escolaridade versus conhecimento dos direitos e … · deveres dos usuários do sus. e como...

78
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS DEPARTAMENTO DE SERVIÇO SOCIAL TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO MONYQUE VIEIRA RIBEIRO DE AZEVEDO ESCOLARIDADE VERSUS CONHECIMENTO DOS DIREITOS E DEVERES DOS USUÁRIOS DO SUS: CONTRIBUIÇÕES DO SERVIÇO SOCIAL NO ÂMBITO DO HOSPITAL MONSENHOR WALFREDO GURGEL/PRONTO SOCORRO CLÓVIS SARINHO NATAL RN 2012

Upload: dangdat

Post on 24-Nov-2018

213 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: ESCOLARIDADE VERSUS CONHECIMENTO DOS DIREITOS E … · deveres dos usuários do SUS. E como objetivos específicos, compreender como tal ... LDB ± Lei de Diretrizes e Bases LOAS

UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE

CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS

DEPARTAMENTO DE SERVIÇO SOCIAL

TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO

MONYQUE VIEIRA RIBEIRO DE AZEVEDO

ESCOLARIDADE VERSUS CONHECIMENTO DOS DIREITOS E

DEVERES DOS USUÁRIOS DO SUS: CONTRIBUIÇÕES DO SERVIÇO

SOCIAL NO ÂMBITO DO HOSPITAL MONSENHOR WALFREDO

GURGEL/PRONTO SOCORRO CLÓVIS SARINHO

NATAL – RN

2012

Page 2: ESCOLARIDADE VERSUS CONHECIMENTO DOS DIREITOS E … · deveres dos usuários do SUS. E como objetivos específicos, compreender como tal ... LDB ± Lei de Diretrizes e Bases LOAS

MONYQUE VIEIRA RIBEIRO DE AZEVEDO

ESCOLARIDADE VERSUS CONHECIMENTO DOS DIREITOS E DEVERES DOS

USUÁRIOS DO SUS: CONTRIBUIÇÕES DO SERVIÇO SOCIAL NO ÂMBITO DO

HOSPITAL MONSENHOR WALFREDO GURGEL/PRONTO SOCORRO CLÓVIS

SARINHO

Monografia apresentada à Universidade Federal do Rio Grande do Norte – UFRN como requisito parcial para obtenção do grau de Bacharel em Serviço Social. Orientadora: Profª Ms. Jussara Nascimento

NATAL – RN

2012

Page 3: ESCOLARIDADE VERSUS CONHECIMENTO DOS DIREITOS E … · deveres dos usuários do SUS. E como objetivos específicos, compreender como tal ... LDB ± Lei de Diretrizes e Bases LOAS

AGRADECIMENTOS

Para a realização deste trabalho, agradeço primeiramente a Deus, que tanto

me deu força ao longo de todas as adversidades e dificuldades que surgiram

durante esse período, me proporcionando sempre calma, paciência e sabedoria para

lhe dar com todos estes problemas.

Agradeço também aos meus pais, que tanto contribuíram ao longo da minha

vida, para tivesse sempre as melhores oportunidades possíveis, não apenas no

âmbito da educação, em especial minha mãe, que sempre esteve ao meu lado,

entendendo e fazendo o possível para superar todas as minhas necessidades.

Aos meus amigos que sempre me apoiaram e compreenderam minhas

limitações quando tive que abdicar de muitos momentos de lazer para que todo este

trabalho se efetivasse.

E por último, mas não menos importante, agradeço à minha avó Aurinete, que

mesmo não estando mais entre nós há muito tempo, jamais, ao longo de sua curta

vida, deixou de pensar no meu bem, e no meu futuro. Sendo capaz de uma forma

muitas vezes até inexplicável, de parecer adivinhar tudo que viria a acontecer em

minha família.

Page 4: ESCOLARIDADE VERSUS CONHECIMENTO DOS DIREITOS E … · deveres dos usuários do SUS. E como objetivos específicos, compreender como tal ... LDB ± Lei de Diretrizes e Bases LOAS

RESUMO

Este trabalho deseja analisar a evolução das políticas de saúde no Brasil,

analisando sua historicidade para compreender as atuais dificuldades e deficiências

no âmbito da sua implementação. Tem como objetivo principal, relacionar de que

forma o déficit na educação contribui com o não conhecimento acerca dos direitos e

deveres dos usuários do SUS. E como objetivos específicos, compreender como tal

carência de conhecimentos reflete em procedimentos cotidianos não âmbito da

saúde; levantar os principais fatores responsáveis pelo abandono escolar, ou o não

ingresso na escola, e em casos de haver ingresso escolar, ressaltar os principais

motivos que impediram seu retorno; compreender de que forma o Serviço Social

pode intervir nessa problemática mediante ações de cunho socioeducativo no âmbito

do HMWG/PSCS. Como metodologia foi realizado um questionário semiestruturado

com pacientes de diversos setores do hospital, buscando compreender o que estes

entendem por saúde, direito à saúde, SUS etc, aliado à uma revisão de literatura e

coleta de dados, visando uma maior interação entre o pesquisador e o usuário.

Palavras-chave: Saúde Pública, Direitos e Deveres na Saúde, Déficit na Educação,

Escolaridade.

Page 5: ESCOLARIDADE VERSUS CONHECIMENTO DOS DIREITOS E … · deveres dos usuários do SUS. E como objetivos específicos, compreender como tal ... LDB ± Lei de Diretrizes e Bases LOAS

ABSTRACT

This paper aims to analyze the evolution of health policies in Brazil, analyzing

their history to understand the current difficulties and shortcomings in its

implementation. The main objectives relate how the deficit in education contributes to

the lack of knowledge about rights and duties of users of SUS. And as specific goals

such as lack of knowledge not reflected in daily procedures within health, raising the

main reasons for this dropout, or not going to school, and in cases of school

enrollment there to highlight the main reasons that prevented its return; understand

how Social Services can intervene in this issue by shares under the imprint childcare

HMWG / PSCS. The methodology used a semistructured questionnaire was

conducted with patients from diverse sectors of the hospital, trying to understand

what they mean by health, right to health, health services etc, together with a

literature review and data collection, aimed at increased interaction between the

researcher and user.

Keywords: Public Health, Rights and Duties in the Health Deficit in Education,

Education.

Page 6: ESCOLARIDADE VERSUS CONHECIMENTO DOS DIREITOS E … · deveres dos usuários do SUS. E como objetivos específicos, compreender como tal ... LDB ± Lei de Diretrizes e Bases LOAS

LISTA DE QUADROS

Quadro 1: Direitos dos Usuários do SUS

Quadro 2: Média de anos de estudo

Quadro 3: Estabelecimentos de ensino por níveis- 2003

Quadro 4: Eixos de Atuação dos Assistentes Sociais

Page 7: ESCOLARIDADE VERSUS CONHECIMENTO DOS DIREITOS E … · deveres dos usuários do SUS. E como objetivos específicos, compreender como tal ... LDB ± Lei de Diretrizes e Bases LOAS

LISTA DE SIGLAS

AIH – Autorização de Internação Hospitalar

BPC – Benefício de Prestação Continuada

CAP – Caixa de Aposentadoria e Pensão

CAP’S – Centro de Apoio Psicossocial

CF – Constituição Federal

CFESS – Conselho Federal de Serviço Social

CNCDO – RN – Central de Notificação, Captação e Distribuição de Órgãos do Rio

Grande do Norte

CNS – Conferência Nacional de Saúde

CNS – Conselho Nacional de Saúde

DUDH – Declaração Universal dos Direitos Humanos

HMWG – Hospital Monsenhor Walfredo Gurgel

IAP – Instituto de Aposentadoria e Pensão

IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

INAMPS – Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdência Social

INPS – Instituto Nacional de Previdência Social

ITEP – Instituto Técnico-Científico de Polícia

LDB – Lei de Diretrizes e Bases

LOAS –Lei Orgânica da Assistência Social

LOPS – Lei Orgânica da Previdência Social

LOS – Lei Orgânica da Saúde

MEC – Ministério da Educação

MES – Ministério da Educação e Saúde

MESP – Ministério da Educação e da Saúde Pública

MS – Ministério da Saúde

NOAS – Norma Operacional de Assistência à Saúde

NOB – Norma Operacional Básica

ONG – Organização Não-Governamental

ONU – Organização das Nações Unidas

PBF – Programa Bolsa Família

PCB – Partido Comunista Brasileiro

PNAD – Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio

Page 8: ESCOLARIDADE VERSUS CONHECIMENTO DOS DIREITOS E … · deveres dos usuários do SUS. E como objetivos específicos, compreender como tal ... LDB ± Lei de Diretrizes e Bases LOAS

PNH – Política Nacional de Humanização

PNPS – Política Nacional de Promoção à Saúde

PSCS – Pronto Socorro Clóvis Sarinho

PSF – Programa Saúde da Família

SUAS – Sistema Único de Assistência Social

SUDS – Sistema Unificado e Descentralizado de Saúde

SUS – Sistema Único de Saúde

USAID – United States Agency for Internacional Development

UTI – Unidade de Tratamento Intensivo

Page 9: ESCOLARIDADE VERSUS CONHECIMENTO DOS DIREITOS E … · deveres dos usuários do SUS. E como objetivos específicos, compreender como tal ... LDB ± Lei de Diretrizes e Bases LOAS

SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO ..................................................................................................... 9

2. A SAÚDE COMO DIREITO DE TODOS E DEVER DO ESTADO ..................... 12

2.1 O PROCESSO DE CONSTRUÇÃO DA SAÚDE PÚBLICA NO BRASIL ...... 12

2.2 O SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE (SUS)............................................................ 23

2.3 OS DIREITOS E DEVERES DOS USUÁRIOS DO SUS ................................ 31

3. A EDUCAÇÃO COMO CONDIÇÃO PARA EXISTÊNCIA DA DIGNIDADE DA

PESSOA HUMANA................................................................................................... 35

3.1 DADOS DA EDUCAÇÃO NO BRASIL .................................................................. 35

3.2 A RELAÇÃO ENTRE SAÚDE E EDUCAÇÃO ..................................................... 41

4. SERVIÇO SOCIAL E SAÚDE: A EXPERIÊNCIA DO HOSPITAL MONSENHOR

WALFREDO GURGEL/PRONTO SOCORRO CLÓVIS SARINHO .......................... 45

4.1 O SERVIÇO SOCIAL E OS PARÂMETROS PARA ATUAÇÃO NA SAÚDE 47

4.2 AS ATIVIDADES DESENVOLVIDAS PELO SERVIÇO SOCIAL DO

HMWG/PSCS ................................................................................................................. 55

4.3 REFLEXOS DO (NÃO) ACESSO AO DIREITO À EDUCAÇÃO NOS

PACIENTES DO HMWG/PSCS ................................................................................... 58

4.4 AÇÕES SOCIOASSISTENCIAIS E SOCIOEDUCATIVAS DESENVOLVIDAS

PELO SERVIÇO SOCIAL ............................................................................................. 60

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................... 64

6. REFERÊNCIAS .................................................................................................. 67

APÊNDICES ............................................................................................................. 72

APÊNDICE A ................................................................................................................ 73

APÊNDICE B ................................................................................................................. 74

ANEXOS ................................................................................................................... 76

ANEXO 1 ........................................................................................................................ 77

Page 10: ESCOLARIDADE VERSUS CONHECIMENTO DOS DIREITOS E … · deveres dos usuários do SUS. E como objetivos específicos, compreender como tal ... LDB ± Lei de Diretrizes e Bases LOAS

9

1. INTRODUÇÃO

O presente trabalho buscará analisar a forma com que as políticas de saúde

historicamente evoluíram no contexto da saúde pública brasileira, não deixando de

mencionar também as dificuldades e deficiências que a mesma possui para que sua

implementação acabe não ocorrendo da forma com que foi idealizada.

Tem como objetivo principal compreender de que forma o déficit de escolaridade

contribui com o não conhecimento acerca dos direitos e deveres dos usuários do

SUS. Já como objetivos específicos como tal carência de conhecimentos reflete em

procedimentos cotidianos, como marcação de consultas, exames, atendimentos,

entre outros; levantar os principais fatores responsáveis por esse abandono escolar,

ou o não ingresso na escola, e em casos de haver ingresso escolar, ressaltar os

principais motivos que impediram seu retorno; compreender de que forma o Serviço

Social pode intervir nessa problemática mediante ações de cunho socioeducativo no

âmbito do HMWG/PSCS.

Será tido como exemplo para tal análise, a realidade institucional do Hospital

Monsenhor Walfredo Gurgel/Pronto Socorro Clóvis Sarinho – HMWG/PSCS – que é

o maior hospital público do estado, com capacidade para atender casos de alta e

média complexidade no âmbito da urgência e emergência. Sendo assim, foi

realizado um questionário com pacientes de diversos setores do hospital, buscando

compreender o que estes entendem por saúde, direito à saúde, SUS etc. Esta

pesquisa foi realizada a partir de um questionário semiestruturado, aliada à uma

revisão de literatura e coleta de dados, visando uma maior interação entre o

pesquisador e o usuário, como também a observação para que seja feito um

levantamento sobre o histórico de vida e que fatores contribuíram para tal situação

Para tal compreensão, haverá a necessidade de um resgate histórico acerca

dos principais marcos da saúde pública no Brasil, em especial a Constituição

Federal de 1988. No decorrer do primeiro capítulo, serão relembrados fatos

históricos que contribuíram para que a saúde brasileira encontre-se no atual modelo,

passando desde a chegada da Família Real Portuguesa ao Brasil e o surgimento de

uma implantação de medidas de ordem sanitária voltadas para o combate de

epidemias, endemias e moléstias que assolavam a população de índios,

portugueses e diversas outras etnias que já encontravam-se instaladas no país. Ou

Page 11: ESCOLARIDADE VERSUS CONHECIMENTO DOS DIREITOS E … · deveres dos usuários do SUS. E como objetivos específicos, compreender como tal ... LDB ± Lei de Diretrizes e Bases LOAS

10

seja, levantará fatos desde os primórdios das ações em saúde do país, passando

pelo período monárquico, passando posteriormente pelas ações desenvolvidas pela

República Velha, marcada pelo autoritarismo das oligarquias cafeeiras, como

também por surtos de varíola, febre amarela, febre tifoide, peste bubônica e cólera,

que ocasionaram uma maior atuação do Estado não só em períodos caóticos, mas

de uma forma contínua.

Abordará também a Era Vargas e a criação dos ministérios, caixas de

aposentadorias e institutos previdenciários, passando pelo período de regime militar

que até mesmo reduziu as verbas destinadas à saúde. No entanto, com o passar do

tempo isto mudou, já que o governo militar para se afirmar e diminuir as

manifestações populares acabou investindo em políticas sociais, e no âmbito da

saúde, esta ficou sob responsabilidade da Previdência Social.

Passará pelo Movimento Sanitário até a criação do Sistema Único de Saúde –

SUS – marcados pelo fim da ditadura militar, um período de total repressão a toda

forma de participação popular, migrando para um sistema de saúde, onde a

participação da população é uma das principais características que tornam esse

sistema que é vigente até hoje no Brasil, como um dos modelos mais participativos

já existente no âmbito de qualquer política social.

Com o decorrer da análise desse contexto, surgiu o questionamento sobre os

motivos que fazem com que este modelo encontre tantas dificuldades para executar

um atendimento de excelência, e seja marcado por longa espera em filas e por

vagas, consultas, exames, cirurgias etc. Diante disso, percebe-se que um dos

principais fatores é a falta de conhecimento da própria população acerca de seus

direitos, impossibilitando-os de exigir ou até mesmo questionar os motivos que os

fazem permanecer em tal situação.

Entende-se que a educação é um fator determinante para que este indivíduo

possa ver a realidade sob um olhar crítico, não aceitando tudo que lhe é imposto.

Para isto, o segundo capitulo tratará sobre a educação, não apenas a escolar, mas

também a educação voltada para uma promoção à saúde e a prevenção, ou seja,

não deixando que a saúde fique apenas no âmbito curativo, mas também

ressaltando a necessidade da saúde preventiva.

Por último, será analisado a atuação do Serviço Social no HMWG/PSCS,

fazendo uma ponte entre as demandas postas pela instituição, e se esta é tratada de

Page 12: ESCOLARIDADE VERSUS CONHECIMENTO DOS DIREITOS E … · deveres dos usuários do SUS. E como objetivos específicos, compreender como tal ... LDB ± Lei de Diretrizes e Bases LOAS

11

acordo com os Parâmetros de Atuação na Saúde, ressaltando também as

dificuldades que este setor tem que enfrentar para executar suas atividades com

sucesso e da forma idealizada pela divisão de Serviço Social do hospital, como

também as atividades que este desenvolve cotidianamente.

Page 13: ESCOLARIDADE VERSUS CONHECIMENTO DOS DIREITOS E … · deveres dos usuários do SUS. E como objetivos específicos, compreender como tal ... LDB ± Lei de Diretrizes e Bases LOAS

12

1. A SAÚDE COMO DIREITO DE TODOS E DEVER DO ESTADO

Este capítulo abordará a evolução das políticas de saúde no Brasil,

subsidiando a compreensão de fatores históricos que resultaram no atual sistema de

saúde, que muitas vezes não corresponde às necessidades da população, não

dando as respostas necessárias no que diz respeito ao enfrentamento dos seus

problemas de saúde.

Para tal análise histórica, haverá a necessidade de um resgate acerca da

trajetória de tais políticas até a promulgação da nova Carta Magna, a Constituição

Federal de 1988, envolvendo a aprovação da Lei Orgânica da Saúde e a

implantação e desenvolvimento do Sistema Único de Saúde (SUS) e a Política

Nacional de Humanização (PNH).

2.1 O PROCESSO DE CONSTRUÇÃO DA SAÚDE PÚBLICA NO BRASIL

Na chegada de Pedro Álvares Cabral ao Brasil, entendia-se que a saúde dos

índios, que desconheciam enfermidades que naquele período eram a causa de

morte de tantas vidas no continente europeu, era facilmente explicada pela riqueza

de alimentação que possuíam, além da pureza das águas e do clima ameno. No

entanto, logo essa visão de paraíso que antes era anunciada começou a modificar-

se, onde já no século XVII, as chances de sobrevivência dos colonizadores e

escravos na colônia eram muito pequenas, pois além dos constantes conflitos com

os indígenas, havia a existência de dificuldades materiais de vida juntamente com

diversas enfermidades.

De acordo com Bertolli, essas dificuldades ameaçavam o projeto europeu de

colonização e exploração econômica do Brasil, diante disso, no século XVI foram

criados os cargos de físico-mor e cirurgião-mor objetivando cuidar da saúde da

população, no entanto, esses cargos passaram muito tempo sem ocupantes, pois os

médicos, em sua maioria não aceitavam transferir-se para o país, desestimulados

Page 14: ESCOLARIDADE VERSUS CONHECIMENTO DOS DIREITOS E … · deveres dos usuários do SUS. E como objetivos específicos, compreender como tal ... LDB ± Lei de Diretrizes e Bases LOAS

13

pelo baixo salário e receosos pelos perigos que aqui enfrentariam. Os que

finalmente se instalavam no Brasil enfrentavam dificuldades, levando em

consideração o grande território e a pobreza da população que não os permitia ter

dinheiro para pagar uma consulta, além do medo de se submeter a tratamentos que

eram baseados em purgantes e sangrias. Muitas vezes a população rica ou pobre,

recorria aos remédios feitos por curandeiros negros ou indígenas.

Quando a Corte Portuguesa chegou ao Brasil em 1808, foram determinadas

mudanças na área da administração pública, incluindo a área da saúde. O Rio de

Janeiro era o centro das ações sanitárias, já que era a sede provisória e principal

porto do país. Em 1813 foram fundadas as academias médico-cirúrgicas do Rio de

Janeiro, e em 1815 a da Bahia, que posteriormente foram transformadas nas

escolas de médicos do país, com o intuito de oferecer um atendimento constante e

organizado. Em 1829 foi criada a Imperial Academia de Medicina.

A maior parte das medidas sanitárias não surtiam grande efeito, fazendo com

que a população usasse seus próprios meios para lutar contra doenças e morte, os

ricos tinham a possibilidade de tratamento na Europa e clínicas particulares que

começavam a ser criadas, já os pobres continuavam recorrendo aos curandeiros.

Ainda com as tentativas de Dom Pedro II, incentivando pesquisas científicas acerca

das doenças da região tropical, estas não obtiveram o devido efeito, e o Império no

Brasil foi encerrado com os problemas de saúde coletiva perpassando para a

República, onde a essas alturas o país já era considerado um dos mais insalubres

do mundo.

A República Velha (1889-1930) foi marcada pelas oligarquias de São Paulo,

Rio de Janeiro e Minas Gerais, onde o setor da economia que mais se expandia era

a cafeicultura, voltava-se para a modernização do Brasil, expresso por exemplo, pelo

lema positivista da bandeira nacional “Ordem e Progresso”. Foi nesse período que a

mão-de-obra escrava foi substituída pela assalariada, composta em sua maioria de

imigrantes europeus que começavam a trabalhar na indústria que nascia no país,

resultante dos investimentos feitos do lucro do café, que ocasionou também uma

expansão das atividades comerciais e um aumento da população urbana. Enquanto

isso as epidemias espalhavam-se matando a população.

Como os serviços de saúde eram desorganizados, contribuiu para a

ocorrência de novas epidemias no país, onde entre 1890 e 1900 as principais

Page 15: ESCOLARIDADE VERSUS CONHECIMENTO DOS DIREITOS E … · deveres dos usuários do SUS. E como objetivos específicos, compreender como tal ... LDB ± Lei de Diretrizes e Bases LOAS

14

cidades brasileiras foram atingidas por surtos de varíola, febre amarela, peste

bubônica, febre tifóide e cólera, matando milhares de pessoas. Buscando

estabelecer estratégias para resolução dessa situação, os médicos passaram a

ocupar importantes cargos na administração pública, onde suas principais ações

eram voltadas à retificação dos rios que causavam enchentes, drenagem de

pântanos, destruição de viveiros de ratos e insetos, divulgar regras básicas de

higiene e tornar obrigatório o isolamento de pessoas atingidas por doenças

infectocontagiosas, iniciando-se assim a hospitalização de vítimas de doenças

contagiosas e doentes mentais.

Com o Estado intervindo constantemente nas questões de saúde individual e

coletiva, ou seja, não agia apenas nos períodos de surtos epidêmicos, passando a

atuar todo o tempo e em todos os setores da sociedade, elaborando planos de

combate às doenças que reduziam a vida produtiva da população. Isso demonstra a

criação de uma política de saúde, que não pode ser eficaz isoladamente, mas sim

articulada com outros setores como educação, alimentação, habitação, trabalho etc,

que conjuntamente constituem a política social. Ainda que com promessas de

melhorias no padrão de vida da população, acabou-se privilegiando investimentos

na expansão da produção, beneficiando a elite econômica, mantendo assim, a

política da desigualdade.

O compromisso governamental com as necessidades básicas da população tem sido relegado sempre a segundo plano, perpetuando um círculo tristemente vicioso: desamparado e sem participação decisiva nas decisões do governo, o trabalhador recebe salários baixos e vive mal, adoecendo com facilidade. Doente e mal alimentado, ele tem a sua vida produtiva abreviada, tornando muito mais difícil a superação da pobreza nacional. (BERTOLLI FILHO, 2002, 15).

Era dado destaque à população urbana, definindo estratégias para melhorias

sanitárias das cidades e portos, nelas eram montados os primeiros laboratórios de

pesquisas médico-epidemiológicas. Enquanto isso, a população rural ficava em

segundo plano, só sendo vista quando os problemas sanitários interferiam na

produção agrícola ou extrativista que era destinada à exportação.

A maior intervenção foi feita em São Paulo, pelo Serviço Sanitário paulista,

criado em 1892, isto porque a oligarquia local destinou grandes verbas para a saúde

Page 16: ESCOLARIDADE VERSUS CONHECIMENTO DOS DIREITOS E … · deveres dos usuários do SUS. E como objetivos específicos, compreender como tal ... LDB ± Lei de Diretrizes e Bases LOAS

15

pública, que até hoje foram as maiores investidas na área em relação ao total de

recursos anuais aplicados por um estado brasileiro. Nesse período, ficou

estabelecido que apenas os médicos formados em faculdades de medicina, seja no

Brasil ou exterior, poderiam tratar da saúde da população, ficando a cargo da polícia

localizar e punir os curadores que atendiam os doentes mais pobres. Para que estas

ações ocorressem de maneira mais simplificada, foram criados vários institutos de

pesquisas, em 1892 foram criados os laboratórios Bacteriológico, Vacinogênico e de

Análises Clínicas e Farmacêuticas, que logo depois foram ampliados tornando-se os

institutos Butantã, Biológico e Bacteriológico (mais tarde denominado Instituto Adolfo

Lutz).

Os brasileiros que viviam no interior eram os mais atingidos pelas endemias

(doenças constantes em determinada região, atacando um número de pessoas

previamente esperado). Estima-se que por volta de 1918 a população rural do Brasil

girava em torno de vinte milhões de pessoas, que sofriam com doenças como

malária, doença de Chagas, parasitas intestinais e tuberculose. Já nas cidades, a

situação era agravada pelo aumento descontrolado da população, resultante da

chegada dos imigrantes, fazendo com que o número de cortiços e favelas também

aumentasse.

Durante o governo de Rodrigues Alves (1902-1906), o Rio de Janeiro, a

capital da República, passou por uma reforma urbanística e sanitária, feita pelo

prefeito da cidade, Pereira Passos, e por Oswaldo Cruz, diretor-geral do

Departamento Nacional de Saúde Pública. Diversos trabalhadores que viviam, em

prédios antigos no centro da cidade, que eram transformados em cortiços foram

expulsos, pois considerava-se que estas construções ocasionavam a proliferação de

ratos e mosquitos transmissores de doenças. Posteriormente, foi feito um processo

de higienização da cidade, onde inspetores sanitários entravam nas residências à

procura de ninhos de ratos e mosquitos. A cidade de São Paulo passou por um

processo parecido, outras capitais estaduais e cidades do interior também, em maior

e menor escala. No entanto, os beneficiados eram geralmente a elite econômica, já

que essas reformas eram feitas nos bairros onde estas residiam.A população mais

pobre continuava a viver em péssimas condições de vida, sendo o maior alvo das

enfermidades.

Page 17: ESCOLARIDADE VERSUS CONHECIMENTO DOS DIREITOS E … · deveres dos usuários do SUS. E como objetivos específicos, compreender como tal ... LDB ± Lei de Diretrizes e Bases LOAS

16

As leis que vigoravam durante a República Velha não garantiam aos

trabalhadores o direito a uma assistência médica de fato eficaz, e até mesmo a uma

indenização em dinheiro por doença ou acidente de trabalho, sendo assim, aqueles

que adoeciam eram obrigados a procurar hospitais filantrópicos. Somente o instituto

previdenciário dos trabalhadores das estradas de ferro de São Paulo, criado em

1923 através da aprovação da Lei Eloy Chaves1, assegurava o direito à

aposentadoria por tempo de serviço ou invalidez, tratamento médico e

medicamentos, auxílio funeral e direito à pensão aos herdeiros do segurado falecido.

Assim que chegou ao poder em 1930, Getúlio Vargas buscou acabar com o

poder que as oligarquias estaduais tinham sob o controle do Estado, e conseguiu

isso através de uma reforma política e administrativa que afastava os principais

líderes da República Velha. Vargas suspendeu a Constituição de 1891,governando

por decretos até1934,ano em que foi aprovada uma nova Constituição. Seu governo

foi fortemente marcado pela perseguição aos seus opositores e líderes sindicais,

especialmente a partir de 1937, quando foi instituída a ditadura do Estado Novo.

Em 1930 foram criados o Ministério da Educação e da Saúde Pública

(MESP), com isto, a área da saúde ficava a cargo do Estado, objetivando zelar pelo

bem-estar da população, em especial nas áreas onde ainda havia pouca ou

nenhuma assistência médico-hospitalar. A estratégia de Vargas era centralizar tais

serviços. Em 1937 o MESP foi reformado e passou a denominar-se de Ministério da

Educação e Saúde (MES), nessa reforma também foram instituídas as Conferências

Nacionais de Saúde (CNS). Na década de 1930 é perceptível como os avanços da

saúde estavam relacionados com os projetos políticos do Governo Vargas, em 1933

as Caixas de Aposentadorias e Pensões (CAPs)2 se transformaram em Institutos de

1 Foi com a Lei Eloy Chaves, Decreto Legislativo n° 4.682, de 24/01/1923, que se implantou em nosso país a Previdência Social. Através deste, foram criadas as “caixas de aposentadorias e pensões” para os empregados das empresas ferroviárias, contemplando-os com benefícios de aposentadoria por invalidez, aposentadoria ordinária (seria atualmente a aposentadoria por tempo de contribuição), a pensão por morte e a assistência médica. Existia uma caixa de aposentadoria e pensão por empresa ferroviária. 2 As CAPs eram financiadas pela União, pelas empresas empregadoras e pelos empregados. Elas eram organizadas por empresas, de modo que só os grandes estabelecimentos tinham condições de mantê-las. O presidente das mesmas era nomeado pelo Presidente da República e os patrões e empregados participavam paritariamente da administração. Os benefícios eram proporcionais às contribuições e foram previstos: assistência médica-curativa e fornecimento de medicamentos; aposentadoria por tempo de serviço, velhice e invalidez, pensão para os dependentes e auxílio funeral. (BRAVO, 2006: 90)

Page 18: ESCOLARIDADE VERSUS CONHECIMENTO DOS DIREITOS E … · deveres dos usuários do SUS. E como objetivos específicos, compreender como tal ... LDB ± Lei de Diretrizes e Bases LOAS

17

Aposentadorias e Pensões (IAPs)3. É nesta década que o Estado irá começar a

interferir efetivamente no setor saúde tendo é vista que é neste período que ela

emerge como questão social no Brasil, pois até o século XVIII a assistência médica

ocorria na filantropia e na prática liberal.

A conjuntura de 30, com suas características econômicas e políticas, possibilitou o surgimento de políticas sociais nacionais que respondessem às questões sociais de forma orgânica e sistemática. As questões sociais em geral, e as de saúde em particular, já colocadas na década de 20, precisavam ser enfrentadas de forma mais sofisticada. Necessitavam transformar-se em questão política, com a intervenção estatal e a criação de novos aparelhos que contemplassem, de algum modo, os assalariados urbanos, que se caracterizavam como sujeitos sociais importantes no cenário político nacional, em decorrência da nova dinâmica da acumulação. Este processo, sob domínio do capital industrial, teve como características principais a aceleração da urbanização e a ampliação da massa trabalhadora, em precárias condições de higiene, saúde e habitação. (BRAVO, 2006, 91)

Ainda na República Velha, movimentos de educação em saúde através de

cartazes e panfletos eram utilizados, objetivando ocasionar uma mudança de hábitos

anti-higiênicos da população que facilitavam a disseminação de doenças, em

especial infectocontagiosas. Como grande parte da população era analfabeta, tal

medida não surtia o efeito necessário, sendo assim, desde 1938 as mensagens

higienistas eram divulgadas em emissoras de rádio, e os cartazes e folhetos eram

coloridos, podendo ser entendidos até por aqueles que não sabiam ler. Havia as

enfermeiras sanitárias que atuavam nos bairros mais carentes, ensinando regras

básicas de higiene e encaminhando os doentes mais graves aos hospitais

filantrópicos ou públicos.

De toda forma, o governo Vargas representou um avanço com relação às

décadas anteriores no que diz respeito à saúde. A Constituição de 19344 incorporou

3 Eram modelos de pensões vinculadas a gênero ou categoria profissional, foram organizados a partir de 1933 de forma a abranger as mesmas categorias em todo o território nacional. Muitas Caixas de Aposentadorias e Pensões (CAPs) foram transformadas em IAPs. 4Foi a que menos durou em toda a História Brasileira, três anos, mas vigorou oficialmente apenas um. O cumprimento à risca de seus princípios, porém, nunca ocorreu. Ainda assim, ela foi importante por institucionalizar a reforma da organização político-social brasileira, não com a exclusão das oligarquias rurais, mas com a inclusão dos militares, classe média urbana e industriais no jogo de poder.

Page 19: ESCOLARIDADE VERSUS CONHECIMENTO DOS DIREITOS E … · deveres dos usuários do SUS. E como objetivos específicos, compreender como tal ... LDB ± Lei de Diretrizes e Bases LOAS

18

garantias ao operariado como assistência médica, licença remunerada à gestante

trabalhadora e a jornada de trabalho de oito horas.

À medida em que havia um diminuição no número de mortes por epidemias,

por outro lado cresciam as doenças que atingiam milhares e até mesmo milhões de

pessoas, como a esquistossomose, doença de Chagas, tuberculose, doenças

gastrointestinais, doenças sexualmente transmissíveis e a hanseníase.

Nas décadas de 1930 e 1940 eram enfatizadas as campanhas sanitárias, e as

ações contra endemias foram interiorizadas para as áreas rurais, principalmente

devido o fluxo migratório do campo para as cidades. Diante disso foram criados

serviços de combate à endemias. A Política Nacional de Saúde esboçada nesse

período, só foi consolidada de 1945-1950. Em 1948 foi criado o Plano Salte,

envolvendo as áreas de Saúde, Alimentação, Transporte e Energia, onde a Saúde

era vista como uma de seus principais alvos, no entanto o plano não foi

implementado.

Em 1945 Getúlio Vargas é deposto em decorrência de manifestações

populares contra a ditadura, influenciadas pela vitória dos Estados Unidos e dos

Aliados na Segunda Guerra Mundial, no ano seguinte uma Constituição foi

elaborada. Deste então até 1964, essa fase ficou conhecida como Período de

Redemocratização, caracterizado pelas eleições diretas para principais cargos

políticos,pelo pluripartidarismo, liberdade de imprensa entre outros.

O modelo populista de governo que surgiu com Vargas foi mantido pelos

novos presidentes, utilizando medidas que não resolviam os principais problemas da

população, ocasionando diversos movimentos sociais que exigiam melhoras nas

condições de vida, saúde e trabalho. Nesse período havia grandes investimentos

financeiros vindos do exterior, com uma proposta desenvolvimentista que teve como

principal ator o presidente Juscelino Kubitstheck (1956-1964).

Em maio de 1953 foi criado o Ministério da Saúde, já no segundo período

presidencial de Getúlio Vargas. Logo após sua criação foi confirmado o descaso das

autoridades com a saúde do povo quando eram destinadas verbas irrisórias para a

mesma no decorrer da década de 50, impedindo assim que o Estado atuasse

eficazmente na situação da saúde coletiva, pois faltavam funcionários

especializados, equipamentos apropriados, postos de atendimento e até mesmo

ânimo aos servidores. O atendimento hospitalar privado já estava praticamente

Page 20: ESCOLARIDADE VERSUS CONHECIMENTO DOS DIREITOS E … · deveres dos usuários do SUS. E como objetivos específicos, compreender como tal ... LDB ± Lei de Diretrizes e Bases LOAS

19

consolidado no Brasil e já caminhava para a formação de empresas médicas que

eram financiadas pelo Estado, demonstrando os interesses capitalistas na clara

defesa da privatização. Mesmo assim a assistência médica até 1964 foi fornecida

pelos IAP’s. Sendo assim, o MS pouco atuou para que fosse reduzidos índices de

mortalidade e morbidade das doenças, também não patrocinou reformas ou

organizou uma política de saúde eficiente, no entanto combateu muito as doenças

que atingiam a população do interior como a doença de Chagas, a malária, o

tracoma e a esquistossomose, além de tentar promover a educação sanitária da

população rural.

Em 1955 foi criada no Nordeste as Ligas Camponesas, com o objetivo de

lutar pelas melhorias das condições de vida do povo, contra a fome, a doença e a

exploração imposta pelos latifundiários da região. Em 1956 o MS teve que

desenvolver um novo e eficiente programa voltado para a assistência às crianças, já

que com o precário atendimento à infância o índice de mortalidade infantil era muito

alto principalmente nas capitais. Mesmo com as mudanças feitas pelo MS em 1956,

como a multiplicação dos serviços de higiene infantil, vacinação, tratamento de

crianças doentes e assistência às mães, a taxa de mortalidade continuou alta, pois a

população dos estados mais pobres continuaram a consumir águas poluídas e muito

pouco foi feito para a expansão dos sistemas de saneamento básico.

Diante disso, em 1956 foi criado o Departamento Nacional de Endemias

Rurais que procurou adotar um sistema administrativo dinâmico e prático, e entre

1958 e 1965 foram organizadas três campanhas nacionais contra a malária.

Nesse período, o Brasil mesmo com uma redução de casos de doenças

infectocontagiosas e parasitárias era uma das nações mais doentes do mundo

devido a interrupção de importantes obras de saneamento, por ainda haver áreas

totalmente sem assistência médico-hospitalar e diversas dificuldades decorrentes do

clientelismo (partidos e líderes políticos trocavam ambulâncias, leitos hospitalares,

profissionais da saúde e vacinas por votos e apoio nos períodos eleitorais), o MS se

responsabilizou quase exclusivamente pelas áreas rurais, já as regiões industrias e

povoadas eram atendidas pelos hospitais e clínicas próprios ou conveniados com os

institutos de pensões e aposentadorias mantidos pelos trabalhadores e patrões.

Desde o fim da década de 1940, a crescente agitação dos sindicatos fazia

com que o governo revesse a legislação previdenciária. Tendo em vista o aumento

Page 21: ESCOLARIDADE VERSUS CONHECIMENTO DOS DIREITOS E … · deveres dos usuários do SUS. E como objetivos específicos, compreender como tal ... LDB ± Lei de Diretrizes e Bases LOAS

20

do número de trabalhadores e dependentes com direito aos serviços de saúde,

aumento de salários e pensões pagas aos que estavam afastados temporariamente

do trabalho por motivos de doença e o crescente número de aposentados afastados

por tempo de serviço fazia com que a qualidade dos serviços caísse, foi então que

as longas filas nas portas dos hospitais, consultas rápidas e dificuldades para

conseguir internamentos para pacientes em estado mais grave tornaram-se comuns.

Diante disso o setor privado interferiu pressionando o governo federal e estadual

para que fosse restringida ou interrompida a construção de hospitais públicos na

tentativa de que o governo fizesse empréstimos e doações a juros baixos para que

os empresários criassem uma rede de clínicas e hospitais para vender seus serviços

à população, institutos de aposentadorias e pensões e ao governo.

Em 1960 foi sancionada a Lei Orgânica da Previdência Social (LOPS), em

decorrência das dificuldades existentes no gerenciamento dos institutos e pelo

descontentamento dos trabalhadores, como uma tentativa de reorganizar as

administrações e os serviços oferecidos pelas agências previdenciárias. Sua

principal medida foi a uniformização das contribuições pagas pelos trabalhadores

aos institutos que estivessem filiados, onde contribuíam 8% do seu salário para a

Previdência, juntamente com o governo e empregadores. Ainda assim não houve

melhorias dos serviços que os institutos prestavam.

Em decorrência do desconhecimento acerca de regras básicas de higiene e

da ausência de sistemas de tratamento e distribuição de água e coleta de esgoto, a

taxa de mortalidade infantil era altíssima. Sendo assim, em 1956, ficou a cargo do

MS desenvolver um programa voltado à assistência às crianças que multiplicava os

serviços de higiene infantil e os postos de puericultura que acompanhava e vacinava

as crianças e suas mães. No entanto, os sistemas de saneamento básico não foram

expandidos, e dessa forma grande parte da população continuava a consumir águas

poluídas

João Goulart comprometido com o programa de Reformas de Base não

conseguia atender as reclamações do povo e ao mesmo tempo garantir os

interesses dos grandes latifundiários e industriais, tal impasse colaborou para o

golpe militar de 1964, com ele houve uma redução das verbas destinadas à saúde

pública e isso decresceu até o final da ditadura.

Page 22: ESCOLARIDADE VERSUS CONHECIMENTO DOS DIREITOS E … · deveres dos usuários do SUS. E como objetivos específicos, compreender como tal ... LDB ± Lei de Diretrizes e Bases LOAS

21

A ditadura significou, para a totalidade da sociedade brasileira, a afirmação de uma tendência de desenvolvimento econômico-social e político que modelou um país novo. Os grandes problemas estruturais não foram resolvidos, mas aprofundados, tornando-se mais complexos e com uma dimensão mais ampla. (BRAVO, 2006, 93)

As verbas destinadas à saúde haviam sido aumentadas na primeira metade

da década de 1960, no entanto, com o golpe militar, estas foram reduzidas. Diante

das dificuldades das antigas caixas e institutos de aposentadorias e pensões, em

1966 o governo criou o Instituto Nacional de Previdência Social (INPS), unificando

todos os órgãos previdenciários que funcionavam desde 1930, era dirigido por

técnicos e políticos vinculados ao regime, era subordinado ao Ministério do

Trabalho. O INPS tratava dos doentes individualmente, e o Ministério da Saúde

deveria elaborar e executar programas sanitários além de assistir a população

durante as epidemias. Acabou também firmando convênios com 2300 dos 2800

hospitais do país, utilizando o setor privado para atender a massa trabalhadora, mas

devido os baixos preços pelos serviços e a demora na transferência de verbas do

INPS para as entidades conveniadas deixaram esse sistema fragilizado.

Na tentativa de consolidar-se, o regime militar precisou modificar sua relação

com a sociedade civil, diante disso, a política social no período de 1974 a 1979

buscava ser mais efetiva no enfrentamento da questão social, para que dessa forma,

fossem diminuídas as manifestações populares. As políticas de saúde eram

caracterizadas pela intervenção da Previdência Social, através de ações curativas

comandadas pelo setor privado.

No início da década de 1970, a saúde no Brasil continuava a não atender

adequadamente a população. Foi nesse período que ocorreu epidemias como a

meningite, que se alastravam de forma silenciosa. E em 1971 começou a funcionar o

Programa de Assistência ao Trabalhador Rural (Funrural). Com a pressão social que

começou a acentuar-se nessa década os movimentos sociais e comunitários

passam a reorganizar-se, lutando pela redemocratização do país. Movimentos como

associações de moradores, de mulheres, sindicatos, correntes de oposição ao

governo, passaram a denunciar a situação caótica da política de saúde pública e dos

serviços previdenciários de atenção médica, reivindicado das autoridades soluções

para os problemas criados pelo modelo de saúde vigente.

Page 23: ESCOLARIDADE VERSUS CONHECIMENTO DOS DIREITOS E … · deveres dos usuários do SUS. E como objetivos específicos, compreender como tal ... LDB ± Lei de Diretrizes e Bases LOAS

22

Foi nesse período em que médicos residentes e movimentos internos

começaram a articular-se com outros movimentos sociais, buscando denunciar as

más qualidades nos atendimentos e serviços prestados à população.Os movimentos

de contestação em saúde cresceram em número e intensidade, de tal modo que,

entre o final da década de 70 e o início da de 80, sindicatos e partidos políticos

também iniciaram uma fase de discussão e mobilização, centrada na questão da

saúde. E em 1977 houve uma campanha de vacinação.

Nesse contexto, houve uma grande produção científica por intelectuais,

pesquisadores e professores, reforçando estudos anteriores com ênfase a uma

crítica ao modelo de saúde vigente, sugerindo alternativas para a construção de uma

nova política de saúde que fosse de fato democrática. Dessa forma, surgiu o

Movimento Sanitário, em contraposição ao governo ditatorial, caracterizado por uma

política de saúde voltada para um atendimento médico-assistencialista defasado,

contribuindo para problemas quem incidem até os dias atuais. Esse sistema era

ineficiente em relação às necessidades da população brasileira, que cada vez mais

reaprendia a reivindicar seus direitos.

A Reforma Sanitária foi um movimento que organizado por um grupo restrito

de intelectuais, médicos e lideranças políticas do setor da saúde, provenientes, na

sua maioria, do Partido Comunista Brasileiro (PCB), que exerceu um papel de

destaque na oposição ao regime militar. Este grupo foi o mentor desse processo de

reformulação, e em âmbito acadêmico ocorreram mudanças como a criação dos

Departamentos de Medicina Preventiva nas Faculdades de Medicina, surgindo

assim, um pensamento crítico na saúde.

Paralelamente, o Movimento Popular de Saúde ganha importância, embora

tenha sido iniciado desde a década de sessenta. Este passou de um processo de

apenas reivindicações, para um questionamento fundamentado acerca da qualidade

dos serviços, conquista de equipamentos e até mesmo relacionado à gestão e à

organização da política de saúde. O Movimento Popular de Saúde originou-se nos

bairros pobres das periferias das grandes cidades e/ou nas favelas localizadas

dentro dos grandes centros urbanos, principalmente nos Estados do Rio de Janeiro,

Minas Gerais e São Paulo. Compunha-se de médicos sanitaristas, estudantes,

religiosos, militantes católicos, integrantes de partidos políticos clandestinos e das

populações carentes. Enquanto o Movimento Sanitário e o Movimento Médico

Page 24: ESCOLARIDADE VERSUS CONHECIMENTO DOS DIREITOS E … · deveres dos usuários do SUS. E como objetivos específicos, compreender como tal ... LDB ± Lei de Diretrizes e Bases LOAS

23

voltavam-se para a ação institucional, o Movimento Popular privilegiava a

organização de redes locais, fazendo mobilizações no interior das Universidades e

nos aparelhos de Estado.

Ao fim da ditadura, a saúde brasileira encontrava-se em crise, onde os

hospitais funcionavam em situações precárias, havia dificuldades no atendimento, e

eram comuns mortes por falta de um socorro especializado. O Brasil continuava a

sofrer com epidemias, surtos de cólera e dengue, em decorrência da necessidade

de sistema de saneamento e de uma educação sanitária.

A partir das contestações acerca do modelo de saúde que vigorava no pais na

década de 1980, foram surgindo alternativas para a construção de uma política de

saúde que fosse de fato democrática, permeada com a participação popular, além

de uma universalização e descentralização dos serviços de saúde. Neste período

acentuou-se a crise da previdência, e paralelamente, intensificavam-se também os

movimentos de crítica à saúde.

2.2 O SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE (SUS)

A 8ª Conferência Nacional de Saúde, em 1986 foi um marco para a saúde no

Brasil, fazendo com que esta passasse a referir-se à toda a sociedade, nela foi

amplamente discutido os princípios da Reforma Sanitária – participação popular,

equidade, descentralização, universalidade e integralidade das ações de saúde.

Nela participaram cerca de quatro mil e quinhentas pessoas, mudando a história da

saúde pública no Brasil, levando em consideração que o debate acerca da temática

havia perpassado seus fóruns específicos e sido compartilhado também com

sindicatos de moradores, partidos políticos, associações de profissionais e

parlamento. Em 1987 o Sistema Unificado e Descentralizado de Saúde (SUDS) e

depois o Sistema Único de Saúde (SUS) em 1988, no entanto tais medidas não

impactaram tanto pois não foram devidamente operacionalizadas.

Page 25: ESCOLARIDADE VERSUS CONHECIMENTO DOS DIREITOS E … · deveres dos usuários do SUS. E como objetivos específicos, compreender como tal ... LDB ± Lei de Diretrizes e Bases LOAS

24

Com a promulgação da Constituição Federal de 19885, fica evidente a busca

por uma garantia de direitos sociais e de cidadania na tentativa de expressar um

ideal mais igualitário. Podendo-se até mesmo afirmar que esta buscava amenizar e

corrigir injustiças sociais que jamais universalizava direitos, e que historicamente

assolava a população brasileira. Dentre tais direitos, está a garantia da saúde que

faz com que tal constituição seja um marco na saúde pública no Brasil, sendo

caracterizada também por prejudicar os interesses empresariais do setor hospitalar

que tradicionalmente buscava privatizar o setor.

Art. 196 A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.(CF,1988)

Em 1988, com a criação do SUS, princípios são afirmados, como a

universalidade, integralidade e equidade na saúde. Mesmo com os avanços

acumulados no que diz respeito aos princípios norteadores do SUS, à

descentralização da atenção e da gestão, o mesmo ainda enfrenta diversos

problemas, como são expressos na HumanizaSUS.

A Constituição Brasileira de 1988 inscreveu a saúde entre os direitos sociais, reconhecendo-a como um direito de cidadania estendido a todos o brasileiros. Em 1990, na sua regulamentação, através da Lei Orgânica da Saúde, foi instituído oSistema Único de Saúde - SUS. Iniciava-se então uma reforma sanitária de grande envergadura, definida a partir dos seguintes princípios: (1) universalidade de cobertura, ou seja, atendimento integral gratuito, e eqüidade; (2) descentralização dos serviços para os estados e municípios, que participarão do financiamento; (3) não-concorrência mas unidade e hierarquização entre as ações de saúde da União, dos estados e dos municípios; (4) participação complementar do setor privado na oferta de serviços; (5) prioridade para as atividades preventivas; e

5A Constituição de 1988, também conhecida como a Constituição Cidadã, é uma

aproximação com o modelo WelfareState, buscando garantir direitos sociais e de cidadania

na tentativa de expressar um ideal mais igualitário. Dentre tais direitos, está a garantia da saúde que faz com que tal constituição seja um marco na saúde pública no Brasil.

Page 26: ESCOLARIDADE VERSUS CONHECIMENTO DOS DIREITOS E … · deveres dos usuários do SUS. E como objetivos específicos, compreender como tal ... LDB ± Lei de Diretrizes e Bases LOAS

25

(6) controle social através dos Conselhos de Saúde e participação

da comunidade. (PEREIRA, 1995)

A Constituição Federal de 1988 coloca a saúde como um direito universal,

devendo ser garantido pelo Estado, que dessa forma, acabava com a distinção entre

segurado e não segurado ou urbano e rural, através de um sistema de saúde que

integralizava todos os serviços públicos de forma hierarquizada, descentralizada e

regionalizada. Dessa forma, a participação do setor privado seria apenas uma

complementação. O SUS foi implantado gradualmente e para isso era necessário a

formulação de leis, assim foi aprovada a Lei Orgânica de Saúde ou Lei 8.080 de 19

de setembro de 1990. Com a criação do SUS, que retira a assistência médica da

responsabilidade do Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdência Social

(INAMPS)6, onde este ficou restrito aos contribuintes da Previdência Social, agora é

reconhecido o direito ao acesso de toda a população à saúde.

Nessa constituição a saúde passa a ser entendida como resultante de

condições como habitação, educação, alimentação, renda, transporte, lazer, trabalho

e liberdade, não somente sendo relacionada ao acesso aos serviços de saúde.

Fazendo com que a saúde perpasse a assistência médico-hospitalar relacionada a

uma prática curativa ou preventiva para o resultado de um conjunto articulado de

políticas sociais e econômicas.

A Lei 8.080/90 estabelece os princípios do SUS com base na Constituição de

1988, onde os princípios doutrinários são a universalidade, integralidade e equidade;

e os princípios organizacionais são a descentralização, regionalização e

hierarquização.

O SUS é considerado um sistema por ser formado por diversas instituições dos

três níveis de governo – União, Estados e Municípios – além do setor privado e

filantrópico, onde são feitos convênios e contratos que garantam a realização de

serviços e ações não podendo em sua pratica ser diferenciados, ou seja, devem ser

6O INAMPS foi criado em 1974 pelo regime militar com o desmembramento Instituto Nacional de Previdência Social (INPS), que hoje é o Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS), era uma autarquia filiada ao Ministério da Previdência e Assistência Social (hoje Ministério da Previdência Social), e tinha a finalidade de prestar atendimento médico aos que contribuíam com a previdência social, ou seja, aos empregados de carteira assinada. O INAMPS dispunha de estabelecimentos próprios,mas a maior parte do atendimento era realizado pela iniciativa privada; os convênios estabeleciam a remuneração por procedimento.

Page 27: ESCOLARIDADE VERSUS CONHECIMENTO DOS DIREITOS E … · deveres dos usuários do SUS. E como objetivos específicos, compreender como tal ... LDB ± Lei de Diretrizes e Bases LOAS

26

um mesmo corpo, atuando como se fosse público. No entanto, é vedada a

destinação de recursos públicos para a subvenção às instituições com fins

lucrativos. Os contratos feitos com as entidades prestadoras de serviço são feitos

mediante contrato de direito público, ou seja, o Estado pode intervir nesta quando os

termos contratuais não estiverem sendo devidamente seguidos.

É considerado único por possuir a mesma filosofia de atuação em todo o país,

além de ser organizado com a mesma lógica. É universal por ter o dever de atender

a todo e qualquer cidadão sem distinções, de acordo com suas necessidades e

gratuitamente em todos os níveis de assistência. Deve ainda garantir a equidade nos

atendimentos, sendo assim, busca tratar de forma diferenciada os desiguais,

oferecendo mais a quem mais precisa, para dessa forma, diminuir as desigualdades.

O atendimento integral, estabelecido pelo Artigo 198 da Constituição Federal7 como

também pela Lei 8.080/90 que somada à Lei 8.142/908, recebe a denominação de

Lei Orgânica da Saúde (LOS). Em seu artigo 7º, II da Lei 8.080/90 afirma que o

atendimento integral é definido como o conjunto articulado e contínuo das ações e

serviços preventivos e curativos, individuais e coletivos, exigidos para cada caso em

todos os níveis de complexidade do sistema. Dessa forma, todos tem o direito de ser

atendido desde uma simples consulta, fratura, acesso a exames periódicos e

preservativos, até situações complexas como cirurgias e transplantes, partindo do

princípio em que a saúde deve ser tratada como um todo, não podendo ser dividida

e ainda executada de acordo com ações não apenas individuais, mas também

coletivas, para prevenção e tratamento.

A Constituição Federal de 1988 protegeu amplamente o direito à saúde,

tomando como exemplo disto os artigos 1º que elege como fundamento da

7 O Artigo 198 afirma que as ações e serviços públicos de saúde integram uma rede regionalizada e hierarquizada e constituem um sistema único, organizado de acordo com a descentralização, com direção única em cada esfera de governo; atendimento integral, com prioridade em ações preventivas, sem prejuízo dos serviços assistenciais; participação da comunidade. 8 A Lei 8.142/90 complementa a Lei 8080/90 e define a participação da comunidade como condição necessária para o funcionamento do Sistema Único de Saúde (SUS) além de abranger sobre as transferências intergovernamentais de recursos financeiros na área da saúde. Nela há a inclusão de novos sujeitos sociais (usuários) que agora participam da gestão do SUS através das Conferências de Saúde (ocorrem em todos os níveis) a cada quatro anos, nos Conselhos de Saúde há a paridade, onde os usuários tem metade das vagas. Isso acontece em decorrência da universalização dos direitos sociais e do processo de luta pela democratização do país que acabara de sair do regime militar.

Page 28: ESCOLARIDADE VERSUS CONHECIMENTO DOS DIREITOS E … · deveres dos usuários do SUS. E como objetivos específicos, compreender como tal ... LDB ± Lei de Diretrizes e Bases LOAS

27

República Federativa do Brasil a dignidade da pessoa humana; o 3º que constitui

como objetivo da República a promoção do bem de todos; o 5º que é relativo aos

direitos e garantias fundamentais, assegura a inviolabilidade do direito à vida; e o

6º, onde o direto à saúde é qualificado como direito social.

O SUS integra a Política de Seguridade Social, regulamentado em 1990 pela

Lei Orgânica da Saúde (LOS), mesmo com sua real atuação sendo bem diferente do

que constitucionalmente é estabelecido, busca estar em consonância com o objetivo

constitucional de prover a saúde integral, hierarquizada e universalizada a todos os

brasileiros, desenvolvendo diversas políticas nos mais diversos âmbitos. Acabou se

consolidando como espaço destinado aos que não tem acesso aos sistemas

privados.

A Política de Seguridade Social é um conjunto de políticas públicas que visa

dar assistência em variadas situações. É dividida em previdência social, assistência

social e saúde. A previdência social dispõe de assistência àqueles que foram

contribuintes, provendo subsistência ao trabalhador, caso este esteja impossibilitado

de trabalhar; a assistência social é voltada para o atendimento das necessidades

básicas do indivíduo, onde pode-se destacar diversos auxílios, programas e medidas

voltadas para a família, maternidade, idoso, amparo à crianças e adolescentes,

inserção e integração ao mercado de trabalho, entre outros. Dessa forma, a

assistência social destina-se aqueles que não possuem condições de prover seu

próprio sustento, ou seja, deve ser assegurado mesmo que não contribua à

Previdência. Já a saúde é oferecida a todos que dela necessitem, é gratuita e assim

como a assistência, independe do usuário ter contribuído à Previdência Social.

A Lei Federal n.º 8.142 instituiu que, o Sistema Único de Saúde – SUS e

tornou-se, assim, o sistema integrado de assistência à saúde garantido pelo Estado

brasileiro. A responsabilidade pela administração do SUS foi atribuída ao Ministério

da Saúde, mas as secretarias de saúde a nível estadual e municipal, e os centros de

pesquisa sobre saúde também são parte integrante do sistema. O sistema de

financiamento não foi definido, embora ficasse clara a responsabilidade dos três

níveis de Estado, com ênfase na União.

Fica a cargo do Estado não apenas regulamentar, fiscalizar e planejar as ações

e serviços de saúde, mas também prestar serviços necessários no âmbito federal,

estadual e municipal.

Page 29: ESCOLARIDADE VERSUS CONHECIMENTO DOS DIREITOS E … · deveres dos usuários do SUS. E como objetivos específicos, compreender como tal ... LDB ± Lei de Diretrizes e Bases LOAS

28

O Conselho de Saúde, ainda segundo a Lei, atua na formulação de

estratégias e no controle e execução da política de saúde na instância

correspondente, inclusive nos aspectos econômicos e financeiros. Sendo a

representação dos usuários, nos Conselhos de Saúde e nas Conferências, paritária

ao conjunto dos demais segmentos.

No terreno das políticas públicas, a existência de órgãos colegiados setoriais

vinculados ao Executivo não é fenômeno novo no Brasil nem, tampouco, exclusivo

da área da saúde. Como já vimos anteriormente, desde a criação das CAPs., havia

a participação de setores da sociedade nos órgãos de gestão. Eram conselhos

mistos onde trabalhadores, patrões e burocratas concentravam interesses.

Não há na história do Brasil nada que se assemelhe aos Conselhos de Saúde

da atualidade, seja pela representatividade social que expressam, seja pela gama de

atribuições e poderes legais de que estão investidos, ou pela extensão em que estão

implantados por todo o país, nas três esferas de governo.

Ao que diz respeito os princípios organizacionais, o SUS é descentralizado

levando em consideração que o cidadão deve ser atendido no órgão mais próximo,

sendo assim, todas as ações e serviços que atendem a população de um município

devem ser municipais; as que atingem vários municípios devem ser estaduais e

aquelas que são relacionadas a todo o território nacional devem ser federais.

Deve ser regionalizado já que nem todos os municípios conseguem atender

toda a demanda de problemas na saúde, e ainda obedecer uma hierarquia que

estabelece que as questões menos complexas devem ser atendidas nas unidades

básicas de saúde, passando por unidades especializadas, hospital geral e

posteriormente o hospital especializado. É organizado de maneira racional, fazendo

com que cada região ofereça serviços e ações diferenciadas de acordo com a

realidade local e a disponibilidade de recursos, objetivando solucionar os problemas

mais freqüentes através de técnicas adequadas, eliminando o desperdício para que

os recursos públicos sejam aplicados da melhor maneira.

Com o SUS, a expectativa de vida da população brasileira aumentou, e foram

diminuídas a mortalidade e desnutrição infantil, doenças como varíola e poliomielite

foram eliminadas, a tuberculose foi controlada, e outras como tétano e sarampo já

podem ser prevenidas com vacinação. Também distribui preservativos, realiza

campanhas educativas e ações de vigilância sanitária de alimentos e medicamentos.

Page 30: ESCOLARIDADE VERSUS CONHECIMENTO DOS DIREITOS E … · deveres dos usuários do SUS. E como objetivos específicos, compreender como tal ... LDB ± Lei de Diretrizes e Bases LOAS

29

Buscando melhorar o atendimento, o SUS ampliou a atenção primária à saúde,

isto é expresso pelo Programa Saúde da Família (PSF) e pelas campanhas de

vacinação, não deixando de lado os de alta complexidade, como por exemplo, o

Programa de Combate à Aids que tido como modelo internacionalmente.

A Saúde da Família é entendida como uma estratégia de reorientação do modelo assistencial, operacionalizada mediante a implantação de equipes multiprofissionais em unidades básicas de saúde. Estas equipes são responsáveis pelo acompanhamento de um número definido de famílias, localizadas em uma área geográfica delimitada. As equipes atuam com ações de promoção da saúde, prevenção, recuperação, reabilitação de doenças e agravos mais freqüentes, e na manutenção da saúde desta comunidade (Ministério da Saúde)

Em 1988, com a criação do SUS, princípios são afirmados, como a

universalidade, integralidade e equidade na saúde. Mesmo com os avanços

acumulados no que diz respeito aos princípios norteadores do SUS, à

descentralização da atenção e da gestão, o mesmo ainda enfrenta diversos

problemas, como são expressos na HumanizaSUS. Um dos problemas mais comuns

é o fato do sistema público de saúde ser burocratizado e verticalizado; o baixo

investimento na qualificação dos trabalhadores, especialmente no que se refere à

gestão participativa e ao trabalho em equipe, dificultando uma qualidade no

atendimento que muitas vezes poderia ser melhor; desrespeito aos direitos dos

usuários, entre outros.

A Política Nacional de Humanização foi criada em 2003 para efetivar os

princípios do SUS no cotidiano das práticas de atenção e gestão. Teve como

princípios norteadores a valorização da dimensão subjetiva e social em todas as

práticas de atenção e gestão no SUS, fortalecendo o compromisso com os direitos

do cidadão, destacando-se o respeito às questões de gênero, etnia, raça, orientação

sexual e às populações específicas (índios, quilombolas, ribeirinhos, assentados,

etc.); também objetiva o fortalecimento do trabalho em equipe multiprofissional;

apoio à construção de redes cooperativas, solidárias e comprometidas com a

produção de saúde e com a produção de sujeitos, entre outros.

O que mais dificulta o atendimento em excelência no SUS, são problemas

conhecidos em toda a realidade da saúde brasileira, ou seja, as dificuldades de

acesso, como longas filas para consultas, exames e cirurgias; o déficit de vagas

Page 31: ESCOLARIDADE VERSUS CONHECIMENTO DOS DIREITOS E … · deveres dos usuários do SUS. E como objetivos específicos, compreender como tal ... LDB ± Lei de Diretrizes e Bases LOAS

30

para internação, de médicos, medicação e até mesmo insumos básicos;

profissionais com uma rotina de trabalho excessiva e estressante, onde isto acaba

refletindo no atendimento à população. Acredita-se que tais deficiências são

resultantes de um baixo orçamento destinado ao SUS, onde este ainda por cima é

mal aplicado. Tal fato expressa notoriamente um grande embate atualmente,

Reforma Sanitária versus Privatização.

O modo neoliberal de organizar a produção e distribuição de ações de saúde é que não admite a “regionalização” e a “hierarquização”, posto que seu fundamento organizativo é o mercado é o mercado, a propriedade privada dos meios de trabalho e a ausência de Planejamento global, a não ser de forma muito indireta por meio de incentivos fiscais ou financeiros aos produtores. Podemos constatar com facilidade que no modo privado de produzir atenção à saúde a desigualdade e a exclusão tem caráter obrigatório, decorrentes dos próprios estímulos à concorrência e aos mecanismos de acesso típicos do mercado. O mesmo, no entanto, não é verificado diretamente em consequência da “prática clínica”. O Pronto-Atendimento (a consultação?) foi um artifício, criado e desenvolvido em grande escala no Brasil, com objetivo de viabilizar a extensão de cobertura sem o Estado ver-se obrigado a criar um Sistema Único e Público de Saúde, como aconteceu em quase toda a Europa Ocidental a partir dos anos trinta. (CAMPOS, 1999, 86)

Percebe-se a necessidade de uma maior descentralização dos atendimentos,

tendo em vista que muitas ações e serviços executados deveriam ficar a cargo dos

municípios, acarretando assim, a famosa superlotação nos principais hospitais. Até

mesmo a regionalização desses serviços já traria grandes benefícios, pois sabe-se

que as questões menos complexas devem ser atendidas nas unidades básicas de

saúde, passando pelas unidades especializadas, pelo hospital geral até chegar ao

hospital especializado. Ainda que com deficiências, o atendimento no SUS é sim

eficaz e eficiente, pois presta serviços de qualidade e apresenta soluções quando

procurado.

As Normas Operacionais Básicas (NOB) definem as estratégias e

movimentos táticos, que orientam a operacionalidade do SUS, visando aperfeiçoar

sua gestão viabilizando a implantação do mesmo. Elas surtiram efeitos positivos

como um crescimento da oferta de serviços municipais, da capacidade de estados e

municípios, e da transferência de recursos federais para os mesmos. Redefinia os

Page 32: ESCOLARIDADE VERSUS CONHECIMENTO DOS DIREITOS E … · deveres dos usuários do SUS. E como objetivos específicos, compreender como tal ... LDB ± Lei de Diretrizes e Bases LOAS

31

papéis de cada esfera do governo e tem como principal objetivo disciplinar o

processo de implementação do SUS, no entanto, houve problemas com relação à

gestão, a barreira imposta ao acesso aos usuários, à baixa qualidade dos serviços,

entre outros. Foram criadas a NOB 01/919, a NOB 01/9310, a NOB 01/9611. Para que

isso fosse superado foi instituída a NOB/2001, que é denominada Norma

Operacional de Assistência à Saúde (NOAS), no dia 26 de janeiro de 2001. Não é

uma norma operacional do SUS, mas de assistência à saúde que assegura o

comando único sobre o sistema, incorpora a micro regionalização, amplia a atenção

básica, instrumenta e regula a relação entre os gestores e permite maior visibilidade

aos processos de pactuação de referências.

2.3 OS DIREITOS E DEVERES DOS USUÁRIOS DO SUS

Sabe-se que de acordo com a Lei 8.080/90 a saúde passa a ter como

determinantes aspectos como alimentação, moradia, saneamento básico, renda

entre outros. Dessa forma, a saúde passa a necessitar não apenas de serviços que

estejam voltados ao tratamento de doenças, mas também depende de investimentos

voltados para ações e políticas que visem à promoção da saúde.

É notável que a promoção da saúde fica a cargo não só do Estado, mas

também do indivíduo e da sociedade civil organizada agindo conjuntamente. O

Estado desenvolve políticas e ações que objetivam o desenvolvimento econômico,

acesso ao trabalho, terra, educação, entre outros. Já a sociedade civil organizada

participa politicamente dos espaços de controle social (conferências e conselhos de

9 Criou a Autorização de internação hospitalar (AIH), o Sistema de Informação Hospitalar (SIH), o Fator de Estímulo à Municipalização (FEM), além de criar Conselhos Estaduais e Municipais. 10 Definiu procedimentos e instrumentos operacionais visando ampliar e aprimorar as condições de gestão, buscando efetivar um comando único nas três esferas do governo. Com ela houve avanços no processo de descentralização das ações e dos serviços de saúde. 11 Busca aperfeiçoar a gestão dos serviços de saúde no Brasil, fazendo o município passar a ser responsável pelo atendimento e necessidades da demanda em seu território. São duas as gestões municipais: Gestão Plena de Atenção Básica e Gestão Plena do Sistema Municipal, elas recebiam recursos de forma regular e automática para o atendimento básico.

Page 33: ESCOLARIDADE VERSUS CONHECIMENTO DOS DIREITOS E … · deveres dos usuários do SUS. E como objetivos específicos, compreender como tal ... LDB ± Lei de Diretrizes e Bases LOAS

32

saúde) além da realização de projetos voltados à promoção da saúde, geralmente

através de Organizações Não-Governamentais (ONG’s). No que diz respeito ao

indivíduo, este fica responsável por manter um modo de vida saudável através de

uma dieta equilibrada, evitar o consumo de substâncias que prejudiquem a saúde,

praticar exercícios físicos regularmente, entre outros.

No entanto, o fato de uma necessidade de organização vinda da sociedade

civil demonstra contrariedade ao que é idealizado pelo SUS, partindo do princípio de

que o Estado deve assegurar direitos à saúde a toda população, mas, já que na

prática isto não ocorre, a mesma vê-se obrigada a organizar-se em busca de

respostas às suas necessidades. Porém, a consciência dessa necessidade não está

em toda a população,

Toda a população brasileira é considerada usuária do SUS, acrescido dos

estrangeiros residentes de forma legal no Brasil. Aqueles que possuem planos e

seguros de saúde privados tem, as despesas pagas pelas empresas responsáveis,

no entanto, podem utilizar o SUS caso desejem ou necessitem.

Foi elaborada a Carta dos Direitos dos usuários do SUS em um consenso

entre os governos federal, estaduais e municipais e pelo Conselho Nacional de

Saúde, ela contém informações acerca dos direitos que os usuários possuem

quando procuram um atendimento na saúde, e é reunida em seis princípios básicos

de cidadania visando assegurar ao cidadão que este atendimento seja feito com

dignidade, seja no setor público ou privado, conforme mostra a tabela abaixo:

1° Princípio Estabelece que todo cidadão tem direito de ser atendido com ordem

e organização, para dessa forma assegurar que aquele que estiver

em estado mais grave ou maior sofrimento deve ser atendido

primeiro, devendo também ser garantido a todos o fácil acesso aos

postos de saúde, em especial para portadores de deficiência,

gestantes e idosos;

2º Princípio Afirma que todo cidadão tem o direito de ter um atendimento de

qualidade, recebendo informações de maneira clara acerca do seu

estado de saúde, assim como seus parentes além do direito à

anestesia e remédios;

3º Princípio Estabelece um atendimento humanizado e sem nenhuma

discriminação, seja de raça, cor, idade, sexo, nível social etc;

4º Princípio Afirma que todo cidadão deve ter respeitados seus direitos de

paciente, podendo ver seu prontuário sempre que quiser, também a

Page 34: ESCOLARIDADE VERSUS CONHECIMENTO DOS DIREITOS E … · deveres dos usuários do SUS. E como objetivos específicos, compreender como tal ... LDB ± Lei de Diretrizes e Bases LOAS

33

liberdade de permitir ou recusar qualquer procedimento médico,

assumindo a responsabilidade por isso e não pode ser submetido a

nenhum exame sem saber. Caso haja reclamações, o SUS possui

espaços que permitem sugestões e criticas – Ouvidorias e os

Conselhos de Gestores e Saúde;

5º Princípio O quinto afirma que além de direitos, o cidadão também tem deveres

quando busca o atendimento;

6° Princípio Estabelece que não apenas usuários, mas também profissionais e

gestores da saúde, devem cumprir o que esta estabelecido na Carta

de Direito aos Usuários da Saúde.

Quadro 1: Direitos dos Usuários do SUS Fonte: Carta dos Direitos dos Usuários da Saúde

De acordo com a legislação vigente, os usuários do SUS tem o direito de ter

acesso ser tratado pelos meios adequados à bens e serviços indispensáveis à

promoção, proteção e recuperação da saúde; de ser atendido gratuitamente; ter sua

autonomia preservada na defesa da integridade física e moral; ter igualdade da

assistência à saúde, sem preconceitos ou privilégios; ter acesso à informações

quanto ao potencial dos serviços de saúde; decidir receber ou não os cuidados

propostos; Ser tratado pelos meios adequados, humanamente e com presteza,

capacidade técnica, privacidade, respeito e educação; ter a confidencialidade de

seus dados pessoais preservada, entre outros; ser informado sobre a sua situação

de saúde, as alternativas possíveis de tratamento e a evolução provável de seu

estado; receber ou recusar assistência religiosa, psicológica e social, de acordo com

sua livre escolha e credo; reclamar sobre a forma como é tratado, aos setores

competentes; receber indenizações por prejuízos sofridos, se comprovados e

motivados por imprudência, negligência ou imperícia dos profissionais de saúde;

constituir entidades que representem e defendam os seus interesses, com relação à

saúde; ter emitida a Declaração de Nascido Vivo e a Declaração de Óbito, entre

outros.

Da mesma forma que possui direitos, o usuário também possui deveres,

onde ganha destaque a necessidade que este adote medidas que contribuam para a

promoção de sua saúde; cadastrar-se nos serviços de saúde e ações de vigilância

(pré-natal, acompanhamento do crescimento e desenvolvimento da criança, vacina

etc); manter seu domicílio livre de vetores (mosquitos, ratos etc); contribuir para a

limpeza urbana; respeitar áreas de preservação ambiental; preservar as unidades de

Page 35: ESCOLARIDADE VERSUS CONHECIMENTO DOS DIREITOS E … · deveres dos usuários do SUS. E como objetivos específicos, compreender como tal ... LDB ± Lei de Diretrizes e Bases LOAS

34

saúde; exercer o controle social, através da participação política no âmbito do SUS,

via Conferências e Conselhos de Saúde, entre outras instâncias; denunciar aos

órgãos competentes irregularidades identificadas no SUS; denunciar à Vigilância

Sanitária produtos alimentares, água, serviços e ambientes de trabalho que estão

fora das especificações legais.

Além disso, o usuário ainda deve ter conhecimento acerca dos seus direitos e

responsabilidades e funcionamento do SUS, participando da avaliação da qualidade

dos serviços e cuidados que lhe são prestados, denunciando irregularidades,

negligência ou maus tratos em qualquer serviço da rede. Deve também participar

das Conferências, Conselhos de Saúde12 ou movimentos populares.

12 É um espaço de representação e de participação social, que tem o objetivo de acompanhar a execução da política de saúde e de fiscalizá-la, inclusive quanto à aplicação dos recursos financeiros. O Conselho tem caráter permanente e poder de decisão. É composto por 50% de representantes de usuários; 50% de representantes de trabalhadores da saúde, do governo e prestadores de serviços ao SUS.

Page 36: ESCOLARIDADE VERSUS CONHECIMENTO DOS DIREITOS E … · deveres dos usuários do SUS. E como objetivos específicos, compreender como tal ... LDB ± Lei de Diretrizes e Bases LOAS

35

3. A EDUCAÇÃO COMO CONDIÇÃO PARA EXISTÊNCIA DA DIGNIDADE DA

PESSOA HUMANA

Inicialmente, há a necessidade de esclarecimento do que seria a dignidade da

pessoa humana, tendo em vista que este é um conceito de difícil compreensão, já

que é uma expressão que implica diversos valores. Entende-se que todo ser

humano é uma pessoa, dotado de personalidade, que possui tanto direitos quanto

deveres, membro de uma sociedade, merecedor de uma existência humana, e não

sub humana como muitas vezes ocorre.

Neste capítulo será vista a forma como o déficit na educação, não só a

escolar, pode afetar o usuário dos serviços da saúde no que diz respeito o

conhecimento que este deveria ter para posteriormente exigir seus direitos, já que

estes, na grande maioria das vezes não são assegurados da forma devida pelo

Estado, deixando assim, a sociedade civil no dever de exigi-los.

3.1 DADOS DA EDUCAÇÃO NO BRASIL

Todo ser humano deve ter condições mínimas para uma vida digna, humana.

Onde estas podem ser entendidas como condições mínimas para seu auto sustento

físico, como também de poder possuir uma vida social, se relacionando com as

pessoas a seu redor, para dessa forma, ser parte da sociedade em que vive.

Em Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas – ONU – foi

proclamada a Declaração Universal dos Direitos Humanos13 – DUDH – que

reconhece a educação como um direito assim como o direito à vida, à liberdade de

opinião e de expressão, ao trabalho, saúde etc. Os direitos humanos, devem ser

inerentes à todos, independente de sua nacionalidade, cor, raça, etnia, classe social,

religião, entre outros.

13Adotada pela ONU em 10 de dezembro de 1948, buscando construir um mundo sob novas

bases, isto se deu em decorrência do fim do período pós-guerra.

Page 37: ESCOLARIDADE VERSUS CONHECIMENTO DOS DIREITOS E … · deveres dos usuários do SUS. E como objetivos específicos, compreender como tal ... LDB ± Lei de Diretrizes e Bases LOAS

36

No Brasil, a educação só foi reconhecida como um direito na Constituição de

1988, onde o Estado passa a ser o responsável pela promoção da educação,

expressa em seu Artigo 205.

Art. 205 A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho. (BRASIL, 1988)

A Constituição Federal de 1988, além de abarcar o princípio da dignidade

humana, ainda reconhece o mínimo existencial. O princípio da dignidade humana

constitui-se como uma norma jurídica, sendo assim, precisa ser respeitado, e caso

não seja, o transgressor estará sujeito a punições. A educação é componente para o

mínimo existencial, ou seja, o indivíduo necessita dela para viver em sociedade.

A Constituição de 1988 e a Lei de Diretrizes e Bases14 – LDB – sanciona o

direito de acesso ao ensino fundamental, obrigatório e gratuito. Esse é considerado

um direito público subjetivo, ou seja, judicialmente, só se pode reivindicar, questionar

a execução do acesso à educação que deveria ser garantida pelo Estado ou pelas

famílias apenas ao que compete o ensino fundamental. Sendo assim, nos

questionamos pelo fato que, como o acesso à educação é direito de todos e dever

do Estado, se este é restringido apenas à um nível de ensino?

Sabe-se que um direito proclamado não significa que este será devidamente

desfrutado. Para que isto ocorra, temos que ir muito além no que diz respeito à

garantia de acesso, permanência e ainda uma qualidade no ensino. Aquela que

entende-se por educação básica, voltada para todos os brasileiros, constitui-se por

ensino infantil, fundamental e médio. Esta ainda necessita de um significativo

aumento nos investimentos, como também em políticas públicas educacionais para

garantir tal acesso igualitário. O Estado deve não apenas garantir o direito à

educação, mas também prover meios para que esta possa ser usufruída.

Além disso, a educação expressa um agravo da exclusão social para aqueles

que não a possuem, tendo em vista que também ocasiona descriminação. Sendo

14Lei 9394/96, é a lei orgânica geral da educação brasileira, pois dita as diretrizes e bases

para a organização do sistema educacional com base na Constituição Federal de 1988.

Page 38: ESCOLARIDADE VERSUS CONHECIMENTO DOS DIREITOS E … · deveres dos usuários do SUS. E como objetivos específicos, compreender como tal ... LDB ± Lei de Diretrizes e Bases LOAS

37

assim, entende-se que a educação é determinante para que direitos sejam

resguardados, e isto não restringe-se apenas à ela, mas também à boas condições

de saúde, segurança, participação social etc.

Cristovam Buarque (2007) afirma que o modelo educacional brasileiro acaba

por dividir a população, pois não oferece chances iguais para todos, ocasionando

assim, uma sociedade dividida. De acordo com o autor, só a educação é capaz de

integrar socialmente as massas excluídas, partindo de uma educação de base.

Quando analisa-se a realidade educacional no Brasil, percebe-se que à

medida que a idade escolar aumenta, a frequência diminui gradativamente, onde,

cada vez mais, há uma redução na quantidade de pessoas frequentando a escola

quando ficam mais velhas, isto significa que, mais de 60% das crianças que iniciam

os estudos não concluem o ensino médio.

No decorrer dos últimos anos e das conquistas sociais, a educação deixou de

ser exclusividade de alguns, para ser necessidade de todos. A necessidade de uma

educação de qualidade passou fazer parte de uma consciência comum de toda a

população, deixando cada vez mais evidente as deficiências de um sistema escolar,

em sua maior parte inadequado para os problemas daqueles que dela necessitam.

Quando fala-se em educação pública, vem à mente escolas compostas por

filas para realização de matrícula, prédios superlotados, poucos professores para a

demanda imposta etc. Além de grande parte não possuir a qualidade necessária,

soma-se a isso não serem suficientes em termos de quantidade.

A educação não pode ficar restringida à um método meramente técnico-

operativo, ou seja, ler, escrever e contar, deve ir além e voltar-se também para

hábitos de sociabilidade, de pensamento, reflexão e de uma sensibilidade aplicada

tanto aos seus direitos, quanto aos coletivos. Não pode-se deixar de mencionar

também a deficiência da educação no que diz respeito o preparo dos professores e

demais profissionais da referida área, expressando-se em baixos salários,

dificuldade de acesso ao nível superior. Sendo esta última resultante tanto de uma

deficiência na formação como um todo, aliada a um déficit no número de vagas.

A igualdade dos indivíduos baseia-se em que devem ser dadas oportunidades

iguais de desenvolvimento e participação social, não baseia-se em uma igualdade

psicológica. Sendo o homem um ser social, faz-se necessário que este esteja

integrado à sociedade, quando isto não ocorre, significa que este pode estar vivendo

Page 39: ESCOLARIDADE VERSUS CONHECIMENTO DOS DIREITOS E … · deveres dos usuários do SUS. E como objetivos específicos, compreender como tal ... LDB ± Lei de Diretrizes e Bases LOAS

38

em situação desumana, ao menos socialmente, não necessariamente significa dizer

que ele não possui meios de suprir necessidades básicas como a alimentação e

moradia por exemplo.

(...) a educação serão processo pelo qual o indivíduo se formará para a sociedade plural e múltipla a que irá pertencer, temos de fazer as instituições educativas exemplos de instituições integradas, humanas e pessoais, nas quais iniciemos o educando na experiência de integração, graças a um meio que guarde as qualidades do meio ainda pequeno, mais simples e mais puro, em oposição ao grande meio complexo, tumultuoso e divergente em que ele irá viver e no qual ingressará com o viático de sua formação escolar. (TEIXEIRA, 1977, 171)

Historicamente, a educação brasileira é marcada por avanços e retrocessos.

Foi inicialmente realizada pelos jesuítas, voltava-se para a catequese dos índios, e

ensinava as primeiras letras aos filhos dos colonos, tendo em vista que esta era uma

colônia rural, não dava-se a devida importância para o aprendizado de fato. Os

jesuítas trouxeram não apenas a religião, a moral, os costumes, mas também,

métodos pedagógicos. Para as elites havia a possibilidade de estudar na Europa.

Quando os jesuítas foram expulsos do Brasil, não houve mudanças.

Com a chegada da família real ao país em 1808, a educação continuava a ser

um privilégio das camadas mais elitizadas, no entanto, foi nesse período que

criaram-se cursos considerados as primeiras faculdades, conforme já mencionado

no primeiro capítulo deste trabalho.

Quando os primeiros imigrantes chegaram ao Brasil em decorrência da

revolução industrial, houve a necessidade e uma maior preocupação com a escola,

embora esta só passe a ser aprimorada na década de 1960, resultante de

movimentos populares e sindicais. No entanto, estes foram combatidos e

exterminados com o Governo Militar em 1964. Foi no decorrer deste período que foi

sancionada a Lei de Diretrizes e Bases – LDB - 5.692/71 que normatizava o sistema

escolar, mas porém deixava a escola dependente do interesse norte-americano,

decorrente dos acordos MEC-Usaid15, iniciados a partir de 1964.

15 Acordo estabelecido entre o Ministério da Educação – MEC – e o United StatesAgency for Internacional Development – USAID – objetivando reformar o ensino brasileiro, tendo como

Page 40: ESCOLARIDADE VERSUS CONHECIMENTO DOS DIREITOS E … · deveres dos usuários do SUS. E como objetivos específicos, compreender como tal ... LDB ± Lei de Diretrizes e Bases LOAS

39

Quando a ditadura militar chegou ao fim, o ensino teve que ser reformulado, e

em 1996 foi promulgada uma nova LDB que rege a educação brasileira até os dias

atuais, caracterizada pelo direito à educação como conhecemos, ou seja, não como

um dever dos pais, estados e municípios, mas como obrigação do Estado de ofertar

condições de acesso e permanência na escola.

A educação formal figura como um direito universal reconhecido pelo Estado

brasileiro em atenção às lutas que compreenderam a educação como uma

estratégia de emancipação da pessoa como contribuidora fundamental para a

construção e formação social do sujeito.

Como já fora mencionado, sabe-se quem nem todos tem condições de ter

acesso e permanecer na escola, como também os três níveis de ensino

(fundamental, médio e superior) não fazem parte dos objetivos de grande parte dos

jovens em idade escolar. No tópico seguinte serão apresentados dados sobre a

educação brasileira.

De acordo com a Cartilha Direito à Educação (2009), a efetivação de tal

direito diminui para pobres, negros, com menos de 6 (seis) e mais de 14 (quatorze)

anos de idade, pessoas que moram na zona rural, portador de alguma deficiência,

que esteja preso, entre outros.

Conforme o relatório As Desigualdades na Escolarização no Brasil realizado

pelo Conselho de Desenvolvimento Social (2007) tem-se como macroproblema para

o melhoramento do sistema educacional brasileiro, o fato do nível de escolaridade

da população ser baixo e desigual, e isto ocorre em decorrência de problemas como

a persistência do analfabetismo, insuficiências e desigualdades nas etapas da

educação básica, na educação profissional e no ensino superior.

Este fato é expresso por dados fornecidos pela Pesquisa Nacional por

Amostra de Domicílio16 – PNAD – de 2006, onde é afirmado que a população

brasileira de 15 anos ou mais, tem em média 7,1 anos de estudo, ficando abaixo do

que é estabelecido pela Lei 5.962/71, que é 8 (oito) anos, no entanto, isto pode

principais mudanças a fusão entre o ensino primário e o ginasial, resultando no conhecido primeiro grau, fundindo também o curso científico com o básico, resultando no segundo grau. O ensino superior ficou conhecido como terceiro grau. Este regime retirava do currículo escolar disciplinas como filosofia, latim e educação política, além de diminuir a carga horária em diversas outras. 16É uma pesquisa feita pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE – que

investiga diversas características econômicas da sociedade, como educação, trabalho, previdência social, habitação, saúde, nutrição etc.

Page 41: ESCOLARIDADE VERSUS CONHECIMENTO DOS DIREITOS E … · deveres dos usuários do SUS. E como objetivos específicos, compreender como tal ... LDB ± Lei de Diretrizes e Bases LOAS

40

variar de acordo com as regiões, com os habitantes de zonas rurais e urbanas, entre

brancos e negros e pobres e ricos.

MÉDIA DE ANOS DE ESTUDO

20% mais pobres – 4,7 anos 20% mais ricos – 10,3 anos

Habitantes de áreas rurais – 4,3 anos Habitantes de áreas urbanas – 7,6 anos

Região Nordeste – 5,8 anos Região Sudeste – 7,8 anos

Pop. negra/parda – 6,4 anos Pop. branca - 8,1 anos Quadro 2: Média de anos de estudo

Fonte: PNAD, 2006

O estudo “Brasil em Números” (2004), publicado pelo IBGE, demonstra que

houve um aumento na taxa de alfabetização; crescimento do índice de alunos

matriculado no ensino médio e em faculdades; aumento da quantidade de alunos

que concluem o nível fundamental, médio e superior; criação de mais escolas de

ensino fundamental, médio e superior; queda nos índices de evasão escolar e

menos repetência.

Estabelecimentos de Ensino por Níveis - 2003

Estabelecimento de Ensino

Públicos Privados Total

Pré- Escolar 68.666 26.075 94.741

Fundamental 149.968 19.107 169.075

Médio 15.312 6.668 21.980

Superior 195 1.442 1.637

Quadro 3: Estabelecimentos de Ensino por Níveis – 2003 Fonte: Adaptado de “Brasil em Números 2004”, IBGE

Ainda que não devamos deixar de salientar a importância de uma melhor

qualidade da educação, no entanto, quando falamos de educação com finalidade em

um melhoramento na qualidade da participação social dos usuários da saúde ou até

mesmo em qualquer outra área voltada para direitos sociais, não podemos nos

restringir apenas à educação em âmbito escolar, já que esta, na atual realidade

brasileira, fica geralmente resumida à aspectos emergenciais, ou seja, muitas vezes

volta-se apenas a ler, escrever, calcular etc, deixando de lado a construção de um

sujeito com um olhar mais crítico acerca dos problemas inerentes à sociedade que o

cerca e o atinge de variadas formas. Sejam elas, a deficiência estrutural na própria

Page 42: ESCOLARIDADE VERSUS CONHECIMENTO DOS DIREITOS E … · deveres dos usuários do SUS. E como objetivos específicos, compreender como tal ... LDB ± Lei de Diretrizes e Bases LOAS

41

educação, saúde, previdência, trabalho, lazer, moradia, entre outros, fazendo com

que o indivíduo não tenha entendimento acerca da dinâmica que ocasiona tais

dificuldades nos mais variados âmbitos da vida social.

No tópico a seguir, será iniciada uma discussão que irá relacionar a saúde e a

educação, ressaltando como a educação pode contribuir tanto em aspectos

preventivos quanto aspectos resolutivos com relação a variados problemas que

possam surgir na saúde pública.

3.2 A RELAÇÃO ENTRE SAÚDE E EDUCAÇÃO

A educação deve ser considerada o mais importante dentre os direitos

sociais, partindo do princípio que ela é subsídio para compreensão de todos os

outros direitos, ou seja, além de ser um direito, é também elemento constitutivo do

ser humano, podendo ser imprescindível para sua realização enquanto sujeito.

A educação está intrinsecamente ligada à uma conscientização que permite a

construção de sujeitos sociais críticos, possibilitando assim, uma atuação efetiva na

sociedade para dessa forma, buscar alterar sua própria história.

Na saúde, esta deve ser uma ação que busque contribuir com a afirmação do

SUS enquanto política pública, como também ampliar o entendimento por direito à

saúde da população.

O Caderno de Participação Popular e Saúde (2007), afirma que seria de

grande importância caso a participação social fosse ampliada através de ações

educacionais que visassem uma emancipação do indivíduo, uma maior participação,

como também a consciência de que este é um sujeito de direitos, partindo do

princípio da integralidade do SUS que visa a atenção integral em todos os níveis do

sistema, ou seja, estão incluídos práticas, vivências, saberes, entre outros. Isto

ocorre através da criação de vínculos entre a ação socioassistencial e o pensar e

fazer da população.

(...) a Educação Popular tem significado um instrumento fundamental na construção histórica de atenção integral à saúde, na medi da em

Page 43: ESCOLARIDADE VERSUS CONHECIMENTO DOS DIREITOS E … · deveres dos usuários do SUS. E como objetivos específicos, compreender como tal ... LDB ± Lei de Diretrizes e Bases LOAS

42

que se dedica à ampliação da inter-relação entre as diversas profissões, especialidades, serviços, doentes, familiares, vizinhos e organizações sociais locais envolvidos num problema específico de saúde, fortalecendo e reorientando suas práticas, saberes e lutas. Esta redefinição da prática médica se dá, não a partir de uma nova tecnologia ou de um novo sistema de conhecimento, como as chama das medicinas alternativas pretendem ser, mas pela articulação de múltiplas, diferentes e até contraditórias iniciativas presentes em cada problema de saúde, em um processo que valoriza principalmente os saberes e as práticas dos sujeitos usualmente desconsiderados devido à sua origem popular. (MS, 2007).

Teoricamente a participação popular é defendida e assegurada legalmente,

sendo expressa por espaços como Conselhos e Conferências de Saúde, no entanto,

na prática, tal participação muitas vezes não se dá de maneira efetiva, já que essas

instâncias, em grande parte voltam-se para questões gerenciais, e acabam não

conseguindo implementar a mesma participação popular no âmbito cotidiano do

sistema. Como se não bastasse, as dificuldades já existentes, ainda somam-se ao

modelo biomédico tradicional que ao invés de questionar o modelo vigente, reforça

ainda mais a forma com que as deficiências no modelo de saúde estruturam-se.

(...) Educação Popular se refere não à característica de sua clientela, mas à perspectiva política desta concepção de educação: a construção de uma sociedade em que as classes populares deixem- se ser ato res subalternos e explorados para serem sujeitos altivos e importantes na definição de suas diretrizes culturais, políticas e econômicas. A experiência dos movimentos sociais tem mostra do que este modo de conduzir o processo educativo pode ser aplicado com sucesso na formação profissional. (MS, 2007).

Sendo assim, seria de grande importância também que os profissionais da

saúde passassem por uma educação voltada para uma perspectiva de ampliar a

gestão participativa do SUS.

No decorrer da história temos exemplos de como a educação em saúde

auxiliou na prevenção de doenças. Quando epidemias e endemias como a febre

amarela assolavam a cidade do Rio de Janeiro, foi elaborado um projeto que

buscava mostrar formas de higienização, em especial nos bairros mais pobres, havia

Page 44: ESCOLARIDADE VERSUS CONHECIMENTO DOS DIREITOS E … · deveres dos usuários do SUS. E como objetivos específicos, compreender como tal ... LDB ± Lei de Diretrizes e Bases LOAS

43

ainda, neste mesmo período, a polícia sanitária, que combatia a febre amarela e a

tuberculose.

A proposta da educação relaciona-se ao direito à saúde situando-se no

movimento acerca do direito, bem como a condições de compreensão da política

pública através da participação e do controle social.

A atenção em saúde não deve ser vista apenas sob uma percepção básica,

voltada para organização e manutenção dos serviços de saúde, devendo também

melhorar os serviços ofertados, democratizar conhecimentos, ampliar a participação

da população etc.

A promoção da saúde tem a capacidade de ocasionar mudanças

comportamentais de diversas camadas da sociedade, já que uma comunidade

organizada pode ajudar na implementação de ações e programas educativos que

contribuam com a melhoria nas condições de saúde. Já a prevenção em saúde,

pode anular uma doença antes que ela ocorra, como também, interromper ou

atrasar a progressão da mesma.

Em 2005 o Ministério da Saúde definiu a Agenda de Compromisso pela

Saúde que agregava três eixos: o Pacto em Defesa do SUS, o Pacto em Defesa da

Vida e o Pacto de Gestão. Destacando-se no contexto desse trabalho o Pacto em

Defesa da Vida que abrange um conjunto de compromissos sanitários que devem

tornar-se prioridades nos três níveis de governo, cada um com respectivas

responsabilidades. Dando também grande importância para o acesso e qualidade

dos serviços ofertados pelo SUS, enfatizando o fortalecimento e qualificação da

Saúde da Família, como também promover a informação, a educação em saúde

voltada para a promoção de atividades físicas, hábitos saudáveis, controle de

possíveis vícios como o tabagismo e álcool, e cuidados com o processo de

envelhecimento.

A promoção da saúde é considerada uma estratégia que busca a melhoria da

qualidade de vida da população, isto ocorre através de uma gestão compartilhada

entre usuários, movimentos sociais, trabalhadores de variados setores entre outros.

Em 30 de março de 2006 foi aprovada a Política Nacional de Promoção à Saúde –

PNPS – que dá diretrizes e aponta estratégias de organização das ações da

promoção da saúde nos três níveis do SUS.

Page 45: ESCOLARIDADE VERSUS CONHECIMENTO DOS DIREITOS E … · deveres dos usuários do SUS. E como objetivos específicos, compreender como tal ... LDB ± Lei de Diretrizes e Bases LOAS

44

A saúde, sendo uma esfera da vida de homens e mulheres em toda sua diversidade e singularidade, não permaneceu fora do desenrolar das mudanças da sociedade nesse período. O processo de transformação da sociedade é também o processo de transformação da saúde e dos problemas sanitários. Nas últimas décadas, tornou-se mais e mais importante cuidar da vida de modo que se reduzisse a vulnerabilidade ao adoecer e as chances de que ele seja produtor de incapacidade, de sofrimento crônico e de morte prematura de indivíduos e população. Além disso, a análise do processo saúde-adoecimento evidenciou que a saúde é resultado dos modos de organização da produção, do trabalho e da sociedade em determinado contexto histórico e o aparato biomédico não consegue modificar os condicionantes nem determinantes mais amplos desse processo, operando um modelo de atenção e cuidado marcado, na maior parte das vezes, pela centralidade dos sintomas. (MS, 2010)

Esse processo requer a participação da população visando sua vida cotidiana,

e não apenas aquelas que já correm risco de adoecer. Ampliando o entendimento de

saúde para uma busca de bem-estar em aspectos físicos, mentais, ambientais,

emocionais e sócio-ecológicos. Esta compreensão passa pela garantia do

desenvolvimento de condições educacionais para fazê-lo.

O reordenamento político da saúde no Brasil e no Rio Grande do Norte passa

pela gestão que os conselhos de saúde fazem da política pública. Neste sentido, a

educação formal e outras formas de acesso ao conhecimento, especialmente dos

direitos sociais, são imprescindíveis para que a classe trabalhadora e os usuários do

SUS exerçam com condições a participação e o controle social.

Para que a situação da saúde pública brasileira mudasse seria necessário

uma efetiva descentralização dos atendimentos visando evitar ou ao menos suavizar

a famosa superlotação tão comum não só no HMWG/PSCS, mas na maioria dos

hospitais da rede pública, e até mesmo privada. Até mesmo a regionalização desses

serviços já traria grandes benefícios, pois sabe-se que as questões menos

complexas devem ser atendidas nas unidades básicas de saúde, passando pelas

unidades especializadas, pelo hospital geral até chegar ao hospital especializado.

No capítulo a seguir será discorrida a atuação do Serviço Social no âmbito do

HMWG/PSCS frente os Parâmetros para Atuação na Saúde, dando destaque para

as atividades que este desenvolve nesta instituição.

Page 46: ESCOLARIDADE VERSUS CONHECIMENTO DOS DIREITOS E … · deveres dos usuários do SUS. E como objetivos específicos, compreender como tal ... LDB ± Lei de Diretrizes e Bases LOAS

45

4. SERVIÇO SOCIAL E SAÚDE: A EXPERIÊNCIA DO HOSPITAL

MONSENHOR WALFREDO GURGEL/PRONTO SOCORRO CLÓVIS

SARINHO

Neste capítulo será discorrida uma análise acerca da inserção e atuação do

Serviço Social no âmbito da saúde, mais especificamente, a experiência adquirida

em campo de estágio, realizado no Hospital Monsenhor Walfredo Gurgel/Pronto

Socorro Clóvis Sarinho17, no entanto, antes de iniciarmos a apreciações acerca do

Serviço Social, é importante tecermos algumas considerações acerca do

HMWG/PSCS.

O Hospital Monsenhor Walfredo Gurgel, foi inaugurado no dia 14 de março de

1971, mas suas atividades iniciaram-se apenas no dia 31 de março de 1973. O

Pronto Socorro Dr. Clóvis Sarinho foi inaugurado em 05 de setembro de 1977, onde

este conjunto passou a ser chamado de Complexo Hospitalar Monsenhor Walfredo

Gurgel, com a missão de prover atendimentos com ênfase na urgência e

emergência pelo SUS, “promovendo a dignidade da pessoa humana, preservando-

lhe e resgatando-lhe a saúde, oferecendo-lhe atendimento de boa qualidade,

universal e igualitário, nas áreas de trauma e emergência”.

O SUS no HMWG/PSCS tem como missão promover a descentralização para

os municípios dos serviços e das ações de saúde, bem como, acompanhar,

controlar e avaliar estas ações, proporcionando apoio técnico e financeiro,

coordenando o processo saúde-doença, na perspectiva da proteção e recuperação

da saúde individual e coletiva.

O HMWG/PSCS é a maior unidade em atendimento de urgência e

emergência do Rio Grande do Norte, este é o único hospital estadual da região

metropolitana de Natal a manter, com exclusividade, equipes para atendimento

Neurológico; Neurocirúrgico; Ortopédico; Cirurgia Plástica / Atendimento a

Queimados; Nefrologia; Urologia; Cirurgia Vascular; Buco-Maxilo-Facial;

Otorrinolaringologia; Oftalmologia; Cirurgia Torácica para retirada de corpo estranho

17 O Complexo Hospitalar Monsenhor Walfredo Gurgel, localiza-se na Avenida Senador Salgado Filho, S/N, no bairro de Tirol, Natal/RN. Com telefones para contato (84) 3232 7530 ou 3232 7532, e ainda pelo [email protected], ou pelo portal www.walfredogurgel.rn.gov.br.

Page 47: ESCOLARIDADE VERSUS CONHECIMENTO DOS DIREITOS E … · deveres dos usuários do SUS. E como objetivos específicos, compreender como tal ... LDB ± Lei de Diretrizes e Bases LOAS

46

e Hematologia. Oferece ainda serviços de Cirurgia geral; Cirurgia Pediátrica de

emergência; serviço de Anestesiologia; Enfermagem; Nutrição e Dietética;

Fisioterapia, Endocrinologia; Gatroenterologia; Fonaudiologia; Psicologia;

Dermatologia; Pneumologia; Cardiologia; Clínica Médica; Ginecologia; Serviço

Social e Pediatria. É o único hospital público da região metropolitana que conta com

serviços considerados referência para toda a rede pública de saúde.

Há cerca 310 leitos, onde todos estão cadastrados no SUS, faturando 804

Autorizações de Internações Hospitalares (AIHs) / mês, com taxa de ocupação

girando em torno de 100 %. No hospital são realizadas aproximadamente 1.300

internações mensais, com grande afluência de pacientes oriundos do interior (60%).

Dispõe ainda do Programa de Internação Domiciliar (PID), para dar suporte

aos idosos em suas residências.

Conta ainda com 19 leitos de UTI, assim divididos: 09 leitos na UTI Geral; 05

leitos na UTI Cardiológica e 05 na UTI Pediátrica; possui ainda 05 salas de Cirurgia;

CRO com nove leitos; Central de Material; Central de Esterilização Química; Sala de

Atendimento Clínico e Pediátrico; Sala de Atendimento ao Politraumatizado; Sala de

Observação Clínica; Unidade Intermediária; Sala de Reanimação; Sala de Vacinas;

Sala de Pequena Cirurgia; Farmácias Centrais; Farmácias Satélites; Laboratório;

Banco de Sangue; Unidade de Transferência; Setor de Queimados; Setor de

Radiologia; Setor de Endoscopia; Lavanderia Hospitalar; Central de Equipamentos;

Setor de Manutenção; três Geradores de Energia; Setor Administrativo; 06 Diretorias

(Geral; Médica; do P. Socorro; Técnica; Administrativa e de Enfermagem); Serviço

de Análise e Revisão de Prontuários; Central de Parecer; Lactário; 05 pavimentos

com Enfermarias Coletivas; CCIH; Serviço de Vigilância Epidemiológica; Setor de

Marcação de Consultas; Serviço de Hotelaria; NAST; Ambulatório para funcionários

e dependentes, Enfermaria Pediátrica e Necrotério.

Segundo dados fornecidos pelo site do hospital, em todo o complexo

hospitalar são realizados mensalmente cerca de 25.000 atendimentos, 450 cirurgias,

890 tomografias computadorizadas e 6.300 radiografias. Os leitos subdividem-se

em: 193 leitos Clínicos; 106 leitos Cirúrgicos; 18 Pediátricos; 30 leitos da Ortopedia;

08 leitos da Hematologia; 07 leitos da Nefrologia e 18 leitos para Queimados.

O complexo abriga ainda a Central de Notificação, Captação e Distribuição de

Órgãos do RN (CNCDO-RN), credenciada ao sistema nacional de transplante.

Page 48: ESCOLARIDADE VERSUS CONHECIMENTO DOS DIREITOS E … · deveres dos usuários do SUS. E como objetivos específicos, compreender como tal ... LDB ± Lei de Diretrizes e Bases LOAS

47

O hospital oferece ainda serviço de radiologia; Tomografia computadorizada;

Endoscopia, Ultra-sonografia convencional; Ultra-sonografia com Doppler; Ultra-

sonografia com eco; Colonoscopia; Laboratório de Microbiologia e Serviço de

remoção de pacientes com duas ambulâncias.

O hospital objetiva qualificar o atendimento aos pacientes de maior gravidade,

pois é este seu papel no SUS, porém também é dever deste garantir e assegurar o

direito de todos à saúde, isto faz com que pacientes que deveriam ser atendidos em

postos de saúde de bairro, hospitais municipais e regionais, também procurem o

HMWG/PSCS, tendo em vista que estes não prestaram tais serviços à população.

Diante das demandas postas pelo público do hospital ao Serviço Social frente

apolítica de saúde do Estado, o próximo capítulo trará a relação entre os Parâmetros

para Atuação de Assistentes Sociais na Saúde com as atividades desenvolvidas

pelo Serviço Social no complexo hospitalar.

4.1 O SERVIÇO SOCIAL E OS PARÂMETROS PARA ATUAÇÃO NA SAÚDE

A sociedade é historicamente marcada pelo autoritarismo, no entanto, com o

passar do tempo e de lutas acerca da cidadania, diversos direitos, tanto civis quanto

políticos foram alcançados. Não deixando de lado os direitos sociais, que podem ser

voltados às condições de vida, de trabalho, acesso à saúde, educação, trabalho,

lazer, segurança, previdência social, assistência social etc. Ao passo que tais

direitos são garantidos constitucionalmente, suas condições de efetivação para a

maior parte da população brasileira distancia-se daquilo almejado teoricamente.

Uma extensa parcela da população não tem acesso sequer à alimentação para a

manutenção de uma vida saudável, como também a dignas condições de habitação,

e de uma inserção a um trabalho que lhes garanta uma remuneração de fato

satisfatória. Sendo assim, conclui-se que está distante do exercício pleno da

cidadania e da dignidade humana.

O Serviço Social foi inserido na saúde por volta da década de 1930, pois foi

neste período que a política de saúde e outras políticas sociais passaram a ser

formuladas de uma maneira que atendesse melhor as demandas que geralmente

Page 49: ESCOLARIDADE VERSUS CONHECIMENTO DOS DIREITOS E … · deveres dos usuários do SUS. E como objetivos específicos, compreender como tal ... LDB ± Lei de Diretrizes e Bases LOAS

48

aumentavam. Surgia principalmente como necessidade de resposta às

reivindicações dos trabalhadores, sendo subdividida em saúde pública e saúde

previdenciária. Nesse período era conhecido como Serviço Social Médico, que

estava vinculado à assistência médico-previdenciária e ações de educação voltadas

em especial para hábitos de higiene da população. Suas ações eram executadas de

forma rotineira e burocratizada.

No Brasil, o Serviço Social entra no campo da saúde através de trabalhos

com a comunidade, em práticas educativas sobre procedimentos de higiene,

incentivando o controle de natalidade, de doenças infantis, de higiene bucal, de

saneamento para a criação das primeiras políticas urbanas de saúde, ou seja,

através de um trabalho educativo que visava proporcionar informação sobre a

higiene do próprio corpo. Embora a categoria ainda não tivesse um olhar crítico

frente às políticas públicas, este trabalho foi de grande importância para a época,

levando em consideração que este era uma país em grande parte sem escolaridade,

e ainda com parte significativa da população vivendo sob condições de miséria.

No desenvolvimento de sua criticidade, o Serviço Social contribuiu com as

lutas políticas pela construção do SUS, e no que diz respeito à atuação profissional,

Bravo (2009) destaca a importância de uma qualificação das ações profissionais,

para que possam contribuir para o efetivo controle democrático dos sujeitos

coletivos, buscando garantir-lhes os direitos sociais numa época de regressão

destes. Bem como os sujeitos, para uma intervenção qualificada precisam estar

organizados e capacitados, no sentido de saber reconhecer seus direitos para poder

exigi-los e pressionar o poder público, e somente conseguirão se tiverem os

instrumentos que lhes permitam uma efetiva análise da realidade.

Cabe ao profissional utilizar de sua autonomia, assegurada pela Lei

8.662/1993, que regulamenta a profissão, seja em órgãos públicos ou privados,

empresas ou entidades sem fins lucrativos, pois este é tanto um direito quanto um

dever do mesmo.

(...) a instituição e realização dos direitos sociais a que se vincula o exercício profissional, é portanto do interesse da democracia. Tornar eficazes estes direitos é o campo próprio dos assistentes sociais. Tanto que, no título sobre a Ordem Social, a Constituição, além de instituir o trabalho não somente como um direito, mas também um dever (art. 193), elegeu três deles – a saúde, a previdência social e a

Page 50: ESCOLARIDADE VERSUS CONHECIMENTO DOS DIREITOS E … · deveres dos usuários do SUS. E como objetivos específicos, compreender como tal ... LDB ± Lei de Diretrizes e Bases LOAS

49

assistência social – como prioritários e imprescindíveis à seguridade social. São instituições de interesse público por dois motivos: a) porque asseguram a estabilidade do sistema e, deste ponto de vista, têm natureza conservadora; mas b) porque são garantias de direitos subjetivos públicos a serem assegurados pelo Estado em sua plenitude e, deste ponto de vista, têm natureza progressista. Como vemos, sob os dois aspectos a atividade do assistente social é de interesse coletivo. E este, porque assumido pela ordem jurídica

constitucional, deve ser tornar eficaz. (SIMÓES, 2009, 417)

O Serviço Social atua em um contexto onde a luta pela afirmação de direitos

significa uma luta contra o capital, buscando uma afirmação dos direitos de

cidadania, para assegurar as necessidades e interesses dos sujeitos sociais. Sua

atuação é centrada nas formas mais latentes de manifestação da questão social,

expressa cotidianamente na vida da população.

(...) apreender a questão social é também apreender como os sujeitos a vivenciam. Ora, desvelar as condições de vida dos indivíduos, grupos e coletividades com as quais se trabalha é um dos requisitos para que se possa decifrar as diversas formas de luta, orgânicas ou não, que estão sendo gestadas e alimentadas, com inventividade, pela população. (...) Muitas vezes, o profissional move-se pela vontade de estar junto com a população atendida, mas objetivamente não está próximo de seus interesses como coletividade, sendo, de fato, um estranho para os indivíduos com que trabalha. (IAMAMOTTO, 2008, 76).

Iamamotto (2009) afirma que a forma como o profissional deve agir será

definida pelo espaço ocupacional em que está inserido, sejam o Estado, empresas

privadas, organizações não governamentais, movimentos sociais, entre outros.

Partindo do princípio que cada espaço possui racionalidades e funções distintas na

divisão social e técnica do trabalho, ocasionando ações de forma particular para

cada trabalho realizado, onde este, pode até mesmo ser voltado para a lucratividade

do capital, ou seja, a atuação do assistente social na sociedade depende de um

conjunto de relações e condições sociais.

O exercício da profissão exige um sujeito profissional que tenha competência para propor, para negociar com a instituição os seus projetos, para defender o seu campo de trabalho, suas qualificações

Page 51: ESCOLARIDADE VERSUS CONHECIMENTO DOS DIREITOS E … · deveres dos usuários do SUS. E como objetivos específicos, compreender como tal ... LDB ± Lei de Diretrizes e Bases LOAS

50

e atribuições profissionais. Requer ir além das rotinas institucionais para buscar apreender, no movimento da realidade, as tendências e possibilidades, ali presentes, passíveis de serem apropriadas pelo profissional, desenvolvidas e transformadas em projetos de trabalho. (IAMAMOTTO, 2009, 25)

O projeto ético-político do Serviço Social18 está vinculado a um projeto de

transformação da sociedade, levando em consideração a dimensão política da

intervenção profissional, pois atua em face ao movimento contraditório da sociedade

de classes. Tem como ponto central o reconhecimento da liberdade, expressando

um compromisso com a autonomia, emancipação e plena expansão dos indivíduos

sociais. Colocar este projeto profissional em prática configura uma das maiores

dificuldades enfrentadas pelos profissionais atualmente, pois, se por um lado a

igualdade é assegurada juridicamente a todos, por outro, a desigualdade econômica

age de uma maneira inversa a este princípio.

Com relação aos núcleos de objetivação do trabalho do assistente social na

área da saúde pode-se citar o levantamento de dados, que caracteriza e identifica as

condições socioeconômicas, familiares e sanitárias dos usuários; a interpretação de

normas e rotinas, que relaciona-se a procedimentos de natureza educativa;

agenciamento de medidas e iniciativas de caráter emergencial – assistencial,

constituem emergências sociais que interferem no processo saúde doença, são

atividades voltadas para agilização de internamentos/leitos, exames e consultas,

entre outros; procedimentos de natureza socioeducativa, informação e comunicação

em saúde, que relacionam-se com assegurar os usuários à obtenção de variadas

informações, como também ampliar a democracia institucional e a capacidade de

análise e de intervenção dos sujeitos e dos grupos; desenvolvimento de atividades

18 Para que um projeto profissional se defina, é necessária a apreensão da realidade como uma totalidade, e dessa forma apreender suas condições e disposições subjetivas, buscando modifica-la. O projeto profissional do Serviço Social tanto produziu quanto foi produto de conquistas históricas do final da década de 1970 (a partir do Congresso da Virada em 1979, que foi um símbolo no que diz respeito à insatisfação com a sociedade e com a própria profissão). Foi consolidado nas décadas de 1980 e 1990, tendo como uma de suas características, pensar a profissão em um contexto histórico, garantindo a análise de sua particularidade e relação com outros (sujeitos sociais e profissionais), buscando defender valores e princípios relacionados à emancipação humana. Tornou-se hegemônico na primeira metade da década de1990, sendo expressa em três níveis: a produção de conhecimento, nos marcos legais e na organização política. (RAMOS, 2009)

Page 52: ESCOLARIDADE VERSUS CONHECIMENTO DOS DIREITOS E … · deveres dos usuários do SUS. E como objetivos específicos, compreender como tal ... LDB ± Lei de Diretrizes e Bases LOAS

51

de apoio pedagógico e técnico-político, que é a realização de atividades junto aos

funcionários, representantes dos usuários no sistema, entre outros.

Nos Parâmetros de Atuação dos Assistentes Sociais na Saúde, orientadas

pelo CFESS, fica expressa a necessidade um profissional que atue de uma forma

diferenciada, afastando-se de abordagens tradicionais funcionalistas e pragmáticas

que tratam questões sociais como problemas pessoais devendo ser enfrentados de

forma singular, isto aplica-se também a todas as outras políticas públicas. Dessa

forma o assistente social deve atuar partindo de uma perspectiva totalizante.

A intervenção orientada por esta perspectiva teórico-política pressupõe: leitura crítica da realidade e capacidade de identificação das condições materiais de vida, identificação das respostas existentes no âmbito do Estado e da sociedade civil, reconhecimento e fortalecimento dos espaços e formas de luta e organização dos trabalhadores em defesa de seus direitos; formulação e construção coletiva, em conjunto com os trabalhadores, de estratégias políticas e técnicas para modificação da realidade e formulação de formas de pressão sobre o Estado, com vistas a garantir os recursos financeiros, materiais, técnicos e humanos necessários à garantia e à ampliação dos direitos. (CFESS, 2010)

Ainda de acordo com os Parâmetros de Atuação dos Assistentes Sociais na

Saúde, é estabelecido que, os assistentes sociais atuam de acordo com quatro

eixos, compreendidos de forma articulada em uma perspectiva de totalidade. Estes

serão explicitados na tabela abaixo:

ATENDIMENTO DIRETO AOS USUÁRIOS

O atendimento direto aos usuários se dá nos diversos espaços de atuação profissional na saúde, desde a atenção básica até os serviços que se organizam a partir de ações de média e alta complexidade, e ganham materialidade na estrutura da rede de serviços brasileira a partir das unidades da Estratégia de Saúde da Família, dos postos e centros de saúde, policlínicas, institutos, maternidades, Centros de Apoio Psicossocial (CAPs), hospitais gerais, de emergência e especializados, incluindo os universitários, independente

Page 53: ESCOLARIDADE VERSUS CONHECIMENTO DOS DIREITOS E … · deveres dos usuários do SUS. E como objetivos específicos, compreender como tal ... LDB ± Lei de Diretrizes e Bases LOAS

52

da instância a qual é vinculada seja federal, estadual ou municipal.

MOBILIZAÇÃO, PARTICIPAÇÃO E CONTROLE SOCIAL

Este eixo envolve um conjunto de ações voltadas para a mobilização e participação social de usuários, familiares, trabalhadores de saúde e movimentos sociais em espaços democráticos de controle social (conselhos, conferências, fóruns de saúde e de outras políticas públicas) e nas lutas em defesa da garantia do direito à saúde. As atividades realizadas têm por objetivo contribuir na organização da população e dos usuários enquanto sujeitos políticos, que possam inscrever suas reivindicações na agenda pública da saúde.

INVESTIGAÇÃO, PLANEJAMENTO E GESTÃO

Este eixo envolve um conjunto de ações que tem como perspectiva o fortalecimento da gestão democrática e participativa capaz de produzir, em equipe e intersetorialmente, propostas que viabilizem e potencializem a gestão em favor dos usuários e trabalhadores de saúde, na garantia dos direitos sociais.

ASSESSORIA, QUALIFICAÇÃO E FORMAÇÃO PROFISSIONAL

As atividades de qualificação e formação profissional visam ao aprimoramento profissional, tendo como objetivo a melhoria da qualidade dos serviços prestados aos usuários. Envolve a educação permanente dos trabalhadores de saúde, da gestão, dos conselheiros de saúde e representantes comunitários, bem como a formação de estudantes da área da saúde e residentes, como também a assessoria, que será explicitada posteriormente. Estão englobadas neste eixo as ações relacionadas especificamente com a equipe de Serviço Social, como também com os demais profissionais de saúde. Dessa forma, podem ser realizadas atividades para cada área profissional, como programações que visem à qualificação da equipe de saúde, na perspectiva de um trabalho interdisciplinar.

Quadro 4: Eixos de Atuação dos Assistentes Sociais Fonte: CFESS, 2010

Page 54: ESCOLARIDADE VERSUS CONHECIMENTO DOS DIREITOS E … · deveres dos usuários do SUS. E como objetivos específicos, compreender como tal ... LDB ± Lei de Diretrizes e Bases LOAS

53

Tendo em vista o conhecimento do assistente social no que diz respeito às

lutas sociais, é de se esperar que tal profissional contribua para a politização

também no campo da saúde. Ao mesmo tempo em que se comemora duas décadas

do Sistema Único de Saúde, também é comemorado trinta anos do Congresso da

Virada, e isso não é uma mera coincidência, pois o nascimento do SUS esteve

profundamente ligado e foi um produto de lutas sociais, onde os assistentes sociais

contribuíram e trouxeram para sua categoria a afirmação de um referencial teórico

voltado para uma teoria social crítica que se compromete com a formação de um

novo projeto de sociedade.

Diante disso, na saúde pública foram desenvolvidas abordagens individuais

sobre a saúde, tendo como destaque o Serviço Social de caso, representando a

necessidade de intervenção do assistente social nas políticas de reprodução social,

como um reconhecimento de que a saúde mesmo possuindo determinantes sociais,

também havia a necessidade de que muitos desses determinantes fossem tratados

isoladamente.

Sua formação possibilita que tal profissional possa atuar na saúde, tendo em

vista sua competência para esta e outras dimensões da questão social. De acordo

com a Resolução CNS n° 218 de 06 de março de 1997, o Conselho Nacional de

Saúde reconhece o assistente social, juntamente com outras categorias, como um

profissional da área da saúde.

Na saúde, assim como em qualquer outra área tem-se a necessidade de uma

interação entre o usuário e o profissional, sendo enfatizados a história de vida e

sofrimento do mesmo através de escutas, o assistente social atua juntamente com

profissionais de outras áreas, para poder também usar de novas tecnologias,

objetivando um atendimento humanizado aliado às necessidades individuas. Dessa

forma há tanto uma abordagem singular quanto em relação à realidade do mesmo.

As contradições que existem no processo de racionalização do SUS são o

principal vetor das demandas do Serviço Social, ou seja, as necessidades da

população se deparam com o conteúdo e a forma de organização dos serviços.

Dessa forma, quando o Serviço Social as atende, interfere e cria um conjunto de

mecanismos que refletem sobre as principais contradições do sistema de saúde

pública.

Page 55: ESCOLARIDADE VERSUS CONHECIMENTO DOS DIREITOS E … · deveres dos usuários do SUS. E como objetivos específicos, compreender como tal ... LDB ± Lei de Diretrizes e Bases LOAS

54

O trabalho do assistente social é importante para a consolidação do SUS, e

para realizar qualquer tipo de atendimento é necessário que o profissional conheça a

instituição ou a unidade em que trabalha, sendo assim, tal profissional se insere

dentro do processo de trabalho em saúde como um agente de interação ou como

uma ligação entre os variados níveis do SUS, assegurando a integralidade das

ações. Sua atuação também busca, de certa forma acabar ou amenizar a

burocratização das ações, seja nos níveis de prestação de serviços de saúde ou até

mesmo entre as políticas de saúde e as demais políticas sociais e setoriais.

O Serviço Social foi regulamentado como uma “profissão liberal” dela decorrente os estatutos legais e éticos que prescrevem uma autonomia teórico-metodológica, técnica e ético-política à condução do exercício profissional. Entretanto o exercício da profissão é tensionado pela compra e venda da força de trabalho especializada do assistente social, enquanto trabalhador assalariado, determinante

fundamental na autonomia do profissional. A condição assalariada – seja como funcionário público ou assalariado de empregados privados, empresariais ou não – envolve, necessariamente, a incorporação de parâmetros institucionais e trabalhistas que regulam relações de trabalho, consubstanciadas no contrato de trabalho. (IAMAMOTTO, 2009, 38).

Assim, o principal desafio da atualidade para o profissional de Serviço Social

na área da saúde é ter o seu trabalho reconhecido como tal. Mostrar e desmistificar

que o trabalho do assistente social não é voluntário, assistencialista, messiânico,

mas sim uma profissão que atua em diferentes áreas e exerce suas competências e

atribuições norteadas pelo Código de Ética e Lei de Regulamentação da Profissão.

O Código de Ética nos indica um rumo ético-político, um horizonte para o exercício profissional. O desafio é a materialização dos princípios éticos na cotidianidade do trabalho, evitando que se transformem em indicativos abstratos, descolados do processo social. Afirma, como valor ético central, o compromisso com a nossa parceira inseparável, a liberdade. Implica a autonomia, emancipação e a plena expansão dos indivíduos sociais, o que tem repercussões efetivas nas formas de realização do trabalho profissional e nos rumos a ele impressos. (IAMAMOTTO. 2008, 77)

No tópico seguinte veremos as atividades realizadas pela Divisão de Serviço

Social, tentando relacionar aos aspectos postos por Iamamotto, bem como,

Page 56: ESCOLARIDADE VERSUS CONHECIMENTO DOS DIREITOS E … · deveres dos usuários do SUS. E como objetivos específicos, compreender como tal ... LDB ± Lei de Diretrizes e Bases LOAS

55

posteriormente as dificuldades e desafios para a materialização dos respectivos

valores éticos no cotidiano profissional.

4.2 AS ATIVIDADES DESENVOLVIDAS PELO SERVIÇO SOCIAL DO

HMWG/PSCS

Quando o Serviço Social surge na divisão social do trabalho, possuía uma

dimensão técnica voltada para resultados imediatos a partir de sua ação profissional,

e isto garantia legitimidade e reconhecimento da sociedade acerca da profissão. O

Movimento de Reconceituação19 buscava romper com essa visão, para que o

Serviço Social possuísse uma visão científica. Na Intenção de Ruptura20,

denominada por Netto (2004), buscava que a profissão produzisse uma crítica

acerca da realidade social, para que a mesma construísse objetivos e objetos de sua

intervenção, e dessa forma responder às demandas sociais. Após isso, Iamamotto

(2004) aponta três dimensões que o assistente social deve dominar: a ético-política;

teórico-metodológica e técnico-operativa.

19 Teve como principais vertentes de análise: a Modernizadora, caracterizada por abordagens mais funcionalistas, estruturalistas e positivistas com uma perspectiva de integração social, que, no entanto, responsabilizavam o indivíduo em relação aos processos e disfunções da sociedade, como também a busca da eficiência e eficácia. A entrada dessas abordagens vieram como forma de enfrentamento da pobreza e marginalização com intuito de integrar os indivíduos na sociedade. A vertente fenomenológica trouxe uma abordagem mais pessoal e de comunidade, avaliando a situação segundo as vivências e buscava a transformação das pessoas, o que o autor José Paulo Netto, chamou de “Reatualização do Conservadorismo”. E a vertente Marxista, que levará a primeira aproximação do Serviço Social às teorias de Marx, mesmo que de forma enviezada. Trás uma postura mais crítica e de inserção nas classes sociais. É nessa primeira aproximação também que o serviço social questiona sua prática profissional, visto que, é essa a utilizada pela maioria dos profissionais atualmente, apesar de ainda conter traços das outras vertentes. 20 Trazia a imposição de um trabalho teórico-metodológico constituído por critica teórica ao tradicionalismo, busca de experimentação de propostas de ação e trabalho de pesquisa sem as exigências imediatas das demandas institucionais ou restrições políticas das mesmas. A Intenção de ruptura se expressa inicialmente como “experiências piloto” de ações de extensão e estágios. Assim consegue sair do isolamento intelectual e aproxima-se das comunidades.

Page 57: ESCOLARIDADE VERSUS CONHECIMENTO DOS DIREITOS E … · deveres dos usuários do SUS. E como objetivos específicos, compreender como tal ... LDB ± Lei de Diretrizes e Bases LOAS

56

Partindo da competência técnico-operativa que o profissional deve dominar

para, dessa forma criar um conjunto de habilidades quanto executa uma ação

profissional, e através de metodologias de ação utiliza instrumentos e técnicas de

intervenção social, que no âmbito do HMWG/PSCS, tem-se como destaque a Ficha

de Acompanhamento Social (Anexo 1), que ao mesmo tempo que traça o perfil

socioeconômico do paciente, também permite dar outras disposições acerca de sua

situação para posteriores ações e encaminhamentos, caso seja necessário.

Dentre as funções e atribuições do assistente social no Pronto Socorro Clóvis

Sarinho destacam-se o:

Atendimento ao paciente/família na observação médica,

politrauma e reanimação; Atendimento ao paciente interno da UTI Bernadete, UTI Geral,

UTI Pediátrica e CRO; Realizar entrevista social com a família do paciente no ato de

admissão ; Interpretar e informar normas e rotinas do hospital à

família/paciente; Orientar família/paciente sobre os seus direitos e deveres; Contatos com entidades de apoio e proteção à criança e

adolescente; Solicitar da família do paciente a documentação necessária para

a realização de exames em outras unidades de saúde; Assessoramento técnico à direção; Supervisionar estagiários (as) de Serviço Social; Agilizar a remoção do paciente para outras unidades de saúde; Comunicar à família sobre a alta do paciente; Comunicar à família quando do óbito do paciente; Dar apoio psico-social aos familiares no momento do óbito; Orientar à família quanto à remoção do cadáver; Orientar à família quanto ao registro da declaração de óbito em

cartório; Em caso de morte violenta, orientar às famílias das providências

necessárias para encaminhamento do cadáver ao ITEP;

Comunicar à Central de Transplantes quando da ocorrência de

óbitos. (Serviço Social do HMWG/PSCS, 2009)

(

No Hospital Monsenhor Walfredo Gurgel:

Visitar diariamente os pacientes internados nas enfermarias; Atender aos usuários que buscam a Divisão de Serviço Social

solicitando informações e/ou orientações sobre os serviços prestados pela unidade;

Informar os familiares sobre o estado de saúde do paciente;

Page 58: ESCOLARIDADE VERSUS CONHECIMENTO DOS DIREITOS E … · deveres dos usuários do SUS. E como objetivos específicos, compreender como tal ... LDB ± Lei de Diretrizes e Bases LOAS

57

Contato com outras unidades de saúde em caso de transferência de pacientes ou realização de exames inexistentes nesta unidade hospitalar;

Realizar reuniões com acompanhantes; Orientar quanto aos direitos trabalhistas, previdenciários e/ou

sobre seguro; Contatos com entidades de apoio e proteção à criança e

adolescente; Contato com familiares ou responsáveis, em caso de óbito; Assessoramento técnico à direção; Contato interprofissional e interinstitucional; Autorizar visita extra, quando se fizer necessário; Orientar a família e/ou paciente quando necessário amputar

membros ou intervenção cirúrgica de urgência; Supervisionar estagiárias de Serviço Social; Comunicar alta de pacientes às famílias; Contato com Prefeituras e Hospitais Municipais para agilizar o

retorno do paciente ao município; Encaminhar o usuário a outros serviços e/ou recursos existentes

na comunidade; Autorizar acompanhante para crianças, adolescentes menores de

18 anos e idosos com mais de 60 anos, conforme legislação vigente. (Serviço Social do HMWG/PSCS, 2009)

Considerando os Parâmetros para Atuação dos Assistentes Sociais na

Saúde, observa-se que, de acordo com as funções e atribuições do assistente social

no PSCS e HMWG, estas são quase que em sua totalidade de eixo 1 (um):

atendimento direto aos usuários, conforme mencionados em tabela anteriormente.

Observa-se também ações do eixo 4 (quatro): assessoria, qualificação e formação

profissional, através das atividades de supervisão de estágio e assessoramento

técnico à direção.

Nas referidas atribuições construídas pela divisão de Serviço Social, não se

verifica ações do eixo 2 (dois) e 3 (três). No entanto, durante o período de estágio

curricular obrigatório, através de observações participante, constatou-se que os

profissionais também realizam ações do eixo 3(três): investigação, planejamento e

gestão.

As ações de investigação se dão no levantamento estatístico de demandas,

situações de violências, sobretudo quando solicitadas pela direção do hospital. As

ações de planejamento ocorrem anualmente com participação dos profissionais e

nos demais momentos são realizadas pela chefia da divisão de Serviço Social.

Quanto ao eixo 2 (dois): mobilização, participação e controle social, não foram

observadas durante o período de estágio.

Page 59: ESCOLARIDADE VERSUS CONHECIMENTO DOS DIREITOS E … · deveres dos usuários do SUS. E como objetivos específicos, compreender como tal ... LDB ± Lei de Diretrizes e Bases LOAS

58

A não realização de ações deste eixo se dá, em parte, porque os profissionais

não são designados para as referidas representações pela direção do hospital. No

âmbito das possibilidades de participação em fóruns, comitês e conselhos enquanto

trabalhadores da saúde, observa-se que alguns profissionais não tem interesse,

algumas vezes tempo, frente à demanda de trabalho do hospital, e até mesmo

questões objetivas pessoais. Desta forma, perde-se uma grande possibilidade de

contribuições destes profissionais para o monitoramento da política dessaúde do

estado.

A administração da demanda reprimida é uma das principais atividades que o

assistente social desenvolve, e deve fazê-la em um cenário em que há o desafio da

execução de um bom trabalho, diante do crescimento da mesma, do déficit da oferta

de serviços, da efetividade dos mecanismos de controle e acompanhamento

requeridos pelo processo de reorganização do SUS.

4.3 REFLEXOS DO (NÃO) ACESSO AO DIREITO À EDUCAÇÃO NOS

PACIENTES DO HMWG/PSCS

Os usuários do Serviço Social são aqueles que requerem e necessitam dos

serviços de saúde, não é apenas um consumidor dos serviços, mas também um

coparticipante do processo de trabalho, tendo em vista que dele dependem as

informações acerca do seu estado de saúde, do cumprimento das prescrições

médicas e recomendações terapêuticas. Diante disso, o assistente social pode

executar ações de caráter emergencial assistencial, educação, informação e

comunicação em saúde, planejamento e assessoria e mobilização e participação

social.

No questionário semiestruturado realizado nos variados setores do hospital,

tanto em pacientes quanto acompanhantes do HMWG/PSCS pode-se perceber que

até aqueles que possuíam certo grau de escolaridade, ainda assim não sabia definir

ao certo o que era saúde por exemplo. Esta era umas das perguntas contidas no

referido questionário, em grande maioria, os entrevistados entendiam por saúde,

Page 60: ESCOLARIDADE VERSUS CONHECIMENTO DOS DIREITOS E … · deveres dos usuários do SUS. E como objetivos específicos, compreender como tal ... LDB ± Lei de Diretrizes e Bases LOAS

59

apenas o fato de não estar doente no referido momento; uma pequena minoria,

atribuiu saúde como qualidade de vida, incluindo alimentar-se bem.

Quando questionados sobre o que é ter direito à saúde, quase unanimemente

referiram-se que isto relacionava-se ao acesso aos serviços de saúde com

qualidade, melhor atendimento, sem longas esperas. Foi perceptível também, que

muitos queixavam-se da forma com que eram atendidos pelos profissionais do

hospitais (médicos, enfermeiros, técnicos etc).

No entanto, chama-se atenção para o fato de que, mesmo que estivessem

utilizando o SUS, uma maioria significativa não sabia o que era, alguns não tinham

ouvido falar e atribuíam esse sistema de saúde, ao cartão utilizado para realização

de serviços mais complexos (cartão SUS21). Já os que sabiam que este era gratuito,

direito de todos, pois pagavam impostos, afirmavam que preferiam pagar serviços a

hospitais privados, afirmando que a qualidade no atendimento e serviços destes era

melhor.

Em sua maioria, também ressaltavam as dificuldades para marcar

procedimentos de saúde como consultas, exames e cirurgias nos postos de saúde

mais próximos de suas residências, alegando que grande parte destes só ofereciam

o clínico-geral, e que não haviam médicos especialistas, percebeu-se que isto ocorre

geralmente nas cidades do interior do estado.

Este questionário também continha perguntas relacionadas ao Serviço Social,

e o que mais impressiona é que grande parte dos entrevistados tinham apoio deste

setor, com destaque para o Programa Bolsa Família22, ainda assim não sabiam

21O Cartão Nacional de Saúde é um instrumento que possibilita a vinculação dos procedimentos executados no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS) ao usuário, ao profissional que os realizou e também à unidade de saúde onde foram realizados. Para tanto, é necessária a construção de cadastros de usuários, de profissionais de saúde e de unidades de saúde. A partir desses cadastros, os usuários do SUS e os profissionais de saúde recebem um número nacional de identificação. Disponível em http://portal.saude.gov.br/portal/saude/Gestor/area.cfm?id_area=944 22O Programa Bolsa Família (PBF) é um programa de transferência direta de renda que beneficia famílias em situação de pobreza e extrema pobreza em todo o País. O Bolsa Família integra o Plano Brasil Sem Miséria (BSM), que tem como foco de atuação os 16 milhões de brasileiros com renda familiar per capita inferior a R$ 70 mensais, e está

baseado na garantia de renda, inclusão produtiva e no acesso aos serviços públicos. O Bolsa Família possui três eixos principais focados na transferência de renda, condicionalidades e ações e programas complementares. A transferência de renda promove o alívio imediato da pobreza. As condicionalidades reforçam o acesso a direitos sociais básicos nas áreas de educação, saúde e assistência social. Já as ações e programascomplementares objetivam o desenvolvimento das famílias, de modo que os

Page 61: ESCOLARIDADE VERSUS CONHECIMENTO DOS DIREITOS E … · deveres dos usuários do SUS. E como objetivos específicos, compreender como tal ... LDB ± Lei de Diretrizes e Bases LOAS

60

definir as atividades realizadas por este setor, atribuindo ao Serviço Social uma

identidade voltada para a assistência, como um profissional facilitador de serviços

burocráticos, ou seja, desconheciam o fato de que o assistente social zela pela

defesa intransigente dos direitos humanos, direitos estes que lhes são

frequentemente negados nos mais variados âmbitos da vida social, ocasionando

episódios como este, que expressam a realidade da saúde pública brasileira.

Ao que diz respeito a educação, aqueles que não possuíam ao menos o

ensino médio completo, afirmaram que abandonaram os estudos, por necessidades

financeiras a família que os obrigavam a trabalhar ainda adolescentes para contribuir

na renda familiar, isto ocorria, geralmente com os homens. Quando o abandono

escolar era realizado por mulheres, todas afirmaram que o motivo foi o fato destas

engravidarem, e consequentemente abandonaram os estudos para cuidar dos filhos,

e posteriormente, quando estes já eram crescidos, não houve interesse ou tempo

para dar continuidade aos estudos.

Isto revela um problema muito complexo, não atribuído apenas à necessidade

de uma maior escolaridade, ou ações de cunho socioeducativo/socioassistencial,

mas também que visassem a educação sexual por exemplo, já que a gravidez

indesejada, ainda é um dos principais motivos que fazem com que muitas mulheres

abandonem os estudos.

4.4 AÇÕES SOCIOASSISTENCIAIS E SOCIOEDUCATIVAS

DESENVOLVIDAS PELO SERVIÇO SOCIAL

Quando nos referimos ao atendimento direto aos usuários ou qualquer outra

atividade desenvolvida, sabe-se que há variações de acordo com a realidade de

cada instituição em que o Serviço Social esteja inserido já que este se adequa às

necessidades historicamente definidas da população no âmbito da saúde.

A partir da implementação do SUS, novas reivindicações entram em pauta,

decorrentes dos princípios em que este foi concebido. Diante destas exigências,

beneficiários consigam superar a situação de vulnerabilidade. Disponível em http://www.mds.gov.br

Page 62: ESCOLARIDADE VERSUS CONHECIMENTO DOS DIREITOS E … · deveres dos usuários do SUS. E como objetivos específicos, compreender como tal ... LDB ± Lei de Diretrizes e Bases LOAS

61

surgem também, novas contradições, já que o SUS como fora idealizado de fato não

conseguiu ser executado. Isto se expressa nos problemas mais conhecidos

cotidianamente, tais como: burocratização; demora no atendimento, nas marcações

de consultas, exames, cirurgias, entre outros serviços; ênfase na assistência médica

curativa, quando deveria ser voltada da mesma forma para a preventiva; o

atendimento geralmente não é realizado com a qualidade adequada. Essas

deficiências ocasionam a visão que grande parte da população tem do setor público,

ou seja, que este não possui qualidade, quando na verdade, sabemos que estes

problemas são decorrentes principalmente de uma má aplicação da verba, que por

sinal é insuficiente, não deixando de mencionar também, que na maioria das vezes

ao atendimento não é realizado como deveria pela condições de trabalho dos

profissionais como baixa remuneração, aumento das atividades, carga horária

excessiva entre outros.

As ações a serem desenvolvidas pelos assistentes sociais devem transpor o caráter emergencial e burocrático, bem como ter uma direção socioeducativa por meio da reflexão com relação às condições sócio-históricas a que são submetidos os usuários e mobilização para a participação nas lutas em defesa da garantia do direito à Saúde. O profissional precisa ter clareza de suas atribuições e competências para estabelecer prioridades de ações e estratégias, a partir de demandas apresentadas pelos usuários, de dados epidemiológicos e da disponibilidade da equipe de saúde para ações conjuntas. As demandas emergenciais, se não forem reencaminhadas para os setores competentes por meio do planejamento coletivo elaborado na unidade, vão impossibilitar ao assistente social o enfoque nas suas ações profissionais. A elaboração de protocolos que definem o fluxo de encaminhamentos para os diversos serviços na instituição é fundamental. (CFESS, 2009)

.

Os parâmetros destacam ainda que estas observações cabem para pensar o

HMWG/PSCS pois durante a observações participante realizada durante o estágio,

as ações emergenciais, sobretudo no que diz respeito à lotação do hospital, de

ordem estrutural da política de saúde inviabilizam que os profissionais executem

com efetividade as ações planejadas que desafiam o setor.

Deve-se agir com cautela em assuntos relacionados à avaliação

socioeconômica da família, já que este instrumento não pode ser utilizado como um

Page 63: ESCOLARIDADE VERSUS CONHECIMENTO DOS DIREITOS E … · deveres dos usuários do SUS. E como objetivos específicos, compreender como tal ... LDB ± Lei de Diretrizes e Bases LOAS

62

meio para eleger ou selecionar o usuário, pois este busca garantir direitos ao invés

de impedi-lo de acessar determinados serviços, ainda que seja levado em

consideração as limitações institucionais. Isto aplica-se também às visitas

domiciliares, já que estas buscam uma melhor compreensão ao que diz respeito às

condições de vida dos usuários, e jamais como uma verificação ou fiscalização dos

dados fornecidos pelo usuário.

Não há como discutir a atuação do Serviço Social na saúde, sem mencionar

um fato que historicamente recai sobre os assistentes sociais: ações que não são

atribuições deste profissional. Ao passo que o trabalho coletivo é necessário, deve-

se ficar atento com o papel que cada profissional deve desempenhar, ou seja, suas

atribuições e competências.

Em experiência do estagio supervisionado obrigatório, foi observado o que

nos Parâmetros para Atuação dos Assistentes Sociais na Saúde já havia sido

ressaltado. É comum, e neste caso, já tornaram-se rotina do assistente social

realizar marcações de consultas e exames; identificação de vagas em outras

unidades hospitalares para possíveis transferências ou cirurgias; solicitação de

ambulâncias; comunicação de altas e óbitos etc, ou seja, atividades técnico-

administrativas. Isto demonstra a necessidade de uma maior informação de toda a

equipe hospitalar acerca das atribuições e competências do profissional.

Ficou explícito também o caráter socioeducativo da atuação do Serviço Social

do HMWG/PSCS, já que as ações são realizadas tanto individualmente quanto

coletivamente em momentos de informação acerca da rotina e normas hospitalares,

no entanto, foi perceptível que na maioria das vezes tal ação ficava restringida

apenas à fornecer informações e esclarecimentos aos pacientes e familiares, que de

certa forma, contribui com que estes não superem a situação em que se encontram.

Diante disso, a atuação do assistente social deve ultrapassar esse caráter,

buscando ao menos, o uso de artifícios que contribuam minimamente com o

conhecimento e compreensão crítica dos usuários acerca da sua realidade. Como

por exemplo, buscar superar a visão que muitos possuem da saúde, ou de qualquer

serviço público como um favor, mas sim como um direito que lhes é resguardado

constitucionalmente, ocasionando assim, uma participação consciente deste usuário.

Foi constatado que, no HMWG/PSCS os profissionais do Serviço Social

desenvolvem tanto ações socioassistenciais quanto socioeducativas no decorrer do

Page 64: ESCOLARIDADE VERSUS CONHECIMENTO DOS DIREITOS E … · deveres dos usuários do SUS. E como objetivos específicos, compreender como tal ... LDB ± Lei de Diretrizes e Bases LOAS

63

cotidiano hospitalar. Pode-se mencionar exemplos de ações socioassistenciais

desenvolvidas, quando o assistente social busca facilitar e possibilitar o acesso dos

usuários aos serviços, e a forma mais comum desta ação são os encaminhamentos

para serviços voltados para a garantia de direitos (esfera as seguridade social

quando são orientações relacionadas à saúde, educação e em especial previdência

nos casos de aposentadoria por invalidez ou até mesmo o benefício de

BPC/LOAS23). É necessário também, que o profissional conheça a rede de serviços

disponível para as mais variadas demandas, sejam elas para os casos de violência

contra a mulher, crianças e adolescentes, idosos, como também em casos de

abusos sexual, ou seja, de todo o rol de serviços que se fazem necessário para uma

atuação profissional de qualidade, objetivando viabilizar os direitos sociais dos

usuários. O assistente social deve ainda, democratizar as informações através de

orientações individuais ou coletivas, como também encaminhamentos ao que diz

respeito os direitos da população. Este momentos dá-se geralmente em encontros

com os acompanhantes e pacientes, realizados diariamente nos mais variados

setores do hospital.

No que diz respeito às ações socioeducativas são dadas orientações aos

usuários acerca de seus direitos, dos princípios e diretrizes do SUS, das normas e

rotinas hospitalares, entre outras necessidades que surgem de acordo com a

realidade de cada paciente/acompanhante. No entanto, foi notável a necessidade de

uma maior interação usuário/profissional ao que diz respeito ações que requisitariam

uma maior mobilização social, já que estamos diante de um cenário tão contraditório

e que expressa de forma fiel os aspectos latentes da questão social.

23 O Beneficio de Prestação Continuada da Assistência Social – BPC foi instituído pela Constituição Federal de 1988 e regulamentado pela Lei Orgânica da Assistência Social – LOAS (...) O BPC é um benefício da Política de Assistência Social, que integra a Proteção Social Básica no âmbito do Sistema Único de Assistência Social – SUAS e para acessa-lo não é necessário ter contribuído com a Previdência Social. É um benefício individual, não-vitalício e intransferível, que assegura a transferência mensal de 1 (um) salário mínimo ao

idoso, com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais, e à pessoa com deficiência, de qualquer idade, com impedimentos de longo prazo, de natureza física, mental intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas. Em ambos os casos, devem comprovar não possuir meios de garantir o próprio sustento, nem tê-lo provido por sua família. A renda mensal familiar per capita deve ser inferior a ¼ (um quarto) do

salário mínimo vigente. (Disponível em http://www.mds.gov.br/assistenciasocial/beneficiosassistenciais/bpc)

Page 65: ESCOLARIDADE VERSUS CONHECIMENTO DOS DIREITOS E … · deveres dos usuários do SUS. E como objetivos específicos, compreender como tal ... LDB ± Lei de Diretrizes e Bases LOAS

64

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Diante do exposto ao longo deste trabalho foi possível analisar como o

conceito sobre saúde historicamente foi alterado no Brasil. Marcos como a 8ª

Conferência Nacional de Saúde e a Constituição de 1988 foram significativas para a

afirmação de direitos tão importantes quando a saúde pública, marcados

especialmente pela participação popular, expressando a busca pela implantação da

cidadania de fato, além de um ideal mais igualitário.

Neste contexto, o SUS foi de grande importância, já que em seus princípios

(equidade, universalidade e integralidade) colocam a saúde como um direito

universal, devendo ser garantido pelo Estado através de serviços públicos de forma

hierarquizada, descentralizada e regionalizada, colocando um fim entre segurados e

não segurados. No entanto, mesmo tão bem planejado, o mesmo não se realiza

cotidianamente da forma com que foi idealizado, tendo em vista que é associado a

longas filas de espera por vagas, exames, cirurgias etc, além da carência de até

mesmo insumos básicos, ocasionados pela má administração, somada à falta de

investimentos..

A educação é geradora de desigualdade, no entanto, ela geralmente é

atribuída apenas a aspectos como a colocação dos indivíduos no mercado de

trabalho, qualidade do emprego, principalmente com relação ao salário e horas

trabalhadas. No entanto, a educação deve ser vista como parte das condições para

a existência da dignidade da pessoa humana a partir do momento que esta define

que todo ser-humano é uma pessoa, dotado de personalidade, com direitos e

deveres, membro de uma sociedade em que vive, e merecedor de uma existência

humana, e não sub-humana.

Ao longo da pesquisa e do estágio curricular supervisionado, observou-se que

os usuários com menos acesso à educação formal, possuem menos conhecimento

acerca do direito à saúde ou do SUS e do Serviço Social, mesmo com grande parte

deles recebendo apoio deste setor através de programas como o Bolsa Família.

Este contexto, exige do profissional, um maior detalhamento nas ações assistenciais

de orientação e nas ações socioeducativas.

Já que direitos como a saúde não são assegurados corretamente pelo Estado

diante do atual contexto brasileiro que tanto favorece a privatização de variados

Page 66: ESCOLARIDADE VERSUS CONHECIMENTO DOS DIREITOS E … · deveres dos usuários do SUS. E como objetivos específicos, compreender como tal ... LDB ± Lei de Diretrizes e Bases LOAS

65

serviços. Há a necessidade de que o próprio usuário, juntamente com toda a

sociedade civil exija seus direitos, no entanto, é perceptível como o déficit na

educação formal afeta diretamente tais usuários, impossibilitando-os de ter uma

visão crítica acerca da realidade que os cerca

Sendo assim, foi possível perceber a necessidade de um maior conhecimento

dos usuários ao que diz respeito seus direitos e deveres no SUS, considerando

também que a falta de tal conhecimento, está intimamente ligado à carência da

escolaridade, ou até a falta dela. Sabe-se que este fator não é determinante nesta

problemática, no entanto, deve-se levar em consideração que os benefícios de um

maior nível de escolaridade não resumem-se apenas ao âmbito econômico, mas

também, o fato de que uma população escolarizada e consciente exerce seus

direitos mais plenamente.

É necessário um trabalho na forma de ações bem pensadas, visando uma

melhoria nas condições de saúde da população, partindo do princípio que este é um

direito que assiste a todos, no entanto não se efetiva, a partir do momento em que

não há uma participação de todos. Sabe-se também, que esta prática educativa é

necessária para uma posterior participação em massa.

Dessa forma, não se pode deixar de mencionar a importância da inserção do

Serviço Social nas escolas visando a contribuição para a garantia ao direito à

educação, como também a aspectos que perpassam o cotidiano da escola, como

por exemplo o desinteresse, a evasão, o baixo rendimento escolar, muitas vezes

poderiam ser melhoradas caso houvesse uma maior participação da família no

contexto escolar.

Porém, toda e qualquer mudança relacionada às melhorias da qualidade de

vida, sejam elas voltadas à saúde, educação, transporte, moradia etc, demanda uma

mudança em vários âmbitos da sociedade, principalmente pelo fato de que

mudanças desse tipo, só são possíveis quando abandonarmos essa prática

individualista, e migrarmos para uma orientação mais humanista, para dessa forma

fazer com que serviços básicos como saúde e educação sejam suficientes e

eficientes para as necessidades reais dos seus usuários.

Diante disso, o Serviço Social pode executar ações de caráter emergencial

assistencial, educacional, de informação e comunicação em saúde, planejamento e

assessoria e mobilização e participação social. Com todo o conhecimento que este

Page 67: ESCOLARIDADE VERSUS CONHECIMENTO DOS DIREITOS E … · deveres dos usuários do SUS. E como objetivos específicos, compreender como tal ... LDB ± Lei de Diretrizes e Bases LOAS

66

profissional possui no que diz respeito às lutas sociais, deve contribuir para uma

politização também no campo da saúde e dessa forma interferir e criar um conjunto

de mecanismo que incidem sobre as principais contradições do sistema de saúde

pública do país.

É necessário a presença de ações voltadas para a educação, informação e

comunicação em todas as unidades de saúde, ao invés de resumir essa prática em

apenas orientações acerca da rotina hospitalar ou outros tipos de procedimentos,

deve-se também realizar atividades que assessorassem, organizassem e

realizassem cursos, debates, palestras, oficinas, folders, reuniões, entre outros, pois

estas são novas exigências no trabalho dos assistentes sociais para colaborar na

construção de estratégias de efetivação de direitos de cidadania através de uma

mobilização dos usuários. Ressaltando também, o fato de que a dinâmica idealizada

pelo SUS, efetiva-se principalmente através de processos de trabalho coletivo. As

ações socioeducativas são muito requisitadas em toda a política de assistência

social, pois propiciam oportunidades de aprendizagem, visando o desenvolvimento

de capacidades, da autoconfiança, autoestima, objetivando a construção de um

novo projeto de sociedade.

Cotidianamente, o Serviço Social é sobrecarregado com demandas

emergenciais, que impossibilitam o profissional de contribuir com a mobilização, a

participação e o controle social da política de saúde no Rio Grande do Norte. Criar

estratégias de participação do assistente social, junto aos usuários, se mostra um

desafio que a categoria tem que enfrentar.

Page 68: ESCOLARIDADE VERSUS CONHECIMENTO DOS DIREITOS E … · deveres dos usuários do SUS. E como objetivos específicos, compreender como tal ... LDB ± Lei de Diretrizes e Bases LOAS

67

6. REFERÊNCIAS

BARROCO, Maria Lucia Silva. Fundamentos éticos do Serviço Social. In.: Serviço Social: direitos sociais e competências profissionais. Brasília: CFESS/ABEPSS, 2009. BERTOLLI, Cláudio Filho. História da saúde pública no Brasil. 4ª ed. São Paulo:

Ática,2002 BRASIL, Ministério da Saúde. A Construção do SUS: Histórias da Reforma Sanitária e do Processo Participativo. Brasília, 1ª edição, 2006. Disponível em

http://portal.saude.gov.br/portal/arquivos/pdf/construcao_do_SUS.pdf _______, Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social. As Desigualdades na Escolarização no Brasil. In.:Observatório da Equidade: Relatório de Observação n° 02.

Brasília, 2007. _______, Constituição: República Federativa do Brasil, Brasília: Senado Federal, Centro Gráfico, 1988. _______, Ministério da Saúde. O SUS de A a Z. Garantindo Saúde nos Municípios. 36ª

ed. Brasília: MS, 2009. Disponível em http://portal.saude.gov.br/portal/arquivos/pdf/sus_3edicao_completo.pdf _______, Ministério da Saúde. Carta dos Direitos dos Usuários da Saúde. Brasília. 1ª ed. Brasília: MS. 2006. Disponível em http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/carta_direito_usuarios_2ed2007.pdf _______, Ministério da Saúde. Cartilha Direito à Educação. 1ª ed. Brasília, MS, 2009

________, Ministério da Saúde. Caderno de Educação Popular e Saúde. 1ª ed, Brasília:

MS, 2007. Disponível em http://portal.saude.gov.br/portal/arquivos/pdf/caderno_de_educacao_popular_e_saude.pdf ________, Ministério da Saúde. HumanizaSUS: Documento base para gestores e trabalhadores do SUS. Brasília, 1ª edição, 2004. Disponível em

http://portal.saude.gov.br/portal/arquivos/pdf/doc_base.pdf ________, Ministério da Saúde. HumanizaSUS: VISITA ABERTA E DIREITO AO ACOMPANHANTE. 2ª ed. Brasília: MS, 2007. Disponível em

http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/visita_acompanhante_2ed.pdf

Page 69: ESCOLARIDADE VERSUS CONHECIMENTO DOS DIREITOS E … · deveres dos usuários do SUS. E como objetivos específicos, compreender como tal ... LDB ± Lei de Diretrizes e Bases LOAS

68

________, Ministério da Saúde. Mais Saúde: Direito de Todos. Brasília, 3ª ed.Brasília: MS,

2010. Disponível em http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/mais_saude_direito_todos_3ed.pdf ________, Ministério da Saúde. Lei Orgânica da Saúde de n". 8080/90 e Lei complementar de n. 8142/90. 2. ed. MS — Assessoria de Comunicação Social. Brasília, 1991 BRAVO, Maria Inês de Souza. A Política de Saúde no Brasil .In.:Serviço Social e Saúde:

Formação e trabalho profissional, São Paulo: Cortez, 2006. BRAVO, Maria Inês Souza. MATOS, Maurílio Castro de. Projeto Ético-Político do Serviço Social e sua Relação com a Reforma Sanitária: elementos para o debate.Disponível em

http://www.fnepas.org.br/pdf/servico_social_saude/texto2-3.pdf BUARQUE, Cristovam. A revolução na educação: escola igual para todos. Brasília, 2007 BOSCHETTI, Ivanete. CFESS: O projeto ético-político profissional trinta anos depois: sentido e desafios. In.:CFESS/ABEPSS/CRESS – SP. 30 anos do Congresso da Virada (1979 – 2009) CAMPOS, Gastão Wagner de Souza. Subordinação da Saúde Pública à Dinâmica da Acumulação Capitalista, ou Breve História do “Ocaso” da Saúde Pública. In.: A Saúde

Pública e a Defesa da Vida. 2ª ed, São Paulo: Hucitec, 1999. CARVALHO, Raul de; IAMAMOTTO, Marilda Vilela. O Serviço Social no Processo de Reprodução das Relações Sociais – Perspectiva de Análise. In.:Relações Sociais e Serviço Social no Brasil: Esboço de uma interpretação histórico-metodológica. 20ª ed, São

Paulo: Cortez, 2007. COELHO, Marilene A. ImediaticidadenaPrática Profissional do Assistente Social. In.: GUERRA, Yolanda; FORTI, Valéria (orgs). O Serviço Social: temas, textos e contextos:

coletânea nova de Serviço Social. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010. COIMBRA, Marcos. Saúde: Direito de todos e dever do Estado. Artigo publicado no Monitor Mercantil em 27.09.2001. Disponível em http://www.brasilsoberano.com.br/artigos/Anteriores/saudedireitodetodosedeverdoestado.htm COSTA, Maria Dalva Horácioda.O Trabalho nos Serviços de Saúde e a Inserção dos(as) Assistentes Sociais. In.:Serviço Social e Saúde: Formação e trabalho profissional e na Revista Serviço Social e Sociedade, nº62.Disponível em http://www.fnepas.org.br/pdf/servico_social_saude/texto2-7.pdf

Page 70: ESCOLARIDADE VERSUS CONHECIMENTO DOS DIREITOS E … · deveres dos usuários do SUS. E como objetivos específicos, compreender como tal ... LDB ± Lei de Diretrizes e Bases LOAS

69

GRUPO DE TRABALHO SERVIÇO SOCIAL NA SAÚDE. Março de 2009, Brasília. Parâmetros para atuação de assistentes sociais na saúde. LARA, Ricardo.O Serviço Social e os descaminhos da pesquisa na universidade “moderna”. In.: Revista Àgora: Políticas Públicas e o Serviço Social. Ano 3, n° 6, abril de 2007 ISSN – 1807 – 698X. IAMAMOTO, Marilda Vilela. O Serviço Social na cena contemporânea. In.:CFESS/ABEPSS. Serviço Social: direitos e competências profissionais. Brasília, 2009

__________, Marilda Vilela. Os espaços sócio-ocupacionais. In.: CFESS e ABEPSS (org). Serviço social: Direitos Sociais e competências profissionais. Brasília:

CFESS/ABEPSS, 2009 __________, Marilda Vilela. As Dimensões Ético-Políticas e Teórico-Metodológicas no Serviço Social Contemporâneo. In.:Serviço Social e Saúde: Formação e trabalho

profissional, São Paulo: Cortez, 2006. (p.161-195). _________, Marilda Vilela. Projeto Profissional, espaços ocupacionais e trabalho do Assistente Social na atualidade. In.:CFESS Atribuições Privativas do Assistente Social em questão. Brasília, 2002.

_________, Marilda Vilela. Rumos ético-políticos do trabalho profissional. In.:O Serviço Social na contemporaneidade: trabalho e formação profissional. 14ª ed. São Paulo:

Cortez, 2008. MARTINELLI, Maria Lucia (Org). Pesquisa qualitativa: um instigante desafio. São Paulo.

Veras Editora, 1999. MOTTA, Ana Elizabete; AMARAL, Ângela. Projeto profissional e projeto societário. In.:CFESS Revista Inscrita, n° 12, Brasília, 2009.

NETTO, José Paulo. A Intenção de Ruptura. In.:Ditadura e Serviço Social: uma análise do Serviço Social pós-64. 7ª ed. São Paulo. Cortez, 2004 PEREIRA, Luis Carlos Bresser. Criação das Organizações Sociais: Reforma Administrativa do Sistema de Saúde. In.:Conferência Nacional de Saúde On-line. Trabalho apresentado

ao Colóquio Técnico prévio à XXV Reunião do Conselho Diretivo do CLAD, Buenos Aires, Outubro de 1995. Disponível em http://www.datasus.gov.br/cns/temas/MARE.htm RAMOS, Sâmya R, Limites e possibilidades históricas do Projeto Ético-Político. In.:CFESS Revista Incrita, nº 12, ano IX, Brasília, 2009.

Page 71: ESCOLARIDADE VERSUS CONHECIMENTO DOS DIREITOS E … · deveres dos usuários do SUS. E como objetivos específicos, compreender como tal ... LDB ± Lei de Diretrizes e Bases LOAS

70

SANTOS, Nelson Rodrigues dos. A Reforma Sanitária e o SUS: tendências e desafios após 20 anos. In.:Revista Saúde em Debate. Nº81, V.33. Disponível em

http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/processoAudienciaPublicaSaude/anexo/A_REFORMA_SANITARIA_E_SUS_TENDENCIAS_E_DESAFIOS03_10.pdf Secretaria da Assistência Social e Desenvolvimento Social – SP. Parâmetros das ações socioeducativas: igualdade como direito, diferença como riqueza. Imprensa Oficial do

Estado de São Paulo, São Paulo, 2007 SHAEDLER, Vanice Maria. A atuação do assistente social na unidade básica de saúde.

2º SEMINÁRIO NACIONAL ESTADO E POLÍTICAS SOCIAIS NO BRASIL. Campus Cascavel, 2005 SILVA, Maria Ozanira da (coord.) O Serviço Social e o Popular: resgate teórico-metodológico do projeto profissional de ruptura. 4ªed, São Paulo: Cortez, 2007. (pág. 105-127). SIMÓES, Carlos. Na Ilha de Robinson: a autonomia e a ética profissional no neoliberalismo. In.:Revista Serviço Social e Sociedade. N° 99. Julho/Setembro, 2009.

SOCIAL, Divisão de Serviço Social. As atividades Desenvolvidas pelo Serviço Social do

HMWG/PSCS. 2009

TEIXEIRA, Anísio. Educação não é privilégio: atualidades pedagógicas. 4ª ed, vol 130,

São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1977. http://www.apagina.pt/?aba=7&cat=64&doc=7241&mid=2 http://www.farmacia.ufmg.br/cespmed/text1.htm http://www.ibge.gov.br http://intertemas.unitoledo.br/revista/index.php/ETIC/article/viewFile/2321/1816 http://www.lfg.com.br/artigos/Blog/dignidade_direito_absoluto.pdf http://www.mds.gov.br http://www.walfredogurgel.rn.gov.br

Page 72: ESCOLARIDADE VERSUS CONHECIMENTO DOS DIREITOS E … · deveres dos usuários do SUS. E como objetivos específicos, compreender como tal ... LDB ± Lei de Diretrizes e Bases LOAS

71

http://www.suapesquisa.com/educacaobrasil/

Page 73: ESCOLARIDADE VERSUS CONHECIMENTO DOS DIREITOS E … · deveres dos usuários do SUS. E como objetivos específicos, compreender como tal ... LDB ± Lei de Diretrizes e Bases LOAS

72

APÊNDICES

Page 74: ESCOLARIDADE VERSUS CONHECIMENTO DOS DIREITOS E … · deveres dos usuários do SUS. E como objetivos específicos, compreender como tal ... LDB ± Lei de Diretrizes e Bases LOAS

73

APÊNDICEA

Page 75: ESCOLARIDADE VERSUS CONHECIMENTO DOS DIREITOS E … · deveres dos usuários do SUS. E como objetivos específicos, compreender como tal ... LDB ± Lei de Diretrizes e Bases LOAS

74

APÊNDICE B

Page 76: ESCOLARIDADE VERSUS CONHECIMENTO DOS DIREITOS E … · deveres dos usuários do SUS. E como objetivos específicos, compreender como tal ... LDB ± Lei de Diretrizes e Bases LOAS

75

Page 77: ESCOLARIDADE VERSUS CONHECIMENTO DOS DIREITOS E … · deveres dos usuários do SUS. E como objetivos específicos, compreender como tal ... LDB ± Lei de Diretrizes e Bases LOAS

76

ANEXOS

Page 78: ESCOLARIDADE VERSUS CONHECIMENTO DOS DIREITOS E … · deveres dos usuários do SUS. E como objetivos específicos, compreender como tal ... LDB ± Lei de Diretrizes e Bases LOAS

77

ANEXO1