UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA JÚLIO DE MESQUITA FILHO FACULDADE DE CIÊNCIAS E TECNOLOGIA CAMPUS DE PRESIDENTE PRUDENTE PROGRAMAÇÃO DE PÓS-GRADUAÇÃO EM GEOGRAFIA
JOÃO MARCIO PALHETA DA SILVA
PODER, GOVERNO E TERRITÓRIO EM CARAJÁS
Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Geografia da Faculdade de Ciências e Tecnologia UNESP de Presidente Prudente, para obtenção do título de Doutor em Geografia. Orientador: Prof. Dr. Eliseu Savério Sposito
Presidente Prudente 2003
UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA JÚLIO DE MESQUITA FILHO FACULDADE DE CIÊNCIAS E TECNOLOGIA CAMPUS DE PRESIDENTE PRUDENTE PROGRAMAÇÃO DE PÓS-GRADUAÇÃO EM GEOGRAFIA
JOÃO MARCIO PALHETA DA SILVA
PODER, GOVERNO E TERRITÓRIO EM CARAJÁS
Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Geografia da Faculdade de Ciências e Tecnologia UNESP de Presidente Prudente, para obtenção do título de Doutor em Geografia. Orientador: Prof. Dr. Eliseu Savério Sposito
Presidente Prudente 2003
Ficha catalográfica elaborada pelo Serviço Técnico de Biblioteca e Documentação - UNESP – FCT – Campus de Presidente Prudente
S58p
Silva, João Márcio Palheta da. Poder, governo e território em Carajás / João Márcio
Palheta da Silva. – Presidente Prudente : [s.n.], 2004
198 f. : il., graf.
Tese (doutorado). – Universidade Estadual Paulista,
Faculdade de Ciências e Teconologia
Orientador: Eliseu Savério Sposito
1. Geografia. 2. Poder. 3. Governo. 4. Território. 5.
Carajás (PA) 6. Municípios. 7. CVRD. I. Silva, João Márcio
Palheta da.. II. Título.
CDD (18.ed.) 910
AGRADECIMENTO ESPECIAL
À minha mãe, Lucimar Borges, por tudo que me deu na vida; in memoriam de meu
pai, João Corrêa pela falta que sempre fará em nossas vidas; à minha esposa, Franciele
Minhoto, por tudo e pelo apoio; e ao meu filho Enzo pela alegria que me contagia quando o
vejo.
AGRADECIMENTOS
Nestes quase quatro anos que morei em São Paulo, especialmente morando
em Presidente Prudente e Clementina, poder conviver com várias pessoas que foram
fundamentais na minha trajetória acadêmica e humana foi um exemplo de vida. Exato, em 18
de fevereiro de 2000 mudei minha residência para a cidade de Prudente. Minha intenção era
perder um pouco do meu provincianismo e conhecer outras formas de perceber o Brasil.
Nessa trajetória conheci várias pessoas que me auxiliaram numa redescoberta do Brasil, dos
costumes, das culturas do modo de ser, pensar e viver da sociedade brasileira.
Quando aqui cheguei de imediato me senti estranho, tudo parecia diferente,
nada me fazia sentir pertencente ao lugar, senti falta da chuva, das músicas paraenses, das
festas, dos amigos, das noites, dos bares, da minha família, estava sozinho numa cidade cujo
significado não conseguia entender direito. Não conseguia também entender o que ela traria
para meu crescimento enquanto ser humano.
Lembro-me da primeira chuva que caiu em Prudente, foi tão bom sentir o
cheiro de terra molhada, sentir saudade de tudo. Ainda não conseguia compreender como
minha vida iria mudar completamente. Passei noites em claros, e por isso sempre chegava
atrasado às aulas da professora Carminha, não de propósito, mas porque não conseguia dormir
e tenho a mania de ficar estudando e lendo durante a madrugada, minha sorte é que as outras
disciplinas eram durante a tarde, assim conseguia assistir às aulas no horário marcado. Peço
desculpas à Carminha por esse comportamento, mas não conseguia acordar cedo, às oito
horas, pois sempre ia dormir às 6 horas da manhã.
Aos poucos ia conhecendo Prudente e as pessoas, meus professores, meus
amigos de disciplinas e de curso, ia conseguindo me sentir mais em casa. Lembro-me que
comecei a conhecer Prudente na primeira crise de saudade. Saí e conheci o Zapping, um
barzinho de música ao vivo. Comecei a ir ao cinema, ao teatro, ao Fran’z café, onde muitas
noites terminavam minhas leituras tomando cafezinho. Comecei a olhar com mais
determinação a cidade e passei a entender que meu espaço, embora fosse provisório, durante
um bom tempo seria aquele, e eu precisava conhecê-lo.
Lembro-me dos conselhos de amigos que sempre me diziam que eu
precisava sair de Belém, para conhecer outros ares. Sou grato a todos eles. De repente estava
entendendo a cidade em que morava; as ruas pareciam com as de minha cidade, as pessoas
amigas, e eu não era mais estranho à cidade e nem a cidade a mim.
A universidade foi um espaço de conhecimento importante em minha
trajetória acadêmica, mas também foi um espaço de amizades, de novos amigos, de conversas
e de aprendizagem do ser humano. Todas as vezes que me olhar no espelho lembrarei com
saudades os momentos que aqui vivi, sem hierarquizá-los, todos foram importantes.
Sentirei falta do grupo de estudos que tínhamos, dos jogos de futebol no
parque do povo, das noites em que nos reuníamos na casa do Wallace ou em outro local para
conversamos sobre tudo, e assim estreitar nosso laços de amizades. Nossa turma na UNESP
nos deu amizade.
De repente, minha vida mudou. Mudei para a cidade de Clementina uns 130
quilômetros de Presidente Prudente, mas não perdi os laços com a cidade, e aqui começam
meus sinceros e eternos agradecimentos a todos que, sem exceção, foram fundamentais em
minha vida:
À Lucimar Borges Palheta, minha querida mãe, a quem devo meus
primeiros ensinamentos sobre a vida e como enfrentar meus desafios. Sem seu conhecimento
eu nada seria. Meu eterno obrigado. Amo-te.
Ao João Corrêa da Silva, meu querido pai, que há muito partiu, mas que
deixou um ensinamento profundo do que é a vida e como viver intensamente. Pelo pouco
tempo que esteve entre nós, mostrando que a vida é cada momento, nunca o esqueceremos.
Amo-te.
Aos meus queridos e amados irmãos Ana Levinda, Ana Rita, João Bosco.
Sem o apoio que tive de vocês não teria chegado até aqui. Amo muito vocês.
Aos meus queridos sobrinhos Julinho, Juninho, Rebeca e Mayara que com
seus sorrisos e alegrias me dão esperança de uma vida melhor. Obrigado pela força do sorriso
de vocês.
À minha esposa amada, Franciele Minhoto, que aturou meu mau humor e
minhas crises acadêmicas e que soube entender que eram passageiras, que com seu sorriso
sempre belo me fez ver que a vida é maravilhosa. Ainda bem que passou meu mau humor;
obrigado, meu amor.
Ao meu filho Enzo, que nestes nove meses me deu muita alegria
engatinhando pela casa e sempre sorrindo. Sua chegada me deixou mais feliz e acreditando
que poderia ser muito mais prazeroso escrever meu trabalho. Mesmo nas noites em que
ficamos juntos e você não saía do meu colo, o jeito era largar tudo e dedicar uma parte de meu
tempo para você, isso também me ajudou a crescer. Amo você, filho.
Aos meus professores do Programa de Pós-Graduação em Geografia, Maria
Encarnação Beltrão Sposito, Eliseu Sposito, Dalton Moro, Horacio Bozzano, Iná Castro, Ana
Fany, Mauricio Abreu, Dirce Suertegaray, meu muito obrigado pelos ensinamentos.
À professora Josette Linz César, pelas sugestões. Muito obrigado.
Ao professor Nivaldo Hespanhol, pelas sugestões. Muito obrigado.
À professora Adélia Gimenes Greco, pela revisão gramatical.
Ao amigo Alan Guimarães, muito obrigado. À professora Maria Célia
Nunes Coelho, pelas sugestões, pela sua amizade e pela sua ajuda em minha trajetória. À
Francynette Melo, Fred e Maristela, obrigado pelo apoio.
Aos meus alunos dos Campi da UFPA de Conceição do Araguaia, Rondon
do Pará, Ourilândia do Norte, que me auxiliaram em meus trabalhos de campo e me ajudaram
a entender melhor a região que estudo. Eli Carlos, Zé Alves, Osório, Henrique, Tânia, sou
grato a todos vocês pela ajuda que recebi.
À Secretaria de Pós-Graduação do Curso de Geografia da UNESP. Muito
obrigado.
À Biblioteca da UNESP. Muito Obrigado.
Aos novos amigos Patrícia e César Gomes, amigo-irmão de tantas batalhas,
pelas discussões sempre produtivas sobre as relações de poder e a cultura brasileira. Pela sua
sincera amizade, obrigado, companheiro. Ao Wallace Oliveira, pelo companheirismo e
amizade também. Ao Antonio Firmino Neto pelas conversas sempre proveitosas que tivemos
sobre as questões brasileiras. Ao amigo Marcio Silveira pelas longas conversas sobre as
diferenças regionais, que renderam artigos muito interessantes e pela sua amizade. Ao
professor Jairo Mello, pelas sugestões, pelas conversas e pelo papo sempre agradável que
tivemos. Muito obrigado. Ao William e Lirian pela acolhida em Londrina e em Presidente
Prudente. Muito obrigado a vocês. A Aos amigos de Clementina, avó Estela, Valdi, Fernando,
Dilly e Elza, Rodrigo, Maurílio e Glória, a D. Maria e Israel, muito obrigado pela amizade.
Ao amigo paraense Luciano Rocha, pela ajuda sempre disposta em Belém e pelos papos em
Presidente Prudente; obrigado, companheiro. O que mais agradeço a todos meus amigos, além
da ajuda direta e indireta neste trabalho, é a amizade que não me deixou sentir sozinho. Sou
grato a todos vocês.
Aos amigos que fiz em Prudente, Elaine, Márcia, Carla, Helton, e a todos de
minha turma de doutorado, obrigado.
Ao meu orientador, professor Dr. Eliseu Sposito, pela sua orientação pela
sua sempre bem disposta acolhida em Presidente Prudente e pelas discussões acerca do tema
proposto que me fizeram avançar na minha pesquisa serei sempre grato.
Sei que esse caminho que trilhei não acaba aqui e que devo continuar
sempre olhando que os obstáculos precisam ser ultrapassados e que sempre existirão outros e
que com humildade sempre devo acreditar no conhecimento e reconhecer meus limites para
tentar superá-los. A todos que se fizeram presentes em minha vida meu muito obrigado, levo
comigo a certeza que sempre existirão novos amigos e que os que aqui fiz e os que sempre
tive serão auxiliares no meu caminho. Obrigado a todos vocês.
Escrever é uma tarefa solitária e ao mesmo tempo prazerosa e angustiante,
mas eu não teria conseguido dar mais este passo em minha vida se não tivesse um conjunto de
amigos que direta e indiretamente foram meus parceiros nesta produção acadêmica. Devo a
eles muito mais que um simples agradecimento, devo minha amizade sincera e, como já dizia
Renato Teixeira, “a amizade sincera, é um santo remédio, é um abrigo seguro, é natural da
amizade, um abraço, um aberto de mão, um abrigo, por isso conte comigo, amigo disponha,
lembre-se sempre que mesmo modesta minha casa será sempre sua”.
Resumo: A pesquisa aqui realizada trata da formação e relação entre grupos de poder
que articulam políticas para fazer a gestão municipal envolvendo práticas que se manifestam
no uso do território e no poder constituído no território de Carajás. Embora essas práticas
disciplinadoras de poder articulem a gestão do território diferentemente do período da
oligarquia do Tocantins, são objetos de uso e manipulação por parte da empresa de mineração
Companhia Vale do Rio Doce (CVRD), e de contestação por diferentes atores sociais que
partilham o poder junto com aqueles que formam o poder local advindo da época da
oligarquia na área hoje correspondente aos municípios de Marabá, Curionópolis, Parauapebas,
Eldorado do Carajás, Canaã do Carajás e Água Azul do Norte. Dessa forma, a organização do
território em Carajás reflete a organização sócio-político-econômica, em que diferentes atores
sociais entram em conflitos ou aproximação com as práticas territorializadas de uma única
empresa (CVRD) que organiza, a partir do mercado internacional os espaços potenciais,
palcos de projetos de mineração instalados pela companhia. Tudo isto, tem provocado uma
corrida pelos recursos advindos dos royalties pagos pela empresa nos locais onde a mesma
tem projetos, e pelos diferentes interesses dos atores sociais no território para legitimar suas
práticas de poder, estimulando diferentes conflitos sociais, políticos e econômicos expressos,
sobretudo nas emancipações territoriais ocorridas desde a década de 1980.
Palavras-Chave: Poder, Governo, Território, Carajás, Municípios, CVRD.
Abstract: The research presented here aims to broach the formation of groups of
power – as well as their relationship - that articulate politics in order to run the management
of the territory of Carajás involving practices manifested by both the use of the land and the
power roles established in the territory. Even though those power disciplining practices
articulate the management of the territory in question differently than it used to be done
during Tocantins State’s oligarchy, they are also objects of use of the mining company
Companhia Vale do Rio Doce – CVRD – along with various social agents which share the
power with those who form the local power resulted from the oligarchy period in the area that
nowadays covers the territories of Marabá, Curionópolis, Parauapebas, Eldorado do Carajás,
Canaã do Carajás e Água Azul do Norte. In this regard, the territory of Carajás has been going
through its social, political, and economical organization in which different social agents
either conflict or approach the territorial practices of one single company – CVRD – which,
based on the international market, organizes the potential areas where their mining projects
are supposed to take place. This has been causing a rush for the resources that come from the
royalties paid by both CVRD where it runs its projects and the different social agents’
interests in the territory in order to legitimize their power practices, which stimulates various
social, political, and economical conflicts expressed especially by the territorial
emancipations that have occurred since the eighties.
Keywords: Power, Government, Territory, Carajás, Counties, CVRD.
Résume: Cette recherche a, comme principal objectif, étudier la formation des groupes de pouvoir dans la région de Carajás, État du Pará et leur relations. Les groupes pratiquent la politique en adoptant un type de géstion différent de la période concernant la forte présence de la oligarchie qui commandait la région de Tocantins. Maintenant, elles ne sont plus les sujets les plus importants, mais se situent à l’aval de la Companhie Vale do Rio Doce (CVRD) et des différents organismes sociaux qui partagent le pouvoir avec les groupes qui conforment les actions sur le territoire depuis l’époque concernant le gouvernement de la oligarchie sur la región qu’aujourd’hui corresponde aux municipes de Marabá, Curionópolis, Parauapebas, Eldorado de Carajás, Canaã do Carajás et Água Azul do Norte. Ainsi, l’organisation de la région du Carajás connaît l’organisation social, politique et économique entraînée par différents organismes sociaux mais, par contre, se démontre opposée ou adopte les pratiques d’une seule entreprise, dont pouvoir s’organise à partir du marché international, ce qui resulte à l’occurrence de plusieurs conflits surtout à partir des années 1980. Mots-clés : Pouvoir, gouvernement, villes, Carajás, CVRD.
LISTA DE SIGLAS
ACIC - Associação Comercial e Industrial de Curionópolis.
ACIM – Associação Comercial e Industrial de Marabá.
ACIP – Associação Comercial e Industrial de Parauapebas.
AMAT – Associação dos Municípios do Araguaia Tocantins.
ASICA – Associação das Siderúrgicas de Carajás
AMZA – Amazônia Mineração.
BASA – Banco da Amazônia.
BNDES – Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social.
CDL – Clube de Diretores Lojistas.
CEDERE – Centro de Desenvolvimento Regional.
CFEM – Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais.
CIB – Companhia Industrial do Brasil.
COOMIGASP – Cooperativa de Mineração dos Garimpeiros de Serra Pelada.
COOPER – Cooperativa Mista dos Produtores Rurais da Região de Carajás.
COSIPAR – Companhia Siderúrgica do Pará.
CREA – Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia.
CVRD – Companhia Vale do Rio Doce.
DNPM – Departamento Nacional de Pesquisas Minerais.
DOCEGEO – Rio Doce Geologia e Mineração.
EEPP - Equipe de Educação Popular de Parauapebas.
EFC – Estrada de Ferro Carajás.
FASE – Federação de Órgãos para Assistência Social e Educacional.
FDR - Fundo de Desenvolvimento Regional.
FICAP- Feira de Indústria, Comércio e Agropecuária de Parauapebas.
FLONA - Floresta Nacional de Carajás.
FNS – Fundação Nacional de Saúde.
FPM – Fundo de Participação dos Municípios.
FUNDEF – Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de
Valorização do Magistério.
GETAT – Grupo Executivo de Terras do Araguaia-Tocantins.
IBAMA – Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis.
IBÉRICA – Ibérica Siderúrgica de Carajás
IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística.
ICMS – Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e Serviços.
IPEA – Instituto de Pesquisa Econômica e Aplicada.
IPI – Imposto sobre Produtos Industrializados.
IPTU – Imposto Predial e Territorial Urbano
ISS – Imposto Sobre Serviços.
IUM - Imposto Único sobre Minerais.
METABASE – Sindicato dos Trabalhadores na Indústria de Exploração de Ferro e Metais
Básicos.
MLT – Movimento dos Trabalhadores Rurais na Luta pela Terra.
MSS - Mineração Serra do Sossego.
MST – Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra.
NAEA – Núcleo de Altos Estudos Amazônicos.
NUCOR – Nucor Corporation.
ONG – Organização Não-Governamental.
PDS – Plano de Desenvolvimento Sustentável.
PFC – Projeto Ferro Carajás.
PGC – Programa Grande Carajás.
PIB – Produto Interno Bruto.
SEBRAE – Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas.
SEFA – Secretaria da Fazenda.
SEICOM – Secretaria de Indústria Comércio e Mineração.
SEMA – Secretaria de Meio Ambiente.
SIMARA – Simara Siderúrgica de Marabá S/A.
SIMETAL – Sindicato dos Trabalhadores Metalúrgicos.
SIPRODUZ – Sindicato dos Produtores Rurais.
STN – Secretaria do Tesouro Nacional.
SUDAM – Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia.
SUMIC – Superintendência das Minas de Carajás.
TCM – Tribunal de Contas dos Municípios.
TCU – Tribunal de Contas da União.
TERRA NORTE - Terra Norte Metais.
UFPA – Universidade Federal do Pará.
UHT – Usina Hidrelétrica de Tucuruí.
USIMAR – Usina Siderúrgica de Marabá
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Sumário 1 Introdução 17 2 Poder, Governo e Território 32
2.1 Refletindo sobre os Conceitos 32 2.2 Poder 34
2.2.1 Poder Local 36 2.2.2 Fragmentação do Poder 39 2.2.3 Poder: o uso do território 40 2.2.4 Poder Formal e Informal 41
2.3 Governo e Estado 41
2.3.1 Governo e Sociedade 44 2.3.2 Governo e Poder 45 2.3.3 Governo e Descentralização do Poder 46 2.3.4 Governo e Participação da Sociedade Civil 49
2.4 Território 50
2.4.1 Relações Territoriais 51 2.4.2 O Uso do Território 54 2.4.3 Território e Territorialidade 55
3 O Município de Marabá e sua Formação Territorial:
Breve consideração sobre o final do século XIX até os nossos dias 57 3.1 A Configuração Territorial de Marabá no Final do Século XIX
e Início do Século XX 59 3.2 Marabá no Contexto da Economia Local: do século XIX ao século XX 61 3.3 O Município de Marabá; Contextualizando a década de 1980 70 3.4 A Implantação dos Projetos de Mineração da
Companhia Vale do Rio Doce no Antigo Território de Marabá 81 3.5 Emancipação Territorial em Marabá 88 4 Territórios Sócio-Político-Econômicos, Relações
de Poder e Situação Financeira dos Municípios no Sudeste Paraense 95 4.1 Municípios e Suas Arrecadações:
Instrumentos de poder para a gestão territorial 100 4.2 Breve Análise das Arrecadações dos Municípios
de Marabá, Parauapebas,Curionópolis, Eldorado dos Carajás, Canaã dos Carajás e Água Azul do Norte 105
5 Polêmicas, Relações e Conflitos entre Poderes (da CVRD e dos poderes públicos) no Contexto das Realidades Municipais 120
5.1 Relações e Conflitos entre Atores Sociais no Município de Marabá 121 5.2 Relações e Conflitos entre Atores Sociais no Município de Parauapebas 133 5.3 Relações e Conflitos entre Atores Sociais no Município
de Água Azul do Norte 141 5.4 Relações e Conflitos entre Atores Sociais no Município de
Canaã dos Carajás 149 5.5 Relações e Conflitos entre Atores Sociais no Município de Curionópolis 157 5.6 Relações e Conflitos entre Atores Sociais no Município de
Eldorado do Carajás 163 5.7 Uma Visão Conjunta dos Problemas e Conflitos Municipais 168 6 Considerações Finais 177 7 Bibliografia 197 7.1 Bibliografia de Jornais 208
17
1 – INTRODUÇÃO
No passado, a área correspondente ao antigo município de Marabá foi
dominada pelas elites oligárquicas tradicionais (Mutran, Almeida, Moraes, entre outras).
Atualmente, nos municípios que compõem o antigo município de Marabá (Parauapebas,
Curionópolis, Eldorado do Carajás, Canaã dos Carajás e Água Azul do Norte), todavia, no
presente, o “poder local” é disputado por uma nova elite (composta de representantes de
empresários e pecuaristas), pelas antigas elites (foreiros da castanha tornados pecuaristas ou
seus representantes) e pelos diferentes movimentos sociais. Não só, mas particularmente
desde a década de 1980, as relações anteriormente vigentes vêm se modificando
dinamicamente, alterando as formas de gestão municipal e territorial com vistas a solucionar
conflitos através de mudanças nas formas de atuações.
Com o declínio da borracha (1912) até a década de 1970, a oligarquia dos
castanhais dominou as áreas que atualmente correspondem ao antigo município de Marabá.
Antes da 1980, as atividades da oligarquia marabaense estavam ligadas praticamente à
extração da Castanha-do-Pará e de pedras preciosas (como diamantes, por exemplo). As
famílias tradicionais, como os Mutran, Azevedo, Almeida, Moraes, Chamon, Queiroz, Leitão,
Salame, Lima, entre outras donas de castanhais, perderam forças, porém compõem ainda o
poder local dessa área. São hoje importantes aliadas das diversas empresas que se instalaram
na região. Em outras palavras, com a introdução de novos atores sociais (empresas,
fazendeiros, posseiros, etc.) a partir da primeira metade da década de 1970, houve uma
modificação nas estruturas político-sociais e econômicas desses municípios.
De um lado, os novos atores sociais capitalizados eram representados pela
CVRD, os bancos, os pecuaristas, os madeireiros, os fazendeiros empresários e fazendeiros
individuais, principalmente, vindos do Sudeste do país. De outro lado, os atores sociais não-
capitalizados eram constituídos dos muitos migrantes que vinham do Sudeste e
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principalmente do Nordeste do país em busca de empregos e terras para cultivar e/ou do ouro
dos diversos garimpos. Esses muitos migrantes foram fundamentais para alterar as relações
anteriormente comandadas e controladas hegemonicamente pelos donos de castanhais,
modificando a situação sócio-político-econômica local.
O enfraquecimento do poder das famílias tradicionais a partir de 1960, ou
mais particularmente de 1970, com a introdução de novos atores sociais no município de
Marabá, favoreceu a expansão do núcleo urbano do município e contribuiu para o avanço das
transformações político-econômicas em outras áreas adjacentes.
Os novos atores sociais nessa região organizaram-se de acordo com os
diversos segmentos sociais aos quais pertenciam. Surgiram assim: a Cooperativa de
Mineração dos Garimpeiros de Serra Pelada (COOMIGASP), a Associação dos Garimpeiros
de Serra Pelada, o Sindicato dos Garimpeiros, os Sindicatos dos Urbanitários, o Sindicato de
Trabalhadores Rurais, o Sindicato Patronal da Agropecuária, o Sindicato dos Trabalhadores
na Indústria de Exploração de Ferro e Metais Básicos (METABASE), o Sindicato dos
Trabalhadores Metalúrgicos (SIMETAL), além dos movimentos dos trabalhadores pela posse
e uso da terra, de forma organizada e reconhecida através de diferentes siglas, como o
Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), e o extinto MLT1, e as Organizações
Não-Governamentais, entre outros.
Mesmo com o surgimento e conquista de poder pelos novos atores, a
oligarquia não desapareceu, mas adequou-se às novas situações impostas pelas
1 O Movimento de Luta Pela Terra (MLT), que foi criado na Bahia, e em Curionópolis, foi formado pelo PC do B, teve uma breve atuação. Era formado por posseiros da região e tinha no ex-secretário de agricultura de Curionópolis sua coordenação no município. O movimento era apoiado por um antigo prefeito e por fazendeiros do município, que na esperança de suas terras serem desapropriadas pelo Governo Federal incentivavam suas ocupações, em conjunto com os militantes do MLT. Porém, como isso não ocorreu, o movimento perdeu força e depois da demissão do secretário de agricultura e com o final do mandando do prefeito na segunda metade da década de 1990 o movimento desapareceu. Esse movimento diferente do MST não tinha o apoio da Comissão Pastoral da Terra e de entidades como a FASE, pois eles eram acusados de fazer acordos com os fazendeiros e com isso enfraquecia os movimentos que lutam pela reforma agrária. Hoje a única área em que existe posseiro, cerca de 20 famílias, é uma área da fazenda do ex-prefeito, que foi o principal incentivador das ocupações.
19
transformações da região. Para não desaparecer, ela vem aliando-se a alguns dos novos atores,
dando origem aos mais diferentes arranjos de poder.
Cada um desses atores sociais tem seus poderes acrescidos pela forma de
atuação e pela capacidade de aliar-se a outros atores dentro de seus respectivos territórios ou
extrapolam seus limites territoriais, compondo correlação de forças que lhes sejam favoráveis
e que lhes garantam exercerem seus poderes em diferentes períodos históricos.
As novas relações sociais estabelecidas a partir da década de 1980,
envolvendo novos agentes econômicos e atores sociais, na reestruturação sócio-espacial,
como é o caso da CVRD, empresas agropastoris, sindicato dos fazendeiros, sindicatos dos
trabalhadores rurais, Igreja, associações de moradores, Ongs, etc, também se fazem presentes.
A gestão territorial envolve práticas que se manifestam no uso do território e
no poder constituído ao longo dos anos no território de Carajás. Embora essas práticas de
poder articulem uma nova forma de fazer a gestão do território, este é objeto de uso por parte
das empresas de mineração e dos profissionais liberais que partilham o poder junto com
aqueles que formam o poder local advindo da época da oligarquia dos castanhais na área hoje
correspondente à área do antigo município de Marabá.
Sua relação direta ou indireta com a empresa Companhia Vale do Rio Doce
(CVRD), a partir da instalação do Projeto Ferro Carajás no começo da década de 1980, fez
com que ocorresse, no espaço do então antigo município de Marabá, uma fragmentação
territorial que simboliza, sobretudo, partilhar o poder e fazer novos laços entre os novos
representantes das elites locais, articulados ou não com a oligarquia do Tocantins.
O poder, dessa forma, acaba se tornando um campo de disputas entre o novo
e velho sistema de dominação exercido em Marabá. Agora empresa de mineração, bancos,
movimentos dos trabalhadores sem-terra (esse já na década de 1990), metalúrgicos,
Organizações Não-Governamentais (Ongs), movimentos de bairros, empresários, fazendeiros,
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enfim a sociedade civil em processo de organização em Carajás, formam assim o campo de
poder e dessa forma modificam as relações anteriormente estabelecidas pelos senhores dos
castanhais.
Em relação ao governo no território, poderíamos dizer que a modernização
das administrações municipais é um dos caminhos para que os municípios possam evoluir
visando a formas de planejamento competente e políticas públicas que contemplem o
conjunto da sociedade. Como exemplo podemos citar os novos municípios, como é o caso
estudado na área de Carajás, onde são quase inexistente um banco de dados e políticas que
articulem um conjunto de elementos que buscam resolver seus problemas, ou seja, que
contemplem a participação da sociedade civil e que seja prioritária para definição de políticas
públicas na forma de desenvolvimento municipal, não somente para legitimar o governo, mas
também para que haja decisão e participação nas políticas municipais.
Governo, no sentido do território em novos municípios, apresenta uma
diferenciação enquanto expressão de uma gestão compartilhada. Há tentativa, através da
pressão dos diferentes atores sociais, principalmente aqueles que se sentem excluídos dos
processos decisórios, de se inserir na definição do ato de governo, mas não como atores
passivos na modelagem do território, e sim como aqueles que têm na sua participação uma
forma de garantir seus projetos sociais e políticos, para não estarem cada vez mais à margem
dos processos econômico, social e político no município.
Porém há nesse território de Carajás uma superposição que tem a ver com a
forma de governo, ou melhor, com a legislação da área de domínio, onde prevalece um
conflito implícito entre a CVRD, o município, o Estado do Pará e a União. Nesse caso, o
governo perdeu o controle e o domínio sobre as áreas de seus interesses e se mostrou
despreparado para lidar com a questão da demanda acelerada por equipamentos urbanos a
serem disponibilizados no território. Entretanto, há uma falta de definição de competência
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quando se trata de lidar com os interesses da empresa, do município, do Estado e da própria
União, o que se reflete na ingovernabilidade dos territórios, exceto o da grande empresa de
mineração.
No entanto, podemos levantar um conjunto de questões que poderiam nos
auxiliar em nossa caminhada em busca de uma interpretação do governo estadual e dos
governos municipais em Carajás: quais seriam, então, as áreas de governo em que se pode
identificar quem tem a legislação sobre elas, a fim de, de uma forma ou de outra, impedir uma
superposição de áreas e mesmo de interesses? Há uma região de Carajás? Os municípios
desmembrados de Marabá formam uma região? O que significa governo na atual
configuração do território em Carajás, e quais são os atores sociais que modificam essa forma
de governar? Que governos estão modificando seu território em busca de recursos financeiros
para dinamizar o território e quais são os mecanismos utilizados por esses governos?
As diferenciações no território passam, sobretudo, em espaços como o de
Carajás, pela política econômica desencadeada em diferentes níveis, onde o global acaba por
influenciar as decisões locais e, no local, evidencia-se a diferença ocasionando conflitos de
diferentes naturezas.
O que se torna uma diferenciação evidenciada no território? Quais os atores
sociais que fazem com que as diferenciações aconteçam, e por que se torna tão difícil
caracterizar tais diferenciações territoriais? Seria pela sua natureza ou seria pela metamorfose
que o território sofre a partir das diferentes práticas sociais?
Para Milton Santos e Maria Laura Silveira (2001), “nas condições atuais, o
modelo econômico incidente sobre o território confere maior peso às forças centrífugas” (p.
268), o que, por sua vez, não deixa de ser verdade, pois, quando observamos Carajás,
podemos constatar que a maior parte das decisões que são tomadas sobre a regulação
econômica do território da empresa, principal “vetor” de industrialização local, são, na sua
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maior parte, decisões externas ao local. Isso, por sua vez, ocasiona, em determinados
momentos, conflitos de interesses envolvendo atores sociais e a grande empresa, ou em outros
momentos a união dos objetivos empresariais locais com o governo local.
Segundo Milton Santos e Maria Laura Silveira (2001), “o papel de
comando, todavia, é reservado às empresas dotadas de maior poder econômico e político e os
pontos do território em que elas se instalam constituem meras bases de operação,
abandonadas logo que as condições deixam de lhes ser vantajosas” (SANTOS; SILVEIRA,
2001, p. 291). Sendo assim, há uma particularidade no tempo histórico e no espaço geográfico
que caracteriza o comando das forças locais de organizar o território com fins econômicos:
recursos naturais de valores comercializados e escassos no planeta e sua durabilidade em
tempo geológico, como é o caso das jazidas minerais que a CVRD explora no Pará. Além do
mercado, a abundância e o alto teor dos minérios são de grande valia no mercado
internacional, o que faz com que a empresa tenha um tempo estimado para abandonar suas
operações a longo prazo.
Sendo assim, para Milton Santos e Maria Laura Silveira (2001), “cada
empresa, cada ramo da produção produz, paralelamente, uma lógica territorial. Esta é visível
por meio do que se pode considerar uma topologia, isto é, a distribuição no território dos
pontos de interesse para a operação dessa empresa” (SANTOS; SILVEIRA, 2001, p.292).
Esses pontos estão, às vezes, diretamente ligados, como é o caso de Carajás com a escala
global, e responde a uma lógica do mercado mundial e da modernização da empresa. Segundo
Milton Santos e Maria Laura Silveira (2001) “O resultado, quanto ao território, é de novo o
exercício de um controle parcial de certos pontos por lógicas que se interessam apenas por
aspectos particularizados. Quanto aos outros interesses, não respondem de forma neutra a essa
ação privativista, já que tal ação tem sobre eles reflexos indiretos” (p. 293).
23
Em que medida a multiplicidade de atores sociais tem elevado a
complexidade das relações de gestão municipal nos municípios estudados? Como os
diferentes atores sociais vêm atuando e quais são as práticas por eles adotadas? Em que
medida os diferentes atores sociais através da gestão vêm participando da vida e dos destinos
municipais? Ainda, quais os momentos em que os interesses desses atores sociais aparecem
de forma mais intensa na gestão municipal? Onde começa e onde termina o papel exercido
pela CVRD na gestão dos municípios situados em área sob sua influência? Os municípios em
área de mineração ou sob a influência da CVRD têm tido mais condições de alcançar
autonomia financeira, modernizar suas administrações e gerir democraticamente seus
recursos? Nos municípios de criação recente, as barreiras colocadas pela estrutura de poder
tendem a ser menores do que nos municípios antigos, onde os valores tradicionais estão mais
arraigados?
Qual é o grau de autonomia financeira e administrativa de cada um desses
municípios? Como essa autonomia é obtida? E em que medida a articulação entre as esferas
municipal, estadual e federal tem se tornado um desafio fundamental para o sucesso do
desempenho da gestão nos problemas locais nesses municípios?
O Projeto Ferro Carajás e os projetos a ele associados vêm contribuindo
para mudança na estrutura social e, conseqüentemente, na formação do “poder local”. Assim,
a partir da década de 1980, no sul/sudeste do Pará acontece uma articulação entre os
diferentes padrões de relações existentes. As oposições aos interesses entre os diversos atores
sociais da região do antigo município de Marabá (governo local, empresas, governo estadual,
fazendeiros etc.) agravaram-se. Nesse contexto, as relações sociais tornam-se mais complexas
em escala local, já que “a localidade é menos um espaço físico e mais um conjunto de redes,
estruturadas em torno de interesses identificáveis” (FISCHER, 1992, p. 107).
24
No caso dos municípios de Marabá, Parauapebas, Curionópolis, Eldorado
do Carajás, Canaã dos Carajás e Água Azul do Norte podemos identificar de imediato alguns
grupos que aí sobressaem em termos de relações de poder Esse é caso da Companhia Vale do
Rio Doce (CVRD), da Cooperativa dos Garimpeiros de Serra Pelada (COOMIGASP), dos
sindicatos, das associações de moradores, do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra
(MST), das Organizações Não-Governamentais (Ongs), e das associações de municípios que
atuam nesses municípios. Dessa forma, o estudo do “local”2 volta-se tanto para a relação de
poder, que envolve alianças e confrontos entre atores sociais, como também para a busca por
uma identidade dos municípios e de políticas específicas.
Julgamos pertinente para o desenvolvimento da pesquisa a busca de uma
análise comparativa desses municípios recentes e antigos, porém com graus de autonomia
financeira e administrativa diferenciadas, a fim de desenvolver um quadro empírico com base
em trabalho de campo e investigar as relações que nele se configuram, identificando que
instituições, entidades ou atores sociais têm peso diferenciado dentro da área dos municípios
estudados e como os diversos atores sociais vêm as problemáticas locais e como articulam
com as instâncias de poder municipal, estadual e federal.
Nossa hipótese é de que Marabá, Parauapebas, Curionópolis, Canaã dos
Carajás, Eldorado do Carajás e Água Azul do Norte são municípios com graus diferenciados
de subordinação às decisões de exploração mineral e ações de implementações de projetos da
empresa CVRD e das instâncias estadual e federal. O grau de autonomia administrativa e
financeira de cada um dos municípios reflete o bom ou o mau desempenho administrativo e a
gestão bem ou mal sucedida de seus problemas urbanos e rurais. Dessa forma, a eficácia da
gestão sócio-política, econômica e territorial desses municípios depende dos arranjos locais de
2 A concepção de “local” envolve, enquanto articulação e oposição entre os atores sociais, as interações entre interesses comuns a grupos localmente hegemônicos (PALHETA DA SILVA, 1999).
25
poder e da composição com os poderes extralocais. Depende basicamente da iniciativa e
capacidade de seus governos locais de (a) estabelecer articulações entre o nível estadual e
com nacional e internacional através da busca de convênios ou parcerias; (b) gerar recursos
próprios e (c) dialogar com os atores extralocais.
Por se tratar de uma proposta inovadora, a gestão municipal envolve um
contato mais direto com a população, voltada para a descentralização do poder e participação
popular. Dessa forma, cogestão-descentralização torna-se mais democrática em torno da
capacidade de geração de recursos para decidir o que fazer, como fazer e quando fazer. Torna-
se necessário ainda avaliar como as prefeituras percebem as novas propostas de gestão
municipal e como elas vêm agindo a fim de encontrar soluções alternativas para os seus
problemas.
Nesses municípios, atuam atores sociais diversos e atores sociais comuns,
porém com complexidade variável. Esses novos municípios, criados em diferentes períodos,
têm suas peculiaridades, através das políticas direcionadas por partes do governo estadual e
federal. Destarte, torna-se necessário (1) identificar e mapear as áreas de influência dos
“novos” e “velhos” atores sociais e (2) investigar suas formas de atuação e suas
conseqüências na gestão municipal, tendo em vista as espeficidades históricas e geográficas
desses municípios. Identificar, investigar e analisar, ao nível de cada município: (a) os atores
sociais e suas práticas disciplinadoras ou não, exercidas em diferentes contextos, e seus
poderes de influência e interferência na organização e nas relações sociais, locais e regionais;
(b) as relações entre poderes locais, poder municipal e as demais esferas de poder e os
diferentes atores sociais; (c) a gestão dos problemas enfrentados pelos municípios e suas
conseqüências verificadas no antigo município de Marabá, porém distintos quanto ao grau de
autonomia financeira e administrativa; (d) analisar e comparar o grau de autonomia
26
administrativa e financeira, além das formas de gestão encontradas nesses municípios,
geograficamente contíguos, de origens recentes e localizados no corredor da EFC.
Assim, o debate que envolve Poder, Governo e Território, coloca no centro
das discussões as formas democráticas que consigam elaborar canais de participação da
sociedade civil para que esta não apenas legitime os atos dos governos, mas que possam
também elaborar suas formas de desenvolvimento e colocá-las em prática.
Torna-se necessário entender as formas de desenvolvimento dos diferentes
níveis em que se encontra a sociedade civil e, por outro lado, criar parcerias em diferentes
níveis que vão desde a participação da sociedade civil organizada até a busca de novos
recursos humanos e econômico-financeiros para as administrações municipais.
A discusão dos três conceitos - poder, governo e território – foi o caminho
que optamos trilhar para entender e analisar as relações de poder que influenciam nas formas
de desenvolvimento encontradas por municípios novos e antigos que estão sob áreas de
mineração. Nesse ínterim, a área do antigo município de Marabá, que denominamos como
região de Carajás, nos servirá de objeto de análise para entender as formas de
desenvolvimento encontradas pelos municípios que surgiram a partir dos desmembramentos
ocorridos pós década de 1980 no então município de Marabá.
Esses vinte e três anos de estruturação ou de reestruturação territorial por
que passou a antiga área do município de Marabá, área onde se encontram os principais
projetos de mineração da Companhia Vale do Rio Doce (CVRD), principal empresa nessa
região, tem sido alvo de inúmeras pesquisas, haja vista a aceleração dos processos econômico-
sociais pelos quais tal área vem passando. A complexidade das relações sociais agravou-se
durante estes vinte três anos, e toda uma rede de processos sociais formou-se, direta e
indiretamente, em função das ações econômicas da CVRD na região.
27
O surgimento de uma nova elite econômica, que se sobrepôs diferentemente
à antiga oligarquia dos castanhais, é agora formada por fazendeiros, empresários,
profissionais liberais (médicos e advogados), comerciantes, políticos, etc. E, de outro lado,
por uma rearticulação da antiga oligarquia da castanha, a fim de não perder totalmente o
poder que desde o começo do século XX vinha exercendo no então município de Marabá.
Uma rede de acontecimentos foi responsável pela fragmentação sócio-
territorial de Carajás. No começo da década de 1980, já se fazia surtir os efeitos das décadas
anteriores e um descontentamento da elite local do sudeste paraense em função da partilha
pelo poder político-econômico da região.
A relação que nos parece ser digna de investigação, entre território e
governo, é a relação do poder. A espacialidade do poder liga, a nosso ver, o conceito de
governo e território, e articula as práticas diferenciadas dos atores sociais e a gestão territorial
local.
Para nós, geógrafos, essa relação entre território e governo feita através das
relações e processos que organizam territorialmente o espaço é realizada através do exercício
do poder, institucionalizado ou não, que determinados atores sociais estabelecem como
relações diferenciadas em diferentes esferas institucionais, seja ela federal, estadual ou
municipal. Aqui, o território não é limítrofe, sua escala não é definida matematicamente, nem
fisicamente e, está em constante mutação, em se tratando das relações que dão vida a este
território: as relações sociais, suas potencialidades e seus recursos.
Pergunta-se então: como acontece a gestão territorial dentro desse conjunto
de relações e processos que estão estabelecidos e são constantemente transformados pela ação
dos atores sociais no território? Como definir quais seriam as relações de poder que unem
melhor e definem a escala de análise entre governo e território?
28
A presente pesquisa justifica-se pelo fato de que são ainda reduzidas as
pesquisas sobre (a) a complexidade da gestão municipal desses municípios, ou ainda em quais
situações elas aparecem ou se modificam e (b) como se formam os poderes locais ou sobre
quem são e como atuam os atores sociais na área dos municípios de Marabá, Parauapebas,
Curionópolis, Eldorado do Carajás, Canaã dos Carajás e Água Azul do Norte na região
sudeste paraense, que compõem os poderes locais na escala municipal.
Estudos específicos sobre a relação entre poderes locais e gestão municipal,
tendo em vista a compreensão da realidade dos municípios do sudeste paraense, ainda são
raros e pouco aprofundados. Os desafios municipais e a necessidade de encontrar soluções
novas para os diversos problemas não têm sido acompanhados pelo esforço de realização de
estudos sobre a problemática da gestão, principalmente nessa região, em que surgiram
municípios novos, onde atores sociais mais diversos se fazem presentes como é o caso da
CVRD. Essa é, entretanto, a proposta desta pesquisa, que se concentrará no exame dos
arranjos de poderes nos municípios de Marabá, Parauapebas, Curionópolis, Eldorado do
Carajás, Canaã dos Carajás e Água Azul do Norte, esses cinco últimos de criação recentes e
localizados ao longo da Estrada de Ferro Carajás (EFC) no sudeste do Pará e desmembrados
do município de Marabá.
Como entender diferentes relações sociais sobrepostas de formas
contraditórias; ora fazendo seus pares no território, ora desenvolvendo ações e definindo
práticas de seus interesses? Ficamos observando e estudando essa região, da qual nos
tornamos admirador, tivemos interesse em entender e compartilhar, de forma direta ou
indireta, o conhecimento com aqueles que nos ensinaram tudo que pensamos saber sobre a
região e como também admirá-los por permanecerem na região desenvolvendo suas práticas
para melhorar as condições sociais dos municípios aos quais pertencem. Foi dessa forma que
29
nos propusemos a tentar entender essa região, dentro de uma área limitada para nosso estudo,
mas com complexidade variada e peculiar.
A antiga área do município de Marabá parece ser um amplo laboratório
social para se desenvolverem pesquisas que possam contribuir para melhorar as formas
sociais que fazem dessa área uma das mais importantes do Estado do Pará e do Brasil, por
possuir uma infinidade de recursos naturais para o desenvolvimento do País, bem como é, ao
mesmo tempo, palco de inúmeros conflitos envolvendo diferentes atores sociais que
desenvolvem práticas sociais no território.
Realizamos nossa pesquisa concentrando esforços na revisão bibliográfica
sobre os conceitos analisados na tese. Na elaboração dos capítulos realizamos também
Pesquisa Bibliográfica sobre a área do antigo município de Marabá (Pesquisa Bibliográfica e
documental em Instituições para levantamento de dados nos municípios Estudados:
Superintendência do Desenvolvimento da Amazônia (SUDAM); Tribunal de Contas dos
Municípios do Estado do Pará (TCM); Biblioteca do Núcleo de Altos Estudos Amazônicos
(NAEA); IBGE (Belém); Biblioteca da Universidade Federal do Pará (UFPA); Fundação
Nacional de Saúde (FNS); Secretaria da Fazenda (SEFA-Pará); Tribunal de Contas da União
(TCU); Arquivo Público do Pará; SEBRAE-Pará e Associação dos Municípios do Araguaia
Tocantins (AMAT) e prefeituras dos municípios estudados).
Para melhor analisar estas questões, priorizamos elaborar na primeira parte
(Introdução) um panorama da situação de conflitos que envolvem os territórios dos
municípios estudados e a presença tanto da CVRD, como também de outros atores sociais na
desarticulação das formas de poder tradicionais que dominaram o antigo município de Marabá
através da oligarquia do Tocantins.
Na segunda parte da pesquisa priorizamos discutir os conceitos de Governo
e Território, tomando como ponto de ligação outro conceito que consideramos fundamental
30
nessa tese, o de Poder, procurando estabelecer uma matriz que nos leve a analisar os conceitos
e sua aplicabilidade aos demais capítulos que tratam das questões dos municípios situados em
área de mineração no sudeste paraense.
Na terceira parte, a análise feita foi realizada sobre as relações e processos
de formação sócio-econômico-territorial do município de Marabá, antes das transformações
ocorridas durante a década de 1980, e como esse período foi de fundamental importância para
a formação e consolidação econômico-político-social de Marabá e os diferentes momentos
onde ocorreram emancipações no município de Marabá.
Na quarta parte da pesquisa, procuramos analisar e contextualizar a antiga
área do município de Marabá, durante a década de 1980, e os processos sócio-político-
econômico-financeiros que dinamizaram o período posterior e transformaram os municípios
de Marabá, Parauapebas, Curionópolis, Eldorado do Carajás, Canaã dos Carajás e Água Azul
do Norte como palco dos possíveis projetos da Companhia Vale do Rio Doce (CVRD); a
dinâmica interna de cada município em relação a sua viabilidade econômico-financeira e as
formas de poder expressas através de produção sócio-político-econômica do território.
Da quinta parte em diante, vamos tratar dos municípios e de seus recursos
sócio-político-econômicos, e as materialidades das relações de poder tentando mostrar que o
território na região de Carajás é um território sócio-político-econômico, e que as relações de
poder são relações que fazem desse território um espaço de complexidades variadas, no tempo
e no espaço, pelos diferentes atores sociais nos municípios que sediam os principais projetos
da CVRD no sudeste do Pará. Com base em entrevistas e documentação que foram realizadas
in loco com atores locais envolvidos nas formas de produção do espaço geográfico,
procuramos analisar a década de 1990 e os processos que fizeram a área onde estão
localizados os principais projetos da CVRD no Pará, continuar a ser uma área que ainda tem
ações que podem levar a novas emancipações territoriais, bem como a mudança das ações da
31
Companhia Vale do Rio Doce nos municípios que sediam seus projetos e estão sob sua área
de influência após suas privatização, e as implicações advindas de sua privatização para
gestão municipal de cada um dos municípios estudados.
Na sexta parte, vamos analisar como os processos analisados nos capítulos
anteriores deram à área do antigo município de Marabá a atual configuração territorial e quais
as perspectivas de desenvolvimento sócio-econômico desses municípios em razão da lógica
da privatização e dos conflitos territoriais surgidos ao longo de tempo em Carajás.
Sabemos que os diferentes conceitos interligados (poder, governo e
território) na pesquisa aqui proposta também são desafios para nós. Nestes 13 anos de
formação como aluno, professor e profissional de Geografia, temos percorrido um campo do
saber que nos tem dado prazer em continuá-lo; o campo da Geografia, principalmente, sem
deixar de lado a sua relação com outras ciências. Para nós, é um desafio trilhar neste caminho
que nós mesmos escolhemos, por gostar de fazer da Geografia um prazer na nossa vida, mas
sabemos também que é um sempre caminhar que não se acaba aqui, apenas me deixa com
mais instrumental no exercício da busca pelo conhecimento para prosseguir nesse caminho.
32
2 - PODER, GOVERNO E TERRITÓRIO.
A Geografia tem se preocupado com a análise dos conceitos ou noções
referentes às diversas problemáticas relacionadas ao território. Em Por uma Geografia do
Poder, Claude Raffestin (1993) analisa questões referentes ao papel da geografia política,
destacando conceitos como poder e território, questões que para nós são de extrema
relevância, e Milton Santos (1996), em A Natureza do Espaço, contribui para a análise dos
conceitos/noções que são importantes para a análise geográfica, apenas para citar dois
importantes teóricos da Geografia, dentre outros. Nessa trilha teórica, procuraremos analisar
Poder, Governo e Território enquanto instrumentais teóricos fundamentais para uma melhor
compreensão do objeto de estudo aqui proposto. São conceitos que analisaremos, não
perdendo o contexto histórico-geográfico, ou seja, a relação com a realidade dos municípios
estudados neste trabalho.
2.1 – Refletindo sobre os conceitos
Debater conceitos ou noções fazendo uma associação com a prática das
relações sociais, ou seja, os processos sociais que dão vida às formas que a sociedade
interpreta, parece ser ainda para nós um desafio. Para não cometermos o “erro”
epistemológico de confundir conceitos e noções, o exercício de revisão crítica necessita ser
feito para melhor precisar nossa pesquisa. Quando buscamos a formulação de nosso
problema, recorremos à prática de discussões de três conceitos que pensamos serem essenciais
à nossa pesquisa (Poder, Governo e Território), essa tríade que gera e está presente no dia-a-
dia das práticas sociais.
Porém, como na análise de Gilles Deleuze & Félix Guattari (1997), as
discussões que envolvem conceitos ou noções são a de “que cada conceito remete a outros
conceitos, não somente em sua história, mas em seu devir ou suas conexões presentes” (p.
33
31). De uma forma ou de outra, a interpretação desses conceitos ou seu conteúdo está
expressa em práticas que o modificam a partir do momento em que as relações sociais vão se
modificando também. Eles vão afirmando mais que os conceitos “não são jamais criados do
nada” (p.31), daí o caráter material das relações sociais estar presente nos conceitos, ou seja,
há uma dialética entre essa relação do abstrato com o material, como já havia alertado Marx
em relação à crítica da economia política3.
As relações sociais em municípios-sede de atividades de mineração
(industrial associada à grande empresa, e artesanal relativa ao garimpo) no sudeste paraense
foram desenvolvidas ao longo da história dos lugares. Tais relações precisam ser
compreendidas dentro de um contexto de articulação entre diferentes atores sociais,
identificados em escalas diversas. Isso é essencial ao entendimento das conexões
estabelecidas entre o lugar (o município) e os agentes situados nas escalas estaduais, nacionais
e internacionais.
Destarte, as relações sociais, que são definidas por meio de práticas
diferenciadas e desenvolvidas de forma espacializada no território, carregam uma organização
que pode ser apresentada sob a forma de governo, compreendido no sentido da organização
política que envolve os órgãos oficiais do país, Estado ou município, e que aborda a
organização político-social dos diferentes atores sociais que materializam suas ações no
território.
Poderíamos organizar nosso pensamento partindo dos vínculos existentes
entre Poder, Governo e Território. A inter-relação que existe entre esses conceitos encontra-se
expressa na prática sócio-político-econômica observada nos municípios ou nas ações
espacializadas dos atores sociais, que participam da vida sócio-política dos municípios em
geral.
3 Contribuição à Crítica da Economia Política. Karl Marx. 2ª ed. (tradução de Maria Helena Barreiro Alves). São Paulo: Martins Fontes, 1983.
34
Toda e qualquer ação que a sociedade desenvolve acontece/materializa-se
no território através de relações sociais entre os níveis mais diferenciados nas escalas social,
política, econômica e cultural.
Milton Santos e Maria Laura Silveira nos colocam a importância de
entender que “a categoria de análise é o território utilizado” (SANTOS; SILVEIRA, 2001, p.
247). Sendo assim essa utilização do território, continuam os dois autores, “Quando
quisermos definir qualquer pedaço do território, deveremos levar em conta a interdependência
e a inseparabilidade entre a materialidade, que inclui a natureza, e o seu uso, que inclui a ação
humana, isto é, o trabalho e a política” (SANTOS; SILVEIRA, 2001, p. 247).
Os usos do território caracterizados por Milton Santos e Maria Laura
Silveira (2001) permitem-nos analisar a relação dos conceitos e das noções e aplicá-los ao
nosso objeto de pesquisa, evidenciando a relação entre trabalho e política e esses na relação
entre Poder, Governo e Território. A produção do território na definição das diferentes formas
de territorialidades implica práticas sociais, práticas essas que diferenciam territórios e se
diferenciam no território. Dessa forma, Poder, Governo e Território estão dentro desta análise,
mas não como as únicas formas de entender a utilização do território, mas como elementos
que podem contribuir para dar enfoque em determinados momentos da produção desse
território.
2.2 - Poder
Quando falamos em poder, devemos definir ou contextualizar da melhor
maneira, porque nosso objeto de pesquisa necessita ter interface com a escala de análise que
queremos explicitar, ou melhor dizendo, revelando uma matriz de análise que nos permita
caracterizar melhor as relações de poder dentro do território que é o nosso caso neste estudo.
35
Como ponto de partida, o poder pode ser caracterizado, no referente estudo,
como um campo de forças (BOURDIEU, 1998) que envolve, de maneira diferenciada, atores
sociais que buscam exercer uma relação de poder dependendo do momento histórico para
assim tentar reproduzir suas relações sociais. Poder aparece como um conteúdo diferenciado;
dessa forma, devemos explicitar que tipos de relações de poder estamos tratando, para não
confundir com outras relações de poder.
Pode acontecer que, em relação às formas de poder, ao criarem (os
movimentos sociais organizados, ONG, etc.) um campo de atuação diferenciado de outros
campos que comportam poder, estimulam comportamentos sociais que produzem efeitos no
ordenamento do território. A formação de um determinado grupo que articula relações de
poder pode fazer com que ocorra uma criação diferenciada de relações que esses grupos
configuram em determinados momentos históricos, onde poderão ou não se encontrar
enfraquecidos por utilizarem tais mecanismos para dar continuidade na partilha pelo poder.
Dessa forma, a relação que estimula o poder é definida pela relação social e
pelo posicionamento de atores sociais na resolução de seus objetivos no território para
garantirem sua reprodução e fortalecerem seus laços dentro de uma determinada ordem social.
O poder político-social (DANIEL, 1988; BOBBIO, 1997), aqui definido
pelas suas ações que produzem efeitos no território, é co-relacionado ao campo de poder que
se forma toda vez que existem diferentes interesses no território onde os mesmos não
alcançam um grau de negociação, ocorrendo assim uma fragmentação na disputa pelo poder,
onde os grupos mais coesos tendem a sobressair.
Dessa forma, podemos entender que as múltiplas faces do poder se
manifestam em estruturas político-econômicas, que de uma forma direta e indireta interferem
no poder local, constituindo formas contraditórias que demonstram a fragmentação do poder.
O poder que aqui analisamos é o composto por interesses político-econômicos que dão um
36
conteúdo diferenciado nas relações dos atores sociais. Isso não quer dizer que sejam anuladas
outras formas de expressar o poder (ARENDT, 1994; DANIEL, 1988; BOBBIO, 1998;
FOUCAULT, 1979; LEDRUT, 1981; FISCHER, 1992; DAVIDOVICH, 1993). Podemos
então dizer que, em determinados momentos, o poder torna-se inerente à vontade econômico-
política de determinados atores que disputam a hegemonia do poder local, porém não anula a
participação de outros, que, inseridos no momento histórico, têm seus interesses diferenciados
dos demais, que estão no poder.
2.2.1 - Poder Local
Por Poder Local entendemos as relações que delimitam e reorganizam o
poder entre os diferentes movimentos sociais, não somente da estrutura municipal, imposta
pelo poder legal, conferido aos governantes, através principalmente de alianças político-
econômicas, mas também daqueles que interferem nas práticas das políticas municipais no
reordenamento territorial (DANIEL, 1988).
O poder local que aqui discutimos, ou seja, o poder social e político, está
relacionado tanto à questão da institucionalização do poder, ou seja, o constitutivo formal
onde a sociedade é poder por excelência, quanto às outras formas de exercício do poder, que
são formas oriundas do conjunto da sociedade civil organizada, que as exercem por meio do
poder sócio-político-econômico.
Para Filomeno (1997), “Poder político aparece com a institucionalização do
poder social e com a criação do Estado, que é sociedade política por excelência”
(FILOMENO, p.125). O poder não é neutro, as relações que são exercidas através dele
expressam sem dúvida a vontade daqueles atores sociais que estão em determinados
momentos históricos no poder ou no controle, seja do Estado seja da economia; enfim, como
37
ressalta Filomeno, surge um núcleo peculiar de poder onde existem determinados fins e
propósitos (FILOMENO, 1997).
Esse poder, que se faz por alianças, define práticas diferenciadas entre
atores sociais que participam na mesma escala de poder, ou melhor dizendo, que possuem
interesses comuns. Pode carregar também conflitos internos que permitem verificar
fragmentos de interesses e, posteriormente, afetará a relação de poder.
Dentro desse contexto podemos destacar
Os grupos de pressão nada mais são do que entidades, agremiações ou instituições que, para defenderem interesses próprios ou da comunidade em geral, influem direta ou indiretamente nas deliberações governamentais (de cunho legislativo e executivo). São exemplos disso as associações de classe, sindicatos, grupos empresariais, bancos e suas entidades representativas, as diversas igrejas, a imprensa etc. (FILOMENO, 1997, p. 128).
Dessa forma, podemos observar que as possíveis neutralidades do poder
institucionais não existem, e que essas entidades interferem, como foi destacado acima
(através dos grupos de pressão), nas deliberações a serem efetivadas no território. As
articulações entre as escalas de poder permitem verificar também, dentre outras coisas, a
materialização de interesses exógenos e endógenos no território (SANTOS, 1996). O poder é
uma relação instável em que os conflitos surgem constantemente obrigando as relações de
poder a serem refeitas a todo momento dentro da sociedade.
Celso Daniel (1988), analisando o poder local no Brasil, define três formas
de poder: o poder econômico local, o poder social local e o poder político local. Assim para
ele,
O exercício do poder econômico local é levado a efeito a partir de instituições específicas, que possuem ser as próprias empresas, isoladas ou agrupadas, ou mesmo uniões formalizadas dessas empresas em associações representativas de seus interesses (p.29). [...] o poder social local, em suas diferentes modalidades, alcança sua eficácia no plano simbólico, ainda que sempre acompanhado de um substrato material. Na realidade, não se trata de apenas um poder social, mas de múltiplas expressões sociais de poder, a que correspondem outras tantas culturas políticas, referências para a legitimação do poder político e da própria sociedade (p.30). O poder político local – fruto da conjugação dos poderes executivo, legislativo e administrativo – é
38
exercido, respectivamente, as instituições do governo, da Câmara e do aparelho administrativo municipais. As decisões políticas locais, além disso; são o resultado de um processo sobre o qual os poderes econômico e social buscam exercer influência (p. 33).
As relações de bases material e econômica do poder econômico junto
àquelas relacionadas ao poder social investido nas elites locais e nos movimentos sociais
diversos são relações que definem práticas territoriais e, conseqüentemente, na gestão
territorial de uma maneira peculiar, o que por sua vez expressa que, em determinados
momentos, essas relações definem a configuração territorial que corresponde aos interesses
relacionados tanto com as empresas, quanto com as elites ou movimentos sociais na busca por
seus interesses.
Assim, a capacidade de cada ator social em produzir efeitos que modificam
as formas de gestão ou que, de uma maneira ou de outra, possibilita alcançar seus interesses,
depende, também, dessas formas de gestão, entendidas como formas de negociação
estabelecidas entre os diferentes interesses dos atores envolvidos no território e o das práticas
articuladas do exercício de poder. Os exercícios de poder são na verdade manifestações de
reorganização de forças oriundas de diferentes atores sociais, que materializam suas ações
dentro de um determinado território (PALHETA DA SILVA, 1999, p. 23).
Gestão territorial, dessa forma, envolve atores sociais, de maior ou menor
poder, num processo dinâmico (PALHETA DA SILVA, 1999, p.30), bem como o
desenvolvimento de estratégias para envolver atores interessados no destino de um
determinado espaço geográfico de atuação.
Como, então, classificar os tipos de relações de poder que interferem em
determinados momentos em diferentes escalas e que, em cada uma, produziu um efeito
diferenciado partindo de um mesmo ator social? Em escala global, nacional ou local efeitos
produzem relações diferenciadas e vice-versa, porém é na escala local que esses efeitos são
39
mais perceptíveis e alcançam um número maior de problemas, embora não percamos de vista
sua produção mais ampla.
2.2.2 - Fragmentação do Poder
Nas relações sociais, as definições econômico-políticas são relações que
interferem nas práticas territoriais e definem posições dentro de um contexto político-social e
econômico vivido por esses territórios. Todas as vezes que ocorrer uma modificação das
relações sociais no território, produzida por interesses de poder diferenciados, ocorre uma
rearticulação de outras relações de poder que, por ora, estavam fora da escala de decisão
político-econômica no território e que ressurgem por causa das fragmentações e dos interesses
partilhados por outros atores sociais. Na verdade, há um complexo campo de poder que não é
definido, nem pode ser, por haver interesses diferenciados e alianças multiplicáveis
dependendo das relações que podem ser agrupadas no território em determinado momento
histórico, em virtude de um único interesse mais amplo de determinados atores sociais.
Dessa forma, as relações sócio-econômicas no território não entrariam em
contradição quando tentam conciliar diferentes interesses e mesmo assim promover o bem
estar da sociedade, sem prejuízos, sem deixar de perder de vista o desenvolvimento local? E
como articular as diferentes relações de poder não segregando parcelas significativas da
sociedade e promover o desenvolvimento sócio-econômico? Como ter um governo no
território que contemple as relações de poder e consiga fazer dessas relações diferenciadas de
poder um canal em que a sociedade possa alcançar seus interesses e desenvolver uma gestão
que envolva toda a sociedade civil?
Entender a natureza do poder e como as relações de poder se formam, quais
seus interesses e que impactos elas causarão, é uma tarefa para se ter um governo no território
que possa tentar organizar esses mecanismos da melhor maneira possível e possa também
40
criar canais de participação da sociedade na elaboração de projetos para tentar conter as
diferenças sociais.
2.2.3 – Poder: o uso do Território
O poder torna-se relações de processo de uso do território, materializado ou
virtualizado pelas formas de atuação dos atores sociais locais. Sendo assim, poder é uma
relação estabelecida entre interesses divergentes com fins específicos de utilização do
território.
Os conflitos gerados pelo uso do território também são formas de poder,
embora muitas das vezes o poder esteja em risco, como afirma Hannah Arendt (1993), o que,
para essa autora, aconteceria pelo uso da força ou da violência, ou seja, só há violência onde o
poder está em risco.
O poder é objetivação política do território utilizado para se atingir
determinado objetivo, e um de seus recursos é o convencimento do outro. Dessa forma, é na
relação de poder que podemos evidenciar soluções e conflitos que podem ser gerados pela não
associação de sua prática em relação ao outro, nesse caso as relações político-econômico-
sociais entre o governo local (aqueles que representam interesses de determinados atores
sociais que os ajudaram a se elegerem) e a sociedade civil (aquela que tem dois momentos de
participação: uma que participa indiretamente do poder local; e a outra em sua maioria esta
excluída da maioria das decisões importantes tomadas no território). Que atores sociais
possuem mais poder que outros? E como articulam suas formas de uso no território? Que
parcelas do território são alvos de interesses de determinados atores sociais, e por quê?
41
2.2.4 - Poder Formal e Informal
Quais são os atores sociais que mais partilham o poder e que interesses estão
em jogo? Em que esfera social ou política o poder torna-se mais ativo? Estamos numa
diferenciação entre o poder formal, institucional e poder informal advindo dos movimentos
sociais, e aqui faremos uma diferenciação entre o formal e o informal. O formal seria aquele
da instituição política, vinculada à idéia da esfera municipal, estadual e federal; e o poder
informal é o da sociedade civil organizada, incorporado no papel dos movimentos sociais
diversos e de seus representantes junto às três esferas que mencionamos.
Não estamos querendo dizer que entre essas escalas não aconteçam
associações, mas queremos apenas, para fim de análise, diferenciar seu campo de negociação.
Sabemos que, entre essas escalas, acontecem interferências, seja no poder formal, seja no
poder informal, e que entre esses poderes acontece uma dialética na definição das formas de
desenvolvimento e de uso no território.
Interferência em um tem resultado no outro e vice-versa. Uma
associação/negociação entre os poderes se faz necessária para que aconteçam tanto acordos
quanto divergências, que podem se tornar produtivos no território e fazer com que
determinada relação de poder possa ser concretizada no território com uma definição que
marca o papel de cada movimento social no território. Nessa ocasião, dependendo da decisão
tomada determinados atores sociais poderão sair prejudicados por não terem suas intenções
realizadas no território.
2.3 – Governo e Estado
Estado e Governo fazem parte da mesma unidade de controle do território.
A relação que existe entre Estado e Governo está vinculada à interdependência de suas
existências, enquanto as práticas de cada governo é algo que depende e está sujeito a um
42
tempo pré-determinado, pois os governos mudam. Por exemplo, governo com intervalos de
quatro ou mais anos, garantidos pela Constituição de cada Estado. O Estado tem sido
permanente, em sua existência garantida pela constituição, fazendo com que permaneça o
mesmo em sua estrutura enquanto existe a garantia que o legitima através de sua
regulamentação pelas leis, ou seja, o Estado é um ente institucionalizado, e o governo é um
dos seus elementos essenciais.
Segundo Filomeno (1997),
Quando houver uma clara definição um núcleo de poder (governo) da sociedade (geralmente uma nação, ou mais de uma), bem como das fontes subjetivas e objetivas das normas de conduta – aqui entendidas como os órgãos que as criam – e as normas efetivamente no que tange à sua forma e características; então nós podemos dizer que nesse momento nasce o Estado. (FILOMENO, 1997, p. 63).
Dessa forma, podemos observar que o governo é uma estrutura para manter
o Estado, sua existência depende do Estado e vice-versa. Podemos então destacar que o
Estado é constituído por Elementos Materiais (Território e População), Elementos Formais
(Ordenamento Jurídico e Governo Soberano) e Final (Bem Comum). De maneira genérica,
esses seriam os elementos essenciais na configuração de um Estado. O Governo surge
precisamente da necessidade do Estado ter um núcleo de Poder e esse núcleo constituir,
também, o Estado, ou seja, um Governo composto por órgãos do Estado que exerçam controle
sobre as deliberações e sobre a legislação do território e, conseqüentemente, sobre o bem
comum de sua sociedade. Segundo Filomeno (1997), “pode ainda conceituá-lo como a
organização necessária para o exercício do poder político do Estado” (p.83).
Porém, o Estado também assume diferentes formas dependendo de seus
interesses, e daqueles que estão no poder de direcionar esses interesses. Nesse caso o Estado
permanece em contradição e conflitos, muito embora esses conflitos, para se tornarem
aparentes, necessitem dos interesses das relações sócio-econômico-políticas em confrontos,
43
fazendo com que o Estado apareça nesse momento como um elemento de “violência
concentrada e organizada da sociedade”. O Estado aparece como um aparelho ideológico do
próprio capital. Na intermediação dos interesses sócio-econômico-sociais e sua utilização no
território, o Estado é contestado em seus processos de realização como produto de uma classe
social que acaba sendo representada por ele, haja vista que, quando não colocada a sua
posição em contestação, ele não se posiciona contra aqueles que em outro momento eram seus
potenciais aliados. Nesse caso, o Estado é resultado das contradições internas da sociedade e
se encontra em permanente conflito4.
A noção de Estado está relacionada com a nação politicamente organizada,
o que por sua vez implica conflitos de interesses (FILOMENO, 1997, p. 57). Dessa forma,
podemos acrescentar que a organização do Estado tem seus fundamentos na Constituição que
define normas de regulação das formas político-legislativas do território, controlando sua
sociedade e fazendo cumprir suas leis. Sendo assim, ainda segundo Filomeno (1997),
O Estado como uma sociedade organizada que ocupa um território definido e possui um governo efetivo independente de controle externo; a essência do Estado é a soberania, ou o poder de fazer executar leis, preservando a ordem social pela punição daqueles que infringem essas leis(FILOMENO, 1997, p. 58).
De acordo com certas peculiaridades de determinados territórios, podemos
dizer que, no governo, o domínio torna-se relativo quando visualizamos um conjunto
complexo de conflitos envolvendo diferentes atores sociais em busca de seus interesses. O
controle do Estado e o governo no território, quando observamos seus conceitos, vai além
deles, não fica restrito ao direito do Estado e do Governo, mas depende de um conjunto de
forças que atuam no território modificando, de acordo com seus interesses, as políticas
territoriais, o que exige uma nova análise sobre o papel dos governos locais no plano
territorial. 4 As questões referentes ao Estado tentam articular as contradições e os conflitos internos e externos gerados pelos atores sociais e pela sua representação no conjunto da sociedade e tiveram como motivações os questionamentos realizados por Marx, Engels, Lênin.
44
2.3.1 - Governo e Sociedade
A própria discussão do governo remete a tempos antigos, quando Bobbio
(1997) fala das tipologias clássicas das formas de governo existentes em Aristóteles,
Maquiavel e Montesquieu. Para Bobbio, esses três autores têm uma contribuição fundamental
na discussão de governo. Segundo Bobbio, em Aristóteles, no livro A Política, há uma
classificação da constituição com base no número de governantes; em Maquiavel, apenas
monarquia e república merecem destaque; Montesquieu define três formas: monarquia,
república e despotismo.
Quando aparece a palavra governo, de imediato acontece uma ligação com
uma outra palavra: regra. Neste sentido, as relações pautadas em regras estabelecidas por
constituições, políticas oriundas de um conjunto seleto da sociedade, aqueles que são
incumbidos de fazer uma constituição para terem sob regras seus cidadãos, de uma forma ou
de outra, para que os cidadãos convirjam em ordem segundo a regra “socialmente”
estabelecida.
Porém, em se tratando de governo, ou daqueles que estão sob um governo,
as relações que se fazem presentes em regras governamentais aparecem margeadas por
conflitos de interesses. O conjunto da sociedade na qual um governo exerce seu domínio legal
se encontra em conflito quando direitos sociais são usurpados, o que poderia ser mediado por
relações sociais, que são regras governamentais pautadas numa constituição maior, sob a qual
estados e municípios estão sub judice.
A política de Aristóteles reflete que o bom cidadão seria o bom governo e
vice-versa. Ser um bom cidadão para as relações políticas seria fundamental. Para Aristóteles,
Um cidadão integral pode ser definido por nada mais nem nada menos que pelo direito de administrar justiça e exercer funções públicas; algumas destas, todavia, são limitadas quanto ao tempo de exercício, de tal modo que não podem de forma alguma ser exercidas duas vezes pela mesma pessoa, ou somente podem sê-lo depois de certos intervalos de tempo pré-fixados; para
45
outros encargos não há limitações de tempo no exercício das funções públicas (ARISTÓTELES, 1997, p. 78).
Sendo assim, todo cidadão tem o direito de estabelecer, através do governo,
uma estrutura para manter a cidadania, ou seja, o governo precisa garantir aos cidadãos seus
direitos, assim o tempo de exercício das funções do governo poderia ser limitado, ou não,
havendo, de uma forma ou de outra, uma legislação sobre o território. Esta seria realizada
através do governo, cujas regras pré-estabelecidas organizam os setores da sociedade e
estabelecem quem poderia exercer o comando das relações territoriais.
Para Aristóteles, nenhuma das formas de governo atua para a sociedade
como um todo, todas elas têm uma tendência, e é nessa tendência que gostaríamos de alinhar
nosso pensamento. Seguindo Aristóteles, como definir então para quem se governa segundo a
forma de governo? Para ele,
Se os cidadãos em sua maioria fossem ricos e controlassem o governo, essa maioria no governo seria democracia? Da mesma forma, se em algum lugar os pobres fossem menos numerosos que os ricos e detivessem o poder por serem mais forte, poder-se-ia dizer que o governo seria oligárquico por ser controlado pela minoria?...Riqueza e liberdade são os fundamentos para as reivindicações das duas classes quanto ao exercício do poder político (ARISTÓTELES, 1997, p. 92).
Segundo a afirmação de Aristóteles, poderíamos analisar o pacto político em
relação ao governo, quando grupos chegam ao poder governamental através de representações
de setores da sociedade civil e que, em determinados momentos históricos, dominam as
relações locais e que quando não ascendem ao poder elegem seus representantes, o que, por
sua vez, pode provocar conflitos de interesses entre setores da sociedade que não foram
contemplados.
2.3.2 - Governo e Poder
O governo, sob a égide do conflito social, clama por definições e práticas
contraditórias dependendo da maneira como são estabelecidas as relações sócio-politico-
46
econômicas num determinado território. Dessa forma, em determinados momentos históricos,
atores sociais competem pelo poder político e por decisões que são além de sociais, relações
político-econômicas. A forma de governo assume determinados padrões não lineares,
podendo variar conforme o curso das relações sócio-políticas. Isso depende das forças de
poder que participam das disputas pelos territórios sob diferentes interesses conflitando na sua
maioria quando estabelecem práticas autoritárias de poder para fazer valer a vontade de
determinados segmentos sociais.
2.3.3 - Governo e Descentralização do Poder
Outro fator, essencial no governo, refere-se à questão da descentralização
como forma de atribuição de poder em sua mais variada conceituação. É dado poder de
decisão para os governantes e poder para a sociedade decidir sob a forma de distribuição dos
recursos existentes no território, ou seja, a sociedade passa a ter um certo poder de decidir
sobre a forma de organizar o desenvolvimento no território. Os canais que a sociedade devem
ter para decidir junto ao governo municipal são de extrema importância para o
desenvolvimento local.
Descentralizar significa, a nosso ver, atribuir um conjunto de relações
fiscais, econômicas, jurídicas e sociais etc., para que o governo e a sociedade possam decidir,
no território, relações que possam contribuir para o município ter condições de
desenvolvimento efetivo.
Governo significa associação e parceria entre o poder público e a sociedade.
Sem essa união não será possível um desenvolvimento que, mesmo com conflitos e
desigualdades, leve o município a pensar possibilidades de resolução dos problemas urbanos e
rurais. Torna-se necessária a construção de canais de participação da sociedade civil no
governo municipal, ampliando essas relações às esferas estadual e federal. Isso implica
47
relações de poder que podem ser negociadas para melhor definir as formas de
desenvolvimento de diferentes setores da sociedade, mas sem perder de vista seu contexto
mais amplo, que implica associar diferentes escalas. Nem sempre essas relações de poder
serão negociadas sem conflitos de interesses envolvendo diferentes atores sociais e, mesmo
aqueles que têm interesse comum em um momento, podem entrar em conflito em outro
momento, dependendo do grau de interesse que esteja em discussão e das relações de poder
que estejam em jogo.
Ao analisar as definições de governo, temos a impressão que estão
carregadas de uma maneira formal de legalizar ações, de manter comportamentos, de
legitimar atos, e de formalismo através de regras preestabelecidas. Embora a palavra controle
esteja também presente no ato de garantir comportamentos, é através de regras que o controle
assume seu papel significativo no ato de governar.
Porém, em outro ponto de vista, para que esse governo seja legitimado no
território através de suas ações, torna-se necessário que tenha um efeito positivo para
diferentes atores sociais, muito embora saibamos que essas diversidades de atores e de
interesses acabem fazendo com que ocorram conflitos em virtude dos anseios e das
contradições sociais existentes no território. Este, por sua vez, tem que incluir a sociedade,
construindo canais de negociação para que essa sociedade tenha papel ativo, participação
efetiva nas políticas municipais, definindo formas de desenvolvimento em conjunto com o
governo local.
Segundo Milton Santos e Maria Laura Silveira (2001),
Fala-se hoje muito em guerra fiscal, na medida em que a disputa de Estados e municípios pela presença de empresas e a busca pelas empresas de lugares para se instalar lucrativamente é vista sobretudo nos seus aspectos fiscais. A realidade é que, do ponto de vista das empresas, o mais importante mesmo é a guerra que elas empreendem para fazer com que os lugares, isto é, os pontos onde desejam instalar-se ou permanecer, apresentem um conjunto de circunstâncias vantajosas do seu ponto de vista. Trata-se, na verdade, de uma busca de lugares “produtivos” (SANTOS; SILVEIRA, 2001, p. 296).
48
O papel desempenhado por grupos empresariais no controle de
determinadas atividades econômicas no território acaba, por sua vez, fazendo com que
ocorram conflitos pelas disputas de projetos a serem efetivados nos territórios,
proporcionando as disputas dos lugares por atividades econômicas e os favores fiscais que
cada lugar oferece para atrair determinados empreendimentos econômicos. Embora a escala
local mereça ênfase neste estudo, não podemos esquecer que ela faz parte de um conjunto
maior, que é o governo estadual, o federal e as implicações internacionais que modificam as
relações sócio-econômicas em todas essas escalas. Segundo Milton Santos e Maria Laura
Silveira (2001), “de modo geral, e como resultado da globalização da economia, o espaço
nacional é organizado para servir às grandes empresas hegemônicas e paga por isso um preço,
tornando-se fragmentado, incoerente, anárquico para todos os demais atores” (SANTOS;
SILVEIRA, 2001, p. 258).
A organização econômica do território realizada pelos grandes grupos
econômicos acaba por projetar, também, problemas na ordem social, onde a migração pela
busca de empregos nesses projetos e de melhores condições de vida acaba por acarretar
problemas sérios ao lugar, apenas para citar um dos elementos que os grandes
empreendimentos atraem quando selecionam determinados territórios como ponto para sua
implantação. Geralmente esses pontos econômicos são territórios potenciais para o
empreendimento da empresa, o que por outro lado acaba gerando problemas sérios para os
governos locais, que, na sua maioria, apenas conseguem ver o lado positivo dos projetos,
através dos impostos e geração de empregos, sem se preocupar com os problemas que
poderiam ser gerados a partir de suas instalações.
Esses fatores reabrem uma discussão salutar nos planejamentos territoriais,
sobre que tipo de sistema de governo se exerce a soberania do Estado e, conseqüentemente,
do governo local, considerando o papel dos lugares (municípios) na capacitação de atrair
49
recursos econômicos para seus territórios e o papel desempenhado pela sociedade civil na
organização da gestão territorial.
Em relação à gestão territorial dos governos locais, podemos analisar que
tipo entrou na discussão para fundamentar nossa análise quando se discute a relação entre os
interesses públicos do governo e privados dos grandes grupos econômicos. Nossa forma de
governo republicano nos permite visualizar
o modelo de valorização do poder em um espaço territorial menor está vinculado à idéia de espaço econômico, cultural e político que fundamenta a unidade municipal, e sua viabilidade econômica deve ser fator primeiro a ser observado na recomposição dos municípios brasileiros, possibilitando a construção de uma nova federação onde os municípios cumpram o papel mais importante de construção de uma democracia, e de uma cidadania plena a ser exercida pela população (MAGALHÃES, 1999, p. 118).
As relações exógenas permanecem reordenando as relações político-
econômicas do território, modificando a função dos lugares (municípios), e sobrepondo
poderes e interesses entre o público e o privado. Podemos ver a força da globalização
econômica modificando as relações territoriais e a pressão dos grandes grupos econômicos
modificando a economia local, conectando o território às diferentes escalas, em conflito com
diferentes interesses e com as formas de gestão territorial.
2.3.4 - Governo e Participação da Sociedade
Diante do exposto, como podemos entender o poder institucional e a
sociedade civil sem o processo de organização para que ocorra mudança significativa na
gestão territorial? Podemos ver na afirmação de José Luiz Quadros de Magalhães (1999):
não serão a forma de Estado e o sistema de governo que permitirão a mudança, mas sim a criação de condições sociais e econômicas e o estabelecimento de canais de comunicação e participação, de uma população informada, que permitirão a mudança constante e a evolução permanente do processo democrático juntamente com as transformações do ser humano (MAGALHÃES, 1999, p. 62).
50
Assim, o papel desempenhado pela sociedade civil é um dos caminhos para
uma melhor gestão municipal; com os canais de participação dessa sociedade ampliam-se as
possibilidades de mudanças significativas na gestão territorial, e dessa forma, para que as
decisões sobre a organização econômico-social do território possam ser democráticas e tentar
amenizar os problemas urbanos e rurais de cada lugar.
Outra forma de conceber tal organização é a relação que se poderia fazer
sobre o papel de decisão dos lugares (municípios) como entes federados a partir da
Constituição de 1988, que atribuiu aos municípios mais poderes decisórios. Aqui tratamos do
governo republicano de caráter federalista, como é conhecida a república brasileira, que é
nossa forma de governo. Nesse contexto, a descentralização do governo no território pode ser
pensada sob o ângulo das mais diversas correntes político-econômicas em se tratando de
sistema de governo.
2.4 - Território
O território que aqui tentaremos abordar em uma breve discussão é o dos
geógrafos, aquele das relações e das múltiplas territorialidades/materialidades sociais. O
território que vamos analisar é o político-econômico-social, onde as práticas dos diferentes
atores sociais se materializam, sejam elas internas ou externas ao território. Nessa perspectiva,
optamos pelo uso do conceito de território, pois esse oferece, em termos de abordagem
teórico-metodológica, parte significativa da existência do Estado e conseqüentemente do
governo. O território é a institucionalização do poder por excelência e é nele que podemos
evidenciar os conflitos de interesses entre a institucionalização do poder (poder formal) e os
poderes que lhes são paralelos (poder informal) e que buscam satisfazer seus exercícios
convergindo ou divergindo dele (PALHETA DA SILVA, 1999).
51
A utilização do conceito de território pelos diferentes atores sociais
caracteriza a luta pelo poder que envolve conflitos por definições de territórios. As práticas
reveladoras de interesses dentro do campo de poder (BOURDIEU, 1998) envolvem interesses
contrários e convergentes.
Como, então, discutir as práticas reveladoras de ações sociais5 que se
materializam no território e definem campo de poder associados aos atores sociais portadores
de diferentes interesses? Que atores sociais têm mais peso que outros no uso do território
específico num momento histórico particular? Quais são as alianças e os conflitos gerados
pelo uso do território? De que forma os atores sociais usam o território definindo práticas de
poder? Esses são alguns questionamentos que aparecem quando nos deparamos com um
campo de poder conflituoso, no qual os exercícios do poder e de suas práticas reorganizam o
território e definem a gestão territorial dos governantes e dos sujeitos das políticas
governamentais.
O território, dessa forma, torna-se um palco de relações e processos no qual
os atores sociais definem suas práticas espaciais de poder e sua territorialidade. O território
parece, de imediato, um campo de forças de poder diferenciado, com graus distintos de
legalidade. Determinados tipos de atores sociais se unem, através de sindicatos, ONG,
movimentos de bairros etc, para, por meio de sua organização, poder fazer partilhar ou tentar
partilhar o poder no território.
2.4.1 - Relações Territoriais
A territorialização das ações que marca a presença no território “conduzida”
por atores sociais é caracterizada pela diferenciação de interesses que forçaram 5 Para Émile Durkheim “é fato social toda maneira de fazer, fixada ou não, suscetível de exercer sobre o indivíduo uma coerção exterior; ou ainda, toda maneira de fazer que é geral na extensão de uma sociedade dada e, ao mesmo tempo, possui uma existência própria, independe de suas manifestações individuais” (DURKHEIM, p.13). Utilizamos aqui o termo ações sociais com a finalidade mais ampla no conjunto do atores sociais que modificam as relações sociais presentes no território, definindo práticas disciplinadoras de atuação.
52
posicionamentos diferentes causando conflitos no território. Os atores sociais possuem, a
partir de seus interesses, posições que delimitam seus respectivos poderes no território,
definindo e redefinindo suas territorialidades. A luta expressa por meio de conflitos reais e
latentes entre atores sociais de interesses diversos redefinem um território mais ou menos
sujeito às interferências, tanto internas como externas, de outros atores situados em escalas
diferentes que tentam reorientar o local a partir de seus próprios interesses.
Conseqüentemente, na imagem desejada de um território nem sempre se revela o
planejamento pretendido pelo ator social ou por atores sociais, demonstrando a multiplicidade
de interesses e as interferências que se caracterizam nos planos do território. As ações
político-econômico-sociais de diferentes atores hegemônicos criam a superposição de
territórios localmente estabelecidos.
Segundo Claude Raffestin (1993),
o território se forma a partir do espaço, é o resultado de uma ação conduzida por um ator sintagmático (ator que realiza um programa) em qualquer nível. Ao se apropriar de um espaço, concreta ou abstratamente (por exemplo, pela representação), o ator “territorializa” o espaço. Evidentemente, o território se apóia no espaço, mas não é o espaço. É uma produção, a partir do espaço...Qualquer projeto no espaço que é expresso por uma representação revela a imagem desejada de um território, de um local de relações (RAFFESTIN, 1993, p. 143-144).
Essa produção, a partir do espaço, é feita através do uso que a sociedade
realiza no território. Os atores sociais ao realizarem suas ações político-econômico-sociais
territorializam práticas sociais para suas permanência nele. Mas nem sempre as práticas
territoriais revelam-se como desejadas por seus atores sociais, pois elas dependem de um
conjunto de fatores de negociação e conflitos que envolvem quase sempre mais de um
interesse no território.
O território do município torna-se, assim, o locus privilegiado para análise
das práticas de gestão territorial e do campo de poder na definição do território no qual
melhor podemos evidenciar o uso do território pelos diferentes atores sociais. É no município
53
que esses atores buscam resolver seus anseios e garantir seus acessos aos recursos sociais.
Para isso lutam para ampliar as possibilidades de participação efetiva nas políticas sócio-
econômico-culturais.
Quais os territórios que podemos identificar como possibilidades de ação e
transformação de diferentes atores sociais? Quais as multiplicidades territoriais que
superpõem interesses e criam campos conflituosos?
Claude Raffestin (1993), ao tratar do território e da territorialidade, levanta a
questão do poder presente no território. Assim, para ele,
os homens “vivem”, ao mesmo tempo, o processo territorial e o produto territorial por intermédio de um sistema de relações existenciais e/ou produtivistas. Quer se trate de relações existenciais ou produtivistas, todas são relações de poder, visto que há interação entre os atores que procuram modificar tanto as relações com a natureza como as relações sociais. Os atores sem se darem conta disso, se automodificam também. O poder é inevitável e, de modo algum, inocente. Enfim, é impossível manter uma relação que não seja marcada por ele (RAFFESTIN, 1993, p. 158-159).
O território, para Raffestin, é uma interferência de poder constante pelas
práticas dos atores que modificam esse território a todo instante. As relações que carregam
conteúdos de poder, ou seja, intenções a serem materializadas no território, são parciais, têm
uma intencionalidade, ou melhor, carregam a “vontade” de grupos que mantêm o poder e se
manifestam no território através de seus interesses. A característica de cada território está
carregada de diferentes intenções sobre as quais os atores expressam suas vontades no
território, territorializando relações que são marcadas pelo poder e, dependendo do contexto
histórico, de conflitos de interesses que formam o campo conflituoso no território marcado
pelo poder em conflito.
As redefinições de relações que se tornem mensageiras de soluções
elaboradas por determinados atores sociais que compartilham o poder local e que definem
formas de desenvolvimento no âmbito municipal são elementos essenciais na configuração
das práticas territoriais efetivadas no espaço do município. Todas as decisões que podem
54
modificar práticas territoriais ou que podem atingir direta ou indiretamente determinados
setores da sociedade civil são relações que poderiam ser analisadas e ter como partícipes os
cidadãos dentro de uma gestão territorial participativa.
As formas que organizam o território, pelas relações que distintos atores
sociais materializam, transformam o território em campo conflituoso pelas disputas de seus
direitos. Para se resolverem direitos conflitivos, estratégias territoriais são lançadas nas
formas de ações político-econômicas e sociais.
2.4.2 – O Uso do Território
Para Milton Santos e Maria Laura Silveira (2001), o território possui
determinados pontos que possuem uma forma modernizada que, por sua vez, atraem, para ele,
uma característica de produção. Esses territórios, acima de tudo, são pontos únicos.
Observamos que, em seus entornos, há, em geral, uma ordem diferente daquele estabelecido
pela modernização especializada, uma ordem que foge à lógica da modernização imposta no
caso por uma grande empresa, ou seja, é uma lógica diferente da lógica da organização
produtiva do território modernizado pela empresa.
Dessa forma, segundo Milton Santos e Maria Laura Silveira (2001),
as configurações territoriais são o conjunto de sistemas naturais, herdados por uma determinada sociedade, e dos sistemas de engenharia, isto é, objetos técnicos e culturais historicamente estabelecidos. As configurações territoriais são apenas condições de sua materialidade, isto é, sua significação real, advém das ações realizadas sobre elas (SANTOS; SILVEIRA, 2001, p. 248).
Os recursos existentes no território, que são elementos de intencionalidade
através das práticas sócio-político-econômicas, materializam, segundo Milton Santos e Maria
Laura Silveira, as configurações territoriais. Dessa forma, tornam-se passíveis de serem
questionados por aqueles que se sentem excluídos dos seus usos ou que de alguma forma são
55
parcialmente contemplados. Assim, tanto os recursos naturais existentes como os recursos
político-econômicos são alvos de questionamentos sociais que pleiteiam a sua socialização
para uso geral da sociedade.
O território, neste caso, passa pelas relações sociais, que também são
produto e produtores de novas configurações territoriais e definem práticas reveladoras de
diferentes interesses, partindo de diferentes atores sociais que no território expressam suas
vontades, seus anseios, enfim suas práticas sociais, culturais, econômica e política em
diferentes contextos históricos fazendo ocorrerem conflitos sociais de diferentes natureza.
Há uma flutuação entre os níveis global, nacional e local. O local assume
uma forma bem mais heterogênea que os demais, por possuir uma diferença bem mais visível
na escala municipal. É na escala local que se evidenciam essas diferenciações. As práticas
políticas, disciplinadoras ou não, de organização territorial e de relações, definem tanto a
gestão como os conflitos virtualizados pelas novas ações diferenciadas, ou não, dos atores
sociais.
No território, está expressa a vontade e a materialidade de formas
diferenciadas de poder seja ele político, econômico, social ou cultural, considerado
isoladamente ou em combinação, mas que expressam a singularidade do território e dos atores
sociais envolvidos, definindo práticas de governo em suas diferentes frentes.
2.4.3 - Território e Territorialidade
A territorialidade torna-se, assim, uma condição para se atingir a resistência
nos lugares e a organização em setores da sociedade civil para elaborarem suas metas para
atingir suas ações e seus anseios em relação ao desenvolvimento sócio-econômico-político. O
significado do território está diretamente relacionado com as diferentes territorialidades que
os atores sociais materializam por força de suas relações de poder. Buscar desenvolver
56
estratégias de desenvolvimento sócio-econômico-político passa a ser objetivo dos atores, que
precisam garantir suas territorialidades.
As estratégias de territorialidades que os atores sociais materializam no
território dão origem a uma rede de relações sociais que tornam suas relações de poder mais
solidificadas. Dependendo do momento histórico e do campo de força no qual eles estão
envolvidos, criam estratégias para marcar suas presenças no território.
A classificação dos territórios faz-se a partir de suas territorialidades através
da multiplicidade de fenômenos que ocorrem no seu território e qualificam as práticas sociais
que os atores sociais desenvolvem no uso do território. As diferenciações e as práticas sociais
dependem do conjunto de forças que atuam no espaço territorial e das relações de interesses
que estão em jogo em determinados momentos históricos.
Embora a territorialidade seja obtida muitas vezes por relações de poder,
estas nem sempre são visualizadas facilmente. Mas é na escala do município que melhor
podemos evidenciá-las, como já foi dito anteriormente. Porém, toda territorialidade é uma
relação direta com a busca de interesses diferenciados entre os que se territorializam e as
outras diferentes territorialidades.
Outra tentativa de avançar sobre a questão da territorialidade e de seu
domínio político é proposta por Bertrand Badie, quando ele analisa que “não sendo uma
questão em si, o território é, pelo menos, o atributo material do objetivo visado, isto é, do
exercício do poder” (BADIE, 1995, p. 198). Porém, toda relação de poder no território é
também uma forma conflituosa de territorialidade e de materialização das ações de diferentes
atores sociais uma vez que existe mais de uma territorialidade e conseqüentemente mais de
um interesse no território.
57
3 – O MUNICÍPIO DE MARABÁ E SUA FORMAÇÃO TERRITORIAL: BREVE CONSIDERAÇÃO SOBRE O FINAL DO SÉCULO XIX ATÉ OS NOSSO DIAS
As questões referentes aos municípios no Brasil perpassam a sua viabilidade
econômico-financeira e a possibilidade de cada um na capacitação de recursos para viabilizar
tanto o planejamento quanto o desenvolvimento municipal. A relação de viabilidade
econômica em municípios como Marabá, Parauapebas, Curionópolis, Eldorado do Carajás,
Canaã dos Carajás e Água Azul do Norte é bem diferenciada. Marabá, o município-mãe, que
deu origem aos demais, tem sua história econômico-social pautada em economias agrárias
exportadoras, o que proporcionou o surgimento de grupos políticos locais, no domínio das
políticas públicas e na formação de uma elite oligárquica que dominou seu território durante
décadas, desde sua formação até a entrada de um outro tipo de extrativismo na região.
Destarte, com os ciclos econômicos pelos quais esse município passou e
com o surgimento de novos tipos de extrativismo, principalmente o mineral, ocorreu uma
mudança na estrutura de poder local: grupos de profissionais liberais, empresas e bancos,
passaram a exercer o poder em conjunto com a oligarquia local, ora convergindo, ora
divergindo nos seus interesses. Esse clima que ocorreu, a partir da segunda metade da década
de 1970 (EMMI, 1988), carregou indícios dos tempos áureos da borracha e da castanha, na
formação econômica do território de Marabá, onde podemos ver que a estrutura da oligarquia
local ainda subsiste, embora se tivesse rearticulado (diante de um novo modelo econômico,
que envolve diferentes atores sociais na conquista econômica do território) com os novos
atores sociais, para não perder totalmente o poder na região, através de diferentes formas de
favores políticos e união dos grupos locais de poder.
Marabá continuou com seu papel de pólo regional, em função das relações
político-econômicas que já vinham do início do século XX. Com a abertura das estradas, na
década de 1960 e 1970, e dos projetos de mineração na década de 1980 em seu território, o
58
município se tornou ainda mais estratégico para o desenvolvimento do Estado e do País,
devido à exportação de produtos minerais para o mercado internacional e do valor
significativo de suas reservas minerais existentes em seu território.
No Pará e em geral no Brasil, a maioria dos municípios criados,
principalmente aqueles que foram criados pós-década de 1980 no sudeste paraense, surgiram
em razão de fatores políticos, o que tem colocado em xeque seu papel enquanto forma para se
atingir o desenvolvimento sócio-econômico local.
O município de Marabá e municípios criados a partir de sua fragmentação
territorial, na década de 1980, que analisamos aqui, não fogem ao contexto dos fatores
políticos-econômicos citados acima. Políticas arraigadas do tradicionalismo por parte das
elites oligárquicas e sem perspectivas de melhorar as condições de vida das populações foram
exacerbadas por práticas sociais que se consolidaram no domínio de municípios como Marabá
durante décadas. Na ausência de uma visão de planejamento voltada para a sua sociedade,
acabaram deixando passar momentos importantes da história sócio-econômico-política desse
município, causando graves problemas sociais, que se refletem nas atuais configurações
territoriais dos municípios e nos conflitos de poder, que se traduzem, também, nas
emancipações territoriais, aqui estudadas.
O papel desempenhado por uma elite que sustentou o poder durante décadas
e, com ele, se consolidou no domínio do poder local no sudeste paraense, manipulando as
relações político-econômicas, sobretudo, para garantir seus domínios na região e com isso
estreitar os laços políticos com a capital paraense, era uma forma de conseguir enfrentar as
crises que oscilavam entre as economias extrativistas da borracha e, posteriormente, da
castanha-do-Pará, que quase sempre os ajudavam a manter a estrutura de poder local; por
outro lado, deixava de lado os problemas urbanos e rurais de seus núcleos urbanos,
desconsiderando as verdadeiras funções do governo no município.
59
Porém, o que se viu no Pará foi a formação dos “currais eleitorais” no
sul/sudeste paraense com seus coronéis no domínio das políticas municipais, centralizando,
ainda mais, o poder da federação na região, tendo como aliada a elite política da capital
paraense, da qual eram seus representantes na região. As elites que dominavam as relações de
poder no Pará precisavam assegurar seus domínios, por isso expandiram seus interesses até as
áreas mais longínquas, como a de Marabá, para garantir suas alianças tanto políticas quanto
econômicas e, assim, consolidar seu papel de dominação na fronteira, tanto com o Estado do
Maranhão, quanto a parte do Estado de Goiás (hoje Tocantins), favorecendo seus pares e,
dessa maneira, continuar na manutenção do controle político-econômico do Estado,
fortalecendo seus representantes locais.
3.1 - A Configuração Territorial de Marabá no Final do Século XIX e Início do Século XX
A formação territorial paraense tem ligação com a expansão portuguesa para
controlar a fronteira de seu território na região Norte contra a invasão de outros países. O que
fazia parte do domínio português, no século XVII, era alvo de penetrações de outras nações
européias e deveria ter um ponto estratégico para controlar a entrada da região voltada para o
Oceano Atlântico. Belém surgiu em 1616 com a fundação do Forte do Presépio, às margens
da baía do Guajará, como ponto de apoio à fiscalização da região e como área militarizada
pelos portugueses para controle da região sobre os recursos que eram objetos de invasões de
outros países, principalmente, as drogas do sertão. É a partir desse contexto que a ocupação
do território passa a ser fundamental para o controle da região, e, assim, vão surgindo
estratégias de ocupação como as missões e os fortes na região ao longo dos diferentes rios da
Amazônia.
A segunda metade do século XIX e o início do século XX foram marcados
por formas que indicavam o progresso paraense em alguns setores, como o de energia, o de
60
transportes, entre outros. A capital paraense despontava como uma das cidades brasileiras
cujo o crescimento de atividades econômicas realizadas através de investimentos era um dos
mais significativos e cujo o capital local estava associado ao capital estrangeiro, que fazia a
diferença na economia local.
Relatos da viagem de Ignácio Moura6 colocam-nos diante da realidade do
século XIX na região do vale do Tocantins, e do período histórico vivido pelo Estado do Pará,
e dos investimentos que já se faziam presentes no território paraense,
o nosso regime comercial se desenvolve; as duas linhas inglesas de barcos a vapor, as linhas para a América, e as companhias alemães põem-nos em rápida comunicação com o mundo exterior. O gênio do Barão de Mauá, criando a navegação a vapor para o Amazonas, marcou meta gloriosa ao desenvolvimento do Pará [...] A par do desenvolvimento da navegação, e com ela o do comércio, as instituições bancárias se multiplicam, o valor dos bens imóveis aumenta, novos produtos se descobrem, novas aplicações são estudadas e os créditos públicos, que em 1847 mal chegavam a mil contos, em 1897 ascendem a quatorze mil (MOURA, 1989. p. 34).
Assim foram surgindo territórios econômicos no Pará, ligados tanto à
economia internacional, como aos investimentos do capital local, o que indicava de imediato
os ciclos pelos quais a economia paraense teria que passar, para atender aos interesses
econômicos internacionais, o que, por sua vez, proporcionou a formação de uma elite local,
com vínculos aos interesses ligados à escala internacional.
Essas relações econômicas favoreceram e fortaleceram a implantação da
economia local, no sudeste paraense, principalmente a economia agrária exportadora da
castanha, fazendo surgir, sobretudo, os comerciantes como força política local. Dessa forma,
outras regiões paraenses foram direta ou indiretamente se beneficiando do papel
desempenhado pela capital paraense.
Por sua vez, municípios que tinham uma certa expressão econômica como
Marabá, Tucuruí, Santarém, além de outros, constituíram-se em cidades importantes em 6 Em seu livro Ignácio Moura relata a viagem que realizou de Belém a São João do Araguaia no vale do rio Tocantins.
61
virtude de suas relações político-econômicas, já que se tornaram ponto de apoio à economia
do Estado e de suas regiões. É nesse contexto que Marabá assume o papel político-econômico
proeminente dentro da região sul/sudeste paraense.
3.2 - Marabá no Contexto da Economia Local: do século XIX ao século XX
O município de Marabá foi emancipado, em 1913, desmembrado do então
município de São João do Araguaia. As relações que davam vida à sua configuração territorial
eram constituídas a partir da oligarquia do Tocantins, que tinha como economia fundamental
a castanha-do-Pará. Suas relações econômico-políticas eram exercidas por famílias
oligárquicas que tinham controle dos principais castanhais da região.
O controle dos castanhais era feito por famílias de brasileiros que vieram,
primeiramente, em busca do caucho (borracha) e, logo em seguida, por famílias de libaneses,
que, além de terem sido atraídos pela economia da borracha, tinham empreendimentos no
comércio de outras cidades do Maranhão, e que transferiram suas atividades econômicas para
Marabá. As primeiras famílias que chegaram à região tinham por objetivo a coleta da
borracha (caucho) que no final do século XIX era abundante na região de Marabá, e que tinha
mercado internacional significativo.
Segundo Brandão (1998), o território do antigo município de Marabá já
tinha sido alvo de visitas estrangeiras no século XVI, o que desencadeou a vinda de
Bandeirantes para o local, mas foi só a partir de 1892 que essa área sofreu com mais
intensidade a procura por parte de migrantes vindos principalmente do Maranhão atrás da
borracha e fugindo da guerra de Boa Vista. Tais migrantes encontravam na fronteira do Pará
com Goiás (hoje Tocantins) e Maranhão um território propício para fixarem suas atividades.
A origem e a ocupação do território de Marabá são contadas por formas
diferenciadas: a mais antiga diz respeito à estratégia de ocupação portuguesa no Pará, com a
62
instalação dos fortes e com a entrada dos bandeirantes (os bandeirantes atrás de índios para
escravizá-los e atrás de ouro, foram um dos primeiros a adentrarem o corredor do vale do
Araguaia-Tocantins, seguidos pelos jesuítas, que tinham além das catequeses, interesses
comerciais nas drogas do sertão e nos minérios); a mais recente diz que no século XIX,
devido à guerra civil de Boa Vista (Goiás), refugiados da guerra migraram para a região,
ocupando áreas da região sudeste paraense onde uma delas formou o Burgo de Itacaiúnas.
Vicente Sales, prefaciando o livro de Ignácio Moura, relata a conquista do
território do Araguaia Tocantins,
O território regado pelos rios Tocantins e Araguaia foi devassado, explorado e colonizado por duas correntes de expansão, uma de sudeste e de sul para norte e outra de norte para o sul. A primeira, iniciada com os bandeirantes da Piratininga, partindo de São Paulo vinha pelos sertões adentro em procura do ouro das minas; a segunda, dos colonos portugueses do Grão-Pará, rios Tocantins e Araguaia acima, ia ao resgate de índios. Uns e outros deixavam ao longo da caminhada sinais da passagem, aqui e ali pessoas que se desgarravam ou se fixavam na terra, estabelecendo núcleos populacionais e direitos de ocupação, reconhecidos a partir de regras consuetudinárias e legitimados pela legislação colonial. Essa legislação delimitou a jurisdição das terras ocupadas e estabeleceu direitos aos territórios jurisdicionados por governos sediados em Belém, São Luís e Vila Boa de Goiás, que usaram dela para manter as terras incorporadas à sua entidade político-administrativa de capitania, de província e de Estado (SALES apud MOURA, 1989. p. 07).
A ocupação do Tocantins-Araguaia só pôde ser efetivada no século XX. Os
fatores determinantes para sua ocupação foram, a borracha, a castanha, os garimpos e o
sistema pastoril, os quais atraíram diferentes correntes migratórias para a região, como os
paulistas e mineiros (DA MATA; LARAIA, p.62-63). Essa expansão proporcionou a
instalação de povoados, como Alcobaça (hoje Tucuruí) e o Burgo de Itacaiúnas (hoje
Marabá)7. A importância desses dois núcleos urbanos foi fundamental para que, em 1927,
começasse a construção de uma ferrovia (Estrada de Ferro Tocantins, com 117 km), que só foi
7 O rio Itacaiúnas foi importante, principalmente no início do século XX, pois fazia a ligação para oeste com a Serra dos Carajás, na região que é hoje o município de Parauapebas.
63
terminada na década de 1940, para dinamizar a exportação da castanha e da borracha na
região (DA MATA; LARAIA, 1978, p. 66).
Segundo Roberto da Mata e Roque Laraia (1978),
além da catequese, das bandeiras, da busca do ouro e da caça aos índios, e da expansão pastoril, devemos citar as expedições geográficas que, a partir do século XVIII, procuraram estabelecer ligações fluviais entre o norte e o sul do país, sendo ora determinadas pelo governo de Goiás, ora pelo do Pará. Dentro deste programa, para facilitar a navegação, foram fundados vários povoados e fortes (P.62).
O território paraense estava voltado muito mais para o comércio exterior
que propriamente para o restante do Brasil. Assim a borracha tinha um papel peculiar na
economia e seu valor, no mercado internacional, direcionava os movimentos da economia
paraense. O sudeste paraense, nesse contexto, teve um valor significativo para a economia do
Estado, pois no seu território o caucho teve um valor representativo e despertou o interesse de
outros comerciantes, tanto brasileiros quanto estrangeiros, que vieram para a região e
começaram a fazer a exploração dos seringais paraenses.
A área do antigo município de Marabá era então dominada por relações de
aviamento que envolviam donos de barracões e aqueles que se aventuraram na procura do
látex. Os ciclo se iniciaram no século XVI pelas drogas do sertão, passam pelo minério, pelo
ouro do vale do Tocantins, pela borracha e, entre o final do século XIX e início do século XX,
desencadearam uma corrida pelo extrativismo da goma. Era a partir dessas economias que se
dava a ocupação do território na região sudeste do Pará.
O então burgo do Itacaiúnas surgia, dessa forma, como refúgio daqueles que
fugiam da guerra de Boa Vista e vinham em busca do caucho na região, como já foi citado
anteriormente. O valor econômico da borracha e o ponto estratégico no qual estava localizado
o burgo, na confluência dos rios Tocantins e Itacaiúnas, favoreciam o comércio e o transporte
da borracha para outros locais. Vicente Sales, analisando esse período no prefácio do livro de
Ignácio Moura, relata:
64
é o tempo em que Ignácio Moura é comissionado pelo governo do Estado, 1896, ainda governança de Lauro Sodré, para inspecionar o burgo de Itacaiúnas, onde, com os favores do Estado, o célebre coronel Carlos Leitão recolhera em colônia agrícola os foragidos da guerra de Boa Vista, Goiás [...] Esses conflitos, mais os que aconteceram em Conceição do Araguaia, ao tempo de frei Gil Vila-Nova, - que resultou na criação do município em 1900, - chamaram a atenção dos governos do Maranhão, Pará e Goiás. O sul do Pará começou a entrar mais decididamente na história do Estado com a criação do burgo de Itacaiúnas, que auxiliava e reforçava a ocupação da terra, o longínquo posto de Conceição do Araguaia e o destacamento de São João do Araguaia, até onde chegava a jurisdição do Grão-Pará (SALES apud MOURA, 1989. p. 15).
No período da segunda metade do século XIX, Goiás disputava as terras do
Estado do Pará que ficavam na fronteira entre os dois Estados, na região sudeste paraense,
mais precisamente onde se localizava o município de Marabá. Comerciantes, descontentes
com as políticas da capital paraense em relação ao município de Marabá, ameaçavam aliar-se
a Goiás e, assim, pedir a anexação de Marabá8 ao Estado vizinho. Devido à distância de
Marabá em relação à sede Belém, o maior contato ocorria com Goiás (hoje Tocantins) e
Maranhão, o que favorecia a vinda de pessoas dessas localidades às terras do sul/sudeste
paraense e, assim, o burgo de Itacaiúnas era formado por maranhense e goianos,
principalmente. As diferentes famílias que vieram para o então antigo município de Marabá
tinham na economia da borracha o seu “ouro negro”, e com ele pensavam, através do
comércio, aumentar seus ganhos e dinamizar o comércio local e extra-local.
Logo um dos barracões de castanha foi denominado com o nome de
Marabá, nome dado pelo proprietário, em homenagem ao poema de Gonçalves Dias. O
barracão prosperava e famílias se formavam nas proximidades dele, vindas atrás da castanha
ou para trabalhar nos castanhais. Destarte, Marabá ia tomando características de uma vila e,
posteriormente, de núcleo urbano de maior expressão na região, além de ser ponto estratégico
de comercialização da castanha. Contudo, nem sempre a economia da borracha ou da castanha
8 O pleito que elevou Marabá a ser emancipado de São João do Araguaia também está relacionado com esse episódio histórico.
65
interessou quem se predispôs a penetrar no vale do Araguaia –Tocantins. Segundo Sales
(1989),
pastores e mineradores, os brasileiros do centro, ao contrário não manifestavam grande vocação para penetrar na floresta e dela extrair borracha e castanha. Logo descobriram a botija de diamantes que se escondia nos poções da foz do Itacaiúnas e do Araguaia, rolando das terras mais altas juntamente com os seixos. E assim surgiu Marabá bafejada por sua invejável localização. Em 1896 Ignácio Moura encontrará ali apenas um morador isolado, o maranhense Francisco Coelho da Silva, admirador de Gonçalves Dias, a quem se deve a denominação do sítio (SALES apud MOURA, 1989. p.16).
Os relatos de que no sudeste paraense a borracha existia em abundância fez
com que, rapidamente, houvesse um grande número de comerciantes que vieram explorar a
borracha, fazendo com que ocorresse um esgotamento das fontes seringais nas proximidades
de Marabá, o que forçou os comerciantes a rumarem em direção ao vale do Xingu, atrás do
caucho para dar continuidade ao comércio da borracha. Outro fato importante foi o fim das
duas grandes guerras mundiais e a concorrência com os seringais da Malásia que fizeram com
que a borracha tivesse uma queda significativa no mercado internacional, tornando quase que
inviável a sua exploração na Amazônia, o que prejudicou os comerciantes de Marabá.
Logo, outras atividades surgiram em função do acúmulo dos rendimentos da
borracha e houve a tentativa de saída para outro tipo de economia: a da castanha, que
sustentava os períodos de ida e vinda da economia da borracha, acabando por substituí-la.
Dessa forma, os castanhais tornaram-se a principal atividade econômica da região sudeste
paraense, especialmente, a do antigo município de Marabá.
Os castanhais, produtos dos aforamentos ocorridos no século XIX, em sua
maioria, tiveram como principais donos famílias maranhenses e libaneses, que tornaram essa
atividade meio de sobrevivência, dinamizando e substituindo a economia da borracha,
fazendo crescer o comércio local e extra-local. A economia da castanha tornou-se a atividade
66
responsável pela manutenção da elite do Tocantins no comando das relações políticas de
Marabá.
Dessa forma, para exercerem o controle tanto do território como das
atividades econômicas, tornava-se necessário criar estratégias efetivas de organização
político-econômico-militar na região do vale do Tocantins-Araguaia. Sendo assim, foram
criadas formas de ocupação do território, como as colônias, presídios, todos com aparato
militar para promoverem povoações e garantir a segurança nacional ao longo dos rios
Araguaia-Tocantins. Segundo José Brandão (1998), “algumas povoações foram fundadas na
margem esquerda do Araguaia e Tocantins porém, elas somente subsistiam enquanto a mesma
estivesse em evidência e desapareciam todas as vezes que a navegação por um ou por outro
motivo era interrompida e voltavam a existir, quando a navegação era restabelecida”
(BRANDÃO, 1998, p. 126).
Não obstante, certas localidades que acabaram exercendo certa importância
na região sobreviveram aos períodos de interrupção de navegação dos rios. Durante todo o
período, a ocupação do território se deu dessa forma. Só a partir do final do século XIX e
início do século XX, com a fundação do burgo do Itacaiúnas, aconteceu de fato que
povoações se tornaram permanentes. Esse fato ocorreu devido às fugas dos escravos do então
Goiás, pelos rios do Pará, e o contrabando do ouro das minas, o que levou à proibição da
navegação nos rios Tocantins e Araguaia durante certos períodos.
o governador da capitania do Grão-Pará, José de Nápoli Menezes, mandou fundar a povoação de São Bernardo da Perdeneira, em 1781, tendo mais tarde mudado a sua localização e seu nome para Alcobaça, que hoje é a cidade de Tucuruí (BRANDÃO, 1998. p. 127). A notícia de constantes invasões de franceses, holandeses e ingleses que faziam um grande contrabando de ervas do sertão, muito fartamente encontradas nos vales do Araguaia-Takayuna-Pacajá-Tocantins, onde corria frouxa a coleta predatória da baunilha, borracha, cacau, canela, cravo e guta-percha, que eram levados para os seus países sem a anuência da Capitania e do governo português (BRANDÃO, 1998. p. 132).
67
Os rios Araguaia e Tocantins foram as estradas fluviais que durante longo
período tornaram-se os principais meios de penetração e comunicação na região de Marabá e
foram importantes para o estabelecimento de povoações às margens desses rios. Em virtude
das fugas dos escravos ocorridas nas minas de ouro de Goiás, a navegação no vale dos rios
Araguaia e Tocantins ficava interrompida constantemente, todas as vezes em que ocorriam as
fugas.
em 1731, D. Francisco de Assis Mascarenhas, pediu a proibição da navegação nos rios Araguaia-Tocantins e, em 27 de outubro de 1733, saiu o Alvará de proibição. Aquele expediente tinha a finalidade de coibir a fuga de escravos das minas de ouro de Goiás, o contrabando do ouro que se fazia por esta via e também a evasão de criminosos de alta periculosidade que se evadiam pelos rios. A partir daí, as regiões ribeirinhas e as minas de ouro, passaram a ser abastecidas por Pernambuco e Bahia, pelo rio São Francisco a partir da vila de São Romão nas Minas Gerais, fato que prevaleceu até 1782 (DOLE Apud BRANDÃO 1998, p. 135).
Assim, em 1802, foi que surgiu o presídio de Taquanhonha, onde hoje está
situada a Marabá pioneira (BRANDÃO, 1998), dando assim, os primeiros indícios da
formação do que mais tarde ficou conhecido como núcleo urbano de Marabá, que só se
consolidou na segunda metade do século XIX.
A ocupação do território de Marabá começou a interessar ainda mais os
vizinhos comerciantes do Estado do Maranhão, em virtude dos interesses comerciais que
tinham pela economia da borracha. Nesse período, a atividade comercial era arriscada, pois
antigos moradores da área, os índios (Caiapó, Gavião, etc) defendiam seu território contra a
invasão daqueles que iam em busca da economia extrativista. O ataque dos índios era uma
constante; quando seringueiros e castanheiros se embrenhavam na mata atrás da borracha e da
castanha, os índios quase sempre defendiam seu território atacando os invasores, de forma que
bem poucos saíam com vida no conflito pela posse e uso do território e pela goma e castanha,
que tinham valor monetário para os comerciantes. Os conflitos, aos poucos, com a ocupação
68
do território e com as milícias que iam se formando pelos donos de barracões, intimidavam as
investidas dos indígenas e afugentava-os, cada vez mais para o centro da floresta.
Dessa forma, os castanhais também foram sendo apropriados e seus donos
tomando posses através da legislação que concedia seu domínio àqueles que obtivessem sua
exploração, favorecendo a hegemonia da oligarquia na região. A ocupação do território
ostentava as famílias tradicionais (Quadro 01), pois era dela o poder local paraense.
Necessitava-se fazer alianças tanto para o controle do território quanto para garantir os
espaços político-econômicos de Belém.
Quadro 01 - Algumas Famílias Pioneiras na Formação do Antigo Município de Marabá Nome Origem Atividade Exercida Francisco Coelho da Silva Maranhense Comerciante Levino Moraes Maranhense Comerciante/Fazendeiro Carlos Leitão Maranhense Coronel da Guarda Nacional Antonio da Rocha Maia Maranhense Político Kalil Mutran Libanês Comerciante João Anastácio de Queiroz Maranhense Político Pedro Peres Fontenelli Maranhense Comerciante/fazendeiro Quirino Franco de Castro Goiano Major
Fonte: adaptado pelo autor segundo os dados de Brandão, 1998.
Outrossim, o poder exercido pelas autoridades locais na distribuição e na
forma de ocupação do território foi fundamental para que a oligarquia do Tocantins pudesse
desenvolver suas atividades e, posteriormente, se consolidasse como uma das forças políticas
locais e do Estado do Pará.
O poder econômico das famílias que dominavam os castanhais, durante o
final do século XIX e a primeira metade do século XX, só iria sofrer uma fragmentação,
principalmente no final da década de 1970, com a presença de novos atores sociais, dentre
eles as empresas de mineração. Esse conjunto de acontecimentos (aberturas das estradas, os
garimpos de beira de estrada, empresas de mineração, fazendeiros e bancos, etc.) que levou à
fragmentação do poder econômico na região de Carajás agravou-se mais ainda com o início
da década de 1980.
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A década de 1980 vai marcar definitivamente as posições político-
econômicas no antigo município de Marabá e terá reflexo nos sucessivos desmembramentos
territoriais que esse município sofreria no decorrer da década de 1980 e, posteriormente, na
década de 1990. A divisão do poder político e os novos atores sociais que partilham o poder já
não são somente os remanescentes da oligarquia do Tocantins. Os municípios passam a ser
palco de uma disputa político-econômica pelos seus territórios tanto pelas empresas quanto
pelos diferentes atores sociais que agora compõem a gestão territorial desses municípios.
A complexidade de relações envolvendo diferentes atores sociais ocasionará
uma infinidade de conflitos sociais pela resolução dos problemas, tanto os da sede do
município quanto do seu meio rural. Isso servirá também para consolidar novos atores sociais
pela disputa do poder político-econômico na região dos municípios aqui estudados.
Segundo Stephen Bunker, Maria Célia Coelho e Adaíse Lopes,
O início dos trabalhos nas minas de Carajás, a construção da estrada e da ferrovia e os rumores em todo o país de que havia empregos e oportunidades econômicas a serem exploradas aceleraram o fluxo de migrantes para área onde a maior parte da terra disponível já havia sido objeto de disputas. Por volta de 1976, ocorreu o primeiro conflito direto entre os donos de castanhais e camponeses sem terra; rapidamente esses conflitos se tornaram violentos, pois sua proliferação encorajava novas invasões de terras por parte dos camponeses e uma resistência mais determinada por parte dos donos de terra. Os conflitos de terras intensificaram-se, pois Carajás atraía mais pessoas à procura de emprego em Marabá, ao mesmo tempo em que novas estradas que levavam a Carajás tornavam os velhos castanhais mais acessíveis, especialmente durante a estação da seca, quando os proprietários não tinham muitas razões para controlá-los (BUNKER; COELHO; LOPES, 2002, p.25).
Ainda segundo Stephen Bunker, Maria Célia Coelho e Adaíse Lopes “os
incentivos fiscais tinham facilitado a expansão da pecuária e das madeireiras. Era o início do
fim de um período do domínio dos castanhais e, conseqüentemente, do poder político e
econômico dos donos de castanhais” (BUNKER; COELHO, LOPES, 2002. p. 27). É nesse
contexto que a década de 1980 servirá como marco referencial para nossa análise e precisará
70
ser contextualizada, relacionando os principais acontecimentos que marcaram a complexidade
das relações e dos conflitos sociais que perfazem a configuração territorial desses municípios.
3.3 - O Município de Marabá: Contextualizando a década de 1980
A década de 1980 é marcada por uma profunda transformação na estrutura
político-econômica e territorial dos municípios do sudeste paraense, principalmente aqueles
que estão em áreas de mineração e que foram e continuam sendo alvos de projetos de
empresas de mineração, dentre elas a de maior expressão na região, a Companhia Vale do Rio
Doce (CVRD). Sua importância se deve ao fato de ela conectar a escala local à internacional
devido à sua abrangência econômica, negociando minerais de valor econômico significativo
no mercado nacional e internacional como: ferro, manganês, ouro, níquel, entre outros,
explorados ou a serem explorados por ela em área de concessão real de uso9 e pelo seu
complexo mínero-metalúrgico envolvendo as suas minas em Carajás, a sua estrada de ferro
cortando os Estados do Pará e do Maranhão e seu terminal de exportação: o porto de ponta da
madeira no Estado do Maranhão.
Segundo Breno dos Santos (1981),
após a descoberta e o requerimento das áreas de pesquisa em meados de 1967, pela Companhia Meridional de Mineração – subsidiária da United States Steel -, negociações políticas conduzidas pelo governo brasileiro levaram à criação da Amazônia Mineração S. A. (AMZA), em abril de 1970, com a composição acionária de 50,9% do Grupo CVRD e de 49,1% do grupo multinacional. Com a conclusão dos trabalhos de pesquisa e dos estudos preliminares de viabilidade, em 1974, foi elaborado o projeto básico de desenvolvimento, que previa a produção inicial de 12 milhões de toneladas de minério em 1979, e que deveria sofrer ampliações anuais, atingindo 50 milhões de toneladas em 1986 (SANTOS, 1981, p. 75).
Investimentos em prospecção e a busca por minerais tornaram o sudeste do
Estado paraense uma área especial para o crescimento econômico do país, por parte do
9 A área de concessão de uso da CVRD corresponde a 411.984,87 hectares (direito real de uso).
71
governo federal, principalmente, com a descoberta do ferro em Carajás e com o garimpo de
ouro em Serra Pelada, áreas que na época pertenciam ao município de Marabá.
Quadro 02 - CVRD e suas Reservas Minerais no Brasil Mineral Reservas Estimadas Duração Estado
Ferro 37,5 bilhões de toneladas 540 anos Pa e MG Bauxita 1,1 bilhões de toneladas 137 anos PA Manganês 135 milhões de toneladas 135 anos PA e MS Ouro 300 toneladas 25 anos PA, BA e MG Cobre 100 milhões de toneladas 24 anos PA Caulim 100 milhões de toneladas 330 anos PA Florestas 566.000 hectares renováveis BA e MG
Fonte: CVRD, 1993; Benatti, 1997.
A CVRD é uma das maiores mineradoras do mundo; seu potencial em
minerais pode ser comprovado com o quadro acima (Quadro 02); suas reservas são
estimativas de média a longa duração; seu potencial a ser explorado também coloca a empresa
em números como uma das maiores empresas do mundo, e seus minerais são cobiçados pelos
países, principalmente os mais ricos do mundo, por serem um material escasso que o Brasil
tem em abundância: suas reservas dão créditos à empresa e seu potencial administrativo
também a coloca como uma das empresas mais modernas no ramo dos minerais estratégicos.
O Estado do Pará (no Estado o grupo CVRD tem o controle de exploração
de diversos espaços conforme demonstra a Figura 01), como pode ser comprovado no mapa,
aparece como um dos Estados brasileiros com um grande potencial para exploração e
exportação mineral favorável em termos de ferro, bauxita, manganês, ouro, cobre e caulim.
As principais reservas minerais da CVRD correspondente a bauxita, caulim e cobre são
encontradas apenas no território paraense. A existência desses minerais coloca em expectativa
econômica os municípios paraenses, principalmente aqueles aqui estudados (Marabá,
Parauapebas, Curionópolis, Eldorado do Carajás, Canaã dos Carajás e Água Azul do Norte).
Uma expectativa em termos de ganhos econômicos a partir dos projetos da companhia e
daqueles que virtualmente virão a ser implantados, mesmo com as crises financeiras que
Estados e municípios passam.
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73
Embora tenhamos no país uma crise econômica, que muitos economistas
classificam como a década perdida, a década de 1980 é marcada por profundas modificações,
que repercutiram também no sudeste do Pará, o que, por sua vez, não impediu que se criasse
na Amazônia toda uma estrutura para que fossem implantados os projetos da CVRD, como
uma das mais importantes empresas estatais, criada em 1942. Na época, era associada ao
capital internacional, para que realizasse suas pesquisas sobre a potencialidade mineral na
Amazônia.
O extrativismo continuou a dominar a economia local, no sudeste paraense,
só que a extração mineral, diferentemente da castanha-do-Pará, acabou direta e indiretamente
desestruturando o regime político-econômico da oligarquia do Tocantins, fazendo surgir uma
nova elite, composta por fazendeiros empresários, funcionários da CVRD ou de suas contratas
ou subsidiárias, bancos, profissionais liberais como médicos, advogados, políticos e
comerciantes.
O arranjo político local ocasionou uma fragmentação na estrutura político-
econômico-territorial do município de Marabá, fazendo com que fosse pleiteada a criação de
novos municípios, desmembrados de seu território. Esse arranjo era oriundo tanto dos
investimentos locais realizados pela CVRD como pela disputa política entre o novo regime da
elite, recentemente forjada para disputar o poder político local, e o regime da oligarquia dos
castanhais querendo continuar a manutenção do seu domínio no território de Marabá.
Dessa forma, o que vemos é uma articulação entre esses regimes de poder,
estabelecidos através da base econômica extrativista, que nem sempre funcionou, devido ao
surgimento de atores sociais que se encontravam fora do campo de poder político local
dominado pela oligarquia do Tocantins.
Surge então um sistema de poder político-econômico, paralelo ao
anteriormente citado, favorecido pelas empresas de mineração, pelos bancos e pelos
74
empresários, que viam na oligarquia um empecilho aos seus interesses presentes e futuros. Por
outro lado, a oligarquia, vendo-se enfraquecida e cercada pelos novos atores econômicos,
buscou uma aproximação com esses atores sociais para não perder totalmente seu poder
político-econômico no município.
Entretanto, uma rede de poder político de uma nova elite passa a comandar
as relações político-econômicas do antigo município de Marabá, fazendo com que
acontecesse uma pressão desses novos grupos pela partilha do poder político na região,
ocorrendo, dessa forma, emancipações territoriais, com o surgimento de novos municípios,
desmembrados de Marabá, para então fortalecer os grupos políticos que surgiram e
disputavam o poder político-econômico nos novos municípios.
Outrossim, surgem paralelamente ao movimento das elites pela busca e
hegemonia do poder político-econômico, os que estavam excluídos do processo decisório do
município (colonos, posseiros, sindicatos rurais, sindicatos urbanos, movimentos de bairros,
etc), bem como com as organizações populares e Organizações Não-Governamentais (Ongs),
a Igreja Católica com as pastorais, que passam juntos a formar ou tentar formar lideranças e,
assim, exigir seus diretos, para participar direta ou indiretamente das decisões político-
econômicas dos municípios de que fazem parte.
Essas parcerias acima citadas resultaram na formação, nos centros urbanos
desses municípios, de organizações de trabalhadores insatisfeitos com as políticas
municipalistas. Na demonstração de seu peso político, em virtude de sua organização,
passaram a exigir participação nas decisões dos projetos dos quais eram alvos e, embora
timidamente, nas decisões municipais e começam mais diretamente a vivenciar os conflitos de
interesses, envolvendo os “donos do poder” (FAORO, 2000) e suas vítimas, os excluídos de
qualquer forma de participação política municipal.
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Embora a CVRD, através de seus projetos de mineração, direta ou
indiretamente, mude a função dos municípios que estão sob sua área de influência, ela sozinha
não é responsável por todos os problemas que afetam os municípios que abrigam seus
projetos, e não se desvia de sua função de empresa mineradora.
Surge, assim, a tentativa de organização da sociedade civil, com os
movimentos urbanos dos metalúrgicos, entre outros, que passam a convergir suas discussões e
seus interesses, unindo assim forças para tentar participar nas decisões dos governos locais.
Embora seus objetivos sejam virtualmente diferentes, essas organizações
percebem sua exclusão e usam a formação de suas lideranças e seu grau de consciência
política para questionarem os mandos dos governos locais e seus representantes.
Dessa forma, a década de 1980 é um embocadouro de múltiplos processos
que vão tomando corpo e se formando ao longo das décadas posteriores. Os conflitos que vão
surgindo são acompanhados, embora timidamente, mas com certa personalidade, de embriões
do amadurecimento dos atores sociais excluídos do poder que procuram se inserir no processo
político-econômico territorial dos novos municípios, de sorte que os governos e as elites
locais não podem mais ignorar os problemas locais. Sendo assim, também o questionamento
da presença dos grandes grupos econômicos nesses municípios se faz necessário e torna-se
tema presente nos debates local.
Os atores sociais buscam a participação, procurando interferir no processo
sócio-econômico-político, para que, nesse processo, não fiquem excluídos das decisões locais
e encontrem a resolução dos problemas urbanos e rurais.
Embora ainda seja incipiente, a flexibilização do poder local para com a
gerência da participação da sociedade civil começa a existir, sendo esse um dos caminhos
encontrados pelos atores sociais para resolução dos conflitos de interesses. A forma de
governar e a participação da sociedade civil organizada ainda podem, no entanto, ser
76
insuficientes em se tratando dos municípios que passaram décadas sendo dominados e
governados pelos “coronéis da castanha” e, posteriormente, por seus representantes.
A configuração territorial dos municípios que surgiram da fragmentação
político-territorial de Marabá pode ainda ter o formato já citado, mas com certeza sofreu uma
mudança qualitativa com o surgimento de diferentes movimentos sociais, que passaram a
pressionar o poder político local, fazendo-o não ignorar suas presenças no ordenamento
territorial.
Os novos municípios aqui estudados (Marabá, Parauapebas, Curionópolis,
Eldorado do Carajás, Canaã dos Carajás e Água Azul do Norte) possuem áreas nas quais a
CVRD tem projetos efetivos ou virtuais, mas possuem complexidade variada e grau de
autonomia econômico-financeira diferenciada também.
Sendo assim, a estrutura sócio-econômica de cada município depende de um
conjunto de fatores correlacionados, com busca de recursos e parcerias com a CVRD ou
outras empresas e atores econômicos, o que também depende quase que diretamente do grau
de viabilidade econômico-social e da sua potencialidade em gerenciar tanto os recursos
naturais em seus territórios como o do planejamento viável que possibilite aumentar sua
receita e arrecadação.
Aqui, entendemos que o recurso é uma possibilidade de organização sócio-
econômico-territorial, e a potencialidade o grau de sujeição do recurso ao seu melhor
aproveitamento, ou seja, para o município, potencialidade são todos os recursos disponíveis
no território, sejam eles naturais ou humanos, bem como a melhor aplicação e
proporcionalidade pensada para cada um no desenvolvimento local.
Se olharmos para cada um dos municípios aqui estudados, poderemos notar
que sua estrutura urbana é bem diferenciada; a planta urbanística de cada um apresenta
77
características dos processos sócio-econômicos que tanto antecederam a economia mineral
quanto, após sua implantação, aceleraram o processo de ocupação desordenado do território.
A ocupação desordenada em seus territórios tem gerado conflitos sociais
graves. Em relação ao meio rural, este permaneceu, aparentemente, semelhante enquanto
estrutura de concentração de terras e dominação por parte dos que se sucederam, ou dos que
continuaram os processos de aquisição de terras na região. Surgiu, por outro lado, uma nova
categoria de trabalhadores rurais organizados, os trabalhadores rurais sem terra, fazendo-nos
crer que a mudança mais evidente aconteceu no meio rural.
Embora o movimento de trabalhadores esteja no meio rural, esse aconteceu,
principalmente, como reflexo dos grandes projetos implantados na região amazônica, como a
Usina Hidrelétrica de Tucuruí (UHT), o Projeto Ferro Carajás (PFC), a abertura de estradas,
como a Transamazônica e a Belém-Brasília e à falta de uma política agrária que amenizasse
os conflitos envolvendo o contraste entre as áreas de latifúndio e os expropriados que
aumentam a massa de sem-terra, refletindo a elevação demográfica e o acirramento dos
conflitos na região sudeste paraense.
De uma maneira ou de outra, Carajás tornou-se um território vinculado a
economia extrativista mineral, ligada à escala econômica internacional, onde uma única
empresa, a CVRD, tornou-se a principal empresa nesse território, com interferência direta ou
indireta em cada município, que estão sob a sua área de influência, conectando-os a diferentes
escalas, que ora vai do local ao internacional ou do local ao nacional e, articulando diferentes
interesses, aliando-se ou não a diferentes atores político-sociais locais, nacionais e
internacionais de acordo com seus interesses.
As administrações municipais sofreram uma drástica mudança na forma de
conceber a ligação de cada município, em diferentes escalas. Hoje, o que vemos nos
comandos das administrações locais são alguns indícios de que a visão administrativa mudou
78
com a presença de médicos, comerciantes, etc, em relação à visão tradicionalista da oligarquia
da castanha, que dominavam a economia e a política local até a segunda metade da década de
1970.
Parcerias são feitas com diferentes empresas e setores da sociedade civil;
projetos são realizados ou ampliados a partir das pressões da sociedade civil, o que
demonstra, de uma forma ou de outra, a presença do poder desta sociedade organizada.
Dessa forma, podemos evidenciar que o poder co-relacionado ou divergente
interfere na organização do território, fazendo com que os governos locais mudem sua visão
de desenvolvimento. Mesmo que essa mudança seja parcial, torna-se necessário dividir a
mesa de decisões, pois fica evidente que a presença de setores da sociedade civil tem peso
significativo no desenvolvimento do município, obrigando o poder municipal a dar voz de
participação nas decisões aqueles que anteriormente eram excluídos dos processos decisórios.
Poder, governo e território são conteúdos que a sociedade civil organizada
ou em processo de organização, como é o caso de alguns municípios recém criados, utilizam
no seu planejamento para pensar um desenvolvimento relacionado à diferença político-
econômica local e para a resolução dos conflitos de interesses, bem como para organizar a
gestão territorial.
Entretanto, há múltiplas ações no território de Carajás superpondo poderes,
sejam eles: judiciário, executivo ou legislativo bem como aqueles oriundos dos movimentos
sociais organizados, o que faz com que se estabeleçam formas diferenciadas de atuação no
território e alterações nas relações de poder dos governos locais.
A sobreposição de territórios demonstra, também, os conflitos de interesses
dos poderes locais e, até certo ponto, a omissão dos poderes federal, estadual e municipal em
relação a outros poderes econômicos e não institucionalizados.
79
Essa sobreposição de território e de interesses favoreceu também o processo
de emancipação dos municípios criados a partir de Marabá, na década de 1980, e os de
segunda geração, criados na década de 1990, na disputa pelo poder político local (Figura 02).
Esses conflitos de interesses, que envolvem políticos locais, empresas de
mineração, bancos, movimentos sociais urbanos e rurais, e movimentos indígenas entre outros
fazem parte tanto da história mais antiga desses municípios quanto dos processos ocorridos
pós-década de 1980, que aceleraram as transformações territoriais locais.
O surgimento de movimentos sociais nas décadas posteriores ao início da
década de 1980, como os sindicatos urbanos e dos metalúrgicos, o Movimento dos
Trabalhadores Rurais Sem Terra, entre outros, são reflexos tanto das crises econômico-sociais
quanto dos processos advindos desde a época dos castanhais, que se acirraram com a falta de
planejamento local para esses municípios. O fato de não considerar a participação da
sociedade como prioritária na solução dos problemas locais é o reflexo de um contexto mais
amplo, no qual Carajás está envolvido. Com a crise econômica brasileira e internacional, na
década de 1980, a busca por novos mercados de minerais no mundo levou à adoção de
políticas que desconsideravam o contexto local e sua sociedade.
Marabá, por ser um município com uma estrutura político-econômica mais
sólida que os demais, que surgiram de sua fragmentação, é um dos pólos regionais do sudeste
paraense, e de todo o Estado do Pará, em termos de arrecadação e receita, o que faz desse
município um dos territórios mais cobiçados pelos políticos locais e estaduais. Assim, Marabá
assume o papel de líder político-administrativo da região, tudo convergindo ou para Marabá
ou para capital Belém.
O município de Marabá, assim como o de Parauapebas, assumem um papel
estratégico para o Estado do Pará e para os políticos regionais e locais, em se tratando dos
projetos da CVRD, principalmente, depois da privatização da companhia em 1997.
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Depois de sua privatização, a CVRD mudou sua estratégia econômica local
deixando em dúvida se iria ou não implantar seus projetos. Quando ainda era estatal, tinha
quase certas suas implantações nesses municípios, como é o caso do projeto Serra Leste em
Curionópolis, hoje em impasse. Se for viável ou não sua implantação, esta depende de um
conjunto de fatores que responde ao mercado internacional e aos interesses da CVRD, que
agora, privatizada, responde à economia de mercado, sem a preocupação com o Estado
Nação.
Isso tem feito com que o poder político local tenha ficado insatisfeito diante
da atitude da companhia. Alguns municípios viam, nesses projetos virtuais, uma forma de
aumentar suas arrecadações, bem como a criação de novos empregos, já que a grande maioria
dos municípios tem na prefeitura a sua maior empregadora municipal. A implantação desses
projetos poderia também atrair para os municípios outras empresas para prestarem serviços à
CVRD.
3.4 - A Implantação dos Projetos da Companhia Vale do Rio Doce no Antigo Território
de Marabá
As minas de Carajás, na década de 1980, pertenciam ao território de
Marabá. Dessa forma, Marabá continuava a exercer o papel de pólo da região sudeste
paraense e líder político-econômico regional no sul/sudeste do Estado. O primeiro projeto a
ser implantado em Marabá foi o Projeto Ferro Carajás, carro-chefe do Programa Grande
Carajás (PGC)10 (um pacote de incentivos fiscais11), anunciado na década de 1980, a fim de
atrair investimentos para Amazônia Oriental (relativos à agricultura, ao reflorestamento, à
pecuária e ao setor mínero-metalúrgico) e industrializar esse território. Dessa maneira
10 Decreto Lei nº 1813 de 24 de novembro de 1980. 11 Os incentivos fiscais também foram regulamentados pelo Decreto Lei nº 1815 de 24 de novembro de 1980, a todos os empreendimentos numa área que abrangia os Estados do Pará, Tocantins e Maranhão, num total de 895.236 Km2.
82
qualquer projeto que estivesse relacionado e integrado nesse território teria direito aos
chamados incentivos fiscais atribuídos pelos organismos financeiros de Estado, que nesse
caso era representado pela Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia (SUDAM).
Para esses empreendimentos, seria necessário montar toda uma infra-
estrutura para alocar esses projetos e fazê-los funcionar. Assim em anos anteriores já tinham
sido traçados os eixos de desenvolvimento através dos planos de viabilização econômica para
essa região e para que empresas nela se instalassem. A Hidrelétrica de Tucuruí (Figura 03) é o
maior exemplo da grandiosa ambição que se pensou para a Amazônia brasileira a fim de atrair
o capital nacional e internacional. A abertura das estradas em anos anteriores foi o primeiro
passo para preencher a condição necessária para levar o capital a se instalar na Amazônia,
viabilizando as políticas dos governos brasileiros.
Figura 03: Hidrelétrica de Tucuruí construída para atender principalmente os Grandes Projetos (Foto: João Marcio Palheta da Silva, 1997).
Para José Helder Benatti (1997),
A própria instalação autoritária do PGC, em 1980, reflete a política centralizadora e de caráter militar, segundo a qual foi concebido nos anos de 1970. Para a implantação dessa política, os governos militares utilizaram-se de decretos-leis, o que significava, na prática, a exclusão do poder legislativo federal, estadual e da sociedade civil brasileira da discussão e implementação de políticas públicas. O decreto-lei foi um instrumento jurídico criado pelo Regime Militar, e por ser de lavra exclusiva do Poder Executivo, é uma usurpação das prerrogativas do Poder Legislativo, fazendo
83
com que a elaboração e aprovação se restringisse aos gabinetes palacianos (BENATTI, 1997, p. 80).
A sobreposição de poderes dentro das instâncias governamentais serviu para
legitimar atos que eram pensados para a região Amazônica com fins econômicos, o que, por
sua vez, explica o autoritarismo com que o projeto foi implantado e a sua completa
desvinculação com a realidade local, contrariando os interesses da sociedade que ali se
encontra. Em conseqüência as expectativas sociais e ambientais que hoje caracterizam Carajás
fazem dessa região uma das áreas mais problemáticas do país em termos de conflitos sociais.
Outros projetos foram implantados como o projeto manganês do Igarapé do
Azul, em 1985 e, o projeto ouro do Igarapé Bahia, em 1990 (já esgotado). Além da
exploração mineral, a CVRD verticalizou seus empreendimentos, investindo em setores como
o de transporte, como o sistema roll-on-roll-off; participou de convênios e parcerias como no
caso do projeto soja no sudeste paraense através do sistema integrando rodovia-ferrovia-
hidrovia, incluindo a possível viabilização da hidrovia Araguaia-Tocantins, e elaborou
projetos virtuais como o do cobre do Salobo e o do níquel. Assim, desde a implantação do
projeto ferro a CVRD dinamizou sua economia investindo em diferentes setores mostrando o
potencial que a companhia adquiriu desde que está instalada no Estado do Pará.
Vale a pena ressaltar que a CVRD tem outros projetos fora da região sudeste
paraense, mas que permaneceram dentro do Estado do Pará, como a exploração da bauxita
pela Mineração Rio do Norte. O grupo CVRD possui todo um aparato que foi montado pelo
governo federal no Pará para exploração dos recursos minerais que, hoje, estão nas mãos da
iniciativa privada, em decorrência do processo de privatização das estatais realizado pelo
governo federal (durante a década de 1990).
O efeito multiplicador que o Programa Grande Carajás tenderia a gerar não
se concretizou; o que vemos hoje na região, principalmente a que vai de Parauapebas no Pará
a Santa Inês, no Maranhão: um corredor de problemas sociais. A maioria dos municípios que
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se encontra no corredor da Estada de Ferro Carajás encontra-se em situação de pobreza sem
expectativa de crescimento econômico e sem conseguir resolver seus problemas urbanos e
rurais. O trem de passageiros da CVRD é um verdadeiro navio sobre rodas, com migrantes
indo e vindo atrás de trabalho (nos projetos da companhia ou em outras empresas quando não
nas fazendas localizadas nesse trecho) e melhores condições de vida nesse corredor.
Segundo Maria Célia Nunes Coelho (1997),
A CVRD, como toda grande empresa, tenta localmente imprimir ordem (regras) no espaço restrito a seu território. Os núcleos urbanos exemplares/ordenados da companhia contrastam com os núcleos caóticos vizinhos. Sem dúvida, elas, as grandes empresas, têm um papel entrópico em relação às demais áreas. Este é o caso da CVRD que mantém a ordem nos seus territórios (que incluem seus núcleos urbanos). Entretanto, ainda que involuntariamente, a CVRD e suas subcontratadas têm papel entrópico em relação às áreas urbanas vizinhas (COELHO, 1997, p. 77).
Figura 04: Vista parcial da Floresta Nacional de Carajás ao fundo o núcleo residencial de Carajás (Foto :João Marcio Palheta da Silva, 2003).
A implantação dos grandes projetos na Amazônia intensificou a explosão
demográfica dos diversos núcleos urbanos na região sudeste paraense, quando não foi
responsável pelas suas criações. A ordem da qual Maria Célia Nunes fala é a ordem que faz
do núcleo urbano de Carajás (Figura 04), assim como dos condomínios fechados da CVRD
tanto no Pará como no Maranhão, exemplos do ordenamento territorial criado pela
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companhia, não só para abrigar seus funcionários, mas também para vender uma imagem
ordenada de seus projetos.
Seus núcleos habitacionais são exemplos das cidades de primeiro mundo em
termos de organização, porém existe um controle social não só para aqueles que moram em
seus núcleos urbanos, como também para aqueles que adentram seu território. O controle de
entrada e saída das pessoas é uma das formas da companhia manter a ordem dentro dos seus
núcleos (Figura 05), diferente do que acontece com aqueles povoados ou núcleos que estão
em seu entorno.
Figura 05: Portão de acesso ao Núcleo Urbano de Carajás controlado pela CVRD (Foto: João Marcio Palheta da Silva, 2003).
Exemplo dessa natureza é Parauapebas, no sopé da Serra dos Carajás, onde
apenas uma parte da cidade foi planejada para abrigar, logo no início da instalação do PFC, os
trabalhadores que viabilizaram a obra de exploração de ferro, assim como aqueles que
trabalhavam na construção da estrada que dá acesso à Serra dos Carajás. Logo após sua
instalação, ocorreu uma explosão demográfica, intensificada ao longo dos anos que
sucederam a instalação do PFC, o que ajudou a fazer de Parauapebas umas das cidades mais
populosas dessa região, porém com todos os problemas urbanos: falta de infra-estrutura,
problemas de saúde, prostituição, o que não ocorre na CVRD.
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Quadro 03 - Quantidade de Passageiros Transportados pelo Trem da CVRD12 Ano Número de Passageiros
1986 212.342 1987 401.192 1988 424.447 1989 498.838 1990 590.901 1991 520.659 1992 428.012 1993 460.645 1994 631.889 Total 4.168.925
Fonte: CVRD, 1997.
As principais estações ferroviárias da CVRD no trecho entre Pará e
Maranhão são: a do Anjo da Guarda, a de Santa Inês, a de Açailândia, a de Imperatriz, todas
no Maranhão, e as de Marabá e Parauapebas no Pará. Como podemos ver, todas essas
estações foram pontos de chegada ou de saída para diversas localidades no Pará e no
Maranhão (Quadro 03). Os que migram nesse corredor têm diferentes histórias para contar
quanto à sua migração. Paraenses e maranhenses que mudam de lugar em busca de melhores
condições de vida, indo ou voltando ajudaram a modificar as relações no sudeste paraense13,
principalmente nos municípios aqui estudados.
Esses fatores estão sobretudo relacionados às expectativas econômicas que o
Brasil vivia na época de instalação dos projetos da CVRD na Amazônia. Havia um conjunto
de fatores que favoreceram as condições para que esses projetos fossem pensados na
Amazônia, além dos recursos naturais que existiam na região. As variáveis que serviram de
justificativa para a implantação dos projetos na Amazônia estavam relacionadas às condições
de “duplicarem as exportações brasileiras, e com isso, conseguiriam mais dólares para o
pagamento da dívida externa brasileira” (BENATTI, 1997, p. 82).
12 Não foi possível obter dados mais recentes. 13 Relatório de viagem que serviu como tema para o ensaio “Impressões do ”Passageiro de Ferro”: reflexões de um viajante”. Publicado no livro: 10 Anos da Estrada de Ferro Carajás em 1997 pelo Núcleo de Altos Estudos Amazônicos (NAEA/UFPA).
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Com isso, ficaria mais fácil justificar, através do autoritarismo, a
implantação que legalizou a instalação dos projetos na Amazônia, associados ao esgotamento
das reservas da Companhia Vale do Rio Doce no centro-sul do Brasil, à expectativa vinculada
pelo Banco Mundial em relação à carência do ferro no mundo na década de 1980, a outros
recursos minerais existentes em Carajás e à possibilidade de crescimentos das divisas para
pagamento dos juros da dívida externa (BENATTI, 1997, p. 82).
Dessa forma, a Amazônia brasileira estava relacionada a uma das fronteiras
de expansão do capital internacional na América Latina. Toda essa forma estava também
associada à possibilidade de “desenvolvimento” da Amazônia. Assim, o governo conseguiu
desenvolver sua estratégia de associação do capital privado nacional e internacional ao capital
estatal numa associação que era de 51% do capital da CVRD tendo o Estado Nacional como
seu principal acionista e os outros 49% pulverizados em diferentes capitais nacionais e
internacionais. Associava, assim, a escala local à internacional visando sobretudo ao mercado
internacional de exportação do ferro. Ainda segundo Benatti (1997), um dos financiadores do
Projeto Ferro Carajás (PFC) foi
o Banco Mundial que interveio no co-financiamento juntamente com os bancos comerciais; empréstimos japoneses; créditos europeus ligados à Comunidade Européia do Carvão e do Aço, e um empréstimo dado pelo Banco de Desenvolvimento da Alemanha Federal (KFW); financiamentos para aquisição de equipamentos dos EUA – Eximbank na Europa e no Japão; um euro-prêt de US$ 30 milhões, empréstimo realizado por um consórcio de bancos dirigidos por Morgan Quaranty Trust; e instituições de créditos brasileiras que completaram o empréstimo para o projeto (BENATTI, 1997, p. 83-84).
Esses empréstimos consolidaram a viabilização do PFC e sua instalação no
município de Marabá no começo da década de 1980, vindo a fazer seu primeiro transporte de
ferro em 1985, com a inauguração da Estrada de Ferro Carajás ligando as minas de Carajás no
Pará ao porto de Itaqui-Madeira no Maranhão. Era o começo de uma nova era para os
municípios do sudeste paraense e, conseqüentemente, para o Pará a era dos minérios, que se
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tornavam a principal economia da região. A CVRD, que já era uma das maiores empresas de
mineração do Brasil, ganhava mais elementos para se transformar numa das maiores empresas
de mineração do mundo. Opera em dois sistemas destacados por ela, o sistema norte e o
sistema sul, o que indicava o crescimento que a empresa vinha ganhando com a instalação de
seus projetos no Brasil e na Amazônia.
O território de Marabá sofreu conseqüências com todos esses
acontecimentos, que foram provocados pela implantação dos projetos da CVRD e também por
outros fatores, o que contribuiu em muito com o crescimento demográfico e com a
fragmentação não só do seu território, mas das relações político-econômicas, a partir da
fragmentação dos grupos de poder na partilha do poder político e do domínio econômico do
município, e conseqüentemente da região sul/sudeste paraense.
3.5 - Emancipação Territorial em Marabá.
A primeira emancipação territorial que Marabá sofreu foi a de Parauapebas,
onde estava a mina de Carajás da CVRD e a de Curionópolis, onde se encontrava o garimpo
de Serra Pelada, que teve seu auge entre os anos de 1980 e 1986. Parauapebas e Curionópolis
foram emancipados de Marabá, em 1988. Marabá perdeu duas importantes áreas de
mineração, e conseqüentemente uma parte significativa de seu território, de sua receita e de
sua população.
Parauapebas teve uma história um pouco diferenciada de Curionópolis. Uma
parte de seu território tinha sido planejada pela CVRD para abrigar cerca de 5.000 pessoas
relacionadas aos trabalhadores que vieram para o Projeto Ferro Carajás (PFC) e de suas
subsidiária. Essa parte planejada hoje é conhecida como Cidade Nova, enquanto no alto da
Serra Norte, onde fica a mina de ferro, foi construído um outro núcleo urbano para abrigar os
altos funcionários da CVRD. Duas realidades muito diferentes. De um lado, Parauapebas, que
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a cada dia crescia e ia além da parte planejada, principalmente a parte que hoje se tornou um
dos bairros mais populosos de Parauapebas e que na época era conhecido como Rio Verde.
Este formava quase que outro núcleo urbano que tinha até mais população que aquela parte
construída pela CVRD no sopé da Serra. Ao longo dos anos, Rio Verde e Parauapebas
cresciam com todos os problemas de um núcleo urbano, sem infra-estrutura, até se unirem
formando um só núcleo. Embora a parte planejada tivesse aspectos de serviços que só eram
encontrados em Marabá, a CVRD atraiu para seu interior os serviços que, pela distância de
Marabá, ficava mais viável serem implantados em Parauapebas.
Em 1985, a situação dos serviços oferecidos nesses núcleos era a seguinte
(Quadro 04):
Quadro 04 – Situação dos Núcleos Urbanos no Trecho Mina-Marabá em 1985 Localidade Distância em
Relação a EFC
Principal Atividade
Rede de Água Energia Elétrica
Esgoto Limpeza Urbana
Principais Acessos
Núcleo Urbano da CVRD
10 Km Serviços de Mineração
Sim Sim Sim Sim PA-275
Parauapebas 12 Km Serviços de apoio a mineração
Escasso Escasso Escasso Parcial PA-275
Rio Verde 13 Km Serviços de apoio a mineração
Não Não Em implantação
Não PA-275
Curionópolis 20 km Serviços de apoio ao garimpo
Não Não Não Não PA-275
Eldorado do Carajás
50 Km Serviços de apoio ao garimpo
Não Não Não Não PA-275
Marabá Atravessa a área urbana
Entreposto de produtos primários (castanha, madeira, gados e centro de seviços).
Sim Sim Sim Sim PA-275, PA-150, BR-230 e BR-222
Fonte: CVRD/SUMIC, 1985.
A realidade dos núcleos residenciais começou a mudar a partir da segunda
metade da década de 1980. Houve uma melhoria, porém os problemas não desapareceram.
Parauapebas e Curionópolis tornaram-se municípios, porém com características muito
diferentes. Enquanto a CVRD continuava com o projeto ferro, Curionópolis conheceu a
decadência do garimpo de Serra Pelada na segunda metade da década de 1980.
90
Figura 06: Garimpo de Serra Pelada 20 anos depois da sua descoberta (Foto: João Marcio Palheta da Silva, 1999).
Com a decadência do garimpo de Serra Pelada (Figura 06), Curionópolis
acabou perdendo população e uma parte de sua arrecadação, vendo-se obrigado a procurar
outras formas de desenvolvimento econômico. Isto fez com que os governos do Município
depositassem suas esperanças na possibilidade da CVRD vir a explorar o cobre do Serra
Leste, que está dentro de seu território, depositando suas expectativas na geração de empregos
e royalties vindos da CVRD. Enquanto a receita de Parauapebas crescia, Curionópolis via a
sua diminuir progressivamente, depois do auge do garimpo de Serra Pelada.
Quadro 05 – População dos Municípios no Trecho Mina-Marabá Município 1970 1980 1991 2000
Marabá 24.474 59.915 123.668 167.873 Parauapebas - - 53.335 71.651 Eldorado do Carajás - - - 29.244 Água Azul do Norte - - - 21.443 Curionópolis - - 38.672 19.387 Canaã dos Carajás - - - 10.826 Total 24.474 59.915 217.666 322.424
Fonte: IBGE Censos demográficos do Pará de 1970, 1980 e 1991. Sinopse Preliminar do Censo de 2000.
Essa área tornou-se densamente populosa (Quadro 05), os núcleos urbanos
foram crescendo e acabaram sendo alvo de políticos interessados na partilha do poder político
e acabaram pleiteando as suas emancipações de Marabá. Foi assim que, depois do surgimento
de Parauapebas e Curionópolis como municípios, surgiram outros novos municípios de
91
segunda geração desmembrados de Marabá. O município de Eldorado do Carajás, em 1991,
desmembrado de Curionópolis, e Água Azul do Norte, também em 1991, desmembrado de
Parauapebas, e no ano de 1993 Canaã dos Carajás se emancipou de Parauapebas (Quadro 06).
Quadro 06 – Data de Criação dos Municípios da Mesorregião Sudeste do Pará Município Ano de
Criação Município de Origem Lei de Criação
Marabá 1913 São João do Araguaia Lei nº 1.278 Conceição do Araguaia 1935 Marabá Lei nº 1.091 Itupiranga 1947 Marabá Lei nº Lei 62 alterada pela Lei 158
Tucuruí 1947 Baião Lei nº Lei 62 – alterada pela Lei 158
Santana do Araguaia 1961 Conceição do Araguaia Lei nº 2.460 São João do Araguaia 1961 Marabá Lei nº 2.460 São Félix do Xingu 1961 Altamira Lei nº 2.460 Jacundá 1961 Itupiranga Lei nº 2.460 Paragominas 1965 São Domingos do Capim e Viseu Lei nº 3.235
Redenção 1982 Conceição do Araguaia Lei nº 5.28 Rio Maria 1982 Conceição do Araguaia Lei nº 5.28 Rondon do Pará 1982 São Domingos do Capim e Mojú Lei nº 5.027
Xinguara 1982 Conceição do Araguaia Lei nº 5.28 Parauapebas 1988 Marabá Lei nº5.443 Santa Maria das Barreiras 1988 Santana do Araguaia Lei nº 5.451 Bom Jesus do Tocantins 1988 Conceição do Araguaia Lei nº 5.455 Curionópolis 1988 Marabá Lei nº 5.443 Ourilândia do Norte 1988 São Félix do Xingu Lei nº 5.449 Tucumã 1988 São Félix do Xingu Lei nº 5.455 São Geraldo do Araguaia 1988 Xinguara Lei nº 5.441 Dom Eliseu 1988 Paragominas Lei nº 5.450 Brejo Grande do Araguaia 1988 São João do Araguaia Lei nº 5.448 Goianésia do Pará 1991 Rondon do Pará, Jacundá, Moju e
Tucuruí. Lei nº 5.686
Breu Branco 1991 Tucuruí, Moju e Rondon do Pará. Lei nº 5.703
Água Azul do Norte 1991 Parauapebas Lei nº 5.694 São Domingos do Araguaia 1991 São João do Araguaia Lei nº 5.706 Novo Repartimento 1991 Tucuruí, Jacundá e Pacajá. Lei nº 5.702 Eldorado do Carajás 1991 Curionópolis Lei nº 5.687 Abel Figueiredo 1991 Bom Jesus do Tocantins Lei nº5.708 Palestina do Pará 1991 Brejo Grande do Araguaia Lei nº 5.689 Ulianópolis 1991 Paragominas Lei nº 5.697 Pau D’Arco 1991 Redenção Lei nº 5.696 Cumarú do Norte 1991 Ourilândia do Norte Lei nº 5.710 Floresta do Araguaia 1993 Conceição do Araguaia Lei nº5.760 Nova Ipixuna 1993 Jacundá e Itupiranga Lei nº 5.687 Bannach 1993 Ourilândia do Norte Lei nº 5.761 Canaã dos Carajás 1993 Parauapebas Lei nº 5.860 Piçarra 1995 São Geraldo do Araguaia Lei nº 5.934 Sapucaia 1996 Xinguara Lei nº 5.961
Fonte: IBGE, Diário Oficial da União, TCM, AMAT.
92
No conjunto da mesorregião sudeste paraense, o município de Marabá na
década de 1970 era o segundo maior município em população com seus 14.585 habitantes,
perdendo apenas em números populacionais para o município de Conceição do Araguaia, que
tinha na época 28.953 habitantes. Na década de 1980, Marabá continuou no segundo lugar em
população; Tucuruí em primeiro lugar em números populacionais com 61.140 habitantes,
contra 59.915 de Marabá e 11.551 de Conceição do Araguaia. Já na década de 1990 houve
uma inversão: Marabá passou a ser o primeiro município em população da mesorregião
sudeste com 123.668 habitantes contra 81.623 habitantes do segundo colocado, o município
de Tucuruí, 67. 075 habitantes de Paragominas, 55.968 habitantes do município de Redenção
e 53.335 habitantes de Parauapebas, município que foi desmembrado do território de Marabá.
No começo de 2000 Marabá continuou com aumento populacional passando para 167. 873
habitantes, Paragominas com 76.095 habitantes, Tucuruí com 73.740 habitantes, Parauapebas
com 71.651 e Redenção com 63.197 habitantes; esses são os números que ilustram o
crescimento populacional na mesorregião sudeste paraense. Em relação ao total populacional
da mesorregião sudeste paraense, os seis municípios estudados representam cerca de 20 % do
total da população.
No seu conjunto em números de habitantes os municípios aqui estudados
apresentam a seguinte colocação: Marabá é o primeiro município em população da
mesorregião sudeste, Parauapebas é o quarto, Eldorado do Carajás no décimo sexto, Água
Azul do Norte o vigésimo, Curionópolis o vigésimo terceiro e Canaã dos Carajás trigésimo
segundo município em números populacionais. Curionópolis, que teve Eldorado do Carajás
emancipado de seu território, hoje perde população (em função principalmente do fim da
lavra manual do garimpo de Serra Pelada), sendo entre os seis municípios o quinto em
números populacionais, só estando na frente de Canaã dos Carajás (Quadro 07).
93
Quadro 07– População por Município na Mesorregião Sudeste Paraense 2000. Posição Município População Total 1 Marabá 167.873 2 Paragominas 76.095 3 Tucuruí 73.740 4 Parauapebas 71.651 5 Redenção 63.197 6 Itupiranga 50.213 7 Conceição do Araguaia 43.453 8 Novo Repartimento 41.819 9 Jacundá 40.830 10 Rondon do Pará 39.856 11 Dom Eliseu 39.428 12 Xinguara 34.760 13 São Félix do Xingu 34.516 14 Breu Branco 32.907 15 Santana do Araguaia 30.966 16 Eldorado do Carajás 29.244 17 São Geraldo do Araguaia 27.641 18 Tucumã 26.504 19 Goianésia do Pará 22.642 20 Água Azul do Norte 21.443 21 São Domingos do Araguaia 19.883 22 Ourilândia do Norte 19.645 23 Curionópolis 19.387 24 Ulianópolis 19.067 25 Rio Maria 17.091 26 Floresta do Araguaia 14.286 27 Bom Jesus do Tocantins 13.015 28 Piçarra 12.627 29 São João do Araguaia 12.165 30 Nova Ipixuna 11.865 31 Santa Maria das Barreiras 11.163 32 Canaã dos Carajás 10.826 33 Palestina do Pará 7.527 34 Brejo Grande do Araguaia 7.460 35 Pau D’Arco 7.125 36 Abel Figueiredo 5.951 37 Cumaru do Norte 5.818 38 Sapucaia 3.789 39 Bannach 3.776 Total da Mesorregião 1.191.244 Fonte: IBGE – Sinopse preliminar do Censo Demográfico de 2000.
Essas emancipações tiveram várias manifestações (entre elas o crescimento
demográfico), mas tiveram, principalmente motivações político-econômicas. Como se vê, o
poder municipal só se preocupava com a sede do município e acaba esquecendo o interior, as
áreas rurais, deixando-as em completo atraso econômico. Essa visão levou à criação de vários
94
municípios não só no Pará, mas também no Brasil. Favoráveis à criação de municípios são
também aqueles que reivindicam que os serviços concentrados na sede municipal sejam
ampliados para o interior, pois essas áreas ficam em completa dependência dos serviços da
sede, a qual não tem condições de atender a todos aqueles que estão fora dos limites da sede
do município.
Assim a história dos municípios aqui estudados tem uma única vertente
territorial, que é a de serem originários do município de Marabá, mas, por sua vez, têm suas
peculiaridades e suas próprias configurações territoriais. Seus territórios são desdobramentos
das fragmentações políticas do poder local de Marabá. Suas transformações político-
econômicas têm reflexos também nos projetos da CVRD e do conjunto de ações promovidas
por grupos políticos locais e extralocais. Seus representantes podem ter vínculos políticos,
caso dos representantes políticos, mas dependendo dos interesses político-econômicos,
fragmentam-se ou associam-se, dependendo do grau de viabilidade e favorecimento que está
em jogo.
95
4 – TERRITÓRIOS SÓCIO-POLÍTICO-ECONÔMICOS, RELAÇÕES DE PODER E SITUAÇÃO FINANCEIRA DOS MUNICÍPIOS NO SUDESTE PARAENSE
O município é a escala de análise que privilegiamos, por acreditarmos que é
nela que podemos evidenciar todas as formas de relações sociais de maneiras explícitas.
Mesmo naquelas formas que são oriundas dos atores econômicos externos à escala local do
município, podemos constatar suas intenções e modificações, a partir de diferentes
complexidades.
Os seis municípios que aqui estudamos são frutos de políticas diferenciadas
e de diferentes complexidades que envolvem também diferentes atores sociais. É, portanto, na
escala municipal que percebemos as diferentes territorialidades, com suas diferentes formas
de organização no território, as formas de gestão adotadas pelos poderes públicos e os
diferentes graus de interferência da sociedade civil.
Essas alterações no território do município têm reflexo nas diferenciações de
poderes e nos arranjos locais de poder que comandam as relações municipais. O governo
municipal, nesse contexto, acaba sofrendo interferências econômicas de diferentes formas
organizadas a partir de grupos que participam do campo de poder no município. As estratégias
criadas pelo poder municipal acabam se confundindo com as estratégicas dos grupos de poder
que direta ou indiretamente participam do exercício de poder no território.
Essas estratégias no município nem sempre são alternativas para se fazer
uma gestão territorial ampla envolvendo a sociedade civil. A gestão acaba tendendo para um
lado que, nesse momento, comanda as relações de poder que decidem as grandes obras no
território ou influencia sua decisão. Dessa forma, uma parcela considerável da sociedade fica
de fora dos arranjos econômicos e dos benefícios (nas formas de equipamentos urbanos para
melhorar as condições de vida da população) que poderiam ser elementos para melhorar a
96
tomada de tais decisões. Em conseqüência, origina-se uma hierarquia no poder, onde o
município é o intermediário entre os diferentes poderes e, muitas vezes, sendo anulado, acaba
se tornando aquela esfera que legalizará as decisões de determinados atores sociais, sem, no
entanto, ter poder de decisão ou de influenciar a decisão. Assim, podemos ver as
interferências de determinados grupos demonstrando a parcialidade do poder público.
No Brasil, são os poderes executivo, legislativo e judiciário que demandam
as decisões, cada um com sua forma de legalizar decisões, respeitando a Constituição. A
Constituição de 1998 deu ao município o caráter de ente Federado, como os Estados, o
Distrito Federal e a União. Esse caráter atribuiu aos municípios uma tomada de poder
diferentemente das constituições anteriores, que tinham no município apenas um elo de
ligação com a escala do Estado.
O município, desde a Constituição de 1988, tem associado caráter
descentralizador ao poder de decisão, respondendo aos diversos mecanismos que expandiram
seus recursos enquanto município, em áreas que antes eram de responsabilidade dos Estados e
da União, e que passaram para a esfera municipal, como saúde, educação, proteção à
sociedade civil, planos de desenvolvimento econômico, dentre outros.
Segundo Sílvia Regina Pacheco (1999),
essa agenda ambiciosa se forma num contexto de profundo questionamento do papel do Estado e de escassez de recursos públicos para responder ao conjunto das demandas sociais. Por um lado, isto implica repensar a organização do Estado – especialmente do governo local – como uma network de agentes capazes de impulsionar novas soluções, catalisados pelo Poder Público. Por outro lado, tornam-se de fundamental importância as políticas para melhorar a qualidade do serviço e a produtividade do setor público, visando à melhoria de sua performance (PACHECO, 1999, p. 40).
A escassez dos serviços públicos ainda é algo que diferencia no primeiro
momento os municípios no Brasil. Podemos notar a grande diferenciação entre os mais de
5.000 municípios existentes no território nacional. A maioria desses municípios é considerada
como micro municípios e apresentam diferentes problemas sócio-econômicos, que
97
aumentaram nas últimas décadas do século XX. Houve assim uma inversão da população
municipal no Brasil como demonstra a Figura 07.
A inversão ocorrida na população dos municípios brasileiros foi a seguinte:
os 60% de municípios que possuíam mais de 20 mil habitantes, passaram, já no período de
1940 a 1963, para 14%, e na segunda metade da década de 1990, para 2% (Figura 07).
Enquanto isso os municípios que possuíam até 20 mil habitantes aumentavam no Brasil,
passando de 40% antes de 1940, para 86% entre os anos de 1940 e 1963. Já na década de
1990, esse número subiu de 90% para 98% dos municípios com até 20 mil habitantes. Essa
inversão demográfica ajudou na fragmentação territorial de diversos municípios brasileiros.
Surgiu, principalmente a partir da Constituição de 1988, no Brasil, uma “febre das
emancipações”, sem, no entanto, serem criados critérios de viabilidade econômico-financeira
e sem ser analisado o desempenho municipal para garantir que aqueles que pleiteavam suas
emancipações poderiam gerar riquezas para suas populações e não o contrário, como
aconteceu com a maioria dos novos municípios no Brasil, que geraram mais problemas
sociais e aumentaram a dívida de Estados e municípios.
40%
60% 86%
14%
83%
17%
90%
10%
97%
3%
98%
2%
0%
20%
40%
60%
80%
100%
Antesde 1940
1940 a1963
1964 a1988
1989 a1992
1993 a1996
após1996
Fonte: IBGE, 2000.
Figura 07 - Ano de Instalação dos Municípios por Tamanho da População (1999)
Até 20 mil habitantes
Acima de 20 milhabitantes
98
A Figura 07 demonstra a grande proliferação de pequenos municípios no
Brasil a partir da Constituição de 1988 (surgiram 1.307 municípios desde então). Dessa
forma, a reestruturação municipal se faz necessária por diversos fatores. O primeiro é a
necessidade de atender a diversos setores da sociedade civil antes excluídos e que têm
ocasionado diversos segmentos sociais, como os sem-teto, os sem-terra e outros que surgiram
ao longo das últimas de décadas no Brasil, frutos de um processo social que os colocou como
vítimas de uma política que desconsiderava os setores sociais que, hoje, não podem mais
passar despercebidos diante de tantos conflitos sociais gerados pelas políticas de Estado e
municípios no Brasil. Um segundo fator que justifica a reestruturação municipal é o número
de municípios que surgiram sem a menor condição de viabilidade econômico-financeira e,
conseqüentemente, sem recursos para atender a seus habitantes.
O Brasil encontra-se em diferentes estágios em relação às questões político-
administrativas. De Norte a Sul do país, encontramos formas variadas de desenvolvimento
econômico e modelos de gestão pública, o que demonstra a diversidade dos caminhos
encontrados pelos governos locais para enfrentarem seus problemas urbanos e rurais, porém a
maioria dos pequenos municípios ainda está sob condições quase nulas de viabilidade
econômico-financeira. Sabemos que só a questão econômico-financeira não resolverá os
problemas municipais, mas poderá contribuir para melhorar as administrações públicas.
As questões referentes aos municípios brasileiros, especialmente os que
estudamos neste caso, os do sudeste paraense, são questões que perpassam as suas formas e
funções de viabilidade econômico-financeiras. Esse desafio em relação à captação de recursos
para aumentar a capacidade de arrecadação municipal está diretamente relacionado com as
formas de gestão encontradas pelos municípios em virtude dos diferentes graus de
dificuldades econômicas que cada um encontra em relação aos problemas urbanos e rurais.
99
Todo e qualquer arranjo espacial no território acaba por influenciar o
potencial dos municípios. Essa potencialidade municipal, muitas vezes, acaba sendo
direcionada para atividades econômicas com maior rentabilidade e maior potencial de
arrecadação de impostos na geração da receita municipal, sem se preocupar com os possíveis
impactos gerados pela implantação dessas atividades, que, no caso em estudo, são atividades
de mineração.
Dessa forma, o desafio municipal está na coordenação conjunta entre a
captação de recursos, geração de empregos e melhorias nas condições de vida dos munícipes.
Um dos elementos é a falta de infra-estrutura inversamente proporcional ao crescimento
demográfico, o que tem ajudado a aumentar os problemas sociais locais, como os de saúde,
em municípios sem receita para solucioná-los.
Embora a descentralização tenha por objetivo aumentar o poder municipal, a
fim de solucionar os problemas locais, ela também aumenta a responsabilidade do município
quanto aos gastos e investimentos em determinados setores, que antes eram responsabilidade
do Estado e da União. Uma dessas responsabilidades é o recente processo de municipalização,
que, no caso os municípios estudados, provocou um repasse dos problemas sociais (falta de
infra-estrutura, migração, dentre outros) gerados pelo Estado e pela União para os municípios,
muitos dos quais sem condições de gerirem seus problemas.
Dessa forma, sobressaem os municípios com receita e arrecadação
suficientes para colocar em sintonia a descentralização e o poder de decidir; para esses a
descentralização é um elemento de democracia. Em outros a descentralização acaba por
onerar ainda mais os problemas municipais. Sem condições de terem alguns setores
municipalizados passam cada vez mais a aumentar suas dívidas internas, aumentando sua
dependência tanto dos Estados como da União na busca de aumentar suas receitas.
100
Outro elemento que inviabiliza a descentralização municipal é o pensamento
tradicional de muitos poderes locais que continuam a inibir a participação da sociedade civil,
obstando a criação de canais de participação dessa sociedade. Com canais abertos para
participação da sociedade civil, poderíamos alcançar uma melhor estrutura municipal e
começar a mudar de certa forma a organização da própria sociedade e a gestão municipal.
Por outro lado, essa responsabilidade não veio acompanhada pela
modernização da estrutura municipal, ou seja, muitas prefeituras continuam no atraso
burocrático, sem conseguir criar estratégias para definir seus eixos de desenvolvimento para
atingir tanto o crescimento econômico e, conseqüentemente, o aumento de suas receitas, como
também melhorar as condições de vida de suas sociedades.
4.1 Municípios e suas arrecadações: instrumentos de poder para a gestão territorial
Poder, governo e território são elementos para analisarmos as relações
político-econômico-sociais que no sudeste paraense fazem da gestão territorial uma cadeia de
processos que envolvem diferentes atores sociais e se manifestam em diferentes interesses no
processo de arranjo territorial, demarcando assim territórios de interesses e suas alianças em
função de determinados processos sócio-ecônomicos locais.
Ao mesmo tempo, acontecem buscas por recursos econômicos para
viabilizar políticas setoriais para geração do crescimento econômico local. Muitos dos
municípios da mesorregião sudeste paraense dependem diretamente dos repasses dos tributos
do governo estadual e da União, sem, no entanto, apresentar políticas que os tornem capazes
de aumentar suas arrecadações e assim dar soluções aos seus problemas urbanos e rurais.
As arrecadações oriundas das atividades econômicas que representam as
receitas municipais em certos casos não são suficientes para dar condições de viabilidade
econômica aos municípios, a começar pelo fato que seus orçamentos acabam concentrando
101
gastos nos serviços públicos, como o pagamento do salário do funcionalismo municipal. A
grande questão e, ao mesmo tempo, o desafio das administrações municipais em conjunto
com a sociedade civil organizada, é como capacitar a gestão territorial para que ela, ao mesmo
tempo em que aumenta suas receitas, possa traduzi-las em benéficos para a sociedade, criando
um efeito multiplicador no município. Como captar recursos sem colocar em risco a
viabilidade municipal é um grande desafio dos municípios do sudeste paraense.
No entanto, ainda pode ser precoce afirmar a viabilidade dos municípios que
surgiram das emancipações territoriais que Marabá sofreu durante as décadas de 1980 e 1990.
Marabá, o município que deu origem aos demais municípios, tem toda uma história político-
econômico-social na região, que permite analisá-la com mais precisão, enquanto municípios
novos como Parauapebas, Curionópolis, Eldorado do Carajás, Água Azul do Norte e Canaã
dos Carajás não podem ser analisados da mesma forma. Mas eles devem servir como
exemplos de recortes territoriais diferenciados a partir dos projetos econômicos (voltados para
mineração), que foram implantados em seus territórios, e da capacidade de organização
político-social de suas sociedades.
Suas histórias de criação se confundem com a partilha pelo poder
econômico de Marabá, mas também são frutos de novos tempos econômicos pensados para a
região Amazônica, dentro do projeto de desenvolvimento econômico do país, a partir da
década de 1960. Não podemos descartar a forma pela qual a Amazônia é inserida dentro do
projeto de globalização econômica de seu território no espaço nacional e mesmo
internacional. Seu território sofreu com a ganância econômica de grandes grupos empresariais
tanto nacionais quanto internacionais e com as políticas governamentais orientadas para a
região.
É nesse contexto de tentar inserir a Amazônia em um cenário econômico
nacional e mesmo internacional que o território econômico de Marabá sofreu profundas
102
transformações e deu origem a novas formas econômico-políticas locais, que acabaram por
fomentar as disputas territoriais locais e a partilha pelo poder econômico e político da região
sudeste paraense.
Territórios até então “esquecidos” tornaram-se estratégicos para diferentes
grupos empresariais locais, nacionais e até mesmo internacionais. É dentro desse novo cenário
econômico, principalmente a partir da década de 1980, que Marabá se torna ainda mais um
pólo regional e ganha estatutos políticos de um grande centro regional na Amazônia em
virtude da presença do grupo CVRD e da exploração das riquezas minerais existentes em seu
território.
Assim, as relações de poder político-econômico vão se tornando mais
explícitas, e as formas de governo do território vão assumindo caráter diferenciado do período
da oligarquia dos castanhais no que diz respeito à inserção da região no cenário internacional
e na mudança de visão em torno da economia local (como já foi citado anteriormente no
capítulo 02 com a inserção de novos atores sociais).
A visão empresarial mudou com a chegada dos bancos e, principalmente,
dos projetos da CVRD na região; a relação político-econômico-social agora era de conviver
economicamente com um grande grupo empresarial na exploração dos minérios da região
sudeste paraense. É assim que muitos municípios passam a depositar suas esperanças de
aumento de receita e de criação de novos espaços econômicos com os possíveis tributos
advindos das explorações minerais em seus municípios, o que também faz aumentar a disputa
pelos projetos da companhia e pela disputa do poder político-econômico local.
A introdução de novos atores sociais modificou a forma de ver e administrar
a gestão nesses municípios. Um conjunto de elementos foi fundamental para tais mudanças,
entre eles: a experiência de muitos empresários em outras áreas do país, a presença de uma
das maiores companhias de mineração do mundo com uma visão empreendedora de
103
exploração mineral em alta escala e a formação de um novo tipo de organização da sociedade
civil, com novos políticos (médicos, comerciantes, enfim profissionais liberais de toda parte
do país) advindos de outros ramos econômicos, com a formação de sindicatos, e com a
própria organização do MST. Tudo isso contribuiu para a nova gestão territorial.
Era necessário pensar a viabilidade econômica como expressão de poder
local, não só para fortalecer os municípios, mas ainda para expressar seus domínios na
política local. Dessa forma, a receita municipal é um instrumento de poder político-
econômico no governo do território nos municípios utilizados pela elite local tanto para
fundamentar os discursos emancipacionistas quanto para sua manutenção no poder municipal.
A organização econômica do território expressa, sem dúvida, o poder das novas alianças
político-econômicas locais e extralocais na gestão territorial.
Figura 08: Monumento em homenagem aos mortos da curva do “S” em Eldorado do Carajás (Foto: João Marcio Palheta da Silva, 2003).
Assim não seria mais possível excluir ou ignorar a presença dos conflitos de
interesses existentes nesses municípios. Embora os conflitos continuem existindo. A
sociedade civil tem suas representações na forma organizada de reivindicar seus direitos
104
diante dos novos governos que se sucedem nas administrações locais. Entretanto, em certos
municípios ainda persistem formas tradicionais de domínio em que o poder local é exercido
de forma autoritária e até mesmo coercitiva e, para lembrar uma expressão de Hannah Arendt
(1993), onde o poder está em risco, quando se usa a força física e, a coerção para se resolver
direitos conflitivos. O maior exemplo dessa natureza foi o massacre de Eldorados dos
Carajás14 (Figura 08), onde dezenove trabalhadores rurais foram assassinados.
Em outros municípios, entretanto, embora a estrutura de poder se mantenha
nas mãos da elite político-econômica local, essas formas não são tão visíveis assim, o que
reflete tanto os interesses econômicos locais e extralocais, como o grau de organização da
sociedade civil. Para expressar tais interesses e conflitos, optamos pelos impostos arrecadados
para direcionar quais municípios são ou não dependentes das receitas adquiridas e qual é seu
grau de viabilidade diante de tais recursos financeiros. Sempre faremos referência a todos os
municípios da mesorregião sudeste paraense para uma análise comparativa em seu conjunto
durante os anos de 1995 a 2000.
As fontes de arrecadações, os impostos, têm sido suas únicas saídas para
aumentar suas receitas e, dessa forma, criar mecanismo de desenvolvimento local. Por isso o
aumento desses recursos é um desafio para os governos locais. O poder econômico-político-
social municipal tem como parceiros o Estado e a União, o que cria uma relação de
dependência entre essas instâncias e o município, apesar de ser este um ente federado.
14 Episódio do dia 17 de abril de 1996, onde foram assassinados 19 trabalhadores rurais do Movimento dos Sem-Terra (MST) na curva do “S” no município de Eldorado do Carajás. Os trabalhadores protestavam na PA-275 e em passeata, iam com destino até a capital Belém para pedirem a desapropriação do complexo de fazendas Macaxeira, quando foram cercados por policias militares e ficarem em fogo cruzado, onde ocorreram as mortes dos trabalhadores, até o presente momento ninguém foi oficialmente responsabilizado pelas mortes.
105
4.2 Breve Análise das Arrecadações dos Municípios de Marabá, Parauapebas Curionópolis, Eldorado do Carajás, Canaã dos Carajás e Água Azul do Norte.
Os seis municípios aqui estudados possuem suas arrecadações diferenciadas
e suas dinâmicas econômicas próprias. Embora Marabá, que deu origem aos demais, tenha
uma dinâmica econômica própria mais desenvolvida, não podemos deixar de destacar
Parauapebas, em cuja região se encontram os principais projetos da CVRD. Desde suas
emancipações, municípios como Curionópolis, Eldorado do Carajás, Canaã dos Carajás e
Água Azul do Norte, criados em diferentes períodos, enfrentam problemas comuns e com
grau de capacidade de resolução diferenciado de acordo com sua potencialidade político-
econômico-social para resolvê-los, sejam eles urbanos e rurais.
Muitos desses municípios, após sua emancipação, não conseguem
desenvolver aquilo que seus mentores/emancipacionistas pregavam quando de sua separação,
em relação ao município em que sua área estava associada. O discurso da elite local de que
seus impostos não são traduzidos em melhoria para essas áreas acaba sendo apenas um
elemento para direcionar interesses político-econômicos e, assim, fortalecerem seus laços de
poder, sem, no entanto, esse discurso ser traduzido em melhoria para a população
emancipada.
Como elemento para analisarmos melhor essas questões que implicam as
relações de poder que organizaram o território e fundamentaram o governo local, é necessário
analisarmos suas arrecadações que, no discurso, não deixam de ser elementos de poder e de
organização do governo no território.
Sendo assim, vamos analisar os repasses de FPM nos municípios da
mesorregião sudeste paraense, com destaque para os municípios que selecionamos para
estudo. Esses repasses têm sido cada vez mais questionados, por ocasião do investimento em
setores que seriam prioritários para o crescimento econômico do município. A maioria dos
governos locais, sem capacidade de atrair novos recursos, tem nesses repasses sua única via
106
de investimento na melhoria de vida de suas sociedades e na capacidade de investimento
local.
Assim, ICMS, FPM, IPI e os próprios royalties da CVRD são soluções e
esperança de crescimento econômico local. Acreditam os governos municipais que esses
recursos são a “tábua de salvação” dos municípios que não conseguem atrair investimentos e
vêem, nesses repasses, seu grande “filão” para manter o discurso emancipacionista e para
continuar a garantir suas relações de poder no território e a manutenção de seus governos.
O repasse de ICMS entre os anos de 1995 e 2000 tem nos dados das tabelas
(Tabelas 01 e 02), uma definição de quanto cada município do sudeste paraense tem
arrecadado nesses últimos anos. Esses repasses têm oscilado ao longo dos anos que
analisamos. Nos municípios como Marabá pode-se fazer uma análise mais detalhada dos anos
de arrecadação do ICMS, mas em outros municípios, como Canaã dos Carajás, que foi
recentemente criado, não podemos. Por essa razão, em alguns momentos não temos dados
suficientes para analisarmos comparativamente suas arrecadações com aquelas de municípios
mais antigos e com os mais economicamente dinâmicos, como é o caso de Marabá e
Parauapebas.
Tabela 01 – Repasses de ICMS aos Municípios da Mesorregião Sudeste Paraense em R$ Municípios
Total do Ano 1995 Total do Ano 1996 Total do Ano 1997
Água Azul do Norte 221.997,91 257.594,53 234.615,59 Canaã dos Carajás - - 167.582,56 Curionópolis 806.861,79 936.239,35 837.912,82 Eldorado do Carajás 143.403,36 166.397,61 167.582,56 Parauapebas 5.665.779,71 6.574.268,29 10.982.866,60 Marabá 3.543.885,31 4.112.135,31 3.737.091,19 Soma dos seis municípios 10.159.930,17 11.789.040,56 16.129.648,32 Demais Municípios 13.204.835,18 15.322.185,74 48.320.430,132
Fonte: SEFA, 2001.
Municípios Total do Ano 1998 Total do Ano 1999 Total do Ano 2000
107
Tabela 02 – Repasses de ICMS aos Municípios da Mesorregião Sudeste Paraense em R$ Fonte: SEFA, 2001.
Mas o importante é notarmos que a dinâmica interna de cada município
depende de um conjunto de fatores a serem postos em prática pelas gestões municipais. O
grau de viabilidade econômica de cada município não depende só de suas arrecadações,
depende também das formas como os seus planejamentos têm sido realizados. O desafio não
está só em captação de recursos, mas também na maneira como a sociedade pode participar na
elaboração de planos mais democráticos e salutares para o desenvolvimento local de cada
município e do seu entorno.
Não basta ter recursos naturais e ter empresas em seus territórios, as práticas
de poder na organização econômica do território dependem da capacidade da sociedade civil
em acordo com a gestão municipal de elaborar suas formas de crescimento econômico-
político-social.
Um conjunto de idéias e de diferentes interesses por parte dos atores sociais
poderá ser um dos caminhos que cada administração municipal tenderia a trilhar caso canais
de participação para a sociedade civil fossem abertos. Esses canais seriam discutidos com a
sociedade civil organizada para melhor se fazer a gestão territorial e organizar
democraticamente o governo e suas relações de poder com a sociedade civil.
Embora a arrecadação municipal de alguns municípios tenha aumentado nos
últimos anos, se não ocorrer uma reestruturação nas relações de poder no território, fazendo
com que parcelas significativas da sociedade tenham espaço na gestão municipal para
Parauapebas 11.134.072,31 17.913.590,23 27.649.158,83 Marabá 3.819.843,27 5.346.340,65 7.201.875,62 Curionópolis 856.467,10 789.041,42 3.349.123,97 Água Azul do Norte 239.810,79 375.332,20 629.534,58 Eldorado do Carajás 171.293,42 309.223,24 478.446,28 Canaã dos Carajás 171.293,42 223.919,04 553.990,43 Total dos Sei Municípios 16.392.780,31 24.957.446,78 39.862.129,71 Total dos Demais Municípios 18.826.329,39 18.761.224,14 25.533.922,64
Total da Mesorregião 35.219.009,70 43.718.670,92 65.496.052,35
108
resolução dos problemas, ou seja, que os problemas sejam discutidos pela sociedade, formas
autoritárias de governos e de exclusão da sociedade civil tenderão a coexistir, sem, no entanto,
levar à melhoria da gestão territorial e inviabilizando o crescimento econômico local. Dessa
forma, apesar dos conflitos de interesses co-existirem, a sociedade civil não pode ser apenas
legitimadora das relações de decisão municipal, ela tem que fazer parte das decisões.
Os repasses de verbas e as formas como os municípios buscam arrecadar
seus tributos são expressões de poder político-econômico e social. Essas dinâmicas, no
território, refletem o grau de campo de poder e de governo nas suas formas mais expressivas
de organização do território.
Todo e qualquer elemento a ser incorporado pela gestão territorial tem como
ponto de partida relações de poder que, no território, refletem práticas de governos e seus
interesses. No caso dos municípios do sudeste paraense, essas práticas, que vêm oriundas das
oligarquias dos castanhais, são disciplinadoras e reveladoras de novos tempos, muito embora
ocorra uma manutenção de seus eleitos no poder, no caso os representantes das elites locais.
Os movimentos sociais organizados fazem pressões de diferentes maneiras para que ocorra
ressonância e, conseqüentemente, a amplitude dos benefícios sociais no que diz respeito ao
orçamento municipal, e assim beneficiam a sociedade como um todo. Como podemos notar
nas tabelas 01 e 02 onde são relacionados no período que vai de 1995 a 2000 os repasses do
ICMS aos municípios do sudeste paraense, há indicação também da maneira como a gestão
territorial e os discursos político-econômicos têm sido direcionados de acordo com o
crescimento econômico local.
Nos seis anos de repasses para os municípios do sudeste paraense, os seis
municípios aqui estudados, principalmente Marabá e Parauapebas, municípios que sediam
projetos da CVRD e que têm suas atividades no comércio e na mineração, alcançaram um
certo grau de independência financeira em relação aos demais municípios aqui estudados.
109
Porém, depois da promulgação da Lei Kandir, esses repasses acabaram
sendo diminuídos em virtudes da redução da cota do ICMS. Certas atividades, que antes
condicionaram um incremento dos repasses, depois da Lei Kandir desabaram no sentindo de
diminuir os repasses.
Os repasses são expressões não só do crescimento econômico municipal
mas da dependência ou independência econômica dos municípios. Entretanto o aumento ou a
diminuição dos repasses expressa também relações de poder na ordem do governo no
território, bem como o território econômico e sua gestão territorial em cada município.
Os dados das tabelas 01 e 02, nos períodos que vão de 1995 a 2000,
expressam nitidamente o grau de dependência econômico-financeira de cada município e as
possibilidades de crescimento bem como as oscilações de cada município em termos de
arrecadação. Cada um tem sua peculiaridade, assim como sua capacidade de melhor gerir seus
recursos.
Fica difícil compararmos ano a ano os seis municípios, em virtude dos
períodos de emancipação de cada um, porém faremos uma análise a partir do ano de 1995,
quando podemos observar uma certa expressão não só nos municípios de primeira geração,
mas também nos municípios de segunda geração.
As relações de poder na organizam da gestão no território, expressam de
uma forma ou de outra esse crescimento ou diminuição nas arrecadações. As formas de
implantação e de viabilidade dependem de um conjunto de fatores que congregam os três
conceitos analisados nessa pesquisa: poder, governo e território. Essa tríade explica como a
organização econômica do território se apresenta complexa tanto na forma quanto na função
de cada atividade econômica no desencadeamento dos processos econômico-político-sociais e
culturais em cada município.
110
Nesse conjunto de repasses de ICMS para mesorregião sudeste paraense
cada município tem sua participação em relação aos repasses realizados nos períodos de 1995
a 2000. De acordo com sua posição em cada período. Parauapebas é o primeiro município em
arrecadação de ICMS, seguido de Tucuruí, Marabá e Curionópolis como os maiores
arrecadadores; enquanto municípios como Água Azul do Norte, Canaã dos Carajás e Eldorado
do Carajás seguem entre aqueles que menos arrecadam dentro da mesorregião sudeste.
Por terem períodos de criação diferenciada e por Marabá ser o município-
mãe que originou os demais, escolhemos a década de 1990 para analisarmos os repasses
realizados pelo Estado e pela União para os seis municípios, para termos uma análise
comparativa mais detalhada. Marabá, município que sediava projetos da CVRD na década de
1980 e que tem uma história econômica de destaque na região, Tucuruí, que possui a
Hidrelétrica, e Parauapebas, sede dos atuais projetos da CVRD na região, são municípios que
se destacam em termo de repasse, por possuírem em seus territórios projetos ou atividades que
são sedimentadas em relação aos demais municípios da mesorregião.
O crescimento ou a diminuição nos repasses depende do momento histórico
que cada município vivia ou vive. De uma forma ou de outra, a região que corresponde aos
municípios que pertenciam a Marabá é uma região onde a atividade mineral domina. A ordem
econômica traduzida nos repasses ou nas arrecadações em cada município tem como elo de
intermediação os diferentes conflitos que compõem as relações sociais nesses municípios do
sudeste paraense.
Cada projeto implantado em seus municípios expressa de uma forma direta
ou indireta o poder econômico de cada ator social na organização econômica do território. E,
dessa forma, o governo local, na concepção do poder local, acaba direcionando seus interesses
para melhor expressar suas formas de domínio tanto político quanto econômico nesses
municípios. Na própria concepção de poder local, como expressa por Celso Daniel (1988), o
111
poder acaba fazendo parceria com o governo na organização do território com a finalidade
explícita de direcionar a gestão municipal e dessa forma visa satisfazer os anseios dos atores
sociais envolvidos no fortalecimento de cada atividade local seja ela industrial, mineral ou
comercial, fortalecendo os atores sociais no poder local.
As transferências de receitas são depositadas no FPM, no ICMS e no IPI
basicamente. Dessa forma podemos constatar que o aumento gradativo dessas transferências
tem esbarrado na boa ou má administração municipal. Assim elas beneficiam municípios
como Marabá e Parauapebas e contribuem com as parcerias e com outros tributos como os
royalties para aumentar a arrecadação municipal. No caso dos municípios como Eldorado do
Carajás, Curionópolis, Canaã dos Carajás e Água Azul do Norte essas transferências são
essenciais porque esses municípios dependem diretamente desses recursos para viabilizar a
gestão territorial local.
As tabelas seguintes mostram ao longo dos últimos seis anos a distribuição
das transferências e do PIB municipal dos municípios estudados. No conjunto dos municípios
da mesorregião do sudeste paraense, em matéria de IPI o município que mais tem arrecadado
nos últimos três anos é Parauapebas, sendo ele o primeiro município arrecadador de IPI
(Tabela 03) seguido de Tucuruí e Marabá respectivamente. Isso demonstra que, entre os
municípios da mesorregião, Parauapebas e Marabá têm se destacado, o que não ocorre quando
comparamos com os demais municípios de nosso estudo.
Em relação ao Produto Interno Bruto (PIB) dos municípios estudados ele
tem sido, ao longo do tempo, um desafio aos novos municípios, e incluindo Marabá,
município-mãe, para a melhoria da gestão dos recursos no território e sua distribuição na
sociedade civil. Para ilustrar essa questão Gustavo Gumes e Maria Cristina MaC Dowell
(2000) analisam a importância das transferências municipais e como elas, de uma maneira ou
112
de outra, colocam em cheque a questão da descentralização e o papel de cada município no
desenvolvimento econômico nacional.
Na sua acepção mais ampla, o processo envolve a redistribuição de poder – e, portanto, de prerrogativas, recursos e responsabilidades – do governo para a sociedade civil, da União para os estados e municípios, e do Executivo para o Legislativo e o Judiciário[...] Outra evidência é a proliferação de pequenas cidades, que veio junto com a descentralização política implementada após 1984. Os distritos se converteram em municípios, em primeiro lugar, porque suas populações e elites políticas percebem que podem fazê-lo, ou seja, porque a descentralização política lhes deu uma parcela de poder anteriormente monopolizada por Brasília; e, em segundo, porque isso lhes aumenta o status – e os recursos financeiros (GOMES MaC DOWELL, 2000, p. 8-9)
Tabela 03 – Imposto Sobre Produto Industrializado na Mesorregião SE do Pará em R$
Municípios 1995 1996 1997 1998 1999 2000 Marabá 292.134,34 367.887,30 425.428,45 393.053,65 425.728,45 551.281,52 Parauapebas 467.049,20 588.159,10 271.884,70 1.145.672,07 1.240.912,53 2.116.458,41 Curionópolis 66.512,32 83.759,54 38.719,01 88.128,62 95.545,81 48.188,94 Canaã dos Carajás
- - - 17.625,72 190.090,96 42.406,27
Eldorado do Carajás
11.821,22 14.886,56 6.881,52 17.625,72 19.090,96 36.623,60
Água Azul do Norte
18.300,03 23.045,39 26.727,35 24.676,01 31.828,35 48.188,94
Total do Seis Municípios
857.812,11 1.079.733,89 771.638,03 1.688.779,79 2.005.196,06 2.845.147,68
Fonte: SEFA, 2001.
Nesse caso, os autores afirmam que os pequenos municípios, principalmente
aqueles que possuem até cinco mil habitantes, dependem diretamente das transferências dos
impostos. Segundo os autores, em relação ao ano de 1996 apenas “9% da receita corrente
disponível dos municípios de até 5 mil habitantes no Brasil era própria, no sentido de resultar
de recurso arrecadados por eles próprios” (GOMES; MaC DOWELL, 2000, p. 11). Marabá,
município de melhor renda com mais de 100 mil habitantes e que tem uma receita
considerável tanto em relação à mesorregião sudeste paraense, quanto em relação ao Estado
do Pará devido a sua história econômica e por sua dinâmica política (desde o período da
borracha e da castanha), é considerado um dos pólos político-econômico-adiministrativos do
Estado.
113
Tabela 04 - Produto Interno Bruto dos Municípios do Estado do Pará - PIB (em U$ 1,00 - 1998) Municípios 1970 1975 1980 1985 1990 1996
Água Azul do Norte - - - - - 15.272.378
Curionópolis - - - - 26.826.687 33.154.696
Eldorado do Carajás - - - - - 16.198.710
Marabá 44.716.990 53.808.425 137.004.877 359.563.931 441.869.214 455.154.875
Parauapebas - - - - 90.074.108 105.198.528
Total do Estado Sem os Cinco Municípios 2.706.618.905 4.085.118.633 8.783.062.117 10.851.780.369 15.194.310.564 16.651.060.743
FONTE: Dados básicos: IBGE e IPEA.
No que diz respeito ao PIB (Tabela 04) dos municípios estudados, no ano de
1996 eles se destacam em relação aos demais municípios paraenses. Dentre os 18 maiores PIB
do Estado do Pará estão a capital Belém em primeiro lugar seguido de Ananindeua, Santarém,
Marabá, Castanhal, Itaituba, Capanema, Tucuruí, Altamira, Redenção, Bragança, Rondon do
Pará, Santa Izabel do Pará, Dom Eliseu, São Domingos do Capim, Oeiras do Pará, Tomé-Açu
e Parauapebas. Entre eles Marabá aparece em quarto lugar e Parauapebas em décimo oitavo
na lista dos maiores municípios paraenses em arrecadação. Essa classificação demonstra o
peso de Marabá e Parauapebas dentro do Estado do Pará e dentro da mesorregião sudeste
paraense, assim como de Tucuruí, Redenção, Rondon e outros municípios política e
economicamente importantes no Estado do Pará.
Dentro dessa análise, dos municípios que foram desmembrados de Marabá
apenas Parauapebas demonstra viabilidade econômico-financeira, devido à presença da
CVRD e os projetos a ela associados, como também aos recursos financeiros dos diversos
assentamentos rurais existentes em seu território, como é o caso dos assentamentos do MST.
Esses assentamentos ajudam a impulsionar em momentos de crises, o comércio local de
Parauapebas.
De uma forma ou de outra, municípios como Água Azul do Norte e Canaã
dos Carajás acabam dependendo do crescimento econômico e dos novos investimentos de
seus vizinhos como Parauapebas, enquanto aguardam possíveis projetos que a CVRD poderá
implantar em seus territórios, como é o caso de Canaã com a entrada em funcionamento do
114
Projeto Mineração Serra do Sossego (MSS) em 2004 e de Curionópolis do Serra Leste
(pendente desde sua privatização em 1997). Por sua vez Eldorado do Carajás e Água Azul do
Norte dependem diretamente do comércio local e da agricultura, para fazer parceria com o
impulso que esses outros municípios já citados poderão ter, apostando no efeito multiplicador
para crescerem economicamente.
Tabela 05 - Fundo de Participação dos Municípios do Estado do Pará entre os anos de 1995- 200015 em R$. MUNICÍPIOS 1995 1996 1997 1998 1999 2000
ÁGUA AZUL DO NORTE 693.591,96 784.687,28 782.974,11 1.621.942,93 2.188.900,34 2.469.733,10
CURIONÓPOLIS 2.543.170,38 2.877.186,70 1.565.948,01 1.621.942,93 1.740.856,05 1.701.981,02
ELDORADO DO CARAJÁS 924.789,27 1.046.249,76 782.974,11 810.971,60 938.100,40 1.058.457,32
MARABÁ 8.640.023,90 9.774.792,05 9.999.495,11 10.220.167,45 9.558.221,08 9.697.492,40
PARAUAPEBAS 2.311.973,08 2.615.624,24 1.826.939,31 2.162.590,44 2.501.600,31 2.822.552,13
Total dos cinco Municípios 15.115.543,59 17.100.536,03 14.960.327,65 16.439.613,35 16.929.677,18 17.752.215,97
Total dos Municípios Paraenses 269.774.795,88 305.206.661,12 293.577.131,64 316.351.194,04 349.229.444,652.976.545.124,85
Fonte: Ministério da Fazenda – Secretaria do Tesouro Nacional.
Ao analisar os repasses dos principais impostos dos municípios do sudeste
paraense, constatamos que ocorre uma imensa diferença entre aqueles municípios novos que
foram criados a partir de 1988 (Tabela 05) e em cujo território possuem projetos efetivos de
mineração da CVRD e aqueles que não os possuem. Por exemplo: Parauapebas, que foi
emancipado em 1988 junto com Curionópolis, possui grau de arrecadação diferenciada.
Enquanto Parauapebas sobrevive com mais recursos financeiros, Curionópolis está entregue a
sua própria sorte.
Parauapebas, ao ser emancipado de Marabá, herdou os principais projetos da
CVRD e ainda dispõe dos royalties da mineração. Enquanto isso Curionópolis, que tinha
Serra Pelada, com o fim da lavra manual depositou toda a sua esperança no projeto Serra
Leste, cuja viabilidade e implantação no município citado ainda hoje está em discussão.
Os fins político-econômicos pelos quais esses municípios foram criados em
muitos casos não se traduziram em melhorias, pelo contrário, aumentaram as dívidas
municipais e suas sociedades não melhoraram e, em muitos casos, pioraram suas condições de
15 Não foi possível conseguir dados sobre Canaã dos Carajás.
115
vida. Com receitas insuficientes e sem possibilidade de captar recursos externos, esses
municípios inviabilizam seu desenvolvimento sócio-econômico.
Dependentes dos repasses da União e do Estado, suas estruturas, enquanto
formas de desenvolvimento, continuam inexistentes, suas elites político-econômicas fecham
os olhos para o futuro e permanecem com sua visão de desenvolvimento como se ainda
fossem os oligarcas do Tocantins e mantiveram seu pensamento econômico e sua economia
presa ao século XIX.
O grau de dependência econômica dos novos municípios tem ocasionado a
discussão sobre os canais de participação da sociedade civil. Por outro lado, como Alain
Bourdin (2001) bem analisou em seu livro a respeito das questões referentes às formas de
desenvolvimentos das mobilidades, estas “são tratadas como fatores perturbadores e como
perigos, mas não se pensa que elas possam produzir novas definições da localidade”
(BOURDIN, 2001. p.59). Assim, nos municípios estudados, diríamos que a questão local tem
proporcionado o surgimento e o fortalecimento dos atores sociais devido à mobilidade que
existe nessas áreas atratoras de migração, em função das atividades econômicas fazendo
surgir diferentes formas de organização social das disputa pelos recursos utilizados no
território. Por outro lado essa mobilidade serviu aos interesses das elites locais. Esses
interesses estão associados a discursos emancipacionistas que tanto serviram para legitimar o
poder local e fizeram emergir novos atores sociais na disputa pelo campo de poder na
organização do governo territorial no sudeste paraense.
Na questão da mobilidade existe a respeito do FPM (Tabela 05) uma relação
direta entre aqueles municípios que não possuem atividades econômicas atrativas para as
empresas de mineração como a CVRD; nesse caso o FPM é uma das principais fontes
financeiras para o município. Para outros, que possuem projetos definidos pela CVRD, e que
116
recebem os royalties da mineração, o FPM é um elemento a mais na sua arrecadação (Nesse
caso os novos municípios dependem diretamente das transferências dos impostos).
Assim o local (município) é a escala que melhor expressa essas trilhas
financeiras que equivalem a relações de poder nas disputas tantos entre os municípios quanto
entre os atores político-econômicos locais e extra locais.
Ainda, segundo Alain Bourdin (2001)
Chegamos a uma definição do local que não faz dele nem uma necessidade antropológica nem um conteúdo herdado e inevitável, mas uma forma social que constitui um nível de integração das ações e dos atores, dos grupos e das trocas. Essa forma é caracterizada pela relação privilegiada com um lugar, que varia de intensidade e em seu conteúdo. A questão se desloca então da definição substancial do local à articulação dos diferentes lugares de integração, à sua importância, à riqueza de seu conteúdo (BOURDIN, 2001. p. 56).
É nessa perspectiva que se pode entender a integração das atividades
mineradoras presentes em municípios como Marabá, Canaã e Parauapebas e a possível
virtualidade de outros projetos em Curionópolis, por exemplo. Nessa ótica não só o Estado,
mas também as empresas e os diferentes atores econômicos utilizaram-se dos recursos
financeiros tornando-os elementos através dos quais os discursos do poder local mobilizam a
sociedade local para tentar garantir seu domínio municipal. Porém, sociedade civil organizada
no sudeste paraense, especialmente nos municípios estudados, tem seu papel bem definido no
que diz respeito à busca pelos recursos disponíveis nos territórios.
Quando comparamos diferentes áreas dentro de um mesmo território, como
é o caso da cidade de Parauapebas e do núcleo urbano de Carajás (administrado pela CVRD),
os contrastes na paisagem local vão além da distinta organização sócio-espacial que tem
levado à organização da sociedade civil e à disputa por melhores condições de vida dessas
populações.
As arrecadações são diferenciadas, porém as práticas que levam esses
municípios a se emanciparem são praticamente as mesmas. O discurso da elite de que os
117
impostos não são traduzidos em recursos acabam ecoando na população. Pela sua própria
mobilidade, a maioria dessa população vinda do vizinho Estado do Maranhão, um Estado com
menos recursos que o Estado do Pará quando comparamos as formas de desenvolvimento,
vêem nesses discursos formas de melhoria de vida; assim o discurso de desenvolvimento
sócio-econômico que seria da sociedade, acaba sendo apropriado e distorcido pela elite local,
no intuito de partilhar o poder político-econômico.
Destarte, por ocasião dos desmembramentos dos municípios bem poucos
governos locais criam canais de participação para aqueles que os ajudaram a realizar seus
sonhos de poder territorial. A gestão municipal, dessa forma, acaba sendo uma gestão
hegemônica da elite que controla o poder político-econômico da região. Por isso depois da
fragmentação alcançada, a situação das áreas urbanas e rurais em quase nada melhora. Novos
cargos de prefeitos e vereadores são a forma do reducionismo desenvolvimentista pensado
pelo poder local na fragmentação do poder no sudeste paraense.
Para Gustavo Gomes e Maria MaC Dowell (2000), “para custear suas
despesas (inclusive, é claro, as despesas com sua própria administração), os pequenos
municípios dependem fortemente das transferências de impostos, especialmente dos imposto
federais, via Fundo de Participação dos Municípios” (GOMES; MaC DOWELL, 2000, p. 11).
De uma forma ou de outra, sempre a discussão sobre a viabilidade econômico-financeira dos
municípios aqui estudados passa pela direta ou indireta dependência desse imposto, e da
capacidade de captar recursos, principalmente com a implantação de possíveis projetos da
CVRD na região.
Outro fato a destacar, como podemos observar, é a discussão sobre a
participação dos municípios na cota parte do FPM, já que dos 5.506 municípios existentes no
Brasil (Quadro 08) 4.119 municípios têm até 20 mil habitantes. Assim, segundo os autores
eles oneram a outra parcela dos municípios com mais de 100 mil habitantes. Os municípios
118
aqui estudados não fogem à regra das distribuições e das maneiras como foram criados
municípios em áreas em que os discursos políticos sobressaíram em relação às suas condições
de viabilidade econômico-financeira. Segundo Gustavo Gomes e Maria MaC Dowell “para o
Brasil como um todo, os grupos de municípios com mais de 100 mil habitantes financiam (via
FPM) os municípios com menos de 100 mil habitantes” (GOMES; MaC DOWELL, 2000, p.
14).
Quadro 08 – Municípios e Faixas de População no Brasil
Fonte: IBGE – Perfil dos Municípios Brasileiros, 1999 (adaptado pelo autor).
Ainda segundo Gomes e MaC Doweel,
Os grandes beneficiários dos critérios de repartição de recursos tributários (especialmente federais) entre os municípios são os pequenos municípios e, dentre estes, especialmente os de até 5 mil habitantes. Nos últimos anos, o processo de descentralização política, com intensa criação de municípios e proliferação dos pequenos municípios, tem implicado uma transferência de renda tributária cada vez maior para esses municípios, pelo simples fato de que eles proliferam e de que há uma cota mínima, por estado, para o recebimento do FPM pelos municípios (GOMES; MaC DOWELL, 2000, p. 16).
Considerando que os municípios que estudamos estão dentro da faixa que
vai de 10 mil habitantes (como é o caso de Canaã dos Carajás) até 160 mil (como é o caso de
Marabá), podemos evidenciar que, com exceção de Marabá e Parauapebas, todos os outros
municípios que estudamos se encontram dentro da análise feita num dilema de dependência
Faixas de População Municípios Até 5.000 1.407 De 5.001 a 10.000 1.320 De 10.001 a 15.000 860 De 15.001 a 20.000 532 De 20.001 a 50.000 908 De 50.001 a 100.000 279 De 100.001 a 200.000 106 De 200.001 a 500.000 68 De 500.001 a 1.000.000 15 Mais de 1.000.000 11 Total 5.506
119
direta dos repasses constitucionais, com pouca viabilidade econômico-financeira quando
olhamos sua configuração no território. Suas formas de gestão ainda confusas, por persistirem
resquícios de uma visão de desenvolvimento sócio-econômico-político que não engloba a
sociedade civil como um todo, se vêem na dependência de possíveis projetos de mineração da
CVRD.
120
5 - POLÊMICAS, RELAÇÕES E CONFLITOS ENTRE PODERES (DA CVRD E DOS PODERES PÚBLICOS) NO CONTEXTO DAS REALIDADES MUNICIPAIS.
As relações de poder que se formam a partir dos processos conflituosos
dependem do embate com atores sociais, sejam eles a CVRD, os produtores rurais patronais,
os trabalhadores rurais sem terra, pequenos colonos, posseiros, fazendeiros individuais ou
empresariais, garimpeiros dentre outros, junto ao poder público municipal.
Todas as relações que contribuem para a gestão territorial dos municípios
aqui estudados se diferenciam pelo grau e pela complexidade que cada ator social desenvolve
ao longo das trajetórias político-econômico-sociais em seus territórios, mesmo acontecendo
momentos em que alguns atores sociais atuem em mais de um município.
O poder que organiza o território é um poder fragmentado, que, embora
exista em parceria entre atores, se fragmenta pelo número e importância dos atores sociais e
por seus objetivos alcançados no território.
Dividiremos nossas análises em cada um dos municípios, explicando suas
questões de acordo com as entrevistas e os documentos coletados, de forma que possamos
entender suas problemáticas, realizando uma breve conclusão em cada uma delas de acordo
com as prerrogativas que consubstanciam as relações de domínio na região sul/sudeste do
Pará. Nesse caso, o território é entendido pelo seu uso, pelas relações e as ações entre a
CVRD, poderes públicos e atores sociais manifestas na organização e consolidação dos
municípios. Assim, embora fragmentadas, podem ser lidas também no seu conjunto, não
dissociando os processo que foram mais expressivos dentro de cada unidade territorial.
121
5.1 – Relações e Conflitos entre Atores Sociais no Município de Marabá
Como primeiro passo, começaremos nossas análises sobre o município de
Marabá (Figura 09), município que deu origem aos demais, considerando a importância
político-econômico-social que o município tem na região e no conjunto dos municípios
paraenses. Em entrevista realizada no município com o presidente da Associação Comercial e
Industrial de Marabá (ACIM), que é uma das entidades mais importantes na região sudeste
paraense, o representante da ACIM destacou a perda que o Estado do Pará vem tendo nos
últimos anos em função da mudança para o Maranhão de quase toda a base logística da
CVRD, que comandava as relações em Carajás. Mudando-se para o vizinho Estado do
Maranhão, beneficiou este Estado, tornando os paraenses meros fornecedores de matéria-
prima.
Figura 09: Vista Parcial da Cidade de Marabá pólo da mesorregião sudeste paraense (Foto: João Marcio Palheta da Silva, 2003).
Segundo seu presidente,
A associação Comercial e Industrial de Marabá aglutina a classe empresarial do sul do Estado. Ela é como se diz a porta voz. Por exemplo, o pólo siderúrgico quem denunciou, fomos nós. Eu acho até que muita coisa que se perdeu na região, ou foi desconhecimento da própria classe política do Estado, ou da própria riqueza que o Estado do Pará tem. A Vale tinha uma política predatória. Esse pólo siderúrgico começou a ser montado há dez anos atrás. A elite de Belém é extremamente conservadora, o Estado não tem uma política industrial, um Estado que vive praticamente do extrativismo,
122
seja vegetal ou mineral. O Estado não tem ninguém que discuta tecnicamente com a Vale do Rio Doce. Em determinado momento pode ter até emoção, mas depois, tem que ter razão é sentar, é estudo de viabilidade técnica, econômica. O Estado tem que se preparar, se o Estado souber negociar, a gente tem que pensar no Estado como um todo (Trabalho de Campo, 2003).
A crítica empresarial realizada pela ACIM de Marabá à elite política
paraense ressalta que sempre teve seus momentos convergentes e divergentes. Uma das
divergências se deu por conta da tentativa de criação do Estado do Carajás16, que os políticos
e empresários da região sul e sudeste paraense tentaram realizar. No momento (2003) está
suspensa qualquer criação de Estado e Município, decisão tomada por parte do governo
federal. Em outras ocasiões, como a da crise do pólo siderúrgico instalado no Maranhão,
unificam-se os interesses do Estado e daqueles que representam a região sudeste paraense.
Outra crítica fundamental, realizada pelo ACIM, está relacionada à falta de
visão de planejamento industrial futuro para o Estado, e diz respeito às obras rodoviárias
realizadas pelo governo paraense. Segundo os empresários, ao invés de se construir a alça
viária ligando Belém ao sul/sudeste do Pará por via rodoviária, o Estado deveria ter investido
na construção das eclusas de Tucuruí, pois segundo o presidente da ACIM a alça viária17 “liga
nada a lugar nenhum”. Tucuruí, segundo ele, tem toda uma relação que poderia dinamizar a
região sul e sudeste paraense, tornando-se muito mais estratégica para o Estado, porém esse
planejamento para viabilizar a construção das eclusas deveria incluir negociações e parcerias
com empresas como a CVRD, ao invés de ter investido na alça viária.
16 A tentativa de criação do Estado do Carajás teve na comissão Brandão seu principal articulador entre os políticos locais para viabilizar a emancipação. O projeto foi rejeitado pela Assembléia Legislativa do Estado, mas continua o impasse e há fortes indícios que no futuro voltará a ser questão central para os políticos do sudeste paraense. 17 A alça viária é composta por quatro pontes, com 4,5 km de extensão e 70 km de rodovia, o complexo viário representou um investimento de R$ 246 milhões e vai integrar a região metropolitana de Belém ao leste paraense, onde está concentrada a maior parte da população do Estado. A maior das quatro pontes localizada sobre o rio Guamá tem 1,9 km de comprimento. As demais pontes são Moju-cidade, com 878 metros de comprimento; a Moju-alça, também com 878 metros, e a ponte sobre o Rio Acará, que tem 860 metros de extensão.
123
A preocupação da ACIM em querer pensar o futuro da mineração no Estado
está relacionada também aos projetos que estão sendo direcionados para municípios na região
sul e sudeste do Pará, como é o caso do projeto MSS em Canaã dos Carajás. Segundo o
presidente da ACIM,
O pólo guseiro está se deslocando de Minas Gerais para o Maranhão e para o Pará, porque lá já desmataram demais, lá já tinha pouca mata e, eles acabaram o trabalho. Tem que ter um pólo guseiro auto sustentável, porque o mercado internacional é cada vez mais exigente nessa qualidade. A Vale fez essa sociedade com a Nucor. É boa porque ela vai pagar outros guseiros, ela vai fazer reflorestamento, ela vai usar o carvão de áreas reflorestadas, deixa de dizimar as florestas, de incentivar as queimadas, porque ela compra o carvão das siderúrgicas, nesse aspecto é bom (Entrevista realizada em 2003).
Dessa forma, as empresas CVRD e a Nucor18 poderiam amenizar as
questões ambientais na região, porém o que se verifica é que, embora haja uma legislação de
reflorestamento, muito do carvão comprado pelas guserias presentes em Marabá vem de
municípios vizinho como São João do Araguaia, onde o agricultor familiar, em virtude de
adversidades nas formas como foram realizados seus assentamentos, estão derrubando a mata
para fazer carvão e vender para as guserias em Marabá. Assim eles aumentam as queimadas e
prejudicam seu futuro como agricultor.
Há uma contradição entre as práticas otimizadas para o desenvolvimento
industrial de Marabá. O perigo do que ocorreu com Minas Gerais, em relação às guserias, é
transferido para o Estado do Pará. A pressão sobre a floresta, e o baixo nível de receita obtida
pelo pequeno produtor com a agricultura por falta de infra-estruturas e apoio financeiro dentre
outros, faz com que ele se torne refém das guserias, ou melhor, dos atravessadores que vêm
comprar carvão vegetal em seus pequenos lotes induzindo-os a aumentar suas remessas de
carvão em virtude do valor pago. Cada caminhão de carvão vegetal equivale a mil reais,
18 A parceria entre a Companhia Vale do Rio Doce e a siderúrgica americana Nucor tem um primeiro projeto anunciado, com investimento de US$ 400 milhões, e inclui a produção de ferro gusa no Brasil e a ativação da usina Trayco nos EUA (Gazeta Mercantil, 29/04/02).
124
fazendo com o trabalhador fique iludido pelo retorno financeiro que está tendo sem se
preocupar com a preservação da floresta.
A questão do pólo siderúrgico torna-se assim um elemento a ser discutido,
por causa do impacto regional e local, em relação à agricultura familiar, que é a base de
sustento da maioria dos pequenos municípios na região. Ainda, segundo o presidente da
ACIM, o Pará perdeu a disputa na questão do pólo siderúrgico em virtude de toda a infra-
estrutura da CVRD ter sido montada no Maranhão, e nessa relação, ocorreu um erro que é
histórico, e se deve no “passado de uma elite conservadora, em parceria com a elite política
nacional, que não se preocupou com o futuro da economia do Estado com um todo”.
Para ressaltar o que afirmamos acima, no começo da década de 1980,
Ricardo Bueno (1984) criticou as formas como os nossos recursos naturais estavam sendo
extraídos, e exportados na Amazônia, por diversas multinacionais. Ele afirmava que corria o
risco da Companhia Vale do Rio Doce ficar apenas coma exploração do ferro. Depois de anos
a CVRD deixou de ser estatal, em 1997, e passou ao capital privado, expandiu seus negócios,
associou-se aos diferentes capitais e tem monopolizado os minérios no Estado do Pará,
contrariando a preocupação de Ricardo do Bueno no começo da década de 1980. Quando na
época a CVRD ainda pertencia ao Estado, e o capital privado internacional não estava
interessado na companhia, mas nas jazidas minerais da Amazônia. Dentre as empresas
interessadas estavam, segundo ele,
Exxon e Inço para exploração das reservas do cobre avaliadas em 1 bilhão de toneladas, a Sheel de olho nas reservas de bauxita, o grupo Patino que deseja a cassiterita e a Anglo-American que quer se apropriar das reservas de ouro. Retalhada a Serra dos Carajás, a Vale do Rio Doce ficaria apenas com o minério de ferro. Uma tese que áreas entreguistas do Ministério das Minas e Energias vêem com simpatia (BUENO, 1984. P. 139).
Em parte Ricardo Bueno não perdeu sua análise. A CVRD não só ficou com
o ferro, como também se associou as diversas empresas para explorarem juntas os minérios na
Amazônia. Na década de 1990 quando foi privatizada; nem o ferro o Estado Brasileiro
125
conseguiu controlar. Por exemplo, a CVRD conversou muito com a Anglo-American para
exploração de minas de ouro no Pará. E deu um passo significativo ao se associar com
empresas chinesas no ramo da siderurgia mundial, voltando seus interesses mais para os
mercados mundiais de que para os interesses do Estado Brasileiro. Nisso a velha lógica do
entreguismo reapresentada por Ricardo Bueno parece estar correta nesse sentido; empresas
estão levando ferro, ouro, manganês, cobre e outro minerais, e isso aqui na Amazônia; o que
há muitos anos não despertava tanto interesse mundial (Carajás) agora está sendo utilizado; o
que era reserva, está sendo apropriado pelo capital mundial para atender aos mercados de
outros países.
Nesse caso, a demanda do mercado mundial e as novas relações que a
CVRD agora, como empresa privada, possui, alteraram completamente suas relações com o
Estado brasileiro e com os interesses nacionais. O pólo siderúrgico (instalado no Maranhão) é
uma questão passada, mas torna-se necessário repensar como a região paraense pode ser
beneficiada com os erros ocorridos no passado, colocando-se diante da empresa e se
posicionando no que o Estado quer em termos de industrialização para a região,
diferentemente daquele que teve como principal indutor o Projeto Ferro Carajás. Segundo
Félix Miranda, presidente da ACIM,
Pelas informações que a gente obteve com os técnicos da Vale sobre o pólo siderúrgico, usando o carvão mineral, nesse caso por isso que São Luís é economicamente mais viável, porque é uma empresa da China, ela importa o carvão da China, faz a placa de aço e depois exporta para a própria China, para ser no Pará, teria que trazer esse carvão mineral para Marabá e depois voltar, ninguém paga frete, ninguém fica passeando, quando pode encurtar o caminho, além do que em São Luís eles fizeram a logística do porto e da ferrovia, eles fizeram tudo, e o governo do Estado foi aceitando as coisas. Não adianta achar que a Vale vai resolver o problema da pobreza do Pará (Entrevista Realizada em 2003).
Há, contemporaneamente, uma tentativa de se compensar o Pará, não por
parte da CVRD, mas por parte de políticos paraenses. Projetos não faltam; um exemplo é o da
senadora Ana Júlia Carepa é de aumentar o percentual relativo aos royalties; a tentativa é de
126
compensar, não só as perdas que o Estado vem tendo ao longo dos mais de vinte anos de
Projeto Ferro Carajás, mas tentar amenizar os impactos diretos e indiretos que os municípios
vêm sofrendo em função da instalação dos projetos da companhia na região.
Para o presidente da ACIM, o problema não está diretamente relacionado
com arrecadação proporcionada pelos royalties, pois segundo ele, se assim fosse, como dizem
aqueles que defendem que seus municípios só prosperariam se recebessem o recurso da
exploração mineral, Parauapebas não teria problemas. Segundo o secretário,
eu acho que a lei que tinha que aprovar os royalties, tinha que dizer quanto dos royalties tinham que ser utilizados em educação, saúde, investimentos. Parauapebas esta aí, entra um monte de dinheiro e não vai resolver nada, tu vais a Parauapebas e vê que lá é muito mais atrasado que outros municípios (entrevista realizada em 2003).
A implantação dos grandes projetos na Amazônia, segundo o presidente da
ACIM, foi indutor dos desmembramentos territoriais. Dessa forma Marabá perdeu
importantes áreas de mineração, contudo não perdeu sua importância regional, continuou
sendo o pólo político-econômico da região, junto com Tucuruí, cidade que abriga a Usina
Hidrelétrica de mesmo nome. No final do século XX houve uma corrida pela criação de novos
municípios, que foi freada pelo governo federal, mas esses discursos ainda sustentam a
posição da elite político-econômica, insatisfeita com a distribuição das arrecadações, que
disputa o poder na região sul e sudeste paraense. Segundo Félix Miranda,
esses projetos de mineração foram criando núcleos que fatalmente se separam, isso prejudicou Marabá. Eu vejo também em cima da incapacidade nossa, eu digo nossa, porque os políticos da época não souberam negociar, fizeram separar Parauapebas e Marabá aceitou. Assim perdeu ferro, perdeu o ouro. A sorte de Marabá é sua posição geográfica que é estratégica tem interligação com ferrovia, rodovia, e no dia que tiver as eclusas de Tucuruí, ela fica uma cidade completa. Tem uma estrutura de serviços melhor, todas as sedes das repartições públicas federais e estaduais ficam em Marabá, as regionais. É importante, a siderurgia é, mas siderurgia não é um ramo de economia de grande fator de distribuição de renda, é concentrador de renda, é diferente de uma agricultura forte (entrevista realizada em trabalho de campo, 2003).
127
As criticas recaem na falta de representatividade dos políticos paraenses,
segundo a ACIM “você sente até na divisão de poder. O Pará é levado a sério?”. Os jornais no
Estado do Pará deram destaques para políticos que na época da implantação do Projeto Ferro
Carajás eram importantes, mas que nada fizeram para mudar o rumo da história que apontava
o Estado do Maranhão como beneficiado pelos minérios do Pará, declarando-se
impossibilitado de mudar os rumos dos acontecimentos que marcaram a história político-
econômica do Estado.
As discussões não terminam com a saída do pólo siderúrgico para o
Maranhão, mas destaca-se que a política de mineração que o Estado do Pará tem em relação,
não só à CVRD, mas ao Estado como um todo, é equivocada. A crítica recai sobre um Estado
omisso em suas decisões, enquanto planejamento futuro da economia no Estado. Foi-se
deixando levar, era fácil pedir à CVRD e a empresa atender os pedidos.
Ou o Estado não se preparou, ou aqueles que estavam preparados para
discutir com a CVRD não tinham espaço nem a representatividade, pois precisavam do
Estado para questionar o papel da empresa. E a lógica de desenvolvimento implantada na
região ficou a mercê das vontades econômicas e sociais da CVRD.
Para a ACIM os erros do passado foram responsáveis pelo desmanche que a
CVRD fez no Estado, e esses erros começaram quando foi entregue à CVRD o domínio sobre
411.000 hectares. Segundo o presidente da ACIM,
não tem como tirar a Vale do negócio, pois é a empresa que detêm a riqueza da região, do Estado. A gente pode dar um equilíbrio e ter um crescimento planejado, meu medo é que quando eu digo o Estado eu digo os técnicos do Estado. O Estado enquanto máquina é muito despreparado, para isso, mas despreparados que nós, não existe isso, a gente que impôs a verticalização do cobre, a verticalização do alumínio. Porque você tem que discutir isso agora, porque daqui a cinco ou seis anos vai ser montada essa metalurgia, se você não começar preparar agora o Estado para poder ter isso, você não vai ter nada.Temos aqui a COSIPAR que é a maior ferrogusa, tem a SIMARA que é a segunda maior, tem a USIMAR que é a terceira maior tem a IBÉRICA que a quarta maior e têm a TERRA NORTE que é a quinta, cinco siderúrgicas (entrevista realizada em 2003).
128
Marabá acabou ficando com a siderurgia (guserias) de menor porte, algumas
delas vão buscar sua matéria-prima em outros municípios, devido à pressão que existe em
Marabá em função da questão ambiental. Para entendermos mais a questão ambiental em
Marabá, entrevistamos seu secretario de Meio Ambiente, Antonio Rosa, para exemplificar o
papel das guserias e como a questão ambiental vem sendo tratada em relação ao município, e
com a principal empresa na região, a CVRD. Segundo ele,
a SEMA tem um papel tipicamente urbano. Ela ficou de fora do licenciamento em áreas rurais, a questão das queimadas na zona rural, fica muito difícil à gente atuar dentro dessa área. As discussões mais em níveis regional e nacional perpassam pela questão do arco do desmatamento na Amazônia, o arco do fogo, Marabá esta dentro e a questão dos recursos naturais. Quanto à questão dos recursos minerais nos firmamos um convênio como DNPM que nos permite fiscalizar, monitorar e licenciar atividades de mineração em pequena e média escala. Então, o que a gente faz só com o DNPM é solicitar a autorização de lá, mediante a autorização de lá, nós concedemos o licenciamento. (entrevista realizada durante o trabalho de campo em 2003)
A Prefeitura de Marabá articula participar mais ativamente das questões
ambientais do município, principalmente em virtude dos problemas que o município vem
enfrentando em relação às queimadas e aos recursos naturais. O município também vem se
preparando para enfrentar no futuro o projeto Salobo, que a CVRD poderá implantar, em vista
do programa de cobre elaborado pela companhia e inaugurado como o projeto Mineração
Serra do Sossego em Canaã dos Carajás.
O município encontra-se dentro de uma área em que os problemas sociais
vêm crescendo nos últimos anos, a do corredor da Estrada de Ferro Carajás. Por causa da
briga que se tem em captar recurso, os gestores municipais não se preocupam com os
problemas que poderão surgir com os projetos instalados, e se preocupam apenas com a
geração de emprego e receita para o município. Dessa forma, é o município que acabará
sofrendo as conseqüências de sua corrida por projetos, principalmente de mineração e outros
ligados a ele.
Segundo Antônio Rosa,
129
muita gente me criticava.O pessoal dizia vamos trazer o pólo siderúrgico para o Estado do Pará. Vamos trazer o pólo siderúrgico para Marabá, mas ninguém pensava assim: e as conseqüências desse pólo siderúrgico ao nível de passivo ambiental que vai ser gerado dentro da região; que comprometimento que a Vale teria no caso, a partir da instalação desse pólo em Marabá, que tipo de sistema de monitoramento, como ela vai recuperar a área degradada? Ninguém se perguntava, a preocupação era trazer o pólo siderúrgico para o Pará. Eu vejo, por exemplo, cinco guserias implantadas dentro do município. Eu vejo uma série de problemas ambientais que estão postos, estão se agravando a cada dia e, eu não vejo movimentação por parte de nenhum desses guseiros em tentar resolver o problema do passivo ambiental, que elas estão gerando. Com cinco guseiros nós já sofremos a pressão sobre nossa mata, imagine com quinze, vinte empreendimentos desses, pressão sobre a floresta, sobre as comunidades tradicionais são muito grande (entrevista realizada durante o trabalho de campo em 2003).
Oura questão levantada pelo secretario de Meio Ambiente de Marabá diz
respeito à poluição que, segundo ele, vem ocorrendo no rio Itacaiúnas por ter sido
contaminado pela exploração do ouro do Igarapé Bahia. Responsabilizar a CVRD é para a
secretaria uma questão de chamar a companhia a ter mais responsabilidade pelos locais onde
ela desenvolve atividades de risco ambiental, pois são passiveis de poluição e merecem um
controle mais rigoroso. O município não pode arcar sozinho com a recuperação dos danos
causados pela exploração do minério.
Segundo o secretario, há algumas questões prioritárias com que a secretaria
tem que começar a se envolver diretamente:
nós temos questões aqui para discutir muito séria. Por exemplo, a poluição no Igarapé Bahia contaminou o rio Itacaiúnas, o que a Vale vai fazer para recuperar esse rio, repovoar esse rio? Qual é o papel da Vale nas eclusas? O que ela poderia fazer para viabilizar as eclusas? Nós temos aí dentro do município de Marabá 48% de área degradadas. O que é que a Vale pode fazer, para recuperar essas áreas degradadas? Que tipo de investimento a Vale pode gerar para o município e para região, como alternativa? Marabá não tem vocação para ser uma cidade industrial, ela tem vocação para ser uma cidade de serviços, por isso desenvolveu o setor de serviços, Marabá é confluência, o município mais importante da região, o setor de serviços é o que mais cresce que gera mais recursos (Entrevista realizada em 2003).
A relação de Marabá com a questão dos minerais explorados pela
Companhia Vale do Rio Doce é diferente em relação aos demais municípios estudados nesta
pesquisa, pois ela não depende dos recursos que a companhia repassa por meio dos royalties.
130
Marabá, como foi relatada na parte três, tem uma história de cidade concentradora de
atividades na região, e se tornou importante pólo econômico e político, além da sua tão
destacada posição geográfica, que o secretario comentou.
Com a perda da mina de ferro e de Serra Pelada, por meio do
desmembramento municipal, o município, embora tenha perdido receita e importantes áreas,
não perdeu sua importância. Marabá continua a ter sua vida direcionada não para a questão
mineral, diferente de Parauapebas, por exemplo, que direciona todas suas formas de
desenvolvimento para questão mineral, por possuir importantes minas em seu território.
Marabá tem encontrado outras saídas, embora não descarte parcerias com a CVRD, segundo o
secretário:
a secretaria agora que se adequou para buscar recursos ao nível nacional e internacional, então nos estamos na fase de elaboração desses projetos.Quais são os nossos interesses principais: seqüestro de carbono, essa é uma área importantíssima que a gente precisa atuar dentro do município; o aproveitamento de resíduo da indústria madeireira, hoje nos temos três setores que vivem desse resíduo da indústria madeireira, vamos operacionalizar esses resíduos para poder trabalhar o oleiro e o guseiro. O frigorífico também esta utilizando este resíduo; a recuperação do rio Itacaiúnas essa é uma questão que o município tem que ter o compromisso de fazer e nesse processo envolver a Companhia Vale do Rio Doce que é a principal poluidora do rio Itacaiúnas, além disso, a gente pretende fazer o zoneamento econômico-ecológico do município que ainda não existe (entrevista realizada durante o trabalho de campo em 2003).
Outro elemento fundamental é o tradicionalismo político herdado da época
da oligarquia do Tocantins. A burocracia das prefeituras e seu baixo nível técnico impedem
um melhor traçado de seu desenvolvimento vindo a depender de outros para traçar suas metas
de crescimento e desenvolvimento econômico-social.
Para o secretário de Planejamento de Marabá, o município não apresenta
tantos problemas como seus vizinhos, pois tem sua independência financeira diferenciada, não
está totalmente atrelada às implantações dos projetos da CVRD. A companhia tem feito
parcerias que são dívidas antigas contraídas na época da implantação da mina em Carajás. O
município, como não disponibilizava de tanto investimento para aplicar em asfaltamento de
131
vias, fez um acordo com a CVRD, e ela se responsabilizou em asfaltar alguns trechos dentro
da sede do município, considerados pela prefeitura como pontos críticos.
Outra parceria é o projeto Salobo, previsto nos planos da CVRD “O salobo
quando entrar em operação Marabá terá benefícios”. Segundo o secretário, não tem como
receber nada em função da implantação do futuro projeto.
Essa parceria é uma dívida antiga da Vale, de certa forma tava na justiça, rolando muito tempo. São os ISS da construção da própria mina de Carajás. Quando se tentou negociar com a Vale, a companhia aceitou fazer um acordo, esse acordo foi: o prefeito não quis dinheiro, eu tenho quatro, cinco pontos críticos de Marabá que não tenho recursos para fazer, asfaltamento da universidade, da avenida verde mares, da avenida do cemitério, a Vale aceitou (entrevista realizada durante o trabalho de campo em 2003).
Em relação a importantes áreas que o município perdeu para Parauapebas e
Curionópolis, segundo o secretário, municípios que têm extensas áreas fatalmente irão perdê-
las no futuro, como foi o caso de Marabá. Segundo ele, mesmo perdendo essas áreas, ainda é
um município muito extenso em dimensão territorial, e poderá no futuro sofrer novos
desmembramentos.
Parauapebas mais cedo ou mais tarde ia se separar, uma mina dessa dá uma força à microrregião. O município é ainda município muito grande, até hoje nós sofremos, nós temos áreas de 350 km de distância.Para você chegar lá é um sacrifício, como a gente vai asfaltar uma estrada municipal de 350 km se Estado e União penaram anos para construir a BR 222, para ir daqui a Dom Eliseu, que é menos de 222 km (entrevista realizada durante o trabalho de campo em 2003).
Outra questão fundamental para o município é a instalação da NUCOR, uma
associação com a Companhia Vale do Rio Doce para explorar o aço. Segundo o secretário,
a proposta é da Vale e da NUCOR que é uma gigante americana no ramo de aço. A Vale tem uma área já reflorestada podendo ser usada para o carvão, na divisa de Marabá com o Maranhão. Aquele negócio de pólo siderúrgico parece que está pendendo para o lado do Maranhão, mas são duas coisas independentes não é uma compensação, a NUCOR ia fazer a proposta mesmo que o pólo tivesse ficado aqui (entrevista realizada durante o trabalho de campo em 2003).
A região apresenta várias questões que podem ser associadas à problemática
da mineração na Amazônia, em especial ao território do município de Marabá: a questão do
132
desmatamento, o reflorestamento, a preocupação com a implantação de grandes projetos para
explorar os minerais. A NUCOR ainda é debate entre o empresariado local e os representantes
do poder público municipal, que acompanham de longe os resultados adversos para o
município em relação à perda do pólo siderúrgico para o Maranhão. Não acreditam mais em
promessas feitas pela companhia, e esperam e contam com apoio dos parlamentares
paraenses, na realização de uma onda de protestos em relação à participação da Companhia
Vale do Rio Doce nas formas de desenvolvimentos e em problemas sócio-ambientais que
surgiram ao longo de sua presença na região.
Um passo importante foi a criação do Curso de Engenharia de Minas em
Marabá em parceria com a CVRD e a Universidade Federal do Pará (que receberá da CVRD
R$ 1,2 milhão para investir em construção de um prédio, na montagem de laboratório e custos
operacionais), pois o pessoal formado por esse curso deverá ser absorvido pela demanda dos
projetos de mineração implantados em Carajás.
Segundo o prefeito de Marabá, “nós sabemos que o fundamental para se
desenvolver a região sul e sudeste do Pará é transformar isso aqui num pólo de
conhecimento”, que segundo ele será fundamental para a criação de uma universidade, pois
em Marabá existe apenas por enquanto um campus da Universidade Federal do Pará, com
cursos que em sua maioria funcionam em períodos intervalares. Segundo o prefeito, o apoio
da CVRD no Curso de Engenharia de Minas mostrará o papel que a companhia deve ter na
região, nos próximos anos.
133
5.2 – Relações e Conflitos entre Atores Sociais no Município de Parauapebas
O Município de Parauapebas, emancipado em 1988, por sediar a CVRD e a
infra-estrutura montada pelo Projeto Ferro Carajás (PFC), apresenta condições de expansão e
desenvolvimento singulares em relação aos outros municípios. A influência direta da
Companhia Vale do Rio Doce (CVRD) no seu começo, com a formação do núcleo urbano de
Parauapebas (Figura 10) para abrigar funcionários que iriam trabalhar na implantação do PFC,
e posteriormente, com os royalties foram fatores fundamentais para sua emancipação. Este
município continua a ser dinamicamente influenciado pela atuação local dessa companhia.
Figura 10: Vista parcial do Núcleo Urbano de Parauapebas (Foto: João Marcio Palheta da Silva, 2003).
As relações político-econômicas do município sofrem influência direta e
indireta da CVRD, o que por um lado favoreceu a conjuntura sócio-político-econômica do
município. A sociedade civil em Parauapebas cresceu e traçou seus projetos em função das
possibilidades que a companhia trazia para o município em relação aos investimentos. Assim,
surgiram movimentos sociais de metalúrgicos e profissionais liberais. Os movimentos de
posseiros, colonos (vindos de todos os cantos do Brasil, principalmente da região Nordeste,
do Estado do Maranhão) e o novo movimento de trabalhadores rurais sem-terra na região,
influenciaram nas decisões municipais.
134
Atores sociais diversos criaram estratégias de participação popular, ao longo
dos anos. Associação de moradores, cooperativas, Ongs, sindicatos se fizeram presentes no
município a fim de defender seus interesses diante daqueles que estavam no domínio do poder
local em Parauapebas.
A relação de poder nesse município foi alterada, na medida que o município
crescia e novos atores sociais ascendiam ou tentavam ascender ao poder. O município cresceu
em população e em problemas sociais também, o que por sua vez favoreceu também os
discursos políticos locais em virtude da captação de recursos para se resolverem os problemas
que estavam surgindo.
Um dos representantes desses novos atores sociais, a Associação Comercial
e Industrial de Parauapebas (ACIP), é a entidade de representação de empresários locais.
Segundo seu vice-presidente, essa representação vem crescendo. Argumenta que, embora a
associação esteja se fortalecendo, a atividade industrial depende do desenvolvimento das
atividades da CVRD, a principal empresa. O desenvolvimento do comércio depende da
CVRD, das empreiteiras que prestam serviços a companhia e do crescimento populacional do
município.
Quando ocorre a expansão local da CVRD, o comércio melhora suas
vendas, caso contrário acontece a retração das atividades comerciais, às vezes até o chamado
calote acontece, por parte de empregados de empreiteiras que terminando os serviço, migram
para outras localidades e com elas os empregos que estavam sendo gerados no município,
assim há uma diminuição no volume de negócios e de dinheiro circulando pela cidade. Assim
o município acaba dependendo das atividades da CVRD. Dessa forma, segundo o presidente
da ACIP,
Hoje, a nossa missão é buscar mais representatividade junto à classe. Hoje nós temos por volta de 270 associados, mais o universo do comércio, da indústria e muito maior. Quem gera mais emprego é o comércio, mas a economia local tem a sua maior participação na indústria devido às
135
atividades minerárias da Vale do Rio Doce. Toda economia gira em função da presença dos projetos, o comércio tem que buscar alternativas, se qualificar para poder atender, enquanto fornecedor as expectativas desse grande comprador que são os projetos minerários (Trabalho de Campo 2003).
Segundo a representação que tem a ACIP no município, e as parcerias (com
SEBRAE, CVRD e outros) que surgem, são destaques principais três elementos, considerados
fundamentais para a realização de eventos e de projetos que são desenvolvidos no município.
Segundo seu presidente, essa tríade é formada pela CVRD, a Prefeitura Municipal e o
SEBRAE (embora no município aconteçam outras parcerias, esses são fundamentais, não
podem ficar de fora de nada), que poderá ainda mais fortalecer o papel da ACIP, em
Parauapebas. De uma maneira ou de outra, qualquer parceria, segundo ele, deve passar por
um ou por mais desses parceiros, que a associação não pode deixar de fora. O vice-presidente
da ACIP destaca:
crescimento acredito que houve, principalmente nos últimos dois e três anos. Temos apoio da Vale em alguns projetos. Quando se fala em parceria não podemos fugir de três nomes aqui, Vale do Rio Doce, Prefeitura Municipal e SEBRAE, com esses a gente cresce. Tem que associar a esses nomes. Nós temos um projeto, o primeiro projeto da iniciativa privada, a FICAP Feira da Indústria, Comércio e Agropecuária de Parauapebas, estamos tocando esse evento junto com a ACIP, o CDL e o SIPRODUZ que é a Associação dos Sindicatos dos Produtores Rurais, e temos como parceiros principais a Vale e a Prefeitura e estamos buscando essa parceria com o SEBRAE, com focos em negócios (entrevista realizada durante o trabalho de campo em 2003).
Outro ponto de destaque apontado pela associação diz respeito às migrações
que vêm ocorrendo para Parauapebas, e que sempre ocorreram desde a implantação do
Projeto Ferro Carajás, que acelerou esse processo migratório para o Município.
Eu diria que tirando a atividade minerária, temos vocação para agropecuária. O comércio ele tende a crescer, ele tem atraído mais investimentos para a cidade. Mas o que esbarra no calcanhar aqui é a migração. A migração desordenada, super acelerada, trás um ônus muito grande para o município, principalmente o social, tem muita gente chegando na cidade, tem hoje mais de 100 mil habitantes é um grande desafio para todos nós (entrevista realizada durante o trabalho de campo em 2003).
Um representante local, um dos fundadores da Equipe de Educação Popular
de Parauapebas (EEPP), destaca que o papel da entidade a única ONG que era presente no
136
município, já passou. Segundo ele, a EEPP cumpriu o papel que tinha no município e criou
possibilidades tanto dentro da zona rural como da urbana e proporcionou uma visão mais
ampla do que é desenvolvimento para região. Para ele,
se a EEPP tivesse que continuar, e foi essa nossa proposta para a agência financiadora, a Miserio, que fosse funcionar apenas como uma instituição de formação política, sindical e popular. Alguma coisa, assim, temos um projeto nesse sentido, apresentado a Miserio, só que até agora a Miserio não se manifestou. A minha saída da EEPP, se deu num momento em que a gente percebeu que meu papel já é outro. Nesse momento, meu papel não é de trabalhar numa entidade, mas de ser uma das ferramentas para conquistar o poder aqui na cidade, devolver ao povo a possibilidade de governar. Então, a partir do momento que a gente viu isso, não teria mais sentido ficar trancado numa entidade. Depois da eleição de deputado estadual, onde tive 23% dos votos da cidade, acaba me cacifando para uma coisa maior (entrevista realizada durante o trabalho de campo em 2003).
A projeção de conquista de poder por parte de integrantes de entidades que
trabalham há anos no município deixou de ser somente uma utopia e passou a convencer até
membros do empresariado local de que o município precisava mudar. Para isso a EEPP
cumpriu seu papel atuando de forma a ampliar as conquistas sociais dentro do município. A
cooperativa (COOPER)19 foi criada com apoio da EEPP pelos agricultores familiares. Estes
estão começando a comercializar frutos regionais como o cupuaçu. É o maior exemplo do
trabalho da ONG. Segundo seu integrante, agora o momento é outro.
A EEPP era uma entidade de assessoria, uma vez cumprido o seu objetivo, ela é transitória, enquanto uma entidade classe é permanente. Criamos a COOPER, foram treze anos de trabalho. A partir de 1996, começamos o trabalho na área urbana na organização das entidades de apoio; acompanhamento do projeto de água e esgoto. Nesse sentido, alcançamos nossos objetivos, de 30% que estavam previstos na época, nós conseguimos por conta das denúncias ao Banco Mundial, ampliar isso para uma porcentagem maior, uma vez que no projeto estava escrito que era para cidade toda. O projeto só atenderia 30%, foi aí que entrou toda uma nova reorientação do tipo de projeto a ser implantado, e acabou sendo o projeto chamado condominial (entrevista realizada durante o trabalho de campo em 2003).
A conquista do projeto de saneamento básico foi um ponto fundamental
para a sociedade parauapebense. Sua ampliação uma conquista de membros da sociedade civil 19 A Cooperativa Mista dos Produtores Rurais da Região de Carajás (COOPER) foi fundada com objetivo de industrializar e comercializar os frutos tropicais da área de Carajás. Foi articulada pela EEPP junto com os trabalhadores da Região de Carajás.
137
organizada, que, por sua vez, melhorou as condições de vida do povo de Parauapebas. Muito
embora os problemas de saúde continuem no município, o salto qualitativo em termos da água
e de certa forma do esgoto na cidade melhorou.
As questões referentes aos investimentos sofrem críticas de alguns
empresários, associações e sindicatos que estão fora do poder público. Segundo alguns
entrevistados, o que o município arrecada não tem se traduzido em investimentos que tenham
beneficiado a sociedade como um todo, seja no setor urbano, seja no rural.
Porém, segundo os ex-membros da entidade, há necessidade de uma
reavaliação do potencial político dos atores sociais, que de uma forma ou de outra, estão de
fora das principais decisões que definem a forma de viabilidade municipal. Segundo eles, em
algumas circunstâncias a sociedade não consegue separar seus interesses individuais dos
coletivos e acaba sendo fragilizada.
Existem figuras que querem se eleger presidente de uma associação de moradores para poder exigir do poder público um emprego, tem muito disso aqui, isso eu entendo que de repente seja falta de formação política. Hoje nós temos associação de moradores que estão começando a repensar a própria ação deles, enquanto entidade que acaba se rendendo ao poder público municipal. O presidente vai a prefeitura leva uma pastinha com 500/600 associados e diz, isso é meu poder e tenta vender a associação e os associados. Tem acontecido muito desses casos aqui (entrevista realizada durante o trabalho de campo em 2003).
Esse é o principal motivo que levou ex-membros da EEPP a tentarem
reativar a entidade em função da necessidade de formação política e sindical na região.
Embora a EEPP tenha desenvolvido atividades juntos à comunidade, esse não era seu objetivo
principal, já que a mesma foi criada com função mais rural do que urbana.
Por sua vez, o secretário de Planejamento de Parauapebas acredita que o
município não interfere no processo de desenvolvimento industrial. Já que o principal
elemento que modifica o território são os interesses em relação à área mineral, é a CVRD que
provoca essa modificação. Segundo ele,
138
Aqui nós temos um processo que é induzido, ele é induzido pela própria Vale, a Vale que gera emprego, a Vale que contrata empreiteira, a Vale que gera uma boa receita para o município, tanto para a população através da geração de empregos, quanto para o poder público, o problema nosso não é de atrair as empresas, isso é automático, elas já vem atrás da Vale (entrevista realizada durante o trabalho de campo em 2003).
Embora a presença da CVRD seja marcante, o secretário acredita que ela
por si só “é atratora de novos investimentos na área mineral”, e que o município acaba sendo
dependente dessa relação desigual, mas combinada em que a CVRD se torna um ator
hegemônico, e o município um reflexo do poder da companhia. A CVRD gera recursos para
receita municipal e torna o município um dos mais importantes do Estado do Pará (ver
capítulo 3). Segundo ele não depende do município atrair novas instalações industriais,
porque há uma restrição de espaços necessário para formação de um distrito industrial.
Nós temos um limite, porque o município é isso aqui, 80% é reserva florestal tem a parte agrícola, tem o núcleo urbano e tem a parte do CEDERE I. Área para se colocar indústria aqui nós temos dificuldade muito grande, que todo mundo quer para perto da Estrada de Ferro, só que lá na frente já é assentamento, lá nos assentamentos não podemos comprar uma área para construir um distrito industrial (entrevista realizada durante o trabalho de campo em 2003).
Outra questão inibidora, segundo o secretário, é a forte e contínua migração
para o município. Estudos realizados na segunda metade da década de 1990, a pedido da
CVRD, acusaram que para cada um emprego gerado, outras sete ou oito pessoas migrariam
para a cidade. Dessa forma um número considerável de desempregados acabaram inchando os
movimentos sociais rurais e a parte urbana do município.
Parauapebas tem uma realidade interessante: verdadeiros bairros são
formados com migração de outros Estados como Maranhão, por exemplo, facilitada pela
Estrada de Ferro Carajás (EFC), e de outros município como Curionópolis. Com isso os
problemas sociais também se agravam.
Segundo o secretário,
Canaã agora vai ter um desemprego muito grande. Canaã vai passar por um processo agora que nosso município passou há dezoito anos atrás. Aquele
139
boom para implantar o projeto gerou muitos empregos, a estrada gerou emprego, a mina gerou emprego. A mina em Canaã vai necessitar de mil pessoas. Dizem que há quase vinte mil pessoas lá. Para onde vão essas pessoas? Possivelmente um pouco vai ficar lá, e outro vai vir para cá para somar com a massa desempregada (entrevista realizada durante o trabalho de campo em 2003).
A maneira como se tratará a questão das migrações e dos problemas gerados
por ela e por projetos que a CVRD poderá implantar, em Parauapebas e municípios vizinhos,
é um desafio para a gestão municipal e para toda a sociedade civil organizada do município.
De uma forma ou de outra, será necessário fazer com que a presença da CVRD seja
importante nessas discussões. Não se pode colocar a empresa fora dos problemas gerados.
Não é só o benefício que interessa, o que ela gera em relação de receita para o município, mas
o que realmente se poderá fazer em função da presença de um grande projeto de mineração
que acelerou as transformações territoriais do município.
Outro questionamento feito está relacionado à posição do METABASE, e
tem como principal foco a terceirização, que segundo membros do sindicato tem prejudicado
a representatividade, e não deixa aumentar o número de associados, pois acabam vindo de
outros Estados, como Minas Gerais, empresas cujos trabalhadores são sindicalizados. Essa
rotatividade de empresas que vêm prestar serviços para a CVRD, segundo o METABASE,
tem prejudicado o sindicato.
Em relação à CVRD, a atual diretoria (2003) disse não ter tido problemas,
muito pelo contrário. Segundo sua diretoria eles conseguiram negociar um reajuste de
reposição de 100%, o maior que o sindicato já teve. Para eles, a CVRD é uma parceira, e não
se tem motivo para questionar o papel da empresa na região.
Em relação aos grandes produtores e pecuaristas, o vice-presidente do
Sindicato dos Produtores Rurais (SIPRODUZ) destacou que o sindicato tem procurado se
fortalecer. Onde o sindicato atua (Parauapebas, Canaã dos Carajás, Curionópolis e Eldorado
140
do Carajás) seu principal objetivo tem sido o fortalecimento dos pecuaristas e produtores
rurais.
Segundo ele, a pecuária está em pleno desenvolvimento no município junto
com a agricultura.
Nós temos mais ou menos uns 800 associados. O gado desses quatros municípios está sendo abatido em Eldorado do Carajás, mas nós temos Frigoríficos em Marabá, Xinguara e Redenção. Desse gado que é abatido, o Estado do Pará não consome nem 50% da carne que é produzida. Exportamos principalmente para os Estados do Nordeste, em função das barreiras sanitárias que existe, porque para o Sul, Centro-Oeste e Sudeste não pode ir o gado a não ser o desossado (entrevista realizada durante o trabalho de campo em 2003).
O sindicato critica as formas como o poder público vem atuando no
município. Segundo seu vice-presidente “nós somos privilegiados em viver em Parauapebas
por ser um município muito rico. Agora questionamos muito como são aplicadas essas
riquezas aqui. Somos um município muito rico de pessoas muito pobre”.
O questionamento se dá pela presença da CVRD e dos recursos que são
adquiridos, em função da exploração das minas de Carajás, e dos impostos gerados pelas
contratadas da CVRD no município. Todavia, há um domínio de paisagem pobre, uma vez
que o município de Parauapebas apresenta bairros sem infra-estrutura e sistema de saúde
deficientes. Há falta de apoio aos produtores familiares.
As críticas contra ou a favor da presença da companhia, e das formas de
desenvolvimento encontradas pelo poder público em Parauapebas, são relacionadas a um
conjunto de múltiplos fatores que envolvem diferentes interesses e são determinantes na
forma como o município vem realizando a gestão territorial.
141
5.3 - Relações e Conflitos entre Atores Sociais no Município de Água Azul do Norte
Em Água Azul do Norte (Figura 11), foram identificados pelo menos dois
discursos sobre a presença e parceria com a Companhia Vale do Rio Doce. Um deles
questiona os repasses da Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais
(CFEM20), em virtude do município não receber esses benefícios, mesmo dispondo de parte
do território da Floresta Nacional do Carajás; O outro não se posiciona em relação a CFEM,
mas focaliza sua atenção na atual arrecadação que o município dispõe sem ter planos futuros
em relação à possibilidade de vir a receber recursos com a exploração das riquezas minerais
contidas na Floresta Nacional de Carajás.
Figura 11: Via principal (Pa-279) corta o município de Água Azul do Norte (Foto: João Marcio Palheta da Silva, 2003).
20 Segundo o DNPM “A CFEM, estabelecida pela Constituição de 1988, em seu Art. 20, § 1o, é devida aos Estados, ao Distrito Federal, aos Municípios, e aos órgãos da administração da União, como contraprestação pela utilização econômica dos recursos minerais em seus respectivos territórios. A Compensação Financeira é calculada sobre o valor do faturamento líquido, obtido por ocasião da venda do produto mineral. Para efeito do cálculo da CFEM, considera-se faturamento líquido o valor da venda do produto mineral, deduzindo-se os tributos, que incidem na comercialização, como também as despesas com transporte e seguro. Quando não ocorre a venda, porque o produto mineral é consumido, transformado ou utilizado, pelo próprio minerador, então considera-se como valor, para efeito do cálculo da CFEM, a soma das despesas diretas e indiretas ocorridas até o momento da utilização do produto mineral. As alíquotas aplicadas sobre o faturamento líquido para obtenção do valor da CFEM, variam de acordo com a substância mineral. Aplica-se a alíquota de 3% para: minério de alumínio, manganês, sal-gema e potássio. Aplica-se a alíquota de 2% para: ferro, fertilizante, carvão e demais substâncias. Aplica-se a alíquota de 0,2% para: pedras preciosas, pedras coradas lapidáveis, carbonados e metais nobres. Aplica-se a alíquota de 1% para: ouro”.
142
Encontramos também uma disputa política pelo poder local. Essa disputa
vem desde a emancipação de Água Azul do Norte. Nela se acham aqueles que não
participaram diretamente do projeto de consulta à população sobre a criação do município e
outros que foram os que começaram a fazer o movimento pela criação do município.
Esse conflito político pelo poder local está de acordo com o que nós
discutimos na segunda parte do trabalho, sobre os conceitos de poder, governo e território,
uma vez que há disputa pelo controle da gestão municipal que acaba formando um “campo de
poder”. Existe mais de um interesse diferenciado entre os atores locais sobre as formas de
buscar recursos para o município e de como esses recursos serão úteis em seus discursos para
a sua reprodução no poder, e, conseqüentemente, controlar o poder político local, e expandir
seu domínio no território de Água Azul do Norte.
Água Azul do Norte é um município recente. Num ponto os atores sociais
que disputam o poder local convergem: é necessário o asfaltamento da PA-279, tanto no
trecho que vai para o município de Ourilândia do Norte e para o município de Tucumã, como
o que vai para o município de Xinguara. A estrada no período de chuva fica intransitável, e no
período sem chuvas, leva-se até 3 horas para trafegar um trecho de 70 quilômetros. Essa
dificuldade inviabiliza qualquer forma de escoamento da produção que o município venha a
desenvolver e prejudica as demais existentes, como a pecuária.
O município apresenta a pecuária como principal atividade econômica, com
o quarto maior rebanho do Estado, o que fez com que um grupo de São Paulo começasse a
instalação de um frigorífico no município, às margens da PA-279, no sentido Ourilândia-
Tucumã.
O município possui além desse empreendimento dois outros grupos de
lacticínios, o Leite Bom e o Hilda. A bacia leiteira chega a produzir de 80 a 90 mil litros de
leite por dia. O secretário afirma que a produção de grãos é uma tendência econômica que o
143
município começa a apresentar, e há todo um investimento sendo realizado na Vila Canadá,
para viabilizar a produção de grãos. Há também madeireira.
A parceria com o Estado tende a aumentar a produção de grãos, no que diz
respeito ao armazenamento da produção. A falta de armazéns e silos para estocagem
aumentava a dependência de Água Azul do Norte em relação aos outros municípios como Rio
Maria, que abastece a região de Xinguara, Rio Maria, e da capital Belém. As carretas vinham
buscar de 35 a 40 toneladas e levavam para esse município.
Na PA-279 estão sendo construídos frigoríficos. Em Água Azul a previsão é
de abater 800 bois por dia; os outros três frigoríficos são em Ourilândia do Norte, Tucumã e
São Félix do Xingu, pertencentes a empresários de São Paulo, que atuam também no Estado
do Mato Grosso.
Segundo o secretário de planejamento, o município é dependente dos
repasses federais, como o Fundo de Participação Municipal (FPM), pois sua arrecadação
ainda é insuficiente, apesar do melhoramento que segundo ele ocorreu no município depois de
sua emancipação.
Não há arrecadação própria. O município depende diretamente do ICMS e
do FPM, que servem também para manter a folha de pagamento em dia. Entretanto,
percebemos que o município, por ser recente, teve apenas três administrações, desde a sua
criação. Tem suas políticas municipais ainda indefinidas; a Lei Orgânica Municipal foi
aprovada recentemente.
Seu comércio é pequeno, não tem indústrias, além daquelas já mencionadas.
Segundo alguns moradores, na década de 1980, com o esgotamento da madeira, as
madeireiras que atuavam nessa região migraram para os municípios de Ourilândia, Tucumã e
Xinguara, ficando apenas uma madeireira, que praticamente não explora mais a madeira. O
gado passou a ser a frente de expansão da economia local, o gado de engorda. Há 650 mil
144
cabeças de gado no município. Segundo o secretário, são abatidos em sua maioria em
frigoríficos em Xinguara e Redenção.
O descaso com essa região levou ao fortalecimento do discurso
emancipacionista pela criação do município, que quando ainda pertencia a Marabá já
solicitava um melhor tratamento (e por sua distância considerável da sede Marabá) dos
políticos marabaenses. Houve então a pressão e coincidiu com a instalação do Projeto Ferro
Carajás, que com a infra-estrutura que deu a Parauapebas possibilitou tanto a emancipação de
Parauapebas como, anos depois, a de Água Azul do Norte de Parauapebas. Como depois da
emancipação de Parauapebas o problema de Água Azul, que pertencia ainda a Parauapebas
continuava, a área conseguiu eleger um vereador que começou com outros políticos da região
o processo de emancipação política do município.
Briguei para emancipação de Parauapebas e Água Azul do Norte. Eu formei quase dez comissões, tudo por minha conta. Os grandes que podiam ajudar eram todos contra, diziam que aqui era uma curutela. O vice-prefeito atual dizia que era uma vergonha a gente emancipar Água Azul, porque era uma curutela que até o prefeito ia passar fome, hoje é a segunda gestão dele. Em Parauapebas, foi fácil demais emancipar, porque lá todo mundo ajudou com dinheiro e lá todo mundo queria emancipar, e nós aqui tinha um pessoal que não queria, o município é fraco mais é muito melhor do que esta dependendo de Parauapebas. (Entrevista em 2003 com o primeiro vereador eleito por Água Azul do Norte).
No processo de emancipação, segundo o primeiro vereador eleito por Água
Azul, Xinguara reivindicava uma parte do território que vai até o Rio Água Azul, que deu
nome ao município, o que não foi atendido, ainda porque, segundo outros moradores, cercado
por fazendas o município não tem para onde crescer.
Segundo o secretário de Administração e Planejamento, Obras e Transporte
do município de Água Azul do Norte,
temos uma malha viária de 2.800 quilômetros de estradas vicinais para dar manutenção. Temos três motos niveladoras, temos áreas de 160, 170 quilômetros da sede do município. O município é dividido em oito regiões, temos 5 vilas, três bem estruturadas que são: as vilas Canadá, Jussara e Paraguassu, que exige mais, e outras duas menores que são as vilas União e a Racha Placa (entrevista realizada durante o trabalho de campo em 2003).
145
O discurso relembra o que Ana Brasileiro (1973) já havia analisado em seu
estudo sobre os municípios como sistemas políticos, que recai sobretudo no abandono que o
poder público direciona para as áreas rurais porque concentra seus recursos para a sede
municipal. Dessa forma não atende os “pedidos” das áreas mais longínquas. Essa atitude do
poder público faz com que certas localidades pleiteiem suas emancipações, mesmo aquelas
que não têm certa infra-estrutura, mas por estarem mais distantes das sedes municipais,
também tentam viabilizar sua emancipação do município, como é o caso da vila Canadá.
Nesse caso em particular, segundo depoimento de uma antiga moradora do município, “na
minha opinião não é bom perder a vila Canadá, porque Água Azul vai perder uma parte
melhor, eu acredito que tem interesse do próprio prefeito, ele tem interesse de emancipar,
porque ele tem família lá, e toda a vida ele foi de lá de Xinguara, mas ele sempre andou por
lá”.
O município de Água Azul, de acordo com depoimentos, não possui
capacidade de investimentos próprios; a saída é buscar convênios para fomentar a capacidade
de investir no município. Quando ocorrem, os convênios são executados com a administração
direta, sem contratação de terceiros, segundo o secretário “porque os recursos são poucos e
nenhuma firma vai querer realizar a obra com poucos recursos que conseguimos. Isso faz com
que a prefeitura economize” e como ela consegue economizar de acordo com o secretário, só
assim ela consegue investir em outras áreas do município.
Outra maneira de conviver com a falta de recursos, segundo o secretário, é
com a sobra do FPM e do ICMS, ela paga as peças e os combustíveis das quatro caçambas
basculhadeiras de uma carregadeira e de três motos niveladores. Como dessa forma 70 % dos
convênios que a prefeitura consegue são executados com a administração direta, a própria
prefeitura realiza a obra.
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O comércio da cidade é na base dos secos e molhados. Não há cobrança do
IPTU, de taxa de água, de limpeza, e apenas 30% do comércio, segundo a prefeitura, é
legalizado.
Por outro lado, um dos moradores mais antigos do município critica a falta
de técnicos agrícolas e de agrônomos, que para ele poderiam ajudar a sociedade a trabalhar
melhor a terra, e não se dedicar somente à cultura do pasto. Para ele isso acontece por falta de
desconhecimento técnico dos agricultores, o que faz com que o município acabe dependendo
de Anápolis no que diz respeito à agricultura.
Diz um antigo morador que Água Azul era uma cidade tranqüila. O
garimpo, a madeira, a abertura da estrada PA-279 e os projetos de colonização direcionada
pelo governo federal em Tucumã ajudaram a cidade a crescer, mas depois da construção da
estrada e da cidade de Tucumã e de Ourilândia, a cidade acabou perdendo população para
esse dois municípios.
Quando começou Água Azul era uma cidadezinha boa, cheia de garimpeiros. Aqui era cheio de casa por tudo que era parte, quando abriu Tucumã, Ourilândia arrancaram todas as casas daqui e foram para lá, aí Água Azul caiu lá embaixo.Todas as madeireiras daqui Perachi, Campos Altos levaram embora, aqui na época forte tinha 22 madeireiras, quando pertencia a Marabá, de 1980 a 1987, aí as madeireiras começaram a ir para Tucumã, Ourilândia, Água Azul saiu prejudicada saiu tudo que foi madeira, e não construíram nada aqui. (Entrevista Realizada em 2003).
Na década de 1980, a fuga das madeireiras seguiu o mesmo trajeto que a
região do Pará e Maranhão vinha sofrendo. A madeira foi se esgotando elas migram para
outras aéreas; vieram de Açailândia e Imperatriz no Maranhão, e chegaram ao Pará, entrando
pela região sul e sudeste do Estado. Água Azul passou pelo garimpo, pelas madeireiras e
chega à pecuária como um município que não teve nenhum investimento.
Seus moradores reclamam da falta de infra-estrutura do município. Segundo
alguns moradores,
viver em Água Azul é difícil. Tudo você depende de Xinguara, você não tem Banco, o telefone recentemente foi instalado, energia era muito precária,
147
agora que esta mais estabilizada. Agora a gente já tem três farmácias, que tem bastantes medicamentos, um hospital que funciona, já faz cirurgias de emergências (Entrevista realizada em 2003).
Por outro lado, o processo emancipatório de Água Azul foi conturbado e
teve como fonte os interesses políticos, e a própria localização geográfica do município, que
acaba tendo contato muito mais com Xinguara do que com Parauapebas e Marabá. Devido às
péssimas condições de acesso pela PA-279, o município fica praticamente isolado no período
de chuvas. Segundo depoimentos de alguns moradores, o município quando ainda pertencia a
Marabá sofreu pressão do poder público para não apoiar a emancipação de Parauapebas.
O prefeito Hamilton Bezerra no discurso dele, não queria perder Água Azul para Parauapebas, naquela época, e aí ele nos usava. Nós que estávamos na educação e o pessoal que atuava na saúde para fazer esse trabalho de conscientização na população para não se emancipar. Água Azul apoiou o plebiscito de Parauapebas, no sentido de que a Vale ia ajudar o município, então o povo que morava em Água Azul achava que ia se beneficiar disso. Havia na época interesse de apoiar Parauapebas, pensando no futuro se emancipar de Parauapebas. Nessa época, os próprios políticos que moravam em Água Azul que queriam, pensando que no futuro a Vale pudesse atuar em Água Azul (Entrevista Realizada em 2003).
Por sua vez, a questão da própria emancipação de Água azul foi realizada
com base em favorecimentos pelo apoio que tinha dado a Parauapebas. Sendo assim, o
plebiscito do município ocorreu com certas irregularidades. Segundo uma das pessoas que
ficou responsável pela coleta de assinaturas para votação no município,
O plebiscito foi feito, no sentido de que, o povo que morava no município de Água Azul tinha que votar com o título eleitoral de Parauapebas. Como os de lá tinham, também que votar, mas como na época não ia dar coro para a eleição do plebiscito, então eles liberam para votar com a carteira de identidade. A representante fazia vista grossa, foi para um churrasco numa fazenda, e nos deixou trabalhando com o povo, então qualquer caminhoneiro daqueles que passavam ali votava, se era ou não do município, se vinha do Maranhão (Entrevista Realizada em 2003).
Essa forma beneficiava quem estava interessado na emancipação do
município. Diante do discurso da elite, que queria a emancipação, a idéia era passada para a
população, que acatava sem questionamentos. Segundo depoimento de moradores, quem fosse
contrário sofria perseguição. Ainda hoje, segundo depoimentos, para aqueles que viveram a
148
época do plebiscito e para os que vieram para o município trabalhar no serviço público
ocorrem perseguições “é o que mais tem, se alguém for contra ele é remanejado, mexe no
vencimento do salário, deixa ele inútil”.
149
5.4 - Relações e Conflitos entre Atores Sociais no Município de Canaã dos Carajás
O município de Canaã dos Carajás foi desmembrado de Parauapebas em
1993, surgiu do antigo CEDERE II21. Atualmente (2003) o município vive um período único
de sua história, cercado de loteamentos realizados na época do CEDERE. O seu núcleo
residencial presencia uma metamorfose catastrófica, uma ebulição populacional, gente vindo
de todas as partes do sul e sudeste paraense e do nordeste, principalmente do Maranhão, em
função da implantação do Projeto Mineração Serra do Sossego da CVRD (com duração de 20
anos), que começará a explorar o cobre22 em 2004 e que está em fase de implantação no
município,
o Projeto Mineração Serra do Sossego, situado a cerca de 30 quilômetros da sede de Canaã dos Carajás e a 54 quilômetros de Parauapebas, deve ser o divisor de águas da história de extração de minério de cobre do grupo Vale do Rio Doce. No Auge de sua produção, o Sossego exportará 150 mil toneladas/ano, o que deve contribuir sensivelmente para a auto-suficiência do país com relação ao cobre, uma vez que, atualmente, o país importa quase 100% do que a indústria utiliza. Em 2007, quando entrarão em funcionamento as unidades de mineração da Vale (Sossego/Sequeirinho, Alvo 188, Igarapé Bahia, alemão e Salobo), com uma produção estimada em 768 mil toneladas/ano, o Brasil deixará de ser um país importador de cobre para se inserir no seleto grupo dos cinco maiores países produtores de cobre (Jornal Correio do Pará, Região, 06 a 09 de maio de 2003, p. 06).
Para realização do projeto foi desenvolvido o Plano de Desenvolvimento.
Sustentável (PDS). Segundo Raphael Bloise diretor da CVRD,
o Plano de Desenvolvimento Sustentável vai ser o ponto fundamental, pois não é um projeto de implantação com tempo definido, é de longa duração e vai buscar a sustentabilidade do município. Os primeiros passos são para mitigar a primeira onda e a partir daí, o projeto continua com a sociedade toda participando. Quero frisar que o plano não é da empresa, é da sociedade, que vai estudar seus problemas e vai buscar suas soluções. O município vai ter outras fontes de recursos, como os royalties, por exemplo, (Jornal Correio do Pará, 06 a 09 de maio de 2003, Cidade/Região p.07).
21 Centro de Desenvolvimento Regional criados pelo GETAT na década de 1980. 22 Segundo o Informe Mineral do DNPM “A produção de cobre vem declinando paulatinamente a cada ano, tornando-se insuficiente ao atendimento interno, configurando, assim, uma dependência externa de 80%. Em relação ao ano anterior, a produção de concentrado, em termos de metal contido, situou-se abaixo de 9,5%. Essa desaceleração constatada é fruto da paralisação e encerramento das atividades da mina a céu aberto da Mineração Caraíba S/A, ocorrida em setembro de 1998” (DNPM, 2000, pág 08).
150
Segundo o Plano de Desenvolvimento Sustentável (PDS) em relação ao
fluxo migratório,
a execução em ritmo mais intenso das obras de implantação e operacionalização da mina de cobre da MSS vem contribuindo para o aumento rápido e substancial dos fluxos migratórios que se destinam a Canaã dos Carajás. Esse problema continua a ocorrer, apesar das medidas de triagem e orientação que vêm sendo postas em práticas pela MSS, com o apoio da Prefeitura. Os principais contingentes migratórios provêm dos Estados do Maranhão e do Tocantins e de algumas regiões no Estado do Pará. (I Relatório Parcial de Consulta à Comunidade Livro Verde do PDS).
O Projeto Mineração Serra do Sossego (Figura 12), sem dúvida nenhuma,
está transformando o município de Canaã dos Carajás em um território de atração
populacional; esse município teve seu objetivo inicial que era de Centro de Desenvolvimento
Regional (CEDERE II) com base agrícola. Todavia, sua base econômica mudou recentemente
para economia extrativa mineral. Com isso, as atividades da Companhia Vale do Rio Doce
mudam a função dos municípios que estão sob sua área direta de atuação.
Figura 12: Implantação do Projeto Cobre da CVRD em Canaã (Foto: João Marcio Palheta da Silva, 2003).
Mesmo com o PDS, não há como evitar a migração para o município. Antes
mesmo de entrar em operação o projeto já atraiu muita gente, e o município virou um canteiro
de obras, com gente vindo de todos os lugares da região e do vizinho Estado do Maranhão.
Com isso aumentam os problemas sociais desses municípios como é o caso de Canaã, que não
possui condições de absorver toda essa população. Num ponto as administrações municipais
151
estão de acordo: as migrações acabam ficando na periferia da cidade em condições também
precárias. Com isso o tamanho de cada cidade ao longo do tempo vai aumentando e
verdadeiros bairros como os bairros Liberdade e Maranhão, em Parauapebas, vão se
formando,
com apenas duas administrações municipais, nas eleições de 1996 e 2000, na história dos seus oito anos de emancipação de Parauapebas, completos em outubro próximo, o município de Canaã dos Carajás se prepara hoje para receber seu primeiro asfalto. O projeto de urbanização do município, do qual o asfaltamento é parte, está sendo feito com recursos a fundo perdido da ordem de R$ 25 milhões. O investimento é fruto de uma parceria da Prefeitura Municipal com a Companhia Vale do Rio Doce (CVRD) e Mineração Serra do Sossego (MSS) (Jornal Opinião 07 e 08 de agosto de 2003, Região, p. 9).
Figura 13: Rodovia Pa- 160 estrada que servirá para o transporte do cobre (Foto: João Marcio Palheta da Silva, 2003).
Embora se tenha todo um investimento no município com infra-estrutura,
este não evitará a desordem urbana que, segundo depoimentos, já começa a ocorrer.
Loteamentos aparecem em todos os cantos da cidade. Antes o valor da terra em Canaã era
baixo, porém, com a infra-estrutura que a CVRD está montando com construção de estrada
(Figura 13) ligando o município à Estrada de Ferro Carajás, no município de Parauapebas, o
valor do lote tanto urbano quanto rural aumentou, fazendo com que o preço da terra se
multiplicasse da noite para o dia. Com isso muitos agricultores familiares estão vendendo seus
152
lotes, transferindo-se para outros locais ou para a cidade e dando origem a loteamentos
urbanos.
Nesse caso, os investimentos que a CVRD está fazendo em parceria com a
prefeitura não conseguirão evitar a desordem urbana, nem a vinda de mais migrantes para
cidade. É comum encontrar migrantes andando pelas ruas sem asfaltos do município. Eles
acabaram de chegar ali, não possuem qualquer relação com a cidade. Foram atraídos pelo
Projeto Mineração Serra do Sossego. Esse projeto, ao mesmo tempo em que gera
investimentos no município, traz junto com eles graves problemas sociais, cuja solução ficará
no futuro a cargo do poder público municipal.
No discurso de um antigo morador que veio na época dos CEDERES
trabalhar como técnico agrícola, havia uma estratégia para os Centros Regionais, que junto
com a reforma agrária era conter e viabilizar todo o cinturão de proteção da área da
Companhia Vale do Rio Doce. Para ele,
precisamente em 1983, tempo que estavam fazendo esse projeto aqui, que hoje para mim esta claro que, naquele tempo não era só a questão da reforma agrária, dá o lote para o colono, mas na verdade, a Vale estava tentando um projeto aqui de assentamento, alias fazendo um projeto de mineração. Era área de conflito essa região aqui, tinha muita terra devoluta, eles bolaram esse projeto.Na minha visão, e tem muita gente que compartilha comigo, que na verdade ele foi feito ao redor da Vale antes de tudo para pegar e tomar aquele pedaço de terra e acabar com os conflitos e acomodar as tensões agrárias nessa região. Assentaram naquela época 2.500 colonos, eram de vários lugares, Maranhão, Goiânia, até mesmo do Ceará veio gente (Entrevista Realizada em 2003).
As migrações eram controladas; dentro da área dos CEDERES. O GETAT
se encarregava de disciplinar a questão de distribuição dos lotes. E, com os técnicos agrícolas
que foram mandados para lá para ficarem somente seis meses, viabilizando as técnicas para
facilitar a produção do CEDERE II, o projeto logo começou a apresentar problemas. Havia
também outros interesses, um deles é que os centros deveriam servir de abastecimento para os
trabalhadores da CVRD, ao produzirem teriam como destino a própria CVRD como
153
consumidora. Porém, só o CEDERE II conseguiu um certo sucesso na fixação do trabalhador
no campo, e com as dificuldades que foram surgindo nem o próprio CEDERE II conseguiu
sustentar todos que para ali migraram. Acabaram por vender seus lotes a terceiros, e aos
poucos, os mais capitalizados foram formando grandes fazendas, ainda mais com a saída dos
técnicos agrícolas que depois do término do contrato foram embora,
era muito difícil pedir para um cara solteiro, com a expectativa que ele tinha, ficar numa realidade dessa. Foram todos embora, inclusive quando acabou o salário já não tinha mais ninguém. Era seis meses de salário e a única diferenciação que nos tínhamos enquanto técnicos, era que naquele tempo, o GETAT cedia para gente uma compra num supermercado lá em Carajás. Por exemplo, uma lata de óleo você não encontrava na região para comprar, tudo era caro, era coisa de garimpo mesmo, a única diferença é que nos técnicos íamos de Kombi e comprávamos esse mantimento, acabou que hoje nós somos cinco, não atuamos como técnico, mas agora somos empreendedores mesmo (Entrevista Realizada em 2003).
A situação piorou, na visão de um morador antigo, quando o GETAT
abandonou o projeto. E as dificuldades aumentaram, o CEDERE II ficou quase que isolado do
resto da região, o que fez com que muitos dos antigos moradores vendessem seus lotes e
migrassem para Marabá, Parauapebas e outras localidades, e a pecuária foi tomando cada vez
mais espaço na região do CEDERE II.
Dessa forma, o CEDERE II foi ficando esquecido como centro de
abastecimento agrícola para as localidades próximas como Parauapebas, e como as estradas
ficaram ruins, o tempo de duração do percurso entre o CEDERE II e Parauapebas aumentou,
dificultando ainda mais a vida dos colonos,
e quando foi de 1987 para cá, começou uma outra realidade do projeto. Até então você tinha suporte: logística de estrada e saúde, infra-estrutura boa. O que aconteceu, o GETAT que era o órgão gestor disso, e implantador disso, praticamente abriu mão quando acabou a missão dele. Os colonos ficaram a mingua, e aí as estradas se acabaram. Quando a gente fazia uma viagem de três horas para Parauapebas, passou ser um dia até mais, aí foram embora basicamente 60% dos colonos. O pessoal começou realmente a passar dificuldade aqui, não tinha saúde, não tinha escola, o pessoal que chegou novo, os casais novos, quando começou a precisar de aula, foi um dos fatores que levou o pessoal a ir embora daqui, além da expectativa econômica. Ninguém tem bola de cristal, ninguém ia saber que seria essa magnitude que é hoje. Então, quem ficou ou porque se contentou com a realidade, o colono não tinha aquela visão do que era hoje, ou porque
154
especulava, ou os técnicos do GETAT tivessem uma idéia do que seria hoje. Começou uma troca desse colono que vivia de subsistência, que plantava; pelo que vinha com um pouquinho de dinheiro, geralmente de venda de terra. O cara vendia sua propriedade lá, quando ele chegava aqui dava para comprar um meio mundo de terra. Esse pessoal veio e trouxe outra cultura, trouxeram outra maneira de lidar com a terra, o processo produtivo mudou de agricultura, passou basicamente para a pecuária. Começou a se instalar e foi crescendo e tomando corpo, de forma que na minha visão quem tem dinheiro hoje, esta capitalizado, se capitalizou, a partir desse processo. A assistência técnica não trouxe solução para essa região (Entrevista Realizada em 2003).
Para um antigo morador, a cidade apresenta hoje uma alteração que
acompanhou as transformações do município, de uma base agrária para uma extrativa
mineral, como o Projeto Mineração Serra do Sossego (MSS). A cidade não é mais a mesma,
os antigos moradores ficam assustados com a transformação pela qual o município está
passando, com a chegada de estranhos para trabalhar, interessados em empregos no projeto.
Hoje ocorre uma confusão por causa da infra-estrutura que está sendo
montada, não se encontra mais nada no lugar, as casas, o comércio vão se formando em
função da via principal, prédios estão sendo construídos da noite para o dia, hotéis vão
surgindo para abrigar os trabalhadores da MSS, muitos dos quais ainda estão dormindo em
Parauapebas, onde a maioria dos hotéis está reservada para as empresas que estão trabalhando
na construção do Sossego,
Canaã tem três grupos: os colonos, que você vai achar no mesmo supermercado, se vestindo do mesmo jeitinho, dessa forma acanhado naquele cantinho, porque ele chega e não acha mais aquela cidadezinha que ele via; tem outro grupo que esta conseguindo intermediar isso e esta ganhando dinheiro, nós que conseguimos entender o que esta acontecendo com o município, esta tirando proveito da situação e; tem os forasteiros que na verdade chegam sem compromisso, é só mão-de-obra rotativa, que esta construindo a cidade, mas acho que nem esta entendendo direito o que vai ser Canaã (Entrevista Realizada em 2003).
A crítica de um antigo morador recai na falta de posicionamento do poder
local. Ele acredita que o projeto que está sendo construído na cidade é um projeto com visão
somente da CVRD, não tem a visão do cidadão de Canaã, e dessa forma o projeto fere os
interesses e os costumes locais. Quem estava acostumado com um estilo de vida e uma forma
155
de viver e pensar a cidade, o tempo da cidade mudou, mudou por fatores econômicos que
inseriram o município na economia do cobre e modificou sua relação com o lugar, com as
pessoas, que passaram a viver em função do projeto ou da expectativa que ele pode dar a cada
um dos que vivem ali, que estão vendo reconstruírem sua cidade, sem pedirem sua opinião,
sem consultar seus anseios. Para outro antigo morador,
no meu ponto de vista, até um pouco polêmico, até um pouco questionável, é que o projeto aqui é um pouco diferente da realidade de Parauapebas. Parece que houve mais intervenção do poder público lá. É isso que realmente os cidadãos querem, querem um projeto da cidade, e aqui parece ao meu ver que não tem um projeto da cidade, tem um projeto da empresa, da mineradora que implanta. Independente dos benefícios disso, eu acho que a questão democrática, a questão da imposição do próprio cidadão, onde eu quero minha praça, o que é que eu quero, eu acho que esta sendo atropelado (Entrevista Realizada em 2003).
Segundo o secretário de planejamento do município a sociedade está sendo
consultada. Ele rebate as críticas dizendo que o PDS é um instrumento construído pelo
município, reuniões de demanda para elaboração do PDS foram realizadas, as reuniões foram
promovidas pela MSS, para elaboração do livro verde, que traçou um plano sustentável para o
município. Segundo o secretário a sociedade participou das discussões, e no dia em que a
MSS não existir mais esse plano tem que prosseguir,
aqui no meio rural a gente vê que está escasso. Enquanto está chegando gente, aqui no núcleo urbano, o meio rural fica meio esvaziado. O preço da terá encareceu. O pessoal vende aqui, compra duas três aí pra fora. Na realidade a gente vê como uma chuva passageira, uma enchente que vai passar. No entanto, até o comércio sofre com esse enchimento. Essa praça cheia de gente, não significa que o comércio está se dando bem, eles compram, ou melhor, eles pagam no vencimento, no final do mês, alguns comércios estão se dando bem porque vendem bebidas, é uma coisa preocupante. Há dois anos atrás existia um bairro só, de um ano pra cá o negócio expandiu, há loteamento por todo lado, e não digo que é ordenado não, é um negócio bem desordenado, isso aqui era uma cidade que não tinha pedinte. Tinham pessoas necessitadas, mas hoje o negocio aqui está feio e é só com pessoal de fora, de qualquer forma esta causando um dissabor (Entrevista Realizada em 2003).
Para o secretário a migração é preocupante embora ele aposte que a infra-
estrutura que está sendo feita vai diminuir esse problema. O problema é que a cada hora do
156
dia surge um novo loteamento, e o plano acabará deixando esses que surgiram depois da
viabilização do PDS fora de sua área de atuação.
Por outro lado, ele deposita toda sua esperança nos recursos que virão com a
implantação do projeto da MSS (em 2004), o projeto começará a pagar os royalties da
mineração e com isso a receita municipal vai aumentar, é nisso em que quase todos os
municípios apostam e pleiteiam nos projetos da CVRD, esperando que os recursos que a
companhia vai repassar aos municípios sirvam como elementos de investimentos no local, e
sejam um indicador de desenvolvimento. Segundo o secretário de Canaã,
é lógico que isso aí vai ser uma vida para Canaã. Acho que aqui nós ainda estamos felizes devido essa área de projeto. Se não houvesses esses avanços, com a arrecadação dos tributos federais, estaduais nós não íamos ter isso aqui, então a relação entre o poder público e a mineração é boa (entrevista realizada em 2003).
Por uma razão ou outra, o poder público não está ainda interessado nos
elementos adversos que surgirão, problemas urbanos e rurais, e sim na viabilização financeira,
no aumento das receitas, sem se preocupar se tais atividades poderão gerar prejuízo aos
municípios. Assim não se preocupa com a sustentabilidade social do município e com o
desenvolvimento das condições sócio-econômicas do município, só concentra suas atenções
no aumento de receita que esses projetos poderão atrair para o município.
157
5.5 –Relações e Conflitos entre Atores Sociais no Município de Curionópolis
O município de Curionópolis (Figura 14), como já foi dito anteriormente,
foi emancipado de Marabá, em 1988, e teve como ponto principal o garimpo de Serra Pelada,
disputado em vários momentos pela COOMIGASP e pela CVRD, por ocasião da privatização
da companhia. Na segunda metade da década de 1990, o município viveu a possibilidade de
ter o projeto Serra Leste implantando em seu município. Na época o poder público acreditava
que o projeto seria a salvação de Curionópolis. Depois de privatizada a companhia não se
pronunciou mais sobre a viabilização do projeto da mesma forma como quando ainda era
estatal.
Figura 14: Vista de uma das ruas do município de Curionópolis (Foto: João Marcio Palheta da Silva, 2003).
O município ainda deposita suas esperanças em possíveis projetos que a
companhia venha a instalar no seu território. Sua grande esperança está direcionada em
relação aos Projetos Cristalino e Serra Leste, segundo entrevista com o presidente da
Associação Comercial e Industrial de Curionópolis.
Durante o fórum paraense de desenvolvimento de 50 anos de mineração no Pará, eu fiz a pergunta ao representante da Vale: o que Curionópolis poderia esperar em curto prazo? Já que o município tinha duas áreas de mineração e
158
estava concluído o trabalho de pesquisa, o Serra Leste e o Projeto Cristalino. Ele me disse: olha Curionópolis em curto prazo, tem investimento na ordem de 8 a 10 milhões dólares, nesses dois projetos, pode ter certeza que isso é irreversível e entrará em operação o mais rápido possível. Eu questionei quanto ao problema do garimpeiro, ele me informou que o problema do garimpeiro estava mais fácil de ser resolvido, do que já esteve nesses dezesseis anos (Entrevista Realizada em 2003).
O município vive um período de perda populacional, principalmente para o
município de Parauapebas, que lhe é contíguo. O município possui o lacticínio como única
indústria, e tem um comércio que apresenta problemas, e como nos demais município a
prefeitura é que mais emprega, “hoje a área comercial encontra-se decadente.O único meio de
geração de emprego seria a prefeitura e lacticínio. O lacticínio emprega em torno de 300 e a
prefeitura, 500”, destaca o presidente da Associação Comercial e Industrial de Curionópolis
(ACIC). Para o presidente da ACIC a esperança do município é que a CVRD num período
curto de tempo passe a explorar a jazida de cobre que existe no município dentro do projeto
que começou em Canaã, só assim a arrecadação municipal começará a crescer, e novos
investimentos poderão ser feitos, caso contrário, o município continuará na mesma.
Parece que a CVRD é a única alternativa que tem os municípios como
Curionópolis e Canaã de verem suas receitas aumentarem, e de alguma forma poder investir
no município. Segundo o vice-prefeito do município,
a gente tem dificuldade de convênios. As promessas da Vale do Rio Doce são fundamentais para o município. Os serviços do município não têm como atender a demanda da população, o único empregador que tem aqui é a prefeitura, e não podemos mais contratar e acaba que as pessoas vão para outro município, nós lamentavelmente, mas não temos condições de segurar todo mundo (Entrevista Realizada em 2003).
Para ele a população hoje está estável. Segundo o seu depoimento o
município não tem mais nada para perder. Quando questionado em relação ao papel de Serra
Pelada para o município, o vice-prefeito disse que nas questões de Serra Pelada ele não tinha
domínio e que a Serra era uma questão do prefeito Sebastião Curió.
159
Na entrevista com uma antiga moradora de Curionópolis, ela nos falou que
veio para Curionópolis para trabalhar como enfermeira, hoje (2003) tinha montado uma
farmácia e estaria candidata a vereadora nas próximas eleições. Ela disse que viver em
Curionópolis era uma questão de honra, pois sobreviver no município era difícil, e que tudo
que ela tinha foi construído em cima de viver no município.
Para ela Serra Pelada foi decisiva na sua vinda para o município, pois a
questão de saúde era precária, e ela acabou se acostumando a cuidar dos garimpeiros e das
pessoas que ficavam morando em Curionópolis, enquanto seus filhos e marido iam trabalhar
no garimpo.
Para outro morador de Curionópolis,
chegamos no auge de Serra Pelada. Eu encontrei não era bem um município, era uma curutela, como o garimpeiro costumava chamar. Tudo era distrito de Marabá. Essa curutela, Curionópolis era o local mais perto de Serra Pelada, e onde os garimpeiros costumavam deixar suas famílias. Não era permitido a entrada de família em Serra Pelada, só de homens (entrevista realizada durante o trabalho de campo em 2003).
A cidade, que surgiu em função do garimpo de Serra Pelada, cresceu de
forma desordenada, cercada de fazendas. A maioria de suas habitações sendo cabarés, suas
ruas eram formadas por casas noturnas que atendiam os garimpeiros, que desciam da Serra
Pelada para se divertirem. Na época a maioria dos habitantes vivia dos garimpos e das casas
de prostituição que se formavam em Curionópolis.
O exército assumiu o garimpo, na pessoa do Major Curió. Em 1982 ele se
elegeu deputado federal com os votos dos garimpeiros de Serra Pelada. Curió foi eleito
prefeito do município e esta no seu segundo mandato consecutivo (2003). Por muito tempo,
Curió exerceu o controle e ordenou, através da criação da Cooperativa de Mineração dos
Garimpeiros de Serra Pelada (COOMIGASP criada por ele), a entrada e saída dos garimpeiros
na época evitando os chamados furões, que, embora ilegais, conseguiam entrar no garimpo.
Segundo um antigo morador que trabalhou no garimpo, “a primeira coisa que Curió fez
160
quando assumiu o garimpo foi credenciar todos os garimpeiros e expedir para eles uma
carteira para controlar a entrada e saída”.
Em 1987, com a permissão das mulheres entrarem no garimpo, as famílias
puderam mudar seus domicílios para Serra Pelada e acabaram formando uma localidade que
hoje possui formato de um núcleo urbano desestruturado, sem condições infra-estruturais com
muitos garimpeiros que vivem da extração do ouro em pequena escala e da agricultura
familiar.
Curionópolis surgiu em função do garimpo, mas não foi um garimpeiro seu
primeiro prefeito. Segundo entrevista com um antigo morador sobre a emancipação do
município,
tinham pessoas bem influentes que iniciaram essa política, uma dessas pessoas foi o senhor Salatiel, inclusive ele se tornou o primeiro prefeito de Curionópolis. Era farmacêutico, evangélico da Assembléia de Deus. Ele tinha uma grande influência por ser bom farmacêutico, e dono de uma das maiores farmácias que tinha aqui, numa região dessa que todo mundo adoece, o farmacêutico logo se torna um destaque (Entrevista Realizada em 2003).
É comum nessa região o profissional da saúde ser uma pessoa importante e
de respeito, pois há uma carência em virtude sobretudo da falta de saneamento básico na
maior parte dos núcleos urbanos. É comum assumirem a prefeitura dos municípios, nessa
região, médicos, farmacêuticos, enfermeiros. Dessa forma, acabam assumindo compromissos
que os levam para a política. Com o interesse de Parauapebas se emancipar, Curionópolis viu
a possibilidade de também conseguir seu desmembramento de Marabá. Nesse caso, segundo
um antigo morador “Parauapebas tinha essa idéia muito antes de Curionópolis, Parauapebas
tinha o Projeto Ferro Carajás que dava suporte bem maior para que se emancipasse, e
Curionópolis estava vivendo a decadência de Serra Pelada, esse período começa a decadência
de Serra Pelada”.
Com a decadência do garimpo de Serra Pelada, na segunda metade da
década de 1980, o município de Marabá perdeu uma importante área de mineração, e com
161
impossibilidade da lavra manual e acreditando perder população, o município levou adiante a
idéia de se desmembrar. Como no caso de Água Azul e Parauapebas, já citados, ocorreu em
Curionópolis uma troca de favores para apoiar seu desmembramento de Marabá.
Sem a produção do ouro em alta escala em Serra Pelada, com a
emancipação o município recuperou áreas e continuou a manter suas relações político-
econômicas com sucesso, acreditando que num futuro, tanto Serra Pelada, como outras áreas
pudessem vir a ser exploradas no município. No entanto, com o sucesso de Parauapebas em
torno da implantação do PFC, o município perdeu parte de sua população para Parauapebas.
Passadas as “fofocas”23 dos garimpos, como costumam chamar os novos
garimpos, Curionópolis continuava com alguns garimpos como o Serra Verde e o da Cotia,
que sobrevivem com pouca produção. O Serra Verde, mais antigo garimpo e o da Cotia
depois do boom de Serra Pelada. Essa luta é traduzida na briga pelo controle da
COOMIGASP, que na última eleição teve o representante do prefeito Curió (o fundador da
cooperativa) como vencedor. A disputa pela Cooperativa sempre foi conflituosa entre os
grupos opositores a Curió e sempre terminaram em confusão e até mesmo em assassinato.
Sobre os convênios que a prefeitura pretende fazer para melhorar as
condições de vida dos mais de 6.000 habitantes que vivem hoje em Serra Pelada. Curió
declarou à imprensa que a “Vale vai montar infra-estrutura, o maquinário, e a COOMIGASP
vai explorar o calcário com a obrigação de vendê-lo para a CVRD, a preço de mercado.
Então, é um avanço muito grande para a comunidade de Serra Pelada” (Correio do Tocantins,
março de 2003, p.17).
A tendência, segundo Curió, é de que Serra Pelada se transforme em distrito
que, no futuro poderá, ser emancipada de Curionópolis. Para ele, isso poderá acontecer com
os investimentos que a CVRD poderá fazer em Serra Pelada. Assim, tudo indica que esse será
23 As “fofocas” de garimpeiro correspondem à descoberta de uma nova mina.
162
o caminho do antigo garimpo. Segundo Curió Curionópolis terá o projeto de ouro e cobre, o
Cristalino, e o Projeto de Ferro Serra Leste, além de ter um projeto para exploração de platina.
Segundo Curió “a CVRD já está preparando um campo social para iniciar esses projetos.
Então, sem dúvida alguma, está começando uma nova fase de progresso, para gerar emprego
para o povo e a comunidade” (Correio do Tocantins, marco de 2002 p. 17).
O poder público em Curionópolis aposta na viabilidade econômico-social do
município a partir dos investimentos que poderão ser realizados pela Companhia Vale do Rio
Doce. Para o prefeito Curió,
baseado em fontes seguras há projetos sendo definidos pela Companhia Vale do Rio Doce para serem implantados em nosso território, cujos investimentos, gerarão emprego, renda e oportunidade para muitas empresas aqui se instalarem. O Próprio Projeto Sossego, em Canaã dos Carajás, nos trará dividendos, já que parte das jazidas a serem exploradas ali, está em nosso território. Isso vai redundar em royalties para os cofres do município (Jornal de Curionópolis junho de 2000).
O interessante é que em municípios como Curionópolis o poder público
acredita que toda e qualquer forma de viabilidade econômica passa pela CVRD, e que sem a
presença da companhia esses municípios seriam enviáveis, e suas arrecadações não poderiam
dar conta nem de fomentar sozinhas o desenvolvimento local.
Por enquanto, tudo não passa de projetos virtuais que a CVRD poderia
implantar em Curionópolis, e seus gestores ficam na expectativa de verem esses projetos em
atividades, gerando recursos para os municípios.
163
5.6 – Relações e Conflitos entre Atores Sociais no Município de Eldorado do Carajás24
Eldorado do Carajás (Figura 15) é um Município com menos expectativas
em relação à presença de projetos da Companhia Vale do Rio Doce. Muito embora esteja
dentro da área de influência da Estrada de Ferro Carajás. O município que surgiu em função
das madeireiras e foi emancipado de Curionópolis em 1991. Seus gestores municipais
acreditam que sobreviva de suas principais atividades, agricultura e a pecuária, e que eles não
dependem da possibilidade de implantação de projetos da CVRD em seu município.
Acreditam que, não existindo nenhuma jazida no município, este seja desinteressante para a
companhia.
Figura 15: PA-275 que liga Eldorado ao Município de Parauapebas e a Serra dos Carajás (Foto: João Marcio Palheta da Silva, 2003).
Em entrevista o presidente da Câmara Municipal de Eldorado do Carajás,
um dos moradores mais antigos, comenta:
eu fui um dos fundadores da política de Eldorado. Eu e o ex-prefeito Jair, nós em 1986, começamos a dar os primeiros passos políticos. Eldorado pertencia a Marabá, aqui era uma área de segurança e, todos os municípios pertenciam a Marabá, Parauapebas, Curionópolis e Eldorado. Em 1988, veio
24 No município de Eldorado do Carajás não há Associação Comercial e Industrial.
164
à primeira eleição, desmembramos Curionópolis e Parauapebas, na primeira eleição eu já participei (Entrevista Realizada em 2003).
Para o presidente da Câmara Municipal, emancipar o município foi uma
maneira de fazer com que ele criasse expectativas de se desenvolver sozinho, já que os outros
municípios apresentavam características minerais e Eldorado não, e estava distante do
principal centro, que era Marabá.
Outra característica fundamental para o presidente da câmara é que o
município está no entroncamento da PA-275 com a PA-150, que dá acesso tanto para Marabá
quando para Xinguara, o que facilita o escoamento da produção local. Em relação à
perspectiva de crescimento,
Eldorado já nasceu com o destino marcado. Parauapebas é extração de minério, jazida de ferro. Curionópolis teve aquele foco de Serra Pelada e ainda a poderá ser a salvação, o garimpo de Serra Pelada. Então, Eldorado já nasceu com destino traçado, é a pecuária. A madeira é coisa passageira. A madeira acabou, não existe mais madeira. Mineração nós não temos, eu acompanho desde 1980 a Vale fazer pesquisa, nós não temos nada de minério dentro do município, então é agricultura e a pecuária. Nós temos um grande potencial na pecuária, hoje o Eldorado tem umas 700 mil cabeças de gado (entrevista realizada durante o trabalho de campo em 2003).
De todos os municípios pesquisados, até o presente momento, Eldorado é o
único que escapa em não atrelar seus interesses públicos à questão da presença da CVRD no
município. E, embora seja um município recente, acreditam seus gestores que a agricultura e a
pecuária sejam as únicas formas de crescimento econômico para viabilizar o município e
assim atrair investimentos e empregos. Para um vereador do município,
o futuro de Eldorado, o crescimento de Eldorado é baseado na agricultura e na pecuária, a prova é que chegou um lacticínio aqui em Eldorado. Ele fez uma estrutura pensando em trabalhar inicialmente com dez mil litros de leite, no primeiro mês ele já pegou 32 mil litros de leite. Nós temos uma associação na Boca do Cardoso, com 280 associados, nós estamos fazendo um financiamento no BASA vai sair dinheiro para cada produtor para comprar vinte vacas leiteiras (Entrevista Realizada em 2003).
O município de Eldorado e os demais da região estão atraindo os laticínios,
pelo potencial da bacia leiteira dentro dos seus territórios. Frigoríficos também migram para
esses municípios pelo potencial da pecuária, o que já foi destacado durante este capítulo, e
165
Eldorado do Carajás possui um frigorífico que, junto com a prefeitura, é um grande
empregador local.
Outro ponto a ser destacado pelo poder público é a relação com os
assentamentos realizados; como exemplo a fazenda Macaxeira, onde a produção cacaueira
vem sendo estimulada e com isso, segundo o presidente da câmara municipal, “então está se
concentrando tudo na pecuária e na agricultura depende do crescimento baseado que nós
temos na invasão. Eldorado hoje tem dezessete assentamentos de sem terras (entre os novos e
os antigos realizados na época do GETAT na região), e nós temos ainda várias fazendas
grandes, que não adianta elas vão ser invadidas”. Os assentamentos, na visão do presidente,
são uma questão positiva para o município, pois os incentivos que virão junto com eles
poderão viabilizar a agricultura no município.
Para o vereador, a produção de grãos deve ser incentivada, e a viabilidade
de construção das eclusas de Tucuruí poderá ser um dos caminhos para aumentar a produção,
visto que vai baratear os custos de transporte, principalmente da soja. Para ele “o sul do Pará
pode ser um grande produtor de soja do Brasil. Santana do Araguaia, Redenção, Conceição,
Santa Maria são só cerrado e só campo é só incentivar”. Para ele é por aí que o poder público
estadual pode buscar parcerias com a CVRD e tornar essa região um pólo produtor de grãos.
Em companhia com a CVRD, viabilizaria as eclusas, o que tornaria a região ainda mais
próspera para investimentos em agricultura.
Porém as fortes migrações, segundo o poder público, são entraves ao
desenvolvimento do município. Na declaração do representante da câmara municipal, “nossa
região tem muita migração que vem do Maranhão, vem do Piauí, no nordeste, pensando que
aqui é um mar de rosas, é aonde nós temos os problemas sociais, eles vem e não tem no que
trabalhar”.
166
Como os municípios não têm capacidade de investir, de atrair novas
empresas e gerar empregos, eles acabam formando verdadeiros bolsões de pobrezas. Segundo
entrevistas, os pobres acabam indo para os movimentos sociais como o MST, sua única
alternativa.
Outra forma de tentar tornar o município atrativo é tentar, segundo o
presidente da câmara, esquecer alguns equívocos que foram praticados dentro do município e
que não foram de responsabilidade do poder municipal, mas acabaram fazendo com que ele
ficasse com a imagem de um município violento, “aquele massacre da curva do “S” levou
uma má imagem de Eldorado e nós estamos recuperando ela aos poucos”.
O comércio apresenta problemas, ocasionados sobretudo, como declararam
alguns comerciantes, pelo período de chuvas na região, que atrapalha o processo nas
madeireiras, o que por sua vez causa desemprego, e o comércio tem suas vendas reduzidas.
Segundo entrevistas de comerciantes à imprensa, “nós dependemos da prefeitura e das
madeireiras, como elas não estão funcionando e a prefeitura demora a contratar, acontece
isso”. Para outros comerciantes a falta de indústrias na cidade é que acaba sendo responsável
por esses acontecimentos.
Eldorado do Carajás, como outros municípios do corredor da Estrada de
Ferro Carajás, apresentam graves problemas sociais, como falta de saneamento básico, dentre
outros e que precisam ser solucionados, mas esbarram em viabilizar parcerias e promover a
integração da sociedade civil na resolução dos problemas urbanos e rurais.
A economia do município ainda é incipiente para gerar ganhos aos cofres
públicos, e o município ainda depende em sua maior parte da infra-estrutura de municípios
vizinhos, como Parauapebas e Marabá, que acabam sobrecarregando suas atividades com os
problemas gerados por município como Eldorado.
167
Não há uma forma definida de gestão. Embora eles apontem o caminho da
agricultura e da pecuária, faltam investimentos nessas áreas. A prefeitura e as madeireiras
ainda presentes no município (no período de chuva diminuem seus serviços, por isso acaba
diminuindo também o consumo no comércio na cidade, pois deixam de contratar nesse
período) junto com o frigorífico acabam sendo os responsáveis pelos empregos no local.
168
5.7 – Uma Visão Conjunta dos Problemas e dos Conflitos Municipais
Todas as questões que envolvem as relações de poder e as formas de
desenvolvimento dos municípios estão ainda longe de serem resolvidas, devido a diferentes
interesses dos atores locais. Parauapebas, Curionópolis, Canaã dos Carajás, Água Azul do
Norte e Eldorado do Carajás são ainda municípios novos, em termos de emancipação política
e econômica. Como Marabá, esses municípios apresentam antigos problemas sociais
agravados com a introdução da mineração e por planejamentos realizados sem a participação
da sociedade civil ou de grupos rivais que disputam o poder local.
Em relação à questão econômico-financeira, destacada no capítulo IV, a
grande maioria dos municípios da mesorregião sudeste paraense são pobres, com pequena
arrecadação, dependem do repasse do governo federal e têm sua receita atrelada à questão do
FPM. São municípios que têm dependências financeiras, que acabam onerando outros
municípios por não possuírem infra-estrutura suficiente para atender sua população, que acaba
buscando serviço melhor em outra localidade próxima, e também acaba migrando para
municípios como Parauapebas ou para Marabá, os dois mais bem estruturados, entre o seis
municípios estudados e que acabam recebendo problemas que deveriam ser resolvidos nos
municípios adjacentes.
Segundo um ex-integrante da EEPP:
a questão da saúde pública é uma calamidade em Parauapebas. A maioria do pessoal diante de qualquer problema vai para Teresina, no Piauí. Isso é aparentemente um absurdo para uma cidade que dispõem de recursos, que o paciente tenha que ser levado para outra cidade que é capital de um dos Estados mais pobres do Brasil (Entrevista realizada em 2003).
As prefeituras acabam sendo o principal empregador. Sem perspectivas de
atrair indústrias e serviços, esses municípios entregam seu futuro em termos de
desenvolvimento econômico às vontades dos projetos que poderiam ser implantados por parte
da Companhia Vale do Rio Doce.
169
Outro destaque está relacionado à dependência que os municípios têm das
atividades de mineração da CVRD, que monopoliza a exploração dos minérios na região. Nas
entrevistas, foi quase que unânime a questão da necessidade de abertura do sul e sudeste
paraense para outras empresas realizarem suas prospecções. Outras empresas precisam dividir
junto com a CVRD a responsabilidade econômica e social pelo desenvolvimento dos projetos
na região. Acredita-se que só assim haverá uma redistribuição de poder econômico em virtude
da quebra do monopólio exercido pela CVRD na região.
Para tentar mudar esse quadro considerado crítico em relação não só ao
poder público, mas em função das atividades desenvolvidas pela CVRD, que tem impactado
alguns municípios que não têm em seu território projetos da companhia, ou aqueles que
futuramente poderão abrigar projetos dela, criou-se uma alternativa, proposta pela Senadora
Ana Júlia Carepa: aumentar alíquota dos royalties para tentar amenizar os problemas sociais e
econômicos tanto para os que possuem projetos como para aqueles que acabam sofrendo
influência desses projetos. Segundo depoimento de antigos participantes da EEPP,
o município Parauapebas recebe 22% do CFEM do país pela extração mineral em seu município. O projeto dos royalties pretende dobrar essa alíquota que é cobrado sobre o lucro líquido da empresa, e beneficiar de forma residual outros municípios. Na verdade seriam os municípios que fazem fronteiras com o município sede. No caso aqui seria Curionópolis, Canaã, Eldorado, Água Azul, Marabá, que pegaria o projeto Carajás. Por outro lado, de Canaã nós também pegaríamos, nós também sofremos impacto do projeto Mineração Serra do Sossego. Então fica justo, ela é correta, embora ocorram críticas de como isso se sustente ao longo do tempo. Tem muitos lugares que o projeto é mais demorado, tem lugares que é menos, municípios que tem projeto mais a longo prazo vão dizer não, nós não queremos isso, depois nós só vamos esta dando, não vamos estar recebendo (entrevista realizada durante o trabalho de campo em 2003).
Uma outra questão está relacionada ao projeto da senadora Ana Júlia, depois
da decisão da CVRD de implantar o pólo siderúrgico no Maranhão. Os paraenses ficaram
questionando o papel da companhia dentro do Estado e, principalmente, na região de Carajás.
Muitos manifestos foram feitos, principalmente por políticos paraenses, dentre eles o projeto
da senadora Ana Júlia, que não foi somente motivado pela questão do pólo siderúrgico, mas
170
sim pela pobreza que impera dentro da área em que a CVRD tem projetos, ou seja, daqueles
municípios que recebem, e de outros que não recebem benefícios da companhia.
Segundo o secretário de Planejamento de Parauapebas,
O projeto até que é bom, mas eu acho que se a Vale hoje coloca minério na China, num preço melhor do que a Austrália vende, é em função dessas vantagens. Então teria que ver até que ponto implica na exportação do minério, que além de ajudar o município uma parte desses recursos fica com Estado, outra parte vai para o DNPM, o município não vai ter perda nenhuma (entrevista realizada durante o trabalho de campo em 2003).
Porém, toda a região no momento vive as expectativas do Projeto
Mineração Serra do Sossego em Canaã. Parauapebas é o primeiro caminho para se chegar a
Canaã pela Estrada de Ferro Carajás, principalmente, portanto a chegada de migrantes
atraídas pelo Projeto de Mineração Serra do Sossego também causa impacto em Parauapebas.
Segundo representantes da ACIP, diferentemente de outros municípios é
Parauapebas que acaba sendo o pólo da microrregião, por possuir as atividades principais da
CVRD na região. Segundo a associação, “Canaã é um filme de Parauapebas, é um filme que
passou aqui, e está passando lá, um boom de emprego, uma cidade que há dois anos tinha 13
mil habitantes, só hoje, em mão-de-obra gerada no projeto tem 30 mil. É um canteiro de obras
daqui até lá, Parauapebas foi isso. Parauapebas vai continuar sendo o pólo dessa
microrregião”. Para o vice-presidente da ACIP, não terá outro jeito; com o fim do primeiro
estágio do projeto em Canaã, ocorrerá uma migração inversa em direção a Parauapebas, a
principal e mais próxima com infra-estrutura melhor do que Canaã. Por tal motivo, ele
acredita que esses migrantes que estão indo em busca de empregos vão acabar ficando em
Parauapebas. Nem todos irão conseguir empregos em Canaã, e Parauapebas será o local
melhor para eles tentaram a sorte.
171
Fonte: Informativo Mineral DNPM, 2000.25
Em se tratando da CFEM, o Estado do Pará, em conjunto com o Estado de
Minas Gerais, responderam em 1999 por 73% de sua arrecadação (Figura 16), sendo
respectivamente 31,7 e 41,4% da arrecadação do País. A crítica recai na própria experiência
de Parauapebas, que recebe recurso (o município recebeu em 1997 R$ 11.954.930,07, em
1998 recebeu R$ 14.394.61485 e em 1999 recebeu R$ 15.326.455,45 de CFEM) por possuir
os projetos da CVRD em seu município, muito embora o próprio município apresente graves
problemas sociais, como o de saúde e de infra-estrutura em alguns bairros mais distantes,
como é o caso do bairro Liberdade (antigo cortinão), em contraste com o núcleo pioneiro da
cidade, que recebeu investimento da CVRD no começo da implantação do Projeto Ferro. Em
relação à forma como o município vem se desenvolvendo, um ex-integrante da EEPP destaca:
para o desenvolvimento regional, não adianta desenvolver uma ilha num município pequeno, porque você vai ter todos os problemas da cidade vizinha, que acabam desembocando aqui. Hoje, por exemplo, qualquer problema maior, o hospital aqui de Parauapebas atende Canaã, atende Curionópolis, atende Eldorado, apesar de terem pequenas unidades nesses
25 Segundo o DNPM “Considerando a arrecadação por municípios, em 1999, o recolhimento da CFEM foi encabeçado por Parauapebas-PA, Oriximiná-PA e Itabira-MG, que representaram, respectivamente, 22,0%, 11,0% e 10,0%. Juntos, são responsáveis por 43,0% da arrecadação nacional” (Informativo Mineral, 2000).
F ig u ra 1 6 - P A R T IC IP A Ç Ã O D O S P R IN C IP A IS M U N IC ÍP IO S N A A R R E C A D A Ç Ã O - 1 9 9 9
2 2 ,3 %
1 1 ,0 %
1 0 ,2 %4 ,4 %4 ,3 %3 ,4 %
2 ,7 %
2 ,6 %
2 ,3 %
1 ,7 %
3 5 ,1 %
P A R A U A P E B A S (P A ) O R IX IM IN A (P A ) IT A B IR A (M G )
O U R O P R E T O (M G ) N O V A L IM A (M G ) M A R IA N A (M G )
IT A B IR IT O (M G ) V IT O R IA D O J A R I (A P ) R O S A R IO D O C A T E T E (S E )
IP IX U N A D O P A R A (P A ) O U T R O S
172
municípios, mas que não tem a infra-estrutura que tem aqui, então na verdade a gente acaba tendo mais problemas do que o necessário, se você canalizar os recursos para esses municípios, eles também, vão poder construir uma infra-estrutura decente (entrevista realizada durante o trabalho de campo em 2003).
Segundo o secretário de Parauapebas, investimentos feitos em municípios
como Canaã podem beneficiar Parauapebas.
A abertura da estrada de Canaã com 80 quilômetros de asfalto, e com a influência que nós temos nos assentamentos dentro de Marabá, além disso, o mercado consumidor deles é o município de Parauapebas. É, 80 quilômetros daqui até lá, e para Marabá é 120/180 quilômetros, e as estradas são ruins. Eu vejo amanhã o pessoal de Água Azul, Tucumã, Ourilândia, São Feliz do Xingu querendo ir para Marabá ou para Belém, vão querer passar aqui por dentro, isso aqui vai ser um corredor de exportação, essa região (entrevista realizada durante o trabalho de campo em 2003).
Outra crítica realizada pelo secretário é em função da perda dos
investimentos para o Estado do Maranhão. Como esses municípios que têm em seu território
projetos de mineração recebem muitos migrantes, para a CVRD junto com o Estado e
município é um desafio pensar essa questão. Embora não seja função da empresa, essas
questões em parte são de sua responsabilidade indireta, devido à metamorfose que ocorreu nas
últimas duas décadas. É preciso repensar a questão da mineração no Pará, definindo,
sobretudo, a área que está sob a influência da CVRD e aplicar recursos para minimizar esses
problemas diferentemente de como era na época do Fundo de Compensação das Áreas de
Influência da CVRD,
o minério é nosso, está dentro do Estado do Pará e vai gerar emprego para os de lá. Eu vejo que quem esta perdendo muito com isso é o próprio Estado, porque gente de lá para cá vem de monte. Agora gente daqui para lá não vai. Não se vê ninguém do Pará morando no Maranhão é raridade, mas maranhenses aqui na nossa cidade 60% correspondem a população (entrevista realizada durante o trabalho de campo em 2003).
Há falta de banco de dados com indicadores sócio-econômicos, comum em
todos os municípios estudados nesta pesquisa, e não se tem ainda definido qual seria o eixo de
desenvolvimento desses municípios. Isso facilita ações de domínio como as que são em parte
173
inerentes da CVRD na região, o que fragmenta as relações de poder dentro do município, não
deixando espaço para novas idéias no que diz respeito às políticas econômicas e sociais
traçadas a médio e longo prazo para o município.
Em função do pólo siderúrgico surge outro questionamento relacionado ao
aumento das alíquotas da CFEM que transita no Congresso Nacional por parte de políticos
paraenses. A questão vai além do aumento da alíquota e sua distribuição e sobre quais seriam
as áreas sob a influência da CVRD no Pará, e de que forma seriam aplicados esses recursos.
Os questionamentos feitos por alguns municípios, dentre eles Parauapebas, é
sobre a vida útil de cada projeto que a CVRD tem na região. Em alguns casos como Canaã o
projeto tem vida curta, e uma parte do repasse proposto pelo novo projeto da senadora não iria
beneficiar Parauapebas. Talvez por isso a indiferença do secretário, que já alertava sobre as
possíveis migrações que viriam de Canaã em direção a Parauapebas aumentando os
problemas sociais do Município.
Segundo depoimentos, é impossível negociar com a empresa questões de
interesses da sociedade. Com outras empresas presentes no município, necessariamente
ocorrerá uma disputa para ver quem melhor assume um papel de destaque, tanto no setor
econômico, como no social nos municípios. Crescerá assim o número de futuros projetos, de
maneira que poderá realmente acontecer a verticalização da produção dentro do território
paraense. Para isso é preciso evitar também que haja fuga de projetos para beneficiamento dos
minérios em outros locais, fora do Estado do Pará. Dessa forma, segundo depoimento de
integrantes da EEPP:
primeiro nós temos que pintar um cenário com vários atores que nós temos aqui. Nós temos a Vale do Rio Doce. Não é possível discutir desenvolvimento sem colocá-la no cenário. É daí que vem a maior parte da riqueza que é produzida aqui. Eu sinto que aqui há uma tendência do poder público municipal, hoje de tentar segurar novas indústrias aqui, porque os empregados de uma indústria ou de nova empresa grande que se instale aqui, eles necessariamente não estão submissos ao poder público. Vejo que o desenvolvimento tem sido travado de alguma forma por isso, porque a disputa eleitoral aqui acaba influenciando demais na questão do
174
desenvolvimento. Deixa de se fazer muitas coisas por conta do medo de perde apoio político, apoio do voto (entrevista realizada durante o trabalho de campo em 2003).
Por outro lado, a questão dos empregados, com a presença de outras
empresas nos municípios, está relacionada à liberdade de expressar seus descontentamentos
com a administração local, e de mostrar como o poder local age em função de seus interesses.
Segundo alguns depoimentos, essa crítica que poderia ocorrer caso outras empresas viessem a
se instalar em Parauapebas forçaria e diminuiria a perseguição política que ocorre, caso os
empregados se posicionem contra a vontade do poder público e dos seus representantes.
A tentativa de ex-membros da EEPP participarem do poder público ou de
reativarem sua própria entidade representa iniciativas de viabilizar seus próprios discursos de
desenvolvimento atrelado à formação política de atores excluídos do poder local. Seus
membros procuram, a partir da experiência adquirida, definir qual seria a forma de se
posicionar diante de um grande grupo econômico que monopoliza a economia no município.
Diante do fato político e de outros, como o econômico, os moradores
sentem-se prejudicados pelo posicionamento do poder público municipal. Segundo eles “a
proposta da prefeitura não é uma proposta, é uma imposição; a relação de diálogo entre o
poder público e a sociedade não existe nessa cidade”. Dessa forma, o discurso de ex-membros
da entidade é de tornar o município um espaço público dinamizado pela participação popular.
Outro ponto relevante está relacionado com o poder público, que acaba
inibindo a entrada de outras indústrias para competir, sobretudo com a CVRD; mas segundo
depoimento de ex-integrantes da EEPP, a própria CVRD não abrirá mão de suas jazidas ou da
parte que contempla, principalmente a Floresta Nacional de Carajás. A CVRD sente-se
ameaçada por ser possível a exploração da floresta por uma outra empresa, que não seja ela.
Agora por exemplo tem toda essa discussão em relação da Floresta Nacional de Carajás, já tem pelo menos duas ou três empresas que querem fazer pesquisas nessa floresta. A Vale junto com IBAMA, inclusive foi criado o conselho da floresta para ajudar, acompanhar a questão do manejo e o potencial, seja no ponto de vista da questão da produção vegetal, seja
175
mineral, que na verdade a Vale não quer que outras empresas entrem. A partir do momento que outras empresas atuem aqui vai ter concorrência, seja na produção, seja no social. Então ela jamais vai querer grupos que possam se contrapor a própria política dela (entrevista realizada durante o trabalho de campo em 2003).
Essa preocupação ambiental tem levantado questionamentos em relação à
Floresta Nacional de Carajás (FLONA) e tem preocupado a comunidade da área técnica com
restrições por parte dos ambientalistas, que vêem pela primeira vez um caso de exploração de
uma Floresta Nacional, que coloca em risco a questão ambiental na região e no Estado como
um todo.
Segundo o jornal O Liberal,
a Floresta Nacional de Carajás, cobrindo exatamente a área que a CVRD já vinha (e vem) mantendo sob seu domínio desde 1986, foi criada no dia 02 de fevereiro de 1998. Para seu uso, foi elaborado um plano diretor que prevê, entre outras coisas, a pesquisa, a lavra, a industrialização, o transporte e a comercialização de recursos minerais, além da promoção de manejos dos recursos florestais. A partir do momento que foi criada lá a Floresta Nacional, uma unidade de conservação pertencente ao Ministério do Meio Ambiente, qualquer empresa só poderá requerer ao DNPM um alvará de autorização de pesquisa, em Carajás, se apresentar, junto com o requerimento, a anuência do IBAMA. Do contrário, o requerimento é liminarmente indeferido. Um obstáculo novo e quase intransponível para as mineradoras, com uma única exceção: por ter títulos minerários na área, a Companhia Vale do Rio Doce consegue facilmente a anuência do IBAMA (Jornal O Liberal 08 de junho de 2003, painel, p. 2).
Por essas e outras questões ambientais locais e extralocais, o secretário de
meio ambiente de Marabá, Antônio Rosa, destacou a importância de cada município ter em
sua prefeitura uma lei ambiental e normas para licenciamento ambiental considerados por ele
indispensáveis para o desenvolvimento dos municípios. O Problema da FLONA é uma
questão que, de forma direta ou indireta, mostra o peso político-econômico que a CVRD tem
na região, monopolizando cada vez mais a questão mineral na região.
De uma maneira ou de outra, o importante é que se tem que repensar o papel
da mineração no Pará e das empresas como a CVRD, que atuam dentro do Estado, e no efeito
multiplicador que foi gerado por esses projetos na Amazônia. A questão do aumento da
176
alíquota tem que ser acompanhada por uma nova forma de pensar o desenvolvimento na
região, que leve em consideração a sociedade local, e os impactos gerados por esses projetos.
É preciso não repetir os mesmos erros do passado, não apenas na quantificação, mas na
qualificação da aplicação desses recursos, e não permitir que as empresas montem suas infra-
estruturas fora do Estado, ficando este somente como o fornecedor da matéria-prima.
177
6 – CONSIDERAÇÕES FINAIS A CVRD como ator hegemônico na região de Carajás organiza suas
relações a partir de sua exploração mineral e de seus contratos econômicos com quem
financia seus projetos. Ela desenvolve relação com a gestão pública local e com os demais
atores sociais que participam da vida ativa do Estado e dos municípios onde ela possui
projetos.
De uma maneira ou de outra, o poder que a companhia adquiriu localmente
vem de longos anos de sua trajetória como uma grande empresa de mineração não só no
cenário nacional, como também no internacional. Não se pode afirmar que a CVRD omitiu
sua participação na vida econômica dos municípios, pois seus projetos trouxeram recursos
financeiros onde estavam instalados, porém pela falta de uma visão de futuro dos políticos
paraenses, não foi possível exigir da empresa um outro tipo de participação qualitativa, para
que ela pudesse participar mais ativamente em parcerias com os municípios na resolução de
seus problemas urbanos e rurais.
Isso não quer dizer que a CVRD deixou de participar do desenvolvimento
local, mas queremos dizer que sua participação poderia e pode se dar de uma outra maneira,
possibilitando aos municípios não dependerem somente da empresa, mas permitindo que
possam construir alternativa que não a do minério.
De fato, os 411.000 hectares que estão sob o poder de exploração da
empresa impedem a abertura de uma outra frente que correlacione o poder na região. Com o
monopólio da CVRD fica difícil negociar. Não foi possível quebrar as barreiras do
protecionismo da empresa e criar abertura para que outras empresas brasileiras viessem a
explorar a região com compromisso e responsabilidade com o desenvolvimento dos locais
onde estivessem sendo instalados novos empreendimentos. Se isso tivesse acontecido teria
evitado fugas de projetos para outros Estados, viabilizando realmente seus interesses com
178
compromisso de efeito multiplicador na região. Houve no caso ausência de planejamentos que
levassem em conta a participação efetiva da sociedade local, criando alternativas de
viabilidade não só econômica, mas também social, respeitando as sociedades atingidas pelos
projetos.
Embora os atores sociais entrassem em conflitos pelo poder local e por
outro tipo de ordenamento no território, sempre deixaram de fora de maneira direta a CVRD.
Com raras exceções, como a do MST, a companhia não teve questionado seu papel na região,
com força suficiente que fizesse a empresa mudar seu comportamento no Estado do Pará.
Com a privatização aos poucos a empresa mudou para o vizinho Estado do
Maranhão sua base logística que tinha na capital paraense. Houve reclamações, mas não com
a devida notoriedade, pelo simples fato de a empresa não temer a ordem legal dos paraenses.
Outra mudança importante foi a decisão de instalar o pólo siderúrgico no
Maranhão e não no Pará. Segundo Lúcio Flávio Pinto,
Desarmado, o Estado reage aos fatos buscando compensações e derivações, ao invés de encarar a Vale do Rio Doce com sua própria visão do setor. Mas como criar essa visão sem estar habilitado a isso e sem buscar respaldo técnico, sempre recorrendo à própria empresa para custear estudos e projetos, como aconteceu com os planos de Eliezer Batista e Raphael de Almeida Magalhães – e se repete agora com a fábrica de placas? (Jornal Pessoal, 2003. P. 05).
A afirmativa acima de Lúcio Flávio corrobora com a nossa no seguinte
sentido: quais definições e proposta de desenvolvimento com base local o Estado apresentou
em relação à companhia? Na visão do senso comum, desde o primeiro trem carregado de
minério que saiu de Carajás através da estrada de ferro que vai da mina no Pará até o porto de
Itaqui, no Maranhão, a população apenas vê o minério sair, sem nada se fazer. Para ela parece
que o Estado ficou alheio a sua condição de organizar e governar o território diante da lógica
econômica imposta pela empresa. Assim, deixa a cargo da empresa a tarefa que de fato seria
sua de direito: responsabilizar-se pela viabilidade dos territórios ocupados pela CVRD.
179
Ainda segundo Lúcio Flávio Pinto,
a conclusão do estudo realizado pela Natrontec e a Macrotempo...de que São Luís do Maranhão é o melhor lugar para instalação da primeira usina de placas de aço do Brasil, significa o ponto final na história da siderurgia no Pará? O Estado tem a melhor jazida de minério de ferro que existe no planeta, localizada na província mineral de Carajás. Mas até agora o único passo adiante na transformação da matéria prima, um quarto de século depois de iniciada a mineração do ferro, foi dado pelas cinco usinas de gusa implantadas no distrito industrial de Marabá (Jornal Pessoal, 2003. p. 04).
O destino da fábrica de placas seria outro, se de fato há muito tempo o poder
público paraense tivesse deixado de lado seus interesses individuais e olhado para o futuro da
mineração no Estado. As relações que a CVRD vem estabelecendo localmente viabilizam o
desenvolvimento de suas ações rumo ao Maranhão. Um conjunto de processos pesou na
decisão de instalar a fábrica no Estado do Maranhão, o porto está localizado em São Luís e a
Estrada de Ferro Carajás tem como destino final esse Estado. Dessa forma, fica muito mais
em conta para a empresa diminuir seus custos instalando a fábrica no Maranhão do que
atender às reivindicações dos paraenses.
Outra condição encontrada pela companhia para garantir suas pretensões de
instalar a fábrica no Maranhão é explicada por Lúcio Flávio Pinto,
desde o ano passado, a primeira pelotizadora de ferro, que faz a agregação do minério fino, funciona em São Luís. Ela é uma das três maiores usinas de pellets do país, com capacidade de produção de seis milhões de toneladas por ano. Pelotas de ferro e minério granulado são dois insumos para a fabricação de chapas de aço, que representam um estágio mais avançado na industrialização. Se depender do estudo realizado por encomenda da Companhia Vale do Rio Doce, a primeira fábrica de chapas, em sociedade com os chineses, também ficará na capital maranhense, produzindo 3,7 milhões de toneladas anuais. A outra siderúrgica, com metade do tamanho da de São Luís, está surgindo ao lado do porto de Pecém, no Ceará, a mais nova do Nordeste, mas também utilizando o minério de Carajás (Jornal Pessoal, 2003. p. 04).
Alguns dos argumentos da CVRD poderiam ter sido contestados em relação
à instalação do pólo siderúrgico no Maranhão, mas, como já ressaltou Lúcio em vários livros
e artigos publicados no Pará, a elite paraense só contesta o fato depois de consumado. Mais do
180
que a capacidade de contestar é necessário pensar num Estado, não somente como mais um
mero centro minerador e produtor de semi acabados das empresas do Grupo CVRD.
Durante vários meses do ano de 2003, ocorreu um debate, sem muito efeito
para a CVRD, entre os representantes do poder público e da elite paraense, sobre a definição
do pólo siderúrgico. Reuniões foram realizadas, debatidas, tudo depois de uma possível
constatação que o Pará não seria o centro das intenções da empresa para instalação do pólo
siderúrgico.
O Liberal publicou diversos artigos sobre a CVRD, alguns deles acusando a
companhia de débitos em relação aos royalties, que, segundo estudo realizado pelo
Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM), estão aproximadamente em 226
milhões de reais. Segundo nota na imprensa, a CVRD disse “não concordar com os critérios
utilizados pelo DNPM para a apuração desses valores e, portanto, a CVRD considera que
esses valores não são devidos” (O Liberal, 2003 painel, p. 2).
Por outro lado o DNPM acusa ainda a CVRD de ter ficado anos sem pagar a
taxa de pesquisa. Esta é relativa ao pagamento anual por hectare que o DNPM cobra de todas
as empresas mineradoras que fazem pesquisas geológicas de exploração mineral. Com base
no memorial da empresa o DNPM expede o alvará de pesquisa, e com isso cobra a taxa que
representa R$ 1,06, que contabiliza uma dívida de R$ 13 milhões.
Desde 1998, quando contestou na justiça a cobrança da taxa, a CVRD vinha
depositando em juízo os depósitos relativos ao pagamento da taxa. No início de 2003, a
companhia voltou a pagar ao DNPM.
O Estado do Pará elaborou um documento denominado Agenda Pará
exigindo compensações da CVRD. O documento destaca a verticalização do cobre e do
alumínio no Pará, investimentos em relação ao ferro-gusa, além da construção de 40 mil casas
populares para a população com renda mensal de até R$ 30,00.
181
Outros 180 milhões de reais (correspondentes em dólares de hoje) estão
incluídos na Agenda Pará para a realização das obras de construção das eclusas de Tucuruí.
Esse documento é uma resposta do Estado e de entidades de classes pela decisão da CVRD de
instalar a fábrica de placas de aço no Maranhão. Caso a CVRD diga não à Agenda Pará,
afirma o governador: “impõe não só uma urgente releitura da realidade paraense por parte da
companhia, mas também uma mudança de comportamento que indique a todo o Pará um novo
momento” (O Liberal, agosto de 2003: atualidades p. 6).
O escritor Benedito Monteiro quando era deputado ressaltou que combateu
o Decreto Lei 1.164 baixado pelo governo militar, que transferiu 75 % das terras públicas do
Estado do Pará para a União. Segundo ele,
O que esse decreto tem a ver com a Companhia Vale do Rio Doce? Tudo, tudo, pois os mais de 400 mil hectares de terras públicas do Pará, que foram doados a essa companhia pelo Governo Federal, não poderiam nem ser vendidos, se obedecesse a legislação de terras estadual. E é nesse verdadeiro latifúndio, particular, que se encontram a maior mina de ferro a céu aberto do mundo e mais jazidas de ouro, manganês, níquel e cobre, que a Vale do Rio Doce já está explorando e lucrando mais, muito mais que todo o Estado do Pará (O Liberal, agosto de 2003, painel, p. 2).
Paraguassu Éleres, o principal questionador das terras que foram doadas à
CVRD, afirmou categoricamente que ajuizou, em 1999, ação popular sobre o
cancelamento do registro imobiliário de 411.948 hectares de terras na província mineral de Carajás, ilegalmente arrecadados pela União, à época da ditadura militar de 1964, e dados gratuitamente à Vale do Rio Doce...A ação popular da iniciativa de pessoa do povo (como facultam a Lei 4.717/1965 e a Constituição de 1988, artigo 5º, LXXIII) não seria ajuizada se em 1996 a procuradoria Geral do Estado cumprisse o que autorizou o procurador-geral Pedro Bentes Pinheiro Filho, formalizando ação sobre a federalização de áreas do Estado ocupadas pela Companhia Vale do Rio Doce (O Liberal, maio de 2003, painel, p. 3).
Desses 411.000 hectares a CVRD tem explorado uma parte, e suas
pesquisas delineiam que serão utilizados outros tantos quantos forem de interesse da
182
companhia. E Paraguassu Éleres mostra a omissão do poder público, o mesmo poder que hoje
contesta o tratamento dispensado pela CVRD ao Estado do Pará.
A privatização levou ao esquecimento projetos tidos como certos no Pará, e
à mudança de comportamento da companhia em relação ao território em que atua. Municípios
ficaram só na esperança e sem qualquer justificativa aceitável: por que os projeto antes
prioritários ao Estado e da companhia hoje estão no esquecimento, e por que compromissos
assumidos foram esquecidos?
O governador Simão Jatene declarou na imprensa que
o royalty hoje no Pará, na área de tudo que o Pará produz em termos de minérios, para o governo do Estado fica alguma coisa em torno de R$ 1,5 milhão, uma quantia que é absolutamente irrisória. Se nós quiséssemos fazer uma comparação, rápida: vi alguma coisa no jornal que a Companhia Vale do Rio Doce parece que nesse carnaval do Rio gastou alguma coisa em torno de R$ 6 milhões. Ou seja, no carnaval do Rio a Vale gastou quatro vezes mais – e não só a Vale, é maior do que as empresas de mineração deixam no Estado do Pará em um mês (O Liberal fevereiro de 2003, cidade 03).
Não se pode dizer o mesmo em relação aos municípios que recebem os
royalties; na sua maioria os municípios paraenses no sudeste do Estado vivem em precárias
condições e dependem dos repasses dos fundos do governo federal e estadual.
Parauapebas é o maior exemplo da falta de investimentos em setores sociais.
Canaã dos Carajás, que está recebendo o Projeto Mineração Serra do Sossego da CVRD,
também deposita suas esperanças nos royalties e nas arrecadações advindas das empresas que
virão para o município.
Segundo o economista Armando Mendes,
a questão da Vale do Rio Doce que está mexendo tardiamente com os brios dos paraenses, principalmente os das nossas elites políticas, deve ser avaliada com sensatez e sabedoria, para evitar ações que precipitadas e indesejáveis que possam vir a prejudicar ainda mais a dinâmica do desenvolvimento do Estado do Pará...Instalado o projeto, nunca houve interesse dos paraenses de aprofundar a questão e, governo após governo, o projeto ficou como originalmente determinou a elite dominante, sem reação e nenhuma contestação das nossas lideranças políticas regionais, satisfeitas com a montagem e grandeza do projeto e os recursos que os royalties
183
proporcionariam para engordar o “caixa” do governo. Inebriados com a magnitude do projeto, nossas lideranças não tiveram a curiosidade de saber se tão majestoso investimento contribuiria, na verdade, para desenvolver o Estado, ou se iria repetir, em grau muito mais elevado, os mesmos erros de avaliação do passado com a borracha, que apesar de ser genuinamente amazônida, enriqueceram outros povos e deixou a Amazônia estagnada (O Liberal, março de 2003, painel, p. 2).
Mendes tem razão, as relações de poder que comandam as ações políticas
dos paraenses quase sempre foram desfavoráveis ao Estado do Pará, muito embora tenhamos
representantes nos poderes do Estado Brasileiro. A Amazônia passou por experiências
desastrosas e pouco se tomou como lição, ocorre uma continuação na repetição de erros do
passado quando se trata de falta de planejamento, para o Pará e para toda a Amazônia.
Destarte, a maior experiência que se venha a tirar das relações da empresa
com o Estado é que precisamos evoluir em termos de proposta e de viabilidade econômica,
financeira e social. É necessário conhecermos os recursos naturais que podem contribuir para
o desenvolvimento da sociedade paraense.
O Estado precisa ter um projeto de desenvolvimento não setorizado, mas
que atinja o seu território como um todo. Só teríamos condições de conceber as riquezas e dar
condições às sociedades locais para participarem do desenvolvimento de cada localidade se
viabilizássemos as condições político-econômico-sociais das sociedades locais.
A questão do pólo siderúrgico que se instala no Maranhão parece ser coisa
do passado para o Estado do Pará. O desenvolvimento paraense poderia ser pensado em
termos do presente, e para o futuro é indispensável criar condições para viabilizar a parceria
da CVRD, sem que esta seja o maior interlocutor dos recursos do Pará, o Estado que tem que
ter nos recursos naturais seu poder de barganha.
“Os donos do poder” (FAORO, 2000) são hoje aqueles que recebem
influência dos dirigentes da CVRD, e o Estado um mero coadjuvante na economia dos
recursos minerais, aquele Estado que legitimou a ação da companhia que hoje ele contesta. E
atrelado ao “poder dos donos” (BURSZTYN, 1984), sem uma proposta de desenvolvimento
184
que envolva a companhia num compromisso de planejamento, a partir dos recursos que dele
ela extrai, o Estado faz com a CVRD uma parceria para se atingir o desenvolvimento das
sociedades atingidas pelos seus projetos.
Enquanto a elite paraense manifesta seu descontentamento com a empresa,
para o Maranhão ela dirige todo o seu potencial de parque industrial, não só na instalação do
pólo siderúrgico, mas na construção do píer de seu porto no Maranhão, para aumentar a
capacidade dos navios. Segundo a ex-governadora do Maranhão, Roseana Sarney, “o novo
investimento reafirma a confiança da Companhia Vale do Rio Doce no Maranhão”. Segundo
a matéria do jornal O Liberal, quando entrar em funcionamento em 2004, a capacidade do
terminal portuário aumentará de 56 milhões de toneladas para 85 milhões a capacidade do
porto de Ponta da Madeira no Maranhão, com isso estima-se que a quantidade de navios
chegue a 50 por mês.
Segundo jornal O Liberal,
de acordo com a Companhia Vale do Rio Doce, a construção do novo píer é parte de um plano de expansão da capacidade portuária para atender à demanda de movimentação de granéis sólidos, como minério de ferro, manganês, ferro gusa, soja, e ainda a exportação de pelotas. O Píer III terá no início 364 metros de comprimento e 18 metros de largura, com capacidade de carregamento de oito mil toneladas/hora e calado de 21 metros. A segunda fase compreende o complemento das obras civis e ampliação do cais para 580 metros (O Liberal, fevereiro de 2003, painel p.02).
A CVRD prepara-se para ampliar sua exploração mineral no Pará, e prepara
sua infra-estrutura para receber essa produção no Maranhão. A elite paraense diz que em troca
recebe a migração que passa a ocupar o território do sul/sudeste paraense, e o minério fica no
Maranhão. A contradição está na crença de que a economia do minério irá trazer sozinha o
desenvolvimento para os dois Estados. Nesses anos todos em que a companhia vem
explorando o minério na região amazônica pouca coisa mudou, em se tratando da melhoria
das condições e qualidade de vida daqueles municípios que estão sob a área de influência da
empresa nos dois Estados.
185
Outro fato importante é que a preparação da segunda fase do porto de Itaqui
e Madeira no Maranhão proporcionará à CVRD receber a atracação do maior graneleiro do
mundo, “Berge Stahl”. Hoje o único porto que recebe com capacidade para até 360 mil
toneladas de carga é o de Rotterdã, na Holanda.
Enquanto o Pará vai à imprensa e denuncia, o Maranhão prepara seu espaço
e a infra-estrutura de seu território abrindo possibilidades de novos empreendimentos da
CVRD. Nesse ínterim, parece que a questão locacional favorece as proximidades do Porto,
que recebe cada vez mais infra-estrutura e se moderniza para novos tempos de globalização e
de inserção da empresa no mercado internacional.
Segundo Lúcio Flávio Pinto,
incapaz de detectar as situações no momento mesmo em que elas são criadas e de ter um domínio da extensão dos processos que aqui emergem na figura dos “grandes projetos”, usando, por isso, uma agenda desatualizada, a Amazônia talvez só venha a se dar conta de sua história cotidiana, no que ele tem de contemporânea, quando o tempo, como o trem simbólico, sempre usado para definí-lo, tiver passado (Pinto, 1997: p.84).
Há alguns anos a afirmação de Lúcio Flávio estava relacionada à pergunta
que aqueles que comandam a economia e os rumos do desenvolvimento no Estado do Pará
não queriam responder. Hoje ela é uma certeza; a realidade com os processos de poder que
vieram junto com os interesses de um grande grupo de mineração, a Companhia Vale do Rio
Doce, aos poucos suplantou o poder do Estado paraense e até mesmo o nacional. A CVRD
multifacetou e criou sua hegemonia no território que ela domina em Carajás, direcionando
seus interesses muito diferentes dos interesses do Estado do Pará.
Uma outra questão relevante está relacionada ao papel das siderúrgicas que
atuam em Marabá. Depois de decidido o pólo siderúrgico para o Maranhão, a Companhia
186
Vale do Rio Doce anunciou a join-venture26 com uma empresa norte-americana Nucor. A
CVRD deverá vender minério de ferro para a empresa norte-americana, que o transformará
em ferro-gusa e o exportará para sua matriz nos Estados Unidos, onde será transformado em
aço. Pelo projeto será construída uma usina em Marabá. Segundo o presidente da ASICA,
Nacib Hetti:
as treze siderúrgicas que fazem parte da ASICA27 vendem 70% do ferro-gusa fabricado para a Nucor, que importa tudo para sua matriz nos Estados Unidos. Com esta associação, a Vale e a Nucor produzirão todo ferro-gusa, retirando a maior parte do nosso mercado e iniciando a criação de um outro monopólio (O Liberal, agosto de 2003, painel, p.06).
Segundo o diretor comercial da área de minério de ferro da Companhia Vale
do Rio Doce, Nelson Silva,
esta notícia é velha e isso já foi anunciado há seis meses. No entanto, a nova empresa não destruirá o setor porque vai produzir 350 mil toneladas de ferro-gusa por ano. Lá em Carajás, as demais empresas produzem dois milhões de toneladas por ano. O que vai mudar é algo muito simples: surgirá a 14ª siderúrgica, porém, que não representará nenhuma ameaça a ninguém. As trezes siderúrgicas que fazem parte da ASICA compram, por ano, da própria Vale, 3,5 milhões de toneladas de ferro. Querer acabar com esse mercado é dar um tiro no pé (O Liberal, agosto de 2003, painel p.06).
Estudos realizados pelo Conselho Regional de Engenharia e Arquitetura
(CREA-PA) indicam a possibilidade de construção de mais usinas no Pará, uma de placas de
ferro e outra para produção de blocos, tarugos e aços longos. Segundo o geólogo Evaldo Pinto
da Silva, “a produção do Maranhão está estimada em 3,7 milhões de toneladas/ano, enquanto
a demanda mundial de placas hoje é de 26 milhões de toneladas/ano e a previsão para o ano
de 2010 é de 35,5 milhões de toneladas/ano” (O Liberal, agosto de 2003, painel, p. 07).
Outro grande empreendimento que vem sendo realizado no Pará é o projeto
MSS da CVRD. Segundo Raphael Bloise da CVRD,
26 Segundo Paulo Sandroni (1999) “expressão em inglês que significa “união de risco” e designa o processo mediante o qual pessoas, ou, o que é mais freqüente, empresas se associam para o desenvolvimento e execução de um projeto específico no âmbito econômico e/ou financeiro” (SANDRONI, 1999. p. 315). 27 Associação das Siderúrgicas de Carajás (ASICA) congrega treze siderúrgicas: 8 estão no Estado do Maranhão e 5 no Estado do Pará.
187
O Sossego é o primeiro projeto dos muitos que estão nos planos de implantação da Companhia Vale do Rio Doce e a previsão de entrada de operação é para o final de março de 2004. O projeto tem duração de 20 anos, conforme as pesquisas que até então efetuamos. Entretanto, a variação de preço, novas pesquisas ou outros fatores, podem fazer a perspectiva aumentar. A produção será 150 mil toneladas de cobre metal ano, além de um subproduto que é o ouro. O ouro é encontrado na mina agregado ao minério de cobre, na ordem de 0,03 grama por tonelada de cobre (Correio do Pará, maio de 2003, p.07).
Além da MSS, Canaã dos Carajás terá o projeto Alvo 188. Outros projetos
de cobre seguirão: Cristalino em Curionópolis, Igarapé Bahia e Alemão em Parauapebas e
Salobo em Marabá completam o projeto cobre da CVRD no Pará. Em 2007 estarão todos
funcionando com uma produção estimada de 768 mil toneladas de concentrado de cobre por
ano e 261 mil toneladas de cobre catodo, com isso o Brasil deixará de ser depende da
importação do minério. A CVRD será uma das maiores empresas produtoras de cobre, e o
Brasil um dos cinco maiores produtores do minério.
Segundo o Relatório Social da CVRD,
para Carajás foi destinado cerca de 74% do orçamento de 2002, contemplando as atividades de cobre, níquel, ouro, metais do grupo da platina e manganês. Para o restante do Brasil foram desembolsados US$ 10,6 milhões. No estado do Pará, excluindo-se Carajás, focou-se em caulim - na bacia do Rio Capim - e bauxita - na região de Paragominas. O programa de exploração para cobre incluiu os estados do Ceará, Piauí e Pernambuco. Na pesquisa do ouro, priorizou-se os estados de Mato Grosso e Goiás. Para o níquel, o programa abrangeu alguns estados das regiões Nordeste e Sudeste. (Relatório Social da CVRD 2002).
Grande parte dos investimentos a CVRD destinou para Carajás, mas pouco
está relacionada à verticalização da mineração no Pará. O minério continua saindo quase que
in natura, sendo agregado pouco valor ao produto. Com isso o Estado deixa de arrecadar, e a
sociedade local acaba não sendo beneficiada pelos investimentos realizados pela companhia
conforme deveria ser.
Todos os investimentos que foram feitos pela companhia são importantes,
não podemos negar sua contribuição, muito embora essa contribuição só agora seja
questionada, ou seja, só agora aqueles que comandam a vida política do Estado perceberam
188
que não bastam somente esses projetos sociais28, tem que haver muito mais para gerar o efeito
multiplicador na região de Carajás e assim beneficiar a sociedade local.
Desde que saiu o primeiro carregamento de minério de ferro do território
paraense, essa região mudou completamente suas relações econômicas com a empresa e seus
diferentes atores sociais que estão presentes no sudeste paraense. Atraídos pelos projetos,
migrantes, empresas e empresários vieram em busca dos investimentos que a CVRD estava
fazendo em Carajás.
A CVRD montou sua base logística em Carajás, em São Luís e em Belém, a
Docegeo e uma base administrativa. Depois da sua privatização a empresa desativou quase
tudo na capital paraense. Aos poucos a CVRD foi transferindo todas as suas bases de Belém
para São Luís, deixando apenas um de seus funcionários, o diretor de marketing David Leal,
num pequeno escritório. O desmonte realizado pela empresa na capital paraense era
irreversível, a empresa não tinha mais nenhuma razão para continuar em Belém, sua ligação
permanecia apenas com seus projetos que estão localizados nos municípios paraenses.
Segundo o ex-deputado estadual Oswaldo Mello,
aqui em Belém já funcionou uma unidade administrativa da Fundação Vale do Rio Doce, que em determinada época chegou a abrigar cerca de 40 funcionários. Pois bem, essa unidade foi desativada, os funcionários demitidos e suas atribuições transferidas para a unidade com isso fortalecida – instalada em São Luís do Maranhão. Sediado em Belém, o distrito Amazônia da Docegeo, empresa responsável pelas mais importantes descobertas minerais ocorridas até hoje em território paraense, chegou a ter perto de 1.300 funcionários, entre geólogos, pesquisadores, técnicos de diversas áreas e pessoal de apoio administrativo. Pois bem a base local da Docegeo – a exemplo dos demais distritos administrativo – acabou sendo extinta, e da empresa sobrou apenas um núcleo central, sediado próximo a Belo Horizonte. Alguns poucos geólogos foram transferidos para Carajás, mas o restante do pessoal foi sumariamente demitido. Daqui não se salvou nem o laboratório, um dos mais sofisticados do país em ensaios geológicos (O Liberal, março de 1999. Painel, p. 4).
28 Não temos os valores que são investidos em projeto sociais no Pará, mas certamente são pouco representativos no conjunto do lucro da CVRD. Na sua maioria, são projetos paliativos, que não resolvem os problemas sociais.
189
Quando a elite paraense se deu conta, a CVRD apenas continuava no Pará
em razão de seus projetos, pois as minas não se deslocam de lugar. A CVRD aos poucos
também está indo embora e leva consigo a maior riqueza do subsolo paraense, seus minérios.
Através de seu acelerado volume de exploração e tecnologia, aos poucos a empresa carrega
para o exterior riquezas das jazidas que a natureza formou durante um longo período
geológico. Como já ressaltou Stephen Bunker (1985), o que mudará nessas economias
extrativistas será a aceleração do ritmo de exploração, como se pode visualizar na falta de
verticalização da produção de minérios em Carajás.
Segundo esse autor:
Há uma distinção entre “economias de produção” e “economias extrativas” de recursos naturais. Estas últimas, típicas de sistemas econômicos como o amazônico, envolvem a exportação de produtos com baixa incorporação de trabalho e de capital fixo ao valor. As diferenças entre o dinamismo interno dos modos de extração e dos modos de produção criam uma troca desigual, não somente em termos de valor de trabalho incorporado na produção, mas também através da apropriação direta, principalmente de recursos não-renováveis, sujeitos ao rápido esgotamento. Nesse contexto, o subdesenvolvimento é a materialização, no tempo e no espaço, de um avanço na degeneração de processos físicos e sociais (BUNKER apud COELHO, 1997, p. 53-54).
Embora ocorra um aumento nas exportações do Pará, esse crescimento
econômico não vem acompanhado pela modernização da indústria, nem pela ressonância
econômica nos municípios, traduzidos em qualidade de vida para suas populações.
Nada garante que o Pará, cada vez mais um Estado Minerador, possua e
tenha como base somente esse tipo de economia para seu desenvolvimento. Torna-se
necessário criar estratégias de desenvolvimento em outras escalas, como por exemplo
aproveitar o potencial agrícola do Estado.
A indústria que permanece em Carajás, seja ela da CVRD, sejam suas
associadas, bem como as que prestam serviço ou são parceiras da companhia, não têm
apresentado significativos avanços na criação de pólos de desenvolvimento (que não deram
190
certo na região) nem acarretado benefícios à sociedade local. Pelo contrário, em se tratando
das guseiras, a floresta da região corre risco de total desaparecimento, pois não ocorre
reflorestamento para se obter o carvão vegetal. Muitas vezes são trabalhadores rurais que em
seus lotes utilizam a economia do carvão e vendem para guserias de Marabá, colocando em
risco seu próprio futuro. É comum passar pela Transamazônica e entrar em um dos diversos
ramais que levam a assentamentos rurais e comunidades que associam a agricultura à prática
de comercialização do carvão com as guserias, sem qualquer projeto de reflorestamento.
Nesse sentido, a industrialização acabou fazendo na economia capitalista
uma verdadeira mudança de valores, pois a industrialização virou sinônimo de
desenvolvimento. Segundo Altvater (1995), o desenvolvimento é contrário ao meio ambiente,
pois transforma numa desordem aquilo que a natureza levou milhões e milhões de anos para
deixar no estado em que se encontra hoje. O tempo da natureza e do capital são incompatíveis
nesse caso.
Assim a CVRD, ao se apropriar das diversas jazidas que explora, coloca em
risco o desenvolvimento do Estado do Pará. A matéria-prima necessita ser beneficiada senão
há agregação de valor, e há outras perdas além das econômicas. Por outro lado, segundo
Maria Célia Nunes Coelho,
em decorrência de sua ainda reduzida atuação regional, a CVRD vem sendo pressionada a ampliar sua participação no desenvolvimento local/regional. À CVRD interessa participar da elaboração de planos junto ao governo estadual que lhe possibilitem aumentar o sucesso de seus empreendimentos locais (COELHO, 1997, p.76).
Suas relações com Estado e municípios foram mudando, a partir de sua
privatização. Embora tenha interesse em manter sua imagem de companhia que tem
responsabilidade e quer manter cordialidade com quem negocia, a empresa radicalmente
mudou seu comportamento em relação às suas prioridades para diminuir custos e aumentar
seus lucros, e de certa forma ocorreu uma omissão dos representes do poder público paraense.
191
A CVRD desconsiderou as manifestações que os paraenses fizeram e vêm fazendo contra as
decisões que ela vem tomando agora diferentemente da época quando 51% de suas ações
pertenciam ao governo brasileiro.
Não foi só a privatização da empresa que acelerou esse processo. Embora
seja o fator primordial, as flutuações da economia mundial junto com a busca de novas fontes
energéticas no planeta aceleram a viabilização dos interesses da CVRD. Também as
prioridades da economia globalizada, na busca de cobre, ouro, manganês e mais ferro,
favoreciam certos investimentos em capital estrangeiro na Amazônia. Não se pode
responsabilizar a CVRD pela gestão municipal, mas pode-se cobrar dela e do próprio Estado
do Pará parcerias efetivas que viabilizem no município, não só a economia extrativista mas o
desenvolvimento de sua sociedade local.
Nesse sentido segundo Oswaldo Mello,
no Estado que contribui para seu enorme faturamento e lhe garante lucros fantásticos – no ano passado foram mais de US$ 1 bilhão – a Vale deixa apenas buracos e nenhum beneficio. Os empregos para os profissionais locais são muito poucos e limitados quase que exclusivamente aos serviços gerais, que têm os mais baixos padrões de remuneração. A empresa, que no passado recolhia aos cofres estaduais em média R$ 7 milhões por mês em impostos, hoje recolhe em torno de R$ 300 mil, beneficiada que foi pela Lei Kandir, que desonerou de impostos as exportações (O Liberal, março de 1999. Painel, p. 4).
A Lei Kandir (de setembro de 1996) impactou significativamente a
economia do Pará no que diz respeito às exportações, diminuindo as contribuições que a
CVRD depositava todo mês para o Estado. A implantação dessa lei trouxe um conjunto de
medidas que não só oneraram a economia do Estado, mas também aumentaram as intenções
da companhia, em parceria com suas associadas, de instalar novos projetos de exportações no
território paraense e de beneficiamento no Maranhão, com destino ao mercado internacional,
como no caso das placas de aço para o mercado Chinês. Alguns defendem que esses
192
incentivos de que a CVRD dispõe tornam a empresa também competitiva no mercado
globalizado.
Segundo Maria Célia Nunes Coelho,
a inclusão do Imposto Único Sobre Minerais/IUM no imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços/ICMS e, posteriormente a Lei complementar 087, de setembro de 1996, acarretaram perdas na arrecadação do ICMS sobre os recursos extraídos do subsolo, aumentando-lhes a dependência da União, suas insatisfações e conflitos com grandes empresas mineradoras. Dessa forma, o minério continua a sair dos Estados sem provocar a tão propalada integração vertical e sem instrumentos de política que levem à geração dos efeitos fiscais que poderiam conferir capacitação financeira aos Estados de investir em áreas que fossem avaliadas como estratégicas ao seu desenvolvimento (COELHO, 2000, p.144).
De uma maneira ou de outra, não é com punição que se vai resolver o
problema da verticalização da produção mineral, que conta com várias dificuldades para ser
viabilizada no território paraense, mas com planejamento associando a economia do ferro às
demais economias do Estado e viabilizando o projeto de desenvolvimento para o Estado do
Pará, tendo na CVRD um de seus principais parceiros para novos investimentos na região
sudeste paraense e no Estado.
Outra questão a ser definida está relacionada à área sob influência da
CVRD. Falamos de área sob influência, não área de influência, pois muitos dos projetos da
CVRD extrapolam os territórios dos municípios que os abrigam influenciando outras áreas de
outros municípios.
O jornal O Liberal de março de 1998 publicou uma matéria sobre a venda da
CVRD na qual destacou que os municípios que seriam beneficiados pela venda da companhia,
através do Fundo para o Desenvolvimento Regional com Recursos da Desestatização (FDR)
em substituição ao Fundo de Desenvolvimento da CVRD, seriam treze municípios no Pará:
Parauapebas, Marabá, Curionópolis. Eldorado do Carajás, Bom Jesus do Tocantins,
193
Itupiranga, Abel Figueiredo, Nova Ipixuna, Rondon do Pará, São Domingos do Araguaia, São
João do Araguaia, Água Azul do Norte e Brejo Grande do Araguaia.
Maria Célia Nunes Coelho a esse respeito destacou que
o poder de barganha dos Estados e municípios nas negociações com a CVRD estatal foi sempre reduzido. Ás vésperas de sua privatização, por pressões dos governos estaduais, ela destinou 8% de seu lucro líquido anual à aplicação em projetos sociais nos municípios da área de sua influência. A relação da CVRD com o desenvolvimento destes municípios deixou de existir como obrigação. Como forma de compensação, foi criado o Fundo para o Desenvolvimento Regional com Recursos da Desestatização/FDR, de R$ 200,9 milhões, a ser administrado pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social/BNDES. Do valor de R$ 200,9 milhões, R$ 85 milhões são oriundos do patrimônio da estatal (o equivalente ao estoque de investimentos da CVRD no setor social) e o restante do orçamento do banco. A cada balanço anual da CVRD, uma parcela do FDR deveria ser liberada (COELHO, 2000, p. 144).
Há um questionamento em virtude de novos empreendimentos a serem
instalados pela CVRD, por exemplo Canaã dos Carajás com o Projeto Mineração Serra do
Sossego, ampliando assim a área sob influência da CVRD. Novos estudos deverão ser feitos
para definir de fato quais seriam as áreas sob influência da companhia no Pará para beneficiar
esses municípios.
Enquanto não se definir essa questão, o Estado paraense precisa elaborar
metas de desenvolvimento que contemplem a empresa como um de seus parceiros, e não a
tomem como inimiga, como querem alguns políticos, que sempre foram omissos, e quando
puderam interferir numa melhor definição do papel da companhia em território paraense nada
fizeram.
As relações de poder que definem práticas espacializadas tanto da empresa
como do poder público precisam ser revistas, a fim de se criarem condições de negociações
entre as partes envolvidas e os representantes da sociedade civil. O território assim torna-se
um campo onde atuam diferentes forças, que condicionam práticas diferenciais de atores
sociais em busca de seus anseios. Essas práticas tornam-se opressoras para outros atores
194
sociais quando eles se sentem prejudicados por elas. O campo de poder que se forma é
marcado por conflitos de interesses, nesse caso entre a companhia e representantes da
sociedade civil.
Agora como uma empresa privada, não podendo omitir-se do papel que a
consagrou com uma empresa que recebeu o aval de organismos financeiros internacionais
pelo papel que desempenhava na região, quando ainda era empresa estatal, a CVRD
apresentando-se como aquela empresa que cuida do meio ambiente, que investe em projetos
sociais e que, de uma forma ou de outra, mantém diálogo com aqueles que querem com ela
debater.
A empresa não pode ter apenas a imagem de uma companhia que cumpre
com suas obrigações financeiras sem ter nas formas de implantação de seus projetos os
benefícios para as sociedades locais o que garante respeito no mercado internacional. Deve
preocupar-se com os impactos sócio-ambientais na sua área de atuação.
Por isso, com os pagamentos dos royalties a CVRD equipou a cidade de
Parauapebas de infra-estrutura e em outros municípios fez parcerias para tratamento de água,
construção de escolas, e outros investimentos. De alguma forma, a CVRD tem participado,
muito embora a maioria desses projetos tenham como mentor a própria companhia, já que
muitos municípios deixam nas mãos da empresa o papel de elaboração e realização do
projeto.
Dessa forma, aos poucos a empresa assumiu, sem a menor pretensão, o
papel que deveria ser do Estado e do município. Antes tudo começava e terminava na CVRD,
ela decidia quem contratava e elaborava as formas pelas quais seriam realizados seus projetos
sociais que estariam em benefício dos municípios que tinha como parceiros.
O poder que a empresa aos poucos foi conquistando ultrapassou seu poderio
econômico na região. Alguns de seus funcionários ou ex-funcionários tornaram-se
195
empregados do poder público nos municípios em que a empresa atuava, e outros tantos
acabavam sendo confundidos com aqueles que tinham poder dentro do município.
O século XXI começa com os mesmos conflitos do passado, agravados pela
falta de transparência de ambas as partes, Estado e empresa, na definição de suas prioridades
no território que está sob seus domínios. As sobreposições de territórios e de domínios deixam
claros os diversos conflitos que surgem envolvendo diferentes setores da sociedade civil. A
resolução desses conflitos passa pela definição de prioridades e do grau de desenvolvimento
que cada um terá em relação ao território de seu domínio ou de sua influência, sem
desconsiderar outras partes.
Sejam eles MST, empresa de mineração, siderurgias, castanheiros, há
necessidade de uma definição clara e de uma reavaliação do uso do território em Carajás.
Como já ressaltaram Milton Santos e Maria Laura Silveira (2001), é o uso do território que
interessa. Nesse caso os recursos que estão disponíveis no território e sua utilidade respondem
a sua função social e econômica na definição do projeto de desenvolvimento da sociedade de
Carajás.
Neste caso, a ordem que faz surgir é a de um conflito de interesses quando
observamos espaços dos municípios que estão sob área de mineração em Carajás. Esses
municípios são “escolhidos” pelas empresas mineradoras para efetivarem seus projetos.
Enquanto isso outras áreas, que são potencialmente virtuais para possíveis projetos, que não
fazem parte direta do conjunto de interesses da grande empresa, ficam momentaneamente
excluídas do processo de organização econômica do território. A organização territorial que
envolve outros atores sociais, como é o caso de Carajás, acontece pela forma de conflito
envolvendo diferentes interesses e atores sociais que não estão diretamente ligados à empresa
de mineração.
196
Dessa forma, há um ponto no território no qual emanam energias em várias
direções com variáveis diferenciadas e com maior ou menor grau de poder e interferência na
organização territorial local. A existência de locais que a empresa seleciona como espaços
potenciais para sua operação gera conflitos de interesses com outros atores sociais que, direta
ou indiretamente, são afetados por esses projetos.
A organização territorial, na atualidade (2003), passa pela regulação
econômica do território em Carajás; são as práticas globalizadas de uma única empresa –
CVRD - que organiza, a partir do mercado internacional, o território econômico, os espaços
potenciais a serem palcos de projetos virtuais ou efetivamente instalados para a inserção de
Carajás num mundo econômico globalizado. A globalização, nesse aspecto, é a globalização
da economia num ponto do território, aquele que a empresa projeta e define como seu
território e o une à escala global e local, o que, por sua vez, passa por formas de governos
municipal, estadual ou federal.
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Comunicação da Vale se reúne com a imprensa local. Correio do Pará. Parauapebas, 15 a 22 nov. 2002. Região, p. 05. Conflitos atrapalham retorno de garimpeiros à Serra Pelada. Correio do Pará. Parauapebas, 27 set. a 04 out. 2002. Cidade, p.07. Coomigasp passa por reestruturação interna. Correio do Pará. Parauapebas, 01 a 05 ago. 2003. Regional, p. 10. CREA aponta viabilidade para três usinas. O Liberal. Belém, 5 ago. 2003. Painel, 07. Curió é reeleito para diretoria da AMAT. Correio do Pará. Parauapebas, 31 jan. a 04 fev. 2003. Diversos, p. 02. Curió: Curionópolis tem um futuro brilhante a ser construído. Curionópolis. Curionópolis. 2003. Entrevista, p.12. Diretor da Vale afirma que empresa está disposta a negociar com o governo. Correio do Tocantins . Marabá, 2003. Cad 02, p. 5. Educação é prioridade em Canaã dos Carajás. Correio do Pará. Parauapebas, 25 a 29 abr. 2003. Região, p. 08. Eleição da Coomigasp agita Serra Pelada. Opinião. Marabá, 10 e 11 jul. 2003. Polícia, p. 15. ÉLERES, P. Rico de Minérios, mas pobre de coragem? O Liberal. Belém, 11 mai. 2003. Painel, p. 03. Esperança da Vale é cada vez menor para o Salobo. Correio do Tocantins. Marabá, 20 a 22 de jan. 1998. Cad. 3, p.03. Farras dos municípios vai acabar. O Liberal. Belém, 28 mai. 2000. Painel, p.06-07. Fazenda Macaxeira vive produção cacaueira. Correio do Pará. Parauapebas, 25 a 28 de mar. 2003. Cidade, p. 07. Fluxo migratório instalado em Canaã dos Carajás. Correio do Pará. Parauapebas, 14 a 18 de mar. 2003. Região, p. 08. Gazeta Mercantil, 29 de abril de 2002. Garimpeiro faz esculturas para sobreviver em Serra Pelada. Correio do Pará. Parauapebas, 01 a 05 ago. 2003. Regional, p. 05. Garimpeiros voltam a Marabá para discutir retorno a Serra Pelada. Correio do Tocantins. Marabá, 15 a 18 de mar. 2002. Cad. 3, p.07. Gestor anuncia projetos da Vale para desenvolver Curionópolis. Correio do Tocantins. Marabá, 15 a 18 de mar. 2002. Cad. 3, p.17.
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Governo exige compensação da Vale. O Liberal. Belém, 17 ago. 2003. Painel, p. 06. Governo fixa prazo para a Vale dar resposta. O Liberal. Belém, 1 ago. 2003. Painel, p.06. Impasse entre Vale e Gavião continua. O Liberal. Belém, 29 jun. 2003. Atualidades, p 11. Laticínio de Eldorado vai gerar 300 empregos. Correio do Pará. Parauapebas, 31 de jan. a 04 de fev. 2003. Cidade, p.08. Leitor comenta a desordem em Canaã dos Carajás. O Carajás. Parauapebas, 10 a 25 maio. 2002. p.07. Maranhão já comemora a implantação do pólo siderúrgico. Opinião. Marabá, 15 e 16 jul. 2003. Cidade, p.03. MELLO, O. Quem pode acreditar na Vale? O Liberal. Belém, 14 mar. 1999. Painel, p.04. MELO, O. A Vale não vale para o Pará. O Liberal. Belém, 09 mar. 2003. Painel, p.02. METABASE fecha o melhor acordo em 10 anos. Correio do Pará. Parauapebas, 12 a 15 ago. 2003. Cidade, p.05. Mina de Cobre terá US$ 50 milhões. O Liberal. Belém, 7 abr. 1996. Painel, p. 01. Minérios da Amazônia vão parar na Sapucaí. O Liberal. Belém, 2 maio. 2003. Atualidades, p. 06. MLT avança pacificamente. O Liberal. Belém, 14 mar. 1998. Painel, p.06. MONTEIRO, B. As terras da Vale do Rio Doce. O Liberal. Belém, 17 ago. 2003. Painel, p.02. MSS implanta parceria com a prefeitura de Canaã. Correio do Pará. Parauapebas, 30 maio. 03 jun. 2003. Região, p. 08. NOGUEIRA, M. A nós, o ônus. Aos outros, o bônus. Correio do Pará. Parauapebas, 07 a 11 mar. 2003. Painel, p.03. NOGUEIRA, M. Ainda temos cartas na manga. Correio do Pará. Parauapebas, 21 a 25 mar. 2003. Painel, p.03. NOGUEIRA, M. Chega de perder. Correio do Pará. Parauapebas, 28 fev. a 04 mar. 2003. Painel, p.03. NOGUEIRA, M. Não precisamos de mais dinheiro, precisamos de mais empregos. Correio do Pará. Parauapebas, 01 a 04 abr. 2003. Painel, p. 03. NOGUEIRA, M. O bônus para o Maranhão, o ônus para o Pará. Correio do Pará. Parauapebas, 29 jul. a 01 ago. 2003. Painel, p.03.
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NOGUEIRA, M. O quarteto mágico da região de Carajás. Correio do Pará. Parauapebas, 31 jan. a 04 fev. 2003. Painel, p.03. O fim da farsa. Revisa Isto É. 27 de setembro de 2000. O maior julgamento dos últimos tempos será em Marabá. Correio do Pará. Parauapebas, 10 a 20 nov. 1998. Cidade, p.10. OZIEL alerta contra isolamento do Pará. O Liberal. Belém, 01 jun. 2003. Painel, p. 04. Pará começa a discutir o futuro Estado de Carajás. Carajás. Marabá, 08 ago. 1995. Ano I n.01. Parlamentares frustram Curionópolis e prometem apoio aos garimpeiros. Correio do Tocantins. Marabá, 19 a 25 jul. 1996. Cad. 3, p.08. PASSARINHO, J. Carajás, da descoberta a hoje. O Liberal. Belém, 23 fev. 2003. Cidade, p.02. PINTO, Lúcio Flávio. Pirotecnia do cobre. Jornal Pessoal. Belém, nov. 1998. n.199. ano XII. p.01-02. PINTO, Lúcio Flávio. A boa causa das eclusas. Jornal Pessoal. Belém, jul. 2003. n.305. ano XVI. p.03. PINTO, Lúcio Flávio. As lições de 30 anos. Jornal Pessoal. Belém, jul. 1997. n.167. ano X. p.01-02. PINTO, Lúcio Flávio. Caso Eldorado: inocência terá um preço muito alto. Jornal Pessoal. Belém, set. 1997. n.171. ano X. p.07. PINTO, Lúcio Flávio. CVRD não dá conta da demanda por ferro. Jornal Pessoal. Belém, jul. 2003. n.305. ano XVI. p.11. PINTO, Lúcio Flávio. Gusa em brasa. Opinião. Marabá, 12 e 13 jul. 2003. Ponto de Vista, p. 06. PINTO, Lúcio Flávio. Hidrelétricas: O rendimento do Caos. Jornal Pessoal. Belém, set. 1989. n.48. ano III. p. 01. PINTO, Lúcio Flávio. Mineração: um retorno desigual. Jornal Pessoal. Belém, maio 1989. n.41. ano III. p.04. PINTO, Lúcio Flávio. Minérios: tudo só para eles? Jornal Pessoal. Belém, set. 1989. n.47. ano III. p.01. PINTO, Lúcio Flávio. O metal vai para a Bahia. Jornal Pessoal. Belém, set. 1997. n.171. ano X. p.01-02. PINTO, Lúcio Flávio. O publico vai Ganhar? Jornal Pessoal. Belém, ago. 2003. n.306. ano XVI. p.01
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PINTO, Lúcio Flávio. Pará: sem voz. Jornal Pessoal. Belém, jul. 2003. n.305. ano XVI. p.01-02. PINTO, Lúcio Flávio. Placas vão para São Luís: fim do sonho siderúrgico? Jornal Pessoal. Belém, ago. 2003. n.306. ano XVI. p. 4-5. PINTO, Lúcio Flávio. Serra Pelada acabou. Jornal Pessoal. Belém, mar. 1996. n 135. ano IX. p.1-2. Pólo siderúrgico vai mesmo para São Luís do Maranhão. Correio do Pará. Parauapebas, 01 a 05 ago. 2003. Estado, p.07. População de Parauapebas insatisfeita protesta contra a Vale. Correio do Pará. Parauapebas, 25 a 28 fev. 2007. Cidade, p.07. Porto maior embarcará riquezas do Pará. O Liberal. Belém, 23 fev. 2003. Painel, p.02. Prefeito diz que curso é o embrião da universidade do sudeste do Pará. Correio do Tocantins. Marabá. 2003. Cad 02 p. 5. Prefeitura de Canaã dos Carajás inaugura obras. Correio do Pará. Parauapebas, 07 a 11 fev. 2003. Região, p. 08. Prefeitura de Curionópolis e Vale distribuem cestas básicas. Correio do Pará. Parauapebas, 18 a 25 out. 2002.Curionópolis, p. 08. Presidente da Coomigasp é destituído sob acusação de irregularidades. Correio do Pará. Parauapebas, 25 out. a 01 nov. 2002. Região, p 10. Projeto Sossego faz da CVRD uma exportadora de cobre. Correio do Pará. Parauapebas, 06 a 09 maio. 2003. Cidade, p.06. Projeto Sossego vai produzir 150 mil toneladas/ano de cobre. Correio do Pará. Parauapebas, 06 a 09 maio. 2003. Cidade, p.12. Raphael Bloise: um apaixonado pelo Projeto Sossego. Correio do Pará. Parauapebas, 06 a 09 maio. 2003. Cidade, p.07. Raphael Bloise: um apaixonado pelo Projeto Sossego. Correio do Pará. Parauapebas, 23 a 27 maio. 2003. Cidade, p. 06. RIBEIRO, L. C. P. OS pioneiros de Carajás e o p-322: dezoito anos depois. Correio do Pará. Parauapebas, 27 a 30 maio. 2003. Diversos, p.02. Royalties não compensam o Pará pela exploração de seus minérios. O Liberal. Belém, 23 fev. 2003. Cidade, p.02. Sargentos são absolvidos no Júri de Eldorado do Carajás. Correio do Pará. Parauapebas, 31 maio a 07 jun. 2002. Polícia, p.11.
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Sarney diz que profetizou siderúrgica no MA em 1973. A Notícia. Parauapebas, 08 a 14 ago. 2003. p.02. Senador vai à tribuna e faz duras críticas contra a Vale. Correio do Tocantins. Marabá, 19 a 25 jul. 1996. Cad. 3, p.09. Senadora Ana Júlia visita Parauapebas e região. Correio do Pará. Parauapebas, 01 a 04 abr. 2003. Cidade, p. 07. Sessão inaugural debate implantação de pólo siderúrgico. Correio do Pará. Parauapebas, 21 a 25 fev. 2003. Cidade, p.06. Siderúrgicas temem joint-venture da Vale. O Liberal. Belém, 12 ago. 20003. Painel, p.06. SIQUEIRA, F. Débitos dos royalties vão a R$ 226 mi. O Liberal. Belém, 17 ago. 2003. Painel, p.02. SIQUEIRA, F. DNPM aponta: Vale deve R$ 151 milhões à União. O Liberal. Belém, 2 mar. 2003. Painel, p.01. SIQUEIRA, F. FLONA de Carajás é alvo de desconfianças. O Liberal. Belém, 8 jun. 2003. Painel, p 02. SIQUEIRA, F. Maranhão na dianteira para ganhar pólo. Belém: Jornal O Liberal 11 de maio de 2003. Painel p.03. SIQUEIRA, F. Minério do Pará é brilho do Maranhão. O Liberal. Belém, 23 fev. 2003. Painel, p.01-02. SIQUEIRA, F. novos municípios multiplicam a pobreza. O Liberal. Belém, 17 ago. 1997. Painel, p. 4-5. SIQUEIRA, F. Província de Carajás se torna feudo da Vale. O Liberal. Belém, 08 jun. 2003. Painel, p 01. SIQUEIRA, F. Questão siderúrgica não é palanque, diz Jatene. O Liberal. Belém, 09 mar. 2003. Painel, p.02. SIQUEIRA, F. Vale ficou cinco anos sem pagar taxa de pesquisa. O Liberal. Belém, 17 ago. 2003. Painel, p.01. SOARES, A. A Vale e o Pará.O Liberal. Belém, 09 mar. 2003. Painel, p.02. Tetê acha que Pará foi injustiçado pela Companhia Vale do Rio Doce. Opinião. Marabá, 07 e 08 ago. 2003. Cidade, p.05. Trabalhadores marcham em protesto à impunidade de Eldorado do Carajás. Correio do Pará. Parauapebas, 15 a 18 abr. 2003. Cidade, p.07.
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Trabalho Infantil persiste em Parauapebas. Correio do Pará. Parauapebas, 12 a 15 ago. 2003. Cidade, p.07. Trincheira no acampamento. O Liberal. Belém, 15 mar. 1998. Atualidades, p. 08. Um projeto fundamental para o Brasil. Correio do Pará. Parauapebas, 06 a 09 maio. 2003. Cidade, p.06. Vale antecipa investimentos para expansão de Carajás. Diário do Pará. Belém, 15 agos. 2003. Mercantil, p.01. Vale forma primeira turma de aprendizes dos projetos Cobre e Níquel. Correio do Pará. Parauapebas, 11 a 15 abr. 2003. Regional, p. 08. Vale vai reavaliar siderúrgica no Maranhão. Correio do Pará. Parauapebas, 14 a 18 mar. 2003. Cidade, p. 06. Vereadores aprovam moção de protesto contra a CVRD. Correio do Pará. Parauapebas, 28 fev. a 04 mar. 2003. Cidade, p.06. Vereadores visitam guserias de olho na Nucor. Opinião. Marabá, 08 e 09 jul. 2003. Cidade, p.06. Vice-Prefeito dá apoio a sem-terra. O Liberal. Belém, 15 mar. 1998. Atualidades, p. 11. VINAS, S. Emancipação do Tapajós tem aval de comissão no Senado. O Liberal. Belém, 28 maio. 2000. Painel, p.05. VINAS, S. Venda da Vale ajuda municípios. O Liberal. Belém, 14 mar. 1998. Painel, p.01.