UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ
SETOR DE CIÊNCIAS HUMANAS
CURSO DE CIÊNCIAS SOCIAIS
THAIS MADEIRA FILIPI
MINISTROS DA FAZENDA E POLÍTICA ECONÔMICA: UM ESTUDO DO
DESENVOLVIMENTISMO BRASILEIRO (1930-1964)
CURITIBA
2015
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UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ
SETOR DE CIÊNCIAS HUMANAS
CURSO DE CIÊNCIAS SOCIAIS
THAIS MADEIRA FILIPI
MINISTROS DA FAZENDA E POLÍTICA ECONÔMICA: UM ESTUDO DO
DESENVOLVIMENTISMO BRASILEIRO (1930-1964)
Monografia apresentada ao Curso de Graduação em Ciências Sociais, Setor de Ciências Humanas, Universidade Federal do Paraná, para conclusão do curso e obtenção do grau de Bacharel. Orientador: Prof. Dr. Renato Monseff Perissinotto
CURITIBA
2015
4
AGRADECIMENTOS
Gostaria de agradecer a todos (as) que contribuíram com este trabalho,
de uma forma ou de outra, como os amigos e familiares mais próximos, meu
companheiro, os colegas do Núcleo de Pesquisa em Sociologia Política
Brasileira, o orientador – que prestou todo o suporte possível – e outros
professores do Departamento de Ciências Sociais (DECISO), pelas dúvidas
que ajudaram a sanar. Além do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação
Científica (PIBIC), do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e
Tecnológico (CNPq), pelo apoio financeiro.
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RESUMO
O objetivo desta pesquisa é saber se existe alguma relação entre o perfil
dos ministros da Fazenda e o padrão de política econômica existente entre os anos de 1930 e 1964. A nossa hipótese é de que não existe essa relação. Para tanto, sistematizamos, de um lado, os dados (de carreira e ideologia econômica) dos ministros da Fazenda que ocuparam o cargo durante o período (às vezes mais de uma vez), usando o método prosopográfico, e, de outro, as medidas de política econômica por eles efetivadas. Os ministros analisados foram aqueles que ocuparam o cargo por pelo menos trinta dias. Concluímos que as razões de indicação de um ministro têm muito mais a ver com questões políticas conjunturais do que com problemas relativos à política econômica. Palavras-chave: Desenvolvimentismo; Ideologia econômica; Política Econômica; Elites políticas.
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ABSTRACT
This paper aims to verify the existence of a connection between Ministers of Finances’ social, occupational, institutional and ideological characteristics and the pattern of economic policy from 1930 to 1964. Initial hypothesis denies such existence. Therefore, ministers’ decisions over the economic policy and information concerning ministers’ career and ideological affiliation were systematized, the later through the prosopographical method. Ministers’ were those who occupied office at least for 30 days (sometimes more than once). Conclusions indicate recruitment as a result of political conjuncture circumstances rather than issues related to the economic policy.
Keywords: Developmentism; Economic ideology; Economic policy; Political elites.
7
Lista de Siglas
BNDE – Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico.
CPDOC – Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do
Brasil.
Cexim – Carteira de Exportação e Importação.
Nusp - Núcleo de Pesquisa em Sociologia Política Brasileira.
SUMOC – Superintendência da Moeda e do Crédito.
8
Lista de quadros, gráficos e tabelas
Quadro 1. Organograma do Ministério da Fazenda, p. 31
Quadro 2. Órgãos gerenciadores da política econômica e suas atribuições, p.
40
Quadro 3. Resumo da orientação geral das políticas econômicas adotadas
entre 1930 e 1964, p. 54
Gráfico 1. Comparação entre a permanência em meses dos ministros - por
governo e pasta ocupada, p.32
Gráfico 2. Tempo de carreira dos ministros por governo, p. 42
Gráfico 3. Distribuição dos tipos de cargo em relação ao total de cargos
ocupados pelos ministros, p. 43
Gráfico 4. Tipos de cargos ocupados por governo, p. 44
Gráfico 5. Distribuição da orientação em ideologia econômica por governo, p.
47
Gráfico 6. Condições de nomeação por governo, p. 52
Gráfico 7. Motivos de saída por governo, p. 53
Tabela 1. Região de nascimento, p. 35
Tabela 2. Curso de graduação, p. 35
Tabela 3. Instituição de graduação, p. 37
Tabela 4. Ocupação Profissional, p. 38
Tabela 5. Ocupação imediatamente anterior à nomeação, p. 39Tabela 6.
Tabela 7. Partido no momento da nomeação, p. 45
Tabela 8. Orientação - ideologia econômica, p. 46
Tabela 9. Nomeação dos ministros, p. 51
Tabela 10. Motivos de saída da pasta, p. 52
9
SUMÁRIO
Introdução ........................................................................................................ 10
Capítulo 1. Desenvolvimentismo: o contexto histórico, político institucional e ideológico ......................................................................................................... 14
Contexto político ........................................................................................... 14
Evolução institucional da elaboração da política econômica ........................ 17
Os atores políticos ........................................................................................ 22
Capítulo 2. Os ministros e seu perfil ................................................................. 28
Inserção institucional: o Ministério da Fazenda ............................................ 29
Quem são os ministros ................................................................................. 33
Capítulo 3. Os ministros e suas medidas ......................................................... 50
Conclusão ........................................................................................................ 58
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ................................................................. 61
ANEXO I ........................................................................................................... 64
ANEXO II .......................................................................................................... 65
ANEXO III ......................................................................................................... 67
10
Introdução A partir de 1930, com a revolução liderada pela Aliança Liberal, tem
início uma série de mudanças qualitativas na forma como o Estado passou a
conduzir a vida pública e os assuntos econômicos. Tornou-se fundamental,
portanto, a questão das escolhas tomadas quanto ao rumo do desenvolvimento
que deveria ser seguido.
Observou-se um envolvimento cada vez maior do poder central no
controle da estrutura administrativa e nas decisões de política econômica – e
de forma distinta daquele que eventualmente ocorria durante a Primeira
República – inaugurando o período que pode ser denominado como
“desenvolvimentista”.
O termo “desenvolvimentismo” pode ser usado para caracterizar tanto
um conjunto de práticas de política econômica quanto correntes de
pensamento ou discursos políticos (Fonseca, 2014, p. 02). A partir do
entendimento de Bielschowsky, ele seria a ideologia de transformação da
sociedade brasileira composta a partir de alguns elementos considerados
fundamentais. Seriam eles, por exemplo, a percepção de que a industrialização
integral viabilizaria a superação da pobreza e do subdesenvolvimento, sendo o
Estado ator fundamental nesse processo, com as funções de planejar,
promover, coordenar e executaras atividades econômicas de acordo com o
projeto definido como desejável para os propósitos do desenvolvimento
(Bielschowsky, 1988, p. 07).
A proposta do presente trabalho é avaliar esse processo do ponto de
vista de um segmento da elite estatal, quais sejam, os ministros da Fazenda,
titulares e interinos, que ocuparam o cargo por pelo menos trinta dias entre
1930 e 1964, totalizando 33 ocupações na pasta e 31 ministros.
Para tanto, será empregado o método histórico-bibliográfico e o método
prosopográfico. O primeiro consiste na consulta de literatura tanto descritiva do
processo de industrialização, quanto da história da política econômica e da
história política geral, e o segundo no estudo coletivo da vida de alguns atores
da sociedade, o que envolve a sistematização da distribuição de características
e atributos da trajetória desses indivíduos (Stone, 2011, p. 116).
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Para a dimensão histórico-bibliográfica, será acrescentada ao exame da
literatura disponível sobre os assuntos tratados, a consulta aos verbetes
biográficos disponíveis no website do Centro de Pesquisa e Documentação de
História Contemporânea do Brasil (CPDOC), da Fundação Getúlio Vargas. O
mesmo recurso será utilizado para a dimensão das biografias coletivas, mas
sua sistematização se dará de forma distinta. Os dados serão recolhidos em
uma planilha a partir de variáveis consideradas relevantes para cumprir os
propósitos do método prosopográfico. Elas foram organizadas no Núcleo de
Pesquisa em Sociologia e Política Brasileira, e são compostas por dados sobre
identificação dos ministros, informações da pasta, dados de escolaridade,
dados sobre herança política familiar, cargos ocupados na carreira privada,
cargos ocupados na carreira pública, participação em conselhos econômicos,
filiação partidária e ideologia econômica.
Essa última será sistematizada de outra forma. Será seguida a tipologia
de Bielschowsky1 (1988), segundo o qual o período – ciclo ideológico do
desenvolvimentismo – possui três grandes correntes de pensamento, e o
pensamento independente de Ignácio Rangel. Faz parte da tipologia o
pensamento neoliberal, o pensamento desenvolvimentista – subdividido em
três, de acordo com concordâncias e divergências relacionadas a questões tais
como o grau de intervenção estatal desejável na economia e as relações com o
capital estrangeiro – como o setor público não-nacionalista, o setor privado e o
setor público nacionalista, e a corrente mais “à esquerda”, o pensamento
socialista. De acordo com a literatura consultada, as ideias em debate, tanto
econômicas quanto políticas, moldaram de forma significativa as decisões de
política econômica do contexto em questão (Benevides, 1976; Bielschowsky,
1988; Draibe, 1985; Fonseca, 1989; Leff, 1977, entre outros).
Como os dados disponíveis, pelos seus próprios propósitos, não
abordam a ideologia econômica dos ministros de forma específica, e como não
é pertinente uma abordagem rígida quanto a tal classificação (as ideias
econômicas estavam, de maneira geral, dispersas e interligadas a um sem
número de outros posicionamentos políticos e de valores pessoais), os dados
1 Um esforço similar de localização ideológica dos atores políticos segundo a tipologia de
Bielschowsky foi feita por Sérgio Braga. Ver Elites Políticas e Alternativas de Desenvolvimento na Redemocratização de 1945-1946, Curitiba, História Econômica & História de Empresas, v. 2, p. 75-106, 2002.
12
serão sistematizados de maneira flexível, a partir de posicionamentos
declarados.
Os ministros da Fazenda serão abordados como um segmento da elite
estatal segundo uma definição posicional e institucional, responsáveis por
decisões de alcance nacional (Perissinotto, 2009, p. 52). Deve ser enfatizado
que tais atores estavam inseridos em uma estrutura social e econômica
específica, em um dado momento de um movimento mais geral do processo de
mobilidade social, de tal forma que informações sobre seus perfis podem dizer
algo a esse respeito (Guttsman, 1960, p. 147). Nesse sentido, os estudos
prosopográficos, teriam por propósito
[...] dar sentido à ação política, ajudar a explicar a mudança ideológica ou cultural, identificar a realidade social e descrever e analisar com precisão a estrutura da sociedade e o grau e a natureza dos movimentos em seu interior (Stone, 2011, p. 116).
A sistematização das informações referentes ao background dos
ministros (distribuição de características e atributos) oferece a possibilidade de
vincular a trajetória desses indivíduos à história institucional, permitindo
compreender a inserção política dos mesmos nesses espaços. Sendo assim,
recorrer à sistematização dos dados biográficos não é um fim em si mesmo,
mas uma forma frutífera de análise dos processos sociais dos quais tais
indivíduos fizeram parte (Ferrari, 2010, p. 548). Ainda, a mobilização de
variáveis como idade, escolaridade, ocupação, região de nascimento e as
outras abordadas aqui podem oferecer pistas sobre o recrutamento dessa elite
e seus padrões de carreira (Eulau, 1977, p. 393).
Já quanto à escolha do Ministério da Fazenda, esta se justifica, entre
outros, por ter sido o locus da elaboração da política econômica no período.
Além disso, “uma compreensão exaustiva dos governos – sua composição,
estrutura e funcionamento – demanda o estudo específico de quem é recrutado
para encabeçar a política econômica” (Castillo, p. 48, tradução nossa). Este
trabalho segue um percurso lógico similar ao de Castillo, no esforço de uma
abordagem específica dos ministros da Fazenda. A preocupação do autor em
“Los ministros de Hacienda en España (1901-1986): perfil sociopolítico e
influencia” foi a de identificar se a nomeação desses possuiria ou não
características distintivas, em ótica comparativa a outros ministérios e qual
seria o escopo de influência dos ministros, principalmente na sua relação com
13
outros atores, como o chefe de Governo, outros ministros, elementos da
burocracia, grupos de pressão e outros órgãos econômicos. Soma-se a isso a
escassez de trabalhos específicos sobre os ministros da Fazenda no Brasil2,
especialmente no que diz respeito a dados sobre perfil, formas de inserção no
sistema político e o papel exercido por eles à frente da pasta3.
Ficam, portanto, questões a serem feitas. A pergunta proposta, então, é
avaliar em que medida é possível associar o perfil dos ministros da Fazenda às
decisões de política econômica no período em questão. A avaliação dos perfis
dos ministros tem por objetivo tentar responder a essa pergunta, assim como
os seus desdobramentos, conforme seguem: qual teria sido a lógica de
recrutamento para o cargo? Quais teriam sido os fatores – políticos ou
econômicos – relevantes para a escolha? As coalizões e compromissos
assumidos por parte desses setores da elite teriam sido fundamentais ou pouco
importava quem eles eram para o resultado geral das diretrizes
macroeconômicas implementadas? E, enfim, os ministros respondiam apenas
às diretrizes de seus respectivos presidentes ou seria possível identificar graus
de autonomia em sua atuação, baseado nos valores e ideologia econômica
possuída por eles?
A proposição inicial é a de que o perfil dos ministros da Fazenda pouco
tem a ver com o padrão de política econômica existente no período, pelo
menos não de forma automática. Teriam de ser levados em conta mais de um
aspecto de seus perfis4, que poderiam ser divididos em três dimensões, como
o background social (muito homogêneo, para adiantar), a construção das
trajetórias na vida pública e privada (ou seja, as instituições pelas quais
2 Tal escassez não se limitaria ao caso brasileiro. Castillo identificou como exceções trabalhos
como Blondel (1991), Larsson (1993) y Considine y Reidy (2008). Segundo o autor, com freqüência os ministros da Fazenda seriam abordados em exames mais gerais de estudos de elites políticas, apesar das contribuições parciais desses estudos sobre tais atores. Ver Castillo, op. cit. 3 Entre os trabalhos encontrados que dizem respeito ao Ministério da Fazenda brasileiro de forma específica está a sistematização das medidas econômicas de cada ministro desde o Império até 1954 de Augusto de Bulhões (1955) e o de Maria Rita Loureiro sobre o papel do Ministério da Fazenda no governo Fernando Henrique Cardoso (1999). 4 Em estudo sobre as relações existentes entre atitudes e comportamento e características do background social na análise de elites, Edinger e Searing (1967) ressaltaram que a conexão não pode ser feita sem que haja uma discriminação entre as características de perfil, algumas mais relevantes para a “previsão” de determinadas atitudes do que outras. Apesar do montante de dados mobilizados por eles, e pela natureza de suas preocupações, que diferem do proposto neste trabalho, tais considerações podem ser úteis no aspecto da vinculação entre perfil e decisões em política econômica dos ministros.
14
passaram e construíram suas carreiras) e o perfil ideológico (ou dos
posicionamentos, valores etc.). A hipótese seria a de que o segundo aspecto
seria o mais decisivo para a escolha do presidente, baseada em possíveis
expectativas das ações de tais ministros nas situações concretas de definição
de política econômica. Dito de outra forma, as indicações teriam mais a ver
com as composições políticas circunstanciais do que com tipo de política
econômica adotada no período, dotada de uma estabilidade significativa
(manutenção do Estado como principal ator na condução da atividade
econômica, com vistas à promoção da industrialização).
O trabalho está dividido em quatro partes: o Capítulo 1 dedica-se a uma
apresentação geral do contexto político do período, com a evolução
institucional da presença estatal nas atividades econômicas e do tom do debate
ideológico, além dos principais atores políticos envolvidos; o Capítulo 2 dedica-
se à exposição dos dados de perfil dos ministros, além de um breve histórico e
forma de organização do Ministério da Fazenda; o Capítulo 3 contém
considerações gerais sobre as condições de nomeação e saída dos ministros e
das medidas em política econômica tomadas por eles, e, finalmente, a seção
destinada às conclusões.
Capítulo 1. Desenvolvimentismo: o contexto histórico, político institucional e ideológico
Esse segmento pode ser dividido em três partes. Na primeira é
conveniente uma breve descrição do contexto político subjacente, com ênfase
às questões mais relevantes para o presente estudo. Na segunda parte, cabe
uma apresentação da evolução institucional da elaboração da política
econômica e as questões ideológicas a ela relacionadas, e na terceira dos
agentes políticos atuantes nos contextos apresentados.
Contexto político
A periodização básica a ser seguida considera a era Vargas, que vai de
1930 a 1945 como um intervalo, e a experiência democrática posterior, que vai
de 1946 até o golpe de 1964, como outro grande intervalo – consideradas as
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diferenças observadas entre os governos. Para aspectos relativos às atividades
econômicas, vale levar em conta, além disso, a posição do Brasil no cenário
internacional, especialmente no que diz respeito à natureza das relações
estabelecidas com os EUA ao longo do tempo.
A era Vargas compreende a fase do governo provisório, até 1934, o
governo constitucional de Vargas, que vai de 1934 a 1937 e o golpe que deu
origem ao Estado Novo, que vigorou de 1937 a 1945.
De acordo com Thomas Skidmore, o movimento revolucionário de 1930
se distinguia das outras lutas entre elites travadas até então por ter posto fim à
estrutura republicana criada na década de 1890. Havia também, segundo o
autor, uma concordância entre os atores envolvidos sobre a necessidade de
uma revisão do sistema político de então, devido ao seu descontentamento
com o exercício político das lideranças da República Velha. No entanto, a
natureza do descontentamento poderia ser distinta a depender da facção
apoiadora da revolução, tendo em vista que o conjunto de forças que a
promoveu era heterogêneo em sua composição (Skidmore, 1992, p. 26-27).
O Governo Provisório, instalado em 03 de novembro de 1930, teve suas
competências institucionalizadas através do Decreto-Lei nº 19.398. Getúlio
Vargas, chefe do novo governo, passou a ter atribuições do Poder Executivo e
Legislativo, podendo governar através de decretos-leis. O Congresso Nacional,
câmaras estaduais e municipais foram dissolvidos, situação que prevaleceria
até a eleição de uma assembleia nacional constituinte. Além disso, os
governadores estaduais foram substituídos por interventores, responsáveis
apenas perante o presidente (Iglésias, 1993, p. 234).
Nesse cenário, a heterogeneidade da “coalizão revolucionária” tornar-se-
ia preeminente. O significado político do Decreto-Lei nº 19.398 foi a
concentração de poderes do poder executivo. Assim, divergências quanto à
forma de reconstitucionalizar o país, após 1930, culminaram na Revolução
Constitucionalista de 1932, que também incorporou as insatisfações
regionalistas de São Paulo ao governo provisório. Após a derrota militar do
Estado, o presidente convocou a Assembleia Constituinte em 1933 (Skidmore,
1992, p. 31 a 39).
Com o encerramento dos trabalhos da Assembleia Constituinte, Vargas
foi eleito indiretamente presidente. Ocorreram reformas no sistema eleitoral e
16
foi instituída a representação profissional. Havia, no entanto, um novo tipo de
ativismo político, em que seguia em direção à radicalização ideológica. Nesse
contexto se encontrava a Aliança Nacional Libertadora (ANL), que concentrava
as forças “progressistas” e de esquerda e a Ação Integralista Brasileira (AIB),
movimento de cunho fascista. Somado ao cenário internacional, a radicalização
ideológica resultou no isolamento dos comunistas, especialmente após o
episódio chamado de “Intentona de 1935”. Tal ameaça teria justificado o golpe
do Estado Novo, com o apoio dos militares (Plano Cohen). (Skidmore, 1992, p.
43).
Os mecanismos de centralização política foram ampliados e
diversificados sob o autoritarismo do Estado Novo, através da construção de
um aparato burocrático-institucional de apoio ao processo de concentração de
poder por parte do Estado. A criação de novas arenas decisórias, para o
tratamento das relações entre o setor público e os grupos de interesse,
garantia, em boa parte dos casos, a primazia estatal. Os mecanismos
centralizadores criados foram o sistema de interventorias nos Estados, os
institutos, autarquias e conselhos econômicos5, sendo os dois últimos decisivos
na regulamentação, coordenação e controle de diversos setores produtivos,
novamente segundo Diniz (1991, p. 109 a 113).
A aproximação da paz, com o fim da 2ª Guerra Mundial, entre 1944 e
1945, tornou insustentável a manutenção da ditadura Estadonovista. A censura
foi relaxada e foram criados os partidos políticos que iriam atuar no período
democrático subsequente. Dois teriam a inspiração direta de Vargas: o Partido
Trabalhista Brasileiro (PTB) e o Partido Social Democrático (PSD). O principal
foco de oposição seria a União Democrática Nacional (UDN). O General Eurico
Gaspar Dutra foi eleito pelo PSD e teve início a Assembleia Nacional
Constituinte. Tal movimento significou uma dispersão do poder central, embora
não tivesse havido alterações fundamentais nesse sentido. (Skidmore, 1992, p.
72 e 94).
Passa a ser característico do período, além disso, um estilo de
procedimento político baseado na mobilização do eleitorado urbano de massas,
marcadamente personalista. Seria uma forma possível de resposta de setores
5 Um quadro geral dos institutos de regulação econômica pode ser visto no Anexo I.
17
da elite política à incorporação desse segmento ao sistema político através do
Estado (Sola, 1998, p. 19).
Evolução institucional da elaboração da política econômica
Tendo as linhas gerias da conjuntura política sido apontadas, segue uma
caracterização mais específica do caráter da política econômica, e sua
evolução institucional, ou seja, seus lugares de formulação.
Uma das formas de compreender o período abordado aqui é através do
conceito-chave denominado “desenvolvimentismo”. Pedro Fonseca (2014)
sugere que ele pode ser entendido tanto como “um conjunto de práticas de
política econômica propostas e/ou executadas pelos policymakers” quanto
como “um conjunto de ideias que se propõe a expressar teorias, concepções
ou visões de mundo”, e que podem tomar a forma de discursos políticos ou de
correntes de pensamento. O termo propriamente dito ganhou uso difundido
apenas na década de 1970, mas já era utilizado por alguns autores em meados
de 1950 (Fonseca, 2014, p. 03-09).
Vale a pena transcrever o conceito elaborado por ele:
[...] entende-se por desenvolvimentismo a política econômica formulada e/ou executada, de forma deliberada, por governos (nacionais ou subnacionais) para, através do crescimento da produção e da produtividade, sob a liderança do setor industrial, transformar a sociedade com vistas a alcançar fins desejáveis, destacadamente a superação de seus problemas econômicos e sociais, dentro dos marcos institucionais do sistema capitalista (Fonseca, 2014, p. 28).
Assim, é possível analisar a trajetória da prática governamental
desenvolvimentista6, nos termos definidos por Fonseca, e o da evolução dos
debates e delineamento das escolas de pensamento.
6Para avançar mais nesse aspecto, Pedro Fonseca definiu um “núcleo duro” para a definição
conceitual de desenvolvimentismo, através de vasta pesquisa sobre seus usos na literatura especializada. Os elementos constitutivos do núcleo duro seriam aqueles relacionados à defesa da industrialização, da intervenção estatal pró-crescimento e alguma forma de nacionalismo. Nesse sentido, só seria possível falar em Estado desenvolvimentista quando esses três elementos, conjuntamente, transformam-se em políticas conscientes e amplas de intervenção estatal, o que de fato só ocorreu após 1930, ou, como sugere a hipótese de Fonseca, com o governo de Getúlio Vargas à frente da presidência estadual do Rio Grande do Sul, em 1928. Ele ainda identificou quais seriam as correntes de ideias que antecederam o desenvolvimentismo: o pensamento dos nacionalistas, o dos papelistas (em oposição a metalistas, relacionado à problemática do padrão-ouro), dos defensores da indústria e o dos positivistas. Ver Fonseca, 2004. Gênese e Precursores do Desenvolvimentismo no Brasil. Pesquisa & Debate, São Paulo, volume 15, n. 2(26), p. 225-256.
18
Para um melhor entendimento de como se deu o processo de
industrialização levado a cabo pelo Estado, é interessante seguir a uma
reconstituição da sua própria construção. Segundo Sônia Draibe, a estrutura
cafeeira do período anterior, com o elevado grau de diferenciação interna que
atingiu, havia forjado uma estrutura social diferenciada e heterogênea. Isso se
torna relevante a partir da crise de superprodução que veio a seguir, que, pelos
seus impactos sobre a economia mercantil-exportadora, teria representado
uma forma de ruptura da forma de inserção das classes e frações de classes
no conjunto da economia. Dito de outro modo, teria aberto diferentes
alternativas de desenvolvimento capitalista. (Draibe, 2004, p. 25-33).
A configuração concreta dos setores sociais fundamentais seria
composta pela burguesia cafeeira, a burguesia industrial, o proletariado urbano,
os setores médios e os setores rurais, levando em consideração suas
contradições internas, fragmentação e caráter heterogêneo. A tradução dessa
estrutura no campo das lutas políticas seria, contudo, constituída de relações
de poder definidas e possuidoras de sentido social. Segundo a autora, seria
sobre essas bases que se fundara a autonomia do Estado. (Draibe, 2004,
p.35).
A autonomia estatal seria limitada, entretanto, por reproduzir, em última
instância, as formas prevalecentes de dominação presentes na sociedade, e
também pelo sentido impresso à ação estatal na hierarquização dos interesses
sociais, que estaria circunscrito às respectivas correlações de forças em cada
conjuntura. Apesar disso, e por conta mesmo da heterogeneidade dos
interesses sociais traduzidos na luta política, o Estado objetivamente pôde
exercer sua direção econômica. Assim teria se dado a construção do aparelho
do Estado, em seu ritmo, seu sentido e seu formato (Draibe, 2004, p. 36-69).
A centralização da estrutura administrativa foi um dos movimentos de
construção de um Estado nacional capitalista. Sônia Draibe captou o sentido
desse processo, que, além disso, foi condensado no tempo:
A centralização trouxe consigo elementos novos, que alteraram a qualidade e a natureza do conjunto de instrumentos políticos ou de regulação e controle anteriormente vigentes. Velhos órgãos ganharam nova envergadura, estruturaram-se gradativamente as carreiras, assim como os procedimentos sujeitaram-se crescentemente à lógica racional-legal. Ao mesmo tempo, erigiu-se um novo aparelho de regulação e intervenção econômica; estruturou-se no Estado uma área social na qual passaram a ser gestadas políticas públicas de
19
caráter nacional; finalmente, os organismos coercitivos e repressivos estatais adquiriram substância qualitativamente nova (Draibe, 2004, p. 56).
Como efeito, ele teria dado suporte à elaboração de políticas
econômicas de âmbito nacional, com a incorporação dos interesses sociais
para dentro das estruturas do Estado e a configuração de um tipo específico de
intervencionismo econômico, ligado ao projeto de industrialização que orientou
a ação do governo (Draibe, 2004, p. 76).
No que diz respeito ao aparelho econômico, teria havido a “estruturação
de órgãos responsáveis pela instauração de políticas gerais, compreendendo
regulação e controle das áreas cambial e de comércio exterior, monetário-
creditícia e de seguros”, além da política salarial (Draibe, 2004, p. 78).
O projeto de industrialização pesada, que teve início em 1930 e contou
com o suporte da estrutura material do Estado para sua execução, não seguiu,
no entanto, uma trajetória linear, e não deixou de apresentar limitações na
implantação do referido projeto, tanto pelas oposições que sofreu, quanto pelas
próprias restrições objetivas de coordenação e planejamento (Draibe, 2004, p.
111; Souza, 1976, p. 103).
O que é importante destacar é que a ação estatal foi decisiva tanto no
movimento econômico real quanto na tentativa de definir o processo e tomar a
iniciativa da instalação das indústrias de base no país, com o objetivo de
estabelecer as formas do capitalismo industrial no Brasil. O ponto de inflexão
observado durante o governo Dutra, apoiado sobre uma aliança conservadora
e que não tinha como prioridade a diversificação e expansão de investimentos
nas indústrias de base, não desmontou, no entanto, os aspectos
intervencionistas e regulatórios7 do Estado (Draibe, 2004, p. 87-125-153).
No campo das ideias, segundo Ricardo Bielschowsky, a partir de 1930
teria havido “uma primeira e limitada tomada de consciência da problemática
da industrialização por parte de uma nova elite técnica, civil e militar”, alocadas
7Quanto ao uso do termo “intervenção”, Sônia Draibe atenta para o fato de que se o seu
significado genérico for utilizado – como qualquer tipo ou grau de presença estatal na esfera econômica, em se tratando de um estado liberal em uma fase concorrencial de capitalismo, seriam igualmente intervencionistas o Estado oligárquico (com políticas de valorização do café, por exemplo) e o Estado brasileiro dos dias atuais. Ela destaca, a esse respeito, para as características específicas em que a intervenção se coloca em cada momento histórico, num dado momento da divisão social do trabalho e do movimento da luta social e política (Draibe, 2004, p. 110).
20
nas novas arenas decisórias do Estado, com preocupações de longo prazo
sobre os rumos da economia. (Bielschowsky, 1989, p. 251).
Como mencionado anteriormente, em Pensamento Econômico
Brasileiro, o autor mapeou as correntes de ideias em debate nesse contexto
histórico específico, e que disputavam espaço nas arenas decisórias do
Estado. De forma instrumental, serão reconstruídas de forma breve as linhas
gerais de cada uma das correntes, com exceção do pensamento independente
de Ignácio Rangel, por referir-se a uma preocupação específica do trabalho de
Bielschowsky. Desse modo, tem-se a corrente neoliberal, cuja história no Brasil
remonta aos tempos do Império; a corrente desenvolvimentista do setor público
não-nacionalista8, que surgiu em meados dos anos 1950; a corrente
desenvolvimentista do setor privado, que teve origem já desde a década de
1930, assim como a corrente desenvolvimentista do setor público nacionalista,
além de, rapidamente, a corrente socialista.
A corrente de pensamento neoliberal9, expressa a partir dos economistas
dessa corrente, seria caracterizada por três aspectos fundamentais, como a
defesa do princípio de redução estatal na atividade econômica, a defesa de
políticas de equilíbrio monetário e financeiro (sem a discussão de seus efeitos
sobre o nível de renda e emprego) e o posicionamento contrário às medias de
suporte ao projeto de industrialização. O projeto econômico seria aquele do
crescimento equilibrado via forças de mercado; a tese básica seria a de que no
Brasil não existia desemprego, mas baixa produtividade; o processo de
crescimento foi interpretado como desequilibrado e ineficiente, por conta de
erros de política econômica; o apoio financeiro interno ao investimento deveria
vir da estruturação do sistema financeiro; o capital estrangeiro deveria ser
estimulado, ao contrário das empresas estatais; havia tolerância apenas a
ensaios de planejamento parcial, de resto, mostravam-se contrários; defendiam
a redução de tarifas e tinham a ideia de que o déficit externo é causado pela
inflação; essa seria causada por conta da existência de pleno emprego, e,
8 Os atores pertencentes à essa corrente serão chamados aqui de cosmopolitas, termo
emprestado de Jaguaribe e utilizado por Lourdes Sola, por fins de nomenclatura. Eles referem-se ao mesmo fenômeno. 9De acordo com Bielschowsky, o prefixo “neo” é explicado pelo fato de que a maior parte dos
liberais brasileiros teria passado a admitir a necessidade de alguma intervenção estatal como forma de corrigir imperfeições de mercado, na realidade que surgiu após 1930 (Bielschowsky, 1988, p. 37).
21
portanto, deveria ser sanada por políticas de estabilização; posicionavam-se de
forma contrária à reforma agrária (Bielschowsky, 1988, p. 38-242).
O que unia as três correntes desenvolvimentistas era a defesa da
constituição de um capitalismo industrial moderno no país. Os
desenvolvimentistas do setor público não nacionalista diferenciavam-se em
torno das questões relacionadas ao grau de intervenção reservado ao Estado.
Este não deveria dedicar-se às áreas em que o capital privado, nacional ou
estrangeiro, poderia atuar com mais eficiência. Enfatizavam, além disso, a
necessidade de controle da inflação. O projeto econômico básico seria o da
industrialização em ritmo compatível com o equilíbrio das contas públicas,
participação do capital estrangeiro e planejamento setorial; a tese básica seria
o da existência de “pontos de estrangulamento” e “pontos de crescimento” na
atividade econômica; a interpretação do processo de crescimento estaria
baseada na existência de tendências a desequilíbrios não corrigidas, mantidas
por erros de política econômica; o apoio financeiro interno ao investimento
deveria vir por meio de tributação e o capital estrangeiro deveria ser
estimulado; eram favoráveis ao protecionismo; o déficit externo seria causado
pela inflação, apesar de ser possível sem ela; essa última seria causada por
conta da plena capacidade das forças produtivas, passíveis de serem
corrigidas por políticas de estabilização; finalmente, havia a visão de que a
redistribuição de renda reduziria o crescimento (Bielschowsky, 1988, p. 104-
243).
O pensamento desenvolvimentista do setor privado incorporava a defesa
de um projeto de industrialização conjuntamente com a defesa dos interesses
do capital privado nacional. O projeto econômico básico seria o da
industrialização com proteção estatal ao capital privado nacional; a tese básica
baseava-se no crédito à produção como instrumento de crescimento; a
interpretação do processo de crescimento seria o da substituição de
importações; o apoio financeiro interno viria de incentivos à inversão de lucros;
havia um posicionamento favorável ao capital estrangeiro, desde que com
controles; eram moderadamente favoráveis às empresas estatais, nas áreas
em que as empresas particulares não demonstrassem interesse em investir;
eram favoráveis ao planejamento e ao protecionismo; valiam-se da
interpretação estruturalista do déficit externo; interpretavam a inflação como
22
funcional no processo de crescimento econômico; eram defensores do lucro,
confrontado com a política salarial, para reinvestimento; havia um
posicionamento moderado em relação à reforma agrária (Bielschowsky, 1988,
p. 79-242).
Os desenvolvimentistas do setor público nacionalista apresentavam uma
inclinação pela ampliação da intervenção do Estado na economia, através de
políticas de apoio à industrialização integrada em um sistema de planejamento
abrangente, com investimentos estatais em setores básicos. Defendiam a
subordinação da política monetária à política de desenvolvimento econômico e
possuíam uma inclinação política por medidas econômicas de cunho social,
especialmente no que dizia respeito à política salarial, desenvolvimento
regional e reforma agrária. O projeto básico era o da intervenção estatal na
economia para superação do subdesenvolvimento e emancipação econômica e
política através do processo de industrialização. As ideias básicas provinham
das teses estruturalistas, da Cepal e a interpretação do processo de
crescimento era baseada no processo de substituição de importações e na
existência de desequilíbrios estruturais, mantidos pela ausência de
planejamento e passíveis de serem corrigidas no longo prazo; o apoio
financeiro interno ao investimento deveria vir por meio da tributação; eram
favoráveis ao capital estrangeiro, desde que por meio de controles e não nos
setores considerados “estratégicos”, como de serviços públicos e mineração
(Bielschowsky, 1988, p. 127-131-243).
A corrente socialista baseava-se na interpretação do materialismo
histórico; defendia a passagem para o socialismo e o planejamento estatal e
era contrária ao capital estrangeiro (Bielschowsky, 1988, p. 242)10.
A seção seguinte destina-se a uma localização geral dos atores na luta
política, também de instrumental importância para a localização dos ministros
ao longo do processo de industrialização.
Os atores políticos
Conforme explicitado por Sônia Draibe, o movimento de expansão e
centralização do aparelho do Estado – desde então responsável pela definição
10
Ver Anexo II para um quadro resumo das correntes de pensamento.
23
de políticas gerais regentes da atividade econômica – implicou, por conta disso,
na estatização da luta econômica de classes. Dessa forma, “a construção da
direção política devia ser disputada nas estruturas centralizadas nacionais e
intervencionistas do Estado”, com a ênfase devida à relação conflituosa e
dotada de contradições que o esquema fez surgir (Draibe, 2004, p. 37).
É proveitoso, assim, um mapeamento geral das forças políticas atuantes
e que exerciam suas pressões e influências sobre a condução da política
econômica no período analisado, a começar pela própria Presidência.
Enquanto “vértice do executivo”, exerceria, nessa configuração, uma atuação
unificadora e dirigente, em vista do aparelho burocrático que lhe dava suporte –
mesmo que esse também fosse fragmentado entre os diversos órgãos que
surgiram. A orientação e mesmo a personalidade do presidente em torno do
projeto econômico a ser levado adiante seriam aspectos dessa dinâmica
(Draibe, 2004, p. 44).
Com isso em mente, o que poderia divergir de um regime político a
outro, como um autoritário ou democrático, seriam as formas de interação do
Executivo – a Presidência e o aparelho burocrático, com os outros atores
políticos. Assim como os canais de acesso disponíveis.
A evolução dos alinhamentos entre atores políticos entre 1930 e o golpe
do Estado novo poder ser vista com a transformação das formas de
organização dos grupos políticos: dos grupos de apoio da Aliança Liberal –
oligarcas dissidentes, tenentistas civis e militares, os constitucionalistas liberais
paulistas, militares superiores e parte da burguesia cafeeira – até a formação
dos primeiros movimentos políticos de expressão nacional, como a Aliança
Nacional Libertadora (ANL), de cunho progressista, e a Ação Integralista
Brasileira (AIB), e a inserção dos interesses econômicos nas instâncias
corporativas do Estado.
A composição ministerial entre 1930 e 1935 demonstra tal correlação de
forças inicial, em que, segundo Silva (2013, p. 23), de um total de 25 ministros,
13 eram vinculados ao movimento tenentista (entre eles o próprio Osvaldo
Aranha, segundo ministro de Vargas na pasta da Fazenda), enquanto 6 eram
republicanos liberais, 5 eram membros das oligarquias dissidentes e 1 vinha de
quadros burocráticos, caso do também ministro da Fazenda Souza e Costa,
bancário de carreira do Banco da Província do Rio Grande do Sul.
24
A burocracia estatal estava dividia em diversos órgãos, mas com o
sentido fundamental de “estabelecer novos suportes organizacionais e
normativos para a expressão do poder do Estado como poder unificado,
genérico e abstrato”. Isso se deu com o aparelho coercitivo-repressivo, com a
constituição do sistema judiciário e das Forças Armadas; com o aparelho
social, de saúde e previdência. No que diz respeito à modernização
administrativa, foi criado em 1938 o Departamento Administrativo do Serviço
Público (Dasp), tornado órgão responsável por funções normativas, executivas
e legislativas (Draibe, 2004, p. 55-57-66-78).
Dessa estrutura surgem os quadros gerais do funcionalismo público, civil
e militar, que viriam a exercer importantes pressões sobre o orçamento nas
decisões salariais e os grupos alocados nos aparelhos de intervenção
econômica do estado, os “técnicos”.
Há uma considerável literatura que estuda esse último segmento,
especialmente no que diz respeito ao delineamento de seus perfis ideológicos
e de seus lugares institucionais de atuação. Sua relevância enquanto setor
social residiria nas suas características de possuidores do saber técnico, em
sua posição de formuladores e difusores de ideologia e sua inserção no interior
do aparelho estatal, em posições relativamente protegidas das pressões de
outros segmentos sociais (Sola, 1998; Jaguaribe, 1962; Portugal-Gouvêa,
1994; Bielschowsky, 1988; Leff, 1968).
De acordo com Lourdes Sola, a mobilização do saber econômico
enquanto recurso político foi importante instrumento de disputas intra-
burocráticas, nas decisões quanto à direção política da atividade econômica.
As alternativas diziam respeito à atuação dos agentes econômicos, os
principais beneficiários do desenvolvimento, seu ritmo de crescimento e a
tolerância quanto à inflação. No tocante às decisões tomadas, um aspecto
essencial seria a posição desses técnicos enquanto parte do establishment –
válido tanto para os técnicos nacionalistas quanto cosmopolitas, categorias
com as quais a autora trabalha, herdadas de Jaguaribe (1962). Essa posição,
somada à experiência técnica e política que eles teriam adquirido, teria levado
a um pragmatismo político e econômico na tomada das decisões (Sola, 1998,
p. 67-74).
25
Levando adiante a discussão, segundo a interpretação de Nathaniel Leff,
que analisou a política econômica brasileira do pós-guerra (1947-1964), uma
situação combinada da política de clientela com a centralização política das
decisões alocativas teria resultado na abertura da possibilidade da ação política
baseada na “opinião da elite” – menção à ideologia econômica modernizadora
adotada por diversos setores técnico-burocráticos no interior do aparelho
estatal – que passaram a deter uma forma programática efetiva, protegidos
politicamente de pressões pelo presidente. Outro resultado teria sido o
enfraquecimento da atuação dos grupos de pressão, em especial o setor
exportador ligado ao café e o empresariado industrial, outro set de atores
políticos (Leff, 1968, p. 99-160).
Conforme apontado, os interesses sociais seriam incorporados ao
aparelho estatal sob diversas formas de corporativismo, ao longo de todo o
período. A instituição da representação classista presente no Código eleitoral
de 1932 constrangeu a organização das classes em sindicatos organizados e
reconhecidos pelo estado, válido tanto para os trabalhadores urbanos quanto
para os grupos patronais. Não é possível proceder a uma reconstrução da
atuação política dos grupos econômicos relevantes nesse trabalho, pela sua
complexidade e por fugir aos objetivos específicos do trabalho. Mas é
interessante assinalar a presença fundamental do setor mercantil-exportador,
especialmente os cafeicultores, cuja presença no Congresso após 1946 e no
Governo Dutra é considerável; o empresariado industrial, organizado em
diversas associações e atuante nos conselhos técnicos e comissões
econômicas criadas no aparelho estatal; os trabalhadores urbanos organizados
nos sindicatos, demandantes de políticas de cunho social, especialmente no
que dizia respeitos aos reajustes salariais e cuja tônica nacionalista11 de
mobilização popular lhe foi dirigida nos últimos anos do segundo governo de
Vargas, além dos movimentos de trabalhadores rurais, que, apesar de não ter
11
De acordo com Lourdes Sola, o nacionalismo seria uma linha divisória entre os dois grupos
de técnicos no pós-guerra, ou seja, os nacionalistas e os cosmopolitas. Para ela, o nacionalismo brasileiro poderia ser abordado seja como um projeto de desenvolvimento nacional seja instrumento de mobilização popular. Ver Sola, op. cit., p. 60.
26
sido muito expressivo no período, ganhou maior atenção nos últimos anos do
regime democrático12.
Como um exemplo, mudanças na estrutura social proporcionadas pela
urbanização e industrialização crescente tornaram a classe operária essencial
na formulação de alianças políticas no período. Segundo Sônia Draibe, o
sentido das políticas sociais implementadas a partir de 1930 iria depender das
correlações de forças e condições de luta política das classes subalternas em
cada conjuntura, mas seu reconhecimento estaria assegurado (Draibe, 2004, p.
66). Ângela Maria de Castro Gomes, por sua vez, ao investigar a história da
constituição da classe trabalhadora no Brasil, propôs um eixo de análise em
que os trabalhadores – classe diversificada e afastada de purismos
ideológicos13 - teriam de forma mais acentuada um papel de sujeito, em que a
ação estatal seria variável de interlocução. Dessa forma, ficaria reconhecida a
existência de “um diálogo entre atores com recursos de poder diferenciados
mas igualmente capazes não só de se apropriar das propostas político-
ideológicas um do outro, como de relê-las” (Gomes, 1996, p. 46). A montagem
do aparelho corporativo durante o Estado Novo, e a importância da estrutura
sindical entre 1946 a 1964, como saneadora ou fonte de crises políticas são
alguns dos momentos da construção da relação dos trabalhadores com o
aparelho estatal.
O Congresso Nacional e os partidos políticos também funcionaram como
aglutinadores de forças sociais. Para a legislatura que teve início em 1933, os
partidos, em sua maioria, ainda eram organizados regionalmente. A descrença
e desmoralização do parlamentarismo multipartidário no interior dos círculos
políticos e a crescente polarização ideológica, no cenário nacional e
internacional, acabaram por dar suporte a poderes emergenciais ao Executivo,
12
Sobre isso, ver Maria Antonieta P. Leopoldi, Política e interesses: as associações industriais, a política econômica e o Estado na industrialização brasileira, São Paulo: Paz e Terra, 2000. Ângela Maria de Castro Gomes, Burguesia e trabalho: política e legislação social no Brasil (1917-1937), Rio de Janeiro: Campus, 1979. Eli Diniz, Empresário, estado e capitalismo no Brasil: 1930-1945. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1978. Para o capital cafeeiro do período anterior, ver Renato Perissinoto, Estado e Capital Cafeeiro: Burocracia e interesses de classe na condução da política econômica (1889-1930), 1997, 479 f. Tese (Doutorado em Ciências Sociais) – Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 1997. 13
A proposta analítica da autora estava baseada em torno do debate do conceito de “populismo”, e é em relação a alguns de seus usos na literatura que a menção aos “purismos ideológicos” se refere. Gomes, op. cit.
27
o que conduziu, em última instância, ao fim desse curto intervalo democrático,
com o golpe do Estado Novo (Souza, 1976, p. 65).
O contexto de 1945/1964 era diferente. Os partidos foram organizados
em bases nacionais, conforme previa a Lei Agamenon, e em sua evolução não
deixou de ter dificuldades em absorver e expressar as mudanças sócio-
econômicas em trânsito. O Congresso, por sua vez, teria sido ao mesmo tempo
forte e fraco: forte em relação a outros países da América Latina e por possuir
maiores atribuições constitucionalmente, além de ter sido protagonista da
contenção de maiores crises políticas, como a 1954, com o suicídio de Vargas
e a de 1961, com a renúncia de Jânio Quadros e fraco frente às estruturas
burocráticas e ao executivo (Souza, 1976, p. 107). Os próprios conselhos e
órgãos técnicos, que por vezes atuavam em áreas que estavam além de suas
competências legais, foram mecanismos de contorno às resistências impostas
à ação estatal pelo Legislativo e grupos de pressão (Draibe, 2004, p. 113).
As Forças Armadas, que a partir de 1930 tiveram seu papel
monopolizador do uso legítimo da violência consolidado, a partir da
subordinação das polícias militares estaduais, fortaleceu-se como instituição
nesse movimento. Possuíam, além disso, um projeto de industrialização,
pensado tanto em termos de defesa militar (projeto de reequipamento), quanto
de autonomia nacional e da força do Estado (Draibe, 2004, p. 59). Em termos
políticos, segundo Skidmore, sua atuação na resolução de crises iria tornar
recorrente a autopercepção desses atores enquanto árbitros finais da política
interna (Skidmore, p. 25). O episódio da Junta Governativa, do golpe do Estado
Novo, da deposição de Vargas, da intervenção pela posse de Juscelino
Kubitscheck e o veto inicial dado a João Goulart quando da renúncia de Jânio
Quadros são alguns exemplos.
Finalmente, o setor externo, constituído pelos credores internacionais,
privados e públicos e investidores estrangeiros. Tanto pressões por maior
racionalização nas contas públicas e manutenção de compromisso da dívida
externa, quanto possibilidades vislumbradas por autoridades brasileiras de
financiamento do projeto de desenvolvimento pelo capital estrangeiro
acabaram resultando, por vezes, na vinda de missões estrangeiras para
análise da situação econômica nacional, em caráter de cooperação técnica.
Esse foi o caso da Missão Cooke (1942), da Missão Abbink (1948) e da
28
Comissão Mista Brasil-Estados Unidos (1950), por exemplo, com distintos
diagnósticos e alternativas propostas.
Essa apresentação geral e não exaustiva dos atores políticos relevantes
do período em questão poderiam fazer parte daquilo que Lourdes Sola
denominou de “deferenda políticos”. Ou seja,
[...] aquelas determinações que se impõem à percepção e à açãodos decisores
e de cuja intervenção o ator político deve tomar consciência e levar em conta
para poder enfrentá-la melhor –, sob pena de desvirtuamento de seus próprios
objetivos e metas estratégicas (Sola, 1998, p. 39).
A formação das políticas econômicas, além disso, estaria exposta aos
requisitos impostos pelo sistema econômico e pelo modo de percepção do que
viria a ser a “necessidade econômica”, por parte dos atores políticos (Sola,
1998, p. 39). A ênfase dada por Sola dizia respeito à atuação dos “técnicos”,
equipados com o saber econômico. No caso dos ministros da Fazenda, por
enquanto cabe dizer que faziam parte desse contexto, ou seja, estavam
identificados a algum grupo político14e eram ao mesmo tempo constrangidos
pelos fatores apontados, na condição de funcionários com a principal
responsabilidade pela política econômica.
Capítulo 2. Os ministros e seu perfil
O presente capítulo é dedicado à apresentação dos dados sobre o perfil
dos ministros da Fazenda, no período republicano que vai de 1930 a 1964.
Como mencionado, fazem parte do estudo os ministros titulares ou aqueles que
ocuparam a pasta por pelo menos trinta dias no período considerado. Somam-
se, assim, 33 ocupações na pasta e 31 ministros que a ocuparam – a distinção
é importante pelo eixo de análise ser o Ministério da Fazenda. Ainda, todas as
informações de trajetória – cargos ocupados, atividades na vida privada,
filiação partidária, participação nos conselhos econômicos e associativismo –
referem-se a atividades exercidas pelos ministros até o momento da nomeação
14
Apesar de não serem nomeados exclusivamente por conta disso. Nathaniel Leff tem uma
consideração interessante, adotada em partes nesse trabalho, que é a de que os ministros seriam “homens do presidente”, seus agentes pessoais. Não seriam, portanto, representantes de uma classe, como a indústria, uma comunidade de negócios etc. para lidar com tais interesses classistas no governo. Ver Nathaniel Leff, 1968, p. 110.
29
para o MF. Dessa forma, é possível conectar as trajetórias à história
institucional. No caso em questão, apenas dois ministros ocuparam o cargo
duas vezes, em momentos distintos: o banqueiro José Maria Whitaker e o
jurista Oswaldo Aranha.
A próxima seção, no entanto, é dedicada a uma breve descrição da
história do Ministério da Fazenda, que fornece elementos essenciais para a
compreensão da própria atuação dos ministros no exercício de suas funções.
Inserção institucional: o Ministério da Fazenda
As atribuições clássicas do Ministério da Fazenda nos Estados Liberais
seriam aquelas relacionadas à arrecadação de impostos, distribuição de
recursos orçamentários entre os diferentes órgãos estatais, controle dos gastos
e administração da moeda e das finanças públicas. No Brasil, no entanto, ainda
assumia funções relacionadas às necessidades de sustentação da economia
exportadora, como a atuação pontual ou permanente na área cambial e em
questões tarifárias, desde o Império. (Loureiro, 1998, p. 52). O Erário Régio foi
o núcleo inicial do atual Ministério da Fazenda, transplantado de Portugal para
o Brasil em 1808, junto à vinda da Família Real. Com a proclamação da
Independência em 1822, a parte do Real Erário que ainda remanescia no Rio
de Janeiro mudou de nome para Tesouro Público do Rio de Janeiro. O nome
Ministério da Fazenda só foi adotado em 1824, com a Constituição do Império.
Ao longo do período imperial e da Primeira República, naturalmente, o
Ministério passou por reorganizações e reformas administrativas. Merece
destaque as reformas realizadas pelo ministro Bernardo de Vasconcelos em
1831; a de Joaquim José Rodrigues Torres, Visconde de Itaboraí, em 1850; a
de Inocêncio Serzedelo Correia em 1892, primeira do período republicano e a
de José Leopoldo de Bulhões Jardim, em 1909 (Bulhões, 1955).
Após 1930, o Ministério passou por mais mudanças. Houve a instalação
do Conselho de Contribuintes, da Comissão geral de Compras e a instituição
de um sistema de gestão financeira na Contabilidade Pública sob a gestão do
primeiro ministro, por exemplo. Uma reforma mais geral, no entanto, foi
realizada por Oswaldo Aranha, entre 1931 e 1934, regularizada pelo Decreto
24.036 de 1934.
30
A reforma teve por objetivo racionalizar, sistematizar e definir serviços e
atribuições do órgão. Teve a tarefa de desobrigar o ministro de uma série de
tarefas administrativas, que puderam ser delegadas a outras partes, como a
Direção Geral da Fazenda Nacional. Um esquema geral da organização
funcional do Ministério, que perdurou pelo menos até 1954, pode ser visto no
Quadro 1.
31
Fonte: Decreto nº 24.036, de 26 de Março de 1934, em Bulhões, 1955.
Quadro 1. Organograma do Ministério da Fazenda
32
Uma característica do MF em relação a outros ministérios é o da
preocupação – assinalada ao longo da sua história, com a formação técnica do
quadro dos funcionários. Além disso, a criação da direção central de
administração assegurou alguma continuidade administrativa, que não seria
sujeita a mutações políticas. Adaptando as considerações de Maria Rita
Loureiro, cujo estudo diz respeito ao MF no período democrático pós-1988,
medidas como a centralização de atribuições e a continuidade administrativa
iriam de encontro a um fortalecimento do ministério frente a outras instâncias
decisórias na área econômica (Bulhões, 1955, p. 264; Loureiro, 1998, p. 54-
60).
Os dados sobre a rotatividade dos ministros na pasta é ilustrativo quanto
a esse ponto. A mediana da permanência em meses no Ministério da Fazenda,
de todo o período, é 5. A distribuição por governo pode ser vista no Gráfico 1.,
e em comparação com a rotatividade apresentada no Ministério da Educação,
das Relações Exteriores e Justiça. A escolha desses ministérios justifica-se
pela disponibilidade dos dados e por também terem feito parte, de forma
íntima, do processo de construção do Estado nacional.
Fonte: Elaboração própria a partir de informações disponíveis no portal eletrônico dos Ministérios da Fazenda, Relações Exteriores, Justiça e Educação. Acesso em maio de 2015.
33
Uma observação formal: o ministro José Linhares não permaneceu mais
de três meses na pasta, mas o mesmo ministro nomeado por ele continuou nos
primeiros meses do governo seguinte, por isso a disparidade.
Pode ser visto que em comparação aos outros ministérios, o MF foi o
que apresentou menor rotatividade, o que pode ser explicado pelas exigências
do próprio cargo de um mínimo de conhecimentos técnicos sobre assuntos
econômicos. Além disso, 8 dos 12 ministros interinos que ocuparam a pasta
tiveram como cargo imediatamente anterior postos do Ministério da Fazenda,
como Chefia de Gabinete, Direção do Serviço de Pessoal e Diretoria-Geral da
Fazenda Nacional.
O que é possível extrair dessa apresentação é que o Ministro, uma vez
no cargo, incorpora os imperativos das funções fazendárias. Seja qual for o
grupo político do qual faça parte, ou a orientação econômica que possui, ele
também estará exposto às pressões do equilíbrio orçamentário, arrecadação
tributária, cifras da dívida pública externa e interna e outras atribuições, do qual
será pessoalmente responsável perante o Presidente e o conjunto da
sociedade.
Quem são os ministros
O objeto dessa seção é descrever o perfil social, profissional/institucional
e ideológico dos ministros da Fazenda. Todos eles são homens, e chegaram à
pasta com uma idade média de 53 anos15.
Como já foi dito, os ministros inclusos no estudo contabilizam um total de
33. Mas cabe, nesse momento, uma distinção entre eles. Há os ministros
interinos – substitutos legais do ministro titular no caso de sua ausência, e que
estavam, dessa forma, inseridos na orientação do ministro representado, no
que diz respeito a políticas implementadas. É o caso de Orlando Vilela,
Cavalcanti Pessoa e Paulo Lira, suplentes do ministro Sousa Costa; Vieira
Machado e Ovídio Abreu, suplentes do ministro Correia e Castro; Alberto
Andrade de Queiroz, suplente do ministro Horácio Lafer; Vianna Júnior,
suplente do ministro José Maria Alkimin; Antônio Carlos Barcellos e Maurício
Chagas Bicalho, suplentes do ministro Sebastião Paes de Almeida e Hamilton
15 Desvio padrão: 9,1.
34
Prisco Paraíso, suplente do ministro Clemente Mariani. E também os ministros
interinos do período parlamentarista, como Tancredo Neves e Henrique
Domingos Ribeiro Barbosa, que assumiram interinamente durante a ocupação
de Walter Moreira Sales na pasta16.
Algumas dificuldades da pesquisa foram relativas à escassez de
informações de alguns ministros, especialmente os interinos, quando não
possuíam uma biografia no Dicionário Histórico-Biográfico do Centro de
Pesquisa e Documentação de História Contemporânea da Fundação Getúlio
Vargas. São eles Alberto Andrade de Queiroz, Antônio Carlos Barcellos,
Hamilton Prisco Paraíso, Henrique Ribeiro Barbosa, João Vianna Júnior,
Orlando Bandeira Vilela, Paulo de Lyra Tavares e Romero Cavalcanti Pessoa.
A descrição dos dados de perfil está divida em três partes. Na primeira
será apresentado o perfil social dos ministros, com dados sobre região de
nascimento, herança política e escolaridade. Na segunda, dados sobre a
carreira profissional e institucional, ou seja, as ocupações exercidas na vida
privada e pública dos ministros, anos de carreira até a chegada à pasta, os
tipos de cargos ocupados, a participação em conselhos econômicos,
experiência legislativa anterior e ligação a partidos políticos. Finalmente, serão
apresentados dados sobre o perfil ideológico. Conforme mencionado, será
empregada a tipologia de Bielschowsky. As principais fontes foram os verbetes
biográficos de cada um dos ministros e a literatura consultada. Ainda, a seção
possui uma última parte dedicada às considerações finais. Nela, a partir das
condições de nomeação e saída, são elucidados os aspectos do perfil – nas
três dimensões apontadas – que teriam sido mais relevantes nas
circunstâncias consideradas.
Vale adiantar que a relevância das dimensões dos perfis deu-se de
forma combinada para todos os casos, no que diz respeito ao recrutamento.
Perfil social
A região de origem, como pode ser visto na Tabela 1., demonstra a
preponderância da região sudeste. Minas Gerais, Rio de Janeiro e São Paulo
são os estados que mais aparecem, com 8, 7 e 6 ministros respectivamente.
16
Ver Anexo III. O número total de ministros (titulares e interinos) por governo é conforme segue: Junta Governativa, 1 ministro nomeado; Era Vargas, 6; José Linhares, 1; Dutra, 5; Getúlio Vargas, 3; Café Filho, 2; Juscelino Kubitschek, 6; Jânio Quadros, 2 e João Goulart, 7.
35
Tabela 1. Região de nascimento
Frequência Percentual
Valid
Total 33 100
Sudeste 21 63,6
Nordeste 7 21,2
Sul 4 12,1
Norte 1 3
Fonte: Elaboração própria, a partir de dados do CPDOC
Esses dados podem apontar para duas considerações interessantes. A
primeira é a que vai em direção às desigualdades regionais do período. Os
efeitos dinâmicos do processo de industrialização foram concentrados na
região centro-sul do país, e não apenas com implicações econômicas, mas
também àquelas referentes às capacidades de organização política (Cano,
2008, p. 71). Alguns autores ligados à corrente do desenvolvimentismo do setor
público nacional faziam, inclusive, analogias em âmbito interno das teses
cepalinas das desigualdades internacionais, em relação às disparidades entre
a região Centro-Sul e o Nordeste (Bielschowsky, 1988, p. 158).
Outra é a da região de origem do presidente. No entanto, essa
informação foi significativa apenas no caso de Juscelino Kubitschek, que
recrutou seus quatro titulares com nomes de seu próprio estado, Minas, e para
Getúlio em ocasiões específicas. Ou seja, ter feito parte de um contexto político
regional anterior, juntamente com o presidente, ou com o conhecimento deste,
foi relevante apenas em momentos pontuais (Osvaldo Aranha e Souza Costa
no primeiro governo de Vargas e José Maria Alkimin, Lucas Lopes e Sebastião
Paes de Almeida no governo de Juscelino Kubitschek).
A herança política, ou seja, a ocorrência da ocupação de cargos públicos
pelos avôs ou pais desse setor da elite não se mostrou muito significativo.
Apenas um ministro teve avô que obteve um cargo público e outros cinco cujos
pais alcançaram tais posições.
No que diz respeito à escolaridade, dos 31 ministros17, apenas três não
possuíam ensino superior, desses, dois concluíram até o ensino secundário e
17
Para os dados sobre escolaridade, curso de graduação e instituição de graduação, os ministros foram tomados de forma individual, e não na categoria “ocupação na pasta”, que tomaria os ministros de forma duplicada para os que ocuparam o cargo mais de uma vez, como foi o caso de José Maria Whitaker e Oswaldo Aranha. Assim, para esses dados, tais ministros foram contabilizados apenas uma vez, por ter sido um dado que permaneceu constante nas
36
um completou os estudos até o ensino técnico18. A seguir a relação dos cursos
de formação dos ministros com ensino superior:
Tabela 2. Curso de graduação
Frequência Percentual Percentual válido
Valid
Direito 18 58,1 72
Engenharia 4 12,9 16
Ciências Contábeis 1 3,2 4
Medicina 1 3,2 4
Odontologia 1 3,2 4
Total 25 80,6 100
Missing
Nenhum 4 12,9
Sem informação 2 6,5
Total 6 19,4
Total 31 100
Fonte: Elaboração própria, a partir de dados do CPDOC
Quanto ao ano de graduação, metade dos ministros para o qual a
informação foi encontrada graduou-se antes dos anos 1930 (10), e os outros
depois de desse período. A predominância da formação em Direito pode ser
explicada pela própria estrutura de formação superior do período, que começou
a ser integrada na estrutura universitária apenas após 1930 e pela tradição da
presença do bacharel em Direito na vida política brasileira. Embora as
formações em Engenharia, Administração e Economia tenham adquirido maior
importância, por conta de requisitos impostos pelo processo de
desenvolvimento econômico (Venâncio Filho, 1977, p. 295-306). As instituições
de graduação são conforme seguem na Tabela 3.:
duas ocasiões em que foram ministros. Para todos os outros dados, eles foram tratados segundo a ocupação, cada um com duas linhas distintas no banco de dados. Isso mesmo para a região de nascimento, que apesar de ser um dado que permaneceu constante, também foi tratado em relação à variável da região de nascimento do presidente, que variou para o caso de José Maria Whitaker. 18Para o ministro Antônio Carlos Barcellos, interino sob a gestão de Sebastião Paes de Almeida, não foram encontradas informações sobre escolaridade.
37
Tabela 3. Instituição de graduação
Frequência Percentual Percentual válido
Faculdade de Direito de São Paulo 5 16,1 18,5
Faculdade de Direito do Rio de Janeiro 4 12,9 14,8
Faculdade de Direito de Belo Horizonte 3 9,7 11,1
Faculdade de Direito da Bahia 2 6,5 7,4
Universidade do Brasil 2 6,5 7,4
Escola de Engenharia da Universidade de Minas Gerais 1 3,2 3,7
Escola de Engenharia de Ouro Preto 1 3,2 3,7
Escola Politécnica da Bahia 1 3,2 3,7
Escola Politécnica do Rio de Janeiro 1 3,2 3,7
Escola Superior de Comércio 1 3,2 3,7
Escola Superior de Comércio do Rio de Janeiro 1 3,2 3,7
Faculdade de Direito do Largo de São Francisco 1 3,2 3,7
Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro 1 3,2 3,7
Faculdade Nacional de Direito 1 3,2 3,7
Faculdade Nacional de Direito do Rio de Janeiro 1 3,2 3,7
Instituto Lafayette 1 3,2 3,7
Total 27 87,1 100
Não possui graduação 4 12,9
Total 31 100
Fonte: Elaboração própria, a partir de dados do CPDOC
Apenas três ministros freqüentaram a pós-graduação, cuja titulação foi a
de especialista para os três casos. Esse dado é relevante para o contexto em
que está inserido, no qual os cursos de especialização eram quase inexistentes
no país.
Trajetória profissional/institucional
A distribuição da ocupação profissional é conforme segue na Tabela 4.
Para esse item, foi considerada a ocupação de maior preeminência na
trajetória do ministro, pública ou privada, até o momento de nomeação para a
pasta. Isso foi feito com base em uma consulta mais direcionada das
biografias, com atenção ao que foi a ocupação mais recorrente dos ministros.
Ocupações mais específicas foram agregadas em categorias mais gerais.
Dessa maneira, o desempenho de atividades empresariais, assessoria jurídica
ou exercício da advocacia, contratação pela competência em engenharia,
cargo nos quadros do funcionalismo e carreira em instituições bancárias foram
agrupados como “empresário”, “funcionário público”, “bancário”, “engenheiro” e
“economista”.
38
Tabela 4. Ocupação Profissional
Frequência Percentual
Empresário 11 33,3
Funcionário público 7 21,2
Bancário 4 12,1
Engenheiro 2 6,1
Economista 1 3
Fonte: Elaboração própria, a partir de dados do CPDOC
A posição de jurista engloba o exercício da advocacia e de consultoria
jurídica, ambas praticadas pelos ministros em questão. Essa posição, ainda,
pelas suas características, torna possível o exercício de outras ocupações. Na
análise das biografias, algumas ocupações superpostas – como jurista e
empresário, exercida por Clemente Mariani e Osvaldo Aranha em sua segunda
gestão; ou jurista e militante partidário, como Tancredo Neves, demonstraram
ter igual destaque em suas trajetórias.
O caso dos funcionários públicos, cujos funcionários do Ministério da
Fazenda totalizam 4, dos 7 funcionários, aplicam-se aos ministros interinos,
substitutos legais do titular. Outra ocupação que merece destaque é a de
banqueiro, no interior da categoria de empresários (6 de um total de 11 casos).
A socialização nos meios financeiros mostrou-se um atributo importante para a
nomeação, e, sendo assim, pode ser somada à posição de bancário, também
ligado aos meios financeiros, mas a partir de uma lógica distinta.
A primeira ocupação em cargo público pelos ministros apresenta um
número considerável de funcionários públicos (10), assim como a ocupação de
diretorias de órgãos públicos ligados à atividade econômica (10), já de médio
ou alto escalão. Nesse ponto, é possível constatar a existência de trânsito entre
atividades no setor público e privado por parte desses ministros, e acúmulo de
competências necessárias ao exercício do cargo em outro locus. Também
houve a ocorrência de ocupações de assessoria a ministros ou secretários de
Estado (3), cargos eletivos (4), professor universitário (2), magistratura (1),
oficial de Gabinete do MF (1), secretário da Fazenda (1) e cargo comissionado
(1). A Tabela 5., por sua vez, apresenta o cargo ocupado imediatamente antes
da nomeação, seja ele público ou privado.
39
Tabela 5. Ocupação imediatamente anterior à nomeação
Ocupação Frequência Percentual
Presidente do Banco do Brasil 5 15,2
Chefe de Gabinete do Ministério da Fazenda 4 12,1
Deputado Federal 4 12,1
Empresário 4 12,1
Diretor-Geral da Fazenda Nacional 3 9,1
Banqueiro 1 3
Chefe civil do governo de São Paulo 1 3
Diretor da Cexim 1 3
Diretor do Núcleo de Economia da FGV 1 3
Diretor do Serviço do Pessoal do Ministério da Fazenda 1 3
Diretor-executivo da Sumoc 1 3
Embaixador em Washington 1 3
Ministro da Justiça e Negócios Interiores 1 3
Ministro do Tribunal de Contas da União 1 3
Ministro do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo 1 3
Presidente do BNDE 1 3
Primeiro-Ministro 1 3
Secretário das Finanças 1 3
Total 33 100
Fonte: Elaboração própria, a partir de dados do CPDOC
Todos os cargos ligados ao funcionalismo público, inclusive do Ministério
da Fazenda, foram ocupados por ministros interinos. Nem todos eles,
entretanto, ocuparam tais cargos. De 12, três ocupavam cargos nomeados
antes de assumir interinamente (Diretor-executivo da Sumoc, Secretário de
Finanças e Presidente do Banco do Brasil), e o outro era Tancredo Neves, que
foi interino enquanto Primeiro-Ministro. As outras ocupações anteriores dizem
respeito a atividades empresariais e empresariais-financeiras, atuação em
outros órgãos econômicos, como o Banco do Brasil, a Carteira de Exportação e
Importação do Banco do Brasil (Cexim) e o Banco Nacional de
Desenvolvimento Econômico (BNDE), cargos eletivos ou outros cargos
nomeados.
Quanto aos outros órgãos econômicos, é expressiva a ocupação anterior
na presidência do Banco do Brasil. Isso porque uma característica institucional
da condução da vida econômica brasileira é o das atribuições dos órgãos
autorizados a regular tais atividades. A política econômica era gerenciada pela
Sumoc, pelo Banco do Brasil e pelo Tesouro, do Ministério da Fazenda. A
Sumoc, órgão subordinado diretamente ao MF, tinha um Conselho presidido
40
pelo ministro da Fazenda (Abreu, 1999, p. 185). As atribuições desses órgãos
podem ser vistas no Quadro 2.
Quadro 2. Órgãos gerenciadores da política econômica e suas atribuições
Órgão Atribuições
Conselho Sumoc Órgão normativo da política econômica.
Tesouro Responsável pela emissão de papel moeda e sua amortização através da Caixa de Mobilização Bancária.
Sumoc Órgão de controle. Responsável pela política cambial; fixava o juro de redesconto e o percentual de depósitos compulsórios dos bancos; fiscalizava o registro de capitais estrangeiro; podia operar no mercado aberto e fiscalizava os bancos comerciais.
Banco do Brasil
Agente financeiro do Tesouro autorizado a realizar operações de crédito; depositário de reservas voluntárias dos bancos comerciais; banco comercial e único banco rural. Operava a Carteira de Redescontos para crédito seletivo e de liquidez, e também a Caixa de Mobilização Bancária como emprestador de última instância. Como órgão executor da política definida pela Sumoc, operava a Carteira de Câmbio, que realizava a compra e venda de moedas em taxas fixadas pela Sumoc e a Caixa de Exportação e Importação (Cexim).
Fonte: Abreu, 1999.
A partir daí, a importância assumida pelo Banco do Brasil ganha
destaque. Além do que está em exposição no quadro, a mistura de atribuições
do banco tornava difusa a execução da política monetária, o que dificultava seu
controle. Atritos de orientação entre o Ministro da Fazenda e o Presidente do
Banco do Brasil eram devidos às diferenças de orientações entre os dois
órgãos e, portanto, de lógicas de atuação e de atribuições exigidas. A política
creditícia expansiva era contrária aos imperativos de manutenção de um
orçamento equilibrado e controle da inflação. Quando algum ministro em
exercício era substituído pelo então presidente do Banco do Brasil, a política
monetária – às vezes acompanhada da política fiscal e creditícia, passava a ser
conduzida de forma expansionista em relação à orientação anterior. Isso se
aplica para o ministro Guilherme da Silveira, que substituiu Correia e Castro;
Sebastião Paes de Almeida, que substituiu Lucas Lopes e Ney Neves Galvão,
que substituiu Carvalho Pinto19. Outro ex-presidente do Banco do Brasil, Souza
Costa, não se envolveu em conflito direto com seu antecessor, e deu
prosseguimento, pelo menos em um momento inicial, à sua orientação. Uma
possível explicação é a de que nos episódios em que as possibilidades de
ocorrência de desacordo entre as forças políticas quanto aos rumos da política
monetária e de disponibilidade de crédito aumentavam – como é o caso de
19
A partir da bibliografia consultada. Para os episódios políticos mencionados, ver Skidmore, op.cit e Sola, op. cit.
41
políticas monetário-creditícia restritivas, a posição do ministro tornava-se
vulnerável. A substituição pelos presidentes do Banco do Brasil são episódios
em que o ministro perdeu na correlação de forças existente, pelo abandono do
apoio presidencial.
Quanto ao tempo de carreira total (vida privada e pública) até a chegada
à pasta, em anos, a mediana é 23,5. O ponto inicial da contagem foi a data do
primeiro cargo público ocupado. A carreira menos extensa teve dois anos e a
mais extensa, 37. A distribuição em quartis pode ser vista na Tabela 6.
Tabela 6. Tempo de carreira em anos
Classes (quartis) Frequência %
Até 11 anos 7 25%
12 a 23 7 25%
24 a 30 8 28,5%
31 a 37 6 21,4%
Total 28 100%
Fonte: Elaboração própria, a partir de dados do CPDOC.
Pela tabela, é possível perceber que as carreiras foram construídas de
forma relativamente extensa até a chegada na pasta. Esse número foi
alcançado através da subtração entre o ano em que o ministro assumiu e o ano
em que ocupou o primeiro cargo na vida pública. Não é possível identificar a
partir desses valores, entretanto, a trajetória na sua completude, como as
descontinuidades referentes ao trânsito na vida profissional privada. Mesmo
assim, é interessante assinalar a existência de algum treinamento na vida
pública antes da nomeação. A distribuição dos anos de carreira por governo
segue no Gráfico 2.
42
Fonte: Elaboração própria, a partir de dados do CPDOC.
O ministro escolhido pela Junta Governativa (constituída pelos generais
Tasso Fragoso e Mena Barreto e o almirante Isaías de Noronha), apenas um
caso, era Ministro do Tribunal de Contas na ocasião, funcionário público de
longa data e jornalista. O primeiro governo de Vargas foi formado basicamente
por ministros com experiência de até 10 anos na vida pública. A recente
instalação do governo revolucionário, que pode não ter significado uma ruptura
brusca, inicialmente, com a primeira república, renovou alguns quadros. Em
comparação com os anos de carreira dos ministros do governo de Washington
Luís, por exemplo, em que o próprio Getúlio ocupou o cargo, a mediana foi de
27 anos. O outro caso que destoa visualmente é o do governo de Café Filho,
que teve como ministros José Maria Whitaker e Eugênio Gudin. O primeiro
tinha apenas dois anos de carreira na sua primeira ocupação no governo
provisório de Vargas, e ambos eram figuras que atuavam de forma
43
predominante na vida privada. Para cinco casos não foram encontradas
informações sobre anos de carreira, não tendo sido contabilizados20.
Os cargos ocupados na trajetória na vida pública foram categorizados
em três tipos: cargos eletivos, cargos nomeados e cargos burocráticos. Os
primeiros são os cargos alcançados através de disputa eleitoral, via pleito
majoritário ou proporcional, para algum cargo público. O segundo diz respeito a
cargos de confiança, que não exige ligações ao funcionalismo. São os cargos
de diretoria no geral, assessoria pessoal a alguma figura pública ou outros
cargos de nomeação em órgãos públicos. O terceiro refere-se a cargos que
exigiam algum tipo de seleção oficial anterior, como o concurso público. O
Gráfico 3. mostra a distribuição entre esses cargos em relação ao número total
de cargos ocupados pelos ministros.
Gráfico 3. Distribuição dos tipos de cargo em relação ao total de cargos ocupados pelos
ministros
Fonte: Elaboração própria, a partir de dados do CPDOC.
Essa informação também precisa ser vista de forma relativa, uma vez
que existe uma distorção na forma em que foi construído, oriunda da
20
Casos de Henrique Pereira Barbosa, João Vianna Júnior, Orlando Vilela, Paulo de Lyra Tavares e Romero Cavalcanti Pessoa.
13%
64%
23%
0%
10%
20%
30%
40%
50%
60%
70%
ELETIVOS NOMEADOS BUROCRÁTICOS
44
disparidade dos números de cargos públicos ocupados por cada ministro. Ao
mesmo tempo em que há ministros com 15 cargos públicos ocupados até a
nomeação, como José Maria Alkimin, há aqueles com menos de três, como
Souza Costa. A contabilização, no entanto, foi feita de forma geral. Dito isso, os
cargos nomeados são a grande maioria entre os tipos de cargos que foram
ocupados pelos ministros ao longo de suas carreiras antes de assumir a pasta,
o que indica o tipo de inserção tido na vida pública.
A distribuição dos tipos de cargos ocupados, por governo, pode ser vista
no Gráfico 4. Para esse gráfico, foi considerado o número total de cargos
ocupados, de todos os ministros, para cada um dos tipos de cargo, eletivo,
nomeado ou burocrático. Assim, por exemplo, durante a Era Vargas (1930-
1945), o número de ministros em exercícios – titulares e interinos – foi 6. Para
5 deles, a frequência de cargos eletivos foi 0, e para apenas um, foi de dois
cargos21. Dessa forma, durante a Era Vargas, pode-se afirmar que o número
total de cargos eletivos ocupados pelos ministros até a nomeação,
considerando o número total de ministros, foi 2.
Fonte: Elaboração própria, a partir de dados do CPDOC.
A predominância dos cargos nomeados também está refletida para cada
governo. Os governos de Juscelino Kubitschek e o de João Goulart destacam-
se por esse tipo de cargo ocupado pelos seus ministros. O número de cargos
21 No caso, Osvaldo Aranha, que ocupou os cargos de Intendente de Alegrete e Deputado Federal. Ver Verbete Biográfico – CPDOC.
0
5
10
15
20
25
30
35
Junta Era
Vargas
José
Linhares
Dutra Getúlio
Vargas
Café
Filho
JK Jânio
Quadros
João
Goulart
Gráfico 4. Tipos de cargos ocupados por governo
Eletivos
Nomeados
Burocráticos
45
demonstra, acima de tudo, o tipo de carreira construída por eles até a
nomeação, sendo os cargos de nomeação aqueles com critérios mais
específicos, como confiança, capacidade técnica, reputação junto a grupos de
pressão etc. – em um contexto institucional na qual o tamanho do Executivo é
uma variável fundamental.
A participação em conselhos econômicos ficou dividida: 16 ministros não
participaram de nenhum e 15 participaram de pelo menos um. Para esses
dados, houve escassez de informações em dois casos. A experiência
legislativa anterior somou 11 dos 33 casos.
No tocante à filiação ou proximidade partidária, 19 ministros não
estavam ligados a nenhum partido. A classificação não foi rígida, então não
apenas as filiações formais foram consideradas, mas também quaisquer
evidências de conexão/afinidade presentes nas fontes consultadas22. A Tabela
7. expõe esses números e a distribuição dos partidos para os ministros
nomeados.
Tabela 7. Partido no momento da nomeação
Frequência Percentual Percentual válido
PSD 8 24,2 57,1
UDN 2 6,1 14,3
PRR 1 3 7,1
PSF 1 3 7,1
PTB 1 3 7,1
PTN 1 3 7,1
Total 14 42,4 100
Sem filiação/simpatia 19 57,6
Total 33 100
Fonte: Elaboração própria, a partir de dados do CPDOC.
Dos 14 filiados a algum partido, 7 eram do mesmo partido do presidente
por quem foi nomeado. O PSD é o que mais aparece. Juntamente com a UDN
e o PTB, constituíam-se como os principais partidos no cenário nacional23.
Acordos partidários foram muito relevantes na nomeação de Eugênio Gudin,
ligado a grupos udenistas, no governo de Café Filho; de Horácio Lafer, do PSD,
no segundo governo Vargas e de Clemente Mariani, UDN, no governo de Jânio
Quadros. Além disso, há o caso de intensa articulação partidária de Gastão
Vidigal e de José Maria Alkimin, ambos do PSD, em apoio à campanha
22
Verbetes biográficos do CPDOC. 23
Campello de Souza, op. cit.
46
presidencial de Dutra e Juscelino Kubitschek, respectivamente, que acabou por
render, entre outros fatores momentâneos, a nomeação24.
Perfil ideológico
O processo de construção do Estado nacional e capitalista do Brasil não
foi feito sem sua contrapartida ideológica no que se refere às alternativas a
serem seguidas. Como explica Lourdes Sola, não haveria, então, uma
ausência de ideologias efetivas, como faria supor uma abordagem formalista
centrada no sistema partidário. Segundo a autora, relevante seria analisar
[...] “o processo histórico que explica o deslocamento pelo qual as ideologias mais eficazes – o desenvolvimentismo e o liberalismo econômico – eram mais bem articuladas e sistematicamente transmitidas por profissionais que detinham postos-chave no aparelho de Estado” (Sola, 1998, p. 47).
Assim, justifica-se atentar para a orientação dos ministros da Fazenda. A
seguir (Tabela 8.) a distribuição da orientação pelos ministros, com o
desenvolvimentismo desdobrado em três correntes, segundo a tipologia de
Bielschowsky25. Foi mantida a nomenclatura de “cosmopolitas” de Sola, que
designa os desenvolvimentistas do setor público não-nacionalista.
Tabela 8. Orientação - ideologia econômica
Frequência Percentual Percentual válido
Cosmopolita 10 30,3 45,5
Neoliberal 7 21,2 31,8
Setor privado 3 9,1 13,6
Nacionalista 2 6,1 9,1
Total 22 66,7 100
Sem informações* 11 33,3
Total 33 100 Fonte: Elaboração própria, a partir de dados do CPDOC.
* Incluí o ministro Agenor de Roure e todos os ministros interinos, com exceção de Ovídio de Abreu.
Como mencionado, a tipologia do autor foi construída para a
caracterização de escolas de pensamento. Ele utilizou como fonte a literatura
econômica do período 1945-1964, presente em livros, revistas especializadas e
documentos governamentais (Bielschowsky, 1998, p. 5). Dessa forma, os
objetivos e o que é analisado são diferentes dos objetivos desse trabalho. Nem
todos, no entanto, possuíam posicionamentos sistematizados ou mesmo
definidos sobre as alternativas de desenvolvimento. Mesmo assim, a partir das
24
Verbetes biográficos; Sola, op. cit. e Skidmore, op. cit. 25 1988, op. cit.
47
suas biografias foi possível identificar algum tipo de posicionamento. O Gráfico
5. tem a distribuição das orientações por governo.
Fonte: elaboração própria. * Foram considerados apenas os dados válidos, ou seja, com informação disponível sobre a orientação em ideologia econômica.
É significativa a presença de ministros identificados com o liberalismo,
conforme a Tabela 8. Tais ministros assumiram em momentos de relativas
vitórias de setores mais conservadores. Quanto a esse aspecto, para Sônia
Draibe, a evolução da intervenção estatal nas mais diversas esferas, em
especial a econômica, teria estabelecido graus mínimos de intervenção estatal,
indicando a “irreversibilidade de uma certa estatização das relações
econômicas”. Nesse sentido, o liberalismo teria passado por um processo de
instrumentalização, para que fosse compatibilizado com a intervenção do
Estado (Draibe, 2004, p. 272-273).
A defesa, quando na pasta, de medidas de equilíbrio orçamentário,
contenção da inflação, tratamento do déficit externo, entretanto, não foram
exclusivos de nenhuma das correntes. As diferenças residiam nas prioridades
atribuídas a elas, assim como os graus de intervenção estatal e o ritmo do
desenvolvimento industrial preconizados. Por isso foi possível classificar como
neoliberais Sousa Costa, durante a Era Vargas; Gastão Vidigal, Correia e
Castro no governo Dutra; Eugênio Gudin e José Maria Whitaker no governo
Café Filho – mesmo havendo grandes divergências entre os dois. Whitaker,
que também foi ministro no governo provisório de Vargas, era um banqueiro
0
0,5
1
1,5
2
2,5
3
3,5
4
4,5
Era Vargas José
Linhares
Dutra Getúlio
Vargas
Café Filho JK Jânio
Quadros
João
Goulart
Gráfico 5. Distribuição da orientação em ideologia econômica por governo
Neoliberal Cosmopolita Setor Privado Setor público nacionalista
48
ligado ao setor mercantil-exportador cafeeiro. O setor dependia amplamente da
intervenção estatal, cuja orientação ortodoxa-restritiva de Gudin era
incompatível, mesmo que nenhum deles fosse defensor da industrialização
promovida pelo Estado26. Dando continuidade, também era neoliberal
Clemente Mariani, no governo de Jânio Quadros27. A presença de uma figura
como Sousa Costa, com forte inclinação ao liberalismo econômico, na fase de
maturação do projeto de industrialização pesada de Vargas durante do Estado
Novo, é significativa. Leva a considerações sobre a centralidade do Ministério
da Fazenda na condução desse processo. Um indicativo para o período foi a
transferência de iniciativa da elaboração orçamentária ao Dasp, que o utilizou
como o instrumento possível de planejamento e coordenação econômica
(Draibe, 2004, p. 77-91).
Os cosmopolitas – a maioria – eram Osvaldo Aranha na Era Vargas,
sendo também ministro em seu segundo governo; Pires do Rio, no governo
interino de José Linhares; Ovídio Abreu, interino de Correia e Castro, no
governo Dutra; Horácio Lafer no segundo governo de Vargas; José Maria
Alkimin e Lucas Lopes no governo de Juscelino; Tancredo Neves, Walter
Moreira Salles e Miguel Calmon, durante o período parlamentarista e Carvalho
Pinto, no governo de João Goulart28.
Novamente, as ênfases dadas à intervenção estatal, o ritmo da
industrialização pesada e o controle da inflação e gastos públicos variaram. O
controle da inflação e o equilíbrio orçamentário seriam condições ao
desenvolvimento econômico, nos termos definidos a essa corrente. Horácio
Lafer, por exemplo, era um empresário ligado à produção de bens de capital,
atuante nos interesses setoriais da e importante articulador da instalação da
26
Draibe, op. cit. Sobre as divergências entre Eugênio Gudin e José Maria Whitaker, e como o primeiro deixou o cargo, ver Demosthenes Madureira de Pinho Neto, O interregno Café Filho: 1954-1955, in Abreu, op. cit. 27
Principais fontes consultadas, por ministro: Sousa Costa, fonte: Verbete CPDOC e Draibe, op. cit., p. 100; Gastão Vidigal, verbete CPDOC e Abreu, 1995, p. 109; Correia e Castro: verbete CPDOC, Skidmore, op. cit., p. 97 e Draibe, op. cit., p. 145-268-277; Eugênio Gudin: verbete CPDOC e Bielschowsky, 1988, p. 41; José Maria Whitaker: verbete CPDOC, Abreu, 1995, p. 157 e Draibe, op. cit., p. 264; Clemente Mariani: verbete CPDOC e Sola, 1998, p. 248. 28 Principais fontes consultadas, por ministro: Osvaldo Aranha, fonte: Verbete CPDOC, Skidmore, op. cit., p. 440 e Bulhões, 1955, p. 222; José Pires do Rio, verbete CPDOC; Horácio Lafer, verbete CPDOC e Bielschowsky, op. cit., p. 103; José Maria Alkimin, verbete CPDOC e Sola, op. cit., p. 186; Lucas Lopes, verbete CPDOC, Bielschowsky, op. cit., p. 103 e Bulhões, op. cit., p. 216; Tancredo Neves, verbete CPDOC; Walter Moreira Salles, O Estado de S. Paulo, 12 set. 1961, p. 40 e Miguel Calmon, O Estado de S. Paulo, 04 jan. 1963, p. 17.
49
Comissão Mista Brasil-Estados Unidos – não hesitou, no entanto, em defender
uma política monetária mais rígida como forma de combate à inflação.
Envolveu-se em conflitos com o Banco do Brasil por conta de tal orientação
(Sola, 1998, p. 116).
É interessante apontar, além disso, a relevância no controle de alguns
conhecimentos técnicos. A nomeação de Lucas Lopes, um dos técnicos que
elaborou o Plano de Metas, foi precedida de uma negociação mal sucedida de
José Maria Alkimin com o FMI, cujas exigências iam em direção oposta à
execução do Plano de Metas – apesar do comprometimento de Alkimin com o
Plano. A falta de domínio técnico sobre o assunto e a decisão política de
restringir aos técnicos a participação nas negociações com o Fundo teria
levado a tal resultado, conforme apontado por Lourdes Sola (1998, p. 188).
Outro caso interessante é o de Osvaldo Aranha. Sua ocupação na pasta em
dois momentos distintos poderia ser atribuída ao seu histórico com o
presidente, que data da origem de ambos na política do Rio Grande do Sul,
pois o ministro não demonstrava o mesmo entusiasmo com o projeto de
industrialização pesada conduzido pelo Estado, apesar de não ser contrário a
ele. Também não era hostil aos capitais estrangeiros. Por ter sido um dos
tenentistas civis mais destacados, acreditava nos efeitos benéficos da
centralização e racionalização administrativa. Mesmo assim, considerava a
manutenção das contas públicas em dia e o controle da inflação como
essenciais, e, além disso, também era um defensor da “lavoura” (Bulhões,
1955, p. 227).
Os desenvolvimentistas do setor privado foram Guilherme da Silveira, no
governo Dutra; Sebastião Paes de Almeida, no governo JK e Ney Neves
Galvão no governo de João Goulart. Guilherme da Silveira acreditava que o
crédito tinha uma função essencial no desenvolvimento econômico, como meio
de financiar os investimentos (Bulhões, 1955, p. 215). Paes de Almeida, por
sua vez, diante da oposição dos meios empresariais decorrente das limitações
ao crédito industrial previstos no Plano de Estabilização Monetária,
acompanhou tais queixas, e enquanto presidente do Banco do Brasil recusou-
se a limitar o crédito. Nesse embate de forças, Lucas Lopes foi substituído29.
29
Principais fontes consultadas, por ministro: Guilherme da Silveira, fonte: Verbete CPDOC, Draibe, op. cit., p. 269 e Bulhões, op. cit. p. 215; Sebastião Paes de Almeida, verbete CPDOC,
50
Os desenvolvimentistas do setor público nacionalista foram Ovídio de
Abreu, interino de Correia e Castro, no governo Dutra e Francisco de San
Tiago Dantas, no governo de João Goulart, mais enfáticos quanto à atuação
estatal na atividade econômico e com um posicionamento mais específico
quanto às políticas de cunho social30.
Capítulo 3. Os ministros e suas medidas
Antes da exposição do caráter das medidas em política econômica
adotadas pelos ministros – objetivo do capítulo – é oportuno um exame mais
cuidadoso sobre as condições de nomeação e saída dos ministros do
Ministério da Fazenda, em especial pela conexão que é estabelecida com as
informações sobre o perfil, em sua dimensão social, profissional/institucional e
ideológica.
Retomando a proposição do trabalho, o perfil dos ministros não
guardaria relações com o padrão de política econômica da época, pelo menos
não de forma automática. No que diz respeito a atributos sociais, eles parecem
ser um grupo homogêneo. Uma informação adicional é a que todos eles, em
algum momento de suas carreiras, passaram por ocupações que lhes
forneceram algum tipo de treinamento, mesmo que prático, com a gestão
econômica. As diferenças aparecem nas formas de inserção institucional
assumidas em suas carreiras, e os grupos político-econômicos dos quais
faziam parte. A Tabela 9. mostra como os ministros foram nomeados: se
diretamente pelo presidente ou chefe do governo em exercício, se pelo
presidente em atendimento a pressões de grupos políticos, pela indicação de
algum órgão econômico ou em substituição ao ministro da ocasião. É
importante destacar que as informações encontradas não deixam de retratar
leituras heterogêneas nos relatos de cada conjuntura política, a partir da
diversidade das fontes consultadas.
Skidmore, op. cit., p. 219 e Bielschowsky, op. cit., p. 403 e Ney Galvão, verbete CPDOC e O Estado de S. Paulo, 21 set. 1963, p. 19. 30 Principais fontes consultadas, por ministro: Ovídio de Abreu, fonte: verbete CPDOC e San Tiago Dantas, verbete CPDOC, Bielschowsky, op. cit., p. 361-415, Skidmore, op. cit., p. 286 e Sola, op. cit., p. 275.
51
Tabela 9. Nomeação dos ministros
Frequência Percentual
Presidente 13 39,4
Substituto legal 9 27,3
Pressões de grupos políticos 5 15,2
Primeiro-Ministro 3 9,1
Órgão econômico 2 6,1
Junta Governativa 1 3
Total 33 100
Fonte: Elaboração própria, a partir de dados do CPDOC.
A escolha pessoal do presidente é a forma com maior freqüência. No
regime presidencialista, com o Poder Executivo forte e centralizador, existe um
papel-chave assumido pelo presidente. Segundo Sônia Draibe, isso se daria
pela ausência de órgãos e mecanismos técnicos de coordenação e planificação
em um contexto de múltiplos instrumentos de intervenção e regulação. Dessa
forma, “reforçou-se o poder presidencial na medida em que ele se tornou a
memória e a garantia da execução do projeto mais global [...] que nascia na
Presidência e no núcleo político mais ativo do Executivo” (Draibe, 2004, p.
114). Ser parte do círculo de confiança do presidente foi um atributo relevante.
Outra forma de nomeação é a do presidente em atendimento a pressões
de grupos políticos. Alguns episódios em que um ministro é escolhido mais
diretamente por ser parte de um grupo político-econômico são sintomáticos.
Um exemplo é a escolha de José Maria Whitaker, banqueiro, como ministro do
Governo Provisório. Ser uma figura reconhecida nos meios financeiros
internacionais e possuir ligação com o setor cafeeiro justificou a escolha do seu
nome em um período sensível da conjuntura política. No governo Café Filho
houve uma situação semelhante no tocante ao uso da autoridade do ministro
no setor cafeeiro. Sua escolha resultou de um acordo feito pelo presidente com
Jânio Quadros, para que fosse relaxada a política creditícia. A escolha de
Horácio Lafer esteve intimamente ligada a acordos partidários feitos por Getúlio
para sua reeleição. A nomeação de Paes de Almeida esteve relacionada com
apelos empresariais pelo relaxamento da política creditícia. Walter Moreira
Sales e Carvalho Pinto, por sua vez, foram chamados por suas reputações
juntos aos setores conservadores e credores internacionais, no conturbado
ínterim entre o regime parlamentarista e o fracasso do Plano Trienal. É
52
importante destacar, contudo, que mesmo nessas situações o presidente pôde
escolher o indivíduo a ser nomeado, por ter essa prerrogativa.
Entre os substitutos legais e os indicados por órgãos econômicos estão
os interinos. Os órgãos foram a Sumoc e o Banco do Brasil. A indicação do
Primeiro-Ministro e da Junta Governativa são escolhas da chefia do governo
em exercício.
A apresentação da distribuição das condições de nomeação por governo
pode ser vista no Gráfico 6.
Fonte: Elaboração própria, a partir de dados do CPDOC.
O gráfico oferece uma visualização mais detalhada das condições
mencionadas na Tabela 9. A seguir, as formas gerais de motivação de saída
dos ministros (Tabela 10).
Tabela 10. Motivos de saída da pasta
Frequência Percentual
Interinos 12 36,4
Fim do mandato 9 27,3
Reforma ministerial 4 12,1
Discordância com o presidente 4 12,1
Pressões de grupos políticos 2 6,1
Demissão para concorrer a cargo eletivo 2 6,1
Total 33 100
Fonte: Elaboração própria, a partir de dados do CPDOC.
0
0,5
1
1,5
2
2,5
3
3,5
Junta Era Vargas José Linhares
Dutra Getúlio Vargas
Café Filho JK Jânio Quadros
João Goulart
Gráfico 6. Condições de nomeação por governo
Presidente Pressões de grupos políticos Substituto legal Órgão econômico Chefia de governo
53
Os motivos de saída distribuídos por governo podem ser vistos no
Gráfico 7.
Fonte: Elaboração própria, a partir de dados do CPDOC.
A saída por pressões de grupos políticos foi classificada como as
situações em que o ministro foi demissionário por esse motivo. José Maria
Whitaker exonerou-se por conta das pressões exercidas pelos próprios
cafeicultores paulistas, que o acusavam de favorecimento aos setores
financeiros em detrimento da lavoura. Eles haviam conseguido afastar do
governo nomes de sustentação ao ministro, como o secretário da Fazenda de
São Paulo, Numa de Oliveira, e o interventor do estado, Laudo de Camargo.
Outro caso é do ministro Correia e Castro, que sofreu oposição frontal de
órgãos de classe do setor cafeeiro e da bancada paulista, e pôde resistir até a
divulgação de uma carta que teria enviado ao Secretário do Tesouro norte-
americano, na ocasião da visita da Missão Abbink, considerada “humilhante” ao
país. Depois disso, pediu demissão, que foi aceita pelo presidente.
Reformas ministeriais foram mudanças encabeçadas pelo presidente,
seja por motivos estratégicos ou mudança de orientação. Esse é o caso da
substituição de Osvaldo Aranha por Souza Costa, de Horácio Lafer por
0
0,5
1
1,5
2
2,5
3
3,5
Junta Era
Vargas
José
Linhares
Dutra Getúlio
Vargas
Café Filho JK Jânio
Quadros
João
Goulart
Gráfico 7. Motivos de saída por governo
Fim do mandato Pressões de grupos políticos
Reforma ministerial Demissão para concorrer a cargo legislativo
Discordância com o Presidente Interinos
54
Osvaldo Aranha, de Lucas Lopes por Sebastião Paes de Almeida e de San
Tiago Dantas por Carvalho Pinto.
Foram dois casos de demissão para desincompatibilização para a
disputa de algum cargo eletivo: Gastão Vidigal para disputar a prefeitura de
São Paulo e José Maria Alkimin para concorrer ao Congresso, embora sua
saída tenha sido permeada pela polêmica com o acordo do FMI.
Saídas por discordância com o presidente foram ocasiões em que o
presidente não apoiou a orientação do ministro, o que enfraqueceu sua posição
e o levou ao pedido de demissão. Foi o caso do Eugênio Gudin, que teve um
desentendimento com Café Filho desde o início de 1955 por ter o presidente
negociado com Jânio Quadros um afrouxamento da política econômica do
governo. Discordou que se entregasse o Ministério da Fazenda e o Banco do
Brasil à direção de paulistas, que, segundo ele, interromperiam o programa de
estabilização. José Maria Whitaker, em sua segunda gestão à frente da pasta,
pediu de demissão por Café Filho ter submetido à aprovação do Congresso o
projeto de reforma cambial apresentado por ele. Clemente Mariani teve um
desentendimento inicial com Jânio Quadros, por este tê-lo criticado
abertamente. Permaneceu até a renúncia, pois seu pedido de demissão inicial
não foi aceito por Jânio, e não teve outra oportunidade. Carvalho Pinto pediu
demissão por ter se desentendido com João Goulart no episódio em que este
teria convidado César Prieto para assumir o cargo de ministro extraordinário
para Arrecadação e Fiscalização das Rendas da União sem consultá-lo31.
Após essa apresentação, o resumo da orientação geral da política
econômica dos ministros titulares pode ser vista no Quadro 3.
Quadro 3. Resumo da orientação geral das políticas econômicas adotadas entre 1930 e 1964
Ministro Orientação geral
Whitaker/ 1930 – Neoliberal
Primeiros enfrentamentos do choque de 1929; valorização do café e pagamento do serviço da dívida.
3131
Verbetes biográficos; Draibe, op. cit. Sola, op. cit. e Skidmore, op. cit.
55
Osvaldo Aranha/1931 – Cosmopolita
Tentativas de racionalização da atividade fazendária, com a busca de equilíbrio orçamentário e no balanço de pagamentos. Manutenção da política de valorização do café, acentuando a nacionalização da política. Formalização de um regime de taxa cambial única, combinada com o controle de importações operado pelo Banco do Brasil, que tinha a função de racionar divisas com base em critérios de essencialidade. Deu início ao chamado "processo de substituição de importações", pelos efeitos protecionistas à produção interna que causou, somado à desvalorização cambial. A política cambial, combinada com outras, no entanto, tinha como objetivos iniciais o pagamentos dos serviços da dívida externa, ainda assim sendo um importante instrumento de política econômica disponível ao governo.
Sousa Costa/1934 – Neoliberal
Até 1937 houve a mesma orientação de Osvaldo Aranha, com ativos esforços na questão do pagamento dos serviços da dívida, o que incluía a política cambial. A partir do Estado Novo, houve preocupação maior do presidente ao reequipamento da economia e realização de compras militares. Foi estabelecido o monopólio cambial a uma taxa unificada e controle de importações administrado pelo Banco do Brasil. No início da década de 1940 surgem iniciativas envolvendo o governo federal na esfera produtiva, e foi acentuado seu papel coordenador e promotor da atividade econômica, com a criação do Conselho Técnico de Economia e Finanças (CTFE), o Conselho Federal do Comércio Exterior (CFCE) e as carteiras de crédito do Banco do Brasil. Criação da Superintendência da Moeda e do Crédito (Sumoc).
Pires do Rio/1945 – Cosmopolita
Tentativas de contenção da inflação através da diminuição do meio circulante. Limitação das operações da Carteira de Redescontos do Banco do Brasil. Transferência das atribuições da Caixa de Mobilização e Fiscalização Bancária para a Superintendência da Moeda e do Crédito (Sumoc).
Gastão Vidigal/1946 – Neoliberal
Medidas de redução das despesas públicas como meio de conter a inflação, o que incluía os gastos com funcionalismo, investimento público e crédito. Também serviam aos propósitos de diminuição do tamanho do Estado na atividade econômica. A criação de uma comissão encarregada de desativar o Departamento Nacional do café é um exemplo. Medidas de controle da circulação monetária. Liberalização da política cambial, com o fim da separação entre o câmbio livre e oficial, como forma de combate à inflação e de atração de fluxos de capitais.
Correia e Castro/1946 – Neoliberal
Manutenção inicial do liberalismo na política cambial, com uso das reservas acumuladas durante a guerra. Sobrevalorização do câmbio também como forma de política antiinflacionária. Não houve reajustes salariais em todo o governo Dutra. Políticas fiscais e monetárias severamente contracionistas, com a contenção de investimentos públicos e redução de emissões de moeda. Continuação da sustentação dos preços do café. Restabelecimento do controle de cambiais em 1947.
Guilherme da Silveira/1949 – Setor privado
Manutenção da taxa sobrevalorizada do câmbio, de forma a atender à demanda contida por matéria-prima e bens de capital durante a guerra, para reequipamento da indústria, sendo a liberação de importações para bens de consumo uma tentativa baixista dos preços industriais. Seria uma forma de política antiinflacionária. Mas o sistema de licenças prévias para importação – controle de cambiais – foi cada vez mais encarado como política industrial. Política de crédito ascendente e elaboração do Plano Salte (Saúde, Alimentação,Transporte e Energia), primeira tentativa de planejamento estratégico no plano econômico.
Horácio Lafer/1951 – Cosmopolita
Tentativas de estabilização da economia e atuação do Estado nas atividades econômicas. Manutenção da taxa de câmbio fixa e sobrevalorizada e o regime de licenças prévias para importar. Políticas monetária e fiscal rígidas. Houve, ao mesmo tempo, expansão creditícia e elevadas taxas de investimento. O BNDE foi criado em 1952. Havia a expectativa de financiamento dos EUA para o projeto de desenvolvimento brasileiro. Instituição da Lei do Mercado Livre (Lei 1807), que estabeleceu um sistema de taxas múltiplas de câmbio.
Osvaldo Aranha/1953 – Cosmopolita
Comprometimento inicial com a aplicação de medidas antiinflacionárias. Reorganização do Ministério da Fazenda de modo a agilizar o mecanismo fazendário e fiscal. Manutenção do Estado coordenador, promotor e ator de atividades econômicas. Instrução 70 da Sumoc, que instituiu taxas múltiplas de câmbio, sendo a política cambial importante instrumento de política econômica do governo. Fixação do preço do café brasileiro nos níveis mais elevados do mercado internacional. Subordinação do Banco do Brasil ao Ministério da Fazenda. Expansão creditícia.
56
Eugênio Gudin/1954 – Neoliberal
Elaboração de rígida política de estabilização destinada a combater a inflação, reequilibrar as contas externas e garantir o apoio de entidades financeiras internacionais. Isso foi feito com o corte de despesas públicas (inclusive investimentos) e na contenção da expansão monetária e creditícia. Instrução 113 da Sumoc, que tinha como objetivo a criação de condições favoráveis à realização de investimentos estrangeiros no país. A liberalização do fluxo de capitais inseria-se em um contexto mais amplo. Aplicação do chamado "confisco cambial" do setor exportador, em especial do café, pois a receita dos ágios oriundo da política cambial era uma fonte de arrecadação não-inflacionária do setor público.
Whitaker/1955 – Neoliberal
Alívio da política monetária, devido à crise de liquidez. Expansão do crédito. Suspensão do programa de compra de estoques de café pelo governo, tendo em vista a redução da despesa pública e a eliminação dos produtores menos eficientes. Aumento das bonificações nas exportações de café. Elaboração de uma reforma cambial.
Alkimin/1956 – Cosmopolita
Participação do Ministério da Fazenda no Conselho de Desenvolvimento, criado em 1956 e responsável pela elaboração do Plano de Metas. O plano definiu os investimentos a serem feitos, tendo cinco principais áreas tidas como prioritárias: energia, transporte, alimentação, indústrias de base, e educação. E a meta autônoma da construção de Brasília. A criação de grupos setoriais foi relevante para a execução do Plano. A política cambial foi importante instrumento de política econômica disponível, como a Instrução 113 da Sumoc. O sistema de taxas múltiplas foi posteriormente simplificado. A política monetária simultaneamente assegurou o crédito necessário à expansão dos investimentos públicos e atenuou as consequências mais perturbadoras da inflação. Manutenção do confisco cambial. Financiamento inflacionário. Crédito oferecido pelo BNDE. Estado como provedor de insumos básicos. Ênfase no setor industrial.
Lucas Lopes/1958 – Cosmopolita
Elaboração do Plano de Estabilização Monetária, que tinha como base quatro medidas principais: limitação da oferta de meios de pagamento, através de restrição ao crédito; maior controle dos gastos públicos, conjugado com o aumento nos impostos sobre a renda e o consumo; menores reajustes salariais; e eliminação dos subsídios cambiais. Contou com o apoio do FMI. Havia instrumentos heterodoxos como forma de contenção dos meios de pagamento. Um deles era a manipulação dos empréstimos das diversas carteiras do Banco do Brasil (regulação da base monetária). O outro era a compra e venda de divisas nas operações de câmbio, com a venda de Promessas de Venda de Câmbio (PVC). Planejamento de cortes nos gastos de custeio, mas o que ocorria eram cortes de gastos de investimentos. Rompimento com o FMI por parte do presidente quando foi constatada a inviabilidade política da aplicação do Plano de Estabilização, que poderia vir a comprometer a execução do Plano de Metas.
Paes de Almeida/1959 – Setor privado
Reatamento das negociações com o FMI, Banco Mundial e Banco Interamericano de Desenvolvimento. Emissão de moeda em larga escala, com a política cambial, creditícia e agrícola expansionistas.
Clemente Mariani/1961 – Neoliberal
Objetivos de correção do desequilíbrio orçamentário e do déficit do balanço de pagamentos, o que implicava a redução das despesas governamentais, a restrição do crédito e o estímulo às exportações. Reforma cambial, com a Instrução 204 da Sumoc, que eliminou os leilões de cambiais para a categoria geral de importações e permitiu que fossem realizadas à taxa livre. A reforma possibilitou um empréstimo do FMI ao Brasil.
Moreira Sales/1961 – Cosmopolita
As contradições internas do governo e a curta duração dessa equipe ministerial impediram a implantação de um programa econômico-financeiro coerente.
Miguel Calmon/1962 – Cosmopolita
Tentativa de implantação de um plano de estabilização da moeda e a diminuição do déficit de caixa do Tesouro.
San Tiago Dantas/1963 – Nacionalista
Comprometimento com o programa de austeridade econômica, baseado nas diretrizes traçadas em fins de 1962 pelo Plano Trienal de Desenvolvimento Econômico e Social, de autoria de Celso Furtado, ministro extraordinário para o Planejamento.
Carvalho Pinto/1963 – Cosmopolita
O ministério elaborou medidas para diminuir a quantidade de dinheiro circulante, reduzir o déficit federal e controlar a concessão de crédito
57
Ney Galvão/1963 – Setor Privado
Os objetivos prioritários seriam o incremento das exportações, o aproveitamento da capacidade ociosa de setores da indústria de base, o reaparelhamento do sistema tributário, a reavaliação da colaboração federal no equilíbrio orçamentário dos Estados, o fortalecimento do mercado de títulos e o financiamento à agricultura de subsistência. Revogação da Instrução nº 255 da Sumoc. Monopólio do Banco do Brasil sobre as divisas obtidas pelas exportações de café e açúcar. Manutenção dos subsídios sobre o petróleo e trigo. Regulamentação da lei sobre capital estrangeiro.
Fonte: Elaboração própria, a partir dos verbetes biográficos do CPDOC/FGV e ABREU, 1995, p. 31 a 212 (capítulos 2 ao 8).
Uma primeira impressão pode ser o da relativa disparidade entre o
que foi apresentado no perfil ideológico e as medidas tomadas de fato.
Vale dizer, no entanto, que o produto final das políticas econômicas não
se constituiu como competência privativa dos ministros, e esteve sujeita a
uma série de externalidades, além dos imperativos impostos pelo cargo,
mais pragmáticos32.
Vale uma comparação entre as informações da seção dedicada ao
perfil ideológico e a recorrente manifestação a políticas mais ou menos
estabilizadoras ao longo do período, com poucas exceções (como a
gestão de Guilherme da Silveira, José Maria Alkimin, Sebastião Paes de
Almeida e Ney Galvão, com políticas mais expansionistas).
A esse respeito, em uma análise do segundo governo Vargas,
Pedro Fonseca fez algumas críticas ao que ele chamou de “mito do
populismo econômico” do presidente. Segundo o autor, não haveria
incompatibilidade entre um governo afinado com o desenvolvimentismo
optar por políticas de estabilização austeras ou contracionistas, em certas
conjunturas e diante de determinadas circunstâncias. O momento inicial
do segundo governo Vargas ilustraria o fato.
O discurso presidencial continuava a defender o projeto de desenvolvimento, mas alertava que não se poderia ignorar as adversidades “herdadas” (no que já criticava Dutra), com o risco de, ao
agravar‑se as finanças internas e o desequilíbrio externo,
comprometer‑se a própria execução do programa de crescimento
(Fonseca, 2011, p. 64-65).
A avaliação feita por Lourdes Sola sobre o ensaio de estabilização
monetária em 1953, o Plano de Estabilização Monetária (PEM) em 1958 e
o Plano Trienal apontam na mesma direção. Tais experiências contrariam
32
Uma forma mais interessante de abordar a ideologia econômica seria através das medidas propostas que não foram aprovadas, apesar de não ter sido possível explorar tal aspecto.
58
a incompatibilidade mencionada por Fonseca, embora encabeçadas por
técnicos de orientações distintas, ainda que ligados ao enquadramento
mais geral desenvolvimentista. A diferença atribuída entre o PEM e o
Plano Trienal marcaria as concepções distintas do que viria a ser a
necessidade econômica entre os técnicos cosmopolitas e nacionalistas:
A flexibilidade, observável no texto do Plano [Trienal], quanto ao uso de alguns instrumentos monetários e fiscais, assim como a defesa de uma política de exportações mais agressiva, não deve obscurecer a prioridade atribuída à política de investimentos (Sola, 1998, p. 259).
Conclusão
Os objetivos propostos no início do trabalham tinham por pretensão
verificar em que medida seria possível associar o perfil dos ministros da
Fazenda ao padrão de política econômica existente a partir de 1930. A partir da
contextualização política e econômica do período desenvolvimentista (capítulo
1), de uma sistematização geral do perfil dos ministros (capítulo 2), e da
sistematização das medidas em política econômica tomadas por eles (capítulo
3), é possível elaborar algumas conclusões.
A evolução do padrão de ação estatal intervencionista assumiu um
caráter irreversível na medida em que foram estabelecidos, ao longo do
período considerado, padrões de intervenção mínimos na atividade econômica
– dada a centralidade do Estado nesse contexto, tendo nesse movimento
promovido a estatização da luta das classes econômicas, com a definição dos
canais de acesso disponíveis. O que faz do Ministério da Fazenda, juntamente
com outros órgãos públicos de regulação econômica, objeto de pressões dos
diversos segmentos sociais organizados politicamente ou não.
A posição de ministro traz consigo as responsabilidades atribuídas à
posição, tanto do ponto de vista legal quanto do ponto de vista político. Ocupar
o cargo significou tornar-se responsável por tais atribuições, através do
imperativo do equilíbrio orçamentário, arrecadação tributária, déficit público
externo e interno e controle da inflação. Ocasiões significativas de expansão
creditícia e consequente relaxamento da política monetária foram conduzidas
por ex-Presidentes do Banco do Brasil, órgão que atuava sob outro tipo de
lógica, embora não tenha sido sua exclusividade.
59
O perfil, em sua dimensão social, assinala as características em comum
dos ministros: todos são homens, com idade de chegada à pasta por volta
dos52 anos (mediana), na sua maior parte originários da região centro-sul, sem
herança política significativa, a maioria com ensino superior. A dimensão
profissional/institucional delineou as diferentes formas de construção de
carreira dos ministros: através da carreira predominantemente na vida pública,
com trânsitos na vida privada ou o inverso, ingresso na vida pública já a partir
de cargos elevados, por conta da carreira construída na vida privada, entre
outros caminhos. Ainda, as formas de carreira na vida pública poderiam variar
a partir do tipo de cargo exercido, ou seja, se nomeado, burocrático ou eletivo.
Eles poderiam dividir-se ainda quanto à experiência legislativa, filiação
partidária ou participação em conselhos econômicos. Uma característica
adicional foi a observação de que todos eles, em algum momento de suas
trajetórias, pôde treinar-se na gestão econômica33.
As considerações sobre o recrutamento devem levar em conta o caráter
do sistema presidencialista brasileiro, com o Poder Executivo forte. A
prerrogativa de nomeação e substituição dos ministros é do presidente. A
escolha pode ser feita de forma estratégica ou em resposta a demandas de
grupos políticos, e mesmo nesses casos, o ministro deve ser depositário de
confiança do presidente, pelo menos minimamente. O relacionamento pessoal
com o presidente, o tipo de caminho institucional percorrido, a reputação, a
experiência na gestão econômica e os posicionamentos declarados foram os
fatores de escolha observados na nomeação dos ministros da Fazenda.
A combinação do perfil profissional/institucional ao perfil ideológico
mostrou-se decisiva nas ocasiões políticas de nomeação. A sua relação com o
padrão de política econômica, entretanto, merece algumas pontuações. Como
foi mencionado, o padrão de ação estatal intervencionista foi uma constante
durante o período. De forma recorrente, outras instâncias do aparelho estatal
assumiram protagonismo em levar adiante o projeto industrializante34. Apesar
33 A partir do banco de dados construído, que explorou toda a trajetória dos ministros até o momento de sua nomeação para a pasta. 34
A utilização da elaboração orçamentária como a forma possível de planejamento econômico pelo Dasp, a criação da Assessoria Econômica no segundo governo Vargas, a criação do Conselho de Desenvolvimento, que elaborou o Plano de Metas no governo JK e todos os outros órgãos econômicos que atuaram durante o período, além do importante papel desempenhado pelos técnicos, em momento de mobilização política do saber econômico (Sola,
60
disso, e das outras constrições mencionadas, é possível identificar as
impressões de cada ministro na condução da política econômica,
especialmente a partir de seus posicionamentos pessoais quanto aos rumos do
desenvolvimento capitalista a ser seguido no Brasil. No entanto, a força do
ministro baseia-se na força do próprio presidente, e quando este está
enfraquecido ou deixa de apoiar as decisões do ministro, este não tem
condições de permanecer no cargo. A sua autonomia estaria limitada a um rol
de escolhas acordado.
op. cit.). Fazer um mapeamento do locus de elaboração da política econômica entre 1930-64 não é o objetivo desse trabalho, mas é importante manter em mente o lugar ocupado por esses órgãos.
61
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SILVA, E. & SILVA, T. Eleições no Brasil antes de 1945: os casos de 1933 e 1934. In: III Seminário Discente da Pós-Graduação em Ciência Política, 2013, Universidade de São Paulo, São Paulo, Mesa 11.2. Disponível em [http://www.fflch.usp.br/dcp/assets/docs/III_SD_2013/Mesa_11.2_-_Thiago_Nascimento_e_Estevao_Silva_III_SD_2013.pdf>. Acesso em maio de 2015].
SKIDMORE, T. E. Brasil: de Getúlio a Castelo. 8ª ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1992.
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VENÂNCIO FILHO, Alberto. Das Arcadas ao Bacharelismo – Cento e cinqüenta anos de ensino jurídico no Brasil. São Paulo: Perspectiva, 1977.
63
Portais Eletrônicos
Portal Ministério da Fazenda – Galeria dos Ministros da Fazenda [http://www.fazenda.gov.br/institucional/galeria-dos-ministros/republica]. Acesso em abril de 2014.
Portal Ministério da Educação – Galeria dos Ministros [http://portal.mec.gov.br/index.php?Itemid=945&id=13462&option=com_content&view=article]. Acesso em maio de 2015.
Portal Fundação Alexandre Gusmão – Ministros das Relações Exteriores [http://www.funag.gov.br/chdd/index.php?option=com_content&view=article&id=134&Itemid=92]. Acesso em maio de 2015.
Portal Ministério da Justiça – Ministros de Estado da Justiça e Negócios Interiores [http://portal.mj.gov.br/data/Pages/MJAD82FBF6ITEMID0E82BAD7FD324B3387A93492B8E9C0A4PTBRNN.htm]. Acesso em maio de 2015.
Verbetes biográficos do Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil (CPDOC). Disponíveis em: < http://cpdoc.fgv.br/>. Acesso em abril de 2014.
64
ANEXO I
Demonstrativo geral de órgãos públicos criados entre as décadas de 1930 a 1950
Órgãos destinados a equilibrar consumo e produção em setores agrícolas e extrativos ou reger sua importação e exportação
1º Vargas/1930-1945
Departamento Nacional do Café 1933
Instituto Nacional do Açúcar e do Álcool 1933
Departamento Nacional da Produção Mineral 1934
Instituto Nacional do Mate 1938
Conselho Nacional do Petróleo 1938
Instituto Nacional do Sal 1940
Conselho Nacional de Minas e Metalurgia 1940
Instituto Nacional do Pinho 1942
Dutra/1946-1951
Comissão Nacional do Trigo 1946
Comissão Executiva de Defesa da Borracha 1947
Comissão de Industrialização do Xisto Betuminoso 1950
2º Vargas/1951-1954 Comissão Nacional de Política Agrária 1951
Instituto Brasileiro do Café 1952
Órgãos destinados a aplicar medidas de incentivo à indústria privada
1º Vargas/1930-1945
Comissão de Similares 1934
Conselho Nacional de Política Industrial e Comercial 1943
Comissão do Financiamento de Investimentos 1944
Comissão de Planejamento Econômico 1944
Dutra/1946-1951 Comissão de Investimentos 1947
2º Vargas/1951-1954
Comissão de Desenvolvimento Industrial 1951
Comissão Executiva da Indústria de Material Automobilístico 1954
Comissão Executiva da Indústria de Material Elétrico 1954
Órgãos destinados à implantação, ampliação ou remodelação de serviços básicos de infra-estrutura para a industrialização
1º Vargas/1930-1945
Conselho Federal do Comércio Exterior 1934
Conselho de Águas e Energia Elétrica 1939
Comissão Nacional do Gazogênio 1939
Comissão Executiva do Plano Siderúrgico 1940
Conselho Nacional de Ferrovias 1941
Comissão do Vale do Rio Doce 1942
Comissão do Plano Rodoviário Nacional 1942
Comissão de Combustíveis e Lubrificantes 1942
Coordenação da Mobilização Econômica 1944
Dutra/1946-1951 Comissão do Vale do São Francisco 1948
2º Vargas/1951-1954 Comissão de Coordenação e Desenvolvimento dos Transportes 1952
Comissão Executiva do Carvão Nacional 1953
Órgãos destinados a ingressar diretamente em atividades produtivas
1º Vargas/1930-1945
Companhia Siderúrgica Nacional 1941
Companhia Vale do Rio Doce S.A. 1942
Banco de Crédito da Borracha 1942
Companhia Nacional de Álcalis 1943
Fábrica Nacional de Motores 1943
Banco Nacional de Crédito Cooperativo 1943
Companhia Hidrelétrica de São Francisco 1945
2º Vargas/1951-1954
Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico 1952
Banco do Nordeste do Brasil S.A. 1952
Instituto Nacional do Babaçu 1953
Petrobrás S.A. 1953
Companhia Nacional de Seguros Agrícola 1954
Fonte: Elaboração própria a partir de Draibe, 2004 e Souza, 1976.
65
ANEXO II
Correntes do pensamento econômico
Neoliberal
Desenvolvimentista Socialista
Setor público (não nacionalista)
Setor privado Setor público (nacionalista)
Orientação teórica
Teorias clássicas e
neoclássicas (liberalismo)
Ecletismo pós-
keynesiano
Ecletismo pós-keynesiano;
Prebisch
Ecletismo pós-keynesiano;
Prebisch
Materialismo
histórico
Projeto econômico básico
Crescimento equilibrado via
forças de mercado
Industrialização em ritmo compatível com equilíbrio, com intensa
participação do capital estrangeiro e com planejamento parcial
Industrialização com proteção
estatal ao capital industrial nacional
Industrialização planificada e fortemente apoiada
por empreendimentos estatais
Viabilizar o desenvolvimento
capitalista para preparar a passagem ao
socialismo. Industrialização planificada em
bases estritamente nacionais e reforma agrária
Teses básicas
No Brasil não
há desemprego, apenas baixa
produtividade
Tese dos "pontos de estrangulamento/pontos de crescimento"
Crédito à produção como instrumento de
crescimento
Teses cepalinas Tese da etapa antifeudal e anti-imperialista
Interpretação do processo de crescimento
Crescimento desequilibrado
e ineficiente, por erros de política
econômica
Existência de tendências a
desequilíbrios não corrigidas (confirmadas por erros de política
econômica)
Substituição de importações
Substituição de
importações, existência de desequilíbrios
estruturais, confirmados por ausência de
planejamento e corrigíveis apenas no longo prazo
Duas contradições obstruem o
crescimento econômico: monopólio de terra
e imperialismo
Apoio financeiro interno a investimento
Estruturação
do sistema financeiro
Tributação
Incentivos à
reinversão de lucros
Tributação Tributação
Capital estrangeiro Por estímulos Por estímulos Favorável mas com controles
Favorável, desde com controles e não nos setores de
serviços públicos e mineração
Enfaticamente contrária (exceto capital de
empréstimo)
Empresa estatal Enfaticamente contrária
Tolerante, quando capital privado (nacional e estrangeiro)
não manifesta interesse
Moderadamente favorável
Enfaticamente favorável
Enfaticamente favorável
Planejamento
Entre
contrário e tolerante a ensaios de
planejamento parcial
Favorável a planejamento parcial
Favorável
Enfaticamente
favorável a planejamento geral e a planejamento
regional
Enfaticamente favorável
Protecionismo
A favor de fortes
reduções de tarifas
Favorável Enfaticamente
favorável Favorável Favorável
Déficit externo Visão da
inflação como causa básica
Possível sem inflação,
mas em geral, causado por ela
Estruturalista Estruturalista
Ênfase na falta de controles pelo
Estado (especialmente
66
sobre remessas
de lucros)
Inflação
Visão de que o pleno
emprego é a causa básica. A favor de
políticas de estabilização
Visão da plena
capacidade como causa básica. A favor de políticas de
estabilização
Ênfase na
utilidade da expansão creditícia
Estruturalista
Imprecisão
interpretativa. Ênfase na defesa do salário real
Salário, lucro e distribuição de renda
Argumento
neoclássico da produtividade
marginal
Redistribuição de renda reduz crescimento
Defesa do lucro (argumento do reinvestimento)
Concentração de renda obstrui crescimento
Pela redistribuição da renda via reforma agrária e
luta sindical
Reforma agrária Contrária Omissa Por reforma limitada
Favorável Enfaticamente favorável
Fonte: Bielschowsky, 1988, p. 242-243.
67
ANEXO III
Ministros da Fazenda do período 1930-1964 - por governo
Governo Ministro UF Interinos UF
Era Vargas (1930-1945)
José Maria Whitaker SP
Oswaldo Aranha RS
Artur de Souza Costa RS
Orlando Vilela PB
Cavalcanti Pessoa CE
Paulo Lira PE
José Linhares (STF) (1945)
José Pires do Rio SP
Dutra (1946-1951)
Gastão Vidigal SP
Correia e Castro RJ Vieira Machado RJ
Ovídio Abreu MG
Guilherme da Silveira Filho RJ
VargasII (1951-1954) Horácio Lafer SP Alberto Andrade de Queiroz PA
Oswaldo Aranha RS
Café Filho (1954-1955)
Eugenio Gudin RJ
José Maria Whitaker SP
Juscelino Kubitschek (1956-1961)
José Maria Alkimim MG Vianna Júnior RJ
Lucas Lopes MG
Sebastião Paes de Almeida MG Antônio Carlos Barcellos RJ
Maurício Chagas Bicalho MG
Jânio Quadros (1961) Clemente Mariani BA Hamilton Prisco Paraíso BA
João Goulart (1961-1964)
Walter Moreira Salles MG Tancredo Neves MG
Henrique Barbosa MA
Miguel Calmon BA
San Tiago Dantas RS
Carvalho Pinto SP
Ney Neves Galvão RS
Fonte: Elaboração própria, a partir de dados do CPDOC