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Caderno de Resumos - Comunicações Coordenadas 40 Sessão Coordenada - 06 ESCOLAS ISOLADAS: A FACE OCULTA DA ESCOLA PRIMÁRIA BRASILEIRA Coordenadora: MARIA CRISTINA SOARES DE GOUVEA Eixo Temático: 6 - História das Culturas e Disciplinas Escolares ESCOLAS ISOLADAS URBANAS: ENTRE O INVESTIMENTO E A PRECARIZAÇÃO (BELO HORIZONTE 1906/1927) Maria Cristina Soares de Gouvea O trabalho busca resgatar a presença de escolas isoladas na cidade de Belo Horizonte, no período entre a Reforma de 1906, que instituiu a escola graduada no estado mineiro e a Reforma de 1927, que implementou a pedagogia escola novista, tendo como fontes a legislação educacional, relatórios de inspetores, correspondências oficiais, cartografia. Tem-se em vista apreender o lugar social das escolas multiseriadas, após a implementação da escola graduada. O projeto republicano de instrução centrou-se naquele período na criação dos grupo escolares. Tal projeto era voltado para os espaços urbanos, demandando recursos para prédios, funcionários e cultura material sofisticada. Porém, as condições históricas de um país rural, com um modelo federativo que imputava aos estados a responsabilidade pela instrução determinaram um alcance limitado e socialmente restritivo das escolas graduadas. As escolas isoladas permaneceram numericamente dominantes no país até meados do século, embora secundarizadas nas políticas de instrução e demonizadas nos discursos dos educadores e dirigentes, produzindo seu apagamento na história e historiografia da educação primária. Ainda que presentes nos centros urbanos, afirmou-se historicamente a associação entre escola rural e escola isolada, representantes do atraso e ineficiência na oferta da instrução. No caso de Belo Horizonte, cidade republicana planejada para reproduzir na ocupação dos espaços a estratificação social, observa-se a dificuldade do acesso à escola graduada por parte dos setores populares. Os recursos foram concentrados na criação dos grupos escolares, inicialmente localizados no centro da cidade, atendendo aos extratos superiores, precarizando-se as escolas isoladas, que atendiam preponderantemente à população pobre das zonas suburbana e colônias agrícolas. Observa-se, ao longo do período, oscilação e ambiguidade nas políticas de instrução dirigidas a estas escolas na cidade. Por um lado, verifica-se um progressivo investimento na sua qualificação, com elaboração de plantas que padronizassem os prédios, pagamento igualitário dos docentes dos grupos( desde que normalistas), financiamento de auxiliares de ensino. Por outro, mobiliário, material didático, presença de caixa escolar(recurso que buscava garantir a frequência dos alunos) eram secundarizados em relação aos grupos. Tal ambiguidade do projeto de instrução é demonstrativa do modelo restritivo de cidadania da primeira república. No caso de Belo Horizonte fez-se presente tanto a elitização dos grupos escolares, quanto o investimento, ainda que limitado, nas escolas isoladas, configurando- as como um mal necessário, ante as dificuldades de universalização da instrução. Palavras chave: cidade- escola isolada- República ESCOLAS ISOLADAS PÚBLICAS E PRÁTICAS DE SERIAÇÃO NO ESTADO DO RIO DE JANEIRO (1916- 1950). Amália Cristina Dias da Rocha Bezerra Apresentamos resultados de pesquisa concluída sobre os tipos de escolas primárias existentes no município de Iguaçu, estado do Rio de Janeiro, entre 1916-1950. O município apresentou uma significativa expansão na oferta de escolas primárias nas primeiras décadas republicanas. A partir da análise dos mapas de frequência escolar – ferramenta de inspeção estadual das escolas – foi possível restituir um perfil de escolas primárias. A escola isolada predominou como tipo de organização das escolas, tanto em áreas rurais quanto urbanas do munícipio. Os mapas de frequência, ao fornecerem indícios que permitem situar a distribuição nas escolas em um mesmo município, constituem uma fonte importante para os estudos de história local. O trabalho sistemático realizado e o cruzamento com outras fontes revelaram a expressiva presença de escolas públicas estaduais e municipais de ensino primário em Iguaçu e no distrito-sede – nas décadas de 1930 e 1940. A presença de escolas foi maior no distrito-sede em todo período coberto pela pesquisa. A localização das escolas no distrito- sede revelou a maior presença de escolas de localização urbana, nas principais ruas e no entorno central do distrito-sede. A experiência da microanálise imposta por este tipo documental institui uma escala de observação para a

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Caderno de Resumos - Comunicações Coordenadas

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Sessão Coordenada - 06

ESCOLAS ISOLADAS: A FACE OCULTA DA ESCOLA PRIMÁRIA BRASILEIRA

Coordenadora: MARIA CRISTINA SOARES DE GOUVEA Eixo Temático: 6 - História das Culturas e Disciplinas Escolares

ESCOLAS ISOLADAS URBANAS: ENTRE O INVESTIMENTO E A PRECARIZAÇÃO (BELO HORIZONTE 1906/1927)

Maria Cristina Soares de Gouvea

O trabalho busca resgatar a presença de escolas isoladas na cidade de Belo Horizonte, no período entre a Reforma de 1906, que instituiu a escola graduada no estado mineiro e a Reforma de 1927, que implementou a pedagogia escola novista, tendo como fontes a legislação educacional, relatórios de inspetores, correspondências oficiais, cartografia. Tem-se em vista apreender o lugar social das escolas multiseriadas, após a implementação da escola graduada. O projeto republicano de instrução centrou-se naquele período na criação dos grupo escolares. Tal projeto era voltado para os espaços urbanos, demandando recursos para prédios, funcionários e cultura material sofisticada. Porém, as condições históricas de um país rural, com um modelo federativo que imputava aos estados a responsabilidade pela instrução determinaram um alcance limitado e socialmente restritivo das escolas graduadas. As escolas isoladas permaneceram numericamente dominantes no país até meados do século, embora secundarizadas nas políticas de instrução e demonizadas nos discursos dos educadores e dirigentes, produzindo seu apagamento na história e historiografia da educação primária. Ainda que presentes nos centros urbanos, afirmou-se historicamente a associação entre escola rural e escola isolada, representantes do atraso e ineficiência na oferta da instrução. No caso de Belo Horizonte, cidade republicana planejada para reproduzir na ocupação dos espaços a estratificação social, observa-se a dificuldade do acesso à escola graduada por parte dos setores populares. Os recursos foram concentrados na criação dos grupos escolares, inicialmente localizados no centro da cidade, atendendo aos extratos superiores, precarizando-se as escolas isoladas, que atendiam preponderantemente à população pobre das zonas suburbana e colônias agrícolas. Observa-se, ao longo do período, oscilação e ambiguidade nas políticas de instrução dirigidas a estas escolas na cidade. Por um lado, verifica-se um progressivo investimento na sua qualificação, com elaboração de plantas que padronizassem os prédios, pagamento igualitário dos docentes dos grupos( desde que normalistas), financiamento de auxiliares de ensino. Por outro, mobiliário, material didático, presença de caixa escolar(recurso que buscava garantir a frequência dos alunos) eram secundarizados em relação aos grupos. Tal ambiguidade do projeto de instrução é demonstrativa do modelo restritivo de cidadania da primeira república. No caso de Belo Horizonte fez-se presente tanto a elitização dos grupos escolares, quanto o investimento, ainda que limitado, nas escolas isoladas, configurando- as como um mal necessário, ante as dificuldades de universalização da instrução. Palavras chave: cidade- escola isolada- República

ESCOLAS ISOLADAS PÚBLICAS E PRÁTICAS DE SERIAÇÃO NO ESTADO DO RIO DE JANEIRO (1916- 1950).

Amália Cristina Dias da Rocha Bezerra

Apresentamos resultados de pesquisa concluída sobre os tipos de escolas primárias existentes no município de Iguaçu, estado do Rio de Janeiro, entre 1916-1950. O município apresentou uma significativa expansão na oferta de escolas primárias nas primeiras décadas republicanas. A partir da análise dos mapas de frequência escolar – ferramenta de inspeção estadual das escolas – foi possível restituir um perfil de escolas primárias. A escola isolada predominou como tipo de organização das escolas, tanto em áreas rurais quanto urbanas do munícipio. Os mapas de frequência, ao fornecerem indícios que permitem situar a distribuição nas escolas em um mesmo município, constituem uma fonte importante para os estudos de história local. O trabalho sistemático realizado e o cruzamento com outras fontes revelaram a expressiva presença de escolas públicas estaduais e municipais de ensino primário em Iguaçu e no distrito-sede – nas décadas de 1930 e 1940. A presença de escolas foi maior no distrito-sede em todo período coberto pela pesquisa. A localização das escolas no distrito- sede revelou a maior presença de escolas de localização urbana, nas principais ruas e no entorno central do distrito-sede. A experiência da microanálise imposta por este tipo documental institui uma escala de observação para a

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VIII Congresso Brasileiro de História da Educação

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compreensão da diversidade e heterogeneidade dos processos de escolarização. Quanto ao formato das escolas, da seriação de ensino ofertada, da organização de turnos, dos professores e alunos por elas distribuídos, localizamos a existência de múltiplas experiências de escolas primárias no município, sendo, contudo, predominante a escola isolada com até as três primeiras séries do ensino. A comparação da movimentação de alunos por classes, séries e turnos restitui um cotidiano diversificado. Quadro de adjuntos, turno, série e classe eram variáveis agregadas de diferentes modos, revelando a coexistência de tipos diferentes de escolas e as apropriações realizadas dos termos classe, série, turno, em face da implantação do novo regime de organização das escolas. Nas contradições que permearam este processo, observava-se o contraste entre a homogeneidade pretendida pelos projetos de norma zação elaborados pelo estado, e a pluralidade das experiências, a instabilidade, as estratégias promovidas para povoar as escolas de alunos, professores, modos e condições de funcionamento. Estes resultados da pesquisa agregam subsídios ao debate historiográfico sobre a importância das escolas isoladas públicas nos processos de expansão da escola primária nas primeiras décadas republicanas. Palavras-chave: escola isolada, mapa de frequência, seriação. “ PEQUENOS FOCOS DE LUZ”: AS ESCOLAS ISOLADAS NO PERÍODO DE IMPLEMENTAÇÃO DO MODELO

ESCOLAR SERIADO NO RIO GRANDE DO SUL

Natália de Lacerda Gil Este trabalho centrou-se no exame das representações das escolas isoladas na documentação do estado do Rio Grande do Sul durante o início do século XX. Embora seja inegável que a escola seriada tenha sido identificada como uma instituição de melhor qualidade ao longo desse período e progressivamente tenha passado a predominar em termos quantitativos, esse processo não se deu sem resistências. A historiografia da educação recentemente tem dado maior atenção a essas escolas numerosas e reputadas quase sempre como de pior qualidade, cuja existência deveria durar apenas enquanto ou onde não se tivesse condições de substituí-las por uma escola seriada. É no sentido da compreensão das representações acerca dessas escolas que este estudo pretende contribuir. Opera-se aqui a análise a partir do conceito de representação, conforme definido por Roger Chartier (2002). Ou seja, busca-se compreendê-la como percepções do social que mobilizam estratégias e práticas pretendendo impor-se sobre outras. Nesse sentido, objetivou-se compreender a coexistência de discursos antagônicos como evidência da luta de representações. Numerosas no estado do Rio Grande do Sul, as escolas isoladas vão existir/resistir por um longo período – fisicamente, é certo, mas também no imaginário das pessoas que, mesmo recentemente, estudaram nessas instituições. Até pelo menos os anos 1940, a matrícula nessas escolas, de diversos tipos e administradas por diferentes instâncias, foi numericamente mais expressiva do que a das escolas seriadas, cuja instalação se deu em 1909 no estado. Nem sempre essas representações reportam uma escola precária, indesejável. Aqui, interessa sublinhar a necessidade de aprofundar os estudos sobre essas escolas sul-rio-grandenses, buscando conhecer suas características, as resistências e os arranjos na composição com o novo modelo. Neste estudo, num primeiro momento, tentou-se evidenciar a expressiva participação das escolas isoladas nas matrículas do ensino público no estado durante a primeira década de funcionamento da escola seriada. Em seguida, pretendeu-se destacar aspectos do discurso oficial ressaltando as oscilações entre a defesa desses “pequenos focos de luz” espalhados pelo amplo território do estado e a proposição de sua substituição pelos colégios elementares e grupos escolares, que puseram em funcionamento no Rio Grande do Sul o modelo seriado. Para tanto, foram analisados os Relatórios da Secretaria do Interior e do Exterior publicados entre 1909 e 1920, além da legislação que regulamentou o funcionamento da instrução pública no período. No que se refere à legislação, foi dada especial atenção ao decreto nº 89, de 2 de fevereiro de 1897, que reorganiza a instrução pública do estado em consonância com as necessidades do novo regime político. Palavras-chave: escola isolada, escola seriada, matrículas

DE ESCOLAS ISOLADAS AOS GRUPOS ESCOLARES: O ENSINO CONFORME A ORIGEM SOCIOECONÔMICA

Maria Angélica Cardoso

Esta pesquisa tem por objeto a organização do trabalho didático nas escolas isoladas paulistas no período de 1893 a 1932. Neste período ocorreu a criação e a predominância dos grupos escolares sem, contudo, extinguir-se as escolas isoladas. Fundamentando-se no método histórico-crítico, foi estabelecida a organização do trabalho didático como categoria de análise, objetivando analisar a história e a forma como estas escolas se organizaram didaticamente para atender à camada pobre, enquanto os grupos escolares voltavam-se à camada média, em formação naquele período. A fundamentação teórica tem por base os trabalhos de Saviani (2008); Alves (2005);

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Caderno de Resumos - Comunicações Coordenadas

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Marcílio (2005); Souza (1998, 2009); Reis Filho (1995); Infantosi (1983). Os documentos impressos e manuscritos, constantes no Arquivo do Estado de São Paulo, foram as fontes primárias consultadas. No primeiro período republicano, a necessidade de universalização da instrução pública brasileira levou à criação dos grupos escolares, que atendiam, inicialmente, aos grandes centros urbanos; para os centros menores e bairros populosos, criaram-se as escolas reunidas. Contudo, estas escolas não atendiam aos bairros afastados, periféricos, às vilas, nem às áreas rurais; locais onde a instrução deveria chegar também, para alcançar a universalização pretendida. Coube, então, às escolas isoladas assumiram a função de dar uma formação básica – leitura, escrita e as operações elementares da aritmética – à população pobre, residente nesses locais. Funcionando em casebres, as Escolas Isoladas herdaram das Escolas de Primeiras Letras, principalmente, o atendimento, em uma só sala, por um único professor, com crianças de idades variadas e em diferentes níveis de adiantamento. Conforme Souza (2009), enquanto os grupos escolares caracterizavam um tipo de escola de melhor qualidade, consolidava-se um sistema escolar excludente, privilegiando determinados setores sociais e discriminando setores populares de menor poder aquisitivo. Para Cunha (1978) as escolas elementares, destinadas aos filhos dos trabalhadores, eram de qualidade muito baixa, a educação por eles recebida era incomparavelmente inferior à dos filhos das classes dominantes e das camadas médias. No período da Primeira República brasileira foi conveniente manter as escolas isoladas para atender às classes populares suburbanas e/ou rurais, economicamente carentes, educando, em pouco tempo, crianças cujo serviço era muito cedo aproveitado pelos pais. Nos grandes centros urbanos, os grupos escolares atendiam aos filhos dos trabalhadores mais especializados e, para a elite, escolas particulares nacionais ou estrangeiras. Palavras-chave: Escolas Isoladas; Grupos Escolares, Organização do Trabalho Didático.