UNIVERSIDADE FEDERAL DE SERGIPE
PRÓ-REITORIA DE PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DESENVOLVIMENTO E MEIO
AMBIENTE
DOUTORADO EM DESENVOLVIMENTO E MEIO AMBINETE
GIVALDO BARBOSA DA SILVA
AS CERTIFICAÇÕES COMO INSTRUMENTO ÉTICO DE
SUSTENTABILIDADE AMBIENTAL EM EDIFICAÇÕES DA CONSTRUÇÃO
CIVIL
SÃO CRISTÓVÃO
2014
GIVALDO BARBOSA DA SILVA
AS CERTIFICAÇÕES COMO INSTRUMENTO ÉTICO DE
SUSTENTABILIDADE AMBIENTAL EM EDIFICAÇÕES DA CONSTRUÇÃO
CIVIL
Tese apresentada como requisito parcial para a
obtenção do título de Doutor, pelo Núcleo de Pós-
Graduação em Desenvolvimento e Meio Ambiente da
Universidade de Federal de Sergipe.
Orientador:
Prof. Dr. Antonio Carlos dos Santos
SÃO CRISTÓVÃO
2014
FICHA CATALOGRÁFICA ELABORADA PELA BIBLIOTECA CENTRAL UNIVERSIDADE FEDERAL DE SERGIPE
S586c
Silva, Givaldo Barbosa da As certificações como instrumento ético de sustentabilidade
ambiental em edificações da construção civil / Givaldo Barbosa da Silva ; orientador Antonio Carlos dos Santos. – São Cristóvão, 2014.
338 f. : il.
Tese (Doutorado em Desenvolvimento e Meio Ambiente) - Universidade Federal de Sergipe, 2014.
1. Construção civil - Rotulagem ambiental. 2. Proteção ambiental. I. Santos, Antonio Carlos, orient. II. Título.
CDU 69:502
À minha mãe e ao meu pai,
Eugênia e Severino.
AGRADECIMENTOS
No esforço de conclusão desse trabalho, pude contar com a valiosa ajuda de várias
pessoas.
Ao meu orientador, Prof. Dr. Antonio Carlos dos Santos, que sabiamente soube
me guiar pelos caminhos da filosofia e da interdisciplinaridade.
A todos do PRODEMA, em especial à Prof.ª Dra. Maria José Nascimento, pelo
apoio e colaboração, e àqueles que participaram da Banca de Qualificação, Prof.ª Dra.
Cláudia Ruberg, Prof. Dr. Antonio José Pereira Filho e a Prof.ª Dra. Rosemeri Melo e
Souza.
Aos colegas e professores do Grupo de Pesquisa em Filosofia e Natureza, pelas
valiosas contribuições.
A todos os professores que passaram por minha vida e que me ajudaram a chegar
até aqui.
A todos os amigos, em especial a Zélio Nascimento e Gilderman Lázaro, pelo
companheirismo e apoio constantes.
À minha família, irmãs, sobrinhos, tias e cunhados, pela torcida e orações diárias.
Em especial aos meus pais, Eugênia e Severino, pela dedicação, incentivo e amor
incondicional ao longo de toda minha vida.
A todas estas pessoas os mais sinceros agradecimentos.
RESUMO
Esta pesquisa tem como objeto de estudo as certificações ambientais para edificações como
um instrumento da sustentabilidade sob a perspectiva da ética ambiental. O intuito
écontribuir para o avanço do conhecimento no campo da construção civil, de modo
particular, na sua modernização, através de certificados de sustentabilidade no Brasil, e
observar como essa metodologia pode contribuir para a melhoria da qualidade ambiental
dos espaços urbanos. Desse modo, a tese foi estruturada, basicamente, em cinco
abordagens ou capítulos. O primeiro capítulo, de caráter teórico, foca em três categorias
analíticas: natureza, ética e sustentabilidade ambiental, as quais juntas formam o lastro
conceitual de conexão entre todos os temas tratados. O conceito de natureza foi analisado a
partir da modernidade, buscando-se entender como esta passou a determinar os rumos da
própria existência humana e como foi inserida na sociedade e no espaço urbano. Aqui, o
estudo da ética centra-se no desafio de equacionar os dilemas contemporâneos, frente aos
avanços tecnocientíficos, no embate entre o homem e os danos ambientais. O tema da
sustentabilidade ambiental está construído na problematização dos diversos sentidos que
envolvem esta questão, no contraponto entre sustentabilidade e desenvolvimento
sustentável, em estabelecer suas extensões, superposições e divergências entre estes dois
conceitos. O segundo capítulotrata da construção do espaço da cidade sustentável, desde
suas bases histórico/urbanas até a influência dos marcos legais sobre sua formação. O
terceiro capítulo investiga a resposta da indústria da construção civil aos novos desafios
ambientais impostos pela escassez dos recursos naturais, nas possibilidades de rearranjo de
sua cadeia produtiva e de seu sindicato. O quarto trata das certificações Leed, AQUA,
Procel Edifica e Casa Azul, como estão sendo difundidas no país, em seus limites e
abrangência. Por fim, no quinto e último capítulo, há duas constatações: primeiramente,
buscou-se demonstrar, através de uma estrutura comparativa, a capacidade limitada dessas
quatro metodologias de avaliação em certificar a sustentabilidade de edifícios,
enquadrando-as em dois grupos, a saber, Certificações ambientais (Leed e Procel Edifica) e
Certificações Socioambientais (AQUA e Casa Azul);segundo, foi apresentado um
instrumento alternativo às certificações para quemnão quer ou não pode se vincular a uma
instituição certificadora e, mesmo assim, deseja obter o reconhecimento de suas práticas
construtivas sustentáveis, instrumento esse pautado na ética ambiental.
Palavras-chave: Natureza. Ética. Sustentabilidade Ambiental. Certificação Ambiental.
ABSTRACT
This research is focused on environmental certifications for buildings as a tool of
sustainability from the perspective of environmental ethics. The intention is to contribute
to the advancement of knowledge in the field of construction, particularly in its
modernization through sustainability certificates in Brazil, and observe how this
methodology can contribute to improving the environmental quality of urban spaces. Thus,
the thesis was structured basically in five chapters or approaches. The first chapter, which
has a theoretical approach, focuses on three analytical categories: nature, ethics, and
environmental sustainability, which together form the conceptual ballast connection
between all treated subjects. The concept of nature was analyzed from modernity, seeking
to understand how this came to determine the course of human existence and as entered in
society and urban space. Here, the study of ethics is centered on the challenge of solving
contemporary dilemmas facing the techno-scientific advances in the struggle between man
and environmental damage. The theme of environmental sustainability is built in
questioning of several senses involving this issue in the counterpoint between
sustainability and sustainable development, to establish its extensions, overlaps and
differences between these two concepts. The second chapter deals with the construction of
the sustainable city space, from its historical / urban bases to the influence of legal
frameworks for their training. The third chapter investigates the response of the building
industry to new environmental challenges posed by the scarcity of natural resources, the
possibilities of rearrangement of their production chain and their union. The fourth deals
with LEED, AQUA, ProcelEdifica e Casa Azul certifications, how it is being widespread
in the country, its limits and scope.Finally, in the fifth and final chapter, there are two
findings: first, we sought to demonstrate, through a comparative framework, the limited
capacity of these four assessment methodologies to certify the sustainability of buildings,
fitting them into two groups, namely, Environmental Certifications (Leed e ProcelEdifica)
and Social and Environmental Certifications (AQUA and Casa Azul); second, we present
an alternative instrument to the certifications for those who do not want or cannot link to a
certifying institution but that still want to get recognition for their sustainable building
practices, this instrument grounded in environmental ethics.
Keywords: Nature. Ethics. Environmental Sustainability. Environmental Certification.
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 - Santuário da Natureza – Findhorn, Escócia. Fonte: Novos Paradigmas Ambientais. Ricardo Braun,
2008. ................................................................................................................................................................ 27 Figura 2 - Arquitetura Ecológica – Praia do Peba, foz do Rio S. Francico. Fonte: Novos Paradigmas
Ambientais. Ricardo Braun, 2008. ................................................................................................................... 28 Figura 3 - Jardim Francês. Jardim do ChateauVaux-le-Viconte. ..................................................................... 51 Figura 4 - Jardim Francês. Jardim do Palácio de Versailles. ........................................................................... 51 Figura 5 - Jardim Inglês. Parque Buttes, .......................................................................................................... 52 Figura 6 - Jardim Inglês. Parque Rousseau, ..................................................................................................... 53 Figura 7 - Teto Jardim. Rockfeller Center, Nova York. .................................................................................. 59 Figura 8 - Jardim Vertical. Barcelona, Espanha. Autor: Patrick Blanck. ......................................................... 60 Figura 9 - Modelo da Sustentabilidade Forte. Fonte: Adams (2006). .............................................................. 90 Figura 10 - Modelo da Sustentabilidade Fraca. ............................................................................................... 91 Figura 11 - Vila de New Lanark. Fonte: Google Photos. ............................................................................... 108 Figura 12 - Palácio Social de Fourrier. .......................................................................................................... 108 Figura 13 - Vila de Saltaire. Autor: Jonfarman .............................................................................................. 109 Figura 14 - Cidade Jardim de Ebenezer Howard. .......................................................................................... 109 Figura 15 - Cidade Linear – Perfil Transversal. ............................................................................................. 111 Figura 16 - Cidade Industrial de Tony Garnier. ............................................................................................. 112 Figura 17 - Casa da Cascata – Pensilvânia – Estados Unidos – Frank Lloyd Wright. ................................... 115 Figura 18 - Plan Voisin, Paris – Le Corbusier. .............................................................................................. 120 Figura 19 - Plano Piloto de Brasília – Lúcio Costa. ....................................................................................... 120 Figura 20 - Centro Pompidou, Paris – Renzo Piano e Richard Rogers. Autor: Galeria Anapinatelier. ......... 122 Figura 21 - Museu do Mar de Galicia - Espanha – Aldo Rossi/César Portela. Autor: Galeria Anapinatelier.
....................................................................................................................................................................... 123 Figura 22 - Teatro Nacional da Catalunha – Ricardo Bofil. Autor: KatjaVitskaja. ....................................... 123 Figura 23 - Parque La Villete, Paris – Bernard Tschumi. Autor: KatjaVitskaja. ........................................... 124 Figura 24 - Etiqueta ENCE. Fonte: www.eletrobras.com. ............................................................................. 239 Figura 25 - Selo Procel. Fonte: www.eletrobras.com. ................................................................................... 240 Figura 26 - Logomarcas do Selo Casa Azul níveis Ouro, Prata e Bronze. ..................................................... 249
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 - Estrutura de Avaliação LEED NC v.3 – 2009 .............................................................................. 228 Tabela 2 - Critério Sustentabilidade do Espaço ............................................................................................. 229 Tabela 3 - Critério Racionalização do Uso da Água ...................................................................................... 230 Tabela 4 - Critério Eficiência Energética ....................................................................................................... 230 Tabela 5 - Critério Qualidade Ambiental Interna .......................................................................................... 231 Tabela 6 - Critério Materiais e Recursos ....................................................................................................... 231 Tabela 7 - Critério Inovação e Processo do Projeto ....................................................................................... 232 Tabela 8 - Critérios Regionais para o Brasil .................................................................................................. 232 Tabela 9 - Estrutura da QAE .......................................................................................................................... 237 Tabela 10 - Estrutura da Procel Edifica – RTQ-R ........................................................................................ 243 Tabela 11 - Estrutura da Procel Edifica – RTQ-C ......................................................................................... 244 Tabela 12 - Limites de Avaliação e Localidades para o Selo Azul nível Bronze .......................................... 249 Tabela 13 - Critérios de Avaliação da Categoria Qualidade Urbana ............................................................. 254 Tabela 14 - Critérios de Avaliação da Categoria Projeto e Conforto ............................................................. 256 Tabela 15 - Critérios de Avaliação da Categoria Eficiência Energética ........................................................ 259 Tabela 16 - Critérios de Avaliação da Categoria Conservação de Recursos Materiais ................................. 262 Tabela 17 - Critérios de Avaliação da Categoria Gestão da Água ................................................................. 265 Tabela 18 - Critérios de Avaliação da Categoria Práticas Sociais ................................................................. 268 Tabela 19 - Base Comparativa com as Categorias de Avaliação, Conceitos e Critérios Gerais .................... 287 Tabela 20 - Agrupamento das Categorias de Avaliação por Esferas da Sustentabilidade ............................. 289
LISTA DE SIGLAS
ABNT – Associação Brasileira de Normas Técnicas
Abramat - Associação Brasileira da Indústria de Materiais de Construção
ABRELPE - Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais
ACV - Análise do Ciclo de Vida
ADEMI - Associação dos Dirigentes da Indústria Imobiliária
AFNOR - Associação Francesa de Normatização
AIA - Avaliação de Impacto Ambiental
ANA - Agência Nacional de Águas
ANAMACO - Associação Nacional dos Comerciantes de Material de Construção
ANTAC - Associação Nacional de Tecnologia do Ambiente Construído
AQUA -Alta Qualidade Ambiental
ASHRAE - American Society of Heating, Refrigerating and Air-Conditioning Engineers.
ASTM - American Society for Testing and Materials
ATT - Área de Transbordo e Triagem
BEPAC - Building Environmental Performance Assessment Critéria
BEQUEST – Building Environmental Quality Evaluation for Sustainability Throutime
BREEAM - Building Research Establishment Enviromental Assessment Method
BSCD - Business Council for Sustainable Development
BSI - British Standards Institution
CASBEE - Comprehensive Assessment System for Building Environmental Efficiency
CBCS - Conselho Brasileiro de Construção Sustentável
CBIC - Câmara Brasileira da Indústria da Construção
CEBDS - Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável
CIB – International Council for Research and Innovation Association in Building and
Construction
CIESP - Centro das Indústrias do Estado de São Paulo
CIPA - Comissão Interna de Prevenção de Acidentes
CNI - Confederação Nacional da Indústria
COMASP - Comitê de Meio Ambiente do Sinduscon-SP
Conama - Conselho Nacional de Meio Ambiente
Concept - Programa Nacional da Racionalização do Uso dos Derivados do Petróleo e do
Gás Natural
CRISP – Construction Related Sustainability Indicators
CSMA - Comissão de Sustentabilidade e Meio Ambiente
DIEESE - Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos
DOE - U.S. Department of Energy
DOF - Documento de Origem Florestal
EIA - Estudo de Impacto Ambiental
ELECS – Encontro Latino Americano de Edificações e Comunidades Sustentáveis
ENCE - Etiqueta Nacional de Conservação da Energia
ENECS - Encontro Nacional de Edificações e Comunidades Sustentáveis
EPA - U.S. Environmental Protection Agency
FGTS – Fundo de Garantia por Tempo de Serviço
FIEC - Federação das Indústrias do Estado do Ceará
FIESP - Federação das Indústrias do Estado de São Paulo
FINEP - Financiadora de Estudos e Projetos
GBC Brasil – Green Building Council Brasil
Habitare - Programa de Tecnologia da Habitação
HQE - Haute Qualité Environnementale
IBICT - Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia
IFES-SE- Instituto Federal de Educação de Sergipe
IPT - Instituto de Pesquisas Tecnológicas
IPTU – Imposto Territorial Urbano
ISO - International Organization for Standardization
LEED- Leardership in Energy and Environmental Design
MCTI - Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação
P+L - Produção Mais Limpa
PAC – Programa de Aceleração do Crescimento
PBE - Programa Brasileiro de Etiquetagem
PBE - Programa Brasileiro de Etiquetagem
PBQP-H - Programa Brasileiro da Qualidade e Produtividade do Habitat
Planasa - Plano Nacional de Saneamento
PmaisL - Projeto Produção mais Limpa
PMCMV - Programa Minha Casa, Minha Vida
PMCMV - Programa Minha Casa, Minha Vida
PND - Plano Nacional de Desenvolvimento do Brasil
PNMA - Política Nacional de Meio Ambiente
PNRH - Política Nacional de Recursos Hídricos
Pnuma - Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente
Procel Edifica - Programa Nacional de Conservação de Energia Elétrica da Edificação
PRODEMA – Programa de Desenvolvimento em Meio Ambiente
PSQ - Programa Setorial da Qualidade
PSQ - Programa Setorial de Qualidade
PSQ - Programas Setoriais da Qualidade
RCD - Resíduos da Construção e Demolição
RCD - Resíduos da Construção e Demolição
RCD - Resíduos de Construção e Demolição
RIMA - Relatório de Impacto Ambiental
RTQ-C - Requisitos Técnicos da Qualidade para o Nível de Eficiência Energética de
Edifícios Comerciais, de Serviços e Públicos.
RTQ-R - Requisitos Técnicos da Qualidade para o Nível de Eficiência Energética de
Edifícios Residenciais
SAS - Sistema de Aquecimento Solar
SBPE - Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo
SEBRAE - Serviço Brasileiro de Apoio a Micro e Pequenas Empresas
SEMA - Secretaria Especial de Meio Ambiente
SENAI – Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial
SESI – Serviço Social da Indústria
SGA - Sistema de Gestão Ambiental
SGA - Sistema de Gestão Ambiental
SGE - Sistema de Gestão do Empreendimento
SICV Brasil - Inventário do Ciclo de Vida para Competitividade Ambiental da Indústria
Brasileira
SiMaC - Sistema de Qualificação de Materiais, Componentes e Sistemas Construtivos
SINAT - Sistema Nacional de Aprovação Técnica
SINAT - Sistema Nacional de Avaliações Técnicas
SINDUSCON – Sindicato da Indústria de Construção Civil
Singreh - Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos
Sisnama - Sistema Nacional de Meio Ambiente
Snirh - Sistema Nacional de Informações sobre Recursos Hídricos
SUSHI - Sustainable Social Housing Initiative
UFBA – Universidade Federal da Bahia
UFS – Universidade Federal de Sergipe
WBCSD - World Business Council for Sustainable Development
WCED - World Commission on Environment and Development
WICE - World Industry Council for the Environment
ZEE - Zoneamento Ecológico-Econômico
ZEIS - Zona Especial de Interesse Social
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO..............................................................................................................18
1– Contextualização...........................................................................................................20
2 – Questões Norteadoras..................................................................................................30
3 – Objetivos da Pesquisa..................................................................................................30
4 – Pertinência Científica e Social.....................................................................................31
5 – Plano Conceitual da Pesquisa......................................................................................32
CAPÍTULO 1 – PRESSUPOSTOS TEÓRICOS ..............................................35
1.1 O Conceito de Natureza...............................................................................................35
1.2 – O Conceito de Ética a partir da Modernidade.......................................................63
1.2.1 – Ética Aplicada..........................................................................................................65
1.2.2 – Ética Ambiental........................................................................................................68
1.2.3 – A Ideia de Ética Utilitarista......................................................................................73
1.3 – A Sustentabilidade Ambiental..................................................................................81
1.3.1 – Sustentabilidade e Desenvolvimento Sustentável....................................................82
1.3.2 – A Apropriação do Discurso do Desenvolvimento Sustentável pelo Setor
Empresarial...........................................................................................................................93
CAPÍTULO 2 – CONSTRUÇÃO DA CIDADE SUSTENTÁVEL: A
ESTRATÉGIA DA GESTÃO AMBIENTAL...................................................102
2.1 – A Gênese do Espaço Urbano Moderno..................................................................107
2.1.1 – Primeiras Iniciativas...............................................................................................107
2.1.2 – O Urbanismo Moderno...........................................................................................113
2.2 – A (In)Sustentabilidade Urbana e o Planejamento Ambiental.............................126
2.3 – Assentamentos Urbanos Sustentáveis....................................................................131
2.4 – As Políticas Ambientais Urbanas no Brasil..........................................................133
2.5 – Instrumentos de Gestão Ambiental Urbana Sustentável.....................................145
CAPÍTULO 3 – A INDÚSTRIA DA CONSTRUÇÃO E O
DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL........................................................157
3.1 – A Cadeia Produtiva da Indústria da Construção e o desafio da
Sustentabilidade................................................................................................................161
3.2 – O papel do Sinduscon nas principais capitais do país........................................173
3.2.1 – SINDUSCON – Pará..............................................................................................175
3.2.2 – SINDUSCON – Tocantins.....................................................................................175
3.2.3 – SINDUSCON – Ceará............................................................................................176
3.2.4 – SINDUSCON – Pernambuco.................................................................................177
3.2.5 – SINDUSCON – Bahia............................................................................................180
3.2.6 – SINDUSCON – Sergipe.........................................................................................181
3.2.7 – SINDUSCON – Goiás............................................................................................181
3.2.8 – SINDUSCON – Mato Grosso................................................................................182
3.2.9 – SINDUSCON – Rio de Janeiro..............................................................................183
3.2.10 – SINDUSCON – São Paulo...................................................................................185
3.2.11 – SINDUSCON – Rio Grande do Sul.....................................................................189
3.2.12 – SINDUSCON – Paraná........................................................................................190
3.2.13 – Considerações Gerais sobre as Ações Sustentáveis dos Sindicatos da Indústria da
Construção Civil.................................................................................................................191
3.3 – Outras instâncias que tratam da Construção Sustentável ..................................193
3.3.1 – Instâncias Governamentais.....................................................................................194
3.3.2 – Instâncias do Setor Privado....................................................................................200
3.3.3 – Instâncias Acadêmicas e da Sociedade Civil.........................................................203
3.4 – Norma ABNT NBR 15575/2013.............................................................................207
CAPÍTULO 4 – CERTIFICAÇÃO AMBIENTAL.........................................212
4.1 – As Certificações Ambientais na Indústria da construção....................................215
4.2 – A Certificação LEED..............................................................................................225
4.2.1 – Estrutura do Sistema LEED...................................................................................227
4.3 – A Certificação Aqua................................................................................................234
4.3.1 – Estrutura do Sistema AQUA..................................................................................236
4.4 – A Certificação Procel Edifica.................................................................................239
4.4.1 – Estrutura do Sistema PROCEL Edifica..................................................................241
4.5 – O Selo Casa Azul da Caixa.....................................................................................247
4.5.1 – Conceituação do Selo e Pré-Requisitos..................................................................248
4.5.2 – Identificação dos Aspectos Socioambientais.........................................................251
4.5.3 – Categoria Qualidade Urbana..................................................................................253
4.5.4 – Categoria Projeto e Conforto..................................................................................256
4.5.5 – Categoria Eficiência Energética.............................................................................259
4.5.6 – Categoria Conservação de Recursos Materiais......................................................262
4.5.7 – Categoria Gestão da Água......................................................................................265
4.5.8 – Categoria Práticas Sociais......................................................................................267
4.5.9 – Considerações acerca do Selo Casa Azul...............................................................274
CAPÍTULO 5 – DIAGNÓSTICO FINAL – CONCLUSÕES.....................280
5.1 – Abordagem crítica das principais certificações ambientais na indústria da
construção nacional..........................................................................................................280
5.1.1 – Resumo Comparativo entre os Sistemas LEED, AQUA, PROCEL Edifica e Selo
Casa Azul...........................................................................................................................286
5.1.2 – Alternativas à Certificação de Edificações.............................................................299
REFERÊNCIAS...........................................................................................................311
ANEXOS.........................................................................................................................318
INTRODUÇÃO
O tema central da pesquisa é a certificação enquanto instrumento ético da
sustentabilidade em edificações da construção civil. As certificações podem contribuir para
a sustentabilidade no setor, tendo em vista que, nas últimas décadas, esse ramo comercial
vem assumindo a missão de incorporar ao seu ciclo de produção a responsabilidade
ambiental. Este processo requer não só incorporar mudanças profundas neste segmento,
mas também em todos os agentes envolvidos, seus colaboradores e clientes. Esta pesquisa
visa a contribuir para o avanço do conhecimento no campo da construção civil, de modo
particular, na sua modernização, através da análise dos certificados de sustentabilidade no
Brasil.
Por esta razão, a proposta desta pesquisa representa um triplo desafio. O primeiro,
porque ela visa a investigar as questões da sustentabilidade sob o ponto de vista das
construtoras responsáveis pelos empreendimentos imobiliários; o segundo, analisar as
principais empresas certificadoras que creditam às edificações como sustentáveis;
finalmente, o terceiro, problematizar o poder público enquanto órgão regulador
urbanístico. Correlacionar este tripé nos dá a dimensão da problemática e o tamanho do
desafio que se deseja enfrentar.
A presente pesquisa se justifica por quatro razões fundamentais: a primeira, de
ordem prática; a segunda, de ordem política; a terceira de ordem teórica; e a última de
ordem pessoal.
A primeira, por se tratar de um tema atual, urgente e necessária. O crescimento da
construção civil no Brasil, aliado ao apelo à preocupação com a natureza, tem provocado
uma procura enorme nos chamados empreendimentos imobiliários ditos “sustentáveis”.
Mas até que ponto eles o são? Quais são os critérios? A população tem acesso a esses
dados? Sem informações mais apuradas ou “científicas”, as construtoras invadem a
população com panfletos e propagandas em que basta haver muitas árvores ou jardins para
que aquele empreendimento passe a imagem de ser considerado “sustentável”. Ou seja,
trata-se aqui de uma questão da ordem do dia, uma vez que está em jogo uma questão
19
prática: como a sustentabilidade pode ser realmente incorporada ao setor da construção
civil, afastando-se dos mecanismos do “marketing verde”?
A segunda razão é que, apesar dos avanços das pesquisas nesta área no Brasil, o
tema exige maior aprofundamento e reflexão, principalmente diante do crescente número
de edificações certificadas1 e da falta de um marco legal específico
2 que, de alguma forma,
regule estas construções ou certificações sobre padrões adequados à realidade social e
ambiental do país.
A terceira é de ordem teórica. Se o conceito de sustentabilidade per si já é uma
discussão complexa, ela ganha novos contornos ainda mais proeminentes aplicados à
construção civil, um setor estratégico para o desenvolvimento de qualquer país, e que
envolve muitos interesses e distintos processos.
Por fim, uma última razão que justifica a pesquisa tem relação a questões pessoais.
Formado em Arquitetura e Urbanismo, com quase vinte anos de atuação na área e
dezessete anos de docência no Instituto Federal de Educação (IFES-SE), ministrando
disciplinas vinculadas à área desta pesquisa, esta tese tornou-se, assim, fruto de uma
maturidade intelectual e prática. Ela não nasceu de forma artificial ou superficial; tem uma
história de vida pessoal e profissional que se complementam e que, ao mesmo tempo,
impulsionam para a sua finalização, tornando-a não só factível como apaixonante e
motivadora. Desta forma, esta tese é o aprofundamento e consolidação de um trabalho que
já vem sendo construído e que vai reverberar tanto na vida pessoal quanto na profissional,
especialmente agora, em que os Institutos Federais (IFES) deixaram de ser “Escola” e
passaram a ter o status de “Institutos de Pesquisa”, que precisam de profissionais cada vez
mais bem qualificados. De forma direta, essa formação altamente qualificada vai ressoar
na prática de ensino, melhorando a formação do aluno com ênfase em ética ambiental na
construção civil, contribuindo, enfim, para uma nova educação, ainda na base,
precisamente nos futuros técnicos em edificações, arquitetos e engenheiros. Mas esta
formação também ecoará no trabalho quotidiano, enquanto profissional do setor,
materializada na forma de projetos residenciais, comerciais e institucionais, de pequeno,
1 Segundo o GBC Brasil –Green BuildingCouncilBrasil, empresa responsável pela certificação LEED, o
número de processos registrados de edifícios buscando esta certificação passou de 01 para 231 unidades em
2010. 2 Há leis que versam sobre questões ambientais e o espaço urbano, entretanto, não há leis específicas sobre
certificação ambiental.
20
médio e grande porte, e que ao longo dos últimos anos vem despertando um interesse pela
incorporação de outros elementos que possam assegurar uma edificação mais próxima de
uma realidade socioambiental e uma sustentabilidade presente em todo o processo
construtivo. Doravante, seus projetos poderão ou deverão manifestar este aprendizado,
fruto da pesquisa, e que certamente servirá de exemplo ou de inspiração para tantos outros
profissionais do setor.
Se a experiência adquirida por ocasião do mestrado no PRODEMA-UFS, reforçada
pelo interregno entre o seu término e a elaboração desta tese, possibilitou o
amadurecimento intelectual necessário à boa condução do doutorado, a continuidade e o
aprofundamento de uma linha de pesquisa com um novo enfoque científico, o da
sustentabilidade na construção civil, poderá abrir novas portas ou perspectivas de resolução
de muitos dos problemas no setor. Por tudo isso, esta pesquisa se justifica e se firma como
urgente e necessária.
1 – Contextualização
A temática da engenharia de construção, em sua interface com o paradigma da
sustentabilidade, desdobra-se em uma série de questões que se conectam em uma trama
complexa, e que, por isso, precisa ser analisada em todas as suas partes. Desde sua cadeia
produtiva, as normas de construção até as fases da obra, todos esses aspectos incidem sobre
as possibilidades de se alcançar ou não um patamar mais sustentável para o setor.
Se a sustentabilidade, por si só, engendra uma série de questionamentos, quando
associada ao ramo construtivo assume novos contornos, devido não só aos grandes
impactos causados pela sua operacionalização, mas também por sua capacidade de
aumentar a qualidade de vida das pessoas (atendimento das necessidades básicas como
abrigo, saúde, educação, transporte, etc.) e pela participação expressiva na geração de
empregos e renda de qualquer país. Segundo Silva (2003), não é possível alcançar o
desenvolvimento sustentável, sem que haja construção sustentável e define:
Buscar uma indústria da construção sustentável e fornecer mais valor, poluir
menos, ajudar no uso sustentado de recursos, responder mais efetivamente às
partes interessadas, e melhorar a qualidade de vida presente sem comprometer o
futuro. Construção sustentável não é desempenho ambiental excepcional à custa
21
de uma empresa que saia do mercado, nem desempenho financeiro excepcional,
à custa de efeitos adversos no ambiente e comunidade local [...], não implica em
priorizar uma dimensão em detrimento das demais, nem demanda uma solução
perfeita, e sim a busca por equilíbrio entre a viabilidade econômica que mantém
as atividades e negócios; as limitações de ambiente; e as necessidades da
sociedade. (SILVA, 2003, p. 04).
A cadeia produtiva no que diz respeito à construção civil, envolve uma enorme
complexidade de ações, atores e materiais, sendo responsável pela alteração do ambiente
natural para o construído. Este processo implica em grandes impactos ambientais, além de
estar em amplo processo de crescimento com previsão de crescer duas vezes e meia até o
ano de 2050 (AGOPYAN; JOHN, 2011). Este setor depende de uma série de etapas para o
seu desenvolvimento: desde a extração de matérias-primas, transporte, legislação, projetos,
construção, manutenção, até a demolição, ou seja, praticamente todas estas etapas, de
alguma forma, interagem e impactam o meio ambiente. A sustentabilidade nesta área
produtiva depende de instrumentos não menos complexos e ações articuladas em todos os
níveis de forma sistêmica.
Na produção de materiais e insumos básicos, devem ser tomadas medidas de
mitigação aos danos ambientais, controle nos processos de extração e uma vigilância
constante dos órgãos governamentais responsáveis pela liberação de licenças de exploração
de recursos. Este acompanhamento deve estender-se inclusive ao transporte destes
materiais no sentido de se criar alternativas de otimização da infraestrutura viária bem
como veículos menos poluidores e mais eficientes.
As normas construtivas, tais como plano diretor e código de obras, tanto podem
servir como vetor de indução a práticas mais sustentáveis, como podem desestimular tais
soluções, dificultando as inovações. Diretamente ligado a este fator, o projeto, e as
decisões inerentes a ele, afetam a utilização dos recursos naturais e energéticos, pois atuam
desde a especificação de materiais até os efeitos estéticos e urbanísticos.
A fase de execução, provavelmente, é a que mais visivelmente se produzem
resíduos, na maioria das vezes pela falta de planejamento nos canteiros, e este efeito é
agravado principalmente quando as obras são realizadas nas áreas urbanas. Entretanto, é
durante sua manutenção que a edificação mais causa impacto ao meio ambiente. Isto se
deve ao seu longo período de vida útil, ao menos de 30 a 50 anos, exigindo assim soluções
22
construtivas inteligentes e coerentes com a atual escassez de recursos (AGOPYAN; JOHN,
2011).
Ao final deste ciclo a demolição deve ser prevista com o reaproveitamento do
máximo possível de materiais, a reciclagem do que não pode ser reutilizado e por fim uma
destinação correta para os resíduos gerados.
Como se pode notar, a sustentabilidade, para ser alcançada na construção civil,
deve perpassar todas estas etapas, configurando-se como um caminho que envolve não só
uma mudança de comportamento por parte dos empresários, mas também dos usuários e da
classe política. Necessita do estabelecimento de uma agenda de metas de curto, médio e
longo prazo, permitindo ao mercado ajustar-se adequadamente e também uma constância
na franca divulgação dos avanços, retrocessos e dificuldades enfrentadas pelo setor,
permitindo à sociedade estar sempre bem informada. A construção civil é um setor
estratégico para o desenvolvimento de qualquer nação e hoje já dá exemplos de boas
condutas ambientais, como pode ser observado em muitos países do exterior e, portanto,
deve ser posto como uma prioridade, como um instrumento concreto aliado à
sustentabilidade, uma prática presente em vários países com a contribuição de diversas
entidades3 de pesquisa.
A partir dos últimos dez anos observa-se uma tendência crescente pela adoção do
instrumento da certificação ambiental como uma alternativa que irá mudar o mercado de
consumo. Este movimento, já solidificado em outros setores da sociedade, encontrou solo
fértil na construção civil, e o que se tem é que a cada semana surgem novos selos, muitas
vezes para um mesmo tipo de produto.
Uma certificação deve possibilitar a uma pessoa comum reconhecer que
determinado produto diferencia-se dos demais por apresentar características singulares, e,
no caso de uma certificação ambiental, este produto deve, no mínimo, significar que no
processo de sua produção medidas foram tomadas de modo a reduzir o impacto ao meio
ambiente. Entretanto, esta proliferação de certificações traz mais dúvidas que certezas, e,
no caso do Brasil, existem muitos sistemas que não divulgam claramente suas regras,
3 Vários países vêm desenvolvendo trabalhos na área ambiental da construção, a exemplo dos indicadores de
sustentabilidade para o setor das redes européias BEQUEST (Building Environmental QualityEvaluation for
SustainabilityThroutime) e CRISP (ConstructionRelatedSustainabilityIndicators); pesquisa e eventos
organizados pelo CIB (InternationalCouncil for ResearchandInnovationAssociation in
BuildingandConstruction), na Holanda, Estados Unidos e outras nações.
23
dificultando sua avaliação e relevância, aproximando-se mais de uma espécie de “verniz
verde” do que de dados científicos e seguros (AGOPYAN; JOHN, 2011).
Os greenbuildings(e suas certificações) não devem ser confundidos com
construções sustentáveis, uma vez que não internalizam em seus processos variáveis
socioeconômicas. Além do mais, são tecnicamente muito rigorosos e inacessíveis a uma
parcela da população, provavelmente sendo os que mais necessitam dos benefícios de
espaços em harmonia com as condições ambientais. Na realidade do mercado brasileiro,
estas certificações estão reduzidas a um tipo de excelência, para empreendimentos de
altíssimo padrão, e vale salientar que, no exemplo das certificações importadas, estes
critérios retratam o estágio de desenvolvimento sustentável dos países de origem. Assim
sendo, quando em um mesmo local diversos selos competem, sem muitos critérios, o
mercado, por sua vez, acaba seguindo caminhos distintos, muitas vezes distantes do
propósito de reduzir as agressões à natureza (AGOPYAN; JOHN, 2011).
Estudos para a compreensão da importância das certificações de empreendimentos
imobiliários já vêm ocorrendo ao longo da última década. Entretanto, por se tratar de uma
atividade em constante processo de adaptação, pois além de se basear no capital financeiro
também se sustenta na exploração de recursos móveis, precisa ser sistematicamente
reavaliada. À medida que o mercado imobiliário brasileiro cresce em volume de
construções, tornando-se mais dinâmico, acaba afetando a sua relação com as bases sócio-
ambientais, principalmente no momento atual, em que um conjunto de ações4 do Governo
Federal visa a estruturar o crescimento do país.
No Brasil, quatro certificações destacam-se por serem mais conhecidas e utilizadas:
duas de origem estrangeira e duas nacionais. Das primeiras, o Leed (Leardership in Energy
and Environmental Design), aplicado pelo GBC Brasil, importou esta metodologia dos
4 Por meio do PAC – Programa de Aceleração do Crescimento, lançado em 2007, engloba uma série de
medidas políticas e econômicas em várias áreas. Tem como objetivo construir a infraestrutura logística para
sustentar o crescimento do país e está subdividido em cinco grandes eixos de ação: energia, habitação, cidade
melhor, comunidade cidadã, água e luz para todos e transportes. Pretende criar também todo um aparato para
otimizar o sistema financeiro e fiscal, com investimentos na casa dos bilhões de reais advindos do poder
público direto, das estatais, dos bancos oficiais e privados. A maior parte destes investimentos está sendo
direcionada para o setor da construção, uma vez que para a materialização das ações sempre são necessárias
obras civis, tais como sistema de esgotamento sanitário e abastecimento de água, construção de estradas,
ferrovias, hidrelétricas, escolas, hospitais, além do programa “Minha Casa Minha Vida”, que pretende
construir mais de um milhão de casas. Desta forma, nos últimos anos, a indústria da construção civil nacional
vem passando por um crescimento surpreendente de suas bases e com previsão de continuação deste processo
por pelo menos mais dez anos.Dados disponíveis em www.pac.gov.br/sobre-o-pac.
24
Estados Unidos e se autoapresenta como o sistema mais difundido no país; e o AQUA
(Alta Qualidade Ambiental), que é de propriedade da Fundação Vanzolini, e adaptou este
selo do sistema francês HQE (Haute Qualité Environnementale), e que, segundo esta
mesma fundação, foi tropicalizado para a realidade nacional.
Grosso modo, há dois problemas concernentes às certificações estrangeiras. O
primeiro refere-se à sua venda como um produto internacionalmente reconhecido e,
portanto, acima de qualquer suspeita quanto ao seu propósito. Entretanto, esta é uma
afirmação que vai de encontro a uma das premissas básicas da sustentabilidade, em que se
reconhece que se os problemas são globais a solução, por sua vez, tem que ser local,
respeitando as especificidades e as culturas de cada região. Quanto ao segundo problema,
vale salientar que a maioria dos defensores das certificações constrói sua defesa no
pressuposto de que edifícios com selos ambientais são mais valorizados e que existe um
nicho de consumidores dispostos a pagar mais por esse produto diferenciado. Entretanto,
trata-se de uma proposição extremamente excludente e que deixa de fora um universo de
pessoas (destacando-se, aqui, a grande maioria das construções, inclusive em épocas de
planos de incentivo à construção de moradias para as classes “c” e “d”) que não dispõem
de poder aquisitivo suficiente, mas que gostariam de viver ou trabalhar em construções
menos impactantes e energeticamente eficientes. Soma-se a este fato a justa opção do
cidadão individual, ou da pequena construtora, de não querer submeter-se aos ditames de
uma certificação genérica, mas que deseja construir segundo padrões ambientalmente mais
corretos e obter as benesses de uma construção sustentável. Sendo assim, não tem muitas
opções de programas que possam guiá-lo em sua obra, ficando, na maioria das vezes,
relegada às “facilidades” da informalidade.
Diferente destas certificações importadas e/ou adaptadas, há duas brasileiras que se
destacam: o Procel Edifica e o Selo Casa Azul, que foram desenvolvidos inteiramente por
instituições locais, e criadas, teoricamente, para atender as especificidades do mercado da
construção civil brasileira. Primeiramente, o selo Procel Edifica foi criado em 2003, pela
Eletrobrás/Procel com o intuito de estabelecer uma metodologia para o uso racional de
energia elétrica nas construções. Seu processo de certificação culmina com um selo
semelhante aos utilizados por aparelhos eletroeletrônicos, onde a edificação é classificada
segundo seu consumo energético. Em linhas gerais, o sistema é tecnicamente muito
rigoroso, necessitando, na maioria dos casos, de uma equipe especializada para realizar as
análises dos projetos e da obra, além de limitantes técnicos que dificultam a inclusão de
25
pequenas construções tais como as moradias desenvolvidas pelo programa do PAC, por
exemplo.
Já o segundo, o Selo Casa Azul, foi desenvolvido pela Caixa Econômica Federal
em parceria com a Fundação Universidade de São Paulo e envolveu diversos
pesquisadores. Lançado em 2010, tem a pretensão de ser o primeiro instrumento de
classificação de projetos sustentáveis, desenvolvido dentro da realidade brasileira.
Diferencia-se das demais certificações por incorporar ao seu leque de critérios, além dos
técnicos como qualidade urbana, eficiência energética, dentre outros, “práticas sociais” a
serem desenvolvidas pelas empresas candidatas à certificação.
Percebe-se que, nos últimos anos, diversas instituições vêm se mobilizando, na
tentativa de criarem outros certificados e manuais mais adaptados à realidade do lugar, tais
como o SINDUSCON e ADEMI de diversos estados5.
Se a sustentabilidade na construção civil engendra uma série de desafios, as
certificações ambientais sinalizam como mais uma alternativa, um instrumento legítimo
com um papel importante na redução dos impactos ambientais. Trata-se, com certeza, de
um enorme avanço em termos de criação de mecanismos direcionados a parametrização de
ações mais sustentáveis na construção civil. Entretanto, é necessária uma reflexão mais
profunda sobre estes critérios com a ética e, por conseguinte, sobre as pretensas iniciativas
mais includentes e socialmente justas.
Grosso modo, todo o desenvolvimento tecnológico e industrial dos últimos séculos
elevou a qualidade de vida para as pessoas de uma forma geral, dando-lhes mais conforto.
Entretanto, ainda uma enorme parcela da população não pode ter acesso a estas benesses e,
além disso, é a que mais sofre com a degradação ambiental e social resultante de todo este
processo. Isto demonstra que não apenas tratou-se de um “progresso” desigual, mas
também que o homem ainda não conseguiu equacionar, de forma satisfatória, a relação
entre a modernização da vida e o desgaste do meio ambiente.
A ecologia profunda6 vem servindo de base filosófica para o desenvolvimento de
muitas comunidades que procuram desenvolver-se dentro de parâmetros mais
5 SINDUSCON – Sindicato da Industria da Construção, ADEMI – Associação dos Dirigentes da Indústria
Imobiliária. Um exemplo desta mobilização refere-se ao SINDUSCON do Espírito Santo que lançou em
2010 uma certificação (apresentada no ELECS 2011 – Encontro Latino Americano de Edificações e
Comunidades Sustentáveis) própria para guiar seus associados em práticas mais sustentáveis.
26
democráticos e ambientalmente mais próximos da natureza. Assim, proclamam o
questionamento de uma visão de mundo dita dominante, dentro de um padrão tecnocrata-
industrial e regido pelos paradigmas centralizadores. Consideram o homem como parte
orgânica do todo que deve alcançar dois estágios de consciência: a autorrealização como
uma sabedoria advinda de um crescimento espiritual e que vai aproximar todos com a
natureza e outros entes vivos, e a equidade biocêntrica onde todos os organismos “são
igualmente importantes no processo evolutivo porque tudo está intrinsecamente
relacionado” (BRAUN, 2008, p. 45).
Como dito anteriormente, algumas comunidades adotam esses princípios em sua
organização e isso se reflete, inclusive, nas construções que procuram causar o menor
impacto possível ao meio ambiente e que se materializa num design dentro dos padrões de
uma arquitetura dita ecológica. Em linhas gerais, estas edificações adotam diretrizes
quanto à forma e ao uso de materiais, tais como: procuram uma adaptação ao meio
ambiente circundante, uma integração com a paisagem na forma de um mimetismo7
acompanhando, muitas vezes, a conformação topográfica ou aproveitando formações
naturais do relevo, tais como cavernas ou encostas; geralmente utilizam os materiais
encontrados na região onde as construções são erguidas, em muitos casos sem nenhum
tratamento industrial que retire as características naturais; as edificações procuram adaptar-
se as condições climáticas do local tirando o maior proveito dos recursos naturais, tais
como localizar-se abaixo das árvores para aproveitar o sombreamento, os cursos dos rios e
riachos para a movimentação de moinhos, etc. (Figura 01).
6 Em seu campo conceitual a ecologia profunda pretende estender-se para além do saber científico, afirmando
seu conhecimento advindo da verdadeira sabedoria da terra, fugindo do cartesianismo racional que é tido
como limitador, um bloqueio para a realidade da natureza, só plenamente percebida quando evocado o campo
espiritual (BRAUN, 2008). 7 Da ecologia quando um organismo procura uma adaptação com o objetivo de confundir-se com um outro
indivíduo de outra espécie.
27
Figura 1 - Santuário da Natureza – Findhorn, Escócia. Fonte: Novos Paradigmas Ambientais. Ricardo
Braun, 2008.
Como um dos princípios fundamentais da arquitetura ecológica é adaptar-se
morfologicamente e retirar do local os materiais construtivos, exige-se uma longa
observação, bem como pesquisas específicas e experimentações para se entender como as
condições naturais de determinada região se formaram e, consequentemente, como podem
interferir e contribuir para uma construção mais sustentável. Segundo Braun (2008), esta
interação, por si só, representa uma arte, pois implica em descobrir os movimentos
favoráveis da natureza a fim de seguir sempre o caminho da menor resistência, permitindo
maior interação do ambiente externo com os detalhes íntimos da vida cotidiana.
Muito do estilo das comunidades ecológicas modernas tem sua origem nos
assentamentos nativos existentes em diversas partes do mundo, a maioria nas zonas rurais
em florestas ou nas margens dos rios ou do mar. Estes agrupamentos trazem consigo uma
tradição construtiva que foi construída ao longo de gerações através da observação direta
dos fenômenos naturais, além da necessidade de transpor obstáculos econômicos e físicos,
ou seja, pela falta de recursos para a compra de materiais industrializados e as grandes
distâncias dos centros urbanos, respectivamente. Nestas comunidades, a utilização destas
técnicas tradicionais aparece de forma muito clara, seja nas paredes de fechamento (em
bambu, barro, madeira, etc.) ou nos telhados (em fibras naturais) onde visivelmente
percebe-se o uso dos recursos naturais locais (Figura 02).
28
Figura 2 - Arquitetura Ecológica – Praia do Peba, foz do Rio S. Francico. Fonte: Novos Paradigmas
Ambientais. Ricardo Braun, 2008.
Nos agrupamentos modernos ditos sustentáveis, também chamados de ecovilas,
além da incorporação destes saberes tradicionais existe uma preocupação com a reciclagem
de materiais. Muitas destas comunidades são assistidas por grandes centros de pesquisa ou
fazem parte de uma rede mundial8 que, ao mesmo tempo em que financiam estudos,
facilitam o intercâmbio de know-how tecnológico entre diferentes grupos. Neste sentido,
são muitas as experiências utilizando fontes alternativas como insumos as técnicas
construtivas, a exemplo do uso de pneus usados de veículos para construção de paredes,
garrafas plásticas de refrigerantes como elementos de iluminação ou aquecimento de água,
papel reciclado para a construção de blocos, etc. Em todos estes casos, o que existe de
comum é a reutilização de objetos descartados, com um forte aporte tecnológico no sentido
de desenvolver processos que viabilizem sua reciclagem.
Apesar de muitos princípios da arquitetura ecológica e das ecovilas terem sido
aproveitados nos conceitos modernos das construções ditas sustentáveis, mas de alto
padrão tecnológico9, seu desenvolvimento apresenta alguns limitantes quanto à sua
utilização em grande escala, ou onde se apresenta a maior demanda por uma arquitetura
menos impactante, ou seja, nos grandes centros urbanos. A maioria das técnicas utilizadas
nesses dois padrões de arquitetura incorpora processos lentos de manufatura e com pouco
8 O Centro de Tecnologia Alternativa no País de Gales e a GEN (Rede Global de Ecovilas).
9 Os tetos vegetalizados que foram adaptados aos tetos e paredes jardim; muitos materiais isolantes térmicos
que foram elaborados a partir da reciclagem da madeira ou uso de elementos cerâmicos, etc.
29
rigor estético, aproximando-se mais de um padrão conhecido como “rústico”, o que reduz
sua utilização uma vez que não se aplica a todos os tipos de construção que muitas vezes
requerem linguagens arquitetônicas mais sofisticadas.
A arquitetura ecológica e as ecovilas também apresentam técnicas construtivas mais
adequadas para edifícios de pequeno porte, como casas, praticamente inviabilizando sua
utilização em edifícios de muitos andares ou que exijam soluções estruturais muito
elaboradas, tais como grandes vãos livres ou marquises, por exemplo. Como emprega uma
tecnologia quase artesanal, em muitos casos, adquirida através de um conhecimento
passado de geração a geração, como um saber tradicional e antigo, torna-se difícil sua
utilização em grande escala, mesmo que em empreendimentos simples, pois a pouca
agilidade das técnicas empregadas inviabiliza financeiramente sua reprodução. Também,
agregado ao sistema construtivo propriamente dito, exige que sejam utilizadas instalações
de infraestrutura que sigam o mesmo princípio filosófico, como tratamento de dejetos por
compostagem, purificação das águas servidas por processos naturais envolvendo filtragem
com plantas aquáticas, dentre outros, o que necessita consequentemente a disponibilidade
de grandes áreas para as construções, um elemento cada vez mais escasso nos grandes
centros urbanos cada vez mais adensados.
Deste modo, mesmo reconhecendo seu papel importante no desenvolvimento de
técnicas e materiais construtivos mais sustentáveis, a arquitetura ecológica não se enquadra
nos estudos que envolvem as certificações de edifícios, uma vez que essas se resumem ao
tratamento de empreendimentos que utilizam processos industrializados, típicos do setor
formal da engenharia e da arquitetura, uma vez que podem ser utilizados em larga escala e
não apresentam limitantes quanto ao porte da obra e sua localização, e são os mais
impactantes em termos de degradação ao meio ambiente.
Assim, o marco legal ambiental que incide sobre o espaço sustentável, o
posicionamento da indústria da construção frente ao desafio da sustentabilidade e aos
sistemas de avaliação ambiental de edifícios no Brasil são temas que estruturam o presente
trabalho e dialogam com a interface da natureza e da ética na sustentabilidade e,
consequentemente, no acesso amplo e democrático nos espaços menos impactantes ao
meio ambiente.
30
2 – Questões Norteadoras
Algumas questões mais significativas foram levantadas e podem contribuir para dar
substância e forma ao problema da pesquisa, ao objeto, ao campo de atuação e atores
envolvidos, assim temos:
1) Como estas certificações podem contribuir para a sustentabilidade na
construção civil?
2) As certificações importadas contribuem para uma construção sustentável no
Brasil? De que forma? Quais as dificuldades? Quais os benefícios?
3) Como as certificações metodologicamente complexas podem interferir nas
construções do dia-a-dia?
4) Quais estratégias podem ser adotadas para que as certificações possam adquirir
um estatuto ético mais consistente?
5) Existem alternativas para quem não quer seguir os preceitos das certificações e
mesmo assim edificar uma construção sustentável?
3 – Objetivos da Pesquisa
Quanto aos objetivos da pesquisa:
a) Geral:
Analisar as certificações enquanto instrumento ético de sustentabilidade na
construção civil.
b) Específicos:
1) Caracterizar os conceitos de natureza, ética e sustentabilidade, e seus
rebatimentos na problemática ambiental contemporânea;
2) Verificar a abrangência da gestão ambiental para a construção de espaços
sustentáveis;
31
3) Analisar o conceito do desenvolvimento sustentável aplicado à indústria da
construção civil no cenário brasileiro;
4) Investigar o papel das certificações ambientais para que empreendimentos
imobiliários sejam caracterizados como sustentáveis;
5) Estabelecer uma comparação entre as certificações ambientais mais empregadas
no país e propor uma alternativa a esse instrumento.
A hipótese que norteia a pesquisa é:
A certificação ambiental de edifícios na construção civil constitui um instrumento
ético que garante os empreendimentos sustentáveis.
4 – Pertinência Científica e Social da Tese
A pesquisa apresentada tem sua relevância ao abordar uma problemática
contemporânea, em um setor que exerce forte impacto sobre as bases sociais e ambientais e
que está em amplo crescimento.
Temos assim, uma tripla tarefa: primeiro, avaliar a inserção deste setor no ideário
do desenvolvimento sustentável, enquanto meta amplamente divulgada, não só pelo
governo, mas também pela iniciativa privada; segundo, desvendar quais são os
instrumentos e mecanismos que estão sendo utilizados, sua abrangência, limites, avanços e
divergências, à luz de uma reflexão construída na ética; terceiro, pensar a extensão e o
mérito de metodologias de certificação ambiental, construídas em bases científicas, e que
se propõem elevar a sustentabilidade das obras civis serem aplicadas sistematicamente a
todos os tipos de construções.
Com o aquecimento do mercado imobiliário no Brasil e o avanço sem precedentes
das preocupações ambientais, tornou-se necessário dar maior credibilidade aos
empreendimentos ditos “verdes” e, por isso, os selos de certificações são considerados
como uma espécie de passaporte da construção dita sustentável. Ora, pensar estes selos no
Brasil se torna mais do que urgente, socialmente necessário, como já foi explicitado acima.
O resultado desta pesquisa pode reverberar no maior rigor às propagandas destes
empreendimentos e maior credibilidade àqueles que realmente levam em conta com
seriedade as questões ambientais por meio da sustentabilidade.
32
5 – Plano Conceitual da Pesquisa
Primeiramente, a parte introdutória deste trabalho abrange: a base justificatória da
pesquisa; uma breve contextualização do tema; objetivos; a pertinência científica e social
da pesquisa e seus limites.
O primeiro capítulo está voltado para o aprofundamento de três categorias que
foram incorporadas à pesquisa e deram o suporte teórico para o entendimento do objeto da
pesquisa, a saber: natureza, ética e sustentabilidade. O conceito de natureza foi analisado,
primeiramente, a partir da modernidade e como esta ideia, tão profundamente introduzida
na humanidade, passou a determinar os rumos de sua própria existência. Em um segundo
momento, tratou-se das questões relativas às modificações sofridas pela natureza por sua
inserção na sociedade e no espaço urbano atual. Trata-se, aqui, de uma concepção
romantizada e que vem servindo de validação para o recente movimento do greenbuilding
e que culmina com uma reinvenção do conceito adaptado às novas necessidades e limites
dos recursos ambientais.
A segunda parte do primeiro capítulo está centrada na ética, provavelmente o saber
mais desafiado nas últimas décadas. Em virtude dos inimagináveis avanços
tecnocientíficos, o homem defronta-se constantemente com questões normativas que
remetem ao real entendimento do “bem” e do “mal”. Neste sentido, uma nova ética vem
sendo proposta como alternativa às bases clássicas criadas para a reflexão das ações
humanas: uma ética ambiental e que tem a enorme missão de regular o agir do homem
sobre a natureza.
Por fim, ainda no mesmo capítulo, o tema da sustentabilidade ambiental foi
construído na problematização dos diversos sentidos que envolvem esta questão, fazendo
um contraponto entre sustentabilidade e desenvolvimento sustentável e, assim, estabelecer
os limites, superposições e divergências entre estes dois saberes.
O segundo capítulo trata das questões ligadas à construção do espaço urbano
sustentável, desde a formação das bases do urbanismo moderno e sua influência na
sustentabilidade dos assentamentos na cidade contemporânea, até o papel dos marcos
legais que tratam das políticas urbanas no país.
O terceiro capítulo apresenta o desenvolvimento sustentável como meta adotada
pela indústria da construção civil para alcançar práticas ambientais menos impactantes.
Neste sentido, coube abordar, primeiramente, sua cadeia produtiva e os elementos que
33
contribuem para aumentar/diminuir o impacto ao meio ambiente e, também, analisar as
possibilidades de inovação que o setor dispõe para incrementar práticas menos
consumidoras de recursos naturais. Em segundo lugar, verificou-se o desempenho dos
SINDUSCONS em algumas capitais do país, nas cinco regiões geográficas, afim de
desvendar suas estratégias de divulgação e incentivo da construção sustentável e do
instrumento de certificação ambiental de edifícios. Por fim, analisou-se o papel de outras
instâncias (públicas, privadas e de pesquisa) que, de alguma forma, contribuem para o
incremento da construção sustentável e o mais recente instrumento normativo da ABNT,
que incide sobre as construções no país.
O quarto capítulo examina o tema da certificação de edifícios como uma
metodologia para se construir com otimização de recursos e focou as quatro principais
certificações que estão em vigor no país (LEED, AQUA, Procel Edifica e Selo Casa Azul)
e suas estruturas metodológicas.
O quinto e último capítulo refere-se às considerações finais, às análises de
comparação entre as quatro certificações estudadas, seus pontos de semelhança e
divergência, sua capacidade de atuar em outros nichos mercadológicos, menos
privilegiados. Por fim, foi apresentado um instrumento alternativo às certificações voltado
para quem não quer se vincular a uma instituição certificadora e, mesmo assim, deseja o
reconhecimento de suas práticas construtivas sustentáveis. Tal instrumento é pautado na
ética ambiental.
CAPÍTULO 1
PRESSUPOSTOS TEÓRICOS
1– PRESSUPOSTOS TEÓRICOS
O objetivo deste capítulo é analisar categorias que formam a base teórica da tese:
natureza, ética, sustentabilidade e desenvolvimento sustentável.
Numa primeira etapa, o conceito de natureza é apresentado em três momentos:
primeiramente, na observação dos fenômenos e, consequentemente, na ação de aprender
com a natureza; em segundo lugar, na experimentação, ou seja, na capacidade de se
reproduzir os fenômenos naturais; por fim, na descoberta da finitude e da necessidade da
natureza perdurar, ou o conhecimento do respeito. Numa segunda etapa, a natureza é
analisada como o elemento capaz de devolver ao homem o equilíbrio perdido com a
artificialização da vida nos espaços urbanos e as contradições por trás dessa afirmação.
O estudo da ética é debatido na sua conceituação clássica e, posteriormente, na
necessidade de ser aplicada às demandas da vida contemporânea. Sustentabilidade e
desenvolvimento sustentável são conceitos amplamente utilizados, porém, ainda suscitam
muitos questionamentos. A pesquisa reconstrói esse debate no intuito de esclarecer as
tantas definições e equacionar as inconsistências desse tema; também, aprofunda-se nos
mecanismos de mensuração dos ganhos ambientais, os indicadores de sustentabilidade e,
por fim, detém-se no entendimento de como o setor empresarial vem se posicionando
diante do novo paradigma ambiental.
O estudo dessas categorias visa a montar as pontes de diálogo entre a teoria e a
prática de uma pesquisa interdisciplinar com foco principal na sustentabilidade da cidade;
em outras palavras, na tentativa de se contribuir para a construção do espaço urbano
melhor sob a perspectiva ambiental e ética.
1.1 – O Conceito de Natureza
1.1.1– A Construção do Conceito de Natureza no Pensamento Moderno
O termo natureza apresenta uma multiplicidade de definições envolvendo,
inclusive, conceituações antagônicas. Se por um lado remete a todas as coisas do mundo,
36
por outro, representa a essência; se vulnerável, passível de reprodução e degradação,
também aquilo “que se mantém, o permanente” (LARRÈRE, 2003, p. 228).
Em seu uso mais fluente, o termo natureza é interpretado como “o movimento de
todas as coisas existentes”, o primeiro momento da vida, aquilo que “cuida bem dos seres
que se manifesta”. Ao mesmo tempo em que se diferencia da obra do homem, a natureza é
o “próprio poder criador de Deus” (ABBAGNANO, 2007, p.699).
A natureza pode estar relacionada ao conjunto de entes (vivos e não vivos) que
compõem o mundo físico, o conjunto de mares, montanhas, árvores, animais e todos os
fenômenos do universo, ou seja, o mundo material/real em que vive o homem. Também se
pode fazer conexão com uma dimensão mais intangível quando centralizada na regência do
comportamento humano, em sua índole e essência; ou ainda ser associada à condição
original do homem, ainda não civilizado, longe de uma consciência racional.
A atuação do homem sobre a natureza não está determinada apenas por questões
biológicas de sobrevivência, mas também pelo acúmulo de experiências culturais, passadas
de geração para geração. Esta ação do homem, ao mesmo tempo em que transforma a
natureza, humanizando-a, transforma a si próprio diferenciando-o cada vez mais dos outros
animais. Todo este caminho pode ser entendido como o processo de produção da existência
humana, necessário à sua sobrevivência. Entretanto, essa ação continuada caracteriza-se
por uma constante reinvenção de velhas necessidades, que passam, imediatamente, a fazer
parte fundamental do seu viver e revela uma natureza modificada a todo o momento, pela
incorporação de elementos antes inexistentes (ANDERY, 2007).
Mais do que tentar explicar o termo, o mundo contemporâneo volta-se para uma
preocupação ética com a natureza, os meios de se limitar a ação humana, ou em outras
palavras, qual a natureza que se quer preservar e transmitir para as gerações futuras. Esse
caminho filosófico de compreensão e descoberta da natureza pode ser compreendido,
cronologicamente, em três momentos distintos: da observação, da experimentação e do
respeito (LARRÈRE, 2003).
O percurso inicial, o de observar, remete à antiguidade, ao tempo em que uma
natureza “sendo ao mesmo tempo abstrata, tem entretanto como regra a observação,”
(LARRÈRE, 2003) e mantém o homem inserido nela, com normas a aprender.
37
Os temas filosóficos da antiguidade relacionados às questões do mundo, de sua
origem e criação, centravam suas abordagens a partir de uma estrutura ternária composta
pela política, pela ética e pelo psíquico, mantendo uma inserção do homem na natureza. “A
ética está ligada à física, da mesma maneira que as oposições entre as diferentes
concepções da história natural têm conseqüências morais: elas determinam a relação entre
a natureza e a lei” (LARRÈRE, 2003, p. 229).
A natureza, como um constructo de arte e inteligência, que trabalha para um fim
próprio, o do melhor, encerra uma ordem na qual o homem deve imitar, seja no cosmos ou
nas formas biológicas, “existem normas a aprender na natureza” (LARRÈRE, 2003,
p.229), uma intenção, que mesmo considerando o normal e as anormalidades, direciona sua
existência para a correção.
Contudo, os antigos, como Aristóteles e Platão, consideram que “viver de acordo
com a natureza não é viver na natureza” (LARRÈRE, 2003, p.230), pois o homem como
ser moral só alcança sua excelência na cidade. É nesse espaço onde sua liberdade de agir,
diante da eventualidade do mundo, é posta à prova, justamente em sua capacidade de
observar as leis da natureza e, prudentemente, optar pela ação correta.
O pensamento moral antigo de unicidade entre o homem e a natureza, vai começar
a ser desfeito com o um novo princípio ético com o cristianismo. A Bíblia ao “dizer que o
homem foi criado à imagem de Deus, coloca-o à margem da natureza, submetendo-o
apenas à lei divina” (LARRÈRE, 2003, p.230). Entretanto, não é essa concepção
antinaturalista que vai se propagar nos séculos pós-antiguidade, até que se consolide uma
ruptura.
O que se impõe durante longo tempo não é a dualidade oposta da natureza e da
graça, mas uma concepção hierárquica que coloca o homem, diretamente ligado
a Deus, em posição central na natureza, onde ele é a principal das criaturas e que
lhe foi confiada por Deus para que ele a use sabiamente. (LARRÈRE, 2003, p.
230).
O movimento de transformação da ideia de natureza na Idade Moderna indica a
existência de dois momentos distintos. O primeiro abrange os séculos XVI e XVII, quando
a natureza ainda era vista como um organismo vivo, resquícios do pensamento medieval,
que, gradualmente, foi se transformando em uma visão matematizada (COLLINGWOOD,
1986).
38
Todavia, nessa primeira fase a natureza era ainda considerada como um
organismo vivo, e a relação entre a natureza e o homem era ainda concebida em
termos de astrologia e de magia; isto porque o poderio do homem sobre a
natureza era concebido, não como o poderio do espírito sobre o mecanismo mas
sim como o poderio de uma alma sobre outra alma, o que implicava magia;
(COLLINGWOOD, 1986, p. 141).
Ao criar o mundo, Deus o fez à sua vontade e, desta forma, poderia tê-lo feito
diferente, poderia até não tê-lo feito; a natureza é, portanto, coisa criada, é obra do divino,
mas fora Dele. O homem, portanto, feito à imagem de Deus, está fora da natureza, não
pertence ao seu reino, e com isso “a estrutura do cristianismo, que põe o homem em
relação direta com Deus, fora da natureza, abre a possibilidade de o homem ocupar o lugar
de Deus” (LARRÈRE; LARRÈRE, 1997, p. 67).
A natureza regida por leis ordenadas, num cosmos regular onde os fenômenos não
são mais obra de deuses caprichosos, confirma um período de mais de vinte séculos. Com
o cristianismo, a natureza, obra de Deus, ensina ao homem a voltar-se para o seu criador e
define seu lugar (LENOBLE, 2002).
O homem, dizia o cristianismo, não se situa na natureza como um elemento num
conjunto; não tem o seu lugar nela como as coisas têm o seu lugar; é
transcendente em relação ao mundo físico; não pertence à Natureza mas a graça,
que é sobrenatural; e, por conseguinte, se se quer a todo o custo encontrar-lhe
um lugar, existe apenas um, o primeiro, com a condição ainda de precisar de
imediato que não nasceu da natureza e que é feito para nela permanecer.
(LENOBLE, 2002, p. 186).
Esta transição ocorreu com o trabalho de diversos pensadores e cientistas que
passaram a dedicar suas pesquisas sobre os fenômenos do universo. Estes estudos
resultaram em descobertas que revolucionaram o pensamento da época, a exemplo de
Copérnico, que expôs a tese de que a terra não era mais o centro do universo e o
movimento dos planetas se dava através de uma rotação heliocêntrica. Esta afirmação
significou a ampliação dos poderes do homem, determinando que as suas leis científicas,
aqui aplicadas, poderiam ser eficientes a outros mundos semelhantes ao nosso. Com o
passar do tempo, esta tese foi adquirindo superioridade e a ideia de natureza como uma
máquina suplanta qualquer outra possibilidade de entendimento dos fenômenos
(HENRIQUE, 2004).
39
A visão de natureza deixa de ser vista como um organismo e passa a ser encarada,
definitivamente, como uma máquina e toda a realidade natural como um agregado de
quantidades. É com o trabalho de Galileu, Bacon, Descartes, Newton, dentre outros, que a
ciência passa definitivamente a conceituar a natureza, tratada agora como objeto desta
mesma ciência, que abria um enorme leque de possibilidades para o homem como ser
superior de um mundo totalmente mensurável (COLLINGWOOD, 1986).
É a partir do Renascimento que a ciência “emerge contra a observação”, onde o
espaço abstrato da geometria euclidiana e o universo infinito contribuem para a
conceituação de um mundo regido por leis matemáticas, regulares, passível de uma
“compreensão exata”. Descortina-se ai uma nova intelectualidade, que passa a exigir
procedimentos (produzidos e reproduzidos) laboratoriais para se chegar ao conhecimento
exato das coisas (LARRÈRE, 2003, p. 231). A natureza manifesta-se numa regularidade,
uma lei geral do universo, onde a regra matemática, que dá ordem à natureza, deve ser
descoberta e descrita em todas as suas partes (ABBAGNANO, 2007).
É na confirmação do conhecimento científico moderno que se determina a
dependência da natureza para com o homem. A experimentação proporciona a
oportunidade de se produzir artificialmente o fenômeno, impossível de ser observado
livremente na natureza; nem por isso deixa de ser natural, pois são seguidas,
rigorosamente, as leis que determinam este fenômeno. A esta experimentação faz-se
necessário um experimentador, um sujeito impessoal, que pode ser substituído por outro, a
qualquer momento, sem comprometer a realização do experimento, uma vez que este
último está decomposto em partes, peças distintas que pelas leis da física podem ser
reagrupadas. Assim, cabe ao homem papel de conhecedor de uma natureza, antes apenas
“observada” e, por isso mesmo, menos verdadeira, e agora, definitivamente extrapolando
os limites do artificial para o natural.
O homem percebe que a natureza está submetida a ciclos, que se repetem de tempos
em tempos, tal como o realinhamento dos astros no universo. Esse “mecanismo” deixa
claro que a natureza é uma coisa nas mãos de Deus e como máquina suas alavancas
também podem ser manejadas pelas mãos daqueles que não estão nela, mas situam-se
perante ela. Assim, a nova física que vai dar explicação a todos os fenômenos, não tarda a
quebrar os elos reflexivos que o homem fazia sobre si, sobre o mundo e a natureza como
testemunho do divino (LENOBLE, 2002).
40
A ideia de natureza desenvolvida no período moderno assemelha-se ao sentido de
uma máquina, com partes coordenadas, conjugadas e com um fim definido. Esta visão está
totalmente em acordo com a época, rica em novos inventos que, cada vez mais, faziam
parte do cotidiano das pessoas, já anunciando a Revolução Industrial próxima. Esta
interação homem/máquina passou a interferir, mais ainda, na maneira como as pessoas
concebiam as relações com o mundo e, assim, passou a definir novos padrões de vida
(COLLINGWOOD, 1986).
A moderna visão de natureza, que começa a tomar forma em fins do século
XVIII e desde então se tem consolidado e estabelecido mais seguramente até aos
nossos dias, é baseada na analogia entre os processos do mundo natural,
estudado por homens de ciências naturais, e as vicissitudes dos problemas
humanos, estudadas por historiadores (COLLINGWOOD, 1986, p.19).
As novas leis da física e da mecânica vão além das definições dos fenômenos
naturais, servem de base epistemológica para a filosofia engendrar o ponto de partida, que
a partir de agora é capaz de guiar e ordenar todo o pensamento moderno, a racionalidade
científica. Este modelo que ao mesmo tempo esclarece e revela os novos pressupostos do
fazer ciência, surpreende pela sua amplidão, pelo seu caráter sistemático, pela sua
coerência, pelo seu êxito.
A unicidade e coesão de todo o ideário moderno científico conferiu-lhe a
capacidade de redefinir a própria racionalidade humana, agora alicerçada sobre
pressupostos que definitivamente atribuía valor de ciência verdadeira aos novos processos
de investigação dos fenômenos naturais. Assim, o fazer ciência significava seguir
pressupostos, normas, procedimentos, criados por uma comunidade específica que ao
mesmo tempo em que validava o saber apresentado, exigia a prova (LARRÈRE;
LARRÈRE, 1997).
A revolução científica moderna unifica o mundo celeste e o terreno com as
descobertas da física mecânica clássica em estabelecer uma regularidade geométrica para
todos os fenômenos, que se reproduzem de forma universal e a terra como um planeta
semelhante aos demais. É neste novo cenário de rupturas e transformações que a filosofia
moderna assume o trabalho de revelar os fundamentos desta nova revolução científica,
coerente, sistemática, ampla, e por tudo isso satisfatória e que até hoje é sinônimo de
racionalidade (LARRÈRE; LARRÈRE, 1997).
41
Neste sentido, podemos creditar o êxito da racionalidade científica moderna ao seu
caráter de unicidade, imposta pela coesão das suas características epistemológicas e
traduzidas na matematização da experiência, na separação entre o sujeito e o objeto e por
fim ao valor atribuído a experimentação. Esta tríade metodológica faz produzir um novo
tipo de conhecimento, especializado, o saber racional moderno adota deste modo um novo
objeto, conhecido profundamente, determinado pela prova de suas características e
confirmado por uma comunidade específica, os cientistas (LARRÈRE; LARRÈRE, 1997).
No século das luzes, grande parte dos pensadores voltou-se para as questões de
concepção do universo como cadeia de seres. Com os avanços nos estudos do átomo, por
John Dalton, no início do século XVIII e, do desenvolvimento das hipóteses científicas da
biologia e da história natural, desencadeou uma série de deduções filosóficas que buscou
explicar uma ascendência ou continuidade natural entre os seres (SOUZA, 2002).
Desta forma, a filosofia interessa-se pelas relações entre os homens e os demais
entes do mundo, a explicação para distinção entre os animais e vegetais, a reconstrução de
sua origem, enfim, uma explicação de todos os fatos relativos aos seres vivos.
O interesse pela natureza, nesta época, volta-se, principalmente, para as explicações
sobre as coisas da vida, sobretudo pelas questões da reprodução animal. Não são poucos os
estudos que se voltam para a elaboração de teorias a respeito da fecundação e o surgimento
dos embriões. Entretanto, grande parte destes tratados toma por base um princípio divino
da preexistência para a elucidação da origem primeira dos seres, atribuindo esta origem à
ação do criador (SOUZA, 2002).
De qualquer forma, as abordagens centravam-se na explicação da natureza
enquanto força vital, no entendimento dos processos de distinção entre as espécies, e, dessa
forma, buscavam uma resposta filosófica para o problema do desenvolvimento das formas
da vida (SOUZA, 2002).
O homem, como todas as outras coisas, é visto como um somatório de partes, um
encadeamento de forças, um agregado de moléculas, que, reunidas, formam o todo. Este
ideário iluminista, ao mesmo tempo em que concretiza a concepção de conjunto, reforça a
teoria separatista cartesiana, estabelecendo lados opostos entre corpo e alma, homem e
natureza (SOUZA, 2002).
42
A construção deste novo pensamento desenvolveu-se a partir do avanço dos estudos
históricos das espécies e tinham em seu centro a concepção de processo, mudança e
evolução como categorias fundamentais para a consolidação da visão de natureza. Esta
concepção baseada nas mudanças ou processos históricos, que poderiam ser
cientificamente conhecidos, comumente foi designada de evolução, era empregada para a
explicação de todos os fenômenos do universo.
Primeiramente, nesta visão, de modo análogo à história, a natureza é considerada
como um processo em constante progresso, sem repetições, isto é, o que, aparentemente,
parecia cíclico, na verdade, comporta-se como um movimento em espiral; em segundo
lugar, a ideia de desenvolvimento com uma finalidade toma corpo. Na natureza tudo
conspira para um determinado fim (COLLINGWOOD, 1986).
Devido ao prodigioso sucesso alcançado pelas descobertas científicas ligadas as
áreas do conhecimento ditas “duras”, a matéria morta, muito do progresso científico
relacionado ao ser vivo passou desapercebido. É certo que, a partir da rigidez metodológica
da ciência moderna, enquadrar o ser vivo nos pressupostos mecanicistas não foi tarefa
fácil. Neste sentido, os cientistas passaram a recorrer às analogias no intuito de validarem
seus experimentos, ao coração uma bomba, o sangue e sua circulação como dutos e fluxos
de volume e velocidade. Entretanto, quando as associações não se faziam presentes, os
estudos dos naturalistas perdiam força e é por isso que “por fidelidade ao mecanismo que,
prisioneiros de analogias, eles descobriram tão pouco” (LARRÈRE; LARRÈRE, 1997, p.
81).
A regularidade dos fenômenos de uma natureza homogênea contrapõe-se a de uma
natureza plural, verificada na diversidade das formas vivas. Não podendo enquadrar-se nos
ditames mecânicos, os estudos naturalistas permaneceram, por assim dizer, às margens da
modernidade e procuraram outros caminhos de enquadramento da ciência racional. Neste
sentido, esforçam-se primeiramente na produção de inventários, na tentativa de vencer a
diversidade, depois lançam mão das classificações e sistematizações revelando uma busca
por uma ordem geral do universo, e por fim avançam para a formulação de uma
interdependência entre todas as partes e funções da natureza na forma de uma unidade sem
falhas (LARRÈRE; LARRÈRE, 1997).
Apesar dos grandes avanços de descobertas científicas, ligadas às ciências da
natureza, na forma de inventários de animais e insetos, classificações botânicas, entre
43
outros, em muito impulsionado pelo crescimento do comércio e a expansão colonial
européia, até finais do século XVIII muito pouco se avançou em termos de uma verdadeira
ciência da vida que explicasse os mistérios da reprodução animal. Até então, seja através
de combinações, produções espontâneas, renovações, o surgimento dos seres, e portanto a
natureza, é de maneira geral tratada como uma estrutura sempre em movimento, um fluxo
contínuo, não escapando ao mecanismo moderno10
(LARRÈRE; LARRÈRE, 1997).
A natureza só vai alcançar sua separação da moral, com Rousseau, quando este
fundamenta a ideia de moralidade condicionada a vida em sociedade, ou seja, a liberdade
humana materializa-se no mundo moral construído por ele, “fora de uma natureza
irremediavelmente perdida” (LARRÈRE, 2003, p.231).
O caminho está assim aberto às filosofias que irão ligar a moralidade a tudo o
que separa a humanidade da natureza: a liberdade, o espírito, a história, o
trabalho [...] O mundo tornou-se o lugar do humano, a natureza não é mais a sua
casa. Talvez isso se dê porque ela cessou de ser habitável. (LARRÈRE, 2003, p.
232).
É com a contribuição de todas estas pesquisas que, no século XIX, a teoria da
evolução de Darwin apresenta uma nova proposição naturalista de surgimento das
espécies, baseada na hereditariedade. É a possibilidade de um parentesco humano com
todos os outros seres terrenos.
Mesmo hegemônico e coeso, esse pensamento moderno, baseado na mecânica
clássica, foi mais responsável por um parcelamento do saber do que por sua unificação,
uma vez que cada ciência centrou seus estudos em campos fechados, tratando seus objetos
irredutivelmente isolados. Este quadro, ao mesmo tempo em que garantiu certa liberdade
aos ditames da racionalidade, foi capaz de assegurar uma unidade da ciência moderna, que
dificilmente seria conseguida caso a opção fossem processos mais interdisciplinares.
A concepção mecânica racional, progressivamente deixou de lado as questões da
natureza macroscópica do mundo visível e perceptível aos olhos e sentidos humanos, optou
pela visão do microscópio e do telescópio, ora no átomo, ora no universo intangível. Os
fenômenos macroscópicos terrenos, ou que afetavam diretamente a humanidade, ficaram a
10
Os autores consideram que nesse período o que ocorreu foi uma passagem do “mecanismo cartesiano para
o mecanismo newtoniano”, ou seja, “a exterioridade das formas visíveis pela interioridade de um processo”,
que mesmo “demasiado ligado à idéia moderna de equilíbrio, da regularidade da ordem da natureza” abre
campo para o evolucionismo darwinista. (LARRÈRE, 1997, p. 90).
44
cargo de outros saberes, das ciências do homem, menos importantes frente ao
determinismo racional (COLLINGWOOD, 1986).
Sem dúvida, foi a física que mais apresentou um desenvolvimento de suas teorias.
A mecânica clássica, até as primeiras décadas do século passado, deu conta de explicar os
fenômenos do mundo macroscópico, do movimento dos corpos no universo. Com os
avanços da física contemporânea no século XX, descobre-se que a natureza não é
composta apenas por simples átomos regidos por leis previsíveis, mas também por
partículas diversas que interagem entre si de múltiplas formas, definindo forças fortes e
fracas.
O progresso da ciência moderna no século XX acrescenta mais um elemento que,
definitivamente, vai influenciar a visão de natureza. Os trabalhos de alguns cientistas, a
exemplo de Albert Einstein, determinam que o universo físico foi originado em uma data
específica e que também apresenta uma finitude espacial e temporal. Com isto, o mundo da
natureza assume outra dimensão, ao mesmo tempo em que, tem um papel secundário, de
dependência de algo que a antecedeu, é também lançada a uma concepção de fim
(COLLINGWOOD, 1986).
Estas duas ideias, de natureza viva e finita, representam a visão contemporânea de
natureza e, juntas, configuram as bases para o recente movimento do desenvolvimento
sustentável, que anuncia um novo olhar para as coisas do mundo natural, inclusive para o
próprio homem, até então o ser supremo acima de toda esta questão.
Como anuncia Larrère (2003), “para que a história continue” o homem percebe a
necessidade da natureza perdurar. É justamente no progresso do conhecimento, longamente
embasado na cisão com a natureza, que se anuncia a fragilidade do mundo natural,
ameaçado em seu equilíbrio ecológico. Nesse sentido, retoma-se o princípio dos limites das
relações humanas com a Terra, e a natureza volta a determinar a medida destas ações sob o
lastro do respeito. “É do próprio interior da racionalidade científica que provém a
revelação dos limites necessários da intervenção técnica, como o conhecimento do que
deve ser respeitado” (LARRÈRE, 2003, p. 233).
A teoria da relatividade, e mais recentemente da física quântica, definem novos e
distintos campos dos fenômenos do mundo. Entretanto, quanto mais profundos são os
avanços científicos destes saberes, na investigação dos objetos microscópicos, mais
imprevisíveis se tornam os resultados medidos diante da complexidade destas partículas,
45
que parecem compostas por características próprias e submetidas a leis singulares. A
unidade abre um vasto campo à diversidade, ao previsível, ao imprevisível, ao caos
(LARRÈRE, 2003).
É diante desta natureza múltipla que as ciências contemporâneas vêm questionando
a partição implementada pelo quadro conceitual moderno, esta exterioridade do homem
frente aos fenômenos do mundo. Esta natureza artefato, dissecada nos laboratórios, não
responde mais aos questionamentos elementares que sempre moveram o progresso do
conhecimento: de que é feito o mundo? Quais as forças e leis que o regem? (LARRÈRE,
2003).
A apreensão da complexidade devolve à natureza o status de interação ao homem,
de processo contínuo, de dependência. A atual crise ambiental vem questionar os
equilíbrios e as regularidades dos fenômenos, o papel secundário dos saberes da
observação frente aos da experimentação, vem demonstrar a dependência entre as ações e
os artefatos humanos e os limites dos recursos naturais, os princípios morais de
responsabilidade pela continuidade da natureza.
A tentativa de explicar a natureza, seja ela em sua concepção simplificada de
associação das coisas do mundo natural, seja em sua forma mais subjetiva relacionada às
ações e reações do homem, sempre se constituiu em empreitadas desenvolvidas
primeiramente pelos filósofos e o novo milênio deposita mais uma vez sobre este campo
do saber a tarefa de retomar os conceitos de natureza e por este caminho encontrar as
respostas para os males que afligem esta nova era.
O homem defronta-se com uma nova realidade, em muito produto do progresso
tecnocientífico, que criou um mundo de desigualdades, com grandes alterações e a
perspectiva de um futuro incerto. Se, por um lado, permitiu descobertas revolucionárias e
que, até hoje, servem de base justificadora para o seu discurso, por outro lado, descortina-
se cada vez mais um sentimento de pavor em parcela da humanidade que se mantém lúcida
e crítica, mas que também usufrui destas benesses tecnológicas.
Este desenvolvimento alicerçado nos fundamentos de reprodução do capital
proporcionou um pensamento crítico, que veio responder e justificar as causas e efeitos da
modernidade tecnológica sobre os valores morais e existenciais do homem e sua qualidade
de vida. Esta razão põe a natureza e o homem apenas como objeto e força de trabalho,
46
respectivamente, desprezando qualquer processo de satisfação das atividades humanas
(LEFF, 2001).
O conceito em que a natureza é concebida como fonte de recursos para a
sobrevivência humana, conceito este, aprofundado com o desenvolvimento da ciência
moderna, é o que mais recentemente vem causando uma série de questionamentos e pondo
em cheque os próprios fundamentos que nortearam grande parte da civilização humana.
Segundo Heemam (2001), o porquê de tal importância agora depositada na
natureza, constituindo-se como recorrência usual para embasar o comportamento ético-
moral, justifica-se no fato de o homem redescobrir sua inserção nessa natureza e, nela,
encontrar indicativos que possam reger sua conduta.
A nova concepção de natureza implica na crítica ao ideário moderno de natureza
produzida, apropriada, pondo em questão o sentido de posse desse objeto fabricado. De
certa forma, retoma-se a ideia dos antigos, de usufruto, do cuidado, de observar e dos
limites, do dever do homem em “permitir à vida continuar” (LARRÈRE, 2003, p. 233).
Das diversas formas da relação entre o homem e a natureza, desde a “observação”
dos antigos mostrando a possibilidade de interação entre naturalismo e humanismo,
passando pelo “experimentalismo” moderno que em última instância sinaliza para uma
degradação irreversível da natureza, até finalmente, a partir das últimas décadas, percebe-
se a possibilidade de se continuar esse processo agora sobre o lastro do “respeito”, que
explicitamente exige a consideração da dependência, dos limites, do singular, mas também
do global, do progresso do conhecimento, da tecnologia, vem exigindo o repensar da
natureza, dessa nova reconciliação e que passa pela dignidade do homem e de tudo que
envolve sua existência. Passa pela diminuição da poluição do ar, das águas, do solo, da
preservação de florestas nativas com seus habitantes humanos e não humanos. Preservar a
natureza é preservar a terra e o mundo.
1.1.2 – A Incorporação da Natureza na Sociedade e no Espaço Urbano Contemporâneo
Os muitos estudos que se debruçam sobre o tema da natureza indicam que esta
categoria carrega na sua conceituação um simbolismo pleno de diversas formas de
pensamento e ideologias. Entretanto, o objetivo, ao se tratar deste tema neste momento, é
analisar que a natureza, a partir da modernidade, materializa-se em uma apropriação do
natural no cotidiano do espaço urbano. Esta nova visão de natureza continua por reproduzir
47
uma intencionalidade romântica, com um forte apelo a uma estética mundializada do
belo11
.
A cidade, como a maior realização do homem, seu principal artefato, torna-se, na
contemporaneidade, o principal palco para uma nova relação entre o homem e a natureza.
Na expansão e especialização do espaço urbano, um reencontro com os elementos naturais
parece inevitável: esse retorno pretende devolver ao ser humano o equilíbrio perdido com a
artificialização.
Vários são os conceitos para a cidade, a depender do enfoque adotado. Segundo
Franco (2001), em uma abordagem mais humanista, o espaço urbano pode ser visto como
um fenômeno social, formado por uma concentração populacional não agrícola,
desenvolvendo ações de comércio, indústria, financeiras e culturais, ou, como salienta
Hardt (2000), o espaço habitado, palco de múltiplas inter-relações, em diferentes níveis de
cultura e sociedade. Dentro de uma visão ecológica, aparece como um ecossistema,
dependente de áreas externas que nutre suas necessidades de consumo (FRANCO, 2001),
ou como uma estrutura viva, tal qual um grupo de células, que tem como objetivo a
manutenção de sua vida (LABORIT, 1971).
Sob a ótica da arquitetura e do urbanismo, a cidade é um lugar intencionalmente
produzido, composto pela conjugação de espaços artificiais abertos e fechados, em
diferentes escalas de adensamento, interligados por ruas e avenidas, edificados de forma
planejada e espontânea (KOHLSDORF, 1996). Neste sentido, esta estrutura age
diretamente sobre o grupo humano que nela habita e vice-versa, tornando as relações
sociais mais fortes ou fracas.
A natureza, quando analisada dentro do espaço urbano, assume em muitos aspectos
uma condição contraditória. Ao mesmo tempo em que é vista como uma fonte/local para a
renovação das energias gastas no dia-a-dia, é também tratada como um impedimento, um
entrave para o crescimento da cidade, e, neste sentido, são muitas ações de desvio de rios,
desmonte de morros, aterramento de manguezais.
11
A atuação do homem sobre a natureza extrapola as necessidades de melhoria da produtividade e incorpora
elementos estéticos que vão sendo definidos de acordo com os gostos impostos pelo decorrer do tempo. Esse
peso simbólico admite desde uma visão de natureza belamente controlada, com forte influencia dos artistas
plásticos no período clássico, até a visão contemporânea de incorporação da natureza à vida contemporânea,
amplamente aceita no contexto do consumo e da qualidade de vida (HENRIQUE, 2004).
48
Como um constructo humano, a natureza na cidade, traduz-se como um elemento
simbólico que foi construído historicamente, assumindo diversos papéis a depender da
época. Sua maior representação é visualizada na vegetação (praças, parques e jardins), um
conceito enraizado no “imaginário coletivo” e que não consegue ultrapassar para outros
elementos como pertencentes ao reino do natural. Um bom exemplo é o ar puro.
Fortemente influenciada pela força da estética, esta natureza foi sofrendo modificações
pelos “gostos”, estilos que se sucediam com o tempo, impondo padrões de beleza natural,
assim, ora volta-se para as planícies campesinas, para as montanhas e rochedos, ora para as
paisagens litorâneas.
Esta natureza cultivada, que passou pelo filtro da civilização, é mais facilmente
absorvida pela imaginação do homem, àquelas áreas ditas muito selvagens são
incompreensíveis e guardam muito perigo. Segundo Henrique, (2004), mais aprazíveis são
as avenidas arborizadas, os lagos entrecortados por pontes, praças salpicadas de esculturas
e fontes. A perfeição do jardim planejado passou a ser o sinônimo de beleza natural, onde,
com segurança, todos podiam usufruir dos benefícios da natureza.
Entretanto, nos primeiros assentamentos urbanos, a natureza era incorporada como
um elemento definidor destes espaços, no desenho urbano, e em muitos casos, serviu como
força de agregação das pessoas, seja por motivos econômicos (margem dos rios, portos
naturais, vales cultiváveis) ou por motivos de defesa (alto dos morros). Em todas estas
situações, o elemento natural ocupava um valor estratégico para a formação destes
aglomerados e até hoje muitos exemplos que sobreviveram ao tempo podem ser vistos,
como muitos núcleos medievais e suas ruas estreitas e tortuosas adaptadas ao relevo
montanhoso. A cidade moldava-se à natureza física.
A inserção de áreas naturais planejadas na cidade teve sua origem no século XVI, a
inclusão dos parques urbanos foi primeiramente uma obra da nobreza européia com a
criação dos bosques voltados para a prática da caça. Nesse século, havia um grande
interesse pelos jardins botânicos, locais de cultivo de plantas exóticas do Novo Mundo,
importadas pelas expedições e descobrimentos. Estes espaços passaram a representar o
modelo de natureza, em uma espécie de curiosidade por um mundo estranho, selvagem,
mas ao mesmo tempo domesticada e controlada pelos muros destes jardins (HENRIQUE,
2004).
49
A projeção e a gestão dos espaços urbanos no Renascimento foram fortemente
influenciadas por uma série de fatores sociais e políticos, que se refletiram no espaço
aberto das principais cidades da Europa. A crise econômica, as mudanças nas classes
dirigentes e a formação da pesquisa científica moderna fizeram com que a arte perdesse
seu caráter unitário de concepção do ambiente físico: “a verdade das coisas não coincide
mais com a beleza das coisas” (BENEVOLO, 2009, p. 5003), isto é, formaram-se as bases
do novo classicismo racional, francês e europeu, o controle mais rigoroso do ambiente
natural e artificial.
No Renascimento, o espaço urbano adquiriu certo caráter cenográfico e a
arquitetura extrapolou os espaços fechados para o domínio dos espaços abertos. O sistema
viário passou a ser visto como o sistema circulatório, em que as praças eram o coração; os
parques, os pulmões urbanos, e tudo isso em consonância com as novas ideias mecanicistas
emergentes na época. A vegetação adquiriu a dupla função de acompanhante das
edificações e delimitadora dos espaços de arquitetura, é o que Pereira (2010) chama de
“arquitetura vegetal em contraposição à arquitetura pétrea”, onde as árvores são tratadas
como elementos básicos na definição do traçado dos passeios, acessos, alamedas, na ênfase
aos eixos monumentais de alguns jardins.
Como dito anteriormente, os parques e espaços arborizados foram tratados
inicialmente como jardins da corte, como elemento enaltecedor do palácio. Na França, dois
célebres exemplares aparecem como representativos do jardim típico francês (Figuras 03 e
04), Parque de Vaux e o Jardim de Versailles. Essa tipologia paisagística desenvolve-se a
partir de um modelo de espaço aberto, produzido dentro de formas rígidas da geometria,
projetados segundo regras de desenho. Rigorosamente simétricos e com distribuição dos
seus espaços secundários a partir de um eixo monumental, as linhas retas dominam o seu
traçado, prezando pela lógica, clareza e equilíbrio.
Henrique (2004), afirma que esses espaços caracterizam-se por serem isentos de
árvores, para não impedir a visualização geral; as espécies arbustivas de pequeno porte
eram plantadas com rígido espaçamento, podas das copas em formas geométricas,
combinação de cores entre a folhagem e as flores. Além do desenho, agenciamento e
vegetação, outros elementos complementam o cenário do jardim francês: as fontes,
espelhos d‟água e estátuas. Este mobiliário urbano visava enriquecer as praças e seus
principais acessos, que eram, por assim dizer, coroados com estes elementos, reforçando os
50
grandes pontos de perspectivas, guiando o olhar do observador para esses eixos
estrategicamente projetados. Representa a natureza subjugada a arte, através do poder do
homem em séculos de evolução12
.
Os franceses construíram seus jardins em locais pouco acidentados, ou mesmo
nivelando a área por meio de aterros, criados em direta proporção aos palácios da época.
Dessa forma, foi eliminada qualquer interferência natural, com a clara intenção de reforço
a uma grandiosidade, criada para uma corte que amava o espetáculo e o luxo, para um
povo orgulhoso de sua cultura e origem (PIRES, 2008). A partir de então, os grandes
jardins urbanos caíram no gosto popular e passaram a ser considerados locais de encontro,
principalmente para a elite. Este novo modelo acabou sendo expandido para praticamente
toda Europa, a partir de Paris, tornando-se um elemento comum em qualquer plano de
reformulação e melhoria urbana, inclusive como um fator de expansão dos centros para
além dos muros medievais13
e vai desenvolver-se sem grandes alterações durante todo o
séculoXVII.
Outro tipo de jardim impôs-se como um contraponto aos aspectos formais do
jardim francês, trata-se do jardim inglês (Figuras 05 e 06). Esse modelo de jardim rompeu
com a rigidez do estilo geométrico, numa nítida tentativa de aproximação com o natural.
Este estilo tem origem nos jardins da China, através das constantes viagens dos europeus a
esse país e pelo “cansaço” ao estilo anterior já reproduzido a exaustão (BARBIN, 2003).
O jardim inglês apresenta uma série de características e elementos próprios que
definem seu estilo: os acessos/passeios tem formato curvilíneo, formando alamedas que ora
conduzem o olhar para pontos estratégicos, ora impedem a visão total da paisagem;
maciços arbóreos e arbustivos são dispostos em determinados locais, dando a impressão de
caminhar dentro de uma mata fechada; ao longo dos passeios o caminhante é
constantemente conduzido ao encontro de bifurcações, de modo que, ao mesmo tempo em
que leva a dúvida, estabelece uma hierarquia entre estas alamedas; em alguns locais
aparecem “ruínas” construídas indicando a presença do homem no passado, o qual se
12
“Así se crea el modelo de ljardín a la francesa, donde la naturaleza está totalmente sometida a La
voluntad del hombre. El mensaje de que La naturaleza ha sido subyugada por el arte es explícitamente
expresado a través Del diseño de jardines en donde La remoción de tierras, las obras hidráulicas, El desafío
al clima a través de orangeries e invernaderos y otros trabajos muestran de forma eminente el poder Del
hombre. Es La culminación de dos siglos de evolución.” (CAPEL, 2002, p.255). 13
Os muros medievais limitou a expansão da malha urbana em muitas cidades. Com a criação de parques
(extra muros) novas ocupações aconteceram atraídas por esses espaços verdes. (BENEVOLO, 2009. p. 565).
51
rendeu às forças da natureza; além de riachos, rochas e colinas artificiais, em tudo imitando
a natureza, em todas as suas possibilidades de despertar sensações e emoções ao visitante
(BARBIN, 2003).
Figura 3 - Jardim Francês. Jardim do ChateauVaux-le-Viconte.
Autor:ThomasHenzSadeness. Disponível em WWW.wikipedia.org
Figura 4 - Jardim Francês. Jardim do Palácio de Versailles.
Autor: Arnoud 25. Disponível em WWW.wikipedia.org
Segundo Henrique (2004), esta diferenciação refletia uma dualidade de
pensamentos políticos: de um lado o absolutismo da França; de outro, o ideal democrático
do Parlamento inglês. Falar neste simbolismo materializado no espaço urbano não
comporta uma inconsistência, nem uma novidade. Aldo Rossi, em A Arquitetura da
Cidade, trata constantemente deste tema, da identificação entre o acontecimento
político/social e a sua representação na concretude da cidade, ou como a arquitetura tem o
alcance de repropor a necessidade de ser “signo” e “acontecimento” (ROSSI, 2001).
52
É a necessidade de estabelecer um novo juízo que se coloca mais ou menos
necessariamente em certos períodos da arquitetura [...] Há obras que assinalam
uma nova constituição, são o signo de novos tempos na história urbana; elas são,
na maior parte, ligadas a períodos revolucionários, a acontecimentos decisivos
no curso histórico da cidade (ROSSI, 2001, p. 167).
Apesar de o citado autor referir-se, em grande parte, aos espaços construídos, à
edificação e ao conjunto arquitetônico, pode-se extrapolar suas análises para os espaços
abertos, numa relação de similaridade. Neste sentido, a identificação entre alguns fatos
urbanos e o espaço pode, em alguns casos, ser imediata de tal forma que especifica
claramente a natureza do fato social14
. Entretanto, é necessário que isso se dê numa
coincidência de fatores entre o momento histórico/político e uma arquitetura racional,
compreensiva e transmissível, capaz de assumir valores e significados (ROSSI, 2001).
Figura 5 - Jardim Inglês. Parque Buttes,
Chaumont, França. Autor: Evaldo Becker.
14
O estilo do jardim francês e as bases ideológicas do mecanicismo moderno.
53
Figura 6 - Jardim Inglês. Parque Rousseau,
Chaumont, França. Autor: Evaldo Becker.
Já no início do século XVIII, estava em pleno desenvolvimento a transformação de
grandes áreas terrestres, seja pela expansão dos centros urbanos com a aceleração da
indústria, ou pela ampliação de áreas agrícolas. Entretanto, outro desejo imanado do
homem, que não aquele de satisfazer suas necessidades produtivas, pôde reconfigurar a
terra: a adoração, com a adição de arte à natureza. Deu-se continuidade, assim, ao
tratamento dos espaços não cultivados carregados pela ânsia do belo, distinta e distante da
originalidade primitiva e que foi se materializando em um crescente sentimento pela
estética da paisagem.
A Revolução Industrial representa uma série de fenômenos que, definitivamente,
reconfiguraram o espaço citadino: o aumento da população, tanto pela diminuição da
mortandade, quanto pelo aumento do fluxo migratório dos camponeses em busca de
trabalho nas indústrias instaladas nas periferias; a redistribuição espacial dos habitantes nas
cidades ocupando não só os antigos centros medievais, mas formando uma série de novos
bairros; os novos meios de transporte permitiram à população tanto locomover-se de forma
mais fácil e rápida, quanto a facilitaram o fluxo de mercadorias. Esses fatos preparam as
bases para as transformações, nos espaços públicos abertos, que surgiram no século
seguinte: a insalubridade, decorrente de uma ocupação desregulada, ameaçou não só os
mais pobres, mas também os abastados, que abandonando suas moradias nos antigos
54
centros, tentaram isolar-se em residências mais afastadas (vilas). Neste sentido, vale
salientar o surgimento dos jardins individuais nesse tipo de moradia, servindo de
diferenciação entre os ricos e médios burgueses, das classes pobres e operárias, que
ocupavam habitações menos isoladas, em fileiras ou sobrepostas (BENEVOLO, 2009).
Os jardins nas cidades, com forte apelo à melhoria de uma forma estética urbana,
aos poucos foram incorporando outros elementos, tanto de valorização do solo, como de
caráter de redução do males urbanos. Paralelo à corrente estética e como resposta aos
problemas de salubridade das grandes capitais, surgiu outra corrente que acabou por
moldar um novo olhar sobre a natureza na cidade, o higienismo (HENRIQUE, 2004).
Os higienistas eram os responsáveis pela limpeza das cidades, onde o crescente
acúmulo de pessoas em um traçado urbano, ainda medieval, tornou-se o local de foco de
doenças pela falta de infraestrutura. Para solucionar estes problemas, grandes obras são
iniciadas para transformar os espaços urbanos em locais saneados, com uma natureza
limpa (HENRIQUE, 2004). Nesse período, foram abertas grandes avenidas com a
demolição de quarteirões inteiros, as quais, ao mesmo tempo em que resolviam os
problemas de salubridade, valorizavam estas mesmas áreas. Também, com a aceleração da
industrialização, as cidades da Europa ficaram sujeitas a um forte processo de
contaminação pela poluição do ar, e assim, a ideia do verde dos jardins associava-se à fuga
destes males e trazia o alívio para quem pudesse morar nestas cercanias.
Em conjunto à ação dos higienistas, a corrente esteticista continuava a dotar a
cidade de grandes espaços ditos naturais, dentro de um padrão de beleza sinônimo de
civilidade elitizada. Tanto uma corrente como a outra incorporavam elementos de uma
natureza romantizada15
e que aos poucos foi se tornando um objeto de consumo,
principalmente das classes mais abastadas.
São muitos os exemplos de criação de parques, jardins públicos e grandes alamedas
associados à valorização imobiliária. Em Londres, o Regent’s Park, na Alemanha, os
Volksparken (com um forte apelo à popularização destas áreas verdes), na França o Bois de
Boulognee o Bois de Vincennes, na Espanha, a reforma de Barcelona, em 1859, e nos
Estados Unidos, os parques de Yosemite Valley e o Central Park (HENRIQUE, 2004).
15
A cidade, que aos olhos dos contemporâneos, está doente, perturbada pelo maquinismo industrial, e precisa
ser reinventada, daí surge a procura da higiene e a utopia da cidade ideal tendo como corolário o verde, a luz,
o espaço e a água (HAROUEL, 1990, p. 117).
55
As ideias sanitaristas e esteticistas adquiriram grande repercussão e foram
praticamente exportadas de Paris e Londres para todos os continentes, chegando inclusive
ao Brasil no final do século XIX e início do século passado, reconfigurando espacialmente
algumas das principais capitais do país. O formalismo dos grandes planos urbanísticos e
seus rígidos traçados geométricos chegaram a cidades como Belo Horizonte, Rio de
Janeiro e Recife (SEGAWA, 2010). Intimamente ligado aos programas de erradicação de
epidemias e reformas nos sistemas de esgotamento sanitário e de abastecimento de água,
além da inserção destas cidades nos moldes de modernidade representados pelas grandes e
largas avenidas, estas reformas não tinham preocupação com os acervos arquitetônicos,
ocasionando a destruição de grande parte do patrimônio histórico edificado.
Conforme Capel (2002), ao final das últimas décadas do século XIX, o jardim já
não era apenas um luxo da burguesia, mas um indicador de status, isto devido ao enorme
sucesso dos parques urbanos de Londres e Paris, e assim, era cada vez mais crescente a
conjugação entre os planos urbanísticos e a apropriação da natureza na cidade, ideal que se
estende por todo o início do século XX.
Surgiu um novo modelo de agrupamento urbano, as cidades jardim, onde a
pretensão era fazer com que o homem, ao mesmo tempo, desfrutasse das comodidades
urbanas e das benesses do contato com a natureza. Pertencente a uma corrente humanista
do urbanismo, este modelo de cidade representava o pensamento anti-industrialista, de
retorno a um passado onde se pretendia ressuscitar o calor humano e a qualidade da
arquitetura. Procuravam-se reunir as vantagens da cidade e do campo, e tinha no traçado
radiocêntrico o modelo de desenho urbano mais difundido. Localizava-se, geralmente, nas
proximidades dos grandes centros urbanos e possuía uma rede de comunicação com outras
cidades (HAROUEL, 1990). Este modelo, apesar de amplamente difundido, não logrou
grande êxito, principalmente pela distância entre estes complexos e as cidades centrais,
obrigando seus moradores a grandes deslocamentos até o trabalho (BENEVOLO, 2009).
Paulatinamente, o Estado passa a atuar mais incisivamente na regulação das
cidades dividindo sua ação com a iniciativa privada, implantando leis de controle a
56
ocupação do solo e, ao mesmo tempo, estimulando o crescimento urbano, as cidades
passam a ser zoneadas16
em áreas centrais, residenciais, de lazer e industrial17
.
As duas grandes guerras mundiais, a despeito das incalculáveis perdas humanas e
materiais, proporcionaram a reconstrução de muitas cidades já dentro do novo ideário
urbanístico. Grandes arquitetos, a exemplo de Le Corbusier e Frank Lloyd Wright,
passaram a elaborar tratados urbanísticos para o ordenamento das cidades. Surgiu, assim, o
novo urbanismo racionalista18
.
O conceito de urbanismo passou a se relacionar com alguns critérios que
possibilitassem restabelecer o bom convívio entre as pessoas e a natureza e, desta forma,
foram lançados alguns pressupostos: pretendia-se uma verticalização das construções (em
uma área mínima de terreno) para a liberação de áreas verdes, a prevalência das áreas
públicas sobre as privadas, e o planejamento dos espaços deveria ocorrer desde uma escala
local até uma internacional19
.
A técnica, que se materializa no espaço entre o homem e a natureza, converteu-se
no mais sofisticado dos objetos e definitivamente artificializou qualquer tipo de relação
entre o humano e o resto do universo. Neste sentido, como uma ação para contrabalancear
este processo, esta crescente necessidade de retorno ao natural, ao que chamam de
humanização da natureza, corresponde a uma forma de alívio, a uma possibilidade, mesmo
que momentânea, de livrar-se da fria rigidez da racionalidade que o homem mesmo criou
(SANTOS, 2004).
A arborização urbana ganha força com o desvelamento de seus benefícios “ao
desempenhar o equilíbrio edáfico e microclimático, reduzindo a velocidade do vento e
poluição sonora, contribuindo na conservação e manutenção da ave-fauna e, sobretudo,
melhorando a saúde física e mental dos habitantes” (LIMA NETO; MELO E SOUZA,
2011, p. 01). Proliferam-se os parques e praças nos novos projetos urbanísticos, com a
16
Ocorre, em 1924, o Congresso Internacional de Planejamento Urbano, em Amsterdã, para tratar das
funções e formas de organização do espaço das cidades (HENRIQUE, 2004). 17
Especificamente o tema da formação da cidade moderna (urbanismo moderno) será aprofundado no
capítulo 3. 18
Influenciado pela filosofia das Luzes, propõe um modelo urbano perfeito que convinha a todo grupo
humano (o homem-padrão), é obcecado pela modernidade e a cidade deve retratar o seu tempo atual e tudo
aquilo que se traduz como o avanço da técnica. Relaciona-se com a austeridade, a racionalidade e o desapego
a cidade antiga (HAROUEL, 1990, p. 119). 19
Le Corbusier apresenta em 1933 a Carta de Atenas, o resultado do Congresso Internacional de Arquitetura
Moderna.
57
inclusão de índices de áreas livres em relação às áreas construídas; a preservação (por força
da lei) de muitos espaços remanescentes verdes no interior da trama das cidades.
Definitivamente, a natureza materializada nesses lugares assume contornos de equilíbrio, a
cura para muitos males da vida moderna e não demora para que se percebam (alguns atores
do mercado) a importância e oportunidades nessa revalorização.
Com a consolidação de uma estrutura urbana modernizada e os espaços de praças,
jardins e parques definidos dentro desta malha, o ideal de revalorização da natureza nos
espaços públicos das cidades contemporâneas foi alterado por novas demandas político-
econômicas e a volta do verde à cidade foi sendo submetida ao poder da propriedade
privada. Os vazios urbanos remanescentes passaram a pertencer aos grandes investidores
imobiliários, os quais, por sua vez, é que decidem não apenas para onde a cidade vai
crescer, mas também de que forma.
O tempo atual traduz-se no auge da possibilidade de se transformar a natureza em
um objeto do social. É o resultado de um contínuo gasto de energia necessária para a
adaptação do mundo às necessidades do homem, de desejos intangíveis.Como introduzir a
natureza em um espaço totalmente construído e ocupado a exemplo das grandes cidades
contemporâneas? A primeira tarefa a ser cumprida para o equacionamento deste impasse
requer uma reinvenção para o que seja natural, como um novo artefato.
Esta natureza artificial, enquanto produto da ação humana, e de mentira, no
sentindo de não possuir uma identidade local e sim ser um padrão, se encontra
hoje compromissada com uma felicidade capitalista. Uma natureza carregada de
ideologia que não mostra toda a história da sua construção social, uma natureza
ideologizada que busca apagar as diferenças entre classes, fornecendo um
„sentimento da identidade social‟ a partir de referências coletivas (HENRIQUE,
2004, p. 05).
Vale ressaltar o forte papel que a imagem, o signo, desempenha na consolidação de
uma ideia. Assim, na sociedade atual estas categorias tornam-se sinônimos de felicidade,
poder, status e sucesso e desempenham a função de criar um consenso, de estabelecer uma
verdade.
Outro passo importante rumo a internalização do natural, no intramuros das cidades
contemporâneas, refere-se aos mecanismos de adaptação à sistemática urbana. Assim, a
natureza também deverá ser produzida de forma padronizada e irá atender aos diferentes
interesses dos usuários, com distintos usos e funções, para distintas classes sociais. Esta
58
natureza produzida, fortemente ideologizada20
, reflete, ao mesmo tempo, duas imagens:
uma que remete ao retorno a um bucolismo romântico, a uma natureza perdida21
, que é
vendida aos habitantes, usuários do lugar e outra que é mais subjetiva e está associada à
criação de áreas verdes altamente especializadas para a valorização do espaço urbano,
como um recurso econômico e, consequentemente, de confirmação do status.
A ideologia é utilizada como um instrumento para induzir a sociedade, de uma
forma geral, a acreditar que esta natureza criada, forjada nos ditames da reprodução do
capital, é natural e, portanto, revestida de todas as qualidades e encantamentos que lhe são
inerentes. Trata-se de uma ideia de vida na natureza, em seu interior, segura, confortável,
distante de todos os males do mundo urbano moderno. Este conforto, entretanto, é
acessível a poucos, uma vez que se trata de um produto que confere status e um fator de
definição das classes sociais.
Harvey (1996) salienta que a humanização da natureza por intermédio do
paisagismo ou jardinagem contemporâneo, onde o jardim privado assume o valor ou o
meio para contribuir para a realização pessoal do morador usuário em experiências
prazerosas de contato com uma natureza particular, trata-se, na verdade, da ação do
consumo como o caminho para a felicidade.
Esta dissolução da natureza em algo que seja mais facilmente apropriado pela
sociedade traduz o projeto atual para o consumo do espaço natural e está embasado em
uma eficiente estratégia de venda. Estão lançadas as bases do novo urbanismo que permeia
a maioria dos recentes empreendimentos imobiliários e podem ser facilmente percebidos
desde as suas denominações – greenville, ecoville, greenparck – até a concepção dos
projetos com ênfase nas complexas áreas de lazer, em detrimento das áreas dos lotes
individuais, maximizados na busca do alto lucro.
Mesmo no campo do desenvolvimento sustentável, e sua vertente ligada ao
ambiente construído, já foi incorporada uma parte destes preceitos. A arquitetura
sustentável, como sendo a vanguarda da indústria da construção civil, tratou de reinventar
20
A ideologia fabrica uma história imaginária (aquela que reduz o passado e o futuro às coordenadas do
presente), na medida em que atribui o movimento da história a agentes ou sujeitos que não podem realizá-lo
(CHAUI, 1984, p. 34). 21
O tema da preservação de espaços naturais (parques), como áreas ecológicas com fins à manutenção das
riquezas naturais e estéticas, para apreciação dos visitantes, sem, entretanto, permitir a moradia de pessoas
em seu interior, é tratado com profundidade em Diegues (2001), no livro O Mito Moderno da Natureza
Intocada.
59
o espaço natural introduzindo-o ao edifício. Entretanto, como conceber uma arquitetura
verde (geenbuildins) sem a presença da natureza? Mas como fazê-lo nos escassos espaços
livres da cidade? Diante dos obstáculos e em sua imensa capacidade de reinvenção o setor
imobiliário apresenta duas alternativas.
A primeira delas retoma uma solução já defendida pela escola modernista de
arquitetura desde as primeiras décadas do século passado, ou seja, a reintrodução do “teto
jardim” com o aproveitamento das áreas de cobertura para o plantio das espécies, as mais
variadas, desde os simples gramados até árvores de médio porte. Estes espaços são
construídos com o propósito de oferecer descanso e lazer para os usuários do edifício, além
de contribuir para a redução das “ilhas de calor”, nas quais os grandes centros se
transformaram devido à absorção térmica provocada pela radiação solar, e também
diminuir a temperatura interna dos ambientes ao limitar a incidência de calor que atravessa
a cobertura (Figura 07).
Figura 7 - Teto Jardim. Rockfeller Center, Nova York.
Disponível em: www.wikipedia.org
Trata-se de uma solução relativamente simples, mas que envolve cuidados tanto de
ordem técnica – principalmente nas regiões com maior incidência de chuvas e,
consequentemente, a necessidade de uma drenagem eficaz – quanto de ordem social, uma
vez que, com seu caráter “segregador”, estes espaços tornam-se jardins inacessíveis à
60
maioria da população, reservados a um pequeno grupo de usuários, o que se revela como
um contrassenso à ideia socializadora da sustentabilidade.
Outra alternativa pode ser observada nos chamados “jardins verticais”, o que pode
ser traduzido também como uma variação de dois elementos arquitetônicos muito
empregados no modernismo: as fachadas falsas e as jardineiras22
. Entretanto, este tipo de
jardim diferencia-se pelo uso de grandes “panos” de fachada completamente cobertos por
plantas, verdadeiras superfícies verdes obtidas graças a técnicas relativamente complexas
de montagem, plantio de espécies específicas e irrigação. Sua vantagem térmica deve-se às
mesmas características do teto jardim (Figura 08).
Trata-se de uma solução recente, mas que vem sendo rapidamente difundida graças
ao seu forte impacto visual, principalmente dentro de uma malha urbana árida. Entretanto,
deve ser encarado como um jardim contemplativo de passagem, de efeito pictórico, sem
muita interação física com as pessoas – diferente das praças, por exemplo –, apenas
despertando nelas o sentido visual.
Figura 8 - Jardim Vertical. Barcelona, Espanha. Autor: Patrick Blanck.
22
Elementos construtivos muito difundidos pela arquitetura modernista e que consiste em: o primeiro
representava a construção de um plano de fachada paralelo e afastado ao da construção, com o intuito de
proteção da incidência direta dos raios solares; o segundo representava a criação de canteiros em partes da
fachada, geralmente como uma extensão das varandas ou situados logo abaixo das janelas no intuito de trazer
o verde para dentro dos apartamentos e escritórios.
61
Dentro de uma realidade brasileira, a maioria das grandes cidades apresenta
carência de áreas verdes, principalmente em seus centros consolidados, cujos espaços
arborizados são de uma época em que os conceitos urbanísticos pouco privilegiavam os
espaços públicos com vegetação, tendo como resultado grandes áreas adensadas
extremamente áridas. Neste sentido, não se pode deixar de lado as propostas do recente
urbanismo sustentável com seus tetos jardins e fachadas verdes. Ainda que contradições
permeiem sua concepção, estas soluções devem ser vistas como legítimas e uma alternativa
criativa para trazer um maior equilíbrio entre o construído e o verde.
Todavia, estas soluções carecem de incentivos na forma de normas urbanísticas,
tanto para regular, quanto para sistematizar sua utilização e, assim, garantir o livre acesso a
estes espaços (no caso dos tetos jardins onde for possível) e difundir sua utilização,
incentivando pesquisas botânicas e paisagísticas na busca por soluções mais baratas e
adaptadas ao nosso clima, uma vez que estas soluções ainda são pouco utilizadas no Brasil,
desvelando um enorme campo de possibilidades para o incremento da sustentabilidade (ao
menos paisagística) nestas áreas.
Com relação aos novos empreendimentos urbanísticos, com forte apelo a um
reencontro com a natureza, estes se caracterizam por um forte sentido segregador, na forma
dos condomínios fechados. Essa proposta, por sua vez, vai de encontro às diretrizes da
sustentabilidade nas cidades, que visa, dentre outras coisas, a privilegiar a democratização
dos espaços com o apelo ao encontro, à sociabilização dos lugares. Evidente que a solução
procurada para este problema perpassa por outros aspectos, como a segurança nos centros
urbanos, mas que mesmo assim deve ser perseguido como um objetivo da sustentabilidade
nas cidades.
Conforme já foi registrado, essas propostas necessitam urgentemente da atenção do
poder público, a fim de se obter um maior controle da especulação imobiliária que
geralmente acompanha estes empreendimentos, os quais conduzem as novas periferias a
um forçoso crescimento urbano, geralmente em áreas com alta fragilidade ambiental,
carentes de infraestrutura e, em muitos casos, expulsando populações tradicionais.
Uma variação das implantações urbanísticas citada anteriormente, não menos
danosa, refere-se aos grandes conjuntos residenciais elaborados pelo poder público, para
atender a uma enorme demanda popular (média e baixa renda) pela moradia própria. Estes
62
condomínios multiplicaram-se nos últimos anos com características semelhantes aos
condomínios fechados, no sentido de ocuparem grandes áreas nas periferias das cidades,
obrigando as prefeituras a enormes gastos com instalação de redes de facilidades urbanas,
formando novos bairros, que de uma forma ou de outra continuam a pressionar os espaços
centrais, ao invés de formarem-se como novas centralidades, mais coerentes com as
diretrizes sustentáveis. Estes empreendimentos incorporam o espaço natural de forma
estanque, em praças pouco convidativas, calçadas estreitas com ruas sem arborização e
lotes pequenos, quase inviabilizando a criação de áreas verdes dentro dos mesmos.
Basicamente, estes exemplos retratam como a natureza, em suas áreas verdes
públicas, vem sendo incorporada ao urbanismo das cidades, em especial nas cidades
brasileiras, na contemporaneidade. Ao mesmo tempo em que contradições se materializam,
possibilidades concretizam-se na dinâmica urbana, abrindo espaço para um longo percurso
de debates e proposições que certamente não se encerram nem se reduzem a estes
argumentos.
Os desafios que vêm sendo impostos à humanidade, esse repensar de suas atitudes,
recolocam a natureza em lugar de destaque sob qualquer perspectiva. Seja uma natureza a
ser preservada, porque dela dependem todos para sobrevivência, seja para ser usufruída,
porque dela é possível revigorar-se para enfrentar o caos do mundo artificial. A cisão,
entretanto, continua. O homem atingiu um grau de racionalidade tal de especialização, e,
sendo assim, reintegrar-se à natureza vai exigir um esforço sobre-humano, algo próximo de
uma “nova racionalidade”, de “padrões naturais” muito estranhos aos padrões de civilidade
postos e validados.
Essa nova postura não significa, absolutamente, a volta ou um retrocesso
civilizatório, mas um olhar diferente, um entender, aceitar, admirar e respeitar os processos
da natureza. E é justamente nesses aspectos, no vencer essa estranheza, que reside a maior
dificuldade e que vem pondo à prova séculos de conhecimento.
A dinâmica da melhoria das condições ambientais dos espaços construídos encerra
uma série de condicionantes que vão além dos materiais. Os problemas cotidianos, cada
vez mais fechados em áreas específicas com demandas específicas, vêm exigindo dos
filósofos respostas que não mais se apoiam nos pressupostos do pensamento clássico.
Esse novo patamar da condição humana põe tradicionais preceitos da ética em
xeque, e é nessa perspectiva, dos novos desafios impostos aos pensadores da atualidade,
63
que se forma o conceito de ética ambiental, com o objetivo de encontrar alternativas aos
conflitos inerentes ao paradigma da sustentabilidade e que serão abordados nos tópicos a
seguir.
1.2 – O Conceito de Ética a partir da Modernidade
A palavra ética tem forte vinculação com conceitos fundamentais desta pesquisa:
habitação e natureza.
O conceito de ética vem do grego ethos, que, quando surgiu pela primeira vez em
Homero, significou “morada”. Como não existia a palavra “arquitetura” ou “técnica de
construção”, ethos é “habitat”, ou “toca”, mas também significava o fato e a maneira de
habitá-lo. Com afirma Matos (2006):
[...] a modesta tenda do caçador nômade ou a casa do agricultor sedentário é
localização em um espaço sagrado de onde se faz possível a comunicação com
os deuses. Habitar um espaço é decisão religiosa que, „cosmizando‟ o caos,
santifica um pequeno cosmos, tornando-o semelhante ao divino.(MATOS, 2006,
p. 147).
Filosoficamente, Aristóteles foi o primeiro a sistematizar a relação entre a conduta
humana pessoal com a concórdia na cidade. Após esse filósofo, ethos se aproximou do
caráter e do hábito. É graças ao costume que o caráter se desenvolve: praticando ações
virtuosas o homem se torna virtuoso, buscando o prazer, fugindo da dor. A ética, assim, diz
respeito à conduta pessoal de cada um, mas, sobretudo, no entrelaçamento com o outro, do
indivíduo com a cidade; do homem com o mundo e com a natureza. A partir do surgimento
da palavra ética, o homem passou a ter uma morada: o próprio mundo, que é a civilização.
Mesmo entre os especialistas em filosofia moral, não existe um consenso em
relação ao sentido dos termos moral e ética. E, mesmo tomando como referência a
etimologia, pouco se pode avançar, uma vez que são de origens distintas, ou seja, do
latim e do grego, respectivamente, quando se referem “ao domínio comum dos
costumes” (RICOEUR, 2003, p. 591).
64
A moral pode-se ligar à área das normas, do permitido e proibido e,
consequentemente, à identificação do homem com a obrigação de relacionar-se com as
normas. Já a ética pode ser dividida sob duas abordagens: a primeira faz referência ao lado
pessoal, à vida individual; a segunda corresponde à ética inserida na vida prática, em
situações concretas (RICOEUR, 2003).
Entretanto, como separar as experiências da vida prática da ação individual? O
autor encontra, nesta ambivalência, a justificativa para um termo único, ética, que faz a
junção entre os dois campos da ação humana, ou seja, no desejo e na vida concreta, ao
mesmo tempo.
Neste sentido, a ética cumpre o reconhecimento dos costumes, do obrigatório,
da ação que deve ser aceita por todos, do sujeito autor de seus próprios atos, seguindo
uma norma, mesmo sendo um sujeito autônomo, pois reconhece nela a legitimidade
de regular as condutas (RICOEUR, 2003).
O campo da ética constitui-se basicamente da relação entre o sujeito moral
(pessoa)23
e os valores morais (virtudes)24
. Do primeiro, a ética exige o autocontrole de
sua conduta, isto é, requer basicamente uma racional reflexão de seus atos, uma
autonomia. No que diz respeito aos valores morais, a ética define, com base nos laços
culturais e sociais, o que vem a ser o bem e o mal, as virtudes e os vícios, para determinado
grupo (CHAUI, 2000).
Na conduta ética, é a razão humana25
que estabelece os limites e o controle das
paixões desmedidas26
, para preservar a liberdade da pessoa, livrar-lhe da violência e,
assim, preservar sua existência. A ética pressupõe, então, um ser autônomo e livre, que,
23
“O sujeito ético ou moral, isto é, a pessoa, só pode existir se preencher as seguintes condições: ser
consciente de si e dos outros [...] ser dotado de vontade, isto é, de capacidade para controlar e orientar
desejos [...] ser responsável [...] ser livre [...] dando a si mesmo as regras de conduta”. (CHAUI, M.
Convite à Filosofia. São Paulo: Ática, 2000, p. 434). 24
“Do ponto de vista dos valores, a ética exprime a maneira como a cultura e a sociedade definem para si
mesmas o que julgam ser a violência e o crime, o mal e o vício e, como contrapartida, o que consideram ser
o bem e a virtude”. (CHAUI, M. Convite à Filosofia. São Paulo: Ática, 2000, p. 434). 25
“Assim, na origem, razão é a capacidade intelectual para pensar e exprimir-se correta e claramente, para
pensar e dizer as coisas tais como são. A razão é uma maneira de organizar a realidade pela qual esta se
torna compreensível. É, também, a confiança de que podemos ordenar e organizar as coisas porque são
organizáveis, ordenáveis, compreensíveis nelas mesmas e por elas mesmas, isto é, as próprias coisas são
racionais”. (Ibid., p. 71). 26
Sentimentos que tornam o homem imoral e incapaz de relações dignas com outros ou com ele próprio.
(Ibid., p. 451).
65
mesmo pondo-se em acordo às regras morais de uma sociedade, não perde sua capacidade
de criticar, refletir e, com isso, estabelecer as fronteiras entre o permitido e o proibido27
.
Se para os filósofos antigos a ética estava sempre ligada aos ideais de felicidade, ou
ao desejo à vida feliz, hoje, este ideal vem se desfazendo, lentamente substituído pela força
do consumo, “é como se houvesse um lento enfraquecimento da noção de ética e das
conquistas do espírito com o avanço da técnica” (NOVAES, 2007, p. 9).
Segundo Chaui (2007), esta crise dos valores morais, que ora se apresenta,
materializa-se na opacidade das normas de conduta, na desorientação, e chama mais uma
vez pela reflexão filosófica e espera da ética as respostas necessárias.
A ética baseia-se em pressupostos que, até então, foram suficientes para estabelecer
os princípios que regem as relações humanas, estes preceitos podem ser entendidos como:
1) tanto o homem, em sua essência, quanto a natureza, sempre estiveram preservados em
suas características fundamentais; 2) o bom para o homem é algo claramente identificável;
3) as ações implementadas pelos humanos nunca fugiram do previsível (JONAS, 2006).
Entretanto, com o desenvolvimento da modernidade, estes pressupostos não dão mais
conta das necessidades do homem, em função das mudanças ocasionadas por suas ações.
A complexidade da sociedade moderna, e dos dilemas desta, vem abrindo espaço
para o aparecimento de vários sistemas éticos, cada um abrangendo um conjunto social ou
profissional, com sua identidade e normas específicas. Por intermédio dessas abordagens
conjuntas, os embates ambientais podem ser melhor interpretados, em suas nuances e
particularidades, e é neste sentido que o campo da ética aplicada tenta responder estas
questões e lançar regras aos homens que assegurem sua existência e o respeito mútuo.
1.2.1 – Ética Aplicada
A ética, no campo da vida prática, materializa-se numa pluralidade de esferas, em
ações concretas, distribuídas e articuladas em éticas regionais ou especiais. É neste campo,
o das éticas aplicadas, que se torna possível escolher,diante do cotidiano, a norma correta,
27
A relação entre a ética e a ação humana (uma vida ética) se dá a partir dos laços das relações sociais, dentro
dos costumes e dos valores de uma sociedade, em uma época determinada. (Ibid., p. 436). O tema da
temporalidade ética será aprofundado adiante no tratamento de outras questões como a ética ambiental, que
aparece como resposta a atual crise que envolve o homem e a escassez dos recursos naturais.
66
e discernir a regra a ser seguida. Mesmo nesse espaço de regras próprias e aparentemente
independentes, pode-se observar um campo comum, onde se formam o julgamento e a
tomada de decisão.
Os problemas do mundo contemporâneo, principalmente os ligados à crise
ambiental pela qual passa a humanidade, exigem o repensar de uma nova ética que possa
regular não somente as ações de sentido coletivo, mas também as interações entre o
homem e a natureza.
Descortina-se a necessidade de novos pressupostos éticos, os quais estabeleçam
parâmetros para ações que extrapolem a esfera das relações do homem com o seu
semelhante, uma nova ética para uma civilização tecnológica (JONAS, 2006). Neste
sentido, nas últimas décadas, ganhou força a discussão que agora passa a exigir novos
pressupostos éticos capazes de reorientar as ações humanas. A área de estudo específica
para essa temática seria, pois, a ética aplicada.
Durante as cinco primeiras décadas do século passado, a filosofia moral deteve-se
praticamente em uma investigação dos enunciados morais sob uma abordagem mais
neutra, no plano axiológico. O debate acerca das questões de conteúdo moral, no campo da
medicina ou do direito, por exemplo, passou a ser defendido através de disciplinas tais
como teologia, psicologia e antropologia, as quais, de alguma forma, imprimiram uma
visão distinta e mais sensível, por assim dizer, a estas questões, distanciando-se de uma
análise do tema como objeto puro da razão (PARIZEAU, 2003).
O termo “ética aplicada” surgiu na década de 60 do século passado, mais
precisamente nos Estados Unidos, quando uma série de fatores alterou definitivamente a
sociedade de uma forma geral (PARIZEAU, 2003). Questões ligadas à vida pública, como
a consolidação de direitos coletivos, do direito a privacidade, maior abertura aos temas
sexuais e de gênero ou o aumento do consumo, e, principalmente, o aprimoramento da
ciência e da técnica, fizeram com que os temas da filosofia moral retomassem o campo da
ética sob a orientação de uma decisão mais especializada.
Estas questões ligadas à vida cotidiana, ao mesmo tempo em que se associavam a
uma ideia de melhoramento das condições de existência humana na Terra, acabavam
suscitando perigos, principalmente com relação à degradação do meio ambiente e
manipulação genética. Neste sentido, na medida em que a complexidade do sistema social
aumentava e novos problemas surgiam em campos específicos do conhecimento, os
67
filósofos eram solicitados a darem pareceres, esclarecimentos, e suas opiniões foram
progressivamente formando o campo da ética aplicada, que se liga diretamente à
concretude contínua do dia-a-dia.
Ao referir-se a uma análise ética de situações precisas, põe o acento sobre a
resolução prática. Aqui a importância é dada ao contexto, à análise das
conseqüências, à tomada de decisão. Esse propósito, mais descritivo que
reflexivo, exerce-se sobretudo nos setores das práticas sociais e profissionais
(PARIZEAU, 2003, p. 596).
Neste sentido, o mesmo autor enfatiza que, na atual sociedade industrializada, três
campos da ética aplicada destacam-se por incorporar os maiores problemas e desafios e
que, de certa forma, passam por todas as áreas da vida humana e não humana.
Primeiramente, pode-se citar a bioética, que engloba as questões da medicina. Seu
discurso apoia-se em uma abordagem multidisciplinar, pois contempla normalmente as
áreas do direito e da teologia, no embate de suas deliberações, como por exemplo, nas
questões do aborto, da fecundação e da manipulação genética. Centra-se, geralmente, em
uma abordagem casuística na resolução de questões particulares, mas também num
generalismo de recomendações passíveis de serem aplicadas ao maior número de pessoas
(PARIZEAU, 2003).
O segundo campo, o qual será discutido mais detalhadamente a seguir, refere-se à
ética ambiental. Esta categoria da ética aplicada trata das interações entre o homem e o
meio ambiente ou a natureza, entendida como o conjunto maior de entes que compõem a
Terra, incluindo ela própria e seus componentes sólidos, líquidos e gasosos, a biosfera
(PARIZEAU, 2003).
O terceiro campo da ética aplicada è a ética profissional. Caracteriza-se por sua
amplitude de atuação, uma vez que perpassa todos os setores das práticas de cada
profissão. Três principais espaços da estrutura social determinam os campos de atuação
profissional: a economia, que fornece os valores os custos e benefícios; a tecnociência, que
fornece os meios de operação à economia e, por fim, o direito, que normatiza as relações
sociais (PARIZEAU, 2003). Da interação entre estes campos, estruturam-se as demais
profissões, cada vez mais especializadas, necessitando de regras específicas de
regulamentação de suas práticas. A ética profissional tem o papel de questionar as
68
profissões frente aos riscos inerentes à sua atuação, além de garantir a honestidade, a
integridade e a responsabilidade em relação à sociedade como um todo.
Na medida em que a ética aplicada tem seu foco na praticidade do dia-a-dia, sua
análise preocupa-se substancialmente com o contexto, com as consequências da ação moral
no presente e no futuro. Essa preocupação é o que alguns autores chamam de movimento
de equilíbrio refletido (PARIZEAU, 2003), e que, de certa forma, força essa linguagem
moral a dar significado, uso e lógica às questões do mundo atual. Trata-se, grosso modo,
da aplicação de princípios da teoria moral – portanto universais – aos problemas práticos e
singulares, gerando normas possíveis de aplicação geral, ou seja, refletindo-se novamente
no universal, ao menos em um determinado grupo de pessoas/profissões.
O que parece mais coerente é considerar este campo do pensamento como o
movimento que busca uma renovação de certas questões tradicionais da filosofia moral e
inseri-las nos acontecimentos da vida contemporânea. Neste sentido, muitos conceitos
fundamentais, tais como natureza, pessoa, propriedade, ambiente, estão sendo repensados,
reinterpretados e seus sentidos ampliados, tendo como base justificatória a racionalidade da
ética tradicional, face às novas exigências da sociedade técnico/científica. Parizeau (2003)
resume assim o sentido de ética aplicada: “O que se pede à ética aplicada é um auxílio com
o objetivo de estabelecer limites, de enquadrar práticas, de dar sentido e conteúdo (pistas
de interpretação) aos atos dos indivíduos no quadro de seu papel social e profissional”
(PARIZEAU, 2003, p. 599).
Faz-se necessário agora o aprofundamento no campo ético que envolve as questões
da relação do ser humano com a natureza, das condições de bem estar, das
responsabilidades com todos os entes do planeta, no presente e no futuro, e é no campo da
ética ambiental que todos estes aspectos são debatidos.
1.2.2 – Ética Ambiental
Esta categoria de reflexão filosófica surge com o desenvolvimento
técnico/científico, que nos últimos séculos atingiu praticamente todos os setores da vida do
homem, trazendo, ao mesmo tempo, inúmeras benesses e graves problemas ambientais e
sociais. Se, por um lado, uma parcela da população mundial hoje tem mais acesso a bens
materiais, melhores condições de saúde, alimentação, transporte, comunicação, moradia,
69
etc., por outro lado, uma grande maioria sofre com os danos ao meio ambiente,
decorrentes: do desmatamento de florestas em substituição à agricultura extensiva; da
poluição de ambientes aquáticos por resíduos industriais; da fome pela má distribuição de
riquezas; da ocupação urbana de forma desordenada e sem infraestrutura, enfim, de uma
série de fatores que de alguma forma afetam negativamente o meio ambiente e,
consequentemente, a vida das pessoas28
.
Dessa visão de opostos, natureza de um lado, ciência do outro, dessa dualidade
entre o bem e o mal, surge o atual debate da chamada “crise ambiental” e é sobre ela que se
debruça a ética ambiental (SANTOS, 2012).
A ética ambiental entra como um ramo da ética aplicada que trata destas questões
relativamente recentes, mas que, nas últimas décadas, assumiram proporções enormes
frente ao agravamento dos problemas ambientais. O questionamento ético acerca do papel
do homem perante a natureza tornou-se justo e cada vez mais o debate amplia-se, na
mesma medida em que novos problemas surgem com as crescentes contradições sociais.
Ao se incorporar a dimensão do valor às coisas da natureza, consequentemente
incorre-se em uma divergência quanto à distinção entre valor instrumental e valor
intrínseco.
O meio ambiente pode ser avaliado quanto a seus próprios direitos,
independentemente de seu valor para os seres humanos? Animais e plantas têm
direitos morais? Pode ser afirmado que animais e plantas têm valor intrínseco?
Se têm valor intrínseco, se são passíveis de considerações morais por si mesmos,
o que lhes confere tal valor? Um golfinho tem mais valor que um rato? Ou um
rato mais que uma árvore de pau-brasil? Um indivíduo tem mais valor que uma
espécie? Que obrigações, se há alguma, os homens têm para com o mundo
natural, os ecossistemas, o meio ambiente? O interesse das pessoas pode se
sobrepor ao do meio ambiente? É moralmente defensável privilegiar a
construção de uma represa que beneficiará várias comunidades humanas em
detrimento da extinção de espécies que decorrerá de sua construção? (VIDAL,
2008, p. 131).
Todo o debate ético ambiental é, necessariamente, uma discussão multidisciplinar,
uma vez que outros saberes fornecem os dados fatuais e técnicos para que o
questionamento filosófico possa refletir sobre a questão específica (PARIZEAU, 2003). A
28
Pesquisadores da ONU estimam que, em 2001, havia 921 milhões de favelados e mais de 1 bilhâo em
2005, distribuídos em aproximadamente 200 mil favelas com populações variando de algumas centenas a
mais de um milhão de pessoas em cada uma delas. (DAVIS, 2006)
70
biologia, a economia, o direito e a política constituem-se como as principais áreas que
interagem com a filosofia, uma vez que praticamente todas as matérias que envolvem o
meio ambiente podem ser traduzidas em disputas entre pelo menos duas destas áreas.
Percebe-se o envolvimento entre considerações de diversos campos do conhecimento, que,
a depender dos interesses ou abordagens, podem concorrer para um acordo ou
divergências. Trata-se de discussões que apenas começam a fazer parte da pauta dos
estudiosos contemporâneos.
Segundo Parizeau (2003), sob um plano metodológico, a ética ambiental apresenta
pouca sistematização e descreve basicamente duas perspectivas diferentes que podem
abordar os problemas ambientais. A primeira delas centra-se na questão concreta e vai
desde uma escala local (a poluição de uma lagoa), passando por problemas de ordem
nacional (códigos de proteção de florestas), até discussões internacionais (aquecimento
global). Trata-se de uma corrente que visa a refletir sobre o problema à luz da razão ética,
codificá-lo e, por fim, propor normas para seu equacionamento.
A segunda abordagem trata do problema de forma mais reflexiva, tentando, por
assim dizer, adaptar o contexto contemporâneo às normas filosóficas clássicas. Tenta, na
medida do possível, incorporar outros atores não humanos, ou ainda unir todos os seres
vivos às reflexões éticas e morais, aproximando-se de uma sacralização do natural29
. Em
resumo, aceitando ou rejeitando uma visão antropocêntrica, esta segunda corrente deposita
no homem a capacidade e a responsabilidade de gerir os problemas ambientais e mais
amplamente a própria natureza (PARIZEAU, 2003).
Trata-se de um desafio que terá que dirimir alguns impasses e incorporar
referências para o estabelecimento de novas condutas e posturas do homem com o restante
do planeta. Esta ética, que vem fundamentada, dentre outros pressupostos, no direito à
existência das gerações futuras, carrega consigo uma questão a ser ultrapassada. Como
equacionar a legitimidade deste direito a um sujeito futuro, e que, portanto, ainda não
existe? Mesmo acreditando na importância de uma vida futura, quem são os representantes
destes sujeitos que não podem se representar? Quem vai falar em nome das gerações
29
O ecocentrismo, o biocentrismo, wilderness, Teoria Gaia são alguns exemplos deste tipo de perspectiva
ética, os quais serão mais detalhados posteriormente.
71
futuras? Como abrir mão dos direitos dos presentes pelos direitos dos que ainda estão por
vir?
A justificativa pode estar contida na importância depositada na vida futura, ao valor
creditado a um dever moral de continuidade da espécie. Hans Jonas sinaliza a necessidade
de uma crença, uma convicção na importância da vida por vir. É uma questão de valor à
vida. Reconhece a necessidade de se limitar este futuro, trabalhar com um espaço temporal
de curto tempo, um futuro imediato. Estas gerações se tornariam próximas de nós, nossos
descendentes imediatos, com direitos facilmente reconhecidos. Trata-se de uma ética para
a humanidade, formando um conjunto entre espécie humana atual e as gerações vindouras,
como uma coisa só, diferente das éticas clássicas, que sempre se voltaram para os
problemas do homem x homem (JONAS, 2006), e, consequentemente, tem seu raio de
abordagem limitado pela ação, pela práxis humana no tempo presente, tem seu fundamento
no imediatismo.
Nos últimos cinquenta anos, a técnica abre uma nova perspectiva, um novo campo
para a reflexão, na medida em que passa a agir e alterar a própria natureza humana, uma
intervenção nunca antes imaginada e, portanto, a parte de qualquer preocupação ética.
Estes processos biológicos, inerentes ao homem, como a morte, o comportamento, sua
criação, passaram a ser encarados como falhas e, desta forma, passíveis de uma
transfiguração dos seus mecanismos (JONAS, 2006).
O processo evolutivo e o homem operam com escalas temporais diferentes, aquilo
que na sucessão das eras representa os lentos passos da natureza, para a humanidade
significa um lapso de tempo infinitamente longo. Diante deste fato, é preciso dar mais peso
ao que Hans Jonas chama de “mandamento da ponderação” (JONAS, 2006, p. 78), dado
que que, cada vez mais escravos do relógio tecnológico, não sobra muito tempo para as
correções deste acelerado processo. Estas correções, quando funcionam, fazem tudo e
todos novamente dependentes de outras ações tecnológicas, que continuam a levar às
mesmas incertezas de antes, criando-se o eterno ciclo das correções da tecnologia.
Para o autor, a tecnologia despreza todo o conhecimento acumulado presente na
natureza humana e herdado de uma lenta evolução. Este saber adquirido é agora posto em
descrédito, em nome de uma “melhoria” certa, de uma condição superior. Entretanto,
inerente a esta condição está uma enorme dose de incerteza e que não pode ser superada
pela valorização desta herança adquirida.
72
No âmago de toda esta questão, ocorre a retomada da discussão sobre a “natureza
humana”, onde, atualmente, não se pode afirmar com certeza “o que é o homem” ou “o que
é a humanidade”, o “normal” da essência humana é constantemente rediscutido,
modificado pela alquimia dos avanços tecnológicos. Os estados de violência, discordância,
as ansiedades, são muitas vezes controlados, inibidos por drogas que impõem um padrão
de comportamento.
Além da necessidade de se ultrapassar tais dicotomias conceituais, a fim de
alcançar estes novos pressupostos guiadores da conduta humana, outra instância, não só a
do sentimento humano individual, deve ser sensibilizada para incorporar este novo saber.
Assim, o campo da política tem grande alcance temporal e espacial e, por isso mesmo, tem
mais responsabilidades.
Esta instância é, provavelmente, o espaço mais importante, por sua capacidade de
implementação deste projeto de uma nova ética. Neste campo, exige-se uma grande dose
de certeza nos prognósticos, pois é a partir deles que pode ser justificada a renúncia a ações
desejáveis e próximas, em favor de um efeito indesejável no futuro e que, entretanto,
jamais será vivenciado agora. Hans Jonas afirma que a ordem de grandeza dos efeitos
distantes e indesejados deve ser superior a dos efeitos próximos desejados, e assim criar
uma compensação para a incerteza, neste sentido, o autor aponta alguns pressupostos
básicos para a ética ambiental.
Acredita que o julgamento das consequências futuras, que extrapolam o domínio do
saber ético atual, deve ser subordinado a uma nova ciência, que o autor chama de “previsão
hipotética”. Esta nova ciência deve incorporar ao seu campo de ação a contribuição de
outro fator, o medo, que, em última instância, auxiliará na prevenção da provável
deformação da natureza humana, pela ação desmedida da tecnologia. Este medo,
vivenciado no tempo presente, pode servir de fio condutor para a ética do futuro, para as
normas daquilo que ainda não foi vivenciado. É necessário que o homem deixe-se afetar
por este temor que ainda não experimentou e conceder-lhe tal influência (JONAS, 2006).
A tecnologia, por sua vez, opera tendo como premissas as ações racionais de rápida
eficácia, com a temporalidade do eterno obsoleto e que “longe de oferecer ao homem uma
perspectiva mais segura de uma evolução bem-sucedida, produz uma incerteza e um perigo
totalmente novos” (JONAS, 2006, p. 77).
73
Diante disso, qual o tipo de humanidade deve ser preservado? Quais as
características da natureza humana devem ser mantidas? A questão é que, não obstante a
importância fundamental de toda esta discussão ética, a resposta está, cada vez mais, nas
mãos dos cientistas, em seus saberes especializados e impenetráveis a um entendimento do
homem comum. Desta forma, a ética ambiental tem seu princípio e fim na ciência, nos
atuais debates acerca dos limites (se possível) das pesquisas, que longe de encerrarem uma
solução, acabam por suscitar, a todo o momento, novas perspectivas no enfrentamento dos
embates entre o homem e a natureza.
Dando continuidade à discussão ética, mas saindo do foco das ações humanas e de
suas consequências e desdobramentos no meio ambiente, abre-se agora o espaço para a
interpretação das intenções do setor da construção civil à luz do pensamento utilitarista,
uma corrente filosófica que traduz uma ideia racional de mundo, com forte acento no
social e que em muito vem influenciando vários campos da vida social, tais como o
político, o econômico ou o jurídico.
A temática utilitarista foi observada sob duas perspectivas: a primeira relacionada
à utilidade em si dos ganhos ambientais, ou, o que de benefícios esses avanços conseguem.
A segunda refere-se ao fundamento principal dessa corrente filosófica, ou seja, ao modo
como esses benefícios são distribuídos e quem são os beneficiados.
1.2.3 – A Ideia de Ética Utilitarista
O discurso ambiental da indústria da construção civil vem embasado nas ideias do
desenvolvimento sustentável30
, em uma concepção de benefícios coletivos, inclusive para
gerações futuras, isto é, um bem maior democraticamente distribuído, obtido através de
procedimentos “ecologicamente corretos” e que se materializam em “edifícios verdes”.
Acontece que grande parte destes empreendimentos vem alcançando o respaldo desta
titulação através de certificações ambientais – selos – que validam as ações do setor,
tornando-os úteis para venda.
30
Aqui resumidas no conceito elaborado pela Comissão Brundtland em 1987, onde, “o desenvolvimento
sustentável é o desenvolvimento através do qual as necessidades do presente são satisfeitas, sem, no entanto,
comprometer as capacidades das gerações futuras de satisfazerem as suas próprias necessidades”. (PRIORI
JÚNIOR, 2008, p. 09).
74
Deve-se ter em mente a seguinte questão: os empreendimentos sustentáveis, que
envolvem somas significativas de dinheiro, seriam uma questão ideológica? Ou, de forma
simples, tais empreendimentos estão ligados a uma questão puramente econômica? É
verdade que não se pode ter a ingenuidade de acreditar que este “esverdeamento” das
construtoras seria uma opção de consciência estritamente ecológica, mas então é preciso
saber em que medida essas duas posições se expressam, e, nesse sentido, a ética utilitarista
pode ajudar a compreender esse processo.
O utilitarismo preconiza que o fim de qualquer atividade humana é a felicidade da
maioria, de todos os afetados pelas consequências desse ato, no momento de sua avaliação,
ou em outras palavras, no momento de escolha entre ações, deve-se escolher aquela que
possa trazer o maior bem para o maior número (ABBAGNANO, 2007).
O utilitarismo, que tem seu ápice entre meados do século XVIII e XIX (AUDARD,
2003), foi amplamente criticado, uma vez que pregava uma nova visão de mundo, no qual
se concebia um sistema social, político e econômico separado da religião, como bem
exemplifica Santos (2011), quando se refere à sociedade pensada por Mandeville (1670 –
1733).
Segundo as ideias utilitaristas de Mandeville, o homem precisa saber utilizar suas
paixões,uma vez que são elas que “estruturam nossas visões morais, nossos hábitos, nossos
costumes [...], a base das regras de nossa sociedade” (SANTOS, 2011, p. 60). Por sua ideia
de submissão do homem à paixão, Mandeville foi duramente criticado, sobretudo, porque
esse sentimento, nessa época, estava intimamente ligado a uma concepção religiosa.
Fazendo isso, na verdade, Mandeville procura descrever o homem real, governado
por suas fraquezas e virtudes, o homem que aprendeu a “transformar os vícios privados em
benefícios públicos”. No fundo, ele “não crê que a religião seja fonte de moralidade”
(SANTOS, 2011, p. 65).
Para Mandeville, se insistimos sobre uma visão do mundo bastante religiosa,
caímos na miséria econômica e, por consequência, na pobreza social. Então,
existe uma forte contradição entre a moral da religião cristã e aquela estabelecida
pela economia. Se desejamos que o mundo moderno funcione bem, pensa
Mandeville, é preciso deixar a religião um pouco de lado. (SANTOS, 2011,
p.66).
75
O apogeu desse pensamento é alcançado com os trabalhos de Jeremy Bentham
(1748-1832) e John Stuart Mill (1806-1873) (AUDARD, 2003). Para o primeiro a noção
de moralidade utilitarista resume-se na busca da felicidade para o maior número de
pessoas, “funda-se em fatos e na razão, isto é, na felicidade individual e no cálculo do bem
coletivo de seres reais”(THIRY-CHERQUES, 2002, p. 296). Para Bentham, é a
conveniência que guia o homem moralmente, que obediente às normas morais, busca o
prazer.
As ideias de Bentham em muito contribuíram para uma nova concepção de normas
jurídicas e transformou o utilitarismo num movimento político e social, onde “o
radicalismo de Bentham transformou de maneira revolucionária a concepção de justiça
penal e da relação entre os delitos e as penas atribuindo-lhe como único guia a utilidade
social, e não o desejo de vingança” (AUDARD, 2003, p. 739).
Bentham teve, ao longo de seu trabalho, uma preocupação prática, uma concepção
normativa de sua teoria, principalmente na sua aplicação para questões jurídicas e
econômicas. Neste sentido, sua teoria moral volta-se mais ao legislador e, como este, pode
alcançar seus objetivos apoiado num “conhecimento científico dos recursos do
comportamento humano” (AUDARD, 2003, p. 739).
O utilitarismo de Bentham confirma uma definição de bem supremo que passa
diretamente pelo prazer – hedonismo31
– e, por isso mesmo, uma visão simplificada e
mecânica dos sentimentos, residindo, aí, grande parte das críticas a sua teoria. Segundo
Thiry-Cherqyes (2002), Bentham acreditava ser possível mensurar a quantidade de prazer,
uma espécie de matematização moral que, em última instância, dará suporte ao legislador
em impor as sanções ou penas que regulam a busca do prazer, que, por sua vez, pode ser
valorado segundo sua intensidade, duração, certeza, proximidade, fecundidade, pureza e
extensão, o “cálculo felicífico”(AUDARD, 2003, p. 739).
A filosofia do utilitarismo de Bentham, concebe uma sociedade composta de
“átomos individuais de prazer e de sofrimento”, juridicamente tratada de forma igual,
ignorando as especificidades, uma homogeneização de dados quantitativos (AUDARD,
2003, p. 740).
31
Hedonismo na sua concepção básica “considera o prazer como o único bem possível, portanto como
fundamento de vida moral”. (ABBAGNANO, 2007, p. 508) Entretanto, o mesmo autor faz uma distinção
do hedonismo com o utilitarismo , uma vez que “para este último, o bem não está no prazer individual, mas
no prazer do maior número possível, ou seja, na utilidade social”. (ABBAGNANO, 2007, p. 508).
76
John Stuart Mill, por sua vez, direciona seu estudo no sentido de justificar uma
ação, o princípio de utilidade, o bem supremo (a felicidade), distanciando-se de um
intuicionismo, em nome de uma racionalidade em ética; afirma que “Justificar uma ação,
quer ela seja de ordem moral, prudencial ou estética, é poder substituir essa ação sob uma
regra mais geral em nome de um princípio universal incessantemente confirmado pela
„prática reflexiva‟ (reflectivepractice)” (AUDARD, 2003, p. 741).
Stuart Mill afasta-se da ideia de felicidade como uma quantidade de prazeres
(quantificação dos sentidos), aproximando-se dos prazeres mais elevados, virtuosos, onde
“a satisfação é um dos motivos, ao lado de outros elementos, cujo conjunto constitui a
felicidade” (AUDARD, 2003, p. 741). Ele separa a felicidade do prazer, conferindo ao
primeiro a ideia de utilidade: “o prazer é necessário para a felicidade, mas não é
suficiente”, pois “afirmar que uma coisa é útil significa dizer que essa coisa tem valor –
mesmo que o valor que encerre seja meramente econômico – não que dá prazer” (THIRY-
CHERQUES, 2002, p. 303).
Pode-se afirmar que o pensamento utilitarista foi mais que assimilado; foi adotado,
pelo homem moderno – por excelência, econômico –, como a doutrina moral máxima que
guiou suas ações, livre dos tabus religiosos e moralismos tradicionais. Por isso mesmo, tão
bem serviu de base justificatória para seus objetivos fundamentais de maximização das
vantagens pessoais (AUDARD, 2003, p. 741).
Há duas formas de utilitarismo: uma clássica e a outra contemporânea. Na
primeira,o tratamento dado à “utilidade” é visto como sendo a satisfação das
“preferências” que levam ao bem estar de um indivíduo. Na segunda, essas preferências
correspondem a um estado mental consciente, racional, informado e prudente, um estado
tão objetivo que de certa forma chega a afastar-se do próprio sentido de preferência32
.
São muitas as objeções ao utilitarismo, cabe aqui destacar aquela que parece ter
relação à temática ambiental. Nesse sentido, esse campo filosófico leva a um
descomprometimento com os temas que não diz respeito à humanidade, como, por
exemplo, uma “responsabilidade moral com os seres humanos que ainda não existem”
(COSTA, 2002, p. 171), e é por isso mesmo que vem sendo o alvo dos ataques de
32
Aproxima-se de um modelo behaviorista, ou seja, “ao estudo do comportamento humano eliminando
qualquer referência a consciência e ao espírito [...] a negação da introspecção como instrumento legítimo de
investigação”. (ABBAGNANO, 2007, p. 105).
77
ambientalistas, envolvidos com a causa do crescente comprometimento dos recursos
naturais, pelo progresso tecnológico, pondo em risco a existência das gerações futuras33
.
Entretanto, a complexidade multifuncional da sociedade de hoje põe o homem em
uma posição de insuficiência em avaliar todos os seus atos morais, os seus efeitos, no dia-
a-dia, restando apenas à opção de “seguir regras que universalizam tipos de ações que a
experiência coletiva mostrou que produzem um bem maior para a sociedade” (COSTA,
2002, p. 171), e a despeito de todas as críticas34
, não se podem negar a importância e os
avanços conquistados pelo utilitarismo, principalmente no que se refere à influência das
crenças e diferenças culturais no enfrentamento dos dilemas, as quais passaram a ser
excluídas, considerando-se apenas a racionalidade dos fatos observáveis.
De fato, essa racionalidade35
, a partir das últimas décadas e até os dias atuais,
continua influenciando a maioria das ações nos campos políticos, jurídicos e econômicos,
nas decisões em ética aplicada, seja para a avaliação da adoção do aborto, da importância
das gerações futuras ou o direito dos animais, nos mais diversos campos relacionados aos
conflitos ambientais, na imposição de sanções a empresas que danificaram o meio
ambiente, no incentivo fiscal à produção de materiais certificados ou políticas públicas
voltadas ao incremento do desenvolvimento sustentável.
No âmbito dos atos das organizações, o utilitarismo preconiza que os negócios
devem “promover a felicidade dos outros tanto quanto o da minha organização” (THIRY-
CHERQUES, 2002, p. 309), uma vez que a manutenção de uma vida civilizada, em muito
construída pelo trabalho das empresas, depende de um ordenamento social, que é de
interesse do indivíduo e da organização manter.
33
“Para exemplificar, suponhamos que se queira construir uma represa em uma certa localidade. Essa ação
produzirá um bem por possibilitar a produção de energia elétrica e irrigação de terras da região. Ela produzirá
também um certo sofrimento: famílias que há muito tempo vivem na região que será alagada terão de ser
deslocadas etc. Esse mal poderá ser reduzido se o governo reembolsar as perdas... Como o prazer resultante
acabará sendo muito maior que o sofrimento, a construção da represa torna-se, quando medida por seus
prováveis efeitos, uma boa ação”. (COSTA, 2002, p. 164). 34
São muitas as críticas ao utilitarismo, principalmente no que se refere ao tratamento da pessoa humana, na
redução ou sacrifício de liberdades e direitos fundamentais, caso isso seja necessário para o aumento do bem-
estar da coletividade, ou, em outras palavras, “a pluralidade das pessoas não é, por conseguinte, levada a
sério pelo utilitarismo”. De forma análoga ao raciocínio anterior, a doutrina utilitarista também não leva em
conta a diferenciação entre valores, uma vez que adota um critério único de valor, seja do prazer ou da pena,
considera sempre a felicidade da maioria. “A obrigação moral não é, portanto, o resultado de uma motivação
psicológica particular, mas princípios utilitaristas que modelam nosso julgamento e nosso caráter”. Dessa
forma, para o utilitarismo, pode-se chegar à justiça e à correção das desigualdades. (AUDARD, 2003, p.
743). 35
“O utilitarismo é a tentativa de transformar a ética em ciência positiva da conduta humana, ciência que
Bentham queria tornar exata como a matemática” (ABBAGNANO, 2007. p. 986).
78
Assim, para analisar a moralidade de uma decisão gerencial, primeiro devemos
avaliar os vários cursos de ação disponíveis. Em seguida, quem será afetado por
essa ação e quanto de bem ou de mal ela pode causar. E, finalmente, escolher o
curso de ação que irá produzir o maior bem para o maior número possível de
pessoas dentro e fora da organização. (THIRY-CHERQUES, 2002, p. 309).
O utilitarismo tem se mostrado uma corrente de pensamento consistente, a qual,
mesmo tendo sido criada séculos atrás, trouxe grande contribuição para muitos aspectos da
vida social, vigentes até hoje. No campo político, por exemplo, destacam-se as questões da
ampla discussão e a ampla participação na formulação de diretrizes, além do ideal de
governo baseado no interesse geral sobre o particular. No campo econômico, a distribuição
do valor, do bem para o maior número possível. No campo jurídico com a ideia de
igualdade; e nas ações individuais como a liberdade de expressão. (THIRY-CHERQUES,
2002).
Quando se extrapola o objetivo principal da filosofia utilitarista36
para toda a
humanidade, percebe-se uma proximidade com o ideal da sustentabilidade, na medida em
que tal ideal tenta assegurar a existência de todos os entes da terra, inclusive os das
gerações futuras. Assemelha-se, também, quando analisada a questão da moralidade das
ações e das suas consequências, onde uma ação é moralmente correta quando traz
benefícios à maioria e incorreta se os resultados não forem positivos para o maior número,
é com base nas consequências dos atos humanos que grande parte do discurso da
sustentabilidade se sustenta. Em outras palavras, é nos atos, seus efeitos e nos que são
afetados que se instaura o utilitarismo, numa aplicabilidade prática, ao tempo em que
acessível por qualquer pessoa é uma doutrina fundamentada no social, que ainda está a
influenciar novas correntes de pensamento, reinventando-se no cotidiano da sociedade
contemporânea.
A indústria da construção civil em seu desafio sustentável não se diferencia de
outros setores econômicos da sociedade contemporânea, onde, ao tempo em que deve
propiciar melhor qualidade ao ambiente no que tange aos anseios dos usuários e da
comunidade, deve atender aos requisitos de mercado com produtos competitivos.
36
Que seria: a máxima felicidade para o maior número de pessoas.
79
Entretanto, é preciso indagar sobre o valor em si dos ganhos ambientais com as
construções sustentáveis, qual sua utilidade? Nessa perspectiva, pode-se concluir que os
ganhos são diferenciados: em primeiro lugar, os empreendedores tendem37
a ganhar
financeiramente com a redução no desperdício de materiais, além de ganhos tecnológicos
com processos construtivos inovadores; em segundo lugar, os compradores ou quem
usufrui de imóveis sustentáveis têm a vantagem de utilizar espaços mais eficientes e com
garantias de conforto ambiental geral (térmico, de iluminação, auditivo, segurança contra
agentes poluidores, etc.), o que ao final também se reverte em ganhos financeiros,
principalmente pela economia nos custos com energia e água; por fim, os ganhos indiretos,
por assim dizer, são gerais, uma vez que toda a comunidade ganha com a economia de
recursos naturais e, por conseguinte, tem-se uma menor geração de resíduos.
Diante dessas observações, parece claro identificar como os benefícios são
distribuídos. Os ganhos diretos ou imediatos podem ser atribuídos aos empreendedores e
aos que utilizam as edificações, os que se beneficiam primeiro, seja sob a ótica financeira
ou a ambiental. Mas a sociedade em geral também ganha se houver menos impacto aos
recursos naturais, que, no final, acabam por reverberar em espaços mais saudáveis. O que
ainda é necessário é mensurar e redistribuir melhor os ganhos e os custos financeiros entre
todas as partes.
Percebe-se que, sob a perspectiva da ética utilitarista, o posicionamento do setor da
construção civil, em suas posturas sustentáveis, é coerente, ou seja, suas ações, além de
trazerem benefícios, possuem uma utilidade em si, atingem uma comunidade que, mais
abrangente ou restrita, a depender dos ganhos indiretos ou diretos, respectivamente,
validam o pressuposto principal do utilitarismo, “a máxima felicidade para o maior
número”.
Posto o tema da ética, bem como a problemática que a envolve, na vertente que
adota as proposições ambientais como fonte de estudo e caminhando para a conclusão
desta temática, levantamos a questão: é possível revincular eticamente o homem, o meio
ambiente, a ciência e a tecnologia?
O difícil quadro no qual a humanidade se insere atualmente é o resultado de cisões
envolvendo a ciência, a tecnologia e o homem. Primeiramente, ocorre uma dupla cisão
37
Trata-se ainda de uma tendência, ou uma suposição, uma vez que não existem pesquisas suficientes
(dados) que comprovem que construir um edifício sustentável é mais barato que um convencional.
80
entre ciência e tecnologia, na separação entre juízo de fato e juízo de valor, quando da
superação (autonomia) da tecnologia para com a ciência, fazendo com que essa ficasse
cada vez mais dependente do conjunto de técnicas que ela mesma criou (DOMINGUES,
2004). Contudo, este parece ser um processo que trouxe também muitos ganhos, visto que
foi importante para o crescimento racional do conhecimento e sua desvinculação a
preceitos teológicos, além de fazer com que a tecnologia “realimentasse” a ciência,
contribuindo, assim, para o seu progresso.
Em segundo lugar, outra cisão ocorre quando tanto a ciência quanto a tecnologia
sucumbem aos imperativos do capital financeiro, sujeitadas aos interesses privados.
Entretanto, não se pode negar a importância de muitos investimentos, que possibilitaram
equacionar graves dilemas sociais, através do desenvolvimento de novos conhecimentos e
seus desdobramentos em novas tecnologias, consequentemente (DOMINGUES, 2004).
Dessa forma, fica claro que a dinâmica das questões abre caminho para análises
divergentes; a solução, se houver, requer um conjunto de esforços, que a ética, sozinha,
não será capaz de resolver.
A humanização entre ciência e tecnologia, como deseja Domingues, passa pela
redefinição das responsabilidades da comunidade científica, enquanto um empreendimento
coletivo, constituído por inúmeros pensadores, os limites, se couberem, devem ser
construídos por uma moral coletiva e responsável, deve ser definida pelo conjunto de
cientistas, mas sempre comprometidos com o avanço do conhecimento, o progresso da
ciência, não negando, com isso, seu ideal e compromisso com suas bases epistemológicas.
Assim, a ciência continuará sua aliança com a tecnologia, com suas boas
contribuições a humanidade, pois o problema não está na ciência em si, mas no seu uso e
apropriação. Neste sentido, o conjunto da sociedade, apoderando-se de ambas pode
começar a reinscrever estas relações sobre um lastro mais democrático, responsável, ético.
Como um bom exemplo dessa possibilidade de articulação entre essas instâncias,
aparentemente incompatíveis, pode-se citar o uso da tecnologia auxiliando no surgimento
de sociedades mais democráticas, materializada nas redes sociais, onde, a todo instante,
dão prova de sua enorme capacidade de mobilização social e divulgação da informação em
tempo real, com consequências surpreendentes. Comprovam, objetivamente, que ciência e
tecnologia, se usadas adequadamente, concorrem para ações de melhoria da comunidade
humana, em um novo sistema de saber e comunicação, mais democrático e informado.
81
Ao lado da ética, a sustentabilidade ou o desenvolvimento sustentável são os temas
mais debatidos nas últimas décadas. Entrelaçados pelas consequências das ações humanas
sobre o meio ambiente, a ética é desafiada a embasar uma nova consciência racional, e a
sustentabilidade, os meios, ou seja, uma prática para recolocar o homem numa nova
relação com a natureza.
Tanto a sustentabilidade, quanto o desenvolvimento sustentável vêm sendo
incorporados aos discursos ambientais dos muitos setores que compõem a rede complexa
da sociedade atual. E é justamente nesse contexto, de ampliar o debate a respeito desse
apoderamento e de contribuir para uma maior consistência na distinção dessas correntes,
que se estruturam os tópicos a seguir.
1.3 – A Sustentabilidade Ambiental
A tomada de consciência acerca dos limites do crescimento da sociedade humana e,
consequentemente, o embate entre meio ambiente e desenvolvimento econômico tomou
corpo a partir da segunda metade do século passado. Desde então, muito se tem discutido,
estabeleceram-se várias conferências e tratados e, de uma forma geral, o cidadão comum
começou a ter contato mais efetivamente com esta problemática.
A sustentabilidade ou o desenvolvimento sustentável podem ser considerados como
palavras chave da contemporaneidade. Por isso mesmo, inúmeras ideologias apropriaram-
se desses termos dando-lhes diferentes definições, ou seja, fala-se muito, mas não se sabe
exatamente o que significa (BELLEN, 2006). Outro problema reside em como mensurar os
custos dos danos ambientais e sua relação com a ideologia da sustentabilidade, uma vez
que ser sustentável é compatibilizar ambiente, sociedade e economia. Vale salientar,
também, as questões que envolvem os mecanismos de adaptação do mercado às novas
demandas sociais por produtos com certificação ambiental, isso exigiu das empresas a
criação de instrumentos, selos verdes, que “garantem” as boas práticas da sustentabilidade
(BELLEN, 2006).
Dessa forma, pretende-se aqui levantar, primeiramente, o debate construído por
alguns pesquisadores na estruturação de um entendimento mais profundo do significado e,
consequentemente, a distinção entre sustentabilidade e desenvolvimento sustentável e,
82
assim, entender o porquê da existência de tantas definições desses conceitos. Em segundo
lugar, faz-se necessário aprofundar-se na complexidade dos mecanismos de mensuração,
mais especificamente nos indicadores de sustentabilidade, e sua capacidade de estabelecer
o grau de desenvolvimento (sustentável ou não) e como esse instrumento pode contribuir
para esclarecer e difundir o novo paradigma da sustentabilidade.
Por fim, em atendimento ao escopo da pesquisa, as adaptações feitas pelo setor
empresarial, como um todo, serão debatidas no esforço de se entender como estes
organismos vêm se posicionando frente aos novos conceitos e exigências de uma sociedade
cada vez mais esclarecida dos problemas ambientais.
1.3.1 – Sustentabilidade e Desenvolvimento Sustentável
Se por um lado o progresso da ciência permitiu descobertas revolucionárias e que
até hoje servem de base justificadoras para o discurso desenvolvimentista e do bem estar,
por outro lado, descortina-se cada vez mais um sentimento de pavor em parcela da
humanidade, que se mantém lúcida e crítica, face aos muitos estudos que sinalizam para
um futuro incerto.
Segundo Leff (2006), a ânsia a um conhecimento exacerbado, centrado na ciência e
no progresso tecnológico, a normatização, nomeação e ordenação das coisas, a redução da
realidade a fórmulas matemáticas, gerou uma excessiva objetividade no mundo e
encobriram os elementos simbólicos presentes à natureza humana e tudo que a cerca.
Esta transmutação da ordem do real e do simbólico, essa ruptura do espelho da
representação, faz com que a reintegração do mundo seja uma ilusão que está
além do propósito de abrir o cerco das ciências para a interdisciplinaridade e um
diálogo de saberes, para compreender a nova ordem híbrida do real: os objetos
transgênicos (LEFF, 2006, p.130).
O desenvolvimento do capitalismo gerou um pensamento crítico que veio a
responder e justificar as causas e efeitos da modernidade tecnológica sobre os valores
morais e existenciais do homem e sua qualidade de vida. Esta razão põe a natureza e o
homem apenas como objeto e força de trabalho, respectivamente, desprezando qualquer
processo de satisfação das atividades humanas.
83
Contrários a este pensamento surgem os valores ambientais, no fim dos anos 60,
questionando os limites do crescimento, o fosso entre países pobres e ricos, a destruição
das bases ecológicas. A degradação ambiental aparece materializada, principalmente nos
países da América Latina e África, em um quadro de violência social e empobrecimento
generalizado38
.
Traduzir os custos da degradação ambiental, seja na forma de conservação ou
restauração, constitui-se um dos grandes desafios do processo de reintegração da natureza
na economia, uma vez que ambos possuem ciclos diferentes, “não existe um instrumento
econômico, ecológico ou tecnológico capaz de calcular o valor real da natureza na
economia” (LEFF, 2001, p.65).
Neste sentido, esta incomensurabilidade traduz-se na impossibilidade de serem
reduzidos os processos ambientais a valores de mercado. Também no campo do ambiental
se expressam disputas de poder, neste caso associadas à disputa em torno de paradigmas
sociais e cadeias produtivas alternativas e deve-se ficar atento para que os conflitos ligados
à área socioambiental não venham a velar o caráter das reais defesas ecológicas. Os
movimentos ambientais estão mais ligados a processos de lutas dos cidadãos por sua
identidade cultural e democracia.
Estes movimentos sociais fazem parte de uma resistência cultural como defesa de
um estilo de vida, e fazem da defesa do meio ambiente um processo de reapropriação do
seu território e de seu patrimônio de recursos naturais. A atual crise da racionalidade
econômica leva a proposição de um novo paradigma no qual o ambiente não seja tratado
como uma externalidade, mas como o potencial de uma nova racionalidade produtiva.
O modelo de progresso econômico, intensificado a partir da modernidade,
confrontou dois mundos diferentes em uma posição antagônica e conflitante. Se, por um
lado, as nações ricas e desenvolvidas clamam por “uma nova ética frente à abundância, o
desperdício” (LEFF, 2001, p. 154), por outro lado, o mundo subdesenvolvido exige
satisfação de necessidades básicas e dignidade humana.
A degradação do meio ambiente foi provavelmente a principal temática da segunda
metade do século XX. Esteve na pauta dos líderes da maioria das nações do mundo e que
38
Entre as trinta maiores favelas do mundo, apenas cinco não se localizam na America Latina e Africa.
(DAVIS, 2006).
84
iniciaram uma reavaliação da ideia de crescimento que culminou com o conceito de
desenvolvimento sustentável, este conceito anunciou o fim da ambiguidade entre meio
ambiente e crescimento econômico, com a adoção de mecanismos de apropriação dos
recursos naturais.
Esse discurso promete atingir seu objetivo sem uma fundamentação a respeito da
capacidade do mercado em dar seu justo valor à natureza, desmaterializar a
produção, e reverter às leis da entropia e atualizar as preferências das gerações
futuras [...] constituem o mecanismo extra-econômico por excelência da pós-
modernidade para manter o domínio sobre o homem e a natureza (LEFF, 2006,
p.141).
Foram vários os encontros envolvendo os mais renomados cientistas e importantes
políticos mundiais que produziram uma série de documentos e compromissos para se
reverter essa tendência crescente de desgaste da natureza e, consequentemente, de uma
ameaça à própria existência humana na terra.
The Limits to Growth, publicado em 1972, foi o primeiro relatório impactante para
o mundo, resultado dos estudos de um grupo de cientistas e empresários chamado Clube de
Roma. Como o próprio nome diz, este documento afirma que o crescimento econômico,
nos moldes até então praticados, tem um limite, imposto pela finitude dos recursos
naturais. Neste mesmo ano, a Conferência de Estocolmo produz um relatório que rompe
com a concepção dominante de expansão contínua da sociedade industrial e reforça as
conclusões divulgadas pelo Clube de Roma (BRUSEKE, 1995).
Surgem, a partir daí, alguns termos para substituírem a ideia recorrente de
desenvolvimento. O principal deles, talvez, tenha sido o ecodesenvolvimento, que surgiu
em 1973 pela formulação e articulação de aspectos desenvolvidos por Ignacy Sachs e que
estabelecia uma íntima relação entre meio ambiente e desenvolvimento, com a articulação
entre educação, participação, preservação dos recursos naturais e satisfação das
necessidades básicas (BELLEN, 2006). Este conceito, a princípio, voltava-se a
determinadas regiões do planeta onde se concentravam os países mais pobres. Entretanto,
foi uma ideia importante para a percepção da problemática ambiental no âmbito global, na
tentativa de estabelecer um manejo prudente dos recursos naturais.
A partir da concepção de ecodesenvolvimento forma-se outra visão do que se quer
para o homem e é neste novo ambiente que emergem novos valores éticos e estéticos, que
85
visam a responder aos problemas gerados pela degradação ambiental. Neste sentido, é que
se constrói a ideia de sustentabilidade apoiada nos limites das leis da natureza, nas
potencialidades ecológicas, nos saberes sociais (LEFF, 2006).
Devido à aliança entre as diversas ideias que permeiam o termo, conceituar
sustentabilidade implica em estabelecer um entendimento entre os campos interdisciplinar,
interinstitucional e intergeracional (BURSZTYN, 2012).
Ao primeiro, cabe o ajuste entre as dimensões econômica, social e ambiental, no
debate democrático entre estes saberes, de modo a construir práticas ambientais
integrativas que vençam as dificuldades do isolamento disciplinar, comum à academia, e
assim dialogar com “mundo real”, dos conhecimentos populares (BURSZTYN, 2012).
O caráter interinstitucional requer novos arranjos políticos administrativos que
ultrapassem os atuais modelos, nesse sentido, exige harmonizar “estruturas de poder e de
decisão muitas vezes opostas” (BURSZTYN, 2012, p. 48) com a simplificação do tecido
institucional, e assim ser capaz de identificar e barrar vetores de pressão opostos aos ideais
sustentáveis.
O campo intergeracional talvez seja o mais complexo, uma vez que, pede ao
homem uma solidariedade com as gerações futuras, justamente em um mundo marcado por
profundas desigualdades. Nesse contexto,
A referência a uma solidariedade frente ás gerações futuras se coloca como algo
tão distante quanto a própria incerteza e o desconhecimento de como será o
futuro. Agregue-se a isso a comodidade de se alegar a crença na ciência como
salvadora de futuros problemas, para justificar condutas negligentes com as
conseqüências ambientais futuras. (BURSZTYN, 2012, p.49).
A construção de uma nova racionalidade ambiental – aqui adotada como sinônimo
de sustentabilidade – sinaliza para uma contraposição ao corrente processo de
desenvolvimento e pretende avançar no campo dos direitos civis, políticos, econômicos,
sociais e culturais, e consiste em: 1) formar uma consciência ecológica; 2) um
planejamento entre diversos setores da administração pública, com a participação social na
gestão dos recursos ambientais; 3) a reorganização do saber com apelo a
interdisciplinaridade (LEFF, 2001).
O conceito de sustentabilidade se constrói a partir da articulação de cinco esferas de
racionalidade:
86
1) Racionalidade substantiva – que orientam as ações sociais.
2) Racionalidade teórica – que sistematiza os valores da racionalidade substantiva.
3) Racionalidade instrumental – que cria os vínculos técnicos através de um
sistema de meios eficazes.
4) Racionalidade cultural – que produz a identidade e integridade de cada cultura.
5) Racionalidade ambiental – que se traduz na busca do bem comum sob a ordem
do Estado com a participação da sociedade civil num processo de reapropriação
da natureza (LEFF, 2001).
A conjugação de todos estes pressupostos concorre para a formação de uma
consciência superior para uma mudança no íntimo de cada ser. Na junção das ações
coletivas, tais pressupostos se transformarão em um saber ambiental, com a estruturação do
pensamento concretizado no particular de cada cultura e que caracteriza as especificidades
e diversidade dos povos do mundo em gerir seus recursos (LEFF, 2001). Trata-se de um
novo plano para o conhecimento, de utopias construídas na concretude das mudanças
desejadas.
O ideal sustentável, como definido, traz consigo um forte apelo à interdependência
de saberes, numa visão múltipla e conjunta de abordar os problemas ambientais, que
passam a ser um problema do homem, do mundo e de todos os seus entes vivos não
humanos. Paralela a essa visão interdisciplinar, a estrutura econômica mundial vai
percebendo os limites impostos pela escassez dos recursos e redirecionando suas posturas
diante dessa crise, o que resulta no conceito de desenvolvimento sustentável.
Nas últimas décadas, os problemas ambientais passaram a ser percebidos sob uma
visão globalizada, fruto dos muitos desastres de grandes proporções que envolveram o
meio ambiente. Alguns fatores determinantes contribuíram e ainda contribuem para este
quadro de degradação: ecossistemas naturais explorados a exaustão; abandono de técnicas
tradicionais de agricultura gerando destruição do ambiente rural; a agroindústria utilizando
de forma inadequada o solo e os recursos hídricos; depleção da natureza para fins de lazer;
crescimento econômico indiferente aos limites ambientais; crescimento urbano
descontrolado, afetando, por fim, sua infraestrutura (BELLEN, 2006).
Bursztyn (2012) salienta que a problemática ambiental passou a ganhar espaço no
sistema econômico a partir de duas constatações: primeiramente com os alertas da ciência
87
em relação à finitude dos recursos naturais atrelado aos custos de compensação dos danos
ambientais, gerando deseconomias; em segundo lugar, a própria economia descobre as
grandes oportunidades de negócio e novos mercados ligados às práticas ambientais
corretas.
Ao longo das últimas décadas, as causas ligadas ao meio ambiente alcançaram uma
repercussão sem precedentes, tornando-se praticamente um imperativo em todos os agentes
e segmentos do mundo contemporâneo. Nesse sentido, declarar-se “ecologicamente
correto” tornou-se o discurso corrente, mesmo entre atores efetivamente de visão
antagônica aos postulados pelos ideais da conservação dos recursos naturais, e passou a
significar um comportamento que concorre para a proteção do planeta, “como um
fundamento ético e místico da vida”. Entretanto, o que se percebe entre muitos atores
envolvidos é um “deslocamento entre discurso e práticas” (BURSZTYN, 2012, p.32), que
não asseguram manifestações efetivamente ambientais.
Esta percepção de crise ecológica vai, paulatinamente, deslocando seu foco com a
incorporação de novas estratégias de ordem econômica, submetendo o discurso ambiental,
mais crítico e ainda em formação, à sustentabilidade, aos ditames dos macroprocessos
mundiais, é o que Leff chama de crescimento sustentável, desenvolvimento sustentado ou
sua versão mais difundida e aceita, desenvolvimento sustentável.
É no Relatório Brundtland39
, divulgado em 1987, resultado da World Commission
on Environment and Development (WCED), que surge o mais conhecido conceito de
desenvolvimento sustentável, afirmando ser o “desenvolvimento através do qual as
necessidades do presente são satisfeitas sem, no entanto, comprometer a capacidade das
gerações futuras de satisfazerem as suas próprias necessidades” (WECD, 1987, p.42). Este
encontro culmina com a recomendação de se fazer uma conferência sobre os temas da
pobreza e consumismo, o que resulta em duas assembléias das Nações Unidas, sendo a
última delas a mais conhecida, a Rio-92.
Em 1992, na cidade do Rio de Janeiro, ocorre a segunda Conferência das Nações
Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, também conhecida como Rio-92. Deste
encontro resulta outro conceito para desenvolvimento sustentável. Trata-se de um extenso
39
Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, criada pela ONU em 1983, com o objetivo
de capacitar a humanidade para enfrentar os principais problemas ambientais do planeta e assegurar o
progresso humano sem comprometer os recursos para as gerações futuras (ALMEIDA, 2002 p.54).
88
documento intitulado Agenda 21, composto por 40 capítulos um preâmbulo e quatro
seções: 1) Dimensões Sociais e Econômicas, 2) Conservação e Gestão dos Recursos para o
Desenvolvimento, 3) Fortalecimento do Papel dos Grupos Principais, 4) Meios de
Execução. Deste encontro participaram 179 países e desse processo resultaram cinco
outros acordos, além da Agenda 21: a Declaração do Rio, a Declaração de Princípios sobre
o Uso das Florestas, o Convênio sobre a Diversidade Biológica e a Convenção sobre
Mudanças Climáticas (BURSZTYN; BURSZTYN, 2012).
Em seu primeiro princípio, “Os seres humanos constituem o centro das
preocupações relacionadas com o desenvolvimento sustentável, têm direito a uma vida
saudável e produtiva em harmonia com a Natureza”40
, fica claro que o foco é deslocado
para o elemento humano, buscando-se, assim, um maior equilíbrio entre as dimensões
econômica, ambiental e social.
A partir destes encontros, o termo desenvolvimento sustentável passou a ser
considerado das mais diversas formas, nos mais distintos sentidos, podendo ser aplicado
para qualquer área do saber humano, um conceito-chave para identificar qualquer ideia que
se aplicasse a temática conflituosa entre o meio ambiente e o crescimento econômico.
Assim, esta diversidade de sentidos é consequência das abordagens que se quer dar para o
tema, o desenvolvimento sustentável não é uma ideia fechada, é relativa, dependente da
ideologia ambiental e do ator envolvido na problemática (BELLEN, 2006).
Diante dessa “abertura” conceitual, desenvolvimento sustentável e sustentabilidade
passaram a ser construídos na sobreposição de ideias e, tanto um termo quanto o outro,
atualmente, tratam da mesma coisa, dos meios de se equacionar os problemas ambientais
(poluição, finitude de recursos, extinção de espécies, etc.), advindos das ações humanas,
com o crescimento econômico e social.
Com isso, o redirecionamento dos estudos dessa temática deixa em segundo plano
essa diferenciação de conceitos41
, concentrando-se em outros aspectos, tais como a escala
ou abrangência, na distinção dos seus campos de influência, na capacidade de atuação, ou
ainda, nos mecanismos de mensuração.
40
“Human beings are at the centre of concerns for sustainable development, they are entitled to a healthy
and productive life in harmony with nature” (UNITED NATIONS, 1993 p. 5). 41
A partir de então o emprego dos termos desenvolvimento sustentável e sustentabilidade serão utilizados
conforme os autores consultados e referenciados.
89
Como salienta Bellen (2006), parece existir um consenso de que existem múltiplos
níveis desta sustentabilidade, em maior ou menor grau. Neste sentido, a noção de escala ou
subsistemas de atuação passa a ser fundamental para se observar a sustentabilidade e vai
desde uma comunidade local até uma nação. Observa, ainda, que se trata de um processo
dinâmico, isto é, em constante mutação, uma vez que ligado à complexidade do sistema da
sociedade humana; além de ser adaptativo, já que pertencente a outro sistema complexo: o
meio ambiente.
Sachs (1997) afirma que o desenvolvimento sustentável, enquanto instância
dinâmica, pode ser melhor entendido à luz de cinco distintas dimensões: econômica, social,
ambiental, geográfica e cultural.
As ideias de desenvolvimento sustentável, na perspectiva econômica, trazem em
seu bojo a visão de um mundo com estoques e fluxo de capital, mas não se restringe apenas
ao capital monetário, como na visão tradicional; abrange possibilidades maiores e
considera também o capital ambiental, o humano e o social. Aposta na capacidade humana
de acomodar-se a novas situações, no poder da tecnologia para resolver os problemas e os
desastres ambientais (SACHS, 1997).
Sob o âmbito do social, o desenvolvimento sustentável centra-se no ser humano e
sua presença no mundo, seu bem estar e os meios empregados para se garantir e elevar a
qualidade de vida. Este desenvolvimento deve permitir acesso aos serviços básicos da vida
em sociedade, tais como: boa qualidade do ar e da água, segurança, saúde, educação,
habitação, lazer e trabalho digno, bem como uma melhor distribuição de renda e
consequentemente a diminuição das diferenças entre os muito ricos e os muito pobres
(SACHS, 1997).
Na visão ambiental, a principal preocupação está no controle dos impactos sobre a
natureza decorrente da ação humana, o que significa ao mesmo tempo ampliar as
possibilidades de exploração dos recursos e estabelecer os danos em padrão mínimo
possível. Devem-se buscar práticas sustentáveis tais como aumento da eficiência
energética, reduzir a utilização de combustíveis fósseis, diminuir a emissão de poluentes,
entre outras (SACHS, 1997).
Sob a perspectiva geográfica, materializa-se numa distribuição humana e
econômica mais equilibrada, uma harmonia entre os espaços rurais e urbanos. Já sob a
90
perspectiva cultural, devem-se preservar as experiências locais, seus saberes e tradições,
mesmo no caminho da globalização e da derrubada das fronteiras (SACHS, 1997).
A complexidade do tema ainda suscita divergências entre os dois conceitos –
sustentabilidade e desenvolvimento sustentável. Algumas correntes, adotando como
referência as três esferas que compõem o paradigma sustentável (social, ambiental e
econômica), estabelecessem uma diferenciação entre sustentabilidade forte e
sustentabilidade fraca a exemplo da ecologia profunda que, sustentando o primeiro
conceito e defendendo a incompatibilidade entre desenvolvimento e sustentabilidade, adota
um esquema de abrangência entre as três dimensões, prevalecendo o aspecto ambiental
sobre os demais, como pode ser visto no esquema (Fig. 01).
A sustentabilidade fraca considera o equilíbrio harmonioso entre as esferas,
compatibilizando a dinâmica inerente a elas, no espaço comum do entrelaçamento das três
dimensões reside à sustentabilidade (Fig. 02), esse modelo tornou-se praticamente um
consenso e foi amplamente adotado para representar o equilíbrio das forças que interagem
seja para a sustentabilidade, seja pelo desenvolvimento sustentável.
Figura 9 - Modelo da Sustentabilidade Forte. Fonte: Adams (2006).
91
Figura 10 - Modelo da Sustentabilidade Fraca.
Cabe agora “estabelecer os limites até onde é possível usar, sem abusar da
natureza” (RABELO, 2008, p. 83). Nesse sentido, examinar com exatidão a problemática
ambiental, que engloba ambos os conceitos (sustentabilidade e desenvolvimento
sustentável), apela para um caminho além dos fundamentos teóricos, depende de técnicas e
instrumentos que sejam capazes de:
[...] prever e dar apoio à tomada de decisão, como cenários [...] que permitam
antever os efeitos e reduzir os riscos com [...] instrumentos de mensuração[...]
para a aferição do estado do ambiente. O estabelecimento de indicadores para
[...] mensurar alterações na dinâmica de ecossistemas é um elemento central para
a difícil tarefa de medir a sustentabilidade. O desenvolvimento de uma base
científica sobre os limites do meio natural [...] é preciso conhecer a sua
capacidade de suporte e sua resiliência. (BURSZTYN; BURSZTYN, 2012,
p.53).
Uma vez inserido na ideia do capital, o desenvolvimento sustentável precisou
adequar-se à sua lógica, e a primeira coisa a se fazer foi criar ferramentas para sua
avaliação e mensuração, o que, inclusive, é uma das recomendações tanto do Relatório
Brundtland como da Agenda 2142
. Em resposta a este desafio, inúmeros pesquisadores
iniciaram trabalhos voltados à avaliação da performance do desenvolvimento, e em 1996,
42
Segundo o Relatório Brundtland, “Deve-se aprimorar e ampliar sem demora a capacidade de identificar,
avaliar e divulgar os riscos de danos irreversíveis aos sistemas naturais e as ameaças à sobrevivência, à
segurança e ao bem-estar da comunidade mundial”. (CMMAD, 1991, p. 23).
A Agenda 21 Brasileira informa em seu Objetivo 18 que: “Instituir um sistema de informação com a
definição de indicadores de desenvolvimento sustentável para o gerenciamento das políticas públicas.
(Agenda 21 brasileira, 2004, p. 77).
92
na Itália, um grupo de especialistas divulga uma síntese dos aspectos relacionados à
avaliação do desenvolvimento sustentável, denominado de Princípios de Bellagio43
.
Neste sentido, ganharam impulso os estudos envolvendo os indicadores de
sustentabilidade, uma ferramenta capaz de simplificar as informações sobre os fenômenos
ambientais complexos, tornando-os mensuráveis, cognoscíveis, passíveis de mudança e de
propaganda e, a partir daí, facilitar sua comunicação. São muitas as utilizações dos
indicadores e cada vez mais cresce sua capacidade de aplicação aos diferentes tipos de
situações. Na teoria, são considerados elementos-chave para a sociedade compreender seu
mundo, seus problemas e, por conseguinte, facilitar a tomada de decisões, bem como o
planejamento de suas ações (RABELO, 2008).
Muitos indicadores de sustentabilidade, a depender de sua aplicação, incorporam a
dimensão temporal ao seu escopo operacional e, assim, assumem o papel de vetores, isto é,
entidades que possuem magnitude e direção, uma vez que podem expressar a realidade de
maneira gráfica, com um movimento, uma meta e a velocidade deste movimento, rumo a
um futuro. Este tipo de indicador tem sido muito utilizado na definição de políticas e
estratégias ambientais pela clareza, inclusive visual, de sua apresentação, o que facilita o
convencimento por sua adoção (BELLEN, 2006).
Como o desenvolvimento sustentável envolve situações de difícil compreensão,
muito dos seus indicadores requerem sistemas interligados ou a agregação de diferentes
indicadores e tudo isto para aumentar o conhecimento a respeito dos problemas ambientais.
Neste sentido, muitos críticos desta sistemática apontam para um problema, pois quanto
maior sua agregação mais se distancia do problema em si e mais difícil fica sua
conceituação. Também, existe sempre o risco com o obscurecimento de informações e
consequentemente a valorização de alguns setores em detrimento de outros.
Esta preferência é nada mais que a superioridade dos sistemas econômicos e sua
ligação com o desenvolvimento e a necessidade de mensurar matematicamente todos os
problemas, e, neste sentido, pode-se aplicar melhor a fenômenos menos importantes, como
43
Em novembro de 1996, um grupo de pesquisadores reuniu-se no Centro de Conferências de Bellagio, na
Itália, para revisar os dados e as iniciativas de avaliação de sustentabilidade até então produzidas. Os dez
princípios resultantes deste encontro passaram a servir de guia para avaliação de um processo qualquer, desde
sua escolha, utilização, interpretação e comunicação, sendo eles: a) guia de visão e metas; b) perspectiva
holística; c) elementos essenciais; d) escopo adequado; e) foco prático; f) abertura e transparência; g)
comunicação efetiva; h) ampla participação; i) avaliação constante; j) capacidade institucional. (BELLEM,
2006 p. 73)
93
a receita, mais do que a outros imprescindíveis, como a qualidade de vida. Ainda, no que
tange aos seus limites metodológicos, os indicadores de sustentabilidade lidam com dados
e informações muitas vezes subjetivos, tendências sociais ou ideológicas, não tão fáceis de
obter, diferente de dados técnicos de alta precisão (BELLEN, 2006).
Assim, a despeito do fascínio da contemporaneidade pelos indicadores há de se ter
sempre em mente suas limitações, já observadas em sua própria conceituação tratando-se
de um instrumento que resume informações e por isso mesmo, em sua tarefa
simplificadora, não retrata fielmente a realidade, ainda mais quando se refere a um tema
tão complexo, que envolve tantos atores e interesses quanto é o meio ambiente.
Sem dúvida, o processo de mudança para práticas sustentáveis demanda tempo pois
o lento processo de convencimento, assegurado por comprovações científicas que ainda
não aconteceram, faz com que o “conceito de desenvolvimento sustentável ainda esteja à
mercê de ambiguidades e incertezas” (BURSZTYN; BURSZTYN, 2012, p. 33). Com isso,
fica claro o enorme potencial da ciência em contribuir para a mudança desse quadro
através da produção de “conhecimentos sobre limites e fronteiras do meio natural, gerando
tecnologias que poupem matéria prima” e informação, e assim, contribuir para uma
profunda modificação de hábitos, podendo se desdobrar em pressões para uma melhor
distribuição das riquezas (BURSZTYN; BURSZTYN, 2012, p. 33).
Diante desta evidência, fica clara a necessidade de contribuir discursivamente para
reduzir as inconsistências ainda presentes ao tema e, assim, alargar as perspectivas de
análise e entendimento dos atores envolvidos nestas questões. Faz-se necessário, portanto,
introduzir alguns aspectos que interligam o tema da sustentabilidade com sua apropriação
pelo setor produtivo, como esse ramo vem reagindo e se reposicionando frente ao desafio
de reduzir o consumo de recursos naturais, com processos mais limpos.
1.3.2 – A Apropriação do Discurso do Desenvolvimento Sustentável pelo Setor
Empresarial
O desenvolvimento sustentável vem sendo utilizado amplamente como um
instrumento balizador de boas práticas ao meio ambiente pela maioria das empresas e
instituições comerciais. Aprofundar neste campo representa uma etapa fundamental para
esclarecer melhor uma das várias faces deste processo e que, sem dúvida, vai contribuir
94
para o entendimento da recente incursão da indústria da construção civil no seu
comprometimento com a redução dos impactos ambientais decorrentes de seu processo
produtivo.
O conceito de desenvolvimento sustentável apresentado por Barata44
situa o ramo
empresarial em posição de destaque, uma vez que delega a este uma posição estratégica
para o seu alcance. A autora atribui ao poder público a missão de induzir o setor
empresarial a trilhar o caminho deste novo conceito. Neste sentido, estabelece metas para o
incremento e a manutenção da produtividade, a busca por indicadores de justiça social,
qualidade no processo, no produto, na prestação do serviço e nas condições
ambientais.Trata-se de uma abordagem bastante coerente com os idealizadores do
desenvolvimento sustentável e com o de sustentabilidade empresarial45
.
Este setor, na justificação de suas ações ambientais, comumente refere-se à
importância estratégica das “partes interessadas” como sendo o “grupo e/ou indivíduos que
podem afetar ou serem afetados durante o cumprimento dos objetivos organizacionais da
empresa” (BARATA, 2009, p. 275). Entretanto, esta afirmação não passa da
superficialidade da definição, não discute que estes grupos (partes) são compostos por
interesses antagônicos e que são afetados, inclusive, de forma distinta. Sendo assim, impor-
lhes o trabalho de conduzir uma boa prática ambiental nas empresas parece uma tarefa
utópica, ainda mais se somada às dificuldades inerentes ao próprio processo de conciliar
produção de riquezas com preservação da natureza.
As boas ações do ramo empresarial são definidas, como um processo crescente de
incorporação nos últimos anos, advindo de uma “adoção voluntária” resultado de uma
normal capacidade de mutação deste ramo, adaptando-se ao seu tempo (RODRIGUES,
2005). No princípio, as ações ambientais eram adotadas para evitar a paralisação de suas
atividades ou para fugir de multas, e assim vistas como um aditivo aos custos de produção.
A partir de graves acidentes ambientais, como o da usina nuclear em Chernobyl, as
empresas foram obrigadas a assumir os custos em indenizações e descontaminação de
44
“[...] um processo de transformação no qual a exploração dos recursos, a direção dos investimentos, a
orientação do desenvolvimento tecnológico e as mudanças institucionais se harmonizam de modo a
contribuir para o bem-estar social no presente e no futuro”. (BARATA, 2009 p. 271). 45
“Para ser sustentável, uma empresa ou empreendimento tem que buscar, em todas as suas ações e decisões,
em todos os seus processos e produtos, incessante e permanentemente, a ecoeficiencia. Vale dizer, tem que
produzir mais e melhor com menos: mais produtos de melhor qualidade, com menos poluição e menos uso
dos recursos naturais. E tem que ser socialmente responsável: toda empresa está inserida num ambiente
social, no qual influi e do qual recebe influência. (ALMEIDA, 2002, p. 78).
95
áreas, além de terem sua imagem prejudicada junto ao mundo. Estes fatos levam o setor a
repensar suas estratégias comerciais e então “voluntariamente” implantar instrumentos de
gestão ambiental (BARATA, 2009).
Isto posto, fica claro que esta ação voluntária nada mais foi que a reinvenção de
estratégias econômicas com vistas a manter a produtividade, internalizando os custos
ambientais com alta exposição à mídia “verde”.
De forma mais específica, o setor empresarial voltou-se para as questões ambientais
a partir da década de 80, quando o debate acerca dos limites impostos ao desenvolvimento
econômico pela finitude dos recursos naturais toma um novo direcionamento.
O universo empresarial, até então, pouco tinha se envolvido com estas discussões,
participando, quando acionado, pelos controles fiscais dos órgãos ambientais, mesmo
assim, as medidas tomadas para a minimização dos impactos estavam condicionadas a não
interferir nos processos de produção e comercialização. Eram ações paliativas, na maioria
das vezes como um „banho verde‟ para apaziguar a pressão da opinião pública
(ALMEIDA, 2002).
Em 1984, ocorre um vazamento do gás isocianato de metila na cidade indiana de
Bhopal, sob a responsabilidade da indústria de pesticidas Union Carbide e que contaminou
praticamente 100% de seus habitantes, matando aproximadamente 15 mil pessoas. Foi
considerado o pior desastre ambiental da história da Índia e todo o setor químico mundial
passou a sofrer uma enorme pressão para rever seus processos industriais. Assim, no ano
seguinte tem início um programa criado pela Canadian Chemical Producers Association
para melhorar a produção dos seus componentes em relação ao meio ambiente e a saúde e
segurança dos trabalhadores e populações próximas (BARATA, 2009).
A partir do exemplo da indústria química e também por solicitação da ONU46
, os
maiores grupos empresariais do mundo organizaram-se e fundaram uma instituição, a
BSCD (Business Council for Sustainable Development), que produziu em 1992 um
trabalho intitulado „Mudando o Rumo: uma perspectiva empresarial global sobre
desenvolvimento e meio ambiente‟.
46
No ano de 1990 o secretário-geral da Conferência da ONU, marcada para 1992, solicitou ao conselho de
indústria e comércio um relatório global sobre desenvolvimento sustentável na perspectiva do setor
empresarial (ALMEIDA, 2002, p. 60).
96
Se o relatório da Comissão Brundtland preocupava-se com as gerações futuras, o
BSCD enfatizava o compromisso com a contemporaneidade, com os povos do presente,
seus acionistas, empregados, consumidores e fornecedores, uma visão bastante coerente
com o sistema de produção em desenvolvimento. Propõem novos instrumentos de
regulação com a diminuição da participação governamental e o estímulo a uma
autorregulação, novos mecanismos econômicos que permitiriam a cobrança de impostos
sobre a degradação e até uma licença de poluição negociável. Introduz conceitos voltados
para otimização da eficiência das empresas incorporando a ideia de que a poluição deve ser
vista como recursos que evadiram do processo produtivo, e portanto, uma fonte de
vantagem econômica (ALMEIDA, 2002).
Em 1995, o BSCD faz uma fusão com outra organização empresarial, a WICE
(World Industry Council for the Environment) e surge então o WBCSD (World Business
Council for Sustainable Development), rapidamente desenvolvendo-se ao ponto de que em
2001 já reunia 150 das maiores corporações mundiais, que representavam um faturamento
anual de 4,5 trilhões de dólares, cerca de 20% do PIB mundial (ALMEIDA, 2002).
No Brasil, o WBCSD foi o responsável pela organização e fundação do CEBDS
(Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável) criado no ano de
1997 e que já reúne cerca de sessenta grandes grupos privados e estatais, geram mais de
quinhentos mil empregos e respondem por mais de 30% do PIB nacional47
. Segundo
Almeida (2002), seus objetivos podem ser reunidos em quatro grandes eixos de atuação:
Implantar a ecoeficiência e o Sistema de Gestão Ambiental (SGA)48
como
um princípio fundamental de qualquer empresa, independente de seu porte;
Estimular a comunicação e o diálogo entre os empresários, o poder estatal,
as ONGs, a academia e a sociedade em geral;
Participar da definição de políticas que conduzam ao desenvolvimento
sustentável;
Manter um estreito intercâmbio de informações sobre as melhores práticas
em desenvolvimento sustentável junto às grandes organizações
internacionais e nacionais.
47
Dados disponíveis em www.cebds.org.br/cebds/cebds-associados.asp 48
Posteriormente estes conceitos serão melhor detalhados.
97
O CEBDS elege alguns pré-requisitos para que o desenvolvimento sustentável seja
incorporado pelo universo empresarial. Assim, primeiramente, aponta a necessidade de se
estabelecer um sistema aberto de mercado, baseado na competitividade que reflita
claramente os custos, inclusive os ambientais. Rejeita os subsídios, qualificando-os como
mascaradores dos preços e inibidores da justa competição. Por fim, aponta a importância
do investimento de novas tecnologias voltadas à obtenção de uma produção mais eficiente
econômica e ambientalmente correta (ALMEIDA, 2002).
A democracia é encarada por esta instituição como essencial para o
desenvolvimento sustentável, uma vez que só assim podem ser garantidos os mercados
abertos e a autorregulação, pressupõe o respeito à lei e à prosperidade. O regime
democrático também favorece a transparência, entendida como ausência de corrupção,
regulamentações previamente apresentadas antes de sua implementação, além de ouvir e
dialogar com as partes interessadas (ALMEIDA, 2002). Entretanto, não menciona nada no
sentido de deixar transparecer os ganhos financeiros ou os danos ao meio ambiente
impostos pelos processos industriais.
Na medida em que a competitividade aumentou, companhias passaram a enxergar
vantagens mercadológicas, na forma de uma imagem positiva perante a sociedade e assim
passaram a investir num marketing social. Nesse sentido, o conceito de “responsabilidade
social”49
, nas últimas décadas, desenvolveu-se principalmente na Europa e Estados Unidos
como um fator decisivo nas disputas por mercados internos e externos (FÁVERO, 2012).
Uma empresa socialmente responsável deve gerenciar seus processos de forma a
minimizar os efeitos negativos e maximizar os positivos e dessa iniciativa construir um
valor a mais em seus produtos, diferenciando-se em termos de competitividade (FÁVERO,
2012).
De forma geral, as empresas descobriram que das deficiências dos serviços sociais,
de responsabilidade do poder público, poderiam se diferenciar no mercado caso
assumissem certos compromissos suprindo essas demandas. Assim, vinculando sua marca
a essas ações, além da obrigação legal, poderiam agregar valor aos produtos ofertados.
49
Conjunto de práticas visando melhorar as condições de vida da comunidade onde a empresa está inserida,
na relação com os empregados, com os clientes, fornecedores e o governo. Faz investimentos em ações
sociais além do exigido por lei, tais como a erradicação do trabalho infantil, segurança dos trabalhadores e
redução dos impactos no meio ambiente. (FÁVERO, 2012, p. 02).
98
O reconhecimento de uma empresa socialmente responsável se faz por uma
certificação emitida por fundações e institutos devidamente habilitados. No Brasil, o
campo da responsabilidade social vem crescendo no que tange as empresas que pretendem
se fixar de forma competitiva no mercado internacional50
.
Dentro do conceito e responsabilidade social, as questões ambientais, em grande
parte nas empresas que estão ligadas ao mercado internacional, materializam-se nos
programas de compensação dos impactos gerados aos recursos naturais, que permitem a
melhoria dos processos industriais e assim a inserção no mercado da sustentabilidade,
exigência cada vez maior para as companhias que ambicionam os consumidores dos
grandes centros econômicos, cada vez mais atentos aos efeitos colaterais dos agentes
poluidores, buscando sempre uma melhoria da qualidade de vida (FÁVERO, 2012).
Entretanto, para que a responsabilidade social seja reconhecida em termos
ambientais, as empresas poluidoras devem estabelecer programas de compensação desses
efeitos danosos, ações essas que devem ultrapassar as exigidas legalmente51
. Acontece que
algumas empresas investem na melhoria de seus processos internos, que se reflete em
benefício próprio, e alegam que essas benesses culminam por reverberar na comunidade.
Nesse sentido, cabe ao poder público52
e os institutos certificadores uma justa avaliação
dessas companhias, em suas posturas ambientais, que garantam produtos e ações realmente
responsáveis por uma melhoria das condições de vida de toda a comunidade envolvida, dos
funcionários, das populações vizinhas, até o consumidor final.
A partir das ideias da responsabilidade social, o empresariado vem se
reorganizando com a criação de diversos instrumentos, desenvolvidos pelo próprio setor,
50
No Brasil destacam-se como institutos e fundações certificadoras: Instituto Ethos de Empresas e
Responsabilidade Social, fundada em 1998; Fundação ABRINQ, criada em 1990 e que emite o selo
“Empresa amiga da criança”; Fundação UNIMED, criada em 1995; Associação Brasileira de Comunicação
Social, que confere prêmios a projetos de cidadania empresarial; BVQI do Brasil (Bureau VeritasQuality
Internacional), responsável pelas certificações AS 8000 e ISSO 14000. (FÁVERO, 2012, p. 03). 51
Pesquisas apontam que grandes empresas poluidoras, como a Companhia Siderúrgica Belgo-Mineira e a
Companhia Siderúrgica Nacional, estão fazendo pouco além do que lhes é atribuído como obrigação, onde os
investimentos ambientais declarados, na realidade, apenas diminuem os impactos negativos por elas gerados.
((FÁVERO, 2012, p. 15). 52
Uma das grandes dificuldades encontradas na sistematização de taxas de licenças ambientais reside na
determinação de valores na forma de compensação de danos causados ao meio ambiente, essa eficiência
econômica, que exige um “preço correto”, está intimamente ligada aos preceitos do desenvolvimento
sustentável, surgindo daí grande parte das críticas sofridas por esse novo paradigma ambiental.
Nesse sentido, a política ambiental brasileira é considerada, por alguns, como limitada pois centra-se nos
instrumentos de comando e controle em detrimento dos instrumentos econômicos, e assim “motivada por
uma nefasta equação: a impunidade de quem degrada somada à falta de incentivos àqueles que preservam”.
(AGUIAR; TRENTINI, 2012, p. 07).
99
no sentido de apoiar e direcionar suas estratégias ambientais. A ecoeficiência, o ecodesign,
a governança corporativa, além de uma gama de metodologias (PmaisL)53
e de normas
certificadoras (Série ISO 14000)54
, passaram a fazer parte da pauta dos dirigentes
empresariais para conduzir seus negócios na ordem do lucro crescente, mas sob o escudo
do desenvolvimento sustentável.
A ecoeficiência foi um conceito criado em 1991 pelo Conselho Empresarial
Mundial para o Desenvolvimento Sustentável e tem como principais objetivos: a) consumo
reduzido de recursos (energia e água); b) reutilização, durabilidade e minimização de
desperdícios dos materiais industrializados; c) reduzir os impactos ambientais (emissões
atmosféricas, efluentes, ruídos, resíduos) d) aumento da produtividade ou do valor do
produto (bens mais flexíveis, funcionais, duráveis) (BARATA, 2009).
Seu conceito relaciona-se a um processo contínuo de melhoria da empresa e exige
um conhecimento das bases naturais que dão suporte ao sistema operacional, tendo claro o
limite destas bases em resistir aos impactos.
A ecoeficiência é alcançada mediante a oferta de bens e serviços a preços
competitivos, que satisfaçam as necessidades humanas e tragam qualidade de
vida. Ao mesmo tempo, ela reduz progressivamente o impacto ambiental e o
consumo de recursos ao longo do ciclo de vida do produto ou serviço, a um nível
no mínimo equivalente à capacidade de sustentação estimada da Terra
(ALMEIDA, 2002, p.101).
Ser ecoeficiente significa incorporar à gestão empresarial a contribuição da
biologia para observação da natureza, como um modelo sustentável enquanto um ciclo
fechado de produção. Nos sistemas naturais, o que é detrito para uns é alimento para
outros, assim, as empresas ecoeficientes tem como objetivo final gerar zero de resíduo
(BARATA, 2009).
Deste conceito podem-se retirar duas ideias básicas: a primeira refere-se ao peso
dado aos critérios de lucratividade e aumento da produção, ficando as estratégias
ambientais relegadas a um terceiro plano; a segunda é que este conceito não incorpora ou
53
Projeto Produção mais Limpa, iniciado em 1995 pelo Centro Nacional de Tecnologias Limpas do Senai-RS,
em convênio com o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma) e com a Organização das
Nações Unidas para o Desenvolvimento Industrial (Unido) (Barata, 2009). 54
ISO - International Organization for Standardization. A série de normas denominadas ISO 14000 trata
basicamente da gestão ambiental (VALLE, 2002).
100
prioriza a reutilização ou reciclagem de materiais, está pautado na ideia de “produzir mais
com menos recursos” (BARATA, 2009, p. 280).
Seguindo o mesmo raciocínio de ecoeficiência, o ecodesign é mais uma iniciativa
empresarial que foca sua ação no ciclo de vida do produto, otimizando-o desde a sua
concepção até a disposição final, ou seja, considerar os problemas ambientais na fase de
projeto do bem. Ambas as iniciativas reafirmam a continuidade da lógica empresarial
como elementos indutores de redução de custos e riscos financeiros e benefícios
econômicos (BARATA, 2009).
A governança corporativa, conforme Almeida (2002), é encarada como um
conceito ainda em construção e, portanto, passível de diversas interpretações e com forte
tendência a aproximar-se de uma instância ambiental. De forma geral, é um instrumento
que regula as práticas e os relacionamentos entre os acionistas, o conselho de
administração, a diretoria, a auditoria e o conselho fiscal, assegurando a todos
transparência na prestação de contas e responsabilidade nos resultados. Neste sentido, ao
aproximar-se de uma preocupação ambiental, a empresa deverá incorporar, aos sujeitos
citados anteriormente, a sociedade e o meio ambiente, e passar a exercer uma governança
sustentável.
O WBCSD especificou alguns instrumentos que devem ser aplicados pelas
empresas para se alcançar a ecoeficiência. Assim, o sistema de gestão ambiental, a análise
do ciclo de vida, os processos de produção mais limpa, a certificação ambiental, são
algumas das principais recomendações para que negócios mais sustentáveis sejam obtidos.
O Sistema de Gestão Ambiental ou SGA é a mobilização da empresa de forma
preventiva na conquista da qualidade ambiental. O WBCSD exige uma série de princípios
e ações: ter o SGA como uma prioridade com investimentos contínuos em aperfeiçoamento
de processos e pessoas; ter o diálogo como meta entre as partes interessadas; ter claro quais
as leis e normas são aplicadas às atividades da empresa; estabelecer metas crescentes de
desempenho ambiental; ter programas permanentes de auditoria e compatibilizar o SGA
com outros sistemas de gerenciamento da empresa (ALMEIDA, 2002).
Segundo o CEBDS, a análise do ciclo de vida é ainda um processo complexo pois
envolve a definição e avaliação de muitos elementos e são poucas as experiências efetivas
deste instrumento. Foi um processo que nasceu na Europa, na década de 80, pela pressão
de organismos ambientais exigindo cuidados em todas as etapas dos processos industriais,
101
os impactos devem ser medidos desde o projeto do produto até sua disposição final depois
de consumido, ou seja, „do berço ao túmulo‟ (ALMEIDA, 2002).
A produção mais limpa (P+L) visa reduzir ou eliminar a poluição durante o
processo de produção, não apenas no seu final (ALMEIDA, 2002). Incorpora o sentido de
que toda matéria-prima que é mal aproveitada significa perda econômica, pois é daí que
surgem os resíduos. Neste sentido, P+L requer um constante aperfeiçoamento e permite
identificar novas oportunidades de negócio, o estímulo da criatividade e a inovação.
Estes instrumentos de gestão ambiental empresarial são considerados voluntários,
haja vista que não são exigidos pela força da lei, mas que, por pressão das partes
interessadas ou do mercado, podem ser incorporados ao ciclo de produção. Entretanto, esta
adoção voluntária está condicionada ao gestor da empresa em perceber a possibilidade
destas ações contribuírem para a redução de custos, redução de riscos ao negócio, criação
de oportunidades e estabelecer um melhor relacionamento com as partes interessadas
(BARATA, 2009).
Em muitos casos, estes mecanismos exigem investimentos elevados em projetos,
máquinas ou alteração da cadeia produtiva, assim, o empresário só adotará medidas de
redução dos impactos ambientais se houver a real possibilidade de comprovar que os
custos do presente evitarão maiores custos no futuro. Mesmo assim, configura-se como um
entrave para grande parcela do setor, pequenas e médias empresas, que não tem como arcar
com valores que extrapolam seus orçamentos. Diante disto, mais uma vez o mercado, em
sua imensa capacidade de reinvenção, cria um mecanismo mais simples e barato, que
oferece diretrizes de apoio à gestão ambiental empresarial, as certificações do grupo de
normas da série ISO 14000.
A certificação ambiental diz respeito a uma adesão voluntária da empresa, em
conjunto com um organismo credenciado, para padronizar procedimentos e assim atingir
certos critérios ambientais. Pode-se observar que esta tem sido uma prática crescente entre
o universo empresarial, motivado principalmente por uma crescente pressão da sociedade
em exigir produtos „ambientalmente corretos‟, mesmo assim, a certificação ambiental não
exclui a obrigatoriedade de se obter as licenças exigidas por lei (AGOPYAN, 2011).
As Certificações ISO 14000 entraram em vigor no Brasil na década de noventa,
mais precisamente em 1996, e depois revisadas em 2000 (BARATA, 2009). Nelas estão
descritas as diretrizes e requisitos para um correto sistema de gestão ambiental e podem ser
102
aplicadas a todas as categorias de organizações, de diferentes escalas de atuação e
localização. São ações que a empresa assume em cumprir, de forma sistemática em um
processo de melhoria contínuo.
A introdução de novos conceitos (Certificação Ambiental, Auditoria Ambiental,
Gestão Ambiental), que vieram atrelados à implantação das normas ISO, propiciou a
modificação do relacionamento entre as empresas, os órgãos de fiscalização e as
Organizações Não-Governamentais, fazendo com que uma prática de “responsabilidade
solidária” fosse tomando lugar das multas, autuações e denúncias, contribuindo em muito
para a boa imagem da empresa (VALLE, 2002). Este é um fator que em muito contribuiu
para o crescente aumento no número de empresas certificadas no mundo (até 2003 eram
36.765) (BARATA, 2009).
Por outro lado, é certo que estas práticas influenciaram para o avanço de novas
tecnologias, materiais e produtos, mais eficientes sob o ponto de vista de consumo de
recursos naturais e cada vez mais acessíveis à população em geral. Em quase todas as áreas
da vida social é possível encontrar bens de consumo com certificação ambiental,
diminuindo a culpa pelo consumo em parcela da sociedade que se autodenomina
“ambientalmente correta”.
Apesar de reconhecer que o atual estágio de degradação dos recursos naturais está
associado à sua exploração pelos processos empresariais diretamente ligadas a uma
condição de crescente poder econômico, que não incorporam nenhum tipo de preocupação
com o meio ambiente, o CEBDS deposita total confiança na capacidade de reinvenção do
capital e aceita as contradições inerentes a este sistema como uma característica da
contemporaneidade.
À primeira vista, o reconhecimento de tal poder e riqueza nas mãos das
corporações contradiz a nova realidade do mundo tripolar, em que o poder é
equilibrado entre empresas, governo e sociedade civil organizada, e a área de
ação desses três elementos se dá nas dimensões econômica, ambiental e social.
As contradições aparentes são uma característica do mundo contemporâneo e a
sobrevivência será o prêmio para quem melhor souber lidar com elas. O
capitalismo, que até agora mostrou ser o sistema econômico mais eficaz,
precisará de uma gestão competente para que, em algumas décadas, entremos na
era do capitalismo sustentável. (ALMEIDA, 2002, p. 175).
103
Trata-se de uma posição coerente e otimista como reforço à ideia do
desenvolvimento sustentável, na medida em que devolve ao capital a responsabilidade e o
poder de reverter o moderno cenário de degradação ambiental, colocando nas mãos do
universo empresarial as esperanças por um mundo melhor.
O termo “desenvolvimento sustentável” apresenta vários significados.
Provavelmente, terá sido a expressão mais difundida nas últimas décadas, em seu conceito
cabem todos os significados, sendo sinônimo de sociedade racional, indústrias limpas,
crescimento econômico, enfim “tudo nele parece caber” (HERCULANO, 1992, p. 43).
Entretanto, destacam-se, aqui, duas ideias que podem sinalizar para dois caminhos, que não
são excludentes e representam possibilidades de escolha.
O primeiro caminho seria a introdução de valores éticos na racionalidade capitalista
meramente instrumental, critérios voltados para a construção de uma sociedade mais justa
e includente. O segundo seria um conjunto de mecanismos de ajustamento que resgata a
funcionalidade da sociedade capitalista, medidas paliativas em prol de um “capitalismo
verde”, e que podem ser um primeiro passo para escaparmos do insustentável, entretanto
ainda longe do “bom”.
Parece que, quanto mais diversas são as ideias utilizadas para se definir e construir
o desenvolvimento sustentável, mais ampla se torna a complexidade de se construir uma
sociedade igualitária, livre, justa e democrática, e que não cabe em uma expressão
“desenvolvimento isso” ou “desenvolvimento aquilo”. Essa construção parece extrapolar o
já fundamentado campo do saber racional e sinaliza para um retorno às bases de uma
antiga reflexão, a ética.
A indústria da construção civil, como os demais setores do mercado, nos últimos
anos, vem enfrentando o desafio de incorporar diretrizes sustentáveis aos seus processos
produtivos. Esta força indutora aparece, principalmente, na demanda da sociedade por
construções e ambientes mais eficientes, que de alguma forma sejam compatíveis com os
novos tempos de recursos escassos. Por sua vez, esta mesma população pressiona o poder
público na implementação de normas construtivas e urbanísticas que contribuam para a
melhoria do ambiente citadino. Evidentemente, o setor imobiliário passou a enxergar nesse
novo mercado emergente – mais consciente da crise ambiental – oportunidades de bons
negócios, uma clientela cada vez mais disposta a pagar mais por uma construção dentro
dos padrões do desenvolvimento sustentável.
104
Todo o processo que envolve a construção civil, que culmina em uma edificação ou
espaço edificado qualquer (residência, hospital, praça, pontes, etc), está atrelado a uma
série de fatores e etapas que vão desde políticas públicas a iniciativas do próprio setor.
As categorias analíticas abordadas nesse capítulo (natureza, ética,
sustentabilidade/desenvolvimento sustentável) formaram o contexto de informações
teóricas e permitiu o aprofundamento dos outros temas, mais específicos e correlacionados
com a construção sustentável e, consequentemente, com a formação da cidade, com mais
respeito aos parâmetros ambientais.
Estas três categorias foram imprescindíveis para o entendimento da gênese do
espaço citadino e, mais especificamente, do espaço sustentável, no qual a urbanidade
contemporânea materializa as inconsistências e as possibilidades por uma vida melhor.
A natureza, na medida em que o setor público e imobiliário cada vez mais deposita
importância nos espaços verdes, não só como elemento de equilíbrio entre o construído e o
natural, não só é o lugar para recompor as forças perdidas no caos cotidiano, mas também
o da distinção, onde só privilegiados têm acesso.
A ética, como o saber desafiado a guiar as condutas humanas frente aos novos
imperativos do mundo, pela escassez dos recursos, das desigualdades, das consequências
obscuras, de um futuro incerto, representa questões que, de alguma forma, se materializam
na cidade, no espaço de realização da vida.
Por fim, a sustentabilidade/desenvolvimento sustentável como o fio de condução de
todos os temas, recolocando disciplinas clássicas num outro patamar de discussões, para
responder questões práticas do mundo atual, evidenciar as incoerências a serem
ultrapassadas e indicar novos caminhos, possibilidades de arranjos (sociais, ambientais,
urbanos, econômicos, políticos, etc.) mais justos.
CAPÍTULO 2
CONSTRUÇÃO DA CIDADE SUSTENTÁVEL: A ESTRATÉGIA DA
GESTÃO AMBIENTAL
2 – CONSTRUÇÃO DA CIDADE SUSTENTÁVEL: A ESTRATÉGIA
DA GESTÃO AMBIENTAL
O objetivo deste capítulo é analisar a formação do espaço urbano moderno até a
contemporaneidade, com a inclusão dos preceitos sustentáveis e como o Brasil tem
montado o seu quadro de políticas ambientais urbanas. Essa abordagem alinha-se com o
escopo principal da pesquisa, cujo fim último é contribuir para a melhoria da cidade, e
versa sobre a sustentabilidade na construção civil, na interação desse setor com o espaço
citadino, e sua influência/dependência das leis urbanísticas.
A primeira parte refere-se a uma reconstrução das bases do urbanismo moderno,
desde os novos arranjos das cidades no final do século XIX, passando pelos modelos
racionais da escola moderna, até o experimentalismo da contemporaneidade.
A segunda parte aborda os principais problemas da cidade atual, do crescimento
sem limites, da perda da qualidade de vida e da fragmentação espacial e administrativa, e o
Planejamento Ambiental como estratégia para equacionar, ao menos, parte dessas
questões.
Num terceiro momento, são apresentadas novas experiências como alternativas ao
urbanismo contemporâneo, com a incorporação de parâmetros inovadores, em planos de
desenho para a cidade sustentável.
A quarta parte trata do quadro das políticas ambientais urbanas no país, num
percurso histórico desde os anos 60, passando pelas diretrizes e estratégias que terminaram
por montar o panorama urbano brasileiro atual.
Por fim, a quinta parte elenca os instrumentos de gestão que incidem sobre o espaço
urbano direcionado a sua sustentabilidade, tais como: Zoneamento Ambiental,
Licenciamento Ambiental, Relatório de Impacto Ambiental, Avaliação de Impacto
Ambiental, dentre outros.
107
2.1 – A Gênese do Espaço Urbano Moderno
2.1.1 – Primeiras Iniciativas
Com a consolidação do processo industrial no século XIX, as principais cidades
europeias passaram a sofrer graves problemas relacionados à salubridade urbana
decorrentes de uma rápida e descontrolada ocupação territorial, resultando em uma série de
epidemias que ameaçavam toda a população, sem distinção de classe social.
Um dos aspectos mais importantes nas alterações vividas neste século XIX foi
provocado pela crescente urbanização e aumento da população, [...] apesar das
diferenças que distinguiam as diversas cidades, havia características comuns a
todas, tais como habitações dos trabalhadores, alinhadas em longas fiadas de
casas do mesmo tipo, [...] os problemas de saúde pública eram também
basicamente os mesmos, más condições de habitação e populações brutalizadas
pela ignorância e pelo excessivo consumo de álcool. (ALMEIDA, 2010, p. 17).
Com efeito, a cidade tipicamente industrial do século XIX abria espaço para uma
dualidade urbana: “a cidade burguesa se contrapondo à cidade-carvão” (PEREIRA, 2010,
p. 219) e, assim, criava o campo para as alternativas, ou utopias, urbanas que surgiram
nesse século, com o “objetivo de solucionar as carências habitacionais e de qualidade de
vida existente” (PEREIRA, 2010, p. 222).
Em um primeiro momento, essas propostas aproximaram-se de um ideal de
comunidade diminuta, composta por uma população entre mil e dois mil habitantes, com
forte intenção na solução dos problemas da moradia da classe operária, grandemente
influenciada pelo ideal socialista de Marx e Engels (PEREIRA, 2010, p. 222).
Nesse sentido, especificamente na Inglaterra, é que se pôde observar a tentativa de
se fazer “um urbanismo que buscava um equilíbrio entre o crescimento econômico e os
problemas sociais integrados ao desenho da paisagem” (ANDRADE, 2009, p. 367),
materializado na ação de empresários preocupados em melhorar as condições de
habitabilidade de seus operários.
Podem-se observar exemplos dessas iniciativas no modelo de vila de New Lanark,
de Robert Owen, em 1817 (Fig. 01); no Palácio Social de Fourrier, em 1822 (Fig. 02), e na
vila de Saltaire de Sir Titus Salt, em 1851 (Fig. 03). Em todos estes exemplos percebe-se a
intenção de aproximar a moradia do local de trabalho (todos eram conjuntos de casas
108
localizados nas proximidades das indústrias nas quais os operários trabalhavam) e, ao
mesmo tempo, do campo, no propósito de causar um efeito saudável aos trabalhadores, o
que, em última instância, se reverteria em benefícios à própria indústria (ANDRADE,
2009).
Figura 11 - Vila de New Lanark. Fonte: Google Photos.
Autor: Elizabeth Oliver
Figura 12 - Palácio Social de Fourrier.
Fonte: www.cooperativismolatino.blogspot.com
Acesso em 05/05/2013
109
Figura 13 - Vila de Saltaire. Autor: Jonfarman
Fonte: www.nturismo.com/saltaire. Acesso em 05/05/2013.
Após essas primeiras experiências, centradas na primeira metade do século XIX,
novas propostas só foram surgir no final desse século, com destaque para três modelos de
cidade.
Primeiramente com o arquiteto Ebenezer Howard, no ano de 1898, e sua cidade-
jardim. Segundo Pereira (2010), esse desenho enquadrava-se no ideal de uma cidade
alternativa que unia as facilidades urbanas aos prazeres do campo, numa utopia “rurbana”
(Fig. 04).
Figura 14 - Cidade Jardim de Ebenezer Howard.
Fonte: www.cooperativismolatino.blogspot.com. Acesso em 05/05/2013.
110
Tratava-se de uma concepção de cidade idealizada na autossuficiência, uma vez que
propunha a união entre campo e o espaço urbano e a expansão industrial, criando um
desenvolvimento de mercados interdependentes entre estes setores, mas afastado dos
grandes centros. “Seria, portanto, uma maneira de assegurar os benefícios de uma vida
urbana, cheia de oportunidades e entretenimento, juntamente à produtividade e os deleites
do campo” (PEREIRA, 2010, p. 369).
Não se pode deixar de analisar esse conceito como uma proposta de conter a
expansão urbana dos grandes centros, e, por isso mesmo, hoje entendida como em
consonância com algumas estratégias de desenvolvimento urbano sustentável, uma vez
que, em sua concepção, podem-se identificar diretrizes como: “tamanho do núcleo urbano
controlado, uso misto (sem zoneamento), mistura de classes, reaproveitamento de resíduos
sólidos em terras agrícolas e centros comerciais com economia local” (PEREIRA, 2010, p.
369).
Para Andrade (2003), a intenção de Howard era criar uma cidade de dimensões
controladas, não ultrapassando 2.400 hectares, dividida em 2.000 para ocupação rural com
2.000 habitantes e os 400 hectares restantes destinados ao uso urbano com 30.000
habitantes. Em linhas gerais, o desenho da cidade-jardim estaria disposto em uma forma
radial com 6 bulevares de 36 metros de largura no sentido do centro até a periferia,
dividindo o círculo em 6 partes iguais. Na região central, haveria um parque onde estariam
dispostos os edifícios públicos, culturais e o hospital. Uma grande circunferência
delimitaria o parque central, constituindo-se como área comercial e que faria a transição
para as demais áreas residenciais (SABOYA, 2008).
Grande parte das críticas direcionadas ao modelo de cidade-jardim aborda a questão
da suburbanização, ou seja, “a expansão urbana com baixas densidades que ocupa terras
agricultáveis” (SABOYA, 2008, p. 372). Entretanto, cabe ressaltar que a proposta de
Howard afasta-se da ideia de subúrbio dependente de um grande centro, para a de uma
cidade independente, que resguarda grandes áreas para o uso agrícola. Tão logo essa
configuração fosse completada (atingindo a área e a população estipulada), imediatamente
outra cidade-jardim se formaria, resguardando-se um espaço mínimo entre elas e, assim, se
formaria um grande sistema de cidades conectadas (SABOYA, 2008).
Em segundo lugar, destaca-se outro importante modelo urbano, criado no final do
século XIX, foi a cidade linear, concebida pelo urbanista espanhol Arturo Soria y Mata,
111
que construiu na periferia de Madri um bairro (hoje conhecido por Bairro Ciudad Lineal)
entre o ano de 1894 e a década de 20 do século passado (Fig. 05).
Inconformado com o estado dos grandes centros urbanos pós-industrialização, a
proposta de Soria parte de “premissas como a higiene, terrenos baratos, formas regulares e
meios rápidos de comunicação” (BISPO, 2011, p. 86.), como o transporte férreo que tinha
papel preponderante em seu desenho urbano.
Tratava-se de uma configuração definida por linhas, com uma grande via central,
com uma ou duas linhas férreas paralelas a esta via e que dava origem aos eixos
secundários, demonstrando a grande importância na época do sistema viário, diretamente
ligada ao movimento higienista e como uma resposta aos novos desafios abertos pelo
progresso industrial, que exigia dos técnicos urbanistas propostas inovadoras para a cidade
do futuro (BENEVOLO, 2009). Previa uma cidade para no máximo 30 mil habitantes, que,
entretanto, poderia expandir-se indefinidamente pelo prolongamento da avenida central.
No sentido transversal, propõe uma largura máxima de 500 metros, com funções urbanas
definidas e criteriosamente distribuídas de maneira uniforme ao longo do eixo principal,
assim, acreditava em um acesso, a serviços e comércio, de forma mais democrática, o que
manteria o equilíbrio entre a oferta e procura por terrenos, inibindo a especulação
imobiliária e a criação de áreas muito valorizadas em detrimento de periferias
marginalizadas.
Figura 15 - Cidade Linear – Perfil Transversal.
Fonte: Google Photos. Acesso em 07/05/2013.
112
A proposta de cidade linear de Soria “estava assente em dois fatores muito
importantes: a universalidade e a resolução da dicotomia cidade/campo. Propunha um
sistema que se podia espalhar por todo o globo e que favorecia uma distribuição
equilibrada da população” (BISPO, 2011, p. 88). Muitos conceitos desse modelo foram
amplamente adotados por arquitetos do urbanismo moderno, a exemplo de Le Cobusier, e
influenciaram muitos projetos ao longo do século XX.
Em terceiro lugar, um modelo de cidade amplamente difundido no início do século
passado foi o de cidade industrial idealizado por Tony Garnier, que procurou resolver o
problema da habitação social.
Para Benevolo (2001), seu plano urbanístico contemplava uma ocupação por cerca
de 35 mil habitantes e um claro zoneamento para separar as funções da cidade, dividida
em: habitação, lazer, trabalho e transporte, onde cada atividade poderia ocorrer sem
interferir na outra (Fig. 06).
Figura 16 - Cidade Industrial de Tony Garnier.
Fonte: Google Photos. Acesso em 07/05/2013.
Em seu projeto de cidade industrial, Tony Garnier projetou desde casas, escolas, até
ferroviárias e hospitais, minuciosamente detalhados em uma linguagem moderna para a
época, onde largamente empregou materiais “novos”, tais como o concreto armado, o vidro
e o ferro. Apesar de ter a fábrica como seu principal elemento urbanístico, idealizou uma
rede de outras atividades e funções para suprir as necessidades da população, tais como
113
áreas agrícolas, o rio (preferencialmente, a cidade deveria localizar-se nas proximidades
desse corpo d‟água) para funcionar como via de transporte e produzir energia elétrica, e o
poder público atuando na definição do uso do solo e responsável pelo esgoto, lixo e saúde.
Dentre muitas contribuições ao urbanismo emergente, destaca-se um caráter “socialista”
em sua proposta, com uma cidade sem muros, onde “todas as áreas não construídas eram
parques públicos” (FRAMPTON, 2000, p. 62).
Com esses arquitetos, observa-se uma rica e sólida investigação da moradia e uma
primeira tentativa de normalização universalizante, tanto do espaço urbano como da
edificação.
De uma forma ou de outra, ainda hoje, não é raro encontrar projetos urbanísticos
com fortes referências às propostas dos arquitetos das cidades utópicas, como ficaram
conhecidas. Assim sendo, “são o ponto de conexão com o novo urbanismo que se
manifesta no século XX, síntese de planejamento e construção da cidade” (PEREIRA,
2010, p. 224).
Pela primeira vez, os arquitetos propunham uma cidade centrada nas necessidades
dos que nela moravam, na simples tarefa de melhorar as condições de vida, na solução dos
problemas práticos do dia-a-dia, de uma época repleta de novas e maravilhosas invenções.
Estas propostas de desenhos de cidades, em muito contribuíram para o desenvolvimento da
ciência do urbanismo, ou do urbanismo moderno como se conhece nos dias atuais. Em
todas elas podem-se vislumbrar elementos, conceituais e práticos, que, de alguma forma
anteciparam a “cidade do futuro”.
2.1.2 – O Urbanismo Moderno
O início do século XX retrata um conjunto de grandes cidades intensamente
povoadas, decorrente do êxodo rural pela atração da indústria, com graves problemas de
salubridade ambiental, ao mesmo tempo em que experimentava mudanças culturais e
científicas e, por isso, arquitetônicas.
A cidade era considerada um tecido patológico, doente, palco das epidemias, da
delinquência e da proliferação dos cortiços que abrigavam toda uma população operária.
Paralelo a esse quadro degradante, mas também em grande parte responsável por ele, o
progresso científico abre espaço para uma série de questionamentos “de possibilidades,
114
para se construir um novo sistema de alcance geral, uma nova objetividade” (PEREIRA,
2010, p. 227).
“A arquitetura moderna é a busca de um novo modelo de cidade, alternativo ao
tradicional” (BENEVOLO, 2009, p. 615) e o progresso técnico da época contribuiu
definitivamente para facilitar o trabalho dos arquitetos e urbanistas no propósito de
mudança da vida cotidiana. “A difusão do aço, as infinitas possibilidades de utilização da
eletricidade, o elevador (1887), o uso do petróleo para mover o automóvel” (BENEVOLO,
2009, p. 616), de uma forma ou de outra, acabaram por modificar os sistemas e materiais
construtivos, que, por sua vez, exigiam novas soluções estruturais e plásticas nas
edificações.
O novo objetivo a ser alcançado – “o equilíbrio do ambiente construído”
(BENEVOLO, 2009, p. 618) – acaba por fundir a objetividade do trabalho científico com a
subjetividade do trabalho artístico, e os arquitetos acabam por assumir o compromisso em
um “modelo urbano perfeito, que convenha a todo grupo humano, fortemente
influenciados pelo racionalismo da filosofia das luzes” (HAROUEL, 1990, p. 115).
Observa-se que “os arquitetos modernos põem em movimento uma nova pesquisa coletiva
e unitária, isto é, trabalham nos mesmos problemas e oferecem soluções comparáveis, que
se direcionam e se aperfeiçoam no tempo” (BENEVOLO, 2009, p. 630).
Criticando fortemente os planos urbanísticos até então implementados, em especial
a cidade-jardim, que, na verdade, foi convertida em bairros dormitórios, implantados na
periferia e que configurou um tipo de cidade denominada de tentacular, o urbanismo
moderno propõe aos homens “se agruparem para se ajudar mutuamente, se defender e
economizar seus esforços” (CORBUSIER, 1979, p. 28).
Conforme Pereira (2010), para romper com as linguagens tradicionais no processo
para a cidade do século XX, a vanguarda arquitetônica desse século precisou
primeiramente: decompor o volume arquitetônico em elementos primários, adotar a
normalização e mecanizar o desenho dos ambientes construídos, pressupostos que estão na
base da filosofia arquitetônica moderna.
115
A decomposição e destruição da caixa55
representaram romper definitivamente
com os fundamentos da linguagem clássica. Nesse sentido, destaca-se o trabalho do
arquiteto norte-americano Frank Lloyd Wright (1869-1959), que de forma inovadora
passa a conceber seus projetos na construção do espaço contínuo, na eliminação das
paredes que limitavam os espaços em usos especializados.
Wright trabalha na ruptura do rigor dos fechamentos externos, nas paredes das
fachadas, que, por suas mãos, passaram a ser panos envidraçados ou uma simples lâmina e,
assim, podendo ser deslocada para qualquer lugar ou ser dividida em partes. Com isso, a
volumetria ganha uma nova dimensão, uma fluidez coerente com os espaços internos
(PEREIRA, 2010) (Fig. 07).
Figura 17 - Casa da Cascata – Pensilvânia – Estados Unidos – Frank Lloyd Wright.
Fonte: Google Images. Acesso em 08/05/2013.
Um segundo aspecto, no tocante aos primeiros passos à modernização da
arquitetura e do urbanismo, refere-se a uma passagem à normalização. O principal intento
era a integração entre todas as artes, em especial as artes aplicadas, vinculadas inclusive à
indústria. Assim, cabe ressaltar o trabalho da vanguarda alemã dos arquitetos Henry van de
55
Se o sistema baeaux-arts tinha algum fundamento unitário, esta era a proposta da caixa como sustentação e
base de todo processo arquitetônico. A arquitetura se confundia com a edificação, e o edifício não era senão
uma grande caixa – ou uma soma de grandes caixas – composta por uma série de volumes, ou partes
menores. (PEREIRA, 2010, p. 230).
116
Velde (1863-1957), Peter Behrens (1868-1940), Hans Poelzig (1869-1936) e Hermann
Muthesius (1861-1927), que fundaram a Sociedade Alemã do Trabalho (Deutsche
Werkbund), que “empreenderam um esforço integrador comprometido com a produção”
(PEREIRA, 2010, p. 235).
O debate em torno dessa questão, que, a princípio, limitou-se apenas às artes
aplicadas, evolui para um movimento geral, passando da normalização dos objetos
industriais para os objetos de uso cotidiano, até chegar na discussão das normas em
arquitetura, na forma de se estabelecer um “padrão arquitetônico”.
Nessa relação entre arte e técnica, entre arquitetura e indústria, aparecem os
temas construtivos resultantes da utilização dos novos materiais, a produção em
massa de objetos, a edificação das moradias, a normatização das técnicas e a
padronização dos procedimentos e objetos. Tudo isso conduz a uma nova
orientação formal, compositiva, espacial e lingüística da arquitetura após a
Primeira Guerra Européia. (PEREIRA, 2010, p. 236).
Finalmente, como última contribuição para as bases do urbanismo moderno, pode-
se considerar o processo de mecanização do ambiente construído, especificamente nas
tarefas do cotidiano, materializada na mecanização dos fogões, da limpeza ou da
refrigeração.
Tão logo aceita a mecanização do mobiliário, passa-se à mecanização da unidade
habitacional, pois, não havendo mais coerência entre os objetos e os espaços que os abriga,
uma nova relação entre a casa e suas funções é estabelecida. Uma série de diretrizes são
adotadas na definição dos ambientes, em suas dimensões mínimas necessárias para o
habitar, a exemplo do banheiro, que passa a ser definido em função das peças sanitárias, na
rigorosa determinação da área para o seu funcionamento (PEREIRA, 2010).
Como um desdobramento do aspecto anterior, o movimento moderno passa a
determinar os “mínimos funcionais e seus níveis de agregação” (PEREIRA, 2010, p. 238),
ou seja, adota a moradia como célula primeira – nível 1, cujo conjunto mínimo determina o
edifício – nível 2, que, em agrupamento, dá origem ao bairro – nível 3, finalmente
resultando em uma cidade, nível 4 (PEREIRA, 2010). Essa cadeia de elementos permite
estabelecer uma nova metodologia compositiva arquitetônica, a qual, ao mesmo tempo em
que tem o poder de domínio sobre problema, decomposto em mínimos elementos e tendo a
moradia como célula essencial, tem a possibilidade de infinitas soluções.
117
Assim estão colocados os pressupostos da nova arquitetura e, consequentemente, do
novo urbanismo, uma vez que, para abrigar conceitos tão inovadores, para atender as
recentes conquistas humanas, a cidade tradicional não mais se aplica.
A revolução arquitetônica, com a intervenção do vidro, do aço e do concreto
armado, permitiu as soluções necessárias. O uso secular: fundações maciças,
paredes portantes espessas, aberturas de janelas limitadas, solo inteiramente
atravancado, cobertura impossível de ser utilizada, necessidade de repetir
divisões idênticas em todos os andares, é substituída por uma nova técnica:
fundações concentradas, supressão das paredes portantes, possibilidade de dispor
de toda a fachada para iluminação, solo livre entre delgados pilotis, cobertura
constituindo um novo solo para uso dos moradores. (COBUSIER, 1979, p. 28).
Todos estes aspectos são considerados no projeto para a cidade moderna, um
esquema válido em qualquer lugar, uma vez que é concebido para o homem-padrão
(HAROUEL, 1990). Os arquitetos determinam as funções que se desenvolvem na cidade:
habitar, trabalhar, o lazer e, por fim, circular (BENEVOLO, 2009).
Pereira (2010) indica que para cada uma destas funções são aplicados os aspectos
definidores dos padrões de composição arquitetônica, descritos anteriormente, adequando-
os às especificidades encontradas, com uma metodologia que regula as intervenções caso a
caso. Esse método consiste em, primeiramente, estabelecer uma legislação, depois, um
zoneamento setorial e, por fim, um estudo das comunicações, circulações e do tráfego
urbano.
A função de morar ou, mais especificamente, a residência (o local onde se passa o
maior tempo) torna-se o elemento mais importante da cidade e o núcleo do trabalho do
arquiteto. Entretanto, não se pode separá-la das outras funções consideradas
complementares e agrupadas sob uma nova morfologia, as “unidades de habitação”56
.
A casa não se apóia mais sobre paredes, mas sobre pilares (menos de um
milésimo da superfície coberta). Estando as moradias reunidas em altura, sua
concentração, ao mesmo tempo que assegura uma grande densidade de
habitação, ocupa somente uma pequena parte do solo. (COBUSIER, 1979, p.
30).
56
As unidades de habitação configuram edifícios com 50 metros de altura, distantes 150 a 200 metros um do
outro, alojam até 1600 pessoas e ocupam 4 hectares. (CORBUSIER, 1979, p.30).
118
As atividades laborais são classificadas em três tipos: agricultura, indústria e
comércio, e classificadas no mesmo nível de importância e determinam morfologias
urbanas diferenciadas (BENEVOLO, 2009).
Os estabelecimentos humanos são distribuídos sobre o solo. Eles o são mal,
depois deste primeiro ciclo centenário do mecanicismo e essa desordem
conduziu à crise. Os estabelecimentos humanos devem ocupar o solo em lugares
especificamente designados, e sua forma, decorrência de valores intrínsecos, se
organiza em uma autêntica biologia construída [...] para a terra, uma unidade
(nova ou renovada), de exploração agrícola. Ferramenta de produção alimentar.
[...] para a indústria, uma forma que responda especificamente a cidade-linear-
industrial. Ferramenta de fabricação [...] nos cruzamentos das grandes estradas,
as cidades radiocêntricas de trocas poderão ser ou tornar a ser, isolada ou
simultaneamente, os centros de comércio, as cidades do pensamento, as cidades
de administração e de governo. (CORBUSIER, 1979, p. 85).
A liberação do solo, pelas edificações em pilotis, criava espaços livres, apropriados
às atividades recreativas e de lazer, distribuídos ao longo de todo o tecido urbano, na forma
de áreas contínuas. As zonas verdes assumiriam diversas utilizações a depender de sua
localização e dimensionamento; seriam utilizadas para a prática de esportes, como parques
de bairro, da cidade, regionais e até nacionais. Em muitos casos, seriam áreas protegidas no
território ou o elemento de contraponto e equilíbrio com as grandes massas edificadas.
Uma nova biologia do domínio construído aparece. Os órgãos e as funções
necessárias à realização de um dia agradável, útil e propício, se inscrevem nesta
nova forma de habitat. O imóvel se ergue em um parque, que contém os terrenos
de esporte, as creches maternais, as escolas primárias e o clube. Ele se presta a
múltiplas criações coletivas, úteis ou indispensáveis à vida harmoniosa de seus
habitantes. (CORBUSIER, 1979, p. 30).
A última função a se desenvolver na cidade corresponde à circulação e, nesse
sentido, o modelo urbanista moderno elabora toda uma trama de vias – “um sistema
sanguíneo e respiratório” (CORBUSIER, 1979, p. 54) – que se articulam e se distinguem
segundo sua função, tipo de tráfego a suportar e velocidade.
Divididas em oito categorias, as vias são classificadas em: V1 – estrada nacional ou
de província que atravessa o país ou o continente; V2 – via de criação municipal, essencial
de uma aglomeração; V3 – reservada ao tráfego pesado de caminhões; V4 – rua de
comércio setorial; V5 e V6 – vias de penetração no setor indo até as habitações; V7 – via
119
de acesso as zonas verdes e, por conseguinte, as escolas, complexos esportivos, etc; V8 –
ciclovias (CORBUSIER, 1979). Com essa sistematização, o urbanismo moderno pretende
afastar as pessoas dos perigos do tráfego, por meio de percursos exclusivos e impedir a
mistura de veículos, em consonância com os transportes modernos que, por sua vez,
demandam uma ocupação racional do território.
Se, para a arquitetura moderna, o mínimo elemento situa-se na residência, para o
urbanismo, resume-se ao bairro. Tratado como estrutura autossuficiente, o bairro, para ser
caracterizado como tal, precisava atender a pré-requisitos estabelecidos em função do
número de unidades de habitação, que, por sua vez, determinava outros equipamentos:
escolas, hospital, lojas, quadras de esporte, etc.
A unidade menor – cerca de 300-400 moradias, com jardim de infância, as lojas
de primeira necessidade e as áreas de recreação para os jovens e os adultos –
pode-se tornar o mínimo elemento projetável da cidade (isto é, o análogo do
edifício na cidade tradicional); um certo número destas unidades, combinadas
entre si, pode construir uma cidade maior, compreendendo um maior número de
moradias e uma dotação mais ampla de serviços; por exemplo, três unidades
primárias da medida anterior podem formar uma unidade secundária, com cerca
de 1.000-1.200 moradias, três jardins de infância, uma escola primária, um grupo
de lojas mais completo e uma área mais extensa para o esporte e a recreação.
(BENEVOLO, 2009, p. 644).
Essa lógica projetual buscava alcançar uma “estrutura urbana coerente cujo
funcionamento seja similar ao de uma máquina e que, ao mesmo tempo, contenha os
atributos do organismo biológico” (PEREIRA, 2010, p.249). Esse urbanismo científico,
fechado, onde o arquiteto tem total domínio de seu desenho, na definição de todos os
elementos compositivos, direciona-se para a idealização das grandes metrópoles, de 2 ou 3
milhões de habitantes57
e ganha força através da convergência de ideias no trabalho
individual e coletivo, em especial, na obra de Le Corbusier e da Escola Bauhaus,
respectivamente.
Tendo-se identificado como o estilo internacional, o urbanismo moderno é
praticamente aceito em todas as partes do mundo. Seu repertório, desvinculado da
arquitetura do passado, pelo fascínio tecnológico e dos novos materiais, permite a
formulação de regras gerais que podem ser adotadas em qualquer lugar. Nesse sentido,
57
Ludwig Hilberseimer projeta a Gross Stadt e Le Corbusier propõe a VilleRadieuse, ambas cidades de alta
tecnologia, composta de inúmeros arranha-céus .
120
cabe destacar alguns projetos, executados ou não, que seguiram as diretrizes da vanguarda
modernista: por Le Corbusier, o PlanVoisin, de 1925, para Paris (Fig. 08); o Plano Maciá,
de 1932, para Barcelona; as intervenções pós-Segunda Guerra Mundial, em Chandigarh,
Islamabad e Dhaka; por Lúcio Costa e Oscar Niemeyer, o projeto e execução de Brasília
(Fig. 09); pelo grupo MARS58
, em 1942, o plano para modernização de Londres.
Segundo Pereira (2010), a Segunda Guerra Mundial significou um ponto de ruptura
no movimento da arquitetura moderna, que, em médio prazo, trouxe consequências para
sua revisão e difusão.
Figura 18 - Plan Voisin, Paris – Le Corbusier.
Fonte: www.publising.cdlib.org. Acesso em 09/05/2013.
Figura 19 - Plano Piloto de Brasília – Lúcio Costa.
Fonte: www.revistaescola.abril.com. Acesso em 09/05/2013.
58
Modern Architecture Research Society.
121
Os processos de reconstrução e desenvolvimento próprios do pós-guerra
produzem uma enorme expansão prática da arquitetura vinculada ao Movimento
Moderno, mas com um duplo sentido, ou seja, ao mesmo tempo o esplendor e a
banalização de seus ideais arquitetônicos. (PEREIRA, 2010, p.273).
Como bem salienta Bruno Zevi, os primeiros questionamentos ao Movimento
Moderno surgiram na Europa do pós-Segunda Guerra Mundial, mais especificamente,
quando o plano do grupo MARS para o centro de Londres foi recusado, em favor do plano
de Abercrombie e Forshaw, em 1942. Apesar destes terem apresentado um projeto ainda
dentro das exigências das novas tecnologias, os automóveis e os aeroplanos, consideraram
a variedade, a intimidade e a harmonia, necessários a uma “pequena máquina de modelo
antigo”(ZEVI, 1970, p. 319), o homem.
Timidamente foi surgindo uma nova sensibilidade, antimaquinista e com restrições
ao progresso tecnológico, expressa de forma diferente em termos geográficos: nos países
industrializados, as críticas partiam no sentido de uma preocupação com questões
energéticas, enquanto que nos países em desenvolvimento pregava-se uma arquitetura
menos dependente de tecnologia, mais adaptada ao clima (MARQUES; LOUREIRO,
2005). Essas críticas surgiram no final dos anos 50 e vão se consolidar por toda década
seguinte, principalmente nos Estados Unidos e na Itália, nos trabalhos de Kevin Lynch59
,
Jane Jacobs60
e Aldo Rossi61
.
Assim, em meados dos anos sessenta uma série de pontos críticos da arquitetura
e do urbanismo modernos já estavam arrolados por estes diversos autores: no
plano do urbanismo, o zoneamento funcional; na arquitetura, o anti-historicismo,
o relativo desprezo pelo entorno pré-existente, a excessiva standardização que
impede o reconhecimento da especificidade do lugar [...]. (MARQUES;
LOUREIRO, 2005, p.4).
Desde então, progressivamente, tem-se formado uma corrente de pensamento
antimodernista, centrada na confirmação da falência desse movimento, pelo que prometeu
e não cumpriu.
Não aprofundando nos debates de cunho mais filosófico, que destacam aspectos
ligados aos ideais modernistas, o que se pretende focar adiante é o trabalho dos próprios
59
LYNCH, K. Aimagem da Cidade. Lisboa: Edições 70, 1990/1960. 60
JACOBS, J. The Death and Life of Great American Cities. New York: The Modern Library, 1993/1961. 61
ROSSI, A. La Arquitetura de laCiudad. Barcelona: Gustavo Gili, 1981/1966.
122
arquitetos, zelosos em encontrar novas práticas, “novas orientações para a investigação
projetual” (MARQUES; LOUREIRO, 2005, p.5).
A crise do movimento moderno evidencia o abandono de um certo ideal ético62
,
substituído por um ideal estético, traduzido numa liberdade de linguagens, carente de
conteúdos, na primazia por uma plástica figurativa e pluralista e que vai caracterizar as
décadas de 70 e 80 (PEREIRA, 2010).
Na busca por novos padrões, são muitas as possibilidades em função dos novos
materiais e sistemas estruturais, a tecnologia é elevada ao extremo, tanto no uso, quanto na
aparência, transposta ao patamar de solução plástica, materializada na arquitetura high-tech
(Fig. 10). Deve responder aos avanços da técnica contemporânea, de uma nova era baseada
no dinamismo, no movimento e na instabilidade (PEREIRA, 2010). Como exemplo de
seguidores dessa linguagem, merece destaque o trabalho de Renzo Piano, Richard Rogers e
do grupo britânico Archigram.
Figura 20 - Centro Pompidou, Paris – Renzo Piano e Richard Rogers. Autor: Galeria Anapinatelier.
Fonte: www.flickr.com. Acesso em 07/05/2013.
Um grupo de arquitetos da vanguarda italiana, liderados por Aldo Rossi, propõe
uma arquitetura do essencial, onde a “forma é um elemento comprometedor que deve se
62
Na base conceitual do movimento moderno está presente uma preocupação com a solução da moradia
popular nos grandes centros. (PEREIRA, 2010, p. 272).
123
manifestar da maneira mais simples possível, a redução das formas, à manifestação
mínima” (PEREIRA, 2010, p. 289). Dessa proposta surgem projetos de linhas simples,
duras e vigorosas (Fig. 11).
Figura 21 - Museu do Mar de Galicia - Espanha – Aldo Rossi/César Portela. Autor: Galeria
Anapinatelier.
Fonte: www.flickr.com. Acesso em 07/05/2013.
Em Bruxelas, o grupo de La Cambre toma o caminho oposto ao grupo italiano,
valorizando a forma, em suas inúmeras possibilidades de construir e inventar. Assim,
buscam um resgate histórico clássico, de onde podem extrair elementos formais que são
reutilizados e reinterpretados de modo eclético (PEREIRA, 2010) (Fig. 12).
Figura 22 - Teatro Nacional da Catalunha – Ricardo Bofil. Autor: KatjaVitskaja.
Fonte: www.lyuve.com. Acesso em 07/05/2013.
124
Merece destaque ainda a linguagem descontrutivista, que marcou a obra de
diversos arquitetos na década de 80, como uma proposta antagônica a ideia de
composição arquitetônica. Nesse sentido, propõe um processo composto por
fragmentar, combinar e reagrupar a forma, livre de conotações, versátil em seus
significados, espaços não-hierarquizados (PEREIRA, 2010). Os novos princípios levam
a concepções que abandonam os eixos, as proporções e a simetria, fundamentos
evidentes no Parque de La Villette de Paris (1984-1991) (Fig. 11).
Figura 23 - Parque La Villete, Paris – Bernard Tschumi. Autor: KatjaVitskaja.
Fonte: www.lyuve.com. Acesso em 07/05/2013.
Ao final da década de 80, são muitos os modelos e a arquitetura começa a ser
entendida mais como comunicação e desenho, onde parece caber e valer tudo. Esse
contexto colabora para a percepção de uma fragilidade como base desse movimento
contemporâneo.
Assim, nos referindo ao urbanismo frágil – como foi chamado – é evidente que
há algo de perverso em nossa contemporaneidade, quando os urbanistas mais
inteligentes e capazes estão mais preocupados com o desenho das lixeiras do
que com o preço do solo, e quando a opinião pública esclarecida se preocupa
mais com a forma dos semáforos do que com a política de transportes.
(PEREIRA, 2010, p. 293).
125
Definir os elementos que caracterizam a arquitetura e o urbanismo contemporâneos
representa uma tarefa difícil, uma vez que se trata do presente, ou, no máximo, de um
passado muito recente, onde as “certezas” ainda estão por se construir. A atualidade
representa o momento das constantes transformações, do tempo fugaz, dos modismos, da
globalização homogeneizadora em constante embate contra a resistência das tradições, das
identidades locais.
De uma forma geral, o que se pôde observar nas últimas décadas, no campo da
arquitetura, foi um certo experimentalismo, em uma crítica ao modernismo, centrado na
plástica das construções. Em termos de urbanismo, pouco se avançou numa teoria ou
processos metodológicos que pudessem propor uma nova urbanidade e a cidade
contemporânea tornou-se o palco das contradições, de um mundo dividido entre a
concentração e a dispersão, em seu mais amplo sentido.
Essa dialética pode ser observada sob diferentes aspectos: seja na reafirmação da
necessidade de se firmarem os centros históricos como o coração da cidade ou o
multicentrismo como política de democratização espacial; a verticalização e o
adensamento para otimizar a infraestrutura ou a suburbanização como modelo de acesso ao
solo das classes mais desfavorecidas; enfim, viver na cidade, com todas as facilidades
modernas, ou no campo, e usufruir das benesses que o contato com a natureza pode
oferecer.
De um modo ou de outro, a contemporaneidade lança o desafio aos profissionais do
urbanismo, aos que fazem do território da arquitetura uma atividade capaz de permitir
continuar sua identificação com o homem e fazer da cidade o espaço, síntese e limite, das
boas relações.
No Brasil, o movimento moderno da arquitetura e do urbanismo ficou vulnerável
aos regimes políticos, e, até os anos 80, pouco foi criticado, em grande parte pelo sucesso
mundial de Brasília. Com o advento da ditadura e do milagre econômico, a política
habitacional do BNH direcionou o foco para a crença no grande planejamento.
Os projetos dos conjuntos habitacionais na periferia das grandes cidades visavam à
erradicação da informalidade das construções dos centros urbanos, atendendo a grande
demanda por moradias, adotando a tipologia consagrada dos conjuntos de apartamentos,
livremente inspirados nas superquadras da nova capital federal. Essa linguagem
arquitetônica/urbanística aos poucos foi deixando transparecer uma série de dificuldades –
126
ausência de privacidade, monotonia plástica, problemas de ventilação e iluminação,
aumento de marginalização em áreas remanescentes, etc. – que, assim apontadas,
identificam as fragilidades do modelo de cidade moderna.
É só a partir da década de 80 que surgem os primeiros questionamentos por uma
atitude mais realista, fruto das reivindicações de movimentos sociais pela permanência da
população em locais de invasão e favelas. Essa postura, reforçada pela retomada da
democracia, vem marcada pela criação de novos instrumentos de legislação urbana, a
exemplo da Zona Especial de Interesse Social63
(ZEIS), que adere às aspirações populares.
Desloca-se então, de certa forma, o âmbito da atuação do arquiteto: “de pedagogo, ele
passa a aprendiz, ou antes, adepto, da própria pedagogia que pretende aprender, com o
aluno – o povo ensina arquitetura” (MARQUES; LOUREIRO, 2005, p.9).
As ambiguidades da cidade contemporânea, fruto de décadas de contradições,
materializam um lugar fragmentado sob diversos aspectos, principalmente nos países em
desenvolvimento, como o Brasil. No campo social, espacial, econômico ou de
infraestrutura, os dilemas formam um panorama complexo, no embate de interesses e
necessidades entre diversos atores.
Os grandes centros urbanos enfrentam, hoje, o desafio de elevar a qualidade de vida
e diminuir as desigualdades nas próximas décadas, passos fundamentais para se alcançar as
bases de uma sociedade lançada ao propósito da sustentabilidade. É amparado nesse
diagnóstico dos entraves e oportunidades da cidade contemporânea que o próximo tópico
será desenvolvido.
2.2 – A (In)Sustentabilidade Urbana e o Planejamento Ambiental
O cenário urbano das principais cidades brasileiras, dentre outros aspectos,
caracteriza-se por um acelerado processo de descaracterização de suas paisagens
singulares, onde se podem destacar: excessiva verticalização; segregação social e
63
Originalmente implantadas pelo Plano Diretor de Recife, na década de 80, as ZEIS são áreas de
assentamentos habitacionais de população de baixa renda, surgidos espontaneamente, existentes,
consolidados ou propostos pelo Poder Público, onde haja possibilidade de urbanização e regularização
fundiária. Disponível em www.recife.pe.gov.br/pr/leis/luos/soloZEIS.html (Acesso em 12/06/2013).
127
isolamento em condomínios residenciais; intensificação do tráfego de veículos individuais;
descaso do poder público com as áreas públicas (CASTILHO, 2012).
Essas práticas urbanas, na verdade, vem acontecendo desde sua formação histórica,
apenas com a variante (agravamento) de novos elementos fruto dos avanços tecnológicos
que, somados, consolidam o atual quadro de fragmentação urbana das cidades brasileiras.
Nesse sentido, a insustentabilidade do espaço citadino é algo histórico, que
visivelmente teve início no século XIX (nas cidades industriais), quando as políticas
públicas urbanas, ao privilegiarem o crescimento sem limites, desconsideraram as
populações e os espaços naturais das cidades. Esse processo só vai sofrer alguma
modificação nas últimas décadas desse mesmo século, quando as classes mais abastadas
passaram a sentir os efeitos negativos dessa lógica, entretanto, as intervenções urbanísticas
foram pontuais (de caráter higienista) e não penetraram na complexidade da problemática
ambiental (CASTILHO, 2012).
Ao longo do século XX os problemas urbanos evoluíram ao ponto da complexidade
desse quadro exigir agora o repensar de soluções sob o lastro de práticas baseadas na
interdisciplinaridade. Com isso, alguns aspectos podem ser destacados na reflexão de
mudanças concretas: em primeiro lugar é preciso valorizar as ideias alicerçadas na
democracia, no livre debate, no fortalecimento de projetos políticos “atrelados às
necessidades vitais dos homens lentos” (CASTILHO, 2012, p. 191).
Pessoas que também almejam mundos diferentes, nos e a partir dos quais
consigam participar efetivamente do processo de construção dos seus ambientes
vividos, usufruindo dos benefícios promovidos por essa participação, para o que,
aliás, a apropriação e organização de ambientes condizentes às suas reais
necessidade e liberdade constituem práticas de suma importância. (CASTILHO,
2012, p. 191).
Outro aspecto a ser considerado reside na consolidação da ideia de justiça
socioambiental, que remete não apenas a redistribuição de recursos, mas ao uso dos
espaços urbanos por todos os citadinos, partilhando responsabilidades na preservação dos
recursos naturais e, em consequência, estabelecer democraticamente o local da “tomada de
decisão ambiental” (CASTILHO, 2012, p. 191).
Essa perspectiva interdisciplinar exige também uma abordagem dos problemas
ambientais urbanos sob a ótica das diversas escalas em que ocorrem: local, regional,
128
nacional, continental e global. Com isso, descarta-se a lógica simplificadora globalizante, e
as ações de política ambiental concorrem, para o fortalecimento das singularidades e
promoção da igualdade e justiça ambiental.
Por fim, o mundo real, onde se materializam os problemas ambientais, é múltiplo,
complexo e não admite fronteiras estanques. Assim, a interdisciplinaridade sinaliza o
esforço que deverá sustentar a interação entre os diversos saberes da ciência, no âmbito da
pesquisa teórica e empírica e sua aplicação prática no ambiente construído urbano,
respeitando toda sua história de formação e o ser humano nele inserido (CASTILHO,
2012).
Nesse sentido, a sustentabilidade urbana requer, por assim dizer, basicamente duas
frentes de ação: uma primeira centrada no espaço, nos condicionantes ambientais que
assegurem salubridade, segurança, ambientes saudáveis. A segunda voltada ao homem,
como ser histórico, cultural, com seu cotidiano construído no lugar (CASTILHO, 2012).
Apostando nessa consciência humana, nos anos oitenta surgiu um novo tipo de
planejamento dos espaços urbanos, embasado nas possibilidades reais dos ecossistemas
que davam suporte às cidades, o Planejamento Ambiental.
Atualmente entende-se por Planejamento Ambiental o planejamento das ações
humanas (da antropização) no território, levando em conta a capacidade de
sustentação dos ecossistemas a nível local e regional, sem perder de vista as
questões de equilíbrio das escalas maiores, tais como a continental e a planetária,
visando a melhora da qualidade de vida humana, dentro de uma ética ecológica.
(FRANCO, 2001, p. 37).
O Planejamento Ambiental tem por objetivo principal a obtenção do
desenvolvimento sustentável da espécie humana e toda sua obra (as cidades por
excelência), dentro do conceito de economia de longo prazo e, assim, garantir a existência
de civilizações futuras (FRANCO, 2001).
Entretanto, tomando por base a realidade brasileira, pode-se destacar limitações na
elaboração de um Planejamento Ambiental: primeiramente, a cidade reflete a sociedade
que a constrói, ou seja, em um ambiente desigual, autoritário, de privilégios para poucos e
arbitrariedade, o espaço vai reproduzir essas relações; em segundo lugar, vale salientar a
questão referente à lógica burocrática da máquina pública administrativa, centrada numa
129
confusão entre esferas (pública e privada), com um afastamento entre o discurso e a
prática; destaca-se também, as dificuldades (corrupção, desaparelhamento da máquina
administrativa, baixo salários dos fiscais) entre a lei (urbanística e ambiental) e sua
implementação (MARICATO, 2001).
Comumente, o que se observa, é uma preponderância dos projetos, que visam à
sustentabilidade urbana, que dão maior ênfase aos aspectos espaciais. Evidentemente que
as variáveis sociais, por seu caráter de grande subjetividade, demandam um maior esforço
dos poderes públicos promotores em mobilizar equipes interdisciplinares, que ao não
prescindirem dos saberes populares, no diálogo democrático, poderão construir ambientes
urbanos mais humanos e, por conseguinte, sustentáveis.
No aprofundamento do debate destas questões, fica cada vez mais evidente que o
caminho para a sustentabilidade urbana passa por uma abordagem múltipla, complexa, “no
convívio com o paradoxo entre desenvolver e conservar” (FRANCO, 2001, p. 42).
Detendo-se no âmbito social, a sustentabilidade cada vez mais se desloca para um
sentido de qualidade de vida64
, resultando daí uma ambiguidade. Por um lado, esse estilo
almejado centra-se numa confiança exacerbada na tecnologia em resolver os problemas
ambientais, e, consequentemente, uma liberação das limitações de consumo, numa relação
direta entre padrões materiais e uma provável boa qualidade de vida. Por outro lado, o
pensamento apontado como “neo-romântico” direciona o entendimento de alto nível de
vida através de uma mudança de valores, calcada num “freio” do desenvolvimento
tecnocientífico, numa reconciliação do homem com modelos do passado (FRANCO,
2001).
No cerne dessa discussão, é preciso afastar-se dos pensamentos e soluções
extremas, ou seja, a qualidade de vida exige pré-requisitos de um e outro pensamentos. O
sentido do viver bem engloba a satisfação de necessidades básicas, uma distribuição
igualitária de bens materiais, mas também de liberdade, de valores essenciais, morais e
éticos, para a salvaguarda do convívio harmonioso.
Sob a ótica espacial, muito da insustentabilidade urbana é provocada pela “perda da
importância do município”, uma fragmentação territorial onde ocorre a preponderância de
64
O grau de prazer, satisfação e realizações alcançadas por um indivíduo no seu processo de vida.
(MARICATO, 2001, p. 43).
130
certos centros em detrimento de outros, dificultando uma distribuição mais racional dos
serviços estaduais, nesse sentido, uma possibilidade seria a criação de “Regiões
Administrativas”, uma unidade territorial intermediária entre o Estado e o município
(FRANCO, 2001), instância já preconizada em alguns planos, a exemplo da Agenda 21,
como poderá ser visto ao final desse capítulo.
Para muitos pesquisadores, a exemplo de Eugene P. Odum65
e Salvador Rueda66
, a
cidade comporta-se como um ecossistema67
, e é desse entendimento, do funcionamento
desses organismos que se pode entender as trocas de materiais e energia que os ambientes
urbanos executam, a interação e dependência com outros sistemas (cidades), numa malha
extensa de atividades orgânicas e dinâmicas que garantem a sua sobrevivência. Dessa
concepção de base ecológica e do sentido de Regiões Administrativas surge a proposta de
“redes urbanas”68
,
Esse conceito adota a ideia de região como base espacial essencial para a
sustentabilidade, conectadas e trabalhando para um funcionamento mútuo, em harmonia
com o suporte físico natural (reservas florestais e hídricas), com respeito às diferenças,
através de um processo de Planejamento Ambiental. Assim sendo, “a crise urbana e a crise
do planejamento urbano abrem espaço para novas propostas, criando espaço para uma
gestão social e ambiental” (MARICATO, 2001, p. 69).
Dentro dessa perspectiva, vale salientar que, nas últimas décadas, vem ganhando
força um novo modelo de urbanismo, o qual tenta romper com as bases formais da cidade
“tradicional”. Na tentativa de ultrapassar a maioria dos problemas urbanos, comuns aos
grandes centros, esse desenho vem apoiado numa série de pressupostos que estruturam e
definem características sustentáveis ao lugar, tais como: população limitada, ocupação
compacta, tecnologias inovadoras, dentre outras. É no desdobramento desses aspectos que
o item a seguir se detém.
65
ODUM, E. P. Ecologia. Rio de Janeiro: Guanabara, 1988. 66
RUEDA, S. El Ecossistema Urbano y los mecanismos reguladores de lasvariablesautogenerativas. In.
Ciudad y Teritorio – EstudiosTerritoriales, v. II. Madrid: Ministerio de Obras Publicas, 1992. 67
Uma comunidade de organismos vivos, onde predomina o homem, um meio físico que vai se
transformando, fruto da atividade interna, e um funcionamento à base de trocas de metéria, energia e
informação. (FRANCO, 2001, p. 57). 68
Territorialidade regional que gera nos sistemas locais inter-relações dinâmicas que aumentam a
criatividade global [...] um espaço de comunicações para a integração de know-how e produção cultural.
(FRANCO, 2001, p. 78).
131
2.3 – Assentamentos Urbanos Sustentáveis
A partir dos anos 90, na Europa, cresceu um movimento contra o urbanismo
tradicional, tipicamente marcado por uma suburbanização extensiva, que na maioria dos
casos, comprometia terras agriculturáveis ou áreas ambientais protegidas, além de se
basear no transporte individual. Já o “novo urbanismo” tinha por base o conceito de
desenho urbano da cidade compacta, para pedestres, redução do uso do automóvel e uma
hierarquia entre arquitetura pública, privada e espaços livres, com prevalência do último
sob os demais (ANDRADE, 2009).
Além dessas diretrizes formais, que interferem diretamente no desenho, aspectos
ecológicos assumiram um papel preponderante na definição dos espaços, em conjunto com
novas tecnologias baseadas na economia de energia, na reciclagem, na redução do uso de
combustíveis fósseis, no uso racional de materiais, o que se vem caracterizando como um
urbanismo sustentável.
As propostas para a cidade sustentável giram basicamente em torno de alguns
pressupostos comuns, que se repetem em maior ou menor grau, como princípios de
organização espacial direcionados ao entendimento da ideia de sistema, autossuficiência e
de interdependência. Nesse sentido, vale ressaltar alguns aspectos: primeiramente,
trabalha-se na limitação do número de membros, numa capacidade máxima de sustentação
dos padrões de vida, que são comprometidos em assentamentos muito populosos pois
demandam um enorme consumo de energia e produzem resíduos em uma escala difícil de
se controlar e reciclar.
Em segundo lugar, é adotado o conceito geral de cidade compacta, com hierarquia
de densidades e diversidade do uso do solo dentro dos bairros, criando, consequentemente,
novas centralidades. Assim, busca-se construir localidades autossuficientes, diminuindo a
dependência do transporte motorizado, otimizando a infraestrutura e um maior equilíbrio
entre setores habitacionais e de trabalho, contribuindo para a diversidade social. Entretanto,
vale salientar que o grau de compacidade adequada varia para cada cidade e deve ser
determinado tendo como parâmetros o clima do lugar e, também, vir acompanhado de
outras estratégias compensatórias, como o aproveitamento das águas das chuvas,
agricultura urbana, arborização intensa de ruas, praças e coberturas verdes nas construções,
por exemplo (ANDRADE, 2009).
132
Em terceiro lugar, outro aspecto presente nos diversos modelos de urbanismo
sustentável, consiste na ideia de sistema, ou uma rede de interdependência nas diversas
escalas dos assentamentos humanos, indo desde os bairros até as cidades e regiões. Esses
aglomerados urbanos buscam romper conceitos tradicionais e tendem a uma visão da
cidade como um ecossistema Trata-se da incorporação de princípios da ecologia na
formulação das comunidades humanas, dentro de uma visão de equilíbrio dinâmico
(ANDRADE, 2009).
Em quarto lugar, merece destaque a busca e o uso intensivo por novas tecnologias
que priorizam aspectos como: o uso de energia de fontes renováveis; reuso e reciclagem de
materiais; gestão dos resíduos e processos de produção limpa dentro dos campos
industriais; áreas agriculturáveis com cultivo de alimentos por técnicas que não utilizam
agrotóxicos.
Em quinto lugar, as novas propostas de desenho urbano vêm acompanhadas por
um conjunto de políticas públicas de incentivo ao uso de tecnologias sustentáveis,
preservação de conjuntos e monumentos arquitetônicos de interesse histórico e cultural,
recuperação de áreas urbanas degradadas (em grande parte os centros históricos) com o
reaproveitamento de infraestrutura consolidada (ANDRADE, 2009).
Por fim, como um desdobramento das políticas mais abrangentes, são propostas
posturas urbanas no âmbito da escala local, na definição de tipologias arquitetônicas com o
intuito de atrair populações com características e necessidades semelhantes, como por
exemplo, reunir nas zonas centrais moradias sem automóveis voltadas para pessoas que
não se utilizam do mesmo (ANDRADE, 2009).
Esse conjunto de diretrizes são estruturantes do urbanismo sustentável e aparecem
nos novos conceitos das ecovilas69
, ecocidades70
ou cidades compactas71
. Depositam no
processo de desenho uma responsabilidade estratégica para “proporcionar assentamentos
humanos economicamente viáveis, em equilíbrio com a natureza e lugares agradáveis para
se viver” (ANDRADE, 2009, p. 392).
69
Nova forma de desenvolver padrões de vida, a partir dos padrões da natureza, sendo utilizadas por
comunidades que vivem de maneira sustentável, geralmente encontradas no âmbito rural em conjuntos de
moradias de pequeno número (ANDRADE, 2009, p. 377). 70
Conjunto de bairros para pedestres com pequenos centros comerciais de vizinhança ligados por ciclovias,
com percursos de longa cobertos por transporte público eficiente, com áreas verdes e rios recuperados
(REGISTER, 2002, p. 142). 71
Cidade com diversidade de usos otimizando o espaço e a infraestrutura urbana (RUEDA, 2000, p. 99).
133
Trata-se de um enorme desafio que se apresenta para os profissionais da arquitetura
e do urbanismo. Repensar a cidade, nos princípios da sustentabilidade ambiental, exige
uma estrutura de planejamento que perpassa por diversos níveis e instâncias que compõem
o espaço urbano e que se desdobram em ações no campo público e privado.
Nesse sentido, o próximo tópico destaca os aspectos preponderantes dessa questão,
ou seja, as políticas ambientais que interferem na conformação dos assentamentos
humanos urbanos no país e que, de alguma forma, atuam diretamente na sustentabilidade
da construção.
2.4 – As Políticas Ambientais Urbanas no Brasil
As cidades, de uma forma geral, vêm se configurando, nas últimas décadas, como
o espaço das contradições. Ao mesmo tempo em que exercem um grande fascínio pela
possibilidade de acesso a bens materiais e serviços de melhoria das condições de vida,
revela-se como o palco das desigualdades, do caos e vetor principal da degradação
ambiental.
Grande parte dos problemas urbanos, em especial das cidades brasileiras, deve-se
ao rápido crescimento da população, resultando na periferização ou ocupação de áreas
impróprias, pois, até recentemente, não havia controle de para onde e de que forma
crescer. No Brasil, aconteceu um gigantesco processo de construção da cidade72
,
ocasionando uma enorme demanda por novas moradias, trabalho, abastecimento,
transporte, saúde, energia, água, etc. Hoje, mais de 150 milhões de brasileiros vivem nas
zonas urbanas (IBGE, 2010).
As primeiras iniciativas de se criar uma política urbana no país remontam a década
de 1960, quando ocorreu um aumento do número de elaboração de Planos Diretores para
melhor planejar a cidade. Entretanto, nessa época, ainda não havia uma normatização que,
de certa maneira, pudesse servir de referência, tornando-os mais eficientes. Assim, foram
produzidos documentos segmentados, que tratavam de problemas isolados na forma de
Plano Diretor da Saúde, Plano Diretor de Transporte, entre outros (RIBEIRO, 2009). Com
72 Entre 1940 e 2005, houve um crescimento da população urbana na ordem de 1.102,2% (RIBEIRO, 2009,
p. 63).
134
isso, os planos não surtiram o efeito desejado, pois não dialogavam entre si, tornando-se
documentos inúteis frente à realidade complexa dos problemas urbanos.
Em 1973, foi criado o II Plano Nacional de Desenvolvimento do Brasil73
, que
continha um capítulo intitulado “Desenvolvimento Urbano: Controle da Poluição e
Preservação do Meio Ambiente”. O próprio título já demonstrava como o assunto seria
tratado, ou seja, separando os aspectos urbanísticos dos problemas ambientais, desse modo,
apresentaram-se diretrizes que focavam, principalmente, na proposição de uma
descentralização para diminuir a força atrativa das Regiões Metropolitanas e, assim, tornar
o quadro urbano brasileiro, que ora se formava, mais equilibrado74
.
Todavia, o desdobramento dessas diretrizes em estratégias específicas para as
diversas regiões do país deixa transparecer uma preocupação baseada em apenas dois
aspectos: primeiramente, volta-se à ordenação e disciplinamento da ocupação urbana e
rural, na forma de uma regulamentação do uso do solo; em segundo lugar, priorizam-se
aspectos de incentivo às atividades produtivas para a promoção de uma base econômica
durável que sustente essas regiões.
Dessa forma, as proposições contidas nesse documento terminaram por reforçar a
importância dos principais centros urbanos e contribuíram para o fenômeno da
metropolização, como pôde ser observado nas décadas seguintes. A partir do II PND, uma
série de projetos e leis federais são formuladas, mas de pouca eficácia, merecendo destaque
apenas a Lei 6.766 de 197975
, que trata tão somente do parcelamento do solo urbano e não
do conjunto da cidade.
A temática da qualidade do meio ambiente tomou grande impulso a partir da
década de 70, principalmente pelo crescimento do parque industrial brasileiro e o aumento
dos alarmes em torno da poluição do ar, em especial nos grandes centros metropolitanos. É
nesse contexto que se estruturaram no Brasil os primeiros órgãos e leis, que passaram a
tratar de uma política federal de meio ambiente, a exemplo da Secretaria Especial de Meio
Ambiente – SEMA, criada no ano de 1972 (BURSZTYN; BURSZTYN, 2012).
73
Lançado no final de 1974 o II PND, com vigência entre 1975 a 1979, visava superar os desequilíbrios
econômicos entre setores e regiões do país. Disponível em www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/1970-1979,
acesso em 24/05/2003. 74
II PND, 1974, p. 66. Disponível em www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/1970-1979, acesso em 24/05/2003. 75
Lei 6.766/1979. Disponível em www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l6766.htm, acesso em 24/05/2013.
135
A SEMA foi a responsável pelo delineamento de um marco legal que serviu de base
das políticas ambientais do País, apoiando a criação de órgãos estaduais de meio ambiente.
A partir de 1976, em conjunto com o Ministério do Interior, ao qual estava subordinada,
iniciou um processo de elaboração de um marco legal mais abrangente e descentralizado,
antecipando uma tendência para tratamento dos problemas de meio ambiente no âmbito
local, onde eles aconteciam (BURSZTYN; BURSZTYN, 2012).
Assim, em 1981, foi criada a Política Nacional de Meio Ambiente – PNMA, Lei
6.938, que, até hoje, é o mais importante marco legal ambiental brasileiro (BURSZTYN;
BURSZTYN, 2012). A PNMA é responsável pelo Sistema Nacional de Meio Ambiente –
Sisnama76
e pelo Conselho Nacional de Meio Ambiente – Conama77
, tendo em sua
constituição uma série de instrumentos para sua operacionalização78
. Da PNMA serão
mostrados resumidamente, a seguir, apenas aqueles mecanismos que, de uma forma ou de
outra, mais incidem na organização do espaço urbano.
Primeiramente, os Padrões de Qualidade Ambiental são um instrumento preventivo
de controle da poluição, subdivididos em “padrões de emissão, que indica[m] os valores
máximos permitidos para o lançamento de poluentes, e os padrões de qualidade, que
indicam as condições de normalidade dos meios receptores” (BURSZTYN; BURSZTYN,
2012, p. 477), sendo os últimos apresentados como: padrões de qualidade da água; padrões
de qualidade do ar; padrões de qualidade dos ruídos e do solo.
Em segundo lugar, estabelecem-se o Zoneamento Ambiental, a Avaliação de
Impactos Ambientais e o Licenciamento Ambiental, com o objetivo de determinar critérios
76
Responsável pela proteção e melhoria da qualidade ambiental, é constituído por órgãos dos três níveis de
governo assim estruturados: Órgão Superior – Conselho de Governo; Órgão Consultivo e Deliberativo –
Conama; Órgão Cental – Ministério do Meio Ambiente; Órgão Executor – Instituto Brasileiro de Meio
Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis, Ibama, e Instituto Chico Mendes de Conservação da
Biodiversidade; Órgão Seccionais – entidades estaduais responsáveis pela execução de programas e
projetos; Órgãos Locais – entidades municipais responsáveis pelo controle e fiscalização dessas atividades.
Disponível em www.mma.gov.br/port/conama/estr1.cfm, acesso em 02/06/2013. 77
Órgão consultivo e deliberativo do Sisnama, representativo de cinco setores: órgão federais, estaduais e
municipais, setor empresarial e sociedade civil. Dentre outras, tem as seguintes competências: estabelecer
normas e critérios para o licenciamento de atividades efetiva ou potencialmente poluidoras; estabelecer
normas, critérios e padrões relativos ao controle e à manutenção da qualidade do meio ambiente;
estabelecer os critérios técnicos para a declaração de áreas críticas, saturadas ou em vias de saturação; etc.
Disponível em www.mma.gov.br/port/conama/estr.cfm, acesso em 02/06/2013. 78
Art. 9º. Da Lei 9.938/81. Disponível em www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l6938.htm, acesso em
02/03/2013.
136
para orientar atividades diversas, de urbanização inclusive, no sentido de auxiliar decisões
públicas e privadas no uso e ocupação do solo e no desenvolvimento econômico e social79
.
A PNMA representa um sistema legal que envolve os três níveis da federação, de
forma mais integrada. Depois da Constituição Federal, é a norma mais relevante que incide
sobre as questões ambientais e, consequentemente, influencia as demais políticas públicas,
incluídas ai as ligadas ao espaço urbano.
A década de 80 consolida o aprofundamento do marco legal urbano das
competências político-administrativas do Brasil, principalmente na esfera municipal
(BURSZTYN; BURSZTYN, 2012). Esse quadro é fortalecido com a publicação da
Constituição de 1988, mais especificamente nos artigos 182 e 183, a qual criou a
obrigatoriedade da elaboração de Planos Diretores para cidades com mais de 20 mil
habitantes, tratada agora como instrumento básico da política de desenvolvimento e de
expansão urbana80
, tornando o município “ente autônomo da federação, podendo legislar,
de modo suplementar, sobre a política ambiental, em especial nas questões de interesse
local” (BURSZTYN; BURSZTYN, 2012, p. 544).
Antes de se aprofundar na legislação urbana federal propriamente dita, cabe, aqui,
um breve parênteses para a discussão de duas leis que, de alguma forma, limitam e
interferem na ocupação das cidades por apresentarem diretrizes de gestão e de zoneamento
urbano ambiental, são elas: o Código Florestal e a Resolução do Conselho Nacional de
Meio Ambiente (Resoluções números 302/2002, 303/2002/, 369/2006 e 412/2009).
Primeiramente, o Código Florestal, que foi aprovado pelo Decreto 23.739/1934,
além de estabelecer as florestas brasileiras como um bem de interesse comum nacional,
classificou-as em quatro categorias: florestas protetoras – para conservar, de alguma
forma, recursos naturais, salubridade pública, belezas naturais e espécies raras; florestas
remanescentes – constituindo parques nacionais, estaduais e municipais; florestas modelo
– plantadas para fins comerciais e constituídas de uma única espécie; florestas de
rendimento – sujeitas à exploração comercial (BURSZTYN; BURSZTYN, 2012).
Apesar do apelo conservacionista, o Código não foi capaz de inibir o processo de
degradação das florestas, principalmente as situadas nas regiões mais adensadas do Brasil
79
Os três instrumentos serão melhor detalhados posteriormente como ferramentas auxiliares no desenho
urbano sustentável. 80
Constituição Federal de 1988. Disponível em www.senado.gov.br, acesso em 27/05/2013.
137
(BURSZTYN, 2012). Em 1965, foi aprovado um novo Código Florestal (Lei 4.771) onde,
dentre outras diretrizes, cabe destacar a criação da área de preservação permanente81
e a
reserva legal82
.
O Código delimitou as áreas de preservação permanente (APPs) nos seguintes
espaços: ao longo dos rios ou de qualquer curso d‟água; ao redor das lagoas, lagos ou
reservatórios naturais e artificiais; nas nascentes e olhos d‟água; no topo dos morros,
montes, montanhas e serras; nas encostas com declividade superior a 45 graus; nas
restingas, dunas e mangues; em altitude superior a 1.800 metros (BURSZTYN;
BURSZTYN, 2012).
Ao longo dos anos, o Código Florestal foi diversas vezes alterado por Leis e
Medidas Provisórias, e, finalmente em 2012, aprovada a Lei 12.651, posteriormente
alterada pela Lei 12.727, do mesmo ano, em que foram expostas as novas diretrizes do
Código Florestal. Alguns aspectos do novo Código recaem no ambiente das cidades, na
forma de “regularização fundiária em área urbana consolidada e que ocupam APPs”83
.
No Artigo 25, o Código estabelece instrumentos de proteção de áreas verdes
urbanas, tais como a preferência na compra de remanescentes florestais urbanos ou a
exigência de áreas verdes nos loteamentos, empreendimentos comerciais e na implantação
de infraestrutura84
.
Outro exemplo de intervenção do Código Florestal em áreas urbanas refere-se a um
problema muito comum em cidades brasileiras, ou seja, às enchentes. Nesse sentido, esses
fenômenos são, em grande parte, influenciados pela ocupação de várzeas e planícies de
inundação natural dos cursos d‟água e das áreas no entorno dos lagos e lagoas naturais ou
artificiais (RAMOS & AHMAD, 2012). Assim, o Código, em seus artigos 64 e 65, prevê à
regularização fundiária desses assentamentos, desde que estejam caracterizados como zona
especial de interesse social, já consolidados e também que não seja identificada área de
81
Área protegida nos termos dos arts. 2º e 3º desta Lei, coberta ou não por vegetação nativa, com a função
ambiental de preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica, a biodiversidade, o fluxo
gênico da fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bem estar das populações humanas. (Redação dada
pela Lei 7.803/89). Disponível em www.planalto.gov.br, acesso em 01/06/2013. 82
Área localizada no interior de uma propriedade ou posse rural, excetuada a de preservação permanente,
necessária ao uso sustentável dos recursos naturais, à conservação e reabilitação dos processos ecológicos,
á conservação da biodiversidade e ao abrigo e proteção de fauna e flora nativas. (Redação dada pela Lei
7.803/89). Disponível em www.planalto.gov.br, acesso em 01/06/2013. 83
Arts. 64 e 65 da Lei 12.651/2012. Disponível em www.planalto.gov.br, acesso em 01/06/2013. 84
Art. 25 da Lei 12.651/2012. (Disponível em www.planalto.gov.br) Acesso em 01/06/2013.
138
risco, através de estudo técnico de regularização ambiental, na forma da Lei 11.977/200985
.
Essa regularização permite o Poder Público realizar obras de infraestrutura nesses locais,
outrora APP, melhorando as condições de enfrentamento das intempéries.
Desse modo, o Código Florestal rompeu com uma série de questionamentos que o
consideravam como de aplicação exclusiva em áreas rurais. Incide, agora, sobre problemas
de ocupação das cidades, tornando-se mais um marco legal a ser considerado no
planejamento urbano, principalmente, nos planos embasados no paradigma da
sustentabilidade.
As Resoluções do Conama, aqui tratadas, referem-se às que, de alguma forma, têm
referência sobre áreas urbanas e foram implementadas a partir do ano de 2001, ano de
aprovação do Estatuto da Cidade, legislação a qual será detalhada mais adiante.
A primeira Resolução a ser abordada data do ano de 2002, número 302, e dispõe
sobre os limites de Áreas de Preservação Permanente, que poderão ser reduzidos pela
ocupação urbana consolidada86
, não excedendo ao limite de 10% dessa APP, conforme o
Art. 3º, Inciso 5º.
A segunda Resolução, de número 303, do mesmo ano, correlaciona-se com a
anterior na medida em que delimita uma largura mínima de 30 metros de APP em torno de
lagos e lagoas naturais localizados em áreas urbanas, conforme o Art. 3º, Item III.
A Resolução 369, de 2006, trata da intervenção ou supressão de vegetação em APP.
São destacados aqui os casos excepcionais que se relacionam aos espaços urbanos. Em
primeiro lugar, é permitida a intervenção para a implantação de áreas verdes de domínio
público, que deverão adotar medidas tais como: recomposição da vegetação nativa; mínima
impermeabilização da superfície; apresentar projeto técnico aprovado previamente pela
autoridade ambiental competente, no âmbito estadual ou federal, contemplando alguns
equipamentos urbanos, tais como: trilhas ecoturísticas, ciclovias, mirantes, bancos,
85
Lei 11.977 de 7 de julho de 2009 – Dispõe sobre o Programa Minha Casa, Minha Vida – PMCMV e a
regularização fundiária de assentamentos localizados em áreas urbanas. Disponível em
www.planalto.gov.br, acesso em 02/06/2013. 86
Área Urbana Consolidada é aquela que atende aos seguintes critérios: definição legal pelo poder público;
existência de no mínimo quatro dos equipamentos de infra-estrutura urbana listados a seguir: malha
viária com canalização de águas pluviais, rede de abastecimento de água, rede de esgoto, distribuição de
energia elétrica e iluminação pública, recolhimento de resíduos sólidos urbanos, tratamento de resíduos
sólidos urbanos, densidade demográfica superior a cinco mil habitantes por km2. Disponível em
www.mma.gov.br/port/conama/legiabre.cfm, acesso em 06/06/2013.
139
sanitários, chuveiros, rampas de lançamento de barcos, ancoradouros, etc., conforme Seção
III, Art. 8º.
A Seção IV, Art. 9º., da mesma Resolução, permite a intervenção ou supressão de
vegetação em APP para a regularização fundiária sustentável de área urbana, desde que
observadas as seguintes condições: sejam ocupações residenciais de baixa renda; localizar-
se nas margens dos cursos d‟água, entorno de lagoas, lagos ou reservatórios artificiais; em
topo de morro, montanha ou restinga (desde que atenda as Resoluções Conama 302 e
303/2002); esteja inserida em área urbana com no mínimo três dos seguintes itens de
infraestrutura: malha viária, captação de águas pluviais, esgotamento sanitário, coleta de
resíduos sólidos, rede de abastecimento de água, rede de distribuição de energia; dentre
outras condições.
Por fim, a Resolução 412, de 2009, estabelece critérios para o licenciamento
ambiental simplificado, para novos empreendimentos destinados à construção de
habitações de interesse social. Nesse sentido, adota uma licença única (localização,
instalação e operação) e um prazo máximo de análise do processo de 30 dias (contados a
partir da data de entrega da documentação exigida), torna obrigatória a implantação de
sistema de abastecimento de água potável, coleta e tratamento de esgoto sanitário, coleta e
disposição adequada de resíduos sólidos, implantação de equipamentos que garantam a
qualidade e a segurança ambiental do empreendimento (áreas de circulação, equipamentos
urbanos e comunitários, áreas verdes, etc.). Por fim, limita a área máxima de ocupação do
empreendimento em 100 hectares.
Ao longo de três décadas de atuação, o Conama desempenhou um papel importante
na regulamentação de temas que incidiram diretamente sobre a qualidade do meio
ambiente dentro das mais diversas questões. Nas Resoluções destacadas anteriormente,
existe uma intenção em se estabelecer critérios de regulação na ocupação urbana,
principalmente quando esta ocorre na interface com áreas de preservação ambiental,
situação muito comum nas grandes cidades brasileiras, e uma temática recorrente na
maioria dos projetos de urbanização de áreas de baixa renda, ocupadas por invasão. A
despeito das controvérsias envolvidas, as diretrizes do Conama representam um marco
legal a ser considerado no interesse público por espaços urbanos com melhor qualidade
ambiental.
140
Após esse breve panorama acerca das leis que, de certo modo, formam a base das
políticas urbanas do Brasil no seu eixo ambiental e, retornando as que tratam
especificamente da ordenação dos assentamentos humanos, pode-se constatar que com os
avanços dos problemas citadinos e, consequentemente, de uma maior conscientização
social, os novos Planos Diretores, elaborados a partir da Constituição e por toda década de
1990, são muito mais eficazes e inovadores e representaram valiosos avanços em termos de
políticas de ordenamento do crescimento das cidades.
Os conteúdos da Política Urbana, após a promulgação da Constituição de 1988,
foram aprofundados e discutidos por mais de uma década e, finalmente em 2001, foi
aprovada a Lei 10.257, mais conhecida como Estatuto da Cidade. Essa lei, dá as diretrizes
para uma concepção de cidade, de planejamento e de gestão, delegando aos municípios a
regulamentação necessária para sua implementação dentro da realidade local.
Para tanto, o Estatuto da Cidade define uma série de instrumentos que permitem
uma correlação entre projeção urbana e meio ambiente, e, de forma inovadora, avançar
numa política de assentamentos humanos mais próximos dos ideais do desenvolvimento
sustentável. Sendo assim, cabe destacar alguns desses instrumentos.
Já no Capítulo I, nas Diretrizes Gerais, a Lei garante o direito de acesso à cidade
sustentável, como sendo “o direito à terra urbana, à moradia, ao saneamento ambiental, à
infra-estrutura urbana, ao transporte e aos serviços públicos, ao trabalho e ao lazer, para as
presentes e futuras gerações”87
. Com isso, permite que se delineie a intenção em uma
política mais integradora entre os aspectos físicos, sociais e ambientais, e, portanto, mais
próxima da complexidade contemporânea das cidades brasileiras.
Os avanços podem ser notados, também, em relação a alguns instrumentos que a lei
oferece como fonte de renda, como é o caso do IPTU Progressivo88
, da Outorga Onerosa
do Direito de Construir89
e dos Consórcios Imobiliários90
. Como o administrador público é
87
Lei 10.257/2001 – Art. 2º. Disponível em www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/leis_2001/l10257.htm,
acesso em 25/05/2013. 88
IPTU cobrado em valores progressivos no tempo para imóveis urbanos não edificados, subutilizados ou
não utilizados. Tem por objetivo a eliminação de vazios urbanos (em áreas construídas ou não) e com isso
combater a especulação imobiliárias e otimização de infra-estrutura existente. 89
O Plano Diretor poderá fixar áreas nas quais o direito de construir poderá ser exercido acima do coeficiente
de aproveitamento básico (relação entre a área edificável e a área do terreno) adotado, mediante
contrapartida a ser prestada pelo beneficiário. Lei 10.257/2001, Seção IX, Art. 28.
141
o responsável pela implementação da lei, esses dispositivos podem criar as condições
financeiras necessárias para sua real efetivação, esse formato jurídico estabelece um
processo fechado, contínuo, onde a política urbana gera receita para sua aplicação.
Merece destaque outro instrumento inovador, para a época, a transferência do
direito de construir, ou seja, caso um imóvel urbano seja considerado de interesse público
(valor histórico, cultural, etc.) ou necessário para implantação de algum equipamento
urbano comunitário, o proprietário poderá exercer seu direito de construir em outro local.
Com isso, as transações de desapropriação ficam mais fáceis ou menos conflituosas, como
por exemplo: em edifícios históricos tombados é obrigatória a sua preservação física, o
que, de certa forma, penaliza o dono, pois limita sua possibilidade de comercialização.
Nesse sentido, a transferência do direito de construir contribui para a redução das
demolições da noite para o dia, tão comuns nesses casos, garantindo a preservação do
patrimônio edificado das cidades.
Em relação específica a uma ação ambiental, o Estatuto da Cidade estabelece
diretrizes “e ações estratégicas para controle e fiscalização do meio ambiente, tais como:
estabelecimento e gestão de áreas de proteção especial; áreas de preservação permanente e
reserva legal; e unidades de conservação” (BURSZTYN; BURSZTYN, 2012, p. 545).
Com isso, traz para a esfera do espaço urbano uma integração com políticas de meio
ambiente, chamando a atenção para a inevitável interdependência entre o “construído” e o
“natural”.
O Estatuto da Cidade detalha e amplia a obrigatoriedade dos Planos Diretores,
passando a serem exigidos nos municípios enquadrados nos seguintes casos: integrantes de
regiões metropolitanas; de especial interesse turístico; inseridos em áreas de influência de
empreendimentos ou atividades de impacto ambiental de âmbito regional ou nacional;
integrantes de áreas sujeitas a ocorrências naturais, tais como, deslizamentos ou
inundações.
Outro dispositivo de grande importância refere-se à usucapião especial de imóvel
urbano. Destinado, em princípio, para áreas ou edificações de até duzentos e cinquenta
90
Conjunto de intervenções e medidas coordenadas pelo Poder Público municipal, com a participação dos
proprietários, moradores, usuários permanentes e investidores privados, com o objetivo de alcançar em uma
área transformações urbanísticas estruturais, melhorias sociais e a valorização ambiental, para tanto, podem
ser adotadas medidas de: modificação de índices e características de parcelamento, uso e ocupação do solo
e subsolo, alterações das normas edilícias. A contrapartida exigida dos beneficiados deverá ser utilizada
exclusivamente na própria operação urbana consorciada. Lei 10.257/2001, Seção X, Art. 32, 33 e 34.
142
metros quadrados, ocupado por cinco anos, ininterruptamente, o direito de domínio é
ampliado para áreas com metragem superior à anteriormente estabelecida, desde que
ocupada por populações de baixa renda e que o possuidor(es) não seja(m) proprietário(s)
de outro imóvel urbano ou rural. Em linhas gerais, esse instrumento visa a garantir o
direito de permanência em áreas urbanas, geralmente centrais e muito valorizadas, de
indivíduos ou comunidades antigas, comumente pressionadas pelo poder do capital
imobiliário, podendo ser traduzida como uma proposta social de retardar a periferização e
contribuir para a o uso do solo mais diversificado.
Por fim, vale salientar a intenção do Estatuto em promover, a partir daquele
momento, uma gestão democrática da cidade, para tanto, estabelece uma série de ações
para a participação da população, obrigatória em muitos casos, na forma de debates,
audiências, consultas públicas, para a aprovação de diretrizes orçamentárias, orçamento
anual, planos e projetos de desenvolvimento urbano, que, de algum modo, venham
interferir na vida do município (BURSZTYN; BURSZTYN, 2012, p. 545).
O Estatuto da Cidade representou um grande avanço em termos de política urbana
federal, com instrumentos e mecanismos inovadores que possibilitavam um novo olhar
sobre a administração do ambiente urbano. A nova lei, partindo de pressupostos
democráticos, delegava aos municípios sua implementação através do Plano Diretor e, com
isso, visava a garantir a devida adequação aos problemas locais, específicos de cada lugar.
Nesse sentido é que, talvez, ocorreram os maiores problemas, pela falta de conhecimento,
de estudo da realidade das cidades pelas equipes técnicas responsáveis pelos planos,
gerando políticas de eficácia parcial sobre as deficiências da maioria dos centros urbanos
do país.
Dois outros eixos de políticas públicas federais (além do Estatuto da Cidade)
merecem destaque por tratar de iniciativas governamentais de regulação dos problemas
urbanos: a Lei 11.445/2007 (Lei de Saneamento Básico) e a Lei 12.305/2010 (Política
Nacional de Resíduos Sólidos).
O poder público federal inicia a Política Nacional de Saneamento no ano de 1967,
quando criou o Conselho Nacional de Controle da Poluição Ambiental, responsável por
ações no campo do abastecimento de água, esgoto sanitário e pluvial, drenagem, controle
da poluição, do lixo, etc. Aproximadamente três anos depois, no início de 1970, foi criado
o Plano Nacional de Saneamento – Planasa, que desencadeou uma série de estratégias
143
importantes para o setor nos diversos estados da federação (BURSZTYN; BURSZTYN,
2012).
O Planasa concebeu e estruturou uma Companhia Estadual de Saneamento Básico,
com novas diretrizes de gestão da política de saneamento, criando uma fonte de recursos
advindos de arrecadação de impostos estaduais. Ao mesmo tempo em que essas ações
ampliaram significativamente o abastecimento de água potável para as populações urbanas,
de certa forma, por sua estrutura centralizante, “engessou” os órgão estaduais na gestão dos
problemas locais, dificultando sua ampliação, principalmente para áreas mais carentes
(BURSZTYN; BURSZTYN, 2012).
Em 1985, foi instituído o Ministério do Desenvolvimento Urbano e Meio
Ambiente, que assumiu a política de saneamento, e, a partir daí, o que se observou foi uma
sucessão de criação e extinção de órgãos e normas legais que sinalizavam para um modelo
de gestão fragmentado e setorizado. Isto se deu até 2007, quando foi aprovada a Lei
11.445, estabelecendo novas diretrizes nacionais para o saneamento básico (BURSZTYN;
BURSZTYN, 2012).
A Lei do Saneamento Básico colocou um grande desafio aos diversos níveis do
governo quando estabeleceu responsabilidades e interação entre áreas que, historicamente,
vinham trabalhando nem sempre em consonância, como por exemplo, as áreas de
infraestrutura, de habitação, da saúde pública e de proteção do meio ambiente
(BURSZTYN; BURSZTYN, 2012). Entretanto, é um desafio que se deve superar frente
aos imperativos de uma qualidade ambiental, de um ambiente urbano mais saudável, e que
tem, no saneamento e serviços afins, uma preponderante importância.
Os serviços de abastecimento de água e tratamento de resíduos, dentre outros são
estratégicos para o crescimento das cidades, e, nesse sentido, o quadro brasileiro é bastante
heterogêneo. Fazendo um comparativo entre acesso à água potável e coleta de esgotos,
observa-se que o primeiro serviço é bem distribuído no território nacional, atendendo 94%
dos municípios, enquanto que o segundo serviço abrange cerca de 55%. Em termos
regionais, o quadro é ainda mais crítico: no Sudeste, 95% dos municípios são atendidos por
algum tipo de coleta; na região Norte, este número despenca para 13,3%91
. Evidente que
esses dados, por si só, não retratam toda a realidade do saneamento nas cidades brasileiras;
91
Dados do Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento, Ministério das Cidades. Disponível em
www.snis.gov.br, acesso em 28/05/2013.
144
os avanços são notáveis, mas, de certa forma, dão uma dimensão do problema que ora se
coloca nas mãos dos técnicos e gestores municipais.
O último grande eixo legal, no âmbito federal, e que atinge diretamente os centros
urbanos refere-se à geração e destinação adequada do lixo. Nesse sentido, foi criada, em
2010, a Lei 12.305, que institui a Política Nacional de Resíduos Sólidos. Em consonância
com o debate atual acerca das limitações dos recursos naturais e melhoria das condições de
vida no planeta, a Lei traz em seu primeiro objetivo a “proteção da saúde pública e da
qualidade ambiental”92
. Também, aborda princípios do desenvolvimento sustentável,
como: a ecoeficiência, a reutilização, a reciclagem, o respeito às diversidades locais e
regionais.
A nova lei estabelece e diferencia tipos de resíduos (doméstico, industrial, da
construção civil, etc.) para os grandes geradores, responsabilizando-os por gerenciar seu
produto ao longo de todo o ciclo de produção, incluindo, inclusive, seu recolhimento pós-
uso, separação e destinação adequada final. Incentiva a organização de municípios, na
forma de consórcios públicos, para o tratamento correto do lixo urbano, com a eliminação
dos lixões e a criação de aterros sanitários, coleta seletiva e cooperativa de catadores. Essas
ações permitem o acesso a linhas de financiamento com recursos do Governo Federal.
Em termos de esfera administrativa, estabelece a obrigação de criação de Planos de
Resíduos Sólidos, no âmbito nacional, estadual e municipal, sendo os dois primeiros
elaborados para um horizonte de atuação de 20 anos e revisado a cada 4. Os Planos
Municipais podem vir integrados aos Planos de Saneamento Básico, previstos na Lei
11.445, e poderão ter conteúdo simplificado para localidades com menos de 20 mil
habitantes.
Em resumo, o Estatuto da Cidade, a Lei de Saneamento Básico e a Política
Nacional de Resíduos Sólidos constituem os três principais marcos legais brasileiros que
refletem uma “tendência internacional de ambientalização das políticas públicas e de
aumento da capacidade de regulação das ações humanas em suas interfaces com o meio
ambiente” (BURSZTYN; BURSZTYN, 2012, p. 548). Essas políticas retratam uma nova
lógica de regulação do Estado, numa tentativa de pacto entre ações coordenadas e
92
Lei 12.305/2010 – Art. 7º. Inc. I. Disponível em www.mma.gov.br
145
sistemáticas e desdobram-se em instrumentos que visam à materialização destas leis em
ambientes urbanos mais sustentáveis.
Cabe, agora, aprofundar nos instrumentos de planejamento e de apoio as atividades
de gestão, seja no âmbito normativo93
ou indicativo94
. A base de regulação pública do meio
ambiente urbano, recentemente, volta-se para um processo de planejamento em que exige,
cada vez mais, dos planejadores, bom senso e criatividade, mas também disponibiliza
mecanismos de administração que auxiliam no processo de gestão, em especial nas
questões que envolvem os atores sociais e os recursos naturais e, portanto, mais próxima da
sustentabilidade.
Tanto o Zoneamento, a Avaliação de Impactos Ambientais e o Licenciamento
Ambiental, atualmente representam modernas alternativas de auxílio aos gestores públicos
para a consolidação de cidades mais democráticas, social e espacialmente, e é nessa
perspectiva que a pesquisa avança a seguir.
2.5 – Instrumentos de Gestão Ambiental Urbana Sustentável
O desenho urbano interfere na qualidade físico-ambiental das cidades, resultado das
políticas, planos, projetos e programas, que incidem no ambiente construído.
O urbanismo sustentável apresenta basicamente três eixos fundamentais: a
habitação, a infraestrutura e a paisagem (ANDRADE, 2009), os quais, juntos, fornecem o
campo de atuação e o instrumental teórico e prático para os que intervêm no meio
ambiente urbano, seja gerindo, desenhando, construindo ou usufruindo o espaço. O grande
desafio está, justamente, na superação das situações conflituosas, que, de alguma forma,
entrelaçam estas instâncias e terminam por afetar a qualidade do meio ambiente.
Os centros urbanos exercem um “encantamento” sobre as pessoas no sentido de
atraí-las para que possam usufruir de bens (materiais e imateriais), fazendo com que mais
de 50% da população mundial, hoje, viva nesses espaços (ANDRADE, 2009). Isso fez
93
Quando o Estado determina o que deve ser feito e faz com que tais determinações sejam cumpridas.
(BURSZTYN; BURSZTYN, 2012, p. 154). 94
O Estado formula estratégias, define instrumentos e aponta rumos aos agentes econômicos, que podem
desfrutar das vantagens de seguirem o que está sendo proposto, mas também podem optar por não acatar as
propostas (e possivelmente sofrer algum tipo de desincentivo). (BURSZTYN; BURSZTYN, 2012, p. 154).
146
com que surgissem, paralelamente e fora das cidades, grandes áreas agrícolas e
industriais para darem suporte à demanda de consumo, pressionando ou degradando, na
maioria das vezes, os recursos naturais.
Cabe observar que os problemas ambientais, advindos da ocupação urbana,
extrapolam os limites da cidade, trata-se de uma rede complexa de condicionantes que
precisam ser analisados conjuntamente, no diálogo de inter-relações entre causas e efeitos.
Entretanto, os aspectos que interferem na sustentabilidade urbana, mas que estão
diretamente ligados às questões agrícolas ou industriais, não farão parte das investigações
desta pesquisa, tendo em vista que se afastam do foco e dos objetivos pré-estabelecidos.
Grosso modo, a maioria dos problemas ambientais urbanos brasileiros tem sua
origem na rápida expansão urbana, intensificada nas últimas décadas, elevando a demanda
por novas habitações e redes de infraestrutura. Esse fenômeno, comum em países em
desenvolvimento, delimitou um quadro de proliferação de assentamentos informais, em
locais de risco, ocasionados principalmente pela incapacidade da gestão pública em
atender, de fato, a essa demanda; quando ocorre o “atendimento”, é notável a “adoção de
soluções ambientalmente condenáveis” (ANDRADE, 2009, p. 352).
Só no Brasil há mais de 6,5 milhões de pessoas morando em favelas, palafitas e
assentamentos precários nas áreas marginais e periféricas das cidades [...] a
ilegalidade da ocupação do solo e das edificações em meio urbano atingem mais
de 50% das construções nas cidades brasileiras. (ANDRADE, 2009, p. 352).
A expansão urbana sem controle provoca um complicado e perigoso ciclo95
de
agressões ao meio ambiente. No caso do Brasil, o problema decorre mais do não
cumprimento da lei do que sua inexistência, uma vez que o quadro legal, que de, alguma
forma, disciplina o uso do solo urbano, é bastante consistente (como visto anteriormente).
Antes de se proceder à discussão dos instrumentos de gestão ambiental urbana,
cabe abordar brevemente as questões relativas à opção do poder público por algum tipo de
gestão administrativa, que constitui a base política de organização do espaço na cidade.
Nesse sentido, nas últimas décadas, percebe-se uma tendência por formas que ampliam o
95
Que pode ser entendido desde a dependência do automóvel (individual ou coletivo) que pressiona as
redes de infraestrutura e o consumo de combustíveis fósseis, que contribui para o desmatamento, o
enfraquecimento do solo, a qualidade dos corpos d‟água, que recai no comprometimento do consumo deste
recurso na cidade, especificamente nas condições de saneamento ambiental (ANDRADE, 2009, p. 353).
147
universo de atores que participam das decisões, assemelhando-se aos formatos amplamente
adotados pelo setor empresarial, na forma das gestões participativas, mais conhecido como
a governança96
.
Em nossos dias, a governança pública vai além das ações de governo, na
medida em que outros atores (empresas, ONGs e mesmo organismos
internacionais) participam ativamente de ações de interesse público, tanto
como protagonistas na implementação, como na própria definição das
políticas. (BURSZTYN, 2012, p. 160).
Esse envolvimento pode se apresentar de forma variada, dependendo dos setores
sociais que interagem na constituição das co-governanças, assim caracterizadas: co-gestão
(agências de governo e comunidade); parcerias público-privadas; parcerias empresariais e
sociedade (ONGs); parcerias governo, sociedade e empresas (BURSZTYN, 2012).
Se, por um lado, a governança reduz o poder do governo no momento em que
divide sua participação nas decisões, por outro lado, aumenta sua responsabilidade, na
medida em que tem a função de garantir o fiel cumprimento das regras que asseguram o
bem da coletividade de forma homogênea, reduzindo “assimetrias de poder”
(BURSZTYN, 2012, p. 161).
Desse modo, a governança configura-se como o mecanismo da administração
pública que mais se aproxima dos ideais de gestão democrática, em que é assegurada a
participação dos atores sociais. Estes, ao tempo em que usufruem do espaço da cidade,
podem contribuir para uma configuração urbana mais sustentável.
Todas as leis que interferem na gestão ambiental urbana estão hierarquicamente
submetidas à Constituição Federal de 198897
. Nesse sentido, a Lei da Política Nacional do
Meio Ambiente (Lei 6938/81), posteriormente complementada pelo Estatuto da Cidade, dá
as diretrizes para integração entre o espaço urbano e as questões ambientais. Em seu artigo
9º, são apresentados os instrumentos que interferem mais diretamente no planejamento e
no desenho urbano, a saber: os Zoneamentos, a Avaliação de Impactos Ambientais (AIA) e
96
Esse conceito, que já foi abordado na discussão da sustentabilidade nas empresas, aqui será abordado na
sua aplicação na esfera pública. 97
Art. 225 - Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e
essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e
preservá-lo para as presentes e futuras gerações. Disponível em www.planalto.gov.br, acesso em
03/05/2013.
148
o Licenciamento Ambiental (ANDRADE, 2009), que servem de base aos corpos técnicos
que se debruçam hoje sobre planos urbanos sustentáveis.
O Zoneamento é uma importante ferramenta aos administradores públicos, para
uma gestão ambiental relativa ao uso do solo. Nesse sentido, incorpora aspectos sociais,
econômicos e ambientais (BURSZTYN, 2012). Definido como um instrumento de
organização do território, passa a ser obrigatório para a implantação de planos, obras e
atividades públicas e privadas, devendo ser elaborado por cada unidade estadual da
federação, como forma de integração das políticas ambientais nos três níveis de poder98
.
Os Zoneamentos direcionam os Planos (de uso e ocupação do espaço), e significam
dar uma função a uma área. Especificamente, desdobram-se três tipos de zoneamento que
compõem a política de ocupação urbana. Primeiramente, o Zoneamento Urbano integra o
Plano Diretor do município e “estipula regras à ordenação do espaço territorial urbano,
incluindo o zoneamento industrial, priorizando a segurança sanitária de suas populações”
(ANDRADE, 2009, p. 355).
Em segundo lugar, o Zoneamento Ambiental, atualmente denominado Zoneamento
Ecológico-Econômico (ZEE), “divide o território em zonas de acordo com a necessidade
de proteção, conservação e recuperação dos recursos naturais e do desenvolvimento
sustentável” (ANDRADE, 2009, p. 356). O Art. 3º. do Decreto 4297/2002 define como
objetivo geral do ZEE “organizar de forma vinculada, as decisões dos agentes públicos e
privados, quanto aos planos, programas, projetos e atividades, que diretamente ou
indiretamente utilizem recursos naturais [...]”99
. Desse modo, pode contribuir para
determinar as potencialidades e fragilidades (físicas, bióticas, sociais e econômicas) das
áreas de estudo e, assim, dar suporte à elaboração dos Planos de Manejo das Unidades de
Conservação100
.
98
Decreto 4297/10 de Julho de 2002, Dos Objetivos e Princípios, Art. 2º. Disponível em
www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/2002/d4297.htm, acesso em 10/06/2013. 99
Decreto 4297/2002. Disponível em www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/2002/d4297.htm, acesso em
10/06/2013. 100
A Lei 9.985/2000, que institui o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza, define:
Unidade de Conservação – espaço territorial e seus recursos ambientais, incluindo as águas jurisdicionais,
com características naturais relevantes, legalmente instituído pelo Poder Público, com objetivos de
conservação e limites definidos, sob regime especial de administração, ao qual se aplicam garantias
adequadas de proteção; Manejo – todo e qualquer procedimento que vise assegurar a conservação da
diversidade biológica e dos ecossistemas;
Plano de Manejo – documento técnico mediante o qual, com fundamento nos objetivos gerais de uma
unidade de conservação, se estabelece o seu zoneamento e as normas que devem presidir o uso da área e o
149
O limite de suporte do regime hídrico de uma dada região deveria ser a principal
unidade de planejamento urbano. É nesse sentido que o zoneamento hídrico (como o
terceiro tipo de zoneamento) tem por premissa fundamentar, orientar e gerenciar esse
recurso, “a partir de um diagnóstico de sua situação atual e com base nas alternativas de
crescimento demográfico, da evolução de atividades produtivas e das modificações dos
padrões de uso e ocupação do solo” (ANDRADE, 2009, p. 357).
A disponibilidade hídrica brasileira apresenta-se distribuída de forma desigual em
seu território, uma vez que as regiões mais populosas (Sul, Sudeste e Nordeste) são as que
menos dispõem deste recurso (15,8% do total de água doce). Sendo assim, essa temática
assume destaque estratégico na definição de políticas ambientais do país, principalmente a
partir da Constituição de 1988 (BURSZTYN, 2012).
A lei magna brasileira extinguiu a propriedade privada da água e deu à União a
competência para instituir, nove anos depois, a Lei 9.433/1997, que estabeleceu a Política
Nacional de Recursos Hídricos – PNRH e criou o Sistema Nacional de Gerenciamento de
Recursos Hídricos – Singreh (BURSZTYN, 2012).
A PNRH adotou vários instrumentos, no âmbito federal e estadual, para a gestão
racional da água no Brasil: os Planos de Recursos Hídricos; o enquadramento dos corpos
d‟água em classes; a outorga dos direitos de uso; a cobrança e o Sistema Nacional de
Informações sobre Recursos Hídricos – Snirh101
. Essa estrutura tem a pretensão de criar as
bases regulatórias para o gerenciamento sustentável da água no país, seu reconhecimento
como recurso natural limitado, dotado de valor econômico, devendo ser gerido de forma
democrática entre o poder público e os usuários.
Entretanto, ao longo de quase duas décadas, desde a implementação da PNRH,
percebe-se uma série de deficiências que, de certa forma, vem fragilizando a gestão das
águas no país, seja pela falta de recursos disponíveis para a efetivação das ações
administrativas, seja pela pouca articulação entre as políticas federais, estaduais e
manejo dos recursos naturais, inclusive a implantação das estruturas físicas necessárias à gestão da unidade.
Disponível em www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L9985.htm, acesso em 04/05/3013. 101
Em linhas gerais: Planos de Recursos Hídricos são planos diretores que visam a fundamentar e orientar a
implementação da política e da gestão dos recursos hídricos; o Enquadramento, segundo usos
preponderantes, estabelece metas a serem alcançadas ou mantidas em um segmento de corpo d‟água; A
Outorga refere-se à autorização, concessão ou permissão para fazer uso da água; a Cobrança visa a fazer
com que o consumidor reconheça o valor econômico da água e a use de modo racional; o Snirh é
encarregado de coletar, sistematizar e divulgar os dados relativos ao recurso hídrico e a fatores
intervenientes na sua gestão. (BURSZTYN; BURSZTYN, 2012, p. 537).
150
municipais ou pela incipiente participação dos usuários na definição dos planos de gestão.
Os problemas de desperdício, acesso e poluição dos corpos d‟água apresentam-se, ao
mesmo tempo, como um enorme desafio e como potencialidades aos planejadores urbanos,
principalmente no Brasil, país que se destaca no panorama internacional como dos mais
ricos nesse recurso.
A Avaliação de Impacto Ambiental – AIA, representa uma ferramenta de
planejamento que visa a associar aspectos ambientais, sociais e econômicos e deve permitir
estimar o nível de impacto que determinado empreendimento irá imprimir no local e
proximidades, por ordem de sua implantação e, assim, considerar vantagens, desvantagens
e formas de mitigar possíveis danos ao meio ambiente (BURSZTYN, 2012).
Sendo aplicado de forma preventiva, a AIA deve ocorrer, portanto, anteriormente à
implantação do empreendimento, no sentido de se diagnosticar a área em questão,
definindo as características ambientais relevantes, os processos sócio econômicos
existentes e o tipo de ecossistema local, para fornecer informações que viabilizem tomadas
de decisões coerentes, incluindo a participação da população envolvida.
Instituída pela Lei 6938/81 (PNMA), a AIA tem seus critérios básicos e diretrizes
gerais definidos na Resolução Conama 001/86102
, e apresenta os instrumentos técnicos de
sua real implementação, a saber: o Estudo de Impacto Ambiental (EIA) e o Relatório de
Impacto Ambiental (RIMA).
O EIA, a partir dessa Resolução, passa a ser exigido para o licenciamento de
diversas atividades consideradas modificadoras do meio ambiente, inclusive projetos
urbanísticos acima de 100 ha, ou localizados em “áreas consideradas de relevante interesse
ambiental”103
. Nesse sentido, contemplará, no mínimo, as seguintes atividades técnicas:
diagnóstico ambiental da área de influência do projeto; análise dos impactos ambientais do
projeto e de suas alternativas; definição das medidas mitigadoras dos impactos negativos;
elaboração do programa de acompanhamento e monitoramento dos impactos positivos e
negativos104
.
102
Disponível em www.mma.gov.br/port/conama/legiabre.cfm, acesso em 10/06/2013. 103
Resolução Conama 001/86 – Art. 2º. Item XV. Disponível em
www.mma.gov.br/port/conama/legiabre.cfm, acesso em 10/06/2013. 104
Resolução Conama 001/86 – Art. 6º. Disponível em www.mma.gov.br/port/conama/legiabre.cfm, acesso
em 10/06/2013.
151
O RIMA refere-se a um documento conclusivo do EIA, “em linguagem acessível,
de modo que todos possam entender as vantagens e desvantagens das diferentes
alternativas do empreendimento” (BURSZTYN, 2012, p. 505). Em resumo, a AIA é
formada pelo conjunto EIA/RIMA e permite ao Gestor Público analisar o empreendimento
e conceder (ou não) a licença requerida.
O Licenciamento Ambiental autoriza o exercício da atividade solicitada, podendo
ocorrer na forma de Licença Prévia, Licença de Instalação e Licença de Operação105
.
É um instrumento coercitivo, de comando e controle, que obriga empreendedores
públicos e privados a submeterem os seus projetos a um processo administrativo
de análise e avaliação dos impactos ambientais a eles relacionados. É o
instrumento de política ambiental brasileira que tem maior reconhecimento e
poder na gestão ambiental. (BURSZTYN; BURSZTYN, 2012, p. 505).
O sistema de Licenciamento Ambiental representa um avanço em termos de
condicionamento entre ações públicas e privadas e a legislação ambiental, com forte
tendência à descentralização desse instrumento106
, desvinculando-se da esfera federal, e,
consequentemente, a uma maior atuação dos Estados e Municípios. Nesse sentido, alguns
ajustes devem ser feitos no intuito de superar problemas operacionais, que podem limitar a
atuação desse instrumento, tais como: corpos técnicos treinados, simplificação burocrática
e a adoção de parâmetros específicos (para grandes e pequenos projetos) nas exigências
impostas aos empreendedores que buscam licenciamento.
Postos os principais mecanismos de gestão ambiental com atuação mais pontual,
destaca-se mais um instrumento que também incide sobre a formação dos espaços
sustentáveis da cidade, de forma mais abrangente, na estruturação das políticas macro;
trata-se da Agenda 21.
105
A Licença Prévia concede provisoriamente a instalação e operacionalização do empreendimento até a
complementação das informações necessárias para a Licença Ambiental; a Licença de Instalação autoriza
apenas o início da implantação do empreendimento urbano; a Licença de Operação finaliza o processo com
a permissão do início da atividade licenciada. (ANDRADE, 2009, p. 361). 106
A Lei complementar 140/2011 fixa normas para a cooperação entre União, os Estados, o Distrito Federal e
os Municípios, nas ações administrativas relativas à proteção das paisagens naturais, à proteção do meio
ambiente, dentre outros, sinaliza para uma crescente responsabilidade de licenciar localmente os
empreendimentos. Disponível em www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/lcp/Lcp140.htm, acesso em
11/06/2013).
152
A agenda 21 foi um dos principais documentos resultantes da Conferência Rio-92 e
definiu o compromisso de cada país em desenvolver estratégias para combater os
problemas socioambientais. As nações ficaram responsáveis por construir suas Agendas e,
no caso do Brasil, a coordenação ficou a cargo da Comissão de Políticas de
Desenvolvimento Sustentável107
.
A primeira fase de elaboração desse documento nacional se deu entre 1996 e 2002 e
sua implementação, numa segunda fase, a partir de 2003. Uma das demandas da Agenda
21 Global – capítulo 28108
– é a elaboração da Agenda 21 Local, como um instrumento de
planejamento de políticas públicas para o desenvolvimento sustentável, no âmbito da
localidade, indo desde a cidade, o bairro, até comunidades rurais, bacias hidrográficas, etc.
A Agenda 21 brasileira está dividida em 21 objetivos, sendo o décimo o que trata
das questões do espaço urbano, dentro das “Estratégias para a Sustentabilidade Urbana e
Rural”, esse objetivo está voltado para a “Gestão do Espaço Urbano e a Autoridade
Metropolitana”.
Especificamente, alerta para a necessidade de descentralização das instâncias
decisórias e o fortalecimento de ações de co-gestão, ou seja, o planejamento intersetorial
envolvendo o Município, as Regiões Metropolitanas, os Estados e o Governo Federal, com
enfoque nos assentamentos informais ou irregulares e, também, construir uma nova ordem
administrativa, a do espaço metropolitano109
.
Apresenta as seguintes ações e recomendações: reformar o Estado dentro da
filosofia do federalismo cooperativo110
; garantir a Governança e a sustentabilidade das
cidades e criar a Autoridade Metropolitana; fortalecer a integração de municípios dentro
das regiões metropolitanas, ou com problemas urbanos e ambientais similares; combater o
aumento de assentamentos irregulares e ilegais em áreas urbanas; promover habitação
utilizando estoque de áreas urbanas degradadas; fortalecer as estruturas técnico-
107
Dados disponíveis em www.mma.gov.br/index.php/responsabilidade-socioambiental/agenda-21. 108
“Cada autoridade em cada país implemente uma Agenda 21 local tendo como base de ação a construção,
operacionalização e manutenção da infra-estrutura econômica, social e ambiental local, estabelecendo
políticas ambientais locais e prestando assistência na implementação de políticas ambientais nacionais”.
Disponível em www.mma.gov.br/index.php/responsabilidade-socioambiental/agenda-21/agenda-21-global. 109
Dados disponíveis em www.mma.gov.br/index.php/responsabilidade-socioambiental/agenda-21. 110
Permite a participação de todos os entes federados (União, Estados e Distrito Federal), na repartição das
competências, conforme expresso no Artigo 24 da Constituição Federal - “Compete à União, aos Estados e
ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre: I- Direito Tributário, Financeiro, Penitenciário,
Econômico e Urbanístico” [...].
153
burocráticas de planejamento urbano e ambiental; promover a elaboração de Planos
Diretores; aperfeiçoar o sistema tributário com vistas à viabilização de instrumentos
econômicos que promovam o uso sustentável dos recursos naturais; implementar sistemas
integrados de gestão urbana (AGENDA 21 BRASILEIRA, 2004).
Todo o processo de desenvolvimento sustentável, proposto pela Agenda 21, tem
por limite os condicionamentos impostos pelo controle de gastos públicos, mas também os
entraves do aparelho burocrático que envolve problemas de coordenação entre diferentes
setores, nos três níveis de processo.
Evidente que não se podem desprezar as estruturas político-administrativas do país
que, bem ou mal, estão a executar os planos de desenvolvimento; o que se pede não é o
desmonte de toda máquina burocrática, mas tão somente, o aperfeiçoamento técnico, o
reforço de suas bases políticas. Com isso, as estratégias apresentadas pela Agenda 21 terão
condições de consolidar um arcabouço político-institucional integrado para a efetiva
implementação dos instrumentos de gestão urbana e, juntos, concorrerem para a cidade
sustentável.
Em linhas gerais, os instrumentos de gestão urbana, aqui apresentados, contornam
apenas parte das possibilidades de uma estrutura e leis muito mais amplas, cada vez mais
especializadas, na mesma proporção que os problemas ambientais se tornam mais
complexos. O Brasil, desde a promulgação da Constituição de 1988, é apontado como um
país cuja legislação ambiental é sinônima de modernidade, que avançou num escopo legal
em consonância com suas riquezas naturais.
Não resta dúvida de que o problema não está na lei, mas sim no seu cumprimento, e
essa é uma questão difundida pela sociedade brasileira já há muito tempo. Os impasses
para a aplicação de uma legislação ambiental, e, consequentemente, de uma gestão
ambiental, permeiam várias instâncias administrativas do Poder Público e da sociedade
como um todo. Tais impasses vão desde a operacionalização da lei e sua fiscalização, as
limitações das equipes de técnicos responsáveis pelos projetos, a deslegitimação das
decisões ambientais pelos imperativos das demandas energéticas, pelo descompasso entre
os desastres ecológicos/sociais e ações preventivas e corretivas, até a falta de informação
do cidadão comum, dos seus direitos e deveres, da tomada de decisão democrática, da
discussão dos planos, da comunicação das vantagens e desvantagens em linguagem
simples e acessível.
154
Tratar da cidade sustentável é optar pela gestão ambiental urbana. É controlar o uso
e a ocupação do solo por meio de instrumentos que vão além dos parâmetros puramente
econômicos. É abordar os problemas nas suas especificidades, afastando-se das
generalizações, com suas distinções físicas, sociais e ambientais.
As posturas ambientais que incidem sobre o solo urbano têm a dupla função de
tanto regular a ocupação, quanto estimular/induzir usos e, nesse caso, usos sustentáveis.
Não resta dúvida de que um marco regulatório, se bem aplicado, tem o poder de modificar
toda uma estrutura urbana, nos transportes, abastecimento, espaços livres, na preservação
de recursos, enfim, muito dos elementos físicos que compõem a cidade.
A força da lei faz com que os agentes que participam da instituição da vida citadina
deem respostas às demandas impostas, e é o que acontece no caso da indústria da
construção civil, quando esta atende às novas diretrizes urbanísticas, o que interfere tanto
em sua cadeia produtiva, quanto no reposicionamento dos entes de sua rede organizacional.
Com base na nova realidade imposta pelas diretrizes da sustentabilidade, esse setor
produtivo vem sendo pressionado sob diversas formas. Em primeiro lugar, pelas
necessidades internas de modificação dos processos produtivos por sistemas que gerem
menos desperdícios frente à escassez de recursos e, consequentemente, a elevação dos
custos iniciais com insumos básicos, o que responde também à pressão para a diminuição
de resíduos produzidos. Em segundo lugar, a sociedade como um todo, mais atenta e
exigente por edificações mais eficientes, começa a formar nichos de mercado por produtos
diferenciados. Em terceiro lugar, o aumento da livre concorrência vem impondo a
necessidade de o setor reorganizar-se e abrir espaço para a inovação como elemento de
diferenciação mercadológica. Por fim, as próprias entidades que congregam esse ramo de
atividade (Sinduscon), vêm desenvolvendo estratégias tanto de reorganização empresarial,
quanto de divulgação e incentivo por novas técnicas e produtos, mais adequados aos novos
imperativos ambientais.
As certificações ambientais correspondem a um instrumento que, de alguma forma,
interfere em todas essas questões e visa responder, com maior ou menor propriedade, essas
pressões e demandas. Seja na redução dos resíduos e desperdícios, em edifícios que
consomem menos recursos e, portanto, diferenciados no mercado, ou na readequação
administrativa imposta com o desenvolvimento de processos menos impactantes; esses
155
mecanismos vêm se tornando cada vez mais utilizados pelo setor e se consolidando como
legítimos, na busca pelo ambiente construído sustentável.
É nessa perspectiva, das respostas que a indústria da construção civil vem dando ao
novo paradigma da sustentabilidade, que se estrutura o próximo capítulo desta tese.
CAPÍTULO 3
A INDÚSTRIA DA CONSTRUÇÃO E O DESENVOLVIMENTO
SUSTENTÁVEL
3 – A INDÚSTRIA DA CONSTRUÇÃO E O DESENVOLVIMENTO
SUSTENTÁVEL
O presente capítulo tem por objetivo analisar o posicionamento do setor da
indústria da construção civil frente aos pressupostos sustentáveis, de como esse novo
paradigma tem influenciado na reorganização de seus processos e de sua estrutura. A
primeira parte trata da cadeia de produção da construção civil, todas as etapas para se
edificar um empreendimento e seus impactos ao meio ambiente. A segunda parte aborda as
possibilidades de inovação que se apresentam ao setor, na forma de novas metodologias e
técnicas construtivas. A terceira parte retrata as ações do Sinduscon, como a entidade
congregadora da categoria, para conduzir seus associados em posturas consoantes com o
desenvolvimento sustentável. A quarta parte refere-se à atuação de entidades
governamentais, particulares e acadêmicas, com relação às suas práticas de pesquisa,
incentivo, divulgação e adoção da sustentabilidade aplicada à construção civil. Finalmente,
a ABNT NBR 15575/2013 é revisada como o mais recente instrumento normativo com
vistas a estabelecer novos padrões de eficiência para as edificações, com perspectiva de
induzir mudanças em todos os agentes envolvidos na cadeia produtiva da engenharia de
construção.
Esse conjunto de temas justifica-se no descortinamento de outros posicionamentos
que o setor construtivo vem tomando, em contraposição à certificação ambiental, tanto
para reforçar a legitimidade desse instrumento, quanto par desmistificar sua imagem de
única alternativa para se edificar dentro dos parâmetros da sustentabilidade.
A cidade constitui-se no principal campo de atuação da construção civil, onde as
oportunidades e os problemas ambientais decorrentes da ocupação humana se manifestam
com maior força e é onde esse setor empresarial enfrenta o grande desafio de equacionar os
muitos problemas urbanos. Esses centros passam, atualmente, por um processo de
reacomodação espacial de sua população, na forma de uma ocupação fragmentada,
dispersa e, consequentemente, mais expandida, mesmo com a desaceleração do
crescimento demográfico. É o que os pesquisadores chamam de contraurbanização e, nesse
contexto, intensifica-se o impacto sobre os recursos naturais (HOGAN, 2010).
158
Discutir sobre este desafio e sobre como o setor imobiliário vem se posicionando
diante destas questões requer dupla análise, sob perspectivas diferentes, porém conectadas
de forma intensa. Primeiramente, tomando por base uma visão institucional, as políticas
públicas de planejamento, uso e ocupação do solo urbano retratam uma discussão que, nas
últimas décadas, questionam qual o modelo ideal de cidade: a dispersa ou a compacta?
Em ambos os lados, especialistas empenham-se em elencar as vantagens de cada
modelo. Para os que apoiam a dispersão espacial, alguns fatores são preponderantes: não se
podem desprezar os anseios daqueles que aspiram moradias mais afastadas dos centros e
com maior contato com a natureza; existe uma tendência à redução dos custos da
construção pelo distanciamento das áreas mais valorizadas e, assim, aumentar o acesso a
este bem; incentivo à ocupação territorial, o que acaba aquecendo o mercado imobiliário,
gerando, por sua vez, empregos e atrai atividades comerciais pela descentralização
(HOGAN, 2010).
Da mesma forma, quando se apontam as vantagens da fragmentação, as
desvantagens igualmente não podem ser ignoradas. Assim, quando do afastamento dos
empreendimentos imobiliários, toda uma rede de infraestrutura é demandada,
sobrecarregando os cofres públicos, ao mesmo tempo em que, imediatamente, ocorre uma
valorização destas áreas, gerando conflitos sociais pela expulsão de populações antigas.
Os defensores da cidade compacta apontam, principalmente, as vantagens
econômicas na otimização de uma infraestrutura já existente, na redução da necessidade de
utilização de veículos automotores e, consequentemente, poluição do ar. No Brasil, o
debate toma ainda contornos primários, evidenciado-se, nos anos mais recentes, na
formulação dos planos diretores, em grande parte pela incorporação de diretrizes
ambientais demandadas por grupos da sociedade organizada.
O certo é que a conexão entre as políticas públicas e a formação do espaço
“sustentável” construído nas cidades reverbera diretamente sobre a indústria da construção
civil. Este debate, na verdade, revela um embate entre as forças políticas e econômicas,
mas que podem resultar em possibilidades concretas, mesmo que pela força da lei, em
cidades mais justas espacialmente, eficientes, menos impactantes e com melhor qualidade
de vida.
A fim de sobreviver e desenvolver suas atividades sociais urbanas, o homem
precisa das construções cada vez mais elaboradas na proporção direta em que a sociedade
159
se torna mais complexa. As previsões são de que o setor da construção civil tenha um
grande incremento nas próximas décadas111
e, para que possa alcançar a sustentabilidade,
os mecanismos institucionais (políticas públicas) são decisivos, já que podem
estimular/refrear este processo. Todavia, em outra perspectiva, grande parte desta
responsabilidade cabe ao próprio setor, que tem pela frente o grande desafio de implantar
mudanças estratégicas em seu processo de produção.
Não se pode discutir a sustentabilidade da Construção Civil, sem interferir em
toda cadeia produtiva que é complexa, pois envolve setores industriais tão
díspares como: a extração de matérias minerais e a eletrônica avançada; enormes
conglomerados industriais, como a indústria cimenteira, que interagem e até
competem em alguns mercados com milhares de pequenas empresas familiares;
órgãos públicos nas três escalas de governo; clientes de famílias de baixa renda
em autoconstrução a empresas que constroem verdadeiras cidades (AGOPYAN;
JOHN, 2011, p. 23).
O desafio da sustentabilidade na construção civil passa, desse modo, por uma visão
que engloba todos esses atores, muitas vezes independentes, com culturas, procedimentos e
objetivos específicos. Equacionar esses interesses, ao tempo em que instiga o setor,
proporciona enormes possibilidades, que, em muitos aspectos, já sinalizam grandes
avanços.
A obra, propriamente dita, é a etapa que, aparentemente, gera maior quantidade de
resíduos e consumo de recursos, entretanto, o tempo de execução é relativamente curto se
comparado com toda a vida útil da construção, em média 50 anos. Assim, tomadas as
medidas adequadas, estes impactos serão minimizados. Um fator importante que deve ser
levado em consideração trata-se de um constante acompanhamento da obra por uma equipe
devidamente preparada, para que seja garantida a real implantação das decisões de projeto,
seja na utilização dos materiais corretos ou nos processos construtivos. Essa fiscalização
deverá ser capaz de conduzir adequações ou modificações do projeto/execução sem,
contudo, perder as diretrizes e intenções ambientais.
111
“Espera-se que a indústria de materiais de construção cresça duas vezes e meia entre 2010 e 2050 em nível
mundial, sendo que nos países em desenvolvimento (excluída China e Índia) 3,2 vezes” na indústria de
materiais de construção, de forma geral. Nos países em desenvolvimento (exceto China e Índia) a expectativa
é de 3,2 vezes”. (AGOPYAN; JOHN, 2011, p. 14 apud IEA/WBCSD, 2009).
“No Brasil, a expectativa é que o setor da construção dobre de tamanho até o ano 2022”. (AGOPYAN;
JOHN, 2011, p. 14 apud FGV, 2010).
160
Como dito anteriormente, é na operacionalização do edifício, em todo o seu tempo
de existência e funcionamento, que os maiores impactos são gerados para o meio ambiente,
pelo consumo de energia/recursos e geração de resíduos. Este montante será um reflexo
direto das decisões de projeto, mas também do bom uso das soluções construtivas por parte
dos usuários. Cabe ressaltar que esta condição não depende diretamente da construtora, a
qual é responsável tão somente pela execução da obra, todavia, diretrizes podem indicar
certa “obrigação” da mesma em desenvolver treinamento de pessoal/usuários, garantindo o
conhecimento correto no uso das inovações tecnológicas, o que certamente reduzirá o
custo e a intensidade com manutenções, além da potencialização das soluções sustentáveis
propostas.
Por fim, como última etapa na existência de uma edificação qualquer, deve-se
considerar seu desmonte (demolição) e o devido depósito dos resíduos. Vários estudos112
já
estão bem avançados no desenvolvimento de tecnologias que minimizam os impactos
ambientais resultantes destes processos, abrangendo, inclusive, ações durante a construção,
trata-se das pesquisas em RCD (Resíduos da Construção e Demolição).
Com o incremento do setor, estima-se que 90 milhões de toneladas de resíduos são
gerados anualmente, das quais, no ano de 2010, apenas um terço foi recolhido de forma
adequada. Ou seja, a maior parte foi depositada de forma incorreta, causando graves
problemas, principalmente nas áreas urbanas, com o assoreamento dos sistemas de
drenagem e a formação de ambientes favoráveis à proliferação de vetores de doenças
(AGOPYAN; JOHN, 2011).
Desde 2002 que o Conselho Nacional de Meio Ambiente (CONAMA) estabeleceu
uma resolução113
com diretrizes para o gerenciamento desses resíduos, inclusive com o
incentivo à reciclagem, contudo, segundo a ABRELPE114
(Associação Brasileira de
Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais), apesar do aumento da quantidade
coletada de 2011 para 2012 (5% a mais), isso não representa o total de lixo da construção e
demolição gerado pelos municípios brasileiros, uma vez que as prefeituras recolhem
112
AGOPYAN, V.; JOHN, V. M. Reciclagem de Resíduos da Construção. Departamento de Construção
Civil da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo. São Paulo, 2000.
SPOSTO, R. M. Análise Preliminar da Sustentabilidade na Produção de Blocos Cerâmicos para Alvenaria
em Brasília – DF. Anais I Conferência Latino-americana de Construção Sustentável, São Paulo, 2004. 113
Resolução CONAMA No. 307 de 2002 onde estabelece diretrizes, critérios e procedimentos para a gestão
dos resíduos da construção civil (Disponível em WWW.mma.gov.br). 114
Dados disponíveis em www.abrelpe.org.br/Panorama/panorama2012.pdf.
161
apenas os resíduos de obras sob sua responsabilidade e os lançados nos logradouros
públicos. De qualquer forma, percebe-se que a efetiva operacionalização dessa norma
ainda configura-se como um desafio, principalmente com relação aos resíduos gerados nos
municípios de menor porte (que necessitam de uma regulação mais simplificada) e aqueles
gerados em pequenas reformas (AGOPYAN; JOHN, 2011).
Um dos maiores desafios da sustentabilidade para o setor da construção civil refere-
se aos problemas gerados pela informalidade das construções. Esta condição é visível em
praticamente todos os municípios do país, materializada nas invasões e ocupações de áreas
impróprias, com sérios riscos ao meio ambiente, a infraestrutura urbana e ao próprio
morador. A informalidade também favorece à desigualdade entre construtores e à
corrupção de agentes públicos e privados, sendo de difícil combate (AGOPYAN; JOHN,
2011). Por outro lado, este mesmo problema configura-se como uma grande oportunidade
para o setor no sentido de se trazer para a formalidade todo esse contingente, com a criação
de novas habitações e toda a rede física de estruturação social, como escolas, hospitais,
estradas, etc.
A sustentabilidade de todo o sistema da construção civil exige uma série de
inovações: o aperfeiçoamento de tecnologias existentes, a criação de novos sistemas
inteligentes, investimento no desenvolvimento de materiais mais duráveis, a reciclagem,
treinamento pessoal, legislação atualizada, etc. Enfim, um desafio que envolve toda a
sociedade na interação de todos os seus atores em sua extensão social, ambiental e
econômica, com novos contornos diferentes dos tradicionais conceitos de prazo, qualidade
e custos.
3.1 – A Cadeia Produtiva da Indústria da Construção e o desafio da Sustentabilidade
No constante fluxo de materiais, necessários para o desenvolvimento da vida
moderna, uma série de resíduos são gerados e esse processo vem se intensificando na
medida em que mais complexa se torna a rede social humana. Com isso, algumas matérias-
primas já começam a dar sinal de finitude, evidenciando a necessidade de mudanças nesses
processos, na busca por alternativas mais sustentáveis.
162
Essa ampla extensão no consumo de materiais, típica da construção civil está
intimamente ligada ao aumento da população, processo este que demanda infraestrutura,
moradia, trabalho, segurança, lazer, saúde e educação.
O consumo de materiais de construção e per-capita vem aumentando quase
ininterruptamente nos últimos 100 anos, e essa tendência continua. Mantidas as
atuais soluções tecnológicas, será necessário multiplicar por 2,5 vezes a
produção de cimento, bem como dos demais materiais de construção entre 2010
e 2050. (AGOPYAN; JOHN, 2011, p. 60).
Dentro da cadeia produtiva da indústria da construção, os resíduos gerados
diretamente no processo de construção representam apenas uma parcela do todo,
principalmente quando se observa toda uma gama de insumos que são produzidos no
sistema de mineração (areia, argila, calcário, etc.), na industrialização intensiva (vidro, aço,
alumínio) e no transporte desses materiais (combustíveis fósseis). Esse conhecimento
limitado deve ser ampliado para que a sociedade pressione o setor por novos processos
menos impactantes ao meio ambiente.
A obra pronta pode ser comparada a um objeto qualquer e, como tal, seu impacto
pode ser dimensionado sob alguns condicionantes: depende dos pormenores do projeto,
que, por sua vez, implica tecnologias empregadas na produção e uso de materiais; o
transporte da matéria-prima; seu desempenho durante o tempo de uso; após sua vida útil,
seu potencial de reaproveitamento. Diante disso, diferentes impactos ambientais são
observados na elaboração das construções, mesmo que pertença à mesma cadeia produtiva
(AGOPYAN; JOHN, 2011).
Os elos que definem a cadeia de produção da construção civil constituem um
sistema de empresas de diversos portes e que, por isso mesmo, têm um peso diferente
sobre o próprio sistema e sobre o meio ambiente. Pensar nessa cadeia envolve a articulação
entre atividades, materiais, processos e pessoas, que culminará na materialização de um
produto imóvel (a obra feita) para ser distribuído ou comercializado.
São três grupos industriais que compõem o setor da construção civil: os que
produzem materiais, insumos básicos e componentes; os que se colocam como da cadeia
auxiliar e, finalmente, os responsáveis pela obra especificamente (BLUMENSCHEIN;
SPOSTO, 2009).
163
Ao primeiro grupo, também denominado de indústrias de suprimento, pertencem os
que extraem os insumos básicos como areia, brita, madeira, calcário, etc., que podem ser
utilizados diretamente na obra, como é o caso da areia, ou servir de matéria-prima para
fabricação de outros componentes, a exemplo da argila para a fabricação de tijolos.
Também fazem parte desse conjunto as indústrias que produzem equipamentos de
suporte para a construção, como máquinas e ferramentas, que auxiliam na obra, mas não se
incorporam ao produto final, podendo ser reutilizados.
Trata-se de um elo da cadeia maior, muito segmentado sob todos os aspectos, desde
o porte até os processos e capacidade de inovação tecnológica; os entes que fazem a
produção dos insumos básicos vão desde as grandes mineradoras de ferro e calcário até
pequenos grupos extrativistas de areia, e, por isso mesmo, sua capacidade de inovação em
processos menos impactantes ao meio ambiente ocorre de maneira diversificada.
Atualmente, verificam-se grandes avanços em termos de novos equipamentos
menos poluidores, que maximizam a utilização do produto reduzindo desperdícios, com
maior comprometimento com processos industriais que controlam todas as etapas de
produção, desde a fabricação, a comercialização e o descarte final, até a adoção por
medidas mitigadoras dos impactos ambientais gerados.
Entretanto, são ações que envolvem investimentos, custos difíceis de serem
incorporados pelos pequenos grupos, além da falta de uma estrutura fiscalizadora mais
eficiente, dos órgãos públicos ambientais, em fazer cumprir os parâmetros legais que
incidem sobre esse tipo de produção.
As indústrias da cadeira auxiliar, como o próprio nome indica, dão suporte
informacional a todo o sistema, onde a pesquisa científica tem papel preponderante.
Referem-se às universidades e centros especializados em desenvolver novas tecnologias
para a indústria da construção civil, que vão auxiliar os escritórios de arquitetura,
engenharia e consultoria, oferecendo novos softwares, processos de produção, materiais,
enfim, produtos inovadores de toda natureza que de alguma forma contribuam para a
otimização das ações do sistema como um todo (BLUMENSCHEIN; SPOSTO, 2009).
Assim como os elos da cadeia de suprimentos, os da auxiliar apresentam grande
variedade de porte. Neste conjunto, enquadram-se desde os grandes centros de tecnologia
até os pequenos escritórios de arquitetura, que, em muitos casos, fazem a ligação direta
164
com a obra. Nesse sentido, uma grande dificuldade reside no fluxo das informações: como
fazer para que as inovações produzidas cheguem até a ponta da cadeia e reverberem em
processos e construções mais sustentáveis?
Por fim, no último grupo de indústrias que compõem a cadeia de produção da
construção civil encontram-se os entes do sistema principal; trata-se da cadeia de processo.
Este grupo é o responsável pela produção das edificações, bens tangíveis e imóveis. Nesse
conjunto, a grande divergência reside nos processos adotados, que tanto podem se valer de
alta tecnologia, quanto de alternativas tradicionais, em muitos casos já ultrapassadas, e vai
determinar o tipo de produto final, seu impacto no meio ambiente durante a execução e
utilização (BLUMENSCHEIN; SPOSTO, 2009).
A cadeia de processos caracteriza-se por ser muito tradicional e, por isso mesmo,
resistente às inovações e lenta em sua evolução; alguns aspectos podem ser apontados na
configuração desse quadro: produtos fixos e operários móveis (ao contrário da produção
em cadeia), dificultando organização e controle; mão-de-obra pouco qualificada; trabalho
sujeito a intempéries; da aquisição ao uso, um longo ciclo dificulta a contribuição da
experiência do usuário; grau de imprecisão de orçamentos e prazos maior que outras
indústrias (BLUMENSCHEIN; SPOSTO, 2009).
É comum confundir a cadeia de processos como o sistema geral da construção e,
portanto o maior responsável pela degradação do meio ambiente. Entretanto, este impacto
acontece em fases anteriores e posteriores, segundo três momentos ou características.
Num primeiro momento, a ação sobre o meio físico (de forma positiva ou negativa)
acontece na ocupação do espaço, ocasionado pelo processo de urbanização, que demanda
novas áreas de habitação, trabalho, lazer e redes de infraestrutura que dão suporte ao pleno
funcionamento das sociedades. Essa ocupação, por sua vez, sobrecarrega recursos naturais
como água, florestas, subsolo; o impacto será influenciado não só pelo processo de
implantação imediato (preparação da área com terraplenagem, desmatamento, etc.), mas
também pelos índices urbanísticos que vão regular, por força da lei, o uso e ocupação do
solo, com maior ou menor proteção desses recursos.
Em segundo lugar, a extração dos insumos básicos e seu processamento
representam uma enorme pressão sobre o meio ambiente e o alvo de grande preocupação
pelo desenvolvimento de estratégias mais sustentáveis. Um bom exemplo dessa etapa
refere-se à produção do cimento, material imprescindível na construção, que ao retirar
165
argila e calcário do solo pode comprometer grandes áreas naturais, e nas regiões das
fábricas, os cursos d‟água são poluídos pelos efluentes de sua produção.
Um terceiro aspecto, relacionado aos impactos ao meio ambiente, refere-se ao
transporte dos produtos que alimentam a cadeia produtiva da construção civil. Daí, tem-se
a utilização de combustível fóssil (em geral o diesel) nos caminhões e, consequentemente,
a emissão de CO2, na atmosfera, relativa a esses deslocamentos. Com isso, reveste-se de
grande importância a escolha desses materiais próximos aos locais de consumo, reduzindo
os deslocamentos no transporte, ou, quando possível, a utilização de transportes mais
eficazes, como trens ou navios.
Já a construção, propriamente dita, sua utilização e seu posterior desmonte, ao final
da vida útil, apresentam uma série de questões a serem consideradas na minimização dos
impactos, principalmente nas relacionadas ao: planejamento da obra; ao projeto e sistema
de construção adotado; na execução; no controle de qualidade e na redução dos resíduos.
A fase de planejamento de uma obra, que vai desde a primeira intenção, passando
pela escolha do local até a função do edifício, é importante para que os objetivos de
sustentabilidade sejam alcançados. É nessa etapa preliminar que os estudos de viabilidade
econômica e ambiental devem responder às questões preliminares na tomada de decisão: É
possível construir esse empreendimento? Quais os custos ambientais? Que medidas
mitigadoras serão necessárias?
A partir dessas respostas, serão apontadas as diretrizes que servirão de fio condutor
para as demais etapas, numa análise abrangente e sistêmica, na antecipação dos problemas,
na opção pelo desafio da inovação.
Um plano de canteiro é importante na organização da obra, antes do início da
construção. Nesse momento, poderão ser otimizados os fluxos internos de materiais com a
redução de tempo e perda; localização seletiva de resíduos para posterior reciclagem;
medidas para minimizar o impacto ambiental na vizinhança (incômodos); medidas para
garantir a boa acomodação e segurança dos empregados, assegurando sua integridade física
e pessoal, enfim, ações que devem ser formalizadas e reverberadas ao longo de toda obra.
A fase projetual assume cada vez mais papel preponderante em todo o processo
construtivo, uma vez que é ao longo dela que as decisões mais relevantes são tomadas e
vão interferir em muitas etapas, desde a especificação dos materiais, sua origem, o tipo de
166
processo construtivo, a utilização do usuário final até o descarte da obra quando findada
sua vida útil (BLUMENSCHEIN; SPOSTO, 2009).
O setor precisa investir na formação de seus profissionais projetistas. As decisões
técnicas de partido arquitetônico, soluções de ventilação, iluminação, proteção das
fachadas, tipo de cobertura, estrutura, instalações elétricas e hidráulicas, sistemas de
automação e a escolha de materiais e fornecedores, tudo isto, com vistas à otimização de
recursos, depende diretamente de profissionais bem treinados e atualizados com as opções
e inovações do mercado (AGOPYAN; JOHN, 2011).
No Brasil, alguns aspectos contribuem para que se ignore a importância do projeto,
o que resulta numa má qualidade do edifício final, cabendo destacar:
A economia, devido à escassez de recursos no caixa do empreendimento durante
a elaboração do projeto; a pressa em submeter o projeto a agentes financeiros,
seja para antecipar as vendas, ou para a obtenção de financiamentos; [...] cada
projeto é visto como único, não há o interesse em padronizar; a cultura atrapalha
na escolha de materiais e componentes racionalizados; o detalhamento é
pequeno, na maioria das vezes sendo delegado para o momento da execução; a
compatibilização é feita tardiamente, em geral quando o projeto legal já está
pronto e o empreendimento lançado (BLUMENSCHEIN; SPOSTO, 2009, p.
781).
Desse modo, muitos dos problemas enfrentados durante a fase de execução, e
mesmo de utilização do empreendimento, poderiam ser eliminados através de um projeto
bem elaborado, com uma especificação de materiais adequada às condições de localização,
assim como de projetos complementares integrados, as built115
, um corpo de projetistas
atento à dinâmica da obra, capaz de rapidamente assimilar novas demandas e propor as
modificações projetuais necessárias.
Durante a execução da obra, as perdas representam os maiores problemas que
apontam no sentido contrário à sustentabilidade. Nesse sentido, por perda entende-se
qualquer tipo de ineficiência que incida sobre o uso de materiais e equipamentos, no
aproveitamento de mão-de-obra, nos deslocamentos, enfim, qualquer ação que, de alguma
forma, contribua para a redução da qualidade ambiental e econômica do empreendimento
(BLUMENSCHEIN; SPOSTO, 2009).
115
Revisão do projeto com a incorporação de todas as modificações realizadas ao final da obra, ou o projeto
que foi efetivamente construído.
167
As perdas podem ser identificadas na produção em excesso de quantidades, na
substituição de materiais por outros de desempenho superior ao especificado, no manuseio,
na falta de procedimentos padronizados, no treinamento de operários, na falta de cuidados
no armazenamento, na utilização de materiais defeituosos e, consequentemente, o
retrabalho (BLUMENSCHEIN; SPOSTO, 2009).
A recente estabilização da economia brasileira, o aumento da concorrência pela
abertura do mercado para empresas estrangeiras e uma clientela cada vez mais exigente
vêm impondo ao setor da construção civil uma nova postura, com a incorporação de
programas de melhoria dos seus processos. Essa nova conjuntura não admite desperdícios,
os quais se refletem em edificações ineficientes e mais caras, principalmente ao longo de
sua utilização, quando os custos com a manutenção das atividades tendem a se tornar cada
vez mais onerosos, pela crescente escassez dos recursos naturais e a valorização da mão-
de-obra.
Esse quadro vem consolidando uma tendência por empreendimentos dentro de uma
visão de sustentabilidade, desde sua concepção, execução, utilização e desmonte ao final
de sua vida útil, ou, em outras palavras, do berço ao túmulo. De forma geral, tanto o setor,
especificamente, quanto a sociedade como um todo vêm experimentando, cada vez mais,
opções por produtos sustentáveis, o que contribui sobremaneira para sua popularização e
acesso.
Para que a cadeia produtiva da construção civil seja caracterizada como sustentável,
toda uma gama de ações deve ser adotada ao longo de todo o processo. Nesse sentido, cabe
destacar o problema que, provavelmente, seja o mais visível e, portanto, o que mais é
associado à degradação do meio ambiente causada por este setor de mercado, que seria a
geração de resíduos sólidos.
Nos últimos anos, diversas pesquisas vêm sendo desenvolvidas na investigação das
possibilidades de gestão desses resíduos, com o poder público voltando-se a esse problema,
principalmente a partir da Resolução 307 do CONAMA, que define como responsabilidade
do Município a elaboração do Plano Municipal de Gestão de Resíduos da Construção.
O incremento do setor construtivo nos últimos anos agravou esse problema
consideravelmente, principalmente nos grandes centros, com a saturação dos locais de
depósito do lixo urbano e a disposição clandestina em áreas impróprias. Por essa razão,
168
surgiu a necessidade pela implantação de sistemas de gestão que visam controlar a geração
desses resíduos, acondicionamento, coleta, transporte, reciclagem e disposição final.
Comumente, os resíduos que são produzidos por uma edificação qualquer são
associados apenas à sua etapa de construção, entretanto estes acontecem na manutenção do
edifício e, ao final de sua utilização, em seu desmonte. Porém, mais importante do que
identificar a etapa de geração do resíduo, é traçar um plano para a sua redução, que deve
perpassar todas as fases do processo de produção.
Na etapa de planejamento, a escolha do local, a função do edifício, as opções de
fornecedores ou a escolha da tecnologia a ser utilizada são decisões preponderantes para a
racionalização e otimização do processo, “considerando-se o ciclo de vida dos materiais e
componentes a serem empregados, desde a extração da matéria-prima até o seu potencial
de reciclagem” (BLUMENSCHEIN; SPOSTO, p. 787, 2009). Um exemplo claro e simples
de uma ação nessa etapa refere-se à opção do incorporador por deixar os materiais de
acabamento das unidades construídas serem escolhidos e aplicados pelo cliente, após a
entrega do empreendimento. Trata-se de uma decisão que pode ser tomada antes do início
da construção e que, ao final, reduzirá desnecessárias quebras e desperdícios para atender a
necessidades específicas que fogem ao controle do construtor.
A fase de projeto pode ser dividida em dois tipos: o projeto do produto e o projeto
da produção e, em ambos, ações podem ser tomadas para a redução dos desperdícios e,
consequentemente, dos resíduos. O primeiro tipo constitui os projetos de arquitetura e
complementares e devem priorizar os princípios de padronização e racionalização nas suas
soluções. A flexibilidade do projeto também é uma característica importante, pela
possibilidade de modificações e adaptações ao longo da obra e no aproveitamento futuro
da edificação e de suas partes, permitindo ao usuário uma personificação sem a
necessidade de demolições (BLUMENSCHEIN; SPOSTO, 2009).
Todos os projetos (arquitetura, estrutural, hidro-sanitário, elétrico, lógica, etc.)
devem ser compatibilizados para evitar descontinuidades de soluções que acarretam em
decisões na obra e nem sempre as mais racionais. Espera-se que os projetistas foquem suas
decisões em tipologias mais compactas, nos elementos pré-fabricados e modulados, nos
materiais certificados e na reciclagem, sempre que for possível, tanto nos componentes
quanto nos processos internos a obra.
169
O projeto da produção refere-se basicamente à organização do canteiro de obra, que
deve ser preparado para o fluxo do transporte de chegada e interno, o armazenamento, a
gestão dos resíduos gerados com sua adequada sinalização e disposição. A otimização
destas etapas também reduz as perdas e influenciará de fato na sustentabilidade de todo o
processo.
Esse plano de redução de resíduos consiste na sistematização controlada das
atividades desenvolvidas no canteiro, com alguns procedimentos fundamentais: utilização
adequada dos equipamentos; mão-de-obra treinada para cada tarefa; gestão dos materiais
desde o controle no recebimento, na armazenagem, utilização, recolhimento das sobras e
lixo; na segurança dos funcionários e seu bem estar geral (BLUMENSCHEIN; SPOSTO,
2009). Tais cuidados podem garantir uma execução dentro dos padrões de qualidade
atualmente exigidos pelo controle da sustentabilidade ambiental, que, ao final, serão
incorporados à edificação e em sua consequente valorização no mercado.
Durante a construção, os focos de perdas e resíduos deverão ser detectados num
processo contínuo, tanto para sua correção imediata, se possível, quanto para a tomada de
decisões futuras, em outras obras, corrigindo imperfeições e na escolha por outras
tecnologias ou materiais.
Em relação aos resíduos na fase de manutenção do edifício, estes estão diretamente
ligados à qualidade da construção. Nesse contexto, se todas as decisões tomadas, nas
etapas anteriores à utilização do edifício, e se forem baseadas no aumento da vida útil da
edificação, certamente, estas ações se desdobrarão num desempenho adequado na futura
utilização pelos usuários.
Paralelamente a essas ações, ainda existem os procedimentos de manutenção
preventiva a serem tomados a fim de evitar “desgastes prematuros devido à falta de
manutenção” (BLUMENSCHEIN; SPOSTO, 2009, p. 789,). Também, é necessária a
adequada informação aos usuários em relação ao uso das novas tecnologias e materiais
empregados, através de treinamentos e manuais da edificação, realizados e entregues no
ato de posse do imóvel.
Todos esses procedimentos de redução dos resíduos, citados anteriormente, estão
ligados diretamente à edificação, seu planejamento, execução e manutenção, mas a
construtora pode dar continuidade a esse processo através do Plano de Reutilização dos
Resíduos em outras obras, tais como restos de madeira ou restos de blocos. Esses
170
materiais, que a princípio seriam descartados, passam a fazer parte dos novos insumos,
para, novamente, entrar na cadeia de produção, onde, na maioria das vezes, assumem outra
função que não a originalmente de sua produção, mas nem por isso menos importante
dentro dos princípios da sustentabilidade.
Como visto, o ciclo de produção da indústria da construção civil envolve uma série
de etapas, e seu posicionamento frente às propostas da sustentabilidade assinala para um
grande desafio. Ao mesmo tempo, todo um leque de possibilidades se expõe em virtude da
própria novidade que o tema encerra. Com base nisso, o próprio mercado já começou a se
articular e, atualmente, já é possível encontrar alternativas inovadoras, seja em termos de
materiais, processos produtivos ou metodologias, que em muito vem contribuindo para a
diminuição dos impactos ambientais causados por essa cadeia. Nessa perspectiva, cabe
destacar um método que tem sido progressivamente defendido como auxiliar na tomada de
decisões mais conscientes, tanto de produtores, quanto dos clientes, a Análise do Ciclo de
Vida (ACV).
A ACV, que faz parte das normas da ISO 14000, “está baseada na quantificação
dos fluxos de entrada (consumo) e saída (emissões) de materiais e energia associados ao
produto, ao longo do ciclo de vida [...] e, em tese, permite a tomada de decisões analisando
o impacto ambiental.” (AGOPYAN; JOHN, 2011, p. 64).
Devido à sua complexidade, que demanda uma considerável quantidade de dados,
tornando-a trabalhosa e demorada, em muitos casos, inclusive o Brasil, tem levado
pesquisadores a se basearem em informações de outros países mais desenvolvidos nessa
tecnologia, mas que incorre em erros, uma vez que os insumos, resíduos e processos são
distintos, e mudam de acordo com a realidade local. Associada às dificuldades técnicas,
deve-se considerar também que a ACV é, por enquanto, um instrumento optativo dos
produtores e sua popularização estará diretamente relacionada tanto a pressões normativas,
quanto de clientes mais conscientes e, consequentemente, mais exigentes, o que leva
tempo.
Segundo as normas ISO 14000, a ACV deve ir além da avaliação dos impactos ao
meio ambiente causados pelos produtos e seus processos de produção, deve incorporar
alternativas de redução. Para tanto, deve considerar desde a matéria-prima ou insumos
básicos (extração, consumo), utilizados na execução do produto final, sua utilização (vida
útil), e reciclagem ou disposição final. Esse produto deve também ser comparado com
171
outros semelhantes, mas que utilizaram materiais e processos alternativos de fabricação, no
intuito de se verificar os graus de geração de resíduos e as possibilidades de
reaproveitamento, em cada um dos casos (VALLE, 2002).
A ACV está dividia em estágios, dentro da série de normas ISO, da seguinte forma:
a norma 14040 estabelece os objetivos do estudo, abrangência, profundidade e define uma
base comparativa de equivalência com outros produtos; a norma 14041 refere-se aos
estudos dos fluxos de energia e materiais (consumos e emissões durante a vida útil); a
14042 quantifica os impactos sofridos pelo meio ambiente; a norma 14043 direciona-se
para a interpretação dos dados na forma de comparar os impactos com os objetivos
estabelecidos inicialmente, permitindo, assim, reavaliar continuamente o processo
produtivo; as demais, 14044, 14047, 14048 e 14049, indicam diretrizes, formatação dos
documentos necessários e exemplos de aplicação (SATTLER, 2009).
A popularização da Análise do Ciclo de Vida deve ser tomada como um objetivo
pelo setor da construção civil. Para tanto, investimentos na simplificação da metodologia
tornam-se fundamentais, que, associados a algumas novas ferramentas de projeto que
utilizam modelagem computacional, tornarão a ACV um processo trivial e valioso para a
medição dos impactos desse setor (AGOPYAN; JOHN, 2011).
Os sistemas de certificação de edifícios verdes brasileiros ainda não incorporaram a
ACV em suas avaliações, sendo um dos motivos de críticas por parte de pesquisadores, a
exemplo do professor Vanderley John, da Universidade de São Paulo. De forma parcial,
apenas o Selo AQUA “incentiva a tomada de decisão baseada em declaração ambiental de
produto” (AGOPYAN; JOHN, 2011, p. 66,).
No Brasil, cabe destacar o papel do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação,
quando, em 2007, aprova o projeto Inventário do Ciclo de Vida para Competitividade
Ambiental da Indústria Brasileira (SICV Brasil), através do Instituto Brasileiro de
Informação em Ciência e Tecnologia (IBICT), cujo “objetivo principal é desenvolver um
banco de dados de inventário do ciclo de vida da indústria de base do Brasil”116
.
Desde sua criação em 2007, o projeto SICV Brasil vem desenvolvendo uma série
de ações com destaque para um banco de dados ACV, uma metodologia nacional em ACV
(com base na norma ISO 14040) que está em fase de homologação por pesquisadores e
116
Disponível em www.pbacv.blogspot.com.br.
172
instituições européias da mesma área, um Sistema de Inventário do Ciclo de Vida próprio
da realidade nacional, uma ontologia117
brasileira e, por fim, vem desenvolvendo uma linha
de aprendizagem informacional com o propósito de divulgar para o grande público
(inclusive crianças) os conceitos de ACV e sua importância para a sustentabilidade
ambiental118
.
Especificamente o setor da construção civil (no Brasil e no exterior) vem,
gradativamente, se valendo dos conceitos em ACV, principalmente como suporte para
decisões na utilização de materiais e componentes. Esse processo, evidentemente, tem sido
possível graças às pesquisas na área de avaliação de materiais de construção,
principalmente com relação à madeira (BARBOSA, 2001), bloco cerâmico, (DRUSZCZ
2002), bloco de concreto (MASTELLA, 2002) e processos em geral.
São muitas as possibilidades para utilização das inovações para a sustentabilidade
nas construções. A todo o momento, novas ferramentas, materiais, processos, são
apresentados com vista à melhoria da qualidade dos sistemas construtivos e do espaço da
cidade. Esse processo requer um esforço conjunto entre políticos, empresários e sociedade
consumidora em geral. Políticas fiscalizadoras eficazes e desburocratizadas, campanhas de
esclarecimento, normas técnicas atualizadas, métodos de avaliação e produção
simplificados, incentivos fiscais, etc. podem compor um marco técnico/político capaz de
fomentar nos empresários o desejo pela produção mais limpa e assegurar um mercado com
base no equilíbrio fiscal, na justa remuneração do trabalho, na competitividade com
respeito às legislações e aos padrões de qualidade.
Tais políticas podem levar ao cidadão comum os esclarecimentos da importância
em se trabalhar, morar e se ter lazer, em ambientes saudáveis, em sua mais ampla
concepção, tornando-os mais exigentes, atentos e conscientes de seus direitos e deveres no
processo de sustentabilidade das cidades.
Esses novos marcos políticos, sociais, econômicos e ambientais sinalizam para a
reorganização da indústria da construção civil em torno do seu sindicato, enquanto
instância capaz de conduzir o setor para práticas menos impactantes. As respostas dessas
organizações se materializam de forma heterogênea, reflexo da profundidade na qual a
sustentabilidade vem sendo tratada nos diversos estados da federação. O próximo tópico
117
Ontologia organiza conceitos no âmbito da temática ACV. 118
Disponível em www.ibict.br.
173
aborda essas questões, visando montar um panorama geral das ações dos Sinduscon sobre
o tema, tendo por base, exclusivamente, as informações contidas nos respectivos sites
dessas entidades.
3.2 – O papel do Sinduscon nas principais capitais do país
Percebe-se que a área dos empreendimentos imobiliários caracteriza-se por uma
intensa competição, acirrada nos últimos anos pelo aquecimento do mercado, fazendo com
que grande parte das empresas do setor buscasse alternativas de se diferenciar. Sendo
assim, muitas delas passaram a criar estratégias que melhor as conduzissem frente aos
novos desafios, principalmente em tempos de fervorosos apelos ambientais.
O setor da construção civil trabalha diretamente com produtos que envolvem riscos
financeiros, associados principalmente ao seu longo processo de realização e seu alto
custo, ficando a mercê das mudanças do seu ambiente mercadológico, cada vez mais
comuns nas últimas décadas. Nesse sentido, vem tomando grande importância a
participação dos Sindicatos da Indústria da Construção, distribuídos nos Estados nacionais,
no sentido de orientar o setor para reduzir os riscos e maximizar as oportunidades, com
base nos novos pressupostos do desenvolvimento sustentável.
A complexidade inerente à execução dos projetos resulta de uma série de
contribuições, não só dos departamentos internos à construtora, mas também de outros
agentes que interferem ao longo de todo processo, “incorporando a atividade imobiliária,
elevados riscos associados aos investimentos de porte que são exigidos antecipadamente à
absorção do produto final pelo mercado” (BALARINE, 2004, p. 50). Essa lógica
construtiva tem suas bases sólidas graças a décadas de aprimoramento das técnicas, o que
resulta em um setor altamente tradicional e resistente as mudanças.
Contudo, o conceito da sustentabilidade vem questionar, dentre outras coisas, muito
dos materiais, técnicas e soluções construtivas do setor. Desde então, as empresas de
construção civil vêm sendo pressionadas pela sociedade como um todo, além de uma
crescente concorrência mercadológica, fazendo da inovação um elemento preponderante da
diferenciação e do sucesso dos empreendimentos.
174
Distribuídos nos diversos estados da nação, os sindicatos das construtoras
(SINDUSCON) vêm desenvolvendo ações no sentido de informar o setor acerca das várias
possibilidades de “posturas ambientalmente corretas” que podem ser incorporadas ao longo
de toda a cadeia construtiva. Esse posicionamento tende a avançar para um estágio além
das estratégias de gestão das empresas, caracterizadas pelas Certificações ISO 9000,
passando a se preocupar com o produto final, a obra, e todas as etapas de sua execução.
As ações do SINDUSCON caracterizam-se por estágios de atuação diferenciados
nos estados brasileiros, provavelmente associados ao maior ou menor rigor das legislações
ambientais existentes, ou seja, nos locais onde o marco legal, que incide sobre o ambiente
construído, é mais consistente, levou o setor das construtoras a se organizar com mais
efetividade para se enquadrar nessas posturas.
Nesse momento, a pesquisa avança na abordagem direta do trabalho dos
SINDUSCON nas regiões do país. Num primeiro momento, pretendia-se levantar as ações
nas principais capitais nordestinas – Fortaleza, Recife e Salvador – e nas duas maiores
cidades brasileiras, São Paulo e Rio de Janeiro, e assim fazer um contraponto entre duas
realidades distintas. Entretanto, devido às dificuldades de dados colhidos diretamente nas
sedes119
, optou-se por ampliar o universo investigativo para outras regiões do país,
tomando por base, exclusivamente, o material informativo disponível de forma eletrônica
nos sites desses órgãos.
Se, por um lado, o volume da amostra passou a ser maior, por outro, em muitas
vezes, alguns dados não puderam ser confirmados, ou aprofundados, graças às limitações
próprias da ferramenta de investigação. Contudo, essa indeterminação não comprometeu os
objetivos propostos de se traçar um quadro geral das respostas do setor e de que forma isso
acontece na distribuição espacial do território brasileiro, identificando as regiões mais
organizadas em termos de incorporação de diretrizes sustentáveis.
Evidente que as análises são generalizadas devido ao caráter de amostra da pesquisa
e no pressuposto de que todas as ações ligadas à sustentabilidade dos sindicatos estão
informadas e disponibilizadas nos respectivos sites.
119
Das cinco capitais visitadas, apenas o SINDUSCON de Recife e Salvador disponibilizaram acesso a
material impresso.
175
Nesse ponto, abre-se uma perspectiva enriquecedora para o desdobramento de
novos trabalhos na forma de se investigar profundamente as ações de todos os Sinduscon
em todos os Estados da Federação, uma investigação in loco que proporcionaria um retrato
pormenorizado de como o setor da construção civil vem se reorganizando, frente aos novos
desafios ambientais.
A seguir, será apresentado um demonstrativo de como vêm sendo feitas as
orientações sobre o desenvolvimento sustentável na construção civil a partir dos
SINDUSCON, nas regiões Norte, Nordeste, Centro-Oeste, Sudeste e Sul, numa
amostragem que computou no máximo dois sindicatos por região, a exceção do NE com 4.
3.2.1 – SINDUSCON – Pará
Fundado em 1942, o Sinduscon-PA120
desenvolve o “Projeto Construir” em
parceria com o Serviço Brasileiro de Apoio a Micro e Pequenas Empresas (SEBRAE), com
o objetivo de melhorar o arranjo produtivo local do setor da construção civil. Dentre os
vários campos de atuação do projeto, apenas o serviço de “Gestão da Qualidade e da
Produção” enquadra-se nos pressupostos da sustentabilidade e refere-se à assessoria para
adoção do Programa Brasileiro da Qualidade e Produtividade do Habitat (PBQP-H)121
.
As informações contidas no site não detalham o Projeto Construir, entretanto, só o
incentivo a implementação do PBQP-H já sinaliza um compromisso com a
sustentabilidade, que, mesmo assim, poderia ser melhor explorado pelo sindicato.
3.2.2 – SINDUSCON – Tocantins
O Sinduscon-TO atua desde 1992 e sua principal ação, para desenvolver a
sustentabilidade no ramo, refere-se ao trabalho da Comissão de Qualificação, que orienta
as construtoras para implantação do PBQP-H através de um fórum regular de discussões e
por meio de consultoria técnica122
.
120
Disponível em www.sinduscon-pr.com.br. 121
Esse programa será detalhado adiante. 122
Disponível em www.sinduscon-to.com.br.
176
Da mesma forma que o Sinduscon-PA, o sindicato do Estado de Tocantins tem seu
empenho reconhecido no incentivo à adoção do PBQP-H, e também deveria explicitar
melhor essa ação, explorando, inclusive, o potencial de marketing desse instrumento.
3.2.3 – SINDUSCON – Ceará
O SINDUSCON, com base no território do Estado do Ceará, foi fundado em 1942.
Quando trata de temas de abrangência nacional, o faz através da Câmara Brasileira da
Indústria da Construção (CBIC), da Federação das Indústrias do Estado do Ceará (FIEC) e
da Confederação Nacional da Indústria (CNI), já nas questões locais, atua diretamente com
autoridades e órgãos estaduais e municipais123
.
Atualmente, tem mais de 430 construtoras afiliadas, junto às quais promove cursos,
palestras e eventos, com temas relacionados ao setor visando aprimorar o nível técnico e
operacional das empresas. Também realiza ações junto à sociedade em geral, no sentido de
esclarecer a importância da construção civil e como se deve estabelecer uma boa relação
entre os clientes e as construtoras, exemplo disso foi o lançamento em 2012 do “Guia do
Comprador de Imóveis”, onde estão expostas as informações necessárias para se fazer um
negócio bom e seguro124
.
Dentre muitos benefícios oferecidos aos associados, destacam-se a isenção da Taxa
Compensatória Ambiental125
e o convênio com o PBQP-H.
O Sinduscon-CE elabora, mensalmente, uma revista intitulada “Sinduscon
Notícias”, com a primeira edição em janeiro de 2009 e a última em setembro de 2012, onde
informa aos seus associados os diversos assuntos relacionados ao setor, no âmbito local,
nacional e internacional126
. Nesse sentido, foi executado um levantamento de todos os
conteúdos ligados a temática da sustentabilidade, desde a edição 13, de janeiro de 2010,
123
Disponível em www.sinduscon-ce.org/ce/institucional.html. 124
Disponível em www.sinduscon-ce.org/ce/links-e-dowloads.html. 125
Conforme Lei Municipal 8.738/2003, Art. 10, que destina um percentual de 0,5% dos custos totais
previstos para a implantação do empreendimento, visando à criação, conservação e preservação de áreas
especialmente protegidas e à proteção do meio ambiente natural e artificial. (Disponível em
www.fortaleza.ce.gov.br/diarios-oficiais). Desde sua implantação que essa taxa vem sendo questionada
judicialmente pelo SINDUSCON-CE. 126
Disponível em www.sinduscon-ce.org/ce/sinduscon-noticias.html.
177
ano de início da pesquisa, até a última edição de número 40. As informações foram
sistematizadas, cujo conteúdo analisado consta do Anexo 01.
Nas primeiras edições pesquisadas, encontram-se, de forma constante, informações
ligadas à temática ambiental, na maioria das vezes são informações de novos materiais ou
processos construtivos que podem ser adotados pelas construtoras com objetivos
sustentáveis. Cabe ressaltar, inclusive, que nestas edições existe um espaço editorial
específico para este tipo de informação intitulado “sustentabilidade”. A partir da edição 26,
de maio de 2011, esse espaço vai adquirindo um caráter esporádico, ficando a temática
ausente por até quatro edições (da 30 a 33).
Com relação aos temas, especificamente, cabe ressaltar que se trata, em sua grande
maioria, de caráter meramente informativo sobre algum novo material, evento, pesquisa,
legislação, etc., poucas foram as notificações sobre ações concretas desenvolvidas pelo
órgão para implementar a sustentabilidade no setor, tais como cursos ou palestras.
Entretanto, cabe ressaltar o Programa Qualidade de Vida na Construção, que apesar de não
relacionar-se às questões construtivas, desempenham um favorável trabalho junto aos
operários e seus familiares, que sem dúvida contribui para a sustentabilidade social na
construção civil do Estado.
3.2.4 – SINDUSCON – Pernambuco
O Sinduscon-PE, ao longo dos últimos cinco anos, vem desenvolvendo um trabalho
bastante atuante na área da sustentabilidade. Através de sua Diretoria de Ciência e
Tecnologia, responsável por aproximar o órgão com novas pesquisas e entidades de ensino,
tem realizado, desde 2008, o Seminário Pernambucano de Construção Sustentável, além de
promover regularmente (uma vez ao mês desde abril de 2008) o Fórum Pernambucano de
Construção Sustentável, que acontece na própria sede do Sinduscon, aberto ao público e
com participação de diversas instituições convidadas127
.
Durante o primeiro ano de realização do Fórum, foi montada sua estrutura
organizacional, dividida em quatro Grupos de Trabalho, com diretrizes e ações diferentes.
127
Disponível em www.sindusconpe.com.br.
178
O primeiro grupo, Resíduos Sólidos, é responsável por analisar toda a legislação
(Municipal, Estadual e Federal) pertinente ao assunto, objetivando padronizá-la para
divulgação junto às empresas associadas a fim de proporcionar a destinação correta desses
resíduos. Uma de suas principais ações foi a apresentação da Área de Transbordo e
Triagem (ATT), para a Região Metropolitana do Recife, em junho de 2009, através da
Cartilha Resitech – Módulo Avançado de Destinação de Resíduo da Construção128
.
O segundo grupo, Coleta Seletiva, tem como objetivo conhecer a realidade dos
catadores de lixo da cidade, para proporcionar inclusão social através do cooperativismo e
difundir a reciclagem129
. Em 2008, o grupo elaborou um projeto de coleta seletiva para o
bairro da Boa Viagem, envolvendo os condomínios e os catadores, denominado “Atitude
Seletiva”. Em 2009, como desenvolvimento do projeto, ocorreu o treinamento dos
catadores e o lançamento oficial da campanha, entretanto, não houve prosseguimento da
ação por falta de contrapartida da Prefeitura Municipal do Recife em fornecer o local para
triagem do lixo e venda dos produtos reciclados. Atualmente, o projeto ainda aguarda o
apoio público municipal130
.
Esse caso evidencia uma situação corriqueira, no sentido de, mesmo quando o setor
privado toma uma iniciativa de ação, no caso socioambiental, nem sempre o setor público
acompanha, evidenciando um descompasso entre as instâncias, o que geralmente resulta no
fracasso da iniciativa e na perda da melhoria.
O grupo de Construção Sustentável tem por finalidade fundamentar um conceito e
ações concretas do setor para alcançar esse fim. Em 2008, publicou uma revista intitulada
“Potencialidades e Desafios para o Desenvolvimento Sustentável na Construção Civil”, em
que apresenta uma visão geral da sustentabilidade, sua aplicação no setor e os desafios e
tendências futuras (PRIORI JUNIOR, 2008). Em 2009, realizou uma pesquisa com o tema
“Projeto para a Melhoria das Condições Socioambientais no Gerenciamento Sustentável de
Canteiros de Obra”, resultando posteriormente de dois diagnósticos apresentados na forma
de cartilhas, divulgadas em 2009 (primeira fase) e em 2010 (segunda fase).
128
Disponível em www.sindusconpe.com.br/sustentabilidade.php. 129
Disponível em www.sindusconpe.com.br/index.php/seminários2010. 130
Disponível em www.sindusconpe.com.br/sustentabilidade.php.
179
Por fim, o quarto grupo de trabalho, Banco Social, tem por objetivo criar em
Pernambuco o Banco de Materiais de Construção, seguindo os mesmos moldes do criado
no Rio Grande do Sul131
.
Nas reuniões mensais do Fórum, na sede do Sinduscon-PE, diversos temas são
tratados, desde a avaliação de eventos realizados, debates de questões jurídicas ou
apresentação de palestras de novos materiais e processos construtivo, todos relacionados a
área da sustentabilidade.
O Seminário Pernambucano de Construção Sustentável132
acontece anualmente
entre agosto e novembro, e tem sua pauta montada a partir das reuniões do Fórum durante
o primeiro semestre de cada ano. A programação desde o Primeiro Seminário (2008), até o
último (2013) consta do Anexo II.
Além dos Fóruns e Seminários, o Sinduscon-PE concebeu, em 2011, o Portal
Eletrônico “Movimento Vida Sustentável”133
, lançado oficialmente no Quinto Seminário,
com as pretensões de agregar todas as informações e ações do Sindicato com relação à
sustentabilidade no setor, marcando também uma parceria com a Secretaria de Recursos
Hídricos e Energéticos do Estado de Pernambuco e a Revista Construir Nordeste.
Em resumo, percebe-se uma crescente participação do Sinduscon-PE na discussão
da sustentabilidade na construção civil, claramente verificada nos últimos dois anos com a
ampliação do Seminário, não só em termos de dias, mas principalmente quando foi
agregado a dois outros eventos maiores (FICONS134
e SUSTENCONS135
), o que trouxe
muita visibilidade no âmbito do Nordeste.
Com relação às temáticas abordadas nos eventos principais136
(Seminários), pôde-se
constatar que perpassam por aspectos importantes da sustentabilidade, como resíduos,
eficiência energética, normas técnicas, reaproveitamento de águas, certificações, etc., com
131
Os Bancos Sociais foram idealizados pela Fundação Gaúcha dos Bancos Sociais – Indústria da
Solidariedade, e tem por objetivo principal “transformar o desperdício em benefício social, oferecendo para
as comunidades carentes excedentes industriais dos mais diversos segmentos, além de lhes proporcionar
cursos de capacitação, treinamento, e principalmente, introduzir as técnicas de Gestão Empresarial ao terceiro
setor”. Disponível em wwwbancossociais.org.br/pt/ Pagina/2/O-que-Fazemos. 132
Disponível em www.sindusconpe.com.br/sustentabilidade.php. 133
Disponível em www.movimentovidasustentavel.com.br. 134
Feira Internacional de Materiais, Equipamentos e Serviços da Construção. 135
Feira da Sustentabilidade na Construção. 136
As pautas dos Fóruns não estão disponíveis para consulta no site, as informações descritas foram obtidas
diretamente na sede do sindicato em material impresso.
180
uma consistente integração entre as experiências do setor privado, instituições de ensino e
órgão públicos administrativos e financiadores.
3.2.5 – SINDUSCON – Bahia
Com sede em Salvador, o Sinduscon-BA, foi fundado em 1952 e, hoje possui duas
Delegacias Regionais, em Vitória da Conquista e Feira de Santana. Mesmo divulgando
como uma de suas “missões”137
a responsabilidade socioambiental, não possui em sua
estrutura organizacional nenhuma diretoria que responda diretamente pelas ações de
sustentabilidade do setor.
No site do órgão138
está disponível para consulta o “Informativo Sinduscon-BA”139
,
um boletim divulgado de forma bimestral, a partir de abril/maio de 2010, com o resumo
das principais ações e notícias relacionadas ao setor construtivo na Bahia.
Após um levantamento em todas as edições (Anexo III), com última data de
novembro/dezembro de 2012, para se investigar os conteúdos da temática da
sustentabilidade, pode-se constatar que: o Sinduscon-BA ateve-se, basicamente, à
divulgação de cursos, eventos e programas, numa atitude mais voltada à formação do
conhecimento, com apoio de outras instituições, a exemplo do SENAI e da UFBA. Isso
demonstra, aparentemente, uma intenção de se construir um corpo técnico especializado
numa esfera superior de comando, uma vez que essas ações eram, basicamente, voltadas
para engenheiros, arquitetos e o corpo administrativo das construtoras, incluindo seus
dirigentes, deixando de lado os operários.
Notadamente, uma das mais importantes ações do Sinduscon-BA refere-se à
construção da nova sede do sindicato. Amplamente divulgado como uma futura vitrine
para os novos parâmetros da construção sustentável, o novo empreendimento tomou por
base modernos sistemas construtivos, de soluções arquitetônicas e materiais que objetivam
a racionalização do consumo energético e de água, com pretensões de ser certificado pelo
Selo AQUA140
.
137
Disponível em www.sinduscon-ba.com.br/publicacao/prg_pub_det.cfm/quem-somos-apresentacao. 138
Disponível em www.sinduscon-ba.com.br. 139
Disponível em www.sinduscon-ba.com.br/informativo-sinduscon. 140
Disponível em www.sinduscon-ba.com.br/arquivo/folder_sinduscon.pdf.
181
Concebido para ser um espaço multiplicador de ideias sustentáveis no
compartilhamento do conhecimento adquirido por sua construção, o projeto contempla um
prédio de sete pavimentos, mais dois de garagem e um de cobertura. Dentre as inovações
destacam-se: fachadas ventiladas; panos de vidro com controle solar; pavimentação
permeável; paisagismo com espécies nativas; reuso de águas cinzas, pluviais e de
condensação do sistema de ar condicionado; bicicletário; toda iluminação com lâmpadas
LED; cobertura em teto jardim; etc. Durante a obra e a demolição da antiga sede, também
foram adotados sistema de tratamento de resíduos e desconstrução seletiva,
respectivamente.
Ao que tudo indica, a nova sede representará um marco para a sustentabilidade no
setor, que passa a enxergar as grandes possibilidades de crescimento frente às novas
demandas de um mercado consumidor mais exigente por espaços ambientalmente corretos.
3.2.6 – SINDUSCON – Sergipe
Fundado em 1972, o Sinduscon-SE não explicita linhas de ação ligadas à
sustentabilidade do setor, apenas apresenta seis comissões técnicas sem, entretanto,
detalhar qualquer atividade específica. As comissões dividem-se em: Materiais; Economia
Estatística; Indústria Imobiliária; Qualidade e Produtividade; Obras Públicas; Relações
Trabalhistas e Meio Ambiente141
.
3.2.7 – SINDUSCON – Goiás
Tendo iniciado sua atuação no ano de 1948, o Sinduscon-GO é um dos cinco
primeiros sindicatos patronais da indústria, fundados no Estado. Dentre as várias linhas de
atuação, cabe ressaltar algumas que estão relacionadas ao tema da sustentabilidade, sendo:
Materiais e Tecnologia, Qualidade e Produtividade, Desenvolvimento Humano,
Comunidade da Construção142
.
A primeira área, Materiais e Tecnologia, tem por objetivo a inovação tecnológica
de materiais, equipamentos e serviço, com vistas a contribuir para o aprimoramento,
141
www.sinduscon-se.com.br. 142
www.sinduscongoias.com.br.
182
fortalecimento e competitividade do setor. Atua através de um foro de discussão e no
desenvolvimento de projetos, tais como Revisão do Código de Obras, Difusão da
Inovação, Modulação, etc143
.
A Qualidade e Produtividade atuam no apoio organizacional das construtoras para a
melhoria do seu desempenho, através de duas frentes: a primeira, no apoio à adoção do
Sistema ISO 9001 e/ou do Programa Brasileiro de Qualidade e Produtividade do Habitat
(PBQP-H); a segunda, no estímulo a ações que apresentem soluções sustentáveis na
construção144
.
As ações de Desenvolvimento Humano destinam-se a qualificação profissional,
recolocação e integração dos trabalhadores. Possui um banco de empregos com cadastro de
profissionais disponíveis e com recente formação profissional, parcerias com o SESI e o
SENAI para desenvolvimento de cursos145
.
Por fim, a Comunidade da Construção refere-se a um movimento nacional de
integração entre os atores da cadeia de produção do setor que trabalham com cimento, com
o objetivo de difundir informações de melhores práticas e sistemas construtivos146
.
Apesar de não possuir uma coordenação específica da sustentabilidade, o
Sinduscon-GO desempenha um trabalho consistente em áreas afins que, diretamente,
incidem na atuação socioambiental das construtoras associadas e que, provavelmente,
reverberam em suas obras.
3.2.8 – SINDUSCON – Mato Grosso
Atuando desde 1968, o Sinduscon-MT divulga uma linha de atuação denominada
“Meio Ambiente”. Entretanto, verificou-se que as ações se situavam exclusivamente no
campo informativo com a divulgação de reportagens ou a disponibilização de textos e leis,
restringindo-se às áreas da “Gestão de Resíduos” e “Legislação Ambiental”147
; ações
específicas do sindicato voltadas à sustentabilidade do setor não estão informadas.
143
www.sinduscongoias.com.br/index.php/materiais-e-tecnologia. 144
www.sinduscongoias.com.br/index.php/qualidade-e-produtividade. 145
www.sinduscongoias.com.br/index.php/desenvolvimento-humano. 146
Disponível em www.sinduscongoias.com.br/index.php/comunidade-da-construcao. 147
Disponível em www.sindusconmt.org.br.
183
3.2.9 – SINDUSCON – Rio de Janeiro
Um dos mais antigos sindicatos da indústria da construção civil do Brasil, o
Sinduscon-Rio foi fundado em 1919, na época sob o nome de Associação dos Construtores
Civis do Rio de Janeiro. Hoje, com cerca de 2.000 empresas filiadas e 200 associadas,
possui uma consistente agenda de atividades ligadas às questões de meio ambiente e
sustentabilidade social e da construção civil148
.
Cabe destacar, primeiramente, o “Programa Alfabetizar é Construir”, lançado em
1990, destinado à educação do trabalhador diante das novas técnicas e no enfrentamento
dos problemas causados pelos erros de execução, gerando o retrabalho e o desperdício.
Também tem como objetivo mudar o perfil de indústria que mais emprega mão-de-obra
desqualificada. Nesse sentido, o Sinduscon é o órgão responsável pela coordenação
pedagógica do programa (juntamente com o SESI), no cadastro dos professores e na
supervisão geral, organizando reuniões e atividades extraclasses149
.
Em segundo lugar, criado tem 1994 numa parceria entre o Sinduscon-Rio e o
SENAI-RJ, o “Clube da Qualidade”150
é um modelo de associação entre empresas e
instituições de pesquisa, voltado para desenvolver ações e projetos relacionados à
qualidade da produtividade no setor. Tem sido responsável, ao longo destes anos, pela
criação e organização de cursos, seminários, conferências, etc.
Um terceiro ponto importante refere-se à sua estrutura organizacional, onde, dentro
de seu departamento técnico, encontra-se a Comissão de Sustentabilidade e Meio
Ambiente (CSMA) composta por representantes das empresas associadas, cujas atribuições
se referem à articulação do sindicato com os órgãos públicos responsável pelo controle e
licenciamento ambiental, no âmbito Municipal, Estadual e Federal, além da promoção do
amplo debate, através de eventos, sobre os conceitos e práticas de construção
sustentável151
.
A referida Comissão não possui uma agenda de reuniões pré-estabelecidas, sua
convocação é determinada por uma demanda interna dos próprios membros representantes
junto ao presidente da comissão, quando algum assunto toma vulto e merece ser discutido
148
Disponível em www.sinduscon-rio.com.br. 149
Disponível em www.sinduscon-rio.com.br/qsperfil.asp. 150
Disponível em www.sinduscon-rio.com.br/ps_cqualidade.asp. 151
Disponível em www.sinduscon-rio.com.br/qs_tecnico.asp.
184
ou, ainda, da solicitação de algum órgão externo para consulta e/ou apresentação de
informações de interesse mútuo.
A última ata de reunião da CSMA, disponível para consulta no site do sindicato152
,
data de janeiro de 2013. Nela, pode-se observar uma amostra dos temas tratados, que vão
desde aspectos puramente técnicos, como a geração e potencialidades das fontes de energia
solar para o Brasil, até exposições de assuntos institucionais ligados ao licenciamento
ambiental por técnicos da Secretaria de Meio Ambiente do Rio de Janeiro.
Por fim, vale salientar o trabalho do Sinduscon-Rio junto à divulgação das
informações e a promoção de eventos (reuniões, seminários, cursos, etc.). O sindicato
divulga, por mídia virtual, um informativo semanal e que tem o objetivo de noticiar ao
setor as últimas novidades. As reportagens são compilações de outros meios de
comunicação como revistas, jornais e até partes de livros, e versam sobre política em geral,
problemas urbanos locais, entrevistas, etc. Por sua pouca objetividade, vasta temática e,
principalmente, por não representar uma informação produzida pelo Sinduscon-Rio,
entendeu-se que qualquer tipo de análise sobre esse material poderia mascarar um perfil
mais próximo das reais ações sustentáveis do sindicato para o setor153
.
Quanto aos eventos, apresenta uma programação vasta que é divulgada com uma
antecedência mínima de dois meses. Conforme observado em seu calendário para 2013154
,
organizou um total de 46 eventos, perfazendo uma média de mais de 4 ao mês, destes, 16
encontros (35% aproximadamente) giraram em torno da ampla temática da
sustentabilidade.
Assim sendo, o Sinduscon-Rio demonstra um amadurecimento das ações de
formação do conhecimento do tema propriamente dito, seja pelo simples debate ou através
de uma divulgação mais formal e acadêmica.
152
Disponível em www.sinduscon-rio.com.br/ata_csma.pdf. Conforme agenda do próprio site, outra reunião
aconteceu no mês de maio, entretanto, sua ata não está disponível para consulta. 153
Disponível em www.sinduscon-rio.com.br/ps_inf_letters.asp. 154
A média calculada englobou o período de janeiro a outubro do referido ano. Disponível em
www.sinduscon-rio.com.br/acontece.htm. Acesso em 01 de setembro de 2013.
185
3.2.10 – SINDUSCON – São Paulo
Fundado em 1934, o Sinduscon-SP representa uma das maiores associações de
empresas do setor da América Latina, atualmente com cerca de mil construtoras associadas
e trinta mil filiadas, distribuídas em nove Regionais no interior do Estado155
.
O sindicato vem atuando nas questões ambientais com maior ênfase a partir de
1999, quando instituiu o Comitê de Meio Ambiente do Sinduscon-SP (COMASP). Desde
então, estabeleceu uma agenda estratégica com diversos temas voltados à disseminação das
informações e capacitação das empresas associadas.
Em 2010, o Sinduscon-SP alterou sua estrutura organizacional criando o Conselho
do Meio Ambiente (além dos já existentes Conselho Fiscal e o Consultivo), que tem por
objetivo “dar suporte à Presidência do sindicato nos assuntos relacionados à
sustentabilidade no setor da construção civil”156
.
Os temas prioritários tratados pelo COMASP estão divididos em 9 categorias:
Câmara Ambiental da Industria da Construção; Áreas Contaminadas; Construção
Sustentável; Educação Ambiental; Gestão de Resíduos; Mudanças Climáticas; Uso
Racional da Água; Eficiência Energética; Madeira Legal. Serão apresentadas as principais
ações do Sinduscon-SP em cada um destes temas, em informações disponibilizadas no site.
O trabalho da Câmara Ambiental da Indústria da Construção é, principalmente,
assessorar a Secretaria de Meio Ambiente na alteração de normas e no estabelecimento de
planos ambientais (conservação de energia, uso racional de recursos ambientais,
reciclagem de resíduos, etc.). Desde sua instituição, em julho de 1998, o Sinduscon-SP,em
sua composição administrativa, ocupa a cadeira da presidência da Câmara, desenvolvendo
trabalho dentro de cinco áreas: rodovias, desenvolvimento urbano e licenciamento
ambiental, resíduos da construção, avaliação de áreas contaminadas e sustentabilidade157
.
Com relação aos cuidados com áreas contaminadas, o Sinduscon-SP vem
trabalhando diretamente com a Secretaria de Meio Ambiente do Estado dentro da Câmara
Ambiental da Indústria da Construção. Em 2003, elaborou o “Guia para Avaliação do
Potencial de Contaminação em Imóveis”, em uso até hoje, com o objetivo de orientar no
155
Disponível em www.sindusconsp.com.br. 156
Disponível em www.sindusconsp.com.br/msg2.asp?id=3241. Acesso em 02 de setembro de 2013. 157
Disponível em www.sindusconsp.com.br/msg2.asp?id=1901. Acesso em 02 de setembro de 2013.
186
cuidado que se deve ter ao se fazer uma transação imobiliária, ou antes do início de uma
obra, averiguando as possibilidades de contaminação e, consequentemente, o risco à saúde
humana e ao meio ambiente 158
.
Especificamente, o tema da construção sustentável vem sendo abordado dentro do
Sinduscon-SP na forma de fóruns de discussão. Segundo o sindicato, os principais debates
aconteceram em 2003, sob o título “Avaliação Ambiental de Edifícios”; em 2009, “A
Responsabilidade da Saúde e Segurança no Canteiro de Obra”, os workshops “Eficiência
Energética” e “Mudanças Climáticas”; em 2010, destaca o “Seminário BIM – Modelagem
da Informação da Construção” e as palestras “Educação Ambiental na Construção Civil” e
“Sustentabilidade no Setor da Construção Civil Instrumentando Mudanças”; em 2011,
organizou o “Seminário Novos Caminhos para a Capacitação e qualificação Profissional de
Mão de Obra na Construção Civil”, a palestra “Avaliação Ambiental de Edifícios” e o
“Seminário Internacional de Avaliação Ambiental de Edifícios”; em 2012, os seminários
“BIM – Modelagem da Informação da Construção”, “Resíduos da Construção Civil” em
São José do Rio Preto e Sorocaba, “O Selo Casa Azul”; no ano de 2013, já realizou o
“Seminário Normas de Desempenho” e tem programado para outubro o “Seminário
Internacional BIM”159
. Além da responsabilidade direta na organização desses eventos,
apoiou outros, a exemplo dos “Seminários de Segurança e Saúde na Indústria da
Construção”, em parceria com o Instituto para Promoção do Trabalho Empreendedor; o
“4º. Simpósio Brasileiro de Construção Sustentável”, em conjunto com o Conselho
Brasileiro de Construção Sustentável e o “Encontro sobre Habitação Econômica e
Desenvolvimento Urbano Sustentável”, juntamente o Centro de Tecnologia de
Edificações160
.
Na área da educação ambiental, o Sinduscon-SP, em parceria com o SENAI-SP,
desenvolveu uma metodologia de trabalho que atua, basicamente, em dois campos: em
primeiro lugar, volta-se para a conscientização do setor administrativo (diretores, gerentes
e engenheiros), para as oportunidades mercadológicas relacionadas às questões ambientais;
em segundo lugar, foca diretamente no canteiro de obra, com o objetivo de criar um
ambiente favorável para implantação de ações sustentáveis, no envolvimento dos operários
e fornecedores. A operacionalização da metodologia se faz por meio da capacitação de
158
Disponível em www.sindusconsp.com.br/downloads/publicacoes/guia_avaliacao_de_contaminacao.pdf. 159
Disponível em www.sindusconsp.com.br/msg2.asp?id=1806. Acesso em 02 de setembro de 2013. 160
Disponível em www.sindusconsp.com.br/msg2.asp?id=5016. Acesso em 02 de setembro de 2013.
187
multiplicadores das informações e por material didático como cartilhas, cartazes e filmes,
que reproduzem situações cotidianas de uma obra mas com forte apelo por ações
ambientalmente mais corretas161
.
A partir de 2002, visando a atender a Resolução CONAMA 307/2002162
, o
Sinduscon-SP, através do COMASP, vem desenvolvendo algumas atividades no
gerenciamento dos resíduos da construção. Destaca-se, em primeiro lugar, o Programa de
Gestão Ambiental de Resíduos em Canteiros de Obra, iniciado em 2003, e de onde
participam onze construtoras com o objetivo de “capacitar estas empresas para o correto
gerenciamento dos resíduos nos canteiros, incluindo a redução da geração, segregação,
reuso, correta destinação que possibilite a reciclagem”163
. Em segundo lugar, foram
formados os “Grupos de Trabalho para Desenvolvimento de Soluções para os Resíduos da
Construção”, formados por representantes diversos da cadeia produtiva, entre eles
fabricantes, aplicadores, pesquisadores, órgãos públicos, etc. Estão divididos em quatro
grupos: Gesso, Impermeabilização, Tintas e Resíduos de Madeira.
Por fim, o COMASP participa das Comissões de Estudo da ABNT ligadas às
normas que incidem sobre o tema, com especial destaque na elaboração da NBR 15.112,
NBR 15.113, NBR 15.114 e NBR 15.115. Por fim, elaborou folhetos explicativos,
distribuídos com a sociedade em geral, abordando a problemática tanto de forma macro
(gestão pelos municípios e pelos grandes geradores) quanto de forma micro (gestão pelos
pequenos geradores), e livros e cartilhas com os temas tratados de forma mais didática e
profunda, voltados para os fornecedores e construtoras em geral164
.
Com relação ao tema das Mudanças Climáticas, o Sinduscon-SP participou como
órgão de apoio a elaboração do “Guia Metodológico para Inventário de Emissões de Gases
de Efeito Estufa na Engenharia e Construção”165
, como resultado do Grupo de Trabalho
Engenharia e Construção do Fórum Clima166
. Lançado em abril de 2013, o Guia teve como
161
Disponível em www.sindusconsp.com.br/msg2.asp?id=5018. Acesso em 02 de setembro de 2013. 162
Estabelece diretrizes, critérios e procedimentos para a gestão dos resíduos da construção civil. Disponível
em www.mma.gov.br/port/conama/legiabre.cmf?codlegi=307. 163
Disponível em www.sindusconsp.com.br/msg2.asp?id=3243. Acesso em 02 de setembro de 2013. 164
www.sindusconsp.com.br/msg2.asp?id=3243. 165
Disponível em
www.sindusconsp.com.br/downloads/GuiaMetod_ParaInventarioEmissoesGEE_Engenharia_Construçoes.pd
f. 166
Fórum Brasileiro de Mudanças Climáticas, criado pelo Decreto 3.515/2000, com o objetivo de
conscientizar e mobilizar a sociedade sobre os problemas da mudança climática decorrentes dos gases de
efeito estufa. Disponível em www.forumclima.org.br.
188
principais componentes as Construtoras Andrade Gutierrez, Camargo Corrêa, OAS e
Odebrecht.
No tratamento da questão da Conservação e Reuso da Água, o Sinduscon-SP
assinou um Termo de Cooperação Técnica, que envolveu a Agência Nacional de Águas
(ANA), o Centro da Indústrias do Estado de São Paulo (CIESP) e a Federação das
Indústrias do Estado de São Paulo, que teve como resultado o “Manual Conservação e
Reuso da Água em Edificações”167
, lançado em junho de 2005, com orientações para
construções comerciais e residenciais, novas ou existentes.
O tema Eficiência Energética tem sido tratado, aparentemente, pelo Sinduscon-SP
ainda de forma muito parcial, limitando-se à divulgação de tecnologias no emprego e uso
de energia solar para sistemas de aquecimento de água. Essas ações vêm ocorrendo na
forma de palestras, cursos e exposições de materiais em feiras, principalmente a partir do
Programa PROCEL Edifica, que passa a exigir padrões superiores de eficiência energética
em edifícios comerciais e residenciais168
.
A Madeira Legal é um tema bastante debatido pelo Sinduscon-SP, resultando no
desenvolvimento de diversas ações. Primeiramente, cabe destacar o “Programa Aquisição
Responsável de Madeira na Construção Civil”, uma metodologia elaborada pelo sindicato
e o World WideFund for Nature Brasil (WWF-Brasil), com o objetivo de orientar as
construtoras no cumprimento da legislação ambiental voltada para a utilização de madeira
e seus produtos, e tem como meta final substituir a madeira legal pela certificada169
; além
de promover um curso piloto, em 2011, lançou, no mesmo ano, a publicação de um “Guia
Prático para Construtoras”170
.
Em segundo lugar, o COMASP, em conjunto com a Secretaria Municipal de Meio
Ambiente de São Paulo e o Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT), desenvolveu o
projeto intitulado “Madeira: Uso Sustentável na Construção Civil”, que resultou na
publicação de um manual em 2003, com os seguintes objetivos principais: orientar na
167
Disponível em
www.sindusconsp.com.br/downloads/prodserv/publicacoes/manual_agua_em_edificacoes.pdf. Acesso em 02
de setembro de 2013. 168
www.sindusconsp.com.br/msg2.asp?id=5017. 169
Madeira legal significa que foi extraída de forma autorizada por órgãos ambientais, mas não garante o
impacto ao meio ambiente, certificada garante um menor impacto socioambiental. Disponível em
www.floratiete.org.br. 170
Disponível em www.sindusconsp.com.br/msg2.asp?id=5021.
189
adoção de madeiras de menor impacto ambiental com uma lista de espécies que podem
substituir as mais visadas pelo mercado; informar onde estas madeiras podem ser
encontradas e os cuidados necessários à sua utilização; substituir madeiras nobres no uso
cotidiano da obra por espécies menos valorizadas171
.
Em terceiro lugar, o Sinduscon-SP tem parceria com a Caixa Econômica Federal na
Ação Madeira Legal, no monitoramento da origem das madeiras utilizadas nas obras e
empreendimentos habitacionais financiados por essa agência. Por fim, assinou o Protocolo
de Cooperação entre o Governo do Estado, a Prefeitura da Capital e mais 21 entidades
comprometidas no uso da madeira de origem regularizada na construção civil172
.
Essas frentes de ação resumem a atuação do Sinduscon-SP, com vistas à
sustentabilidade no setor, demonstrando, em muitos aspectos, um consistente trabalho, com
destaque para a gestão de resíduos, uso racional da água e madeira legal, provavelmente
como resposta as imposições normativas mais atuantes nestes temas. Sendo o mais
importante sindicato da indústria da construção civil do país, sua atuação tem forte
influência na política nacional no âmbito da legislação ambiental com reflexos no restante
da nação. Tem igual responsabilidade pelo fortalecimento e consolidação de uma posição
sustentável para o setor e assim abrir espaço para a inovação tecnológica e de processos.
3.2.11 – SINDUSCON – Rio Grande do Sul
O Sinduscon-RS foi fundado em 1949 e, desde então, vem aumentando sua
representatividade junto ao setor nesse Estado. Atualmente há 300 empresas associadas e
aproximadamente 4.000 empresas cadastradas. Além da sede em Porto Alegre, possui dois
escritórios regionais, um no Litoral Norte em Capão da Canoa e outro no Vale do Rio
Pardo, em Santa Cruz do Sul173
.
Divulga uma linha de atuação denominada “Estratégias/Produtividade”, onde
elenca quatro áreas de atuação: Inovação e Tecnologia, Meio Ambiente, Relações de
Trabalho e Responsabilidade Social. O conjunto de trabalhos desenvolvidos nesses campos
traduz o perfil sustentável da entidade.
171
Disponível em www.sindusconsp.com.br/dowloads/prodserv/publicacoes/manual_madeira2.pdf. 172
Disponível em www.sindusconsp.com.br/dowloads/meioambiente/guia_caixa.pdf. 173
Disponível em www.sinduscon-rs.com.br.
190
A área de inovação e tecnologia tem por objetivo reunir estudos relacionados à
fabricação, comércio e normalização de materiais de construção, com vistas ao aumento da
qualidade e produtividade do setor174
.
Meio ambiente atua no aperfeiçoamento dos temas ambientais voltados
principalmente para a regularização das empresas, para atender as normas vigentes
estaduais175
.
A área de relações do trabalho trata das questões de segurança, saúde e
informalidade, na orientação da conformidade das empresas associadas176
.
Por fim, a responsabilidade social tem por objetivo difundir esse conceito dentro do
setor para o fortalecimento dos vínculos entre os colaboradores e as construtoras
sindicalizadas177
.
Apesar da relativa facilidade de associação dessas ações com a sustentabilidade,
esse tema não aparece explicitamente em nenhum local do site e mesmo a definição dos
objetivos de cada área não passa além do conceito, inexistindo qualquer informação
relacionada a eventos, cursos ou qualquer outra prática mais efetiva.
3.2.12 – SINDUSCON – Paraná
Desde 1944 que o Sinduscon-PR atua e, desde então, vem ganhando
representatividade como um dos maiores sindicatos do Estado, com mais de 4.000
empresas, entre associadas e filiadas. Dentre vários serviços que oferece às construtoras
destacam-se: assessoria para a “Melhoria da Qualidade” onde faz parceria com o Sesi-PR
oferecendo apoio para a certificação das empresas no Programa Brasileiro de Qualidade e
Produtividade do Habitat (PBQP-H); “Qualificação da Mão-de-obra” com programas para
aperfeiçoamento profissional dos trabalhadores178
.
Na sua atuação no campo de meio ambiente, o sindicato aborda três aspectos. O
primeiro ligado à “Gestão de Resíduos na Construção Civil”, onde apresenta: as
174
Disponível em: www.sinduscon-rs.com.br/estrategias-e-produtividade/inocacao-e-tecnologia/. 175
Disponível em:www.sinduscon-rs.com.br/estrategias-e-produtividade/comissao-do-meio-ambiente/. 176
Disponível em:www.sinduscon-rs.com.br/estrategias-e-produtividade/relacoes-do-trabalho/. 177
Disponível em:www.sinduscon-rs.com.br/estrategias-e-produtividade/responsabilidade-social/. 178
Disponível em: www.sinduscon-pr.com.br/principal/home/.
191
orientações da Resolução 307 do Conama179
e o Decreto Municipal 1.068/2004180
; projeto
simplificado de gerenciamento de resíduos da construção civil; modelo de documento
exigido pela Secretaria Municipal do Meio Ambiente para o transporte de resíduos; termo
de referência para elaboração do projeto de gerenciamento de resíduos da construção
civil181
.
O segundo aspecto, onde disponibiliza o quadro legal que incide sobre a construção
civil e as questões ambientais, centrado no âmbito do município de Curitiba e nas
Resoluções do Conama. Por fim, detalha o procedimento da Caixa Econômica Federal no
processo “Ação Madeira Legal”182
.
Já no campo da tecnologia e produtividade, põe à disposição uma cartilha com
“dicas para a qualidade e produtividade” e o documento completo do PBQP-H183
.
Em relação à responsabilidade social, o Sinduscon-PR elabora uma programação
anual de cursos e palestras com o objetivo de melhorar a qualidade de vida dos
trabalhadores e familiares, tais como: curso de Leitura e Interpretação de Projetos, Inclusão
Digital, Oficina de Matemática nas Obras, Curso SESI Cozinha Brasil, dentre outros184
.
Com essas três áreas de atuação – meio ambiente, tecnologia/qualidade e
responsabilidade social, o Sindicato da Construção Civil do Paraná desenvolve um trabalho
mais voltado à informação, seja no conteúdo direto via site, ou por meio dos cursos e
palestras. Especificamente na área ambiental, abre pouco espaço para outras abordagens
tais como novos materiais, ou a inclusão de fóruns de debates.
3.2.13 – Considerações Gerais sobre as Ações Sustentáveis dos Sindicatos da Indústria da
Construção Civil
Quando se analisa o conjunto das ações sustentáveis dos Sinduscon, percebe-se
uma diferenciação regionalizada de abordagens. Na Região Norte, as atuações se
restringem ao incentivo de implantação do PBQP-H. No Nordeste, as três principais
179
Gestão de resíduos gerados pela construção civil. 180
Disciplina o manuseio e disposição de vários tipos de resíduos produzidos nos canteiros de obra. 181
Disponível em: www.sinduscon-pr.com.br/principal/home/?sistema=conteúdos.conteudo&i_conteudo=58. 182
Disponível em: www.sinduscon-pr.com.br/principal/home/?sistema=conteúdos.conteudo&i_conteudo=81. 183
Disponível em: www.sinduscon-pr.com.br/principal/home/?sistema=conteúdos.conteudo&i_conteudo=78. 184
Disponível em: www.sinduscon-pr.com.br/principal/home/
192
capitais têm atuação mais consistente, com destaque para Pernambuco e Bahia com ações
que vão além da divulgação informativa, elaboram cursos, seminários e, no caso da Bahia,
adota o princípio de construção sustentável em sua nova sede, já para Sergipe as
informações são mínimas. No Centro Oeste, apenas o Sinduscon-GO divulga um trabalho
substancioso e diversificado, desde a elaboração de cursos até a formação de fóruns de
debates. A Região Sudeste, como já esperado, demonstra um sólido desempenho, reflexo
das condições políticas e financeiras privilegiadas, com um setor organizado, na vanguarda
das ações sustentáveis no país. Por fim, o Sul, aborda timidamente a temática, com ações
informativas, na divulgação de leis e manuais.
Um aspecto positivo é uma tendência a viabilização do PBQP-H que, por si só, já
garante uma elevação na qualidade dos processos construtivos, que certamente contribui
para edificações mais sustentáveis. Como em todo sistema industrial e na indústria da
construção, não seria diferente, as mudanças começam pela melhoria de seus processos de
produção que, num primeiro momento, focaram no escopo administrativo através dos
programas de qualidade da Série ISO 9000 e, atualmente, caminham para sua interface
com a obra propriamente dita.
É provável que os Estados cujo quadro político/legislativo é mais atuante em
termos de parâmetros ambientais tenham pressionado o Sinduscon local a se organizar no
seguimento desses ditames legais. Isso ocasionou certa heterogeneidade em termos de
atuação sindical e mobilização do setor, demonstrada nas ações sustentáveis, ainda
superficiais, de alguns Estados.
De todo modo, parece claro que alguns aspectos já se encontram consolidados
como metas de uma sustentabilidade em médio prazo e que se faz notar segundo alguns
pressupostos. Primeiramente, os desperdícios não são mais admissíveis, uma vez que os
recursos naturais estão cada vez mais escassos. Em segundo lugar, os resíduos passaram a
ser encarados como parte do processo e, portanto, passíveis de
reaproveitamento/reciclagem e, consequentemente, como fonte de renda.
Em terceiro lugar, aumentaram consideravelmente os cuidados com a mão-de-obra,
graças não apenas às garantias de direitos trabalhistas, mas também à percepção por parte
dos empresários de que boas condições de trabalho terminam por refletir no produto final,
a edificação construída. Cabe destacar melhorias no ambiente dos canteiros com normas de
segurança mais rigorosas; os aspectos ligados ao aprimoramento intelectual dos operários
193
por meio de cursos de educação básica e cursos técnicos profissionais; ações de integração
interpessoal e familiar, com vistas à melhoria das relações de trabalho; cursos de educação
ambiental como base para implantar futuros processos produtivos mais sustentáveis.
Através das ações do Sinduscon, as empresas parecem também começar a investir
na formação de um corpo técnico/administrativo com maior conhecimento nas novas
tecnologias sustentáveis, com cursos voltados para o segmento de trabalhadores das áreas
gerenciais.
As inúmeras dificuldades de se “comprar a ideia” da sustentabilidade, em uma
indústria tão tradicional, vêm aos poucos sendo vencidas segundo três aspectos:
primeiramente, pela força da lei em impor a obrigatoriedade no cumprimento de normas
ambientais, a exemplo da destinação correta dos resíduos da construção e demolição; em
segundo lugar, pela pressão da sociedade por processos menos impactantes e, finalmente,
pela real possibilidade de ganhos financeiros em um nicho mercadológico crescente e
ainda pouco explorado.
Face à relativa novidade do tema e às dificuldades inerentes do setor em
instrumentalizar as mudanças necessárias, caracterizado por processos que quase não
mudaram ao longo das últimas décadas, ainda há muito a ser realizado. Pouco foram os
sindicatos que efetivamente implementaram ações sustentáveis, a exemplo do Sinduscon-
BA, e a perspectiva de se tornar uma vitrine das novas tecnologias, não apenas para o
setor, mas também para toda sociedade.
3.3 – Outras instâncias que tratam da Construção Sustentável
O conceito de sustentabilidade na construção civil tem sido debatido nos últimos
anos na articulação de diversos órgãos, divididos, basicamente, em três grupos: um
institucional, um do setor construtivo privado e o terceiro ligado à academia.
Mesmo trabalhando em instâncias diferenciadas, da conjugação entre esses três
grupos, muito se avançou nesse tema, o que sobremaneira contribuiu para sua difusão não
só junto ao setor privado, como também aos centros de pesquisa.
A maioria dos debates vem acontecendo na forma de fóruns discursivos
(seminários, palestras, encontros, feiras, workshops) organizados por entidades ligadas a
194
um dos grupos citados ou na cooperação entre eles. De todo modo, são através desses
eventos que as pesquisas têm sido divulgadas, novos materiais apresentados, sistemas
produtivos propostos, enfim, o conhecimento expandido, materializando-se nas novas
tecnologias, que cada vez mais estão presentes no dia-dia.
A seguir, serão apresentadas algumas das principais entidades que tratam do tema
conforme os grupos anteriormente especificados.
3.3.1 – Instâncias Governamentais
A instância superior, no âmbito federal, que se pode reportar em relação à
sustentabilidade na construção civil é o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação –
MCTI185
, o qual lidera um conjunto de instituições ligadas diretamente à promoção de
pesquisas. Dentro de sua estrutura organizacional, pode-se encontrar a Financiadora de
Estudos e Projetos – FINEP, uma das mais importantes agências de fomento a pesquisa do
país.
A FINEP foi criada em 1967 com a principal finalidade de implantar programas de
pós-graduação nas universidades. Atualmente, tem por objetivo principal o apoio público
ao desenvolvimento da ciência, tecnologia e inovação em instituições públicas e privadas,
abrangendo todas as etapas e dimensões da pesquisa.
Dentro das suas linhas de atuação, pode-se encontrar o programa “Brasil
Sustentável”, lançado durante a RIO+20, com o objetivo de “apoiar o desenvolvimento de
produtos, processos e serviços inovadores que tratem de forma integrada os aspectos
sociais, ambientais e econômicos”186
. Dentro de seu escopo, dentre outros, cabe destaque
aos temas de mobilidade e transportes urbanos sustentáveis, reciclagem de resíduos e
saneamento ambiental, construções e infraestrutura urbana sustentável, ligados
especificamente ao setor da construção civil.
Por sua vez, o “Brasil Sustentável” terminou por incorporar o Programa de
Tecnologia da Habitação – Habitare, implantado originalmente em 1995, e que era voltado
185
Todas as informações referentes as agências ligadas a sustentabilidade na construção civil, no âmbito
federal foram obtidas por consulta online disponível em www.mcti.gov.br. 186
Disponível em www.finep.gov.br/pagina.asp?pag=programas_brasil_sustentavel#escopo.
195
para o desenvolvimento do conhecimento no campo da tecnologia do ambiente construído,
com ênfase na solução do déficit habitacional e modernização da construção civil do país.
Ao longo de todos os anos de sua existência, o Habitare tornou-se um dos
principais agentes financiadores da pesquisa voltada para o setor da construção civil, com
foco na habitação. Sua atuação trouxe inúmeras contribuições na formação de recursos
humanos e na difusão dos preceitos da sustentabilidade no ambiente construído em
consonância com as políticas ambientais e de desenvolvimento humano. Atualmente, o
Programa Habitare encontra-se inativo nos seus moldes originais e, mesmo tendo sido
substituído pelo procedimento de Chamadas Públicas, continua a desenvolver trabalhos na
área, a exemplo da “Seleção Pública Construção Sustentável e Saneamento Ambiental”187
aberta para participação em fevereiro de 2013.
Outro importante agente do Governo Federal que fomenta a sustentabilidade na
construção civil é a Caixa Econômica Federal. Na sua estrutura organizacional, pode-se
encontrar uma linha denominada “Sustentabilidade na Caixa”, que, conceitualmente, se
autocoloca dentro dos preceitos da Responsabilidade Social Empresarial188
e tem como
preceitos as principais diretrizes seguintes: o exercício da sustentabilidade está presente em
todas as áreas e empregados da CAIXA; os princípios da sustentabilidade permeiam todos
os processos de produção, produtos e serviços e fazem parte do Plano Estratégico da
CAIXA; atuar de forma a minimizar os riscos e potencializar os impactos positivos ao
meio ambiente; acreditar na compatibilidade entre lucratividade e sustentabilidade social e
ambiental.
Dentre os serviços e produtos oferecidos na linha da sustentabilidade, que fazem
interface com a construção civil, encontram-se: Energias Renováveis, Ecoeficiência
Empresarial, Habitação de Interesse Social, Saneamento Ambiental e Infraestrutura de
Transporte e Mobilidade Urbana.
Na linha de energias renováveis, financia empreendimentos voltados à geração,
transmissão e distribuição de energia de fontes renováveis, na forma de pequenas centrais
hidrelétricas, parques eólicos, usinas de álcool e açúcar, dentre outros. Em relação à
187
Disponível em www.finep.gov.br/editais/vigentes.asp#topo. 188
“Se define pela relação de ética e transparência da empresa com todos os públicos e pelo estabelecimento
de metas empresariais compatíveis com o desenvolvimento sustentável da sociedade, preservando recursos
naturais e culturais para as gerações futuras”.
Disponível em www.caixa.gov.br/portal/rse/home/rse_na_caixa/conceito.
196
Ecoeficiência Empresarial, o programa financia máquinas e equipamentos que reduzam a
geração de resíduos e emissões, em especial a água e energia, nos parâmetros dos
processos de Produção Mais Limpa (P+L)189
.
Dentro dos serviços ligados à Habitação de Interesse Social, por sua longa tradição
no financiamento desse tipo empreendimento, a CAIXA desenvolve um amplo programa
de construções sustentáveis com fundos destinados a várias linhas, tais como Carta de
Crédito com recursos do FGTS, Programa Minha Casa Minha Vida, Programa Nacional de
Habitação Rural, Carta de Crédito Material de Construção, dentre outros, todos podendo se
enquadrar dentro dos preceitos da sustentabilidade190
.
A área do Saneamento Ambiental visa a investir em projetos que promovam a
qualidade ambiental nos municípios do Brasil, com destaque para: Programas de serviços
urbanos para água e esgoto, Programas de resíduos sólidos urbanos, Programas de gestão
de recursos hídricos, Intervenções em favelas, etc191
.
Por fim, no campo da Infraestrutura de Transporte e Mobilidade Urbana a CAIXA
oferece crédito para projetos que priorizem o transporte coletivo e não-motorizado, através
basicamente de programas: Viver Sem Limites, Pró-Transporte e Programa de Intervenção
Viária192
.
Em sua política de meio ambiente, cabe ainda destacar o Programa Construção
Sustentável, que, a partir de 2008, passou a incorporar variáveis socioambientais nos
empreendimentos habitacionais por ela financiados, tais como: minimizar os impactos da
obra no meio ambiente; aproveitar os recursos naturais do ambiente local; promover o uso
racional dos materiais de construção; arborizar e estimular o plantio de árvores nos
terrenos; promover a coleta e reciclagem dos resíduos sólidos nos empreendimentos;
adotar soluções para melhoria do conforto interno das habitações e promover a educação
ambiental dos moradores193
.
Esse Programa faz parte do modelo de governança corporativa que a CAIXA vem
adotando como meta de gestão, em consonância com os desafios atuais de incorporar
189
Disponível em www14.caixa.gov.br/portal/rse/home/produtos_servicos/energias_renovaveis. 190
Disponível em www14.caixa.gov.br/portal/rse/home/produtos_servicos/habitação_interesse_social. 191
Disponível em www14.caixa.gov.br/portal/rse/home/produtos_servicos/saneamento_ambiental. 192
Disponível em www14.caixa.gov.br/portal/rse/home/produtos_servicos/infraestrutura_transp_mob_urb. 193
Todas as informações citadas desse Programa estão disponível em
www.caixa.gov.br/portal/rse/home/nossos_relacionamentos/meio_ambiente/programa_construcao_su.
197
variáveis ambientais às práticas administrativas. Ao longo de sua existência algumas ações
importantes foram implementadas, descritas a seguir:
Em primeiro lugar, pode-se mencionar o Selo Casa Azul CAIXA, com o intuito de
reconhecer os projetos habitacionais concebidos na intenção de minimizar danos ao meio
ambiente, reduzindo custos de manutenção, e divulgar as vantagens dos sistemas
sustentáveis na construção civil, tanto para a sociedade quanto para os empresários.
Em segundo lugar, a Ação Madeira Legal é outro conjunto de metas dentro do
programa de sustentabilidade, que visa a combater a exploração ilegal de madeira,
principalmente da Amazônia, onde os empreendedores são obrigados a apresentar o
Documento de Origem Florestal – DOF nos financiamentos dos empreendimentos.
Um terceiro aspecto refere-se ao Aquecedor Solar de Água que passou a ser um
item financiável em todos os programas habitacionais fomentados pela CAIXA,
principalmente a partir 2009, quando um acordo de cooperação técnica com a Agência
Alemã GIZ foi firmado no financiamento de instalação de aquecedores solares e a difusão
de suas vantagens econômicas e ambientais.
Em quarto lugar, no Projeto de Arborização de Empreendimentos, a CAIXA
recomenda o plantio de árvores na proporção de uma para cada unidade habitacional em
conjuntos horizontais e, sempre que possível, seguir a mesma proporção para os verticais.
Em quinto lugar, o Programa de Compensação Ambiental é um instrumento que
estabelece que os empreendimentos que causarem impacto ao meio ambiente deverão
compensá-lo pelo pagamento de determinado valor ao Estado, dentro do princípio do
“poluidor-pagador”. Os recursos oriundos dessa fonte serão, obrigatoriamente, utilizados
em intervenções socioeconômicas e ambientais, fiscalizadas pelo Ministério Público
Federal.
Em sexto lugar, para controle dos riscos ambientais causados por empreendimentos
localizados em terrenos com suspeita de contaminação, a CAIXA desenvolveu um
conjunto de procedimentos metodológicos denominado Avaliação Ambiental de Terrenos
com Potencial de Contaminação, hoje referência para técnicos e agências públicas que
trabalham na área.
Por fim, o Programa Eficiência Energética na Habitação de Interesse Social firmou
acordo com as concessionárias de energia dos estados da Bahia, Pernambuco e Rio Grande
198
do Norte na doação de lâmpadas econômicas e geladeiras novas em empreendimentos do
“Minha Casa Minha Vida”, para famílias com renda de zero a três salários mínimos.
Desde 2008, a CAIXA divulga um relatório anual de desempenho econômico,
social e ambiental denominado “Relatório de Sustentabilidade”, elaborado com bases em
diretrizes internacionais padronizadas. Nesse documento, são apresentados os principais
fatos, iniciativas e realizações da empresa no ano, além dos desafios e metas para os anos
vindouros, numa forma da instituição prestar contas à sociedade.
As ações sustentáveis da Caixa Econômica Federal, no âmbito da construção civil,
tiveram maior destaque a partir do lançamento do Selo Casa Azul. Com esse programa a
instituição vislumbra, em médio prazo, estimular as construtoras que vierem a pleitear
financiamento a adotarem sistemas construtivos mais racionais. Apesar de se restringir a
construções habitacionais, até o momento, seis empreendimentos já foram certificados,
sendo o primeiro em março de 2011, mesmo com a CAIXA não “recompensando” os
interessados com nenhum tipo de bonificação.
Ao se analisar a capacidade de atuação da instituição e o relativo pouco tempo de
implementação do programa “Construção Sustentável”194
, percebe-se o grande potencial de
expansão desses parâmetros. Com toda sua capacidade e tradição no financiamento
habitacional, a CAIXA poderá, em pouco tempo, se tornar a maior agência fomentadora da
sustentabilidade na construção civil, expandindo essas ações para os pequenos
empreendedores e o cidadão comum, transformando o Selo Casa Azul de certificação em
modelo de se construir.
Finalmente, vale salientar uma sistemática de incentivo a construção sustentável
vinculada ao Ministério das Cidades, através da Secretaria Nacional de Habitação, o
Programa Brasileiro da Qualidade e Produtividade do Habitat (PBQP-H)195
que foi criado
em 1998 com a assinatura da Portaria 134, do então Ministério do Planejamento e
Orçamento. Surgiu para o cumprimento dos compromissos firmados pelo Brasil na
Conferência do Habitat II/1996 – Carta de Istambul, com foco na qualidade do habitat e
modernização produtiva. O objetivo principal do programa é “apoiar o esforço brasileiro
de modernidade e promover a qualidade e produtividade do setor da construção
194
Desde 2008, a CAIXA passou a incorporar variáveis socioambientais em seus programas. Disponível em
www.caixa.gov.br/portal/rse/home/nossos_relacionamentos/meio_ambiente/programa_construcao_su. 195
Disponível em www.cidades.gov.br/pbqp_apresentacao.php.
199
habitacional, com vistas a aumentar a competitividade de bens e serviços por ele
produzidos”196
.
O programa desenvolve uma série de ações no alcance de seus objetivos, tais como:
avaliação da conformidade de empresas, melhoria da qualidade de materiais, formação e
requalificação de mão-de-obra, normalização técnica, capacitação de laboratórios,
avaliação de tecnologias inovadoras, informação ao consumidor e entre os setores
envolvidos. Em longo prazo, espera-se criar um ambiente de isonomia competitiva,
barateando as soluções de melhor qualidade, reduzindo o déficit habitacional do país.
Foi baseado numa estrutura de projetos, onde cada um corresponde a ações que
contribuem para o desenvolvimento do Programa como um todo e buscam solucionar
problemas específicos da área da qualidade na construção civil. Assim, os projetos são
organizados da seguinte forma: Conformidade de Empresas de Serviços e Obras (SiAC);
Qualidade dos Materiais (SiMAC); Indicadores de Desempenho; Sistema Nacional de
Avaliações Técnicas (SINAT); Assistência Técnica; Capacitação e Certificação
Profissional; Capacitação Laboratorial; Comunicação e Troca de Informações; Cooperação
Técnica Internacional197
.
O PBQP-H é um programa de adesão voluntária e ocorre segundo três etapas: na
primeira, ocorre a “Sensibilização e Adesão” através da sua divulgação por palestras nos
diversos Estados da federação; num segundo momento, as entidades do setor se mobilizam
para elaborar um diagnóstico local, o que resulta em um Programa Setorial de Qualidade
(PSQ); por fim, o PSQ fundamenta um Acordo Setorial entre os entes privados, o setor
público e a CAIXA, estabelecendo metas e um cronograma de implantação dos Programas
de Qualidade198
.
A operacionalização do Programa se dá quando os diversos atores da cadeia
produtiva do setor, de acordo com suas especificidades, interesses e objetivos, aderem a
um dos projetos da estrutura principal, e devem atender aos requisitos dos Referenciais
Normativos199
específicos a cada projeto. Cumpridas todas as exigências, a empresa
196
Disponível em www.cidades.gov.br/pbqp-h/pbqp_baselegal.php. 197
Disponível em www.cidades.gov.br/pbqp-h/projetos.php. 198
Disponível em www.cidades.gov.br/pbqp-h/pbqp_etapas.php. 199
Os Referenciais estão contidos no Regimento Geral do Sistema de Avaliação da Conformidade de
Empresas de Serviços e Obras da Construção Civil (SiAC), disponível em www.cidades.gov.br/pbqp-
h/projetos_siac.php.
200
aprovada passa a constar de uma lista de empresas avaliadas em conformidade tendo o
valor de uma certificação.
Quanto aos benefícios em se aderir ao Programa, pode-se citar: primeiramente, na
melhoria da produtividade interna da empresa, nos seus processos produtivos e
administrativos e consequentemente na redução dos custos; em segundo lugar, no
crescimento do nível técnico intelectual dos trabalhadores em todos os níveis da empresa;
em terceiro lugar, na facilitação da modernização tecnológica e gerencial, por meio da
modernização de laboratórios, incremento a pesquisa e o aperfeiçoamento da organização
administrativa e de gestão; em quarto lugar, a garantia de produtos (materiais de
construção e unidades habitacionais) confiáveis e, consequentemente, clientes mais
satisfeitos; finalmente, outra vantagem importante consiste em linhas de financiamentos
específicos, concedidos pela CAIXA, para as empresas do setor da construção civil que
implantam o PBQP-H200
.
Paulatinamente o Programa vem ganhando espaço como uma estratégia para a
modernização tecnológica e gerencial do setor. Segundo dados do próprio Programa, mais
de 3.000 construtoras estão ativas no SiAC e atualmente conta com 25 Programas Setoriais
da Qualidade (PSQ) direcionados ao segmento de materiais e componentes, com um índice
de conformidade médio de 81,5%201
.
A adesão ao Programa avança para outras instâncias, além da privada, e tem
contribuído para a prática da qualidade dentro da administração pública. O PBQP-H, está
se consolidando como um importante instrumento para a sustentabilidade da indústria da
construção civil, com sua implementação já sendo incentivada por diversas instituições do
ramo, a exemplo de vários Sinduscon, como visto anteriormente.
3.3.2 – Instâncias do Setor Privado
A Câmara Brasileira da Indústria da Construção – CBIC foi fundada em 1957, no
Rio de Janeiro e, atualmente, sediada em Brasília, reúne 68 sindicatos e associações do
200
Disponível em www.cidades.gov.br/pbqp-h/porque_beneficios.php. 201
Disponível em www.cidades.gov.br/pbqp-h/resultados.php.
201
setor da construção civil. Representa politicamente as entidades no Brasil e no exterior e é
responsável pela integração de toda cadeia produtiva envolvida nessa atividade202
.
Com o objetivo principal de desenvolver a indústria da construção e o mercado
imobiliário como um todo, é dirigida por um Conselho Administrativo que atua por meio
de cinco comissões técnicas: Obras Públicas, Privatizações e Concessões (COP); Indústria
Imobiliária (CII); Política e Ralações Trabalhistas (CPRT); Materiais, Serviços,
Tecnologia, Qualidade e Produtividade (COMAT); Meio Ambiente (CMA); e ainda conta
com três fóruns que trabalham atividades específicas, Fórum de Advogados, Fórum de
Ação Social e Cidadania e o Fórum dos Seconcis203
.
O objetivo desses grupos é implementar as discussões em torno das questões
estruturantes da construção no país, bem como estabelecer um campo de troca de
experiências entre os grupos regionais e procurar soluções para entraves políticos e
técnicos. Especificamente, a Comissão de Meio Ambiente é responsável pela mobilização
do setor em torno das políticas públicas e projetos que estimulem o desenvolvimento do
conhecimento em torno da construção civil e das questões ambientais204
.
Esse grupo, atualmente, possui uma série de projetos em andamento em parceria
com outras instituições, tais como: Projeto de Compensação Ambiental, em parceria com a
Confederação Nacional da Indústria - CNI; Programa de Construção Sustentável, que trata
de mudança climática, água, biodiversidade e resíduos, e a definição de compromissos do
setor com esses temas; Projeto de Educação Ambiental, em parceria com o SENAI, no
desenvolvimento de um programa nacional de conscientização dos trabalhadores nos
canteiros de obra; Projeto de Eficiência Energética e Aquecimento Solar na Habitação de
Interesse Social, em atendimento às prerrogativas de sustentabilidade do Minha Casa
Minha Vida; Projeto Esplanada Sustentável/Empregos Verdes, em parceria com o Governo
Federal, para reformar os edifícios dos ministérios em Brasília com o objetivo de diminuir
o consumo de água e energia; Projeto de Licenciamento Ambiental, em parceria com a
CNI, no acompanhamento, no âmbito federal, dos projetos de lei sobre o tema; Projeto
Madeira Legal, que realiza um trabalho de mobilização voluntária de seus associados no
202
Disponível em www.cbic.org.br. 203
Serviço Social da Construção Civil com o objetivo de promover ações de assistência social, incluindo
saúde, educação e demais atividades afins. Disponível em www.seconci-sp.org.br. 204
Todas as informações referentes à Comissão de Meio Ambiente estão disponíveis em:
www.cbic.org.br/comissoes-e-foruns/comissao-de-meio-ambiente.
202
uso sustentável da madeira na construção civil; e o Projeto Resíduos Sólidos, que
acompanha o trabalho do CONAMA em torno da Política Nacional de Resíduos Sólidos.
O CBIC também realiza ações no campo da informação, a exemplo do “Guia CBIC
de Boas Práticas em Sustentabilidade na Indústria da Construção”, lançado em 2012. Essa
publicação afasta-se de um formato mais acadêmico e adota por finalidade apresentar
experiências já realizadas por outras empresas da cadeia produtiva da construção, numa
opção por expor o tema na prática, como mecanismo de simplificação do conhecimento e
seu potencial de replicagem205
.
No campo dos eventos, o CBIC é o principal idealizador do maior simpósio que
reúne toda a cadeia do segmento para debater propostas, difundir experiências, buscar
soluções para os problemas da área. Trata-se do evento anual “Encontro Nacional da
Indústria da Construção”, que já está em sua 85ª Edição e, em 2013, ocorreu em Fortaleza,
composto por uma programação baseada nos trabalhos das cinco comissões técnicas que
compõem a instituição, dentre elas a de meio ambiente, que neste ano trouxe as seguintes
temáticas: Cidades Sustentáveis, Investimentos em Sustentabilidade, Incentivos
Necessários para a Construção Sustentável, Aplicabilidade dos Selos e Certificações e, por
fim, Sustentabilidade no Projeto206
.
Por ser uma entidade que agrupa uma das mais importantes cadeias de produção do
país, o CBIC detém grande capacidade de apoiar a difusão dos parâmetros da
sustentabilidade, seja em termos econômicos ou de mobilização do setor. Evidentemente,
em se tratando de uma instituição inserida no mercado, tem em suas bases o compromisso
com o desenvolvimento econômico, entretanto, vem demonstrando o reconhecimento da
importância que o tema adquiriu nos últimos anos e o seu potencial, ainda inexplorado,
para bons negócios futuros com ganhos reais, não só financeiros, mas também sociais e
ambientais.
205
Disponível em: http://migre.me/hpDd7. 206
Disponível em www.cbic.org.br/comissoes-e-foruns/comissao-de-meio-ambiente/85-enic/pagina/85-enic.
203
3.3.3 – Instâncias Acadêmicas e da Sociedade Civil
Primeiramente, destaca-se o trabalho da Associação Nacional de Tecnologia do
Ambiente Construído – ANTAC207
, fundada em 1987 e constituída, em sua maioria, por
pesquisadores vinculados às universidades ou centros de pesquisa. Tem por objetivos
principais divulgar o conhecimento produzido sobre o tema e representar a comunidade de
pesquisadores associados junto à sociedade, entidades governamentais e privadas.
Atualmente, a ANTAC é constituída por oito Grupos de Trabalho (GTs), cujas
discussões são aprofundadas nos seguintes temas específicos: Argamassa, Conforto
Ambiental e Eficiência Energética, Desenvolvimento Sustentável, Durabilidade, Gestão
Econômica da Construção, Qualidade do Projeto, Resíduos e Sistemas Prediais.
O GT Argamassa tem como objetivos consolidar e coordenar pesquisas sobre o
tema no Brasil e participar da organização de normas, principalmente junto à ABNT; a sua
linha principal de pesquisa aborda tanto argamassas industrializadas quanto preparadas em
obra. O Grupo Conforto Ambiental e Eficiência Energética foi criado em 1988 e se dedica
às pesquisas nas áreas de conforto térmico, acústico, luminoso, ergonomia e eficiência
energética nas edificações. Uma de suas principais ações refere-se à participação
preponderante no estabelecimento das Normas Técnicas Brasileiras NBR 15.220 e NBR
15.215 nas áreas do desempenho térmico das edificações e iluminação natural,
respectivamente.
O Grupo de Trabalho sobre Desenvolvimento Sustentável foi criado em 1995,
impulsionado pelos debates após a RIO 92. Tem se destacado nas pesquisas sobre consumo
de energia e impacto ambiental na produção dos componentes construtivos e ao longo da
vida útil, demanda por recursos naturais não renováveis e a geração de resíduos. O GT
Durabilidade possui o foco nas pesquisas que envolvem o tempo de vida útil dos materiais
das construções, bem como a energia consumida durante esse período e os resíduos
produzidos.
O Grupo Gestão e Economia da Construção tem promovido o debate entre
pesquisadores interessados nas transformações trabalhistas e comerciais que envolvem a
construção civil, nas novas formas e tipos de organização das empresas do setor. O Grupo
de Trabalho Qualidade do Projeto visa a pesquisar os processos de projeto nas suas várias
207
Disponível em www.antac.org.br.
204
fases bem como a avaliação do espaço em uso, tudo isso com o objetivo de atingir a
qualidade do ambiente construído que a sociedade espera.
O GT Resíduos desenvolve trabalhos na área de reciclagem de rejeitos
agroindustriais para utilização na construção civil, com foco no potencial econômico
desses processos, no desenvolvimento de mercado para resíduos e na avaliação do impacto
ambiental desses produtos. Finalmente, o Grupo de Trabalho Sistemas Prediais tem como
objetivo implementar o conhecimento nas áreas de sistemas prediais hidráulicos e
sanitários, gás combustível, eletricidade, combate a incêndios e automação predial, tendo
em vista a melhoria da qualidade desses sistemas, em todas as fases de implantação, desde
o projeto, materiais, fornecedores, execução e uso.
Cada Grupo de Trabalho desenvolve, segundo agenda própria, uma série de eventos
para divulgação de suas pesquisas. Nesse sentido, cabe destacar os encontros bianuais
organizados pelo GT Desenvolvimento Sustentável “Encontro Nacional de Edificações e
Comunidades Sustentáveis”, em sua sétima edição, e o “Encontro Latinoamericano de
Edificações e Comunidades Sustentáveis”, em sua quinta edição. Nesses encontros, face à
complexidade do tema, são apresentados trabalhos de diversas áreas que podem contribuir
para a sustentabilidade na construção civil, seja na esfera ambiental, econômico-social ou
cultural.
A ANTAC tem reconhecido papel no debate e difusão do conhecimento sobre o
tema, não só em termos de atividades acadêmicas, mas também na participação dos fóruns
de discussão junto às instâncias governamentais e privadas na formulação de uma política
de ciência, tecnologia e informação no ambiente construído. Com isso, vem preencher um
espaço importante na formação de um corpo técnico especializado, no intercâmbio das
informações e no aprimoramento dos estudos sobre sustentabilidade dos assentamentos
humanos.
Outra entidade importante na difusão do conhecimento acerca do tema refere-se ao
Conselho Brasileiro de Construção Sustentável – CBCS208
, fundado em 2007, que agrega
membros da academia, fabricantes, construtoras, projetistas, representantes do governo,
associações e outros segmentos da construção civil. O CBCS adota uma visão sistêmica da
sustentabilidade ao procurar entender a interdependência entre a construção civil e a
208
Disponível em www.cbcs.org.br/website/.
205
indústria de materiais, o governo, a academia e a sociedade civil. Nesse sentido, objetiva,
principalmente, produzir e difundir estudos sobre a sustentabilidade no setor, através a
inovação, integração de redes de pesquisa, elaboração e discussão de ferramentas de
postura e normas técnicas. Atua segundo o trabalho de oito comitês temáticos: Água,
Avaliação de Sustentabilidade, Econômico e Financeiro, Energia, Gerenciamento de
Riscos, Materiais, Projeto e Urbano209
.
O Comitê Água aborda os temas: uso racional, indicadores de consumo,
conservação, reuso, gestão, saneamento básico, sistemas prediais e educação ambiental
para o uso da água. O Comitê Avaliação de Sustentabilidade foca seus trabalhos na
avaliação de produtos, projetos, processos, todos com vistas à realidade brasileira, também
elabora uma base de dados para alimentar atividades de pesquisa e inovação.
O Comitê Temático Econômico e Financeiro trabalha na mudança dos conceitos
tradicionais de mercado através da conscientização das oportunidades de ganho de imagem
e ganhos econômicos presentes nas ações de sustentabilidade da construção. O CT Energia
enfoca a eficiência energética de edifícios comerciais, públicos e residenciais, na educação
do consumidor, nos processos de etiquetagem do Inmetro e na discussão da NBR 15.575.
O Comitê de Gerenciamento de Riscos Ambientais busca desenvolver trabalhos de
mapeamento, identificação, prevenção e mitigação de riscos ambientais associados à
construção civil, na implementação de empreendimentos imobiliários. As ações estão
centradas em áreas de preservação permanente, de proteção de mananciais e paisagens, na
poluição sonora e na segurança do trabalho.
O Comitê Temático de Materiais tem por objetivo desenvolver processos e
ferramentas de melhoria do desempenho socioambiental de produção de materiais e
componentes da indústria da construção. Está focado, principalmente, na análise do ciclo
de vida simplificada como instrumento de informação aos consumidores e projetistas.
O aumento da complexidade dos projetos vem exigindo novas abordagens, mais
sustentáveis e integradas. Assim, o CT Projeto desenvolve ações na contribuição do
aumento da qualidade dos projetos, frente às novas possibilidades de inovação técnica, de
processos e materiais, além do atendimento as novas normas de desempenho.
209
Todas as informações referentes aos Comitês Temáticos estão disponíveis em
www.cbcs.org.br/website/comite-temático/.
206
O Comitê Urbano aborda a temática da sustentabilidade das cidades no Brasil, na
conjugação dos aspectos sociais, econômicos e tecnológicos, com foco em cidades
compactas e eficientes, código de posturas e no problema da informalidade urbana.
Dentre os projetos desenvolvidos pelo CBCS, cabe destacar o projeto que lidera e é
desenvolvido em parceria com a United Nations Environment Programme
(UNEP/PNUMA), com apoio da União Européia, intitulado Sustainable Social Housing
Initiative(SUSHI), o qual está direcionado para o estudo de práticas sustentáveis em
habitações de interesse social. O objetivo é desenvolver uma habitação (e uma metodologia
construtiva) eficiente no consumo de água e energia, durável, confortável, fácil de manter e
integrada à cultura e ambiente local210
.
Vale ressaltar também o projeto “Avaliação do Ciclo de Vida Modular”
desenvolvido pelo CT de Materiais e que se propõe a criar uma plataforma de informações
com dados levantados na produção de componentes, junto aos fabricantes, para servir de
base de consulta aos consumidores e técnicos na tomada de decisões. Envolve uma
metodologia simplificada de ACV como guia para empresas identificarem pontos críticos
e, assim, otimizarem seus processos de forma mais sustentável.
Finalmente, o CBCS, através do Comitê Energia, está desenvolvendo uma
ferramenta de etiquetagem energética para edifícios não residenciais já construídos e,
assim, medir seu grau de eficiência no consumo de energia. Trata-se de uma nova
metodologia que deverá vincular-se à etiqueta do Procel Edifica, complementando-a, uma
vez que essa só é aplicada a projetos ou edifícios recém-construídos. A proposta é criar
uma base referencial de dados para que os gerentes ou proprietários de um edifício possam
avaliar o seu desempenho e implantar melhorias.
Em relação aos eventos, o CBCS realiza, anualmente, o Simpósio Brasileiro de
Construção Sustentável, que, em 2013, se encontra na sua sexta edição. Esse evento vem
consolidando e ampliando o debate da construção sustentável em suas três escalas: o
espaço urbano, os edifícios e as unidades habitacionais. Ao longo dos anos de realização
abordou diversos temas como: eficiência energética; a sustentabilidade em edifícios bairros
e cidades; economia verde; gestão e inovação211
.
210
Disponível em www.cbcs.org.br/sushi/. 211
Disponível em www.cbcs.org.br/website/simposios/show.asp.
207
O CBCS vem, ao longo dos anos de sua existência, desenvolvendo um trabalho
relevante perante o setor da construção civil, no desvelamento das oportunidades de
negócios que a sustentabilidade proporciona, na importância do planejamento e projeto dos
espaços construídos, na análise do ciclo de vida dos materiais, nas fontes alternativas de
energia, no consumo de água, no saneamento básico, nas políticas públicas, enfim, nos
diversos temas que envolvem o meio ambiente, os recursos naturais, os espaços
construídos e o homem.
3.4 – Norma ABNT NBR 15575/2013
O conjunto normativo mais recente que incide sobre as bases da construção civil no
Brasil refere-se à Norma ABNT 15575/2013, que trata do desempenho das edificações
habitacionais e passou a vigorar a partir de julho de 2013. O texto original tinha previsão
de vigorar em março de 2010, entretanto, diante de algumas divergências relacionadas ao
grau de exigências, o CBIC solicitou sua revisão a Associação Brasileira de Normas
Técnicas, trabalho que ocorreu ao longo dos últimos dois anos para, enfim, entrar em
vigor.
Em linhas gerais, a Norma visa a estabelecer padrões de eficiência para as
edificações, ou seja, garantir requisitos mínimos de conforto, estabilidade, vida útil,
segurança estrutural e contra incêndios para os edifícios habitacionais. Nesse sentido, não
só proporciona maior garantia ao consumidor, como também estabelece critérios para
todos os envolvidos na cadeia produtiva do setor, criando bases mais padronizadas e,
portanto, mais igualitárias.
Sua redação seguiu modelos internacionais de normalização de desempenho, onde
para cada necessidade do usuário e condição de exposição do material aparece uma
sequência de Requisitos e Critérios de Desempenho e os respectivos Métodos de
Avaliação. Foi organizada segundo os elementos e etapas da construção, sendo dividida em
seis partes: Requisitos gerais; Requisitos para os sistemas estruturais; Requisitos para os
sistemas de pisos; Requisitos para os sistemas de vedações verticais internas e externas;
Requisitos para os sistemas de cobertura; Requisitos para os sistemas hidrossanitários
(MARINS, 2013).
208
Em linhas gerais, pode ser entendida segundo três partes estruturantes de exigências
requeridas e por temas secundários, a saber: Exigências de Segurança (desempenho
mecânico, segurança contra incêndio, segurança no uso e operação); Exigências de
Habitabilidade (estanqueidade, desempenho térmico e acústico, desempenho lumínico,
saúde, higiene e qualidade do ar, funcionalidade e acessibilidade, conforto tátil);
Exigências de Sustentabilidade (adequação ambiental, durabilidade e manutenibilidade)
(MARINS, 2013)
Para fins de concisão e adequação à proposta temática da presente pesquisa, a
análise da Norma será focada apenas nos aspectos referentes às Exigências de
Sustentabilidade, suprimidas as demais.
Os critérios de Adequação Ambiental indicam que os empreendimentos devem ser
projetados, construídos e mantidos com o mínimo de interferência no ambiente, com
atenção primária aos riscos ou agentes de risco relativos à implantação da obra, tais como:
enchentes, erosão, deslizamentos, vendavais, tremores de terra, rota de aeronaves, antiga
presença de aterro sanitário, linhas de alta tensão, dentre outros. Devem ser construídos
dentro de metas de consumo racionalizado de recursos naturais (água, energia, etc.),
utilizando-se madeira de origem comprovada; no período da obra, deve-se implantar
sistema de gestão de resíduos; nos projetos, deve-se avaliar o ciclo de vida dos materiais e
soluções arquitetônicas privilegiando iluminação e ventilação natural.
Em relação à água, a Norma estabelece a racionalização de seu consumo pela
utilização de sistemas hidrossanitários com mecanismos economizadores nas torneiras e
vasos e diâmetro reduzido dos ramais de descarga do box do chuveiro, provocando o
afogamento do ralo. Recomenda também o reuso desse recurso para destinação não potável
(MARTINS, 2013), minimizando o volume de esgoto conduzido para tratamento.
Finalmente, institui a impossibilidade de contaminação do solo e do lençol freático pela
operacionalização dos empreendimentos, devendo o esgoto sanitário estar ligado à rede
pública ou sistema de tratamento.
As exigências de durabilidade decorrem da crescente escassez de recursos pela
exploração do meio ambiente. Assim, a Norma estabelece requisitos de prazos de vida útil
de projeto e características de resistência para outros elementos do edifício como pisos,
fachadas, etc.
209
Para os projetos, estipula uma vida útil em três níveis: Mínimo (obrigatório),
Intermediário e Superior, distribuídos segundo uma tabela (MARTINS, 2013) para
diferentes tipos de sistemas (estrutura, vedações, cobertura, etc.). Numa obra qualquer,
esses prazos deverão ser atendidos (teoricamente) por documento especificando a vida útil
do empreendimento como um todo, calculado a partir de suas partes com base em
metodologia especificada na norma e contada a partir da data de conclusão (habite-se) ou
outro documento legal.
Os aspectos de durabilidade dos elementos componentes da edificação deverão ser
avaliados segundo alguns critérios: atendimento às normas técnicas brasileiras, execução e
montagem segundo orientação do fabricante e manutenção e gestão conforme manual de
uso e operação. Esses cuidados visam a garantir o atendimento da vida útil estipulada ou a
durabilidade da obra, que nada mais é que o somatório da durabilidade de todos os seus
componentes. Nesse sentido, apresenta uma série de comportamentos tolerados ou
permitidos para alguns elementos como pisos atingidos por umidade, por abrasão e por
agentes químicos, ação do calor nas paredes das fachadas e estabilidade da cor das telhas.
No que tange às Exigências de Manutenibilidade, a Norma foca no uso correto, na
adoção de processos eficientes de manutenção e no seguimento do manual de uso dos
componentes de um projeto. Essas manutenções podem ocorrer de forma preventiva ou
corretiva, a depender do uso e característica do produto, e obedecer a um manual fornecido
pela construtora ou incorporadora que por sua vez deve ser elaborado conforme a norma
NBR 14037212
, constando das seguintes informações gerais: garantias e assistência técnica,
memorial descritivo do produto, fornecedores credenciados, limpeza e uso do imóvel,
manutenção.
Os cuidados de manutenção destacados visam a garantir a realização da vida útil da
construção prevista no projeto, preservar suas características originais e recuperar o
desgaste natural dos sistemas pelo tempo de uso. Essa responsabilidade começa durante a
sua construção, mas é ao longo de sua operação que se torna imprescindível uma
responsabilidade dividida entre os usuários da edificação, os quais, se bem orientados,
podem fazer cumprir os objetivos sustentáveis da Norma.
212
NBR 14037 – Manual de Operação, Uso e Manutenção das Edificações – Conteúdo e Recomendações
para Elaboração e Apresentação. Disponível em www.abntcatalogo.com.br.
210
Os breves enfoques aqui apresentados quanto à NBR 15575, obviamente, não
dispensam a apreciação completa do documento para aqueles que anseiam construir algo
dentro das atuais recomendações de preservação dos recursos naturais. A Norma assume, a
partir de sua implementação, um papel preponderante no momento em que o setor
construtivo brasileiro alcança índices muito elevados de produção e que, portanto, tem a
enorme responsabilidade de trazer para o seu campo de atuação a consciência por
processos mais sustentáveis. Limita-se, entretanto, por não incidir sobre as edificações já
existentes ou em execução, o que já deixa margem para futuros projetos que tenham o
objetivo de inserir na sustentabilidade esse enorme estoque construído.
CAPÍTULO 4
CERTIFICAÇÃO AMBIENTAL
4 – CERTIFICAÇÃO AMBIENTAL
As certificações vêm alcançando, nas últimas décadas, um patamar de destaque nas
ações do mercado para atender as novas demandas por produtos ambientalmente corretos.
Nesse contexto, a indústria da construção civil vem num movimento crescente em adotar
esse instrumento de avaliação, como forma de validar e reconhecer seus esforços por
edificações sustentáveis. Assim, o objetivo desse capítulo é analisar o mecanismo da
certificação ambiental de empreendimentos imobiliários, com base nos seus limites,
abrangência e inserção no mercado brasileiro e como vem se estruturando os quatro mais
importantes sistemas de avaliação empregados no país.
A primeira parte aborda os passos evolutivos das certificações ambientais no
âmbito das construções sustentáveis. As seguintes, segunda, terceira, quarta e quinta partes,
tratam dos Selos internacionais, Leed e AQUA e, dos nacionais, Procel Edifica e Casa
Azul, respectivamente.
Até meados de 1970, as questões ligadas aos impactos causados ao meio ambiente
estavam sujeitas a ações de regulamentação, em sua grande maioria na forma de estipular
padrões e limites de emissões, aceitos e seguidos pelos agentes poluidores. As abordagens
do problema de forma mais abrangente, conectando causas e efeitos, começaram a ser
realizadas de forma isolada por alguns países, na tentativa de rotular produtos que
agredissem menos o meio ambiente, e, a partir daí, surgiram então os selos verdes
(VALLE, 2009).
Quem passasse a ostentar um rótulo dessa categoria era identificado imediatamente
como merecedor da preferência do consumidor e, portanto, entendido como um poderoso
instrumento de mercado. Dessa forma, diversos países do primeiro mundo passaram a
desenvolver selos verdes, sendo o primeiro introduzido na Alemanha em 1978,
denominado de Anjo Azul (VALLE, 2009).
Em 1992 o British Standards Institution (BSI) homologa uma norma, a BS 7750,
que introduz procedimentos para que as empresas introduzam em sua gestão parâmetros
ambientais. Essa normatização desperta a ISO para a elaboração de normas internacionais
de certificação ambiental de organizações e de produtos, nos mesmos moldes das já criadas
213
e amplamente difundidas da série ISO 9000213
. Assim, em 1996 foi publicada a primeira
norma da série ISO 14000, a norma certificadora ISO 14001, Sistemas de Gestão
Ambiental – Requisitos com Orientação para Uso, aplicável tanto a atividades industriais,
como extrativistas, comerciais, de serviços e até institucionais (VALLE, 2009).
É concebida como uma sistemática de melhoria contínua da gestão ambiental da
empresa, que a adota de forma voluntária, e deve cumprir um roteiro-padrão de exigências
válido internacionalmente. Criam-se, assim, condições favoráveis de disputa por mercados
exteriores cada vez mais competitivos e exigentes pela adequação aos novos parâmetros de
preservação ambiental.
A certificação nada mais é que um processo executado por uma entidade externa e
independente, credenciada a emitir um documento no qual fica comprovada a
conformidade de um produto, processo ou serviço, tendo por marco referencial um
conjunto de normas existentes aplicável para as distintas áreas em questão. Isso se faz
necessário para o reconhecimento internacional da certificação (VIEIRA & BARROS
FILHO, 2009).
A empresa solicitante da ISO 14000 deverá atender a três critérios básicos,
estipulados em três etapas: ter implantado um Sistema de Gestão Ambiental; cumprir a
legislação ambiental do local de instalação; ter o compromisso de melhoria contínua de seu
desempenho ambiental (VALLE, 2009).
Na primeira fase de certificação, a empresa deve apresentar sua política de gestão,
comprovando seus compromissos, objetivos, metas de organização e os procedimentos das
entidades parceiras, todos com vistas à melhoria das condições ambientais. Ainda, é
necessária a criação de mecanismos de controle da documentação e uma estratégia de
treinamento de pessoal para adequação às novas posturas.
A segunda etapa exige a comprovação de que a empresa atende a todas as normas
ambientais do local de instalação, municipais e estaduais, uma vez que a certificação não
substitui essa legislação, ficando assim vinculada a observância de todo esse marco legal.
213
Gestão da Qualidade e Garantia da Qualidade, adotada no Brasil pela ABNT e designada por NBR ISO
9000. Disponível em www.abntcolecao.com.br.
214
Finalmente, a organização deve comprometer-se com a melhoria contínua de sua
performance ambiental, identificando e destinando corretamente todos os resíduos gerados
por seus processos de produção, incluindo seu produto ao fim de sua vida útil.
A série ISO 14000 se autoapresenta como uma metodologia gerencial voltada para
as atividades de gestão ambiental da empresa, dividida em dois grupos de atuação, as que
tratam da organização (Sistema de Gestão Ambiental, Auditoria Ambiental e da Qualidade,
Avaliação do Desempenho Ambiental) e as normas que tratam dos produtos (Rotulagem
Ambiental, Avaliação do Ciclo de Vida, Aspectos Ambientais nos Produtos).
Desde sua implementação, na década de 90, que a certificação da série ISO 14000
vem amplamente sendo introduzida nos mais diversos ramos do mercado, principalmente
por seu forte apelo comercial, de vantagens na disputa por produtos de melhor qualidade
produzidos em processos “limpos”, o que delega à empresa uma boa imagem junto ao
cliente interno ou externo. Por se tratar de sistemas historicamente mais poluentes, as
atividades industriais pesadas ainda formam o conjunto de entidades que mais pleiteiam
essas certificações, entretanto, essa nova visão de negócio apoiada na imagem ambiental da
empresa vem ganhando espaço e outros ramos empresariais começam a apostar nessas
novas estratégias de ampliação do negócio.
Provavelmente, o aspecto mais importante das certificações ambientais não reside
nas vantagens agregadas à imagem mercadológica, mas sim aos ganhos financeiros diretos
obtidos numa produção otimizada, reduzindo o custo de seus produtos e serviços,
minimizando a geração de resíduos e, consequentemente, o impacto ambiental. Ressalta-se
ainda a eliminação de eventuais multas por danos ao patrimônio natural e a redução nas
apólices de seguros, uma vez que a empresa está sujeita a menores riscos (VALLE, 2009).
O rápido crescimento do campo das certificações ambientais resulta não só das
pressões legais e da sociedade como um todo. A classe empresarial começou a enxergar a
necessidade de se avançar para além das abordagens convencionais e partir a uma atuação
mais objetiva e responsável. O setor da indústria da construção civil também vem se
engajando nesse processo: num primeiro momento, com as certificações de gestão da
qualidade (série ISO 9000) e, atualmente, com as certificações ambientais dos edifícios.
215
4.1 – As Certificações Ambientais na Indústria da construção
A construção das edificações urbanas é um dos grandes fatores responsáveis pelo
crescente impacto sobre o meio ambiente, sentido não apenas na fase de sua
implementação, mas, principalmente, durante seu uso. Dentre as muitas agressões
destacam-se: o consumo de energia e água, as emissões de CO2, a produção de resíduos
(lixo) sólidos, líquidos e gasosos.
Esse consumo excessivo está diretamente relacionado às demandas da sociedade
moderna em termos de conforto e qualidade de vida, que, por sua vez, depende, em larga
medida, da capacidade dos edifícios construídos responderem a essas novas exigências,
materializadas na qualidade térmica, acústica, qualidade do ar interior, ventilação e
iluminação. A inadequação desses aspectos é o que vem elevando a pressão sobre os
recursos naturais, ao longo do tempo, com o crescente aumento populacional e,
consequentemente, o crescimento das cidades.
Foi a partir da crise petrolífera dos anos 70, e consequentemente energética, que,
progressivamente, iniciativas foram tomadas no intuito de se minimizarem os impactos
sociais, fruto da percepção da escassez dos recursos naturais. De forma sistemática, nos
países mais desenvolvidos, medidas foram sendo implantadas para a redução dos danos
ambientais, incluindo os ocasionados pela indústria da construção (PINHEIRO, 2006).
A Comunidade Europeia começou a se mobilizar em termos de estabelecer
diretivas que, de alguma forma, assegurassem um melhor desempenho às edificações em
termos de materiais, produtos e energia. Nesse sentido, em 1988, foram estabelecidos
normas e métodos regulando parâmetros de qualidade do ar no interior dos edifícios, bem
como a produção de materiais ambientalmente corretos, a gestão dos resíduos da
construção e demolição e os custos envolvidos na operacionalização das construções
(PINHEIRO, 2006).
Paralelamente aos mecanismos de avaliação do desempenho energético das
edificações, foram surgindo instrumentos de caracterização ambiental de produtos e
materiais de construção, além dos selos verdes mencionados anteriormente, que, em
seguida, evoluíram para as abordagens do ciclo de vida desses componentes e,
216
consequentemente, tem-se o estabelecimento de diretrizes e guias para melhorar o
comportamento das construções e sua avaliação.
Os processos de verificação da análise do ciclo de vida forneceram a base de dados
para o desenvolvimento das ferramentas de avaliação ambiental de edifícios que surgiram
na Europa, EUA e Canadá, a partir da década de 90, e contribuíram, substancialmente, para
o surgimento do conceito de construção sustentável (SILVA, 2007).
Esse conceito surge em meados da década de 90 num forte movimento que
envolveu os países desenvolvidos, mais especificamente em 1994, na Flórida, na cidade de
Tampa, com a Primeira Conferência Internacional sobre Construção Sustentável, onde
aparece uma definição largamente aceita, na qual se estabelece a conexão entre ambiente
construído saudável, ecologia e riquezas naturais. Tal movimento é baseado em princípios
de redução do consumo, reutilização, reciclagem de materiais, proteção dos sistemas
naturais e a eliminação de agentes tóxicos em todas as fases da produção da edificação
(PINHEIRO, 2006).
A construção sustentável, a construção verde ou a construção vernácula,
pretendem permitir a integração do homem com a natureza utilizando os recursos
naturais. Todas preservam o ambiente e procuram soluções plausíveis. A
construção sustentável difere por ser um produto da moderna sociedade
tecnológica, recorrendo ou não, a materiais naturais e/ou produtos provenientes
da reciclagem de resíduos, focando a importância de uma abordagem holística,
integrada e prática numa perspectiva interdisciplinar, como forma efectiva de
concretizar esses princípios. (PINHEIRO, 2006, p. 106).
Fortemente atrelado às questões de competitividade do setor, como uma forma de
equacionar a tensão entre desempenho ambiental e desempenho financeiro das empresas, a
construção sustentável, paulatinamente, vai ganhando relevância frente às organizações
governamentais, na perspectiva de se criar um consenso de classificação e avaliação de
mecanismos eficientes de demonstração e melhoria contínua tanto dos estoques
construídos, quanto das novas construções (SILVA, 2007).
Esse processo levou esses países a uma crescente conscientização da população e
dos agentes econômicos de forma diversificada, sendo alguns mais avançados do que
outros, a depender da resposta e pressão governamental sobre esses agentes, cabendo
destacar o papel do Reino Unido que, em 1990, lança o BREEAM (Building Research
217
Establishment Enviromental Assessment Method), largamente aceito como o primeiro
sumário de avaliação de desempenho para edificações (PINHEIRO, 2006).
Desde então, formas práticas de avaliar e reconhecer a construção sustentável vêm
sendo desenvolvidas, em muito impulsionadas pelas conferências internacionais na
comparação das metodologias, na divulgação e sensibilização do mercado em adotar,
voluntariamente, esses mecanismos e se tornar um agente contribuinte de elevação do
padrão ambiental dos espaços construídos.
O aprofundamento em torno dessas questões conduziu ao aparecimento de,
basicamente, quatro formas de atuação em torno das avaliações das edificações: em
primeiro lugar, surgiram guias ou orientações para se obter construções sustentáveis
encabeçadas por agentes públicos, estabelecendo critérios ou metodologias baseadas em
análise do ciclo de vida ou de impacto ambiental; em segundo lugar, foram criados
processos de avaliação desses critérios como forma de validá-los; em terceiro lugar,
processos de avaliação independentes regulados pelo mercado; por fim, surgiram os
especialistas (auditores) como personagens para o desenvolvimento, coordenação e
integração das ações de avaliação e certificação (PINHEIRO, 2006).
Grosso modo, um sistema de avaliação ambiental de um edifício tem por objetivo
determinar o seu desempenho, baseado em um grupo de critérios estabelecidos e
reconhecidos como relevantes, para quantificar o impacto (negativo ou positivo) do
empreendimento no seu meio (rua, bairro, cidade, etc.). Essa avaliação justifica-se pela
comprovação de um melhor desempenho ambiental, o qual pode ser comunicado a
possíveis inquilinos ou compradores, consequentemente favorecendo a valorização
imobiliária; na redução de perdas e resíduos, com ganhos em marketing ambiental; na
diminuição de custos operacionais, com maior economia no funcionamento da edificação e
obtenção de privilégios em taxas e impostos institucionais; como contribuição voluntária
na melhoria e economia dos recursos naturais; etc.
A certificação de um edifício nada mais é do que a continuação do processo de
sustentabilidade iniciado no projeto, depois na obra, devendo se prolongar durante sua
utilização. Mas, de alguma forma, necessita ser validada, ou seja, ter o reconhecimento das
“boas ações” pela sociedade.
Segundo Silva (2007), os sistemas de avaliação ambiental também podem ser
classificados em dois grupos: um primeiro, que se utiliza de mecanismos de mercado para
218
promover a sustentabilidade na construção, é facilmente absorvido pela sociedade e por
projetistas, baseando-se em metodologias mais simples, na forma de sumários de
verificação, e resulta sempre em uma certificação de desempenho. O segundo grupo
engloba as metodologias orientadas para pesquisa de fundamentação científica de cunho
exploratório.
Conforme a mesma pesquisadora, em termos metodológicos, os sistemas de
certificação podem ser construídos sob três questões fundamentais: o que avaliar? Como
avaliar? Quanto atingir?
As distinções entre os temas analisados nas certificações baseiam-se no local de
origem, pois “refletem expectativas de mercado, práticas construtivas e, principalmente,
agendas ambientais diferentes para cada país” (SILVA, 2007, p. 47). Temas gerais, de
abrangência global, tais como impacto sobre a camada de ozônio ou destruição de
florestas, são abordados por todos os métodos, o que diferem quanto a temas “menores”
que se inserem, ou não, a depender de sua influência, na sustentabilidade local, atrelada a
característica de deficiência ou abundância, respectivamente. Em outras palavras, os
recursos ambientais locais definem a ênfase que o sistema de avaliação traz consigo,
limitando, assim, sua capacidade de adaptação para outras realidades ambientais.
Ainda com relação ao “o que” os sistemas avaliam, Silva (2007) aponta uma
deficiência presente em 10 metodologias internacionais214
, que pode ser extrapolada como
uma característica generalizante, quando se refere à não consideração de uma análise que
englobe os três aspectos da sustentabilidade, ou seja: o social, o ambiental e o econômico.
Nesse sentido, todas as certificações aparentam ser incoerentes com seus objetivos
basilares de contribuir para a construção sustentável, demonstrando nesse aspecto uma
lacuna a ser explorada.
Ao se abordar “como avaliar”, a situação ideal seria os sistemas adotarem uma
metodologia baseada em valores de referência (benchmark), ou, em outras palavras, avaliar
o desempenho das edificações. Entretanto, face à complexidade desse método, a maioria
das certificações adota conceitos prescritivos.
214
BREEAM, BRE EcoHomes, BEPAC, LEED, LEED for Homes, CASBEE, HQE, Certification Habitat
&Environment, GBC-GBTool, Green Star (SILVA, 2007).
219
[...] trabalham com listas de verificação (checklists) que concedem créditos em
função da aplicação de determinadas estratégias de projeto ou especificação de
determinados equipamentos. Esta é uma saída com nível de complexidade muito
menor, que presume que uma coleção de estratégias e equipamentos
provavelmente levará a alguma melhoria de desempenho, ainda que ela não
possa ser estimada (SILVA, 2007).
Esse formato é mais simples e, por isso mesmo, mais aceito, onde o
dimensionamento do desempenho ambiental é uma consequência da atribuição de pontos a
aspectos avaliados, ou, quanto maior o número de pontos, maior o desempenho. O
problema está não só em se estabelecerem medidas de referência a serem atingidas
minimamente e quais os critérios na definição desses valores, tomando-se o cuidado para
não incorrer no estabelecimento de parâmetros baseados na prática usual, pelo que
sumárias melhorias são logo aceitas como um bom desempenho (COLE, 2002). Assim, se
uma edificação preencher satisfatoriamente uma listagem de verificação, isso não garante
uma melhor operação ambiental futura, em ternos globais, como, por exemplo, o uso de
iluminação eficiente (LED) não garante a implantação de estratégias de estímulo para a
redução do consumo de energia, o que, em termos de sustentabilidade geral, é mais
importante (SILVA, 2007).
Outro entrave à aceitação das certificações, principalmente no meio acadêmico,
reside na mínima utilização da metodologia de Análise do Ciclo de Vida como ferramenta
de definição dos critérios ambientais avaliados, principalmente os relacionados ao uso de
materiais (SILVA, 2007).
Enquanto a ACV não for efetivamente introduzida, tudo o que os sistemas de
avaliação de desempenho podem informar é que o edifício certificado “tem a probabilidade
de ter menor impacto ambiental. E essa probabilidade decresce na medida direta de o
usuário não ter compromisso com o tema” (AGOPYAN; JOHN, 2011, p. 136). Em outras
palavras, pode-se dizer que, de modo geral, ou pelo menos na maioria dos casos, nas
certificações, deposita-se total empenho da melhoria no cumprimento de critérios,
entretanto esses dependem de quem irá operá-los. Ou seja, é preciso retirar das mãos
dessas pessoas essa responsabilidade e devolvê-la aos métodos de avaliação, onde essa
segurança do “bom” ou “excelente” desempenho venha garantida desde a escolha dos
materiais em seus processos de produção.
220
Vale ressaltar que os dados de inventário disponibilizados ainda são reduzidos e as
metodologias de ACV muito complexas e caras, como já abordado no capítulo anterior,
dificultando e limitando sua incorporação por outras sistemáticas ambientais de
sustentabilidade.
Silva (2007) levanta também a questão da falta de clareza na comparação das
variáveis ou dos critérios ambientais avaliados. Nesse sentido, os efeitos desejados com a
avaliação de determinado aspecto – isolamento térmico, por exemplo – variam não só em
termos de material, mas também do uso, da importância geográfica, etc. Certificações
muito difundidas (LEED, por exemplo) adotam a sistemática de pontos no tratamento de
todas as categorias, a variação está na quantidade de créditos atribuídos para cada uma
dessas, o que, por sua vez, resulta da decisão das equipes que desenvolveram o sistema. O
problema é que o desempenho final é expresso através de uma pontuação geral, não sendo
exigido, minimamente, o atendimento de pontos em cada categoria.
Por fim, ainda dentro do tema de “como avaliar”, têm-se as diferentes
possibilidades dos sistemas de avaliação no que tange a informar o resultado obtido. Nesse
sentido, Pinheiro (2006) assinala que as certificações cujas partes constituintes de
investigação são menos evidentes, adotam resultados resumidos em expressões como
“excelente” ou “bom”, para cada critério avaliado, e são mais claramente entendidos pelo
mercado. Outras adotam escalas de valores ou simplesmente o atendimento, ou não, do
critério avaliado. Silva (2007) ainda distingue uma comunicação do desempenho ambiental
de forma absoluta (nos moldes dos citados anteriormente) ou de forma relativa (em
comparação com o desempenho típico do mercado). De qualquer forma, a grande maioria
das certificações apresenta um resultado global, na forma de uma valoração hierarquizada
que classifica a edificação em níveis, podendo ser entendidos, geralmente, em três escalas:
mínimo, médio e superior.
Uma terceira questão metodológica dos sistemas de certificação reside na definição
do “quanto é preciso atingir” para garantir a classificação de edificação sustentável. Nesse
sentido, uma das maiores dificuldades está na confirmação de valores de referência e metas
a serem atingidas, processos esses que demandam uma grande quantidade de dados
tratados estatisticamente e, devido ao relativo pouco tempo de abordagem do tema, ainda
não foi possível montar uma base de informação consistente (SILVA, 2007).
221
Atualmente, a grande maioria das certificações define, num primeiro momento, sua
sistemática de valores e metas de forma empírica, passando, posteriormente, a processos de
revisão que retroalimentam e reajustam as versões posteriores. Esse é ainda o mecanismo
mais viável em termos de custos e de tempo, mas que abre novamente um extenso campo
futuro de aperfeiçoamento para os sistemas de avaliação ambiental.
Vale salientar ainda duas fortes tendências (de certo modo antagônicas) no tocante
à formulação de novas certificações. Em primeiro lugar, várias entidades governamentais e
particulares, no âmbito local, vêm desenvolvendo sistemáticas de avaliação baseadas nos
condicionantes climáticos, recursos naturais, aspectos culturais e limites econômicos da
região215
. Pode-se mencionar como exemplo, inclusive no Brasil, o SINDUSCON Espírito
Santo, que desenvolveu e vem estimulando a implantação de uma certificação junto a
empresas associadas.
No sentido contrário à tendência de regionalização, esforços vêm sendo tomados na
construção de uma certificação de comparação internacional na troca de informações entre
diversos países. Exemplo disso é o Green Building Tool,216
iniciado em 1996, como um
processo de melhoria continuada, com um grau de flexibilidade nos seus critérios, que
permite sua aplicação não só em uma série de tipos diferentes de edifícios, mas também em
diversas regiões do planeta (PINHEIRO, 2006).
A sustentabilidade no processo construtivo requer um conjunto de princípios que,
em linhas gerais, visam a minimizar o consumo de recursos naturais. Entretanto, tais
procedimentos precisam ser avaliados em todas as etapas de produção: projeto, execução,
operação e, por fim, o desmonte da edificação. Isso se faz necessário não só por se tratar de
uma sistemática relativamente recente, e, portanto, ainda em construção, mas também para
que se torne evidente as vantagens de sua adoção.
Atualmente, vários países adotam sistemas de certificação na construção civil,
elaborados dentro das especificidades locais. Muitos destes venceram os limites territoriais
e passaram a ser utilizados internacionalmente, cabendo destacar: LEED (Leadership in
Energy and Environmental Design), originário dos Estados Unidos da América; o Green
Star (Environmental Raiting System), de origem Australiana; o HQE (Haute Qualité
215
Dados de 2006 apontam a existência de 36 certificações locais em operação nos Estados Unidos
(PINHEIRO, 2006, p. 185). 216
Ferramenta de certificação desenvolvida pelo IISBE (InternationalIniciative for a
SustainableBuiltEnvironment). Disponível em www.iisbe.org/sbmethod. Acesso em 08/10/2013.
222
Environinmentale), da França e o CASBEE (Comprehensive Assessment System for
Building Environmental Efficiency), do Japão217
.
Face à sua relevância no âmbito internacional como o primeiro sistema de
certificação ambiental implantado e seu papel como impulsionador dessa sistemática no
restante do mundo, o BREEAM, será analisado em seus aspectos fundamentais.
O sistema BREEAM estabelece créditos ao edifício no cumprimento de requisitos
estipulados, distribuídos em categorias, com pesos distintos, dependendo da tipologia da
edificação. A conjugação entre os créditos e os pesos determina o desempenho ambiental
da edificação (PINHEIRO, 2006).
Tem por objetivo estabelecer o atendimento de padrões de construção acima dos
estipulados na lei, difundir práticas construtivas ambientalmente corretas em todas as fases
da obra, destacando as edificações de elevado desempenho ambiental, dentre as demais
construídas (SILVA, 2007). Sua implementação está dividida em quatro fases: avaliação
inicial; dimensionamento, inventário e compra de materiais; gestão e operação; controle da
qualidade. Permite avaliar vários tipos de construção: habitações, edifícios para escritórios,
unidades industriais, edifícios comerciais, escolas, hospitais e prisões218
.
O BREEAM é a metodologia mais copiada/adaptada em termos internacionais,
estando, atualmente, presente em mais de 50 países. Sua popularidade deve-se a: “uma
abordagem de desempenho de referencia; cobertura abrangente de aspectos relacionados à
energia, impacto ambiental, saúde e produtividade; identificação de oportunidades realistas
para melhoria, assim como de potenciais vantagens financeiras adicionais” (SILVA, 2007,
p.12).
No Brasil, o marco que representa o início dos aportes conceituais para a
construção sustentável foi a realização do “Simpósio sobre Construção e Meio Ambiente –
da teoria para a prática”, realizado no ano de 2000 pelo Departamento de Engenharia de
Construção Civil da Escola Politécnica da USP (AGOYAN; JOHN, 2011).
Esse evento teve um papel preponderante no reconhecimento e divulgação de
vários grupos de pesquisa em construção sustentável no país, sendo muitos destes,
posteriormente, os responsáveis pela criação de entidades e outros encontros importantes
217
Os sistemas LEED e AQUA serão analisados em maior profundidade ainda neste capítulo. 218
Disponível em www.breeam.org/index.jsp.
223
no tratamento do tema, tais como o CBCS219
e ENECS220
, respectivamente. Não se pode
negar que esses grupos difundiram, em um primeiro momento, esses conceitos para a
comunidade acadêmica e, consequentemente, para a sociedade em geral, e formaram um
campo fértil para a introdução das certificações de edifícios.
O processo de certificação ambiental de edifícios no Brasil cresceu
consideravelmente nos últimos anos. Exemplo disso pode ser verificado quando analisados
os dados fornecidos pelos selos LEED e AQUA, no período de 2005 a 2010, quando
passaram de 04 para 57 unidades certificadas, somados os números das duas entidades221
.
Há que se ressaltar que os dois métodos citados anteriormente apresentam
características bem similares, todos trazem as agendas ambientais de seus países de
origem, sendo, portanto, de alcance limitado à realidade brasileira (AGOPYAN; JOHN,
2011).
A grande maioria dessas certificações concentra-se no estado de São Paulo e
estados vizinhos, devido ao poderio econômico da região, somado à pressão
governamental através de leis ambientais mais rigorosas, o que, de certa forma, vem
forçando o setor a procurar por esses instrumentos no intuito de se adequarem a essas
exigências (JUNIOR; MORAES; FONTENELE, 2011).
Entretanto, algumas dificuldades ainda atrapalham um maior desenvolvimento e
popularização desses sistemas, tais como: o lucro de curto prazo como meta prioritária do
mercado imobiliário; pouco incentivo por parte do poder público; o tradicionalismo do
setor resistente as inovações tecnológicas; pouca importância dada à fase do projeto, e,
portanto, reduzidos investimentos; as diferenças econômicas entre as regiões do país
(JUNIOR; MORAES; FONTENELE, 2011).
Outra questão importante recai sobre o papel dos planos públicos no incentivo à
construção sustentável e, consequentemente, a certificação. Nesse sentido, cabe ressaltar
que o principal foco das políticas habitacionais das últimas décadas está voltado para a
diminuição do déficit de moradias no país, materializado no programa “Minha Casa Minha
219
Conselho Brasileiro de Construção Sustentável. 220
Encontro Nacional de Edificações e Comunidades Sustentáveis. 221
Dados disponíveis em www.gbcbrasil.org.br e www.vanzolini.org.br.
224
Vida”, com investimentos na ordem de R$ 34 bilhões de reais222
. Desse aparente contraste,
percebe-se a grande oportunidade do governo em resolver dois problemas com uma única
ação, uma vez que incentivos à sustentabilidade não são incompatíveis com moradias
populares.
Pelos pontos apresentados, nota-se que o desenvolvimento dos sistemas de
certificação, desde seu aparecimento, obteve um grande crescimento em todos os sentidos.
Em termos de números absolutos, praticamente todos os países europeus, além de EUA,
Canadá, México, Japão, Austrália, países da América do Sul como a Argentina, Chile,
Peru, Venezuela, Brasil, ou seja, em todos os continentes, pode-se encontrar a atuação
dessas metodologias.
Tal crescimento, deve-se, em grande parte, pelo seu poder comunicativo, o
chamado marketing verde que, pelo menos em tese, garante ao usuário que aquele produto,
no caso edificação, atende a requisitos mínimos de cuidados ambientais, além de vantagens
em termos de redução de consumo de recursos naturais, alta performance energética e
ambientes internos seguros e confortáveis, dentre outras vantagens. Esse reconhecimento
espera atrair a preferência do consumidor e assim reduzir o campo de atuação das
construções não certificadas, forçando-as, de certo modo, a migrarem para incorporar esse
diferencial.
Essa crença, na mudança do espaço construído a partir das certificações ambientais,
está repleta de contradições e de uma supervalorização do instrumento em si, merecendo
estudos mais detalhados. Tanto as certificações importadas adaptadas, quanto as nacionais,
apresentam limitações que precisam ser esclarecidas e comunicadas à sociedade, em suas
aplicações pretendidas, seus critérios de avaliação, seu papel como ferramenta de apoio ao
projeto e instrumento de distinção do desempenho da edificação, seja potencial ou real.
Nesse sentido, a seguir, serão analisadas as duas certificações importadas de maior
destaque no país, LEED e AQUA, e duas nacionais, Selo Casa Azul e Procel Edifica,
elaboradas por entidades que trabalharam dentro da realidade ambiental e de mercado do
país. As investigações estarão focadas justamente no esclarecimento das questões citadas
222
Investimentos da primeira etapa com a construção de 1 milhão de casas, finalizada em 2010. Para a
segunda etapa, está prevista a construção de 2 milhões de casas até 2014. Dados disponíveis em:
www.pac.gov.br/minha-casa-minha-vida. Acesso em 21/10/2013.
225
anteriormente com base em informações diretas das próprias certificadoras e por
pesquisadores que investigam o tema.
4.2 – A Certificação LEED
Iniciado em 1994, pelo US Green Building Council (USGBC), instituição
financiada pelo Nacional Institute of Standards and Technology, o trabalho de elaboração
da certificação LEED (Leadership in Energy and Environmental Design) visava a
incrementar o mercado de projeto e construção dentro dos preceitos ambientalistas do
desenvolvimento sustentável, fortemente influenciado pelas experiências de certificação no
Reino Unido (BREEAM) e no Canadá (BEPAC223
) e pela crença de que os sistemas
voluntários, quando comunicam o bom desempenho ambiental dos edifícios, contribuem
para o aumento da consciência dos consumidores na seleção dos empreendimentos
estimulando, consequentemente, o mercado a produzir edifícios ambientalmente corretos
(SILVA, 2007).
Sua primeira versão foi lançada em 1999 e, desde então, foi revisado por três vezes
(CASADO, 2011). Tem por objetivo avaliar a edificação em termos de seu desempenho
ambiental ao longo de todo seu ciclo de vida e, assim, definir padrões de sustentabilidade
em construções e planejamento urbano (PINHEIRO, 2006), de modo a melhor
proporcionar a apreensão de seus conceitos e metodologia por parte de profissionais da
área e indústrias de apoio ao setor, a fim de que os empreendimentos sejam reconhecidos
pelos mesmos e pela sociedade como diferenciados no mercado.
Trata-se de um sistema centrado na concessão de créditos quando critérios pré-
estabelecidos são atendidos. Tem validade por um período de cinco anos e, a partir desse
prazo, uma nova avaliação deverá ser realizada com foco na operação e gestão do edifício.
Baseia-se na especificação de desempenho tomando por referência índices ambientais
reconhecidos e adotados por instituições de alta credibilidade224
(SILVA, 2007).
223
Building Environmental Performance AssessmentCritéria, método canadense lançado em 1993. 224
Taiscomo o ASHRAE (American Society of Heating, Refrigerating and Air-conditioning Engineers), o
ASTM (American Society for Testing and Materials) ou o Clean Water Act (Lei da ÁguaLimpa) (CASADO,
2011).
226
No Brasil, o LEED, lançado em 2004 e representado oficialmente pelo GBC
Brasil225
, possui empreendimentos registrados em 17 estados da nação, além do Distrito
Federal. Até o final do primeiro semestre de 2013, perfazia o total de 120
empreendimentos certificados e 362 em fase de certificação; deste total mais de 70% estão
localizados nos estados de São Paulo e Rio de Janeiro, colocando o país no 4º lugar no
ranking mundial com o maior número de registros226
.
Atualmente, possui 18 segmentos de entidades membros, entre incorporadoras,
órgãos do governo, escritórios de engenharia, construtoras, instituições de ensino,
imobiliárias, etc. Apresenta uma agenda ligada à área de educação, voltada para a
divulgação da certificação e formação de um corpo técnico de consultores, geralmente em
parceria com instituições de ensino particular, em diversas modalidades, tais como:
seminários, palestras, educação à distância, MBA‟s, etc.
Quanto à adaptação à realidade brasileira, o GBC Brasil não explicita bem quais
foram às modificações sofridas pela versão original norte-americana. Menciona a
diminuição do número de pontos por redução do consumo de energia227
e na adoção do
conceito de reciclagem228
. Por outro lado, salienta o incremento na pontuação pela escolha
e recuperação de locais degradados, pois considera uma prática pouco explorada que deve
ser incentivada. Por fim, levanta a possibilidade de criação de duas novas categorias
referentes à biodiversidade e ao impacto social positivo de uma construção229
.
Ainda segundo o GBC Brasil, o tempo médio para obter uma certificação dura de
quatro a seis meses após a conclusão da obra, dependendo da complexidade do
empreendimento, e aborda uma sequência de nove etapas, a saber: registro do projeto (no
site do sistema); coleta de informações pelas equipes de projetos; cálculos e elaboração dos
memoriais e plantas; envio de todo o material anteriormente relacionado ao GBC
americano – análise 01; coleta e preparação de documentos após a conclusão da obra;
envio dessa documentação – análise 02; treinamento para ocupação do empreendimento;
pré-operação e pós-entrega; análise final – certificação (CASADO, 2011).
225
Green BuildingCouncil Brasil 226
Dados disponíveis em: www.gbcbrasil.org.br. Acesso em 12/08/2013. 227
Justificado pela origem de energia de hidroelétricas (fonte não poluente). 228
Segundo o GBC Brasil uma prática amplamente utilizada pelo setor da construção nacional. 229
Todas as informações disponíveis em: www.gbcbrasil.org.br/?p=faq.
227
A certificação LEED está dividida em nove tipologias: LEED NC – novas
construções e grandes projetos de renovação; LEED EB_OM – operação e manutenção de
edifícios existentes; LEED CI – projetos e interiores e edifícios comerciais; LEED CS –
projetos de envoltória230
e parte central do edifício; LEED Schools – escolas; LEED ND –
desenvolvimento de bairro231
; LEED Healthcare – para unidades de saúde; LEED Retail
NC e CI – para lojas de varejo; LEED for Home – para residências232
(CASADO, 2011).
A seguir, será detalhada a certificação LEED, tomando por base a versão LEED-
NC v.3 – 2009, para expor o sistema em sua estrutura e pontuação.
4.2.1 – Estrutura do Sistema LEED
O sistema prevê o atendimento de pré-requisitos para que o projeto tenha direito à
acumulação de pontos para a certificação, caso não sejam atendidos o mesmo não poderá
ser certificado. Atendidos os pré-requisitos, passa-se para a fase seguinte, que é de análise
propriamente dita e é onde ocorre a classificação do desempenho da edificação. Os
créditos, ou recomendações, valem pontos e variam de acordo com dimensões ou
categorias especificas (Tabela 01). A partir de um número mínimo de pontos, o
empreendimento estará habilitado a ser certificado.
O número de pontos adquiridos determina o tipo de certificação, que pode ser: de
40 a 49 pontos – Certificado; de 50 a 59 pontos – Certificação Prata; de 60 a 79 pontos –
Certificação Ouro; de 80 a 110 pontos – Certificação Platina. Abaixo de 40 pontos, a
certificação é indeferida (CASADO, 2011).
No interior a cada categoria, estão distribuídos os créditos com os respectivos
pontos. Essa distribuição define a importância233
que cada categoria tem no conjunto da
certificação. Essa estrutura com dimensões de pesos iguais e pontos “corridos” permite a
implementação de estratégias compensatórias, ou seja, o baixo desempenho em
determinada categoria pode ser compensado por uma alta performance em outra.
230
Superfícies de fachadas com seus materiais e elementos. 231
Em fase piloto no Brasil. 232
Ainda não aplicável no Brasil. 233
Trata-se de uma definição implícita já que não existe um critério de comparação entre as categorias, uma
vez que são tratadas de forma igual dentro do método.
228
Esse formato permite analisar os campos ambientais que a certificação considera
mais importantes, no caso os aspectos de eficiência energética e sustentabilidade do
espaço, 32% e 23% respectivamente, conforme a Tabela 01, refletindo, provavelmente, as
características da agenda ambiental do país de origem.
Tabela 1 - Estrutura de Avaliação LEED NC v.3 – 2009
Categoria/Dimensões
(%por total de pontos)
Especificação Pré-requisitos Pontos Possíveis
Sustentabilidade do
Espaço
(23%)
Incentiva estratégias
minimizadoras dos impactos
nos ecossistemas no período
de implantação do
empreendimento.
(1) Prevenção da poluição na
atividade da construção.
26
Racionalização do Uso
Da Água
(9%)
Promove inovações para o
uso racional da água na
redução do consumo,
tratamentos alternativos e
reuso.
(1) Redução no uso da água. 10
Eficiência Energética
(32%)
Promove eficiência
energética por meio de
estratégias simples e
inovadoras.
(1) Comissionamento do sistema
de energia.
(2) Performance mínima de
energia.
(3) Gestão fundamental de gases
refrigerantes, não uso de CFC‟s.
35
Qualidade Ambiental
Interna
(14%)
Promove a qualidade
ambiental interna do ar, com
foco na escolha de materiais
com baixa emissão de
compostos orgânicos
voláteis.
(1) Desempenho mínimo da
qualidade do ar interno.
(2) Controle da fumaça do cigarro.
15
Materiais e Recursos
(13%)
Incentiva o uso de materiais
de baixo impacto ambiental e
reduz a geração de resíduos.
(1) Depósito e coleta de materiais
recicláveis.
14
Inovação e Processos
De Projetos
(5%)
Incentiva, criação e medidas
projetuais que não estão
contempladas no LEED.
- 6
Créditos Regionais
(4%)
Incentiva créditos de acordo
com as diferenças
ambientais, sociais e
econômicas existentes em
cada local.
- 4
Fonte: Adaptado de SILVA, 2007 e USGBC, 2011234
.
234
O modelo base da tebela foi retirado de Silva (2007) com os dados atualizados de USGBC (2011).
229
No interior das categorias está o conjunto de créditos, com suas respectivas
pontuações, que poderão ser atendidos, ou não, definindo ao final a performance total
naquela categoria. O somatório de todas as categorias informa o valor global. Esses
créditos visam, de forma pormenorizada, abranger todas as questões que se referem à
categoria especifica, na tentativa de garantir o seu pleno atendimento, ou, ao menos, parte
dele.
Para cada crédito é exigido uma documentação específica comprobatória de seu
atendimento. Nela aparecem os objetivos que se pretende alcançar, os requisitos
obrigatórios e a forma de apresentá-los, podendo ser através do preenchimento de fichas
padrão, memorial de cálculo, diagnósticos técnicos, projetos/plantas, mapas, relatório
fotográfico, narrativas de estratégias adotadas235
, etc.
A seguir, serão apresentadas todas as categorias com seus respectivos créditos e
pontuação (Tabelas 02 a 09), detalhamento acima desse patamar poderão ser observados
nos documentos (Anexo 04) onde constam exemplos de planilha padrão do sistema LEED.
Tabela 2 - Critério Sustentabilidade do Espaço
Sustentabilidade do
Espaço
Pontos
Crédito 1 Seleção do terreno. 1
Crédito 2 Densidade urbana e conexão com a comunidade. 5
Crédito 3 Remediação de áreas contaminadas. 1
Crédito 4.1 Alternativa de transporte – acesso ao transporte público. 6
Crédito 4.2 Alternativa de transporte – bicicletário e vestiário. 1
Crédito 4.3 Alternativa de transporte – uso de veículo de baixa emissão. 3
Crédito 4.4 Alternativa de transporte – redução da área de estacionamento. 2
Crédito 5.1 Desenvolvimento do espaço – proteção e restauração do
habitat.
1
Crédito 5.2 Desenvolvimento do espaço – maximizar espaços abertos. 1
Credito 6.1 Controle das águas pluviais – controle da quantidade. 1
Crédito 6.2 Controle das águas pluviais – controle da qualidade. 1
Crédito 7.1 Redução da ilha de calor – áreas cobertas. 1
Crédito 7.2 Redução da ilha de calor – áreas descobertas. 1
Crédito 8 Redução da poluição luminosa. 1
Fonte: USGBC, 2011.
235
As plantas com títulos e unidades não precisam ser fornecidas em inglês, entretanto os cálculos e
memoriais sim (CASADO, 2011).
230
Tabela 3 - Critério Racionalização do Uso da Água
Racionalização do Uso
Da Água
Pontos
Crédito 1 Uso eficiente de água no paisagismo 2 a 4
Redução de 50% 2
Uso de água não potável ou sem irrigação. 4
Crédito 2 Tecnologias inovadoras para águas servidas. 2
Crédito 3 Redução do consumo de água. 2 a 4
30% de redução 2
35% de redução 3
40% de redução 4
Fonte: USGBC, 2011.
Tabela 4 - Critério Eficiência Energética
Eficiência Energética Pontos
Crédito 1 Otimização do desempenho no uso de energia. 1 a 19
12% prédios novos ou 8% prédios reformados 1
14% prédios novos ou 10% prédios reformados 2
16% prédios novos ou 12% prédios reformados 3
18% prédios novos ou 14% prédios reformados 4
20% prédios novos ou 16% prédios reformados 5
22% prédios novos ou 18% prédios reformados 6
24% prédios novos ou 20% prédios reformados 7
26% prédios novos ou 22% prédios reformados 8
28% prédios novos ou 24% prédios reformados 9
30% prédios novos ou 26% prédios reformados 10
32% prédios novos ou 28% prédios reformados 11
34% prédios novos ou 30% prédios reformados 12
36% prédios novos ou 32% prédios reformados 13
38% prédios novos ou 34% prédios reformados 14
40% prédios novos ou 36% prédios reformados 15
42% prédios novos ou 38% prédios reformados 16
44% prédios novos ou 40% prédios reformados 17
46% prédios novos ou 42% prédios reformados 18
48% prédios novos ou 44% prédios reformados 19
Crédito 2 Geração local de energia renovável. 1 a 7
1% de energia renovável 1
3% de energia renovável 2
5% de energia renovável 3
7% de energia renovável 4
9% de energia renovável 5
11% de energia renovável 6
13% de energia renovável 7
Crédito 3 Melhoria do comissionamento. 2
Crédito 4 Melhoria no uso de gases refrigerantes. 2
Crédito 5 Medições e Verificações. 3
Crédito 6 Energia verde – no mínimo 35% do consumo. 2
Fonte: USGBC, 2011.
231
Tabela 5 - Critério Qualidade Ambiental Interna
Qualidade Ambiental
Interna
Pontos
Crédito 1 Monitoração do ar externo. 1
Crédito 2 Aumento da ventilação. 1
Crédito 3.1 Plano de qualidade do ar – durante a construção. 1
Crédito 3.2 Plano de qualidade do ar – antes da ocupação. 1
Crédito 4.1 Materiais de baixa emissão – adesivos e selantes. 1
Crédito 4.2 Materiais de baixa emissão – tintas e vernizes. 1
Crédito 4.3 Materiais de baixa emissão – sistemas de piso. 1
Crédito 4.4 Materiais de baixa emissão – madeiras compostas e agrofibras. 1
Crédito 5 Controle interno de poluentes e produtos químicos. 1
Credito 6.1 Controle de sistemas - iluminação. 1
Crédito 6.2 Controle de sistemas – conforto térmico. 1
Crédito 7.1 Conforto térmico - projeto. 1
Crédito 7.2 Conforto térmico - verificação. 1
Crédito 8.1 Iluminação natural e paisagem – para 75% dos espaços 1
Crédito 8.2 Iluminação natural e paisagem – para 95% dos espaços 1
Fonte: USGBC, 2011.
Tabela 6 - Critério Materiais e Recursos
Materiais e Recursos Pontos
Crédito 1.1 Reuso do edifício – manter paredes, forros e cobertura. 1 a 3
Reuso de 55% 1
Reuso de 75% 2
Reuso de 95% 3
Crédito 1.2 Reuso do edifício – manter 50% dos elementos interiores não
estruturais.
1
Crédito 2 Gestão de resíduos da construção. 1 a 2
Destinar 50% para reuso 1
Destinar 75% para reuso 2
Crédito 3 Reuso de materiais. 1 a 2
No mínimo 5% do custo dos materiais 1
No mínimo 10% do custo dos materiais 2
Crédito 4 Conteúdo reciclado. 1 a 2
No mínimo 10% (pós-consumo+1/2pré-consumo) 1
No mínimo 20% (pós-consumo+1/2pré-consumo) 2
Crédito 5 Materiais regionais – extraído, processado e fabricado na
região.
1 a 2
No mínimo 10% extraído, processado e fabricado na região. 1
No mínimo 20% extraído, processado e fabricado na região. 2
Crédito 6 Materiais de rápida renovação – no mínimo 2,5% do total
utilizado.
1
Crédito 7 Madeira Certificada – no mínimo 50% do custo total da
madeira utilizada.
1
Fonte: USGBC, 2011.
232
Tabela 7 - Critério Inovação e Processo do Projeto
Materiais e Recursos Pontos
Crédito 1 Inovação no projeto. 1 a 5
Inovação ou performance exemplar 1
Inovação ou performance exemplar 1
Inovação ou performance exemplar 1
Inovação 1
Inovação 1
Crédito 2 Profissional acreditado LEED. 1
Fonte: USGBC, 2011.
Tabela 8 - Critérios Regionais para o Brasil
Critérios Regionais
para o Brasil
Pontos
Crédito 1 Prioridades Regionais (06 opções). 1 a 4
Adequação da acessibilidade externa e interna 1
Plano do impacto ambiental do empreendimento 1
Redução do consumo de água – medição setorizada 1
Aquecimento solar – redução de 50% ou 100% do consumo 1
Gestão de resíduos da construção – limitar o desperdício em
no máximo 10% em massa ou volume
1
Reuso dos materiais – projetar para o desmonte. 1
Fonte: USGBC, 2011.
Quando observados os critérios de forma individual, em alguns exemplos, percebe-
se a ênfase que se quer dar a determinado aspectos, como no critério de Sustentabilidade
do Espaço (Tabela 02), quando se destacam com uma elevada pontuação os créditos de
“Densidade urbana e conexão com a comunidade”e “Alternativa de transporte – acesso ao
transporte público”. Nesse sentido, fica claro o direcionamento da certificação em
estimular a implantação de edificações em áreas urbanas consolidadas, bem servidas de
infraestrutura. Em outros casos, essa ênfase não está presente, como no critério Qualidade
Ambiental Interna (Tabela 05), onde os créditos são distribuídos de maneira uniforme.
No tocante à categoria de Critérios Regionais para o Brasil (Tabela 08), cabe
brevemente detalhar seus objetivos, como sendo o principal ponto de aproximação da
certificação, de origem norte-americana, com a realidade brasileira. O quesito de
“Adequação da Acessibilidade Externa e Interna” tem por objetivo resguardar o direito de
233
acesso a portadores de deficiência física em edifícios e deve atender às normas da ABNT
que tratam do tema, tais como ABNT NBR 9050/04236
e ABNT NBR 9777/01237
.
Ainda no que diz respeito a esse critério, mencione-se, aqui, o “Plano de Impacto
Ambiental do Empreendimento”, o qual visa a minimizar a poluição decorrente das
atividades da obra com foco no controle da demolição, supressão de vegetação,
contaminação do solo e da água, geração de ruído, poluição do ar, alteração do tráfego
local, etc. Deve atender às resoluções do CONAMA que tratam do Estudo de Impacto
Ambiental e Gestão de Resíduos e, ao final, apresentar um relatório do desempenho da
edificação contendo: consumo de água (l/m2 de área construída); consumo de energia
elétrica (kWh/m2 de área construída); consumo de materiais básicos de construção (m3/m2
de área construída); geração de emissões de CO2 (ton/m2 de área construída); quantidade
de pessoas capacitadas em educação ambiental; consumo de materiais básicos de
construção reciclados (m3/m2 de área construída).
Na “Redução do Consumo de Água”, está previsto o monitoramento do consumo
desse recurso através de medições setorizadas (medidores individuais), tanto para
edificações não residenciais, quanto para residenciais.
O crédito direcionado ao “Aquecimento Solar” tem a intenção de reduzir o
consumo de energia elétrica utilizada no aquecimento de água, atendendo ao mínimo de
50% de toda a demanda anual de energia para esse fim.
Finalmente, o item relacionado ao “Reuso dos Materiais” visa a incentivar a
utilização de sistemas modulares de projeto, facilitando a reutilização dos componentes
construtivos ao final da vida útil da edificação no momento de seu desmonte.
São esse os critérios apontados como elementos de transição da certificação para a
realidade brasileira. Tomando por base essa pretensão, um questionamento, ao menos,
parece oportuno: como um país com características geográficas, culturais, econômicas,
dentre outras, tão complexas pode ser traduzido em tão poucos aspectos?
Ao que tudo indica, o trabalho de simplificar a metodologia LEED, e assim facilitar
sua penetração no mercado da construção civil, estendeu-se para o esforço de sua
adaptação à realidade local. De uma aproximação com as peculiaridades da construção
236
Acessibilidade a edificação, mobiliário, espaços e equipamentos urbanos. Disponível em:
www.pessoascomdeficiencia.gov.br. 237
Saídas de emergência em edifícios. Disponível em www.abnt.org.br.
234
nacional espera-se encontrar algumas abordagens, ou problemas, que são corriqueiros: a
informalidade, mão-de-obra desqualificada, desperdício, resistência a inovação, dentre
outros. Além da contemplação desses aspectos, uma certificação estrangeira, para ser
realmente adaptada ao Brasil, deve levar em conta suas dimensões territoriais e abrir
campo para a flexibilização e adaptação dentro de tal adaptação.
4.3 – A Certificação Aqua
Na França, as questões de meio ambiente foram incorporadas pelo setor da
indústria da construção civil no ano de 1992, a partir do programa Écologie et Habitat,
com o PUCA238
, que, em 1996, instituiu o HQE239
que foi, por sua vez, a associação que
desenvolveu o Démarche HQE, a certificação posteriormente importada para o Brasil com
a denominação AQUA – Alta Qualidade Ambiental (SILVA, 2007).
Os trabalhos, até a publicação da primeira versão oficial desse sistema de avaliação,
duraram um período de 9 anos, e só em março de 2005 foi emitido o primeiro certificado,
reconhecido pela Associação Francesa de Normatização – AFNOR (SILVA, 2007).
Tem por objetivo auxiliar o empreendedor na pré-definição de um perfil ambiental
para a edificação e, ao mesmo tempo, auxiliá-lo, como ferramenta de gestão, para atender a
esse perfil. Nesse sentido, contribui para a adaptação do empreendimento ao seu ambiente
imediato, respondendo satisfatoriamente ao contexto e prioridades ambientais de
proximidade, além de estimular nos usuários práticas mais eficientes em termos de
recursos naturais (Processo AQUA, 2013).
Segundo Silva (2007), um dos fatores que determina seu papel inovador, em
comparação a outras certificações, reside na sua metodologia de avaliação periódica,
auditorias, nas fases de planejamento240
, concepção241
e realização242
, não se limitando a
uma verificação apenas do produto final. A fase de operação não é coberta pelo selo, que,
238
Plan Urbanisme, Construction et Architecture. 239
Haute QualitéEnvironinmentale. 240
Fase na qual se elabora o programa de necessidades, imprescindível para os projetistas do
empreendimento. 241
Etapa de elaboração dos projetos arquitetônicos e técnicos complementares, com base no programa. 242
Execução da obra com base nos projetos.
235
no entanto, estimula a adoção de um sistema de gestão ambiental (SGA) com base em
normas próprias do local de aplicação.
Outra questão importante refere-se à inserção de categorias de análise ligadas ao
conforto e saúde dos usuários, aproximando-se, assim, de uma dimensão mais social e não
se restringindo a fatores puramente ambientais. Com isso, amplia-se o foco para uma
abordagem mais próxima da sustentabilidade.
Vale salientar, também, o aspecto de flexibilidade desse referencial, ancorado em
um de seus objetivos, que é o de promover a inovação no setor e contemplar soluções
técnicas e arquitetônicas que vão além das especificadas nas suas bases conceituais. Desse
modo, permite, através do “princípio de equivalência”, propor uma forma alternativa de
avaliação do desempenho ambiental estabelecido, desde que tecnicamente comprovado
(Processo AQUA, 2013).
Especificamente tratando do sistema AQUA, este foi publicado no Brasil em 2007,
traduzido e adaptado do HQE pela Fundação Vanzolini, constando, atualmente, de versões
específicas para edifícios habitacionais, escritórios e escolas, renovação de edificações,
além de edifícios com fins de hospedagem, lazer, bem estar, eventos e cultura243
. Até
outubro de 2013, segundo informações do site da entidade, 31 empreendimentos haviam
sido certificados na fase de concepção e 14 na de realização da obra244
.
Em termos estruturais, a certificação AQUA funciona de forma idêntica ao sistema
original francês, mudando apenas os parâmetros de exigência das categorias. É no
tratamento desses parâmetros que se percebe o trabalho de adaptação, ou tropicalização,
como é comumente conhecido. Em análise realizada pelo Núcleo de Pós-Graduação em
Construção Civil da Universidade Federal do Paraná, constatou-se que podem ser divididos
em duas categorias: parâmetros quantitativos e parâmetros qualitativos.
Trata-se de uma divisão equilibrada, ou seja, 50% para cada tipo, em função das
categorias às quais se vinculam. Os conceitos denominados quantitativos referem-se a
normas, leis ou parâmetros de ordem matemática, e prestam-se ao atendimento de
categorias com características mais exatas, a exemplo da gestão da energia. Os qualitativos
seguem critérios mais subjetivos, adequados ao tratamento de temas mais ligados à
243
Referenciais técnicos e guias disponíveis em www.vanzolini.org.br. 244
Dados disponíveis em: www.vanzolini.org.br/conteudo_104.asp?cod_site+104&id_menu=810. Acesso
em 14/11/2013.
236
definição do partido arquitetônico, como, por exemplo, a relação da edificação com seu
entorno. Vale salientar que metade desse percentual quantitativo é baseado em
normatização brasileira (ABNT, Inmetro, PBPQ-H), sendo o restante estrangeiro por falta
de normas nacionais, o que representa, ao menos, uma consistente intenção em aproximar a
certificação de parâmetros construídos para a realidade local (HILGENBERG, TAVARES
& FREITAS, 2011).
A seguir, será detalhada a certificação AQUA nos seus principais aspectos
estruturais com base na versão 2 para edifícios habitacionais.
4.3.1 – Estrutura do Sistema AQUA
O sistema da avaliação AQUA organiza-se em duas vertentes: uma de gestão
ambiental e outra arquitetônica e técnica. Para cada uma dessas vertentes, tem-se um
instrumento específico de avaliação do desempenho.
Em primeiro lugar, o Sistema de Gestão do Empreendimento (SGE) cria as bases
para organizar o empreendimento para atingir a qualidade ambiental estimada, controlando
o conjunto dos passos operacionais ao longo de todo o processo, desde o programa até o
final da obra. Tem por finalidade organizar o trabalho das equipes, auxiliar os dirigentes e
técnicos nas decisões e no momento adequado e contribuir para a melhoria continua do
sistema (Processo AQUA, 2013).
O SGE estrutura-se em capítulos e atribuições, a saber:
Comprometimento do Empreendedor – trata-se da descrição e definição dos
elementos de análise solicitados para construir o perfil ambiental do imóvel,
bem como a formalização (documentada) de tal comprometimento
ambiental.
Implementação e Funcionamento – a exposição do sistema organizacional.
Gestão do Empreendimento – o detalhamento das formas de monitoramento
do processo, das avaliações, do atendimento aos compradores e como serão
feitas as correções dos erros.
237
Aprendizagem – a descrição dos termos de aprendizagem e o balanço de
toda a experiência (Processo AQUA, 2013).
Em linhas gerais, trata-se de todo um sistema documental onde o empreendedor e
equipe técnica definem o perfil do empreendimento, a organização, as competências, as
responsabilidades, as autoridades, o método, os contratos, os meios financeiros para
atender os objetivos e as expectativas de todas as partes interessadas, dentro das normas
estipuladas pela certificação.
O segundo instrumento de avaliação refere-se à Qualidade Ambiental do Edifício
(QAE), que tem por finalidade avaliar o desempenho arquitetônico e técnico da construção.
Agrupa-se segundo dois domínios, quatro famílias e catorze categorias (Tabela 09), sendo
essas últimas ainda desmembradas em “preocupações” que se associam a cada desafio
ambiental estimado, e “depois em comentários e exigências expressas por critérios e
indicadores de desempenho” (Processo AQUA, 2013, p. 12).
Tabela 9 - Estrutura da QAE
DOMÍNIO
Gerenciar os Impactos sobre o Ambiente
Exterior
DOMÍNIO
Criar um Espaço Interior Sadio e
Confortável Família
Sítio e Construção Família
Conforto
Cat. 1. Relação do edifício com o seu
entorno.
Cat. 2. Escolha integrada de produtos,
sistemas e processos.
Cat. 3. Canteiro de obras com baixo impacto
ambiental.
Cat. 8. Conforto Higrotérmico.
Cat. 9. Conforto acústico.
Cat. 10. Conforto visual.
Cat. 11. Conforto olfativo.
Família
Gestão Família
Saúde
Cat. 4. Gestão da Energia.
Cat. 5. Gestão da água.
Cat. 6. Gestão dos resíduos de uso e
operação do edifício.
Cat. 7. Manutenção – permanência do
desempenho ambiental.
Cat. 12. Qualidade sanitária do ambiente.
Cat. 13. Qualidade sanitária do ar.
Cat. 14. Qualidade sanitária da água.
Fonte: Processo AQUA, 2013.
Os comentários e exigências indicam os parâmetros técnicos, as normas, ou os
índices que devem ser atendidos satisfazendo as preocupações. São esses elementos que
atribuem um caráter mais quantitativo ou qualitativo à análise. Quanto aos indicadores de
238
desempenho, estes podem ser expressos em três níveis: Bom (B), Superior (S) e Excelente
(E).
O nível “bom” relaciona-se ao desempenho mínimo aceitável para a obtenção da
certificação, que pode corresponder à prática corrente, desde que suficientemente exigente.
O “superior” significa pertencer ao nível das boas práticas. Por fim, o “excelente” é
classificado junto aos desempenhos máximos constatados em empreendimentos de alta
qualidade ambiental, assegurando sua exequibilidade (Processo AQUA, 2013).
Os comentários ou exigências podem ser expressos de forma obrigatória ou
opcional, entretanto, para o alcance do desempenho (B, S, ou E) desejado, é necessário
atender a uma quantidade mínima de exigências opcionais. Assim, o perfil ambiental do
empreendimento vai retratar seu comportamento em cada categoria analisada ou, em outras
palavras, em quais aspectos a edificação tem um desempenho melhor e em quais tem pior.
Esse perfil vai variar conforme alguns fatores: as características do
empreendimento em termos funcionais e arquitetônicos, as metas estabelecidas pelo
empreendedor, o local e suas restrições físicas e legais, as expectativas dos futuros usuários
e, por fim, a disponibilidade financeira. A certificação AQUA exige um perfil mínimo a
ser atingido, correspondendo a três categorias no nível Excelente, quatro categorias no
nível Superior e sete categorias no nível Bom; abaixo disso não é possível certificar
(Processo AQUA, 2013).
Essa sistemática permite uma visão mais detalhada e diversificada dos edifícios
certificados, pois, mesmo em uma mesma região, as peculiaridades inerentes a cada obra
certamente interferem no desempenho final. Assim, o AQUA afasta-se das rotulagens
universalizantes, que atestam segundo um padrão universal, como, por exemplo,
“certificação nível ouro”, para um conjunto de edifícios que se sabem distintos entre si.
Por fim, vale salientar que essa estrutura de 14 categorias, que abrangem os
principais pontos para uma adequada arquitetura, pelo menos metade precisa estar
enquadrada no desempenho “bom”. Isto caracteriza não só o empenho pela integração
necessária para as boas práticas ambientais, mas também o cumprimento de padrões
mínimos do que se pode esperar de uma edificação de alta qualidade ambiental.
239
4.4 – A Certificação Procel Edifica
Em 1984, o Inmetro iniciou um projeto focado na avaliação da conformidade de
equipamentos disponíveis no mercado brasileiro, com o objetivo de contribuir para a
racionalização do uso de energia. Num primeiro momento, focado no setor automotivo,
esse projeto foi ampliado para o Programa Brasileiro de Etiquetagem (PBE), que passou a
desenvolver os processos de Avaliação da Conformidade, tendo como principal
instrumento a Etiqueta Nacional de Conservação da Energia (ENCE), responsável pelas
informações sobre o desempenho dos produtos no que diz respeito à sua eficiência
energética (INMETRO, 2013).
Os objetivos da ENCE são: difundir informações para auxiliar a decisão de compra
dos consumidores, que devem considerar outros atributos além do preço; incentivar a
competitividade da indústria e, consequentemente, a inovação tecnológica. Trata-se de uma
etiqueta para evidenciar o atendimento mínimo de requisitos de desempenho (Imagem 01),
determinados por normas e regulamentos técnicos e classificando os equipamentos em
categorias da “A” (mais eficiente), B, C, D e “E” (menos eficiente), além de fornecer
informações técnicas importantes, tais como consumo, eficiência em relação à determinada
função, etc. (INMETRO, 2013).
Figura 24 - Etiqueta ENCE. Fonte: www.eletrobras.com.
240
Atualmente, o PBE é composto por 38 Programas de Avaliação de Conformidade,
indo desde a linha de utensílios domésticos, de equipamentos advindos das novas
demandas ambientais, como aquecimento solar e fotovoltaico, a produtos mais complexos,
como edificações e veículos. Atua em parceria com o Programa Nacional de Conservação
de Energia Elétrica (Procel), operacionalizada pela Eletrobrás, premiando os produtos mais
eficientes na etiquetagem do Inmetro.
O Procel foi criado em 1985 pelos Ministérios de Minas e Energia e da Indústria e
Comércio e tem por principal atividade promover a racionalização da produção e do
consumo de energia elétrica, reduzindo os desperdícios, custos e investimentos. O Selo
Procel (Imagem 02) foi instituído por Decreto Presidencial em dezembro de 1993 e tem
por principal objetivo indicar os produtos com os melhores níveis de eficiência energética
dentro de cada categoria (PROCEL/ELETROBRAS, 2013).
Figura 25 - Selo Procel. Fonte: www.eletrobras.com.
241
Para obter o selo, o produto deve se submeter a experimentos específicos em
laboratórios autorizados pelo Procel, dentro de parâmetros técnicos determinados por esse
órgão, essa concessão é realizada em parceira com o Inmetro que determina a ENCE, onde
os produtos caracterizados com o nível “A” recebem o selo. A cada quatro anos ocorre a
revisão dos critérios de avaliação para verificar se as características do produto
permanecem válidas após o período de concessão inicial, sendo dado um prazo (12 a 18
meses) para que os fabricantes se adéquem a eventuais mudanças
(PROCEL/ELETROBRAS, 2013).
A diferença entre o Selo Procel e a ENCE é que o primeiro orienta o consumidor no
ato da compra, indicando os produtos com melhor eficiência energética. A etiqueta tem um
caráter mais informativo do consumo, auxiliando na comparação entre mercadorias de uma
mesma categoria, além de indicar algumas especificações técnicas.
No país, o processo de etiquetagem Procel de edificações ocorre, primeiramente,
para construções comerciais, com a metodologia sendo lançada em 2009 e revisada em
2010. Nesse último ano, também foi publicada a classificação para edifícios residenciais. A
etiqueta, de caráter voluntário, poderá ser outorgada tanto para novas edificações, quanto
para existentes e ocorre em dois momentos: na etapa de projeto e depois que o edifício está
pronto245
.
4.4.1 – Estrutura do Sistema PROCEL Edifica
A avaliação do projeto pode ser feita pelo método prescritivo246
ou pelo método de
simulação247
. O primeiro é um método simplificado e que nem sempre pode ser aplicado
ou, em alguns casos, possui uma aplicação parcial; o segundo método permite uma
avaliação mais completa, não sendo limitado por características do projeto (o que, às vezes,
ocorre com o prescritivo), inclusive permitindo a incorporação de soluções não previstas
nos regulamentos. Já o edifício construído deve ser avaliado por meio de inspeção no local.
245
Na avaliação do projeto, é emitida uma etiqueta que atesta o nível de eficiência do mesmo. Na avaliação
do edifício, após a instalação de todos os sistemas e o alvará de conclusão, uma entidade acreditada pelo
Inmetro realiza a inspeção e concede a etiqueta que ficará exposta no edifício. 246
Por equações, tabelas, e parâmetros limites é obtida uma pontuação que indica o nível de eficiência parcial
e total do edifício. 247
Por simulação computacional, o desempenho é comparado ao desempenho de edifícios referenciais de
acordo com o nível de eficiência.
242
Em termos estruturais, existe uma diferenciação entre a certificação de edificações
de uso habitacional - RTQ-R (Tabela 10) e de uso comercial, de serviço e público - RTQ-C
(Tabela 11). No primeiro caso, existe uma subdivisão em quatro categorias: unidades
habitacionais autônomas248
, edificações unifamiliares249
, edificações multifamiliares e
áreas de uso comum.
Nesse sentido, a etiquetagem ocorre da seguinte forma:
Unidades Habitacionais Autônomas – avaliam-se os requisitos relativos ao
desempenho térmico da envoltória250
, à eficiência do(s) sistema(s) de
aquecimento de água e a eventuais bonificações;
Edificação Unifamiliar – aplica-se o procedimento descrito acima para a
unidade habitacional autônoma;
Edificações Multifamiliares – pondera-se o resultado da avaliação dos
requisitos de todas as unidades habitacionais autônomas da edificação;
Áreas de Uso Comum – avaliam-se os requisitos relativos à eficiência do
sistema de iluminação artificial, do(s) sistema(s) de aquecimento de água,
dos elevadores, das bombas centrífugas, dos equipamentos e de eventuais
bonificações (PROCEL/ ELETROBRAS, 2013).
Nas edificações de uso comercial, de serviço e público, a classificação da eficiência
ocorre segundo a avaliação de três sistemas: envoltória, iluminação e condicionamento de
ar. O primeiro refere-se às características físicas externas da edificação, os parâmetros que
compõem sua “pele”.
A classificação do sistema de iluminação é determinada em função da potência
utilizada, relativa às atividades exercidas pelos usuários em cada ambiente, onde “quanto
menor a potência utilizada, menor é a energia consumida e mais eficiente o sistema, desde
248
Bem imóvel destinado à moradia e dotado de acesso independente, corresponde a uma unidade de uma
edificação multifamiliar (apartamento) ou uma edificação unifamiliar (casa) (PROCEL/ ELETROBRÁS,
2013). 249
Edificação que possui uma única unidade habitacional autônoma (UH) no lote (PROCEL/
ELETROBRÁS, 2013). 250
Conjunto de planos que separa o ambiente interno do ambiente externo, tais como fachadas, empenas,
cobertura, aberturas, assim como quaisquer elementos que os compõem. Não estão incluídos pisos, estejam
eles ou não em contato com o solo, complementados pelo volume e orientação das fachadas (PROCEL/
ELETROBRÁS, 2013).
.
243
que garantidas as condições adequadas de iluminação” (PROCEL/ ELETROBRAS, 2013,
p. 8).
Tabela 10 - Estrutura da Procel Edifica – RTQ-R 251
SISTEMA PRÉ-REQUISITO
Envoltória
Transmitância Térmica.
Capacidade Térmica e Absortância das
Superfícies.
Ventilação Natural.
Iluminação Natural.
Aquecimento de Água
Solar.
Gás.
Bombas de Calor.
Elétrico.
Caldeiras a Óleo.
Bonificações
Iluminação Natural.
Ventilação Natural.
Uso Racional de Água.
Condicionamento Artificial do Ar.
Iluminação Artificial.
Ventiladores de Teto.
Refrigeradores.
Medição Individualizada.
Fonte: RTQ-R, 2012.
Quanto ao sistema de condicionamento de ar, existe a possibilidade de duas
classificações diferentes, em função do tipo de aparelhagem utilizada. Nos sistemas
individuais e do tipo split, já com a classificação (ENCE) fornecida pelo Inmetro, basta
consultar os níveis de eficiência indicados, para cada aparelho instalado, e aplicar o
resultado na equação geral da edificação. No caso de sistemas mais complexos, como as
centrais de condicionamento de ar, que não são classificadas pelo Inmetro, deve-se
proceder a verificação de uma série de requisitos segundo as prescrições definidas no
regulamento (PROCEL/ ELETROBRAS, 2013).
251
Requisitos Técnicos da Qualidade para o Nível de Eficiência Energética de Edifícios Residenciais.
244
Tabela 11 - Estrutura da Procel Edifica – RTQ-C252
SISTEMA
PRÉ-REQUISITO
Envoltória
Transmitância Térmica253
.
Cores e Absortância254
das Superfícies.
Iluminação Zenital.
Fator de Altura255
e Fator de Forma256
.
Percentual de Aberturas na Fachada.
Ângulos de Sombreamento.
Iluminação
Divisão de Circuitos.
Contribuição de Luz Natural.
Desligamento Automático do Sistema de
Iluminação.
Condicionamento deAr
Proteção das Unidades Condensadoras.
Isolamento Térmico para Dutos de Ar.
Condicionamento de Ar por Aquecimento
Artificial.
Fonte: RTQ-C, 2010.
Após o cálculo da eficiência nos três sistemas (avaliação parcial), os resultados são
inseridos na equação geral para verificar a performance global da edificação, a ENCE
então é formatada contendo não só a informação total, mas também os resultados parciais
do nível de eficiência na envoltória, iluminação e condicionamento de ar. Os valores
parciais, assim como o valor geral, podem ser alterados para mais ou para menos, através
de bonificações ou o cumprimento de pré-requisitos, respectivamente.
A ENCE pode ser fornecida de forma geral, a partir da avaliação dos sistemas
individuais, ou de forma parcial. A ENCE Geral indicará o nível de eficiência energética
alcançado pelo conjunto e a Parcial é fornecida após serem avaliados um ou dois sistemas
individuais, podendo apresentar as seguintes combinações: envoltória; envoltória e sistema
de iluminação; envoltória e condicionamento de ar. Para a classificação geral, as avaliações
252
Requisitos Técnicos da Qualidade para o Nível de Eficiência Energética de Edifícios Comerciais, de
Serviços e Públicos. 253
Transmissão de calor em unidade de tempo e através de uma área unitária de um elemento ou componente
construtivo, neste caso, de componentes opacos das fachadas (paredes externas) ou coberturas, incluindo as
resistências superficiais interna e externa, induzida pela diferença de temperatura entre dois ambientes (RTQ-
C, 2010). 254
Quociente da taxa de radiação solar absorvida por uma superfície pela taxa de radiação solar incidente
sobre esta mesma superfície (RTQC-R, 2012). 255
Razão entre a área de projeção da cobertura e a área total construída (Apcob/Atot), com exceção dos
subsolos (RTQ-C, 2010). 256
Razão entre a área da envoltória e o volume total da edificação (Aenv/Vtot) (RTQ-C, 2010).
245
parciais recebem pesos distribuídos assim: Envoltória 30%, Sistema de Iluminação 30% e
Sistema de Condicionamento de Ar 40% (PROCEL/ ELETROBRAS, 2013).
Um fator importante na determinação da eficiência energética da edificação,
segundo o Selo Procel, refere-se à determinação da “Zona Bioclimática”257
, na qual está
inserida a construção. Esse elemento é definido pela NBR 15.220-3 – Zoneamento
Bioclimático Brasileiro, a qual apresenta oito zonas, determinando, assim, as estratégias
que o edifício deve adotar para conseguir o conforto térmico dos seus usuários.
Especificamente na etiqueta, essas zonas influenciam na adoção de índices que incidem
diretamente nas equações de cálculo dos limites de desempenho mínimo e,
consequentemente, o atendimento, ou não, de pré-requisitos.
Por sua vez, os pré-requisitos são divididos em gerais e específicos. Os gerais são
determinantes para a classificação geral do nível de eficiência da edificação, caso aconteça
o não atendimento de algum desses pré-requisitos, não impede que sejam realizadas as
classificações parciais, entretanto fica impossibilitada a etiquetagem completa no nível A,
B ou C. Ou seja, mesmo com classificações parciais nível A, a classificação final poderá
ser alterada para nível D, dependendo do pré-requisito que não for atendido (PROCEL/
ELETROBRAS, 2013).
Os pré-requisitos gerais dividem-se em dois: circuitos elétricos – possuir circuito
elétrico separado por uso final (iluminação, condicionamento de ar, etc.); aquecimento de
água – nas edificações com elevada demanda de água quente (clubes, hospitais,
restaurantes, etc.), representando percentual igual ou superior a 10% do consumo de
energia, devem ser utilizados sistemas eficientes, tais como aquecimento solar, a gás, reuso
do calor, etc. (PROCEL/ ELETROBRAS, 2013).
Os específicos estão relacionados a cada sistema avaliado (envoltória, iluminação e
condicionamento de ar) de acordo com o nível de eficiência pretendido e critérios
estabelecidos nesses sistemas.
Outro fator que influencia na etiquetagem geral refere-se às “Bonificações”. Trata-
se de pontuações extras em virtude de ações que aumentem a eficiência da edificação e
visam a incentivar o uso de soluções alternativas que reduzam o consumo. A pontuação
257
Região geográfica homogênea quanto aos elementos climáticos que interferem nas relações entre
ambiente construído e conforto humano (PROCEL/ELETROBRÁS, 2013, p. 54).
246
varia entre 0 e 1 ponto e sua implementação se dá por laudos e a comprovação, da
economia gerada, através de dois memoriais de cálculo: um com a análise do edifício sem
a bonificação e outro com a bonificação (PROCEL/ ELETROBRAS, 2013).
Exemplo dessas bonificações pode ser a comprovação de, no mínimo, economia de
40% do consumo anual de água por meio de equipamentos racionalizadores, tais como
torneiras temporizadas ou aproveitamento de água pluvial, ou sistemas ou fontes
renováveis de energia (eólica, solar, etc.) com atendimento a índices mínimos (encontrados
nos manuais técnicos da certificação) de redução do consumo de energia.
A certificação Procel Edifica, por seu caráter extremamente técnico, apresenta um
elevado grau de complexidade na sua implementação. Em virtude disso, a Eletrobrás
disponibiliza uma lista de laboratórios conveniados com consultores especializados nessa
etiquetagem.
A meta do Governo Federal e da Eletrobrás é avançar com a etiqueta do caráter
voluntário para o obrigatório nos próximos anos, nesse sentido, já vêm desenvolvendo
algumas ações relacionadas no âmbito de edifícios públicos, a exemplo do Programa de
Eficiência Energética nos Prédios Públicos (PROCEL EPP), que visa a incentivar a
melhoria da eficiência energética nessas edificações através do financiamento
compartilhado e articulação na execução do projeto entre as concessionárias de energia
elétrica e a Eletrobrás (SILVA, 2011).
Segundo dados258
do Inmetro, 63 edificações comerciais, de serviço e públicas
obtiveram a etiqueta Procel Edifica para projeto (entre 2009 e outubro de 2013), sendo que,
deste total, 20 edifícios foram etiquetados. Os números com relação às edificações
residenciais são mais expressivos em termos gerais: 2.035 unidades autônomas com
projetos etiquetados e 4 com certificação final. As edificações multifamiliares
apresentaram 21 projetos etiquetados. Já as áreas comuns dos prédios com 3 projetos
etiquetados.
Atingir a meta de obrigatoriedade para a certificação Procel incorre no desafio de
difundir o selo primeiramente. Nesse sentido, uma grande vantagem está na sua fácil
258
Os dados consistem em tabelas com edifícios etiquetados com as seguintes informações: empresas
solicitantes, nome da edificação, endereço, entidade responsável pela avaliação do projeto e inspeção do
imóvel, método empregado, data da emissão da etiqueta e o nível de eficiência. Disponível em:
www.inmetro.gov.br/consumidor/pbe/tabelas.pdf. Acesso em 10/10/2013.
247
comunicação, um formato já assimilado pela maioria da população que, largamente, o
utiliza na seleção de produtos mais eficientes. Entretanto, elevar essa percepção ao patamar
da construção ainda é um desafio a ser superado, e paralelas à sua inerente complexidade
técnica outras dificuldades se somam, como os elevados custos.
É evidente que o Brasil tem avançado em termos de legislação por práticas
construtivas mais eficientes259
e o Procel Edifica é um reflexo disso. Entretanto, a
sustentabilidade no setor da construção civil vai além dos parâmetros técnicos ambientais,
centrados, principalmente, na racionalização do consumo de energia, característicos desse
selo. As políticas de meio ambiente precisam contemplar e garantir o acesso das benesses
sustentáveis para o maior número de pessoas possível, considerando-se as outras
exigências desse novo padrão de desenvolvimento, e a dimensão sociocultural é peça
fundamental nesse processo.
4.5 – O Selo Casa Azul da Caixa
A publicação Boas Práticas Para Habitação Mais Sustentável (JOHN; PRADO,
2010) refere-se a um guia elaborado pela Caixa Econômica Federal (doravante
denominada CAIXA), em parceria com um grupo multidisciplinar de professores da Escola
Politécnica da Universidade de São Paulo, Universidade Federal de Santa Catarina e
Universidade Estadual de Campinas, com o objetivo de apresentar uma metodologia para
práticas construtivas mais sustentáveis, com foco para obtenção do Selo Casa Azul.
Todas as informações descritas a seguir foram retiradas do já citado guia,
organizado em duas partes principais. A primeira parte consiste em uma apresentação geral
dos impactos socioambientais provocados pela cadeia produtiva da construção civil;
introduz o Selo Casa Azul com seus critérios e procedimentos e, por fim, apresenta a
agenda do empreendimento, um instrumento criado para a sustentabilidade. A segunda
parte aprofunda as categorias e os critérios que estruturam o Selo Casa Azul. Os aspectos
relacionados aos impactos ambientais da construção civil descritos no guia serão
259
Um exemplo disso é a Lei 10.295/2001 – Dispõe sobre a Política Nacional de Conservação e Uso
Racional de Energia. Disponível em: www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/leis_2001/L10295.htm.
248
suprimidos aqui, uma vez que este tema já foi desenvolvido mais detalhadamente em
tópico anterior.
4.5.1 – Conceituação do Selo e Pré-Requisitos
O Selo Casa Azul é definido como um instrumento de classificação de
empreendimentos habitacionais, o qual incorpora elementos socioambientais com soluções
construtivas eficientes em relação ao seu uso, ocupação e manutenção, além de incentivar a
otimização dos recursos naturais, melhorando a qualidade da unidade habitacional,
especificamente, e de sua área de implantação. Com esta metodologia, a CAIXA se propõe
a criar um espaço de parceria com os proponentes, orientando-os para a propagação dos
pressupostos da sustentabilidade aplicada a empreendimentos habitacionais.
Destina-se, especificamente, para empreendimentos habitacionais que solicitam
financiamento à CAIXA, esses desenvolvidos por construtoras, Poder Público, empresas
públicas de habitação, cooperativas, associações e entidades representativas de
movimentos sociais. Trata-se de um instrumento voluntário onde o empreendedor
manifesta-se interessado em ter seu projeto analisado segundo os critérios deste
mecanismo.
O Selo apresenta três níveis de gradação, conforme o atendimento (ou não) dos
critérios estabelecidos. Assim, para obter a categoria Bronze, o empreendimento deverá
atender a todos os critérios obrigatórios (19 critérios); para a categoria Prata, deverá
atender aos critérios obrigatórios e mais seis de livre escolha e, por fim, para obter a
categoria Ouro, a de maior exigência, além dos obrigatórios, optar livremente pelo
atendimento de mais doze critérios optativos. Outra exigência para a classificação do tipo
de Selo refere-se ao valor de avaliação da unidade habitacional. Assim sendo, os
empreendimentos cujos valores não ultrapassarem os estabelecidos no Quadro 01 serão
classificados na categoria Bronze; valores de avaliação acima dos estabelecidos no citado
quadro serão enquadrados, no mínimo, na categoria Prata.
249
Figura 26 - Logomarcas do Selo Casa Azul níveis Ouro, Prata e Bronze.
Fonte: (JOHN; PRADO, 2010).
Tabela 12 - Limites de Avaliação e Localidades para o Selo Azul nível Bronze
Localidades Valor de Avaliação da
Unidade Habitacional
Distrito Federal, cidades de São Paulo e Rio de Janeiro, municípios
com população igual ou superior a 1 milhão de habitantes
integrantes das regiões metropolitanas dos Estados de São Paulo e
Rio de Janeiro.
Até R$130.000,00
Municípios com população igual ou superior a 250 mil habitantes,
Região Integrada do Distrito Federal e Entorno – RIDE/DF nas
demais regiões metropolitanas e nos municípios em situação de
conurbação com as capitais estaduais (exceto Rio de Janeiro e São
Paulo).
Até R$ 100.000,00
Demais Municípios Até R$ 80.000,00
Fonte: (JOHN; PRADO, 2010).
Para candidatar-se à obtenção do Selo, a CAIXA exige, como pré-requisito, que o
projeto esteja em atendimento aos programas e linhas de financiamentos já estabelecidos
pela instituição (independente do Selo Casa Azul), além de toda documentação
comprobatória de aprovação do empreendimento junto aos órgãos licenciadores
municipais, estaduais e federais, tais como prefeituras e concessionárias de água e energia.
250
Deverá, também, atender às regras da Ação Madeira Legal260
e o Documento de Origem
Florestal (DOF), ou seja, as informações relativas ao volume, as espécies e destinação final
de todas as madeiras utilizadas durante a obra.
Outra preocupação da CAIXA em relação aos projetos financiados refere-se ao
atendimento às normas de acessibilidade e exige o cumprimento da NBR 9050261
e
unidades habitacionais adaptadas aos portadores de necessidades especiais, em número
regulado conforme legislação municipal ou estadual, desde que atenda a um percentual
mínimo de 3% do total de unidades construídas. Também, o atendimento às normas da
ABNT será exigido para elaboração do projeto, especificação dos serviços e materiais
empregados para a construção.
Para início da análise do projeto candidato ao Selo, além da documentação
necessária, será cobrada uma taxa para a cobertura dos custos de análise técnica, conforme
fórmula descrita a seguir: Taxa= 40,00 + 7(n-1), onde “n” significa o número de unidades
habitacionais, entretanto, a taxa não ultrapassará o valor de R$ 328,00.
Todos os critérios estabelecidos pela metodologia do Selo Casa Azul serão
avaliados e verificados não só na fase projetual, mas também durante o desenvolvimento
da obra por meio de medições mensais ou vistorias em momentos específicos. Quando da
ocorrência de uma não conformidade entre projeto e execução (durante a obra), esta será
informada através de um Relatório de Acompanhamento do Empreendimento e sua
correção solicitada por ofício com o estabelecimento de um prazo. Ao final de todo o
processo, quando o proponente já estiver de posse do Selo e, mesmo assim, for detectada
alguma não conformidade, este será suspenso imediatamente, ficando o empreendedor
impossibilitado de ingressar em outro processo de mesmas características por um prazo de
dois anos. Após esgotados todos os recursos para sanar a não conformidade e o problema
persistir, será cobrada uma multa no valor de 10% do investimento a título de
ressarcimento à CAIXA pelos danos causados e pela utilização indevida da marca Selo
Casa Azul. A desistência na obtenção do Selo (durante o processo) poderá gerar uma nova
260
A Ação Madeira Legal é um conjunto de medidas articuladas entre a CAIXA, IBAMA e o Ministério do
Meio Ambiente (MMA) para monitorar a origem das madeiras utilizadas em obras de empreendimentos
habitacionais viabilizados pela CAIXA, em vigor desde 02 de janeiro de 2009. 261
Acessibilidade a Edificações, Mobiliário, Espaços e Equipamentos Urbanos, em vigor a partir de 30 de
junho de 2004.
251
análise de todo o projeto, inclusive com a substituição de todos os documentos já
apresentados, não havendo a devolução da taxa de análise.
Após obtenção do Selo Casa Azul, os empreendedores poderão fazer uso da
logomarca de diversas formas, em material publicitário de venda das unidades, inclusive
placa metálica permanente onde será divulgado o nível de gradação do Selo, desde que
siga modelo previamente estabelecido pela CAIXA, que também orienta que todo produto
de propaganda informe e descreva os itens de sustentabilidade contemplados no
empreendimento como forma de divulgação da metodologia e formação de um mercado
consumidor mais consciente.
4.5.2 – Identificação dos Aspectos Socioambientais
A Agenda do Empreendimento é considerada pela CAIXA um instrumento
estratégico complementar e fundamental à metodologia do Selo. Deverá ser elaborado pelo
empreendedor através de sua equipe técnica e, se possível, envolvendo os futuros clientes e
tem por objetivo “identificar os aspectos socioambientais relevantes para o
empreendimento em questão, servindo de guia para selecionar as ações a serem adotadas
considerando-se os recursos disponíveis e as características dos usuários” (JOHN;
PRADO, 2010, p. 29). Neste sentido, a CAIXA indica os pontos mais relevantes que
deverão ser contemplados na elaboração deste documento.
A instituição financiadora entende que, quando um proponente faz a opção pela
adoção da certificação, este já demonstra uma visão de responsabilidade socioambiental e
que, geralmente, já possui uma agenda própria de gestão de seus empreendimentos onde
deixa claro o emprego de algumas soluções as quais entende como estratégicas para a sua
empresa. Assim, a CAIXA respeita e considera legítima a priorização de determinados
critérios que já são comumente adotados pelo proponente, desde que consoantes aos
critérios estabelecidos pelo Selo.
A Agenda deverá fazer uma análise das condições sociais e ambientais no âmbito
regional onde o empreendimento pretende ser construído. No Brasil, país de dimensões
continentais, existem especificidades que devem ser contempladas na elaboração de um
projeto, tais como: a ausência ou abundância de recursos hídricos, os ventos, regime de
chuvas, entre outros. Todos estes fatores influenciam as soluções arquitetônicas que, de
252
alguma forma, irão afetar positiva ou negativamente o conforto ambiental das unidades
residenciais.
As características funcionais do empreendimento incidirão diretamente sobre os
aspectos ambientais, demandando uma maior ou menor incidência sobre os recursos
naturais. Assim sendo, os projetos poderão tirar partido de soluções que garantam a
otimização de determinada fonte natural, reduzindo, assim, futuros custos com
manutenção. Neste mesmo sentido, as características da vizinhança imediata afetarão
muitos critérios a serem atendidos na obtenção do selo, como, por exemplo, se existe uma
reserva de área verde nas proximidades, este espaço deverá ser, de certa maneira,
contemplado no projeto, seja como utilização racional e/ou como instrumento de
preservação do recurso.
As exigências legais do lugar onde o empreendimento está sendo submetido
deverão se sobrepor às exigências do Selo, ou seja, se determinado critério de avaliação do
Selo aparece como optativo e, no entanto, a legislação local exige seu atendimento, ele
passará a ser considerado como obrigatório.
As características dos usuários devem ser consideradas como fundamentais para a
escolha das soluções arquitetônicas e de funcionamento do empreendimento, uma vez que
é esta população que, por muitos anos, irá operar as unidades habitacionais. Neste sentido,
os procedimentos deverão ser aceitos e amplamente divulgados por um programa de
educação para a sustentabilidade.
Os custos para implantação de um programa de sustentabilidade deverão ser
estudados de forma global, inclusive na forma de compensações, ou seja, ao se reduzirem
os custos com determinada solução, esta economia poderá financiar gastos maiores em
outros procedimentos mais onerosos, mas de alta eficiência.
Por fim, um sistema de gestão passa a ser um instrumento indispensável para o
empreendedor que deseja optar por práticas mais sustentáveis em suas obras, uma vez que
estes processos exigem a introdução de novas ações socioambientais com certo grau de
complexidade, as quais, se não bem administradas, poderão ocasionar a perda do controle
do processo. Entretanto, se o proponente não possui nenhum mecanismo neste sentido, a
CAIXA recomenda a adoção de alguns processos gerenciais implantados desde a fase
inicial até o final do empreendimento, a saber:
253
Elaboração da agenda de desempenho socioambiental do empreendimento –
estabelecer a hierarquia das preocupações socioambientais do
empreendimento;
Planejamento do empreendimento – antever os passos para a conclusão do
empreendimento e alcançar os objetivos propostos;
Responsabilidades e autoridades – para cada atividade, atribuir uma
autoridade com responsabilidade específica;
Competências – sistema de avaliação para assegurar a competência dos
profissionais envolvidos;
Contratos – sistema de gestão dos contratos para assegurar a correta
contratação de serviços;
Comunicação – sistema de comunicação eficiente para definir o que
comunicar, a quem e no momento certo;
Controle de documentos e registros – um banco de gerenciamento de toda
documentação envolvida, assegurando sua confiabilidade e disponibilidade
sempre que necessário;
Monitoramento e análises críticas – modelo de monitoramento de todo o
processo assegurando a capacidade de alcançar os objetivos propostos;
Avaliação socioambiental do empreendimento – documento que assegura o
cumprimento dos critérios requeridos para a obtenção do Selo em
determinada categoria;
Correções e ações corretivas – procedimentos gerenciais que visam a ações
corretivas de não conformidades detectadas ao longo do processo, evitando
repetições;
Melhoria contínua – balanço da experiência passada para a melhoria de
procedimentos em empreendimentos futuros (JOHN; PRADO, 2010).
Na segunda parte do Guia, são apresentadas todas as categorias de análise e seus
critérios de avaliação que somados compõem a base para a obtenção do Selo Casa Azul. A
seguir, cada uma destas categorias será apresentada.
4.5.3 – Categoria Qualidade Urbana
Os critérios que determinam se um empreendimento contribui para a qualidade
urbana de determinada área referem-se a uma série de elementos e ações, que vão desde
decisões projetuais até a escolha correta do sítio. O bom uso do solo, ao mesmo tempo em
254
que protege áreas estratégicas, pode diminuir a incidência de tráfego em excesso e, assim,
contribuir para uma melhor qualidade do ar. A malha urbana, por sua vez, se bem
dimensionada e conectada, favorece à fluidez dos veículos, reduz os percursos e o uso de
combustíveis, e ainda, se conjugada com passeios arborizados e ciclovias protegidas,
estimula o pedestre e o uso de bicicletas. Por fim, um sistema de transporte coletivo
eficiente minimiza a necessidade do transporte individual motorizado e,
consequentemente, áreas de estacionamento, que podem ser convertidas em praças e
jardins públicos.
A Categoria Qualidade Urbana desenvolvida pelo Selo impõe a necessidade do
empreendimento estar inserido dentro de uma malha urbana já consolidada, com
disponibilidade de serviços e equipamentos, o que evita o processo de espalhamento
urbano e, consequentemente, a pressão por novas redes de infraestrutura. Os critérios desta
Categoria focam no cuidado da escolha do local do empreendimento e na interação do
empreendimento com o entorno, sempre com o objetivo maior de criar comunidades com
boa qualidade de vida.
Tabela 13 - Critérios de Avaliação da Categoria Qualidade Urbana
Qualidade Urbana Caráter
a) Qualidade do Entorno – infraestrutura. Obrigatório
b) Qualidade do Entorno – impactos. Obrigatório
c) Melhoria do Entorno. Livre Escolha
d) Recuperação de Áreas Degradadas. Livre Escolha
e) Reabilitação de Imóveis. Livre Escolha
Fonte: (JOHN; PRADO, 2010).
a) Qualidade do Entorno – Infraestrutura
Este critério tem por objetivo garantir aos futuros moradores usuários do
empreendimento o fácil acesso a serviços e equipamentos urbanos que garantam um maior
conforto e qualidade de vida. Trata da inserção do empreendimento em malha urbana
dotada de itens mínimos de infraestrutura.
b) Qualidade do entorno – impactos
255
O critério relativo aos impactos sofridos pelo empreendimento tem por objetivo
garantir o bem-estar, a segurança e a saúde dos moradores, exigindo a inexistência de
qualquer elemento considerado prejudicial ao bem-estar em um raio de 2,5km, contado a
partir do centro geométrico do empreendimento. Tais elementos referem-se a fontes de
ruídosexcessivos (rodovias, aeroportos, etc.) e odores (estações de tratamento, lixões,
indústrias, etc.). A CAIXA faz a ressalva de que, eventualmente, quando o
empreendimento não estiver atendendo ao critério em questão, o mesmo pode candidatar-
se ao Selo desde que medidas mitigatórias sejam adotadas elevando os fatores de risco a
níveis aceitáveis.
c) Melhorias no entorno
Refere-se ao estímulo de atitudes de melhoria paisagística, funcional, estética e de
acessibilidade ao entorno do empreendimento, contribuindo, desta forma, para a
humanização da vizinhança e a criação de marcos de identidade pessoal, fatores
preponderantes para o estímulo aos sentimentos de pertença urbana. Estas ações podem ser
traduzidas na forma de recuperação de passeios, mobiliário urbano e calçadas, arborização
de ruas, construção ou recuperação de praças e áreas de lazer, etc.
d) Recuperação de áreas degradadas
Visa à recuperação de espaços sociais ou ambientais degradados, devolvendo-os a
sociedade em boas condições favorecendo assim a dinâmica urbana. Para pontuar neste
item, o empreendedor terá que recuperar uma área igual ou superior a 20% da área total do
empreendimento em análise, ou na forma de remoção de moradias (construção em outro
local) situadas em áreas de preservação permanente (APP) e, consequentemente, a
recuperação da APP.
e) Reabilitação de imóveis.
Tem por objetivo diminuir o déficit habitacional brasileiro através da recuperação
de edifícios habitacionais em centros (históricos ou não) ou ocupação de vazios urbanos.
Estas ações favorecem a ocupação de áreas ricas em infraestrutura que podem contribuir
para a dinâmica dos centros urbanos através do uso misto entre comércio, serviços e
moradias.
256
4.5.4 – Categoria Projeto e Conforto
Esta categoria tem por objetivo a avaliação da concepção arquitetônica e
paisagística do empreendimento com relação à sua adaptação aos condicionantes
climáticos e geográficos do local de implantação. Neste sentido, será avaliado o
desempenho térmico das edificações em relação aos ventos dominantes, temperatura,
umidade, orientação solar e, assim, estimar sua capacidade de minimizar ou evitar o uso de
mecanismos artificiais de condicionamento da temperatura do ar. Alguns elementos são
preponderantes à boa orientação da edificação: o tamanho das aberturas (portas e janelas),
as proteções da incidência solar direta, o uso de cores e materiais de acabamento, que
podem ou não contribuir para um menor consumo de energia.
De forma geral, os aspectos mais importantes relacionados a esta categoria referem-
se à: iluminação natural dos ambientes das unidades habitacionais, que consiste em
promover a entrada de luz proveniente diretamente do sol; flexibilidade das unidades
habitacionais a serem modificadas futuramente, atendendo às novas necessidades dos
moradores; o empreendimento deve harmonizar-se com as edificações vizinhas, no sentido
de evitar sombreamento ou impedir a circulação dos ventos; as construções devem adaptar-
se à topografia do lugar, evitando a grandes movimentos de terra e/ou desmatamentos;
projeto paisagístico eficiente para evitar a formação de ilhas de calor; incentivar o uso de
transporte alternativo (bicicleta) e a circulação de pedestres; implantação de equipamentos
de lazer, sociais e esportivos dentro do empreendimento; por fim, promover a coleta de
lixo seletiva em local de fácil acesso e adequado aos padrões de limpeza e manutenção.
Tabela 14 - Critérios de Avaliação da Categoria Projeto e Conforto
Projeto e Conforto Caráter
a) Paisagismo Obrigatório
b) Flexibilidade do Projeto Livre Escolha
c) Relação com a Vizinhança Livre Escolha
d) Solução Alternativa de Transporte Livre Escolha
e) Local para Coleta Seletiva Obrigatório
f) Equipamentos de Lazer, Sociais e Esportivos Obrigatório
g) Desempenho Térmico – Vedações Obrigatório
h) Desempenho Térmico – Orientação ao Sol e Ventos Obrigatório
i) Iluminação Natural de Áreas Comuns Livre Escolha
j) Ventilação e Iluminação Natural de Banheiros Livre Escolha
k) Adequação as Condições Físicas do Terreno. Livre Escolha
Fonte: Boas Práticas para Habitação Mais Sustentável. Fonte: (JOHN; PRADO, 2010).
257
a) Paisagismo
O paisagismo visa à melhoria do desempenho térmico e visual do empreendimento,
mediante sua interferência em fatores como o sombreamento e a umidade. Uma boa
solução paisagística contribui para a redução das ilhas de calor, dos gases de efeito estufa,
além da manutenção ou resgate da flora e fauna urbana. Uma vegetação bem localizada
pode reduzir a incidência solar direta em paredes e janelas e, consequentemente, diminuir a
necessidade de resfriamento artificial do ar.
b) Flexibilidade do projeto
Incentiva à flexibilidade da edificação, adaptando-se às futuras necessidades de
seus usuários, através de modificações e/ou ampliações. Neste sentido, pode contribuir
para o aumento da vida útil da construção e consequentemente a economia de materiais.
c) Relação com a vizinhança
Tem por objetivo reduzir os impactos negativos do empreendimento sobre o seu
entorno imediato, no sentido de permitir à vizinhança boas condições de iluminação,
sombreamento, ventilação, privacidade, manutenção de vistas panorâmicas e a
tranquilidade. Para tanto, o empreendimento deve ter sua implantação e projeto
arquitetônico definidos em acordo com estudos urbanísticos que levem em consideração as
edificações circundantes.
d) Solução alternativa de transporte
Prioriza os meios de transporte menos poluentes, com a inclusão no
empreendimento de bicicletários, ciclovias ou transporte coletivo privativo do condomínio
(quando este possuir grandes dimensões).
e) Local para coleta seletiva
Este critério incentiva a existência de locais para a coleta seletiva de resíduos
domésticos e seu correto armazenamento dentro do empreendimento e também recomenda
campanhas de conscientização dos moradores.
f) Equipamentos de lazer, sociais e esportivos
Visa a incentivar as práticas saudáveis de convivência e entretenimento dos
usuários, através da implantação de diversos equipamentos tais como: praças, ciclovias,
258
quadras, sala de ginástica, de jogos e festas, espaços de recreação infantil, dentre outros, de
acordo com o número de unidades habitacionais construídas.
g) Desempenho térmico – vedações
Este critério tem por objetivo garantir condições favoráveis de conforto térmico,
através do controle da ventilação e radiação solar que ingressa pelas aberturas ou
absorvidas pelas paredes externas e telhado da edificação. Esta eficiência energética é
influenciada diretamente pelos materiais que compõem as superfícies que envolvem a
construção, assim, os revestimentos utilizados e os tipos de acabamentos das janelas devem
ser adequados às diferentes regiões climáticas do país (zonas bioclimáticas).
h) Desempenho térmico – orientação ao sol e ventos
Garantir o conforto térmico da edificação mediante opções projetuais ligadas à
implantação da construção em relação à orientação solar, ventos dominantes e interferência
de outros elementos do entorno. As estratégias adotadas para o atendimento a este critério
contribuem para a diminuição dos custos com resfriamento e/ou aquecimento artificial.
i) Iluminação natural de áreas comuns
Tem por objetivo a redução do consumo de energia advindo da iluminação artificial
das áreas comuns, escadas e corredores dos edifícios. Neste sentido, o projeto deve atentar
para uma combinação entre a iluminação natural e parâmetros de sombreamento, para
manter o equilíbrio térmico nestes ambientes. Algumas estratégias podem ser adotadas
para melhoriae otimização destas ações, tais como: o uso de cores claras no interior para
uma melhor reflexão da luz, recuos maiores entre edificações facilitando a penetração do
sol, vidros com boa transmissividade à luz.
j) Ventilação e iluminação natural dos banheiros
O principal objetivo deste critério é a salubridade nestes ambientes, considerados
menos prioritários em termos de ventilação e iluminação, possibilitando a redução da
umidade em excesso e, consequentemente, o acúmulo de mofo. Vale salientar também que,
apesar de espaços de uso temporário, é substancial a economia de energia elétrica pela
opção de janelas voltadas diretamente para o exterior.
259
k) Adequação as condições físicas do terreno
Ao adequar as edificações à topografia natural do terreno, o projeto minimiza a
necessidade de cortes e aterros, reduzindo a movimentação de terra e, assim, favorecer a
estabilidade do local, evitando erosão e deslizamentos.
4.5.5 – Categoria Eficiência Energética
A importância da aplicação da categoria eficiência energética apoia-se nos dados do
Balanço Energético Nacional realizado no ano de 2009, onde se afirma que 44% de toda
energia produzida no país é consumida por edificações (residenciais, comerciais e
públicas). Deste total, o setor residencial é responsável por 22%, um número expressivo, e
que revela a necessidade de se pensar em alternativas para a redução deste consumo
(JOHN, 2010).
Neste sentido, esta categoria tem por objetivo a redução do consumo de
eletricidade, lenha e gás e, por conseguinte, o incentivo às fontes alternativas que podem
ser aplicadas às edificações, tornando-as mais eficientes, o que, em última instância,
revela-se como um fator de redução nas despesas mensais dos futuros moradores. O foco
principal recai sobre o controle nos equipamentos de uso final, como os eletrodomésticos,
energia elétrica para aquecimento de água e iluminação artificial.
Tabela 15 - Critérios de Avaliação da Categoria Eficiência Energética
Eficiência Energética Caráter
a) Lâmpadas de Baixo Consumo – Áreas Privativas Obrigatório para HIS até três
Salários Mínimos
b) Dispositivos Economizadores – Áreas Comuns Obrigatório
c) Sistema de Aquecimento Solar Livre Escolha
d) Sistema de Aquecimento a Gás Livre Escolha
e) Medição Individualizada – Gás Obrigatório
f) Elevadores Eficientes Livre Escolha
g) Eletrodomésticos Eficientes Livre Escolha
h) Fontes Alternativas de Energia Livre Escolha
Fonte: (JOHN; PRADO, 2010).
260
a) Lâmpadas de Baixo Consumo – Áreas Privativas
Este é um critério obrigatório para empreendimentos de interesse social, voltados às
famílias de até três salários mínimos de renda mensal. Tem por objetivo a redução ao
consumo de energia elétrica advindo da iluminação artificial, através da utilização de
lâmpadas de baixo consumo, as quais devem possuir o selo Procel ou etiqueta Nível de
Eficiência A do Programa Brasileiro de Etiquetagem (PBE), do Inmetro. O Guia
recomenda que uma medida fundamental para a redução ao consumo energético por
iluminação artificial e a otimização da luz natural em todos os ambientes nos períodos
diurnos, um recurso que pode ser obtido através de uma criteriosa organização dos
ambientes. Salienta também que o tipo de lâmpada deve ser estudado em função do tipo de
ambiente em relação à frequência de seu uso (prolongada, transitória, acionamento
contínuo ou intermitente).
b) Dispositivos Economizadores – Áreas Comuns
Este critério tem por objetivo a redução do consumo de energia elétrica pelo uso de
iluminação artificial nas áreas comuns dos empreendimentos, tais como salão de festas,
portarias, escadas e circulações. Para tanto, recomenda-se a utilização de sensores de
presença, minuterias ou lâmpadas eficientes, recursos estes a serem decididos em função
de sua frequência de uso.
c) Sistema de Aquecimento Solar
Visa à redução do consumo elétrico ou de gás para o aquecimento de água. O guia
recomenda que todo o projeto do Sistema de Aquecimento Solar (SAS) deve obedecer a
NBR específica para cada caso (água quente e fria, aquecimento auxiliar, a gás, etc.) e
apresenta as principais diretrizes para a definição deste sistema, ou seja, sua posição na
cobertura, localização em relação à incidência dos raios solares e seus componentes
(coletores, reservatório, dutos, etc.), tudo isto aplicado a empreendimentos de habitações
individuais horizontais ou multifamiliares verticais.
d) Sistema de Aquecimento a Gás
Aplica-se em situações onde o aquecimento solar não é recomendado e visa à
redução do consumo de gás. Como critério de livre escolha, os equipamentos utilizados
261
deverão estar etiquetados com o selo Ence262
/Concept263
, ou classificados na categoria
Nível A do Programa Brasileiro de Etiquetagem (PBE) do Concept/Inmetro.
e) Medição Individualizada – Gás
Refere-se ao uso de medidores individuais para cada unidade habitacional
proporcionando aos mesmos a possibilidade de gerenciar seu consumo. A instalação deste
sistema deve obedecer às normas implementadas pelo corpo de bombeiros e adequar-se à
legislação municipal local.
f) Elevadores Eficientes
O controle do consumo de energia proveniente da utilização de elevadores
representa um ganho na sustentabilidade das edificações, conseguido pela utilização de
sistemas operacionais eficientes com controle inteligente de tráfego de passageiros e esta
economia, consequentemente, será repassada aos usuários das unidades habitacionais.
g) Eletrodomésticos Eficientes
Tem por objetivo incentivar os empreendedores entregarem as unidades
habitacionais dotadas de alguns eletrodomésticos eficientes, principalmente a de interesse
social. Para que este critério seja considerado na avaliação, é necessária a inclusão de, no
mínimo, geladeira e ventiladores de teto (para habitações com famílias de renda de até
cinco salários mínimos e os aparelhos). Quando da previsão de ar-condicionado, estes
devem ser etiquetados com o selo Procel ou nível A do Inmetro (obrigatório também para
as geladeiras e ventiladores).
h) Fontes Alternativas de Energia
O Guia considera como fonte de energia alternativa a utilização de sistemas
diferentes dos já apresentados e que proporcionem a economia de energia elétrica por meio
de fontes renováveis, tais como o sol ou o vento.
262
Etiqueta Nacional de Conservação de Energia. 263
Programa Nacional da Racionalização do Uso dos Derivados do Petróleo e do Gás Natural.
262
4.5.6 – Categoria Conservação de Recursos Materiais
Trata-se de uma categoria de análise em que foca sua atenção no problema
ambiental ocasionado pela acumulação e produção de resíduos da indústria da construção
civil. Neste sentido, algumas ferramentas podem contribuir para a diminuição dos danos
causados pelo setor, efetivando-se em ações mais sustentáveis.
Primeiramente, deve haver por parte do empreendedor uma postura cética diante de
produtos vendidos com o selo do ecologicamente correto, uma vez que todo material
produzido, de alguma forma, causa impacto ao meio ambiente. Assim, devem estar claros
os critérios de fabricação e haver sempre uma pesquisa por materiais similares, na busca do
que melhor atenda às necessidades da obra. Uma boa ferramenta para auxiliar nas decisões
do melhor produto está na Avaliação do Ciclo de Vida.
Em segundo lugar, ter como meta a redução das perdas que passa, invariavelmente,
por decisões tomadas desde antes do início da obra, no projeto, na seleção dos
fornecedores. A modulação ou o uso de elementos pré-fabricados otimiza os insumos e
pode ser uma boa solução para construções que buscam uma maior qualidade ambiental
em seus processos. Em terceiro lugar, o Selo Casa Azul orienta para a gestão de resíduos
de construção e demolição (RCD) de acordo com as resoluções do Conselho Nacional do
Meio Ambiente (Conama) e das legislações municipais locais.
Tabela 16 - Critérios de Avaliação da Categoria Conservação de Recursos Materiais
Conservação de Recursos Materiais Caráter
a) Coordenação Modular Livre Escolha
b) Qualidade de Materiais e Componentes Obrigatório
c) Componentes Industrializados ou Pré-fabricados Livre Escolha
d) Fôrmas e Escoras Reutilizáveis Obrigatório
e) Gestão de Resíduos de Construção e Demolição – RCD Obrigatório
f) Concreto com Dosagem Otimizada Livre Escolha
g) Cimento de Alto-forno (CPIII) e Pozolâmico (CPIV) Livre Escolha
h) Pavimentação com RCD Livre Escolha
i) Madeira Plantada ou Certificada Livre Escolha
j) Facilidade de Manutenção da Fachada Livre Escolha
Fonte: (JOHN; PRADO, 2010).
263
a) Coordenação Modular
Através da adoção de dimensões padronizadas, este critério visa a reduzir as perdas
de materiais com cortes desnecessários, ajustes e uso de componentes de enchimento,
assim, pode aumentar a produtividade.
b) Qualidade de Materiais e Componentes
Para evitar reparos desnecessários após pouco tempo de uso dos empreendimentos,
faz-se necessária uma criteriosa escolha nos materiais empregados (especificação técnica),
emfornecedores que atuam em conformidade com as normas. Esta qualidade contribui para
a sustentabilidade, diminuindo o impacto ambiental.
c) Componentes Industrializados ou pré-fabricados
Ao adotar sistemas construtivos que, seguramente, utilizam componentes
industrializados montáveis no canteiro de obra, o empreendimento estará reduzindo perdas
de materiais e a geração de resíduos. O sistema escolhido deverá ser aprovado pelo SINAT
(Sistema Nacional de Aprovação Técnica) no âmbito do Ministério das Cidades, estando
em conformidade com a NBR 15575.
d) Fôrmas e Escoras Reutilizáveis
Com a utilização de fôrmas e escoras reutilizáveis durante a construção do
empreendimento, estará reduzindo o emprego de madeira em aplicações de baixa
durabilidade. Segundo o Guia, cerca de 33% da madeira cerrada na Amazônia são
utilizados para fôrmas e andaimes (JOHN; PRADO, 2010 apud ZENID, 2009). Portanto,
com a adoção desta estratégia além de aumentar a produtividade da obra, com montagens e
desmontagens rápidas, contribui-se para um menor impacto ambiental.
e) Gestão de Resíduos de Construção e Demolição – RCD
Este critério tem por objetivo contribuir para a diminuição da quantidade de
resíduos produzidos pelas construções e que, geralmente, são depositados no tecido
urbano, contribuindo para a proliferação de vetores e dificultando a drenagem natural das
áreas. Assim, determina uma série de itens a serem adotados na obra, todos com vista ao
atendimento do critério.
264
f) Concretos com Dosagem Otimizada
Com a adoção deste critério, espera-se reduzir eficientemente (sem reduzir a
segurançaestrutural) o consumo de cimento na produção do concreto, material artificial de
maior consumo na construção civil, cuja indústria é grande contribuinte na emissão de
gases do efeito estufa. Neste sentido, os estudos demonstram que a melhor maneira de se
alcançar este objetivo é a adoção do controle de umidade e de dosagem em massa dos
agregados e da água, processo normatizado pela NBR 7212 Execução do Concreto Dosado
em Central.
g) Cimento de Alto-forno (CP III) e Pozolâmico (CP IV)
Esta ferramenta visa à incorporação de resíduos (escórias e cinzas volantes) ou
materiais abundantes (pozolana produzida com argila calcinada) à produção de cimento de
forma a reduzir o impacto ambiental. Os cimentos que utilizam um destes elementos no
seu preparo são denominados CP III e CP IV e podem ser usados na produção do concreto
ser comprometer sua qualidade técnica.
h) Pavimentação com Resíduos de Construção e Demolição Utilizados
como Agregados Reciclados
Com o uso de RCD na pavimentação, há uma série de vantagens ambientais na
obra: reduz-se a pressão sobre recursos naturais; reduz-se o volume de resíduos gerados na
construção; ocorre ganho financeiro com a economia na compra de materiais.
i) Madeira Plantada ou Certificada
Este critério tem por objetivo reduzir a pressão sobre as florestas não manejadas na
extração de madeira nativa, que, no caso da construção civil, representa um dos maiores
financiadores na destruição destes ambientes. Neste sentido, o uso de espécies arbóreas
exóticas ou nativas, mas plantadas e certificadas, constituem uma estratégia sustentável,
assim, o empreendedor deve assumir o compromisso no uso de madeira legal em todas as
fases da obra.
j) Facilidade de Manutenção da Fachada
Visa à redução dos elevados custos com pinturas frequentes em fachadas,
principalmente em empreendimentos de interesse social, além de reduzir o consumo de
materiais e, assim, o impacto ambiental.
265
4.5.7 – Categoria Gestão da Água
O uso sustentável da água está associado diretamente a dois fatores: sua quantidade
e sua qualidade. Em ambos os aspectos, é preciso tem em mente que se trata de um insumo
indispensável à vida humana, mas que é finito. As ações de sustentabilidade, as quais
podem ser experimentadas por uma edificação, passam por um sistema de gestão da água
alicerçado em três aspectos: água potável, água pluvial e esgoto sanitário.
A gestão das fontes de água potável depende do controle na demanda e oferta deste
recurso, no âmbito macro (recursos hídricos), meso (sistemas públicos de distribuição) e
micro (no uso interno nas edificações). No âmbito do controle do uso da água nas
construções (foco deste capítulo do Guia), duas estratégias são recomendadas: consumo
medido de forma individualizada (reduz perdas por vazamentos e usos excessivos) e
utilização de componentes economizadores de água que controlam a vazão e a pressão
(torneiras temporizadas, registros reguladores, etc.).
A gestão das águas pluviais visa a reduzir o consumo de água potável e diminuir a
pressão sobre o sistema de drenagem e, consequentemente, o risco de inundações, através
de sistemas de captação e tratamento e, posteriormente, o uso doméstico adequado.
Quanto ao esgotamento sanitário, são aceitas duas situações: o sistema está
interligado a rede pública de coleta e tratamento ou o empreendimento possui um sistema
próprio executado segundo normas técnicas próprias.
Tabela 17 - Critérios de Avaliação da Categoria Gestão da Água
Gestão da Água Caráter
a) Medição Individualizada – Água Obrigatório
b) Dispositivos Economizadores – Bacia Sanitária Obrigatório
c) Dispositivos Economizadores – Arejadores Livre Escolha
d) Dispositivos Economizadores – Registros Reguladores de Vazão Livre Escolha
e) Aproveitamento de Águas Pluviais Livre Escolha
f) Retenção de Águas Pluviais Livre Escolha
g) Infiltração de Águas Pluviais Livre Escolha
h) Áreas Permeáveis Obrigatório
Fonte: (JOHN; PRADO, 2010).
266
a) Medição Individualizada – Água
Significa a possibilidade do usuário, morador da unidade habitacional, controlar e
reduzir seu consumo de água, e, para tanto, faz-se necessário um sistema individual de
medição. Aos ganhos econômicos juntam-se os ambientais, pois ocorre a diminuição da
demanda na captação de água nas fontes naturais e os mecanismos de retenção, tratamento
e distribuição.
b) Dispositivos Economizadores – Bacia Sanitária
Os aparelhos sanitários (vaso e chuveiro) são os que mais consomem água em uma
residência. Assim, o uso de dispositivos economizadores significa ganhos econômicos e
ambientais, contribuindo sobremaneira para a sustentabilidade como um todo. Este critério
indica a utilização de bacias sanitárias com duplo acionamento (para 3 e 6 litros) e volume
nominal de seis litros, ou inferior a isso.
c) Dispositivos Economizadores – Arejadores
Tem por objetivo a redução do consumo de água e proporcionar maior conforto aos
usuários pela eliminação dos respingos. Como um sistema de simples implantação,
recomenda-se sua utilização em todas as torneiras da unidade habitacional e nas áreas
comuns, com arejadores adaptados a pressão do local de instalação.
d) Dispositivos Economizadores – Registro Regulador de Vazão
Trata-se de um dispositivo economizador que atende a todos os pontos de consumo,
independente da utilização de outros sistemas como os apresentados anteriormente. Aplica-
se a todas as faixas de pressão, devendo o empreendedor atentar apenas para o tipo de
água, se fria ou quente, tendo em vista que cada tipo exige materiais de fabricação
diferenciados, plástico ABS ou latão cromado, respectivamente.
e) Aproveitamento de Águas Pluviais
Tem por objetivo a restrição do uso de água potável para usos que não exigem este
tipo de água, tais como em vaso sanitário, lavagem de pisos e irrigação de jardins. Este
sistema deve ser independente do sistema de água potável e apresentar coleta,
armazenamento, tratamento e distribuição de acordo com um plano de gestão que garanta
umaredução de no mínimo 10% do consumo de água potável.
267
f) Retenção de Águas Pluviais
Pela contenção das águas pluviais, visa a contribuir para o sistema de drenagem
urbana e, com isso, prevenir o risco de inundações, principalmente em regiões altamente
impermeabilizadas. Para tanto, deve existir dentro do empreendimento um reservatório de
retenção e que seja interligado a um sistema de infiltração ou aproveitamento de águas
pluviais.
g) Infiltração de Águas Pluviais
Esta estratégia significa a construção de poço de infiltração para permitir a absorção
das águas das chuvas pelo solo, de forma controlada e, assim, diminuir a pressão sobre o
sistema de drenagem urbana, diminuir o risco de inundações e recarga do lençol freático.
Deverá ser previsto em empreendimentos com área impermeável acima de 500m2.
h) Áreas Permeáveis
O objetivo deste critério é garantir a permanência de uma porção do terreno do
empreendimento livre de qualquer tipo de pavimentação que impeça a infiltração da água
no solo, isto é, o objetivo é permitir o ciclo natural da água e a recarga do lençol freático,
prevenindo o risco de inundações e promovendo a diminuição da pressão sobre o sistema
de drenagem urbana.
4.5.8 – Categoria Práticas Sociais
Esta categoria busca ir além do estabelecimento de critérios técnicos para a
obtenção de um selo de certificação, isto é, tem como propósito induzir o empreendedor a
ser um agente de transformação social, envolvendo os diversos agentes que fazem parte da
produção do empreendimento, desde sua concepção, execução até a utilização.
Estas ações visam a ampliar a consciência de que a sustentabilidade é um processo
de responsabilidades distribuídas, tangível apenas com a diminuição das desigualdades
sociais. O Guia aponta uma série de pressupostos que devem ser considerados em qualquer
proposição a um empreendimento que busque a sustentabilidade, sendo:
Respeito aos saberes locais;
Inclusão social;
Questões de gênero;
268
Potencializar as produções das comunidades envolvidas;
Respeito ao meio ambiente;
Utilização de metodologias participativas;
Priorizar parcerias;
Interdisciplinaridade;
Integração interinstitucional;
Equipes técnicas integradas (social, arquitetura e engenharia);
Sustentabilidade como meta final (JOHN; PRADO, 2010).
Tabela 18 - Critérios de Avaliação da Categoria Práticas Sociais
Práticas Sociais Caráter
a) Educação para Gestão de RCD Obrigatório
b) Educação Ambiental dos Empregados Obrigatório
c) Desenvolvimento Pessoal dos Empregados Livre Escolha
d) Capacitação Profissional dos Empregados Livre Escolha
e) Inclusão de Trabalhadores Locais Livre Escolha
f) Participação da Comunidade na Elaboração do Projeto Livre Escolha
g) Orientação aos Moradores Obrigatório
h) Educação Ambiental dos Moradores Livre Escolha
i) Capacitação para Gestão do Empreendimento Livre Escolha
j) Ações para Mitigação de Riscos Sociais Livre Escolha
k) Ações para a Geração de Emprego e Renda Livre Escolha
Fonte: (JOHN; PRADO, 2010).
a) Educação para a Gestão de Resíduos de Construção e Demolição –
RCD
Tem por objetivo a realização de eventos educativos e de mobilização com os
empregados da construção com a finalidade de operacionalizar o Plano de Gestão de RCD
e, assim, dotá-los de condições para: caracterizar e triar os resíduos gerados; recolher,
acondicionar e transportar os resíduos dentro do canteiro de obra; transportar os resíduos
do canteiro para a destinação final, certificando de que foi realizada de forma correta.
Este critério tem caráter obrigatório e exige um Plano Educativo além de toda a
documentação possível para a comprovação da execução deste plano, tais como relatório
escrito e fotográfico, filmagens, etc. O Guia apresenta uma série de orientações para o
269
desenvolvimento das competências requeridas para a operacionalização da Gestão dos
Resíduos e orienta para a confecção de material didático fartamente ilustrado, tais como:
jornais, revistas, cartazes, entre outros, facilitando o aprendizado e suprindo uma
deficiência educativa dos trabalhadores, normalmente pessoas afastadas da escola por um
longo período.
b) Educação Ambiental dos Empregados
Este critério visa a levar aos trabalhadores da obra conhecimento acerca das ações,
tecnologias e benefícios sustentáveis adotados no empreendimento. O empreendedor
deverá adotar um plano de atividades educativas, neste sentido, o Guia sugere uma série de
técnicas:
Realizar oficinas, cursos, palestras, simulações, entre outros;
Visitas a outros empreendimentos dotados de tecnologias sustentáveis;
Comunicação didática baseada em jornais, cartilhas, murais e similares;
Formação de uma equipe de agentes educadores ambientais dentre os
próprios trabalhadores;
Aulas dinâmicas na forma de vídeos, teatros, etc.;
Possibilidade de reciclagem periódica (JOHN; PRADO, 2010).
Apresenta também a indicação de competências a serem desenvolvidas nestas
atividades (nos moldes do critério anterior), que possibilitarão o alcance dos objetivos
propostos com esta estratégia. O critério em questão tem caráter obrigatório de
atendimento e sua comprovação feita pela apresentação do Plano de Educação Ambiental
com carga horária mínima de 4 horas atendendo a no mínimo 80% de todos os
empregados, além de relatório comprovando a implementação do já citado Plano.
c) Desenvolvimento Pessoal dos Empregados
Tem por objetivo proporcionar o progresso pessoal do trabalhador através de um
projeto de educação complementar e para a cidadania, uma vez que o setor da construção
civil congrega grande número de empregados com baixos salários dificultando o acesso à
educação e a outros serviços ligados ao seu desenvolvimento enquanto cidadão (saúde,
política e profissional).
Neste sentido, o atendimento ao critério em questão (de livre escolha) será avaliado
por documentação comprovando a adoção de pelo menos uma dentre as seguintes ações:
270
Educação Complementar – alfabetização, inclusão digital, idioma
estrangeiro, Educação de Jovens e Adultos (EJA). O programa deve durar
por todo o tempo de execução do empreendimento e abranger 20% dos
trabalhadores (mínimo);
Educação para Cidadania – programas de segurança, saúde, higiene,
economia doméstica e educação financeira. Carga horária mínima de 8
horas e atingir no mínimo 50% de todos os trabalhadores (JOHN; PRADO,
2010).
d) Capacitação Profissional dos Empregados
Consiste no empreendedor aplicar um plano de capacitação profissional,
preferencialmente em atividades ligadas a construção civil, com carga horária mínima de
30 horas e atingindo pelo menos 30% de todos os trabalhadores. O Guia sugere,
basicamente, duas áreas gerais de conhecimento: atividades de gestão (planejamento,
organização, controle de atividades, etc.) e atividades diretamente ligadas à construção
civil (aquecedores solares, marcenaria, instalações, serralharia, etc.).
O proponente pode estabelecer convênios com instituições de ensino ou outras
empresas para a implantação do programa, devendo dar especial atenção às capacitações
que enfoquem a sustentabilidade. A carga horária pode ser flexionada em função da
disponibilidade dos trabalhadores e dos recursos (atendendo ao mínimo exigido). Critério
de livre escolha comprovado por documentação evidenciando a implementação do
programa de capacitação.
e) Inclusão de Trabalhadores Locais
Tem por objetivo a contratação, para execução do empreendimento, de
trabalhadores originários da área de entorno ou de futuros moradores, em um percentual
mínimo de 20% do total de empregados na obra. Com esta ação, espera-se ampliar a
capacidade econômica do entorno do empreendimento, refletindo na melhoria das
condições gerais de vida (segurança, bens, serviços, etc.) e proporcionar uma maior
interação com os novos ocupantes.
O Guia recomenda uma associação com instituições que já atuem no local
(organizações de bairro, ONG‟s, organizações religiosas, etc.) para captar e selecionar os
empregados. Critério de livre escolha e para o seu atendimento o proponente deverá
271
entregar declaração especificando a reserva do percentual de vagas e a origem destes
trabalhadores.
f) Participação da Comunidade na Elaboração do Projeto
Trata-se de um critério que só pode ser aplicado quando se conhece a população
que vai habitar o empreendimento. Neste sentido, tem por objetivo o envolvimento destes
moradores desde a concepção do projeto e, dessa forma, contribuir para a construção de
um saber coletivo, democrático aumentando os vínculos desta coletividade.
Alguns cuidados são recomendados para a otimização desta ação, tais como o
estímulo e sensibilização ao envolvimento no empreendimento e a informação prévia da
comunidade para qualificar a participação. Esta mobilização deve perdurar além da fase de
projeto, podendo ser estendida a execução (comissão de acompanhamento da obra) e a
ocupação.
Como um critério de livre escolha, sua comprovação se dará pelos relatórios e atas
das reuniões prévias ao início da obra, demonstrando a participação da população na
elaboração do projeto, com suas demandas e encaminhamentos.
g) Orientação aos Moradores
Este critério visa a orientar os futuros moradores quanto às características
sustentáveis do empreendimento, para um melhor uso e manutenção dos equipamentos
além de conscientizá-los dos benefícios socioambientais implementados. Neste sentido, o
empreendedor responsabiliza-se pela confecção e distribuição do Manual do Proprietário,
ilustrado e escrito em linguagem simples e didática, e pela realização de, pelo menos, uma
atividade (reunião, palestra, vídeo, etc.) informativa envolvendo os futuros moradores.
Tanto o manual quanto a atividade informativa devem abranger todos os critérios
adotados pelo Selo Casa Azul com suas categorias, características, orientações técnicas,
funcionais e para as boas práticas. O critério em questão tem caráter obrigatório e sua
comprovação feita pela entrega dos seguintes documentos:
Minuta do Manual do Proprietário;
Plano de Ação Informativa;
Relatório da execução do plano informativo através da relação dos
participantes, ata da reunião, fotos, etc (JOHN; PRADO, 2010).
272
h) Educação Ambiental dos Moradores
Tem por objetivo, através da educação ambiental, mudar os hábitos de agressão à
natureza e aos espaços comuns e, assim, criar um comportamento de maior respeito ao
meio ambiente como um todo. O Guia sugere abordar os seguintes temas: cidadania e
consumo sustentável; água; alimentos; biodiversidade; transportes; energia; lixo e
publicidade. Toma como referência o “Manual de Educação para o Consumo
Sustentável”264
e deixa a critério do proponente estabelecer as bases e técnicas do plano de
educação ambiental.
Como critério optativo, seu atendimento será feito pela entrega do Plano de
Educação Ambiental e dos relatórios das reuniões de sua implementação com os
moradores.
i) Capacitação para Gestão do Empreendimento
Consiste em dotar os futuros moradores de conhecimento para a correta gestão do
empreendimento e de seus benefícios, dando continuidade as ações sustentáveis
implementadas. Neste sentido, faz-se necessária a capacitação com vistas às seguintes
competências:
Operação e manutenção das instalações físicas do empreendimento;
Operação das atividades de apoio;
Gestão do empreendimento enquanto patrimônio imobiliário;
Gestão de pessoas e conhecimento na área de associação condominial
(JOHN; PRADO, 2010).
O Guia desdobra todas as competências apresentadas anteriormente em uma série
de habilidades, como sugestão para orientar o plano de capacitação, que, por sua vez,
deverá ser implementado dentro das instalações do empreendimento. Trata-se de um
critério de livre escolha e sua comprovação feita pela apresentação do Plano de
Capacitação para Gestão do Empreendimento e do relatório evidenciando sua aplicação,
através de atividades diversas com carga horária mínima de 12 horas e atingindo, ao
menos, 30% de todos os moradores do empreendimento.
264
CONSUMO SUSTENTÁVEL: Manual de educação. Brasília: ConsumersInternational/MMA/MEC/IDEC,
2005. 160 p. Disponível em: portal.mec.gov.br/dmdocuments/publicacao8.pdf.
273
j) Ações para Mitigação de Riscos Sociais
Para a adoção deste critério, faz-se necessária, primeiramente, a elaboração de um
diagnóstico com a população de entorno e entre os próprios moradores do
empreendimento, a fim de detectar possíveis situações de risco social. Caso haja a
comprovação de alguma vulnerabilidade, o candidato ao Selo pode propor ações que
venham a mitigar os danos e conflitos sociais, muitas vezes causados pela implantação do
próprio empreendimento. O guia sugere uma série de ações que podem ser selecionadas
conforme o tipo de risco ou carência, tais como: alfabetização, inclusão digital,
profissionalização, atividades esportivas e culturais, construção de creche ou posto de
saúde, etc.
Como um critério de livre escolha sua comprovação se dará pela apresentação do
Plano de Mitigação de Riscos Sociais e o relatório de sua implementação (atas das
reuniões, relação dos participantes, fotos, etc.) em atividades com carga horária mínima de
40 horas.
k) Ações para a Geração de Emprego e Renda
Tendo o empreendedor verificado (através de pesquisa ou diagnóstico) a existência
de uma população formada por moradores sem atividade e qualificação profissional, este
poderá propor um plano de capacitação para a inserção destes trabalhadores no mercado
formal, contribuindo para a elevação de sua renda e atendimento de suas necessidades
básicas.
Estas ações devem atingir 80% dos moradores identificados como demanda em
atividades com carga horária mínima de 16 horas. Pode incentivar, inclusive, a formação
de associações ou cooperativas e ser estendido para a população do entorno ao
empreendimento. O Guia sugere uma série de etapas como método de implantação do
plano:
Identificação dos moradores e seu perfil profissional;
Identificação das vocações e demandas do entorno;
Incentivo a adesão de grupos já existentes;
Divulgação do plano para adesão dos moradores;
Identificação de parceiros e montagem da infraestrutura dentro do
empreendimento;
Desenvolvimento do plano;
274
Avaliação das competências adquiridas;
Articulação com parceiros para absorção dos moradores capacitados
(JOHN; PRADO, 2010).
Como um critério de livre escolha, sua comprovação será validada pela
apresentação do Plano de Geração de Trabalho e Renda e o relatório de sua implementação
comprovada por meio de ata de reunião, fotos, relação dos participantes, etc.
4.5.9 – Considerações acerca do Selo Casa Azul
A Caixa Econômica Federal, reconhecida como a principal entidade nacional na
promoção de programas de moradia de interesse social e, consequentemente, instituição
estratégica na redução do déficit habitacional, tem um papel preponderante na promoção,
divulgação e incentivo por práticas construtivas menos impactantes ao meio ambiente.
A sustentabilidade na construção civil, e especificamente na construção
habitacional, com toda complexidade inerente ao tema, precisa ampliar sua percepção de
moradia, extrapolar as funções de abrigo e segurança, de atendimento das necessidades
básicas. Nesse sentido, o espaço sustentável da casa carece evoluir para o de “habitat” na
medida em que proporciona o reconhecimento, a “inserção num marco cultural e
econômico”, como um “instrumento de inclusão social e acesso à cidadania”
(MEDVEDOVSKI, 2010, p. 191).
Historicamente, na maioria dos países que se utilizam desse conceito, inclusive o
Brasil, a habitação de interesse social, na valorização exclusiva dos aspectos econômicos e
políticos, converteu-se na habitação coletiva, basicamente em dois padrões de arranjo
espacial: nos conjuntos de unidades individuais ou nas edificações coletivas. Muitos desses
modelos, nas últimas décadas, apresentaram graves problemas de ambiência que
culminaram por se refletir no comportamento dos usuários (REIS, 2010) e passaram a ser o
foco de estudos na avaliação desses arranjos e na tentativa por estruturas espaciais mais
integradas ao binômio habitação/meio ambiente (FREITAS, 2001).
Com o avanço das pesquisas em sustentabilidade urbana, os aspectos que envolvem
os fluxos entre a moradia e o meio ambiente (água, energia, lixo, transporte, etc.) vêm
ganhando destaque, na medida em que causam impacto aos recursos naturais, mas também
275
são vitais na manutenção das funções humanas. Segundo Coelho (2010), pensar na
habitação é pensar na cidade, onde a ação de habitar envolve muitas outras ações que estão
implícitas (mover-se, trabalhar, recrear, etc.), ou seja, na casa parece tudo conter, o
princípio e o fim do espaço urbano.
É nesse contexto, de novos olhares acerca da cidade e especificamente da habitação
e na tentativa de integração das três dimensões da sustentabilidade (ambiental, econômica
e social), que o Selo Casa Azul tenta preencher as lacunas existentes com esse sistema de
avaliação por espaços urbanos de melhor qualidade.
Em seu compromisso socioambiental, essa certificação compromete-se com
questões de uso, ocupação e manutenção do empreendimento, no âmbito interno às
unidades habitacionais e também ao entorno, e visa a estabelecer parcerias com os usuários
após a ocupação. Outro aspecto positivo, mas não original, refere-se à incorporação de pré-
requisitos baseados em legislação federal (acessibilidade, Madeira Legal, DOF), não
incorrendo em superposições ou repetições de normas. Vale salientar, também, que o Selo
só é atribuído à obra acabada, não havendo o risco de certificação apenas de projeto, ou
seja, não há risco de se deixar de fora a execução.
Um dos instrumentos mais importantes que o Selo aborda, a Agenda do
Empreendimento, mesmo sendo encontrado em outras certificações, a exemplo do AQUA,
representa um passo metodológico importantíssimo na busca pela sustentabilidade do
setor. Entretanto, esse documento, que se caracteriza, ao mesmo tempo, por ser um
compromisso do empreendedor com práticas ambientais menos impactantes e por ser um
diagnóstico físico/sócio/ambiental do local do empreendimento e entorno, com
informações preponderantes para as fases de projeto execução, deveria ser revestido de
maior peso, deixando claro ser uma etapa obrigatória, e detalhada em mais profundidade
no Guia.
Ainda em relação às suas características de conteúdo, ressalta-se que as seis
categorias de avaliação podem ser enquadradas em dois grupos: um com foco nos aspectos
socioambientais (Qualidade Urbana, Projeto e Conforto, Práticas Sociais) e outro com foco
na eficiência e conservação de recursos (Eficiência Energética, Conservação de Recursos
Materiais, Gestão da Água). A distribuição de peso entre esses grupos se dá de forma
igualitária, observada não só quando da atribuição de critérios obrigatórios (dos 19
critérios obrigatórios 10 pertencem ao primeiro grupo, 52%, e os 9 restantes ao segundo,
276
48%), mas, também, na quantidade total de critérios avaliados (27 relacionados ao
primeiro grupo e 26 ao segundo).
Essa distribuição parece ir de encontro às bases conceituais do Selo, quando se
autodenomina de socioambiental e, portanto, onde se esperava menor ênfase às categorias
de eficiência, característica comumente observada em outras certificações e que, por isso
mesmo, deveria ser um fator de diferenciação do Casa Azul.
Quando observada especificamente a categoria Práticas Sociais, essa apresenta uma
distribuição disforme de critérios, ou seja, seis critérios avaliam aspectos relacionados à
fase da obra265
, três estão direcionados a ações junto aos moradores pós-ocupação266
e dois
critérios para as comunidades de entorno267
. Desse modo, fica claro o peso que a
metodologia atribui à etapa de execução do edifício, mesmo quando avalia os aspectos
sociais.
Outro fator limitante do Selo refere-se tanto ao do tipo de construção (habitacional),
quanto ao tipo de proponente (construtoras, Poder Público, cooperativas, etc.). Essas
restrições praticamente impõem um padrão construtivo, ou seja, o Casa Azul aplica-se para
empreendimentos residenciais multifamiliares e impedem que o cidadão comum se utilize
da ferramenta para incorporar ganhos sustentáveis a sua residência.
Por ter sido elaborado pela maior instituição nacional de financiamento imobiliário,
a Caixa Econômica Federal, essa certificação já traz consigo associada uma imagem sólida
no mercado, e também a enorme possibilidade de ser difundida junto aos programas
desenvolvidos por essa entidade. Trata-se de um potencial de transformação do processo
construtivo que pode influenciar toda indústria de construção civil e a enorme cadeira
produtiva atrelada a esse setor.
Entretanto, quando responde que os ganhos em eficiência, e consequentemente em
custos, já são suficientes para justificar a adoção da certificação e, com isso, não concedem
nenhum tipo de incentivo fiscal (nem para o empreendedor, nem para o comprador), a
Caixa nega a possibilidade de expandir, consideravelmente, o Selo Casa Azul e aumentar
265
Educação para a Gestão de RCD, Educação Ambiental dos Empregados, Desenvolvimento Pessoal dos
Empregados, Capacitação Profissional dos Empregados, Inclusão de Trabalhadores Locais, Participação da
Comunidade na Elaboração do Projeto. 266
Orientação aos Moradores, Educação Ambiental dos Moradores, Capacitação para a Gestão do
Empreendimento. 267
Ações para Mitigação de Riscos Sociais, Ações para Geração de Emprego e Renda.
277
os ganhos ambientais em uma grande parcela do volume de construções no país,
principalmente quando se refere às obras do PAC, na condição de um dos maiores
programas imobiliários nacionais das últimas décadas e que, certamente, se reflete no atual
momento de forte aquecimento da indústria da construção, e o seu enorme potencial
sustentável que vem sendo desperdiçado.
Ao se observar os números de certificações emitidas por esse selo, percebe-se uma
tímida participação no contexto geral dessas metodologias de avaliação. Segundo
informações no próprio site268
da entidade, seis condomínios residenciais já foram
certificados desde o lançamento do selo em 2010, distribuídos da seguinte forma:
Residencial Bonelli(45 unidades) – Joinvile/SC – Certificação Ouro.
Condomínio E e Condomínio G Paraisópolis (117 unidades) – São
Paulo/SP – Certificação Ouro.
Edifício HAB2 Chapéu Mangueira/Babilônia (16 unidades) – Rio de
Janeiro/RJ – Certificação Ouro.
Ville Barcelona (32 unidades) – Betim/MG – Certificação Prata.
Conjunto Guaratinguetá (880 unidades) – Santo André/SP – Certificação
Ouro.
Residencial Parque Jequitibá (62 unidades) – Vitória/ES – Certificação
Ouro.
Sem dúvida que o Selo Casa Azul apresenta uma metodologia simplificada em
relação às demais em uso no país e considera aspectos específicos da realidade nacional,
uma vez que foi idealizada para o contexto local e é concedida por uma instituição sólida
dentro do mercado imobiliário. Sendo assim, como explicar o número reduzido de
empreendimentos até então certificados? O problema pode estar nas ações de incentivo de
sua adoção voluntária e/ou nos mecanismos de divulgação da ferramenta, junto aos
empreendedores e aos usuários. Ambas as questões são deficientes, ou seja: se, por um
lado, o momento atual ainda caracteriza-se pela formação de uma cultura de construção
sustentável, mais ainda num setor altamente tradicional, sendo necessárias iniciativas mais
consistentes de estímulo a novas práticas construtivas, por outro, a própria dinâmica da
concorrência do mercado exige não só uma boa imagem da empresa, mas sua venda
através de uma eficiente divulgação.
268
Dados disponíveis em: http://goo.gl/JHYFEU. Acesso em 25/09/2013.
278
Também, aqui, descortina-se um rico material para desdobramento dessa pesquisa,
na forma de se investigar os pontos críticos do Selo Casa Azul que dificultam sua
implementação, uma análise junto às empresas certificadas, com o agravante de estarem
todas localizadas nas Regiões Sudeste e Sul.
Facilmente, percebem-se dificuldades em obter informações sobre a certificação de
edifícios da Caixa Econômica Federal. No site da entidade, em sua página inicial, não
consta nenhuma referência a essa ferramenta, nem mesmo quando se acessam as ações de
sustentabilidade da empresa. O arquivo com o guia informativo do selo está na página de
downloads269
, mas sem nenhuma referência à construção sustentável ou explicações de seu
conteúdo.
Esclarecimentos sobre o tema só podem ser obtidos no diretório ligado à
responsabilidade social da empresa, no link “meio ambiente”, onde, sucintamente, o
Programa Construção Sustentável é descrito.
Como já salientado anteriormente, um dos aspectos mais atrativos em se voluntariar
ao uso de certificações reside na possibilidade do uso da ferramenta como instrumento de
marketing da empresa, com a possibilidade de se destacar no mercado. Nesse sentido, o
Selo Casa Azul ainda precisa avançar em ações mais incisivas de propaganda, na
divulgação das vantagens não só ambientais e econômicas, mas, sobretudo, no seu
diferencial de certificação de cunho social.
269
Disponível em: www.caixa.gov.br/download/asp/download.asp.
CAPÍTULO V
DIAGNÓSTICO FINAL - CONCLUSÕES
[Digite aqui]
5 – DIAGNÓSTICO FINAL - CONCLUSÕES
É na perspectiva das possibilidades de se construir um espaço urbano melhor que
essa pesquisa foi estruturada, tendo a certificação como um instrumento ético capaz de
promover uma sociedade mais sustentável.
Os principais selos de avaliação de edifícios, no panorama nacional, serão, a seguir,
analisados comparativamente nos seus pontos comuns e divergentes, na tentativa de se
extrair os aspectos mais relevantes e que traduzam uma aplicação mais coerente com a
realidade do país. Em seguida, será proposta uma alternativa à certificação, um
instrumento que possa garantir um mínimo de sustentabilidade na construção, facilmente
utilizado pelo cidadão comum nas construções do dia-a-dia.
5.1 – Abordagem crítica das principais certificações ambientais na indústria da
construção nacional
A indústria da construção civil, atualmente, situa-se numa posição estratégica no
que tange à sustentabilidade. Se, por um lado, é vista como um dos principais setores
produtivos de alto impacto ambiental, por outro, pode tornar-se exemplo de boas práticas e
ponte para novos padrões de desenvolvimento, os quais a humanidade tanto almeja.
A sustentabilidade, apesar de amplamente debatida, ainda é um tema em
construção, e, por isso mesmo, carregado de inconsistências e lacunas ainda a serem
preenchidas. Atrelada a esse complicador conceitual está a indústria da construção, um
ramo de atividade altamente tradicional, com uma estrutura de produção complexa, mas
que é posta à frente do desafio por processos otimizadores dos recursos naturais, estes cada
vez mais escassos.
No cerne da questão sustentável está a lógica do longo prazo. A sustentabilidade é
pensada para durar, para atender às gerações futuras. Nesse contexto, a indústria da
construção civil e seu principal produto, a edificação, estão plenamente em sintonia. Um
281
edifício é feito, normalmente, para durar muitas décadas, até centenas de anos, sendo,
portanto, uma estrutura excepcional onde todos podem ver materializados muitos dos
preceitos desse novo pensar. É por isso que esse setor de produção tem o enorme desafio,
e, ao mesmo tempo, a grande oportunidade de ser o elemento decisivo nessa ruptura de
pensamento, nesse novo paradigma.
Pensar essas mudanças num setor tão complexo e tradicional não é tarefa fácil,
entretanto, no Brasil, mais intensamente na última década, muito já se avançou e as
certificações ambientais de edifícios tiveram o seu papel. O considerável aumento de
certificações nesse curto espaço de tempo – o LEED, por exemplo – denota o despertar do
setor para um novo tipo de empreendimento com poder de elevar a imagem da empresa a
um patamar de destaque num mercado cada vez mais competitivo. Essa mudança também
representa um novo nicho de negócios, com uma demanda crescente, de uma clientela cada
vez mais exigente e favorável a pagar por um produto diferenciado, ou ainda, revela a
pressão social, por processos menos impactantes, sobre uma indústria notadamente muito
poluidora, mas que depende de recursos naturais cada vez mais escassos.
O certo é que no território nacional a procura por esses instrumentos de avaliação
tem se tornado cada vez mais comum. Entretanto, algumas questões precisam ser
levantadas, seja numa abordagem mais geral, quanto a estratégias políticas que deveriam se
antecipar a essas certificações, bem como quanto às diferenças regionais – e, aí, entenda-se
culturais, financeiras, geográficas, etc. – comuns num país como o Brasil de dimensões
continentais, ou ainda mais específicas, no âmbito das próprias metodologias.
Merece destaque, primeiramente, o formato da avaliação. Baseada em checklists,
onde créditos são concedidos em função do atendimento a indicações projetuais ou
equipamentos utilizados, essa estrutura vem sendo criticada por pesquisadores brasileiros
(SILVA; SILVA; AGOPYAN, 2003; FIGUEIREDO; SILVA, 2012; PARDINI; SILVA,
2010; SILVA, 2007), principalmente da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo e
da Universidade Estadual de Campinas, uma vez que a certificação é atribuída em relação
ao valor total obtido pela soma dos pontos, mesmo deixando de atender a um número
mínimo em cada categoria de avaliação. Isto é, um melhor desempenho da edificação
como um todo não é assegurado, justamente pela falta de determinados critérios
ambientais. Dentre as quatro certificações o LEED é a que exemplifica claramente esse
formato, quando a pontuação final, independente de critérios importantes terem sido
282
atendidos ou não, classifica a edificação nos níveis de sustentabilidade definidos pelo
método. Nesse aspecto, todas as certificações avaliadas adotam esquemas similares, pois,
mesmo trabalhando com metodologias relativamente distintas270
, ao final, atribuem um
resultado único, que indica o desempenho global da edificação.
Esse formato metodológico de listas instrutivas, o qual, geralmente, vem associado
a critérios prescritivos com estratégias de projeto que “garantem” um desempenho
ambiental, por ter uma escala de complexidade inferior, tem sido amplamente utilizado e
bem aceito pelo mercado. Entretanto, espera-se que, paulatinamente, exista uma migração
para avaliações focadas no desempenho, onde todos os critérios que compõem a grade de
análises sejam atendidos, ao menos em índices mínimos aceitáveis, baseados em estudos
que podem estabelecer comparações tanto com situações ideais, ou, em última instância,
com o já praticado no mercado, e, nesse último caso, garantir um mínimo de melhoria
acima dos padrões usuais.
Não restam dúvidas de que um dos fatores que podem ser decisivos no incremento
de edificações certificadas está na força da lei, facilmente observado, por exemplo, em
vários estados dos EUA271
, por meio da exigência de parâmetros mínimos ambientais em
edificações públicas e privadas.
O diferencial de um marco regulatório é que ele pode preparar o mercado
consumidor e produtor para o desenvolvimento de ferramentas de sustentabilidade com
base em critérios mínimos que deverão ser atendidos por todos os interessados. Essa
uniformização, por exemplo, tende a minimizar distorções na adaptação de selos
estrangeiros, no sentido de chamar a atenção para aspectos importantes na realidade social
do país, os quais deverão ser contemplados pelas certificações. Uma política de edificações
sustentáveis, invariavelmente, antecipa-se às certificações na viabilização de base de dados
que darão suporte aos próprios selos, com o diferencial de trabalharem com informações da
realidade local e não com índices ou parâmetros importados, como é comumente
observado.
No caso do Brasil, por exemplo, que possui um sistema de leis ambientais bastante
avançado, as certificações, se reguladas por normas federais, deveriam atender a esse
270
O LEED adota uma lista de créditos com peso idêntico (pontos), já no Casa Azul, a quantidade de itens
obrigatórios indica a importância de uma determinada categoria em relação à outra, por exemplo. 271
No Estado da Califórnia, uma série de leis elevou consideravelmente a quantidade de edifícios certificados
LEED (PARDINI; SILVA, 2010).
283
sistema legal, seja na inclusão ou substituição de critérios obrigatórios, como, por exemplo,
na adoção do EIA/RIMA ou a Gestão Ambiental da empresa. Com isso, além de atribuir
mais força política a esses instrumentos, seria valorizado todo um esforço intelectual
desprendido na construção desses marcos regulatórios272
.
Em resumo, um sistema político normativo, voltado especificamente para a
sustentabilidade na construção civil, teria a função primordial de certificar as empresas
certificadoras, credenciá-las a atuarem no mercado nacional, dentro da realidade do país,
um problema já levantado por pesquisadores (AGOPYAN; JOHN, 2010; SILVA, 2007)
preocupados com a profusão de novos selos que, a todo instante, surgem no mercado.
A mais recente iniciativa de normatização construtiva refere-se à NBR 15575, que
incide sobre o desempenho das edificações habitacionais ao longo de sua vida útil, ou seja,
claramente trabalha com conceitos da sustentabilidade ambiental. Entretanto, ao entrar em
vigor só em meados de 2013, não conseguiu atingir além das certificações já em uso no
Brasil, como por exemplo a LEED desde 2004, também os planos de desenvolvimento
federal (PAC lançado em 2007), todos em plena expansão. De qualquer forma, o setor,
entidades ligadas à área e pesquisadores do tema esperam com a implementação da NBR
15575, para os anos vindouros, que a qualidade técnica das construções seja incrementada,
revertendo-se, para os usuários, em habitações mais seguras, confortáveis e eficientes.
Um segundo aspecto das certificações que merece referência, situa-se nas
características físicas, geográficas, sociais, culturais e econômicas do Brasil, onde esses
selos têm atuado de forma homogênea em termos de metodologia. Num país de grandes
dimensões, algumas especificidades precisam ser contempladas, principalmente em se
tratando de regiões opostas, como, por exemplo, entre as regiões norte e sul.
Nesse contexto, percebe-se uma diferença entre a certificação LEED e as outras três
analisadas. O selo de origem dos EUA, no tratamento dos requisitos ligados ao conforto
térmico das edificações (ventilação e iluminação naturais), adota sempre o atendimento de
parâmetros das normas ASHRAE, ASTM, EPA e o DOE273
, todos de origem daquele País,
272
Exemplo dessa iniciativa pode ser visto no Selo Casa Azul, quando estabelece como pré-requisito
obrigatório atender às regras da Ação Madeira Legal, o Documento de Origem Florestal e a NBR 9050 de
acessibilidade. 273
American Society of Heating, Refrigerating and Air-Conditioning Engineers.
American Society for Testing and Materials.
U.S. Environmental Protection Agency.
U.S. Department of Energy.
284
com características climáticas bem diversas das brasileiras. Ao contrário disso, o AQUA,
Procel Edifica e Casa Azul adotam base de dados advindos da NBR 15220274
, que trabalha
com temperatura, altitude e umidade, dentro das características das zonas bioclimáticas
nacionais.
É evidente que, neste ponto, essas três certificações se afastam metodologicamente
do selo dos EUA, conferindo às mesmas um grau de aproximação com a realidade do País
muito maior. Além disso, ao trabalharem com as zonas bioclimáticas, conseguem
diferenciar os índices aceitáveis de avaliação (ventilação, incidência solar) de forma
flexível, de acordo com as características daquele local, ou seja, uma possibilidade de
intervenção na escala da cidade, o que, em termos de processos de certificação, é algo
muito enriquecedor, pois confere muito mais credibilidade ao sistema.
Essa questão da regionalização das certificações incorre em outros detalhes, além
dos técnicos de conforto ambiental. Um aspecto importante refere-se às diferenças sociais,
culturais e econômicas, sendo o Brasil um exemplo vivo dessas diferenças, e esses temas
precisam ser contemplados quando se atesta que uma edificação busca a sustentabilidade.
Certificar envolve uma série de elementos, num sistema complexo de atores, materiais e
processos de produção que variam de região para região. Desde o nível intelectual dos
envolvidos (trabalhadores, projetistas, administradores, fornecedores, usuários, etc.) até a
proximidade com centros de captação de matéria-prima e produção de materiais. Tudo
incidirá na facilidade, dificuldade ou mesmo inviabilidade de atender a certos critérios
estabelecidos e esses fatores devem ser considerados.
Não é por acaso que, ao observar-se a distribuição de certificações no território
nacional, a grande maioria situa-se nas regiões sul e sudeste275
, justamente as mais ricas e
concentradoras dos maiores pólos industriais. Certificar nestes locais certamente apresenta
maiores facilidades do que na região norte, por exemplo. Desse modo, esses processos de
274
Norma Brasileira de Desempenho Térmico para Edificações, publicada em 2005 e dividiu o País em 8
zonas bioclimáticas. 275
A Certificação LEED atesta que os Estados de São Paulo e Rio de Janeiro perfazem juntos 77.4% do total
de registros solicitados (Dados disponíveis em www.gbcbrasil.org.br/?p=empreendimentos-leed.).
O Procel Edifica indica 82% de registros na região Sudeste e 10% na Sul (Dados disponíveis em
www.procelinfo.com.br/main.asp).
O Selo AQUA informa que do total de 173 edifícios certificados, 83% localizam-se na região Sudeste (Dados
disponíveis em www.processoaqua.com.br.).
O Selo Casa Azul apresenta 100% das certificações nas regiões Sul e Sudeste (Dados disponíveis em
www.caixa.gov.br/portal/rse/home/nossos_relacionamentos/meio_ambiente/programa_construcao_sustentav
el.
285
avaliação precisam flexibilizar alguns critérios, ou mesmo incluir/suprimir outros, de modo
a tornar a metodologia mais equilibrada, equacionando essas “distorções” próprias do País.
Outro aspecto geral e provavelmente um dos mais importantes refere-se à
capacidade avaliativa desses sistemas em abranger todas as esferas que compõem o
paradigma da sustentabilidade (ambiental, social e econômico). Para ser sustentável o selo,
impreterivelmente, deverá contemplar todos esses três pilares, com suas categorias de
avaliação enquadradas nesses três aspectos. A ênfase em cada um pode até ser distribuída
conforme as especificidades do país ou da localidade, caso possua a capacidade de
adequar-se e, assim, dar maior peso ao aspecto social e menor nos outros dois, por
exemplo.
A análise geral dos quatro selos, baseada na distribuição das categorias de avaliação
indica: o LEED e o AQUA se restringem ao primeiro dos três aspectos, configurando-se
como Certificações Ambientais; o Procel Edifica foca, basicamente, no uso racional de
energia, podendo enquadrar-se como uma Certificação de Eficiência Energética; o Casa
Azul é o único que incorpora critérios sociais, além dos ambientais, podendo ser
denominado como Certificação Socioambiental.
Diante da importância desse tema, o estudo avança, a partir de agora, no
detalhamento dessas categorias de avaliação, para, assim, estimar a intensidade com a qual
essas certificações tratam cada uma delas e, portanto, perceber as maiores lacunas
avaliativas, demonstrando os aspectos que deverão ser incrementados no estabelecimento
de metas compatíveis com os parâmetros da sustentabilidade. Com isso, espera-se
contribuir para o salto da avaliação ambiental ou socioambiental para a avaliação de
sustentabilidade de edifícios.
Para tanto, foi necessário montar uma estrutura básica de comparação, uma
estrutura de referência, suficientemente abrangente para contemplar além dos dados
ambientais, temas sociais e econômicos, de modo a reduzir as distorções durante o
confrontamento entre as metodologias, como descrito a seguir.
286
5.1.1 – Resumo Comparativo entre os Sistemas LEED, AQUA, PROCEL Edifica e Selo
Casa Azul
Partindo para as questões mais específicas, o estudo de comparação entre as
certificações foi estruturado a partir do reagrupamento das diversas categorias de cada selo,
segundo um escopo comum (Tabela 01), tendo por base as pesquisas de Silva (2003), Silva
(2007), Silva; Silva; Agopyan (2003) e Figueiredo; Silva (2012).
A comparação direta entre as certificações resultaria em inúmeras distorções graças
às suas diferenças estruturais. Nesse caso, optou-se, então, por se criar uma base comum
comparativa, em relação a qual todos os selos foram “testados” em sua performance
avaliativa. Com esse critério único, as relações de semelhança e disparidade puderam ser
verificadas com maior precisão.
A base comparativa (conjunto de categorias) foi determinada através do trabalho
feito por Silva (2003) para um sistema de certificação de edifícios de escritórios
brasileiros, com o objetivo principal de avançar acima dos aspectos ambientais, indo até os
sociais e econômicos. Assim, foram definidas nove categorias, cada uma contemplando um
grupo de critérios de avaliação, que, por sua vez, vão determinar a intensidade com que
cada selo trata cada categoria. Essas categorias, como dito anteriormente, englobam os
aspectos (critérios) ambientais, sociais e econômicos de uma avaliação que pretende ser
minimamente sustentável. Em outras palavras, compõem um esquema ideal de avaliação
de sustentabilidade de edifícios, tendo como meta atingir os principais entraves dessa
questão na realidade brasileira.
Tem-se claro que a definição desses critérios de avaliação de um empreendimento
construído é um material controverso, alvo de muitos questionamentos e que, por ser um
setor produtivo tão complexo e dinâmico, requer constante revisão de suas bases. Com o
propósito de suprir essas barreiras metodológicas, optou-se por se fazer uma revisão
detalhada de todos os aspectos avaliados em cada certificação, agrupando-os nos temas
gerais (categorias) previamente definidos e, posteriormente, comparados com a literatura
específica do tema. Evidentemente, a pesquisa não tem a pretensão de esgotar as
possibilidades de definição de diretrizes para a sustentabilidade na construção civil no país,
mas sim, como registrado anteriormente, estabelecer uma estrutura de abrangência mínima
que garanta atingir os principais aspectos de uma edificação que se propõe sustentável.
287
Assim, essa base de referência comparativa é composta por critérios mais
específicos de avaliação, os quais foram enquadrados da seguinte forma: Estratégias de
Implantação – 9 critérios; Uso de Água – 4 critérios; Uso de Energia – 3 critérios;
Materiais e Resíduos – 5 critérios; Prevenção da Poluição – 5 critérios; Qualidade do
Ambiente Interno – 4 critérios; Gestão Ambiental do Processo – 3 critérios; Desempenho
Econômico – 3 critérios; Práticas Sociais – 7 critérios (Tabela 01).
A quantidade de critérios por categoria não denota uma escala de importância, uma
vez que não foi atribuído nenhum tipo de peso avaliativo entre os mesmos (pontos ou
obrigatório/optativo, etc.). Esses critérios apresentam distintos graus de complexidade, que
necessitariam de uma análise detalhada da estrutura de cada um, trabalho esse necessário
caso os objetivos fossem estruturar um novo selo de certificação. Entretanto, a meta
principal aqui estabelecida é mapear/comparar a profundidade com que cada certificação
trata as categorias da sustentabilidade de uma edificação, para esse confrontamento é
satisfatório tão somente que as categorias sejam contempladas de forma uniforme, quando
do processo de comparação simplesmente se constata que atendem ou não àquele aspecto.
Tabela 19 - Base Comparativa com as Categorias de Avaliação, Conceitos e Critérios Gerais
CATEGORIA DE
AVALIAÇÃO
CONCEITO CRITÉRIOS GERAIS
1) Estratégias de
Implantação
Aspectos ambientais que incidem
na implantação do
empreendimento, no uso racional
do solo e sua conectividade com
o entorno.
1- Densidade e conexão urbana.
2-Adequada orientação com
relação aos ventos e ao sol.
3-Remediação de áreas
contaminadas.
4-Proteção e restauração do
habitat.
5-Paisagismo e redução de ilhas de
calor.
6-Implantação de equipamentos de
lazer, sociais e esportivos, dentro
do empreendimento ou no entorno
imediato.
7-Adequação as características do
solo (topografia).
8-Preservação de áreas
permeáveis.
9-Respeito às norma de
acessibilidade.
2) Uso de Água Gerenciamento do consumo de
água potável, com a adoção de
componentes economizadores ou
sistemas de reuso.
1-Medição individualizada.
2-Uso de dispositivos/mecanismos
economizadores (em metais ou
vasos sanitários).
3-Aproveitamento de águas
pluviais.
288
4-Reuso de águas servidas (águas
cinzas).
3) Uso de Energia Eficiência energética da
edificação com a redução do
consumo de energia elétrica e de
fontes fósseis e o aumento do uso
de fontes renováveis.
1-Geração local de energia/uso de
energia verde (solar, eólica).
2-Uso de dispositivos
economizadores.
3-Uso de equipamentos
comprovadamente eficientes.
4) Materiais e Resíduos Práticas de construção que
reduzam o consumo de materiais
e a geração de resíduos, através
de projetos, métodos construtivos
e produtos de melhor qualidade.
1-Construção modular/uso de pré-
fabricados.
2-Gestão de resíduos – RCD.
3-Uso de materiais de alta
performance.
4-Uso de materiais certificados,
com origem comprovada (madeira)
e de baixo impacto ambiental.
5-Reuso e reciclagem de materiais
e componentes.
5) Prevenção de
Poluição
Controle das cargas ambientais
geradas durante o processo de
construção e ao longo do ciclo de
vida do edifício.
1-Gestão de efluentes durante a
obra.
2-Controle da emissão de
substâncias causadoras do Efeito
Estufa e que causem dano a
Camada de Ozônio.
3-Uso de materiais locais
reduzindo as distâncias em
transporte.
4-Escolha de materiais com base
na análise do ciclo de vida (ACV).
5-Implantação de coleta seletiva.
6) Qualidade do
Ambiente Interno
Na concepção do
empreendimento considerar
elementos relacionados às
condições climáticas, físicas e
geográficas, com o objetivo de
minimizar ou evitar o uso de
dispositivos artificiais de
iluminação, ventilação, além do
controle de odores, acústico e
qualidade sanitária da água de
consumo humano.
1-Otimização da ventilação
natural/conforto térmico (materiais
e dimensionamento).
2-Controle da iluminação natural e
artificial.
3-Controle interno de odores e de
poluentes e uso produtos
químicos/materiais de baixa
emissão.
4-Controle de ruídos.
7) Gestão Ambiental do
Processo
Escolha de produtos, sistemas e
processos construtivos a fim de
limitar os impactos
socioambientais do
empreendimento e de sua
construção e garantir a
durabilidade da construção.
1-Escolha de produtos, sistemas e
processos construtivos (projetos)
que garantam a durabilidade da
construção, sua manutenção e
fornecedores que não pratiquem a
informalidade.
2-Flexibilidade do projeto.
3-Realizar pesquisas de pós-
ocupação (satisfação/insatisfação).
8) Desempenho
Econômico
Ações voltadas à produtividade, a
melhoria no produto oferecido
com retorno de investimentos e
mensurar os custos inerentes a
obtenção de uma certificação.
1-Processos construtivos em bases
industriais mais producentes.
1-Mensuração do retorno do capital
investido
3-Mensuração dos benefícios com
investimentos em sustentabilidade.
289
9) Práticas Sociais Ações voltadas à ampliação da
consciência ambiental e a
redução das desigualdades
sociais, envolvendo os agentes na
elaboração, planejamento,
construção e ocupação do
empreendimento.
1-Educação ambiental e
profissional dos empregados.
2-Desenvolvimento pessoal dos
empregados.
3-Parcerias com a comunidade do
entorno.
4-Educação ambiental dos
moradores.
5-Capacitação dos moradores para
gestão futura do empreendimento.
6-Mitigação de riscos sociais.
7-Ações para geração de emprego e
renda, envolvendo os moradores do
empreendimento e população do
entorno.
Fonte: Adaptado de (SILVA; SILVA; AGOPYAN, 2003; SILVA, 2003; SILVA, 2007;
FIGUEIREDO; SILVA, 2012; CASADO, 2011; AQUA, 2013; PROCEL/ELETROBRAS, 2012;
PROCEL/ELETROBRAS, 2013; JOHN; PRADO, 2010).
É evidente que o conjunto de categorias estabelecidas se agrupa de forma distinta
nas três bases da sustentabilidade (ambiental, econômica e social) e, nesse caso sim,
demonstra uma maior preocupação em relação ao primeiro aspecto (Tabela 02). Essa
distinção justifica-se como uma resposta ao atual momento pelo qual passa o setor e a
sociedade como um todo, de forte pressão sobre os recursos ambientais e, também, pelo
pouco desenvolvimento nos outros dois aspectos – econômico e social –, que ainda
carecem de um tratamento mais profundo, com o tempo necessário ao amadurecimento do
setor para uma aceitação maior da importância desses aspectos, inclusive para a construção
de um lastro de dados mais consistente e necessário para intervenções mais eficazes.
Tabela 20 - Agrupamento das Categorias de Avaliação por Esferas da Sustentabilidade
ESFERA DA
SUSTENTABILIDADE CATEGORIAS DE AVALIAÇÃO
AMBIENTAL
Estratégias de Implantação
Uso de Água
Uso de Energia
Materiais e Resíduos
Prevenção de Poluição
Qualidade do Ambiente Interno
Gestão Ambiental do Processo
ECONÔMICA Desempenho Econômico
SOCIAL Práticas Sociais
Fonte: Trabalho do Autor e Adaptado de SILVA; SILVA; AGOPYAN, 2003; SILVA, 2003;
SILVA, 2007; FIGUEIREDO; SILVA, 2012; CASADO, 2011; AQUA, 2013;
PROCEL/ELETROBRAS, 2012; PROCEL/ELETROBRAS, 2013; JOHN; PRADO, 2010.
290
Uma dificuldade nessa recategorização dos critérios gerais residiu no fato de que
alguns itens se enquadravam, ao mesmo tempo, em categorias distintas, quando os selos
eram comparados (conforto térmico pertence à qualidade do ambiente interno ou uso de
energia, por exemplo). Nesses casos, o procedimento adotado foi a consulta às estruturas
de outras certificações (BREAM, BEPAC e CASBEE), além de pesquisas na área (SILVA,
2007; SILVA; SILVA; AGOPYAN, 2003; PARDINI; SILVA, 2010; FIGUEIREDO;
SILVA, 2012). Com isso, pôde-se verificar em quais categorias esses critérios mais
incidiam e, assim, definir melhor o seu enquadramento.
O grau de profundidade (em valores percentuais) atingido em cada categoria foi
determinado pelo confrontamento dos critérios da base comparativa com todos os critérios
de avaliação dos selos, desprezando-se qualquer elemento valorativo, uma vez que a
pretensão era verificar se a certificação abordava ou não aquele aspecto. Por exemplo, para
o Selo LEED, tomando-se por base a Categoria Estratégia de Implantação da estrutura de
referência montada (Tabela 01), o conjunto total de critérios lá estabelecidos (no caso 9)
representava 100% de amplitude, de preocupação com essa categoria; a partir daí, cada
critério da certificação foi comparado aos critérios da base, preenchendo o campo de
atendimento ou não em cada um deles; nesse caso específico, o LEED atendeu a 6
critérios, representando 66% de profundidade no tratamento dessa categoria. As tabelas
referentes ao resumo de comparação de todas as categorias podem ser vistas no Anexo 05.
Uma vez comparadas a essa estrutura comum, as certificações puderam ser
relacionadas entre si, na sua amplitude frente a cada categoria. O Gráfico 01 resume os
resultados.
Nas “Estratégias de Implantação”, os Selos LEED, AQUA e Casa Azul têm
desempenho semelhante, ficando todos contemplados acima de 50% do grau de
abordagem, com destaque para a Certificação de origem europeia, que teve aspectos de
avaliação contemplados em todos os critérios da base comparativa (100% de atendimento).
Esse quadro demonstra um bom nível de preocupação com questões relativas à
implantação do empreendimento no terreno, com as decisões projetuais que irão interferir
na avaliação de outros fatores, de forma positiva ou negativa.
O “Uso de Água” retrata a única categoria onde as quatro certificações apresentam
resultados bem uniformes, todos com índice acima dos 70%. Esse recurso natural, apesar
da cultura da abundância no país, já é um dos principais problemas ambientais na maioria
291
dos grandes centros urbanos e em tantas outras regiões, com tendência a tornar-se um
elemento constante de conflitos sociais, pela própria escassez, custos de tratamento e
distribuição. Os sistemas de avaliação estudados refletem a preocupação e a importância
desse bem para os estudos de impacto ambiental e, consequentemente, para a
sustentabilidade do setor da construção civil.
Gráfico 1- Estrutura de Comparação de Categorias de Sustentabilidade Ambiental nos Sistemas
LEED, AQUA, SELO CASA AZUL e PROCEL EDIFICA. Fonte: Trabalho do Autor.
A Categoria “Uso de Energia” aproxima as Certificações AQUA, Casa Azul e
Procel Edifica no nível máximo de abrangência, pondo o selo de origem Norte-Americana
em posição muito aquém, num desempenho visivelmente inferior. Entretanto, cabe
salientar que, como em outras situações, isso não representa que o sistema relega esse tema
a um tratamento superficial, mas tão somente que, em relação aos critérios estabelecidos,
tem pouca compatibilidade276
e, em consequência disso, não se insere de modo adequado
276
A geração local de energia ou o uso de energia alternativa (solar, eólica, etc.), dispositivos
economizadores e equipamentos comprovadamente eficientes, definitivamente são critérios mínimos a serem
atendidos para a eficiência energética de edifícios e são relativamente simples de serem operacionalizados.
São também facilmente atendidos, uma vez que dependem de áreas tecnológicas bastante avançadas e com
resultados (equipamentos) cada vez mais acessíveis as construtoras, inclusive no aspecto econômico.
292
na realidade energética do Brasil, reforçando, nesse ponto, as dificuldades de adequação de
uma metodologia estrangeira ao contexto de outro país.
No quesito “Materiais e Resíduos”, as Certificações LEED, AQUA e Casa Azul
apresentam desempenho muito semelhante à verificada na primeira categoria de análise.
Todas se situaram acima de 50% do grau de amplitude com o qual tratam o tema, o que,
em termos de realidade nacional, é um dos grandes entraves à sustentabilidade no setor da
construção civil. Basicamente, são duas linhas principais de ação que precisam ser
enfrentadas: melhoria nos processos construtivos e uso de materiais.
O primeiro aspecto recai sobre a tendência de “industrialização” dos sistemas de
construção com a adoção de padrões modulares, sejam no conjunto estrutural de edifício,
nas vedações (paredes), pisos, forros, etc. Todos esses componentes estão gradativamente
evoluindo para modelos mais complexos e pré-fabricados, incrementando
consideravelmente a possibilidade de montagens rápidas e com poucos resíduos (que
deverão ser geridos e reciclados), assemelhando-se aos padrões industriais, da obra
transformar-se em linha de montagem. Somados a essas vantagens, de cunho econômico,
tem-se ganhos sociais/trabalhistas, através da formação de uma força de trabalhadores
especializados contribuindo para a formação de grupos bem treinados e melhor
remunerados.
O segundo aspecto refere-se ao aumento da pressão sobre os recursos naturais e a
resposta da tecnologia com materiais mais eficientes e maior controle no tratamento dos
insumos básicos (madeira, por exemplo). A evolução para quadros normativos mais
rigorosos de controle da mineração, do desmatamento e da própria produção de
componentes (produtos certificados), tem contribuído para a modernização, e os três selos
citados anteriormente parecem sintonizados com esses novos padrões ambientalmente mais
aceitáveis.
A “Prevenção da Poluição” tem por objetivo reduzir e/ou controlar a emissão de
gases e efluentes poluidores, durante a construção e uso da edificação. O gráfico
comparativo revela que se trata de um tema ainda pouco explorado pelas certificações
ambientais, o Selo AQUA é a exceção que plenamente atende aos cinco critérios avaliados.
Trata-se de um tema com dificuldades técnicas importantes a serem superadas pelo setor e
que depende de fatores que envolvam outros entes da cadeia produtiva, refletindo-se,
aparentemente, nos demais selos estudados. Exemplo disso pode ser observado quanto ao
293
uso de materiais locais ou a adoção da metodologia de ACV como critério de escolha de
materiais.
Nem sempre a região onde o empreendimento é planejado é abastecida por uma
rede de produção de componentes construtivos, impondo a necessidade de transporte de
longas distâncias. Esses impedimentos, de ordem estrutural econômica e política, vêm
relegando ações mais enfáticas dos proponentes a um segundo plano, as quais, entretanto,
precisam ser superadas. Outra questão mais complexa sinaliza na direção de pesquisas
científicas que produzam conhecimento profundo sobre o impacto na produção e uso de
materiais ao longo do tempo. Trata-se de um trabalho de montagem de um banco de dados
que, posteriormente, poderá ser utilizado como critério de escolha, para empreendedores
tomarem decisões mais coerentes com a sustentabilidade.
Diante dessas dificuldades que distanciam a realidade nacional de um “ideal” de
medidas contra a poluição gerada pela construção civil, as certificações têm o papel de
pressionar para o avanço do tema a padrões superiores e sensibilizar as instâncias políticas
para a descentralização espacial dos complexos industriais de apoio ao setor.
No tratamento da “Qualidade do Ambiente Interno”, verifica-se claramente a
aproximação entre a agenda ambiental dos dois países de origem dos selos importados
(LEED e AQUA), quando apresentam um grau de abordagem das categorias comparativas
acima de 70%, possivelmente em virtude das condições climáticas desses países que
obrigam o fechamento dos ambientes, com longos períodos de meses de isolamento das
áreas externas para seus usuários. Nesse contexto, é coerente que se tente garantir
condições salubres ao ar interno desses espaços, indo a detalhes técnicos ainda distantes da
realidade do Brasil.
As duas outras certificações nacionais refletem as contingências climáticas do país,
que favorecem a ventilação e iluminação natural, praticamente o ano inteiro, bastando,
para tanto, que se atendam às normas básicas dos Códigos de Obras municipais. Esse é
mais um aspecto onde fica bastante clara a diferença e a dificuldade em se adaptar
certificações estrangeiras.
A Categoria “Gestão Ambiental do Processo”, cujo objetivo principal é limitar
e/ou controlar os impactos socioambientais e garantir uma edificação durável, tendo
preservadas todas as suas características sustentáveis, representa bem a aproximação entre
os selos AQUA e Casa Azul. Ambos apresentam, nas suas metodologias, um importante
294
instrumento, que, inclusive, antecipa-se à avaliação propriamente dita, o Sistema de Gestão
do Empreendimento (SGE), no caso do primeiro selo, e a Agenda do Empreendimento, em
relação ao segundo. Nos dois sistemas de avaliação, esses documentos têm o objetivo não
só de orientar a tomada de decisão para se alcançar as metas sustentáveis estimadas, mas,
também, de controlar todo o processo de construção e lançar as bases para uma gestão
futura da edificação, coerente com os preceitos de eficiência implantados. Nesse sentido,
as duas metodologias representam um avanço em termos de proposta de gestão ambiental
para os empreendedores e contribuem para a solidificação de uma prática administrativa
baseada no planejamento, no controle e na melhoria contínua, aspectos indispensáveis para
quem se propõe como construtor da sustentabilidade.
Vale salientar que os critérios de escolha de produtos, sistemas e processos mais
duráveis, assim como a escolha de fornecedores não adeptos da informalidade, constituem-
se em ações de difícil controle. Nesse sentido, as duas certificações citadas anteriormente
adotam os mesmos preceitos de avaliação, que residem na adesão do empreendedor ao
Programa Brasileiro da Qualidade e Produtividade do Habitat277, fornecendo pistas não só
para a melhoria dos outros sistemas, mas também para tendência à adoção de mecanismos
regulatórios já implantados dentro do sistema construtivo do país.
Os resultados do quesito “Desempenho Econômico” comprovaram o que
anteriormente já havia sido dito, isto é, que as certificações em vigor no país comportam-se
de forma parcial frente à sustentabilidade e não contemplam os aspectos econômicos do
novo paradigma. Esta é uma das categorias mais complexas no atendimento dos critérios
avaliativos, uma vez que a mesma envolve análises de valoração monetária dos
ganhos/perdas com ações ambientais, um dos temas mais controversos da sustentabilidade.
Todavia, trata-se de um desafio a ser enfrentado para a comprovação (ou não) dos ganhos
financeiros com a sustentabilidade e a desmitificação de que prédios eficientes são mais
caros de serem construídos do que os convencionais.
277
O PBQP-H (Programa Brasileiro de Qualidade e Produtividade do Habitat) é um conjunto de diretrizes
desenvolvidas pelo Ministério das Cidades - Secretaria Nacional da Habitação e seus parceiros privados, com
o objetivo de melhorar a qualidade do habitat e contribuir para a modernização produtiva. Uma das
atividades do PBQP-H é o SiMaC (Sistema de Qualificação de Materiais, Componentes e Sistemas
Construtivos), que abriga diferentes PSQ (Programa Setorial da Qualidade), um para cada tipo de produto,
que atestam a conformidade de fabricantes e seus respectivos produtos de construção com relação a padrões
definidos de qualidade (AQUA, 2013, p. 53).
295
Muito da resistência do setor em adotar práticas sustentáveis vem justamente desses
“mitos”, que não só afastam os empreendedores, como também uma clientela em potencial
que almeja espaços ambientalmente mais coerentes, mas que tem receio dos custos desses
ganhos. A via financeira é, sem dúvida, a mais segura para o convencimento do mercado e,
de alguma forma, essas benesses precisam ser demonstradas e comunicadas à sociedade, e
as certificações constituem-se como alternativas legítimas.
É em relação à última categoria, “Práticas Sociais”, que reside grande parte dos
questionamentos dos muitos pesquisadores do tema (AGOPYAN; JOHN, 2011; SILVA,
2007; SILVA; SILVA; AGOPYAN, 2003; PARDINI; SILVA, 2010; FIGUEIREDO;
SILVA, 2012). Nos sistemas de avaliação de desempenho ambiental de edifícios, os
critérios giram basicamente em torno de questões do meio ambiente, da eficiência e
redução dos impactos: consumo reduzido de recursos naturais não renováveis (água,
matérias prima, solo, combustíveis fósseis, etc.); minimização de emissões relacionadas ao
efeito estufa, de efluentes líquidos e resíduos sólidos; etc.
Os sistemas com a pretensão de abranger a sustentabilidade devem incorporar, além
dos aspectos citados, parâmetros de sociabilidade, de equilíbrio e inclusão, no interior do
empreendimento e seu entorno (FIGUEIREDO; SILVA, 2012). Nesse sentido, o Selo Casa
Azul da Caixa distingue-se dos demais na medida em que cria uma categoria de avaliação
específica voltada para “práticas sociais”. Esse diferencial, ressaltado inclusive como
marketing de divulgação, uma vez que é “vendido” como uma certificação socioambiental,
aproxima-o do paradigma da sustentabilidade, tornando-o mais coerente com a agenda
ambiental do país, onde, na maioria dos casos, os muitos problemas sociais ainda se
sobrepõem aos do meio ambiente.
Descortina-se, então, mais um desafio para o setor e para as instituições ligadas a
esses instrumentos, a saber: como passar da avaliação ambiental para a avaliação de
sustentabilidade?
Por suas características próprias, na indústria da construção civil, a sustentabilidade
passa por toda uma rede de produção, em diversas etapas com diversos atores envolvidos.
Perpassa diretamente pelos usuários, uma vez que é nos espaços construídos que vão
desenvolver as muitas atividades, que, no percurso do tempo, compõem a existência de
cada um e onde é possível a qualidade de vida materializar-se. Ou seja, para ser
sustentável, o edifício tem que ir além da eficiência.
296
Contemplar os aspectos sociais da sustentabilidade na construção civil indica um
esforço ao longo de toda cadeira produtiva, um controle das relações interpessoais em
bases justas, pois é inválido investir-se em processos limpos se a mão-de-obra na captação
de matéria-prima tem indícios de trabalho infantil, por exemplo. Esse esforço demanda
novas estratégias não só ao setor especificamente, mas também aos centros de pesquisas,
academia e instituições políticas, que, ao avançarem até agora em termos de ciência e
legislação, precisam agora reverter os ganhos tecnológicos em ganhos sociais.
Notadamente, essa constatação está associada, em grande parte, às inovações da
tecnologia com processos de produção, decorrentes de decisões projetuais ou, imposição
legal, que visam à diminuição dos impactos sobre os recursos naturais e a geração de
resíduos. Sob o ângulo do greenbuilding essa definição está coerente, entretanto extrapolar
para o sustentável é ainda inconsistente. A ambiguidade pela qual passa o setor, se ao
tempo em que é um dos maiores propulsores da economia do país, é também um grande
gerador de impacto ao meio ambiente, paulatinamente vai abrindo espaço para o
reconhecimento do “bom negócio da sustentabilidade”, com grandes oportunidades para a
inovação, principalmente numa cadeia produtiva tão rica e complexa.
A Certificação Procel Edifica distingue-se das demais, na medida em que centra sua
estrutura de avaliação especificamente na eficiência energética, coerente com os preceitos
institucionais da entidade que a originou, no caso a Eletrobrás. Essa certificação
caracteriza-se pelo emprego de tecnologia relativamente complexa, conferindo-lhe um
elevado grau de precisão matemática nas suas análises, baseado no comportamento
termodinâmico e luminoso dos materiais e condicionamento do ar e da água. Evidente que,
no cerne dessa lógica analítica, estão, além da eficiência, garantidas condições de conforto
aos usuários em termos de temperatura interna, ventilação e iluminação, fazendo o selo,
nesse ponto, aproximar-se dos demais nos aspectos ambientais.
Por suas características próprias e seus objetivos, esse sistema de avaliação, mais do
que ser enquadrado no mesmo patamar das outras certificações, presta-se com melhor
desempenho ao papel de instrumento de apoio complementar, mecanismo já utilizado pelo
Selo AQUA, quando adota o Procel Edifica como parâmetro técnico para a redução do
consumo de energia por meio da concepção arquitetônica. Essa estratégia, além de agregar
um caráter científico à avaliação, lança mão de uma metodologia construída para os
297
padrões energéticos nacionais, a qual é amplamente difundida e com previsão de se tornar
obrigatória para todas as novas construções nos próximos anos.
Os dois selos de origem internacional situam-se numa categoria de sistemas
claramente desenvolvidos para o mercado, de fácil operacionalização e informação dos
esforços desprendidos para a melhoria da qualidade ambiental do edifício. Da mesma
forma, o selo da CAIXA aproxima-se desse contexto, fato esse observado, inclusive, no
modelo de seu lançamento e divulgação, na forma de um guia de fácil leitura com
propósitos claros de aproximar a academia do meio profissional da construção civil.
Através do Gráfico 01, fica clara essa similitude entre o LEED, o AQUA e o Casa
Azul, na medida em que enfocam com muita proximidade algumas questões, como, por
exemplo, em relação às categorias Estratégias de Implantação, Uso de Água e Materiais e
Resíduos, que, pelos três selos, são tratadas com um grau de profundidade maior, no
atendimento de várias de categorias analíticas.
Nos quesitos Prevenção da Poluição e Qualidade do Ambiente Interno, o estudo
comparativo indica resultados mais disformes, com a Certificação AQUA tendo um bom
desempenho em ambos. Já na Gestão Ambiental do Processo e Práticas Sociais, apenas os
Selos Casa Azul e AQUA têm destaque no tratamento de critérios dessas categorias de
avaliação.
Fazer uma comparação no conjunto das quatro certificações revelou-se uma tarefa
de grande dificuldade devido às diferenças de abordagem. Os Selos LEED e AQUA, por
serem importados de países no mesmo padrão de desenvolvimento, apresentam
semelhanças mais visíveis em vários aspectos, mas também dialogam com o Casa Azul,
como visto claramente no gráfico comparativo apresentado. Em vários momentos, esses
selos aproximam-se e divergem, o que é um reflexo da origem de cada um e dos objetivos
implícitos, resultado das diferentes agendas ambientais.
Num contexto mais abrangente, três das quatro certificações situam-se no âmbito de
avaliações ambientais, uma vez que focam basicamente nas categorias relacionadas a essa
esfera da sustentabilidade. O Selo Casa Azul é o único que realmente amplia para uma
abordagem socioambiental, quando se destaca no quesito de Práticas Sociais. O Sistema
AQUA também trata dessa categoria, entretanto, devido à sua atuação muito restrita
(abaixo de 20%), não pode ser caracterizado da mesma forma que o selo da CAIXA.
298
Diante dessas constatações, é mais coerente comparar as certificações restringindo-
se aos critérios puramente ambientais e, assim, responder à questão: Dentre as avaliações
ambientais da construção civil qual a mais abrangente?
Com base nas análises, fica claro que o Selo AQUA apresenta um grau de
profundidade no tratamento dessas questões muito consistente, destacando-se perante os
demais com índices, sempre acima dos 50%. Reflete não só as preocupações do seu país de
origem, mas de todo o continente europeu, uma região com altos índices sociais,
construídos, em grande parte, graças aos altos impactos ao meio ambiente, e que, por isso
mesmo, tema preponderante na sua agenda política.
Mesmo assim, dentre as quatro certificações, qual seria a melhor para a construção
do Brasil? Num país de realidades tão contrastantes, com uma cadeia de produção tão
complexa, basicamente todas as áreas que interferem no setor precisam ser focadas, e isso
denota uma maior amplitude de abordagens que o Selo Casa Azul atinge de forma mais
satisfatória. Apesar das limitações de sua atuação no campo econômico, só o passo para
uma esfera socioambiental já indica o avanço de uma metodologia que se aproxima dos
ideais da sustentabilidade. Evidente que, além da superação das restrições citadas, esse
Selo pode incorporar outras estratégias que podem deixá-lo ainda mais simples e acessível,
aplicado por construtoras pequenas, médias ou grandes, pelo cidadão comum e ampliado
para outras categorias construtivas, não apenas a habitacional. Isso indica que suas
limitações precisam ser reavaliadas e os pontos críticos identificados no estudo dos casos
já implantados, abrindo espaço para novas pesquisas e proposições para o seu
aperfeiçoamento, uma tarefa complexa, que exigirá da interdisciplinaridade sua
recomposição validada no contexto do país.
Se as certificações têm desempenhado um papel importante na difusão dos
pressupostos sustentáveis na construção civil, inclusive por suas características de
comunicação de efeitos, também têm se revelado como um instrumento de ação restrita,
que atinge uma parcela ainda pequena do volume de construção total. Em decorrência das
singularidades de sua estrutura, amplamente discutidas no capítulo anterior, os selos de
avaliação ambiental na construção civil têm sido exclusivamente278
utilizados por
278
Nas pesquisas nos sites dos selos de avaliação, não consta nenhuma informação de empreendimento
individual (residência unifamiliar) que tenha sido certificada.
299
construtoras em empreendimentos de grande porte, fazendo com que a construção
individual fique alheia a esse processo.
Alterar esse quadro demandará um enorme esforço do setor e entidades que dão
suporte aos selos de avaliação (certificadoras e organismos de pesquisa), o que, a curto e
médio prazo, parece tarefa difícil. Entretanto, a sustentabilidade exige que ações imediatas
sejam tomadas, para validar suas bases conceituais, e as vantagens das boas práticas
ambientais e sociais democratizadas e usufruídas por todos.
Mas como fazer para, se não atingir a sustentabilidade no seu sentido amplo, ao
menos reduzir o impacto no meio ambiente e social provocado pela construção do dia-a-
dia? Haveria uma alternativa para a certificação de edificações mais acessível, mais
democrática e, portanto, mais ética?
É nesse contexto de reavaliar instrumentos que permitam introduzir ganhos
ambientais na construção do cidadão comum, e de aproximá-lo da sustentabilidade
ambiental, que se desdobram as análises a seguir.
5.1.2 – Alternativas à Certificação de Edificações
O Brasil vem passando, nos últimos anos, por um momento político e econômico
que tenta suprir as deficiências de infraestrutura, moradias e serviços. No âmbito geral, o
maior destaque fica por conta dos grandes empreendimentos, principalmente os ligados ao
PAC e à Copa do Mundo de 2014, onde os números são expressivos: no período de 2004 a
2010, a construção nacional cresceu 42,41%, o que significa uma taxa média de 5,18% ao
ano e o mercado de crédito imobiliário (englobando todas as categorias) saltou de um
volume anual de R$ 6 bilhões em 2004, para R$ 110 bilhões em 2011279
.
Segundo dados do Relatório Anual do ITCnet280
, no ano de 2012, do volume total
de metros quadrados edificados no país, 124,15 milhões de metros quadrados,
aproximadamente 84 milhões foram do setor habitacional, o que representa,
aproximadamente, 68%. O valor total de financiamentos imobiliários concedidos com
279
Informativo Econômico do CBIC com o balanço para o ano de 2011. Dados disponíveis em
www.cbicdados.com.br. Acesso em 25/10/2013. 280
Informações Técnicas da Construção. Dados disponíveis em www.itc.etc.br.
300
recursos SBPE281
, nos últimos 10 anos aumentou cerca de 2.900%, chegando a mais de 79
bilhões de reais em 2011. O IBGE, na Pesquisa Anual da Construção 2011, divulgou que,
do valor total das incorporações, obras e serviços da construção, a participação das obras
residenciais aumentou de 15,1% para 22% no período de 2007 a 2011.
Essas informações situam bem as condições de crescimento no ramo da construção
habitacional no país, que passou a atender, nos últimos anos, a uma demanda reprimida por
moradias, na maioria dos espaços urbanos. Esses dados, entretanto, incidem sobre o
volume de construções formais, no sentido de que, de alguma forma, passam pelo sistema
de entidades financiadoras e, portanto, estão sujeitas a instrumentos regulatórios, tais como
normas urbanísticas, ambientais, trabalhistas, etc.
O problema reside justamente na quantidade de serviços que é executado pelo
cidadão comum, nas pequenas reformas, construções iniciais ou ampliações de sua
residência e que não são submetidas aos mecanismos de crédito imobiliário. Esse volume,
apesar de não apresentar dados formalizados, é visivelmente percebido pela grande
quantidade de obras em desenvolvimento em todas as partes da cidade, e, mesmo não
sendo uma grandeza de fácil mensuração, merece a atenção dos que se propõem a construir
espaços mais sustentáveis.
Na maioria das vezes, essas obras pertencem a uma área da informalidade282
, ou
seja, não foram projetadas por profissional habilitado e, consequentemente, não obedecem
ao código de obras, o que, por si só, desencadeia uma série de danos que vão se prolongar
por toda a existência da edificação com sérios problemas urbanísticos, ambientais, sociais e
até de ordem econômica para o usuário. Isso porque se uma construção não obedece a
padrões mínimos urbanísticos, a mesma pode, por exemplo, dificultar a ventilação e
iluminação no interior e em seu entorno imediato e, assim, contribuir para ambientes
insalubres, que, por sua vez, podem contribuir para vetores de doenças. Além disso, uma
casa mal iluminada e ventilada consome muita energia, onerando as despesas da família.
Evidente que, numa única edificação, os danos são imperceptíveis em termos de urbanismo
281
Recursos do Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo que permite o financiamento de imóveis
residenciais novos 282
Na cadeia produtiva da construção civil, a informalidade tem muitas facetas: não cumprimento de
obrigações sociais e trabalhistas, sonegação de impostos, extração de matéria-prima, fabricação e
comercialização de materiais, elaboração de projetos, desrespeito à legislação ambiental, etc. (AGOPYAN;
JOHN, 2011); nesse momento da pesquisa serão abordados apenas os aspectos da Agenda do CBCS e da
informalidade de projetos e seus desdobramentos.
301
da cidade, do bairro e até mesmo da rua, mas quando multiplicados pelas milhares (ou
centenas de milhares) de obras que uma cidade comporta, o quadro é preocupante.
Além desse aspecto mais prático, ligado à melhoria das condições do meio
ambiente, recai o direito do indivíduo por uma vida melhor, o direito de boa escolha,
conseguida através da informação, do conhecimento; a segurança de que as benesses da
sustentabilidade chegarão até ele, e essas bases só podem ser construídas através do acesso
à informação e, nesse caso específico, de uma boa assessoria de arquitetura.
Então, quais os mecanismos disponíveis para se atingir essa demanda construtiva e
atribuir-lhe características socioambientais mais equilibradas, abrangentes e eticamente
mais justas? Ou, como combater a informalidade nesse tipo de construção?
Uma opção pode estar ligada à Agenda apresentada pelo CBCS283
, intitulada “Seis
Passos”, a qual orienta para a correta escolha de insumos e fornecedores dentro de critérios
da sustentabilidade. Trata-se de uma ferramenta simples para auxiliar projetistas,
empreendedores e usuários, distribuída em seis etapas.
O primeiro passo consiste em verificar a formalidade da empresa fabricante ou
fornecedora de produtos e serviços através de consulta direta a Receita Federal, por meio
do CNPJ da empresa. Caso o registro não seja válido, significa que aquela entidade não
está recolhendo os impostos devidamente ou que é informal; nesse caso, esse fornecedor
deve ser descartado como opção para a compra ou contratação.
Se a opção for por um produto importado, a verificação é mais complexa, ou
incompleta, pois o CNPJ fornecido é da importadora, o que não garante que o fabricante
estrangeiro pratique a informalidade no seu país.
O segundo passo refere-se à verificação da licença ambiental da atividade que
gerou o produto que se quer comprar, pois toda atividade industrial precisa dessa
autorização para funcionar dentro da lei. A consulta dessa informação geralmente é feita
diretamente ao órgão licenciador estadual, entretanto, no próprio site do CBCS, verifica-se
que, na maioria dos estados brasileiros, não é possível acessar a licença ou, em alguns
casos, é preciso fornecer o número do processo de licenciamento. Apenas no Rio Grande
283
Todas as informações relativas aos “Seis Passos” foram analisadas com base no site do CBCS e estão
disponíveis em www.cbcs.org.br/selecaoem6passos/. Acesso em 28/10/2013.
302
do Sul, São Paulo, Pernambuco, Pará, Mato Grosso e Rondônia, essa informação é
acessível sem protocolos.
O terceiro passo reside na confirmação de questões de cunho trabalhistas, tais
como: trabalho infantil, insalubre ou com jornada excessiva; trabalho escravo; trabalho
com alimentação inadequada. A consulta é feita diretamente no site, as listas de empresas
que mantiveram algumas dessas condições e deverão ser eliminadas do grupo de
fornecedores.
No que tange ao quarto passo, deve haver a consulta na qualidade e normas técnicas
dos produtos a serem empregados na obra, como forma de reduzir os desperdícios, os
custos e resíduos. Nesse sentido, aconselha-se consultar se a empresa é qualificada pelo
PBQP-H, o que já garante conformidade com as normas técnicas da ABNT.
O site disponibiliza uma ferramenta que orienta a verificação de itens básicos de
sistemas construtivos, indispensáveis numa obra residencial, onde aparecem as seguintes
famílias de produtos: infraestrutura; sistemas hidráulicos; sistemas elétricos;
superestrutura; pisos; revestimentos de paredes; pintura interna e externa; esquadrias,
portas e janelas; forros; sistemas de prevenção e combate a incêndios; alvenarias,
fechamentos e divisórias; estruturas metálicas; ar-condicionado, ventilação e exaustão;
vidros; impermeabilização; estruturas de madeira; coberturas; sistemas pluviais; isolação
térmica e acústica. Para cada uma destas famílias está associado um grupo de itens de
construção com informações do produto e de sua entidade setorial a qual se vincula perante
o PBQP-H.
No mínimo, esse conjunto de informações serve de base referencial e orientação
para se distinguirem os diversos sistemas construtivos que compõem uma obra, bem como
todos os componentes individuais. Permite que o interessado tenha uma dimensão da
complexidade que envolve uma construção e eleger os aspectos que considera mais
importantes no controle da qualidade.
No quinto passo, deve-se consultar o perfil de responsabilidade social, ambiental e
empresarial da empresa, que visam a garantir uma proximidade com a sustentabilidade.
Nesse quesito, o interessado deverá fazer uma pesquisa do fornecedor sob quatro aspectos,
numa espécie de check list, conforme segue:
303
a) Funcionários e fornecedores
1º) Atende ao Passo 3 (Verificação das questões sociais) e respeita a legislação
trabalhista brasileira (consulta à Lei 10.097 – 2000).
2º) A empresa possui Comissão Interna de Prevenção de Acidentes (CIPA),
serviços de segurança e medicina do trabalho (consulta ao site do Departamento
Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos - DIEESE284
).
3º) A empresa está de acordo com a declaração da Organização Internacional do
Trabalho Sobre os Princípios e Direitos Fundamentais no Trabalho285
.
b) Meio Ambiente
1º) Atende ao Passo 2 (Verificação da licença ambiental); adota a Gestão de
Resíduos da Construção Civil (atende a Resolução CONAMA 307).
2º) A empresa possui comissão interna que trata dos assuntos de meio ambiente,
investe em novos processos de eficiência energética e de recursos ambientais.
3º) A empresa já realizou análise do ciclo de vida de seus produtos.
c) Comunidade e Sociedade
1º) A empresa pratica política de reparação de danos causados e recebeu
reclamações da sociedade como um todo.
d)Transparência e Governança
1º) A empresa possui política socioambiental, anticorrupção e antipropina.
2º) A empresa seleciona fornecedores licenciados.
3º) A empresa pratica a transparência de seus compromissos éticos divulgando-os
nos diversos meios de comunicação.
4º) A empresa atua conforme a legislação em vigor, dispõe de conselho consultivo
e suas finanças são auditadas.
5º) A empresa pratica preços e concorrência justos, evitando pirataria, sonegação
fiscal, contrabando adulteração de marcas e falsificação de produtos.
284
www.dieese.org.br. 285
www.oit.org.br/sites/default/files/topic/oit/doc/ceclaracao_oit_547.pdf.
304
O CBCS não detalha o tratamento que se deve dar às informações obtidas,
obviamente se espera o atendimento de todos os quesitos de forma positiva para a
aprovação do fornecedor avaliado, todavia, caso algum item seja negativo, isso
inviabilizaria o processo? Existiria algum tipo de hierarquia entre os quesitos?
Finalmente, o sexto passo foca na identificação de existência de propaganda
enganosa, principalmente de produtos ligados a ecoeficiência. Para se alcançar o objetivo
de realmente selecionar produtos menos impactantes ao meio ambiente, o interessado
deverá lançar mão de algumas estratégias de observação: aspectos negativos são
disfarçados pelo destaque de aspectos positivos; não existem provas, dados de que as
afirmações (ambientais) são verdadeiras; as informações são genéricas, imprecisas e geram
dúvidas; as informações são irrelevantes sobre o desempenho do produto; declarações
exageradas destacando apenas os resultados positivos; vantagem irrelevante perante
aspectos verdadeiramente ambientais (inseticida orgânico).
Os “seis passos do CBCS” configuram-se como uma ferramenta simples para quem
tem acesso à rede de internet. Na verdade, funciona como uma espécie de certificação onde
informações são verificadas e, na medida em que os itens vão assegurando a conformidade,
o produto ou serviço é habilitado. Acontece que, dois problemas são percebidos logo de
imediato: o primeiro é de ordem prática, ou seja, nem todas as pessoas têm acesso a um
computador e à internet e o caminho para se chegar até o site do CBCS exige um nível de
conhecimento de informações hoje disponível apenas para as pessoas envolvidas no tema
da sustentabilidade da construção civil, em outras palavras, sua abordagem é muito restrita.
Em segundo lugar, a estrutura dos “seis passos” abre espaço para alguns
questionamentos, tais como: caso algum item seja reprovado, o produto será inabilitado
como um todo, ou, mesmo com alguma deficiência, pode-se considerar sua propriedade
para determinado uso, a depender de suas características de fabricação e funcionais? O
método não faz referência a isso. Ainda, nessa mesma lógica, alguns itens não podem ser
verificados, como por exemplo, a Licença Ambiental que em determinados Estados do país
configura-se como uma informação “não acessível”, nesse caso, qual o procedimento
deverá ser tomado para sua superação?
Outros requisitos obrigam ao cruzamento de informações, em certa medida,
complexas e exigem do interessado uma capacidade investigatória apurada, além da
dependência de dados internos às empresas nem sempre fáceis de serem acessados.
305
De forma geral, a ferramenta pode ser enquadrada como uma alternativa às
certificações e um instrumento de verificação de condições básicas de sustentabilidade,
que, a depender da região do país, com um acervo de dados maior e disponível, configura-
se como uma ferramenta satisfatória no auxílio à tomada de decisões por produtos e
serviços menos impactantes ao meio ambiente. Entretanto, suas restrições impedem uma
abordagem mais ampla e, consequentemente, aproximam-na de uma determinada fração da
sociedade, conferindo-lhe um caráter menos democratizante.
Mas, então, como superar essas restrições, das alternativas serem acessíveis para
todos, principalmente àqueles com dificuldades à informação mais especializada? No
Brasil, um país com tantas deficiências sociais, a alternativa mais viável é que parte das
ações sustentáveis seja “garantida” pelo poder público antes de chegar ao consumidor.
Nesse sentido, um meio eficaz é o da via econômica, condicionando o financiamento para
construção a partir de estratégias sustentáveis, controladas por entidades governamentais.
Esse pressuposto está previsto, inclusive, na Agenda 21 Brasileira quando assinala a
necessidade de inclusão de instrumentos de incentivo econômico.
Deve-se promover a mudança de enfoque nas políticas de desenvolvimento e de
preservação do ambiente urbano, sobretudo no que se refere aos assentamentos
informais ou irregulares e às atividades industriais. Essa mudança deve ser
operada com a substituição paulatina dos instrumentos punitivos e restritivos
para os instrumentos de incentivo e negociação. Entre os instrumentos de
incentivo, deve-se privilegiar aqueles de natureza econômica, por entender que
eles são mais adequados quando se verifica a necessidade de gerar recursos
adicionais para a promoção de projetos indutores de sustentabilidade urbana.
O desafio atual da gestão das cidades passa ainda pela busca de modelos de
política que combinem as novas exigências da economia globalizada à regulação
pública da produção da cidade e ao enfrentamento do quadro de exclusão social e
de deterioração ambiental. (AGENDA 21 BRASILEIRA, p. 53, 2004).
Basicamente, dois campos de ação podem ser traçados, partindo do mesmo
instrumento, “linhas de microcrédito”. A primeira refere-se ao “controle” projetual da
reforma ou construção e a segunda ao “controle” na compra dos materiais empregados e
mobília.
Em primeiro lugar, uma questão que é comum a todos os métodos de avaliação
refere-se à importância estratégica que a fase do projeto tem em relação à sustentabilidade
da construção. É justamente nessa fase que os problemas podem ser antevistos e reparados.
306
Nos grandes empreendimentos habitacionais, financiados por programas no âmbito
federal, alguns avanços podem ser percebidos em termos de ações sustentáveis (kit de
sistema solar, estruturas pré-moldadas, por exemplo). Nesses casos, esses tipos de
inovações são mais fáceis de serem incentivadas e controladas, uma vez que seguem
projetos; o grande problema está na construção do cidadão comum que vai edificar sua
casa pela primeira vez ou reformá-la e não possui recursos para contratar um profissional
da área e tão pouco percebe o papel preponderante de um projeto de arquitetura.
Esse acesso pode ser construído por intermédio das linhas de microcrédito, no ato
de contratação do financiamento, havendo a opção de se ter a assessoria de um profissional
da arquitetura para elaboração de um projeto. Os profissionais seriam cadastrados e
remunerados pelo órgão financiador, que também seria responsável pelo treinamento,
dotando-os de conhecimento na área da sustentabilidade, formando, assim, um leque de
escritórios habilitados para as consultorias. Outra forma seria o trabalho conjunto com as
prefeituras municipais, que se responsabilizariam por montar equipes de arquitetos para
elaboração desses projetos, que, por sua vez, receberiam dos órgãos financiadores os
contemplados com os créditos financeiros. Seja um caso ou o outro, a entidade
financiadora daria incentivos (redução de taxas, maiores prazos de pagamento) para que o
proponente optasse por essa assessoria técnica, de modo que, a partir daí, o projeto fosse
devidamente documentado e aprovado junto ao departamento licenciador de obras
municipais.
Os ganhos nessa sistemática seriam percebidos de forma financeira, ambiental e
social, além de trazer para a formalidade todo um universo de construções que são
executadas de forma clandestina sem a aprovação da prefeitura.
Em termos econômicos, o projeto contribui para a otimização dos espaços, redução
na quantidade de materiais e diminuição dos custos no uso futuro pela minimização no
consumo de energia elétrica. Em termos ambientais, é possível ter unidades bem
ventiladas, iluminadas e, consequentemente, mais salubres, e os ganhos sociais são
percebidos pela maior integração com o entorno e respeito à legislação urbanística.
Essa “sociabilização” do projeto de arquitetura contribuirá também para o debate
acerca da popularização desse instrumento, comumente associado a uma elite, mas que tem
papel imprescindível na construção do espaço urbano, mais ainda se a pretensão for por
espaços sustentáveis. Outra questão é que o projeto de habitação popular ou de interesse
307
social precisa avançar para outros modelos, além da fórmula dos conjuntos habitacionais, e
alcançar o espaço do cotidiano, a arquitetura do homem comum. A proliferação de projetos
resultaria num “efeito cascata” através da percepção por outros moradores das diferenças
estruturais e vantagens de uma edificação projetada para uma espontânea.
A segunda linha de ação, além do acesso ao projeto, reside no “controle” da compra
dos materiais de construção e do mobiliário. Segundo a Associação Brasileira da Indústria
de Materiais de Construção (Abramat), a Associação Nacional dos Comerciantes de
Material de Construção (ANAMACO) e o Dieese, após apresentar um crescimento
vertiginoso de cerca de 10% em 2010, o crescimento do setor de materiais de construção
decaiu para uma taxa de 4% em 2011 e 1,4% em 2012. Entretanto, o segmento mostra-se
confiante quando divulga a retomada do crescimento, com 4% em 2013, e uma expectativa
na ordem de 7% para 2014286
.
Outros dados podem ser obtidos tomando como exemplo o CONSTRUCARD da
Caixa Econômica Federal, uma linha de financiamento para a aquisição de materiais de
construção em geral, armários embutidos, piscina, elevador e aquecedor solar, com fundos
oriundos do FGTS, onde o cliente tem de 2 a 6 meses para realizar as compras e até 8 anos
para pagar as prestações. Segundo a entidade financiadora, esse sistema de crédito
movimentou, nos últimos 2 anos, um montante no valor de R$ 22,5 bilhões287
,
representando um aumento de 25% entre 2012 e 2013288
, o que demonstra que esse
instrumento está em pleno crescimento.
Além do CONSTRUCARD, a CAIXA oferece outras opções de crédito que podem
ser utilizados para a compra de móveis e eletrodomésticos, a exemplo do “Minha Casa
Melhor” e do “Moveiscard”. No primeiro caso, o proponente tem até 5 mil reais de crédito
para comprar móveis e eletrodomésticos e um prazo de 48 meses para pagar e foi criada
em novembro de 2013 para atender aos beneficiários do Programa Minha Casa, Minha
Vida (PMCMV). Essa linha de financiamento, além de restringir os itens de compra,
estipula um valor máximo para cada um deles, limitado ao máximo do empréstimo, é
permitida a compra de: guarda-roupa, cama e/ou colchão, mesa com cadeiras, sofá, estante,
286
Dados disponíveis em www.anamaco.com.br, www.abramat.org.br, www.dieese.org.br. 287
Assessoria de Imprensa da Caixa Econômica Federal – Divisão Sergipe. 288
Dados fornecidos pela Assessoria de Imprensa da Caixa Econômica Federal – Divisão Sergipe.
308
móveis para cozinha, refrigerador, fogão, micro-ondas, lavadora de roupa, TV, computador
e tablet.
O segundo caso refere-se a uma linha de crédito exclusiva para clientes do
PMCMV e correntistas do banco, com limite de financiamento variando de 10 mil reais a
20 mil reais, respectivamente. O prazo estipulado é de 2 meses para compra e máximo de 5
anos para pagamento, e, nesse caso, não existem restrições quanto aos itens de compra nem
a valores individuais dos produtos a serem adquiridos.
Esses exemplos de microcrédito exemplificam as possibilidades de conjugação
entre ações sustentáveis e mecanismos já implantados de apoio à construção. Neste caso,
também poderia haver o incentivo a compra de materiais de construção dentro de certas
características ambientais.
Assim, os clientes poderiam adquirir os materiais de construção ou bens móveis
desde que inclusos numa lista pré-estabelecida pela entidade financiadora, que, por sua
vez, selecionaria segundo pré-requisitos de sustentabilidade ambiental. Torneiras
temporizadas e com arejador, vasos sanitários com duplo acionamento, chuveiro aquecido
com sistema solar, cimento de alto forno (CP III) ou pozolânico (CP IV)289
, madeira
certificada, componentes modulados, dentre outros, são exemplos de materiais de
construção com redução do impacto ao meio ambiente. Na sua produção ou utilização,
quanto ao mobiliário, podem-se selecionar fabricantes certificados pela série ISO 14000 e
eletrodomésticos certificados pelo Inmetro, com selo Nível A de eficiência.
A seleção dos produtos e fornecedores deverá seguir rigorosos critérios técnicos,
orientados pelas normas da ABNT e comprovados por inspeção nos componentes. Essas
medidas podem servir de mecanismo indutor ao mercado não só para aumentar as opções
de bens menos impactantes, incrementando a justa concorrência, mas também pela
modernização do pátio fabril com processos mais limpos.
Em resumo, trata-se de uma iniciativa relativamente simples, que se apropria de um
instrumento largamente utilizado, mas enriquecendo-lhe com novas ações. Mesmo que
atrelado ao sistema financeiro e assumindo suas distorções, a exemplo de taxas de juros
elevadas, não se pode deixar de considerar a capacidade de abrangência dos sistemas de
289
Cimentos produzidos com a redução do uso de recursos naturais não renováveis através da adição de
resíduos (escórias ou cinzas volantes) ou materiais abundantes (pozolana produzida com argila calcinada)
(JOHN; PRADO; 2010).
309
microcrédito e seu status consistente como um mecanismo de incentivo à construção. É
justamente nessa vertente, na capacidade de ampliação, de atingir a todas as camadas
sociais que se consolida essa proposta. As ações também não podem ter caráter impositivo,
mas de incentivo, com privilégios para aqueles que optarem pela sistemática. Com o tempo
e a visibilidade dos ganhos, as medidas poderão se tornar práticas usuais.
Espera-se, com isso, superar o obstáculo do acesso, ao menos a parte das benesses
da sustentabilidade, tanto da informação (projeto), quanto do bem em si (materiais de
construção). Por seu caráter de uma proposta alternativa, com o devido distanciamento das
certificações, não se pode esperar que tenha a mesma profundidade destas, assim como seu
rigor tecnológico ou eficiência, contudo, certamente, baseia-se em um lastro mais
democrático e, consequentemente, mais ético.
Com visto no segundo capítulo, a ética, ao assumir as questões do dia-a-dia da
contemporaneidade, submetida aos imperativos do tempo e das singularidades dos arranjos
sociais, das profissões e suas ações, e ao se desdobrar em outros campos, em éticas
aplicadas, é, constantemente, desafiada a dar significado às questões do mundo atual.
Entretanto, mesmo revestida desses novos contornos, dessa aparente renovação, a ética
sempre estará assentada sobre seus princípios fundamentais, do bem, da liberdade da
pessoa, do ser autônomo e livre.
Esse direito do indivíduo, ao ser reportado ao campo dos espaços edificados,
descortina um novo campo da ética aplicada, a “ética da construção”, que vai além da
construção sustentável, uma vez que nela se superpõe e se faz na responsabilidade e na
integridade com todos, deve ser levada em consideração desde o planejamento do
empreendimento até a sua finalização, sempre com vistas à melhoria do ambiente e da
qualidade de vida das pessoas.
Sob essa perspectiva, a proposta alternativa junto aos instrumentos de microcrédito,
anteriormente apresentada, abre espaço para ser interpretada como uma proposta mais ética
do que sustentável, o que não deixa de ser verdade.
Na medida em que centra sua ação no direito à informação, nesse caso
materializada no subsídio ao projeto de arquitetura, aproxima-se de uma conduta ética que,
mais do que um projeto sustentável, espera um “bom” projeto, com respeito aos
condicionantes ambientais e legais, obviamente, mas também aos anseios de cada um, sua
310
história e seus costumes. Os aspectos ambientais se revelarão por consequência, mas nunca
antecedendo o campo moral.
Essa nova conduta ética, mesmo voltada ao tempo presente, uma vez que expressa
um espaço construído para ser vivido agora, se harmoniza com o pressuposto de respeito às
gerações futuras, fortemente encampado pelo desenvolvimento sustentável, pois a boa
arquitetura perdura no tempo.
Nesse contexto, pode-se concluir que as certificações de edifícios, ao menos as em
vigor no país, não se constitui em instrumento de garantia da sustentabilidade, pelo seu
caráter limitado, evidenciado sob dois aspectos. Primeiramente, faltam-lhes ainda
elementos da esfera econômica, o que faz com que sejam denominadas de certificações
ambientais ou no máximo socioambientais. As avaliações tornaram-se parciais, focadas em
aspectos específicos, sejam energéticos, de consumo de água, de implantação, etc. Isso
retirou de suas metodologias a possibilidade de abordagens mais abrangentes e mais
completas.
Em segundo lugar, todas as certificações apresentam um grau de complexidade que
restringe sua aplicação a um grupo de especialistas, convertendo-se, por sua vez, em
mecanismos caros. Nesse sentido, ainda vai de encontro aos pressupostos éticos clássicos
de livre acesso à informação, afasta-se do cidadão comum e, consequentemente, da
sustentabilidade.
O desafio de se criar um instrumento que valide a construção sustentável ainda
continua, o que leva a ressaltar a legitimidade das certificações enquanto uma alternativa
para se reduzir os impactos ambientais advindos dos processos industriais do setor,
entretanto esses ganhos ainda são usuflídos por poucos, o que aproxima as certificações de
um instrumento da ética utilitarista
A superação dos limites só será construída através do livre debate, no diálogo dos
saberes, na revinculação do homem ao meio ambiente. Assim, a sustentabilidade é elevada
a um patamar de quase utopia, e se a ética sozinha não dá conta de resolver essa questão,
aquela pode ajudar.
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318
ANEXOS
319
ANEXO I
320
321
TABELA 01 – Ações de Sustentabilidade do Sinduscon-CE colhidas na Revista Sinduscon Notícias. (Intervalo da pesquisa janeiro
2010/novembro 2012). a partir de janeiro 2010.
Ano Título da
Informação Fonte/Autor Resumo da Informação Tipo da Ação
Edição 13
01/2010
Pesquisa que
substitui areia por
PET na
construção civil
vence prêmio
www.revistasustentabilidade.com.br
O artigo apresenta, sucintamente, um projeto que
substitui a areia pelo plástico das garrafas de pet
(moído) para fazer argamassa, e, assim, contribuir para a
redução dos impactos causados pela retirada de areia
direto da natureza. A pesquisa foi desenvolvida pela
Universidade Estadual Paulista e venceu a 10ª. Edição
do Prêmio Ecopet, promovido pela Associação
Brasileira da Indústria de Pet.
Informativo de
Pesquisa
Edição 14
02/2010
Pesquisa de
Instituto produz
tijolo à base de
lixo orgânico
www.revistasustentabilidade.com.br
O Instituto Virtual de Mudanças Globais desenvolveu
uma pesquisa para produzir tijolos a partir da mistura de
lixo orgânico compostado, resíduos da construção civil e
cimento, seguindo o mesmo modelo dos blocos de solo-
cimento.
Informativo de
Pesquisa
Edição 15
03/2010
Caixa começa a
distribuir Selo
Azul até julho
www.revistasustentabilidade.com.br
O lançamento do Selo Azul pela Caixa Econômica
Federal visa a certificar empreendimentos que
implantarem projetos de eficiência energética e de
redução de impacto ambiental, com a apresentação de
suas diretrizes básicas.
Informativo de
Programa
Edição 15
03/2010
Caixa começa a
distribuir Selo
Azul até julho
www.revistasustentabilidade.com.br
Projeto oferece casas populares verdes por R$ 1.000,00
o m2; projeto de cinco modelos de habitações verdes
desenvolvidos pela Faculdade de Arquitetura e
Urbanismo da Universidade Federal do Rio de Janeiro,
com investimentos da indústria de cimento Holcim. Os
projetos variam de 46 a 68 metros quadrados, com
previsão de economia de energia e água, conforto
térmico, facilidades para reciclagem e menor geração de
resíduos durante a obra.
Informativo de
Pesquisa
Edição 16
Sustentabilidade e
www.revistasustentabilidade.com.br
Construtora paranaense iHome oferece um sistema de
construção baseado em blocos de solo-cimento, que
dobra a velocidade das empreitadas e diminui a geração
Informativo de
Novo Sistema
Construtivo
322
04/2010 redução de custos de resíduos, resultando numa redução dos custos globais
da obra em torno de 15% a 30%. O sistema permite a
construção desde projetos básicos de casas populares de
33m2, até residências de alto padrão acima de 400m
2.
Edição 16
04/2010
Pesquisadores
adaptam materiais
ao clima do
Nordeste
www.revistasustentabilidade.com.br
Pesquisa desenvolvida pela Universidade Federal do Rio
Grande do Norte, através da Rede de Pesquisa em
Eficiência Energética de Sistemas Construtivos
(RePEESC), voltada a produção de elementos
construtivos, adequados ao clima do Nordeste brasileiro,
em habitações termicamente confortáveis e com baixo
consumo de energia.
Informativo de
Pesquisa
Edição 17
05/2010
Tinta regula
temperatura
www.revistasustentabilidade.com.br
Tinta produzida pela Sherwin-Williams que, segundo o
fabricante, é capaz de regular a temperatura interna do
imóvel, deixando-o mais fresco no verão e mantendo a
temperatura interior no inverno.
Informativo de
Novo Material
Edição 17
05/2010
Universidades
lançam MBA de
construção
sustentável
www.revistasustentabilidade.com.br
Trata do lançamento do curso em MBA de Construção
Sustentável, organizado pelo Green BuildingCouncil
Brasil, Universidade Paulista e o Instituto Brasileiro de
Extensão e Cursos.
Informativo de
Curso
Edição 18
05/2010
AllAbout Energy
movimenta setor
de energias
renováveis
Não informada Destaque para o evento AllAbout Energy, feira sobre
energias renováveis, realizada na capital Fortaleza.
Informativo de
Evento
Edição 18
05/2010
Casa Azul
estimula projetos
de ecoeficiência.
www.revistasustentabilidade.com.br Trata da divulgação sucinta dos critérios do Selo Casa
Azul da Caixa Econômica Federal.
Informativo de
Programa
Edição 18
05/2010
Cooperação
técnica para
gestão de
resíduos urbanos
www.revistasustentabilidade.com.br
Informa sobre a assinatura de um protocolo de
cooperação técnica entre o Estado do Rio de Janeiro e o
Governo de Portugal, nas áreas de gerenciamento de
resíduos urbanos e saneamento básico.
Informativo de
Programa
323
Edição 19
07/2010
Dia Nacional da
Construção Social
2010
Não informada
Divulgação do evento Dia Nacional da Construção
Social 2010, em prol da cidadania para todos os
funcionários da construção e do mercado imobiliário e
seus familiares.
Informativo de
Evento
Edição 20
08/2010
Construir com
sustentabilidade:
projeto busca
minimizar
problemas
ambientais
www.revistasustentabilidade.com.br
www.cbic.org.br
Trata do Programa de Construção Sustentável, lançado
pela Câmara Brasileira da Indústria da Construção, que
engloba temas como água, mudanças climáticas,
desenvolvimento humano, energia, resíduos, materiais e
sistemas, meio ambiente, infraestrutura e
desenvolvimento urbano.
Informativo de
Programa
Edição 21
09/2010
Construção
sustentável: em
respeito ao meio
ambiente
Não informada
Reportagem com o engenheiro Eugênio Montenegro
(Diretor de Investimentos Internacionais do Sinduscon-
CE) onde aborda a importância por se adotar os
preceitos da construção sustentável e seus benefícios
ambientais e econômicos.
Entrevista
Edição 22
10/2010
Programa
Qualidade de
Vida na
Construção:
oportunizando
melhorias para o
trabalhador da
construção
Paula Frota
Vice-presidente do Sinduscon-CE; a reportagem divulga
o Programa Qualidade de Vida na Construção que
consiste numa série de eventos e atividades com o
objetivo de levar saúde, educação, esporte, segurança,
capacitação profissional e lazer para os trabalhadores da
construção civil. Distribui-se em três atividades
principais: Oficinas da Construção Social, Dia Nacional
da Construção Social e Jogos da Construção.
Informativo de
Programa
Edição 22
10/2010
3º. Simpósio
Brasileiro de
Construção
Sustentável
www.sbcs.net.br
Divulgação do evento 3º. Simpósio Brasileiro de
Construção Sustentável, com a temática
“Sustentabilidade nos Negócios e Instrumentos de
Mudança”, realizado em São Paulo.
Informativo de
Evento
Edição 23
11/2010
Inovações para a
Construção Civil Roberto Sérgio (Presidente do Sinduscon-CE)
Trata de um evento organizado pelo CBIC, Sinduscon-
CE e Sinduscon-BA, no sentido de promover o debate
sobre sustentabilidade, capacitação e novidades
tecnológicas para o setor.
Informativo de
Evento
324
Edição 24
01/ 2011
Sinduscon-CE
lança nova turma
de consultoria
para o PBQP-H
Sinduscon-CE
Trata do lançamento para consultoria do Programa
Brasileiro de Qualidade e Produtividade do Habitat,
organizado pelo Sinduscon-CE para as construtoras do
Estado.
Informativo de
Programa
Edição 24
01/ 2011
Construção com
menos impactos
ambientais
www.24horasnews.com.br/índex.php?mat=350991.
Apresenta a viabilidade (vantagens técnicas e
construtivas) na utilização de tijolos ecológicos como
alternativa de aumentar a sustentabilidade nas
construções.
Informativo de
Novo Material
Edição 25
02/2011
Telhados brancos
podem ajudar a
reduzir
aquecimento
global
Green BuildingCouncil Brasil
Relata a campanha do Green BuildingCouncilintitulada
“Onedegreeless”, que tem por objetivo ajudar a reduzir
a temperatura do planeta, a partir da pintura branca dos
telhados.
Informativo de
Programa
Edição 26
03/2011
Edificar Lean Sinduscon-CE
Divulgação da Coletânea Edificar Lean, com o novo
modelo de construção enxuta. O Lançamento do livros
teve o apoio do Sinduscon-CE e Câmara Brasileira da
Indústria da Construção.
Informativo de
Lançamento
Editorial
Edição 27
05/2011
Empresas do
Nordeste são
destaques em
responsabilidade
social
Sinduscon-CE
Relata os dados de uma pesquisa realizada pela Câmara
Brasileira da Indústria da Construção sobre
responsabilidade social empresarial.
Informativo de
Pesquisa
Edição 28
06/2011
Construção Civil
debate norma de
desempenho de
edifícios
Sinduscon-CE
Trada da divulgação dos trabalhos realizados pelo
Sinduscon-CE junto a Câmara Brasileira da Indústria da
Construção na revisão dos parâmetros da NBR 15.575.
Informativo de
Nova Legislação
Edição 28
06/2011
A Cultura da
Inovação na
Construção Civil
Sinduscon-CE
A reportagem divulga o evento ocorrido na capital do
estado intitulado “VII Seminário de Gestão da Inovação
Tecnológica no Nordeste”, tema considerado
fundamental para melhorar a qualidade das obras e
consequentemente a sustentabilidade.
Informativo de
Evento
Sinduscon Sinduscon-CE Divulgação de evento, organizado pelo Sinduscon-CE, Informativo de
325
Edição 29
07/2011
promove
Workshop de
Resíduos Sólidos
sobre a problemática da geração de resíduos sólidos na
construção civil e seu gerenciamento.
Evento
Edição 34
01/012
Comissão estuda
impacto da
Norma de
Desempenho na
construção civil
www.sinduscon-ce.org/ce
Informa sobre a reabertura da comissão de estudos da
NBR 15.575 e divulga o curso “Desmistificando a NBR
15.575”, promovido pelo Sinduscon-CE em parceria
com a Universidade Federal do Ceará.
Informativo de
Nova Legislação
Edição 3502/2012
Comam aprova
termos de
implantação do
Certificado Fator
Verde em
Fortaleza
Sinduscon-CE
Relata a aprovação da certificação Fator Verde pelo
Conselho Municipal do Meio Ambiente, que certifica
projeto e/ou obra de construção civil que desenvolveram
conceitos durante o planejamento e execução, visando a
sustentabilidade ambiental do empreendimento.
Informativo de
Programa
Edição 38 e 39
07/ 2012
Meio ambiente no
84º ENIC Sinduscon-CE
Informativo sobre o tema da sustentabilidade discutido
no 84º. Encontro Nacional da Indústria da Construção.
Informativo de
Evento
Edição 38 e 39
07/ 2012
Selo Azul Caixa –
Estímulo à
construção
sustentável
Sinduscon-CE Informativo sobre o Selo Azul da Caixa Econômica
Federal que foi apresentado durante o 84º. Enic.
Informativo de
Programa
Edição 38 e 39
07/ 2012
Projeto Minha
Casa, Minha Vida
II
Sinduscon-CE
Informativo sobre debate ocorrido durante o 84º. Enic
sobre “Como construir mais sem agredir tanto o meio
ambiente?”, com foco nas habitações de interesse social
a exemplo das executadas pelo programa Minha Casa,
Minha Vida.
Informativo de
Evento
Edição 40
09/2012
Norma de
Desempenho
entrará em vigor
em 2013
Sinduscon-CE
Informativo acerca da NBR 15.575 e os avanços
esperados a partir de sua efetivação. Destaca também a
cartilha explicativa da norma elaborada pelo Sinduscon-
CE.
Informativo de
Nova Legislação
Edição 40
09/2012
Taxa
Compensatória
Ambiental
Sinduscon-CE
Trata da suspensão da Taxa Compensatória Ambiental,
por ordem judicial, que era cobrada de todas as
construtoras do Ceará conforme legislação municipal.
Informativo de
Nova Legislação
326
ANEXO II
327
Pg.01
328
Pg.02
329
Pg.03
330
Pg.04
331
Pg.05
332
Pg.06
333
ANEXO III
334
TABELA 02 – Ações de Sustentabilidade do Sinduscon-BA colhidas na Revista Informativo Sinduscon-BA (Intervalo da pesquisa
novembro 2010/dezembro 2012).
Ano Título da Informação Fonte/Autor Resumo da Informação Tipo da
Ação
Novembro/dezembro
2010
Projeto leva Educação Básica aos
Trabalhadores Sinduscon-BA
Trata de um convênio de cooperação técnica entre o Sinduscon-BA, a
Secretaria Municipal de Trabalho de Salvador e o Sesi-BA, na oferta de
cursos de ensino fundamental para os trabalhadores da construção civil,
nos bairros onde ocorre a maior concentração de operários do setor.
Informativo
de Curso
Novembro/dezembro
2010 Olimpíadas da Construção Sinduscon-BA
Divulgação da 4ª. Olimpíada da Construção com o objetivo de integrar e
incluir os trabalhadores da construção, desde operários a dirigentes.
Informativo
de Evento
Março/abril de 2011 Parceria Visa Qualificação de
Terceirizados Sinduscon-BA
O Sinduscon-BA e a Associação Brasileira da Indústria de Materiais de
Construção (Abramat) montam parceria com o intuído de qualificar para
a inovação trabalhadores terceirizados que prestam serviços ao setor.
Informativo
de Curso
Março/abril de 2011 Baiano Recebe Prêmio CBIC Sinduscon-BA
Premiação de aluno da UFBA no 17º. Prêmio CBIC de Inovação
Tecnológica que desenvolveu uma forma de fácil montagem e
desmontagem que reduz o uso de insumos, aumenta a vida útil do
material e pode ser usada em diferentes obras, sem perder sua
integridade.
Informativo
de Projeto
Julho/agosto de 2011 Dia Nacional da Construção Social Sinduscon-BA
Divulgação do evento “Dia Nacional da Construção Social” onde
oferece uma série de serviços, procedimentos, informações e lazer aos
funcionários das empresas associadas ao sindicato e seus familiares.
Informativo
de Evento
Julho/agosto de 2011 Sustentabilidade é Foco do Setor Sinduscon-BA Trata da divulgação do evento “GreenBuilding Brasil – Conferência
Internacional & Expo”, sobre sustentabilidade na construção civil.
Informativo
de Evento
Julho/agosto de 2011
Construir Bahia Engloba Seminários
sobre o Desempenho e Tecnologia
para o Desenvolvimento Sustentável
Sinduscon-BA
Divulgação do Seminário Tecnológico da Construção Civil e do
Seminário de Inovação da Construção Civil, realizados em parceria com
o SENAI e o SEBRAI, ambos acontecidos em paralelo com a Feira
Construir Bahia.
Informativo
de Curso
Julho/agosto de 2011 Programa para Fornecedores Sinduscon-BA
O Sindicato e a Coopercon-BA montam curso do Programa de
Qualificação do Fornecedor, que tem como meta avaliar, qualificar e
certificar fornecedores potenciais ou efetivos, no que diz respeito ao
controle de seus processos de resíduos e à prevenção de acidentes.
Informativo
de Curso
Janeiro/fevereiro de
2012 PIT Incentiva Construção Civil Sinduscon-BA Divulgação do Programa de Inovação Tecnológica, criado pelo CBIC.
Informativo
de Programa
Maio/junho de 2012 Campanha Reúne Empresários Sinduscon-BA Trata do lançamento do “Programa Nacional de Prevenção de Acidentes Informativo
335
do Trabalho – Trabalho Seguro”, parceria local do sindicato com o TRT-
BA, com o objetivo de contribuir para a criação de uma cultura de
prevenção de acidentes.
de Programa
Maio/junho de 2012 Construção Enxuta Diminui
Desperdícios Sinduscon-BA
Divulgação do “Workshop Construção Enxuta”, como meta do sindicato
em divulgar essa metodologia para ser adotada pelas empresas
associadas.
Informativo
de Curso
Maio/junho de 2012 Curso para Inovação Sinduscon-BA
Em parceria com o IEL, apoio da FAPESB, UFBA e SENAI-BA, o
Sinduscon-BA inicia curso de Extensão em Gestão da Inovação da
Construção Civil.
Informativo
de Curso
Maio/junho de 2012 Missão Técnica Ecobuilding 2012 Sinduscon-BA
Diretoria do Sinduscon-BA visita à feira de construção sustentável,
Ecobuilding, em Londres.
Informativo
de Evento
Julho/agosto de 2012 Concurso de Grafite valoriza Ecoart Sinduscon-BA
Concurso entre grafiteiros para pintura de painéis para decorar os
tapumes da obra da nova sede do sindicato, que teve como temática a
construção sustentável.
Informativo
de Evento
Novembro/dezembro
de 2012
Grupo Técnico Elabora Proposta
para Gerenciamento de Resíduos Sinduscon-BA
Representantes do Sinduscon-BA integram equipe nacional para elaborar
proposta do Plano de Gerenciamento de Resíduos da Construção,
direcionado ao governo federal.
Informativo
de Programa
336
ANEXO IV
337
Pg.01
338
Pg.02
339
ANEXO V
340
TABELA 01 – Base Comparativa Confrontada com as Certificações LEED, AQUA, CASA AZUL E PROCEL EDIFICA (CAT. 01).
CATEGORIA
1-ESTRATÉGIAS DE IMPLANTAÇÃO LEED AQUA CASA AZUL PROCEL EDIFICA
Densidade e conexão urbana
Orientação com relação aos ventos e ao sol.
Remediação de áreas contaminadas
Proteção e restauração do habitat
Paisagismo e redução de ilhas de calor
Equipamentos de lazer, sociais e esportivos
Características do solo
Áreas permeáveis
Acessibilidade
FONTE: AUTOR DA PESQUISA
341
TABELA 02 – Base Comparativa Confrontada com as Certificações LEED, AQUA, CASA AZUL E PROCEL EDIFICA (CAT. 02).
CATEGORIA
2-USO DE ÁGUA LEED AQUA CASA AZUL PROCEL EDIFICA
Medição individualizada
Dispositivos/mecanismos economizadores
Aproveitamento de águas pluviais
Reuso de águas servidas (águas cinzas)
FONTE: AUTOR DA PESQUISA
TABELA 03 – Base Comparativa Confrontada com as Certificações LEED, AQUA, CASA AZUL E PROCEL EDIFICA (CAT. 03).
CATEGORIA
3-USO DE ENERGIA LEED AQUA CASA AZUL PROCEL EDIFICA Geração local de energia/uso de energia verde (solar,
eólica)
Dispositivos/mecanismos economizadores
Equipamentos comprovadamente eficientes
FONTE: AUTOR DA PESQUISA
342
TABELA 04 – Base Comparativa Confrontada com as Certificações LEED, AQUA, CASA AZUL E PROCEL EDIFICA (CAT. 04).
CATEGORIA
4-MATERIAIS E RESÍDUOS LEED AQUA CASA AZUL PROCEL EDIFICA
Construção modular/uso de pré-moldados
Gestão de resíduos - rcd
Materiais de alta performance Uso de materiais certificados, com origem comprovada
(madeira) e de baixo impacto ambiental
Reuso e reciclagem de materiais e componentes
FONTE: AUTOR DA PESQUISA
TABELA 05 – Base Comparativa Confrontada com as Certificações LEED, AQUA, CASA AZUL E PROCEL EDIFICA (CAT. 05).
CATEGORIA
5-PREVENÇÃO DA POLUIÇÃO LEED AQUA CASA AZUL PROCEL EDIFICA
Gestão de efluentes durante a obra
Controle da emissão de substâncias causadoras do efeito
estufa e que causem dano a camada de ozônio
Uso de materiais locais reduzindo as distâncias com
transporte
Escolha de materiais com base na análise do ciclo de vida
(acv)
Implantação de coleta seletiva
FONTE: AUTOR DA PESQUISA
343
TABELA 06 – Base Comparativa Confrontada com as Certificações LEED, AQUA, CASA AZUL E PROCEL EDIFICA (CAT. 06).
CATEGORIA
6-QUALIDADE DO AMBIENTE INTERNO LEED AQUA CASA AZUL PROCEL EDIFICA Otimização da ventilação natural/conforto térmico (materiais
e dimensionamento)
Controle da iluminação natural e artificial Controle interno de odores, de poluentes e produtos
químicos/materiais de baixa emissão
Controle de ruídos
FONTE: AUTOR DA PESQUISA
TABELA 07 – Base Comparativa Confrontada com as Certificações LEED, AQUA, CASA AZUL E PROCEL EDIFICA (CAT. 07).
CATEGORIA
7-GESTÃO AMBIENTAL DO PROCESSO LEED AQUA CASA AZUL PROCEL EDIFICA
ESCOLHA DE PRODUTOS, SISTEMAS E PROCESSOS
CONSTRUTIVOS (PROJETO) QUE GARANTAM A
DURABILIDADE DA CONSTRUÇÃO E SUA
MANUTENÇÃO E FORNECEDORES QUE NÃO
PRATIQUEM A INFORMALIDADE
FLEXIBILIDADE DO PROJETO
REALIZAR PESQUISAS DE PÓS-OCUPAÇÃO
344
FONTE: AUTOR DA PESQUISA
TABELA 08 – Base Comparativa Confrontada com as Certificações LEED, AQUA, CASA AZUL E PROCEL EDIFICA (CAT. 08).
CATEGORIA
8-DESEMPENHO ECONÔMICO LEED AQUA CASA AZUL PROCEL EDIFICA
Processos produtivos em bases industriais mais producentes
Mensuração do retorno do capital investido Mensuração dos benefícios com investimentos em
sustentabilidade
FONTE: AUTOR DA PESQUISA
TABELA 09 – Base Comparativa Confrontada com as Certificações LEED, AQUA, CASA AZUL E PROCEL EDIFICA (CAT. 09).
CATEGORIA
9-PRÁTICAS SOCIAIS LEED AQUA CASA AZUL PROCEL EDIFICA
Educação ambiental e profissional dos empregados
Desenvolvimento pessoal dos empregados
Parcerias com a comunidade do entorno
Educação ambiental do moradores
Capacitação dos moradores para gestão futura do
empreendimento
Mitigação de riscos sociais
Ações para geração de emprego e renda envolvendo os
moradores e população do entorno
FONTE: AUTOR DA PESQUISA
UNIVERSIDADE FEDERAL DE SERGIPE
PRÓ-REITORIA DE PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISA
NÚCLEO DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ESTUDOS DO SEMI-ÁRIDO
DOUTORADOEM DESENVOLVIMENTO E MEIO AMBINETE
345
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PRODEMA/UFS – Cidade Universitária Prof. José Aloísio de Campos – Pólo de Gestão
Av. Marechal Rondon- S/N – CEP: 49100-000 – Aracaju - Sergipe – Brasil
Tel./Fax: (79) 212-6783 – E-mail: [email protected] /Home Page: www.pos.ufs.br/prodema