elementos de aritmética abramo hefez

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TEXTOS UNI VER s ITÁRI o s A. Hefez p-i q-i SOCIEDADE í BRASILEIRA < DE MATEMÁTICA j

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Page 1: Elementos de aritmética   abramo hefez

T E X T O SU N I V E R s I T Á R I o s

A. Hefez

p-i q-i

SOCIEDADE íBRASILEIRA <DE MATEMÁTICA j

Page 2: Elementos de aritmética   abramo hefez

índice

1 Os Números Naturais l1.1 Adição e Multiplicação l1.2 Subtração 61.3 Axioma de Indução . • 7

2 Aplicações da Indução 142.1 Definição por Recorrência 142.2 Binómio de Newton 172.3 Propriedade da Boa Ordem . 202.4 Aplicações Lúdicas • 23

3 Divisão nos Naturais 303.1 Divisibilidade 303.2 Divisão Euclidiana 353.3 A Aritmética na Magna Grécia 40

4 Representação dos Números Naturais 434. l Sistemas de Numeração 434.2 Jogo de Nim 50

5 Algoritmo de Euclides 535.1 Máximo Divisor Comum 535.2 Propriedades do mdc 585.3 Mínimo Múltiplo Comum 63

6 Aplicações do Máximo Divisor Comum 666. l Equações Diofantinas Lineares 666.2 Expressões Binômias 746.3 Números de Fibonacci 79

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7 Números Primos 827.1 Teorema Fundamental da Aritmética . 827.2 Sobre a Distribuição dos Números Primos i 887.3 Pequeno Teorema de Fermat 927.4 O Renascimento da Aritmética . 96

8 Números Especiais . 978.1 Primos de Fermat e de Mersenne . 978.2 Números Perfeitos 1018.3 Decomposição do Fatorial em Fatores Primos 1048.4 Euler, um Gigante da Matemática 108

9 Congruências 1109.1 Aritmética dos Restos 1109.2 Aplicações 1199.3 Congruências e Números Binomiais . . 1239.4 Gauss, um Príncipe da Matemática 126

10 Os Teoremas de Euler e Wilson 12910.1 Teorema de Euler 12910.2 Teorema de Wilson 138

11 Resolução de Congruências 14111.1 Resolução de Congruências Lineares 14111.2 Teorema Chinês dos Restos 14411.3 Congruências Quadráticas 14711.4 Lei da Reciprocidade Quadrática 150

Sugestões aos Problemas 161

índice Analítico 167

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Prefácio

O nosso objetivo aqui é estudar as propriedades dos números naturais junto com assuas operações de adição e de multiplicação, enfatizando as questões relacionadas com adivisibilidade.

Este livro cobre o material para um primeiro curso de Aritmética e destina-se à formaçãobásica dos alunos de graduação em Matemática, e, à formação complementar daqueles queestão no exercício da docência no ensino fundamental e médio.

Apesar deste material não ser ensinado neste grau de detalhe e de profundidade nasescolas, ele deve, obrigatoriamente, fazer parte da bagagem mínima de todo professor deMatemática.

A Aritmética, como usualmente é chamada a parte elementar da Teoria dos Números,teve como principal marco inicial a obra Os Elementos, de Euclides (aprox. 300 AC),encontrando o seu auge nos trabalhos de Pierre de Fermat (1601-1665) e Leonhard Euler(1707-1783), o que a levou a se tornar um dos principais pilares da Matemática. A partirdo início do século 19, graças à obra de Cari Friedrich Gauss (1777-1855), a Aritméticatransforma-se em Teoria dos Números e começa a ter um desenvolvimento extraordinário.Estes são os quatro principais protagonistas da história que iremos contar aqui.

A Gauss deve-se a fecunda ideia, entre muitas outras, de efetuar a fatoração de númerosnaturais em anéis de números algébricos. Esta ideia foi grandemente desenvolvida nostrabalhos de Ernsí Kummer, Richard Dedekind e Leopold Kronecker, iniciando o que sechama atualmente a Teoria Algébrica dos Números. Por outro lado, com os trabalhos deLejeune Dirichlet e Bernhard Riemann, também no século 19, foram utilizadas técnicasde Análise Real e Complexa para se compreender melhor a distribuição dos números pri-mos, iniciando, assim, uma outra maneira de se tratar os problemas da Aritmética, a TeoriaAnalítica dos Números. Hoje, há uma terceira abordagem, a Geometria Aritmética, cu-jos métodos são tomados da Geometria Algébrica e cujos precursores foram Emil Artin,Helmut Hasse, Louis Joel Mordell e André Weil. Esta última abordagem tem se mostradoextremamente fecunda, permitindo provar profundos teoremas em Teoria dos Números, eculminando com a publicação, em 1995, da demonstração, por Andrew Wiles, do chamadoÚltimo Teorema de Fermat.

O livro é organizado como segue: são onze capítulos, divididos em seções. Cada seçãocontém inúmeros exemplos e, ao seu final, uma lista de problemas numerados com três

Page 5: Elementos de aritmética   abramo hefez

IV

niímeros; o'primeiro indicando o capítulo, o segundo, a seção e o terceiro, o problema emsi. Além disso, nó final da maioria dos capítulos, o leitor encontrará uma lista de problemassuplementares. Os problemas marcados com asterisco são aqueles que têm alguma sugestãopara a sua resolução, ou mesmo, a própria, no final do livro.

Para tornar possível a'utilização do -livro em um curso semestral, algumas seções, acritério do professor, poderão ser omitidas sem comprometer a compreensão do todo. Essasseções são as seguintes: 4.2, 62, 6.3, 8.2, 8.3, 9.3, 11.3 e 11.4.

Este livro foi escrito com base em notas de aula de um curso semestral de Aritmética queministrei em'2003, no âmbito do Projeto. de Melhoria de Ensino da Matemática no Estadodo Rio de Janeiro, organizado pela SEM e patrocinado pela FAPERJ, aos quais agradeçopela oportunidade concedida. .

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lOs Números Naturais

Os números naturais formam um dos conceitos mais antigos concebidos pelo ser hu-mano. Entretanto, a sua evolução de uma noção intuitiva para um conceito mais elaboradofoi muito lenta. Só no final do século 19, quando os fundamentos de toda a matemáticaforam questionados e intensamente repensados, é que a noção de número passou a serbaseada em conceitos da teoria dos conjuntos, considerados mais primitivos.

Neste curso, não pretendemos descrever a evolução do conceito de número natural, nemtentar explicar sua natureza, mas apenas estudar algumas das suas propriedades.

Como em tudo há sempre um ponto de partida, o nosso será o de admitir que o leitoresteja familiarizado com o conjunto dos números naturais

juntamente com as operações de adição (a, b) >-> a + è e de multiplicação (a, 6) M- a • b(ou (a, 6) H-» ao).

A nossa abordagem será essencialmente axiomática; ou seja, a partir de uma lista ra-zoavelmente pequena de propriedades básicas dos números naturais e das duas operações,iremos obter as demais propriedades.

A lista de axiomas que adotaremos não será a menor possível, pois, quanto menor foresta lista, mais demorado será chegar aos resultados mais relevantes da teoria.

Existe uma axiomática idealizada no final do século 19 pelo matemático italiano Giusep-pe Peano que, com quatro axiomas, consegue não só definir a adição e a multiplicação nosnaturais, como também deduzir as propriedades que assumiremos aqui como axiomas.

1.1 Adição e Multiplicação

l ) A adição e a multiplicação são bem definidas:

V a, 6, a', 6' 6 IN, a = a' e b = b' => a + b = a' + b' e a • 6 = a' - b'.

l

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2 1. Os Números Naturais

2) A adição e a multiplicação são comutativas:

V a, 6 € IN, a + b = b + a e a • b = b • a.

3) A adição e a multiplicação são associativas:

V a, 6, c € IN, (a + 6) + c = a + (6 + c) e (a • 6) • c = a • (6 • c).

4) A adição e a multiplicação possuem elementos neutros:

Vá e IN, a + 0 = a e a - l = a.

5) A multiplicação é distributiva com relação à adição:

V a, 6, c e IN, a • (ò + c) = a • 6 + a • c.

A Propriedade l é que permite somar, a ambos os lados de uma igualdade, um dadonúmero, ou multiplicar ambos os membros por um mesmo número.

Algumas vezes, trabalharemos com outros conjuntos, diferentes dos naturais, munidosde operações de adição e multiplicação que possuem as propriedades de (1) a (5) acima.Neste caso, diremos que os elementos de tais conjuntos, juntamente com as duas operações,estão sujeitos às leis básicas da aritmética. Por exemplo, sabemos que os números inteirosrelativos, os números racionais, os números reais e os números complexos estão sujeitosàs leis básicas da aritmética. Alertamos o leitor quanto ao fato de que estes números sóserão utilizados nos exemplos e nos problemas; nunca, porém, em lugar essencial para odesenvolvimento da teoria.

Usaremos a notaçãoIN* = {1,2,3,...}.

Vamos admitir, também, que os números naturais possuam as propriedades a seguir:

6) Integridade: Dados a, 6 e IN*, tem-se que a • b 6 IN*.

Equivalentemente, pela formulação contrapositiva:

V a, & 6 IN, a-b = Q =^ a = 0ou6 = 0.

7) Trícoíomia: Dados a, ò € IN, uma, e apenas uma, das seguintes possibilidades é verifi-cada:

i) a = b ii) 3c€lN*, b = a + c iii) 3 c € IN*, a = b + c.

Diremos que a é menor do que b, simbolizado por a < ò, toda vez que a propriedade(ii) acima é verificada.

Page 8: Elementos de aritmética   abramo hefez

§1.1 Adição e Multiplicação 3

Com esta definição, temos que a propriedade (iii) acima equivale a afirmar que 6 < a.Assim, a tricoíomia nos diz que, dados a, b E M, uma, e somente uma, das seguintescondições é verificada:

i) a = b ii) a < ò iii) ò < a.Utilizaremos a notação b > a, que se lê 6 é maior do que a, para representar a < b.

Decorre, das definições, que O < a, para todo a € IN*. De fato, para todo a 6 IN*,temos que O + a = a, o que implica O < a.

Temos, também, que se a + ò = O, então a = b — 0. De fato, se a ^ O teríamos b < O,o que é absurdo, logo a = 0. Analogamente, mostra-se que 6 = 0. Portanto, se a 6 IN* oub e IN*, então a + b 6 M*.

Proposição 1.1.1. a • O = Q para todo a € IN.

DEMONSTRAÇÃO: Temos que

a • O = a (O + 0) = a • O + a • 0.

Se a • O 7^ O, então teríamos a • O 6 M* e, portanto, seguiria, da igualdade acima, quea • O > a • O, o que é absurdo. Logo a • O = 0.

D

Proposição 1.1.2. A relação "menor do que " é transitiva:

V a, b, c € IN, a < b e b < c => a < c.

DEMONSTRAÇÃO: Supondo a < b e b < c, temos que existem d, f E IN* tais queb = a + d e c = b + f. Logo, usando a associatividade da adição, temos que

com d + f e M*, o que implica que a < c.

D

Proposição 1.1.3. A adição é compatível e cancelativa com respeito à relação " menor doque ":

V a, 6, c e M, a < b <=» a + c < b + c.

DEMONSTRAÇÃO: Suponha que a < b. Logo, existe d 6 IN*, tal que b = a+d. Somandoc a ambos os lados desta última igualdade, pela comutatividade e associatividade da adição,temos

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1. Os Números Naturais

o que mostra que a + c < 6 + c.Reciprocamente, suponha que a + c < b + c. Pela tricotomia, temos três possibilidades:

(i) a = b. Isto acarretaria c + c = 6 + c, portanto, falso, (ii) b < a. Isto acarretaria, pelaprimeira parte da demonstração, que b + c < a + c; também é falso, (iii) a < b. Esta é aúnica possibilidade que resta. .

• ' D

Proposição 1.1.4. A multiplicação é compatível e cancelativa com respeito à relação "^f-

menor do que ": m

V a, 6 6 M, Vc6]N*, a < b <=> a • c < b • c.

DEMONSTRAÇÃO: Suponha que a < b. Logo, existe d e M* tal que 6 = a + d. Mul-tiplicando por c ambos os lados dessa última igualdade, pelas propriedades comutativa edistributiva da multiplicação, decorre

o que mostra que a • c < ò • c, pois, pela integridade, c- d E M*.Reciprocamente, suponha que a • c < 6 • c. Peia tricotomia, temos três possibilidades a

analisar:

(i) a = b. Isto acarretaria a • c = b • c, o que é falso, (ii) b < a. Isto acarretaria, pelaprimeira parte da demonstração, que 6 • c < a • c, o que também é falso, (iii) a < b. Esta éa única possibilidade válida.

• " ~ D' '

Proposição 1.1.5. A adição é compatível e cancelativa com respeito à igualdade: ¥

V o, 6, c 6 IN, a = b <==> a + c = b+'c. .

DEMONSTRAÇÃO: A implicação a = b =$> a + c = b + cê consequência do fato daadição ser bem definida (Propriedade l ).

Suponha agora que a + c = b + c. Temos três possibilidades: í^Ht.

(i) a < b. Pela Proposição 1.1.3, temos que a + c < b + c, o que é um absurdo. .(ii) b < a. Pelo mesmo argumento acima, b + c < a + c, o que é também uni absurdo.(iii) o = fe. Esta é a única alternativa válida. ' .

D

Proposição 1.1.6. A multiplicação é compatível e cancelativa com respeito à igualdade:

Va,6eIN, VcelN*, a = b <í=>- a-c = b-c.

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§1.1 Adição e Multiplicação * . . • • • • 5

".

DEMONSTRAÇÃO: A implicação 0 = 6 => a • c = b • c decorre imediatamente do fatoda multiplicação ser bem definida (Propriedade l ). . . .

Suponha agora que a- c — b- c. Temos três possibilidades:(i) a < b. Pela Proposição 1.1.4, temos que a • c < b --c, o que é um absurdo.(ii) b < a. Pelo mesmo argumento acima, b • c < a • c, o que é um absurdo.(iii) a — b. Está é a única alternativa válida.

• Di.

Note que a relação < não é uma relação de ordem, pois não é reflexiva. Podemos,entretanto, através dela, obter uma relação de ordem, como descrevemos a seguir.

Diremos que a é menor ou igual do que b, ou que 6 é maior ou igual do que a, escrevendoa < b ou b > a, se a < b ou a = b. • .

Note que a < b se, e somente se, existe c e M, tal que b = a + c. Com isto, éfácil verificar que esta nova relação é efetivamente uma relação de ordem, pois possui asseguintes propriedades:1) É reflexiva: V a, a < a. '. •2) É anti-simétrica: V o, 6, a<b e b<a ==> a = b.3) É transitiva: V a, 6, c, a < 6 e b < c =r> a < c.

Problemas

1.1.1 Mostre que a relação < é uma relação de ordem em IN. '

1.1.2 Mostre, V a, 6, c € IN, que ' •a) a < b =$• a <b. • .b ) a < 6 e ò < c ==> a < c.c ) a < 6 e ò < c ==> o < c.

1.1.3 Levando em conta a tricotomia, .a) mostre que a negação de a < b é a > 6.b) qual é a negação de a > 6? . .c) qual é a negação de a — 6?

1.1.4 Mostre q u e . - . ' - .a) V a, ò, c 6 IN, a < 6 <^=> a + c< 6 + c. .: -b) V a, 6 e IN, V c € IN*, a < ò <=> a - c < b -c. .

1.1.5 Mostre, V a, 6, c, d 6 IN, que

b ) a < 6 e c < d =í> a + c < 6 + d e a • c < b • d.

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1. Os Números Naturais

1.1.6 Sejam a e b números naturais.a) Mostre que, se a + b = a, então 6 = 0.b) Mostre que, se a • b = a, então a = O ou 6 = 1.c) Mostre que, se a • a = a, então a = O ou a = 1.

1.2 Subtração

Dados dois números naturais a e 6 com a < 6, sabemos que existe um número naturalc tal que b = a + c. Neste caso, definimos o número b menos a, denotado por b — a, comosendo o número c. Em símbolos:

b — a = c.

Dizemos que c é o resultado da subtração de a de 6.Portanto, temos por definição

c = b — a <í=> 6 = a + c.

No universo dos números naturais, nem sempre existe a subtração de dois números; sóexiste b — a quando a < b.

Note que a — a = O para todo a E IN, e que, por definição, (6 — a) + a = 6.

Exemplo 1.2.1. 8-5 = 3, 3-2 = 1, 8-3 = 5,

(8 -5) -2 = 3-2 = l, 8- (5 -2) = 8-3 = 5.

Os dois últimos exemplos mostram que a subtração não é associativa.

Proposição 1.2.1. Sejam a, b, c e IN. Se a < b, então

c • (b — a) = c • b — c • a.

DEMONSTRAÇÃO: Note que, se 6 > a, então c • 6 > c • a, o que nos diz que c •• b — c • aestá bem definido.

Suponha agora que 6 — a = d, logo 6 = a + d. Multiplicando por c ambos os membrosdesta última igualdade, obtemos c-b = c-(a + d) = c-a + c-d, o que implica

c- d = c- b — c- a.

Substituindo d por 6 — a na igualdade acima, obtemos

c • (6 — a) = c • b — c • a.

D

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§1.3 Axioma de Indução 7

Problemas

1.2.1 Sejam a, ò e c números naturais tais que a — (ò — c) esteja bem definido. Mostre que(a + c) — b está bem definido e que

a — (b — c) = (a + c) — 6.

1.2.2 Sejam a, 6 e c números naturais tais que b+c < a. Mostre que a— (b+c) e (a —ò) —cestão bem definidos e que vale a igualdade

a - (ò + c) = (a - ò) - c.

1.2.3 Sejam o, ò e c números naturais tais que O < c < ò < a. Mostre que O < b — c <a — c < a.

1.2.4 Sejam a, ò e c números naturais tais que c < b < a. Mostre que 6 — c < a — c < a.

1.2.5 Sejam a, 6, c € IN tais que a < c e b < c. Mostre que, se c — a < c — 6, então a > b.

1.2.6 Sejam a, 6, c, d € IN tais que a < b e c < d. Mostre que

ò — a < d — c •<=> ò + c < a + d.

1.3 Axioma de Indução

As propriedades dos números naturais e de suas operações que descrevemos até o mo-mento não bastam para caracterizá-los. Por exemplo, os números racionais não negativos,assim como os números reais não negativos possuem todas as propriedades acima. No en-tanto, há uma propriedade adicional que só os naturais possuem, que é o Axioma de Induçãoque passamos a descrever.

8) Axioma de Indução: Seja S um subconjunto de IN tal que

i) O e 5.

ii) S é fechado com respeito à operação de "somar l" a seus elementos, ou seja,

V n, n e S =» n + l e S.

Então, S = M.

Se A C IN e a E IN, usaremos a seguir a seguinte notação:

a + A = {a + x; x £ A}.

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8 1. Os Números Naturais

É imediato verificar que

a + IN = {m E IN; m > a}.

Segue-se, do Axioma de Indução, o seguinte importante instrumento para provar teore-mas:

Teorema 1.3.1 (Princípio de Indução Matemática). Seja a e IN e sejap(ri) uma sentençaaberta em n1. Suponha que

(i) p(a) é verdade, e que(ii) V n > a , p(n) =$• p(n + 1) é verdade,

então, p(n) é verdade para todo n>a.

DEMONSTRAÇÃO: Seja V — {n e IN; p(n)}\u seja, V é o subconjunto dos elementosde IN para os quais p(n) é verdade.

Considere o conjuntoS={m6lN; a + m e V},

que verifica trivialmente a + 5 C V.Como, pela condição (i), temos que a + O = a € V, segue-se que 065.Por outro lado, se m E S, então a + m 6 V e, por (ii), temos que a + m + 1 € V; logo

m + l 6 5. Assim, pelo Axioma de Indução, temos que S = M. Portanto,

{m € IN; m > a} = a + M C V,

o que prova o resultado.

D

É preciso que o leitor note que, para provar que p(n) ==> p(n + 1) é verdade para todon, o que se faz é mostrar que, se p(n) é verdade para algum n, então p(n + 1) é verdade, jáque a implicação é verdade sempre que p(ra) é falso. Isto pode gerar alguma confusão, poispoder-se-ia pensar que estamos usando a tese do teorema para provar o teorema, o que nãoé o caso, pois a tese é que p(n) é verdade para todo n > a.

Corolário 1. Não existe nenhum número natural n tal que O < n < 1.

DEMONSTRAÇÃO: O enunciado acima é equivalente a dizer que

p(n) : n > O =$- n > l

é verdade para todo n e M.

'Uma sentença aberta em n é uma frase de conteúdo matemático onde figura a letra n como palavra e quese torna uma sentença verdadeira ou falsa quando n é substituído por um número natural bem determinado.

Page 14: Elementos de aritmética   abramo hefez

§1.3 Axioma de Indução 9

Sendo O > O falso, segue-se que p(0) : O > O => O > l é verdade.Por outro lado, note que p(n + 1) : n + l > O =» n + l > l é verdade para

todo n e IN. De fato, n + l > l ê verdade para todo n 6 IN, pois é equivalente, porcancelamento, a n > O, o que é sempre verdade.

Logo, sendo p(n + 1) verdade para todo n, segue-se que p(n) ==> p(n + 1) é verdadepara todo n € IN.

Portanto, o resultado decorre do Princípio de Indução Matemática.

D

Corolário 2. Dado um número natural n qualquer, não existe nenhum número natural mtal que n < m < n + 1.

DEMONSTRAÇÃO: Suponha, por absurdo, que exista um número natural m com n <m < n + 1. Logo, existiria um número /c € IN* tal que n + fc = m < n - í - l , que, pelaProposição 1.1.3, implicaria que O < k < l, o que é uma contradição, tendo em vista oCorolário l acima.

D

Corolário 3. Sejam a, b 6 IN. Se a • b = l, então a = b = l.

DEMONSTRAÇÃO: Inicialmente, note que a ^ O e b O, pois, caso contrário, a • b = 0.Agora, se a ^ l e ò ^ l, então, pelo Corolário l, segue-se que a > l e b > l. Logo,

a • b > b > 1; contradição. Portanto, a = l ou b = 1. Qualquer uma dessas possibilidadesimplica a = b = 1.

D

É necessário que o leitor não confunda Indução Matemática com indução empírica. Nasciências naturais, é comum, após um certo número (sempre finito) de experimentos, enun-ciar leis gerais que governam o fenómeno em estudo. Essas leis são tidas como verdades,até prova em contrário. A Indução Matemática serve para estabelecer verdades matemáticasválidas sobre subconjuntos infinitos de IN. Não se trata de mostrar que determinada sentençaaberta é verdade para um grande número de casos, mas, trata-se de provar que tal sentençaé verdade para todo número natural maior ou igual do que um certo a G IN.

Por exemplo, considere a sentença aberta2

p(n) : n = n + (n - l)(n - 2) • • • (n - IO6).

2Nos exemplos, bem como nos problemas, usaremos livremente números reais, supondo conhecidas suaspropriedades. No entanto, no desenvolvimento da teoria, faremos apenas uso de conceitos previamentedefinidos.

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10 1. Os Números Naturais

Temos que p(l),p(2), . . . ,j>(1.000.000) são verdade. Poderíamos achar que um milhãode testes bastariam para concluir que p(n) é verdade para todo n 6 IN. Qual não seria anossa decepção se, ao testarmos n = 1.000.001, encontrássemos que p(l. 000. 001) é falso?

O tipo de "indução" que faríamos acima é o que o filósofo e matemático Bertrand Russelchamou de indução galinácea. E a historinha que ele conta à respeito é, mais ou menos, aseguinte:

Havia uma galinha nova no quintal de uma velha senhora. Diariamente, ao entardecer,a boa senhora levava milho às galinhas. No primeiro dia, a galinha, desconfiada, esperouque a senhora se retirasse para se alimentar. No segundo dia, a galinha, prudentemente,foi se alimentando enquanto a senhora se retirava. No nonagésimo dia, a galinha, cheiade intimidade, já não fazia caso da velha senhora. No centésimo dia, ao se aproximar asenhora, a galinha, por indução, foi ao encontro dela para reclamar o seu milho. Qualnão foi a sua surpresa quando a senhora pegou-a pelo pescoço com a intenção de pô-la napanela.

Vejamos agora como pode-se usar o Princípio de Indução Matemática para provar osmais variados resultados.

Exemplo 1.3.1. Este exemplo ilustra o primeiro registro da utilização do Princípio deIndução Matemática feita por Francesco Maurolycus em 1575. Trata-se da determinaçãode uma fórmula exata em função de n > l para a soma dos n primeiros números naturaisímpares. Ou seja, busca-se uma fórmula para

Vamos calcular Sn para alguns valores de n:

Sl = l, 52 = 4, 53 = 9, S4 = 16, 55 = 25.

Os casos particulares acima nos conduzem a conjecturar que Sn = r?. Mas como tercerteza de que não estamos cometendo o engano da galinha de Bertrand Russel? Bom, oúnico jeito é usar o Princípio de Indução Matemática.

Definamos p(n) : Sn = n2.Temos que p(l) : Si = l — l2, portanto verdade. Para provar que p(n) =$• p(n + 1)

é verdade para todo n e IN, basta mostrar que, se supusermos p(n) verdade, então p(n + 1)é verdade, qualquer que seja n 6 IN.

De fato, supondo p(n) verdade, ou seja, Sn = n2, e somando 2n + l a ambos os ladosdesta última igualdade, obtemos:

Sn+i = Sn + 2n + l = n2 + In + l = (n + l)2,

o que nos diz que p(n + 1) é verdade.

Page 16: Elementos de aritmética   abramo hefez

§1.3 Axioma de Indução 11

Pelo Princípio de Indução Matemática, p(n) é verdade para todo n G M*.

Exemplo 1.3.2. Vamos determinar uma fórmula para a soma dos n primeiros númerosnaturais não nulos. Seja

Sn = l + 2 + • • • + n.

Somando a igualdade acima, membro a membro, com ela mesma, porém com as parce-las do segundo membro em ordem invertida, temos que

Sn = l + 2 + - • • + nSn = n + (n-1) + • • • + l

1Sn = (n + 1) + (n + 1) + • • • + (n + 1)

Daí segue-se que 2Sn = n(n + 1), e, portanto,

_ n(n + 1)bn ~ 2 '

Conta-se a seguinte história sobre Cari Friederich Gauss quando ainda garoto. Na es-cola, o professor, para aquietar a turma de Gauss, mandou os alunos calcularem a somade todos os números naturais de l a 100. Qual não foi a surpresa quando, pouco tempodepois, o menino deu a resposta: 5050. Indagado como tinha descoberto tão rapidamente oresultado, Gauss, então com nove anos de idade, descreveu o método acima.

Pelas suas contribuições à Matemática, Gauss é considerado um dos maiores matemá-ticos de todos os tempos, tendo dedicado boa parte de seu talento à aritmética, sua área deinteresse preferida.

Vamos agora verificar a validade da fórmula acima por indução. Note que

Suponha agora que Sn = n(n + l)/2. Somando n + l a ambos os membros destaigualdade, obtemos:

< "(" + 1) , „ , i n(n + l) + 2(n + l) (n + l)(n + 2)+ n + l = ,

o que mostra que a fórmula vale para todo n 6 IN*.

Seja A um conjunto qualquer. Uma sequência em A é uma função

s: IN* — )• An t— > s(n)

Ê praxe denotar o número s (n) por sn. Uma sequência s também será denotada por

Page 17: Elementos de aritmética   abramo hefez

12 1. Os Números Naturais

Problemas

1.3.1 Mostre as seguintes fórmulas por indução;

a)l2 + 22 + . . .+n2 = 6

+ n3 =2

1 1 I nc) T^T + TrrH +1.2 2.3 n(n+l) n + 1

l n(n + 3)+ ••• +

7 1.2.3 2.3.4 n(n + l}(n + 1] 4(n + l)(n + 2)

1.3.2 Uma progressão aritmética (PA) é uma sequência de números reais (an) tal que a\ dado e, para todo n 6 IN*, tem-se que

: r =

onde r é um número real fixo chamado razão.a) Mostre que an = ai + (n — l)r.

„ „ n(n ~b) Se Sn = ai H ----- 1- an, mostre que Sn — na\ — —£ &

1.3.3 Uma progressão geométrica (PG) é uma seqiíência de números reais (an) tal que a\ dado e, para todo n E IN*, tem-se que

an+l — «ra • Ç;

onde ç é um número real fixo, diferente de O e de l, chamado razão.a) Mostre que an = ai • qn~1.

qn - lb) Se Sn = a\- h an, mostre que Sn = ai - — .

q-1

1.3.4 Uma progressão aritmético-geométrica é uma sequência de números reais (an) talque a\ dado e, para todo n e IN*, tem-se que

= qan + r,

onde ç e r são números reais dados, com q 1.flfí-l _ J

a) Mostre que an = a\ qn~^ + r - .q-1

b) Se Sn = ai -\- h an, mostre que

jn~l - l qn -l n-1(l — ç)2 l — q l — q'

Page 18: Elementos de aritmética   abramo hefez

§1.3 Axioma de Indução 13

1.3.5 Ache uma fórmula para cada uma das seguintes somas:a) 2 + 4 + ---- h 2n.

1.3.6 Ache uma fórmula para cada uma das seguintes somas:

a) 2 + 4 + 8 + - - - + 2n., 1 1 1 lb )2 + 4 + 8 + "- + F-Para quanto tende a soma em (b) quando o número de parcelas aumenta indefinidamente?

1.3.7 Uma vitória régia encontra-se em um tanque de água. Sabendo que ela dobra deárea a cada dia, e que, no final de 20 dias, ela ocupa toda a superfície do tanque, em qualdia ela ocupará a metade da superfície do tanque?

1.3.8 Em uma cidade de 5000 habitantes, alguém resolve espalhar um boato. Considerandoque, a cada 10 minutos, uma pessoa é capaz de contar o caso para 3 pessoas desinformadas,determine em quanto tempo toda a cidade fica conhecendo o boato.

1.3.9 Sejam A e B dois conjuntos com nem elementos, respectivamente. Mostre, porindução sobre n, que o número de funções de A em B é mn.

Page 19: Elementos de aritmética   abramo hefez

2Aplicações da Indução

Neste capítulo, exploraremos o Princípio de Indução Matemática, mostrando algumasde suas inúmeras aplicações.

•.;íi»

2.1 Definição por Recorrência ?

O que realmente significa uma expressão da forma

que consideramos no Exemplo 1.3.1?Apesar de intuirmos o que quer dizer, isso formalmente ainda não faz sentido, pois só

sabemos somar números aos pares. Para dar um sentido preciso a este tipo de expressão,vamos utilizar o Princípio de Indução Matemática como descrito a seguir.

Para definir uma expressão En, para todo n € a + IN, basta definirmos Ea e mostrarcomo obter En+\ partir de En, para todo n E a + ISf.

De fato, consideremos a sentença aberta

p(n) : En está definido

e provemos, por Indução Matemática, que p(n) é verdade para todo n € a + IN.Temos, por construção dos En, que p(a) é verdade e que, para todo n € IN, p(ri) =$•

p(n + 1) é também verdade. Logo, pelo Princípio de Indução Matemática, temos que p(n)é verdade para todo n E a + IN.

Neste caso, dizemos que En foi definido por recorrência.

Por exemplo, usamos recorrência para definir progressões aritméticas (Problema 1.3.2)e progressões geométricas (Problema 1.3.3).

Algumas vezes, definiremos uma expressão En por recorrência através de uma dadafunção avaliada em vários termos anteriores, En-\,En-z, . . . , En-T. Isto definirá, semambiguidade, En, desde que se conheçam as expressões de EI, . . . , Er.

14

Page 20: Elementos de aritmética   abramo hefez

§2.1 Definição por Recorrência 15

Exemplo 2.1.1. Seja (an) uma sequência de elementos de um conjunto munido de duasoperações sujeitas às leis básicas da aritmética. Para dar sentido às somas

Sn — o-i + o-i H ---- + o,n,

basta pôr Si — ai e, supondo Sn definido, definir

Sn+i = Sn + an+i-

Somas como Sn serão também denotadas com a notação de somatórios:

Exemplo 2.1.2. Define-se ofatorial de um número natural n, denotado por n!, como:

0! = 1, (n + 1)! = n\ (n + 1).

Exemplo 2.1.3. Seja a um elemento de um conjunto A munido de duas operações sujeitasàs leis básicas da aritmética. Vamos definir as potências an com n € IN por recorrência.

Ponhamos a1 = a e a° = l, se a 0. Supondo a" definido, defina

an+1 = an • a.

É fácil, por meio de indução, provar as propriedades usuais das potências.

Proposição 2.1.1. Sejam a, 6 6 A e m, n E M*. Então,

i) a™ • an = an+m.ii) (am}n = amn.iii) (a • b)n = an • bn.

DEMONSTRAÇÃO: Provaremos (i), deixando o restante como exercício.Fixemos a em arbitrariamente e demonstremos a relação por indução sobre n. Temos

claramente, pelas definições, que

Por outro lado, supondo que am • an = àm+n, temos que

am • an+l = am • (an • a) = (am • a") • a = am+n • a = am+n+l.

Isto, pelo Princípio de Indução Matemática, prova a nossa propriedade.

D

Page 21: Elementos de aritmética   abramo hefez

16 2. Aplicações da Indução

Problemas

2.1.1 Sejam (a^), (6^) duas sequências de elementos de um conjunto A munido de duasoperações sujeitas às leis básicas da aritmética e seja c E A.a) Mostre que

n n nV^ / . z. 12_, (ai + bi) =

b) Mostre que

i=\) Mostre que

2.1.2* Mostre que

2.1.3 Calcule uma expressão condensada para as somas:a) l + (l + 2) + (l + 2 + 3) + • • • + (l + 2 + • • • + n).b) l - 2 - 3 + 2 - 3 - 4 + 3 - 4 - 5 + - - - + n(n + l)(n + 2).c) l - 3 + 3 - 5 + 5- 7 - - - + (2n-l)(2n + l).d) l + (l + 22) + (1 + 22 + 32) + • • • + (1 + 22 + 32 + • • • + n2).

2.1.4 a) Considere, para i € IN*, a seguinte identidade:

(i + l)5 - i5 = 5i4 + 1(M3 + IO?2 + 5» + 1.

Efetue o somatório de ambos os lados para i variando de l a n. Utilizando os Problemas2.1.1 e 1.3.1, determine uma fórmula para X^íLi *4-b) Proceda de modo análogo para achar uma fórmula para X^=i i5-c) Mostre como isto pode ser generalizado.

2.1.5 Demonstre as propriedades (ii) e (iii) na Proposição 2.1.1.

2.1.6 Sejam n, a e INa) Mostre que existe m € IN tal que (a + l)n = ma + 1.b) Mostre que, se a > O, então existe m 6 M tal que (a — l)2n+1 = ma — 1.c) Mostre que, se a > l, então existe m 6 IN tal que (a — l)2n = ma + 1.

2.1.7 Dados a, ò € IN e n, m e M*, mostre quei) a<b <=> an <bn.ii) para a > l, m < n

Page 22: Elementos de aritmética   abramo hefez

§2.2 Binómio de Newton 17

2.1.8 Mostre por indução quea) 2n > n, para todo natural n.b) n\ 2n, para todo n natural com n > 4.c) n\ 3n, para todo n natural com n>7.

2.2 Binómio de Newton

Considere a expressão (l + X)n, onde X é uma indeterminada ene um número naturalnão nulo. É claro que o desenvolvimento dessa potência é um polinómio de grau n em Xcujos coeficientes são números naturais:

(l + X)n = a0 + aiX + a2X2 + ••• + an^X™'1 + anXn.

fn\ coeficiente ai, i = O, . . . , n, será denotado pelo símbolo oj = ( e será chamadoVv

de número binomial.Observe que, tomando X = í no desenvolvimento de (l + X}n, obtemos a seguinte

identidade:

Queremos agora determinar fórmulas explícitas para esses números binomiais.

Como os coeficientes do termo independente de X, do termo em X e do termo em .no desenvolvimento de (l + X)n são, respectivamente, l, n e l, temos que

n n

o =1' =n

AÃSe i > n, é cómodo definir l =0.\

Lema 2.2.1 (Relação de Stifel). Para todo n e IN* e iodo i e IN com O < i < n, tem-seque

n + l N

DEMONSTRAÇÃO: Para i = n, a relação acima é trivialmente verificada. Para O < i < n,as relações decorrem, imediatamente, das seguintes igualdades:

n+l

Page 23: Elementos de aritmética   abramo hefez

18 2. Aplicações da Indução

n\\ .L a. í i n l _L i n \ y« _i_ l n \il A H hl , ) + l •* + l M •l /J [ \n-ly W J \"/

D

Lema 2.2.2. Para todos n, i € IN*, com í < i < n, tem-se que

71= n(n — 1) - - • (n — i + 1).

DEMONSTRAÇÃO: Vamos provar isto por indução sobre n. A igualdade é trivialmenteverificada para n = 1. Suponha que as igualdades sejam válidas para algum n G IN* e todoi com l < i < n. Pela relação de Stifel, temos, para i < n, que

n=«(«-!)!

in(n - 1) • • • (n - i + 2) + n(n - 1) • • • (n - i + 1) =

n(n - 1) • • • (n - i + 2) (i + n - i + 1) =

(n + l)n(n - 1) • • • (n + l - i + 1),

o que prova a igualdade para n + l e para todo i com l < i < n. Uma verificação diretamostra que a fórmula também vale para i = n + 1. Portanto, a igualdade vale para todo n etodo i com l < i < n.

D

Segue-se daí que, para n, z G IN* com l < i < n, vale a seguinte fórmula para oscoeficientes binomiais:

ra\ — 1) • • • (n — i + 1) n!«/ i! i\(n — i}\e que os termos extremos nas igualdades acima têm sentido e são iguais quando

i = 0.

Da fórmula acima, decorre imediatamente, para todo n € IN e todo i com O < i < n, aseguinte identidade fundamental:

'n\ ni l \n-

Page 24: Elementos de aritmética   abramo hefez

§2.2 Binómio de Newton 19

Teorema 2.2.1 (Binómio de Newton). Sejam a e b números reais ' e seja n 6 IN*. Tem-seque

1 n-l

DEMONSTRAÇÃO: Se a = O, o resultado é óbvio. Se a 7^ O, substitua X por — naa

expansão de (l + X)n e multiplicar ambos os lados por a™.

Exemplo 2.2.1.(a + 6)2 = a2 + 2a6 + fe2

(a + ò)3 - a3 + 3a26 + 3aò2 + &3

(a + ò)4 = a4 + 4a36 + 6a262 + 4aò3 + 64.

Problemas

2.2.1* Demonstre a identidade das colunas:

' i + A /n"\n + 1

2.2.2 Demonstre a identidade das diagonais:

n + 2\ + m\ í n + m + í2 )'"+ ( m J ~ ( m

2.2.3* a) Demonstre, para todos n, m, k 6 IN*, a identidade de Euler:

k / \V ^ / m \ n2-^ ( i l (k -i=0 \ J \

b) Em particular, deduza a identidade de Lagrange:

2.2.4 Sejam n, a G IN*. Calcule as somas:

z=0

D

'No corpo da nossa exposição utilizaremos apenas a expansão de (l + X)n.

Page 25: Elementos de aritmética   abramo hefez

20 2. Aplicações da Indução

2.2.5* a) Mostre que l . l é o número de subconjuntos distintos com i elementos de um

conjunto com n elementos.

b) Mostre que o conjunto das partes de um conjunto com n elementos tem 1n elementos.c) Usando os itens acima, dê uma outra prova para a igualdade:

2.2.6 Seja n € M*. Mostre que„ n —

; equera+1

, se i > ——

2.3 Propriedade da Boa Ordem

Seja S um subconjunto de IN. Dizemos que um número natural a é um menor elementode S se possui as seguintes propriedades:i) a G S,ii) V n 6 5, a < n.

É imediato verificar que, se 5 possui um menor elemento, este é único. De fato, se a e a'são menores elementos de S, então a < a' e a' < a, o que implica que a = a'(propriedadeanti-simétrica da relação de ordem).

O menor elemento de S, quando existe, é denotado por min 5.

O Axioma de Indução tem a seguinte consequência notável:

Teorema 2.3.1 (Propriedade da Boa Ordem). Todo subconjunto não vazio de IN possuium menor elemento.

DEMONSTRAÇÃO: A demonstração será feita por redução ao absurdo.Seja S um subconjunto não vazio de IN e suponha, por absurdo, que 5 não possui um

menor elemento. Queremos mostrar que S é vazio, conduzindo a uma contradição.Considere o conjunto T, complementar de S em M. Queremos, portanto, mostrar que

T = IN.Defina o conjunto

In = {k e IN; k < n},

e considere a sentença abertap(n) : In C T.

Page 26: Elementos de aritmética   abramo hefez

§2.3 Propriedade da Boa Ordem 21

Como O < n para todo n, segue-se que O € T, pois, caso contrário, O seria um menorelemento de S. Logo, p(0) é verdade.

Suponha agora que p(n) seja verdade. Se n + l € 5, como nenhum elemento de In

está em S, teríamos que n + l é um menor elemento de S, o que não é permitido. Logo,n + l 6 T, seguindo daí que

7n+i = In U {n + 1} C T,

o que prova que V n, In C T; portanto, IN C T C IN e, conseqiientemente, T = ]N.

D

A Propriedade da Boa Ordem tem várias outras aplicações, conforme veremos ao longodesse livro. Vejamos agora uma dessas aplicações.

Um subconjunto A de IM será dito limitado superiormente se for vazio ou se existir umnúmero n e IN tal que

V x e A, x <n.

Neste caso, diremos que n é uma cota superior para A.Diremos que um elemento a e IN é o maior elemento de A, se a é uma cota superior

de A com G 6 A. É imediato verificar que o maior elemento de um conjunto, se existe, éúnico. Nesse caso, ele será denotado por max A.

Corolário. Seja A um subconjunto de IN não vazio e limitado superiormente; então Apossui um maior elemento.

DEMONSTRAÇÃO: Suponha que n seja uma cota superior para A. Logo x <n para todox e A. Considere o conjunto

B = {y € IN; y = n — x, com x 6 A}.

O conjunto B é não vazio, logo, pela Propriedade da Boa Ordem, ele tem um menorelemento n — a. Vamos mostrar que a = max A. De fato, a E A, e se x E A, temos quen — x 6 B e portanto, n — x >n — a, o que implica que x < a (veja Problema l .2.5).

D

O resultado a seguir nos dirá que as potências de um número natural maior do que l nãoformam um conjunto limitado superiormente.

Lema 2.3.1. Sejam a e m dois números naturais com a > 1. Então, existe um númeronatural n tal que an > m.

Page 27: Elementos de aritmética   abramo hefez

22 2. Aplicações da Indução

DEMONSTRAÇÃO: Definamos A = {an; n 6 IN} e suponhamos, por absurdo, que an <m para todo n G IN. Portanto, o conjunto A é limitado superiormente e, conseqiientemente.,pelo corolário acima, possui um maior elemento; isto é, existe r 6 M tal que x < ar paratodo x em A. Mas, sendo a > 2, segue-se que

ar+1 > 2ar > ar,

contradizendo o fato de ar+1 6 A e ar ser o maior elemento de A.

D

O Princípio de Indução Matemática admite uma variante que é muito útil e que damosa seguir.

Teorema 2.3.2 (Princípio de Indução Matemática, 2a Forma). Sejap(n) uma sentença aberta tal que

i) p(a) é verdade, e queii) V n, p(a) e p(a + 1) e • • • e p(n) =>• p(n + 1) é verdade,

então, p(n) é verdade para todo n > a.

DEMONSTRAÇÃO: Considere o conjunto

V = {n 6 a + M; p(n)}.

Queremos provar que o conjunto W = (a + M) \ é vazio. Suponha, por absurdo,que vale o contrário. Logo, pela Propriedade da Boa Ordem, W teria um menor elementok, e, como sabemos de (i) que a g W, segue-se que existe n tal que k = a + n > a.Portanto, a, a + l,..., k — l 0 W; logo a, a + l,..., k — l 6 V. Por (ii) conclui-se quek = k — l + l € V, o que contradiz o fato de A; S W.

D

Problemas

2.3.1* Usando a Propriedade da Boa Ordem, dê uma outra prova do Corolário l do Teo-rema 1.3.1.

2.3.2* Mostre que IN possui a Propriedade Arquimediana . Ou seja, mostre que, dadosa, ò e IN com O < a < 6, existe n € IN tal que na > 6.

2.3.3* Supondo válida a Propriedade da Boa Ordem, mostre que vale o Axioma de Indução.

Page 28: Elementos de aritmética   abramo hefez

§2.4 Aplicações Lúdicas 23

2.4 Aplicações Lúdicas

Mostraremos nesta seção algumas aplicações lúdicas da indução matemática.

Exemplo 2.4.1. A TORRE DE HANÓi E o FIM DO MUNDO

Este é um jogo bastante popular e pode ser facilmente fabricado ou ainda encontradoem lojas de brinquedos de madeira.

O jogo consiste de n discos de diâmetros distintos com um furo no seu centro e umabase onde estão fincadas três hastes. Numa das hastes estão enfiados os discos de modo quenenhum disco esteja sobre um outro de diâmetro menor (veja figura abaixo).

O jogo consiste em transferir a pilha de discos para uma outra haste, deslocando umdisco de cada vez, de modo que, a cada passo, a regra acima seja observada.

As perguntas naturais que surgem são as seguintes:

1. O jogo tem solução para cada n € IN?

2. Caso afirmativo, qual é o número mínimo jn de movimentos para resolver o problemacom n discos?

Usando Indução Matemática, vamos ver que a resposta à primeira pergunta é afirmativaqualquer que seja o valor de n. Em seguida, deduziremos uma fórmula que nos fornecerá onúmero jn.

Considere a sentença aberta

p(n) : O jogo com n discos tem solução.

Obviamente, p ( l ) é verdade. Vamos agora provar que é verdade a seguinte sentença:

V n, p(n] => p(n + l).

De fato, vamos supor, para um valor de n arbitrário, que p(n) é verdade, ou seja, que ojogo com n discos tem solução, e provar que o jogo com n + l discos tem solução.

Para ver isto, inicialmente resolva o problema para os n discos superiores da pilha,transferindo-os para uma das hastes livre (isto é possível, pois o problema com/n discostem solução):

Page 29: Elementos de aritmética   abramo hefez

24 2. Aplicações da Indução

Em seguida, transfira o disco que restou na pilha original (o maior dos discos) para ahaste vazia. Feito isto, resolva novamente o problema para os n discos que estão juntos,transferindo-os para a haste que contém o maior dos discos:

Isto mostra que o problema com n +1 discos possui solução, e, portanto, pelo Princípiode Indução, que p(n) é verdade para todo n E IN*.

Para determinar uma fórmula para jn, veja que, para resolver o problema para n + ldiscos com o menor número de passos, temos, necessariamente, que passar duas vezes pelasolução mínima do problema com n discos. Temos, então, que

Jn+l = %Jn + l-

Obtemos, assim, uma progressão aritméíico-geométrica (jn) cujo termo geral é, peloProblema l .3.4, dado por

•i — 971 — 1Jn — ~ •!••

Page 30: Elementos de aritmética   abramo hefez

§2.4 Aplicações Lúdicas 25

Este jogo foi idealizado e publicado pelo matemático francês Edouard Lucas, em 1882,que, para dar mais sabor à sua criação, inventou a seguinte lenda:

Na origem do tempo, num templo oriental, Deus colocou 64 discos perfurados de ouropuro ao redor de uma de três colunas de diamante e ordenou a um grupo de sacerdotes quemovessem os discos de uma coluna para outra, respeitando as regras acima explicadas.Quando todos os 64 discos fossem transferidos para uma outra coluna, o mundo acabaria.

O leitor não deve preocupar-se com a iminência do fim do mundo pois, se, a cadasegundo, um sacerdote movesse um disco, o tempo mínimo para que ocorresse a fatalidadeseria de 264 — l segundos e isto daria, aproximadamente, um bilhão de séculos !

Exemplo 2.4.2. O ENIGMA DO CAVALO DE ALEXANDRE, o GRANDENum mosaico romano, Bucéfalo, o cavalo de Alexandre, o Grande, é representado como

um fogoso corcel cor de bronze. Neste exemplo, vamos "provar" que isto é uma falácia.Inicialmente, "provaremos" que todos os cavalos têm mesma cor. De fato, considere a

sentença aberta:

p(n) : Num conjunto com n cavalos, todos têm a mesma cor.

Note que p(l) é obviamente verdade. Agora, suponha o resultado válido para conjuntoscontendo n cavalos. Considere um conjunto

C = {Ci, 62, . . . , Cn, Cn+i}/

com n + 1 cavalos. Decompomos o conjunto C numa união de dois conjuntos:

Pela hipótese indutiva, ie., que, num conjunto com n cavalos, todos têm mesma cor,segue-se que os cavalos em C' têm mesma cor; idem para os cavalos em C". Como

C2 e c' n c",

segue-se que os cavalos de C1 têm a mesma cor dos cavalos de C", permitindo concluir,assim, que todos os cavalos em C têm a mesma cor.

Assim, a nossa "demonstração" por indução está terminada, provando que p(n) é ver-dade para todo n 6 M.

Agora, toda criança sabe que Marengo, o famoso cavalo de Napoleão, era branco. Logo,Bucéfalo deveria ser branco.

Onde está o erro nesta prova? Para achá-lo, sugerimos ao leitor tentar provar quep(l)=»p(2).

Page 31: Elementos de aritmética   abramo hefez

26 2. Aplicações da Indução

Exemplo 2.4.3. O PROBLEMA DA MOEDA FALSA

Têm-se 2n moedas, sendo uma delas falsa, com peso menor do que as demais. Dispõe-se de uma balança de dois pratos, mas sem nenhum peso. Vamos mostrar, por indução sobren, que é possível achar a moeda falsa com n pesagens.

Para n = l, isto é fácil de ver, pois, dadas as duas moedas, basta pôr uma moeda emcada prato da balança e descobre-se imediatamente qual é a moeda falsa.

Suponha, agora, que o resultado seja válido para algum valor de n e que se tenha queachar a moeda falsa dentre 2n+1 moedas dadas. Separemos as 2n+1 moedas em 2 gruposde 2n moedas cada. Coloca-se um grupo de 2n moedas em cada prato da balança. Assim,poderemos decobrir em que grupo de 2n moedas encontra-se a moeda falsa. Agora, pelahipótese de indução, descobre-se a moeda falsa com n pesagens, que, junto com a pesagemjá efetuada, perfazem o total de n + l pesagens.

No Capítulo 4, resolveremos este problema para um número qualquer de moedas.

Exemplo 2.4.4. OS COELHOS DE FlBONACCI

Trata-se do seguinte problema proposto e resolvido por Leonardo de Pisa em seu livro,Líber Abacci de 1202: Quotparia coniculorum in uno anno ex unopario germinentur.

Trocando em miúdos: um casal de coelhos recém-nascidos foi posto num lugar cercado.Determinar quantos casais de coelhos ter-se-ão após um ano, supondo que, a cada mês, umcasal de coelhos produz outro casal e que um casal começa a procriar dois meses após o seunascimento.

Leonardo apresenta a seguinte solução:

mês

lu

2U

3°40

5°6°7u

8°9u

10°llu

12U

número de casaisdo mês anterior

01123581321345589

número de casaisrecém-nascidos

1011235813213455

total

1123581321345589144

Portanto, o número de casais de coelhos num determinado mês é igual ao número total

Page 32: Elementos de aritmética   abramo hefez

§2.4 Aplicações Lúdicas 27

de casais do mês anterior acrescido do número de casais nascidos no mês em curso, que éigual ao número total de casais do mês anterior ao anterior.

Se denotarmos o número de coelhos existentes no n-ésimo mês por un, temos, então,que

V-n = Un-l + Un-2, U\ U-i = 1.

Essas relações definem, por recorrência, uma sequência de números naturais, chamadade sequência de Fibonacci, cujos elementos, chamados de números de Fibonacci, possuempropriedades aritméticas notáveis que ainda hoje são objeto de investigação.

Uma recorrência2 do tipoXn =Xn-\n-2 (2.1)

só permite determinar o elemento xn se conhecermos os elementos anteriores xn-\ xn-z,que, para serem calculados, necessitam do conhecimento dos dois elementos anteriores, etc.Fica, portanto, univocamente definida a sequência quando são dados x\ x%. A sequênciade Fibonacci corresponde à recorrência (2.1), onde x\ x^ = 1.

Quando é dada uma recorrência, um problema importante é determinar uma fórmulapara o termo geral da sequência sem recorrer aos termos anteriores. No caso da seqiiênciade Fibonacci, existe uma fórmula chamada fórmula de Binet, que apresentamos a seguir.

Proposição 2.4.1. Para todo n € M*, tem-se que

Un =

DEMONSTRAÇÃO: Procuremos as progressões geométricas vn = qn, com q ^ O, quesatisfazem à recorrência (2. 1). Temos que

cujas soluções são, i + Vs „ 10=^2- e « =—2 —

Defina vn = q'n e wn — q"n. Note que, como as duas sequências vn e wn satisfazemà recorrência (2.1), então, para todo a. e /3 reais, a sequência un = avn + /3wn tambémsatisfaz à recorrência. Agora impomos u\ u? = l, o que nos dá um sistema de duasequações com as duas incógnitas a e /?, cujas soluções são a = 4= e /3 = — 4=.

D

2Uma recorrência é uma fórmula que define um elemento de uma sequência a partir de termos anteriores.

Page 33: Elementos de aritmética   abramo hefez

28 2. Aplicações da Indução

É notável que seja necessário recorrer a fórmulas envolvendo números irracionais pararepresentar os elementos da sequência de Fibonacci que são números naturais.

Leonardo de Pisa, filho de Bonacci, e por isso apelidado Fibonacci, teve um papel fun-damental no desenvolvimento da Matemática no mundo ocidental. Em 1202, publicou olivro Líber Abacci, que continha todo o conhecimento sobre números e álgebra da época.Esta obra foi responsável pela introdução na Europa do sistema de numeração indo-arábicoe pelo posterior desenvolvimento da álgebra e da aritmética no ocidente.

Problemas

2.4.1 Mostre que o problema da moeda falsa para 3" moedas também se resolve com npesagens.

2.4.2* Mostre que a sequência de Fibonacci satisfaz às seguintes identidades:a) u\ u-i -\- h un = un+2 - I-b) «l + U3 -\- h «2n-l = U2n-

C) Ui + ÍÍ4 H ----- h Uin = U2n+l ~ l-

d) U\ U\ ---- h ul = UnUn+i.

2.4.3* Dados n, m e IN*, com n > 2, mostre que

Un+m = Un-iU

2.4.4* Dado n e IN, com n > 2, mostre quea)

b) U-in = U?nl -n+l

C) U3n =

Problemas Suplementares

2.S.1 Sejam n, m e IN*, com m > 2. Mostre que

ji(i + 1) • • • (i + m - 2) = — n (n + 1) • • • (n + m - 1).

=

2.S.2* Dada a recorrência an+z = 2an+i + an, com OQ = u\ l, ache uma fórmula parai an.i

j 2.S.3* Dada a recorrência an = an_i + n, onde CIQ = l, calcule uma expressão para an.ii

Page 34: Elementos de aritmética   abramo hefez

§2.4 Aplicações Lúdicas 29

2.S.4* A PIZZA DE STEINER3. Determine o número máximo de regiões em que n retasdividem o plano.

2.S.5 Dada a sequência de Fibonacci (un), mostre, por indução sobre n, que

a)

b) V%n = U\U2 + UyUs + U3U4 -] h

c) uín+l - ! = U1U2 + M

2.S.6* Sabendo que q = é raiz da equação x2 = x + l, mostre que qn —unq + un-i.2.S.7* Prove que

. . , ^3^+2 - lUs+U6+Ug-\ U3n = .

3O nome do problema é uma homenagem a Jacob Steiner (1796-1863), proeminente geômetra que deu asolução deste problema em 1826.

Page 35: Elementos de aritmética   abramo hefez

3

Divisão nos Naturais

Como a divisão de um número natural por outro nem sempre é possível, expressa-seesta possibilidade através da relação de divisibilidade.

Quando não existir uma relação de divisibilidade entre dois números, veremos que,ainda assim, será possível efetuar uma "divisão com resto pequeno", chamada de divisãoeuclidiana. O fato de sempre ser possível efetuar tal divisão é responsável por inúmeraspropriedades dos naturais que exploraremos neste e nos próximos capítulos.

3.1 Divisibilidade

Dados dois números naturais a e 6 com a ^ O, diremos que a divide b, escrevendo a|ò,quando existir c 6 IN tal que b = a • c. Neste caso, diremos também que a é um divisor ouum/afor de 6 ou, ainda, que b é um múltiplo de a.

Observe que a notação a\b não representa nenhuma operação em IN, nem representauma fração. Trata-se de uma sentença que diz ser verdade que existe c tal que 6 = ac. Anegação dessa sentença é representada por a / b, sigificando que não existe nenhum númeronatural c tal que b = ac.

Exemplo 3.1.1. 1|0, 2|0; 1|6, 2|6, 3|6, 6|6; 1|3, 3|3; 3 /4; 2 |5.

Suponha que a\ e seja c 6 M tal que b = ac. O número natural c é chamado de

quociente de b por a e denotado por c = — .a

Por exemplo,

, .

Note, ainda, a semelhança entre as definições da relação de divisibilidade e da relação

30

Page 36: Elementos de aritmética   abramo hefez

§3.1 Divisibilidade 31

de ordem em IN:a < b <í=> 3 c € M; b = a + c,

a\ <==> 3 c e IN; 6 = a • c.

A divisibilidade é, portanto, a contrapartida multiplicativa em IN da relação de ordem(note, porém, que não vale a tricotomia para a relação de divisibilidade).

Estabeleceremos a seguir algumas propriedades da divisibilidade.

Proposição 3.1.1. Sejam. o, 6 G M* e c € M. Tem-se quei) l|c, a\a e a|0.ii) se a\b e b\c, então a\c.

DEMONSTRAÇÃO: (i) Isto decorre das igualdades c = l -c , a = a - l e o • O = 0.(ii) a\b e b\ implica que existem /, g G IN, tais que b = a - f e c = b-g. Substituindo ovalor de b da primeira equação na outra, obtemos

c = b-g = (a- f ) - g = a - ( f - g ) ,

o que nos mostra que a\c.

O item (i) da proposição acima nos diz que todo número natural é divisível por l e, senão nulo, por si mesmo.

Proposição 3.1.2. Se a, 6, c, d e IN, com a^Q e c^Q, então

a\b e c\d =$• a • c\b • d.

DEMONSTRAÇÃO: Se a\b e c\d, então 3 /,g 6 IN, b = a - f e d = c-g. Portanto,6 • d = (a • c)(f • g), logo, a • c\ • d.

D

Em particular, se a\b, então a • c\ • c, para todo c e M*.

Proposição 3.1.3. Sejam a, b, c 6 IN, com a ^ O, tozs <?we a|(ò + c). Então

a\b <=?• a\c.

DEMONSTRAÇÃO: Como a|(ò + c), existe / 6 IN tal que b + c = f • a.Agora, se a\b, temos que existe g G IN tal que 6 = a • g. Juntando as duas igualdades

acima, temosa-g + c = f -a = a- /,

Page 37: Elementos de aritmética   abramo hefez

32 3. Divisão nos Naturais

donde segue-se que a • / > a - g , e, conseqiientemente, / > g. Portanto, da igualdade acimae da Proposição 1.2.1, obtemos

o que implica que a\c, já que / — g G M.A prova da outra implicação é totalmente análoga.

D

A proposição a seguir tem uma demonstração muito semelhante à da proposição anteriore será deixada como exercício.

Proposição 3.1.4. Sejam a, 6, c € M, com a ^ O e b > c, tais que a\(b — c). Então

a\b <í=> a|c.

Proposição 3.1.5. Se a, b, c € IN, com a ^ O, e x, y € IN são tais que a\b e a\c, entãoa\(xb + yc}; e se xb> ycf então a\(xb — yc}.

DEMONSTRAÇÃO: a\ e a\c implicam que existem /, g E IN tais que b = af e c = ag.Logo,

xb±yc = x(af] ± y(ag) = a(xf ± yg),

o que prova o resultado, pois, nas condições dadas, x f ± yg € IN.

D

Proposição 3.1.6. Dados a, 6 6 IN*, temos que

a\ =>• a < 6.

DEMONSTRAÇÃO: De fato, se a\b, existe c e IN* tal que 6 = ac. Como, do Corolário ldo Teorema 1.3.1, c > l, segue-se que a < ac = b.

D

Em particular, se a|l, então a < l e, portanto, a = 1.

Claramente, a recíproca da Proposição 3.1.6 não é válida, pois, por exemplo, 3 > 2; e,no entanto, 2 não divide 3.

Note que a relação de divisibilidade em IN* é uma relação de ordem, pois

i) é reflexiva: V a € M*, a\a. (Proposição 3.1.1(i)),

ii) é transitiva: se a| 6 e b\c, então a\c. (Proposição 3.1. l(ii)),

iii) é anti-simétrica: se a|6 e b\a, então a = b. (Segue-se da Proposição 3.1.6).

Page 38: Elementos de aritmética   abramo hefez

§3.1 Divisibilidade 33

As proposições a seguir serão de grande utilidade.

Proposição 3.1.7. Sejam a, 6, n e IN, com a > b > 0. Temos que a — b divide an — bn.

DEMONSTRAÇÃO: Vamos provar isto por indução sobre n.É óbvio que a afirmação é verdade para n = O, pois a — 6 divide a° — 6° = 0.Suponhamos, agora, que a — b\an — bn. Escrevamos

an+l _ bn+l = aan _ n + n _ òfen = (fl _ n + n _ &nj_

Como a — b\a — b e, por hipótese, a — b\an — bn, decorre da igualdade acima e daProposição 3.1.5 que G — 6|an+1 — 6n+1. Estabelecendo o resultado para todo n 6 M.

D

Proposição 3.1.8. Sejam a, 6, n G M, com a+b 0. Temos que a+b divide a2n+1+b2n+l.

DEMONSTRAÇÃO: Vamos provar isto também por indução sobre n.A afirmação é, obviamente, verdade para n = O, pois a + b divide a1 + 61 = a + b.Suponhamos, agora, que a + 6|a2n+1 + 62"+1. Escrevamos

(a2 - Ò2)a2n+1 + 62(a2n+1 + b2n+l).

Como a + 6|a2 — ò2 e, por hipótese, a + b\a2n+1 + b2n+l, decorre das igualdades acimae da Proposição 3.1.5 que a + ò|a2("+1)+1 + è2(«+1)+1. Estabelecendo, assim, o resultadopara todo n e IN.

D

Proposição 3.1.9. Sejam a, b, n E ]N, com a>b> Q. Temos que a + b divide a2n — è2".

DEMONSTRAÇÃO: Novamente usaremos indução sobre n.A afirmação é verdade para n = O, pois a + b divide o° — 6° = 0.Suponhamos, agora, que a + 6|a2" — b2n. Escrevamos

02(n+l) _ 62(n+l) = ^n _ tf^n + tf^n _ tftfn =

(a2 - Ò2)a2n + &2(a2" - b2n).

Como a + 6|a2 — ò2 e, por hipótese, a + 6|a2n — 62n, decorre das igualdades acima e daProposição 3.1.5 que a + 6|a2(n+1) + ò2("+1). Estabelecendo, desse modo, o resultado paratodo n 6 IN.

D

Page 39: Elementos de aritmética   abramo hefez

34 3. Divisão nos Naturais

Problemas

3.1.1 Sejam a, c e M* e 6 6 IN. Mostre que

ac\bc <í=^ a\b.

3.1.2 (ENC-98)1 A soma de todos os múltiplos de 6 que se escrevem (no sistema decimal)com dois algarismos é:(A) 612 (B) 648 (C) 756 (D) 810 (E) 864

3.1.3 Com quanto zeros termina o número 100!?

3.1.4* a) Mostre que o produto de i números naturais consecutivos é divisível por i\.b) Mostre que Q\n(n + l)(2n + 1), para todo n e IN.

3.1.5 Mostre, por indução matemática, que, para todo n € IN,a)8|32" + 7 6)9|10n + 3.4n+2 + 5c) 9\n4n+1 -(n + l)4n + l d) 169|33n+3 - 26n - 27

3.1.6 Mostre que 13|270 + 370.

3.1.7 Mostre que, para todo n,

a)9|10n-l b)8|32n-l c) 53|74n - 24",~- d)3|10n-7n e)13|92"-24n f) 6|52n+1 + l\) 19|32n+1 + 44n+2 h) 17|102n+1 + 72n+1 i) 14|34n+2 + 527l+1

3.1.8 Sejam a > b > O números naturais,

a) Mostre que, para todo n € M, n > 2,

TI t fn

= an~l + a"-2 • b + • • • + a • bn~2 + ò™"1.0-6

b) Mostre que, para todo n G IN*,

a2n+l

a + 6

c) Mostre que, para todo n 6 IN*,

= a2" - a2"-1 - 6+ - - - - a • b2n~l + 62".

n2n — ?i2n

— = a2""1 - a2"-2 • 6 + - - - + a • b2n~2 - ò2""1.

'Exame Nacional de Cursos, MEC/INEP.

Page 40: Elementos de aritmética   abramo hefez

§3.2 Divisão Euclidiana 35

3.1.9* Para quais valores de a € Ma) a - 2|o3 + 4?b) a + 3|a3-3?c) a + 2|a4 + 2?d) a + 2|a4 + 2a3 + a2 + l?

S.lrlO Mostre que, para todos a,m,n 6 IN,

ora . omm> n =^> o + l|a — 1.

3.1.11* Mostre, para todo n e IN*, que n2|(n + 1)" - 1.

3.1.12* Mostre, para todo a € M, que

a) 2|a2 - a b) 3|a3 - a c) 5|a5 - a d) 7|a7 - a

3.1.13 Mostre que existem infinitos valores de n em IN para os quais 8n2 + 5 é divisívelpor 7 e por 11.

3.2 Divisão Euclidiana

Mesmo quando um número natural a não divide o número natural b, Euclides2, nos seusElementos, utiliza, sem enunciá-lo explicitamente, o fato de que é sempre possível efetuara divisão de b por a, com resto. Este resultado, cuja demonstração damos abaixo, não sóé um importante instrumento na obra de Euclides, como também é um resultado central dateoria.

Teorema 3.2.1 (Divisão Euclidiana). Sejam a e b dois números naturais com O < a < b.Existem dois únicos números naturais qer tais que

b = a • q + r, com r < a.

DEMONSTRAÇÃO: Suponha que b > a e considere, enquanto fizer sentido, os números

b, b — a, b — 2a,. . . , b — n • a,...

Pela Propriedade da Boa Ordem, o conjunto 5 formado pelos elementos acima tem ummenor elemento r = b — q • a. Vamos provar que r tem a propriedade requerida, ou seja,que r < a.

Se a | ò, então r = O e nada mais temos a provar. Se, por outro lado, a /&, então r ^ a,e, portanto, basta mostrar que não pode ocorrer r > a. De fato, se isto ocorresse, existiria

2para saber mais sobre a obra de Euclides, leia a nota histórica no final deste capítulo.

Page 41: Elementos de aritmética   abramo hefez

36 3. Divisão nos Naturais

um número natural c < r tal que r = c + a. Conseqiientemente, sendo r = c + a = b —q-a,teríamos

c = ò — (q + 1) • a e S, com c < r,

contradição com o fato de r ser o menor elemento de 5.Portanto, temos que b = a • q + r com r < a, o que prova a existência de q e r.Agora, vamos provar a unicidade. Note que, dados dois elementos distintos de S, a

diferença entre o maior e o menor desses elementos, sendo um múltiplo de a, é pelo menosa. Logo, se r = b — a • q e r' = 6 — a • q', com r < r' < a, teríamos r' — r > a, o queacarretaria r' > r + a > a, absurdo. Portanto, r = r'

Daí segue-se que b — a-q = b — a-q',o que implica que a • q = a • q' e, portanto, q = q'.

aNas condições do teorema acima, os números q e r são chamados, respectivamente, de

quociente e de resto da divisão de ò por a.

Note que o resto da divisão de b por a é zero se, e somente se, a divide b.

Note que a demonstração do teorema fornece um algoritmo (i.e. um procedimentoexecutável) para calcular o quociente e o resto da divisão de um número por outro, porsubtrações sucessivas.

Exemplo 3.2.1. Vamos achar o quociente e o resto da divisão de 19 por 5.

Considere as diferenças sucessivas:

19-5 = 14, 19 -2 -5 = 9, 19 - 3 - 5 = 4 < 5.

Isto nos dá q = 3 e r = 4.

Aparentemente, não haveria necessidade de se provar a unicidade de ç e r no Teorema3.2.1, já que o resultado da subtração a cada passo do algoritmo é único e, portanto, r e qtêm valores bem determinados. O fato é que apresentamos um método para determinar qe r, satisfazendo as condições do teorema, mas nada nos garante que, utilizando um outrométodo, não obteríamos outros valores para q e r; daí a necessidade de se provar a unicidade.

Exemplo 3.2.2. Vamos mostrar aqui que o resto da divisão de 10" por 9 é sempre l,qualquer que seja o número natural n.

Isto será feito por indução. Para n = O, temos que 10° = 9 - 0 + 1; portanto, o resultadovale.

Suponha, agora, o resultado válido para um dado n, isto é 10" = 9 • q + l. Considere aigualdade

10"+1 = 10 • 10" = (9 + 1)10" = 9 • 10" + 10" = 9 • 10" + 9 • q + l = 9(10" + q) + l,

Page 42: Elementos de aritmética   abramo hefez

§3.2 Divisão Euclidiana 37

provando que o resultado vale para n + l e, conseqiientemente, vale para todo n E IN.Note que este resultado decorre também do Problema 3.1.7(a), pois lá pedia-se para

mostrar que 9|10n — 1; portanto, sendo isso verdade, temos que 10" — l = 9g e, con-seqiientemente, 10" = 9q + 1.

Corolário. Dados dois números naturais a e b com l < a < b, existe um número naturaln tal que

na <b < (n + l)o.

DEMONSTRAÇÃO: Pela divisão euclidiana, temos que existem g, r e M com r < a,univocamente determinados, tais que 6 = a • q + r. Basta agora tomar n — q.

D

A afirmação contida no corolário acima, feita, sem demonstração, por Euclides nos Ele-mentos, é o que lhe permitia deduzir a divisão euclidiana. O corolário também nos forneceuma outra prova da Propriedade Arquimediana (Problema 2.3.2); isto é, dados a, b e IN*,quaisquer, existe m € IN tal que ma > b. De fato, se a > b, basta tomar m = 1. Se o < b,basta tomar m = n + l na desigualdade do corolário acima.

Exemplo 3.2.3. Dado um número natural n E IN* qualquer, temos duas possibilidades:i) o resto da divisão de n por 2 é O, isto é, existe q E IN tal que n — 2ç; ouii) o resto dá divisão de n por 2 é l, ou seja, existe ç G IN tal que n = 2q + 1.

Portanto, os números naturais se dividem em duas classes, a dos números da forma 2qpara algum g € IN, chamados de números pares, e a dos números da forma 1q+1, chamadosde números ímpares. Os naturais são classificados em pares e ímpares, pelo menos, desdePitágoras, 500 anos antes de Cristo.

A paridade de um número natural é o caráter do número ser par ou ímpar. É fácil deter-minar a paridade da soma e do produto de dois números a partir da paridade dos mesmos(veja Problema 3.2.3).

Exemplo 3.2.4. Mais geralmente, fixado um número natural m > 2, pode-se sempreescrever um número qualquer n, de modo único, na forma n = mk + r, onde k, r E IN er < m.

Por exemplo, todo número natural n pode ser escrito em uma, e somente uma, dasseguintes formas: 3fc, 3k -f l, ou 3/c + 2.

Ou ainda, todo número natural n pode ser escrito em uma, e somente uma, das seguintesformas: 4k, 4k + l, 4& + 2, ou 4A; + 3.

Exemplo 3.2.5. Dados a, n E IN*, com a > 2 e ímpar, vamos determinar a paridade de(a" - l)/2.

Como a é ímpar, temos que a" — l é par, e, portanto (a™ — l)/2 é um número natural.Logo, é legítimo querer determinar a sua paridade.

Page 43: Elementos de aritmética   abramo hefez

38 3. Divisão nos Naturais

Temos, pelo Problema 3. l .8(a), que

Sendo a ímpar, temos que an~l -\- h a + l é par ou ímpar, segundo n é par ou ímpar(veja Problema 3.2.3). Portanto, a nossa análise se reduz à procura da paridade de (a — 1)/2.

Sendo a ímpar, ele é da forma 4k + l ou 4& + 3. Se a = 4k + l, então (a — l)/2 é par,enquanto que, se a = 4& + 3, então (a — l)/2 é ímpar.

Resumindo, temos que (an — 1)/2 é par se, e somente se, n é par ou a é da forma 4fc + 1.

Exemplo 3.2.6. Vamos achar os múltiplos de 5 que se encontram entre l e 253. Estes sãotodos os múltiplos de 5 que cabem em 253. Pelo algoritmo da divisão temos que

253 = 5 • 50 + 3,

ou seja, o maior múltiplo de 5 que cabe em 253 é 5 • 50, onde 50 é o quociente da divisãode 253 por 5. Portanto, os múltiplos de 5 ente l e 253 são

1-5, 2 - 5 , 3 - 5 , . . . , 50 -5,

e, consequentemente, são em número de 50.

Mais geralmente, (dados a, 6 e IN com a < 6, o número de múltiplos não nulos de omenores ou iguais a b é^igual ao quociente da divisão de b por a.

Problemas

3.2.1 Ache o quociente e o resto da divisãoa) de 27 por 5. b) de 38 por 7.

3.2.2 Mostre como, usando uma calculadora que só realiza as quatro operações, pode-seefeíuar a divisão euclidiana de dois números naturais em apenas três passos. Aplique o seumétodo para calcular o quociente e o resto da divisão de 3721056 por 18735.

3.2.3 Discuta a paridadea) da soma de dois números. —b) da diferença de dois números.c) do produto de dois números.d) da potência de um número.e) da soma de n números ímpares.

Page 44: Elementos de aritmética   abramo hefez

§3.2 Divisão Euclidiana 39

3.2.4 a) Mostre que um número natural a é par se, e somente se, a" é par, qualquer queseja n € IN*.b) Mostre que an ± am é sempre par, quaisquer que sejam n, m E IN*.c) Mostre que, se a e ò são ímpares, então a2 + ò2 é divisível por 2 mas não divisível por 4.

3.2.5 Quais são os números que, quando divididos por 5, deixam resto iguala) à metade do quociente? b) ao quociente?c) ao dobro do quociente? d) ao triplo do quociente?

3.2.6 Seja n um número natural. Mostre que um, e apenas um, número de cada ternaabaixo é divisível por 3.a)n,n + l,n + 2 b)n,n + 2,n + 4c) n, n + 10, n + 23 d)n,n + l,2n + l

3.2.7 Mostre quea) se n é ímpar, então n2 — lê divisível por 8.b) se n não é divisível por 2, nem por 3, então n2 — lê divisível por 24.c) Vra <E M, 4 /n2 + 2.

3.2.8 Sejam dados os números naturais a, m e n tais que l < a < m < n.a) Quantos múltiplos de a existem entre m e n?b) Quantos múltiplos de 7 existem entre 123 e 2551?c) Quantoâ múltiplos de 7 existem entre 343 e 2551 ?

3.2.9(ENC-2000) Mostre que, se um inteiro é, ao mesmo tempo, um cubo e um quadrado,então ele é da forma 5n, 5n + l, ou 5ra + 4.

3.2.10(ENC-20QO) a) Mostre que, se um número a não é divisível por 3, então a2 deixaresto l na divisão por 3.b) A partir desse fato, prove que, se a e 6 são inteiros tais que 3 divide a2 + ò2, então a e bsão divisíveis por 3.

3.2.11(ENC-2001) Seja N um número natural; prove que a divisão de JV2 por 6 nunca deixaresto 2.

3.2.12(ENC-2002) O resto da divisão do inteiro N por 20 é 8. Qual é o resto da divisão deJV por 5?

3.2.13 Mostre que, se n é ímpar, então a soma de n termos consecutivos de uma PA ésempre divisível por n.

3.2.14 Ache o menor múltiplo de 5 que deixa resto 2 quando dividido por 3 e por 4.

Page 45: Elementos de aritmética   abramo hefez

40 3. Divisão nos Naturais

Problemas Suplementares

3.5.1 Mostre, para todo n 6 IN, quea)6|n3 + lln b)9|4n + 15n-l c) 3n+21103íl - ld) 7|23n - l e) 8|32" +7 f) 7|32n+1 + 2n+2

g) a2 - a + I|a2n+1 + (a - 1)™+2, para todo a 6 IN

3.5.2 Mostre que, se um inteiro é um quadrado e um cubo, então é da forma 7k ou 7k +1.

3.S.3* a) Mostre que um quadrado perfeito ímpar é da forma 4n + 1.b) Mostre que nenhum elemento da sequência 11,111,1111,... é um quadrado perfeito.

3.5.4 a) Mostre que todo quadrado perfeito é da forma 5k ou 5k ± 1.b) Com que algarismo pode terminar um quadrado perfeito?c) Se três inteiros positivos verificam a2 = b2 + c2, então entre eles há um múltiplo de 2 eum múltiplo de 5.d) A soma dos quadrados de dois inteiros ímpares não pode ser um quadrado perfeito.

3.5.5 Mostre que, de n inteiros consecutivos, um, e apenas um, deles é divisível por n.

3.S.6* Um número é dito livre de quadrados se não for divisível pelo quadrado de nenhumnúmero diferente de l.a) Determine qual é o maior número de números naturais consecutivos livres de quadrados.b) Defina números livres de cubos e resolva o problema correspondente.

3.5.7 Seja m 6 IN. Pode o número m(m+1) ser a sétima potência de um número natural?(generalize).

3.5.8 Dados a, ò € IN, quantos números naturais divisíveis por 6 existem na sequênciaa, 2a,.. . ,bal

3.5.9 Sejam a, d E IN*. Mostre que, na sequência a + Od, a + d, a + 2d, a + 3d,... ounão existe nenhum quadrado ou existem infinitos quadrados.

3.3 A Aritmética na Magna Grécia

Segundo os historiadores, foi Tales de Mileto (640-546 AC) quem introduziu o estudoda Matemática na Grécia. Tales teria trazido para a Grécia os rudimentos da geometriae da aritmética que aprendera com os sacerdotes egípcios, iniciando a intensa atividadematemática que ali se desenvolveu por mais de 5 séculos.

A diferença entre a matemática dos egípcios e a dos gregos era que, para os primeiros,tratava-se de uma arte que os auxiliava em seus trabalhos de engenharia e de agrimensura,

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§3.3 A Aritmética na Magna Grécia 41

enquanto que, com os segundos, assumia um caráter científico, dada a atitude filosófica eespeculativa que os gregos tinham face à vida.

Em seguida, foram Pitágoras de Samos (5807-500? AC) e sua escola (que durou váriosséculos) que se encarregaram de ulteriormente desenvolver e difundir a Matemática pelaGrécia e suas colónias. A escola pitagórica atribuía aos números um poder místico, adotandoa aritmética como fundamento de seu sistema filosófico. Quase nada sobrou dos escritosoriginais dessa fase da matemática grega, chegando até nós apenas referências e comentáriosfeitos por outros matemáticos posteriores.

Os gregos tinham uma forte inclinação para a filosofia e a lógica, tendo isto influenciadofortemente toda a sua cultura e, em particular, o seu modo de fazer matemática. Um im-portante exemplo disso foi a grande influência que sobre ela exerceu Platão (429-348 AC),que, apesar de não ser matemático, nela via um indispensável treinamento para o filósofo,ressaltando a metodologia axiomático-dedutiva a ser seguida em todos os campos do co-nhecimento. O domínio da geometria era uma condição necessária aos aspirantes para oingresso na sua academia. A preferência de Platão pelos aspectos mais teóricos e concei-tuais o fazia estabelecer uma clara diferenciação entre a ciência dos números, que chamavaaritmética, e a arte de calcular, que chamava logística, a qual desprezava por ser "infantil evulgar".

Com toda esta herança cultural, surge por volta de 300 AC, em Alexandria, um tratadoque se tornaria um dos marcos mais importantes da Matemática, Os Elementos de Euclides3.Pouco se sabe sobre os dados biográficos deste grande matemático, tendo chegado a nós,através de sucessivas edições, este tratado composto por treze livros, onde se encontra sis-tematizada a maior parte do conhecimento matemático da época.

Aparentemente, Euclides não criou muitos resultados, mas teve o mérito de estabelecerum padrão de apresentação e de rigor na Matemática jamais alcançado anteriormente, tidocomo o exemplo a ser seguido nos milénios que se sucederam. Dos treze livros de Os Ele-mentos, dez versam sobre geometria e três, sobre aritmética. Nos três livros de aritmética,Livros VII, VIII e IX, Euclides desenvolve a teoria dos números naturais, sempre com umavisão geométrica (para ele, números representam segmentos e números ao quadrado re-presentam áreas). No Livro VII, são definidos os conceitos de divisibilidade, de númeroprimo, de números perfeitos, de máximo divisor comum e de míninimo múltiplo comum,entre outros. No mesmo livro, além das definições acima, todas bem postas e até hoje uti-lizadas, encontra-se enunciada (sem demonstração) a divisão com resto de um número na-tural por outro, chamada divisão euclidiana (nosso Teorema 3.2.1). Com o uso iterado destadivisão, Euclides estabelece o algoritmo mais eficiente, até hoje conhecido, para o cálculodo máximo divisor comum de dois inteiros (Proposições l e 2 nos Elementos), chamado de

3Sobre Euclides e a sua obra recomendamos a leitura de Os Elementos de Euclides, de João Bosco Pitom-beira, Cadernos da RPM, Volume 5, N. l, 1994; ou ainda, Euclides, a conquista do espaço, por Carlos Tomei,Odysseus, São Paulo, 2003.

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42 3. Divisão nos Naturais

Algoritmo de Euclides, que apresentaremos no Capítulo 5. No Livro VIII, são estudadaspropriedades de sequências de números em progressão geométrica. No Livro IX, Euclidesmostra, de modo magistral, que a quantidade de números primos supera qualquer númerodado; em outras palavras, existem infinitos números primos (Proposição 20 nos Elementos;nosso Teorema 7.2.1). Euclides também prova que todo número natural se escreve de modoessencialmente único como produto de números primos, resultado hoje chamado de Teo-rema Fundamental da Aritmética (Proposição 14 nos Elementos; nosso Teorema 7.1.1). Étambém provado um resultado que dá uma condição necessária para que um número naturalseja perfeito (Proposição 35 em Os Elementos; parte de nosso Teorema 8.2.1).

Após Euclides, a aritmética estagnou por cerca de 500 anos, ressuscitando com ostrabalhos de Diofanto de Alexandria, que viveu por volta de 250 DC. A obra que Dio-fanto nos legou chama-se Aritmética e foi escrita em treze volumes, dos quais apenassete nos chegaram. Trata-se do primeiro tratado de álgebra hoje conhecido, pois a abor-dagem de Diofanto era totalmente algébrica, não sendo revestida de nenhuma linguagem ouinterpretação geométrica, como o faziam todos os seus predecessores. A maioria dos proble-mas estudados por Diofanto em Aritmética visava encontrar soluções em números racionais,muitas vezes contentando-se em encontrar apenas uma solução, de equações algébricas comuma ou várias incógnitas.

Um dos problemas tratados por Diofanto era a resolução em números racionais, ouinteiros, da equação pitagórica x"2 + y2 = z2, chegando a descrever todas as suas soluções.Este problema teve o poder de inspirar o matemático francês Pierre Fermat mais de 1300anos depois, traçando os rumos futuros que a Matemática iria tomar, como veremos maisadiante.

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4Representação dos Números

Naturais

O sistema universalmente utilizado pelas pessoas comuns para representar os númerosnaturais é o sistema decimal posicionai. Este sistema de numeração, que é uma variante dosistema sexagesimal utilizado pelos babilónios 1700 anos antes de Cristo, foi desenvolvidona China e na índia. Existem documentos do século VI comprovando a utilização dessesistema. Posteriormente, foi se espalhando pelo Oriente Médio, por meio das caravanas,tendo encontrado grande aceitação entre os povos árabes. A introdução do sistema deci-mal na Europa foi tardia por causa dos preconceitos da Idade Média. Por exemplo, numdocumento de 1299, os banqueiros de Florença condenavam o seu uso.

O sistema começou a ter maior difusão na Europa a partir de 1202, quando da publicaçãodo livro Líber Abacci, de Fibonacci. Vários séculos se passaram para que, finalmente, essesistema fosse adotado sem restrições pelos europeus.

Há outros sistemas de numeração em uso, notadamente os sistemas binário ou em basespotências de 2, que são correntemente usados em computação. Uma característica comuma esses sistemas de numeração é o fato de serem todos sistemas posicionais com base cons-tante.

4.1 Sistemas de Numeração

No sistema decimal, todo número é representado por uma sequência formada pelosalgarismos

l, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9,

acrescidos do símbolo O (zero), que representa a ausência de algarismo. Por serem dez osalgarismos, o sistema é chamado decimal.

O sistema é também chamado posicionai, pois cada algarismo, além do seu valor intrín-seco, possui um peso que lhe é atribuído em função da posição que ele ocupa no número.

43

Page 49: Elementos de aritmética   abramo hefez

44 4. Representação dos Números Naturais

Esse peso, sempre uma potência de dez, varia do seguinte modo:O algarismo da extrema direita tem peso l; o seguinte, sempre da direita para a esquerda,

tem peso dez; o seguinte tem peso cem; o seguinte tem peso mil, etc.Portanto, os números de um a nove são representados pelos algarismos de l a 9, corres-

pondentes. O número dez é representado por 10, o número cem por 100, o número mil por1000.

Por exemplo, o número 12019, na base 10, é a representação de

l • IO4 + 2 - IO3 + O • IO2 + l - 10 + 9 = l • IO4 + 2 • IO3 + l • 10 + 9.

Cada algarismo de um número possui uma ordem contada da direita para a esquerda.Assim, no exemplo acima, o primeiro l que aparece l é de segunda ordem, enquanto que oúltimo é de quinta ordem. O 9 é de primeira ordem, enquanto que o 2 é de quarta ordem.

Cada terna de ordens, também contadas da direita para a esquerda, forma uma classe.As classes são, às vezes, separadas umas das outras por meio de um ponto.

Damos a seguir os nomes das primeiras classes e ordens:

unidades 1a ordemClasse das Unidades ^ dezenas 2a ordem

centenas 3a ordem

unidades de milhar 4a ordemClasse do Milhar 4 dezenas de milhar 5a ordem

centenas de milhar 6a ordem

unidades de milhão 7Q ordemClasse do Milhão ^ dezenas de milhão 8a ordem

centenas de milhão 9a ordem

Os sistemas de numeração posicionais baseiam-se no seguinte resultado, que é umaaplicação da divisão euclidiana.

Teorema 4.1.1. Dados a,ò G M, com b > l, existem números naturais CQ,Ci,...,cn

menores do que b, univocamente determinados, tais que a = CQ + c\b + c^b2 + • • • + cnbn.

DEMONSTRAÇÃO: Vamos demonstrar o teorema usando a segunda forma do Princípio deIndução Matemática sobre a. Se a = O, ou se a = l, basta tomar n = O e CQ — o.

Supondo o resultado válido para todo natural menor do que a, vamos prová-lo para a.Pela divisão euclidiana, existem g e r únicos tais que

a = bq + r, com r < b.

'Não se esqueça, sempre da direita para a esquerda.

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§4.1 Sistemas de Numeração 45

Como q < a (verifique), pela hipótese de indução, segue-se que existem números natu-rais n' e do, di, . . . , dn>, com d j < b, para todo j, tais que

Levando em conta as igualdades acima destacadas, temos que

a = bq + r = b(d0 + e f i & H ---- + dn,bn'} + r,

donde o resultado segue-se pondo CQ = r, n = n' + l e GJ = dj-\a j = l, . . . , n.A unicidade segue-se facilmente das unicidades acima estabelecidas.

D

A representação dada no teorema acima é chamada de expansão relativa à base b.Quando b = 10, essa expansão é chamada expansão decimal, e quando 6 = 2, ela tomao nome de expansão binária.

A demonstração do Teorema também nos fornece um algoritmo para determinar a ex-pansão de um número qualquer relativamente à base 6.

Trata-se de aplicar, sucessivamente, a divisão euclidiana, como segue:

a = bqo + ro, TQ < 6,

qo = bqi + ri, n < 6,

q\ bqz + r2, r2 < 6,

e assim por diante. Como a > qo > q\ • • • , deveremos, em um certo ponto, ter qn-\ be, portanto, de

qn-l = bqn + rn,

decorre que qn = O, o que implica O = qn = qn+i = qn+2 = • • • , e, portanto, O = rn+i =rn+-2 = • • - .

Temos, então, quea = ro -t- nó -! ----- h rnbn.

A expansão numa dada base b nos fornece um método para representar os númerosnaturais. Para tanto, escolha um conjunto S de 6 símbolos

S = { SQ, Si, . . . , S&_i },

com SQ = O, para representar os números de O a b — 1. Um número natural a na base b seescreve da forma

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46 4. Representação dos Números Naturais

com XQ, ..., xn € S, e n variando, dependendo de a, representando o número

XQ + X]b-\ xnbn.

No sistema decimal, isto é, de base b = 10, usa-se

5 = {O, l, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9}.

Se 6 < 10, utilizam-se os símbolos O, l, ... ,6 — 1. Se 6 > 10, costuma-se usar ossímbolos de O a 9, acrescentando novos símbolos para 10,..., b — 1.

Exemplo 4.1.1. No sistema de base 6 = 2, temos que

S = {O, 1},

e todo número natural é representado por uma sequência de O e 1. Por exemplo, o número10 na base 2 representa o número 2 (na base 10). Temos também que

100 = 22, 101 = l + 22, 111 = l + 2 + 22, 1011 = l + 2 + 23.

O sistema na base 2 é habitualmente utilizado nos computadores.

Exemplo 4.1.2. Vamos representar o número 723 na base 5.Por divisão euclidiana sucessiva,

723 = 144 • 5 + 3, 144 = 28 - 5 + 4, 28 = 5 • 5 + 3, 5 = l • 5 + O, 1 - 0 - 5 + 1.

Portanto,723 = 3 + 4 • 5 + 3 • 52 + O • 53 + l • 54,

e, conseqiientemente, 723 na base 5 se representa por 10343.

Daremos a seguir critérios de divisibilidade por 5, por 10, por 3 e por 9 para númerosrepresentados na base 10.

Proposição 4.1.1. Seja a = rn- • -r\TQ um número representado no sistema decimal. Umacondição necessária e suficiente para que a seja divisível por 5 (respectivamente por 10) éque TO seja O ou 5 (respectivamente O).

DEMONSTRAÇÃO: Sendo a = 10 • (rn • • • ri) + ro, temos que a é divisível por 5 se, esomente se, ro é divisível por 5, e, portanto, ro = O ou ro = 5. Por outro lado, a é divisívelpor 10 se, e somente se, ro é divisível por 10, o que somente ocorre quando ro = 0.

D

Page 52: Elementos de aritmética   abramo hefez

§4. l Sistemas de Numeração 47

Proposição 4.1.2. Seja a = rn • • • ri TQ um número representado no sistema decimal. Umacondição necessária e suficiente para que a seja divisível por 3 ou por 9 é que rn + • • • +r\ ro seja divisível por 3 ou por 9, respectivamente.

DEMONSTRAÇÃO: Temos que

o - (rn + • • • + n + r0) = rnlQn H ---- + ri 10 + r0 - (rn + • • • + n + r0) =

rn(10n-l) + - - -

Como o termo à direita nas igualdades acima é divisível por 9 (veja o Exemplo 3.2.2),temos, para algum número q, que

a = (rn + • • • + n + r0) + 9g,

de onde segue-se o resultado, em virtude das Proposições 3.1.3 e 3.1.4.

D

Exemplo 4.1.3. O Nove Misterioso. Peça para alguém escolher, em segredo, um númeronatural com, pelo menos, três algarismos (no sistema decimal, é claro). Peça, ainda, paraque efetue uma permutação qualquer dos seus algarismos, obtendo um novo número, e quesubtraia o menor do maior dos dois números. Finalmente, peça ao seu parceiro de jogo parareter um dos algarismos diferente de zero desse novo número e divulgar os restantes. Épossível adivinhar o algarismo retido!

Vamos desvendar o mistério. Seja a = rn • • • riro o número secreto e seja a' o númeroobtido pela permutação dos algarismos de a. Pela demonstração da Proposição 4.1.2 sabe-mos que existem g, g' € IN tais que

a = (rn-\- h «"i + T-Q) + 9g e a' = (rn -\- H n + r0) + 9g'.

Logo, a diferença entre o maior e o menor desses números é divisível por 9. Portanto, paraadivinhar o algarismo que falta, basta descobrir, dentre os números de l a 9, quanto devemossomar à soma dos algarismos divulgados para que o resultado seja divisível por 9.

A exclusão do zero no algarismo retido é para eliminar uma possível ambiguidade queocorre quando a soma dos algarismos divulgados seja já múltiplo de 9; neste caso, o alga-rismo escondido tanto poderia ser o nove quanto o zero.

A representação binária tem peculiaridades interessantes, como veremos a seguir. Ini-cialmente extraímos um corolário imediato do Teorema 4.1.1.

Corolário. Todo número natural se escreve de modo único como soma de potências dis-tintas de 2.

Page 53: Elementos de aritmética   abramo hefez

48 4. Representação dos Números Naturais

Determinar a expansão binária de um número a é ainda mais fácil do que determinar asua expansão relativa a um número 6 2.

De fato, escreve-se a lista de números começando com a, seguido pelo quociente <jo dadivisão de a por 2, seguido pelo quociente q\a divisão de ÇQ P°r 2, seguido pelo quociente<j2 da divisão de q\r 2, etc. (Note que a divisão por 2 é tão fácil que pode ser feitamentalmente.)

Na divisão euclidiana sucessiva, temos que, se a é ímpar, então r$ = 1; caso contrário,r0 = 0; temos r\ l se qo é ímpar, e ri — O, caso contrário. Em geral, TÍ+I = l se % éímpar, e r;+i = O, caso contrário. Até encontrarmos qn-i = l, quando colocamos rn = l.Segue-se, portanto, que

a = r0 + r i - 2 + - - - + r n - 2 n .

Exemplo 4.1.4. O método acima, para determinar expansões binárias, permite desen-volver um algoritmo utilizado pelos antigos egípcios para calcular o produto de dois númerosusando apenas multiplicações e divisões por 2, além de adições. Este método tem a van-tagem de apenas necessitar do conhecimento da tabuada do 2.

De fato, para efetuar a multiplicação de a por b, escreve-se a como soma de potênciasde 2:

com cada TJ zero ou um. Logo,

a • b = rQ • b + n • 26 H rn • Tb.

Escrevem-se duas colunas de números, uma ao lado da outra, onde, na coluna da es-querda, colocam-se, um em cada linha, os números a, ço, qi, • • -, q-n-i (= 1) (como descri-tos acima) e, na coluna da direita, também um em cada linha, os números 6, 26,46,..., 2n6.Como a paridade do elemento da coluna da esquerda na linha i — l determina se r i = O our i — l, quando somarmos os elementos da coluna da direita que correspondem a elementosímpares da coluna da esquerda, obteremos a • b.

Vejamos um exemplo. Vamos multiplicar 523 por 37.

37 523 +18 10469 2092 +4 41842 8368l 16736 +

Portanto,37 • 523 = 523 + 2092 + 16736 = 19351

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§4.1 Sistemas de Numeração 49

Exemplo 4.1.5. O Problema da Moeda Falsa.

Vamos generalizar a solução do problema da moeda falsa, que discutimos no Exemplo2.4.3, para um número arbitrário de moedas.

Seja m o número total de moedas, das quais uma é falsa. Escrevamos a expansão bináriade m:

m = 2ni+2 í l2 + - - - + 271'-.

Vamos mostrar que ni pesagens são suficientes para descobrir a moeda falsa. A de-monstração será feita usando a segunda forma do Princípio de Indução sobre n\.

Suponha n\ l, ou seja, temos, no máximo, três moedas. Pondo uma moeda emcada prato da balança, descobre-se imediatamente a moeda falsa e, portanto, o resultado étrivialmente verificado. Suponha o resultado verdadeiro para todo n' < n\.

Sejam agora 2"1 + 2712 H 1- 2"r moedas, das quais uma é falsa. Separemos as moedasem 2 lotes com, respectivamente, 2™1 e 2™2 + • • • + 2"r moedas cada um. Começamosanalisando o primeiro lote com 2ni moedas. Se a moeda falsa está neste lote, com o métododiscutido no Capítulo 2, sabemos que podemos descobrir a moeda falsa com, no máximo,n\. Se este lote não contém a moeda falsa, descobrimos isto com apenas umapesagem (põe-se metade das moedas do lote em cada prato; se a balança se equilibrar, amoeda falsa não se encontra aí) e descartamos o lote todo. Sobram, então, 2"2 + • • • + 2"r

moedas a serem analisadas. Pela hipótese de indução, bastam nz pesagens para descobrira moeda falsa, que, juntamente com a pesagem já realizada, perfazem um total de n2 + lpesagens que certamente é menor ou igual do que n\.

Problemasl

4.1.1 Mostre que, na base 10, o algarismo das unidades de um quadrado perfeito só podeser O, l, 4, 5, 6 ou 9.

4.1.2 Um certo número de três algarismos na base 10 aumenta de 36 se permutarmos osdois algarismos da direita, e diminui de 270 se permutarmos os dois algarismos da esquerda.O que acontece ao número se permutarmos os dois algarismos extremos?

4.1.3 [Critério de divisibilidade por uma potência de 2] Seja dado um número a, re-presentado na base 10 por a = anan-\... ao . Usando o fato de que 2k\Wk, mostre que2fc divide a se, e somente se, o número a^-i... aiao é divisível por 2k. Em particular, aé divisível por 2 se, e somente se, ao é O, 2, 4, 6 ou 8; também, a é divisível por 4 se, esomente se, ai ao é divisível por 4.

4.1.4 Escolha um número abe de três algarismos no sistema decimal, de modo que osalgarismos das centenas a e o das unidades c difiram de, pelo menos, duas unidades. Con-sidere os números abe e cba e subtraia o menor do maior, obtendo o número xyz. A somade xyz com zyx vale 1089. Justifique este fato.

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50 4. Representação dos Números Naturais

4.1.5 Seja dado o número 4783 na base 10; escreva-o nas seguintes bases: 2, 3, 4, 7, 12 e15.

4.1.6 O número 3416 está na base 7; escreva-o nas bases 5 e 12.

4.1.7 Um número na base 10 escreve-se 37; em que base escrever-se-á 52?

4.1.8 Considere 73 na base 10; em que base ele se escreverá 243?

4.1.9 Escreva a tabuada na base 5. Use-a para calcular 132 -i- 413 e 23 • 342.

4.1.10 Utilize o método dos antigos egípcios para calcular 527 • 72.

4,2 Jogo de Nim

Trata-se de um antigo jogo chinês de palitos jogado por duas pessoas. Este jogo foiobjeto, em 1901, de um artigo científico na prestigiosa revista Annals of Mathematics, deautoria de C.L. Bouton, mostrando que há uma estratégia que, se adotada pelo jogador queinicia o jogo, ele sempre ganhará.

Há várias versões deste jogo, cada uma com uma estratégia própria.

VARIANTE l Dispõe-se sobre uma mesa um certo número N de palitos. Estipula-se quecada jogador, na sua vez, possa retirar, no mínimo, l palito e, no máximo, n palitos, comn > 1. Supõe-se, ainda, que nem N nem N — l sejam múltiplos de n + 1. Perde o jogadorque retirar o último palito. A estratégia para que o primeiro jogador ganhe sempre é descritaa seguir.

Seja q o quociente e r o resto da Divisão Euclidiana de N por n + 1. Por hipótese,tem-se que r > 1. Divida mentalmente os palitos em q grupos de n + l palitos mais umgrupo com r — l palitos, restando ainda um palito. O jogador que começa retira essesr — l palitos. O segundo jogador, ao retirar de l a n palitos, deixará o primeiro jogador nasituação confortável de retirar o que sobra no primeiro grupo de n -f-1 palitos. Isto se repetepara cada grupo de n + l palitos, fazendo que, no final, sobre l palito na vez do segundojogador, provocando a sua derrota.

Faça um experimento com N = 34 e n — 3.

VARIANTE 2 Da mesma forma que a variante anterior, dispõe-se sobre uma mesa umcerto número N de palitos e estipula-se que cada jogador, na sua vez, possa retirar, nomínimo, l palito e, no máximo, um número n pré-fixado de palitos, com n > 1. Supõe-se,ainda, que TV não seja múltiplo de n+1. Ganha o jogador que retirar o último palito. Vamosdescrever a nova estratégia para que o primeiro jogador'ganhe sempre.

'O leitor interessado poderá ler mais sobre esse jogo na Revista do Professor de Matemática, N°. 6.

Page 56: Elementos de aritmética   abramo hefez

§4.2 JogodeNim 51

Seja q o quociente e r o resto da Divisão Euclidiana de N por n + l. Por hipótese,tem-se que l < r < n. Divida mentalmente os palitos em q grupos de n -h l palitos maisum grupo com r palitos. O jogador que começa retira os r palitos. O segundo jogador, aoretirar de l a n palitos, deixará o primeiro jogador na situação confortável de retirar o quesobra no primeiro grupo de n + l palitos. Isto se repete para cada grupo de n + l palitos,fazendo sempre com que, depois do segundo jogador realizar a sua jogada, sobre no grupoum número tal de palitos que possam ser retirados de uma só vez pelo primeiro jogador,levando-o à vitória.

A seguir, discutiremos uma variante mais complexa do jogo.

VARIANTE 3 Dispõe-se sobre uma mesa 15 palitos separados em três grupos, de 3, 5 e 7palitos, respectivamente (pode-se generalizar o jogo com três grupos com número arbitrário,porém, distinto de palitos).

Cada jogador, na sua vez, deve retirar um número qualquer de palitos de um, e de apenasum, dos grupos. Os jogadores se alternam e quem retirar o último palito ganha o jogo.

Vamos estabelecer uma estratégia de tal modo que, quem iniciar a partida fazendo umaboa abertura e seguindo certas regras, sempre vencerá.

Para isto, a cada jogada, escreve-se o número de palitos de cada grupo na base 2,colocando-os um em cada linha, de modo que os algarismos das unidades se correspon-dam. Por exemplo, no início da partida tem-se

Grupo l 11Grupo 2 101Grupo 3 111

Somando os três números acima como se fosse na base 10, obtemos o número 223, quechamaremos, a cada etapa, de chave do jogo. O primeiro jogador poderá, então, com umajogada, tornar todos os algarismos da chave pares. Por exemplo, poderá retirar um palito dogrupo 3, obtendo

Grupo l 11Grupo 2 101Grupo 3 110

222

Agora, qualquer jogada que o segundo jogador efetue transformará a chave 222 numachave com, pelo menos, um algarismo ímpar, o que, mediante uma jogada conveniente,poderá ser recolocado na situação de ter todos os algarismos pares.

Page 57: Elementos de aritmética   abramo hefez

52 4. Representação dos Números Naturais

Uma situação em que todos os algarismos da chave são pares será chamada de posiçãosegura, enquanto que, quando pelo menos um dos algarismos da chave é ímpar, será umaposição insegura.

Pode-se mostrar que, de uma posição segura, qualquer que seja a jogada, só se podechegar a uma posição insegura. Mostra-se também que, de uma posição insegura, pode-se,com uma jogada conveniente, sempre retornar a uma posição segura. Como 000 é umaposição segura, ganhará o jogo quem sempre se mantiver em posições seguras.

Problemas

4.2.1 Demonstre que as afirmações feitas na variante 3 do jogo de Nim são verdadeiras.

4.2.2 Determine, em cada caso apresentado abaixo, se a posição é segura ou insegura.a ) M I Ib ) I I I M I Ic ) I I l |d) l l

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5Algoritmo de Euclides

Os conceitos e resultados contidos neste capítulo encontram-se, em sua maioria, noLivro VII dos Elementos de Euclides. É notável a sua atualidade, apesar dos quase doismilénios e meio que nos separam de sua criação.

5.1 Máximo Divisor Comum

Dados dois números naturais a e ò, não simultaneamente nulos, diremos que o númeronatural d 6 IN* é um divisor comum de a e b se d\a e d\b.

Por exemplo, os números l, 2, 3 e 6 são os divisores comuns de 12 e 18.

A definição que se segue é exatamente a definição dada por Euclides nos Elementos ese constitui em um dos pilares da sua aritmética.

Diremos que d é um máximo divisor comum (mdc) de a e b se possuir as seguintespropriedades:

i) d é um divisor comum de a e de 6, eii) d é divisível por todo divisor comum de a e ò.

A condição (ii) acima pode ser reenunciada como se segue:

ii') Se c é um divisor comum de a e ò, então c\d.

Portanto, se d é um mdc de a e 6 e c é um divisor comum desses números, então c < d.Isto nos mostra que o máximo divisor comum de dois números é efetivamente o maiordentre todos os divisores comuns desses números.

Em particular, isto nos mostra que, se d e c?' são dois mdc de um mesmo par de números,então d < d' e d' < d, e, conseqíientemente, d — d'. Ou seja, o mdc de dois números,quando existe, é único.

O mdc de a e 6, quando existe (veremos mais adiante que sempre existe o mdc de doisnúmeros naturais não simultaneamente nulos), será denotado por (a, 6). Como o mdc de a

53

Page 59: Elementos de aritmética   abramo hefez

54 5. Algoritmo de Euclides

e 6 não depende da ordem em que a e ò são tomados, temos que

(a, 6) = (6, a).

Em alguns casos particulares, é fácil verificar a existência do mdc. Por exemplo, se ae b são números naturais, tem-se claramente que (O, a) = a, (l, a) = l e que (a, a) = a.Mais ainda, temos que

a\ <=^ (a,b) = a. (5.1)

De fato, se a | ò, temos que a é um divisor comum de a e 6, e, se c é um divisor comumde a e 6, então c divide a, o que mostra que a = (a, b).

Reciprocamente, se (a, 6) = a, segue-se que a\b.

A demonstração da existência do mdc de qualquer par de números naturais, não ambosnulos, é bem mais sutil. Poder-se-ia, como se faz usualmente no Ensino Fundamental,definir o máximo divisor comum de dois números a e ò como sendo o maior elemento doconjunto de todos os divisores comuns desses números, o que de imediato garantiria a suaexistência. De qualquer modo, seria necessário provar a propriedade (ii) da definição demdc, pois é ela que possibilita provar os resultados subsequentes, e não o fato do mdc ser omaior dos divisores comuns.

Para provar a existência do máximo divisor comum, Euclides utiliza, essencialmente, oresultado abaixo.

Lema 5.1.1 (Lema de Euclides). Sejam a, 6, n G IN com a < na < b. Se existe (a, b—na),então (a, b) existe e

(a, 6) = (a, b — na).

DEMONSTRAÇÃO: Seja d = (a, b — na). Como d\a e d\(b — na), segue que d divideb = b — na + na. Logo, d é um divisor comum de a e 6. Suponha agora que c seja umdivisor comum de a e ò; logo, c é um divisor comum de a e 6 — na e, portanto, c\d. Issoprova que d = (a, b).

nObservação 5.1.1 Com a mesma técnica usada na prova do Lema de Euclides, poder-se-iaprovar que, para todos a, 6, n 6 M,

(a, b) = (a, 6 +na),

ou que, se na > b, então(a, 6) = (a, na — 6).

O Lema de Euclides é efetivo para calcular mdc, conforme veremos nos exemplos aseguir, e será fundamental para estabelecermos o algoritmo de Euclides, que permitirá, commuita eficiência, calcular o mdc de dois números naturais quaisquer.

Page 60: Elementos de aritmética   abramo hefez

§5.1 Máximo Divisor Comum 55

Exemplo 5.1.1. Dados a, m € IN com a > l, temos que

\l = (o -l, m).a — l

De fato, chamando de c? o primeiro membro da igualdade, temos, pelo Problema 3. l .8(a),que

d = (am~l + a™'2 + ••• + « + l, o-l) =

((am~l - 1) + (am~2 - l) + . . . + (a - l) + m,o - 1) .

Como, pela Proposição 3.1.7, temos que

a - l\(am~l - 1) + (am~2 - 1) + • • • + (a - 1),

segue-se que (am~l — 1) + (am~2 — 1) H ----- h (a — 1) = ra(a — 1) para algum n € M, e,portanto, pela Observação 5.1.1, tem-se que

d = (n(a — 1) + m, a — 1) = (a — l, n(a — 1) -|- m) = (a — l, m).

Exemplo 5.1.2. Vamos, neste exemplo, determinar os valores de a e n para os quais a + 1divide a2™ + 1.

Note inicialmente que

a + I|a2n + l «=> (a + l, a2n + 1) = a + 1.

Como a2" -j- 1 = (a2n — 1) + 2, e a + I|a2n — l (veja Proposição 3.1.9), segue-se, pelaObservação 5.1.1, que para todo n,

(a + l, a2n + 1) = (a + l, (a2íl - 1) + 2) = (a + l, 2).

Portanto, a + I|a2n + l, para algum n 6 M, se, e somente se, a + l = (a + l, 2), oque ocorre se, e somente se, a = O ou a = 1.

Exemplo 5.1.3. Vamos, neste exemplo, determinar os valores de a e n para os quais a + 1divide a2n+1 - 1.

Note que

(a + l, o2n+1 - 1) = (a + l, a(a2n - 1) + o - 1) = (o + l, a - 1).

Portanto, a + I\a2n+1 — l, para algum n € M, se, e somente se,

a + l = (a + l, a2n+1 - 1) = (a + l, a - 1),

o que ocorre se, e somente se, a = 1.

Page 61: Elementos de aritmética   abramo hefez

56 5. Algoritmo de Euclides

Algoritmo de Euclides

A seguir, apresentaremos a prova construtiva da existência do mdc dada por Euclides(Os Elementos, Livro VII, Proposição 2). O método, chamado de Algoritmo de Euclides, éum primor do ponto de vista computacional e pouco conseguiu-se aperfeiçoá-lo em mais dedois milénios.

Dados a, b E TN, podemos supor a < 6. Se a = l ou a = b, ou ainda a\b, já vimos que(a, ò) = a. Suponhamos, então, que l < a < b e que a / b. Logo, pela divisão euclidiana,podemos escrever

b = aq\ ri, com ri < a.

Temos duas possibilidades:a) r\\a, e, em tal caso, por (5.1) e pelo Lema 5.1.1,

ri = (a, n) = (a,b-qia) = (a, 6),

e termina o algoritmo, oub) n /a, e, em tal caso, podemos efetuar a divisão de a por ri, obtendo

a = n 92 + í"a, com rz < TI.

Novamente, temos duas possibilidades:a') f2\ri, e, em tal caso, novamente, por (5.1) e pelo Lema 5.1.1,

r-i = (n,r2) = (ri,a-ç2n) = (n,a) = (b-q^a) = (ò, a) = (a, 6),

e paramos, pois termina o algoritmo, oub') TI /ri, e, em tal caso, podemos efetuar a divisão de r\r r'2, obtendo

»"i = r2<?3 + r3, com r3 < r2.

Este procedimento não pode continuar indefinidamente, pois teríamos uma sequênciade números naturais a > r\ r2 > • • • que não possui menor elemento, o que não épossível pela Propriedade da Boa Ordem. Logo, para algum n, temos que rn\rn-i, o queimplica que (a, 6) = rn.

O algoritmo acima pode ser sintetizado e realizado na prática, como mostramos a seguir.Inicialmente, efetuamos a divisão b = aq\ r\e colocamos os números envolvidos no

seguinte diagrama:

Page 62: Elementos de aritmética   abramo hefez

§5.1 Máximo Divisor Comum 57

A seguir, continuamos efetuando a divisão a = r\qi + TI e colocamos os númerosenvolvidos no diagrama

bn

91a

T-i

92

n

Prosseguindo, enquanto for possível, teremos

6n

91a

T-Í.

92

ri«"3

93

í~2

í"4

9n-l

í"n-2

rn

9íi

í"n-l

9n+l

rn = (a, 6)

Exemplo 5.1.4. Calculemos o mdc de 372 e 162:

37248

216218

34812

2186

112

26

Observe que, no exemplo acima, o Algoritmo de Euclides nos fornece:6 = 18 - l • 1212 = 48 - 2 • 1818 = 162 - 3 • 4848 = 372 -2-162

Donde se segue que6 = 18 - l • 12 = 18 - l • (48 - 2 • 18) = 3 • 18 - 48 =3 • (162 - 3 • 48) - 48 = 3 • 162 - 10 • 48 =3 • 162 - 10 • (372 - 2 • 162) = 23 • 162 - 10 • 372.

Temos, então, que

(372,162) = 6 = 23 • 162 - 10 • 372.

Note que conseguimos, através do uso do Algoritmo de Euclides, de trás para frente,escrever 6 = (372,162) como múltiplo de 162 menos um múltiplo de 372.

O Algoritmo de Euclides nos fornece, portanto, um meio prático de escrever o mdc dedois números como diferença entre dois múltiplos dos números em questão. Esta é umapropriedade geral do mdc que redemonstraremos com todo rigor na próxima seção.

Page 63: Elementos de aritmética   abramo hefez

58 5. Algoritmo de Euclides

Problemas

5.1.1 Para cada par de números naturais a e 6 dados abaixo, ache (a, b) e determinenúmeros naturais m&n tais que

(a, 6) = na — mb ou (a, 6) = mb — na.>

a) 637 e 3887 b) 648 e 1218 c) 551 e 874d) 7325 e 8485 e) 987654321 e 123456789

5.1.2 Seja n 6 IN. Mostre quea) (n, In + 1) = lb) (ra + l,n2 + rc + l) = lc)(2n+l,9n + 4) = ld) (n! + l, (n + 1)! + 1) = l

5.1.3 Mostre que (a, a + b)\b, quaisquer que sejam a, 6 E IN.

5.1.4 Dados a, m 6 IN com a > l, mostre que

a) 0 +

5.1.5' Calcule

a2m+1 4-1 \ + i ,o + l j = ( a + l,

5.1.6 Um prédio possui duas escadarias, uma delas com 1000 degraus e a outra com 800degraus. Sabendo que os degraus das duas escadas só estão no mesmo nível quando con-duzem a um andar, descubra quantos andares tem o prédio.

5.2 Propriedades do mdc

Sejam a, 6 6 IN*. Definimos o conjunto

J(a, 6) = {x 6 IN*; 3 u, v e M, x = ua - vb}.

Por definição, temos que

J(6, a) = {y € IN*; 3 u, v 6 M, y = vb - ua}.

Lema 5.2.1. Tem-se que

J(o,6) = J(6,o)?é0.

Page 64: Elementos de aritmética   abramo hefez

§5.2 Propriedades do mdc 59

DEMONSTRAÇÃO: Inicialmente, mostraremos que os dois conjuntos são iguais. Pelocaráter simétrico do resultado com relação a a e 6, basta mostrar que J (a, b) C J (b, a).

Seja x 6 J (a, b), então x = ua — vb com u, v G IN. Pela Propriedade Arquimediana(veja Problema 2.3.2), existem números naturais A, p, G IN tais que Aã > v e /uè > u.Tomando p = max{A, p}, tem-se que pá > v e pb > u. Portanto,

x = ua — vb = (pá — v)b — (pb — u)a G J(6, a).

Agora, note que a € J(a, b) e, portanto, J(a, 6) 0.

D

O resultado acima e a Propriedade da Boa Ordem garantem que existe min J (a, b).

Teorema 5.2.1. Sejam a, b E M* e seja d = min J(a, b). Tem-se queí) dê o mdc de a e b ii) J(a, 6) = {nd; n E IN}.

DEMONSTRAÇÃO: (i) Suponha que c divida a e b; logo, c divide todos os números natu-rais da forma ua — vb; portanto, divide todos os elementos de J (a, b), e, conseqiientemente,c\d.

Vamos agora mostrar que d divide todos os elementos de J(a, 6). Seja x G J (a, 6) esuponha, por absurdo, que d J(x. Logo, pela Divisão Euclidiana,

x = dq + r, com O < r < d.

Como x = ua — vb e d = mb — na, para alguns u, v, m, n G M, segue-se que

r = (u + qn)a — (v + qm)b € J(a, 6),

o que é um absurdo, pois d = min J(a, 6) e r < d. Em particular, d\a e d\b.(ii) Dado que Id = l(na — mb) = (ln)a — (lm)b € J (a, b), é claro que

{ld- í e IN} C J(a,6),

Por outro lado, já provamos que todo x G J(a, b) é tal que d\x, e, portanto,

J (a, b) C{ld; l € M}.

D

O Teorema acima nos dá uma outra demonstração da existência do mdc de dois números.Note que essa demonstração, ao contrário da prova de Euclides, não é construtiva, no sen-tido de que não nos fornece nenhum meio prático para achar o mdc dos dois números.

Page 65: Elementos de aritmética   abramo hefez

60 5. Algoritmo de Euclides

Corolário 1. Quaisquer que sejam a, b, n E M*, (na, nb) = n(a, b).

DEMONSTRAÇÃO: Note inicialmente que

J(na,nb) = n J(a, ò) = {nx; x E J(a, b)}.

Agora, o resultado segue-se do teorema e do fato de que

min n J (a, b) = n min J (a, b) .

D

Corolário 2. Dados a, 6 6 IN, tem-se que { - — — , - — — - 1=1.\, ò) (a, b) J

DEMONSTRAÇÃO: Pelo Corolário l, temos que

o que prova o resultado.

D

Dois números naturais aeb serão ditos primos entre si, ou coprimos, se (a, b) = 1; ouseja, -se o único divisor comum de ambos é 1.

Proposição 5.2.1. Dois números naturais aeb são primos entre si se, e somente se, existemnúmeros naturais nem tais que na — mb = 1.

DEMONSTRAÇÃO: Suponha que aeb são primos entre si. Logo, (a, 6) = 1. Como, peloTeorema 5. 2. l, temos que existem números naturais n e rn tais que na — mb = (a, b) (= 1),segue-se a primeira parte da proposição.

Reciprocamente, suponha que existam números naturais nem tais que na — mb = 1.Se d — (a, b), temos que d\(na — mb), o que mostra que d|l, e, portanto, d = 1.

D

A Proposição 5.2.1 estabelece uma crucial relação entre as estruturas aditiva e mul-tiplicativa dos números naturais, o que permitirá provar, entre vários outros resultados, oimportante teorema a seguir.

Teorema 5.2.2. Sejam a,b e c números naturais. Se a\ -cê (a, ò) = l, então a\c.

Page 66: Elementos de aritmética   abramo hefez

§5.2 Propriedades do mdc 61

DEMONSTRAÇÃO: Se a\b • c, então existe e 6 IN tal que bc = ae,Se (a, 6) = l, então, pela Proposição 5.2.1, temos que existem m, n 6 IN tais que

na — mb = 1.

Multiplicando por c ambos os lados da igualdade acima, temos quei

c = nac — mbc.

Substituindo bc por ae nesta última igualdade, temos que

c = nac — mãe = a(nc — me)

e, portanto, a\c.

D

Corolário. Dados a e IN e 6, c € IN*, temos que

T I i bc .b\ e ca <£=> 77—r a.

(b, c)

DEMONSTRAÇÃO: De fato, temos que a = nb — me para alguns n, m € INT. Logo,

6 cn——r = m-

, c) >,c)-

„ , / b c \ . 6 .Como l -r—-,——- J = l, segue-se que ——-m, o que implica que c-.—r- cm.

V (o, c) (b, c) J (b, c) (b, c)Como cm = a, o resultado se segue.

D

A noção de mdc pode ser generalizada como se segue.

Um número natural d será dito mdc de dados números naturais ai,..., an se possuir asseguintes propriedades:

i) d é um divisor comum de a\ an.ii) Se c é um divisor comum de ai , . . . , an, então c\d.

O mdc, quando existe, é certamente único e será representado por

(ai,...,on).

Proposição 5.2.2. Dados números naturais ai,..., an, existe o seu mdc e

Page 67: Elementos de aritmética   abramo hefez

62 5. Algoritmo de Euclides

DEMONSTRAÇÃO: Vamos provar a proposição por indução sobre n (> 2). Para n = 2,sabemos que o resultado é válido. Suponha que o resultado vale para n. Para provar que oresultado é válido para n + l, basta mostrar que

(ai,... ,an,an+i) = (a i , . . . , (an,an+i)),

pois isso provará também a existência.Seja d = (ai,...,(on,an+i)). Logo, d|ai,... ,d\an-i e d|(an,an+i)). Portanto,

d\ai,.-..,d\an-i,d\an ed|ara+i.Por outro lado, seja c um divisor comum de ai , . . . ,an , an+i; logo, c é um divisor

comum de a i , . . . , an-i e (an, an+i); e, portanto, c\d.

D

Para calcular o número (ai , . . . , on), pode-se usar recursivamente o Algoritmo de Eu-clides.

Problemas

5.2.1 Mostre que, se (a, 6) = l, a|c e b\c, então a • b\c.

5.2.2 a) Mostre que, se (a, 6) = l, então (a • c, b) = (c, 6).b) Mostre que (a • c, ò) = l se, e somente se, (a, 6) = (c, 6) = 1.

5.2*3 Suponha que (a, 6) = (a, a7) = (c, 6) = (c, d) = 1.a) Mostre que (a • c, 6 • d) = 1.b) Mostre que (an, fem) = l, Vn, m € IN.c) Mostre que, se a > b e n € IN, então (a + 6,6n) = (a — 6,6") = 1.

5.2.4 a) Mostre que, se n é ímpar, n (r?,2 — 1) é divisível por 24.b) Mostre que 24 divide n(n2 - l)(3n + 2) para todo n 6 IN.

5.2.5* a) Mostre que n5 — n é divisível por 30.b) Mostre que n5 e n possuem o mesmo algarismo das unidades.

5.2.6 Mostre que a\bc se, e somente se, r-|c.(a, 6)

5.2.7 Sejam a e 6 dois números naturais com a < b e (a, 6) = 1.a) Mostre que (b + a, 6 — a) é l ou 2.b) Mostre que (a + 6, a2 + b2) é l ou 2.

5.2.8* Sejam a, 6, m 6 IN*, com (a, 6) = 1./ a"1 _ jm \) Se a > b, mostre que í a - 6, — = (a - 6,m).

V 0-6 /

Page 68: Elementos de aritmética   abramo hefez

§5.3 Mínimo Múltiplo Comum 63

( flm _j_ yn \ + b, - — = (a + b, m).

a + 6 J

5.2.9 Mostre que, se a, 6, x, y 6 IN, com ax — by = (a, 6), então (x, y) = 1.

5.2.10 Calcule (1116, 984, 852).

5.2.11 Três números naturais são ditos primos entre si se (a, 6, c) = 1. Mostre que trêsnúmeros naturais, dois a dois primos entre si, são primos entre si. Mostre que não vale arecíproca; isto é, ache três números naturais primos entre si, mas não dois a dois primosentre si.

5.2.12 Mostre que, para todo n E IN*, tem-se que n + l divide l j

5.3 Mínimo Múltiplo Comum

Diremos que um número é um múltiplo comum de dois números naturais dados se ele ésimultaneamente múltiplo de ambos os números.

Em qualquer caso, o número ab é sempre um múltiplo comum de a e b.

Diremos que um número m é um mínimo múltiplo comum (nane) de a e b se possuir asseguintes propriedades:

(i) m é um múltiplo comum de a e 6, e(ii) se c é um múltiplo comum de a e b, então m\c.

Por exemplo, 12 é um múltiplo comum de 2 e 3, mas não é um mmc destes números. Onúmero 6 é um mmc de 2 e 3.

Se c é um múltiplo comum de a e 6, então, do item (ii) da definição acima, temos quem\c, e, portanto, m < c, o que nos diz que o mínimo múltiplo comum, se existe, é único eé o menor dos múltiplos comuns de a e 6.

O mínimo múltiplo comum de a e 6, se existe, é denotado por [a, b].

Proposição 5.3.1. Dados dois números naturais a e b, temos que [a, b] existe e

[a, b] (a, b) = ab.

DEMONSTRAÇÃO: Ponhamos m = - — — . Como(a, ò)

h am = a l — zT 7 — IA'(a, b) (a, b)

temos que a\m e b\m.

Page 69: Elementos de aritmética   abramo hefez

64 5. Algoritmo de Euclides

Seja c um múltiplo comum de a e 6; logo, c = na = n'b. Segue daí que

a . bn-—-r = n

(a, 6) (a, b) '

Como, pelo Corolário 2 do Teorema 5.2.1, - — — - e - — — - são primos entre si, segue-se,(a, 6) (a, 6)

do Teorema 5.2.2, que - - r- divide n', e, portanto, m = - — rr-6 divide n'b que, é igual a c.(a, 6) (a, 6)

D

Em virtude da Proposição acima, o mínimo múltiplo comum de dois inteiros pode serencontrado por meio do Algoritmo de Euclides para o cálculo do mdc, pois basta dividir oproduto dos dois números pelo seu mdc.

Corolário. Se a e b são números naturais primos entre si, então [a, 6] = ao.

Exemplo 5.3.1. Sejam bem dois números naturais. Vamos mostrar que, na sequência denúmeros

6, 2í>, 36, . . . , mfe,

existem exatamente (6, m) números divisíveis por m. De fato, os números da sequênciadivisíveis por m são múltiplos de 6 e m; logo, múltiplos de [b, m]. Esses são:

[ò, m], 2[6,m], 3[6,m], .. . , (ò, m) [b, m] (=mb)

Portanto, tem-se (6, m) números divisíveis por m na sequência.

Podemos estender a noção de mmc para vários números, como faremos a seguir.Diremos que m é um mmc de ai, . . . , an se m é um múltiplo comum de ai, . . . , an, e,

se para todo múltiplo comum w! desses números, tem-se que m\m' . É fácil ver que o mmc,se existe, é único, sendo denotado por [ai, . . . , an].

Proposição 5.3.2. Sejam a\ . . . , an números naturais. Então existe o número [a\ . . . , an]e

i , . . . ,an_i,an] = [01,. . . ,[an_i,an]] .

DEMONSTRAÇÃO: Basta provar que, se existe [ai,. . . , [an_i,ara]], vale a igualdade acima.A existência do mdc segue facilmente disso, por indução.

Seja m = [ai,...,[an_i,an]]. Logo, ai,...an_a e [an_i,an] dividem m. Comoan_i |[an_i, an] e an|[ara_i, an], segue que m é um múltiplo comum de ai, . . . , ara.

Por outro lado, suponha que m' seja um múltiplo comum de ai, . . . , an. Logo, ai|m',n-alm' e [an_i, an]|m'; daí segue que m = [ai, . . . , [an_i, an]] divide m'.

D

Page 70: Elementos de aritmética   abramo hefez

§5.3 Mínimo Múltiplo Comum 65

Problemas

5.3.1 Calcule o mmc dos pares de números do Problema 5.1.1.

5.3.2 a) Se m é um múltiplo comum de a e ò, mostre que

b) Se rã = sb, mostre querã sb

(r,-) (r,«) l"' r

5.3.3 Sejam a, 6, c três números naturais. Mostre que

abe = [a, b, c](ab, ac, bc).

5.3.4 Sejam a, 6 e IN e seja n E IN*; mostre que

[na, nó] = n[a, 6].

5.3.5 Seja n 6 IN*; calcule [n2 + l, n + 1].

5.3.6 a) Mostre que (a, 6) = [a, b] <=>• a = b.b) Mostre que, se b = a2, então, [a, 6] = (a, ò)2.

5.3.7 Sejam a, b E IN*. Considere o conjunto

M (a, b) = {x E IN*; 3n, m e IN* tais que x = na e x = mb}.

a) Mostre que [a, 6] = minM(a, b).b) Conclua que todo elemento de M(a, 6) é múltiplo de minM(a, è).

5.3.8 Sejam d, m E M*. Mostre que uma condição necessária e suficiente para que exis-tam a, 6 6 IN tais que (a, 6) = d e [a, b] = m é que d\m.

5.3.9 Sejam ai , . . . , an E M. Mostre que

(a», CLJ) = l, i ^ j •$=>• [ai,..., an] = ai • • • an.

5.3.10 Sejam a, b, c E M*. Mostre quea) (a, [ò, c]) = [(a,fr),(a,c)];

Page 71: Elementos de aritmética   abramo hefez

6Aplicações do Máximo Divisor

Comum

6.1 Equações Diofantínas Lineares

A resolução de vários problemas de aritmética recai na resolução, em números naturais,de equações do tipo

aX - bY = c,

ou, ainda, do tipoaX + bY = c,

com a, b, c E M.Tais equações são chamadas equações diofantinas lineares em homenagem a Diofanto

de Alexandria (aprox. 300 DC).Nem sempre estas equações possuem solução. Por exemplo, as equações

4X-6Y = 3 e 4X + 6Y = 2

não possuem nenhuma solução em números naturais xo,yo pois, caso contrário, para aprimeira equação, teríamos 4aro — 6yo par e» portanto, nunca igual a 3; e, para a segundaequação, teríamos 4xo + 6yo > 2.

É, então, natural perguntar-se em que condições tais equações possuem soluções e, casotenham, como determiná-las?

A resposta para as equações do tipo aX — bY = c é relativamente fácil e será dada nasduas proposições a seguir.

Proposição 6.1.1. Sejam a, ò G IN* e c € IN. A equação aX — bY = c admite solução emnúmeros naturais se, e somente se, (a, 6)|c.

66

Page 72: Elementos de aritmética   abramo hefez

§6.1 Equações Diofantinas Lineares 67

DEMONSTRAÇÃO: Pelo Teorema 5.2.l, temos que

J(a, 6) = {na - mb e IN; n, m € IN} = (a, ò)IN.

É claro que a equação aX — bY = c possui solução se, e somente se, c E J(a, 6), o queé equivalente a c € (a, 6)1N, que, por sua vez, é equivalente a (a, b)\c.

D

Se a equação aX — bY = c tem solução, então ela é equivalente à equação

a\X — biY = ci,

onde

" ' -(«,&) ' "l~(a,by -1 (a,6)'

Note que (GI, 61) = l e, portanto, podemos nos retringir às equações do tipo

aX — bY = c, com (a, 6) = l,

que sempre têm soluções.

Uma solução minimal de aX — bY = c é uma solução XQ, yo da equação, tal que, sex i, y i é uma solução qualquer da equação, então XQ < x\.

Mostraremos a seguir como as soluções da equação diofantina aX — bY = c, com(a, 6) = l, podem ser determinadas a partir da solução minimal XQ, yo.

Proposição 6.1.2. Seja XQ, yo a solução minimalda equação aX—bY = c, onde (a, b) = 1.Então, as soluções x, y em IN da equação são

x = xo + tb, y = yo + ta, t 6 M.

DEMONSTRAÇÃO: Seja x, y uma solução de aX — bY — c, logo,

axo — byo = ax — by = c.

Conseqiíeníemente,a(x - XQ) = b(y - y0). (6.1)

Como (a, b) = l, segue-se que b\(x — XQ). Logo,

x - XQ = tb, t e TN.

Substituindo a expressão de x — XQ acima em (6.1), segue-se que

y - yo = ía,

Page 73: Elementos de aritmética   abramo hefez

68 6. Aplicações do Máximo Divisor Comum

o que prova que as soluções são do tipo exibido.Por outro lado, x, y, como no enunciado, é solução, pois

ax — by = a(xo + tb) — b(yo + ta) —\

Note que a equação aX — bY = c, com (a, 6) = l, admite infinitas soluções.

A seguir, descreveremos um método para encontrar a solução minimal de uma equaçãodo tipo aX — bY = c, quando (a, 6) = 1.

Se a, 6 e c são números pequenos, a solução pode ser encontrada por inspeção. Emgeral, o método descrito abaixo sempre permitirá achar a solução minimal.

Usando o algoritmo euclidiano, é possível escrever

na — mb = (a, b) = l ou mfb — n' a — (a, b) = l.

No caso em que l = m'b — n' a, escolha p e IN tal que pb > n' e pá > m', logo,

l = (pb — n')a — (pá — m')b.

Portanto, pode-se sempre escrever l = na — mb, para alguns n, m e IN.Multiplicando ambos os membros da igualdade acima por c, obtemos

c = cna — cmb.

Logo, x\ ca e y\ cm é uma solução particular da equação. Pela Proposição 6. 1.2,temos que a solução minimal é XQ = x\ tb e yo — y\ ta para o maior valor de í, demodo que ainda se tenha

cn — tb = x\ tb > O e cm — ta = y\ ta > 0.

Exemplo 6.1.1. Resolvamos a equação 24X — 14Y = 18.A equação tem solução, pois (24, 14)|18; e é equivalente a 12X — 7Y = 9.Vamos, em seguida, achar a solução minimal XQ, yo desta última equação. Pelo algo-

ritmo euclidiano, temos

12 = 7 -1 + 57 = 5 - 1 + 25 = 2 - 2 + 1

Substituindo as equações acima umas nas outras, obtemos

1 = 12-3 -7 -5 ,

Page 74: Elementos de aritmética   abramo hefez

§6.1 Equações Diofantinas Lineares 69

e, portanto,9 = 12 • 27 - 7 • 45.

Logo, x\ 27 e yi = 45 é solução particular da equação. A partir desta solução,vamos, com o auxílio do método acima exposto, determinar a solução minimal. Ponhamos

z = 27-£7, y = 45-í!2,

e determinemos o maior valor de t E IN, de modo que a;, y G M. Isto ocorre quando t = 3,dando a solução minimal XQ = 6 e yo = 9-

As soluções da equação são, portanto,

z = 6 + í7, y = 9 + í!2.

Exemplo 6.1.2. Resolvamos a equação 14X — 24Y = 18.A equação tem solução, pois (14,24)|18, e é equivalente a IX — 12Y = 9.Vamos, em seguida, achar a solução minimal XQ, yo desta última equação. Pelos cálculos

feitos no Exemplo 6.1.1, temos que

9 = 12 - 27 - 7 • 45 = 7(4 • 12 - 45) - 12(4 • 7 - 27) = 7 • 3 - 12 • l,

o que nos dá a solução minimal XQ — 3 e yo = 1.Portanto, as soluções da equação são dadas por

x = 3 + £12, y = l + ti.

Para responder às mesmas perguntas formuladas acima para as equações do tipo aX +bY = c, vamos precisar do resultado a seguir.

Proposição 6.1.3. Sejam a, ò G IN*, com (a, 6) = 1. Todo número natural c pode serescrito (de modo único) de uma e, somente uma, das seguintes formas:

c = na + mó, ou c = na — mó, com n < b.

DEMONSTRAÇÃO: EXISTÊNCIA: Sabemos que existem «, v G IN tais que ua — vb =(a, b) — 1. Multiplicando ambos os lados desta última igualdade por c, temos que

auc — bvc = c.

Pela divisão euclidiana, temos que existem ç, n G M com n < b tais que uc = qb + n.Substituindo esse valor de uc na igualdade acima, obtemos

c = na + qab — vcb.

Page 75: Elementos de aritmética   abramo hefez

70 6. Aplicações do Máximo Divisor Comum

Se qa > vc, pondo m = qa — vc, temos que c = na + mb.Se vc > qa, pondo m = vc — qa, temos que c = na — mb.

UNICIDADE: Suponhamos que

na ± mb = n'a ± m'b, com n, n' < b.

Temos três possibilidades para analisar:

na + mb = n'a — m'b, na + mb = n1 a + m'b, na — mb — n'a — m'b.

Inicialmente, mostraremos que a primeira possibilidade só ocorre quando n = n' em = m' = 0. Para isto, basta mostrar que n = n', pois teríamos

O = na + mb — (n'a — m'b) = mb + m'b = b(m + m'),

o que implicaria que m + m' = O e, portanto, que m = m' = 0.Para mostrar que n = n', suponhamos, por absurdo, que n' ^ n. Logo, necessaria-

mente, n' > n. Portanto,(n' — n)a = (m + m')b.

Como (o, 6) = l, temos que a\m + m') e, portanto, m + m' = rã. Logo, (n1 — n)a =(m + m'}b = rab. Daí segue que (n1 — n) = rb, o que é absurdo, pois n' — n < b e rb > b.Portanto, n = n', seguindo assim a unicidade.

As outras duas possibilidades podem ser tratadas de modo semelhante e são deixadascomo exercício para o leitor.

D

Sejam a, 6 6 3N*. Definimos o conjunto

S(a, b) = {xá + yò; x,y 6 M}.

É claro que aX + bY = c, com (a, b) = l, tem solução se, e somente se, c 6 5(a, 6).Portanto, é de fundamental importância caracterizar os elementos do conjunto 5(a, 6).

Proposição 6.1.4. c G S(a, 6) se, e somente se, existem n, m e IN, com n < b (univoca-mente determinados) tais que c = na + mb

DEMONSTRAÇÃO: É claro que, se c = na + mb, então c 6 5(a, b). Por outro lado, sec 6 S (a, b), então c = xa + yb com x, y € M. Pela divisão euclidiana, x = bq + n, comn < b; logo, substituindo o valor de x desta última igualdade na igualdade acima, obtemosque c = na + mb, onde n < b, e m = aq + y.

n

Page 76: Elementos de aritmética   abramo hefez

§6.1 Equações Diofantinas Lineares 71

Definamos o conjunto de lacunas de S(a, b) como sendo o conjunto

£(o,6)=lN\5(o,6).

Corolário. Temos que

L(a, ò) = {na - mb e IN; n < b, m € IN}.

DEMONSTRAÇÃO: Isto decorre imediatamente das Proposições 6.l .3 e 6. l.4.

D

Teorema 6.1.1. A equação aX + bY = c, onde (a, 6) = l, tem solução em númerosnaturais se, e somente se,

c g L(a, b) = {na - mb e M; n < b, m 6 IN}.

DEMONSTRAÇÃO: Como a equação aX + bY = c tem solução se, e somente se, c €S (a, b), o resultado segue-se do Corolário.

D

Note que o conjunto L(a, b) é finito e o seu maior elemento é

maxi(a, è) = (6 — l)a — b.

Portanto, sec> (&- l )a - f r+ l = (6-l)(a-l),

a equação aX + bY = c admite solução; se c = (ò — 1)(o — 1) — l, ela não admite solução.

Na prática, não é difícil decidir se a equação aX + bY = c admite solução.Se (a, 6) /fc, a equação não tem solução. Se (a, è)|c, a equação é equivalente a uma

outra com (a, 6) = 1. Com o algoritmo euclidiano, escreva

l = (a, ò) = n'a — m'b.

Logo,c = cn'a — cm'6.

Agora, com a divisão euclidiana, escreva cn' = qb + n com n < 6, logo,

_ f na + (qa — cm'\ — (cm' — qa

— cm')b 6 5(a, 6), se qa > cm'qa)b e L(a, 6), se cm' > qa

A equação tem solução no primeiro caso, mas, não no segundo.

A solução n, m da equação aX + bY = c, com n < b, é uma solução minimal, nosentido de que se x, y é uma solução, então x > n.

Page 77: Elementos de aritmética   abramo hefez

72 6. Aplicações do Máximo Divisor Comum

Proposição 6.1.5. Suponha que a equação aX + bY = c, com (a, 6) = l, tenha soluçãoe seja XQ = n,yo = m a solução minimal. As soluções x, y da equação são dadas pelasfórmulas

x = n + tb, e y = m — ta.

DEMONSTRAÇÃO: Temos que ara + bm = ax + by = c. Logo,

a(x — n) = b(m ~ y),

que, de modo totalmente análogo ao que foi feito na demonstração da Proposição 6.1.2,implica no resultado.

D

Note que este tipo de equação tem, no máximo, um número finito de soluções, corres-pondentes aos seguintes valores de t:

onde — representa o quociente da divisão euclidiana de m por a.L a J

Exemplo 6.1.3. Vamos determinar para quais valores de c e IN a equação 11X + 7Y = ctem soluções em M.

O conjunto de lacunas de 5(11, 7) é o conjunto

£(11, 7) = {nll - ml 6 IN, n, m 6 IN, n < 7}

= {l, 2, 3, 4, 5, 6, 8, 9, 10, 12, 13, 15, 16, 17, 19, 20, 23, 24, 26, 27, 30,

31,34,37,38,41,45,48,52,59}.

Portanto, a equação 11X + 7Y — c admite solução se, e somente se, c g £(11, 7).

Exemplo 6.1.4. Resolvamos a equação 11X + 7Y = 58.Como, de acordo com o Exemplo 6.1.3, 58 0 £(11, 7), a equação possui soluções. Para

determiná-las, considere o algoritmo euclidiano,11 = 7 - 1 + 47 = 4 - 1 + 34 = 3-1 + 1Logo,

1 = 4-3 = 4- (7 -4) = 2 - 4 - 7 = 2(11 - 7) - 7 = 2 • 11 - 3 • 7.

Portanto,

58 = (58 • 2)11 - (58 • 3)7 = (4 + 16 - 4)11 - 174 • 7 = 4 • 11 + 2 • 7.

Page 78: Elementos de aritmética   abramo hefez

§6.1 Equações Diofantinas Lineares 73

Segue daí que £o = 4eí/o = 2éa solução minimal da equação. Logo, as soluções são

x = 4 + t7, y = 2- £11,

que só têm sentido para t = O, e, portanto, a equação só possui a solução XQ = 4, yo — 2.

Para resolver equações como as acima, não é necessário usar toda a técnica que desen-volvemos, pois os números envolvidos são suficientemente pequenos para que seja vjávelachar as soluções por inspeção.

No exemplo acima, basta testar os valores x = I ,2 ,3 ,4e5 para verificar que apenasx = 4 é possível.

Problemas

6.1.1 Resolva as equações:a) mX - 28Y = 22 b) 5QX - 56F = 74c) 40X - 65Y = 135 d) SX - 13Y = 23

6.1.2 Para quais valores de c a equação 9QX + 28Y = c não possui soluções?

6.1.3 Resolva as equações:a) 1QX + 7Y = 601 b) 3QX + ITT = 201c) 47X + 29Y = 1288 d) 8X + 13Y = 23

6.1.4 Dispondo de 100 reais, quais são as quantias que se podem gastar comprando selosde 5 reais e de 7 reais?

6.1.5 Determine todos os múltiplos de 11 e de 9 cuja soma é igual aa)79 b) 80 c) 270

6.1.6 Determine o menor inteiro positivo que tem restos 11 e 35 quando dividido, respec-tivamente, por 37 e 48.

6.1.7 Numa criação de coelhos e galinhas, contaram-se 400 pés. Quantas são as galinhase quantos são os coelhos, sabendo que a diferença entre esses dois números é a menorpossível?

6.1.8 Subindo uma escada de dois em dois degraus, sobra um degrau. Subindo a rnesmaescada de três em três degraus, sobram dois degraus. Determine quantos degraus possui aescada, sabendo que o seu número é múltiplo de 7 e está compreendido entre 40 e 100.

6.1.9(ENC 2002) Em certo país, as cédulas são de $4 e $7. Com elas, é possível pagar,sem troco, qualquer quantia inteiraa) a partir de $11, inclusive. b) a partir de $18, inclusive.

Page 79: Elementos de aritmética   abramo hefez

74 6. Aplicações do Máximo Divisor Comum

c) ímpar, a partir de 87, inclusive, d) que seja $1 maior do que um múltiplo de 83.e) que seja 81 menor do que um múltiplo de 85.

6.1.10 De quantas maneiras pode-se comprar selos de 3 reais e de 5 reais de modo que segaste 50 reais?

6.2 Expressões Binômias

Nesta seção, mostraremos como calcular o mdc de pares de números da forma an ± l,mediante o uso do Algoritmo de Euclides.

O resultado a seguir nos permitirá calcular o mdc de elementos de sequências de númerosnaturais cujos elementos possuem propriedades aritméticas especiais.

Proposição 6.2.1. Dada uma sequência (an}n tal que V m > n, (am,an) = (an,ar), onder é o resto da divisão de m por n, então tem-se que

DEMONSTRAÇÃO: Sejam ri,r2,...,rs,rs+i = O os restos parciais no Algoritmo deEuclides; logo, rs = (m, n). Portanto, pela propriedade de (an)n,

(am,an) = (an,ari) = ••• = (ars,aTs+1) = (ari,0) = a(m,n).

D

O uso da Proposição acima nos permitirá provar o resultado a seguir.

Proposição 6.2.2. Se n, m, a e IN*, com a > 2, então

(am -l,an-l) = ad- l, onde d = (m, n).

DEMONSTRAÇÃO: De fato, se m > n, pela divisão euclidiana podemos escrever m =nq + r, onde r é o resto da divisão de m por n. Como

am - l = an<1+r - l = ar(an<! - 1) + ar - l,

e como an — l\ánq — l (Proposição 3.1.7), segue-se, pelo Lema de Euclides, que

(am - l,an - 1) = (aT(anci - 1) +ar - l,an - 1) = (an - l,ar - 1).

O resultado segue-se, agora, da Proposição 6.2.1, pondo an = an — 1.

D

Page 80: Elementos de aritmética   abramo hefez

§6.2 Expressões Binômias 75

Para calcular (am ± l, a" ± 1) nos outros casos, necessitaremos de alguns lemas.

Lema 6.2.1. Sejam a, m, n, ç, r 6 IN, com a>2, tais que n = mg + r; então

DEMONSTRAÇÃO: Como am — l\amq — l (Proposição 3.1.7), e como

o" + l = amq+T + l = aT(amq - 1) + ar + l,

o resultado segue-se pelo Lema de Euclides.

D

Lema 6.2.2. Sejam a, m, n, q, r G IN, com a > 2, tais que m = nq + r, então

{ (an + l, ar — 1), se q é par

(an + l, ar + 1), se q é ímpar

DEMONSTRAÇÃO: Se q é par, an + l\anq - l (Proposição 3.1.9), e como

am - l = anq+r - l = ar(anq - 1) + ar - l,

decorre do Lema de Euclides que

(an + l,am + 1) = (an + l,ar - 1).

Se g é ímpar, temos que an + \\anq + l (Proposição 3.1.8), e como

am - l = anq+r - l = ar(anq + 1) - ar - l,

segue-se da Observação 5.1.1 que

(an + l,am + 1) = (an + l,ar + 1).

D

Lema 6.2.3. Sejam a € IN* e m, n, q, r e IN, tais que m = nq + r, então

(an + l, ar + 1), se q é par

(an + l, ar — 1), se q é ímpar

Page 81: Elementos de aritmética   abramo hefez

76 6. Aplicações do Máximo Divisor Comum

DEMONSTRAÇÃO: Se q é par, an + l\anq — l (Proposição 3.1.9), e como

am + l = anq+r + l = aT(anq - 1) + ar + l,

segue-se do Lema de Euclides que

(an + l,<zm + 1) = (a71 + l,ar + 1).

Se ç é ímpar, an + l\an(} + l (Proposição 3.1.8), e como

a™ + l = a"9+r + l = aT(anq + 1) - a7" + l,

decorre da Observação 5.1.1 que

(an + l,am + 1) = (an + l, a7" - 1).

D

?T£Proposição 6.2.3. Sejam n,m £ IN*, com n\m e — par. Se a E M*, então,

n

é ímpar

DEMONSTRAÇÃO: De fato, basta aplicar o Lema 6.2.3 na situação em que q (= ^) é pare r = 0.

D

Corolário. S<? n m, entôo, (22" + l, 22"1 + !) = !.

Os resultados acima nos permitem deduzir o seguinte teorema:

Teorema 6.2.1. Se a, n, m E M*, com a > 2, então, (a™ - l,an - 1) = a<m'n) - l e(am ± l, a71 + 1) porfe apenas assumir um dos seguintes valores: l, 2 ou a(m>") + 1.

DEMONSTRAÇÃO: De fato, a primeira igualdade acima segue-se da Proposição 6.2.2.Por outro lado, segue-se dos lemas acima que (am ± l, an + 1) só pode ser igual a um dosseguintes números: (a(m^ + l,a° + 1), (a(m>ri) + l,a° - 1), ou (a<m'n) - l,a° + 1).Portanto, (am ± l, an + 1) só pode assumir os valores: l, 2 ou a(m>n) + 1.

D

Page 82: Elementos de aritmética   abramo hefez

§6.2 Expressões Binômias 77

Exemplo 6.2.1. Note que 22 — 1|23 + 1. Vamos mostrar que, dados n, m Ç. IN*, comm > 2, então, 2m - l /2n + 1.

Dado que 2n +1 e 2m -1 são ímpares, pelo Teorema 6.2. l segue-se que (2™ +1,2m -1)só pode assumir os valores l ou 2(n>m) + 1.

Se 2m - 1|2" + l, teríamos que 2m - l = l ou 2m - l = 2(">m) + 1. A primeirapossibilidade só ocorreria se m = l, o que é vedado pela hipótese. Se a segunda possibili-dade ocorresse, teríamos 2m-1 = 2^n'm^~l + l, o que implicaria que (n, m) = l e m = 2,também vedado por hipótese.

Os seguintes dois corolário dos Teorema 6.2.1 nos permitirão determinar os números(am ± l, a" + 1) em todos os casos

Corolário 1. Tem-se que

, s [m, n]a\n,mi _|_ j 5e ^ g lmpar

(m, n)

[m, n]2, se -. e par e ae impar

(m, n)

[m, n]l, se -. =- e a são pares

(m, n)

DEMONSTRAÇÃO: Note que o resultado é trivialmente verificado se a = O ou a = 1.Assumiremos, portanto, a > 2.

Pelo Teorema 6.2.1 temos que (am + l,an + 1) só pode assumir os valores l, 2 ea(min) _(-1; g, portanto, (am +1, an + 1) = a^m>n^ + l, se, e somente se, a^m>n^ +

Escrevendo m = (m,n)-. r- e n = (m,n)-. r-, temos, pela Proposição 3.1.8 e(m, n) (m, nj

r i "^pelo Exemplo 5.1.2, que ayn-'n' + l divide am + l e a" + l se, e somente se, -. r e(m, n)

TLsão ímpares, o que ocorre se, e somente se, o seu produto é ímpar; ou seja, se, e

(m, n)somente se, é ímpar o número

m n [m, n]

(m, n) (m, n) (m, n)'

O resultado segue-se, pois o restante da prova é trivial.

D

Page 83: Elementos de aritmética   abramo hefez

78 6. Aplicações do Máximo Divisor Comum

Corolário 2. Se a 6 IN*, tem-se que

(am-l,a"

(n,m) _j_ j se é par e -. é ímpar(m, n) r (m, n)

2, caso contrário e a ê ímpar

l, caso contrário e a é par

DEMONSTRAÇÃO: Note que o resultado é trivialmente verificado se a = 1. Assumire-mos, portanto, a > 2.

Pelo Teorema 6.2.1 temos que (am — l, a" + 1) só pode assumir os valores l, 2 ea(m,n) + i; e? portanto, (am - l, a" + 1) = a(m>") + 1, se, e somente se, a^m'") + l divideam - l e a" + 1.

Escrevendo m = (m, n)- e n = (m, n)- r-, temos, pela Proposição 3.1.8 e(m, n) (m, n)

/ \pelo Exemplo 5.1.2 que a\'n> + l divide an + l se, e somente se, é ímpar. Por

(m, n)outro lado, pela Proposição 3. l .9 e pelo Exemplo 5.1.3, tem-se que a^m'n^ +1 divide am — l

mse, e somente se, e par.

(m, n)O resultado segue-se, pois o restante da prova é trivial.

D

Problemas

6.2.1 Sejam a, m, n € IN*. Mostre que an — l|am — l se, e somente se, n\m.Tn

6.2.2 Sejam n, m G IN com n\m e — ímpar. Se a 6 EM*, mostre quen

6.2.3 Sejam a, m, n 6 IN*, com m > n. Mostre que

( o/n 971 \n^ - l,cT +1) =a2 +1.

6.2.4 Calculea) (5202 + l, 574 + 1) b) (36497 + l, 36210 + 1) c) (3144 - l, 378 + 1)

6.2.5* Seja (Mn)n a seqíiência definida por Mn = 2™ — 1. Mostre que 3|Mn se, e somentese, n é par.

Page 84: Elementos de aritmética   abramo hefez

§6.3 Números de Fibonacci 79

6.3 Números de Fibonacci

Nesta seção, apresentaremos algumas propriedades dos números de Fibonacci, come-çando por calcular o mdc de um par qualquer desses números. Antes, porém, necessitare-mos de dois lemas.

Lema 6.3.1. Dois termos consecutivos da sequência de Fibonacci são primos entre si.

DEMONSTRAÇÃO: Mostraremos, por indução sobre n, que (un+\ un) — 1. De fato, paran = l temos que

(«2, «i) = (!,!) = l-

Suponhamos, agora, o resultado válido para n, isto é, (un+i,un) = 1. Temos, então,que

(«n+2,«ra+l) = («n+2 ~ «n+l,«n+l) = («n, «n+l) = l,

provando, assim, o resultado.

D

Lema 6.3.2. Se n, m 6 IN* são tais que n\m, então, un\um.

DEMONSTRAÇÃO: Vamos escrever m = nk e demonstrar o lema por indução sobre k.Para k = l, o resultado é trivialmente verificado. Suponha, agora, o resultado válido

para algum valor de k; isto é, um\umk.Pela identidade do Problema 2.4.3, temos que

um(k+l) = umk+m = Umk-\Um + UmkUm+l-

Como um\umk-\um e, por hipótese de indução, um\umkUm+\, segue-se que um divide> provando, assim, o resultado.

D

Teorema 6.3.1. Seja (un)n a sequência de Fibonacci; então,

(um,Un) = U(m,n)-

DEMONSTRAÇÃO: Suponha que m > n; logo, pela Divisão Euclidiana, m — nq + r; e,portanto, pela fórmula do Problema 2.4.3,

Unq-lUr + UnqUr+i.

Logo, como pelo Lema 6.3.2, un\unq, segue-se, do Lema de Euclides, que

(Un , Um ) = ( Unq- 1 Ur + UnqUT+ 1 , Un ) = ( Unq- \r , Un ) . (6.2)

Page 85: Elementos de aritmética   abramo hefez

80 6. Aplicações do Máximo Divisor Comum

Como, pelo Lema 6.3.1, (unq-i,unq) = l, segue-se que (unq-i,un) = l (veja Proble-ma 5.2.2(b)); e, consequentemente, de (6.2) e do Problema 5.2.2(a), segue-se que

O resultado segue-se agora da Proposição 6.2. l .

D

Corolário. Na sequência de Fibonacci, temos que un divide um se, e somente se, n dividem.

Exemplo 6.3.1. O resultado acima nos permite estabelecer alguns critérios de divisibili-dade para os termos da sequência de Fibonacci.

Assim, para acharmos, por exemplo, os termos um da sequência de Fibonacci divisíveispor 3, basta notar que «4 = 3 e que

3\Um <É=> íí(4,m) = («4, Um} — (3, Um] = 3 = «4,

e, portanto, 3]^ se, e somente se, (4, m) = 4, o que equivale a dizer que 4|m.

Problemas

6.3.1 Mostre que, se na sequência de Fibonacci existir um termo divisível por um númeronatural m, então existem infinitos tais termos. (No Capítulo 9, Exemplo 9.2.7, mostraremosque este é sempre o caso, qualquer que seja m.)

6.3.2 Na sequência de Fibonacci, mostre que um é par se, e somente se, m é divisível por3.

6.3.3 Na sequência de Fibonacci, mostre que um é divisível por 5 se, e somente se, m édivisível por 5.

6.3.4 Na sequência de Fibonacci, mostre que um é divisível por 7 se, e somente se, m édivisível por 8.

6.3.5 Na sequência de Fibonacci, mostre que um é divisível por 4 se, e somente se, m édivisível por 6.

Problemas Suplementares

6.S.1 Ache a menor distância entre dois pontos (xi,y\) e (x%,y%), no plano, que sãosoluções da equação diofantina aX — bY = c, onde a, 6, c e IN e (a, 6) = 1.

Page 86: Elementos de aritmética   abramo hefez

§6.3 Números de Fibonacci 8 1

6.S.2 Sejam a, 6 e IN*, com (a, ò) = 1.a) Mostre que 5(a, 6) é simétrico no seguinte sentido: para todos x, y 6 IN, com x + y =ab — a — b, tem-se que

xeS(a,b) <=> y

b) Mostre que no intervalo Q < x < ab — a — b existem tantos elementos pertencentes aS(a, b), quanto elementos não pertencentes a 5(a, ò).

6.S.3* Sejam a, 6 6 IN, com a > 2, b > 2 e (a, 6) = 1. Considere o conjunto S* (a, ò) ={ax + by; a;, y G IN*}.a) Mostre que existe c e S* tal que c + IN C 5*.b) Mostre que existe um número natural p tal que, se n, m e IN são tais que n + m = p,então n € S* (a, b) se, e somente se, m g S* (a, b).

Page 87: Elementos de aritmética   abramo hefez

7Números Primos

Iniciaremos neste capítulo o estudo dos números primos, um dos conceitos mais impor-tantes de toda a Matemática. Esses números desempenham papel fundamental e a eles estãoassociados muitos problemas famosos cujas soluções têm resistido aos esforços de váriasgerações de matemáticos.

7.1 Teorema Fundamental da Aritmética

Um número natural maior do que l e que só é divisível por l e por si próprio é chamadode número primo.

Dados dois números primos p e g e um número natural a qualquer, decorrem da definiçãoacima os seguintes fatos:

I) Se p\q, então p = q.De fato, como p\ e sendo q primo, temos que p = l ou p = q. Sendo p primo, tem-se

que p > l, o que acarreta p = q.

H) Se p l a, então (p, a) = 1.De fato, se (p, a) = d, temos que d\ e d\a. Portanto, d = p ou d = 1. Mas d p, pois

p /a e, conseqiíentemente, d = 1.

Um número maior do que l e que não é primo será chamado composto. Portanto, seum número n é composto, existirá um divisor n\e n tal que n\ l e n\ n. Portanto,existirá um número natural n-i tal que

n = nina, com l < n\ n e, l < n-z < n

Por exemplo, 2, 3, 5, 7, 11 e 13 são números primos, enquanto que 4, 6, 8, 9, 10 e 12são compostos.

Do ponto de vista da estrutura multiplicativa dos naturais, os números primos são osmais simples e ao mesmo tempo são suficientes para gerar todos os números naturais, con-forme veremos mais adiante no Teorema Fundamental da Aritmética.

82

Page 88: Elementos de aritmética   abramo hefez

§7. l Teorema Fundamental da Aritmética 83

A seguir, estabelecemos um resultado fundamental de Euclides (Os Elementos, Propo-sição 30, Livro VH).

Proposição 7.1.1. Sejam a, 6, p 6 IN*, com p primo. Se p\ab, então p\a oup\b.

DEMONSTRAÇÃO: Basta provar que, se p\ab e p / a, então p\b. Mas, se p /a, temosque (p, a) = l, e o resultado segue-se do Teorema 5.2.2.

D

Na realidade, a propriedade dos números primos descrita na proposição acima, os ca-racteriza totalmente, como se pode verificar através do Problema 7.1.10.

Corolário. Se p,p\, . . . ,pn são números primos e, se p\p\ • -pn, então p = pi paraalgum i = l, . . . , n.

DEMONSTRAÇÃO: Use a Proposição 7.1.1, indução sobre n, e o fato de que, se p\pi,então p = pi.

D

Teorema 7.1.1 (Teorema Fundamental da Aritmética). Todo número natural maior doque l ou é primo ou se escreve de modo único (a menos da ordem dos fatores) como umproduto de números primos.

DEMONSTRAÇÃO: Usaremos a segunda forma do Princípio de Indução. Se n = 2, oresultado é obviamente verificado.

Suponhamos o resultado válido para todo número natural menor do que n e vamosprovar que vale para n. Se o número n é primo, nada temos a demonstrar. Suponhamos,então, que n seja composto. Logo, existem números naturais n\ n^ tais que n = n\ni,com l < n\ n e l < n-i < n. Pela hipótese de indução, temos que existem númerosprimos pi,... ,pr e çi, . . . ,çs tais que n\ pi • • -pr e n-i = q\ • • qs. Portanto, n =P\---prq\---qs.

Vamos, agora, provar a unicidade da escrita. Suponha, agora, que n — p\ • • pT =qi • • • qs, onde os pi e os QJ são números primos. Como p\\q\ • • qs, pelo corolário acima,temos que p\ QJ para algum j, que, após reordenamento de qi, . . . , qs, podemos suporque seja q\. Portanto,

Como pi • • • pr < n, a hipótese de indução acarreta que r = s e os pi e qj são iguais aospares.

D

Page 89: Elementos de aritmética   abramo hefez

84 7. Números Primos

Este resultado, porém, não explicitamente enunciado em sua totalidade, está essencial-mente contido nos Elementos de Euclides, pois ele é consequência quase que imediata deproposições que lá se encontram.

Agrupando, no Teorema 7.1.1, os fatores primos repetidos, se necessário, e ordenandoos primos em ordem crescente, temos o seguinte enunciado:

Teorema 7.1.1'. Dado um número natural n > l, existem primos pi < • • • < pr eQI , . . . , GV 6 IN*, univocamente determinados, tais que

Quando estivermos lidando com a decomposição em fatores primos de dois, ou mais,números naturais, usaremos o recurso de acrescentar fatores da forma p° (= 1), onde p éum número primo qualquer. Assim, dados n, m € IN com n > l e m > l quaisquer,podemos escrever

n — nai • • • nar p m — ifl • • • rt&Tn — PI • • -pr e m — p^ Pr •>

usando o mesmo conjunto de primos pi, . . . ,pr, desde que permitamos que os expoentesQI, . . . , ar, /?i, . . . ,/3s variem em IN e não apenas em IN*.

Por exemplo, os números 23 • 32 • 7 • 11 e 2 • 52 • 13 podem ser escritos, respectivamente,23 • 32 • 5° • 7 • 11 • 13° e 2 - 3° • 52 • 7° • 11° • 13.

Observe que um número natural n > l, escrito na forma n = p"1 • • - p f r , como noteorema acima, é um quadrado perfeito se, e somente se, cada expoente ai é par.

Proposição 7.1.2. Seja n = p"1 • • -pfT um número natural escrito na forma acima. Se n'é um divisor de n, então

n'=pf ...pf%

onde O < fa < OLÍ, para i = l, . . . , r.

DEMONSTRAÇÃO: Seja n' um divisor de n e seja p@ a potência de um primo p quefigura na decomposição de n' em fatores primos. Como p^jn, segue que p@ divide algump"* por ser primo com os demais p A e, conseqiientemente, p = pi e /3 < a^.

D

Denotando por d(n) o número de divisores do número natural n, segue, por uma con-tagem fácil, que se n = p"1 • • • pfT , onde p\ . . . , pr são números primos e cei , . . . , ar 6 IN ,então

d(n) = (ai + I)(a2 + 1) • • • (ar + 1).

Exemplo 7.1.1. A fórmula acima nos mostra que um número n = p"1 • • • pfT possui umaquantidade ímpar de divisores se, e somente se, cada ai é par, ou seja, se, e somente se, n éum quadrado perfeito.

Page 90: Elementos de aritmética   abramo hefez

§7. l Teorema Fundamental da Aritmética 85

Relacionado com esta propriedade, apresentamos a seguir uma brincadeira que costumafazer sucesso em sala de aula.

No vestiário de uma escola com n alunos, numerados de l a n, há n armários enfileira-dos em um corredor, também numerados de l a n. Um dia, os alunos resolvem fazer aseguinte brincadeira:

O primeiro aluno abre todos os armários. Em seguida, o aluno número 2 fecha todosos armários de número par. O aluno número 3 inverte as posições das portas dos armáriosde número múltiplo de 3. O aluno número 4 inverte as posições das portas dos armários denúmero múltiplo de 4, e assim sucessivamente. Pergunta-se, qual será a situação de cadaum dos armários após todos os alunos terem completado a brincadeira?

Para responder à pergunta, analisemos a situação do armário de número m. Com apassagem do primeiro aluno, a porta será aberta. Em seguida, a porta só será mexida peloaluno cujo número for o divisor seguinte dz (> d\ 1) de m e novamente só será mexidapelo aluno cujo número for o divisor seguinte cfe (> d-z) de m, e assim sucessivamente.Portanto, a situação da porta do m-ésimo armário será: aberto, fechado, aberto, fechado,. . . , altemando-se a medida que forem passando em ordem crescente os divisores de m.

Quando o n-ésimo aluno terminar a sua tarefa, teremos passado por todos os divisoresde m, pois se d é um divisor de m, então d < m < n. Portanto, a porta do m-ésimoarmário estará aberta ou fechada dependendo se o número de divisores de m é ímpar ou par.Consequeníemente, a porta do m-ésimo armário estará aberta se, e somente se, m for umquadrado perfeito.

A fatoração de números naturais em primos revela toda a estrutura multiplicativa dessesnúmeros, permitindo, entre muitas outras coisas, determinar facilmente o mdc e o mmc deum conjunto qualquer de números.

Teorema 7.1.2. Sejam a = p"1 • • -p%n e b = pf1 • • -pfr. Pondo

tem-se quef , , M _ «71 . . . _7» p [n ftl — r/1 • • • rfn\i °) — Pi Pn e Ia) °J — Pi Pn •

DEMONSTRAÇÃO: É claro, pela Proposição 7.1.2, que p]1 • • -plr é um divisor co-mum de o e ò. Seja c um divisor comum de a e 6; logo, c = p^1 • • -p^T, onde BÍ <min{a!j, @i} e, portanto, clpj1 • • • pnn - Do mesmo modo, prova-se a asserção sobre o mmc.

D

Exemplo 7.1.2. Dados a, b E IN*, vamos determinar para quais pares de números naturaisa e ò temos que [a, 6] = (a, 6)2.

Vimos no Problema 5.3.6(b) que, se a = ò2 ou ò = a2, vale a igualdade acima. Vamosprovar que a equação [a, 6] = (a, 6)2 tem muitas outras soluções além dessas.

Page 91: Elementos de aritmética   abramo hefez

86 7. Números Primos

Sejam a = p" l • • -p%n e b = p^1 • • -p^n. A igualdade

[a,ò] = (a,6)2

nos diz quemaxíoíí,/?,} = 2m.in{ai,/3i}, i = l,...,n.

Isto equivale a dizer que

V f = l, . . . , n, ai = 2$ ou $ = 2^.

Por exemplo, se a = 225 e 6 = 2 • 52, então [a, 6] = 2252 e (a, 6) = 2 • 5, o que mostraque a e 6 formam uma solução da equação [a, 6] = (a, ò)2.

Em geral, a equação [a, b] = (a, 6)r tem por solução pares de números a = p"1 • • -p%n

e b = PI • • • pn tais que, para todo i = l, . . . , n, tem-se que a>i = rfy ou fa = r<Xi.

Exemplo 7.1.3. Dados dois números naturais d e m, vamos resolver em X, Y, nos natu-rais, o sistema de equações:

(X,Y)=d, [X,Y] = m.

É claro que uma condição necessária para que o sistema tenha solução é que d\m. Estacondição é também suficiente, pois (m, d) = d e [m, d] = m.

Portanto, limitaremos a nossa análise para o caso em que d\m.Escrevamos as decomposições de d e m em fatores primos:

f] — n*1 . . . rTIr m — <nSl ... <nSra — Pi Pr J m — Pi Pr )

onde 7j < <5j. Então, pelo Teorema 7.1.2, temos que X = a e Y = 6 é uma solução dosistema se, e somente se,

a = p?...p? b = £•-.#,

ondee i= maxi , , = , . . . , r.

Portanto, temos para a uma ou duas escolhas para ai, segundo se % = ôi, ou se 7» ^ <Jj.Conseqiientemente, temos 2S escolhas para a, onde

Como, para cada escolha de a, o número 6 é univocamente determinado, temos que oproblema admite 2S soluções. Se ainda quisermos identificar uma solução a, & com 6, a,devemos dividir o número 2S por 2, obtendo 2S-1 soluções.

Page 92: Elementos de aritmética   abramo hefez

§7.1 Teorema Fundamental da Aritmética 87

Exemplo 7.1.4. Seja n > 4 um número natural composto; vamos provar que n\(n — 2)!Provaremos inicialmente que n\(n — 1)!.De fato, suponha que n = nin-2 com n\ n e n^ < n. Se n\ n-z, podemos supor

que n\ n-z, e portanto,

(n-l)! = l - - - n 1 - - - n 2 - - - ( n - l ) ,

o que mostra que n\(n — 1)!, neste caso.Suponhamos que n\ n^ > 2. Logo,

(n - 1)! = l • • • m • • • 2ni • • • (n - 1),

o que implica também que n(= n\n\) divide (n — 1)!.Agora, note que (n, n — 1) = l e que n\(n — 1}\(n — 1); portanto, n\(n — 2)!.

A propriedade acima pode ser generalizada como segue:

Sejam n > 4 composto e p o menor número primo que divide n; então, n\ — p)\e fato, temos que (n — l, n) = l,... (n — 2, ri) = l,... (n — (p — 1), n) = 1. Logo,

segue que ((n — l)(n — 2) • • • (n — p + 1),n) = l, o que, em vista do fato de n\(n — 1)!,acarreta o resultado.

Problemas

7.1.1 Ache os possíveis valores de n, m € IN de modo que o número 9m10n tenha:a) 27 divisores b) 243 divisores.

7.1.2 Qual é a forma geral dos números naturais que admitem:a) um só divisor além de l e dele próprio?b) um número primo de divisores?

7.1.3 Sejam a, 6 € IN*, com (a, 6) = 1. Mostre que, se ab é um quadrado, então a e b sãoquadrados.

7.1.4 (ENC-2002) Qual é o menor valor do número natural n que torna n\l por1000?

7.1.5 Com quantos zeros termina o número 1000!? Qual é a potência de 3 que aparece nadecomposição de 1000! em faíores primos?

7.1.6 Mostre que existem infinitos valores de n e M para os quais 8n2 + 5 é divisível por77.

7.1.7 Mostre que a soma de todos os números naturais menores ou iguais a n divide o seuproduto se, e somente se, n + l é composto.

Page 93: Elementos de aritmética   abramo hefez

88 7. Números Primos

7.1.8 Usando a caracterização de mdc e mmc de dois números a e ò através da fatoraçãoem primos desses números, prove que (a, 6) [a, b] = ab.

7.1.9 Mostre que, se a, b e M e n 6 IN*, então (an, bn) = (a, b)n e que [an, 6"] = [a, 6]".

7.1.10 Seja p > l um número natural com a seguinte propriedade: Se p divide o produtode dois inteiros quaisquer, então p divide um dos fatores. Mostre que p é necessariamenteprimo.

7.1.11 Mostre que, se n e m são dois números naturais não nulos tais que (n, m) = l,então d(n • m) = d(n)d(m).

7.1.12* Mostre que, se n é composto, então o n-ésimo número de Fibonacci un é com-posto.

7.2 Sobre â Distribuição dos Números Primos

Quantos serão os números primos? Essa pergunta foi respondida por Euclides no LivroIX dos Elementos. Utilizaremos a mesma prova dada por Euclides, onde pela primeira vezse registra o uso de uma demonstração por redução ao absurdo em matemática. Essa provaé considerada uma das pérolas da matemática.

Teorema 7.2.1. Existem infinitos números primos.

DEMONSTRAÇÃO: Suponha que exista apenas um número finito de números primosPi, . . . , pr. Considere o número natural

Pelo Teorema 7. l . l , o número n possui um fator primo p que, portanto, deve ser um dosPi , . . . , pT e, consequentemente, divide o produto pip2 • • • pT • Mas isto implica que p dividel , o que é absurdo.

D

Agora que sabemos que existem infinitos números primos, nos perguntamos, inicial-mente, como podemos obter uma lista contendo os números primos até uma dada ordem.A seguir, apresentaremos um dos mais antigos métodos para elaborar tabelas de númerosprimos, devido ao matemático grego Eratóstenes, que viveu por volta de 230 anos antes deCristo. O método, chamado de Crivo de Eratóstenes, permite determinar todos os númerosprimos até a ordem que se desejar, mas não é muito eficiente para ordens muito elevadas.

Por exemplo, vamos elaborar a tabela de todos os números primos inferiores a 120.

Page 94: Elementos de aritmética   abramo hefez

§7.2 Sobre a Distribuição dos Números Primos 89

Escrevem-se todos os números naturais de 2 a 120. Riscam-se, de modo sistemático,todos os números compostos da tabela, seguindo o roteiro abaixo.

Risque todos os múltiplos de 2 acima de 2, já que nenhum deles é primo.O segundo número não riscado é 3, que é primo. Risque todos os múltiplos de 3 maiores

do que 3 pois esses não são primos.O terceiro número não riscado que aparece é 5, que é primo. Risque todos os múltiplos

de 5 maiores do que 5 pois esses não são primos.O quarto número não riscado que ora aparece é 7, que é primo. Risque todos os

múltiplos de 7 maiores do que 7 pois esses não são primos.

Será necessário prosseguir com este procedimento até chegar a 120? A resposta é não ese baseia no seguinte resultado devido ao próprio Eratóstenes.

Lema 7.2.1. Se um número natural n > l não é divisível por nenhum número primo p talque p2 < n, então ele é primo.

DEMONSTRAÇÃO: Suponhamos, por absurdo, que n não seja divisível por nenhumnúmero primo p tal que p2 < n e que não seja primo. Seja q o menor número primo quedivide n; então, n = qn\, com q < n\. Segue daí que q2 < qn\ n. Logo, n é divisívelpor um número primo q tal que g2 < n, absurdo.

D

Portanto, na nossa tabela de números de 2 a 120, devemos ir até alcançarmos o primo7, pois o próximo primo é 11, cujo quadrado supera 120.

1325374961733597109

2y426985062n8698

1X0

31/5W995163?59799

1X1

AVá2S40&WW98

1001X2

517294153CS?789101113

fiW30425466?890

1021X4

719314356677991103

1X5

A2092f456688092

1041X6

y921934557698193

1051X7

M)22944658?o9294

1061X8

1123354759718395107

1X9

VI24364S60Tfl9496

108120

Note que o Lema 7.2. l também nos fornece um teste de primalidade, pois, para verificarse um dado número n é primo, basta verificar que não é divisível por nenhum primo p quenão supere ^/n.

Tanto o crivo de Eratóstenes para gerar números primos, quanto o teste de primalidadeacima descrito, são extremamente lentos e trabalhosos. Muitos progressos têm sido feitos

Page 95: Elementos de aritmética   abramo hefez

90 7. Números Primos

nessa direção1 .

Uma questão importante que se coloca é de como os números primos se distribuemdentro dos números naturais. Em particular, qual pode ser a distância entre dois primosconsecutivos? Qual é a sua frequência?

Olhando para a tabela acima, nota-se que há vários pares de números primos quediferem de duas unidades. Esses são: (3,5), (5,7), (11,13), (17,19), (41,43), (59, 61), (71,73), (101, 103), (107, 109).

Pares de números primos com esta propriedade são chamados de primos gémeos. Até opresente momento, ainda não se sabe se existem infinitos pares de números primos gémeos.

Por outro lado, em contraste com esses pares de primos consecutivos muito próximos,existem primos consecutivos arbitrariamente afastados.

De fato, dado n, a sequência

(n + 1)! + 2, (n + 1)1 + 3, . . . , (n + 1)! + n + l

de números naturais é formada por n números consecutivos compostos.Portanto, a resposta à primeira pergunta é que não há nenhum padrão que descreva o

quanto dois primos consecutivos estão longe um do outro.

Quanto à segunda pergunta, é necessário formalizar o conceito de frequência de primos,que é a mesma coisa que probabilidade. Denotemos, por TC(X), a quantidade de númerosprimos menores ou iguais a x. Portanto, a probabilidade de que um elemento do conjunto{l, . . . , x} seja primo é dada por

x

Como este quociente é uma função bastante complexa, o que se gostaria de fazer é acharuma função de comportamento bem conhecido que se aproxima do quociente acima para nsuficientemente grande.

Legendre e Gauss, analisando tabelas, chegaram à conclusão de que este quociente tem

a ver com - — . Por volta de 1900, J. Hadamard e Ch. de Ia Valleè-Poussin, independen-Ino;

temente, provaram o profundo resultado chamado de Teorema dos Números Primos e cujoenunciado simplesmente é

r = Lx~>oo x \lnor/

'Veja, por exemplo, o livro: Primalidade em Tempo Polinomial de S. C. Coutinho, Coleção IniciaçãoCientífica, Sociedade Brasileira de Matemática

Page 96: Elementos de aritmética   abramo hefez

§7.2 Sobre a Distribuição dos Números Primos 91

Em 1949, A. Selberg simplificou substancialmente a prova do Teorema dos NúmerosPrimos, merecendo por esse seu trabalho a Medalha Fields2.

A distribuição dos números primos é algo ainda bastante misterioso e a ela estão asso-ciados muitos problemas em aberto. Por exemplo, o já citado problema de saber se existeminfinitos números primos gémeos. Listamos abaixo alguns problemas em aberto acerca dadistribuição dos números primos:

1) Sempre existe um número primo entre n2 e (n + l)2 para qualquer n € IN*?

2) Para n = O, l , . . . , 40, tem-se que n2 — n + 41 é primo. Existem infinitos números pri-mos dessa forma?

3) A sequência de Fibonacci contém infinitos números primos?

Uma outra curiosidade matemática, ainda em aberto, é a famosa conjectura que Gold-bach formulou a Euler em 1742 e que afirma que todo número natural par maior do que3 pode ser escrito como soma de dois números primos. O matemático russo Ivan Vino-gradov, em 1937, demonstrou o difícil teorema que garante que todo número natural ímpar,suficientemente grande, pode ser escrito como soma de, no máximo, três números primos.

Esse tipo de problema, que relaciona as estruturas aditiva e multiplicativa de IN, emgeral é muito difícil.

Finalmente, não podemos deixar de mencionar o mais importante problema em abertoem Teoria dos Números: a Hipótese de Riemann. Trata-se de uma conjectura formuladapor Riemann e que está muito além do material aqui exposto. Esta conjectura, ao contráriodo Último Teorema de Fermat3, tem uma multitude de consequências, cuja confirmaçãoapenas depende da prova do resultado. Se provado o teorema, muitos dos mistérios dosnúmeros primos serão revelados, o que deixará o seu realizador num destacado lugar entreos imortais da matemática.

Problemas

7.2.1 Quais dos números abaixo são primos?a) 239 b) 241 c) 247 d) 253 e) 1789

7.2.2 (ENC-98) Uma das afirmativas abaixo sobre números naturais é FALSA. Qual é ela?(A) Dado um número primo, existe sempre um número primo maior do que ele.

"Até recentemente, a Medalha Fields era a maior distinção dada a um indivíduo por sua contribuição àMatemática. Em 2003, foi outorgado, pela primeira vez, o Prémio Abel para a Matemática, correspondente aoprémio Nobel para as outras áreas, e que foi conferido ao matemático francês Jean Pierre Serre, que tambémfoi vencedor da Medalha Fields em 1954. Serre realizou importantes trabalhos em Teoria dos Números.

3Veja a nota histórica no final do capítulo.

Page 97: Elementos de aritmética   abramo hefez

92 7. Números Primos

(B) Se dois números não primos são primos entre si, um deles é ímpar.(C) Um número primo é sempre ímpar.(D) O produto de três números naturais consecutivos é múltiplo de 6.(E) A soma de três números naturais consecutivos é múltiplo de três.

7.3 Pequeno Teorema de Fermat

Desde, pelo menos, 500 anos antes de Cristo, os chineses sabiam que, se p é um númeroprimo, então p\1p — 2. Coube a Pierre de Fermat, no século XVH, generalizar este resultado,enunciando um pequeno mas notável teorema que se constitui no resultado central destaseção.

Para demonstrar o Teorema de Fermat, necessitaremos do lema a seguir.

/V\a 7.3.1. Seja p um número primo. Os números l .], onde O < i < p, são todosW

divisíveis por p.

DEMONSTRAÇÃO: O resultado vale trivialmente para i = 1. Podemos, então, suporl < i < p. Neste caso, i\\p(p — 1) • • • (p — i + 1). Como (i\,p) = l, decorre quei\\(p — 1) • • • (p — i + 1), e o resultado se segue, pois

(O-D

Teorema 7.3.1 (Pequeno Teorema de Fermat). Dado um número primo p, tem-se que pdivide o número ap — a, para todo a € IN.

DEMONSTRAÇÃO: Vamos provar o resultado por indução sobre a. O resultado valeclaramente para a = l, pois p|0.

Supondo o resultado válido para a, iremos prová-lo para a+ 1. Pela fórmula do binómiode Newton,

(a + - (a + 1) = ap - a + (^V'1 + • • • + ( P_ Já.

Como, pelo Lema 7.3.1 e pela hipótese de indução, o segundo membro da igualdadeacima é divisível por p, o resultado se segue.

D

Exemplo 7.3.1. Dado um número qualquer n € IN, tem-se que n9 e n, quando escritosna base 10, têm o mesmo algarismo da unidade.

Page 98: Elementos de aritmética   abramo hefez

§7.3 Pequeno Teorema de Fermat 93

A afirmação acima é equivalente a 10|ra9 — n. Como n9 e n têm a mesma paridade,segue-se que n9 — n é par; i.e, 2|n9 — n.

Por outro lado,

n9 - n = n(n4 - 1)(«4 + 1) = (n5 - n)(n4 + 1).

Logo, pelo Pequeno Teorema de Fermat, temos que 5|n5 — n e, portanto, 5|n9 — n.Tem-se, então, que 10|n9 — n.

Corolário. Se p é um número primo e se o, é um número natural não divisível por p,então p divide ap~l — 1.

DEMONSTRAÇÃO: Como, pelo Pequeno Teorema de Fermat, p\a(ap~l — 1) e como(a, p) = l, segue-se, imediatamente, que p divide ap~1 — 1.

D

O Corolário acima também será chamado de Pequeno Teorema de Fermat.

Note que o Pequeno Teorema de Fermat nos fornece um teste de não primalidade. Defato, dado m € JN, com m > l, se existir algum a € IN, com (a, m) = l, tal quem J(am~l — l, então m não é primo.

Os chineses achavam também que se m era composto, então m J(2m — 2, uma recíprocado Teorema de Fermat, no caso a = 2. Muitos matemáticos acreditavam neste resultado,até que, em 1819, Sarrus mostrou que o número 341(= 31 x 11) divide 2341 — 2.

Poder-se-ia perguntar se vale a recíproca mais restritiva do Pequeno Teorema de Fermat:Dado um inteiro m > l, a condição m\am~l — l para todo a €. IN tal que (a, m) = l,

acarreta, necessariamente, que m é primo?Veremos, no próximo exemplo, que isto também é falso.

Exemplo 7.3.2. Seja a 6 IN tal que (a, 3) = (a, 11) = (a, 17) = 1. Note que essacondição é equivalente a (a, 561) = l, pois 3-11-17 = 561.

Por outro lado,(a280,3) = (a56,11) = (a35,17) = l,

e, portanto, pelo Pequeno Teorema de Fermat, 3 divide (a280) — l = a560 — l, 11 divide

(a56)10 - l = o560 - l e 17 divide (a35)16 - l = a560 - 1.Segue-se daí que 561 divide a560 — l, para todo a tal que (a, 561) = l, sem que 561

seja primo.

Exemplo 7.3.3. O Pequeno Teorema de Fermat nos diz que

47|246-1.

Page 99: Elementos de aritmética   abramo hefez

94 7. Números Primos

Logo, temos que- 2 3

e como

47|(223-1)(22

(223-l,223 + l) = (223-l,2) = l,

segue-se que 47 divide um, e apenas um, dos números 223 — l ou 223 + 1.Como decidir qual dessas duas opções, acima, é verificada?

Em geral, o Pequeno Teorema de Fermat nos diz que se p > 2 é um número primo e aum número natural tal que p /a, então tem-se que

Como p é primo, tem-se que p i a 2 — 1 J ou p i a 2 + l J •Decidir qual das duas condições de divisibilidade, acima, ocorre, é, em geral, um pro-

blema difícil. No Capítulo 11, veremos como esta questão se relaciona de modo inesperadocom outra, envolvendo resíduos quadráticos (ou seja, certas equações diofantinas do se-gundo grau), através de um critério devido a Euler.

Problemas

7.3.1 Mostre que 421 a7 — a para todo número natural a.

7.3.2 Ache o resto da divisão de 12p-1 por p quando p é primo.

7.3.3 Mostre que, para todo n e IN, é natural o número

3 5 2 3 115 n + 3 n + 1 5 n -

7.3.4 Mostre que, para todo n e M, 15|3n5 + 5n3 + In.

7.3.5 Seja n € IN*. Mostre quea) Se 5 /n, 5 Jfn-1,5 J(n + l, então 5|rc2 + 1.b) Se 7 /n, 7 /n - l, 7 jfo3 + l, então 7|n2 + n + 1.

7.3.6 Sejam a, k e M*. Mostre que 7|a6fc - l, se (a, 7) = 1.

7.3.7 Mostre que a13 - a é divisível por 2, 3, 5, 7, 13 e 273, para todo a £ IN.

7.3.8 Mostre que a12 — ò12 é divisível por 13, se a e 6 são primos com 13. Mostre tambémque é divisível por 91, se a e 6 são primos com 91.

Page 100: Elementos de aritmética   abramo hefez

§7.3 Pequeno Teorema de Fermat 95

Problemas Suplementares

7.5.1 Se p e q são números primos p > q > 5, então 24|p2 — g2.

7.5.2 Todo primo da forma 3n + l é também da forma 6m + 1.

7.5.3 Mostre que o único número primo da forma n3 + l é 7.

7.5.4 O único número primo n tal que 3n + l é um quadrado é 5.

7.5.5 Seja k € IN, fc > 2. Mostre quea) Se & divide ai — l, 03 — l,. . . , ar — l, então A; divide 0102 • • • ar — 1.b) Se n > O, então existe um primo p tal que k /(p — 1) e p|(n& — 1).c) Existem infinitos primos p tais que k /(p — 1).

7.8.6 Mostre que existe uma correspondência biunívoca entre pares de primos gémeos enúmeros n tais que r? — l possui quatro divisores.

7.5.7 Mostre que o produto dos divisores de um inteiro positivo n é ns/2, onde s é onúmero de divisores de n.

7.5.8 Prove que, se r é o número de fatores primos distintos de n € IN*, o número demodos em que n pode ser fatorado como produto de dois números relativamente primos éT~-1.

7.5.9 Seja n > 2. Mostre que entre nenl existe pelo menos um número primo.

7.5.10 Mostre que sep,p + 2ep + 4 são primos, então p = 3.

7.5.11 a) Sejam m, n 6 IN de paridade distinta. Mostre que 3|am — a".b) Seja p > 3 um número primo. Mostre que ap — a e apb — W a são sivisíveis por 6p, paratodos a, 6 M, com a > b.

7.5.12 Sejam a, b E IN, com (a, b) = l, e n e IN tal que n + 2 = p é um número primo.Mostre que o mdc de a + b e a2 — nab + b2 deve ser l ou p.

7.5.13 Seja p um número primo ímpar. Mostre que pode-se escrever p = y2 — x2, comz, y S M, de modo único.

7.5.14 Sejam a, 6, n, m 6 IN* e suponha que a71 + 6m seja um número primo. Mostre que(n, m) = l, ou (n, m) = 2r, para algum r € IN.

Page 101: Elementos de aritmética   abramo hefez

96 7. Números Primos

7.4 O Renascimento da Aritmética

A Renascença, movimento ocorrido entre os séculos XIII e XV na Europa, cujas ca-racterísticas principais foram a luta contra os preconceitos da época e a redescoberta e aleitura dos clássicos gregos, teve por consequência uma revolução nas artes, na ciência enos costumes.

Este movimento atingiu a Matemática um pouco mais tardiamente. Em 1575, Re-giomanto traduziu para o latim o tratado Aritmética, de Diofanto. Em 1621, Bachet deMéziriac publicou uma edição francesa que se tornaria protagonista de uma das mais ricashistórias de toda a Matemática.

Por esta época, ocorre o renascimento da aritmética, na acepção de Platão, essencial-mente por obra do jurista francês Pierre de Fermat (1601-1665). Na época, era comum osmatemáticos não divulgarem as demonstrações dos resultados que descobriam, lançando-oscomo desafio para outros. Os resultados de Fermat foram divulgados por meio de sua cor-respondência, principalmente com o padre Marin Mersenne, que desempenhava o papel dedivulgador da Matemática. Numa de suas cartas de 1640, Fermat enunciou o seu PequenoTeorema, dizendo que não escreveria a demonstração por ser longa demais.

Fermat descobriu vários teoremas em Teoria dos Números, mas a sua contribuição maismarcante foi a anotação que deixou na margem do Problema 8, Livro 2, de sua cópia deBachet da Aritmética de Diofanto, onde se encontravam descritas as infinitas soluções daequação pitagórica X2 + Y2 = Z2. Fermat escreveu: "Por outro lado, é impossível sepa-rar um cubo em dois cubos, ou uma biquadrada em duas biquadradas, ou, em geral, umapotência qualquer, exceto um quadrado em duas potências semelhantes. Eu descobri umademonstração verdadeiramente maravilhosa disto, que todavia esta margem não é suficien-temente grande para cabê-la."

Esta afirmação de Fermat, apesar de não demonstrada por ele, acabou sendo chamadade Último Teorema de Fermat. Passaram-se mais de 350 anos e muita matemática foidesenvolvida para que, em 1995, o matemático inglês Andrew Wiles desse uma prova,encerrando este glorioso capítulo da história da Matemática.

Um outro problema cuja solução desde há muito era procurada pelos matemáticos é adeterminação de fórmulas geradoras de números primos. Fermat morreu com a convicçãode que a expressão 22" + l representava sempre um número primo, admitindo, no entanto,não ser capaz de prová-lo rigorosamente. Esta fórmula produz números primos para n =O, l, 2,3 e 4, mas a crença de Fermat revelou-se posteriormente falsa com a apresentaçãode uma fatoração de 225 + l por Leonhard Euler. Este foi o mais importante matemático

>

do século 18 e que provou todos os resultados de Fermat, exceto, obviamente, o UltimoTeorema, do qual mostrou que X3 + Y3 — Z3 e X4 + y4 = Z4 (este também provado porFermat) não admitem soluções em inteiros positivos.

Page 102: Elementos de aritmética   abramo hefez

8Números Especiais

Neste Capítulo, estudaremos algumas propriedades de certos números primos que pos-suem formas especiais e de certos números que possuem propriedades especiais.

8.1 Primos de Fermat e de Mersenne

Nesta seção, estudaremos alguns tipos de números primos especiais famosos. O primeiroresultado relaciona-se com os números conhecidos como números de Fermat em home-nagem a Pierre de Fermat (1601-1665), jurista francês e matemático amador. Após Euclidese Eratóstenes, Fermat é considerado o primeiro matemático a contribuir para o desenvolvi-mento da Teoria dos Números do ponto de vista teórico. Muitos dos resultados e problemasdeixados por Fermat motivaram o extraordinário avanço da Matemática.

Proposição 8.1.1. Sejam a e n números naturais maiores do que 1. Se an + l é primo,então a é par e n = 1m, com m € IN.

DEMONSTRAÇÃO: Suponhamos que an + l seja primo, onde a > l e n > 1. Logo, atem que ser par, pois, caso contrário, a" + l seria par e maior do que dois, o que contrariao fato de ser primo.

Se n tivesse um divisor primo p diferente de 2, teríamos n = n'p com n' E IN*.Portanto, pela Proposição 3.1.8, a"' +1 dividiria (an')p +1 = an +1, contradizendo o fatodesse último número ser primo. Isto implica que n é da forma 2m.

D

Os números de Fermat são os números da forma

Fn = l2" + 1.

Em 1640, Fermat escreveu em uma de suas cartas que achava que esses números eramtodos primos, baseado na observação de que FI = 5, F?. = 17, F$ = 257, F$ = 65537são primos.

97

Page 103: Elementos de aritmética   abramo hefez

98 8. Números Especiais

Em 1732, Leonhard Euler mostrou que

F5 = 225 + l = 4.294.967.297 = 641 • 6700417,

portanto, composto (veja Exemplos 9.2.2 e 10.1.4), desmentindo assim a afirmação de Fer-mat.

Os números de Fermat primos são chamados de primos de Fermat. Até hoje, não se sabese existem outros primos de Fermat além dos quatro primeiros. Conjecturou-se (Hardy eWright) que os primos de Fermat são em número finito.

Um resultado que já provamos acerca desses números, Corolário da Proposição 6.2.3, éo seguinte:

(Fn, Fm) = l, sen^m.

Note que esse resultado nos fornece uma outra prova de que existem infinitos númerosprimos, pois cada número de Fermaí tem pelo menos um divisor primo (Teorema 7.1.1) eesses divisores primos são todos distintos.

O resultado que se segue relaciona-se com outros números primos também famosos.

Proposição 8.1.2. Sejam a e n números naturais maiores do que L Se an — l é primo,então a = 2 e n é primo.

DEMONSTRAÇÃO: Suponhamos que an — l seja primo, com et > l e n > 1.Suponhamos, por absurdo, que o > 2. Logo, a — l > l e a — l|a" — l (Proposição

3.1.7), e, portanto, an — l não é primo, contradição. Conseqiientemente, a = 2.Por outro lado, suponha, por absurdo, que n não é primo. Temos que n — rs com r > l

e s > 1. Como 2r — l divide (2r)s — l = 2n — l (novamente, Proposição 3.1.7), segue que2" — l não é primo, contradição. Logo, n é primo.

D

Os números de Mersenne são os números da forma

onde p é um número primo.No intervalo 2 < p < 5000 os números de Mersenne que são primos, chamados de

primos de Mersenne, correspondem aos seguintes valores de p: 2, 3, 5, 7, 13, 19, 31, 61,89, 107, 127, 521, 607, 1279, 2203, 2281, 3217, 4253 e 4423. Até dezembro de 2001, omaior primo de Mersenne conhecido era Mi34669i7> que possui no sistema decimal 4053946dígitos, e é o trigésimo nono primo de Mersenne conhecido.

Enunciaremos a seguir, sem demonstração, um resultado profundo devido ao matemáticoalemão do século dezenove Lejeune Dirichlet:

Page 104: Elementos de aritmética   abramo hefez

§8.1 Primos de Fermat e de Mersenne 99

Teorema (de Dirichlet). Em uma PA de números naturais, com primeiro termo e razãoprimos entre si, existem infinitos números primos.

A demonstração deste resultado é muito difícil e pertence à teoria analítica dos números.No entanto, demonstraremos alguns casos particulares de teorema. O primeiro caso parti-cular é o seguinte:

Proposição 8.1.3. Na progressão aritmética 3, 7,11,15,..., 3 + 4n,... existem infinitosnúmeros primos.

DEMONSTRAÇÃO: Trata-se de mostrar que existem infinitos números primos da forma4n + 3.

Inicialmente, note que todo primo ímpar é da forma 4ra + l ou 4n + 3.Em seguida, observemos que o conjunto A = {4n + 1; n € IN} é fechado multiplicati-

vamente. De fato,(4n + l)(4n' + 1) = 4(4nn' + n + n') + l.

Suponhamos agora, por absurdo, que haja apenas um número finito de números primosPi < • • • < Pk da forma 4n -f- 3, com n > 1. O número a = 4(pi • pi • • -pk) + 3 não édivisível por nenhum dos números primos 3,pi,... ,pk e, portanto, sua decomposição emfatores primo só pode conter primos da forma 4n + 1. Consequentemente, a é da forma4n + l, o que é uma contradição, pois é da forma 4ra + 3.

D

Mostrar que existem infinitos primos da forma 4n + l é um pouco mais sutil e seráprovado a seguir.

Antes, porém, provaremos um lema que será necessário para a prova do resultado.

Lema 8.1.1. Seja x e IN*, com x > 2. Todo divisor ímpar de x2 + l é da forma 4n + l.

DEMONSTRAÇÃO: Inicialmente, provaremos que todo divisor primo p ^ 2 de x2 +1 é daforma 4n + 1. O resultado, em geral, seguirá disso, pois o conjunto A = {4n + 1; n E M}é fechado multiplicativamente (provamos isso no decorrer da demonstração da Proposição8.1.3).

Suponhamos, então, que p\x2 +1, com p primo maior do que 2. Temos que (p —1)/2 eM e, para algum A € IN, que x2 + l = \p. Consequentemente,

x2 = Xp - l.

Elevando à potência (p — l)/2 ambos os lados da igualdade acima, temos, para algunsH, fj,' 6 M, que (veja o Problema 2. l .6)

fj,p+Lj se ^y-e par

fj!p — l, se £^Í é ímpar

Page 105: Elementos de aritmética   abramo hefez

100 8. Números Especiais

Sexp~l = fj.'p— l,

subtraindo l de ambos os lado, teríamos que

xp~l - l = p'p - 2. (8.1)

Comop|a;2 + l, segue que p j ( x (justifique!). Logo, pelo Pequeno Teorema de Fermat,temos que p\xp~l — lê, conseqiientemente, por (8.1) p|2, o que é uma contradição.

p- lPortanto, a única alternativa possível é que —-— seja par, o que implica que p é da

forma 4n + 1.

nProposição 8.1.4. Na progressão aritmética l, 5,9,13,17,..., 4n +1,... existem infinitosnúmeros primos.

DEMONSTRAÇÃO: Suponha, por absurdo, que haja um número finito pi,... ,pk de pri-mos da forma 4n + 1. Considere o número

Como pi / a, para todo « = !,...,&; logo, todo divisor primo de a é da forma 4n + 3,o que é um absurdo, em vista do Lema 8.1.1.

D

No Corolário da Proposição 10.1.5, provaremos outro caso particular do teorema deDirichleí, cuja prova requererá mais instrumentos do que dispomos no momento.

Problemas

8.1.1* Mostre que todo divisor de um número de Fermat Fn é da forma 4m + 1.

8.1.2 Se p e q são dois números primos distintos, mostre que

(MP,M,) = 1.

8.1.3 Sejam dados n, m G M,

a) Mostre que, se m < n, então Fm\Fn — 2.

b) Dê uma outra prova para: (Fn, Fm) = l, se n m.

8.1.4 Mostre que existem infinitos números primos da forma 6n + 5.

8.1.5 Mostre que existem infinitos números primos da forma 3n + 2.

8.1.6* Seja pn o n-ésimo número primo. Mostre que pn < 22"~ + 1.

8.1.7* Considere a sequência de Fibonacci (un). Mostre que, se n é ímpar, então osdivisores ímpares de un são da forma 4& + 1.

Page 106: Elementos de aritmética   abramo hefez

§8.2 Números Perfeitos 101

8.2 Números Perfeitos

Seja n um número natural maior do que 1. Denotemos por S (n) a soma de todos osseus divisores. Note que 5(0) não está definido e que 5(1) = 1.

Se n > 2, o próximo resultado nos fornecerá uma fórmula para S(n) em função dadecomposição de n em fatores primos.

Proposição 8.2.1. Sejan=p^1 • • -p^T, ondepi,. . . ,pr são números primos e a\,. . . ,ar GIN*. Então,

«1+1 _ 1 Or + l _ 1

5(n) = a - -!...£ - -i.Pi ~ l Pr ~ l

DEMONSTRAÇÃO: Considere igualdade

onde o somatório do lado direito da igualdade é tomado sobre todas as r-uplas (/?i, . . . , /3r)ao variar de cada $ no intervalo O < /3j < «j, para i = O, . . . , r. Como tal somatório, pelaProposição 7.1.2, representa a soma de todos os divisores de n, a fórmula para S (n) resultaaplicando a fórmula da soma de uma progressão geométrica a cada soma do lado esquerdoda igualdade acima.

D

Segue-se imediatamente do resultado acima, o seguinte corolário.

Corolário. A Junção S(n) é multiplicativa; isto é, se (n, m) = l, então S(n • m) —S(n)S(m).

22-lExemplo 8.2.1. 5(3) = - — - = 4.

£ ~~~ JL

•?2 _ l Q2 _ i= 5(2.3) = — — = 12.

2S(18) = 5(2 - 32) = f = 39.

5(28) = 5(22 • 7) = |fl íf^ = 56.

5(45) = 5(32 - 5) = fi = 78.

Note que 5(18) = 39 48 = 5(3)5(6); e, portanto, a conclusão do corolário acimanão vale se (n, m) ^ 1.

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102 8. Números Especiais

Os números como 6 e 28, com a propriedade de serem iguais à metade da soma deseus divisores, tiveram o poder de fascinar os gregos antigos, que os chamaram de númerosperfeitos.

Mais precisamente, um número n é chamado de número perfeito se S(n) = In. Ouainda, se o número é igual à soma dos seus divisores distintos dele mesmo.

Até a Idade Média, conheciam-se apenas os seguintes números perfeitos: 6, 28, 496,8128 e 33550336.

Atualmente, conhecem-se mais alguns números perfeitos. Um fato curioso é que todosos números perfeitos conhecidos são pares. Não se sabe nada sobre a existência ou não denúmeros perfeitos ímpares. O teorema que enunciaremos abaixo, parte devida a Euclidese parte devida a Euler, caracterizará os números perfeitos pares, relacionando-os com osnúmeros de Mersenne definidos na seção anterior. Antes, porém, daremos um pequenolema.

Lema 8.2.1. Seja n 6 IN*. Tem-se que S(n) = n + l se, e somente se, n é um númeroprimo.

DEMONSTRAÇÃO: Se S (ri) = n + l, segue-se que n > l e que os únicos divisores de nsão l e n; logo, n é primo.

n2 -lReciprocamente, se n é primo, da Proposição 8.2.1, segue-se que S (n) =

n — ln + 1.

D

Teorema 8.2.1 (Euelides-Euler). Um número natural n é um número perfeito par se, esomente se, n = 2P~Í(2P — 1), onde 2P — l é um primo de Mersenne.

DEMONSTRAÇÃO: Suponha que n = 2p~l (2p — 1), onde 2P — l é um primo de Mersenne.Logo, p > l, e, conseqiientemente, n é par.

Como V — l é ímpar, temos que (2p~l, 2P - 1) = 1. Logo, pela Proposição 8.2.1, oseu corolário e o Lema 8.2.1, segue-se que

S(n) = S(2p~l(2p - 1)) = S(2p~l)S(2p - 1) = Ç— 2P = 2n.£* J.

Portanto, n é perfeito.Reciprocamente, suponha que n é perfeito e par. Seja 2p~l a maior potência de 2 que

divide n. Logo, p > l e n = 2p~lb com 6 ímpar. Temos, então, que (2P~1, 6) = l e, pelaProposição 8.2.1 e o seu corolário, segue-se que S (n) = (2P — 1)5(6). Como S (n) = 2n,segue-se que

(2p - 1)5(6) = 2pb. (8.2)

Page 108: Elementos de aritmética   abramo hefez

§8.2 Números Perfeitos 103

Daí segue-se que (2? - 1)|6 pois (2?, 2? - 1) = 1. Logo, existe c € M com c < 6 talque

6 = c(2p - 1). (8.3)

Substituindo (8.3) em (8.2), segue-se que

(2p - 1)5(6) = 2p(2p - l)c;

portanto,5(6) = 2pc. (8.4)

De (8.3) temos que c e 6 são dois divisores distintos de 6 tais que c + 6 = 2pc.Nesta situação, c = 1. De fato, suponha, por absurdo, que c ^ 1. Temos, então, que

5(6) > l + c + 6>c- |-6 = 2pc. Disto e de (8.4) segue-se que

2pc = c + b < 5(6) = 2pc,

contradição.Portanto, de (8.3) e (8.4) segue-se que 5(6) =6+1. Logo, pelo Lema 8.2.1, 6 é primo.

Temos, assim, que n = 2P~1(2P — 1) com 2P — l primo.

D

A primeira parte da demonstração do teorema acima, sem dúvida a mais fácil, já seencontra nos Elementos de Euclides (Proposição 36, livro IX). A recíproca data do século18 e é devida a Euler. O fato do número 2P — l, no enunciado do teorema, ser um númeroprimo de Mersenne, implica que p é primo. Note, ainda, que o teorema reduz a existênciaou não de um número infinito de números perfeitos pares ao problema análogo para primosde Mersenne.

Problemas

8.2.1 Mostre que a soma dos inversos dos divisores de um número perfeito par é sempreigual a 2.

8.2.2 Seja an = 22n(22n+1 - 1). Mostre por indução sobre n que

a2n+l = 256a2n_i + 60(16"),

= 256a2n + 240(16n).

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104 8. Números Especiais

8.3 Decomposição do Fatorial em Fatores Primos

Nesta Seção, iremos mostrar como achar a fatoração em números primos de n\, onde né um número natural arbitrário.

Por conveniência, vamos designar pelo símbolo — o quociente da divisão de b por a,L«J

na divisão euclidiana.

Note, para uso futuro, que, se a > b, então - =0.L«J

Temos a seguinte propriedade relacionada com os quocientes da divisão euclidiana:

Proposição 8.3.1. Sejam a 6 IN e 6, c E IN*. Temos que

[[f]' a

DEMONSTRAÇÃO: Sejam

9, [ <2~j

6Je 09 = [f]

Logo,a = bq\ TI , com r\ l

Lb\ qi = ' com r2 - c ~

Portanto,

Comobrz + TI < b(c — 1) + b — l = 6c — l,

segue-se que ca é o quociente da divisão de a por bc, ou seja,

«•-ta-D

O que acabamos de provar enuncia-se com palavras como: O quociente da divisão porc do quociente da divisão de a por b é igual ao quociente da divisão de a por b vezes c.

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§8.3 Decomposição do Fatorial em Fatores Primos 105

Dados um número primo p e um número natural m, vamos denotar por Ep(m) o ex-poente da maior potência de p que divide m, ou seja, é o expoente da potência de p queaparece na fatoração de m em fatores primos.

Em particular, Ep(n\) representará a potência de p que aparece na fatoração de n! emfatores primos.

Teorema 8.3.1 (Legendre). Sejam n um número natural e p um número primo. Então,

Ef(^=[í\ \^} + \^]+'"

DEMONSTRAÇÃO: Note, inicialmente, que a soma acima é finita, pois existe um númeron

natural r tal que p1 > n para todo i > r (veja Lema 2.3.1); portanto, — = O, se i > r.b* J

Vamos demonstrar o resultado por indução sobre n. A fórmula vale trivialmente paran = 0. Suponha que o resultado vale para qualquer natural m com m < n. Sabemos queos múltiplos de p entre l e n são

p, 1p[n]

, . . . , - p.LPJ

Portanto,

*">-[=]+*([=]')•Pela hipótese de indução, temos que

í-1[P\P

O resultado, agora, decorre da Proposição 8.3.1.

D

Na prática, é fácil calcular Ep(n\). Isto se faz com o uso do seguinte algoritmo:n = pq\ TIq\ pqi + r-2

qs-l = pqs + rs.Como q\ q? > • • • , segue-se que, para algum s, tem-se que qs < p. Portanto,

segue-se queEp(n\) =qi+qz + ---+qs-

Page 111: Elementos de aritmética   abramo hefez

106 8. Números Especiais

Exemplo 8.3.1. Vamos determinar a decomposição de 10! em fatores primos e descobrircom quantos zeros termina a representação decimal desse número.

Para resolvermos o problema, deveremos achar EP(10\) para todo primo p < 10.Sendo E2(10!) =5 + 2 + 1-8, #3(100 = 3 + 1 = 4, #5(100 = 2, #7(10!) = !,

segue-se que10! = 2834527.

Conseqiientemente, como há dois fatores iguais a 5 e oito fatores iguais a 2 na decom-posição de 10! em fatores primos, vê-se, imediatamente, que 10! termina com dois zeros.

Para extrairmos um corolário do teorema acima, necessitaremos do seguinte lema.

Lema 8.3.1. Sejam ai , . . . , am, b números naturais, com 6^0. Tem-se que

[ai -i ham1 ron faml[ b J - U J l b J"

DEMONSTRAÇÃO: Sejam % e TÍ respectivamente o quociente e o resto da divisão de a^por b para i = l, . . . ,m. Somando, membro a membro, as igualdades <Zj = bqi + r i,segue-se que

ai -l ----- \-am = (qi-\- h <?m)& + n H ----- 1- rm.

Segue-se daí que o quociente da divisão de ai + • — h am por b é maior ou igual do que9i + • • • + 9m> P°ÍS ri + • • ' + rm poderia superar 6 — 1. Isto é o que se queria provar.

D

Corolário. Se ai, . . . , am, 6 são números naturais com 6^0, então é natural o número

(ai -\: De fato, pelo Lema 8.3.1, para todo número primo p e todo número

natural i, temos que

ai + • • • + om"| foi _____

Somando, membro a membro, as desigualdades acima, obtemos que

Ep ((ai + ••• + o»)!) > #p(aiO + • • • + Ep(am\),

o que prova o resultado.

D

Page 112: Elementos de aritmética   abramo hefez

§8.3 Decomposição do Fatorial em Fatores Primos 107

O próximo resultado relacionará Ep (n!) e a representação p-ádica de n (i.e., a representaçãorelativa à base p).

Teorema 8.3.2. Sejam p, n e IN* com p primo. Suponha que

n = nrpr + nT-ipr~l -\- h- n\p + n0

seja a representação p-ádica de n. Então

= n-(p-1

DEMONSTRAÇÃO: Sendo O < ra; < p, temos que

r 2

Portanto,

nr - - + nr_i - — + ---- h ni =p — l p — l

+ nr_ipr~1 -i ----- h n\p + np - (n^ + nr_i H ----- h ni +

n — (no + n\ ----- h nr)J=i •

D

Problemas

8.3.1 Ache a decomposição em fatores primos de 100! e determine com quantos zerostermina a representação decimal desse número.

Page 113: Elementos de aritmética   abramo hefez

108 8. Números Especiais

8.3.2 a) Ache as maiores potências de 2 e de 5 que dividem 10000!.b) Determine com quanto zeros termina a representação decimal de 10000!.c) Ache a maior potência de 104 que divide 10000!.

8.3.3 Ache o menor valor de n, de modo que a maior potência de 5 que divide n! seja 584.Quais são os outros números que gozam dessa propriedade?

8.3.4 Mostre que não há nenhum número natural n tal que 37 seja a maior potência de 3que divida n!.

8.3.5 Dados ai, . . . , am e IN e ò 6 IN*, mostre que

m + • • • + m <-8.3.6 Mostre que, se m, n e IN são tais que (m, n) = l, então

8.3.7 Sejam m, n, 6 € IN com 6^0. Mostre que

(2m)!(2n)! ,e um numero natural.,m\n\(m + n)\8 Sejam n, m e IN; mostre que (n • m)! é divisível por [(n!)m, (m!)"].

8.3.9 Mostre que (n!)^"1)1 divide (n!)!.

8.3.10 Sejam n, ai, ... ar 6 IN e d = (ai , . . . , etr). Mostre que é natural o número

d(n - 1)!GI! • • -ar!

8.4 Euler, um Gigante da Matemática

Leonhard Euler (1707-1783) foi, sem dúvida, um dos maiores e mais férteis matemáti-cos de todos os tempos.

Euler nasceu na Suíça, perto da cidade de Basileia, filho de um modesto pastor protes-tante que nutria a esperança de que seu filho seguisse a mesma carreira.

Euler possuía uma grande facilidade para o aprendizado de línguas e uma prodigiosamemória, aliada a uma extraordinária habilidade para efetuar mentalmente contas com-plexas, habilidade esta que lhe seria muito útil no final de sua vida. Aos 14 anos, ingressou

Page 114: Elementos de aritmética   abramo hefez

§8.4 Euler, um Gigante da Matemática 109

na Universidade da Basileia, onde foi aluno de Johann Bernoulli, com quem teve a sua ver-dadeira iniciação à matemática. Aos 20 anos de idade, Euler recebeu menção honrosa daAcademia de Ciências de Paris por um trabalho sobre a trajetória do mastro de um barcoem movimento, ganhando reconhecimento internacional.

Em 1727, começa a sua carreira profissional, assumindo uma posição como físico nanova Academia de São Petersburgo, na Rússia. Foi nessa época que conheceu ChristianGoldbach, que chamou a sua atenção para os problemas tratados por Fermat, fato esseresponsável pela grande obra de Euler em Aritmética. Em 1733, Euler assumiu a cátedra dematemática na Academia de São Petersburgo.

Um de seus primeiros grandes sucessos em matemática foi calcular, em 1735, o valorexato da soma infinita

1 + i + S + è + è + -Cálculos numéricos indicavam que o valor aproximado desta soma era 8/5, ficando em

aberto, por cerca de um século, o problema de determinar o valor exato da soma. Eulersurpreendeu os matemáticos provando que a soma da série é 7r2/6.

Euler produziu freneticamente resultados matemáticos ao longo de sua longa vida cien-tífica, que só cessou com a sua morte. Em 1738, Euler perde a visão de seu olho direito,ficando totalmente cego em 1771, não diminuindo por isto a sua produtividade científica.Durante muito tempo, a metade de cada volume dos anais da Academia de São Peíersburgoera dedicada a seus trabalhos e, durante 48 anos após a sua morte, ainda neles eram publi-cados artigos seus.

Euler escreveu sobre os mais variados assuntos, tais como, teoria das funções, cálculodiferencial e integral, números complexos, acústica, música, teoria dos números, teoria daspartições e mecânica, entre muitos outros, ocupando, indiscutivelmente, um lugar entre osmaiores matemáticos de todos os tempos.

Page 115: Elementos de aritmética   abramo hefez

9Congruências

Neste Capítulo, apresentaremos uma das noções mais fecundas da aritmética, intro-duzida por Gauss no seu livro Disquisitiones Arithmeticae., de 1801. Trata-se da realizaçãode uma aritmética com os restos da divisão euclidiana por um número fixado.

9.1 Aritmética dos Restos

Seja m um número natural diferente de zero. Diremos que dois números naturais a e 6são congruentes módulo m se os restos de sua divisão euclidiana por m são iguais. Quandoos inteiros a e 6 são congruentes módulo m, escreve-se

a = b mod m

Por exemplo, 21 = 13 mod 2, já que os restos da divisão de 21 e de 13 por 2 são iguaisai.

Quando a relação a = b mod m for falsa, diremos que a e 6 não são congruentes, ouque são incongruentes, módulo m. Escreveremos, neste caso, 0 ^ 6 mod m.

Como o resto da divisão de um número natural qualquer por l é sempre nulo, temos quea = b mod l, quaisquer que sejam a, 6 6 IN. Isto torna desinteressante a aritmética dosrestos módulo 1. Portanto, doravante, consideraremos sempre m > 1.

Decorre, imediatamente, da definição que a congruência, módulo um inteiro fixado m,é uma relação de equivalência. Vamos enunciar isto explicitamente abaixo.

Proposição 9.1.1. Seja m G IN, com m > 1. Para iodos a, 6, c 6 IN, tem-se que(i) a = a mod m,(ii) se a = b mod m, então b = a mod m,(iii) sea = b mod m e b = c mod m, então a = c mod m.

110

Page 116: Elementos de aritmética   abramo hefez

§9. l Aritmética dos Restos 111

Para verificar se dois números são congruentes módulo m, não é necessário efetuar adivisão euclidiana de ambos por m para depois comparar os seus restos. É suficiente aplicaro seguinte resultado:

Proposição 9.1.2. Suponha que a, 6 6 IN são tais que b > a. Tem-se que a = b mod mse, e somente se, m\b — a.

DEMONSTRAÇÃO: Sejam a = mq + r, com r < m e b = mq' + r', com r' < m, asdivisões euclidianas de a e b por m, respectivamente. Logo,

{ m(qr — q) + (r1 — r), ser' > r

m(q' — Q) — (r — r')i ser > r'

onde r' — r < m, ou r — r' < m. Portanto, a = b mod m se, e somente se, r = r1, o queé equivalente a dizer que m\b — a.

D

Note que todo número natural é congruente módulo m ao seu resto pela divisão eucli-diana por m e, portanto, é congruente módulo m a um dos números O, l , . . . , m — l. Alémdisso, dois desses números distintos não são congruentes módulo m.

Portanto, para achar o resto da divisão de um número a por m, basta achar o númeronatural r dentre os números O , . . . , m — l que seja congruente a a módulo m.

Chamaremos de sistema completo de resíduos módulo m a todo conjunto de númerosnaturais cujos restos pela divisão por m são os números O, l , . . . , m — l, sem repetições enuma ordem qualquer.

Portanto, um sistema completo de resíduos módulo m possui m elementos.É claro que, se a\ am são m números naturais, dois a dois não congruentes módulo

m, então eles formam um sistema completo de resíduos módulo m. De fato, os restosda divisão dos GJ por m são dois a dois distintos, o que implica que são os númerosO, l , . . . , m — l em alguma ordem.

O que torna útil e poderosa a noção de congruência é o fato de ser uma relação deequivalência compatível com as operações de adição e multiplicação nos inteiros, conformeveremos na proposição a seguir.

Proposição 9.1.3. Sejam a, b, c, d, m e M, com m > 1.i) Se a = b mod m e c = d mod m, então a + c = b + d mod m.ii) Se a = b mod m e c = d mod m, então ac = bd mod m.

DEMONSTRAÇÃO: Suponhamos que a = b mod m e c = d mod m. Podemos, semperda de generalidade, supor que b > a e d > c. Logo, temos que m\b — aem\d — c.

Page 117: Elementos de aritmética   abramo hefez

112 9. Congruências

(i) Basta observar que m\(b — a) + (d — c) e, portanto, m\(b + d) — (a + c), o que provaessa parte do resultado.(ii) Basta notar que bd — ac = d(b — a) + a(d — c) e concluir que m\bd — ac.

D

Corolário 1. Para todos n E IN*, a, b G M, se a = b mod m, então an = 6" mod m.

DEMONSTRAÇÃO: A demonstração faz-se por indução sobre n e não apresenta nenhumadificuldade.

D

Corolário 2. Sejam a, b, m € M*, com m > 1. Se o + 6 = O mod m, então, para todon E IN, tem-se que

a2" = 62n mod m e a2n+1 + 62íl+1 = O mod m.

DEMONSTRAÇÃO: O resultado é claramente válido para n = 0. Podemos ainda supor,sem perda de generalidade, que a > b.

Como a + b = O mod m, segue-se que m\a + 6 e, portanto, m \a + 6) (a — 6). Como(a + 6) (a — 6) = a2 — ò2, segue-se que a2 = fe2 mod m. Aplicando o Corolário l, temosque a2n = 62n mod m para todo n 6 IN*.

Por outro lado, como

e m|a + 6, segue-se que m|a2n+1 + 62n+1 e, portanto, a2ra+1 + 62?l+1 = O mod m.

D

Observação 9.1.1. O corolário acima será de grande utilidade no que se segue e substituias seguintes relações:

a = -b mod m =» a2n = 62n e a2n+1 = -62íl+1 mod m,

já que não trabalhamos com números negativos.

Com a notação de congruências, o Pequeno Teorema de Fermat se enuncia como sesegue:

Se p é número primo e a G IN, então

ÓP = CL mod p.

Além disso, se p /a, entãoap~l = l mod p.

Page 118: Elementos de aritmética   abramo hefez

§9.1 Aritmética dos Restos 113

Exemplo 9.1.1. Sejam p um número primo e a, 6 € IN. Vamos mostrar que

(a + b)p = ap + bp mod p.

O resultado decorre da formulação acima do Pequeno Teorema de Fermat, pois

(a + b)p = a + b = ap + bp mod p.

Exemplo 9.1.2. Se b > a e p é primo, então (6 — a)p = tf* — ap mod p.Pelo Exemplo 9.1.1, temos que

b? = (6 - a + a)p = (b - a)p + ap mod p,

o que implica o resultado, levando em conta o Problema 9.1.2 (b).

Exemplo 9.1.3. Sejam a, ò, p 6 IN, com p primo. Vamos mostrar que

a? = W mod p => ap = bp mod p2.

De fato, sem perda de generalidade, podemos supor que b > a. Sabemos, pelo Exemplo9.1.2, que

\f - ap = (b - a)p mod p,

e como, por hipótese, temos que p divide W — ap, segue-se que p\ — a; ou seja, a =b mod p. Isto implica que a1 = b1 mod p para todo z 6 IN. Decorre daí que

tf'1 + abp~2 + ••• ap~2b + ap~l = pap~l = O mod p.

Logo, o resultado decorre, pois

W - ap = (b - a ) ( l f - 1 + a^-2 + • • • ap~2b + a11'1),

e ambos os fatores no lado direito são divisíveis por p.

Proposição 9.1.4. Sejam a, &, c, m G IN, com m > 1. Tem-se que

a + c = b + c mod m ^=> a = b mod m.

DEMONSTRAÇÃO: Se a = 6 mod m, segue-se imediatamente da Proposição 9. l .3(i) quea + c = b + c mod m, pois c = c mod m.

Reciprocamente, suponhamos que a + c = b + c mod m. Sem perda de generalidade,podemos supor b + c > a + c. Logo, m\b + c — (a + c), o que implica que m\b — a e,conseqiientemente, a = b mod m.

D

Page 119: Elementos de aritmética   abramo hefez

114 9. Congruências

A proposição acima nos diz que, para as congruências, vale o cancelamento com relaçãoà adição. Entretanto, não vale, em geral, o cancelamento para a multiplicação, como pode-se verificar no exemplo que se segue.

Exemplo 9.1.4. Como 6 - 9 - 6 - 5 = 24 e 8|24, temos que 6 • 9 = 6 • 5 mod 8, e, noentanto, 9 ^ 5 mod 8.

Iremos, a seguir, dar um resultado relacionado com o cancelamento multiplicativo.

Proposição 9.1.5. Sejam a, ò, c, m 6 M, com c / O e m > 1. Temos que

mac = bc mod m <í=> a = b mod

(c, m)'

DEMONSTRAÇÃO: Podemos supor, sem perda de generalidade, que bc > ac. Comom c

e são copnmos, temos que(c, m) (c, m)

Tíí Cac = bc mod m <=> m\(b — a)c <í=^ r|(6 — a)-

(c,m) l v '(c, m)

m , m-\ — a <í=> a = d modf ^~ \\J t* T - r i* — i/ JULJxrvj. .. ,. •

(c, m)' (c, m)

n

Corolário. Sejam a, b, c, m € IN, com m > l e (c, m) = 1. Temos que

ac = bc mod m <£=> a = b mod m.

Proposição 9.1.6. Sejam a, k, m G IN, com m > l e (k, m) = 1. Seai,... ,am é umsistema completo de resíduos módulo m, então

a + kai,. . . ,a + kam

também é um sistema completo de resíduos módulo m.

DEMONSTRAÇÃO: Como, do corolário acima, para i, j = O, ... m — l, temos que

a + kai = a + kaj mod m <í=^ kai = kaj mod m

ai = a mod m

Isto mostra que a + ka\ . . . , a + kam são, dois a dois, não congruentes módulo m e,portanto, formam um sistema completo de resíduos módulo m.

D

Page 120: Elementos de aritmética   abramo hefez

§9.1 Aritmética dos Restos 115

Daremos, a seguir, propriedades adicionais das congruências relacionadas com a multi-plicação.

Proposição 9.1.7. Sejam a, 6 6 IN, m, n, mi,..., mr 6 M \. Temos quei) se a = b mod m e n\m, então a = b mod n;ii) a = b mod m^, i = l , . . . , r <:==> a = 6 mod [mi,.. . , mr];iii) se a = ò mod m, entôo (o, m) = (ò, m).

DEMONSTRAÇÃO: Suponhamos, sem perda de generalidade, que b > a.(i) Se a = 6 mod m, então m\b—a. Como n\m, segue-se que n\b—a. Logo, a = b mod n.(ii) Se a = 6 mod mj, i = l,..., r, então mj|ò — a, para todo i. Sendo 6 — a um múltiplode cada mi, segue-se que [mi,.. . , mr]\b — a, o que prova que a = b mod [mi,. . . , mr].

A recíproca decorre do item (i).(iii) Se a = b mod m, então m\b — a e, portanto, b = a + tm com í G M. Logo, peloLema de Euclides, Capítulo 5, temos que

(a, m) = (a + ím, m) = (6, m).

D

Exemplo 9.1.5. Vamos achar o menor múltiplo de 7 que deixa resto l quando divididopor 2, 3, 4, 5 e 6.

Portanto, queremos achar a menor solução do seguinte sistema de congruências:

IX = l mod 2, mod3, mod4, modo e mod 6.

Pela Proposição 9.1.7(ii), temos que toda solução simultânea das congruências acima ésolução da congruência

7X = l mod [2,3,4,5,6],

e reciprocamente.Portanto, devemos resolver a congruência IX = l mod 60. Isto se traduz como

60I7JÍ — l,o que equivale a resolver a equação diofantina IX — 60Y = l.Pelo Algoritmo de Euclides, temos que60 = 7 - 8 + 47 = 4 - 1 + 34 = 3-1 + 1Portanto,

1 = 4 - 3 - 1 = 4-(7-4) = 2 - 4 - 7 = 2(60 - 7 • 8) - 7 = 2 - 60 - 17 - 7.

Decorre daí quel = (p 60 - 17)7 -(p 7- 2)60,

Page 121: Elementos de aritmética   abramo hefez

116 9. Congruências

e, portanto, a; = p60 -17ey = p7 -2 . Tomando p = l, temos a: = 43ey = 5éasolução minimal, pois 43 • 7 — 5 • 60 é a única maneira de escrever l = a • 7 — b • 60 coma < 60. Segue-se, então, que o número procurado é 7 • 43 = 301.

Exemplo 9.1.6. Vamos achar o resto da divisão de 23728 por 13.Certamente, calcular a potência 23728, para depois dividir o resultado por 13, não é o

melhor caminho. Faremos isto de modo mais económico.Inicialmente, note que 237 = 3 mod 13 (é só efetuar a divisão euclidiana e tomar

o resto). Pelo Pequeno Teorema de Fermat, temos que 23712 = l mod 13. Logo, peloCorolário l da Proposição 9.1.3, temos que (23712)2 = 23724 = l mod 13.

Analogamente, temos que 2374 = 34 = 81 = 3 mod 13. Usando a Proposição9.1.3(ii), temos que 23728 = 3 mod 13.

Portanto, o resto da divisão de 23728 por 13 é 3.

Exemplo 9.1.7. Vamos mostrar que 45| 133n -f- 173n, para todo número natural ímpar n.Note que os resultados do Capítulo 3 não permitem mostrar diretamente a propriedade

acima enunciada. Utilizando congruências, mostraremos como chegar à conclusão dese-jada.

De fato,133 = 132 • 13 = 34 • 13 = 442 = 37 mod 45,

logo,133 + 8 - O mod 45.

Portanto, como n é ímpar, pelo Corolário 2 da Proposição 9.1.3, temos que

133n + g" = Q mod 45.

Por outro lado, como

173 = 172 . 17 = 19 .17 = 323 = 8 mod 45,

segue-se que173n = 8n mod 45.

Agora, o resultado segue-se imediatamente.

Exemplo 9.1.8. Vamos determinar o algarismo das unidades do número 77 .De fato, vamos determinar, mais geralmente, o algarismo das unidades de todo número

da forma 77°, onde a é um número natural ímpar.Note, inicialmente, que 7 + 3 = 0 mod 10 e, portanto, pelo Corolário 2 da Proposição

9.1.3, temos que77° -f 3?a = O mod 10.

Page 122: Elementos de aritmética   abramo hefez

r

§9.1 Aritmética dos Restos 117

Por outro lado, de 32 + l = O mod 10, do fato de (7Q - l)/2 é ímpar (veja Exemplo3.2.5) e do Corolário 2 da Proposição 9.1.3, temos que

(32)1 i + l =0 mod 10.

Logo,

37" + 3 = 3[(32)2^zi + 1] = O mod 10,

e, portanto,

Consequen temente, o algarismo das unidades de 77Q é 3.

Problemas

9.1.1 Sejam a, ò, c, d, m, ai, &i, . . . , an, 6n € IN, com m > 1.

a) Mostre que, se a + b = O mod m e c + rf = O mod m, então ac = bd mod m.

b) Mostre que, se a = b mod m e c + d = 0 mod m, então ac + bd = O mod m.

c) Suponha que aj + òj = O mod m, i = l, . . . , n. Mostre quese n é ímpar, então ai • • • an + b\ • • bn = O mod m; e,se n é par, então ai • • • an = b\ • • bn mod m.

d) Dê uma outra prova para o Corolário 2 da Proposição 9. l .3.

9.1.2 Sejam a, 6, c, m, XQ 6 IN, com m > 2 , a > c e 0 < a ; o < m .

a) Mostre que, se a = 6 + c mod m, então a — c = b mod m.

b) Mostre que (m — rco)2 = XQ mod m.

9.1.3 Sejam a, p € IN, com p primo. Mostre que, se a2 = l mod p, então a = l mod pou a = p — l mod p.

9.1.4 Ache o resto da divisão

a) de 710 por 51 b) de 2100 por 11

c) de 521 por 127 d) de 14256 por 17

e) de (116 + 1717)21 por 8 f) de 1316 - 225515 por 3

g) de l! + 2! + • • • + (IO10)! por 40

9.1.5(ENC 98) O resto da divisão de 1212 por 5 é:

(A) O (B) l (C) 2 (D) 3 (E) 4

9.1.6 Para todo n e IN, mostre que

a) 1016" - l é divisível por 70; b) 198íl - l é divisível por 17.

Page 123: Elementos de aritmética   abramo hefez

118 9. Congniências

9.1.7 Determine o resto da divisão por 7 do número

a) IO10 + IO102 + IO103 + - - • + 10lol°° b) l7 + 27 + • • • + 1007

c) l6 + 26 + - - - + 1006

d) 22225555 + 55552222

9.1.8 Determine o resto da divisão por 4 do número

a) l + 2 + 22 + - - - + 219 b) l5 + 25 + • • • + 1005

9.1.9 Determine o algarismo das unidades do número 99 .

9.1.10* Ache os algarismos das centenas e das unidades do número 7""".

9.1.11* Mostre, para todo n € IN, que

a) 102n = l mod 11 b) 102n+1 + 1 = 0 mod 11

9.1.12ÇENC 2000) Se x1 = l mod 5, então,

(A) x = l mod 5 (B) x =. 2 mod 5 (C) x = 4 mod 5

(D) x = l mod 5 ou x = 4 mod 5

(E) x = 2 mod 5 ou x = 4 mod 5

9.1.13 Suponha que m = p^1 • • • p f r . Mostre que

a = 6 mod m <=$• a = b mod p"', i = l , . . . , r.

9.1.14* Ache o menor número natural que deixa restos 5, 4, 3 e 2 quando dividido, res-pectivamente, por 6, 5, 4 e 3.

9.1.15 a) Mostre que todo quadrado perfeito é congruente a O, l ou 4, módulo 8.

b) Mostre que não há nenhum quadrado perfeito na sequência: 2,22,222,2222,22222, —

c) Mostre que não há nenhum quadrado perfeito na PA: 3,11,19, —

9.1.16* Mostre que a soma dos quadrados de quatro números naturais consecutivos nuncapode ser um quadrado.

9.1.17* Mostre que nenhum número natural da forma 4n + 3 pode ser escrito como asoma de dois quadrados.

9.1.18* Se k > 2, mostre, para a ímpar, que a2 =1 mod 2fc.

Page 124: Elementos de aritmética   abramo hefez

§9.2 Aplicações 119

9.2 Aplicações

A seguir, daremos algumas aplicações da noção de congruência.

Exemplo 9.2.1. Vamos mostrar que o número de Mersenne MSS = 283 — l não é primo,apesar de 83 ser primo.

De fato, temos que28 = 256 = 89 mod 167216 = 7921 = 72 mod 167232 = 5184 = 7 mod 167264 = 49 mod 167

Daí, segue-se que

283 = 2642i623 = 49 . 72 . g = l mod 167,

o que implica que 283 — l é divisível por 167.

Exemplo 9.2.2. Vamos provar neste exemplo o resultado de Euler que afirma que o quintonúmero de Fermat F$ = 22& + l não é primo.

Note inicialmente que, da igualdade 641 = 5 • 27 + l e, do Corolário 2 da Proposição9.1.3, segue-se que 54228 = l mod 641. Disto e da igualdade 641 = 54 + 24, temos que54 . 228 + 232 _ Q moc} 641, logo l + 225 = O mod 641, o que mostra que 641|F5.

Exemplo 9.2.3. Critérios de divisibilidade por 2, 5 e 10.No Capítulo 4, discutimos critérios de divisibilidade por 2, 5, e 10. Revisaremos aqui

estes critérios usando a noção de congruência.Notando que 10 = 0 mod 2, 10 = O mod 5 e 10 = O mod 10, temos que

n^lO1 = O mod 2, mod 5, mod 10; i > 1;

portanto, dado um número n = n rn r_i. . . no, na base 10, temos que

n = no mod 2, mod 5, mod 10,

o que nos diz que n é divisível por 2, 5 ou 10 se, e somente se, n0 é divisível por 2, 5 ou 10.Daí decorrem os critérios que apresentamos na Proposição 4. l. l e no Problema 4. l .3.

Exemplo 9.2.4. Critérios de divisibilidade por 3 e 9.Vamos revisar estes critérios já apresentados no Capítulo 4.Como 10 = l mod 3, mod 9, segue-se que n^lO* = n; mod 3, mod 9. Isto mostra

que, se n é representado na base 10 como n r n r _i . . . n0, então

n = nr + nr-\ • • • + no mod 3, mod 9,

Page 125: Elementos de aritmética   abramo hefez

120 9. Congruências

0 que prova que n é divisível por 3 ou 9 se, e somente se, nr + nT-\ ----- !- «o é divisível,respectivamente, por 3 ou por 9.

Isto justifica a famosa regra dos "noves fora", que se enuncia como se segue:Para verificar se um dado número é divisível por 3 ou por 9, somam-se os seus algaris-

mos, desprezando-se, ao efetuar a soma, cada parcela igual a nove. Se o resultado final forO, então o número é divisível por 9. Se o resultado for um dos algarismos O, 3 ou 6, então onúmero é divisível por 3.

Exemplo 9.2.5. Critério de divisibilidade por 11Como 10 + l = O mod 11, pelo Corolário 2 da Proposição 9.1.3, temos que IO2" =

1 mod 11 e 102n+1 + 1 = 0 mod 11.Seja n = nr • • • n^n^n^nininQ um número escrito na base 10. Temos, então, que

= «o mod 1 1= O modll= ri2 modll

n3103 +n3 = O modll

Somando, membro a membro, as congruências acima, temos que

n + ni + «3 + • • • = «o + ni + " • ' mod 11

Portanto, n é divisível por 11 se, e somente se, n = O mod 11, o que equivale a

n\ HZ + • • • = no + n-2 + • • • mod 11.

Assim, acabamos de provar que um número natural é divisível por 11 se, e somentese, a soma dos seus algarismos de ordem par for congruente, módulo 11, à soma dos seusalgarismos de ordem ímpar.

Exemplo 9.2.6. Prova dos nove.A prova dos nove é um teste que se realiza nas quatro operações para detectar erros

de contas. Como exemplo, suponhamos que efetuamos a multiplicação a • b, obtendo oresultado c, cuja exatidão queremos verificar.

Suponha que na base 10 tenhamos

a — anan-i ...aiao, b = bmbm~i • • -Mo, c = CrCr-i • • -CICQ.

Após ter posto os noves fora em ao + a\ • • • an, obtém-se o algarismo a'. Fazendo omesmo para b e c, obtemos os algarismos 6' e c'. Efetua-se a multiplicação a' -b' Q põem-seos noves fora, obtendo c". Se c' ^ c", então, certamente, foi cometido um erro na operação.A justificativa é a seguinte:

c' = c = a • b = a' • b' = c" mod 9,

Page 126: Elementos de aritmética   abramo hefez

§9.2 Aplicações 121

com c < 9 e c' < 9.Caso c' = c", nada podemos afirmar quanto à exatidão da operação efetuada, mas

podemos garantir que a nossa conta tornou-se mais confiável por ter passado por um teste.

Exemplo 9.2.7. Todo número da forma an = 22"(22ra+1 - l), onde n > l, na suarepresentação decimal, ou termina em 28 ou termina em a6, onde a é um algarismo ímpar.Em particular, todo número perfeito par termina de um desses modos.

De fato, recorde que, pelo Problema 6.4.2, temos que

a2fc+2 = 256a2A; + 240 - 16* e a2k+i = 256a2A;_1 + 60 - 16fc.

Faremos agora a análise dos últimos dois algarismos de 16" ao variar de n em IN.Temos que

16 = 16 modlOO162 = 56 modlOO163 = 96 modlOO164 = 36 modlOO165 = 76 modlOO166 = 16 modlOO,

e, daí para a frente, esses números se repetem ciclicamente.Portanto, para todo n E IN, os dois últimos algarismos de 16n são da forma 66, onde 6

é ímpar.Observe agora que a2 = 96, logo, da forma a6, onde a é ímpar. Vamos provar, por

indução sobre n, que o mesmo ocorre para todos os números da forma ain. Suponha quetermina em a6, onde a é um algarismo ímpar; logo,

<*2(n+i) = 256a2ra + 240 • 16™ = 56 • a6 + 40 • 16n =(50 + 6) (10a + 6) + 40(106 + 6) = 10(6o + 3 + 4) + 6 =lOc + 6 mod 100,

onde c é um algarismo. O resultado, portanto, segue-se neste caso, pois o número 6a +3 +4é ímpar.

Observe agora que a\ 28; logo, termina em 28. Vamos provar por indução sobre nque o mesmo ocorre para todos os números da forma a2n+i. Suponha que 02^-1 terminaem 28. Logo,

a2n+1 = 256a2n_i + 60 • 16n = 56 - 28 + 60 • 16n =56 • 28 + 60(106 + 6) = 68 + 60 = 28 mod 100,

Exemplo 9.2.8. Vamos mostrar que, dado um número natural m 6 IN*, existe um númerode Fibonacci un tal que m\un.

Page 127: Elementos de aritmética   abramo hefez

122 9. Congruências

De fato, sejam ri,r2, . . ., respectivamente, os restos da divisão de M1,«2, . . ., por m.Como, para todo i, tem-se que O < TÍ < m, segue-se que existem, no máximo, m2 paresTÍ,TÍ+I distintos. Portanto, dentre os pares ri,r^', r^r^', ...", ym2+i?rm2+2 existe pelomenos um par que se repete. Seja k o menor índice para o qual r k, rk+i se repete. Vamosmostrar que k = 1.

Suponha, por absurdo, que k > 1. Seja r/, r/+i o par que repete r^, rk+i- Como

—ui= ui-i = TI-\d m,

segue-se que o par /•&_!, r/t é igual ao par rj_i, ri, o que contradiz a minimalidade de k.

Decorre daí e do Problema 6.3.1 que existem infinitos números de Fibonacci divisíveispor 77i. Deduz-se, ainda, que, dado um número primo p qualquer, existe um número deFibonacci divisível por p; ou seja, na decomposição dos números de Fibonacci em fatoresprimos aparecem todos os números primos.

Problemas

9.2.1 a) Usando o fato de que 100 é divisível por 4, 25 e 100, ache critérios de divisibili-dade por 4, 25 e 100.b) Considerando que 1000 é divisível por 8, 125 e 1000, ache critérios de divisibilidade por8, 125 e 1000.

9.2.2 Mostre que um número na base 10 é divisível por 6 se, e somente se, a soma doalgarismo da unidade com o quádruplo de cada um dos outros algarismos é divisível por 6.

9.2.3 Usando o fato de que

IO3 + l = O mod 7, modll, modlS,

prove o seguinte critério de divisibilidade por 7, 11 e 13:Um número n = nr ... n^nino, escrito na base 10, é divisível por 7, 11 ou 13, se, e

somente se,

715714^3 + nuniQUg + • • • = n^niHQ + n^njne + • • • mod 7, modll, modlS.

Page 128: Elementos de aritmética   abramo hefez

§9.3 Congruências e Números Binomiais 123

9.3 Congruências e Números Binomiais

Nesta seção, daremos vários resultados envolvendo divisibilidade por potências de nú-meros primos e conguências de números binomiais.

Lema 9.3.1. Sejam p, m E IN com p primo.(i) Tem-se que (pm)\ pmMm\, onde M €. IN e M = [{p - l)!]m mod p.

(ii) Ep((mp)\) = m + Ep(m^.

DEMONSTRAÇÃO: O resultado decorre facilmente da igualdade:

(pro)! = p • 2p • • • mp [l • 2 • • • (p - 1)] [(p + 1) • • • (p + p - 1)] • • •

[((m - l)p + 1) . . . ((m - l)p +p - 1)].

D

Lema 9.3.2. Sejam a, p, r 6 ]N, com a^Q, p primo e O < r < p. Então

(ii) Ep((pa - r)!) = J

(iii) (pá + r)! = H mod p.

DEMONSTRAÇÃO: (i) e (iii) decorrem imediatamente da igualdade

(pá + r)\ (pa)\(pa + 1) • • • (pó + r),

observando que p J((pa + i), para todo i = l, . . . , r, e que pá + i = i mod p.(ii) Isto, por sua vez, decorre da igualdade:

(pá — r)\(pa — r + 1) • • • (pá — r + r) = (pá)!,

observando que a maior potência de p que divide (pá — r + ! ) • • • (pá — r + r)ép.

n

Lema 9.3.3. Sejam m, p, a, @ e ]N, com p primo e O < a, P < p. Tem-se que

(mp\) MH mod p.\npj \nj

r../'mp + a\(u) _ = l l mod p.^'\np + /3J W W

Page 129: Elementos de aritmética   abramo hefez

124 9. Congruências

DEMONSTRAÇÃO: (i) Usando Lema 9.3.l, temos que

npj \n

onde N, M, M' 6 IN são tais que N = [(p~l)\]n mod p,M = [(p-l)!]m mod p e M' =[(p - l)!]m~" mod p. O resultado segue-se do fato de ATM' = M = [(p - l)!]m mod p eque p e [(p - l)!]m são primos entre si (veja o Corolário da Proposição 9.1.5).

(ii) Note que, se m < n, então mp + a < np + /?, implicando no anulamento dos doismembros da congruência em (ii).

Suponhamos agora que m>n. Temos, pelo Problema 2.2.3, que

mp \\ (mp + a\ +

Se i < /3, então, pelo Lema 9.3.2, temos que

Ep((mp)\) - Ep((np + 0- â)!) - Ep((p(m -n)-(0- i)

Ep((mp)\) - Ep((np)\) - Ep((p(m - n))!) + l > l,

o que mostra que í . j = O mod p.

Se /3 < i < p, novamente pelo Lema 9.3.2, temos que

Ep((mp)\) - Ep((np -(i- /?))!) - Ep((p(m - n) + (í - 0

Ep((mp)\) - Ep((np)\) + l - Ep((p(m - n))!) > l,

o que mostra que í - 1 = 0 mod p.M M \np + /3-iJ F

Portanto, usando o item (i), temos que

D

Teorema 9.3.1 (Lucas). ' Seja p um número primo e sejam m = m^ + m\p + • • • + mTpr

e n = no + n\p + • • • + nsps dois inteiros representados relativamente à base p. Tem-seque

Im\d p.í™} =\nj

'Este resultado pode ser provado de modo mais simples usando identidades polinomiais sobre um corpocom p elementos (veja Curso de Álgebra Volume 2, do autor).

Page 130: Elementos de aritmética   abramo hefez

§9.3 Congruências e Números Binomiais 125

DEMONSTRAÇÃO: Isto faz-se por indução, usando o Lema 9.3.3.

D

Lema 9.3.4. Sejam p um número primo e a, /3 £ IN, com a > /?. Então pa~P é a maior

potência de p que divide

DEMONSTRAÇÃO: Usando o Teorema 8.3.2, vê-se facilmente que

.

o que prova o resultado.

D

Vamos agora provar a recíproca do Lema 7.3.1, dando mais um teste pouco eficiente deprimalidade.

fn\a 9.3.2. Seja n € IN tal que ( =0 mod n, para todo i tal que O < i < n, então

Wn é primo.

DEMONSTRAÇÃO: Seja p um número primo que divide n e seja n = n\p -\- nrpr arepresentação de n relativamente à base p, com nr ^ 0. Se essa representação possui maisde um termo não nulo, digamos nsps, além de nrpr, então, pelo Teorema de Lucas,

nspsj \ns

o que é uma contradição.Portanto, n = nrpr. Se nr > l, então, novamente pelo Teorema de Lucas,

/ nrpr \ nr \ „( t ^ r ) = ( t ,x ^0 modp,\(nr - l)prj \(nr - l) J ^

o que também é uma contradição.Portanto, n = pr. Se r > l, então

moápr,P

pois, pelo Lema 9.3.4, pr~1 é a maior potência de p que divide í j . Novamente uma

contradição. Só resta, portanto, a possibilidade n = p.

n

Page 131: Elementos de aritmética   abramo hefez

126 9. Congruências

Problemas

9.3.1 Mostre que 2n divide (2n)!. Mais geralmente, mostre que o produto de 2n númerosnaturais consecutivos é divisível por 2n.

9.3.2 Mostre que n!2"3n divide (3n)L

9.3.3*(Kummer) Seja p um número primo e suponha que m = mr ... mjmo e n =nr ... nino sejam dois números naturais representados na base p (para alcançar toda a ge-neralidade, mr ou nr pode ser nulo). Mostre que

( TL ~\~ TTL \

n /

9.3.4 Se l < r < pn com Ep(r) = k, mostre que í J é divisível por pn~k, mas não por

pn-k+l

9.4 Gauss, um Príncipe da Matemática

Cari Friederich Gauss (1777-1855) foi um dos maiores matemáticos de todos os tempos.Gauss nasceu em Brunswick, Alemanha, filho de uma modesta família e manifestou o

seu génio na mais tenra idade, aprendendo a ler sozinho e demonstrando uma habilidadeímpar em realizar complicados cálculos mentais.

Bem jovem ainda, Gauss resolveu o chamado Paradoxo do Binómio. Desde Newton,conhecia-se o desenvolvimento

onde n é um número real, não necessariamente natural, quando, nesse caso, a soma dadireita pode ser infinita. Tratar somas infinitas com a aritmética usual apresenta muitasarmadilhas; por exemplo, tomando n = — l e X = —2, obtém-se

o que, claramente, é um absurdo.Gauss, então, de modo revolucionário para a época, reconhece a necessidade de intro-

duzir a noção de convergência para séries infinitas e mostra que vale a igualdade do binómio,no sentido de que o lado esquerdo representa a soma infinita do lado direito, quando estaúltima converge, dando também os valores de X para os quais a série é convergente para n,

Page 132: Elementos de aritmética   abramo hefez

§9.4 Gauss, um Príncipe da Matemática 127

número real positivo dado. Não contente, Gauss, em 1812, realiza o estudo da convergênciada série hipergeométrica,

ab q(a + 1)6(6 + í) X2 a(a + l)(a + 2)6(6 + 1)(6 + 2) X3

c + c(c +1) ~2T + c(c + l)(c + 2) 3 ! + ' " '

que engloba, para valores particulares de a, 6 e c, as funções logarítmica, trigonométricas evárias outras funções que aparecem em Física e Astronomia. Este trabalho é uma obra primade rigor matemático, ultrapassando, nesta matéria, os génios de Newton, Euler e Lagrange,e iniciando, assim, a importante área da Análise Matemática, que seria, ulteriormente, de-senvolvida pelos talentos de Abel, Cauchy, Weierstrass e Dedekind.

Aos dezessete anos, Gauss decide incursionar na Aritmética, com o projeto de esclare-cer, completar e desenvolver o que os seus predecessores haviam realizado. Em 1798, aos21 anos, Gauss produz uma das obras primas de toda matemática, o livro DisquisitionesAríthmeticae, que seria publicado somente em 1801. No livro, Gauss introduz a noção decongruência; desenvolve a teoria dos resíduos quadráticos, demonstrando a profunda Leida Reciprocidade Quadrática; estuda as formas quadráticas binárias, deduzindo, dentro deum quadro bem mais geral, o teorema de Fermat, que assegura que todo número primo daforma 4n + l se escreve como soma de quadrados de dois números naturais; e, na últimaseção, deduz o belo e famoso teorema que diz que um polígono regular com um númeroprimo n de lados, inscrito no círculo, é construtível com régua e compasso se, e somente se,n é um número primo de Fermat,

Em 1799, em sua tese de doutorado na Universidade de Helmstedt, Gauss demonstra,pela primeira vez, o Teorema Fundamental da Álgebra, que havia sido enunciado por váriosantecessores, mas jamais provado corretamente. Foi, também, um dos primeiros a trataros números complexos como entidade matemática, dando-lhes a representação geométricacomo pontos do plano cartesiano.

A partir de 1807, Gauss foi diretor do observatório de Gõttingen, dando contribuiçõesfundamentais à Matemática aplicada, à Astronomia e à Física. Uma das maiores contribui-ções de Gauss à Astronomia foi determinar, com grande precisão, a órbita do planeta Ceres,que havia, recentemente, sido descoberto em uma posição incómoda para a observação.Os cálculos de Gauss permitiram que os astrónomos o reencontrassem numa outra posiçãoprevista por ele. Em Física, foi um dos criadores da teoria do eletromagnetismo; inventou,como subproduto dos seus estudos, o telégrafo elétrico, contribuiu para o estudo da capila-ridade e para a óptica.

Em Matemática pura - sem a menor sombra de dúvida, a sua maior paixão -, deucontribuições à teoria das probabilidades e foi um dos criadores das geometrias não-eu-clidianas, da geometria diferencial, das funções de variável complexa, da topologia e dateoria algébrica dos números.

Gauss teve o poder de mudar os rumos da matemática a partir dos seus trabalhos revo-lucionários, apresentados com extremo rigor e grande concisão e elegância. Por isso, foi

Page 133: Elementos de aritmética   abramo hefez

128 9. Congruências

considerado, pelos seus contemporâneos e pelas gerações que se sucederam, um príncipeda rainha das ciências.

Page 134: Elementos de aritmética   abramo hefez

10Os Teoremas de Euler e Wilson

Neste capítulo, estudaremos dois importantes teoremas em Teoria dos Números: o Teo-rema de Euler, uma generalização do Pequeno Teorema de Fermat, e um teorema de La-grange, conhecido pelo nome de Teorema de Wilson.

10.1 Teorema de Euler

Será muito útil, no que se segue, decidir se a congruência aX = l mod m possuialguma solução em X. A este propósito, temos o seguinte resultado:

Proposição 10.1.1. Sejam a, m € IN, com m > 1. A congruência aX = l mod m possuiuma solução XQ se, e somente se, (a, m) = 1. Além disso, x é uma solução da congruênciase, e somente se, x = XQ mod m.

DEMONSTRAÇÃO: A congruência acima tem uma solução XQ se, e somente se, m\axQ—l,o que equivale a dizer que a equação diofantina aX — mY = l possui solução em númerosnaturais. Em virtude da Proposição 5.2.1, isto ocorre se, e somente se, (a, m) = 1.

Por outro lado, observe que, se XQ e x são soluções da congruência aX = l mod m,então ax = O.XQ mod m, o que implica, em virtude do Corolário da Proposição 9.1.5, quex = XQ mod m.

Observe, ainda, que se XQ é solução da congruência aX = l mod m, e x ~ XQ mod77i, então x é também solução da mesma congruência, pois

ax = axQ = l mod m.

D

Uma solução da congruência aX = l mod m determina e é determinada por qualqueroutra solução. Se considerarmos que duas soluções congruentes módulo m são, essencial-mente, a mesma, temos a unicidade da solução da congruência aX = l mod m.

129

Page 135: Elementos de aritmética   abramo hefez

130 10. Os Teoremas de Euler e Wilson

Um sistema reduzido de resíduos módulo m é um conjunto de números naturais r\rs tais que

a) (TÍ, m) = l, para todo i = l , . . . , s;b) TÍ =É r j mod m,sei^ j',c) Para cada n e IN tal que (n, m) = l, existe i tal que n = TÍ mod m.

Pode-se obter um sistema reduzido de resíduos TI, ..., rs, módulo m, a partir de umsistema completo qualquer de resíduos ai , . . . , am, módulo m, eliminando os elementos aique não são primos com m.

De fato, as propriedades (i) e (ii) da definição são claramente verificadas para r\ rs.Por outro lado, dado um número natural n, existe j tal que n = a,j mod m. Se (n, m) = l,então, pela Proposição 9.1.7(iii), (oj, m) = l e, portanto, para algum j, temos que a j = r ie, conseqíientemente, U = TÍ mod m.

Vamos agora verificar que dois sistemas reduzidos de resíduos módulo m têm o mesmonúmero de elementos.

Sejam n,.. .r s r(,... ,r't dois sistemas reduzidos de resíduos módulo m. Vamos es-tabelecer uma bijeção entre esses dois conjuntos. Dado r'^ temos que (r'^m) = 1. Comori, . . . , rs formam um sistema reduzido de resíduos módulo m, então existe um único jtal que r\ r j mod m. Isso define uma função / entre os dois sistemas. Reciproca-mente, do mesmo modo, está bem definida uma função g de {rj , . . . ,r' t} em {ri,... rs}.Suponha que g(r'j) = r k, então r\ r k mod m. Como também r\ r j mod m, segueque r j = r& mod m e, conseqiíentemeníe, r j = r/t mod m, mostrando que g é a funçãoinversa de /.

Designaremos por <p(m) o número de elementos de um sistema reduzido de resíduosmódulo m, que corresponde à quantidade de números naturais entre O e m — l que sãoprimos com m. Isto define uma importante função

(f :. IN* —•> M,

chamada função fi de Euler.

Pela definição, temos que(p(m) <m — l.

Além disso, 99(771) = m — l se, e somente se, m ê um número primo.De fato, m é primo se, e somente se, l, 2 , . . . , m — l formam um sistema reduzido de

resíduos módulo m, o que equivale a dizer que <p(m) = m — 1.

Mais adiante, mostraremos como calcular (f>(m) em geral.

A função ip é de grande utilidade em Teoria dos Números. Uma das primeiras aplicaçõespode ser apreciada no seguinte exemplo.

Page 136: Elementos de aritmética   abramo hefez

§10.1 Teorema de Euler 131

Exemplo 10.1.1. Se n = kd, com k, d 6 M, então a quantidade de números naturais mtais que l < m < K e (n, m) = d é ip(k).

De fato, temos que

l < m < n e (m, kd) = d •£=> m = Xd, com l < A < k e (A, k) — 1.

Portanto, a quantidade de números naturais m, como acima, é igual à quantidade dosA 6 M tais que l < A < k e (A, k) = 1; ou seja, <p(k).

Exemplo 10.1.2. (Gauss) ' Tem se que

d\n

De fato, seja / = {l, 2, . . . , n} e seja d E IN tal que d\n. Defina

Id = {m 6 /; (m, n) = d}.

Note que, se d d', então

ed\n

Portanto,

Por outro lado, os elementos de /^ são os múltiplos de d da forma md, com (m, n) = ln

e m < — . Portanto,a */<=,(=).

>rre tod(todos os divisores de n, logo,

71Note que, quando d percorre todos os divisores de n, os números — também percorrem

d

Por exemplo, temos que

tp(2) + <^(3) + v(4) + y>(6) + y>(9) + y>(12) + <^(18) + y>(36) = 36.

'Este resultado encontra-se no art. 39 do livro Disquisitiones Aríthmeticae de Gauss

Page 137: Elementos de aritmética   abramo hefez

132 10. Os Teoremas de Euler e Wilson

Proposição 10.1.2. Seja r\ rwm) um sistema reduzido de resíduos módulo m e sejaa e IN tal que (a, m) = 1. Então, ar\ ar^(m) é um sistema reduzido de resíduosmódulo m.

DEMONSTRAÇÃO: Seja ai,.. . , am um sistema completo de resíduos módulo m do qualfoi retirado o sistema reduzido de resíduos ri , . . . , r^m^. Do fato de que (aj, m) = l se, esomente se, (aíij, m) = l, o resultado se segue.

D

Teorema 10.1.1 (Euler). Sejam m, a 6 IN com m > l e (a, m) = 1. Então,

a^m) = l mod m.

DEMONSTRAÇÃO: Seja n , . . . , rv(m) um sistema reduzido de resíduos módulo m. Logo,pela Proposição 10.1.2, ari, . . . , ar^(m) formam um sistema reduzido de resíduos módulom. Portanto,

av(mVi • r2 • • • rv(m) = an • ar2 • • • ar¥j(m) = n • r2 • • • r¥,(m) mod m.

Como (ri • rj • • • r^^), m) = l, segue-se pelo Corolário da Proposição 9.1.5 que

a^m> = l mod m.

D

Corolário. (Pequeno Teorema de Fermat) Sejam a, p G IN, onde p é um número primoe (a, p) = 1. Tem-se que

ap~l = l mod .

DEMONSTRAÇÃO: Basta notar que, sendo p primo, <p(p) = p — 1.

D

O cálculo de <p(m), em geral, seguirá do seguinte resultado.

Proposição 10.1.3. Sejam m, m' 6 IN, com m > l, m1 > l e (m, m') — 1. Então

ip(m • m1) = (p(m)ip(mr).

Page 138: Elementos de aritmética   abramo hefez

§10.1 Teorema de Euler 133

DEMONSTRAÇÃO: Considere a seguinte tabela formada pelos números naturais de l am • m':

2 ... k . . . m 'm' + 2 ... m' + k ...

(m — l)m' + 1 (m — l}m' + 2 ... (m — l)m' + k ... m -m!

Como se tem que (í, m • m') = l se, e somente se, (t, m') = (í, m) = l, para calcularíf>(m-m'), devemos determinar os inteiros na tabela acima que são simultaneamente primoscom m e m'.

Se o primeiro elemento de uma coluna não for primo com m', então todos os elementosda coluna não são primos com m'. Portanto, os elementos primos com m' estão necessaria-mente nas colunas restantes que são em número (p(m'}, cujos elementos são primos comm', como é fácil verificar. Vejamos agora quais são os elementos primos com m em cadauma dessas colunas.

Como (m, m') = l, a sequência

k, m' + k, . . . , (m — l)m' + k

forma um sistema completo de resíduos módulo m (veja Proposição 9.1.6) e, portanto,<f>(m) desses elementos são primos com m. Logo, o número de elementos simultaneamenteprimos com m' eme (p(m) • (p(m'}.

D

Lema 10.1.1. Se p é um número primo e r, um número natural, então tem-se que

í T\ T—l 7* l -i<P(P)=P-jr = P U - -

V P

DEMONSTRAÇÃO: De l até pr, temos pr números naturais. Temos que excluir desses osnúmeros que não são primos com pr, ou seja, todos os múltiplos de p, que são precisamentep, 1p,... ,pn~lp, cujo número épn~l. Portanto, tp(pr) = pT -pr~l, provando o resultado.

D

Finalmente, podemos obter a expressão de tp(m) para qualquer m e IN*.

Teorema 10.1.2. Sem = p"1 • • • p%n é a decomposição de m em faiares primos, então

Page 139: Elementos de aritmética   abramo hefez

134 10. Os Teoremas de Euler e Wilson

DEMONSTRAÇÃO: O resultado decorre do Lema 10. l . l e do Corolário acima.

D

A fórmula do Teorema acima pode ser reescrita como se segue:

Para calcular o resto da divisão de urna potência an por um número natural m > l,é conveniente achar um expoente h de modo que a potência ah = l mod m, pois, sen = hq + r é a divisão euclidiana de n por h, teremos an = ahqar = ar mod m. Portanto,é clara a utilidade do Teorema de Euler para a resolução desse tipo de questão, como sepode ver no próximo exemplo.

Exemplo 10.1.3. Vamos achar o resto da divisão de 3100 por 34.Note que

y>(34) = tp(2 • 17) = 2°17°(2 - 1)(17 - 1) = 16.

Pelo Teorema de Euler, temos que 316 = l mod 34, logo,

glOO = 316.6+4 = 34 = 13 mod 34

Portanto, 13 é o resto da divisão de 3100 por 34.

Em geral, nem sempre é possível achar um número h tal que ah = l mod m. Vejamosquando isto ocorre.

Proposição 10.1.4. Dado a € IN*, existe h E M* tal que ah = l mod m se, e somente se,(a, m) = 1.

DEMONSTRAÇÃO: Se (a, m) = l, temos, pelo Teorema de Euler, que a^m^ = l modm, mostrando a existência do expoente desejado. Por outro lado, se (a, m) ^ l, entãoa equação aX — mY = l não possui solução e, portanto, aX = l mod m não possuisolução. Conseqíientemente, não pode existir h > l tal que ah = l mod m.

D

Suponha que a, m € IN*, com m > l e (a, m) = 1; vamos definir a ordem de a comrespeito a m como sendo o número natural

ordm(a) = min{z e M*; a1 = l mod m}.

Lema 10.1.2. Temos que an = l mod m se, e somente se, ordm(a)|n.

Page 140: Elementos de aritmética   abramo hefez

§ 1 0. l Teorema de Euler 135

DEMONSTRAÇÃO: Suponha que ordm(a)|n. Logo, n = r • ordm(a) e, portanto,

Reciprocamente, suponha que a" = l mod m. Queremos provar que ordTO(cz)|n. Peladivisão euclidiana, podemos escrever n = ordm(a)g + r, onde r < ordm(a). Suponha, porabsurdo, que r =£ 0. Então,

l = a" = aordm(a)9+r = aord™(a) V = ar,

o que é um absurdo, pois O < r < ordm(a) e ordm(a) é o menor expoente não nulo i talque a2 = l mod m.

D

Corolário. 5e/<zm a, m 6 M, com (a, m) = 1. Temas que ordm(a)|y>(m).

O próximo resultado nos dará informações sobre os divisores dos números de Fermat.

Proposição 10.1.5. Todo divisor de Fn é da forma 2n+1k + 1.

DEMONSTRAÇÃO: Inicialmente, note que o produto de números da forma 2n+1k + l étambém um número dessa forma. Portanto, basta provar a proposição para os divisoresprimos de Fn.

Seja p um divisor primo de Fn = 22" + 1. Logo, p é ímpar e

22" + l = O mod p.

Daí segue-se que ordp(2) / 2n, pois, caso contrário, teríamos 2 = 0 mod p, o que éfalso pois p é ímpar.

Elevando ao quadrado ambos os membros da congruência acima, temos

O = (22" + l)2 - 22"+1 + 2 - 22" + l = 22"+1 -1 + 2 (22" + l) = 22"+1 - l mod p,

e, portanto,22"+1=l mod p.

Do lema, segue-se que ordp(2)|2n+1, e como ordp(2) / 2n, segue-se que ordp(2) =2n+1.

Por outro lado, pelo Pequeno Teorema de Fermat, temos que 2P~1 = l mod p e,conseqíientemente, pelo Lema, temos que ordp(2)|p — 1. Daí segue-se que 2n+1|p — l e,portanto, p = 1n+lk + l.

D

Page 141: Elementos de aritmética   abramo hefez

136 10. Os Teoremas de Euler e Wilson

Exemplo 10.1.4. Neste exemplo, vamos dar uma prova mais conceituai, do que a doExemplo 9.2.2, do fato de que o quinto número de Fermat F& = 225 + l não é primo.

Pela Proposição 10.1.5, temos que os possíveis divisores primos de FS são os númerosprimos da forma 26/c + 1.

Fazendo k variar de l a 10, obtemos os números: 65, 129, 193, 257, 321, 385,449, 513,577, 641, dos quais apenas 193, 257,449, 577 e 641 são primos.

Vamos testar esses valores. Para p = 193, temos que

28 = 256 = 63 mod 193,

logo,232 = 634 = 1092 = 108 mod 193,

e, conseqíientemente,232 + l = 109 ^ O mod 193.

Deixaremos para o leitor, como exercício, verificar que 232 +1 O mod 257, 232 +1 O mod 449 e 232 + l =á O mod 577.

Vamos, agora, mostrar que 641 divide F5.De fato,

216 = (256)2 = 65536 = 154 mod 641.

Logo,232 = 1542 = 23716 = 640 mod 641.

Daí, temos que232 + l = 641 = O mod 641,

o que implica que 6411F&.

Corolário. Na progressão aritmética de primeiro termo l e razão 2r, para r e IN fixo,existem infinitos números primos.

DEMONSTRAÇÃO: Seja Fn o n-ésimo número de Fermat. Como todo número naturalmaior do que l possui pelo menos um divisor primo, segue-se que cada número de Fermattem, pelo menos, um divisor primo e, como (Fn, Fm) = l, se n ^ m, esses divisores sãodois a dois distintos. O resultado segue-se agora da Proposição 10.1.5.

D

Para finalizar este Capítulo, mostraremos como o Teorema de Euler conduz a um testede primalidade devido a E. Lucas, publicado em 1878, que é uma recíproca parcial doPequeno Teorema de Fermat.

Page 142: Elementos de aritmética   abramo hefez

§10.1 Teorema de Euler 137

Teorema 10.1.3 (Lucas). Sejam aem dois números naturais tais que (a, m) = 1. Suponhaque

am-l ^ j mocj m^

e queak já l mod m, VÃ, A; < m — 1;

então, m é primo.

DEMONSTRAÇÃO: Pelo Teorema de Euler, temos que a^m^ = l mod m; logo, pelahipótese, temos que (p(m) > m — 1; e, como (p(m) < m — l, segue-se que ip(m) = m — l,o que implica que m é primo.

D

Problemas

10.1.1 Ache o resto da divisão de

a) 560 por 26 b) 3100 por 10.

10.1.2 Mostre que, se m > 2, então <f>(m) ê par.

10.1.3* a) Mostre que

^ i = -m<p(m).(i, m) = l

i < m

b) Mostre que, se mi , . . . , mvrm\ um sistema reduzido de resíduos módulo m, então mdivide mi H h "^(m).

10.1.4 Resolva em m 6 IN as equações

a) (p(m) = 12 b) ip(m) = 8

c) (f>(rn) = 16 d) <j0(m) = 24

10.1.5 Supondo que (a, m) = (a — l, m) = l, mostre que

l + a + a2 + • • • + a^™)"1 = O mod m.

10.1.6* Mostre que, se tf>(m) = 2r, para algum r e M, então m é um produto de umapotência de 2 e de primos de Fermat distintos 2.

2Essa equação aparece na resolução dada por Gauss do problema clássico da construtibilidade com régua ecompasso dos polígonos regulares inscritos numa circunferência.

Page 143: Elementos de aritmética   abramo hefez

138 10. Os Teoremas de Euler e Wilson

10.1.7 Supondo que (m, n) = l, mostre que

10.1.8 Sejam a, m G IN*, com m > l, tais que (a, m) = 1. Mostre que, se n\n-i mod 92(771), então ani = a712 mod m.

10.1.9* Mostre que 2730|ra13 - n, para todo n 6 M.

10.1.10 Sejam a 6 IN e n, r 6 IN*, com (r, n) = 1. Mostre que na PA

a, a + r, ... , a + (n - l)r,

há exatamente <p(n) números primos com n.

10.2 Teorema de Wilson

Nesta seção, vamos provar um teorema atribuído a Wilson(1741-1793), mas que, narealidade, foi provado, pela primeira vez, por J.L. Lagrange (1736-1813).

Teorema 10.2.1 (Wilson), p é um número primo se, e somente se, (p— 1)1 =p—l mod p.

DEMONSTRAÇÃO: Suponhamos p primo. Para todo z G (l, . . . ,p — 1}, pela Proposição10.1.1, a congruência iX = l mod p possui uma única solução, módulo p; ou seja, dadoi G {l, ... ,p — 1} existe j G {l, ... ,p — 1} tal que ij = l mod p. Por outro lado, sei G {l, ... ,p — 1} é tal que i2 = l mod p, então p|i2 — l, o que equivale a p\ — l oup\ + l,o que só pode ocorrer se i = l ou i = p — 1.

Logo,2 ... (p - 2) = l mod p,

e, portanto,l - 2 - - - ( p - 2 ) ( p - l ) =p- l mod p,

Reciprocamente, se p não é primo, temos, pelo Exemplo 7.1.4, quep|(p— 1)! e, portanto,p não divide [(p — 1)! — (p — 1)], o que mostra que (p — 1)! p — l mod p.

D

O teorema de Wilson pode ser lido como se segue: p é primo se, e somente se,

(p -!)! + ! = 0 mod p.

Note que o Teorema de Wilson é um critério de primalidade. Para verificar se umnúmero n é primo, basta calcular (n — 1)! + l e verificar se este número é divisível por n.

Page 144: Elementos de aritmética   abramo hefez

§10.2 Teorema de Wilson 139

Infelizmente, este método não é nada eficiente. Imagine que, para verificar que 83 éprimo, se deva calcular (83 — 1)! + l e verificar se este número é divisível por 83.

Exemplo 10.2.1. Se p é um número primo ímpar, então p\1p~l + (p — 1)!.De fato, sendo p um número primo ímpar, pelo Pequeno Teorema de Fermat, temos que

p\2p~l - l. Por outro lado, pelo Teorema de Wilson, p\(p - 1)1 + 1. Logo, p\[2p~l - 1] +((p -!)! + !].

Exemplo 10.2.2. Seja p = 2ç + l um número primo, onde q é ímpar. Vamos mostrar queq\ l mod p ou q\ l = O mod p.

De fato, considere as congruências:

q + (q + 1) = O modp(ç - 1) + (q + 2) =0 modp

l + 2ç = 0 modp.

Do Problema 9.1.1, pelo fato de q ser ímpar, segue-se que

q(q - 1) • • • l + (q + l) (q + 2) • • • 2ç = O mod p.

Multiplicando ambos os membros da congruência acima por q\ somando l , temos que

(ç!)2 + (2q)\ l = l mod p.

Portanto, pelo Teorema de Wilson, temos que

(ç!)2 = l mod p,

o que prova o resultado, levando em conta o Problema 9.1.2.

Problemas

10.2.1 Mostre que o número primo p é o menor inteiro maior do que l que divide onúmero (p — 1)! + 1.

10.2.2 Mostre que, se p > 2 é um número primo, então

10.2.3 Seja p > 3 um número primo.

a) Mostre que p! e (p — 1)! — l são primos entre si.

b) Prove que, se n 6 IN* e n = (p — 1)! — l mod p!, então os p - 2 inteiros que precedemn e os p inteiros que sucedem n são compostos.

Page 145: Elementos de aritmética   abramo hefez

140 10. Os Teoremas de Euler e Wilson

10.2.4 Seja p um número primo e a € IN. Mostre que

a) ap + (p - l)!a = O mod p b) (p - l)!ap + a = O mod p

10.2.5* Seja p um número primo tal que p = l mod 4. Mostre que

l2

+ 1 = 0 mod p.

10.2.6 Seja p um número primo tal que p = 3 mod 4. Mostre que

= l mod p.

10.2.7* Seja p um número primo ímpar e seja N = l • 3 • 5 • • • (p — 2). Mostre queAT = l mod p ou N + l = O mod p.

10.2.8 Seja p um número primo ímpar. Mostre que

a) 1232 • • • (p - 2)2 = 2242 - - - (p - l)2 mod p

b) Se p = l mod 4, então 2242 • • • (p - l)2 + l = O mod p.

c) Sep = 3 mod 4, então 2242 • • • (p - l)2 = l mod p.

Problemas Suplementares

10.5.1 Se n e IN*, então f(n)\n se, e somente se, n é da forma l, 22, 2a36, onde a, 6 €IN*.

10.5.2 Sejam m, n € IN* e d = (m, n). Mostre que

=

(p(d)

10.5.3 Mostre que (^(m2) = m<p(m) para todo m 6 IN.

10.5.4 Mostre que, se d|n, então <p(d)\<f>(n).

10.S.5* Mostre que, seri,...,rs e r{, . . . r\o sistemas reduzidos de resíduos respec-tivamente módulo m e módulo m', então os números rim1 + r^-m, onde l < i < s el < j < t, formam um sistema reduzido de resíduos módulo mm'.

10.S.6* Utilize o problema anterior para dar uma outra prova da Proposição 10. l .3.

Page 146: Elementos de aritmética   abramo hefez

11Resolução de Congruências

Neste Capítulo, mostraremos como resolver congruências e sistemas de congruênciaslineares, além de discutirmos a resolubilidade ou não de congruências quadráticas.

11.1 Resolução de Congruências Lineares

Esta seção será devotada à resolução de congruências dos seguintes tipos:

aX = c mod m, aX + c = O mod m;

ou seja, ao problema de determinar, se existirem, os números naturais x tais que ax =c mod m ou ax + c = O mod m.

Vamos, inicialmente, dar um critério para decidir se tais congruências admitem solução.

Proposição 11.1.1. Dados a,c,m 6 ]N*, com m > l, as congruências aX = c mod me aX + c = O mod m possuem solução se, e somente se, (a, m)\c.

DEMONSTRAÇÃO: Suponhamos que a congruência aX = c mod m tenha uma soluçãox; logo, temos que m\c — ax ou m\ax — c, o que equivale à existência de y tal que c — ax =my ou ax — c = my. Portanto, pelo menos uma das seguintes equações mY + aX = c ouaX — mY = c admite solução. Isto, em vista do que foi visto na Seção 6.1, implica que(a, m) | c.

Reciprocamente, suponha que (a, m)\c. Logo, em virtude da Proposição 6. l. l, a equaçãoaX — mY = c admite uma solução x, y. Portanto, ax = c + my e, conseqííeníemente, x ésolução da congruência pois, ax = c mod m.

A outra congruência é inteiramente análoga.

D

141

Page 147: Elementos de aritmética   abramo hefez

142 11. Resolução de Congruências

Note que, se XQ é solução da congruência aX = c mod m (respectivamente, aX + c =O mod m), então todo x tal que x = XQ mod m é também solução da congruência pois,

ax = axQ = c mod m (respectivamente, ax + c = CLXQ + c = O mod m).

Portanto, toda solução particular determina, automaticamente, uma infinidade de solu-ções da congruência. Essas soluções serão identificadas (módulo m), já que são congruentesentre si, e portanto, se determinam mutuamente.

Estaremos, portanto, interessados em determinar uma coleção completa de soluçõesduas a duas incongruentes módulo m, ás quais serão chamadas de sistema completo desoluções incongruentes da congruência.

Teorema 11.1.1. Sejam a, c, m 6 IN*, com m > l e (a,m)|c. Se XQ é a solução minimal( Lê, a menor solução ) da congruência aX = c mod m (respectivamente, aX + c =O mod 77i), então

m m mXQ, XQ -\, Xn + ^—r, • • • -i XQ + (u — i )—r ,

d d d

onde d = (a, m) formam um sistema completo de soluções incongruentes da congruência.

DEMONSTRAÇÃO: Vamos provar o resultado somente para a congruência aX = c modm, pois a outra é totalmente análoga. Pela Proposição 11.1.1, sabemos que a congruênciaadmite solução.

771Vamos mostrar que os números XQ + i—, com z 6 IN, são soluções. De fato,

d

í •rn\G _ _a [ XQ + í — l — dXn + Z—771 = OXn = C mod 771.\ J d

Além disso, esses números são dois a dois incongruentes módulo m. De fato, se, parai, j < d,

m mXQ +1— = XQ + j — mod TB,

d d

entãom m

i—r = ?— mod m.d J d

Pela Proposição 9. l .5, e pelo fato de

m

segue-se que i = j mod d, implicando que i = j.

Page 148: Elementos de aritmética   abramo hefez

§11.1 Resolução de Congruências Lineares 143

Finalmente, mostraremos que toda solução x da congruência aX = c mod m é con-7T?

gruente, módulo m,axQ + i— para algum i < d. De fato, seja x uma solução qualquer dacongruência; logo,

ax = axQ mod m,

e, portanto, pela Proposição 9.1.5,

j mx = XQ mod — .et

Logo, x — XQ = km/d. Pela divisão euclidiana, existe i < d tal que k = qd + i e,portanto,

m mx = XQ + qm + ^—- = XQ + i— mod m,,

d d

D

Exemplo 11.1.1. Resolvamos a congruência 8X = 4 mod 12.Como d = (8, 12) = 4 divide 4, temos que a congruência tem d = 4 soluções módulo

12.Por tentativa e erro, obtemos a solução minimal XQ = 2. Portanto, as soluções módulo

12 são2, 2 + 3, 2 + 6, 2 + 9.

Corolário 1. Se (a, m) = l, ewíão aí congruências aX = c mod m e aX+c = O mod mpossuem uma única solução módulo m,

Corolário 2. Sejam m > l e R' um conjunto reduzido de resíduos módulo m. Seja a E IN*,com (a, m) = 1. Então, para todo r E R', a congruência r X = a mod m possui umaúnica solução em R'.

A congruência aX = l mod m, com (a, m) = l, admite uma única solução módulo77i. Esta solução será chamada de inverso multiplicativo módulo m .

Observação 11.1.1. Note que, se uma congruência

aX = b mod m

possui solução, então d = (a, m) divide b. Pondo

m

temos que a congruência acima é equivalente a

a' X = b' mod n,

Page 149: Elementos de aritmética   abramo hefez

144 11. Resolução de Congruências

que, por sua vez, é equivalente à congruência

X =. c mod n,

onde c = b'a", sendo a" o inverso multiplicativo de a módulo m.

Exemplo 11.1.2. Resolvamos a congruência 13X = 4 mod 42.Como (13,42) = l, temos que a congruência tem apenas uma solução módulo 42.

Além disso, como 42 = 2 x 3 x 7, e [2,3,7] = 42, temos, pela Proposição 9.1.7 (ii), que XQé solução da congruência acima se, e somente se, XQ é solução simultânea das congruências:

13X = 4 mod 2, mod3, mod7.

É fácil verificar que XQ = 10 é solução simultânea das congruências acima.

Problemas

11.1.1 Pode o dobro de um número natural deixar resto igual a 9 quando dividido por 26?E quando dividido por 25?

11.1.2 Resolva, quando possível, as congruências:a) 3X = 5 mod 7 b) 6X = 21 mod 18c) 12.X = 36 mod 28 d) 12X + 36 = O mod 28

11.1.3 Seja p um número primo e seja a um número natural tal que p /fa. Mostre que aúnica solução módulo p da congruência aX = b mod p é x = ap~2ò.

11.2 Teorema Chinês dos Restos

No primeiro século da nossa era, o matemático chinês Sun-Tsu propôs o seguinte pro-blema:

Qual é o número que deixa restos 2, 3 e 2 quando dividido, respectivamente, por 3, 5 e7?

A resposta dada por Sun-Tsu para este problema foi 23.Traduzido em linguagem matemática, o problema de Sun-Tsu equivale a procurar as

soluções do seguinte sistema de congruências:

X = 2 mod3X = 3 modoX = 2 mod7.

Page 150: Elementos de aritmética   abramo hefez

§11.2 Teorema Chinês dos Restos 1 45

Mais geralmente, estudaremos sistemas de congruências da forma:

ai-X" = &i modmiaiX = 62 modma

aTX = br modmr

Para que tal sistema possua solução, é necessário que (aj, mj) |6j, para todo i = l, . . . , r.Neste caso, pela Observação 1 1.1.1, o sistema acima é equivalente a um da forma

X = c\ = c2 modn2 .^ ^

X = CT modnr

Teorema 11.2.1 (Teorema Chinês dos Restos). O sistema (11.1), onde (n^nj) = l, paratodo par n^ nj com i ^ j, possui uma única solução módulo N = n\n-i • • • nr. Tal soluçãopode ser obtida como se segue:

x = Niyici H ---- + NryrCr,

onde NÍ = N/UÍ eyié solução de NiY = l mod ni, i = l, . . . , r.

DEMONSTRAÇÃO: Vamos, inicialmente, provar que x é uma solução simultânea do sis-tema (11.1). De fato, como ni\Nj, se i j, e AT^ = l mod n^ segue-se que

+ ••• + NryrCr = NiyiCi = GÍ mod HÍ.

Por outro lado, se x' é outra solução do sistema (11.1), então

x = x' modrij, Vi, « = !,..., r.

Como (rij, nj) = l, para i ^ j, segue-se que [ni, . . . , nr] = n\ • • nr = Ne, con-seqíientemente, pela Proposição 9.1.7 (ii), temos que x = x' mod N.

D

Exemplo 11.2.1. Vamos determinar a solução do problema de Sun-Tsu.Neste caso, temos queJV = 3 x 5 x 7 = 105, NI = 35, JV2 = 21 e JV3 = 15. Por

outro lado, y\ 2, yi = 21 e yz — l são soluções, respectivamente, das congruências35Y = l mod 3, 21Y = l mod 5 e 15Y = l mod 7. Portanto, uma solução móduloN = 105 é dada por

x = N\y\c\ Niyici + N-^y^cz = 233.

Page 151: Elementos de aritmética   abramo hefez

146 11. Resolução de Congruências

Como 233 = 23 mod 105, segue-se que 23 é a solução minimal única, módulo 105, doProblema de Sun-Tsu e qualquer outra solução é da forma 23 + A105, com A e ]N.

Exemplo 11.2.2. Seja M um número natural e sejam r?, TU e TIS os seus restos peladivisão por 7, 11 e 13, respectivamente. Tem-se então que

M = 715r7 -l- 364ru + 924ri3 mod 1001.

De fato, temos N = 7 x 11 x 13 = 1001, NI = 143, AT2 = 91 e JV3 = 77. Por outrolado, yi = 5, í/2 = 4 e j/a = 12 são soluções de 143Y = l mod 7, 91 Y" = l mod l i e77Y = l mod 13, respectivamente. Logo, o sistema

X = r? mod 7X = TH mod 11_3T = rjs mod 13

tem por solução 715r7 + 364rn + 924r13 mod 1001.

O exemplo acima presta-se à seguinte brincadeira em sala de aula: O professor pede aum aluno que escolha um número menor do que 1001 e que diga os restos TI, r\\e r\z dessenúmero quando dividido por 7, 11 e 13, respectivamente. Sem nenhuma outra informação,o professor é capaz de adivinhar o número escolhido pelo aluno.

De fato, o número que o aluno escolheu é o resto da divisão de 715r7 + 364rn + 924rispor 1001.

Problemas

11.2.1 Ache todos os números naturais que deixam restos 2,3 e 4 quando divididos por 3,4 e 5, respectivamente.

11.2.2 Ache o menor número natural que deixa restos l, 3 e 5 quando dividido por 5, 7 e9, respectivamente.

11.2.3 Resolva o sistema:X = 2 mod 11X = 4 mod 12X = 5 mod 13

11.2.4 Resolva o sistema:3X = l mod 75X = 1 mod 114X = 3 mod 13

11.2.5 Levando em consideração que 2275 = 25 x 13 x 7, resolva a congruência 3X =11 mod 2275.

Page 152: Elementos de aritmética   abramo hefez

§11.3 Congruências Quadráticas 147

11.2.6* Resolva o sistema:X = 2 mod 3X = 3 mod 4X = 4 mod 5J£ = 5 mod 6

11.2.7 Resolva o sistema:X = 2 mod 3.X" = 3 mod 4X = 4 mod 5X = 2 mod 6

11.2.8 Mostre que, se (rii,nj) = l, para todos os i, j = l,... ,r com z ^ j, então osistema

X + GI = O mod niX + 02 = O mod «2

X + c,. = O mod nr

admite solução. Descreva todas as soluções do sistema.

11.2.9* Sejam F\,... ,Fn os n primeiros números de Fermat. Mostre que existe umnúmero natural N tal que FÍ divide N + i — l para z = l,..., n.

11.2.10 Sejam a, 6, n, m e IN, com n, m > 1. Mostre que o sistema

X = a modnX = b modm

possui solução se, e somente se, a = b mod (n, m). Além disso, se (m, n) = l, então asolução é única módulo mn.

11.3 Congruências Quadráticas

Uma congruência do tipoX = a mod m,

onde a, m € IN com m > l, nem sempre tem solução.Por exemplo, é fácil verificar que a congruência X2 = 2 mod 3, não possui nenhuma

solução.Quando a congruência X2 = a mod m possui alguma solução, diz-se que a é resíduo

quadrático, módulo m; caso contrário, diz-se que a é «ao resíduo quadrático, módulo m.Por exemplo, 2 é não resíduo quadrático módulo 3. Por outro lado, todo número natural

a é resíduo quadrático módulo 2. Um outro exemplo é dado pelo Problema 10.2.5, onde se

Page 153: Elementos de aritmética   abramo hefez

148 11. Resolução de Congruências

mostra que, se p é um número primo da forma 4n + l, então p — l é resíduo quadráticomódulo p.

Gauss dedicou uma boa parte do seu livro Disquisitiones Arithmeticae ao estudo dosresíduos quadráticos. Lá se encontra o belo Teorema chamado de Lei da ReciprocidadeQuadrática, que demonstraremos na Seção 11.4.

Nesta seção, apresentaremos um critério devido a Euler, relacionando o fato de umnúmero ser resíduo quadrático, módulo um número primo ímpar, com o Pequeno Teoremade Fermat.

O lema a seguir nos dirá que, se p é um número primo ímpar e a congruência X2 =a mod p possui uma solução, então ela possuirá uma outra solução, de modo que essasduas sejam as únicas soluções incongruentes entre si, módulo p.

Lema 11.3.1. Sejam p, a € IN, com p > 2 primo e {p, a) = 1. Se a congruência X2 =a mod p possui uma solução XQ e / = {O, l,... ,p — 1}, então (XQ,P) = l e p — XQtambém é solução e estas são as únicas soluções em I.

DEMONSTRAÇÃO: Se x\ a mod p, então l = (a,p) = (XQ,P), o que implica que(ZO,P) = 1.

Por outro lado, pelo Problema 9.1.2 (b),

(p — or0)2 = x\ a mod p.

Seja x\ /, com x\ XQ, tal que x2 = a mod p. Logo, XQ = x\d p e, portanto,p\x\ x\, o que implica que p\x\— XQO\IP\X\+XQ. Isto, por sua vez, implica que x\ XQou a:i = p — XQ.

D

O critério que estamos buscando será consequência do seguinte resultado.

Proposição 11.3.1. Sejam a, p 6 IN, onde p é um número primo ímpar e (a, p) = 1.

i) Se X2 = a mod p não tem solução, então (p — 1)! = a 2 mod p.

ii) Se X2 = a mod p tem solução, então (p — 1)! + a 2 =0 mod p.

DEMONSTRAÇÃO: Ponhamos R' = {!,...,p- 1}.

(i) Seja dado um elemento r e R'. Como a congruência X2 = a mod p não tem solução,pelo Corolário 2 do Teorema 11.1.1, existe um único r' e R', com r' ^ r, tal que rr' =a mod p. Portanto, agrupando os elementos de R', aos pares, temos que

P~I(p — 1)! = a 2 mod p.

Page 154: Elementos de aritmética   abramo hefez

§11.3 Congruências Quadráticas 149

(ii) Supondo que a congruência X2 = a mod p tem solução, pelo Lema 11.3.1, ela possuiduas soluções r e r'. Como r' = (p — r), e r2 = o mod p, segue-se que r r' + a = O e,conseqíientemente,

. p-3 p-1rr a 2 + a 2 =0 mod p.

Por outro lado, os outros elementos de R1 se agrupam aos pares de elementos distintoss e s', tais que ss' = a mod p. Portanto,

(p — l)! + a 2 =rr'a 2 + 0 2 =0 mod p.

D

Vamos agora ao resultado.

Teorema 11.3.1 (Critério de Euler). Seja p um número primo ímpar e seja a 6 IN tal que(a, n) = 1. Tem-se que

i) p\ 2 — l se, e somente se, a é resíduo quadrático módulo p.

ii) p\ 2 + l se, e somente se, a é não resíduo quadrático módulo p

DEMONSTRAÇÃO: O resultado segue-se da Proposição 1 1.3.1 e do Teorema de Wilson.

D

Exemplo 11.3.1. Voltando à questão colocada no Exemplo 7.3.3, temos que 47|246 — l,pois X"2 = 2 mod 47 tem a solução 7.

Apesar de não ser fácil, em geral, reconhecer no conjunto {l, . . .p — 1} quais são todosos resíduos quadráticos módulo p, é bem fácil determinar quantos são esses resíduos. Issoé uma consequência imediata do próximo resultado.

Proposição 11.3.2. Seja p um número primo ímpar. Os números l2, 22, . . . (E-^)2 são doisa dois incongruentes e representam todos os resíduos quadráticos módulo p.

DEMONSTRAÇÃO: É claro que todo número que é resíduo quadrático módulo p é con-gruente, módulo p, a um dos números: l2, 22, ... (p — l)2. Nesse conjunto de elementos hárepetições pois, a2 = (p — a)2 mod p, para todo a = l, ... ,p — 1. Portanto, os númerosl2, 22, . . . í2^)2 representam todos os resíduos quadráticos módulo p. Só falta mostrar quesão dois a dois incongruentes.

De fato, suponha que a, b G {l, . . . , -^}, com a < b, e que a2 = 62 mod p. Logo,p|62 — a2 e, portanto, p\ — a ou p|6 + a, o que é impossível.

D

Page 155: Elementos de aritmética   abramo hefez

150 11. Resolução de Congruências

Corolário. No conjunto {l,... p—1} há tantos resíduos quadráticos quanto não resíduosquadráticos, módulo p.

Exemplo 11.3.2. Sep = 5, então l e 2 são os os elementos de {l, 2,3,4} que são resíduosquadráticos módulo 5. Se p = 7, então l, 2 e 4 são os os elementos de {l, 2,3,4,5,6} quesão resíduos quadráticos módulo 7.

Problemas

11.3.1 Ache todos os resíduos quadráticos módulo lie módulo 13.

11.3.2 a) Determine no conjunto {1,2,..., 46} os resíduos quadráticos módulo 47.P—i

b) Determine todos os números a, com (a, 47) = l, tais que 47|a 2 — l .

c) Determine todos os números a, com (a, 47) = l, tais que 47|aEí~ + 1.

11.3.3 Seja Q C {l,... ,p—1} o subconjunto dos elementos que são resíduos quadráticosmódulo p. Denotemos por P o produto dos elementos de Q. Mostre quea) se p é da forma 4ra + 3, então P = l mod p.b) se p é da forma 4n + l, então P + l = O mod p.c) se p é da forma 4n + l, então a congruência X^ + 1 = 0 mod p admite solução.

11.3.4 Seja p um número primo maior do que 3. Seja Q como no problema anterior edenotemos por S a soma dos seus elementos. Mostre que p divide 5".

11.4 Lei da Reciprocidade Quadrática

Gauss demonstrou, em 1796, aos dezoito anos, o belo Teorema da Reciprocidade Qua-drática, anteriormente descoberto, sem demonstração completa, por Euler e Legendre. Esseserá o resultado central desta seção.

Como não lidamos neste livro com números negativos, introduzimos o símbolo —l, queserá sujeito às seguintes regras operatórias:

(-!)•! =-l, -(-!) = !, a + (-l) = o-l, o-(-l) = a + l; e

i \n _ í l se n é par— l se n é ímpar

Se p. é um número primo ímpar, define-se o símbolo de Legendre como sendo

a\ í lP} l ~*

seaé resíduo quadrático módulo pse a é não resíduo quadrático módulo p

É claro que ( — l = l, pois o é solução de X2 = a2 mod p. Em particular, l - J =1.\P J \Pj

Page 156: Elementos de aritmética   abramo hefez

§ 11.4 Lei da Reciprocidade Quadrática 151

Por outro lado, se a é ímpar, a congruência X^ = a = l mod 2 tem por solução todo

número ímpar; logo, í — J = 1.

O símbolo de Legendre, que desempenha papel importante na formulação da Lei deReciprocidade Quadrática, possui as seguintes propiedades:

Proposição 11.4.1. Sejam a, b, p E M, com p primo ímpar e (a, p) = (b, p) = 1. Tem-seque

i) Se a = b mod p, então ( — J = f - l.\P) \PJ

ii)P-i /a\) a 2 — | - l = o mod p.

\P/fa-b\\) l = - ) - .

V P J \P/ \PJ

DEMONSTRAÇÃO: (i) Como a = b mod p, segue-se imediatamente que a congruênciaX2 = a mod p tem solução se, e somente se, X2 = b mod p tem solução,(ii) A congruência decorre imediatamente do Critério de Euler (Proposição 11.3.1).(iii) Pelo item (ii) e pelo Problema 9.1.1 (c), temos que

.p/ \p>O resultado segue-se agora do Critério de Euler.

D

Corolário. Sejam p um número número primo ímpar eaeb dois números naturais primoscom p.

(i) Se a e b são, simultaneamente, resíduos ou não resíduos quadráticos módulo p, entãoab é resíduo quadrático módulo p.

(ii) Se a é resíduo quadrático módulo p e b é não resíduo quadrático módulo p, então ab énão resíduo quadrático módulo p.

Em particular, decorre da Proposição 11.4.1, para todos a, k E IN tais que (a, p) =(k, p) = l, que

P J \P J W \Py

Dado a E IN, com (a,p) = l, qualquer, podemos escrever a na forma a = k2pi • • -pr,onde k E IN e pi,... ,pr são números primos distintos, com (k,p) = (pi,p) = • • • =(Prip] = 1. Portanto,

/ >a _

P} \P

Page 157: Elementos de aritmética   abramo hefez

152 11. Resolução de Congruências

Isto mostra que, para determinar o símbolo de Legendre de um número natural qualquer,

basta saber calcular l - J , onde p e g são números primos distintos.

-)p)A seguir, determinaremos l - J em vários casos particulares.

\PJ

Proposição 11.4.2. Seja p um número primo ímpar. Temos que

(P~l\ J *> Je P =

V P ) \ se p == 4n + l

4n + 3

DEMONSTRAÇÃO: Se p é da forma 4n + l, então (p — l)/2 é par; logo, pelo Problema2.1.6, deduz-se que (p — 1)(P-1)/2 = mp + l, para algum m 6 IN. Portanto,

p|(p- 1)^-1,

donde o resultado se segue, em vista do Critério de Euler.Suponhamos, agora, que p seja da forma 4n + 3. Logo, (p — l)/2 é ímpar e pelo

Problema 2.1.6, deduz-se que (p — l)^"1)/2 = mp — l, para algum m 6 IN. Portanto,

p|(p-l) 2 +1,

donde o resultado se segue, novamente, em vista do Critério de Euler.

D

O próximo resultado, conhecido como Lema de Causs, nos dará um método para deter-

minar í — l para todo primo ímpar p e todo número natural a, tal que (a, p) = 1.\Pj

Proposição 11.4.3 (Lema de Gauss). Sejam p e a dois números, com p primo ímpar e(p, a) = 1. Sejam n,... , rp-i os restos da divisão por p dos números a, 2a,.. . ,

2

respectivamente. Se k é o número dos r i que são maiores do que ^j-, então

a

P

DEMONSTRAÇÃO: Como (a,p) = l, os números a, 2a,. . . , 2^a são dois a dois in-congruentes módulo p, pois, se na = ma modp, com n, m < (p — l)/2 e n ^ m,então n = m mod p, o que é absurdo. Portanto, ri, . . . rp-i € {l, 2 , . . . ,p — 1} e são

2

distintos. Dividamos o conjunto {ri, TI,.... rp-i } em duas partes: {&i, • • • , í»fc}, dos ele-2

mentos maiores do que (p — l)/2; e {ci,..., c/}, dos elementos menores do que ou iguaisa (p - l)/2. Note que k +1 = (p - l)/2.

Page 158: Elementos de aritmética   abramo hefez

§ 1 1 .4 Lei da Reciprocidade Quadrática 1 53

Observe, agora, que os números p — b\,...,p — bk são menores do que (p — l)/2 e quesão distintos entre si. Além disso, esses números são distintos dos números cj, . . . , c/, pois,se p — bi = Cj, teríamos b{ = GJ mod p, o que não é o caso.

Portanto, como k + l = (p — l)/2, segue-se que

{p -&!,... ,p - bk} U {Cl, . . . , Q} = {l, 2, . . . , 1}.

Temos, então, que

Por outro lado, pela definição dos r i, temos que

• bkci • • • cL = a l — — - ! mod p;

e, portanto,

P— ib i - - - bhci •••€[ = a 2 (p - bi) • • • (p - bk)ci • • • q mod p,

dondebi---bk = aV(p-61). . .(p-6 f c) mod p.

Como (p,p — 6j) = l, para todo i, existe di tal que di(p — bi) = l mod p (Proposição1 1.1.1); logo,

di---dkbi---bk = aIL2~ mod p. (11-2)

Note que d; 6; + 1 = O mod p, logo, pelo Problema 9. l . l , c?i • • • dkb\ • • bk = l mod p,se k é par, e d\ • • dkbi • • • bk + l = 0 mod p, se A; é ímpar. Portanto, de (l l .2), obtemosque

a^ -(-l)fc = 0 mod p,

e o resultado segue-se da Proposição 1 1.4.1 (ii).

D

O próximo resultado nos dará uma fórmula para calcular o símbolo de Legendre.

Proposição 11.4.4. Sejam p e a dois números naturais ímpares, com p primo e (a, p) = 1.

Pondo p' = (p - 1)11 e K = \-\ 2- -j ----- h p'- L temos queLPJ L P\ P

Page 159: Elementos de aritmética   abramo hefez

154 11. Resolução de Congruências

DEMONSTRAÇÃO: Sejam ri,... ,rp>, respectivamente, os restos da divisão por p dosnúmeros a, 2a,..., p'a. Temos que

f a1a=p 2-L P

i f ;&!p a = p p - +

Somando, membro a membro, as igualdades acima; e após somarmos os termos da PA:1,2,...,p', temos que

p2-l—-—a = (H 1- p')a = pK + ri H h rw.

o

Mas, usando as notações da demonstração do Lema de Gauss e pondo B = b\ 6fee C = ci -\- Q, temos que r\-\ ry = S + C; e, portanto,

p2-lí-— a =£« + £ +C. (11.3)

£5

Como{cx,...,Ci,p - &i , . . . ,p - bk} = {!,... ,p'},

segue-se queP 2 -1 = 1 .

8

Subtraindo (l l.4) de (l l.3), temos, para K > k, que

'=pk-B + C. (11.4)

í—-(a-l)=p(/c-fc)+2B; (11.5)£5

e, para fc > K, quep2-l£——(a-l)+p(fc-is) = 2B. (11.6)

8

Sendo a — l par e p ímpar, decorre das igualdades acima que K & k têm a mesmaparidade, seguindo-se o resultado do Lema de Gauss.

D

Page 160: Elementos de aritmética   abramo hefez

§ 11.4 Lei da Reciprocidade Quadrática 155

Exemplo 11.4.1. Vamos mostrar que a equação diofantina X2 — \3Y = 5 não possuisoluções em números naturais.

De fato, se ela tivesse alguma solução, 5 seria resíduo quadrático módulo 13. Vamosmostrar que esse não é o caso.

Temos que

5 10

Portanto,

' £ ) = (-D" = (-D6 =-l,

decorrendo daí que 5 é não resíduo quadrático módulo 13.

Corolário. Seja p um número primo ímpar. Tem-se que

l, se p = l ou p = 7 mod 8—l, sep = 3 ou p = 5 mod 8

DEMONSTRAÇÃO: Temos que

0."0'P\ 2 p

e, portanto,[21 f 21 Fp-l 2'i

K= \- \+ 2- + • • • + ^ =0.f 212-L P\] L * P]

Note que as conclusões a que chegamos na demonstração da Proposição 11.4.4 sãoválidas até (11.6), inclusive, independentemente da paridade de a. Logo, sendo a = 2 e

onde k tem o mesmo significado que no Lema de Gauss.Portanto, k e (p2 — l)/8 têm a mesma paridade, e o resultado segue-se do Lema de

Gauss, após analisar a paridade de (p2 — l)/8.

D

A Proposição 11.4.4 nos fornece uma fórmula para calcular o símbolo de Legendre re-lativamente a um número primo ímpar qualquer. No entanto, isso pode ser muito trabalhosopara números grandes. Veremos, em seguida, como a Lei da Reciprocidade Quadrática deGauss nos permitrá fazer esse cálculo de modo muito mais eficiente.

Page 161: Elementos de aritmética   abramo hefez

156 11. Resolução de Congruências

Para deduzir a Lei da Reciprocidade Quadrática, necessitaremos do lema chave a seguir,que possui várias demonstrações na literatura. A demonstração que apresentaremos é devidaao matemático alemão Ferdinand Gotthold Max Eisenstein (1823-1852), contemporâneo deGauss.

Lema 11.4.1. Sejam p e q dois números primos ímpares distintos. Tem-se que

+ 12?• — l p~2~9

p-lq-l

DEMONSTRAÇÃO: A demonstração será melhor compreendida se a visualizarmos geo-metricamente.

Num sistema retangular de coordenadas, marquemos sobre o eixo das abscissas os pon-tos distantes l, 2 , . . . , (p — l)/2 unidades da origem O', e sobre o eixo das ordenadas, ospontos distantes l, 2, . . . , (q — l)/2 unidades de O. Além disso, marquemos os pontosP = (p/2,0), Q = (O,ç/2), R = (p/2,q/2) e os pontos com ambas as coordenadasnaturais no interior do retângulo OPRQ.

Os pontos de coordenadas naturais no interior do retângulo (dentro do retângulo, masnão na fronteira), são em número ((p — l)/2)((q — l)/2).

A reta que passa por O & R tem por equação py = qx e a reta x = k a corta no pontode coordenadas (k, kq/p). Como kq/p 0 M, se & e IN e l < k < p — l, segue-se queos pontos de coordenadas naturais sobre a reta x = k, acima do segmento O P e abaixo da

reta OR, são em número — . Portanto, o número de pontos de coordenadas naturais no

interior do triângulo OPR é

-j. q2 pLPJ L P\, tomando as retas y = l, l — l, 2 , . . . , (q — l)/2, tem-se que o número

Page 162: Elementos de aritmética   abramo hefez

§ 11.4 Lei da Reciprocidade Quadrática 157

de pontos de coordenadas naturais no interior do triângulo ORQ é

Portanto, K + K.' é igual ao número total ((p — l)/2)((g — l)/2) de pontos no interiordo retângulo OPRQ, seguindo-se daí o resultado.

D

Finalmente, podemos provar o resultado.

Teorema 11.4.1 (Lei da Reciprocidade Quadrática de Gauss). Sejam p e q doisnúmeros primos ímpares distintos. Tem-se que

- ] ( - ) = (—l)2^" ai~.q J \p/

DEMONSTRAÇÃO: Isto é uma consequência imediata da Proposição 11.4.4 e do Lema11.4.1.

D

Isto pode ser reenunciado através dos dois seguintes corolários:

Corolário 1. Se p e q são dois números primos distintos, tais que p = q = 3 mod 4, entãoq é resíduo quadrático módulo p, se, e somente se, p é não resíduo quadrático módulo q.

Corolário 2. Se p e q são dois números primos distintos, tais que p = l mod 4, ou q =l mod 4, então q é resíduo quadrático módulo p, se, e somente se, p é resíduo quadráticomódulo q.

A Lei de Reciprocidade Quadrática, juntamente com as propriedades do símbolo deLegendre contidas nas Proposições 11.4.1,11.4.2 e no Corolário da Proposição 11.4.4, fun-ciona como um algoritmo para determinar se um número é ou não é resíduo quadráticomódulo um número primo ímpar p.

/2561\o 11.4.2. Vamos calcular I l.

\k /Note inicialmente que 241 é um número primo e que 2561 = 151 mod 241. Logo,

pela Proposição 11.4.1 (i), temos que

/2561\ /151\ 241 J ~ V 241 J "

Page 163: Elementos de aritmética   abramo hefez

158 11. Resolução de Congruências

Pela Lei da Reciprocidade Quadrática, temos que

| 151 \\ ,^75.120 _ j.

e, portanto,

151\2\ 2_W 5241 isi 151

J_\\ /_5_\ /151\ / 1\

151 J Ui; ~ Uiy ~ ( 5 "

Com isto, provamos que 2561 é resíduo quadrático módulo 241. Como consequênciaimediata, temos que a equação diofantina

X2 - 24iy = 2561

possui soluções naturais./3\o 11.4.3. Vamos calcular l - l , onde p é um número primo maior do que 3.

\P/Pela Lei da Reciprocidade Quadrática, temos que

Pela Proposição 1 1 .4. l (i), temos que

(i) = l, sep= l mod3\3t

(f) =

Por outro lado,

= 2 mod3

l, se p = l mod 4— l, se p = 2 mod 4

Juntando as informações acima, temos que

-} = í '•p) l -L= l ou p = 11 mod 12

se p = 5 ou p = 7 mod 12

Exemplo 11.4.4. Vamos calcular l - l, onde p é um número primo maior do que 5.

Page 164: Elementos de aritmética   abramo hefez

§ 11.4 Lei da Reciprocidade Quadrática 159

Pela Lei da Reciprocidade Quadrática, temos que

(f) - (f) (-' = (f) •Pela Proposição 11.4.1 (i), temos que

(g) = 1, se p = l mod 5

(g) = —1} sep = 2mod5

(§) = -!, sep = 3mod5

. (g) = l, sep = 4 mod 5

(!) =

A seguir, como aplicação da Lei de Reciprocidade Quadrática, generalizaremos o Lema8.1.1. Em seguida, utilizaremos esse resultado para provar mais um caso do Teorema deDirichlet sobre a existência de primos em progressões aritméticas.

Proposição 11.4.5. Sejam x ey dois números coprímos. Se p é um divisor primo ímpar dex2 + y2, então p = l mod 4.

DEMONSTRAÇÃO: Seja p um divisor primo ímpar de x2 + y2. Tem-se, necessariamente,que p }{xe,p /y, pois se p dividisse x ou y, então p dividiria ambos, o que é uma contradição.

Sejam r, s e {l,... ,p — 1}, respectivamente, os restos da divisão de x2 e y2 por p;logo, r + s = O mod p. Se s' é o inverso multiplicativo de s módulo p (que existe, pois(s,p) = 1), tem-se que

r s' + l = O mod p,

o que implica quers'=p—l mod p. (11-7)

Sendo s resíduo quadrático módulo p e ssr = l mod p, segue-se, do Corolário daProposição 11.4.1, que s1 também é resíduo quadrático módulo p. Conseqííentemente, r s'é resíduo quadrático. Por (l 1.7), segue-se que p — l é resíduo quadrático e, portanto, pelaProposição 11.4.2, p é da forma 4ra + 1.

D

Corolário. Todo divisor de um número da forma x2 + y2, com (x, y) = l, é da forma

DEMONSTRAÇÃO: Se m é um divisor de x2 + y2, podemos escrevê-lo na forma m = 2lp,onde p é ímpar. Se um dos números ré ou y é par e o outro é ímpar, tem-se que / = 0. Se x e

Page 165: Elementos de aritmética   abramo hefez

160 11. Resolução de Congruências

y são ímpares, então 1 = 1. Seja agora p"1 • • • p®r a decomposição de p em fatores primos.Logo, cada pi é da forma 4fe + 1. Como produtos de números desta forma continuam dessaforma, o resultado segue-se.

D

Exemplo 11.4.5. Existem infinitos primos da forma 8n + 5.De fato, todo número primo desta PA é ímpar e, portanto, de uma das seguintes formas:

8k + l, 8& + 3, 8/S + 5, 8k + 7.

Note que o quadrado de um número ímpar é da forma 8k + l (verifique!).Suponhamos, por absurdo, que os números primos da forma 8A; + 5 que ocorrem nessa

PA sejam em número finito; e seja p o maior deles.Considere o número

o = ( 3 - 5 - 7 - - - p ) 2 + 4.

Sendo (3 • 5 • 7 • • • p)2 o quadrado de um número ímpar, logo, da forma 8k +1, segue-seque a é da forma 8k + 5.

Sendo a ímpar e soma dos quadrados de dois números coprimos, segue-se da Proposição11.4.5 que todo divisor de a é da forma 4fc +1; portanto, da forma 8A; + l ou 8k + 5. Comoo produto de números da forma 8A; + l é da mesma forma, a deve ter um fator primo q daforma 8k + 5, que não pode ser nenhum dos primos 3,5,7,... ,p, pois estes não dividema. Portanto, q > p, o que é um absurdo.

Problemas

11.4.1 Mostre que

se p = i mod 28, i = l, 3,9,19,25,27-W1*p) l -l, se p = i mod 28, i = 5,11,13,15,17,23

11.4.2 Para quais primos p é o seguinte número resíduo quadrático?

a) 6 b) 10 c) 14 d) 15 e) 21 f) 35.

11.4.3 Ache os números primos p para os quais í — J = 1.

11.4.4 Mostre que p — 3 é resíduo quadrático para todo número primo da forma 6n + l enão resíduo quadrático para todo número primo da forma 6n — l

11.4.5 Mostre que a congruência X2 = 93 mod 137 possui solução.

11.4.6* Seja p > 2 um número primo. Considere a congruência aX2 + bX + c =O mod p, onde p /a, e seja m um número natural tal que mp + ò2 — 4ac > 0. Mostre quea congruência possui solução se, e somente se, mp + 62 — 4ac é resíduo quadrático móduloP-

Page 166: Elementos de aritmética   abramo hefez

Sugestões aos Problemas

Nesta parte do livro, apresentamos sugestões e, algumas vezes, a solução para os pro-blemas assinalados com asterisco ao longo do livro.

Capítulo 2

2.1.2 Utilize a fórmula para a soma l H ----- h n, bem como a fórmula do Problema 1.3. l (a).

2.2.1 Por indução sobre n.Alternativamente, pode-se proceder como se segue:Considere a identidade de polinómios

que pode ser obtida com uma fórmula análoga à da soma dos termos de uma PG, e, emseguida, iguale os coeficientes de Xi de ambos os lados.

2.2.3 (a) Use a identidade (l +X)n+m = (l + X)n(l +X)m e efetue o produto no segundomembro.

2.2.5 Sugestão para (a): Por indução sobre n. Quando o conjunto tem n + 1 elementos, fixeum elemento a e separe os seus subconjuntos em duas classes: os subconjuntos que contêmo e os que não contêm a. Use, então, a hipótese de indução.

2.3.1 Suponha, por absurdo, que exista um número m tal que O < m < 1. ConsidereA = (m1; i e IN}. Sendo o conjunto A não vazio, pela propriedade da Boa Ordem, elepossui um menor elemento mr. Mostre que O < mr+1 < mr < l, o que é uma contradição,pois mr+l E A.

2.3.2 Suponha, por absurdo, que não exista tal n. Considere A = {ia; i € IN}. Mostreque A é limitado superiormente; logo, pelo Corolário do Teorema 2.3.1, A possui um maiorelemento rã. Mostre que (r + l)a > rã, o que é uma contradição, pois (r + l)a € A.

2.3.3 Seja S um subconjunto de ]N tal que O G S e S é fechado com respeito à operação"somar l" a seus elementos. Queremos provar que S = IN.

161

Page 167: Elementos de aritmética   abramo hefez

162 Problemas: Sugestões

De fato, se A = IN \ ^ 0, então A possui um menor elemento a. Como a 6 A,segue-se que a ^ O, já que O e S". Portanto, a — l ^ A e, conseqiientemente, a — l 6 S.Como S é fechado com respeito à operação "somar l", segue-se que a E S, o que contradizo fato de a 0 S.

Como o Axioma da Indução implica o Princípio de Indução Matemática (Teorema1.3.1), temos que a Propriedade da Boa Ordem implica também o Princípio de InduçãoMatemática.

2.4.2 (d) Use a identidade u^u^+i — Uk-iUk = u^.

2.4.3 Fixe n e demonstre a validade da identidade usando a segunda forma do Princípio deIndução sobre m.

2.4.4 Use a fórmula do Problema 2.4.3. Você conseguiria deduzir essas fórmulas de outraforma?

2.S.2 Usando o mesmo argumento utilizado para provar a fómula de Binet, mostra-se que

n 2 2

2.S.3 Sendo an — an_i = n, somando, temos que

Como a soma do lado esquerdo dá an — do, segue-se que

n(n + l)an = l + — -

2.S.4 Seja .R^ o número máximo de regiões em que se consegue dividir o plano com nretas.

É imediato verificar que RQ — l e RI = 2.O que se pode dizer de R-^l Bem, RI = 4, pois são três as regiões determinadas por

duas retas paralelas e quatro as regiões determinadas por duas retas concorrentes.Determinemos agora #3. Se as retas são paralelas, então o número de regiões é quatro.

Se duas retas são paralelas e a terceira é concorrente com as outras duas, ou se as três retassão concorrentes, o número de regiões é seis. Se as três retas se cortam duas a duas empontos distintos, então o número de regiões será sete. Portanto, R$ = 7.

Note que, se considerarmos a situação anterior de duas retas se cortando e a terceira retacortando-as fora do ponto de interseção, teremos as quatro regiões determinadas pelas duasretas, acrescidas de três novas regiões. Portanto, RS = R% + 3 = 7.

Page 168: Elementos de aritmética   abramo hefez

Problemas: Sugestões 163

Vejamos agora o valor de R±. Se considerarmos a situação anterior que gerou R3 = 7, ecortarmos as três retas por uma quarta, o número máximo de regiões será R^ = R^+4 = 11.

Em geral, obtém-se o número máximo Rn de regiões com n reías, através da configura-ção das n — l retas que gera Rn-i, cortando-a com uma reta que não é paralela a nenhumadas outras retas e que não passa por nenhum ponto de interseção de outras duas, obtendo nnovas regiões além das -i regiões pré existentes.

Assim,

Rn = Rn-i + n.

Utilizando agora a fórmula obtida no Problema 2.S.3, temos que

2.5.6 Por indução.

2.5.7 Use a fórmula de Binet.

Capítulo 3

3.1.4 Utilize o Lema 2.2.2.

3.1.9 Escreva a3 + 4 = (a3 - 8) + 12, a3 - 3 = (a3 + 27) - 30,a4 + 2 = (a4 - 16) + 18.

3.1.11 Desenvolva (n + l)n pelo binómio de Newton.

3.1.12 Sugestão para (c) e (d): Por indução sobre a.

3.S.3 11 ... 111 = 11 ... 108 + 3 = 4k + 3.

3.S.6 Observe que, de quatro números naturais consecutivos, um deles é divisível por 4.

Capítulo 5

5.2.5 Mostre que 6 divide n5 — n e use o Problema 3.1.12 (c).

5.2.8 Imite o Exemplo 5.1.1 e use os Problemas 5.2.3(c) e 5.2.2(a).

Capítulo 6

6.2.5 Note que M-i = 3 e use a Proposição 6.2.2.

6.S.3 Relacione o conjunto 5* (a, b) com o conjunto S (a, b) da Seção 6.1. Por exemplo,ache o seu menor elemento.

Page 169: Elementos de aritmética   abramo hefez

164 Problemas: Sugestões

Capítulo 7

7.1.12 Use o Lema 6.3.2.

Capítulo 8

8.1.1 Use o Lema 8.1.1.

8.1.6 Use os seguintes fatos: (Fj, Fj) = l, se i j, 2 /Fj e FS é composto.

8.1.7 Use a fórmula do Problema 2.S.2 para mostrar que u^—un-iun = u^_i + l. Concluaque todo divisor de un é divisor de u^l_l + l e use o Lema 8. l. l.

Capítulo 9

9.1.10 Note que 74 = 2401 = l mod 100.

9.1.11 Use o Corolário 2 da Proposição 9.1.3.

9.1.14 Note, inicialmente, que X = m — l mod m se, e somente se, X + l = O mod me, posteriormente, faça m = 6,5,4,3.

9.1.16 Suponha que este seja o caso. Então, existem a, a; 6 M tais que a2 + (a + l)2 +(a + 2)2 + (a + 3)3 = x2. Logo, 4a2 + 12a + 14 = x2. Portanto, z2 = 2 mod 4. Mas éfácil verificar que essa congruência é impossível.

9.1.17 Suponha que 4n + 3 = x2 + y2. Logo, x2 + y2 = 3 mod 4, e isto é impossível.

9.1.18 Por indução sobre k.

9.3.3 Dado um conjunto finito A, a notação #A representa a cardinalidade de A, ou seja oseu número de elementos.

Use a fórmula do Teorema 8.3.2 e a observação abaixo.Seja (n + m)r+i... (n + m)i(n + m)o a representação na base p de n + m. Se

njt + m,k > p, então«fc + fnk + 6 = (n + m)k + P,

onde ô = O, l é o que foi transportado do passo anterior.Daí segue-se que

nk + mk - (n + m)k _ p-ô > J

p-l p-1~

Page 170: Elementos de aritmética   abramo hefez

Problemas: Sugestões 165

Capítulo 10

10.1.3 Note que a igualdade é trivialmente verificada se m = 2. Portanto, podemos suporm > 2. Neste caso, <p(m) é par. O resultado segue-se notando que (a, m) = l 4»(m — a, m) = 1.

10.1.6 Seja m = PQ° • • • p%k a decomposição de m em fatores primos, onde

2 = pó < Pi < • • • < Pk-

Temos então, pelo Teorema 10.1.3, que

Como pi, . . . ,pk são diferentes de 2, devemos ter ai = • • • = a& = 1. Além disso,Pi — l = 2&, para i = !,...,&;, logo, PÍ = 2& + 1. Como pi é primo, segue-se daProposição 8.1.1 que /% = 2Hi para algum HÍ e M. Logo

onde 22"1 + l, . . . , 22"fc + l são primos de Fermat distintos.

10.1.9 Note que 2730 = 13 x 7 x 5 x 2, e que 13|n13 - n e 2|n13 - n. Para provar que 7e 5 dividem n13 — n, use o Problema 10.1.7.

10.2.5 Mostre que íf2^) '] = (p - 1)' mod p.

10.2.7 Suponha que p = In + l e note que (p - 1)! = 2nn!l • 3 • 5 • • • (In - 1). Use osProblemas 10.2.5, 10.2.6 para calcular n! e o fato de que 22n = l mod p.

10.S.5 Sejam a\, . . . , am e a'1? . . . , a'm, dois sistemas completos de resíduos módulo m em', respectivamente. Inicialmente, vamos provar que os números a/m' + aj^m, ao variar deí = l , . . . , m e f c = l,... m', formam um sistema completo de resíduos módulo mm'. Defato, esses são mm' números, dois a dois incongruentes módulo mm', pois suponha que

a/m + a&m = a^m + ci^m mod mm ,

onde a/m' + a'km > a\m' + a' m, logo,

mml\(ai — ax)m! + (a'k - a^)m.

Como (m, m') = l, segue-se que m|a/ — a^ e m'|a^, — a' o que implica que a/ =mod m e a'k = a'^ mod m', acarretando a/ = a^ e a'k = a'^.Agora, pelo Problema 5.2.2(b), note que

(a/m' + aj^m, mm') = l •£> (a/m' + a^m, m) — (aim! + a'km, m') = 1.

Page 171: Elementos de aritmética   abramo hefez

166 Problemas: Sugestões

Logo, pelo Lema de Euclides e pelo fato de (m, m') = l, temos que

! + a'km, m) = (a/m^m) = (a/, m),

e(a/m' + a^.m,m') = (a'km, m') = (a'h,m!).

Juntando as duas igualdades acima com a observação imediatamente acima delas, temosque

(airn! + a'km,mm') = l <£=$• (ai,m) = (a'h,m') = l,

o que mostra que ai = r i e a'k = r'j para alguma escolha de i e j.

10.S.6 É só observar que, no problema anterior, temos que s = <p(m) e í = if>(m') e queum sistema reduzido de resíduos, módulo mm', tem rt elementos.

Capítulo 11

11.2.6 Resolva, inicialmente, o sistema formado pelas três primeiras congruências.

11.2.9 Use o fato de que (Fj, Fj) = l, se i ^ j, e, em seguida, o Problema 11.2.8.

11.4.6 Siga os mesmos passos da dedução da fórmula para as raízes de uma equação dosegundo grau, completando quadrados.

Page 172: Elementos de aritmética   abramo hefez

y

índice Analítico

Aadição lalgoritmo de Euclides 56Andrew Wiles 96anti-simétrica 5associatividade 2axioma de indução 7BBachet de Méziriac 96Bertrand Russel 10binómio de Newton 19Ccancelativa 4Cari Friederich Gauss 11classe 44comutatividade 2congruentes 110conjectura de Goldbach 91conjunto de lacunas 71, 72coprimos 60cota superior 21critérios de divisibilidade 46, 119, 120Crivo de Eratóstenes 88Ddefinição por recorrência 14Diofanto de Alexandria 66, 96Disquisitiones Arithmeticae 110,131,148distributividade 2divisão euclidiana 30, 35divisor 30divisor comum 53

EEdouard Lucas 25elemento neutro 2equações diofantinas lineares 66Euclides 30expansão ò-ária 45expansão decimal 45expressões binômias 74Ffator 30fatorial 15, 104Fibonacci 28,43fórmula de Binei 27Francesco Maurolycus 10função fi de Euler 130GGauss 131Giuseppe Peano lHHipótese de Riemann 91Iidentidade de Euler 19identidade de Lagrange 19ímpar 37incongruentes 110, 142indução empírica 9indução Matemática 9integridade 2inverso multiplicativo módulo m 143Ivan Vinogradov 91JJacob Steiner 29

167

Page 173: Elementos de aritmética   abramo hefez

168

Jean Pierre Serre 91jogo de Nim 50LLagrange 138Lei da Reciprocidade Quadrática 148, 150Lejeune Dirichlet 98Lema de Gauss 152Lema de Euclides 54Leonardo de Pisa 26, 28Leonhard Euler 96Líber Abacci 28, 43limitado superiormente 21livre de quadrados 40Lucas, E. 27Mmaior do que 3maior elemento 21Marin Mersenne 96máximo divisor comum 53mdc 53mínimo múltiplo comum 63mmc 63multiplicação lmúltiplo 30múltiplo comum 63Nnão resíduo quadrático 147nove misterioso 47número binomial 17, 123número composto 82número primo 82números complexos 2números de Fermat 97números de Fibonacci 27, 79, 121números de Mersenne 98números ímpares 37números incongruentes 110números inteiros relativos 2números naturais l

números naturais congruentes 110números pares 37números perfeitos 102, 121números racionais 2números reais 2Oordem 44ordem de um número 134Os Elementos de Euclides 35,41, 53, 83Ppar 37paridade 37Pequeno Teorema de Fermat 92, 112, 132Pierre de Fermat 96Pitágoras 37pizza de Steiner 29Platão 96potências 15Prémio Abel 91primos de Fermat 98primos de Mersenne 98primos entre si 60primos gémeos 90Princípio de Indução Matemática 8Princípio de Indução Matemática, 2a Forma

22potências 16problema da moeda falsa 26, 49progressão aritmética 12progressão aritmético-geométrica 12progressão geométrica 12Propriedade Arquimediana 22, 37Propriedade da Boa Ordem 20prova dos nove 120

Qquociente 30, 36Rrazão 12recorrência 27

Page 174: Elementos de aritmética   abramo hefez

169

reflexiva 5 tricotomia 2Regiomanto 96 Uregra dos noves fora 120 Último Teorema de Fermat 96relação de ordem 5 Zrelação de Stifel 17 zero 43relação transitiva 5representação p-ádica 107resíduo quadrático 147resto 36Ssentença aberta 8sequência 11sequência de Fibonacci 27, 79, 121símbolo de Legendre 150sistema binário 439sistema completo de resíduos 126sistema decimal 43sistema completo de resíduos 111sistema completo de soluções incongru-

entes 142sistema posicionai 43sistema reduzido de resíduos 130sistema sexagesimal 43sistemas de numeração 43solução minimal 67soma dos divisores 101somatório 15subtração 6Sun-Tsu 144TTeorema Chinês dos Restos 144Teorema de Dirichlet 99Teorema de Euler 132Teorema de Legendre 105Teorema de Wilson 138Teorema dos Números Primos 90Teorema Fundamental da Aritmética 82teste de primalidade de Lucas 136torre de Hanói 23