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EMPRESA BRASILEIRA DE SERVIÇOS HOSPITALARES EBSERH : um modelo neoliberal para a privatização da Saúde e para a destruição do sistema único de saúde (SUS) brasileiro PERGUNTAS E RESPOSTAS SOBRE A EBSERH Com uma diferença :aqui são formuladas as perguntas realmente esclarecedoras sobre esta questão; aqui você lê as verdades; aqui você não é enganado; aqui você aprende; aqui você conhece; aqui você rejeita esta ideia... 1- Como surgiu a ideia da EBSERH? Qual a sua verdadeira origem? Para entendermos a Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (EBSERH), necessário conhecermos o contexto histórico da sua idealização, bem como as armadilhas dispostas na Lei de sua criação (Lei nº 12.550/11) , no seu Estatuto Social (Decreto nº 7.661/11) e no seu Regimento Interno, analisando os seus aspectos jurídicos constitucionais e legais, sob a perspectiva dos Princípios Norteadores da Administração Pública e da Lei Orgânica da Saúde (Lei nº 8.080/90) , e sem deixar de lado fundamentos da política, da filosofia e da sociologia jurídicas. No final da década de 1970, através, principalmente, da Escola Monetarista do economista Milton Friedman, surgiu a ideologia neoliberalcomo um conjunto de ideias políticas e econômicas capitalistas que defendiam a não participação do Estado na economia, devendo haver total liberdade de comércio (livre mercado), o que garantiria o crescimento econômico e o desenvolvimento social de um país, sendo capaz de solucionar a crise econômica mundial provocada pelo aumento excessivo no preço do petróleo, a partir de 1973. Esse pensamento ideológico (ideologia do pensamento único) foi rapidamente assimilado por Ronald Reagan e Margareth Thatcher, responsáveis maiores por globalizar essa doutrina no mundo. E quais as características principais dessa ideologia neoliberal? Mínima participação estatal nos rumos da economia de um país; Pouca intervenção do governo no mercado de trabalho; Política de privatização de empresas estatais; Criação das parcerias público-privadas; Livre circulação de capitais internacionais e ênfase na globalização; Criação de condições para a hegemonia do capital financeiro; Abertura da economia para a entrada de multinacionais; Política de globalização neoliberal, impondo um mercado único de capitais à escala mundial; Supremacia do capital financeiro sobre o capital produtivo; Adoção de medidas contra o protecionismo econômico; Liberdade da “indústria dos produtos financeiros”, criados em profusão, sem qualquer relação com a economia real, apenas para alimentar os jogos de azar jogados nas bolsas-cassinos; Desburocratização do Estado, instituindo-se leis e regras econômicas mais simplificadas para facilitar o funcionamento das atividades econômicas; diminuição do tamanho do Estado, tornando-o mais eficiente; Posição contrária aos impostos e tributos excessivos; Aumento da produção, como objetivo básico para atingir o crescimento econômico; Contra o controle de preços dos produtos e serviços por parte do Estado; ou seja, a lei da oferta e demanda seria suficiente para regular os preços (“a mão invisível do mercado”);

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EMPRESA BRASILEIRA DE SERVIÇOS HOSPITALARES

EBSERH: um modelo neoliberal para a privatização da Saúde e para a destruição do

sistema único de saúde (SUS) brasileiro

PERGUNTAS E RESPOSTAS SOBRE A EBSERH

Com uma diferença:aqui são formuladas as perguntas realmente esclarecedoras sobre

esta questão; aqui você lê as verdades; aqui você não é enganado; aqui você aprende;

aqui você conhece; aqui você rejeita esta ideia...

1- Como surgiu a ideia da EBSERH? Qual a sua verdadeira origem?

Para entendermos a Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (EBSERH), necessário conhecermos o

contexto histórico da sua idealização, bem como as armadilhas dispostas na Lei de sua criação (Lei nº

12.550/11) , no seu Estatuto Social (Decreto nº 7.661/11) e no seu Regimento Interno, analisando os seus

aspectos jurídicos constitucionais e legais, sob a perspectiva dos Princípios Norteadores da Administração

Pública e da Lei Orgânica da Saúde (Lei nº 8.080/90), e sem deixar de lado fundamentos da política, da

filosofia e da sociologia jurídicas.

No final da década de 1970, através, principalmente, da Escola Monetarista do economista Milton Friedman,

surgiu a ideologia neoliberalcomo um conjunto de ideias políticas e econômicas capitalistas que defendiam a

não participação do Estado na economia, devendo haver total liberdade de comércio (livre mercado), o que

garantiria o crescimento econômico e o desenvolvimento social de um país, sendo capaz de solucionar a crise

econômica mundial provocada pelo aumento excessivo no preço do petróleo, a partir de 1973.

Esse pensamento ideológico (ideologia do pensamento único) foi rapidamente assimilado por

Ronald Reagan e Margareth Thatcher, responsáveis maiores por globalizar essa doutrina no mundo.

E quais as características principais dessa ideologia neoliberal?

Mínima participação estatal nos rumos da economia de um país;

Pouca intervenção do governo no mercado de trabalho;

Política de privatização de empresas estatais;

Criação das parcerias público-privadas;

Livre circulação de capitais internacionais e ênfase na globalização;

Criação de condições para a hegemonia do capital financeiro;

Abertura da economia para a entrada de multinacionais;

Política de globalização neoliberal, impondo um mercado único de capitais à escala mundial;

Supremacia do capital financeiro sobre o capital produtivo;

Adoção de medidas contra o protecionismo econômico;

Liberdade da “indústria dos produtos financeiros”, criados em profusão, sem qualquer relação com a

economia real, apenas para alimentar os jogos de azar jogados nas bolsas-cassinos;

Desburocratização do Estado, instituindo-se leis e regras econômicas mais simplificadas para facilitar

o funcionamento das atividades econômicas; diminuição do tamanho do Estado, tornando-o mais

eficiente;

Posição contrária aos impostos e tributos excessivos;

Aumento da produção, como objetivo básico para atingir o crescimento econômico;

Contra o controle de preços dos produtos e serviços por parte do Estado; ou seja, a lei da oferta e

demanda seria suficiente para regular os preços (“a mão invisível do mercado”);

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Independência dos Bancos Centrais, senhores absolutos da política monetária, posta ao serviço

exclusivo da estabilidade dos preços;

A base da economia deve ser formada por empresas privadas;

Destruição do Estado-providência;

Redução dos direitos dos trabalhadores, em nome de uma pretensa competitividade;

Flexibilização e desumanização do Direito do Trabalho, transformando em Direito das Empresas ou

Direito dos Empresários, negando o “Princípio do Favor Laboratoris”;

Defesa dos Princípios Econômicos do Capitalismo;

A defesa do mercado significa a defesa da concepção neoliberalde Estado;

Considerado este como pura instância política, pretensamente separada da Economia e da

Sociedade Civil, pretende garantir ativamente e salvaguardar as estruturas de Poder.

Ora, o que vimos acontecer nos países pobres que adotaram esse pensamento econômico a partir

dessa época foi o aumento do desemprego, o congelamento de salários, o aumento das diferenças sociais, a

perda de direitos sociais e a dependência do capital internacional, já que essa política neoliberal só veio a

beneficiar as grandes potências e as empresas multinacionais.

Todavia, já no final da década de 1990, a política neoliberal revelava a sua face mais cruel também

para as nações mais ricas do planeta, provocando essas mesmas mazelas na sua gente e nas suas próprias

empresas.

A partir desse momento, então, o pensamento neoliberal passou a mostrar toda a sua esperteza ao

colocar para o mundo o argumento de que as grandes empresas não poderiam “quebrar”, em razão da

enorme responsabilidade social que elas tinham, de modo que, agora, o Estado deveria, sim, intervir na

economia injetando dinheiro público para salvar essas empresas privadas que não deram certo no mundo

competitivo, desregrado e livre do capitalismo neoliberal (um mundo que eles mesmos inventaram),

comprando os seus títulos de dívida privada e transformando-os em títulos da dívida pública, aumentando,

com isso, o endividamento público do país.

E foi essa lógica empresarial que foi definida pelo Conselho Europeu, em 2008, de modo que o

dinheiro público salvando essas empresas manteria aqueles seus mesmos dirigentes nos seus cargos ou em

cargos afins, ainda que fossem responsáveis por fraudes contábeis em suas empresas.

No Brasil, este pensamento ganhou mais força no Governo de Fernando Henrique Cardoso,

particularmente através do chamado Plano Diretor de Reforma do Aparelho de Estado (PDRAE) elaborado e

proposto pelo Ministro Bresser Pereira.

Ou seja, o desenho de Reforma do Aparelho Estatal foi idealizado, no Brasil, por pessoa estranha à

carreira pública de servidor público federal; portanto, por quem desconhecia a sua estrutura internamente

funcionando. Ele, simplesmente, trouxe uma ideia de fora e a implantou de forma arbitrária aqui, com o

argumento de que a máquina pública precisava ser modernizada. Na verdade, o que se desejava era criar

condições para que o setor privado pudesse participar, de alguma forma, da Administração Pública, de modo

a ganhar mais terreno para a expansão dos seus negócios. E assim foi feito...

Em 1993, o Banco Mundial, entendendo que a Saúde poderia se constituir em um importante mercado a

ser explorado pelo capital,apresentou um Relatório propondo a reforma do Estado e a implantação de um

novo sistema de saúde no Brasil, com o argumento de que “em muitos países em desenvolvimento, os

sistemas sanitários administrados pelo governo são grandes demais e deveriam ser reduzidos; para tanto,

seriam necessárias alterações jurídicas e administrativas facilitadoras da prestação de serviços pela

iniciativa privada, que deveria receber subsídios públicos para prestarem serviços, promovendo cortes de

investimentos em hospitais públicos terciários”.

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Entre outras mudanças, a reforma administrativa e na saúde deveria permitir ao Estado a

“focalização” no atendimento das necessidades básicas sociais, reduzindo a área de atuação do Estado

através de alguns mecanismos, dentre os quais:

A privatização (venda de ativos de empresas públicas);

A publicização (transformação de órgãos estatais em entidades públicas de direito privado);

criação das Organizações Sociais (OS), Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP),

Fundações Públicas de Direito Privado, Agências Executivas, Agências Reguladoras...

Terceirização (contratação de serviços prestados por terceiros);

Subsídios públicos para as ONGs;

Cortes de investimentos em hospitais públicos terciários;

Criação de um Fundo para aposentadoria complementar dos servidores públicos federais

(FUNPRESP).

Ora, a “focalização” das políticas de saúde nega a universalidade do sistema (do SUS), relativizando os

Princípios Norteadores do SUS previstos na Lei nº 8080/90 (artigo 7º incisos I e II). E isto é inconstitucional!

Nesse contexto, surge a Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (EBSERH) através da edição da

Medida Provisória nº 520 de 2010, que, durante discussão no Congresso Nacional, não foi convertida em Lei,

dada a sua clara inconstitucionalidade, tendo sido inicialmente aprovada na Câmara de Deputados Federais,

mas caducado no Senado Federal. Nessa época, a ideia do Governo era criá-la na forma de “Sociedade de

Economia Mista” – “EBSERH S.A.” – e foi dessa forma que ela foi concebida na MP 520/2010 -, o que já

deixava clara a intenção de uma empresa estatal com forte atuação na ordem econômica, para exploração

direta de atividade econômica pelo Estado (lato sensu).

Mais tarde, surgiu o Projeto de Lei nº 1.749/11, do Poder Executivo, com o objetivo também de criar

a Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares, agora não mais apresentada como uma S.A., cujo Parecer do

Relator – Senador Roberto Requião (PMDB) – foi totalmente contrário à sua aprovação, exatamente por

reconhecer a sua inconstitucionalidade, tendo em vista que o sentido da Lei permanecia o mesmo, ou seja,

era uma empresa que visava lucro com o exercício da sua atividade fim: a prestação de serviços hospitalares;

além de ferir frontalmente o Princípio Constitucional da Autonomia Universitária.

Todavia, tendo maioria no Congresso Nacional, e convencendo Parlamentares (e nós sabemos como

isso acontece na prática) de que isso seria a solução para a crise dos Hospitais Públicos Federais,

Universitários ou não, foi aprovada a Lei nº 12.550/11, autorizando a criação da EBSERH.

2- Quais as razões da crise atual dos nossos Hospitais Públicos Federais,

Universitários ou não?

Ora, a crise dos Hospitais Públicos Federais, Universitários ou não, basicamente, tem duas causas principais: a

falta de investimento público regular e adequado, e a falta de recursos humanos, ao longo particularmente

dos últimos vinte anos, o que vem provocando uma verdadeira mistanásia nesse País: um abandono social

criminoso e intencional por parte dos nossos governantes e do próprio Congresso Nacional.

Isto, ao longo desses últimos anos, provocou o fechamento de leitos hospitalares, o fechamento de

serviços, a deterioração de equipamentos, a falta de medicamentos e materiais básicos para o perfeito

funcionamento desses hospitais, a redução e precarização da força efetiva de trabalho, a permanência de um

parque tecnológico obsoleto e precário, a desmoralização desses hospitais frente a opinião pública, as

péssimas condições técnicas e ambientais de trabalho, a desmotivação, a indignação e revolta de servidores

públicos, estudantes e usuários, a deterioração dos seus prédios, a impossibilidade e inviabilidade de uma

boa gestão...

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Nesse contexto, com um discurso longe da verdade, o Governo Federal apresenta a EBSERH como a

única solução para todos os problemas hoje enfrentados e vividos pelos Hospitais Universitários Públicos

Federais do nosso País, afirmando que, após um ano da assinatura do contrato entre as Universidades e a

EBSERH, todos os leitos hospitalares estarão reativados, o parque tecnológico desses Hospitais estará

modernizado, a estrutura física desses Hospitais será reestruturada e todos os recursos humanos necessários

ao bom funcionamento desses Hospitais estarão contratados. Isso está escrito na Lei nº 12.550/11.

Então, o Governo Federal reconhece, por escrito, que a crise atual dos Hospitais Universitários está

fundamentada em quatro problemas principais: falta crônica de recursos humanos em número adequado

para atender às necessidades para o normal funcionamento desses Hospitais; precariedade do seu parque

tecnológico; sucateamento da sua estrutura física; redução criminosa do número de leitos hospitalares

ativos nesses Hospitais.

Acontece que todos esses problemas vêm avançando de forma progressiva nesses Hospitais

Universitários pela omissão criminosa do Governo Federal ao longo dos últimosanos, criando para os seus

gestores uma situação impossível de bem administrar esse caos instalado, já que os recursos públicos para

esses Hospitais foram sendo liberados sem qualquer planejamento estratégico responsável.

Nesse momento, convidamos os mais velhos a fazerem um exercício mental de memória, de modo a

visualizarem o funcionamento desses Hospitais Universitários, e também dos Hospitais Públicos Federais,

antes do início de toda essa crise de financiamento público e da falta de recursos humanos.

Certamente, irão se lembrar de que todos esses Hospitais Públicos Federais, Universitários ou não,

eram muito bem estruturados e muito bem administrados, muitos deles, inclusive, sendo referências para

toda a América do Sul.

Basta recordar um momento da nossa história em que um Presidente da República (General João

Batista de Figueiredo), ao sofrer um infarto agudo do miocárdio, foi atendido e internado para tratamento

da fase aguda da sua doença no atual Hospital Federal dos Servidores Públicos.

Naquele tempo, não existia a EBSERH.

Acontece que naquele tempo a União cumpria com mais responsabilidade as suas obrigações com a

Saúde Pública e a Educação Pública desse nosso País.

3- O que é a Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares?

A EBSERH constitui-se em uma empresa pública com personalidade jurídica de direito privado, de dimensão

nacional, unipessoal, regida pela Lei que autorizou a sua criação (Lei nº 12.550/11), por seu Estatuto Social,

por seu Regimento Interno e pela Lei nº 6.404/76 (Lei das Sociedades Anônimas), que vem intervir,

definitivamente (para sempre) e com força, na vida dos trabalhadores e na missão dos atuais Hospitais

Universitários Públicos Federais, trazendo consigo um pensamento e um modelo de gestão totalmente

estranhos aos interesses dos seus trabalhadores, dos seus usuários, dos estudantes universitários e da

própria Universidade Pública Federal, constituindo-se em um instrumento de ressonância deste Governo, e

jamais um instrumento de ressonância da sociedade e da comunidade acadêmica, expressando uma vontade

política vergonhosa e covarde de enxergar a Saúde Pública como um setor a ser explorado na perspectiva de

um grande negócio, e não como um setor cujo investimento público (e não gasto público), regular e

flexivelmente progressivo, possa contribuir, de modo permanente e estável, para o desenvolvimento humano

e, consequentemente, para o desenvolvimento nacional; e que, embora denominada “empresa pública”, tem

o seu espírito todo recheado de aspectos próprios das sociedades de economia mista.

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4- Por que foi criada a EBSERH?

Quem responde é o próprio Ministério da Educação:“A EBSERH foi criada para exercer uma dupla finalidade –

de assistência direta à população e de apoio ao ensino e à pesquisa das Universidades; sua gestão exige um

nível de agilidade, flexibilidade e dinamismo muitas vezes incompatíveis com as limitações impostas pelo

regime jurídico de direito público próprio da Administração Direta e das Autarquias, especialmente no que se

refere à contratação e à gestão da força de trabalho, o que tem acarretado distorções ao longo dos anos e

vulnerabilidade jurídica”.

Bem, este é um discurso típico de um pensamento ideológico – qualquer que seja a ideologia -; ou

seja, é aquele discurso que procura mascarar uma realidade social, permitindo, desse jeito, legitimar a

exploração e a dominação, transformando o falso em verdadeiro, o errado em certo e o injusto em justo.

Como assim?

Ora, “o exercício de assistência direta à população” já é uma finalidade dos nossos Hospitais

Universitários Públicos Federais, uma vez que, até por determinação legal, estes hospitais integram o SUS

(artigo 45 da Lei nº 8080/90), nos seguintes termos: “Os serviços de saúde dos hospitais universitários e de

ensino integram-se ao Sistema Único de Saúde, mediante convênio, preservada a sua autonomia

administrativa, em relação ao patrimônio, aos recursos humanos e financeiros, ensino, pesquisa e

extensão, dos limites conferidos pelas instituições a que estejam viculados”.

Portanto, essa primeira justificativa não tem sustentação legal.

No que se refere ao “apoio ao ensino e à pesquisa das Universidades”, esse apoio não se espera de

uma EBSERH, mas sim da própria Administração Pública Direta, por intermédio da disponibilização de

recursos humanos, tecnológicos e financeiros constitucionalmente previstos, de forma regular, contínua e

adequada às necessidades das Universidades, de modo a permitir que, de modo autônomo, elas possam

elaborar e realizar os seus próprios projetos de pesquisa, sem a interferência de nenhuma pessoa estranha ao

seu ambiente social.

Então, essa justificativa do Governo Federal também se autodestrói.

Quanto à questão de que “a sua gestão exige um nível de agilidade, flexibilidade e dinamismo muitas

vezes incompatíveis com as limitações impostas pelo regime jurídico de direito público próprio da

Administração Direta e das Autarquias, especialmente no que se refere à contratação e à gestão da força de

trabalho, o que tem acarretado distorções ao longo dos anos e vulnerabilidade jurídica”, temos a

frontalmente contestar com os seguintes argumentos:

Uma gestão ágil, flexível e dinâmica é incompatível não com o regime jurídico de direito público das

nossas Universidades, mas sim com a carência de recursos humanos e a falta de investimentos públicos

adequados e necessários à sobrevivência digna dos nossos Hospitais Federais Universitários e dos seus

servidores, situação essa fomentada, de forma cruel, covarde e criminosa, pelo próprio Poder Público, há

pelo menos duas décadas; sem que isso jamais pudesse ser corretamente - e eticamente - discutido e

apresentado pela imprensa à nossa sociedade.

Se fosse assim, deveríamos lançar uma campanha nacional para a criação da “EBSERJ” – Empresa

Brasileira de Serviços Jurídicos -, já que a lentidão nociva do Poder Judiciário – utilizando-se o mesmo

raciocínio que o Governo Federal faz quanto aos problemas atuais dos nossos Hospitais Universitários – deve

ter como causa o regime jurídico de direito público aplicado aos nossos Tribunais de Justiça. Então, vamos

criar uma carreira de magistrados contratados pelo regime trabalhista da CLT, vamos flexibilizar os seus

direitos, e a Justiça se tornará célere e eficiente como todos nós desejamos...

Na verdade, isso é uma manobra perversa de burlar o entendimento do STF (Supremo Tribunal Federal) de

que os trabalhadores das Autarquias (Pessoas Jurídicas de Direito Público) têm que ser contratados,

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obrigatoriamente, pelo regime trabalhista da Lei nº 8.112/90, ou seja, como servidores públicos

estatutários.

Ora, o Poder Público costuma trabalhar com argumentos mentirosos; e algumas pessoas costumam viver

numa alienação social, aceitando, sem questionar (e sem estudar a questão), tudo o que lhes falam. E o

Governo agradece...

Portanto, essa justificativa para a criação da EBSERH igualmente não se sustenta.

No que se refere à “contratação e gestão da força de trabalho, o que tem acarretado distorções ao

longo dos anos e vulnerabilidade jurídica”, sentimo-nos no dever de clarear as mentes distraídas e algo

preguiçosas, algumas vezes coniventes, de alguns poucos colegas membros da Academia (nossas

Universidades Públicas) – quem diria? - e que ainda manifestam apoio à ideia da EBSERH, com as seguintes

observações:

Os artigos 11 e 12 da Lei nº 12.550/11 (Lei que autoriza a criação da EBSERH)afirmam que, para fins de sua

implantação, fica a EBSERH autorizada a contratar, mediante processo seletivo simplificado, pessoal técnico e

administrativo por tempo determinado, sendo que esses contratos temporários de emprego poderão der

celebrados durante os dois anos subsequentes à constituição da EBSERH, podendo ser prorrogados uma

única vez, desde que a soma dos dois períodos não ultrapasse cinco anos, tudo com base nas alíneas “a” e “b”

do § 2ºdo artigo 443 da CLT (Consolidação das Leis do Trabalho).

Nesse contexto, queremos apontar o que diz aConstituição Federal com relação à investidura em

cargo ou emprego público:

Artigo 37 inciso II:A investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso

público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego,

na forma prevista em lei, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre

nomeação e exoneração.

Artigo 37 inciso III:O prazo de validade do concurso público será de até dois anos, prorrogável uma vez por

igual período.

Artigo 37 inciso IX:A lei estabelecerá os casos de contratação por tempo determinado para atender a

necessidade temporária de excepcional interesse público.

Desse modo, o concurso público é um procedimento administrativo, aberto a todo e qualquer interessado

que preencha os requisitos estabelecidos em lei, destinado à seleção de pessoal, mediante a aferição do

conhecimento, da aptidão e da experiência dos candidatos, por critérios objetivos, previamente

estabelecidos no edital de abertura, de maneira a proporcionar uma classificação de todos os aprovados,

consistindo em meio técnico posto à disposição da Administração Pública para obter-se a moralidade,

eficiência e aperfeiçoamento do serviço público e, ao mesmo tempo, propiciar igual oportunidade a todos os

interessados que atendam aos requisitos da lei.

Com relação à exigência de títulos, esta deve ser pautada nos Princípios da Razoabilidade,

Moralidade e da Igualdade, sob pena de ser declarada a nulidade da regra irregular prevista no edital pelo

Poder Judiciário.

Assim a exigência de experiência profissional somente no serviço público viola Princípio da Igualdade,

conforme manifestação do STF (Supremo Tribunal Federal).

Pelo concurso se afastam os ineptos e os apaniguados, que costumam abarrotar as repartições, num

espetáculo degradante de protecionismo e falta de escrúpulos de políticos que se alçam e se mantêm no

poder, leiloando empregos públicos.

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Então, a exigência do concurso público para o acesso aos cargos e empregos públicos reveste-se de caráter

ético e moralizador, e visa assegurar a igualdade, impessoalidade e o mérito dos candidatos.

Ora,a exceção prevista no inciso IX do artigo 37 da Constituição Federal (“contratação temporária”) destina-

se a possibilitar contratação de pessoal para enfrentar situações extraordinárias, que não podem ser

enfrentadas com o contingente normal de servidores, sob pena de prejuízo para a prestação continuada dos

serviços públicos, e em caráter temporário a ser estabelecido em lei.

Acontece que “situações extraordinárias” certamente não é o caso das nossas Universidades Públicas

e nem dos nossos Hospitais Públicos Federais, pois a deficiência de recursos humanos hoje existente nessas

instituições é decorrência direta da falta de planejamento administrativo dos últimos vinte anos, de modo

que a Administração Pública Federal, por vontade política equivocada, vem se negando a autorizar concursos

públicos com o número necessário de vagas para Professores, Médicos, Enfermeiros e outros servidores

públicos técnico-administrativos, passando a adotar o pensamento do “Estado mínimo” também para os

setores da Educação e Saúde Públicas.

Com isso, já de longa data os Governos vêm autorizando a realização de concursos para o

preenchimento temporário da maioria dessas vagas por “contratados temporários”, sem vínculo

empregatício, ainda assim em número muito abaixo do necessário.

Isso acabou por criar a chamada “indústria dos concursos públicos para contratos temporários de

trabalho”, que não emprega ninguém, mas que arrecada regularmente, anualmente, muito dinheiro com o

valor pago pelos candidatos nas suas inscrições, e mantém a carência crônica e crescente de recursos

humanos nas Universidades Públicas e nos Hospitais Públicos Federais, Universitários ou não, destruindo o

“corpo clínico” desses Hospitais, de modo que, atualmente, em alguns hospitais federais, quase 50% dos

profissionais que hoje ali trabalham o fazem por regime de contrato temporário de trabalho.

É claro que isso viola os Princípios Constitucionais da Eficiência (art. 37 caput da CRFB/88) e do Valor Social

do Trabalho (art. 1º inciso IV da CRFB/88), além de violar o Princípio do Concurso Público, não sendo

constitucionalmente aceito.

“Situações extraordinárias” seriam aquelas, por exemplo, relacionadas ao estado de calamidade pública,

declaração de guerra externa, terremotos, enchentes etc; mas jamais a situação de que o Governo se recusa

a contratar definitivamente novos servidores públicos para o preenchimento de vagas em número suficiente

para atender o interesse público. Note-se que, nesse caso, o Governo está agindo contra o interesse

público, fugindo da finalidade precípua do Estado que é o bem comum.

Mais do que isso: os artigos 11 e 12 da Lei 12.550/11 estabelecem que os contratos temporários de emprego

poderão ser prorrogados uma única vez, desde que a soma dos dois períodos não ultrapasse 5 anos; devendo

obedecer o disposto no artigo 443 da CLT (Consolidação das Leis Trabalhistas).

Acontece que os dispositivos da CLT apontados dizem que o contrato de trabalho por tempo

determinado só é válido em se tratando de : a) serviço cuja natureza ou transitoriedade justifique a

predeterminação do prazo; b) atividades empresariais de caráter transitório.

Como interpretar a lei trabalhista nesse caso?

Para este fim, trazemos os ensinamentos do Desembargador do Tribunal Regional do Trabalho – 2ª

Região – Prof. Sérgio Pinto Martins:

Bem, o “serviço de natureza transitório” é o que é breve, efêmero, temporário.

Aqui está se falando de serviço transitório e não de atividade empresarial de caráter transitório, de

modo que a transitoriedade deverá ser observadaem relação às atividades do empregador e não do

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empregado. Seria o caso, por exemplo, de contratar um empregado temporariamente para atender a um

breve aumento de produção em certo período do ano.

Esse não é o caso dos Hospitais Universitários, porque a contratação de pessoal é exigida para o

atendimento de uma necessidade contínua, permanente, da instituição; e não temporária. Do mesmo modo

com relação aos outros Hospitais Federais.

Já as “atividades empresariais de caráter transitório” dizem respeito à empresa e não ao empregado

ou ao serviço.

Seria o caso, por exemplo, de criar uma empresa que apenas funcionasse em certas épocas do ano,

como a de venda de fogos nas festas juninas; a que produzisse ovos de Páscoa; a que fabricasse panettone

para o Natal etc.

Esse, logicamente, também não é o caso dos Hospitais Públicos Federais, Universitários ou não.

Além do mais, existe a Súmula nº 195 do Supremo Tribunal Federal (STF), que assim dispõe:

Contrato de trabalho para obra certa, ou de prazo determinado, transforma-se em contrato de prazo

indeterminado, quando prorrogado por mais de quatro anos.

Também não podemos deixar de considerar que o Supremo Tribunal Federal já afirmou que o serviço público

de saúde é essencial, não podendo ser caracterizado como temporário. Portanto, é desarrazoado contratar

temporariamente servidores para exercer funções a ele relacionadas.

Do mesmo modo, o STJ (Superior Tribunal de Justiça) já se pronunciou afirmando que empregados de

empresas públicas e sociedades de economia mista, apesar de se submeterem ao concurso público, não são

equiparados aos servidores públicos.

Então, além de inconstitucional, essa Lei que autoriza o Poder Executivo a criar a EBSERH traz uma

clara ilegalidade no seu conteúdo, pois ignora a manifestação do Supremo Tribunal Federal e contradiz o

prescrito pela CLT.

Com relação ao regime de pessoal permanente da EBSERH, este será o da CLT, ou seja, os trabalhadores da

EBSERH serão “empregados públicos”, celetistas, sem estabilidade e sem direito à aposentadoria integral e

paritária.

A esse respeito, importante assinalar a Orientação Jurisprudencial nº 247 do Tribunal Superior do

Trabalho (TST), que assim se coloca: A despedida de empregados de empresa pública e de sociedade de

economia mista, mesmo admitidos por concurso público, independe de ato motivado para sua validade. Ou

seja, o TST admite a demissão dos empregados públicos sem justa causa.

Então, trabalhando nos Hospitais Federais, Universitários ou não, teremos servidores públicos (estatutários,

estáveis, com direito à aposentadoria integral e paritária) e os empregados públicos; além de, por um período

de tempo, também trabalhadores temporários (sem vínculo empregatício com a Administração Pública).

Todos trabalhando sob regimes diversos de pessoal, com planos remuneratórios diferenciados, com

vencimentos e salários também distintos, e exigidos indistintamente quanto a eficiência na prestação dos

serviços públicos. Direitos trabalhistas desiguais.

Isso, sim, acarreta distorções e vulnerabilidade jurídica insanáveis.

Isso, sim, fere Princípios Constitucionais.

Por si só, isso revela uma aberração de política administrativa, porque o que precisamos é de um regime de

pessoal único (regime jurídico único) que trate igualmente os trabalhadores de uma mesma instituição, de

modo a não gerar conflitos de interesses entre esses trabalhadores, o que afeta a eficiência dos serviços

públicos por eles prestados.

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Qualquer pensamento contrário a esse fere os Princípios Constitucionais da Igualdade e da

Eficiência, previstos no caput dos artigos 5º e 37 da nossa Constituição Federal.

Necessário esclarecer que a criação da EBSERH vem contra aquilo que foi estabelecido na 14ª Conferência

Nacional de Saúde, realizada em 2011, e reafirmada em 2012, que reconheceu que a implantação desta

Empresa nos Hospitais Universitários do Brasil trará prejuízos para os usuários, trabalhadores, estudantes,

professores e para a sociedade em geral, e conclamou que a comunidade universitária e os Conselheiros das

diversas Universidades rejeitem, no Conselho Universitário, a sua implantação.

5- Quais as principais finalidades da EBSERH?

Para respondermos esta pergunta, importante conhecermos a definição de “empresa”.

“Empresa” é definida como atividade economicamente organizada, voltada para a produção ou a

circulação de bens ou de serviços, com finalidade lucrativa. Esta é a interpretação correta do artigo 966 do

Código Civil/2002.

Ninguém cria uma “empresa” com finalidade de prejuízo econômico ou sem qualquer finalidade lucrativa.

Isto não existe.

Assim, a EBSERH é uma empresa pública estatal, com personalidade jurídica de direito privado, com dupla

finalidade: prestação de serviço público e obtenção de lucro; de modo que esse lucro terá que ser obtido,

necessariamente, através da prestação do serviço público a que ela se destina.

Ou seja, os atuais Hospitais Universitários, com a EBSERH, deixarão de ser hospitais universitários

propriamente ditos e passarão a ser hospitais prestadores de serviços hospitalares – instrumentos para a

obtenção do lucro líquido desta empresa.

Desse modo, fica claro que o Governo, com a criação da EBSERH, está decidido a não mais investir

nestes hospitais (terciários e quaternários), criando, então, condições para que estes hospitais, ao médio e

longo prazo, se mantenham por si mesmos, através de recursos obtidos com a mercantilização da saúde, do

ensino e da pesquisa.

Além disso, está entre os objetivos do Governo, com a criação da EBSERH, possibilitar, ao longo prazo,

economizar nos benefícios previdenciários e nas aposentadorias desses empregados públicos (celetistas), já

que esses irão se aposentar recebendo o teto remuneratório da Previdência Social, sem direito à

integralidade e sem direito à paridade dos seus proventos, e sem todos os direitos previstos no Regime

Jurídico único (Lei nº 8.112/90).

6- A EBSERH faz parte de um projeto do Governo Federal de privatizar os Hospitais

Universitários Federais?

Com certeza, sim! Afinal de contas, trata-se de uma entidade com personalidade jurídica de direito privado.

Caso contrário, o Governo Federal jamais alteraria o regime jurídico desses Hospitais, ou seja,

manteria os Hospitais Públicos Federais Universitários submetidos ao regime de direito público.

Mas não tem como objetivo privatizar somente os nossos Hospitais Públicos Federais Universitários.

O projeto do Governo é muito mais amplo e deplorável! O objetivo é flagrantemente destruir o nosso

Sistema Único de Saúde (SUS).

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A própria Lei nº 12.550/11 deixa clara a sua perversa intenção.

Vejamos o que diz o seu artigo 6º: “A EBSERH...poderá prestar os serviços relacionados às suas

competências mediante contratocom as instituições federais de ensino ou instituições congêneres.”

Bem, desse modo, todos os atuais Hospitais Públicos Federais, Universitários ou não, poderão

contratualizar com aEBSERH.

Vejamos o que diz o artigo 17 desta Lei: “Os Estados poderão autorizar a criação de empresas

públicas de serviços hospitalares.”

Ah, então, o Governo Federal sinaliza para os Estados que eles devem adotar o mesmo caminho.

E, recentemente,o Município do Rio de Janeiro propôs a criação de uma “Empresa Municipal de

Saúde”, passando todas as funções de gestão da Secretaria Municipal de Saúde para esta Empresa.

Então, o projeto do Governo é, por intermédio da EBSERH, destruir o SUS como foi originalmente pensado e

construído ao longo de mais de vinte anos.

A EBSERH gera um “efeito dominó” para todos os entes federativos, de modo que a Saúde passa a

ser pensada, planejada e executada sob a óptica de mercado e sob a lógica empresarial.

Como assim?

A EBSERH tem conteúdo não de empresa pública, mas sim de sociedade de economia mista, já que a Lei

12.550/11 autoriza a criação de filiais e subsidiárias (artigo 1º §§ 1º e 2º) para o desenvolvimento de

atividades inerentes ao seu objeto social, assim como diz que a integralização do seu capital social será

realizada também pela incorporação de qualquer espécie de bens e direitos suscetíveis de avaliação em

dinheiro (artigo 2º parágrafo único), além de falar na obtenção de lucro líquido (artigo 7º parágrafo único).

E o que são estes institutos (filiais, subsidiárias, agências)?

Filial: refere-se àquele estabelecimento que representa a direção principal; contudo, sem alçada de poder

deliberativo e/ou executivo, encontrando-se em dependência mais direta da sede.

A filial pratica atos que têm validade no campo jurídico e obrigam a organização como um todo, porque este

estabelecimento possui poder de representação ou mandato da matriz.

Por esta razão, a filial deve adotar a mesma firma ou denominação do estabelecimento principal.

Sucursal: trata-se de uma forma de crescimento ou expansão de uma atividade empresarial, expansão esta

que se dá em novas zonas de mercado, sem que se constitua numa entidade jurídica distinta.

Trata-se de um órgão subordinado que depende economicamente de outro principal, tendo o seu

mesmo objetivo e denominação social, ainda que situada numa região diferente do país ou do mundo.

A abertura de uma sucursal visa um aumento de volume de negócios fora da sede da entidade principal,

sendo consequência da dispersão de estabelecimentos de uma mesma empresa.

As sucursais podem celebrar atos e contratos no âmbito dessa mesma empresa a qual se encontram

subordinadas, pois gozam de uma certa independência administrativa para o desenvolvimento das suas

atividades quotidianas.

Agência:é o estabelecimento comercial localizado fora da sede, e a esta subordinada, com o fim de

promover a intermediação de negócios.

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Portanto, não resta dúvida quanto à intenção governamental de privatizar a Saúde Pública do nosso País.

Mas isto é inconstitucional!

7- É possível uma Empresa Pública com personalidade jurídica de direito privado

prestar serviços públicos de saúde, sob o manto da nossa Constituição Federal?

Não!

E fundamentamos nosso entendimento com os ensinamentos do jurista e Professor de Direito

Administrativo e de Direito Tributário – Prof. Marcelo Alexandrino:

Para melhor compreendermos essa questão, importante conhecer o conceito de “empresas estatais”.

Empresas Estatais: são pessoas jurídicas de direito privado pertencentes à Administração Pública Indireta,

nas formas de empresas públicas ou sociedades de economia mista, criadas por autorização legislativa, para a

exploração de atividades econômicas ou para a prestação de serviços públicos.

Todavia, se a hipótese for de criação de uma empresa pública ou sociedade de economia mista prestadora

de serviços públicos, seu objeto somente poderá ser um serviço público que tenha natureza econômica em

sentido amplo, ou seja, os serviços públicos de que trata o artigo 175 da Constituição da República

Federativa do Brasil, de 1988.

E quais são esses serviços públicos de natureza econômica em sentido amplo?

São aquelas atividades empresariais exploradas com finalidade de lucro e os serviços públicos passíveis de ser

explorados com intuito de lucro, segundo os princípios da atividade empresarial. São exemplos os serviços de

telefonia, de fornecimento de energia elétrica, fornecimento de gás canalizado, de radiodifusão sonora e de

sons e imagens, de transportes coletivos.

Importante salientar que os serviços de educação e saúde, quando prestados pela Administração Pública

Direta ou Indireta, são serviços públicos em sentido estrito, diferindo dos serviços públicos referidos no

artigo 175 da Constituição Federal em relevantes aspectos: não há possibilidade de serem explorados pelo

Estado com intuito de lucro; e não existe delegação de seu exercício a particulares, de modo que quando

tais atividades são exercidas por particulares o são como serviço privado.

Então, os chamados serviços sociais de educação e de saúde só podem ser prestados pelo Poder

Público sob o manto do regime jurídico público e, portanto, por entidades públicas com personalidade

jurídica de direito público.

Esta é a correta interpretação do nosso Texto Constitucional.

Assim, a execução das atividades relacionadas ao Título VIII da nossa Carta Magna (“Da Ordem

Social”), dentre os quais saúde e educação, como serviço público, por entidades da Administração Pública

Indireta, é própria das autarquias e fundações públicas de direito público.

Então, muito embora as empresas públicas e as sociedades de economia mista sejam categorias

distintas de entidades, a verdade é que as diferenças entre elas são unicamente formais, não havendo

distinção quanto ao objeto e quanto às possíveis áreas de atuação.

É próprio das entidades administrativas com personalidade jurídica de direito privado o regime de

pessoal conhecido como “emprego público”, caracterizado pela existência de um vínculo funcional de

natureza contratual entre o agente público e a entidade administrativa, ou seja, a relação jurídica funcional é

formalizada em um contrato de trabalho sujeito à legislação trabalhista (CLT), exigindo-se aprovação prévia

em concurso público.

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Todavia, a relação jurídica funcional entre a Administração Pública e o servidor público (estatutário) é

formalizada, obrigatoriamente, sob as normas da Lei nº 8.112/90 (Regime Jurídico Único).

Então, também sob este prisma a EBSERH é inconstitucional!

8- Objetivamente, o que significa ser a EBSERH uma “empresa unipessoal”?

Significa que a sua constituição acarreta a criação de pessoa jurídica com personalidade jurídica própria – no

caso, de Direito Privado.

Além disso, nesse caso, a União, embora participe como verdadeira empresária (responsável por

100% de integralização do seu capital social) – participação esta que se dá através de seus designados e por

meio dos instrumentos da tutela administrativa -, não impõe a sua vontade, já que a vontade dominante é

externa ou transcendente, quer dizer, essa vontade é manifestada de fora, atuando dentro da pessoa jurídica,

como seus órgãos, os administradores designados pelo Estado.

Isso porque na empresa pública unipessoal inexiste Assembleia Geral ou órgão da empresa através

do qual se manifeste a detentora do capital, dentro da entidade; além do que a EBSERH não está subordinada

ao Ministério da Educação, mas tão-somente vinculada a ele. O Conselho de Administração é que detém

funções deliberativas.

9-Mas se todo o capital social da EBSERH será integralizado por recursos oriundos

exclusivamente (100%) dos cofres da União (artigo 2º da Lei nº 12.550/11), então, para

que a criação da EBSERH?

A resposta é uma só: iniciar um processo de privatização do setor público de saúde do nosso País, de

modo a permitir uma desestatização nessa área, sendo isso iniciado a partir da desfiguração dos nossos

atuais Hospitais Universitários Públicos Federais. A intenção é economizar no setor público que envolva

questões sociais (no caso, área da Saúde Pública) para permitir o crescimento do setor privado empresarial. E

esta economia abrange também os salários, benefícios sociais e aposentadorias dos profissionais deste setor,

modificando o seu regime trabalhista.

Por esta razão, recentemente, o Governo Federal editou aquela Medida Provisória (MP) nº 568/12,

que reduzia em 50% os vencimentos dos médicos federais, além de manter congelado por temo

indeterminado esses vencimentos. Felizmente, graças à mobilização organizada e determinada desses

médicos e de suas entidades de classe, este dispositivo foi retirado desta MP.

Portanto, nada justifica a sua criação.

Na verdade, a EBSERH é mais um elemento do Programa Nacional de Desestatização iniciado pelo Ministro

Bresser Pereira, na década de 1990, cujo objetivo fundamental é reordenar a posição estratégica do Estado

na economia, transferindo à iniciativa privada atividades indevidamente exploradas pelo setor público,

podendo submeter-se à desestatização os serviços públicos objeto de concessão, permissão ou autorização.

Ora, Desestatização significa o Estado afastar-se de suas obrigações e responsabilidades na

prestação de determinados serviços públicos – no caso, a Saúde e a Educação Públicas.

Com isso, em pouco tempo, é possível que o Governo Federal crie a “EBSERED” – Empresa Brasileira

de Serviços Educacionais -, nos mesmos moldes da EBSERH.

Mas isso é inconstitucional!

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10- Há ofensa ao Princípio Constitucional da Moralidade Pública com a criação da

EBSERH?

Sim, com certeza!

Acontece que a Lei que autoriza a criação da EBSERH (Lei nº 12.550/11), no seu artigo 2º, diz que o seu

capital social estará integralmente sob a propriedade da União, sendo realizado com recursos oriundos de

dotações consignadas no orçamento da União.

Então, por si só, essa lei é contraditória em si mesma. Se o seu orçamento é todo ele oriundo da

União, por que a criação da EBSERH?

Além do mais, temos o artigo 16 da Lei nº 12.550/11, que assim dispõe: “A partir da assinatura do

contrato entre a EBSERH e a instituição de ensino superior, a EBSERH disporá de prazo de até 1 (um) ano

para reativação de leitos e serviços inativos por falta de pessoal”.

Portanto, existe, neste momento, verba disponível no Tesouro Nacional (cofres públicos) para ser aplicada na

reativação e modernização imediatas dos nossos Hospitais Públicos Federais Universitários.

Todavia, o Governo Federal vem chantagear toda a comunidade universitária utilizando como

“moeda de troca” para a liberação dessa verba a celebração de contrato com a EBSERH.

Ou seja, o Governo Federal confessa ter conhecimento de que os Hospitais Universitários estão

dramaticamente desvitalizados, mas se mantém numa passividade criminosa há anos e agora quer impor a

EBSERH para “salvar” esses Hospitais.

Um absurdo!

Ora, isso fere frontalmente o Princípio Constitucional da Moralidade Pública, previsto no caput do

artigo 37 da Constituição Federal, razão pela qual temos que resistir e denunciar esse artifício ardiloso do

Poder Executivo contra os interesses dos nossos Hospitais Públicos Federais Universitários e tudo aquilo que

ele carrega de valor em si.

Mas, afinal de contas, o que é o chamado “Princípio Constitucional da Moralidade Pública”?

Bem, este Princípio é que torna jurídica a exigência de atuação ética dos agentes da Administração

Pública, possibilitando a invalidação dos atos administrativos que sejam praticados com sua inobservância.

Portanto, a Moralidade Administrativa (Pública) é um requisito de validade do ato administrativo,

e não um aspecto atinente ao seu mérito, de modo que um ato contrário à Moral Administrativa não está

sujeito a uma análise de oportunidade e conveniência, mas a uma análise de legitimidade; isto é, um ato

contrário à Moral Administrativa é nulo, e não meramente inoportuno ou inconveniente.

Então, um ato contrário à Moral Administrativa não deve ser revogado, e sim declarado nulo,

podendo este controle ser efetuado tanto pela própria Administração Pública quanto pelo Poder Judiciário.

Não podemos perder de vista que a Moral Administrativa liga-se à ideia de Probidade e de Boa-Fé.

Nesse sentido, interessante observarmos os argumentos da AGU (Advocacia Geral da União), ao defender a

criação da EBSERH,sustentando que “a EBSERH foi instituída para regularizar os recursos humanos e as

relações de trabalho nos hospitais públicos federais universitários, dizendo que, atualmente, os Hospitais

Universitários Federais mantêm vínculos considerados irregulares pelos órgãos de controle e fiscalização, e

que por meio de concursos públicos a empresa irá recompor a força de trabalho dos Hospitais, permitindo

a reativação de leitos desativados em decorrência da falta de profissionais e a ampliação de serviços”.

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Ora, para a regularização das relações de trabalho hoje existentes nos nossos Hospitais Públicos Federais

Universitários não é necessária a criação de nenhuma empresa pública, mas tão-somente a autorização e

realização de concursos públicos federais para a contratação urgente de servidores públicos estatutários, e

tudo com observância dos preceitos constitucionais hoje vigentes e do disposto na Lei de Responsabilidade

Fiscal (Lei Complementar nº 101/2000).

Ao contrário do que afirma a AGU, a Lei que autoriza a criação da EBSERH (Lei nº 12.550/11) traz nos

seus artigos 11 e 12 a seguinte proposição: “Fica a EBSERH, para fins de sua implantação, autorizada a

contratar, mediante processo seletivo simplificado, pessoal técnico e administrativo por tempo

determinado, sendo que esses contratos temporários de emprego somente poderão ser celebrados

durante os dois anos subsequentes à constituição da EBSERH e, quando destinados ao cumprimento de

contrato celebrado com as instituições federais de ensino ou instituições congêneres, nos primeiros 180

(cento e oitenta) dias de vigência dele, de modo que esses contratos temporários de emprego poderão ser

prorrogados uma única vez, desde que a soma dos dois períodos não ultrapasse 5 anos. Além disso, a

EBSERH poderá celebrar contratos temporários de emprego com fundamento nas alíneas “a” e “b” do § 2º do

artigo 443 da CLT (Consolidação das Leis do Trabalho), mediante processo seletivo simplificado, observado o

prazo máximo de duração estabelecido no artigo 445 da CLT (“O contrato de trabalho por prazo determinado

não Poderá ser estipulado por mais de 2 anos, observada a regra do artigo 451 da CLT”)”.Artigo 451 da CLT:

“O contrato de trabalho por prazo determinado que, tácita ou expressamente, for prorrogado mais de uma

vez passará a vigorar sem determinação de prazo”.

Ou seja, em princípio, a EBSERH não vem regularizar nada nas relações trabalhistas com a Administração

Pública, mantendo e prolongando a vulnerabilidade jurídica hoje existente, por meio de contratos

temporários de trabalho,contrariando o interesse público nessa questão.

E isto é inconstitucional, ilegal e imoral.

11- A EBSERH estará submetida ao controle social o SUS (Sistema Único de Saúde)?

Não!

A EBSERH não se submete a qualquer controle social.

E isso está claro no artigo 14 da Lei nº 12.550/11, nos seguintes termos: “A EBSERH e suas

subsidiárias estarão sujeitas à fiscalização dos órgãos de controle interno do Poder Executivo e ao controle

externo exercido pelo Congresso Nacional, com o auxílio do Tribunal de Contas da União”.

Esta é mais uma das inconstitucionalidades e ilegalidades contidas na EBSERH e tudo o que de ruim ela

representa.

Como assim?

Se os serviços de saúde dos hospitais universitários e de ensino integram-se ao SUS, conforme

disposto no artigo 45 da Lei Orgânica da Saúde (Lei nº 8.080/90), estes não podem ficar fora de um controle

social.

Portanto, se com a EBSERH os atuais Hospitais Públicos Federais Universitários deixam de sofrer

qualquer fiscalização e controle direto da sociedade, é porque estes hospitais deixam de pertencer à

estrutura física, patrimonial e administrativa das Universidades Públicas Federais e passam a ser tão-somente

Unidades Hospitalares da EBSERH – verdadeiros instrumentos para a realização dos seus negócios

empresariais e obtenção do seu lucro líquido -; na prática, não sujeitos aos Princípios Norteadores e

Inspiradores do SUS.

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Dizer que o Conselho Consultivo da EBSERH (órgão interno da própria EBSERH) tem finalidade de controle

social fere a nossa inteligência. Esta é mais uma das inúmeras hipocrisias contidas no seu Regimento Interno.

Controle socialé aquele exercido diretamente pela sociedade, de fora para dentro, conforme prescrito nos

artigos 1º e 2º da Lei nº 8.142/90 (Conferências e Conselho de Saúde). Não existe outro!

12- Qual a composição dos órgãos estatutários da EBSERH?

AEBSERH será composta de quatro órgãos estatutários, a saber:

1- Conselho de Administração (composto por nove membros nomeados pelo Ministro da Educação;

sendo três deles indicados pelo próprio Ministro da Educação, um deles indicado pelo Ministro do

Planejamento, Orçamento e Gestão; dois deles indicados pelo Ministro da Saúde; um representante

dos empregados e respectivo suplente; e um membro indicado pela ANDIFES, sendo Reitor de

Universidade Federal ou Diretor de Hospital Universitário Federal; e o Presidente da Empresa);

2- Diretoria (composta por um Presidente e até seis diretores nomeados pelo Presidente da República,

por indicação do Ministro da Educação);

3- Conselho Fiscal (composto de três membros efetivos e respectivos suplentes, nomeados pelo

Ministro da Educação; sendo um deles indicado pelo próprio Ministro da Educação; outro indicado

pelo Ministro da Saúde; e outro ainda indicado pelo Ministro da Fazenda como representante do

Tesouro Nacional).

4- Conselho Consultivo (composto por oito membros; sendo um deles o Presidente da Empresa; dois

representantes do Ministério da Educação; um representante do Ministério da Saúde; um

representante dos usuários dos serviços em saúde dos Hospitais Universitários Federais, indicado

pelo Conselho Nacional de Saúde; um representante dos residentes em saúde dos Hospitais

Universitários Federais; um Reitor ou Diretor de Hospital Universitário, indicado pela ANDIFES; um

representante dos trabalhadores dos Hospitais Universitários Federais).

Mas é só isso?

Claro que não! Ela também tem órgão de auditoria interna, um corpo diretivo com inúmeros cargos

(Presidência, Chefia de Gabinete, Coordenadoria Jurídica, Assessoria de Planejamento e Avaliação, Assessoria

de Comunicação, Ouvidoria, Diretoria de Gestão de Pessoas, Diretoria de Atenção à Saúde e Gestão de

Contratos, Diretoria de Logística e Infraestrutural Hospitalar, Diretoria Administrativa e Financeira, Diretoria

de Gestão de Processos e Tecnologia da Informação), Estrutura de Governança composta por um Colegiado

Executivo (Superintendente do Hospital, Gerente de Atenção à Saúde, Gerente Administrativo, Gerente de

Ensino e Pesquisa – quando se tratar de Hospitais Universitários -; sendo que os cargos de Superintendente e

de Gerentes serão de livre nomeação), dentre outros tantos cargos para compor toda a estrutura gigantesca

dessa Empresa, de dimensão nacional.

Haja dinheiro público para bancar tudo isso!

Estamos diante, pois, de um enorme “cabide de empregos” politicamente definido. É preciso “empregar”

os “amigos do Rei”, por todo o território nacional.

É muita gente estranha para definir planos, programas, metas e resultados de um Hospital Público

Federal Universitário. É, sem dúvida alguma, uma intervenção federal nos Hospitais de Ensino.

Para se ter uma ideia do absurdo desse projeto, consta no Regimento Interno da EBSERH que

apenas o superintendente da sua Unidade Hospitalar deverá ser da Universidade; todavia, os gerentes,

inclusive os de ensino e de pesquisa não precisarão ser dos quadros da Instituição.

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Ora, é preciso dizer mais alguma coisa? A quem interessa isso? Certamente que não à comunidade

acadêmica e nem à sociedade. Isso é preparar um ambiente para o domínio da iniciativa privada na seara

da pesquisa nessas Unidades Hospitalares. Estão dando um ar de legalidade a tudo isso. Mas isso é

inconstitucional!

E isto se multiplica infinitamente se imaginarmos as filiais, escritórios, sucursais e tantas outras coisas

mais por todo este nosso País, sempre incorporando novos personagens, como assessores, coordenadores,

gerentes etc.

Bem, o Conselho de Administração da EBSERH é o seu órgão de orientação superior, com

competência para fixar as orientações gerais das atividades da EBSERH, assim como, dentre outras coisas,

deliberar o regulamento de pessoal, incluindo o regime disciplinar e as normas sobre apuração de

responsabilidade; deliberar o quadro de pessoal, com a indicação do total de vagas autorizadas; deliberar o

plano de salários, benefícios, vantagens e quaisquer outras parcelas que componham a retribuição de seus

empregados; propor a destinação de lucros ou resultados; propor sobre a dissolução, cisão, fusão e

incorporação que envolva a EBSERH; deliberar sobre alteração do capital e do Estatuto Social da EBSERH;

autorizar a contratação de empréstimos no interesse da EBSERH; dirimir questões em que não haja

previsão estatutária, aplicando, subsidiariamente, a lei nº 6.404/76 (Lei das S.A.); dentre outras

competências.

Então, fica claro que, a qualquer tempo, a EBSERH pode ter o seu Estatuto Social alterado, bem como

alterado o seu capital social, não havendo qualquer impedimento para que, por lei específica, seja ela

transformada em uma Sociedade de Economia Mista, abrindo o seu capital para o mercado.

Nesse contexto, importante assinalar o que consta no artigo 12 § 3º do Estatuto Social da EBSERH: “O

representante dos empregados não participará das discussões e deliberações sobre assuntos que envolvam

relações sindicais, remuneração, benefícios e vantagens, inclusive assistenciais ou de previdência

complementar, hipóteses em que fica configurado o conflito de interesses, sendo tais assuntos deliberados

em reunião separada e exclusiva para tal fim”.

Logo, a lei deixa claro que as portas estão fechadas às reivindicações dos trabalhadores. Não há

ouvidos para eles. A EBSERH decide e ponto final.

13- Com a adesão à EBSERH, os atuais Hospitais Públicos Federais

Universitárioscontinuarão os mesmos?

Não!

Na prática, a EBSERH desvincula os Hospitais Universitários das Universidades Públicas Federais, ficando sob

uma gerência totalmente estranha à Universidade, o que, como afirma o Professor Dalmo Dallari (USP),

carece de lógica e razoabilidade jurídica, já que isso fere o Princípio Constitucional da Indissociabilidade entre

Ensino, Pesquisa e Extensão.

Desse modo, saem do cenário universitário os nossos Hospitais Universitários Públicos Federais e

entram em cena no ambiente empresarial as Unidades Hospitalares da EBSERH.

Ficando o Hospital Universitário sob a administração da EBSERH, os servidores públicos (estatutários)

cedidos para ali atuarem estarão sob o comando administrativo e disciplinar da EBSERH, que determinará o

modo de cumprimento das suas jornadas de trabalho (ambulatório, plantão...), férias etc.

Assim, qualquer acordo anteriormente feito com a Universidade restará sem validade e sem eficácia.

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Do mesmo modo, será a EBSERH que irá definir chefias de serviços e de enfermarias, número de

consultas ambulatoriais por turno, horários de funcionamento dos ambulatórios no ambiente do Hospital

Universitário, dentre tantas outras coisas.

Os Professores Universitários, particularmente os da Faculdade de Medicina, perderão espaço e

poder.

Mais do que isso: em pouco tempo, com as aposentadorias e mortes dos atuais servidores públicos

federais (estatutários), só teremos trabalhando nos atuais Hospitais Públicos Federais Universitários (mais

tarde, Unidades Hospitalares da EBSERH) os chamados “empregados públicos” (celetistas), desfigurando e

descaracterizando totalmente esta instituição.

Isto porque a EBSERH não está subordinada ao Ministério da Educação, mas apenas vinculado a

ele. E, como empresa estatal, os seus trabalhadores são regidos para sempre pela CLT (Consolidação das

Leis Trabalhistas), não incidindo sobre eles a Lei 8.112/90.

Assim, o empregado público não será trabalhador da Universidade, mas sim da EBSERH. O concurso público

que ele vai fazer será para a EBSERH, e não para a Universidade.

Então, o vínculo empregatício será com a EBSERH, e não com a Universidade Pública Federal, já que a EBSERH

é pessoa jurídica distinta da Universidade e com ela não se confunde. A EBSERH é empresa pública com

personalidade jurídica de direito privado e a Universidade Federal é autarquia com personalidade jurídica de

direito público.

Portanto, os Hospitais Universitários não serão mais os mesmos, pois perderão a sua essência de caráter

universitário (de escola) e ganharão uma essência de caráter empresarial. Assim, só serão “universitários”

no nome, mas não na sua atividade.

Assim, se for celebrado o contrato com a EBSERH, na verdade, a Universidade estará abrindo mão, de

modo definitivo,do seu Hospital Escola, considerando que ele não é importante para a formação acadêmica

na área da Saúde.

Esta é a interpretação juridicamente correta do artigo 7º da Lei nº 12550/11: “... os servidores

titulares de cargo efetivo em exercício na instituição federal de ensino ou instituição congênere que

exerçam atividades relacionadas ao objeto da EBSERH poderão ser a ela cedidos para a realização de

atividades de assistência à saúde e administrativas.”

Tudo isso, e muito mais, configurando lesão ao Princípio da Autonomia Universitária e também ao Princípio

da Isonomia, ambos de índole constitucional.

Ora, os Hospitais Públicos Federais Universitários não podem estar sujeitos a um regime de trabalho que

não se submeta às regras do regime jurídico único; ou seja, não podem existir e funcionar sob as rédeas de

uma entidade com personalidade jurídica de direito privado. Isto porque os nossos Hospitais Públicos

Federais Universitários devem ser considerados verdadeiras cláusulas pétreas de nossas Universidades

Públicas Federais e, portanto, intocáveis e indissociáveis da sua vinculação direta e absoluta à estas.

E qual o verdadeiro significado dessa desvinculação?

Significa que todos os concursados (engenheiros, arquitetos, advogados, sociólogos, economistas,

administradores etc) das Universidades Públicas continuarão sendo servidores públicos, exceto os

concursados para os atuais Hospitais Universitários Federais, que serão todos empregados públicos.

Então, por exemplo, os nossos filhos e netos, ou os atuais estudantes da área da Saúdeque venham a ser

médicos, enfermeiros, assistentes sociais, psicólogos, fisioterapeutas, fonoaudiólogos, técnicos de

enfermagem, técnicos de laboratório, terapeutas ocupacionais, técnicos de gasoterapia e tantas outras

especialidades na área da saúde, se quiserem trabalhar num Hospital Público Federal Universitário, só

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poderão fazê-lo sob o regime de trabalho celetista, sem estabilidade e sem aposentadoria integral e

paritária, e com vínculo empregatício com a EBSERH, e nunca mais com as Universidades públicas Federais.

Portanto, trabalharão para uma Unidade Hospitalar da EBSERH, e não para um Hospital Universitário.

Assim, a partir de um determinado momento, todos os concursados das Universidades Públicas

Federais, de todas as suas Unidades,continuarão com a garantia da estabilidade e da aposentadoria

integral e paritária, exceto os pobres coitados dos concursados que estiverem trabalhando nos atuais

Hospitais Universitários das respectivas Universidades, pois esses trabalharão sem a garantia da

estabilidade e irão se aposentar recebendo não a integralidade e paridade dos seus vencimentos, mas tão-

somente o teto da aposentadoria do INSS. Na verdade, não estarão trabalhando num Hospital

Universitário, mas sim numa simples Unidade Hospitalar da EBSERH.

Isso porque a EBSERH não está subordinada ao Ministério da Educação, mas apenas vinculado a

ele. E, como empresa estatal, os seus trabalhadores são regidos para sempre pela CLT (Consolidação das

Leis Trabalhistas), não incidindo sobre eles a Lei 8.112/90.

Tudo isso, e muito mais, configurando lesão ao Princípio da Autonomia Universitária e também ao Princípio

da Isonomia, ambos de índole constitucional.

14- Qual o tipo de contrato que a EBSERH propõe firmar com as Universidades Públicas

Federais?

Trata-se de um “contrato de adesão”, onde um dos pactuantes (no caso, a EBSERH) predetermina (ou seja,

impõe) as cláusulas do negócio jurídico, eliminando a possibilidade de qualquer discussão da proposta,

devendo a Parte que não participou da sua elaboração (no caso, a Universidade Pública Federal) aceitá-lo em

bloco ou rejeitá-lo.

Constitui instrumento próprio da prestação de serviços privados de utilidade pública, tais como o de

telefonia móvel.

Quais são as características principais desse tipo de contrato?

Uniformidade: o objetivo do estipulante (EBSERH) é obter, do maior número possível de contratantes, o

mesmo conteúdo contratual, para uma racionalidade de sua atividade e segurança das relações

estabelecidas.

Predeterminação Unilateral:a fixação das cláusulas é feita anteriormente a qualquer discussão sobre o

contrato, sendo imprescindível que as cláusulas uniformes sejam impostas por somente uma das Partes (no

caso, pela EBSERH).

Rigidez:não é possível rediscutir as cláusulas do contrato de adesão.

Posição de Vantagem (superioridade material) de uma das Partes:assim, a vontade daquele que elabora o

contrato (EBSERH) prevalece (sempre) sobre a dos aderentes (Universidades Públicas Federais), ainda que

mais forte economicamente.

Portanto, o contrato de adesão traz em si uma característica limitadora da liberdade contratual.

Desse modo, os contratos de adesão constituem uma oposição à ideia de contrato paritário, por inexistir a

liberdade de convenção (acordo), visto que excluem a possibilidade de qualquer debate e transigência

entre as Partes, uma vez que um dos contratantes (no caso, a Universidade Pública Federal) se limita a

aceitar as cláusulas e condições previamente redigidas e impressas pelo outro (no caso, a EBSERH),

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aderindo a uma situação contratual já definida em todos os seus termos (Artigo 54 §§ 1º ao 4º da Lei nº

8.078/90).

Assim, esses contratos ficam ao arbítrio exclusivo de uma das Partes – o policitante (EBSERH) -, pois o

oblato (Universidade Pública Federal) não pode discutir ou modificar o teor do contrato ou as suas cláusulas.

Como exemplos de contratos de adesão, temos os contratos de seguro e os contratos de telefonia

fixa ou celular.

Então, no contrato de adesão não há alternativa para o outro contratante (no caso, a Universidade

Pública Federal): é pegar ou largar.

E quem será o responsável por definir as cláusulas desse contrato?

A resposta nós encontramos nos instrumentos legais que regem a própria EBSERH, nestes termos:

Artigo 44 § 3º do Regimento Interno da EBSERH: “O contrato será proposto pela Diretoria Executiva e

aprovado pelo Conselho de Administração”.

Artigo 15 do Estatuto Social da EBSERH (Lei nº 7.661/11): “A EBSERH será administrada por uma Diretoria

Executiva composta pelo Presidente e até seis Diretores, todos nomeados pelo Presidente da República, por

indicação do Ministro de Estado de Educação”.

Mas há uma armadilha nessa questão – neste procedimento - (para não dizer má-fé): inicialmente, a

Universidade Pública Federal formaliza, por meio de um ofício do Reitor dirigido ao Presidente da EBSERH, a

decisão (e não a intenção) de aderir à empresa. Essa decisão é de caráter irrevogável; quer dizer, toma-se

essa decisão sem ter conhecimento prévio dos termos e cláusulas contratual, nos seguintes termos:

Artigo 44 do Regimento Interno da EBSERH: “As instituições federais de ensino ou instituições congêneres

(por exemplo, os Hospitais Públicos Federais não universitários) aderirão à EBSERH por meio de Termo de

Adesão e Contrato”. § 1º: “O Termo de Adesão é o instrumento pelo qual a instituição federal de ensino ou

instituição congênere assume o compromisso de adesão ao projeto da EBSERH e lhe concede plenos poderes

para a realização de diagnóstico situacional do hospital, que precederá o estabelecimento do contrato.”

Desse modo, a assinatura do Termo de Adesão é obrigatoriamente anterior ao conhecimento dos Termos

do Contrato; quer dizer, assinar o Termo de Adesão significa entregar os nossos Hospitais Públicos Federais

Universitários para uma empresa pública com personalidade jurídica de direito privado para ela fazer o que

quiser com esses Hospitais, e sem a possibilidade de voltar atrás quanto a essa decisão. Além disso, a

assinatura do Termo de Adesão concede à EBSERH plenos poderes para a realização do diagnóstico

situacional do Hospital.Ou seja, o Governo Federal está colocando para as nossas Universidades Públicas

Federais, e para a sociedade, que elas (as Universidades) não dispõem de pessoal qualificado para a

realização desse diagnóstico e que esse diagnóstico é desconhecido delas. Portanto, assinar esse Termo de

Adesão é reconhecer publicamente que aquela determinada Universidade Pública Federal é incompetente

para se autoconhecer e se autogerenciar, estando absolutamente alienada em relação aos seus problemas e

às soluções deles. E isso quem vai afirmar será o seu respectivo Reitor.

Então, a assinatura do contrato com a EBSERH só acontecerá após vencida a fase de realização do

diagnóstico situacional da instituição; todavia, a assinatura prévia do Termo de Adesão cria para a

Universidade a obrigatoriedade de assinar o Contrato. Portanto, já tendo decidido pela adesão (Termo de

Adesão), ainda que venha a discordar dos termos e cláusulas do contrato - só posteriormente conhecidos

pela Universidade -, esta não poderá recusar-se à sua assinatura.

Desse modo, como podem os Conselhos Universitários aprovar e deliberar pela adesão à EBSERH,

se eles desconhecem o conteúdo do Contrato? Isso é de uma irresponsabilidade e inconsequência

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absolutamente condenáveis sob todos os aspectos. Não podemos admitir esse tipo de conduta. Com

certeza, cabe Mandado de Segurança contra essa decisão.

Acontece que, dependendo do Reitor, é possível até que um ou outro Reitor esteja alheio a tudo isso;

afinal de contas, existem reitores e Reitores. Mas, com certeza, se ele (o reitor) não sabe, nós – os servidores

públicos federais que atuamos nesses Hospitais Públicos Federais -, com certeza, sabemos o seu diagnóstico,

conhecemos as suas causas e temos as soluções; e não nos furtamos ao desafio. Assim, não precisamos que

ninguém de fora da Universidade venha dizer e determinar o que podemos ou não podemos fazer aqui,

definir o nosso diagnóstico e impor as nossas soluções.Isso fere a Autonomia Universitária.

Se alguma Universidade Pública Federal é dirigida, no momento, por um “reitor” que desconhece os

problemas do seu respectivo Hospital Universitário, cabe, com certeza, uma proposição de impeachment

feita imediatamente pelo seu Conselho Universitário.

Então, até por isso a autonomia universitária fica frontalmente comprometida e mitigada.

Mas as armadilhas não cessam aí. Há mais.

O artigo 44 § 2º do Regimento Interno da EBSERH assim dispõe: “O contrato conterá, entre outras: I-

as obrigações dos signatários; II- as metas de desempenho, indicadores e prazos de execução; III- a respectiva

sistemática de acompanhamento e avaliação, contendo critérios e parâmetros a serem aplicados; IV- a

previsão de que a avaliação de resultados obtidos, no cumprimento de metas de desempenho e observância

de prazos pelas Unidades da EBSERH, será usada para o aprimoramento de pessoal e melhorias estratégicas

na atuação perante a população e as instituições federais de ensino ou instituições congêneres, visando ao

melhor aproveitamento dos recursos destinados à EBSERH; V- mecanismos de controle social.”

Bem, quanto ao controle social da EBSERH, este está mais do que provado e reconhecido que não existirá,

por impossibilidade imposta pela própria Lei nº 12.550/11 (artigo 14).

A própria EBSERH denomina os atuais Hospitais Públicos Federais Universitários de “Unidades da

EBSERH”, uma vez feita a adesão.

Não se fala em cláusulas definidoras das causas, modos e condições de rescisão contratual.

Então, este é o momento de fazermos a leitura do artigo 1º da Lei nº 12.550/11: “Fica o Poder

Executivo autorizado a criar empresa pública unipessoal, ... denominada Empresa Brasileira de Serviços

Hospitalares (EBSERH), com personalidade jurídica de direito privado e patrimônio próprio, vinculada ao

Ministério da Educação, com prazo de duração indeterminado.”

Portanto, a Lei nº 12.550/11 prevê que o contrato a ser firmado com a EBSERH é por tempo

indeterminado (“o céu é o limite”), pois não existe cláusula de revisão ou rescisão contratual, de modo que

esse contrato só termina se o Congresso Nacional aprovar uma Lei que promova a extinção da EBSERH.

Então, de forma definitiva (para sempre), A EBSERH quebra a Autonomia Universitária, retirando das

Universidades Públicas (Autarquias Públicas Federais – Pessoas Jurídicas de Direito Público) os seus quarenta

e seis Hospitais Universitários e transformando-os em Unidades Hospitalares de uma Empresa Pública –

Pessoa Jurídica de Direito Privado – com sede em Brasília, com a possibilidade de criação de subsidiárias e

filiais (institutos jurídicos próprios das Sociedades de Economia Mista) – Subsidiária Norte, Subsidiária Sul etc

-, cuja real finalidade é a obtenção de lucro líquido através da realização do seu objeto social (basicamente,

a prestação de serviços hospitalares), inaugurando a “dupla entrada” nesses Hospitais (pacientes do SUS

com Plano de Saúde e pacientes do SUS sem Plano de Saúde),passando a ter autoridade disciplinar e

administrativa sobre todos os atuais funcionários (servidores públicos estatutários) desses Hospitais, que

deixam (para sempre) de estar subordinados às diretrizes administrativas e disciplinares das Universidades

Públicas.

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Ou seja, esses Hospitais Universitários passam a ser “Universitários” somente na nomenclatura, pois,

na realidade, deixam de ter qualquer subordinação às decisões e aos planos estratégicos e curriculares das

Universidades Públicas Federais, já que tudo aquilo que disser respeito às Unidades Hospitalares da EBSERH

será deliberado pelo Conselho de Administração da própria EBSERH, que não sofre qualquer interferência

das Universidades e nem se submete a qualquer controle social.

Até mesmo as pesquisas realizadas nessas Unidades Hospitalares estarão sujeitas ao olhar decisório da

EBSERH.

Quando falamos em Autonomia Universitária estamos falando de dois Princípios Fundamentais -

ambos de índole constitucional: Princípio da Autonomia Didático-Científica, Administrativa, de Gestão

Financeira e Patrimonial; e Princípio da Indissociabilidade entre Ensino, Pesquisa e Extensão.

Nesse sentido, as Universidades devem ter a liberdade de caminhar por si mesma, determinando os

seus regulamentos internos, currículos, cursos, pesquisas... - tudo no ideal de permitir a autonomia do

próprio saber humano.

Mas sendo os nossos atuais Hospitais Universitários retirados do corpo físico e administrativo das

Universidades Públicas Federais, e passando todos eles a funcionar como simples Unidades Hospitalares da

EBSERH, tudo aquilo que será decidido a seu respeito será feito sob o manto da lógica empresarial, pois

essas Unidades Hospitalares da EBSERH serão o seu negócio lucrativo.

Então, as decisões do Conselho de Administração da EBSERH acabarão por gerar implicações no dia-

a-dia desses Hospitais, já que o seu caráter nitidamente empresarial visa a implementação de uma gestão

única, com geração de indicadores quantitativos e qualitativos para o estabelecimento de metas e resultados

(metas de produtividade), e obtenção de lucro líquido, de modo a proporcionar ao Estado “gastar” cada vez

menos em Saúde e Educação.

A EBSERH pensa a Saúde Pública tratada como um negócio, em que suas Unidades Hospitalares passam a

ser instrumentos para a realização desse fim – o fim lucrativo.

Este é um dos fundamentos para a implantação do “ponto eletrônico” – controle de frequência

típico da iniciativa privada.

Na prática, por exemplo, o número de pacientes atendidos em cada turno ambulatorial será

aumentado, porque o compromisso da EBSERH não é com o ensino, mas sim com a atividade negocial

(prestação de serviços hospitalares sob a óptica negocial). Do mesmo modo, com certeza, será criado mais

um turno de atendimento ambulatorial. Os protocolos de tratamento médico levarão em conta

principalmente o seu aspecto econômico. Poderão ser reservados espaços físicos, leitos e consultas

ambulatoriais para pacientes do SUS com Plano de Saúde. Do mesmo modo, poderão ser definidos horários e

dias para a realização de cirurgias nos pacientes do SUS com Plano de Saúde. Esse comportamento também

irá refletir na realização de exames complementares de laboratório e de imagens (radiológicos) nessas

Unidades Hospitalares. Poderá haver definição de números de leitos reservados para internações de

determinadas patologias, utilizando-se o critério econômico e não social e/ou educacional para isso (por que

internar tantos pacientes com doenças complexas que geram gastos enormes para a EBSERH?). Tudo isso

retirando espaço e oportunidades daqueles pacientes do SUS sem Plano de Saúde, ferindo o Princípio

Constitucional da Universalidade e do Livre Acesso nos Serviços Públicos de Saúde. Ou seja, a

contratualização com a EBSERH abre caminho para a abertura de leitos reservados para internações de

pacientes do SUS com Plano de Saúde nas suas Unidades Hospitalares, dando de presente para os gestores

desses Planos de Saúde um enorme número de leitos públicos (antes 100% reservados para atender somente

pacientes do SUS, sem qualquer dirigismo com relação a ter ou não plano de saúde) para, agora, atender as

necessidades privadas desses Planos/Seguros de Saúde. E isto a nossa Constituição Federal não admite.

Todos os acordos trabalhistas feitos com as Universidades perdem eficácia com a EBSERH, já que

Universidades e EBSERH constituem Pessoas Jurídicas distintas, que não se tocam.

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Além disso, a EBSERH ganha de presente das Universidades Públicas Federais todoo patrimônio

(estrutura física e todo o seu conteúdo material) dos Hospitais Universitários Públicos Federais, de forma

definitiva, já que o contrato com a EBSERH é por tempo indeterminado.

Artigo 13 da Lei nº 12.550/11: “Ficam as instituições públicas federais de ensino e instituições congêneres

autorizadas a ceder à EBSERH, no âmbito e durante a vigência do contrato, bens e direitos necessários à sua

execução.”

Acontece que a adesão à EBSERH, em princípio, não tem volta; é para sempre.

Esse é mais um elemento que fere o Princípio Constitucional da Autonomia Universitária.

A Lei que autoriza a criação da EBSERH cria uma estrutura grandiosa e cara de comando, com a criação de

inúmeros cargos de alto escalão, quase todos ocupados por personagens estranhos à vida acadêmica

universitária, sendo os salários pagos aos seus gestores uma violência à Moralidade Pública, além de trazer

dispositivo legal que nega ao trabalhador da EBSERH qualquer participação nas decisões relativas a Planos

de Carreiras, reajustes salariais, concessão de benefícios etc.

15- As Universidades Públicas Federais são obrigadas a aderir à EBSERH?

Vejamos como responde a própria EBSERH: “As Universidades Federais não são obrigadas a aderir à EBSERH,

sendo, portanto, opcional esta alternativa.”

Portanto, a Lei que cria a EBSERH, embora esteja vigendo, não tem eficácia jurídica automática, ou

seja, não produz qualquer efeito na vida em sociedade, enquanto não houver adesão da Universidade.

Então, para aquela Universidade Pública Federal que não assinar o Termo de Adesão, a Lei nº

12.550/11 é natimorta.

16- O que acontecerá com aquela Universidade Pública Federal que não aderir à

EBSERH?

As Universidades Públicas Federais que não aderirem à EBSERH continuarão recebendo recursos do REHUF

(Programa Nacional de Reestruturação dos Hospitais Universitários Federais) e a recomposição da sua força

de trabalho terá que ser feita, obrigatoriamente, através da autorização imediata e realização de concurso

público para o preenchimento de cargos públicos, sob o regime trabalhista estatutário, de modo a substituir

de forma definitiva todo o pessoal terceirizado, considerado irregular, sob o manto da nossa Constituição

Federal e por determinação do TCU (Tribunal de Contas da União), com o aval do STF (Supremo Tribunal

Federal).

Isso porque, ao não aderir à EBSERH, os Hospitais Públicos Federais Universitários continuarão sendo

regidos pelas regras atinentes ao regime jurídico de direito público, pois sendo as nossas Universidades

Públicas Federais entes Autárquicos da União, os seus trabalhadores têm que ser, obrigatoriamente,

servidores públicos federais (estatutários), e jamais empregados públicos (celetistas).

Além do mais, o próprio Governo Federal afirma, na Lei que autoriza a criação da EBSERH, que o

Tesouro Nacional (a União) dispõe de todos os recursos financeiros para resolver todos os problemas dos

nossos Hospitais Públicos Universitários Federais, no prazo máximo de 1 (um) ano.

Então, cabe ao Ministério Público Federal exigir que isso seja cumprido já.

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Por isso, o Governo Federal está pressionando tanto para acelerar, sem qualquer discussão mais

profunda, as adesões à EBSERH. Porque ele sabe que não tem mais tempo para continuar resistindo a essa

decisão do STF e do TCU. Quem não aderir continuará com a sua Autonomia Universitária preservada e com o

seu corpo de funcionários estáveis e efetivos.

17- A partir da contratação da EBSERH, haverá prejuízo da Autonomia Universitária?

Com certeza, sim! Disso ninguém duvida. Nem mesmo aqueles que negam que essa Autonomia seja afetada.

Eles negam sem duvidar que ela, de fato, seja atingida. Como assim? Eles simplesmente mentem para nós e

para eles mesmos. Tentam falar essa mentira compulsivamente para ver se convencem a si mesmos de que

essa mentira possa ser transformada em verdade fabricada. Há uma certa esquizofrenia nisso tudo.

Vejamos o que diz o jurista e Professor da Faculdade de Direito da USP – Prof. Dalmo Dallari – sobre esta

questão:

A prestação do serviço público de assistência à saúde da população por meio do Sistema

Único de Saúde (SUS) é atividade típica do Poder Público; “é serviço público de relevância pública,

que não pode ser transformado em atividade econômica”.

O hospital-escola reúne atividades públicas universais e gratuitas de natureza híbrida

(educação-saúde), tais como ensino, pesquisa e extensão, esta última materializada sob a forma de

assistência à saúde prestada à população no processo do ensino acadêmico (professor-aluno).

Para dar cumprimento à grade curricular do ensino acadêmico formal, os hospitais-escola

são conveniados ao Sistema Único de Saúde (SUS), nos seguintes termos da Lei nº 8.080, de

1990:

Art. 45. Os serviços de saúde dos hospitais universitários e de ensino integram-se ao Sistema Único de Saúde (SUS), mediante convênio, preservada a sua autonomia administrativa, em relação ao patrimônio, aos recursos humanos e financeiros, ensino, pesquisa e extensão nos limites conferidos pelas instituições a que estejam vinculados.

Núcleo da instituição oficial responsável pelo ensino e pela extensão em saúde pública,

o hospital-escola é parte integrante da universidade, que no setor público é instituída sob a forma de

autarquia ou fundação pública, esta última denominada pela pacífica jurisprudência1 das Cortes

Suprema e de Justiça como de natureza autárquica.

O artigo 32, § 5º da Lei Orgânica do SUS (Lei nº 8.080, de 1990) também estabelece

que as atividades de pesquisa e desenvolvimento científico e tecnológico em saúde serão co-

financiadas pelo SUS e pelas universidades, custeadas com recursos do orçamento fiscal, além de

investimentos (operações de crédito) que podem ser realizados pelos entes da Federação no

âmbito de suas políticas de saúde.

1 Recurso Extraordinário nº 215.741-STF. “EMENTA: RECURSO EXTRAORDINÁRIO. FUNDAÇÃO NACIONAL DE SAÚDE. CONFLITO DE

COMPETÊNCIA ENTRE A JUSTIÇA FEDERAL E A JUSTIÇA COMUM. NATUREZA JURÍDICA DAS FUNDAÇÕES INSTITUÍDAS PELO PODER PÚBLICO. 1. A Fundação Nacional de Saúde, que é mantida por recursos orçamentários oficiais da União e por ela instituída, é entidade de direito público. 2. Conflito de competência entre a Justiça Comum e a Federal. Artigo 109, I da Constituição Federal. Compete à Justiça Federal processar e julgar ação em que figura como parte fundação pública, tendo em vista sua situação jurídica conceitual assemelhar- se, em sua origem, às autarquias. 3. Ainda que o artigo 109, I da Constituição Federal, não se refira expressamente às fundações, o entendimento desta Corte é o de que a finalidade, a origem dos recursos e o regime administrativo de tutela absoluta a que, por lei, estão sujeitas, fazem delas espécie do gênero autarquia. 4. Recurso extraordinário conhecido e provido para declarar a competência da Justiça Federal.” (grifou-se) e Súmula STJ nº 324

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Ainda de acordo com o artigo científico de WEICHERT (2009), para as atividades de

serviço público de assistência à saúde da população o regime de direito privado não é passível de

ser empregado, concluindo seu artigo científico nos seguintes termos:

... parece-nos que a prestação de serviços públicos de saúde é exclusiva de instituições estatais regidas pelo direito público, enquanto a realização de atividades econômicas pode ser afetada a pessoas jurídicas estatais de direito privado, tais como as sociedades de economia mista, as empresas públicas e, também, as novéis fundações. (...) O Poder Público, no SUS, é sempre um prestador de serviço público. Não há outra possibilidade. E, fora do SUS, não há autorização para atuar. Todo esforço estatal em saúde deve ser realizado dentro do SUS. E será, evidentemente, parte da prestação do serviço público de saúde.

A idéia de estabelecer, ainda que indiretamente, uma relação de consumo entre a empresa

federal de natureza privada (por exemplo, EBSERH) e a União (orçamentos fiscal e da seguridade

social), para prestação de serviços públicos de ensino e saúde, é outro ponto que não se sustenta

quando analisado à luz do arcabouço constitucional vigente.

É preciso deixar claro que as instituições oficiais de ensino e de saúde públicas não

prestam serviços à União, mas sim à população, que recolhe tributos para o custeio de tais ações a

cargo do Estado por determinação constitucional. Eis os termos constitucionais que justificam tal

assertiva:

Art. 195. A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e das seguintes contribuições sociais:

(...)

Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.

(...)

Art. 205. A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.

Art. 206. O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios:

(...)

IV - gratuidade do ensino público em estabelecimentos oficiais;

O artigo 198 da Constituição dispõe que o SUS deve seguir diretrizes tais como o

atendimento integral atendimento integral, com prioridade para as atividades preventivas, sem

prejuízo dos serviços assistenciais, mediante financiamento, nos termos do artigo 195 (contribuições

sociais), com recursos do orçamento da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios,

vedada a cobrança de qualquer espécie aos usuários dos serviços públicos, contribuinte direto e/ou

indireto da elevada carga tributária brasileira.

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Na seqüência da normatização, o artigo 199 estabelece que instituições de natureza privada

poderão participar de forma complementar ao SUS, não podendo substituir o Poder Público no

exercício de seus deveres constitucionais. Saúde pública é dever do Estado, que deve operar

segundo as normas de Direito Público formuladas para garantir o interesse público.

Esse é o figurino delineado pela Carta de 1988, marcado pelo binômio “cobrança de

tributosXprestação de serviços pelo Poder Público”, segundo normas específicas de Direito

Público que garantam equilíbrio a essa equação desafiadora em qualquer nação.

Nesse ponto, então, temos que observar o que diz o artigo 207 da Constituição Federal:

Art. 207: “As universidades gozam de autonomia didático-científica, administrativa e de gestão financeira e

patrimonial, e obedecerão ao Princípio de Indissociabilidade entre Ensino, Pesquisa e Extensão.”

Autonomia Universitária não é apenas a independência da instituição universitária, mas a do próprio saber

humano, pois as Universidades não serão o que devem ser se não cultivarem a consciência da independência

do saber e se não souberemque a supremacia do saber, graças a essa independência, é levar a um novo

saber.

E para isto precisam viver em uma atmosfera de autonomia e estímulos vigorosos de

experimentação, ensaio e renovação.

Não é por simples acidente que as Universidades se constituem em comunidades de mestres e

discípulos, casando a experiência de uns com o ardor e a mocidade dos outros.

Elas não são apenas instituições de ensino e de pesquisas, mas sociedades devotadas ao livre,

desinteressado e deliberado cultivo da inteligência e do espírito, e fundadasna esperança do progresso

humano pelo progresso da razão.

Mas é também o reconhecimento de que a Universidade deve ter a liberdade de caminhar por si

mesma, determinando seus currículos, pesquisas, cursos, além de seus regulamentos internos etc.

Não se pode deixar de considerar que essas instituições podem desempenhar papel estratégico na

redução das desigualdades regionais, sociais e econômicas existentes no País, contribuindo de forma efetiva

para a transformação social e econômica brasileira.

E manter a Universidade Pública é fundamental para a redução dessas desigualdades e da

dependência científica e tecnológica brasileira.

Sendo assim, a Universidade Pública representa os interesses da sociedade, participa da política do

Estado – no sentido de que é parte da polis – mas não é governada pelo Estado, nem em seu nome. É a única

instituição que se insere no Estado e o transcende.

Também não podemos desconhecer que a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB)

consolida os Princípios Constitucionais da Gratuidade do Ensino Público, da Gestão Democrática do Ensino

Público e da Garantia do Padrão de Qualidade.

Portanto, a caracterização da Universidade como locus do saber, da liberdade acadêmica e da

inteligência, livre do dirigismo, por melhor intencionado que seja, é um pressuposto básico da autonomia.

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Ora, não há como negar que a EBSERH atinge de forma incontestável a Autonomia Universitária, já

que o seu Conselho de Administração tem caráter deliberativo na gestão dos Hospitais Universitários

Federais. E isso fere o Princípio da Autonomia Universitária, de índole constitucional.

Na verdade, a própria EBSERH afirma que a sua contratação leva à perda da Autonomia

Universitária, quando, respondendo se haverá conflito entre os Regimentos Internos dos Hospitais

Universitários Federais e o Estatuto Social ou Regimento Interno da EBSERH, afirma que “a estrutura

organizacional da EBSERH e a respectiva distribuição de competências serão estabelecidas pelo Conselho de

Administração da Empresa, mediante proposta da Diretora Executiva, e que os Regimentos Internos dos

Hospitais Públicos Federais poderão ser revistos para harmonizar-se com o Estatuto e o Regimento da

Empresa”.

Ou seja, a EBSERH tem tanta força e tanto domínio que é o Hospital Público Federal Universitário que deverá

(e não poderá) mudar as suas regras internas para se moldar e adequar aos objetivos dessa Empresa.

Não precisamos falar mais nada, não é mesmo?

Basta dizer que todas as decisões relacionadas aos bens e direitos dos atuais Hospitais Públicos Federais

Universitários estarão sob a autoridade exclusiva do Conselho de Administração da EBSERH – seu órgão

superior, de caráter deliberativo.

Autonomia Universitária não é compatível com uma entidade com personalidade jurídica de direito

privado, simplesmente porque ao saber humano não cabe a lógica empresarial.

Aliás, os Professores Universitários são completamente ignorados pela EBSERH.

18- O que é o chamado “Pregão Eletrônico”?

O “Pregão” é modalidade de licitação válida para todas as esferas federativas (União, Estados,

Distrito Federal e Municípios) e utilizado para contratação de bens e serviços comuns.

E o que são “bens e serviços comuns”?

Trata-se de um conceito jurídico estabelecido no artigo 1º parágrafo único da Lei nº

10.520/02, nos seguintes termos: “Consideram-se bens e serviços comuns, independentemente de

valor, aqueles cujos padrões de desempenho e qualidade possam ser objetivamente definidos pelo

edital, por meio de especificações usuais no mercado.”

Portanto, no “Pregão”, importa a qualidade, independentemente da quantidade.

O artigo 4º do Decreto nº 5.450/05tornou obrigatório o uso do pregão para o âmbito federal,

devendo ser adotada preferencialmente a modalidade eletrônica.

Assim, o uso do pregão presencial na esfera Federal somente será permitido mediante justificativa expressa

da autoridade competente.

No pregão, o intervalo mínimo entre a publicação do instrumento convocatório e o envio de

propostas é de oito dias úteis, tendo como característica fundamental a inversão nas fases naturais da

licitação, de modo que o julgamento das propostas antecede a habilitação dos licitantes.

Essa inversão relaciona-se com o objetivo essencial do pregão: propiciar economia de tempo e de

dinheiro para o Poder Público.

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Assim, após a fase dos lances verbais decrescentes, analisa-se a documentação somente de quem

ofertou o menor lance, devolvendo-se, fechados, os envelopes com documentos de habilitação dos demais

licitantes.

Atualmente, a Administração Pública Federal tem discricionariedade para decidir, diante do caso concreto, o

que pode ser considerado objeto comum e licitado via pregão.

O pregão eletrônico é aquele realizado com apoio da Internet.

Mas há proibição para o uso do pregão, para todas as esferas federativas, quando se tratar de:

contratação de obras e serviços de engenharia, locações imobiliárias e alienações em geral.

Não obedecer o Princípio Licitatório, de índole constitucional e legal, significa, na prática, autorizar

o clientelismo e o subjetivismo na realização de compras por parte da EBSERH, o que não atende, em

hipótese alguma, o interesse público, só beneficiando com isso o interesse privado.

Vejamos como isso está disposto na nossa Constituição Federal e no Ordenamento Jurídico

Ordinário:

Artigo 37 inciso XXI da Constituição Federal:“...As obras, serviços, compras e alienações serão contratadas

mediante processo de licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes, com

cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta, nos

termos da lei, o qual somente permitirá as exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis à

garantia do cumprimento das obrigações”.

Artigo 1º parágrafo único da Lei nº 8.666/93 (Lei que institui normas para Licitações e Contratos na

Administração Pública): “Subordinam-se ao regime desta lei, além dos órgãos da Administração Direta, os

fundos especiais, as autarquias, as fundações públicas, as empresas públicas, as sociedades de economia

mista e demais entidades controladas direta ou indiretamente pela União, Estados, Distrito Federal e

Municípios”.

Artigo 2º parágrafo único da Lei nº 8.666/93: “Para os fins desta lei, considera-se contrato todo e qualquer

ajuste entre órgãos ou entidades da Administração Pública e particulares, em que haja um acordo de

vontade para a formação de vínculo e a estipulação de obrigações recíprocas, seja qual for a denominação

utilizada”.

Então, a licitação é um procedimento administrativo por meio do qual a Administração Pública

seleciona a proposta mais vantajosa para o contrato que melhor atenda ao interesse público.

Destina-se a garantir a observância do Princípio Constitucional da Isonomia, na medida em que

visa assegurar a participação de todos os interessados em contratar com a Administração Pública, e a

selecionar a proposta mais vantajosa para a Administração e o interesse coletivo, também se destinando a

promoção do desenvolvimento nacional sustentável.

Exatamente por consistir numa seleção pública, a licitação será processada e julgada em estrita

conformidade com os Princípios básicos da Legalidade, da Impessoalidade, da Moralidade, da Igualdade, da

Publicidade, da Probidade Administrativa, da Vinculação ao Instrumento Convocatório, do Julgamento

Objetivo e dos que lhes são correlatos, tendo por objeto as obras, serviços, inclusive de publicidade, compras,

alienações, concessões, permissões e locações da Administração Pública, quando contratadas com terceiros.

Então, em face do Princípio da Indisponibilidade do Interesse Público, a Administração Pública só pode

contratar com terceiros depois de proceder à licitação.

Portanto, a obrigatoriedade da licitação é, por si mesma, um Princípio Jurídico que vincula a Administração

Pública.

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Assim, a constitucionalização do Princípio da Licitação Pública é imposição lógica da implantação

de um Estado Democrático de Direito, justificando-se em nome da moralidade administrativa e do princípio

da igualdade, porque através dela é estabelecido um procedimentoadministrativo cujo objetivo é escolher as

propostas para a execução de obras, serviços, compras ou alienações que sejam mais vantajosas para a

Administração Pública, o que se dá através de contratações, as quais passam por um critério seletivo

estabelecido de acordo com a lei.

A esse respeito, o Tribunal de Contas da União (TCU) já se pronunciou nos seguintes termos: “As

Empresas Públicas, ainda que sob regime de Contrato de Gestão, estão sujeitas a todas as exigências

constitucionais e legais, da mesma forma que as demais entidades integrantes da Administração Pública

Federal, tais como: obrigatoriedade de concurso público para seleção e admissão de pessoal, observância

do limite máximo de remuneração de dirigentes e servidores, cumprimento das normas para licitação e

contratos pertinentes a obras, serviços, compras, alienações e locações”.

Feitas estas considerações, ficamos estarrecidos quando, numa reportagem veiculada no Jornal Nacional, da

rede Globo de televisão, no dia 20/04/13, um representante do Ministério da Educação disse que “a

contratação da EBSERH pela Universidade Federal do Piauí fez com que a compra de equipamentos e

remédios passassem a ser feita de forma centralizada e por um pregão eletrônico, tornando o sistema mais

transparente e observando-se a queda de custos, havendo a redução de preços em mais de 30%, com uma

economia até agora de quase R$ 480 milhões”.

Se a Universidade Federal do Piauí não cumpria o procedimento licitatório prescrito na Lei, isso é motivo de

investigação e responsabilização, mas nunca um motivo que justifique a contratação da EBSERH.

Isto porque,, como já esclarecemos, o pregão eletrônico é a modalidade licitatória preferencial na esfera

Federal, com ou sem EBSERH.

Então, as falas oficiais têm sido postas para o público em geral com o objetivo de confundir a opinião pública

leiga, e não com o objetivo de informar com honestidade.

19- Como ficará a situação dos trabalhadores terceirizados que estão hoje nos Hospitais

Públicos Federais Universitários?

Para respondermos esta questão, devemos observar o disposto no artigo 10 da Lei nº 12.550/11: “O regime

de pessoal permanente da EBSERH será o da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), e legislação

complementar, condicionada a contratação à prévia aprovação em concurso público de provas e títulos,

observadas as normas específicas editadas pelo Conselho de Administração.”

Portanto, ao término dos seus contratos temporários de trabalho, esses trabalhadores terceirizados

estarão desligados desses Hospitais, já que não possuem vínculo trabalhista efetivo com a Administração

Pública Federal.

Ou seja, não existe qualquer possibilidade desses trabalhadores terceirizados serem aproveitados e

absorvidos automaticamente pela EBSERH.

Se alguém estiver falando o contrário disso, este alguém está mentindo.

20- Como será a atuação dos Docentes nas Unidades Hospitalares da EBSERH?

Não existe nenhuma previsão legal quanto a isto.

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Lembramos que o objeto social principal da EBSERH é a prestação de serviços hospitalares sob as

regras do regime jurídico privado, e não o compromisso institucional com a educação, pesquisa e extensão.

Além do mais, a carreira dos Docentes não permite que eles sejam cedidos a uma Empresa.

21- Como saber a escolha certa entre aderir ou não à EBSERH?

Não é difícil decidir.

Aderir à EBSERH significa fazer a escolha por um ideal neoliberal, que flexibiliza direitos dos

trabalhadores do serviço público e/ou privado; que relativiza direitos sociais; que transfere a execução de

políticas sociais para instituições de direito privado, incluindo transferência de patrimônio público; que torna

possível a captação de recursos por parte das instituições a partir da mercantilização dos serviços públicos e

da financeirização dos recursos públicos; e adota a relação público-privada a partir dos denominados

contratos de gestão.

Por outro lado, não aderir à EBSERH significa optar pelo ideal de um Estado Social e Democrático

de Direito reconhecido na nossa Constituição Federal, que garante e aperfeiçoa direitos sociais; que defende

a valorização social do trabalho; que reconhece a saúde e a educação públicas como valores essenciais para a

vida humana e, portanto, um dever do Estado; que respeita os Princípios norteadores do SUS; que não aceita

uma política de metas e resultados, de caráter mercantilista, com objetivo de obtenção de lucro pela

prestação de serviços públicos.

Para compreendermos melhor essa questão é necessário observar o que dispõem os artigos 196 e

197 da Constituição Federal:

Art. 196:A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas

que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e

serviços para sua promoção, proteção e recuperação.

Art. 197:São de relevância pública as ações e serviços de saúde, cabendo ao Poder Público dispor, nos

termos da lei, sobre sua regulamentação, fiscalização e controle, devendo sua execução ser feita

diretamente ou através de terceiros e, também, por pessoa física ou jurídica de direito privado.

Então, a nossa Constituição deixa claro que a saúde é um direito fundamental do ser humano,

devendo o Estado prover as condições indispensáveis ao seu pleno exercício, comportando duas vertentes:

uma, de natureza negativa, que consiste no direito a exigir do Estado ou de terceiros que se abstenham de

qualquer ato que prejudique a saúde; outra, de natureza positiva, que significa o direito às medidas e

prestações estaduais (União, Estados, Distrito Federal e Municípios) visando a prevenção e o tratamento das

doenças.

Portanto, a Constituição Federal estabelece como dever do Estado a prestação de assistência à

saúde e garante o acesso universal e igualitário do cidadão aos serviços e ações para sua promoção,

proteção e recuperação, de modo que o direito à saúde não deve sofrer embaraços impostos por autoridades

administrativas, no sentido de reduzi-lo ou de dificultar o acesso a ele.

O acesso universal e igualitário assegurado pela Constituição Federal atrela-se a um dever

fundamental de não-discriminação de acesso aos bens e serviços de saúde; enquanto que o reconhecimento

da relevância pública das ações e dos serviços de saúde demonstra o caráter indisponível do direito à saúde,

uma vez que se encontra estreitamente vinculado com o direito à vida e a proteção da dignidade da pessoa

humana.

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Desse modo, o Estado brasileiro não pode se omitir na prestação da saúde pública, pois além de estar

estipulada na Constituição, a saúde pública é custeada com dinheiro de toda a sociedade.

Portanto, ao mesmo tempo em que é um direito dos cidadãos, o direito à saúde é um dever do Estado, que

tem a obrigação de efetivar essa tutela (proteção) à sociedade.

E um “Estado de Direito” exige que o Estado esteja submetido e obediente às Leis desse Estado,

reconhecendo a Constituição como o seu Texto Maior e dotado de supremacia legislativa.

Assim, a EBSERH é mais uma concepção do ideal neoliberal, ou seja, uma tentativa do império do

dinheiro de desbastar todas as conquistas e voltar ao comércio de coisas e de homens.

Só os que podem pagar pelos direitos, apenas os que podem mostrar merecimento pelo preço das

coisas com que se ostentam socialmente é que se fazem titulares do direito de permanecerem membros do

grupo. Aos outros cabe excluir-se da comunidade.

E se o Estado não permite agir senão incluindo os homens e universalizando os seus direitos, ao

capitalismo neoliberal cabe destruir o Estado, especialmente o Estado de Direito, substituindo-se a lei dos

homens pela lei de mercado, que é a não-lei, que é a selva dos dinheiros com donos certos e destinos

incertos, porque não-humanos nem justos.

Esse “monstro empresarial” na roupagem do neoliberalismo engole homens e países, tendo em conta

nada mais que a sua ganância insaciável por todas as formas de posse.

Então, o neoliberalismo não quer o Direito, não pode com ele, não sobrevive se o homem puder ter a

sua dignidade insculpida no sistema normativo fundamental (constitucional) e assegurada pela estrutura

institucional.

A EBSERH não olha para o homem como um fim, mas como um meio para a obtenção do seu lucro.

Nesse contexto, a EBSERH fere o Princípio Constitucional da Dignidade da Pessoa Humana na sua

perspectiva coletiva.

E sem o respeito à dignidade da pessoa humana não há Democracia e não há que se cogitar de Poder

exercido legitimamente, pois a legitimidade tem sua única expressão no homem respeitado em sua essência

e em sua transcendência.

Na verdade, o que alimentou a criação da EBSERH foi a assertiva corrente no pensamento neoliberal de que o

Estado é mau prestador de serviços.

Ocorre que o Estado é, sem dúvida alguma, pior fiscalizador do que prestador de atividade.

22- Qual a solução que se apresenta constitucional, legal, moral e socialmente justa

para resolver, de uma vez por todas, a atual crise dos nossos Hospitais

Universitários Públicos Federais?

Várias são as possibilidades. Todavia, o próprio Governo Federal deu a resposta (e, ao nosso ver,

correta e economicamente e socialmente viável) quando publicou o Decreto nº 7.082/2010, que instituiu o

“Programa Nacional de Reestruturação dos Hospitais Universitários Federais (REHUF), dispondo sobre o

financiamento compartilhado dos Hospitais Universitários Federais entre as áreas da educação e da saúde e

disciplinando o regime da pactuação global com esses hospitais.

Acontece que o Governo Federal não cumpriu o disposto neste Decreto, no tempo previsto (até o final de

2.012), optando, posteriormente, por fazer tudo isso através da EBSERH, utilizando a mesma fonte de

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recursos públicos do REHUF (recursos públicos 100% da União), passando, então, a promover uma

“chantagem” com os atuais Reitores das Universidades Públicas Federais e com os Diretores dos Hospitais

Universitários Federais, criando um ambiente de insegurança nestes órgãos ao deixar clara a sua disposição

de só realizar esses objetivos se houver a assinatura de contrato com a EBSERH; ou seja, se estes órgãos

públicos aceitarem a privatização parcial da Saúde Pública do nosso País, o que se revela absolutamente

inconstitucional, ilegal, imoral e socialmente inaceitável, já que fere frontalmente o interesse público e os

Princípios Norteadores do SUS.

Então, o que se apresenta razoável, socialmente justo e em conformidade com o nosso

Ordenamento Jurídico é o aperfeiçoamento de todos aqueles objetivos postos pelo REHUF, no sentido de

incorporar verbas do Ministério da Ciência e Tecnologia neste Programa (REHUF); prorrogar o prazo para a

sua complementação até o fim de 2.014; abertura imediata de concurso público para o preenchimento

imediato de todos os cargos efetivos necessários para o bom funcionamento de todos os Hospitais

Universitários Públicos Federais, pelo regime trabalhista da Lei nº 8.112/90 (estatutários), o que estará

legalmente amparado pela Lei de Responsabilidade Fiscal; implantação do Plano de Carreira, Cargos e

Salários, conforme previsto no artigo 4º da Lei nº 8.142/1.990; respeito ao controle social exercido pelo

Conselho Nacional de Saúde.

Do mesmo modo, é importante a aprovação de uma Lei de Responsabilidade Social, que exclua os

servidores públicos das áreas de Educação e de Saúde dos limites legais da Lei de Responsabilidade Fiscal,

haja vista o reconhecimento constitucional da relevância pública desses serviços, de modo que Saúde e

Educação sejam reconhecidos como direitos sociais “pré-prioritários”, como afirmava com muita

propriedade o Senador Darcy Ribeiro.

E sendo estes serviços de relevância pública, então, cabe ao Governo Federal reconhecer que

Saúde e Educação são atividades típicas do Estado – tão típicas quanto a Defensoria Pública.

0bjetivamente, o REHUF deve orientar-se pelas seguintes diretrizes aos Hospitais Públicos Universitários

Federais:

Instituição de mecanismos adequados de financiamento, igualmente compartilhados entre as

áreas da Educação e da Saúde, progressivamente, até o final de 2.014;

Melhoria dos processos de gestão, através de capacitação dos seus próprios servidores públicos

interessados;

Adequação da estrutura física;

Recuperação e modernização do parque tecnológico;

Abertura imediata de concurso público para preenchimento de todas as vagas necessárias, pelo

regime jurídico único, substituindo todos os atuais trabalhadores terceirizados;

Reestruturação do quadro de recursos humanos dos Hospitais Universitários Federais; todos eles

submetidos ao mesmo regime jurídico de toda a Universidade, ou seja, o regime jurídico único;

Reativação de todos os leitos hospitalares;

Reativação de todos os serviços fechados;

Aprimoramento das atividades hospitalares vinculadas ao ensino, pesquisa e extensão, bem como

à assistência à saúde, com base em avaliação permanente e incorporação de novas tecnologias em

saúde;

Democratização na escolha dos seus Diretores Gerais;

Manutenção dos seus Serviços de Emergência abertos, sem perder o seu caráter referencial da

visão do SUS;

Concursos públicos regulares e anuais para acadêmicos estagiários remunerados;

Reconhecimento de que os Professores e Técnicos-Administrativos exercem, de fato e

obrigatoriamente, duas atividades distintas (ensino e assistência) nesses Hospitais Universitários,

embora sejam remunerados por apenas uma delas, corrigindo essa injustiça secular através de

uma remuneração diferenciada;

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Capacitação e qualificação contínuas dos seus servidores públicos;

Melhoria das condições de trabalho

Importante compreender que, embora a Lei nº 12.550/2.011 (aquela que criou a EBSERH) esteja em vigor, ela

só passa a ter eficácia, ou seja, ela só passa a ser capaz de gerar os seus efeitos no mundo real, se houver

contratualização individualizada com as diversas Universidades Públicas Federais, pois sem isso essa Lei é

letra morta, e o Governo Federal terá, obrigatoriamente, que seguir um outro caminho para resolver a crise

dos nossos Hospitais Universitários Federais, que não a EBSERH, – crise essa que depende apenas de uma

vontade política responsável do Governo Federal para resolvê-la. E o que exigimos é que essa vontade

política respeite o disposto na nossa Constituição Federal.

23- Qual o perfil daqueles que defendem a adesão à EBSERH?

Os defensores da EBSERH, até para dar credibilidade aos seus discursos, deveriam abrir mão dos seus

vínculos estatutários com a Universidade Pública Federal e fazer concurso público para ser um empregado

público regido pela CLT, da EBSERH. Isso, sim, seria mostrar, de fato, que abraçam essa causa. Porque se é

bom para os outros deverá ser bom para esses defensores também, não é mesmo? Mas isso eles não querem

para eles mesmos, ou seja, o que é ruim para os outros deixa para lá, porque o que é bom para eles (os

defensores da EBSERH), eles já garantiram (o regime estatutário).

Então, o que vemos é que alguns desses colegas defendem aquilo que desconhecem, outros

defendem por convicção neoliberal, outros por alienação social (são incapazes de questionar qualquer coisa

imposta pelo Poder Público), enquanto outros, muitas vezes próximos de nós, defendem por interesses

próprios, por almejarem, por exemplo, um cargo num Conselho de Administração ou de Diretoria nessa

EBSERH. Nem pensam no interesse público. Passam a pensar o SUS (Sistema Único de Saúde) relativizando os

seus Princípios informadores. Passam a sonhar com o Poder...

Quem defende a EBSERH não quer trocar o seu vínculo trabalhista estatutário pelo da CLT (pode

perguntar a qualquer um deles); quem defende a EBSERH traz consigo vários interesses, menos o interesse

público; quem defende a EBSERH defende um Estado Inconstitucional, Ilegal, Imoral e Socialmente Injusto;

quem defende a EBSERH incomoda-se com a existência do SUS, pois não é capaz de se colocar na posição de

milhões de pessoas carentes e mais vulneráveis da nossa sociedade, cada dia mais fragilizadas, e aos poucos

tornando-se esquecidas...; quem defende a EBSERH entende que o interesse privado deve prevalecer sobre o

interesse público; quem defende a EBSERH carrega dentro de si pensamentos e sentimentos neoliberais, não

acredita e não quer um Estado Social; quem defende a EBSERH, em geral, não mostra a sua cara...

A EBSERH é uma proposta ideológica equivocada, contrária ao bom senso.

A EBSERH não atende ao fim social, mas sim ao fim do capital.

A aqueles que defendem a EBSERH por convicção neoliberal, queremos deixar claro que a nossa

Constituição Federal não admite a aplicação do pensamento neoliberal com relação aos direitos sociais

previstos no seu Capítulo VIII, dentre os quais Saúde e Educação.

E nós não podemos defender inconstitucionalidades, ilegalidades e/ou imoralidades.

Ao longo desses anos, muitos companheiros mudaram de lado. Porém, outros vieram somar nossas

trincheiras.

O importante é que aqueles que ficaram estão ainda mais fortes, porque a nossa força vem de

Princípios Éticos e Morais que nos conduzem na defesa implacável e inegociável do interesse público, que

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deve sempre predominar nas nossas ações, em obediência aos Princípios Humanitários da Solidariedade e

da Fraternidade.

A população carente desse nosso País precisa de gente como a gente para pensar nela...

O SUS pede socorro!

E a bandeira em sua defesa e pelo seu fortalecimento e aperfeiçoamento é nossa!

24-A Lei de Responsabilidade Fiscal também se aplica à EBSERH?

Sim, nos seguintes termos:

A EBSERH é classificada como uma “empresa pública dependente” – aquela cujo capital social é todo ele

integralizado pela União – e, como tal, está absolutamente subordinada ao disposto na Lei de

Responsabilidade Fiscal, de modo que a contratação de empregados públicos também terá que obedecer

ao teto de despesas com pessoal previsto nessa Lei.

O artigo 19 da Lei Complementar nº 101/00 (Lei de Responsabilidade Fiscal – LRF), que estabelece

normas de finanças públicas voltadas para a responsabilidade na gestão fiscal – Lei de Responsabilidade

Fiscal, assim se revela: “Para os fins do artigo 169 da Constituição, a despesa total com pessoal, em cada

período de apuração e em cada ente da Federação, não poderá exceder os percentuais da receita corrente

líquida, a seguir discriminados: I- União: 50% (cinquenta porcento)...”.

Artigo 169 da Constituição Federal: “A despesa com pessoal ativo e inativo da União, dos Estados, do

Distrito Federal e dos Municípios não poderá exceder os limites estabelecidos em lei complementar”.

Artigo 2º da LRF: “Para os efeitos desta lei complementar, entende-se como ente da Federação: União,

Estados, Distrito Federal e Municípios”...; entende-se como “empresa dependente”: empresa controlada

que receba do controlador (no caso da EBSERH : a União) recursos financeiros para pagamento de despesas

com pessoal ou de custeio em geral ou de capital, excluídos, no último caso, aqueles provenientes de

aumento de participação acionária”.

Artigo 1º § 2º da LRF: “As disposições desta lei complementar obrigam a União, os Estados, o Distrito

Federal e os Municípios... Com relação a estes entes federativos, estão compreendidas: os Poderes

Executivo, Legislativo (inclusive Tribunal de Contas da União, Tribunal de Contas do Estado e Tribunal de

Contas do Município) e Judiciário, e o Ministério Público; as respectivas Administrações Diretas, Fundos,

Autarquias, Fundações e Empresas Estatais Dependentes”.

Acontece que, hoje, esse percentual está em torno de 38% (dados da Secretaria do Tesouro Nacional),

havendo, portanto, margem mais do que suficiente na receita líquida da União para a concessão do reajuste

salarial para todos os servidores públicos federais, bem como para a autorização para a abertura de concurso

público para a Administração Pública Federal, para cargos públicos efetivos regidos pelo regime trabalhista da

Lei nº 8.112/90 (Regime Jurídico único – RJU), ou seja, estatutários.

Ou seja, para a Lei de Responsabilidade Fiscal pouco importa se a contratação de pessoal para cargo no

serviço público seja feito pelo regime jurídico celetista ou pelo regime jurídico estatutário. Ambos têm que

obedecê-la

Aliás, essa é uma exigência constitucional.

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25-Como fica a situação dos atuais servidores públicos estatutários desses Hospitais

Públicos Federais Universitários após a adesão à EBSERH?

Para que os atuais servidores públicos que atuam nos Hospitais Universitários possam permanecer exercendo

suas atividades nessas novas Unidades Hospitalares da EBSERH, esses servidores públicos terão que,

formalmente, aceitar trabalharem como “cedidos” e a EBSERH terá que aceitá-los em suas Unidades, e todos

eles trabalhando sob as ordens da EBSERH, e não mais das Universidades.

Caso o servidor público não queira ficar como cedido para a EBSERH, ele será devolvido à

Universidade e colocado à disposição, recebendo em casa, sem trabalhar, vencimentos proporcionais ao

período de tempo trabalhado na Universidade, por tempo indeterminado. O mesmo acontecerá se esse

servidor não mais atender aos interesses da EBSERH. E isso é a EBSERH quem decide, e não a Universidade. O

interesse predominante será o da Pessoa Jurídica de Direito Privado, e não o da Pessoa Jurídica de Direito

Público.

26- 0 que é um “Plebiscito”?

Trata-se de um instituto jurídico próprio da Democracia Direta, constituindo-se em forma de consulta popular

prévia para que o povo delibere sobre matéria de acentuada relevância, de natureza constitucional,

legislativa ou administrativa.

Portanto, ignorar e desrespeitar o resultado de um plebiscito é dar um tapa na face da Democracia; é

ignorar a vontade popular; é desrespeitar o sentimento da gente.

E isso uma Universidade Pública não pode fazer.

O Conselho Universitário deve representar e expressar a vontade da Universidade (dos seus

servidores públicos) e não substituí-la por uma vontade própria e individual de cada um dos seus membros.

Na verdade, nessa questão da EBSERH, o Conselho Universitário não tem legitimidade para decidir, já

que a representatividade do Hospital Universitário Antônio Pedro neste Conselho não chega a 10%; e os 90%

restantes não têm o direito de decidir aquilo que não os afetará, nem diretamente e nem mesmo

indiretamente. Por exemplo, as pesquisas na área da Engenharia continuarão sob o domínio da Universidade,

mas isso deixa de acontecer com relação à área da Saúde. Os servidores públicos de todo o restante da

Universidade não serão afetados e nem terão que trabalhar como “cedidos” para uma Empresa com

personalidade jurídica de direito privado.

Portanto, a forma constitucional, legal e moral de decidir essa questão é respeitar o resultado do

plebiscito, porque este representa, de fato e de direito, a vontade dos servidores públicos, estudantes e

usuários do Hospital Universitário Antônio Pedro.

Apenas para informar: o resultado do plebiscito realizado aqui na Universidade Federal Fluminense,

na última semana, com a participação da comunidade acadêmica e dos usuários, teve o seguinte resultado:

Contra a EBSERH: 5.123 VOTOS

A Favor da EBSERH: 33 VOTOS

Desse modo, 99,4% dos votantes, aqui na UFF, disseram “NÃO” à EBSERH!

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Wladimir Tadeu Baptista Soares

Médico do Hospital Universitário Antônio Pedro – UFF

Professor do Departamento de Medicina Clínica da Faculdade de Medicina da Universidade

Federal Fluminense

Advogado

E-mail: [email protected]

Tel: (21) 9647 4121

“Mais triste que a morte, é a maneira de morrer” (Marcial)