efeito das suturas barbadas na nefrectomia parcial laparoscópica… · 2019-07-13 ·...
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Efeito das suturas barbadas na nefrectomia
parcial laparoscópica: uma meta-análise
Efeito das suturas barbadas na nefrectomia parcial laparoscópica: uma
meta-análise
Estudante:
Duarte Filipe Santos Sousa
Mestrado Integrado em Medicina
Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar, Universidade do Porto
Orientador:
Dr. Miguel António Costa de Araújo da Silva Ramos
Professor Associado Convidado no Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar
Serviço de Urologia do Centro Hospitalar do Porto – Hospital de Santo António
1 de junho de 2018
Assinatura do estudante
Assinatura do tutor
1 de junho de 2018
DEDICATÓRIA
À minha família, por todo o apoio incondicional e pelo esforço que fizeram
para me poder permitir realizar este meu percurso académico.
Aos meus amigos, companheiros destes seis anos, que partilharam comigo
as dificuldades e felicidades e por me terem marcado para a vida.
i
AGRADECIMENTOS
Ao Dr. Miguel Ramos, meu orientador, pelo auxílio na pesquisa de
bibliografia, por todo o tempo gasto na análise e correção do meu trabalho, pela
atitude crítica, pela gentileza e pelo enorme conhecimento na área.
Ao Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar e ao Centro Hospitalar
Universitário do Porto, por terem feito parte da minha formação académica.
ii
Resumo
Introdução: A nefrectomia parcial laparoscópica tem-se assumido como cirurgia
difundida para tratamento de tumores e massas renais <4cm. É, contudo, uma
técnica que impossibilita o arrefecimento adequado do rim, é tecnicamente difícil
e está associada a tempos de isquemia mais elevados e maiores taxas de
hemorragia.
Objetivos: determinar a existência ou não de vantagens no uso de suturas
barbadas para a rafia do parênquima renal na nefrectomia parcial laparoscópica,
em comparação com as suturas convencionais.
Metodologia: Foram pesquisadas as bases de dados do PubMed, Scopus e
Cochrane Central Register of Controlled Trials desde a sua conceção até maio de
2018. Foi extraída informação de uma forma padronizada.
Resultados: Um total de 7 estudos e 399 doentes foram incluídos nesta análise.
Todos os estudos eram retrospetivos observacionais exceto um que era um ensaio
clínico randomizado. Não houve diferenças significativas quanto à perda de sangue
estimada (p=0,13), complicações perioperatórias (p=0,25), complicações Clavien-
Dindo I-II (p=0,41), complicações Clavien-Dindo III-V (p= 0,35). O uso de suturas
barbadas foi significativamente melhor quanto à duração da sutura, -4.67 minutos
(p=0,002), quanto à duração da cirurgia, -7,24 minutos (p=0,002) e principalmente,
quanto ao tempo de isquemia quente, - 6,81 minutos (p<0,00001).
Conclusões: O uso de suturas barbadas permite uma renorrafia mais rápida,
diminuir a duração da cirurgia e diminuir o tempo de isquemia. O seu uso é seguro,
pelo que são dignas de ser usada na clínica.
Palavras-chave: nefrectomia parcial laparoscópica; suturas barbadas; tempo de
isquemia quente
iii
Abstract
Introduction: Laparoscopic partial nephrectomy is being used in the treatment of
small renal masses and neoplasms <4cm. However, it’s considered to be a difficult
technique that is not suitable for a proper renal cooling, therefore, it is associated
with longer ischemia time and more frequent haemorrhaging.
Objectives: to determine whether or not there are advantages to the use of barbed
sutures for for the renorrhaphy of the parenchyma in laparoscopic partial
nephrectomy, compared to conventional sutures.
Methodology: A search was conducted at PubMed databases, as well as Scopus
and Cochrane Central Register of Controlled trials since its conception until May
2018. I extracted information in a standardized way.
Results: A total of 7 studies and 399 patients were included in this analysis. All
studies were retrospective observational but one that was a randomized clinical
trial. There were no significant differences in estimated blood loss (P = 0, 13),
perioperative complications (P = 0.25), postoperative Clavien-Dindo I-II
complications (p = 0,41), postoperative Clavien-Dindo III-V complications (P = 0.35).
The use of barbed sutures was significantly better reducing suture time, -4.67
minutes (P = 0,002), duration of the surgery, -7.24 minutes (P = 0,002) and, most
importantly, warm ischemia time, -6.81 minutes (P < 0,00001).
Conclusions: The use of barbed sutures allows for faster renorrhaphy, reduces
surgery’s duration and reduces warm ischemia time. They are safe, feasible, and
their use in clinical practice is more than creditable.
iv
Lista de abreviaturas
CI: intervalo de confiança
DP: Desvio padrão
M-H = Mantel-Haenszel
NPL: Nefrectomia parcial laparoscópica
SC: Sutura convencional
SB: Sutura barbada
v
INTRODUÇÃO: 1
MÉTODOS 2
Estratégia de pesquisa 2
Considerações estatísticas 3
RESULTADOS 3
Duração da cirurgia 4
Duração da sutura 4
Tempo de isquemia quente 5
Complicações perioperatórias 5
Perda de sangue estimada 6
Necessidade de transfusão 6
Complicações pós-operatórias 6
DISCUSSÃO 7
CONCLUSÃO 10
BIBLIOGRAFIA 11
ANEXOS 13
1
Introdução:
A nefrectomia parcial é o tratamento gold-standard de pequenas massas e
neoplasias renais (<4cm). É, atualmente, o esteio do tratamento para o carcinoma
de células renais quer localizado, quer metastizado e tem vindo a ser usada em
tumores cada vez maiores e mais complexos, 1-4
. Aliás, no que diz respeito ao
carcinoma de células renais, a cirurgia assume-se como o único tratamento curativo
com evidência de elevada qualidade. Os resultados oncológicos e de qualidade de
vida mostram que tumores localizados T1a-b são melhor tratados com nefrectomia
parcial do que com nefrectomia radical, se tecnicamente possível,
independentemente da abordagem cirúrgica5
. Estas orientações são baseadas em
dados retrospetivos que mostram que ajustado à idade e ao tamanho de tumor, os
doentes submetidos a nefrectomia parcial têm maior sobrevida global que os
doentes submetidos a nefrectomia radical. A explicação para este facto está na
preservação do parênquima renal durante a cirurgia, que está associada a menor
incidência de eventos cardiovasculares, assim como a uma menor necessidade de
recorrer a diálise ou transplante e daí melhores taxas de sobrevida.6-10
A cirurgia renal laparoscópica trouxe imensas vantagens relativamente à via
aberta: menos dor pós-operatória, menos complicações da parede, melhores
resultados estéticos, menos tempo de internamento, mais rápida recuperação
funcional e retoma da atividade laboral11
. No entanto, a nefrectomia parcial
laparoscópica impossibilita um adequado arrefecimento do rim, é tecnicamente
exigente, estando, portanto, associada a maior risco de hemorragia e a tempos de
isquemia quente mais prolongados11,12
. A rafia do parênquima renal é um processo
crítico que deve ser executado no menor tempo possível, de modo a diminuir o
único preditor de função renal modificável, o tempo de isquemia quente sendo
dependente do cirurgião e da técnica cirúrgica.13
Como resposta a estas necessidades surgiram várias modificações nas
técnicas de sutura de modo a facilitar a renorrafia. Uma das inovações é o uso de
fios de sutura barbados, que consistem num fio recoberto de “microespinhos”. À
medida que a sutura é tracionada através dos tecidos, os espinhos dispersos pelo
fio de sutura penetram-nos e ancoram-se a eles, criando um sistema de
manutenção de tensão ao longo da linha de sutura que elimina a necessidade de
segurar fisicamente a sutura ou dar nós. Estes fios são particularmente úteis na
sutura de tecidos friáveis como o parênquima renal.
2
Apesar das suturas barbadas terem sido descritas nos anos 60, só muito
recentemente começaram a ser usadas na renorrafia. Embora existam várias
publicações sugerindo as suas vantagens, são habitualmente séries institucionais
e com um número limitado de doentes. Para além disso estas suturas não são
universalmente usadas na renorrafia laparoscópica.
Assim, o objetivo deste trabalho é clarificar se há vantagens e quais são, no
uso de suturas barbadas na nefrectomia parcial laparoscópica, realizando a
primeira meta-análise sobre o tema.
Métodos
Estratégia de pesquisa
Foi realizada uma pesquisa sistemática, eletrónica nas bases de dados do
PubMed, Scopus e Cochrane Central Register of Controlled Trials. Em todas as
bases dados a estratégia foi a utilização das seguintes palavras-chave: (suturing
OR suture OR closure) AND (barbed OR knotless). A pesquisa nas bases de dados
do PubMed, Scopus e Cochrane resultou, respetivamente, em 737, 474 e 114
artigos. Destes, 7 foram selecionados para incluir no estudo, dos quais 1 era ensaio
clínico randomizado e 6 estudos observacionais retrospetivos. A figura 1 resume
o processo de seleção de estudos. Apenas estudos que comparavam o uso de
suturas barbadas em contexto de nefrectomia parcial laparoscópica foram
incluídos nesta revisão. Os critérios de exclusão foram (1) estudos que não se
focaram em doentes submetidos a cirurgia com suturas barbadas, (2) estudos que
incluíam nefrectomia radical, ou nefrectomia parcial não laparoscópica, (3) estudos
não primários (ex.: artigos de revisão, cartas, comentários editoriais, conteúdo de
conferências científicas), (4) não clínicos (ex.: estudos animais ou laboratoriais), (5)
literatura cinzenta (ex.: estudos com apenas abstract disponível, teses), (6) estudos
noutra língua que não inglês, (7) relatos de caso, ou pequena série de casos, sem
controlos.
3
Figura 1. Fluxograma do processo de seleção de estudos
Considerações estatísticas
As estimativas combinadas tiveram por base o uso de um modelo de efeito
aleatório. Especificamente, foi estimada a diferença das médias combinadas para
avaliar dados contínuos, enquanto a razão das probabilidades foi calculada para a
avaliação de dados dicotómicos. A existência de heterogeneidade estatística entre
os estudos incluídos foi avaliada com o teste X2
e o teste I2
. Todas as análises
estatísticas foram realizadas usando o software Review Manager (RevMan) versão
5.3 (The Nordice Cochrane Center, The Cochrane Collaboration, Copenhague,
Dinamarca, 2014). P <0,05 foi considerado estatisticamente significativo.
Resultados
As características principais dos estudos incluídos nesta revisão (tipo de
publicação, número de doentes incluídos, idade dos doentes, duração da cirurgia,
duração da sutura, tempo de isquemia quente, perda de sangue estimada,
complicações peri-operatórias, necessidade de transfusão, complicações pós-
operatórias segundo a classificação de Clavien-Dindo e duração do follow up. estão
resumidas na Tabela I.
4
Duração da cirurgia
Sete estudos foram incluídos na análise no que diz respeito ao tempo
necessário para a conclusão da cirurgia14-20
. Os dados revelam que a sutura barbada
permite uma cirurgia de duração significativamente inferior em comparação com a
sutura convencional 7,24 minutos por cirurgia (p=0,002; intervalo de confiança a
95% [-11,74; -2,74]) Heterogeneidade: Tau² = 0.00; Chi² = 3,20, graus de liberdade
= 6 (P = 0,78); I² = 0%. Ver figura 2.
Figura 2. Duração da cirurgia; CI = Intervalo de Confiança; IV = Variância Inversa; SD = Desvio Padrão; SB=Sutura Barbada; SC=Sutura convencional;
Duração da sutura
Quatro estudos foram incluídos na análise relativamente ao tempo
necessário para proceder à sutura da lesão15,17-19
. A análise revelou que o uso de fios
de sutura barbados conseguiu uma diminuição significativa de 4,67 minutos no
tempo de sutura (p=0,002; Intervalo de confiança a 95% [-7,60; -1,74]). Esta análise
revelou alto grau de heterogeneidade: Tau² = 7,45; Chi² = 18,27, graus de
liberdade = 3 (P = 0,0004); I² = 84%. Ver figura 3.
Figura 3. Duração da sutura; CI = Intervalo de Confiança; IV = Variância Inversa; SD = Desvio Padrão; SB=Sutura Barbada; SC=Sutura convencional
5
Tempo de isquemia quente
Sete estudos avaliaram o impacto do tipo de sutura Tempo de isquemia
Quente14-20
e e a análise destes estudos revelou uma diminuição média do Tempo
de Isquemia Quente de -6,81minutos (p<0,00001; Intervalo de confiança a 95% [-
8,41; -5.21]).
Heterogeneidade: Tau² = 1.13; Chi² = 8.03, graus de liberdade = 6 (P = 0,24);
I² = 25%. Ver figura 4
Figura 4. Tempo de isquemia quente. CI = Intervalo de Confiança; IV = Variância Inversa; SD = Desvio Padrão; SB=Sutura Barbada; SC=Sutura convencional
Complicações perioperatórias
Seis estudos avaliaram o impacto do tipo de sutura na taxa de complicações
perioperatórias14-17,19,20
e a sua análise conclui que a razão de probabilidades foi de
0,70 (p=0,25; Intervalo de confiança a 95% [0,38; 1,29]) favorecendo a sutura
barbada em comparação com a sutura convencional.
Heterogeneidade: Tau² = 0,00; Chi² = 2,04, graus de liberdade = 5 (P = 0,84);
I² = 0%. Ver figura 5.
Figura 5. Complicações perioperatórias. CI = Intervalo de Confiança; M-H = Mantel-Haenszel; SD = Desvio Padrão; SB=Sutura Barbada; SC=Sutura convencional
6
Perda de sangue estimada
Sete estudos avaliaram o impacto do tipo de sutura na perda de sangue
estimada14-20
e a sua análise conclui que diferença das médias foi de -22,39 mL
(p=0,13; Intervalo de confiança a 95% [-51,32; 6,55]) favorecendo a sutura barbada
em comparação com a sutura convencional.
Heterogeneidade: Tau² = 614,87; Chi² = 21,01 graus de liberdade = 6 (P =
0,002); I² = 71%. Ver figura 6.
Figura 6. Perda de sangue estimada; CI = Intervalo de Confiança; IV = Variância Inversa; SD = Desvio Padrão; SB=Sutura Barbada; SC=Sutura convencional
Necessidade de transfusão
Sete estudos avaliaram o impacto do tipo de sutura na necessidade de
transfusão14-20
e a sua análise conclui que a razão de probabilidades foi de 0,52
(p=0,14; Intervalo de confiança a 95% [0,21; 1,25]) favorecendo a sutura barbada
em comparação com a sutura convencional.
Heterogeneidade: Tau² = 0,00; Chi² = 4,60, graus de liberdade = 5 (P = 0,47);
I² = 0%. Ver figura 7.
Figura 7. Necessidade de transfusão; CI = Intervalo de Confiança; M-H = Mantel-Haenszel; SD = Desvio Padrão; SB=Sutura Barbada; SC=Sutura convencional
7
Complicações pós-operatórias
Três estudos avaliaram a segurança da utilização das suturas barbadas em
comparação com as convencionais utilizando a classificação de Clavien-Dindo17,19,20
.
A análise destes resultados resultou numa razão de probabilidades para as
complicações leves, isto é, de grau I e II, de 0,56 (p=0,41; Intervalo de confiança a
95% [0,14; 2,20]) favorecendo a sutura barbada.
Heterogeneidade: Tau² = 0,46; Chi² = 2,88, graus de liberdade = 2 (P = 0,24);
I² = 31%. Quanto às complicações mais graves, III-V a análise revelou uma razão de
probabilidades de 2,99 (p=0,35; Intervalo de confiança a 95% [0,29; 30,40])
favorecendo a sutura convencional. Heterogeneidade: Tau² = 0,58; Chi² = 1,26,
graus de liberdade = 1 (P = 0,26); I² = 21%. Ver figuras 8 e 9.
Figura 8. Clavien-Dindo I-II; CI = Intervalo de Confiança; M-H = Mantel-Haenszel; SD = Desvio Padrão; SB=Sutura Barbada; SC=Sutura convencional
Figura 9. Clavien-Dindo III-V; CI = Intervalo de Confiança; M-H = Mantel-Haenszel; SD = Desvio Padrão; SB=Sutura Barbada; SC=Sutura convencional
Discussão
A nefrectomia parcial laparoscópica é uma técnica exigente e associada a
maior taxa de complicações que a nefrectomia radical. Um dos passos críticos da
técnica é a renorrafia, que tem que ser rápida para diminuir o tempo de isquemia
e eficaz na redução da hemorragia. Mesmo para um cirurgião laparoscópico
experiente manipular a agulha e proceder à reconstrução com uma mão ao mesmo
tempo que mantém a tensão na sutura com a mão não dominante durante o
8
procedimento, pode ser um desafio técnico e consome tempo 19
. Embora a
nefrectomia parcial assistida por robô, possa ultrapassar algumas dificuldades
desta cirurgia, é uma técnica cara, disponível em poucos centros e sempre
dependente da prática laparoscópica do ajudante21
.
Nos últimos anos, foram introduzidas alterações às técnicas de renorrafia
como o uso de clips como travão de maneira a dispensar o uso de nós
intracorporais11
. As pequenas farpas espaçadas homogeneamente numa disposição
helicoidal na sutura, criam um mecanismo de auto-ancoragem22
. Estes materiais
possuem uma vantagem importante que se prende com a sua utilização de fácil
aprendizagem e a ausência de nós facilitando o seu uso na renorrafia. Shikanov et
al.23
foram os primeiros a usar as suturas barbadas na nefrectomia parcial
laparoscópica em modelos suínos e consideraram-nas eficazes e eficientes mas não
reportam ganhos no tempo de isquemia quente.
Esta meta-análise mostra que os uso de suturas barbadas pode reduzir o
tempo de isquemia quente em media 6,81 min comparando com as suturas
convencionais. Esta diferença para além da significância estatística é clinicamente
importante, vários grupos apontam para os 20 minutos como o tempo aceitável de
isquemia quente, mas cada minuto conta13,24-26
. Um estudo que inclui apenas
nefrectomias parciais realizadas em doentes com um só rim, mostrou que cada
minuto de isquemia quente está associado a um aumento de 6% no risco de lesão
renal aguda, 7% de doença renal terminal de início agudo e 4% de doença renal
terminal de início rápido 24
. Esta diferença pode estar subestimada uma vez que,
dada a natureza não randomizada e retrospetiva da maioria dos estudos presentes
nesta revisão, há uma curva de aprendizagem que não está a ser contabilizada e
pode influenciar o tempo de renorrafia e consequentemente o tempo de isquemia
quente.
Como seria de esperar, estes resultados, devem-se ao menor tempo de
renorrafia. Embora nem todos os estudos incluídos nesta meta-análise tenham
avaliado esta variável, os 4 que o fizeram permitem-nos afirmar que houve um
ganho médio de 4,67 min no tempo de sutura com uso de suturas barbadas versus
suturas convencionais (p=0,002). Este ganho de tempo não avaliado diretamente
em todos estudos, pode ser uma razão para o ganho em tempo de isquemia
quente. No entanto, este resultado é acompanhado por um grau de
heterogeneidade de I2
=84%, que é considerável. A pequena amostragem de estudos
e a pequena amostragem dentro de cada estudo, assim como definições
divergentes, técnicas cirúrgicas diferentes podem explicar esse grau de
9
heterogeneidade, embora seja possível ver uma clara tendência para se perder
menos tempo com as suturas barbadas. Os ganhos de tempo na renorrafia e
isquemia quente com este tipo de sutura poderão capacitar os urologistas de
excisar tumores maiores e de mais difícil abordagem no contexto de NPL e desta
forma aumentar as aplicações deste tipo de cirurgia.
A análise conclui também que o uso deste novo material de sutura permitiu
diminuir a duração da cirurgia em 7,24 minutos p=0,02, portanto um resultado
estatisticamente significativo. Esta diminuição do tempo cirúrgico pode estar
relacionada com o menor tempo necessário com a sutura, mas também com a
segurança da sutura, ou seja, menor hemorragia após renorrafia. Apesar dos
cirurgiões terem naturalmente seguido técnicas diferentes entre os estudos, este
achado é curioso, porque o uso de suturas barbadas revelou ser útil mesmo com
técnicas diferentes.
Quanto à segurança das suturas barbadas, todos os estudos incluídos nesta
meta-análise reportaram a existência de doentes com necessidade de transfusão e
compararam a perda de sangue estimada nos dois grupos14-20
, seis reportaram o
número de complicações peri-operatórias14-17,19,20
, e três17,19,20
analisaram as
complicações segundo a escala de Clavien-Dindo27,28
. Em nenhuma desta análise se
alcançou a significância estatística o que nos leva a acreditar que a opção pelas
suturas barbadas é, pelo menos, tão seguro como usar suturas convencionais.
Aliás, à exceção das complicações classificadas como grau III-V na escala de
Clavien-Dindo27,28
, em que houve uma tendência para maior risco neste grupo,
embora a significância estatística estivesse longe de ser encontrada (p=0,35), na
necessidade de transfusão, na taxa de complicações perioperatórias e nos graus I-
II de Clavien-Dindo27,28
os resultados favoreceram sempre o uso de suturas
barbadas, ainda que não estatisticamente significativos. Esta significância
estatística poderá vir a ser provada, com ensaios clínicos maiores e mais bem
estruturados, com metodologia robusta, multicêntricos e mais representativos da
realidade.
Erdem15
, Chien17
, e Wang19
avaliaram as alterações na taxa de filtração
glomerular, alegando que os custos são elevados com o uso de cintigrafia, usaram
estimativas com base na creatinina. Liu20
, por outro lado, alicerçando-se na
evidência de que a creatinina sérica é inapropriada para estimar as alterações na
função renal no rim afetado, uma vez que o rim normal contralateral compensa a
função29
, usou 99
m-Tecnécio-dietilenotriaminopentacetato para avaliar a função
renal. Estas medições permitiram que este grupo de trabalho afirmasse que a
10
redução da taxa de filtração glomerular fosse significativamente menor nos
doentes submetidos a NPL com uso de suturas barbadas em comparação com os
doentes em que a sutura convencional foi usada20
.
Esta meta-análise tem algumas limitações. Em primeiro, a qualidade da
evidência não é elevada uma vez que apenas um ensaio clínico randomizado foi
incluído, sendo a maioria dos estudos de caráter retrospetivo. Segundo, houve
grande heterogeneidade, particularmente na análise das variáveis Duração da
sutura e Perda de sangue estimada. Por esta razão, as conclusões tiradas da análise
destas variáveis devem ser feitas com cuidado na prática clínica. Terceiro, muitos
estudos incluídos nesta revisão reportaram períodos de follow-up curtos,
inconsistentes, ou não reportavam de todo, pelo que não foi possível avaliar
resultados a longo prazo sobre o uso deste tipo de suturas. Quarto, as curvas de
aprendizagem, embora pensadas por alguns autores, que levaram a alterações na
estratégia do seu estudo, não foram consideradas por todos, pelo que não
podemos concluir se afetaram os resultados, uma vez que nenhum estudo
comparou resultados iniciais versus subsequentes com uso destas novas suturas.
Agora que este tipo de sutura está mais difundido, está na altura de realizar
ensaios clínicos randomizados de maior qualidade metodológica, com maior
amostragem, e maior período de follow up, que possam comparar resultados de
segurança e de eficácia, vantagens na sutura, resultados pós-operatórios, e função
renal a longo prazo.
Conclusão
Esta é a primeira meta-análise sobre o uso de suturas barbadas na
nefrectomia parcial laparoscópica e mostra que o seu uso está associado a uma
simplificação do procedimento cirúrgico com redução da duração da cirurgia,
duração da sutura e consequente redução do tempo de isquemia quente. As
suturas barbadas são pelo menos tão seguras quanto as suturas convencionais em
termos de complicação no peri-operatório e no pós-operatório imediato.
11
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12
21. Gautam G, Benway BM, Bhayani SB, Zorn KC. Robot-assisted Partial Nephrectomy: Current Perspectives and Future Prospects. Urology 2009;74:735-40. 22. Shah HN, Nayyar R, Rajamahanty S, Hemal AK. Prospective evaluation of unidirectional barbed suture for various indications in surgeon-controlled robotic reconstructive urologic surgery: Wake Forest University experience. Int Urol Nephrol 2012;44:775-85. 23. Shikanov S, Wille M, Large M, et al. Knotless closure of the collecting system and renal parenchyma with a novel barbed suture during laparoscopic porcine partial nephrectomy. J Endourol 2009;23:1157-60. 24. Thompson RH, Lane BR, Lohse CM, et al. Every minute counts when the renal hilum is clamped during partial nephrectomy. Eur Urol 2010;58:340-5. 25. Thompson RH, Frank I, Lohse CM, et al. The impact of ischemia time during open nephron sparing surgery on solitary kidneys: a multi-institutional study. J Urol 2007;177:471-6. 26. Thompson RH, Leibovich BC, Lohse CM, Zincke H, Blute ML. Complications of contemporary open nephron sparing surgery: a single institution experience. J Urol 2005;174:855-8. 27. Clavien PA, Sanabria JR, Strasberg SM. Proposed classification of complications of surgery with examples of utility in cholecystectomy. Surgery 1992;111:518-26. 28. Dindo D, Demartines N, Clavien PA. Classification of surgical complications: a new proposal with evaluation in a cohort of 6336 patients and results of a survey. Ann Surg 2004;240:205-13. 29. Funahashi Y, Hattori R, Yamamoto T, Sassa N, Fujita T, Gotoh M. Effect of warm ischemia on renal function during partial nephrectomy: assessment with new 99mTc-mercaptoacetyltriglycine scintigraphy parameter. Urology 2012;79:160-4.
13
Anexos
Tabela I. Características e resultados dos estudos relacionados co1m o uso de suturas barbadas na
nefrectomia parcial
1º Autor,
Ano, País
Tipo de
publicação
Nº de
doentes
Idade
média dos
doentes em
anos
Duração da
cirugia
(minutos)
Duração da
sutura
(minutos)
Tempo de
isquemia
quente
(minutos)
Olweny,
2011, EUA ERC
SB vs.
SC: 29
vs. 49
SB vs. SC
média (DP):
55,1 (13,0)
vs. 55,1
(12,9)
p=0,99
SB vs. SC
média (DP):
174 (35) vs.
178 (41)
p=0,7
Não
especificado
SB vs. SC
média (DP):
26,4 (8,3) vs.
32,8(7,9)
p<0,001
Erdem,
2013,
Turquia
ERC
SB vs.
SC: 17
vs. 17
SB vs. SC
média (DP):
56,7 (12,82)
VS. 59,4
(12,61)
P=0,480
SB vs. SC
média (DP):
123 (31,26)
vs. 130
(28,2)
p=0,368
SB vs. SC
média (DP):
5,83 (2,0) vs.
8,42 (4,3)
p=0,368
SB vs. SC
média (DP):
21,59 (8,64)
vs. 29,47
(13,23)
p=0,037
Jeon, 2013,
Coreia do
Sul
ERC
SB vs.
SC: 13
vs. 24
SB vs. SC
média (DP):
60,1 (13,8)
vs.55,3
(11,7)
p=0,27
SB vs. SC
média (DP):
248,5 (37,2)
vs. 256,7
(39,2)
p=0,54
Não
especificado
SB vs. SC
média (DP):
24,5 (5,3) vs.
31,9 (8,9)
p=0,037
Wang, Ke,
2014, China ERC
SB vs.
SC: 36
vs. 40
SB vs. SC
média (DP):
51,3 (10,1)
vs. 50,8
(11,2)
p>0,05
SB vs. SC
média (DP):
78,5 (15,4)
vs. 90,3
(18,1)
p<0,05
SB vs. SC
média (DP):
10,4 (3,2) vs.
19,4 (6,7) p<
0,01
SB vs. SC
média (DP):
15,2 (4,2) vs.
24,1 (5,6) p<
0,01
Liu, 2015,
China ERC
SB vs.
SC: 41
vs. 41
SB vs. SC
média (DP):
61,8 (15,7)
vs. 58,4
(7,0) p>0,05
SB vs. SC
média (DP):
118 (18,8)
vs. 120
(21,3)
p>0,05
Não
especificado
SB vs. SC
média (DP):
20,7 (5,3) vs.
27,5 (4,8)
p<0,05
Chien,
2015,
Taiwan
ERC
SB vs.
SC: 17
vs. 21
SB vs. SC
média (DP):
55 vs. 63
SB vs. SC
média (DP):
205 (57) vs.
202 (70,9)
SB vs. SC
média (DP):
9,83 (3,02) vs.
13,5 (4,75)
p=0,015
SB vs. SC
média (DP):
24,6 (8,50)
vs. 25,4
(13,7)
p=0,934
Wang,
Mingshuai,
2018, China
ECR
SB vs.
SC: 30
vs. 30
SB vs. SC
média
(DP):50,9
(10,6) vs.
50,5 (14,8)
SB vs. SC
média (DP):
65,3 (16,9)
vs. 73,0
(22,4) p=
0,14
SB vs. SC
média (DP):
10.4 (3.7) vs.
13.8 (5.6) p=
0,01
SB vs. SC
média (DP):
18,8 (8,2) vs.
22,9 (7,3)
p=0,04
14
Tabela I (continuação)
1º Autor,
Ano, País
Perda de
sangue
estimada
(mL)
Complicações
perioperatórias
(%)
Necessidade
de
transfusão
Clavien-
Dindo I-II
Clavien-
Dindo III-V
Meses de
follow-up
Olweny,
2011, EUA
SB vs. SC
média
(DP): 188
(205) vs.
255 (337)
p=0,34
SB vs. SC: 10,3
vs. 24,4 p=0,13
SB vs. SC:
1/29 vs.
5/49
Não
Especificado
Não
Especificado
Não
Especificado
Erdem,
2013,
Turquia
SB vs. SC
média
(DP): 140
(117,35)
vs.
115,59
(55,84)
p=0,986
SB vs. SC: 17,6
vs. 17,6
SB vs. SC:
2/17 vs.
2/17
Não
Especificado
Não
Especificado
Não
Especificado
Jeon,
2013,
Coreia do
Sul
SB vs. SC
média
(DP):
319,2
(311,3)
vs. 331,3
(221,6)
p=0,89
SB vs. SC: 23,1
vs. 25 p=0,90
SB vs. SC:
2/17 vs.
2/24
Não
Especificado
Não
Especificado
Não
Especificado
Wang, Ke,
2014,
China
SB vs. SC
média
(DP):
60,5
(21,2) vs.
110,4
(21,1)
Não
Especificado
SB vs. SC:
0/36 vs.
3/40
Não
Especificado
Não
Especificado
Não
Especificado
Liu, 2015,
China
SB vs. SC
média
(DP): 180
(150) vs.
188 (160)
p<0,05
SB vs. SC: 7,3
vs. 12,2 p >
0,05
SB vs. SC:
2/41 vs.
3/41
SB vs. SC:
2/41 vs.
4/41
SB vs. SC:
3/17 vs.
0/21
1-11
Chien,
2015,
Taiwan
SB vs. SC
média
(DP): 250
vs. 300
p=0,504
SB vs. SC: 23,5
vs. 33,3
p=0,622
SB vs. SC:
1/17 vs.
7/21
SB vs. SC:
0/17 vs.
5/21
SB vs. SC:
1/41 vs.
1/41
1-20
Wang,
Mingshuai,
2018,
China
SB vs. SC
média
(DP): 58
(32) vs.
22,9 (7,3)
p=0,04
SB vs. SC: 16,7
vs. 13,3 p=0,95
SB vs. SC:
0/30 vs.
0/30
SB vs. SC:
4/30 vs.
3/30
SB vs. SC:
0/30 vs.
0/30
SB vs. SC:
9,4 (3,8) vs.
8,8 (3,4)
Abreviaturas: DP=desvio padrão; ECR=ensaio clínico randomizado; ERC=estudo retrospetivo comparativo;
SB=sutura barbada; SC=sutura convencional;