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2014-04-12

Em busca do próximo bilhão de internautas

Balões, drones e satélites — vale tudo para lucrar com uma internet que está em plena metamorfose

- Carlos Alberto Teixeira

Com pouco mais de 44 anos de idade, a internet tem atualmente mais de 2,7 bilhões deusuários (39% da população mundial), alimentando hoje um mercado multibilionário. Osrestantes 61% — humanos ainda desconectados — estão sendo disputados a tapa pelosatuais gigantes da internet. No mundo móvel a briga é ainda mais acirrada. Com o celulartendo penetração de mais de 96% dos terráqueos, se houver acesso internet onde essaspessoas vivem, logo elas também vão querer se pendurar na rede, migrando aos poucospara smartphones baratos.

Google e Face estão esfomeados, quase desesperados para engolir o próximo bilhão deinternautas. E, para isso, estão à cata de maneiras criativas e urgentes criar acesso à redeem locais ainda virgens.

Mark Zuckerberg, CEO do Facebook, lançou em agosto de 2013 sua iniciativa“internet.org” em parceria com seis grandes companhias de telefonia móvel, com oobjetivo de levar acesso internet barato a todos.

“A população conectada do mundo está crescendo apenas 9% ao ano. Queremos aceleraresse crescimento”, diz o documento principal da instituição <http://goo.gl/yUu8NL>, quejá fechou acordos com players locais nas Filipinas (com a operadora Globe) e no Paraguai(com a Tigo). Mas a internet.org investe também em outras tecnologias.

Drones e satélites

No setor de satélites, para fornecer conexão internet, o Facebook contempla usarequipamentos geoestacionários, que orbitam a mais de 35 mil km de altitude, e satélitesnão estacionários de órbita terrestre baixa (entre 400km e 600km). Em vez de tecnologiaspor radiofrequência, como a SAT>IP, desenvolvida pela luxemburguesa SES, o Facebookestá avaliando usar em seus satélites a tecnologia FSO (Free Space Optics), baseada emlaser e exigindo grande precisão na pontaria do feixe luminoso.

Já no departamento dos drones — veículos aéreos não tripulados — o Facebook temousados planos, mas levou uma rasteira de última hora da Google, que comprou debaixode seu nariz a empresa Titan Aerospace, que estava em sua mira. Cabisbaixo, Zuckieacabou comprando a inglesa Ascenta, que produz drones movidos a energia solar.

Mas mesmo parecendo promissores, os drones ainda são uma tecnologia incerta paraprover conectividade internet.

— Drones usados para internet ainda são uma aposta — afirma Nei Brasil, cofundador epresidente da Flight Technologies <http://flighttech.com.br/>, empresa brasileiraespecializada nessas aeronaves. — Os custos são altos e a viabilidade técnica existe, mas amodelagem econômica ainda é um mistério. Outro fator é a incerteza quanto à

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regulamentação pelas autoridades do setor aeronáutico, tanto no Brasil quanto nos outrospaíses. Os próprios americanos ainda não tem regulamentação para drones na áreaprivada. Mas Google e Facebook têm bala na agulha para se dar ao luxo de queimar US$ 50ou 60 milhões em um projeto experimental de drones para implementar conectividade.

Balões

Desde 2008, a Google já vinha pesquisando balões atmosféricos para implementarconectividade internet, mas só em junho de 2013 iniciou o Project Loon, com umexperimento na Nova Zelândia envolvendo 30 balões lançados em coordenação com asautoridades locais de aviação civil e fornecendo acesso à rede a 50 usuários na região.

No início de abril passado, a Google soltou <http://goo.gl/rcG0oX> cerca de 300 balõesque deram uma volta completa na Terra à latitude de 40º sul, provendoexperimentalmente acesso à internet para regiões da Nova Zelândia, Austrália, Chile eArgentina, e um dos balões — o histórico I-167 — fez a volta completa em 22 dias. O planoda empresa é espalhar milhares de balões na estratosfera de modo a cobrir as áreas secas ehabitáveis do planeta com acesso à rede.

Brasil estratosférico

O Brasil também tem uma iniciativa de prover conexão internet por balões: o ProjetoConectar, do INPE (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais). Mas o conceito é diferente.

— Nossos balões são “ancorados”, ou seja, ficam presos à terra por uma corda de aramida(Kevlar), bem leve — explica José Ângelo Neri, pesquisador do INPE e coordenador doProjeto Conectar. — Ele pairam a cerca de 400m do solo, proporcionando conexão internetnum raio de até 100km, funcionando como se fosse uma torre convencional, só que maisalta, mais barata e com alcance muito maior.

O projeto é 100% brasileiro, e pode servir também para dar apoio a regiões em caso dedesastres. O próximo passo é um experimento piloto — definido em dezembro de 2013 masmisteriosamente até agora aguardando autorização ministerial — na Região Norte,cobrindo dez cidades num raio entre 50km e 100km.

— Usamos nos balões os gases hélio ou hidrogênio, mas a logística do projeto écomplicada. Quanto à inflamabilidade do hidrogênio não há problema. Já testamos nossosbalões dando até sete tiros neles. Não houve explosão e a descida foi suave, já que adiferença de pressão é minúscula, apenas 1 centésimo de atmosfera.

Para quê mais usuários?

Os tubarões da internet sabem que a grande rede está num momento de transformações eeste — além da possibilidade de grandes lucros — é um dos motivos para essa fome pornovos usuários.

Hugo Fuks, professor e diretor do Departamento de Informática da PUC-Rio, explica que,de fato, a grande rede está mudando de vocação.

— Deixando de lado o bom e velho e-mail, a internet está deixando de ser um veículo deconsumo de informações para se tornar uma via de interações entre usuários, instituições e

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empresas, uma metamorfose bem simbolizada pelo fenômeno das redes sociais — explica.— Com a iminente “internet das coisas”, essa situação se agrava ainda mais, pois asinterações passam a contemplar bilhões ou trilhões de objetos conectados e endereçáveispelo protocolo IPv6, que teoricamente seria capaz de abarcar todos os grãos de areia doplaneta.

Google, Facebook e outros grandes players estão conscientes desse futuro, que é um dosmotivadores “secretos” desse ávido desejo de expansão no número de internautas.

O tech-analista americano Mike Elgan se aprofunda <http://goo.gl/7L9DyF> na mudançade caráter das redes sociais e das empresas por trás delas.

— Essas redes estão se transformando de sites centralizados concentrando milhões deusuários em aplicativos com funções específicas dentro de uma mesma platafor, queconseguirão captar ainda mais usuários e, é claro, capturar o máximo de informações delespara depois dirigir-lhes anúncios personalizados supereficientes.

Quem paga?

No processo de expansão da internet, é preciso considerar também a questão econômica,pois o próximo bilhão de internautas é mais pobre do que o 1/3 da humanidade que já estáon-line. Algumas iniciativas mais recentes — e até agora um tanto incipientes — têm comometa fornecer acesso grátis à internet para os mais pobres, como Google Free Zone,Facebook Zero e a ainda incipiente A4AI (Alliance for Affordable Internet).

A Profª Marília Maciel, pesquisadora e coordenadora do Centro de Tecnologia e Sociedadeda FGV Direito Rio explica que iniciativas assim demoram mesmo para decolar e delineia oque nos falta para expandir a rede no Brasil.

— Precisamos primeiramente prover tecnologias inovadoras. Em paralelo, temos que criarum arcabouço de leis que facilitem a inclusão digital, pois falta um ambiente legislativo quecrie competição entre provedores e facilite a redução de preços. Com a A4AI, uma dasmetas é identificar boas práticas e boas leis — detalha. — E em terceiro lugar, precisamoscriar indicadores nacionais harmonizados para medir o desenvolvimento da internet, suaqualidade e a acessibilidade de seu conteúdo.

O último bilhão

Em recente palestra no evento TED de Vancouver, o cientista americano NicholasNegroponte, famoso por ter previsto muito do que temos hoje em termos de tecnologia einternet, aponta que o grande desafio será atingir o “último bilhão” de internautas.

— Eles serão em geral pessoas miseráveis e em alguns casos até primitivas, que podemestar carentes de saúde e educação, mas que teriam a chance de melhorar de vida sepudessem ter acesso à internet. A educação é a chave para o futuro, e bem mais adiante,sabe como as pessoas aprenderão novas informações? Engolindo pílulas de conhecimentocom nanocomponentes.

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BOX: “Não queremos balões da Google sobre o Brasil”

Falamos com um especialista brasileiro em aeronáutica e espaço que preferiu se manteranônimo. Ele reside no exterior e teve acesso a todos os detalhes técnicos do Projeto Loon,da Google.

— Eles querem soltar 50 mil balões ao sabor do vento sobre diferentes países, e não são asautoridades locais que os operam. Isso tem implicações muito sérias na segurança aérea,na segurança de dados e na segurança nacional — ressalta. — Além disso, no Brasil seriacontra a lei. Esses balões do Loon precisariam ter “transponders” para que, caso percamaltitude (e isso ocorre com muita frequência), possam ser esquadrinhados e evitados pelotráfego aéreo. E eu vi as especificações da Google: os balões deles não têm potênciaelétrica para aguentar um transponder, nem empuxo vertical para sustentar a massa deum.

Ele considera temerário permitir essa “invasão” de balões sobre o território de qualquerpaís.

— Observe que na tão alardeada “volta ao mundo em 22 dias”, os balões do Loon voarambasicamente em cima de água, pois seria bem complicado obter autorização de diferentespaíses para essa empreitada.

Quanto às ambições do Google e à subserviência brasileira, o engenheiro é incisivo.

— O pessoal lá de Brasília endeusa o Google e os “gênios” que trabalham lá, gente que vairesolver os problemas do mundo. Mas não vai. A solução deles nesse caso não tem razãopara funcionar, pois baseia-se em um princípio furado. O enlace de dados entre o balão, obackbone internet e o usuário no solo é problemático, especialmente em lugares como anossa Região Norte, onde há muita umidade no ar. A Google queria balões a 20km dealtura mas, diante do caso amazônico, eles propuseram diminuir drasticamente a altitudedeles.

O especialista levanta também problemas de “turnaround”, que se agravam no Brasil comépocas do ano com pouco vento.

— O projeto pressupõe também correntes de vento ideais. Mas o fluxo de vento não dá avolta “certinho” no planeta. Ele não segue paralelos nem meridianos. Esse controle nãoexiste. Com essa maravilhosa rede de computadores do Google, eles esquecem que descerum balão é fácil, mas subir é difícil — afirma. — Além disso, precisaria mudar toda aregulamentação brasileira, onde é obrigatório expedir um “Notam”<http://goo.gl/X5WczK>, documento informativo oficial da Aeronáutica, para cada balão,informando data, hora, local e sua trajetória

Segundo ele, aceitar os balões do Google sobre o Brasil seria uma ameaça à soberania e àsegurança nacionais.

— Eles vão ter que lutar muito com cada país que se considere decente para que aceite esseprojeto. Nem o Paraguai aceitaria isso. Já o Brasil...

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