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  Ernesto Bozzano O Espiritismo e as Manifestações Psíquicas Cornelis Barend Pintor Paisagista  Materializações de “Marie”, a dançarina, com a

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  • Ernesto Bozzano

    O Espiritismo e as

    Manifestaes Psquicas

    Cornelis Barend

    Pintor Paisagista

    Materializaes de Marie, a danarina, com a

  • mdium Florence Cook.

    Experincias espritas de um ministro da Igreja Anglicana.

    Joy Snell e a Misso dos Anjos.

    Telepatia, telemnesia e a lei da relao psquica.

  • Contedo resumido

    Esta obra rene quatro monografias de Ernesto Bozzano, par-

    te de um numeroso conjunto de obras desse grande cientista:

    A primeira apresenta as materializaes de espritos atravs

    da mediunidade de Florence Cook.

    A segunda relata as experincias do pastor V. G. Duncan,

    colhendo provas da sobrevivncia da alma com o fim de orientar e consolar os seus paroquianos.

    A terceira monografia narra a histria de Joy Snell, a en-fermeira clarividente, que teve a oportunidade de presenciar a

    Misso dos Anjos no hospital em que servia.

    Por fim, a quarta monografia apresenta um estudo da tele-patia e da telemnesia, em confronto com a lei de relao psqui-

    ca relacionada a esses dois fenmenos.

    Sumrio

    Homenagem a Ernesto Bozzano (1862 - 1943) ......................... 4

    Ao Leitor .................................................................................... 7

    Materializaes de Marie, a danarina, com a mdium Florence Cook ........................................................................... 9

    Experincias espritas de um ministro da Igreja Anglicana .... 24

    Joy Snell e a Misso dos Anjos ............................................... 44

    Telepatia, Telemnesia e a Lei da Relao Psquica ............. 60

  • Homenagem a

    Ernesto Bozzano

    (1862 - 1943)

    Sob o ponto de vista cientfico, a contribuio de Ernesto

    Bozzano ao Espiritismo realmente incalculvel, quer em quali-

    dade, quer em riqueza de casos e depoimentos. Influenciado pelo sistema positivista atravs da linha spenceriana, como ele pr-

    prio declara, nunca teve qualquer indcio de misticismo, mas,

    pelo contrrio, sempre foi um homem voltado para as solues objetivas, infenso cogitao, como se dizia muito em sua

    poca.

    Vejamos a franqueza com que Bozzano fala de seu passado filosfico:

    Uma vocao predominante me havia conduzido a ocu-par-me, exclusiva e apaixonadamente, da escola cientfica e

    Herbert Spencer era, naquele tempo, o meu dolo. Durante dois anos, eu estudara, ininterruptamente, anotara e classifi-

    cara com imenso amor todo o contedo do seu imponente e

    enciclopdico sistema filosfico para, em seguida, lanar-me de corpo e alma nas lutas do pensamento, empenhando-

    me em polmicas com quem ousasse criticar os argumentos

    e as hipteses que o meu venerando mestre formulara. (A declarao est no I captulo de uma de suas maiores o-

    bras: Animismo ou Espiritismo?)

    Mais tarde, por estudo e observaes diretas, chegou con-vico esprita e definiu sua nova posio em diversos trabalhos. Uma de suas motivaes para o estudo da fenomenologia cha-

    mada paranormal foi a leitura dos Anais das Cincias Psquicas,

    publicao dirigida por Dariex, mas orientada pelo Professor Charles Richet, autor do Tratado de Metapsquica. Houve ainda

    outra motivao, alis bem significativa: o debate de Richet com

    Rosenbach pela Revista Filosfica. Os argumentos que Richet contrapunha ao opositor impressionaram muito o nimo de

    Bozzano, justamente pela sua consistncia cientfica, enquanto

  • as objees de Rosenbach lhe pareceram logo insustentveis pela

    falta de solidez. Da por diante Bozzano e Richet trocaram

    correspondncia muito franca e afetuosa.

    Sabe-se que Richet ficou na Metapsquica, mas deixou tes-

    temunho a respeito dos fatos e, por isso mesmo, embora no tenha chegado Doutrina Esprita, ainda citado com toda a

    procedncia. Convm lembrar, e bem a propsito, que uma das

    cartas de Richet a Bozzano, naturalmente depois de muitas observaes e reflexes, termina assim: E agora, abro-me a

    voc, de modo absolutamente confidencial. O que voc supunha

    verdade. Aquilo que no alcanaram Myers, Hodgson, Hyslop e Lodge, obteve-o voc por meio de suas magistrais monografi-

    as, que sempre li com religiosa ateno. Elas contrastam, estra-

    nhamente, com as teorias obscuras que atravancam a nossa cincia. (Sir Oliver Lodge, ao contrrio do que geralmente se

    supe, j estava convencido da sobrevivncia do esprito muito

    antes do desenlace de seu filho Raymond na I Guerra Mundial, comeada em 1914). O livro de Lodge, Raymond, um depoi-

    mento valiosssimo.

    Bozzano estudou e pesquisou muito. Leu, com afinco, tudo quanto lhe foi possvel sobre cincias psquicas e, especifica-

    mente, sobre o Espiritismo, mas no reduziu o seu campo de trabalho aos estudos de gabinete, pois era um homem afeito

    observao e investigao. Corajoso em suas afirmaes,

    proclamou a validade das teses espritas sem temer os preconcei-tos acadmicos e as ojerizas religiosas. Alm de artigos em

    diversas revistas especializadas, Ernesto Bozzano publicou

    muitos livros, entre os quais Xenoglossia, Enigmas da Psicome-tria, Pensamento e vontade, Fenmenos psquicos no momento

    da morte, Fenmenos de transporte, Metapsquica humana,

    Literatura de alm-tmulo, Animismo ou espiritismo?, Comuni-caes medinicas entre vivos (com depoimento de diversos

    pesquisadores, como Barrett, Lodge, Stead, Geley, em traduo de Francisco Klrs Werneck e apresentao de J. Herculano

    Pires, EDICEL, So Paulo), Desdobramento Fenmenos de

    bilocao e muitas monografias: Breve histria dos raps,

  • Materializaes minsculas, Marcas e impresses de mos de

    fogo, etc.

    Temos a apenas algumas referncias biogrficas, bem pouco, quase nada, sobre um estudioso e pesquisador do alto porte de

    Ernesto Bozzano, nascido em Gnova (Itlia) em 1862 e desen-carnado em julho de 1943. Neste pequeno resumo, entretanto,

    imprimimos todo o vigor espiritual de um preito de homenagem

    do Instituto de Cultura Esprita do Brasil.

    Observaes especiais:

    A carta de Charles Richet a Ernesto Bozzano est no livro de

    Srgio Valle (mdico), edio da LAKE, So Paulo. Veja-se o

    penltimo captulo.

    Diversos livros de Bozzano foram publicados pela Federao

    Esprita Brasileira; outros foram publicados pelas editoras ECO (Rio de Janeiro), CALVRIO (So Paulo), EDICEL (So Paulo)

    e LAKE (So Paulo), tradues do Dr. Francisco Klrs Werneck.

    (Transcrito do IV vol. dos Anais do Instituto de Cultura Esp-rita do Brasil, Rio de Janeiro, RJ, 1979, com autorizao do seu

    digno Diretor, Prof. Deolindo Amorim).

  • Ao Leitor

    Ernesto Bozzano, o grande Mestre da Cincia da Alma, es-

    creveu os trabalhos constantes deste volume nos tempos ureos

    do Espiritismo cientfico, isto , quando se procuravam provas concretas da sobrevivncia da alma e da sua comunicao com

    os vivos da Terra.

    Depois veio a II Grande Guerra Mundial, travada principal-mente no continente europeu, e, depois dela, o Espiritismo, devido a ditaduras polticas e religiosas, desapareceu quase por

    completo, sendo mesmo proibido em Portugal e na Espanha. Na

    Itlia, terra de Bozzano, s pde surgir mais tarde apenas com o nome de Metapsquica, porque os sucessores dos perseguidores

    cristos no permitiam que o Espiritismo fosse pregado luz do

    dia e ento tivemos, por nossa vez, o Espiritismo das catacumbas europias. J na Inglaterra, por ser um pas protestante e separa-

    do do continente, o Espiritismo continuou a ser pregado e prati-

    cado, tornando-se, mais tarde, uma das religies do pas graas ao esforo de Lord Dowding, Marechal do Ar e grande heri

    nacional.

    Convm esclarecer o leitor que os anglo-saxes (ingleses, norte-americanos, etc.) no empregam a palavra Espiritismo e

    sim Espiritualismo, pois o Espiritismo uma doutrina codificada por Allan Kardec e s mesmo os seus adeptos que podem ser

    chamados de espritas, pois ele no tem santos, nem sacerdotes,

    nem altares, etc.

    Parece-me, pois, que, na verdade, o Espiritismo cientfico de-

    sapareceu, ou quase isto, pois no se fala mais em sesses de efeitos fsicos e muita gente s quer aprender Espiritismo em

    livros medinicos no importando de qual autor e procedncia,

    livros que muitos ainda consideram como fico medinica esquecida de que um fato um fato e que contra fatos no h

    argumentos. H ainda muita gente, nos tempos de hoje, que quer

    provas concretas e, como no as encontram aqui, em parte algu-ma, mesmo em livros nacionais, resolvi continuar a publicao

    de alguns dos excelentes trabalhos do grande Bozzano, que

  • provam, na base dos fatos, a sobrevivncia da alma e a sua

    comunicao com os vivos da Terra.

    O Tradutor

  • Materializaes de Marie, a danarina,

    com a mdium Florence Cook

    A longa carreira profissional da mdium Srta. Florence Cook

    (depois Sra. Elgie Corner) divide-se, distintamente, em duas fases bem diferentes de notoriedade pessoal e fenomnica. De

    fato, tornaram-se clssicas e famosssimas as materializaes do

    esprito de Katie King, comeadas quando a mdium era uma jovem de apenas 18 anos de idade e prosseguiram durante 3 anos

    seguidos. Ao contrrio, caram no esquecimento as materializa-

    es de um esprito que sucedeu a Katie King, depois que esta, anunciando o fim de sua misso na Terra, se despediu da m-

    dium e de Sir William Crookes numa sesso memorvel, cessan-

    do as suas manifestaes para sempre.

    Reconheo que o esquecimento da longa srie de manifesta-

    es de Marie, a danarina, encontra a sua justificativa no fato de serem tais manifestaes bem menos interessantes do que as

    anteriores, quer pelo temperamento incivil e vulgar da entidade

    que se manifestava, quer porque se prestavam a suspeitas de fraude sempre renovadas, devido ao revezamento de experimen-

    tadores inexperientes que no podiam imaginar que os espritos

    de defuntos, quando viveram em um ambiente social pouco evoludo, continuavam a se manifestar mundanos e pouco evolu-

    dos, como o foram na vida terrena. Tais suspeitas foram agrava-

    das pelo fato de ter-se o referido esprito apresentado muitssimo parecido com a mdium, apesar de diferenar-se dela pelas

    propores do corpo, alto e formoso, em contraste com o corpo

    da mdium, pequeno e magro. Da resultou que as manifestaes de Marie, a danarina, faziam a pobre mdium sofrer martrios

    e amarguras 1 sempre renovados, que certos pesquisadores

    incompetentes lhe infligiam com acusaes destitudas de qual-quer fundamento e isso apesar de ter a mdium constantemente

    exigido severo controle ser despida, examinada e amarrada e a despeito de terem sido as sesses realizadas quase sempre em

    casas alheias com o fim de impossibilitar a ajuda de companhei-

    ros ocultos.

  • Antes de expor, resumidamente, os principais eventos das materializaes de Marie, acho til recordar, como tambm

    nas materializaes de Katie, que foi amide observada (mas nem sempre) a circunstncia teoricamente embaraante de sua

    semelhana com a mdium. O Sr. William Harrison, diretor de

    The Spiritualist, pediu, certa vez, explicaes a Katie sobre a razo de tal semelhana e esta assim lhe respondeu: No posso

    impedi-lo. Quando as circunstncias no so favorveis, a fora

    organizadora da mdium sobrepuja a fora de minha vontade e ento o meu rosto assume, mais ou menos, a aparncia do da

    mdium. No posso impedi-lo de modo algum.

    Este esclarecimento de Katie King parecer concludente a todo aquele que possuir noes relativas ao assunto, o que no

    impede que a mesma encerre um enorme mistrio ligado ao problema do Ser. fato que todos os seres organizados, nos trs

    reinos da natureza vegetal, animal e hominal cresam, se

    desenvolvam e assumam a forma que lhes compete por efeito de uma misteriosssima fora organizadora, fora esta que dirige

    e obriga as molculas qumicas a se disporem de forma a mode-

    lar uma dada individualidade organizada, prodigiosamente complexa. S atualmente e at certo ponto que se comea a

    penetrar no grande mistrio mais profundamente e isto graas s

    investigaes chamadas formas arqutipos, que se mostram aos videntes nos processos de desenvolvimento orgnico, pro-

    cessos por eles observados nas espcies pertencentes aos trs

    reinos da natureza, formas arqutipos pela primeira vez por mim salientadas e mostradas em dez pginas de comentrio ao

    caso XXX de minha obra intitulada Dei fenomeni di apporto.2

    Ora, baseado nessas pesquisas, deve-se inferir que tudo con-corre para fazer presumir que tais formas arqutipos preexis-

    tem aos processos e da a constituio da trama sobre a qual se exerce a fora organizadora e talvez dever-se-ia acrescentar

    que as formas arqutipos tenham a sua origem em uma espcie de misteriosssimo viveiro csmico que contm, em potenciali-

    dade, todas as formas, que, pela lei da afinidade, seriam atradas

    para todo nascimento de germes fecundados nos trs reinos da natureza, ao passo que a fora organizadora, que lhes inata,

  • exercendo-se ainda e sempre pela lei da afinidade, foraria as

    molculas qumicas a gravitarem e a se fixarem no ponto preciso

    que lhes compete na trama preexistente da forma arqutipo.

    Querendo aplicar esses conhecimentos novssimos ao pro-

    blema em exame, referente aos processos das materializaes medinicas, dever-se-ia dizer que o poder da fora organizado-

    ra, inerente ao mdium e inata forma arqutipo correspon-

    dente, justificaria a enorme dificuldade para uma entidade de-sencarnada alcanar, inteiramente, o fim de materializar sua

    prpria forma, servindo-se da substncia extrada da forma

    arqutipo do mdium. Somente em condies de um ambiente excepcional e homogneo poderia o desencarnado alcanar

    completamente o seu objetivo. E isto o que demonstra a medi-

    unidade de Florence Cook, semelhana de outros mdiuns de efeitos fsicos; contudo no generalizemos, esquecendo que, por

    vezes, se verificam condies excepcionais de ambiente que

    tornam possvel alcanar o objetivo. Recordo, a propsito, o mdium polons Franek Kluski, com o qual o saudoso doutor

    Gustave Geley experimentou por muito tempo. Com to potente

    mdium de efeitos fsicos no se verificou nenhuma semelhana entre o seu rosto e os dos espritos materializados que constitu-

    am imponente variedade: masculinos, femininos e infantis, de

    espritos que, amide, se exprimiam em lnguas ignoradas de todos os presentes.

    Observo ainda que esses novssimos conhecimentos tambm seriam teis para elucidar o misterioso processo da materializa-

    o, por meio da qual se assiste concretizao e dissoluo,

    quase instantnea, de espritos solidamente construdos, prodgio que, de certo modo, se tornaria mais compreensvel no caso que

    se realizasse sobre a base da presena das formas arqutipos

    preexistentes, as quais, servindo de tramas s mirades de mol-culas lanadas em movimento vertiginoso, as obrigassem, pela

    lei da afinidade, a gravitar para o ponto preciso em que deveria fixar-se nas formas materializadas para depois reentrar e fixar-se

    no organismo do mdium. Repito que, em tal caso, o prodgio

    pareceria mais compreensvel porquanto a condio de exteriori-

  • zao auxiliaria a compreender que tudo isso pode realizar-se,

    em ordem perfeita, mesmo em curto tempo.

    No , porm, chegado o momento de estender-se em torno do fascinante assunto sobre a existncia das formas arqutipos,

    fundamento de todo processo organizador, que no devem ser confundidas com o que se entende por perisprito, visto que esta

    ltima denominao se refere ao invlucro do esprito, ao

    passo que as formas arqutipos, sendo comuns aos trs reinos da natureza e preexistindo aos organismos criados, originariam

    para assim me exprimir as Arcas da Vida e no ainda os

    Tabernculos do Esprito.

    No podendo estender-me mais sobre o tema em questo, re-

    comendo a leitura de meu supracitado trabalho, Fenmenos de Transporte, aos que desejarem conhecer melhor o assunto.

    Voltando a Katie King, observo como ela, amide, quando eram favorveis as condies de ambiente, diferia totalmente da

    mdium, o que deveria bastar para confirmar as explicaes por

    ela dadas a respeito e ainda para disso inferir a interveno de uma personalidade espiritual, ou, se o quiserem, de uma forma

    arqutipo extrnseca mdium, ao mesmo tempo em que, de

    outra parte, a independncia espiritual da personalidade em apreo j parecia manifesta quanto aos caractersticos de seu

    temperamento e de sua intelectualidade, ambos radicalmente

    diferentes dos da mdium.

    A Sra. Florence Marryat descreve nestes termos, em sua obra

    There is no death (No h morte), um interessante episdio em que Katie King pde manifestar-se tal qual fora em vida:

    Certa noite Katie saiu do gabinete medinico e veio sentar-se nos meus joelhos, o que me deu oportunidade para

    verificar o quanto mais formosa e menos pesada era que a

    mdium, mas, em certas ocasies, se parecia muito com ela. Disse-lhe isto, ela encolheu os ombros e respondeu-me:

    Bem o sei, mas no posso impedi-lo. De qualquer modo, fui bem mais formosa na existncia terrena. Chegar o dia

    em que lho provarei. Reentrou no gabinete, espreitou s

    ocultas por uma fenda da cortina e me pediu que me apro-

  • ximasse. Assim o fiz e ela me levou para o interior do gabi-

    nete. Observei que as cortinas eram muito transparentes e

    permitiam que a luz do gs iluminasse suficientemente o seu interior. A mdium Florence Cook estava deitada num

    colcho e mergulhada em profundo sono. Katie desejava

    ansiosamente que eu me certificasse de sua personalidade, insistindo para que eu a tocasse, a apalpasse, lhe apertasse

    as mos e puxasse os cabelos. Depois me perguntou: Est

    bem certa de se achar na presena de minha mdium? Respondi-lhe que estava absolutamente certa disso e ela as-

    sim prosseguiu: Observa-me agora. Olha meu rosto tal

    como foi em vida terrena. Dirigi o olhar para a forma que estivera sentada no meu colo e, extremamente maravilhada,

    distingui o vulto de uma jovem formosssima, de grandes

    olhos azuis ou cinzentos, pele alvssima, abundante cabelei-ra avermelhada. Katie parecia enlevada com a minha sur-

    presa e sorriu, perguntando-me: Porventura no sou mais

    bonita do que a minha Florice? Levantou-se em seguida, apanhou uma tesoura de cima da mesa, cortou uma madeixa

    dos seus cabelos e outra dos da mdium e me entregou as

    duas. Os cabelos da mdium so quase pretos e pareciam macios como seda, ao passo que os de Katie so de um

    vermelho dourado e spero ao tato.

    A Sra. Marryat, que, como Crookes, assistiu ltima e emo-cionante sesso em que Katie King se despediu dos seus amigos do mundo terreno, ainda assistiu s primeiras manifesta-

    es de Marie, a danarina, e, na sua narrao, descreve nestes

    termos a memorvel sesso:

    A cena do ltimo adeus foi emocionante como acontece

    quando nos separamos de entes amados nos seus leitos de morte.

    Katie parecia no querer partir e sempre se voltava para contemplar ainda uma vez os caros amigos que deveria dei-

    xar, mas o fazia especialmente por sua amizade a William

    Crookes, a quem muito se afeioara, como ele a Katie King. O que ela havia dito a respeito de sua partida defini-

  • tiva realizou-se efetivamente, porque, depois daquele dia,

    Florence Cook no mais a viu e nada mais soube sobre ela.

    Katie foi imediatamente substituda por outra forma materializada, que se deu o nome de Marie. Esta danava

    e cantava de maneira classicamente profissional, habilidade que a Srta. Cook no possua absolutamente. No teria

    mencionado esta nova manifestao que poucas vezes vi

    se no me sentisse no dever de faz-lo pelo seguinte mo-tivo:

    Certa vez em que a Srta. Cook se prontificou a realizar uma sesso no salo da National British Association of Spi-

    ritualists, um moo inexperiente, de nome George Sitwell,

    insinuou que a mdium mistificava e que o esprito de Ma-rie era a prpria mdium, vestida de branco para enganar

    os outros. A notcia foi logo acolhida pelos jornalistas e to-

    da a imprensa do pas acusou a mdium e os espritas...

    Em uma sesso subseqente, que deveria realizar-se no

    mesmo local, a Srta. Cook exigiu a presena de um dos as-sistentes no gabinete medinico, sem o que no faria a ses-

    so, e eu fui a escolhida. Devo acrescentar que fui solida-

    mente amarrada mdium e que assim permanecemos du-rante a sesso inteira, o que no impediu que Marie se

    materializasse, danasse e cantasse fora do gabinete, como

    havia feito antes na presena do dito George Sitwell e isto, repito, durante o tempo em que eu e a mdium estivemos

    bem ligadas uma outra. E foi quanto bastou para aconse-

    lhar os sabiches do grande salo a serem prudentes quando se pronunciassem a respeito de assuntos que no conhe-

    cem...

    Naturalmente que a alegre notcia, referente prova resolut-ria a que a mdium foi submetida e em virtude da qual emergiu triunfante a sua inocncia, bem como a independncia do fan-

    tasma materializado de Marie, foi logo acolhida e divulgada

    pelas revistas espritas, mas j se compreende que a imprensa jornalstica, que divulgara rapidamente a notcia da suposta

  • mistificao, absteve-se, rigorosamente, de acolher a intempesti-

    va notcia que desmentia a acusao feita.3

    Como quer que fosse, transcorreram alguns anos sem que se renovassem as suspeitas de fraude, mas, em contraposio, e

    especialmente devido a uma srie de experincias realizadas em Paris e Berlim, surgiu a hiptese de desdobramento materiali-

    zado da mdium e, no obstante ter tudo concorrido para de-

    monstrar que dita hiptese era insuficiente para explicar o con-junto dos fatos, fcil no foi refut-la e isto pela falta de provas

    adequadas de identificao pessoal combinada com a circunstn-

    cia da semelhana entre o rosto da forma materializada e o da mdium, semelhana que, todavia, pelo menos uma vez, no foi

    verificada, como veremos mais adiante.

    Deve-se, contudo, reconhecer que Marie bem pouco reve-lava a respeito de sua vida terrena, limitando-se a informar que

    nascera na Arglia, exercera a profisso de bailarina e cantora em teatros de variedades e falecera na flor da idade. A sua morte,

    porm, ocorrera havia alguns anos e, como vivera obscuramente,

    tornava-se impossvel verificar-lhe a identidade. Exprimia-se, todavia, em um patu francs falado pelos nascidos na Arglia e

    esta ltima circunstncia assume certo valor probatrio.

    Intil seguir, no presente trabalho, as dolorosas alternativas do calvrio medinico de Florence Cook por causa das materia-

    lizaes de Marie, a danarina, e tanto mais desaconselhado parece faz-lo porque as manifestaes em questo se sucederam

    por dez anos, sempre com as mesmas modalidades de exteriori-

    zao, isto , que, depois de uma demora mais ou menos longa, Marie se materializava, saa do gabinete, danava e cantava

    quando o podia ou dirigia aos presentes algumas frases no mes-

    mo patu para depois voltar ao gabinete e desaparecer.

    Resulta da que a reproduo de narraes de sucessos sem-

    pre iguais se tornaria sumamente montona, o que naturalmente no significa que essa longa srie de experincias no sejam

    dignas de ser estudadas em suas mais minuciosas particularida-des, das quais se poderiam colher verdades altamente instrutivas

    acerca do poder de sugesto das pessoas cticas e hostis relati-

    vamente conduta inconsciente dos mdiuns em transe.

  • Para evitar a monotonia, limito-me a repetir a parte substan-cial de uma boa sesso em que se encontram todas as modalida-

    des com as quais se manifestava Marie, a danarina.

    Extraio a narrao do livro da marquesa Townshend of Ray-

    nhal True Ghost Stories (Verdadeiras histrias de fantasmas) e o relator o conhecido e autorizado metapsiquista ingls Sir

    Ernest Bennett, scio fundador da Society for Psychical Resear-

    ch, de Londres. Ele, meticuloso partidrio dos mtodos cientfi-cos das pesquisas psquicas, que exigem provas e mais provas

    antes de pronunciar-se a respeito, se abstivera de publicar, nos

    seus Proceedings, a narrao da nica sesso qual assistira com Florence Cook, mas logo permitiu que a Sra. Townshend a

    inclusse em seu livro.

    Como extensa a dita narrao, condenso, em poucas pala-vras, o caso de que se trata.

    H trinta e cinco anos, achando-se Sir Ernest Bennett na resi-dncia da propriedade agrcola de Lady B. H., senhora perten-

    cente alta aristocracia inglesa, pediu esta a Sir Bennett que arranjasse um mdium em Londres para fazer algumas experin-

    cias ali. Ele no queria, mas, para no mostrar-se indelicado, lhe

    disse que conhecia uma autntica mdium de nome Florence Cook e aconselhou-a se devesse convid-la como hspede e no

    como mdium.

    Assim se fez e Florence Cook foi bem acolhida por um grupo de pessoas cticas e completamente novatas no assunto. J ao

    contrrio, Sir Bennett era bom conhecedor das experincias psquicas e disps-se a tomar as mais minuciosas medidas de

    fiscalizao, que, de resto, haviam sido pedidas pela prpria

    mdium. Assim sendo, duas senhoras do grupo despiram-na, examinaram-na e depois a vestiram com outras roupas. Posteri-

    ormente Sir Bennett ligou-a solidamente cadeira, pelos braos

    e pernas, por meio de um feixe composto de filamentos soltos de seda, filamentos esses que tornavam impossvel desatar os ns

    em plena obscuridade. Terminados todos os preparativos, os experimentadores foram colocados em semicrculo, de modo a

    cercar o gabinete medinico improvisado com duas cortinas, em

    um canto da sala. Sir Ernest Bennett sentou-se direita e um

  • doutor ctico esquerda da mdium, que ficava no gabinete, mas

    com as cortinas abertas.

    A narrao assim prossegue:

    A mdium no tardou em cair no estado de transe. Reclinou a cabea e subitamente ficou inconsciente... O a-

    posento estava fracamente aclarado por uma lampadazinha

    vermelha que iluminava os vultos dos experimentadores... Previamente Florence Cook havia pedido e conseguira a

    promessa formal de no tocarem as formas materializadas...

    De repente abriram-se as cortinas do gabinete medinico e surgiu uma curiosa figura humana com um turbante na

    cabea, tnica e calas largas oriental, presas abaixo dos joelhos. As pernas e os braos estavam nus e a figura pare-

    cia indubitavelmente a de uma mulher. Saiu e voltou imedi-

    atamente no gabinete; depois, adquirida a fora suficiente, reapareceu defronte dele, fechando-lhe as cortinas atrs de

    si.

    Ainda no estavam os experimentadores refeitos da e-norme surpresa provocada pela apario de to singular fi-

    gura, quando essa comeou a falar em francs, informando que se chamava Marie, que nascera na Arglia e que em

    vida fora bailarina. Essa forma materializada revelou-se lo-

    go uma personalidade pouco sria e nada espiritualizada. Conversava voluvelmente na sua gria francesa e espantava

    os experimentadores ao executar ousados giros de dana

    peculiar ao ambiente argelino. Em seguida, como se tomada por sbita timidez ou outro motivo, precipitava-se para den-

    tro do gabinete, onde ficava durante longo tempo.

    A impresso que ela produziu nos experimentadores foi a mais desastrosa, visto que o que haviam presenciado no se

    harmonizava absolutamente com a idia que tinham sobre a volta dos defuntos do plano espiritual. Essa forma materia-

    lizada se mostrava em aspecto florido, na forma mais vul-gar do termo, tal como deveria ter vivido na Terra, e o mais

    benvolo dos presentes no a teria certamente descrito co-

    mo a simptica Marie, visto que, por outro lado, se reve-

  • lava, visivelmente, teimosa e temperamental; todavia,

    quando melhor se certificou do temperamento dos experi-

    mentadores, dignou-se de se aproximar de um deles, ofere-cendo-lhe um aperto de mo. O favorecido com tal ofere-

    cimento no ousou rejeit-lo e longo e vigoroso foi o aperto

    de mos. Esse homem informou depois aos assistentes que a mo que apertara lhe parecera realmente de carne e osso.

    Sir Ernest Bennett no conseguiu explicar a gnese de semelhante personalidade e, para fazer alguma investiga-

    o, pediu a Marie que lhe mostrasse o seu prprio p.

    Tal pedido, um tanto indiscreto, irritou a danarina que, com maus modos, o afastou de sua presena, dizendo-lhe,

    sem rebuos, a opinio que dele formara, por meio de uma

    gria bem expressiva. Sir Bennett, porm, sem perder a li-nha, conseguiu examinar minuciosamente o p de Marie,

    que, no sendo precisamente o da clebre bailarina Trilby,

    era, todavia, um pezinho bem modelado. Essa inspeo foi acompanhada de fortes protestos de Marie, que finalmen-

    te declarou que ia retirar-se definitivamente, visto estar en-

    farada de todos: Je suis fatigu mourir de ces mornes vrais types anglais.

    Sir Bennett replicou ento: Assim que voc entrar no gabinete, eu a seguirei. Esta declarao provocou uma s-

    rie de desaforos sobre ele. Lady B. H. ficou impressionada

    e lembrou a Sir Bennett que ele e os demais assistentes ha-viam prometido no tocar na forma materializada, mas ele

    lhe respondeu: S prometi no toc-la, mas no prometi

    que no a seguiria. Enquanto durava essa breve disputa, passou a oportunidade de seguir a forma materializada de

    Marie, que penetrou no gabinete e, quando Sir Bennett se

    precipitou em direo ao mesmo, s vislumbrou Florence Cook rodeada pelos cordes de seda, com os ns intactos e

    mergulhada em profundo transe. Marie havia desapareci-do, como se tivesse afundado no cho. E todos se pergunta-

    vam: Para onde teria ido ela? Que fora feito dela?, visto que

    tiveram a ocasio de notar que entre Marie e Florence

  • Cook grandes eram as diferenas de corpos e que no havia

    a menor semelhana entre o rosto de uma e o da outra.

    Algum sugeriu que Marie poderia ser um manequim de dimenses naturais, acionado, de forma incompreens-

    vel, por meio de fios, e que suas palavras eram pronuncia-das por um ventrloquo, mas tal sugesto foi logo repelida

    pelo bom senso de todos. O mdico ctico sugeriu, por sua

    vez, que os experimentadores teriam sido hipnotizados distncia pela mdium, da mesma maneira que os faquires

    indianos, porm Sir Bennett declarou que tal hiptese era

    absurda, visto no existirem exemplos de hipnotizao co-letiva, sem contar que, mesmo nos casos de hipnotizao

    singular, a coisa sempre falha na primeira tentativa, especi-

    almente por falta de consentimento do sensitivo, pelo que seria absurdo pretender que uma dzia de experimentadores

    tivessem sido hipnotizados por uma pessoa estranha, que

    nem era vista por se achar oculta dentro do gabinete.

    Em resumo: Marie permanece um mistrio absoluto. E

    Sir Bennett a ela se refere como da mais estranha experin-cia em sua aventurosa existncia. E o problema se torna

    mais embaraoso pela personalidade invulgar de Marie:

    rude, teimosa e xingadora. Poder-se-ia compar-la a uma personagem do ambiente descrito por Emile Zola em seus

    romances desenrolados em lugares de corrupo e vcio.

    Mas quem a teria levado a Gloucestshire? E naquela noite onde foi ela parar?

    So estas as modalidades com as quais se manifestava o fan-tasma materializado de Marie, a danarina, em um ambiente

    favorvel. Noto, especialmente, que na narrao feita h a parti-cularidade excepcional de os experimentadores terem tido a

    oportunidade de observar que no existia a menor semelhana

    entre o rosto da mdium e o da forma materializada, particulari-dade que penso ter sido a nica conseguida na longa srie de

    experincias. De qualquer modo, saliento que a verificao desse

    fato, teoricamente importantssima, se verificou tanto no caso de Marie como no de Katie e, assim sendo, dever-se-ia conclu-

  • ir, tambm desta vez, em favor da independncia dos fantasmas

    materializados.

    Firmado este ponto, observo que o que surpreende, princi-palmente na narrao acima, o grande contraste existente entre

    a natureza vulgar e incivil da personalidade de Marie e a nobreza do carter de Katie, no obstante terem-se as duas

    exteriorizado com a mesma mdium e em sucesso imediata. Tal

    fato nos leva a concluir pela completa independncia espiritual de ambas as formas materializadas entre si, bem como pela

    inexistncia de ligao com a personalidade psquica da mdium,

    ao mesmo tempo em que nos induz a concluir ainda que Sir Ernest Bennett tinha razo quando comparou Marie, a danari-

    na, s personagens dos romances de Emile Zola, que ele tirou

    das baixas camadas da sociedade. Efetivamente, considerando-se verdadeira sua informao acerca de seu prprio passado, ento

    se torna indubitvel o acerto da comparao feita, visto que o

    ambiente em que vivem as bailarinas no certamente um ambiente moralmente elevado e socialmente perfeito. E uma vez

    admitido isto, estas consideraes justificam o modo de agir da

    forma materializada, de modo que tambm no erraram os experimentadores quando tiveram dela uma impresso moral-

    mente desastrosa. Por que moralmente desastrosa? Esperavam

    eles, porventura, devessem regenerar-se, como por encanto, os espritos de defuntos simplesmente pelo fato de terem desencar-

    nado, de terem ido para o mundo espiritual, transformando-se

    moralmente em modelos de virtudes mesmo quando tivessem vivido em um ambiente de vcio? No lhes farei a injustia de

    consider-los capazes de concluses to irracionais, limitando-

    me a observar que, em seu juzo, eles se comportaram como se o tivessem acreditado, porque, em caso contrrio, deveriam ter

    concludo que assistiram manifestao de uma personalidade

    materializada, que, em vida, pertencera camada inferior da sociedade, ou, se o quiserem, talvez melhorada em algum defeito

    moral que no aparecera em suas manifestaes. Em outras palavras: basta o bom senso para se entender que um esprito

    desencarnado, moralmente inferior, somente consegue purificar-

  • se, aperfeioar-se, redimir-se, em conseqncia de uma longa e

    laboriosa sucesso de provas de ordem espiritual.4

    Ao contrrio, no caso de Katie King, que fora filha de um corsrio ingls e levara uma vida que no se pode calcular,

    compreende-se que suas condies espirituais, j notavelmente evoludas, estavam em relao com sua permanncia de alguns

    sculos no mundo espiritual, de modo que teve longa oportuni-

    dade de evoluir, entregando-se a tarefas laboriosas e obras meritrias, como essa agora no mundo terreno, mostrando aos

    viandantes extraviados no caminho spero da Terra a estrada reta

    da vida e dando-lhes a mais completa prova da sobrevivncia da alma. Enfim, Katie afirmara que o objetivo de suas materiali-

    zaes constitua para ela uma ltima misso a cumprir na Terra,

    misso destinada a trazer sua contribuio de provas, baseadas em fatos, para demonstrar que o esprito sobrevive morte do

    corpo.

    De um outro ponto de vista, apresenta-se-nos um problema a resolver e que as materializaes de Marie, a danarina, no

    somente no progrediram durante tantos anos de experincias, mas, ao contrrio, retrogradaram lentamente nos ltimos anos da

    carreira da mdium, de modo que as boas sesses, como a que

    foi narrada, se realizaram exclusivamente nos primeiros anos de suas manifestaes para depois degenerar, fazendo com que o

    fantasma de Marie raramente conseguisse manifestar-se inte-

    gralmente. Efetivamente, faltava-lhe a desenvoltura dos outros tempos, no danava mais, j no cantava nem falava e apenas

    conseguia manter sua forma por uns instantes. Ao contrrio, se

    confrontarmos toda a srie das manifestaes de Katie King com as de Marie, verificaremos que, na primeira srie, conse-

    guida com a mesma mdium e quando ela contava apenas 15

    anos, os processos de materializaes progrediram sempre nos trs anos, tempo da durao das memorveis experincias de Sir

    William Crookes e, no fim, o fantasma de Katie conseguiu tal excelncia de organizao materializada que chegou a ter um

    corao que pulsava regularmente, ao mesmo tempo em que

    revelava tal independncia da mdium que lhe permitiu mostrar-se ao lado dela, prestando-se a ser fotografada quarenta vezes e

  • passeando pelo aposento de brao dado com Crookes e, final-

    mente, reunindo, em torno de si, os filhos dele e entretendo-os

    com o relato de acontecimentos de sua vida breve e aventurosa. E tudo isso na residncia do mesmo Crookes, em que a mdium

    se hospedara por semanas inteiras, durante as quais no perma-

    necera sozinha, nem de dia, nem de noite.5

    Quais as razes de to grande diferena entre a evoluo tri-

    unfal da primeira srie das materializaes e a lamentvel invo-luo da segunda srie, se a mdium era a mesma? A resposta

    no dbia e reside no fato de que, nos trs primeiros anos

    durante os quais se desenvolveram as experincias de William Crookes, ele e os componentes de seu grupo permaneciam

    sempre os mesmos, de modo que seus fluidos exteriorizados

    puderam harmonizar-se, sintonizar-se e fundir com os da m-dium, contribuindo eficazmente para reunir o mximo rendimen-

    to de que seria capaz a mediunidade dela.

    E aqui se apresenta a oportunidade de reforar estas conside-raes atinentes aos mtodos de investigao experimental com

    o relato de um segundo exemplo do gnero, ocorrido na minha presena. Quando no Crculo Cientfico Minerva, de Gnova,

    depois de onze meses de experincias com a mdium Euspia

    Paladino, lembrei-me, subitamente, de propor a John a esco-lha, dentre os scios do Crculo (que, em sua totalidade, j

    haviam experimentado com Euspia), de pessoas que, por afini-

    dade fludica, melhor se prestassem a reforar a potencialidade da mdium, John acolheu a proposta com entusiasmo e obti-

    vemos a mais extraordinria sesso de toda a carreira de Euspia,

    sesso que se realizou em um aposento iluminado por um bico de gs e na qual se apresentaram, diante dos experimentadores,

    entre os quais o Professor Morselli, o Dr. Venzano e a minha

    pessoa, seis formas materializadas e perfeitamente formadas. Entre elas havia uma forma de mulher idosa, que trazia nos

    braos uma criana de tenra idade, cujos bracinhos envolviam a cabea da forma feminina que beijou trs vezes na fronte. Tudo

    isto, repito, em plena luz, com a mdium visvel atravs da

    abertura das cortinas, solidamente ligados os ps, as mos e a cintura (pelo Prof. Morselli) e deitada em uma maca. A narrativa

  • de to memorvel sesso foi publicada no 2 volume da obra do

    Prof. Morselli, Espiritismo e Psicologia, nele ocupando 66

    pginas. Tambm indico o livro Hiptese Esprita e Teorias Cientficas.

    Estas so as conseqncias prodigiosas da harmonizao flu-dica nas sesses experimentais de efeitos fsicos. Observa-se,

    pois, que, no caso de Florence Cook, a grande lei da sintonizao

    entre os experimentadores foi mantida durante os trs anos em que Katie King se manifestou, ao passo que, ao contrrio, essa

    lei foi totalmente negligenciada durante os vrios anos em que

    Marie se manifestou, com a conseqncia de ter o revezamen-to de experimentadores, sempre novos, impedido a sintonizao

    de fluidos, para o que preciso um bom nmero de sesses

    sempre com os mesmos experimentadores, reunidos no mesmo aposento e nos mesmos lugares de sempre. E foi este o motivo

    pelo qual a forma materializada de Marie, a danarina, no

    conseguia mais a excelncia da organizao anterior.

    So estes os ensinamentos prticos que sugere o confronto

    entre as duas longas sries de manifestaes materializadas conseguidas com a mdium Florence Cook e de efeitos to

    diferentes pelos resultados.

    0

  • Experincias espritas de um

    ministro da Igreja Anglicana

    Atualmente est se multiplicando o nmero de timos m-

    diuns de voz direta e isto em correspondncia com o vivo desejo desses mdiuns de chegarem a obter essa forma convincente de

    manifestaes, o que demonstra como a mediunidade de efeitos

    fsicos mais ou menos transformvel, com a condio, porm, de possurem uma boa persistncia e um propsito absoluto, porque

    isto requer anos de pacincia e metdicas sesses preparatrias

    com resultados nulos antes de ser atingido o to ambicionado fim.

    Sabe-se que a Sra. Gibbons Grinling sentou-se com seu filho, em plena obscuridade, trs vezes por semana, durante trs anos

    seguidos, sem nunca chegarem a obter coisa alguma. Depois,

    certa noite, de um ngulo do teto, fez-se ouvir a voz do filho morto que lhe comunicava a agradvel notcia de que a sua

    perseverana havia alcanado o desejado prmio e desde aquele

    dia a sua mediunidade se desenvolveu de forma rpida.

    Sucedeu o mesmo, recentemente, com o conhecido jornalista

    ingls Hannen Swaffer, autor da obra Northcliffs Return (A volta de Northcliff), o qual, depois de ter assistido, em casa de

    H. Dennis Bradley, s sesses com o mdium Valiantine, for-

    mou, em sua prpria casa, um grupo de experimentadores esco-lhidos com o escopo de chegarem a obter o fenmeno de voz

    direta e nisto perseverou por dois anos sem resultado algum, mas

    eis que, j passados alguns meses, a voz direta se fez ouvir tambm no seu grupo, desenvolvendo-se e reforando-se rapi-

    damente.

    Diga-se o mesmo das bem conhecidas senhoritas Moore, das quais me resolvo ora tratar a propsito de magnficas sesses que

    o Rev. V. G. Duncan teve com elas, que, j desde 1917, nunca se tinham interessado por experincias medinicas, mas naquele

    ano conheceram uma famlia de espritas com a qual participa-ram de algumas experincias psicogrficas que lhes despertaram

    o interesse. Tentaram escrever automaticamente e o consegui-

  • ram. Numa dessas experincias, uma entidade comunicante

    aconselhou-as a se proverem de uma trombeta acstica e que

    se sentassem em plena obscuridade, assegurando-lhes que, com sua persistncia, conseguiriam o fenmeno de voz direta. Nisso

    perseveraram por quase um ano sem nada obterem, mas certa

    noite fizeram-se ouvir leves pancadinhas batidas na trombeta. O modesto fenmeno serviu para reforar-lhes a tenacidade de

    propsito que estava prestes a findar e, depois de alguns meses,

    ouviram a voz de um esprito que lhes enviava uma saudao de feliz xito. Desse momento em diante, a mediunidade delas se

    desenvolveu rapidamente em tal sentido e depois as vozes diretas

    se exprimiram num tom absolutamente normal.

    O Rev. Duncan intitulou o seu livro com uma s palavra,

    Proofs (Provas), ttulo lgico este, pois que repleto de fatos que convergem todos para um fim nico: a demonstrao da existn-

    cia e sobrevivncia do esprito humano. Observa ele:

    Este livro, profundamente sincero, foi escrito por um ministro da igreja anglicana e o resultado de um esforo

    comeado em 1926 para resolver, por meio do mtodo ex-perimental, o problema dos problemas que o da sobrevi-

    vncia do esprito morte do corpo... O esforo para adqui-

    rir uma convico pessoal sobre este assunto se impe a tal ponto que toda pessoa, capaz de refletir, no pode deixar de

    realiz-lo em uma poca como a nossa, de isolamento e de

    perplexidade espiritual.

    Nesse esforo tenaz de pesquisas, em que me aconteceu

    explorar tambm a minha f ... cheguei a descobrir quanto basta ... para oferecer o blsamo de consolo s almas tortu-

    radas pela dvida ou queles que choram sobre uma sepul-

    tura recente e se interrogam, consternadas, sobre que coisa teria sucedido aos seus parentes prximos, chegados ao te-

    nebroso ocaso ou aurora radiosa que os humanos chamam

    de morte.

    Estas reflexes, profundamente verdadeiras e no menos sin-ceras, demonstram logo que, no ministro anglicano como num

    imenso nmero de pessoas, cultas e incultas, de nosso sculo, se

  • instalara o tormentoso acleo de uma dvida filosfica que no

    poderia ser eliminada de outra forma seno obtendo-se provas

    concretas da sobrevivncia.

    Em tais circunstncias, ele recorda que, quando moo, assisti-

    ra a algumas sesses medinicas que, na verdade, no o tinham animado a prosseguir nas pesquisas que ora resolvia fazer. Assim

    escreve ele:

    A minha volta s pesquisas psquicas comeou em 1922, na ocasio em que ainda estava na Esccia. Quando me de-

    parava com almas sofredoras, que me suplicavam palavras de conforto, sentia mais do que nunca a necessidade de en-

    contrar argumentos mais seguros e pessoais do que os que

    me fornecera a ortodoxia anglicana e foi por essa imperiosa necessidade que resolvi empreender o estudo dos portento-

    sos volumes da Society for Psychical Research. Depois, li,

    estudei e anotei uma centena de obras diversas sobre o mesmo assunto. Certo dia, o meu livreiro habitual, que ti-

    nha notado minha preferncia por essa espcie de literatura,

    disse-me que, se eu desejava aprofundar-me experimental-mente nas pesquisas psquicas, ele poderia ajudar-me...

    E assim aconteceu. Por intermdio do seu livreiro foi que o Rev. Duncan conheceu as senhoritas Moore, mdiuns que ele

    descreve nos seguintes termos:

    Nunca eu me encontrara com mdiuns de voz direta, pe-

    lo que, quando me foram apresentadas as duas jovens ir-ms, comecei a observ-las com grande interesse, estudan-

    do-as do ponto de vista psicolgico. Pareceram-me, em tu-

    do, duas jovens escocesas normalssimas, modestas e gen-tis, nas quais no se observavam absolutamente as caracte-

    rsticas especiais de mdiuns suspeitos. A nica particulari-

    dade perceptvel a um observador perspicaz consistia no seu olhar vago, que parecia fixar-se longe, muito longe

    mesmo: era o indescritvel olhar particular aos videntes

    da Esccia. Durante a breve conversa que precedeu a ses-so, tive meios de verificar que as duas irms eram entusi-

    astas do movimento espiritualista ao qual tinham consagra-

  • do a vida e pelo qual esperavam a regenerao da humani-

    dade. Explicaram-me, modestamente, que eram simples ins-

    trumentos a servio dos desencarnados...

    O Rev. Duncan fora sesso juntamente com um amigo, ex-

    oficial do Exrcito, amigo que estava tanto quanto ele prprio desejoso de formar um conceito pessoal sobre a realidade das

    manifestaes dos chamados mortos. Ambos obtiveram boas provas em tal sentido: ao oficial manifestou-se a prpria me, da

    qual reconheceu a voz e que lhe forneceu magnficas provas de

    identificao pessoal, e ao Rev. Duncan manifestou-se um dos vigrios que o haviam precedido no exerccio da parquia que

    lhe foi confiada, vigrio que ele nunca conhecera. Relato a seguir

    um trecho deste ltimo episdio:

    O esprito-guia dirigiu-se a mim, dizendo: Irmo, est

    presente algum que deseja falar-vos. alto, bem apessoa-do, e parece tambm um ministro anglicano. Apresenta-se

    vestido com uma comprida batina preta, ao que respondi

    que me seria bem agradvel conversar com ele.

    Fez-se logo ouvir uma voz que me falou defronte, a

    poucas polegadas do rosto, e que se exprimiu nestes termos:

    Sou Moss, Gerald Moss. No me conhecestes, mas bem

    sabeis quem sou. Fui o primeiro vigrio da igreja em que estais.

    Estou mais do que satisfeito em conversar com um meu antecessor. Podeis dizer-me em que local falecestes?

    Sim. Millhaven.

    verdade. E de que doena falecestes?

    Pulmonite.

    (Exato). Naturalmente vos lembrais do nome de minha igreja.

    De nossa igreja, devereis dizer. So J...

    (Exato). Porventura desejais encarregar-me de uma

    mensagem para a vossa esposa?

  • Nunca me casei e bem o sabeis, replicou prontamente a voz, com certo ressentimento na tonalidade com que se

    exprimiu.

    Apressei-me a pedir-lhe desculpas, observando que ele

    compreendia certamente e talvez apreciasse o motivo pelo qual lhe dirigi uma pergunta assim.

    Ouviu-se uma risadinha, seguida da resposta: Provas cruciais para a casustica.

    Observei-lhe ainda que, se me fornecesse alguma infor-mao valiosa de identificao pessoal, prestar-me-ia um

    assinalado servio. Preferivelmente algum incidente por

    mim ignorado, mas suscetvel de controle, caso em que no seria fcil para os adversrios proferirem a palavra mgica:

    subconsciente.

    Ele respondeu: Esperai um momento... Achei. Ignorais certamente que j fui professor.

    Ignoro-o absolutamente e asseguro-vos sinceramente que nada conheo de vosso passado.

    Bem, bem... Ento vos informo que, antes de receber as ordens religiosas, fui mestre na Escola M. T., de Edimbur-

    go. Podeis verificar a exatido do que afirmo.

    Obrigado. F-lo-ei certamente.

    Caro colega, tocou-vos por sorte uma dura misso a de-sempenhar com os tempos que corre, observou o comuni-

    cante com uma entonao triste.

    Respondi-lhe: verdade.

    E verificareis que no o ser menos difcil no futuro, todavia estarei sempre convosco na igreja e no plpito. E

    deveis informar disto os fiis para que conheam esta gran-de verdade. Informai-os de que continuo vivo aqui como

    eles esto vivos a. A morte s do corpo, no da alma.

    A este respeito, devo salientar uma notabilssima coinci-dncia e que algumas semanas aps a conversa acima vie-ram a mim, uma aps outra, vrias pessoas de minha con-

    gregao para me informarem que, quando estou a pregar

  • um sermo no plpito, percebem ao meu lado um vulto al-

    to, robusto, vestido com uma longa batina preta.

    Ora, eu ignorava tudo sobre o aspecto pessoal do Rev. Gerald Moss, mas, interrogando a respeito algumas pessoas

    que o tinham conhecido em vida, vim a saber que as infor-maes prestadas por elas, como as idnticas fornecidas pe-

    lo esprito-guia, correspondiam exatamente ao seu aspecto

    pessoal. Noto que, entre elas, havia tambm um menino de oito anos, que me narrou o acontecido, presa de grande agi-

    tao (pgs. 28/30).

    Finalmente, como complemento do exposto acima, resta-me acrescentar que, na pgina 43 do seu livro, o Rev. Duncan nos informa que, na busca por ele empreendida para verificar a

    particularidade fornecida pelo morto, segundo a qual este, antes

    de receber as ordens religiosas, fora preceptor na escola de Edimburgo por ele citada, particularidade absolutamente ignora-

    da pelo consulente, pde verificar serem exatas essas informa-

    es.

    Este o caso mais sugestivo, em meio a outros igualmente

    interessantes, acontecidos com o Rev. Duncan na sesso inicial da investigao empreendida e deve-se convir que ele foi feliz,

    porquanto lhe sucedeu logo um timo caso de identificao

    pessoal dificilmente acessvel hipercrtica adversria.

    Por outro lado, o desenvolvimento das manifestaes ocorri-

    das serve para eliminar a hiptese de fraude, visto que as m-diuns no podiam conhecer os numerosos e ntimos informes

    pessoais fornecidos pelos espritos comunicantes a ttulo de

    identificao e a esse respeito no o caso de adicionar coisa alguma.

    Observo que, no caso exposto, alm de uma informao to-talmente ignorada pelo consultante, informao que foi em

    seguida verificada como verdadeira (o que serve para eliminar a

    hiptese de leitura do pensamento consciente e subconsciente), encontra-se ainda um incidente que serve para eliminar a hipte-

    se de uma mistificao subconsciente e o de dirigir o reve-

    rendo uma pergunta insidiosa destinada a faz-lo trair-se, como

  • se tratasse de uma personalidade sonamblica, mas, ao contr-

    rio, assim no aconteceu, e o comunicante retificou prontamente,

    com uma expresso de ressentimento, a tentativa do Rev. Dun-can, demonstrando, com isto, de maneira eficacssima, a prpria

    identidade pessoal.

    Um outro episdio, em tal sentido, o do esprito-guia des-crever o aspecto do defunto com particularidades reconhecidas

    como exatas, informaes que ele no poderia ter apreendido na subconscincia do reverendo, que ignorava tudo a respeito. E tal

    notabilssimo episdio se completa at tornar-se impressionante

    quando se verifica que a promessa formulada pelo defunto, de assistir o seu sucessor na igreja e no plpito, confirmada, de

    forma inesperada, pela circunstncia de vrios paroquianos

    perceberem, coletiva e sucessivamente, um esprito ao lado do seu vigrio, esprito que descreveram em termos que concorda-

    vam com os fornecidos pelo esprito-guia, portanto todas essas

    descries correspondiam realidade.

    Achamo-nos, portanto, diante de um conjunto intricado de

    provas e contraprovas convergentes todas para uma interpretao espirtica dos fatos e no sei, na verdade, que coisas poderiam

    objetar, a propsito, os propugnadores da palavra mgica

    subconsciente!

    Relato ainda um caso de identificao espirtica que escolho

    pela sua brevidade:

    Andrew, o esprito-guia, informou-o de que se achava

    presente um esprito com o nome de Dan e que o mesmo desejava vivamente falar com o Rev. Duncan.

    Seguiu-se o dilogo abaixo:

    Eu no consigo estabelecer uma ligao entre tal nome e

    pessoas mortas que me fossem conhecidas, a no ser com um parente afastado, falecido numa das colnias, antes que

    eu nascesse.

    No, no se trata desse Dan. Este outro Dan vs o co-nhecestes muito familiarmente em Edimburgo.

  • Caro Andrew, desagrada-me ter de repetir que no me lembro de quem seja ele e, assim sendo, no falemos

    mais nisto. Poder acontecer que mais tarde me lembre.

    lamentvel que penseis assim, pois se trata de um es-

    prito ansioso por falar-vos. Ele afirma que o conhecestes muito bem e que se encontrava regularmente convosco.

    Estou bem contrariado com isto, mas no consigo re-cordar-me dele.

    Acrescenta que conhecestes tambm a esposa e o filho dele. Moravam perto de vs.

    intil, caro Andrew, mas no consigo recordar-me da pessoa dele. Talvez mais tarde me recorde.

    E com estas palavras teve fim o nosso dilogo, que deve-ria ter um interessante eplogo algum tempo depois.

    Um amigo de Edimburgo me enviava, trimestralmente, os nmeros atrasados do Boletim Paroquial e, em dezembro de

    1929, recebi um pacote deles. Ao ler os boletins, caiu-me

    sob os olhos uma notcia que anunciava o falecimento de um velho amigo meu: William Dann, caixa do Conclio das

    Igrejas Unidas. Morrera no sbado, dia 14 de setembro de

    1929. A sesso supracitada se realizara em Hamble, quinze dias depois. Eu estava bem longe de imaginar que ele tives-

    se falecido e ignorava mesmo que estivesse enfermo. Re-

    portando-me ao que me fora dito na sesso para me desper-tar recordaes, observo que tudo era verdade, inclusive a

    circunstncia de que, cada quinzena, geralmente em um s-

    bado noite, nos reunamos regularmente para conversar-mos sobre as pesquisas psquicas, assunto em que era muito

    competente. Nada mais certo, portanto, que, se depois da

    morte, lhe deparasse uma oportunidade de se manifestar, ele a teria acolhido com alegria. Assim sendo, convenci-me

    de que o fizera realmente naquela noite em Hamble. Infe-

    lizmente, o meu pensamento se fixara em um Dan, nome de batismo, e, como eu ignorasse que o meu amigo Dann ti-

    vesse morrido, na ocasio no conseguia atinar de quem se tratava. Posteriormente o meu amigo Dann se manifestou,

  • censurando-me pelo meu tardio reconhecimento de sua pes-

    soa (Ob. cit. pg. 117).

    De um ponto de vista rigorosamente cientfico, poder-se-ia observar que o caso em si no se reveste de grande valor terico,

    porquanto as numerosas informaes apresentadas pelo comuni-cante, para fazer-se reconhecer pelo amigo, existiam todas na

    subconscincia deste ltimo, mas, em compensao, nota-se a circunstncia de o reverendo ignorar a morte recentssima do

    amigo comunicante, o que equivale a admitir que ele foi, por

    processo medinico, informado de um detalhe que ignorava, do mesmo modo que as mdiuns: o do falecimento do amigo.

    O referido livro contm ainda alguns casos de identificao espirtica, mas, para no me estender muito, passo a anotar

    outros aspectos interessantes das experincias espritas do Rev.

    Duncan, informando, antes de tudo, que nesta srie de experin-cias de voz direta esto intercalados fenmenos supranormais de

    todas as espcies: casos de clarividncia no presente e no passa-

    do, correspondncia cruzada, batidas medinicas, telecinesia, xenoglossia, perfumes espirituais e tambm curas imediatas de

    pequenas enfermidades dos presentes.

    Relato a seguir um caso de voz direta ocorrido na sesso de 28 de maio de 1929, qual assistia o Dr. Barker, eminente

    mdico de Edimburgo. O esprito-guia Andrew dialogou assim com o mdico:

    Est presente aqui uma senhora que deseja falar ao seu mdico.

    Terei bastante prazer em ouvi-la.

    Foi uma de vossas clientes e diz-me que conversou

    convosco sobre assuntos espritas pouco antes de sua morte.

    Esta notcia muito me interessa.

    Assim e ela vos agradece por t-la orientado nessas pesquisas. Porventura lhe emprestastes alguns livros?

    Pode ser que tenha acontecido.

    Diz-me agora que, em outra manh, experimentou ma-nifestar-se visivelmente no vosso quarto.

  • Que diz? (O Dr. Barker d um pulo de surpresa).

    Diz que procurou aparecer-vos, encostada parede, e est segura de que a vistes. verdade isto?

    Eis uma comunicao surpreendente. bem verdade que na manh passada tive uma viso em que me pareceu

    reconhecer o esprito de uma cliente minha, falecida h

    pouco tempo, e a via precisamente encostada na parede. Ti-ve cuidado em no diz-lo para no passar por alucinao.

    Ela sorri. Est exultante de satisfao por saber que a vistes realmente. Diz que desapareceu penetrando atravs

    da parede.

    Andrew, diz-me agora o nome dela.

    Ela faz-me um S maisculo. ! Chama-se Sally!, Sally! Est h pouco tempo deste lado, mas far o que puder. Vin-

    de, podeis falar, irm.

    Faz-se ouvir uma voz feminina bastante distinta e algo forte para ser ouvida por todos, a qual se dirige ao mdico

    chamando-o pelo nome Duncan! Duncan!

    !, cara Sally. Sois vs mesma?

    Sim, caro Duncan. Disse que voltaria se a coisa fosse possvel. Disse-o e o estou fazendo.

    Sim, o dissestes e o estais fazendo. Gratssimo vos fico.

    Ento me vistes mesmo?

    Sim, percebi-vos encostada na parede, mas no podia

    crer em mim mesmo e achei que se tratava de uma iluso dos sentidos.

    Nada disto. Era eu mesma.

    O que esperveis se realizou?

    Muito mais cedo do que eu esperava. Sou extraordina-riamente feliz, mas no posso demorar-me... A fora se en-

    fraquece... Adeus, adeus!

    Adeus, Sally. Deus vos abenoe.

    Na ocasio, o Dr. Barker explicou que o acontecido se reduzia a uma prova de identificao extraordinria. Sally

  • fora uma cliente sua que padecia de um mal incurvel. Em

    tal circunstncia, para confort-la, aconselhara-a a que lesse

    livros espiritualistas e fizera quanto possvel para prepar-la para a grande passagem inevitvel. Nos seus ltimos dias

    de vida, ela prometera ao seu mdico que, se fosse possvel,

    voltaria, esforando-se por se lhe mostrar sob forma visvel. Ningum, no mundo, alm de ns dois, sabia da existncia

    de nosso acordo, que fora mantido de modo impressionan-

    te. (Ob. cit., pgs. 95 e 96).

    Que pensar deste outro admirvel episdio? Eis uma enferma que promete ao seu mdico que, podendo, voltaria, fazendo-se

    ver, e mantm a palavra empenhada! Reconheo, entretanto, que

    se tudo consistisse nisto, os nossos adversrios teriam podido objetar legitimamente, mas erroneamente, que o mdico fora

    vtima de uma alucinao por efeito de uma ateno expectan-

    te e o mdico o compreendera to bem que se absteve de fazer saber que vira um esprito. Eis, porm, que o mdico convida-

    do para assistir a uma sesso de voz direta e a primeira a se

    manifestar justamente a sua cliente que fora comunicar-lhe que havia mantido o trato feito de aparecer-lhe no seu quarto, con-

    firmando, de maneira definitiva, a autenticidade da viso perce-

    bida por ele. Nada, portanto, de ateno expectante, determi-nadora de vises alucinatrias.

    Estes os fatos, dos quais decorre que a confirmao, inespe-rada e magnfica, da objetividade da viso ocorrida se transforma

    numa dupla prova de identificao espirtica: uma decorrente da

    demonstrada veracidade do esprito aparecido e a outra da no menos demonstrada identidade do mesmo que se manifestou pela

    voz direta para fazer-se anunciar ao seu mdico.

    Passando adiante, observo que tambm o fenmeno das curas rpidas de pequenas enfermidades, de que sofriam os experimen-

    tadores, se mostra interessante e incomum nas circunstncias em que os acontecimentos se desenvolvem. Resolvo-me, portanto, a

    narrar um caso delas.

    O Sr. Sidney Charters fora convidado para assistir a uma ses-so do Rev. Duncan e, na vspera do dia marcado, cara, ao jogar

  • golfe, lacerando seriamente as cartilagens de um joelho. Ainda

    assim, compareceu sesso mancando e sentindo dores, e logo

    se ouviu a voz de Andrew, que, dirigindo-se a ele, lhe disse o seguinte:

    Irmo, no estais muito bem. Sei de tudo: foi um aci-dente num jogo de bolas.

    O Sr. Charters, sorrindo, respondeu-lhe:

    Tendes razo e as bolas desta vez me deram um forte ti-

    ro.

    J sei. Sentis dores num dos joelhos.

    Exato. Faz-me muito mal. Podereis sugerir-me algum remdio?

    Vou satisfazer-vos. Esperai um momento. Vou procurar um esprito que foi mdico na Terra.

    Ouvi-se pouco depois uma surpreendente conversa entre dois espritos, na qual intervinha algumas vezes Andrew.

    Este ltimo, finalmente, anunciou que dois mdicos esta-vam presentes, para depois acrescentar:

    Irmo, agora os mdicos iro curar-vos.

    Muito obrigado, Andrew. Confio muito na vossa in-

    terveno.

    Logo depois ele soltou um grito agudssimo de dor e to-

    dos perguntaram: Que est acontecendo?

    O Sr. Charters observou: Meu Deus! Que dor agudssi-

    ma! Parecia que me enterraram uma lmina entre as juntas do joelho. Andrew, dizei-lhe para no fazer mais isto.

    No vos alarmeis, irmo respondeu ele . O mdico que vos feriu est sorrindo e diz que agora ficareis curado.

    Ento folgo em sab-lo e agradeo a todos vs.

    E foi isto mesmo que aconteceu. Daquele momento em

    diante o meu amigo no sentiu mais dor alguma e, quando saiu da casa, desceu as escadas desembaraadamente, sem

    capengar. Ficou radicalmente curado num instante e nada mais sentiu no joelho ferido, nem no dia seguinte, nem de-

    pois. (Ob. cit., pgs. 84/85).

  • No h o que dizer seno isto: as curas rpidas, de tal nature-za, em que se trata de feridas e no de um mal-estar qualquer,

    so teoricamente interessantes porquanto se mostram inexplic-veis com as teorias da auto-sugesto curadora e da f que

    produz milagres, como se afirma para as curas na cidade de

    Lourdes, na Frana, teorias legitimamente aplicveis a numero-sas enfermidades de origem nervosa ou ainda de outra natureza,

    mas que no parecem suficientes para explicar o caso em exame,

    em que se trata de uma lacerao das cartilagens do joelho. Observo como tambm a particularidade do agudssimo grito

    soltado pelo paciente, com a explicao que se seguiu de ter ele

    sentido como uma lmina a se lhe enterrar no joelho, parece comprovar a interveno de um operador invisvel. Como expli-

    car a cura havida? Nada sabemos, mas o fato que o paciente

    ficou curado, num instante, de um ferimento, no insignificante, em delicada parte da perna.

    Resta aludir caracterstica principal das experincias em questo, a qual consiste na freqncia com que os espritos-guia

    revelam o futuro pessoal dos experimentadores sob a forma de

    minuciosos anncios antecipados dos acontecimentos que lhe surgiro durante o ano. E trata-se sempre de acontecimentos

    comuns, no trgicos.

    A importncia da questo tal que exigiria um longo desen-volvimento e lamento no poder faz-lo. Limito-me, pois, a

    narrar um caso, a ttulo de exemplo.

    O Rev. Duncan, seguindo os conselhos dos espritos-guia,

    que desejavam que ele passasse a morar em centros mais pr-prios propaganda das novas idias, pedira a sua demisso de

    Reitor da Igreja Episcopal de Santo Andr, em Edimburgo, e

    fora para Londres na esperana de poder obter um outro posto nas imediaes, mas a oportunidade no se apresentava e a

    situao comeava a tornar-se inquietante.

    Durante uma sesso na residncia das irms Moore, uma de-las se dirigiu ao esprito-guia Andrew e com ele se estabeleceu o seguinte dilogo:

  • Andrew, ns imploramos o vosso auxlio devido situao em que se acha o Rev. Duncan. J estamos ficando

    preocupados.

    No vos preocupeis, irm. Tudo acabar bem. (num

    timbre de voz como muito seguro de si).

    Assim esperamos, Andrew, mas somos criaturas hu-

    manas e no podemos evitar a nossa ansiedade.

    O irmo Duncan seguiu fielmente o nosso conselho.

    Sim, letra, e agora se sente intranqilo quanto ao seu futuro.

    No assegurei, porventura, que no permitiramos que ele ficasse desocupado?

    Sim, verdade.

    Pois bem, a coisa no assim mesmo? Estaria ele tal-vez desiludido?

    Aqui, o Rev. Duncan d o seu aparte e esclarece: Certa-mente que no. Desde o dia em que deixei a Esccia no ti-

    ve um s domingo sem ocupaes retribudas. Dir-se-ia que

    todos se esforam em auxiliar-me.

    Andrew e a Srta. Moore voltam ao seu dilogo.

    No vos entristeais, irmo. Ns vos ajudaremos sem-pre.

    Isto um conforto, Andrew, mas no seria melhor obter para ele uma ocupao estvel? Procurai consegui-lo,

    pediu a Srta. Moore.

    Est bem, irm. Faremos o que pudermos.

    Seguiu-se um perodo de silncio e a mais jovem das ir-ms, que possui o dom de clarividncia, disse perceber

    Andrew, que conversava com uma entidade alta e more-na. Depois Andrew se manifestou novamente anunciando

    que, no fim de trs semanas, o Rev. Duncan estaria com

    uma ocupao estvel. E assim continuou.

    Vejo um comprido envelope que lhe chega com uma proposta. Dentro h um papel escrito mquina, que lhe

    endereado. No ngulo, ao alto, distingo um selo.

  • E segue-se o seguinte dilogo entre o Rev. Duncan e Andrew:

    Pelo que descrito, lembra um documento oficial.

    No. uma oferta que vos ser feita.

    A coisa est me interessando. Podeis descrever o local

    em que se acha o vicariato?

    um vicariato simptico. Fica no alto de uma colina,

    em pleno campo.

    Suponho que podereis dizer-me tambm o nome da i-

    greja.

    Experimentarei. Chama-se... Maria... Santa Maria Ma-

    dalena.

    Estou tomando nota de tudo o que me dizeis. bonita a

    igreja?

    Sim, bastante. Desejo que tome nota tambm do plpi-

    to, que pintado de verde com numerosos dourados e certas pinturas que se assemelham s dos vasos de louas.

    Este um detalhe pouco comum e no me esquecerei certamente de observ-lo.

    Lembrai-vos de observar tambm os vitrais laterais e, na ocasio de vossa ida l, achareis um vaso cheio de alvos

    lrios, apoiado bem defronte da figura pintada em um vitral.

    , certamente que no me esquecerei.

    E que coisa mais podeis dizer-me sobre o vicariato? perguntou a Sra. Duncan, intervindo na conversa.

    Bem, sei que as senhoras gostam de ficar bem instala-das. Pois bem, o vicariato bonito, simptico, construdo

    de pedras e tijolos vermelhos. Verificareis que nas paredes

    externas h cruzes pintadas por todas as partes.

    Lembrar-me-ei de tudo que me descreveis. H jardins?

    perguntou ela.

    Sim, sim. quando entrardes pela porteira do jardim,

    percebereis uma rvore estranhamente torta, em torno da qual esto dispostos canteiros floridos.

  • Nada mais de notvel? perguntou ainda ela.

    Sim, quando chegardes l, encontrareis um homem que vos espera na porta. um ministro anglicano, alto, magro,

    de rosto comprido e barbeado e de cabelos brancos. Obser-

    vareis que ele tem os dedos das mos muito compridos...

    Fica o vicariato situado ao norte ou ao sul? pergun-

    tou, por sua vez, o Rev. Duncan.

    situado ao sul e fica bem longe daqui.

    Caro Andrew, fica, pois, entendido que o Rev. Dun-can obter breve uma ocupao estvel. Podemos levar em

    considerao as vossas palavras? perguntou, por sua vez, a Srta. Moore, intervindo na conversa.

    Sem dvida alguma, irm. Ele confiou em ns e ns nunca permitiremos que possa arrepender-se. No posso

    permanecer por mais tempo... A fora diminui. Boa-noite,

    irmo. Boa-noite, irms. Deus vos abenoe.

    O Rev. Duncan teceu a propsito os seguintes coment-

    rios:

    Foi esta uma das sesses mais estupefacientes e proban-

    tes por mim obtidas at hoje. Todas as predies que me fo-ram feitas se realizaram totalmente. No fim das trs sema-

    nas indicadas, chegou-me um comprido envelope contendo

    um papel datilografado em que me era oferecido um vicari-ato vago. Trazia, num dos ngulos, ao alto, o selo do Co-

    lgio Eclesistico e tinha a aparncia de um documento o-

    ficial. A igreja, que me foi oferecida, era consagrada San-ta Maria Madalena e, para atingi-la, era preciso subir a en-

    costa de uma colina. O plpito era mesmo pintado de verde,

    com numerosos dourados, e sobre os trs lados do mesmo se notavam trs grandes escudos com armas gentlicas, que

    Andrew comparara s pinturas existentes nos vasos de

    loua. O vicariato era construdo em tijolos vermelhos e pedras silicadas e nas paredes externas haviam cruzes mais

    ou menos espalhadas. Quando fomos visitar o vicariato, imaginvamos que no se realizaria a predio relativa ao

    vaso dos lrios e isto porque era ocasio da quaresma, per-

  • odo durante o qual so retiradas as flores das igrejas, mas

    assim no aconteceu. Verificamos que nos vitrais estavam

    pintadas imagens de Nossa Senhora e do menino Jesus e que diante das mesmas havia um vaso cheio de lrios. Che-

    gados ao vicariato, achamos o Reitor no limiar da porta a

    esperar-nos e era mesmo um homem alto, magro, barbeado e de cabelos brancos. No reparei nas suas mos, mas a mi-

    nha esposa no o esqueceu, notando que tinha dedos muito

    compridos. Enfim, no jardim prximo ao porto de entrada, encontramos a tal rvore curiosamente torta de que falara a

    predio, circundada de canteiros floridos como descritos.

    (Ob. cit., pgs. 110/115).

    O caso exposto apresenta-se teoricamente muito importante sob diversos pontos de vista e comportaria mesmo um longo

    comentrio, porm deverei limitar-me s caractersticas que lhe

    so peculiares.

    Observo a propsito que, neste mesmo caso, como em outros

    contidos no livro, nota-se a circunstncia interessante de que os espritos-guia, enquanto prenunciam, minuciosamente, aconte-

    cimentos comuns que deveriam suceder aos experimentadores,

    declaram, explicitamente ou fazem compreender veladamente, que os acontecimentos vaticinados se realizaro por sua inter-

    veno direta sob a forma de sugestes apropriadas aos diversos

    protagonistas da situao vaticinada. Tal circunstncia, que j fiz notar no meu trabalho sobre os fenmenos premonitrios,

    altamente sugestiva, porquanto poderia servir para explicar uma

    parte dos fenmenos precognitivos, mas preciso no imaginar que ela sirva para explic-los todos.

    Nota-se, alm disso, que, no caso exposto, se combinam a clarividncia no futuro com a mesma no presente, visto que os

    estupendos informes dados sobre o vicariato destinado ao Rev.

    Duncan pressupem que a entidade comunicante tenha ido ao local dele ou tenha tido, de qualquer forma, a viso, distncia,

    de cada detalhe em particular.

    Quanto ao incidente do vigrio demissionrio, que os recebeu na porta dele, conforme foi predito, faz supor que se trata, evi-

  • dentemente, de um fenmeno que se classificaria na ordem dos

    supracitados, em que a entidade comunicante obtm a realizao

    do prprio vaticnio sugestionando, no sentido apropriado, os protagonistas do caso.

    Neste ponto, apresenta-se uma interrogao formidvel. Co-mo classificar as personalidades medinicas capazes de sugesti-

    onar os diversos protagonistas de sua situao vaticinada de

    modo to eficaz a ponto de faz-los agir como autmatos subme-tidos sua vontade? Personalidades sonamblicas ou personali-

    dades espirituais? Nenhuma dvida padece de que a primeira

    soluo da questo se mostra inverossmil at o absurdo. Seria lgico, talvez, presumir que, nas subconscincias das irms

    Moore, existam faculdades capazes de submeter, sua vontade,

    qualquer pessoa viva? Quer dizer, at pessoas que lhes so inteiramente desconhecidas? Este ltimo detalhe, se fosse verda-

    deiro, estaria em completa contradio com a frrea lei da rela-

    o psquica indispensvel a qualquer forma de comunicaes supranormais entre duas mentes, lei que no comporta excees

    no domnio das pesquisas psquicas, como no comporta exce-

    es no domnio da qumica, da eletrotcnica, tomando, respec-tivamente, os nomes de lei da afinidade, de sintonizao

    entre os diversos comprimentos da onda. Decorre, da, que a

    segunda soluo da questo se apresenta como a nica racional-mente e cientificamente aceitvel, visto que no pode existir uma

    terceira.

    *

    Termino aqui com as citaes, embora outras sries de fen-menos teoricamente interessantes existam, os quais exigiriam

    adequados comentrios, que sero provavelmente feitos em outro

    trabalho meu.

    Do ponto de vista filosfico-religioso, o livro do Rev. Duncan

    vem colocar-se ao lado de outros igualmente importantes publi-cados na Inglaterra por ministros da Igreja Anglicana, o que

    demonstra que o clero reformado comea a penetrar resoluta-

    mente no terreno das investigaes supranormais, experimentan-do, publicando livros e aderindo interpretao espirtica dos

  • fatos.6 No s isto, mas houve dois pastores anglicanos, um dos

    quais o prprio Rev. Duncan e o outro o Rev. Mac Clean, que

    desenvolveram do plpito todo um programa de sermes desti-nados a mostrar aos seus fiis a importncia providencial das

    pesquisas psquicas, porquanto elas contribuem evidentemente

    para reforar a vacilante f crist do sculo em que vivemos, sculo muito cientificamente avanado para que a humanidade

    pensante possa adaptar-se a crer fora do obsoleto critrio de

    autoridade.

    A propsito de sua prpria pregao, observa o Rev. Duncan:

    O fato que os meus sermes sobre a importncia das pesquisas psquicas na atual crise religiosa, sermes por

    mim proferidos na igreja de Santo Andr, em Edimburgo, e todos publicados todas as semanas pelo Edinburgh Evening

    Despatch, que o jornal mais lido na Esccia, produziu

    uma enorme impresso na massa popular e eu recebi uma poro de cartas de encorajamento, de agradecimento, de

    bno e tambm vrias cartas de contedo violento e ame-

    aador. Mas, afinal de contas, o coeficiente de correspon-dncia foi para mim uma revelao, pois que serviu para

    demonstrar-me quanto se acha difundido no meio dos me-

    lhores cristos, bem como no meio dos que no praticam o culto, o desejo supremo de obterem provas tangveis de que

    os seus entes queridos sobreviveram morte do corpo fsi-

    co. Demonstrou-me, sobretudo, que, na maioria deles, este ardente desejo se transformara em tormentosa necessida-

    de... Pois bem, baseado na minha experincia pessoal, afir-

    mo que as pesquisas psquicas so as nicas que podem fornecer-lhes o conjunto de fatos destinados a satisfazer as

    suas prementes necessidades espirituais. E esta a razo

    de ser do presente livro. (Idem, pgs. 83/84).

    E o Rev. Duncan tem plena razo: o seu livro, repleto de fatos variadssimos, sugestivos, convincentes, no sentido da demons-

    trao da existncia e sobrevivncia do esprito humano, livro

    este publicado por sentimento de dever, depois de escrito com escrupulosa preciso e concebido com grande sinceridade de

    propsitos, encher de supremo conforto as almas atormentadas

  • pela dvida filosfica e as feridas sob os golpes inexorveis da

    foice da morte.

    0

  • Joy Snell e a Misso dos Anjos

    H vrios foi publicada, na Inglaterra, uma bela obra sobre

    assuntos espirituais, que j em 1924 havia alcanado a sua

    qinquagsima edio. Trata-se de The Ministry of Angels,7 cuja

    autora, a Sra. Joy Snell, expe, de forma simples, franca e des-

    pretensiosa, suas multiformes experincias de clarividncia do

    tipo da vidente de Prevorst. Sua apresentao ao pblico foi feita pelo Rev. Arthur Chambers, em curto mas precioso prefcio.

    Trata-se, de fato, de um livro digno de toda considerao: primeiro, porque contm o relato sincero de experincias subje-

    tivas que realmente ocorreram pessoa que as expe; segundo, porque essas experincias, do ponto de vista terico, so parci-

    almente interessantes e, de outra parte, algo surpreendentes, de

    modo a tornar desejvel um exame profundo do assunto com o fim de assegurar, nos casos duvidosos, se se trata de episdios de

    vidncia autntica, de vidncia simblico-verdica, de vidncia

    auto-sugestivo-alucinatria ou, ainda, se se trata, antes, de uma mistura das trs formas em questo.

    Comearei pelos fatos de vidncia bem autntica para passar, em seguida, discusso sumria dos casos de vidncia teorica-

    mente duvidosos.

    Sua autora, a Sra. Joy Snell, rf de me desde a mais tenra idade, cresceu no meio de abastana e se revelou vidente j aos

    12 anos de idade. Ela atingira apenas a idade dos 20 anos quando teve a viso premonitria da morte iminente de seu adorado pai,

    acontecimento que se realizou exatamente como ela o havia

    visualizado. Com o falecimento do seu genitor, o infortnio abateu-se sobre a sua pessoa, pois no tardaram a compreender

    que o defunto confiara os seus interesses a pessoas indignas que

    o haviam enganado, de modo que a pobre rf e o seu irmo se acharam subitamente reduzidos mais completa indigncia. O

    irmo partiu para a frica, a fim de ganhar a vida para si prprio

    e para a sua irm, porm o navio que o levava naufragou e o moo pereceu com os demais passageiros. Ficando s no mundo,

    a infeliz Joy foi acolhida por um tio que, no conseguindo tir-la

  • da prostrao moral em que cara, com perigo de morte, tentou

    distra-la, entregando-a aos cuidados de sua irm, diretora de um

    sanatrio. Assim fazendo, ela esperava que a pobre sobrinha talvez encontrasse alguma distrao na prtica do bem a tantas

    outras infelizes, do que lhe adviria proveito tanto do ponto de

    vista moral como do fsico. Foi isso que efetivamente aconteceu e Joy Snell obteve o seu diploma de enfermeira, consagrando-se,

    com amor, sua nova misso de caridade.

    Ora, foi exatamente devido sua profisso de enfermeira que os seus casos de vidncia se revestem de grande valor terico.

    De fato, no tardou ela a verificar grande nmero de casos de desdobramento fludico, que se apresentavam sua viso

    supranormal, no leito de moribundos, assim como numerosos

    casos de aparies de defuntos no leito de morte ou aparies de fantasmas, com carter premonitrio (por vezes de morte e

    outras vezes de cura), para os enfermos em cuja cabeceira eles se

    manifestavam.

    Os fenmenos de desdobramento fludico no leito de mori-

    bundos no eram, todavia, novos para a vidente, que, ainda bem criana, assistira a um deles no leito morturio de uma sua

    amiga. Passo a narrar esse caso que apresenta um interesse

    especial por ter sido o primeiro do gnero que a vidente pde constatar e que foi precedido pela viso do fantasma da jovem

    que ia morrer, fantasma que anunciou sua amiga a iminncia

    do seu falecimento. Escreve a vidente:

    Certa noite, despertei, sobressaltada, de profundo sono,

    encontrando iluminado o meu quarto, apesar de estarem a-pagadas todas as luzes. Percebi, ao meu lado, o fantasma de

    minha cara amiga Maggie, que me disse: Quero confiar-

    lhe um segredo. Sei que dentro de alguns dias deverei ir pa-ra o mundo espiritual. Desejo que fique junto de mim at o

    meu ltimo momento e que console minha me depois de

    minha partida.

    Antes de estar suficientemente refeita do susto e da sur-presa experimentados vista do fantasma, vi este desapare-

    cer e, pouco a pouco, extinguir-se a claridade.

  • Uma semana aps fui chamada pela famlia de minha a-miga. Encontrei Maggie sofrendo de um resfriado acompa-

    nhado de febre, todavia as suas condies gerais no inspi-ravam preocupaes e a prpria enferma estava bem longe

    de experimentar pressentimento de morte. Era evidente que

    ela no tinha a menor lembrana da visita que me fizera em esprito. esse um mistrio que no consigo explicar-me,

    tanto mais que, durante a minha vida, tive numerosas expe-

    rincias de aparies de vivos que me dirigiram a palavra e com as quais por minha vez falei, verificando sempre que

    elas no guardavam recordao alguma de se terem comu-

    nicado comigo...

    Encontrava-me, pois, junto de Maggie, h uns trs ou

    quatro dias, quando, certa noite, foi ela assaltada por terr-vel e sbita crise e faleceu nos meus braos antes que o

    mdico tivesse tempo de acudir ao chamado feito. Foi esse

    o primeiro caso de morte a que assisti. Logo que o corao de Maggie deixou de bater, vi distintamente algo semelhan-

    te ao vapor, que se desprende de uma chaleira em ebulio,

    elevar-se do seu corpo fsico, pairar a alguma distncia dele e condensar-se em forma idntica de minha amiga. Essa

    forma, muito vaga a princpio, tomou gradualmente contor-

    no mais definido at tornar-se perfeitamente distinta. Ela estava envolta numa espcie de vu branco, de reflexos al-

    jofrados, sob o qual apareciam claramente as formas. O ros-

    to era o de minha amiga, mas glorificado e sem qualquer trao dos espasmos que o haviam contrado na agonia.

    Mais tarde, quando me tornei enfermeira, vocao na qual perseverei por vinte anos, tive oportunidades de assis-

    tir a numerosos casos de morte e, logo aps o falecimento,

    constantemente eu observava essa condensao da forma etrica acima do corpo fsico, forma sempre idntica quela

    donde se destacava e que, uma vez condensada, desaparecia de minha vista.

    Os dois episdios contidos na experincia que acabamos de relatar so igualmente interessantes e sugestivos. A autenticidade

    supranormal do fenmeno de auto-premonio de morte ficou

  • provado pela sua realizao em curto prazo, embora continuemos

    a encontrar-nos diante do mistrio de um Eu subconsciente que

    conheceu, antecipadamente, a data do seu falecimento, mesmo quando o mal, que deveria levar o corpo ao tmulo, era de natu-

    reza acidental. Mistrio grande e perturbador, mas incontestvel.

    Intil ir mais longe, no momento.

    Quanto autenticidade supranormal do outro incidente, o do

    desdobramento fludico no leito de morte, est ela demonstra-da pela existncia de numerosos casos anlogos visualizados por

    sensitivos pertencentes a todos os povos do mundo terreno,

    inclusive os selvagens, com esta circunstncia eloqente de que os sensitivos, ainda que desconheam as experincias de outras

    pessoas e tambm a existncia mesma dos fenmenos, fazem

    todos a sua descrio com os mesmos detalhes, o que demonstra, incontestavelmente, que eles expem algo de real e de objetivo.

    Por outro lado, conveniente notar que j se conseguiu fotogra-

    far o fenmeno em questo.

    Outra considerao, teoricamente muito importante, a de

    no poderem ser explicados os casos de desdobramento fludico no leito de morte pela projeo objetiva do pensamento.

    Sabe-se que, a propsito da fotografia transcendental, em que

    ficam gravados os fantasmas dos defuntos identificados nas chapas fotogrficas, os nossos contraditores fazem observar que,

    como tudo contribui para provar que um pensamento uma

    forma sui generis de dinamismo psquico, suscetvel de ser projetado distncia, numa forma objetiva, ainda que invisvel,

    segue-se que as supostas fotografias espritas nada mais so

    realmente que fotografias do pensamento. Esta objeo parece, at certo ponto, legtima, pois que o fenmeno da fotografia do

    pensamento um fato real, ainda que obedea a leis que o

    circunscrevem em estreitos limites e que, conseqentemente, seja pouco aplicvel s condies em que se produzem as foto-

    grafias espritas.

    Como quer que seja, no menos verdade que, na ocorrncia

    dos fenmenos de desdobramento fludico no leito de morte, esta hiptese insustentvel, visto que os moribundos no

    podem cuidar de concentrar seu pensamento sobre a idia de sua

  • forma corporal e, em conseqncia, no podem projetar, dis-

    tncia, formas de pensamentos dessa natureza, tanto mais que, na

    maioria dos casos, o fenmeno de desdobramento comea aps o falecimento do enfermo.

    Resulta da que, no existindo uma hiptese naturalista para explicar os fenmenos de desdobramento fludico no leito de

    morte, somos necessariamente levados a concluir que eles

    representam o grande fato da separao do corpo etrico (que o envoltrio do esprito) do seu corpo somtico. E como

    acontece que, em tais circunstncias, o corpo etrico gradual-

    mente se integra nessa vida e que no menos gradualmente abandona o corpo somtico, isto equivale chegar soluo

    experimental, no sentido afirmativo, do grande enigma da exis-

    tncia e sobrevivncia da alma.

    A este respeito convm recordar a famosa resposta dada pela

    personalidade medinica de George Pelham ao Dr. Hodgson por intermdio da Sra. Piper:

    Eu no acreditava na sobrevivncia, o que ultrapassava o meu entendimento. Hoje me pergunto como pude duvi-

    dar... Ns temos um fac-smile de nosso corpo fsico, que

    persiste aps a dissoluo deste ltimo.

    Eis uma resposta admirvel pela simplicidade com a qual ela resolve o grande problema da sobrevivncia, ao passo que a

    afirmativa que ela contm pode ser mesmo demonstrada experi-

    mentalmente graas aos fenmenos de desdobramento fludico no leito de morte j estudados. Volto, a propsito, a insistir no

    fato de que, como no h hipteses naturalistas a serem opostas

    s consideraes que acabo de expor, estas so de natureza literalmente decisiva. Resulta da que quando a autenticidade

    dos fenmenos em questo estiver definitivamente reconhecida

    pela cincia oficial (o que forosamente acontecer, visto que fatos so fatos), nesse dia a existncia e sobrevivncia da alma

    estaro cientificam