em defesa das lagoas: os anos quentes de 1993 e 1994

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Teófilo José Soares de Braga Em defesa das Lagoas: os anos quentes de 1993 e 1994 8 de Outubro de 2011

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Apontamentos sobre o movimento de defesa das lagoas.

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Page 1: Em defesa das lagoas: os anos quentes de 1993 e 1994

Teófilo José Soares de Braga

Em defesa das Lagoas: os anos quentes de 1993 e 1994

8 de Outubro de 2011

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Em defesa das Lagoas: os anos quentes de 1993 e 1994

Em Memória de Veríssimo Borges

Nota Prévia

Tal como referi no primeiro texto sobre o assunto, não é minha intenção fazer a história

do movimento de defesa das lagoas.

Este segundo texto, apresenta as limitações do primeiro, isto é, foi elaborado apenas

com recurso ao meu arquivo pessoal e ao que foi divulgado pelos jornais que tenho em

minha posse.

Espero que, tal como aconteceu com outras “investigações” que realizei no passado,

esta desperte o interesse de alguém, mais jovem e com maior disponibilidade e saber,

para elaborar uma monografia sobre o movimento em defesa das lagoas ou sobre a

actividade das associações de defesa do ambiente na ilha de São Miguel.

Do nascimento do SOS LAGOAS à Presidência Aberta de Mário Soares

A 1 de Janeiro de 1993, o “Grenpeace açoreano”, no dizer de Helena Neves Pereira,

decidiu reagir à indiferença governamental e organizou um mergulho na Lagoa das

Furnas, em protesto contra a eutrofização crescente das suas águas.

De acordo com o Açoriano Oriental, de 4 de Janeiro de 1993, participaram na acção

mais de uma dezena de “amigos das lagoas”, alguns dos quais exibiram “cartazes

condenando a eutrofização e apelando à defesa do Ambiente nos Açores.

No mesmo texto, João Paz, publicado no dia 4 de Janeiro de 1993, fala no empenho

pessoal do Presidente do Governo, Dr. Mota Amaral, na “eliminação das dificuldades

criadas por alguns interesses e grupos à defesa e preservação do ambiente na Região”,

na sua disponibilidade para “andar a pé volta da lagoa [Sete Cidades], predispondo-se a

recolher lixo que encontre”. Para além do referido, foi também noticiada a elaboração

de nova legislação que tornará possível a implementação dos “planos de

deseutrofização”.

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No dia 5 de Janeiro de 1993, o Açoriano Oriental noticia a intenção dos “Amigos das

Lagoas” (SOS LAGOAS) de recorrer ao Presidente da República, Mário Soares, com

vista à recuperação das lagoas das ilhas. No mesmo jornal, numa reportagem elaborada

por Berta Tavares, o Secretário Regional do Turismo e Ambiente, Eugénio Leal, referiu

que já em 1989 havia alertado para a necessidade de adquirir terrenos nas áreas

circundantes às lagoas e que o problema não era unicamente da sua secretaria. Merecem

ficar registadas as suas declarações:

“Não é a Secretaria do Ambiente que dá as autorizações para se fazerem as

pastagens nem para se cortarem as florestas e não é a Secretaria do ambiente que

tem os recursos hídricos da região a seu cargo.

A questão da protecção das lagoas é uma questão complexa que envolve vários

departamentos para os quais, em termos de jurisdição, o ambiente é aquele que

infelizmente tem tido menos a ver”

No dia 11 de Janeiro de 1993, a Direcção dos Amigos dos Açores emitiu um

comunicado, que abaixo se transcreve, sugerindo a inclusão das Lagoas do Fogo, das

Sete Cidades e das Furnas na lista das Zonas Húmidas de Importância Internacional, da

Convenção de RAMSAR:

“Já passaram mais de cinco anos desde a altura em que, pela primeira vez, foi

alertada a opinião pública para o estado de degradação de algumas das nossas

lagoas. Desde então, a situação tem vindo a agravar-se, sem que se vislumbre a

tomada de medidas conducentes a remover as causas, perfeitamente

identificadas, tudo levando a crer que se vai ficar por acções de mera cosmética.

A acrescentar ao que, por mais de uma vez, já foi tornado público e tendo em

conta que:

a) As nossas três principais lagoas - Sete Cidades, Furnas e Fogo - são

sítios de características ímpares na Macaronésia;

b) Desde 1980, Portugal aderiu à Convenção sobre Zonas Húmidas de

Importância Internacional (Convenção de RAMSAR);

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c) No âmbito daquela Convenção, todos os aderentes têm a obrigação de

“promover a conservação de zonas húmidas incluídas na Lista de Zonas Húmidas

de Importância Internacional”;

Os Amigos dos Açores solicitam que o Governo da RAA diligencie, de imediato,

no sentido da inclusão das referidas lagoas na Lista das Zonas Húmidas de

Importância Internacional, da Convenção de RAMSAR.”

A 12 de Janeiro de 1993, através de uma alegada fuga de informação, o Açoriano

Oriental divulgou alguns conteúdos de um Decreto Regional que seria discutido em

Conselho de Governo no dia seguinte e que iria “transformar as pastagens e terrenos que

circundam as lagoas das Furnas, Sete Cidades e do Fogo em floresta pretendendo com

estas medidas acabar com a actual situação de eutrofização”. De entre as medidas

enunciadas, destaca-se a proibição do pastoreio de gado nos terrenos que circundam as

bacias hidrográficas, os proprietários que fizeram arroteamentos nos últimos cinco anos

e que provocarem escoamentos de águas ou resíduos sólidos para as lagoas seriam

obrigados a fazer valas retentoras e ou a pagá-las, se fosse o governo a fazê-las, o

compromisso do governo em pagar aos proprietários, que terão de fazer a reflorestação

dos seus terrenos, o rendimento que iriam ter com o cultivo e caso não aceitassem o

valor o governo não pagaria nada.

No dia em que o decreto estava a ser discutido já o Açoriano Oriental trazia um texto,

da autoria de Manuel Moniz, intitulado “Proposta ambiental pode ser inconstitucional”.

Neste texto, que reflectirá a opinião de alguns técnicos de ambiente, de ambientalistas e

de um ou mais juristas, o projecto de Decreto que, depois de ser considerado uma boa

proposta do ponto de vista político, é tido como um decreto que facilmente poderia ser

considerado inconstitucional, pois interferia directamente com o Código de Direito

Civil, por ameaçar o direito de propriedade e o direito adquirido, para além de ser

dificilmente aplicável. Embora se reconheça que muitas das falhas detectadas no decreto

tenham razão de ser, nota-se que por parte dos “ambientalistas” ouvidos que, por um

lado tinham uma fé cega na capacidade da ciência/técnica para a resolução do problema

da eutrofização e, por outro, estavam amarrados por uma ou outra razão a interesses

puramente economicistas ou, por outras palavras, já naquele tempo o desenvolvimento

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sustentável tinha três pés: a economia (para alguns poucos), a sociedade (estava

atrofiado) e o ambiente (servia apenas de adorno).

A comprovar as minhas afirmações, que são partilhadas, hoje, por algumas das pessoas

que se sentiram traídas pelo comportamento, na altura e posterior, de alguns que

estiveram no movimento de defesa das lagoas, um porta-voz do SOS Lagoas não

identificado pelo Diário Insular, no dia 13 de Janeiro de 1993, depois de afirmar que

“nós só baixamos os braços quando aparecerem resultados. Somos como São Tomé…”

e de afirmar que o SOS tinha “gente com capacidade técnica para analisar e perceber

quais as soluções que não estão certas” considerou que a compra de terrenos junto às

Lagoas “é uma despesa inútil para a Região” e “defendeu uma maior responsabilidade

dos proprietários dos terrenos na protecção das lagoas”. É caso para dizer, as posições

do governo e dos amigos das lagoas/técnicos de ambiente estavam invertidas. Falha na

análise do problema ou outros valores se levantavam?

A 14 de Janeiro de 1993, a revista E, suplemento do Jornal de São Miguel, traz uma

entrevista com o “porta-voz” do SOS LAGOAS, Hermenegildo Galante, que caracteriza

o movimento como “um grupo de pessoas amigas, entre as quais se contam professores

universitários, médicos, repórteres e até gente de outros países, e cujo objectivo é a

preservação do meio ambiente açoreano, nomeadamente das nossas lagoas”.

Para além de criticar o governo pelo facto de não passar das intenções à prática,

Hermenegildo Galante afirmou que “muitas vezes, seria mesmo necessário entrar em

conflito comproprietários de terras, o que não convém ao executivo…”. Nem ao da

altura nem a nenhum, penso eu.

A grande novidade da entrevista é a sua posição acerca da Universidade dos Açores

que, segundo a sua opinião: “ tem estado longe de corresponder às mais vastas

necessidades de desenvolvimento regional, de onde não admira que a preservação do

ambiente nas ilhas seja uma questão que lhes passa quase totalmente ao lado.”

Teófilo Braga, em entrevista publicada no Suplemento do jornal A VILA, de 28 de

Janeiro de 1993, apresenta a sua versão sobre o aparecimento do SOS LAGOAS. Aqui

se registam as suas declarações:

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"A Associação Amigos dos Açores foi contactada por um cidadão, no sentido de

apresentar propostas relativamente a uma intervenção sobre o assunto "lagoas".

Pessoalmente, contactei com o nosso interlocutor e sugeri a criação de um

organismo independente dos Amigos dos Açores para se dedicar exclusivamente

ao problema da eutrofização das lagoas, forneci alguns contactos e indiquei

algumas actividades que poderiam ser realizadas. Dias depois fui contactado

para assistir a uma reunião. Lá, voltei a defender a criação de um grupo

independente, a elaboração de um abaixo-assinado e a realização de acções de

educação ambiental, tendo ficado com a tarefa de apresentar uma proposta de

texto de abaixo-assinado, em conjunto com outras pessoas.

Posteriormente a Direcção dos Amigos dos Açores discutiu o assunto e deliberou

apoiar, na medida do possível, as iniciativas do movimento, o que tem feito,

nomeou um seu representante junto daquele, o qual ficou com a incumbência de

apresentar a minha proposta de texto do abaixo-assinado e sugerir a designação

SOS LAGOAS"

Em Fevereiro, entrou em actividade o Grupo de Trabalhos das Zonas Húmidas, dos

Amigos dos Açores, que durante dois anos implementou o projecto “Caracterização de

28 Lagoas e Lagoeiros da Ilha de São Miguel”, tendo como objectivo “informar e

consciencializar os cidadãos e as entidades cujas actividades possam colidir com a

sobrevivência das zonas húmidas, para a necessidade de proteger estas áreas através da

sua gestão racional). No final do projecto, foi elaborado um relatório que foi enviado às

entidades competentes e mais tarde, em 1977, foi editado o livro “Lagoas e Lagoeiros

da Ilha de São Miguel”.

A 5 de Fevereiro de 1993, uma delegação do SOS LAGOAS entregou ao Presidente do

Governo Regional dos Açores, Dr. Mota Amaral, um abaixo-assinado, já mencionado

anteriormente, com mais de sete mil assinaturas que foram recolhidas em todo os

Arquipélago e a nível nacional. Destas assinaturas constavam 189 que haviam sido

recolhidas pelos Amigos dos Açores. No mesmo dia, o SOS Lagoas promoveu uma

conferência de imprensa no Centro Comercial Sol-Mar, tendo o seu porta-voz, António

Sousa, referido que “Mota Amaral demonstrou abertura e “prometeu” manter-se atento

em relação ao problema das lagoas, não dando, porém nenhuma garantia de resolução”.

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De acordo com Cármen Ventura, em texto publicado no Correio dos Açores de 7 de

Fevereiro, que vimos citando, “leves críticas foram dirigidas ao Governo Regional

durante o encontro com os jornalistas, nomeadamente pela não adopção, até agora, de

medidas concretas, por isso, a promessa de que “não vamos largar o problema”.

O Açoriano Oriental de 7 de Fevereiro de 1993, publica um parecer do Eng. Álamo

Meneses sobre a proposta de decreto-lei elaborada pelo governo para protecção das

lagoas de São Miguel. Nas conclusões do mesmo é afirmado o seguinte: “é um projecto

legislativo para esquecer. Não defende o ambiente e, se aprovado, a todos nos

envergonharia”.

A 10 de Fevereiro de 1993, as lagoas foram à discoteca. Com vista à angariação de

fundos o SOS LAGOAS organizou uma festa musical na discoteca Populo´s Inn.

O presidente da Câmara Municipal da Povoação; Carlos Ávila, promoveu no dia 11 de

Fevereiro, nas Furnas, um encontro com o objectivo de debater a questão da

eutrofização da Lagoa das Furnas. Neste encontro a associação Agrícola de São Miguel,

representada por Aristides Silva e por Ricardo Rodrigues, que também era do SOS

LAGOAS, defendeu que a solução para Lagoa não podia ser feita à custa das

explorações agrícolas. João Porteiro, da Universidade dos Açores e do SOS LAGOAS,

defendeu que numa primeira fase deveria ser eliminada a agropecuária nas zonas

sensíveis da lagoa e manifestou a sua discordância com a oxigenação sem haver um

diagnóstico concreto.

A 18 de Fevereiro de 1993 morreram dois jovens, Luís Aguiar e Roberto Faria, que

estavam a trabalhar na Lagoa das Sete Cidades a tirar “limos”. João Gouveia,

responsável pelos seis trabalhadores que estavam na lagoa, em declarações prestadas ao

Açoriano Oriental de 20 de Fevereiro de 1993, assumiu que terá sido um erro pois não

tinham coletes. Natalino Viveiros, que era na altura Secretário Regional da Habitação,

Obras Públicas, Transportes e Comunicações, não quis fazer comentários, tendo

afirmado o seguinte: “numa altura destas há muita gente a especular e em vez de

consolar acabam por prejudicar e perturbar mais a memória daqueles que partiram e dos

familiares que precisam de paz de espírito”.

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O jornal Eco Regional, a 18 de Fevereiro de 1993, publica declarações do Secretário

Regional do Turismo e Ambiente, Eugénio Leal, que para além de afirmar que a

eutrofização “é um problema complexo, que merece a atenção de todos, mas o

fenómenos está a ser controlado, está a ser estudado e vamos ter soluções”, arrasa

alguns defensores das lagoas, dizendo que surgiram pessoas “algumas até

provavelmente prevaricadoras do ambiente, e que aparecem agora que está na moda,

como grandes defensoras das lagoas e que querem também aparecer na comunicação

social”.

A 25 de Fevereiro de 1993, em reunião que contou com a presença dos secretários

regionais Natalino Viveiros e Eugénio Leal, o SOS Lagoas, de cuja delegação faziam

parte Ricardo Rodrigues e Hermenegildo Galante, apresentou um parecer técnico sobre

a proposta de decreto-lei elaborada pelo governo, que segundo o movimento está repleto

de imprecisões técnicas e peca por aparecer isolado de uma política integrada de

ambiente. Os Amigos dos Açores recusaram-se a comparecer à reunião, alegando que

haviam sido contactados de véspera.

A 26 de Fevereiro de 1993, os Amigos dos Açores remetem para a Secretaria Regional

da Habitação, Obras Públicas, Transportes e Comunicações o seu parecer sobre a

proposta de decreto-lei elaborada pelo governo para protecção das lagoas de São

Miguel, tendo considerado a proposta demasiado proibitiva.

Num artigo de opinião publicado no Correio dos Açores, a 28 de Fevereiro de 1993, o

Eng. Francisco Botelho exige a responsabilidade pela “morte estúpida de dois jovens

que limpavam, sem o mínimo de condições de segurança” e pela situação das lagoas

devido “às sua políticas de incentivo à monocultura da vaca e com a total ausência de

uma política de ambiente”.

Para chamar a atenção para a urgência da intervenção do governo regional na

recuperação das lagoas, o SOS LAGOAS organizou, no dia 21 de Março de 1993, uma

regata de windsurf que contou com a participação de cerca de duas dezenas de

desportistas.

A 13 de Abril de 1993, Lopes de Castro, no Açoriano Oriental, denuncia através de uma

fotografia e de um texto o facto de continuarem as adubações nas margens da Lagoa das

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Sete Cidades e do gado continuar a apascentar junto à Lagoa e pergunta: “Afinal o

“projecto de recuperação” está ainda em embrião ou apenas vegeta no cérebro de algum

sonhador?”

A 2 de Maio de 1993, a Associação Amigos dos Açores apelou para a urgência na

tomada de medidas para a salvaguarda da Lagoa do Peixe sob pena de se perder mais

um biótopo do património natural dos Açores. No texto, então enviado à comunicação

social, os Amigos dos Açores manifestaram-se contra os trabalhos de extracção de

inertes na referida lagoa, os quais estavam a provocar a degradação daquela massa de

água.

O SOS LAGOAS como forma de celebrar o Dia Mundial do Ambiente, 5 de Junho,

promoveu, em 1993, um concurso de desenho infantil destinado a crianças entre os 4 e

os 12 anos de idade.

A 3 de Julho de 1993, Marco Walleinstein Teixeira, em artigo publicado no Açoriano

Oriental, refere que as entidades governamentais dos Açores têm conhecimento, desde o

passado mês de Junho do sistema PLOCHER que segundo ele já foi utilizado na

Alemanha e na Suíça e que é “o mais económico e eficiente no mercado internacional”.

Carla Batista, no Diário de Notícias, de 23 de Julho de 1993, publica uma extensa

reportagem sobre o estado das lagoas de São Miguel. Nesta, para além de apresentar a

situação, divulga o parecer de várias pessoas de que destacamos Conceição Raimundo,

Álamo Meneses, João Porteiro e Natalino Viveiros.

Conceição Raimundo, da Universidade Nova de Lisboa, afirmou que a única solução

curativa consiste na paragem do acesso de nutrientes às massas de água e acrescentou

que “uma vez isso feito…será uma questão de tempo até o ecossistema reencontrar o

seu equilíbrio”.

Sobre a proposta legislativa do governo, Álamo Meneses, deputado do CDS, afirmou

ironicamente: “são precisas três secretarias regionais para autorizar o plantio de um

cento de couves num quintal das Sete Cidades!” e acrescentou que “o texto proíbe tanto

que obrigaria, para ser eficaz, a uma fiscalização intensiva”.

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João Porteiro, da Universidade dos Açores, referiu-se ao facto de ser difícil cumprir a

legislação, tendo exemplificado com o caso da Lagoa do Fogo onde se continua a

apanhar leiva apesar da sua proibição.

Natalino Viveiros, Secretário Regional da Habitação, Obras Públicas, Transportes e

Comunicações, falou no inicio para breve de “um tratamento de choque de

coagulação/floculação”.

A 23 de Julho o SOS LAGOAS emite um comunicado a contestar a movimentação de

terrenos na bacia hidrográfica da Lagoa das Furnas, autorizadas pela Secretaria

Regional da Agricultura e Pescas.

José Manuel de Oliveira Melo, do Circulo de Amigos das Furnas, regressa ao assunto

da eutrofização em texto publicado no Açoriano Oriental de 24 de Julho de 1993.

Depois de manifestar o seu desapontamento pelo facto do problema persistir depois dos

vários apelos, faltando apenas “sanar tão rápido quanto possível a progressão da doença,

antes mesmo que o doente sucumba”.

A 3 de Agosto de 1993, o SOS LAGOAS manifestou o seu descontentamento com a

versão final do decreto legislativo que o governo vai entregar na Assembleia Legislativa

Regional e que visa proteger as lagoas. Segundo aquela organização “o governo não é

sério nas suas preocupações com as lagoas”, não chama “a comunidade científica, as

autarquias e a população a participarem na recuperação das lagoas” e apenas contempla

as lagoas de São Miguel.

A 6 de Agosto de 1993, a Secretaria Regional da Habitação, Obras Públicas,

Transportes e Comunicações emitiu um comunicado onde para além de rebater as

acusações do SOS LAGOAS, acusa esta organização de não mobilizar “as suas energias

no trabalho de formação e informação que é tão necessário fazer junto dos cidadãos” e

termina com o seguinte texto:

“Finalmente, entende-se que o vedetismo com que algumas pessoas aparecem a

pronunciar-se sobre a eutrofização das lagoas é motivo de profunda

preocupação pelo espectáculo degradante que transmitem para o exterior, nada

condizente com a realidade.

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A defesa das lagoas que é uma tarefa nobre que tem de estar acima da

promoção pessoal, da mira do negócio fácil e do ataque político porque tem de

se afirmar oposição.

Este combate é um combate comum e nesta frente temos de estar todos unidos,

com as nossas diferenças e com as funções que a cada qual cabe desempenhar.”

A 20 de Agosto de 1993, Manuel Moniz, denuncia no Açoriano Oriental mais um

perigo para as lagoas: a presença de lagostins na Lagoa do Peixe. No texto referido a

Dr.ª Ana Costa, da Universidade dos Açores, para além de mencionar o exemplo do

pardal mencionou que “as introduções não estudadas são, em geral, má notícia”.

A 10 de Setembro de 1993, os Amigos dos Açores condenam a introdução do lagostim

na ilha de São Miguel, considerando que o acto “constitui um atentado ecológico que

deve ser condenado veementemente. Ninguém tem o direito de, por capricho ou

descuido, comprometer o equilíbrio ecológico de toda a ilha”.

A 12 de Setembro de 1993, as associações Horizontes, de São Brás, e A Balada, da

Maia, denunciam a acumulação de dejectos e a escorrência de adubos que estavam a

transformar em charco a Lagoa de São Brás.

A 27 de Setembro, o SOS LAGOAS organizou um debate no anfiteatro da Escola

Secundária das Laranjeiras que contou com a presença dos eurodeputados Vasco Garcia

e Cunha de Oliveira.

Cunha de Oliveira, segundo a reportagem de Nuno Mendes, publicada no Açoriano

Oriental de 29 de Setembro de 1993, considerou que “qualquer acção que se tome em

relação ao problema das lagoas deve passar, também, por uma campanha onde se

sensibilize e eduque a população pois também é culpa de todos nós que as lagoas se

encontrem neste estado lastimável”.

O deputado Vasco Garcia lembrou q ue: “há catorze anos atrás a Universidade dos

Açores publicou diversos estudos e avisou o Governo para a situação de eutrofização

das lagoas” e que todos os “apelos foram esquecidos e deixou-se agravar o problema até

à actual situação”. Para além do referido, o deputado social-democrata denunciou o

facto da Comissão do Ambiente do parlamento açoriano nos dois anos em que existiu

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nunca chegou a reunir pelo que na sua qualidade de líder demitiu-se. No que diz

respeito à Comunidade Europeia, Vasco Garcia considerou-a, no que toca às questões

ambientais, hipócrita “uma vez que poucas são as verbas que disponibiliza preferindo

agir por nítidas preocupações económicas”.

A 16 de Outubro de 1993, os escuteiros de São Miguel fizeram uma limpeza de lixos

nas margens das lagoas de São Miguel. Esta iniciativa contou com a participação do

presidente do Governo regional dos Açores, Dr. João Bosco Mota Amaral.

A 8 de Dezembro de 1993, o SOS LAGOAS apresenta uma exposição da qual consta

um modelo que poderia ser a solução para a Lagoa das Furnas e emite um comunicado

onde afirma:

“Marginalizando-nos da política partidária e eleitoralista e esperando ECO da

nossa voz na opinião pública e nos responsáveis directos e indirectos dos ECUS

comunitários para inverter o processo de eutrofização das nossas lagoas, no

sentido de preservar o nosso futuro turístico e a qualidade de vida dos Açoreanos.

Enquanto genuíno grupo de pressão, o SOS LAGOAS aproveita esta exposição de

propostas alternativas, apesar de não nos competir assumir a responsabilidade (e

muito menos a implementação) das soluções correctas ou desejáveis para corrigir

os gravíssimos problemas resultantes da desregrada conquista de Quota

Leiteira”.

A terminar o ano, a 20 de Dezembro, Veríssimo Borges, no jornal Açoriano Oriental

explica o seu modelo, apadrinhado pelo SOS LAGOAS, e afirma que o SOS LAGOAS

é um grupo de pressão independente do poder político partidário, mas que alguns

membros são militantes de alguns partidos e que terá entrado para o movimento por

convite. Outra revelação importante desta reportagem foi a denúncia de “uma proposta

de federação dos grupos ecológicos a nível regional “soprada” pelo governo regional”.

A 15 de Janeiro de 1994, o presidente do Governo Regional dos Açores participou num

passeio pedestre na Serra Devassa, organizado pelos Amigos dos Açores. No passeio

houve uma troca de impressões entre o Dr. Mota Amaral e os responsáveis pela

associação.

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A 4 de Janeiro de 1994, de acordo com o Açoriano Oriental do dia seguinte, o SOS

LAGOAS promoveu uma conferência de imprensa para assinalar a passagem do

primeiro aniversário da entrega de um abaixo-assinado que havia recolhido sete mil

assinaturas. Na conferência de imprensa o SOS LAGOAS referiu que Mota Amaral “faz

de conta que as coisas estão a andar, mas não andam” quando promove acções de

recolha de lixos nas margens das lagoas e reivindica para si o primeiro convite ao

Presidente da República, Mário Soares para dar continuidade à presidência aberta sobre

ambiente nos Açores.

A 23 de Fevereiro, o Governo Regional dos Açores decidiu adjudicar ao INOVA um

plano de monitorização da qualidade das águas de 26 lagoas açorianas e atribuir à

empresa francesa “Setal-Degremont, Tratamento de Águas, Lda. “ o fornecimento e

montagem de um sistema de arejamento para a Lagoa das Furnas.

A 19 de Março de 1994, a Câmara Municipal da Povoação promoveu uma reunião sobre

o processo de recuperação da lagoa das Furnas à qual não compareceram a Delegação

de Ambiente de São Miguel e a Secretaria Regional da Habitação, Obras Públicas,

Transportes e Comunicações. Na reunião foram discutidas, entre outros assuntos, as

propostas de Veríssimo Borges e a da empresa H.Vaultier .

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A 21 de Março do mesmo ano, realizou-se, nas Furnas, um Workshop sobre Ambiente

cujas conclusões apontaram para o saneamento básico e a florestação como saída para a

eutrofização.

A 24 de Março de 1994, o Açoriano Oriental publica um texto dos Amigos dos Açores,

onde essa associação denuncia a destruição de pequenos lagoeiros localizados no Pico

das Três Lagoas, junto ao posto de batata de semente (Casa da Batata), em Vila Franca

do Campo.

De 18 a 20 de Abril de 1994, Mário Soares, no âmbito da sua Presidência Aberta sobre

Ambiente deslocou-se os Açores, onde visitou as ilhas de São Miguel, Faial e Terceira.

A propósito da presidência sobre ambiente, Veríssimo Borges escreveu um texto (não

datado) onde depois de fazer o historial da intervenção do SOS LAGOAS, refere-se à

sensibilidade ecológica de Mota Amaral nos seguintes termos:

“Preparando a Presidência Aberta, Mota Amaral viu a devassidão existente na

Serra Devassa, onde algumas lagoas (que não são menos lindas por serem

pequenas) enfrentam o perigo de extinção.

A reacção foi radicalmente positiva (quase de bombeiro atentar acudir ao fogo).

Poder-se-á dizer que não fosse a participação do Presidente do Governo

Regional no passeio organizado, a 15 de Janeiro, pelos “Amigos dos Açores”,

teríamos perdido as lagoas da Serra Devassa.”

Mas para além dos elogios, Veríssimo Borges, deixou questões/dúvidas como estas:

“Será que as atenções de Mota Amaral, por relação às lagoas da Serra Devassa,

se destinam a desviar as atenções dos problemas das grandes lagoas

eutrofizadas?”

“Será que as atenções de Mota Amaral, assumindo pessoalmente a liderança da

reconciliação e relançamento de um processo pluridisciplinar e transparente,

corrigindo vícios anteriores de obscurantismo “científico”, constituem um início

de contributo duradouro imprescindível para a concertação de esforços, em

perspectiva consolidada e realista, na superação dos problemas ecológicos que

enfrentamos?

Ou transformar-se-á em transitoriedade de cosmética política, no enquadramento

de uma Presidência Aberta, que, perdendo a sua intencionalidade de germinação

de sementes ficará reduzida à potencialidade dos esporos que poderão renascer

algum dia?”

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A 19 de Abril de 1994, o Presidente Mário Soares participou numa sessão sobre “As

Lagoas e a Biodiversidade” na Lagoa das Furnas e visitou a Lagoa das Sete Cidades. No

mesmo dia, esteve a Escola Secundária das Laranjeiras onde teve a oportunidade de

visitar a “Mostra Ambiental” onde para além de trabalhos de alunos de várias escolas

estavam expostos posters a divulgar a actividade do Grupo de Trabalho das Zonas

Húmidas dos Amigos dos Açores. Aquando da visita o SOS LAGOAS “infiltrou-se” no

meio dos alunos e com cartazes deu a conhecer a sua existência e chamou a atenção

para a situação das lagoas.

No mesmo dia, à noite, Teófilo Braga participou num jantar nas Furnas, oferecido pelo

Presidente do Governo Regional dos Açores, onde estiveram também presentes

Veríssimo Borges e o presidente da direcção Nacional da Quercus, Viriato Soromenho

Marques.

Teófilo Braga, na sua qualidade de presidente da direcção dos Amigos dos Açores, que

já havia sido, por duas vezes, contactado por Viriato Soromenho Marques no sentido da

transformação daquela associação regional em núcleo da Quercus, aproveitou a ocasião

para apresentar àquele Veríssimo Borges, mencionando que seria a pessoa ideal para

liderar a Quercus na Região. Estava dado o primeiro passo para a Criação do Núcleo de

São Miguel da Quercus.

Pico da Pedra, 8 de Outubro de 2011

Teófilo José Soares de Braga