. A aldeia foi
povoada por imigrantes europeus (italianos, franceses e espanhóis)
que vinham ao Brasil em busca de empregos e terras. “Os colonos
2 “Em 1859, criou-se a mando de dom Pedro II o chamado Aldeamento do Mutum, situado na foz do Rio Mutum Preto, cujo objetivo era catequizar os indígenas, que pouco tempo mais tarde foi desativado devido à precariedade e a ataques dos próprios índios. Apesar disso, aos poucos os nativos passaram a se familiarizar com a civilização”. Disponível em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Baixo_Guandu, acessado em 2 de abril de 2017.3 In: Revista Baixo Guandu – Edição Especial 150 Anos de Colonização, abril de 2016.4 In: EFVM – Diagnóstico Integrado em Socioeconômica da Estrada de Ferro Vitória a Minas. Dimensão Histórico-Cultural. Junho de 2008.5 Disponível em: http://www.pmbg.es.gov.br/v1/?, acessado em 4 de abril de 2017.
estrangeiros se estabeleceram no Vale do Guandu e outros no
Ribeirão do Lage. Em ambas as margens, há, ainda hoje, sinais
marcantes da herança europeia no município.”
Em 1891, Baixo Guandu foi elevado a distrito de Linhares e,
em 1915, tornou-se sede do município. No ano de 1921, passou
a pertencer a Colatina, que havia se tornado independente
em agosto do mesmo ano. Em 1934, foi criada uma comissão
pró-emancipação de Baixo Guandu, que iniciou um intenso
trabalho junto ao governo do estado. A oficialização aconteceu
em 10 de abril de 1935.
Baixo Guandu localiza-se a 186 quilômetros da capital
do Espírito Santo, Vitória. Sua área é de 916.931 quilômetros
quadrados e a cidade é constituída de cinco distritos: a sede
Baixo Guandu, Alto Mutum Preto, Ibituba, Km14 do Mutum e
Vila Nova de Bananal.
História de Baixo Guandu
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Estação Cultural: Mapeamento de Baixo GuanduEstação Cultural: Mapeamento de Baixo Guandu
Por Adriana Facina6
As casas tão verde e rosa que vão passando ao nos ver passar
Os dois lados da janela
E aquela num tom de azul quase inexistente, azul que não há
Azul que é pura memória de algum lugar (Caetano Veloso, Trem das Cores)
Quem chega de trem a Baixo Guandu, em dia de imenso azul
no céu e sol forte, não imagina que sua história se iniciou com
um violento esforço de pacificação dos indígenas que viviam às
margens do Rio Doce. A resistência dos botocudos às tentativas
de colonização de suas terras durou décadas. Dizimados os
povos originários, no século 19 as terras foram ocupadas por
trabalhadores imigrantes europeus de várias procedências. A partir
de 1907, com a inauguração da Estrada de Ferro Vitória a Minas,
mais colonos europeus chegaram à região e houve um processo
de urbanização fruto do crescimento econômico e populacional.
6 Adriana Facina é graduada e mestre em história, com doutorado e pós-doutorado em antropologia social. É professora no Museu Nacional/UFRJ e no PPCULT/UFF. Pesquisa produção cultural e criação ar-tística, principalmente a realizada em favelas e periferias. Coordena a Universidade da Cidadania, órgão do Fórum de Ciência e Cultura da UFRJ. Publicou os livros Santos e Canalhas: Uma Análise Antropológica da Obra de Nelson Rodrigues, Literatura e Sociedade, Vou Fazer Você Gostar de Mim: Debates sobre a Música Brega e Poesia Favela, Acari Cultural: Mapeamento da Produção Cultural em uma Favela da Zona Norte do Rio de Janeiro.
Memória de algum lugar
Emancipado em 1935, hoje o município de Baixo Guandu possui
cerca de 32 mil habitantes, 77% deles vivendo em área urbana.
Apesar dessa predominância da população urbana, a cultura
de Baixo Guandu tem forte referência rural. A arte da selaria,
que garante beleza e segurança para cavaleiros e amazonas,
é importante no município. As oficinas são familiares e os
ensinamentos do ofício são transmitidos pelos mestres mais
velhos aos aprendizes, que organizam seus negócios com suas
famílias. Assim também ocorre com a olaria, outra tradição
artesanal do lugar. Mas a selaria possui relação com atividades
de lazer e eventos importantes no município: as cavalgadas, o
Baixo Guandu Rodeio Show e a Festa dos Trabalhadores Rurais de
Ibituba. Todas essas práticas são baseadas em devoção ao sagrado
ou festas profanas, onde fé, viola, bebida e jogos se misturam.
A música sertaneja embala essas ocasiões de festejos e lazer,
mas também está muito presente no cotidiano do município. No
entanto, nem só de sertanejo vivem os cidadãos guanduenses.
A cidade tem forte e diversificada tradição musical: seresta, bandas
de heavy metal, forró, música erudita, a Banda Municipal Lyra
Guanduense (com mais de 50 anos de existência) e as fanfarras.
Das 14 escolas municipais, 12 possuem fanfarras, além de
duas escolas estaduais e uma particular. Elas desfilam no dia
7 de Setembro pela cidade, num grande festejo musical. A
disseminação dessas fanfarras nas escolas do município faz
com que quase todos os seus cidadãos tenham contato com
instrumentos e teoria musical. Todas as quintas-feiras, durante a
Feira Municipal, a força dessa tradição musical de Baixo Guandu
pode ser percebida nos shows que acontecem na Concha
Acústica da Praça São Pedro. Essa praça é a principal da cidade,
onde se situa a Igreja Matriz. A feira ocupa os arredores da praça
pública, que se transforma num local de encontro, conversa, lazer,
trocas entre os moradores, principalmente de noite, quando o
forte calor de Baixo Guandu fica mais ameno.
A Concha Acústica faz parte do conjunto de equipamentos
culturais da cidade, alguns de grande valor histórico, mas
ameaçados pela conservação precária. Um exemplo é o Canaã
Clube, inaugurado em 1953 e palco de grandes Carnavais de
clube, algo em extinção por todo o país. Sua arquitetura é original:
pedras, tijolos queimados, madeira de lei e telhas francesas
compõem o conjunto. Hoje é sede de bailes da terceira idade e de
ensaios da Banda Municipal Lyra Guanduense.
O Casarão da Madame Albertina é outro desses equipamentos
culturais importantes para a memória do município. De propriedade
de uma família de imigrantes alemães, o casarão foi erguido em
1919, próximo à estação ferroviária. Sua dona, madame Albertina,
era uma grande comerciante local. A prefeitura adquiriu o imóvel
em 2006 e pretende transformá-lo em museu. A família de madame
Albertina também foi uma das responsáveis pela construção do
Cine Alba, incrível cinema construído em 1954 pelas famílias Holz
e Kunkel. Muito moderno para sua época, a sala contava com 800
lugares e hoje se encontra abandonada, à espera de restauro.
Essa convivência do moderno e do tradicional faz parte da
cultura de Baixo Guandu. Se a cavalgada é o principal lazer de
muitos de seus moradores, o lugar também é uma referência
nacional do parapente, esporte contemporâneo de aventura.
Seus praticantes desenvolvem atividades de lazer e sociabilidade
na sede construída por eles próprios.
O fazer cultural autônomo é uma prática comum em Baixo
Guandu, o que envolve diversos mecanismos de autofinanciamento.
São poucas as manifestações culturais do município que
contam com recursos financeiros públicos expressivos.
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Estação Cultural: Mapeamento de Baixo GuanduEstação Cultural: Mapeamento de Baixo Guandu
Uma prática importante é a do bingo, ou binguinho, como
dizem os moradores. O jogo, além de uma diversão em si, é
também utilizado para arrecadar fundos para a manutenção de
instrumentos musicais das fanfarras, uniformes etc. Sua prática
também é associada às várias festas religiosas da igreja católica,
gerando recursos para ajudar pessoas doentes ou as pastorais. É
uma forma de financiamento popular e solidário desenvolvida
pela população de Baixo Guandu.
Percebemos a mesma autonomia e autogestão nas histórias
de feirantes, comerciantes do Mercado Municipal e produtores
dos sabores de Baixo Guandu. Como a aguardente de manga
produzida pela família Fleger Raasch, utilizando o excedente não
comercializado da fruta para produzir uma bebida original que se
tornou típica do lugar. A fábrica de doces Ilha da Fantasia também
surgiu de uma criativa iniciativa familiar, em que a necessidade
de encontrar opções de sobrevivência levou ao desenvolvimento
de um saber culinário em permanente aperfeiçoamento. Hoje,
a pequena fábrica chega a produzir 5 mil peças de rapadura e
doce de leite por mês, garantindo o sustento da família de Djalma
Galdino de Almeida e Ilza Frederico.
Produzir cultura é também criar memória. Essa tem caminhos
que não são lineares como os trilhos de um trem. São tortuosos
e espiralados e fazem reviver o passado de modo inesperado.
Talvez isso explique o fato de o brout, pão típico produzido pelos
descendentes dos pomeranos, ser feito de fubá. Os pomeranos são
europeus de uma região, a Pomerânia, situada entre a Alemanha e a
Polônia. Seu idioma praticamente desapareceu da Europa e o Brasil
é um dos únicos lugares do mundo onde ainda se fala pomerano
e no qual suas tradições são mantidas. Entretanto, o pão pomerano
de Baixo Guandu é feito de fubá, farinha derivada do milho plantado
originariamente por indígenas da América Latina. Se a massa do
saboroso pão não apaga o extermínio indígena que acompanhou
a colonização da região, ela traz consigo a memória como algo que
renasce como sobrevivência cultural.
Por isso, as práticas culturais devem ser vistas sempre como
algo complexo, mesmo em seus aspectos aparentemente mais
simples e cotidianos, como jogar dominó na praça e negociar no
Mercado Municipal. Elas tecem formas de vida e de ver o mundo.
Afinal, como afirma Michel de Certeau:
A cultura é uma noite escura em que dormem as revoluções
de há pouco, invisíveis, encerradas nas práticas —, mas
pirilampos, e por vezes grandes pássaros noturnos,
atravessam-na; aparecimentos e criações que delineiam a
chance de um outro dia.
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Estação Cultural: Mapeamento de Baixo GuanduEstação Cultural: Mapeamento de Baixo Guandu
ArtesanatoSelaria . Cerâmica . Luteria
Estação Cultural: Mapeamento de Baixo GuanduEstação Cultural: Mapeamento de Baixo Guandu
Selaria
Quem passa pela Avenida Carlos de Medeiros há pelo
menos cinco décadas reconhece o senhor já de cabelos
brancos, sentado atrás da bancada: é o seleiro Arlindo Jovino
Francisco. Aos 83 anos, seu Arlindo, como é carinhosamente
chamado, é o mais antigo artesão de selas de Baixo Guandu.
Analfabeto, estudou apenas até o 1º ano do ensino
fundamental. O pai morreu aos 57 anos, quando ele
tinha apenas 6. De uma família de 11 irmãos, com uma
deficiência nas pernas, desde criança tinha como objetivo
poder viver da própria renda para não sobrecarregar a
família. “Eu me sentia um parasita, e desde pequeno ficava
preocupado em poder fazer algo e não me tornar um peso
para eles”, relembra.
Com uma tia morando em Afonso Cláudio (ES), mudou-se
para lá e, aos 7 anos, começou a aprender a fazer selas.
Aos 12, pediu emprestado dinheiro à família para montar sua
selaria, mas não conseguiu. Como tinha algumas economias,
comprou couro, fez uns laços de boi e saiu para vender.
Juntou 23 cruzeiros, dos quais usou 15 cruzeiros para comprar
uma máquina de costura e, com os 8 cruzeiros restantes,
comprou mais material.
Em 1952, mudou-se para Baixo Guandu e montou uma
selaria. Com o passar dos anos, o negócio foi prosperando
tanto que ele chegou a fabricar 100 selas por semana e a ter
33 funcionários. Casado com Lucia, adotaram três filhos. Ele se
tornou uma referência em Baixo Guandu e é considerado
o mestre dos seleiros do município.
Arlindo Jovino Francisco
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Estação Cultural: Mapeamento de Baixo GuanduEstação Cultural: Mapeamento de Baixo Guandu
Genecy Luis Andreatt
De uma família de pedreiros, com pai, avôs e tios trabalhando
em obras, Genecy sempre foi muito franzino e não tinha
forças para o trabalho pesado. A selaria surgiu por acaso em
sua vida. Aos 16 anos, para pagar os estudos de contabilidade,
procurou emprego e a selaria de seu Arlindo tinha vaga. Um
amigo que trabalhava no local o levou lá e, assim, começou
costurando as selas. Trabalhava de dia e estudava à noite.
Quando se formou, aos 18 anos, ficava à noite sozinho
fazendo ele próprio a sela para se aperfeiçoar. Um dia
mostrou para seu Arlindo o resultado de seu trabalho e
ganhou sua confiança para confeccionar ele próprio a sela.
Ficou sete anos trabalhando com seu mestre. “Aprendi
observando bastante e colocando em prática. Nunca fiz
curso. O mais difícil é esticar o assento”, conta Genecy. Já são
três décadas se dedicando ao artesanato de selas – a única
atividade que realizou na vida, tendo atuado por apenas
seis meses como operador de máquina numa fábrica de
chocolate em Vila Velha.
Em setembro de 1991, saiu para montar seu primeiro negócio.
Chegou a pensar em construir uma venda de verduras, mas foi o
próprio seu Arlindo quem o incentivou a abrir uma selaria. Para
ajudá-lo, comprava algumas selas que Genecy produzia.
Começou num salão pequeno, de 16 metros quadrados.
Comprou material para fazer três selas. Uma delas trocou com
um amigo para comprar mais material. Hoje a selaria cresceu e
já ocupa 80 metros quadrados na Rua Terezinha, em São José.
Produz em média três selas por semana, além de bolsas de
couro, cabeças e outros acessórios para a montaria.
Sua casa fica em cima da selaria onde mora com os dois
filhos, que cria sozinho. Jefferson, de 27 anos, tem necessidades
especiais, e Rafael, de 22 anos, é formado em análise de
sistemas. Em 2015, recebeu o título de honra ao mérito da
prefeitura em reconhecimento a seu trabalho e cuidado com
o filho especial. “Minha vida e a dele são uma só. Apenas vou a
lugares em que possa levá-lo”, comenta o seleiro.
Aos 52 anos, Genecy trabalha ao lado do primo e de um
funcionário. Para ele, o que mais desperta o interesse na selaria é
a possibilidade de criar, de inventar algo para as selas. “Gosto de
parar, pensar e propor modelos novos. O couro permite criar muitas
coisas diferentes”, pontua. O seleiro explica que, além da segurança,
a sela deve ter beleza, já que vaqueiros e amazonas costumam
ser vaidosos. “A sela precisa de uma costura boa para garantir a
qualidade e também um couro grosso, retirado do lombo do boi. A
trança é um diferencial das selas que faço”, orgulha-se.
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Estação Cultural: Mapeamento de Baixo GuanduEstação Cultural: Mapeamento de Baixo Guandu
José Hilário Peixoto
No quintal de sua casa, com muitas árvores ao fundo, José
Hilário Peixoto, de 58 anos, trabalha em pé, concentrado
em uma sela, apoiada em uma mesa. Da janela da cozinha, sua
esposa, Cristina de Souza Evangelista, o observa. Companheiros
há 23 anos, pais de três filhos, o casal mantém a Selaria Cristina
– homenagem à esposa –, ativa diariamente.
A história de Hilário é daquelas que poderiam virar filme.
Seu pai teve mais 17 filhos, com três esposas diferentes. Ele
nasceu em Ecoporanga (ES) e a família se mudou para o Rio
de Janeiro. Os pais se separaram e seu pai o trouxe de volta
ao Espírito Santo com apenas 3 anos.
Passou 22 anos sem ver a mãe, até que um dia resolveu
ir ao Rio de Janeiro. Aproveitando o passeio, quis conhecer o
Maracanã e, ao ver uma equipe de rádio, resolveu contar sua
história para pedir ajuda para reencontrar a mãe. Voltou para
Baixo Guandu e, depois de três dias, apareceu uma pessoa que
veio até a cidade capixaba conferir a história. Hilário, então,
voltou para o Rio e foi ao encontro da mãe, que morava em
Caxias. Os dois conseguiram conviver por mais 15 anos, até
o falecimento dela, no início dos anos 2000. Do encontro,
descobriu que possui duas certidões de nascimento, uma com
registro no Rio de Janeiro e outra em Minas Gerais.
Sua história está impressa em seu trabalho. Sua relação
com a selaria é antiga. “Nasci em um seleiro”, brinca Hilário,
que herdou a profissão de seu pai. Aos 8 anos, começou a
trabalhar com ele e fazia suadores. Aos 14 – mesma idade em
que se mudou para Baixo Guandu –, começou a fazer selas
para outras selarias, costurando tudo à mão. Trabalhou mais
de dez anos para o seleiro de seu Arlindo, parte desse tempo
ao lado de Genecy.
Hoje, aos 58 anos, tem a própria selaria, mas continua
prestando serviço para outras, e não só de Baixo Guandu, mas
também de cidades nos arredores. Faz selas de diferentes
modelos: americano, australiano e canadense. Para produzir as
mais sofisticadas, chega a levar três semanas trabalhando em
cada detalhe. Já as mais simples ele consegue fazer dez por
semana, sempre com a ajuda de Cristina. Vende o produto para
diversos estados do Brasil, da Bahia ao Pará. “Tenho cliente até
da Itália, que compra de duas a três selas por ano”, comemora.
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Estação Cultural: Mapeamento de Baixo GuanduEstação Cultural: Mapeamento de Baixo Guandu
Rogério Zani
Rogério Zabi, 41 anos, nasceu em Baixo Guandu e tem o
;ensino médio completo. Já foi açougueiro e guarda de
banco e morou na Itália por um ano, trabalhando, em Milão,
como ajudante de pedreiro. Depois, ele e a namorada voltaram
para Baixo Guandu e se casaram. Trabalhou por mais cinco anos
em um açougue até resolver montar a própria selaria, a Cavalo
de Aço. “Percebi que as pessoas que fazem selas em Baixo
Guandu já estavam ficando mais velhas, todos viviam bem, e vi
como uma oportunidade de negócio”, comenta.
Como morava na roça, via o tio e dois primos fazendo selas
e aprendeu com eles o ofício. Produz tudo de forma artesanal
e sua matéria-prima é o couro. “Sempre andei muito a cavalo
e isso me ajudou a aprender mais rapidamente. Durante as
cavalgadas de que participo, faço pesquisa para saber como
melhorar as selas que produzo”, conta.
Usando algumas de suas ferramentas essenciais, como faca,
martelo, turquesa, agulha, linha e até cera de abelha para amaciar
o couro, Rogério faz em média 12 selas ao mês. Sua maior clientela
é de Minas Gerais, de cidades como Aimorés e Resplendor.
Demora em torno de dois dias para fazer uma, a partir da armação
de madeira revestida de couro que é sua estrutura. “A costura da
sela é como o DNA do artesão: cada um tem a sua”, afirma.
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Estação Cultural: Mapeamento de Baixo GuanduEstação Cultural: Mapeamento de Baixo Guandu
Estrutura da selaOs seleiros de Baixo Guandu têm um único fornecedor da
estrutura da sela, fundamental para compor a peça. É feita de
madeira, ferro e couro cru, costurado manualmente. Albertina
Rossmann, de 32 anos, é quem está à frente da produção.
Há dez anos, ao lado do tio e de mais dois funcionários,
produzem 12 estruturas por dia. “Depende mesmo do sol,
pois elas ficam de dois a três dias secando”, comenta ela.
E eles fornecem suas estruturas não apenas para seleiros
de Baixo Guandu, mas de Governador Valadares e Ipatinga
também. “O tio Almir foi quem começou a produção, pois
trabalhou com o seleiro seu Arlindo e com ele aprendeu a
costurar o couro”, relembra Albertina.
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Estação Cultural: Mapeamento de Baixo GuanduEstação Cultural: Mapeamento de Baixo Guandu
Na última olaria de Baixo Guandu, Ailsomar Costa, o
Esperança, de 55 anos, trabalha sozinho. Costuma descansar
aos sábados por ser da igreja adventista, mas em todos os outros
dias da semana é possível encontrá-lo na Olaria Sapucaia.
Aprendeu o ofício aos 14 anos, fazendo panelas de barro em
São Torquato. Aos 20, começou a trabalhar com o oleiro Manoel
Johanson, com quem aperfeiçoou seu trabalho. Foram três décadas
juntos, parceria que se encerrou em 2011, com o falecimento de
Manoel. “O segredo é manter sempre a argila centralizada. Gosto da
olaria porque me possibilita criar. Não é qualquer artesanato que
permite isso”, comenta Esperança, que estudou apenas até
o 1º ano do ensino médio.
E sua arte começa a partir da compra da argila, que separa
cuidadosamente. Depois, deixa-a três dias curtindo numa caixa
de cimento para então bater a matéria-prima e só aí dar forma a
Ailsomar Costa (Esperança)
sua criatividade. Quando senta no torno para fazer vasos, filtros
e moringas, pode demorar dias produzindo uma única peça. Ao
terminar de criá-la, deixa-a secando por mais uma semana até levar ao
forno, a 600 graus. Em estilo alemão original, o forno é controlado de
perto por Esperança, que vai aumentando a temperatura aos poucos.
São em torno de 30 horas queimando e mais 30 horas esfriando.
As peças são vendidas em várias cidades do Espírito Santo,
mas em Baixo Guandu só é encontrada em sua olaria, que fica
no bairro Sapucaia. “A cultura da olaria existe na cidade desde
a década de 1930. Começou com um português que fazia as
peças e convidada as pessoas a vê-las. Esse artesanato teve um
bom momento em Baixo Guandu, mas depois chegou o vidro e
o alumínio, e os oleiros foram desaparecendo”, afirma Esperança,
que tem ensinado o ofício para um de seus três netos. “Para que
essa arte continue viva”, finaliza.
Cerâmica
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Estação Cultural: Mapeamento de Baixo GuanduEstação Cultural: Mapeamento de Baixo Guandu28
Estação Cultural: Mapeamento de Baixo GuanduEstação Cultural: Mapeamento de Baixo Guandu
Madeira Eder Pereira Johanson Esculturas de lajota
T,erra, água e criatividade: esses são os ingredientes que
Dênis Xavier Martins, 40 anos, e Rogério Apolinários, 37,
usam para produzir carretas, navios, casas e até igrejas usando
apenas lajota e uma faca. Os dois trabalham em uma fábrica de
cerâmica que produz tijolos na cidade e usam o espaço e
o tempo livre para criar.
Dênis trabalha como oleiro há 20 anos. Nas horas vagas e
depois do trabalho, aproveita a sobra da lajota da fábrica e, há
15 anos, produz peças como trem, churrasqueira, trator e até a
Igreja Matriz São Pedro. “Vi um colega fazendo casinhas e resolvi
criar também, mas gosto de desafios e passei a fazer outras
peças que representam a cidade.” Só para fazer o caminhão
leva uma semana, depois são mais três dias para secar, quatro
dias no forno e três dias para pintar e envernizar. “É um trabalho
com muitos detalhes. Transformo a lajota em arte”, comenta
o artesão, que vende suas peças apenas sob encomenda e
dentro da própria fábrica onde trabalha.
Colega de Dênis na cerâmica, o oleiro Rogério também
se interessou pelo ofício e começou a produzir as esculturas
de lajotas há oito anos. “O diferencial é que as pessoas usam
madeira para fazer objetos assim, e nós fazemos com a
lajota”, explica. Ele produz diversas peças e conta que a mais
procurada é a casinha de passarinho.
Num canto da Olaria Sapucaia é possível observar
também o trabalho de Eder Pereira Johanson, 32
anos, neto de Manoel Johanson. Ele não seguiu os
passos do avô – pelo menos por enquanto, já que
prometeu ter aulas com Esperança em breve. Seu
ofício é a madeira. “Meu avô era muito sistemático
e não gostava de crianças correndo pela olaria.
Cheguei a aprender a fazer vasinhos quando tinha
8 anos, mas não segui”, relembra Eder, que morou
por alguns anos com os avós. Em 2014, começou a
trabalhar com madeira e MDF fazendo ornamentação
de festas, quarto de bebê e até esculturas. Nesses
três anos de atividade, contabiliza já ter produzido
em torno de 2 mil peças, que são vendidas em
Baixo Guandu e cidades próximas, como Aimorés e
Colatina, a maioria sob encomenda.
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Estação Cultural: Mapeamento de Baixo GuanduEstação Cultural: Mapeamento de Baixo Guandu
Luteria
Eliezer Lopes (Zirim)
O mineiro Eliezer Lopes – ou Zirim, como costuma ser
chamado – tem 51 anos e mora há 45 em Baixo Guandu.
Os pais foram para a cidade capixaba para montar uma fábrica
de bicicletas. Chegaram até a ter uma loja no Centro, mas
acabaram falindo. Foi o pai quem despertou seu interesse pela
música, pois, além de soldador, tocava cavaquinho e bandolim.
Aprendeu com ele a tocar, mas resolveu se aperfeiçoar
em outra atividade e foi fazer um curso de luthier em Belo
Horizonte. Durante dois anos, saía de trem de Baixo Guandu
para ter aulas de segunda a quarta-feira na capital mineira. Ao
concluir o curso, montou uma escola de música, dando aulas
de violão, guitarra e contrabaixo, por 12 anos. E, por conta das
aulas, foi ganhando sua clientela como luthier. Para fazer um
instrumento, leva em torno de duas semanas. “É um trabalho
muito delicado e precisa ser benfeito, com muita atenção.”
Sua matéria-prima era o jacarandá e o marfim, que
com o tempo se tornaram escassos e caros. Hoje, segue
fazendo reparos e manutenção dos instrumentos –
principalmente violões, violinos e violas. Mas sua arte
diminuiu bastante. “O trabalho de um luthier tornou-se
complicado, porque uma peça feita à mão é muito mais
cara e ficou difícil competir com os produtos da China, da
Indonésia ou do Paquistão”, reflete.
Mas as lojas de música de Baixo Guandu e das
redondezas seguem indicando-o para afinar os
instrumentos e realizar a manutenção. “Quando a
pessoa compra um instrumento novo, eles me indicam.
Consigo deixar um instrumento 100% afinado sem
precisar usar o afinador.”
Zirim é considerado um dos únicos luthiers da região
e vê uma possibilidade de seu trabalho voltar a ter força
com a nova escola de música que está montando com
seus dois filhos, ambos músicos – um deles é baterista
da Banda Municipal Lyra Guaduense. O local está sendo
construído ao lado de sua serralheria e vai contar também
com um estúdio de gravação e uma sala especializada
para Zirim trabalhar.
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Artes Visuais Pintura
Estação Cultural: Mapeamento de Baixo GuanduEstação Cultural: Mapeamento de Baixo Guandu
Equimar Francisco de Assis
Aos 72 anos, o guanduense Equimar Francisco de Assis já sofreu
,dois infartos e perdeu um filho, mas não a vitalidade. Com
graduação e pós-graduação em geografia, a pintura sempre andou
lado a lado com as atividades de professor. Tanto que, nos 35 anos
em que deu aula em Baixo Guandu – e outros 26 anos em Aimorés –,
atuou como professor de geografia e de artes. “Hoje, na situação em
que estamos, quem vive só de arte morre de fome”, critica.
A paixão pela pintura começou em 1964, aos 19 anos.
São mais de cinco décadas dedicas à arte. “Já nasci com a
pintura. Não precisei de muitas aulas porque, na verdade,
eu me alimento de tinta”, brinca Equimar, que já realizou três
exposições individuais nos mais variados espaços: em centros
culturais, na Assembleia Legislativa e em hotéis e restaurantes.
Participou de mostras também em Brasília e em Vitória e vende
seus quadros até para admiradores internacionais.
Considera seu trabalho clássico moderno e sua técnica é o
óleo sobre tela. Além de pintar paisagens, animais e natureza,
sua preferência é pelos autorretratos – de conhecidos, como
a atriz Juliana Paes, a desconhecidos. Admirador do pintor
surrealista espanhol Salvador Dalí, Equimar usa de 15 a 20 cores
nos retratos que pinta. Já perdeu as contas de quantas obras
fez nesses 50 anos atuando como artista, mas acredita que já
passem de 2 mil quadros. “O infarto foi decorrência do uso da
tinta por todos esses anos”, afirma.
Sua maior inspiração é o Brasil, com sua abundância
de flora e fauna e seu povo com tanta riqueza cultural.
Já participou 18 vezes do Projeto Rondon, uma ação
interministerial do governo federal realizada em coordenação
com os governos estadual e municipal para contribuir com
o desenvolvimento local sustentável e com a construção
e promoção da cidadania. “Você tem de viajar para ter
inspiração para pintar. Escolhi a geografia humana porque
gosto de falar sobre povos”, resume.
Em 2003, ganhou o Prêmio Nacional de Referência em
Gestão Escolar, e, em 2007, recebeu uma homenagem da
Assembleia Legislativa do Espírito Santo “pelos relevantes
serviços prestados às artes em nosso estado”.
Pintura
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Estação Cultural: Mapeamento de Baixo GuanduEstação Cultural: Mapeamento de Baixo Guandu
MúsicaBanda Municipal . Sertanejo . Seresta .
Erudita . Heavy Metal . Fanfarra
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Banda Municipal
São mais de cinco décadas dando o tom musical em Baixo
Guandu. Fundada em dezembro de 1953, sob a regência
do maestro Jaime Gasparini, a Banda Municipal Lyra Guaduen-
se segue em plena atividade. Atualmente com 30 integrantes,
o grupo ensaia toda terça-feira, às 19 horas, no Canaã Clube.
Com um repertório que varia do popular ao erudito, a banda
conta com clarinete, flauta, saxofone, trompete, trombone, tubas,
bateria, teclado, guitarra e percussão. Tem duas apresentações
fixas no calendário da cidade: é a banda que abre os desfiles de 7
de Setembro e o aniversário de emancipação de Baixo Guandu,
em 10 de abril. Mas o grupo se apresenta também em outras
cidades e festas particulares. Já tocaram em diversos festivais,
como o de Inverno de Domingos Martins; Encontro de Bandas
de São Gabriel; Painel Funarte de Bandas de Música; e nos 50
Anos de Bossa Nova, em Governador Valadares.
Wanderson Emeriok da Silva toca na banda há 27 anos,
integrando o grupo desde 1991. “A banda é uma tradição de
Baixo Guandu, das manifestações culturais mais importantes
que temos, que passa por gerações”, comenta Wanderson, que
tem um tio entre os ex-músicos da Lyra Guaduense.
O trompetista Willian Botelho, membro da banda desde
os 13 anos, conta que, em 2009, houve uma reformulação
do repertório. “Passamos a tocar músicas mais populares,
novas interpretações de Roberto Carlos e até temas de filmes”,
comenta o músico, que já foi regente da banda.
Lyra Guaduense
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Estação Cultural: Mapeamento de Baixo GuanduEstação Cultural: Mapeamento de Baixo Guandu42 43
Estação Cultural: Mapeamento de Baixo GuanduEstação Cultural: Mapeamento de Baixo Guandu
Banda Faith Again Ricardo & Sabrina
Formado por Ariel Soares Simoura Vieira no vocal e
contrabaixo, Rafael Henrique Teixeira na bateria, Wallace Silva
Requel na guitarra e Alisson Junior no teclado, o grupo autoral de
heavy metal progressivo Faith Again está junto desde 2011. Os
integrantes são amigos de infância. Apesar de Wallace ser mineiro
e morar na vizinha Aimorés, estudava na Escola Estadual José
Damasceno Filho junto com Ariel, que, por sua vez, conheceu
Rafael na escola de música. Os dois tocaram juntos num dos
Workshows promovidos pelo professor Mayckson Lee, que todo
ano faz recitais e forma grupos para se apresentarem na cidade.
A primeira banda que montaram foi a de rock cover Notícias
de Ontem, mas queriam fazer algo mais autoral. Inspirados
no grupo britânico Pink Floyd, criaram a banda Faith Again,
que faz apresentações em festivais. Em Colatina, chegaram
a conquistar o quarto lugar. Foi lá que o tecladista Alisson Jr.
Sabrina Bohrer Martelo Gonçalves, 14 anos, está
no 8º ano do ensino fundamental na escola
municipal Elza Ewald Oliveira, no distrito Km 14 do
Mutum. Participou do projeto Dó Ré Mi Lá na Escola,
em 2012, por meio do qual aprendeu a técnica para
tocar. Mas desde muito pequena gostava de música.
No lugar de ursos e bonecas, Sabrina dormia abraçada
ao violão, mesmo sem saber usá-lo. Aos 4 anos,
tocou a marcha nupcial sozinha. Investiu em aulas de
teclado e passou a integrar a banda de arrocha Top
Sensação. Depois de um ano, resolveu sair e formar
a dupla sertaneja com o pai, a Ricardo & Sabrina.
Ricardo nasceu em 1974. É o encarregado de frente
numa pedreira. “Sempre cantei. Fui vocalista da banda
de forró Os Máximos do Forró por cinco anos.
SertanejoHeavy Metal
conheceu o trabalho do grupo e se juntou a eles, em 2017.
Para o baterista, Rafael, é um desafio manter uma banda de
heavy metal progressivo numa cidade em que o sertanejo e o
forró são as músicas mais tocadas. “Queríamos fazer algo novo,
autoral, nossa arte. Na banda, todos somos compositores e até
transformamos o samba em heavy metal”, comenta.
Estou muito feliz em ter essa dupla com minha filha”, orgulha-
se. Eles tocam forró, arrocha e sertanejo e fazem apresentações
em pesque e pague, bares, casas de shows. A dupla é uma de
tantas outras de Baixo Guandu que se dedicam ao sertanejo.
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Estação Cultural: Mapeamento de Baixo GuanduEstação Cultural: Mapeamento de Baixo Guandu
A história dos músicos Sidenir Pereira da Rocha e Ismair de
,Souza ,Corrêa se misturam com a própria história de Alto
Mutum Preto. O pai de um era bandolinista e um seresteiro nato.
O pai do outro, o responsável por ligar o motor que todas as
noites gerava a luz para a região. Entre suas notas, o que se pode
ouvir também são muitos “causos”.
Sidenir tem 69 anos, nasceu em Colatina e, aos 3 – mesma
idade em que ganhou do pai seu primeiro bandolim –, foi morar
no Alto de Mutum Preto. “Papai falou para eu ter cuidado e não
romper a corda. Fiquei com medo de tocar.” Analfabeto, foi por
meio da música que aprendeu a se comunicar. Foi o avô de Ismair
que o incentivou a perder o medo: dizia que ele tinha de aprender.
Hoje, Sidenir toca bandolim, cavaquinho, violão, guitarra, pandeiro,
reco-reco – tudo de ouvido, sem nunca ter feito uma aula.
No repertório, música sertaneja, moda de viola, MPB. Mas é a seresta
que o alegra, principalmente as canções de Nelson Gonçalves. A vida
de músico nunca foi fácil; ele enfrentou vários preconceitos. Uma vez o
chamaram para substituir um violonista em Colatina. “Quando me viram,
comentaram que eu não devia tocar nada. Fiquei com medo. Parei num
bar para tomar uma pinga e criar coragem. Subi no palco e perguntei
ao cantor qual a nota que ele queria. A primeira música foi Maria Helena.
Comecei a tocar e foi o maior sucesso. Seresta é tango, bolero, valsa e
samba de breque. As grã-finas passaram a me chamar toda hora para tocar.”
O pai de Ismair, de 53 anos, era do Km 14 de Mutum e o avô, de
Brasília. Moraram na capital federal até 1979, quando se mudaram para
o distrito de Baixo Guandu porque a mãe de Ismair estava doente.
Foi do pai que Ismair herdou o gosto pela música. Aos 6 anos, já o
acompanhava em rodas de música, e com essa idade ganhou dele o
primeiro pandeiro. Seu pai tocava bandolim com os amigos bebendo
cachaça e Ismair o acompanhava nas rodas. Um dia, a irmã mais nova
furou seu pandeiro de propósito e ele ficou anos sem tocar. Até que,
com 13 anos, ganhou um novo pandeiro do pai.
Foi vendo o avô Crizalino Corrêa tocar violão com facilidade que
Ismair aprendeu a tocar o instrumento de cordas também. “Pedi para
ele me ensinar, mas meu avô não tinha paciência. Eu não desistia e
andava com o violão para todos os lugares.”
As famílias de Sidenir e Ismair se uniram diversas vezes para fazer serestas
na região, e hoje guardam muitas memórias em suas notas musicais.
Seresta do Alto Mutum Preto
Seresta
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Estação Cultural: Mapeamento de Baixo GuanduEstação Cultural: Mapeamento de Baixo Guandu
Descendente de pomeranos, Lisca Tressman Piske conta que a
maior herança que recebeu do extinto país – que ficava situado
entre a Polônia e a Alemanha – foi a música. O avô era pomerano e veio
para o Brasil em 1890 para fugir da pobreza que assolava o lugar. Foi para
Santa Leopoldina (ES) porque era um local seco e frio. “A maior parte dos
imigrantes pomeranos se instalou nessa região”, conta Lisca. Depois, o avô
migrou com a família para Itaguaçu (ES), onde ela nasceu. A família vivia da
agricultura, plantando milho, mandioca, café e banana. Lisca tinha 7 anos
quando o avô faleceu, em 1952, e lembra até hoje dele tocando concertina.
Começou a estudar piano aos 12 anos na casa de um pastor
luterano, com aulas em alemão. Aos 15, passou a tocar a marcha
nupcial e alguns clássicos de Bach e Händel em casamentos no
hormônio, instrumento parecido com o piano, presente nas igrejas
luteranas. “Era chamada para tocar até em igrejas católicas, algo inédito,
pois na época não abriam as portas aos luteranos”, conta Lisca.
Seu maior incentivador foi o pai. Ela lembra que ele insistia para
aprender a tocar algum hino e, em troca, dava 5 cruzeiros para que
comprasse meias finas, de que tanto gostava. “Tenho gratidão pelo
incentivo de meu pai, que me deixou estudar apenas música. Entrei no
ginásio somente aos 17 anos.”
Foi estudar música no Centro Musical Villa-Lobos, em Vitória, nos anos
1980. Nesse período, chegou a frequentar psicólogos, pois o nível de
exigência era tão alto que ela precisou de ajuda para vencer os desafios. “Mas
nunca pensei em desistir”, afirma a pianista, acordeonista e regente de coral.
Perseverança é uma das principais características de Lisca, que
decidiu, aos 59 anos, fazer faculdade de pedagogia. “Estudava todas as
noites em Colatina por quatro anos. Chegava meia-noite em casa e, às
7 horas, já estava na escola.”
Foi professora primária e diretora da E.E.E.F. Brasil até se aposentar,
em 2005. É professora de piano desde os 15 anos e chegou a ter 50
alunos por mês. Fazia recital para 70 pessoas em casa no fim de ano,
com repertório de música erudita. Em 1992, participou com a filha
Margareth – que também se formou em música – de um concerto em
Brasília com 200 vozes e três regentes.
Aos 72 anos, casada há 50 com Elmuth Piske, tem três filhos, cinco
netos e dois bisnetos. Hoje, diz que seu maior prazer está na roça,
onde já plantou cedro, jatobá, sapucaia e árvores frutíferas, além de
produzir mel. “Mas sigo dando aulas de piano, sempre”, conta.
Pianista Lisca Tressman Piske
Erudita
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Estação Cultural: Mapeamento de Baixo GuanduEstação Cultural: Mapeamento de Baixo Guandu
No 7 de Setembro, a Avenida Carlos Medeiros, no
Centro, torna-se um palco. Diversas fanfarras desfilam,
enchendo a cidade de música. A tradição é forte nas escolas
de Baixo Guandu há pelo menos seis décadas. Das 14 escolas
municipais, 12 têm fanfarras, assim como duas escolas
estaduais e a escola particular Ginásio Brasil.
Na Escola Municipal Elza Ewald Oliveira, no distrito Km 14
do Mutum, a fanfarra existe desde a década de 1960,
mas parou nos anos 1990 por falta de verba. A retomada
começou em 2011, com o projeto Dó Ré Mi Lá na Escola, que
contemplava aulas de música nas instituições de ensino.
“A princípio, a proposta não era formar uma fanfarra.
Não tínhamos instrumentos; então, improvisamos usando
latas, baldes e latões de 200 litros”, conta Fabiano Natali,
de 35 anos, instrutor da Fanfarra do Km 14 e ex-integrante
da banda, em 1991. “Os pais fizeram tanta pressão junto à
prefeitura para conseguirmos receber os instrumentos que
a fanfarra retornou”, relembra.
Fanfarras
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Estação Cultural: Mapeamento de Baixo GuanduEstação Cultural: Mapeamento de Baixo Guandu
A Fanfarra do Km 14 tem 32 componentes e reúne-se uma
vez por semana para ensaiar. Um deles é João Floriano Martelo
Stein, de 14 anos, que hoje está no 9º ano e toca na banda desde
2012. “Comecei no balde e depois fui para o surdo. Meu pai
tocava na fanfarra em sua última formação, em 1991”, conta.
Lucas Nascimento Merlo, de 17 anos, já está formado no ensino
médio e cursa química na faculdade, mas segue tocando na
fanfarra. “Com a música, aprendi a respeitar hierarquias e também
aumentei o diálogo em casa. Agora falo de música com minha
mãe”, afirma o jovem, que está na fanfarra desde a retomada.
“A música une essas crianças”, declara o instrutor Fabiano.
Uma das mais tradicionais fanfarras de Baixo Guandu é a
da Escola Estadual José Damasceno Filho. Wilson Mathias dos
Santos, de 35 anos, é o instrutor da banda desde 2006. Inspetor
penitenciário, interessou-se em dirigir o grupo assistindo ao desfile
no Centro da cidade, no 7 de Setembro. Músico autodidata desde
os 9 anos, tocava trombone de vara na banda do Exército. O pai já
foi maestro da banda, que tem 60 integrantes.
“Dar aos jovens a oportunidade de trabalhar com música é
muito gratificante. Não há muitas opões para eles na cidade.
A fanfarra dá disciplina, ajuda a trabalhar em grupo e estimula
a autoconfiança. Os alunos apresentam melhores resultados
na escola”, pontua Wilson, que ressalta que, para participar da
banda, é preciso ter boas notas.
Aos 24 anos, Cristiano Charles Corrêa conta que a fanfarra do José
Damasceno Filho mudou sua vida. Morador da comunidade São
Vicente, acompanhava a apresentação da banda nos desfiles de 7 de
Setembro. Um dia, apareceu no ensaio na escola, que fica próxima a
sua comunidade, com um instrumento de sucata feito por ele. Recebeu
o convite de Wilson para participar, mesmo não sendo aluno, e tocou
por muitos anos, até passar para a Faculdade de Música do Espírito
Santo (Fames), em Vitória. “Participar da fanfarra aumentou meu desejo
de trabalhar com música e foi fundamental para me dar um nível
técnico suficiente para passar na prova”, conta Cristiano.
Outra fanfarra bem tradicional em Baixo Guandu é a do
Ginásio Brasil, escola criada desde os anos 1950 pelo padre
Alonso Leite. Com 17 integrantes, os ensaios acontecem três
vezes na semana: às segundas, terças e quintas-feiras. Além da
apresentação no desfile cívico de 7 de Setembro, tocam em
outros eventos, como no Desfile Cívico de Aniversário da Cidade
de Aimores (MG) e na Mostra Musical do Instituto Federal do
Espírito Santo, em Colatina. Instrutor da banda desde 2011,
Brendon Mendonça Sousa conta que a fanfarra gera muita força
de vontade nos alunos, ajudando a superar desafios.
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Estação Cultural: Mapeamento de Baixo GuanduEstação Cultural: Mapeamento de Baixo Guandu
Equipamentos Culturais
Casarão . Clube . Cinema . Biblioteca . Teatro . Concha Acústica
Estação Cultural: Mapeamento de Baixo GuanduEstação Cultural: Mapeamento de Baixo Guandu
Casarão da Madame Albertina Holz
Albertina Holz nasceu na Alemanha, em 1862. Aos
13 anos migrou para o Brasil com outras famílias
pomeranas e, em 1892, mudou-se com o marido e os
14 filhos para Baixo Guandu, devido à construção da Estrada
de Ferro Vitória a Minas. Fortaleceu-se no comércio de secos e
molhados e expandiu para café e cereais.
O casarão foi erguido em 1919, sendo uma das primeiras
edificações do município, antes mesmo da emancipação
política de Baixo Guandu. Localiza-se próximo à Estação
Ferroviária, na Praça Governador Bley, no Centro. Com estilo
eclético e influência do neoclassicismo da segunda metade
do século 19, a edificação foi construída de forma irregular,
com 30 metros de frente e 38 metros de lado, numa área de
746 metros quadrados.
Possui alicerces de pedra e paredes de tijolo queimado
e é coberto de telhas francesas. O primeiro pavimento era
usado como local de comercialização de secos e molhados e
recebimento de imigrantes que chegavam à cidade. É formado
por um único cômodo. O piso é cimentado e há três portas de
frente. Já o segundo pavimento era usado como residência e
tinha um assoalhado, com 11 cômodos, três janelas de frente
e esquadrias de madeira de lei. Ao lado do casarão, havia
armazéns para estoque de café e artefatos.
Reconhecida na cidade como uma grande comerciante,
Albertina comprava e vendia mercadorias produzidas no
interior e utilizava os trens para manter seu comércio forte
com Vitória. Morreu em 1952, aos 90 anos. O imóvel, batizado
de Casarão da Madame Albertina Holz, foi comprado, em
2006, pela prefeitura, que pretende transformá-lo em um
museu. Foi tombado pelo município como bem material e
está com pedido de tombamento tramitando no Conselho
Estadual de Cultura (CEC).
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Estação Cultural: Mapeamento de Baixo GuanduEstação Cultural: Mapeamento de Baixo Guandu
Usado para bailes e festejos principalmente
da elite social da cidade, foi inaugurado em
10 de abril de 1953. Durante 30 anos, foi palco do
Carnaval e também do Réveillon guanduense. Com o
passar do tempo, tornou-se uma das principais áreas
de recreação, integração e lazer de Baixo Guandu.
Tombado pelo município, atualmente o pedido de
tombamento do clube tramita no Conselho Estadual
de Cultura (CEC).
Sua arquitetura é original e conta com alicerces de
pedra, paredes de tijolo queimado, coberto de telhas
francesas e portas e janelas de madeira de lei. É formado por
um primeiro pavimento de piso de madeira, um salão principal,
dois banheiros e salas administrativas.
Durante os anos 1980 e 1990, o clube ficou abandonado,
mas na década de 2000 passou por reformas e ampliações,
mantendo sua arquitetura e seu modelo original – o lustre
do salão principal de dança, inclusive, é o mesmo até os dias
atuais. Pertence ao município, mas, depois de reformado, foi
entregue em comodato ao Grupo da Melhor Idade, que realiza,
aos sábados, um baile voltado para a terceira idade. Também é
a sede de ensaios da Banda Municipal Lyra Guanduense.
Canaã Clube
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Estação Cultural: Mapeamento de Baixo GuanduEstação Cultural: Mapeamento de Baixo Guandu
A Rua Milagreas Júnior, no Centro, guarda memórias
,inesquecíveis dos moradores guanduenses. Na
imaginação de muitos, histórias de amor, de aventura e
dramas. Foi lá que funcionou o Cine Alba, que chegou a ser
considerado uma das melhores salas de exibição do país.
Construído em 1954 pelas famílias Holz e Kunkel, foi
inaugurado em 29 de setembro de 1956, sob a benção
de padre Alonso, com direito a pulo de paraquedas
festejando a abertura de suas portas. O prédio de traços
modernistas, inspirado em salas americanas, foi um projeto
assinado pelo então renomado arquiteto de Vitória Marcelo
Vivacqua. A sala possuía 800 cadeiras estofadas, tela em
CinemaScope, projetores italianos com lentes alemãs,
modernos sistemas de som, iluminação e ventilação.
Chegou a ter cinco sessões diárias.
Além das atrações cinematográficas, também era um
dos principais palcos de shows com artistas regionais ou
nacionalmente conhecidos, como a cantora Ângela Maria.
Cine Alba
Alien, o Oitavo Passageiro foi um dos últimos filmes exibidos.
Fechou as portas na década de 1990. Depois disso, já foi
discoteca, igreja e depósito. Hoje, está abandonado, embora
tenha recebido verba para seu restauro.
Um forasteiro que passe pela principal via do Centro da
cidade talvez não perceba que no prédio do Mercado
Municipal, em uma das portas, funciona o maior tesouro
de Baixo Guandu: sua memória. É ali, numa sala, que está
localizada a Biblioteca Municipal. Fundada em 1944 pelo
então prefeito Manoel Milagres Ferreira, a biblioteca tem em
torno de 5 mil itens em seu acervo, entre livros históricos,
literatura clássica, jornais e revistas. Há mesas e cadeiras no
local para os visitantes lerem à vontade. Grupos de alunos
também frequentam a sala para pesquisar. A biblioteca
funciona de segunda a sexta, das 7 às 18 horas.
Biblioteca Municipal
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Estação Cultural: Mapeamento de Baixo GuanduEstação Cultural: Mapeamento de Baixo Guandu
Quem chega à Praça São Pedro, no Centro, logo nota
um palco a céu aberto em formato meia-lua. É lá,
com a Igreja Matriz ao fundo, que a Banda Municipal,
duplas sertanejas, grupos de rock, cantores de forró e
covers se apresentam, tornando o local um dos espaços
mais democráticos de Baixo Guandu. Inaugurada em 2008,
juntamente com o projeto de urbanização da praça, a
concha é um palco público administrado pela prefeitura.
O espaço é usado para apresentações gratuitas e é
ocupado às quintas-feiras, com shows durante a Feira
Municipal. O público vai se formando no entorno da concha:
grupos em pé, às vezes sentados em mesas e cadeiras
levadas ao local, ou dançarinos que demarcam com seus
passos um salão improvisado em plena praça.
Concha Acústica
Usado como palco de shows, teatro, espetáculos
de dança, além de apresentações escolares
e formaturas, o Teatro Dom Bosco foi inaugurado
em março de 2014. O espaço tem capacidade para
310 pessoas e pertence ao Ginásio Brasil, escola
fundada em 1950, ainda como escola paroquial pelo
padre Alonso (Alonso Benício Leite), pároco da Igreja
Matriz São Pedro. Dois anos depois, ele ampliou a
escola, oferecendo, além do curso ginasial (ensino
fundamental), ensino médio técnico em contabilidade
e magistério. Passou a se chamar Ginásio Brasil, em 14
de outubro de 1952. Atualmente, a escola pertence à
Rede Salesiana de Escolas.
A época da inauguração do Teatro Dom Bosco,
o diretor do Ginásio Brasil Euber Barbato afirmou
que “a construção do teatro foi um sonho de muitos
educadores, gestores e educandos que, nesses 61 anos,
formaram neste espaço seus conhecimentos e valores”.
Para o bispo diocesano dom Décio Sossai Zandonade,
“o teatro é uma das maneiras educativas mais eficazes:
favorece a boa comunicação, desenvolve a capacidade
criativa, descobre e revela talentos, além de enriquecer os
atores de novos conhecimentos”.
Teatro Dom Bosco
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Estação Cultural: Mapeamento de Baixo GuanduEstação Cultural: Mapeamento de Baixo Guandu
Feiras e Mercados
Mercado Municipal . Feira Municipal
Estação Cultural: Mapeamento de Baixo GuanduEstação Cultural: Mapeamento de Baixo Guandu
Mercado Municipal
Ao entrar pelo portão localizado na Avenida
10 de Abril, ;no Centro de Baixo Guandu,
uma mistura de cores e cheiros atiça a curiosidade.
Fundado em 1944, o Mercado Municipal vende
um pouco de tudo: frutas, verduras, mel, produtos
naturais (como óleos e essências), temperos, fubá,
farinha, feijão, peixes, aves e ração. Mas há também
Bíblias, vassouras, produtos de limpeza, ferramentas,
material de pesca e até berrantes. Desde 2014, a
Associação de Artesãos de Baixo Guandu (Associarte)
tem duas bancas no mercado para a comercialização
de seus produtos.
Há 27 anos trabalhando no local, Valdir Gonçalves
conta que Baixo Guandu cresceu a partir do mercado.
“Aqui era tudo estrada de terra. Chegou um comerciante
e colocou a primeira barraca, depois outros se juntaram e
a cidade foi crescendo em volta. Anos depois, a prefeitura
oficializou o local e colocou a estrutura”, conta.
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Estação Cultural: Mapeamento de Baixo GuanduEstação Cultural: Mapeamento de Baixo Guandu
Vizinho do Mercadinho do Valdir, o dono da Casa
do Canário, Nivaldo Holzju está há 23 anos no Mercado
Municipal. Encanador do Serviço Autônomo de Água
e Esgoto (Saeed), procurou o local para ter uma renda
complementar. Hoje vende um pouco de tudo, como gaiolas,
canários, patos e galinhas vivos, além de ferramentas. Uma
das mais antigas no mercado é Ellen Possimozer da Rocha,
que montou sua venda de frutas e verduras em 1982. “O
mercado é uma tradição da cidade”, comenta a vendedora.
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Estação Cultural: Mapeamento de Baixo GuanduEstação Cultural: Mapeamento de Baixo Guandu
Às quintas-feiras, a Praça São Pedro transforma-se. De
15 horas à meia-noite, o local fica cheio de moradores.
Famílias, casais, jovens, crianças, senhores e senhoras da
terceira idade lotam o espaço, que recebe em seus arredores
a Feira Municipal. É possível encontrar frutas, verduras,
queijos, flores, temperos, além de panelas e utensílios
domésticos. Na feira, também há comida para consumir
no local, como tortas, doces e também o pastel com caldo
de cana. Durante a noite, shows de música ou dança são
realizados na Concha Acústica, tornando a feira um evento
cultural. O horário nada convencional foi uma necessidade
dos vendedores e moradores devido ao intenso calor que faz
em Baixo Guandu.
Odair Jacobsen, 42 anos, descendente de alemão, há oito
anos vende pão com linguiça na feira. “Fui um dos pioneiros.
Chegava a vender 200 sanduíches por dia”, relembra. A
fabricação das linguiças é caseira: tem fina, grossa, com jiló, de
porco, de boi e misturada (feita de carne de porco e de boi).
Gilmar Costa Soares, 51 anos, trabalha há quase dez
anos na Feira Municipal. Sete anos atrás, começou a vender
temperos e pimentas. Ele conta que já teve diversas profissões:
trabalhou em curral, foi pedreiro, marceneiro, soldador, artesão
em ferro, mecânico, vaqueiro, queijeiro, operador de trator,
operador de empilhadeira, motorista portuário, serralheiro,
metalúrgico, e hoje é feirante.
“A faculdade da vida foi quem me deu minhas
qualificações. Só estudei até o 5º ano do ensino fundamental,
mas foi o suficiente para dar a condição de chegar aqui.
Vendo pimenta em pó, in natura, em conserva. Também
faço garrafadas de ervas medicinais para a infertilidade e a
impotência. Tenho mais de 300 ervas”, conta Gilson, que todas
as quintas-feiras pega o trem para poder estar na feira.
Feira Municipal na Praça São Pedro
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SaboresDoces . Pão Pomerano . Cachaça
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Ilha da Fantasia: rapadura e doce de leite
Os quatro filhos de Djalma Galdino de Almeida e
Ilza Frederico estavam chegando à idade escolar
e a família morava numa roça muito distante. Foi então
que o casal resolveu vender o terreno onde morava e,
com o valor, conseguiu comprar outro apenas numa ilha
em Aimorés (MG). Nem energia elétrica o local possuía.
Quando chegaram, os bois andavam dentro da casa.
Como não tinham recurso para construir algo,
limparam tudo e resolveram seguir a sugestão da
cunhada, de que produzissem doce de leite para vender
e ter uma renda. O irmão de Djalma foi quem deu as
duas vacas leiteiras. “Os primeiros doces que fizemos não
ficaram bons. Aí Djalma lembrou que sua mãe – que fazia
doces – e mexia depois de pronto”, conta Ilza. Com isso,
conseguiram acertar a receita.
O nome dos doces faz alusão ao local onde tudo
começou: a Ilha da Fantasia. Depois de um ano e meio,
começaram a vender os produtos de barco pelo Rio
Doce, em bares e restaurantes e na Estação Ferroviária
de Aimorés. Não tinham canavial, mas Djalma plantou
e começaram a fazer rapadura também. “Desde os 10
anos ajudava meu pai. Todos os dias, levantava à 1 hora
para moer a cana de açúcar até o dia clarear”, relembra
Djalma. As duas filhas do casal, juntos há 38 anos, também
ajudavam os pais. A irmã mais velha ralava os cocos na mão
e ficava toda machucada. A mais nova mexia o doce de
leite no fogão a lenha.
Por conta da construção da hidrelétrica em Aimorés,
precisaram sair da Ilha da Fantasia. Com o dinheiro da venda
do terreno, começaram a buscar um novo local para viver.
Doces
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Como sempre moraram longe, resolveram procurar algo mais
acessível, primeiro em Minas Gerais, mas foi no Espírito Santo
que acharam a terra do jeito que queriam: com facilidade para
escoar a produção, terreno baixo e facilidade de irrigação (pelo
Rio Guandu). Em 2005, mudaram para Baixo Guandu.
Dos quatro filhos, só Márcia se interessou em seguir com
os pais na produção de doces. A receita do pé de moleque
vendido hoje é dela. Cursando administração, um dia ela
estava na faculdade quando soube do Programa Agir –
Apoio à Geração e Incremento de Renda, da Fundação
Vale –, e inscreveu os doces da Ilha da Fantasia. Dos 43
empreendedores selecionados para fazer o curso, eles foram
um dos sete contemplados com o prêmio do programa.
“Tive de montar um plano de negócio e eles gostaram. Não
tínhamos estrutura adequada para trabalhar. Com a reforma,
houve um aumento de 20% da produção”, comenta Márcia.
Depois de passar pela reestruturação, a pequena fábrica
familiar tem sua produção de origem animal (doce de leite)
separada da vegetal (rapadura). O processo é ainda bem manual:
usam ferro para selar o papel que embrulha os doces. Atualmente,
produzem em média 5 mil peças por mês. Possuem selo de
inspeção e podem distribuir para todo o território nacional.
Pão Pomerano
Feito de fubá no forno a lenha, o brout é um típico
pão produzido pelos pomeranos. Yolanda Kamke
Krauses, de 50 anos, vende a iguaria na Feira Municipal.
“Meus pais e avós são pomeranos e aprendi com eles a
receita”, conta Yolanda, que prepara o pão com a ajuda
da família. Em sua casa só se fala pomerano, e suas filhas
participam de grupos de danças folclóricas pomeranas
em Laranjal da Terra.
A Pomerânia foi um país que existiu entre a Alemanha
e a Polônia. Baixo Guandu possui em torno de 8 mil
habitantes de descendência pomerana. É um dos
municípios capixabas com maior presença dessa cultura.
Estima-se que no Espírito Santo haja mais de 120 mil
descendentes de pomeranos, a maior concentração no
país depois da de Santa Catarina. Em outubro de 2017,
Brout
está prevista a primeira festa pomerana do município,
que pretende resgatar aspectos da cultura pomerana,
destacando comidas e bebidas típicas, as danças, os
shows de grupos musicais, o toque da concertina e dos
grupos de trombonistas.
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Primorosa é o tipo de manga produzido pela família
Fleger Raasch que, a partir de 1990, começou a usar o
excedente não comercializado da fruta para a produção da
aguardente. Toda a produção é orgânica, feita num sítio da
família no Km 4 de Baixo Guandu.
Ignácio Raasch, de 75 anos, trabalhava em uma oficina
mecânica até ter um esgotamento físico e mental. Seu
médico recomendou parar, pois ele não estava mais
aceitando ouvir o barulho das máquinas. Assim, mudou-se
de Colatina para Baixo Guandu, em 1969. No ano seguinte,
começou a plantar manga e a vender o fruto de charrete pelo
Centro. Em 1990, teve a ideia de fazer a cachaça de manga.
“Na primeira vez que produzimos a cachaça, o barril pegou
fogo. Foram três anos até conseguir acertar o gosto. Dávamos
para as pessoas provarem e comentarem”, relembra Ignácio.
Primorosa, aguardente de manga
A família esteve três vezes em Viçosa até conseguir ter a
cachaça aprovada. Contaram com algumas consultorias do
Sebrae para fazer a apresentação e o rótulo da aguardente.
De Baixo Guandu, a cachaça já cruzou oceanos e viajou para a
Itália, a Alemanha e até a China.
Novembro, dezembro e janeiro são os meses de colheita
da manga. Por safra, produzem mil litros da cachaça em um
tanque de 6 mil litros. Na outra parte do ano, preparam a terra
e plantam a manga. “Produzimos a cachaça somente nesse
período e vendemos apenas aqui”, conta Ignácio.
Cachaça
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Festas e Eventos
Rodeio . Festa dos Trabalhadores Rurais . Festa Luterana . Festa Católica . Workshow
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Baixo Guandu Rodeio Show
Realizado anualmente desde 2002, o rodeio
,entrou para o calendário oficial da cidade a fim
de estimular o desenvolvimento socioeconômico
local. Além da competição, há shows e exposição
de animais. Tornou-se um dos principais eventos
da cidade, ao lado do aniversário da festa de
emancipação de Baixo Guandu, celebrado em abril;
da festa de são Pedro, padroeiro municipal, em junho;
e da ExpoGuandu, em setembro ou outubro, com
shows, feira de artesanato, concursos e expositores de
animais e produtos agrícolas. As celebrações cívicas
e religiosas são uma opção de lazer para a população
e expressam os valores locais, colaborando na
construção e consolidação das identidades.
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Música, dança, cavalgada e bingo são algumas das
,atrações da festa voltada para os trabalhadores rurais
do distrito de Ibituba. O evento, realizado próximo ao feriado
de 1º de Maio, entrou para o calendário de manifestações
culturais do município.
Silvia Abreu, professora aposentada, esteve presente na festa
realizada em abril de 2017, juntamente com a família e amigos.
“Temos poucas atividades culturais aqui. Assim, uma festa
como essa se torna fundamental”, afirma ela. Iracema Vieira
de Souza Santos conta que no distrito há também a Festa do
Divino Espírito Santo, na paróquia do local. “Tem missa, novena,
procissão, bingo todo sábado, música e almoço comunitário.”
Festa dos Trabalhadores Rurais de Ibituba
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Igreja Matriz São Pedro
A construção da Igreja São Pedro começou em 1942,
,coordenada pelo primeiro pároco de Baixo Guandu,
o padre Aristides. Em abril de 1944, chegou a Baixo Guandu
o padre Alonso, segundo pároco da cidade, que deu
continuidade às obras.
Em junho é realizada a festa de são Pedro, padroeiro da
cidade. Novena, procissão e celebração de missas em estilos
diferentes, como em italiano ou à moda sertaneja, são alguns
dos eventos, que contam ainda com os tapetes de sal na rua
em frente à igreja. Na área de lazer, palanques para shows e
barracas de comida são algumas das atrações. Nos fundos
da igreja está sendo construído um museu que vai contar a
história da Matriz São Pedro, que se confunde com a própria
história de Baixo Guandu. Vestimentas do padre Alonso,
biblioteca, móveis, fotos antigas com os tapetes de Corpus
Christi são algumas das peças que estarão expostas.
Festa Católica
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Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil
A sede da Igreja de Confissão Luterana fica localizada
no Morro da Caixa d’Água, na Rua Martim Lutero.
A igreja luterana tem forte presença em Baixo Guandu.
Com quase 2 mil membros, os luteranos celebram o Dia
de Ação de Graças, em junho, com coral luterano, dança
folclórica, cuca, bolo, arroz-doce e canjica. O culto festivo
conta com a tradição da linguiça colonial de metro.
Todos os anos, uma pessoa da comunidade luterana
fica responsável por fazer a linguiça com muitos
metros, que fica enrolada e exposta durante o evento.
Todos palpitam a metragem, e quem chegar mais
próximo do número leva a linguiça. Durante o evento,
as tradições são relembradas por meio da história oral
entre seus frequentadores.
Festa Luterana
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Myckson Lee Matias Barros, 32 anos, começou a
tocar bateria aos 6, na igreja batista de Governador
Valares. Mudou-se para Baixo Guandu em 2004. Na época,
era missionário itinerante da Assembleia de Deus. Quando
chegou, montou uma escola de música em Vila Kennedy.
No local, passou a ensinar violão, guitarra, teclado, bateria,
contrabaixo e canto. Já formou dezenas de músicos, em
aulas individuais ou em grupos para até cinco alunos.
Há 13 anos, realiza em novembro o Workshow, um
dia de apresentações musicais gratuitas em algum
palco da cidade. Para o evento, Myckson Lee seleciona
seus alunos e forma bandas que se apresentam para o
público em geral. No Workshow tem de tudo: de solo
de sanfona a show de heavy metal. Além dos alunos,
bandas convidadas também se apresentam, a grande
maioria formada por ex-alunos da escola de música.
“Essa apresentação surgiu como uma disciplina do curso,
para trabalhar o desenvolvimento e a prática de bandas”,
comenta Myckson Lee.
Workshow
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LazerCavalgada . Bingo . Bocha .
Dominó . Parapente
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Cavalgada
O toque do berrante marca o início das cavalgadas.
Em Baixo Guandu, são realizadas ao longo de todo
o ano e por diversos grupos, nos quatro distritos do
município. Cavaleiros e amazonas solitários, casais e famílias
acompanhadas de jovens e crianças se reúnem por fé,
promessa ou apenas diversão. A cavalgada se tornou uma
manifestação cultural no lugar.
Numa mistura de aventura, devoção, encontro entre amigos,
a atividade faz parte dos hábitos locais e já está no calendário
cultural e esportivo guanduense. Para Jovino Furtado de Mello,
de 72 anos, que recebeu os diversos cavaleiros em seu sítio
como ponto de partida para a 7ª Cavalgada do Rosário I e II,
“a atividade é uma alternativa para o homem do interior, onde
diversos agricultores não têm lazer”.
Por meio da cavalgada, reúnem-se grupos de conhecidos
e desconhecidos, moda de viola e muita bebedeira. Armando
Pachá, 78 anos, acompanha cavalgadas desse os 15 anos. Para
o operador de máquina, é o momento de diversão para tirar
o estresse do trabalho. Jair Pereira, de 69 anos, é farmacêutico.
Começou a trabalhar atrás de um balcão aos 12, e só aos 45
foi cursar uma faculdade de farmácia. Há 25 anos, participa de
cavalgadas, com um grupo de dez cavaleiros. Com barracas de
camping e um violão, eles seguem por dias e dias cavalgando e
são recebidos em diversas cidades. “Melhor terapia não existe. A
cavalgada cura tudo”, afirma Jair.
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Estação Cultural: Mapeamento de Baixo GuanduEstação Cultural: Mapeamento de Baixo Guandu96 97
Estação Cultural: Mapeamento de Baixo GuanduEstação Cultural: Mapeamento de Baixo Guandu
Em tábuas de madeiras dispostas de forma retangular, famílias,
jovens e crianças se posicionam de pé. Cada um com uma
ou mais cartelas e um pouco de milho, aguardam os números
sorteados, que são cantados acompanhados de brincadeiras e
suspense. A tradição do bingo é forte em Baixo Guandu.
Muitas vezes associadas a festas religiosas, o binguinho – como
costuma ser chamado – também é usado para arrecadar fundos
para alguma finalidade maior. É o caso do bingo realizado pelos
alunos da escola municipal do Km 14, Elza Ewald de Oliveira.
“Todos os anos precisamos renovar nossos uniformes e também
garantir a manutenção dos instrumentos. Então, realizamos o
bingo às segundas sextas-feiras do mês”, conta Walksey Matheus
Novaes da Silva, 19 anos, tesoureiro da fanfarra.
A diretora de Apostilados da Oração da Igreja Matriz São Pedro,
Elizabeth Barbosa, conta que todos os sábados são feitos bingos
não apenas na Igreja Matriz, mas em outras paróquias também.
“É um lazer que muitos adoram. Às vezes também fazemos para
ajudar alguém doente e até as pastorais”, comenta.
Bingo
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A pista de bocha na Praça São Pedro foi inaugurada em 2008 e
,com ela nasceu a tradição de jogar para muitos moradores.
Diariamente, é possível ver a pista cheia de apaixonados pela
bocha. O aposentado Ovídeo Barbosa, de 78 nos, é o responsável
pela pista e a mantém aberta todos os dias, das 13 às 20 horas.
O aposentado Natalino de Freitas, de 71 anos, aprendeu a
jogar bocha durante as férias em Guarapari, local da sede da
igreja adventista que frequenta. “A paixão pela bocha já existe
há 52 anos”, comenta. Já para Marco Barreto, de 51 anos, a
identificação com a atividade de lazer é mais recente. Com as
tardes ociosas, há oito anos começou a frequentar a pista de
bocha e aprendeu a jogar. “Ficava em casa sem fazer nada. Hoje,
vou de três a quatro vezes por semana na praça, das 16
às 18 horas, para jogar, conversar e estar entre amigos.”
João Roberto da Silva, 59 anos, é militar aposentado,
aprendeu a jogar bocha sozinho e é considerado um dos
melhores do grupo. Frequenta o local todos os dias, das 16 às
19 horas, mesmo sem poder jogar devido a um problema no
Bocha
joelho. “Realizamos campeonatos três a quatro vezes por ano
de que participam em torno de 30 pessoas. Já tenho quatro
troféus de 1º lugar, dois de 2º e um de 3º”, orgulha-se.
Todos os dias, a Praça São Pedro fica repleta de jogadores
de dominó. A atividade é praticada pela terceira idade, que
costuma lotar a praça na parte da tarde. As mesas são localizadas
próximo à pista de bocha. Paulo Henrique dos Santos, 49 anos, é
trabalhador autônomo. Vem todos os dias para a praça às 15h30
e fica até as 18h30. Aos domingos, o horário é mais cedo, logo
depois da missa realizada na Igreja Matriz. “Quando revitalizaram
a praça, as mesas passaram a ser ocupadas. É um cassino a céu
aberto. Tem gente que já traz até a marmita e nem volta para
casa para almoçar”, conta Paulo Henrique.
Dominó
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O ponto de encontro aos sábados, domingos e feriados
é de frente para uma vista espetacular. Os amigos da
Associação de Voo Livre de Baixo Guandu reúnem-se na Rampa
do Monjolo para praticar o parapente e também para conversar
e trazer a família. É um estilo de vida para o grupo, que tem
contas em redes sociais para seguir trocando informações.
Baixo Guandu se tornou uma referência internacional
do esporte. Em 2018, vai ser a sede do Panamericano de
Parapente. “Não basta ter um morro para fazer um bom voo.
São vários fatores, como possuir muitas áreas de pouso e
uma corrente térmica adequada”, comenta o comerciante
Ricardo Mendonça de Aquino, de 43 anos. Ele está há 15 anos
no parapente e é considerado o veterano da rampa. Foi um
dos líderes da construção da sede no local, com banheiros,
bar que serve almoço aos domingos e até um sistema
interno com câmera para conectar a biruta, que permite ver
as condições de voo. “Construímos com dinheiro próprio,
doações de amigos e de outros parapentistas.”
Leovane Rossoin, 46 anos, é eletricista mecânico. Há dois
anos e meio pratica o parapente. “Baixo Guandu é o Havaí
do voo livre. Quase todos os dias dá para voar. Em alguns
locais do país, isso é possível apenas em determinadas
épocas do ano”, comenta.
Raney Modeneze de Freitas, 28 anos, voa desde 2013
e está se formando para ser instrutor de voo. Ele conta
que muitas vezes o grupo se reúne para fazer voos em
grupo. “É um esporte de paciência, e por vezes ficamos
horas esperando o melhor momento. Tem dia que, mesmo
sabendo que não vamos voar, nós nos encontramos na
rampa para conversar.”
Parapente
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Ficha Técnica Fundação Vale
Diretora-PresidenteIsis Pagy
Diretor-ExecutivoLuiz Gustavo Gouvêa
Gerência Fundação ValeMarcos Reys
Gerência de CulturaFernanda FingerlCamila AbudDiogo BarbosaNatalia Chamusca
Mapeamento Cultural
RealizaçãoMovida Produções
Coordenação Geral e Pesquisa de CampoJúlia Motta
Coordenação de ConteúdoAdriana Facina
Pesquisa HistóricaManuela Green
FotografiaMarcela Pin
Publicação
Edição Movida Produções
Produção de TextoJúlia Motta
FotografiaMarcela Pin
Coordenação de ConteúdoAdriana Facina
Revisão de ConteúdoMariana Filgueiras
RevisãoMarca-Texto Editorial
Design GráficoLígia LourençoFernanda Rossi
Impresso porJ. Sholna