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1 ESCOLA SUPERIOR ABERTA DO BRASIL – ESAB CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU EM EDUCAÇÃO RELIGIOSA ESCOLAR E TEOLOGIA COMPARADA ADRYADSON FLABIO NAPPI A CONTRIBUIÇÃO DA FÉ CRISTÃ NA FORMAÇÃO DE UMA SOCIEDADE MAIS JUSTA VILA VELHA (ES) 2012

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ESCOLA SUPERIOR ABERTA DO BRASIL – ESAB CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU EM EDUCAÇÃO

RELIGIOSA ESCOLAR E TEOLOGIA COMPARADA

ADRYADSON FLABIO NAPPI

A CONTRIBUIÇÃO DA FÉ CRISTÃ NA FORMAÇÃO DE UMA SOCIEDADE MAIS JUSTA

VILA VELHA (ES) 2012

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ADRYADSON FLABIO NAPPI

A CONTRIBUIÇÃO DA FÉ CRISTÃ NA FORMAÇÃO DE UMA SOCIEDADE MAIS JUSTA

Monografia apresentada ao curso de Pós-Graduação em Educação Religiosa Escolar e Teologia comparada da Escola Superior Aberta do Brasil como requisito para o título de especialista em Educação Religiosa Escolar e Teologia Comparada, sob orientação do Prof. Me. Marcony Brandão Uliana.

VILA VELHA (ES) 2012

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ADRYADSON FLABIO NAPPI

A CONTRIBUIÇÃO DA FÉ CRISTÃ NA FORMAÇÃO DE UMA SOCIEDADE MAIS JUSTA

Monografia aprovada em_____de_______de 2012

Banca Examinadora

_________________________________

_________________________________

_________________________________

VILA VELHA (ES) 2012

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DEDICATÓRIA

Dedico este trabalho especialmente para minha esposa Vanessa e minha amada

filha Ana Clara, por sempre estarem ao meu lado. Dedico também aos meus pais e

irmãos, e todos os amigos e membros da Comunidade Missão Peregrinos do Amor,

por serem tão importantes em minha vida.

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AGRADECIMENTOS

Primeiramente, agradeço a Deus, por todo o seu amor incomparável e por ter me

abençoado para o término de mais um trabalho de minha vida.

Agradeço também minha amada esposa por me apoiar e motivar em tudo o que

realizo e por ser uma mulher tão maravilhosa, carinhosa e compreensiva. Agradeço

por minha filha por ser a expressão máxima de revelação de Deus em minha vida,

santificando-me no cotidiano de minha existência.

Agradeço por meus pais, irmãos, familiares e amigos, que são um grande suporte

em minha vida, me fazendo crescer todos os dias. Agradeço especialmente aos

amados irmãos da Comunidade e por todos aqueles que de alguma forma,

contribuíram para com a minha experiência mística e religiosa.

Agradeço por todos os professores do curso, que trouxeram com muita sabedoria e

sensibilidade seus conhecimentos, que proporcionaram grandes mudanças em

minha vida e, principalmente, na minha forma de pensar a Religião e a Teologia.

Agradeço especialmente ao professor e orientador deste trabalho, Prof. Me.

Marcony Brandão Uliana, por todo o seu tempo, conhecimento, carinho e dedicação

para comigo e para com este trabalho.

Enfim, agradeço a todos os funcionários e colaboradores da ESAB, por toda

dedicação, seriedade e competência.

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“A fé e a razão constituem como que duas

asas pelas quais o espírito humano se

eleva para a contemplação da verdade”

(João Paulo II)

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RESUMO

Este trabalho teve como objetivo analisar a contribuição da fé cristã para a formação de uma sociedade mais justa e fraterna, trabalhando os princípios fundamentais do cristianismo e sua ação na vida de quem os adere. Investigando e retirando seus principais ensinamentos baseados em pressupostos filosóficos, catequéticos e teológicos do Catecismo da Igreja Católica (2000), bem como de autores como Adriano Sella (2003), Marciano Vidal (2007), Papa João Paulo II (1998), Urbano Zilles (2008) e outros que trabalham a problemática da religião, da fé e da razão. O trabalho em questão está estruturado com uma breve introdução do tema e três capítulos que trabalham a fé e ciência, os princípios fundamentais do cristianismo e alguns conflitos entre a doutrina cristã e a sociedade moderna, respectivamente. Toda a pesquisa foi realizada de forma bibliográfica, baseada em livros e artigos impressos ou digitais disponibilizados na internet. Sem querer desrespeitar ou discriminar qualquer outro sentimento religioso, a máxima deste trabalho está em encontrar ou, talvez, reencontrar a beleza do ensinamento cristão e resgatar o princípio máximo do amor ao próximo, a tolerância e abertura reflexiva para os conflitos da modernidade e o sonho idealizado de uma unidade que construa a paz, a justiça e fraternidade na sociedade, construindo a tão sonhada civilização do amor. Como conclusões mais relevantes, percebeu-se a possibilidade de um discurso harmonioso entre a religião e a ciência e a possível capacidade de um diálogo produtivo entre cristianismo e sociedade, auxiliando na formação ética e social. Palavras-chave: Religião. Cristianismo. Sociedade. Fé. Razão.

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO .................................................................................................. 09

2 FÉ E CIÊNCIA................................................................................................... 14

3 PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS DO CRISTIANISMO E SUA CONTRIBUIÇÃO

PARA A FORMAÇÃO HUMANA E SOCIAL....................................................... 17

3.1 SERMAO DA MONTANHA ............................................................................ 19

3.1.1 As bem aventuranças ............................................................................... 19

3.1.2 A luz do mundo ......................................................................................... 21

3.1.3 Leis e condutas para aqueles que seguem Jesus ................................. 21

3.1.4 Relacionamento com Deus....................................................................... 24

3.1.5 As escolhas e buscas fundamentais da vida.......................................... 25

3.1.6 Não julgue e não serão julgados ............................................................. 27

3.1.7 Amar ao próximo como a si mesmo........................................................ 28

3.1.8 A fé e a prática........................................................................................... 30

3.2 - A ULTIMA CEIA ........................................................................................... 32

3.2.1 O lava pés .................................................................................................. 34

3.2.2 O mandamento novo de Jesus ................................................................ 36

3.2.3 O envio do Espírito Santo......................................................................... 38

3.2.4 Conselhos para preservar a unidade e perseverança............................ 39

3.2.5 O ódio e a oposição do mundo ................................................................ 41

3.2.6 A oração pela unidade .............................................................................. 43

4 CONFLITO ENTRE A AXIOLOGIA CRISTÃ COM A SOCIEDADE MODERNA

............................................................................................................................. 47

4.1 A SEXUALIDADE E A HOMOSSEXUALIDADE............................................. 54

4.3 O ABORTO .................................................................................................... 59

5 CONCLUSÃO ................................................................................................... 63

REFERENCIAS ................................................................................................... 66

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1 INTRODUÇÃO

A religião sempre fez parte da cultura dos povos. Sua importância histórica é

grandiosa na formação da identidade do ser humano e da sociedade. Marilena

Chauí, ao discursar sobre a definição de filosofia e religião, afirma que tanto a

filosofia quanto a religião possuem um objeto de estudo em comum, ou seja, a

busca pela compreensão do universo e tudo o que nele existe. Porém, a filosofia “faz

através de um esforço racional” enquanto a religião “através da confiança (fé) numa

revelação divina”. (CHAUÍ, 2000, p. 15).

O problema religioso não pode ser ignorado dentro da construção ética da

humanidade, pois este desempenha um papel fundamental na vida do homem. De

maneira especial, a fé cristã teve seu papel na construção da sociedade mundial,

principalmente no mundo ocidental.

Por muito tempo, a religião, as tradições e os mitos eram tudo o que se tinha para

responder as perguntas existenciais do ser humano. Estas mesmas perguntas que

deram origem a filosofia, onde os primeiros filósofos buscavam respostas “sobre as

causas da mudança, da permanência, da repetição, da desaparição e do

ressurgimento de todos os seres” (CHAUÍ, 2000 p. 28).

Em especial, a religião cristã surge na história encabeçada pela ocorrência da vida

de um judeu carpinteiro conhecido como Jesus de Nazaré. Esse homem que nasceu

em um estábulo na pequena cidade de Belém, viveu uma vida misteriosamente

simples e foi condenado e morto por Pilatos por volta dos 33 anos de idade, sob a

acusação de crime religioso e político. (SMITH, 1991)

Segundo Smith (1991, p.307), “os detalhes bibliográficos da vida de Jesus são tão

escassos que, no começo do século XX, alguns pesquisadores chegaram a sugerir

que ele nunca existiu”. Essa ideia foi logo rejeitada, pois os estudiosos do

classicismo perceberam que os parâmetros de confiabilidade da Bíblia eram

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praticamente os mesmos do mundo Greco-romano, e refutar os Livros Sagrados

certamente iria abalar o conhecimento do pensamento clássico. (SMITH, 1991)

O nascimento de Jesus marca o início de uma nova forma de pensar a

transcendência do homem e sua ligação com o sagrado. Um homem judeu que

desafiou os grupos sociais de sua época e suas formas de dominação para com o

povo. (SMITH, 1991)

Para os que crêem, Ele é o Filho de Deus encarnado, o Verbo de Deus que se fez

homem (Jo 1,14) para renovar a criatura humana em toda a sua plenitude. Nascido

de uma jovem virgem na pequena cidade de Belém, envolto em faixas em uma

manjedoura, verdadeiro Deus e verdadeiro homem, o Deus conosco, o Messias

esperado pelo mundo.

Segundo Smith, Jesus cria uma “quinta posição” de resposta do sofrimento judeu

com a dominação de Roma. Isso devido ao contexto político e social que se

encontrava o povo judeu naquele momento. O povo estava dominado por Roma há

quase um século, sem liberdade e profundamente explorados por altos impostos.

(SMITH, 1991)

Como resposta a essa situação, ainda segundo Smith, havia quatro grupos que

manifestavam suas posições: os saduceus, os essênios, os fariseus e os zelotas.

Todos os quatro grupos tinham suas características e posturas dentro da sociedade.

(SMITH, 1991)

Smith ainda afirma que Jesus aparece então com uma postura diferente das quatro

existentes, trazendo um discurso libertador e ousado, porém, sem fazer alusão a

guerra ou confronto armado. Sobre esta perspectiva que nasce o cristianismo e a

chamada religião cristã. Uma forma de libertação pessoal e social para a construção

de um Reino de paz. Foi desta forma que os apóstolos levaram a fé para os quatro

cantos do mundo. (SMITH, 1991)

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A promessa da salvação anunciada na primeira pregação pública de Pedro no Livro

dos Atos dos apóstolos é clara: “Salvai-vos do meio desta geração perversa” (At 2,

40).

Antes de qualquer coisa, o cristianismo primitivo trazia uma forma diferenciada de

viver a fé, por meio da caridade e da vida fraterna. A experiência das primeiras

comunidades cristãs que se suportavam e colocavam tudo em comum, era uma

forma direta de afetar o sistema corrupto e dominador da época, proporcionando

uma transformação social. “Todos os fiéis viviam unidos e tinham tudo em comum”

(At 2, 44).

Porém, ao longo dos séculos do cristianismo, muitos acontecimentos marcaram a

história da Igreja, tanto positiva quanto negativamente, fazendo com que a

problemática do fenômeno religioso entrasse em choque com os avanços da

sociedade moderna.

Tais confrontos foram criticados por estudiosos dos séculos XVI ao XX. Segundo

Zilles,

Realiza-se uma ruptura com a tradição medieval, através da descoberta do Mundo Novo, através do Renascimento cultural, com o giro do teocentrismo para o antropocentrismo, e através da Reforma Protestante, que fomenta o individualismo moderno. (ZILLES, 2008, p.37).

Em especial, a Revolução Francesa e Industrial juntamente com o iluminismo que,

segundo Zilles, “desenvolve um tipo de pensamento que discute criticamente, à luz

da razão, as concepções herdadas”. (ZILLES, 2008, p. 38). Assim, com esse

pensamento, muitos caíram no erro terrível de colocar a fé contra a razão e vice-

versa, gerando sérios conflitos entre elas.

A racionalização do mundo ocidental moderno trouxe uma exacerbada oposição

contra a fé e a religião, ocasionando rupturas dos dois lados. João Paulo II ao

escrever sobre a problemática, cita São Tomás de Aquino e seu pensamento

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harmonioso sobre a fé e a razão, afirmando que “a luz da razão e a luz da fé provêm

ambas de Deus e por isso não se podem contradizer entre si” (JOAO PAULO II,

1998, p.47).

Sem a pretensão de cometer excessos para nenhum dos lados, mas, porém, com a

preocupação de perceber a importância da axiologia cristã para o mundo moderno,

para não cairmos em um vazio pensamento da razão iluminista que, segundo o

pensamento de Petrini, entra em crise por não ser mais capaz de dar conta de todos

os fatores da realidade, de orientar suas conquistas para responder às exigências

humanas. (PETRINI, 2005).

Este estudo visa retomar a problemática da fé em harmonia com a razão como um

possível caminho na busca de uma sociedade mais justa, digna e sustentável,

promovendo uma ética a favor da vida.

O problema de pesquisa que orientará este estudo é: “Qual a contribuição da fé

cristã na formação de uma sociedade mais justa?”.

Para responder o problema levantado, formulou-se o seguinte objetivo geral:

“Analisar a contribuição da fé cristã na formação de uma sociedade mais justa”.

Desta forma, para alcance do objetivo geral da pesquisa, foram elencados os

objetivos específicos abaixo:

• Conceituar fé e a razão e suas mediações na experiência do real;

• Descrever os princípios fundamentais do cristianismo e sua contribuição para

a formação humana e social;

• Investigar os conflitos entre a axiologia cristã e a sociedade moderna.

A metodologia utilizada neste trabalho é a pesquisa bibliográfica, do tipo

exploratória, sendo utilizados livros, artigos e revistas publicados na internet para a

coleta e análise dos dados.

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Este trabalho monográfico está estruturado com os seguintes capítulos, a saber. O

primeiro capítulo traz uma breve introdução e exposição do problema e dos objetivos

da pesquisa. No segundo capítulo, trazemos a conceituação da fé e da razão. No

terceiro capítulo, tratamos da investigação dos princípios fundamentais do

cristianismo e seus impactos na formação humana e social, e, por último, o quarto

capítulo investiga alguns conflitos modernos da axiologia cristã com a sociedade

atual.

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2 FÉ E CIÊNCIA

A concepção de fé sempre se altera ao longo dos tempos. Pode-se dizer que a

expressão da fé envolve fatores culturais e sociais da época que se encontra.

Segundo Zilles, “o sujeito da ciência e da fé é o mesmo homem, que empenha parte

de sua capacidade – a razão – quando faz filosofia ou ciência, mas envolve todo o

seu ser – razão, coração, sentimento e emoção – quando crê”. (ZILLES, 2005, p. 2)

Segundo Chauí,

Pela fé, a religião aceita princípios indemonstráveis e até mesmo aqueles que podem ser considerados irracionais pelo pensamento, enquanto a Filosofia não admite indemonstrabilidade e irracionalidade. Pelo contrário, a consciência filosófica procura explicar e compreender o que parece ser irracional e inquestionável. (CHAUI, 2000, p.15)

A razão já está relacionada na capacidade de se provar e demonstrar às coisas, que

segundo Chauí, está à essência da consciência filosófica. (CHAUI, 2000).

Para a doutrina cristã, “a fé é um dom de Deus, uma virtude sobrenatural infundida

por Ele” (CIC, 2000, p.51). É a capacidade misteriosa de acreditar nos mitos e

linguagens religiosas, sem que seja preciso provas científicas, físicas ou materiais.

Na matriz iluminista da razão, isso é inadmissível. O fenômeno da racionalização

proporcionado por Descartes, ao qual o iluminismo promoveu e consolidou, foi de

encontro com a fé medieval, de maneira especial, com a fé cristã predominante na

época. (PETRINI, 2005)

Segundo Petrini (2005, p.22), “o que, no entanto, de início tinha o aspecto de uma

esperada libertação, começa a mostrar seu rosto de opressão, de violência e de

sangue”. Ainda segundo o autor, “realizou-se um grande desenvolvimento nos

domínios das ciências e da técnica, mas o esforço para dominar a natureza e a

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história acabou conduzindo a razão a servir o poder: econômico, militar, político e

ideológico”. (PETRINI, 2005, p. 22)

O autor da carta aos Hebreus explica que a fé “é a posse antecipada das coisas que

esperamos; é a demonstração das coisas que não vemos” (Hb 11, 1).

Já o Catecismo da Igreja escreve:

O motivo de crer não é o fato de as verdades reveladas aparecerem como verdadeiras e inteligíveis à luz de nossa razão natural. Cremos “por causa da autoridade de Deus que revela e que não pode nem enganar-se nem enganarmos”. (CIC, 2000, p.51).

O que é preciso compreender é que a fé e a razão devem caminhar em

conformidade uma com a outra. Com a evolução da ciência moderna, pensou-se

que todas as perguntas seriam respondidas e que a religião estava com os dias

contados, mas não foi bem assim que aconteceu. (PETRINI, 2005)

João Paulo II, ao falar sobre este conflito, explica que “a fé liberta a razão, à medida

que lhe permite alcançar coerentemente o seu objeto de conhecimento e situá-lo

naquela ordem suprema onde tudo adquire sentido”. (JOAO PAULO II, 1998, p.25)

Um exemplo deste conflito está quando falamos sobre a criação do universo. Para a

igreja, o mito religioso da criação na Bíblia indica que todas as criaturas foram

criadas por Deus do nada, conforme escreve o catecismo: “Cremos que Deus não

precisa de nada preexistente nem de nenhuma ajuda para criar” (CIC, 2000, p.88);

“Nenhuma criatura tem o poder infinito que é necessário para ‘criar’ no sentido

próprio da palavra, isto é, produzir e dar o ser àquilo que não tinha de modo algum

(chamar a existência ‘ex nihilo’ = ‘do nada’)” (CIC, 2000, p.95).

Portanto, o mito da criação não deseja fazer ciência ou confrontar-se com ela, é

apenas um mito. Basicamente, mito,

É uma narrativa. É um discurso, uma fala. É uma forma de as sociedades espelharem suas contradições, exprimirem seus paradoxos, dúvidas e inquietações. Pode ser visto como uma possibilidade de se refletir sobre a

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existência, o cosmos, as situações de "estar no mundo" ou as relações sociais. (ROCHA, 1985, p.3)

João Paulo II ao discursar sobre a confiança cega na razão afirma que

O homem de hoje parece estar sempre ameaçado por aquilo mesmo que produz, ou seja, pelo resultado do trabalho das suas mãos e, ainda mais, pelo resultado do trabalho de sua inteligência e vontades. (JOAO PAULO II, 1998, p.52)

Zilles explica que

A separação entre fé e razão criou um racionalismo que se distanciou da fé e, de outro lado, muitos cristãos se refugiaram no fideísmo. Para alguns, a fé tornou-se prejudicial e alienante para o pleno desenvolvimento da razão e, para outros, a razão tornou-se ameaça para a fé. (...) O percurso de dois milênios de história mostra que quando fé e razão se respeitam mutuamente em sua autonomia uma pode fecundar a outra. (ZILLES, 2008, p.3)

Portanto, compreendemos que a fé e a razão não são contrárias ou conflitivas uma

com a outra, mas podem ser complementares entre si. Como disse João Paulo II, “a

fé e a razão constituem como que duas asas pelas quais o espírito humano se eleva

para a contemplação da verdade”. (JOAO PAULO II, 1998, p.5)

Se cometemos grandes erros históricos, talvez seja porque separamos algo que

sempre deveria estar unido, tomando parte de um lado e ignorando o outro por

completo.

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3 PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS DO CRISTIANISMO E SUA

CONTRIBUIÇÃO PARA A FORMAÇÃO HUMANA E SOCIAL

O cristianismo teve grande papel na formação da sociedade, de maneira especial,

na cultura ocidental. Não dá para imaginar a civilização moderna sem a participação

da Igreja cristã. (SMITH, 1991)

Podemos dizer que o cristianismo é uma religião histórica, pois está baseada em

fatos reais de um judeu conhecido como Jesus de Nazaré. Segundo Figueiredo, a

expressão cristianismo foi utilizada primeiramente por Inácio, Bispo de Antioquia, por

volta do ano 110 d.C. (FIGUEIREDO, 2009)

O conteúdo que conhecemos sobre a vida de Jesus está nos chamados

Evangelhos, que significa “boa nova”, totalizando quatro livros: Mateus, Marcos,

Lucas e João. Segundo Porter, “do século II em diante, se não mais cedo, os

cristãos produziram uma vasta literatura para suplementar os textos do Novo

Testamento, entre eles, evangelhos escritos no estilo dos textos canônicos”

(PORTER, 2009, p.149). Estes escritos são considerados apócrifos, pois não

entraram no cânone dos Livros Sagrados que compõem a Bíblia cristã.

Ainda segundo Porter,

Vários fatores parecem ter contribuído para que os quatro evangelhos conquistassem a condição canônica. Os livros foram compostos relativamente cedo: todos já existiam em 100 d.C., e os estudiosos hoje tendem a datá-los de época ainda mais remota. Apesar das diferenças, em especial entre João e os três evangelhos sinóticos, eles compartilham forma e conteúdo, porque contam a vida de Jesus em uma narrativa interligada que começa com as atividades de João Batista e culmina na prisão, morte e ressurreição de Jesus. Os evangelhos contam basicamente a mesma história de maneira mais sóbria e menos lendária que os outros textos do cristianismo primitivo que reivindicam a condição de evangelho (PORTER, 2009, p.148).

Nos evangelhos canônicos, pouco se fala sobre a infância de Jesus, fator um pouco

incômodo para alguns. O Catecismo da Igreja explica que “durante a maior parte de

sua vida, Jesus compartilhou a condição da imensa maioria dos homens: uma vida

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cotidiana sem grandeza aparente, vida de trabalho manual, vida religiosa judaica

submetida à Lei de Deus, vida na comunidade” (CIC, 2000, p.149). “A obediência de

Cristo no cotidiano da vida escondida inaugura já a obra de restabelecimento daquilo

que a desobediência de Adão havia destruído” (CIC, 2000, p.150).

Segundo a Tradição cristã, o “anonimato” da maior parte da vida de Cristo é uma

forma de exemplo de submissão para que todo homem possa estar unido a Cristo

nos caminhos do cotidiano da vida (CIC, 2000).

Smith diz que Jesus era profundamente judeu, embora estivesse sempre

manifestando suas posições de conflito contra os mesmos. Sua inquietação e

postura contra as injustiças de seu tempo pareciam cumprir o perfil do Messias

esperado pelo povo. (SMITH, 1991)

Antes de iniciar seu ministério, segundo os evangelhos, Jesus foi precedido por um

profeta conhecido como João Batista. “João foi anunciado pelo profeta Isaías, que

disse: ‘Esta é a voz daquele que grita no deserto: Preparem o caminho do Senhor,

endireitem suas estradas’” (Mt, 3, 3).

O Catecismo explica que Jesus inicia seu ministério após ser batizado por João, nas

águas do Rio Jordão (CIC, 2000). Desta forma, a presença de João como profeta do

povo vai se enfraquecendo, para dar lugar à nova presença do esperado Messias, o

ungido de Deus.

Imediatamente após o batismo, os evangelhos relatam um tempo de solidão e

recolhimento de Cristo no deserto, onde vence as tentações e instaura a nova

criação, sendo fiel até o fim, ao contrário de Adão que sucumbiu (CIC, 2000).

Porém, para estudarmos os princípios fundamentais do cristianismo, utilizaremos

basicamente dois evangelhos: Mateus e João, de maneira especial, o Sermão da

Montanha, contido no Evangelho de Mateus, nos capítulos 5 ao 7, e na última ceia,

que está relatada nos quatro evangelhos, mas que será utilizado o relato contido no

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evangelho de João, nos capítulos 13 ao 17, onde o autor parece ter se preocupado

em demonstrar de forma um pouco mais mística do que nos outros evangelhos.

A escolha pelo relato de João parece ser a mais acertada, pois quando se pensa em

valores e princípios cristãos, João tentou demonstrar mais profundamente o que

realmente aconteceu naquela sagrada ceia com Jesus, com o intuito de despertar e

alimentar a fé em Jesus Cristo como Filho de Deus encarnado.

3.1 O SERMÃO DA MONTANHA

3.1.1 As bem aventuranças

O discurso de Jesus na montanha começa de forma poética. As bem aventuranças

vem proclamar o anúncio da felicidade que o Reino de Deus quer instaurar na

sociedade injusta e corrompida.

Segundo Smith,

ao contrário dos saduceus, ele queria mudanças. Ao contrário dos essênios, permaneceu no mundo. Ao contrário dos defensores da oposição militar (zelotas), louvava os pacifistas e insistia que mesmo os inimigos deveriam ser amados. (SMITH, 1991, p.307)

As bem aventuranças vem inaugurar o chamado Reino de Deus, estabelecendo um

projeto de vida para todos aqueles que aderissem a fé em Jesus. Segundo Rohden,

Mahatma Gandhi disse a seguinte frase: “se se perdessem todos os livros sacros da

humanidade, e só se salvasse o sermão da montanha, nada estaria perdido”

(ROHDEN, 2011, p.6).

O teólogo italiano Adriano Sella afirma que o sermão da montanha é o anúncio do

Reino de Deus no meio da humanidade, revelando a preferência pelos pobres não

simplesmente por questão de bondade ou favor, mas por uma questão de justiça.

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“Trata-se de resgatar a ordem de Deus, que destinou todos os bens para todos os

povos da terra” (SELLA, 2003, p.136).

No trecho de evangelho, bem aventurados são: os pobres de espírito, os puros de

coração, os mansos, os misericordiosos, os que têm fome e sede de justiça, os

pacificadores, os tristes e os perseguidos por causa da justiça. (Mt, 5, 3-11)

Percebe-se desde o início que o discurso de Jesus é libertador e confortante, indo

de encontro às necessidades fundamentais para se alcançar a dignidade do homem

e da sociedade: palavras como mansidão, paz, misericórdia e justiça tornam-se

valores presentes e fundamentais do cristianismo.

Sella ainda explica que “as bem aventuranças anunciam a justiça que vai acontecer

por meio da vinda do Reino de Deus” (SELLA, 2003, p.139). Segundo o teólogo, a

justiça deste Reino está manifestada por três grandes dimensões: a predileção pelos

pobres, a denúncia dos ricos e poderosos que são impedimento para a justiça do

Reino e o apelo para que todos se tornem construtores do Reino de Deus, através

de um encontro pessoa com Cristo e a aplicação do mandamento do amor. (SELLA,

2003)

Segundo Porter,

tem-se afirmado que o Sermão da Montanha apresenta Jesus como o novo Moisés, ensinando a Lei ao povo. Existem correspondências entre os cinco discursos de Jesus no evangelho de Mateus (Mateus 5-7; 13; 18; 23-25) e os cinco livros da Lei Mosaica. O cenário montanhoso e o fato de Jesus falar sentado – a postura judaica habitual para ensinar – também podem ser referências a Moisés: o banco na sinagoga de onde a Lei era exposta era conhecido com “cadeira de Moisés". Mesmo que se admita tudo isso, deve-se reconhecer que, do ponto de vista cristão, Jesus é muito maior que Moisés e seu sermão é muito mais que apenas a promulgação de uma nova Lei. A força da Lei Mosaica permanece, mas só para a era de Jesus. O sermão da montanha é a proclamação de um reino futuro, que impõe aos discípulos de Jesus exigências que vão além dos requisitos da Lei. (PORTER, 2009, p.168)

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Portanto, “a justiça de Deus apresentada nos evangelhos não é um apelo somente

que denuncia, exige e condena, mas primariamente é um encontro com o Deus

amor, por meio do perdão e da misericórdia” (SELLA 2003, p.145).

3.1.2 A luz do mundo.

Após proclamar o caminho cristão das bem aventuranças, Jesus continua seu

discurso estabelecendo a importância da prática na vida cotidiana. Ao usar a

comparação da luz com as trevas, Ele volta a realçar a necessidade de mudanças e

de uma libertação por completo. (Mt 5, 13-16)

A luz que ilumina e dá a possibilidade de caminhar sem tropeços ou por caminhos

errados. Ao fazer tal comparação , Cristo convoca todos para uma vivência coerente

e sem hipocrisia, enfatizando a importância do testemunho de cada um: “que brilhe a

vossa luz diante dos homens” (Mt 5, 16).

Parece ficar muito claro que a mudança proposta por Jesus deve começar no interior

de cada um, onde exista a preocupação e o esforço para ser e fazer o melhor para o

mundo, sendo como que “iluminados”, tornando-se construtores da justiça social e

da paz.

Sella escreve que “o convite de Jesus supera a simples conversão, mas é um

pedido a mudar as estruturas injustas da lei por meio da força do amor”. (SELLA,

2003, p.146)

O Catecismo trata a fidelidade aos ensinamentos como condição primeira do cristão,

conforme vemos: “A fidelidade dos batizados é condição primordial para o anúncio

do Evangelho e para a missão da Igreja no mundo. Para manifestar diante dos

homens sua força de verdade e irradiação” (CIC, 2000, p.537).

3.1.3 Leis e condutas para aqueles que seguem Jesus

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Na continuidade de seus ensinamentos, Jesus volta a apresentar a Lei Mosaica

como fundamento para todo o povo. Porém, Cristo volta a dizer contra os grupos da

época que nada faziam para ajudar na construção de uma sociedade mais justa. “Se

a justiça de vocês não superar a dos doutores da Lei e dos fariseus, vocês não

entrarão no Reino do céu” (Mt 5, 20).

Percebe-se uma dura crítica a hipocrisia daqueles que se diziam cumpridores da Lei

sagrada. Smith explica que “foi a negligência na observância do código de santidade

que reduziu os judeus ao estado de servidão, o qual só seria revertido com a volta

sincera à Lei de Javé”. (SMITH, 1991, p.306)

Com o intuito de demonstrar a essência da Lei de Deus, Jesus dedica algumas

falas, relembrando a Lei Mosaica e demonstrando seu verdadeiro sentido. Dentre

elas estão: a ofensa e reconciliação com o próximo, o caso de adultério e divórcio, o

juramento, a regra do olho por olho e dente por dente e a forma de amar o próximo.

(Mt 5, 17-48)

A ofensa para com o outro é vista como uma forma de morte e condenação e a

reconciliação torna-se uma exigência fundamental para entrar no Reino de Deus.

Basicamente, é aplicação da misericórdia e da mansidão, citada nas bem

aventuranças.

Ao citar o adultério e o divórcio, Jesus claramente eleva ao máximo o valor da

família e do casamento. Esse tema é novamente falado um pouco mais à frente, no

capítulo 19 do mesmo evangelho.

No Catecismo da Igreja lemos que

em sua pregação, Jesus ensinou sem equívoco o sentido original da união do homem e da mulher, conforme quis o Criador desde o começo; a permissão de repudiar a esposa, concedida por Moisés, era uma concessão devida a dureza de coração (Mateus 19, 8); a união matrimonial é indissolúvel: Deus mesmo a consumou: “O que Deus uniu, o homem não deve separar. (CIC, 2000, p.442)

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O apóstolo Paulo também eleva o valor da união conjugal, comparando o amor dos

esposos com o amor de Cristo a sua Igreja, como lemos: “Maridos amai vossas

mulheres, como Cristo amou sua Igreja e se entregou por ela... É grande este

mistério, refiro-me à relação entre Cristo e sua Igreja” (Ef 5, 25-32).

Antes de qualquer coisa, a valorização está na estrutura familiar, onde estão as

bases de uma sociedade, já que toda a experiência humana começa à partir dela.

Claro que, por ser um ente social, a família sofreu mudanças ao longo do tempo e,

especialmente nos tempos modernos, sofre duras penas para adaptar-se àquilo que

vem sendo proposto. (PETRINI, 2005)

Segundo Petrini,

Aumentam as separações e os divórcios, os jovens casam mais tarde, em comparação a duas décadas atrás, diminui também significativamente o número dos casamentos, aumenta o número de famílias reconstituídas, as uniões de fato, as famílias monoparentais e as chefiadas por mulheres (Berquó, 1998) (9). As tarefas educativas e de socialização são cada vez mais compartilhadas com outras agências, públicas ou privadas (Goldani, 1994). As mudanças são de tal magnitude e influenciam de tal maneira a família que esta parecia desaparecer. É dos anos 70 o livro de Cooper (1994), que anunciava “a morte da família”. (PETRINI, 2005, p. 29)

O catecismo reforça o valor da instituição familiar na sociedade dizendo que “de sua

aliança, se origina também diante da sociedade uma instituição firmada por uma

ordenação divina” (CIC, 2000, p.448). Sendo assim, a necessidade de cuidar,

valorizar e proteger a família são pontos fundamentais no ensinamento de Cristo

para a construção correta da sociedade.

Continuando o ensinamento, Jesus fala sobre a importância da palavra do homem

baseada na verdade e honestidade. O juramento não deve ser feito em nenhuma

circunstancia. “Diga apenas sim quando é sim e não quando é não” (Mt 5, 37).

Isso parece ser algo utópico dentro da sociedade atual onde o valor da palavra

tornou-se cada vez mais medíocre. Nada se faz sem testemunha, contratos ou

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documentos comprobatórios que possam testificar a palavra da pessoa. Fica claro

que a força da palavra auferida é um valor fundamental do cristianismo.

Encerrando a atualização da Lei, Jesus adverte sobre a não violência e o amor

comportamental. Oferecer a outra face e amar seus inimigos talvez seja a forma de

cumprir com excelência o Reino de paz.

Não existe guerra para aquele que oferece a paz. Muitos usaram dessa verdade,

como, por exemplo, Gandhi, um homem de fé conseguiu libertar seu povo com o

princípio da “não violência”. (ROHDEN, 2011)

A proposta de amar aqueles que nos odeiam é um tanto instigante e, porque não

dizer, bem complicada, porém, a forma mais correta de instaurar uma sociedade de

paz e de justiça.

3.1.4 – Relacionamento com Deus

O relacionamento com Deus também é tratado por Jesus em seu sermão, sendo um

ponto importante para compreendermos como o sentimento religioso deve ser

buscado pelo cristão. Não basta fazer a justiça, dar esmolas ou realizar lindas

orações ou pregações públicas se o verdadeiro fim não for o próprio Deus, ou seja,

sem esperar elogios ou reconhecimentos dos outros. (Mt 6, 1-14)

Sem dúvida, Jesus fala sobre a hipocrisia religiosa da época, onde nem mesmo a

boa ação tem valor perante o Reino se não partir do coração desinteressado por

recompensas.

É um ataque explícito sobre a falsidade do homem, como Smith explica: “Ele fala de

pessoas cuja fachada é um sepulcro majestoso, mas cuja vida interior tem o fedor

de cadáveres em decomposição”. (SMITH, 1991, p. 309)

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Zilles explica que o ensinamento social da igreja cristã é antigo quanto a própria

Igreja e que se baseia sempre na fé e na ética (ZILLES, 2011). Esta ética cristã é

exigida por Jesus em seu sermão da montanha, contrário à hipocrisia e expressões

exteriores mentirosas.

Jesus termina seus conselhos religiosos ensinando a oração conhecida como “Pai

nosso”. Dentro desta oração, tudo está interligado com a transformação pessoal do

coração daquele que reza. Até mesmo o perdão de Deus está condicionado ao

perdão que damos ao outro, “perdoai assim como perdoamos” (Mt 6, 12).

A hipocrisia é uma forma de descumprir a justiça, pois, segundo Sella, a justiça é

cumprir a vontade e o plano de Deus (SELLA, 2003).

Jesus nos ensina que a justiça de Deus é uma justiça nova, superior a justiça dos fariseus e dos escribas (Mt 5, 20) quer era aquela perfeita e minuciosa observância da lei, como estavam convencidos os fariseus e escribas. Trata-se, ao invés, de fazer a vontade do Pai. (SELLA, 2003, p.126)

Sendo assim, ao combater a hipocrisia dos fariseus e escribas, Jesus demonstra a

ética da justiça cristã.

3.1.5 – As escolhas e buscas fundamentais da vida

A máxima do ensinamento cristão sobre as escolhas da vida pode ser resumida na

frase “onde está o seu tesouro, aí estará também o seu coração” (Mt 6, 21), pois “de

que vale o homem ganhar o mundo inteiro e perder a sua própria vida?” (Mc 8, 36).

Jesus proporciona uma reflexão entre a busca desenfreada por riquezas e poderes

seculares e o esquecimento do sentido maior da vida. Tal ensinamento vem de

encontro com a sociedade moderna, pois, mesmo diante de tanta evolução e

tecnologia, o abismo social de classes e a triste realidade da fome e das doenças

crescem a cada dia.

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Com certeza, aqui está outra máxima da consciência religiosa cristã que enfatiza a

busca por um sentido maior na vida, não se deixando fracassar nas escolhas

fundamentais do cotidiano e se perdendo no sentido último de cada um.

O Catecismo da Igreja afirma que Jesus “ensina que a verdadeira felicidade não

está nas riquezas ou no bem-estar, nem na glória humana ou no poder, nem em

qualquer obra humana, por mais útil que seja” (CIC, 2000, p.471), pelo contrário, é a

escolha por um sentido maior (Deus, fonte do amor e todo bem) que transcende o

sentimento materialista.

A vida é um emaranhado de escolhas que precisamos realizar, e nem sempre

fazemos a coisa certa. Quando Jesus fala sobre isso, coloca a opção pelo amor e

pelo bem acima de qualquer outra coisa, e ataca diretamente ao acúmulo de

riquezas e tesouros exteriores ao invés do crescimento e elevação espiritual e

existencial.

“Não ajuntem riquezas aqui na terra, onde a traça e a ferrugem corroem, e onde os

ladrões assaltam e roubam” (Mt 6, 19) é o ensinamento de Cristo para um povo que

vivia duas realidades distintas.

Enquanto uma pequena parcela enriquecia e beneficiava-se da ocupação romana,

outra parcela muito maior vivia às margens da sociedade, sem dignidade e

perspectiva futura. (SMITH, 2005)

Para estes pequeninos e injustiçados, Jesus pede a fé e a busca por uma vida justa

e tudo o resto viria em acréscimo (Mt 6, 33). O ensinamento cristão genuíno quer

mostrar um Deus presente na vida cotidiana e atento as necessidades de cada um.

Aqui temos outra máxima cristã, ou seja, o dever em apresentar um Deus que é um

Pai presente e amoroso, com atenção especial para com os mais pobres e

necessitados.

Mais uma vez percebe-se a ética cristã em busca da justiça social. Vidal explica que

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“a moral cristã é um projeto de realização autêntica e libertadora para a história

humana; a forma de assumir o humano no projeto da ética cristã tem de estar

condicionada pela estrutura secular de realidade intra-mundana”. (VIDAL, 2007, p.6)

Assim, compreendendo o argumento de Vidal, o cristianismo se insere socialmente

na realidade secular dos homens para tentar conduzi-los a, em todos os momentos,

escolherem e optarem por fundamentos morais e éticos que alcancem o bem

comum.

3.1.6 – Não julgar para não ser julgado.

Quando Jesus alerta sobre os julgamentos humanos, certamente está abrindo a

mente do povo para um tipo de sabedoria superior, onde não devem existir

julgamentos por ninguém, a não ser pelo próprio Deus, sendo que não existe

ninguém capaz de realizar tal ação. “Quem não tem pecado, atire a primeira pedra”

(Jo 8, 7) é a conhecida frase que faz com que todos voltem para si antes de olhar

para os defeitos dos outros.

É a experiência do autoconhecimento e do reconhecimento da limitação humana,

que os maiores sábios da humanidade encontraram e reconheceram. Assim como

Sócrates em sua famosa frase “só sei que nada sei” (CHAUI, 2000), em contradição

aos sofistas da época que vendiam o conhecimento e diziam ser sabedores de todas

as coisas, o filósofo grego alerta sobre a transcendência da sabedoria e a limitação

do pensamento.

O discurso de Jesus quer trazer a reflexão existencial para cada homem ou mulher,

para não cairmos no erro da arrogância e autossuficiência que só tendem a matar a

capacidade de crescimento intelectual e existencial da humanidade.

No Catecismo da Igreja está escrito: “a santíssima Igreja romana crê e confessa

firmemente que no dia do juízo todos os homens comparecerão com o seu próprio

corpo diante do tribunal de Cristo para dar contas de seus próprios atos” (CIC, 2000,

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p.297). Portanto, para o ensinamento cristão, somente Cristo tem a condição de

julgar os pecados.

Sella explica que “justiça é então, cumprir o projeto do Pai sobre a terra. Esta

preocupação de Jesus está presente do começo ao fim da sua missão” (SELLA,

2003, p.132). “O ministério do justo é realizar o Reino de Deus. Por isso, Jesus, ‘o

Justo’, veio fazer acontecer o Reino de Deus que é a grande e absoluta vontade de

Deus” (SELLA, 2003, p.133).

3.1.7 – Amar ao próximo com a si mesmo.

Aqui está o fundamento máximo do cristianismo para a construção de uma

sociedade justa e de paz: “Tudo o que vocês desejam que os outros façam a vocês,

façam também a eles” (Mt 7, 12).

A busca do lugar perfeito para se viver só irá terminar no dia em que todos

perceberem que suas necessidades humanas não são mais e nem menos do que as

necessidades das outras pessoas. É o reconhecimento de que todos temos

necessidades, desejos, sonhos e aspirações que, na verdade, passamos toda a vida

buscando a melhor forma de realizá-los.

No texto evangélico, a afirmação é “façam ao outro aquilo que deseja que façam a

você” (Mt 7, 12), porém, o inverso também é verdadeiro, ou seja, “não façam ao

outro aquilo que não deseja que façam a você”.

Entretanto, a busca simples pelo lucro e poder acaba por reduzir pessoas em

fantoches do capitalismo, a serviço de um sistema que valoriza uma busca

desenfreada pelo ter e abomina qualquer discurso existencial, sendo válido qualquer

esforço para alcançar o objetivo esperado, ainda que derrube ou prejudique o outro.

Petrini discursa sobre isso, dizendo:

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O mercado vitorioso abre espaço a uma pós-modernidade na qual a lógica do capitalismo globalizado mostra seus lados sombrios, com a redução dos quadros funcionais nas empresas e nas administrações públicas, com a ameaça de desemprego, com as exigências de competitividade, de qualidade e de dedicação ao trabalho que absorvem as melhores energias das pessoas, com violências e guerras que mal encobrem com o ideal das liberdades democráticas interesses menos elevados. “A sensação de insegurança invadiu os espíritos: a saúde se impõe como obsessão das massas, o terrorismo, as catástrofes, as epidemias são regularmente notícias de primeira página” (PETRINI apud LIPOVETSKY, 2004, p.64). Este novo cenário não dispõe mais das utopias que já foram desconstruídas. A vida aparece como estressante e apreensiva, prevalecem as preocupações com a segurança, com a proteção, com a defesa das conquistas sociais, com a ecologia. (PETRINI, 2005, p. 26)

Em contrapartida desse pensamento, Jesus resume toda a Lei Mosaica no amor a

Deus e ao próximo, elevando ao máximo o valor de todas as pessoas. O amor que

Cristo apresenta é universalizante, pois não coloca ninguém na condição de

“preferidos” por Deus.

Tal pensamento se choca diretamente com a ideia do Messias que viria para salvar

o povo judeu. Esse conflito era o principal argumento dos fariseus contra a pessoa

de Jesus, pois, para eles, era inadmissível o enviado de Deus visitar a casa dos

pecadores. (Lc 19, 7)

O evangelista João inicia seu evangelho dizendo “ele veio para o que era seu, mas

os seus não o reconheceram. Mas a todos aqueles que o receberam, aos que creem

no seu nome, deu-lhes o poder de se tornarem filhos de Deus” (Jo 1, 11-12).

Isso comprova a universalidade da mensagem cristã, pois, mesmo Cristo sendo

judeu e vivendo toda a sua vida segundo os costumes e tradições judaicas, sua

vinda não estava limitada apenas para um tipo de cultura ou povo específico, mas

para toda a humanidade. Vemos esta comprovação também no livro de Atos dos

apóstolos, que na ocasião de Pentecostes, eles receberam línguas vivas e

anunciaram o evangelho na língua de cada peregrino (At 2, 6).

O Catecismo da Igreja ensina que

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“Deus escolheu Abraão e fez uma aliança com ele e sua descendência. Daí formou seu povo, ao qual revelou sua Lei por intermédio de Moisés. Pelos profetas preparou este povo a acolher a salvação destinada à humanidade inteira” (CIC, 2000, p.32).

Sendo assim, toda a mensagem de amor de Jesus, mesmo que sendo revelada em

um povo escolhido, o povo de Israel, destina-se para todos aqueles que aderem à

mesma fé.

Assim Jesus disse: “Ninguém tem maior amor do que aquele que dá a sua vida por

seus amigos” (Jo 15, 13). Portanto, o amor é o fundamento máximo do cristianismo.

Tudo que afrontar o amor não pode ser essencialmente cristão.

3.1.8 – A fé e a prática

Jesus encerra seu sermão falando sobre a fé no cotidiano. Nos últimos versos do

sermão, parece ficar claro que o cristianismo autêntico exige coerência e

compromisso, com uma dose de coragem e renúncias.

“Entrem pela porta estreita, porque é larga a porta e espaçoso o caminho que levam

para a perdição, e são muitos os que entram por ela. Como é estreita a porta e

apertado o caminho que levam a vida, e são poucos os que a encontram.” (Mt 7, 13-

14).

Percebemos que, segundo o evangelho, existem dois caminhos: o que leva para a

perdição e o que leva para a vida. É interessante pensar que Jesus não quer iludir o

povo e nem prometer um caminho repleto de flores e alegrias. Pelo contrário, a

escolha por uma vida de princípios e guiada pelos valores cristãos tende a ser mais

difícil.

Jesus diz ser prudente o homem que escolhe e põe em prática as palavras

proferidas por ele, pois este construiu sua casa sobre a rocha (Mt 7, 24). Desta

forma, podemos perceber que o ensinamento cristão não pode ser reduzido para

uma simples religiosidade ou filosofia religiosa, pois é muito mais do que isso.

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Ele exige ações concretas de amor, piedade, misericórdia, compaixão, caridade e

justiça. Nem todos os que dizem Senhor, Senhor entrarão no Reino do céu (Mt 7,

21), pois não basta uma religiosidade vazia e sem atitudes cotidianas concretas.

Isso se comprova no ensinamento pastoral do apóstolo Tiago em sua carta, quando

diz que “assim como o corpo sem a alma é morto, assim também a fé sem obras é

morta” (Tg 2, 26).

Se todos os cristãos do mundo colocassem em prática os ensinamentos genuínos

de Jesus, talvez pudéssemos ver uma sociedade com mais justiça, paz e

solidariedade.

O cristianismo exige ética nas ações cotidianas, de maneira especial, o cuidado para

com os mais necessitados e desvalidos da sociedade. Libanio (2006) explica que a

ética antiga construída no mundo grego, apesar de manter distância da religião,

utilizava a premissa básica do “conhece-te a ti mesmo”, onde “por esse

conhecimento começava a perguntar-se por que caminho seguir, que ethos assumir

de maneira crítica. E ia construindo a ética, como momento reflexivo sobre essa

conduta. Norteava-o o ideal de realizar o bem em sua vida. Este é o fim último”.

(LIBANIO, 2006, p.2).

O pensamento cristão apresenta Deus como o bem supremo e, portanto, o

seguimento fiel aos seus ensinamentos pode construir uma vida ética, ou seja, Deus

é o fim último. É a experiência da construção da casa sobre a rocha, ou seja,

construir uma vida com princípios valiosos e duradouros, capazes de sustentar a

dignidade de cada pessoa. Portanto, todo ensinamento do sermão quer chegar ao

fim último da prática e da implantação do Reino de Deus. (LIBANIO, 2006).

No cristianismo primitivo, muitos acreditavam em uma breve segunda vinda gloriosa

de Jesus, embasados no anúncio de conversão de João Batista: “convertam-se, pois

o Reino de Deus está próximo” (Mt 3,2). Percebemos isso na carta de Paulo aos

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Tessalonicenses, o texto mais antigo do Novo Testamento, escrito por volta dos

anos 50 d.C. Nela vemos um alerta sobre as falsas ideias relativas ao retorno de

Cristo, pois pensava-se em um retorno imediato de Cristo (2 Ts 2,2-3).

Porém, o Reino que João Batista anuncia no deserto inicia-se em Jesus e em seus

ensinamentos, que devem ser vividos e aplicados no mundo por todos aqueles que

aderem ao cristianismo.

Paulo diz que “ainda que eu tivesse toda a fé a ponto de transportar montanhas,

sem amor não sou nada” (I Cor 13, 2). O amor é a ética cristã máxima e o

cumprimento integral da fé, a maior de todas as obras, conforme Baleeiro explica,

baseando-se no pensamento de Vattimo, dizendo que todo o novo testamento é

orientado pelo critério do amor ao qual Jesus pretende demonstrar em seus atos e

interpretações do Antigo Testamento. (BALEEIRO, 2009)

3.2 – A ÚLTIMA CEIA

A última ceia e tudo o que acontece depois dela, a paixão, morte e ressurreição de

Jesus, são fontes inesgotáveis e insondáveis de riqueza espiritual e humana para os

cristãos do mundo inteiro.

Smith afirma que “Jesus e seus discípulos talvez tivessem construído uma

‘irmandade’ e se encontrassem regularmente para uma refeição religiosa formal”

(SMITH, 2009, p. 192).

Os evangelhos nos mostram uma ligação profunda entre Cristo e seus discípulos e,

por essa razão, é considerado a primeira comunidade cristã da história. Para o povo,

Jesus falava por meio de parábolas (Mc 4, 2), mas, quando estavam a sós, ele as

explicava aos discípulos (Mc 4, 13).

No evangelho de João, Jesus mostra claramente essa ligação ao dizer: “já não vos

chamo de servos, porque o servo não sabe o que faz o seu senhor. Mas chamei-vos

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de amigos, pois vos dei a conhecer tudo o quanto ouvi de meu Pai” (Jo 15, 15).

Desta forma, fica claro que o relacionamento que Cristo desejou desde o princípio

não era meramente de servidão, mas de uma irmandade verdadeira.

Portanto, o cristianismo primitivo começa com a formação de comunidades

comprometidas e solidárias entre si, primeiramente com a comunidade messiânica e,

depois, com a extensão das comunidades sob o comando dos apóstolos de Jesus

(At 2, 42-47).

Por essa razão, a última ceia passa a ser tão importante para o cristianismo, pois

não é simplesmente uma refeição de despedida de Jesus, mas uma forma de

manter a unidade, a comunhão e a força da comunidade cristã.

O Catecismo da Igreja ensina que

Jesus exprimiu de modo supremo a oblação livre de Si mesmo na refeição que tornou com os doze Apóstolos (472), na «noite em que foi entregue» (1 Cor 11, 23). Na véspera da sua paixão, quando ainda era livre, Jesus fez desta última Ceia com os Apóstolos o memorial da sua oblação voluntária ao Pai (473) para a salvação dos homens: «Isto é o meu Corpo, que vai ser entregue por vós» (Lc 22, 19). «Isto é o meu "Sangue da Aliança", que vai ser derramado por uma multidão, para remissão dos pecados» (Mt 26, 28). (CIC, 2000, p.174)

Esse momento é relatado nos quatro evangelhos, mas João relata diferente dos

outros três evangelistas, enfatizando a dimensão espiritual e mística da experiência.

Muito diferente do sermão da montanha, que é proclamado à multidão, a última ceia

parece ser um momento íntimo de ensinamento, movido por uma profunda

experiência de amor, perdão, despedidas e conselhos valiosos.

João propositalmente relata a experiência de outra maneira, trazendo atos e

conversas que os outros não trazem, especialmente pontos importantes como o lava

pés, o mandamento novo de Jesus, o envio do Espírito Santo, conselhos para

preservar a unidade e a perseverança, o ódio e a oposição do mundo e a oração

pela unidade, os quais trabalharemos a seguir.

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3.2.1 – O lava pés

A santa ceia no evangelho de João começa com o episódio do lava pés, que não é

relatado nos outros três evangelhos. Hunter em seu livro chamado “O monge e o

executivo” traz uma reflexão sobre liderança baseado nos ensinamentos de Cristo.

Almeida, ao citar esse livro, explica que

o mundo corporativo começou a falar de liderança servidora. A fonte da autoridade seria, então, a disposição para servir. O líder servidor é alguém que é obedecido, porque antes de mandar fazer ele já fez, e já sabe como se faz. (ALMEIDA, 2008, p.14)

Sem dúvida, Jesus foi um líder servidor, pois em tudo deu exemplo e demonstrou

com atitudes concretas tudo o que ensinava com palavras. Ele mesmo confirma sua

liderança servidora quando adverte dois de seus apóstolos: “e quem de vocês quiser

ser o primeiro, deverá tornar-se servo de vocês. Pois o Filho do Homem não veio

para ser servido. Ele veio para servir, e para dar a sua vida como resgate em favor

de muitos” (Mt 20, 27-28).

Assim, o lava pés quer trazer uma mensagem de servidão mútua para o bem

comum, ou seja, o bem de cada um estar subordinado ao bem de todos. Sella

explica que

o bem comum é o rosto da justiça social, sendo também a essência do cristianismo, segundo o pensamento patrístico. É São João Crisóstomo que declara explicitamente que a “regra do cristianismo mais perfeito, a definição mais exata, seu ponto mais elevado, consiste em procurar o bem comum”. (SELLA, 2003, p.160)

Mas a riqueza desse ato de Jesus é ainda maior se aprofundarmos na mística

daquele momento onde Cristo estava prestes a ser entregue as autoridades para

cumprir sua paixão, morte e ressurreição.

A humildade, o desprendimento de si e a renúncia de qualquer condição humana

são impressionantes nesse momento da ceia. “Eu que sou o Mestre e Senhor, lavei

os seus pés, vocês também devem lavar...” (Jo 13, 14) disse Jesus.

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Não é tão simples agir assim nos dias de hoje, onde o individualismo é cultuado e

nos escondemos nos títulos, diplomas e cargos que assumimos. É interessante

pensar que Pedro nega o fato, a princípio (Jo 13, 8), escondendo suas misérias e

conflitos.

Pedro, na verdade, não queria ver Jesus daquela forma. Ele esperava um Messias

diferente. Vanier afirma que ele “teria preferido um Jesus profético e messiânico, que

não tivesse insistido para lavar-lhes os pés, e não tivesse falado em morrer”.

(VANIER, 2011, p.163). Talvez tenha pensado estar preparado para ser preso ou

dar a vida por Jesus, e até chegou a prometer isso (Lc 22,33), mas foi pego de

surpresa quando Jesus o repreende por ter ferido um soldado com a espada (Jo 18,

11).

Tal situação fez com que Pedro negasse Jesus três vezes. Vanier afirma que

Para Pedro, era fácil seguir Jesus quando o via fazer milagres e outras coisas maravilhosas. Agindo dessa forma Jesus parecia, de verdade, com o Messias que iria devolver a dignidade a Israel a dignidade (VANIER, 2011, p.165).

A riqueza do lava pés é que Jesus insistiu em lavar os pés de Pedro, mesmo

sabendo de sua covardia em um futuro muito próximo (Lc 22, 34). Com isso, Cristo

inaugura a máxima do perdão e da aceitação do outro, com suas misérias, medos,

fraquezas e limitações humanas.

É a experiência de olhar nos olhos daquele que traiu e perdoar, amar

incondicionalmente e voltar a confiar novamente, assim como Cristo confiou as

ovelhas para Pedro (Jo 21, 15).

Em uma sociedade individualista e capitalista, o lava pés parece ser o mais difícil

dos ensinamentos de Jesus, pois temos a tendência de nos fechar para o outro na

medida que a decepção chega. Antes de ser uma simples lembrança do que Cristo

realizou, acima de tudo, a essência está em acertar o que está errado, perdoar e

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suportar as limitações e formar comunidade de irmãos, filhos de um mesmo Pai, o

“Pai nosso”.

3.2.2 – O mandamento novo de Jesus

Toda a essência da mensagem de Cristo está no amor, por isso, este foi o único

mandamento que ele deixou: “Amai-vos uns aos outros, como eu vos amo” (Jo 15,

12).

Ao dizer isso, Jesus quer deixar a máxima do cristianismo que é o amor

incondicional e sem limites pelo outro, pois foi assim que ele amou; “ninguém tem

maior amor do que aquele que dá a vida por seus amigos” (Jo 15, 13).

Podemos entender o “dar a vida” de duas formas. Primeira, a literal, como Jesus fez

na cruz. Muitos que vieram depois dele tiveram essa coragem, pois grandioso é o

número de mártires na história do cristianismo. A segunda pode-se entender como

uma espécie de renúncia do “eu” para viver para o “tu”.

Leonardo Boff, ao refletir sobre a razão e o sentimento, afirma que

(...) o dado originário não é o logos, a razão e as estruturas de compreensão, mas o pathos, o sentimento, a capacidade de simpatia e empatia, a dedicação, o cuidado e a comunhão com o diferente. Tudo começa com o sentimento. É o sentimento que nos faz sensíveis ao que está à nossa volta, que nos faz desgostar. É o sentimento que nos une às coisas e nos envolve com as pessoas. É o sentimento que produz encantamento face à grandeza dos céus, suscita veneração diante da complexidade da Mãe-Terra e alimenta enternecimento face à fragilidade de um recém-nascido. (BOFF, 1999, p.2)

Boff chama isso de “saber cuidar”, uma capacidade que somente os humanos

podem ter. Com esse pensamento, o teólogo quer resgatar a característica principal

do homem, ou seja, sua capacidade de sentir emoção e cuidar do mundo e do outro.

Jesus, ao deixar o mandamento do amor, quer demonstrar que todas as relações

começam e devem começar a partir dele. João, conhecido como o discípulo amado,

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escreve em uma de suas cartas: “Amemo-nos uns aos outros, porque o amor vem

de Deus, e todo aquele que ama é nascido de Deus e conhece a Deus” (I Jo 4, 7).

Essas palavras de João deixam claro que o ensinamento máximo de Jesus é

repassado pelos apóstolos para as novas comunidades cristãs que iam surgindo.

João apresenta Jesus como a encarnação ou personificação do amor (Deus), aquele

que “tudo desculpa, tudo crê, tudo espera, tudo suporta” (I Cor 13, 7).

Toda a essência do que se originaria a religião cristã está fundamentado no amor.

Um amor sem precedentes, sem limites e completamente incondicional. Jesus

apresenta um Deus Pai apaixonado pelo homem, disposto a chegar até as últimas

consequências para conquistar o seu coração.

Qualquer coisa que não tenha esse fim não pode ser reconhecidamente cristão,

pois, assim como ensina Paulo

O amor é paciente, é prestativo, não é invejoso, não se ostenta com, não se incha de orgulho. Nada faz de inconveniente, não procura seu próprio interesse, não se irrita, não guarda rancor. Não se alegra com a injustiça, mas se regozija com a verdade. Tudo desculpa, tudo crê, tudo espera, tudo suporta. O amor amais passará (I Cor 13, 4-8).

É por isso que, passado muitos anos, ainda se fala Dele e Seu nome está gravado

em muitos corações. Uma presença que transcende toda a limitação humana e

eterniza nossas faculdades primeiras, aguçando nossas capacidades emotivas e

dando asas para todos aqueles que Nele verdadeiramente se aproximam. Uma

ponte de ligação do que é humano para o divino e do que é profano para o sagrado.

Sella explica que a justiça torna-se amor ao se encontrar com o Deus amor, dizendo

O capítulo 15 de João revela como o fruto mais maduro e saboroso da justiça, encarnando a vontade de Deus, é o amor que se torna a relação essencial dos discípulos e da comunidade (...) João tentou revelar em todo o seu evangelho esta eterna verdade que liberta: o amor. João então acrescenta que a justiça se torna vontade de Deus, ou seja, uma nova ordem da humanidade mediante o Reino de Deus, somente quando se torna o amor ágape. (SELLA, 2003, p. 147)

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Ou seja, o fruto maior que o cristianismo pode trazer é a justiça transformada em um

amor verdadeiro e universalizante, integrador e libertador.

3.2.3 – O envio do Espírito Santo

O Espírito Santo é uma forma misteriosa de presença de Deus no cotidiano da vida

cristã. Toda a ação religiosa, cultural, social ou humana dos seguidores de Jesus

Cristo está fundamentada nesta presença.

No livro de Atos dos Apóstolos, vemos que somente depois da descida dessa “força

do alto” (At 1,8) que os apóstolos saíram propagar a notícia evangélica e

continuaram o ministério de Jesus (At 2, 14).

É o próprio Jesus que promete esta vinda para os apóstolos na Santa Ceia: “Então

eu pedirei ao meu Pai, e ele dará a vocês outro Advogado, para que permaneça com

vocês para sempre” (Jo 14, 16).

No Catecismo da Igreja está escrito que “ao anunciar e prometer a vinda do Espírito

Santo, Jesus o denomina de o “Paráclito”, literalmente: aquele que é chamado para

perto de, ‘advocatus’“. (CIC, 2000, p.200)

Segundo o ensinamento cristão, o Espírito Santo é uma das pessoas da Trindade

Santa que, consubstancial ao Pai e ao Filho, está presente desde a criação. Na

Economia divina foi manifestado desde os patriarcas da fé (Abraão, Isaac e Jacó)

até Moisés e nas visões dos profetas (CIC, 2000).

Porém, a plenitude de sua manifestação se dá no próprio Jesus Cristo, no momento

do anúncio do seu nascimento para Maria (CIC, 2000), conforme relata o evangelho:

“O Espírito Santo virá sobre você, e a força do Altíssimo a cobrirá com sua sombra”

(Lc 1, 35).

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O próprio Jesus confirma isso, ao dizer: “O Espírito do Senhor está sobre mim...” (Lc

4, 18). Desta forma, “toda a missão do Filho e do Espírito Santo na plenitude do

tempo está contida no fato de o Filho ser o Ungido do Espírito do Pai desde a sua

Encarnação: Jesus é o Cristo, o Messias” (CIC, 2000, p.210).

É importante compreender que, ao anunciar a vinda do Espírito Santo na última ceia,

Jesus está inaugurando um novo tempo, onde o dom do Espírito Santo é para todos

e não mais para alguns homens e mulheres escolhidos, como vemos no Antigo

Testamento.

Assim, o dia de Pentecostes é o marco inicial para o que se entende como últimos

tempos, ou seja, “o Reino anunciado por Cristo está aberto aos que creem nele; na

humildade da carne e na fé, eles participam já da comunhão da Santíssima

Trindade” (CIC, 2000, p.211).

Desta forma, no tempo da plenitude, o Espírito Santo é para todos os homens e

mulheres que, por meio da fé, pedirem ao Pai por intermédio de Jesus Cristo: “Pois

a promessa é em favor de vocês e de seus filhos, e para todos aqueles que estão

longe, todos aqueles que o Senhor nosso Deus chamar” (At 2, 39).

Porter explica que

o dom do Espírito Santo é de importância central para o autor dos livro dos Atos dos apóstolos, porque é a força que move a história contada por ele. O Espírito faz conversões, possibilita milagres e dá sabedoria e coragem aos líderes da jovem Igreja. Ele os leva a assumir iniciativas importantes, como a visita de Pedro ao gentio Cornélio (At 10), e viagens missionárias. (PORTER, 2009, p. 216)

Por fim, somente por meio da ação deste Espírito Santo que o cristianismo pode ser

conduzido e todo aquele que adere a fé pode receber os dons concedidos por Ele.

3.2.4 – Conselhos para preservar a unidade e perseverança

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“Permanecei em mim e eu permanecerei em vós” (Jo 15, 4) é a orientação dada por

Jesus para seus apóstolos como forma de perseverar em seus ensinamentos. É

interessante perceber que nesse momento da ceia, assim como no sermão da

montanha, Jesus realiza um pequeno sermão e, através da parábola da videira, se

apresenta como o tronco que sustenta os ramos (todos aqueles que seguem Jesus).

Na verdade, Cristo alerta novamente sobre o amor e a permanência nesse mesmo

amor, pois somente desta forma os ramos podem dar frutos (João 15, 5).

“Perseverai no meu amor” (Jo 15, 9) é o que ele diz, reforçando novamente o seu

novo mandamento.

É através do mesmo amor que Cristo amou, ou seja, o amor que chegou até as

últimas consequências, que o mundo deveria reconhecer o cristianismo (Jo 14, 34-

35). No cristianismo primitivo, foi essa forma de amar que atraiu e cativou muitos

para a adesão da mesma fé, conforme vemos no livro de Atos: “louvando a Deus e

cativando a simpatia de todo o povo. E o senhor cada dia lhes ajuntava outros, que

estavam a caminho da salvação”. (At 2, 47)

Vanier, parafraseando Santa Teresa de Lisieux, escreve:

Vi que não os amava como o bom Deus os ama. Ah! Agora compreendo que a caridade perfeita consiste em suportar os defeitos dos outros, não se espantar com suas fraquezas e tirar proveito dos menores atos virtuosos que o vemos praticar. (VANIER, 2011, p.63)

Portanto, o grande segredo da permanência e da perseverança está na continuidade

do amor cristão que Jesus inaugura com sua forma de viver e de agir.

Sella afirma que

Esta é a grande verdade que Deus nos revelou: é somente o amor que chega na profundidade humana, no coração dos ricos e poderosos, nas raízes das estruturas de morte e dos sistemas históricos opressores e consegue erradicar o mal da injustiça e a prepotência da ganância e do domínio. É o amor que faz desabrochar novas relações, novas estruturas, novos sistemas, novas comunidades, novas pessoas e povos. A justiça de

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Deus será plena, quando culminar no amor do encarnado por meio da constante e teimosa busca do Reino de Deus. (SELLA, 2003, p.149)

Somente através do amor, a essência do cristianismo poderá influenciar e instituir

uma sociedade justa e fraterna.

3.2.5 – O ódio e a oposição do mundo

Jesus alerta sobre o ódio e a oposição do mundo dizendo a seguinte frase: “Se o

mundo vos odeia, sabei que me odiou a mim antes que a vós” (Jo 15, 18). Naquele

momento, certamente os apóstolos não imaginavam o que estaria por vir, mas, hoje

a história conta com perseguições pesadas nos primeiros três séculos da era cristã,

onde milhões de pessoas morreram em nome da fé em Jesus Cristo e nos princípios

cristãos para o mundo.

Cechinato escreve o seguinte:

Porque só a Igreja foi perseguida? É muito simples. Porque a Igreja não era fechada em si mesma. Ela havia recebido de Jesus a missão de anunciar o Evangelho a todos os povos. Devia converter o mundo, fazer discípulos. E isto criava um problema. Mexia com a vida dos pagãos. Representava um perigo para o Estado, que tinha divindades e seu culto oficial. Em nome de Cristo ressuscitado, a Igreja condenava aquela idolatria, inclusive o culto à pessoa do imperador. (CECHINATO, 2006, p.45)

Na verdade, Jesus sabia que sua proposta revolucionária nas formas de amar e

viver em comum não iriam ser aceitas com facilidade por todos. Seu pensamento

parece ser sofisticado demais para alguns, ou até mesmo incorreto e utópico.

Paulo de Tarso foi um dos maiores missionários cristãos, onde passou de

perseguidor (At 8,3) a perseguido (At 9,23) depois de viver uma experiência mística

de encontro com Jesus no caminho de uma viagem para Damasco (At 9, 1-9).

Jesus, na última ceia, fala sobre a perseguição, mas também afirma que, mesmo

diante dela, o ensinamento cristão seria ouvido, conforme lemos: “Se me

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perseguiram, também vos hão de perseguir. Se guardaram a minha palavra, hão de

guardar também a vossa” (Jo 15, 20).

Ao falar deste tempo do cristianismo, Cechinato afirma que

Os cristãos não tinham exército nem poder político. Sua arma não era a espada nem a violência. Eles não agrediam: eram agredidos. Não matavam: eram mortos. Não se vingavam: perdoavam. (CECHINATO, 2006, p.46)

Foi desta forma que o sangue dos mártires tornou-se fermento na massa e o número

de cristãos aumentava a cada dia.

Talvez os apóstolos expressassem medo em seus rostos, quando Jesus anuncia tal

perseguição, pois, logo depois, no texto evangélico, Jesus justifica dizendo querer

preservá-los das quedas (Jo 16, 1) e ratifica a alegria que virá: “Vocês ficarão

angustiados, mas a angústia de vocês se transformará em alegria (...) e essa

alegria, ninguém tirará de vocês” (Jo 16, 20-22).

Cechinato transcreve um trecho de uma carta de defesa aos cristãos encarcerados

que teria sido enviada para o imperador Trajano (por volta de 107 d.C) de um

conhecido escritor da época do cristianismo primitivo chamado Plínio. Assim diz:

Afirmam (os cristãos encarcerados) que o seu único crime consistia em reunir-se num dia determinado, antes do nascer do sol, para adorarem a Cristo, como seu Deus, e cantarem hinos em sua honra. Comprometem-se por juramentos, nas suas reuniões, a não praticar crimes, evitar furtos, violências e adultério, e a não renegar a sua fé. Depois voltam a reunir-se para tomarem juntos um alimento comum e inocente. (CECHINATO, 2006, p.48)

Por fim, a perseguição e intolerância religiosa foi uma realidade não somente no

início da era cristã, mas também em muitos outros momentos da história. Sem

dúvida, toda e qualquer perseguição, coação, deturpação, difamação ou calúnia com

qualquer sentimento religioso deve ser condenável, pois Jesus deixou claro como

deveria ser reconhecido o povo que aderiu seus ensinamentos e sua doutrina: “Nisto

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todos conhecerão que sois meus discípulos, se vos amardes uns aos outros” (Jo 13,

35).

A fé cristã tem um caráter universal de integração com toda a humanidade e uma

dimensão essencialmente missionária, seguindo a última ordem de Jesus:

Toda a autoridade foi dada a mim no céu e sobre a terra. Portanto, vão e façam com que todos os povos se tornem meus discípulos, batizando-os em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo, e ensinando-as a observar tudo o que ordenei a vocês. Eis que eu estarei com vocês todos os dias, até o fim do mundo” (Mt 28, 18-20).

Porém, cabe a cada homem ou mulher optar pelos ensinamentos e aderir a fé no

íntimo de seu coração. Da mesma forma que, no início de tudo, o amor e a unidade

contagiavam e ajuntavam mais cristãos, assim também deve continuar nos dias de

hoje.

3.2.6 – A oração pela unidade

João encerra seu relato sobre a última ceia com uma maravilhosa e inspiradora

oração de Jesus. É interessante que o evangelista não escreve sobre a instituição

da Eucaristia, conforme os outros três evangelhos (Mt 26,26; Mc 14,22 e Lc 22,19).

Ao contrario, João traz a chamada oração sacerdotal de consagração e, mais à

frente, faz a ligação da Eucaristia com o sangue derramado sobre o soldado: “mas

um dos soldados abriu-lhe o lado com uma lança e, imediatamente, saiu sangue e

água” (Jo 19, 34).

O evangelista João teria sido o único apóstolo que permaneceu ao lado de Jesus até

o fim, acompanhando as três Marias, a mãe de Jesus, a mulher de Cleófas e Maria

Madalena (Jo 19, 25-26). Tudo indica que ao vivenciar e testemunhar tudo (Jo 19,

35), João relata toda a Paixão, Morte e Ressurreição de Jesus como que uma

“continuação” ou extensão da última ceia.

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Por essa razão, enquanto os outros evangelhos trazem a consagração do vinho

como o “sangue da Nova Aliança que será derramado para a remissão dos pecados”

(Mt 26,28; Mc 14,24 e Lc 22,20), João faz questão de mostrar o sangue que jorra do

coração de Cristo no soldado que havia acabado de crucificar Jesus.

A oração pela unidade descrita no evangelho do amor é mais uma preciosidade do

insondável coração de Cristo. Assim como no sermão da montanha, onde Jesus

ensina a universal oração do “Pai Nosso” para toda aquela multidão, na última ceia

também traz uma oração repleta de vestígios do seu amor.

Ela está repleta de sentimento, despedidas, pedidos especiais e muito carinho.

Basicamente, está dividida em três partes: quando Jesus ora ao Pai por si mesmo,

quando ora pelos discípulos e, por fim, quando ora pela unidade.

A primeira parte é um louvor de agradecimento que Jesus eleva ao Pai por ter

cumprido seu ministério e ter glorificado o nome de Deus. Parece ter um tom de

despedida, já antecedendo o que iria acontecer algumas horas depois, naquela cruz:

“Agora, pois, Pai, glorifica-me junto de ti, concedendo-me a glória que tive junto de ti,

antes que o mundo fosse criado” (Jo 17, 5).

Já na segunda parte, Jesus intercede ao Pai por seus amigos e discípulos, pedindo

que sejam guardados e protegidos do mundo. Nesse momento, podem-se sentir

palavras carregadas de afeto e de preocupações: “Enquanto eu estava com eles, eu

os guardava em teu nome” (Jo 17, 12). Mais uma vez Jesus surpreende com sua

maneira de amar, pois, mesmo estando às portas de uma grande provação física e

psicológica, ainda se preocupava com o bem dos seus discípulos. Naquele

momento, seu insondável coração esquecia-se novamente de si, para olhar para o

outro.

Na terceira e última parte da oração, Jesus manifesta seu desejo máximo de

unidade entre todos os creem, através do amor. Nesse instante, Cristo intercede por

todos os outros cristãos que viriam, pedindo que a unidade perfeita que existe entre

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o Pai e o Filho também possa existir entre todos os cristãos do mundo. “Não rogo

somente por eles, mas também por aqueles que por sua palavra hão de crer em

mim. Para que todos sejam um, assim como Tu, Pai, estás em mim e eu em ti” (Jo

17, 20-21). Jesus encerra essa bela oração dizendo: “para que o amor com que me

amastes esteja neles, e eu mesmo esteja neles” (Jo 17, 26).

Com certeza João trouxe uma preciosidade de valor inestimável ao relatar sua

versão sobre a última ceia. Acima de qualquer coisa, João traz o amor e a unidade

como fundamental para a vivência do cristianismo.

A última ceia parece não acabar com essa oração, pois, para João, tudo o que

acontece depois é uma continuidade do chamado mistério pascal de Jesus Cristo,

que se entrega livremente para ser maltratado, condenado e morto para a remissão

dos pecados de toda a humanidade, como disse o sumo sacerdote Caifás: “Nem

considerais que vos convém que morra um só homem pelo povo, e que não pereça

toda a nação” (Jo 11, 50).

Desta forma, a unidade foi uma característica fundamental dos primeiros cristãos

que, aliada com o amor e a vida fraterna, ajuntaram-se muitos outros para a nova fé

que surgia. Assim vemos:

A multidão dos fiéis era um só coração e uma só alma. Ninguém considerava propriedade particular as coisas que possuía, mas tudo era posto em comum entre eles. Com grande poder, os Apóstolos davam testemunho da ressurreição do Senhor Jesus. E todos eles gozavam de grande aceitação. Entre eles ninguém passava necessidade, pois aqueles que possuíam terras ou casas vendiam-nas, traziam o dinheiro e colocavam-no aos pés dos Apóstolos; depois, era distribuído a cada um conforme a sua necessidade. Foi assim que procedeu José, um levita nascido em Chipre, apelidado pelos Apóstolos com o nome de Barnabé, que significa “filho da exortação”. Ele vendeu o campo que possuía, trouxe o dinheiro e colocou-o aos pés dos Apóstolos. (At 4, 32-37)

Sella escreve que

A justiça, segundo os Padres da Igreja, é uma rede de relações sociais que tem como eixo a igualdade e tem como primazia o bem comum que está sempre acima do bem individual. É marcante, nos escritos dos Padres, a

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dimensão horizontal da justiça como relações inter-humanas baseadas na igualdade social que eliminam todo tipo de discriminações, de marginalizações e de exclusões que, sobretudo, os pobres sofrem. (SELLA, 2003, p. 157)

Portanto, a unidade e a preocupação com o bem comum é, sem dúvida, um princípio

fundamental do cristianismo e, foi ela (a unidade), que trouxe o cristianismo para a

posição mundial, contagiando pessoas no mundo todo.

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4 CONFLITO ENTRE A AXIOLOGIA CRISTÃ COM A SOCIEDADE

MODERNA

É certo dizer que a religião cristã vai além da simples vida religiosa e transcende a

experiência interior do homem. Ela pretende instaurar um Reino de justiça e de paz

através do testemunho e da forma de viver de seus adeptos, ensinando e

implantando um novo mundo através de pessoas novas (Mt 28, 18-20).

Talvez seja por isso que ao longo dos séculos o cristianismo sempre “incomodou” o

mundo político e social. A perseguição romana com os primeiros cristãos estava

interligada a essa nova forma de ver a sociedade, com uma vida fraterna e

comprometida com os bons princípios. (CECHINATO, 2006)

A história nos conta que até o início do século quarto, os cristãos, mesmo sendo

vítimas de perseguições e mortes, já estavam espalhado por todo o mundo, até

mesmo na classe nobre. Cechinato explica que a força da fé está na virada de

comportamento do imperador Galério, pois este começou seu governo perseguindo

os cristãos e, no fim da vida, vítima de uma doença incurável, publicou um edital

pedindo orações para os cristãos. Após Galério, o império estava dividido, mas

Constantino torna-se imperador após vencer Maxêncio, junto a Ponte Mílvia, no dia

28 de outubro de 312. (CECHINATO, 2006)

Constantino, também chamado Constantino I, foi imperador durante 31 anos, filho de

uma cristã Helena, que depois viria a ser Santa Helena. Foi ele quem, no ano de

313, deu a liberdade de culto aos cristãos com o chamado Edito de Milão, que dizia

assim: “Havemos por bem anular por completo todas as restrições contidas em

decretos anteriores, acerca de cristãos – restrições odiosas e indignas de nossa

clemência – e de dar total liberdade aos que quiserem praticar a religião cristã”.

(CECHINATO, 2006) Foi a partir desta liberdade que todos os cristãos do mundo

puderam exercer sua religiosidade e sua fé.

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Com o Edito de Milão, o cristianismo continuou a crescer e se inserir na sociedade

com seus princípios éticos e morais ao longo dos séculos. Aquino explica que

Na Idade Média foi formada uma comunidade política sobre a unidade religiosa e sobre a fortíssima união entre a autoridade civil e religiosa, entendida e aceita como a vontade de Deus, com o mesmo fim: o bem do homem neste mundo e na eternidade (AQUINO, 2009, p.27).

Neste contexto, o Estado e a Igreja desempenhavam o papel de condutores da

sociedade. Porém, o movimento iluminista traz uma ruptura para com essa antiga

sociedade, conforme explica Zilles ao tratar sobre o iluminismo:

Caracteriza-se por uma confiança quase ilimitada na razão humana e no seu poder ilimitado para libertar o pensamento de todo tipo de preconceitos. Crê-se que somente a razão é capaz de dissipar as trevas da ignorância e do mistério, combater o despotismo e a superstição religiosa e conquistar dias melhores para a humanidade. (ZILLES, 2008, p.4)

Este processo de racionalização promovido pelo movimento iluminista se intensifica

e alcança seu auge no século seguinte, onde acontecem grandes descobertas e

inovações cientificas. Petrini escreve que

Basta pensar na abertura do Canal de Suez e na construção da Torre Eiffel, como símbolos de uma época que apostava tudo no poder da racionalidade, aplicada à solução de problemas práticos e técnicos, para melhorar as condições materiais da existência. (PETRINI, 2005, p.21)

Desta forma, a razão evoluiu e o homem conseguiu mostrar sua grande capacidade

intelectual e científica, realizando grandes descobertas até os dias de hoje. Porém, a

ciência e a razão, mesmo com todo seu crescimento, ainda não conseguiram

responder todas as perguntas e muito menos resolver todos os problemas

existenciais da humanidade.

Sella afirma que

A Revolução Francesa, século XVIII, levantou a bandeira da modernidade com três grandes objetivos: liberdade, fraternidade e igualdade. (...) A Revolução industrial do século XIX reivindicou a igualdade da produção e do consumo, e a Revolução tecnológica do século XX levantou a questão dos serviços sociais e dos bens essenciais para atender as necessidades

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fundamentais da humanidade. (...) Hoje, fazendo uma avaliação histórica, podemos declarar que a modernidade alcançou amplamente o primeiro objetivo quanto à liberdade, porém uma liberdade individual. Ainda mais, radicalizou este tipo de liberdade até o ponto de perder o horizonte ético e social. (SELLA, 2003, p.27)

Sobre isso, Petrini ainda afirma que

A sociedade moderna entra em crise por uma carência da razão, usada segundo o paradigma iluminista, que não é mais capaz de dar conta de todos os fatores da realidade, de orientar suas conquistas para responder às exigências humanas. Com efeito, a razão não mais compara seus produtos com as exigências elementares do ser humano, com as exigências de liberdade, justiça, verdade, felicidade, e sim com as exigências do mercado, isto é, do lucro e do poder. (PETRINI, 2005, p.23)

Entramos novamente, desta forma, na discussão inicial sobre a fé e a razão. Até que

ponto a razão pura e simples pode responder aos anseios humanos? Será mesmo

que a ciência pode ser um fim em si mesmo?

Muitos estudiosos discursaram sobre isso como, por exemplo, Nietzsche que

formulou a tese “Deus está morto”. Zilles ao explicar esse pensamento, escreve:

A fórmula “Deus está morto” expressa, antes de tudo, a carência do fundamento da fé num Deus transcendente. O fim da metafísica clássica significa o fim de um vínculo com a transcendência, com o mundo do além. Por isso, para Nietzsche, a morte de Deus não é um momento dialético, como em Hegel, uma “sexta-feira santa” do intelecto, à qual segue a páscoa, mas a certeza total e definitiva de que a fé num Deus transcendente é um absurdo. A crítica que Nietzsche faz do conceito cristão de Deus é que todas as concepções sobre o além são pura ficção, as quais falsificam, desvalorizam e negam a realidade. (ZILLES, 2008, p.40)

Em contrapartida, outros muitos ainda defendem e expressam a fé na

transcendência física do homem. Zilles afirma que a discussão sobre a fé e a razão

é tão antiga quanto é a Igreja. Segundo ele, Tomás de Aquino foi o primeiro a dar

uma formulação clássica e harmoniosa.

Tomás de Aquino primeiro distingue as duas e depois as reconcilia. Como cristão, aceita o ensinamento da revelação e a ela se submete na fé. Para distinguir fé e razão, Tomás de Aquino recorre à distinção entre ordem natural e ordem sobrenatural. Para ele, trata-se de duas ordens distintas, mas não opostas, nem contraditórias, pois o Deus da criação e o Deus da

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revelação é o mesmo. Ambas se complementam em harmonia, pois a graça não destrói a natureza, mas a aperfeiçoa. (ZILLES, 2011, p.16)

Por tudo isso, podemos afirmar que a fé e a razão ainda serão protagonistas de

grandes discussões filosóficas e científicas. Conforme o tempo passa e o mundo

sofre mudanças sociais e culturais, o problema reaparece.

Este capítulo não tem a pretensão de trazer respostas rápidas e prontas para

questões tão importantes e delicadas, até porque não queremos cometer o mesmo

erro dos sofistas na época de Sócrates e muitos outros que acreditam ter as

respostas para todas as perguntas.

Ao contrário do que muitos pensam a doutrina cristã não tem resposta para todas as

perguntas, ela tem fé. É através da fé e das chamadas lei natural e lei moral que

muitas perguntas são respondidas, bem como a obediência a Lei Mosaica e os

ensinamentos de Jesus Cristo. (CIC, 2000)

Zilles escreve que

A fé cristã fundamenta-se em Deus, não nos homens. Estes podem decepcionar-nos, Deus não. Crer em Deus significa encontrar um sentido e um valor profundo para o mundo; significa encontrar-se com Ele através do mundo. Da mesma forma como é falsa a alternativa “ou Deus ou mundo” é falsa a alternativa “ou fé ou ciência”, porque seria absurdo dizer sim a Deus Criador e não a sua criatura, que é o mundo. Por isso crer em Deus significa crer no próximo, no mundo e em si mesmo. (ZILLES, 2011, p.14)

Vidal explica que para a formulação de uma tese fundamental da moral cristã

destacou-se o valor teológico da criação. Para o catedrático de Teologia Moral, “a

ordem natural, ao ser criação de Deus, traduz uma normatividade ‘teológica’. Pode-

se falar, e de fato fala-se, de uma ‘teologia do direito natural’”. (VIDAL, 2007, p.12)

Segundo o catecismo,

a lei natural é a participação na sabedoria e na bondade de Deus, pelo homem formado à imagem de seu Criador. A lei natural exprime a dignidade da pessoa humana e constitui a base de seus direitos e deveres fundamentais (CIC, 2000, p.523).

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Desta forma, todo ensinamento cristão está baseado no princípio da lei natural e lei

moral. O catecismo afirma que “a lei divina e natural mostra ao homem o caminho a

seguir para praticar o bem e atingir seu fim. A lei natural enuncia os preceitos

primeiros e essenciais que regem a vida moral” (CIC, 2000, p.517). “Presente no

coração de cada homem e estabelecida pela razão, a lei natural é universal em seus

preceitos, e sua autoridade se estende a todos os homens” (CIC, 2000, p.517).

A discussão sobre a verdade é um campo frutífero na filosofia. Marilene Chauí

indica-nos que “a Filosofia é herdeira de três grandes concepções da verdade: a do

ver-perceber, a do falar-dizer e a do crer-confiar”. (CHAUI, 2000, p.122)

Para o cristianismo, a verdade está revelada em Jesus Cristo e nele se finda. O

Catecismo ensina que

a lei moral encontra em Cristo a sua unidade. Jesus Cristo em pessoa é o caminho da perfeição. Ele é o fim da lei, pois só ele ensina e dá a justiça de Deus. “Porque a finalidade da lei é Cristo para a justificação de todo aquele que crê” (Rm 10, 4). (CIC, 2000, p.516).

O próprio Jesus afirma isso para os apóstolos na última ceia, ao dizer: “Eu sou o

caminho, a verdade e a vida” (Jo 14, 6) e reafirma no interrogatório com Pilatos: “Eu

nasci e vim ao mundo para dar testemunho da verdade. Todo aquele que está na

verdade, ouve a minha voz” (Jo 18, 37). Portanto, tudo o que o cristianismo ensina

está fundamentado no ensinamento evangélico e no testemunho de Jesus.

Para o mundo moderno e seu racionalismo, em certos momentos, viver a

experiência da fé e do mistério parece tornar-se cada dia mais difícil, ocasionando

questionamentos e conflitos sobre a posição da Igreja nos mais variados assuntos.

O fato é que o mundo espera uma posição eclesiástica para tudo, mas nem sempre

tal posição é aceita por todos.

Vattimo faz uma dura crítica sobre a posição da Igreja afirmando que

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O autoritarismo da igreja católica, por exemplo, é a pretensão de voltar a um determinado texto em definitivo, fechando um processo interpretativo não em nome de uma continuidade de discurso e de escuta da voz da comunidade, mas sim em nome da imposição de uma verdade fundamental que se supõe presente em algum lugar (na definição dogmática, por exemplo, ou pior, como costumamos ouvir sempre com maior frequência, nas discussões relativas a problemas de bioética, em uma suposta “natureza” e nas suas leis imutáveis). (VATTIMO, 2004, p.87)

Parece claro que Gianni Vattimo critica a posição moral da Igreja sobre a

inviolabilidade da Lei Moral. Em contrapartida, a Igreja afirma que a lei natural e

moral é obra de Deus para a humanidade e, por essa razão, não pode substituí-la ou

abnegá-la por completo. Assim lemos:

Obra excelente do Criador, a lei natural fornece fundamentos sólidos em cima dos quais pode o homem construir o edifício das regras morais que orientarão suas opções. Ela assenta igualmente a base moral indispensável para a construção da comunidade dos homens. Proporciona enfim a base necessária à lei civil que se relaciona com ela, seja por uma reflexão que tira as conclusões de seus princípios, seja por adições de natureza positiva e jurídica. (CIC, 2000, p.518)

Vattimo chama de autoritarismo tal posição da Igreja frente a uma sociedade

moderna a qual chama de “comunidade de intérpretes”, devido à contribuição da

Reforma Protestante sobre a livre interpretação bíblica. (VATTIMO, 2004)

Porém, toda a ideia do cristianismo parte de um início e de um fim, ou seja, o início

encontra-se em Deus criador e seu fim está em Jesus Cristo. Portanto, a afirmação

cristã está em dizer que “Deus é a fonte de toda a verdade” (CIC, 2000, p.635) e “em

Cristo esta verdade foi revelada plenamente para a humanidade” (CIC, 2000, p.635),

sendo exigida a fidelidade aos evangelhos.

Vidal (2007) explica que existem três modelos ou paradigmas principais da

normativa ética da ordem natural ou lei natural: o modelo cosmocêntrico

(estoicismo), modelo biológico-concreto e modelo ontológico abstrato. O primeiro,

“deu uma importância decisiva para a natureza, vista como lugar da normatividade

moral para a pessoa” (VIDAL, 2007, p.39). O segundo, identifica a natureza humana

com a biológica, tratando como um fundamento essencial para a normatividade

moral.

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Ulpiano, jurisconsulto do direito romano, definiu a lei natural como aquilo que a natureza ensina a todos os animais, distingue a lei natural do “ius gentium”. O “ius gentium” é aquela norma que é própria aos seres humanos, enquanto que o “ius naturale” é o sistema normativo comum a todos os animais, incluindo o ser humano. (VIDAL, 2007, p.40)

O terceiro traz que a concepção do humano tende-se a prescindir ou não dar

suficiente ênfase aos três grupos variáveis da condição humana: história, cultura e

situação. (VIDAL, 2007)

Segundo Chauí (2000), Aristóteles, ao teorizar os campos do conhecimento pelo que

chamou de lógica, classifica as ciências em produtivas, práticas e as teóricas

(contemplativas), sendo que, no grau máximo das ciências teóricas está a teologia,

que é a ciência última que estuda “as coisas divinas que são a causa e a finalidade

de tudo o que existe na Natureza e no homem”. (CHAUI, 2000, p.49)

Portanto, para Aristóteles assim como para o pensamento cristão, Deus é “causa e

finalidade” de tudo o que existe. Para a Igreja,

As expressões da lei moral variam muito, e todas se acham coordenadas entre si: a lei eterna, fonte em Deus de todas as leis, a lei natural, a lei revelada, compreendendo a Lei Antiga (Decálogo) e a Nova Lei (ou evangélica); enfim, as leis civis e eclesiásticas. (CIC, 2000, p.516)

Movido por esta “ordem” que o cristianismo trata todas as questões existenciais da

humanidade e, através dela, formaliza suas respostas aos anseios de cada tempo,

cultura e sociedade.

Chegamos, por fim, há um conflito espinhoso no campo da moral e da ética

moderna. A homossexualidade e o aborto são pontos diretamente ligados à

dignidade da vida humana e são relacionados a lei natural e moral. Vidal escreve

que

A relação entre secularidade e moral cristã pode ser analisada a partir de diversas perspectivas. Creio que todas elas convergem para três desafios,

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aos quais a consciência cristã tem de responder adequadamente se quiser viver o projeto de Jesus num mundo secular. (VIDAL, 2007, p.5)

Segundo o catedrático, os três desafios são: a retomada da relação entre religião e

moral, a formação de uma ética civil que valerá como denominador comum entre

crentes e não crentes em uma sociedade plural e a realização de uma moral cristã

autêntica e libertadora para a história humana. Desta forma, “a resposta correta a

esses três desafios fará com que a ética cristã estabeleça um diálogo fecundo com a

secularidade e que ela mesma converta-se em uma sã moral secular”. (VIDAL, 2007,

p.6)

Basta saber que toda ética cristã deve defender, elevar, valorizar e proteger a

dignidade da vida conforme o próprio Cristo afirma que veio para trazer a vida em

abundância (Jo 10, 10). Sem dúvida, esta deve ser a maior contribuição da ética

cristã para o nosso tempo.

Assim, nesta ótica, os dois pontos a seguir serão discutidos com a intenção de

contribuir para a reflexão ética e moral, derrubando possíveis mitos ou opiniões de

senso comum que não dizem respeito com a realidade.

4.1 A SEXUALIDADE E A HOMOSSEXUALIDADE

A homossexualidade é um dos temas mais discutidos na sociedade atual. Marilene

Chauí trabalha o conceito de ideologia para explicar a posição atual sobre a

homossexualidade. Segundo ela, a ideologia é uma elaboração intelectual

incorporada pelo senso comum social para que as ideias de uma classe social

dominante tornem-se o ponto de vista de todas as outras. (CHAUI, 2000) Ainda

segundo Chauí,

A ideologia não é o resultado de uma vontade deliberada de uma classe social para enganar a sociedade, mas é o efeito necessário da existência social da exploração e dominação, é a interpretação imaginária da sociedade do ponto de vista de uma única classe social. (CHAUÍ, 2000, p.225)

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Desta forma, Chauí afirma que a homossexualidade, bem como a virgindade

feminina e o adultério são posições ideológicas implantadas no senso comum.

(CHAUÍ, 2000) O cristianismo traz estas concepções em sua doutrina que são

herdadas dos Dez Mandamentos (Decálogo).

No Decálogo, podemos verificar a problemática da sexualidade sendo tratado pelo

sexto e nono mandamento (segundo a fórmula catequética de Santo Agostinho)

(CIC, 2000) condenando a sexualidade desregrada e a cobiça da mulher do próximo

(Ex 20, 1-17).

O Catecismo da Igreja afirma que “o Decálogo contém uma expressão privilegiada

da lei natural. Conhecemo-lo pela revelação divina e pela razão humana” (CIC,

2000, p.547).

Portanto, toda a ideologia cristã está baseada nos mandamentos, já que o próprio

Cristo reconheceu sua veracidade e confirmou seu valor moral e ético (Mt 19, 16).

Entretanto, o seguimento dos mandamentos torna-se ainda mais do que uma

simples ideologia dominadora, conforme define Chauí, mas, para o povo cristão, é a

própria revelação divina para a vida humana, conforme lemos: “Os dez

mandamentos estão gravados por Deus no coração do ser humano” (CIC, 2000,

p.546).

“Embora acessíveis a razão, os preceitos do Decálogo foram revelados. Para chegar

a um conhecimento completo e certo das exigências da lei natural, a humanidade

pecadora tinha necessidade desta revelação” (CIC, 2000, p.546), ou seja, para o

pensamento cristão, os fundamentos do decálogo poderiam ser alcançados pela

razão do homem, porém, afirma que a revelação foi necessária para se alcançar a

compreensão e o ponto do partida para suas reflexões existenciais.

Para a igreja, o pecado contra a castidade é uma falta grave diante de Deus e da

sociedade, pois atinge a integralidade da pessoa humana, bem como a família e a

sociedade. O Catecismo define a castidade como:

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A castidade comporta uma aprendizagem do domínio de si, que é uma pedagogia da liberdade humana. A alternativa é clara, ou o homem comanda as suas paixões e obtém a paz, ou se deixa subjulgar por elas se torna infeliz. A dignidade do homem exige que ele possa agir de acordo com uma opção consciente e livre, isto é, movido e levado por uma convicção pessoal e não por força de um instinto interno cego ou debaixo de mera coação externa. O homem consegue esta dignidade quando, liberto de todo o cativeiro das paixões, caminha para o seu fim pela escolha livre do bem e procura eficazmente os meios aptos com diligente aplicação. (CIC, 2000, p.606)

O ensinamento cristão parece querer elevar um estado de consciência humana

sobre a importância do domínio de si, para que se alcance a felicidade individual e

social.

Chauí afirma que “sem a repressão da sexualidade, não há sociedade nem ética,

mas a excessiva repressão da sexualidade destruirá, primeiro, a ética e, depois, a

sociedade”. (CHAUÍ, 2000, p.458)

Tal afirmação parece ser a essência do pensamento cristão. A castidade é vista

como uma virtude moral e todo cristão é chamado a vivê-la como a integração

correta da afetividade e sexualidade humana. (CIC, 2000)

Portanto, para o cristianismo, “a sexualidade está ordenada para o amor conjugal

entre o homem e a mulher, No casamento a intimidade dos esposos se torna um

sinal e um penhor de comunhão espiritual” (CIC, 2000, p.611).

O ensinamento de Paulo escreve: “posso fazer tudo o que quero? Sim, mas nem

tudo me convém” (I Cor 6, 12), alertando sobre a falsa noção de liberdade em seu

contexto. Ser livre não é fazer tudo e realizar todos os desejos e motivações

interiores, mas saber discernir o que leva ao crescimento e a realização da pessoa

humana.

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A fecundidade e o compromisso são vistos como fundamentais na formação familiar

cristã. A primeira (fecundidade) não está relacionada simplesmente no ato de gerar

filhos, mas em gerar vida e comunhão com o outro.

A sexualidade afeta todos os aspectos da pessoa humana, em sua unidade de corpo e alma. Diz respeito particularmente à afetividade, à capacidade de amar e de procriar e, de uma maneira mais geral, à aptidão a criar vínculos de comunhão com os outros (CIC, 2000, p.605).

Portanto, a fecundidade de um casal está em sua capacidade de gerar vida para

outrem e para a sociedade em que vivem.

A doutrina cristã admite três tipos de castidade: a dos esposos - fundamentada na

fidelidade, no compromisso e no respeito; da viuvez – fundamentada na abstinência

como um compromisso; e na virgindade - fundamentada na abstinência temporária

(solteiros chamados ao matrimônio) ou perpétua (religiosos). (CIC, 2000)

Assim, a castidade, para os cristãos, é a forma correta de viver a afetividade e o

sexo, não sendo uma repressão sexual, mas uma educação moral e ética a respeito

da vida sexual humana. A homossexualidade, o adultério e a perda da virgindade

(tanto para o homem quanto para a mulher) antes da constituição familiar

(casamento) são, portanto, uma quebra a esta condição de virtude cristã.

Claro que, conforme citamos acima o comentário de Chauí (2000), são posições

cristãs muito conflituosas para o estilo de sociedade que vivemos atualmente. A

homossexualidade não é um assunto fácil de ser discutido. Pelo contrário, nem

mesmo a ciência conseguiu explicar sua procedência.

É importante dizer que não temos a intenção de trabalhar a fundo sobre sua origem

e, muito menos, trazer respostas sobre a discussão, mas apenas desmistificar a

falsa ideia de que o cristianismo é homofóbico e a favor de maus tratos para com os

homossexuais.

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Para a Igreja Católica, em especial, a prática homossexual é vista como uma forma

de quebra da castidade, já que vai de encontro com a lei natural da união de homem

e mulher, portanto, não são aprovados. Assim lemos:

A homossexualidade designa as relações entre homens e mulheres que sentem atração sexual, exclusiva ou predominante, por pessoas do mesmo sexo. A homossexualidade se reveste de formas muito variáveis ao longo dos séculos e das culturas. A sua gênese psíquica continua amplamente inexplicada. Apoiando-se na Sagrada Escritura, que os apresenta como depravações graves (Gn 19,1-29. Rm 1, 24-27; 1Cor 6, 9-10; 1Tm 1, 10), a tradição sempre declarou que “os atos de homossexualidade são intrinsecamente desordenados”. São contrários à lei natural. Fecham o ato sexual ao dom da vida. Não procedem de uma complementaridade afetiva e sexual verdadeira. Em caso algum podem ser aprovados. (CIC, 2000, p.610)

É importante compreender que esta posição mostra-se contra a prática da

homossexualidade, jamais contra a pessoa do homossexual. Podemos verificar isso

na continuidade do ensinamento, conforme lemos:

Um número não negligenciável de homens e de mulheres apresenta tendências homossexuais profundamente enraizadas. Esta inclinação objetivamente desordenada constitui, para a maioria, uma provação. Devem ser acolhidos com respeito, compaixão e delicadeza. Evitar-se-á para com eles todo sinal de discriminação injusta. Estas pessoas são chamadas a realizar a vontade de Deus em sua vida e, se forem cristãs, a unir o sacrifício da cruz do Senhor as dificuldades que podem encontrar por causa da sua condição. (CIC, 2000, p.610)

É claro que a posição da Igreja está fundamentada na Sagrada Escritura, umas das

fontes da fé do cristão, sendo a Tradição e o Magistério as outras duas (CIC, 2000),

e no princípio da lei natural, conforme explicado acima.

Muitos teólogos e filósofos modernos trabalham o tema, como, por exemplo, Vattimo

(2004), que afirma não aceitar a lei moral e traz um cristianismo integrado na

sociedade secularizada, retirando as verdades absolutas e pressupostos

metafísicos. A Igreja, ao contrário, traz respostas além da física (metafísica), através

da fé na lei eterna, lei natural, lei moral e lei revelada (Sagradas Escrituras) (CIC,

2000).

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Vidal, em sua avaliação, afirma que a posição expressa pela Igreja não consegue o

mesmo grau de assentimento por parte dos crentes e dos teólogos.

No Catecismo aparecem com claridade os argumentos que justificam essa desqualificação da atividade homossexual: seu caráter não natural; a falta de complementaridade afetivo-sexual; e a falta de abertura para a transmissão da vida, porém, insistem na necessidade de compreensão e não de discriminação para com as pessoas homossexuais. (VIDAL, 2007, p.122)

O teólogo termina suas colocações dizendo: “A pessoa humana não pode encontrar

sua figura adequada na redução somente à sua orientação sexual”. (VIDAL, 2007,

p.130)

Contudo, ainda não é possível dizer o ponto em comum que esta discussão

chegará, mas o que precisa ficar claro é que o cristianismo jamais será

“homofóbico”, mesmo sendo contra o homossexualismo.

O fato de a igreja aceitar ou não as práticas homossexuais não a torna homofóbica,

já que o princípio fundamental de defesa da dignidade e da vida humana sempre

será válido para qualquer pessoa; pois, “toda pessoa possui uma dignidade

intrínseca, porque foi criada à imagem de Deus”. (VIDAL, 2007, p.130)

3.2 - O ABORTO

A problemática do aborto é uma discussão urgente na sociedade contemporânea,

que segundo Vidal, ao citar a encíclica Evangelium Vitae (1995), diz que

a aparição e o desenvolvimento cada vez maior da bioética favoreceu a reflexão e o diálogo – entre crentes, não crentes, como também entre crentes de diversas religiões – sobre problemas éticos que dizem respeito a vida do homem” (VIDAL, 2007, p.55).

Na legislação brasileira atual, a prática do aborto é crime, salvo nos casos de risco

de vida para a mãe ou estupro (Art. 128 do Código Penal) e, aprovado em 2012, no

caso de bebês anencéfalos. Para a igreja, tal pratica é uma afronta direta ao direito

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primeiro e fundamental de todo e qualquer ser humano: o direito a vida. A proteção

pela vida humana deve ser realizada desde seu início, no ato da concepção.

Coelho (2008), ao discursar sobre isso, afirma alguns pontos importantes do

posicionamento cristão, colocando que toda a vida humana deve ser respeitada

desde sua concepção, já que a alma espiritual de cada pessoa é imediatamente

criada por Deus.

Para o cristianismo, a vida humana é criada por Deus e somente Ele pode tirá-la. A

sacralidade e dignidade da vida humana tem valor fundamental na moral cristã e

qualquer afronta contra ela é inaceitável pela ótica divina.

O Catecismo ensina que

Desde o primeiro século a Igreja afirmou a maldade moral de todo aborto provocado. Este ensinamento não mudou. Continua invariável. O aborto direto, quer dizer, querido com um fim ou como um meio, é gravemente contrário à lei moral: “Não matarás o embrião por aborto e não farás perecer o recém-nascido” (Didaché 2,2). Deus, senhor da vida, confiou aos homens o nobre encargo de preservar a vida para ser exercida de maneira condigna ao homem. Por isso a vida deve ser protegida com o máximo de cuidado desde a concepção. O aborto e o infanticídio são crimes nefandos (GS 51,3). (CIC, 2000, p.592)

Coelho explica que

para o aborto provocado, os argumentos da igreja provêm de um ponto de vista específico, baseado numa antropologia teológica e em uma compreensão filosófica da pessoa humana, filosofia que inclui uma compreensão metafísica”. (COELHO, 2008, p.18)

Marilena Chauí, ao trabalhar o conceito de ética e violência, explica que desde a

antiguidade Greco-romana, o problema da violência e os meios para evitá-las ou

controlá-las sempre foi motivo de grande discussão. Segundo ela

Fundamentalmente, a violência é percebida como exercício da força física e da coação psíquica para obrigar alguém a fazer alguma coisa contrária a si, contrária aos seus interesses e desejos, contrária ao seu corpo e à sua consciência, causando-lhe danos profundos e irreparáveis,

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como a morte, a loucura, a auto-agressão ou a agressão aos outros. (CHAUÍ, 2000, p.432)

Refletindo nesta linha, podemos classificar o aborto como um ato de profunda

violência, tanto para a mãe quanto para o feto ou nascituro. João Paulo II em

Evangelium Vitae escreve que

no que se refere ao direito a vida, cada ser humano inocente é absolutamente igual a todos os demais. Esta igualdade é a base de todo o relacionamento social autêntico, o qual, para ser verdadeiramente, não pode deixar de se fundar sobre a verdade e a justiça, reconhecendo e tutelando cada homem e mulher como pessoa, e não como coisa de que se possa dispor. (JOÃO PAULO II, 1995, p. 82)

Vidal traz uma reflexão sobre uma bioética teológica, que deve refletir o que chama

de “problemas de sempre”, relacionados com o valor da vida humana: em si mesma,

em sua fase nascente e em sua fase final. (VIDAL, 2007)

Sobre isso, Vidal explica que um grupo de intelectuais franceses publicou afirmando

conseguir encontrar distinção entre vida humana e vida humanizada. Assim ele

escreve:

Cremos que é possível distinguir entre vida humana e vida humanizada; pois cremos que se realmente o indivíduo não é humanizado, senão mediante sua relação com os demais, por e para os demais – se recebe seu próprio ser dos outros – a relação de reconhecimento, tal como esboçamos, é reveladora, senão, instauradora, do caráter plenamente humano do ser em gestação. Em outras palavras, como o ser humano não existe sem corpo, tampouco é humanizado sem essa relação com os outros. (VIDAL, 2007, p.99)

Vidal mesmo caracteriza essa opinião como inaceitável, pois estabelece uma

diferença entre vida humana e vida humanizada, fazendo com que a primeira seja

descartável, enquanto a segunda seja merecedora autentica de respeito ético.

(VIDAL, 2007)

Essa concepção da alteridade é redutiva e não corresponde a uma genuína interpretação filosófica da pessoa. Alteridade não é uma “aceitação” ou “relação” que se pode dar ou tirar ao ser humano. Posta a realidade de uma existência pessoal, surge de modo imediato à exigência a ser respeitada por todos os demais sujeitos racionais. (Vidal, 2007, p.100)

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O catecismo afirma que

Os direitos inalienáveis da pessoa devem ser reconhecidos e respeitados pela sociedade civil e pela autoridade política. Os direitos do homem não dependem nem dos indivíduos, nem dos pais, e também não representam uma concessão da sociedade e do Estado; pertencem a natureza humana e são inerentes à pessoa em razão do ato criador do qual se origina. Entre estes direitos fundamentais é preciso citar o direito a vida e à integridade física de todo ser humano desde a concepção até a morte. (CIC, 2000, p.592)

Desta forma, o cristianismo se posiciona contra o aborto, pois, conforme já

explicado, as razões cristãs trazem uma resposta que transcende a física e as

ciências produtivas, na qual está definida a medicina, atingindo um nível da ciência

contemplativa, segundo o pensamento de Chauí (2000).

Vidal aumenta ainda mais a discussão ética sobre o valor da vida humana

embrionária, afirmando o seguinte:

Sobre o valor da vida em gestação, convém que advirtamos sobre o perigo de cair em tentação em que tantas vezes foram sucumbidos os humanos: quando os homens quiseram desfazer-se de uma raça, de um grupo, de um indivíduo, previamente os “desqualificaram” em sua mente (raciocínios filosóficos) e em seu coração (exclusão da “afeição” humanitária). Esta advertência serve na atualidade para a consideração da vida em gestação. O embrião humano é um “filho” ou é uma “possibilidade tecnológica”? (VIDAL, 2007, p.106)

João Paulo II afirma que a ciência genética traz grandes contribuições para a fé

cristã, afirmando que desde o primeiro instante da concepção se encontra fixado o

programa daquilo que será este ser vivo (JOÃO PAULO II, 1995).

Por essa razão que a Igreja defende a inviolabilidade da vida humana desde a

concepção até sua morte natural, preservando o quinto mandamento da Lei Mosaica

(Ex 20, 13).

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5 CONCLUSÃO

Sempre que entramos em uma discussão envolvendo a fé e o sentimento religioso,

partimos para um complexo e polêmico campo do pensamento humano. Porém, a

discussão pode agregar muito valor quando realizada correta e respeitosamente,

sem ferir ou coagir nada ou ninguém. Foi nesta perspectiva que este trabalho

desejou trazer a problemática da religião, estudando os ensinamentos primeiros de

uma fé específica.

O problema de pesquisa que orientou este estudo foi: “Qual a contribuição da fé

cristã para a formação de uma sociedade mais justa?”. Desta forma, estipulou-se

como objetivo geral da pesquisa, analisar a contribuição da fé para a formação de

uma sociedade justa, que foi devidamente alcançado, ao percebermos que o

cristianismo e a religião têm muito a contribuir com a sociedade e com a justiça, pois

promove a reflexão sobre pontos fundamentais da vida humana, como a dignidade,

ética, justiça, amor, perdão e busca do bem comum.

O objetivo específico sobre a conceituação da fé e da razão foi cumprido, onde, à

luz de autores como Zilles (2005), Chauí (2000), Petrini (2005) e João Paulo II

(1998), percebemos a necessidade harmoniosa das duas concepções que, através

de um diálogo reflexivo entre elas, possa-se alcançar ao conhecimento verdadeiro

das causas humanas. A fé sem a razão torna-se cega e fundamentalista, da mesma

forma que a razão sem a fé torna-se egoísta em si mesma.

Já o objetivo específico de investigar os princípios fundamentais que norteiam o

cristianismo, também foi cumprido, onde pudemos perceber como a ética cristã

contribuiu e pode continuar contribuindo para a formação de uma sociedade justa e

pacífica. Para isso, a necessidade de buscar o conhecimento genuíno dos princípios

cristãos foi imprescindível para alcançar o objetivo proposto.

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Textos doutrinais e catequéticos, bem como posicionamentos de cristãos e filósofos

foram buscados, a fim de trazer à luz a compreensão e a ideologia cristã acerca das

questões existenciais humanas.

A fé cristã deve construir a “civilização do amor” que Paulo VI definiu como um

conjunto de condições morais, civis, econômicas, que permitem à vida humana uma

possibilidade melhor de existência, uma plenitude racional e um feliz destino eterno

(SELLA, 2003).

Acima de qualquer coisa, dentro da civilização do amor, é preciso ficar o

mandamento máximo do amor ao próximo e o sonho de unidade idealizado por

Jesus. Verificar e admirar o coração de um homem que nunca pegou em armas, não

condenou nem excluiu ninguém e chegou até as últimas consequências do amor e

do perdão ao próximo.

Um grandioso homem que se fez pequeno para estar com os pequenos. Que só

ensinou o bem e falou contra a injustiça social e a hipocrisia de seu tempo, e que só

tem a agregar valor na educação, na política e na vida social e familiar do homem,

pois amou intensamente a vida humana.

Para conhecer um pouco deste homem chamado Jesus Cristo, fundador do

sentimento religioso cristão, foram utilizados dois momentos importantes para o

cristianismo: o sermão da montanha e a última ceia.

Por último, o objetivo específico de investigar pontos conflituosos da axiologia

cristã com a sociedade moderna também foi cumprido, onde trabalhamos dois

pontos conflituosos e atuais do cristianismo com a sociedade moderna; não com a

intuição de qualquer julgamento ou ato discriminatório, mas apenas para tentar

explicar as raízes argumentativas da doutrina cristã para tais situações.

Assim, como todo o sentimento religioso é muito particular e exige uma adesão de fé

e um compromisso por parte de seus seguidores, assim também o cristianismo

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espera de seus fiéis, obedecendo ao seu fim último que está no testemunho de

Jesus Cristo.

Portanto, na ótica do pesquisador, o trabalho foi plenamente realizado em sua

essência, alcançando o objetivo esperado. A pesquisa realizada abriu um horizonte

repleto de possibilidades para aumentar o conhecimento teológico acerca de como

ajudar a sociedade moderna encontrar um caminho de justiça e paz por meio dos

princípios fundamentais do cristianismo.

Com certeza, a discussão não acabará tão cedo e esta fascinante viagem

continuará, sempre tentando buscar o elo entre a fé e a razão do homem, “as duas

asas que levam o homem para a contemplação da verdade”. (JOÃO PAULO II,

1998, p.5)

Contudo, a maior contribuição do cristianismo para formar uma sociedade justa e

fraterna é o amor, pois, concluímos que, da mesma forma que Sella (2003), somente

por ele podemos chegar à profundidade da vida humana, no coração dos mais

diversos homens e mulheres e acabar com as estruturas de morte e opressão da

sociedade moderna.

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