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Ensaios para a Docência: Memória do III Encontro PIBID UVA A A V A A V A A V A A V A A V A A V V U U V U V U U V U V U U V U o c o c r o ó c o ó c o c o c s o ó s o ó ó ó n E E n n E I ó m n m E e E e m n m n m E e M I n E E n n E I o ó a a s n i a s s n M ó M I I M M I M I I I M E M E M M M M Organizadores Maria Edinete Tomás Benedita Marta Gomes Costa Antonio Glaudenir Brasil Maia Ermínio de Sousa Nascimento para a Docên ia do ontro PIBID D D D D D D D D D n ê n ê ê D B P I B B I P D B P I B B I P D B P I B B I P c c o D D c o D P o o r o r t P o o d o d r o o o d r t P o o r o r t a a a a d d a a r d a d d d t n o n n t a n i o a n a n t n o n n a p i p p i ncia: a a c i c

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PIBIDUVA

Programa Institucional deBolsas de Iniciação à Docência

Em geral, encontros aproximam pessoas e se tornam boas oportunidades de integração e de partilha; encontros que hoje se dão de diferentes maneiras, espaços, circunstâncias... No cenário acadêmico, os encontros, em especial, correspondem a excelentes oportunidades de discussão e de socialização do saber, recursos que se têm revelado indispensáveis à evolução do conhecimento humano.

O III Encontro do PIBID UVA: Desafi os da Interdiscipli-naridade na Formação de Professor bem exemplifica a asserti-va acima. O diálogo entre bolsistas de diferentes áreas e categorias, tanto entre si, quanto com os demais membros da comunidade aca-dêmica, inclusive o público advindo das escolas de educação bási-ca, “regou sementes” que vinham sendo germinadas ao longo do processo de formação docente dos pibidianos. E eis um dos “frutos”: este livro.

Ensaios de Docência: Memórias do III Encontro do PIBID UVA possibilita ao leitor uma visão geral do “canteiro de formação docente”, que se vem desenvolvendo num espaço duplamente rico: ensino superior e educação básica. São ensaios de teoria e prática que se aperfeiçoam na ação, refl exão, ação (re) inventada!

Maria Edinete TomásCoordenadora Institucional do PIBID UVA 2011

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Ensaios para a Docência:Memória do III Encontro PIBID UVA

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Ensaios de Docência: Memórias do III Encontro do PIBID UVAOrganização

Maria Edinete TomásBenedita Marta Gomes Costa

Antônio Glaudenir Brasil MaiaErmínio de Sousa Nascimento

Coordenação EditorialMaria Edinete Tomás

Edição e DiagramaçãoGilberlânio Rios

CapaAssessoria de Comunicação Institucional da UVA - ACMI

Conselho EditorialAdriana CampaniÂngelo Bruno Lucas de OliveiraBenedita Marta Costa Francisco Alencar MotaFrancisco Ulisses Paixão e VasconcelosIsaurora Cláudia Martins de FreitasJosé Hamilton Máximo de AlmeidaJosé Reginaldo Feijão ParenteMaria Elisalene Alves dos SantosNilson Almino de FreitasVirgínia Célia Cavalcante de HolandaWalber Henrique Ferreira Ribeiro

RevisãoÂngelo Bruno Lucas de OliveiraCristiane Melo NobreFrancisca Liciany Rodrigues de SousaMaria Gorete de Sousa Margarida Pontes TimbóTeobaldo Campos MesquitaRaimundo Francisco Gomes

A exatidão das informações, os conceitos e opiniões emitidos neste livro são de exclusiva responsabilidade de seus autores.

Todos os direitos reservados ao PIBID UVA.

978-85-879-0676-2

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PREFÁCIO

Há fatos tão intrínsecos ao seu contexto que não admitem ser dele dissociados sob risco de perda de seus traços identitários. É o caso do livro que ora se apresenta, cujo título aponta diretamente para suas origens multifacetadas, da qual serão dados rápidos deta-lhes para possibilitar melhor compreensão da obra.

Ensaio de Docência: Memórias do III Encontro do PIBID UVA compõe-se de dez relatos de experiência, cujos autores inte-graram dois projetos institucionais propostos e desenvolvidos pela Universidade Estadual Vale do Acaraú – UVA, sediada em Sobral - CE: o Projeto Integração da Iniciação à Docência da UVA com a com a Educação Básica – PIBID UVA 2009 (Edital CAPES/DEB Nº2 / 2009 - PIBID), e o Projeto de Iniciação à Docência Experiências Inovadoras entre Universidade e Escolas – PIBID UVA 2011 (Edital Nº 001/2011/CAPES).

Ambos os projetos achavam-se respaldados, legal e fi nancei-ramente, pelo Programa de Bolsa de Iniciação à Docência (PIBID), iniciativa da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), por meio da Diretoria de Formação de Professo-res da Educação Básica Presencial (DEB). A aludida iniciativa fede-ral corresponde a uma estratégia de promoção à gradativa melhoria da educação básica da escola pública, para tanto investindo na for-mação inicial de professores com ênfase na indissolubilidade teo-ria-prática. Daí porque os textos que compõem o presente volume representarem “ensaios de docência” quanto ao foco, primarem pelo gênero relato de experiência e demonstrarem traços de um estágio inicial de formação acadêmica de seus respectivos autores, nove dos quais ainda bolsistas de iniciação à docência.

Considere-se também que os referidos relatos foram selecio-nados por um comitê científi co ad hoc, dentre os 157 trabalhos aca-dêmicos apresentados pelos pibidianos no III Encontro do PIBID UVA: Desafi os da Interdisciplinaridade na Formação de Profes-

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sor. O evento, que se realizou em outubro de 2013, foi promovido pela coordenação institucional do PIBID UVA 2009 e 2011, respecti-vamente. Objetivava a divulgação de atividades realizadas no âmbito do PIBID e a integração dos pibidianos para troca de experiências signifi cativas relacionadas com a iniciação à docência.

Os trabalhos apresentados no III Encontro PIBID UVA (…) provinham de 11 diferentes cursos de licenciatura da UVA, todos benefi ciados com subprojetos no âmbito do PIBID: Biologia, Ciên-cias Sociais, Educação Física, Filosofi a, Física, Geografi a, História, Letras, Matemática, Pedagogia, Química. Numa perspectiva amos-tral, aqui se fazem presentes trabalhos de apenas seis destas áreas: Biologia, Ciências Sociais, Geografi a, Letras, Matemática, Pedagogia e Química.

O recorte acima delineado possibilita aferir-se a importância do livro a partir de diferentes perspectivas: o de subsídio aos obje-tivos do III Encontro PIBID UVA (…); o de corresponder a um valioso registro histórico, não só de um estágio da formação acadê-mica de seus respectivos autores, mas, em especial, do modo como essa formação para o exercício da docência se vem desenvolvendo na UVA a partir do incentivo dado pela CAPES via PIBID. Nesta perspectiva, o livro Ensaio de Docência: Memórias do III Encontro do PIBID UVA pode e deve suscitar refl exões acerca da formação do professor para a educação básica ante as atuais exigências do ensino público brasileiro, de modo que se possa melhor atender às deman-das socioeconômicas, éticas e culturais do nosso tempo.

Prof.ª Maria Edinete Tomás

Coordenadora Institucional do PIBID UVA 2011

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SUMÁRIO

O ENSINO DE SOCIOLOGIA NA EDUCAÇÃO BÁSICA: DESAFIOS E PERSPECTIVAS .................................................................................................7

SOCIABILIDADE DE GRUPOS JUVENIS NOS ESPAÇOS DA ESCOLA LUÍS FELIPE .....................................................................................................23

ACERTANDO AS HORAS DO MUNDO: OFICINA DE PRODUÇÃO DE RECURSOS DIDÁTICOS NAS AULAS DE GEOGRAFIA ................35

O TEMA DO EFEITO ESTUFA E PRODUÇÃO TEXTUAL: PREDIÇÃO E CONFIRMAÇÃO EM DINÂMICAS PARA A CONSTRUÇÃO DO CONTEÚDO DO TEXTO..............................................................................47

PRECONCEITO RACIAL, SEXUAL E SOCIAL NA CONSTRUÇÃO DA INFORMAÇÃO DO TEXTO ESCRITO ......................................................63

O TEMA DA INFLUÊNCIA DA INTERNET NA SOCIEDADE ATUAL E A CONSTRUÇÃO DAS IDEIAS NA PRÁTICA DE PRODUÇÃO TEXTUAL..........................................................................................................75

A MATEMÁTICA PRESENTE NA CONTA DE ENERGIA ELÉTRICA 89

MATEMÁTICA APLICADA À QUÍMICA DE MATERIAIS: CONCRETIZANDO O ENSINO DE GEOMETRIA................................101

APRENDENDO A CONVIVER NA ESCOLA: RELATO DE UMA EXPERIÊNCIA ...............................................................................................115

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O ENSINO DE SOCIOLOGIA NA EDUCAÇÃO BÁSICA: DESAFIOS E PERSPECTIVAS

Ana Carmem Aguiar Rodrigues - Professora supervisora, bolsista do PIBID UVA. Especialista em Ensino de História do Ceará.

Rosângela Duarte Pimenta - Doutora em Sociologia. Professora da Universidade Estadual Vale do Acaraú – UVA (orientadora).

IntroduçãoO presente estudo tem como objetivo propor uma discussão

sobre os desafi os e perspectivas do ensino de Sociologia na Educação Básica. Para tanto, relatarei alguns aspectos de minha experiência como professora de Sociologia na rede pública de ensino, desde o impacto da minha formação acadêmica até minha atuação como do-cente no Ensino Médio, na Escola Ministro Jarbas Passarinho, em Sobral, Ceará.

A constante inserção e retirada da Sociologia do currículo da Educação Básica, ao longo de mais de um século, contribuiu para que a disciplina não conseguisse se fi rmar e permanecesse margi-nalizada no rol dos componentes curriculares deste nível de ensino. Deste modo, para os estudantes, a disciplina não é vista como um componente relevante, como a Língua Portuguesa e a Matemática, por exemplo. Essa desvalorização também ocorre no âmbito insti-tucional, pois a escola, seguindo o norte das políticas educacionais, tende a priorizar as disciplinas acima citadas, por considerar a So-ciologia — bem como outras áreas das Ciências Humanas — como disciplina “menor” na formação escolar do aluno, que precisa “ter rendimento” para ser aprovado no ENEM e outros vestibulares.

No caso da Sociologia, tal discurso se revela na prática, a co-meçar pela carga horária, atualmente restrita a uma aula de 50 mi-nutos por semana. Essa situação provoca uma sobrecarga do pro-fessor, que é obrigado a assumir muitas turmas, pois, numa jornada de trabalho de 40 horas semanais, tende a fazê-lo assumir até 27 tur-mas, enquanto que no caso de disciplinas como História e Geografi a,

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essa quantidade cai pela metade, uma vez que o número de aulas semanal é maior. Esta sobrecarga de trabalho interfere diretamen-te no desempenho do professor e na qualidade de suas aulas, visto que não é possível analisar a atuação do docente na rede púbica de ensino sem levar em conta as suas precárias condições de trabalho, que extrapolam a sala de aula, pois cabe também a este profi ssional ler e pesquisar para elaborar aulas, corrigir trabalhos e provas, além de cumprir exigências burocráticas como preenchimento de fi chas e diários escolares.

Ingressei na rede estadual de ensino do Ceará através de con-curso público, em outubro de 2009. Nesse período, minha atuação como docente se restringiu a lecionar Sociologia, sendo a única pro-fessora efetiva formada em Ciências Sociais na instituição em que trabalho. Existem outros professores formados da área, mas em re-gime de contrato de trabalho temporário. Mesmo com a abertura de 120 vagas para licenciados no concurso em que concorri, a carência de profi ssionais formados ainda constitui um dos grandes obstácu-los a serem enfrentados em relação ao ensino de Sociologia. Sob o pretexto de “não existir carência desses profi ssionais”, o governo do Estado do Ceará, em 2013, ofertou apenas 14 vagas para professores de Sociologia no concurso para a rede de ensino.

Considerando a questão anteriormente mencionada, outro agravante em relação à situação da Sociologia na Educação Básica pode ser encontrado na noção generalizada de que a disciplina é um “tapa buraco” para professores formados em outras áreas que não conseguem completar sua carga horária. É comum professores de História e Geografi a, assim como de outras disciplinas, ministrarem Sociologia ou mesmo Filosofi a com este objetivo. Nos questiona-mentos acerca dessa questão, vem à tona o discurso da “interdiscipli-naridade”, que já serviu como justifi cativa para que a Sociologia não estivesse presente no currículo escolar, posto que ela já estaria sendo ministrada nos conteúdos de outras matérias que também produ-zem conhecimento sobre o mundo social na área de Humanas, como História e Geografi a. A própria forma como a disciplina aparece no ENEM (Exame Nacional do Ensino Médio), de forma contextuali-zada com outras disciplinas, é um fator que pode vir a interferir na percepção de sua importância e peculiaridade em relação a outras disciplinas da grade escolar.

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A pergunta que não quer calar: para que serve a Sociologia?“Para que serve a Sociologia?”, é uma pergunta que os estudan-

tes da Educação Básica sempre fazem. Na opinião de muitos está o fato de que a Sociologia não tem nada a ver com as suas vidas, como também não é capaz de contribuir em sua formação profi ssional para concursos e exames. Esta visão utilitarista decorre de um modelo de sociedade no qual em tudo se buscam vantagens, principalmen-te materiais e fi nanceiras. Grande parte dos alunos que terminam o Ensino Médio pensam na sua inserção no mercado de trabalho ou mesmo em serem aprovados em exames como o ENEM e, a partir dessa aprovação terem a chance de ingressar em uma universidade.

Perante isto, considero que a preocupação que deve nortear o ensino de Sociologia ou mesmo justifi car sua inclusão na grade curricular do Ensino Médio, não é estar a serviço da profi ssionaliza-ção técnica, nem da formação de sociólogos. Trata-se de promover o contato cognitivo dos alunos com o pensar sociológico, para que este possa ajudá-los a pensar sobre suas próprias vidas e a avaliar até que medida são produto da sociedade e até que ponto têm a liberdade de pensar e agir diante das questões que envolvem a vida social. A So-ciologia, portanto, longe de ser algo distante, está presente em todos os lugares, auxiliando os indivíduos a entender as diversas formas de interação de homens e mulheres com os demais grupos e institui-ções que compõem a sociedade. Com esse objetivo, temas como a religião, a família, a educação, o trabalho, a ciência, a política, entre outros diversos fatores que envolvem a vida do homem em socieda-de são objetos de estudo da Sociologia.

Em seu artigo “Refl exões acerca do sentido da Sociologia no Ensino Médio”, o professor Flávio Marcos Sarandy (2001) desta-ca a especifi cidade da Sociologia em relação às demais disciplinas das Ciências Humanas, enfatizando que tal especifi cidade perpassa pela afi rmação de uma identidade da Sociologia no Ensino Médio. O autor argumenta que disciplinas como História, Geografi a e Filo-sofi a produzem conhecimentos sobre o mundo social, no entanto, ele chama a atenção para a necessidade de um “olhar sociológico” nessas outras disciplinas, já que o conhecimento sociológico é ca-paz de produzir nos estudantes do Ensino Médio uma percepção e um modo de raciocínio que nenhuma outra matéria produz, a partir do desenvolvimento da “percepção sociológica”, que leva a “rasgar

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os véus das representações sociais e compreendê-las sob uma nova ótica, elas próprias como produtos sociais” (SARANDY, 2001,p. 3). Nisto residiria também a sua fi nalidade pedagógica:

[...] quão importante se torna para os alunos a desco-berta sobre como nossa vida é perpassada por forças nem sempre visíveis – por nossa simples pertença a um grupo social. E não a um grupo social qualquer, mas a esse grupo, com sua identidade, posição na es-trutura social, símbolos e recursos de poder. Quando o aluno compreende que os cheiros, os gestos, as gí-rias, as tensões e confl itos, as lágrimas e alegrias, en-fi m, o drama concreto dos seus pares, é em grande medida resultante de uma confi guração específi ca de seu mundo, então a sociologia cumpriu sua fi nalidade pedagógica. (SARANDY, 2001, p.3)

Ser professor de Sociologia não é uma tarefa simples; transfor-mar e mediar o conhecimento científi co-acadêmico em saber escolar muito menos. O papel da Sociologia enquanto ciência é produzir um saber científi co sobre a realidade social, buscando compreendê-la através do “estranhamento” e da “desnaturalização” dos fatos sociais, rompendo com os achismos e formas de pensar que não percebem as relações entre os indivíduos, grupos e instituições como algo cons-truído socialmente. As Orientações Curriculares Nacionais (OCN) fornecem um importante esclarecimento sobre como a Sociologia pode ser lecionada na Educação Básica a partir destes princípios:

Um papel central que o pensamento sociológico rea-liza é a desnaturalização das concepções ou explica-ções dos fenômenos sociais. Há uma tendência sem-pre recorrente de se explicarem as relações sociais, as instituições, os modos de vida, as ações humanas, coletivas ou individuais, a estrutura social, a organi-zação política, etc. com argumentos naturalizadores. Primeiro, perde-se de vista a historicidade desses fe-nômenos, isto é, que nem sempre foram assim; segun-do, que certas mudanças ou continuidades históricas decorrem de decisões, e essas, de interesses, ou seja, de razões objetivas e humanas, não sendo fruto de tendências naturais. (ORIENTAÇÕES CURRICULA-RES NACIONAIS PARA O ENSINO MÉDIO, 2006, p.105-106).

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O pensamento de Luiza Helena Pereira (2012) também leva a refl etir sobre o ensino de Sociologia a partir do estudo de temas sociais:

Quando se fala em temas, considera-se que todo e qualquer tema social é objeto de estudo da sociologia no ensino médio. Mas como defi nir o que é um tema social? Com Durkheim e Wright Mills, entendemos que todo problema social que é geral, na sociedade é objeto de estudo da sociologia, isto é, segundo Dur-kheim, “podemos defi nir também (o fato social) pela difusão que apresenta no interior do grupo...” (Dur-kheim, 1995, p. 10). Mills dá o exemplo do desem-prego para mostrar que se este fenômeno é geral na sociedade, isto é, se muitos estão desempregados em uma formação social (país), então é um problema da estrutura social, é um problema social e, portanto, pode ser construído como um problema sociológico, isto é, passível de ser estudado pela sociologia (Mills, 1969). (PEREIRA, 2012, p. 62)

Quando elaborei o programa curricular da disciplina de So-ciologia para os anos de 2012 e 2013 na escola Ministro Jarbas Pas-sarinho, levei em consideração o fato de trabalhar em sala de aula temas da atualidade que pudessem auxiliar os alunos a compreender como se constroem as relações entre indivíduo e sociedade, a par-tir de eixos temáticos, que, por sua vez, se desdobrariam em outros assuntos correlatos, sem desconsiderar as explicações sociológicas de autores clássicos como Durkheim, Marx e Weber, além de outros autores contemporâneos. A construção do currículo também levou em conta o conteúdo abordado no livro didático Sociologia para o Ensino Médio, de Nelson Dacio Tomazi, não no sentido de “copiar” o sumário do livro, mas a partir da seleção das temáticas desenvolvidas em algumas de suas unidades — tendo em vista a facilidade do aces-so ao conteúdo pelo aluno — nortear a explicação das aulas, orientar atividades, leituras e elaboração de provas. Isto não signifi ca, porém, que não busquei outras fontes e ou que meramente reproduzi os as-suntos ali tratados.

Vale destacar aqui, que, pela primeira vez, após a obrigato-riedade da inserção da disciplina no Ensino Médio, em 2009, livros didáticos de Sociologia foram inseridos no Programa Nacional do

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Livro Didático (PNLD) do MEC, e sua distribuição para a escola pú-blica iniciou-se no ano letivo de 2012. No entanto, as opções eram apenas duas, sendo estas o livro de Nelson Dacio Tomazi, anterior-mente citado, e o livro Tempos Modernos, Tempos de Sociologia, das autoras Helena Bomeny e Bianca Freire-Medeiros.

Com o intuito de dar maiores detalhes acerca dos eixos te-máticos contidos no programa curricular de Sociologia da Escola Ministro Jarbas Passarinho, elencarei os principais pontos contem-plados no plano anual do ano de 2013, dividido em quatro períodos. Para as turmas de segundo ano, no primeiro período, optei por dar continuidade ao conteúdo visto no primeiro ano, aprofundando as teorias sociológicas de Durkheim, Marx e Weber, a partir dos con-ceitos de fato social, ação social e classes sociais. No segundo perío-do, abordei a relação entre cultura e sociedade, a partir de conceitos como etnocentrismo, diversidade cultural, indústria cultural, identi-dade e culturas juvenis. No terceiro período, o eixo temático sobre desigualdade social teve como objetivo levar o aluno a compreender os problemas gerados pelas desigualdades sociais em suas diversas formas: racial, de gênero, econômica, entre outras, mostrando as raízes históricas das desigualdades, que são perpetuadas sob formas de dominação e confl itos entre países, sociedades, grupos e pessoas. No quarto e último período pensei em uma proposta que partia da realidade do contexto escolar: o desenvolvimento de uma pesquisa acerca da questão das drogas na escola, que servisse tanto para ela-borar um diagnóstico acerca da percepção dos alunos sobre o assun-to, como para saber que ações a escola poderia colocar em prática para enfrentar o problema. Isso foi algo que também decidi trabalhar nas turmas de terceiro ano, buscando articular as duas séries neste trabalho.

É notório que a função da Sociologia não passa por um ca-ráter messiânico de buscar resolver todos os problemas sociais. No entanto, nenhum educador é neutro em suas ações. Conforme refl ete Goulart (2013), o professor, enquanto sujeito de sua profi ssão, anali-sa a sociedade construindo categorias de análise capazes de revelar as relações sociais, elaborando concepções e práticas pedagógicas, que também o levam a tomar posição frente a essas relações construídas por essa mesma sociedade. Pois, como observa Florestan Fernandes

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(1989), o caráter político do professor está diretamente relacionado não só ao que ele faz, mas ao que ele deixa de fazer, levando em conta que este educador também necessita ser “reeducado”.

Para alguns, tratar a questão das drogas na escola aparece como um discurso moralista, entretanto, não creio que a posição do educador seja simplesmente a de cruzar os braços e “abafar” um as-sunto que ocorre à vista de todos. Citando como exemplo a escola Ministro Jarbas Passarinho, é notório que o uso de drogas entre os alunos é frequente dentro do ambiente escolar, onde, não raro, se presenciam casos de estudantes drogados e até mesmo com sinto-mas de overdose, ou mesmo de mães que chegam para justifi car as faltas do fi lho, que não está frequentando as aulas devido a ameaças de morte por conta de dívidas de drogas ou rixas entre gangues. A primeira vez que deparei com um aluno drogado em sala de aula, lembro bem o que ele me disse: “Professora, hoje eu estou de cabeça feita, para matar um não é muito difícil”. Eu logo respondi: “Fique tranquilo, não serei um problema para você.” A aula transcorreu tranquilamente, pois o aluno sentou-se em sua carteira e lá fi cou. Lembro também que o mesmo usava um boné para cobrir o rosto. Depois do episódio não o vi mais na escola, nem tive notícias sobre o que aconteceu com ele, nem ao menos de ter a oportunidade de con-versarmos em outro momento, sem ele estar sob o efeito de drogas.

Quando estagiários me procuram para saber se podem acom-panhar o meu trabalho em sala e aula, geralmente peço que procu-rem conhecer e visitar o bairro Terrenos Novos, onde a escola está localizada, pois não podemos conhecer a escola sem conhecer o lo-cal onde os alunos moram e como eles vivem.

A Escola Ministro Jarbas Passarinho é considerada uma das escolas estaduais da região com o mais baixo rendimento, tanto no IDEB - Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (que atual-mente está em 2,4) como também em avaliações externas realizadas pelo próprio Estado, a exemplo do SPAECE (Sistema Permanente de Avaliação da Educação Básica do Ceará). O núcleo gestor, preocupa-do com a quantidade de alunos aprovados em provas como ENEM e outros vestibulares e com o aumento do “rendimento” dos alunos no IDEB, parece ignorar as verdadeiras condições sociais que resul-tam no baixo rendimento dos alunos. A principal preocupação dos

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agentes escolares está em se adequar às normas ditadas pela Secreta-ria Estadual de Educação através da CREDE (Coordenadoria Regio-nal de Desenvolvimento da Educação), que constantemente avalia essas instituições, submetendo-as às diretrizes de suas políticas edu-cacionais, concretizadas no ambiente escolar a partir de prescrições, regulamentos e normas impostas pelo poder público, através da vigi-lância exercida por superintendentes escolares que frequentemente “visitam” a instituição.

Sobre a construção do plano curricular para o terceiro ano do Ensino Médio no ano de 2013, no primeiro período, privilegiei a apresentação da Sociologia como disciplina que ajuda a pensar e compreender a vida em sociedade a partir da desnaturalização e do estranhamento da realidade social, apontando para a compreensão entre os discursos produzidos pela esfera do senso comum e pela Sociologia como ciência. No segundo período, o eixo temático a ser abordado foi Trabalho e Sociedade, cujo desdobramento resultou no estudo do conceito de trabalho como objeto de estudo da Sociologia, nas suas diversas formas de organização e nos seus modos de pro-dução em diferentes sociedades, a partir de uma contextualização histórica e sociológica, partindo da análise das transformações no mundo do trabalho na sociedade atual através de fenômenos como desemprego, subemprego, terceirização, informalidade, exploração do trabalho feminino, entre outros. Nesse ponto, também foi abor-dada a relação entre os jovens e o mercado de trabalho, uma vez que o público da referida série é composto por jovens em busca do primeiro emprego e outros que já trabalham, seja de modo informal ou sob o regime de estágio.

No terceiro período, que compreende os meses de agosto e setembro, o eixo temático Cidadania, Direitos e Movimentos Sociais foi proposto e considerado importante, quando discutido a partir de uma perspectiva sociológica e histórica, construída em diferen-tes contextos sociais e políticos, levando o aluno a compreender a cidadania como resultado da luta de movimentos organizados pelos mais variados setores da sociedade, visando a conquistar, manter e ampliar direitos civis, sociais e políticos. Houve ênfase sobre a for-mação do “cidadão consumidor” na era do capitalismo neoliberal assim como sobre as políticas de ações afi rmativas no Brasil atual,

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tendo como exemplo a política de cotas e leis, como o Estatuto da Igualdade racial.

Os conteúdos e as metodologias de ensino utilizados na abor-dagem dos temas serão objeto de outro trabalho, que priorizará estas questões.

Distinção entre saber escolar e acadêmico: um grande desafi oOutro enorme desafi o a ser enfrentado no ensino de Sociolo-

gia na educação básica é a distinção entre saber escolar e acadêmico, o que signifi ca fazer com que o conhecimento sociológico chegue ao cotidiano dos alunos, tendo em vista que trazer para a realidade es-colar da Educação Básica as complexas teorias acadêmicas na forma como são ministradas na universidade resultaria em maior aversão e desinteresse dos estudantes pela disciplina.

As Orientações Curriculares Nacionais ainda alertam para este que ainda é um dos grandes problemas encontrados no ensino de So-ciologia, que tem sido a simples transposição de conteúdos e práticas de ensino do nível superior para o nível médio, sem a devida mediação pedagógica necessária em termos de adequação de linguagem, conteú-dos, metodologias e temas para a fase de aprendizagem dos jovens, con-siderando ainda outras questões relacionadas à interpretação, leitura e escrita.

Tal tarefa não é fácil e decorre também de muitas defi ciências na formação dos professores de Sociologia na própria Universidade, que também não está preparada para rever suas próprias concepções e práticas de ensino, muitas vezes tão distantes da realidade escolar da Educação Básica nas escolas públicas. Há, ainda, além disso, uma divisão muito grande entre Licenciatura e Bacharelado, sendo a for-mação de sociólogos pesquisadores uma prioridade para muitos no meio acadêmico, fazendo com que ensino e pesquisa não caminhem juntos na formação dos estudantes. Com exemplo disto, descrevo a minha própria experiência enquanto estudante do curso de Ciên-cias Sociais na Universidade Estadual Vale do Acaraú. Ao optar por cursar Licenciatura, fui formada numa grade curricular que priori-zava, nos primeiros anos, a formação do pesquisador e, nos últimos semestres, “de repente”, nos “formávamos” professores a partir do contato com as disciplinas pedagógicas, geralmente ministradas por

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professores do curso de Pedagogia. No último ano, o contato com a realidade escolar se deu através de duas disciplinas de Prática de En-sino. Não foi pensada, ao longo do curso, e poucas vezes discutida, a formação do professor de Sociologia, ou mesmo o que fazer com o “turbilhão” de teorias políticas, antropológicas e sociológicas na Educação Básica. Vale ressaltar, que na época em que me formei, em 2005, a disciplina de Sociologia já estava inserida na grade curricu-lar do Ensino Médio nas escolas públicas do Estado. Na escola em que estagiei, uma professora de História e uma formada em Estudos Sociais ministravam Sociologia, havendo apenas uma professora for-mada em Ciências Sociais.

Diante do que foi mencionado, quero pontuar que essa discus-são sobre a formação do professor de Sociologia na Educação Básica diz respeito à própria valorização da Licenciatura, e que a formação do pesquisador não pode ser separada da formação do professor, assim como a produção científi ca também deve estar voltada para pensar o porquê da Sociologia na Educação Básica, buscando res-postas para a insistente pergunta: “Para que serve a Sociologia?” e levando a uma refl exão profunda sobre o papel a ser desempenhado pela mesma no atual cenário da educação escolar, e qual o seu papel na educação dos jovens do Ensino Médio.

O academicismo está recheado de discursos em que se defen-de que o profi ssional da educação deve estar constantemente repen-sando suas práticas. No entanto, muitos “professores-pesquisadores” do meio acadêmico devem estar preparados para repensar constan-temente suas práticas e concepções de ensino, para além do mero domínio de teorias e de uma formação livresca. Tenho conversado com muitos colegas outrora universitários e hoje professores, e, não raro, ouço comentários acerca do “choque” causado pelo confronto das teorias acadêmicas ministradas na universidade e a realidade, que é a escola pública, pois se a teoria é um instrumento para anali-sar a realidade, só o domínio teórico não é sufi ciente; a experiência do dia a dia na sala de aula acaba sendo uma grande “professora”. Tenho a convicção de que o nosso processo de formação não de-pende apenas de um curso universitário, mas que ele consiste em um aprendizado constante, em que cada vez mais desafi os estarão presentes, e que nem sempre os objetivos desejados serão atingidos.

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No que se refere a minha experiência como professora de So-ciologia na Educação Básica, considero que minhas opiniões acerca do que é educação, ensino e Sociologia mudaram muito, ao longo do curto período que venho vivenciando a rotina na educação pública. Só agora percebo a falta de maturidade e a incoerência de muitas críticas que fi z enquanto universitária, ou mesmo em meus estágios como “observadora”, ao questionar o porquê do professor não elabo-rar 28 aulas diferentes para 28 turmas sob sua responsabilidade, não levando em conta uma série de outros fatores que interferem direta-mente na qualidade de trabalho do professor e na sua relação com os alunos na sala de aula. Só agora percebo com mais clareza o quanto observar é diferente de vivenciar o dia a dia do professor, que enfren-ta problemas que vão desde a difi culdade em reservar um datashow para ministrar uma aula até o fato de lidar com alunos que ingressam e saem do Ensino Médio como analfabetos funcionais.

O PIBID na formação dos graduandos em Ciências SociaisEm relação ao processo de formação docente, programas

como o PIBID (Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Do-cência) representam um passo importante em buscar promover a relação teoria-prática na formação do futuro professor de Sociologia, o que, aliás, é um dos principais objetivos do programa, contribuin-do para diminuir as fronteiras ou “abismos” ainda existentes entre o campo escolar e o acadêmico, entre a teoria ministrada da universi-dade e a prática escolar, a pesquisa e o ensino, ou mesmo a ciência e a escola, além de cumprir um importante papel na formação de futuros profi ssionais do magistério para as redes públicas de ensino, visto que o programa visa oportunizar o desenvolvimento de ações e propostas que contribuam para que se estabeleça de fato uma cone-xão entre a formação universitária e a realidade da Educação Básica no contexto escolar, dinamizando a troca de experiência entre pro-fessores, alunos e bolsistas, com o intuito de ampliar a participação dos mesmos nas atividades a serem desenvolvidas na escola.

Em outubro de 2012, fui aprovada numa seleção para profes-sor supervisor do PIBID - Subprojeto de Sociologia, na escola. Des-de então, venho supervisionando as atividades de sete bolsistas na instituição. Dentre as ações e propostas de trabalho desenvolvidas

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pelo PIBID, na Escola Ministro Jarbas Passarinho, cito a criação do grupo de estudos “Sociologia na escola”, cujo propósito é promover discussões e debates acerca de assuntos como formação docente e elaboração de material didático com sugestões de textos, atividades e estratégias de ensino a serem trabalhadas em sala de aula, seja a partir da análise do livro didático existente, bem como a elaboração de novos materiais.

Uma outra proposta de trabalho é oferecer minicursos vol-tados para melhoria do desempenho dos alunos no que se refere à leitura, interpretação e escrita. Para o segundo semestre de 2013, elaboramos o Projeto “A contribuição do conhecimento sociológico para as redações do ENEM”. Esta proposta de trabalho tem como objetivo possibilitar que a Sociologia possa cumprir um duplo papel: enquanto disciplina capaz de promover uma leitura crítica da reali-dade social, seu objetivo maior; bem como contribuir para melhorar a capacidade de leitura e interpretação dos estudantes, indo além de uma mera instrução técnica de elaboração de redações, visto que seu propósito também é atuar como formadora de opinião do aluno da educação básica, levando-o a problematizar e refl etir sobre o impac-to das transformações sociais em suas próprias vidas.

Outra proposta já concretizada é a construção de um blog com o objetivo de criar um espaço virtual que possa ser compartilhado por professores, alunos e bolsistas, a partir da divulgação de material didático, além do desenvolvimento de metodologias e pesquisas vol-tadas para a intervenção no ensino de Sociologia na Educação Bási-ca. O blog também tem a fi nalidade de divulgar as ações e atividades desenvolvidas na escola, assim como o material didático produzido pelos bolsistas do PIBID – Sociologia.

Para o planejamento das ações e atividades a serem desenvol-vidas na escola, realizaram-se reuniões semanais, momento em que professor supervisor e bolsistas discutiram sobre possíveis propostas didático-pedagógicas que pudessem promover a devida mediação entre o saber acadêmico e escolar, o que, conforme abordado an-teriormente, é um dos maiores desafi os encontrados no ensino de Sociologia no Ensino Médio. É nesse aspecto, que a efetivação da relação teoria-prática passa a ser pensada, a partir da produção de pesquisas e tecnologias de ensino necessárias ao trabalho docente.

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Foi partindo dessas discussões que surgiu a elaboração de uma proposta interdisciplinar que envolvesse as disciplinas de Lín-gua Portuguesa e Sociologia. Tal proposta de intervenção pedagógica foi apresentada pelos bolsistas do PIBID de Sociologia no Encontro Nacional de Sociologia no Ensino Médio (ENESEB), em junho de 2013. O trabalho se propôs a analisar, a partir de uma perspectiva so-ciológica, o conceito de trabalho na obra Luzia-Homem, do escritor cearense Domingos Olímpio. Publicado em 1903 e considerado uma das mais importantes obras do regionalismo brasileiro, o romance narra a história da retirante Luzia que, em meio à fome, a miséria e à seca que assolava a região nas últimas décadas do século XIX, chega à cidade de Sobral em busca de trabalho. É nesse contexto que come-ça a trabalhar na construção de uma cadeia pública na cidade para conseguir alimentos, pagamento recebido pelos sertanejos em troca de trabalho. Atualmente, 110 anos após a publicação de Luzia-Ho-mem, o Estado do Ceará atravessa outra grande seca, talvez não tão sentida como em outros tempos, devido à modernização econômica. Fazer o paralelo entre o ontem e o hoje constitui um dos principais objetivos do trabalho, realizado em duas turmas do terceiro ano do Ensino Médio, na escola Ministro Jarbas Passarinho em Sobral-CE.

O projeto constituiu uma ferramenta pedagógica que possi-bilitou abordar a contextualização da obra, enquanto um romance regionalista, escrito no estilo literário conhecido como realismo-na-turalismo e o enfoque sociológico, a partir da problematização dos seus aspectos políticos, sociais e econômicos, tendo como propósito fazer com que a literatura seja concebida como instrumento de re-fl exão sociológica, dada a possibilidade de explorar questões liga-das à realidade social da região. A abordagem didático-pedagógica consistiu em o professor da disciplina de Língua Portuguesa contex-tualizar a obra a partir do seu estilo literário, bem como enfocar a interpretação de texto, a partir de trechos da obra que retratassem o contexto social abordado pelo autor. Nas aulas de Sociologia, a obra foi apresentada aos alunos, levando em conta a abordagem do conhecimento sociológico como forma de promover uma refl exão crítica das relações de trabalho e suas implicações para a vida do ser-tanejo, de modo a se fazer paralelo histórico entre a época e os dias atuais. Os professores envolvidos no projeto também organizaram

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atividades avaliativas que incluíram uma dramatização da obra in-terpretada pelos alunos e bolsistas, e produções textuais geradas a partir do aprofundamento das discussões em sala de aula.

É importante destacar que o PIBID oportuniza participação dos bolsistas em outras atividades realizadas na escola, como reu-niões de planejamento escolar, eventos como a Semana da Consciên-cia Negra, Meio Ambiente, Semana Pedagógica, dentre outros.

Mesmo ciente da relevância de iniciativas como o PIBID para um maior diálogo entre educação básica e superior, e consequente-mente para uma maior valorização da licenciatura, há muitos pro-blemas que difi cultam a plena realização dos objetivos do programa, seja a burocracia na liberação de recursos fi nanceiros para custear publicações, ajudas de custo para bolsistas apresentarem trabalhos em eventos, entre outros, bem como em relação à necessidade de haver uma maior comunicação da coordenação institucional e coor-denações de área na universidade e a direção das escolas, com intuito de fornecer maiores esclarecimentos sobre os objetivos do progra-ma e os benefícios que ele pode trazer para a instituição escolar. Por fi m, é necessária a criação de encontros para que os subprojetos ex-ponham e socializem projetos e experiências realizadas no contex-to escolar nas mais diversas áreas, até mesmo com o intuito de que maiores propostas no âmbito interdisciplinar sejam desenvolvidas.

Considerações FinaisAinda há muitos entraves que difi cultam uma maior valoriza-

ção da Sociologia nas escolas, considerando que a sua atual reinser-ção como disciplina obrigatória no currículo do Ensino Médio é re-sultado de uma luta histórica que se manteve ao longo desses anos e que leva a refl etir sobre qual o papel a ser desempenhado pela mesma no atual contexto educacional, e, consequentemente, pelo profi ssio-nal que atuará nessa área, dentre outros fatores que levaA pergunta que não quer calar: para que serve a Sociologia?m a pensar sobre os desafi os e a necessidade de um trabalho que busque promover discussões em torno da afi rmação de uma identidade da Sociologia, de modo a consolidar sua legitimidade no currículo escolar.

A realidade que vivenciei ao longo de minha experiência neste ambiente escolar, em muitos momentos me levou a refl etir sobre o

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papel do cientista social/educador nesse contexto. Pois sendo a So-ciologia uma disciplina que reclama a formação de alunos capazes de interpretar e analisar criticamente as questões sociais que o envolvem, conforme preconiza teoricamente a própria LDB, ao privilegiar, além da formação profi ssional do estudante, o seu aprimoramento como pessoa humana, incluindo a formação ética e o desenvolvimento da autonomia intelectual e do pensamento crítico, tenho em mente, ao levar em conta essa difícil missão, as várias difi culdades encontradas nesse processo, que vão desde a difícil situação de aprendizagem dos alunos, (passando pela carga horária limitada e insufi ciente para se cumprir as metas e os objetivos propostos pela disciplina, pelo uso de instrumentos didático-metodológicos e pela elaboração de um conteúdo que, atraindo o interesse dos estudantes, melhor venha a corresponder aos objetivos que a Sociologia se propõe a alcançar) até detalhes aparentemente simples, como a utilização de exemplos práticos que, partindo do cotidiano e de situações mais concretas e menos teóricas, permitam auxiliá-los nessa compreensão crítica da realidade social.

Partindo desse enfoque, podemos citar Wright Mills (1982) e a sua concepção acerca do papel político a ser desempenhado pelo cientista social/educador, posto que a Sociologia, enquanto uma ciência que trata de entender as questões humanas, estudando as re-lações do homem em seu meio social, já traria consigo um caráter político. E é exatamente por descortinar o que está por trás da reali-dade que ele passa a incomodar, pois esse cientista social/educador tem a capacidade de fazer com que seus alunos questionem, entre outros aspectos, a fragilidade e as carências do sistema educacional de seu país até o próprio ambiente escolar em que vivem.

É levando em conta essas e outras questões já citadas, que mi-nhas considerações fi nais estão muito mais cheias de perguntas do que de respostas, pois como professora percebo os inúmeros obstá-culos a serem enfrentados.

Referências

BRASIL, MEC. Ciências Humanas e suas Tecnologias/ Secretaria de Educação Básica. Brasília: Ministério da Educação, Secretaria de Educação Básica, 2006.

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BRASIL, Ministério da Educação e do Desporto. Lei n0 9.394/96 de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as Diretrizes e Bases da Educa-ção Nacional. Imprensa Nacional, Brasília, Diário ofi cial da União, Seção I, 23/12/1996.

FERNANDES, Florestan. O Desafi o Educacional. São Paulo: Cor-tez, 1989.

GOULART, Débora Cristina. A culpa é dos professores! Um diag-nóstico que engendra uma política neoliberal de formação docente. In: Revista Café com Sociologia. Vol. 2, No 1, Abril de 2013. Dispo-nível em: <http://revistacafecomsociologia.com/revista/index.php/revista/article/view/28/pdf>. Acesso em 18 jul. 2013.

MILLS, Wright C. A Imaginação Sociológica. 6. ed. Rio de janeiro: Zahar, 1982.

PEREIRA, Luiza Helena. Sociologia no Ensino Médio: socialização, reprodução ou emancipação? In: Revista Percursos. Florianópo lis, v. 13, n. 01, p. 60 – 80, jan/jun. 2012. Disponível em: http://www.pe-riodicos.udesc.br/index.php/percursos/article/view/2433.> Acesso em 20 jul. 2013.

SARANDY, Flávio Marcos Silva. Refl exões acerca do sentido da sociologia no Ensino Médio. In: Revista Espaço Acadêmico. São Paulo, ano I, nº 5, outubro de 2001. Disponível em: <http://www.espacoacademico.com.br/005/05sofi a.htm> Acesso em 18 jul. 2013.

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SOCIABILIDADE DE GRUPOS JUVENIS NOS ESPAÇOS DA ESCOLA LUÍS FELIPE

Maria Imaculada Conceição Pinto Freire – Bolsista de Iniciação à Docência do PIBID e Acadêmica do Curso de Ciências Sociais da Universidade Estadual Vale do Acaraú. Diocleide Lima Ferreira - Doutora em Sociologia. Professora Adjun-ta da Universidade Estadual Vale do Acaraú – UVA (Orientadora).

IntroduçãoA instituição de ensino escolar, que tem múltiplos objetivos e

metas, como o de preparar os alunos para exercerem sua cidadania e assumir papéis sociais ao longo de seu processo de formação, está sofrendo múltiplas transformações e recebendo públicos que tam-bém trazem consigo uma carga sociocultural que acarreta transfor-mações no processo de socialização dos mesmos.

O jovem, parte essencial desses públicos, vive em condições específi cas, como um ser social de direitos que devem ser reconhe-cidos na sua condição sócio-histórico-cultural e que está situado de forma heterogênea como uma categoria social. Ele deve ser respeita-do em suas diversas formas de estar e ser no mundo. Nesse processo, a formação de grupos faz parte de suas experiências dentro e fora da instituição de ensino, a qual ele frequenta, muitas vezes, movido mais pelos círculos de amizade que pelas disciplinas ou componen-tes curriculares .

Cada jovem cria identidades e simbologias no grupo com suas particularidades. Para Dayrell,

Além de ser marcada pela diversidade, a juventude é uma categoria dinâmica, transformando-se de acordo com as mutações sociais que vêm ocorrendo ao longo da história. Na realidade, não há tanto uma juventude e sim jovens, enquanto sujeitos que a experimentam e sentem segundo determinado contexto sociocultural onde se inserem (DAYRELL, 2010, p.67)

Esta pesquisa trata da formação de grupos juvenis durante o intervalo escolar e tem o intuito de revelar algumas questões refe-rentes a tais grupos e sua formação. O momento do intervalo foi

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escolhido por se caracterizar como situação de maior sociabilidade entre os jovens no ambiente escolar. O trabalho está sendo realizado na Escola de Ensino Fundamental e Médio Professor Luis Felipe, si-tuada na cidade de Sobral-CE, que atualmente atende a 803 alunos.

ObjetivosA pesquisa teve como objetivo saber como ocorre a dinâmica

dos grupos no intervalo escolar, também conhecido como “hora do recreio”. A hipótese de partida é a de que as relações entre os mem-bros desses grupos se constroem a partir de interesses de múltiplas dimensões, o que produz um processo de identifi cação com o grupo a que pertencem.

Julguei necessário, para uma melhor sistematização dos da-dos, observar os grupos juvenis do turno da manhã, registrar con-versas e realizar entrevistas. Logo após um mapeamento desses gru-pos, três foram escolhidos para foco deste trabalho.

Metodologia da pesquisaComo método da pesquisa, utilizei o qualitativo, devido à ne-

cessidade de explicações mais detalhadas sobre meu objeto de estu-do, que requer um exercício de aproximação para compreensão da dinâmica interna dos grupos. Para chegar a detalhes e informações entre os jovens, optei pela escolha do método acima referido, uma vez que

A pesquisa qualitativa responde a questões muito particulares. Ela se ocupa, nas Ciências Sociais, com um nível de realidade que não pode ou não deveria ser quantifi cado. Ou seja, ela trabalha com o univer-so dos signifi cados, dos motivos, das aspirações, das crenças, dos valores, e das atitudes. Esse conjunto de fenômenos humanos se distingue não só por agir, mas por pensar sobre o que faz e por interpretar suas ações dentro e a partir da realidade vivida e partilhada com seus semelhantes. O universo da produção humana que pode ser resumido no mundo das relações, das representações e da intencionalidade e é objeto da pesquisa qualitativa difi cilmente pode ser traduzido

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em números e indicadores quantitativos. (MINAYO, 2010, p.21)

Assim, dirigi perguntas aos componentes dos grupos anali-sados a fi m de adquirir informações úteis ao desenvolvimento da pesquisa, tais como suas aspirações, crenças, valores e atitudes.

O turno em que a pesquisa foi realizada foi o da manhã. A entrada em campo não foi difícil, por que faço parte do PIBID (Pro-grama Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência). Por conta do programa, eu frequentava semanalmente a escola neste horário, mesmo antes de ela ocupar o atual prédio em que funciona. Essa frequência gerou certa familiaridade com os professores e demais membros da instituição.

Grande parte disso, creio, foi possível devido ao meu enga-jamento em um projeto, que é realizado uma vez por ano na esco-la, chamado “Sarau Literário”, em que mostrei uma proposta para o professor supervisor do Subprojeto de Sociologia, pertencente ao Projeto de Iniciação à Docência Experiências Inovadoras entre Uni-versidade e Escolas – PIBID UVA 2011. A proposta era a encenação de uma peça que escrevi chamada “O casal da roça”, com conteúdo humorístico, cujo intuito era fazer alianças e aproximações entre os bolsistas do PIBID e os alunos da escola. O projeto acabou sendo muito interessante em todo o período de realização, desde o início até a apresentação, que aconteceu no Teatro São João, em Sobral, no mês de junho de 2012.

Depois do meu primeiro contato com os alunos, senti-me à vontade para conversar com os mesmos. Isso me permitiu realizar um mapeamento dos grupos, a fi m de defi nir quais eram os focos da pesquisa, ou seja, aqueles que mostram mecanismos através dos quais a seguinte questão possa ser respondida: como ocorre a formação de grupos juvenis nos espaços escolares da escola Luís Felipe?

Aproveitei muitos momentos em que eu estava nas reuniões do PIBID na escola para observar os grupos na hora do intervalo. Afi nal, estar engajada em um projeto que me deu acesso ao local aju-dou a ter um contato mais próximo com os grupos. Cada grupo tem um estilo próprio, fazendo com que os membros mantenham laços de afetividade e amizade. É de meu interesse saber quais os valores

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que sustentam esses grupos, suas simbologias particulares e o que, de certo modo, faz com que um grupo entre em contato com outro, ou até mesmo se afaste.

Discussão dos ResultadosO intervalo na Escola Luis Felipe: sociabilidade de grupos ju-

venis que confi guram os espaços das salas de aula e do pátioNa escolha do tema desta pesquisa, pensei ser necessário ob-

servar um momento que tivesse ligação com algumas práticas dos grupos e que pudessem dar sinalização de uma produção cultural um pouco diferenciada dos padrões e valores que são criados e nor-matizados por todo um processo pedagógico e político impostos pelas regras escolares. Tive como foco as relações de sociabilidade partindo da hipótese de que essas relações se constroem a partir de interesses de múltiplas dimensões que têm muito a ver com uma cul-tura específi ca da juventude.

As culturas juvenis, como expressões simbólicas da condição juvenil, se manifestam na diversidade em que esta se constitui, ganhando visibilidade por meio dos mais diferentes estilos, que têm no corpo e no seu visual uma de as suas marcas distintivas. Jovens osten-tam os seus corpos e, neles, as roupas, as tatuagens, os piercings, os brincos, falando da adesão a determina-do estilo, demarcando identidades individuais e co-letivas, além de sinalizar um status social almejado. Ganha relevância também a ostentação dos aparelhos eletrônicos, principalmente o MP3 e o celular, cujo impacto no cotidiano juvenil precisa ser mais pesqui-sado. (DAYRELL, 2010, p. 70).

As culturas descritas estão presentes nos mais diversos espa-ços da sociedade, tais como a própria instituição escolar, sobretudo no momento do intervalo, em que os grupos se encontram para rea-lizarem muitas dessas expressões, algumas das quais serão descritas adiante.

Antes do tocar da sirene para o intervalo, pude comprovar que há um silêncio, que se desfaz no momento em que a mesma toca, dando espaço para todo um conjunto de sonoridades, falas, risos e brincadeiras, que vão modifi cando a confi guração dos espaços da

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escola e ganham um valor e uma dinâmica em que não cabe mais o silêncio. Este é substituído por um conjunto de ações e interações que vão modelando e estruturando-se em diversas dimensões sim-bólicas na medida em que os estudantes vão, aos poucos, fazendo seus grupos de aproximação, tirando dos bolsos das calças e mochi-las objetos como celulares para ouvirem músicas, compartilhando o fone do celular com um colega etc. Nesse momento, práticas afetivas e relações de amizades, como sentar no colo da amiga, conversar so-bre assuntos diversos com temas que envolvem namorados, paque-ras, famílias, novelas, dentre tantos outros, também são comparti-lhados nos grupos que se formam.

Os grupos se formam logo que o intervalo inicia, às 9h30 (ele se prolonga por quinze minutos, até 9h45), havendo aqueles que são compostos por meninas, por meninos e outros compostos por am-bos os sexos. Há grupos que vão para a mesa jogar, há aqueles que fi cam no pátio; há ainda os que fi cam nas salas e os que fi cam tran-sitando no ir e vir das mesmas. Há também os jovens que gostam de estar em dupla ou transitando sozinhos. O importante é perceber a confi guração dinâmica que, com essas ações, transforma o espaços disciplinar da escola.

A maior parte dos grupos é composta por quatro, cinco, seis, chegando a ter até doze membros, que vão se apropriando dos es-paços físicos da escola como mesas e carteiras que fi cam no pátio, corredores e salas de aula para se socializarem.

Em alguns casos, pelo que pude observar e conversar com es-ses grupos, há assuntos que podem ou não ser discutidos no grupo como um todo. No caso de grupos mistos de moças e rapazes, se há homens ou não no momento da conversa, os assuntos mudam de temas. Por exemplo: quando se tratam de questões amorosas, afe-tivas, e conversas sobre os namorados e paqueras, as meninas têm preferência de conversar entre si por se sentirem, segundo elas, mais à vontade. Porém, quando se trata de questões que incluem brinca-deiras entre os membros e pares, os meninos ganham mais visibili-dade e atenção, fazendo com que a dinâmica do grupo, em grande parte dos momentos, se torne mais descontraída, ou, como eles afi r-mam, “mais engraçada”. Estas brincadeiras relacionam-se com o que afi rmou Radcliff e-Browm (1989, p.134): “na relação de brincadeira

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o comportamento é um comportamento em que, em qualquer ou-tro contexto social, expressaria e provocaria certas hostilidades, mas este comportamento não é suposto ser levado a sério”.

As brincadeiras se manifestam na maneira de fazer gracejos, dançar na frente das meninas, contar alguma piada, “zombar da cara do colega” ou trazer alguma informação de forma humorística. Em suma, gestos e ações que tornam os meninos um dos valores que fazem o grupo ter suas especifi cidades, o que torna agradável a seus membros estarem naquele específi co grupo e não em outro.

Ao serem questionados sobre a preferência por estar num grupo específi co, muitos responderam que é por conta do processo de identifi cação e por conta dos membros serem engraçados. Desse modo, o intervalo se confi gura como um dos momentos que fazem com que os alunos construam relações e redes de cruzamento de identidades individuais, o que acaba por dar uma estrutura de iden-tifi cação e funcionamento interno que é própria ao grupo.

Nos momentos em que se socializam, construindo relações de amizades, esses jovens também criam experiências para a constru-ção de suas próprias personalidades e experiências cotidianas, que, pelo que pude perceber, tem muito daquilo que trazem dos espaços extraescolares, pois cada jovem:

Constitui-se como um ator plural, produto de expe-riências de socialização em contextos sociais múlti-plos, dentre os quais ganham centralidade aqueles que ocorrem nos espaços intersticiais dominados pelas relações de sociabilidade. Os valores e comportamen-tos apreendidos no âmbito da família, por exemplo, são confrontados com outros valores e modos de vida percebidos no âmbito do grupo de pares, da escola, das mídias, etc... (DAYRELL, 2010, p.76)

Estes valores, os jovens absorvem, transformam e potenciali-zam em uma “face juvenil”, no sentido de se apropriarem e experi-mentarem de determinados mecanismos sociais de forma diferen-ciada de outras etapas da vida. Isso também por conta de estarem in-seridos em um contexto histórico-cultural em que as transformações globais têm conexão com dimensões locais, em que os mesmos se utilizam dos aparatos tecnológicos como fonte de aproximação entre

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os membros, como exemplo, as músicas e vídeos que muitos deles têm no celular, geralmente de cantores norte americanos.

Tais elementos infl uenciam em suas construções subjetivas, so-ciais e culturais por conta de, como humanos, acharem-se em constante conexão com os mecanismos sociais que os cercam e ressignifi cam suas construções psíquicas e produções sócioculturais, pois:

As idades da vida (criança, jovem e adulto), embora ancoradas no desenvolvimento bio-psíquico dos in-divíduos, não são um fenômeno puramente natural, mas construídas, social e historicamente, insepará-veis do processo de constituição da modernidade, do ponto de vista do que ela implicou em termos de ação voluntária sobre os costumes e os comportamentos, ou seja, naquilo que ela teve de intrinsecamente edu-cativo. (PERALVA, 1997, p. 15)

Cada jovem vem de outros locais da sociedade com educação de outras instituições, como exemplo a familiar. Eles têm histórias de vidas diferentes, sendo que na instituição escolar relacionam-se e interagem para dar sentido ao que produzem e ao que vivenciam em outros espaços, pondo em prática: atitudes, comportamentos, hábi-tos e gostos que não se resumem ao que vivenciam só no processo educativo, na sala de aula. Isto se confi gura nas diversas sociabili-dades construídas no intervalo, com as trocas simbólicas, afetivas, emocionais, culturais e interações sociais.

Para Simmel (1983), a sociedade é movida de inte-rações entre os indivíduos, surgindo essa interação a partir de objetivos e fi nalidades em comum, em uma relação de convívio um com o outro, essas interação com outro que passa de uma forma individual para o coletivo e denominado socialização. Sendo a sociabi-lidade uma forma de socialização, a forma mais livre de viver a vida, livre de todos os conteúdos. Mesmos em encontros por objetivos defi nidos e específi cos, vai existir a socialização e o prazer de estarem uns com os outros reunidos. A forma como este proces-so de socialização se desenvolve, passa a ser a socia-bilidade, que ocorre quando os indivíduos passam a interagir surgindo essa interação sempre a partir de determinados impulsos ou da busca de certas fi nali-dades (GONÇALVES, 2012, p. 3)

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Alguns dos grupos observados optam por estar no mesmo lo-cal quase sempre, tais como o pátio ou salas, transformando esses es-paços em locais de ligações de comprometimento, fi nalidades e jogo de interesses, devido a darem e receberem algo. Os interesses, tais como: trocar um diálogo, um gracejo, sorrisos, dentre tantos outros mecanismos, fazem com que cada grupo construa seus valores, que são socializados nos intervalos. Estas relações, em muitos casos, se estendem para fora dos muros da escola. Confi rmei esse dado ao perguntar para alguns membros dos grupos se eles se encontravam apenas na escola ou em outros locais. Tive como resposta de muitos deles que se encontravam em outros locais, que saíam juntos para ir ao cinema, ao teatro, ao Boulevard do Arco, tomar sorvete, entre outras coisas. De acordo com Carrano (2011, p. 43), “a produção das identidades além de demarcar territórios de sociabilidades e de prá-ticas coletivas, põe em jogo interesses em comum que dão sentido ao ‘estar junto’ e ao ser dos grupos”. Estas sociabilidades tomam lugar na cultura, pois de acordo com o autor citado, “[...] a cultura se ma-nifesta como espaço social privilegiado de práticas, representações, símbolos e rituais” (CARRANO, 2011 p,43).

Voltando aos interesses, estes têm muito a ver com relações de múltiplas dimensões, tais como trocas de conversas que dizem respeito àquilo que os mesmos vivenciam, trocas culturais como participar da mesma banda, ou grupo musical, como é o caso de um grupo de meninas do turno da manhã.

As trocas simbólicas apresentam diversos sentidos. Como exemplo, cito um grupo de meninos e meninas que gostam de es-tar na sala de aula durante o intervalo. Este grupo conversa sobre assuntos diversos, tais como sexo, novelas, fi lmes, e ouvem músicas, de preferência internacionais. Eles sociabilizam gostos, utilizando-se de objetos e construções que a sociedade moderna vem produzindo, como exemplo a utilização das novas tecnologias: celulares e redes virtuais como Facebook e até mesmo a preferência por cantoras in-ternacionais como Britney Spears, Madonna, Rihanna, com músicas de estilo pop, pop rock e dance. Sobre o exposto, Dayrell afi rma que:

Na trajetória de vida desses jovens, a dimensão sim-bólica e expressiva tem sido cada vez mais utilizada como forma de comunicação e de um posicionamen-to diante de si mesmos e da sociedade. A música, a dança, o vídeo, o corpo e seu visual, dentre outras

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formas de expressão, têm sido os mediadores que ar-ticulam jovens que se agregam para trocar ideias, para ouvir um “som”, dançar, dentre outras diferentes for-mas de lazer. (DAYRELL, 2007, p.1109)

No caso aqui pesquisado, o que se pode chamar de lazer tem uma durabilidade diária de 15 minutos. Neste momento, os alunos se utilizam de uma linguagem que tem muito a ver com aquilo que absorvem de outros locais, como, por exemplo, as gírias e expressões, que, pelo que pude observar, contribuem para as peculiaridades ine-rentes aos grupos. Pude constatar isso a partir de uma expressão uti-lizada por um dos integrantes de um grupo que gosta de permanecer na sala de aula durante o intervalo, quando perguntei para o mesmo porque a preferência dele em estar naquele grupo. Ele me respondeu “empolgado” que estava ali porque aquele grupo era a parte “máster”. Ao perguntar o signifi cado da expressão, soube que signifi ca a elite, a parte melhor, opondo-se à “farofa”, que é o resto, a “ralé”. Diante da resposta, todos os outros integrantes riram. Observei, a partir deste momento, que o jovem a quem fi z a pergunta funcionava no grupo como um “líder”, que era responsável por estar à frente de certas con-versas, que em alguns momentos causavam riso, sendo este riso um dos componentes de aproximação entre os mesmos, provocado por atitudes na forma de falar, de agir, de ter determinados gestos.

Os jovens não se negaram a dar informações e trocar diálogo comigo, e se colocaram-se à disposição para falar de seus grupos, das suas relações de amizades, daquilo que mais gostavam de fazer quan-do estavam no intervalo, facilitando bastante o processo da pesquisa.

Uma das questões que me causou inquietação foi saber se es-ses grupos tinham relações de amizades desde anos atrás ou se os mesmos se conheceram depois que vieram para essa escola. No gru-po de uma aluna do terceiro ano do turno da manhã, as relações de sociabilidade e amizades entre os membros acontecem desde o 9º ano. Este grupo é formado por homens e mulheres. Havendo seis in-tegrantes, dois homens e quatro mulheres, que estudam todos juntos no segundo ano, e que têm como um dos mecanismos de aproxima-ção a mesinha de jogos que fi ca no pátio da escola, sobre a qual um dos pertencentes me falou que a mesinha os aproxima porque todos gostavam de jogar.

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Considerações FinaisO que venho comprovando com esta pesquisa e com estudos

feitos é que nas relações sociais e de amizades da juventude que se encontra na contemporaneidade existe uma nova sociabilidade, no-vos valores que merecem um olhar mais atento sobre o que os jovens vêm produzindo.

O cenário em que está inserida essa juventude e seu processo de socialização e consolidação de valores mudou, sendo resultado de todo um processo de reordenação da sociedade, tanto de aparelhos institucionais como também da própria sociedade civil, dos proces-sos políticos, econômicos, das novas tecnologias, dos movimentos sociais dentre outras demandas e mudanças que fazem identifi car transformações que infl uenciam diretamente na juventude atual e sua socialização no mundo contemporâneo, refl etindo também em sua cultura. Portanto,

O jovem compõe um grupo social heterogêneo, que se apresenta à sociedade sob a égide da diversidade e exige de sua escolarização processos de aprendizagem que considerem o conjunto de vínculos que afi nam seu caráter, escolhas, recusas, gostos culturais, con-dutas ética e ideológica diante dos acontecimentos, elementos que corroboram para formar a sua cons-ciência social. (SOUZA, 2002, p.168).

Assim como cada geração teve mecanismos constitutivos de cada contexto social. A sociedade atual coloca os seus para serem vividos, trans-formados, reordenados e estruturados, a partir de construções e experi-mentação de identidades que são elaboradas em constante contato umas com as outras nos grupos em que se identifi cam e têm sua participação.

Seus valores, crenças e simbologias acabam se consolidando ou se re-signifi cando de acordo com transformações de cada con-texto histórico, social, econômico e cultural. Estes grupos têm certa autonomia para criarem e recriarem suas condutas morais, éticas, sociais, grupais, simbologias e aspectos culturais específi cos, sendo necessário da instituição escolar diferentes formas de dialogar para um melhor engaja-mento e desempenho desses jovens na produção de cultura e atividades escolares que os mesmos sintam prazer em executá-las.

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Referências

BROWN, Radcliff e. Apontamentos sobre a relação de brincadei-ra. In: Estrutura e Função nas Sociedades Primitivas. Publicado em África, vol. XIII, pp.133-170, 1979.

DAYRELL, Juarez. A escola “faz” as juventudes? Refl exões em torno da socialização juvenil. Educ. Soc., Campinas, vol. 28, n. 100 - Especial, p. 1105-1128, out. 2007.

______. BATISTA Juliana dos Reis. Módulo Didático: Sociologia da ju-ventude Currículo Básico Comum - Sociologia do Ensino Médio: Centro de Referência Virtual do Professor - SEE-MG / setembro, 2010.

DESLANDES, Suely Ferreira; GOMES, Romeu; MINAYO, Cecília de Souza (Orgs). Pesquisa Social: Teoria Método e Criatividade. 29. Ed-Petrópolis, RJ: Vozes, 2010.

GONÇALVES, Mairla Mara Fernandes; Grupos Juvenis, Lazer e Escola. Laboratório das Juventudes - LAJUS. In: Anais do Primeiro Colóquio Internacional das Juventudes, em Fortaleza-CE, de 05 a 08 de novembro de 2012, p.01-11.

MARTINS,Carlos Henrique dos santos;CARRANO,Paulo césar Ro-drigues. A escola diante das culturas juvenis:reconhecer para dia-logar. Educação, Santa Maria, v.36,n.1.p.43-56, jan-abr.2011.

PERALVA, Angelina. T. O jovem como modelo cultural. In: Revista Brasileira de Educação. n° 5- 6: Juventude e Contemporaneidade, SP: Anped. Maio-dezembro 1997, p. 15-24.

SOUZA, Janice Tirelli ponte; DURAND,Olga celestino. Experiências edu-cativas da juventude:entre a escola e os grupos culturais. Publicado em: Perspectiva-Revista do Centro de Educação Florianópolis, v.20, n. Especial, pp.163-181,jul./dez, 2002.

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ACERTANDO AS HORAS DO MUNDO: OFICINA DE PRODUÇÃO DE RECURSOS DIDÁTICOS NAS AULAS

DE GEOGRAFIA

Simoni Lemos de Assis - Bolsista de Iniciação à Docência do PIBID e acadêmica do curso de Geografi a da Universidade Estadual Vale do Acaraú.Lenilton Francisco de Assis - Professor do Centro de Educação Uni-versidade Federal do Rio Grande do Norte-UFRN (orientador)

IntroduçãoNas últimas décadas, muitas foram as discussões realizadas

acerca do ensino de Geografi a. Entre essas encontramos, por exem-plo, as que dizem respeito aos materiais e metodologias utilizadas, sobretudo aquelas relacionadas aos conteúdos da Cartografi a Esco-lar (ALMEIDA, 2007). Vista como tema desafi ador, a Cartografi a requer estratégias diversifi cadas de ensino que reduzam o grau de abstração e o temor construído por muitos professores e alunos da educação básica, temor esse, vale frisar, que quase sempre é de ordem matemática, e não geográfi ca, pois os mapas continuam aguçando a curiosidade dos alunos sobre os signos ali representados.

Alunos que, nas séries iniciais, não são alfabetizados para o uso da linguagem cartográfi ca geralmente não conseguirão, em momentos posteriores, utilizar mapas para a leitura do lugar e do mundo. E o problema tende a se agravar a partir dos anos terminais do ensino fundamental, quando os conteúdos requerem maior grau de abstração e de domínio de noções espaciais básicas (vizinhança, proximidade, lateralidade, visão oblíqua e vertical, codifi cação de le-gendas etc.) que não foram construídas nos primeiros anos escolares através da confecção de mapas simples do espaço de vivência desses alunos.

Neste sentido, para melhor conhecimento do espaço supra-citado, de acordo com Passini (2012, p. 28), “[...] a passagem desses ‘mapas-desenhos’ para um mapa cartografi camente sistematizado é o caminho metodológico da alfabetização cartográfi ca”. Quando esse “caminho” não é bem percorrido, resta ao professor retomar alguns

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preceitos da alfabetização cartográfi ca para avançar na aprendiza-gem geográfi ca.

Para tanto, apostamos no uso e na produção de recursos di-dáticos para encurtar essa trajetória, pois tais instrumentos podem associar o lúdico e a criatividade para a ressignifi cação dos saberes e fazeres escolares.

Neste quesito, o presente relato apresenta algumas experiên-cias vivenciadas na ofi cina “Acertando as horas do mundo”, realizada na Escola de Ensino Médio Ministro Jarbas Passarinho, em Sobral--CE, nas atividades do Programa de Iniciação à Docência Experiên-cias Inovadoras entre Escolas e Universidade – PIBID UVA 2011, subprojeto Geografi a. A escolha do tema não foi casual, baseada em pesquisa prévia com professores de escolas públicas de Sobral, que apontaram a cartografi a como um dos temas mais desafi adores, des-tacando dentre os seus conteúdos os fusos horários.

A preparação da ofi cina foi iniciada com uma pesquisa bi-bliográfi ca para elaborar um diagnóstico preliminar do ensino da Cartografi a na Educação Básica, baseada em autores como Duarte (2002); Boligian; Almeida (2007); Simielli (2007). Nesta revisão da literatura, observamos os conteúdos prescritos e as estratégias me-todológicas indicadas, tanto nos livros didáticos, quanto nos artigos acadêmicos.

A partir destes pressupostos, conversamos com os professores de Geografi a da escola supracitada para conhecer a metodologia, os recursos adotados e sua avaliação sobre a aprendizagem dos alunos quanto aos conteúdos de cartografi a.

Feito esse diagnóstico, realizamos uma breve enquete com alunos do 1º ano do ensino médio sobre o tema fusos horários. As respostas nos estimularam a aceitar o desafi o de pensar estratégias de ensino-aprendizagem que pudessem reduzir o grau de abstração e as “difi culdades” relatadas por professores e alunos.

Passamos, então, a vivenciar o cotidiano da escola e a partici-par, com frequência, das reuniões de planejamento. As experiências adquiridas nestes encontros foram inúmeras. Alguns professores fi caram reticentes com a ofi cina proposta. Outros logo acataram e deram sugestões para pensar a ação didática. A ofi cina foi baseada na construção dos seguintes materiais: o globo terrestre e seus fusos,

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as maquetes dos fusos adotados no Brasil, nas quais os alunos utili-zaram materiais variados para codifi car as faixas de fuso horários. O método do “aprender-fazendo” mostrou-se efi caz, pois associou a criatividade e o lúdico à aprendizagem.

Cartografi a e fusos horários no ensino de Geografi aÉ possível perceber que o estudo da linguagem cartográfi ca

vem, cada vez mais, reafi rmando sua importância desde o início da escolaridade. Ele contribui não apenas para que os alunos compreen-dam os mapas, mas também para desenvolver capacidades relativas à representação do espaço. “Os alunos precisam ser preparados para construir conhecimentos fundamentais sobre essa linguagem, como pessoas que representam e codifi cam o espaço e como leitores dos fenômenos sociais” (FRANCISCHETT, 2004, p. 124).

A Cartografi a, na geografi a escolar, aparece como um comple-mento indispensável para a representação, análise e explicação dos fenômenos observados na relação sociedade-natureza que resulta na produção do espaço geográfi co. Os mapas, cartas, gráfi cos, tabelas, maquetes e croquis são instrumentos cada vez mais necessários na análise da realidade espacial. Sobre essa questão Cavalcanti (2002, p. 96) assinala:

O trabalho com diferentes formas de representação gráfi ca comuns na linguagem geográfi ca deve ser to-mado como um procedimento de grande relevância nos estudos da Geografi a, em seus vários momen-tos. É um procedimento que se orienta para uma das metas da Geografi a no ensino, que é a habilidade de orientação, de localização e de representação dos alu-nos e de aspectos da realidade socioespacial por eles estudada.

Percebemos, então, a grande relevância que a Cartografi a e as representações gráfi cas têm no ensino da Geografi a, permitindo a educandos e professores a decodifi cação dos fenômenos e da reali-dade socioespacial observada.

Contudo, constatamos nas entrevistas e observações em sala, que os professores e alunos têm muita difi culdade no ensino-apren-dizagem dos conteúdos cartográfi cos. A Cartografi a é vista como

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algo difícil de explicar e compreender. Muitos professores trabalham o conteúdo de forma resumida, fazendo a descrição apenas do que está no livro didático, sem interpretar e explorar as formas de repre-sentação dos fenômenos estudados.

No debate das difi culdades enfrentadas por professores e alu-nos no ensino-aprendizagem dos conteúdos cartográfi cos ganham destaque os fusos horários (zonas horárias). A grande difi culdade enfrentada pelo professor de Geografi a no ensino dos fusos horários é o fato de ser uma convenção humana, algo abstrato, que requer a imaginação e a crença da sua existência.

Os fusos horários foram estabelecidos através de uma reunião composta por representantes de 25 países em Washington, capital estadunidense, em 1884. Nessa ocasião, foi realizada uma divisão do mundo em 24 fusos horários distintos. A metodologia utilizada partiu do princípio de que são gastos, aproximadamente, 24 horas (23 horas, 56 minutos e 4 segundos) para que a terra realize o mo-vimento de rotação, ou seja, que gire em torno de seu próprio eixo, realizando um movimento de 360°. Em uma hora a terra se desloca 15°. Devido a este movimento, todos os meridianos (semicircunfe-rências de círculos máximos, cujas extremidades são os dois polos geográfi cos da terra) passam pela frente do Sol em um determinado momento, voltando a fazê-lo somente depois de 24 horas (DUARTE, 2002).

Outro fator relevante para os fusos é quanto à forma arredon-dada da terra, que possui leve achatamento nos polos (geoide), o qual combinado ao movimento de rotação faz com que progressivamente o Sol ilumine diferentes áreas da superfície terrestre, resultando na sucessão de dias e noites.

O fuso referencial para determinação das horas é o de Green-wich, que atravessa a Grã-Bretanha, além de cortar o extremo oeste da Europa e da África. A hora determinada pelo fuso de Greenwich recebe o nome de GMT (Tempo Médio Greenwich). Na extremida-de oposta ao meridiano 0º, tem o meridiano 180º ou Linha Inter-nacional de Data (LID), que é a coordenada geográfi ca responsável pela mudança da data. Assim, de leste para oeste perde-se um dia, e de oeste para leste ganha-se um dia no calendário. A maior parte da Linha Internacional da Data está localizada no Oceano Pacífi co,

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mas também abrange territórios, como Ilha Wrangel, Chukotka, na Rússia, oeste do Alasca, nos Estados Unidos, Oceano Antártico, dependência de Ross na Nova Zelândia e Antártida. A proposta da localização ocorreu a partir da análise que defende que as pessoas poderiam “voltar ou adiantar um dia”, o que geraria alguns transtor-nos em escala social e comercial. Muitas polêmicas foram criadas, inclusive com a Igreja. Mas, rapidamente todos compreenderam e aceitaram a regra.

Se adotassem rigorosamente os limites dos fusos estabelecidos mundialmente, países como Rússia, Brasil, China e Canadá enfren-tariam muitos problemas práticos, pois muitos dos seus estados e cidades seriam divididos por dois ou mais fusos. Para evitar pro-blemas deste tipo, o Brasil adaptou seus fusos horários, fazendo-os na medida do possível coincidir com os limites estaduais. Em 24 de abril de 2008, a Lei Federal nº 11.662 reduziu a quantidade de fusos horários do Brasil, de quatro para três, dos quais dois abrangiam o território continental e o outro as Ilhas Penedos de São Pedro e São Paulo, Atol das Rocas, Fernando de Noronha, Trindade e Martin Vaz. Sobre o assunto, Duarte (2002, p.19) ressalta:

É importante lembrar que existem os fusos teóricos e os práticos. Os primeiros seguem exatamente o traça-do dos meridianos. No entanto, uma série de conve-niências locais leva a adaptações dos fusos, fazendo com que estes não coincidam com os meridianos e se apresentem, em certos casos, bastante distorcidos.

Percebemos o grau de complexidade que este conteúdo apre-senta, tornando-se ainda maior quando trabalhado na Geogra-fi a Escolar. Os fusos horários são tratados no sexto ano do ensino fundamental II, o qual abriga alunos com 12 anos, em média. Este tema é revisto no primeiro ano do ensino médio, porém, geralmen-te, com predomínio de cálculos de tempo de viagens, de partidas e chegadas em países onde as horas são diferentes. Os alunos fi cam como “máquinas”, decoram, calculam, fazem exercícios, mas sem a consciência do que estão fazendo, do por que é assim, de como foi convencionado.

Todavia, os cálculos não devem ser abolidos. Eles são impor-tantes e desafi adores no estudo dos fusos horários, pois estimulam a

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problematização de situações reais conhecidas pelos alunos, como o ajuste dos relógios em viagens a outros países ou nos horários dife-rentes de jogos realizados fora do país e transmitidos pela TV.

Acreditamos que estes cálculos devem ser complementados com estratégias de ensino-aprendizagem que reduzam o grau de abs-tração para entendimento das convenções que deram origem ao sis-tema de fusos horários. E isso pode ser perfeitamente atingido com o uso e a construção de materiais didáticos, como veremos a seguir.

Do abstrato ao concreto: ofi cina de ensino-aprendizagem dos fusos horários

A professora, quando indagada sobre os desafi os do ensino dos fusos horários, respondeu:

Uma das grandes difi culdades em ensinar os fusos ho-rários, é que é uma convenção humana, de difícil dis-cussão por não ter materiais capazes de suprir e con-tribuir com o ensino dos mesmos, e também a pouca importância dada aos mesmos no livro didático, prin-cipalmente no que se refere aos cálculos, aspecto que assumo sentir difi culdade.

Diante disso, desenvolvemos uma ofi cina sobre produção de materiais didáticos para o ensino dos fusos horários. Primeiro, pro-pomos a construção dos seguintes materiais: o globo terrestre e seus fusos, as maquetes dos fusos convencionais e daqueles adotados no Brasil. A ofi cina foi realizada com os alunos do 1º ano do ensino mé-dio da Escola Ministro Jarbas Passarinho, em Sobral-CE.

Em seguida, explicamos o procedimento de construção dos recursos didáticos, os materiais que seriam utilizados, os recurss a serem construídos, o objetivo e os resultados esperados. Na sequên-cia, começamos a construção fazendo uso de material de baixo custo e de fácil acesso para o professor e os alunos.

A seguir, apresentamos as etapas da construção de cada material:

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O globo terrestre e seus fusosMaterial utilizado: 2 bolas de isopor de 10 cm, 1 folha de EVA,

fi ta métrica para medir o diâmetro do isopor, uma caixa de tinta guache com cores diferentes, pincéis, palitos de churrasco, folha de papel A4, régua e uma folha de isopor.

1º passo: Dividimos a sala em seis equipes de sete alunos, dei-xando-os à vontade para formar os grupos. Entregamos três globos para as seis equipes, deixando claro que teríamos que trabalhar com o que fosse possível. Eles observaram o globo e disseram a partir da explicação teórica o que perceberam em relação aos fusos horários.

2º passo: Pedimos que desenhassem as coordenadas geográ-fi cas no isopor, obedecendo a mesma distância, destacando o me-ridiano de Greenwich e a linha internacional de mudança da data (antimeridiano).

3º passo: Cada grupo deveria desenhar o mapa-múndi no iso-por, através da observação no globo, obedecendo às faixas de fusos de acordo com o que está no globo original, para que a construção do material fosse a mais verídica possível, facilitando o entendimen-to da turma em relação ao conteúdo.

Fig.1: Alunos construindo o globo terrestre

Fig.2: Globo terrestre construído pelos alunos

Fonte: Arquivo pessoal Fonte: Arquivo pessoal

Durante a confecção da maquete do globo, os alunos identifi -cavam os dois principais movimentos do planeta, principalmente o de rotação. Em seguida, enquanto desenhavam os paralelos e meri-dianos, discutíamos a importância das coordenadas geográfi cas.

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Ao partir da esfera do isopor como se fosse a terra, sem horas, sem linhas imaginárias, os alunos montaram o sistema de coordena-das geográfi cas que lhes permitiu a compreensão do que elas exer-cem nos fusos horários, mas também a noção de latitude, longitude e orientação.

Na sequência, quando desenhavam e cobriam os continentes com EVA, os mesmos observavam a questão da escala e percebiam que mesmo com uma diferença enorme da realidade para o mate-rial que estava sendo confeccionado, era possível obedecer, de forma considerável, às faixas de fusos horários da convenção real. Impor-tante ressaltar que, durante todo processo de construção do recurso, os educandos descobriam e estabeleciam relações entre a teoria e a prática, passando a compreender as diferentes horas no mundo.

Maquete do Brasil e seus fusos horáriosMaterial utilizado: uma folha de isopor, mapa original do Bra-

sil, diversos tipos de texturas (a critério do professor), massa de vi-draceiro, folha de papel A4, estiletes, velas, fósforos, pincéis, tintas e cola de isopor.

A opção em trabalhar com diferentes texturas também é uma forma de estimular a criatividade e a mudança na estética das ma-quetes convencionais, o que pode ser atingido com uso de materiais como: areia, vegetais, EVA, alfi netes, sementes, papel crepom, papel alumínio etc. Isso permite aos educandos tornar o mapa mais auto-ral, mais signifi cativo, indo além das cores tradicionais que, muitas vezes, “poluem” com excesso de informação o mapa a ser decodifi ca-do pelos alunos. Nesse sentido, Passini (2012, p. 19) também alerta: “[...]os mapas murais e de atlas são complexos para a fase alfabetiza-dora, pois contêm muitas informações, símbolos complexos e gene-ralizações que o leitor iniciante não consegue signifi car”.

Na ofi cina, os alunos tiveram a oportunidade de pensar e es-colher o que seria utilizado como textura para preencher as faixas de fuso horário. Eles entenderam que além de decodifi car, também tinham a capacidade de codifi car, de dar novas cores, formas e ilus-trações aos mapas. Esse foi o primeiro passo para que, na sequência, lidassem com os cálculos de fuso horário de forma prazerosa.

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Estávamos cônscios de que não seriam os cálculos que permi-tiriam aos alunos entender os fusos horários, suas divisões, seus sig-nifi cados e nem os mapas e exercícios dos atlas prontos para colorir. Passini (2012, p. 17), novamente, nos advertia: “Não são as cópias de mapas nem as atividades de colorir rios que possibilitarão à criança desenvolver habilidades para ‘entrar’ no mapa, ler e conseguir extrair informações para interpretar a sua espacialidade, mas, sim, sua capa-cidade de mapear”.

Por isso, a atividade de mapear as faixas de fuso horário fez os alunos perceberem os vários processos e elementos cartográfi cos que infl uenciam nas diferentes horas do mundo.

A construção da maquete do Brasil e seus fusos horários fo-ram realizados em três passos:

1º passo: Discutimos com os alunos sobre os fusos horários do Brasil. Explicamos o motivo de existirem três fusos horários em nos-so país, como são divididos, quando passou a existir essa diferença de horas, quais ações e interesses políticos foram e são considerados para essa defi nição.

2º passo: Pedimos que os grupos desenhassem no isopor ou no EVA o mapa do Brasil com escala defi nida, considerando seus fu-sos horários e suas divisões. Os alunos construíram duas maquetes, uma mostrando a convenção padrão e outra mostrando a divisão adotada pelo país, considerando as fronteiras estaduais. A maque-te que considera a convenção padrão foi construída com diferentes texturas no mapa do Brasil feito com EVA, e a outra maquete confec-cionada com massa de vidraceiro e isopor, com alturas diferentes de acordo com os fusos adotados no País.

3º passo: Discutimos sobre as difi culdades dos alunos em compreender a diferença dos fusos horários, tanto no mundo, quan-to no Brasil.

À medida que os alunos construíam as linhas, percebiam que estas recortavam territórios de países e se perguntavam: como podia um país ou cidade ser “cortada” por mais de um fuso? Como teriam os mesmos horários? Como foram estabelecidas e adotadas as dife-rentes horas nos países, regiões e cidades? Questionamentos comuns, durante e após a confecção dos recursos, mostraram que os alunos estabeleciam relação entre teoria e prática, o que antes observavam

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apenas no livro didático, no qual desenvolviam atividades de pintar ou respondiam questionários. Com a ofi cina descobriam que o co-nhecimento era, para além de decorar, calcular.

Figura 1: Alunos confeccionando a maquete

Fonte: Arquivo pessoal

Figura 2: Maquete construída pelos alunos

Fonte: Arquivo pessoal

A partir da percepção dos alunos, analisamos e comprovamos o potencial dos recursos construídos e o quanto é relevante fazer links da teoria apreendida na academia com a prática na escola. Ava-liamos que, embora o livro didático permaneça como importante fonte de apoio para o professor, e sobretudo para o aluno, não pode ser o único meio ou recurso para se trabalhar Cartografi a nas aulas de Geografi a.

Na culminância da ofi cina, ainda fi zemos alguns jogos rápi-dos de assimilação do conteúdo trabalhado. Com alfi netes, os alu-nos marcaram pontos no globo e no mapa do Brasil e criaram um jogo da velha, em que o jogador só poderia avançar se acertasse os cálculos para assimilar os conhecimentos sobre latitude e longitude, localização, pontos cardeais e principalmente fusos horários. Tudo foi feito a partir dos materiais confeccionados que se tornaram ainda mais signifi cativos e atraentes.

Entre os outros jogos que realizamos com os alunos, estava GEOJAPRE (jogo de afi rmações, perguntas, respostas e explica-ções), em paralelo com GEOQABE (quebra-cabeça), que incluíram

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os conteúdos trabalhados na ofi cina. Durante a culminância e reali-zação dos jogos, percebemos a euforia dos alunos, o quanto fi cavam apreensivos na tentativa de acertar as questões colocadas. A atenção às respostas dos colegas permitiu aos mesmos obter mais conheci-mentos sobre os fusos horários e outros elementos cartográfi cos. A participação foi unânime e intensa, os alunos se mostravam cada vez mais interessados e envolvidos com as atividades propostas.

Obtivemos com esses jogos bons resultados acerca do conhe-cimento e apreensão dos alunos em relação às diferentes horas no mundo e também de outros conceitos que fi zeram parte de nossas discussões no desenvolvimento da ofi cina. Comprovamos que os re-cursos lúdicos produzidos por aluno e professor são preponderantes nas aulas de Geografi a, já que além de despertar o interesse dos alu-nos podem garantir conhecimentos.

Considerações fi naisAs discussões e experiências aqui relatadas revelam a impor-

tância da construção de materiais didáticos para o ensino-aprendiza-gem da Geografi a, especifi camente dos fusos horários.

O papel do professor no ensino de Geografi a está em discutir, analisar e avaliar conteúdos, através de metodologias capazes de ins-tigar o educando a construir seu conhecimento, fazendo uma “pon-te” entre o conhecimento científi co e o saber cotidiano, proporcio-nando analisar criticamente os fenômenos que ocorrem no espaço geográfi co.

Ressaltamos, portanto, a partir do supracitado, a importância da relação teoria-prática no estudo dos fusos horários, visualizada, principalmente, através da confecção de materiais didáticos que con-tribuam positivamente no processo de construção do conhecimento cartográfi co/geográfi co.

Reforçamos ainda que estas se confi guram como estratégias simples, rápidas e baratas, podem facilmente ser feitas em sala de aula, pois os materiais utilizados são encontrados em pequenos co-mércios e papelarias e os procedimentos da ofi cina são fáceis e obje-tivos, podendo ser realizados em duas ou três aulas.

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Referências

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BOLIGIAN, Levon; ALVES, Andressa. Geografi a espaço e vivência - Ensino Médio. São Paulo: Atual, 2004.

CAVALCANTI, Lana de Souza. Geografi a e práticas de ensino. Goiânia: Alternativa, 2002.

DUARTE, Paulo Araújo. Fundamentos de Cartografi a. 2. ed. Flo-rianópolis: EdUFSC, 2002.

FRANCISCHETT, M. N. A cartografi a no ensino da geografi a: abordagens metodológicas para o entendimento da representação e da imagem. Cascavel: EDUNIOESTE, 2009.

PASSINI, Elza Yasuko. Alfabetização cartográfi ca e a aprendiza-gem de geografi a. São Paulo: Cortez, 2012.

SIMIELLI, Maria Elena Ramos. Cartografi a no ensino fundamental e médio. In: CARLOS, Ana Fani Alessandri (Org.). A Geografi a na sala de aula. São Paulo: Contexto, 2007, cap. 10, p.92-108.

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O TEMA DO EFEITO ESTUFA E PRODUÇÃO TEXTUAL: PREDIÇÃO E CONFIRMAÇÃO EM DINÂMICAS PARA A

CONSTRUÇÃO DO CONTEÚDO DO TEXTO

Cassiana Ximenes Carneiro – Bolsista de Iniciação à Docência do PIBID e Acadêmica do Curso de Letras da Universidade Estadual Vale do Acaraú. Maria Soares de Araújo – Mestre. Professora da Universidade Esta-dual Vale do Acaraú – UVA (Orientadora).

IntroduçãoEste estudo compreende um relato de experiência com as ati-

vidades do semestre de 2013.1, referentes à aplicação do projeto O problema da escrita e a escrita dos problemas, desenvolvido na escola Ministro Jarbas Passarinho pelos bolsistas do subprojeto de Letras da Universidade Estadual Vale do Acaraú – UVA, coordena-do pelo Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência – PIBID 2009, sob a supervisão da professora Patrícia Alves, com coordenação de área realizada pela professora Maria Soares, e coor-denação institucional do professor Glaudenir Brasil.

Neste estudo expomos as experiências obtidas nas atividades voltadas para o desenvolvimento de textos de alunos do ensino mé-dio, tal como a dissertação e discussões de temáticas sociais que vi-ram tema das redações. No decorrer do desenvolvimento do projeto, percebemos algumas difi culdades dos alunos ao desenvolverem seus textos, por causa da limitação de informações adquiridas sobre de-terminados assuntos e pela difi culdade de organizarem suas ideias na forma da escrita padrão.

Com o intuito de ajudá-los a resolver essa questão, achamos necessário utilizar alguns critérios que prendessem a atenção deles. Assim, utilizamos os mecanismos da interdisciplinaridade, por meio da contextualização temática efeito estufa, em dinâmica de produção de texto, para que, através da interação didática com os alunos e da natureza interdisciplinar entre efeito estufa e redação, fosse possível desenvolver um trabalho em grupo que visasse à aquisição de infor-mações e de conhecimento para o texto.

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O recurso utilizado para a absorção das informações foi a dis-cussão por meio da predição e confi rmação das informações, que se deteve em torno do tema efeito estufa e, para que fossem observados os resultados, em outro momento, foi desenvolvido um texto dis-sertativo a respeito do assunto em foco; em seguida, realizamos o processo de revisão dos textos com os alunos.

O estudo se apoia nas pesquisas de autores como Solé (1998), Cordiolli (2002) e Marcuschi (2008), os quais, no referencial utiliza-do neste trabalho, discorrem sobre estratégias de ensino de leitura, ensino interdisciplinar e produção de texto.

ObjetivoEste estudo tem o objetivo de explicar uma prática de ensino

com dinâmicas com o texto, dentre outras práticas executadas na escola, observando a habilidade e a competência de alunos do ensino médio ao elaborarem textos dissertativos, tendo como ponto de par-tida a organização das ideias através das informações e discussões em seu entorno. Para tal fi m será proposta a prática de métodos di-dáticos interativos e interdisciplinares com o meio ambiente, ou com outras temáticas, e com a língua portuguesa.

Metodologia da Intervenção DidáticaO projeto O problema da escrita e a escrita dos problemas,

realizado na Escola Ministro Jarbas Passarinho, no período de março a junho de 2013, passou por diversas etapas. Abaixo, informações retiradas do diár io de campo.

7 de março: primeiro encontro. 37 alunos presentes. Foi reali-zada uma dinâmica de abertura e, em seguida, expusemos Gêneros Textuais: conceito e exemplos em slides. Em seguida, focamos em Dissertação; o que é dissertação; como fazer uma boa dissertação; introdução; desenvolvimento; conclusão. Para fi nalizar, analisamos duas redações; uma boa e outra ruim. Lemos a redação considerada boa para toda a turma e reescrevemos, para eles, a redação conside-rada ruim.

14 de março: segundo encontro. 30 alunos presentes. Inicia-mos com uma dinâmica e, em seguida, expusemos o tema para nossa

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primeira produção textual: “Televisão: instrumento de lazer e cultu-ra ou de alienação?” Tendo exposto o tema, iniciamos uma discussão com os alunos. Pedimos que, em um pedaço de papel, cada aluno escrevesse uma frase a respeito do tema. Usamos a frase “A televisão é muito importante, mas alienadora”. Discutimos como seria uma frase ideal para uma informação objetiva. Mostramos que se uma frase gera uma confusão no leitor, ela não é uma frase ideal, pois gerou dúvida. “A televisão é muito importante, mas alienadora.” Por quê? Explicamos que, se ela já vier com a resposta, se tornará mais compreensiva para o leitor: “A televisão é muito importante, mas alienadora, pois transforma a cultura.” Dessa forma, a frase está me-lhor elaborada. Depois de discussões sobre frases bem construídas, pedimos aos alunos que desenvolvessem seus textos.

21 de março: terceiro encontro. 30 alunos presentes. Trabalha-mos a obra de Lima Barreto Triste fi m de Policarpo Quaresma, pois é uma das obras que poderá ser abordada na prova do vestibular da UVA. Lemos, com a ajuda dos alunos, o resumo da obra. Discutimos as questões políticas e sociais de acordo com a obra. Em seguida, os alunos responderam questões de prova de vestibular a respeito da obra. Tivemos a correção em seguida. Logo depois, discutimos sobre as redações que produziram na aula anterior. Discutimos os proble-mas mais comuns entre as suas produções; impessoalidade, concor-dância verbal e nominal, coerência e coesão, ausência de introdução e conclusão. Repetimos o que foi dito no primeiro dia do encontro; a parte teórica da dissertação. Entregamos aos alunos material xero-grafado com informações sobre como fazer dissertação. Usamos os problemas nas redações para discutir e fazer as correções. No fi m do encontro, entregamos as redações, corrigidas.

4 de abril: quarto encontro. 30 alunos presentes. Exibimos o fi lme da obra Triste fi m de Policarpo Quaresma.

11 de abril: quinto encontro. 30 alunos presentes. Iniciamos com a exposição de forma e grafi a de algumas palavras e expres-sões. Usamos slides com as explicações e exemplos. Analisamos a aplicação do mas/mais; onde/aonde; que/quê; mal/mau; ao encon-tro de/de encontro a; afi m/a fi m; demais/de mais; senão/se não; na medida em que/à medida que; porque/por que; porquê/por quê. Em seguida, trabalhamos uma nova produção textual. Desenvolvemos

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uma discussão, usando as imagens propostas pelo projeto; as ima-gens que mostram a evolução tecnológica no decorrer de cem anos. A ideia era instigar os alunos à análise crítica individual das imagens por meio da oralidade. Expusemos cinco imagens. Para cada ima-gem uma análise e assim desenvolvemos uma discussão dos fatos. As discussões se estenderam e, ao fi nal do encontro, pedimos que os alunos desenvolvessem uma redação sobre o tema discutido. Dei-xamos o tema livre para que eles escrevessem sobre o com que eles mais se identifi caram dentro do assunto, porém, para aqueles que não quisessem desenvolver seu próprio tema, propusemos um: “O meu mundo é bem diferente do mundo dos meus bisavós”. O tem-po não foi sufi ciente para os alunos concluírem as redações em sala, então pedimos que eles fi zessem em casa e trouxessem no próximo encontro.

18 de abril: sexto encontro. 21 alunos presentes. Cobramos as redações que eles deveriam ter produzido em casa. Ninguém havia feito. Então, pusemos no Data show as imagens da aula anterior e relembramos o assunto discutido, pedimos que eles desenvolvessem as redações naquele momento. Auxiliamos os alunos no decorrer do desenvolvimento de seus textos (a aula toda girou em torno da pro-dução desse texto). Levamos as redações para serem corrigidas em casa, depois devolvemos os textos revisados com comentários.

25 de abril: sétimo encontro. 20 alunos presentes. Na aula an-terior, pretendíamos passar um exercício sobre as formas e grafi as das palavras. Porém, como os alunos não fi zeram as redações em casa e concluímos que o desenvolvimento dos textos era mais impor-tante, deixamos o exercício para este encontro. Exibimos novamente os slides sobre as formas e grafi as das palavras. Fizemos uma breve revisão sobre o que tínhamos explicado no encontro passado e dis-tribuímos os exercícios para que os alunos resolvessem. Depois de um tempo determinado para a resolução do exercício, fi zemos a cor-reção junto com os alunos. As questões que mais causaram dúvidas foram as com o uso dos “porquês”; então aproveitamos para reforçar as explicações ao seu entorno. Também expusemos questões sobre palavras homônimas e parônimas. Depois da correção dos exercí-cios, entregamos as redações corrigidas aos alunos. Cada instrutor pibidiano fi cou com uma quantidade “X” de redações, que entregou

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pessoalmente ao autor e conversou com cada um deles individual-mente sobre as falhas de seu texto e como poderiam melhorar.

2 de maio: oitavo encontro. 20 alunos presentes. Expusemos a obra O Missionário, de Inglês de Souza. Levamos o resumo da obra, que foi lido e discutido. Em seguida, com slides, expusemos as ca-racterísticas da obra; gênero textual; escola literária; sobre o autor. Discutimos sobre o naturalismo e como o naturalismo está inseri-do na obra O Missionário. Discutimos os aspectos sociais e clericais dentro da obra; sobre a condição humana do Padre Antônio de Mo-raes e suas necessidades de homem; sobre a impunidade que ocorre na trama; as mentiras e a camufl agem das ações dos personagens, principalmente do protagonista. Por fi m, pedimos que os alunos de-senvolvessem um artigo de opinião sobre a obra. Levamos os artigos de opinião para ler em casa, revisamos e devolvemos com comentá-rios e sugestões.

9 de maio: nono encontro. 20 alunos presentes. Levamos para os alunos exercício sobre a obra O Missionário. O exercício tinha o mesmo modelo da prova do vestibular da UVA, contendo um peque-no trecho da obra. Lemos o trecho da obra e as questões do exercício e demos um tempo para que eles resolvessem. Em seguida corrigi-mos as questões junto com os alunos e comentamos as respostas. De acordo com uma questão do exercício, aproveitamos a oportunidade para conceituar e exemplifi car metáfora, perífrase, metonímia e eu-femismo. Analisamos o vocabulário inserido no trecho da obra e no exercício como: paquete, roupeta, carcamano, irascível e verborrági-co. No fi nal do encontro, os bolsistas (Cristóvão, Jonas e Cassiana) informaram aos alunos a programação para os próximos encontros do mês.

16 de maio: Os pibidianos (Cassiana, Cristóvão, José Gomes, Conceição, Vanábia, Ana Patrícia e Paulo Ricardo) se encontraram na escola para produzir o jornal. No jornal, eram publicados trechos das melhores redações e do artigo de opinião.

23 de maio: décimo encontro. 20 alunos presentes. Desenvol-vemos a dinâmica “Predição e Confi rmação” com o tema “Que me-didas devem ser tomadas para diminuir o efeito estufa?” Dividimos a sala em dois grupos. Iniciamos com a exposição da música “Pose – Engenheiros do Hawaii” com o som acompanhado pela letra da

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música no data show. A música é uma crítica irônica que trata da situação ambiental. Explicamos como se desenvolvia a dinâmica e informamos que o assunto seria o tema da redação do concurso re-dacional que ocorrerá no dia 6 de junho. Na dinâmica, tínhamos oito tarjetas, contendo afi rmações a respeito de medidas que ajudam a manter o efeito estufa equilibrado e mais oito tarjetas com a explica-ção para cada afi rmação. O assunto foi debatido por meio do sorteio das tarjetas contendo as afi rmações. Um grupo retirava uma tarjeta por meio de sorteio e o grupo adversário era desafi ado a explicar o porquê daquela afi rmação. Assim, o debate, que foi extremamente dinâmico, ultrapassou em meia hora o horário normal para as nossas atividades, mas ninguém reclamou, tamanha era a empolgação dos alunos. As afi rmações debatidas em sala foram: as fábricas devem ter fi ltros nas chaminés; usar bicicleta e transporte coletivo para se loco-mover; substituir lâmpadas incandescentes por fl uorescentes; evitar consumir produtos em spray e que venham embalados em isopor; plantar árvores nativas da região no quintal de sua casa; dar pre-ferência a carros a álcool; consumir menos carne bovina e suína; o lixo deve ser reciclado para evitar os aterros e lixões. As perguntas giravam em torno das respostas.

6 de junho: décimo primeiro encontro. 20 alunos presentes. Dia do Concurso Redacional. Os alunos produziram as redações que concorrerão à premiação das três melhores. O tema abordado foi o efeito estufa. Os alunos se empenharam bastante. Pediram ajuda quando tiveram dúvidas. Por fi m, todos concluíram seus textos, que recolhemos para a correção e seleção das três melhores. No último encontro do semestre, dia 20 de junho, décimo terceiro encontro, houve premiação dos alunos que obtiveram as três melhores reda-ções. Primeiro lugar: Rebeca Maria Aguiar de Paula; prêmio: um pendrive 8G. Segundo lugar: Sávio Amâncio Moura Costa; prêmio: Um cartão de memória. Terceiro lugar: Rita Andréia de Sousa; prê-mio: uma caixa de chocolate. Sorteamos também uma agenda ofer-tada pela coordenadora Patrícia Alves. Fizemos uma pequena come-moração, com bolo e refrigerante, para encerrar nossos encontros. Os alunos insistiam para continuarmos com as dinâmicas e com o curso de redação no semestre de 2013.2.

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A dinâmica “predição e confi rmação” teve caráter de ofi cina, com foco no tema “Que medidas devem ser tomadas para diminuir o efeito estufa?” A discussão teve propósitos de competição para en-volver todo o grupo na participação. A sala foi dividida em dois gru-pos; o grupo “A” e o grupo “B”.

A dinâmica é bem simples: do texto da bióloga Louredo: “Que medidas devem ser tomadas para diminuir o efeito estufa?” Disponível em http://explicatudo.com/como-evitar-o-efeito-estufa#ixzz-2S6O9zBHR. Fizemos a coleta de oito procedimentos afi rmativos que ajudam a manter o efeito estufa equilibrado, e outras oito informa-ções que explicam as respectivas afi rmações. As oito afi rmações que continham procedimentos favoráveis ao efeito estufa foram escritos em oito tarjetas de cartolina. As oito confi rmações que explicavam os procedimentos foram escritos em outras oito tarjetas e guardadas separadamente.

A seleção das tarjetas contendo as afi rmações seria feita atra-vés do sorteio das mesmas. A equipe que, por meio de sorteio, reti-rava a tarjeta com uma afi rmação, leria o procedimento ali escrito e desafi aria o grupo adversário a explicar o porquê daquela afi rmação, como aquele procedimento ajudaria a manter o efeito estufa equili-brado. Todos os componentes da equipe desafi ada poderiam contri-buir para explicar as causas, e depois de todos os argumentos serem expostos, era conferido, com a tarjeta correspondente, se os argu-mentos da equipe estavam de acordo com as informações científi cas sobre o efeito estufa. Se a resposta da equipe estivesse de acordo com as informações científi cas, então marcaria um ponto.

Depois, seria a vez de a mesma desafi ar seu desafi ador. Dessa forma, com a leitura da confi rmação científi ca, os alunos tinham a oportunidade de confi rmar suas suposições e complementar as in-formações que já traziam consigo a respeito do assunto discutido. Os alunos que não sabiam a resposta tiveram a oportunidade de ouvir dos colegas que sabiam, e assim houve uma troca de informações de igual para igual, tendo um apoio científi co para complementar. Dessa maneira, todos os alunos ouviram o que estava sendo dito sem dispersar; afi nal, numa competição precisamos estar atentos. O pro-tagonista da ação é inteiramente o aluno. Os instrutores ali presentes

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são apenas mediadores. Essa é a vez de ouvir a voz do aluno. É a vez de eles dizerem o que sabem. As afi rmações discutidas foram:

TARJETA 1 (AFIRMAÇÃO)Substituir lâmpada s incandescentes por fl uorescentes.TARJETA 1 (CONFIRMAÇÃO)As lâmpadas fl uorescentes consomem menos energia, assim, produ-zindo menos energia, produz-se menos CO2.TARJETA 2 (AFIRMAÇÃO)Usar bicicleta e transporte coletivo para se locomover.TARJETA 2 (CONFIRMAÇÃO)Com o uso do transporte coletivo diminui-se a quantidade de auto-móveis nas ruas, assim, também a quantidade de gás carbônico.TARJETA 3 (AFIRMAÇÃO)Consumir menos carne bovina e suína.TARJETA 3 (CONFIRMAÇÃO)As carnes bovinas e suínas vêm de animais que liberam dejetos e ruminação emitindo grande quantidade de gás metano.TARJETA 4 (AFIRMAÇÃO)Plantar árvores nativas da região no quintal de sua casa.TARJETA 4 (CONFIRMAÇÃO)As árvores mantêm a fauna e reduz o aquecimento global, pois as árvores eliminam o CO2 e liberam O2.TARJETA 5 (AFIRMAÇÃO)O lixo deve ser reciclado para evitar os aterros e lixões.TARJETA 5 (CONFIRMAÇÃO)O gás metano, que colabora para o aquecimento global, é produzido em grande quantidade pelos lixões.TARJETA 6 (AFIRMAÇÃO)As fábricas devem ter fi ltros nas chaminés.TARJETA 6 (CONFIRMAÇÃO)As indústrias liberam grandes quantidades de gases poluentes e os fi ltros evitam a emissão desses gases.TARJETA 7 (AFIRMAÇÃO)Dê preferência a carros a álcool.TARJETA 7 (CONFIRMAÇÃO)

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O etanol é mais limpo que a gasolina, pois se trata de um combustí-vel renovável.TARJETA 8 (AFIRMAÇÃO)Evitar consumir produtos em spray e os produtos que venham em-balados em isopor.TARJETA 8 (CONFIRMAÇÃO)Spray e isopor contêm o gás CFC (clorofl uorcarbono), destrói a ca-mada de ozônio.

Resultados e DiscussõesÉ sabido que para desenvolver melhor a capacidade crítica e

analítica dos alunos, o professor deve ter como recurso a interdisci-plinaridade. No que diz respeito à habilidade e a competência de ler e entender, escrever e esclarecer. Isto torna ainda mais importante o recurso da interdisciplinaridade, pois o conhecimento geral é o grande aliado para formar bons leitores e escritores.

O conceito de interdisciplinaridade, segundo Cordiolli (2002, p.10):

A interdisciplinaridade corresponde à produção ou processo de relações entre saberes, a partir de uma disciplina ou de um tema sem as limitações de do-mínios ou objetos impostos pela especialização das ciências.

Compreendemos que a discussão sobre o efeito estufa, por exemplo, estudado nas ofi cinas do curso de redação, ultrapassou o limite do conteúdo do texto produzido, pois não era apenas infor-mação para o texto; estávamos criando um momento de refl exão e criticidade sobre uma temática social que poderia mudar a atitude ética e de caráter dos alunos diante do questionamento sobre o meio ambiente.

Cordiolli (2002, p.10) diz ainda queNo espaço escolar e acadêmico, organizados em dis-ciplinas, a prática interdisciplinar refere-se à ação que parte de uma disciplina, mas utiliza de conceitos ou instrumentos de outras para tratar das questões pre-vistas em seus objetivos.

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No entanto, para um bom desenvolvimento linguístico, comu-nicativo e social num todo, por meio de habilidades bem determina-das, seria ideal recorrer à interdisciplinaridade sempre que possível ou sempre que necessário.

[...] o fundamental na educação não é o acúmulo de informações, mas o desenvolvimento de competên-cias e habilidades que nos permitam encontrá-las, li-dar com elas, discernir quais são importantes para nós em determinado momento, analisá-las, criticá-las, ti-rar conclusões. (GARCIA, 2013, p.2)

As habilidades linguísticas correspondem à oralidade (fala e escuta), leitura e escrita, porém para que se adquiram competências linguísticas que correspondam à oralidade, leitura e escrita é preciso ter um conhecimento mais amplo do léxico e buscar meios inter-disciplinares que disponham informações prévias sobre assuntos de diferentes categorias, formando assim um leitor conhecedor e argu-mentador através do conhecimento diversifi cado.

Conforme Marcuschi (2008), o conhecimento pragmático corresponde à formação de conceitos que adquirimos com o conhe-cimento de mundo. Isto signifi ca que o que se ouve ou o que se faz pode gerar desinteresse pela leitura enciclopédica. Entende-se que os conhecimentos de mundo estão relacionados a informações que se obtêm com os programas de TV, viagens, amigos, família e pessoas próximas, além de informações culturais, sociais e políticas. O leitor precisa se apropriar de domínios críticos sobre o que vê e lê.

No que diz respeito ao conceito ou defi nição de habilidade e competência foi importante observar estas informações abaixo, portanto:

Habilidade é o saber fazer. É a capacidade do indi-víduo de realizar algo, como classifi car, montar, cal-cular, ler, observar e interpretar. Competência é a capacidade da pessoa em mobilizar suas habilidades (saber fazer), seus conhecimentos (saber) e suas atitu-des (saber ser) para solucionar determinada situação--problema. Assim, entender os conceitos é uma coisa, interpretá-los é outra e posicionar-se diante disso é outra (LE BORTEF; PERRENOUD, http/Wikipédia.org/wiki/habilidade – acesso em 05/07/2013).

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Assim, o desenvolvimento das habilidades e competências dos alunos torna-se um elemento fundamental na formação do ser apto a exercer a cidadania na sociedade em que está inserido. É a partir da interdisciplinaridade e da contextualização que esse objetivo se torna mais fácil de ser alcançado.

A interdisciplinaridade é um mecanismo associável a qual-quer método de ensino-aprendizagem. A contextualização deve estar sempre associada à interdisciplinaridade, assim como a trans-posição didática para tornar o ensino-aprendizado amplo e efi caz no seu objetivo. A escola é a grande transformadora de saberes em conhecimentos, porém muitas se detêm apenas em saberes.

Segundo Cordiolli (2002, p.15-16), a distinção entre saber e conhecimento se constitui por: “Saber seria, portanto, uma maneira de dotar de sentido um conjunto de dados ou informações. [...] O co-nhecimento é, portanto, o processo de dotar de signifi cado os dados, informações e saberes”.

Assim, a escola é dotada de saberes que têm por objetivo dis-seminar o conhecimento em seu entorno, transferindo-os aos seus discentes através do professor. O professor, por sua vez, que tem a capacidade de transmitir o conhecimento através do saber, precisa de métodos didáticos para atingir esse objetivo. A transposição di-dática está associada aos meios de interação professor-aluno, que é de fundamental importância na troca de conhecimentos, interdisci-plinaridade e contextualização.

A necessidade de ensinar o conhecimento leva à ne-cessidade de modifi cá-lo – e essa modifi cação é cha-mada de transposição didática. Ao entrarem para a escola, os objetos de conhecimento – o saber cientí-fi co ou as práticas sociais – convertem-se em “objetos de ensino”, isto é, em conteúdo curricular. (http/www.namodemello.com.br/pdf/escritos/outros/contextin-terdisc.pdf – acesso em 03/07/2013).

A contextualização, por sua vez, é fundamental para o ensino--aprendizagem, pois a aprendizagem se concretiza com mais efi cácia se voltada para o meio que corresponde ao indivíduo.

A partir da transposição didática interativa, o professor pode buscar recursos para melhorar as habilidades e competências lin-guísticas dos seus alunos, seja na categoria oral, escrita ou leitora.

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A transposição didática pode se dar por meios interativos, em que o professor busca um método diferente de abordar o ensino-apren-dizagem de uma determinada disciplina e melhores resultados que conferem ao aprendizado. A partir da interdisciplinaridade, o pro-fessor pode abordar a discussão por meio da predição de afi rmações sobre determinados assuntos. A predição sobre um tema – que pode ser voltado para a biologia, geografi a, história, sociologia, etc. - de-sencadeia uma discussão a partir da oralidade e, através desta, a or-ganização das ideias. A organização das ideias é fundamental para a argumentação e para a produção textual concisa. Assim, a discussão se torna um treino prévio da escrita.

Solé (1998) estabelece o recurso de predições no ensino--aprendizagem da leitura para alunos. Desse procedimento surge o desenvolvimento da competência da leitura neles.

Embora toda a leitura seja um processo contínuo de formulação e verifi cação de hipóteses e previsões so-bre o que sucede no texto, vamos nos ocupar aqui das previsões que podem ser estabelecidas antes da leitu-ra. (SOLÉ, 1998, p.107).

A predição ou previsão pode ser usada como método intera-tivo no ensino-aprendizagem da leitura, oralidade e até mesmo de textos, como foi o caso do estudo desse tema sobre o efeito estufa. Dispondo dos mecanismos da interdisciplinaridade e da contextua-lização, o recurso da previsão, designado para o ensino da leitura, foi adaptado para desenvolver textos tendo como ferramenta principal a discussão das previsões.

Apesar de ter desenvolvido o projeto “O problema da escrita e a escrita dos problemas” seguindo o foco que foi proposto, perce-bemos a necessidade de buscar meios mais interativos para que se alcançasse o objetivo do projeto; e foi a partir da busca desse objetivo que se chegou à conclusão de que uma abordagem interativa rende-ria melhores resultados. O subprojeto do curso de Letras da UVA do PIBID\2009 contempla as ações do projeto pedagógico executado na escola “[...] o problema da escrita (implicações na produção textual escrita) e a escrita dos problemas (temáticas sociais discutidas)”, e contempla também a interdisciplinaridade (interação entre lingua-gens, conhecimentos, contextos).

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Durante a produção das primeiras redações, o mais notável eram as discrepâncias de concordância verbal e nominal, seguidas pela impessoalidade. Porém, havia ainda um problema que tornavam algumas redações impedidas de desempenhar seu papel: o de trans-mitir a informação, pois era impossível compreender a mensagem. As ideias estavam soltas e confusas, não emitiam nenhum sentido. Porém outras redações eram melhores, mas com os mesmos proble-mas de concordância, impessoalidade e ideias muito limitadas.

Dentre as atividades interativas desenvolvidas nos encontros com os alunos, foi utilizado o recurso visual para captar, em imagens, informações implícitas e explícitas, sendo promovidas por meio de discussões e, em outro momento, a transposição das ideias para uma produção textual. A ideia de promover a discussão, e assim obter a troca de informações, foi desenvolvida pela dinâmica “predição e confi rmação” de informações a respeito do efeito estufa, numa ten-tativa de resgatar o conhecimento prévio, ampliá-lo, e registrá-lo em uma produção textual.

As interações na dinâmica foram discutidas e confi rmadas durante todo o encontro sobre o tema do efeito estufa. Depois da dinâmica, propusemos aos alunos que escrevessem um texto disser-tativo, tendo como ponto de partida a citação sobre efeito estufa da bióloga Louredo; vejamos o trecho utilizado:

O efeito estufa sempre existiu desde que a Terra é Terra. Nos tempos passados ele era benéfi co, porque retinha parte do calor do sol que penetrava no nosso planeta. Assim, ele evitava o congelamento e a extin-ção da vida por aqui. Mas só que nos tempos atuais, a quantidade exorbitante de gases poluentes emitidos na atmosfera fez do efeito estufa um problema. Temos que combater, portanto, essas emissões.

A partir dessa citação, foi pedido para que os alunos desen-volvessem um texto dissertativo argumentativo. Essa produção tex-tual, assim como a dinâmica, também foi de caráter competitivo, pois as três primeiras redações seriam premiadas em um “concurso redacional”. E aqui estão os resultados do trabalho interdisciplinar desenvolvido através do projeto “O problema da escrita e a escri-ta dos problemas” na escola Ministro Jarbas Passarinho, em Sobral.

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Dispomos aqui de trechos das três redações premiadas e seus respec-tivos autores:

[...] Infelizmente, com o decorrer dos anos, com a quantidade de poluição, encontrar soluções para es-tes danos se torna cada vez mais urgente. Em diversas revistas e sites, pesquisadores afi rmam que em um futuro próximo poderá ocorrer de a temperatura se elevar a tal ponto de as calotas polares derreterem e aumentar o nível dos oceanos. Uma das principais causas do efeito estufa é a queimada de árvores e a derrubada das mesmas. Outro fator é o lançamento de gases poluentes como o de automóveis e indústrias [...] (Rebeca Maria Aguiar de Paula, 1º lugar)

Percebemos que o aluno “tinha o que dizer”, o que expressar, diante do texto que escrevia. Também observamos que o que é dito vem com conhecimentos que demonstram um nível de discussão elevado, que não é senso comum, não é algo ouvido em casa ou na rua, mas é algo que leu, debateu, compreendeu. Trecho do segundo aluno:

[...] Atualmente, o efeito estufa está avançando em um nível assustador, trazendo consequências para o planeta e vidas que existem nele, pois essa evolução já pode-se observar mais em cidades populosas, como São Paulo, por causa da liberação de gases. Percebe-se no céu uma intensa cortina de fumaça liberada por indústrias e automóveis. A sociedade, de certo modo, tem culpa. Boa parte não se conscientiza sobre os efei-tos, mas existem pessoas que estão lutando para de-sacelerar esse ato. Contudo, pode-se usar metas para retardar os poluentes, exemplo: reduzir o desmata-mento e reciclar o lixo. [...] (Sávio Amâncio Moura Costa, 2º colocado)

Percebemos que a informação debatida sobre o efeito estufa teve uma repercussão positiva, pois as redações comprovam que os alunos estavam atentos ao conteúdo. Vemos que o vocabulário me-lhorou, os argumentos são críticos e com atitude ou ponto de vista imparcial, informando de forma geral ou convencional, não há um discurso pessoal, individual e preconceituoso ou mesmo aleatório. Fragmento do texto do terceiro aluno:

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[...] A tecnologia está evoluindo bastante nos últimos anos. São grandes projetos e inventos que benefi ciam o homem. Contudo, tais avanços podem acarretar sé-rios prejuízos ao planeta.

As maiores causas, no entanto, se dão através de des-matamentos, queimadas, lixos produzidos em gran-des proporções e gases emitidos pelas indústrias e automóveis. Assim, criando um buraco na camada de ozônio que com o aquecimento elevado da Terra está afetando as geleiras causando o seu descongelamento.

Portanto, as indústrias poderiam fazer trabalho de refl oresta-mento. O governo poderia desenvolver um projeto de conscientiza-ção da população sobre a reciclagem do lixo produzido em casa e, dar apoio no recolhimento desse lixo. [...](Rita Andréia de Sousa, 3ª colocada).

Trabalhar desta forma foi muito produtivo, pois além da prá-tica linguística com o texto “parágrafos, textualidade, gramática, re-visão”, efetuamos também uma temática ambiental de interesse de todos os indivíduos em resolver problemas que podem estar também em nossas atitudes: “o efeito estufa”. Assim, constatamos que a ati-vidade interdisciplinar é possível com produção de texto, trazendo conhecimento sobre texto e mudando nossa mentalidade sobre as-suntos que vivenciamos social-mente em relação ao meio ambiente.

Considerações FinaisAo desenvolver um projeto, percebemos que há uma aquisi-

ção de conhecimentos generalizados, pois se aprende ao ensinar. No decorrer do projeto O problema da escrita e a escrita dos proble-mas, foi possível compreender o espaço educativo e a necessidade de desenvolver métodos interdisciplinares e compreender a importân-cia da contextualização como aliada no ensino-aprendizado, pondo em prática mecanismos de interação voltados para a oralidade no debate de informações, em forma de discussão, visando à organiza-ção das ideias e o senso crítico para, enfi m, atingirmos o objetivo de melhorar a competência escritora dos alunos. Nesse sentido, perce-bemos então que a transposição didática se faz efi caz se combinada com a interdisciplinaridade e a contextualização.

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A prática discursiva pode ser comparada à prática leitora, como um treino prévio para a escrita, pois organiza a argumentação oral e, assim, auxilia a organização escrita na forma dissertativa e ar-gumentativa. Portanto, a utilização de predições sobre determinados temas para protagonizar a discussão destes é uma forma de levar o aluno a expor o que sabe, debater e tirar conclusões. Esta dinâmica pode ser adaptada a outras temáticas sociais.

Ressaltamos que o PIBID tem contribuído para que os bol-sistas, que são graduandos em licenciatura em Letras, possam ter contato direto com as difi culdades práticas dos alunos e possam in-ventariar critérios para facilitar o aprendizado destes, além de incen-tivá-los não só a prática da compreensão textual, mas também para o exercício da cidadania.

Referências

CORDIOLLI, Marcos. A relação entre disciplinas em sala de aula: a inter-disciplinaridade, a transdisciplinaridade e a multidisciplinaridade. Dis-ponível em: <http://www.cordiolli.fi les.wordpress.com/.../cordiolli_e004_dis-ciplinaridade_ed01_p...‎>. Acesso em: 3 jul. 2013.

GARCIA, Lenise. Competências e Habilidades: você sabe lidar com isso? Disponível em: ttp://www.educacao.es.gov.br/.../roteiro1_competenciasehabi-lidades.pdf>.Acesso em: 3 jul. 2013.

LOUREDO, Paula. Que medidas devem ser tomadas para dimi-nuir o efeito estufa? Disponível em<http://explicatudo.com/como-e-vitar-o-efeito-estufa#ixzz2S6O9zBHR>. http://www.wikipedia.org/wiki/Habilidade‎ -Le Bortef e Philippe Perrenoud. Acesso em: 05 jul. 2013.

MARCUSCHI, Luiz Antônio. Produção textual, análise de gênero e compreensão. São Paulo: Parábola Editorial, 2008.

MELLO, Guiomar Namo de. Transposição didática, interdiscipli-naridade e contextualização. Disponível em: <http://www.namode-mello.com.br/pdf/escritos/outros/contextinterdisc.pdf>. Acesso em: 03 jul. 2013.

SOLÉ, Isabel. Estratégias de Leitura. 6. ed. Porto Alegre: Atmed, 1998.

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PRECONCEITO RACIAL, SEXUAL E SOCIAL NA CONSTRUÇÃO DA INFORMAÇÃO DO TEXTO ESCRITO

Leandro de Sousa Lima – Bolsista de Iniciação à Docência do PIBID e Acadêmico do Curso de Letras da Universidade Estadual Vale do Acaraú.Maria Soares de Araújo - Mestre. Professora Assistente da Universi-dade Estadual Vale do Acaraú – UVA (Orientadora).

IntroduçãoNeste texto exponho uma experiência com produção de texto

numa perspectiva interdisciplinar. Essa experiência foi aplicada na escola pública Elza Goersch, em Forquilha-CE, como parte das ativi-dades do PIBID 2009 (Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência), planejadas pelo subprojeto do curso de Letras da UVA (Universidade Estadual Vale do Acaraú).

No ano de 2013, as atividades do PIBID UVA 2009 realizadas na Escola Elza Goersch tiveram como foco o texto dissertativo-argu-mentativo. A motivação para tal escolha deu-se pelo fato de serem esses os textos mais solicitados pelos vestibulares e pelo ENEM. Des-se modo, durante o semestre 2013.1, todas as redações produzidas pelos alunos versaram sobre temas sociais.

No mês de junho, os bolsistas e a então professora supervisora do PIBID propuseram “diversidade sexual” como tema de trabalho. No entanto, fi cou a cargo de cada bolsista optar por trabalhar o tema escolhido ou outro que contemplasse alguma temática social.

Assim, solicitei aos alunos das turmas de 1° e 2° do ensino médio que produzissem seus textos a respeito do preconceito racial, social ou sexual, fi cando ao interesse do aluno escolher aquele com o qual mais se identifi casse ou sobre o qual tivesse mais facilidade de escrever a respeito. Dessa forma, eles teriam mais liberdade ao dissertar sobre o assunto em questão.

Com a execução da atividade, eu e a equipe de pibidianos per-cebemos que os alunos tinham difi culdades de construir a informa-ção em suas redações, e demonstravam desinteresse pela leitura de temáticas sociais em casa. A partir daí, observamos que era preciso intervir com uso de vídeos e debates antes de solicitar a produção

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textual. Feito isso, verifi camos uma melhoria nas informações apre-sentadas nos textos. As noções de conteúdo do texto e de interdisci-plinaridade (temáticas sociais em sala de aula) fundamentaram este estudo.

O objetivo principal desta investigação é analisar e descrever a prática de atividades didáticas unindo temas sociais com produção de informação para o texto. Ao fi nal da experiência, verifi camos que tais atividades contribuem para a melhoria dos argumentos na cons-trução do conteúdo do texto e para atualizar as discussões relacio-nadas às temáticas sociais, que aparecem por meio das informações de jornais (televisivo, impresso, ou online) ou revista. O uso dessas temáticas em vídeo ajudam o aluno a manter-se informado, refl etir sobre os problemas sociais que assolam o país e, consequentemente, a produzir textos mais consistentes, por ter o que dizer. Além disso, a estratégia ajuda o aluno a melhorar suas atitudes éticas, de caráter, e de respeito ao próximo.

MetodologiaO presente trabalho apresenta-se como relato de experiência,

com privilégio do aspecto descritivo. Para preservar a identidade das professoras e alunos envolvidos, são utilizadas letras do alfabeto, atendendo ao que orienta a resolução N° 466, de dezembro de 2012.

Na busca de imprimir mais fi delidade ao texto, as ações de na-tureza pessoal são narradas em 1ª pessoa do singular e as de natureza coletiva, isto é, as que envolverem a equipe de bolsistas do PIBID, são narradas na 1ª pessoa do plural.

As atividades realizadas no PIBID UVA 2009, no semestre 2013.1, se deram da seguinte maneira: o licenciando bolsista ia para a sala de aula e apresentava a dissertação escolar e a sua estrutura, ou seja, as partes principais que compõem o texto dissertativo-ar-gumentativo (introdução, desenvolvimento e conclusão). Essas in-formações eram expostas de forma bem clara e objetiva aos alunos para que eles não tivessem nenhuma difi culdade em compreender as informações. Ao término das exposições, era apresentado um tema envolvendo questões sociais. Havia o debate em sala de aula para que os discentes tivessem uma noção do assunto. Para ajudá-los a produzir seus textos, foram expostos vídeos que discutiam sobre a

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temática apresentada e slides que também abordavam discussões re-ferentes ao assunto para facilitar sua compreensão no ato da produ-ção. A partir daí, verifi camos que os alunos informavam pouco so-bre os conteúdos em suas redações. Houve, então, uma refl exão por parte dos bolsistas, considerando que isso advinha da metodologia usada, pois nas palestras em sala de aula, os bolsistas se prendiam a discussões sobre a estrutura do texto, deixando de lado o conteúdo.

As atividades foram desenvolvidas na Escola Estadual Elza Goersch, em Forquilha-CE, em três turmas com 50 alunos cada, que tinham as professoras A e B como responsáveis e onde atuo como bolsista do PIBID UVA 2009 desde o ano de 2012.

A intervenção didático-pedagógicaAs atividades de redação a serem trabalhadas pelos bolsistas

nas escolas parceiras já tinham sido exploradas em um projeto an-teriormente planejado para ser desenvolvido durante o primeiro se-mestre de 2013. Esse projeto intitulava-se “O problema da escrita e a escrita dos problemas”, referindo-se, de um lado, à produção de tex-to, e do outro, às temáticas sociais que deveriam adentrar o universo da leitura dos alunos, ou seja, sociologia e redação, promovendo a construção da informação como uma unidade do estudo do texto. No projeto, além de outras orientações, foram inclusas temáticas do ENEM e do vestibular da UVA, que apareceram como exemplos de temáticas sociais. O projeto foi elaborado no mês de janeiro de 2013, com os bolsistas, os supervisores e o coordenador de área envolvidos com o PIBID UVA 2009.

As palestras em sala de aulas eram ministradas com o apoio de vídeos que abordavam questões sociais. Ao fi nal do projeto, apesar de permanecerem os problemas com a escrita padrão, os problemas com a construção da informação foram resolvidos. A aplicação do projeto de intervenção iniciou-se a partir das experiências abaixo descritas.

Nos dias 6 e 8 de março de 2013, iniciei as atividades didá-tico-pedagógicas para o trabalho do texto dissertativo com os se-guintes questionamentos: O que seria um texto dissertativo? Qual a sua importância dentro do ambiente escolar? Por que fazer um texto

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dissertativo? Somente visando o sucesso no ENEM ou no Vestibular da UVA?

Partindo desses questionamentos, apresentei aos alunos cada passo que diz respeito à construção do texto dissertativo visando à importância não somente da estrutura do texto, mas também do conteúdo, pois, para se construir um bom texto é necessário que o aluno tenha informações a respeito do tema tratado para só então poder discutir a respeito.

A construção da informação foi bastante debatida em sala de aula. Para isso, investimos na leitura nas mais variadas fontes de no-tícias, como jornais impressos e televisivos, internet, rádio, revistas, dentre outras fontes. Depois dessas discussões, pedi aos alunos que produzissem uma dissertação com o seguinte título “A Renúncia do Papa Bento XVI”.

Depois de aplicada nas três turmas, decidimos que cada bol-sista faria a escolha de cinco redações, de cada turma, que apresen-tassem problemas de construção, para serem acompanhadas ao lon-go do ano letivo.

Nos dias 17 e 18 de abril de 2013, apresentamos os três gêne-ros discursivos: narração, descrição e dissertação, pondo em desta-que suas características principais, como: estrutura, funções comu-nicativas e importâncias. Foi exposto também um parágrafo de cada gênero com o tema da preservação da água, e em seguida um vídeo intitulado “Carta escrita em 2070”, que discutia sobre as consequên-cias devastadoras da não preservação da água pela humanidade. Ao fi nal das exposições, foi pedido aos alunos que escrevessem um texto argumentativo com o título “Água: Preservar hoje para ter amanhã”.

Nos dias 22 e 23 de maio de 2013, foram reforçadas as expo-sições acerca da dissertação, suas características principais e como iniciar um texto dissertativo. Logo em seguida foi pedido aos alunos que refi zessem a redação do encontro passado, “Água: Preservar hoje para ter amanhã”, com o intuito de identifi carem onde foi que erra-ram e dessa forma ter mais atenção ao construírem seus textos.

Nos dias 12, 13 e 14 de junho de 2013, as intervenções foram aplicadas nas três turmas e tiveram como conteúdo a exposição de diversas formas de introdução de um texto dissertativo. Foram ex-postas seis propostas: a primeira com uma afi rmação geral sobre o assunto; a segunda, uma consideração histórico-fi losófi ca; a terceira,

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com um questionamento; a quarta, uma comparação ou metáfora; a quinta, com dados estatísticos e, por último, com uma citação direta (com aspas) ou indireta (sem aspas), de preferência de alguém bas-tante conhecido.

Ao fi nal de cada proposta, era explicado com exemplos como os alunos poderiam iniciar seus textos com cada proposta apresenta-da; na ocasião eles faziam perguntas e as dúvidas eram esclarecidas. A experiência foi bastante proveitosa.

Em 26 de junho de 2013, os bolsistas retornaram à escola con-texto para realizar uma atividade extraclasse, que consistia no se-guinte: escolher aleatoriamente três alunos de cada turma, levá-los para o laboratório de Biologia para serem entrevistados. A entrevista foi fi lmada utilizando-se o próprio celular do bolsista e apoiou-se em seis perguntas, elaboradas pelo próprio bolsista. Investigava a opi-nião dos alunos quanto ao aprendizado que o PIBID vinha propor-cionando, as expectativas e difi culdades discentes na produção do texto dissertativo, possibilidade de melhorias. Foi um momento bas-tante proveitoso, que fez com que todos participassem ativamente.

Sobre essa experiência, uma bolsista do PIBID, aluna do curso de Letras UVA, apresentou um estudo em um congresso em Natal--RN, focando as difi culdades discentes em escrever com a coerência na construção da informação. Diante destas observações, então, tra-balhamos com vídeos temáticos com debates em sala de aula, uma espécie de ofi cina em que depois do vídeo exposto, fazíamos dinâ-micas para criar um ambiente de participação e debate. Dentre os temas apresentados, exploramos “O preconceito racial”, “O precon-ceito sexual” e “O preconceito social”. O aluno assistia aos vídeos, debatia e escolhia uma destas temáticas para escrever. Depois disso, exploramos os problemas com a produção textual.

Apoio Teórico das Intervenções No espaço da escola, é função do professor não permitir que

haja nenhuma discriminação, seja qual for o motivo, o que é um grande desafi o. Usar vídeos em sala de aula [antes de produzir texto] é uma saída para inibir o preconceito, seja ele racial, sexual ou social. Além disso, a estratégia ajuda o aluno a ter o que dizer no momento da escrita.

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Ao que tudo indica “a escola, que poderia e deveria contribuir para modifi car as mentalidades anti discri-minatórias ou pelo menos para inibir as ações discri-minatórias, acaba contribuindo para a perpetuação das discriminações, seja por atuação direta de seus agentes, seja por omissão dos conteúdos didáticos que é abordado, ou pelo que ocorre no dia a dia da sala de aula” (PINTO, 1993, p. 27).

Sabemos que a interdisciplinaridade é um recurso que pode relacionar sociologia (vivenciar, por meio de discussões temáticas, situações problemáticas, que afetam os grupos sociais) com produ-ção textual (informar na redação e argumentar com um ponto de vista menos individual e mais convencional). Com essa abordagem, os alunos aprendem a discutir sobre os assuntos e ainda aprendem a organizá-lo em um texto.

Outro recurso utilizado é o da intertextualidade, que fala não somente da relação de um texto com o outro, mas de uma relação de diálogo de um texto dentro do outro, e que pode emergir de dis-cursos convergentes. Sobre diálogo textual discursivo diz Bakhtin (1997, p.123):

O diálogo, no sentido estrito do termo, não constitui, é claro, senão uma das formas (...) da interação verbal. Mas se pode compreender a palavra “diálogo” num sentido amplo, isto é, não apenas como a comunica-ção em voz alta, de pessoas colocadas face a face, mas toda comunicação verbal, de qualquer tipo.

A intertextualidade é uma forma de interagir na produção textual, e essa interação não deve estar só no plano da divergência discursiva, pode também estar no plano da convergência.

Na escrita dos alunos, percebemos a utilização da intertextua-lidade no ato de transferir informações de outros textos. Com isso, os alunos buscavam enriquecer suas próprias produções, mas também discutiam sobre a temática e orientavam-se para a vida, melhorando a ética, a cidadania, a postura social e comunitária, pois, ao mesmo tempo em que se ensina um conteúdo, também se ensina para a vida.

Ainda com relação ao ensino-aprendizagem, os PCNEM de Linguagens e Códigos (2000, p. 18) afi rmam que:

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O processo de ensino/aprendizagem de Língua Por-tuguesa, no Ensino Médio, deve pressupor uma visão sobre o que é a linguagem verbal. Ela se caracteriza como construção humana e histórica de um sistema linguístico e comunicativo em determinados contex-tos. Assim, na gênese da linguagem verbal estão pre-sentes o homem, seus sistemas simbólicos e comuni-cativos, em um mundo sócio-cultural.

Dessa forma, podemos concluir que a linguagem verbal, na verdade, é uma necessidade de expressão humana no meio em que está inserida. Ao escrever, o homem revela o seu lado crítico e suas opiniões. A escola tem como principal missão, além de ensinar a lín-gua padrão, mostrar aos alunos as mais variadas formas de lingua-gem que devem ser apropriadas a cada de contextos.

No sistema escolar, é muito importante saber redigir: em to-das as idades e escolas, é comum os alunos serem avaliados com base no êxito das redações. No entanto, apesar de sua inegável im-portância, a redação é ainda um “objeto misterioso”: não há uma tradição didática para o ensino da produção textual e, por isso, estu-dantes e professores se encontram na situação de enfrentar a questão sem nenhum trabalho preparatório.

A difi culdade dos professores com respeito à redação surge da falta de referência e de comparação. Um dos maiores obstáculo dos alunos é entender exatamente quais são as expectativas do professor e qual a forma de melhorar a capacidade de escrever. Ao que tudo indica, a difi culdade do professor em relação à produção textual é aparentemente superada pela experiência, quando a quantidade de redações corrigidas é grande, mas que não se cria a possibilidade de discutir sobre os problemas de forma coletiva com reescrita de texto, como uma atividade de revisão, e não apenas a correção em silêncio, individual e diagnóstica quantitativa.

As difi culdades dos estudantes, ao contrário, podem perdurar por todo o período escolar. Periodicamente, os alunos se encontram frente a um novo tema, e os que são menos capazes quase que fa-talmente se sentem em difi culdades. Um novo tema signifi ca uma nova tentativa, na maioria dos casos, fracassada, pois falta um co-nhecimento claro das técnicas de escrever e um método que possa levar a um aumento gradativo da qualidade textual. Alguns alunos

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se tornam autodidatas, já que seus mestres não lhes dão nenhuma regra específi ca. Além disso, há os diversos critérios de avaliação dos professores: há aqueles que valorizam a riqueza de ideias, outros a coerência do raciocínio e outros, ainda, a correção dos períodos. Com base nas experiências vividas no PIBID UVA 2009 e nos auto-res estudados, os bolsistas verifi caram que as atividades de produção textual devem começar com a discussão sobre os vídeos assistidos e, depois, o trabalho com a escrita e a organização do texto e das infor-mações, sem esquecer a necessidade de revisão partindo sempre de redações produzidas pelos próprios alunos em reescrita.

É importante salientar que, para um texto ser bem escrito, é necessário que alguns pontos sejam abordados. São eles: intenciona-lidade, aceitabilidade, intertextualidade, situacionalidade e informa-tividade. Contudo, o foco de estudo será o da informatividade, que trata justamente da informação necessária para construir o texto.

De acordo com Fávero (1985, p. 23), “O termo Informativi-dade designa em que medida os materiais linguísticos apresentados no texto são esperados/não esperados, conhecidos/não conhecidos da parte dos receptores.” É nessa perspectiva que o estudo foi emba-sado, procurando nas dissertações dos alunos o grau de informação acerca da temática abordada.

Ainda com relação ao texto, Van Dijk (apud MARCUSCHI, 1983) conceitua texto como uma estrutura superfi cial regida por uma estrutura profunda, que é semântica e motivada.

A produção textual será muito cobrada dos alunos do ensi-no médio, principalmente porque os mesmos já estão se preparando para dar continuidade aos estudos ou [até mesmo] conseguir uma vaga no mercado de trabalho. Como coloca a LDB (2000) no Artigo 35:

O Ensino Médio, etapa fi nal da Educação Básica, com duração mínima de três anos, terá como fi nalidade:

I - a consolidação e aprofundamento dos conheci-mentos adquiridos no ensino fundamental, possibili-tando o prosseguimento de estudos;

II - a preparação básica para o trabalho e a cidada-nia do educando como pessoa humana, incluindo a

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formação ética e o desenvolvimento da autonomia in-telectual e do pensamento crítico.

Como foi exposto, o aluno ao concluir o ensino médio, tem esses dois caminhos a seguir; no entanto, se faz necessário que o mesmo tenha aproveitado ao máximo os conhecimentos que o en-sino médio lhe proporcionou, tanto na linguagem escrita quanto na linguagem oral. Como destacam os PCNEM (2000, p. 13), “[...] a necessidade de o ensino estar pautado numa concepção de lingua-gem enquanto prática social, o que inclui um trabalho de produção de textos que contemple os diferentes gêneros textuais que circulam na sociedade”.

Resultados e DiscussõesComo já afi rmado, as identidades dos alunos envolvidos nes-

se trabalho foram preservadas; para isso foram utilizadas letras do alfabeto.

Na proposta de redação cuja temática era o preconceito racial, o preconceito sexual e o preconceito social, verifi camos que o uso de slides e vídeos possibilitou uma discussão entre os alunos, o que favoreceu o desenvolvimento da refl exão e do senso crítico.

Durante a aplicação dessas palestras, foi percebida maior par-ticipação discente, bem como melhoria no rendimento escolar dos alunos, como demonstra o trecho da redação a seguir:

Estamos em meio a uma sociedade bastante precon-ceituosa, acontece é que pessoas querem descobrir uma nova identidade, mas que se calam por medo dessa sociedade hipócrita que repreende, por acharem que as pessoas não têm o direito de se redescobrir, de se expressarem e que cometem injustiças. (Aluna A, da Escola Elza Goersch).

Mesmo com alguns desvios de gramática, verifi camos que a aluna soube expressar seu ponto de vista em relação à discriminação sexual, inclusive apontando algumas considerações, fato para o qual fora necessário que ela estivesse inserida num contexto que abordas-se essa questão.

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Com as produções desenvolvidas pelos alunos foi percebido um desenvolvimento mais expressivo das informações, como pode ser comprovado nesse trecho de outro estudante da mesma escola:

O preconceito de classe social está relacionado ao po-der aquisitivo, ao acesso a renda, a posição social, ao nível de escolaridade, ao padrão de vida que está pre-sente no dia a dia das pessoas. (Aluno C)

Através dessa citação, observamos que o nível de informação dos alunos teve uma grande melhoria e que, dessa forma, com as atividades trabalhadas ao longo de semestre, [que foram realizadas com o auxílio de vídeos e slides,] trouxe vantagens para a prática escolar e para o aprendizado do aluno, além de prepará-lo para a vida. Abaixo há algumas falas de alunos, referentes aos trabalhos, desenvolvidos no semestre 2013.1:

Aluna A: Com esse projeto eu pude melhorar o meu vocabulário, aprendi a usar o dicionário que antes não tinha o costume de usar na sala de aula, e antes tinha difi culdades em construir um bom texto argumenta-tivo, em selecionar as palavras corretamente e com o PIBID eu aprendi muito.

Aluna B: Com o PIBID eu obtive muitas melhoras com relação a produção textual, pois antes eu apre-sentava muitas difi culdades em introduzir e concluir uma redação e apresentava difi culdades na coerência, mas depois do programa eu melhorei muito.

Aluna C: Com as atividades do PIBID aqui na escola eu aprendi a fazer uma boa redação com uma boa in-trodução e aprendi também a construir um bom de-senvolvimento e parágrafos bem desenvolvidos. Até o fi nal eu pretendo saber fazer uma boa redação para obter êxito no vestibular.

Aluno D: Antes eu não sabia escrever uma boa reda-ção, tinha difi culdades na escrita de algumas palavras, não sabia a relação entre coesão e coerência e agora eu aprendi a fazer uma boa redação.

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Aluna E: Com o PIBID eu obtive uma melhora muito grande na parte de conhecimentos, eu aprendi a de-senvolver mais o meu texto por que antes eu escrevia poucas linhas mas agora eu já consigo desenvolver melhor uma redação. Tinha difi culdades também em acentuar as palavras e não sabia bem a relação entre coesão e coerência, mas agora com o PIBID eu apren-di muita coisa.

Como foi observado através das falas dos alunos, o PIBID tem contribuído de forma signifi cativa para a aprendizagem dos alunos, o que é muito gratifi cante não só para os bolsistas, coordenadores, supervisores, mas, principalmente, para os alunos, que obtiveram grande conhecimento em língua portuguesa.

Paralelo aos conteúdos de produção textual realizados com os alunos do 1° e 2° anos, foi-lhes solicitado pequeno depoimento acerca das atividades escolares desenvolvidas pelo PIBID, falando de seus aprendizados, difi culdades e expectativas. Os alunos produziam seus depoimentos se autoavaliando e demonstraram muita satisfa-ção ao participarem da realização de gravações e vídeos.

Escrever bem e oralizar bem os textos são atividades que de-monstram competências e habilidades linguísticas e comunicativas, nem sempre envolvem boa caligrafi a. Escrever bem é saber se co-municar bem nas situações de uso da língua. Sobre caligrafi a, afi r-ma Serafi ni (1985, p.11), “[...] pode-se interpretar essa expressão, de forma restrita, como a capacidade de desenvolver bem o ato físico da escrita, ou seja, ter boa caligrafi a”. Assim, o professor, ao avaliar os textos de seus alunos, deve levar em consideração não apenas a cali-grafi a, mas a estrutura do texto, o conteúdo, os argumentos acerca do assunto que está sendo discutido, o que na maioria das vezes passa despercebido pelos professores.

Considerações FinaisPortanto, ao longo de um trabalho que envolveu todos os alu-

nos do 1° e 2°anos, o qual abordava não somente a explanação das ca-racterísticas que compõem o texto dissertativo, mas, principalmente, o desenvolvimento dos argumentos, como refazer um texto, visan-do à refl exão dos conteúdos, conseguimos melhorar a qualidade do

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ensino de produção textual, assim como a exploração das discussões sobre a temática social, que adentra não só ao universo do texto, mas extrapola a redação em si, pois ajuda o aluno a saber lidar com o pro-blema do preconceito. Foi uma experiência muito proveitosa na qual percebemos avanço na produção textual dos alunos e no desempe-nho de sua fala e de seu comportamento social diante das discussões sobre assuntos ligados ao preconceito.

Os resultados confi rmaram que o PIBID tem contribuído de forma signifi cativa para o aprendizado dos alunos e para os bolsis-tas. Um curso de licenciatura tem muito a ganhar com o PIBID, que aproxima o acadêmico da realidade escolar ao mesmo passo que aproxima o aluno da escola do meio universitário, ou seja, há um ganho para ambos. Enfi m, o PIBID tem uma grande importância na formação pedagógica do licenciando ao possibilitar-lhe conheci-mento de como é a realidade escolar.

Referências

BAKTHIN, Mikhail. Estética da criação verbal. tradução [feita a partir do Francês por] Maria Em Santina Galvão G. Pereira [revisão da tradução Marina Appenzellerl. 2 ed. São Paulo: Martins Fontes, 1997.

BRASIL. Parâmetros Curriculares do Ensino Médio - PCNEM. Brasília. DF. 2000.

DIJK, Teun A.van; KINTSCH, Walter. Strategies of discourse com-prehension. Orlando: Academic Press, 1983.

FÁVERO, Leonor L. A informatividade como elemento de textuali-dade. In: Letras de hoje, 60, p. 13-20, jun. 1985. Porto Alegre: PU-C-RS.

PINTO, R. P. Movimento negro e educação do negro: a ênfase na identidade. Cadernos de Pesquisa. São Paulo: Fundação Carlos Cha-gas, 1993.

SERAFINI, Maria Teresa. Como escrever textos. Tradução de Maria Augusta Bastos de Mattos. 7. ed. São Paulo: 1985.

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O TEMA DA INFLUÊNCIA DA INTERNET NA SOCIEDADE ATUAL E A CONSTRUÇÃO DAS IDEIAS

NA PRÁTICA DE PRODUÇÃO TEXTUAL

Maria Vanábia Alves – Bolsista de Iniciação à Docência do PIBID e acadêmica do curso de Letras da Universidade Estadual Vale do Acaraú. Maria Soares de Araújo – Mestra. Professora da Universidade Esta-dual Vale do Acaraú – UVA (Orientadora).

IntroduçãoEste trabalho se propõe apresentar algumas experiências ini-

ciadas em fevereiro de 2013, na Escola Estadual Dom José Tupinam-bá da Frota, em Sobral-CE, onde a primeira autora atuou como bol-sista do PIBID-2009 (Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência), com atividades do subprojeto da Letras. Percebemos que um dos problemas dos alunos do ensino médio da referida es-cola era o desenvolvimento da temática e a construção linguística dos argumentos na produção textual. Observando isso, decidimos então trabalhar com textos jornalísticos que tratassem de temáticas sociais, que instigassem os alunos a se manterem informados sobre os assuntos, desenvolver a temática da redação e também trabalhar a construção de enunciados para a elaboração mais compreensiva dos argumentos.

Na produção textual com alunos da escola básica, percebe-mos que são necessários mecanismos de ensino que desenvolvam no aluno essa habilidade de agir sobre o outro por meio do texto escrito. A principal fundamentação da pesquisa foi o estudo de Mar-cuschi (2008), que apresenta o texto como um mecanismo de caráter discursivo, comunicativo e de categoria de gênero. Sua defi nição de gêneros textuais, em suma, mostra-os como “formas de ação social”. Mas, como este autor mesmo coloca, a defi nição formal dos gêneros é algo muito difícil. Serafi ni (1986) demonstra que uma composi-ção escrita é, fundamentalmente, resultado de algumas operações elementares que podem ser aprendidas. Já Antunes (2003) explora questões relacionadas com a coesão e a coerência textuais. Esses

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teóricos trazem informações que contribuem para a melhoria do ensino-aprendizagem.

O que se ensina na escola acerca do texto é razoavelmen-te pouco, pois os professores parecem deixar a produção escrita só para avaliações fi nais, sem nenhum treino, até porque não encon-tram tempo para as devidas correções e acompanhamento do aluno na sua produção escrita. Só muito recentemente se vê uma ou outra menção a questões da coesão, da coerência, da intertextualidade, da relevância sócio-comunicativa, da amplitude e de outras proprieda-des do texto. No momento, um dos desafi os para os professores é descobrir o que incluir em seus programas de estudo da língua, além da simples repetição das categorias da morfologia e da sintaxe e da estrutura formal do texto. O ensino de produção textual não pode deixar de considerar todo o contexto, que envolve outras discussões e que ultrapassam a estrutura do texto em si. O intuito é trabalhar a difi culdade do aluno em formular argumentos consistentes acerca de um determinado assunto, em seguida escrevê-los de forma clara e concisa.

ObjetivoEste estudo tem como objetivo principal apresentar algumas

discussões advindas das experiências com a realização de ofi cinas de produção de texto na escola Dom José Tupinambá da Frota, com alunos do ensino médio. Estas atividades envolveram a produção de texto, no curso de redação, ou em atividade de tutoria (auxílio ao professor em sala de aula com produção textual). Utilizamos apre-sentação do gênero “notícia” em vídeo sobre a infl uência da internet que, além de servir como tema, impulsionou na melhoria do ato de argumentar.

Metodologia da Intervenção DidáticaNas atividades em sala, inicialmente, eram expostos os con-

teúdos relacionados à produção textual, como as defi nições da dis-sertação, as qualidades de uma dissertação, argumentação, dicas para facilitar o ato de escrever e reconhecer a estrutura de uma disserta-ção (introdução, desenvolvimento e conclusão). Nesse processo, era

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de suma importância refl etir sobre o desenvolvimento da produção de texto, utilizar ideias claras e objetivas e discutir sobre a elaboração da dissertação escolar.

Depois das explicações de conhecimento textual, era traba-lhado o assunto, para, assim, os discentes terem o que dizer e saber como dizê-lo, observando as condições de uso. Então, apresentáva-mos a notícia do dia, expondo todos os detalhes da mesma; em se-guida, era criada, juntamente com os alunos, uma tabela sobre ideias (argumentos) a partir do que eles sentiram diante daquela notícia lida em sala, instigando-os a formular seus próprios argumentos e criar outro texto. A exposição da notícia era feita através de vídeos, slides, reportagens e textos. Os alunos demonstravam total interesse, principalmente no momento da exposição da notícia, que geralmen-te trazia um dos assuntos mais discutidos durante a semana. Após isso, era solicitada uma produção textual e eles escreviam seus ar-gumentos a partir do que fora visto, pois a discussão da notícia aju-dava a superar as difi culdades de saber argumentar ou formar ideias claras.

As atividades foram realizadas com alunos das turmas do 2° ano do ensino médio, da Escola Estadual Dom José. Os encontros se davam uma vez por semana, ao longo do semestre de 2013.1. No procedimento da ofi cina, desenvolvíamos atividades que iam da apresentação da notícia escolhida e a discussão das impressões que causava aquela notícia, juntamente com os alunos, passando pela orientações de como produzir um texto dissertativo (outro texto) até sua revisão e divulgação para a turma.

Os temas trabalhados em sala de aula abrangiam a interdisci-plinaridade, pois envolviam outras áreas além da Língua Portuguesa, tornando, de certa forma, os alunos informados e atualizados sobre assuntos que poderiam ser contemplados em vestibulares, como os resultantes da experiência dos indivíduos que compõem a socieda-de; por exemplo, “a infl uência da internet na sociedade atual”. Esta é uma temática que extrapola o conteúdo do texto e contribui para a formação ética, comportamental e de cidadania na vida do aluno.

Além do tema citado, são exemplos de notícias trabalhadas durante o projeto: “A aprovação do casamento civil entre pessoas de mesmo sexo pelo CHJ”; “Diversidade sexual” e “A morte da menina de 11 anos baleada ao tentar defender o pai em Goiás”.

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As atividades com redação aconteciam ao fi nal da ofi cina, ou seja, a cada encontro se assistia a slides sobre como produzir textos dissertativos; depois havia a apresentação e a discussão do vídeo e, no fi nal, era solicitada a redação.

Para ensinar produção de textos, apoiamo-nos em um projeto elaborado no início do semestre sobre produção de texto [que infor-mava dicas para facilitar o ato de escrever], em critérios de avaliação da redação do ENEM e UVA, na discussão de temáticas sociais, que seriam os temas do texto, e também orientações de como produzir um texto dissertativo. O projeto se intitulava “O problema da escrita e a escrita dos problemas”.

Foram elaborados planos de aula para cada encontro, dividin-do passo a passo cada atividade a ser trabalhada na ofi cina, ministra-da por três bolsistas, junto aos alunos. As atividades foram colocadas em prática através da utilização e confecção de slides, textos, vídeos e cartazes.

As reuniões eram realizadas na primeira semana de cada mês e tinham como objetivo discutir. Ou seja, havia um planejamento, discutindo os conteúdos, objetivos, metodologias e materiais utiliza-dos para cada atividade. Também discutíamos acerca dos resultados já alcançados, avaliando o desenvolvimento e o que podia ser melho-rado para favorecer ainda mais a aprendizagem dos alunos.

Em atenção aos princípios previstos na Portaria Nº 466, de 12 de dezembro de 2012, do Ministério da Saúde, relacionados com pesquisa envolvendo seres humanos, a identidade das pessoas envol-vidas com o presente estudo será preservada. Assim sendo, conven-cionamos fazer referência às pessoas utilizando letras do alfabeto, exemplo: A, T, W E Q.

Resultados e DiscussõesUma forma de se trabalhar o ensino de dissertação é associá-

-lo a disciplinas que discutem e refl etem assuntos sociais. Para Freire (1987, p. 12-28), a interdisciplinaridade é o processo metodológico de construção do conhecimento pelo sujeito com base em sua rela-ção com o contexto, com a realidade, com sua cultura. A expressão dessa interdisciplinaridade é buscada pela caracterização de dois movimentos dialéticos: a problematização da situação, pela qual se

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desvela a realidade, e a sistematização dos conhecimentos de forma integrada. Dessa forma, os alunos são levados a refl etir e construir seus próprios argumentos.

Um sério problema é a falta de organização do aluno para de-senvolver o tema. O estudante, imobilizado pela escassez de conhe-cimento, desmotivado, desinformado e, para agravar, sem conheci-mento de critérios de organização do texto, acaba vencido pelo reló-gio. Afi nal, não se produz texto aleatoriamente. Há critérios e técni-cas que devem ser ensinados ao aluno. Serafi ni (1986, p.13) adverte:

[…] escrever um tema não signifi ca criar por inspira-ção divina. É um trabalho. E para fazer um trabalho é preciso conhecer as regras do ofício. Todavia, nem sempre o professor orienta o educando para observar as diversas etapas necessárias para a organização de texto. Será que esse mesmo professor recebeu, em seu curso de formação, embasamento pedagógico para desenvolver esse trabalho?

Formar um aluno escritor capaz de perceber se seu texto está ou não confuso, incompleto, sem sentido, e que se proponha a re-visá-lo e reescrevê-lo até considerá-lo adequado a seus objetivos, é uma tarefa árdua, mas não impossível. Um bom escritor deve estar bem informado, buscando sempre atualizações de suas ideias e infor-mações. A base de uma dissertação é a fundamentação de um ponto de vista, uma opinião sobre o assunto. É claro que as ideias não vão aparecer do nada. Elas fazem parte de um repertório de opiniões, fatos, informações a que se está exposto todos os dias. Partindo desse conjunto desordenado de ideias, podemos perceber a possibilidade de agrupá-las segundo certas semelhanças. Uma divisão possível se-ria em causas, consequências e soluções.

Ao entender a linguagem como forma de interação ou modo de o interlocutor atingir determinado propósito, fazendo uso de me-canismos linguísticos, percebemos o papel de extrema importância da argumentação nesse processo, conforme nos mostra Koch (2004, p. 29), ao dizer que

[...] o uso da linguagem é essencialmente argumenta-tivo: pretendemos orientar os enunciados que produ-zimos no sentido de determinadas conclusões (com exclusão de outras). Em outras palavras, procuramos

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dotar nossos enunciados de determinada força argumentativa.

De acordo com a perspectiva teórica de Vygotsky (1991, p. 73-89), o professor tem um papel fundamental na mediação do conhe-cimento para os alunos. Esse processo de mediação torna-se mais efetivo quando ocorre de forma dialógica.

Garcia (1992, p.352) explica que “[…] argumentar é, em úl-tima análise, convencer ou tentar convencer mediante apresentação de razões, em face da evidência das provas e à luz de um raciocínio coerente e consistente”, ou seja, argumentar, neste estudo, signifi ca produzir ideias para o texto. Para expor as ideias ou para convencer alguém, é preciso conhecer o assunto tratado, uma vez que ninguém consegue escrever bem, se não conhece o que vai escrever. É preciso, antes de qualquer movimento, conhecer profundamente o objeto de refl exão. Para escrever, assim, a respeito de qualquer assunto, é ne-cessário, antes, ler e refl etir, procurando argumentos que serão apre-sentados como elementos de sustentação temático-textual.

Os PCN (BRASIL, 2008, p.45) orientam princípios e fundamentos para a educação básica:

O professor deve construir uma formação teórica e pedagógica que lhe propicie, numa visão interdisci-plinar, compreender seu objeto de ensino e intervir nas realidades com as quais convive em sua atuação docente.

Como o objetivo não é meramente o de ensino de produção de texto, mas também de formação consciente sobre os assuntos que interferem na vida do indivíduo na sociedade, ensinar a construir ideias para produção textual não se limita a ensinar habilidades lin-guísticas, pois inclui também formação para a cidadania. Quando os discentes emitiam informações sobre a infl uência da internet na sociedade atual, não apenas construíam o conteúdo do texto, mas também estavam aprendendo a formar juízos de valor sobre fatos do mundo. Infelizmente, a realidade tem revelado contradições e defi -ciências graves no que se refere ao ensino. Nessa luta, podemos usar estratégias como o despertar dos alunos por meio de discussão de ideias, manifestações de opiniões e o trabalho com debates. Afi nal, produzir textos inclui ações linguísticas, sociais e cognitivas.

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Marcuschi (2008, p.275-276) comenta que sendo o propósito do professor ensinar textos, é preciso gerenciar o sistema de ativi-dades em sala de aula. Para isso, ele deve tornar o aluno um usuário mais habilidoso, fl exível, versátil, conhecedor da linguagem em di-versos contextos, sendo capaz de: a) reconhecer o valor do texto; b) dizer o que se pretende com aquele texto; c) indicar o potencial do enunciado naquele texto; d) reconhecer as variáveis de contextos dos textos.

Entretanto, em virtude da prática de codifi cação, os alunos são submetidos a escrever sem saber, porque escrevem e não compreen-dem o sentido de suas escritas. Para Antunes (2003, p.47),

Embora o sujeito com quem interagimos pela escri-ta não esteja presente à circunstancia da produção de texto, e inegável que tal sujeito existe e é imprescindí-vel que ele seja levado em conta, em cada momento.[...] quem escreve na verdade escreve para alguém, ou seja, está em interação com outra pessoa. Essa outra pessoa e a medida, e o parâmetro das decisões que de-vemos tomar acerca do que dizer, do quando dizer e de como fazê-lo.

Para tal efeito é necessário um trabalho bastante minucioso no que diz respeito à produção de texto, para que estas habilidades sejam devidamente trabalhadas nas escolas junto aos alunos, esti-mulando-os a construir seus próprios argumentos e atender suas ne-cessidades, a fi m de que não produzam uma escrita mecânica, mas sim uma escrita signifi cativa, com afi rmações respaldadas em argu-mentos claros e concisos. Para argumentar, o sujeito precisa ter um ponto de vista formado e determinado conhecimento sobre o objeto discursivo.

De acordo com Mosca (1999), a argumentatividade faz parte de toda atividade discursiva. Para a autora, argumentar pressupõe considerar o outro, considerar a interação e a reação do sujeito dian-te de propostas e possibilidades que lhe são apresentadas. Implica, ainda, a possibilidade de discussão dos interlocutores frente ao ob-jeto discursivo. No entanto, há uma ressalva: “Na verdade, o envol-vimento não é unilateral, tendo-se uma verdadeira arena em que os interesses se entrechocam, quando o clima é de negociação, em que prevalece o anseio de infl uência e de poder” (MOSCA, 1999, p. 17).

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Argumentar não é um comportamento a ser apresentado ape-nas por fi lósofos ou cientistas. Ele é útil para a vida cotidiana e profi s-sional de qualquer pessoa. A diversidade de situações em que o “ar-gumentar” é fundamental na vida das pessoas possibilita concebê-lo como um comportamento básico, o que indica a necessidade de que ele seja apresentado corretamente e, consequentemente, aprendido com alto grau de efi cácia desde os primeiros anos de formação das pessoas. Muitos alunos, ao serem solicitados a escrever um texto dis-sertativo com o tema “A Infl uência da Internet na Sociedade Atual”, tiveram difi culdade na construção de seus argumentos.

A internet faz nós conhecer o mundo, e é um pouco de passa tempo, para as pessoas que não têm trabalho, e a ajuda a sociedade. Enfi m, toda hora sempre tem qualquer pessoa em frente de um monitor observan-do o que acontece no mundo de bom e pior. ( W, alu-no do 2° ano “A”).

Dessa mesma forma acontece nessa outra citação de redação: a aluna, ao tentar argumentar sobre os benefícios que se adquire na internet, acaba reduzindo seu texto com a frase “[...] ela tem tudo e muito mais”, além disso, percebemos a falta de coerência e de orga-nização nas ideias.

Na internet temos tudo de bom e muito mais. A in-ternet é o melhor pra nós. Tem empregos, bate-papos, cursos, isso é tudo e mais opções que tem claramente no mundo virtual.(Q, aluna do 2° ano “A”).

Outro exemplo que mostra essa difi culdade e que também comprova claramente os sentimentos do autor em relação ao tema discutido:

Sou contra o casamento entre homossexuais, pois isso é contra os bons costumes e a vontade de Deus. Como eles vai ter fi lhos e procriar, se essa é a verdadeira lei da vida. Ora o que é certo é certo e o que é errado é errado. Isso não é preconceito é a minha opinião. (T, aluna do 2° ano “F”).

Vemos na citação da aluna do 2° ano “F” que além de a mesma dizer que não é a favor e que é a sua opinião, o que mostra o envol-vimento ou subjetividade do autor, há uso de argumentos repetidos,

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constituindo um texto com problemas de organização das ideias, falta de clareza e até mesmo falta de conhecimento. Todos esses cri-térios são analisados em um texto dissertativo. Foi feito um trabalho com a reelaboração de frases, períodos e parágrafos para que se atin-gisse o propósito do texto.

A argumentação visa, sobretudo, convencer, persuadir ou in-fl uenciar o leitor ou o ouvinte, mas isso é feito com um trabalho com a linguagem. Garcia (1992, p.370) explica que:

Na dissertação, expressamos o que sabemos ou o que acreditamos saber a respeito de determinado assunto, externamos nossa opinião sobre o que é ou nos parece ser. Na argumentação, além disso, procuramos prin-cipalmente formar a opinião do leitor ou do ouvinte, tentando convencê-lo de que a razão está conosco, de que nós é que estamos posse da verdade.[...]Argu-mentar é, em última análise, convencer ou tentar con-vencer mediante a apresentação de razões, em face da evidência das provas e a luz de um raciocínio coerente e consistente. (GARCIA,1992, p.370).

Percebemos, dessa forma, a necessidade de serem implanta-das nas escolas condições que possibilitem aos alunos apresentar o “exercício real da cidadania”, o que implica os alunos aprenderem a argumentar com outras pessoas, tirarem conclusões próprias e jus-tifi cá-las, opinarem a respeito de diferentes fenômenos, entre outras aprendizagens.

O planejamento das atividades na escola observa os pontos negativos e positivos e deixa abertura para adequação à prática. A proposta inicial do projeto era atender aos alunos com maiores di-fi culdades no que diz respeito aos conhecimentos de texto disserta-tivo. Os bolsistas agendavam suas datas de ida à escola e tentavam ajustar as datas aos dias de aulas de redação. Nestes dias, os profes-sores fi cam com os alunos que têm menos difi culdades com escrita e liberam os alunos que têm mais difi culdades para uma sala espe-cial, e estes eram acompanhados pelos bolsistas. Os bolsistas, dois ou três, fi cavam acompanhando os alunos e desenvolviam atividades de estudo de texto dissertativo, promovendo estratégias de ensino, pro-dução e análise de textos. Determinado o grupo, o trabalho passava a ser menos complexo, devido à menor quantidade de alunos, que

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apresentavam mais atenção e proximidade para tirarem possíveis dúvidas.

Porém, devido ao comprometimento das atividades dos pro-fessores desses alunos, o projeto não funcionou dessa forma, passan-do a se realizar no contra-turno. Infelizmente, devido à baixa quanti-dade de alunos frequentes, foi fi nalizado na própria sala de aula (em forma de tutoria: auxílio ao professor com ofi cinas em sala), o que trouxe resultados positivos. Certamente que o aumento do número de alunos difi culta o atendimento no processo de aprendizagem. En-tretanto, foram elaboradas ofi cinas para as aulas que tivessem como intuito chamar a atenção do aluno e mantê-los por um grande espa-ço de tempo.

Um dos maiores problemas notados nas produções textuais dos alunos foi a construção de argumentos. Notamos que os dis-centes gostavam de dar suas opiniões sobre os assuntos tratados em sala de aula, mas tinham muita difi culdade em retratar seus pensa-mentos e opiniões no papel. Essa questão talvez seja provocada por diversas causas, como falta de conhecimento sobre o assunto, falta de leitura e interesse do próprio aluno e até mesmo a própria esco-la, que não cumpre com a missão de formar um educando crítico, transformador.

Alguns alunos melhoraram suas produções, principalmente em relação à estrutura (introdução, desenvolvimento e considera-ções fi nais). Os textos apresentaram mais coerência e somente um pequeno grupo ainda confunde o uso da primeira pessoa singular/plural. Constatamos que os discentes ainda não conseguem desen-volver o assunto e defender os seus argumentos com suas próprias opiniões, devido à falta de leitura e conhecimento.

Os vídeos e as discussões serviram para auxiliar os alunos a desenvolver seus sensos críticos, para amenizar a difi culdade na construção de argumentos e organização de ideias. Levando tais as-suntos para eles em sala de aula, contribuímos para motivá-los a ler, a dizer suas difi culdades e solucionar seus problemas com a constru-ção de argumentos críticos e objetivos.

O comportamento dos alunos era maleável, sem muitas consi-derações e grandes alterações. Não era necessário chamar a atenção ou suspender as atividades o tempo todo, pois a metodologia que

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empregamos é, para eles, algo novo e diferente das aulas cotidianas. Em relação à participação, alguns alunos eram bastante participati-vos, atentos e demonstravam interesse pelas aulas. Em contrapartida, outros alunos demonstravam total falta de interesse e participação escassa, para não dizer nenhuma.

Essa experiência foi muito gratifi cante e fez com que nós, bol-sistas, sentíssemos que o trabalho como professor não é fácil, pois é uma profi ssão que requer empenho e esforço. Não basta apenas ao educador ter conhecimentos e transferi-los. É necessária refl exão diante daquilo que se espera alcançar e, daquilo que é alcançado, de-vemos dimensionar o que deu certo e o que não deu, refl etir e estu-dar o que deve ser feito para melhorar.

É importante ressaltar que em vídeos gravados com os depoi-mentos de alguns alunos, o aluno R, do 2° ano “A”, falou da importân-cia do projeto do PIBID, que tem trabalhando o gênero dissertativo porque é um assunto bastante cobrado em vestibulares e concursos públicos.

A aluna J, do 2° ano “F”, disse que suas redações melhoram muito, pois está usando tudo que aprendeu no PIBID, elogiou a me-todologia com notícias polêmicas e contemporâneas (porque dimi-nui a difi culdade de organizar suas ideias) e, além disso, falou da importância do projeto na vida de outros alunos.

L, aluna do 2° ano “F”, fala da ajuda do PIBID na vida dela e também na vida de seus colegas de sala, devido à forma que as re-dações saem depois das aulas, e pede a permanência do projeto de redação PIBID. Nos relatos pessoais, a aluna A, do 2° ano, escreveu:

Foi importante para mim porque, irá me ajudar muito em qualquer tipo de redação nas quais irei fazer em exames, como um dos mais importantes o “ENEM”, quem deu para mim e para muitas outras pessoas, esta experiência, foram as alunas do PIBID da UVA, por isso também agradeço pela a ajuda que nos deram.

Depois da realização do projeto pelos bolsistas do PIBID, os alunos têm praticado mais a escrita, e o interesse pela leitura infor-mativa está aumentando. Quanto às correções dos textos, não come-tem mais os mesmos problemas com a escrita e conseguem avaliar

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seu próprio rendimento. Também conta o apoio do professor, que participa tirando as dúvidas e nas correções. Assim, há uma parceria entre bolsistas e professores, unidos na superação das difi culdades e pela melhoria no ensino da escrita, incentivando sempre os alunos a buscar o conhecimento, que será cobrado futuramente em vestibula-res e concursos e que servirão para a sua vida no dia a dia.

Considerações FinaisA partir do trabalho desenvolvido pelos bolsistas do PIBID,

observamos que os alunos apresentaram melhoria em suas produ-ções, diminuíram as difi culdades de escrita, principalmente em re-lação à organização de ideias, de forma a deixar o texto coerente e coeso. Os alunos mais problemáticos, no início, não queriam escre-ver, porém foi observado que esses mesmos alunos, depois, começa-ram a gostar de falar suas opiniões acerca das temáticas trabalhadas. Esse ponto foi crucial para incentivá-los a escrever o que estavam dizendo.

Em vestibulares e concursos, a prova de redação é um grande fator de eliminação. Diferentemente das questões de múltipla esco-lha, através da escrita as instituições têm um indicador mais concre-to da formação do aluno. Dominar a arte de escrever é um trabalho que exige prática e dedicação. Nesse ponto, percebemos o auxílio e a colaboração do Projeto Dissertação desenvolvido pelos bolsistas, já que os mesmos estreitam as relações entre alunos do ensino básico e a Universidade. Através do contato com os bolsistas, os alunos sen-tem-se mais motivados a ingressar no curso superior e reconhecem a importância e peso da redação nos vestibulares, meio pelo qual adentrarão à Universidade. Outra importância do PIBID é que ele aproxima os acadêmicos do espaço escolar, concedendo-lhes expe-riência e desenvolvimento nas áreas trabalhadas.

Quanto ao trabalho com a interdisciplinaridade, percebemos que ela oferece a possibilidade da preparação do ser humano, com um conhecimento completo e total, não fragmentado, que seja ca-paz de criar uma nova história enquanto tal. A interdisciplinaridade busca uma integração entre as disciplinas e não uma simples jun-ção de matérias. Não é, também, uma nova disciplina, mas uma for-ma de proceder, de ver os alunos de um modo mais pessoal, como

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sujeitos do processo e não como meros participantes. Estes discentes se comportam e agem segundo o meio de onde vêm e buscam o co-nhecimento para realizar uma transformação, primeiro na sua vida, para depois tentar mudar a sociedade e construir uma nova histó-ria. Além disso, a interdisciplinaridade facilita a aprendizagem, pois mostra sua utilização no dia a dia.

O ensino de sociologia, enquanto mais uma das ferramentas para a construção de uma sociedade democrática e cidadã, aliada aos demais campos do conhecimento científi co e à vivência cotidiana dos estudantes, é muito proveitoso à prática pedagógica. O estudo de um mundo teórico evidenciando as tensões existentes na realidade social pode tornar o estudo da sociologia signifi cativa para a vida do estudante. Também contribui para que os alunos despertem os seus interesses em participar das discussões sobre temáticas sociais e es-timula na construção de argumentos, na prática de produção textual e na oralidade, no sentido da produção de um raciocínio lógico. As-sim, o ensino de produção de texto extrapola o limite da linguística e adentra o universo do social, da história, da vivência das pessoas na sociedade.

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A MATEMÁTICA PRESENTE NA CONTA DE ENERGIA ELÉTRICA

Joelma Alves RodriguesEstudante do Curso de Licenciatura em Matemática da Universidade Estadual Vale do Acaraú – UVAFrancisco Neto Frota MagalhãesEstudante do Curso de Licenciatura em Matemática da UVAMárcio Nascimento da Silva (Orientador)Mestre. Professor do Curso de Licenciatura em Matemática da UVA

IntroduçãoSabemos que a matemática está muito presente no dia a dia do

homem. Ao se contar as horas, fazer compras, praticar um jogo ou esporte, entre outros afazeres, tudo isso envolve matemática.

A conta de energia não é diferente, ela faz parte da vida da maioria das pessoas e se utiliza muito da matemática. Não só para o cálculo do consumo de energia, mas também para determinação de tarifas embutidas nos tributos, que compõem o valor fi nal da conta.

A energia elétrica, desde a sua descoberta, sempre ocupou lu-gar de destaque, tendo em vista aspectos ligados à qualidade de vida das pessoas, ao progresso econômico e à oferta de produtos e servi-ços, que, por sua vez, dependem de como as empresas de eletricidade projetam, operam e mantêm os sistemas elétricos de potência.

A multiplicidade de aplicações e a comodidade da utilização da energia elétrica tornaram-na um recurso essencial à sobrevivência do homem e indispensável ao desenvolvimento socioeconômico das nações [...] (Por Dentro da Conta de Luz, AGÊNCIA NACIO-NAL DE ENERGIA ELÉTRICA – ANEEL, 2008, P. 8).

Desde o processo de geração de energia até a sua chegada aos consumidores, há bastante matemática envolvida, assim como na composição da conta de energia.

Este trabalho apresenta um projeto realizado por dois estu-dantes bolsistas do Programa Institucional de Bolsa de Iniciação a Docência (PIBID), do curso de Licenciatura em Matemática, da Universidade Estadual Vale do Acaraú (UVA), idealizado a partir do

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projeto Matemática Concreta II1, desenvolvido por todos os estu-dantes bolsistas do subprojeto de Matemática do PIBID UVA. Aqui será relatada uma atividade cuja fi nalidade foi a de auxiliar os alu-nos no entendimento de sua conta de energia, usando a matemática como ferramenta principal.

Foi mostrado aos alunos do Ensino Médio do Colégio Esta-dual Dom José Tupinambá da Frota, como é calculada a conta de energia de suas residências, assim como o processo de elaboração da conta, como, por exemplo, o que é cobrado de imposto e o que se consome de fato em Kwh.

ObjetivosO presente texto tem por objetivo apresentar o projeto “A Mate-

mática Presente na Conta de Energia Elétrica” desenvolvido na referida escola e envolvendo os alunos do Ensino Médio, com a fi nalidade de mostrá-los a presença da matemática tanto na sua conta de energia elé-trica quanto no seu dia a dia.

Cabe enfatizar que para os bolsistas do PIBID e desenvolvedores do projeto, essa atividade buscava ser mais uma experiência na qual os universitários – futuros professores – pudessem planejar, executar e ava-liar ações voltadas para o ensino de matemática partindo de elementos presentes na vida dos estudantes da educação básica.

Metodologia da Intervenção DidáticaPara entender a conta de energia elétrica e saber realizar todos

os cálculos necessários para encontrar o valor cobrado na conta, as rincipais perguntas que todos fazem são: O que é cobrado na conta de energia elétrica? O que são encargos e tributos? Como realizar os cálculos para encontrar o valor cobrado na conta de energia?

No Brasil, as empresas que fornecem energia elétrica são con-troladas pela Agência Nacional de energia elétrica - ANEEL. Além do valor cobrado pelo consumo de energia elétrica, a conta inclui três custos distintos: geração de energia; transporte de energia até as casas mais a distribuição e encargos e tributos.1 É um projeto desenvolvido com a fi nalidade de trabalhar com os estudantes das escolas parceiras do PIBID, assuntos do cotidiano envolvendo a matemática e que possam ser trabalhados com o uso de materiais concretos.

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Os custos com geração de energia são cobrados para cobrir os gastos dos componentes necessários para a geração. Já o valor refe-rente ao transporte de energia e distribuição é o custo da transmis-sora e os serviços prestados pela distribuidora.

Os encargos setoriais são criados por leis aprovadas pelo Con-gresso Nacional. Seus valores constam de resoluções ou despachos da Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL) e são recolhidos pelas distribuidoras por meio da conta de energia.

Os tributos são pagamentos compulsórios devidos ao poder público, a partir de determinação legal e que asseguram recursos para que o governo desenvolva suas atividades. No Brasil, os tributos estão embutidos nos preços dos bens e serviços, por isso estão pre-sentes nas contas de água, energia e telefone, na compra de bens e na contratação de serviços diversos. Na conta de energia, são cobrados tributos federais (PIS2 e COFINS3), estaduais (ICMS4) e municipais (CIP5 ou COSIP, que é a taxa de iluminação pública).

Para a determinação do valor fi nal na conta de energia elétri-ca, o primeiro passo é calcular o valor da tarifa incluindo os tributos. Para isso, é necessário usar a seguinte fórmula:

Valor da Tarifa cobrada pela ANEEL1-(PIS+COFINS+ICMS)-

Para saber o valor da tarifa publicada pela ANEEL e as alíquo-tas cobradas pelo PIS, COFINS e ICMS, deve-se consultar o site da ANEEL (http://www.aneel.gov.br).

De acordo com as pesquisas feitas pelos bolsistas, a alíquota média do PIS/COFINS aplicado é 5,335%, a alíquota do ICMS apli-cado ao consumidor residencial é 27% e o valor da tarifa publicado pela ANEEL para um consumidor classifi cado como residencial é R$ 0,36805 por KWH6 (estabelecido pela resolução ANEEL nº 321, de 18/04/2006).

2 Programa de Integração Social3 Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social4 Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços5 Contribuição para Custeio do Serviço de Iluminação Pública6 Signifi ca quilowatt-hora. Um KWH é a quantidade de energia utilizada para

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Com esses dados, obtém-se, já com os tributos embutidos, um valor de 0,54409047 R$/KWH.

O segundo passo é calcular o consumo de energia da residên-cia em KWH e em seguida seu custo em reais. Para isso, basta seguir as seguintes etapas: 1ª) Saber a potência (em quilowatt, isto é, 1000w) dos aparelhos. 2ª) Determinar o tempo mensal em horas (a partir de uma estimativa diária) que estes aparelhos fi cam ligados. 3ª) Calcu-lar o consumo mensal de energia de cada aparelho, ou seja, multipli-car a potência do aparelho pelo tempo de uso mensal.  4ª) Calcular o valor do consumo, em reais, multiplicando a quantidade de energia consumida (em Kw) pelo valor do KWH.

Para encontrar o valor total cobrado na conta de energia, após encontrar o consumo de energia em reais consumido em sua residência, basta adicionar a ele o valor correspondente a CIP ou COSIP, que é cal-culada proporcionalmente ao consumo individual de cada contribuinte, seja ele residencial, comercial, industrial ou prestador de serviço.

No quadro a seguir, um exemplo com aparelhos comuns nas residências:

APARELHO (NOME)

Potência (Watt)

Uso Diário (min)

Uso Mensal (horas)

Energia (kW.h)

Custo mensal (R$)

Geladeira 2 portas 240 600 300 72 39,17

TV à cores de “29" 150 300 150 22,5 12,24

Condicionador de ar 7000 BTU 1000 120 60 60 32,64

Aparelhagem de som 40 240 120 4,8 2,61

Vídeo game 15 180 90 1,35 0,73Batedeira 200 50 25 5 2,72Cafeteira 750 60 30 22,5 12,24Microondas 1500 120 60 90 48,96TOTAL 3895 1670 835 278,15 151,31

Quadro 1: Exemplo de consumo mensal de energia em uma residência.Fonte: Coleta direta.

alimentar uma carga com potência de mil watts, pelo período de uma hora.

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Ressaltamos que os cálculos feitos até se chegar ao preço fi nal cobrado na conta de energia, não incluem multa e juros. Além disso, as alíquotas cobradas pelos tributos podem variar de um mês para outro e de um lugar para outro.

Para uma aprendizagem mais satisfatória dos alunos, seja de matemática ou de qualquer outra disciplina, é interessante, quando possível, fazer o uso de metodologias e recursos que tornem as aulas mais interessantes e prazerosas.

Ao analisar o signifi cado da utilização dos recursos didáticos no ensino da geometria, Pais (2000, p.30) afi rma que

Os recursos didáticos envolvem uma diversidade de elementos utilizados como suporte experimental na organização do processo de ensino e de aprendiza-gem. Sua fi nalidade é servir de interface mediadora para facilitar na relação entre professor, aluno e o co-nhecimento em um momento preciso da elaboração do saber.

A escolha do recurso usado nesse projeto – a conta de energia – foi feita baseada tanto na importância de se entender bem o que e como é cobrada a energia que se consome nos lares e também como oportunidade de se trabalhar assuntos como porcentagem, regra de três simples, as quatro operações aritméticas e o estudo de gráfi cos.

A realização dessa atividade deu-se na tarde do dia 21 de mar-ço de 2013 com quatro estudantes do 1º ano do Ensino Médio, do Colégio Estadual Dom José Tupinambá da Frota, localizado na cida-de de Sobral, Ceará.

Fora feito um convite aos alunos do turno da manhã, em todas as turmas do Ensino Médio da escola citada acima. Os bolsistas pas-saram nas salas fazendo o convite e, no mesmo momento, já realiza-vam as inscrições dos alunos que desejavam participar do projeto. No ato da inscrição, os alunos eram informados que deveriam levar uma conta de energia de sua casa para ser utilizado durante a reali-zação do projeto.

Na atividade foi trabalhada a conta de energia padrão para o estado do Ceará, cuja empresa responsável é a Companhia Energéti-ca do Ceará (COELCE), criada em agosto de 1971, que atende quase dois milhões de unidades consumidoras residenciais, além de 6,5 mil unidades consumidoras industriais, 139 comerciais, 209,8 mil rurais,

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dentre outros, com atendimento total de 2,34 milhões de unidades consumidoras em uma área de concessão de 146.817 KM2.

As atividades foram iniciadas com a apresentação do projeto aos alunos, para que os mesmos tivessem conhecimento do que seria trabalhado, seguido de um vídeo no qual era explicado o funcio-namento do sistema elétrico brasileiro. Para isso, foram expostas informações tais como, geração, transmissão, distribuição, comer-cialização, o que é a ANEEL e o que é cobrado na conta de energia, verifi cando a presença da matemática na conta.

Figura 1: Apresentação do projeto aos estudantes.

Fonte: Coleta direta.

Em seguida, foi feita uma refl exão baseada na seguinte per-gunta: “De que forma a matemática está presente na conta de ener-gia elétrica?”, para que eles percebessem a necessidade e utilidade da matemática. Logo depois, foram apresentados os conteúdos aborda-dos necessários para a realização dos cálculos da conta de energia: porcentagem, regra de três simples, as quatro operações e um peque-no estudo de gráfi cos.

Um pré-teste contendo cinco questões – três questões abor-dando os conteúdos citados acima e duas específi cas sobre a conta de energia – foi aplicado para avaliar os conhecimentos prévios dos alunos.

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Figura 2: Estudantes entendendo como é composta a conta de energia elétrica.Fonte: Coleta direta.

Após o pré-teste, passamos à apresentação dos componentes da conta de energia elétrica, assim como aos cálculos do valor da tarifa incluindo os tributos (PIS/ COFINS e ICMS), do consumo de energia em KWH e seu custo em reais, e o cálculo do valor total co-brado na conta de energia elétrica incluindo a CIP ou COSIP. Ocor-reram também, de forma rápida, exemplos e explicações sobre como é feito a redução para consumidores de baixa renda.

Em seguida, os alunos passaram a verifi car as contas de ener-gia de suas residências, levadas para a atividade.

Para encerrar , o teste inicial foi reaplicado com a fi nalidade de avaliar o progresso dos estudantes e o que eles absorveram com a realização das atividades.

Discussão dos ResultadosCom a correção do pré-teste, foi diagnosticado que os estu-

dantes não tinham conhecimento algum sobre os cálculos da conta de energia. Alguns conseguiram resolver parte das questões sobre os conteúdos a serem trabalhados, mas nenhum dos alunos conseguiu resolver as questões específi cas sobre a conta de energia.

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Figura 3: Estudante resolvendo o pré-teste.Fonte: Coleta direta.

Quando os bolsistas trabalharam com os estudantes os cálcu-los necessários para encontrar o valor total da conta de energia elé-trica, vimos que o conhecimento dos mesmos acerca do assunto era mínimo. Ao pegarem a própria conta, não sabiam por onde começar a calcular, não tinham entendimento algum.

Os alunos sentiram muitas difi culdades, cada etapa era um desafi o para eles. Foi preciso explicar várias vezes, passo a passo, até eles se sentirem mais confi antes e seguros. O momento mais difícil foi na hora de calcular o valor da tarifa incluindo os tributos, pois era complicado para eles além de ter que aprender realizar os cálculos, ter que entender o que é tributo e por que isso é cobrado. Enfi m, situações que eles não eram acostumados a vivenciar. Vale lembrar que, as difi culdades dos estudantes não foram apenas a respeito da conta de energia, mas também em relação aos conteúdos abordados. Porém, após algumas explicações, todos conseguiram entender todo o processo e realizar os cálculos.

Com a correção do teste fi nal, averiguamos que os estudantes progrediram consideravelmente em relação ao resultado obtido ini-cialmente, justifi cando que o projeto promoveu aos estudantes uma melhor visualização acerca do assunto trabalhado. Além de enten-derem os cálculos realizados na conta, eles aprimoraram seus co-nhecimentos acerca dos conteúdos matemáticos, tendo um avanço signifi cativo, principalmente, no estudo de regra de três simples e porcentagem.

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Figura 4: Estudantes resolvendo o teste fi nal.

Fonte: Coleta direta.

Já para os bolsistas, as difi culdades encontradas já eram es-peradas, uma vez que no trabalho de observação realizado ao longo do ano, percebeu-se a defi ciência dos estudantes em certos assuntos. Em todas as escolas parceiras do subprojeto de matemática do PI-BID/UVA, nas quais

Já para os bolsistas, as difi culdades encontradas já eram espe-radas, uma vez que no trabalho de observação realizado ao longo do ano, percebemos a defi ciência dos estudantes em certos assuntos. Em todas as escolas parceiras do subprojeto de matemática do PI-BID UVA, nas quais os bolsistas realizam as observações em sala de aula, é possível perceber várias difi culdades dos alunos, em diversos conteúdos e, por incrível que pareça, muitos alunos, mesmo sendo do Ensino Médio, ainda sentem difi culdade com relação às quatro operações aritméticas, algo que não deveria acontecer, mas infeliz-mente acontece. Visando minimizar essas difi culdades, os bolsistas elaboram projetos como este, trabalhando com recurso didático di-ferentes, buscando relacionar a matemática com o cotidiano dos alu-nos, para reforçar e facilitar o aprendizado dos mesmos.

Caldeira (2007, p. 74) também defende a ideia de que o estu-dante pode aprender melhor com essa interação entre matemática e realidade, quando afi rma que

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[…] o ensino e aprendizagem da matemática na esco-la básica, partindo da realidade do(a) estudante con-textualizado(a) sócio e culturalmente, proporcionará múltiplas alternativas que o(a) levará a desenvolver o pensamento lógico, a criatividade a aprender os con-teúdos e a construir estruturas matemáticas, não só enfatizando os algoritmos e os conceitos matemáti-cos, mas usando-os na compreensão da dinâmica da realidade social, histórica e cultural, em um processo contínuo de elaborar e sistematizar

Considerações FinaisA realização do projeto “A Matemática Presente na Conta de

Energia Elétrica” foi, de fato, muito recompensador, pois usar a con-ta de energia para ensinar matemática é uma forma diferente de se trabalhar, tornando a matemática mais próxima dos alunos e, assim, facilitando o aprendizado dos mesmos. Sabemos que trabalhar com recursos diferentes e buscar novas metodologias de ensino, propor-cionam um melhor ensino-aprendizagem.

Vale ressaltar que além de um maior esclarecimento a respeito da conta de energia, tornando os alunos capazes de realizar os devi-dos cálculos sozinhos, este projeto também mostrou aos estudantes a grande importância e utilidade da matemática na vida do homem e como ela pode ajudar na resolução de problemas.

Os estudantes sentem-se motivados quando é aplicado um novo método de ensino, diferente do que eles geralmente costumam ver em sala de aula. Em consequência, os mesmos se tornam mais participativos. Com as experiências vividas pelos bolsistas do PIBID em sala de aula, percebendo as difi culdades dos alunos em apren-der matemática e o quanto a utilização de outros recursos facilita a aprendizagem dos mesmos, há um despertar do pensamento crítico em relação a sua futura prática docente, fazendo com que os futuros profi ssionais entendam que a utilização de metodologias inovadoras é um instrumento poderoso que pode favorecer na formação dos estudantes.

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MATEMÁTICA APLICADA À QUÍMICA DE MATERIAIS: CONCRETIZANDO O ENSINO DE GEOMETRIA

Josué Martins Gonçalves1; Felipe Dias de Araújo1; Josafá Martins Gonçalves2 e Murilo Sérgio da Silva Julião3.1Discente do Curso de Licenciatura em Química – UVA. Bolsista do PIBID/CAPES.2Discente do Curso de Licenciatura em Matemática – UVA. Bolsista do PIBID/CAPES.3Docente do Curso Química – UVA. Orientador do PIBID/CAPES.

Palavras chave: Células Unitárias. Ensino. Geometria. Materiais. Química.

IntroduçãoO presente trabalho se origina da preocupação com o ensi-

no da Geometria Espacial. Experiências pessoais, vivenciadas como discente e docente revelam uma desmotivação na aprendizagem da Geometria associada às difi culdades na compreensão de conceitos, demonstrações e aplicações do referido conteúdo. Observações pos-sibilitam verifi car que o ensino da geometria tem se apresentado ri-gorosamente abstrato, com transmissão de regras e memorização de fórmulas através de extensos exercícios mecânicos de lápis e papel (SANTOS, 2009).

Baldissera afi rma que:Num primeiro momento o estudo da Geometria não faz nenhum sentido para os alunos. Geralmente é ensinada sempre partindo da geometria plana, apre-sentando as fi guras achatadas, desenhadas no livro, dando pouca ênfase para a tridimensionalidade, não integrando os objetos sólidos com o espaço, a repre-sentação das formas, e principalmente não fazendo relações com objetos de nossa realidade. Atualmente as escolas trabalham a geometria espacial por meio de dedução das fórmulas e resolução de exercícios, sendo um trabalho muito mecânico. Com isso os alu-nos se confundem na realização das atividades e não compreendem os conteúdos e conceitos da mesma. Pelo fato de apresentar uma quantidade de fórmulas, os alunos não conseguem visualizar os objetos e nem

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fazer relação com os que estão ao seu redor (BALDIS-SERA, p. 1).

De acordo com Santos (2009), há muito tempo é sabido que a matemática é de grande importância na vida das pessoas, entretanto, da forma que a matemática é abordada atualmente nas escolas há poucas explicações de quando, como usá-la e qual a contribuição dessa Ciência no desenvolvimento da humanidade.

Neste sentido, faz-se importante conhecer a aplicação desta ciência em outras áreas do conhecimento, sempre enfatizando os motivos da valorização ensino-aprendizagem, pois segundo Baldis-sera (2013, p. 6), “Conectar a geometria a outras áreas do conheci-mento qualifi ca o aprendizado, capacita o aluno a ter uma visão mais ampla e íntegra, resgatando a matemática do abstrato para o mundo concreto”.

Reconhecendo que uma das grandes difi culdades dos alunos em relação à geometria está na falta de conexão do seu ensino com a realidade (SANTOS, 2009), este trabalho buscou desenvolver uma estratégia de ensino mais contextualizado e que promovesse a inte-gração entre áreas distintas do conhecimento, tais como química dos materiais e a geometria. Tem-se como proposta deste a compreensão da importância dos recursos palpáveis no processo de ensino-apren-dizagem da geometria.

Este trabalho traz um aprofundamento no conhecimento de geometria básica aplicada em certos aspectos da Química de ma-teriais. Diante desta situação, o objetivo deste trabalho consiste em concretizar a dinâmica do ensino de geometria, ressaltando a im-portância desta disciplina para compreendermos o espaço que to-dos estamos contidos e do conhecimento do mundo microscópico da Química, no qual as diversas substâncias que conhecemos estão organizadas.

Materiais e MétodosOs materiais utilizados nesse processo de ensino-aprendiza-

gem foram amostras de células unitárias de algumas estruturas cris-talinas, confeccionadas com madeira e isopor.

A metodologia foi baseada na construção e utilização de mo-delos concretos para a visualização em aulas de matemática na Escola

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Estadual de Ensino Médio Israel Leocádio de Vasconcelos localizada no distrito de Aracatiaçu – Sobral. Para isso, foram propostas aulas diferenciadas que permitiram a visualização e o contato físico dos alunos com as diferentes células unitárias das estruturas cristalinas com o objetivo de estimular a criatividade dos alunos buscando comprovar matematicamente algumas propriedades das estruturas cristalinas.

As atividades destas aulas foram realizadas com alunos de di-ferentes turmas do 2º e 3º do ensino médio. A escolha dessas turmas está relacionada ao assunto que foi desenvolvido durante a realização deste trabalho, uma vez que na matriz curricular desta escola con-ceitos de geometria espacial são inicialmente trabalhos do 2º ano do ensino médio.

O procedimento metodológico consistiu em duas aulas (2 horas/aula): na primeira aula destacou-se a importância da Geome-tria na compreensão da Química de Materiais e sólidos geométricos foram utilizados para permitir a visualização e o contato físico dos alunos com as diferentes células unitárias das estruturas cristalinas. Na segunda aula foi trabalhado o pensamento geométrico dos alu-nos: numa primeira etapa os estudantes foram estimulados a calcular o número de átomos (Nat) e o do fator de empacotamento atômico (FEA) das células unitárias que estavam visualizando e na etapa se-guinte, foi aplicado um questionário de múltipla escolha para avaliar se os estudantes compreenderam o assunto.

Resultados e DiscussãoPara melhor entendimento das refl exões, as atividades realiza-

das na escola foram divididas em quatro etapas, que são:Aula expositiva sobre importância da geometria na Química

de Materiais.Amostras de células unitárias das estruturas cristalinas.Cálculo do número de átomos (Nat) e o do fator de empacota-

mento atômico (FEA).Aplicação de questionário de múltipla escolha.

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Aula expositiva sobre a importância da geometria na Química de materiais

Neste primeiro momento destacou-se a aplicação de conceitos geométricos quando falamos das estruturas cristalinas presentes nas diversas substâncias que encontramos no dia-a-dia. Os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) apresentam a importância destes co-nhecimentos geométricos, pois, por meio deles, “[...] o aluno desen-volve um tipo especial de pensamento que lhe permite compreender, descrever e representar, de forma organizada, o mundo em que vive.” (BRASIL, 1998, p. 51).

Caram Júnior (2013, p. 8) afi rma que:A estrutura dos materiais sólidos é resultado da natu-reza de suas ligações químicas, a qual defi ne a distri-buição espacial de seus átomos, íons ou moléculas. A grande maioria dos materiais comumente utilizados em engenharia, particularmente os metálicos, exibe um arranjo geométrico de seus átomos bem defi nido, constituindo uma estrutura cristalina. Nesses sólidos cristalinos, essa distribuição é muito bem ordenada, exibindo simetria e posições bem defi nidas no espaço.

Nesse sentido, a aprendizagem de alguns conceitos de geome-tria torna-se de fundamental importância para o entendimento da organização espacial das substâncias cristalinas.

Foi mostrado para os alunos que a partir do conceito de estru-tura cristalina, no qual é possível descrever um conjunto de posições atômicas, iônicas ou moleculares repetitivas, é que surge o conceito de célula unitária. Ainda segundo Caram Júnior (2013), uma célula unitária é defi nida como a menor porção do cristal que ainda con-serva as propriedades originais do mesmo. Assim ao estudarmos geometricamente as propriedades de um cristal, estaremos analisan-do apenas sua célula unitária.

Sabendo-se o número de átomos presente em uma célula uni-tária fi ca fácil calcular o FEA, pois o mesmo é defi nido como a ra-zão entre o “espaço ocupado pelos átomos” e o “volume da estrutura cúbica”.

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As células unitárias analisadas, teoricamente pertenciam ao grupo das estruturas cúbicas (simples, de corpo centrado e de face centrada), assim foram exemplifi cadas as substâncias que são orga-nizadas a partir dessas formas. A exemplifi cação é importante, pois mostra para os alunos as diversas substâncias que encontramos no dia a dia e que se organizarão estruturalmente com aquela forma geométrica, por exemplo, o alumínio e o cobre são organizados em estruturas cristalinas de face centrada.

A aula expositiva foi indispensável para introduzir conceitos sobre a Química de materiais e de mostrar a importância da Geo-metria para compreender as propriedades cristalinas das substâncias exemplifi cadas.

Amostras de células unitárias das estruturas cristalinasO segundo momento consistiu de uma aula diferenciada com

aplicação de sólidos geométricos para a visualização das células uni-tárias (Fotografi a 1) e dedução de fórmulas, que trouxe para estes alunos uma maneira diferente de aprender com um direcionamento para a interdisciplinaridade entre as áreas de química e matemática, pois segundo Bolgheroni e Silveira (2008, p. 285), a habilidade de visualizar pode ser desenvolvida, à medida que se forneça ao aluno materiais de apoio didático baseados em elementos concretos repre-sentativos do objeto geométrico em estudo.

Fotografi a 1 – Células unitárias de estruturas cristalinas cúbicas.

Fonte: Josué Gonçalves Martins.

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Santos (2009, p. 15) afi rma que:Cabe ao professor, buscar metodologias que colabo-re para a potencialização das capacidades criativas de seus alunos, explorando conceitos e propriedades da Geometria Plana e Espacial, bem como exercícios de visualização e percepção do espaço, visando dar sig-nifi cância ao estudo da mesma, promovendo-lhes a oportunidade de compreender sua utilidade no coti-diano, na matemática e em outras ciências.

Herron (1975 apud SANTOS, 2009) sugere que conceitos quí-micos podem ser expressos em termos de exemplos concretos com a utilização de modelos de conceitos abstratos; e que expressando conceitos a nível concreto, o estudante vai adquirir um conceito substituto que mais tarde poderá desenvolver um conceito real. Esta sugestão é plenamente aceita, pois o uso de materiais palpáveis torna a aula mais dinâmica e atrativa como mostra a fotografi a 2.

Fotografi a 2 – Alunos visualizando uma célula unitária de estrutura CFC.

Fonte: Josué Gonçalves Martins.

Nesse contexto, o aluno sente-se bastante estimulado no pro-cesso de aprendizagem, pois a visualização das células unitárias das estruturas cristalinas facilita a interpretação geométrica, que por sua vez induzirá os alunos a distinguir as semelhanças e diferenças das mesmas. O pensamento geométrico ativado pela visualização das estruturas trás uma ligação com o domínio do pensamento lógico matemático e este segundo Gardener (1994) é traço de um confronto

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com o mundo dos objetos. Nesse sentido, é indispensável a promo-ção de uma maior integração entre disciplinas, tais como química e matemática, bem como servir de ponto de partida para o desenvol-vimento do ensino interdisciplinar.

Cálculo do Número de Átomos (Nat) e do Fator de Empacotamento Atômico (FEA):

O terceiro momento consistiu no cálculo do número de áto-mos (Nat) e o do fator de empacotamento atômico (FEA) necessários para o entendimento do assunto, pois retrataram de forma matemá-tica o que a visualização das estruturas mostrava. Para esse momen-to, foram utilizadas novamente as células unitárias das estruturas cristalinas para um melhor entendimento das formas geométricas que aquelas possuíam.

Para o cálculo desses parâmetros foi dado bastante destaque à geometria atômica (esférica) e da célula unitária (cúbica), para fi xar a ideia de que o empacotamento atômico depende dessas proprieda-des geométricas. Assim, algumas equações acerca das propriedades dos átomos foram deduzidas e outras foram propostas aos estudan-tes sob a forma de exercícios de fi xação.

a) Cálculo do Nat. e do FEA para estrutura cúbica simples (CS):O arranjo cúbico simples (CS), apesar de pertencer às estruturas

cúbicas, não permite alto grau de empacotamento. Entretanto, a análise desse arranjo é importante no estudo das outras estruturas cúbicas. Nes-se arranjo atômico, existe apenas um átomo em cada vértice do cubo. Na estrutura CS, o parâmetro de rede, defi nido por a, corresponde ao tamanho da aresta desse cubo, ou seja, a = 2r, onde r é o raio atômico. A fotografi a 3 apresenta a estrutura cristalina do tipo CS.

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Fotografi a 3 – Célula unitária da estrutura cúbica simples (CS).

Fonte: Josué Gonçalves Martins.Durante a aula ministrada pelos pibidianos, estes propuseram

que os estudantes calculassem o número de átomos que efetivamente ocupavam a célula unitária (Nat). A observação desta foi de grande importância para concretizar esse cálculo, dessa forma, os alunos concluíram que:

Como forma de classifi car o nível de ocupação pelos átomos em uma estrutura cristalina, deve-se estimar o fator de empacotamento (FEA), que pode ser calculado a partir da Equação 2:

Onde: Nat = número de átomos pertencentes à célula unitária; Vat = volume do átomo (4/3 . π . r3); r = raio atômico e VC = volume da célula unitária (a3).

O fator de empacotamento atômico (FEA) pode ser calculado a par-tir da equação 4:

Ou seja, os alunos puderam provar que apenas 52% desta célula unitária são preenchidos por átomos. Devido ao baixo índice de

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ocupação desta célula, os metais, por exemplo, não apresentam este tipo de arranjo. A única exceção é o polônio (Po).

a) Cálculo do Nat. e do FEA para estrutura cúbica de corpo cen-trado (CCC).

No arranjo CCC existe um átomo em cada vértice de um cubo e outro átomo no centro do mesmo, como pode ser visualizada na Foto-grafi a 4. Esta estrutura pode ser encontrada nos metais cromo, vanádio, zircônio, tungstênio, tântalo, bário, nióbio, lítio, potássio, etc.

Fotografi a 4 – Célula unitária da estrutura cúbica de corpo centrado (CCC).

Fonte: Josué Gonçalves Martins.

O número de átomos que estão efetivamente em uma célula cúbica de corpo Centrado é resultado da soma dos átomos presentes em seus vértices, mais aquele localizado em seu centro. Assim o Nat pode ser calculado de acordo com a eq. 5:

O parâmetro de rede (aresta da célula) dessa estrutura é função da presença do átomo central e é diferente do caso anterior. Ao se ob-servar a diagonal principal da célula unitária dessa estrutura consta-ta-se que seu tamanho corresponde a quatro raios atômicos. Assim, o parâmetro de rede é calculado a partir do teorema de Pitágoras ou da equação 6:

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Portanto, o FEA de uma estrutura do tipo CCC pode ser calculado a partir da equação 7:

a) Cálculo do Nat. e do FEA para estrutura de face centrada (CFC).O arranjo cúbico de face centrada (CFC) caracteriza-se por

exibir os mesmos átomos nos vértices, como nos outros dois arran-jos cúbicos anteriores, e mais um átomo em cada face do cubo. Me-tais como o alumínio, cálcio, chumbo, níquel, cobre, platina, prata, ouro, etc. possuem estrutura centrada. A fotografi a 5 mostra a célula unitária desta estrutura.

Fotografi a 5 – Célula unitária da estrutura cúbica de face centrada (CFC).

Fonte: Josué Gonçalves Martins.

Baseado na célula unitária mostrada na fotografi a 5, podemos calcu-lar o Nat por meio da equação 8:

O parâmetro de rede no caso da estrutura CFC pode ser obtido através da diagonal da face, que tem o tamanho de quatro átomos.

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Usando novamente as relações de um triângulo retângulo, é possível relacionar o parâmetro de rede com o raio atômico (Eq. 9):

Logo, o FEA de uma estrutura do tipo CFC pode ser calculado a partir da equação 10:

Aplicação de questionário de múltipla escolha e entrevista:A análise dos questionários de múltipla escolha mostrou que

os resultados obtidos com a realização das três etapas citadas ante-riormente. As questões contidas no mesmo estavam embasadas em conceitos de propriedades químicas que foram provadas matemati-camente e concretizadas a partir da visualização das células unitárias.

As três primeiras questões abordavam a compreensão do nú-mero de átomos presente nas células unitárias cúbicas. As respostas de alguns alunos estavam fundamentadas em cálculos que represen-tavam as “frações dos átomos” que efetivamente estavam presentes na célula unitária. Para essas três questões o índice de acerto foi aci-ma de 85%.

Nas outras três questões, foi proposto aos alunos que calculas-sem os raios de substâncias que se organizavam de modo semelhante às estruturas estudadas, trabalhando com os conceitos de fator de empacotamento e de geometria básica. Nesse sentido, a visualização das células unitárias passou a ser uma ferramenta indispensável para compreensão e resolução destas perguntas. Esta observação está fun-damentada na porcentagem média de acerto (86%) das três últimas questões por parte dos alunos que responderam aos questionários.

ConclusãoA partir da aplicação deste trabalho nas turmas de 2os. anos do

ensino médio observou-se que o ensino de Geometria é importante

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em toda modalidade de ensino, pois possibilita a resolução de situa-ções-problemas e a interpretação de conceitos presentes em outras áreas do conhecimento. De acordo com os PCNs (1999), o ensino da geometria pode levar o aluno a estabelecer relações entre a Matemá-tica e outras áreas, a partir da exploração de objetos do mundo físi-co, como obras de artes, pinturas, desenhos, esculturas e artesanato. Para Luckesi (1994 apud Santos, 2009), o conhecimento adquirido na escola só é signifi cativo e real para os alunos se for assimilado pela compreensão, exercitação e utilização criativa.

Com a aplicação de um questionário de múltipla escolha e análise das respostas obtidas, fi ca comprovado que a utilização visual e palpável das estruturas cristalinas representadas por células unitá-rias são uma forma inovadora para facilitar o processo de compreen-são e interpretação de estruturas de substâncias químicas a partir de conceitos geométricos. A maioria dos alunos observou e afi rmou que a visualização e o contato com as peças construídas a base de madeira e isopor concretizam o que a teoria predizia deixando o assunto sobre estruturas cristalinas bem mais interessantes. Dessa forma, pode-se afi rmar que a inserção de objetos palpáveis nas aulas de geometria e de estrutura de compostos inorgânicos aumentou o interesse dos alunos pelas disciplinas de Matemática e Química, de-monstrando a aplicabilidade da interdisciplinaridade entre diferen-tes áreas de ensino.

AgradecimentosAos colegas do subprojeto de Química do PIBID/2009 que

contribuíram para a elaboração deste artigo.À Coordenação Institucional do PIBID/UVA pela oportuni-

dade de conhecer a realidade das escolas públicas envolvidas com o subprojeto de Química PIBID/2009.

Á Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Su-perior – CAPES pelo suporte fi nanceiro e pela concessão das bolsas.

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Referências Bibliográfi cas

BALDISSERA, A. A Geometria Trabalhada a Partir da Constru-ção de Figuras e Sólidos Geométricos. Disponível em: <http://www.gestaoescolar.diaadia.pr.gov.br/arquivos/File/producoes_pde/artigo_altair_baldissera.pdf >. Acesso em: 20 ago. 2013.

BOLGHERONI, W.; SILVEIRA, I. F. Soft ware Livre Aplicado ao Ensino de Geometria e Desenho Geométrico. In: Congresso da So-ciedade Brasileira de Computação, 28, 2008, Belém. Anais... Belém: CSBC, 2008. p. 284-293.

BRASIL. Secretaria da Educação Fundamental. Parâmetros Curri-culares Nacionais: Matemática. Brasília: MEC/SEF, 1998.

CARAM JÚNIOR, R. Estruturas Cristalinas. Disponível em: <http://www.fem.unicamp.br/~caram/estrutura.pdf> Acesso em: 14 ago. 2013

GARDNER, H. Estruturas da mente: a teoria das inteligências múltiplas. Porto Alegre: Artes Médicas Sul, 1994.

HERRON, J. D. Piaget for chemists: explaining what “good” students cannot understand. Journal of Chemical Education, v. 52, n. 3, p. 146-150, 1975.

SANTOS, C. O. A Importância da Visualização no Ensino da Geo-metria Plana e Espacial. 2009. 44f. Monografi a (Graduação em Ma-temática) Universidade Estadual de Goiás, Jussara, 2009.

ZANETTE, R. Trabalhando com a Geometria In: Encontro Nacio-nal de Educação Matemática, XI, 2013. Anais... Curitiba: Sociedade Brasileira de Educação Matemática, 2013. p. 1-10.

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APRENDENDO A CONVIVER NA ESCOLA: RELATO DE UMA EXPERIÊNCIA

Aline do Nascimento Araújo – Bolsista de Iniciação à Docência. Acadêmica do curso de Pedagogia da Universidade Estadual Vale do Acaraú – UVAMartyhellen Maria Monteiro da Silva – Bolsista de Iniciação à Do-cência. Acadêmica do curso de Pedagogia da Universidade Estadual Vale do Acaraú – UVA.Railane Bento Vieira – Professora da Universidade Estadual Vale do Acaraú – UVA (Orientadora).

IntroduçãoA educação em valores que se desenvolve na vida familiar, na

convivência humana, no trabalho, nas escolas, nas manifestações culturais, nos movimentos e organizações socais é uma das ques-tões recorrentes para a sociedade atual, que se encontra imersa numa rede complexa de situações e fenômenos que exigem intervenções sistemáticas e planejadas dos profi ssionais da educação escolar.

É na família que as crianças adquirem noções de verdade, respeito, afeto, convivência, dentre outras. E é na escola que essas noções se multiplicam, pois as crianças passam a entrar em contato com diferentes formas de comportamento, culturas e pontos de vis-ta. Aos poucos, elas vão adquirindo a ideia de que existem regras e limites sociais e também valores considerados universais.

Entre as diferentes ambiências humanas, a escola tem sido, historicamente, a instituição escolhida pelo Estado e pela família como o melhor lugar para o ensino-aprendizagem dos valores, de modo a cumprir, em se tratando de educação para a vida em socie-dade, a fi nalidade do pleno desenvolvimento do educando, seu pre-paro para o exercício da cidadania e sua qua lifi cação para o mundo do trabalho.

Diante disso, os alunos bolsistas do Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência – PIBID/CAPES/2009, do cur-so de Pedagogia da Universidade Estadual Vale do Acaraú – UVA, elaboraram, juntamente com a Coordenação de Área, um projeto

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pedagógico intitulado “Aprendendo a conviver na escola”, buscando estimular a boa convivência entre os alunos das escolas integran-tes do PIBID, a fi m de transmitir e debater valores universais, de-monstrando entre as crianças a importância do respeito ao outro, da solidariedade, do amor, dentre outros sentimentos que devem ser cultivados.

O projeto aconteceu nos meses de maio a junho nas turmas do 1º, 2º e 3º ano do ensino fundamental, na Escola de Ensino Infantil e Fundamental Antônio Benício de Vasconcelos, situada no distrito de Várzea da Volta, no município de Moraújo-CE. Trata-se de uma das escolas integrantes do PIBID desde 2009.

O projeto surgiu a partir de observações realizadas na referida escola e de relatos de seus professores acerca da difi culdade de tra-balhar os valores humanos com os alunos, visto que esses estudantes apresentavam reações agressivas diante dos confl itos em sala de aula.

Vale frisar que a inquietação dos professores sobre as ações dos alunos em sala de aula, sobretudo diante dos confl itos, bem como o desejo de colaborar com a aprendizagem das crianças de maneira positiva, foram os fatores que motivaram esta pesquisa e o seu tema. Assim, criou-se a oportunidade de vivenciar a prática pedagógica e associá-la às teorias vistas na universidade.

Utilizou-se como base para o trabalho a observação partici-pante ao longo da vivência do projeto. O estudo é do tipo pesqui-sa-ação, numa perspectiva qualitativa, apoiada nas ações realizadas durante o projeto “Aprendendo a conviver na escola”. Diante disso, objetiva-se relatar a experiência obtida através do projeto aplicado, reconhecendo a importância de se trabalhar os valores no ambiente escolar.

No primeiro momento deste trabalho será apresentado o que são os valores de acordo com as Leis de Diretrizes e Bases – LDB, dentre outros autores. Em seguida, serão mostrados os resultados e as discussões através de alguns relatos das experiências em sala de aula, os caminhos metodológicos, e, por último, as considerações fi nais.

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Metodologia da PesquisaRealizou-se um estudo do tipo pesquisa-ação, numa pers-

pectiva qualitativa, apoiada na realização do projeto “Aprendendo a conviver na escola”, realizado no período de maio a junho de 2013 com as turmas do 1º, 2º e 3º ano do ensino fundamental da Escola de Ensino Infantil e Fundamental Antônio Benício de Vasconcelos, situada no distrito de Várzea da Volta, Moraújo – CE.

A pesquisa-ação se aplica quando os pesquisadores não que-rem limitar suas investigações aos aspectos acadêmicos e burocrá-ticos das pesquisas convencionais. Querem pesquisas nas quais as pessoas implicadas tenham algo a “dizer” e a “fazer”. Com a pesqui-sa-ação os pesquisadores pretendem desempenhar um papel ativo na própria realidade dos fatos observados (THIOLEENT, 2008).

Desse modo, optou-se por desenvolver esta pesquisa como forma de contribuir com os sujeitos envolvidos no estudo. A esco-lha da abordagem qualitativa envolve a interação pesquisador-par-ticipante, a qual lida com interpretações das realidades sociais, bus-cando explorar espectros de opiniões em um grupo social específi co (BAUER; GASKELL, 2002). Para Minayo (2007), “a investigação qualitativa requer como atitudes fundamentais a abertura, a fl exi-bilidade, a capacidade de observação e de interação com o grupo de investigadores e com os atores sociais envolvidos”.

O projeto foi realizado com o intuito de contribuir para a pro-moção de conhecimento, refl exão das crianças sobre os valores. Para obtenção dos dados empíricos, utilizou-se como instrumentos de coleta e análise de dados a observação participante, que consiste na participação real do observador na vida da comunidade, assumindo, até certo ponto, o papel de um membro do grupo (GIL, 2006). Todas as percepções captadas foram registradas em diário de campo. Por seguinte elaborou-se a execução do projeto de pesquisa.

O que são valores?A vida em sociedade requer valores que proporcionam ao ho-

mem participar do processo social, através do trabalho e diferentes ações. Uma tomada de posição implica necessariamente eleger va-lores, aceitar ou questionar normas, adotar uma ou outra atitude, e

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essas capacidades podem ser desenvolvidas por meio da aprendiza-gem. Entretanto, considerar atitudes, normas e valores como con-teúdos requer uma refl exão sobre sua natureza e sua aprendizagem.

Os alunos são o alvo maior quando se luta por um ensino de qualidade, que visa à formação de estudantes pensantes, críticos e capazes de batalhar por um espaço no mundo profi ssional. Assim, deve-se estar atento sobre como esses sujeitos são infl uenciados a aprender. Como afi rmam Dorothy Law Nolte e Rachel Harris, (2003 p.15): “As crianças são como esponjas. Absorvem tudo o que faze-mos, tudo o que dizemos. Aprendem conosco o tempo todo, mesmo quando não nos damos conta do que estamos ensinando”. Em con-trapartida, acredita-se que dessa maneira a educação não precisaria ter um signifi cado, mas apenas um repasse de conteúdo, entre o pro-fessor, que seria o representante de todo o saber, e o aluno, aquele que nada sabe, e, por isso, nada poderá oferecer.

Segundo MARTINS (2005), ao se referir à educação e seus valores, percebe-se o processo social conduzido pelo saber no seio de uma determinada sociedade. Assim sendo, essa sociedade busca através da escola levar os educandos à assimilação dos valores que, explícita ou implicitamente, estão presentes no conteúdo das maté-rias, nos procedimentos e atitudes dos professores, colegas de sala, pais de alunos e  nas experiências humanas acumuladas no decor-rer da história, tendo em vista a formação dos indivíduos enquanto cidadãos.

Segundo os Parâmetros Curriculares Nacionais – PCN, é ne-cessário compreender que atitudes, normas e valores comportam uma dimensão social e uma dimensão pessoal. Referem-se a prin-cípios assumidos pessoalmente por cada um a partir dos vários sis-temas normativos que circulam na sociedade. E essas atitudes são bastante complexas, pois envolvem tanto a cognição (conhecimentos e crenças) quanto os afetos (sentimentos e preferências), derivando em condutas (ações e declarações de intenção).

Logo, “o que são os valores? Que valores devem ser estuda-dos e desenvolvidos na escola?” Estas e outras perguntas permeiam a prática de muitos professores que se sentem incapazes de desen-volver atividades sobre essa temática diante dos confl itos em sala de aula. Dessa forma, observa-se que os valores precisam não apenas

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ser apresentados como uma matéria, mas incorporado às ações de todos que fazem parte da comunidade escolar, como sugerem os PCN (BRASIL, 1997, p.43):

A aprendizagem de valores e atitudes é pouco explo-rada do ponto de vista pedagógico. Há estudos que apontam a importância da informação como um fator de formação e transformação de valores e ati-tudes. Conhecer os problemas ambientais e saber de suas consequências desastrosas para a vida humana é importante para promover uma atitude de cuidado e atenção a essas questões, valorizar ações preserva-cionistas e aquelas que proponham a sustentabilidade como princípio para a construção de normas que re-gulamentem as intervenções econômicas. Para cuidar de sua saúde, uma pessoa que não tenha saneamento básico onde mora precisa saber que esse é um direito seu para poder reivindicá-lo. Outras vezes, a informa-ção é necessária para poder concretizar uma atitude de forma efi caz, como é o caso da solidariedade com alguém que se acidentou e necessita de primeiros so-corros: é preciso saber como prestá-los.

O trabalho com valores torna-se enriquecedor se estiver contido no Projeto Político Pedagógico da escola, dando um senti-do mais profundo às metas da educação. De acordo como Zabalza (2000, p.21):

[...] o tema dos valores foi e será um tema-chave em qualquer processo de ação e de refl exão sobre as pes-soas e suas ações; desde a religião à fi losofi a, desde o pensamento social às doutrinas econômicas e po-líticas, desde a educação à psicologia. Em geral, tudo está envolto em valores (ou contra valores) que dão sentido às ideias e às propostas que em cada âmbito são estabelecidas.

Para o referido autor nenhuma educação terá sentido ou se sustentará se não estiver comprometida com valores. São eles os grandes orientadores que ajudam a dar sentido à vida, a construir-se como pessoa responsável, comprometida e emocional e socialmente ajustada.

No tocante à ação pedagógica relacionada ao tema valores, é fundamental que o coletivo escolar esteja envolvido e consciente de seu

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papel de intervenção. No projeto relatado foi possível observar essa par-ceria entre os professores e bolsistas e o reconhecimento dessa parceria nos relatos dos alunos. Formar para os valores implica vivência partici-pativa no dia a dia da escola e da sala de aula, no pátio, no refeitório, en-fi m, em todos os espaços de convívio e de diálogo entre pessoas devem estar embebidos desse propósito (TREVISOL, 2009).

Com o foco voltado para uma educação de ascensão do huma-no, vale ressaltar que

A educação deve ser vista como um processo integral que permite às crianças e aos jovens aprender a pen-sar, raciocinar, sintetizar, serem responsáveis, praticar as virtudes de solidariedade e de amor ao próximo. [...] a educação desenvolva a autonomia, a criativida-de, o espírito científi co, o espírito literário e artístico. [...] que contribua na construção da identidade e da autoestima, que incite ao respeito dos direitos huma-nos e dos valores éticos e que, permita desenvolver relações de amizade e de solidariedade com os outros (PARRAT-DAYAN, 2008, p.104).

Percebe-se que não é uma tarefa fácil abordar a questão dos valores na educação escolar porque a pedagogia tradicional levou a acreditar que a principal tarefa da escola era a de transmitir conteú-dos escolares. É um modelo pedagógico que não se enquadra mais às exigências do mundo moderno. 

Segundo Martins (2005), a educação escolar não se restringe mais, como no passado, a mera transmissão de conhecimentos, onde a atividade de ensinar era centrada no professor, detentor dos sabe-res, e o aluno, um mero recebedor da matéria. Na sociedade atual, com a ampliação das ambiências de formação escolar, o aluno passa a ser o centro do processo didático-pedagógico, e a educação escolar, agora, entendida como processo de desenvolvimento físico, intelec-tual e moral do educando.

Valores para LDBNa atualidade torna-se gritante a necessidade de se abordar

os valores na escola, de maneira com que os alunos se sintam parte do processo de aprendizagem e compreendam as mudanças de com-portamentos voltados para uma convivência harmoniosa e o modo

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como facilitam a socialização e, consequentemente, uma aprendiza-gem sólida, perpassando os muros da escola.

Sabe-se que a educação em valores está presente em todas as disciplinas do currículo escolar, mas na prática há defasagem no tra-balho com esses valores, até mesmo pela prática dos professores que visam o conteúdo e o ensino ao invés de construí-los com os sujeitos principais: os alunos.

Para ocorrer a inclusão de forma real na prática pedagógica é necessário que o professor reconheça a importância da educação em valores como um meio transformador e refl exivo, organizando seu plano de ensino através de atividades signifi cativas, lúdicas e concei-tuais sobre os temas transversais, que são:

a) Autonomia, que se refere ao valor que reconhece o direito de um indivíduo tomar decisões livremente e ter sua liberdade de se ex-pressar diante de diferentes assuntos.

b) Capacidade de convivência é um valor que desenvolve no edu-cando a capacidade de viver em comunidade, de modo a garantir uma coexistência interpessoal  harmoniosa.

c) Diálogo é um valor de grande importância para o convívio e en-tendimento dos indivíduos, que reconhece na fala  um momento da interação.

d) Dignidade da pessoa humana é o valor absoluto que tem cada ser humano, pois ninguém tem preço, mas sim uma participação fundamental na construção de sua própria história.

e) Igualdade de direitos é o valor inspirado no princípio segundo o qual todos os homens são submetidos à lei e gozam dos mesmos direitos e obrigações.

f) Justiça é o valor mais forte que se manifesta no educando quando o mesmo é capaz de perceber ou avaliar aquilo que é direito e que é justo em várias situações.

g) Participação social é o valor que se desenvolve no educando na medida em que o torna parte da vida em sociedade e leva-o a compartilhar com os demais membros da comunidade confl itos, afl ições e aspirações comuns.

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h) Respeito mútuo é um valor que leva alguém a tratar o próximo com grande atenção, consideração e reverência, respeitando sua opinião e da mesma forma buscando compreender não só as fa-las, mas também as ações do outro.

i) Solidariedade é o valor que se manifesta no compromisso pelo qual as pessoas se obrigam umas às outras e cada uma delas a to-das, particularmente  diante dos pobres, dos desprotegidos,  dos que sofrem, dos injustiçados, com  o intuito de confortar, conso-lar e oferecer ajuda.

j) Tolerância, que é o valor que se manifesta na tendência a admitir nos outros maneiras de pensar, de agir e de sentir diferentes ou mesmo diametralmente opostas às nossas.

Segundo Martins (2005), no que se refere ao ensino funda-mental, a LDB aponta a educação em valores como principal ob-jetivo desta etapa da educação básica, a formação  do cidadão. Tal formação se daria mediante aquisição de conhecimentos através do desenvolvimento da capacidade de aprender, tendo como  estraté-gias básicas o pleno domínio da leitura, da escrita e do cálculo, e de três competências relacionadas explicitamente com a educação em valores: a compreensão do ambiente natural e social, do sistema político, da tecnologia, das artes e dos valores em que se fundamenta a sociedade (inciso II);  o desenvolvimento da capacidade de apren-dizagem, tendo em vista a aquisição de conhecimentos e habilidades e a formação de atitudes e valores; (inciso III) e o fortalecimento dos vínculos de família, dos laços de solidariedade humana e de tolerân-cia recíproca em que se assenta a vida social (inciso IV).

A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) reco-nhece a importância dos valores na educação escolar para a forma-ção da cidadania, incorporando nas fi nalidades da educação básica princípios e valores fundamentais que dão um tratamento novo e  transversal ao currículo escolar.

Com a nova LDB promulgada em particular com os Parâme-tros Curriculares Nacionais, fi cou aparente para todas as instituições de ensino o reconhecimento da importância do ensino e a apren-dizagem dos valores na educação escolar, e o Conselho Nacional de Educação (CNE), ao estabelecer as diretrizes curriculares para a

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educação básica, deu um caráter normativo à inserção e integraliza-ção dos conteúdos da educação em valores nos currículos escolares.

A educação em valores permeia os dispositivos da Lei de Di-retrizes e Bases da Educação Nacional, como pode ser observada à primeira leitura do artigo 2º: “A educação é o dever da família e do Estado, inspirada nos princípios de liberdade e nos ideais de soli-dariedade humana, tem por fi nalidade o pleno desenvolvimento do educando, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualifi ca-ção para o trabalho.” 

Observa-se o papel importante que a família exerce no pro-cesso de ensino e aprendizagem dos fi lhos, transmitindo os primei-ros valores no seio familiar que serão complementados na escola.

Portanto, a LDB mostra a importância da educação em valo-res para uma nova reformulação no ambiente escolar, pautada ain-da no ensino de conteúdos que visam apenas à aprendizagem para este fi m. Com a intenção de se trabalhar com valores de maneira interdisciplinar, acredita-se que mudanças positivas podem ocorrer, facilitando até mesmo esse ensino sistemático com a compreensão e a participação de todos.

Projeto “Aprendendo a Conviver na Escola”O referido projeto surgiu através das observações realizadas

no ambiente escolar e dos relatos de professores e funcionários sobre as reações agressivas dos alunos em diferentes situações, difi cultan-do o convívio com os demais colegas e o desenvolvimento da prática pedagógica.

Juntamente com a coordenadora do PIBID do curso de Peda-gogia, elaborou-se o projeto “Aprendendo a conviver na escola”, cujo objetivo foi proporcionar atividades lúdicas envolvendo os valores humanos, a fi m de que as crianças reconhecessem a importância de utilizar as regras mínimas de boa convivência nas salas de aula das escolas integrantes do PIBID.

Para isso elaboraram-se diferentes planos de aula, desenvol-vendo atividades em cada semana nas diferentes séries. Inicialmente delineou-se cada atividade de acordo com a necessidade da turma observada durante a primeira etapa desta pesquisa.

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Na primeira semana apresentou-se o projeto, promovendo um diálogo sobre os valores humanos, tais como: respeito, solida-riedade e colaboração. Desenvolveu-se a dinâmica “Boas maneiras”, com o auxílio de uma caixa contendo diferentes imagens que repre-sentavam várias ações; cada criança realizou a leitura dessas ima-gens expondo sua opinião, refl etindo sobre essas ações e até mesmo relacionando com suas vivências; em seguida, escreveram uma lista de combinados sobre atitudes corretas para desenvolver em sala de aula, que correspondiam aos valores abordados.

Observou-se que no momento da escrita da lista algumas crianças demonstraram resistência em escrever atitudes que elas mesmas não conseguem realizar; percebeu-se que os valores real-mente devem ser trabalhados diariamente a fi m de que essas crian-ças compreendam a importância dos mesmos em sua vida social e passem a praticar ações ditas corretas em nosso meio, como ajudar o próximo, respeitar, não agir agressivamente, entre outras atitudes. Ao longo do projeto visualizou-se também a cobrança dos alunos em seguir os “combinados” elaborados por eles, demonstrando que reconheceram a importância da boa convivência. Percebeu-se ainda que essa atividade, além de trazer às crianças um novo olhar sobre respeito ao próximo, também contribuiu de forma signifi cativa para uma aprendizagem da leitura e da escrita.

No momento em que as crianças estavam construindo a lista pode-se observar que faziam com muito entusiasmo e dedicação, sen-tiram-se motivadas a produzir algo que fazia parte do convívio naque-le momento. Diante disso, acredita-se que o educador deve procurar meios que levem os alunos ao prazer da leitura e escrita, estimulando-os sempre, além de criar condições que levem a uma realização de conquis-ta e prazer pela leitura e escrita. Martins (1994) esclarece:

Assim, criar condições de leitura não implica apenas al-fabetizar ou propiciar acesso aos livros. Trata-se, antes, de dialogar com o leitor sobre a sua leitura, isto é, sobre o sentido que ele dá, repito, a algo escrito, um quadro, uma paisagem, a sons, imagens, coisas, ideias, situações reais ou imaginárias. (MARTINS, 1994, p. 34)

Na segunda semana de execução da pesquisa os valores união e amizade foram discutidos através de uma roda de conversa, onde as crianças puderam expor sua opinião sobre diferentes atitudes em

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sala de aula e fora dela, como ajuda ao próximo, respeito, formas de agir e resolver confl itos. Realizou-se a contação de várias histórias que abordassem o assunto e questionamentos sobre a compreensão, pedindo também para relacionar com suas vivências. Depois desse momento solicitou-se que os alunos registrassem suas descobertas e opiniões através de desenhos e socializassem com a turma.

Percebeu-se grande envolvimento das crianças nessas ativida-des, principal-mente, na roda de conversas, onde falaram da impor-tância do amigo, o que gostam de fazer com o próximo, como brin-car, estudar e passear. No momento das histórias observou-se que as crianças relacionaram as atitudes dos personagens com o assunto abordado, relatando fatos do seu cotidiano e refl etindo sobre suas próprias atitudes.

Durante o projeto a repercussão dessa atividade foi positiva, pois alguns pais relataram que os fi lhos passaram a cobrar atitudes de amizade, união, respeito entre outros valores em casa, contando as histórias ouvidas com empolgação. A partir dessa dinâmica no-tou-se que o relacionamento e a convivência em sala fi caram mais harmoniosos, as crianças passaram a tratar os colegas de forma ca-rinhosa e com respeito, já não se escutavam mais as reclamações de algumas crianças sobre os colegas em relação ao tratamento em sala e não só na escola, mas também através de relatos de alguns pais sobre o comportamento de seus fi lhos, que diminuíram os confl itos interpessoais, tornando-se mais abertos à socialização, mais efetivos, assimilando e integrando valores, atitudes e normas, na prática so-cial, de modo que esses valores os acompanharão por toda a vida. Portanto, a prática pedagógica pautada no princípio de um relacio-namento afetivo traz inúmeras contribuições para o bom desenvol-vimento de uma turma de forma integral.

A sala de aula é espaço rico para o desenvolvimento da inteligência intrapessoal. O professor pode contri-buir, estimulando a refl exão sobre posturas, atitudes e condutas, ajudando a identifi car valores e crenças indispensáveis ao comportamento ético, responsabili-dade e respeito necessário à vida em sociedade (BOM SUCESSO, 2000, p.103).

Na terceira semana os valores apresentados foram amor e res-peito, através da dinâmica: “Dado dos sentimentos”. Preparou-se um

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dado cujas faces tinham uma expressão de carinho para realizar com o próximo. Após a explicação da dinâmica, cada criança jogou o dado e realizou o carinho solicitado. Percebeu-se que a maioria das crianças demonstrou resistência na realização do carinho, pois relataram que sentiam vergonha. Nesta perspectiva, resgatou-se o diálogo inicial sobre a importância da demonstração de carinho, respeito e outros valores. As pesquisadoras realizaram o carinho umas com as outras, após esse mo-mento as crianças se desinibiram e realizaram a dinâmica com interesse, solicitando essa atividade em outras semanas.

Foi uma experiência bastante signifi cativa, pois a partir da re-fl exão realizada pelas crianças encontrou-se a relevância dos temas transversais e a conscientização sobre novas atitudes para um bom relacionamento. Vislumbraram-se novas atitudes de respeito, coope-ração e amizade entre as crianças junto à comunidade escolar.

Essa atividade também se expandiu para outras turmas, atra-vés do interesse dos professores ao perceber a empolgação dos alu-nos. E após realizarem em suas salas, relataram a importância dessas manifestações de carinho. Franchi (apud FAZENDA, 1995, p. 207) demonstra preocupação com o entendimento da interdisciplinari-dade e o reconhecimento da importância de respeitar as difi culdades dos alunos e a necessidade de conhecer sua história de vida, a fi m de tornar-se parceiro e compartilhar afeto, entendimento, confi ança e alegria. Quando acontece o clima de afeto e compreensão está se formando uma relação facilitadora e, através de um ambiente repleto de afeto, o professor eleva a autoestima do educando, com o objetivo de proporcionar seu pleno desenvolvimento cognitivo e social.

Na quarta semana desenvolveu-se a atividade de contação de história. A narrativa escolhida foi “O grilo e a lua”, que mostra o grande afeto entre os personagens. Em seguida, refl etiu-se com as crianças sobre esse sentimento, relacionando aos acontecimentos do cotidiano e no convívio familiar.

Nessa atividade, as crianças, além de exporem sua opinião, demonstraram interesse, principalmente, quando elaboraram um cartaz com imagens e frases representando as boas maneiras. Foi um momento signifi cativo, além de interdisciplinar, em que elas de-senvolveram a linguagem oral e escrita e socializaram para outras turmas que em outros momentos realizaram essa mesma atividade.

Essa atividade teve como objetivo reconhecer os valores que foram trabalhados ao longo do projeto, refl eti-los e descrever seu

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signifi cado para as crianças, a partir de um novo olhar. Então, através desse diálogo notou-se que cada criança reconhecia a importância de se valorizar e preservar uma boa convivência, em que o respeito e o cuidado com o outro prevalece, e que esse conhecimento é refl etido nas ações das crianças não só na escola, mas também na comunidade onde estão inseridas, de forma que passem a atuar e transformar a sociedade, contribuindo para a promoção de valores para a melhoria da convivência de cidadãos ativos e participativos, promovendo uma sociedade melhor e mais democrática.

O encerramento do projeto aconteceu através da dramatiza-ção da história “A linda amizade de Lica e o Pardal” – Texto de Juciel-do Diogo; Ilustrações de Felipe Dias para as outras turmas; houve o envolvimento de todos os participantes e a compreensão da impor-tância dos valores não só na escola, mas em todos os ambientes, para a construção da boa convivência.

Portanto, este projeto foi importante para o desenvolvimento das crianças e proporcionou momentos de aprendizado e refl exão. Após sua execução observou-se a continuidade das ações na escola, não só por parte dos participantes, mas por outras turmas. Com isso destaca-se a importância de se trabalhar os valores na escola, pois se-gundo Martinelli (1999, p. 21), os valores humanos, na escola, estão presentes na apreciação e assimilação do conhecimento de todos os conteúdos a serem ensinados. Os valores integram o conhecimento, a família, a escola e a vida em sociedade. Vinculam o ensinamen-to ministrado na escola às circunstâncias da vida, construindo uma consciência da ética e da estética do bem.

Considerações FinaisEsta pesquisa permitiu perceber a necessidade de um trabalho

diário com os valores humanos na escola, visando uma aprendiza-gem signifi cativa e refl etiva, por parte dos membros da escola que deverão iniciar as atitudes de respeito, afeto, carinho e outros valo-res, demonstrando o exemplo a ser seguido pelas crianças.

Com o desenvolvimento do projeto localizou-se uma mudan-ça no ambiente escolar por parte das crianças e professores, que pas-saram a resgatar os valores familiares através de diferentes atividades em sala de aula de maneira interdisciplinar, deixando transparecer a

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contribuição desse projeto para a escola, permitindo uma expansão para outras turmas.

A promoção dos momentos de troca de saberes gerou grande satisfação, além do que estreitou elos entre a universidade e a escola; afi nal foi possível desenvolver, na prática, a teoria que o estudante de pedagogia aprende ao longo do seu curso. Desse modo, esse gra-duando oferece um retorno à sociedade e constrói uma ponte mais fi rme para sua futura realização profi ssional.

Referências

BAUER, Martin W.; GASKELL, George (org.). Pesquisa qualitativa com texto, imagem e som: um manual prático. Petrópolis: Vozes, 2002.

BOM SUCESSO, E. de P. Afeto e limite. Rio de Janeiro: Dunya, 2000.

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FAZENDA, I. C. A.A academia vai à escola. Campinas: Papirus, 1995.

GIL, A. C. Como elaborar projetos de pesquisa. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2006.

MARTINELLI, Marilu. Conversando sobre educação em valores humanos. São Paulo: Petrópolis, 1999.

MARTINS, Maria Helena. O que é leitura. 19. ed. São Paulo: Brasi-liense, 1994.

MARTINS, Vicente. A prática de valores na escola, 2005. Disponí-vel em < http www.educaonline.pro.br> Acesso em: 18.Jul.2013

MINAYO, M. C. DE S.; DESLANDES, S. F.; NETO, O. C.; GOMES, R. Pesquisa social: teoria, método e criatividade. 26. ed. Petrópolis: Vozes, 2007.

NOLTE, Dorothy Law; HARRIS, Rachel. As crianças aprendem o que vivenciam. 5. ed. Rio de Janeiro: Sextante: 2003.

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PARRAT-DAYAN, Silvia. Como enfrentar a indisciplina na escola. São Paulo: Contexto, 2008.

TREVISOL, Maria Teresa Ceron. Tecendo os sentidos atribuídos por professores do ensino fundamental ao médio profi ssionalizante sobre a construção de valores na escola. In.: LA TAILLE, Yves de; MENIN, Maria Suzana de Stefano et al (Org.). Crise de valores ou valores em crise? Capítulo 2.p.104. Porto Alegre: Artmed, 2009.

THIOLEENT, M. Metodologia da Pesquisa-ação. 16. ed. São Paulo: Cortez, 2008 (Coleção temas básicos de pesquisa-ação).

ZABALZA, Miguel. Como educar em valores na escola. p.21. Revis-ta Pátio Pedagógica. Ano 4, nº 13, mai/jul. 2000.

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PIBIDUVA

Programa Institucional deBolsas de Iniciação à Docência

Em geral, encontros aproximam pessoas e se tornam boas oportunidades de integração e de partilha; encontros que hoje se dão de diferentes maneiras, espaços, circunstâncias... No cenário acadêmico, os encontros, em especial, correspondem a excelentes oportunidades de discussão e de socialização do saber, recursos que se têm revelado indispensáveis à evolução do conhecimento humano.

O III Encontro do PIBID UVA: Desafi os da Interdiscipli-naridade na Formação de Professor bem exemplifica a asserti-va acima. O diálogo entre bolsistas de diferentes áreas e categorias, tanto entre si, quanto com os demais membros da comunidade aca-dêmica, inclusive o público advindo das escolas de educação bási-ca, “regou sementes” que vinham sendo germinadas ao longo do processo de formação docente dos pibidianos. E eis um dos “frutos”: este livro.

Ensaios de Docência: Memórias do III Encontro do PIBID UVA possibilita ao leitor uma visão geral do “canteiro de formação docente”, que se vem desenvolvendo num espaço duplamente rico: ensino superior e educação básica. São ensaios de teoria e prática que se aperfeiçoam na ação, refl exão, ação (re) inventada!

Maria Edinete TomásCoordenadora Institucional do PIBID UVA 2011