espaÇo institucional, espaÇo educativo: … · a arquitetura escolar é também, por si, um...

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Anais Eletrônicos do IX Congresso Brasileiro de História da Educação João Pessoa Universidade Federal da Paraíba 15 a 18 de agosto de 2017 ISSN 2236-1855 2276 ESPAÇO INSTITUCIONAL, ESPAÇO EDUCATIVO: INSTALAÇÕES EM EXTERNATO E INTERNATO DE CURSOS GINASIAIS Stella Sanches de Oliveira Silva 1 Introdução Em ofício ao diretor da instrução de Mato Grosso, em 9 de janeiro de 1935, a Associação Brasileira de Educação (ABE) divulgava a importância que a Primeira Exposição de Arquitetura Escolar promovida pela instituição havia ganho e instigava o responsável pela instrução pública do estado a averiguar o que encontraria na próxima exposição a ocorrer ainda naquele ano do ofício. Os argumentos da ABE para esse público dirigente da educação pautavam-se no “aparecimento de novos tipos e soluções arquitetônicas, como de soluções e fórmulas econômicas”, “substituição de prédios inadequados por edifícios simples, dotados de todos os requisitos essenciais a uma escola”. A retórica da ABE soava como um apelo político sustentado no ideário da educação moderna: “oferta de uma ‘casa de ensino’ que merecem as crianças é um dos grandes atos de qualquer administração esclarecida”. (OFÍCIO..., 1935). Viñao Frago e Escolano (1998) asseveram que o espaço adquire tamanho significado na pedagogia escolar que se constitui em discursos construídos para determinados fins. A arquitetura escolar é também, por si, um programa, uma espécie de discurso que institui na sua materialidade um sistema de valores, como os de ordem, disciplina e vigilância, marcos para a aprendizagem sensorial e motora [...] é um constructo cultural que expressa e reflete determinados discursos [...] é um elemento significativo do currículo, uma fonte de experiência e aprendizagem. (VIÑAO FRAGO; ESCOLANO, 1998, p. 26). Nesse sentido, não apenas as disciplinas e as aulas têm função de ensinar, mas o espaço, igualmente, é tornado instrumento para a construção de uma cultura, valores e conhecimentos. O espaço, como dizem os autores citados, previa a ordem, a disciplina e a vigilância. Assim como o tempo, o espaço torna-se instrumento de ensino forjando “a interiorização de comportamentos e de representações sociais” (FARIA FILHO; VIDAL, 2000, p. 20), isto é, 1 Doutora em Educação pela Universidade Federal de Mato Grosso do Sul. Professora nos cursos de Pedagogia da UFMS/EAD como bolsista, da UEMS como substituta, Facsul como contratada. E-Mail: <[email protected]>.

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Anais Eletrônicos do IX Congresso Brasileiro de História da Educação João Pessoa – Universidade Federal da Paraíba – 15 a 18 de agosto de 2017

ISSN 2236-1855 2276

ESPAÇO INSTITUCIONAL, ESPAÇO EDUCATIVO: INSTALAÇÕES EM EXTERNATO E INTERNATO DE CURSOS GINASIAIS

Stella Sanches de Oliveira Silva1

Introdução

Em ofício ao diretor da instrução de Mato Grosso, em 9 de janeiro de 1935, a

Associação Brasileira de Educação (ABE) divulgava a importância que a Primeira Exposição

de Arquitetura Escolar promovida pela instituição havia ganho e instigava o responsável pela

instrução pública do estado a averiguar o que encontraria na próxima exposição a ocorrer

ainda naquele ano do ofício.

Os argumentos da ABE para esse público dirigente da educação pautavam-se no

“aparecimento de novos tipos e soluções arquitetônicas, como de soluções e fórmulas

econômicas”, “substituição de prédios inadequados por edifícios simples, dotados de todos os

requisitos essenciais a uma escola”. A retórica da ABE soava como um apelo político

sustentado no ideário da educação moderna: “oferta de uma ‘casa de ensino’ que merecem as

crianças é um dos grandes atos de qualquer administração esclarecida”. (OFÍCIO..., 1935).

Viñao Frago e Escolano (1998) asseveram que o espaço adquire tamanho significado na

pedagogia escolar que se constitui em discursos construídos para determinados fins.

A arquitetura escolar é também, por si, um programa, uma espécie de discurso que institui na sua materialidade um sistema de valores, como os de ordem, disciplina e vigilância, marcos para a aprendizagem sensorial e motora [...] é um constructo cultural que expressa e reflete determinados discursos [...] é um elemento significativo do currículo, uma fonte de experiência e aprendizagem. (VIÑAO FRAGO; ESCOLANO, 1998, p. 26).

Nesse sentido, não apenas as disciplinas e as aulas têm função de ensinar, mas o

espaço, igualmente, é tornado instrumento para a construção de uma cultura, valores e

conhecimentos.

O espaço, como dizem os autores citados, previa a ordem, a disciplina e a vigilância.

Assim como o tempo, o espaço torna-se instrumento de ensino forjando “a interiorização de

comportamentos e de representações sociais” (FARIA FILHO; VIDAL, 2000, p. 20), isto é,

1 Doutora em Educação pela Universidade Federal de Mato Grosso do Sul. Professora nos cursos de Pedagogia da UFMS/EAD como bolsista, da UEMS como substituta, Facsul como contratada. E-Mail: <[email protected]>.

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sistema de valores aceitos e reproduzidos, que não ficarão circunscritos ao espaço interno da

escola, mas se disseminarão na sociedade como padrões de comportamentos.

Ao pensar os prédios e espaços internos das escolas corumbaenses e campo-grandenses

dados a conhecer por meio dos documentos acessados para esse trabalho, torna-se nítida a

importância pedagógica que a arquitetura das instituições teve em relação ao ensino.

A proposta de uma arquitetura escolar articulou localização urbana, normas de

higienização e sanitarismo à finalidade de ensino, uniu elaboração de métodos e materiais

pedagógicos e valorização dos espaços próprios para as atividades pedagógicas.

Sua localização, volume, traço geométrico, sinais que o seu desenho mostra, os símbolos que incorpora tornam inconfundível seu objetivo e permitem sua fácil identificação [...] Pode-se assegurar pois, que o esforço levado a cabo pelos políticos e técnicos [...] por definir o modelo (ou modelos) de arquitetura escolar, cumpriu não só uma função pedagógica, mas também um objetivo cultural de primeira magnitude ao criar um dos símbolos que melhor aglutinam a consciência coletiva das populações e sua própria identidade. [...] A criação e difusão desses símbolos transmitem um certo ethos em favor da modernização nacional. (VIÑAO FRAGO; ESCOLANO, 1998, p. 34).

Espaço e tempo, métodos e materiais pedagógicos formavam um conjunto atribuidor

de sentidos ao cotidiano da escola secundária. Imbuída no intuito de formar os jovens

enquanto cidadãos úteis à pátria em funções burocráticas, profissionais liberais e condutores

da nação, essa escola ganhou novos espaços.

Novas salas com funcionalidades específicas para o ensino dos estudos científicos e

humanísticos com uma diversidade de materiais de apoio pedagógico caracterizaram e,

também, encareceram os estudos secundários. A Biblioteca, o Pátio, as Salas de Estudos, o

Ginásio esportivo, enfim, o espaço escolar ganhou novas esferas e objetivos, diferenciando-se

em certa medida do grupo escolar2 principalmente devido à idade de seu público.

Para o estudo ora proposto, tem-se como objetivo analisar o espaço institucional e

educativo de escolas que ofereceram cursos ginasiais na década de 1930, em algumas cidades

do então Mato Grosso.

Ao pensar os prédios e espaços internos das escolas corumbaenses e campo-grandenses

torna-se nítida a importância pedagógica que a arquitetura das instituições teve em relação ao

2 Conforme Souza (1998), o grupo escolar forjou-se, no estado de São Paulo, ao final do século XIX, sendo disseminado para outros estados do país. Essa forma escolar respondeu a legitimação republicana e tornou-se modelo de ensino primário e símbolo republicano. O prédio do grupo escolar adquiriu tamanha importância que passou a ser considerado verdadeiro templo de civilização, simbolizando a escola moderna para a formação integral da criança, pautada em métodos atualizados de acordo com os países mais avançados e uma estrutura material compatível com essa finalidade.

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ensino secundário, particularmente proposto nas modalidades externato ou internato. Se a

escola fosse confessional religiosa, provavelmente, teria como oferta tanto o regime de

externato quanto internato, neste, alunas ou alunos morariam na própria escola, entregues

integralmente aos religiosos por estarem afastados da família por algum motivo. Os Ginásios

públicos, no sul de Mato Grosso, evitaram esse tipo de regime, oferecendo apenas os

externatos.

Duas questões norteiam a análise: Com quais objetivos os espaços foram pensados e

erigidos? Como se constituiu o espaço institucional e as instalações do externato e do

internato dessas escolas? Como hipótese articuladora para as indagações é possível afirmar

que a arquitetura escolar adquiriu um discurso pedagógico por fazer parte de uma construção

cultural, de modo a esboçar sistemas de valores e uma aprendizagem sensorial e motora.

Relatórios de inspeção prévia e inspeção permanente, colhidos dos acervos de escolas

das cidades de Corumbá e Campo Grande, por meio de um procedimento de identificação e

seleção, compõem as fontes documentais desse trabalho. Como esses relatórios são registros

de pessoas inseridas no contexto educacional de cada instituição adquirem intencionalidades

e propósitos, por isso, não podem ser considerados neutros.

Localização do edifício escolar

As mudanças na urbanização das duas cidades eram acompanhadas de investimentos

nas instituições escolares de curso ginasial. Ao final da década de 1930, as de ensino privado

estavam sensivelmente à frente de suas correspondentes públicas em relação à organização

dos espaços. As duas instituições pública de curso ginasial, o Ginásio Maria Leite, tornado

estadual em 1937, e o Liceu Campograndense, criado em 1938, terminavam a década dando

seus primeiros passos enquanto instituições públicas de ensino secundário.

Em Campo Grande, com respeito ao Ginásio Dom Bosco, estava situado entre a Rua

João Pessoa (a principal artéria da cidade na época) e Avenida Mato Grosso, com os fundos

para a rua 13 de Junho. Tanto a Rua João Pessoa quanto a Avenida eram asfaltadas. De

acordo com o relato do inspetor federal: “A primeira é uma rua de certo movimento de

veículos, não assim a segunda, para onde dá a saída e entrada do externato. O terreno, que

tem três faces isoladas dos prédios vizinhos, é levemente inclinado, permitindo fácil

escoamento às aguas”. (RELATÓRIO..., 1932).

O edifício do Ginásio N. S. Auxiliadora, em 1937, funcionando em imóvel próprio e

construído para fins escolares desde 1931, foi elogiado pelo inspetor Deusdedit de Carvalho

no quesito condições técnicas para o bom funcionamento da instituição de ensino.

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Numa aprazível e salubérrima colina da nova cidade de Campo Grande, salienta-se, dentro do perímetro urbano, o local do edifício do Ginásio Feminino “N. S. Auxiliadora”. Além de se achar numa situação de acordo com todas as condições gerais exigidas pela Saúde Pública, cercam-no lugares reconhecidamente saudáveis, pela pureza do ar, isento de emanações nocivas. Isolado o estabelecimento das habitações vizinhas e relativamente afastado dos centros de grande trânsito, mormente de veículos, não apresenta o inconveniente de perturbação no movimento geral das aulas, nem dos incidentes que poderiam advir, dum meio mais agitado. (RELATÓRIO...,1937).

Descontando os elogios com a clara intenção de conquistar a Inspeção Permanente

para a escola em questão junto ao Ministério de Educação e Saúde Pública, percebe-se a

ênfase na qualidade da localização do prédio dentro da cidade e o cuidado em esclarecer da

sua situação no “perímetro urbano”. Deusdedit de Carvalho frisou que era o “terreno natural,

permeável, permitindo fácil escoamento às águas. Não impede, porém este declive, que o

edifício e suas dependências se achem em terreno regularmente plano e protegido contra

erosões”. (RELATÓRIO...,1937).

Também em 1937, sobre o prédio do Ginásio Imaculada Conceição, em Corumbá, dizia-

se:

está situado na zona urbana. Na vizinhança não há nenhum prédio ou fábrica que possa perturbar o funcionamento regular das aulas. Em frente do Colégio acha-se o jardim público frequentado quase unicamente aos domingos. O terreno é calcário. Há área livre e coberta. (RELATÓRIO..., 1937).

Quanto ao prédio do Liceu Campograndense, nas palavras de Amélio Baís,

[...] foi o mesmo especialmente construído para estabelecimento escolar, ainda que primário, o qual continua ali funcionando. Quanto a este, no caso de vir a funcionar o Ginásio, passará para o pavilhão já construído nos fundos, também com a mesma finalidade. (INSPEÇÃO..., 1941).

Como lembra Amélio Baís, o Liceu Campograndense, em sua instalação em 1939, não

tinha uma sede própria nem apropriada para uma escola secundária ginasial, já que ele

ocupou o prédio do Grupo Escolar Joaquim Murtinho e a Escola Normal (PESSANHA et al.,

2007). Ressalvou o inspetor sobre o pavilhão anexo nos fundos com o fito de dar espaço aos

estudos secundários.

Situado na Avenida Afonso Pena, principal logradouro de Campo Grande, de acordo

com a descrição do inspetor, o prédio escolar ficava em região alta da cidade e havia sido

construído no centro de um amplo terreno,

por ficar distante das atividades comerciais, isento de poeira excessiva [...], satisfazendo as condições de Saúde Pública e da pedagogia, [...] por estar

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afastado do cruzamento de linhas férreas, de casas de diversões, [...] isolado de qualquer perturbação externa. (ELUCIDÁRIO..., 1941).

Nos quatro relatos, a representação da cidade era de ser um local agitado, barulhento,

animado excessivamente, com muitos transeuntes, casas comerciais e indústrias. Como

demonstram os discursos, tais características são consideradas elementos negativos e nocivos

ao pleno andamento do trabalho escolar. Paradoxalmente, a respeitabilidade e a

credibilidade da instituição escolar ligavam-se a sua localização urbana, opondo-se ao mundo

rural, considerado arcaico e ultrapassado.

O externato – edifício e sala de aula

A sede física do Liceu Campograndense, ainda que “emprestada”, complementava o

complexo educacional abrigando: grupo escolar, escola normal e, doravante, curso ginasial.

Relativizando o investimento estadual que não foi tão significativo, uma vez que apenas um

prédio devia dar conta de todos esses ramos de ensino, esse edifício escolar teve condições de

simbolizar algo de realmente notório para a sociedade campo-grandense. O sentido

republicano no qual os cidadãos podiam usufruir da educação pública, a representação da

cidadania, da modernização, da civilidade. Sendo assim, o Liceu Campograndense ofereceu o

regime de externato, caracterizando-se como um local exclusivamente para fins de ensino.

De acordo com o “Elucidario para ficha de classificação” que compõe o Relatório de

inspeção prévia de 1941, é possível conhecer os espaços escolares disponíveis para o Liceu

Campograndense. A transcrição do Relatório feito pelo inspetor federal, Amélio Baís, permite

ter uma ideia desses espaços, assim como, dos termos, linguagens, julgamentos e juízos de

valor por ele atribuído ao referido prédio.

As condições de iluminação do prédio são boas, de acordo com a higiene escolar. Há duas caixas d’agua de 1.000 litros cada uma. Varre-se diariamente, duas vezes todos os compartimentos e aos sábados. O edificio é totalmente lavado, conseguindo-se limpesa e higiene eficientes, apesar da cidade ainda não ser toda calçada. Os bebedouros são cinco e em construção mais seis automáticos. Cada aluno possui seu copo individual. Os Watter Closets são dez, sendo cinco para as meninas e cinco para os meninos em compartimentos separados. Todos têm instalações completas, providos de caixas patentes para as descargas. As aguas servidas são canalizadas para poço-morto, porque a cidade ainda não possue rede de esgoto. (ELUCIDARIO..., 1941).

A iluminação, a varredura, o bebedouro e o compartimento de água, os banheiros

masculinos e femininos, com instalações ditas “completas” com caixa patente ara descarga,

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eram quesitos de saúde, de higiene, de moralidade que se mesclavam, formando um todo

complexo, no qual salubridade e prédio escolar eram indissociáveis.

A população escolar devia encontrar um lugar asseado, confortável e, acima de tudo,

seguro moral e biologicamente. Fosse criança, fosse o jovem, havia uma responsabilidade por

parte da escola pública em relação às pessoas que a frequentavam, incluindo, professores e

demais sujeitos.

Vê-se também uma cidade, a de Campo Grande, com certas limitações sanitárias. O

inspetor não percebe que nos seus apontamentos mencionou dois problemas denegrindo a

imagem da promissora cidade sulista: a cidade sofria com a poeira por não ser toda calçada e

não tinha sistema de esgoto.

Figura 1 – Planta de uma sala de aula do Liceu Campograndense. (ELUCIDARIO..., 1941).

A Figura 1 com a planta de uma sala de aula do Liceu Campograndense mostra a

disposição dos móveis, o quadro negro, as carteiras e a cátedra, local onde ficava o professor

com sua mesa, e a disposição das janelas e portas. No canto superior direito há algumas

informações em relação aos tamanhos das áreas: a área do quadro negro era de 2,50 metros,

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a área de iluminação 12,50 metros, as condições acústicas foram consideradas boas, as

carteiras eram duplas, a direção da luz vinha do lado esquerdo, havia 45 lugares.

A partir do esboço da proporcionalidade desenhada na planta, há 35 lugares

representados pelas carteiras. Uma vez que o número de lugares seria de 45, conforme a

anotação no canto superior da planta, a real proporcionalidade entre os tamanhos da sala,

das carteiras, da mesa do professor e das janelas pode ser questionada.

O relator do Elucidário do Liceu Campograndense descreveu a planta da seguinte

maneira:

As Salas de Aulas são amplas, ventiladas, satisfazem plenamente as condições pedagógicas, medem 6m x 8m e tem capacidade para 40 alunos, com boa iluminação e acústica tambem boa, e preenchem as finalidades a que se destinam. As carteiras e quadro negro estão colocados de modo permitirem a entrada da luz pelo lado esquerdo. (ELUCIDARIO..., 1941).

Ao serem expostas considerações positivas quanto aos aspectos das salas de aulas,

enfatizou-se a relação entre o espaço físico e o fundamento pedagógico, bem como a

qualidade da ventilação e da iluminação e a capacidade física da sala de receber número de

alunos.

Além da sala de aula, o relator do Elucidário também comentou a respeito do

mobiliário:

As carteiras são duplas, tipo americano, presas umas ás outras em sarrafos, parafusadas para evitar movimento. Cumpre-me acrescentar que foram encomendadas carteiras individuais, em substituição as que estão presentemente em uso. Quantos aos demais moveis existentes, estão todos em bom estado de conservação, oferecendo conforto e higiene. (ELUCIDARIO...,1941).

Como se pode acompanhar, os móveis elaborados para fins educativos deviam ser

escolhidos em conformidade com os sentidos espaciais adequados à sala de aula. Lembrando

que desde o final do século XIX, em vários países da Europa e nos Estados Unidos, as

Exposições Universais divulgaram o lançamento de mobiliários escolares concatenando um

pensamento educativo articulado ao método do ensino. Nessa concepção de educação, o

tamanho, o formato e o material para fabricação, eram escolhidos de acordo com o público e

sua idade, no Brasil foi seguida a mesma tendência.

Ao compor o espaço de um externato público, a sala de aula era lugar privilegiado cujo

enaltecimento se deu pelo trabalho docente e o bom desempenho discente, o espaço

“sagrado” do conhecimento.

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O internato – edifício e instalações

A institucionalização do regime de Internato nas escolas salesianas aqui estudadas, a

saber, Ginásio Dom Bosco, para meninos, Ginásio N. S. Auxiliadora e Ginásio Imaculada

Conceição, para meninas, em um dado contexto histórico e regional, representou

responsabilidade civil, religiosa, social e cultural para essas entidades católicas. Ter o jovem

sob seus cuidados envolvia a questão moral de separar o lugar para uso exclusivo feminino ou

masculino, ordená-lo, conduzi-lo pelos trilhos do que era naquele momento entendido por

moralidade, tendo mecanismos de controle sobre o corpo do jovem.

O enclausuramento sempre foi uma prática própria das religiões com finalidade de

guardar a moralidade de seus vocacionados e fiéis, evitar oportunidades maléficas de

envolver-se com as coisas terrenas e, assim, incorrer no erro de perder-se em uma vida

mundana. Conforme o Sistema Preventivo de Dom Bosco3, o internato salesiano ia além do

sentido escola-casa de aluna/aluno que tinha sua família em outra cidade, permanecer como

interno era também preparar-se para as coisas práticas da vida.

Os espaços tinham seu significado específico e deviam ter clara sua função, de modo

que, cada pessoa que ali habitasse soubesse o que devia fazer naquele lugar. O Pátio, a Sala de

aula, a Capela, a Cozinha, os Dormitórios, os Banheiros e Lavabos, tudo devia expressar

segurança, saúde, higiene, conforto e moralidade.

O Relatório de inspeção permanente do Ginásio Dom Bosco, em 1932, transcrito a

seguir, foi realizado pelo inspetor federal Alvino Corrêa da Costa, e descreve o edifício

escolar:

O edificio escolar do Ginasio Municipal de Campo Grande [Ginásio Dom Bosco] possue area total de 10.880m2 e de area coberta 400m2 com três pavilhões e pátios. O 1º pavilhão, o mais antigo construído, em 1920, funcionava como hotel sendo adaptado para a administração da escola, o 2º - edificado em 1925 para pavilhão das aulas e o 3º - o último a ser construido, contem as Salas de Estudo, Capela e Dormitorios. Todo o prédio é de tijolos com alicerces de pedra, alguns pavilhões com piso de ladrilho ou de madeira. (RELATORIO..., 1932).

O prédio foi construído em 1920, sofreu modificações por duas reformas, uma em 1925

e outra após esse ano, já que não há especificação. Parte do prédio foi adaptada de um hotel

para abrigar administração escolar, as salas de aula foram construídas para esse fim e os

outros cômodos do internato - salas para estudo, capela e dormitórios - foram construídos

3 Criado por Dom Bosco, fundador da ordem salesiana na Itália, o Sistema Preventivo baseia-se em um conjunto de premissas filosóficas pela religião, razão e afeto, e fundamenta a proposta educacional salesiana.

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posteriormente. O relato detém-se ainda no material da construção, sendo utilizados

alvenaria, pedras, ladrilhos e madeira.

O edifício escolar do Ginásio N. S. Auxiliadora foi descrito por uma comissão

examinadora composta pelos inspetores federais Alvino Corrêa da Costa, Valeriano Maia e

Amélio Baís, em novembro de 1937, por ocasião da confecção do Relatório para Inspeção

Permanente da instituição:

O prédio ocupa uma area de 19.200m2 sendo de area livre 15.000m2 e de area coberta por pavilhões e dependências. Estas dependências acham-se assim distribuidas: no 1º andar, separadas por um corredor, ao total há onze salas, sendo cinco destinadas como Salas de Aulas e as outras como Secretaria, Diretoria e Sala de visitas. São duas Salas de Estudo do internato. (RELATÓRIO..., 1937).

Em relação ao tamanho da área coberta, vê-se que a área construída do Ginásio N. S.

Auxiliadora, tratada como “coberta” pelos relatores de 1937, era maior que a do Ginásio Dom

Bosco. Pelo relato, conclui-se que havia uma construção vertical, uma vez que se diz 1º andar.

Havia salas de aulas, secretaria, sala para estudos e para receber visitas.

Em Relatório do mês de março de 1937, João de Oliveira Garcia, inspetor federal,

descreveu o prédio escolar do Ginásio Imaculada Conceição.

O primeiro edificio escolar do Ginasio Imaculada Conceição funcionou entre 1904 (ano de sua fundação) e 1925, em prédio adaptado. Em 1926, foi completamente renovado e reedificado para estabelecimento de ensino. As paredes de pavimento terreo são de pedra e as do pavimento superior são de tijolos. Os pisos são ladrilhados com exceção das Salas de aula nº 4, 5, 6 e 7, cujo soalho é de madeira. As vigas são de aroeira-madeira de lei. As telhas são francesas. A escada que une os pavimentos é de dois lances de largura de 1,70m. São sete o numero de Salas de Aulas, seis com capacidade para 26 alunas e uma para 32 alunas. A dimensão das salas é 6,6m x 6,6m, e a maior de 7,8m x 7,3m. (RELATÓRIO..., 1937).

Pela descrição das instalações do edifício escolar do Ginásio Imaculada Conceição,

acompanha-se o ano de chegada das religiosas a Corumbá, vindas de Cuiabá, em 1904. Tendo

o edifício escolar ganhado prédio próprio para fim escolar, a partir de 1926, o registro do tipo

de material utilizado na construção – madeira e pedra – buscou transmitir características de

segurança e durabilidade.

As descrições registradas pelos inspetores sobre o edifício escolar do internato tiveram

como objetivo legitimar uma averiguação necessária aos relatórios a serem endereçados ao

departamento competente. Uma concepção de que não somente o edifício escolar em sua

estrutura e arquitetura, como também, as instalações de internato deviam garantir o bem

estar e conforto dos alunos.

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O relato das instalações para internato do Ginásio Dom Bosco referiu-se ao dormitório

e móveis, como camas e cômodas, além dos complementos como colchões e travesseiros, o

refeitório e a cozinha e todo o conjunto de utensílios domésticos. Como é possível

acompanhar:

A capacidade do edificio e as instalações para internato são limitadas a 50 alunos. O dormitório é um vasto pavilhão, medindo 20m x 10m e a area total das janelas 14m2. As 50 camas de ferro passam mensalmente por um tanque com agua fervente, eliminando-se desta maneira quaisquer possibilidades de vida parasita. Os colchões e travesseiros são trocados anualmente. Para cada aluno há um comodo, um armário com gavetas e acomodações para roupas. A roupa servida é depositada numa rouparia, onde há um lugar reservado para cada aluno. O refeitorio é suficientemente vasto e provido de todos os utensílios de louça e metal branco. O local da cosinha funciona com dois fogões tipo Bertha. O alimento é sadio e farto. O serviço de copa é completo. O Ginásio não dispõe de gabinete médico e dentário, tão de uma pequena enfermaria, de acordo com o limitado numero de alunos. Tem o seu médico que periodicamente visita o estabelecimento. (RELATORIO..., 1932).

Embora o inspetor tenha apontado a limitação do Ginásio Dom Bosco não dispor de

gabinetes médico nem dentário, os elogios e a aprovação do edifício escolar e suas instalações

determinaram a tônica do relato, enfatizando-se as exigências do rigor higiênico, ao ponto de

se lavar camas de ferro com água fervente uma vez por mês.

As instalações para internato do Ginásio Nossa Senhora Auxiliadora foram assim

descritas:

A capacidade do edificio e das instalações é para 120 alunas. Os dormitorios são situados no 2º andar do Pavilhão 7 e são em numero de três. Estes pavilhões nada deixam a desejar quanto ás exigências modernas, quer nas suas dimensões, quer nas boas condições de isolamento, iluminação e ventilação, prescritas pela hygiene. O Pavilhão 6 funciona a enfermaria, gabinete dentário e suas dependências. No Pavilhão 7 se acham instaladas as aulas do Curso Ginasial e a Secretaria. As camas são de ferro esmaltado de branco, para cada aluna há um comodo (criado mudo), com gaveta e acomodações para roupa e calçado. Os dormitórios dispõem de uma bem montada Sala de toilette, com 30 lavatórios de água corrente e uma instalação moderna para banhos de ducha á agua fria e morna. O refeitório é bastante amplo e provido de todos os utensílios de louça e metal branco. A cozinha é revestida de azulejo branco, dispõe de duas pias com agua corrente e mesa recoberta de mármore. (RELATÓRIO..., 1937).

O espaço do Ginásio N. S. Auxiliadora era sede, ainda, do Oratório Festivo4 e da

Associação das ex-alunas duas instituições culturais muito importantes em uma escola

salesiana.

4 O Oratório Festivo eram reuniões salesianas com jovens de cunho lúdico-religioso.

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Conforme o relato de 1937, a comissão examinadora não economizou no adjetivo

“moderno”. Os pavilhões e a sala de banho, os primeiros por apresentarem dimensões,

condições de isolamento, iluminação e ventilação, prescritas pela higiene, o que era sinônimo

de moderno; a segunda, contava com 30 lavatórios de água corrente, banhos de ducha com

água fria e morna. Apareciam outros itens “modernos” relacionados ao sanitarismo: o azulejo

e a mesa de mármore instalados na cozinha.

Também ao atribuir um caráter de civilidade, utilizou-se a banca examinadora de

termos estrangeiros de países considerados mais avançados que o Brasil para se referir às

instalações do banheiro, como os afrancesados, bidet e toilette, e o estadunidense, water-

closets.

A Figura 2 apresenta uma planta de uma sala de aula do Ginásio Feminino N. S.

Auxiliadora com a disposição dos móveis - quadro negro, carteiras e mesa do professor -, das

janelas e das portas.

Figura 2 – Planta de uma sala de aula do Ginásio Feminino N. S. Auxiliadora. (RELATÓRIO...,1937).

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Em uma sala de terceira série ginasial, ficavam dispostas cinco fileiras em sequência de

cinco carteiras, totalizando 25 lugares. À frente, centralizada, encontrava-se a mesa da

professora sobre um púlpito e, atrás da mesa, a lousa. À entrada, na parede da porta, havia

uma das quatro janelas, e na parede contrária, as outras três.

Descrições das instalações para internato do Ginásio Imaculada Conceição

evidenciaram as dimensões do dormitório, a quantidade de camas e colchões, além de os

guarda-roupas e os serviços domésticos disponíveis.

O collegio mantém um pequeno internato para maior comodidade das alunas que moram fora do centro. O dormitorio das maiores mede 92m x 50m e pode conter 18 camas, tem quatro janelas e quatro portas. O dormitório das medias e menores mede 120m x40m, pode conter 24 camas e tem sete janelas e tres portas. As camas são de ferro, os colchões e travesseiros, de palha. Junto a cada leito há uma mesinha de luz para uso particular. A rouparia consta de armários com subdivisões correspondentes ao numero pessoal das alunas e um numero especial de cabides para os uniformes de gala. Há uma enfermaria. (RELATÓRIO..., 1937).

As instalações para internato do Ginásio Imaculada Conceição, ainda que o inspetor

tenha sinalizado tratar de um pequeno internato, não se diferenciavam em seus itens dos

outros dois já apresentados: limpeza e higiene, ordem, móveis adequados, conforto para as

alunas morarem.

No interior das salas de aula projetava-se a disposição das carteiras, a ergonomia de

móveis para o jovem, a luminosidade da sala, a ventilação, a busca frequente por novos

métodos e materiais considerados modernos e apropriados para as atividades nos estudos

secundários. Tudo isso instalado em um edifício escolar, concretizando um aparato elaborado

para garantir os esperados significados pedagógicos.

Salas especiais, gabinetes laboratórios, museus

Seguindo a lógica de ensino mais prático em detrimento dos estudos excessivamente

literários e eruditos considerados sem utilidade para a vida moderna, as salas e os gabinetes

foram espaços considerados instrumentos metodológicos próprios para os estudos científicos

e humanísticos. Diversificada, a cultura material da escola secundária ganhou sentido e

significado nos usos do trabalho escolar pela articulação entre métodos, finalidades de

ensino, materiais e espaços específicos da instituição para fins pedagógicos.

Com respeitos as salas especiais do Ginásio Dom Bosco, disse o inspetor:

Os gabinetes do Gymnasio Municipal de Campo Grande não são museus, onde os aparelhos servem apenas de propaganda perante os pais. De pouco, chegou agora a apresentar 90% do exigido, na longa lista apresentada pelo

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Departamento. É que os próprios alunos foram construindo os aparelhos que faltavam, e na construção foram aprendendo o que talvez não conseguissem em longos tratados. Os instrumentos modestos são os que mais servem para o ensino. No anexo nº 12 vai a lista pormenorizada do material do Gabinete, Museu e Laboratorio. (RELATORIO..., 1932).

Enfatizando o ensino prático, o inspetor explicou que eram os próprios alunos os

criadores dos materiais, realizando um trabalho de artesãos, uma vez que garantiu que a

manipulação nos gabinetes era verdadeira e não apenas para convencer os pais. Pondo em

evidência que a aula prática dava muito mais condições para o aluno aprender que se eles

permanecessem nos livros. Por outro lado, o relator frisa a dificuldade de se completar a

longa lista de materiais, que com esforço da escola tinha conseguido chegar aos 90% do que

era exigido.

O inspetor continuava o relato demonstrando fidelidade aos fatos:

é meu dever notar que não há salas especiais para Geografia e Desenho, mas o material existe, como pode ser visto nas fotografias nº 13. Isto não impede, porem, que as aulas sejam feitas com toda a orientação moderna, nas próprias salas de cada serie. (RELATORIO..., 1932).

Ao explicar que não havia salas especiais de Geografia e Desenho no Ginásio Dom

Bosco, o inspetor ressalva que a aula poderia ser modernizada da mesma forma em sala de

aula comum.

Em relação ao Ginásio N. S. Auxiliadora, o Salão de Atos ou Auditório tinha uma

tribuna para as alunas internas e o palco, feito para realizações de festas escolares,

representações teatrais e projeções de filmes, já que a escola tinha “uma bôa máquina

cinematographica”, como salientou a comissão examinadora da Inspeção Permanente, em

1937.

Para a disciplina de Educação Física, o aparato era extenso, tanto do ponto de vista do

prédio com instalações específicas quanto da materialidade de apoio metodológico. Para

tanto, deveria haver uma área livre para as atividades, gabinete médico-biométrico, chuveiros

e vestiário. À disciplina escolar Educação Física estavam diretamente relacionadas questões

da saúde do jovem e disciplinares, como a obediência às normas e regras e o bom

comportamento. Nos impressos para preenchimento de Relatório de inspeção permanente,

na área da Educação Física, constava espaço para atribuição de notas para estádio, piscina e

ginásio esportivo. Nas escolas estudadas, apenas o Ginásio Esportivo era contemplado.

No Ginásio Dom Bosco, o Ginásio esportivo tinha uma área de 150m2 com materiais de

ginásticas, que não foram relacionados no Relatório de 1932; no Ginásio N. S. Auxiliadora,

esse mesmo lugar tinha 192 m2 e no Ginásio Imaculada Conceição, 136 m2. Em 1941, o

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prédio do Liceu Campograndense não possuía o Ginásio esportivo, contudo havia o Gabinete

Médico e Biomédico com materiais como bolas e redes de voleibol e de basquete, balança, fita

métrica, cronômetro, pesos para lançamento, corda, prancha para saltos.

Em relação à biblioteca do Liceu Campograndense, dizia:

embora incipiente, possue já obras importantes, dentre as quais destaca-se uma ótima coleção de livros didáticos, Enciclopedia e Diccionario Universal (20 volumes), Obras celebres (24 volumes), Thesouro da Juventude (18 volumes). (RELATORIO..., 1932).

Segundo a comissão examinadora da Inspeção Permanente, de 1937, do Ginásio N. S.

Auxiliadora, “a Biblioteca é otimamente instalada, o mobiliário é constituído por um armário,

uma mesa, um jogo de mobília de vime, 12 cadeiras e algumas pequenas estantes”.

Nessa escola, o Gabinete de Ciências Físicas e Naturais estava instalado em um único

ambiente com os Gabinetes de Física, Química e História Natural em uma sala de 80 m2. Os

móveis existentes equipando o recinto eram mesa de laboratório, pia com torneira e trompa

d’água, fogareiro elétrico, gerador de corrente elétrica, aquário escolar, terrário e herbário

escolar. O Relatório de inspeção permanente, de 1937, traz a ampla listagem dos materiais

específicos respectivos aos gabinetes: aparelhos, máquinas, balanças, minerais, microscópios,

substâncias, processadores, simuladores, medidores, protótipos de esqueletos humano e

animais.

A Sala de Geografia do Ginásio Imaculada Conceição possuía globo, atlas em português

e línguas estrangeiras, bússola, coleção de mapas para exercícios cartográficos, cartas murais

do Brasil e do mundo, planisférios, mapas de Estado e de Município, amostras dos principais

produtos nacionais, agrícolas, coleções de vistas em fotografias e cartões postais.

O Gabinete de Desenho do Liceu Campograndense abrigava coleções de modelos em

gesso para desenho, sólidos geométricos de madeira, pranchetas, esquadro, réguas,

transferidor, compassos. E finalmente, a Sala de datilografia do Ginásio Imaculada Conceição

tinha três máquinas para uso das alunas do Curso Comercial.

As salas especiais de disciplinas, Ciências, História Natural, Física, Química, Geografia,

Música, os Laboratórios e os Museus fizeram parte do extenso conjunto espacial e material

do curso ginasial. Essas Salas Especiais ou Gabinetes, ou ainda, Laboratórios, no caso das

disciplinas científicas, ou Museus, acabaram por receber várias denominações. Armazenavam

grande quantidade de materiais e móveis, tinham função de dar suporte metodológico para o

ensino de uma disciplina escolar e, principalmente, tornar o ensino mais prático e concreto

aos alunos no decorrer dos estudos.

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Muitas vezes, ao longo da história da instituição escolar secundária, tanto pública

quanto privada, disponibilizar e manter as Salas Especiais foi um imenso problema. Não

bastava haver um espaço destinado à Sala, era preciso seguir o protocolo legal exigido pela

Divisão de Ensino Secundário, baseado nos decretos e circulares tão característicos do

período, e assim equipar dignamente a sala. Certamente o custo era alto. Em 1937, a

quantidade de materiais citados em uma lista para o Gabinete de Física do Ginásio Imaculada

Conceição chegou a ocupar duas páginas com um item em cada linha, e em 1941, o Gabinete

de Química, do Liceu Campograndense, três páginas de alambique de cobre a gelatina,

passando por ácidos, oxalato, acetato, cromato, etc.

Em nome da educação útil e prática enfatizava-se a necessária apropriação dos

elementos científicos. Uma estrutura se forjava para levar a experiência à sala de aula e

romper com a tradicional força teórica que tanto tempo permeou os estudos brasileiros, e

que, naquela visão, estava ultrapassada.

Considerações Finais

As análises mostram que articuladas às finalidades do ensino, foram concebidas no

interior da escola secundária, propostas de uma arquitetura escolar conciliando localização

urbana, normas de higienização e sanitarismo.

Ademais, buscou-se legitimar uma cultura própria de juventude na escola, não apenas

concebendo métodos e materiais próprios para esse ramo do ensino, como também,

valorizando espaços específicos para as atividades dos ginasianos.

Na busca pela ordem do local, a escola devia manter a organização, a limpeza, a

coerência nas disposições dos objetos e cômodos do prédio, dentre outras atribuições, fato

que fazia detalhes do tipo “qualidade da ventilação e iluminação”, “copo individual”, “sarrafos

bem apertados”, tornarem-se tarefas fundamentais.

A escola pública ganhou atribuições como controlar, proibir, exigir, mediar. Afinal, a

diretoria dependia desses detalhes para a manutenção estabelecida pelos órgãos reguladores

da escola secundária.

De modo que os frequentadores da escola – pública e privada - a associavam a um lugar

seguro em termos moral e biológicos, asseado e confortável. O edifício, o terreno, as

instalações, foram edificados e conformados com propósitos pedagógicos: o pátio, a sala de

aula, a capela, a cozinha, os dormitórios, os banheiros e lavabos, tudo devia expressar

segurança, saúde, higiene, conforto e moralidade.

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As reformas eram recursos utilizados para melhorar as condições sanitárias dos

banheiros, cozinha e refeitório, como por exemplo, encanamento de água e limpeza fossa

sanitária, adequar um prédio antigo adaptado, com pinturas nas paredes e nos quadros

negros. A ampliação dos espaços por meio de reformas e novas construções era realizada com

frequência e a tentativa de mobiliar os espaços com materiais adequados para sua

funcionalidade foram duas ações recorrentemente registradas nos “Relatórios”.

De modo que, os espaços escolares tinham seus significados específicos e deviam

expressar claramente suas funções, de tal forma que os sujeitos escolares soubessem o que

deviam ou podiam fazer em cada lugar.

Referências

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SOUZA, Rosa Fátima de. Templos de civilização: a implantação da escola primária graduada no estado de São Paulo (1890 – 1910). São Paulo: UNESP, 1998. VIÑAO FRAGO, Antonio; ESCOLANO, Agustin. Currículo, espaço e subjetividade: a arquitetura como programa. Rio de Janeiro: DP&A, 1998.