espectros e modelos atômicos

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75 Física na Escola, v. 6, n. 1, 2005 Espectros e modelos atômicos Q uando Kirchhoff e Bunsen, ambos professores em Hei- senberg, deduziram a partir de suas experiências em 1859 que cada elemento emite em determinadas condições um espectro característico exclusivamente desse elemento, descobriu-se não só uma propriedade fundamental da matéria, mas tam- bém um poderoso método de análise. Abriu-se então um novo campo de in- vestigação altamen- te promissor que permitiu, dentre outras coisas, a des- coberta de um novo elemento até então desconhecido na Terra: o hélio. A descoberta deu-se a partir da análise espectral do Sol, em 1868. É impor- tante notar que praticamente tudo que se sabe sobre a composição quí- mica dos astros se deve aos avanços da espectroscopia. Mas as contribui- ções da espectroscopia são inúmeras. A partir de meados do século XIX, os progressos nas técnicas de espectro- metria e a sistematização das medidas permitiram catalogar os diversos comprimentos de onda dos elementos até então conhecidos, bem como a descoberta de novos elementos. Métodos de espectrometria são hoje utilizados na indústria e em labo- ratórios de análises clínicas para deter- minar a composição de uma substân- cia, já que a radiação luminosa emitida é característica da substância que a emite. Em astrofísica, além de determinar a composição e tempera- tura de estrelas, permite estudar o movimento dos corpos celestes, por Efeito Doppler. Mas foi na física do final do mesmo século e início do século XX, com o estudo do espectro de emissão de um corpo negro, que a espectrometria impulsionou o surgi- mento do que chamamos de física moderna. Corpos negros emitem, a uma dada temperatura, espectros idênticos, indepen- dente de sua com- posição. Essa carac- terística intrigante o tornou alvo de grande interesse por parte dos físicos teóricos, cujo traba- lho consistia em deduzir uma equa- ção que permitisse calcular a energia emitida pelo corpo negro correspon- dente a cada um dos comprimentos de onda do espectro da luz por ele emi- tida. Leis empíricas surgiram do es- tudo experimental detalhado de cor- pos negros a temperaturas diferentes. A Lei de Wien mostra uma propor- cionalidade entre a freqüência na qual a radiação emitida tem intensidade máxima e a temperatura do corpo, isto é: (c = 3 x 10 8 m/s é a velocidade da luz no vácuo e b = 2,898 x 10 -3 m.K a constante de Wien). A lei de Stefan - Boltzman explica o fato de termos um aumento consi- derável para a intensidade total da radiação emitida pelo corpo negro com o aumento de temperatura, pois a energia total irradiada pelo corpo A introdução de física moderna no Ensino Médio é hoje consenso entre os professores de Física, já que o seu entendimento é visto como uma necessidade para a compreensão de fenômenos ligados a situações vividas pelos estudantes, sejam de origem natural ou tecnológica. Muitos esforços têm sido alocados com o objetivo de se desenvolver recursos pedagógicos que permitam aos professores abordar tópicos da Física desen- volvida no século XX [1-17]. Neste trabalho apresentaremos um conjunto de experimentos que permitirá ao professor discutir o conceito de quantum de energia. Tais experimentos per- mitem dentre outras observações determinar através de dois métodos distintos a constante de Planck. Formas discretas de emissão e absor- ção de radiação e que são manifestações imedia- tas do quantum de energia serão apresentadas utilizando material de baixo custo e de fácil reprodutibilidade. Por outro lado, o instrumen- tal construído nos permite também estudar a emissão e absorção característica de LEDs (light emission diode), permitindo a abordagem de con- ceitos importantes como a ressonância e o prin- cípio de funcionamento de dispositivos semicon- dutores, fruto das descobertas da física moderna e contemporânea. Marisa Almeida Cavalcante e-mail: [email protected] e Cristiane Rodrigues Caetano Tavolaro e-mail: [email protected] Pontifícia Universidade Católica de São Paulo Rafael Haag Universidade Federal do Rio Grande do Sul e-mail: [email protected] Experiências em Física Moderna Tudo que se sabe sobre a composição química dos astros se deve aos avanços da espectroscopia, cujas contribuições à Ciência são inúmeras, principalmente na indústria e em análises clínicas

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Page 1: Espectros e modelos atômicos

75Física na Escola, v. 6, n. 1, 2005

Espectros e modelos atômicos

Quando Kirchhoff e Bunsen,ambos professores em Hei-senberg, deduziram a partir de

suas experiências em 1859 que cadaelemento emite em determinadascondições um espectro característicoexclusivamente desse elemento,descobriu-se não só uma propriedadefundamental damatéria, mas tam-bém um poderosométodo de análise.Abriu-se então umnovo campo de in-vestigação altamen-te promissor quepermitiu, dentreoutras coisas, a des-coberta de um novo elemento atéentão desconhecido na Terra: o hélio.A descoberta deu-se a partir da análiseespectral do Sol, em 1868. É impor-tante notar que praticamente tudoque se sabe sobre a composição quí-mica dos astros se deve aos avançosda espectroscopia. Mas as contribui-ções da espectroscopia são inúmeras.A partir de meados do século XIX, osprogressos nas técnicas de espectro-metria e a sistematização das medidaspermitiram catalogar os diversoscomprimentos de onda dos elementosaté então conhecidos, bem como adescoberta de novos elementos.

Métodos de espectrometria sãohoje utilizados na indústria e em labo-ratórios de análises clínicas para deter-minar a composição de uma substân-cia, já que a radiação luminosaemitida é característica da substânciaque a emite. Em astrofísica, além dedeterminar a composição e tempera-

tura de estrelas, permite estudar omovimento dos corpos celestes, porEfeito Doppler. Mas foi na física dofinal do mesmo século e início doséculo XX, com o estudo do espectrode emissão de um corpo negro, que aespectrometria impulsionou o surgi-mento do que chamamos de físicamoderna. Corpos negros emitem, auma dada temperatura, espectros

idênticos, indepen-dente de sua com-posição. Essa carac-terística intriganteo tornou alvo degrande interesse porparte dos físicosteóricos, cujo traba-lho consistia emdeduzir uma equa-

ção que permitisse calcular a energiaemitida pelo corpo negro correspon-dente a cada um dos comprimentosde onda do espectro da luz por ele emi-tida. Leis empíricas surgiram do es-tudo experimental detalhado de cor-pos negros a temperaturas diferentes.A Lei de Wien mostra uma propor-cionalidade entre a freqüência na quala radiação emitida tem intensidademáxima e a temperatura do corpo,isto é:

(c = 3 x 108 m/s é a velocidade da luzno vácuo e b = 2,898 x 10-3 m.K aconstante de Wien).

A lei de Stefan - Boltzman explicao fato de termos um aumento consi-derável para a intensidade total daradiação emitida pelo corpo negrocom o aumento de temperatura, poisa energia total irradiada pelo corpo

○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

A introdução de física moderna no Ensino Médioé hoje consenso entre os professores de Física, jáque o seu entendimento é visto como umanecessidade para a compreensão de fenômenosligados a situações vividas pelos estudantes,sejam de origem natural ou tecnológica. Muitosesforços têm sido alocados com o objetivo de sedesenvolver recursos pedagógicos que permitamaos professores abordar tópicos da Física desen-volvida no século XX [1-17]. Neste trabalhoapresentaremos um conjunto de experimentosque permitirá ao professor discutir o conceitode quantum de energia. Tais experimentos per-mitem dentre outras observações determinaratravés de dois métodos distintos a constantede Planck. Formas discretas de emissão e absor-ção de radiação e que são manifestações imedia-tas do quantum de energia serão apresentadasutilizando material de baixo custo e de fácilreprodutibilidade. Por outro lado, o instrumen-tal construído nos permite também estudar aemissão e absorção característica de LEDs (lightemission diode), permitindo a abordagem de con-ceitos importantes como a ressonância e o prin-cípio de funcionamento de dispositivos semicon-dutores, fruto das descobertas da física modernae contemporânea.

Marisa Almeida Cavalcantee-mail: [email protected] Rodrigues Caetano Tavolaroe-mail: [email protected]ícia Universidade Católica de SãoPaulo

Rafael HaagUniversidade Federal do Rio Grande doSule-mail: [email protected]○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

Experiências em Física Moderna

Tudo que se sabe sobre acomposição química dos

astros se deve aos avançosda espectroscopia, cujas

contribuições à Ciência sãoinúmeras, principalmente na

indústria e em análisesclínicas

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negro é proporcional à quarta potên-cia da temperatura absoluta.

Baseando-se nesses resultados,Max Planck, em 1900, deu um saltoqualitativo muito importante para odesenvolvimento da física moderna aointroduzir a hipótese dos quanta naequação do cálculo da energia emitidapelo corpo negro. Segundo a hipótese,a radiação eletromagnética apresentauma descontinuidade: nasce o fótonde luz de energia E = hν e Einstein,em 1905, utiliza esse mesmo conceitopara explicar o Efeito Fotoelétrico!

Concomitante a essas descobertas,a incrível regularidade dos espectrosemitidos por gases permitiu que seobtivessem fórmulas empíricas paracalcular as freqüências emitidas porum dado elemento.

O mesmo conceito de descontinui-dade da radiação eletromagnética,aliado à regularidade dos espectrosemitidos por gases, levou Bohr, em1913, a utilizar as fórmulas empíricasdos espectros atômicos na formulaçãodos seus famosos postulados, dandoorigem ao primeiro modelo atômicoconsistente: o modelo para o átomode hidrogênio.

Vemos, portanto, o papel funda-mental desempenhado pela espectro-metria não somente como técnica demedida utilizada até hoje mas princi-palmente como protagonista do nas-cimento de conceitos e modelos querevolucionaram a Física no século XX!

Na seqüência, apresentaremos

diferentes propostas experimentaisque permitem estudar espectros deemissão e absorção e ainda uma pro-posta de baixo custo para a observa-ção de espectro de absorção.

Espectros de emissãoVários trabalhos têm sido desen-

volvidos [10-18] utilizando CDs comoredes de difração envolvendo desde aconstrução de espectroscópios manu-ais [13-17] até a medida de compri-mentos de onda através de anéisprojetados [11]. Selecionamos três téc-nicas distintas de análise e se manu-seadas adequadamente permitirãoefetuar medidas com elevado grau deprecisão.

Espectro de emissão por projeção:Feixe refletido

Este método fornece anéis deinterferência projetados em uma tela.Os comprimentos de onda da radiaçãopodem ser obtidos a partir da medidado ângulo de desvio de cada anel. Estatécnica de medida é descrita emdetalhes por Cavalcante e Benedetto[11]. Uma montagem que permite avisualização destes anéis de interfe-rência pode ser vista na Figura 1.

Valores dos comprimentos de on-da podem ser estimados se construir-mos uma curva de calibração desteespectroscópio. Para isso basta utilizarcomo fonte luminosa uma lâmpadaeletrônica fluorescente de Hg compac-ta (aconselha-se no mínimo 24 W),

já que se pode observar nitidamentesuas linhas características laranja,verde e violeta, cujos comprimentosde onda são 578 nm, 546 nm e 436nm, respectivamente.

Em seguida retira-se a fonte cali-bradora e dispõe-se na mesma posiçãouma fonte de luz cujo comprimentode onda se deseja medir. O gráfico daFigura 2 mostra a curva de calibraçãobem como os pontos obtidos para oscomprimentos de onda de dois LEDscomerciais, vermelho e verde. Os re-sultados, 600 nm para o vermelho e550 nm para o verde, estão próximosdos valores fornecidos pelo fabricante.

Espectro de emissão por projeção:Feixe transmitido

Para se obter a projeção do espec-tro por feixe transmitido usando oCD, é necessário retirar sua camadarefletora de alumínio de modo a tor-ná-lo transparente. Para isso, toma-se um CD gravável, recobre-se comfita crepe e faz-se um pequeno cortecom um estilete na sua superfície,como indica a Figura 3a. Ao puxar afita (Figura 3b), esta traz a camadarefletora, deixando o CD completa-mente transparente.

Para a observação do espectro seránecessário utilizar uma fonte colima-da de luz, uma lupa, um CD transpa-rente e réguas. Inicialmente ajusta-sea posição relativa entre tela, fonte elupa de modo a se obter uma imagembem nítida da fenda (Figura 4).

Experiências em Física Moderna

Figura 1. Montagem utilizada para a observação do espectro deemissão por reflexão no CD. Na tela, são observados os anéis deinterferência.

Figura 2. Curva de calibração e determinação dos comprimentosde onda de dois LEDs comerciais, vermelho e verde. Observe osvalores obtidos para os comprimentos de onda, cerca de 600 nme 500 nm, respectivamente, são bem razoáveis e estão de acordocom os valores fornecidos pelos fabricantes.

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Em seguida coloca-se o CD entrea lupa e a tela até que se observe oespectro com nitidez (Figuras 5 e 6).

Para a determinação dos compri-mentos de onda devemos medir o des-vio de cada linha projetada em relaçãoà fenda, conforme o esquema daFigura 7. A equação que permitecalcular o comprimento de onda λ daradiação correspondente à linhaescolhida é dada por:

Nλ = dsenθ, (1)

onde N corresponde à ordem do es-pectro que será analisado, d é adistância entre as ranhuras do CD(d = 1/625 mm pois o CD contém625 ranhuras/mm) e θ é o ângulo dedesvio da linha escolhida em relaçãoao eixo correspondente à fendaprojetada. Para determinar senθ , faz-se

, (2)

onde X é o desvio medido na tela deprojeção e D é a distância entre o CD ea tela (Figura 7).

Para permitir uma comparaçãoentre os resultadosobtidos pelo método1 (espectro de emis-são por reflexão) e ométodo 2 (espectrode emissão por feixetransmitido), obti-vemos informaçõesrelativas ao compri-mento de onda mé-dio emitido por umLED comercial

vermelho. Para 5.0 cm de distânciaentre o CD e a tela obtivemos umdesvio X de 2,3 cm, o que conduz aum comprimento de onda médio daemissão igual a 669 nm. A Figura 8mostra o espectro de 1ª ordem obtido.Para que se obtenha bons resultados,devemos garantir uma boa simetriapara estes desvios em relação à ima-gem da fenda. Desvios simétricos ga-rantem que tanto o CD quanto a telaencontram-se perpendiculares ao feixeincidente.

Espectroscópio manual

Uma opção muito interessante ebastante funcional para as escolas quenão dispõem de laboratórios ou salasescuras para a observação dos espec-tros de projeção são os espectroscópiosmanuais. Detalhes sobre a construçãode um espectroscópio manual podemser encontrados em Cavalcante e Ta-volaro [16]. A Figura 9 mostra umafoto de um desses espectroscópios.Trata-se de uma caixa em que em umade suas extremidades é fixado um pe-

Experiências em Física Moderna

Figura 3. Procedimento para a retirada da superfície refletora de um CD.

Figura 4. Montagem mostrando o ajuste inicial da imagem da fenda na tela. Algumasvezes a fonte de luz provoca uma luminosidade excessiva na tela prejudicando a visua-lização das linhas espectrais. Neste caso pode-se reduzir esta luminosidade interpondouma placa com orifício entre a lupa e a tela, melhorando a visualização do espectro.

Figura 5. O CD disposto entre a lupa e atela para a decomposição espectral.

Figura 6. Espectro de 1ª ordem obtido parao Hg. As linhas que são observadas commaior nitidez são violeta, verde, azul, la-ranja e vermelha.

Figura 7. Esquema indica como determinar o comprimentode onda da radiação usando um CD como rede de difração.

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daço de CD transparente e na outra,onde ocorre a incidência de luz, dis-pomos de uma escala graduada queservirá de tela para a projeção doespectro. A fenda que colima o feixe éajustada pelo observador, permitindomaior facilidade de manuseio.

Como sugestão, pode-se calibrara escala a partir da relação expressana Eq. (1), onde a distância da rede dedifração à tela (D) é característica decada caixa (Figura 9). Como a distân-cia entre as ranhuras de um CD é co-nhecida e assume o valor de 1,6 µm,pode-se obter os valores de cada desviopara comprimentos previamentefixados. Para o espectroscópio daFigura 9 temos D = 12,5 cm, forne-cendo a Tabela 1.

A Figura 10 mostra o espectro deuma lâmpada de Hg comercial obtidocom um espectroscópio manual.

De modo a permitir comparaçõescom os demais métodos, obtivemos oespectro de um LED vermelho tam-bém a partir deste espectroscópio,indicado na Figura 11.

Espectro de absorção de gasesPara se obter um espectro de

absorção de um gás deve-se fazer comque uma radiação de es-pectro contínuo e inten-so atravesse o gás demodo que este absorvaas radiações com ener-gias que lhe são carac-terísticas. Utilizaremosaqui como fonte umalâmpada de sódio comer-cial que apresenta umapropriedade muito pecu-liar e bastante útil paraa observação de linhas de

absorção: à medida que aumenta suatemperatura, uma camada de vaporde sódio preenche o espaço entre obulbo central de emissão e o seu bulboexterno (Figura 12). É essa camada devapor de sódio que permitirá oprocesso de absorção.

A Figura 13 mostra o aparatoexperimental utilizado para a projeçãodo espectro de Na.

Assim que ligamos a lâmpadaobserva-se nitidamente as linhasamarelas de emissão do sódio carac-terísticas das transições que envolvemo seu estado fundamental (Figuras14a e 14b).

No entanto, à medida que a tem-peratura aumenta inicia-se o processode absorção das energias caracterís-ticas das transições fundamentais e aslinhas amarelas desaparecem do es-pectro conforme mostram as Figuras15a e 15b.

Uma aplicação importante dessefenômeno reside no estudo dos gasesdas camadas atmosféricas das estrelasque acabam por absorver certos com-primentos de onda, deixando linhasescuras no espectro observado. Comocada elemento absorve apenas oscomprimentos de onda que lhe sãocaracterísticos, através destas linhas

Experiências em Física Moderna

Figura 8. Espectro de 1ª ordem de um LEDvermelho. Nesta montagem X1 = X2 mos-trando uma perfeita simetria, condiçãonecessária para se obter bons resultados.Essa simetria indica que tanto o CDquanto a tela encontram-se perpendicu-lares ao feixe incidente de luz.

Figura 9. Espectroscópio manual segundoCavalcante e Tavolaro [16].

Figura10. Espectro observado em umespectroscópio manual com D = 12,5 cm.

Figura 11. Espectro observado na tela deum espectroscópio manual. Pela tabela decalibração, temos um valor para o com-primento de onda médio de emissão doLED vermelho próximo a 650 nm, valorcompatível com os anteriormente obtidos.

Figura12. Lâmpada utilizada para a obser-vação do fenômeno de absorção no vaporde Na.

Figura 13. Montagem utilizada para a observação doespectro de absorção do Na.

Tabela 1. Calibração de um espectroscópiomanual com D = 12,5 cm.

λ (nm) senθ X (cm)

400,00 0,25 3,23

450,00 0,28 3,66

500,00 0,31 4,11

550,00 0,34 4,58

600,00 0,38 5,06

650,00 0,41 5,56

700,00 0,44 6,08

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absorvidas podemos identificar osgases que compõem essas camadasatmosféricas.

Determinação da constante dePlanck utilizando LEDs

Determinação da constante de Plancka partir do espectro de emissão deum LED

A determinação da constante dePlanck a partir da radiação emitidapor um LED é um método bem conhe-cido e os detalhes sobre este experi-mento podem ser vistos em Caval-cante e Tavolaro [6], onde determina-se a constante de Planck a partir deinformações relativas à curva caracte-rística de um LED. Admite-se que aenergia necessária para o acendimentode um LED é no mínimo igual à ener-gia emitida pela radiação de maiorintensidade. Podemos portanto dizerque a constante de Planck é determi-nada a partir da emissão de radiaçãode um LED.

Um diodo emissor de luz consisteem uma junção entre semicondutoresfortemente dopados. De acordo como diagrama de energias (Figura 16),ao aplicarmos um campo elétrico ex-terno oposto à junção pn, estaremospolarizando-a diretamente, fazendo odiodo conduzir, isto é, a corrente elé-trica obtida aumenta com a tensãoaplicada.

Dessa forma, os elétrons de con-dução ganham energia suficiente paravencer a barreira de potencial e cami-nham para a região p. Podemos verna Figura 16 que para os elétrons demaior mobilidade penetrarem na re-gião p, a quantidade de energia míni-ma necessária é dada por:

eVaplicada = EG + ∆EF, (3)

onde ∆EF incorpora os efeitos do nívelde Fermi e a distribuição de elétronsna banda de condução.

Quando o elétron passar para aregião p, podemos ter uma recombi-nação entre elétrons e buracos e, comoconseqüência, para cada transiçãoteremos a emissão de um fóton comenergia hν. Em geral, ∆EF é muito pe-queno e pode ser desprezado em pri-meira aproximação. Admitindo que afreqüência de radiação de intensidade

Experiências em Física Moderna

Figura14a. Espectro de 1a ordem do Na observado através de uma rede de 300 linhas/mm quando ligamos a lâmpada (nos primeiros 30 s).

Figura14b. Espectro de emissão do Na observado após 1 minuto. Após este intervalo detempo começam a surgir as demais linhas de emissão características do Na.

Figura 15a. Espectro observado transcorrido cerca de 3 minutos em que a lâmpada foiligada.

Figura 15b. Absorção das linhas associadas às transições que envolvem o estado funda-mental do Na.

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máxima pode ser escrita em termosdo limiar de tensão (aquele valor parao qual o diodo começa a conduzir cor-rente), temos

hν = eV, (4)

onde V corresponde ao limiar de ten-são aplicada aos terminais do LEDpara fazê-lo acender e pode serdeterminado através da curva carac-terística do LED.

No entanto, caso se tenha interes-se apenas em obter informações acer-ca da ordem de grandeza da constantede Planck, basta variarmos a tensãonos terminais do LED até que a luzemitida possa ser visualizada direta-mente.

O esquema do circuito para aobtenção da ordem de grandeza daconstante de Planck encontra-se naFigura 17.

O procedimento consiste em alte-rar a tensão aplicada aos terminaisdos LEDs através do potenciômetroaté que seja visualizada a luz de emis-são de cada LED. O LED de maior com-primento de onda necessita de menorenergia para acender. As Figuras 18ae 18b mostram um exemplo de mon-tagem e os valores correspondentes detensão para acendimento de cada umdos LEDs.

Experiências em Física Moderna

Usando os resultados anteriorespara o comprimento de onda do LEDvermelho, isto é, um valor da ordemde 650 nm e a Eq. (4) , obtém -se paraa constante de Planck um valor de:

h = eVλ/c = 5,7 x 10-34 J.s

Já para o LED verde obtivemosum valor de emissão da ordem de560 nm, o que nos fornece um valorde 5,8 x10-34 J.s para a constante dePlanck. Estes valores são muito satis-fatórios se considerarmos todas asaproximações realizadas.

Determinação da constante de Plancka partir da absorção de um LED

Um LED, como todo semicondu-tor, aumenta sua condutividade àmedida que fótons de energia corres-pondente a sua “banda de emissão”incidem sobre ele. Esta propriedadenos permite utilizar um LED comoum sensor de radiação com uma res-posta espectral definida pela largurade sua banda de emissão. Podemosdizer, portanto, que a corrente elétricafornecida pelo LED, na incidência deuma radiação ressonante, é propor-cional à intensidade de luz incidente.

Os LEDs vêm sendo utilizadoscomo sensores de radiação em fotô-metros solares [19-22] desde 1992,

apresentando uma lar-gura típica de respostana região de 550 a 700nm da ordem de 25 a 35nm, o que nos permiteselecionar adequada-mente o comprimento deonda da radiação.

Um experimentomuito simples pode ser

realizado de modo a comprovar apropriedade ressonante de um LEDcomo sensor de radiação. Para issobasta conectar os terminais de umLED a um voltímetro (utilize escalamáxima de 2 V) e inicialmente veri-fique sua resposta com o aumento daincidência de luz.

O próximo passo consiste em de-monstrar a sua resposta ressonante.Um LED vermelho, por exemplo, res-ponderá apenas a radiação de compri-mento de onda na faixa de 600 nm.Para isso disponha diferentes filtrosdiante do LED e verifique que só seobtém um valor significativo para atensão de saída na presença de um fil-tro vermelho. O LED verde, por suavez, responderá significativamentepara o filtro verde.

Uma outra observação muitointeressante consiste em incidir sobreo LED verde um feixe de luz de umaponteira laser. As ponteiras laserscomerciais em geral emitem radiação

Figura 16. Diagrama de energias para uma junção p-n.

Figura 17. Diagrama elétrico para a obtenção da ordemde grandeza da constante de Planck.

Figura18a. O visor do voltímetro indica ovalor de tensão necessária para o LEDvermelho acender (1,65 V).

Figura18b. O visor do voltímetro indicao valor de tensão necessária para o acen-dimento do LED verde (1,85 V). Observeque o LED vermelho neste caso encontra-se totalmente aceso, já que apresenta com-primento de onda maior e, portanto,requer menor energia para iniciar o seuprocesso de condução.

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de comprimento de onda de 630 a680 nm, que não é ressonante para oLED verde mas o é para o vermelho.

Mesmo na presença de um feixebastante intenso quanto o provenientede uma ponteira laser, o LED verde épraticamente insensível. O único LEDque responde de maneira significativaao feixe da ponteira laser é aquele cujaresposta espectral intercepta a sua fai-xa de emissão, ou seja, o LED verme-lho. Cavalcante e Haag [23] desenvol-veram um trabalho que permitedeterminar a constante de Planckutilizando LEDs como sensores deradiação.

A Eq. (5) é a aproximação de Wienpara a energia emitida por unidade detempo e de área, à temperatura T ecomprimento de onda λ no intervalodλ, por um filamento de tungstênioaquecido:

, (5)

onde I é potência emitida pelo filamen-to de tungstênio, por unidade de área,por unidade de comprimento de onda,em um intervalo de comprimento deonda dλ em torno de λ, λ é o compri-mento de onda, T é a temperatura emKelvin, β = 1/kBT, com kB a constantede Boltzmann, h a constante dePlanck, c a velocidade da luz e a emis-sividade média do tungstênio (pratica-mente independente do comprimentode onda e da temperatura, que o ca-racteriza como um “corpo cinza”).

Analisando a equação, percebe-seque o gráfico de ln(I) x 1/T deve nosfornecer uma reta cuja inclinação édada por hc/λkB, permitindo portantoobter informações sobre a constantede Planck.

Nossa proposta é utilizar um LEDcomo sensor da luz emitida pelo fila-mento e como conseqüência a corren-te gerada será proporcional à intensi-dade de radiação incidente comcomprimento de onda λ no intervalodλ. O procedimento consiste em obterinformações sobre a corrente outensão fornecida pelo LED em funçãoda temperatura de aquecimento dofilamento. É importante alertar parao fato de que, em geral, essa “fotocor-rente” assume valores da ordem depoucos microamperes e, como conse-

qüência, aconselha-se a utilização deum amplificador. Nos fotômetros so-lares tem sido utilizado como amplifi-cador o CI 741, na configuração deconversor “corrente x tensão”, onde acorrente gerada é convertida em ten-são. Nessa configuração, a tensãopresente na saída do amplificadoroperacional, será linearmente propor-cional à intensidade da radiação rece-bida pelo LED. Um esquema deste am-plificador é descrito por Cavalcante eHaag [23]. No entanto é possível tam-bém obter medidas de tensão direta-mente nos terminais de cada LED. Paraisso devemos aproximar o LED dalâmpada de filamento. Ainda assimtemos uma redução no número depontos para baixas temperaturas, jáque nesta região há um decréscimosignificativo na intensidade de radia-ção emitida pelo filamento (aconse-lha-se trabalhar com tensões nosterminais do LED sempre abaixo de1,0 V).

Os resultados obtidos para osLEDs vermelho, verde e azul estãoindicados na Figura19.

Observa-se facilmente a relaçãolinear entre ln(VLED) x 1/T, indicandoa aplicabilidade da aproximação deWien para o filamento.

Por outro lado, a constante dePlanck pode ser obtida a partir dainclinação da reta, sendo dada por:

h = inclinação da reta. λKB/c, (6)

onde, em uma primeira aproximação,λ corresponde ao comprimento deonda da radiação de máxima intensi-dade emitida pelo LED. A Tabela 2fornece os resultados obtidos.

Pode-se determinar experimental-mente o comprimento de onda deemissão do LED utilizando qualquerum dos métodos propostos neste tra-balho. Os valores dos comprimentosde onda indicados na coluna 2 daTabela 2, bem como as corresponden-tes larguras espectrais, foram obtidospor visualização direta através de umespectroscópio manual.

Verifica-se facilmente a partir daEq. (6), que a relação entre as inclina-ções das retas obtidas para ln(VLED) x1/T nos fornece a relação entre as fre-qüências de emissão dos LEDs envol-

Figura 19. Gráfico obtido para a tensão nos terminais de cada LED em função datemperatura de aquecimento do filamento.

Tabela 2.

Cor do LED Comprimento de onda Inclinação Valor de he largura espectral (nm) da reta (x10–34) J.s

Vermelho 649 ± 24 19253 5,8 ± 0,3

Verde 562 ± 31 22796 5,9 ± 0,4

Azul 459 ± 28 28132 5,9 ± 0,4

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Referências[1] F. Ostermann, L. Mendonça e C.J.H.

Cavalcanti, Revista Brasileira de Ensinode Física 2020202020, 437 (1998).

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[3] C.E. Laburú, A.M. Simões e A.A. Urbano,Caderno Catarinense de Ensino de Física1515151515, 1192 (1998).

[4] F. Catelli, Caderno Catarinense de Ensinode Física 1818181818, 108 (2001).

[5] M.A. Cavalcante, A. Piffer e P. Nakamu-ra, Revista Brasileira de Ensino de Física2323232323, 108-112 (2001).

[6] M.A. Cavalcante, C.R.C. Tavolaro, D. deS. Fagundes e J. Muzinatti, Física na Es-cola 33333:1, 24-29 (2002)

[7] D.B. Junior, Física Moderna: Tópicos parao Ensino Médio (Editora Companhia daEscola, Campinas, 2002).

[8] V.S. Bagnato, Física na Escola 11111:2, 4

vidos. A Tabela 3 apresenta a relaçãoobtida para cada caso.

Nota-se que a precisão dos resul-tados obtidos neste experimento estálimitada à largura de emissão de cadaLED, o que é indicado na 3a coluna eque para o pior caso nos conduz aprecisões da ordem de 8%.

A concordância entre as relaçõesindicadas nas colunas 2 e 3 da Tabela 3nos leva a crer que os desvios obser-vados para os valores da constante dePlanck indicados na Tabela 2 devem ser

atribuídos principalmente a erros nadeterminação da temperatura do fila-mento. O cálculo dessa temperaturadepende dentre outras variáveis da re-sistência elétrica do filamento a zerograu Celsius [23] e a estimativa dessevalor é bastante difícil de ser efetuada.De qualquer modo, podemos dizer quea aproximação de Wien para a energiaemitida pelo filamento foi verificada.

ConclusãoNeste trabalho procuramos dar

Tabela 3.

Relações Relação entre as inclinações Relação entre as freqüênciasdas retas de emissão

Verde/Vermelho 1,18 1,15 ± 0,08

Azul/vermelho 1,46 1,41 ± 0,11

Azul/verde 1,23 1,22 ± 0,10

enfoque à caracterização das radiaçõesque compõem o espectro eletromag-nético. Os recursos de baixo custo e ametodologia desenvolvida constituemuma ferramenta tecnológica acessívelpara identificação das radiações no es-tudo dos mais variados tipos de estru-tura, de gases a sólidos incandes-centes. Atenção especial foi dedicadaaos semicondutores - mostramos queLEDs comerciais podem substituirtanto as fontes como os sensores deluz na incansável e importante tarefade verificar a validade de modelosatravés da determinação de constantesfísicas: o modelo do quantum de luz ea constante de Planck. Dessa forma,esperamos contribuir para o enrique-cimento das abordagens experimen-tais como estratégia para o ensino defísica moderna no Ensino Médio.

(2001).[9] N. Studart, Física na Escola 44444:2, 4 (2003).[10] M.A. Cavalcante, V. Jardim e J.A.A.

Barros, Caderno Catarinense de Ensinode Física 1616161616, 154 (1999).

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[14] M.A. Cavalcante e C.R.C. Tavolaro, Ca-derno Catarinense de Ensino de Física 1818181818,298 (2001).

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[16] M.A. Cavalcante e C.R.C. Tavolaro, Físicana Escola 33333:2, 40 (2002).

[17] M.A. Cavalcante e C.R.C. Tavolaro, Física

Moderna Experimental (Editora Manole,São Paulo, 2003)

[18] M.G. Cornwall, Phys Educ 2828282828, 12(1993).

[19] F.M. Mims III, Apllied Opticsl 3131313131, 6965(1992).

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[21] T.M. Sansosti, Led’s Detectors, http://laser.physics.sunysb.edu/~tanya/re-port2/.

[22] D.R. Brooks, F.M. Mims III, T. Nguyen,and S. Bannasch, Globe Annual Meet-ing, Snowmass, Colorado, 1998.

[23] M.A. Cavalcante e R. Haag, XVI Sim-pósio Nacional de Ensino de Física, 24 a28 de janeiro de 2005, Rio de Janeiro,R.J. Livro de resumos, p. 101. Paraacesso ao texto completo na paginahttp://www.sbf1.sbfisica.org.br/eventos/snef/xvi/, sessão A12-1, painelP128.

Experiências em Física Moderna

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NovidadeA Sociedade Brasileira de Química lançou o

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