durkheim - suicidio - cap ii - seminario
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Universidade Estadual de Maringá
Curso: graduação em Ciências Sociais
Disciplina: Sociologia III
Professora: Dra. Ana Lúcia Rodrigues
Alunos: Celso Gazoli – RA 67.402
Humberto Yassuo Inokuma – RA 70.710
Fichamento da obra (excerto):
DURKHEIM, Émile. O suicídio: estudo de sociologia. Tradução: Monica Stahel. São
Paulo: Martins Fontes, 2000. Livro I, Cap. II, p. 69-99.
LIVRO I – OS FATORES EXTRA-SOCIAIS
CAPÍTULO II – O SUICÍDIO E OS ESTADOS PSICOLÓGICOS
NORMAIS. A RAÇA. A HEREDITARIEDADE
IO que é raça?
As definições de raça – pelo senso comum e pelos antropólogos – têm
sentidos divergentes (p. 70).
Em uma definição, raça é explicada pelos traços em comum e derivação de
uma mesma geração familiar (genealogia). Assim, raça corresponde a sujeitos de uma
mesma geração com variações próprias que diferenciam de outros; essas variações são
transmitidas no organismo pela hereditariedade (p. 70).
Esta definição apresenta problemas, segundo Durkheim, pois para definição
de raça seria preciso pesquisas histórias e etnográficas quanto à origem das raças e sobre
os diversos cruzamentos que ocorreram em todos os sentidos. As origens são muito
diversas; e também a falta de precisão quanto à origem das raças dificulta relacioná-las
com o suicídio (p. 70-71).
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A semelhança e a hereditariedade como características da raça
Sem adentrar na questão das suas origens, a raça tem como características a
semelhança e hereditariedade. As características comuns são transmitidas por
hereditariedade (p. 71). Nesse sentido, Pritchard
1
define como: “Pelo nome de raça,compreende-se todo o conjunto de indivíduos que apresentam um número maior ou
menor de características comuns transmissíveis por hereditariedade, deixando-se de lado
e reservando-se a origem dessas características.” (apud DURKHEIM, p. 72).
Problemas da constituição das raças
Os problemas da constituição das raças quanto à sua acepção:
a)
significado muito amplo e, com isso, indeterminado. Com isso, “cadagrupo de nações cujos membros, em decorrência das relações íntimas
que os uniram durante séculos, apresentam simularidades em parte
hereditárias constituiria uma raça.” (p. 72);
b) as grandes raças primitivas e fundamentais perderam as suas
individualidades (p. 73);
c) imprecisão e falta de objetividade e rigor científico na definição de tipos
mais especiais, levando a generalidades como raça latina, raça saxônica,
etc. (p. 73).
O sociólogo, diante das incertezas da Antropologia, precisa de cautela sobre
a influência das raças num fenômeno social. Mais significativo ou mais forte que a raça
são os agrupamentos de pessoas que formam os povos ou sociedades, isto é, a
nacionalidade (p. 73).
II
Classificação de raças na Europa e a ordem de suicídios
Durkheim apresenta uma classificação de raças na Europa, tendo como
critério a coincidência de características mais gerais e comuns e de acordo com o
número mais recorrente de suicídios:
1 Edward Evan Evans-Pritchard (1902-1973), antropólogo social britânico da segunda geração, juntamente com Radcliffe-Brown e Malinowski.
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1º) germânico, que reúne o alemão, o escandinavo, o anglo-saxão, o
flamengo;
2º) celto-romano, que reúne o belga, o francês, o italiano e o espanhol;
3º) eslavo;
4º) uralo-altaíco (neste grupo racial, o índice de suicídio é mínimo e, por
isso, não é trabalhado por Durkheim).
Dados estatísticos que distanciam a relação entre raça e o suicídio
Tratando da questão da raça como causa para o suicídio, Durkheim
identifica nos dados estatísticos divergências entre as nações pertencentes à mesma raça
(p. 74-75):
• na raça eslava (baixo índice de suicídio): a Boêmia (uma nação) conta
com 158 suicídios por 1 milhão de habitantes (número elevado);
• na raça celto-romana (segundo lugar no índice de suicídios): a França
com 150 suicídios por 1 milhão de habitantes (número elevado) e a Itália
com 30 suicídios por 1 milhão de habitantes (número baixo);
• na raça germânica (primeiro lugar no índice de suicídios): o Flamengo
com 50 suicídios por 1 milhão de habitantes (número baixo) e os anglo-
saxões com 70 por 1 milhão de habitantes. Nesta raça, apenas os
alemães tem uma taxa de suicídio elevada.
• Mas, na Áustria que tem alemães misturados em proporções diferentes
nas províncias, apresenta dados que mostram que o fator racial alemão
não é determinantes para o suicídio (cf. Quadro VII, p. 77): nas
províncias puramente alemãs o índice de suicídio é mais baixo que nas
províncias de minoria alemã. Com isso, Durkheim afirma que não é
possível verificar a influência alemã nos índices de suicídio na Austria.
O mesmo foi verificado na Suíça, que tem raças alemã e latina juntas (p.
77-78).
Verifica-se, então, uma discrepância entre nações de mesma raça
apresentando taxas de suicídios diferentes. E com isso, a raça não parece ser um
elemento fundamental na propensão ao suicídio. E, assim, diz Durkheim:
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“(...) temos razões para indagar se o que diferencia as sociedades e os
grupos assim chamados étnicos não é antes o desenvolvimento desigual de
sua civilização.” (p. 75)
“Assim, quando um alemão e o eslavo vivem no mesmo lugar social,
sua tendência ao suicídio é sensivelmente a mesma. Por conseguinte, a
diferença que se observa entre eles, quando as circunstâncias são outras, não
está vinculada à raça.” (p. 78).
“(...) se os alemães se matam mais do que os outros povos, a causa
disso não está no sangue que corre em suas veias, mas na civilização em
cujo seio eles são educados.” (p. 79)
Os dados referente ao suicídio na França e a distribuição geográfica francesa
também é utilizado por Durkheim para refutar a tese da raça no suicídio: a França, na
época de Durkheim, estava divida em duas partes: a) do Centro e do Sul e b) do Norte
• Populações do Centro e do Sul: com gênero de vida próprio, sem
absorção das ideias e costumes do Norte;
• População do Norte: onde se encontra o foco da civilização francesa.
Nesta região, a taxa de suicídios é maior. Sobre isso, explica Durkheim:
“Se, então, as pessoas do Norte se matam mais do que as do Sul, não é
porque sejam mais predispostas em virtude de seu temperamento étnico; é
simplesmente porque as causas sociais do suicídio se encontram mais
particularmente acumuladas ao norte de Loire do que ao sul.” (p. 84).
Logo, mais uma vez, Durkheim ressalta que as raças se misturam e se
perdem. As razões históricas é que são determinantes.
III
A hereditariedade do suicídio – questionamento pela sua (in)
demonstrabilidade científica
Se considerar a raça como fator importante à prática do suicídio implica em
admitir que este é hereditário. Com isso o suicídio seria transmissível geneticamente.
O indivíduo, assim, teria um estado orgânico determinado que o conduziria aosuicídio (p. 85).
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Segundo os psicólogos, o suicídio se passa direta e integralmente dos pais
aos filhos. Por essa teoria racial e hereditária, o suicídio é produzido
automaticamente, como um mecanismo psicológico. Por esse pensamento as causas
do suicídio são individuais (p. 86).
O questionamento de Durkheim encontra-se no seu interesse de construir
uma ciência da sociedade. Assim, a hereditariedade é questionada quanto à sua
demonstrabilidade científica. E, na questão do suicídio, se a hereditariedade fosse
válida, três condições deveriam estar presentes (p. 86-87):
a) Repetição de casos em números consideráveis: os casos de suicídio
encontrados na família não podem ser mais ou menos frequentes;
b) Que não houvesse outra explicação;
c) Que não fosse contrariado por nenhum outro fato – neste capítulo
Durkheim apresenta vários questionamentos.
Hereditariedade do suicídio nos loucos
Para questionar a hereditariedade no suicídio, Durkheim faz a ressalva que
muitas das observações feitas sobre a hereditariedade do suicídio envolvem os loucos
(p. 89):
• No caso da loucura, a hereditariedade não se refere ao suicídio.
• O que é transmitido é a anormalidade mental – e não propriamente a
hereditariedade suicida: “Podemos indagar, portanto, se é a propensão
ao suicídio que é hereditária ou se não é, antes, a alienação mental, da
qual essa propensão é um sintoma frequente, no entanto acidental.” (p.
89)
• A loucura não necessariamente leva ao suicídio.
Durkheim apresenta algumas premissas e conclusões lógicas sobre a relação
entre alienação mental e suicídio:
“(...) não está provado que o suicídio sempre se repita apenas nas famílias
de alienados”2 (p. 90).
“Nem todo louco é levado a se matar.” (p. 90)
2 Isto é, os loucos.
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A contagiosidade do suicídio
Refutando a teoria de raça e de hereditariedade, Durkheim defende a ideiade que o suicídio é contagioso, pois (p. 90):
a) Os indivíduos se sentem próximos às sugestões e às ideias de suicídio
em particular;
b) Os indivíduos tendem a repetir um ato ao qual já tem certa propensão,
ou seja, acolhendo facilmente a ideia de se matar.
Para argumentar a favor da contagiosidade do suicídio, Durkheim afirmaque o suicídio é reproduzido de maneira quase idêntica aos exemplos de seus
antepassados (por enforcamento, por asfixia, etc.). Assim, quem se suicidou exerce
uma influência contagiosa sobre os descendentes (p. 91). Afirma Durkheim:
“Pois é preciso que essas lembranças os obsedem3 e os persigam para
determina-los a reproduzir, com fidelidade tão exata, o ato de seus
antecessores.” (p. 91).
Casos de suicídios que ilustram o pensamento de Durkheim sobre a
contagiosidade:
• Exemplo 1: 15 inválidos que, em 1772, se enforcaram sucessivamente
num mesmo gancho existente no corredor escuro do hospital. O gancho
é o elemento comum nesses 15 suicidas;
• Exemplo 2: no acampamento de Boulogne, um soldado atira em sua
própria cabeça dentro de uma guarita; em poucos dias, outros soldadosimitam a ação. A guarita é o elemento comum nesses suicidas.
• Nesses casos, afirma Durkheim, o elemento comum evocou a ideia do
suicídio em todos eles, influenciando a prática do ato (p. 91-92).
Dados estatísticos que desconstroem a hereditariedade do suicídio
Dados estatísticos sustentam a ideia de Durkheim de que o suicídio não é
transmitido por hereditariedade:3 Obsedem: causar obsessão em alguém.
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1º dado) o suicídio masculino é muito mais comum que os suicídios
femininos. Pela hereditariedade, o determinismo psíquico deveria incidir mais ou
menos igualmente os dois sexos (p. 93-94).
2º dado) o suicídio só aparece na fase adulta, especialmente na velhice.
As doenças propriamente hereditárias se manifestam nos primeiros anos de vida. Ex: o
caso da “tísica4”, que a causa pode ser hereditária se houver a manifestação da doença
nos primeiros 3 meses de vida; mas essa probabilidade hereditária deixa de existir se a
doença surgir após os 15, 20 ou 30 meses após o nascimento (p. 94).
Durkheim traz essa explicação médica para o campo da Sociologia para
argumentar que o suicídio não pode ser determinado pelo fator hereditário, pois o
suicídio é muito raro entre as crianças (p. 95). E, em contrapartida, o suicídio é muito
mais frequente nos idosos (p. 96).
Durkheim indica que o que é determinante para o suicídio é a “ação
progressiva da vida social” (p. 99). Assim, cresce a incidência do suicídio na medida em
que os homens se envolvem mais na sociedade (p. 99). Com isso, ao defender a
influência do meio social, a indicação que Durkheim faz nesse capítulo é que o suicídio
tem causas sociais.
4 Tísica significa “tuberculose pulmonar”, conforme definição do Dicionário Aulete.