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Universidade de Brasília
Elane Aparecida Xavier Ribeiro
A RELAÇÃO ENTRE DESENVOLVIMENTO MOTOR E IDADE
UM ESTUDO COMPARATIVO ENTRE CRIANÇAS DA
FASE INTRODUTÓRIA À FASE IV
Prof. Gounnersomn Luiz Fernandes.
Três Marias - MG Abril/2007
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ELANE APARECIDA XAVIER RIBEIRO
A RELAÇÃO ENTRE DESENVOLVIMENTO MOTOR E IDADE
UM ESTUDO COMPARATIVO ENTRE CRIANÇAS DA
FASE INTRODUTÓRIA À FASE IV
Três Marias - MG Abril/2007
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ELANE APARECIDA XAVIER RIBEIRO
A RELAÇÃO ENTRE DESENVOLVIMENTO MOTOR E IDADE
UM ESTUDO COMPARATIVO ENTRE CRIANÇAS DA
FASE INTRODUTÓRIA À FASE IV
Trabalho apresentado ao Curso de
Especialização em Esporte Escolar do Centro de
Educação à Distância da Universidade de
Brasília em parceria com o Programa de
Capacitação Continuada em Esporte Escolar do
Ministério do Esporte para obtenção do título de
Especialista em Esporte Escolar.
Orientador:
Profª. Ms. Jacqueline Pereira
Três Marias - MG
2007
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RIBEIRO, Elane Aparecida Xavier.
A RELAÇÃO ENTRE DESENVOLVIMENTO MOTOR E IDADE
UM ESTUDO COMPARATIVO ENTRE CRIANÇAS DA
FASE INTRODUTÓRIA À FASE IV
Três Marias – MG
007
(Nº de páginas, 64 p.
Monografia (Especialização) – Universidade de Brasília. Centro de Ensino a Distância, 2007.
Palavras-chave: Desenvolvimento motor, faixa etária,
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ELANE APARECIDA XAVIER RIBEIRO
A RELAÇÃO ENTRE DESENVOLVIMENTO MOTOR E IDADE
UM ESTUDO COMPARATIVO ENTRE CRIANÇAS DA
FASE INTRODUTÓRIA À FASE IV
Trabalho apresentado ao Curso de
Especialização em Esporte Escolar do Centro de
Educação à Distância da Universidade de
Brasília em parceria com o Programa de
Capacitação Continuada em Esporte Escolar do
Ministério do Esporte para obtenção do título de
Especialista em Esporte Escolar pela Comissão
formada pelos professores:
Presidente: Jacqueline Pereira
Universidade de Brasília
Membro:
Prof. Gounnersomn Luiz Fernandes
Universidade de Brasília
Três Marias – MG 2007
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Dedico esta monografia: ao meu marido Walmir;
aos meus pais Nelson e Maria; aos meus irmãos Carlos, Sheila,
Shirley e Junio; aos professores;
a minha orientadora Jacqueline Silva Figueiredo Pereira;
a todos profissionais do Programa Segundo Tempo.
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AGRADECIMENTO
Não tenho como expressar a minha gratidão para com todos, pela generosidade, fé,
orientação que enriqueceram o meu trabalho.
Agradeço a todos aqueles que, direta ou indiretamente contribuíram para a elaboração desta
monografia e, de modo especial a professora Jacqueline Pereira, pelo incentivo constante e pela
orientação.
Agradeço também ao Ministério do Esporte pela oportunidade de participar de um curso de
especialização à distância.
Enfim, agradeço a Deus pelo dom da sabedoria, a saúde e a força de vontade em nosso
interior em servir as crianças que necessitam da gente para trilhar um caminho com Deus.
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“Eu quase de nada sei, mas desconfio de muita coisa” Guimarães Rosa
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RESUMO
O desenvolvimento neuromotor é bastante complexo. Compreender a criança pequena em
processo de desenvolvimento significa estar atento às suas reais carências e mudanças de
comportamento, seja psicomotor, emocional ou cognitivo. O desenvolvimento global da criança,
principalmente o desenvolvimento motor, é um dos objetivos mais importantes da Educação Física
Escolar, mas para que ele se efetive é preciso considerar as carências e necessidades das crianças.
Este estudo compreende a relação existente entre desenvolvimento motor e idade. Analisou-se o
equilíbrio estático, equilíbrio dinâmico e a coordenação motora de crianças com idade entre 6 a 8
anos (alunos da fase Introdutória a Fase II), e crianças com idade entre 9 a 10 anos (alunos da Fase
III e Fase IV) da Escola Municipal Antônio Fonseca Leal da cidade de Três Marias, no Estado de
Minas Gerais.
Trata-se de uma pesquisa teórico-empírica cujos dados foram analisados quantitativa e
qualitativamente. A amostra foi constituída por 180 crianças de ambos os sexos, na faixa etária de 6
a 10 anos, regularmente matriculadas na Escola Municipal Antônio Fonseca Leal. Para cada faixa
etária foram avaliadas: 30 crianças com 6 anos de idade, 30 crianças com 7 anos de idade, 40
crianças com 8 anos de idade, 40 crianças com 9 anos de idade e 40 crianças com 10 anos de idade
com testes específicos de avaliação para cada idade.
Constatou-se que, das 180 crianças avaliadas em cada faixa etária, 68,8% acertaram os testes
de equilíbrio estático; 45% de equilíbrio dinâmico e 52,7% de coordenação motora as crianças
consideradas de melhor padrão sociocultural e apenas 38,8%, 12,7% e 6,6%, respectivamente, as
crianças com maiores dificuldades. Estes resultados revelaram que a maioria das crianças
pertencentes a este segundo grupo apresenta déficit motor, devendo submeter-se a um programa de
atividades motoras específicas.
Palavras-chave: Desenvolvimento motor, faixa etária,
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LISTA DE GRÁFICOS
Gráfico 1. Resultados da avaliação do equilíbrio estático em crianças de 6 anos .....................................35
Gráfico 2: Resultados da avaliação do equilíbrio estático em crianças de 7 e 8 anos ...............................36
Gráfico 3: Resultados da avaliação do equilíbrio estático em crianças de 9 e 10 anos .............................36
Gráfico 4: Resultados da avaliação do equilíbrio dinâmico em crianças de 6 anos ..................................37
Gráfico 5: Resultados da avaliação do equilíbrio dinâmico em crianças de 7 e 8 anos.............................37
Gráfico 6: Resultados da avaliação do equilíbrio dinâmico em crianças de 9 e 10 anos...........................38
Gráfico 7: Resultados da avaliação da coordenação motora em crianças de 6 anos..................................38
Gráfico 8: Resultados da avaliação da coordenação motora em crianças de 7 e 8 anos............................39
Gráfico 9: Resultados da avaliação da coordenação motora em crianças de 9 e 10 anos..........................39
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SUMÁRIO
1 - INTRODUÇÃO................................................................................................ 12 2 - FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA ................................................................... 14 3 - MÉTODOS....................................................................................................... 18
4 - RESULTADOS E DISCUSSÃO...................................................................... 33
5 - CONCLUSÃO................................................................................................. 40
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS............................................................ 44
ANEXO – Texto de Eustáquia Salvadora de Sousa1 e Helena Altmann2 ..... 46
1 Professora da Faculdade de Educação da UFMG; licenciada em Educação Física; doutora em Educação pela Unicamp. 2 Professora da Faculdade de Educação da UFMG; licenciada em Educação Física; doutora em Educação pela Unicamp.
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1 - INTRODUÇÃO
A motricidade da criança, que justifica sua própria existência no mundo, encontra-se
influenciada por uma série de limitações de diversas naturezas, gerando desequilíbrio entre os
corpos: físico, mental, emocional e espiritual ou cósmico. Para buscar este equilíbrio, a motricidade
surge de um contexto fenomenológico, no qual a criança deve ser percebida de maneira ôntica,
ontológica, axiológica, antropossociológica e fenomenológica como um ser que possui um
significado no mundo, buscando, incessantemente, suprir suas próprias carências.
A carência é representada pelo início em Ciência da Motricidade Humana. Esta carência
precisa ser descoberta ou identificada para ser devidamente preenchida. A partir do momento em
que a carência é diagnosticada, torna-se necessária ao sujeito. Havendo necessidade ou carência, o
sujeito passa a dar valor às suas ações. O valor é a qualidade estrutural que dá sentido ou
significado à vida existencial e a qualidade de vida é exatamente esse significado atribuído à própria
existência. Em outras palavras, as carências devem ser satisfeitas mediante a conduta motora (meio)
para aumentar, de forma concreta, a qualidade de vida do Homem, (fim), estabelecendo-se uma
relação de meio, representada pela conduta motora e de fim, representado pelo Homem, em Ciência
da Motricidade Humana. Os movimentos aprendidos durante os primeiros seis anos da infância
caracterizam a base para as aprendizagens numa fase posterior. As habilidades motoras que a
criança adquire numa fase inicial são aperfeiçoadas na idade adulta. Desta forma, se uma criança for
pouco estimulada e/ou apresentar deficiência no desenvolvimento motor durante os primeiros seis
anos, esta será refletida em sua vida adulta, na qual os movimentos não serão novos, mas sim, o
continuar da aprendizagem anterior.
A infância é a etapa mais importante a caminho da maturidade para a vida adulta, por isso há
necessidade de garantir que esse período traga condições propícias e pertinentes a sua evolução e
desenvolvimento motor. A coordenação motora é uma estrutura psicomotora básica, concretizada
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pela maturação motora e neurológica da criança e desenvolvida através da sua estimulação
psicomotora.
Além da necessidade de movimentação que a criança apresenta, vale a pena ressaltar que, na
maioria das vezes, a motricidade da criança é pouco explorada durante a infância, gerando
alterações em seu desenvolvimento psicomotor que vão refletir na idade adulta. Para diagnosticar
tais alterações psicomotoras, foi realizado o presente estudo com o objetivo de avaliar, por meio de
testes específicos, a coordenação motora e o equilíbrio das crianças.
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2 - FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
O corpo é compreendido como um organismo integrado e não como um amontoado de“partes”, e “aparelhos”, como um corpo vivo, que interage com o meio físico e cultural, que sente dor, prazer, alegria, medo, etc. Para conhecer o corpo abordam-se os conhecimentos anatômicos, fisiológicos, biomecânicos e bioquímicos que capacitam a análise crítica dos programas de atividade física e o estabelecimento de critérios para julgamento, escolha e realização que regulem as próprias atividades corporais saudáveis, seja no trabalho ou no lazer. (PCN,2001:46/47).
Caminhando para mudanças a Escola que queremos é a escola do ser, conviver, construir,
modificar e recriar principalmente no contexto esportivo social. Uma escola verdadeiramente
cidadã. Cidadania entendida, para além da consciência dos direitos e deveres no convívio social e
do exercício dos mesmos, consiste em resgatar o que lhe foi alienado... É a escola como ethos
(forma de comportamento social de um indivíduo ou grupo humano que faz parte de qualquer classe
social ou grupo étnico, de convívio numa sociedade tão decadente de relações humanas cada vez
mais individualista).
Como as ações não se tratam de maneira isolada e que a cada dia que se passa acumulamos
aprendizado e percebemos que de nada adianta se não formos orientados de forma planejada e
organizada na sociedade principalmente em se tratando de repasse, pois; o que queremos dizer que a
cada dia vamos descobrindo a importância de nos qualificarmos, principalmente quando o assunto é
esporte. A sociedade civil vem percebendo a importância do esporte, e a mídia tem contribuído para
com a divulgação dos esportes, principalmente, a partir das conquistas dos atletas brasileiros em
várias modalidades esportivas e não só no futebol. A visão atual não é a de um esporte de
rendimento, mas sim, o esporte que educa através da cooperação, solidariedade, noção de conjunto,
organização, discussão de regras, socialização e interesses em temas da cultura corporal
vivenciando experiências e oportunidades de alegria, prazer, confiança, expectativa, resolução de
problemas, amizade e sonho promovendo o resgate de brincadeiras: queimada, rouba bandeira,
chicotinho queimado, que rei sou eu, gata cega, adedonha, pé no beque, derrubar lata, jogos lúdicos
e educação esportiva conduzidos através de manifestações corporais de múltiplos significados, bem
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como vivências práticas que possam estimular a socialização permanente e a inteligência corporal e
técnico-tática conforme estabelecido no PCN de Educação Física.
É com o intuito de propagar o esporte que educa através da cooperação, solidariedade, noção
de cultura, organização, discussão de regras, socialização enfocando interesses em temas da cultura
corporal que desenvolvemos este trabalho.
Atualmente, coexistem na área da Educação Física, várias concepções, todas elas tendo em
comum a tentativa de romper com o modelo mecanicista, esportivista e tradicional, podemos
destacar: Psicomotricidade – movimento mais articulado que aparece a partir da década de 70 em
contraposição aos modelos anteriores. Nele, o envolvimento da Educação Física é com o
desenvolvimento da criança, com o ato de aprender, com os processos cognitivos, afetivos e
psicomotores, ou seja, buscando garantir a formação integral do aluno. A educação física é, assim,
apenas um meio para ensinar Matemática, Língua Portuguesa, socialização... Para este modelo, a
Educação Física não tem um conteúdo próprio, mas é um conjunto de meios para a reabilitação,
readaptação e integração, substituindo o conteúdo que até então era predominantemente esportivo, o
qual valorizava a aquisição do esquema motor, lateralidade, consciência corporal e coordenação
viso-motora.
A principal vantagem desta abordagem é que ela possibilitou uma maior integração com a
proposta pedagógica ampla e integrada da Educação Física nos primeiros anos de educação formal.
Porém, representou o abandono do que era específico na Educação Física, como se o conhecimento
do esporte, da dança, da ginástica e dos jogos fosse, em si, inadequado para os alunos.
Outra abordagem é a do Atletismo que não poderíamos de levar em consideração, ainda
mais quando se trata de desenvolvimento motor que será tratado em estudo nesta monografia.
Obviamente, nem tudo é um mar de rosas! As dificuldades certamente existem: é o aluno que não
quer correr se não tiver uma bola nos pés; é a escola que tem um espaço muito pequeno para as
aulas de Educação Física; é o grande número de alunos por turma; é o material específico que não
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existe na escola; é a diretora que quer isso e não aquilo; é o próprio conhecimento insuficiente que
inibe muitos profissionais.
Apesar desta lista é preciso que se diga que o Atletismo pode e deve ser aprendido na escola,
você não acha?
Entretanto, não há como negar que isso tudo depende de muitas coisas: da disposição do
profissional em encontrar um local propício para ensiná-lo; da adequação do conteúdo às suas reais
possibilidades de ensino; se terá disposição para adequar o material, até mesmo confeccionando
materiais alternativos; se tem ou não clareza dos objetivos e comprometimentos que envolvem o
universo escolar, entre os quais está a transmissão de um saber que poderá ocorrer teórica e
praticamente. Esse saber bem poderia ser seriado, de forma que a cada ano escolar houvesse um
conteúdo específico a ser ensinado com um nível determinado de aprofundamento, por exemplo.
Por fim, diríamos que ensinar atletismo é: simples, bom e barato. Portanto, se
reconhecermos o valor que lhe é inerente e as possibilidades reais de ensino, devemos nos articular
para contribuir com a sua difusão, sobretudo no campo escolar, de forma que as defesas em torno
das argumentações que fazem da nossa certeza de que “o Atletismo se aprende na escola” não soem
como algo falso e distante da realidade escolar.
Diante da necessidade de desenvolver as competências e habilidades nos alunos da Fase
Introdutória a Fase IV da Escola Municipal Antônio Fonseca Leal, procurando amenizar as
diferenças alarmantes decorrentes da necessidade individual de cada aluno, desenvolvendo com
precisão as atividades, abordaremos Estudo comparativo sobre o desempenho perceptual e motor na
idade escolar em alunos da Fase Introdutória a Fase IV da Escola Municipal Antônio Fonseca Leal
dentro da abordagem escolar da Psicomotricidade.
Participarão do estudo 2 grupos de crianças, com idades de 6 anos, 7 e 8 anos (alunos da
Fase Introdutória a Fase II). O grupo I será constituído por 100 crianças, de famílias de baixa renda,
sem sinais de seqüela neuromotora. O Grupo II será constituído por 80 crianças, com idade entre 9 a
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10 anos (alunos da Fase III a Fase IV), sexo e nível sócio-econômico equivalentes às crianças do
Grupo I.
A família será entrevistada através de questionário sobre o currículo da criança, contendo o
peso, a altura, sexo, se a criança é prematura, às características específicas dos desvios
neuropsicomotores, sinais de distúrbio de aprendizagem, dificuldades de linguagem, problemas de
comportamento, déficits na coordenação motora e percepção visoespacial na idade escolar, as
características de comportamento e desempenho escolar da criança, e se a criança apresenta história
de prematuridade, sendo também aplicados testes nas áreas de coordenação viso-motora - testes de
acuidade motora de Ayres e Bender gestáltico - e controle postural, com provas de equilíbrio e
tônus postural.
A justificativa é dada pelo fato do problema existir e inúmeras crianças afetadas, o número
de crianças pode ser elevado e se não for corrigido o problema pode trazer sérios prejuízos às
crianças afetadas.
Os estudos serão apontados para dificuldades motoras relacionadas a prematuridade,
indicando falhas na coordenação motora fina, observada em grupos de crianças de 6 a 10 anos. Em
estudo mais recente, serão aplicados testes de inteligência e função verbal, de coordenação motora,
controle motor fino das mãos, percepção viso-espacial e sensação tátil/cinestésica, de acordo com o
gênero.
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3 - MÉTODOS
Esta é uma pesquisa teórico-empírica que visa compreender a relação entre desenvolvimento
motor e idade enfatizando as crianças matriculadas na fase introdutória a fase IV do ensino
fundamental. Os dados e/ou informações foram analisados quantitativa e qualitativamente.
A amostra foi composta por crianças de ambos os sexos, com idades entre 6 e 10 anos,
matriculadas na Escola Municipal Antônio Fonseca Leal, situada na cidade de Três Marias, em
Minas Gerais. Foram avaliadas 180 crianças sendo 30 crianças com 6 anos de idade, estudando na
Fase Introdutória, 30 crianças com 7 anos de idade, estudando na Fase I, 40 crianças com 8 anos de
idade, estudando na Fase II, 40 crianças com 9 anos de idade, estudando na Fase III e 40 crianças
com 10 anos de idade, estudando na Fase IV, com testes específicos de avaliação para cada idade.
O processo de seleção da amostra obedeceu, inicialmente, aos seguintes critérios de inclusão: estar
regularmente matriculada na escola, apresentar freqüência regular, não estar fazendo uso de
medicação atuante sobre o sistema nervoso central, não apresentar comprometimento neurológico
e/ou ortopédico e não apresentar distúrbios visual, auditivo, labiríntico e/ou mental. Posteriormente,
foi realizado um sorteio para a seleção das crianças que iriam participar da avaliação. Dessa forma,
qualquer criança presente na escola no momento da avaliação poderia ser escolhida para compor a
amostra, desde que estivesse preenchendo os critérios de inclusão do estudo. Foi utilizado o
protocolo de Lefèvre, para avaliar o equilíbrio estático, equilíbrio dinâmico e a coordenação motora,
aplicando-se os testes específicos para cada faixa etária. Os testes somente foram considerados
satisfatórios e significativos, esboçando, entretanto, resultados positivos quando atingiam um
percentual de acertos igual ou superior a 75%, de acordo com o autor.
Testes que verificaram equilíbrio estático
• Romberg; Romberg sensibilizado com os olhos abertos; Romberg sensibilizado com os olhos
fechados.
protocolo de Lefèvre - exame neurológico evolutivo da criança
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Testes que verificaram equilíbrio dinâmico
• Caminhar nas pontas dos pés; subir e descer escadas; caminhar para frente aproximando o
calcanhar do antepé; saltar uma corda; saltar uma corda com os pés juntos; saltar girando sobre si
mesmo; pular com os dois pés juntos; pular com um pé só; dar um salto para um lado e cair parado;
caminhar para trás aproximando calcanhar e antepé; pular com um pé só e não dominante.
Testes que verificaram coordenação motora
• Índex-nariz; virar páginas de um livro; copiar uma cruz; fazer uma bolinha de papel; enrolar um
fio no carretel; abrir uma mão e fechar a outra, alternadamente; copiar um círculo; copiar um
quadrado; jogar uma bola em um alvo; bater com os pés, alternadamente; tocar com a ponta do
polegar em todos os dedos; descrever um círculo com os dedos indicadores; enrolar a linha do
carretel no dedo indicador da mão dominante; bater o
indicador direito na mesa; forçar o tronco para trás.
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CAPÍTULO I
DEFINIÇÃO DA CULTURA DO MOVIMENTO
Foi em um longo caminho, de milhares de anos, que o homem construiu sua corporeidade. O
homem representa, ele próprio, diante da natureza, o papel de uma força natural. Ele põe em
movimento, por meio de suas pernas, braços, cabeça e mãos, as forças de que é dotado e se apropria
das matérias para lhes dar uma forma útil à sua vida. Foi assim que construiu sua corporeidade e,
por isso, podemos afirmar que a formação dos cinco sentidos externos é um trabalho de toda a
história mundial até o presente. (Marx e Engels, 1987).
A verdade é que o homem desenvolveu historicamente uma capacidade de ação e, agindo,
criou estruturas que a garantem. Não nasceu correndo, saltando, escalando ou nadando; essas
atividades foram historicamente criadas e socialmente desenvolvidas como respostas a
determinadas necessidades humanas. O exame de atividades como Jogos, Dança, Ginástica,
Atletismo, Natação, Esqui, Malabarismo, Capoeira, Boxe, Futebol, Patinagem e outras revela
aspectos afins – comuns a todas – coincidentes e importantes, que afirmam sua construção histórica
e o seu desenvolvimento social.
A explicação da criação das atividades corporais se relaciona ao caráter dos processos de
produção; por exemplo, os temas que inspiravam os jogos lúdicos eram a caça, a guerra, a vida, os
hábitos dos animais, o trabalho de semear, cultivar e colher; assim como os jogos expressivos,
mímica e pantomima, nos quais se originou a arte cênica, modelavam-se nos atos da vida cotidiana
cuja execução era necessária na luta pela existência.
Mas a análise do enfoque antropológico, com a qual Cagigal, 1979, elabora sua explicação
sobre a Cultura Física, revela que o homem é abordado como soma de duas realidades: o corpo e o
movimento, o que, obviamente, leva a concluir que o fundamento de uma Cultura Física ou
Corporal é o conhecer, o atender, o cuidar e o cultivar o corpo. Nessa perspectiva, à Educação
Física e ao Esporte lhes resta estruturar-se sobre a realidade antropológico-dinâmica do movimento
físico.
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A cultura corporal, como patrimônio da humanidade, não pode ser reduzida pela escola ao
hábito de praticar exercícios visando vantagens para a saúde ou a condição física. Essa não é a
compreensão de cultura corporal que estamos construindo. Reconhece a si como construção social
de atividades específicas, originadas pela subjetividade humana, cujas categorias explicativas,
regularidades princípios e leis se encontram na interação histórica do homem com o meio social,
econômico e político e seus correspondentes
problemas gerados pela luta de classes.
Chama-se Projeto Histórico o tipo de sociedade ou organização social na qual pretendemos
transformar atual sociedade, assim como os meios e as formas de luta que deveremos colocar em
prática para conseguir essa transformação. Sabemos, também, que o conhecimento especial,
denominado “científico”, surge da atividade prática humana – o trabalho – e se desenvolve baseado
nela. O motor principal desse desenvolvimento é constituído pelas necessidades materiais de
produção; por isso, o desenvolvimento da ciência subordina-se ao Projeto Histórico e às relações
econômicas predominantes por ele estabelecidas. É dessas relações que depende o ritmo do
desenvolvimento científico e o aproveitamento das conquistas científicas.
Esse projeto deve, ainda, defender o amplo desenvolvimento da cultura voltada para a
maioria do povo, comprometendo-se com a extinção do analfabetismo, a disseminação do ensino
técnico-científico de boa qualidade, a reforma universitária democrática e progressista, o
desenvolvimento das artes e a disseminação de equipamentos culturais, como teatros, bibliotecas e
centros de práticas esportivas.
Para vir a concretizar um projeto de cultura popular, no qual terá vida o desenvolvimento da
cultura corporal, precisa-se, em primeiro lugar, eliminar os principais fatores que provocam o
desaparecimento dessas formas de cultura espontânea e popular, tais como o crescimento urbano
desordenado das cidades, apropriação especulativa do espaço urbano e a aculturação vinda dos
interesses do capitalismo. Este projeto de uma nova cultura para o povo deve: promover o acesso da
classe trabalhadora ao campo da produção cultural da sociedade; incentivar práticas que tenham o
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maior potencial de universalidade e
alimentem a formação de idéias e valores socialistas; promover a formação de “agentes culturais” –
organizadores, divulgadores, receptores, incentivadores, pesquisadores – que, pela sua visão de
totalidade, sejam verdadeiros “agitadores culturais”, quer dizer, trabalhadores orgânicos da cultura,
engajados na dinâmica sociocultural da comunidade; privilegiar a abordagem científica que revele a
realidade objetiva oculta por conceitos – como lazer, ócio, tempo livre – usados para explicar a
prática social – cultural, artística, recreativa, esportiva – que se desenvolve no tempo não ligado
diretamente ao processo produtivo; promover a unidade de dois fatores que são responsáveis pela
consistência da resistência cultural: os elementos populares da cultura nacional e o desenvolvimento
técnico-científico.
O DESENVOLVIMENTO MOTOR DAS CRIANÇAS DE 6 A 8 ANOS E DE 9 A 10 ANOS;
Vamos recapitular um pouco. Ao nascer, a criança possui como recursos de adaptação, para
interagir com o ambiente, coordenações herdadas, tais como os reflexos, e uma gama de
movimentos ao acaso, sem fim aparente, desordenados. Portanto, é com esses recursos que ela vai
interagir com o mundo para se adaptar a ele. Não possui recursos como pensamento organizado,
fala, movimentos refinados.
Considerando essas descrições anteriores a respeito da imensa possibilidade de
coordenações humanas, graças ao fato de termos, no nascimento, uma motricidade em desordem,
você diria que a pedagogia deve orientar o jovem a aprender, prioritariamente, gestos
diversificados, ou gestos especializados?
O que você acha da especialização esportiva precoce?
Além disso, quase nada sabendo do mundo, isto é, tendo quase nada de conhecimentos, tem
tudo para aprender. O que é visto, ouvido, tocado, constitui novidades, algo para aprender. Quem
quase nada sabe, tem quase tudo para aprender. No entanto, mesmo tendo tanto para aprender, há
poucos instrumentos para realizar as aprendizagens, portanto, o desenvolvimento. Se a criança já
nascesse com todas as ferramentas prontas para aprender, talvez pudesse aprender tudo de uma vez.
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E isso não é real, pois as aprendizagens se realizam em um processo longo e complexo, estendendo-
se por toda a vida.
Nesse começo de vida, além dos reflexos, os instrumentos de aprendizagem são unicamente
os movimentos desordenados e os insipientes sentidos da visão, audição, olfato, tato e paladar.
Movida pela necessidade, ao entrar em contato com o mundo, a criança vai transformando suas
desordens em ordens ajustadas ao meio que chamamos de coordenações ou habilidades motoras.
Há algo absolutamente lógico nessa relação com o mundo. Todos sabemos o quanto à
linguagem verbal facilita o desenvolvimento, pois a fala substitui fartamente os gestos. Mas no
início, não há fala. Portanto, quem não fala tem de fazer. E durante todo o período pré-verbal,
assistimos a uma atividade fantástica de experiências motoras. Praticamente todas as coordenações
motoras básicas da vida de um indivíduo serão organizadas durante o período pré-verbal. Os três
grupos de habilidades (locomoção, manipulação e estabilização corporal) serão desenvolvidos pela
criança que não fala. Daí em diante, e até o fim da vida, as coordenações que se seguirem serão
combinações, cada vez mais refinadas, dessas coordenações de base.
É por isso que esse primeiro período de vida é denominado por diversos autores de período
sensório-motor. Ou seja, a inteligência da criança é exclusivamente sensório-motora. Para resolver
os problemas do mundo, a criança precisa aprender, e aprender, para ela, significa construir gestos
que a ajudem nessa tarefa. A construção desses gestos é sintoma de sua inteligência. Identificar, nos
gestos esportivos, coordenações motoras que já estão presentes na criança pré-verbal, isto é, na
criança que tem por volta de um ano, um ano e meio de vida. Veja que afirmei que todas as
coordenações de base de um ser humano já estão formadas nesse primeiro período de vida. Vou dar
um exemplo: o gesto de “cortar” no voleibol já está presente, como coordenação básica, na
criancinha de oito, dez meses, pois ela é capaz de bater em alguma coisa para repeli-la. No voleibol,
o “cortar” é uma sofisticação do tapa da criança, uma adaptação ao contexto esportivo. Portanto,
observe cenas do esporte e faça algumas identificações.
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INFLUÊNCIA DA CULTURA SOBRE O CORPO, SOBRE O
DESENVOLVIMENTO MOTOR;
CITAÇÕES DE AUTORES
Sem qualquer dúvida, se temos de compreender o que significa aprendizagem e
desenvolvimento e mais particularmente o que isso tem a ver com escola e esporte, precisamos
reconhecer e respeitar as diferentes opiniões dos grandes pesquisadores. Seria impossível que,
motivados por objetivos diferentes, comungassem integralmente. Isso não quer dizer, porém, que,
consideradas as diferenças, não apontem para rumos semelhantes. Em torno deles teceremos
considerações sobre aprendizagem e desenvolvimento e suas manifestações particulares no campo
do esporte escolar.
Feuerstein, citado por Dussel, afirma que: “(...) tudo vai depender do número de conexões
ou ligações que o cérebro estabelecer; ligações que se podem tornar mais ricas mediante a ação
educativa, sempre condicionada ao grau de interesse e da relação mantida com aqueles com quem
aprende” (2000, p. 432).
E Gehlen (1987), acrescenta que:
Frente a este estado de coisas, a ontogênese humana tem uma posição absolutamente especial entre os vertebrados. No momento de seu nascimento, o homem tem um peso cerebral que é aproximadamente três vezes maior que o dos antropóides recém-nascidos e um peso corporal proporcionalmente superior (uns 3.200 gramas, frente aos 1.500 do orangotango). A postura corporal ereta e os inícios da comunicação típica da espécie (a palavra) se alcançam um ano depois do nascimento ( p. 50)
A Wallon (1975) chamaram atenção, no recém-nascido, não só os movimentos sem
finalidade aparente, mas os reflexos que, em alguns casos, parecem ser pontos de partida de uma
série de coordenações que se sucederão, como, por exemplo, os reflexos labirínticos. Julgo ser
muito importante prestar atenção nos diversos tipos de reflexos que, mesmo desaparecendo com o
passar do tempo, permitem à criança referenciais mínimos para sucessivos desenvolvimentos.
Não custa lembrar a advertência do Prof. Bronfenbrenner: “Afirmar que o desenvolvimento
humano é um produto da interação entre o organismo humano em crescimento e seu meio ambiente
é afirmar o que é quase um lugar comum na ciência comportamental” (1996, p. 14).
25
Bronfenbrenner afirma ser um dos poucos que não participam dessa unanimidade, pois,
segundo ele,
(...) esperaríamos que a psicologia, definida como a ciência do comportamento, desse uma ênfase substancial, se não igual, a ambos os elementos do lado independente da equação, que investigasse a pessoa e o meio ambiente, com especial atenção à interação entre os dois. O que encontramos na prática, entretanto, é uma acentuada assimetria, uma hipertrofia da teoria e pesquisa focando as propriedades da pessoa, e somente a mais rudimentar concepção e caracterização do meio ambiente em que a pessoa é encontrada (1996, p. 14).
Ora, se as coordenações localizadas na boca se desenvolvem em ritmo mais acelerado que as
demais, sem dúvida isso as torna atratores em relação aos demais movimentos. São nítidas as
conexões entre os diversos grupos de coordenações, desde o começo da vida. No meu entender, é a
boca que atrai, que reúne em um conjunto coerente, as relações entre esses vários grupos. Wallon
havia observado isso, quando comentou sobre“(...) a deslocação de segmentos corporais ou das suas
fracções, uns em relação aos outros... Estas três espécies de movimentos implicam-se mais ou
menos entre si; condicionam-se mutuamente” (1975, p. 76).
Em primeiro lugar cito um texto de Rolando García, no qual ele discute conceitos de
sistemas:
Sistemas não-descomponíveis ou semidescomponíveis. São sistemas constituídos por processos determinados pela confluência de múltiplos fatores que interatuam de tal maneira que não são separáveis. Em conseqüência, o sistema não pode ser adequadamente descrito, nem seu funcionamento explicado, por mera adição de enfoques parciais provenientes de estudos independentes de cada um de seus componentes. Em um sistema não decomponível, os distintos componentes só podem ser definidos em função do resto. A esses sistemas cujos elementos ou subsistemas estão interdefinidos lhes aplicamos o qualificativo de ‘complexos (2000, p. 68).
Na década de 1970, Edgar Morin iniciou a publicação de sua obra O método, em diversos
volumes. No primeiro deles, em muitas passagens conceitua os sistemas complexos, como na
citação que se segue:
A idéia de unidade complexa vai ganhar densidade se pressentimos que não podemos reduzir nem o todo às partes nem as partes ao todo, nem o uno ao múltiplo nem o múltiplo ao uno, mas que temos de tentar conceber em conjunto, de modo simultaneamente complementar e antagônico, as noções de todo e de partes, de uno e de diverso(1977, p. 103).
Morin (1991), ressalta a diversidade de movimentos que o corpo humano é capaz de
executar quando afirma que:
26
Aparentemente, são muito reduzidas as possibilidades de mobilização corporal que possui o ser humano. Mas, quando consideramos as possibilidades de combinação entre todos os segmentos móveis, cada qual podendo tencionar e relaxar suas cadeias musculares, perdemos a conta das possibilidades. Com apenas sete notas musicais, as mais belas sinfonias foram compostas. Não será por falta de possíveis que deixaremos de compor nossa sinfonia humana ( p. 95).
A extrema complexidade humana que pretendo descrever, neste caso, em relação à
aprendizagem e desenvolvimento, só possui, para iniciar sua evolução, duas ações possíveis. E isso
não impede o extraordinário desenvolvimento que se seguirá.
Ao contrário do que observo quando consulto a literatura especializada sobre motricidade
humana, o que mais me impressiona não são os movimentos organizados, mas a incrível
desorganização motora do recém-nascido. Além dos gestos ordenados em conjuntos biologicamente
determinados
que chamamos de reflexos (alguns os chamam de instintos), todo o resto são movimentos a esmo,
ao acaso, sem direcionamento visível. É, nesse caso, muito semelhante ao jogo: uma espécie de
fazer por fazer, fazer sem ter tarefa para cumprir, sem destino.
Ora, conseqüentemente, o indivíduo que vive nesse meio tem de ser, também flexível,
plástico, criativo. Se esse indivíduo nascesse, como os outros animais, determinado biologicamente
para realizar ações sempre iguais, não teria permanecido no planeta, ou seja, não teria chances de se
adaptar ao seu meio. Só um animal plástico poderia se adequar a um meio ambiente plástico.
Assim, essa desordem motora inicial, que poderia parecer desvantajosa à primeira vista, viabiliza a
vida do homem no planeta.
Nascendo antes do tempo, o ser humano não consegue completar sua gestação no útero
materno (lembre-se dos comentários feitos a esse respeito no item 3.3.1 do vol. 4 do Livro
Especialização em Esporte Escolar/UNB); não completando a gestação nasce incompleto, isto é,
nasce sem que suas coordenações necessárias à adaptação estejam prontas; essa incompletude
traduz-se na forma de desordens motoras; sendo desordenado, está aberto ao mundo, à cultura,
disponível para se coordenar à medida que estabelece interações com o meio ambiente, tanto o
natural quanto o cultural.
27
A desordem motora inicial é a medida do conhecimento humano, isto é, muito pouco. O ser
humano é um animal que pouco sabe no início da vida. Esse pouco saber inicial é indicativo de sua
imensa capacidade de aprender.
Aprender, no início da vida é montar coordenações, que significam ações de adaptação ao
mundo. O ser humano, portanto, nasce incompleto, desordenado, aberto ao mundo. E essa é sua
única forma possível de permanecer, pois seu meio ambiente é, acima de tudo, cultural. Por mais
que mude a cultura, a capacidade humana de mudança (e sintoma maior disso é a desordem motora
inicial) é tamanha que o ser humano poderá mudar sempre. O potencial para o desenvolvimento é
definido pelas poucas organizações motoras herdadas e pelas ilimitadas possibilidades de
organização dadas pela desordem motora inicial.
A aprendizagem começa quando se inicia o desenvolvimento, pois um não vive sem o outro,
um implica o outro. Sem dúvida, o momento em que mais podemos aprender na vida é o momento
do nascimento. Pois, por uma questão de lógica, podemos aprender mais quando sabemos menos.
No nascimento, sabendo quase nada, temos quase tudo para aprender. Adepto de uma teoria da
complexidade, não acredito em coisas separáveis assim. Os pedagogos tendem a acreditar que é a
aprendizagem que provoca o desenvolvimento e muitos se apóiam em Vygotsky para afirmar isso.
O autor russo escreveu que (...) a noção de zona de desenvolvimento proximal capacita-nos a propor
uma nova fórmula, a de que o “bom aprendizado” é somente aquele que se adianta ao
desenvolvimento (1988, p. 100).
Vygotsky tem razão quando considera fatores externos que provocam aprendizagens,
portanto sendo seguidos de desenvolvimentos. Mas isso não significa ser um prioritário sobre o
outro. É preciso considerar, igualmente, tanto os fatores internos quanto os externos, no processo
ensino/aprendizagem.
Chamo a atenção, mais especificamente para a complexidade evidente das organizações
motoras desde o nascimento. Se isso passou despercebido aos estudiosos, em sua maioria, é porque
nossos olhos, nossa atenção, estão orientados há séculos por uma tendência a ver as coisas
28
linearmente, regularmente, previsivelmente, funcionando analogamente às estruturas mecanizadas.
Porém, as coordenações motoras e as demais, são como todo o universo. Negar a complexidade do
universo é fechar os olhos às evidências que estão diante de nossos olhos, e, se o fazemos, é porque
nos parece mais fácil reduzir todas as coisas às suas formas mais simples.
Como afirmado anteriormente, além dos reflexos iniciais, os movimentos em desordem,
aparentemente caóticos, são facilmente observados no recém-nascido. À medida que a criança
interage com o meio ambiente, ela se vê obrigada, por uma questão de adaptação ao mundo, a
construir coordenações que vão resolver os problemas surgidos.
Essa construção, inicialmente, observa-se em forma de gestos criados a cada momento.
Esses gestos distribuem-se de acordo com os grupos básicos de necessidades humanas. Quaisquer
que sejam, serão sempre de locomoção, de manipulação, ou de estabilização corporal. Não
dependem apenas do que encontram no meio ambiente, pois, como já descrevi, os reflexos arcaicos,
início da vida de relações, apontam para isso.
Quando a criança interage com coisas do ambiente e forma uma coordenação de
manipulação, por exemplo, ela já tem, para interagir com esse meio, um reflexo de preensão (que
em poucos meses desaparece como tal). Ora, a interação é sempre entre partes. Há uma parte que já
estava na criança, que servia para abrir e fechar a mão (reflexo de preensão) e isso era interno a ela.
A outra parte são os objetos do meio ambiente.
No caso de pegar uma colher, a mão da criança, desde o nascimento capaz de abrir e fechar
no contato com as coisas, se depara com um objeto para pegar. Se chegarem a um acordo (naquilo
que Piaget chamou de um duplo processo de assimilação e acomodação), o resultado será o ato de
pegar a colher (que será diferente de todos os demais atos de pegar).
Com isso, estou afirmando que todas as coordenações motoras serão distribuídas por três
grupos, orientados por um fator interno inicial (reflexos de preensão, Moro e marcha), capaz sempre
de interagir com objetos e reconhecê-los. As coordenações produzidas resultarão em movimentos
de manipulação, de locomoção ou de estabilização corporal.
29
As desordens iniciais, portanto, são um rico manancial de possibilidades para a
aprendizagem e o desenvolvimento; não se atiram às cegas de encontro ao meio ambiente, pois
possuem uma base de orientação que são os reflexos iniciais. Mas estão suficientemente abertas
para se moldar de acordo com as interações. Precisam estar abertas, disponíveis, pois interagirão
basicamente com a cultura humana, rica em modificações incessantes. Se fossem fechadas, como as
coordenações dos outros animais, não se ajustariam ao meio plástico.
De modo geral, quando consultamos a literatura especializada em desenvolvimento motor,
encontramos descrições, geralmente, do que há em cada ser humano, ou seja, a descrição de como
evoluem as coordenações motoras, dos reflexos às coordenações mais sofisticadas da vida social.
30
CAPÍTULO II
HISTÓRICO DA ESCOLA
A Escola Municipal Antonio Fonseca Leal de Ensino Fundamental de 1ª a 8ª série, antes
denominada Escola Municipal de Ensino Fundamental de 1ª a 4ª série foi criada a partir de fevereiro
de 1998, de acordo com a Resolução n° 9283/98, da Secretaria de Estado de Educação.
A criação desta Escola aconteceu de acordo com o processo de municipalização das turmas
de 1ª a 4ª série do Ensino Fundamental das Escola Estadual José Ermírio de Morais e Escola
Estadual General Artur da Costa e Silva.
As turmas municipalizadas de 1ª a 4ª série, passaram a constituir uma unidade de Ensino,
funcionando no prédio da UMES Carlos Drummond de Andrade, situado a Rua Várzea da Palma,
77 – Centro, com a denominação de Escola Municipal de Ensino Fundamental de 1ª a 4ª série.
Levando em consideração a procura dos pais dos alunos concluintes da 4ª série desta Escola,
quanto ao atendimento dos mesmos na 5ª série, em outubro de 1999, foi solicitada à Secretaria de
Estado de Educação a extensão de séries, ou seja, o funcionamento de turmas de 1ª a 8ª série. De
acordo com o processo de extensão de séries, houve a necessidade de mudança no nome da Escola.
A escolha do novo nome para a Escola foi feita através de eleição em regime democrático pela
Comunidade Escolar, sendo escolhido o nome: Escola Municipal Antônio Fonseca Leal de Ensino
Fundamental de 1ª a 8ª série, em homenagem ao 1° Intendente Prefeito Município de Barreiro
Grande, hoje Três Marias, o Sr. Antônio Fonseca Leal nomeado pelo Governador do Estado de
Minas Gerais, Sr. Magalhães Pinto em 1963.
Sr. Joaquim Cândido Gonçalves, Prefeito Municipal de Três Marias, no uso das suas
atribuições legais e considerando a escolha da Comunidade Escolar decreta então através do
Decreto n° 959/99, no dia 16 de novembro de 1999 a mudança do nome da Escola Municipal de
Ensino Fundamental de 1ª a 4ª Série para Escola Municipal Antônio Fonseca Leal de 1ª a 8ª série.
31
No dia 31/12/1999 foi publicado no MG, pág. 02, coluna 04, a Portaria 895/99 autorizando a
mudança de denominação e também nesta data, a Portaria 896/99, autorizando a extensão da 5ª a 8ª
série do Ensino Fundamental, a partir do ano 2000.
No dia 01 de março do ano 2000, aniversário da cidade de Três Marias, às 10:00 horas o Sr.
Prefeito Municipal Joaquim Cândido Gonçalves faz a Implantação Oficial da Escola Municipal
Antônio Fonseca Leal de 1ª à 8ª série.
A implantação oficial da Escola foi inaugurada através de confraternização, organizada pela
coordenadora da Escola, Sra. Maria Beatriz Celestino Ferreira, tendo como convidados os alunos,
professores e funcionários, pais, comunidade escolar, autoridades, banda de música de Morada
Nova de Minas, a família do Sr. Antônio Fonseca Leal, dentre vários outras pessoas.
- Considerado o mesmo nível sócio-econômico, será que existem diferenças significativas
no desempenho em provas de equilíbrio, tônus postural e coordenação viso-motora entre crianças
com idade entre 6 a 8 anos (alunos da fase Introdutória a Fase II), e crianças com idade entre 9 a 10
anos (alunos da Fase III e Fase IV) da Escola Municipal Antônio Fonseca Leal da cidade de Três
Marias-MG.
Característica Sócio – Econômica e Cultural da Clientela
O Programa Segundo Tempo, ponto de referência sócio-cultural atende filhos de pais
assalariados e baixa renda. Há também filhos, pescadores e trabalhadores no campo, na agricultura
e pecuária.
Uma grande porcentagem é de filhos de pais desempregados ou que prestam, serviços
eventuais, com um nível baixo de renda.
O Programa Segundo Tempo possui equipamentos em bom estado de conservação que
atende satisfatoriamente a demanda do Programa Segundo Tempo e foram fornecidos pela
Secretaria Municipal de Desenvolvimento Econômico, Turismo, Esporte e Lazer. Alguns
equipamentos foram comprados através da realização de eventos promovidos pelo Programa
Segundo Tempo.
32
A Secretaria, têm o armário em aço, arquivos, mesa com cadeiras, quadro de aviso.
Ainda temos TV 20’ polegadas, um vídeo cassete, suporte para televisão e vídeo (tipo grade,
computadores com impressora sendo uma matricial e outra a jato de tinta, microssistem.
A cozinha do Sítio da Criança está bem organizada, possui freezer, geladeira, forno
elétrico, dois fogões, liquidificador industrial, conjunto de panelas, talheres, pratos duralex e
canecas em plástico e copos de vidro, ainda temos bebedouros industrial. O refeitório possui mesas
e necessita de piso, o escovatório também precisa ser melhorado.
A Escola Municipal Antônio Fonseca Leal não possui estrutura física adequada para
realização das aulas de Educação Física, por este motivo as aulas são realizadas no Três Marias
Tênis Clube – que possui 1 quadra poliesportiva, 01 piscina 17,0 x 30,0 m, salão de festa com
palco, 2 saunas, 2 banheiros (masculino e feminino/com vestiários), 1 toboágua, 01 campo de
futebol socite, e também as aulas são realizadas no Ginásio Poliesportivo Manoel Nardi localizado
no bairro Parque Diadorim da cidade de Três Marias – MG (onde funciona o Programa Segundo
Tempo). E no Sítio da Criança fica o Almoxarifado do Programa Segundo Tempo, local que é
armazenado a merenda.
33
CAPÍTLO III
4 - RESULTADOS E DISCUSSÃO
Estágios de desenvolvimento de Piaget
O primeiro é o estágio sensório-motor, pré-verbal, durando aproximadamente os 18
primeiros meses de vida. durante este estágio desenvolve-se o conhecimento prático, que constitui a
sub-estrutura do conhecimento representativo posterior. Um exemplo é a construção do esquema do
objeto permanente. Para um bebê, durante
os primeiros meses, um objeto não tem permanência. Quando ele desaparece do campo perceptivo,
não mais existe. Não há tentativa de pegá-lo novamente. Mais tarde o bebê buscará achá-lo e achá-
lo-á por sua localização espacial. Conseqüentemente, junto com a construção do objeto permanente
surge a construção do espaço prático ou sensório-motor. Similarmente há a construção da sucessão
temporal e da causalidade sensório-motora elementar. Em outras palavras, há uma série de
estruturas que são indispensáveis para o
pensamento representativo ulterior.
Num segundo estágio temos a representação pré-operacional , o início da linguagem, da
função simbólica e, assim, do pensamento ou representação. Mas, no nível do pensamento
representativo, há agora uma reconstrução de tudo o que foi desenvolvido no nível sensório-motor.
Isto é, as ações sensório-motoras não são imediatamente transformadas em operações. Na verdade,
durante todo este segundo período de representações pré-operacionais não há ainda operações como
defini este termo há pouco. Especificamente
ainda não há conservação, que é o critério psicológico da presença de operações reversíveis. Por
exemplo, se
pusermos o liquido de um copo em um outro de formato diferente, a criança em fase pré-
operacional pensará que há mais em um do que em outro. Na ausência da reversibilidade não há
conservação da quantidade.
34
Em um terceiro estágio aparecem as primeiras operações, mas as chamo de operações
concretas devido ao fato de que elas operam com objetos, e ainda não sobre hipóteses expressadas
verbalmente. Por exemplo, há as operações de classificação, ordenamento, a construção da idéia de
número, operações espaciais e temporais e todas as operações fundamentais da lógica elementar de
classes e relações, da matemática elementar, da
geometria elementar e até da física elementar.
Finalmente, no quarto estágio estas operações são ultrapassadas à medida em que a criança
alcança o nível que chamo de operações formais ou hipotético-dedutivas; isto é, ela agora pode
raciocinar com hipóteses e não só com objetos. Ela constrói novas operações, operações de lógica
proposicional, e não simplesmente as operações de classes, relações e números. Ela atinge novas
estruturas que são de um lado combinatórias, correspondentes ao que os matemáticos chamam de
redes (lattices); por outro lado atingem grupos mais complicados de estruturas. Ao nível de
operações concretas, as operações aplicam-se a uma circunvizinhança imediata: por exemplo, a
classificação por inclusões sucessivas. No nível combinatório, entretanto , os grupos são muito mais
móveis.
Estes então são os quatro estágios que identificamos, cuja formação agora é explicada. Que
fatores podem ser invocados para explicar o desenvolvimento de um conjunto de estruturas para
outras?
Parece que há quatro fatores principais: o primeiro de todos, maturação, no sentido
de Gesell, uma vez que esse desenvolvimento é uma continuação da embriogênese; o segundo, o
papel da experiência, dos efeitos do ambiente físico na estrutura da inteligência; o terceiro, a
transmissão social em sentido amplo(transmissão por linguagem, educação, etc.); e o quarto, um
fator que é com freqüência negligenciado, mas que parece fundamental e até o fator principal. Fator
de equilibração ou, se preferirem, de auto-regulação. O primeiro fator é a maturação. Pode-se
pensar que estes estágios são simplesmente um reflexo
de uma maturação interna do sistema nervoso, seguindo as hipóteses de Gesell, por exemplo. Bem,
35
a maturação certamente desempenha um papel indispensável e não pode ser ignorada. Toma parte
certamente em cada transformação que ocorre durante o desenvolvimento da criança. Entretanto
este primeiro fator por si só é insuficiente. Antes de tudo, não sabemos praticamente nada acerca da
maturação do sistema nervoso além
dos primeiros meses da existência da criança. Sabemos alguma coisa acerca disto durante os dois
primeiros anos, mas pouco sabemos nos seguintes. Acima de tudo a maturação não explica tudo,
por que a idade média na qual este estágio aparece (idade cronológica média) varia grandemente de
uma para outra sociedade. O ordenamento desses estágios é constante e tem sido encontrado em
todas as sociedades estudadas.
Baseando-se no referido protocolo que considera como normalidade um índice de acertos
acima de 75%, como referido anteriormente, apresentam-se os resultados da aplicação dos testes
variados, distribuídos pelas respectivas idades e comparando-se os grupos da pesquisa.
Verificando-se o quantitativo de crianças que acertaram acima de 75%, em cada faixa etária,
somou-se os percentuais de acertos, atingindo-se o percentual total que caracterizou a normalidade.
Estatisticamente, portanto, para cada habilidade motora avaliada, baseou-se numa distribuição de
freqüência sobre a qual avaliou-se o percentual de indivíduos normais e com alteração.
Resultados da avaliação do equilíbrio estático
No grupo de 6 anos, 49 crianças (81,7%) da turma A conseguiram realizar o teste de forma
satisfatória, sendo 28 do sexo feminino e 21 do sexo masculino, enquanto na turma B somente 34
(56,7%) revelaram resultados positivos, sendo 9 do sexo feminino e 25 do sexo masculino. (Gráfico
1). Gráfico 1. Resultados da avaliação do equilíbrio estático em crianças de 6 anos.
36
No grupo de 7 e 8 anos, 42 crianças (70%) da Turma A acertaram o teste, sendo 13 do sexo
feminino e 29 do sexo masculino, para 24 (40%) apenas da Turma B, sendo 14 do sexo feminino e
10 do sexo masculino. (Gráfico 2).
Gráfico 2: Resultados da avaliação do equilíbrio estático em crianças de 7 e 8 anos.
Com relação ao grupo de 9 e 10 anos, 33 crianças (55%) da Turma A obtiveram resultados
positivos, sendo 23 do sexo feminino e 10 do sexo masculino, enquanto na turma B somente 12
(20%) conseguiram realizar o teste de forma satisfatória, sendo 4 do sexo feminino e 8 do sexo
masculino.
A diferença entre as duas turmas foi estatisticamente
significativa para p< 0,05. (Gráfico 3).
Gráfico 3: Resultados da avaliação do equilíbrio estático em crianças de 9 e 10 anos
Resultados da avaliação do equilíbrio dinâmico
No grupo de 6 anos, observou-se 24 crianças (40%), sendo 19 do sexo feminino e 5 do sexo
masculino, da turma A, alcançaram resultados positivos. Por outro lado, na turma B, 9 crianças
(15%), sendo 2 do sexo feminino e 7 do sexo masculino, acertaram a totalidade dos testes aplicados.
A diferença entre as duas turmas foi estatisticamente significativa para p < 0,05. ( Gráfico 4).
37
Gráfico 4: Resultados da avaliação do equilíbrio dinâmico em crianças de 6 anos
No grupo de 7 e 8 anos, observou-se que 40 crianças (66,6%) da turma A acertaram acima
de 75% dos testes aplicados, sendo 11 do sexo feminino e 29 do sexo masculino, para 5 (8,4%) da
turma B, sendo 3 do sexo
feminino e 2 do sexo masculino. Constatou-se, porém, que nesta faixa etária, a turma A evidenciou
melhor
desenvolvimento do equilíbrio dinâmico quando comparada à turma B. A diferença entre as duas
turmas foi
estatisticamente significativa para p< 0,05. (Gráfico 5).
Gráfico 5: Resultados da avaliação do equilíbrio dinâmico em crianças de 7 e 8 anos
No grupo de 9 e 10 anos, foi constatado que apenas 17 crianças (28,3%) da turma A
realizaram os testes satisfatoriamente, sendo 8 do sexo feminino e 9 do sexo masculino, para 9
(15%) da turma B, sendo 4 do sexo feminino e 5 do sexo masculino. Observou-se, no entanto, a
ocorrência de resultados negativos nas duas turmas, sendo baixo o percentual de resultados
positivos. A diferença entre as duas turmas teve significância estatística para p< 0,05. (Gráfico 6).
38
Gráfico 6: Resultados da avaliação do equilíbrio dinâmico em crianças de 9 e 10 anos
Resultados da avaliação da coordenação motora
No grupo de 6 anos da turma A, 39 crianças (65%) demonstraram bom desempenho em mais de
75% dos testes realizados, sendo 21 do sexo feminino e 18 do sexo masculino, para apenas 4
crianças (6,6%) da turma B, sendo 3 do sexo feminino e 1 do sexo masculino. Observou-se um alto
índice de resultados negativos na turma B, quando comparada com a turma A, havendo diferença
estatística entre as duas turmas para p<0,05.
(Gráfico 7).
Gráfico 7: Resultados da avaliação da coordenação motora em crianças de 6 anos
No grupo de 7 e 8 anos, observou-se que 21 crianças (35%) da turma A acertaram mais de
75% dos testes aplicados, sendo 11 do sexo feminino e 10 do sexo masculino, para 4 crianças
(6,7%) da turma B, sendo 3 do sexo feminino e 1 do sexo masculino. A diferença entre as duas
turmas foi estatisticamente significativa para p< 0,05. ( Gráfico 8).
39
Gráfico 8: Resultados da avaliação da coordenação motora em crianças de 7 e 8 anos
Observando-se os resultados obtidos com a avaliação do grupo de 9 e 10 anos, verificou-se
que na turma A 35 crianças (58,3%) conseguiram acertar mais de 75% dos testes aplicados, sendo
22 do sexo feminino e 13 do sexo masculino e na turma B apenas 4 crianças (6,7%) obtiveram tal
resultado satisfatório, sendo 2 do sexo feminino e 2 do sexo masculino. A diferença entre as duas
turmas teve significância estatística para p< 0,05. (Gráfico 9).
Gráfico 9: Resultados da avaliação da coordenação motora em crianças de 9 e 10 anos
40
5 - CONCLUSÃO
No presente estudo, observou-se que na turma A, a maioria das crianças de 6 a 10 anos que
participaram da avaliação, apresentou normalidade do equilíbrio estático, havendo um melhor
desempenho das crianças do sexo feminino para as idades de 6 e 10 anos e das crianças do sexo
masculino para a idade de 7 e 8 anos. Já na turma B, obteve-se um alto índice de resultados
insatisfatórios para as idades de 7 e 8, 8 e 9 anos, em que 60% e 80%, respectivamente,
apresentaram alteração do equilíbrio estático e menos da metade (43,3%) para a idade de 6 anos,
resultado significativo quando comparado à turma A, onde apenas 18,3% apresentou anormalidade
do equilíbrio para esta mesma faixa etária. Na turma B, houve um melhor desempenho das crianças
do sexo masculino para as idades de 6, 9 e 10 anos e das crianças do sexo feminino para a idade de
7 e 8 anos. É notório que para as idades de 6 e 9 e 10 anos, as meninas da turma A e os meninos da
turma B demonstraram destaque com relação ao desenvolvimento do equilíbrio estático, assim
como para a idade de 7 e 8 anos, onde os meninos da turma A mostraram o mesmo destaque obtido
pelas meninas da turma B. Dessa forma, não se deve afirmar,
neste estudo, a existência de predomínio do sexo feminino sobre o masculino e vice-versa, quanto
ao desenvolvimento do equilíbrio estático.
Neste trabalho, observou-se que na turma A, a maioria (66,6%) das crianças de 7 e 8 anos
que foram avaliadas apresentou o equilíbrio dinâmico sem alteração, ao contrário das crianças de 6,
9 e 10 anos que mostraram anormalidade desta valência, visto que 60% e 71,7%, respectivamente,
não alcançaram resultados positivos. Tais valores tornam-se bastante significativos quando
comparados à turma B, a qual quase a totalidade das crianças avaliadas apresentou alteração do
equilíbrio dinâmico, obtendo-se 85%, 91,6% e 85% de percentual negativo para as idades de 6, 7 e
8, 9 e 10 anos, respectivamente. Na turma A houve um melhor desempenho das crianças do sexo
masculino para as idades de 7 e 8, 9 e 10 anos e das crianças do sexo feminino para a idade de 6
anos. Já na turma B, houve um destaque das crianças do sexo masculino para as idades de 6, 9 e 10
anos e das crianças do sexo feminino para a idade de 7 e 8 anos. Com tais valores, é correto afirmar,
41
neste estudo, que os meninos de 9 e 10 anos apresentam melhor desempenho do equilíbrio dinâmico
quando comparados às meninas de mesma idade.
Por meio da pesquisa realizada ficou comprovado que as meninas apresentam melhor
desempenho na
execução de atividades que desenvolvem a coordenação motora, ao contrário dos meninos que
costumam ser mais hábeis nas atividades de equilíbrio.
Neste estudo, foram observados índices positivos e negativos. Algumas crianças de 6 anos
ainda não desenvolveram tal habilidade, demonstrando alteração no desenvolvimento da
coordenação motora.
Uma criança de 6 anos de idade já é capaz de arremessar uma bola em um alvo e com 7 e 8
anos já consegue copiar figuras geométricas.
É fundamental a avaliação da coordenação motora e equilíbrio na idade escolar da criança,
pois a alteração de tais habilidades pode interferir na aprendizagem escolar e na conduta geral e
diária da criança.
Na presente pesquisa, verificou-se que na turma A, grande parte das crianças apresentava
normalidade no que diz respeito à coordenação motora, ao contrário das crianças de 7 e 8 anos onde
65% evidenciaram resultados negativos durante a realização dos testes. Para a turma B, os
resultados foram insatisfatórios, revelando alteração da coordenação motora para as três faixas
etárias examinadas, com um percentual negativo correspondente a 93,3% para as idades estudadas.
É importante respeitar as diferenças entre meninos e meninas. Cada um apresenta um ritmo
diferente no desenvolvimento psicomotor: os meninos desenvolvem o equilíbrio e a coordenação
motora bem mais cedo e rápido do que as meninas, que são menos hábeis nesses tipos de
habilidades. Porém, as meninas são mais habilidosas em atividades que exploram a coordenação
motora fina, o que defendeu o autor (10), em seus estudos mais recentes. Vale salientar que, neste
estudo comparativo, observou-se que os meninos apresentaram melhor habilidade na execução dos
testes de equilíbrio e as meninas, nos testes de coordenação motora, tanto grossa quanto fina. Cabe
42
ressaltar, também, que o ambiente com o qual a criança mantém relacionamentos, tem importância
fundamental no desenvolvimento destas habilidades, alterando, portanto, estes resultados
encontrados.
É importante, também, salientar que o atraso no desenvolvimento do equilíbrio e da
coordenação motora
pode afetar toda a vida da criança e causar conseqüências irreversíveis na vida adulta. Entre elas
estão a lentidão na execução dos movimentos e a relação estabelecida do próprio corpo com o meio,
aumentando as dificuldades motoras. As alterações diagnosticadas nas crianças da turma B
merecem atenção, para que sejam evitadas perturbações motoras na fase adulta, além de possibilitar
a essas crianças um melhor relacionamento com o meio e melhor desempenho na execução de suas
atividades diárias.
Para tanto, deve-se dar continuidade a este estudo e elaborar um programa de atividades
psicomotoras voltadas para o equilíbrio estático, equilíbrio dinâmico e coordenação motora,
oferecendo-se, deste modo, assistência às crianças que apresentam tais dificuldades. Por conta
disso, faz-se mister recomendar aos profissionais compromissados com o Homem em suas
diferentes fases da vida, novas reflexões e abordagens concernentes ao assunto em estudo, somando
novas contribuições para a Ciência da Motricidade Humana.
No concernente à análise do equilíbrio estático, observou-se que houve diferença
significativa entre as duas turmas pesquisadas, para as idades de 6 a 10 anos. Ocorreu, também
diferença quanto ao sexo, entre as duas turmas pesquisadas.
Na análise do equilíbrio dinâmico, também se observou diferença significativa entre as
crianças avaliadas. A turma A mostrou resultados mais satisfatórios do que a turma B, ocorrendo
diferença também em relação ao sexo. As crianças do sexo masculino, da faixa etária de 9 e 10 anos
obtiveram melhores resultados,
nas populações estudadas. Na análise da coordenação motora, verificou-se diferença significativa
entre as populações estudadas, em que a turma A mais uma vez se destaca em relação à turma B,
43
que evidenciou um pequeno percentual de acertos dos testes aplicados: 6,6%, 6,7% e 6,7% para as
crianças de 6, 7, 8, 9 e 10 anos, respectivamente.
As crianças do sexo feminino obtiveram melhores resultados na realização dos testes de
coordenação motora, em ambas populações.
De maneira geral, a maioria das crianças avaliadas na turma B não alcançou um índice de
acertos correspondente a 75% das atividades específicas, nas três idades avaliadas e para cada
habilidade examinada, sugerindo atraso no desenvolvimento do equilíbrio e da coordenação motora.
Desta forma obteve-se a maioria e
resultados negativos na turma B: para equilíbrio estático, 43,3%, 60% e 80%, para equilíbrio
dinâmico, 85%, 91,6 e 85%, para coordenação motora, 93,4%, 93,3% e 93,3%, para as idades de 6,
7, 8, 9 e 10 anos, respectivamente.
No contexto da Motricidade Humana, foi importante a identificação das reais carências
dessas crianças para que, então, a motricidade fosse desenvolvida como uma manifestação do
comportamento, para se alcançar
o aumento da qualidade de vida desses sujeitos.
O estudo mostrou as carências das crianças avaliadas, que passarão a atribuir valor: uma
qualidade para
a motricidade, que vai dar sentido à própria vida existencial. Se as crianças valorizam a
motricidade, significa que esta atende às suas necessidades e esse valor atribuído por elas evidencia
a qualidade dos testes de avaliação. Tendo qualidade, a vida tem significado, as carências são, de
fato, atendidas e o ciclo é reiniciado: novas carências surgem e deverão ser diagnosticadas. Isto
ocorre porque o Ser do Homem está em permanente estado de carência.
44
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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45
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1979.
46
ANEXO
Meninos e meninas: Expectativas corporais e implicações na educação física escolar
Eustáquia Salvadora de Sousa3
Helena Altmann 4
RESUMO
Neste texto discute-se o gênero como construção social que uma dada cultura estabelece em
relação a homens e mulheres, mostrando que essa construção é relacional, tanto no que se refere ao
outro sexo quanto a outras categorias, tais como raça, idade, classe social e habilidades motoras.
Analisa as expectativas corporais em relação a meninos e meninas e suas manifestações na cultura
escolar, o esporte como conteúdo genereficado da educação física e as possibilidades de intervenção
docente na construção das relações entre meninos e meninas.
Palavras-chave: Gênero, cultura escolar, educação física, esporte
INTRODUÇÃO
Nessa contagem regressiva para o século XXI, existe um movimento de educadores para que
a escola reencontre os vínculos perdidos entre educação e humanização, assuma a formação do
cidadão(ã) para sua intervenção na vida pública e fortaleça a concepção democrática, na
revitalização do pensamento pedagógico, embora a imagem dela continue vinculada apenas ao
treinamento para o mercado de trabalho.
Nesse sentido, a nova Lei de Diretrizes e Bases de Educação Nacional (Brasil 1996), apesar
de suas contradições, abre espaços para a construção de uma escola comprometida com a cidadania
3 Professora da Faculdade de Educação da UFMG; licenciada em Educação Física; doutora em Educação pela Unicamp. 4 Professora da Fundação de Ensino Superior de Bragança Paulista; licenciada em Educação Física; mestre em Educação pela UFMG.
47
e com a rejeição à exclusão. Esses espaços são garantidos e reforçados pelas Diretrizes Curriculares
do Ensino Fundamental (Brasil, CNE 1998) que, ao regulamentar a lei, adotam como princípios da
educação a garantia aos direitos e deveres da cidadania, a política da igualdade, a solidariedade e a
ética da identidade.
Também os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) (Brasil 1997), que servem de apoio
às discussões e ao desenvolvimento dos projetos educativos da escola, reforçam a necessidade de se
construir uma educação básica que adote como eixo estrutural o princípio da inclusão, apontando
para uma perspectiva metodológica de ensino-aprendizagem que busque a cooperação e a igualdade
de direitos. Para isso, sugerem um conjunto de temas que aparecem transversalizados, permeando a
concepção dos diferentes componentes curriculares, dentre os quais a ética, a saúde, a orientação
sexual e a pluralidade cultural, englobando, portanto, as questões de gênero na cultura brasileira.
Entretanto, para que essas idéias e esses valores se tornem realidade na educação escolar não
basta incluí-los nas leis e nos PCNs; é necessário entender que quanto mais o pensamento e a
prática educacionais se situam no campo dos direitos, mais inevitável se torna encarar a escola
como um dos espaços instituídos da integração e da diversidade. E, como recomenda Arroyo
(1996), é preciso também situar a escola na construção de um projeto político e cultural por um
ideal democrático que reflita, ao mesmo tempo, a complexa diversidade de grupos, etnias, gêneros,
demarcado não só por relações de perda, de exclusão, de preconceitos e discriminações, mas
também por processos de afirmação de identidades, valores, vivências e cultura1.
O propósito deste texto - que discute as relações de gênero na cultura escolar - é contribuir
para a fundamentação de uma ação pedagógica que permita às mulheres e aos homens, conjunta e
indiscriminadamente, conhecimento e vivências lúdicas do corpo que pensa, sente, age, constrói e
consome cultura.
Gênero: A construção social das diferenças sexuais
48
Gênero é aqui entendido como a construção social que uma dada cultura estabelece ou elege
em relação a homens e mulheres, ou, como conceitua Scott (1995, p. 89), é um elemento
constitutivo das relações sociais fundadas sobre as diferenças percebidas entre os sexos, que
"fornece um meio de decodificar o significado e de compreender as complexas conexões entre
várias formas de interação humana".
Na visão da autora, o gênero, ao enfatizar o caráter fundamentalmente social das divisões
baseadas no sexo, possibilita perceber as representações e apresentações das diferenças sexuais.
Destaca, ainda, que imbricadas às diferenças biológicas existentes entre homens e mulheres estão
outras social e culturalmente construídas.
Dessa maneira, a ênfase dada pelo conceito de gênero à construção social das diferenças
sexuais não se propõe a desprezar as diferenças biológicas existentes entre homens e mulheres, mas
considera que, com base nestas, outras são construídas.
Nesse sentido, Bourdieu (1995) lembra que o mundo social constrói o corpo por meio de um
trabalho permanente de formação e imprime nele um programa de percepção, de apreciação e de
ação. Nesse processo, as diferenças socialmente construídas acabam sendo consideradas naturais,
inscritas no biológico e legitimadoras de uma relação de dominação.
Essas idéias são reforçadas por Bordo (1997, p. 20), ao afirmar que "por meio da
organização e da regulamentação de nossas vidas, nossos corpos são treinados, moldados e
marcados pelo cunho das formas históricas predominantes de individualidade, desejo,
masculinidade e feminilidade".
Se os corpos assumem a organização social, a política e as normas religiosas e culturais, também é
por seu intermédio que se expressam as estruturas sociais. Assim, há uma estreita e contínua
imbricação entre o social e o biológico, um jeito de ser masculino e um jeito de ser feminino, com
atitudes e movimentos corporais socialmente entendidos como naturais de cada sexo (Connel 1990).
49
Portanto, o processo de educação de homens e mulheres supõe uma construção social e corporal dos
sujeitos, o que implica - no processo ensino/aprendizagem de valores - conhecimentos, posturas e
movimentos corporais considerados masculinos ou femininos. E, nesse sentido, praticamente,
todo movimento corporal é distinto para os dois sexos: o andar balançando os
quadris é assumido como feminino, enquanto dos homens espera-se um caminhar
mais firme (palavra que no dicionário vem associada a seguro, ereto, resoluto -
expressões muito masculinas e positivas), o uso das mãos [...], o posicionamento das
pernas ao sentar, enfim, muitas posturas e movimentos são marcados, programados,
para um e para outro sexo. (Louro 1992, pp. 58-59)
Como a idéia de gênero está fundada nas diferenças biológicas entre os sexos, ela aponta
para o caráter implicitamente relacional do feminino e do masculino. Assim, gênero é uma categoria
relacional porque leva em conta o outro sexo, em presença ou ausência. Além disso, relaciona-se
com outras categorias, pois não somos vistos(as) de acordo apenas com nosso sexo ou com o que a
cultura fez dele, mas de uma maneira muito mais ampla: somos classificados(as) de acordo com
nossa idade, raça, etnia, classe social, altura e peso corporal, habilidades motoras, dentre muitas
outras. Isso ocorre nos diversos espaços sociais, incluindo a escola e as aulas de educação física,
sejam ministradas para turmas do mesmo sexo ou não.
Os sistemas escolares modernos não apenas refletem a ideologia sexual dominante da
sociedade, mas produzem ativamente uma cadeia de masculinidades e feminilidades heterossexuais
diferenciadas e hierarquicamente ordenadas (Mac An Gahill 1996). Mesmo com essa
hierarquização, as construções de gênero não se opõem, ou seja, o feminino não é o oposto nem o
complemento do masculino.
Sobre isso, Poovey (1988) argumenta que a oposição entre os sexos não é reflexo ou
articulação de um fato biológico, mas uma construção social. A revelação de que a oposição binária
é artificial desestabiliza a identidade aparentemente fixa e rígida do feminino e do masculino e
50
impede a formulação de outras possibilidades. No que se refere à diversidade de construções de
gênero, Louro lembra que,
entendendo gênero fundamentalmente como uma construção social - e, portanto,
histórica -, teríamos de supor que esse conceito é plural, ou seja, haveria conceitos de
feminino e de masculino, social e historicamente diversos. A idéia de pluralidade
implicaria admitir não apenas que sociedades diferentes teriam diferentes
concepções de homem e de mulher, como também que no interior de uma sociedade
tais concepções seriam diversificadas, conforme a classe, a religião, a raça, a idade,
etc.; além disso, implicaria admitir que os conceitos de masculino e feminino se
transformam ao longo do tempo. (1996, p. 10)
Um entendimento dos gêneros como opostos não é exclusividade do mundo adulto. Após
examinar construções de gênero em falas e em jogos de crianças em escolas primárias inglesas,
Francis (1998, p. 42) afirma que as próprias crianças construíam os gêneros como opostos, a fim de
reforçar seu senso de identidade feminina ou masculina. Entretanto, essas culturas não eram
congeladas, e as fronteiras dessa divisão eram freqüentemente ultrapassadas ou recusadas.
Similarmente, Thorne (1993) relata ocasiões em que o senso de gênero como fronteira se dissolvia,
e meninos e meninas interagiam descontraidamente.
Assim, meninos e meninas não mantêm nítidas as divisões de gênero, estando por vezes separados e
noutras juntos, o que, nas aulas de educação física, nem sempre ocorre sem muitos conflitos.
As construções de gênero nas aulas de educação física para turmas mistas
Sendo gênero uma categoria relacional, há de se pensar sua articulação com outras categorias
durante aulas de educação física, porque gênero, idade, força e habilidade formam um "emaranhado
de exclusões" vivido por meninas e meninos na escola (Altmann 1998)2. Não se pode concluir que
as meninas são excluídas de jogos apenas por questões de gênero, pois o critério de exclusão não é
exatamente o fato de elas serem mulheres, mas por serem consideradas mais fracas e menos
51
habilidosas que seus colegas ou mesmo que outras colegas. Ademais, meninas não são as únicas
excluídas, pois os meninos mais novos e os considerados fracos ou maus jogadores freqüentam
bancos de reserva durante aulas e recreios, e em quadra recebem a bola com menor freqüência até
mesmo do que algumas meninas.
Tais constatações mostram-nos que a separação de meninos e meninas nas aulas de educação física
desconsidera a articulação do gênero com outras categorias, a existência de conflitos, exclusões e
diferenças entre pessoas do mesmo sexo, além de impossibilitar qualquer forma de relação entre
meninos e meninas.
Mas, como alerta Kunz (1993), em estudo sobre a construção histórico-cultural dos estereótipos
sexuais, no contexto escolar, a educação física constitui o campo onde, por excelência, acentuam-se,
de forma hierarquizada, as diferenças entre homens e mulheres. Também Louro lembra que, se em
alguns componentes curriculares a constituição da identidade de gênero parece, muitas vezes, ser
feita por meio de discursos implícitos,
nas aulas de educação física esse processo é, geralmente, mais explícito e evidente.
Ainda que várias escolas e professores/as venham trabalhando em regime de co-
educação, a educação física parece ser a área onde as resistências ao trabalho
integrado persistem, ou melhor, onde as resistências provavelmente se renovam, a
partir de outras argumentações ou de novas teorizações. (1997, p. 72)
Essas resistências vêm se mostrando constantes ao longo da história dessa disciplina na
escola brasileira, fortemente vinculada à biologia e ao positivismo, como apontam diversas autoras,
dentre as quais Soares (1994) e Gomes (1998).
Essa história mostra que na aparência das diferenças biológicas entre os sexos ocultaram-se
relações de poder - marcadas pela dominação masculina - que mantiveram a separação e a
hierarquização entre homens e mulheres, mesmo após a criação da escola mista, nas primeiras
décadas deste século. Buscou-se manter a simbologia da mulher como um ser dotado de fragilidade
52
e emoções, e do homem como força e razão, por meio das normas, dos objetos, do espaço físico e
das técnicas do corpo e dos conteúdos de ensino, fossem eles a ginástica, os jogos ou - e sobretudo -
os esportes.
Esporte: Conteúdo genereficado e genereficador
Com a introdução do esporte moderno como conteúdo da educação física escolar no Brasil,
principalmente a partir dos anos 30, a mulher manteve-se perdedora porque era um corpo frágil
diante do homem. Todavia, era por "natureza" a vencedora nas danças e nas artes. O corpo da
mulher estava, pois, dotado de docilidade e sentimento, qualidades negadas ao homem pela
"natureza". Aos homens era permitido jogar futebol, basquete e judô, esportes que exigiam maior
esforço, confronto corpo a corpo e movimentos violentos; às mulheres, a suavidade de movimentos
e a distância de outros corpos, garantidas pela ginástica rítmica e pelo voleibol. O homem que
praticasse esses esportes correria o risco de ser visto pela sociedade como efeminado. O futebol,
esporte violento, tornaria o homem viril e, se fosse praticado pela mulher, poderia masculinizá-la,
além da possibilidade de lhe provocar lesões, especialmente nos órgãos reprodutores.
À medida que os anos transcorreram, as perspectivas sob as quais se adjetivava o esporte foram se
alterando e, nas últimas décadas, presenciamos algumas mudanças: aos homens é dado o direito de
praticar o voleibol, sem riscos para sua masculinidade, e o futebol passa a ser praticado por
mulheres, tanto nos clubes quanto em algumas escolas.
Essa participação das mulheres foi autorizada pelo Conselho Nacional de Desportos (Brasil
1979, Brasil 1983) e endossada por estudos científicos que jogavam por terra os argumentos sobre a
probabilidade de as mulheres estarem mais propensas às lesões esportivas do que os homens
(Azevedo 1988).
Entretanto, não se pode considerar que, pelo fato de homens e mulheres praticarem os
mesmos esportes, estes tenham deixado de ser genereficados. Basta uma análise mais cuidadosa do
noticiário divulgado para verificarmos que eles continuam, de maneira geral, estreitamente ligados à
imagem masculina: destacam-se a beleza das atletas, suas qualidades femininas, sempre frisando
53
que são atletas, mas continuam mulheres. Michel Messner (1992) reforça essas idéias ao considerar
o esporte
uma "instituição genereficada" - uma instituição construída por relações de gênero.
Enquanto tal, sua estrutura e valores (regras, organização formal, composição sexual,
etc.) refletem concepções dominantes de masculinidade e feminilidade. Os esportes
organizados são também uma "instituição genereficadora" - uma instituição que
ajuda a construir a ordem de gênero corrente. (Tradução nossa)
Diversos autores e autoras apontam o esporte como uma atividade predominantemente
masculina e de fundamental importância na construção da identidade masculina (B. Connel 1992,
R. Connel et al. 1995).
Também Badinter (1993, p. 94) afirma que os esportes que envolvem a competição, a agressão e a
violência são considerados como a melhor iniciação à virilidade, pois é nesse espaço que o
adolescente ganha "status de macho", mostrando publicamente seu desprezo pela dor, o controle do
corpo, a força e a vontade de ganhar e esmagar os outros. "Em suma, mostra que não é um bebê,
uma moça ou um homossexual, mas um homem de verdade."
Essa imagem do esporte continua afastando as mulheres de sua prática. Se freqüentarmos
quadras esportivas em algum parque num final de semana, provavelmente encontraremos um
número significativamente maior de homens do que de mulheres jogando. Também nas escolas as
quadras esportivas são normalmente ocupadas por meninos durante o recreio e horários livres, o
que, até certo ponto, demonstra que eles dominam esse universo.
Em Belo Horizonte, Altmann (1998) mostra que, na escola, os meninos ocupam espaços
mais amplos que as meninas por meio do esporte, o qual está vinculado a imagens de uma
masculinidade forte, violenta e vitoriosa.
Isso também parece ocorrer em escolas de outras partes do mundo. Observando pátios de
escolas norte-americanas, Thorne (1993) constatou que meninos ocupavam dez vezes mais espaço
54
do que meninas durante o recreio e, enquanto eles controlavam espaços maiores e principalmente
destinados a esportes coletivos, elas permaneciam em espaços menores e mais próximos ao prédio,
obtendo, assim, a proteção dos adultos. Além disso, meninos invadiam e interrompiam os jogos
femininos mais freqüentemente que o contrário. Na Inglaterra, Grugeon (1995) registrou que o
domínio masculino do espaço físico durante os recreios ocorria principalmente por intermédio do
futebol.
Outra questão importante a ser destacada é que meninas não são vítimas de uma exclusão
masculina. Vitimá-las significaria coisificá-las, 'aprisioná-las pelo poder', desconsiderando suas
possibilidades de resistência e também de exercício de dominação (Altmann 1998). Como exemplo
do exercício dessa resistência, trazemos o relato de um dia em que meninas jogaram futebol durante
um recreio - espaço diariamente ocupado apenas por meninos.
Para se inserirem naquele universo masculino, as meninas lançaram mão de
estratégias. Primeiro, visando evitar conflitos, chegaram cedo nas quadras com uma
bola, organizando-se antes mesmo da chegada dos meninos. Segundo, permitiram
que dois deles fossem os árbitros do jogo. Ao conceder-lhes o papel de autoridade,
elas fizeram da aparente aceitação do domínio masculino daquele esporte uma
estratégia para jogar, pois, ainda que o papel de árbitros lhes tenha sido concedido, o
exercício pleno desta função não o foi, pois eram as meninas que mandavam em
quadra. Apesar de todos os xingões que ouviram, os árbitros, e não as jogadoras,
estiveram prestes a levar um cartão vermelho e serem expulsos de campo.
Os meninos também não foram passivos:
A resistência das meninas ao domínio masculino das quadras foi tão eficiente que a
situação se inverteu: elas passaram a dominar e eles, a resistir.
55
Houve, então, um efeito de contra-resistência: ao perceberem que elas dominavam as
quadras, os meninos tentaram restabelecer seu domínio, planejando uma invasão e
chamando as meninas que jogavam de Marias-homem. Ainda assim, as Marias
jogaram o recreio inteiro.
Quando meninos e meninas praticam juntos algum esporte, parece haver expectativa de que as
práticas e os espaços esportivos sejam dominados por meninos. Na escola pesquisada,
jogar com as meninas não era um desafio para os meninos, pois um bom
desempenho contra meninas não lhes creditava qualquer mérito especial, e jogar pior
do que elas era um vexame, pois ia contra a expectativa de superioridade masculina
nesse universo. Desse modo, jogar com meninas representava para eles não um
desafio, mas uma ameaça.
Para as meninas, por sua vez, superar as expectativas e ser melhor que os meninos no
esporte era uma honra, motivo de consagração que, em algumas ocasiões e entre
alguns meninos, garantia-lhes legitimidade. Noutros momentos, porém, a
desvalorização de sua prática esportiva e delas como mulheres era uma maneira de
resistir ao abalo que sua presença nas quadras infligia ao domínio masculino daquele
espaço. (Altmann 1998, pp. 98-99)
Assim, ainda que a prática de atividades esportivas seja mais freqüente entre homens, o
envolvimento de mulheres com os esportes, inclusive com o futebol, está longe de ser desprezível.
Se no passado apenas meninos jogavam bola, hoje meninas freqüentam esses campos não mais
apenas como espectadoras, mas buscando romper com as hierarquias de gênero.
Exemplo dessa hierarquização pode ser lido numa reportagem intitulada "Mulheres invadem
campos de futebol" recentemente publicada na Folha de S. Paulo, na qual afirma-se que "matar a
bola no peito, driblar o adversário e marcar um gol não é mais exclusividade do mundo masculino".
56
Ela destaca que o futebol tornou-se uma possibilidade de emprego para mulheres, que podem
receber salários entre R$ 500 e R$ 1.000, valores bastante inferiores aos salários recebidos por
jogadores do sexo masculino.
Outro dado interessante é que essa reportagem de meia página localizava-se nos classificados de
emprego e não na seção de esportes, que era composta praticamente por cinco páginas com artigos
sobre campeonatos brasileiros masculinos de primeira e de segunda divisão e sobre torneios
internacionais (Abbud 1999).
Quanto aos homens, continuam "proibidos" de praticar alguns esportes, dentre os quais a Ginástica
Rítmica Desportiva (GRD). Esse esporte é um dos conteúdos de ensino da educação física que nos
permitem ler a genereficação do esporte, como também os mascaramentos que, historicamente,
foram sendo modificados para que seja garantida a manutenção de valores desejados, com regras
diferenciadas para homens e mulheres. Ao se tornar esporte considerado feminino, seu sentido de
expressão de arte mudou para significado de eficiência e perfeição técnica, adaptando-se, portanto,
ao conjunto de valores que o esporte prevê para os homens. Entretanto, mascarando-se o sexismo
dos gestos, esse esporte, mesmo exigindo riscos, valoriza a aparente leveza e feminilidade. Dessa
forma, a GRD, uma experiência que poderia ser interessante para ambos os sexos, pois possibilita a
interação entre o corpo e o manejo de aparelhos manuais diferenciados, passa a ser valorizada pelos
gestos sexistas.
O entendimento das barreiras da prática indiferenciada de esporte por homens e mulheres na escola
remete-nos à afirmação de Kunz (1993, p. 118). Afirma essa autora que:
Na contraposição das possibilidades expressas pelos dois mundos esportivos,
respectivamente para o feminino e masculino - cooperação/competição,
sensibilidade/racionalidade, criatividade/produtividade [agressividade/delicadeza] -
evidenciam-se os pólos que o esporte, como praticado nas escolas, não deixa, por
enquanto, conciliar.
57
Intervenção docente
No que se refere à intervenção docente, várias considerações podem ser feitas, dado o importante
papel do professor ou da professora na aula. Para Louro (1997, p. 75), as aulas de educação física
representam uma situação constante e peculiar de exame:
O uso de alinhamentos, a formação de grupos e outras estratégias típicas dessas aulas
permitem que o professor ou professora exercite um olhar escrutinador sobre cada
estudante, corrigindo sua conduta, sua postura física, seu corpo, enfim, examinando-
o/a constantemente. Alunos e alunas são aqui particularmente observados, avaliados
e também comparados, uma vez que a competição é inerente à maioria das práticas
esportivas.
Todavia, esse olhar escrutinador não é exercitado somente pelo docente, mas pelos estudantes entre
si. Na escola, estudantes estão constantemente vigiando as habilidades, as atitudes, o gênero e a
sexualidade dos colegas. Quando, por exemplo, meninos e meninas são vistos juntos, é comum
ocorrerem comentários pejorativos ou "gozações" entre outros colegas, como chamando-os de
namorados ou questionando sua sexualidade por a atividade ser considerada feminina ou masculina.
Sobre essa questão, Thorne (1993) afirma que a presença de adultos entre crianças pode diminuir a
separação de gênero, pois, ao incentivarem a prática conjunta de meninos e meninas, os
comentários pejorativos provenientes dessa interação são minimizados.
Também Serbin (1984), pesquisando escolas elementares norte-americanas, mostrou que a presença
do professor ou da professora em algum local já é por si mesma um fator de extrema importância na
determinação das atividades da criança. As professoras, por terem sido socializadas como mulheres,
têm interesses específicos na sala de aula e, conseqüentemente, acabam interagindo com as
crianças, principalmente por meio de atividades de preferência feminina. Isso facilitaria um
envolvimento dos meninos com essas atividades, mas não o envolvimento de meninas em
58
atividades predominantemente masculinas. No experimento feito, quando a professora ocupou áreas
na sala de aula onde ficavam brinquedos como blocos e caminhões, as meninas tímidas, que antes
nunca tinham ido àqueles locais, aproximaram-se. A pesquisadora concluiu que as meninas não
chegavam àqueles locais porque a professora não ia até lá. Os mesmos resultados foram obtidos
com os meninos, quando a professora foi brincar com bonecas e quando a experiência foi repetida
com professores.
"A postura docente é uma referência que define como meninas e meninos agem e se relacionam
entre si" (Altmann 1998, p. 101). Meninos e meninas nem sempre reagem da mesma forma à
intervenção docente, e um exemplo reside no fato de que meninos desobedecem mais a normas
escolares e a solicitações docentes do que meninas.
Assim, uma maneira encontrada por meninas - e, em menor freqüência, por meninos - para resolver
problemas e conflitos presentes nas aulas era por meio da intervenção docente. A professora
incentivava seus alunos e alunas a colocarem-na a par do que ocorria nas aulas e a solicitarem sua
ajuda para resolver problemas. Essa atitude não poderia ser interpretada como uma incapacidade de
resolver o problema, pois quem levava a professora a agir era a aluna ou o aluno. Por meio da
intervenção da professora, escondendo-se atrás dela, esses estudantes conquistaram o que
desejavam (Altmann 1998).
Adaptar as regras de algum jogo ou esporte como recurso para evitar a exclusão de meninas
desconsidera a articulação do gênero a outras categorias. Determinar que um gol só possa ser
efetuado após todas as meninas terem tocado a bola, ou autorizar apenas as meninas a marcá-los são
exemplos dessas adaptações. Se tais regras solucionam um problema, criam outros, pois quebram a
dinâmica do jogo e, em última instância, as meninas são as culpadas por isso, pois foi para elas que
as regras foram modificadas.
Como afirma Louro (1997), modificar as regras do jogo pode representar uma forma de ajustar o
jogo à "debilidade" feminina, mais uma vez consagrando-se a idéia de que o feminino é um desvio
construído com base no masculino. Além disso, a exclusão é aí tratada como unicamente de gênero,
59
e aqueles meninos excluídos com as regras oficiais continuam a enfrentar o mesmo problema
quando as regras são adaptadas.
São inúmeros os conflitos e as dificuldades dos educadores no enfrentamento das questões de
gênero presentes na cultura escolar, especialmente nas aulas de educação física, pois se trata de
valores e normas culturais que se transformam muito lentamente.
É importante lembrar que o processo de socialização das novas gerações não é simples nem pode
ser considerado de modo linear ou mecânico. Ele é complexo, sutil e marcado por inevitáveis
resistências individuais e grupais, bem como por profundas contradições. Nesse processo, a
tendência conservadora lógica - presente em toda comunidade social para reproduzir
comportamentos, valores, idéias, artefatos e relações que são úteis para a própria existência do
grupo humano - choca-se inevitavelmente com a tendência, também lógica, que busca modificar os
caracteres dessa formação que se mostram desfavoráveis para alguns dos indivíduos ou grupos que
compõem o complexo e conflitante tecido social (Pérez Gomes 1998).
Além disso, lembrando Sacristán (1995, p. 89), cabe ressaltar que "a escola não opera no vazio; a
cultura que ali se transmite não cai em mentes sem outros significados prévios". Os estudantes são
seres com uma bagagem prévia de crenças, significados, valores, atitudes e comportamentos
adquiridos fora da escola. A televisão, os quadrinhos, a fala e as atitudes cotidianas dos adultos e
dos grupos de amigos estão cheios de estereótipos de gênero, de crenças sobre o que é ser homem
ou mulher em nossa cultura.
Se, por um lado, esse fato limita o poder de intervenção da escola, por outro, não podemos esquecer
que a escola também constrói cultura e que é possível criar propostas político-pedagógicas que
vinculem a cultura escolar e as aprendizagens de origem externa à escolaridade.
Mesmo entendendo que o ensino escolar é uma alavanca de potencial limitado para a conquista de
objetivos que afetam valores e comportamentos enraizados nos distintos grupos sociais, acreditamos
que existe a possibilidade de ampliação de espaços para a construção de relações não-
hierarquizadas entre homens e mulheres, para a qual a escola pode contribuir.
60
Notas
1. Diversos estudos sobre as questões de gênero da educação física escolar foram produzidos no
Brasil, dentre os quais: Romero 1990 e 1995; Kunz 1993; Sousa 1994; Ferreira 1996; Oliveira
1996; Soares 1994 e Gomes 1998.
2. Utilizando procedimentos da etnografia, a autora buscou compreender como meninos e meninas
constroem as relações de gênero. A pesquisa desenvolveu-se em uma escola municipal de Belo
Horizonte. Foram observados recreios e aulas de educação física de quatro turmas de 5a série.
Boys and girls: Genre issues and its implication on education
ABSTRACT: In this paper gender is discussed as a social construction which is established by a
given culture in relation to men and women. Gender is characterised as a relational construction
with reference not only to the other sex but also to categories such as race, age, social class and
motor skills. The paper also analyses: (i) boys' and girls' anticipated bodily expectations and how
they manifest in school culture; (ii) how this concept of sport can be re-defined by applying this
notion of gender to contents in Physical Education; (iii) possibilities for teachers' interventions in
the construction of relationships between boys and girls.
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