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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS – UFMG
INSTITUTO DE CIÊNCIAS BIOLÓGICAS – ICB
GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS BIOLÓGICAS – NOTURNO
DISCIPLINA: TAXONOMIA DE CRIPTÓGAMAS
ALUNOS: ALINNE DO CARMO COSTA; ARYANE ÉVELYN BARBOSA NUNES; CARLOS RICHARD DA COSTA
SANTOS; CAROLINA VEIGA DO NASCIMENTO; FABRÍCIO DE SOUZA ASSIS; FERNANDA ARANHA
MARQUES; FILIPE LEAL DE LORENZO
O FILO BASIDIOMYCOTA
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1. FILO BASIDIOMYCOTA
Os fungos foram agrupados em um único reino, Reino Fungi, por Whittaker em 1969,
onde procurou-se reunir todos os fungos com características típicas. A classificação
atualmente aceita pela maioria dos Micologistas foi proposta por Alexopoulos (1996), embora
já exista proposta mais recente conforme publicada por Kirk (2001), agrupando os fungos com
base em estudos de biologia molecular.
A classificação proposta por Alexopoulos agrupa no Reino Fungi os Filos
Chytridiomycota, Zygomycota, Ascomycota e Basidiomycota.
REINO FUNGI
Filo Chytridiomycota
Classe Chitridiomycetes
Filo Zygomycota
Classe Zygomycetes
Ordem Mucorales
Ordem Enthomophthorales
Ordem Zoopagales
Ordem Dimargaritales
Ordem Endogonales
Ordem Kickxellales
Ordem Glomales
Classe Trichomycetes
Ordem Harpellales
Ordem Amoebidlales
Ordem Assellariales
Ordem Eccrinales
O Filo Basidiomycota reúne os fungos que formam, durante o ciclo reprodutivo
sexuado, células especiais, os basídios, onde se originam os esporos sexuais.
FILO BASIDIOMYCOTA
Classe Basidiomycetes
Ordem Agaricales
Ordem Boletales
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Ordem Russulales
Ordem Aphyllophorales
Ordem Auriculariales
Ordem Ceratobasidiales
Ordem Dacrymycetales
Ordem Tremellales
Ordem Tulasnellales
Ordem Lycoperdales
Ordem Tulostomatales
Ordem Sclerodermatales
Ordem Phallales
Ordem Nidulariales
Classe Tellomycetes
Ordem Uredinales
Ordem Septobasidiales
Classe Ustomycetes
Ordem Cryptobasidiales
Ordem Cryptomycocolacales
Ordem Exobasidiales
Ordem Platygloeales
Ordem Sporidiales
Ordem Ustlaginales
Agrupam-se no Filo Basidiomycota fungos conhecidos popularmente como cogumelos
(Figura 1) e orelhas de pau (Figura 2), outros conhecidos como fungos gelatinosos, ferrugens e
carvões, e ainda espécies unicelulares.
Figura 1: Agaricus sp. Figura 2: Ganoderma sp.
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São fungos terrestres na grande maioria, existindo também muitas espécies parasitas
(ferrugens) e ainda outras que estabelecem relações simbiônticas com coccídeos. Nesse grupo
também são encontradas espécies liquenizadas.
Os integrantes do Filo Basidiomycota são difundidos por todo o planeta e talvez seja o
grupo mais visualizado na natureza, devido ao tamanho dos cogumelos e orelhas de pau,
estruturas de reprodução desses fungos.
O micélio desses fungos é constituído por hifas septadas que podem ser simples ou
possuir ansas, estruturas características do grupo, e também conhecidas como septo
dolipórico, cuja função é proporcionar a transferência de um dos núcleos após sua divisão sem
que ocorra impedimento do material citoplasmático de uma célula para outra. Uma outra
característica marcante desses fungos é a produção de esporos (basidiósporos) de origem
sexuada, em uma estrutura especializada denominada basídio (Figura 3) que está localizada
nos basidiomas (cogumelos e orelhas de pau).
Figura 3: Basídios liberando basidiósporos
Muitas espécies de basidiomicetos são degradadoras de madeira e podem ser
divididos em dois grandes grupos: os fungos causadores de podridão branca e os causadores
de podridão parda.
Os primeiros são dotados de um complexo enzimático que os torna capazes de
converter moléculas de celulose, hemicelulose e lignina em água e CO2. A madeira, depois de
sofrer a ação desses fungos, fica com aspecto esponjoso, fibroso ou laminado e com cor
esbranquiçada, o que caracteriza o nome do grupo.
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Os fungos causadores de podridão parda, por sua vez, são responsáveis pela
degradação da celulose e hemicelulose, deixando a madeira com aspecto amorfo e
desintegrado ao final do processo, restando apenas moléculas de lignina modificada de
coloração parda.
Ao que parece, os fungos basidiomicetos causadores de podridão branca são os únicos
organismos capazes de converter lignina em CO2 e água.
No mundo estima-se que o grupo dos Basidiomycota tenha em torno de 30.000
espécies, correspondendo a 37% do número descrito dos fungos verdadeiros (Kirk, 2001).
Dentre esses, no Brasil estima-se um número de 8.897 espécies de Basidiomycota. O
número exato de espécies dos principais grupos é bastante controverso, devido à intensa
mudança na classificação, ocorrida nos últimos anos (Capellari, 1998).
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2. IMPORTÂNCIA MÉDICA / FARMACÊUTICA
Os fungos são conhecidos da humanidade há vários séculos, tanto por seus benefícios
quanto pelos problemas que causam. Muitas doenças humanas, de animais e plantas são
causadas por fungos. Em humanos e animais os fungos podem causar alergias respiratórias e
cutâneas leves ou intensas, dependendo da suscetibilidade e pré-disposição do indivíduo.
Podem causar infecções em mucosas e outros tecidos subcutâneos, assim como infecções
crônicas e letais envolvendo órgãos inteiros. Cada tecido ou órgão do corpo humano pode ser
afetado, com exceção dos dentes.
Os fungos, quando parasitam o homem e outros animais, causam um grupo de
doenças conhecidas como micoses (Figura 4).
Figura 4: Micose em pé humano
Dentro do filo Basidyomicota, há a espécie Cryptococcus neoformans (Figura 5), uma
levedura encapsulada que pode viver tanto em plantas como em animais, causando a
criptocose. A maioria das infecções por C. Neoformans ocorre nos pulmões. Contudo, a
meningite fúngica especialmente na condição de infecção secundária em pacientes com
Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (AIDS), é frequentemente causada por C.
Neoformans, tornando-o um fungo particularmente perigoso. As infecções causadas por este
fungo são raras em pessoas com sistemas imunitários totalmente funcionais. Por esta razão, C.
Neoformans é algumas vezes descrito como um fungo oportunista.
Figura 5: Fotomicrografia de Cryptococcus
neoformans no pulmão de um paciente
com AIDS. A cápsula interior do
organismo apresenta-se corada em
vermelho.
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Os Basidiomycota destacam-se como agentes infecciosos. As basidiomicoses, infecções
fúngicas provocadas por basidiomicetos ou agáricos, vêm sendo registradas cada vez com
maior frequência na literatura médica, principalmente após o advento da AIDS, em 1981.
Lesões da mucosa da boca, abscessos cerebrais, onicomicoses e endocardites já foram
descritas, aumentando o interesse dos micologistas e infectologistas por este tipo de micose
profunda (mais grave).
Algumas espécies de fungos são venenosas, podendo causar a morte a inúmeros
animais, inclusive o homem. Estão incluídos nesta lista os cogumelos brancos do gênero
Amanita (Figura 6).
Figura 6: Amanita virosa
As variedades vermelhas ou amarelas do gênero Amanita, se ingeridas, produzem
efeitos alucinógenos semelhantes aos produzidos pelo LSD (ácido lisérgico), provocando sérios
danos ao sistema nervoso.
O Amanita muscaria é encontrado em bosques, vivendo em associação micorrízica
(ectomicorriza) com várias coníferas, inclusive do gênero Pinus. Os Amanita são pertencentes à
família Amanitaceae (Basidiomycotina, Agaricales) e, embora de aparência inocente e aspecto
apetitoso, quando ingerido pelo homem ou por animais domésticos é muito tóxico por
possuirem compostos ciclo peptídicos, conhecidos como amatoxinas e falotoxinas.
Dependendo da quantidade ingerida, as referidas toxinas são capazes de induzir
alterações no sistema nervoso, levando à alteração da percepção de realidade, perda de
coordenação motora, alucinações, crises de euforia ou depressão intensa. Espasmos
musculares, movimentos compulsivos, transpiração, salivação, olhos lacrimejando, tontura e
vômitos são também sintomas relatados na literatura.
Fungos do gênero Psilocybe (Figura 7) são também produtores de substâncias
alucinógenas, com sérios efeitos ao sistema nervoso. São utilizados por diversos povos em
suas atividades culturais, ou mesmo como drogas. Um exemplo é o Psilocybe cubensis, uma
espécie de cogumelo alucinógeno mundialmente conhecido, que apresenta como principais
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princípios ativos a psilocibina e a psilocina, embora possua em baixas quantidades outros
alcalóides, como anorbaeocistina ou a baeocistina, cuja ação no sistema nervoso humano
ainda é pouco conhecida. Alguns estudiosos acreditam que essas substâncias agem no cérebro
de modo semelhante ao neurotransmissor serotonina, gerando bem estar e até letargia. São
cogumelos de pequeno porte, geralmente apresentando características que os tornam
facilmente reconhecíveis.
Figura 7: Psilocybe mexicana
Os Basidiomycota também possuem propriedades farmacêuticas, pois por habitarem
ambientes inóspitos, esses fungos desenvolveram mecanismos de sobrevivência, dentre eles a
produção de metabólitos.
Essas substâncias podem ser extraídas dos corpos de frutificação (basidiomas), da
biomassa da cultura miceliana ou do substrato nutritivo onde o micélio do fungo se
desenvolveu (meios de culturas sólidos ou líquidos).
A partir de 1940, programas de triagem já detectavam a atividade antibiótica dos
Basidiomycota e, destes então, foi obtido o metabólito pleuromutilina, que, após modificação
estrutural originou a tiamulina, uma substância com atividade antibacteriana usadano
tratamento de micoplasma bovino. Os contínuos estudos e avanços tecnológicos vêm
elucidando não só a atividade antibiótica como também demonstrando outras propriedades
medicinais dos basidiomicetos. Assim, aos diferentes metabólitos de basidiomicetos é
atribuída uma ou mais ações terapêuticas, tais como: atividade antibacteriana, antifúngica,
antiviral, citotóxica, imunomoduladora, analgésica, cardiovascular, antiinflamatória, psicoativa,
hipoglicemiante, hipolipemiante, entre outras.
No Brasil há registros do uso medicinal e alimentício dos fungos pelos povos indígenas.
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As espécies Geaster saccatus (Figura 8) e Trametes cupreorosea são empregadas pelos
indígenas no tratamento de hemorragias e distúrbios uterinos; enquanto, Pycnoporus
sanguineus em hemoptise.
Figura 8: Geaster saccatus
Em um trabalho de triagem de diferentes extratos de fungos basidiomicetos
encontrados em ecossistemas brasileiros, foi detectada a atividade antimicrobiana de diversos
metabólitos secundários. Foi reconhecida a capacidade da agrocibina, metabólito obtido da
espécie Agrocybe dura (Figura 9), de inibir o crescimento de microorganismos como B.
mycoides, B. subtilis, E. coli, K. pneumoniae, Mycobacterium pheli, M. smegmatis,
Photobacterium fischeri, P. aeruginosa e S. aureus.
Além disso, o mesmo trabalho, de Rosa et al. (2003), descreveu a forte ação
antifúngica do gênero Oudemansiella, sugerida pela substância oudemansina, e indicou outras
várias aplicações médico-farmacêuticas dos Basidiomycota, até mesmo contra outros tipos de
fungo.
Figura 9: Agrocybe dura
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Imunomoduladores, imunopotenciadores ou também chamados modificadores de
resposta biológica (MRB) são substâncias capazes de estimular a resposta imune do organismo
humano e, portanto, são empregados no tratamento e prevenção de câncer, doenças de
imunodeficiência ou quaisquer estados de depressão da imunidade. Em 1969, pesquisas
comprovaram a atividade antitumoral de extratos aquosos obtidos de basidiomicetos da
família Polyporaceae (Figura 10).
Figura 10: Exemplo de fungo da família Polyporaceae
Alguns compostos produzidos por Pleurotus pulmonarius e Bjerkandera adusta
apresentam ação eficaz no combate a nematódeos.
Da espécie Agrocybe perfecta, presente em ecossistemas brasileiros, foi obtida a
agrocibina, composto que apresentou atividade antiparasitária eficaz no combate a formas
tripomastigotas de Trypanosoma cruzi.
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3. IMPORTÂNCIA ECONÔMICA
Os três grupos de fungos pertencentes à divisão Basiodiomycota apresentam grande
importância econômica. Duas delas são importantes patógenos de plantas, os Teliomycetes,
representados pelas ferrugens, e Ustomycetes, representados pelos carvões, e a última, os
Basidiomycetes, são representados pelos cogumelos e orelhas-de-pau, tendo grande
importância na indústria alimentícia.
A classe Basidiomycetes inclui os cogumelos que são seus representantes mais
importantes. Dentre eles estão os fungos tóxicos, alucinógenos e os fungos comestíveis, como
os champignons (Figura 11), shiitakes (Figura 12) e shimejis (Figura 13), que movimentam mais
de 1 bilhão de dólares por ano em todo o mundo.
Figura 11: Champingnons Figura 12: Shiitakes Figura 13: Shimejis
Os fungos da classe Teliomycetes são fitopatógenos, e dentre as doenças mais sérias
estão a ferrugem-preta dos cereais, a ferrugem-branca dos pinheiros, as ferrugens do café, da
maçã e do amendoim. Têm grande importância econômica chegando a causar prejuízos anuais
de bilhões de dólares na agricultura.
Todos os membros de Ustomycetes também são parasitas de angiospermas e são
comumente referidos como carvões (Figura 14). O nome “carvão” é devido à aparência escura,
fuliginosa e pulverulenta dos esporos de resistência. Economicamente são muito importantes,
pois atacam cerca de 4.000 espécies de plantas, incluindo as destinadas à alimentação, como o
milho, a aveia e o trigo.
Figura 14: Fungo do tipo “carvão” parasitando
eucalipto
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4. IMPORTÂNCIA ECOLÓGICA
Os fungos também trazem benefícios à cadeia alimentar, reciclando elementos vitais.
Pelo uso de enzimas extracelulares, como as celulases, os fungos promovem a decomposição
de partes duras das plantas, que não podem ser digeridas pelos animais. Juntamente com as
bactérias hererotróficas, os fungos são os principais decompositores da biosfera, quebrando a
matéria orgânica e reciclando o carbono, o nitrogênio e outros componentes, que são
liberados no solo e no ar.
Quase todas as plantas dependem de simbioses com fungos, conhecidas como
micorrizas, que auxiliam as raízes das plantas a absorverem minerais e água do solo. Os fungos
também são valiosos para os animais. Algumas formigas cultivam fungos para quebrar a
celulose e a lignina presentes nas plantas, gerando glicose, que as formigas podem então
digerir.
Todos os fungos são quimio-heterotróficos, necessitando de componentes orgânicos
como fontes de energia e carbono. Os fungos são aeróbicos ou anaeróbicos facultativos, e
somente alguns fungos anaeróbicos são conhecidos.
Os fungos geralmente são adaptados a ambientes que poderiam ser hostis a bactérias.
Os fungos são quimio-heterotróficos e, assim como as bactérias, absorvem nutrientes em vez
de ingeri-los, como fazem os animais. Diferem das bactérias em determinadas necessidades
ambientais e nas características nutricionais apresentadas a seguir:
Os fungos normalmente crescem melhor em ambientes cujo pH é próximo a 5, que é
muito ácido para o crescimento da maioria das bactérias.
Quase todos os fungos são aeróbios. A maioria das leveduras é anaeróbica facultativa.
A maioria dos fungos é mais resistente à pressão osmótica que as bactérias; muitos,
consequentemente, podem crescer em concentrações relativamente altas de açúcar ou sal.
Os fungos podem crescer em substâncias com baixo grau de umidade, em geral tão
baixo que impede o crescimento de bactérias.
Os fungos necessitam de menos nitrogênio para um crescimento equivalente ao das
bactérias.
Os fungos com frequência são capazes de metabolizar carboidratos complexos, como a
lignina (um dos componentes da madeira), que a maioria das bactérias não pode utilizar como
nutriente.
Essas características permitem que os fungos se desenvolvam em substratos diversos
como paredes de banheiro, couro de sapatos e jornais velhos.
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Os fungos podem ser predadores, causadores de doenças, apreciados na culinária e
formar associações simbióticas com plantas.
4.1. SIMBIOSE
“Viver junto”. É uma associação íntima e duradoura entre organismos de espécies
diferentes. Algumas relações simbióticas, principalmente as que causam doenças, são do tipo
parasitismo. Uma espécie (o parasita) beneficia-se da associação e a outra (o hospedeiro) é
prejudicada. Apesar de muitos fungos serem parasitas, outros estão envolvidos em relações
simbióticas do tipo mutualismo – isto é, a associação é benéfica para ambos os organismos.
Duas dessas simbioses mutualistas – líquens e micorrizas – foram e são de
extraordinária importância em capacitar os organismos fotossintetizantes para a conquista dos
ambientes terrestres.
4.1.1. LÍQUENS
Um líquen (Figura 15) é uma associação simbiótica mutualista entre um componente
fúngico e uma população de algas unicelulares ou filamentosas, ou de cianobactérias. O
componente fúngico de um líquen é chamado micobionte e o componente fotossintetizante é
denominado fotobionte. O nome científico dado a um líquen é o nome do fungo. Cerca de 98%
das espécies de fungos formadoras de líquens pertencem aos Ascomycotas, as restantes, aos
Basidiomycotas.
Figura 15: Um exemplo de líquen
Os líquens são capazes de viver em alguns dos mais inóspitos ambientes da Terra e,
consequentemente, estão amplamente distribuídos. Eles ocorrem desde as regiões desérticas
e áridas até o Ártico, nos solos nus, em troncos de árvores, em rochas aquecidas pelo sol, em
mourões de cerca e nos picos alpinos castigados pelo vento, em todo o mundo.
Alguns talos de líquens são tão pequenos que mal podem ser vistos a olho nu; outros,
como o “musgo-das-renas”, podem cobrir quilômetros de terra, crescendo até a altura dos
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tornozelos. Uma espécie, Verrucaria serpuloides (Figura 16), é um líquen marinho
constantemente submerso. Os líquens são, frequentemente, os primeiros colonizadores de
áreas rochosas recém-formadas. Além de amplamente distribuídos, os líquens podem ocupar
substratos específicos, tais como superfícies internas de rochas, solo, folhas e cascas de
árvores. Alguns líquens são substratos para outros líquens e fungos parasitas, os quais podem
estar em estreita relação entre si. Acredita-se que um dos principais motivos da sobrevivência
dos líquens é o fato de que eles dessecam muito rapidamente. Os líquens frequentemente se
encontram muito dessecados na natureza, com o conteúdo hídrico variando entre 2 a 10% de
seu peso seco. Quando o líquen desseca, a fotossíntese cessa. Nesse estado de “vida
suspensa” mesmo a luz solar ofuscante ou extremos de calor e frio podem ser suportados por
algumas espécies de líquens. Eles exibem seu crescimento mais luxuriante no litoral e nas
montanhas constantemente enevoadas. O fóssil de líquen mais antigo encontrado data do
período Devoniano Inferior (400 milhões de anos).
Figura 16: Verrucalia serpuloides
A nível celular, as células do fotobionte podem ser consideradas parasitas pelo
micobionte, pois suas hifas aderem estreitamente ao fotobionte. Essas hifas formam
haustórios ou apressórios, hifas especializadas que penetram nas células do fotobionte através
de uma ramificação curta. Essas estruturas estão envolvidas na transferência de carboidratos e
de compostos nitrogenados (no caso das cianobactérias fixadoras de nitrogênio, como Nostoc)
do fotobionte para fungo. O micobionte controla a divisão celular do seu fotobionte. Ele
proporciona ao fotobionte ambiente físico adequado para sua sobrevivência e repassa
nutrientes minerais que absorve, provenientes do ar ou da chuva. Ao nível do líquen como um
todo, a associação é claramente mutualista. Nenhum dos parceiros pode sobreviver sozinho
nos nichos em que ocorrem juntos, como líquens. Hoje o mutualismo é julgado como uma
unidade funcional, e, portanto, a simbiose nos líquens é mutualista.
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Os líquens desempenham papel muito importante nos ecossistemas. Os micobiontes
produzem grande número de metabólitos secundários chamados ácidos liquênicos, os quais,
muitas vezes, constituem 40% ou mais do peso seco do líquen. Esses metabólitos contribuem
para o desgaste das rochas e a formação do solo. Os líquens, dessa forma, participam da
formação dos solos, tornando possível a sucessão posterior de plantas.
Líquens contendo cianobactérias são de importância ímpar, pois contribuem para a
fixação do nitrogênio no solo. Tais líquens são fatores importantes na suplementação de
nitrogênio em muitos ecossistemas, incluindo as florestas no noroeste dos EUA, algumas
florestas tropicais, certas regiões desérticas e nas tundras.
Devido ao fato de não terem qualquer mecanismo de excreção dos elementos
sensíveis a compostos tóxicos, que causam degradação da clorofila das algas ou das
cianobactéria, os líquens são indicadores muito sensíveis dos componentes tóxicos do ar
poluído – particularmente do dióxido de enxofre – e cada vez mais estão sendo utilizados no
monitoramento dos poluentes atmosféricos, especialmente, ao redor das cidades.
Eles servem de alimento para muitos animais, vertebrados e invertebrados. São
importantes suprimentos alimentares de inverno para as renas e os caribus nas regiões da
América do Norte e da Europa e são consumidos também por ácaros, insetos e lesmas. Líquens
são dispersos por pássaros que os utilizam em seus ninhos. As tocas de esquilos voadores
contêm até 98% de líquens.
4.1.2. MICORRIZAS
A mais comum e possivelmente a mais importante das simbioses mutualistas no reino
das plantas é a da micorriza (Figura 17), que literalmente significa “raiz com fungo”.
Figura 17: Exemplo de micorriza entre
Boletus e Pinus
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As micorrizas são associações íntimas, simbióticas, mutualistas e benéficas entre os
fungos e as raízes, e ocorrem na grande maioria das plantas vasculares, tanto selvagens como
cultivadas.
Os fungos micorrízicos beneficiam suas hospedeiras pelo aumento da capacidade de
absorção de água e dos elementos essenciais, especialmente fósforo, nas plantas. Incremento
na absorção de zinco, manganês e cobre – três outros nutrientes essenciais – tem sido
igualmente demonstrado.
Em muitas espécies florestais, quando plântulas são cultivadas em solução nutritiva
estéril e depois transplantadas para solo de pradaria, elas apresentam pequeno crescimento e
podem, ao final, morrer por má nutrição.
Os fungos micorrízicos também fornecem proteção contra o ataque por fungos
patogênicos e nematódeos (pequenos vermes do solo). Em troca desses benefícios, o fungo
recebe da planta hospedeira carboidratos e vitaminas essenciais para seu crescimento.
A associação micorrízica aparentemente torna as árvores mais resistentes às condições
severas de frio e de seca que ocorrem nas zonas limites de crescimento das árvores.
Há dois tipos principais de micorrizas: endomicorrizas, as quais penetram nas células
da raiz, e as ectomicorrizas, que circundam as células da raiz. Dessas duas, as endomicorrizas
são, de longe, as mais comuns, ocorrendo em cerca de 80% das plantas vasculares. O fungo
componente é um zigomiceto (ordem Glomales), com pouco menos de 200 espécies
envolvidas em associações amplamente distribuídas. Assim, as relações endomicorrízicas não
são muito específicas.
Nas ectomicorrizas, o fungo envolve, mas não penetra nas células vivas da raiz. Nas
coníferas, as hifas crescem entre as células epidérmicas da raiz e do córtex, formando rede
característica e bastante ramificada, a rede de Hartig, a qual, consequentemente, circunda
muitas das células epidérmicas e corticais. Nas raízes da maioria das angiospermas colonizadas
por fungos ectomicorrízicos, as células da epiderme são forçadas a crescer principalmente em
ângulos retos em relação à superfície da raiz, espessando-a mais do que alongando-a, e a rede
de Hartig fica confinada a esta camada. A rede de Hartig funciona como interface entre o
fungo e a planta. Em adição à rede de Hartig, as ectomicorrizas são caracterizadas pelo manto
ou pela bainha de hifas que cobre a superfície da raiz. Cordões miceliais se estendem do
manto para o solo adjacente. Tipicamente, pelos absorventes não se desenvolvem nas
ectomicorrizas, e as raízes são curtas e muito ramificadas.
A maioria das ectomicorrizas é formada por fungos do Filo Basidiomycota, incluindo
muitos gêneros de cogumelos, mas algumas ectomicorrizas envolvem associações com
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ascomicetos. Pelo menos 5.000 espécies de fungos estão envolvidas nas associações
ectomicorrízicas, frequentemente com alto grau de especificidade.
As micorrizas de Ericaceae parecem funcionar principalmente estimulando mais a
absorção do nitrogênio do que do fósforo. Isto possibilita às Ericaceae colonizar solos inférteis
e ácidos, onde são muito frequentes. Tanto ascomicetos como basidiomicetos estão
envolvidos nas associações micorrízicas com Ericaceae.
Na natureza, as sementes de orquídeas germinam somente quando em presença do
fungo adequado. O fungo, que nessa associação micorrízica é interno, também supre seu
hospedeiro com compostos de carbono, pelo menos enquanto a orquídea está na fase de
plântula. Os fungos de tais associações são principalmente basidiomicetos, com mais de 100
espécies envolvidas.
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5. DISTRIBUIÇÃO DOS BASIDIOMYCOTA NOS BIOMAS BRASILEIROS
O Brasil, por ser um país de dimensões continentais, grandes variações
geomorfológicas e climáticas, é um dos lugares do planeta que possui uma das maiores
diversidades em ecossistemas, espécies biológicas, endemismos e patrimônio genético.
Tal biodiversidade está presente nos sete biomas brasileiros – Amazônia, Caatinga,
Cerrado, Costeiros, Mata Atlântica, Pampa e Pantanal, cujas características estão descritas de
maneira resumida a seguir, de acordo com dados da Empresa Brasileira de Pesquisa
Agropecuária (EMBRAPA) e do Instituto Brasileiro de Meio Ambiente (IBAMA).
Amazônia – Ocupa cerca de 1/3 do território nacional e caracteriza-se por possuir dois
grandes ecossistemas: a vegetação de terra firme e a de várzea. Os tipos de vegetação ali
encontrados incluem: campinaranas, campos naturais, florestas ombrófilas abertas, florestas
ombrófilas densas e alagadas, savanas amazônicas, igapós e várzeas. O clima é equatorial
quente superúmido e úmido, devido às temperaturas e precipitações elevadas. A Amazônia
guarda uma infinidade de espécies: 1,5 milhões de vegetais catalogados, 3 mil peixes, insetos,
anfíbios, e outras espécies.
Caatinga – Significa “mata branca”, em tupi-guarani. Esse ecossistema é exclusivo do
Brasil, ocupando 6,8% do território nacional. É pouco conhecido cientificamente e único, pois
embora em área de clima semi-árido, possui grande variedade de paisagens, relativa riqueza
biológica e endemismo. A paisagem é composta principalmente por cactos, bromélias e
leguminosas. A fauna revela a existência de lagartos, serpentes, quelônios, anfíbios anuros, e
outros animais.
Cerrado – Já ocupou 207 milhões de hectares, cerca de 25% do território brasileiro,
mas entre 1970 e 1980, as queimadas, desmatamentos, uso de fertilizantes químicos e
agrotóxicos geraram voçorocas, assoreamentos e envenenamento dos ecossistemas, restando
somente 20% de área em estado conservado. Ainda assim, é o segundo maior bioma do país e
uma das 25 áreas no planeta consideradas por excepcional concentração de espécies
endêmicas e prioritárias para conservação. O cerrado brasileiro é reconhecido como um
ecossistema tropical de savana, e nesta caracterização, é o mais rico do mundo em
biodiversidade, bastando dizer que sua flora possui mais de 10 mil espécies de plantas, com
4.400 endêmicas, e sua fauna apresenta 67 gêneros de mamíferos (161 espécies, 19
endêmicas), 45 espécies endêmicas de anfíbios, além de outras. O clima é estacional, com um
período de chuvas de outubro a abril, e de seca de maio a setembro. A precipitação média
anual é de 1.500 mm, e as temperaturas, em média, oscilam entre 22 a 27°C.
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Costeiros – A costa brasileira, com diferentes climas e formações geológicas, guarda
múltiplos e entrelaçados ecossistemas – manguezais, restingas, dunas, praias, baías, falésias,
recifes de corais, resíduos de Mata Atlântica e outros – todos importantes do ponto de vista
ecológico.
Mata Atlântica – Compõem a paisagem deste bioma: as florestas estacionais deciduais
e semideciduais, floresta de ombrófila densa, formações florísticas associadas (manguezais,
vegetação de restinga e das ilhas litorâneas), encraves de cerrado, e campos de altitude. A
Mata Atlântica é considerada a quinta área mundial mais rica em espécies endêmicas e mais
ameaçada. Atualmente, restam aproximadamente 7% de sua cobertura florestal original.
Entretanto, nos fragmentos desse bioma existem 1361 espécies de animais, 20 mil espécies de
plantas vasculares (8 mil endêmicas), a maior diversidade botânica do mundo para plantas
lenhosas (454 espécies/ha) e, também, os mananciais hídricos que abastecem cerca de 70% da
população brasileira.
Pampa – Compreende principalmente a metade meridional do Rio Grande do Sul. As
paisagens campestres, estepe e savana estépica, coexistem com duas florestas: a estacional
decidual e a ombrófila densa. Encontram-se nesse bioma espécies endêmicas de cactos e
bromélias, como também, 11 espécies de mamíferos raros ou ameaçados de extinção.
Pantanal – Em decorrência da baixa altitude, da pouca declividade e das inundações
periódicas, este bioma é a maior planície de inundação contínua da Terra. Dessa forma, origina
um mosaico de ecossistemas terrestres, aquáticos e semi-aquáticos, com grande diversidade
de espécies e alta produtividade biológica. A biota do Pantanal foi formada através das áreas
biogeográficas em seu entorno, que compreendem o Cerrado, Floresta Amazônica, Mata
Atlântica, Chaco e a Mata Chiquitana da Bolívia.
Toda a biodiversidade brasileira começou a ser estudada a partir de 1808, com a
chegada ao Brasil das primeiras expedições científicas estrangeiras, cuja missão era dar
conhecimento aos europeus da riqueza da nossa fauna e flora.
A seguir estão relatadas algumas espécies de fungos do filo Basidiomycota, com os
respectivos ecossistemas onde é possível encontrá-los.
5.1. AMAZÔNIA (FLORESTA DE TERRA FIRME)
De acordo com SOUZA E AGUIAR (2004), na região de Rio Preto da Eva, Amazonas,
pode-se encontrar as seguintes espécies de Basidiomycota: Entoloma azureoviride, Hygrocybe
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miniceps, Lactarius panuoides, Marasmius cf. mazatecus, Marasmius cf. setulosifolius,
Marasmius variabiliceps var. variabiliceps.
5.2. CERRADO
Segundo BASEIA (2005), na região de Mogi-guaçu, São Paulo, é encontrada a espécie
Bovista pila.
5.3. CAATINGA
Ainda segundo BASEIA (2005), na Reserva Biológica de Saltinho, Pernambuco, é
encontrada a espécie Bovista plumbea.
5.4. MANGUEZAL
De acordo com CAMPOS E CAVALCANTI (2000), no estado do Pará, região de
Maracanã, pode-se encontrar Basidiomycota da espécie Phellinus mangrovicus.
5.5. PAMPA
De acordo com CORTEZ E COELHO (2005), na região de Santa Maria, Rio Grande do Sul,
são encontradas as espécies Psathyella coprinoceps, Gymnopilus earlei e Inocybe curvipes.
Segundo SULZBACHER E PUTZKE (2005), em Simimbu, Rio Grande do Sul, encontra-se o
fungo Galerina nana.
De acordo com ALBUQUERQUE, VICTORIA E PEREIRA (2006), nas regiões de Cachoeira
do Sul, Canoas, Capão da Canoa, Estrela, Lajeado, São Francisco de Paula, São Leopoldo, São
Sebastião do Caí, Teutônia, no estado do Rio Grande do Sul, são encontradas as espécies
Leucoprinus birbaumii, L. brebissonii, L. citrinellus, L. denudatus, L. fragilissimus.
5.6. MATA ATLÂNTICA
Segundo ROSA (2002), no Parque Estadual do Rio Doce e na Estação Ecológica da
UFMG, em Minas Gerais, são encontrados basidiomicetos das espécies Agaricus cf.
brunneostictus, Lepiota erinana, Coprinus pseudomicaceus, Tubaria cf. dispersa, Nolanea
sipariana, Marasmius allocystis, Marasmiellus paspalis e Volvariella earlei.
Ainda na Mata Atlântica, na região do Nordeste brasileiro, segundo GILBERTONI,
RYVARDEN E CAVALCANTI (2004), são encontrados fungos do filo Basidiomycota das espécies
Auriscalpium villipes, Climacodon pulcherrimus, Gloeodontia discolor, Irpex lacteus e
Scytinostroma duriusculum.
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Segundo LOGUERCIO-LEITE, GROPO E HALMENSCHLAGER (2005), em Santa Catarina
encontram-se as espécies Ganoderma annulare, G. applanatum, G. australe, G. lucidum, G.
aerstedii, G. resinaceum e G. subamboinense.
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6. IMAGENS
Agaricus blazei Murill
Agrocybe cylindracea
Auriculariales
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Auriscalpium sp Bovista sp
Climacodon sp Coprinus
Cordiceps pruinosa Coriolus versicolor
Flammulina velutipes
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Entoloma spp
Galerina sp
27
Ganoderma sp Grifola frondosa
Gymnopilus sp Hygrocybe miniceps
Inocybe sp Irpex sp
Lactarius sp
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Lentinus edodes Leucoprinus sp
Marasmius sp Morchella esculenta
Neolentinus epideus Nolanea sp
Phellinus linteus
29
Psathyrella sp
Sarcodon aspratus
Sclerotinia esclerotiorum Scytinostroma sp
Sparassis crispa Tricholoma mongolicum
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Tubaria sp Volvariella sp
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7. CONSIDERAÇÕES FINAIS
É relevante registrar que o presente trabalho é uma coleta restrita de dados teóricos,
embasados em trabalhos práticos originados de efetivas investidas em campo de profissionais
especializados em Micologia.
Não se pretende, nem seria possível aqui enumerar e/ou ilustrar toda a diversidade do
Filo Basidiomycota encontrada em um país como o Brasil, cuja fauna e flora felizmente ainda
resistem às investidas do homem.
Tão somente buscou-se ilustrar os referidos fungos e sua imensa relevância na vida dos
seres humanos e demais organismos de cada ecossistema em que estão inseridos, compondo
uma engrenagem biológica de importância muitas vezes ignorada por aqueles que dela se
beneficiam.
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8. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ALEXOPOULOS, C.J.; MIMS, C.W.; BLACKWELL, M. Introductory mycology. 4 ed. New York: John
Ileey & Sons, Inc., 1996.
Raven P. H., Evert, R.F., Eichhorn, S.E., 1992. Biologia Vegetal. Rio de Janeiro, Guanabara Koogan; S.A. 5º ed. 728p.
EMPRESA BRASILEIRA DE PESQUISA AGROPECUÁRIA. Biomas Brasileiros.
Disponível em:http://www.embrapa.br/publicacoes/institucionais/laminas-biomas.pdf. Acesso
em 09/04/2013.
INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE. Ecossistemas Brasileiros.
Disponível em: http://www.ibama.gov.br/ecossistemas/home.htm. Acesso em 09/04/2013.
ROSA, L.H. Diversidade de Fungos Agaricales (Basidiomycota) em dois fragmentos de Mata
Atlântica do Estado de Minas Gerais. 2002. 250f. Dissertação – Universidade Federal de Minas
Gerais, Belo Horizonte.