educação física & educação matemática na pré-escola · municipal do ensino de educação...
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Educação Física & Educação Matemática na Pré-escola
Marlúcio de Souza Martins1
Maria Salett Biembengut2
1 APRESENTAÇÃO
A Educação Básica brasileira, de acordo com a Lei n° 9394, de 20 de dezembro de
1996 – Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) – constitui a referência
fundamental da organização do sistema educacional do país. No artigo 21º, a Educação
Básica é composta por “Educação Infantil, Ensino Fundamental e Ensino Médio” e,
conforme artigo 2º “tem por finalidade o pleno desenvolvimento do educando, seu preparo
para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho”.
A Educação Infantil, primeira etapa da Educação Básica, objetiva o
desenvolvimento integral da criança até os seis anos de idade, nos aspectos físico,
psicológico, intelectual, social e está subdividida em: Creches (para crianças de até três
anos) e Pré-escolas (para crianças de quatro a seis anos de idade3). A partir da LDB (1996),
a Educação Infantil foi reconhecida e considerada importante para o desenvolvimento da
criança.
A Educação Física no Brasil está inserida pela LDB, no art. 26º, “[...] os currículos
do Ensino Fundamental e Médio devem ter uma base nacional comum, a ser
complementada, em cada sistema de ensino e estabelecimento escolar, por uma parte
diversificada, exigida pelas características regionais e locais da sociedade, da cultura, da
economia e da clientela”. No mesmo artigo, inciso § 3°, “[...] a Educação Física, integrada
à proposta pedagógica da escola, é componente curricular obrigatório da Educação Básica,
sendo sua prática facultativa somente aos estudantes mencionados neste inciso”. Na
Educação Infantil, contudo, a Educação Física não é componente curricular obrigatório, 1 Aluno Mestrando do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Regional de Blumenau - FURB 2 Orientadora e Professora do Departamento de Matemática e do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Regional de Blumenau - FURB 3 A variação da idade deve-se ao período de adaptação à Lei nº. 11.274, de 6 de fevereiro de 2006, que aponta a obrigatoriedade da Ampliação do Ensino Fundamental para Nove Anos, e o prazo até 2010 para que os sistemas de ensino se adaptem.
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conforme o art. 12º da LDB, “[...] os estabelecimentos de ensino, respeitadas as normas
comuns e as do seu sistema de ensino, terão a incumbência de: I – elaborar e executar sua
proposta pedagógica”. Fica a cargo dos municípios a elaboração de uma proposta
pedagógica com o apoio da União e do Estado.
Adequando-se à LDB, o Estado de Santa Catarina inseriu a Educação Física como
componente curricular obrigatório na Educação Infantil conforme o art. 32º, § ÚNICO da
Lei Complementar nº. 170/1998, “[...] o ensino de arte e Educação Física são componentes
curriculares obrigatórios, ajustando-se às faixas etárias e às condições das crianças”.
Porém, nem todos os municípios dispõem de regulamento, lei, ementa ou decreto
municipal do ensino de Educação Física na Educação Infantil.
A Educação Física na Educação Infantil é essencial às crianças, pois possibilita um
contato maior com as habilidades corporais, psicomotoras, hábitos de higiene, alimentação
saudável, atividades culturais e jogos lúdicos com a finalidade de lazer, qualidade de vida,
expressão de sentimentos, afetos e emoções. Conforme as Diretrizes da Política Nacional,
a Educação Infantil deve se articular às políticas de Saúde, Assistência Social, Justiça,
Direitos Humanos, Cultura, Mulher e Diversidades, bem como aos fóruns de Educação
Infantil e outras organizações da sociedade civil (PNEI, 2006 p.18). Desta forma, a Escola
pode assumir plena formação à criança, ao integrar Educação Física no processo
educacional.
A Educação Física está associada à saúde física, qualidade de vida e longevidade
da criança. A Organização Mundial da Saúde, em 07 de abril de 1948, conceituou saúde
como sendo o completo bem-estar físico, mental e social e não apenas a ausência de
doença. Esta conceituação gerou polêmica e discussões, levando à pesquisas e estudos. A
saúde, segundo Bagrichevsky (2003, p.138), não é uma condição estática, existente
somente devido à ausência de doenças, mas um processo de aprendizagem, tomada de
decisão e ação para a otimização do bem-estar próprio. E a saúde escolar, conforme
Conceição (1994, p.41) é um conjunto de ações destinadas a promover e recuperar a saúde
das coletividades integrantes do sistema educacional. Neste contexto, a Educação Física
Escolar assume a tarefa de desenvolver estilos de vida ativos, permanentes e consistentes
(Bagrichevsky 2003, p.147).
De acordo com os Parâmetros Curriculares Nacionais (1998, p.29), a Educação
Física deve ser entendia como:
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“(...) uma disciplina que introduz e integra o aluno na cultura corporal de movimento, formando o cidadão que vai produzi-la, reproduzi-la e transformá-la, instrumentalizando-o para usufruir os jogos, os esportes, as danças, as lutas e as ginásticas em benefício do exercício crítico de cidadania e da melhoria da qualidade de vida”.
A preocupação e a responsabilidade para com os conhecimentos relativos à
construção da identidade pessoal, ao cuidado com o corpo, alimentação saudável, higiene,
valorização dos vínculos afetivos e todas as implicações relacionadas à saúde e à
coletividade, devem ser de responsabilidades da Educação dentro da rede escolar de ensino
e de todos os profissionais envolvidos com a formação integral da criança.
1.2 PROBLEMATIZAÇÃO
A Educação Infantil é um direito público, cabendo ao município a expansão da
oferta, com o apoio das esferas federal e estadual. A ausência da Educação Física como
componente curricular nessa fase pode gerar prejuízos ou, pelo menos, não contribuir na
formação da criança, uma vez que neste período ela forma seu caráter e pode perder uma
excelente oportunidade de desenvolvimento integral - físico, mental, moral e espiritual.
Na cidade de Blumenau (SC), segundo o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas
Educacionais Anísio Teixeira - INEP4 o município de Blumenau (SC) contém 127 escolas
no ensino Básico: Pré-escola. Este número de escolas abrange todas as redes municipais,
estaduais e particulares de ensino conforme tabela a seguir:
Tabela 1 – Mapa das Escolas com Educação Infantil
Rede Escolar Área Urbana Área Rural TOTAL
Municipal 60 12 72
Estadual 24 1 25
Particular 29 1 30
Número de Pré-escolas no Município de Blumenau 127 Fonte: INEP
A Prefeitura Municipal de Blumenau, por intermédio da Secretaria Municipal de
Educação, inseriu a Educação Física nos Centros de Educação Infantil (CEI’s), por meio
4 INEP - Autarquia Federal vinculada ao Ministério da Educação (MEC), cuja missão é promover estudos, pesquisas e avaliações sobre o Sistema Educacional Brasileiro com o objetivo de subsidiar a formulação e implementação de políticas públicas para a área educacional a partir de parâmetros de qualidade e eqüidade, bem como produzir informações claras e confiáveis aos gestores, pesquisadores, educadores e público em geral.
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de um Projeto: Ação Complementar de Educação Física (PAC), no ano de 2006, que
abrangeu em seu início 11 CEI’s, beneficiando 15,3% dos CEI’s. Em 2007 houve um
aumento para 28 CEI’s, alcançando 38,9% e, 42 CEI’s (58,3%) para 2008. Embora a
Educação Física na rede Municipal de Ensino de Blumenau (SC) não faça parte do
currículo da Educação Infantil, o PAC elaborado e implantado pela Secretaria de Educação
tem o intuito de suprir a necessidade que ainda não está regulamentada por lei, ementa ou
decreto municipal.
Conforme consta no PAC (2008, p.06) a idéia de implantar Educação Física nos
CEI’s “foi baseada na compreensão da importância de uma educação bem dirigida, rica em
estímulos, variedades e prazer. Surge a proposta de vincular as atividades lúdicas, aos
métodos de ensino”. O PAC tem como objetivo:
“(...) Estimular a participação das crianças para a prática do movimento corporal em suas mais variadas formas, desenvolvendo na criança espírito cooperativo, autoconfiança, capacidade afetiva, física, cognitiva, respeito e confecção de regras através de jogos e brincadeiras que têm como características a fantasia e a imaginação, além de conhecer e cuidar do próprio corpo, valorizando e adotando hábitos saudáveis como um dos aspectos básicos da qualidade de vida”. (PAC, 2008 p.25)
Pelo PAC, constatou-se que a Secretaria de Educação do município de Blumenau
(SC) ainda não dispõe de Projeto Político-Pedagógico (PPP) para a Educação Física na
Educação Infantil. Um PPP deve mostrar o que a instituição escolar pretende ou idealiza
fazer: objetivos, metas e estratégias; tanto no que se refere às atividades pedagógicas,
quanto às funções administrativas. O PPP é parte do planejamento e da gestão escolar e sua
importância reside no fato de ser uma direção, um rumo para as ações da escola.
“O projeto é político porque reflete as opções e escolhas de caminhos e prioridades na formação do cidadão, como membro ativo e transformador da sociedade em que vive. O projeto é pedagógico porque expressa as atividades pedagógicas e didáticas que levam a escola a alcançar seus objetivos educacionais. É importante que o Projeto Político-Pedagógico seja entendido na sua globalidade, isto é, naquilo que diretamente contribui para que os objetivos prioritários da escola, que são as atividades educacionais, e naquilo cuja contribuição é indireta, ou seja, as ações administrativas. É também um instrumento que identifica a escola como uma instituição social, voltada para a educação, portanto com objetivos específicos para esse fim”. (VEIGA, 2002, p. 13-14)
O PPP deve conter conteúdos de currículo mínimo da disciplina ministrada
juntamente com sua proposta metodológica. A Secretaria de Educação de Blumenau (SC)
está em vias de elaborar o PPP e baseando-se no art. 9º, IV da LDB, “[...] A União
incumbir-se-á de (...) estabelecer, em colaboração com os Estados, o Distrito Federal e os
Municípios, competências e diretrizes para a educação infantil (...) que nortearão os
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currículos e seus conteúdos mínimos, de modo a assegurar formação básica comum”. De
acordo com o Referencial Curricular Nacional de Educação Infantil - RCNEI (1998, p.19):
“(...) a elaboração de propostas educacionais veicula necessariamente concepções sobre
criança, educar, cuidar e aprendizagem, cujos fundamentos devem ser considerados de
maneira explícita”. Como os conteúdos programáticos devem estar integrados, é pertinente
elaborar uma proposta pedagógica interdisciplinar5. Para Japiassu (1976)
interdisciplinaridade é “a convergência de várias disciplinas com vistas à resolução de um
problema cujo enfoque teórico está, de algum modo, ligado ao da ação ou da decisão” ou
mesmo um “movimento de interação de áreas de conhecimento diferentes, visando à
superação da visão fragmentada da realidade.” (Lück, 1994). A interdisciplinaridade pode
ser compreendida como um ato de troca, de reciprocidade das áreas do conhecimento,
assim, é pertinente uma proposta pedagógica que integre Educação Física às áreas
essenciais como a Saúde e Matemática.
A Educação Física integra-se à Saúde por estar relacionada diretamente com a
atividade física, qualidade de vida e longevidade, e a prática de uma atividade física
associada com orientações de hábitos alimentares saudáveis, podem promover saúde a
médio e longo prazo na vida da criança. A Matemática está presente na vida das pessoas
desde ações cotidianas às complexas tecnologias. Na Educação Física, números, medidas,
espaço e formas estão presentes nas atividades lúdicas e nas ações cotidianas das crianças,
conceitos básicos de matemática que se farão necessários por toda a vida. A criança dentro
do sistema educacional de ensino é o início de um processo de aprendizagem, de formação
humana e da construção de conhecimento.
“[...] os principais benefícios à saúde advinda da prática de atividade física referem-se aos aspectos antropométricos, neuromusculares, metabólicos e psicológicos. (...) os efeitos metabólicos são: o aumento do volume sistólico; o aumento da potência aeróbica; o aumento da ventilação pulmonar; a melhora do perfil lipídico; a diminuição da pressão arterial; a melhora da sensibilidade à insulina e a diminuição da freqüência cardíaca em repouso e no trabalho submáximo. (...) com relação aos efeitos antropométricos e neuromusculares ocorre, a diminuição da gordura corporal; o incremento da força e da massa muscular; da densidade óssea e da flexibilidade. (...) os efeitos psicológicos melhoria da auto-estima, do auto conceito, da imagem corporal, das funções cognitivas e de socialização, na diminuição do estresse e da ansiedade e na diminuição do consumo de medicamentos”. (Matsudo; Matsudo, 2000 p.10-17)
Devido aos vários benefícios relacionados à saúde da criança, oriundos de uma
atividade física, justifica-se a proposta de integrar a Educação Física à Saúde na Pré-
escola, uma vez que, esta fase é um importante momento para adoção de novas práticas, 5 Comum à diversas disciplinas
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vivências e comportamentos relacionados à saúde, pois diversas situações e experiências
podem definir o perfil de saúde na idade adulta.
As atividades corporais na Educação Física favorecem o aprendizado da
matemática, pois o corpo humano é composto por segmentos que contêm medidas, formas
e simetrias. Para Smole (2000, p.15) as atividades corporais podem se constituir numa
forma, numa rota para as crianças aprenderem noções e conceitos matemáticos. Em outra
publicação ressalva a importância das atividades corporais na formação do conhecimento
da criança dizendo que: “não há lugar na matemática para o aluno ‘sem corpo’,
especialmente na escola infantil, onde estão às gêneses de todas as representações, de
todas as noções, pré-conceitos e conceitos que mais tarde trarão a possibilidade da criança
aprender a beleza da matemática como ciência” (Smole, 2000 p.121).
Contar e medir são tão antigos quanto à natureza humana. Ao ensinar matemática
na Educação Física, por meio de números, medidas, espaço e formas, juntamente com
atividades lúdicas na atividade física, as crianças estarão conseqüentemente,
desenvolvendo sua capacidade de generalizar, analisar, sintetizar, inferir, formular
hipóteses, deduzir, refletir e argumentar.
“(...) as noções matemáticas (contagem, relações quantitativas e espaciais etc.) são construídas pelas crianças a partir das experiências proporcionadas pelas interações com o meio, pelo intercâmbio com outras pessoas que possuem interesses, conhecimentos e necessidades que podem ser compartilhados. As crianças têm e podem ter várias experiências com o universo matemático e outros que lhes permitem fazer descobertas, tecer relações, organizar o pensamento, o raciocínio lógico, situar-se e localizar-se espacialmente”. (RCNEI 1998, p.198)
Desse modo, a criança enquanto pratica uma atividade física pode ser incentivada
a realizar contagens, comparação de quantidades, identificar algarismos, adicionar pontos,
formas geométricas, isto é, inicia a aprendizagem de conteúdos relacionados à matemática.
Este constante contato com a matemática, seja para contar pontos, dividir e formar grupos
torna-se um meio de socialização muito grande, além de tornar o ensino da Matemática
mais prazeroso associado à Educação Física.
A Educação Física, com a interdisciplinaridade da Matemática na Educação
Infantil, proporciona a oportunidade para que a criança possa desenvolver além da sua
psicomotricidade, a capacidade de estabelecer noções matemáticas presentes no seu
cotidiano, como: contagem, relações espaciais, quantidades, formas geométricas, medidas
de comprimento, peso, volume e tempo. Os números estão presentes no dia-a-dia e servem
para memorizar quantidades, identificar algo, antecipar resultados, contar, numerar, medir
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e operar. A criança, neste contexto, percebe a diferença entre objetos que têm tamanho,
peso, volume; distingue também o longe e perto, alto e baixo, rápido e lento. Toda essa
vivência permite que a criança faça uma comparação, uma relação e uma representação
com o meio e consigo mesma, estabelecendo uma constante troca de informações e
gerando o conhecimento.
A Educação Física na Escola torna-se uma disciplina importante para promover a
matemática, saúde e estilos de vida ativos, uma vez que há um crescente aumento de
crianças no sistema educacional. De acordo com o Censo Escolar 2007 do INEP, mais de
70% dos 6,4 milhões de alunos que freqüentam a Educação Infantil no Brasil, encontram-
se com idade entre 4 e 5 anos, totalizando aproximadamente 13% dos 46,9 milhões de
alunos da educação básica nacional. Considerando que a Educação Física e a Matemática
são partes da estrutura curricular na Educação Básica e que a saúde física e mental são
condições essenciais para o desenvolvimento da criança no âmbito escolar, é pertinente
elaborar uma proposta pedagógica interdisciplinar que integre a Educação Física à saúde
física da criança e à matemática.
1.3 QUESTÕES ESPECÍFICAS
a) Quais as possibilidades e dificuldades dos professores da Pré-escola em uma
proposta pedagógica interdisciplinar?
b) Quais as vantagens e desvantagens de uma proposta pedagógica entre
Educação Física, Saúde e Matemática para a aprendizagem da criança?
1.4 OBJETIVOS DA PESQUISA
1.4.1 Objetivo Geral
� Analisar a validade de uma proposta pedagógica interdisciplinar de Educação
Física integrada à Matemática e à Saúde na Educação Básica – Pré-escola.
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1.4.2 Objetivos Específicos
� Identificar a concepção da Comunidade Escolar sobre Educação Física e
Matemática;
� Verificar a aprendizagem da matemática e da Educação Física a partir de um
trabalho interdisciplinar na Pré-escola integrando Educação Física e Matemática;
� Levantar possibilidades e dificuldades em implantar um trabalho
interdisciplinar entre Educação Física, saúde e matemática;
� Elaborar uma proposta pedagógica para o ensino da Educação Física na Pré-
escola baseada no trabalho experimental interdisciplinar.
1.5 Metodologia da Pesquisa
Para alcançar os objetivos propostos e o desenvolvimento desta pesquisa, utiliza-se
do mapeamento como princípio metodológico definido por Biembengut (2003) que se
organiza em três etapas: Mapa Teórico, Mapa de Campo e Mapa de Análise. Segundo
Biembengut (2003) “o mapeamento consiste em: identificar e situar saberes desenvolvidos
por diversos pesquisadores sobre o tema e que permita gerar conhecimentos ou identificar
questões que ainda não tenham sido reconhecidas, mapa teórico; levantar, classificar e
organizar os dados para a pesquisa, procurando reconhecer padrões, evidências, traços
comuns ou peculiares tendo como referência o espaço geográfico, o tempo, a história, a
cultura, os valores, as crenças e as idéias dos entes envolvidos, mapa de campo; e explicitar
as significações dos dados do mapa de campo com suporte teórico do mapa teórico, a partir
de cuidadosa percepção, compreensão e interpretação dos dados da pesquisa, mapa de
análise”.
Adota-se o termo mapa definido por Biembengut (2003) como idéia de guia para
se chegar a alguma informação ou mesmo a algum conhecimento, um instrumento que nos
permite compreender e fazer comparações, entender determinadas informações, ir de um
ponto a outro e de uma idéia à outra. É o ato de apresentar algo por meio de algo
materialmente distinto de acordo com as regras exatas, nas quais certas características ou
estruturas daquilo que representam devem ser expressas, acentuadas e tornadas
compreensíveis pelo tipo de apresentação, enquanto outras devem ser conscientemente
supridas.
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O mapa na pesquisa inicia-se pela identificação dos dados envolvidos com o
problema a ser pesquisado, posteriormente com a classificação e a organização desses
dados, tendo assim uma visão mais clara do problema, facilitando o reconhecimento de
padrões, evidências, de traços comuns ou peculiares da pesquisa.
1.5.1 Mapa Teórico
O mapa teórico trata dos processos envolvidos na conceituação, definição do tema
e na identificação e estudo de pesquisas similares e recentes que darão sustentação à
pesquisa que se pretende efetuar. Permitirá justificar a pesquisa, situando-a no mapa dos
trabalhos já desenvolvidos. Os conceitos e as definições envolvidos na pesquisa esclarecem
o tema e delimitam o campo de análise, auxiliando a compreensão e explicação do objeto
da pesquisa.
“O mapa teórico não se restringe a um mero levantamento e organização de dados e, tampouco, ao traçado de um mapa. É um forte constituinte não somente para reconhecimento ou análise dos dados, mas especialmente, nos propicia um vasto domínio sobre o conhecimento existente da área investigada. Suscita-nos a desenvolver fórmulas ou meios adequados para compreensão, análise e representação dos dados ou das informações investigadas e conhecer as questões que envolvem as ações educacionais ou pedagógicas à medida que essas questões se revelam ou revelam movimentos resultantes das circunstâncias”. (Biembengut, 2003)
O passo inicial para esta pesquisa será levantar dados de trabalhos já publicados
sobre os temas “Educação Física, Educação Matemática e Pré-escola” no Brasil. Teoria
disponível, em especial, dos últimos cinco anos nos sítios de buscas, biblioteca virtuais,
bancos de teses e dissertações que permitam identificar a relevância da pesquisa e sustentar
a análise; organizar e classificar as pesquisas pertinentes ao tema e, por fim, fazer uma
análise dos textos estudados.
1.5.2 Mapa de Campo
A proposta no mapa de campo dar-se-á em três frentes: na elaboração de um
material de apoio didático integrando Educação Física, Saúde e Matemática; na aplicação
deste material com duas turmas de crianças de Pré-escola, subseqüentes, por meio de dois
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professores colaboradores da pesquisa; no levantamento de informações da comunidade
escolar6 envolvida na aplicação do material e nas aulas de Educação Física.
1.5.2.1 Síntese do Material Didático
Na elaboração do material de apoio didático, apropria-se das três fases do
processo cognitivo a fim de adaptar os procedimentos para o ensino da matemática nas
aulas de Educação Física. Esses procedimentos estão sintetizados em três fases assim
denominadas: percepção – estimulo da observação e do interesse; compreensão – aumento
do conhecimento e significação e modelagem – associação de idéias, criatividade. Estes
procedimentos foram realizados de forma flexível e circular, um ir e vir no processo
(Kovacs, 1997; Biembengut, 2007; Ratey, 2002). Para estimular a observação e aguçar o
interesse promoveu-se atividades psicomotoras que envolvessem as crianças ao contato
com os conceitos básicos da matemática e da geometria. O aprimoramento do
conhecimento baseou-se na apresentação, na justificativa enfim, no ensinar às crianças
sobre as noções matemáticas em sua prática. E a associação de idéias – significação neste
momento, leva as crianças a representarem por meio de desenhos os conteúdos adquiridos,
o que realmente aprenderam sobre a matemática na atividade física. Vale destacar que o
material didático serve apenas de guia aos professores para ensinar matemática por meio
das aulas de Educação Física e, ao mesmo tempo, transmitir para as crianças hábitos de
vida saudáveis.
Para ilustrar, a seguir, apresenta-se como exemplo uma atividade, composta pelos
estágios que compõem o material didático, que se encontra pronto para aplicação no
próximo semestre (agosto – 2008) em duas escolas, por duas professoras colaboradoras
com a pesquisa, para cerca de 40 crianças. O material está composto por 52 atividades
divididas nas classificações e conceitos da psicomotricidade7 – coordenação motora ampla
e fina, equilíbrio, esquema corporal, lateralidade, orientação espacial e temporal, ritmo,
sentidos e socialização.
6 Pais, professores e coordenação. 7 Integração superior da motricidade, produto de uma relação inteligível entre a criança e o meio – autocontrole muscular.
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Quadro 1 – Exemplo do material didático
Atividade: Amarelinha Descrição: O professor desenha a amarelinha no chão, iniciando do número 1 até o 10. As crianças devem decidir quem vai começar. O escolhido joga a pedra - ou o saquinho de areia, bolinha feita de massinha de modelar - no número 1 (um). A seguir pula casa por casa com um pé só até chegar ao número 10. Na volta repete o trajeto, só que pegando a pedrinha. O mesmo deve ser repetido até chegar à última casa. Perde a vez quem pisar na casa em que está à pedra, pisar na risca, não pegar a pedra ou errar a casinha na hora de jogar a pedrinha. Objetivos: – Estimular o equilíbrio (Educação Física); – Desenvolver conceitos numéricos e geométricos (Matemática); – Promover a resistência muscular (Saúde). Apoio Didático: – Um ambiente com uma área livre de obstáculos. – Giz Percepção e Apreensão: receber e identificar informações. – Levar as crianças no ambiente (quadra, sala de aula) onde será feita a brincadeira. – Desenhar no chão a amarelinha, utilizando o giz ou algo similar. – Montar diversas formas e modelos de amarelinha. – Apresentar as regras da brincadeira. Compreensão e Explicação: elo entre a percepção e conhecimento. – Iniciar a atividade e acompanhar todos os movimentos e ações das crianças, intervindo quando necessário. – Após finalizar a atividade, reunir as crianças para falarem sobre a brincadeira, o que gostaram e o que não gostaram. – Salientar os conceitos numéricos, as formas geométricas, as diferenças e igualdades entre as amarelinhas. Significação e Modelação: compreender a percepção, buscar um modelo – entendimento. – Nesta brincadeira, além de estimular o equilíbrio, o professor pode apresentar verbalmente conceitos matemáticos numéricos (1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9 e 10), as formas geométricas (quadrado, triângulo, círculo, retângulo), as igualdades e diferenças entre as amarelinhas, como também os benefícios da resistência muscular localizada para a saúde e qualidade de vida.
Figura 1: Tipos de amarelinhas
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Nesta atividade incluiu-se a idéia de movimento – rotação e de ângulo. Esta
experiência exige das crianças uma percepção de movimento e uma busca por modelar ou
expressar certo equilíbrio da composição das formas geométricas da amarelinha.
Conforme Maturana e Varela (2001), conhecer é fazer e fazer é conhecer. E o ato de
conhecer produz um mundo; e este conhecimento está associado às raízes cognitivas.
Ao término da atividade o professor reúne as crianças para uma conversa sobre a
brincadeira, abordando as regras (se foram ou não respeitadas), os problemas ocorridos e
os conceitos matemáticos envolvidos, além de ouvir o que elas têm a dizer sobre a
atividade pois falar dá às crianças a oportunidade de trocar experiências com os demais
colegas. Segundo a Carpenter et al (1999), na resolução de problemas, quando as crianças
ouvem umas as outras, se comunicam, elas entendem melhor, faz mais sentido para elas.
1.5.3 Mapa de Análise
Neste mapa da pesquisa há interação entre o mapa teórico e o mapa de campo, e a
análise dos dados para a elaboração de uma proposta pedagógica. As etapas para efetuar a
análise da pesquisa serão: percepção e compreensão da estrutura e dos traços dos entes ou
fenômeno da pesquisa; interpretação e avaliação criteriosa da pesquisa, ou seja, interpretar
significa explicar, explanar ou aclarar pontos relevantes sobre ente ou fenômeno
pesquisado, e avaliar exprime determinar o valor, julgar, apreciar. Para isto, a partir dos
mapas já realizados, da estrutura e dos traços identificados e divisados de acordo com a
relevância, preceituar categorias, critérios e escala para efetuar uma análise mais
fidedigna possível.
Adota-se concepção8 de Educação Física, Saúde e Educação Matemática como
categoria de análise. Segundo Biembengut e Hein (2007), cada pessoa processa a
informação de um modo, de acordo com as suas próprias funções. Ela processa a
informação que recebe do meio que a envolve. A informação que provém do meio em que
a pessoa convive é acrescentada àquela que já possui, sendo incorporadas de acordo com
seus valores, procedentes de seus conhecimentos. Toda aprendizagem origina primeiro da
relação entre o individuo e o mundo do trabalho e segundo, na conexão entre o indivíduo
e outros seres humanos (Gardner, 1999; Biembengut, 2007).
8 Capacidade que cada pessoa tem de conceber ou criar idéias, abstrair, formar modelos mentais e ainda, compreender um assunto, resultante da interação sua com outras pessoas e com o meio que o cerca.
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A análise da aprendizagem da matemática baseia-se nos dados obtidos: dos
trabalhos realizados pelas crianças (desenho), e das ações e do estar motivacional das
mesmas, observadas durante as aulas. Para análise, baseia-se em teorias de vários autores
de Neurociência, entre eles (Maturana e Varela, 2001, Kovacs; 1997; Sacks, 1995, Carter,
2003, Teixeira, 2000; Ratey, 2002), cognição (Gardner; 1997, 1999; Piaget 1967,
Carpenter e outros, 1999); Modelagem matemática (Biembengut, 2007) e faculdade
criadora das crianças (Biembengut, 2002; 2003, 2007; Ostrower, 1986).
1.6 Divisão do Trabalho
As três etapas de pesquisa (mapa teórico, mapa de campo e mapa de análise) serão
estruturadas em quatro capítulos distribuídos da seguinte forma:
No capítulo I será feita a contextualização do objeto de pesquisa e sua relevância
na área educacional, já que a dissertação trata-se dos temas: Educação Física, Educação
Matemática, Saúde e Pré-escola. Será apresentada a justificativa do tema, os objetivos, os
procedimentos metodológicos para análise dos dados e a estruturação da pesquisa.
No capítulo II além do mapeamento teórico sobre a Educação Física e Educação
Matemática na Pré-escola, será feito um levantamento e a análise de trabalhos relevantes
ao tema pesquisado.
No capítulo III será apresenta a história da Educação Física, Educação Infantil e da
Educação Matemática; será elaborado um material de apoio didático integrando Educação
Física, Saúde e Matemática; será aplicado com duas turmas de crianças de Pré-escola na
rede municipal e particular de ensino em Blumenau/SC, por meio de dois professores
colaboradores da pesquisa; será feita a análise dos dados como suporte teórico para
dissertação.
No capítulo IV serão expostas as considerações finais do trabalho e a elaboração
de uma proposta pedagógica voltada à matemática, saúde e qualidade de vida da criança.
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REFERÊNCIAS
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