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Maio 2006 - educ@r sem fronteiras1

Editorial

O Boletim nº 3 “Educar sem Fronteiras” acompanha aevolução deste programa de internacionalização e cooperaçãoao longo de 2006, debruçando-se sobre as principais iniciativasimplementadas pelo GEED em articulação com vários parceiros.Estas vão desde o voluntariado para o desenvolvimento no interiorda Guiné-Bissau (em parceria com o ISU-núcleo de Viana), àCampanha Global pela Educação, à situação do centro de recursosde Assomada, Santa Catarina, conforme testemunho do Delegadoda Educação, Prof. Joaquim Furtado (que considera o centro“uma das melhores coisas que Assomada teve nos últimos anos”)e ao último curso livre “Culturas do Desenvolvimento e Cidadania”que foi consagrado à problemática da cooperação e educaçãocomo resposta humanitária.

Este boletim edita um artigo escrito pelos interlocutoresinternacionais da INEE (Rede Inter-Institucional para a Educaçãoem Situação de Emergência), não só porque a ESE-IPVC estáa apostar nesta área devido aos contextos onde está a implementaro Programa Educar sem Fronteiras, mas também tem estado adivulgar os projectos e materiais desta rede no quadro dos paíseslusófonos.

Ao debruçar-se sobre a temática da educação em paísesfrágeis e ao lançar um olhar mais atento sobre a situação educativade Angola no quadro do pós-guerra, o boletim tenta chamar aatenção para os grandes desafios que se colocam aos sistemasde educação no período da reconstrução. Para isto, contribuem3 artigos relevantes escritos por Luísa Grilo e Filipe Zau (Ministérioda Educação) e por Fernando Pacheco, presidente da ADRA(Acção para o Desenvolvimento Rural e Ambiente). Estes textosdiscutem aspectos históricos, culturais, linguísticos que sãoessenciais para a nossa compreensão da complexidade da actualrealidade educativa de Angola. Põem, por exemplo no caso daADRA, em relevo o papel inovador que as ONG’s podem trazerao domínio da educação. Havendo tão poucos elementos escritossobre o sistema educativo de Angola, também estes contributossão fundamentais para aqueles que pretendem encetar caminhosde cooperação educativa com Angola.

O Boletim não podia ainda deixar de contemplar asvivências daqueles que têm passado por Viana do Castelo àprocura de uma experiência de educação internacional noscontextos do desenvolvimento africano. As crónicas sobre doispaíses (Benjamim Moreira em Santa Catarina e Cristina Rodriguesno interior da Guiné-Bissau) ilustram a grande riqueza que podeconstituir uma experiência de cooperação longe da capital e queacentua a dimensão de desenvolvimento muito próxima dosactores.

Finalmente, é de salientar que a ESE-IPVC vai novamentepreparar a Campanha Global pela Educação que, em 2007, terácomo tema a educação como um direito humano. É, certamente,neste movimento e com este espírito que têm sido concretizadasas acções do programa “Educar sem Fronteiras”. Este está a sero nosso contributo, ainda que modesto, para que muitas crianças,professores e professoras possam ter uma vida com dignidade.

Júlio Santos - GEED

Novembro 2006 - educ@r sem fronteiras1

Os Requisitos Mínimos para aEducação em Situação de Emergênciasão um manual e também a expressãode um compromisso desenvolvido atravésde um amplo processo de colaboração.Neste processo, todos os indivíduos –crianças, jovens e adultos – têm o direitoà educação durante as situações deemergência. Os requisitos expressam osprincípios fundamentais do ProjectoEsfera: de que todos os passos devemser dados para aliviar o sofrimentohumano que advém das calamidades econflitos e que as pessoas afectadaspelas catástrofes têm o direito a uma vidacom dignidade

Esta edição em língua portuguesaesteve a cargo do Gabinete de Estudospara a Educação e Desenvolvimento(GEED), traduzida de uma formaindependente através dos seuscolaboradores, no âmbito do ContratoPrograma Educar sem Fronteiras,financiado pelo Ministério da Ciência,Tecnologia e Ensino Superior Português.

O seu lançamento teve lugar em Junhodo presente ano, integrado no Curso Livre“Culturas do Desenvolvimento eCidadania”, com a presença da focal point(interlocutora) mundial para os RequisitosMínimos da INEE, Allison Anderson.

Lançamento do livro

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2educ@r sem fronteiras - Novembro 2006

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Paredes de Coura, 2006

Opiniões de alguns visitantes

• Parabéns pela iniciativa, o mundo com a vossa ajuda podetransformar-se num local mais “bonito” para todos… Contem comigo!

• Simplesmente fantástico!São actos como este que poderão fazer de nós pessoas melhores,habitantes de um mundo em que todos poderão sorrir… Muitosparabéns e obrigada por mostrar estas imagens!

• Ao visitar esta exposição a vontade que sempre tive de participarem iniciativas como estas cresceu ainda mais! Continuem a “lutar”por um mundo mais risonho e bonito.

• Desejo a vós que necessitam, uma vida melhor… um mundomelhor… tudo de bom!

• Obrigado por este trabalho. É importante haver quem se lembrede nós.

• A iniciativas como estas, resta-me apenas dar os parabéns àspessoas que dão o seu tempo a estas causas.Muitos parabéns por isso!

Programa Educar SemFronte i ras no Fest iva lParedes de Coura 2006Outras culturas no festival…

Integrado na Tenda Tecnológica do Instituto Politécnico

de Viana do Castelo, o Programa Educar Sem Fronteiras do

Gabinete de Estudos para a Educação e Desenvolvimento

(GEED) da Escola Superior de Educação de Viana do Castelo,

proporcionou a todos os presentes no Festival uma mostra

fotográfica dos seus trabalhos, um SPOT informativo do

Gabinete e da Campanha Global pela Educação e a distribuição

de alguns elementos de divulgação deste Programa de

cooperação.

Esta iniciativa, que surgiu no seguimento do apoio

prestado pelo João Carvalho, promotor deste importante festival

de Verão no apoio à Campanha Global Pela Educação, teve

como objectivos sensibilizar os presentes para as questões da

educação para o desenvolvimento e da cooperação com os

países do sul; e mostrar o trabalho realizado pelo GEED em

Angola, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Sri Lanka e Portugal.

A exposição tentou espelhar os contextos tão variados

e complexos, as imagens testemunham os quotidianos e as

práticas da educação e cooperação para o desenvolvimento

local. Desde o interior de Angola (províncias de Malanje e

Huambo, afectadas pela guerra) e da Guiné-Bissau (região de

Gabú), passando por Cabo Verde (interior da ilha de Santiago),

pelo Sri Lanka (no quadro do pós-tsunami) e por Viana do

Castelo ("Campanha Global para a Educação"), foi possível

revelar uma forma de ver e entender uma parte do mundo que

se abre a quem envereda pelos caminhos da cooperação para

o desenvolvimento, quer como técnico, quer como voluntário.

A mostra tentou também suscitar a reflexão sobre o

"outro" e sua maneira de ver o mundo, fazendo-nos, ao mesmo

tempo, redescobrir e repensar a nossa sociedade e a nossa

educação. Neste sentido, algumas imagens são,

propositadamente, uma homenagem àqueles que, nas suas

comunidades, vão, cada dia, conseguindo que a educação e

saúde se afirmem como um direito básico.

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O ISU-Viana foi até à Guiné-Bissau entre Julho a

Setembro deste ano, fazendo-se representar por um grupo de

voluntárias que desenvolveu actividades de formação e

animação comunitária na região leste daquele país: Gabú.

Esta intervenção foi desenhada no âmbito dos projectos

Nô Djunta Mon - NDM (Nós Juntamos as Mãos), iniciativa de

voluntariado para a cooperação, especialmente, dirigido a

estudantes universitários.

Todos os participantes passam por um processo de

formação específica, que abrange conteúdos tais como

voluntariado, cooperação, desenvolvimento, concepção de

projectos e cultural local; selecção e posterior preparação para

a sua permanência no terreno, quer profissionalmente, quer

pessoalmente.

Deste processo, resultou uma equipa de seis elementos:

Marina Rodrigues e Diana Domingues, estudantes na Escola

Superior de Enfermagem do Instituto Politécnico de Viana do

Castelo; Eduarda Cadeco, estudante de Educação de Infância

na Escola Superior de Educação do Instituto Politécnico de

Viana do Castelo; Rita Morgado, licenciada em Ensino de

Matemática; Fátima Amorim e Andreia Soares, presidente e

coordenadora do ISU-Viana, respectivamente. .

Este ano, o Nô Djunta Mon teve lugar em dois locais de

intervenção: a Tabanca (aldeia) de Béli e a cidade de Gabú

(capital de província). Em Béli, a presença do ISU resultou da

parceria com a Divutec - Associação Guineense de Estudos e

Divulgação de Tecnologias Apropriadas, a qual, desde há alguns

anos, se tem vindo a ser reforçada e da qual resultaram já

projectos muito frutíferos. Em Gabú, o trabalho da equipa foi

desenvolvido no Centro Regional Multifuncional para a

Juventude, onde se situa o Centro de Recursos Educ@r Sem

Fronteiras, equipado pela Escola Superior de Educação do

Instituto Politécnico de Viana do Castelo. Este Centro

Multifuncional é uma estrutura pública colocada à disposição

das camadas mais jovens da região de Gabú. De salientar

ainda que esses jovens estão maioritariamente envolvidos em

associações juvenis locais. Desde material informático,

bibliográfico, aparelhos de som e imagem e iniciativas de

planeamento familiar, tudo é colocado ao dispor deste público-

alvo.

Atendendo às características do centro, às necessidades

locais e sugestões dos parceiros locais, as actividades realizadas

consistiram em: formação de professores nas áreas da

matemática e educação pré-escolar - acções realizadas com

o apoio da Direcção Regional de Educação de Gabú; formação

de lideres associativos juvenis, com o apoio do Centro

Muntifuncional e o Centro Regional de Juventude de Gabú,

abrangendo temas como Associativismo, Desenvolvimento,

Participação, Cidadania e Sensibilização para a problemática

do HIV/SIDA, planeamento familiar e higiene pessoal e

comunitária.

Em Gabú, um dos objectivos primordiais da intervenção

NDM no Centro Muntifuncional para a Juventude era a

dinamização do próprio Centro de Recursos Educ@r Sem

Fronteiras, de forma a fortalecer a relação da comunidade local

com aquele espaço para que se apropriem dele, dando

seguimento às actividades depois da permanência da equipa.

Em Béli, os conteúdos e metodologias das actividades

de formação e animação comunitária foram decididos entre a

equipa NDM, os parceiros locais, DIVUTEC e Delegações

sectoriais de Saúde e Educação de Béli, e ainda os próprios

formandos. A partir desta negociação foram dinamizadas

iniciativas de apoio aos professores nas áreas da matemática,

de primeiros socorros e língua portuguesa, sendo os

destinatários professores do ensino básico; de formação de

Agentes de Saúde Básica (Socorristas) e Matronas (Parteiras)

nas áreas da Primeiros Socorros, Higiene e Cuidados de Saúde;

de dinamização da rádio comunitária Colinas de Boé; de

sensibilização para a prevenção do HIV/SIDA, planeamento

familiar e higiene comunitária dirigida aos jovens da tabanca

de Béli e arredores.

Novembro 2006 - educ@r sem fronteiras3

Voluntariado, Cooperaçãoe Desenvolvimento na Guiné-Bissau

Voluntariado e Cidadania

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4educ@r sem fronteiras - Novembro 2006

Nas diferentes actividades de avaliação pelos formandos

e pela comunidade, os resultados obtidos confirmam a impressão

da equipa de que o trabalho implementado atingiu os objectivos

inicialmente traçados de contribuir para o desenvolvimento das

respectivas comunidades, dinamizando os seus espaços sociais.

Os resultados da avaliação individual dos elementos da equipa,

ao considerarmos as impressões de todos os intervenientes

na dinâmica NDM asseguram que a continuidade deste projecto

será uma mais valia para as comunidades de Gabú e Béli, isto

é, com todos aqueles com quem temos vindo a trabalhar desde

2004.

No sentido de dar a conhecer um pouco melhor o

trabalho desenvolvido pelas voluntárias ISU-Viana em Béli e

Gabú durante Julho, Agosto e Setembro de 2006 a equipa

prepara já uma exposição que estará presente em todas as

escolas do Instituto Politécnico de Viana do Castelo. Com isto

pretendemos que os estudantes percebam e sintam a

proximidade desta dinâmica e que possam vir a integrar projectos

desta natureza.

Se algumas das características prinicipais deste projectos

com a filosofia NDM são a proximidade com a comunidade

(nunca descurando as suas próprias necessidades, o que

influencia os planos de trabalho na medida em que se pretende

contribuir de certa forma para a minimização de alguns

problemas sociais) e o crescimento pessoal (implícito às

condições de qualidade de vida que os voluntários vivenciam

durante cerca de dois meses, como foi o caso) podemos então

dizer que o projecto foi, de facto, um sucesso.

Formação de professores, Gabú , 2006

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Novembro 2006 - educ@r sem fronteiras5

Olhando, agora, para este passado próximo e fazendo

uma análise mais madura, longe das emoções fortes que o

continente Africano continua a despertar, mesmo naqueles

mais descrentes neste trabalho pela mediatização que se dá

a toda a questão da cooperação com África ou por qualquer

outra razão, acreditamos que este tipo de experiências é,

verdadeiramente, uma oportunidade de crescer em

conhecimento e entendimento de alguma questões até aí

verdadeiras incógnitas. É ainda uma oportunidade de nos

deixarmos contagiar pela cultura africana que nos ajuda a

aprender novas formas de vida que podem criar condições

para que, enquanto cidadãos activos possamos dar o nosso

contributo consciente na diminuição das barreiras que, muitas

vezes, parecem inultrapassáveis entre o Norte e Sul… e que

estes projectos demonstram que não o são.

A equipa NDM fala mantenhas (cumprimentos) a todos

quantos contribuíram para o sucesso do NDM 2006, bem como

aqueles que já colaboram na idealização do NMD 2007…

ISU - Viana

1

2 3

1 - Grupo de jovens que trabalharam com a equipa NDM, Gabú, 20062 - Formação de professores, Gabú , 20063 - Formação de Líderes Associativos, Gabú, 2006

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6educ@r sem fronteiras - Novembro 2006

Aprender a apoiar a educação nos países frágeis*

O Grupo dos Países Frágeis integrado no Comité de Apoio

ao Desenvolvimento – (CAD) da Organização para a

Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) está

a trabalhar no sentido de aconselhar os doadores no apoio

à educação nos “países frágeis”.1

O Grupo dos Países Frágeis é constituído por

especialistas em governação, prevenção de conflitos e

reconstrução de agência de desenvolvimento bilaterais e

multilaterais para facilitar a coordenação e partilha de boas

práticas para aumentar a eficácia do desenvolvimento nos

“países frágeis”.

O CAD caracteriza os países frágeis como sendo

aqueles onde existe uma falta de compromisso político ou uma

fraca capacidade para desenvolver e implementar políticas a

favor dos pobres. Tais países tendem a ser caracterizados

como possuindo uma governação fraca e com tendência para

os conflitos violentos. Neles vivem um sétimo da população

mundial, um terço daqueles que vivem com menos de um dólar

por dia e metade das crianças que morrem antes de atingir a

idade de cinco anos. Mais de metade dos cerca de 115 milhões

de crianças que não frequentam a escola primária vivem em

países frágeis.

O CAD identificou quarto tipos de países frágeis: em

deterioração (deteriorating); desenvolvimento parado (arrested

development); recuperação recente (early recovery); e pós-

-conflito (post-conflict). Esta tipologia é útil quando que pensa

em diferentes estratégias de resposta. Por exemplo, em

situações de deterioração não será fiável, nem apropriado

trabalhar com o estado. Contudo, talvez seja possível trabalhar

com as comunidades no planeamento a longo prazo e no apoio

sustentável ao sistema educativo enquanto que o estado vai

desenvolvendo as suas capacidades. Durante a fase de

recuperação recente, os doadores podem trabalhar lado a lado

com os parceiros governamentais numa transição gradual para

que o estado possa desempenhar um papel maior na

organização dos serviços educativos. No entanto, há o

reconhecimento da necessidade de ter em conta a realidade

local no planeamento das respostas em contexto específicos.

A educação só recentemente foi incluída como o quinto

pilar da ajuda humanitária. Mesmo assim, não é

necessariamente incluída na resposta humanitária das agências

internacionais. Isto acontece apesar do facto de a educação

ser um direito humano reconhecido com prováveis benefícios

inter-geracionais e na vida das pessoas no que se refere ao

crescimento, à segurança e ao desenvolvimento. A educação

desempenha um papel fundamental na formação da identidade

nacional e pode ser, ao mesmo tempo, uma arma e um promotor

de paz. Felizmente, existe um reconhecimento crescente entre

os especialistas em educação que a dicotomia entre ajuda -

- desenvolvimento é artificial e a educação deve ser planeada

como um esforço a longo prazo. Este reconhecimento, contudo,

necessita de ir para além dos especialistas em educação se,

se pretender que esta integre o nexo assistência humanitária-

- desenvolvimento.

Se as intervenções nos estádos frágeis não forem

desenvolvidas de uma forma holística, e de acordo com uma

abordagem sectorial poderão surgir problemas. As previsões

para um desenvolvimento sustentável podem ser obstruídas

por falta de oportunidades de ensino pós-básico. É também

essencial centrar-se na formação de professores – em particular

de professoras – mesmo em condições de desenvolvimento

deterioradas ou com o desenvolvimento aprisionado, pois, a

educação pode desempenhar um papel fundamental na

transição pós-conflito. Se a formação vocacional não é

proporcionada para os jovens fora da escola as suas frustrações

podem despoletar um retrocesso às condições de deterioração.

Deverá ser salientado, contudo, que a formação vocacional

tem um registo misto, especialmente quando as oportunidades

de trabalho não se encontram imediatamente disponíveis.

É importante construir a partir de iniciativas

espontâneas da comunidade que, geralmente, precedem a

organização dos serviços educativos apoiados a partir do

exterior. Contudo, é necessário sermos cautelosos. A confiança

nas comunidades pode intensificar a inadequação,

especialmente no caso de comunidades que estão

desmembradas em consequência do conflito.

Page 8: Editorial - IPVC

Novembro 2006 - educ@r sem fronteiras7

Os comités de gestão da comunidade podem ser

apropriados pelas elites locais, e eles próprios darem origem

a conflitos. A passagem de iniciativas comunitárias voluntárias

para um sistema inter-sectorial apoiado pelo estado requer

gastos elevados com os salários dos professores, que,

inicialmente podem não ter sido avaliados. Virar-se para o

apoio externo é talvez fundamental para assegurar uma transição

suave, por exemplo, através de um trust fund provisório que

assegure os salários dos professores.

Serão necessárias formas inovadoras de coordenação

para se conseguirem planos estratégicos que sejam consistentes

com o apoio múltiplo trans-sectorial ao nível do país. O

envolvimento de ONG’s com experiência no fornecimento de

serviços nas fases iniciais de planeamento, bem como das

agências das Nações Unidas com experiência de coordenação

anterior, poderá ser uma oportunidade para assegurar que o

sistema seja desenvolvido de uma forma sustentável, indo ao

encontro das preocupações locais, e que poderá proporcionar

o desenvolvimento de abordagens sectoriais. A coordenação

inter-agências é também essencial – dado que, frequentemente,

não existe ligação entre os projectos de assistência humanitária

e de desenvolvimento.

É importante:

• Conseguir fundos dos doadores e assegurar que os dinheiros

circulem de forma previsível, eficiente e atempadamente,

particularmente no que se refere aos salários dos professores;

• Combinar as agendas da Rede Inter-Institucional para a

Educação em Situação de emergência2 (INEE, sigla em Inglês)

e a das da Educação Para Todos Fast Track Initiative3

(FTI, sigla em Inglês), de forma a criar sinergias, não mantendo

linhas distintas entre resposta de emergência versus ajuda a

longo prazo;

• Forjar o consenso nacional à volta da reforma do currículo;

• Evitar os perigos de focar em demasia na assistência técnica,

enquanto se ignora a realidade política;

• Encontrar critérios para disponibilizar fundos para os países

frágeis de uma forma mais transparente e menos sujeita a

considerações estratégicas;

• Assegurar que os mecanismos de prestação de contas

desenvolvidos durante o período de fragilidade não sejam

ignorados quando se reforça o governo.

Martin Greeley, é economista, e investigador no Institute of

Development Studies, Sussex. E-mail: [email protected]

Pauline Rose é docente no Centro Internacional da Educação

da Universidade de Sussex. E-mail: [email protected]

Este artigo lança conclusões preliminares de um estudo

encomendado pelo Department for International Development

(DFID) para ajudar o Grupo dos Países Frágeis do CAD a

identificar as boas práticas e lições aprendidas a partir das

abordagens das agências internacionais para apoiar a educação

nos países frágeis4.

__________________________________________________

1- www.oecd.org/dac

2 - www.ineesite.org

3 - www.fasttrackinitiative.org/education/efafti/

4 - www.ids.ac.uk/ids/pvty/pdf-files/Education_and_Fragile_States.pdf

__________________________________________________

* Traduzido pelo GEED, com a autorização dos autores. Versão original disponível

no suplemento da Forced Migration Review de Junho de 2006, em

http://www.fmreview.org/mags1.htm

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8educ@r sem fronteiras - Novembro 2006

Centro de Recursos de Educação da Assomada

Parcerias para o Desenvolvimento

1.Enquadramento do centro no contexto educativo do

Concelho de Santa Catarina

O concelho de Santa Catarina situa-se no centro da

ilha de Santiago de Cabo Verde e tem uma superfície de 244km2

e população de 49.829 habitantes (censo 2000). Dessa

população, quase metade são estudantes (aproximadamente

20 mil).

Sendo o Pré-Escolar com 1500 crianças, o Ensino

Básico com 10.979 alunos e os restantes distribuídos no

Secundário e na Formação Média.

Em termos de corpo docente – Jardim-de-Infância –

existem 95 monitoras de jardim infantil, com uma formação de

base muito diversificada, indo do ex- 2º ano do Ciclo Preparatório

ao 12º ano de escolaridade, sendo apenas 13 com formação

pedagógica. Essas monitoras são apoiadas por 2 coordenadoras;

Ensino Básico – existem 408 professores, sendo que 36% não

possuem formação pedagógica. Os professores são apoiados

por 22 gestores do Pólo Educativo e 11 coordenadores

pedagógicos.

Em relação às infra-estruturas – existem 58 jardins-

de-infancia e 52 escolas do Ensino Básico em todo o concelho.

Tanto os jardins, como as escolas, encontram-se distribuídas

por todo o concelho, sendo muitas localizadas em zonas de

difícil acesso, chamadas “zonas isoladas”. As escolas não

possuem energia eléctrica, salvo 7 que ficam mais perto do

centro urbano, o que impossibilita o uso de novas tecnologias.

É, neste contexto, que se desenrola o processo ensino-

aprendizagem e a educação pré-escolar e básica no concelho

de Santa Catarina.

Como forma de melhorar a qualidade do processo

através da qualificação dos docentes, temos vindo a procurar

parcerias nacionais e estrangeiras e assim, surgiu a parceria

entre esta Delegação e Escola Superior de Educação de Viana

do Castelo, cujo principal objectivo é troca de experiências e

apoio na formação contínua dos nossos agentes educativos.

Essa parceria já tem como consequência a orientação

de várias sessões de formação por parte dos docentes de Viana

do Castelo aos nossos agentes educativos aqui em Cabo Verde,

a deslocação a Viana do Castelo de alguns dos nossos

professores, gestores e coordenadores para troca de

experiências e formação, a vinda de 4 estagiárias de Educação

de Infância de Viana do Castelo para concluírem os estágios,

o apetrechamento de um Centro de Recursos na Cidade de

Assomada, sede do concelho etc.

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Novembro 2006 - educ@r sem fronteiras9

2 – Descrição do Centro de Recursos

O Centro de Recursos de Assomada foi criado no ano

lectivo 2004/05, com o apoio da Escola Superior de Educação

de Viana do Castelo e têm os seguintes objectivos:

• Desencadear o processo de formação contínua de professores

do Ensino Básico e orientadores de Jardim-de-infância;

• Produzir materiais didácticos de apoio à formação e ensino;

• Garantir o contacto via Internet entre orientadores portugueses

e cabo-verdianos, para formação dos últimos.

• Incentivar a pesquisa na Internet e o recurso a novas

tecnologias no processo de ensino – aprendizagem.

O centro ocupa neste momento 4 salas do 2º piso de

um edifício de 4 andares e cada sala tem as seguintes funções:

• Uma equipada com materiais informáticos e audiovisuais, e

neste momento está servindo aos docentes na elaboração dos

materiais didácticos, na utilização pedagógica das novas

tecnologias, na elaboração de textos pedagógicos, na pesquisa

através de Internet, na passagem de provas e elaboração de

documentos necessários aos pólos educativos e escolas, na

visualização de aulas de vídeo etc. Nessa sala trabalham, por

turno, dois professores com conhecimento e habilidade em

novas tecnologias de informação e comunicação.

• Uma sala de materiais bibliográficos (biblioteca), com vários

manuais de conteúdos científicos e pedagógicos para

actualização dos docentes e ao mesmo tempo, trabalham ali,

também por turno, duas professoras formadas e experientes

que apoiam os docentes, sobretudo, os sem formação

pedagógica, na planificação das aulas, elaboração dos testes

de avaliação dos alunos e em tudo o que os docentes mostrarem

dificuldades.

• Uma sala onde funciona a coordenação do Pré-Escolar, com

duas coordenadoras que apoiam as monitoras de jardim-de-

-infância, além de visitas de terreno.

• Uma sala equipada para alojamento do pessoal de Viana do

Castelo quando se deslocam a Cabo Verde para orientarem a

formação (quarto dos hóspedes).

Devo dizer, que não cumprimos todos os objectivos

preconizados para o Centro de Recursos, sobretudo na parte

que toca a formação orientada via Internet a partir da Escola

Superior de Educação de Viana do Castelo, por alguns

constrangimentos da nossa parte, mas estamos certos que lá

chegaremos. Apesar disso, o Centro está a revelar-se de enorme

importância no apoio aos professores. É muito procurado pelos

professores e gestores, sobretudo os que nunca tiveram acesso

às novas tecnologias. Pode-se dizer, que com o surgimento do

Centro, os Pólos passaram a ter mais igualdade em termos de

benefícios das novas tecnologias, mesmo aqueles que não têm

energia eléctrica. Muitos professores passaram a empenhar-

-se mais na formação em novas tecnologias porque agora têm

um lugar onde vão pôr em prática os seus conhecimento e a

própria Delegação sentiu-se descongestionada em relação aos

gestores e professores que dantes procuravam ali os serviços

informáticos. Para muitos, o Centro de Recursos é uma das

melhores coisas que surgiram na educação no concelho nos

últimos anos.

É claro que precisamos de mais meios informáticos,

mais materiais bibliográficos e de pessoas com mais qualificação

para dirigir o Centro, cremos que com “passos curtos, mas

seguros” como dizia o Sr. Professor Portela no início dessa

parceria, lá chegaremos.

O Delegado

Joaquim Furtado

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10educ@r sem fronteiras - Novembro 2006

Curso Livre – Culturas do desenvolvimento e cidadania

Modulo 4 – A cooperação e a educação como resposta

humanitária.

Nos dias 29 e 30 de Junho de 2006 decorreu na Escola

Superior de Educação de Viana do Castelo (ESE-IPVC) o quarto

módulo do Curso Livre “Culturas do desenvolvimento e cidadania”

integrado no Contrato Programa Educar Sem Fronteiras, bem

como o lançamento do livro Requisitos Mínimos para Educação

em Situação de Emergência, Crises Crónicas e Reconstrução,

edição e tradução do Gabinete de Estudos para a Educação e

Desenvolvimento.

Este módulo intitulado “A cooperação e a educação

como resposta humanitária” teve a presença de vários

especialistas e investigadores da área, de diferentes países

(Angola, Estados Unidos da América, Guiné-Bissau, Grã-

-Bretanha e Portugal) com prelecções incidindo nas questões

da resposta humanitária, da educação na fase de reconstrução

(o caso de Angola) e em países frágeis (o caso da Guiné-

-Bissau).

Num segundo momento, foi abordada a utilização dos

Requisitos Mínimos para a Educação em Situação de

Emergência, Crises Crónicas e Reconstrução para a resposta

humanitária, para a dicotomia emergência-reconstrução, além

da sua utilização numa panóplia de situações, como, por

exemplo, avaliação inicial, acompanhamento de professores e

outros técnicos da educação, coordenação, participação

comunitária, situações de ensino aprendizagem, entre muitas

outras.

As apresentações foram as seguintes:

• A ajuda de emergência numa perspectiva de longo prazo – Elizabeth

Challinor;

• A educação em Angola: desafios da reconstrução – Luísa Grilo

• A educação na Guiné-Bissau: desafios para o desenvolvimento –

João Nala;

• A Educação como resposta humanitária: um desafio para a ESE-

-IPVC – Júlio Santos;

• Educação, reconstrução e desenvolvimento: o caso da província de

Malanje – Rui da Silva;

• Educação, reconstrução e desenvolvimento: a experiência da Christian

Children’s Fund em Angola – Engrácia do Céu;

• Introdução aos Requisitos Mínimos para Educação em Situação de

Emergência, Crises Crónicas e Reconstrução – Allison Anderson, Júlio

Santos e Rui da Silva;

• Participação comunitária e os Requisitos Mínimos para Educação em

Situação de Emergência, Crises Crónicas e Reconstrução – Júlio Santos

e Rui da Silva;

• Politica educativa e coordenação e os Requisitos Mínimos para

Educação em Situação de Emergência, Crises Crónicas e Reconstrução

– Júlio Santos e Rui da Silva);

• Síntese da utilização e aplicabilidade dos Requisitos Mínimos para

Educação em Situação de Emergência, Crises Crónicas e Reconstrução

– Allison Anderson, Júlio Santos e Rui da Silva.

Opiniões de algumas das 31 pessoas presentes:

• Ambiente informal e descontraído; partilha de ideias/experiências; boa

metodologia de trabalho, especialmente no segundo dia (muito positivo);

• A troca de experiências de vários saberes que permitiu uma nova

aprendizagem; partilha de experiências de trabalho de outros países;

• Dinâmica das actividades propostas; o contacto com pessoas de diferentes

origens organizacionais; o tipo de abordagem às problemáticas propostas;

• Partilha de experiências de cooperação em variados contextos sociais

e culturais; reflexão em grupo; diversidade de actividades desenvolvidas

ao longo da sessão e promoção da dinâmica de grupo;

• As oportunidades de explorar/contactar com este instrumento de trabalho;

as orientações foram uma forma excelente de entrar mais directamente

em contacto com o livro e de tornar as sessões em algo interessante e

não demasiado pesado e cansativo;

• Reunião de diferentes pessoas; apelo à participação dos elementos do

grande grupo; metodologia, não sendo apenas expositivas possibilita a

participação mais activa dos participantes; Livro: um manual estruturante

da acção das pessoas no terreno, potencialmente, dará um forte contributo

para a uniformidade de bons procedimentos; parece-me que vai contribuir

decisivamente para os programas e projectos futuros que

venham a ser melhor planeados, implementados e avaliados;

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Novembro 2006 - educ@r sem fronteiras11 12educ@r sem fronteiras - Novembro 2006

Olhar o Sul

21 - Mbamza Congo, Angola, 200612 - Mbamza Congo, Angola, 200613 - Mansoa, Guiné-Bissau, 200214 - Luanda, Angola, 200515 - Béli, Guiné-Bissau, 2006

16 - Béli, Guiné-Bissau, 200617 - Viana do Castelo, Portugal, 200618 - Mbamza Congo, Angola, 200609 - Béli, Guiné-Bissau, 200610 - Béli, Guiné-Bissau, 200611 - Malanje, Angola, 2005

Cooperação – Aprender a estar com os outros...

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Rede Inter-Institucional para a Educação em Situaçãode Emergência*

Novembro 2006 - educ@r sem fronteiras13

Em Dezembro de 2004, a Rede Inter-Institucional para a

Educação em Situação de Emergência, Crises Crónicas e

Reconstrução (INEE, sigla em Inglês) lançou a primeira

ferramenta global para definir um nível mínimo de qualidade

de educação e ajudar a garantir o direito à educação para

as pessoas afectadas por crises.

Os Requisitos Mínimos para a Educação em Situação

de Emergência, Crises Crónicas e Reconstrução foram

desenvolvidos através de um processo de consulta envolvendo

cerca de 2250 indivíduos de mais de 50 países, incluindo

alunos, professores e staff das ONG’s, agências das Nações

Unidas, doadores, governos e universidades. Os Requisitos

Mínimos espelham a Convenção sobre os Direitos das Crianças

das Nações Unidas1, As Metas de Dacar para a Educação

Para Todos (EPT)2 e a Carta Humanitária do Projecto Esfera

e as Normas Mínimas para a Resposta Humanitária em

Situações de Catástrofe3. Eles apoiam a comunidade

humanitária na prestação de contas para proporcionar uma

educação de qualidade sem discriminação. Os requisitos são

suficientemente flexíveis para se tornarem num guia prático

como resposta ao nível comunitário, ao mesmo tempo que

proporcionam aos governos, outras autoridades, agências

financiadoras e agências nacionais e internacionais um

enquadramento harmonizador de forma a coordenar as suas

actividades educativas.

A procura do manual dos Requisitos Mínimos tem sido

elevada, e mais de 17.000 cópias foram distribuídas globalmente.

Os Requisitos Mínimos da INEE foram utilizados em mais de

60 países para o planeamento, avaliação inicial, concepção,

implementação, formação, capacitação, monitorização e

avaliação. No seguimento do tsunami em Aceh, o IRC/CARDI4

utilizou os requisitos para levar a cabo uma avaliação inicial

rápida e holística das necessidades, para a educação em

situação de emergência e planear uma resposta que responda

às necessidades identificadas.

No Chade, a UNICEF e as ONG’s parceiras utilizaram

os Requisitos Mínimos da INEE para ajudar na tomada de

decisões no que diz respeito ao código de conduta para os

professores e para avaliar a eficácia dos planos de trabalho.

No Cambodja, o Ministério da Educação, Juventude e Desporto

tem vindo a utilizar os Requisitos Mínimos da INEE como uma

ferramenta de advocacia e capacitação para planos futuros

para alcançar as Metas da Educação Para Todos. Depois do

Furacão Stan ter devastado a Guatemala em Outubro de 2005,

a CARE utilizou o Requisitos Mínimos da INEE para a formação

de um grupo de professores para ajudar a proporcionar, entre

outros, apoio psicossocial às comunidades locais.

Reforçando a capacidade

O sucesso do lançamento e as subsequentes

actividades promocionais que decorreram durante todo o ano

de 2005 salientaram a necessidade de formação nos requisitos.

Como resultado, o Grupo de Trabalho5 de 20 pessoas da INEE,

facilitou o desenvolvimento de materiais para a formação com

a contribuição de várias organizações-membro, organizando

sessões de formação em todo o ano de 2006. Os materiais de

formação foram testados no Nepal, no norte do Uganda e no

Paquistão no final de 2005. Estão a ser utilizados em nove

sessões de formação de três dias para Formadores de

Formadores (FF), onde em cada um serão formados

aproximadamente 25 formadores da área da educação

humanitária para a aplicação dos Requisitos Mínimos. A cada

formando da FF da INEE é pedido que, no mínimo, realize duas

formações para gestores e práticos na área da educação e

trabalho de emergência no prazo de 12 meses depois de

completar a formação da INEE.

No decorrer do próximo ano é esperado que

aproximadamente 225 formadores dos governos, agências das

Nações Unidas e ONG’s organizem formação para milhares

de trabalhadores humanitários. Deste modo, estes podem

proporcionar protecção psicossocial, física e cognitiva e, para

além de uma resposta coordenada e holística necessária

eassente numa base sólida e segura para a reconstrução do

pós-conflito e na reconstrução pós-catástrofe, educação de

emergência de qualidade que possa chegar às comunidades

em crise.

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14educ@r sem fronteiras - Novembro 2006

A INEE encoraja os seus membros a adoptar e

disseminar os Requisitos Mínimos. Para os ajudar a realizar

esta tarefa, um leque de materiais promocionais

estão disponíveis no sí t io da Internet da INEE

(www.ineesite.org/standards), incluindo traduções dos mesmos

em Francês, Espanhol, Árabe, Português e Bahasa Indonésio.

A crescente Rede da INEE com mais de 1,300

membros representa diversos grupos de ONG’s, agências das

Nações Unidas, doadores, governos, académicos e indivíduos

das populações afectadas. A Rede aumentou a consciência do

papel crítico que a educação desempenha dentro da resposta

humanitária. O Grupo de Orientação da INEE6 o staff do

Secretariado e restantes membros advogam:

• A inclusão da educação em toda a resposta humanitária;

• O acesso para todos os jovens a oportunidades relevantes

de educação sem discriminação;

• A utilização e implementação dos Requisitos Mínimos para

a Educação em Situação de Emergência, Crises Crónicas e

Reconstrução;

• Esforços sustentáveis para melhorar a qualidade na educação

formal e não-formal;

• Que os governos tenham a capacidade e os recursos para

assumir a responsabilidade para proporcionar educação;

• A promoção e investimento na Educação Para Todos (EPT)

pelas partes interessadas internacionais.

A INEE trabalha para melhorar a comunicação,

coordenação e acesso a recursos para práticos e outras partes

interessadas que trabalham no campo da educação em situação

de emergência e reconstrução pós-crise através do seu sítio

na Internet e na lista de distribuição.

O sítio da Internet da INEE contém um guia de boas

práticas, materiais de formação e avaliação, bem como

ferramentas de advocacia – um recurso compreensivo para

práticos, académicos, decisores políticos, doadores e governos.

A lista de distribuição permite aos membros trocarem informações

relacionadas com oportunidades de formação, novos recursos

e ferramentas, além de proporcionar um fórum de discussão

relacionado com os desafios actuais e práticas inovadoras.

Em Maio de 2006 a INEE foi honrada pela Womens’s

Commission for Refugee Women and Children na gala anual

Voices of Courage em Nova Iorque, um muito merecido

reconhecimento da dedicação e perseverança de todos os

membros da INEE que trabalharam para assegurar o direito à

educação em situação de emergência e reconstrução

pós-crise.7

Allison Anderson, é a focal point i(nterlocutora) para os

Requisitos Mínimos, está sedeada no International Rescue

Committee, Nova Iorque.

E-mail: [email protected].

Mary Mendenhall, é a Coordenadora da Rede INEE, apoiada

pela CARE USA e sedeada na UNICEF HQ.

E-mail: [email protected].

Para fazer parte da INEE, solicitar uma cópia dos Requisitos

Mínimos ou consultar os recursos disponíveis. Por favor, visite

www.ineesite.org.

__________________________________________________

1 - www.unicef.org/crc

2 - www.unesco.org/education/efa

3 - www.sphereproject.org

4 - O Consortium for Assistance and Recovery toward Development na Indonésia

é uma coligação de quarto agências especializadas no trabalho com refugiados,

encabeçado pelo International Rescue Committee.

5 - O Grupo de Trabalho nos Requisitos Mínimos actualmente inclui: Academy

for Educational Development, AVSI, BEFARe, CARE India, CARE USA, Catholic

Relief Services, Fundación dos Mundos, GTZ, International Rescue Committee,

Ministério da Educação - França, Norwegian Church Aid, Norwegian Refugee

Council, Foundation for the Refugee Education Trust (RET), International Save

the Children Alliance, UNESCO-IIPE, ACNUR, UNICEF, USAID, Windle Trust,

World Education.

6 - O Grupo de Orientação junta representantes da CARE USA, Christian Children’s

Fund, International Rescue Committee, International Save the Children Alliance,

Norwegian Refugee Council, UNESCO, ACNUR, UNICEF e o Banco Mundial.

7 -www.womenscommission.org/about/Lunch06/INEESpeech.shtml

__________________________________________________* Traduzido pelo GEED, com a autorização dos autores. Versão original disponível

no suplemento da Forced Migration Review de Junho de 2006, em

http://www.fmreview.org/mags1.htm

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Novembro 2006 - educ@r sem fronteiras15

Um professor de línguaportuguesa em Cabo Verde

Crónicas de Cooperação

1. Cooperação: da ideia à sua concretização

A ideia de participar num projecto de voluntariado para

a cooperação com um país lusófono não era nova mas, por

razões diversas, não tinha sido ainda possível concretizar até

que em Outubro de 2005 apresentei a minha disponibilidade

ao Doutor Júlio Santos, director do programa Educar sem

Fronteiras e do Gabinete de Estudos para a Educação e

Desenvolvimento (GEED), da Escola Superior de Educação

do Instituto Politécnico de Viana do Castelo (ESE-IPVC). Sem

o saber, a minha declaração de intenções enquadrava-se

plenamente no conjunto de projectos que, uns gizados e outros

em marcha, estão a ser levados a cabo por aquele pólo

dinamizador com a Guiné-Bissau, Angola e Cabo Verde.

Dada a minha formação profissional, de imediato essa

ideia encontrou eco na Escola de Formação de Professores

do Ensino Básico de Assomada, Instituto Pedagógico de Cabo

Verde, com a qual a ESE-IPVC desenvolveu já diversos

protocolos de cooperação não só a nível de formação como

através da instalação de um centro de recursos para alunos

do IPCV, professores, orientadores de estágio e gestores

escolares do concelho de Santa Catarina, na ilha de Santiago.

A minha iniciativa permitiu assim resolver um problema já que

a escola não dispunha, desde o início do ano lectivo, de

professor para a disciplina de Aprendizagem de Língua

Portuguesa e produziu nos oitenta alunos distribuídos por duas

turmas uma grande expectativa. Tinha portanto reunidas as

condições para desenvolver um trabalho sério e humana e

profissionalmente interessante.

2. As primeiras impressões

Para um português que acaba de chegar pela primeira

vez a África há certas coisas que o perturbam de imediato:

número elevado de pessoas, sobretudo crianças, com as quais

nos cruzamos, maior sujidade nas ruas, casas por rebocar e

pintar, partilha de certos espaços públicos com alguns animais

domésticos como porcos, cabras e galinhas, uma certa animação

sonora com música, vozes e buzinas, acordar frequentemente

ao som de animais a serem abatidos ou sentir tonturas ao ver,

dependuradas nas árvores, vacas esventradas em processo

de esquartejamento para venda ou para serem cozinhadas ali

mesmo. A deslocação de um europeu também não é fácil:

precisa de algum tempo para entender o sistema de transportes

colectivos na ilha de Santiago: em hiace, com lotação máxima

(sempre “cheia”, teoricamente mas não legalmente, ilimitada)

e um grau de comodidade variável; em hilux como carga assente

em dois bancos laterais convidativos à intercomunicação. Em

ambos os casos a sua utilização frequente diminui drasticamente

a sensibilidade aos solavancos provocados pelas irregularidades

do piso das estradas. Já percebeu que está noutro país mas,

ao contrário do que julgava, não entende nada do que “eles”

dizem, ouvindo apenas, aqui e ali, uma ou outra palavra

portuguesa mas no meio de uma sequência que não entende.

Aprende então o mais importante: se está a chegar

ao seu destino deverá dizer, no meio de uma música altíssima,

“Pára li” e a viatura quase instantaneamente se imobiliza (já

se vê que o advérbio “li” significa “aqui”, “já”) ou outra frase

performativa “Aguenta li”. E a música prossegue sem qualquer

interrupção.

Pode haver ao seu lado uma corpulenta vendedeira

que emite odores a que não está habituado ou cujas nádegas

o amarfanham mas se conseguir esquecer essas pequenas

vicissitudes de viajante, olha à sua volta e vê como são bonitas

as pessoas e em quantas delas identifica traços de seus

conterrâneos portugueses. Rapidamente, se assim quiser,

poderá entrar em conversas ou discussões já encetadas ou

trazer à liça outros assuntos. Em Cabo Verde saberá quanto

a água é um bem precioso e a luz eléctrica uma conquista

humana sobre a natureza. Aprenderá também que não é preciso

estar sempre a agradecer ou a pedir favores a ninguém mas

é natural cumprimentar aqueles com quem nos cruzamos no

caminho. Relembramos hábitos já longínquos das aldeias

portuguesas afinal os mesmos que os outros europeus utilizam

polidamente e nós cada vez menos.

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3. Actividade docente

A primeira iniciativa foi tomar conhecimento da situação. Os

meus alunos eram todos adultos e todos professores: numa

das turmas leccionavam em média há 18 anos, na outra há 8

anos. Na parte da manhã frequentavam o curso de formação

na cidade de Assomada e pelas 11:30 corriam para apanhar

o transporte para as suas escolas – algumas bem afastadas

e com acessos difíceis– onde permaneciam até ao final do dia.

Como professores do ensino básico (do primeiro ao sexto ano

de escolaridade), tinham uma turma em regime de

monodocência em qualquer dos níveis, diferentemente do que

se passa no sistema educativo português a nível da docência

do segundo ciclo (5º e 6º anos). Tendo em conta o programa

que me foi dado e a diagnose oral e escrita realizada na segunda

aula, delineei um novo programa e dei conta dele aos alunos

e à direcção da escola tendo em conta as necessidades sentidas

pelos alunos e as dificuldades que neles detectei. Algumas

áreas críticas obrigaram-me a preparar a minha intervenção

não prevista no programa recebido: a organização das ideias

e das frases, os articuladores do discurso, os mecanismos de

referência anafórica, a produção de texto, a coerência dos

tempos gramaticais, as regras de concordância, a flexão verbal,

problemas de ortografia, as regências preposicionais, as relações

de subordinação (causais, consecutivas, concessivas…), o

resumo, a pontuação, audição e reconstituição de partes de

texto, a pedagogia a partir do erro, etc. Alguns desses temas

foram abordados numa perspectiva de linguística contrastiva

entre o crioulo cabo-verdiano e o português (v.g. a relação

causal não explícita em “e fri, e xinta” e outras construções

subordinadas; a flexão em geral; as preposições. Foi ainda

reservado algum tempo para a criação de instrumentos

pedagógicos e materiais didácticos para a resolução de

problemas identificados nos textos dos alunos e que foram

apresentados e discutidos nas últimas aulas do curso. Deve

notar-se que o português só é utilizado, tanto por alunos,

professores ou população em geral, nas salas de aula ou em

situações formais; em todos os contextos informais o crioulo

é a única língua falada. Acresce ainda o facto de o crioulo não

ser língua de escolarização.

4. Actividades de orientação e acompanhamento

Às terças-feiras de manhã orientava um seminário com os

coordenadores e orientadores de estágio acerca de temas que

interessavam os presentes e onde se tratavam não só questões

de língua como de didáctica e metodologia.

Na primeira quinzena de Dezembro e durante todo o mês de

Janeiro realizei visitas a escolas urbanas e rurais, algumas

delas muito isoladas, observando aulas que no final eram

sempre analisadas criticamente. Quando terminei este trabalho

redigi e apresentei para discussão um memorando-relatório

das observações realizadas onde incluí algumas propostas.

Esse documento foi entregue ao Director do Instituto Pedagógico,

ao Delegado Escolar do município de Santa Catarina e enviado

à ministra da Educação e Valorização dos Recursos Humanos.

Encontrei escolas muito diferentes a vários níveis: de

infraestruturas (várias não tinham electricidade nem água

canalizada), de conservação (umas exemplares e outras muito

degradadas), de organização, de meios de apoio às aulas, etc.

Foi surpreendente e em muitos momentos verdadeiramente

emocionante participar nas aulas. Os alunos revelavam uma

tal motivação para a aprendizagem, um desejo de trabalhar e

de saber, um interesse em tudo quanto o professor lhes

propunha, uma educação exemplar, uma simpatia contagiante,

uma disciplina serena que apetecia voltar sempre para ver os

avanços conseguidos.

Participei ainda no encerramento de um curso de alfabetização

para jovens de Rincão que receberam formação em pesca, em

reuniões ao abrigo do programa EBIS no concelho de S. Miguel

da Calheta que se realizavam ao sábado e onde os professores

de diferentes escolas discutiam assuntos diversos, partilhavam

experiências pedagógicas e construíam instrumentos educativos.

Fiz uma conferência sobre questões de gramática do português

para os professores do liceu e escola técnica de Santa Catarina.

16educ@r sem fronteiras - Novembro 2006

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Novembro 2006 - educ@r sem fronteiras17

5. Para além do trabalho

Não se vá pensar que os quatro meses divididos em

duas partes, antes e depois do Natal, foram exclusivamente

preenchidos com trabalho. A oportunidade de estar em Cabo

Verde não podia ser desperdiçada. Por isso, aproveitei dois

fins-de-semana alongados por serem contíguos a dois feriados

fui conhecer outras ilhas, outras realidades. Duas experiências,

fundamentalmente, deixaram traços indeléveis: a subida ao

pico do Fogo e a ida de barco da ilha de Santiago até às ilhas

de S. Vicente, Santo Antão, passando por S. Nicolau. Não cabe

aqui dar conta das sensações únicas que se sente durante o

percurso de ascensão a pé até à cratera cónica quase perfeita

da erupção de 1995, a sensação de um vulcão em actividade,

o chão quente e lunar plantado de videiras, macieiras, feijoeiros

e flores. Como descrever uma manhã na Baía das Gatas em

S. Vicente ou um percurso pelo Mindelo? Como retratar as

emoções nos percursos pedestres na ilha de Santo Antão: da

Ponta do Sol à aldeia-presépio de Fontaínhas, ou a descida

vertiginosa de Covas até Paúl? Como contar os encontros e

os diálogos com crianças, jovens e idosos nesses percursos?

Talvez tenha sido uma grande vantagem o facto de viajar só

porque para evitar a solidão encetamos conversa com pessoas

tão simpáticas e interessantes que quase apetece lá ficar.

Não se pense que só as outras ilhas são interessantes. Percorri

praticamente toda a ilha de Santiago, subi a alguns montes,

alguns bem elevados, contemplei lá do cimo as aldeias e as

casas isoladas ao logo das encostas das montanhas, mergulhei

diversas vezes nas águas tépidas e transparentes da praia do

Tarrafal, observei em diversas praias o labor impressionante

de mulheres arrancando areia ao mar, participei em casamentos,

festas religiosas, populares e de aniversário, assisti a

espectáculos de música tradicional (funaná, batuque, coladeiras,

mornas), conversei com muitas pessoas simples: vendedeiras

do mercado muito animado, pastores, agricultores, alfaiates

(em pleno mercado há diversos pessoas costurando), tecelões,

velhinhos, e também com intelectuais, magistrados, deputados,

políticos.

Em todas as situações estamos perante coisas

diferentes do nosso dia-a-dia na nossa terra mas basta que se

aceite ou se deseje participar na diferença para se usufruir

momentos únicos na nossa vida. Finalmente tive a oportunidade

de assistir tanto à campanha para as eleições legislativas como

para as presidenciais que em Cabo Verde têm um elevado

grau de empenhamento dos cidadãos. Como dizia na primeira

carta que enviei de lá, tenho ainda os olhos carregados de

imagens de paisagens e de pessoas únicas, os ouvidos prenhes

de música, sons e palavras singulares, a cabeça cheia de

sensações, de emoções e agora de recordações.

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18educ@r sem fronteiras - Novembro 2006

5. Duas notas finais

Apesar de humana e profissionalmente esta minha

passagem por Cabo Verde ter sido extremamente positiva, não

posso deixar de lamentar o facto de Portugal desconhecer ou,

pior, ignorar o trabalho dos professores cabo-verdianos que se

dedicam ao ensino da Língua Portuguesa, a língua oficial do

seu país. Tendo estado, a título individual e voluntarista, a

formar professores, e tendo observado o interesse e o trabalho

dos docentes e das crianças nas diversas deslocações a escolas

do ensino básico de Santiago, conheço razoavelmente bem a

situação a que me refiro. A título de exemplo, no final de um

seminário que orientei no liceu local - com uma população de

seis mil alunos! - um professor confessou-me ter sido essa a

segunda vez na sua já muito longa carreira de docente de

Português que pôde obter formação após o curso frequentado

em Portugal. No entanto e apesar do gritante desinteresse do

estado português para com o ensino e a aprendizagem da

língua e não obstante as dificuldades concretas existentes em

virtude de praticamente só se aprender português quando se

entra pela primeira vez na escola e o crioulo cabo-verdiano

ser, além disso, praticamente a única língua falada em todas

as situações de comunicação, os professores revelam um

interesse e uma dedicação inexcedíveis. Veja-se que o francês,

sendo uma língua estrangeira e residual em Cabo Verde, é

objecto de diversos programas massivos de formação de jovens

vocacionados, p.e. para o ecoturismo.

Esta minha curta experiência permite ainda uma

segunda observação: existe uma política para o apoio ao

desenvolvimento dos países de língua oficial portuguesa?

Existe uma política estrangeira para a língua portuguesa? É

certo que há organismos oficiais do Ministério da Educação e

do Ministério dos Negócios Estrangeiros vocacionados para o

apoio à educação, à cooperação e ao desenvolvimento. No

entanto, quando nas férias de Natal de 2005 consegui angariar

junto de escolas, professores e editoras uma tonelada de livros

e material escolar, acabou por ser uma empresa privada, a

SOMAGUE, que transportou, gratuitamente, para a Praia o

contentor com essas doações. Esses organismos oficiais

apresentavam sempre novos entraves e dificuldades cada vez

mais fortes, a necessidade de múltiplos despachos hierárquicos,

prazos de requerimentos absolutamente espantosos. A Somague

só precisou de uma simples mensagem electrónica para que

o transporte se fizesse!Benjamim Moreira

Colaborador do GEED

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Novembro 2006 - educ@r sem fronteiras19

Durante aproximadamente três anos ingressei em projectosde apoio à educação na Guiné-Bissau. Trabalhei na área daformação pedagógica, contribuindo para a formação científica,técnica e pedagógica dos professores em exercício. Para tal,foi necessário um contacto o mais próximo possível do dia adia destes profissionais guineenses, em particular, e dapopulação, em geral. Percorri várias vezes 30 km de bicicleta,debaixo de um calor intenso, para fazer observação de aulas.Os professores locais fazem-no todos os dias, com a diferençade que eu estava bem alimentada e eles, muitas vezes, levamconsigo somente a curta refeição da noite anterior. Sem saláriohá dois anos não se podem permitir à extravagância do matabicho (pequeno almoço)!

Sentava-me na sala (que nalguns casos não era mais que umacabana feita em canas e folhas de palmeira), nos desconfortáveisbancos construídos com ramos de árvores e tentava escreversobre as mesas, feitas à base do mesmo material e estrutura.O que encontrava era um ensino desenvolvido à base damemorização, com turmas de 45 alunos onde, por exemplo,no 1º ano, as idades variam entre os 6 e os 18 anos. Como osprofessores não têm formação específica, importaram o modelodos seus antigos mestres, transmitindo aos futuros docentesas mesmas práticas e envolvendo-se num ciclo sem fim. Ummodelo que se mantém desde a época do colonialismo e emque os curricula são ainda o espelho do curricula português,sem adaptações à realidade guineense.

No entanto, o insucesso não passa somente pela falta deformação dos profissionais da educação, mas também pelaexistência de um sistema que tem como língua oficial oPortuguês, ensinado como língua materna, quando é a segundae nalguns casos a terceira língua dos alunos. Todas as disciplinassão leccionadas em português, que não é dominado pelo próprioprofessor, enquanto as crianças falam a língua étnica, e algumastambém o crioulo (língua nacional). O professor muitas vezesé de outra etnia, desconhecendo a língua materna dos alunosque, por sua vez, não entendem o crioulo. Pode-se fazer umapequena ideia do que esta miscelânea dá!

A situação da educação é deveras preocupante, desde aformação dos docentes, passando pelas instalações das escolase pela falta de recursos – o único livro a que professor e alunostêm acesso é o manual escolar, financiado por um projecto doBanco Mundial – até ao pagamento dos salários dos professores,

que apesar de estarem durante dois anos sem receber, todosos dias se deslocam para a escola e continuam a reunir-sequinzenalmente para a elaboração de planificações! Fazem omelhor que sabem e podem.Mas sobre Africa, e a Guiné-Bissau em particular, muito maishá a dizer…

Passar por África, permite-nos um novo olhar, uma(re)aprendizagem de padrões culturais e, sobretudo, morais ehumanos.

A nossa ocidental sociedade, onde o individualismo e oeconomicismo são condições tidas como necessárias esuficientes, exigidas por um colectivo que se habituou a valorizaro material, sofre de uma perda de valores que conduz à ausênciade identidade familiar e moral, onde a globalização não passase uma retórica ineficaz graças aos cifrões que movem o mundodito desenvolvido.

Por isso, África é uma grande escola de vida. Uma escola viva.Muda-nos o olhar, ensina-nos a despir os pesados mantos quetransportamos, ensina-nos a ser livres!

Pessoalmente, nunca mais posso deixar África, e compreendoagora a velha expressão que diz que quem vai a África ficapara sempre preso a ela. A sua natureza é de uma belezaextraordinariamente simples, que nos atordoa os sentidos. Asua magnitude reduz-nos à nossa verdadeira insignificânciaface às forças da natureza. O seu cheiro mágico é indescritível.O olfacto é, realmente, o primeiro sentido a reagir, mal se poisao pé em chão africano. Parece que é a forma que a terra temde nos chamar, exalando esse dopante odor!

A noite cai apressadamente na Guiné-Bissau. Quando anoitece,as cores transformam-se com a iluminação de inúmeraspequenas velas nas áreas mais centrais de cada localidade,deixando surgir com todo o seu resplendor milhares de pontosno céu. O brilho da noite é, de facto, único! Como a luz eléctricaé quase inexistente, as estrelas não têm a concorrência artificialdos neons dos estabelecimentos públicos, criando umaatmosfera quase mítica de profunda harmonia com a natureza,convidando à contemplação.

Os sons tornam-se mais intensos, misturando-se os da naturezacom os produzidos pelos humanos. As pessoas sentam-se àsportas, ou no alpendre das casas, no djumbai (conversa),partilhando a ambiência nocturna como testemunho de umacalorosa harmonia entre os intervenientes destas (tele)novelasvividas e faladas na primeira pessoa. Aqui, os serões sãoreservados para estar, estar uns com os outros.

… da minhapassagem por África

Crónicas de Cooperação

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Pode-se estar dançando ao ritmo de música gravada ou dosom saído do velho transístor; pelo cantar de alguns ou atravésdo simples ritmo do palmo (bater palmas); ou ainda com o somfantástico da tina (instrumento musical constituído por umacabaça e uma tina de água), de vez em quando interferido poruma gargalhada longínqua de uma hiena ou do toque de umbombolon (instrumento de percussão), transmitindo algumamensagem para a tabanca (aldeia) vizinha. Muitas vezes odjumbai acontece à volta de um pequeno fogareiro, enquantose confecciona o uarga (chá típico dos muçulmanos) com todoum ritual próprio que dura horas.

Este ambiente, necessariamente, envolve as pessoas numespírito de serenidade, tranquilidade, alegria e convivência,que reflectem a sua solidariedade, sentido de partilha e inter-ajuda no dia a dia. Apesar de todas as privações e problemasque este povo tem, na Guiné-Bissau impera, de facto, umsentido único de solidariedade, uma sossegada forma deenfrentar as preocupações, pois destas apenas constam osproblemas imediatos. Assim, não há sofrimentos nem ansiedadespor antecipação. É óbvio que esta atitude poderá tornar-seperigosa, se levada a extremos. No entanto, permite-nos umareflexão a nós, ocidentais, que nos deixamos invadir peloconsumismo exacerbado, donde derivam muitas das nossaspreocupações, remetendo para segundo plano atitudes ecomportamentos que enalteçam a tranquilidade, a atenção aosque nos rodeiam, a partilha…

O dia seguinte chega cedo e com ele as primeiras agitações– mulher a varrer a entrada da casa, mulher a transportar águade um poço próximo, mulheres a dirigirem-se a pé com os seusprodutos para o mercado mais próximo, mulheres a passaremcom redes para irem apanhar peixe ao rio, mulher a acenderlume para a primeira refeição do dia e… homem que aparecena porta de casa e se senta no banco que está sempre lá. Amulher, sempre a mulher, essa figura de pele castanha brilhantee belos penteados, é a heroína da Guiné, sustento da nação,honra lhe seja prestada!Assim começa o dia, ainda com uma temperatura fresca, aqual atingirá o seu ponto máximo entre a uma e as quatrohoras, período de tempo em que o país praticamente pára.Uma criança, duas, três… muitas crianças começam a surgir,primeiro nas portas de casa depois nas ruas, a caminho daescola. Muitas vezes é necessário percorrer quilómetros paralá chegar e é comum estas crianças transportarem o seu próprioassento para a sala de aula, variando o modelo desde o meroti jolo até à mais sofisticada cadeira de plástico.Em Bissau e no resto do país muita gente se desloca a pé,

alguns de candonga (meio de transporte que pode variar entre

um furgão e um camião, onde viajam pessoas e animais) e

muito poucos de bicicleta (o transporte mais adequado para a

época seca, no entanto fora do alcance da maior parte das

bolsas). Na capital, e só aqui, há táxis, muitos mesmo! E como

tudo neste país é partilhado, uma viagem de táxi não pode fugir

à regra. Um único carro transporta até quatro passageiros, que

se vão substituindo ao longo do percurso.

Andar de táxi e ou candonga é fascinante. Além de nos permitir

uma aquisição obrigatória das músicas em voga, é também

uma fonte de conhecimento da cultura local. Foi nestes transporte

que soube que na Guiné-Bissau não existem sem abrigo,

porque mesmo na capital, mais ocidentalizada, os valores

culturais se sobrepõem a qualquer manifestação individualista

importada do ocidente.

Existem pessoas com dificuldade, a viverem mal e sem recursos,

mas jamais um velho, um amigo, um familiar ou simplesmente

um vizinho, é abandonado.

Outra coisa que se aprende, e não só nos transportes, é o valor

dos velhos. Na Guiné-Bissau não existem instituições para

idosos, tão pouco estes se tornam um fardo para a família.

Porque aqui o idoso é sinónimo de sapiência e é ele que, no

peso da sua idade, transporta o conhecimento e sabedoria de

toda uma vida, que até ao fim é tida em conta e transmitida

aos seus descendentes. Ninguém toma decisões sem consultar

a opinião de um homem grande (velho, ancião). Amílcar Cabral

disse que Na Guiné quando morre um velho, é uma biblioteca

que se fecha. É mais um ponto de reflexão para a nossa

sociedade!

De facto, viver em África é apaixonante, é reencontrar/redescobrir

sentimentos e virtudes, permitindo-nos estar mais atentos, não

compactuando com a indiferença. É uma grande escola de

vida!...

Fevereiro de 2006

Cristina Rodrigues

20educ@r sem fronteiras - Novembro 2006

Page 21: Editorial - IPVC

Novembro 2006 - educ@r sem fronteiras21

Actividades do GEED

Actividade Novembro

Missão a Angola da ESE-IPVC e DREN -Províncias do Zaire e Malanje

V Curso Livre: Acesso e Qualidade da Educaçãono contexto de Desenvolvimento: contextos,actores e práticas.

Curso de Formação Geral de Voluntários

Projecto de mobilidade em Cabo Verde

II Encontro Internacional Educar Sem Fronteirase Módulo 5 do Curso Livre Culturas doDesenvolvimento e Cidadania

Apresentação dos resultados do Projecto NôDjunta Mon 2006 - Béli e Gabú

Exposição de fotografias itinerante Nô DjuntaMon

Filmagens em Cabo Verde para documentáriosobre Educação e Desenvolvimento

Edição e lançamento do Manual de LínguaPortuguesa para Cabo Verde

Exposição de fotografias: “Moçambique – Umelo no passado uma ponte para o futuro"

Preparação da Campanha Global para aEducação: “Educação como um direito humano”

Dezembro Janeiro Fevereiro Março

Apoio ao apetrechamento do Centro deRecursos da ADRA - Malanje no âmbito doContrato Programa Educar sem Fronteiras

Page 22: Editorial - IPVC

ESE - IPVC, Viana do Castelo, Portugal , 2005ESE - IPVC, Viana do Castelo, Portugal , 2005

Novembro 2006 - educ@r sem fronteiras

Índice

Editorial - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - 1

Lançamento do livro Requisitos Mínimos para a Educação em Situação de

Emergência, Crises Crónicas e Reconstrução - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - 1

Programa Educar Sem Fronteiras no Festival Paredes de Coura 2006 - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - 2

Voluntariado e Cidadania: Voluntariado, Cooperação e Desenvolvimento

na Guiné-Bissau - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - 3

Aprender a apoiar a educação nos países frágeis - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - 6

Parcerias para o Desenvolvimento: Centro de Recursos

de Educação da Assomada - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - 8

Curso Livre - Culturas do desenvolvimento e cidadania - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - 10

Olhar o Sul - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - 11

Rede Inter-Institucional para a Educação em Situação de Emergência - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - 13

Crónicas de Cooperação: Um professor de língua portuguesa em Cabo Verde - - - - - - - - - 15

Crónicas de Cooperação: ...da minha passagem por África - - - - - - - - - - - - - - - - - - 19

Actividades do GEED - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - 21