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Entre dúvidas e perplexidades: os evangélicos e a relação entre religião e política no atual contexto brasileiro Magali do Nascimento Cunha

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Entre dúvidas e perplexidades: os evangélicos e a relação entre religião e política no atual contexto brasileiro Magali do Nascimento Cunha

Inúmeros programas sociais em parceria com o poder público, com ONGs e movimentos sociais e a presença de religiosos em conselhos de direitos, de políticas e de gestão de políticas sociais específicas; atuações de grupos religiosos em redes e articulações da sociedade civil; participação das religiões na economia - crescimento das ofertas de entretenimento religioso (turismo e lazer em torno da religião); intensa presença em todas as mídias.

(1) a defesa de doutrinas fundamentalistas em contraposição a interesses sociais coletivos como indício de uma forte ameaça à laicidade do Estado; (2) o conservadorismo dos evangélicos como reforço a projetos sociais conservadores e ampliação do espaço dos segmentos de direita na política; (3) uso da política para exploração financeira e alimento para processos de corrupção na política.

A Frente Parlamentar Evangélica se consolidou com uma bancada na faixa de 70 deputados e três senadores.

dois ministros de Estado evangélicos foram nomeados;

o Partido Social Cristão (PSC) tornou-se o “partido da Assembleia de Deus”;

o deputado Pastor Marco Feliciano (PSC-SP) assumiu a presidência da estratégica Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados;

o PSC lançou candidato próprio à presidência da República em 2014, o Pastor Everaldo;

Marina Silva aparece duas vezes como forte candidata de “terceira via” à Presidência da República, desta vez pelo Partido Socialista Brasileiro (PSB), chegando a disputar vaga para o segundo turn. Neste ano conseguiu registrar o próprio partido, a Rede.

uma série de pautas relativas à moralidade religiosa, sob o rótulo de “defesa da família”, ganha espaço na Câmara dos Deputados e mais espaço é dado para pautas que garantam privilégios à atuação pública das igrejas;

alargam-se os posicionamentos de parlamentares evangélicos para além das pautas religiosas, por meio de alianças com parlamentares e frentes conservadoras para a revisão de temas sociais como a maioridade penal e o Estatuto do Desarmamento;

o Deputado evangélico Eduardo Cunha (PMDB-RJ) é eleito presidente da Câmara dos Deputados, depois de se tornar membro da Assembleia de Deus;

a Convenção Geral das Assembleia de Deus trabalha pela criação de partido próprio o PRC

1 – A relação entre religião e política não é nova e sempre existiu A questão que se coloca no tempo presente é como se dá a relação de fronteira entre a religião e a política, entre o público e o privado. A fronteira permanece mas é preciso compreender em que situações ela é ponte, em quais ela é muro, e quando ela é um entrelugar (Hommi Bhabha). Entrelugar na superação da bipolaridade entre público e privado, entre religião e política, entre dominantes e dominados. E aqui está o maior desafio.

2 – O estado laico é uma construção; a laicidade do Estado é um processo. Não existem Estados totalmente laicos, como não existem Estados totalmente democráticos. Assim como a democracia é um processo de construção social e política, o Estado laico também é. O Estado brasileiro não nasceu laico, não é totalmente laico e vive um processo de laicização. Neste processo há avanços e recuos.

1 – O fundamentalismo da Bancada Evangélica coloca o estado laico sob ameaça O Estado laico está sempre sob ameaça quando há os retrocessos e atribuí-los tão só às bandeiras da Bancada Evangélica é limitar demais a abordagem do tema. Há uma certa condescendência midiática com os movimentos pró-privilégios ao Catolicismo e reacionários que partem da Igreja Católica.

1 – O fundamentalismo da Bancada Evangélica coloca o estado laico sob ameaça Atentar também para o fundamentalismo às avessas = outra forma de promoção de intolerância

2 – Equívoco: reduzir a reflexão sobre a relação religião e política à política partidária O foco sobre a atuação político-

eleitoral dos evangélicos tem ocultado e silenciado os processos de participação política deste e de outros grupos

Nesse sentido cria-se armadilhas como a afirmação de que existe um voto evangélico

Mídias como promotoras de intolerância ao invés de mediadoras de diálogos plurais O espaço e a acreditação dados à Igreja Católica e suas autoridades

no noticiário, na publicidade e nos programas de entretenimento é um desserviço das mídias ao Estado laico e à cidadania plural.

Estas abordagens terminam por servir à promoção de intolerância e disputas entre grupos religiosos. Isto se torna mais grave quando mídias eletrônicas tradicionais como TV e rádio são concessões públicas e deveriam atuar

na promoção dos interesses coletivos e dos direitos humanos.

Possíveis caminhos por serem construídos neste momento de dúvidas e perplexidades Um Estado laico e democrático deve trabalhar pelo lugar para todos no espaço público. Grupos religiosos estão entre este “todos” e não devem ser vistos como ameaça ainda que entre eles existam os que tenham discursos e propostas conservadoras e reacionárias. O pluralismo no Estado laico e democrático representa espaço para posições políticas e ideológicas diferentes.

Possíveis caminhos por serem construídos neste momento de dúvidas e perplexidades Na construção da laicidade do Estado deve-se cobrar do poder público ações que constranjam a ação política dos grupos religiosos que almejam financiamento de suas práticas particulares e que constrangem as políticas públicas no campo dos direitos humanos e do progresso da ciência. Deve-se exigir do poder público que impeça o uso do Estado para impor a todos os cidadãos o que grupos religiosos julgam adequado para os seus adeptos e com base nos textos e preceitos que lhe são sagrados.