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8/13/2019 VOCS. QUE ODEIAM OS MORTOS - Roberto Alvim
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VOCS. QUE ODEIAM OS MORTOSpor roberto alvim 2013
I
AQUELA QUE REGISTRA.deitadosde costas
voltas e voltas e reviravoltasa rapidez vertiginosa de um peo
a bater sem pararfora surpreendenteno leitonos mveis
nunca o mais leve cansaoo tempoque durasse
voltas e voltas
fome de lobo s vezesnadasaciava
O MENINO.devorei at a ltima de todas as mas um grande
cesto
AQUELA QUE REGISTRA.inchava-lhes o ventre a impresso:
O OUTRO MENINO.uma bola a rolardentro do estmago
O MENINO.
aqui
O OUTRO MENINO.um animal vivose agita
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A VELHA.as pernas dos pequenos pegavam-se umas s outrascomo entrelaadase no haviafora humanacapaz de separar
AQUELA QUE REGISTRA.Teobaldo8 anos um esqueletinho ambulante
A ME.A VISO
O MENINO.um fantasmaextraordinrio fantasmameu mestre
A ME.O FANTASMA
O OUTRO MENINO.bico de patounhas de gatops de bodeo corpo cobertocompletamentepenas
sujas
A ME.sobrevoando o leito da criana
O MENINO.agora
A ME.ameaando estrangul-lo
O OUTRO MENINO.sou bom fogueiroou no sou?se vierem para minha casanunca vo passarfrio
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AQUELA QUE REGISTRA.O corpo de cada um dos irmos era habitado por dois espritos infernais.
A ME.EM NOME DE DEUS
A VELHA.Oribase
Yps
O OUTRO MENINO.conde do inferno comandante71 legies
AQUELA QUE REGISTRA.um dos demnios que possuam o outro irmo:
O MENINO.Solalethiel
AQUELA QUE REGISTRA.No foi possvel conhecer o nome de seu companheiro.
(risos que se espalham.toca-se um sino: trs vezes.os risos cessam)
A FILHA.por quem est dobrando?
O OUTRO MENINO.por seu pai
A FILHA.MENTIROSOmeu pai?est vivo boa sademeu paitrabalha agora a construo do seminrio
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O OUTRO MENINO.no disse que nomas caiu
no acredita?olha
veja
(grito longo da FILHA.O MENINO se volta para uma outra mulher)
O MENINO.bbada imunda no serve para nada mais nadanunca ouviu tua me?
A ME.no se embriague
O MENINO.e mesmo assim foi at
A BBADA.l?
O MENINO.para beber e beber mais uma vez voc
A BBADA.eu?
O MENINO.vocsa causa da doena
A BBADA.minha filha?
O MENINO.sua morte
(a BBADA cai lentamente de joelhos)
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AQUELA QUE REGISTRA.Muitos pormenores, crimes horrveis cometidos no passado, vieram a ser revelados pelos doispossessos.Nada mais / podia permanecer oculto para /
OS DOIS MENINOS.
NS
A VELHA.as crianas estavam sentadas duas cadeirasse ergueram no armos invisveisdepois caram as cadeiras para um lado os rapazinhosparao outro
UMA FREIRA.uma tarde cinzaesta tarde agora eucom os pequenosnaquele tempo hoje pouca gente se chegava a eles
A BBADA.Lcifer anda nos bailes
AQUELA QUE REGISTRA.a me?
fazendo a cama
acendendo uma vela
A ME.vemvamos deitar
(o som de uma porta que se fecha.tempo.ouve-se o vento que sopra ao longe)
A FREIRA.O pensamento do paraso, perdido por sua culpa, para Sat uma pena atroze indescritvel.
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O OUTRO MENINO.AHQUE ESPLENDOR L EM CIMAQUE ESPLENDORSE PUDESSEPOR UM INSTANTE DE VOLTA LUM NICO MOMENTO
UM INSTANTE A ALEGRIA AQUELA GLRIATER DE VOLTA A GLRIAFELIZENTOCOMO SERIAE PODER PODER VOLTAR ENFIM
VOLTARE V-LO
VER O PAIFACE A FACE
A FREIRA.por onde?
O OUTRO MENINO.NUNCA MAIS
A FREIRA.por ondevoltaria?
O OUTRO MENINO.rastejar milhares de anos
sobre bicos de agulhas caminharlminasafiadas
O MENINO.sangro?
O OUTRO MENINO. que o inferno no como os homens imaginam o infernodesejadesejaser destrudo
destrudo
(silncio)
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O MENINO.agora temos que ir
(os dois meninos caem ao cho.longo silncio)
A FREIRA.o jardim em frente casa antiga:majestosauma coluna de granito10 metros de altura e negratoda negraa base do monumento uma inscrio:
A ME.em perptua memriados dois endemoninhadosmeninos mortos neste anodo Senhor.
INTERMEZZO I
PRIMEIRO TELOGO.obsesso diablicaantiga expresso cada vez menos empregadaincapaz de traduzir os eventos que ora nos assolam:no se trata de um distrbio advindo do interior do corpo
mas de uma usurpao de domnio / uma ocupao / posseque d ao demnio os poderes de um dono
SEGUNDO TELOGO.chamamos demnio a este mal / personificando numa entidade especfica / fora de nsaquela parte obscura do ser que / l no fundo / volve e revolve em treva densae que parece constituir a fora propulsora / destes males todos
PRIMEIRO TELOGO.os meios e instrumentos habituais da medicinainadequados para iluminar a parte mais tenebrosa destecone de sombra/ tringulo de vrtice para baixoque pode muito bem representar o demonaco / em cada um de ns
SEGUNDO TELOGO.demonaco / que tal como a mais devastadora energiapoderia ser transformado e posto a servio de fins criadores?
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PRIMEIRO TELOGO.mas se isto no possvel nem cinciaento?
SEGUNDO TELOGO.estes males todos
PRIMEIRO TELOGO.entotorna-se imperiosa a interveno / algum
SEGUNDO TELOGO.ou alguma coisa?
PRIMEIRO TELOGO.o poder de levar a luz s regies mais negras
SEGUNDO TELOGO.aquinestes outros domnios?outros mtodos / outros instrumentos
PRIMEIRO TELOGO.a possibilidade de mobilizarpara alm das foras obscuras
SEGUNDO TELOGO.
foras espirituais
PRIMEIRO TELOGO.capazes de tirar ao mal desencadeado sua virulncia destruidora
SEGUNDO TELOGO.procedendo assim no se oblitera o tringulo escuro que parece condenar o ser humano emsua presente condio / mas restitui-se ao demonaco a possibilidade de elevao / afirma-seno verme /enlouquecido / feroz / a faculdade final de vir a transformar-se em...
PRIMEIRO TELOGO....angelicalmariposa.
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II
A MULHER VELHA.quem voc?
A POSSESSA.leia
A MULHER VELHA.e depois?
A POSSESSA.os cabelos se desenredam
A MULHER VELHA.VOLTA PARA O INFERNO
A POSSESSA.este corpo minha casa
estou em casa
(a MULHER VELHA abre o livro indicado a Bblia.l uma passagem)
A MULHER VELHA.Jesus lhe perguntou
qual o seu nome?e Satlhe respondeu:
meu nome Legioporque eu souuma multido.
A POSSESSA.QUE MINHA PESTETE DEVORE
AQUELA QUE REGISTRA.a mulheraos 13 anos pela primeira vez o mal-estarmisteriosoindefinvel sensao
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A POSSESSA. como uma dor que desatina
AQUELA QUE REGISTRA.j h 10 anos agoraafligindo atormentando
a dor dia e noite mas principalmente
A POSSESSA. noite
AQUELA QUE REGISTRA.repetidas vezes submetida exames mdicos tratamentos vriosinternada para observao hospitais e clnicas
MULHER 1.perfeitamente s em todas as partes do corpo
AQUELA QUE REGISTRA.at que
MULHER 2.possuda?
MULHER 3.est possuda?
A POSSESSA.MEU NOME LEGIOPORQUE EU SOUUMA MULTIDO
MULHER 4.uma manh de solesplndida manh estauma praaaquipessoas uma vriasmuitas
e a mulhercom passo desenvoltoatravessando a praa calmae sorrindo
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A POSSESSA.um sorrisoos olhares
MULHER 4.a mulher e os olhos
nos olhos dos outros
O HOMEM.regna terrae cantate deo psallite dominetribute virtutem deoexorcizamus te omnis immundus spiritus omnis satanica potestasomnis incurso infernalis omnis legio omnis congredatioet secta diabolicaergoperditionis venenum propinarevade satana inventor et magister omnis fallaciaehumiliare sub potenti manu deiinvocato a nobis sancto et terribile nominequem inferi tremuntabinsidis diaboliliberanosdomine
A POSSESSA.neste instanteum dos que esto aquiacaba de pensar que voc acaba l embaixopor enganar todas estas almas
O HOMEM.quem ?
A POSSESSA.aquelaque olha aquelasque no vemcegas e surdas
SAIAMno tem autorizao para estar aqui
OHOMEM.liberanos domine
APOSSESSA.neste instante outro instante agorauma grande pecadora observa sem ver e chora sem entenderme manda pra ela ou expulsa daqui
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OHOMEM.no posso te mandar pra ela nem para ningum
APOSSESSA.(sorrindo)est perdida
j est perdida
MULHER4.soou o meio-dia os fiisescuta?cantando o angelusa possessa uivando como loba debatendo-sefuriosa
APOSSESSA.alguma coisaou algum a sair da minha bocaconsegue ver?
saiuum esprito
saiuoutro esprito
saramnove espritos?
vocs sentem
onde esto?suas casas quais soagora?
OHOMEM.e voc?
APOSSESSA.eu?ainda estou aqui
OHOMEM.tem que sair TE EXPULSO
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APOSSESSA.no saio por suas palavraspor esta filha tem que fazer maistem que existir de outro modoento irei outro lugaroutros?
OHOMEM.qual o seu nome?FALA
APOSSESSA.sou bonitano sou?
muito muito bonita
meu rosto voc v?o rosto do anjo?
arranquei sua pele fiz de seu rosto uma mscara para mim
e sou bonita agorano sou?
MULHER4.a mulher transfigurada assumia um aspecto terrvel
as mas da face salientes a boca abertacontorcia-se os olhos duas brasaspontinhos de fogovermelhoscomo os de umcoelho?
AMULHER VELHA.quase meia-noite entona praa da cidade antiga pessoas se amontoavampara ouvira possessa falava ora em sussurros ora em berrose contava histriascomo Jesus narrava parbolas:
o que um rato / que passeava na sarjeta / disse ao ver um morcego que voava / perdido?
"deus meu!um anjo..."
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(a POSSESSA ri)
OHOMEM.(exausto)
VOLTAPARA O INFERNO
APOSSESSA.AINDAESTOU
AQUI
o Inferno no est limitado a um nico lugarpois onde estamos o Infernoe onde o Infernoldevemos TODOSestar
MULHER2.Inferno?
AQUELAQUE REGISTRA.sbito
MULHER3.onde o Inferno?
AQUELAQUE REGISTRA.outra voz
MULHER4.l devemos todos
AQUELAQUE REGISTRA.outras vozes outras novesaindo pelas bocas de outras nove mulheresas mulheres que observavam e ouviam e choravame que agora sorriame falavamcomo se outros falassem atravs delas
MULHER1.se deus me enviou at aqui
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MULHER2.se deus me enviou porque vocs so merecedores
MULHER3.vocs
MULHER2.merecedores da minha presena
MULHER4.NS
MULHER2.vivo sou tua morte
MULHER1.morto serei tua pesteminha herana
MULHER3.tua peste
MULHER2.a herana do pai
MULHER3.pai?
MULHER4.sim
minha herana tua peste
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INTERMEZZO II
SEGUNDOTELOGO.deus est em tudoconforme a crena?mas tudo vai vivendo demais
se remexendo demais...deus estaria mesmoera se tudo se esbarrassepor uma vezse confundisse...o demnio:na ruanas casasnas camas...quem sabe dele o corvoo gavioa gaivota esses pssaroseles esto sempre no altoapalpando os ares com os ps penduradosos pequeninos olhos remedindoa alegriae as misrias todas...
PRIMEIROTELOGO.sata figura mais importante da Histria da Almasua vida a grande aventurado mal?
que o demnio
amoudemais...
III
AME.por que entrou neste corpo?
AFILHA.por um amorimenso amorno correspondido
AME.no correspondidopor quem?
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AFILHA.no entende...
AME.responde:quem no correspondeu ao seu amor?
AFILHA.(tocando o prprio peito)estecorpo...
( )
A ME.ANTES DE TUDO
antes de tudo preciso acreditartudoo que vemostudoo que somos:fa f que nos sustenta a f que nos guiacomo uma estrela no deserto do mundo um farol no mar apontando o caminho na turbulnciaviolenta de nossas vidasuma vela na escurido vocs crem?
VOCS CREM?
dvidas muitasem vocs eu sintoas dvidas so como um cncerse multiplicam comendo a base de nossas casas uma infiltrao que devoraat que nosso esprito se torne cinzase no fim do arco-ris tudo o que encontramos a morteescuravaziasem sada isto o que queremos?
j fui como vocsctica perdida em um universo sem sentidofui como vocs compreendo sua ignorncia no tm culpa:so como crianas perdidaslonge de casae por isso que estou aqui lhes falando esta noitepara trazer as crianas de voltaestiveram separadas do conhecimento por muito tempo chegada a hora de retornar
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AFILHA.Uma casa. V? uma casa, sim: janelas. A porta de entrada, de madeira. A casa por dentro.Ns estamos em uma sala. Alguns quadros na parede, cadeiras, uma mesa, um sof. As luzesesto apagadas, ainda dia. O corredor que d para os quartos. VENHAM COMIGO. O quartodos pais, uma cama larga a luz plida da tarde entra pela janela e deita sobre a cama, a luzbranca sobre o cobertor do quarto dos pais. Um porta-retratos na mesa de cabeceira. Uma fotoantiga: esto sorrindo. Parecem felizes, mas h uma sombra, eu sinto. Est escurecendo
rpido. O corredor, de novo. Um outro quarto. O armrio com roupas pequenas, a mesa comtrabalhos de escola, lpis de cor. o quarto da criana. A casa est vazia. domingo. A famliasaiu para almoar. Tudo quieto. Faz frio na casa vazia. Pouco a pouco anoitece, nesta tarde dedomingo. Uma imagem do passado. Da infncia de algum de ns. No existe mais: a casa, osquartos, a antiga foto da famlia. A imagem vem da infncia. Vem do passado. O passado deum OUTRO. Vocs?
AME.OS VIVOS. Os mortos, Deus, Sat. Fantasmas, assim que chamam os que ignoram, no ?Espritos demnios? Como em uma represa: esto trancados do outro lado, nossos mortos,trancados como em uma represa. Querem sair, querem falar, querem que saibamos. Eu tenhoa chave. Em verdade, o OUTRO a chave. E o OUTRO est em voc.
AFILHA.VOC. Me olhava, naquela manh. Eu fazia qualquer coisa e voc me olhava. Ficou assim pormuito tempo; queria falar, eu podia sentir. Mas no conseguia. Ficou em silncio; quandolevantei meus olhos em sua direo, voc desapareceu. Mas eu sabia, sempre soube o quequeria, o que precisava dizer. Naquela manh, agora: no h mais medo, nem angstia. AMORTE NO EXISTE? Eu quero que voc saiba. Quero que saiba que eu amo. E que vou estarsempre, sempre a seu lado, em voc. Vem.
VEM
AME.pensem em seus mortos
O FILHO MORTO.Nasci h 70 anos, e a pobreza da minha infncia resumiu minha vida busca de umcasamento. Me livrar das privaes que meu pai, minha me me impuseram. Conheci meumarido ainda muito jovem e me agarrei a ele com a fome dos que desesperam. Uma casa, um
jardim, algum para cuidar: era tudo. E a felicidade, eu acreditava, a felicidade at o fim.
Engravidei logo e logo meu filho nasceu. Vivamos nossa vida e tudo era bom. No saa,fechada em meu universo particular de felicidade e perfeio. Mas, como dizem os antigos, tolo o homem que se diz feliz antes que tenha chegado seu ltimo instante. E mesmo negando,mesmo me recusando a aceitar, mesmo sem que eu pudesse compreender, mesmo assim oplano de Sat se manifestou para mim.
Meu filho morreu aos 15 anos de idade. Leucemia, foi o que os mdicos disseram. Incurvel.Vinha do sangue dos pais. Teria vindo de mim ou do meu marido, a maldio? No sabia, porisso culpei a ns dois.
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Vivi como uma suicida nos anos seguintes. Frequentava festas, bailes, pequenos infernos.Comecei a beber. Muito. Meu casamento estava destrudo, mal nos falvamos, eu e o estranhoque dormia a meu lado. A casa se tornou o ltimo lugar. A evitava, compreendem? Passava asnoites na rua, voltava de madrugada, depois de ter me embriagado at quase desmaiar.Quando amanhecia, tropeando nas latas de lixo debaixo da luz escura dos postes, e meaproximava do antigo paraso do qual tinha sido expulsa, a sensao de tristeza era to forteque muitas vezes dei meia volta, a caminho do ltimo bar, meu lar de adoo. Passar pelo
quarto do meu filho morto, que eu no permitia que fosse tocado por ningum, sua cama, suasroupas, seus brinquedos... No. Eu no podia.
Misteriosos so os caminhos do antigo esprito, e insondveis os seus desgnios. Pobre dohomem que olha para o Sol e no v mais que uma pequena esfera luminosa: esse cair porsua arrogncia. Muitos de vocs que aqui esto, eu sei, posso sentir, se encontram hojeexatamente no mesmo purgatrio em que eu vivia naqueles anos. Outros ainda no foramexpulsos do paraso que criaram para si mesmos, mas escutem: o monstro est na prximaesquina. O acidente, a doena. No h como fugir. Simplesmente porque esse no o desejodo OUTRO. O ensinamento vir, cedo ou tarde. Pode nos destruir, como quase fez comigo. Oupode nos salvar. Por isso eu falo a vocs: para que saibam. Como eu soube, finalmente.
porque um diameu filhofez contatoe falouatravs de mim
( )
A ME.acabouno vai acontecer de novo
nunca maisest tudo bem agora a porta se fechou est fechadaest tudo bem
A FILHA.bem?
A ME.agora? simtudo bem agora
A FILHA.para vocsbem enfim masapenas para vocs
VOCS.QUE ODEIAM OS MORTOS
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INTERMEZZO III
PRIMEIRO TELOGO.hoje cedo de manhvoc bateu na minha porta foi quandoe eu disse
SEGUNDOTELOGO.ol Satacho que est na hora de ir
PRIMEIROTELOGO.eu e o demnioandando lado a lado
SEGUNDOTELOGO.lado a lado juntosvoc e o outro
PRIMEIROTELOGO.caminhando juntos agora
SEGUNDOTELOGO.deve ser o velho esprito enterrado l embaixo na terra
PRIMEIROTELOGO.VOC PODE ENTERRAR MEU CORPO
L EMBAIXONA BEIRA OS TRILHOS
SEGUNDOTELOGO.ento morto meu velho espritoe poder
PRIMEIROTELOGO.finalmente enfim
SEGUNDOTELOGO.poder enfim ele agora voctomar aquele este trem?
PRIMEIROTELOGO.(sorrindo)carregado de passageiros
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SEGUNDOTELOGO.voc eu mesmo ele o trem carregadoos passageiros e o condutor
PRIMEIROTELOGO.e eu mesmo e os outros de mim
diferentes uns dos outros eu e estes outros aqueles?os passageiros eu
SEGUNDOTELOGO.todos eles nsTODOS
PRIMEIROTELOGO.morto ento
tomar aquele este trem
gigante carregado de outrose conduzi-loenfim
SEGUNDOTELOGO.para onde?