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1 EQUILÍBRIO DA OXIDAÇÃO E REDUÇÃO 1 1. Conceitos Eletroquímica é o estudo das reações químicas nas quais partículas carregadas (íons ou elétrons) atravessam a interface entre duas fases da matéria, tipicamente uma fase metálica (o eletrodo) e uma fase líquida de solução condutora, ou eletrólito. Processos de oxidação e redução estão envolvidos no estudo da eletroquímica, onde as reações químicas ocorrem com o envolvimento de transferência de elétrons de um reagente para outro. Os dois processos ocorrem simultaneamente e não podem coexistir independentemente. Redução ocorre quando um reagente ganha elétrons e vai para um estado de oxidação mais negativo. Ignorando as cargas, isto é exemplificado pelo caso geral: A ox + ne - A red (1) onde, A ox e A red se referem as formas oxidadas e reduzidas do elemento A, respectivamente. Inversamente, durante a oxidação, um reagente perde elétrons e vai para um estado de oxidação mais positivo. O caso geral pode ser representado como B red B ox + ne - (2) onde, novamente B ox e B red se referem as formas oxidadas e reduzidas do elemento B, respectivamente. Cada expressão geral acima é denominada uma meia reação ou meia célula. Isto é em reconhecimento de que nenhum dos processos pode ocorrer independentemente. 1 Arquimedes Lavorenti. Professor Associado do Depto. de Ciências Exatas, ESALQ/USP, Caixa Postal 9, 13418-900 – Piracicaba – SP. E-mail: [email protected] – Publicação Destinada ao Ensino de Ciências - Química - 28/3/2002

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Page 1: Equilíbrio da oxidação e redução - esalq.usp.br · PDF file2 Redução e oxidação ocorrem concomitantemente, e duas meias reações se combinam para dar uma oxi -redução (dupla

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EQUILÍBRIO DA OXIDAÇÃO E REDUÇÃO1

1. Conceitos

Eletroquímica é o estudo das reações químicas nas quais partículas carregadas (íons

ou elétrons) atravessam a interface entre duas fases da matéria, tipicamente uma fase metálica (o

eletrodo) e uma fase líquida de solução condutora, ou eletrólito.

Processos de oxidação e redução estão envolvidos no estudo da eletroquímica, onde

as reações químicas ocorrem com o envolvimento de transferência de elétrons de um reagente

para outro. Os dois processos ocorrem simultaneamente e não podem coexistir

independentemente.

Redução ocorre quando um reagente ganha elétrons e vai para um estado de oxidação

mais negativo. Ignorando as cargas, isto é exemplificado pelo caso geral:

Aox + ne- à Ared (1)

onde, Aox e Ared se referem as formas oxidadas e reduzidas do elemento A, respectivamente.

Inversamente, durante a oxidação, um reagente perde elétrons e vai para um estado

de oxidação mais positivo. O caso geral pode ser representado como

Bred à Box + ne- (2)

onde, novamente Box e Bred se referem as formas oxidadas e reduzidas do elemento B,

respectivamente.

Cada expressão geral acima é denominada uma meia reação ou meia célula. Isto é

em reconhecimento de que nenhum dos processos pode ocorrer independentemente.

1 Arquimedes Lavorenti. Professor Associado do Depto. de Ciências Exatas, ESALQ/USP, Caixa Postal 9, 13418-900 – Piracicaba – SP. E-mail: [email protected] – Publicação Destinada ao Ensino de Ciências - Química - 28/3/2002

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Redução e oxidação ocorrem concomitantemente, e duas meias reações se combinam

para dar uma oxi-redução (dupla redox). Para o caso geral, a oxi-redução é dada como:

Meia reação de redução: Aox + ne- à Ared

Meia reação de oxidação: Bred à Box + ne-

Reação de oxi-redução: Aox + Bred ßà Ared + Box

Assim, uma reação de oxi-redução envolve a reação de um redutor (Bred) com um

oxidante (Aox). O redutor ou agente redutor é o reagente que perde elétrons e então é oxidado.

O oxidante ou agente oxidante ganha elétrons e então é reduzido.

Exemplo: Cuo à Cu2+ + 2 e- (oxidação)

2 Ag+ + 2 e- à 2 Ago (redução)

Cuo + 2 Ag+ ßà Cu2+ + 2 Ago (oxi-redução)

Os metais, em forma elementar ou reduzida, têm uma maior predisposição em ceder

elétrons (oxidação) para outras espécies químicas que ao recebê-los se reduzem. Assim sendo, os

metais nesta forma elementar atuam como agentes redutores, pois induzem outras espécies

químicas a se reduzirem.

Por outro lado, os metais em suas formas catiônicas ou formas já oxidadas, pelo fato

de terem cedido elétrons e ficado com carga positiva, tem mais tendência a receberem elétrons

(redução) e atuarem como agentes oxidantes, ao induzirem que outras espécies químicas se

oxidem e cedam elétrons para eles.

Devido a esta maior ou menor predisposição dos metais em dependendo do caso,

cederem ou receberem elétrons, foi estabelecida uma série de atividade química dos metais ou

série das tensões eletrolíticas:

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Li, K, Ca, Na, Mg, Al, Zn, Fe, Cd, Co, Ni, Sn, Pb, H, Cu, Ag, Hg, Pd, Au, Pt

Aumento do poder como agente oxidante (REDUÇÃO)

Aumento do poder como agente redutor (OXIDAÇÃO)

Exemplo: Lio à Li+ + e-

Lítio metálico é um agente redutor forte e se oxida facilmente. Pode-se dizer que ele é

um agente oxidante fraco e se reduz com muita dificuldade. O lítio tem sido muito utilizado em

baterias ou pilhas.

Exemplo: Ptn+ + n e- à Pto

Platina metálica é um agente redutor fraco e se oxida muito dificilmente. Ela é um

agente oxidante forte e se reduz muito facilmente. A platina tem sido considerada como um metal

inerte.

2. Conceito de potencial de eletrodo

Todas as meias reações podem ser expressas em termos de redução ou oxidação. Por

exemplo, as meias reações Fe2+/Feo são:

Redução: Fe2+ + 2e- à Feo

Oxidação: Feo à Fe2+ + 2e-

Um eletrodo consiste de um metal condutor em contato com uma solução de seus

íons (eletrólito). Observa-se que há duas fases distintas em interação, isto é, fase sólida: metal e

fase líquida: solução contendo um íon.

Por exemplo: Feo(s)/Fe2+

Para o qual as possíveis meias reações são dadas acima. Como alternativa, um

eletrodo pode ser um metal inerte tal como platina em contato com uma solução contendo uma

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reação de oxi-redução. De modo semelhante, nesta situação, também há dois estados físicos em

contato:

Exemplo: Pto(s)/Fe3+, Fe2+

Substâncias diferentes variam em suas tendências de realizarem redução ou oxidação.

O potencial é uma medida da capacidade do reagente (no estado sólido ou líquido)

em ser reduzido ou oxidado.

Considere a situação em que uma lâmina de um metal é imersa em água dentro de um

frasco (Figura 1). Um certo número de átomos da superfície do metal passa para a água sob a

forma iônica, embora isso não seja tão perceptível e sujeito à avaliação analítica. Isso acontece

porque o potencial químico (µ = µo + RT ln a) da fase sólida (metal) não está em equilíbrio com

o potencial químico da fase líquida (água).

Meo ßà Men+ + n e- (fase sólida)

µMeo > µH2O (desequilíbrio)

Figura 1. Lâmina metálica dentro d’água.

Como esse sistema não está em equilíbrio, há passagem de matéria da fase de maior

potencial para a de menor potencial, até que o equilíbrio seja atingido. Por outro lado, como as

partículas que se movimentam em direção à água são dotadas de carga elétrica (íons) aparece um

efeito elétrico na interface e provoca o aparecimento de um potencial elétrico entre as duas fases.

Se agora a lâmina metálica for mergulhada em uma solução aquosa de um sal de seu

cátion (Figura 2), a essa tendência dos átomos metálicos passarem para a fase líquida (pressão de

dissolução) se oporá uma outra pressão provocada pelos cátions preexistentes na solução que, de

acordo com o seu valor, poderá forçar a deposição de cátions sobre a lâmina metálica, invertendo

o sentido do equilíbrio acima citado.

O aparecimento dessa diferença de potencial no eletrodo, chamada de potencial de

eletrodo absoluto, caracteriza-se por uma relativa reversibilidade, que é reflexo do equilíbrio que

H2O

Metal (Meo)

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instantaneamente se estabelece quando a lâmina metálica é mergulhada em água ou na solução do

seu sal.

Meo ßà Men+ + n e- µ1 (fase sólida)

Men+ + n e- à Meo µ2 (fase líquida)

Se µ2 > µ1 à inverte o equilíbrio anterior

Figura 2. Lâmina metálica dentro de uma solução de um sal.

Devido ao fato dos potenciais desses eletrodos poderem variar de maneira reversível,

variando-se a concentração do íon metálico, foram designados como potencial de eletrodo

reversível.

O potencial de uma única meia reação (isto é, um único eletrodo), embora exista, não

pode ser medido diretamente porque não há um meio de colocar um equipamento de medida

elétrica entre estas duas fases, solução-metal, e medir a passagem de elétrons de uma fase para

outra ou vice-versa (regra de Gibbs). Ao invés disto a diferença de potencial entre duas meias

reações (isto é, dois eletrodos) é possível ser determinada.

Potenciais de eletrodo são medidos então em relação ao eletrodo padrão de

hidrogênio (SHE) também conhecido como o eletrodo normal de hidrogênio (NHE). Este

consiste de um fio de platina em uma solução iônica de hidrogênio de atividade unitária sobre a

qual é borbulhada gás hidrogênio a 1 atm de pressão. Isto é representado como:

Pto(s)/H2(f = 1 atm, gas), H+ (a = 1, aquosa)

A meia reação que ocorre:

2 H+ + 2e- à H2(g)

é arbitrariamente assinalada um potencial de 0,000 V. O SHE é impraticável para uso em águas

naturais, e consequentemente outros eletrodos de referência são usados (eletrodo de prata-cloreto

de prata e eletrodo de calomelano).

Para propósitos comparativos todas as meias reações são escritas como redução.

Metal (Meo)

[Men+]

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A diferença de potencial entre o SHE e qualquer meia reação de redução (para a qual

todos os íons em solução existem com atividade unitária) é denominada de potencial de eletrodo

padrão, Eo. Isto também pode ser denominado de potencial de redução padrão devido a

convenção adotada universalmente em escrever meias reações como processo de redução.

A seguinte convenção de sinal é adotada:

i) Um Eo positivo indica que a forma oxidada é um melhor agente oxidante que o H+

ii) Um Eo negativo indica que a forma oxidada é um pior agente oxidante que o H+

Tabela 1. Potencial de eletrodo padrão para alguns elementos

Meia reação de redução Eo, VoltsNa+ + e- --> Na(s) -2,710

Zn2+ + e- --> Zn(s) -0,760

Fe2+ + 2 e- --> Fe(s) -0,440

Cd2+ + 2 e- --> Cd(s) -0,400

Pb2+ + 2 e- --> Pb(s) -0,1262 H+ + 2 e- --> H2(g) 0,000

AgCl (s) + e- --> Ag(s) + Cl-(g) 0,222

Hg2Cl2(s) + 2 e- --> 2 Hg(l) + 2 Cl-(g) 0,268

Cu2+ + 2 e- --> Cu(s) 0,337

I2(s) + 2 e- --> 2 I -(s) 0,535

Fe3+ + e- --> Fe2+(aq) 0,771

Ag+ + e- --> Ag(s) 0,779

O2(g) + 4 H+ + 4 e- --> 2 H2O(l) 1,230

Cl2(g) + 2 e- --> 2 Cl-(g) 1,360

Assim, um constituinte com um elevado (+) Eo será um forte oxidante (exemplo: O2,

Eo = 1,230 V) enquanto que um constituinte com um baixo (–) Eo será um forte redutor

(exemplo: Fe2+, Eo = -0,440 V). Combinando as meias reações, um oxidante reagirá com um

redutor cujo Eo é menor. Isto significa que a meia reação com o Eo maior é escrita como uma

redução, e a outra meia reação é inversa e escrita como uma oxidação (para a qual os potenciais

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de eletrodo medidos em volts também devem ser inversos). Então o potencial do eletrodo padrão

para uma oxi-redução pode ser calculado.

Isto pode ser exemplificado abaixo usando o sistema O2/Fe2+. As meias reações são:

O2 + 4 H+ + 4 e- à 2 H2O Eo = 1,230 V

Fe2+ + 2 e- à Feo Eo = - 0,440 V

Oxigênio será reduzido e ferro elementar será oxidado. Portanto, esta meia reação do

ferro é escrita na forma de oxidação e multiplicada por um fator de 2 a fim de balancear os

elétrons para o processo duplo, verificando que o Eo é independente da estequiometria da reação.

Portanto nós temos:

O2 + 4 H+ + 4 e- à 2 H2O Eo = 1,230 V

2 Feo à 2 Fe2+ + 4 e- Eo = 0,440 V

O2 + 4 H+ + 2 Feo à 2 H2O + 2 Fe2+ Eo = 1,670 V

O potencial final da reação de oxi-redução do exemplo acima será de 1,670 volts.

Este potencial tem sido denominado de potencial da célula, porque duas meias células ou meias

reações ou eletrodos formam uma célula ou reação de oxi-redução, e normalmente tem sido

medido em volts.

3. Equação de Nernst

A diferença de potencial entre os eletrodos de uma célula mede a tendência da célula

em realizar uma reação química, isto é, quanto mais positivo for o seu valor maior será a

tendência da reação a se deslocar para a direita, em direção aos produtos.

O potencial padrão de um eletrodo (Eo) é o potencial que é estabelecido quando todos

os constituintes existem em seus estados padrões (isto é, atividade unitária para todas as espécies

dissolvidas). O potencial do eletrodo será, portanto diferente quando os constituintes da oxi-

redução (redox) não estão em seus estados padrões.

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Nernst foi o primeiro pesquisador a estabelecer uma teoria para explicar o

aparecimento da diferença de potencial nos eletrodos.

Através de raciocínios termodinâmicos Nernst deduziu uma equação que permite

calcular a diferença de potencial existente entre um metal e uma solução aquosa de um de seus

sais, isto é, o potencial E do eletrodo.

A equação de Nernst, dada abaixo, é usada para calcular o potencial de eletrodo para

atividades diferentes das condições padrões das espécies redox. Para a meia reação:

Aox + ne- à Ared

A equação de Nernst é:

RT aAred E = Eo - ------- ln --------- nF aAox

onde: E = potencial (em volts) de eletrodo contra SHE;

Eo = potencial padrão do eletrodo (obtido em tabelas);

R = constante universal dos gases (8,3145 Joules/(K mol);

T = temperatura absoluta em Kelvin;

n = número de elétrons envolvidos na estequiometria da reação;

F = constante de Faraday (96.485,309 Coulombs);

a = atividade das espécies consideradas.

A 25oC, substituindo as várias constantes numéricas e transformando logaritmo

neperiano em decimal resulta na seguinte equação:

0,05915 aAred E = Eo - ----------- log --------- n aAox

Em unidades de concentração ela se torna:

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0,05915 [Ared] E = Eo - ----------- log --------- n [Aox] A equação de Nernst relaciona o potencial reversível real de um eletrodo, E, com o

potencial reversível padrão, Eo, do mesmo eletrodo.

A equação de Nernst pode ser utilizada para calcular tanto o potencial de eletrodos

individuais como a diferença de potencial em uma célula (ou pilha). Em geral, é mais

conveniente aplicar a equação de Nernst para um eletrodo de cada vez.

4. Células galvânica e eletrolítica

Há duas classificações de células eletroquímicas: galvânica e eletrolítica.

Células galvânicas (ou voltaicas) são formadas por dois eletrodos imersos em uma

mesma solução eletrolítica ou em soluções eletrolíticas diferentes que, em virtude das reações

químicas que ocorrem em suas interfaces, geram corrente elétrica espontaneamente.

Figura 3. Representação esquemática de uma célula galvânica.

Anodo Catodo

Ponte salina

e- i(+) (-)

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Quando é necessário fornecer corrente elétrica a fim de que reações químicas

ocorram ao nível dos eletrodos, o sistema é chamado de célula eletrolítica.

Uma célula eletrolítica é uma célula galvânica na qual um potencial de uma fonte

externa (bateria) é aplicado através dos eletrodos para opor qualquer corrente que poderia fluir de

qualquer maneira. Energia elétrica é consumida em vez de ser produzida. Os processos nos

eletrodos não são espontâneos e são opostos àqueles observados na célula galvânica.

Figura 4. Representação esquemática de uma célula eletrolítica.

Desconsiderando o tipo de célula, os eletrodos são designados tanto como catodo ou

anodo dependendo do processo que ocorre no eletrodo e não da carga que ele apresenta.

Um catodo é um eletrodo no qual ocorre a redução. Em uma célula galvânica o

catodo é positivamente carregado e atrai anions que estão em solução. Em uma célula eletrolítica

o catodo é negativamente carregado e cátions são reduzidos na superfície do eletrodo.

AnodoCatodo

Ponte salina

(-) (+)

Bateria(+)(-)

ie-

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Um anodo é um eletrodo no qual ocorre uma oxidação. Ele é carregado

negativamente nas células galvânicas e cátions em solução são a eles atraídos. Inversamente, nas

células eletrolíticas o anodo é positivamente carregado e anions são oxidados.

Notação nas células eletroquímicas:

M1/M1n1+ (a1) // M2

n2+ (a2)/M2

Indica uma célula galvânica formada por 2 eletrodos diferentes imersos em soluções

de seus respectivos sais.

Exemplo: Pilha de Daniel: Cu/Cu2+ (aCu2+) // Zn2+ (aZn

2+)/Zn

M/Mn+ (a1) // Mn+ (a2)/M

Indica uma célula eletroquímica de concentração, formada por 2 eletrodos iguais

imersos em soluções iguais de seus sais porém com atividades diferentes.

Figura 5. Representação esquemática de uma célula de concentração.

Anodo Catodo

Ponte salina

e- i(+) (-)

Mn+ = (a1)

Mn+ = (a2)

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5. Aplicações

5.1. Cálculo do potencial de um eletrodo.

0,05915 [Ared] E = Eo - ----------- log --------- n [Aox]

Exemplo 1: Fe3+ + e- à Fe2+ Eo = + 0,769 V (25oC)

0,05915 [Fe2+] E = + 0,769 - ----------- log --------- 1 [Fe3+]

Exemplo 2: Fe2+ + 2 e- à Feo Eo = - 0,440 V (25oC)

0,05915 [Feo] E = - 0,440 - ----------- log --------- 2 [Fe2+]

0,05915 E = - 0,440 + ----------- log [Fe2+]

2

Conhecendo-se as concentrações de Fe2+ e Fe3+ (Ex. 1) e concentração de Fe2+ (Ex. 2)

é possível calcular o potencial do eletrodo em volts.

5.2. Cálculo do potencial de uma célula galvânica.

Exemplo: Pilha de Daniel: Cu/Cu2+ (aCu2+ = 0,02) // Zn2+ (aZn

2+ = 0,1)/Zn (25oC)

Cu2+ + 2 e- à Cuo Eo = + 0,337 V

Zn2+ + 2 e- à Zno Eo = - 0,760 V

0,05915 [Ared] E = Eo - ----------- log ---------- n [Aox]

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0,05915 aCuo

ECuo = + 0,337 - ----------- log --------- 2 aCu

2+

0,05915 1 ECuo = + 0,337 - ----------- log --------- 2 0,02

0,05915 ECuo = + 0,337 + ----------- log 0,02 = 0,260 V 2

0,05915 aZno

EZno = Eo - ----------- log --------- 2 aZn

2+

0,05915 1 EZno = - 0,760 - ----------- log --------- 2 0,1

0,05915 EZno = - 0,760 - ----------- log 0,1 = - 0,790 V 2

O potencial da célula é igual a diferença de potencial de cada eletrodo, ou seja:

∆E = ECuo – EZno = + 0,260 – ( - 0,790 ) = + 1,050 V

A reação que ocorre na célula (Pilha de Daniel) é:

Zno + Cuo ßà Zn2+ + Cuo ∆E = + 1,050 V

5.3. Cálculo do potencial de uma célula de concentração.

Exemplo: Fe3+ + e- à Fe2+ Eo = + 0,769 V

[Fe3+] = 0,1 M; [Fe2+] = 0,01 M eletrodo E1 (lado direito)

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[Fe2+] = 0,1 M; [Fe3+] = 0,01 M eletrodo E2 (lado esquerdo)

A reação espontânea na célula deve ser aquela em que torna igual as concentrações de

todas as espécies químicas.

Assim sendo, a reação que ocorre na meia célula do lado direito da célula é a

seguinte:

Fe3+ + e- à Fe2+ E1

enquanto que no lado esquerdo é:

Fe2+ à Fe3+ + e- E2

Aplicando a equação de Nernst em ambas as semi-células:

0,05915 [Fe2+] E1 = Eo - ----------- log ----------- 1 [Fe3+]

0,05915 0,01 E1 = + 0,769 - ----------- log -------- = + 0,769 + 0,05915 = + 0,8282 V 1 0,1

0,05915 [Fe2+] E2 = Eo - ----------- log ----------- 1 [Fe3+]

0,05915 0,1 E1 = + 0,769 - ----------- log -------- = + 0,769 - 0,05915 = + 0,7098 V 1 0,01

O potencial da célula é a diferença entre os dois eletrodos (a voltagem maior menos a

menor), ou seja:

∆E = E1 - E2 = 0,8282 – 0,7098 = + 0,1186 V

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5.4. Cálculo da constante de equilíbrio de uma reação de oxi-redução.

Um procedimento utilizado em análise quantitativa é a redução de Fe (III) para Fe (II)

através de Sn (II):

A reação: Sn2+ + 2 Fe3+ ßà 2 Fe2+ + Sn4+

ocorre quantitativamente para a direita.

A constante de equilíbrio, K, para a reação é por definição (lei da ação das massas):

[Fe2+]2 [Sn4+] K = -------------------- [Fe3+]2 [Sn2+]

As semi-reações são:

Sn2+ à Sn4+ + 2 e- Eo = + 0,1539 V

2 Fe3+ + 2 e- à 2 Fe2+ Eo = + 0,769 V

Aplicando a equação de Nernst na forma de concentração em ambos os eletrodos:

0,05915 [Sn2+] ESn

o = + 0,1539 - ----------- log ----------- 2 [Sn4+]

0,05915 [Fe2+]2 EFe

o = + 0,769 - ----------- log ----------- 2 [Fe3+]2

Uma vez que a reação atingiu o equilíbrio, podemos escrever:

E (célula) = 0 = ESno - EFe

o ; então ESno = EFe

o

Igualando as expressões acima teremos:

0,05915 [Sn2+] 0,05915 [Fe2+]2 + 0,1539 - ----------- log ----------- = + 0,769 - ----------- log ---------- 2 [Sn4+] 2 [Fe3+]2

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Rearranjando:

0,05915 [Sn2+] [Fe2+]2 + 0,1539 – 0,769 = ------------ ( log ---------- - log ---------- ) 2 [Sn4+] [Fe3+]2

0,05915 [Sn2+] [Fe3+]2 - 0,6151 = ------------ ( log ----------------- ) 2 [Sn4+] [Fe2+]2

0,05915 [Sn4+] [Fe2+]2 0,6151 = ------------ ( log ----------------- ) 2 [Sn2+] [Fe3+]2

0,05915 0,6151 = ------------ log K 2

1,2302 = 0,05915 log K

20,80 = log K

K = 6,31 x 1020

O valor extremamente elevado desta constante de equilíbrio indica que a reação

ocorre quantitativamente como descrita, isto é, o Sn2+ reduz o Fe2+ para Fe3+.

5.5. Efeito da solubilidade no potencial do eletrodo.

O equilíbrio que existe dentro de uma meia célula não necessita ser eletroquímico.

Todos os tipos de equilíbrio afetarão o potencial do eletrodo. O valor do potencial estável o qual

prevalece no equilíbrio pode ser obtido por cálculo usando a equação de Nernst para qualquer par

ou dupla presente na solução em certo momento. Se as atividades usadas na equação de Nernst

são as atividades que existem atualmente em solução, então todos os pares irão fornecer

exatamente o mesmo valor do potencial da meia célula.

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Considere o par cuja meia reação é:

Ag+ + e- à Ago

0,05915 ared E = Eo - ----------- log ------ n aox

1 E = + 0,7991 - 0,05915 log ------- aox

E = + 0,7991 + 0,05915 log [Ag+]

[Ag+] = 1,0 M à E = Eo = 0,7991 V

[Ag+] = 0,001 M à E = + 0,7991 - 0,05915 (3) = + 0,6218 V

[Ag+] = 1 x 10-6 M à E = 0,7991 - 0,05915 (6) = + 0,4445 V

O que acontece se influenciarmos a concentração do íon prata, Ag+, por algum outro

meio?

Suponha, por exemplo, se nós adicionamos AgCl(s) em um bequer que já contém

uma solução de NaCl 0,01 M. A concentração do íon prata em solução é calculada então por

meio do equilíbrio de solubilidade:

AgCl(s) ßà Ag+ + Cl-

Para o qual nós temos a constante de equilíbrio:

Ksp = 1,76 x 10-10 = [Ag+] [Cl-]

Portanto:

1,76 x 10-10 1,76 x 10-10 [Ag+] = ---------------- = ------------------ = 1,76 x 10-8 M [Cl-] 10-2

E = + 0,7991 + 0,05915 log [Ag+]

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E = + 0,7991 + 0,05915 log 1,76 x 10-8

E = + 0,7991 - 0,4582 = + 0,3408 V

Se a concentração de íons Cl- é de 1,0 molar, então:

[Ag+] = 1,76 x 10-10 M

E = 0,7991 + 0,05915 log 1,76 x 10-10 = + 0,2226 V

Os exemplos acima indicam que as constantes de equilíbrio para o equilíbrio de

solubilidade podem ser usadas para calcular o potencial de um eletrodo, ou mesmo um potencial

de eletrodo padrão.

Exemplo: O produto de solubilidade do Cu(OH)2 é 2,0 x 10-20. Vamos verificar o que

acontece com o potencial do eletrodo Cu2+/Cu, à medida que aumenta o pH da solução, na qual a

concentração molar inicial de Cu2+ é de 1,0 molar.

A equação de Nernst para este par é:

E = + 0,3994 + (0,05915/2) log [Cu2+]

Em solução suficientemente ácida, não haverá efeito do Cu(OH)2 uma vez que nada

dele é formado em pH baixo.

Calculemos primeiro o pH mínimo no qual Cu(OH)2 será formado, usando Ksp =

[Cu2+] [OH-]2

2,0 x 10-20 = [1,0] [OH-]2

[OH-] = 1,414 x 10-10 M

pH = 4,15

Em qualquer pH abaixo de 4,15, então, não vai haver efeito do pH neste par Cu2+/Cu

uma vez que íons hidrogênio não estão explicitamente envolvidos na reação e nenhum Cu(OH)2 é

formado.

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Em pH mais elevado, acima de 4,15 em diante, onde a solução é saturada com

Cu(OH)2, e o equilíbrio de solubilidade está presente nós temos:

E = + 0,3394 + (0,05915/2) log (2,0 x 10-20/[OH-]2)

E = + 0,3394 – 0,5826 – (0,05915/2) log [OH-]2

E = - 0,2432 – 0,05915 log [OH-]

Para a reação: Cu(OH)2(s) + 2 e- à Cu(s) + 2 OH-, o valor do potencial padrão,

Eo é - 0,2432 V em solução básica onde a atividade do íon hidróxido é tomado como 1,

correspondendo a uma concentração 1 molar de hidróxido de sódio.

Acima do pH 4,15, o potencial do par em questão vai depender do valor do pH.

5.6. Efeito do equilíbrio ácido-base no potencial do eletrodo.

Onde quer que o íon hidrogênio, ou qualquer íon que esteja conectado ao íon

hidrogênio através de um equilíbrio de ionização ácido-base apareça em uma reação

eletroquímica, esta reação será afetada pelo pH da solução na qual ele ocorre.

Qualquer variação no pH será controlada através da equação de Nernst da reação para

variar o potencial do eletrodo.

Os químicos têm utilizado isto para ajustar a força de alguns dos reagentes oxidantes

aquosos mais fortes.

Exemplo: Vamos calcular o potencial de um fio de platina mergulhado em uma

solução 0,1 molar em Cr2O72- (íon dicromato), 0,1 molar em Cr3+, e pH 2,0. Calcular também o

mesmo fio de platina mergulhado nesta solução, porém em pH 7,0, com referência ao eletrodo

padrão de hidrogênio.

Primeiro obtém a equação da reação da meia célula balanceada:

Cr2O72- + 14 H+ + 6 e- à 2 Cr3+ + 7 H2O

Nós escrevemos a equação de Nernst:

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0,05915 ared E = Eo - -------------- log (-------) n aox

0,05915 a2Cr3+ a7H2O E = Eo - -------------- log (---------------------) 6 aCr2O7

2- a14H+

0,05915 aCr2O72- a14H+

E = Eo + -------------- log (---------------------) 6 a2Cr3+ a7H2O

[Cr2O72-] [H+]14

E = + 1,36 + 0,01 log (---------------------) [Cr3+]2

[Cr2O72-]

E = + 1,36 + 0,01 log (-------------) + 0,01 log [H+]14 [Cr3+]2

[Cr2O72-]

E = + 1,36 + 0,01 log (-------------) - 0,14 pH [Cr3+]2

[Cr2O72-] = 0,1 M ; [Cr3+] = 0,1 M ; pH = 2,0 à E = + 1,09 V

[Cr2O72-] = 0,1 M ; [Cr3+] = 0,1 M ; pH = 7,0 à E = + 0,39 V

5.7. Efeito do equilíbrio de complexação no potencial de eletrodo.

Algumas das mais exatas determinações das constantes de estabilidade ou de

formação de complexos tem sido feitas usando eletrodos iônico seletivos na presença das

espécies complexantes.

Exemplo: Nós podemos calcular o potencial de um eletrodo de prata em uma solução

originalmente feita com [Ag+] = 0,01 M e [NH3] = 0,1 M. Nesta solução nós temos o seguinte

equilíbrio:

Ag+ + 2 NH3 ßà [Ag(NH3)2]+

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o qual é controlado pela constante de estabilidade:

[Ag(NH3)2]+

Kest = ------------------- = 1,67 x 107 [Ag+] [NH3]

O valor elevado desta constante de estabilidade significa que [Ag(NH3)2]+ é muito

maior que a de [Ag+], desde que amônia esteja em quantidade suficiente para formar o complexo.

No início, nenhum íon complexo está presente, porém no equilíbrio as concentrações

aproximadas serão:

[Ag+] = 0

[NH3] = 0,10 – 2 (0,01) = 0,08 M

[Ag(NH3)2]+ = 0,01 M

E = + 0,7991 - 0,05915/1 log 1/[Ag+]

E = + 0,7991 + 0,05915 log [Ag+]

Rearranjando a expressão para a constante de estabilidade:

[Ag(NH3)2]+

[Ag+] = -------------------------- (1,67 x 107) [NH3]

2

0,01

[Ag+] = -------------------------- = 9,36 x 10-8 M (1,67 x 107) (0,08)2

E = + 0,7991 + 0,05915 log 9,36 x 10-8 = + 0,3833 V