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ELES ESTÃO CHEGANDO Alan Darc

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Page 1: Eles estão chegando · 2017-12-17 · 2 Fundação BIBLIOTECA NACIONAL MINISTÉRIO DA CULTURA REGISTRO No 216.686 LIVRO 378 FOLHA 346 Capa: Desenho de Rafael Pianca Barroso Direitos

ELES ESTÃOCHEGANDO

Alan Darc

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ELES ESTÃO

CHEGANDO

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Fundação BIBLIOTECA NACIONAL

MINISTÉRIO DA CULTURA REGISTRO No 216.686 LIVRO 378 FOLHA 346

Capa: Desenho de

Rafael Pianca Barroso

Direitos autorais reservados Proibida a reprodução

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ELES ESTÃO

CHEGANDO

Autor

Alan Darc

l998/1999

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À minha querida esposa Ana Maria e, aos meus

filhos, Rafael e Cássia.

Mensagem aos leitores: Como eu não sou um literato, e esta obra não foi revisada por nenhum deles, sem sombra de dúvidas, ela deve conter alguns erros de ortografia. Peço desculpas por eles. Vocês não imaginam, como nesta terra é difícil para um “ilustre desconhecido”, expor suas idéias em livro e achar uma Editora que as publique. Por favor, liguem-se somente à história. Sejam meus juizes, mas não sejam por demais severos. Procurem compreender, quantas dificuldades, nós, escritores sem fama, temos que superar para chegar em alguns lares. Graças pela compreensão, e que Deus abençoe a todos.

O autor

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PREFÁCIO

Muito me honrou a leitura prévia desta obra: “Eles estão chegando”. Atualmente, na agitada rotina em que vivemos, você sentirá ao ler esta história, uma imensa paz. Os Planetas Confederados são desconhecidos da Terra, porém possuem uma grande organização social, onde todos vivem em completa harmonia. É preciso que todos os povos conquistem a verdade e o amor. A nossa sociedade reflete uma situação de mal-estar social, desconforto emocional, falta de respeito, paciência e afeto nas relações inter-pessoais. Podemos interpretar este livro como uma “receita” para melhorar nossa rotina desde já. Na minha área de atuação, que é a Educação de adoles- centes, procurarei ainda mais, como já o faço, levar mensagens de paz e ensinar meus alunos a encararem a vida com muito mais dignidade. Tenhamos a certeza de que, apesar de toda a “deteriori- zação” socio-emocional que presenciamos na sociedade mundial e, em especial na nossa, ainda é possível transformá-la. “O amor é o mais nobre dos sentimentos”. Esta frase, extraída de outra obra do autor sintetiza a essência da vida, através de atitudes humanas que possam preservar o verdadeiro significado da nossa existência.

Gisele Nunes Lapo

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ÍNDICE

– Abertura.......................................................... 7 – Um mundo em formação.............................. 12 – A paliçada..................................................... 27 – Descobrindo o passado..................................40 – Diante de Moisés...........................................58 – A Via Láctea................................................. 72 – De volta ao lar............................................... 94 – Dois casos famosos..................................... 102 – Sob vigilância.............................................. 116 – Com a família.............................................. 125 – Sugestão...................................................... 134 – Um “fenômeno controlado”........................ 146 – Sob hipnose................................................. 156 – Pizzas ......................................................... 163 – Cabalá......................................................... 172 – Apresento-vos Agali................................... 173 – O Mensageiro da Paz.................................. 190

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sthor olhava atentamente o “refletor de imagens” e recordava. Via a Terra em seu início. No começo tudo era gás. O gás transfor-

mou-se em massa e assim surgiu um novo planeta. No início não havia água. Somente terra e mais terra. Planícies imensas e vazias cercadas por enormes montanhas desnudas. Precipícios cujos fun- dos não eram possíveis ser vistos a olho nu. Centenas de vulcões se agitavam impacientemente derramando lavas purpúreas sobre suas encostas que cresciam cada vez mais. Gêiseres soluçavam e lan- çavam para o alto gases venenosos. A alta temperatura que envolvia o planeta não permitia que houvesse vida animal. A milhões de quilômetros de distância, dentro da Constelação de Sirius, um povo observava atento. Nada passava despercebido pelos potentes te- lescópios. Acoplados a estes, trabalhavam ininterruptamente cen- tenas de computadores. Um deles mostrava que a temperatura que envolvia o planeta observado, estava em torno de 500 graus centí- grados, o que impedia o desenvolvimento de vida animal. Da vida que conhecemos. O principal gerador e impulsionador da vida, não existia. A água, a preciosa água, não havia. Existiam nuvens ao redor do globo, mas eram muito escassas. Era preciso esperar até que o novo mundo estivesse em condições de receber vida primitiva. Não obstante aqueles olhos observadores tivessem condições de agilizar um novo processo de vida, dado o vasto conhecimento que possuíam, não lhes era permitido alterar algumas regras. Teriam que aguardar o planeta esfriar. Mas não somente os da Constelação de Sirius observavam. Outros localizados na Via Láctea também estavam abertos. Os propósitos eram os mesmos, mas só que queriam ser os primeiros a chegar no pequeno e atraente mundo em formação. Havia outros globos perto daquele planeta, só que a temperatura era extraordinariamente elevada. Um deles se destacava pelo tamanho e outro pela beleza de seus anéis, porém não tinham condições de

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receber, sequer, vida com padrões diferentes da vida que conhe- cemos. Um magnífico sol estava no meio daquele conjunto de pla- netas. Era necessário, quanto antes, produzir chuvas. Imensas chu- vas! Para encher os gigantescos precipícios era necessário muito líquido. Chuvas e mais chuvas deveriam ser produzidas. Mui-tas nuvens envolviam um pequeno satélite que orbitava em volta do planeta visado. No satélite havia uma grande quantidade de gelo nos picos das montanhas e, a temperatura, oscilava entre quarenta graus abaixo de zero durante a noite, e trinta e cinco graus acima de zero durante o dia. Teria que haver um esforço conjunto se quisessem abreviar em alguns anos o início de vida no planeta visado. Esse esforço era praticamente justificável em virtude da necessidade urgente de transferir diversos povos do Sistema de Logus. Esse sistema era composto de seis velhos planetas prestes a desaparecer. Estavam no meio da Constelação de Senior, que estava sendo atraída por um gigantesco “buraco negro”. Era eminente o desaparecimento de milhares de astros. Eles seriam integrados ao misterioso campo de atração. Não obstante o grau de desenvolvimento daqueles olhos observadores, não era possível diagnosticar com precisão o momento que essa operação estaria com- pletada. Seis civilizações estavam prestes a desaparecer, e era preciso trabalhar rapidamente para salvá-las. Se não todas, pelo menos uma. Em todos esses planos havia diversos tipos de vida. Em alguns, selvagem e primitiva. Era necessário socorre-los e levá-los para um novo local. O planeta visado era o lugar ideal, isso se fosse possível baixar a temperatura. De repente, no refletor apareceram as figuras dos pais de Asthor. Berth trocava impressões com sua companheira Darth.

– Em quanto tempo se dará o resfriamento? – perguntava, Darth.

– Pelos meus cálculos não haverá tempo para salvar os habitantes de Senior. Estou pensando em raptar alguns casais e

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transportá-los depois. Sei que terei muitas resistências, mas acho que é a única maneira de conservar algumas espécies. É uma pena perder o que foi feito até agora. Você não está lembrada como foi difícil a união de negros com brancos avermelhados?

– Claro que me lembro! Mas acho que valeu o sacrifício. Quantas lindas histórias surgiram com essa união! Diga-me uma coisa, Berth: a raça humana que existe nos diversos mundos surgiram desses cruzamentos?

– Quase todos. O verdadeiro homem tem outras caracterís- ticas. É mais bonito! Os habitantes de Carlor têm a nossa aparência, só que têm a tez um pouco mais escura. Naquele mundo, hoje muito adiantado, foram esparramados brancos, negros, amarelos, pardos e vermelhos. Cruzaram facilmente e sempre viveram em paz. Hoje existem dezenas de variações aperfeiçoadas. Estão tão adiantados, que estão semeando, como nós, novas vidas. Só que eles ainda não têm acesso a planos fora de seu sistema.

– Já foi traçado um padrão de vida para esse mundo novo? – Seguirá os padrões tradicionais. Depois das chuvas,

conduziremos as águas pelos canais e encheremos os precipícios. Criaremos mares e oceanos. Os rios e os grandes lagos tomarão as planícies e serão os primeiros a receber vida animal. Logo após, distribuiremos os grandes mamíferos. As aves serão as últimas. Haverá vida em todos os lugares. Dentro e fora d’água. Vamos alimentá-los da mesma forma que fizemos em Orior. Lançaremos do alto as sementes e, com a ajuda da luz e do calor da estrela que está no meio do sistema, a terra será coberta rapidamente. Só depois levaremos os grandes herbívoros. Esses animais têm uma fome insaciável.

Enquanto Asthor revivia algumas cenas do passado, do outro lado do Universo, dois de seus aliados traçavam um plano de ajuda para a atual Terra.

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uer dizer então que a Terra entrará numa Era de paz? – Exatamente.

– Quer dizer então que podemos intervir para que essa paz se consolide. – As ordens do conselho foram bem claras, meu caro Lemur. Vamos atuar nas três frentes. Primeiro vamos desmascarar os falsos religiosos, depois vamos retirar os maus políticos, a seguir vamos reduzir o poderio militar das nações. – Já estava na hora. A humanidade tem sofrido muito com a ambição e o egoísmo de algumas mentes privilegiadas. – Há muita miséria e pouca solidariedade e amor. A cada minuto sobem milhares de orações de pessoas atingidas pela fome. O solo terrestre tem que ser melhor aproveitado. Onde já se viu morrer de fome diante de tanta fartura! Se os homens fossem menos gananciosos, haveria alimentos para todos. – Você tem razão, Cabalá. A ambição pelas coisas materiais faz com que o homem não encontre paz. – Há muita terra mal aproveitada. Somente as nações mais ricas têm se beneficiado das terras férteis. – Você já reparou que onde há mais território, existe mais miséria? – Não adianta ter terra e não ter meios para plantar. – Acho que vinte anos terrestres serão suficientes para fazer progredir alguns povos muito atrasados. Especialmente aqueles que vivem na África. – Quase todas as nações da África pertencem ao quinto mundo.

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– Eu não vejo dessa forma. Para mim não há primeiro ou quinto mundo. Todos são filhos do mesmo Pai e, portanto, todos, indistintamente, devem ter os mesmos privilégios. – Onde vamos atuar de início? – Na mais poderosa das nações. Para isso, Asthor já está trabalhando. – De que forma? – Ele já fez contato com um antigo companheiro de jornada. Esse antigo companheiro vive hoje no corpo de um Físico que trabalha num Centro Espacial dos Estados Unidos. Ele será nosso elo de ligação. – Mas e se tivermos que usar a força? De que lado ele ficará? – Isso não será preciso. Não vamos usar a força. A única força que vamos usar é a força do diálogo e do convencimento. Isso será suficiente. – Mas e quanto os mísseis de longo alcance? – Ora, Lemur! Você bem sabe que podemos inutilizá-los facil- mente. – O meu receio é que sejam usados contra nações mais fracas. – E por quê? – Porque quase todos os dirigentes são belicosos. Alguns americanos vão pensar que nosso agente é um espião de outra nação. Você vai ver! – Veremos! – Para onde ele foi levado? – Para as Iríades. É um pequeno asteróide que está servindo como novo lar de alguns terráqueos. – Que tal então vermos o que está acontecendo? – Isso fica para depois. Vamos a Gaster. Lá vão se reunir os Doze Mandatários dos Planetas Confederados. Depois faremos con- tato com Asthor. Acione os comandos e partamos imediatamente.

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Capítulo I Um mundo em formação

rôpego e ofegante, Glenn arrastava-se procurando atravessar a ravina. Jamais havia pensado passar por semelhante situação. Seu bimotor era novo, tinha larga

experiência de vôo, mas aconteceu! Quando o aparelho foi envolto pela ventania, somente teve tempo de saltar. Sequer pôde tirar do avião uma só ferramenta. Tinha meramente um canivete e algumas chaves que levava presas a um chaveiro também preso ao passante da calça. Era muito pouco para quem precisava sair em busca de alimento. Já em terreno firme, divisou as faldas de uma montanha. Era lá que procuraria refúgio. Necessitava refazer as forças e nada como um bom descanso. Depois pensaria em se alimentar. Após vencer a distância que o separava da montanha, avistou uma cavidade a um metro acima do solo. Perscrutou à sua volta e chegou devagarinho à entrada. Cuidadoso, procurou certificar-se de que se dentro dela havia algum réptil ou felino. Lentamente colocou a cabeça para o interior e correu os olhos. Depois de alguns segundos já tinha uma visão mais clara. Era uma vasta caverna. Para sua alegria viu uma pequena queda d’água dentro dela. À sua direita havia uma estreita passagem, de onde enxergou o céu azul e claro. Isso era muito bom! Por aquela brecha poderia escapar do ataque de alguma fera. Afinal, estava em terri- tório desconhecido e longe de qualquer povoado. Extenuado e sob forte emoção adormeceria rapidamente, mas antes deveria tomar algumas precauções. A lâmina de seu canivete era bem afiada, porém não tinha mais de dez centímetros de compri- mento, o que era pouco para se defender do ataque de algum animal.

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Pensando rapidamente, pôs-se a trabalhar. Tirou os cadarços das botas, e fez com alguns gravetos que encontrou no piso da caverna, um feixe que acomodou na abertura do teto. A seguir uniu os dois cordões e deu um nó no maior dos gravetos. Na outra ponta fez um lacete e prendeu num dos dedos. Caso algum bicho tentasse desobs- truir a passagem havia a possibilidade de acordar com o toque. A entrada um pouco acima do chão tinha sido tapada com pedregulhos de diversos tamanhos. Agora sua segurança estava entre-gue a Deus. Orou pedindo proteção e deu uma rápida olhada em seu cronômetro. Eram exatamente dezessete horas e doze minutos. Cerrou os olhos e adormeceu profundamente. Mal pegou no sono foi cercado por alguns vultos. Eram três seres cobertos com uma estranha roupagem e pareciam astronautas. As vestimentas estavam pegadas aos corpos e brilhavam como o alu- mínio polido. Tinham físicos atléticos e perfeitos e, os rostos deve- riam ser muito belos, apesar de estarem cobertos totalmente por um fino tecido. Os pés estavam protegidos por botas bonitas e delicadas, e na cintura luziam fivelas triangulares. Presos aos cintos, cada qual portava um bastão parecido com uma lanterna comum. Nas pontas piscavam luzes, ora amarelas, ora rubras. Um deles tinha destaque. Era maior e aparentava ser mais forte. – Convém deixá-lo repousar – sugeriu, numa voz melodiosa e suave, o mais alto, de nome Asthor. – Coitado! – murmurou a figura da esquerda, cujo nome era Jena. – Ele pensa estar ainda na Terra! – Não seria melhor nos apresentarmos de outra forma? – aconselhou Zirna, que aparentava ser a mais velha. – O que você acha, Asthor?

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– Eu creio que ele está preparado para nos rever; não nos esqueçamos que já trabalhamos juntos. Quando ele foi Aarão1, falá- vamos quase que diariamente. – Mas isso já faz tempo! Não esqueça que já se passaram quatro milênios! – observou, Jena. – O tempo não importa. – Quando acordar vai se lembrar dessa jornada? – indagou Zirna, com olhar benevolente. – Sem nossa ajuda isso não será possível – ponderou, Asthor. – Inicialmente terá que saber que não está mais na Terra. – Explicar isso não será nada fácil! – insinuou, Jena. – Por quê? – Ora Zirna, porque ele deve acreditar que está na Terra. Imagino que quando despertar irá à procura dos escombros do avião. Há muito perigo em volta dele! – Sabem que eu não havia pensado nisso! – admitiu Asthor. – Por momentos esqueci que este asteróide é um mundo primitivo. Há grandes carnívoros e tribos de índios muito ferozes. Além de selva- gens costumam devorar suas vítimas. Se for pêgo por esses canibais teremos problemas. – Enquanto aguardamos, que tal nos contar algo a respeito da passagem de Aarão pela Terra? – Você não acompanhou essa jornada do alto? – Estávamos em outra missão – intercedeu, Jena. – Então vamos lá! Ele teve várias e interessantes passagens no Planeta do Cristo, mas sem sombra de dúvida, a mais valiosa delas foi quando ajudou Moisés a conduzir pelo deserto o povo hebreu. – Mas isso ocorreu antes da vinda de Jesus! Ou estarei enga- nada? – quis saber, Jena. 1 Filho de Levi, irmão de sangue do Patriarca Moisés.

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– Eles vieram antes de Jesus. Nossa frota era composta de dez espaçonaves: oito auxiliares e duas de comando. Eu fazia parte da tripulação de uma das espaçonaves guias, cuja direção estava entre- gue a Mhor2. Movíamo-nos na retaguarda e éramos os responsáveis pela segurança daquele povo subjugado pela força. Bheror coman- dava a outra espaçonave guia e distribuía os alimentos. – Como vocês faziam para orientá-los? – Aarão recebia as ordens de seu irmão, que as recebia de Mhor. – Mas isso ocorria face a face? – insistiu, Jena. – Como face a face? Não entendi esse seu raciocínio! – Estou querendo saber se o diálogo era feito abertamente. Se Mhor ficava descoberto diante de Moisés. – Que eu saiba, Mhor jamais saiu da espaçonave quando lhe passava instruções. – E você? – Também! Todas as vezes que o instruí, fi-lo através do trans- missor. Sempre o orientei da sala de comando. Quando era preciso me comunicar, destacava do corpo central uma nave auxiliar e pou- sava numa região elevada. Nunca lhe dei instruções numa planície e, somente no final da jornada, apareci de relance. – E quanto às Dez Regras?3 Quem as entregou? – Mhor as deixou na encosta de um morro. Essa elevação de terreno, reverenciada até hoje pelos judeus, é conhecida como Monte Sinai. Mesmo nesse significativo momento Moisés não viu o rosto do comandante. Ao meu ver, isso foi uma falha lamentável. – Por favor, Asthor! Explique-se melhor. Por que você acha que foi uma falha?

2 Comandante da espaçonave guia. 3 Dez Mandamentos

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– Se Mhor tivesse se mostrado, talvez não fosse visto como Deus. Quiçá fosse igualado a um Anjo ou a um importante mensa- geiro. Mantendo-se incógnito, criou na imaginação daquela gen- te ingênua, uma falsa realidade. Imaginem vocês! Até hoje os che- fes das mais diversas religiões acham que foi Deus que entregou as Leis. Como se Ele não tivesse algo mais importante para se preo- cupar! – Mas isso é uma insensatez! – bradou admirada, Jena. – E pelo jeito difícil de ser alterada. Mas vamos em frente! O principal objetivo das Regras era fundar uma sociedade livre de vícios. Embora convincente, Aarão tinha muita dificuldade para convencer os mais intransigentes. Os ambiciosos eram os mais into- lerantes. Eram na maioria comerciantes em busca de lucro fácil. Não obstante Moisés ser reconhecido como Patriarca, ele tinha mais opo- sitores que aliados. – Mas se as Leis eram perfeitas, por que tiveram dificul- dades? – ponderou Jena, não convencida. – Porque as Leis retirava de alguns, velhas regalias. Outros não a entendiam, ou faziam-se de desentendidos. – Mesmo dando uma demonstração de força? – interveio Zir- na, também interessada. – Mesmo assim! Submetemos o exército egípcio a uma humi- lhante derrota, usamos a Mãe Natureza para que atravessassem o mar em segurança e, mesmo assim, transgrediam as Leis. Os mais velhos eram extremamente fanáticos e apegados a duvidosas crenças. Alguns eram mais respeitados do que o Patriarca Moisés. Adoravam falsos ídolos e faziam oferendas a diversos deuses. Aliás, nós éramos vistos como deuses. – Meu Deus, que coisas mais absurdas! – observou perplexa, Jena. – Às vezes até o próprio Aarão, vacilava.

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Parou por um momento ao verificar que Glenn movia-se um pouco. Vendo que não havia despertado, prosseguiu. – O sol escaldante e a areia quente do deserto contribuíam para acirrar os ânimos e tumultuar o ambiente. Quase todos os dias haviam mortes estúpidas. Por causa delas resolvemos construir uma base móvel, a fim de estarmos sempre por perto. Aarão ficou respon- sável pela seleção dos obreiros. Todos se mostraram hábeis e exce- lentes artesãos. Rapidamente construíram uma base circular de ouro, prata e carvalho, uma madeira muito resistente ao calor. Os minerais foram retirados de minas próximas do local aonde estávamos, toda- via o carvalho só foi encontrado em florestas localizadas em outro con- tinente. Para resistir ao calor dos reatores, a madeira foi untada com uma camada de óleo vegetal. Depois de concluída a base, deram-lhe o nome de Tabernáculo. Uns poucos preferiram chamá-la de Arca da Aliança. Nós preferimos registrá-la como campo móvel. Tivemos também que ter alguns cuidados na alimentação. Os hebreus abatiam os animais e retiravam os órgãos pela barriga, mas não tinham o cui- dado de lavar a parte restante. – Mas havia necessidade de vocês comerem essas carnes? – ponderou, Zirna. – Não queríamos magoá-los. Só por isso. Os juizes e sacer- dotes usavam o Tabernáculo para algumas cerimônias. No mesmo local em que faziam as cerimônias, abatiam os animais. Nessas oca- siões tínhamos o cuidado de somente comer as carnes sem gordura e bem tostadas pelo fogo. – E durante o repouso, como vocês faziam para se livrar do assédio dos mais ousados? – perguntou Zirna, com vivo interesse. – Envolvemos o campo de pouso com um cinturão de força e uma grande cortina feita de pele de carneiro. Os mais atrevidos perderam a vida tentando ultrapassá-los. – Quantas espaçonaves cabiam dentro do campo de pouso?

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– Ele foi feito para abrigar somente a espaçonave guia. Quan- do era necessário fazer algum reparo numa nave auxiliar, esse servi- ço era feito em campo aberto, mas longe de olhares curiosos. O bate papo estendeu-se por mais algum tempo, até que Glenn acordou e começou a se mexer. – Convém nos afastarmos – disse Zirna, quase cochichando. – Ele está acordando. Aarão, cujo nome atual era Glenn, abriu os olhos e ergueu a cabeça. Esticou preguiçosamente os braços para o alto, e moveu-os para a direita e para a esquerda procurando flexioná-los. Ergueu as costas, sentou-se, procurando relaxar. Por uns instantes ficou medi- tando. Não obstante ser uma pessoa muito tranqüila, demonstrava estar um pouco aflito. Pouco a pouco foi caindo na realidade e começou a pensar como um homem prático. Como um cientista! Afinal era um res- peitado dirigente da Estação Espacial da NASA, fizera parte de uma expedição à Lua, e estava escalado para fazer parte de uma nova equipe que iria à Marte. Assim que abriu os olhos, seu primeiro pensamento foi dirigido à esposa Mary e aos filhos John e Ann. Ainda ressoava em seus ouvidos as palavras de Mary pedindo-lhe para não voar naque- le início de manhã. Na noite anterior tivera uma experiência de-sagradável, mas mesmo assim não ouviu o conselho da esposa. Quando voltava do trabalho colidiu com uma caminhonete que estava sendo dirigida por um homem embriagado. Por pura sorte, seu automóvel Ford-Camaro resistiu ao impacto e ele saiu ileso da batida. Quase havia desistido do vôo, porém como o céu estava sem nenhuma nuvem, resolveu dar o passeio. Quando estava a três mil pés, teve a nítida sensação de que seu avião estava sendo atraído por algo fora de controle. Era uma situação alarmante e, apesar de ser um

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homem preparado, entrou em pânico. Chamou a base de controle, porém não teve nenhuma resposta. Investigou os painéis de comando e não viu nada de anormal, todavia continuou sentindo o aparelho ser sugado por alguma coisa invisível. Não esperou pelo pior: pulou pouco antes de ver o avião desaparecer num funil de vento. Nesse ponto sua cabeça começou a fervilhar. Pulara sem pára-quedas a uma distância do chão impossível de sobreviver, mas houvera escapado ileso, sem nenhum arranhão. Estaria delirando? Seria um sonho? Um pesadelo? Correu as mãos sobre a barriga, esfregou os olhos e, de repente, começou a chorar. Soluçava como uma criança assustada. Entre soluços, divagou por instantes. – De repente, exclamou aos gritos. – Devo estar morto! Morto! Mortinho! – repetia desorde- nadamente. Espremeu as bochechas com os dedos, cuspiu de leve e continuou. Mas que raio de morte é esta? Estou lúcido e sinto-me mais forte do que antes! Acho que na queda perdi o juízo. Isto não pode estar acontecendo! – desafiou elevando a voz. – Não é possível sair daquele avião daquela maneira! Mas isso já não importa – suspirou dessa vez baixinho. – O que importa agora é saber onde estou e como vou voltar para casa. Não devo estar longe, porque voei somente meia hora em linha reta. Devo ter caído perto de um povoado. Se tiver sorte, encontrarei uma estrada logo-logo. Pôs-se de pé e sossegadamente urinou na parede da caverna. Tranqüilamente sacudiu o pênis algumas vezes e acomodou-o nova- mente dentro da calça. Puxou o zíper para cima e encaminhou-se morosamente para a saída da caverna. Antes de atingi-la, saciou a sede naquela corrente d’água cristalina. Já fora, ao andar alguns metros em volta da montanha, avis- tou algo fascinante. Tão extraordinário era o panorama, que esfre- gou os olhos diversas vezes a fim de sentir que era verdadeiro.

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Diante dele havia uma floresta tão exuberante, que o fez estancar rígido e surpreso. Ao fixar a vista numa grande árvore, viu um gigantesco lagarto comendo sua vegetação. Nesse instante seu corpo ficou ainda mais rígido. Ficou ainda mais rígido, quando avistou um tigre-dente-de-sabre atravessar uma clareira com um animal preso à boca. Ao vê-lo, compreendeu porque tinha esse nome: os dentes caninos, excessi- vamente brancos, pareciam dois sabres compridos e pontiagudos. Embora estivesse fora do alcance do enorme felino, jogou-se ao solo procurando ocultar-se. Um pouco mais calmo, foi surpreendido com um novo qua- dro. Ao olhar para o alto, avistou no céu oito esferas maiores que a Lua, todas com um magnífico colorido. Eram lindas e graciosas. A terceira, da direita para a esquerda, estava envolvida por centenas de anéis brilhantes. Apesar da claridade, pareciam espelhos voltados contra o sol. – Meu Deus! – sussurrou, ofegante. – Isso não pode ser real! Só pode ser um sonho! Ou será que perdi o equilíbrio emocional com a queda? Ficou vários e vários segundos naquela posição. Estava tão entretido com o que via no céu, que se esqueceu dos perigos exis- tentes na mata. Sequer imaginava que fora transportado para um pequeno mundo em formação. Estava longe de imaginar, que se en- contrava num mundo igual à Terra, na época dos grandes dinos- sauros. Um pouco distantes, Asthor, Zirna e Jena, observavam. – Que tal interceder e levá-lo imediatamente? –sugeriu, Zirna. – Ainda não – respondeu, Asthor. – Por enquanto vamos nos manter afastados. Ele parece estar apreciando os anéis de Milquía- des! – rematou, referindo-se ao grande planeta envolvido pelos brilhantes anéis.

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Verdadeiramente, Glenn estava tão preso à beleza daquele corpo celeste, que não se deu conta do perigo que corria. Quase roçando seu corpo, passou grasnando um fantástico pterossauro, que para sua sorte, estava com as garras presas a um estranho animal de duas cabeças e um corpo coberto de escamas. Levantou-se tão rapidamente correndo em direção ao interior da caverna, que despertou o riso nos três alienígenas. – Parece-me que agora ele caiu na realidade. Será que ele ainda pensa que está sonhando? – frisou Asthor, com ironia. – Vamos ver como agora ele age. Refeito do susto, Glenn tentou raciocinar com mais lucidez. Sempre fora um homem corajoso e não temia a morte. Já a enfrentara diversas vezes e não seria desta vez que iria fraquejar. Tirou o canivete, encarou-o e começou a sorrir. Que estranho destino o seu. Convivera ao lado das armas mais mortíferas do Planeta Terra, e agora só tinha aquela pequena lâmina como segurança. Havia Deus e ele confiava Nele, entretanto estaria mais seguro se tivesse um rifle. Que tal uma metralhadora que cuspisse mil balas por minuto? Contentar-se-ia também com um revolver calibre 38. Até as velhas carabinas do faroeste eram bem-vindas.

Captando seus pensamentos, Asthor sorriu mostrando uma perfeita dentição. Glenn agora estava mais cuidadoso. Aproximou-se da saída e lançou um olhar furtivo para fora. Depois de certificar-se de que não havia nenhum perigo, correu mais ou menos cem metros, desta vez em linha reta, e abrigou-se debaixo de um arbusto com centenas de sementes vermelhas. Nem pestanejou, nem parou para pensar. Num rápido movimento apanhou um punhado delas e, sem medo nem cerimônia, começou a comê-las. No início mastigava uma a uma. Depois lançava-as à boca aos punhados. Eram tão atrativas e gostosas

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que não poderiam causar nenhum mal. Estava tão absorvido em devorá-las, que não notou a presença de três naturais. Estáticos, admiravam o estranho à frente e pareciam estar cautelosos. Pelo visto não estavam habituados com o forte azul de seus olhos. Ou seria pela espalhafatosa roupa de piloto? Os naturais estavam nus e eram brancos como albinos. Possuíam olhos castanhos, pequeninos e ovalados, e as cabeleiras eram longas e negras como azeviche. Cada um segurava uma clava pontiaguda, do tamanho de seus corpos. Se fossem negros, na certa seriam confundidos com os descendentes ou ascendentes dos selva- gens que davam proteção ao companheiro de Diana – o Fantasma que Anda4. Não obstante parecerem crianças, tudo indicava que eram criaturas em idade madura, pois eram atarracados, tinham a testa larga e saliente, vastas sobrancelhas e uma pele grossa e enrugada. Espreitavam com curiosidade a misteriosa pessoa deliciando-se com as frutinhas, quando repentinamente surgiu por detrás deles um formidável macaco acompanhado de duas fêmeas de menor tamanho. Os antropóides, quem sabe também surpreendidos pela presença de Glenn, pararam de estalo, do que se aproveitaram os anões para fugir em desabalada carreira. Glenn, atônito, deixou cair na relva as sementes que tinha nas mãos e segurou firme o canivete. Por alguns instantes ficou com a mão direita estendida, empu- nhando de forma ameaçadora, a ridícula lâmina. De repente, para assombro de Asthor que observava escondido, começou a gargalhar. Ele debochava, porque compreendeu que o pequeno canivete de nada serviria diante daquelas feras. Era um mero adorno sem nenhuma utilidade. Por isso estava rindo daquela maneira. De que serviria

4 Herói do romance de Lee Falk.

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aquele instrumento cortante? Ora, ora! Para nada! Achou melhor tro- car o riso pela reza. Ajoelhou-se diante das feras e começou a rezar. Em poucos segundos passou a se recordar de inúmeras cenas de seu passado mais recente. Parecia estar vendo um filme cujo ator era ele próprio. Os animais o encaravam e não davam mostra de querer molestá-lo. Debaixo de um grande arbusto, Asthor, Zirna e Jena olha- vam atentamente a cena com estranhos bastões apontados para o gorila e as fêmeas. Em caso de perigo, não obstante afastados, estavam prontos para defender Glenn. Aqueles bastões eram na realidade, armas que paralisavam os movimentos de quem fosse atingido por seus raios. Para surpresa de todos, o grande macho aproximou-se lentamente e começou a sorrir. O mesmo fizeram as fêmeas. À medida que movia os longos braços quase roçando o solo, a fera sorria e os olhos brilhavam com intensidade. Era como se estivesse vendo algo precioso e muito querido. As duas fêmeas trocavam olhares maliciosos e emitiam sons ininteligíveis. Glenn compreendeu que aque- las feras não queriam agredi-lo. Ao contrário, estavam tranqüilos e demonstravam estar contentes com sua presença. O porquê, não adivi- nhava. Sem ter o que fazer, encarou de frente o grande macho, levantou-se devagarinho e, resolveu imitar Tarzan5, batendo levemente o punho sobre o peito. – Sou Glenn! – Tornou a repetir um pouco mais alto: sou Glenn More! Imitando o gesto, a poderosa fera esmurrou o largo peito sem pelos e, para satisfação de Glenn, emitiu um som parecido com a palavra Sandor. Apontou para suas companheiras e repetiu: Menas – Sandor – Menas. 5 Tarzan o Rei das Selvas - personagem principal do romance de Edgar Rice Burroughs.

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Glenn imitou-o: – Sandor – Menas. Estava aberto um diálogo. Asthor, atento a tudo, murmurou em tom baixo: – E agora? O que faremos? – Acho que devemos continuar observando – sugeriu, Zirna. – Nosso tempo está se esgotando – disse, Asthor. – Vamos transportá-lo para a espaçonave. Enquanto ultimavam os preparativos, Glenn encarava os pri- matas e gesticulava inutilmente tentando obter uma resposta. A cena até que era engraçada. Estava tão envolvido com os animais, que não percebeu uma gigantesca nave interestelar pousar suavemente numa clareira às suas costas. Como estava em sentido oposto, ao ver a espaçonave mano- brando, Sandor agarrou Glenn pela cintura e pôs-se a correr, fugindo em sentido contrário. Glenn não tendo sequer tempo para esboçar uma reação, deixou-se levar sem resistência. Enquanto as fêmeas davam co- bertura, fazendo uma espécie de barreira, Sandor desapareceu na mata. – E agora? – indagou Zirna, apreensiva. – O que faremos? – Não se preocupe – observou calmo, Asthor. – Quando o tiramos do avião fiz um implante numa das orelhas. Vamos voltar à espaçonave e acompanharmos seus passos pela Tela Panorâmica. Nossa visão será perfeita. – Mas vocês não acham que ele está correndo perigo? – insistiu, Zirna. – Eu não sou da mesma opinião – afirmou, Jena. – Pelo que vimos, esses animais são inofensivos e amistosos. Se quisessem atacá-lo, já o teriam feito.

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– Olhem aquilo! – exclamou Asthor, apontando para o lugar aonde havia desaparecido Glenn. – Que espécie de animal é aquele? – Parece um mamute. Esse espécime tem mais de trinta tone- ladas – analisou, Zirna. – Interessante! Nunca vi um mamute com um corno. Esse também se diferencia pela juba abundante! – Olhem o que está vindo por detrás dele! – avisou, Asthor. – Esse não estou reconhecendo. Tem as características de um brontossauro, todavia o peito largo e o pescoço curto me faz crer que seja um tiranossauro-rex. Reparem que poderosas mandíbulas ele tem! Suas fileiras de dentes não lembram uma cremalheira? Por isso o mamífero foge desse jeito. Não é sem motivo! – Acho que o paquiderme não escapará – previu baixinho, Zirna. – A não ser que intercedamos. – E por que devemos intervir? – questionou, Asthor. – São duas criaturas acostumadas a lutar. Quando Deus as fez, sabia o que estava fazendo. Sairá vitorioso quem estiver mais preparado. – Como quem estiver mais preparado? Não entendi esse seu ponto de vista! – argumentou, Zirna. – Observe e veja como estou certo – disse, Asthor. – Se o mamute conseguir arremeter de frente, será o vencedor. Se conseguir derrubar o lagarto, tentará esmagar a cabeça. Se isso acontecer, a luta estará terminada. Mas parece que Asthor estava enganado. O terrível sáurio encurralou o pesado paquiderme contra uma barreira de grandes árvores e, de pé, agredia-o com as patas dian- teiras erguidas como se estivesse boxeando, enquanto velozmente abocanhava seu adversário. O mamute urrava e, ao mesmo tempo, lançava sua cabeçorra já tingida pelo sangue contra o peito do pode- roso adversário. Suas reservas pareciam estar no fim, porém conti- nuava no ataque.

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– Não previ que ele tentaria derrubar o lagarto! – comentou, Asthor. – Se ele atacar de frente vai conseguir derrubá-lo. Vou dar uma ajudazinha... Zirna, que observava atenta, aproveitou para lhe dar o troco. – Quando eu sugeri para intercedermos, você foi contra. Por que agora você acha que tem de intervir? Pelo que estou vendo ele não vai precisar de ajuda. Não disse!!! – exclamou, ao observar o lagarto perder o equilíbrio e desabar sobre um monólito Aproveitando-se da queda, o mamute ergueu as patas diantei- ras, e lançou-as de um só golpe em direção à cabeça do lagarto. Ao mesmo tempo tentava enfiar o chifre no pescoço do animal, que estava com o dorso sobre a grande pedra. O descomunal carnívoro lutava para erguer-se, porém o terrível paquiderme continuava a pisoteá-lo. Cada vez mais lentamente. – Agora vocês vão entender quando eu disse que ganharia quem tivesse mais preparo. De fato, apesar de ainda atacar, o mamute parecia não ter mais forças. Estava exausto e se mantinha em pé com enorme difi- culdade. – Se ele não der uma estocada fatal, será encurralado pelo lagarto – comentou, Asthor. E foi isso que aconteceu. Apesar de seriamente ferido, o réptil apoiado na enorme cauda, conseguiu firmar suas poderosas mandí- bulas no pescoço do mamute, imobilizando-o completamente. – Agora é só uma questão de segundos – argumentou, Asthor. – A não ser que ele também já não tenha mais reservas. – Parece-me que é isso que está acontecendo – deduziu, Zirna. – Ele está afrouxando a mordida. Presumo que serão vencidos pelo cansaço. Eu acho que nessa luta de titãs não deve haver nenhum vencedor. – E é o que vai acontecer – vaticinou, Jena.

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Realmente, o carnívoro abriu a respeitável bocarra, equi- librou-se nas patas traseiras e, arrastando vagarosamente no solo seu rabo ensangüentado, começou a se afastar do local. O mamute também se levantou com dificuldade, e retirou-se em sentido con- trário. – Acho que nenhum dos dois sobreviverá. Do jeito que estão, serão presas fáceis dos carniceiros da selva. Dos dois, talvez o paqui- derme tenha mais chances, isso se conseguir se reunir à manada. Já o lagarto terá que defender-se até de seus irmãos de sangue. Esses animais têm um apetite voraz e não vacilarão em atacá-lo – prenun- ciou, Asthor. – Peça a Balthar para descer a esteira. Vamos ver o que está acontecendo com nosso amigo. Da grande espaçonave baixou rapidamente um foco de luz e os três foram içados para dentro. No interior, além de Balthar, mais dois auxiliares compunham a tripulação. Eram seis ao todo. Havia também, diversos andróides. Embora pequeninos, eram réplicas perfeitas de seres humanos. Diferenciavam-se somente destes pelas cabeças ovóides e orelhas pontiagudas. Oito deles movimentavam-se na sala de comando.

Capítulo II A paliçada

o momento em que Asthor e suas amigas voltavam à espaçonave, Sandor caminhava celeremente pela ma- ta cerrada com Glenn enlaçado à altura da cintura.

Resignado e entendendo a situação, Glenn procurava colaborar segu- rando seu pescoço com o braço esquerdo. Glenn tinha aproximadamente dois metros de altura e pesava quase cem quilos bem distribuídos, todavia, o enorme primata levava-o

N

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como se nada tivesse no braço. As fêmeas acompanhavam-no esprei- tando tudo ao redor. Glenn começou a notar que Sandor agora seguia uma trilha bem delineada, o que era um forte indício de que havia vida civilizada no local. Sem sombra de dúvida, quem abriu aquele caminho tinha alguns conhecimentos de medição. Sua largura era exatamente a mesma durante todo o percurso. Em alguns trechos a estradinha era ladeada por pedras esculpidas e escolhidas a dedo. Estava curioso em saber algo a respeito, entretanto viu que Sandor não teria meios de explicar. Preferiu permanecer em silêncio. Por duas vezes tiveram que embrenhar-se na mata em virtude da presença de grandes ani- mais no caminho. Não obstante esses animais serem herbívoros, era melhor não facilitar. Quanto mais avançavam, Glenn estava mais crente de que vivia um pesadelo. Ainda que a maioria dos cientistas não acreditas- sem em Deus, ele era uma exceção, pois tinha fé numa vida após a morte, apesar de não ter idéia de que espécie de vida o homem estaria sujeito após a morte física. Acreditava na Alma e estava convencido de que após a morte, os bons homens iam para o céu. Jamais imaginou que o corpo fosse junto. Não entendia o que estava acontecendo, mas sentia-se mais forte, a despeito da parca alimentação. Tinha convicção de ter voado somente trinta minutos, quando foi envolvido por uma forte ventania. Lembrava-se de que quando saltou do avião, sentiu que sua cabeça pareceu despregar-se do pescoço, tamanho foi o impulso dado ao corpo. Como permanecia vivo, era um mistério. Será que realmente havia sobrevivido? Ou estaria morto? Mas se estava morto, que espécie de morte era aquela? Sabia, ou ima- ginava saber, que o céu dos crentes não era onde estava. Ao invés de Anjos e Serafins, fora acolhido por três primatas de fazer inveja a qualquer macaco africano.

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Acho – sussurrou entre dentes – que se eu estiver vivo e um dia voltar, vou deixar muita gente maluca. Principalmente os meus colegas de trabalho. Também existe muita probalidade de eu ser internado num manicômio. Uma coisa é certa: se não morri, estou em outra dimensão. Só pode ser isso! Quem sabe existem diversos tipos de morte! Isto aqui não se parece nada com as Rochosas, se bem que já avistei diversas montanhas parecidas, só que nenhuma tinha o pico envolvido por nuvens ou gelo. E quanto aos animais! Os que vi por aqui, se parecem com os que habitavam a Terra há milhões de anos. Se realmente são parentes, além de estar em outra dimensão, é sinal de que voltei no tempo. Que situação! Será que quem me trouxe aqui vai permitir que eu saiba como está minha família? Ou será que também faziam parte de um sonho? Bem, de uma coisa tenho certeza: se morri no desastre e estou vivo em outro local, é sinal que somos imortais como Deus que nos criou. Estava com as lembranças tão anuviadas, que nem notou que estavam caminhando em campo aberto. Na frente dele apareceu uma grande clareira. Sandor colocou-o suavemente no chão, apontou para uma paliçada, e soltou uma espécie de grunhido. Glenn reparou que atrás das estacas havia um conjunto de construções do mesmo estilo das existentes em várias planícies da América Central. Será que os Maias6 e Astecas7 foram transferidos para esta região? Só faltava ver alguma escultura dos Olmecas!8 À medida que venciam a distância, rolos de fumaça subiam aos céus. Estaria sendo levado para alguma aldeia indígena? Será que haveriam Apaches9 ou Sioux10 dentro da paliçada? 6 Povo meso-americano, que atingiu uma das maiores civilizações do Ocidente. 7 Povo que dominava grande parte das regiões meso-americanas, inclusive o México. 8 Nome da primeira cultura elaborada pré-colombiana da América Central. 9 Índios peles vermelhas que se estabeleceram em grandes regiões dos EUA. 10 Povos ou confederação de povos ameríndios que viviam nas planícies do oeste da América do Norte.

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Glenn era fã de filmes de ficção e, quando já estava bem perto do grande portal, não teve dúvidas e bradou alto e em bom som: – Acho que caí em Hollywood! Isso só pode ser um estúdio cinematográfico! Ou estão filmando King-Kong, ou uma nova versão do Planeta dos Macacos! Sandor que andava ao seu lado, parecendo compreender, abriu um largo sorriso mostrando dentes alvos e perfeitos. – Não me diga que você entendeu? – perguntou, penetrando nos olhos da fera sorridente. – Só isso que me faltava. Espere aí! – explodiu, aos gritos. – Agora sei o que aconteceu! Os três símios encaravam-no com olhos brilhantes. – Pouco dias antes de levantar vôo – prosseguiu explicando às feras – fui assistir com minha família a um show de David Co- perfield. David é um mágico ilusionista. Faz desaparecer coisas e pessoas. Fui ao palco a convite de sua partner e, com um simples estalar de dedos, ele me fez sumir de cena. Será que ele não con- seguiu me fazer voltar? Só pode ser isso – terminou, fazendo uma careta. Asthor, que apreciava tudo pela Tela Panorâmica, ria aberta- mente. Seus dentes eram tão brancos que faiscavam. Quando já estavam próximos da entrada, Glenn compreen- deu que aquilo não era uma visão. Aquele povoado ou cidade era real. Ele já havia visto muitas coisas para se deixar surpreender com novas situações, por isso não se admirou quando foram recebidos na entrada por dois homens brancos, que falavam inglês. O que parecia ser mais velho, cumprimentou-o estendendo-lhe a mão. O mais novo imitou-o. – Seja bem-vindo. Sou Mike e este é Eddie. Antes de mais nada, – disse adivinhando os pensamentos de Glenn – isto não é sonho, nem pesadelo. É pura realidade e sabemos como você está se sentindo. Conosco aconteceu o mesmo.

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– Quer dizer então que vocês foram trazidos da mesma forma que eu? – Mais ou menos – respondeu Eddie, indo direto ao assunto. – Fomos raptados por uma espaçonave quando sobrevoávamos o Oceano Pacífico. Estávamos em missão de patrulhamento, quan- do avistamos um objeto luminoso acima de nós. Poucos minutos antes, recebemos um pedido de socorro de uma embarcação de bandeira dinamarquesa. Naquela altura, desconhecíamos que o bar- co que pediu socorro já havia sido levado para dentro da espa- çonave. A princípio, os tripulantes da espaçonave pareciam não se incomodar com a nossa presença, tanto é que se afastaram lentamen-te da área. – Como recebemos ordens para interceptá-los, – completou, Mike – pedi a Eddie para ficar do lado direito da nave, enquanto eu me aproximava pelo lado esquerdo. Como estávamos equipados com mísseis, enviei um ultimato para que baixassem. Quando nos apro- ximamos, vi o que estávamos enfrentando. Gritei pelo rádio para Eddie tomar cuidado, mas já era tarde demais. Nossos aviões, perto do majestoso engenho à frente, pareciam brinquedinhos de criança. Diante de nós, estava parado um objeto maior que os nossos porta-aviões. Tinha mais de mil metros de diâmetro, e sua altura era equi- valente a um prédio de duzentos andares. Nossos motores “apa- garam” e fomos levados para dentro da espaçonave, como plumas ao vento. Não terminaram aí, as surpresas! Em seu interior, num han- gar especialmente construído, avistei algumas embarcações e vários bombardeiros devidamente enfileirados. Era tão grande o espaço in- terno da espaçonave, que daria para se construir várias quadras de basquete. Glenn olhava os dois com cara de palerma e sorria à socapa. Sem ter nada objetivo, inquiriu vagamente:

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– Quer dizer então, que somos prisioneiros desses símios? Eles é que pilotavam a espaçonave? – Ora, meu caro! – alardeou Mike, com um sorriso. – Nós não somos prisioneiros! Logo você saberá de tudo. – Parece que Sandor quer se despedir de você – percebeu, Eddie. – Entre os de sua espécie, ele é rei. Os naturais o veneram como a um deus. Antes de se encaminharem a um pequeno edifício, Glenn chegou perto de Sandor e acariciou levemente o peito da fera. Fez o mesmo com suas companheiras e tentou segurar uma lágrima insistente. Não conseguiu. Tentando ocultar sua emoção, saiu-se com essa: – Como vocês se protegem daqueles animais pré-históricos que vi lá fora? Essa paliçada, apesar das toras serem bem grossas, não deterá nenhum daqueles animais. Uma pequena manada é capaz de pô-la abaixo em poucos instantes e, o mastodonte que vi no caminho, eqüivale em massa a cinco elefantes que vivem nos conti- nentes asiático e africano. – Esses animais têm pavor do fogo, por isso não se apro- ximam – explicou, Mike. – Em volta das estruturas de madeira há vários tanques cheios de petróleo natural. Quando necessário, os vigias colocam fogo nesses tanques. As grandes labaredas intimidam qualquer animal, inclusive o maior dos felinos: o tigre-dente-de-sabre. – Eu tive a oportunidade de apreciar um deles – mencionou, Glenn. – É de uma beleza deslumbrante! – Mas e quanto às grandes aves? Como vocês impedem a passagem delas? – Os pterossauros têm pavor da fumaça, isso nos dá plena liberdade dentro das barreiras. Além do mais, eles preferem ali- mentar-se de filhotes de lagartos e de pequenos mamíferos. Apre- ciam em demasia, ovos de dinossauros. Se você ficar algum tempo

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por aqui, verá esses répteis alados cruzando os ares com ovos nas garras. – Ovos aqui não faltam! – observou Eddie, com descontração. – Essas aves também caçam filhotes de grandes primatas. Uma vez vi Tantor, um gorila tão grande como Sandor, estraçalhar uma ave que tentava agarrar uma fêmea recém nascida. – Isso não deixa de ser interessante, porém gostaria de saber porque fui trazido para cá. Afinal eu não estava atacando ninguém quando fui abatido – lembrou, Glenn. – Você não sei, mas nós fomos trazidos para apreender a valorizar a vida. A verdadeira vida! Glenn olhou espantado para Mike e nada adiantou. Limitou-se a encará-lo com uma expressão de desalento. Mike prosseguiu com semblante sério. – Pouco a pouco estamos deixando de lado a mais terrível das doenças. – Vocês não me parecem enfermos! – disparou Glenn, com ironia. – É uma doença moral – disse Mike. Estou falando do orgulho que há dentro das pessoas. Aqui estão nos ensinando a valorizar as boas ações sem objetivos mesquinhos. Enveredando agora para um campo filosófico, acrescentou: – Na Terra, todos acham que virão para o céu depois de mor- tos. Isso é invenção das Igrejas. Existem muitos locais de paz e tranqüilidade no Infinito, mas poucos, muitos poucos, conseguem vir para esses locais acolhedores. Sabe por quê? Por causa do orgulho que há dentro de nós. Um de nossos instrutores nos advertiu que a Terra é um planeta rico e cheio de alternativas, mas muito pobre de amor. Há muita ganância e muita ignorância entre a população, e isso gera sofrimento e miséria; atrás vêm as guerras. Nós estamos sendo

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instruídos para fazer parte de uma legião que lutará para que isso seja modificado. Glenn fitou Mike, e pensou: – Estou diante de um maluco! Esse cara deve estar pirando! Sem ligar para o seu silêncio, Mike, completou: – Neste local há aproximadamente mil pessoas vindas das mais diversas regiões da Terra. Todas estão recebendo instruções e apren- dendo a valorizar a vida. Todas foram escolhidas a dedo. Há finlan- deses, suíços, americanos, russos, franceses, japoneses, chineses, aborí- genes da América Central, da África Setentrional, da República do Guiné, e até dois esquimós do Pólo Ártico. Emudeceu por alguns instantes e, pesquisando Glenn que per- manecia calado, achou melhor mudar de assunto: – Você sabe como foi trazido? Glenn encarou Mike com ar de perplexidade e, a muito custo, respondeu: – Acho que estou sonhando. Vamos lá! Lembro de ter entrado em meu avião, voado aproximadamente trinta minutos, quando tive a nítida sensação de estar sendo atraído por uma força misteriosa. Um vento muito forte sugava o avião. O painel de comando nada acusa- va de anormal, entretanto era como se estivesse nadando contra a maré. Subitamente, senti que o aparelho estava sem comando e não pensei duas vezes; abri a carlinga e me lancei no espaço sem tempo de pegar o pára-quedas. Por incrível que possa parecer, não sofri nenhum arranhão na queda, mas acho que perdi os sentidos por alguns instantes. Acordei no sopé de uma montanha, e estava certo que essa montanha fazia parte das Rochosas. Refugiei-me numa caverna e dormi por algumas horas. Pela manhã pus-me em marcha à procura de alimento, quando fui surpreendido por três homens muito brancos, pequeninos e nus, que fugiram apavorados quando viram Sandor e suas companheiras. Depois disso, sem saber porquê, o

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grande macaco agarrou-me e se pôs a correr em direção a esta pali- çada. Antes disso, vi um gigantesco paquiderme e, antes ainda, um lagarto com mais de vinte metros. Aonde estamos afinal? E o que são aquelas bolas luminosas cheias de anéis que vi no céu? – Estamos numa base de estudos, e aquelas bolas luminosas são mundos com civilizações muito adiantadas – respondeu, Mike. – Lá também há vida selvagem? – Isso não sei responder. Antes de mais nada, que tal dizer teu nome e ocupação na Terra! – Desculpe a falha. Meu nome é Glenn. Sou Físico e trabalho na NASA. Faço parte da equipe do Dr. Nicholas. Nicholas é con- siderado no meio científico como o maior especialista em astro- náutica. Estamos desenvolvendo um projeto em parceria com alguns cientistas franceses, russos e japoneses. Ele está sendo montado em várias fases. – Então deve ser muito importante! – lembrou, Mike. – É um importante projeto, porém diante do que vocês me contaram, cheguei a uma triste conclusão... Imaginem vocês! Primeiro vamos montar uma estação espacial com diversos módulos. Essa montagem está prevista para o ano 2005. Se tudo der certo, tentaremos chegar à Marte em 2010. Se ainda eu estiver vivo, farei parte da tripulação. Quando disse ter chegado a uma triste conclusão, pensei na espaçonave que vos trouxe. Enquanto estamos tentando chegar à um planeta vizinho, os alienígenas cruzam o Cosmos sem nenhuma difi- culdade. Como estamos atrasados! – Quem sabe você não tenha vindo para cá para auxiliá-los de outra forma! – consolou, Mike. – Não entendi? – Acho que doravante será mais fácil para você trabalhar nesse projeto. – Continuo não entendendo!

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– Eu acredito que você antes de voltar, aprenderá alguma coisa nova. Algo que será de extrema valia no mundo científico. Observe esses mundos que nos cercam – acrescentou olhando para o alto. – Deduzo que da Terra ainda eles não foram vistos. Quando você retornar, terá muito que contar. Você é um homem de ciência e deve ser muito observador. Eu sou apenas um piloto e sempre segui ordens sem contestar. O século vinte e um será o século das grandes viagens no espaço! O século da ciência espacial! Quem sabe, não será o século da grande verdade? – Por que você tem tanta certeza que eu voltarei? – Pelo simples fato de você ser um importante Físico. Tenho absoluta convicção de que o trouxeram para torná-lo mais um elo de ligação. Na certa vão instruí-lo na viagem de volta. – Elo de ligação! Não será melhor dizer espionagem? – provo- cou, Glenn. – Para espreitarem eles não precisam de nossa ajuda. Há sécu- los eles estão entre nós; há milênios eles nos ajudam sem que per- cebamos. Seus conhecimentos de astronomia são muito sofisticados. Não se esqueça disso! – Mas então para quê precisam da gente? – Eles não precisam. Nós é que precisamos! O que eles estão tentando, é evitar que haja um novo grande conflito na Terra. Se russos, chineses e americanos não se derem as mãos, fortalecendo a paz, a Terra corre o risco de explodir. Por isso há uma enorme preo- cupação das civilizações próximas a ela. Uma guerra nuclear poderá partir nosso planeta ao meio. O que sobrar dele, vagará perigosamente no espaço. Mike silenciou por alguns segundos e, vendo que Glenn per- manecia calado, mudou novamente de assunto: – Você está com fome?

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– Eu comi um punhado de frutinhas saborosas. Eu gostaria de beber um pouco d’água. Mike estalou os dedos e um menino muito bonito aproximou-se. A criança tinha os fios de cabelo tão dourados, que cintilavam com a claridade; os olhos eram dicrômicos. Glenn ficou impres- sionado com aqueles olhos exóticos, porém resolveu não comentar nada. – Você quer água ou prefere um refresco de limão? – Prefiro água. Se possível fresca. – Por favor, Rafael – pediu Mike à criança – traga-nos um pouco d’água. Você também quer, Eddie? – Prefiro um refresco de limão. O guri retirou-se, voltando alguns minutos após com uma bandeja de prata. Sobre ela havia uma mimosa cabaça transparen- te, uma pequena vasilha de cor esverdeada e três copos em estilo chinês. Mike agradeceu e encheu os copos; dois com água e um com limonada. Glenn, depois de sorver o precioso líquido, perguntou dili- gente: – Quem é esse menino? – É filho de Argel, um de nossos instrutores. É uma criança superdotada e está sendo preparada para viver na Terra. – Jamais vi olhos tão bonitos! – comentou, Glenn. – A íris e a córnea são verdes e a retina é ligeiramente azulada. Nunca vi coisa igual! Quando ele for para a Terra levará essas duas pedras pre- ciosas? – Quem sabe! – Quem lhe contou que ele irá para a Terra? – O pai. Ele disse também, que um dirigente muito impor- tante da Via Láctea irá para a Terra brevemente. Acho que haverá muitas mudanças em nosso planeta.

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– Queira Deus que isso aconteça. Faz muito tempo que você está aqui? – Fomos trazidos no final dos anos sessenta. Por coincidência, completei quarenta e dois anos ao chegar. – Espere um momento!!! Se você chegou aqui no fim dos anos sessenta, e estamos agora na Terra no final dos anos noventa, como você está com essa aparência? Você parece mais jovem do que eu! Por acaso também existe aqui a fonte da juventude? – Como vivemos provisoriamente num plano de paz e esta- mos sendo preparados para voltar, nossas matérias estão livres da velhice. Além de rejuvenescer as células, essa água que você acabou de sorver de um só gole é um tipo de elixir que elimina qualquer vírus ou bactéria nociva. Sem doenças, não envelhecemos. Aqui só perdem o viço os naturais e as feras. – Por que eles perdem o vigor? Por acaso eles bebem um líquido diferente? – Sem querer você adivinhou. Essa água que você acabou de beber, vem de Milquíades – disse Mike, apontando com o dedo indi- cador aquele corpo celeste brilhante que causou admiração à Glenn. – Lá nada envelhece. Glenn insistiu: – E quanto a Rafael? Será sempre um menino? – No tempo em que permanecer por aqui será menino, mas quando for necessário passar para outro ambiente viverá de acordo com as características do novo local. Repare que onde estamos não há insetos nem pequenas aves. – E o que isso significa? – Significa que este é um mundo diferente da Terra. Cada plano tem formas de vida diferente. – Você não deixou família por lá? Não sente saudades de ninguém?

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– Claro que sinto saudades! Recentemente fui visitá-los. Eles pressentiram a minha presença, porém não me viram. Katty casou-se depois de quatros anos de meu desaparecimento. Meus dois filhos também já estão casados. Coitadinha da Katty! Atraente como era, até que esperou muito tempo para se unir novamente. – Um fato continua me intrigando. Vocês têm noção de como chegaram, entretanto esse não é meu caso. Passei aparentemente para uma outra vida, ou sei lá, outra dimensão, todavia continuo sem saber o que realmente houve. É absurdo imaginar que vim para cá num passe de mágica. Vocês sabem como vieram e, os demais, presumo que também saibam. Quem poderá esclarecer o que houve comigo? Mike alisou o rosto com as duas mãos e arriscou: – Imagino que a resposta esteja no teu passado. – No meu passado!? Ora, não existe nada de especial no meu passado! Fui uma criança como tantas outras e me casei aos trinta e um anos. Formei-me em física e me dediquei a projetos espaciais. O que minha vida tem de especial? – Não me referi a tua vida atual. Quando eu cheguei racio- cinava da mesma maneira. O nosso passado é muito importante. É dele que estou falando. – A que vidas você está se referindo? – Às muitas vidas que nós já tivemos. Quando animamos um corpo, achamos que a morte é o fim e que tudo desaparece com ela. Não é verdade! Renascemos novamente em outras condições. Nós fazemos parte de uma grande família. Para vivermos definitivamente entre irmãos mais evoluídos, temos que transpor inúmeros obstá- culos. Encheu os pulmões e prosseguiu: –Em uma de suas palestras, Argel afirmou que não há melhor lugar para progredir espiritualmente do que entre criaturas ingênuas,

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pois elas nesse estado são extremamente dóceis e amorosas. Estamos aprendendo com elas coisas muito importantes. Como Glenn não dava sinais de interrompê-lo, completou: – No momento, a única coisa que me causa temor é retornar num novo corpo e me esquecer deste lugar maravilhoso. – E quanto a mim? – insistiu, Glenn. – Vamos procurar saber como você veio. Sabendo disso tudo será mais fácil. Que eu saiba, daqui não partiu nenhuma missão com esse propósito. – Quem poderá dar essa informação? – Quem sabe a Adele do centro de controle, possa dizer algo! – E onde está esse controle? – Lá! – apontou Eddie em direção a um galpão semelhante a uma pirâmide.

Capítulo III Descobrindo o passado

o período em que procuravam saber quem era o res- ponsável pela vinda de Glenn, Asthor observava tudo num painel luminoso dentro da espaçonave. Além de

apreciar atentamente, sentiu as preocupações do Físico. Por diversas vezes sorriu com complacência. – Chegou o momento de nos apresentarmos – disse a Nesthor que ficara no comando da espaçonave em sua ausência. – Antes de levá-lo de volta vamos dar um passeio pela Via Láctea. Quero mostrar-lhe um dos Doze Mundos Confederados e, se sobrar um pouco de tempo, vou levá-lo à presença de Moisés, em Phantior. Antes de ser Aarão, ele era conselheiro em Phantior. Acho que ele ficará encantado em rever Moisés.

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Alguns minutos após, Asthor pisava em solo firme. Com um aspecto soberbo, dirigiu-se à sala central do edifício sede. Agora sua aparência era outra. Tinha uma leve proteção sobre o peito desnudo, e fina tiara de seda azul cobria a cintura descendo por suas pernas até tocar levemente suas sandálias deli- cadamente trançadas e presas à altura do tornozelo. Seu rosto era por demais belo, e a pele parecia ter sido retocada com uma camada de bronze diluído. A testa era larga, os olhos eram da cor da amên- doa madura, e sua cabeça exibia uma rica cabeleira presa atrás por um largo alfinete. Uma aura azulada envolvia seu corpo e, de quando em quando, lampejos cintilavam à sua volta como purpurina. Durante sua passagem, até os grandes macacos pararam para vê-lo e admirá-lo. O responsável pela colônia chamava-se Bracko e era um velho conhecido de Asthor. Cumprimentaram-se na entrada e cami- nharam lado a lado em direção a uma confortável sala. Um rico tapete de terciopelo com desenhos de estrelas, forrava o chão do com- partimento. Numa das paredes havia um quadro com um desenho de um astro parecido com o sol da Terra. Parecia uma bola de fogo purpúrea. Bracko iniciou o diálogo. – Quanto tempo não nos vemos, caro Asthor. A que devo a visita? – Há muito tempo desejo visitá-lo, meu caro Bracko, mas os problemas havidos na Terra têm impedido minha vinda. Parece-me que os homens não conseguem viver em paz. Nos anos quarenta explodiram duas bombas nucleares que mataram mais de 200.000 pessoas. Outras tantas ficaram contaminadas pela radiotividade e, hoje se arrastam pelo chão, como miseráveis. Quando tudo pare- cia ter terminado, começaram uma corrida armamentista que parece não ter fim. Todas as grandes nações já têm no arsenal de guerra,

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bombas atômicas e bombas de hidrogênio. Os Confederados estão preocupados com os testes nucleares e estão querendo intervir dire- tamente. Isso Deus não permite. Recentemente traçamos um plano em conjunto, e vamos começar a pô-lo em prática. Para isso rap- tamos um velho companheiro de jornada que estava encarnado no planeta, e o trouxemos para cá. Ele é um importante cientista e muito amigo do atual presidente dos Estados Unidos. Vamos tentar con- vencer as autoridades da Terra para acabarem com essas expe- riências que não levam a nada. A Terra corre um sério risco de partir-se ao meio, e sepultará toda a Humanidade. Poderá ocorrer com ela, o que ocorreu com o planeta Janos. Você tem ciência, meu caro Bracko, que todos terráqueos que aqui estão participarão dessa em- preitada? – Eu vim para cá para treiná-los. Inspirou levemente e rematou: – Há pilotos de aviões, técnicos especializados em armamen- tos, homens de ciência, artistas e desportistas. – Não há administradores de verbas públicas? Políticos? Precisamos também atuar nesse meio. – Temos três hábeis políticos entre eles. – Quantas mulheres foram trazidas? – Há quase uma centena delas. Deixe-me ver – disse consul- tando uma pequena agenda. – Sete biólogas, quatro médicas, nove cientistas, dezoito professoras, duas paranormais especialistas em ciências ocultas, cinco astronautas, sendo quatro russas e uma ameri- cana, vinte e cinco desportistas e várias donas de casa. Todas são solteiras ou mulheres casadas sem filhos. É muito difícil trabalhar com mamães. Dentro em breve elas retornarão junto com os homens. Existem cinco homens ligados a uma estranha seita que não querem colaborar. Foram trazidos por acaso. A comandante Zarah sobre- voava o Mar do Mediterrâneo quando viu afundar um barco. Eles são

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os sobreviventes. São todos muçulmanos. Não admitem outra filoso- fia, a não ser a filosofia de Maomé. Vamos devolvê-los com a memó- ria apagada. – Maomé fez um bom serviço naquela área. Você sabe quem é o meu protegido? Nada mais, nada menos, que Aarão dos hebreus. Está sob minha proteção desde a época dos faraós. Antes ainda. – Ele sabe que foi irmão de Moisés?

– Ainda não. – E o quê ele faz hoje na Terra? – É Físico. Trabalha num centro espacial. – Na NASA?

– Exatamente. Estão desenvolvendo um projeto para chegar à Marte. Veja como estão atrasados! – enfatizou com pesar. – Enquanto os demais povos do Sistema Solar já cruzam os céus sem nenhuma dificuldade, eles ainda se arrastam mandando máquinas que demoram dezenas de anos terrestres para vencer pequenas distâncias. Sem nossa ajuda, avançarão como lesmas. – A Confederação dos Doze Mundos está sempre enviando sinais. Por que até hoje eles procuram ignorá-los? Você tem idéia por que agem dessa forma? – Há uma casta privilegiada que não permite que esses sinais cheguem ao conhecimento do povo. Afirmam que haveria uma histeria geral. Até os filmes de nossas naves são vistos como meras falsifica- ções. Quando enviamos nossos robôs, eles são comparados a pequenos monstros, não obstante andarem e parecerem humanos. Se nos apre- sentamos, ficam tão apavorados que é difícil iniciar ou manter um diálogo. Os menos cépticos e os mais preparados, quando contam o que viram, são ridicularizados publicamente. O que é preciso fazer para demonstrar a essas pobres mentes que o Universo pulsa cheio de vida? Será que será preciso pousar nos jardins da Casa Branca? Ou quem sabe na Praça São Pedro, junto ao Vaticano?

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– Caso haja hostilidade, a quem foi confiada a missão de in- tervir? – Essa tarefa foi confiada ao corpo de elite de Agali. Antes de atingirmos o solo, prenúncios cabalísticos serão espalhados por todo o céu. Milhares de pequenas aeronaves aparecerão aos olhos de todos. As Naves Mães permanecerão afastadas até que haja condi- ções de pouso. Não podemos correr riscos. As forças de Agali serão as primeiras. Os comandos de Antari e Almeno a seguirão em curtos intervalos. – E os Etéreos?11 Também colaborarão? – Isso já vem sendo feito há décadas. Esse trabalho tem sido feito sistematicamente por Mensageiros da Esfera da Caridade. Aliás, o meu protegido vivia as delícias de um lar semelhante quando se ofereceu para encarnar no mundo científico. Antes de levá-lo de volta, pretendo colocá-lo a par do que está acontecendo. Aonde ele está agora? Por favor, localize-o e traga-o à minha presença. – É para já. Vou deixá-los a sós. Que a Paz do Divino Manda- tário esteja convosco. – Assim seja!

iante de Asthor, Glenn, já acostumado com as sur- presas, limitou-se a observar e permaneceu calado. Ao contrário dele, o extraterrestre sorriu, esten-

dendo a mão em cumprimento. – Sou Asthor, um extraterrestre de Rodekara. Meu mundo está localizado entre Altair12 e Deneb.13

11 Mundos de Espíritos elevados. 12 Estrela branca de 1a. grandeza, a mais brilhante da Constelação da Águia. 13 A estrela mais brilhante da Constelação do Cisne.

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– Eu sou Glenn, um mísero terráqueo – alardeou com bom humor, apertando a mão que lhe era oferecida. Apesar de alto e robusto, Glenn se sentiu pequeno diante do novo personagem. Captando seus pensamentos, Asthor sorriu e inqui- riu com suavidade. – Como se sente? – Como um cão vadio solto num labirinto! Mas estou me acostumando! – Então permita-me ajudá-lo. Não obstante possa parecer absur- do o que eu vou dizer... – Para mim nada é absurdo! – interrompeu, Glenn. – Estou pre- parado para tudo. – Muito bem. Ouça-me com atenção, pois serei muito direto. Embora meu mundo faça parte da Via Láctea, é indispensável que a ciência da Terra progrida muito para chegar até ele. De acordo com o vosso calendário gregoriano, seriam necessários muitos anos para vencer a distância que há entre o meu e o seu mundo. Se hoje vocês lançassem uma espaçonave tripulada em nossa direção, chegariam somente cadáveres, porém, se nada catastrófico ocorrer com a Terra nos próximos anos, vocês conseguirão superar essas distâncias. Como para nós já não existem fronteiras, visitamos seu planeta e demais astros sem nenhuma dificuldade. Há muitos e muitos anos visitamos a Terra e acompanhamos os progressos da humanidade. Prendeu o ar por alguns instantes e indagou sorridente: – Você é capaz de acreditar que estivemos juntos em várias dessas ocasiões? Glenn encarou Asthor e pensou: – Meu Deus! Outro maluco! Asthor que podia ler a mente de Glenn como um livro aberto, comentou sorrindo.

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– Talvez pareça coisa de maluco, todavia estivemos lado a lado em diversas oportunidades. Glenn desafiou meio descontrolado: – Isso só pode ser um complô!!! Vocês estão se empenhando em me deixar louco! Mas não vão conseguir! – Calma, homem! Ninguém está querendo que você enlou- queça. Antes de mais nada, quero lembrá-lo que nosso corpo varia de acordo com o local em que vivemos. – E por que então conservo os mesmos traços? – observou de forma provocadora. – Porque você não morreu, ora! Você não teve o ciclo de vida material interrompido. Você apenas foi deslocado para um plano com outras características. – E como isso foi possível? – Não lhe disse antes que podemos viajar pelo espaço sem barreiras? – E o que tem isso a ver comigo? – Desculpe. Acho que não estou me fazendo entender. – Então tente ser mais objetivo! Vocês já estão me exaspe- rando! – Vou tentar ser mais claro possível. Olhe para aquela nave interestelar que brilha como um pequeno planeta cintilante. Você veio conosco dentro dela. Você foi induzido para levantar vôo e, quando sobrevoava uma região despovoada, nos aproximamos e trouxemo-lo para dentro. Seu avião não sofreu nenhuma avaria. Você se antecipou e se lançou no espaço. – Mas se eu me atirei sem pára-quedas, como estou aqui.? – Amortecemos a queda com nosso sistema flutuante e, ao mesmo tempo, paralisamos sua memória. Na realidade você desapa- receu dos radares perto das Montanhas Rochosas. Trouxe-mo-lo para dentro ainda inconsciente, e o transportamos para este local.

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– Para quê foi montado esse cenário? – Quisemos testar suas reações. – Isto significa que vocês vão me levar de volta são e salvo? – Isso dependerá de você. – De mim? – Claro! Jamais o devolveremos contra vontade. – Desculpe-me amigo, mas acho que você está querendo brin- car comigo. – Quando você ver algumas coisas, compreenderá o que estou falando. – O quê há de tão especial para que eu não queira voltar? – perguntou com ironia. – Até o momento vi uns poucos selvagens, um antepassado de nossas lagartixas e alguns pilotos também se- qüestrados. Ah! Também vi alguns astros no céu. Belíssimos por sinal! Sentindo pelo semblante de Asthor que havia se excedido, remendou inquirindo humildemente: – Você tem idéia do que sejam? – Aqueles astros são mundos de paz onde habitam alguns grandes Espíritos. Naquele cercado por brilhantes anéis, vive Belchior, um dos poucos dirigentes que têm o privilégio de falar com o Ser Su- premo. – E quem é esse Ser Supremo? – Vocês O evocam muito na Terra, sobretudo quando estão doentes ou em dificuldades financeiras. Quando você pilotava o avião e sentiu o perigo de perto, era Nele que você pensava. – Já entendi! – No Espaço Sideral Ele tem diversos nomes. Sapiente é um deles. Pai Supremo é outro. Eu não tenho nenhuma preferência, somente respeito. Eu me esforço por ser merecedor de Seu amor infindo.

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– Mas na Terra Ele também é adorado! – Não, meu caro! Na Terra Ele é analisado de forma errada. Até nos ambientes onde impera o crime Ele é evocado hipocri- tamente. O que adianta lembrar Dele após um ato de barbarismo! Isso é querer fazer Dele um comparsa! É querer enganá-Lo! Ele nunca foi e nunca será cúmplice de um roubo ou assassinato. Deus é comparado pela humanidade a um simples homem. Estão tão longe da verdade, que acham que Jesus é Deus. Pobres infelizes! Como é possível imaginar Deus imolado numa cruz? Quanta estupidez! Quanta insensatez! Quanta ignorância! Deus é tão grandioso que no vocabulário terrestre não existem palavras para analisá-Lo. Ele deve- ria ser evocado de outra forma. Com mais amor e menos hipocrisia. Não lhe parece também assim? Afinal você já foi um importante emis- sário Dele – completou em tom provocativo. – Eu!!! Você está querendo brincar comigo? – Por que haveria de estar brincado? Isso é um assunto muito sério. Você é que está com a mente bloqueada! – Mas do que você está falando? – Quando somos prisioneiros de um corpo muito pesado, não temos noção do passado. Essa tua atual proteção é muito imperfeita! – Cada vez entendo menos! A quê raio de proteção você está se referindo? – Estou me referindo ao teu corpo físico. A essa tua proteção que faz do Espírito um prisioneiro. Todos os habitantes da Terra, sem exceção, são prisioneiros de um corpo imperfeito. Existem mundos em que o ser não precisa, sequer, de leve proteção. Alguns deles se encontram perto do planeta Terra. Mais perto do que vocês imaginam. Dentro da Via Láctea há milhares de mundos em que o ser não sente os rigores do calor, nem do frio. Há vida em todos os lugares. Todos os astros do Sistema Solar são habitados, inclusive a lua e o sol, só que seus habitantes são invisíveis a olhos humanos. Vivem numa

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dimensão diferente. Por isso suas sondas são incapazes de filmá-los. É uma outra forma de vida. Ela difere de plano para plano. Umas são leves, outras pesadas. Um dia o ser humano também não necessitará de uma proteção grosseira. Tome nota disso. À cada mudança de corpo, o Espírito armazena conhecimentos e se depura cada vez mais. Vai ficando mais leve. Nosso verdadeiro e imortal corpo é imaterial e, na proporção que evoluímos, ele se torna cada vez mais sutil. A parte material apodrece em cada período de existência, mas o Espírito sobrevive e é perpétuo. Acho que estou me alongando demais nesse assunto. Voltemos ao presente. – Gostaria de discutir esse tema em ocasião oportuna – observou, Glenn. – Está bem! Oportunamente voltaremos a esse assunto. Agora vamos fazer um breve relato de uma de suas mais significativas passagens pela Terra. Voltemos ao tempo dos faraós e falemos um pouco dos hebreus que eram prisioneiros dos egípcios. Para impressionar um pouco, ele transformou a narrativa num conto das mil e uma noites. – De um lado, os anciães hebreus pregavam a união e pediam proteção e liberdade aos seus deuses; do outro, homens e mulheres se vendiam em troca de favores. Sensibilizado pelas súplicas dos anciães, Deus resolveu intervir e, mandou à Terra, dois excelentes filhos. Um era muito eloqüente e se tornou um magnífico orador; o outro era forte de caráter e se transformou, depois de ser pastor de ovelhas, no Patriarca tanto esperado. Preso à narração, Glenn saboreava as palavras. – Rafael, Gabriel, Miguel e Uriel, os quatro grandes anjos católicos, ficaram responsáveis pelo nascimento do Patriarca. Enquanto dormia, colocaram no ventre de uma jovem pastora sem máculas, a preciosa semente da vida. Moisés veio à Terra, da mesma forma que Jesus. A negação desse princípio, é ignorância popular. As forças do

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mal procuraram de todas as formas impedir o nascimento. O faraó, sucumbindo aos maus conselhos de seus conselheiros e, olvidando que também era pai, deu ordem para eliminar todos os varões recém-nascidos. A mãe de Moisés, inspirada pelos quatro anjos, levou o filho para perto da filha do faraó. Impressionada pela graça da crian- ça, a princesa adotou-o como filho legítimo. – Mas essa é uma história narrada no Velho Testamento! Essa é a história de Moisés, o Patriarca hebreu! – Isso mesmo! Essa é a história de seu irmão de sangue. Glenn arregalou os olhos, e disparou quase aos gritos: – História de meu irmão?!! Você está se divertindo comigo?!! – Por que iria brincar diante de um assunto tão sério? Você é que está se esforçando para não acreditar! Você foi Aarão, irmão e braço direito de Moisés. – Meu Deus! Jure que não está inventando! Quer dizer então que é sério? Eu fui Aarão? Um hebreu? Isso não deixa de ser fantás- tico! Como um homem como ele pode ser hoje um cientista de pouca expressão? Isso é muito difícil de acreditar! – Você deve saber que para Deus todas as vidas têm um significado, não é? Tudo que existe no Universo são limalhas de um TODO. Nós fazemos parte desse conjunto de limalhas. Nesse com- plexo de harmonia há milhares de Mensageiros que já atingiram um alto estágio de evolução. Eles são os responsáveis pelas mudan- ças que ocorrem nas diversas civilizações. De quando em quando um deles encarna na Terra e ajuda a humanidade a progredir. Jesus, Moisés e Maomé foram três exemplos. Você está somente abaixo deles. – Não posso concordar. Sou um simples professor de Física. Há centenas de homens da Ciência mais preparados do que eu. – A modéstia é uma virtude, e poucos homens a possuem. Você a tem. Eu sei que você está trabalhando em cima de um impor-

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tante projeto para encurtar as distâncias de vôo. Também não tem se esquivado quando é interrogado se há vida no espaço. Recentemente você defendeu uma pessoa que disse ter viajado com alienígenas, e por isso sentiu na pele o escárnio do mundo científico. Sabemos os problemas que causam essas afirmações. – Isso é correto. Eu venho insistindo junto à Aeronáutica para voltarem com o Projeto Livro Azul.14. Eu era mocinho quando a Força Aérea resolveu encerrar as pesquisas. Muitos depoimentos valiosos foram colhidos naquela época. É uma pena que não foram analisados com seriedade. Quando voltar vou encaminhar uma carta ao Congresso pedindo sua reabertura. – Por que você não fala diretamente com o Presidente? Ele não é seu amigo? – Puxa! Você sabe tudo a meu respeito! – Só o necessário, Glenn! Só o necessário! – Não é o que está me parecendo. – Acho que agora é um bom momento para falarmos daquelas instalações no Álamo! Você prefere que eu diga Álamo, Nevada, ou Área 51? – Tanto faz! Eu nunca estive naquela área. Sei somente que é uma área muito vigiada. Comenta-se nos meios científicos que estão tentando construir alguns OVNIs. Recentemente ouvi de um colega que já estão tendo um relativo sucesso. Ele me disse que já cons- truíram uma aeronave que sobe verticalmente e se movimenta para todos os lados, só que não conseguem movimentos rápidos. Parece-me que o problema está no combustível.

– Por acaso você sabe que esse projeto está sendo desen- volvido com o auxílio de uma mente alienígena? Que dentro dessas

14 Projeto desenvolvido pela Aeronáutica dos EUA para estudar aparições de OVNIs.

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instalações está trabalhando um extraterrestre capturado num acidente ocorrido no Novo México? – Esse acidente ocorreu em 1947, exatamente o ano em que eu nasci. Parece-me que não houve sobreviventes. Pelo menos foi o que se comentou na época. Anos mais tarde eu li um artigo confidencial, e nele dizia que só encontraram um humanóide carbonizado pelo fogo. Isso que você está me dizendo não será um boato? – Não é boato, não! As autoridades militares procuraram de todas as formas abafar o caso. Os restos da aeronave foram levados para um lugar secreto junto com um sobrevivente. Os outros dois tripulantes morreram carbonizados. Depois desse acidente come- çaram os projetos para instalação de uma base ultra-secreta. Esses alienígenas vieram do planeta Janos, um planeta reduzido à cinzas em virtude de uma grande guerra. Cerca de um milhão de sobre- viventes estão à procura de um novo lar. Você irá comigo à Janos e verá o que restou desse planeta. Esses três tripulantes fugiram antes do grande caos. Existem centenas deles vagando no espaço. Muitos já fazem parte da população da Terra. Esse sobrevivente chama-se Zoz, e é um grande cientista. Ele está em condições de auxiliá-los sobremaneira. No entretanto, nós não vamos permitir que uma ciência mais adiantada seja usada para oprimir alguns povos. Para conhecer alguns de nossos segredos, é necessário que haja paz entre os homens. – Então não teremos jamais, OVNIs! Eu não acredito na paz dos homens! – Não seja tão pessimista. Nem tudo está perdido. Daqui vamos pressionar alguns maus dirigentes. Conto com tua ajuda. – Como posso ajudar? Eu não tenho poder de decisão. – Você tem muito prestígio no meio científico e é amigo do Presidente. Ele vai te ouvir. De uma coisa esteja certo, vosso arsenal de guerra é inútil diante de nossos instrumentos. Não ignore esse fato.

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– Interessante! Você fala como se estivesse me advertindo. Eu sou contra as guerras. Sou um cientista amante da paz. Se puder ajudar de alguma maneira, farei tudo que estiver ao meu alcance. – É isso que eu queria ouvir. – Posso desviar de assunto? – Claro! – Quando e que argumento usarei quando voltar? Como expli- carei aonde estive. – Vamos forjar um pequeno acidente e mandá-lo de volta. Até um novo contato, você terá apenas algumas lembranças do que ocorreu. – E como nos entenderemos depois disto? – Através de um minúsculo aparelho transmissor. Quando chegar a hora você saberá onde ele está. – Uma coisa está me intrigando. Presumo que já se passaram mais de vinte e quatro horas de meu desaparecimento. Enquanto estou aqui, estou morto na Terra. E se nesse intervalo de tempo fui encontrado por uma missão de salvamento? – Como encontrado? Por enquanto não houve acidente nenhum! – Que coisa insensata acabei de dizer! Faça de conta que eu não disse nada. Antes de voltar gostaria de matar minha curiosidade. – Vamos lá! – No lugar que estamos há um grupo de homens e mulheres trazidos à força de várias regiões da Terra. O que vai acontecer com eles? Qual será o destino desses indígenas? Acho que diante dos perigos existentes na selva eles não têm chances de sobre- viver. – Vamos por partes. Concordo que os homens e mulheres foram trazidos à força, porém foram retirados em seu próprio benefício. Não tenho como te explicar isso agora. Todos voltarão.

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Quanto aos silvícolas, morrerão e renascerão várias vezes até serem civilizados. Todos nós começamos assim. Pouco a pouco eles desen- volverão seus meios de defesa. O mesmo aconteceu com os primei- ros habitantes da Terra. Deus jamais abandona os seus filhos. Pense nisso. A Terceira Revelação, um conjunto de documentos valiosos, explica isso com riqueza de detalhes. – Terceira Revelação?!! Que Terceira Revelação é essa? – A Terceira Revelação explica com riqueza de detalhes, como os homens e os animais se espalharam pela Terra. Todos os animais, selvagens ou não, têm o instinto de sobrevivência e car- regam uma alma diferente da alma dos seres humanos. Quando expi- ram, morre o corpo, todavia a chama interna que os conduz, se mantém viva. Essa chama, embora diferente da dos humanos, passa imediatamente para um novo corpo, às vezes semelhante. Tudo que se move no Universo tem vida e jamais morre em definitivo. Os vegetais, assim como os minerais, têm um princípio de vida idên- tico ao nosso. Podemos até considerá-los irmãos menos evoluídos. Os vermes e insetos também evoluem. Os seus colegas de labora- tório um dia deixarão de fazer experiências com cobaias, porque se darão conta que esses bichinhos indefesos são irmãos em fase evo- lutiva. – Você está querendo dizer que esses bichos se transformarão um dia em seres humanos? – Não! Por enquanto isso não ocorre! Irracionais jamais serão racionais, a não ser que Deus resolva o contrário. Eles somente mudam de casa. – De casa?!! – Eu quis dizer que eles ocupam diversos corpos. Casas nesse caso são corpos. Vou te dar um exemplo: as almas das feras, essas mesmas que você acabou de ver, habitarão um dia outros corpos. Um

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desses mamutes será um dia um cachorrinho de uma madame da alta sociedade. Pode acreditar em mim. Confuso com o que acabara de ouvir, Glenn limitou-se a dizer meio sem graça: – Não precisa ser madame para ter um cachorrinho. Nós temos uma cadelinha da raça poodle. É toda branquinha e chama-se Dolly. Queremo-la como se fosse um membro da família. – E é! Essas criaturas, fiéis e companheiras, são capazes de morrer por nós. Elas têm dentro si, a chama do verdadeiro amor, aquele ainda desconhecido pelos seres humanos. Eu tenho um esquilo como mascote que me acompanha há mais de um milênio terrestre. Ao meu lado, sempre permanecerá jovem. Esses grandes lagartos também se transformarão um dia em animais domésticos. Não te parece justo que isso ocorra? – Tem razão. Estou passando a entender como são sábias as decisões de Deus. Nada se perde, tudo se transforma! – Exatamente. Nada se perde e tudo se transforma. Que tal lutarmos juntos para transformar a Terra num mundo melhor? – Continuo insistindo que não sou nada. Mas vamos lá! Qual o papel que desempenharei? – Você será nosso elo de ligação. Não se impressione, sabe- mos das dificuldades que você terá de enfrentar, todavia confiamos em suas habilidades. Você é uma pessoa qualificada para convencer os políticos. –Você está se esquecendo Asthor, de que há na Terra homens mais poderosos que os políticos? – Você está se referindo aos padres? – Justamente. Eu presumo que o quê vocês estão planejando não seja do agrado da maior das religiões do mundo ocidental. A Igreja Católica desde a sua fundação tem sabotado sistematicamente todas idéias e descobertas científicas. Note bem! Eu não tenho nada

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contra as religiões, porém entendo que algumas são fortes porque existe muita ignorância no mundo. O que você acha se de repente eles tiverem que aceitar algumas novas regras? Se, por exemplo, eles tiverem que explicar aos fiéis que não existe o Diabo! Ca pra nós, você acha que ele existe? – O Diabo é uma crendice. Essa crendice foi criada pelos primeiros dirigentes cristãos para espalhar o medo e fortalecer uma Igreja construída com fins obscuros. É claro que ele não existe! Existe sim, gente ruim que pode ser confundida com o Diabo. Deus dá a todos o livre arbítrio, e isso às vezes leva certos irmãos a trilhar por maus caminhos. Nos mundos em evolução há uma luta constante entre bons e maus, mas o bem sempre triunfará sobre o mal, nem que isso dure muito. O mal existe para que todos aprendam a valorizar o bem. Mas por que você teme mais os padres? – Porque os políticos são eleitos por períodos preesta- belecidos, entretanto os padres e os cardeais permanecem no cargo até morrer. Como vocês enfrentarão essa casta privilegiada? Essas pessoas tão preparadas? – Você está se esquecendo Glenn, de que essas pessoas também têm seus limites? Estamos trabalhando nos dois lados, meu amigo. No material e no espiritual. – Por que vocês não vão direto ao âmago da questão elimi- nando de vez o problema? – Por causa da inexorável Lei do Livre Arbítrio. Se des- truíssemos ou modificássemos as Leis, por que haveria o Universo? Se Deus quisesse criar tudo inicialmente perfeito, não haveria razão de sermos o que somos. Não se preocupe com os padres. Desde o início do século que ora se está encerrando na Terra, estão tra- balhando nesse meio, irmãos de nossa extrema confiança. Dentro em breve haverá significativas reformulações nos quadros que coman- dam as falsas doutrinas. Quando você voltar, observe e verá que isso

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já vem sendo feito. Já foi preparado um novo Regente para a Terra. O único grande problema que terá de enfrentar, é o problema da fome. Parou por uns instantes, e disse com grave entonação: – Que mundo é esse, cujos progressos materiais são imensos, mas no seio das riquezas acumuladas pode-se ainda morrer de pri- vações e de miséria? Que mundo é esse, em que pessoas morrem de fome enquanto as sementes apodrecem nos celeiros? Que mundo é esse, que não passa um dia sem guerras? As dissidências coletivas são preparadas por uma camada social hereditária e endógama que deverá ser retirada e espalhada em mundos primitivos. Em mundos de sofrimento. Ali apreenderão o verdadeiro sentido do amor e da caridade. Não é justo, que as fartas e inesgotáveis riquezas existentes no planeta estejam concentradas em meia dúzia de mãos. Para surpresa de Asthor, Glenn, perguntou: – Você tem idéia de quantas vezes eu vim à Terra depois de ter sido Aarão? – Por que essa pergunta? – Ora! – disparou, Glenn. – Porque quero saber onde fiquei durante esse tempo todo! – Você teve várias passagens. Quando você retornar para o mundo espiritual lembrará de todas elas. – Bem, pelo menos isso é reconfortante! – conformou-se, Glenn. – Muito reconfortante! – emendou Asthor, com um sorriso maroto nos lábios. – Fazendo um ar de mistério completou: a verdade Glenn, é comparável às gotas de orvalho que balançam na extremidade de um ramo; enquanto aí ficam suspensas, brilham como puros diamantes aos raios feéricos do sol; desde, porém, que tocam o chão, confundem-se com todas as impurezas do solo....

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Capítulo IV Diante de Moisés

epois de se despedirem de Bracko, entraram na espaçonave que já estava preparada para recebê-los. Duas aberturas, iguais às existentes no convés dos

navios, foram fechadas assim que pisaram o interior do reluzente aparelho. As portas que levavam ao exterior pareciam muito com as escotilhas dos submarinos terrestres, só que eram maiores e do feitio de um ovo em pé. Glenn, já acostumado com as novidades, nada comentou. Observava tudo com muita atenção. Somente animou-se a falar quan- do divisou por um vidro transparente seu aeroplano. Visto de longe parecia não ter um único arranhão. Então era verdade que fora arras- tado para dentro e que o que havia visto não era um simples jogo de cena? – Santo Deus! – bradou, franzindo a testa. – Mas que absurdo é esse? Vi meu avião se espatifar no solo, e agora o estou vendo como se não tivesse alçado vôo! Sua aparência é ainda mais bonita! Como isso é possível? Ao contrário de Glenn, Asthor explicou mansamente: – Teu avião jamais caiu ao solo. Ele foi transportado suave- mente para o interior da espaçonave. – Mas para que foi criado esse cenário? Não seria mais fácil trazer-me para dentro e depois explicar o que houve? – Esse era o plano original, todavia você nos surpreendeu com teu gesto audacioso. – Mas então o que vi não era real? – Tudo foi real, só a queda do avião foi ilusória. Parou por uns instantes e reiniciou mudando o tema da con- versa.

D

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– Como você pôde atestar, há poucos instante estivemos num mundo em formação. Vamos agora em direção a um astro de muita luz. Terminaremos nossa viagem observando do alto o planeta Janos, um mundo arrasado pela estupidez. – E para que isso me servirá? Não tomando caso da pergunta, disse tranqüilo: – Você verá num, a filosofia do amor e, noutro, a filosofia da insensatez. Glenn, ainda não convencido, retornou a um assunto já dado por terminado. – E quanto àqueles pilotos que conheci? Permanecerão naquele mundo primitivo por muito tempo? – Pare de se preocupar com isso. Dentro em breve terão novas missões. Os que puderem retornar à Terra, retornarão, embora isso não seja do agrado de alguns. – Desde quando voltar ao lar é desagradável? – insistiu, Glenn. – Porque depois de ver a paz que há por aqui, eles preferem ignorar o passado e caminhar em direção ao futuro. Acho que você também agiria dessa forma, não é mesmo? – Não sei não! Sou muito apegado à minha família. – E eles também são, ou você imagina que não haja entre eles pais carinhosos? O que acontece é que eles passam a ter noção de outra vida. Para que ser prisioneiro da carne quando podem se liber- tar em outros mundos? Vamos passear um pouco e você compreen- derá por que muitos preferem ficar. Sente-se defronte àquele painel e verá quantas coisas diferentes há para ver. Bocejou ligeiramente e completou: – Agradáveis e desagradáveis. – Não será mais um de seus truques? – ousou, Glenn. Asthor mirou-o sorridente e resolveu se fazer de mouco.

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Glenn calou-se e começou admirar a paisagem celeste. Milhões de astros, num movimento imperceptível, pareciam lutar por um espaço. – Vistos de perto são ainda mais bonitos – pensou com êxta- se, o importante Físico. Asthor segurava um sorriso de satisfação. Os demais tripu- lantes ficaram observando um pouco retirados. Diante de um astro gigantesco, quiçá dez mil vezes maior que Júpiter, Glenn não se conteve, e exclamou trocando as palavras: – Deus meu! Agora estou entendendo por que alguns não querem voltar! Não obstante seu vasto conhecimento científico, perguntou com simplicidade: – Que coisa magnífica é aquela, Asthor? Essa quantidade de massa é um planeta? – É! E existem muitos iguais a ele. Vês agora por que não querem voltar! A vida reinante num desses mundos é algo que foge à imaginação de um cérebro humano. São lares de paz e harmonia e, todos seus habitantes, sem exceção, já viveram em lugares idênticos à Terra. Hoje desfrutam de uma vida impossível de ser descrita. – Por que é difícil de ser descrita? – Porque o vocabulário terrestre é muito pobre. Apesar de tentar manter-se calmo, Glenn estava muito agita- do. Sem que ele percebesse, Asthor deu-lhe um passe magnético, devolvendo-lhe o equilíbrio emocional. Já mais tranqüilo, mas ainda um pouco ofegante, Glenn ani- mou-se e indagou: – Vamos aterrizar? Não seremos hostilizados? – Ora, Glenn! Por que haveríamos de ser hostilizados! Ao contrário: seremos recebidos com honras, embora sejamos umas formiguinhas sem rumo certo. Vou te contar algo que parecerá fanta-

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sioso. É tão difícil viver nesse seleto mundo, que quando alguém consegue entrar, os daqui o recepcionam de uma forma extraordi- nariamente festiva. Você não se lembra daquela parábola que fala do camelo? – Qual parábola? – Que é mais fácil passar um camelo por um buraco de agulha, do que um rico adentrar as regiões celestes. Pois é! Acho que o autor queria intimidar os ricos avarentos – frisou Asthor numa forma tão engraçada, que fez rir a todos. – Já ouvi essa parábola, mas desconheço sua autoria. – Sua autoria é atribuída a Jesus, mas me parece que com o correr do tempo ela foi alterada. Parece-me absurdo essa exigência. Se para entrar no céu tivéssemos que passar por um furo tão estreito, ele estaria completamente deserto. Acho que Jesus se referia aos corpos espirituais. Sem matéria. Desta vez, até Glenn sorriu abertamente. – Que tal voltarmos ao presente? Para entrarmos no mundo que estamos vendo, usaremos a chave do amor para sermos bem recebidos. Nada de moedas. Somente amor e caridade. Esses são os ingressos reconhecidos pelos porteiros. Não há outra forma de entrar. – Então não há necessidade de nos identificarmos? – Isto aqui não é a Terra. Eles já nos reconheceram e sabem quem somos. Não se preocupe. Ninguém entra se não for bem-vindo e, ninguém se atreve chegar perto, se não for necessariamente bondoso. Os maus são reconhecidos à distância. Aliás os maus não têm acesso sequer a estas máquinas voadoras. Enquanto não aterrizamos, Nesthor, leve-nos para cima da Faculdade. Vá lentamente. Quero que Glenn grave na memória o cenário que vamos ver. Aquele planeta era tão grande que não havia construções com mais de um andar. Eram verdadeiros palacetes cercados por exuberante

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vegetação. Jardins e mais jardins apareciam formando desenhos com contrastes maravilhosos. Do alto se podiam ver formas humanas se movimentando sem auxílio das pernas. Flutuavam suavemente em várias direções. Alguns tinham uma aura tão brilhante, que pareciam pequenos sóis em movimento. Asthor tinha razão quando dizia que o vocabulário terrestre era muito pobre. Era muito difícil descrever o que estavam vendo. Asthor observou que Glenn tinha os olhos umedecidos. Estava emocionado diante do que via. Notava-se que fazia um grande esforço para não chorar, mas seus olhos, resplandecentes e avermelhados, aca- baram por traí-lo. Agora compreendia porque era doloroso voltar. Zirna, atingida também pela emoção, aproximou-se e osculou leve- mente a face de Glenn. Quebrando o silêncio, Asthor interveio, dizendo: – Estamos sobre um dos maiores estabelecimentos de ensino do Universo. Essa Faculdade recebe alunos de vários mundos de luz. Aqui vêm milhares de Espíritos Iluminados aprimorar os seus conhe- cimentos. Quando terminam suas pesquisas partem levando consigo um diploma muito especial. Digo muito especial, porque ele leva a assinatura do Regente Mor. Glenn, ainda atordoado pelo que via, saiu-se com essa: – Nós cientistas temos que nos curvar diante das evidências. Erich von Däniken15 tem razão quando afirma em seus livros que fomos visitados por outras civilizações do cosmo. Desgraçados são os meus companheiros! Quanto pagariam para ver o que estou ven- do! – Suspirou e exclamou rindo: e olhem que estamos prestes a rea- lizar uma grande conquista! Demonstrando ser também curioso, Asthor, perguntou: – Posso saber que grande conquista é essa?

15 Famoso escritor autor do livro “Eram os deuses astronautas?”

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– A conquista da Lua e de Marte. Como estamos atrasados, meu Deus! Ainda nos engalfinhamos em discussões estéreis sobre se há vida no Universo. Pasmem! Você tem idéia por que há ainda tanto atraso em meu planeta? – É muito simples. Por egoísmo e vaidade. Somente por isso. Os humanos são burros e se preocupam unicamente com riquezas efêmeras e passageiras. Gastam imensas fortunas construindo mísseis e rampas de lançamento, e não são capazes de explorar as riquezas que existem no fundo dos oceanos. Deus lhes deu gratuitamente uma terra maravilhosa para plantio, e eles a estão transformando em desertos. Deu-lhes uma vista extraordinária do Universo, e eles não sabem apreciá-la. Deu-lhes ampla liberdade de ação, e eles não sabem se movimentar. Grave bem as imagens que você está vendo; elas lhe serão muito úteis! – Será que eu me lembrarei do que estou vendo? – Algumas coisas ficarão bem claras em tua mente. Além disso não se esqueça de que vamos manter um contato muito estreito. Deixe-me acrescentar uma coisa que não quis dizer antes. Quando não hou- ver mais perigo de guerra e a paz estiver solidificada em todas as regiões do planeta Terra, colocaremos à disposição de vocês alguns de nossos mais importantes segredos. Aliás esses segredos estão bem detalhados nos dois livros sagrados hindus: o Mahabharata16 e o Ramayana.17 – Quê livros sagrados são esses? Se são livros sagrados, como podem falar sobre espaçonaves? – Esses livros não são essencialmente religiosos. Eles têm um pouco de tudo. Explicam até o sistema de propulsão das espaço-

16 Poema épico indiano, escrito em sânscrito clássico, com cerca de 220.000 versos. 17 Poema épico da Índia com cerca de 24.000 estrofes.

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naves. Nos manuscritos do Profeta Enoque existem observações a respeito. – Enoque não é era pai de Matusalém, avô de Lameque, e bisavô de Noé? – É esse mesmo. Ele passeou pelo cosmo dentro de nossas espaçonaves. Auxiliado por cinco escreventes, ele registrou detalha- damente o que viu nas viagens. Antes de acontecer a Grande Inun- dação, o Dilúvio, ele os deixou com Noé. – Mas a Bíblia Sagrada não relata nada disso! – Pudera! Como os padres iriam contar aos seus fiéis que Enoque passeou dentro de uma espaçonave? Se os exegetas não tivessem alterado as Escrituras Sagradas, isso seria muito fácil. Mas vamos ao que interessa no momento. Grave bem as imagens dessa Faculdade que estamos vendo. – E com quê finalidade? – É que queremos fundar na Terra uma semelhante a essa. Já um pouco mais perto do solo, Glenn pôde atestar que realmente não existia casas com mais de quatro metros de altura. Também não haviam postes nem fios elétricos. Uns poucos veículos eram avistados movendo-se mais ou menos a um metro acima do solo. – Como aqui não existem noites – disse inesperadamente Asthor – não há necessidade de luz artificial. Esses veículos que estamos vendo, movem-se com energia retirada do próprio campo magnético que envolve o globo. – Você também colocará à minha disposição esse segredo? – Quando chegar a hora isso lhe será revelado. Vocês já estão perto de vencer vários obstáculos. Se os cientistas fossem menos cépticos, muitos problemas já estariam resolvidos. Eles só crêem no que vêem. Quando a ciência dos homens se unir à ciência dos aliení- genas, esse campo magnético será “visto” facilmente...

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– Você tem idéia de quantos anos serão necessários para ultra- passarmos distâncias formidáveis sem envelhecimento? – Você quer saber baseado no calendário terrestre, não é? – Isso mesmo. Existe algum segredo para encurtar essas distâncias? – Vocês terão que superar primeiro, o problema das doenças. – Mas o que tem a ver doenças com o quê estou perguntando? – Muito simples. Quando elas tiverem desaparecido do solo terrestre, é sinal que a ciência atingiu um alto estágio, o que lhe permitirá dominar alguns segredos do cosmo. Nos mundos mais adiantados não existem enfermidades, portanto, é necessário que primeiro elas sejam totalmente eliminadas. O envelhecimento está atrelado aos problemas da saúde. Você já pensou o mal que causaria a visita de homens gripados em determinadas regiões do Universo? Você está a par do que aconteceu quando portugueses e espanhóis chegaram à América? Os povos que viviam nas costas brasilei- ras foram muito afetados pela sífilis. O mesmo ocorreu nas costas africanas. Apesar de você ser um experiente cientista, há de concor- dar que um simples resfriado matou milhares de primitivos. Primeiro, o homem atual tem que conhecer profundamente todos os mistérios do corpo humano e como debelar às mais diversas moléstias. Quando isso ocorrer, as portas do Infinito estarão devidamente abertas e franqueadas à Humanidade da Terra. Esse segredo será revelado por último. – Não quero polemizar, mas acho que esse perigo não existe. – Quê perigo? – O perigo das doenças. Os nossos astronautas passam por uma bateria de exames, antes de subir à bordo dos foguetes. São examinados do pés à cabeça. Não há perigo de contaminação.

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– Isso é o que você pensa. Você está se esquecendo de que eles antes de entrarem nos foguetes passam por locais possivelmente contaminados? As roupas poderão levar algum vírus. – Mas vocês também podem ser portadores de algum vírus! Eu não vi você passar por nenhum exame antes de entrar na espaço- nave. E eu, também não posso ser portador de algum vírus? – Não se preocupe com isso – respondeu rindo, Asthor. O mesmo fizeram os demais tripulantes, o que deixou Glenn confuso e encabulado. – Acontece meu caro, que os fachos de luz que fazem o trans- porte do solo para a espaçonave, eliminam qualquer corpo estranho, por mais minúsculo que seja. Nas entradas também existem luzeiros, imperceptíveis a vocês, que impedem a passagem de qualquer vírus ou bactéria nociva. O domínio dessa técnica é que permitirá aos homens, creio que num futuro bem próximo, viajar pelo espaço cós- mico sem causar nenhum mal a qualquer forma de vida. Essas nossas chapas cristalizadas não são enfeites. Elas também ajudam a filtrar o ar que inspiramos. – E quando descermos da espaçonave? Não podemos pegar ou transmitir algum tipo de vírus? – Não se preocupe com isso – repetiu, Asthor. – Estamos num mundo quase que perto da perfeição. Aqui não existe nenhum tipo de vida microscópica hostil. – Que tipo de vegetais são esses? – perguntou ao vento, Glenn. – De tão verdes parecem artificiais. Tudo aqui é lindo e muito atrativo. Como são os habitantes daqui? – Dentro de alguns instantes você passará a vê-los mais de perto. Verá que nenhum se parece com as formas monstruosas e disformes que os humanos gostam de pintar. Para alguns homens, o simples contato das mãos dos alienígenas parece o roçar de um réptil peçonhento e nojento.

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– Como assim? – É costume dos homens dizer que todos os extraterrestres provêm de Marte e, que os marcianos são seres pequeninos, esver- deados, com cabeças ovóides e desproporcionais ao corpo. Eu não sei de onde saiu tamanho disparate! Vocês dizem que o homem foi feito à semelhança de Deus. Se foi feito à semelhança Dele, por que os marcianos, que são muito mais adiantados que os seres humanos, seriam feios? Embora a aparência física seja diversa de plano para plano, as maravilhas que existem no Universo são iguais para todos. Os habitantes deste planeta se parecem muito com os maiores atletas de seu mundo, só que são mais altos e mais atraentes. Não obstante serem mais altos e mais encorpados, nada pesam. Se você experi- mentar pesar um deles, verá que o ponteiro da balança não se moverá um só milímetro. Isso significa elevação espiritual. As mulheres têm em média um metro e oitenta centímetros de altura. Nenhuma tem menos do que isso. – Diga-me uma coisa, Asthor. Todas as formas existentes nos diversos globos são iguais à que você está descrevendo? – Existem milhares de formas. A maioria se pareça conosco. Em Anoide, um mundo mil vezes maior do que o planeta Júpiter, os seres são mais altos e mais belos. Já em Astrid, os habitantes têm uma proteção idêntica aos ursos que habitam as florestas canadenses. Possuem olhos azuis e são bem fortes. Em Aleb, os seres são pequeninos, não possuem cabelos e furos na audição. Os olhos são grandes e a boca quase que imperceptível. Os alebinos possuem uma das ciências mais adiantadas do Universo. Embora para os humanos, essas aparências possam amedrontar, nenhum desses povos é agressivo. Ao contrário dos humanos, são extremamente dóceis. Só querem se comunicar e auxiliar os homens. Alguns desejam mostrar à Humanidade que fazemos parte de uma só família. Como não podem se apresentar abertamente, porque são hostilizados, preferem

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trabalhar em segredo. Existem milhares de extraterrestres vivendo entre a Humanidade da Terra. Digo Humanidade da Terra, porque a Humanidade não está restrita à Terra. Muitos extraterrestres, tanto do sexo masculino, como do sexo feminino, se uniram com homens e mulheres constituindo grandes famílias. Todos seus descendentes têm mente cósmica. Têm mente aberta para os grandes sinais... Essas uniões são muito valiosas e ajudarão a Humanidade a evoluir cada vez mais. Como até agora não foi possível se apresentar abertamente, porque os homens são arredios, medrosos e hostis, eles preferem instruí-los de outras formas. Já que você me perguntou sob formas, esta minha atual aparência, me daria o prêmio de homem mais belo da Terra – disse sem vaidade –, no entretanto, perto dos que vivem neste planeta, eu não estaria nem entre os finalistas. Glenn, demonstrando bom humor, brincou: – E eu o que seria? Um troglodita? – Espere para vê-los. Aí você entenderá... A espaçonave pousou suavemente numa elevação circular, especialmente feita para pousos e decolagens, e que estava circun- dada por um magnífico jardim totalmente tomado por crisântemos de várias espécies. Ao apearem, Glenn entendeu o que Asthor tinha falado sobre os habitantes do rico planeta. Diante dele estava um Adônis18 um pouco mais alto que o descrito na Mitologia. Era uma criatura com um pouco mais de dois metros de altura e seu rosto era de uma beleza indescritível. Pisava uma alcatifa ligeiramente arroxeada, com lindos desenhos de aves em vôo. Glenn emudeceu diante da majesto- sa personalidade. – Que a paz de Deus esteja convosco – disse afetuosamente o anfitrião, estendendo as mãos a ambos. 18 Personagem da mitologia grega. Era representado como um jovem caçador de rara beleza, favorito da deusa Afrodite (Vênus).

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Glenn devolveu o cumprimento com um sorriso amarelo; Asthor com um forte abraço. Por uns breves instantes houve um silêncio sepulcral. O novo personagem mediu Glenn dos pés à cabeça. Depois de analisá-lo com um olhar de pai amoroso, falou envolvendo-o pela cintura. – Que prazer em revê-lo, Aarão. Glenn, sob forte emoção, permanecia calado. – Quem seria aquele ente que lhe demonstrava imenso cari- nho? – indagava a si próprio. Sensibilizado com a presença de um velho amigo, o raro ser, num gesto rápido e sem que o visitante percebesse, passou-lhe a des- tra sobre a cabeça. Uma transformação radical ocorreu com Glenn. Como num passe de mágica, ele passou a se lembrar de todas suas vidas. Não era mais um famoso cientista. Sentiu-se novamente forte como na época em que foi Aarão, uma de suas mais expressivas existências. Reconheceu no anfitrião um velho companheiro de jornada, só que, como o tempo, sempre esteve à sua frente na escala divina. Como havia prometido, Asthor o trouxe à presença do Patri- arca Moisés. Como num filme de ficção, Glenn começou a adquirir uma nova forma. Sentiu seu corpo modificar e ficar mais leve. Seus cabelos cresceram e soltaram-se sobre os ombros; abundante barba tomou conta do rosto. Suas vestimentas de piloto desapareceram e foram substituídas por uma suave e mimosa tiara levemente azulada. As botas transformaram-se em delicadas sandálias feitas de tiras de alpaca, e um rico colar apareceu sobre o peito desnudo e forte. – Bendito sejas, Moisés – saudou em hebraico e com nova entonação de voz.

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– Benditos sejam os pacíficos! Que a Paz esteja contigo, meu querido Aarão. Bendito sejas tu também, Asthor. Que alegria me proporcionas ao trazer meu querido irmão de várias batalhas. Apesar de acostumado, Asthor se emocionou um pouco, afinal estava diante de um dos mais queridos Regentes do Grande Universo. – Uma nova e espinhosa tarefa te foi reservada, Aarão. – prosseguiu, Moisés. – Mas não tenhas receio. Estarei atento e daqui dar-te-ei força. Masih19 também acompanhará teus passos. Silenciou por uns momentos, e completou: – Chegou a hora, Aarão, de unir a Terra à algumas de suas irmãs felizes do espaço. Chegou o momento de varrer de seu solo as diferenças e injustiças e, você será peça fundamental para que isso ocorra. Inicialmente vamos tentar devolver o equilíbrio de forças que havia entre os povos. Ezequiel, o Profeta da Verdade, está trabalhan- do ativamente no meio religioso. Pouco a pouco está substituindo os mais radicais. Quando o céu se cobrir de sinais luminosos, a Terra sofrerá profundas modificações. Para melhor. Mestres de infinita sabedoria distribuir-se-ão pelas regiões mais necessitadas e prepa- rarão a volta do Messias. Enquanto nossos centuriões combatem as forças de oposição, legionários dos céus de Vega socorrerão os povos mais carentes. As dificuldades serão imensas, mas seremos vitoriosos. Teus guias serão Asthor e Cabalá, de Agali. Com o auxílio do presidente norte-americano você deverá persuadir as autoridades de alguns países membros da ONU. Se for preciso, utilize o plenário da organização. Quem conseguiu convencer os ministros do intransigente Ramsés20, poderá convencer os mais resistentes. Jetro está na Jordânia desde a década de vinte, e está

19 Como era conhecido Jesus entre seu povo. 20 Faraó do Egito na época de Moisés.

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tentando unir judeus e palestinos. Ajude-o no que for possível. Com a intermediação e apoio dos EUA isso também será possível.. – Que espinhosa missão está tendo o “velho” Jetro! – comentou, Asthor. – Por quê? – indagou, Moisés. – Porque no Oriente há diversos focos de incêndio. Quando se apaga um, acende-se outro rapidamente. Quando não são os pales- tinos os insatisfeitos, são os paquistaneses que gritam. Os mu- çulmanos querem impor sua religião a qualquer preço. Os indianos buscam espaço. A China quer anexar Taiwan. O Japão reclama algumas ilhas. Recentemente estivemos sobrevoando aquela área e sentimos os efeitos de várias explosões. Por incrível que possa parecer, dois países divididos recentemente são os autores dessas explosões. Vejam quanta incoerência! Não conseguem solucionar o problema da fome e da miséria, mas encontram dinheiro para custear esses testes. – De quem você está falando? – perguntou, Moisés. – De dois povos que lutaram juntos contra o Leão Inglês. Depois de obterem a Independência, os muçulmanos se separaram dos indianos e criaram um novo Estado: o Paquistão. Entre eles existe Cachemir, uma área de conflito. Os dois querem ser donos desse território, por isso estão se armando cada vez mais. Pobre de seu sogro Jetro! No tempo em que está tentando unir os dois países, abre-se uma lacuna ainda maior. – Você disse Cachemir, Asthor? – Isso mesmo, Moisés. Estão manchando de sangue o chão que Masih pisou... Moisés acariciou suavemente o queixo e ponderou com tris- teza: – É! Parece-me que em algumas áreas teremos que intervir com relativa dureza. Será que teremos que usar as mesmas armas

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que foram usadas em Sodoma e Gomorra?21. Que o Altíssimo não permita que isso ocorra novamente! Ficaram por um longo tempo conversando e relembrando inú- meras passagens. Num dado momento, Moisés levantou-se e, num gesto mágico, ofereceu aos visitantes uma rica taça com um líquido precioso. Como por encanto, uma terceira taça surgiu numa de suas mãos. Ergueram-nas ao mesmo tempo e sorveram o saboroso licor sem nenhum comentário. A seguir, Moisés aproximou-se de ambos e, num gesto amável, osculou levemente a face dos dois. Estava terminado um encontro de velhos amigos.

Capítulo V A Via Láctea

e volta à espaçonave, Asthor vendo Glenn ainda emocionado pelo que acabara de ocorrer, preferiu silenciar.

Estavam os dois na sala de comando, presos pelas recor- dações, quando inesperadamente surgiu Zirna através de uma parede. Glenn surpreendido, perguntou: – De onde você veio? – Da sala ao lado, ora! –`Eu sei que você veio de algum lugar, mas não sabia que vocês atravessavam as paredes!

21 Duas das cinco “cidades da planície”, situadas na região do Mar Morto, na Palestina. Segundo a Bíblia, foram destruídas por uma chuva de fogo e enxofre por causa da corrupção que nelas imperava.

D

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– Desculpe-nos, Glenn. Devíamos tê-lo avisado que atraves- samos as paredes – brincou sorridente, Zirna. – E eu? Também consigo atravessá-las? – Acho que não, mas não custa tentar – respondeu também brincando, Asthor. Glenn tentou, entretanto foi barrado pela estranha parede. Calmamente levou a mão direita ao rosto e procurou afagar a barba. Prontamente compreendeu que já não era mais Aarão e sim um simples mortal. A farta barba havia desaparecido como por encanto, e suas roupas eram aquelas que usava quando pilotava o avião. – Venha cá – pediu Asthor, procurando distraí-lo. – Você está vendo aquele móvel no canto – observou apontando para um singular utensílio circular. Glenn meneou a cabeça em tom afirmativo. – Então vamos lá. Vou te mostrar algo muito interessante. Você está vendo este marcador? – prosseguiu já perto do que parecia ser um computador. – Qual é o número que aparece no visor? – 1.165.342 – respondeu Glenn, prontamente. – Pois bem! Essa é a distância em quilômetros que estamos da superfície de seu planeta. No momento estamos parados, por isso o marcador continua com o mesmo número. Agora olhe para isto. Não se assuste. Prepare o teu coração. Debaixo do visor avistavam-se cinco botões cada qual de uma cor. O objeto era quadrangular e estava protegido por uma tela finíssima de cristal. Parecia uma tela de televisão, só que cintilava. Fazendo suspense, Asthor apertou um deles e surgiu na superfície a imagem da Terra. Esplendorosa por sinal. – O que é isso? – encantou-se, Glenn. – É um telescópio? – É mais que um telescópio. Veja agora – prosseguiu Asthor, comprimindo um segundo botão.

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Diante dele surgiu a imagem de sua cidade. Era tanta a per- feição que passou a se sentir dentro do centro comercial. Apreciou o movimento agitado das ruas e começou, inclusive, a ouvir as vozes dos transeuntes. Balbucios e conversas um pouco nítidas mistura- vam-se aos sons de buzinas e máquinas trabalhando. – Preste atenção agora – falou animado Asthor, apertando um terceiro botão. A tela pareceu aumentar e os alicerces dos prédios eram vistos nos mínimos detalhes. Até as barras de ferro e aço utilizadas para segurança da massa de cimento e concreto eram vistas perfei- tamente. Era como se estivessem vendo um corpo num aparelho de raio-x. – Está vendo, Glenn! – exclamou rindo, Asthor. – Para nós não existem segredos na Terra. Esta nossa lente penetra em todas as matérias conhecidas. Atravessamos facilmente os mais poderosos obstáculos e podemos ler os pensamentos à distância. Este último botão nos permite localizar e observar qualquer alvo. Que tal achou? – Meu Deus!!! – disparou impressionado pelo que via. – Quer dizer então que vocês nos vêem até nos banhos? – Por que não? – Vocês não sentem pudor? – perguntou com o rosto leve- mente corado – Ora, Glenn! Por que teríamos que ter pudor? Estamos muito distante de coisas banais. – É! Parece que eu cometi uma gafe. Posso lhe pedir para localizar minha família? – Com ou sem som? – brincou, Asthor. – Não quero ser bisbilhoteiro. Prefiro sem som. Só quero ter a oportunidade de vê-los. Coitados! Como estarão?

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A imagem de sua casa apareceu no vídeo num piscar de olhos. Mary falava ao telefone parecendo aflita. Os filhos estavam ao lado da mãe, procurando ouvir o que vinha do outro lado da linha. Não resistindo à curiosidade, Glenn interrompeu pergun- tando: – Podemos ouvi-los? – Claro! Você quer que nos retiremos? – Isso não será preciso. Por favor, fiquem. – ... mas inspetor, isso não é possível! – gritava Mary. – O que ele está dizendo mamãe? – interferiu Ann, angus- tiada. Mary tapou o bocal com a mão e disse à filha. – Desse jeito não posso falar! – Tirou a mão do bocal e con- tinuou a conversa com o inspetor. – O senhor está me dizendo que ainda não há sinais? Como é possível um avião desaparecer num espaço livre, sem deixar vestígios? Se fosse no meio de uma tem- pestade eu compreenderia, mas o senhor há de concordar comigo; num dia claro e ensolarado, um avião não some como por encanto. Será que vocês não estão procurando em lugar errado? Está bem! Até mais. – O que ele disse, mamãe? – insistiu, Ann. – Esse sujeito é um cretino – disparou, fula de raiva. – Imaginem! Ele está achando que o avião se desviou da rota e caiu no mar. Desde quando existe mar nas Rochosas!!! – exclamou, nervo- síssima. – Controle-se, mamãe – aconselhou, John. – Quantos helicóp- teros a Aeronáutica pôs à disposição? – Estão vasculhando a área com onze helicópteros. Até agora não encontraram nenhum sinal que comprove que tenha havido um acidente. – Você quer que eu avise o vovô? – indagou, o filho.

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– Nessa hora ele já deve estar sabendo – deduziu, Ann. – Afinal de contas o papai é muito famoso – acrescentou, orgulhosa. Realmente, em todo o território norte-americano e até no estrangeiro, fervilhavam os comentários a respeito do desapareci- mento do importante homem da Ciência. O Washington Post tinha uma significativa reportagem na primeira página. Uma foto enorme tomava a metade da página, e a CNN de cinco em cinco minutos abria um espaço e dava novas notícias. A cidade de Sacramento, onde vivia o Físico com a família, foi a tal ponto invadida pelas equipes de reportagens, que não havia mais vagas nos hotéis. Os comentários eram os mais variados. Em algumas horas, o país inteiro, do Atlântico ao Pacífico, já sabia do desaparecimento do famoso projetista de foguetes. O noticiário chegou às portas da Casa Branca e, o chefe da nação, demonstrou num rápido pronunciamento, a sua preocupação. Não era do conhecimento público, mas o cientista havia servido o exército ao lado do Presidente e, numa conversa reservada com seu secretário, ele pediu que alguém fosse a Sacramento e acompanhasse as buscas. – Eu não sabia que era tão famoso – disse Glenn, procurando aparentar tranqüilidade. – Vamos continuar ouvindo ou posso desligar? – perguntou, Asthor. – Desligue, por favor. Quanto tempo ainda vamos demorar por aqui? – Vou procurar abreviar ao máximo nossa jornada. Antes de voltarmos, gostaria que você, além de ver Janos, aquele planeta destruído que me referi antes, também observasse um dos Doze Planetas Confederados. Mas, antes ainda, vou te mostrar algo muito interessante. Acomode-se para não cair.

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Glenn, já familiarizado com as surpresas, nada mencionou. Sentou-se calmamente numa banqueta circular que lhe foi oferecida por Zirna. Asthor ficou à frente e Zirna do seu lado esquerdo. Obede- cendo a um sinal de Asthor, Zirna pressionou uma chave que estava oculta sob a mesa. A sala de comando foi inundada por um forte clarão e o teto da espaçonave pareceu se abrir. Um magnífico céu azul penetrou para dentro da espaçonave e, de repente, Glenn sentiu-se pairando no ar livremente. Era como se uma tela gigantesca se abrisse dando-lhe passagem. Asthor e Zirna observavam acomodados e riam abertamente. Zirna, a um outro sinal de Asthor, comprimiu uma nova chave e a abóbada do Capitólio surgiu diante de Glenn. Os jardins da Casa Branca estavam tomados pela forte claridade do sol. Era um dia lindo. Novo movimento de Zirna, e Glenn retornou para dentro da espaçonave. – O que está havendo afinal? – perguntou Glenn, bastante transtornado. – Acalme-se, por favor – murmurou suavemente Asthor. – Estamos te dando uma mostra de como somos evoluídos. Você este- ve em Washington. – Quer dizer então que estive em cima do Capitólio? – Exatamente. Agora vou com você até a sala do chefe do executivo. Não é assim que vocês o chamam? Prepare-se! Outra vez o compartimento aonde estavam foi inundado por um forte clarão, só que desta vez, Glenn sentiu estar pisando uma espécie de esteira luminosa em movimento. Velozmente penetraram pelos amplos salões da Casa Branca e entraram livremente no gabinete do presidente. O famoso dirigente conversava com um dos seus assessores. Ao lado deles estava um homem calvo beirando os sessenta anos que se fazia entender através de um intérprete. Sua pele era parda e tinha

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um turbante na cabeça. Era por demais obeso e transpirava quando falava. Depois de alguns segundos, Asthor deduziu: – Vê-se abertamente que ele está mentindo. Esse sujeito é um parlatão. Ignorando o significado daquela palavra, Glenn indagou de forma ingênua: – O que quer dizer parlatão? – Em meu mundo, parlatão quer dizer, aquele que mente com malícia. Ele está solicitando uma ajuda econômica para seu país, que entretanto será usada para engordar a conta bancária de alguns parasitas. O maior beneficiado será o próprio chefe de governo. Está vendo como os homens ligados ao poder são egoístas e só pensam em si próprios? – Podemos alertar o presidente? – Não podemos nem pensar nisso! – advertiu, Asthor. – Mas então o que estamos fazendo aqui? – Quis mostrar a você do que somos capazes. Somente isso. Olhe bem para esse indivíduo. Iguais a ele, existem milhares espa- lhados pelo seu mundo. É deles que devemos nos ocupar. Quando chegar o momento da verdade, eles desaparecerão da face da Terra. Isso eu posso afirmar com segurança. – E quando será essa hora? – Ela já está próxima, Glenn. Mais perto do que todos ima- ginam! Glenn desejava visitar a família, mas Asthor antecipando-se ao pedido, fez com que ambos voltassem para dentro da espaçonave. Antes que Glenn reclamasse, Jena que estava à espera dos dois, perguntou ao cientista: – Você quer se alimentar? Embora sejamos vegetarianos, você apreciará nossa culinária.

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– Mas eu sou vegetariano! Quando dei baixa das forças armadas deixei de comer carne. Afora camarão, não como nenhum tipo de carne, seja branca ou vermelha. – Mas não são vocês que gostam de comer sanduíches de hambúrguer? – indagou, Zirna. – Realmente meu povo aprecia muito os hambúrgueres, porém eu sou uma exceção. Meu fígado reclama muito quando engu- lo algo gorduroso. Jena tomou-lhe a mão pedindo que a acompanhasse. Desta vez Glenn passou através da parede sem nenhuma dificuldade. Antes que perguntasse, Jena sorriu e ciciou em seus ouvidos: – O contato de minha mão permitiu desmaterializá-lo. Não tente atravessá-la sem nossa ajuda. Entraram num espaçoso compartimento que em alguns detalhes assemelhava-se às requintadas cozinhas terrestres. Sobre uma ampla mesa, havia uma grande variedade de vegetais e legumes; noutra, frutas vistosas. Jena vendo que Glenn apreciava tudo com ansiedade, obser- vou com meiguice: – Sabe de onde estão vindo esses vegetais e essas frutas? – Sequer imagino. – De nossas hortas ao lado. Quer vê-las? Só me falta saber, pensou impressionado, que a água também vem de correntes internas. Jena captando seus pensamentos sorriu intimamente. Em con- tinuação, segurou novamente a mão dele e atravessaram tranqüi- lamente uma outra parede. Havia vários tipos de vegetais e legumes conhecidos na Terra, devidamente distribuídos em hortas de vários tamanhos. De quatro até cem metros quadrados. Atrás das plantações de hortaliças, havia uma grande estufa onde estavam plantados vários pés de frutas.

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Havia maçãs, pêras, uvas, caquis, damascos e até frutos maiores como jacas, melões e melancias. Glenn quase teve um enfarto quando avistou uma corrente d’água. Adivinhando-lhe os pensamentos, Jena dessa vez não agüen- tou e deu uma sonora e estridente gargalhada. – Essa corrente d’água não é natural, Glenn. Não se espante. Ela vem dos reservatórios que estão logo ali e retornam ao lugar de origem. É certo que só retorna o líquido excedente. Nada se perde. – Não vá me dizer que também há chuvas por aqui? – ironizou, Glenn. – Quem sabe um dia isso será possível! – desafiou Jena, rindo gostosamente. Retornando à cozinha, Glenn saboreou avidamente tudo que foi possível comer. Seu cérebro lhe dizia que jamais havia ingerido uma variedade de alimentos tão preciosos. O estômago e o coração, concordaram. – Você não quer descansar um pouco? – perguntou Zirna, chegando de mansinho. As duas cumulavam-no de tantas gentilezas, que Glenn já estava se sentindo incomodado e constrangido. – Temos um lugar maravilhoso para repouso – prosseguiu, Zirna. – Venha comigo. Após alguns segundos, Glenn dormia como os anjinhos numa sala contígua à sala de comando. – Para onde vamos agora? – indagou Zirna. – Vamos ficar pairando por duas horas, tempo suficiente para Glenn se acalmar. Quando ele acordar iremos diretamente a Janos, em seguida a Zemil – um dos doze Planetas Confederados – e, depois, a Rodekara. Depois disso tudo o levaremos de volta à Terra. Contate Cabalá e informe-a de nosso plano de vôo.

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Eram precisamente dezoito horas no mostrador do relógio de pulso que ainda levava, quando Glenn despertou. Coincidência ou não, ele dormira duas horas. Um velho costume fez com que flexio- nasse por algumas vezes os braços. Estava com vontade de urinar, mas como estava diante de Jena não se atreveu perguntar onde era o banheiro. Asthor e Jena começaram a rir ao mesmo tempo, o que fez Glenn avermelhar como um pimentão espanhol. Estava quase uri- nando e defecando na calça, quando Asthor apontou-lhe uma estreita passagem. – Pode ir. Aquela passagem é a única que está aberta a vocês, humanos. – Caso você queira evacuar – observou, Jena – dentro do armário há um rolo de papel higiênico. – Captando o pensamento de Glenn acrescentou: não tenha receio, você terá total privacidade. Sinta-se à vontade. Glenn moveu-se lentamente em direção à passagem. Para gáudio dos extraterrestres, suas pernas roçavam uma na outra como se estivessem pedindo socorro... Depois de alguns minutos retornou com uma visível mancha na calça. Era sinal de que não havia chegado a tempo... – E então? Já está mais aliviado? – indagou brincalhão, Asthor. – No que se refere a gozação, vocês são iguais a nós – falou Glenn, meio amuado. – Não se esqueça de que nós vivemos entre os terráqueos muito tempo – prosseguiu brincando, Asthor. – Bem! Estou pronto! Para onde vamos agora? – Vamos à Janos. Vamos ver o que restou de um formoso planeta. Os espectros de gente que iremos ver dentro de alguns instantes, estavam num estágio muito avançado e já tinham superado

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as doenças do corpo, quando resolveram entrar em guerra. Não sobrou nada. A espaçonave se lançou no cosmo com incrível velocidade. Como se estivesse atravessando o céu da Terra, a espaçonave come- çou a passar por uma área infinitamente escura. Era tanta a escuri- dão, que foi preciso acionar os faróis para poder atravessá-la em segurança. A um pedido de Asthor, Nesthor diminuiu a velocidade da espaçonave, chegando quase a pará-la. Asthor levou-a para uma região deserta. A propósito, quase tudo o que se via à frente era deserto e desolação. Pouco a pouco começaram a ver a proporção do desastre. O que antes fora uma exuberante floresta, era uma região devastada e não se avistava nenhum movimento no solo. Só incúria e um terrível silêncio. Tudo era muito triste e sem sinal de vida. A planície onde haviam pousado, estava cortada como se um gigantesco ser mitológico tivesse enfiado sua enorme espada e cor- tado a terra em fatias. Uma erva rala e amarelada cobria algumas áreas mais altas. A visão era tão triste, que o poeta diria; a morte passara por lá, ceifando flores brilhantes; só deixara hastes fanadas. Imensas cloacas estavam cheias de baratas e ratazanas. – Onde estão as cidades? Não há mais gente por aqui? – perguntou afoitamente, Glenn. – Naquela direção há muitos escombros e o que sobrou de uma metrópole com mais de oito milhões de habitantes. É impossível encontrar alguém sem nenhuma deformidade. Todos foram atingidos pela radiação e estão morrendo como moscas. Não há nenhum ali- mento saudável. – E o quê eles estão comendo? – Alimentam-se de baratas e ratazanas, as únicas criaturas que ainda estão resistindo. Dentro em pouco todos vão morrer. O planeta

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começará a ser restaurado pela própria natureza, e essa restauração durará alguns milhões de anos terrestres. Demonstrando também emoção, completou: – Eles morrerão para renascer. Os que foram vítimas inocentes renascerão em globos de paz. Os culpados cumprirão penas em mun- dos de sofrimento iguais à Terra. Por paradoxal que pareça, muitos deles já estão espalhados pelo Planeta Azul. – Como assim? – Este planeta explodiu há mais de quarenta anos terrestres. Antes do grande caos, muitos deles se lançaram ao espaço em busca de um novo lar. Em tempos idos, esse povo já habitou a Terra. São descendentes do povo da Atlântida. – Que fatos interessantes você está me contando. Quer dizer que a Atlântida realmente existiu? – Não tenha dúvidas disso. O povo da Atlântida era um povo tão desenvolvido, que lançou-se no espaço em busca de novas fontes de vida. Se espalharam por vários mundos. Estão entre os povos mais adiantados do Universo. – Mas se são tão adiantados, o que ocorreu neste planeta? – O mesmo que aconteceu com os que ficaram na Atlântida. A população aumentou e não quiseram dividir as riquezas. Pouco a pouco cresceram as intrigas e daí aconteceu uma guerra brutal. As armas usadas eram tão poderosas, que o mar se revoltou invadindo a terra. Os que tiveram tempo de escapar, se espalharam pelos cinco continentes. Em Janos aconteceu quase o mesmo. Quando ocorreu o desastre, oito bilhões de pessoas viviam sobre estas áreas. Seis con-tinentes acomodavam 148 países e quatro grandes oceanos banha- vam essas terras. Centenas de rios cruzavam todos esses cam- pos atualmente desolados. Os governos eram estáveis e a cada dois lustros eram renovados. Cada lustro eqüivale a um qüinqüenio. – Mas então, como aconteceu isso?

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– Muitas coisas são inexplicáveis até para nós. Quando per- cebemos que a guerra era iminente, procuramos socorrer as pessoas mais simples. Dois povos nômades que viviam dentro das florestas foram levados para um planeta localizado na Constelação de Centauro. Eram povos tão simples que viviam em tugúrios coletivos. Centauro faz parte da Via Láctea, portanto está perto do vosso Sistema Solar. Nesta área que estamos sobrevoando, existia uma floresta tão grande e rica como a selva Amazônica. Sua fauna era composta por mais de um milhão de espécimes. – Quantas explosões houve neste planeta para deixá-lo dessa forma? – Nossos registros acusaram a detonação de 1238 bombas de grande poder. Por um verdadeiro milagre, inexplicável até para nossos cientistas, o planeta não se desintegrou. Foram tão impres- sionantes as explosões, que diversas civilizações do espaço sentiram os efeitos. – Mas então como existem ainda sobreviventes? Sinceramen- te, não estou entendendo. – Os que sobraram, pertenciam a camadas sociais mais privilegiadas e se esconderam em abrigos previamente construídos a centenas de metros abaixo da superfície. Quando começaram a rarear os alimentos, saíram dos esconderijos e foram atingidos pela alta radiação. Eles têm pouco tempo de vida. – Então é isso que nos espera? – indagou preocupado Glenn. – Perfeitamente. Se os políticos não se entenderem a tempo, acontecerá com a Terra o que aconteceu com Janos e com a Atlân- tida. Não quero ser de mau agouro, mas caso se concretize as profe- cias de Nostradamus22, vários povos da Via Láctea também serão

22 Michel de Notredame. Astrólogo e médico francês. (St.-Rémy, 14-12-1503 –– Salon, 02-07-1566). Autor de um livro de profecias em rima, intitulado Centúrias.

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atingidos, por isso os Planetas Confederados estão assustados e de prontidão. – Você já citou mais de uma vez esses Planetas Confede- rados. Quantos são? – São em número de doze e estão próximos da Terra. Eles desejam transformar a Terra no décimo terceiro. – Quem sabe ainda terão êxito – disse Jena, entre dentes – Se depender de mim, isso ocorrerá! – Assim que se fala! – assentiu Asthor, imitando alguns homens. Durante uma hora sobrevoaram vastas regiões. Não havia mais água, nem presença de nuvens. Os mares e rios transformaram-se em dunas. De quando em quando avistavam entre os escombros das cidades, algumas sombras em movimento. Eram silhuetas que se arrastavam penosamente sobre o solo. Ninguém em sã consciência, poderia imaginar que o que estavam vendo foram seres normais. Com pernas e braços saudáveis. Que num passado mais recente anda- ram alegremente entre ruas. Que se amaram e lutaram por melho- res coisas. Pena que não souberam controlar suas ambições. Que judiação! Glenn estava com as batidas do coração tão aceleradas que teve medo de ter uma síncope. Impressionado e comovido diante daquele quadro tão aterrador, disse quase em súplica: – Vocês não podem fazer nada por essas pessoas? – O que podia ser feito, já foi feito. Apesar da aparência, muitos deles voltariam a praticar os mesmos erros se dispusessem de meios. Infelizmente, o egoísmo é uma chaga destruidora que está presente em quase todos os seres que habitam planos com pouca luz. Enquanto estavam entretidos com o triste cenário, Nesthor comunicou a Asthor que havia feito contato com Cabalá. – Você passou nossa posição?

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– Fiz como você ordenou. Ela informou que acompanhará todos os movimentos de Glenn. – Ótimo! Leve-nos agora a Zemil. Nesthor diferenciava-se de Asthor somente pela cor da pele. Era um pouco mais moreno e os cabelos eram mais escuros. Vendo-os lado a lado, pareciam irmãos consangüíneos. Talvez a longa convivência os tornaram tão parecidos. A Via Láctea era ainda mais bela vista de dentro da espaço- nave. Milhões e milhões de pontos luminosos enfeitavam o trajeto. Vega, o formoso sol azul da Lira, com seu brilho coruscante, era visto de todos os ângulos. Constelações e mais constelações eram avistadas dentro de imensas galáxias. Uma das mais vistosas e atraentes, era Andrômeda. Havia uma variedade imensa de cores. Sóis mais vermelhos que o astro rei da Terra. Estrelas azuis, rosas, brancas envolvidas com cinturões coloridos. Planetas cuja magnitude era difícil de calcular. Saturno, perto de alguns, nada significava. Era como a lua perto da Terra. Era como Europa23 perto de Júpiter. Canopo vista de perto era um imenso oceano de luzes. Alcíone, uma de suas rivais do espaço, luzia imponente e vaidosa. Betelgeuse, da Constelação de Órion, observava as duas irmãs com muito respeito. Sirius, embora doze vezes maior que o astro rei, man- tinha-se reservada e quieta em seu canto. Arcturo, apesar da enorme distância, brilhava tanto, que parecia estar dentro da nave interestelar. Capela não deixava por menos, afinal ela é 5800 vezes maior que o sol da Terra. Pólux, como boa geminiana, atrevidamente imiscuía-se com seu formoso brilho. Aldebarã, a mais brilhante da Constelação de Touro, também plei- teou um lugar dentro da gigantesca nave.

23 Uma das luas do Planeta Júpiter.

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– Quebrando o silêncio, Nesthor avisou a Glenn que haviam chegado: – Chegamos! Eis Zemil. Quando já estavam perto da superfície do planeta, foram escoltados por dois extraordinários veículos semelhantes aos subma- rinos terrestres. Glenn já não se espantava com mais nada, mas diante do magnífico aeroporto que surgiu à frente, não se conteve e soltou algu- mas palavras incompreensíveis. Todos olharam admirados, porém se abstiveram de comentários. Mal tocaram o solo foram conduzidos para uma ampla sala, onde os esperavam duas personalidades locais. Ambas usavam trajes que fez Glenn recordar dos antigos tribunos romanos. Asthor já os conhecia. – Sejam bem-vindos! – cumprimentou um deles. – Bons ventos os tragam – saudou o outro. – E que a paz do Absoluto esteja convosco – mencionou gentilmente, Asthor. – Este é Glenn, do planeta Terra. – Olhou para Glenn e apresentou: esses são Omar e Divo. Como estão? – Muito bem, amigo Asthor – respondeu, Omar. – Que a paz esteja com o irmão: completou oferecendo a mão à Glenn. Por favor, sentem-se. Querem beber ou comer algo, ou vão preferir um delicioso sorvete? – Virem até nós e não provar nosso sorvete, é uma ofensa! – exclamou Divo, abrindo um generoso sorriso. – Carmem Dolores continua responsável pela sorveteria? – perguntou descontraído, Asthor. – Ela não deixa ninguém se intrometer – respondeu brinca- lhão, Omar. – Que sabor você quer, Asthor? – Carmim misturado com creme. – Você não se esqueceu, hein! – lembrou, Divo.

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– Carmim! disse Glenn, com olhos bem abertos. – Em meu país, carmim é uma designação de uma espécie de coccídeo que fornece o colorante desse nome. Eu não sabia que ele servia para fazer sorvete! – Não se espantem – interferiu, Asthor. – Glenn é um cientis- ta apegado a fórmulas e teoremas. – Aqui – retornou, Omar – é o nome de um sorvete delicioso. Carmem Dolores é a criadora, por isso foi batizado com esse nome. Vendo Glenn meio sem jeito, Asthor interveio, dizendo: – Não se aborreça, homem! Eu também já cometi essa gafe. Glenn, vendo que Omar colocou o polegar e o indicador da mão direita sobre a testa, perguntou baixinho: – O que ele está fazendo? Rezando? – Ele está usando o telefone mental – observou brincalhão, Asthor. – Está se comunicando com Carmem Dolores. Por favor, peça a ela para por um pouco de chocolate no meu. Poucos segundos após, uma linda jovem entrou na sala flu- tuando. Nas mãos carregava duas taças de sorvete com uma rica cobertura de chocolate e creme. Era tão impressionante sua formo- sura, que Glenn ficou boquiaberto por alguns segundos. Ela, compreendendo o efeito que causara, limitou-se a sorrir. Fez um leve aceno e retirou-se da mesma forma que havia entrado. Todos riram ao vê-lo com a pequenina colher cheia de sorvete parada perto da boca. Ainda paralisado pela aparência da jovem, mencionou contagiado: – Desculpem-me. Nunca vi uma moça tão linda! – Essa moça – comentou, Omar – é a responsável por esse delicioso sorvete. Ela é dona da fórmula. Você não notou que seus lábios são da cor do carmim? – concluiu, com leve ironia. – Sinceramente – falou com entusiasmo, Glenn – eu pensei que Carmem Dolores fosse uma velha senhora, gorda e possivel-

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mente simpática, como costumam ser a maioria das confeiteiras que tive a oportunidade de conhecer. – E quanto ao sorvete? – indagou, Divo. – É divino. Posso levar a receita para minha mulher? – Claro, mas não sei se vocês vão ter todos os ingredientes. De qualquer forma seria uma indelicadeza de nossa parte não dá-la. Aqui tem uma cópia – terminou Omar, oferecendo a Glenn uma folha de papel escrita em inglês. – Como estão os preparativos da Expedição da Paz? – per- guntou Divo, de repente. – Já estão quase no fim. – Acho que vocês vão ter que aligeirá-los – observou Omar. – Nossos registros voltaram a acusar significativas vibrações. Isso é sinal que fizeram novas explosões. – De onde vieram esses sinais de explosões? – intrometeu-se, Glenn. – Do continente asiático. Da Índia e do Paquistão. Será que teremos de usar a força para contê-los? Antes que Asthor opinasse, Divo interferiu, dizendo: – Quando os franceses insistiram para fazer alguns testes, pensamos que fossem os últimos. Apesar da distância, estamos sentindo o efeito dessas explosões. Não será possível apressar os contatos? É muito preocupante e desastrosa essa situação. Essas explosões vão fabricar grandes terremotos naquela área. Se não os pararmos a tempo, poderá acontecer com a Terra o que aconteceu com Janos. Glenn observava e refletia em silêncio. Asthor comprimiu na testa os três dedos do meio da mão direita, e permaneceu por alguns instantes dessa maneira. Pensava, mas não tinha uma solução. Sabia que era iminente uma catástrofe na

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Terra, todavia não tinha autoridade para intervir pela força. Procu- rando ganhar tempo, saiu-se com uma frase conciliadora: – Que tal ouvirmos o que nos tem a dizer Glenn, afinal ele é um experimentado e competente cientista. Glenn, surpreso e admirado, respondeu: – Grato pelo imerecido elogio. Há muito tempo estou vacina- do contra o vírus da vaidade. O que posso dizer? Não tenho autori- dade para proibir nenhum tipo de experiência. – Por acaso você sabe por que insistem nesses testes? – per- guntou, Divo. – Por ambição e porque um desconfia do outro – respondeu a esmo. – Desde que o Paquistão separou-se da Índia, as lutas étnicas se tornaram cada vez mais acirradas e violentas. O que eu não entendo é que durante cinqüenta anos lutaram juntos contra os ingleses e, depois de conseguirem a autonomia, passaram a se odiar. Isso será sina? Francamente, não vejo como parar com essas matanças! Como pode haver paz na Terra, se quando se apaga um estopim, acende-se outro? O continente asiático é um barril de pólvora desde a época da Dinastia Ming. Durante as Cruzadas lutavam cristãos contra os bárbaros. Outrora lutavam querendo impor seus credos, agora lutam por fronteiras e petróleo. Que Deus me perdoe, se vou cometer uma heresia dizendo o que vou dizer: embora seja contrário à maioria das teses de Marx,24 devo concordar quando ele afirmou que as religiões são o ópio do povo. Em tempos idos procuravam o ouro do Rei Salomão,25 agora buscam ouro negro. Amanhã inventarão outra coisa.

24 Karl Marx (1818-1883) - Economista e filósofo alemão. Elaborou com Engels a doutrina do comunismo científico. Obras principais: Manifesto comunista (1848) e O Capital (1867). 25 Rei Salomão - O mais ilustre dos reis de Israel. Filho de David e Betsabé, viveu no século X aC.

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Asthor encarava-o, orgulhoso. Seus pensamentos voltaram aos tempos de antanho, quando no deserto, dava assistência a ele. Renascia novamente o magnífico orador. – Temos que atacar o mal pela raiz – continuou um pouco empolgado. – Se não forem modificadas algumas máximas, tudo será inútil. Acho que vocês devem aparecer diante dos olhos do povo. Se com isso não houver resultados práticos, usem a força, ora! Vocês vão esperar que aconteça com a Terra o que aconteceu com o planeta que acabamos de ver? – Um de nossos cientistas está analisando os efeitos dessas explosões – comunicou, Omar. – Espero que as calotas polares não tenham sido atingidas violentamente. Está sendo muito árduo conter aquelas montanhas de gelo. Se isso continuar, esses insensatos pere- cerão afogados e... – ... levarão consigo muitos inocentes! – argumentou, Divo. – Parece-me que o que aconteceu com Atlântida pode se repetir. Isso pode acontecer novamente – interpretou com tristeza, Asthor. – Que tal conhecer algumas de nossas instalações? – convi- dou, Divo. – Eu tenho prazer em mostrá-las. – Não temos tempo – desculpou-se, Asthor. – Sei que isso seria de nosso agrado, mas no momento é impossível. Omar e Divo foram juntos até a entrada da espaçonave. Ao virar para se despedir, Glenn avistou Carmem Dolores acenando com a mão. Gostaria de levar a lembrança daquele rosto. Será que recordaria quando estivesse na Terra? Quem sabe! Voaram por mais trinta minutos a mais ou menos três mil pés de altura. A visão das cidades era incrível. Ao transpor uma cordilheira, muito alta por sinal, a espaçonave pairou por alguns momentos sobre um mar muito tranqüilo. Nas águas azuis celestes deslizavam um sem número de

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barcos à vela. Perto da orla marítima, vários banhistas nadavam e passeavam em pequenas embarcações movidas por suave brisa. Asthor estava certo quando afirmou que seria penoso retornar. Mas era preciso. – O que vamos ver agora? – indagou logo que a espaçonave tomou velocidade. – Nosso lar – antecipou-se, Jena. Rodekara estava localizado entre um triângulo formado por três magníficas estrelas: Altair, Markab e Deneb. Vega, um pouco mais afastada, também mandava luz e calor Vários planetas menores cercavam Rodekara. Observados de longe, se assemelhavam às luas de Júpiter. Quando já estavam perto da superfície do planeta, Glenn não se conteve ao avistar uma cordilheira cujos picos enfileirados pareciam dentes de uma serra sem começo nem fim. Quase chegou a pular pela impressão que essa lhe causou. Como sobrevoava cons- tantemente as Montanhas Rochosas, viu nas elevações à frente uma cópia das montanhas de seu país. Eram mais altas e mais verdes, entretanto os desfiladeiros eram muito semelhantes. Até os contra- fortes eram parecidos. Diferenciavam-se somente pelo tamanho e pela ausência de gelo. Captando seus pensamentos, Zirna comentou: – Aqui não temos neve, por isso essa paisagem verdejante que cobre os flancos é um jardim eterno. A espaçonave pousou por uns poucos momentos na mais alta delas e, de lá, Glenn teve a oportunidade de admirar parte de um mundo desconhecido pelos cientistas da Terra. – Interessante! Tenho a impressão de já ter estado por aqui. – Não é impressão. Você já esteve aqui, por isso a visão é familiar. Depois de desencarnar você viveu entre nós por um bom tempo. No momento certo você terá noção exata do que ocorreu.

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– Antes de voltar, Asthor, conte-me algo a respeito das espaçonaves. Elas são todas circulares, ou têm outras formas? – A maioria têm a forma de um pires, mas as grandes espaçonaves, as naves-mães ou naves-guias, têm várias formas. São circulares, elípticas, longas e parecidas a um charuto, outras têm a forma de uma cápsula. Algumas parecem balas de fuzil. Umas poucas se parecem aos seus porta-aviões. Embora sejam diferentes na aparência, todas descem em sentido vertical. São tão grandes que parecem edifícios suspensos no ar. As grandes espaçonaves jamais navegam sozinhas. Vão sempre acompanhadas de um grande número de naves de defesa. Perto de planos hostis, caso da Terra, elas formam um cinturão em volta da nave-mãe. As naves-mães evitam deslocar-se em baixas altitudes. Geralmente “flutuam” numa altu- ra razoável do solo e, aí, o reconhecimento é feito pelas naves auxiliares. Quando a Terra não tinha uma grande população, elas desciam tranqüilamente em campos isolados, mas à medida que a civilização aumentou, os cuidados foram maiores. As naves interes- telares de Anoide navegam pelo cosmos sempre acompanhadas de um grande número de espaçonaves. Acopladas a elas existem deze- nas e dezenas de pequenas naves. Quase todas são manobradas à distância. Algumas por robôs. Eles é que geralmente descem nos planos hostis e são confundidos com pequenos monstros. A frota auxiliar da espaçonave que estamos viajando, quando está em missão oficial, é composta de trinta e seis naves. Oitenta por cento delas são dirigidas por andróides e robôs. Eles colhem amostras do solo e fazem o levantamento das áreas. Dificilmente nós saímos das naves durante o dia e, quando o fazemos, é com extrema segurança. A primeira coisa que os homens fazem quando nos vêem, é sacar uma pistola e apontá-las em nossa direção. Esse é o instinto natural do ser humano. Fui claro, amigo Glenn?

– Bastante claro!

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Capítulo VI De volta ao lar

epois de ver cenas de horror e quadros de infinita beleza, Glenn foi devolvido à Terra junto com o avião. O Patriarca deu lugar ao Físico. Apesar de ficar em sua

mente alguns vestígios de tudo aquilo que ocorreu, grande parte foi apagado. Para parecer realmente um acidente, o avião teve uma de suas asas quebrada e, a parte da frente estava ligeiramente enterrada no solo arenoso. Permanecia desacordado sobre a aparelhagem de comando, quando aproximou-se do local um helicóptero. Na realidade, o bimotor fora envolvido por uma súbita e forte corrente de ar que fez o aparelho sacudir violentamente perdendo rapidamente altura. Sem conseguir controlá-lo, Glenn comunicou à base o que estava ocorrendo. Acima dele e fora de sua visão, uma impressionante nave interestelar seguia os seus movimentos. No radar da torre de coman- do esse objeto foi dectado, tendo, inclusive, dois jatos supersôni- cos de defesa tentado cerceá-lo. Essa tentativa foi inútil, porque o misterioso aparelho sumiu dos radares do aeroporto, instantanea- mente. Segundo o relatório de um dos pilotos que tentaram seguí-la, a estranha aeronave com a forma de um disco, girou como um pião e desapareceu como por encanto. O helicóptero pousou suavemente ao lado do pequeno avião, depois de certificar-se de que não havia perigo algum. O aparelho parecia ter condições de levantar vôo. A ponta de sua asa direita tinha tocado o solo, partindo-se. O nariz estava ligeiramente coberto

D

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por uma camada de areia. A asa poderia ser facilmente substituída. O nariz nada havia sofrido com o impacto. Aproximando-se, Stone, que era o médico de plantão e responsável pelo resgate, verificou que o piloto tinha um corte no alto da testa, mas que respirava normalmente. Estava desmaiado e tinha batido a cabeça, provavelmente no painel à frente, mas de pronto o profissional constatou que não havia nenhuma gravidade. Após endireitá-lo, procurou reanimá-lo fazendo-o cheirar um líquido embebido num chumaço de algodão. Glenn, pouco a pouco abriu os olhos e encarou Stone. – O que houve? – O amigo sofreu um pequeno acidente. Foi mais o susto. Está sentindo alguma dor? – Não – respondeu Glenn, acariciando levemente o ferimento coberto com sangue sêco. – Ótimo – considerou, Stone. – Isso é muito bom. Que tal a cabeça? – Estou sentindo um leve torpor. Estranho! Parece-me que estou retornando de uma longa viagem. – Como assim? – Estou com a impressão de que estou vindo de um outro mundo! Gozado! Tenho na memória cenas de um local cheio de luz. Cheio de paz. Estou vendo pessoas desfilarem com trajes coloridos e exóticos. Stone trocou um olhar com seu assistente Mel e, com um sorriso maroto e uma expressão de pouco caso, desviou o rosto para o infinito. Mel que conhecia bem o companheiro, entendeu pronta- mente o que significava essa expressão. Stone estava achando que a mente de Glenn tinha sido afetada na batida. Para despistar, deu um leve suspiro e, com ares de sabi- chão, afirmou:

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– Quase todos que perdem os sentidos têm a mesma impressão. Você sofreu uma ligeira amnésia e talvez o que você está dizendo seja parte de um sonho. Quem sabe Freud26 não tenha a resposta – finalizou brincando e piscando levemente um olho para seu assistente. Mel não compreendeu a ligação, mas preferiu silenciar. Sabia que seu companheiro era muito obstinado e achou melhor não con- testar. Glenn, já com suas faculdades recuperadas, analisou o comentário inoportuno do médico e resolveu discordar em silêncio. Entretanto sabia que havia sofrido uma experiência extraordinária. Oportunamente comentaria isso com a mulher e os filhos. De ante- mão, já sabia que não seria mais o mesmo. Essa sensação era angustiante, mas não o amedrontava, ao contrário, seria capaz de apostar que essa mudança lhe traria muitos benefícios. Já no solo, Stone pediu que fizesse uma leve flexão. Glenn acedeu de imediato, certificando-se de que seus ossos estavam no devido lugar. Verificou que seus documentos estavam todos em ordem e fez um sinal que estava pronto para voltar à vida normal. Mais tarde retornaria com seu mecânico e procederia no local o conserto do aparelho. Como o avião estava numa planície sem vege- tação alta, seria fácil levantar vôo. Mantinha-se tranqüilo e durante o trajeto aproveitou para cochilar. Estava sendo levado ao hospital da base para fazer alguns exames complementares. Stone pilotava e Mel estava sentado ao seu lado. Como viu que Glenn permanecia atrás com os olhos fechados, comentou bai- xinho:

26 Neurologista e psiquiatra austríaco, criador da psicanálise (Freiburg, Morávia, 06-05-1856, Londres 23-09-1939).

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– Não me agradaram as lembranças desse doutor. Qual é a tua opinião? – É melhor ficarmos calados. Ele pode nos ouvir. – Não é isso que estou vendo – deduziu, Stone. – Ele está roncando. – Do que estávamos falando? – Desse estranho sonho. – Pode ser efeito da pancada. Alguns sofrem amnésia e outros retornam contando que viram Deus. Estes são os mais perigosos. Você não vê o que se passa com os astronautas? Alguns afirmam ter visto Deus e ficam completamente pirados. Outros começam a pregar em Igrejas. Será que realmente viram algo extraordinário? – Ora, Mel! Você também acredita nisso? – E por que não?! Você há de concordar que todos têm a mesma linguagem. Alguma coisa de real existe, senão a escrita seria diferente. Armstrong27 quando retornou da Lua não foi mais o mesmo. Gagarin28 também veio contando coisas admiráveis após dar uma volta completa na Terra. – Mas o nosso amigo aí não deu uma volta na Terra, nem foi à Lua. A não ser que o objeto que surgiu na tela por ocasião de seu desaparecimento o tenha levado. Eu não acho possível que tenha ocorrido isso. – E por que não é possível? De seu desaparecimento até o resgate, passaram-se mais de quarenta e oito horas. Se não me falha a memória, já se passaram cinqüenta e duas horas. Esse tempo é sufi- ciente para esses diabólicos engenhos saírem de nosso mundo sem que tenhamos como acompanhá-los. Você não se lembra o que Mike

27 Neil A. Armstrong - Primeiro homem a pisar na Lua em 1969. 28 Iuri Gagarin - Cosmonauta soviético (perto de Gjatsk, atual Gagarin - 09-03-1934 - perto de Moscou - 27-03-1968) - Primeiro homem a circular em torno da Terra em vôo orbital.

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– um dos pilotos que tentaram seguir a nave – comentou quando aproximou-se do objeto? – Eu não estava perto nesse momento. O que ele disse? – Contou que o aparelho estava parado quando fez a aproxi- mação. Ao tentar pressioná-lo para baixar, a aeronave, semelhante a um prato, girou sobre seu eixo e desapareceu da vista dele num piscar de olhos. Um veículo tão veloz é capaz de encurtar as distân- cias. Acho até que é capaz de ultrapassar várias dimensões. – Não será também fruto da tua imaginação, Mel? Quando analisei o teu currículum, verifiquei que você trabalhou com um grupo de ufólogos. – Aonde você quer chegar? – reclamou Mel. – Realmente analisei muitas aparições quando pertencia a equipe do Projeto Livro Azul. Só não entendo por que modificam os fatos. Se as inves- tigações sobre esses objetos fossem mais sérias, quem sabe a estas horas não estaríamos em contato com essas civilizações do espaço. Eu não tenho dúvida nenhuma de que elas existem! Eu me recordo de um caso clássico que merecia constar de todas as bibliotecas que se interessam por esse assunto. – Que caso foi esse? – perguntou ironicamente, Stone. – Esse episódio ocorreu no Brasil. – Só podia ser no Brasil! – observou com desdém, Stone. – E por quê? – Porque o Brasil é um país muito atrasado e, onde há muito atraso, há muita superstição. Aposto que os silvícolas disseram ter feito um passeio no espaço. Não foi isso? – Ouvindo isso, receio que você está fora do mundo. O Brasil é um país muito rico e seu povo é muito hospitaleiro e educado. É a oitava economia do mundo e possui uma riqueza incalculável no subsolo. Existe tanta riqueza naquele país, que algumas nações estão tramando em conjunto para pôr às mãos nela. Para mim não será

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surpresa nenhuma se até o ano 2005 ele esteja entre as cinco maiores potências econômicas. – Ora, Mel! Eu não sabia que você era simpático à causa brasileira. Não sabia que você era especialista em Brasil. – Não sou especialista em nada. Apenas me interesso pelo que ocorre no mundo. Quando disponho de tempo, leio qualquer matéria. Além disso, passei uma temporada no Rio de Janeiro, uma cidade maravilhosa e cheia de encantos. A Natureza foi muito gene- rosa com seus habitantes. – Eu já li um pouco a respeito de sua capital, Buenos Aires. – Não pretendo hostilizá-lo, meu bom amigo, mas você acaba de dizer uma tremenda aberração, o que demonstra que de Brasil, você não entende nada. – Por quê? – Porque a capital do Brasil, desde 1960, é Brasília. – Mas antes de Brasília, era Buenos Aires! – Antes de Brasília, a capital era Rio de Janeiro, a cidade que me referi há pouco. Buenos Aires é a capital da Argentina, o país do tango. É a nação de Eva Perón29 e de Carlos Gardel30. O Brasil é o país do melhor carnaval do mundo. Suas mulatas e escolas de samba são apreciadas no mundo inteiro, entretanto você não é o primeiro que confunde a Argentina com o Brasil. Isso demonstra que nossos estabelecimentos de ensino são muito pobres nisso. Valorizamos em

29 Eva Maria Duarte de Perón - Líder política argentina, popularmente conhecida como Evita (Província de Buenos Aires, 07-05-1919 - Buenos Aires, 26-07-1952). Mulher de Juan Domingo Perón, militar e o mais famoso homem público argentino. 30 Maior cantor popular argentino de todos os tempos. Entre suas músicas mais conhecidas estão El Dia Que Me Quiera e Mano a Mano. Apesar de ter morrido num desastre de aviação em 1935, até hoje suas músicas são tocadas em todas as esquinas da Argentina. Os portenhos têm verdadeira veneração por ele.

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demasia nossa cultura, e abominamos a cultura de outros povos. Nós achamos que os demais povos da América são todos aborígenes. – Você sabe que se estivéssemos em tempo de guerra você seria preso? – Por quê? Porque estou dizendo a verdade? – Porque pertencendo às Forças Armadas, suas opiniões são muito conflitantes e duvidosas. – Ora, meu amigo! Vivemos na maior das democracias e você vem com filosofias ultrapassadas, da época medieval! O que é isso?! Por acaso estamos voltando à Era da Inquisição? Sou americano com muito orgulho e, lutarei pela pátria quando for necessário, mas antes de tudo, sou um filho de Deus e, como filho de Deus, fui ensinado a pensar e falar livremente. – Outra hora continuaremos a conversa. Não sabia que tinha um homem de fé e coragem ao meu lado. Mel limitou-se a um sorriso amarelo. Pararam com a conversa quando o helicóptero chegou à Base. Uma ambulância os esperava, mas Glenn preferiu ir em outro veículo. O automóvel que os levava parou diante do Hospital da Base. A esposa e os filhos de Glenn estavam à espera na recepção, e demons- travam grande ansiedade. Mary correu ao vê-lo, abraçando-o efusivamente. Os filhos fizeram o mesmo. Entre uma lágrima e outra, saíam palavras de conforto. Os sogros e dois cunhados solteiros tinham vindo de Kentucky, onde residiam. Os pais e três irmãs esperavam-no também ansiosos. Vinham todos da Califórnia. O pai era um rico proprietário de terras e, seu maior orgulho era dizer a todos, que seu filho era um cientista da NASA. Os genros e netos ficaram cuidando das terras em sua ausência. De todos, era o mais tenso e, ao mesmo tempo, o mais feliz.

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Era um senhor vigoroso para os seus setenta e seis anos e, ao abraçar o filho, ergueu-o ao ar como se fosse um saco cheio de caroços de algodão, impedindo-o de devolver o abraço. Beijou-lhe a face por diversas vezes, até que dona Elizabeth, a mãe, intercedesse delicadamente. – Que susto você nos deu!! – bradou aflito e emocionado. – O que aconteceu? Como você está? – Calma, papai! Estou bem, graças a Deus Nosso Pai. Com o que acabou de ouvir, o velho Errol encarou perplexo o filho, e exclamou curioso: – Deus Nosso Pai! Você está certo de que tudo está perfeito? – Claro, papai! Por que o senhor acha que tem algo errado? – É que estranhei tua maneira de falar. Olhe que sou teu pai! É a primeira vez que ouço sair da tua boca essas palavras. – Que palavras? – interveio a mãe, suavemente. – Ora, mulher! Você não ouviu? Deus Nosso Pai, ora! Você não se recorda quantas vezes tentei ensiná-lo a rezar o Pai Nosso, sem sucesso, e agora ele vem justamente falar exatamente como se estivesse fazendo uma oração. Por isso achei que havia algo estranho! – Ora, pai! Saiu sem querer! Não há nada para se preocupar. Quem sabe estive perto de Deus! Separaram-se todos já perto da sala de raio-x. Acompanhado por uma jovem enfermeira, Glenn atravessou um longo corredor e desapareceu da vista de todos. – Que tal tomarmos um lanche enquanto esperamos? – sugeriu Stone a Mel. – É uma excelente idéia. – Querem lanchar conosco? – convidou Stone, dirigindo-se diretamente ao senhor Errol.

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– Somos gratos pelo convite – antecipou-se dona Elizabeth – mas vamos ficar aguardando o resultado dos exames. – Vai demorar um pouco! – insistiu, Mel. – Não faz mal. Agradecemos de coração.

– Então dêem-nos licença.

Capítulo VII Dois casos famosos

entados confortavelmente, Stone pediu a uma garçonete, dois sucos de laranja, duas porções de batatas, ovos e presunto. Enquanto aguardavam

observou: – Que tal me contar algo a respeito do Rio de Janeiro? Você não é a primeira pessoa que me diz que é uma cidade muito bonita. – É muito linda! A natureza foi muito generosa com aquela gente. Há disparidades e diferenças sociais, mas a maioria do povo vive sempre muito alegre. Na época de carnaval a cidade adquire uma outra vida. As escolas de samba invadem as ruas e desfilam harmoniosamente entre imenso público. Por que nas próximas férias você não faz uma visita à essa cidade? Se quiser, eu e Millie lhe faremos companhia. – Não deixa de ser uma boa idéia. Quem sabe! Você disse que esteve por lá um bom período? Foi a trabalho, ou a passeio? – Fui convidado pelo Instituto Osvaldo Cruz31 para realizar algumas palestras, mas acabei seduzido pelas belezas da cidade e

31 Osvaldo Gonçalves Cruz - Médico e sanitarista brasileiro (São Luís de Paraitinga SP, 05-08-1872 - Petrópolis RJ, 11-02-1917). Fundador da medicina experimental brasileira, coube-lhe a grande tarefa de exterminar a febre amarela e a varíola no Rio de Janeiro.

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acabei ficando por lá dois anos. Durante esse período eu trabalhei como um dos assistentes do Dr. Newton Queiroz, um grande especia- lista em doenças tropicais. Naquela época estávamos às voltas com o mosquito transmissor da dengue. Esses mosquitos eram terríveis. Procriavam aos milhares, em lugares mais adversos. Desenvolviam-se em qualquer água parada. Era muito difícil combater os focos de transmissão. O Dr. Newton era um homem excepcional. Morreu pouco depois de controlar a praga. – Eu já ouvi falar desse Instituto. Se não estiver enganado, Osvaldo Cruz era um médico sanitarista de grande prestígio. Não tenho certeza, mas me parece que ele foi o descobridor da vacina contra a febre amarela. Faz muito tempo que você esteve por lá? – Estive por lá entre os anos de 1981 e 1983. Nesse período o país estava sendo governado por um forte regime militar. Aliás, o que tem dificultado o progresso da maioria dos povos da América do Sul, são as ditaduras. Quando não é o Brasil, é o Chile. Quando não é o Chile, é a Argentina. Quando não é a Argentina, é o Paraguai. Acho que há alguma organização internacional atrás disso... Não será a CIA? – ciciou perto do ouvido de Stone. – Você já ouviu falar na operação Condor? – Olhe o que está dizendo, homem! Acho bom mudarmos de assunto! – Durante o regime militar daquele país, vi muitos de nossos navios de guerra ancorados perto do porto. Quase todos os dias eu cruzava com nossos fuzileiros navais no centro da cidade. Eu não tenho dúvidas de que alguém estava por detrás daquilo. Bem, parece-me que estou me desviando do assunto inicial. Vamos deixar as más coisas para trás e nos atermos às boas e, sem dúvida nenhuma, há muita coisa interessante para se ver no Rio de Janeiro. Você sabia que ela é conhecida como Cidade Maravilhosa? – Pelo visto eles não são nada modestos!

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– Se você for visitá-la vai compreender que ela faz jus a esse título. Além de suas belezas naturais, as mulheres são muito belas. Suas morenas e mulatas são lindíssimas. Suas praias são famosas e atrativas, especialmente à de Copacabana. Um de seus poetas mais queridos, Vinícius de Moraes, fez várias músicas em homenagem à cidade do Rio de Janeiro. Estive também nas cidades de Cabo Frio e Búzios, duas famosas estâncias turísticas. Visitei também os Estados de Minas Gerais e São Paulo. Aliás, São Paulo é uma metrópole tão grande quanto Nova Iorque. É uma cidade cercada por grandes arranha-céus e sua culinária é riquíssima. É a mais importante cidade do Brasil e da América Latina e, sua Bolsa de Valores, só perde em movimento para a bolsa de Nova Iorque. Foi exatamente numa cidade do interior de São Paulo que me inteirei de um fato extraor- dinário. Esse caso aguçou minha curiosidade. Tornou-se pensativo por alguns instantes e retornou, porém antes tomou um gole da laranjada que já havia sido trazida pela garçonete. – Estávamos no fim do ano de 1982, quando fui atraído por uma manchete estampada num jornal da época. Eu já lia e falava o português regularmente, apesar de o português do carioca ser dife- rente do paulista. – Eu pensei que no Brasil falavam o castelhano! Mas deixe pra lá! O que vem a ser carioca e paulista? – É carioca quem nasce no Rio de Janeiro e, é paulista, quem nasce em São Paulo. Há uma grande diferença no sotaque. Pois bem! Lembro-me até do periódico. Era um exemplar do jornal O Estado de S. Paulo. Na página da frente estava estampada uma foto de um homem magro que narrava em detalhes que havia sido seqüestrado por alienígenas. O que se passou foi mais ou menos assim. Deu um gole na laranjada e prosseguiu:

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– Um tal de Silva, que morava em Botucatu, uma cidade do interior, acordou de madrugada para tomar um remédio. Dentro da casa não havia água corrente, por isso saiu para o quintal onde havia uma torneira no tanque de lavar roupas. Entre o tanque e a casa ouviu um barulho estranho parecido com um motor de carro em movi- mento. Curioso, olhou de onde vinha o ruído. Deu outro gole e continuou: – Ao virar o corpo foi surpreendido por uma luz forte; era tão forte que o cegou momentaneamente. Ao recuperar a visão, viu o que chamou de um elevador de luz. No seu interior viu nitida- mente uma figura igual aos padrões humanos, só que essa figura estava protegida por um grande macacão, mais ou menos parecido às atuais vestimentas dos nossos astronautas. Só não estavam cobertos os olhos e a boca. Ele foi sugado pela luz para dentro de uma espa- çonave, onde outro alienígena o esperava. Mas o mais impressionan- te vem agora. Stone olhava fascinado para Mel, enquanto devorava as batatas. Este levou à boca uma fatia de presunto e retornou empol- gado: – Introduzido numa saleta, viu boquiaberto que os alienígenas atravessavam as paredes interiores como se nada existisse. O coitado estava tão apavorado, que não conseguia sequer emitir um único som. – Também não é pra menos – interrompeu Stone com a boca cheia. – E quem não ficaria?! Eu, hein! – Mas você não pode imaginar o que aconteceu depois... – salientou Mel dramatizando. – Pare de me torturar e diga logo, homem! – exclamou Stone afoitamente, deixando cair da boca, algumas batatinhas. Mel segurou a fala por mais alguns segundos, e Stone estava a ponto de estourar.

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– Diga logo! – Detrás de uma das paredes, surgiu uma linda mulher pelada... – Ah! – interrompeu, Stone. – Eu já estava adivinhando que você estava me gozando! Fui muito ingênuo! – Não é gozação, homem, é pura verdade! Era uma linda alienígena de olhos e cabelos negros que vinham até as espáduas. Era mais linda que Rita Hayworth32 na época em que fez o papel de Gilda. Você já imaginou como poderia ser? – dramatizou, atiçando os instintos do companheiro. – E ele, não desmaiou?. – Não, mas tremia feito vara verde. – Isso está ficando cada vez mais interessante! O que houve depois? – A singular e bela alienígena aproximou-se, e sem acanha- mento nenhum, a .... – Já sei!!! O tal de Silva caiu duro! Acertei? Também não é pra menos! Se a Rita com roupa já matava, o que diria uma mulher mais sensual que ela, sem roupa! Rindo pelos cotovelos com o gesto cômico do amigo, Mel quase joga para fora o presunto que estava mastigando. – Não é mesmo?! Nós que pertencemos ao primeiro mundo trememos só de pensar, imagine um caipira daqueles vendo uma deusa pelada diante dele. Ele morreu? – Não morreu, não! Por sinal era um homem bem equilibrado. – Você está brincando! Quer dizer então que ele sobreviveu ao choque? Está vivo? Sem nenhum arranhão? – Bem! Eu não sei se ele ainda está vivo, mas quando o visitei, estava bem saudável. – Você foi vê-lo? 32 Famosa e sensual atriz do cinema norte-americano ( 1918-1987).

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– Fui, só que antes devo contar o que aconteceu depois dele ter ficado cara a cara com a extraterrestre. A mulher, ou sei lá o quê, aproximou-se com uma vareta nas mãos em forma de Y e a encostou perto de seu rosto. Ele retrocedeu timidamente até onde pôde. – Vai ver que a vareta era o órgão sexual da moça! Você não sabe aquela anedota do marciano que gozava com a ponta dos dedos? Se fosse comigo a coisa seria diferente. – No lugar dele o que você faria? – Iria pra cima dela! Pelo menos se tivesse que morrer, morreria nos braços de uma fada alienígena! – Bem! Se formos para o Rio de Janeiro de férias, vou torcer para que você seja raptado por uma linda fada madrinha. Agora pare de encher o saco e me deixe continuar. Como ia dizendo, a mulher, ou sei lá o quê, aproximou-se e tocou com o Y o rosto dele. Após esse momento, ele teve a memória apagada não se recordando de mais nada. Tornou-se lúcido novamente perto das 6 horas da manhã. Estava caído perto do tanque de lavar, nu e com o corpo untado com óleo. A roupa e uma corrente que levava no pescoço estavam no solo. No peito, exatamente sobre o mamilo direito, havia uns estranhos caracteres na pele. – Ele não contou se fez sexo com a dona? – Mas você não tem jeito mesmo! Sei lá se fez sexo com a dona! Tudo indica que sim. Espere um momento! Agora estou me lembrando! Ele depois foi submetido a uma hipnose e confirmou ter feito sexo com a morena. É isso mesmo! – Que felizardo! – Ele contou até o nome do comandante da espaçonave. Cha- mava-se Rama. Ou será que era Ramã! Isso não importa. Quanto ao sinal feito no tórax, parece-me que significava o nome do planeta de onde tinham vindo. Esse não foi o único contato.

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– Isso é um indício que a mulher gostou de fazer amor com ele – insinuou, maliciosamente. – Pare com isso! Sobre o primeiro caso me inteirei pes-soalmente, todavia quanto ao segundo tive ciência através das man- chetes estampadas em diversos jornais da época. Não sei se houve um terceiro. – Você pode descrever esse segundo contato? – Três meses e meio após o ocorrido, numa madrugada quente, Silva foi misteriosamente induzido a se levantar da cama. Como um sonâmbulo dirigiu-se ao quarto da filha e, sem saber porque, forçou levemente a janela, abrindo-a. Diante dele, do lado de fora, estava Ramã, flutuando no ar. O comandante ergueu o braço direito apontando em sua direção. Silva começou a levitar e sem controle dirigiu-se a ele. Pela manhã, sua mulher e filha en- contraram-no, sob a chuva, deitado sob uma árvore do quintal. Trajava somente as roupas de baixo e tinha uma expressão nos olhos diferente. Ele próprio duvidava do que tinha acontecido, entretanto afirmou ter voado sobre a vegetação entendendo-se com Ramã através da telepatia. Apesar do aguaceiro, estava completamente enxuto. – E depois disso? – Pela expressão do teu rosto acho que você não acreditou numa só palavra, não é? – Não é que eu não creio. É que é muito difícil acreditar nessa história. – Mas esse homem humilde foi submetido a uma bateria de exames e foi testado por um psicoterapeuta muito respeitado. – Não esqueça que há muito charlatães espalhados pelo mundo. Você lembra do nome desse senhor? – Ele se chamava Luciano Silva.

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– Não falei?! Não é muita coincidência terem o mesmo apelido?! Alguém ganhou com isso! – Sabe, Stone! Você está me fazendo lembrar dos militares do Projeto Livro Azul. – Por quê? – Porque todos estavam unidos para apagar o mais leve vestígio dos OVNIs. Chegavam a inventar coisas das mais absurdas para ridicularizar as testemunhas. Até os filmes eram colocados sob suspeita. A coisa chegava a tal ponto, que as pobres testemunhas, depois de interrogadas, se negavam a confirmar o que tinham visto. Preferindo passar por mentirosos, vendiam suas propriedades e mudavam-se para outras cidades. De quem eles recebiam ordens para agir dessa maneira? – Talvez agissem assim para não causar pânico entre a população. Nossos maiores dirigentes temem que haja uma histeria coletiva. Você tem de concordar que não sabemos de onde eles vêm, e qual é a finalidade dessas visitas. Não vá você pensar que está falando com um leigo no assunto! Surpreendido com a novidade, Mel encarava o amigo pen- sando estar ouvindo outra pessoa. – Eu também já li muito a respeito desses estranhos objetos. Eu sou um pouco mais velho do que você e, para confirmar que apesar de rir, estava prestando atenção no que você dizia, vou te contar um caso muito famoso que aconteceu aqui mesmo nos Estados Unidos. Trata-se do caso do capitão Mantell. Eu tinha quatro anos quando isso ocorreu. Meu pai, que era piloto de provas naquela ocasião, não se cansava de contar sobre o raro episódio. O capitão Mantell estava a serviço da base aérea de Godman. Enquanto Stone contava a história, Mel aproveitava e limpava seu prato. Agora era ele que demonstrava ansiedade. Stone bebeu o último gole de suco e prosseguiu com a narração.

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– Eu me impressionei de tal forma com o caso, que tenho gravado na memória a data e a hora: 7 de janeiro de 1948, logo após o almoço. A cidade era Kentucky. Um aparelho enorme, redondo, foi avistado sobre Madisonville e voava em direção a Fort Knox, justamente onde estavam armazenadas as reservas de ouro do país. Para ganhar tempo, Mel estalou os dedos chamando a gar- çonete. – O comandante da base, coronel Hix, ordenou imediata- mente a decolagem de três caças. Essa patrulha era comandada pelo capitão Mantell e os caças levavam mísseis de médio alcance. Após sessenta minutos de vôo, o capitão comunicou por rádio à base que o objeto estava em cima dele e que iria tentar se aproximar. Informou logo a seguir que era um vistoso disco com mais de 70 metros de diâmetro. Tinha o formato de um prato e era feito de metal des- conhecido. Segundo ainda o capitão, era um aparelho magnífico e ao mesmo tempo aterrador. Parou por alguns instantes enquanto Mel acertava a conta com a garçonete. – Posso continuar? – Desculpe, Stone. – Em virtude de grandes nuvens, os outros dois caças per- deram de vista o avião-líder e retornaram à base dando por terminada a missão. Durante esse tempo, quando estava a mais de 5.000 metros de altitude, o capitão comunicou que não conseguia alcançar o disco. Esse foi seu último contato. Por volta das 16 horas, foram encon- trados os destroços do avião, porém seu corpo, apesar de intensas buscas, jamais foi achado. Quanto ao avião, tudo indicava que fora estraçalhado no ar. Suspirou levemente e terminou com melancolia: – Esse episódio ficou marcado em minha memória, por isso procuro ignorar outros fatos.

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– Eu entendo como você se sente, mas isso não é motivo para continuar ignorando outras aparições. Eu li algo sobre esse caso por casualidade. Se não estou enganado, esse estranho acontecimento voltou à baila. Parece-me que uma revista do leste entrevistou recentemente um parente do capitão. Estou curioso com uma coisa. Por que depois de tantos anos você ainda está impressionado com o esse caso? Mantell tinha alguma ligação familiar com seu pai? – O capitão foi meu padrinho de batismo. Mudando de assunto, Mel comentou: – Será que os exames terminaram? – Acho que ainda não! Pedi a enfermeira para nos avisar quando acabassem. Quer tomar mais alguma coisa? – Não quero mais nada. Estou satisfeito. – Então vamos nos reunir aos familiares de Glenn. A meio caminho, Stone ouviu uma voz fina chamá-lo. – Dr. Stone! Dr. Stone! Era Rose, a assistente do médico de plantão. – Então? Já terminaram os exames? – Já terminamos, mas há algo muito curioso para ser visto. – Algum ferimento? Alguma lesão que não vímos? – Não senhor. Não foi localizada nenhuma lesão, porém numa das chapas apareceu um diminuto sinal bem na ponta da orelha direita. É quase que imperceptível. Para confirmar, tiramos mais quatro chapas do mesmo local e em todas aparece esse ponto em forma de cruz. Parece-me que foi feita uma incisão no local. Essa é também a opinião do Dr. Douglas. – Vamos dar uma olhada nessas chapas! Colocadas uma a uma sobre um quadro suspenso na parede, via-se claramente na ponta da orelha um estranho sinal. Examinado de perto, não restou dúvida de que aquilo era algo em forma de cruz. Só um grande especialista faria um serviço dessa natureza.

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– O mais estranho – observou o Dr. Douglas –, é que não há nenhum sinal de corte na parte exterior do órgão da audição. Nem sequer uma cicatriz. Stone acariciou pensativo a ponta do queixo, e perguntou a Mel: – Você já viu algo parecido? Antes que Mel emitisse sua opinião, Stone, meio confuso, indagou ao Dr. Douglas: – Você tem certeza de que isso não é um sinal exterior na pele? Um machucado qualquer? – Tenho certeza absoluta. Me parece que são dois pinos colocados transversalmente por um grande cirurgião. Indeciso, Stone encarou Mel, e disse: – O que você acha? – Acho que o Dr. Glenn teve um contato de quarto grau. Tamanha foi a surpresa de Douglas, que ele disse gaguejando: – Co-co-mo assim?! – Eu acho que Glenn foi seqüestrado por alienígenas e, o que estamos vendo nas chapas, seja um transmissor. – Tran-trans-missor?!! Você não está brincando. – Não, caro doutor. Nunca falei mais sério em minha vida. O que você desconhece, é que antes de me tornar assistente de Stone, eu trabalhava para a Aeronáutica no Projeto Livro Azul. Sabe do que eu estou falando, não é? Um pouco mais calmo, Douglas respondeu dessa vez sem gaguejar. – Não sou nenhum especialista no assunto, porém li algo a respeito. Mas o que tem isso a ver com o que estamos tratando? – Quando acordamos o Dr. Glenn, ele disse que tinha a impressão de ter estado em outro lugar. – O que isso prova?

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– No Livro Azul há diversos casos que confirmam minhas suspeitas. Há pouco comentava com Stone sobre um seqüestro ocorrido no Brasil. Não vou contar toda a história novamente. Um homem foi seqüestrado perto de sua casa, e quando o encontraram semidesacordado, apresentava estranhos sinais no tórax, bem perto do mamilo direito. Será que esses sinais não seriam uma evidência parecida com o que estamos vendo? – E com que finalidade fariam isso? – intrometeu-se, Stone. – Pelo que você me contou, ele não era nenhum cientista. Era um simples homem do campo. A não ser que queriam vigiá-lo, como fazemos com os animais em extinção... – Apesar de seus argumentos continuo achando que isso não prova nada – repetiu, Douglas. – Não será melhor tentarmos analisar se essa misteriosa coisa não lhe fará nenhum mal? – Podemos também extraí-lo. O que vocês acham? – sugeriu, Stone. – Eu acho que o paciente é quem deve decidir – opinou, Rose. – Isso pode ser coisa velha. Ele pode nos dar uma pista. – É uma consideração muito sensata – concordou, Douglas. – Mel, você se recorda de alguém que tenha sido operado depois de contar que foi seqüestrado? – Não! – Se realmente for um receptor, acho que o caso passa para a esfera federal. – Indeciso, questionou: não te parece um assunto para o FBI? Ou talvez para a CIA? – Ora, Stone! Para quem estamos trabalhando? Também não somos federais? Não é o governo central que nos paga? – Você talvez não tenha entendido o que eu quis dizer – tentou se desculpar, Stone. – Eu não sou burro! Se levarmos o caso para a CIA ou FBI antes de verificarmos se realmente essa cruzeta é perigosa, aí sim,

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passaremos a ser considerados idiotas. Afinal de contas somos médicos e, se o Dr. Glenn concordar, poderemos fazer uma pequena incisão e retirá-la sem que ninguém tome conhecimento. – Vamos conversar com ele. Glenn estava na sala de espera. – Que tal lhes pareço? – Excelente – respondeu, Stone. – Por gentileza, ouça o que eu tenho a dizer. Em poucos minutos, Glenn ficou a par do que ocorria. – E então? Concorda com a cirurgia? Quando todos pensavam que ele fosse assentir, ouviram exa- tamente o contrário. – Não me parece sensato fazer isso agora. Tenho também muita curiosidade para ver o que significa tudo isso, todavia minha prudência é maior que minha vontade. Ademais, em meus cinqüenta e dois anos de vida jamais senti o contato de um bisturi e, se Deus me permitir, irei para os Seus braços assim como vim. Sem nenhum corte. Sem nenhum arranhão. – Mas você sabe que não lhe resta nenhuma alternativa! – aconselhou Douglas, querendo convencê-lo. – E nós temos de comunicar o fato para as autoridades maiores, o que não é de nosso agrado – ponderou, Stone. – Quem sabe você não foi violentado por algum espião russo! – opinou Mel, com humor. – Então nossas defesas são muito vulneráveis, vocês não acham? Ser raptado e aprisionado dentro de nosso território por um espião vermelho não deixa de ser patético. E o que eu teria para lhes contar? Que estamos tentando chegar à Marte? Até as crianças sabem disso. Douglas parcimonioso, interferiu: – Por favor, conte-nos mais sobre o que o senhor lembra.

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– Eu já contei tudo que sabia, doutor. Não há mais nada a acrescentar. – Tente lembrar-se do lugar para onde o senhor disse ter ido. – Eu não afirmei ter ido. Não me coloquem palavras na boca. Eu disse que me pareceu ter ido! É muito diferente uma e outra afirmação. Quem sabe com o passar dos dias minha lembrança se torne mais rica e mais clara. Achando que aquela conversa não levava a nada, Rose perguntou ao Dr. Glenn: – O senhor já se alimentou? – Logo depois de ser examinado tomei uma vitamina de maçã com cereais. Onde está meu pessoal? – No saguão de entrada. – Gostaria de bater um papo com minha mulher e filhos. Vocês não se importariam, não é? – Conhecendo o bureau como conheço – pressupôs, Mel – de agora em diante você será vigiado. – Eu não estou preocupado com isso. Não tenho nada para esconder. Se alguém quiser me interrogar, estarei pronto. Acreditem, eu sou o mais interessado em saber o que houve. Com relação à cruzeta, se não houver perigo de infecção, ficará dentro de minha orelha como recordação. Será meu amuleto de sorte. – Ou talvez de azar! – preconizou, Stone. – Até mais ver – completou, oferecendo a mão em cumprimento. – Até mais ver – devolveu, Glenn. Os três copiaram o gesto de Stone, e Glenn foi de encontro à família. – Coitado! – comentou Stone com desdém. – Ele não tem idéia do que é a CIA e o FBI. Vamos preparar o relatório. O doutor nos auxiliará no que for preciso, não é?

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Stone caprichou no documento e não omitiu nenhum detalhe. Deu asas à imaginação e, como fazem todos, distorceu alguns fatos.

Capítulo VIII Sob vigilância

uito interessante! – disse Kirk, um dos chefões do FBI. – Quer dizer então que o Dr. Glenn leva um aparelho receptor dentro da orelha. Se for o que

estou deduzindo, ele terá que perdê-la. Não te parece assim, Molly? – perguntou para sua linda assistente. À sua frente estava o relatório do Dr. Stone, se bem que devidamente alterado. Já não era mais uma diminuta cruzeta o que Glenn levava na orelha, mas sim um transmissor de longo alcance. Não sabiam, mas sem querer haviam acertado, pois aquele sinal era o ponto de ligação de Glenn com a espaçonave. Daquele momento em diante, Glenn passou a ser vigiado dia e noite. Passaram-se quatro meses, quando subitamente sentiu um leve formigar na orelha. Justamente era a orelha visada que for- migava. A princípio os sintomas eram raros, mas depois de alguns dias, uma espécie de comichão começou a importuná-lo. Aconse- lhado pela esposa que tinha medo de que fosse um aviso de enfarto ou derrame, marcou uma consulta com seu médico particular. Após passar por uma bateria de exames, chegaram a conclu- são de que o comichão só poderia provir daquele estranho e minús- culo objeto. Convencido pelo médico, decidiu então extraí-lo. – Quando poderá ser feita a extração? – indagou ao clínico que o atendia, cujo nome era Burt.

M

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– Como você sabe, minha especialidade é o coração. Vou encaminhá-lo ao Dr. Gable, um excelente cirurgião. Acomodou-se à mesa e pôs-se a redigir algo numa pequena folha com seu nome e número de registro da ordem médica. – Apresente esta folha à Arlet no fundo do corredor. Ela o encaminhará. Boa sorte. – Grato – agradeceu o cientista, despedindo-se. Mal tinha dado entrada no consultório, quando ouviu perfeita- mente uma voz que lhe dizia: – Não faça isso, Aarão. Virou-se para ver de onde vinha a voz, mas não viu ninguém. A pessoa mais próxima estava a mais de dez metros dele e era exata- mente a auxiliar do médico procurado. – Será que estou delirando? Andou mais alguns passos e tornou a ouvir a voz, desta vez, nitidamente: – Não faça isso, Aarão. – Quem é você? – Sou o teu elo de ligação. Não está reconhecendo minha fala? Sou Asthor. Glenn olhou detidamente para todos os lados e dessa vez viu uma senhora que vinha em sentido contrário. Parou e encarou-a de tal forma que a mulher quase teve um sobressalto. – Por acaso a senhora falou comigo há poucos instantes? – Eu não. – É que eu ouvi alguém me chamando e, ao me virar, dei com a senhora. Desculpe-me pelo importuno. A mulher sorriu e afastou-se sem nada dizer. – Mas o que está acontecendo? Será que estou pirando? – murmurou, entre dentes. A voz retornou mais clara ainda.

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– Não sei o que significa pirando, porém insisto novamente Aarão; não extraia o elo. – Mas que raio de elo é esse! Quem é Aarão? – bradou num tom de voz que não passou despercebido pela recepcionista que estava sentada um pouco mais adiante. Esta se levantou e, com um ar amistoso, dirigiu-lhe a palavra: – Posso ajudá-lo? Glenn, meio sem jeito, respondeu depois de uns segundos: – Acho que realmente estou precisando de ajuda. Raciocinou um pouco e prosseguiu: – Mas preciso da ajuda de um psiquiatra, não de um cirur- gião! – O senhor não está se sentindo bem?. – Sabe que estou em dúvida? – O senhor não é o Dr. Glenn? – Eu mesmo. Posso usar o telefone? – À vontade. Disque zero primeiro para a telefonista soltar uma linha. O senhor está certo de que não está necessitando de ajuda? Sentindo a pressão, Glenn falou num tom fora do normal: – Por que você acha que estou necessitando de ajuda? – Perdão, mas é que tive a impressão de vê-lo falando sozinho. – E o que tem isso? Todos os dias vejo pessoas falando sozinhas. Pois bem! Se eu disser que estou ouvindo uma voz, você acreditaria? Arlet encarou-o e preferiu silenciar. Enquanto silenciava, pensou: – E depois dizem que os loucos estão encerrados! Valha-me Deus!

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Dessa vez Glenn riu gostosamente como se estivesse captando seus pensamentos. Mas é o que realmente estava aconte- cendo. Experimentou: – Quer dizer que a senhorita me acha louco? Surpresa, Arlet corou até as raízes do cabelo. – Então? Ainda acha que está diante de um louco? – Desculpe-me, doutor. Não sabia que o senhor tinha o dom de ler pensamentos. Era exatamente isso que eu estava pensando há pouco, mas não foi por maldade. Trocaram palavras por mais ou menos dez minutos. – Por favor, não fique chateada comigo! Nunca fui indelicado com alguém. Não sei como isso aconteceu. – Mas é certo que o senhor lê pensamentos? – Os teus foram os primeiros. Oxalá isso não se torne uma rotina. Dê-me licença – completou, erguendo o telefone e iniciando a discagem. A recepcionista afastou-se alguns metros quando ele começou a falar no telefone. – Oi, meu bem! Não há nada para se preocupar. Os exames foram todos negativos e fui aconselhado por Burt para procurar um cirurgião. O que você acha? –– Você deve saber o que faz. – Estou com uma ordem de internamento nas mãos, mas me aconteceu um caso curioso e antes de marcar a cirurgia gostaria de ter uma conversa reservada com você. As crianças estão aí? Pergunte a eles se devo adiá-la? –– John está dizendo que sim. – E Ann? –– Também. – Então vou voltar imediatamente. Um beijão! Colocou o fone no gancho, agradeceu e se despediu de Arlet.

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– Que Deus o acompanhe. – Amém – agradeceu, Glenn. Mal havia desaparecido no corredor, quando Arlet foi abor- dada por dois agentes federais. – Bom dia, senhorita – cumprimentou um deles. Arlet devolveu o cumprimento e disse: – O que desejam? O mais alto deles mostrou-lhe uma pequena carteira com um vistoso distintivo e falou amistosamente. – Somos do FBI e queremos fazer-lhe algumas perguntas. Eu sou Tracy e este é meu companheiro Spencer. Arlet fitou-os séria, sem nada entender. – Desculpe-nos senhorita, pela maneira que chegamos. Infelizmente nossa profissão não nos deixa outra alternativa. Estamos interessados no cavalheiro que acaba de sair. – Ora! Se vocês estão interessados nele, por que não o inter- ceptaram? Não estou entendendo. – É porque o assunto que temos de tratar é estritamente confidencial. Por favor não nos entenda mal. Somos agentes seguin- do ordens. O Dr. Glenn está deixando algumas pessoas apreen- sivas, sobretudo depois do acidente que sofreu. – Apreensivas com o quê? Atendemos diariamente dezenas de pessoas acidentadas, todavia nunca fui interrogada por agentes federais. – Mas você há de concordar que nenhum Físico importante passou por aqui antes do Dr. Glenn, não é mesmo? – Nisso vocês têm razão. Vamos lá! Do que se trata? – Podemos contar com sua discrição, não é mesmo? Incomodada, Arlet devolveu: – É tão importante assim? Afinal de contas conversei com ele somente alguns minutos.

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– Se não fosse importante senhorita, não viríamos aborre- cêla. – Por favor, pare de me chamar de senhorita. Trate-me por Arlet. – Está bem. Vamos ao assunto. Você não se importaria de nos contar o teor dessa conversa, não é? Por favor, não esqueça nenhum detalhe. Até as vírgulas são valiosas. – Eu não vi nada de extraordinário em nossa conversa, mas vá lá. Quem sabe vocês tirem algumas conclusões. Eu volto a afirmar: não observei nada diferente. – Vamos começar pelo princípio – disse Tracy. – Por que ele a procurou? – Ele não veio à minha procura. Ele buscava o Dr. Gable. O Dr. Burt do Instituto do Coração foi quem o enviou. Pelo que observei, ele vinha fazer uma cirurgia. Como os dois agentes sabiam da cruzeta, sem que Arlet per- cebesse, trocaram olhares significativos. Fazendo-se de bobo, Tracy jogou o laço: – Cirurgia?!! Que espécie de cirurgia?! – Não li a recomendação do Dr. Burt, mas me pareceu que ele vinha extrair um cisto numa das orelhas. – Muito interessante! – comentou, Spencer. – E por que ele foi embora? – Isso eu não sei. Não sou adivinha. Ele resolveu ir embora depois de telefonar. – Para quem ele telefonou? – insistiu, Spencer. Irritada, Arlet respondeu: – Olhem aqui! Sou curiosa como toda mulher, mas não tenho o costume de ficar ouvindo conversas alheias. Quando ele começou a falar, afastei-me. Posso saber por que tanto mistério?

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– É que depois de ter sido resgatado, ele tem se mostrado por demais evasivo. – Evasivo com quem? Cada vez entendo menos. – É que ele contou ao médico que foi buscá-lo, que tinha a impressão de ter estado viajando no cosmos. Note bem: eu disse im- pressão. Quem sabe ele não foi raptado por algum inimigo e tenham trabalhado sua mente! Arlet segurou o riso e disse: – Eu acho que vocês estão vendo muitos filmes do James Bond33. – Pode ser! Pode ser! Mas não se esqueça de que somos pagos para isso. Afinal, nós fazemos parte de uma sociedade inve- jada, por isso temos de tomar certas precauções. Você não tem a mesma opinião? – Você não notou nada estranho nele? – intrometeu-se, Tracy. – Puxa! Como vocês atiram! Vocês estão tão certos de que há algo de estranho, que estão me contaminando. – Não queremos induzi-la, mas experimente raciocinar como nós – aconselhou, Tracy. – Está bem! Vamos ver se me recordo de algo interessante. – Tente – incentivou, Tracy. – Pode ser que o que eu estou pensando no momento seja útil. Antes de estarmos frente a frente, parece-me tê-lo visto gesticulando. Tive a nítida sensação de que falava com alguém, mas não vi nin- guém por perto. – Conte-nos sobre isso e não omita nenhum detalhe – incen- tivou, Spencer. – Bem, seja lá o que Deus quiser. Espero não me arrepender por isso. Quando me aproximei dele senti que havia algo de anormal. Sou avessa à fantasias, porém tenho certeza que ele estava falando 33 Agente secreto do cinema, mais conhecido como Agente 007.

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com alguém. Perguntei se estava tudo bem e, ele me respondeu que estava precisando da ajuda de um psiquiatra, e não de um cirurgião. Não entendi o que ele quis dizer. Insisti: o senhor precisa de ajuda? Ele respondeu: você está me convencendo que preciso de ajuda. – Fiz nova pergunta: o senhor não é o Dr. Glenn? Ele disse que sim e pediu para usar o telefone. – E depois? – Informei que deveria discar zero para obter uma linha e persisti perguntando se estava certo de que não necessitava de ajuda. Aí ele foi um pouco brusco. – Não entendi! – É que ele respondeu grosseiramente com outra pergunta. – Que pergunta foi essa? – “Por que acha que estou necessitando de ajuda?” Essas foram as palavras. Aí, um pouco chateada, observei: é que há pouco tive a impressão de que o senhor estava falando sozinho. – E o que ele estava dizendo? – “Mas que raio de elo é esse? Quem é Adão?” – Você tem certeza que foram essas as palavras? – Claro como a luz do dia. Eu estava muito perto dele. – Há dente de coelho nisso! – exclamou, Tracy. – Concordo com você. Há algo de esquisito nisso. E depois? Você tem mais alguma coisa a acrescentar? – Quando me aproximei e lhe dirigi a palavra ele não se fez de rogado. Simplesmente disse com ar de deboche: “se eu te contar que estava ouvindo perfeitamente uma voz dirigindo-se a mim, você acreditaria?” – E o que você disse? – Silenciei, mas aí aconteceu um fato inusitado. – Isto está me impressionando cada vez mais! O que houve de tão especial?

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– Ele leu os meus pensamentos... – Leu teus pensamentos!? Você está brincando com a gente? – Como disse antes, fiz silêncio para não polemizar, mas aquilo que desejava dizer, pensei. E não é que ele leu os meus pensa- mentos! – O que você estava pensando? – E depois dizem que os loucos estão encerrados! Valha-me Deus! Ele me olhou e disse com ironia: “quer dizer então que você me acha louco?” Senti meu rosto arder e nada respondi. Ele adi- vinhou o que se passava comigo e se limitou a sorrir desdenho- samente. Para impressionar os agentes ela inventou ter dito a se- guinte frase: acho que o senhor realmente está precisando de um psiquiatra! – Bem feito! Ele bem que mereceu – aplaudiu, Spencer. – Gostaria de estar por perto para ver a cara dele – concordou, Tracy. Apesar de ter inventado o que acabara de dizer, Arlet sentiu o incentivo dos agentes e deu asas à imaginação: – Senti pena dele, porque vi seu rosto corar. Nesse momento compreendi que havia me excedido e me desculpei. Ele me fitou e reclamou quase num sussurro: “acho que nossa conversa, que era por demais enfadonha, tornou-se por demais agressiva”. – Eu também me excedi. Peço-lhe desculpas. – “Não há nada a desculpar, eu é que fui grosseiro. Não sei como me ocorreu dizer aquilo. Cada vez me convenço mais da necessidade de um auxílio profissional.” – Vendo-o cabisbaixo, apressei-me em animá-lo confortando-o: acho que o senhor ainda não se recuperou do susto que sofreu no acidente, isso acontece com todos. – “Quem sabe você esteja com a razão. Agradeço pela fran- queza”.

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– Ele disse mais alguma coisa? – acrescentou, Spencer. – O resto vocês já sabem. Ele falou algumas palavras no telefone e se despediu cabisbaixo. – Mas e quanto à cirurgia? – Acho que a pessoa que estava falando com ele no telefone aconselhou-o a não fazê-la. Spencer olhou com astúcia para seu companheiro e bombar- deou: – Você tem certeza de não ter ouvido nada? Pense um pouco... Posta sob dúvida e a ponto de explodir com o interrogatório, Arlet finalizou entre dentes: – Acho que hoje é meu dia de ouvir desaforos! Além de bis- bilhoteiros, vocês são também mal-educados. Dêem-me licença. Parece-me que estou sendo chamada. Passem bem! Encarou os dois e, com um curto aceno de cabeça, afastou-se sem olhar para trás. Spencer comentou surpreendido:

– Eta mulherzinha braba!

Capítulo IX Com a família

leen ia tenso dentro do táxi. O chauffeur vendo-o calado e taciturno, resolveu imitá-lo. – Pare defronte àquela casa – pediu ao motorista

apontando com o dedo indicador. O profissional parou um pouco mais adiante, porque antes dele, estacionou um ônibus escolar. – Quanto é?

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– Seis dólares e trinta cents. – Fique com o troco – adiantou Glenn, dando-lhe sete dólares. – Obrigado – respondeu o taxista, com cara de quem não havia gostado. Glenn morava numa espaçosa propriedade. Um bem cuidado jardim cercava a construção de estilo inglês, e três pequenos degraus separavam o quintal da entrada principal. A esposa o esperava com a porta entreaberta. Entraram juntos abraçados. O filho estava entretido diante da televisão, e a filha cantarolava uma canção de Elvis diante do espelho. Ao ver o pai parou com a cantoria e saudou: – Oi, pai! – Oi, filha! – E aí? – indagou o filho. – Como foi o exame? – Que exame? – Ora papai, você não disse que ia fazer um exame? – Eu não disse que ia fazer um exame – implicou, Glenn. – Está bem. Que diferença faz isso? Você disse que ia fazer uma cirurgia e resolveu adiá-la. Está bem assim? O quê aconteceu de tão importante para você mudar de idéia? – Prestem atenção! Glenn narrou nos mínimos detalhes o que havia acontecido, inclusive o conselho daquela voz estranha. – O que vocês acham disso? Será que estou ouvindo coisas? – Sinceramente paizão, não sei o que dizer – argumentou John, tentando agradá-lo. – Eu também, pai – completou, Ann. – E você, Mary? – Não sei o que dizer. Por que você não tenta dialogar com essa voz? – Meu Deus!!! Aconteceu novamente! Todos fitaram-no sem nada entender.

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– Meu Deus!!! – repetiu novamente, agora mais alto. – Acon- teceu novamente!!! – O que aconteceu novamente? – perguntou curiosa a mulher. – Adivinhei teu pensamento antes de você me aconselhar para tentar falar com a voz. Vocês não estão entendendo? – Não estou entendendo nada! – respondeu a esposa. Com vivacidade emendou: – É isso mesmo! Quando o assunto está ligado com “ela” sou capaz de ler os pensamentos antes da pessoa se expressar. Mary encarou admirada os filhos e indagou num tom quase patético. – Mas quem é ela? – A voz, mulher! A voz é “ela”! – Espere aí, papai! – interferiu, Ann. – Você está querendo nos dizer que essa voz se faz presente quando estão falando dela? – O que eu quis dizer filha, é que adivinhei o pensamento da tua mãe quando ela estava prestes a falar da voz estranha. – Mas aquela assistente pensou que você estava louco? Não foi isso que você nos relatou? – Mas não se esqueça, filha, de que naquele momento a voz estava presente. – Então acho que agora ela também está presente – arriscou, John. – Proponho fazermos um teste. – Que espécie de teste você está sugerindo? – indagou a mãe. – Vou pensar em algo e o pai terá que adivinhar o que está passando pela minha cabeça. Que tal, velhão? Você concorda? – Muito bem! Pense em algo. Antes que a charada estivesse completa, uma nítida voz invadiu a sala. – Posso participar? John olhou o pai, e disse confuso:

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– O que é isso, pai? Você está com gozação? – Ora, filho! Por que eu faria isso? – Eu não sabia que você era ventríloquo! – Essa voz não partiu dele – disse Mary. – Conheço muito bem teu pai e sei quando ele está brincando. Não é mesmo, meu bem? – perguntou, com uma ponta de malícia. – Mas vocês não estão percebendo que essa voz não está saindo dos meus lábios? – E de onde então está saindo? – falou a filha, que parecia estar mais calma. – Por favor papai, você está começando a me deixar apreensiva. – Mas filha, você também acha que estou inventando? Que estou brincando com uma coisa tão séria? Por que faria isso? Ninguém se atreveu a contestar. – Está bem! Que tal então voltarmos a nossa brincadeira inicial? – sugeriu, John. – Posso participar? – repetiu a voz. – Claro! Por que não! Do que o senhor quer brincar?

– Observem a orelha direita de seu pai. Verifiquem que quando eu falo ela muda de cor. Estão notando? – É mesmo!!! – explodiu aos gritos Mary. – Olhem, filhos! Ela ficou transparente. Agora se vê nitidamente uma cruzeta. – Pois é! O som de minha voz está saindo do que você qualificou como uma cruzeta. Gostei do nome! Vou adotá-lo – comentou, rindo. – Agora estou rindo, não é mesmo? Vocês também gostam de rir, não é assim? – Claro que rimos! – exclamou exasperado Glenn, perce- bendo que aquela voz era diferente da voz que tinha ouvido no con- sultório médico. Para aumentar sua ansiedade, o personagem captou seus pen- samentos e resumiu:

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– Você tem razão, Aarão. A voz que você ouviu no consul- tório não era a minha. Reparando que o pai estava a ponto de explodir, Ann atalhou conciliadora: – Tenha paciência papai, vamos continuar ouvindo sem per- der a calma. – Muito bem minha jovem. Além de muito bonita você é muito perspicaz. Vaidosa como toda mocinha, Ann, arriscou: – Como o senhor sabe que sou bonita? O senhor está nos vendo? – Quer que eu descreva suas roupas? – Quer dizer que o senhor está perto de nós? Quem sabe, invisível? Uma sonora gargalhada soou pelos quatro cantos da sala. – Não estou aí não! Estamos a 47.812 quilômetros de distância. Vejo-os através de um aparelho. Nós o chamamos de Tela Panorâmica e vocês de Televisão. – Mas aonde estão as câmaras? – insistiu, Ann. – Pergunte ao teu pai! – provocou a voz, com outra sonora gargalhada. – Meu pai?!!! – Exatamente. Teu pai quando viajou ao lado de Asthor teve oportunidade de ver coisas impressionantes aqui do alto. – Seja quem for – interrompeu bruscamente Glenn – você quer parar com esse lengalenga e nos tirar desse sofrimento? – Que sofrimento? Por acaso você está sentindo alguma dor? É física ou mental? Eu posso retirá-la daqui. Descontrolado, Glenn bradou:

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– Eu não estou sentindo nenhuma dor, homem, ou seja lá o que for!! Você não está vendo que foi só uma maneira de me expres- sar? Pare com essa enrolação!! – Procure se controlar, homem! Sejamos amigos e ponto final. Está bem assim? Como prova de minha amizade vou alertá-lo. Neste exato momento estão falando de você. Daqui estou vendo dois agentes do serviço secreto confabulando. Dentro de algumas horas você receberá um convite para comparecer a um centro médico. Ali você será interrogado. Creio que vão submetê-lo a uma sessão de hipnose. – E com que finalidade farão isso? – Querem saber onde você esteve. Você vem sendo vigiado desde que retornou. – Vigiado!!! – exclamou Mary, indignada. – Você, seja lá quem for, não sabe que Glenn é um herói nacional? Ora, ora! Meu marido é muitíssimo respeitado no mundo científico. O que ele fez para estar sendo vigiado? – Você deve perguntar isso a eles. Não a mim. Nós sabemos que ele não fez nada, é um excelente patriota e ótimo chefe de família. Por favor, quero saber antes que me esqueça, o que significa lengalenga? Ainda não me habituei com algumas expressões. – Essa palavra significa conversa fiada. Sem nenhum valor – afirmou, John. – Chiii! – Agora ficou pior! – Até agora você não nos disse seu nome – observou Ann. – Nós não sabemos ler as mentes como você. É um segredo ou pode- mos sabê-lo? – Sou Lemur, do planeta Agali, um mundo um pouco retirado do vosso sistema solar. Estou me comunicando da sala de comando de minha espaçonave. Sou o subcomandante.

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– “Alguém está querendo brincar com a gente” – pensou, John. – Você continua pensando que é brincadeira, não é, rapaz? – captou, Lemur. – Como você faz isso? – É muito simples. Em nosso mundo não falamos. Usamos somente a telepatia. É suficiente. – Eu quero saber como vocês lêem nossas mentes? – insistiu, John. – Isso é muito difícil de explicar. Contente-se com isso: somos muito mais adiantados do que vocês. – E o meu pai? – questionou, Ann. – O que tem o teu pai? – Ele leu os pensamentos de minha mãe? – O teu pai tem uma mente cósmica, portanto está em condições de fazer algumas coisas excepcionais. Além disso, essa cruzeta feita de puro roble, que foi implantada em sua orelha pela equipe de Asthor, lhe dá condições de nos ouvir e ler vossos pensa- mentos. Só que esses pensamentos devem estar sempre ligados à sua pessoa. Entenderam? Por alguns instantes reinou o silêncio. Como ninguém se atre- veu a acrescentar nada, a voz voltou: – A missão que está sendo preparada para Glenn é muito delicada. Terá que contar com a colaboração de vocês e, princi- palmente, que haja absoluto sigilo enquanto estivermos preparando o terreno. – Que missão é essa? – disse Glenn. – Desde já faço um alerta: em hipótese alguma vou trair minha Pátria. – Ora, Glenn! Que infeliz idéia! Quem disse que você será um traidor? Jamais iremos pedir para que você faça algo contrário aos teus princípios. Corrijam-me se usei mal a palavra. Você não terá

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que contrariar uma só lei. Sabemos como você raciocina. É por isso que será um importante mediador. – Vocês podem me adiantar algo? – Primeiro você terá que convencer a todos que existimos. Depois, pedir para desativarem as armas de guerra. Agora calmo, Glenn, contestou: – Aí vocês descem e nos escravizam, não é? – Se quiséssemos escravizá-los, já o teríamos feito. Vossas armas são simples brinquedos perto das nossas. Comparada à nossa, vossa ciência ainda é muito atrasada. Atrevo-me a contar que sem nossa ajuda vocês estariam ainda gatinhando. Acompanhamos o progresso dos homens desde que a Terra se aqueceu. – Quer dizer então que você é imortal? – Tomos nós somos imortais. Você e os teus também são imortais. O que vocês chamam de Deus, nós chamamos de Altíssimo ou Supremo. Não se impressionem. Somos todos filhos Dele. Ou vocês imaginam que só na Terra há vida inteligente? – Como Físico sou obrigado a acreditar somente em fatos. Ainda não fizemos nenhum contato com um ser alienígena. – E o que você me diz daquele elemento que está trabalhando na base de Nevada? Não é um alienígena? – Você também sabe que existe uma base naquela área? – Ora, meu amigo! Para nós não existem segredos! Não acabei de dizer que acompanhamos vossos passos há muito tempo? – Mas do que vocês estão falando? – intrometeu-se Mary, bruscamente. – Não é nada, meu bem! Nada! – repetiu o marido, tentando convencê-la. – Nada!!! Vocês estão pensando que somos idiotas? – frisou, com profunda irritação. – Que elemento é esse, pai? – perguntou, John.

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– Ora, ora! Quer dizer que vocês não sabem? – desafiou Lemur. – Está vendo como vocês escondem certos fatos! Se seus filhos não sabem, é sinal que o povo também não sabe. Você tem de concordar que não somos culpados se ainda somos ignorados. Por instantes voltou o silêncio. Observando que ninguém dizia nada, Lemur continuou: – Centenas de alienígenas de várias partes do Universo já fizeram contato com os homens. Desde o início da civilização eles são feitos. Como é que vocês imaginam que o homem apareceu na Terra? – Segundo o professor Darwin34 evoluímos dos primatas – respondeu Glenn, ligeiramente incomodado. – Para um famoso homem de ciências, vejo que suas teorias são muito peregrinas. Não entendendo o que significava peregrinas, Mary exclamou ainda alterada: – Você quer fazer o favor de falar em nossa língua? O que significa peregrinas? – Eu quis dizer que Glenn estava se apegando a uma estranha teoria. Isso é o que significa peregrina. Além de confusa, ela é bas- tante falha. O homem não evoluiu dos primatas. Esse conhecimento especulativo é um verdadeiro absurdo! – Se não evoluímos deles, de quem então evoluímos? – argu- mentou John, interessado. – De nós, ora! Vocês ainda não perceberam que são nossos descendentes? Os planetas quando estão em condições de receber vida inteligente, são sempre visitados por outras civilizações. No Universo há muitas civilizações adiantadas. O ser humano nunca foi bicho, apesar de alguns agirem como tal. Os animais são formas 34 Charles Robert Darwin - Naturalista inglês (Shrewsbury 12-11-1809 - Down, 19-04-1882). É de sua autoria a mais preciosa obra sobre a origem das espécies.

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distintas de vida. Não raciocinam como os homens. O ser humano está sempre em evolução, e é isso que o faz diferente. Notem que o chimpanzé, que é tão antigo quanto o homem, ainda permanece com a mesma aparência e os mesmos gestos. Estão errados os que pensam que eles se transformarão em seres humanos. Os animais são irra- cionais, também têm sentimentos e são muito carinhosos, mas jamais praticarão a ciência dos homens. Os golfinhos e os macacos são muito inteligentes, mas por mais inteligentes que sejam, jamais terão a inteligência de uma criança. É uma aberração comparar os homens com os macacos, apesar deles serem muito ativos e imitarem os gestos humanos. Um dia tudo isso será esclarecido. – E quanto a você? Podemos vê-lo? – pediu Ann, surpreen- dendo a todos. – Dentro em breve vocês me verão e viajaremos juntos. Demonstrando diáfana alegria, John indagou: – Você está dizendo que faremos um passeio pela Galáxia? Foi isso que entendi? – Perfeitamente. Você ouviu direito. Quando chegar o momento, você poderá apreciar a Terra aqui de cima. Ela é linda. Por ora nos entenderemos à distância. Peço-vos que analisem o que vos disse, e se for necessário falar a alguém sobre essa nossa conversa, tomem cuidado. Que a paz do Altíssimo esteja com todos. – Amem! – disse Mary, fazendo o sinal da cruz.

Capítulo X Sugestão

o tempo em que venciam a distância que os separava do carro, os agentes conversavam baixinho como se estivessem sendo vigiados. N

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– O que você acha? – sussurrou, Spencer. – Ele está escondendo algo. Apesar de seu passado limpo, ele está recebendo ordens de alguém – respondeu, Tracy. Dando rédeas à imaginação, Spencer comentou: – Será que nessa história não há um dedo vermelho? O que te parece? – Tudo é possível. Uma coisa continua me intrigando. Será que ele recebeu ordens para extrair o elo de ligação? Será que não estão querendo apagar possíveis vestígios? – Que raio de elo de ligação é esse? – indagou desatento, Spencer. Dando asas às idéias, Tracy inventou: – O aparelho que ele carrega na orelha. Você já se esqueceu que ele tem um transmissor naquela orelha? – Os vermelhos não seriam tão burros a ponto de introduzir dentro da pele, algo visível. – Você têm razão. Eles são muito atrasados, mas não são tão imbecis. – Se não são russos, quem pode ser? Árabes? Cubanos? – Pare de querer adivinhar. Acho que o chefe tem uma pista. O chefão Kirk esperava-os impaciente ao lado de Molly e de um homem elegantemente vestido, que não obstante ser calvo, aparentava ter pouca idade. – E então? – perguntou Kirk à queima-roupa. – O que ele foi fazer no hospital? – A recepcionista disse que ele foi fazer uma cirurgia – ante- cipou-se, Tracy. – E aí? Fez a cirurgia? – Não – respondeu, Spencer. – Não!!! Mas então que diabos ele foi fazer lá? – Calma! – intercedeu, o calvo.

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– Como, calma! Não é você que está sendo pressionado! Spencer encarou Tracy sem nada entender. O careca, cujo nome era Alfred, olhou de frente Kirk e disse num tom de voz exces- sivamente agressivo: – Quem foi a besta que contou a você que não estou sendo pressionado? Ou você pensa que só os que usam distintivos são fiscalizados? Nós somos também agentes disfarçados. Esse caso já se espalhou pelo país. Correm muitos boatos e o Presidente está cobran- do o Secretário. Como seu auxiliar mais direto ele vem pra cima de mim. Eu imprenso você contra a parede e você judia desses dois. Não é assim que funciona o sistema? Ora, Kirk! O que temos de fazer rapidamente é solucionar esse caso. Temos que tomar medidas mais concretas. Por que não convocamos o Dr. Glenn para uma conversa reservada? Nossos colegas da CIA acham que ele passou para o outro lado. – Que tal sermos razoáveis e seguir o conselho de Alfred? – sugeriu, Molly. Indeciso, Kirk disse a Spencer: – O que você tem a dizer? – É uma boa sugestão. Sob pressão ele deve confessar. Alfred fuzilou o agente com os olhos saltando das órbitas. – Confessar o quê, seu idiota? Você pensa que estamos lidando com algum terrorista? Glenn é um dos nossos mais queridos cientistas e ninguém vai submetê-lo a um duro interrogatório. Pelo menos até que eu esteja acompanhando esse caso. Vamos ter uma conversa amigável. Se não for possível obter alguma informação mais precisa, iremos ao Chefe da Nação. Ele decidirá o que temos que fazer. Compreenderam? Só teremos problemas se ultrapassarmos os limites. – Não precisamos chegar a isso – aconselhou, Kirk. – Spencer não soube se expressar. Seguiu um maldito e velho hábito.

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– Vamos chamá-lo para uma conversa amistosa – instruiu, Alfred. – Molly é a pessoa certa para fazer o convite. – Grata pela confiança – sorriu, Molly. – Quando vamos nos reunir? – Vou ligar para Paul e pedir instruções. Sei que ele está com sua agenda cheia, mas devido à gravidade do assunto talvez queira estar presente. – Onde faremos a reunião? – insistiu, Molly. – Aqui mesmo. Mas vejam bem! Nada de gravadores. Tudo deve ser muito claro. Vamos evitar qualquer espécie de constrangi- mento. Não esqueçam! Ele é pessoa de confiança do Presidente. – Não sabia que ele era ligado à Casa Branca – comentou Spencer, para surpresa dos demais. – Glenn serviu nas Forças Armadas ao lado Presidente. Os dois têm a mesma idade. Devemos pisar com cuidado. A palavra traição deve ser riscada. Ouviram? Ele, o pai e o avô foram con- decorados na guerra. Vocês percebem agora com quem estamos lidando? Ele não é uma pessoa qualquer, portanto tenham muito cuidado. É um cientista muito respeitado e, até que se prove o contrário, um patriota como poucos. Como um homem com essas qualidades pode ser um traidor? Há algo muito esquisito nessa história. Eu estou achando que o tal do Dr. Stone exagerou quando fez o relatório. – Perdão, Dr. Alfred – voltou Spencer, querendo agradá-lo. – Juro que jamais pensei submetê-lo a qualquer tipo de castigo, e não quero que o senhor tenha uma impressão errada de nós. Quando falei pressão, quis dizer que íamos submetê-lo a um interrogatório rigo- roso. Isso é praxe aqui. Não é mesmo, chefe? – Eu entendi, Spencer. Não se preocupe. Todos pensam que nós somos açougueiros – saiu Kirk em defesa do auxiliar.

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– Ora, ora! – caprichou Alfred na ironia. – Não se façam de santinhos. Eu conheço os métodos, só não quero que usem-nos em pessoas do nosso lado. Depois de falar com Paul ligarei marcando dia e hora para a reunião. – Pra mim está bem– concordou, Kirk. – Então fica tudo acertado. Aguardem meu telefonema. Se não há mais nada, “so long”! – “So long”! – responderam todos ao mesmo tempo. Mal Alfred sumiu de vista, Kirk encarou carrancudo Spencer, e o censurou quase aos gritos: – Você precisa ter mais cuidado com essa sua boca nojenta!!! Você ainda pensa que está lidando com marginais de bairro? Quando você vai controlar esses seus impulsos? Esse homem tem autoridade para nos pôr pra fora! Se eu não receber minha aposentadoria de forma integral, eu te mato! Fui bem claro!!?? – Perdão, chefe. – Se você der mais uma rata, juro por minha mãe que te colocarei fora daqui a pontapés!!! Entendeu?!!! – Se eu soubesse quem era esse homem, seria mais cuidadoso – explicou querendo se defender. – E desde quando imprensamos alguém na parede? Não precisamos utilizar nenhum método antigo para arrancar uma confis- são. Para que serve então toda essa parafernália de máquinas? E esses computadores? Será que todos os meios científicos colocados ao nosso alcance não servem pra nada? Estufou o peito e entoou com orgulho: – Será que eu tenho que repetir que nós pertencemos à mais preparada polícia do mundo? Repito novamente: não precisamos utilizar nenhum método antigo para arrancar uma confissão! Muito menos quando o suspeito for um norte-americano! – Prometo que isso não vai mais ocorrer.

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– Muito bem! Agora contem-me em detalhes o que vocês viram. Os dois agentes não omitiram nada. Kirk ouvia atentamente procurando tirar algo mais proveitoso. Quando terminaram, quis saber a opinião de Molly: – O que te parece? – Parece absurdo chefe, porém vou dizer algo que ninguém sequer pensou. Seis olhos se moveram na mesma direção. – Não quero que debochem de mim, entenderam? – Desembuche logo, mulher! – cutucou, Kirk. – Por que iría- mos fazer isso? – Porque o que vou dizer poderá parecer fantasioso. – Fez uma interessante pose e concluiu: acho que o Dr. Glenn foi raptado por alienígenas. – Antes que alguém desse um palpite, completou: não se esqueçam de que ele admitiu ter dito que fez uma viagem. Examinei por minha conta o relatório H e notei que havia algo intri- gante. – Como por exemplo... – falou impressionado, Kirk. – O avião, por exemplo... – O que tem o avião? – No relatório há um longo comentário a respeito. – Você está me conduzindo a um labirinto sem saída. Diga logo o que tem de errado no relatório! – Ora, chefe! Como um avião pode cair no solo sem comando, e não sofrer nenhum arranhão? – Mas ele perdeu uma asa!!! – Será que a asa não foi arrancada para disfarçar? Para simular um acidente? Embora curiosos, os três permaneceram impassíveis e calados.

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Molly cerrou levemente os olhos, como se desejasse impres- sioná-los, e finalizou imitando Sherlock Holmes35: – Algum de vocês poderia dizer porquê o avião embicou e não teve nenhum arranhão? – Porque o destino não quis, ora! – exclamou, Tracy. – Ouçam-me bem. A asa pode ter sido arrancada por algum arbusto, mas e quanto ao bico? Como pode um aeroplano de mais de uma tonelada cair no solo de frente e não ter um único amassado? Sequer deixar um simples vestígio! Um leve rastro! Como dizia minha avó, aqui há dente de coelho! Kirk saboreava aquelas palavras com indisfarçável alegria. A expressão do rosto mostrava que aquelas palavras o estavam conta- giando. Spencer, em contrapartida, parecia não estar gostando. Tracy mantinha-se impassível. Kirk estava tão impressionado com a expla- nação, que emendou elogiando: – Muito eloqüente! Continue, por favor! Animada, Molly encheu-se de coragem e falou demonstrando infinito prazer: – Desde que me aventurei em analisar esse caso, senti que havia algo errado, todavia preferi silenciar para vocês não pensarem que eu estava me metendo em área que não é minha. Kirk fitava-a admirado, no entretanto Spencer, com os brios feridos, perguntou malcriado: – E desde quando você está se ocupando desse caso? – Antes que Molly se aventurasse em responder, prosseguiu: como você teve acesso a ele? Antes que ela devolvesse o insulto, Kirk saiu em sua defesa e falou encarando o auxiliar:

35 Famoso detetive amador, personagem de uma série de notáveis histórias policiais criadas por Conan Doyle, escritor inglês (Edinburg, Escócia, 22-05-1859 –– Crowborough, Inglaterra, 07-07-1930).

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– Você não sabe que Molly é minha assistente e, portanto tem acesso a todas as investigações feitas em meu gabinete? Por que a grosseria? Por acaso está com ciúmes? – Por que eu teria ciúmes? – É o que está me parecendo. Entre nós não devem existir segredos de profissão! Eu aceito todo e qualquer palpite que nos leve a uma resposta. Já estou velho demais para futricas ou agrados. Quero soluções e não medalhas. Por acaso você às têm? – provocou, mirando de frente. – Desculpe-me, chefe. Não sei o que se passou comigo. – Não peça desculpas a mim! – Não precisamos chegar a isso. Eu é que devo me desculpar. Fui além demais na minha exposição. – Chega de conversa mole!!! – explodiu, Kirk. – De agora em diante, quem tiver uma opinião a dar, que a dê! Sem constran- gimentos! Sem lero-lero! Entenderam?!!! Inspirou profundamente e disse à Tracy: – Dê-me a sua! – A minha o quê? – Por acaso estamos falando de cebolas? Quero a sua opinião! – Tem sentido o que Molly expôs. Há algo escabroso nessa história. Estou com ela. Spencer a muito custo não partiu pra cima de Tracy. Olhou-o espantado, e vociferou: – Estamos nesse caso há quatro meses e nunca ouvi sair da tua boca qualquer insinuação a respeito do que Molly acaba de dizer. O que é isso? Uma conspiração? Por que agora você está falando desse jeito? – Porque não me atrevia dizer abertamente, ora! – limitou-se a responder, Tracy. – E por quê? – insistiu ameaçador, Spencer.

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– Porque quando falamos de vida no espaço somos vistos como loucos. Somente por isso. – E desde quando você se interessa por vida alienígena? – Desde meus tempos de estudante. – Você está querendo brincar comigo? – Por que faria isso? Acontece que nunca surgiu a oportu- nidade de falarmos sobre isso. Sempre estivemos envolvidos com outras coisas. – Não é possível – exclamou indignado, Spencer. – Quer dizer então que estamos juntos há mais de quatro anos e não tivemos tempo de falar sobre vida no espaço? É isso que você está querendo dizer? Tracy assombrado com a disposição do amigo, procurou ame- nizar: – Você não está lembrado quando comentei com você sobre o filme Uma Odisséia no Espaço? Spencer encarou-o curioso. – Quando fiz o comentário sobre extraterrestres, você me censurou e ainda debochou, aí me calei e resolvi mudar de assunto. Você não se recorda? Vendo que a conversa não levava a nada, Kirk disse alto: – Afinal o que é isso? Um interrogatório? Parem com isso já! Vocês estão parecendo duas velhas rabugentas! Por que você acha que tem algo de extraordinário nessa história, Molly? – É que o Dr. Glenn mudou seus hábitos de vida. Ele sempre foi um homem muito alegre e equilibrado, e agora tem se mostrado arredio até com os seus colegas de trabalho. – Como você está sabendo disso? – prosseguiu Spencer, des- confiado.

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– Sua assistente me contou que depois do acidente o Dr. Glenn é outra pessoa. Antes que vocês perguntem, a assistente se chama Sally. Dra. Sally! – Ora bolas! – criticou, Spencer. – Eu sempre soube que quem chega perto da morte muda seus hábitos, especialmente se tem contas a pagar. Molly não se sentiu incomodada com a alfinetada. Seguiu seu comentário tranqüilamente. – A Dra. Sally disse-me que ele sempre foi um homem expan- sivo e solidário com os colegas de profissão e, depois do acidente, tornou-se calado e arredio. Tem se portado como se estivesse sendo vigiado. Ela afirmou tê-lo visto falando sem ter ninguém por perto. Ademais, sempre fez suas experiências ao lado dela e de dois auxilia- res, mas agora se fecha no laboratório e fica horas isolado. – É! – disse Kirk, alisando o queixo. – Acho que faz sentido. – Será, chefe, – palpitou, Spencer – que ele não bateu a cabe- ça no painel? – Pare com piadas! – repreendeu, Kirk. – Mas eu não estou fazendo piadas! O impacto pode ter afe- tado alguns neurônios. – Acho que quem está com os neurônios fora do lugar é você! – Mas chefe, pense um pouco nisso! – Está bem! Se isso ocorreu, logo saberemos! – E como? – Vamos submetê-lo a um exame rigoroso. Antes da entre- vista vamos conversar com ele isoladamente. Se não tiver nada a esconder concordará com o exame, do contrário, como Molly obser- vou, há dente de coelho nessa história. Coçou de leve a ponta do nariz, e ordenou a Molly: – A partir de agora você está encarregada de trazê-lo. Você, Spencer, irá com Tracy ao Centro Médico e convidará o Dr. Lara

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para estar presente. Ele é um velho conhecido meu. Quero a presença de um psiquiatra quando tivermos que interrogá-lo. Explique direi- tinho ao meu amigo do que se trata. Ele compreenderá. Inspirou levemente o ar e completou: – Acredito que 48 horas sejam suficientes. Se surgir algum problema vocês sabem onde me encontrar. Boa sorte para todos. – Posso dar um palpite? – disse Molly, suavemente. – O senhor não acha que invés de um psiquiatra deveríamos convidar um especialista em regressão? Quem sabe sob hipnose ele conte o que aconteceu! – Puxa vida!! – concordou Kirk, com uma expressão de júbilo. – Você tem razão! Como não pensei nisso antes?! Spencer, também contagiado pela idéia, sugeriu: – Que tal convidarmos o Dr. Pablo? – Pablo!!! Quem é esse Pablo? – É um especialista espanhol que está fazendo uma demons- tração a convite da Faculdade de Medicina. Eu o vi ontem no noti- ciário das dez na CNN – expôs Molly, ajudando Spencer. – Eu não tenho nada contra os espanhóis, mas isso está fora de cogitação. Nós não sabemos ainda o que Glenn irá revelar. E se ele revelar alguns de nossos segredos? – Tem razão, chefe. Eu não havia pensado nisso. – Você disse, Molly, que esse tal Pablo foi convidado pela Faculdade de Medicina? – Certo! – Então por que não convidamos o profissional que o trouxe? Esse indivíduo deve também entender do assunto; o que acham? Você não quer se ocupar disso, Spencer? – Claro, chefe! – Vá com ele Tracy, e faça com que tudo dê certo. – Não seria melhor o senhor avisar Alfred?

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– Pode deixar, Molly. Eu já havia pensado nisso. Assim que vocês saírem conversarei com ele. Não se preocupe. Faça figa para tudo dar certo. Mal sumiram, Kirk levantou o fone e discou um número que tinha na memória. O telefone tocou duas vezes e uma voz feminina atendeu prontamente o chamado. –– Hotel Palace às suas ordens. – Por favor, apartamento 23. –– Quem devo anunciar. – Kirk, do FBI. –– Aguarde um momento. – Alô, Alfred. É Kirk. –– O que está havendo? – Assim que você saiu, Molly fez uma observação muito interessante. –– Pare com enrolação e vá direto ao assunto. – Está bem! Ela acha que o Dr. Glenn foi raptado por seres extraterrestres. Alfred não se conteve e deu uma estridente gargalhada, fazen- do com que o Capitão afastasse o aparelho do ouvido. – Não ria, homem! Escute primeiro! –– Está bem! Seja breve. Ainda não jantei. Kirk caprichou na exposição. – O que te parece? –– É possível. – Pedi a Molly para traze-lo antes da reunião. O que você sugere? –– Diante desses fatos te desejo sorte. – Deixe comigo! Acho que nosso amigo vai concordar. Molly tem um poder persuasivo fabuloso. Nenhuma objeção?

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–– Só uma: quero estar presente. – Então estamos conversados. Amanhã a estas horas ligarei novamente. Fique tranqüilo. Até logo mais. –– Até logo mais.

Capítulo XI

Um “fenômeno controlado”

lenn trocava idéias com a mulher e os filhos, quando soou a campainha. – Veja quem é – pediu Mary à empregada. –

Quem será a estas horas? Você está esperando alguém, meu bem? – Como hoje não fui ao Laboratório, pedi a Sally que viesse caso houvesse algo novo. Talvez seja ela. – Estou ouvindo voz de mulher – observou John, que estava mais perto da entrada. Era Molly conversando com a auxiliar da casa. – Por gentileza, diga ao Dr. Glenn que é muito importante. Por favor, dê-lhe este cartão. Dool pediu licença e dirigiu-se ao patrão com o cartão na mão. – Quem é? – indagou, Mary. – Não entendi bem! Parece que é uma agente policial. Glenn leu o nome impresso no cartão e ordenou: – Diga-lhe que entre. Acho que Lemur estava certo – dedu- ziu, encarando os filhos. – Por favor, queira entrar. – Obrigada – agradeceu, Molly. Após as apresentações, Glenn falou sorrindo: – Pois não! Em que posso ser útil?

G

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– Perdão pelo adiantado da hora. É que minha visita é extre- mamente sigilosa. Sou agente do FBI, como o senhor já pôde ver na apresentação, e me sinto muito lisonjeada pela amável hospitalidade. Não sei por onde começar. – Tente! – incentivou, Mary. – Por favor – encorajou, Glenn. – Sinta-se em casa. – Fui incumbida pelo meu chefe para vir fazer um convite ao senhor. – Mas isso é muito lisonjeiro! – comentou Glenn, procurando animá-la Mary fitou o marido com uma ponta de malícia nos olhos. – Diga logo minha jovem! Não se acanhe – sorriu o chefe da casa. – Por favor, não considere um absurdo o que vim propor ao senhor. – Sem saber do que se trata não posso tecer nenhum comen- tário. – Nosso departamento está preocupado com o que o senhor leva na orelha e, por isso, querem submeter o senhor a uma sessão de hipnose. – Como vocês sabem que eu tenho algo na orelha? – Quando o senhor foi examinado no Hospital da Base, o Dr. Stone fez um relatório e o enviou ao Serviço Secreto. Esse documen- to veio parar em nossas mãos. – E o que vocês pretendem saber através da hipnose? – O que realmente aconteceu na sua ausência. Onde o senhor esteve e algumas coisas mais... – Por exemplo, o quê? – Vou ser sincera com o senhor; o pessoal da segurança está muito preocupado com seu modo de agir depois do acidente. Fui eu

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mesma que sugeri essa sessão de hipnose, mas se o senhor não esti- ver de acordo, ela não será feita. – Antes de mais nada – interrompeu delicadamente, Glenn – podemos oferecer-lhe algo? Talvez um café, ou quem sabe, um licor? Molly, diante da inesperada oferta e, vendo a calma estampa- da no rosto de seu interlocutor, ficou levemente embaraçada. – Temos um licor delicioso – emendou, Mary. – Obrigada. Se não se importam, vou aceitar um pouco d’água antes do licor. Dool apressou-se em servi-la, enquanto Glenn a olhava sor- ridente. – Sabe no que estou pensando, meu bem? Como uma pessoa jovem e tão bela possa ser uma agente! Nem nos filmes do 007 tinham moças tão bonitas! Não estou certo? – Sabe que é nisso que eu estava pensando? – assentiu Mary, procurando caprichar na gentileza. – Vocês são muitos gentis – limitou-se a dizer, Molly. – Bem! Vamos ao que interessa. Para quando você quer que eu me apresente para a tal sessão? – Quer dizer que o senhor concorda? – Eu estou muito interessado em saber o que realmente acon- teceu. Quando posso me apresentar? – O senhor é quem sabe. – Que tal amanhã às dezessete horas? – Para mim está ótimo, mas antes tenho que confirmar o horário com meu chefe. O senhor me permite usar o telefone? – Esteja à vontade. Quer que nos afastemos? A agente olhou o anfitrião e pensou: “esse homem lindo e adorável não pode ser um espião.” Glenn fitou-a, deixando-a mais encabulada.

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– Por favor, fiquem comigo. O que tenho a dizer não é nenhum segredo. Molly fez a ligação para um telefone particular de Kirk e, sem procurar abaixar a voz, iniciou a conversa: – Alô, chefe! Estou na casa do Dr. Glenn. –– Para você interromper o meu sono deve ser muito impor- tante. – É que achei melhor vir durante a noite para evitar suspeitas. –– Não precisa se desculpar. Sabendo que estava sendo ouvida por Glenn, procurou se esmerar: – O Dr. Glenn é um homem admirável. A família é encan- tadora. Ele próprio se ofereceu para ser examinado. –– Isso é muito bom. Facilitará as coisas. – Será possível marcar a sessão para amanhã às dezessete horas? –– Alfred deseja estar junto e não vou incomodá-lo agora. Só posso confirmar o horário amanhã por volta das dez horas. – Então aguarde um pouco. Cobriu o bocal do aparelho, e perguntou: – Podemos confirmar o horário amanhã por volta das dez horas? – Por mim está bem – anuiu, o cientista. – Só que nesse horá- rio vou estar no escritório. – Está tudo certo chefe. Até logo mais. – Muito obrigado pelo homem admirável – recordou, Glenn. – E muito obrigado pela família – agradeceu, Mary. – Vocês são um encanto e foram muito gentis comigo. Quise- ra ser recebida dessa maneira em todas as partes. – E como é que ficou?

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– Eu ligarei às dez ou antes das dez. Se tudo der certo, iremos apanhá-lo no escritório logo depois do almoço. Está bem para o senhor às quatorze horas?

– É um bom horário. Aqui tem meu telefone. – Obrigada.

– Já é quase uma hora da manhã. Você quer que meu filho a leve? – sugeriu, Mary. – Não é preciso. Meu carro está do outro lado da rua. – Vou acompanhá-la até o automóvel – ofereceu-se, John. – Mais uma vez, obrigada pela acolhida. Vocês são uns amores! Boa noite, e até amanhã se Deus quiser. – Até amanhã, e vá com Deus – retribuiu afetuosamente, Mary. – Amém, e mais uma vez obrigada. Assim que John retornou, Glenn indagou: – O que vocês acham? – Acho muito bom – concordou a esposa. – Nós já devíamos ter pensado nisso. – Realmente mamãe – endossou, Ann. – A mãe de Betty – citou referindo-se a uma colega de escola – submeteu-se a uma dessas sessões e ficou maravilhada com o resultado. Você não se recorda mãe, que ela vivia se queixando de uma dor aguda perto do pulmão? – Claro que me lembro! Mas o que era? – Sob hipnose, dona Esmerald contou que foi esfaqueada por seu amante numa outra vida. Como ela foi em parte culpada, como penitência, ela estava sentindo as dores nesta existência. – Mas que bobagem é essa, minha filha! Isso não tem sentido! – Ora, papai! Você acha que ela ia brincar com uma coisa tão séria?

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– Eu não acho que tenha sido invenção dela, mas continuo achando que isso é um absurdo. Será que a pessoa que fez essa regres- são não é um charlatão querendo arrancar dinheiro de uma mulher aflita e despreparada? – Nada disso, papai. Dona Esmerald não é uma mulher igno- rante ou sugestionável. Ela é psicóloga e só se submeteu a esse exame porque já não estava mais acreditando nos diagnósticos dos médicos. – E como ela está agora? – interferiu, o irmão. – Betty contou que ela não se queixa mais daquela dor e, que inclusive, está pensando em se casar novamente. – É! Não deixa de ser extraordinário. A medicina alternativa tem feito alguns milagres – comentou, o pai. – Mas eu não estou entendendo uma coisa! – interrompeu, a mãe. – O que é, mamãe? – Você falou que ela fez a regressão e quando voltou não sen- tiu mais dor? Foi isso mesmo? – Betty afirmou que ela passou a orar pela alma do assassino e, como por encanto, as dores sumiram. – É! – voltou o pai balançando a cabeça. – Existem ainda muitas coisas inexplicáveis. Eram quase duas horas da manhã quando todos foram se recolher. Ainda não tinham adormecido, quando uma forte ventania sacudiu as janelas. Minutos após, raios cortavam os céus como querendo despedaçá-los. Uma terrível tempestade se aproximava. – Isso não estava no programa – comentou Glenn, já no leito. Levantou-se, ergueu o telefone, e discou um número. – Para quem você está ligando a esta hora? – Para Matt, do Setor de Meteorologia.

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No mesmo instante que respondia à mulher, um forte estron- do balançou a casa. O telefone emudeceu e uma pequena luz de um abat-jour, apagou. – O que está havendo? – gritou assustada com os relâmpagos. – É o que estou tentando saber. Onde está o bendito celular? – Está lá embaixo. – Em que lugar exatamente? –Está sobre a mesa do escritório. Deixe que eu vou apanhá-lo. – Não precisa. Fique na cama. Glenn desceu a escadaria apoiando-se no corrimão. Distintos ruídos no telhado indicavam que uma chuva de granizos havia se formado. A pequena iluminação existente no interior da casa era proveniente das constantes faíscas. Com muita dificuldade encontrou o aparelho em cima da mesa. – Deus queira que esteja funcionando! – pensou. Apesar dos relâmpagos, o celular estava em ordem. – Alô, Matt! É você? –– Ele mesmo. Quem está falando? – É Glenn. O que está havendo? –– Estamos assistindo a formação de um furacão de grandes proporções. Os ventos já passaram de 125mi/h, porém o que não estamos entendendo é como ele se formou. – O olho foi localizado? –– Isso é o que nos está intrigando. – Como assim? –– Imagine o senhor! Ele está vindo do Pacífico, mas parece-me que nasceu perto de Seattle. – Mas isso é perfeitamente lógico. Tempestades tropicais são comuns nesta época do ano. Por que vocês estão intrigados? –– É que em Seattle é uma noite de lua cheia. – Não está havendo nenhuma falha técnica no visor?

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–– Já verificamos e está tudo em ordem. – Como isso é possível? –– É isso que estamos tentando saber! – Vocês já calcularam quando ele estará por aqui? –– Está fugindo de nossos controles. Está se aproximando numa velocidade espantosa. É dos grandes! – E quanto à população? Vocês já deram o alarme? –– Estamos com pouca energia. O que foi possível fazer, já foi feito. – E onde ele está agora? –– Passou por Portland e está próximo de Eureka. Na veloci- dade em que está se movendo, entrará em São Francisco dentro de instantes. – Isso indica que está aumentando sua força? –– Isso mesmo! – Queira Deus que ele não entre pelo Continente. –– Nós estamos achando que depois de Santa Bárbara, ele vá em direção ao Pacífico. – Se isso ocorrer Matt, Los Angeles será atingida por fortes inundações. Convém dar um alerta geral. –– Antes de cair a força demos um alerta geral. O corpo de bombeiros está vigilante. – Diga-me outra coisa, Matt: você acha que ele passará por dentro de Sacramento? –– Ele está vindo pela costa, mas isso não significa que passa- rá perto do centro. – Vocês estão precisando de auxílio? –– Grato, mas a presença do senhor não é necessária. – Então, boa sorte. –– Boa noite, doutor.

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– E então? – perguntou a esposa que já estava do seu lado. – O que está acontecendo? – É um furacão. Está vindo pela costa. – Passará por aqui? – Tomara que não, porém se é o que estou pensando, Los Angeles corre um sério perigo. Embora Matt descartou minha ajuda, vou dar um pulo ao Centro de Pesquisas. Vou tentar sondá-lo. – Isso não será preciso, meu amigo. – Você novamente! – reclamou, reconhecendo a voz de Lemur. – O que você quer dessa vez? – indagou, incomodado. – Não seja agressivo, homem. – Você sabe que horas são? – Calma Glenn, não se apoquente. Por que está tão aflito? – Mas será que você não está vendo! São quase três horas da manhã, estamos enfrentando uma terrível tormenta e você ainda vem azucrinar? – Azucrinar! Gostei da palavra. É dessa tormenta que eu quero falar. O rapaz com que você falou há pouco pelo telefone não achou estranha a formação desse furacão? Você também não está concordando que ele nasceu do nada? É disso que vamos tratar. – Como você sabe que acabei de me comunicar com Matt? – Porque daqui donde estou falando, eu tenho uma visão per- feita do interior de sua casa. Ouvi tudo e sei como você está espan- tado. Não tenha receio, homem. Esse furacão é um “fenômeno con- trolado”. – Um fenômeno controlado!!! Mas do que você está falando? – Diga a ele, Mary, que é do furacão que estou falando. Do furacão, ouviu? Fomos nós que o fabricamos. Estamos dando a vocês uma mostra do que somos capazes. Você não está preocupado que ele entre pelo continente com força ainda maior? Realmente, se não o desviarmos, ele causará um enorme estrago. Mas isso não ocorrerá.

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Quando ele chegar a Crescent City perderá a força e irá em direção ao Oceano. Não haverá mortes, nem danos de monta. Após um ligeiro silêncio, Lemur, aconselhou: – Ligue novamente ao seu amigo e verá que eu estou dizendo a verdade. Peça a ele, dona Mary, para ligar novamente. – Mas como você pode nos ver no escuro? – Para nós não existe escuridão. Enquanto ele respondia à Mary, aproximaram-se os dois filhos tateando os móveis. Glenn voltou a discar. – Matt, sou eu novamente. Você tem alguma novidade? –– Olhe doutor, o senhor poderá achar estranho, mas o fura- cão depois de passar por Nort Bend começou a perder força e está indo para dentro do Oceano. Nunca vi nada parecido. Sua força dimi- nui minuto a minuto. O senhor não acha isso muito esquisito? – Você tem certeza do que está me contando? –– Absoluta. Se o senhor vir para cá, verá com seus olhos o que está acontecendo. Nunca vi nada parecido – repetiu. – Desculpe incomodá-lo, Matt. Boa noite. – E agora você crê em mim? – desafiou Lemur. – Mas como vocês fazem isso? Quer dizer então que vocês dominam a Natureza? – Não dominamos. Somos simples aliados. Não queira saber agora. Isso é muito difícil de explicar. Atenha-se somente aos fatos. Enveredando por outro caminho, John comentou entrando na conversa: – O senhor tinha razão quando nos alertou que papai estava sendo vigiado. – Fui eu que sugeri à Molly para que teu pai fosse submetido a uma sessão de hipnose. Se vocês forem convidados aceitem o

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convite. Será muito interessante. Se vocês não tivessem um compro- misso pela manhã, eu os convidaria para um passeio. – Mas nós não temos nenhum compromisso pela manhã! – exclamou ansiosa, Ann. – A escola é um compromisso, e seu pai deve se preparar para uma sabatina médica. Que o Altíssimo vos abençoe. Farei novo con- tato amanhã ao anoitecer. Como ainda estavam na penumbra, viram nitidamente uma luzinha apagar-se dentro da orelha de Glenn. Alguns segundos após, notaram que as luzes da rua estavam se acendendo. Tudo voltava ao normal.

Capítulo XII Sob hipnose

onforme havia combinado, Molly discou ao Dr. Glenn

exatamente às dez horas. Às quatorze passou para apanhá-lo. Junto com ele ia a esposa e os filhos. Foram diretamente ao consultório do Dr. Mendonza, um profissional especialista em regressão. Mendonza era natural da Nicarágua, mas havia obtido a cida- dania norte-americana há mais de quinze anos. Ele foi quem con- vidou o Dr. Pablo para fazer uma palestra no auditório da Faculdade. Numa de suas vindas a Sacramento, encantou-se com a cidade e adotou-a como novo lar. Sacramento era uma linda cidade localizada na costa do Pací- fico, e a maioria da população procedia da América Central. O idio- ma espanhol caminhava lado a lado com a língua inglesa. Eram exatamente quinze horas quando Glenn chegou junto com a família. À sua espera estavam os agentes, o secretário e o analista. Depois das apresentações, saíram do amplo consultório e entraram numa sala especialmente preparada para a sessão.

C

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Molly seguiu junto, mas Spencer e Tracy receberam ordens para permanecer onde estavam. Dentro do compartimento em penumbra, Glenn foi levado ao passado. Durante aproximadamente uma hora, descreveu com rique- za de detalhes onde havia estado. Induzido magnificamente pelo especialista, resumiu quase tudo. Só não citou como foi colocada a cruzeta. Quando terminou a sessão, um profundo mal estar se apode- rou de todos. O secretário encarava o policial e, este, mirava admirado o médico. Glenn tinha um sorriso amarelo e olhava a esposa e filhos sem nada entender. Quando o silêncio já se havia tornado incômodo, arrematou dizendo: – Alguém poderá me dizer o que aconteceu? – Ouça o que você acabou de nos contar. A um sinal de Kirk, Molly retornou a fita de um gravador que tinha sido colocado perto do ombro direito do cientista. Glenn tomou ciência do que aconteceu. Durante toda a gra- vação não moveu um só músculo da face. Quando a fita chegou ao fim, arriscou: – Eu sempre tive a impressão de ter estado noutro lugar, mas não me atrevia a dizer a vocês – explicou à mulher e aos filhos. John queria saber se o pai sabia como foi colocada a cruzeta, mas algo reprimiu sua curiosidade. Alguém soprou em seus ouvidos que era uma pergunta inconveniente. O pai captou seus pensamentos e sorriu intimamente. – Acho que nos enganamos redondamente! – observou, Kirk. – Por quê? – Porque achávamos que você tinha passado para o outro lado. – Que outro lado?

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– Kirk achava que o senhor tinha se vendido para os russos – interveio, Alfred. Face ao inesperado comentário, Glenn não se conteve e soltou uma sonora gargalhada. – Que absurdo! Quanta imaginação há na cabeça de um agente! – Estamos diante de um fato que merece ser analisado fria- mente. – disse Alfred. – Não será preciso lembrar que o quê acaba- mos de ouvir não deve ser comentado fora de nosso grupo. – Spencer e Tracy fazem parte desse grupo, não é mesmo? – lembrou, Kirk. – Não vejo nenhum inconveniente que eles saibam, afinal de contas eles estão no caso desde o início. Além deles, mais ninguém. O que você pensa dessa viagem fantástica, Glenn? O que será que eles estão pretendendo? – Quanto à viagem foi magnífica sob todos os aspectos. Não foi um pesadelo, foi um sublime devaneio. Afinal, não é todo dia que podemos viajar pelo espaço, livre de embaraços e dos chatos agentes de viagem! Pelo que pude observar – vaticinou Glenn – eles estão muito preocupados com a corrida armamentista na Terra. Senti que querem nos ajudar e, pedem ao mesmo tempo, que nos desarmemos. – Isso seria maravilhoso! – enfatizou a esposa. – Interessante! – murmurou, Alfred. – Ontem a noite, ouvi uma conversa no saguão do hotel que me fez pensar até quando estava com a cabeça no travesseiro. Um senhor de idade avançada dizia a um jovem que parecia ser seu filho: “geralmente meu rapaz, toda experiência traumática faz com que o indivíduo tenha sua concepção alterada; lembre-se disso quando for fazer a prova”. Não sei porque, liguei essa frase a você, doutor. – Compreendo perfeitamente – aquiesceu Glenn, sem se alterar. – Eu também achei que minha concepção tivesse sido alte-

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rada depois do acidente. Como acabamos de ouvir, estávamos enga- nados. – E agora que rumo tomaremos? – inquiriu, Kirk. – Que tal encerrarmos as investigações? – Isso eu já tinha pensado. Mas o que diremos à imprensa? – Que as suspeitas eram infundadas. – Mas estamos diante de um fato novo – insistiu o capitão. – Você acha que eles vão engolir isso? – Olhe Kirk, eles não precisam saber que existe um fato novo. Eles só estavam querendo informações a respeito do acidente e como foi o resgate. O resto são simples insinuações. Muita gente já desapareceu por mais de quarenta e oito horas e ninguém deu bola pra isso. Sem querer ofender ou diminuir o conceito de Glenn, se ele não fosse amigo do Presidente, haveria menos estardalhaço. – Você tem razão. Antes do acidente jamais apareci na pri- meira página de um jornal. – Diga-me com franqueza, Glenn: você é muito ligado ao Velho Testamento? Essa súbita mudança de assunto pegou a todos desprevenidos. – Aonde você quer chegar? – Estou tentando ter uma resposta para o que acabamos de ouvir. – Já entendi! Você pensa que tudo que eu falei foi invenção? – Essa história poderia estar em sua memória. Não é o pri- meiro caso. – Eu gostaria que fosse verdade. Causaria menos problemas. Mas e quanto aos lugares que acabei de descrever? Também os tinha retidos na memória? – Não esqueça, doutor, que você além de Físico, é também Astrônomo e, por conseguinte, costuma vasculhar o cosmo.

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– E o que você me diz da cruzeta? Também saiu da minha imaginação? Mesmo que eu quisesse, não poderia colocá-la aonde está. Diante desse argumento, Alfred resolveu calar-se. – E o senhor, Dr. Mendonza? Também acha que imaginei essas coisas? – De maneira nenhuma! O que o senhor acaba de nos relatar é maravilhoso e deve ser analisado por pessoas extremamente sérias. Estamos diante de uma realidade que não pode ser contestada por ninguém. Acho que em breve, muito breve, eles aparecerão aos olhos de todos.

– Que bom seria se pudéssemos mandar uma sonda à Rodekara! – comentou, Alfred.

– E para quê isso serviria? – Serviria como prova, oras! Mas que raio de lugar será esse!!!

Como vou explicar isso! Se Paul tivesse vindo, as coisas ficariam mais fáceis. – Mas a gravação não é uma prova? – lembrou, Molly. – Para Paul não será suficiente. Vocês não o conhecem. A verdade é que estou numa sinuca de bico. – Sei como você se sente – confortou, Kirk. – Sabe!!! Deixe de bobagem, homem! Como você pode saber o que estou sentindo? – Porque uma vez investiguei a vida de um camarada que jurava ter sido raptado por alienígenas. Dava dó do sujeito. Teve que abandonar a cidade onde havia nascido porque já não agüentava mais as gozações. – Posso fazer uma sugestão? – disse Glenn. – Diga, doutor. Somos todos ouvidos – Que tal mantermos esta reunião sob absoluto sigilo? O que vocês queriam saber já sabem: eu não sou um espião. Isso não basta?

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– Se eu não tivesse convidado Paul para estar presente, isso seria fácil. O que vou dizer quando ele me perguntar o que houve? – Que não houve nada extraordinário que mereça ser analisado. – Mas o que você acabou de contar é muito importante. Não pode ser ignorado. Você não acha que eles podem se tornar peri- gosos? – Eu não temo por isso. Se eles quisessem nos agredir nada os impediria. – Será que eles farão contato brevemente? Para surpresa dos agentes e do médico, Glenn afirmou com extrema simplicidade: – Ontem falei com eles novamente. – Quer dizer então que você fez outra viagem? – indagou admirado, Alfred. – Não fiz outra viagem, mas espero fazê-la dentro em breve. Numa coisa vocês policiais estavam certos. É um transmissor o que carrego comigo. Nós tivemos uma proveitosa conversa com eles ontem à noite. Eram exatamente três horas da madrugada. Come- çamos a ouvi-los justamente no momento em que fomos atingidos pela chuva de granizo. Pressentindo que tinha autorização de Lemur para contar a conversa, narrou tudo que havia se passado. – Meu Deus! – bradou Alfred, com os olhos arregalados. – Se eles podem mexer com a Natureza e produzir furacões, nossas armas não têm nenhum significado. – Isso prova que são amistosos – advertiu Ann, surpreen- dendo a todos. – Tinha razão a minha avó quando dizia que as crianças e os jovens têm dentro de si a sabedoria e a consciência da verdade – lembrou com brandura, Alfred. – Sua filha tem razão. Se eles

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quisessem usar a força, desceriam no Pentágono sem serem moles- tados. – E o que o senhor pretende fazer diante desses novos fatos? – insistiu, Ann. – Vou fazer as malas e voltar a Washington. Por enquanto vamos ocultar de todos este assunto. – Inclusive de meus auxiliares? – lembrou, Kirk. – A situação agora ficou mais embaraçosa. Ao meu ver você deve ocultar deles o que Glenn nos contou sobre o furacão. Pro- cure distraí-los mantendo-os ocupados num novo caso. Quanto ao senhor, doutor Glenn, mantenha-me informado. Eis o número de meu celular. – E quanto a mim? – observou o Dr. Mendonza. – Se o senhor não tem nenhum compromisso, gostaria que me acompanhasse a Washington. O senhor será recompensado. – Por que devo acompanhá-lo? – Porque tenho absoluta certeza de que Paul gostará de ter uma conversa reservada com o senhor. Talvez queira fazer uma nova regressão – tentou adivinhar. – Mas então eu tenho que ir junto! – disse Glenn. – Acho que não será preciso. – Não estou entendendo – insistiu, Glenn. – Quem vai ser examinado? – O Dr. Mendonza. – Por favor seja mais explícito – exasperou-se, Glenn. – Depois de toda nossa conversa, você ainda está pensando que foi uma encenação? – Eu já estou convencido que não foi uma encenação. Deve- mos convencer Paul. O que acabamos de ouvir deve ser levado ao conhecimento das forças de segurança. – Você acha que isso será preciso? – intrometeu-se, Kirk.

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– Admiro você me fazer essa pergunta! – contestou, olhando Kirk de frente. – Justamente quem mais sabe a respeito da CIA. Se tentarmos apagar os vestígios, ela cairá em cima de nós como abe- lhas à procura de mel. – Eu julguei que esse caso estivesse sob nosso controle. – Como vazou não sei, porém ontem recebi um telefonema de Paul me alertando que a CIA estava muito interessada no Dr. Glenn. – Então ele tinha razão! – murmurou discretamente, Mary. Apesar do comentário ter sido feito em voz baixa, todos ouviram. Ansioso, Alfred perguntou: – Quem tinha razão, dona Mary? – O nosso misterioso mensageiro. Ele nos avisou que meu marido estava sob severa vigilância. – Então, que tal pedir a ele para dar maiores detalhes? – pro- vocou, Alfred. – Tenho certeza de que ele fará um novo contato à noite – intercedeu, Glenn. – Se você transferir sua viagem para amanhã, tal- vez leve aos seus superiores algo novo. O que te parece? – E onde você acha que ele se manifestará? – Na certa, em minha residência. – Você se importaria se fossemos todos à sua casa?

– Será um prazer – convidou, Mary.

Capítulo XIII Pizzas

ara não despertar suspeitas, Glenn e a família foram na frente. A mais ou menos duzentos metros atrás, Molly dirigia seu carro seguida pelo chefe. P

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– Que tal levarmos umas pizzas? – sugeriu Kirk, ao avistar um cartaz das pizzas Hutt. – É uma boa idéia – assentiu, Alfred. – Dê um sinal a Molly e peça para que encoste. Kirk sinalizou com os faróis e, Molly, que estava ao lado do Dr. Mendonza, parou. – O que houve? – Vamos levar algumas pizzas. Ainda estamos longe da casa do Dr. Glenn? – Estamos quase chegando. A casa dele fica no número 42 desta avenida. – Tem certeza? – Claro! Você já se esqueceu que eu estive lá ontem? – Então pode seguir. Vou mandar fazer oito pizzas variadas. Uma para cada gosto. Não! Já que o governo está pagando, vou encomendar dez. Quem sabe o extraterrestre queira jantar conosco – completou, rindo. – Mas pra que tanta pizza? Eu só como dois pedaços. – É que eu estou tendo um palpite. Se nosso amigo do espaço vier acompanhado, estaremos prevenidos. Sem saber o que estava ocorrendo, Mary pediu a Doll para preparar alguns lanches para os visitantes. Já estava preocupada com a demora, quando soou a campainha. Molly entrou acompanhada do Dr. Mendonza. Vendo-os sós, Mary indagou: – Onde estão os demais? – Foram comprar umas pizzas. Em alguns minutos chegarão. – Eles não precisavam se incomodar! – Estão trazendo dez pizzas. – Que horror! – explodiu, Mary. – Quem vai comer tantas pizzas?

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– Kirk tem coisas de maluco. Ele acha viável a presença dos amigos do espaço no jantar. – Sentem-se, por favor. Vou avisar Dool para parar. – Para parar! Para parar, o quê? – Pedi a ela para preparar uns lanches. Eu não sabia que vocês tinham idéia de trazer pizzas. Glenn sentou-se à frente de Mendonza e ofereceu-lhe um drinque. – Obrigado. Sou abstêmio. – Que tal um cafezinho? – Aceito, depois das pizzas. – E você, Molly? – Quero um cálice daquele excelente licor. – Então sirva-se. Você já é da casa. Você sabe onde é o bar, não é? Molly estava no meio do caminho, quando soou novamente a campainha. Invés de dirigir-se ao barzinho, desviou-se e foi atender a porta. Kirk e Alfred vinham carregando cinco pizzas cada um. Elas deveriam estar muito quentes, porque os dois entraram velozmente deixando-as no primeiro móvel que viram pela frente. Diante da alegre cena, o riso foi geral. – Chegou o exército da salvação – explodiu contente, Alfred. – Vocês não precisavam ter se incomodado – disse Glenn, também rindo. – E desde quando degustar é incômodo? – frisou Kirk, asso- prando as mãos. – Vocês aceitam um aperitivo? – Provem este licor – sugeriu, Molly. – É delicioso. – Tem razão Molly – observou Alfred, depois de sorvê-lo. Enquanto trocavam algumas idéias, Mary e Ann ajudavam Dool a preparar a mesa. Eram tantas pizzas que tiveram que abrir a

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mesa da sala de jantar. Quando acabaram, metade delas não tinham sido tocadas. Um carrilhão magnificamente esculpido em madeira, alertou-os que já era vinte e uma horas. – Convém diminuirmos as luzes – aconselhou, Mary. Já familiarizado com o ambiente, Alfred fez um chiste: – Espere aí, dona Mary! Seu marido vai receber as mensagens durante uma sessão espírita? Não tomando caso da gozação, Glenn murmurou bem bai- xinho: – É que impressiona mais recebê-las na penumbra. Você não acha? – Eu não sei! Ainda não passei por nenhuma dessas expe- riências. – Então vamos silenciar e esperar. – Antes de silenciarmos – insistiu, Alfred – estou curioso por saber como são iniciados os contatos. – É muito simples – anunciou, Ann.– É só papai pensar neles. Faltava um quarto para meia noite e, já estavam quase desis- tindo, quando um forte clarão invadiu a sala. Embora estivessem esperando um sinal, todos foram pegos de surpresa. Molly ficou com os pêlos eriçados, Kirk com cara de bobo. Mendonza estava muito tranqüilo. Alfred devorava o teto com os olhos, como querendo atravessá-lo para ver o que havia noutro lado. Glenn ouviu uma voz imperceptível aos demais, que ordenou: – Peça a esses curiosos que mirem em direção ao litoral; depois olhem para o céu, exatamente um pouco abaixo da lua. Todos se aproximaram da janela e olharam para o formoso satélite. O céu estava limpo e a lua cheia parecia uma pérola no fir- mamento. Ann foi a primeira a observar um ponto luminoso abaixo dela. Pouco a pouco todos foram reconhecendo a espaçonave. Luzes

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de várias cores começaram a piscar, como se estivessem passando uma mensagem. Emudecidos e emocionados observavam o magní- fico espetáculo. O cenário era tão arrebatador, que até Dolly, a cachor- rinha, mirava o céu com o toco do rabinho em movimento. Aqueles minutos pareciam uma eternidade. Uma voz entoou dentro da sala. – Boa noite a todos. Estamos exatamente a 18.504 metros acima da superfície do mar. Vocês estão nos vendo? – E como! – exclamou Ann, com a respiração ofegante. – Não vejo a hora de passear com vocês! – completou, atrevidamente. – Prometo que quando isso acontecer, você sentar-se-á ao meu lado, querida jovenzinha. Antes de abrirmos um diálogo, vamos fazer uma pequena apresentação teatral. Por favor Ann, coloque as cinco massas que sobraram, uma sobre a outra. – Você quer dizer as pizzas? – Isso mesmo. As pizzas. Coloque em cima delas cinco facas e o mesmo número de garfos. Afastem os pratos e utensílios de vidro, e vejam o que vai acontecer. Ann apressou-se e obedeceu a “voz”. – Por favor, mantenham-se dois metros longe da pilha de pizzas – falou agora uma voz mais fina. Impressionados e sob forte tensão, todos mantinham a visão fixa na mesa. Sequer moviam as pálpebras. Um par de olhos ainda mais curiosos olhava por uma fresta da porta. Esses olhos eram da empregada, que também observava sem nada entender. De repente, surgiu um facho de luz verde e muito intenso, precedido de um forte clarão. Um leve zunido se fez ouvir e as pizzas e os talhares desapareceram de cena. Por dois minutos não se ouviu mais nenhum som. Quando já estavam estranhando o silêncio, a voz fina voltou comentando:

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– Lindos talhares os seus, Mary. Se você não se importar, gostaria de mantê-los conosco. – Quer dizer então que vocês estão saboreando as pizzas? – Ainda não. Vamos ter que esquentá-las. Elas chegaram um pouco frias... – Muito obrigado, policial Kirk, por se lembrar de nós – interveio uma voz ainda mais fina. Kirk estava estupefato, o mesmo acontecendo com Alfred. Ambos perceberam que foram ouvidos e observados quando fizeram o gracejo a respeito dos extraterrestres. – Vocês comem muito bem. Pena que isso não aconteça nas demais partes da Terra. Comentaremos isso outra hora. Meu nome é Cabalá. Antes de mais nada, devo confirmar tudo aquilo que Glenn vos contou sob efeito de hipnose. Não se surpreendam, eu assisti do alto, especificamente através de nossa Tela Panorâmica, a todo o esforço feito por esse competente profissional a quem vocês chamam de Dr. Mendonza. Parabéns, você é um homem muito honesto e isso é uma coisa rara em vosso meio. Na próxima vez tente também usar a força da mente. Quanto a você Kirk, não zombe daquilo que não conhece. Enquanto Mendonza sorria agradecido, Kirk estava ligei- ramente amuado pela admoestação. Alfred, ao lado de Molly, con- tinuava olhando para o teto, talvez querendo localizar aonde estava a dona daquela singular voz. Vendo na tela que Molly estava com um gravador na mão, Cabalá, advertiu: – Não perca seu tempo, moça bonita, pois nada ficará gra- vado. Por favor não insista. Esta nossa conversa deverá ser reservada. É somente um prelúdio do que está sendo preparado. No momento pretendo unicamente endossar as palavras de Glenn.

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Como se tivesse cometido um grave delito e, embora esti- vessem quase na penumbra, todos viram o rosto de Molly corar ligei- ramente. Num esforço incomum sorriu meio sem graça. Observando o efeito que suas palavras haviam causado, Cabalá desviou o assunto dirigindo-se dessa vez à dona da casa: – Mary! Karalá está perguntando o que você usa para manter os talhares tão brilhantes. As pizzas estão muito gostosas – acres- centou. – Essa pergunta deve ser feita à Doll. A esta hora ela deve estar escondida debaixo da cama. Coitada, deve estar apavorada. Também não é pra menos! – Você está redondamente enganada, Mary. Doll é mais cora- josa do que você pensa. Ela está espreitando atrás da porta. Para não melindrá-la, Mary, comentou: – É! Se eu fosse ela também faria o mesmo. Que tal fazermos uma troca? – sugeriu, olhando para o alto como se estivesse avis- tando Cabalá. – Vocês nos mandam um de seus talhares e ficam com nossos garfos e facas. Que tal? – É uma troca muito justa. Espero que vocês não façam muito alarde quando tiverem nas mãos esses espetos. – E o que eles têm de especial que não podemos fazer alarde? – É que eles são feitos de um minério desconhecido na Terra. Se tiverem a curiosidade de testá-los, verão que são muito resis- tentes. Tentem entortá-los. Para vocês terem uma idéia do que estou falando, utilizamos o mesmo minério para construir as nossas espa- çonaves. Não sei se vou me arrepender por enviá-los. – Se depender de mim – disse vacilante, Alfred – eles somente servirão para provar o relato do Dr. Glenn. Dou minha palavra. – Huuummm! De longe senti um leve cheiro de desones- tidade.

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– Apesar de vocês captarem os nossos pensamentos, neste caso estão enganados! – desafiou Alfred. – Eu não quero me promo- ver. Desejo mostrá-los, claro, se Dona Mary permitir, aos meus supe- riores. Vocês não sabem como é difícil convencê-los. Esses talheres serão muito úteis. – E como você provará que eles vêm de outra civilização? – Seguindo vosso conselho e testando-os, ora! – Está bem. Sua lábia me convenceu. Afastem-se da mesa. Diferente da vez anterior, um facho de luz alaranjado invadiu a propriedade. Magnetizados pelo brilho, sequer puderam ver dois garfos e uma delicada faca com um rabo tão reluzente que faiscava, atravessarem o teto e repousarem suavemente sobre a mesa. – Um dos espetos é seu, Alfred. Faça bom uso dele. Os olhos do auxiliar brilhavam tanto, que pareceu a todos que ele havia enlouquecido. – Vocês não podem imaginar como sou grato! – esforçou-se em dizer. – Muito obrigada! – agradeceu Mary, acariciando o valioso par. – Alguém do outro lado da porta também deseja acariciá-los – insinuou, a voz. – Peço perdão, Dona Mary – disse Doll. – Fui atraída pelo forte clarão. Pensei que havia algo de errado. – Não precisa se desculpar, Dool. Veja como são lindos – ter- minou oferecendo-lhe as duas peças. – Bem! – interrompeu, Cabalá. – Por uma noite vocês já têm material de sobra. Que a vossa imaginação seja bastante profícua. – O que você quis dizer com isso? – É que apesar da evidência que vos deixo, muitos duvidarão. Que a paz do Altíssimo permaneça com todos. – Assim seja! – benzeu-se, Mary.

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Glenn, que havia permanecido calado a maior parte do tempo, olhou de soslaio um a um, e falou: – Acho que agora todos acreditam em mim, não é? – Eu nunca duvidei do senhor – afirmou, Molly. – Eu também – anunciou, Mendonza. – E quanto a vocês? – Apesar de tê-lo em boa conta era muito difícil acreditar – ponderou, Kirk. – Em minha longa carreira habituei-me a trabalhar em cima de evidências. Nunca me arrependi por agir assim. – E você, Alfred? – Por natureza sou menos desconfiado que Kirk, mas neste caso pensava da mesma maneira. Você deve concordar que é uma história muito fantasiosa. – O importante neste momento é que não existem mais dúvi- das. O que você vai fazer agora? – Tenho uma prova nas mãos – afirmou acariciando o garfo – e vou aproveitá-la ao máximo. Prepare-se para fazer uma visita a Washington. Tenho a impressão de que o Presidente vai querer rever um velho amigo. – Como você sabe que fomos amigos? – Na Casa Branca todos comentam que vocês estiveram juntos no exército. Quando o presidente soube de seu desaparecimento, ficou muito apreensivo e pediu a Paul que acompanhasse o caso. Estou nele desde então. – E pelo andar da carruagem ele deve ter ainda muitos capítulos – brincou, Kirk. – Concordo, Kirk. Eu acho que essa novela mal começou! – avaliou, o Físico.

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Capítulo XIV Apresento-vos Agali...

o salão oval, Alfred expunha a Paul com riqueza de detalhes a experiência que havia tido. Por diversas vezes fez alusão ao pre- cioso garfo que tinha nas mãos. – Quer dizer então – dizia Paul – que você quer me fazer acre- ditar que tudo isso seja verdade? Que estamos sendo fiscalizados por alienígenas? Raciocinou por alguns instantes, cofiou a barba bem cuidada, e afirmou advertindo: – Acho que fizeram você de idiota! Só não compreendo uma coisa: como um homem esclarecido como você se deixou enganar dessa forma? Alfred não desejava polemizar. Conhecia Paul há muito tempo e sabia como era difícil convencê-lo. Além de céptico, era muito teimoso. Cabalá apreciava o diálogo e observou: – É, meu caro Lemur! Tenho que admitir que nosso amigo tinha razão. É muito difícil convencer esse sujeito. – Quer dizer então – prosseguiu, Paul – que você manteve uma conversa com essa tal de Cabalá? Não é esse o nome? – Exatamente. Todos que estavam na sala ouviram o que eu ouvi. – Pois são todos sugestionáveis – analisou, com profunda irritação. – E quanto às luzes que piscavam no céu?

– Simples ilusão de ótica. Já vi David fazer coisas mais impres-sionantes – completou, referindo-se ao mágico ilusionista David Coperfield.

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– E quanto ao talher que tenho nas mãos? Também é uma ilusão de ótica? – Não é uma ilusão, porém já vi muitos truques e sei que alguns paranormais transportam objetos de um lugar para outro com muita facilidade. Certa feita, assisti a uma apresentação na Embai- xada da Índia que faria você rir quando essa tal de Cabalá fez aparecer esse garfo. O mágico, cujo nome se eu não me engano era Krista, fez o cofre da embaixada sumir de nossas vistas. Sabe quanto pesava esse cofre? Duas toneladas. Fez desaparecer também diversos quadros pendurados na parede. Quando fui escolhido e convidado para subir num pequeno palco montado dentro do salão nobre, simplesmente recusei. Sei lá se o homem perde o controle e me faz desaparecer de vez! Alfred sorriu com timidez e, aventurou-se: – Ele fez voltar o cofre e os quadros? – Claro que fez! – Mas você há de concordar que este garfo é real. Não é uma ilusão. Quer que eu mande analisá-lo? – propôs com humildade. – E o que eu vamos dizer? Que o garfo veio dos Montes Urais? – Esse sujeito é mais teimoso que um jegue – suspirou Cabalá, diante de Lemur. – Você já imaginou se tivéssemos mandado um trator? – Não seria mais prático ele fazer o exame? – Mas é o que ele fará. Os humanos gostam de se estender em futilidades. Não sei como um sujeito tão inseguro está ocupando um cargo tão importante! – Acho que ele teme ser ridicularizado – opinou, Lemur. Paul foi interrompido pelo tilintar de uma sineta. Alfred que já estava a ponto de perder a paciência, agradeceu a Deus. O Presi- dente havia chegado e pedia sua presença.

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– Só me restam alguns minutos. Mande examinar essa peça e mantenha-me informado. – E quanto ao Dr. Glenn e os outros? – lembrou, Alfred. – Por enquanto mantenha-os afastados, mas não afrouxe a vigilância em cima de Glenn. – Mas eu mandei Kirk encerrar o caso! – Eu não mandei abrir o caso. Mandei mantê-lo sob vigi- lância. Isso é diferente. Agora dê-me licença. Apesar de cabisbaixo, Alfred mostrava-se mais confiante. – Você verá ainda quem é sugestionável! – pensou, soltando um sorrisinho maroto. Estava tão ansioso em colher os resultados, que depois de quarenta e cinco minutos estava falando com o Dr. Simas, o mais conceituado mineralogista estadunidense. – Por que o senhor acha que esse garfo é feito de um minério desconhecido na Terra? O que o leva a pensar desse maneira? – Tenho minhas razões. Repare como ele tem um brilho estranho. – Realmente, você tem razão – concordou o Dr. Simas. – Observando com mais atenção, podemos notar que é uma peça rara. Sem dúvida, ele é diferente de nossos garfos. As pontas são circulares e bem torneadas. Além do brilho, isso é o que os distingue dos nossos. Onde você adquiriu essa peça? Não se importa se eu tratá-lo de você, não é? Não fazendo caso da pergunta, Alfred respondeu: – De um colecionador – mentiu, descaradamente. – É a primeira vez que ouço alguém comentar que existam colecionadores de garfos – expôs com brejeirice o mineralogista. – Você não tem mais detalhes? – Por que o senhor quer saber de onde ele provém? – Se me der uma pista, fica mais fácil analisá-lo.

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– Ele veio de Sacramento. É só isso que posso dizer! Sincera- mente, não sei o que isso ajudará! – Para você não, mas para mim já é um início. Antes dessa cidade fazer parte da Federação, era povoada de índios descendentes dos Maias. Até hoje estudamos sua cultura através da análise de vasilhas, lanças, flechas, machados e demais utensílios utilizados no dia a dia. Qualquer indício é muito importante. Observe aquela estatueta! – disse apontando para uma estranha figura com aparência de uma águia. – Ela foi feita de um raro basalto desconhecido em nosso solo. Você deve saber, mas mesmo assim permita-me lembrá-lo, de que o basalto é uma rocha efusiva escura, cujos componentes essenciais são a labradorita e um piroxênio. Esse minério é vulgar- mente conhecido como pedra-ferro. Entretanto essa estatueta tem uma resistência que foge aos padrões do basalto comum. Enquanto o nosso pode ser quebrado com um toque de martelo, essa figura que estamos vendo já resistiu aos golpes de uma marreta. Pode ver! Não tem um único arranhão! Ignorante ao assunto, Alfred insistiu: – Mas por que o senhor está me contando tudo isso? – Porque acho que há algo estranho nesse garfo! – concluiu com malícia. Meio sem jeito, Alfred murmurou: – Como assim? – Você não deve se esquecer que eu sou um experiente e velho homem da Ciência – comentou, Simas. – Já vi muitas coisas extraordinárias nesta vida. Desde que segurei este objeto notei que ele foi feito com um material desconhecido. Por que você não tenta me ajudar e fala claramente? – Está bem – concordou pressionado, Alfred. – Antes de mais nada, o senhor deve compreender que sou um funcionário do Executivo e, portanto, estas coisas devem ser mantidas em sigilo.

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– Atenha-se aos fatos e confie em mim – aconselhou Simas. – Conte tudo e não omita nenhum detalhe. Estou muito interessado em saber de onde veio isto. – Acho que vou fazer uma gravação. Assim será mais fácil. É a terceira vez que me pedem para contar o que houve. Por vários e vários minutos caprichou na exposição dos fatos. À medida que desfilava suas impressões o velho sorria intimamente. Quando terminou, Simas mirou fixamente seus olhos e aduziu: – Ainda está faltando o mais importante! – Narrei tudo, doutor – contrapôs, Alfred. – Você esqueceu de dizer o nome de quem deu as peças. Esta e as outras que talvez estejam com a dona Mary. – Como o senhor deduziu que existem outras peças? – Por que a extraterrestre não cometeria uma indelicadeza. Se “ela” transportou para dentro da espaçonave os talheres e não os devolveu, é sinal que em seu lugar ofereceria outros. Só não sei por que “ela” lhe deu esse garfo! Talvez por sua insistência, não é? Vendo que aquele homem estava lendo seus pensamentos, Alfred sentiu-se como uma criança que havia comido um caramelo proibido. – Não fique chateado – acrescentou, Simas. – Como contei antes, eu já vi muitas coisas na vida, afinal, estou prestes a fazer noventa anos. Meu amigo Albert36 gostaria de ver este garfo. – Procurando deixar a conversa mais descontraída, enfatizou com os olhinhos chispando de alegria: você não tem idéia, mas eu e ele estivemos na mesma escola. Fomos, inclusive, companheiros de quarto.

36 Albert Einstein. Físico de origem alemã, naturalizado norte-americano (Ulm, 14-03-1879 – Princeton, EUA, 18-04-1955). Notabilizou-se pelo estabelecimento da teoria da relatividade.

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– Por favor, doutor. Não quero ser indelicado, mas o tempo é muito precioso para mim! – Ora, homem! O que é o tempo perante à eternidade? – Se o senhor não se importar, outra hora falaremos disso. – Está bem! Acompanhe-me! Depois de rigorosa análise, Dr. Simas foi bastante claro: – O minério utilizado na fabricação deste garfo não provém de nosso solo. – O senhor pode atestar isso por escrito? – Espero que não utilizem esse documento para me cruci- ficarem – observou Simas, entregando uma folha escrita com sua assinatura. – Muito obrigado pela ajuda. Se o senhor não se importar, virei outra hora com mais tempo. – Se isso realmente ocorrer, por favor venha com dona Mary e peça que traga a faca. Quero analisar o cabo. Traga também o Dr. Glenn. Como o velho cientista estava sendo observado por Cabalá, esta comentou rindo: – Esse simpático senhor está prestes a terminar sua missão na Terra. Até lá ele será um importante colaborador. – Não perca de vista nosso amigo – disse Lemur a Mertz. – Destaque do corpo central a nave sete e mantenha-a em cima do Capitólio. Vou pagar a promessa que fiz à Ann. Eram dezenove horas em Sacramento, quando o sol desapareceu no horizonte. Glenn e a família estavam conversando na sala, quando reconheceram a voz de Lemur: – Que a paz esteja com todos. Como se estivesse sido planejado antecipadamente, era o dia de folga de Dool. – Acho que o momento é ideal. Vocês também não acham?

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– Achamos o quê? – perguntou Mary, sem nada entender. – O momento ideal para passearmos por algumas constelações, ora! Vocês não têm nenhum compromisso, não é? – Onde devemos estar? – observou Ann, a mais ansiosa de todos. – Vocês querem vir um a um ou todos ao mesmo tempo? – brincou, Lemur. – Você é quem manda! – interveio, o chefe da casa. Um intenso clarão cobriu toda a área e, num piscar de olhos, estavam dentro da espaçonave. – Que tal foi a subida? – disse Cabalá, encarando Ann como se estivesse diante de uma filha querida. Ann olhava-a emudecida e contagiada pela inesperada situação. Jamais havia visto e olhado de frente, um casal tão bonito. – O que você esperava ver? – indagou Lemur, lendo-lhe os pensamentos. – Você não pensava que era um homenzinho esver- deado que falava com você, não é? – Eu não pensava que era um homenzinho esverdeado, mas também não pensava que você fosse um homem tão lindo – devolveu Ann, com sinceridade. – E se eu afiançasse que sou um dos entes mais feios de meu sistema, você acreditaria? – Isso não pode ser possível! – Todavia, é! Mal Lemur tinha completado a frase, quando Mertz entrou por uma parede. Ao vê-lo, a jovem compreendeu que Lemur não estava inventando. Mertz era tão ou ainda mais belo que ele. Sua tez era cinza clara e refletia diante da luz. Os olhos eram da cor das plumas de um sanhaço macho e, a película que os envolvia, emitia reflexos ora verdes, ora azuis. Nenhum poeta mortal seria capaz de descrevê-los com exatidão.

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– E agora, Ann? – Agora o quê? – ironizou ainda impressionada com a beleza de Mertz. – Pare com isso, filha! – intrometeu-se, Mary. – Você está me fazendo envergonhar! – Está bem, mamãe. – Este é Mertz – apresentou, Lemur. Depois de breve visita à algumas das instalações da espa- çonave, Lemur pegou os comandos e em alguns segundos estavam navegando por um céu extraordinariamente claro, onde se avistavam uma infinidade de astros de diferentes cores. Globos e mais globos surgiam à frente. Vistos de perto, pareciam quadros suspensos numa parede invisível. O verde da vegetação era tão forte que ofuscava a vista. As águas observadas do alto pareciam cristais transparentes, tão claras eram. Podiam-se ver cardumes de peixes saracoteando quase à flor d’água. Árvores serpenteadas por flores de todos as matizes lembra- vam alfombras bordadas por uma hábil anciã. Sóis e sóis apareciam aos milhares. Cada qual com uma rara indumentária. Era como se tivessem recebido algumas pinceladas de um paciente Van Gogh37. As montanhas, desde o sopé até o cimo, estavam cobertas por uma grande variedade de plantas. Em nenhuma havia sinais de neve. Os contrafortes pareciam ter sido aparados por um exímio jardineiro. Lemur movimentava a espaçonave com admirável maestria. A um sinal imperceptível de Cabalá, parou-a sobre um pequeno astro do formato de uma bola de cristal. Vendo-a do alto, parecia uma dessas bolas utilizadas pelas ciganas ou ledoras da sorte.

37 Jan Josephszoon Van Goyen. Pintor holandês (Leyden, 13-01-1596 - Haia, 1656). O mais importante paisagista holandês.

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Um pouco mais perto da superfície, Glenn, em especial, notou que estavam diante de uma civilização muito adiantada. Todas as construções tinham uma simetria admirável. Apesar da rica vegetação que cobria o solo, não se notava nenhum sinal de folhas soltas no chão. Também pétalas dispersas de flores não se viam. Isso prendeu sua atenção, porém achou melhor não fazer nenhum comentário. As avenidas eram bem largas, porém estavam todas desertas. Não havia nenhum transeunte ou veículo em movimento. Para Glenn, tudo aquilo era novidade. Um pensamento ousado invadiu-lhe o cérebro um pouco conturbado. Será que não estavam trabalhando sua mente? Será que não era um filme visto do alto? Será que o que estava vendo não seria uma tela ardilosamente projetada numa das paredes da espaçonave? Porém, com que fim? Cabalá acompanhava as reações do experiente e competente homem da Ciência, sem nada dizer. Lemur desta vez dirigiu a espaçonave em direção às águas. – Será que também veriam portos sem navios? – pensou, Glenn. Nisso ele estava enganado. Ao se aproximarem das águas, transparentes por sinal, não só viu magníficas embarcações flutuando por águas muito calmas, como localizou um grande número de pequeninos submarinos cortando velozmente as águas, numa profun- didade aproximada de vinte metros abaixo da superfície. O seu espanto foi ainda maior, quando viu no fundo, uma impressionante cadeia de construções cujas coberturas feita apa- rentemente de vidros, assemelhavam-se às abóbadas das catedrais da Terra. Algumas eram cópias exatas das coberturas do Kremlin. A um novo sinal de Cabalá, a espaçonave foi dirigida para um outro ponto. Pararam sobre um imenso viveiro de peixes. Peixes de várias espécies nadavam lado a lado sem se molestar. Tubarões e

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golfinhos misturavam-se a cardumes de sardinhas e lambaris. Bagres e traíras pretas ignoravam os carás, redondos como pequenos pratos. Glenn armazenava no cérebro todas aquelas cenas, sem ter coragem de perguntar como aqueles peixes viviam juntos em har- monia, e de que se alimentavam. A espaçonave seguiu contornando o esplêndido globo, quan- do Cabalá cortou o silêncio, dizendo: – Isto tudo que estamos vendo é o meu lar. Nosso lar – corrigiu, olhando para Lemur. – Apresento-vos Agali, um mundo de paz e tranqüilidade. Um plano de amor e ternura. Um local onde nada envelhece. Um recanto onde não há guerras, nem doenças. Esta é uma esfera de luz radiante. Todos seus habitantes, sem exceção, conhecem a Terra. Todos já sofreram os dissabores de uma intran- qüila civilização. Este nosso lar é pleno de paz, mas ainda está em ascensão. Embora estejamos muito longe do Planeta Azul, tememos ser atingidos pelas loucuras dos homens. Por isso estamos desejosos que a paz se faça na Terra; sem mais delongas. – Por que vocês têm essa preocupação? Estamos num estágio evolutivo muito abaixo – considerou, Glenn. Antes que Cabalá dissesse alguma coisa, Mary, completou: – Somos tão frágeis perto de vocês, que é absurdo pensar dessa maneira. – E vocês jovens? Pensam também assim? – experimentou, Cabalá. – Eu não sei o que dizer – titubeou, John. – E você, Ann? – Por que você quer saber o que pensamos? – É que os jovens têm a mente mais aberta – interveio, Lemur. – Glenn sabe do que estou falando. Quando explodem na Terra uma bomba atômica, seu efeito no espaço é devastador.

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– Mas por que vocês não intervêm e acabam com isso? – sugeriu, Mary. – Existe uma lei no Universo que não pode sequer ser contes- tada. Nem em pensamento! – E podemos saber que lei é essa? – prosseguiu, Mary. – A do livre arbítrio. Ela é a segunda de maior significado. – E qual é a primeira? – observou, Mary. – A do amor, ora! A mais sublime das normas! Tenho fé que essa regra seja um dia o mais precioso mandamento do Planeta Terra. O amor são os olhos de Deus, os reflexos da alma humana. Não se deve confundir esse amor com aquele que excita e leva ao êxtase e à loucura. Este último é uma grave doença que deve ser banida dos lares da Terra. – Mas se for banida – afirmou Ann com malícia – como sere- mos mães? – Você não entendeu! Onde há ignomínia, o amor não existe. É uma atração maquiavélica. A afeição profunda não deve ser con- fundida com a tara. A tara, que é um defeito moral muito grave, causa seqüelas terríveis sobre o ser humano. Até sobre a Alma! Ela falava com uma expressão tão magnífica, que até seus companheiros tinham os olhos fixos nela. Ninguém ousava contes- tála. – Nos Mundos adiantados do Universo, há uma só espécie de amor. Ela engloba todas às outras espécies. O ser humano confunde o amor divino, com o amor carnal. A união momentânea de dois corpos não significa o amor como nós conhecemos. O verdadeiro amor existe quando há união na família. Estão presentes em grupos familiares que vivem em harmonia e que lutam por objetivos comuns. São seres afins. A Terra está atravessando por momentos difíceis e, uma das causas, é a desunião familiar. O ser humano não veio ao mundo para viver isolado. Ele necessita de companhia.

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Companhia permanente. Ele necessita se agrupar e criar famílias. Aí está o verdadeiro amor. No meu mundo as uniões são eternas, porque todos comungam dos mesmos princípios e objetivos. Separam-se às vezes provisoriamente, e encontram-se logo à frente em outras situações. Continuam se amando. Cada vez mais. Observem daqui do alto, o intenso movimento que há neste mundo de Deus. Observem também, quanta harmonia. Aqui não há ruídos extremos. Todos sabem o que fazer em benefício geral. Isso pode ser enfadonho do ponto de vista dos humanos. O que talvez vocês desconheçam, é aqui praticamos diversos esportes e temos uma grande variedade de lazer. Há cinemas, teatros, circos, reuniões dançantes e amplas salas de leitura e aprendizado. Só não existem, jogos de azar! Para quê! Até a nossa alimentação é parecida com a vossa. Só que nos alimentamos somente de vegetais. Nossos corpos não aceitam, em hipótese alguma, qualquer espécie de carne, seja branca ou vermelha. Temos aqui imensos viveiros de peixes e gado solto no pasto, todavia não devoramos um só deles. Levamos, de quando em quando, esses animais para mundos em formação. É uma tarefa muitíssimo agradável. Aqui também não existem noites, porque nosso planeta recebe luz e calor de três magníficos sóis. Estamos também livres de tempestades e terremotos. Estamos de bem com a Natureza. No vosso vocabulário, isto aqui é o Paraíso. É uma fonte de energia inesgotável, assim como a Terra, desde que esta seja devidamente explorada. O ser humano um dia saberá o que tem nas mãos! Olhem para aquelas montanhas! Atrás delas está localizada a maior de nossas cidades. Ela tem mais gente em movimento, do que Tóquio e Nova Iorque juntas. – E qual especificamente é a tarefa de cada um? – inquiriu Glenn, com humildade. – Variam muito de ser para ser. Existem milhões de tarefas.

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– Qual é o principal serviço dos submarinos? Aquilo que estou vendo debaixo d’água são submarinos, não é? – São submarinos. Eles transportam para ancoradouros especialmente preparados, milhares de espécies de vida aquática, animal e vegetal. Como disse antes, uma de nossas mais nobres incumbências é levar vida para planos em formação. Aqueles submarinos de cor amarela, carregam equipes de cientistas de outros mundos. Na realidade são Faculdades móveis de ensino. Quem sabe um dia você nos dará o prazer de ser um de nossos alunos! Ou talvez, um de nossos pro- fessores! Por que não! Aquele navio logo à frente, também é uma Faculdade, só que de crianças. O movimento do barco os deixa mas alegres e mais interessados nas matérias. Aquele mais adiante, com centenas de janelinhas retangulares, é um barco de turismo. Reparem que só ele tem janelas retangulares. Esse barco, na realidade, é uma espaçonave. Pertence ao povo de Marchelon, um lindo planeta loca- lizado na Nebulosa de Caires. – Nunca ouvi falar de Marchelon, nem da Nebulosa de Caires! – Quem sabe eles não tenham outros nomes na Terra! – comentou com amabilidade, Lemur! – É muito difícil essa possibilidade. Quem sabe! – Sobre Sirius vocês sabem alguma coisa, não é? – Sabemos muito pouco. – Aquela nave que acabou de chegar é de Sirius. Há muito tempo que eles se comunicam com um povo nômade da Terra. – Acho que você está se referindo aos dogons, da República do Mali, antigo Sudão francês. Esse povo tribal da África ocidental, têm intrigado os estudiosos pelo conhecimento que têm do Universo e pela precisão de suas noções de astronomia. Agora estou enten- dendo de onde vem esses conhecimentos e quem são seus instrutores.

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– Os sirianos estão entre os cinco povos mais adiantados da Via Láctea. Eles fazem parte dos Doze Planetas Confederados. Lastimo, mas é hora de levá-los de volta. – Que pena! exclamou, Ann. – Tenho muito a contar a Sally! – Justo pra Sally! Aquela linguaruda! – desafiou, o irmão. – Sally não é nenhuma linguaruda! Perto daquele seu amigo fofoqueiro, até que ela é reservada. – Que amigo? – Charles, ora! Quem poderia ser? Por acaso você não sabe que ele foi expulso do colégio por fofoca? – Parem com isso! – interveio, a mãe. – Vocês estão pare- cendo duas crianças! Como estará Dool? – lembrou, desviando de assunto. – Não sei porque estou pensando nela! – Não precisa ter cuidado – aconselhou, Cabalá. – Já apaga- mos da mente dela o que ocorreu naquela noite. – Mas e quanto ao garfo e a faca? – lembrou, Glenn. – Também deles ela não se lembrará. Não se preocupem. Vocês não precisarão mentir. Ela pensará que vocês os adquiriram numa reunião de caridade. Quanto a você, meu caro amigo, passare- mos novas instruções quando tiver falado com o secretário do Presi- dente. Por enquanto é só isso que posso dizer. – É minha impressão ou a espaçonave está parada? – deduziu John, observando a Lua. – Ela está parada – confirmou, Cabalá. – São três horas e estamos bem em cima de vossa casa. Dêem às mãos, façam um círculo e fiquem debaixo daquela placa amarela. – Tenham uma boa viagem e um resto de noite tranqüilo – completou, sorrindo. Assim que colocaram os pés no chão da sala, Ann correu para a biblioteca, deixando os pais e irmão sem nada entender. Quando já estava perto da entrada, virou-se e afirmou alto e em bom som:

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– Vou anotar em meu diário essa incrível experiência. – Veja lá o que vai escrever! –observou, o pai. – Você não quer comer um lanche antes de dormir? – sugeriu Mary ao marido. – Estou sem nenhum pingo de fome. Interessante! Apesar do adiantado da hora, estou também sem sono. Como era uma noite de muito calor, Mary lembrou: – Que tal um sorvete? No freezer há um sorvete de creme muito gostoso. – Sorvete!!! Era isso que eu queria me lembrar!!! – bradou Glenn, quase aos gritos. – Como é que eu me esqueci daquele sorvete de carmim? – Mas a que sorvete você está se referindo? – Do sorvete que tomei na viagem que fiz com Asthor. Sem a receita, minha querida, você não vai entender. Onde está a calça que eu estava usando quando ocorreu o acidente? Espere aí! Por que eu não falei nada sobre sorvete quando estava sob hipnose? – Porque talvez não fosse importante. – Será que Dool guardou o bilhete que estava num dos bolsos? – Que bilhete? – Era uma receita. Quando estive no Planeta Zemil, saboreei um sorvete de creme coberto com chocolate. Era tão gostoso que pedi a fórmula aos anfitriões. Você não pode nem imaginar! Ela está escrita em inglês. Se Dool mandou lavar a calça sem verificar o que havia nos bolsos, ela se perdeu. Oxalá ela tenha verificado antes! – Não se preocupe! Ela não manda nada à lavanderia sem antes manusear os bolsos. Disso eu tenho certeza! Se a calça foi lavada, esse papel deve estar na escrivaninha do escritório. Espere um pouco aí. Vou subir para procurar.

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– Deixe comigo mãe! – antecipou-se John, subindo a escada correndo. –Tenho quase que absoluta certeza de que ela não mandou lavar a calça – supôs, Mary. – Tomara! – Sabe por quê? Ela ficou muito impressionada com o seu desaparecimento e, se não estou enganada, ela resolveu deixá-la como veio. Você verá como estou certa! – Está aqui, pai! – disse John, com uma papeleta na mão. – Isto é mais uma prova – murmurou baixinho, Glenn. – Eu acho que essa receita é mais valiosa que os talheres – palpitou, John. – Por quê? – Porque o papel e a tinta devem ter sido fabricadas numa indústria alienígena! – gozou o filho, sem imaginar que realmente essa receita poderia significar muito. – Deixe-me vê-la. Mas que letra bonita! Parece letra gótica! Você não se incomoda se eu rasgar a ponta, não é, meu bem? – E por que você vai rasgá-la? – Para ver se é tão resistente como os talhares. – Bem, a receita é sua. Faça dela o que bem entender – con- sentiu, Glenn. – É, mas me parece que esse papel não rasga facilmente! – observou Mary após várias tentativas. – Tente você que é mais forte! – Deixe comigo, mamãe! – ofereceu-se, John. Depois de rápido e exaustivo esforço, rendeu-se às evidências e desafiou: – Experimente você, papai! Eu não estou conseguindo! – Se você não conseguiu filho, eu também não vou conseguir. Leia a receita, Mary, e diga se pode fazê-lo. – O que é carmim? É alguma baunilha?

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– Deixe-me ver. Agora estou me lembrando. Quando pergun- tei o que era carmim, Omar esclareceu que era o nome da receita. Carmem Dolores era o nome da moça, por sinal muito linda, que fez aquela gostosura de sorvete. – Mas aqui está escrito que depois de batido deve ser adi- cionado cem gramas de carmim. Se Carmem Dolores era o nome da moça, carmim deve ser o nome de algum adoçante ou creme. E quanto as gemas e o leite? – Quê? Não entendi? – Serão gemas de ovos de galinha? – Ora, meu bem! Se fossem ovos de pata eles teriam destacado. – E quanto ao leite? Pode ser leite de cabra! O que você acha, filho? – Ora, mãe! Acho que você está querendo gozar o papai! – Um pouco de alegria não faz mal a ninguém – explodiu rindo. – Vamos lá! Vou tentar fazê-lo. Só que será um sorvete americano feito por uma linda mulher casada – finalizou, fazendo um trejeito alegre. – Você não fica devendo nada a ela! – confortou com agrado o marido. – Puxa! – observou John olhando pela janela. – O dia já clareou! – É verdade! Já são cinco horas e eu continuo sem sono. – Eu também, mãe! Também pudera! Depois dessa incrível experiência não vamos dormir por vários dias!

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Capítulo XV O Mensageiro da Paz

então? – indagou Paul. – Mandou examinar o garfo? – Todas as minhas expectativas foram

confirmadas – alfinetou Alfred, com euforia. – Ah é! Quem examinou a peça? – Dr. Simas, um antigo companheiro do Dr. Einstein. Ele acha que o garfo foi feito com um metal desconhecido na Terra. – Ele tem idéia de onde tenha sido extraído esse metal? – Você não está querendo me gozar, não é? – Nunca falei tão sério. – E desde quando nós temos amostras de minerais de outros planetas? Até agora só conseguimos chegar à Lua e à Marte! Para saber se veio de outro lugar, nós temos que nos basear em algo. Você poderia ser mais claro! – Você tem razão. Que tal fazermos uma comparação com as pedras que estão no Centro Espacial? Quem sabe esse minério não tenha sido extraído do solo de Marte! – Tudo é possível. – Vamos deixar de conjeturas. Corrija-me se estiver errado. Pelas suas afirmações, deduzo que dentro em breve receberemos na Casa Branca alguns alienígenas. Estou certo? – Isso jamais passou pela minha cabeça! – Mas você acha possível, não é? – Por que não? – Então vamos fazer o seguinte. Peça para que todos venham a Washington. Vou abrir um espaço na agenda do Presidente. Diga

– E

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ao Dr. Glenn para trazer os outros talheres. Acomode-os no Palace. Quero que venham ainda hoje. – Posso estender o convite ao Dr. Simas? – Boa idéia. Comece a fazer os contatos daqui mesmo. Se precisar de ajuda, fale com Meg. Se não ocorrer nada em contrário, estarei de volta dentro de quarenta e cinco minutos. Até logo mais. – Mas e se o “homem” não tiver a possibilidade de recebê-los? – lembrou, Alfred. – Não se preocupe com isso. Se não for possível para ele recebê-los, alojo-os em minha casa de veraneio – respondeu Paul, esnobando. Mal Paul desapareceu de sua vista, Alfred murmurou: – Que bicho será que o mordeu! Nunca o vi tão sorridente. Alguma razão deve ter! Sobravam telefones na sala. Pegou o mais atraente deles, de cor rosa, e iniciou as discagens. O mais difícil de ser encontrado foi Kirk. Molly ficou encarregada de achá-lo. Mendonza fez uma exi- gência para vir que foi prontamente aceita. Desejava trazer a esposa que não conhecia Washington. Enquanto Alfred aguardava a volta de Paul, Molly se enten- deu com os Drs. Glenn e Mendonza. Também ficou encarregada de encomendar as passagens aéreas. Havia um vôo às dezesseis horas. Como teve a concordância de todos, retornou a ligação à Casa Branca e informou que estariam em Washington naquela mesma noite. Tudo isso só durou trinta minutos. Paul demorou um pouco mais que o previsto. Retornou depois de quase uma hora e meia. Para surpresa de Alfred, estava ainda mais atencioso e alegre. – Desculpe, meu chapa! George me segurou um pouco mais. São coisas do ofício. E então? Falou com todos? – Está tudo certo. Estarão no aeroporto no final da noite.

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– Que bom! Meus parabéns! Embora amanhã seja sábado, George e Bárbara receberão todos nos jardins. Já foi providenciado um churrasco de boas-vindas. Pelo que verifiquei, George é muito amigo de Glenn. Quantos virão? – Se o Dr. Simas vier sozinho, serão nove ao todo. – Não eram oito? – É que o Dr. Mendonza virá acompanhado da esposa. Não há nenhum problema, não é? – É até bom que ela venha! Assim podemos conversar reser- vadamente. Enquanto elas se agrupam e falam dos filhos, nós fala- mos de discos voadores. Traga Shirley também. Minha mulher não poderá vir porque está fazendo companhia à minha filha Gisele. Você já fez as reservas no hotel? – Meg se encarregou disso. – Estejam prontos às dez horas defronte o hotel. – Não será melhor irmos separadamente para não alertar a imprensa? – Sabe que eu não havia pensado nisso! Encarregue-se de levá-los. Procure estar nos jardins às onze horas. Ao cruzar com Meg na saída, Alfred indagou: – Que bicho mordeu Paul? Nunca o vi tão bem humorado! – Você não sabia? – O quê? – Ele é avô. Nasceu seu primeiro neto. – Ah, agora está explicado! Por isso ele disse que dona Wanda não poderia acompanhá-lo! Por isso me tratou de meu chapa!

ram vinte e uma horas e quinze minutos, quando desembarcaram. Trinta minutos após estavam a cami- nho do Hotel. Glenn e a família se acomodaram no E

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carro de Alfred. Kirk seguia com os demais num táxi logo atrás. Mendonza tinha a companhia da esposa e foi o único que trouxe bagagem. Durante o trajeto, Alfred mantinha-se extremamente cortês e caprichava nas explicações. Washington não se comparava a Nova Iorque, mas era muito bonita à noite. John e Ann nunca haviam estado na cidade dos presidentes e, por isso, apreciavam com curio- sidade os altos edifícios. Mary prestava atenção na conversa do marido.

Alfred despediu-se no hall de recepção, prometendo estar de volta às nove horas da manhã do dia seguinte. – Parece que a natureza está do nosso lado – disse Shirley, se espreguiçando ao pé da cama. – Tudo indica que vamos ter um lindo dia – concordou o marido, encarando um vigoroso sol surgindo no horizonte. Estavam tão tensos com o encontro na Casa Branca, que às cinco horas da manhã já estavam de pé. Contrariando as expectativas da mãe que o achava um amante da noite, Alfred vivia muito feliz ao lado de Shirley, sobretudo agora que a esposa ia lhe dar um filho. Esperava por isso há mais de dez anos. – Puxa, querida! – bradou de repente. – Quase havia me esquecido! Sabe quem é avô? Paul! Nunca o vi tão alegre! Você devia ver o seu bom humor. Também não é para menos! George está fazendo um excelente governo e agora Paul ganhou um neto. Apesar dos pesares, ele merece. Tem virtudes e é muito leal. É um pouco temperamental, mas quem não é? – Pare de julgar os outros! – aconselhou, Shirley. – É o primeiro neto? É menino ou menina? – É um menino! – Que nome lhe deram?

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– Na certa George! Puxa-saco como ele é, não iria perder a oportunidade de agradar o presidente! – Não gosto que você fale desse jeito das pessoas. Paul é um ótimo sujeito! – Eu só estava brincando. – Não gosto dessas brincadeiras! – Está bem, docinho! Desculpe. E nós? Quando vamos saber se é menino ou menina? – perguntou, alisando a barriga da esposa. – Não insista nisso! Não vou fazer nenhum exame. O que Deus mandar, será benvindo! – Ah, meu bem! Faça isso pro seu doce de coco. Tire-me dessa aflição – prosseguiu, ajoelhando-se diante da mulher que ria com seu gesto cômico. – Não vejo a hora de saber se será um va- queiro. – Está vendo como você se traiu? Eu sei que você está querendo um menino! Você pensa que me engana? – Depois Deus nos dará uma pestinha! – vaticinou, beijando a barriga da mulher. – O que você acha? – insistiu, apalpando as náde- gas da esposa. – Não é daí detrás que ele vai sair, seu besta! Pelos chutes deve ser um menino! Está satisfeito agora? Seu cara de abóbora verde! – Eu sabia!!! Eu sabia!!! – repetiu exultante. – Quem sabe não será um novo Joe Di-Maggio!38 É isso ai! Vai se chamar Joe! – E se eu estiver enganada? – Não seja uma estraga prazer – censurou, fazendo biquinho. – Mas e se for menina? – Se chamará Marilyn. Está bem?

38 Famoso jogador de beisebol norte americano recém falecido. Foi casado com a também famosa atriz de cinema, Marilyn Monroe.

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– Quer dizer então – deduziu, Shirley – que se for menino será jogador de beisebol ou vaqueiro; se for menina, será uma atriz! É isso? – É isso! – admitiu muito feliz, o futuro papai. – Eu não tenho nada contra as atrizes, todavia não gostaria que minha filha fosse uma atriz. – Por quê? – Quando envelhecem, morrem infelizes e no anonimato! – Nem todas, meu bem. Que horas são? – Já passam das sete. Você não tem que apanhar o Dr. Simas? – Sabe que eu me esqueci de perguntar se ele vem sozinho? – Você não disse que ele é bem velho? – E daí! Não vejo ligação nenhuma! – Pode ser que ele seja viúvo e viva na casa de algum filho! – Mas por que estamos preocupados com isso? – É falta de assunto. Na verdade somos nós que estamos ansiosos. – Então vamos por um fim nela! – Nela quem? – Na ansiedade, ora! Eu estou pronto! E você? – Vou apanhar as minhas sandálias de campo. Quem sabe elas serão úteis! – É uma boa idéia! Vou levar também as minhas.

imas aguardava-os reclinado numa cadeira de balanço. Do seu lado direito estava uma moça e, pelos traços, devia ser mexicana. Tinha uma tez bronzeada, longos

cabelos negros e olhos ligeiramente esverdeados. Logo atrás dela estava um menino com cabelos dourados entretido com um tabuleiro de xadrez.

S

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– Esta é Soledad, uma amiga muito especial. Este é meu neto Tony – sorriu, apertando a mão de Alfred. – Encantado! – prosse- guiu, acariciando a mão que era oferecida por Shirley. – Linda espo- sa a sua! Desde que minha mulher morreu, Tony mora comigo. Vocês não se importariam se fôssemos os três? – Comigo vocês não precisam se preocupar – disse Tony, com desenvoltura. – Eu sei me comportar. – Muito prazer, Dr. Simas. Eu sou Shirley. Como vai? – completou, oferecendo a mão à Soledad. – Podemos falar a sós um pouquinho? – convidou gentilmente o ancião. – Por favor Soledad, fique com dona Shirley enquanto converso um pouco com nosso amigo. – Venha comigo – convidou Soledad, enlaçando pela cintura a nova amiga. – Enquanto eles colocam em dia a conversa, vou te mostrar um tipo raro de violeta. A senhora já viu uma violeta com matizes diferentes? Pois é, as minhas têm duas cores. – Por favor Soledad, trate-me por você. – Está bem. – E então, doutor? Do que se trata? – Quero que saiba que Soledad é uma pessoa especial. Ela é parapsicóloga e tem também o dom da vidência. Por isso quero levála. – Vidente eu sei o que é, mas o que é parapsicóloga? – Parapsicologia é uma nova ciência que estuda os fenômenos paranormais ou inexplicáveis, como os milagres da cura. Parapsi- cóloga é a pessoa que estuda esses prodígios e, procura de certa maneira, explicá-los. – Já entendi! – bradou, Alfred. – Demonstrando profunda e lamentável ignorância completou: são os tais que andam à caça de fantasmas, não é mesmo?

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– Mais ou menos, meu caro. Mais ou menos isso – concor- dou, com lástima. – Desejo levá-la porque poderá nos ajudar em muitas coisas. Sua sexta visão é fantástica! Para você ter uma idéia, já tive oportunidade de vê-la ler o pensamento de uma pessoa a mais de cem metros de distância. – Que bom! Podemos ir agora? – Onde estão os outros? – Já devem estar à nossa espera. Sente-se na frente comigo. O menino sentou-se atrás entre Shirley e Soledad. Pelo jeito deram-se bem, porque do visor Alfred notou que a conversa estava bem animada. Preocupado com o estado da mulher, dirigia com muito cuidado. Faltavam seis minutos para às nove, quando pararam defronte o Hotel. Glenn conversava com um policial no saguão de entrada. Molly apreciava a rua pouco movimentada, enquanto Mary e os filhos trocavam idéias a respeito dos belos candelabros suspensos no teto. Mendonza e a esposa ainda estavam saboreando o café. – Bom dia! – cumprimentou alegremente, Alfred. – Depois das apresentações, perguntou por Mendonza que estava ausente. – Está terminando o almoço da manhã – respondeu Molly, que estava encantadora. – Quer que eu vá chamá-lo? – Podemos esperar. Dormiram bem? O ruído da capital incomoda quem vem do interior. – Por acaso você está nos chamando de caipiras? – brincou Mary, imitando o sotaque das mulheres da roça. – Nós não dormimos bem – falou Glenn, bocejando ligei- ramente. – Mas não foi pelo ruído. Minha mulher estava muito ansiosa e não me deixava pegar no sono. – Ora, ora! Quem está inventando? Não foi você que me acordou pela madrugada?

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– Era para saber se você ainda estava viva! Afinal de contas ser convidado pelo Chefe da Nação é algo que mexe com a gente – terminou, dando um beijo no rosto de Mary. – Nós também não pegamos no sono. Acho que isso acontece com todo mundo – apostou, Shirley. – Aí vem nosso amigo nicaragüense – alertou, Alfred. – E vem com uma maçã nas mãos! – E a esposa com várias ameixas! – observou, John. – Acho que eles pensam que vão a um piquenique! – alfinetou Kirk com malícia. – Onde vocês vão com essas frutas? – perguntou intrigado, Alfred. – Não é o que vocês estão pensando! – esclareceu o bonachão Mendonza. – Estamos atrás das sementes. Quero plantá-las em meu sítio. – Se o senhor não se importar, eu gostaria de presenteá-lo com algumas mudas de meu rancho – ofereceu, Simas. – Quando voltarmos prepararei doze mudas de cada fruto. É o necessário? – As oido, mujer? Este señor nos vá regalar unas sementitas. – Muchas gracias, señor – emendou a senhora com um sorriso. – O que ela falou? – indagou curioso o menino. – Ela agradeceu o seu avô pela oferta das sementes – interveio, Soledad. Alfred perguntou à Glenn: – Alguma novidade? – Muitas. Se vocês não se importam – disse olhando para as mulheres – gostaria de falar com os homens reservadamente. Por favor, procurem entender. – Eu posso ficar, papai? – Você pode.

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– Por que John pode, e eu não posso? – protestou, Ann. – Ora, filha, não seja criança! Faça o que eu estou pedindo. – E então? – repetiu, Alfred. – O que houve? – Ontem estivemos viajando com “eles”. Eram mais ou menos dezenove horas quando ouvimos a voz de um deles. Ordenaram-nos que déssemos as mãos e fizéssemos um círculo. Segundos depois fomos retirados da sala por um extraordinário feixe de luz difícil de descrever. Em instantes estávamos dentro da espaçonave, em um salão oval cuja beleza interna foge aos nossos padrões de beleza. Embora já fosse noite, do alto tínhamos uma perfeita visão de nossa casa. Pas- samos por locais sequer imaginados. Vimos tantos planetas desconhe- cidos na Terra, que senti humilhação. – Por quê? – observou Simas. – Frente àquelas criaturas, é impossível deixar de sentir humilhação. Me senti como um vira latas diante de um cão de caça. – Mas por quê? – repetiu, Simas. – Se vocês passarem por essa experiência vão entender o meu raciocínio. Como vocês se sentiriam viajando entre formidáveis astros, alguns milhares de vezes maior que a Terra? Por diversas vezes pensei: quem terá sido o imbecil que afirmou que estamos sozinhos no Universo? Será que esse indivíduo não foi o mesmo que insistiu que a Terra era plana? Se eles quisessem nos dominar, fariam isso com extrema facilidade, pois sua ciência está milhares de anos mais adiantada que a nossa. Imaginem vocês! Eles podem penetrar com uma visão nítida, até os alicerces de nossos prédios. Outra novi- dade! Vocês sabem o que ouvi dos lábios de Cabalá? O mesmo que ouvi da boca de Asthor! Para mim não resta nenhuma dúvida! Somos seus descendentes e existe um só Deus em todo o Universo. Nossa civilização teve início com à ajuda desses povos. – E o que eles esperam de nós? – insistiu Simas, com um estranho brilho nos olhos.

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– Eles querem que deponhamos as armas e vivamos em paz. – Mas isso é o que eu mais desejo! – gritou entusiasmado, Simas. – Eles querem que eu seja uma espécie de elo de ligação com às autoridades da Terra. Um intermediário. Uma espécie de mensa- geiro da paz. Ela não expôs isso claramente, todavia eu tirei essa conclusão, porque quando estava dentro da espaçonave, tive a exata noção de quem fui numa outra geração. – Você disse, ela? – Isso mesmo, Alfred. Cabalá é uma linda alienígena! – Eu já sabia disso há tempos! – exclamou Simas, com os olhos semi-cerrados. Todos o encararam curiosos, todavia ninguém comentou nada. – Há alguns anos atrás, ela passou uma mensagem a um senhor de nacionalidade brasileira. Ela trabalhou a mente desse senhor dentro da espaçonave, fazendo que ele a memorizasse. Essa comunicação foi publicada nos principais periódicos do mundo ocidental. Eu tenho em mãos uma página do jornal que fez a man- chete. – Ela está aí com o senhor? – Claro que está comigo, Dr. Glenn. Alguma coisa me dizia para trazê-la. Está escrita em português. Se ainda temos tempo, posso lê-la, senão, deixaremos para outra hora. – Temos tempo de sobra! – incentivou, Alfred. – Que horas você marcou com Paul? – lembrou, Kirk. – Não se incomode. Estamos dentro do horário. Simas desdobrou a folha e, lentamente, começou a leitura:

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MENSAGEM DE CABALÁ, DO MUNDO DE AGALI. “É preciso desativar imediatamente as armas de guerra, capazes de acabar com qualquer espécie de vida aqui existente. Além da apavorante e mortífera devastação, uma guerra nuclear total colocará a Terra fora de sua rota celeste e causará graves distúrbios à vida de mundos vizinhos, alguns de dimensões que o homem terrestre ainda desconhece. É preciso abolir a dominação política, econômica e finan- ceira de nações sobre nações. O imperialismo contraria o direito de igualdade dos povos e constitui uma nova e solerte modalidade de escravidão. É preciso preservar a essência da vida humana e suas funções naturais de reprodução. Em estrelas próximas e em outras inatingíveis pelo homem atual, a vida surgiu do sopro do eterno espírito criador de todas as coisas: Deus. Por essa razão, não deve ser objeto de experiências imponderáveis, pois estas terminariam em desastre genético irreversível. É preciso, dentro do mais rigoroso critério de justiça, com vistas à solução dos problemas sociais resultantes da proliferação humana desordenada, instituir órgãos que, por vias científicas naturais, planejem e executem programas de controle populacional e de eugenia do homem. É preciso que o homem conquiste outros mundos do universo e encontre lugares adequados para suas futuras emigrações e novas fontes de energia e subsistência; mas antes deve conquistar seu próprio mundo, desvendando os enigmas que ainda existem na terra, no mar e no ar, conservando os elementos naturais de vital impor- tância, defendendo-o da sutil pirataria do exterior e curando as imperfeições humanas do corpo, da mente e do espírito.

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É preciso que, atendidas essas exortações, a humanidade esteja preparada para o período de extraordinários acontecimentos dos quais a Terra será palco dentro de pouco tempo. Os grandes eventos serão prenunciados por estranhas manifestações. Mestres de suma sabedoria, retornarão à Terra e ajudarão a estabelecer uma nova sociedade política. Renascerá o paraíso terrestre pleno de luz e de amor. Então, por meios e energias ora sequer supostos, o homem conhecerá os côncavos-convexos dimensionais da Terra, viajará às profundezas do universo e não sentirá o cansaço do tempo (...)” – Ótimo! – frisou com admiração, Alfred. – Essa mensagem reforçará nossos argumentos. – E ainda temos os garfos e a faca – recordou, Simas. O chefe cerimonial os esperava na entrada dos jardins. Um pouco mais atrás havia um pequeno agrupamento de pessoas e, no meio, estava o presidente George e a primeira dama Bárbara. Uma grande variedade de carnes brancas e vermelhas cobria uma comprida grelha. George cumprimentou um a um e, quebrando o protocolo, abraçou Glenn por alguns segundos, o mesmo fazendo com Mary. – Que susto você me pregou, meu caro amigo! Pensei que não o veria de novo. E então? O que aconteceu? – Precisamos ter uma conversa em particular – limitou-se a dizer, Glenn. – O único lugar que me sinto seguro é quando ando por estes jardins, portanto, pode desembuchar. O quê é? Durante o tempo que passeavam, Glenn explicou tudo em detalhes, menos que havia sido Aarão. Estavam tão entretidos com a conversa, que alguns convidados acharam que George estava sen- do deselegante, ignorando-os. Até os guardas de segurança se mos-

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travam preocupados, pois os dois haviam andado mais de qui- nhentos metros e eram alvos fáceis para possíveis franco atira- dores. Essa conversa íntima levou um bom tempo. Quando Bárba- ra resolveu intervir, os dois vinham retornando tensos, mas sorri- dentes. – Isso que você acaba de me dizer é fantástico! Com quem estão os talheres? – Um dos garfos está com Alfred. Ele já mandou analisá-lo. – Quantas pessoas estão sabendo disso? – Acho que só a mulher do Dr. Mendonza desconhece o assunto. – Você acredita na nobreza de sentimentos desses extrater- restres? – Ponho minhas mãos no fogo. É suficiente? – Vou ter uma conversa reservada com o Estado Maior. – Se eu fosse você, por enquanto não diria nada. – Você não poderia arrumar uma entrevista com “eles”? – Cabalá disse que faria um contato muito breve. – Esse negócio que você leva na orelha não é um transmissor? Tente falar com eles! – Agora? – E por que não? Você não afirmou que eles estão nos vendo? – Não sei se agora é conveniente. Teríamos que nos afastar novamente e, aí, os demais ficariam enciumados. – Onde você está hospedado? – No Palace Hotel. – Que tal ficar conosco esta noite? Quem sabe vendo-nos à sós, eles se manifestem! – É uma boa idéia, mas e quanto aos demais? – Aqui há espaço para todos. – Para mim, está bem.

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– Então vamos esquecer do assunto por uns momentos. Você ainda aprecia costelas bem passadas? Para não ser deselegante, Glenn achou melhor não dizer que não comia mais carne. – Você não esqueceu, hein! – Como ia me esquecer, se no front você sonhava com elas! – Apesar dos rigores da guerra, tivemos alguns bons mo- mentos. Diga-me uma coisa: como você enveredou para o campo político? Se não me falha a memória, você desejava ser jogador de beisebol! – Eu nunca pensei em ser político. Desisti do profissio- nalismo quanto torci o joelho numa corrida. Depois de várias infil- trações acabei abandonando essa idéia. Quando estava em tratamen- to, conheci Gerard Grey, que sofrera também um acidente. – Grey não é aquele contravertido senador do Kansas? – Exatamente. Naquela ocasião ele era prefeito de uma cidade do interior. Ele gostava de jogar cartas, e isso nos colocou frente a frente. Entre uma partida e outra ele me convenceu para entrar no partido republicano. Meu pai ficou muito contente com minha filiação. Se eu não tivesse torcido o joelho, meu destino seria outro. – É! – vaticinou, Glenn – Deus escreve certo por linhas tortas! Cá entre nós, sempre achei você a pessoa ideal para comandar os destinos da Nação. Estamos vivendo num clima de otimismo graças a você. – Muito obrigado. – Por quê? Você merece o elogio. – Acontece, meu amigo, que estou cercado de puxa-sacos e aproveitadores de ocasião. Sei que suas palavras são sinceras, por isso o muito obrigado. – Será que podemos entrar na conversa? – interveio Bárbara acompanhada de Mary. – Os convidados estão se sentindo preteridos.

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– Esse pessoal deve compreender que não nos vemos há mais de quinze anos! – Acho que faz mais, George – recordou, Mary. – A última vez que Glenn falou com você, John tinha um ano. Ann ainda não havia nascido. – Que memória, hein! – admirou-se, George. – Falando em filhos, você sabia Bárbara, que Paul é avô? – Ah!!! Por isso ele está tão tagarela! Pouco a pouco estavam todos comendo, bebendo e conver- sando animadamente. George era o mais assediado. Paciente e educa- do, falava com todos. Já estavam no meio da noite quando as mulh- eres foram para o Salão Rosa. Como se fosse coisa premeditada, George se viu cercado pelos três homens que ouviram a voz do alienígena. À um convite seu, juntaram-se ao grupo Paul e Simas. Mendonza estava às voltas com uma chuleta mal passada. – Parece-me que a sorte nos reuniu – previu, George. – O que vocês acham disso que está acontecendo com Glenn. Podem falar claramente. Ele já me colocou à par do assunto. – Acho que é algo muito sério, entretanto não posso apostar se é perigoso ou não – opinou, Alfred. – Eu não vejo perigo! – palpitou, Simas. – Eu também não! – assentiu, Paul. – Eu sou da mesma opinião de vocês – ponderou, George. – Se eles fossem hostis estaríamos em maus lençóis. Se são capazes de usar a Natureza como arma, é sinal que estão muito mais adiantados do que nós. Com quem está aquela mensagem daquela entidade alienígena? – Está comigo – respondeu, Simas. – Posso vê-la?

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– Desculpe-me, Sr. Presidente. O senhor sabe ler em portu- guês? – Ela foi escrita nessa língua? – Exatamente. – Então tire uma cópia dela, Paul, e mande passá-la para o inglês. – Se o senhor quiser, posso lê-la em nossa língua. – Por favor! Simas tornou a ler a comunicação. Assim que terminou, Alfred, perspicaz, observou: – Mas essa não foi a mensagem que o senhor nos leu! Esta parece ser mais comprida! – Você tem razão, meu caro. Naquela ocasião não li o último parágrafo, e adaptei o penúltimo. – E por quê? – É que eu estava com a barriga vazia e minha visão já não é mais a mesma. Por isso a encurtei... No tempo em que trocavam opiniões, Cabalá, que havia visto e escutado toda a conversa através da Tela Panorâmica, ciciou: – Desta vez parece-me que Asthor não estava muito certo! – Por quê? – indagou Lemur, captando os pensamentos da amiga. – Glenn e George são quase dois irmãos siameses. Isso facili- tará em muito nossa tarefa. – Encerrem definitivamente este caso – dizia George. – De agora em diante vamos trabalhar em cima de novos episódios. Estou muito interessado em estar presente num possível e novo encontro. Acredito piamente nessa história, e vou fazer o máximo possível para estreitar as ligações com esses extraterrestres. Vamos continuar todos juntos. Quem sabe “eles” nos contate esta noite.

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– O senhor está querendo que passemos a noite aqui? – deduziu, Simas. – Exatamente. Há lugar de sobra. – Quanto a nós não há problemas, mas e quanto às mulheres? – argumentou, Alfred. – Shirley está grávida e não trouxe nenhuma roupa de reserva. – Então apresse-se e vá buscá-la no Hotel. Todos estão livres para fazer o mesmo. – Não obstante acuado, esse homem sabe dar ordens! – consi- derou Cabalá do alto. – Concordo com você – afirmou, Mertz. – Há mais de um ano ele vem sendo pressionado pelo Congresso. – E por quê? – intrometeu-se, Lemur. – Por que ele quer assinar um acordo para limitar as armas nucleares. Pobres mortais que ainda não conseguem dosar suas ambições! – filosofou, Cabalá. – Dê-me sua opinião, Lemur. Deve- mos trazê-los para dentro da espaçonave, ou será melhor me apresen- tar nos Jardins da Casa Branca? – Você sabe como agir. – Vamos apreciá-los por mais alguns momentos. Depois agiremos conforme o desenrolar dos fatos. Mantenha a nave sobre os jardins. – Caso tenhamos de trazê-los, o que faremos para suprir a ausência do Presidente? – Você esqueceu de que eles costumam dormir? – Ainda não me acostumei com isso! – disse Lemur. – Caso resolvamos trazê-los, isso será feito durante a madru- gada. Ninguém deverá notar a ausência deles. – Bem pensado! – concordou, Mertz. Quando necessitava tomar uma decisão, era costume de George meditar numa das alas reservadas a ele na biblioteca. Sentou-

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se em uma poltrona e cerrou os olhos, só que invés de meditar, pôs-se, inexplicavelmente, a rezar. Uma aura magnífica envolveu toda a sala e suave brisa envolveu o seu corpo. Nesse momento teve vontade de chorar. “Senhor! – dizia mentalmente. – Ilumine minha consciência para poder abraçar essa causa. O Senhor sabe como são difíceis e dolorosos os caminhos de um chefe de nação, sobretudo, quando esse chefe tem a missão de governar um país como os Estados Unidos. Será que chegou o momento de auxiliarmos todos os povos? Será que podemos afrouxar nossa segurança? Será que podemos conviver pacificamente com outros irmãos, apesar de crenças diferentes? Ilumine meu Espírito, ó Senhor, para poder receber esse auxílio magnífico do Alto. Ajude-me a convencer meus opositores, daqui, e de outros países. Conserve minha mente sã, para que eu possa utilizá-la em benefício de todos. Amém”. – Eu não faria melhor! – suspirou Cabalá, captando os senti- mentos do Presidente.

urante o trajeto de volta, Alfred absteu-se de qualquer comentário. Estava intrigado com a posição tomada pelo Chefe da Nação, porém preferiu se manter em

silêncio. Soledad lia seus pensamentos e tinha um imperceptível sorriso nos lábios. Simas acariciava os cabelos do neto olhando o cenário exterior. Shirley estava entretida com os chutes do futuro herdeiro. – Virei buscá-los dentro de uma hora – comunicou Alfred, quando Simas descia do carro. – Para mim está bem – assentiu, o velho. – Até logo mais. Assim que se viram a sós, Soledad, comentou:

D

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– Alfred parece preocupado. – Eu tive a mesma impressão. Não será por causa da gravidez da mulher? E então? Você viu alguma coisa? Sentiu a presença de Cabalá? – Senti a presença de dois espíritos ao lado do presidente. Parece-me que eram os espíritos de Lincoln e Roosevelt. Não sei não, mas isso não é bom! – Por quê? – Porque ambos governaram no meio de guerras A presença deles não será um aviso? Um prenúncio de um novo conflito, talvez ainda mais cruento? – Minha experiência me leva à um pensamento contrário. Acho que eles o estão aconselhando para ser bem ponderado em suas decisões. Tanto um como o outro, apesar dos obstáculos, consegui- ram levar o país a um porto seguro. – Tomara que o senhor esteja certo! Alfred retornou sozinho. – O que aconteceu com dona Shirley? Ela não quis vir? – Em virtude da gravidez, ela teme passar por fortes emoções. O senhor já pensou o susto que ela ia tomar se os extraterrestres resolvessem aparecer diante de nós? Valha-me Deus! Eu não quero nem pensar! – Ah, – suspirou, Simas – nesse estado elas são difíceis de compreender, porém tenho que aplaudir essa decisão. Quando chegaram, repararam que Mendonza estava sozinho. Entre risos disse que a esposa preferiu passear. – Sozinha? – inquiriu preocupado, Alfred. – Uma das recepcionistas se ofereceu para acompanhá-la. – Eu já estive várias vezes em Washington, todavia não conheço sua vida noturna – disse Molly, pertinho de Kirk.

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– Caso fiquemos mais alguns dias, prometo levá-la à um passeio – ofereceu-se, Kirk. Seguindo os hábitos dos ingleses, George e Bárbara chegaram pontualmente às vinte horas. Estavam sem a companhia da filha. – Que tal continuarmos com o churrasco? – disse George. – Parece-me que a Mãe Lua deseja que fiquemos nos jardins. Olhem como ela joga seu feitiço sobre nós! – disse a primeira dama, surpreendendo os convidados. – Se todos concordarem, vou mandar acender o fogo. – Ele já está aceso – interveio o chefe de cerimônias, que esta- va atrás do casal. Era uma linda noite e o céu estava tomado por milhares de pontos luminosos. A brisa agradável ajudava a esparramar o perfume das flores. A lua estava tão cheia, que parecia uma pérola prateada presa a um fio invisível. – Eles até que poderiam ser amáveis e participar de nosso churrasco – observou George, olhando para o alto. – Eles quem? – indagou, Bárbara. – Desculpe, meu bem. Ainda não te contei nada sobre isso. Outra hora falaremos disso. – Você é quem sabe. – E você, Glenn, acha que eles se mostrarão? – Tudo é possível, George. Como você já lembrou, aqui sobra espaço. Quiçá eles resolvam pousar nos jardins! – disse Glenn, piscando um olho. – Você já imaginou o estardalhaço que isso faria? – cutucou, George. Bárbara, não agüentando mais a curiosidade, pegou Mary pelo braço e levou-a a um canto isolado.

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– Por favor, Mary! Você sabe o que está acontecendo? Quem são eles? – George não comentou nada com você? – Ainda não tivemos tempo para conversar reservadamente. Se você não se incomoda e, sabe do que se trata, por favor, diga-me o que está havendo! – Está bem! Sente-se aí. Durante vários minutos Mary contou o que sabia. Caprichou quando falava sobre a extraordinária viagem. – Ah! Agora estou entendendo! George nunca convidou alguém para pernoitar na Casa Branca! O que ele está esperando? – Na certa crê que Cabalá faça um novo contato. – Só pode ser isso! – O que vocês estão tagarelando? – perguntou George, que havia se aproximado sem elas notarem. – Estávamos conversando sobre coisas de mulheres – mentiu Bárbara, enlaçando o companheiro pela cintura. – Você não me engana, meu bem. – Piscou para Mary e concluiu: não estou certo, Mary? – Tem razão, querido. Falávamos de coisas mais sérias – murmurou a primeira dama beijando o rosto do marido. – Se você fosse mais paciente, ouviria de meus lábios o que Mary acabou de te contar. Agora não importa! O que você deduz disso? Mary interveio e observou: – Qual é a opinião de Glenn? Ele obteve algum sinal? – Ainda não, porém está muito confiante. Só acha que há muita gente. Se dependesse de mim – explicou, George – gostaria de ir a sós com ele. – E por quê?

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– Porque imagino que essa extraordinária figura seja um chefe de estado. Talvez queira tratar comigo de coisas que deverão permanecer em segredo. – Mas nós compartilhamos de segredos desde que nos casa- mos – insistiu, Bárbara. – Mas talvez “ela” não pense assim! Apreciando tudo de cima, Cabalá mentalizou: – Está vendo Lemur, como eles gostam de polemizar? – No fundo George tem razão – observou, Lemur. – As mulheres humanas dificilmente guardam um segredo. – Vou aceitar a sugestão dele e trazê-lo durante o sono. A ele e a Glenn. – Não seria de bom grado trazer Simas e Soledad? Eles serão de muita utilidade. – Tem razão. Soledad e Simas pressentem que os estamos vendo. Essa jovem é uma ótima escritora. Vou aconselhá-la a fazer um livro a nosso respeito! Encarregue-se de fazer o menino dormir profundamente. – E os demais? – Eles não terão coragem de importunar o sono do Chefe da Nação. – Você está se esquecendo que as esposas dormem junto? E se elas acordarem e não virem os maridos? – Sabe de uma coisa! Vamos trazê-las também! – Bem pensado – concordou, Mertz. Já era quase meia-noite, quando todos resolveram se recolher. – É melhor irmos dormir – aconselhou, George. – Acho que minha presença os afastou. – Com sua permissão, vou visitar minha filha – disse Paul. – Você fica, Alfred?

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– Se o senhor não precisa de mim, vou voltar ao hotel. Virei buscá-los amanhã por volta das nove – completou, olhando para o Dr. Simas. – Você me dá uma carona? Vou ver se minha mulher já se cansou de andar! – brincou, Mendonza. – Que tal darmos um passeio? – convidou Kirk, olhando para Molly. – Vamos lá! – aceitou, a linda agente. – Até amanhã cedo estaremos de volta. – Vou colocar meu neto na cama e já volto. Se vocês não se importarem, antes de dormir vou jogar uma partida de xadrez com Soledad – disse Simas. – Eu também estou sem sono – disse Bárbara. – Que tal jogar- mos um pouco de cartas? – Excelente idéia – assentiu, Glenn. – Quem vai jogar com quem? – Que tal tirar as cartas mais altas? – sugeriu Bárbara, dando mostras de conhecer o assunto. As cartas não separaram o que o destino uniu. Glenn e Mary jogariam contra George e Bárbara. Sentada numa mesa ao lado, Soledad aguardava a chegada de Simas. Após alguns minutos, o ancião devorava com os olhos o tabuleiro e, sua expressão, era de quem estava em sérios apuros. Seu rei preto estava encurralado e prestes a ser derrubado. Quando ia tomar o xeque-mate, uma voz entoou pelo salão. Glenn e Mary, reconheceram-na de pronto. – Bom fim de noite para todos. Que a graça do Altíssimo ilumine vossas mentes. Vejo que John e Ann estão ausentes. – Eles foram com minha filha assistir à um espetáculo musi- cal – respondeu a primeira dama. – Presumo que não estarão de volta até às quatro horas da manhã, não é?

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– Por que você quer saber quando voltarão? – disse Mary. – Porque vou levá-los à um passeio que demorará algumas horas. – Mas e se eu for procurado nesse intervalo? – lembrou, George. – Confie em mim. Ninguém notará sua ausência. Vocês são exatamente as seis pessoas escolhidas para esse passeio. Por favor, dêem às mãos formando um círculo. De preferência, no meio da sala. Não fiquem em baixo do lustre, senão é capaz dele vir junto – aconselhou, rindo. – Espere um pouco! – advertiu, George. – Vou avisar a segu- rança que estou indo me recolher e, não desejo, em hipótese alguma, ser molestado. Precisamente às onze e cinqüenta e quatro minutos uma estei- ra de luz desceu sobre os Jardins da Casa Branca. Bárbara, acostu- mada a fazer compras num shopping, tentou buscar apoio como se estivesse numa escada rolante. Chegou a tropeçar como se estivesse com os pés num degrau. O marido chegou até a segurá-la, o que cau- sou um riso geral. – Seja bem-vindo, Sr. Presidente! – entonou Cabalá, com a mão direita sobre o coração. Ela estava magnificamente bela. Apesar de ter aproxima- damente um metro e vinte centímetros de altura, Bárbara sentiu-se pequena diante de tanta formosura. Mary já a conhecia e, Soledad, graças aos seus dotes paranormais, também. Cabalá tinha os cabelos da cor do trigo, só que um pouco mais dourados. Os olhos de azul forte, faiscavam como brasas incan- descentes. As narinas eram de uma suavidade impressionante e, os lábios levemente rubros, pareciam ter sido delineados por um grande artista. Um diadema de cor prateada cingia sua cabeça, e um mimoso colar envolvia o bem torneado pescoço. Um vestido de seda amarelo

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cobria todo seu corpo e, seus pés, graciosos e pequeninos, estavam adornados por sandálias da cor do diadema. Lemur e Mertz ladeavam-na e pareciam Adônis e Apolo. Bárbara, sobretudo, não sabia se admirava a anfitriã ou aquelas duas estátuas gregas. – Sou Cabalá, e estes são Lemur e Mertz. Acho que Glenn já vos contou algo a nosso respeito. Embora habituado com as mais diversas situações, George encontrava-se sem fala. Já tinha batizado e visto por dentro, sub- marinos, porta-aviões e, até satélites, todavia nada se comparava com o que estava vendo. Reparava que os comandos da nave eram bem mais simples que os painéis dos aviões de carreira. Mas não era só isso que mar- telava sua cabeça. Desde que estava no interior da nave, notou que não havia pressurização. Nenhum dos tripulantes levava roupas especiais. Sequer capacetes. Como isso era possível? Ao mirar também ao redor, não via portas nem aberturas laterais. Era como se a nave tivesse sido feita com uma única chapa sem cortes. Outra coisa! Respiravam normalmente sem auxílio de nenhum aparelho. – Perguntava intimamente: como isso é possível? Não obstante avistar a Terra pequenina, não estavam flutuando. O que aconteceu com a gravidade? Experimentou dar um pulinho para ver se levitava, mas isso não adiantou. A mesma força de gravidade que havia na Terra, devia haver dentro da nave. Era tanta a sua curiosidade, que não esperou. – Por favor, a que distância estamos da Terra? – Dentro de alguns instantes estaremos a centenas de milhares de quilômetros. Quando trouxemos vocês para dentro, estávamos parados a uma distância bem razoável para os padrões de vossa ciência. Exatamente a 62.000 metros do nível do Oceano Pacífico.

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– Mas então, como estamos respirando sem auxílio de aparelhos? E quanto à gravidade? Por que não estamos flutuando? – Porque, no momento, o piso de nossa nave está com a mesma atração magnética da Terra. Por isso não estamos flutuando. Para respirar, nós também precisamos de oxigênio. Há muito ar puro em nosso mundo. Por ora, é só isso que posso dizer. Por favor, pres- tem atenção no que vamos ver! Desta vez, Cabalá ordenou a Lemur, que fizesse o mesmo trajeto que Asthor fez com Glenn. Mertz explicava com detalhes tudo que viam. Quando já estavam perto de Janos, Cabalá disse com um grave semblante: – Vejam o que a insensatez fez com o planeta Janos. Quero que vocês gravem bem essas cenas, sobretudo você, Presidente George. Digo você, porque terá que convencer os mais intransigentes. Os mais radicais. Aqui havia uma civilização muito mais adiantada da que existe na Terra. Duas nações tinham destaque e, quando uma quis dominar a outra, veja o resultado. A fisionomia de George mostrava uma profunda melancolia. – Trouxe-o aqui – prosseguiu, Cabalá – para mostrar o perigo que corre o Planeta Terra. O vosso arsenal atômico é superior ao que existia em Janos. Se houver uma terceira grande guerra, não tenha dúvidas, a Terra se partirá ao meio. Sabe por quê? Porque além do enorme poder destrutivo, o interior do planeta está com uma racha- dura difícil de ser ligada. Se os testes nucleares não forem defini- tivamente extintos, diversos países da linha dos Andes poderão desaparecer. Existe nos pólos um perigo ainda maior. Em razão dessas explosões, a temperatura está sendo modificada de tal forma, que a massa de gelo concentrada nos pólos vai derreter e invadir todos os continentes. Apesar de estarmos atentos e vigilantes, não poderemos fazer nada contra a Natureza que se revolta. Isso será o caos! O fim!

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À medida que expunha sua sólida teoria, todos notaram que havia uma transformação radical na aparência de Cabalá. Sua aura brilhava tanto, que estava difícil encará-la. Havia tanta nobreza em suas palavras, que ninguém ousava interrompê-la. Enquanto falava, Cabalá se fazia mais bela. Raios divinos fluindo de mananciais invi- síveis, cercavam-na e faziam os ouvintes flutuar. Das mãos em sua- ves movimentos, fluíam intensos jatos de luz. Sua personalidade era tão majestosa, que a cabina de comando foi inundada por um envol- vente perfume. Talvez por humildade, ou talvez querendo ocultar a elevada posição que desfrutava, ela não olhava ninguém de frente. O seu amoroso magnetismo, modificava o campo vibratório e mudava, de segundo a segundo, sua aparência. Finalizou, dando as seguintes instruções: – Você, Soledad, dará asas à imaginação e registrará em livro, este nosso passeio. Bárbara e Mary darão apoio irrestrito às decisões dos maridos. Simas será um ótimo conselheiro e, Glenn, o Mensageiro da Paz. Você, George, terá a incumbência de preparar o ESPÍRITO de todos os grandes dirigentes. Neste pergaminho que ora lhe entrego, estão algumas sugestões. A frota de Almeno já está a caminho. Eles estão chegando. Prepare um local para descermos. Que tal os Jardins da Casa Branca? Não é um lugar ideal? – Vou mandar embelezá-los ainda mais! – disse George, emocionado.

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Alan Darc é autodidata e nasceu em São Paulo no dia 16 de junho de 1939. Começou a escrever desde cedo, porém somente em

1995 resolveu publicar seus trabalhos, pressionado por alguns amigos. É de sua autoria A Última Profecia, publicado em 1997, Parábolas e Frases de Amor, publicado em 1999 e Mooca Berço

Dourado, publicado em 2000.

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“Mensagem de Cabalá, do mundo de Agali, para todos os povos da Terra:

É preciso desativar imediatamente as armas de guerra, capazes de acabar com qualquer espécie de vida aqui existente. Além da apavorante e mortífera devastação, uma guerra nuclear total colocará a Terra fora de sua rota celeste e causará graves distúrbios à vida de mundos vizinhos, alguns de dimensões que o homem terrestre ainda desconhece. É preciso abolir a dominação política, econômica e financeira de nações sobre nações. O imperialismo contraria o direito de igualdade dos povos e constitui uma nova e solerte modalidade de escravidão. É preciso preservar a essência da vida humana e suas funções naturais de reprodução. Em estrelas próximas e em outras inatingíveis pelo homem atual, a vida surgiu do sopro do eterno espírito criador de todas as coisas: Deus. Por essa razão, não deve ser objeto de experiências imponderáveis, pois estas terminariam em desastre genético irreversível. É preciso dentro do mais rigoroso critério de justiça, com vistas à solução dos problemas sociais resultantes da proliferação humana desordenada, instituir órgãos que, por vias científicas naturais, planejem e executem programas de controle populacional e de eugenia do homem. É preciso que o homem conquiste outros mundos do universo e encontre lugares adequados para suas futuras emigrações e novas fontes de energia e subsistência; mas antes deve conquistar seu próprio mundo, desvendando os enigmas que ainda existem na terra, no mar e no ar, conservando os elementos naturais de vital importância, defendendo-o da sutil pirataria do exterior e curando as imperfeições humanas do corpo, da mente e do espírito. É preciso que, atendidas essas exortações, a humanidade esteja preparada para o período de extraordinários acontecimentos dos quais a Terra será palco dentro de pouco tempo. Os grandes eventos serão prenunciados por estranhas manifestações telúricas e sinais celestes de magnífico esplendor e inquietante beleza. Mestres de suma sabedoria retornarão à Terra, renovarão ensinamentos maravilhosos e ajudarão a estabelecer uma nova sociedade política. Renascerá o paraíso terrestre pleno de luz e de amor. Então, por meios e energias ora sequer supostos, o homem conhecerá os côncavos-convexos dimensionais da Terra, viajará às profundezas do universo e não sentirá o cansaço do tempo. E, como sublime conquista da capacidade criadora humana, será posta em ação a máquina do poder absoluto, engenho que, entre muitos outros prodígios, dará à humanidade a visão mais feliz e assombrosa de toda a sua história: a ressurreição dos mortos (...)

Page 221: Eles estão chegando · 2017-12-17 · 2 Fundação BIBLIOTECA NACIONAL MINISTÉRIO DA CULTURA REGISTRO No 216.686 LIVRO 378 FOLHA 346 Capa: Desenho de Rafael Pianca Barroso Direitos

Alan Darc, visto na foto, nasceu na cidade de São Paulo, bairro daMooca. Há 30 anos se dedica ao estudo de fenômenos paranormaise, isso o levou a escrever algumas de suas experiências. É tambémautor de e , todos jáA Última Profecia Parábolas e Frases de Amoreditados.