epidemiologia benefícios do consumo moderado de álcool malefícios do consumo de álcool deteção...

31
ÁLCOOL Epidemiologia Benefícios do consumo moderado de álcool Malefícios do consumo de álcool Deteção precoce do consumo nocivo Aconselhamento no consumo de risco Intervenção breve no consumo nocivo Armando Guimarães, Dr. USF Physis Vizela , Fevereiro 2015

Upload: internet

Post on 22-Apr-2015

121 views

Category:

Documents


3 download

TRANSCRIPT

  • Slide 1
  • Epidemiologia Benefcios do consumo moderado de lcool Malefcios do consumo de lcool Deteo precoce do consumo nocivo Aconselhamento no consumo de risco Interveno breve no consumo nocivo Armando Guimares, Dr. USF Physis Vizela, Fevereiro 2015
  • Slide 2
  • O consumo de lcool uma tradio milenar Desde a antiguidade que do conhecimento geral que o lcool tem efeitos psicoativos agradveis (efeito relaxante, euforizante, desinibidor), mas suscetvel de provocar dependncia quando consumido em excesso. A sua disponibilidade permanente sob vrias formas veio com a industrializao, o que aumentou a prevalncia do consumo de risco, consumo nocivo e dependncia.
  • Slide 3
  • Portugal o pas da Europa ocidental com maior consumo de lcool
  • Slide 4
  • A Europa a regio do mundo com maior consumo de lcool. Os pases de leste so os maiores consumidores, sobretudo de cerveja e destilados. Na Europa ocidental, Portugal destaca-se pelo seu elevado consumo.
  • Slide 5
  • Portugal o pas da Europa ocidental com maior consumo de lcool
  • Slide 6
  • Padro de consumo de lcool em Portugal
  • Slide 7
  • Portugal caracteriza-se por um consumo elevado de vinho, um consumo mdio de cerveja e um consumo baixo de destilados. O padro de consumo do tipo mediterrnico, dirio, sobretudo s refeies, com relativamente poucos episdios de embriaguez. Apesar disso, Portugal um dos pases com mais anos de vida perdidos atribuveis ao lcool, principalmente pela alta mortalidade rodoviria.
  • Slide 8
  • Mortalidade atribuvel ao lcool
  • Slide 9
  • Anos de vida perdidos atribuveis ao lcool (inclui mortalidade e anos de doena)
  • Slide 10
  • Prevalncia do consumo nocivo e de dependncia do lcool em Portugal
  • Slide 11
  • Benefcios do consumo moderado de lcool Existem vrios estudos que mostram benefcios no consumo ligeiro a moderado (definido como um consumo 60 g/dia no homem e 30 g/dia na mulher no estudo EPIC): Diminuio da mortalidade em cerca de 10%. Diminuio da mortalidade por doena coronria ou outra doena cardiovascular (25 a 40%). Diminuio da incidncia de diabetes (40%) e das suas complicaes. O consumo pesado elimina estes benefcios, aumentando o risco de hipertenso, fibrilhao auricular, cardiomiopatia dilatada, AVC hemorrgico. Os cticos argumentam que muitos destes estudos incluem ex-bebedores no grupo dos no bebedores (sick quitters) e que o consumo ligeiro a moderado mais um indicador de boa sade e de bom estatuto socioeconmico do que a sua causa. Uma meta-anlise publicada no BMJ em 10/02/2015 que usou como referncia o grupo dos nunca bebedores encontrou uma diminuio da mortalidade apenas significativa nos homens dos 50 aos 65 anos com um consumo de 12 a 16 bebidas/semana e nas mulheres acima dos 65 anos com um consumo de 4 a 8 bebidas / semana.
  • Slide 12
  • Malefcios do consumo de lcool Segundo a OMS, o consumo nocivo de lcool um dos 5 principais fatores de risco de doena, invalidez e morte no mundo, sendo responsvel por 3,3 milhes de mortes por ano, o que corresponde a 5,9% das mortes em todo o mundo. O consumo nocivo de lcool a 1 causa de morte nos homens dos 15 aos 59 anos. Causas de DALY MundoCausas de DALY Economias de mercado estabelecidas MalnutrioTabaco gua contaminada, ms condies de saneamento e higiene lcool Sexo desprotegidoDoenas ocupacionais: Acidentes, exposio a carcinogneos, exposio a partculas areas (silcio, amianto, carvo), stresse ergonmico, rudo TabacoHipertenso lcoolInatividade fsica
  • Slide 13
  • Fatores influentes no consumo de lcool e no seu malefcio Idade: As crianas, adolescentes e idosos so mais vulnerveis. Gnero: As mulheres so mais vulnerveis (menor peso, mais gordura, menor metabolizao). Histria familiar de alcoolismo: Fatores genticos e ambientais (famlias disfuncionais). Estatuto socioeconmico: Nas classes mais altas h mais bebedores, mas h mais bebedores de baixo risco. Nas classes baixas h mais abstmios, mais bebedores com distrbios provocados pelo lcool e mais mortalidade. Desenvolvimento econmico: Quanto maior o desenvolvimento econmico maior o nvel de consumo e menor a percentagem de abstmios. Cultura e contexto: O risco do consumo depende da quantidade de lcool ingerida numa s ocasio e do contexto (lugares pblicos, possibilidade de acontecimentos violentos, acidentes, consequncias legais, ). Um consumo dirio s refeies considerado de menor risco. Regulao e controlo do consumo de lcool: Quanto mais barato, disponvel e tolerado o lcool num determinado pas, maior o consumo.
  • Slide 14
  • Principais doenas, leses e causas de morte associadas ao consumo de lcool em 2012
  • Slide 15
  • Peso das doenas e leses em anos de vida perdidos atribuveis ao lcool em 2010 (3,9 milhes de DALYs, correspondentes a 5,1% do total das doenas e leses no mundo)
  • Slide 16
  • Deteo do consumo de risco e nocivo: Quantificao do consumo de lcool
  • Slide 17
  • A DGS adotou o padro da OMS, que corresponde a 10 g de lcool (EUA: 14 g, RU 8 g) A quantidade de lcool por 100 ml obtm-se multiplicando a percentagem de lcool por 0,8 (densidade do lcool). Uma bebida padro corresponde a: 100 ml de vinho a 13% = 13*0,8 = 10,4 g de lcool 250 ml de cerveja a 5% = 5*0,8*2,5 = 10 g de lcool 30 ml de destilado a 40% = 40*0,8*0,3 = 9,6 g de lcool 60 ml de porto a 20% = 20*0,8*0,6 = 9,6 g de lcool
  • Slide 18
  • Deteo do consumo de risco e nocivo: Quantificao do consumo de lcool Outros exemplos: 1 garrafa de 75 cl de vinho = 13*0,8*7,5 = 78 g = 8 bebidas 1 garrafa de 37,5 cl de vinho = 13*0,8*3,75 = 39 g = 4 bebidas 1 caneca de 40 cl de cerveja = 5*0,8*4 = 16 g = 1,6 bebidas 1 cerveja de 33 cl = 5*0,8*3,3 = 13 g = 1,3 bebidas 1 fino de 20 cl = 5*0,8*2= 8 g = 0,8 bebidas A quantificao do consumo deve ser feita a partir de uma estimativa do consumo semanal (ou mensal em caso de consumo menos regular).
  • Slide 19
  • Deteo do consumo de risco e nocivo: Questionrio AUDIT O questionrio AUDIT (Alcohol Use Disorders Identification Test) um questionrio breve elaborado pela OMS para o rastreio e interveno breve no consumo de risco ou nocivo de lcool, cujo uso recomendado pela DGS. Pode ser realizado rapidamente durante uma consulta ou ser preenchido pelo paciente em papel ou no computador, o que poupa tempo e pode fornecer respostas mais precisas. As 3 primeiras perguntas correspondem ao AUDIT-C (consumption) e visam detetar o consumo de risco. Uma pontuao no AUDIT-C 5 no homem ou 4 na mulher implica completar o questionrio. As perguntas 4 a 6 correspondem aos sintomas de dependncia. As perguntas 7 a 10 correspondem aos sintomas de consumo nocivo.
  • Slide 20
  • Questionrio AUDIT PERGUNTAS0 pontos1 ponto2 pontos3 pontos4 pontos 1. Com que frequncia consome bebidas que contm lcool? Nunca1 vez por ms ou menos 2 a 4 vezes por ms2 a 3 vezes por semana4 ou mais vezes por semana 2. Quando bebe, quantas bebidas contendo lcool consome num dia normal? 1 ou 23 ou 45 ou 67 a 910 ou mais 3. Com que frequncia consome seis bebidas ou mais numa nica ocasio? NuncaMenos de 1 vez por ms Pelo menos 1 vez por msPelo menos 1 vez por semana Diariamente ou quase diariamente 4. Nos ltimos 12 meses, com que frequncia se apercebeu de que no conseguia parar de beber depois de comear? NuncaMenos de 1 vez por ms Pelo menos 1 vez por msPelo menos 1 vez por semana Diariamente ou quase diariamente 5. Nos ltimos 12 meses, com que frequncia no conseguiu cumprir as tarefas que habitualmente lhe exigem por ter bebido? NuncaMenos de 1 vez por ms Pelo menos 1 vez por msPelo menos 1 vez por semana Diariamente ou quase diariamente 6. Nos ltimos 12 meses, com que frequncia precisou de beber logo de manh para "curar" uma ressaca? NuncaMenos de 1 vez por ms Pelo menos 1 vez por msPelo menos 1 vez por semana Diariamente ou quase diariamente 7. Nos ltimos 12 meses, com que frequncia teve sentimentos de culpa ou de remorsos por ter bebido? NuncaMenos de 1 vez por ms Pelo menos 1 vez por msPelo menos 1 vez por semana Diariamente ou quase diariamente 8. Nos ltimos 12 meses, com que frequncia no se lembrou do que aconteceu na noite anterior por ter bebido? NuncaMenos de 1 vez por ms Pelo menos 1 vez por msPelo menos 1 vez por semana Diariamente ou quase diariamente 9. J alguma vez ficou ferido ou ficou algum ferido por voc ter bebido? NuncaSim, mas no nos ltimos 12 meses Sim, nos ltimos 12 meses 10. J alguma vez um familiar, amigo, mdico ou profissional de sade manifestou preocupao pelo seu consumo de lcool ou sugeriu que deixasse de beber? NuncaSim, mas no nos ltimos 12 meses Sim, nos ltimos 12 meses
  • Slide 21
  • AUDIT-C 5 no homem ou 4 na mulher = consumo de risco PERGUNTAS0 pontos1 ponto2 pontos3 pontos4 pontos 1. Com que frequncia consome bebidas que contm lcool? Nunca1 vez por ms ou menos 2 a 4 vezes por ms2 a 3 vezes por semana 4 ou mais vezes por semana 2. Quando bebe, quantas bebidas contendo lcool consome num dia normal? 1 ou 23 ou 45 ou 67 a 910 ou mais 3. Com que frequncia consome seis bebidas ou mais numa nica ocasio? NuncaMenos de 1 vez por ms Pelo menos 1 vez por ms Pelo menos 1 vez por semana Diariamente ou quase diariamente De acordo com o AUDIT-C, um consumo dirio de 1 a 2 bebidas no homem de baixo risco. Na mulher, qualquer consumo dirio um consumo de risco e implica completar o questionrio. Consumo de baixo risco (OMS): 2 bebidas/dia homens 1 bebida/dia a partir dos 65 anos de idade e mulheres. 2 dias por semana de abstinncia. Consumo ligeiro a moderado: at 60 g/dia para os homens e 30 g/dia para as mulheres. Consumo pesado (heavy drinking): > 60 g/dia para os homens e > 30 g/dia para as mulheres.
  • Slide 22
  • Pontuao no AUDIT e interveno recomendada Nvel de riscoPontuao AUDITInterveno Zona I consumo de baixo risco 0-7Educao / informao sobre os riscos do lcool Reavaliao de 4 em 4 anos Zona II consumo de risco 8-15Aconselhamento simples Zona III consumo nocivo 16-19Interveno breve + seguimento Zona IV - dependncia20-40Referenciao a servio especializado em dependncias (CRI)
  • Slide 23
  • AUDIT 8 a 15 = consumo de risco Aconselhamento simples Este aconselhamento leva menos de 5 minutos e deve incluir (v. PDF no site da USF Physis): A definio de consumo de baixo risco. A noo do que uma bebida padro em quantidade de lcool. A enumerao dos riscos associados ao consumo excessivo de lcool. A necessidade de passar para um consumo de baixo risco ou eventualmente parar completamente o consumo de lcool.
  • Slide 24
  • AUDIT 16 a 19 = consumo nocivo Registo e avaliao Para as pessoas com pontuao no AUDIT de 16 a 19, assim como as que apresentam sinais ou sintomas de complicaes fsicas, mentais ou socioprofissionais do consumo de lcool, deve ser registada a categoria ICPC-2 P15 ABUSO CRNICO DO LCOOL e a categoria ICD-10 correspondente: Uso nocivo para a sade Sndrome de dependncia Sndrome de abstinncia Transtorno psictico Deve ser realizada uma avaliao clnica completa orientada para as complicaes do consumo de lcool e devem ser pedidos exames complementares de diagnstico orientados. Deve ser avaliada a presena de dependncia (Critrios DSM 5).
  • Slide 25
  • Critrios DSM 5: Distrbio de uso do lcool 1. Consumo de lcool em maiores quantidades ou durante mais tempo que o previsto. 2. Desejo constante ou tentativas infrutferas de diminuir o consumo de lcool. 3. Dispndio de muito tempo para obter, consumir lcool, ou recuperar dos seus efeitos. 4. Desejo premente de consumir lcool (craving). 5. Uso recorrente do lcool resultando no incumprimento de tarefas importantes no trabalho, na escola ou em casa. 6. Abandono ou reduo de atividades sociais, ocupacionais ou recreativas importantes por causa do lcool. 7. Uso recorrente do lcool em situaes em que este fisicamente perigoso. 8. Continuao do uso de lcool apesar da existncia de problemas fsicos ou psicolgicos provocados ou agravados pelo lcool. 9. Tolerncia (necessidade de aumentar as doses para obter o mesmo efeito ou diminuio do efeito com a mesma dose). 10. Sndrome de abstinncia (sudorese, taquicardia, tremores, insnia, nuseas ou vmitos, alucinaes, agitao psicomotora, ansiedade, crises convulsivas) ou uso de lcool ou benzodiazepinas para a evitar. 2 ou 3 critrios: DUA ligeiro 4 ou 5 critrios: DUA moderado 6 ou mais critrios: DUA severo
  • Slide 26
  • AUDIT 16 a 19 = consumo nocivo Interveno breve Deve ser fornecida uma interveno breve (v. exemplo no site da USF Physis), acompanhamento e ajuda medicamentosa. A interveno breve uma forma sistematizada de avaliar, implicar a pessoa e implementar imediatamente estratgias para mudar atitudes e lidar com problemas subjacentes ao consumo de lcool, suficientemente rpida para encaixar numa consulta de 15 minutos, mas vrias consultas podem ser necessrias. Os elementos da interveno breve dependem do estdio de mudana de Prochaska e DiClemente.
  • Slide 27
  • Interveno breve e estdios de mudana de Prochaska e DiClemente: Pr-contemplaoA pessoa no est consciente dos malefcios do consumo de lcool e no est disposta a alterar o consumo Informar sobre os riscos do consumo nocivo e de dependncia. ContemplaoA pessoa est consciente dos riscos mas apresenta ambivalncia Informar sobre os riscos do consumo nocivo e de dependncia. Enfatizar benefcios da mudana Discutir um objetivo PreparaoA pessoa prepara-se para mudar hbitos Discutir um objetivo Aconselhamento (plano) Encorajamento AoA pessoa j diminuiu ou parou o consumo, mas a mudana ainda no permanente Rever aconselhamento (plano) Encorajamento ManutenoA pessoa mantm um consumo moderado ou abstinncia de modo permanente Encorajamento
  • Slide 28
  • Tratamento farmacolgico Ajuda ao desmame: benzodiazepinas Diazepam (semivida longa, previne crises convulsivas). Lorazepam (semivida mdia, metabolitos com ao anticonvulsivante, melhor controlo do efeito). Oxazepam (semivida mais curta). Devem ser prescritas em doses rapidamente degressivas ao longo de 1 a 2 semanas. Uma vitaminoterapia geralmente associada (B1, B9, magnsio, ).
  • Slide 29
  • Tratamento farmacolgico Manuteno da abstinncia ou preveno do consumo excessivo Dissulfiram: Efeito aversivo por bloqueio da aldedo desidrogenase. Reservado a pacientes motivados, de preferncia com colaborao de familiar. Reduz os dias de consumo e quantidade ingerida. Naltrexona: Reduz o efeito de recompensa do lcool. Diminui sobretudo os episdios de consumo pesado (30 a 50%) e o craving. Acamprosato: Aumenta a taxa de abstinncia (efeito modesto: 36% vs. 24% placebo). Outros (off-label): Gabapentina 900 a 1800 mg/dia, topiramato 300 mg/dia, vareniclina, baclofeno 30 a 300 mg/dia. Tratamentos de 6 a 12 meses.
  • Slide 30
  • Referenciao em caso de dependncia (AUDIT 20 a 40) Referenciao ao CRI com histria clnica, AUDIT preenchido e exames complementares, incluindo os seguintes: Hemograma Ionograma Creatinina Glicose AST ALT GGT Tempo de protrombina APTT ECG Ecografia abdominal
  • Slide 31
  • Referncias DGS Norma 30/2012, atualizada em 18/12/2014 WHO Global status report on alcohol and health 2014 Bergmann M et al. The association of pattern of lifetime alcohol use and cause of death in the European Prospective Investigation into Cancer and Nutrition (EPIC) study. International Journal of Epidemiology 2013;42:17721790 doi:10.1093/ije/dyt154 Ronksley PE et al. Association of alcohol consumption with selected cardiovascular disease outcomes: a systematic review and meta-analysis. BMJ. 2011;342:d671. WHO The Alcohol Use Disorders Identification Test Guidelines for Use in Primary Care 2001 WHO Brief Intervention for Hazardous and Harmful Drinking. A Manual for Use in Primary Care 2001 NIAAA Helping Patients Who Drink Too Much A Clinicians Guide 2005 Alcohol and CVD: The Tippling Point. Medscape 2014 Alcohol Use Disorder: Recognition, Intervention, and Treatment. Medscape CME 21/01/2015 All cause mortality and the case for age specific alcohol consumption guidelines: pooled analyses of up to 10 population based cohorts. BMJ 2015;350:h384 | doi: 10.1136/bmj.h384