ecologia e avaliaÇÃo dos recursos bÉntÓnicos da zona de transiÇÃo dulciaquÍcola--salobra no...
TRANSCRIPT
-
UNIVERSIDADE DE LISBOA
FACULDADE DE CINCIAS
DEPARTAMENTO DE BIOLOGIA ANIMAL
EECCOOLLOOGGIIAA EE AAVVAALLIIAAOO DDOOSS RREECCUURRSSOOSS
BBEENNTTNNIICCOOSS DDAA ZZOONNAA DDEE TTRRAANNSSIIOO
DDUULLCCIIAAQQUUCCOOLLAA--SSAALLOOBBRRAA NNOO RRIIOO MMIIRRAA
Joo Paulo da Silva Medeiros
MESTRADO EM PESCAS E AQUACULTURA
2009
-
UNIVERSIDADE DE LISBOA
FACULDADE DE CINCIAS
DEPARTAMENTO DE BIOLOGIA ANIMAL
EECCOOLLOOGGIIAA EE AAVVAALLIIAAOO DDOOSS RREECCUURRSSOOSS
BBEENNTTNNIICCOOSS DDAA ZZOONNAA DDEE TTRRAANNSSIIOO
DDUULLCCIIAAQQUUCCOOLLAA--SSAALLOOBBRRAA NNOO RRIIOO MMIIRRAA
Joo Paulo da Silva Medeiros
MESTRADO EM PESCAS E AQUACULTURA
Dissertao orientada por: Professora Doutora Maria Jos Rosado Costa
Doutora Paula Maria Chainho de Oliveira
2009
-
Esta dissertao dever ser citada como:
Medeiros, J. P. (2009) Ecologia e Avaliao dos Recursos Bentnicos da Zona de
Transio Dulciaqucola-Salobra no Rio Mira. Dissertao de Mestrado,
Universidade de Lisboa, Lisboa, Portugal.
-
Ao meu pai, minha me e ao meu namorado
-
Paulinha e Lusa
-
Luis Silva (2006)
-
Do recato dos sobreirais de Mu, na serra do Caldeiro, intempestiva
corredura de mars que se faz vista das arribas marinhas da costa do
Sudoeste Alentejano, o Mira, o rio das guas tranquilas, carrega quilmetros de
venturas e desventuras feitos de montes que se perfilam, uns a seguir aos
outros, numa cascata de relevos que tanto se erguem em possantes miradouros,
como logo em seguida se afundam os barrancos tremendos apertados sobre
estreitas passagens gizadas pelo incessante deambular de bichos e homens. Pelo
meio, j liberto do represamento de Santa Clara, enquanto enche de brio os de
Odemira e envaidece os de Vila Nova de Milfontes, corre numa sonolenta mar
de tranquilidade que s os Invernos copiosos conseguem quebrar.
Jorge Nunes & Manuel Nunes in Da Nascente at Foz, Edies INAPA
-
Sandra Coelho (2007)
-
Sem gua no h rio. E o Mira, o das guas largas e abundantes, s o volta a
ser em Odemira, a islmica povoao que os mouros sabiamente dispuseram em
anfiteatro sob uma apertada curva do rio. aqui, a 30 quilmetros da foz, na
velha povoao que Afonso III granjeou com foral logo em 1256, que o rio se faz
homem e ganha identidade; salobro em vez de doce; largo em vez de estreito;
apressado em vez de lento; e perdoa-se ao forasteiro se acrescentar que rio
em vez de ribeiro. Durante sculos, o Mira foi a nica porta, a sul do Sado, que
o Alentejo abriu ao oceano a ao mundo para l da finisterra lusa. Por ele,
sobretudo durante a Idade Mdia, fazia-se trnsito de gente e animais rumo a
Lisboa; levava-se cartas e recebia-se novas; vendia-se a farinha que os moinhos
moam na gua barrenta e comprava-se panos. Por ele, enfim, passava tudo,
at o peixe os barbos-do-sul, as bogas-de-boca-arqueada e os escalos-do-sul que
alimentavam o povo. O trigo, o milho e a cevada que se moa nos moinhos de
gua que o rio alimentava de Inverno desapareceram.
Jorge Nunes & Manuel Nunes in Da Nascente at Foz, Edies INAPA
-
ENTRE SONO E SONHOS
Entre mim e o que em mim
o quem eu me suponho
Corre um rio sem fim.
Passou por outras margens,
Diversas mais alm,
Naquelas vrias viagens
Que todo o rio tem.
Chegou onde hoje habito
A casa que hoje sou.
Passa, se eu me medito;
Se desperto, passou.
E quem me sinto e morre
No que me liga a mim
Dorme onde o rio corre
Esse rio sem fim.
Fernando Pessoa
-
i
AGRADECIMENTOS
Professora Doutora Maria Jos Rosado Costa, os meus sinceros agradecimentos por ter aceitado orientar este estudo, pelo acolhimento e insero na extraordinria equipa do Grupo de Ecologia e Gesto dos Recursos Aquticos (EMAR) do Centro de Oceanografia. Professora Zita pela amizade, confiana, compreenso, boa disposio, exigncia e disciplina que lhe so caractersticas. Muito obrigado por tudo. Acima de tudo, na vida, temos necessidade de algum que nos obrigue a realizar aquilo de que somos capazes. este o papel da amizade (Emerson).
Doutora Paula Chainho de Oliveira, por ter sido uma das principais pessoas
responsveis pela existncia do projecto EFICAS, por ter feito com que este trabalho exista e por me ter ensinado grande parte daquilo que hoje sei no ramo da Biologia. Chefinha por ter acreditado em mim desde o primeiro dia em que comecei a trabalhar no projecto EFICAS, no Instituto de Oceanografia, e por me ter feito crescer no mundo da cincia, pela sua amizade e pelo enorme carinho que sempre demonstrou para comigo. As pessoas entram na nossa vida por acaso; mas no por acaso que elas permanecem (Alessandra Melo).
Ao Doutor Jos Lino Costa, pela sua infindvel sabedoria, aconselhamento,
ensinamentos e por toda a disponibilidade demonstrada no decurso do presente trabalho, assim como pelas revises crticas da presente dissertao. Ao Lino, pela sua amizade, confiana, boa disposio, companheirismo e por todo o apoio incontornvel, principalmente na fase final. Por no me deixar desamparado, o meu mais sincero obrigado. muito difcil encontrar um bom amigo, mais difcil ainda deix-lo e impossvel esquec-lo (Annimo).
Doutora Maria Lusa Chaves, por me ter ajudado na identificao dos
macroinvertebrados bentnicos de gua doce e pela sua disponibilidade e aconselhamento na estruturao da dissertao. Luisinha, pela sua amizade, companheirismo, boa disposio e alegria que to bem a caracterizam. Os homens cultivam cinco mil rosas num mesmo jardim e no encontram o que procuram. E, no entanto, o que eles buscam poderia ser encontrado numa s rosa (Saint-Exupry).
-
AGRADECIMENTOS
ii
Ao Professor Doutor Carlos Assis, pela sua preocupao, ateno e disponibilidade na tentativa de resolver todos e quaisquer problemas inerentes ao decurso do mestrado, principalmente, na fase curricular.
Ao Professor Doutor Joo Carlos Marques pela coordenao do projecto EFICAS
que serviu de base ao trabalho efectuado na presente dissertao e Doutora Joana Patrcio pela sua capacidade de organizao e por ser uma das pessoas responsveis pelo delineamento do projecto. Joaninha pela sua amizade, perseverana e apoio.
Mestre Gilda Silva pelo seu apoio incondicional na identificao dos
macroinvertebrados bentnicos, pelos seus ensinamentos e pela disponibilidade na formatao e reviso da dissertao bem como pela sua ajuda nas tarefas do dia-a-dia. Gilda, que incondicionalmente foi uma das pessoas responsveis por eu ter chegado onde cheguei, por ter acreditado e acreditar nas minhas capacidades, por me ter aconselhado e aconselhar, por me ter ouvido e ouvir, por ter ralhado e por ralhar comigo, por me chamar ateno, por me ter estendido a mo quando eu mais precisei, por ser quem . Do fundo do meu corao, um simples obrigado pouco para agradecer tudo o que fizeste e tens feito por mim. Que a nossa amizade no seja como a lua que apesar de linda s vezes muda de fase, mas que seja como o cu que apesar de lindo infinito... (Annimo).
Dra. Ana Lusa Rego, pela ajuda na identificao dos macroinvertebrados
bentnicos e pelos seus ensinamentos aquando a minha chegada ao Instituto de Oceanografia. Ana Lusa, pela sua amizade, companheirismo, conselhos, boa disposio e pelas suas gargalhadas que me fizeram sentir bem, principalmente nos momentos menos bons. Pelo seu ombro, compreenso e ajuda na ultrapassagem de um dos momentos mais difceis da minha vida. Um verdadeiro amigo algum que te conhece tal como s, compreende onde tens estado, acompanha-te nas tuas conquistas e nos teus fracassos, celebra as tuas alegrias, compartilha a tua dor e jamais te julga por teus erros (Annimo).
Ao Mestre Tadeu Pereira, pela grande ajuda nas sadas de campo e pelo
companheirismo inigualvel que sempre demonstrou. Ao Tadeu, pela sua amizade, pelo seu sentido de humor, pelo seu esprito de entreajuda e pelas conversas animadas que sempre surgem por muito srio que seja o assunto. Quem tem um verdadeiro amigo, pode afirmar que tem duas almas (Eli Behar).
Ao Dr. Joo Calado, igualmente pela enorme ajuda prestada aquando as sadas
de campo. Ao Joo pela amizade, companheirismo e por ter sido um excelente colega de trabalho.
-
AGRADECIMENTOS
iii
Mestre Carla Azeda, pela disponibilidade demonstrada em ajudar-me sempre que foi preciso e por todo e qualquer esclarecimento relativamente metodologia do laboratrio de Zoologia. Azeda, pela sua sincera amizade, boa disposio, conselhos, fora, apoio, pelos despiques e discusses saudveis e pelas enormes gargalhadas verdadeiramente sentidas. Amigo: algum que sabe tudo a teu respeito e gosta de ti assim mesmo (Elbert Hubbard).
Professora Doutora Helena Ado e Mestre Sofia Alves pelo companheirismo
e ajuda nas campanhas de amostragem. Helena e Sofia pelos excepcionais momentos passados a bordo da embarcao, pelo esprito de entreajuda, pela simpatia, pelo carinho e pela confiana depositada na minha pessoa.
Ao Dr. Nuno Prista por sempre mostrar um enorme companheirismo e mostrar-
se disponvel para ajudar sempre que necessrio. Ao Prista, pela enorme fora que me deu nesta fase final e pelas palavras que me fizeram ter orgulho e tentar ser motivo de orgulho. A melhor parte da vida de uma pessoa est nas suas amizades (Abraham Lincoln).
Professora Doutora Carmen dos Santos, Professora Doutora Isabel
Domingos, Dra. Diana Passos, Dra. Slvia Pedro e Dra. Mafalda Mascarenhas pelo companheirismo, amizade e pela partilha de bons momentos de conversa e desabafos.
Mestre Filipa Neto, pela sua disponibilidade no esclarecimento de dvidas
relacionadas com o tratamento estatstico dos dados e conselhos no delineamento da presente dissertao. Pipa pela sua amizade, boa disposio, alegria e riso contagiante. A linguagem da amizade no de palavras, mas de significados (Henry David Toureau).
Elsa Cabral por sempre se mostrar disponvel em ajudar no que fosse preciso,
pela sua verdadeira amizade e boa disposio. H quatro espcies de amigos que o so sinceramente: o que ajuda, o que permanece igual na prosperidade e no infortnio, o que d um bom conselho e o que tem uma simpatia real por ns (Digha-Nikaya).
Ana Horta por ter sido uma colega exemplar no decurso do mestrado, quer
como colega de grupo, quer como verdadeira amiga. Obrigado pela fora, pelo companheirismo, por me teres ouvido e por me teres cedido o teu ombro e dado o teu abrao quando mais precisei. As palavras de amizade e conforto podem ser curtas e sucintas, mas o seu eco infindvel (Madre Teresa de Calcut).
-
AGRADECIMENTOS
iv
Dlia Freitas e ao Nuno Castro pelo companheirismo ao longo do mestrado e por conservarem uma grande amizade que cada vez mais se fortalece. Talvez as melhores amizades sejam aquelas em que haja muita discusso, muita disputa e mesmo assim muito afecto (George Eliot).
Ao Andr e ao Joo que me ajudaram particularmente numa das sadas de
campo e que mostraram ser pessoas com um enorme esprito de entreajuda. Dra. Vanessa Pinto pelos momentos partilhados na discusso relacionada com
a presente dissertao, partilha de opinies, sugestes e conselhos. Vanessa pela sua incondicional amizade, por ouvir os meus desabafos, por estar presente quando preciso e por ser, sobretudo, uma grande amiga. Amizade como msica: duas cordas afinadas no mesmo tom vibram juntas (Annimo).
Aos restantes colegas e amigos do grupo de Zoologia e aos colegas e amigos dos
grupos de Oceanografia Fsica e Botnica Marinha do Instituto de Oceanografia, em particular Ana Sousa, agradeo o companheirismo e a amizade.
Ao Sr. Vitalino Cruz pela cedncia da sua embarcao nas campanhas de
amostragem e ao Sr. Antnio pela preciosa ajuda nas dragagens, bem como pela boa disposio e entusiasmo com que sempre se empenharam nas sadas de campo.
minha prima Teresa e minha tia-av Laura, pelas ajudas de foro financeiro
sempre prestadas em todos os momentos mais cruciais da minha vida e por acreditarem que eu vingaria os meus sonhos.
Ctia e ao Nuno pelos slidos laos de amizade que nos unem e pela enorme
ajuda e compreenso que tm tido para comigo. Pelo apoio, pelo carinho, por serem pessoas singulares. A glria da amizade no a mo estendida, nem o sorriso carinhoso, nem mesmo a delcia da companhia. a inspirao espiritual que vem quando se descobre que algum acredita e confia em ns (Ralph Waldo Emerson).
Ao meu gato Tij pela companhia e pelos mimos nos momentos em que apenas
se ouvia a minha voz a pensar alto e as teclas do computador que transpunham para o ecr os meus pensamentos e emoes Os animais dividem connosco o privilgio de terem uma alma (Pitgoras).
Ao Tiago, meu companheiro da vida e de todas as lutas, por acreditares em mim,
nas minhas capacidades e nos meus valores, pelo apoio incondicional em todos os momentos mais ou menos difceis e por me mostrares que o caminho do amor chama-se sacrifcio e que o amor a ocasio nica de amadurecer, de tomar forma, de nos
-
AGRADECIMENTOS
v
tornarmos um mundo para o ser amado; que uma alta exigncia, uma ambio sem limites, que faz daquele que ama um eleito solicitado pelos mais vastos horizontes. Palavras so perdidas, promessas so esquecidas, papis e cartas apodrecem, mas o verdadeiro amor o que permanece... (Jonathas Hardy).
Ao meu pai Francisco, que onde quer que ele esteja, sempre acreditou na minha
ambio e nos meus sonhos e que um dia ia e vou conseguir l chegar. No h alegria para o corao de um pai, que valha a certeza da felicidade de um filho (Jlio Dantas).
minha me Vivalda, por ser a melhor me do mundo, capaz de mover vales e
montanhas por mim e pela concretizao dos meus sonhos, por sempre me ter apoiado e nunca me ter dito que eu jamais seria capaz. Os teus braos sempre se abrem quando preciso de um abrao. O teu corao sabe compreender quando preciso de uma amiga. Os teus olhos sensveis endurecem-se quando preciso de uma lio. A tua fora e o teu amor encaminham-me pela vida e do-me as asas que eu preciso para voar (Annimo).
Agradecimentos Institucionais:
Ao Instituto de Oceanografia da Faculdade de Cincias da Universidade de Lisboa por ter proporcionado a realizao da presente dissertao de mestrado.
A presente dissertao de mestrado foi realizada no mbito do projecto EFICAS (POCI/MAR/61324/2004), financiado pela Fundao para a Cincia e Tecnologia (FCT).
-
vi
RESUMO
As comunidades biolgicas da zona de transio dulciaqucola-salobra do esturio do
Mira foram estudadas em duas vertentes principais: composio e estrutura das comunidades
de macroinvertebrados bentnicos de acordo com o gradiente salino, e uso e potencialidade
de explorao dos recursos biolgicos existentes nessa zona. A variabilidade espacial das
comunidades de macroinvertebrados bentnicos revelou a existncia de duas zonas distintas
(zona dulciaqucola e zona salobra). Na zona mais a montante, com uma salinidade anual
inferior a 0,5, predominaram taxa dulciaqucolas, principalmente larvas de insectos, e
observou-se uma tendncia para maiores densidades e riquezas taxonmicas. Na zona salobra,
com uma salinidade anual superior a 0,5, predominaram taxa estuarinos, e por isso mais
tolerantes a variaes de salinidade (Corophium orientale, Cyathura carinata. Lekanesphaera
spp., Alkmaria romijni, Hediste diversicolor e Streblospio shrubsolii), observando-se maiores
valores de diversidade e equitabilidade. Foram observadas variaes sazonais em ambas as
zonas, foi mais acentuada na zona dulciaqucola, tendo sido na Primavera que se registaram os
maiores valores de abundncia e no Outono os mais baixos. Os resultados obtidos neste
estudo indicam que o limite superior do esturio tidal se localiza, sensivelmente, 8 km a
montante da vila de Odemira, estendo-se a zona de transio aproximadamente por 2,7 km
para jusante desse limite superior. A distribuio destas comunidades, na zona de transio
dulciaqucola-salobra, faz-se progressivamente de acordo com o gradiente salino,
comportando-se mais como um padro de ecoclina do que de cotono. A potencialidade dos
recursos biolgicos existentes na zona dulciaqucola-salobra do esturio do Mira foi avaliada
com base em inquritos e complementada com a informao disponvel na bibliografia.
Apenas praticada pesca ldica, com utilizao de cana-de-pesca, utilizando como isco,
sobretudo, a minhoca-da-pesca e o camaro na captura de Dicentrarchus labrax, Anguilla
anguilla, Diplodus sargus e Solea spp., e tambm de milho na captura de Cyprinus carpio,
sendo o principal destino das pescarias o consumo prprio. Procambarus clarkii, Palaemon
longirostris e Corbicula fluminea, embora pouco explorados, so potenciais recursos.
PALAVRAS-CHAVE: macroinvertebrados bentnicos; esturio superior; variao espacial e
temporal, gradiente salino; ecoclina; recursos biolgicos;
-
vii
SUMMARY
The communities of benthic macroinvertebrates of the freshwater and brackish water
transition zone of the Mira estuary had been studied to evaluate the composition and
structure of the communities according to the salinity gradient and to assess potential for
biological resources. Spatial variability of macrobenthos revealed two different areas: a
freshwater area, with median annual salinities of 0.5, characterized by high abundances and
taxa, mainly insects; and a brackish water region, with higher salinities, characterized by
salinity tolerant taxa (Corophium orientale, Cyathura carinata. Lekanesphaera spp., Alkmaria
romijni, Hediste diversicolor e Streblospio shrubsolii) and showing higher diversity and
evenness. Seasonal variations were observed in both areas, although higher in the freshwater
region. Nevertheless, spring was the season with higher abundances while autumn showed the
lowest. The upper limit of the tidal estuary of this estuary was determined to be located 8 km
upstream of Odemira village and the transition area between freshwater and brackish water
extended approximately for 2.7 km downstream of this limit. The communities of benthic
macroinvertebrates in this transition zone are distributed gradually along the saline gradient
which is in accordance with the ecocline model. The potential biological resources to explore in
the freshwater and brackish water zone in the Mira estuary was evaluated by inquiries and
complemented with the information available in the bibliography. Only recreational fishing
was practice, therefore fishing rod the only gear used. Ragworms and shrimp were the
preferential bait for the capture of Dicentrarchus labrax, Anguilla anguilla, Diplodus sargus,
Solea spp., and corn for Cyprinus carpio. Procambarus clarkii, Palaemon longirostris and
Corbicula fluminea were found to be potential resources for human consumption or for bait.
KEYWORDS: transition area; benthic macrofauna, spatial and temporal variations, saline
gradient; potential biologic resources
-
NDICE
Agradecimentos ..................................................................................................................i
Resumo ............................................................................................................................. vi
Summary .......................................................................................................................... vii
CAPTULO 1
Introduo Geral ............................................................................................................... 2
Enquadramento e Objectivos ........................................................................................................ 2
Descrio geral da rea de estudo ................................................................................................ 4
Referncias .................................................................................................................................... 8
CAPTULO 2
Ecologia e definio da zona de transio dulciaqucola-salobra no Rio Mira .............. 14
Resumo ........................................................................................................................................ 14
Introduo ................................................................................................................................... 15
Metodologia ................................................................................................................................ 18
Caracterizao da rea de estudo .......................................................................................... 18
Definio das estaes de amostragem ................................................................................ 19
Amostragem ........................................................................................................................... 19
Processamento laboratorial ................................................................................................... 21
Anlise de dados .................................................................................................................... 22
Resultados ................................................................................................................................... 28
Composio e abundncia das comunidades de macroinvertebrados bentnicos .............. 28
Variao espacial na composio das comunidades de macroinvertebrados bentnicos .... 29
Variao temporal na composio das comunidades de macroinvertebrados bentnicos .. 36
-
Variao espcio-temporal das medidas de diversidade das comunidades de macroinvertebrados bentnicos ............................................................................................ 43
Discusso ..................................................................................................................................... 46
Referncias .................................................................................................................................. 50
CAPTULO 3
Recursos biolgicos da zona de transio dulciaqucola-salobra no Rio Mira ............... 58
Resumo ........................................................................................................................................ 58
Introduo ................................................................................................................................... 59
Metodologia ................................................................................................................................ 63
Resultados ................................................................................................................................... 64
Discusso ..................................................................................................................................... 69
Referncias .................................................................................................................................. 73
CAPTULO 4
Concluses gerais ........................................................................................................... 80
ANEXO A
ANEXO B
ANEXO C
-
INTRODUO GERAL
CAPTULO 1
-
2
INTRODUO GERAL
ENQUADRAMENTO E OBJECTIVOS
As comunidades biolgicas dos esturios so normalmente dominadas por
espcies de origem marinha e, em menor nmero, dulciaqucolas, sendo relativamente
raras espcies tipicamente estuarinas, ou seja, estritamente dependentes de habitats
salobros.
De qualquer forma, todas as espcies capazes de colonizar esturios
desenvolveram uma capacidade de tolerar valores de salinidade intermdios entre os
caractersticos de ambientes de gua doce e marinho e variaes de salinidade
acentuadas, permitindo-lhes viver nos esturios (Muylaert et al., 2009). Esta tolerncia
devida capacidade de osmorregulao do prprio organismo e adaptao s
particularidades ecolgicas destes locais (e.g. habitat e especificidades em termos de
alimentao) (Willmer et al., 2000; Greenwood, 2007).
De facto, os factores ambientais mais importantes e que, normalmente, afectam
os padres longitudinais das comunidades de macroinvertebrados bentnicos nos
esturios so a temperatura, o fluxo de gua doce e a salinidade (Piscart et al., 2005),
sendo que o ltimo factor constitui aquele que, primeiramente, define e controla a
distribuio dessas mesmas comunidades ao longo desses sistemas (Attrill & Power,
2000; Attrill & Rundle, 2002; Piscart et al., 2005; Sousa et al., 2007; Hampel et al.,
2009).
Na zona de transio entre a gua doce e o esturio compreensivelmente que
persiste um maior gradiente de carcter fsico-qumico (i.e. salinidade), consiste
(Greenwood, 2007), ocorrendo por isso mudanas pronunciadas na composio e
diversidade das comunidades biolgicas e de macroinvertebrados bentnicos em
particular (Muylaert et al., 2009).
-
INTRODUO GERAL
3
De acordo com Remane (1934), medida que o gradiente salino aumenta, a
diversidade das comunidades de macroinvertebrados tambm aumenta, facto j
demonstrado tambm para o esturio do Mira, onde a diversidade a jusante
incomparavelmente maior que nas zonas intermdias do esturio e a montante, junto
a Odemira, que considerado o limite superior do esturio salino (e.g. Andrade, 1986).
A definio deste limite superior no consensual entre autores, sendo que, em
alguns trabalhos, referida uma extenso de 30 km (Costa et al., 2001; Ferreira et al.,
2003) e 32 km (Andrade, 1986; Castro et al., 2002), terminando o esturio em
Odemira, enquanto outros autores consideram que o esturio do Mira apresenta uma
extenso superior mencionada anteriormente, cerca de 40 km (Blanton et al., 2000;
Silva et al., 2006). Esta discrepncia deve-se ao facto de uns autores considerarem que
o limite superior do esturio do Mira definido pelas caractersticas salinas da massa
de gua (Andrade, 1986; Costa et al., 2001; Castro et al., 2002; Ferreira et al., 2003;
Almeida, 2003; Costa, 2004), sendo-se que o valor mediano da salinidade, medido a
montante de Odemira, normalmente inferior a 0,5 (Ferreira et al., 2003); e outros
autores considerarem que o esturio se estende at onde a influncia da mar se faz
sentir esturio tidal (Blanton et al., 2000; Silva et al., 2006).
Apesar do esturio do Mira ser um sistema relativamente bem estudado, para
montante do Moinho da Asneira os estudos existentes sobre as comunidades de
macroinvertebrados bentnicos so mais escassos e menos pormenorizados, sendo as
principais obras sobre este assunto da autoria de Bruxelas et al. (1985), Campos &
Fonseca (1985), Andrade (1986) e Chainho (2008). A poro dulciaqucola do Rio Mira
tem sido muito pouco estudada, estando apenas publicado um estudo desenvolvido
por Teixeira et al. (2008) no mbito do projecto AQUARIPORT. Esta escassez de
informao estende-se zona de transio dulciaqucola-salobra deste mesmo
sistema. De um modo geral, a fronteira entre os ecossistemas de gua doce e
estuarino tem recebido muito pouca ateno por parte da comunidade cientfica em
todo o mundo (Rundle et al., 1998), apesar das comunidades que habitam esta
interface reunirem taxa dulciaqucolas e estuarinos e providenciarem a oportunidade
de estudar processos e padres de um ecossistema onde a migrao prevalece, sendo
uma zona dominada por espcies que vivem no seu limite de tolerncia. pouco se sabe
-
INTRODUO GERAL
4
tambm sobre os recursos biolgicos que a existem e o seu potencial de explorao
pelo Homem.
Com o intuito de atenuar as lacunas de informao existentes no que respeita
zona superior do esturio do Mira, com especial incidncia na zona de transio
dulciaqucola-salobra no Rio Mira, o presente trabalho pretendeu representar, de um
modo geral, um contributo para um maior e melhor conhecimento sobre a ecologia
das comunidades aquticas deste sistema e dos recursos biolgicos que a existem,
tendo em vista um melhor aproveitamento pelo Homem.
DESCRIO GERAL DA REA DE ESTUDO
O rio Mira possui um comprimento de cerca de 145 km, com uma rea de
drenagem aproximada de 1576 km2, localizando-se na Costa Sudoeste de Portugal
Continental (Blanton et al., 2000; Ferreira et al., 2003). Culmina num esturio que se
estende desde a regio a montante de Odemira at foz, junto a Vila Nova de Mil
Fontes (37O40 N; 8O45 O) (Castro et al., 2002; Ado, 2003; Costa, 2004; Silva et al.,
2006), e caracteriza-se por ter um formato alongado e entrincheirado (Ferreira et al.,
2003; Costa, 2004) (Figura 1).
Ao contrrio da generalidade dos rios portugueses, mas de modo similar ao rio
Sado, corre fundamentalmente de sul para norte, mais propriamente de sudoeste para
noroeste, embora se observem algumas mudanas de direco em determinadas
regies. Pode ser considerado um rio relativamente parado, que corre com uma
razovel lentido desde a sua nascente (Serra do Caldeiro) at foz. Entre o Sado e a
Ria de Alvor, o Mira constitui o nico curso de gua que actualmente se encontra em
permanente contacto com o oceano, conferindo-lhe uma importncia acrescida num
contexto regional (Marques, 2008).
Este esturio apresenta uma largura mxima de 400 m (Silva et al., 2006) na
parte inferior e de 30 m na parte superior (Castro et al., 2002), pelo que o ciclo tidal
no impe variaes significativas na largura na regio montante, em contrapartida
com o que acontece na zona central e a jusante (Costa, 2004). A profundidade mdia
de 6 m (Castro et al., 2002; Ferreira et al., 2003), oscilando entre 5 e 10 m na parte
-
INTRODUO GERAL
5
central e inferior do esturio, mas no ultrapassando os 3 m na parte superior, onde a
influncia das mars ainda se faz sentir (Castro et al., 2002).
Figura 1. Localizao e delimitao da bacia hidrogrfica do rio Mira.
A sua bacia hidrogrfica apresenta um clima temperado (mesotrmico), com um
perodo seco que se estende pelas pocas da Primavera e Vero (mais concretamente,
entre os meses de Maio e Setembro), e um perodo hmido, no Outono e no Inverno
(de Novembro a Abril). A temperatura mdia do ar anual apresenta valores da ordem
dos 16oC, com uma mdia nos meses mais quentes (Julho e Agosto) varivel entre 21-
25oC junto ao mar e de 30oC na zona interior enquanto no ms mais frio (Janeiro), as
temperaturas do ar oscilam entre 8 e 11oC no litoral e atingem os 5oC no interior. Em
termos globais, e na maior parte da bacia hidrogrfica, verifica-se uma precipitao
mdia anual compreendida entre 600 e 700 mm (Bettencourt et al., 1992).
De acordo com a tipologia definida para Portugal, no mbito da implementao
da Directiva-Quadro da gua, o esturio do Mira encontra-se classificado como sendo
do tipo A2 mesotidal, homogneo e com um fluxo de gua condicionado pelas
Vila Nova de Mil FontesMoinho da Asneira
CarrasqueiraTroviscais Ribeira do Torgal
Ribeira Macheira
RibeiraFoz de Casinhas
ODEMIRA
Sabia
SantaClara-a-Velha
Barragem de Santa Clara
RIO MIRA
RIO MIRA
RIO MIRA
N
N
OCE
AN
O A
TL
NTI
CO
OCE
AN
O A
TL
NTI
CO
Port
ugal
0 100 km
0 2,5 km
-
INTRODUO GERAL
6
estaes do ano (Bettencourt et al., 2004). Segundo Ferreira et al. (2003), o fluxo de
gua doce ao esturio do Mira bastante reduzido, sendo mais pronunciado nas
pocas de Inverno e Primavera, com um fluxo mdio anual de 10 m3.s-1, mas podendo
oscilar entre 0 e 500 m3.s-1 (Blanton et al., 2000). Este fluxo regulado artificialmente,
maioritariamente pela barragem de Santa Clara, localizada no troo do rio Mira a cerca
de 3 km a montante da localidade de Santa Clara-a-Velha. Se durante o semestre
hmido de um ano normal a precipitao e o afluxo de gua doce ao esturio podem
atingir valores importantes, na poca estival a entrada de caudais fluviais no sistema
torna-se praticamente nula. Naturalmente, o fluxo de gua doce do sistema
grandemente influenciado pela ocorrncia de eventos extremos (Figura 2).
Figura 2. Precipitao mdia anual (mm) na estao meteorolgica de Odemira, de 1979 a 2007 (fonte:
INAG, 2009, www.inag.pt).
Consequentemente, em condies normais a hidrodinmica do esturio
sobretudo influenciada pelo ciclo de mars, pelo que nos meses de menor fluxo de
0
100
200
300
400
500
600
700
800
900
1000
1979
/80
1980
/81
1981
/82
1982
/83
1983
/84
1984
/85
1985
/86
1986
/87
1987
/88
1988
/89
1989
/90
1990
/91
1991
/92
1992
/93
1993
/94
1994
/95
2001
/02
2002
/03
2003
/04
2004
/05
2005
/06
2006
/07
mm
Cheia
Cheia
SecaS
eca
-
INTRODUO GERAL
7
gua doce, as suas componentes dinmica e salina so marcadamente dominadas pela
intruso de gua salgada (Ferreira et al., 2003), que por sua vez, condiciona as
flutuaes ambientais dos parmetros fsico-qumicos na coluna de gua,
particularmente, da salinidade e turbidez (Andrade, 1986). Perante eventos de elevada
pluviosidade, a massa de gua estuarina responde com alguma rapidez a essas
alteraes sbitas, nomeadamente, no que diz respeito salinidade (Bettencourt et
al., 1993). So necessrios 14 dias para que se d a troca total da gua contida no
esturio (Chainho et al., 2008; Marques, 2008). Apesar da massa de gua ser
homognea, visvel, como consequncia de eventos de maior fluxo de gua doce e
nas reas mais a jusante, uma estratificao vertical (Ferreira et al., 2003).
Alm da variabilidade espacial nos constituintes hidrodinmicos e fsico-qumicos
da massa de gua estuarina, no menos importantes so as flutuaes sazonais que
resultam dos fenmenos naturais inerentes s diferentes pocas do ano, como o
caso ciclo anual das chuvas e do fluxo de gua doce, que determina a extenso da
intruso da gua salgada, bem como o grau da estratificao vertical (Ado, 2003) e.
Pelo facto de se encontrar no interior de uma rea protegida (Parque Natural do
Sudoeste Alentejano e Costa Vicentina), o esturio do Mira constitui um local com
elevado valor em termos de conservao da natureza. Inerente a uma poltica
integrada de preservao ambiental, so reduzidas as fontes poluidoras e poucas so
as alteraes de ndole antropognica. Comparativamente a outros esturios (e.g.
Tejo, Mondego), o esturio do Mira considerado um ecossistema pristino (Marques
et al., 1993; Ado, 2003).
A bacia do Mira e o seu respectivo esturio apresentam-se ainda bem
preservados quando comparados com outros sistemas semelhantes (Marques et al.,
1993). Para isso muito contribui o facto de uma extenso importante da rea
(fundamentalmente o esturio salino) estar includa no Parque Natural do Sudoeste
Alentejano e Costa Vicentina (PNSACV), o que tem impedido a realizao de
actividades antrpicas e a instalao no local de infra-estruturas particularmente
lesivas para o meio circundante. Contudo, tambm aqui existem alguns
constrangimentos ambientais com alguma relevncia, sendo o maior deles o crescente
assoreamento do leito e da barra do rio. Outros aspectos dignos de nota, mas
-
INTRODUO GERAL
8
aparentemente menos importantes no momento actual so as modificaes
produzidas nos terrenos ribeirinhos marginais, a explorao de recursos biolgicos e
introduo de espcies exticas e a reduo dos caudais dulciaqucolas (Marques,
2008). A barragem de Santa Clara serve uma rea agrcola de 12 mil ha e uma
populao de 24 mil habitantes, existindo cerca de 51 unidades industriais na zona
envolvente (Chainho et al., 2008). Certas reas registam alguma contaminao por
certos metais pesados, como As, Cr, Cu e Ni (Chainho et al., 2008). Apesar destes
constrangimentos, o esturio do Mira assume uma relevncia acrescida funcionando
como zona de viveiro para muitas espcies marinhas (sobretudo peixes) com
importncia comercial e que so pescadas na zona costeira adjacente (e.g. Almeida et
al., 1997; Costa, 2004). Muitas destas espcies icticascas desenvolvem o seu ciclo de
vida na parte superior do esturio, junto zona da vila de Odemira, onde tambm
possvel encontrar algumas espcies de macroinvertebrados bentnicos exticos,
facilmente adaptveis s condies biticas e abiticas da zona de transio
dulciaqucola-salobra. Algumas espcies cticas presentes nesta zona de transio e na
rea envolvente so exploradas pela populao local (pesca ldica) para consumo
prprio.
REFERNCIAS
ADO, M. 2003. Dinmica das comunidades de meiofauna em sedimentos associados
aos povoamentos de Zostera noltii no esturio do Rio Mira. Tese de
Doutoramento. Universidade de vora, vora, Portugal.
ALMEIDA, P. R. 2003. Feeding ecology of Liza ramada (Risso, 1810) (Pisces, Mugilidae) in
a south-western estuary of Portugal. Estuarine, Coastal and Shelf Science, 57:
313-323.
ALMEIDA, P. R., COSTA, J. L. & COSTA, M. J. 1997. Contribuio para a criao de uma
legislao especfica que regule a actividade piscatria no esturio do Rio Mira.
Parecer elaborado por solicitao do Parque Natural do Sudoeste Alentejano e
-
INTRODUO GERAL
9
Costa Vicentina. Instituto de Oceanografia, Faculdade de Cincias da
Universidade de Lisboa. Lisboa. 35 pp.
ANDRADE, F. 1986. O esturio do Mira: caracterizao geral e anlise quantitativa da
estrutura dos macropovoamentos bentnicos. Tese de Doutoramento,
Universidade de Lisboa, Lisboa, Portugal.
ATTRILL, M. J. & POWER, M. 2000. Effects on invertebrate populations of drought-induced
chages in estuarine water quality. Marine Ecology Progress Series 203: 133-143.
ATTRILL, M. J. & RUNDLE, S. D. 2002. Ecological Boundaries in Estuaries. Estuarine, Coastal
and Shelf Science 55: 929-936.
BETTENCOURT, A. M. M. DE, ABREU, M. C. DE, REVEZ, M. A., LEIT O, A. B. C., CATARINO, F. M.
SER DIO, J., NEVES, R. J. J., BAPTISTA, P. O, LANA, M. J., ALVES, M. J., COSTA, M. J.,
RAPOSO, P. & COSTA, J. L. 1992. Final report on the Mira estuary studies.
Comparative studies of salt marsh processes. ECE-DG XII. Lisboa, Portugal.
BETTENCOURT, A., BRICKER, S. B., FERREIRA, J. G., FRANCO, A., MARQUES, J. C., MELO, J. J., NOBRE,
A., RAMOS, L., REIS, C. S., SALAS, F., SILVA, M. C., SIMAS, T. & WOLFF, W. 2004. Typology
and Reference Conditions for Portuguese Transitional and Coastal Waters
(TICOR). Instituto da gua e Instituto do Mar, Lisboa, Portugal.
BETTENCOURT, A. M., CATARINO, F. M., SERDIO, J., LANA, M. J. & ALVES, M. J. 1993. V -
Portugal: pp. 183-235. In: Lefeuvre, J. C. (coord.). Comparative studies on salt
marsh processes. Final report. Vol. I. Universit de Rennes I, Rennes, France.
BLANTON, J. O., FERREIRA, M. A. & ANDRADE, F. 2000. Effect of broad shallow sill on tidal
circulation and salt transport in the entrance to a coastal plain estuary (Mira -
Vila Nova de Milfontes, Portugal). Estuaries, 23: 293-304.
BRUXELAS, A. T., FERREIRA, C. A. & ALBERGARIA, P. M. 1985. Contribuio para o
conhecimento de algumas biocenoses bentnicas da zona de influncia salina do
rio Mira, utilizando tcnicas de anlise multivariada. Relatrio de Estgio de
Licenciatura, FCUL, Lisboa, Portugal.
-
INTRODUO GERAL
10
CAMPOS, M. A. & FONSECA, P. 1985. Aplicao de alguns mtodos de anlise numrica ao
estudo da macrofauna bentnica do esturio do ro Mira. Relatrio de Estgio de
Licenciatura, FCUL, Lisboa, Portugal.
CASTRO, P., FREITAS, H. & VALIELA, I. 2002. Assessing Eutrophication Dynamics in Two
Portuguese Salt Marshes: Past, Present and Future. pp.229-230. In: EUROCOAST
(ed.), Littoral 2002, The Changing Coast. EUROCOAST/EUCC, Porto, Portugal.
CHAINHO, P. 2008. Contribution to the development of biotic integrity assessment tools
for Portuguese estuaries based on benthic communities. Tese de Doutoramento,
Universidade de Lisboa, Portugal.
CHAINHO, P., CHAVES, M. L., COSTA, J. L., COSTA, M. J. & DAUER, D. M. 2008. Use of
multimetric indices to classify estuaries with different hydromorphological
characteristics and different levels of human pressure. Marine Pollution Bulletin,
56: 1128-1137.
COSTA, J. L. 2004. A biologia do xarroco Halobatrachus didactylus (Bloch & Schneider,
1801) e o seu papel na estrutura e funcionamento dos ecossistemas em que se
insere; referncia especial populao do esturio do Mira. Tese de
Doutoramento, Universidade de Lisboa, Lisboa, Portugal.
COSTA, M. J., CATARINO, F. & BETTENCOURT, A. 2001. The role of salt marshes in the Mira
estuary (Portugal). Wetlands Ecology and Management, 9: 121-134.
FERREIRA, J. G., SIMAS, T., NOBRE, A., SILVA, M. C., SHIFFEREGGER, K. & LENCART-SILVA, J. 2003.
Identification of sensitive areas and vulnerable zones in transitional and coastal
Portuguese systems. Application of the United States National estuarine
eutrophication assessment to the Minho, Lima, Douro, Ria de Aveiro, Mondego,
Tagus, Sado, Mira, Ria Formosa and Guadiana systems. Instituto da gua e
Instituto do Mar, Lisboa, Portugal.
GREENWOOD, M. F. D. 2007. Nekton Community Change Along Estuarine Salinity
Gradients: Can Salinity Zones be Defined? Estuaries and Coasts 30 (3): 537-542.
-
INTRODUO GERAL
11
HAMPEL, H., ELLIOTT, M. & CATTRIJSSE, A. 2009. Macrofaunal communities in the habitats of
intertidal marshes along the salinity gradient of the Schelde estuary. Estuarine,
Coastal and Shelf Science 84: 45-53.
MARQUES, J. C. (coord.). 2008. Relatrio de execuo material do projecto EFICAS:
Efeitos dos caudais dulciaqucolas sobre as comunidades de invertebrados
macrobentnicos, na perspectiva da avaliao da qualidade ecolgica dos
esturios. POCI/MAR/61324/2004. Instituto do Mar e Instituto de Oceanografia
da Faculdade de Cincias da Universidade de Lisboa, Lisboa, Portugal.
MARQUES, J. C., MARANHO, P. & PARDAL, M. A. 1993. Human impact assessment on the
subtidal macrobenthic community structure in the Mondego estuary (Western
Portugal). Estuarine, Coastal and Shelf Science, 37: 403-419.
MUYLAERT, K., SABBE, K. & VYVERMAN, W. 2009. Changes in phytoplankton diversity and
community composition along the salinity gradient of the Schelde estuary
(Belgium/The Netherlands). Estuarine, Coastal and Shelf Science 82: 335-340.
PISCART, C., MORETEAU, J.-C. & BEISEL, J.-N. 2005. Biodiversity and structure of
macroinvertebrates communities along a small permanent salinity gradient
(Meurthe River, France). Hydrobiologia 551: 227-236.
REMANE, A. 1934. Die Brackwasserfauna. Zoologischer Anzeiger 7: 34-74.
RUNDLE, S. D., ATTRILL, M. J. & ARSHAD, A. 1998. Seasonality in macroinvertebrate
community composition across a neglected ecological boundary, the freshwater-
estuarine transition zone. Aquatic Ecology 32: 211216.
SILVA, I. C., DINIS, A., FRANCISCO, S., FLORES, A. & PAULA, J. 2006. Longitudinal distribution
and lateral pattern of megalopal settlement and juvenile recruitment of Carcinus
maenas (L.) (Brachyura, Portunidae) in the Mira river estuary, Portugal.
Estuarine, Coastal and Shelf Science, 69: 179-188.
SOUSA, R., DIAS, S., FREITAS, V. & ANTUNES, C. 2007. Subtidal macrozoobenthic assemblages
along the River Minho estuarine gradient (north-west Iberian Peninsula). Aquatic
Conservation: Marine and Freshwater Ecosystems DOI: 10.1002/aqc.871.
-
INTRODUO GERAL
12
TEIXEIRA, A., GERALDES, A. M., OLIVEIRA, J. M., BOCHECHAS, J. & FERREIRA, M. T. 2008. Avaliao
da Qualidade Ecolgica de Rios Portugueses (Projecto AQUARIPORT): Sntese dos
resultados referentes anlise das comunidades de macroinvertebrados
bentnicos. Congresso da gua. 9. pp. 1-12. Associao Portuguesa de Recursos
Hdricos. Cascais.
WILLMER, P., STONE, G. & JOHNSTON, I. 2000. Environmental Physiology of Animals.
Blackwell Science Ltd. Oxford, United Kingdom. 644 pp.
-
ECOLOGIA E DEFINIO DA ZONA DE TRANSIO DULCIAQUCOLA SALOBRA NO RIO MIRA
CAPTULO 2
-
14
ECOLOGIA E DEFINIO DA ZONA DE TRANSIO
DULCIAQUCOLA-SALOBRA NO RIO MIRA
RESUMO
A variabilidade espacial e temporal das comunidades de macroinvertebrados bentnicos na zona de transio dulciaqucola-salobra do Rio de Mira, com base no gradiente salino, foi analisada ao longo das quatro pocas do ano de 2006. Este esturio um sistema mesotidal, homogneo e com um fluxo de gua condicionado pelas estaes do ano. Com base nos dados obtidos pelo presente estudo foi possvel determinar que o limite superior do esturio tidal do Rio Mira localiza-se, sensivelmente, 8 km a montante da vila de Odemira e a zona de transio entre a gua doce e o esturio estende-se aproximadamente por 2,7 km para jusante deste limite. Foram identificados 74 taxa de macroinvertebrados bentnicos. Amphipoda e Insecta compreenderam 70% dos organismos capturados na rea do estudo. Polychaeta, bivalvia, Oligochaeta e Isopoda apresentaram densidades menores estando os Gastropoda escassamente representados. Este trabalho evidenciou a existncia de duas zonas com comunidades de macroinvertebrados bentnicos distintas: uma zona dulciaqucola e uma zona salobra. Alm disso, entre estas duas zonas distinguiu-se uma rea onde as comunidades de gua doce e estuarinas se misturam. Assim, a distribuio das comunidades de macroinvertebrados bentnicos, na zona de transio dulciaqucola-salobra do esturio do Mira, faz-se progressivamente de acordo com o gradiente salino, comparando-se mais com o modelo de ecoclina do que de ectono.
Para alm da sanilidade, outros factores, e.g. granolumetria do sedimento, fluxo de gua doce, parecem determinar secundariamente as variaes espcio-temporais de macroinvertebrados bentnicos presentes na zona.
PALAVRAS-CHAVE: macroinvertebrados bentnicos, gradiente salino, esturio, variao
espacial, variao temporal
-
Zona de transio dulciaqucola-salobra
CAPTULO 2
15
INTRODUO
Os esturios so comummente vistos como zonas de transio entre os sistemas
de gua doce e marinhos (e.g. Odum, 1997; Cohen, 2000), caracterizados por sofrerem
mudanas morfolgicas, qumicas e ecolgicas numa escala espacial e temporal
relativamente curtas (Fairbridge, 1980). De acordo com este ltimo autor, a aco das
mars permite subdividir um esturio em trs zonas: zona inferior, em contacto
directo com o meio marinho; zona mdia, onde a massa de gua de origem marinha se
dilui de forma mensurvel com a gua doce; e zona superior (zona de transio
dulciaqucola-salobra), caracterizada pela presena de gua doce, no entanto, sujeita
ainda influncia das mars. Esta zona superior dos esturios tem sido muito pouco
estudada, quer a nvel internacional (Rundle et al., 1998; Attrill & Rundle, 2002), quer a
nvel nacional (Bruxelas et al. 1985; Campos & Fonseca, 1985; Andrade, 1986; Chainho,
2008; Marques, 2008), facto que se verifica particularmente para o esturio do Mira,
cujos estudos sobre o conjunto das comunidades macrozoobentnicas para montante
do Moinho da Asneira so muito escassos e pouco pormenorizados (Marques, 2008).
Paralelamente, entre os vrios autores que se dedicaram a estudar este esturio, no
de todo consensual a delimitao dessa zona superior (i.e. limite superior do esturio
salino) (e.g. Andrade, 1986; Blanton et al., 2000; Costa et al., 2001; Castro et al., 2002;
Almeida, 2003; Ferreira et al., 2003; Costa, 2004; Silva et al., 2006).
Todavia, nos ltimos anos tm surgido algumas tentativas no sentido de uma
melhor compreenso da composio das comunidades de macroinvertebrados
bentnicos e a sua variao espacial e temporal, bem como das caractersticas fsico-
qumicas destas zonas de transio superiores, em outros esturios e lagoas costeiras
[e.g. esturio do Rio Tamisa, no Reino Unido (Rundle et al., 1998; Attrill, 2002; Attrill &
Rundle, 2002); Lagoa de bidos, em Portugal (Carvalho et al., 2005)]. Tratando-se de
uma zona de transio, vrios autores tm tentado enquadrar esta zona nos conceitos
de ectono (e.g. Gallupo et al., 2007) e/ou ecoclina (e.g. Attrill & Rundle, 2002). Um
ectono uma zona de mudanas relativamente rpidas, sendo por isso dinmica e
normalmente instvel, originando uma zona ecologicamente limitada entre dois tipos
de comunidades distintas e relativamente homogneas (Attrill & Rundle, 2002). O
-
Zona de transio dulciaqucola-salobra
CAPTULO 2
16
conceito de ecoclina mais recente e define uma zona onde existem comunidades
muito heterogneas e mais estveis comparativamente s comunidades existentes
num ectono, distribudas ao longo de um gradiente de mudanas progressivas em
resposta a um factor ou conjunto de factores ambientais (Attrill & Rundle, 2002), que
variando espacial e temporalmente, no a fazem desaparecer de todo (van der Maarel,
1990). Este conceito tem sido pouco aplicado fora do ambiente terrestre, no entanto,
alguns autores tm investido na sua expanso e na sua aplicabilidade no
comportamento de algumas espcies de algas sujeitas a um gradiente salino (e.g.
Rietema, 1995; Russell & Veltkamp, 2008).
Acompanhando o gradiente salino no sentido gua doce-esturio, as espcies
estuarinas, particularmente os macroinvertebrados bentnicos, distribuem-se de
acordo com a sua tolerncia salinidade, concentrando-se mais na fronteira entre a
zona dulciaqucola e a zona salobra (Remane, 1934) (Figura 3). Perante este padro,
Remane (1934) assumiu que a referida distribuio assimtrica dever-se-ia ao facto das
espcies de macroinvertebrados bentnicos de gua doce serem menos tolerantes s
variaes de salinidade do que as espcies marinhas. De facto, com a aproximao da
zona de transio dulciaqucola-salobra, o nmero de espcies de gua doce diminui
drasticamente perante um ligeiro aumento da salinidade, ao passo que as espcies
mais tolerantes s variaes de salinidade (sobretudo espcies estuarinas)
concentram-se nessa mesma fronteira, aumentando significativamente a partir da o
nmero de espcies marinhas, o que se reflecte graficamente numa curva do tipo
sinusoidal (Figura 3).
O modelo comummente utilizado para descrever a composio das comunidades
de macroinvertebrados bentnicos na zona de transio dulciaqucola-salobra prope,
deste modo, uma diminuio considervel da riqueza especfica em relao s reas
adjacentes. De facto, o fluxo de gua doce nestas regies onde mais intenso e sujeito
frequentemente a grandes variaes, apenas sobrevivem algumas espcies mais
tolerantes a fortes variaes espaciais e temporais de salinidade (Rundle et al., 1998)
que inevitavelmente ocorrem.
Em funo de um reduzido fluxo de gua doce, as espcies de
macroinvertebrados bentnicos estuarinas tendem a migrar para montante da zona de
-
Zona de transio dulciaqucola-salobra
CAPTULO 2
17
transio dulciaqucola-salobra, resultando numa alterao da composio das
comunidades, sendo que o inverso tende igualmente a verificar-se. Este padro de
alterao das comunidades de macroinvertebrados bentnicos assenta nos modelos
de ectono ou ecoclina?
Figura 3. Curva de Remane (Remane, 1934) adaptada e anotada de forma a mostrar a aplicabilidade dos
modelos de ectono e ecoclina aos esturios e, particularmente, s zonas de transio dulciaqucola-
esturio.
-
Zona de transio dulciaqucola-salobra
CAPTULO 2
18
Os principais objectivos deste trabalho foram:
a) Estudar os padres de variao espacial e temporal da composio das
comunidades de macroinvertebrados bentnicos que constituem a zona de
transio dulciaqucola-salobra do esturio do Mira,
b) Esclarecer a delimitao superior do esturio salino do Rio Mira e,
c) Perceber qual a aplicabilidade dos conceitos de ectono e ecoclina nesta mesma
zona de transio.
Alm disso, o presente trabalho pretendeu contribuir, de um modo geral, para
um maior e melhor conhecimento sobre a ecologia das comunidades aquticas do
esturio do Mira.
METODOLOGIA
Caracterizao da rea de estudo
O rio Mira nasce a uma altitude de 470 m, na Serra do Caldeiro, estendendo-se
at foz, junto a Vila Nova de Milfontes, por uma distncia de 145 km (Blanton et al.,
2000; Ferreira et al., 2003), terminando num sistema salobro de pequena dimenso
(com uma rea aproximada de 2 km2) que apresenta um formato alongado e
entrincheirado. De acordo com Andrade et al. (1991), a influncia das mars faz-se
sentir a mais de 40 km da foz, no entanto, o limite inferior da zona limntica
encontra-se sensivelmente na regio de Odemira, situada a 32 km do mar (Andrade,
1986). De acordo com os objectivos propostos no presente captulo, a rea de estudo
centrou-se junto a Odemira, abrangendo a zona de transio dulciaqucola-salobra,
cobrindo uma extenso total de aproximadamente 11,2 km, estendendo-se para
montante desta vila cerca de 8,5 km e para jusante 2,7 km (Figura 4).
-
Zona de transio dulciaqucola-salobra
CAPTULO 2
19
Definio das estaes de amostragem
Com base nos dados de salinidade obtidos por Marques et al. (2008),
predefiniu-se o limite superior do esturio salino como sendo a zona a partir da qual os
valores medianos anuais de salinidade (perodo de 2006-2007) nunca ultrapassaram
0,5 (Figura 4). De acordo com este limite, estabeleceram-se dois grupos de estaes de
amostragem: Grupo I - Zona Dulciaqucola (estaes D1, D2 e D3) e Grupo II - Zona
Salobra (estaes S1, S2, S3 e S4) (Figura 4). Estas estaes de amostragem
localizaram-se assim, ao longo do gradiente salino, seguindo o sistema de Veneza
(Annimo, 1959), de forma a abranger a zona dulciaqucola, com salinidade mediana
anual inferior a 0,5 (tidal - estaes D1, D2 e D3), e a zona salobra, com salinidade
mediana anual igual ou superior a 0,5 (oligohalino - estaes S1 e S2, e
mesohalino - estaes S3 e S4).
Amostragem
No mbito do presente estudo, foram realizadas quatro campanhas de
amostragem no esturio do Mira durante o ano de 2006, nomeadamente em Maro
(Inverno)1
Para a captura dos organismos foram recolhidas amostras de sedimento, a bordo
de uma embarcao, utilizando uma draga van Veen modelo LMG, com uma rea de
ataque de 0,5 m2. Em cada estao de amostragem foram recolhidos 3 replicados na
zona subtidal. As amostras foram lavadas in loco e fixadas com uma soluo de
formaldedo a 4% tamponada com borato de sdio e corada com rosa de Bengala, para
posterior processamento laboratorial.
, Junho (Primavera), Setembro (Vero) e Novembro (Outono). A recolha das
amostras foi efectuada no perodo de estofo de mar com o intuito de maximizar a
eficincia da tcnica de captura dos macroinvertebrados bentnicos.
Simultaneamente, em cada estao de amostragem foram efectuadas medies
in situ de salinidade, oxignio dissolvido (mg.l-1 e %) e temperatura (oC) com uma
1 Nesta poca, a amostragem de macroinvertebrados bentnicos contempla apenas seis estaes de amostragem, uma vez que S2 no foi amostrada, devido a dificuldades de acessibilidade ao terreno.
-
Zona de transio dulciaqucola-salobra
CAPTULO 2
20
sonda multiparamtrica, (marca YSI, modelo 6820 V2). Foi ainda medida em cada
estao de amostragem a transparncia (m), recorrendo-se a um disco de Secchi.
Figura 4. rea de estudo e gradiente salino do esturio do Mira, desde a zona tidal zona euhalina
(valores medianos e erro padro por estao de amostragem em 2006 e 2007) (adaptado de Marques,
2008). As caixas a sombreado identificam as estaes estudadas no presente trabalho e o tracejado
indica a zona considerada, a priori, como limite superior do esturio salino. As estaes localizadas na
zona dulciaqucola so identificadas por D e as localizadas na zona salobra so identificadas por S.
SIMBOLOGIA- Estaes de amostragem
- rea de estudo
ODEMIRA
Vila Nova de Mil Fontes
D1D2
D3
S1S2S3
S4
S5
S6
S7
S8
S9
Ribeira do Torgal
Carrasqueira
Troviscais
OCE
AN
O A
TL
NTI
CO
N
OCE
AN
O A
TL
NTI
CO
Port
ugal
0 100 km
N
RIO MIRA
RIO MIRA
0 2,5 km
Moinho da Asneira
-
Zona de transio dulciaqucola-salobra
CAPTULO 2
21
Foram recolhidas amostras de gua junto ao fundo com uma garrafa tipo van
Dorn, para posterior determinao das concentraes de nitratos (N-NO3-, mg.l-1),
nitritos (N-NO2-, mg.l-1), amnia (N-NH4
+, mg.l-1), fosfatos (P-PO43-, mg.l-1), slidos
suspensos totais (mg.l-1) e clorofila a (g.l-1). As amostras de gua para a determinao
de slidos suspensos totais e de clorofila a foram filtradas atravs de filtros do tipo
Whatman GF/C. Aps a filtrao das amostras, os filtrados foram recolhidos e
conservados a uma temperatura de -20oC at respectiva anlise. Foram ainda
recolhidas amostras de sedimento para a determinao da sua granulometria (% das
diferentes fraces) e do respectivo teor em carbono orgnico (TCO, %).
Processamento laboratorial
As amostras de sedimento para anlise dos macroinvertebrados bentnicos
foram lavadas sob fluxo de gua contnuo, atravs de um crivo de malha calibrada de
500 m. Os espcimes retidos foram conservados em lcool a 70% corado com rosa de
Bengala, sendo posteriormente triados, identificados ao menor nvel taxonmico
possvel e contados. Para a determinao taxonmica dos diferentes organismos
recorreu-se, no s a chaves dicotmicas para os vrios grupos encontrados, mas,
sempre que possvel e necessrio, tambm a artigos cientficos com revises
taxonmicas para determinadas famlias ou gneros (Anexo A). Nos casos em que no
foi possvel chegar a uma identificao taxonmica a nvel especfico, os organismos
foram identificados famlia (e.g. Chironomidae, Caenidae, Psychomyiidae) ou ao
gnero (e.g. Gyraulus sp., Viviparus sp.); os Oligochaeta foram identificados ao nvel da
subclasse.
A determinao de N-NO3- e de N-NO2
- seguiu os protocolos indicados em
Strickland & Parsons (1972) e APHA (1995). A concentrao de N-NO3- foi determinada
pelo mtodo de reduo em coluna de cdmio e a concentrao de N-NO2- resultante
foi determinada com base na reaco de Griess. A concentrao de N-NO3- foi obtida
subtraindo o valor da determinao dos N-NO2- ao valor da determinao de N-NO3
aps reduo na coluna de cdmio. As concentraes de N-NH4+ e P-PO4
3-, este ltimo
-
Zona de transio dulciaqucola-salobra
CAPTULO 2
22
na forma de ortofosfato, foram determinadas de acordo com a metodologia indicada
em Annimo (1992). A concentrao de N-NH4+ foi determinada por calorimetria e a
concentrao de P-PO43- foi determinada pelo mtodo do cido ascrbico, por
espectrofotometria com um comprimento de onda de 882 nm. A clorofila a foi
determinada por espectrofotometria, aps extraco com acetona a 90%, de acordo
com Strickland & Parsons (1972).
A granulometria do sedimento foi determinada por separao das diversas
fraces atravs de uma coluna de quatro crivos (2 mm, 500 m, 250 m e 63 m) do
tipo AFNOR, aps secagem a 60oC, por um perodo de 48 horas. A granulometria em
cada estao de amostragem foi classificada como cascalho (G1, >2 mm), areia grossa
(G2, 500 m - 2 mm), areia mdia (G3, 250 - 500 m), areia fina (G4, 63 - 250 m) e
vasa (G5
-
Zona de transio dulciaqucola-salobra
CAPTULO 2
23
pressupostos considerados pela ordenao nMDS respeitantes natureza e qualidade
dos dados comparativamente a outras tcnicas de ordenao e, finalmente, o seu
algoritmo no afectado pela lacuna de alguma informao nos dados a tratar e pela
dimenso dos mesmos (Clarke & Warwick, 1994). Este tipo de anlise fornece uma
projeco das unidades de amostragem dispostas em mapas no mtricos de duas (ou
trs) dimenses, estando as distncias entre as unidades de amostragem de acordo
com o seu grau de similaridade. No caso do valor do stress da anlise ser pequeno
(inferior a 0,1), a ordenao MDS constitui provavelmente a melhor representao
grfica para o tipo de dados a estudar no mbito do presente trabalho (Clarke &
Warwick, 1994). Por esse motivo, a tcnica de ordenao nMDS tem sido
particularmente e amplamente utilizada para analisar a estrutura das comunidades de
macroinvertebrados bentnicos (e.g. Clarke & Green, 1988; Rodrigues et al., 2007;
Spruzen et al., 2008). No entanto, para valores de stress superiores a 0,1, a
classificao hierrquica aglomerativa (Cluster Analysis), com o objectivo de definir
grupos de estaes de amostragem de acordo com a sua similaridade, deve ser
utilizada como complemento ordenao nMDS, e ambas representadas em
simultneo (Clarke & Warwick, 1994).
Assim, neste trabalho, a ordenao nMDS foi complementada com uma
classificao hierrquica aglomerativa, representada por um dendograma, em que o
eixo dos X representa as estaes de amostragem e o eixo dos Y define o nvel de
dissimilaridade pelo qual duas estaes ou grupos de estaes se encontram
agrupadas (Clarke & Warwick, 1994).
Para avaliar a existncia de diferenas significativas entre os grupos de estaes
de amostragem definidos a priori (Grupo I - zona Dulciaqucola vs Grupo II - zona
Salobra), considerando a variabilidade induzida pelas vrias pocas do ano, recorreu-se
ao teste ANOSIM 2-Way Crossed Layout. O teste ANOSIM One-Way Layout foi utilizado
com o intuito de verificar a existncia de diferenas significativas entre pocas do ano,
dentro de cada grupo de estaes de amostragem pr-definido.
O teste ANOSIM um teste no paramtrico, que uma vez aplicado matriz de
similaridade dos dados de base, testa a hiptese nula (H0) de que no existem
diferenas significativas na composio de amostras ou grupos de amostras definidos a
-
Zona de transio dulciaqucola-salobra
CAPTULO 2
24
priori (Magurran, 2003). Considerou-se no referido teste a existncia de dois factores:
factor zona (Grupo I - zona dulciaqucola vs Grupo II - zona salobra) e factor poca do
ano (Inverno, Primavera, Vero e Outono). Para o conjunto das 27 estaes de
amostragem, distinguiram-se 7 estaes por poca do ano 4 pocas do ano (com
excepo da estao S2 da poca de Inverno, que no foi realizada, como referido
anteriormente). O teste ANOSIM 2-Way Crossed Layout permitiu testar a existncia ou
no de diferenas significativas na composio das comunidades de
macroinvertebrados bentnicos nos grupos de estaes de amostragem definidos a
priori (permitindo possveis variaes ao longo do tempo, isto , entre pocas do ano)
e a existncia ou no de diferenas significativas entre pocas do ano (no
impedindo, no entanto, a existncia de diferenas entre os grupos de estaes de
amostragem), assumindo que os replicados efectuados em cada estao amostrada,
em cada zona considerada, constituram replicados das mesmas. H assim, uma
simetria no teste da hiptese nula (H0), em que no havendo diferenas significativas
entre locais, podero haver variaes no tempo, e no existindo variaes temporais,
podero essas diferenas existir no espao (Clarke & Warwick, 1993; Clarke & Gorley,
2001).
O teste ANOSIM One-Way Layout, descrito por Clarke & Green (1988) como
sendo uma adaptao do teste estatstico utilizado por Mantel (1967), que reflecte as
diferenas numa determinada matriz de similaridades entre e dentro de um conjunto
de dados, foi utilizado para constatar se haviam diferenas significativas entre as
comunidades de macroinvertebrados bentnicos para as vrias pocas do ano, para
cada zona considerada a priori, testando a hiptese nula (H0) de que essas diferenas
no existiam (Clarke & Gorley, 2001).
O teste ANOSIM gera um valor de R compreendido entre -1 e +1, sendo que o
valor de 0 corresponde hiptese nula (H0) (Clarke & Gorley, 2001). Assumiu-se haver
diferenas significativas para um valor de R>0,25 e para um valor de p0,05 (Clarke &
Warwick, 1994).
A identificao dos taxa que mais contriburam para a similaridade entre cada
agrupamento de estaes de amostragem e entre as pocas do ano, bem como dos
taxa que mais contriburam para a sua dissimilaridade (aqueles que contriburam em
-
Zona de transio dulciaqucola-salobra
CAPTULO 2
25
mais de 10%), foi efectuada pelo mtodo de percentagens de similaridades (SIMPER)
(Clarke & Warwick, 1994 Este mtodo calcula a dissimilaridade mdia entre os
diferentes grupos de dados, de acordo com o coeficiente de dissimilaridade de
Bray-Curtis (i.e. estaes de amostragem do grupo I vs estaes de amostragem do
grupo II, e pocas do ano). Uma vez que o coeficiente de dissimilaridade de Bray-Curtis
considera a contribuio de cada componente (e.g. espcies), a dissimilaridade mdia
entre as estaes de amostragem do grupo I e as do grupo II e entre as pocas do ano
pode ser expressa em termos de contribuio mdia por parte de cada taxon. O
desvio-padro providencia uma medida de quanto um determinado taxon contribui
para a dissimilaridade entre os grupo I e II e entre as pocas do ano. Um taxa
considerado discriminante se contribui fortemente para uma dissimilaridade entre os
grupos de estaes e pocas do ano e possui um desvio-padro muito baixo (Clarke &
Warwick, 1993). A anlise SIMPER foi efectuada utilizando como base os taxa
reduzidos ao nvel taxonmico da famlia.
A caracterizao e comparao das comunidades de macroinvertebrados
bentnicos de cada estao de amostragem e dos grupos de estaes definidos como
zona dulciaqucola e zona salobra foram efectuadas com base no ndice de constncia
(Cij) nas duas zonas predefinidas, na densidade mdia (D), expressa em nmero de
indivduos por m2 (ind.m-2), nos ndices de diversidade de Shannon-Wiener (H) (log2) e
de equitabilidade de Pielou (J) e na medida de dominncia de Simpson () mdios,
bem como na riqueza taxonmica mdia (S) (por zona e por poca de amostragem).
Com excepo do ndice de constncia, as restantes medidas de diversidade foram
calculadas considerando os taxa identificados ao nvel taxonmico da famlia.
O clculo das medidas de diversidade, ao nvel taxonmico da famlia, prendeu-
se com a elevada heterogeneidade no que respeita composio das comunidades de
macroinvertebrados bentnicos na rea de estudo, quer entre zonas, quer entre
estaes de amostragem dentro de uma mesma zona, sendo muito difcil identificar
certos grupos de macroinvertebrados dulciaqucolas at ao nvel especfico ou mesmo
ao gnero.
O ndice de constncia (Cij) foi calculado pela expresso (1):
-
Zona de transio dulciaqucola-salobra
CAPTULO 2
26
= nijnj 100 (1)
em que nij corresponde ao nmero de ocorrncias do taxon i na estao j e nj
corresponde ao nmero de estaes. De acordo com Bachelet et al. (1996), os taxa
foram considerados comuns (50%C>25%) e constantes (C>50%).
O ndice de Shannon-Wiener (H) baseia-se no conceito de diversidade de um
sistema, fornecendo uma medida da composio dos povoamentos assente na riqueza
taxonmica e na distribuio da abundncia relativa dos indivduos pelos diferentes
taxa. o ndice mais comummente utilizado como medida de diversidade de uma
comunidade bitica (Clarke & Warwick, 1994) e foi calculado pela expresso (2):
= 2 =1 (2)
em que S corresponde ao nmero total de taxa e pi representa a proporo de
indivduos do taxon i, relativamente ao nmero total de indivduos.
O ndice de equitabilidade de Pielou (J) expressa a forma como os indivduos se
encontram distribudos pelos diferentes taxa (Clarke & Warwick, 1994), sendo
calculado pela expresso (3):
= (3)
em que H corresponde ao ndice de Shannon-Wienner [expresso (2)] e Hmax
corresponde diversidade mxima que se obteria se todos os taxa fossem igualmente
abundantes.
A medida de dominncia de Simpson () , na realidade, um ndice de
dominncia que reflecte a probabilidade de dois indivduos escolhidos ao acaso, numa
comunidade, pertencerem mesma espcie (Brower & Zar, 1984). Varia de 0 a 1 e
quanto maior for o valor do ndice, maior a probabilidade dos indivduos pertencerem
-
Zona de transio dulciaqucola-salobra
CAPTULO 2
27
mesma espcie, ou seja, maior a dominncia e, consequentemente, menor a
diversidade. calculado pela expresso (4):
= ( 1)=1( 1) (4)
em que corresponde medida de dominncia de Simpson, ni corresponde ao
nmero de indivduos amostrados da i-sima espcie, N representa o nmero total de
indivduos amostrados e S corresponde ao nmero de taxa amostrados.
As medidas de densidade, riqueza e diversidade das comunidades (densidade,
ndice de Shannon-Wiener, ndice de Pielou, medida de dominncia de Simpson e
riqueza taxonmica) foram sujeitas a um teste estatstico de forma a avaliar a
existncia de diferenas significativas entre as duas zonas definidas a priori (zona
dulciaqucola; zona salobra) e as pocas do ano, simultaneamente (H0: no existiam
diferenas significativas entre as zonas consideradas e as pocas do ano, em
simultneo); a hiptese nula (H0) foi rejeitada para um valor de p0,05. Este teste,
denominado de ANOVA factorial a 2 factores (ANOVA two-way), um caso particular
de uma metodologia de anlise de regresso multivariada que se designa por Modelo
Linear Generalizado (MLG) e que tem em considerao a influncia numa varivel
dependente por mais do que uma varivel independente (factor), transparecendo o
efeito, no s de cada um dos factores, mas tambm a possvel influncia que cada um
dos factores poder exercer sobre a resposta da varivel dependente ao outro factor
(interaco ou moderao entre os factores) (Maroco, 2007). Pretendeu-se, assim,
com a ANOVA factorial a 2 factores seguida do teste a posteriori HSD de Tukey, testar
se as mdias para cada nvel do factor zona e do factor poca do ano eram ou no
iguais [no caso de serem iguais, ento os factores no mostraram ter um efeito
significativo sobre a(s) varivel(eis) dependente(s) (medidas de densidade, riqueza e
diversidade)]. A aplicao do teste estatstico ANOVA two-way exige a verificao
simultnea da normalidade e da homocedasticidade (homogeneidade de varincias)
das amostras, pelo que estes pressupostos foram testados com base nos testes de
-
Zona de transio dulciaqucola-salobra
CAPTULO 2
28
Kolmogorov-Smirnov com correco de Lilliefors e de Levene, respectivamente
(Maroco, 2007).
Uma vez que no se verificaram os pressupostos para a aplicao dos testes
paramtricos referidos anteriormente, os dados foram transformados (neste caso
atravs da logaritmizao, Log x), de modo a validar as condies de aplicao dos
testes. Dado que os testes paramtricos so, de um modo geral, mais potentes
comparativamente aos testes no-paramtricos, o recurso a transformaes
matemticas de modo a validar os pressupostos da anlise paramtrica foi prefervel
utilizao imediata da alternativa no-paramtrica (Maroco, 2007).
Para a realizao da anlise de ordenao multidimensional no mtrica (nMDS),
classificao hierrquica aglomerativa (Cluster Analysis), ANOSIM 2-Way Crossed
Layout, ANOSIM One-Way Layout e anlise de similaridades (SIMPER) foi utilizado o
pacote estatstico PRIMER 5 for Windows Version 5.2.6. Os testes estatsticos de
Kolmogorov-Smirnov com correco de Lilliefors, de Levene e a ANOVA factorial a 2
factores (ANOVA two-way), seguida do teste a posteriori HSD de Tukey, foram
realizados utilizando o software SPSS Statistics 17.0.
RESULTADOS
Composio e abundncia das comunidades de macroinvertebrados bentnicos
Na rea de estudo delimitada e no total das quatro campanhas de amostragem
realizadas em 2006 foram recolhidos 18779 indivduos pertencentes a 74 taxa (Anexo
B).
A ordem Amphipoda constituiu o taxa mais abundante, exibindo 53,0% do total
de indivduos amostrados; a classe Insecta compreendeu 17,0% das capturas,
seguindo-se as classes Polychaeta (7,2%) e Bivalvia (7,0%) e a subclasse Oligochaeta
(6,9%). A ordem Isopoda e a classe Gastropoda incluram apenas 6,0% e 0,4% do
nmero total de indivduos capturados, respectivamente. Indivduos pertencentes a
outros taxa menos representativos (e.g. Nemertina, Decapoda, Tanaidacea) foram
-
Zona de transio dulciaqucola-salobra
CAPTULO 2
29
includos numa nica categoria designada por Outros, constituindo cerca de 2% do
total dos macroinvertebrados bentnicos contabilizados no conjunto das amostragens.
Apesar da ordem Amphipoda ter constitudo o grupo mais abundante, a classe
Insecta foi a que apresentou uma maior diversidade, com 29 taxa identificados,
seguindo-se a classe Polychaeta com 13 taxa identificados. Pertencente classe
Bivalvia, apenas se registou a presena da espcie extica Corbicula fluminea (O. F.
Mller, 1774), que devido sua grande plasticidade ecolgica (Reis, 2006), foi
capturada em quase todas as estaes de amostragem, excepto na estao D1
(estao mais a montante) e na estao S4 (estao mais a jusante).
Os 10 taxa mais abundantes na rea de estudo prefizeram 95% das capturas
totais, sendo a espcie Corophium orientale Schellenberg, 1928 (33,0%), a famlia
Chironomidae (15,3%) e o gnero Gammarus (12,5%), os taxa mais representativos da
comunidade.
As densidades mais elevadas de macroinvertebrados bentnicos foram
registadas na Primavera, na estao S4 (97700 ind.m-2), ao passo que os valores mais
baixos deste parmetro foram registados na poca de Vero, na estao S3 (1540
ind.m-2).
Variao espacial na composio das comunidades de macroinvertebrados
bentnicos
De acordo com a ordenao multidimensional no mtrica (nMDS), as estaes
de amostragem encontraram-se estruturadas de acordo com o gradiente estuarino,
com uma forte influncia da salinidade (Figura 5). Apesar de se encontrarem
representadas as vrias pocas de amostragem (Inverno, Primavera, Vero e Outono),
o agrupamento das estaes de amostragem e, consequentemente, das comunidades
de macroinvertebrados bentnicos, fez-se por classes de salinidade,
independentemente da poca do ano. Distinguiram-se dois grupos de estaes de
amostragem: um grupo de estaes designado por D (D1-D3) zona dulciaqucola
(Grupo I) -, e um grupo de estaes designado por S (S1-S4) zona salobra (Grupo II).
-
Zona de transio dulciaqucola-salobra
CAPTULO 2
30
Figura 5. Anlise de escalonamento multidimensional (MDS) das comunidades de macroinvertebrados
bentnicos da rea de estudo, onde se pode observar a formao de dois grupos de estaes de
amostragem distintos: zona dulciaqucola (Grupo I) (smbolos a cinza) e zona salobra (Grupo II) (smbolos
a branco) (I Inverno; P Primavera; V Vero; O Outono).
A anlise hierrquica aglomerativa, aplicada ao mesmo conjunto de dados,
sedimenta a anlise de escalonamento multidimensional, verificando-se a formao de
grupos idnticos para uma dissimilaridade de 74,1% (Figura 6). O teste estatstico
ANOSIM 2-Way Crossed evidenciou diferenas significativas entre a zona dulciaqucola
e a zona salobra (R=0,939; p
-
Zona de transio dulciaqucola-salobra
CAPTULO 2
31
Figu
ra 6
. Cla
ssifi
ca
o hi
err
quic
a ag
lom
erat
iva
(Clu
ster
Ana
lysi
s) d
as c
omun
idad
es d
e m
acro
inve
rteb
rado
s be
ntn
icos
da
rea
de
estu
do, o
nde
se p
ode
obse
rvar
a
form
ao
de
2 gr
upos
de
esta
es
de
amos
trag
em d
istin
tos:
zon
a du
lcia
quc
ola
(Gru
po I)
(s
mbo
los
a ci
nza)
e z
ona
salo
bra
(Gru
po II
) (s
mbo
los
a br
anco
), pa
ra u
ma
diss
imila
rida
de d
e 74
,1%
.
Gru
po I
Zo
na D
ulci
aqu
cola
Gru
po II
Zo
na S
alob
ra
-
Zona de transio dulciaqucola-salobra
CAPTULO 2
32
As comunidades de macroinvertebrados bentnicos identificadas para este
grupo de estaes so dominadas por indivduos da classe Insecta, algumas espcies
da ordem Amphipoda (Gammarus spp., C. orientale) e indivduos da subclasse
Oligochaeta e da classe Bivalvia. O gnero Gammarus evidenciou-se como o taxa mais
abundante (36,0% das capturas), seguido da famlia Chironomidae com 24,4% e da
subclasse Oligochaeta com 13,3%. As espcies C. orientale e C. fluminea exibiram
tambm uma representatividade notria, particularmente na estao de amostragem
D3 (estao mais a jusante deste grupo), ambas com uma percentagem de dominncia
no superior a 7,0% (Tabela 1).
As estaes de amostragem reunidas no Grupo II constituram uma zona de
transio no que respeita ao tipo de sedimentos, variando gradualmente entre
cascalho-arenoso e vasa, no sentido montante-jusante (Tabela 1). As estaes S1 e S2
apresentaram alguma variabilidade nos sedimentos, oscilando estes entre a
predominncia de cascalho e de vasa arenosa. As estaes S3 e S4 caracterizaram-se,
essencialmente, pela presena de sedimentos de vasa bem compactada. A
profundidade foi, em mdia, superior das estaes do grupo I, atingindo os 4 m na
estao mais a jusante e os valores de transparncia da coluna de gua
proporcionalmente inferiores aos observados na zona dulciaqucola. A salinidade
apresentou uma amplitude bastante elevada, variando entre 0,15 no Outono e 10,71
no Vero (Tabela 1). Devido superior influncia das mars, as estaes deste grupo
tendem a apresentar uma salinidade mediana anual superior s estaes do grupo I. O
valor mediano da salinidade registado na poca do Outono deveu-se ocorrncia de
uma cheia, com o consequente fluxo de gua doce bastante superior aos perodos
considerados normais. As concentraes de nutrientes (particularmente, N-NO3- e N-
NH4+) e a percentagem em teor de carbono orgnico nos sedimentos (TCO) foram
bastante superiores s registadas para as estaes do grupo I (Tabela 1).
As comunidades de macroinvertebrados bentnicos foram dominadas,
essencialmente, pela espcie C. orientale (47,9%), devido ao elevado nmero de
indivduos capturados na Primavera. As espcies Leptocheirus pilosus Zaddach, 1844 e
Cyathura carinata (Kryer, 1847) apresentaram-se como as mais abundantes a seguir a
C. orientale, com 12,3% e 8,6% das capturas, respectivamente.
-
Zona de transio dulciaqucola-salobra
CAPTULO 2
33
Nas estaes mais a jusante deste grupo comearam a ocorrer espcies da classe
Polychaeta, como Streblospio shrubsolii (Buchanan, 1890) (6,3% das capturas) e
Hediste diversicolor (O.F. Mller, 1776) (2,9% das capturas). A espcie C. fluminea
manteve a sua representatividade, principalmente, nas estaes mais a montante
(estaes S1 e S2), correspondendo a 7,6% dos organismos capturados nas estaes do
grupo II (Tabela 1).
Tabela 1. Parmetros ambientais e espcies dominantes nos grupos de estaes de amostragem
definidos na rea de estudo (Grupo I zona dulciaqucola e Grupo II zona salobra). Para os parmetros
ambientais so fornecidos os respectivos valores mnimos e mximos obtidos, com indicao da poca
do ano em que se verificam (I. Inverno; P. Primavera; V. vero; O. Outono). Para os taxa dominantes
disponibiliza-se a sua contribuio face densidade total, bem como (abreviado e a negrito) o grupo
taxonmico a que pertencem [Am. Amphipoda; Bi. Bivalvia; Ga. Gastropoda; In. Insecta; Is. Isopoda; Ol.
Oligochaeta; Ou. Outro; Po. Polychaeta]
Grupo I
(Estaes D1, D2 e D3) Grupo II
(Estaes S1, S2, S3 e S4)
Parmetros ambientais Profundidade (m) 0,33 O 0,53 I, P 1,82 I 2,65 P Transparncia (m) 0,27 O 0,53 I, P 0,24 O 0,89 I Salinidade 0,20 O 0,40 V 0,15 O 10,71 V Temperatura (oC) 15,12 O 20,05 V 13,53 I 25,63 V OD (mg.l-1) 3,77 V 11,02 I 4,51 V 13,75 I N-NO3
- (mg.l-1) 0,022 P 0,169 I 0,207 P 0,549 O N-NO2
- (mg.l-1) 0,001 I 0,003 O 0,003 I 0,013 O N-NH4
+ (mg.l-1) 0,014 I 0,043 O 0,011 P 0,097 O P-PO4
- (mg.l-1) 0,006 V 0,012 O 0,005 P 0,024 O
Clorofila a (g.l-1) 0,40 I 2,13 P 0,32 O 5,13 P TCO (%) 2,68 I 7,24 O 5,77 V 11,82 O Tipo de sedimento Cascalho Vasa Arenosa Cascalho Arenoso Vasa
Taxa dominantes Gammarus spp. (36,0%) Am Corophium orientale (47,9%) Am Chironomidae (24,4%) In Leptocheirus pilosus (12,3%) Am Oligochaeta (13,3%) Ol Cyathura carinata (8,6%) Is Corophium orientale (6,8%) Am Corbicula fluminea (7,6%) Bi Corbicula fluminea (6,5%) Bi Streblospio shrubsolii (6,3%) Po Ceratopogonidae (1,3%) In Oligochaeta (4,1%) Ol Potamopyrgus antipodarum (1,3%) Ga Hediste diversicolor (2,9%) Po Hydroptilidae (1,1%) In Heterotanais oerstedi (2,5%) Ou Limoniidae (0,7%) In Chironomidae (2,4) In Caenidae (0,7%) In Alkmaria romijni (1,3%) Po
-
Zona de transio dulciaqucola-salobra
CAPTULO 2
34
A anlise SIMPER evidenciou a elevada heterogeneidade espacial deste tipo de
comunidades, uma vez que a similaridade entre as estaes dentro de cada grupo
variou apenas entre 48,5% para a zona dulciaqucola e 55,4% para a zona salobra
(Figuras 7A e 7B). Esta anlise confirmou ainda a existncia de uma elevada
dissimilaridade entre a zona dulciaqucola e a zona salobra (74,3%) (Figuras 7A e 7B).
Os taxa que mais contriburam para a dissimilaridade entre as zonas
dulciaqucola e salobra foram os anfpodes Gammaridae (9,0%), Corophiidae (8,7%) e
Aoridae (7,4%), o ispode C. carinata (8,6%), os Chironomidae (7,8%), os poliquetas
Spionidae (7,7%) e Nereididae (6,8%) e os Oligochaeta (6,4%). Os Gammaridae, os
Chironomidae e os Oligochaeta foram mais abundantes na zona dulciaqucola, ao
passo que os anfpodes Corophiidae e Aoridae, o ispode C. carinata e os poliquetas
foram-no na zona salobra. Apesar dos resultados do presente estudo demonstrarem
que a composio das comunidades de macroinvertebrados bentnicos das estaes
de amostragem da zona dulciaqucola difere significativamente da composio das
comunidades da zona salobra, as estaes de amostragem D3 e S1 apresentaram
comunidades de macroinvertebrados bentnicos semelhantes em determinadas
pocas do ano (Tabela 2).
Tabela 3. Taxa comuns s estaes de amostragem D3 e S1 (I. Inverno; P. Primavera; V. vero; O.
Outono)
Estao D3 Espcie
Estao S1
I P V O I P V O
Caenidae Ceratopogonidae Chironomidae Corbicula fluminea Corophium orientale Cyathura carinata Gammarus spp. Heterotanais oerstedi Lekanesphaera monodi Oligochaeta
-
Zona de transio dulciaqucola-salobra
CAPTULO 2
35
Figu
ras
7A e
7B.
Abu
ndn
cias
md
ias
dos
taxa
que
con
trib
ura
m e
m m
ais
de 1
0% p
ara
a si
mila
rida
de d
entr
o de
cad
a gr
upo
de e
sta
es
de
amos
trag
em (
A
Gru
po I,
zon
a du
lcia
quc
ola;
B
Gru
po II
, zon
a sa
lobr
a). A
s pe
rcen
tage
ns d
entr
o de
cad
a gr
fic
o co
rres
pond
em
s si
mila
rida
des
dent
ro d
e ca
da z
ona,
enq
uant
o a
perc
enta
gem
den
tro
da s
eta
entr
e A
e B
cor
resp
onde
p
erce
ntag
em d
e di
ssim
ilari
dade
ent
re o
s gr
upos
I e
II
(val
ores
obt
idos
pel
a an
lis
e SI
MPE
R).
10
2
20
3
16
177
8
7
17
11
106
8 48,
5%
74,3