UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
PROJETO A VEZ DO MESTRE
O BRINCAR NA CULTURA DO CONSUMO
Por: Evanise Feliciano Matassoli do Nascimento
Orientadora
Profª. Mary Sue
Rio de Janeiro
2005
UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
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PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
PROJETO A VEZ DO MESTRE
O BRINCAR NA CULTURA DO CONSUMO
Apresentação de monografia à Universidade
Candido Mendes como condição prévia para a
conclusão do Curso de Pós-Graduação “Lato Sensu”
em Educação Infantil e Desenvolvimento.
Por: Evanise Feliciano Matassoli do Nascimento
AGRADECIMENTOS
3
....ao meu amado esposo pelo amor e
dedicação, aos meus pais, irmãos,
parentes e sinceros amigos......
4
DEDICATÓRIA
... a todos que independente da idade sabem brincar e que nunca perdem a
doçura da infância...
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RESUMO
Este trabalho monográfico tem por objetivo refletir criticamente sobre a
concepção de infância própria da atualidade, na intenção de pensar o brincar
na sociedade vigente, impregnada pela Cultura do Consumo e contribuir para o
repensar desta prática, predominantemente infantil, como algo sério e que vem
sendo cruelmente manipulado pelo consumo, visando levar pais, educadores e
todos quanto lidam com crianças a uma releitura do Brincar na Cultura do
Consumo.
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METODOLOGIA
O que motivou-me a escolher e dedicar-me ao tema ora proposto foi a
minha vivência pessoal através de observações práticas do tema. Sentia-me
incomodada em perceber crianças sendo diariamente “engessadas” em seu
brincar. Tendo um espaço reduzido para brincar, agendas tão lotadas de
afazeres que o tempo para brincar fica sendo o menor possível, pois muitas
outras coisas são consideradas muito mais sérias do que o “simples” fato de
brincar.
A metodologia que norteou minha pesquisa foi a observação prática em
minha atividade pedagógica, minha bagagem teórica adquirida em minha
trajetória acadêmica e a pesquisa bibliográfica pertinente ao tema.
Indubitavelmente, foi um enorme aprendizado que obtive, visto que
aprendi brincando. Nesse trabalho, além dos imensos aprendizados teóricos
que muito auxiliarão em meu fazer pedagógico, ficará a lembrança de que
independente da idade não se deve perder a doçura do brincar.
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SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 08
CAPÍTULO I - A Cultura do Consumo 11
CAPÍTULO II - A infância na cultura do consumo 17
CAPÍTULO III - Brincar é coisa séria 26
CAPÍTULO IV - Brincar X Consumir 34
CONCLUSÃO 48
BIBLIOGRAFIA 50
ÍNDICE 53
FOLHA DE AVALIAÇÃO 54
8
INTRODUÇÃO
O presente trabalho monográfico tem como objetivo cumprir uma das
exigências do curso de Pós Graduação “Latu Sensu” em Educação Infantil e
Desenvolvimento da Universidade Cândido Mendes. O mesmo discuti as
relações de consumo e o brincar na infância moderna.
Não poderia ter escolhido um tema mais gostoso de tratar que esse
sobre o Brincar.
No entanto, reflito sobre um brincar nos tempos atuais, em uma
sociedade capitalista, onde impera a Cultura do Consumo e que enxerga a
infância como uma forte fase em potencial de consumo, onde vale mais pelo o
que se tem do que pelo que se é. Toda uma indústria tecnológica e inovadora
responsabiliza-se por propiciar o “brincar” a essa infância.
Veremos as transformações sociais que ocorreram até chegarmos a
atual sociedade capitalista, centrada na cultura do consumo, percebendo suas
características e suas implicações na forma de viver da sociedade, inclusive no
“simples” fato de brincar.
Percebe se, desta forma, as relações estreitas entre brincar e consumir
na cultura do consumo, onde essas palavras tornam-se indissociáveis.
É necessária uma reflexão sobre o que é brincar na atualidade. Será o
brincar uma forma de lazer e felicidade, oportunidade de desenvolvimento, de
descoberta de papéis sociais, de limites, ou será o brincar mais uma das
formas oferecidas pela cultura do consumo para se consumir?
O zelo pela tradição cultural através do brincar que pode ser
transmitido de geração a geração é um fato em vias de extinção?
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Será que só se pode, na atualidade, tratar o brincar relacionando-o
como objetos de consumo, ou será que é possível resgatar as brincadeiras de
rua, de roda, de pique, e tantas outras?
A inovação tecnológica, as grandes descobertas, a globalização, que
tem a ver com a nova ordem mundial do brincar?
Com a industrialização do brinquedo, resolveu-se também industrializar
o brincar, onde percebeu-se a subordinação do brincar ao dinheiro e,
consequëntemente, ao consumo.
Torna-se urgente a necessidade de pais e educadores discutirem e
refletirem a questão do brincar na cultura do consumo, visto que, o brincar está
diretamente relacionado a infância.
Em meio a tantas interrogações, o estudo da cultura do consumo é
uma eficiente arma para entendermos as nossas crianças de hoje, que
apresentam comportamentos variados, vivem em uma cultura onde o TER
promove STATUS, e compreender como relacionam-se com um fato tão
corriqueiro em seu dia-a-dia, o brincar, tão contaminado por culturas
consumistas.
O primeiro capítulo desse trabalho visa caracterizar a cultura do
consumo, seus principais conceitos e implicações para a atualidade.
No segundo capítulo, trato da infância inserida na cultura do consumo,
onde é percebida como objeto-sujeito de consumo, levando-nos a refletir como
a massificação da cultura do consumo se dá na experiência da infância,
reportando-me primeiramente a outros modelos de concepção de infância
percebidos pelos tempos.
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O terceiro capítulo vem tratar do brincar como assunto muito sério,
merecedor de atenção especial para que entendamos sua real importância,
reconhecendo que através do brincar é possível compreender e assimilar o
mundo em doses pequenas e toleráveis além de conceituar e lidar com
algumas características específicas do parceiro direto do brincar, o brinquedo.
Ouso considerar o quarto capítulo desse trabalho o seu ponto
culminante, onde, articulando a cultura do consumo e a infância nela
engendrada, com o brincar, prática presente em todo ser humano ou não,
podendo perceber sua importância e tantas indagações sobre esse tema:
BRINCAR X CONSUMIR.
Para tanto, aproveito este capítulo para articular alguns temas
importantes na compreensão do brincar engendrado na Cultura do Consumo,
sendo eles: a história cultural do brinquedo, o brinquedo e a cultura e, como
não poderia deixar de fora, os tão atuais jogos eletrônicos, presentes a todo
instante nas brincadeiras da contemporaneidade.
Concluo minha pesquisa monográfica articulando a teoria e a prática no
que refere se ao conceito e a prática no ato de brincar na atual sociedade da
cultura do consumo, procurando promover uma séria reflexão sobre o ato de
brincar, sua importância, suas possibilidades e as imposições culturais, visando
que tal tema seja relevante para a compreensão e melhor atendimento a
infância atual, principalmente, no que refere-se ao brincar, considerando-o
como ato muito sério e de vital importância para qualquer criança.
CAPÍTULO I
A CULTURA DO CONSUMO
11
Antes de tratar sobre qualquer assunto que fale da contemporaneidade,
faz-se necessário o entendimento da nova ordem social do capitalismo, onde
impera a Cultura do Consumo.
Vivemos em uma nova era do modo de produção capitalista, onde novos
conceitos são difundidos e novas tendências formam o cenário atual.
Atualmente somos fruto de um longo tempo de organização social com o
modo de produção feudal, onde, no período da Idade Média, as relações de
trabalho eram servis e os servos estavam presos a terra, sujeitos a várias
obrigações.
A sociedade feudal era estamental e composta pela nobreza, pelo clero
e pelos trabalhadores, onde a nobreza e o clero formavam a camada
dominante dos senhores feudais e a figura do rei, embora influente, não
concentrava o poder político em suas mãos.
Quem imaginaria que de técnicas tão rudimentares de produção como
as utilizadas no modo de produção feudal chegaríamos a alta tecnologia de
ponta que temos hoje?
Pelo final do século XV, esse modelo demonstra grandes mudanças. O
comércio passa a ser cada vez mais intenso e nas cidades aumenta cada vez
mais a população.
Com essas transformações, mudaram também o modo de viver, as
maneiras de fabricar produtos e as formas de relação com o dinheiro.
Havia ricos comerciantes que investiam os lucros, conceito novo, em
novas atividades. Nas cidades, novos habitat de muitas pessoas, surgiram
pequenos comércios e pequenas fábricas que produziam para vender.
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Tudo isso era muito diferente do que se via na Idade Média, em que os
feudos produziam tudo aquilo que precisavam necessariamente sem pensar
em estoque.
Era o feudalismo que ia aos poucos desaparecendo e dando lugar a um
novo sistema econômico, o Capitalismo, que traz consigo novos signos,
padrões e conceitos.
Este baseia-se no lucro, na produção cada vez maior em busca de
riquezas, transformando tudo em um negócio que deve ser lucrativo.
Novos conceitos chegam com ele, propriedade privada dos meios de
produção; sociedade dividida em classes sociais: alta (ricos), média e baixa
(pobres); produção para o mercado; produção para dar lucro ao “patrão”;
remuneração de acordo com a propriedade (em vista do lucro); entre outros.
Muitas outras transformações chegam a nós na atualidade, em pleno
século XXI, por via do modo de produção capitalista, que vem sofrendo
inúmeras mutações. Difunde-se hoje a idéia da Cultura do Consumo.
O capitalismo traz no seu bojo a Cultura do Consumo, que impregna a
sociedade de valores inerentes a ela e que implica diretamente no
comportamento social em diferentes aspectos.
Nessa relação consumista, não se consome o objeto em si a fim de
facilitar a vida, principalmente, nos tempos modernos, onde os acontecimentos
passam muito mais rápidos que os ponteiros dos relógios, como bem aborda
BAUDRILLARD ao tratar sobre a Cultura do Consumo.
BAUDRILLARD (1995), citado por JOBIM E SOUZA, diz:
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“Não se consome o objeto em si, mas o que ele representa
(conforto, status)” (p. 61)
O objeto consumido por essa cultura vale muito mais pelo o que
representa que pelo o que realmente é.
Qualquer objeto pode ser substituído por outro. O objeto assume um
lugar de signo, onde não corresponde mais a noção de necessidade-
satisfação, para assumir o papel de algo descartável, facilmente substituído por
qualquer outro que exerça a mesma função ou semelhante.
“Nessa outra forma de pensar a questão, os objetos deixam de estar
ligados a uma função ou necessidade definidas porque correspondem a
coisa, ou melhor, são meros substitutos.” (JOBIM E SOUZA,2000)
A lógica da cultura do consumo pode ser sintetizada na seguinte
expressão:
“CONSUMO, LOGO, EXISTO!!! “
Esta exclamação reforça a idéia de que para ser é preciso ter.
“ ... a ânsia do consumo encerra a obediência a uma ordem não
enunciada, mas a que, consciente ou inconsciente, todos obedecem, sob
pena de se sentirem infelizes pela ousadia da diferença”. (JOBIM E
SOUZA, 1996, p. 95)
O consumo e o cotidiano hoje são termos indissolúveis, pois o consumo,
como explica JOBIM E SOUZA (1996), se realiza a partir de um cotidiano que
se apresenta como palco privilegiado, cenário cristalizado onde se forja a
promessa dos prazeres absolutos num presente perpétuo.
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É como se nada mais houvesse além do cotidiano em que se dá um
consumir ininterrupto, onde os modismos e as últimas novidades do mercado
servem de eixos centrais que orientam os sujeitos na condução de suas vidas
cotidianas.
Uma indubitavelmente forte aliada a propagação da cultura do consumo
é a mídia, que exerce domínio sobre a difusão desses conceitos, onde o
individuo é “medido” pelos signos que incorpora. A mídia e a publicidade criam
necessidades que na verdade não temos. É na televisão, principalmente,
através do som e da imagem em movimento que a publicidade se fortalece,
ficando cada vez mais difícil a resistência aos apelos consumistas. A TV é
capaz de criar padrões, modas, signos e ainda transmitir conceitos distorcidos
à sociedade.
Não venho dizer que a televisão é em si mesma um veículo nocivo
essencialmente, é um meio de comunicação e entretenimento, no entanto, não
se deve aceitar passivamente, sem nenhuma análise critica, as suas
informações e deformações.
As dimensões da economia globalizada sobre as pessoas, promove a
extinção das individualidades num universo de consumidores, onde a “moda” é
consumir o que todos consomem, sem necessariamente precisar.
Em seu livro “A SOCIEDADE DE CONSUMO”, JEAN BAUDRILLARD,
(1995), citado por JOBIM E SOUZA esclarece que:
“O consumo, na qualidade de novo mito tribal, transformou-se na
moral do mito contemporâneo. Encaminha-se para a destruição das bases
do ser humano. È a alvura profilática de uma sociedade saturada, de uma
sociedade sem vertigem e sem história, sem outro mito além de si
mesma”. (p. 46)
15
Com todas essas transformações no decorrer das sociedades,
percebemos que a Cultura do Consumo modifica as possibilidades tanto da
criança, como do adolescente, como do adulto, oferecendo um apelo
“irresistível” de consumir bens e serviços que possuem signos que podem
diferenciar, no sentido de promover status, e homogeneizar, no sentido de
cultivar a padronização do consumo.
O consumir está presente no cotidiano de todos nós que estamos
engendrados no mercado capitalista que nos cerca de todas as formas para
que consumamos objetos significativos ou não para nós, dependendo do status
que proporcionará.
“... o consumo no capitalismo moderno depende de articulações
para atender aos desejos dos consumidores e não simplesmente às suas
necessidades, adulto e criança não consomem somente mercadorias,
consomem imagens, espaços, linguagens, modos de ser”. (PEREIRA et
alii, 1999, p. 6)
Indubitavelmente o consumo encontra-se latente em nosso cotidiano,
trazendo consigo significados, conceitos e valores específicos a essa cultura.
De posse do entendimento da cultura do consumo em que estamos inseridos,
fica bem mais fácil tratar a infância de hoje, compreendendo como seus
mecanismos de formação do EU e sua atuação social engendradas na Cultura
do Consumo.
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CAPÍTULO II
A INFÂNCIA NA CULTURA DO CONSUMO
Após caracterizar a Cultura do Consumo, pode se viabilizar o
entendimento de como se dá a infância inserida nela.
Esse capítulo aborda a infância na cultura do consumo, como é vista a
criança e como se comporta nessa realidade consumista em que vivemos.
17
Para compreender a infância contemporânea a articularmos com a
cultura do consumo que hoje vivemos, precisamos observar as diversas
mudanças ocorridas nas concepções de infância em diferentes culturas já
vividas.
A infância nem sempre foi concebida como na contemporaneidade,
diversas modificações se deram devidas a inúmeras transformações sociais
que influenciaram nas mudanças de modelo de infância onde nem sempre o
sentimento de infância esteve presente na organização das sociedades.
“A idéia de infância não existiu sempre da mesma maneira. Ao
contrário, ela apareceu com a sociedade capitalista, urbano-industrial, na
medida em que mudam a inserção e o papel social da criança na
comunidade.” (KRAMER, 1996)
NEIL POSTMAN (1999), trata da infância na Idade Média, onde relata
não haver diferenciação entre adulto e criança na sociedade da época.
As crianças nesse período eram vistas como “adultos em miniaturas”,
onde não havia concepção de especificidades infantis, não existia então, como
disserta ÁRIES (1575), o “sentimento de infância”, onde adultos e crianças são
diferentes, cada qual com peculiaridades próprias.
Da mesma forma relata SABINI (1993):
“Até o século XVII predominava o conceito da criança como um
adulto em miniatura, ou seja, acreditava-se que o raciocínio, os
sentimentos e as ações infantis possuíam os mesmos elementos
daqueles dos adultos.” (p. 22)
A criança era sempre aquela vista de cima, como um mini-adulto.
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“Elas recebiam cuidados especiais até os sete anos de idade.
Depois ingressavam na comunidade dos adultos e desenvolviam as
mesmas atividades que eles. Nas classes menos privilegiadas eles
trabalhavam no campo, vendiam seus produtos nos mercados, aprendiam
um ofício. Não lhes era dispensado nenhum tratamento especial. Ao
contrário eram alvos de todo tipo de ‘atrocidade’ por parte dos adultos.
As famílias mais prósperas também faziam pouca distinção entre a
infância e a idade adulta.” (p. 23)
As transformações sócio-econômicas decorrentes da transição do modo
de produção feudal para o capitalista já abordadas no capítulo anterior
transporta-nos para uma nova concepção de infância, o modelo burguês de
infância, onde temos a infantilização da criança, onde consideram-se
especificidades da infância em contra ponto das especificidades da idade
adulta.
O aparecimento do modelo burguês de família, a nuclear, onde pai, mãe
e filhos vivem sob o mesmo teto, conjuntamente com a industrialização e a
divisão burguesa do trabalho, vão acarretar na modificação da concepção de
infância, assumindo a identidade de um ser em desenvolvimento que precisa
de cuidados especiais.
A criança passa a ser vista como um “vir-a-ser”, um ser ainda
incompleto, aquele sempre visto de cima, um ser em formação, que ainda não
possui direitos próprios.
“A dependência da criança frente ao adulto é uma característica
social da infância que está presente, de uma forma ou de outra, nas
diversas classes sociais qualquer que seja a organização da sociedade.
Trata-se, no entanto, de um fato social e não de um fato natural.”
(KRAMER, 1995, P. 22)
19
O surgimento do sentimento de infância não se deu simplesmente pela
afeição as crianças, mas pela consciência das particularidades que a infância
tem, reconhecendo que o período da infância diferencia-se do período adulto.
Segundo KRAMER (1995);
“Sentimento de infância não significa o mesmo que afeição pelas
crianças; corresponde na verdade, à consciência da particularidade
infantil, ou seja, aquilo que distingue a criança do adulto e faz com que a
criança seja considerada como um adulto em potencial, dotada de
capacidades de desenvolvimento.” (p. 17)
A criança na sociedade capitalista é vista como alguém que precisa ser
preparada para o futuro, é o “amanhã” da sociedade.
Contudo, uma das grandes e importantes descobertas do século XVIII,
foi “a existência de um mundo próprio e autônomo da infância”, que contribuiu
para que a criança assumisse papel de destaque, aquele que é diferente do
adulto e que merece “paparicação”.
Segundo POSTMAN (1999), a infância chegou a ser considerada como
um direito inato, simplesmente como fase biológica e não cultural. No entanto,
a percepção que temos hoje de infância é de um ser histórico, que produz e
consome cultura. Como alguém que exerce influencia e é influenciado
culturalmente.
Analisando a infância contemporânea, inserida na cultura do consumo,
percebemos que tornou – se hoje alvo do mercado capitalista, sendo um
consumidor em potencial.
20
Consumir hoje esta no cotidiano de cada sujeito, tendo a criança caráter
de sujeito social assim como o adulto. Como diz MC NEAL: compram, gastam
e consomem como qualquer cliente.
O consumo não visa atender somente às necessidades do consumidor,
mas promove o atendimento de desejos, tanto de adultos como de crianças,
que consomem mais que produtos, consomem signos.
A atual concepção de infância inserida na cultura do consumo permite
que a criança seja vista como consumidor ideal, onde toda uma industria de
bens de consumo esta à sua disposição para a satisfação não só de
necessidades, mas de desejos infantis.
Segundo SOUZA (1997), a criança é o mais recente habitante desse
novo mundo do consumo, e, talvez, o mais promissor. Como já visto no
capítulo anterior, a cultura do consumo prega o consumismo desenfreado,
onde a criança apresenta todas as pré-disposições de consumidor ideal.
“... o sujeito criança apresenta todas as condições para se tornar o
consumidor ideal. A criação de um mercado consumidor dirigido
exclusivamente à criança é fenômeno recente, cujo crescimento, no
entanto, parece inexorável, principalmente no que se refere aos bens
culturais.” (p. 101)
O possuir na infância atual corresponde diretamente ao TER para então
SER, como comenta PEREIRA (1999), “a posse dos objetos, a marca
desses objetos passa a ser o critério de construção de relações sociais,
passa a ser uma forma de identidade”.
A infância na cultura do consumo busca a felicidade no fato de consumir,
baseando felicidade na posse dos bens materiais, formando uma infância
constantemente insatisfeita.
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“O mundo do consumo se oferece como terra prometida, um lugar
a que todos têm o direito e onde se é diferente sendo igual,” (PEREIRA,
et alii, p. 7)
JOEL BRÉE (1995), situa os anos 80 como a década da consolidação
do mercado infantil. Considera que esse mercado se constitui de produtos
infantis tradicionais, como brinquedos, livros e de produtos de adultos e
familiares adaptados e relacionados à infância, como laticínios, refrigerantes,
conservas, entre tantos outros produtos.
Desenvolveu-se todo um trabalho de marketing a fim de informar,
persuadir, vender e satisfazer aos clientes infantis, contando com a poderosa
aliada que é a mídia.
A criança-consumidora consome mais que produtos, consome signos,
como por exemplo, a “sandália da Barbie”, o “shampoo da Xuxa”, o “biscoito
do Seninha”, a “salsicha da Mônica”, entre inúmeros outros signos modificados
sempre pelas tendências da moda.
“Isto significa dizer que já não se consome o objeto em si mesmo,
mas o que ele representa para as pessoas que o possuem. Desta forma a
boneca Z não é apenas um brinquedo, mas assume um lugar de signo, é
desejada por crianças: tê-las significa ter status, ser admirada, respeitada
e invejada por outros.” (PEREIRA, et alii, 1999, p. 8)
A publicidade cria para as crianças necessidades que não existem, onde
desde a infância é difundida a cultura de que possuir signos implica
diretamente na aceitação no grupo e na inserção da sociedade.
“A criança é transformada pela mídia no modelo ideal de
consumidor. Se por um lado ela é considerada um ser incompleto, por
outro lado, na perspectiva de sua inserção na cultura, a criança é plena
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para o exercício do consumo (...). A industria do consumo se dirige
diretamente à criança e pretende seduzi-la com ‘novos’ objetos e signos
especialmente para ela.” (PEREIRA, et alii, p. 11)
Um exemplo simples da impregnação de signos na infância inserida na
cultura do consumo é que a criança, mesmo bem antes de ser alfabetizada,
identifica logomarcas de produtos que tenham algum significado para ela,
geralmente sendo produtos de grandes marcas comerciais, como por exemplo,
COCA-COLA, o S da SADIA, entre outros.
Em reportagem da Revista Educação, publicada em dezembro de 2000,
percebemos que a criança como consumidor em potencial pode ser claramente
percebida através das programações televisivas, por exemplo, onde uma
diversidade de programas foram criados para as crianças em seus 50 anos de
existência.
“A existência de meados anos 80, no entanto, o mercado percebeu
que as crianças eram consumidoras em potencial. Foi o início da fase em
que os programas infantis passaram a ser comandados por jovens
apresentadoras – a maioria loiras – e comprometidas em estimular
hábitos de consumo entre os ‘baixinhos’.” (REVISTA EDUCAÇÃO, 2000, p.
35)
É a época em que os programas imortalizados na memória de quem
acompanhou, como Teatrinho Troll, Teatrinho Tupi, Sítio do Pica-pau Amarelo,
Programa do Bozo, Cirquinho do Arrelia, entre outros, que privilegiam o
despertar infantil pelo gosto de histórias, o desenvolvimento do vocabulário,
exercício de memória e introspecção e aguçando curiosidade, dá vez a
programas de cunho mercantilista, como Clube da Criança, Xou da Xuxa, Xuxa
Park, Xuxa no Mundo da Imaginação, Bom dia & Cia, Pintando o Sete, Eliana &
Alegria, entre outros, que saíram da mesma fôrma.
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Todas as apresentadoras, na maioria “loirinhas”, aparecem sempre
munidas de seus diversos produtos que vão desde sandálias até CD’s,
demonstrando que a arma maior de seus programas é o consumo e não o teor
educativo que é quase, se não totalmente, inexistente.
Em reportagem publicada em 24/06/2001 no JORNAL O DIA, a repórter
Luciana Brum traz em destaque nome de “estrelas” que enriqueceram
emprestando nome e imagem a produtos, movimentando cerca de dois milhões
de reais por ano.
Entre esses seis grandes nomes, cinco destinam-se ao público infantil,
sendo eles: XUXA, ANGÉLICA, ELIANA, GUGU e a dupla SANDY E JÚNIOR.
O primeiro lugar no ranking de vendas é a dupla SANDY E JÚNIOR que
segundo a reportagem, movimenta cerca de 80 milhões por ano, sendo que 10
milhões correspondem a royalites (pagamento por cessão de imagem).
A apresentadora ELIANA, por exemplo, chegou a ter cerca de 500
produtos licenciados.
Ainda na reportagem, a Associação Brasileira de Fabricantes de
Brinquedos (Abrinq) afirma que os brinquedos são o carro-chefe dessa
indústria de produtos infantis.
“(...) a televisão hoje opera a formação de consumidores e não a de
cidadãos que eventualmente seriam consumidores.” (PACHECO, 1999, p.
45)
A revista EDUCAÇÃO (2000) trouxe ainda a discussão sobre a
estimulação da erotização infantil.
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“Além de uma evidente falta de teor educativo em seus programas,
elas passaram a ser consideradas por críticos culpadas pela erotização
das crianças, que copiam suas roupas curtas e justas.” (p. 37)
É muito comum vermos crianças em programas “infantis” vestidas como
adultos, sendo a todo instante estimuladas precocemente a sensualidade, sem
contar com os filmes, desenhos violentos que só estimulam à violência e ao
consumo desenfreado de brinquedos da moda que em nada se harmonizam
com o verdadeiro sentido de brincar.
A erotização precoce tem sido uma das grandes conseqüências de toda
uma indústria consumista destinada ao público infantil que compõe-se de uma
infinidade de produtos, principalmente com nomes de grandes “estrelas” que
estimulam o uso de roupas de “mini-adultos”, como por exemplo a grife da
apresentadora XUXA, o “Bicho-Comeu”, que apresenta sempre em suas
coleções toda uma linha de vestuário e adereços adultizados. Sem contar com
os inúmeros cosméticos que estimulam precocemente a vontade,
principalmente de meninas, de tornarem-se mulheres, o que acarreta em um
cenário de maternidade precoce e banalização do sexo.
POSTMAN (1999) diz que a TV é o mais perfeito meio de comunicação
igualitário, ultrapassando a própria linguagem oral, revelando a criança e
adultos as “alegrias” do consumo, relacionando-o ao bem-estar, ao status e ao
contentamento de que se pode comprar tudo o que se deseja.
Percebendo que a infância inserida na cultura do consumo é aquela
vista como consumidor em potencial, consumo esse que transcende o fato de
satisfazer necessidades e que alcança o ponto de promover prazer e status por
aquilo que se consome, vemos também que uma forte aliada na divulgação
desses conceitos contemporâneos é a mídia, que já descobriu o potencial da
criança-consumidora e a todo instante a convence, a persuadi e a conquista
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com seus apelos consumistas, criando padrões e estabelecendo normas de
convivência e aceitação por aquilo que se consome.
Assim as crianças que hoje convivem em salas-de-aula, em famílias,
cada qual com sua estrutura própria, são, no entanto, as crianças que hoje
convivem com a mídia, com a cultura e com o consumo em seu dia-a-dia.
Ficam então diversas interrogações, entre elas, como essa infância
munida de tais conceitos, relacionam-se com o brincar.
CAPÍTULO III
BRINCAR É COISA SÉRIA
Brincar é coisa séria! Na verdade não é na não seriedade do brincar que
se dá seriedade a ele. O que podemos perceber quando crianças se reúnem e
iniciam uma brincadeira é a alegria que demonstram, e isso costuma causar
em nós prazer e saudades de nossa infância, como bem descreveu CASIMIRO
DE ABREU em seus imortalizados versos;
“Ai que saudades que eu tenho da aurora da minha vida, da minha
infância querida que os anos não trazem mais (...)”
Pais, professores, ou seja, todos aqueles que lidam com crianças,
devem ter a compreensão que o brincar não caracteriza-se somente por ser
uma atividade agradável, mas que assume, no período da infância, uma
ocupação séria e significativa.
26
BETTELHEIM (1998), ao citar FREUD, alerta sobre a seriedade do
brincar, onde considera que “as brincadeiras das crianças deveriam ser
consideradas suas atividades mais sérias.”(p. 164)
No entanto, para a compreensão da seriedade do brincar, se faz
necessário o entendimento de sua importância, o seu real valor, entendendo
porque as crianças devem brincar e considerar seus parceiros nesse ato, os
brinquedos, compreendendo as influencias culturais sobre eles e seu valor
dentro do contexto historio –cultural.
3,1 - O BRINCAR: sua importância e seu valor
Conscientes da seriedade que envolve o ato de brincar, se faz
necessário compreender a sua significativa importância.
Um dos principais motivos para que possamos considerar o brincar
como atividade de enorme importância é quando percebemos que as
atividades lúdicas fornecem informações elementares a respeito das crianças.
Quando elas brincam, principalmente em brincadeiras livres, ou seja, sem
supervisão de adultos, elas nos dão várias pistas de seus funcionamentos,
suas emoções, a forma como interagem com seus colegas, seu desempenho
físico-motor, seu estágio de desenvolvimento, seu nível lingüístico, sua
formação moral.
No brincar a criança se desenvolve, descobre papeis sociais, seus
limites, experimenta novas possibilidades e forma um verdadeiro conceito de si
mesma.
Brincando a criança explora o mundo, faz pequenos ensaios,
compreende e assimila gradativamente suas regras e padrões, absorve esse
27
mundo em doses pequenas e toleráveis, como considera FREUD, citado por
BETTELHEIM (1998):
“A brincadeira como meio pelo qual a criança efetua suas primeiras
grandes realizações culturais e psicológicas, e através da brincadeira
expressa a si própria.” (p. 164)
Através do brincar a criança expressa como ela vê o mundo, como
gostaria que fosse, quais as suas preocupações, aflições, aspirações, de
maneira lúdica, onde por vezes, teria dificuldades de traduzir em palavras tais
sentimentos de maneira tão espontânea.
O brincar favorece o desenvolvimento físico, ao exercitar o corpo,
exercitam concomitantemente, com PAVLOV afirma (1998), “brincar é uma
alegria muscular.”
No brincar, a criança resolve de forma simbólica, problemas que não
foram resolvidos anteriormente e enfrenta, mesmo que simbolicamente,
questões do presente.
Crianças que brincam tem muito mais oportunidades de exercitarem
seus processos mentais.
O valor do brincar tem sido muito ressaltado recentemente em
documentos oficiais, onde vem sendo incluindo o brincar como forma de
aprendizagem e desenvolvimento pleno da criança.
Esses documentos, entre eles, o Estatuto da Criança e do Adolescente,
os Parâmetros Curriculares Nacionais, os Referenciais para a Educação
Infantil, entre outros, consideram as brincadeiras como principal indicador de
aprendizagem infantil, visto que através da brincadeira é desenvolvida a
28
capacidade das crianças de adotarem papéis frente a uma realidade de
maneira não-literal, transferindo e substituindo suas ações e características do
papel assumido.
Entre tantas considerações sobre a importância e o valor do brincar,
compreendemos que além de caracterizar-se por um espaço de conhecimento
do mundo, pode também proporcionar oportunidade de convívio com suas
emoções e estabelecer equilíbrio entre o desejo e a realidade, aprendendo a
modelar suas expectativas de acordo com o mundo em que vivem.
Crianças que brincam, além de crianças felizes, pelo prazer que o
brincar proporciona, adquirem maiores possibilidades de desenvolvimento não
só físico como mental.
29
3.2 - BRINQUEDOS: parceiros no brincar
Não é recente percebermos a utilização de objetos nas diferentes
brincadeiras infantis. A criança sempre encontra objetos os quais ela irá
transformar em brinquedos.
Antigamente, como existia mais espaço e menos perigo para brincar, as
brincadeiras eram caracterizadas por suas habilidades motoras, como correr,
pular, saltar.
Atualmente, com o crescimento das grandes cidades, o aumento de
veículos transitando pelas ruas e os inúmeros perigos causados pela onda de
violência que assola, principalmente os grandes centros, percebemos que as
brincadeiras livres, como correr e pular, estão quase em extinção.
Nas escolas, em nome da “ordem” e da “disciplina”, nossas crianças tem
sido cerceadas do direito e da necessidade de brincar.
Em inúmeras vezes as estruturas físicas de nossas escolas não
propiciam ambientes apropriados para o ato de brincar, onde nossas crianças
são tolidas a todo instante de brincar.
Devido a fatores como esses, relacionando-os a cultura vigente, a partir
do século XIX os brinquedos, parceiros diretos do brincar, passaram a ser
30
produzidos por industrias especializadas. Neste momento passaram a adquirir
status de objeto que valesse produzir, pois teria mercado para a venda.
Diante dessas considerações, cabe-nos refletir sobre a importância dos
parceiros da brincadeira, já que os ambientes acabam favorecendo a
brincadeira individual e com a utilização de objetos lúdicos que obedecem as
normas da sociedade vigente.
O brinquedo traduz o real para a realidade infantil, que prepara-se para
atividades adultas, como KARL GROUS, citado por BARROS afirma:
“O brinquedo é um exercício preparatório para atividades adultas.”
(p. 195)
O brinquedo proporciona o aprender, oferecendo atividades de caráter
dinâmico e desafiador.
Ainda BARROS, citando KARL GROUS diz que:
“O brinquedo corresponde a uma necessidade natural, e isso
explica a alegria que caracteriza os brinquedos infantis.” (p. 185)
O manuseio de objetos propicia a oportunidade de ações,
representações e movimentos, desafia a curiosidade de fazer e desfazer, de
criar estórias, de organizar o seu mundo e a sua mente.
Originalmente, o brinquedo vale para a criança pelo o que ele significa
para ela, como MONTESSORI, citada por RIZZO (1996) diz:
“O brinquedo vale pelo que ele significa para a criança.”(p. 22)
31
No entanto, não podemos analisar o brinquedo sem considerarmos a
cultura em que se insere.
É importante não esquecer que inicialmente o brinquedo não surgiu para
a criança brincar, foi a partir de mudanças na concepção do que é ser criança
que o brinquedo passou a ser produzido para o publico infantil.
Em outros momentos da história, não teria sentido existir brinquedos
para as crianças, visto que a vida infantil não era percebida e muito menos
suas necessidades conhecidas e menos ainda a importância do brincar.
Considerando as afirmativas anteriores, fica claro que o papel que os
valores culturais assumem para um determinado momento histórico e como
estas questões irão refletir em outros âmbitos, influencia em muito a vida e os
costumes das pessoas, inclusive da criança e a sua realidade lúdica.
BROUGÈRE (1997) definindo cultura como o “conjunto de
significações produzidas pelo homem” (p. 8), coloca o brinquedo como um
objeto que também pode ajudar a decifrar costumes e valores de determinada
época.
Desta forma, o brinquedo assume um forte valor cultural, pois é na
brincadeira que a criança irá representar o mundo ao seu redor e dentro do
real, o da fantasia.
Recentemente, os valores culturais além de repassados para as
crianças, que hoje são um forte alvo, através dos brinquedos e jogos, também
são repassados através da mídia, onde a TV, o cinema, a informática dão
subsídios na construção do imaginário da criança.
As crianças sempre buscaram e buscam maneiras de brincar em
contextos bem variados, mas o que proponho como analise a partir das
32
considerações sobre a importância e o valor do brincar e dos brinquedos,
parceiro direto do brincar, é como se tem dado essa relação na atualidade.
Partindo do entendimento da impregnação e do reconhecimento de seu
parceiro, a seguir, poderemos entrar nas relações estabelecidas entre o brincar
e o consumir, considerando a atual cultura em que estamos engendrados, a
Cultura do Consumo.
33
CAPÍTULO IV
BRINCAR x CONSUMIR
Em uma sociedade capitalista, ligada a Cultura do Consumo, que
acarreta na competição, as crianças estão sendo preparadas para sempre se
superarem e serem superadas, garantindo assim um lugar ao sol.
Diante desses aspectos que permeiam o brincar na atualidade, podemos
descrever um cenário de crianças brincando dentro de casa ou em
apartamentos na frente da televisão com uma grande variedade de brinquedos
industrializados ou em condomínios fechados.
Cenário esse fruto do crescimento desenfreado das grandes cidades, da
redução considerável de espaços para brincadeiras, a violência que assusta a
todos e tantos outros motivos conhecidos pelos moradores das grandes
metrópoles.
De posse do reconhecimento do valor e da importância do brincar
caracterizados no capítulo anterior, as perguntas que surgem nesse contexto
são inúmeras, como por exemplo, que relação as crianças da atualidade
mantêm com os parceiros diretos do brincar (o brinquedo)? Diante de tanta
variedade de objetos lúdicos, qual a sua importância para o brincar? Qual a
relação existente entre brincar e consumir?
Uma criança irá sempre encontrar objetos os quais ela irá transformar
em brinquedos. Por exemplo: alguns pais preocupados em não incentivar
comportamentos violentos a seus filhos não permitem que eles brinquem com
revólver ou espada de brinquedos. Esquecem esses pais que um garoto que
34
queira brincar de polícia e ladrão, poderá utilizar um pedaço de pau ou até
mesmo sua própria mão para ser uma arma.
Apesar do caráter de consumo dado ao brinquedo que acaba
influenciando as crianças e que faz com que as indústrias aperfeiçoem os
atrativos desses objetos, para que o consumo seja maior, o brinquedo sempre
foi e continua sendo favorecedor das atividades lúdicas, porém não é
imprescindível para que essas atividades ocorram.
As crianças sempre buscaram e buscam maneiras de brincar em
contextos bem variados, principalmente quando estão em grupo. Mas como o
brinquedo surgiu? E como adquiriu o caráter de objeto lúdico e passou a ser
voltado predominantemente para as crianças?
Para responder a essas e outras perguntas precisaremos entrar na
história cultural do brinquedo e tentar entender como foi modificado o seu valor
dentro de um contexto histórico-cultural até que hoje possa ter assumido um
caráter consumista.
Não será difícil perceber a fortíssima influência da Cultura do Consumo
no que refere-se à brinquedos. Veremos como surgem os brinquedos e como a
qualquer época, são modificados em função dos valores sociais e políticos
vigentes.
4.1 – História Cultural do Brinquedo
35
Há quase setecentos anos o Rei Afonso X, que reinou de 1252 a 1284,
preocupou-se com todas as atividades relacionadas à cultura e entre outras
coisas supervisionou pessoalmente o trabalho de um grupo de cronistas, que
foram encarregados por ele de uma missão: escrever uma série de livros sobre
artes, história, religião, leis, astronomia e jogos.
O Rei Afonso X escreveu no prefácio de seu famoso livro de jogos a
célebre frase: “Deus quis que os homens se divertissem com muitos e muitos
jogos, pois eles trazem conforto e dissipam as preocupações”.
Afonso X compara que os jogos como todas as religiões primitivas,
apresentam profundas semelhanças entre seus ritos e cultos, o que lhes dá um
caráter universal, também os jogos são um patrimônio cultural de toda a
humanidade, apresentando características comuns entre as diversas culturas.
Afonso X afirma inclusive, que muitos jogos que hoje não passam de
divertimentos infantis nada mais são que reminiscências de rituais mágicos e
religiosos quase tão antigos como o próprio homem.
O Rei Afonso X traz dados que ligam os jogos a rituais religiosos,
justificando assim sua permanência entre várias culturas, seu ponto de vista
liga atividades lúdicas a origens religiosas ou místicas.
ALMEIDA fazendo uma gênese da educação lúdica, afirma que “os
jogos sempre constituíram uma forma de atividade inerente ao seu
humano.” (p. 15). O autor cita que em algumas sociedades mais primitivas, a
infância e a cultura adulta faziam parte de um só mundo.
A pesquisa deste autor mostra-nos quanto os jogos foram defendidos
inicialmente como incentivadores do aprendizado infantil, ele cita que Platão,
36
na época, incentivava o aprendizado da matemática de maneira lúdica
PLATÃO dizia que:
“Todas as crianças devem estudar a matemática pelo menos no
grau elementar, introduzindo desde o início atrativos em forma de jogo”.
(A República, cap. VII).
Mesmo entre os egípcios, romanos ou maias os jogos serviam de meio
para a geração mais jovem aprender com os mais velhos valores e
conhecimentos culturais. Porém, mesmo nestas civilizações o jogo surge com
determinada importância e com suas peculiaridades aliadas a cultura
especifica.
BROUGÉRE (1998) afirma que no jogo romano existe uma origem
etrusca que permite ver uma grande diferença da civilização grega. Nesta
civilização os jogos atléticos são efetuados por escravos para espectadores.
Neste caso os jogos são realizados para platéias.
Na Grécia, iremos encontrar a origem dos jogos Olímpicos em 776 a.c.
Aqui, mais do que uma demonstração para espectadores, está incluído a noção
de concurso, neste caso é de fundamental importância a participação.
E assim se pesquisarmos os jogos em várias sociedades, sempre
iremos encontrar aspectos que o diferenciam, porém com o mesmo caráter
místico (ritualístico) ou educativo.
Foi com a ascensão do cristianismo que os jogos foram perdendo o seu
valor enquanto atividade construtiva e passaram a ser considerados profanos e
imorais e sem nenhuma significação. Neste período, qualquer atividade que
tivesse caráter de lazer era considerado contra a moral e os bons costumes.
Acreditava-se que a boa educação deveria ser realizada através da chibata.
37
Depois deste período foi com os jesuítas que iniciou o resgate ao jogo como
instrumento de auxílio a educação.
Contudo, até este momento estamos falando do jogo sem o auxílio do
brinquedo, objeto de suporte para a brincadeira. Passemos agora a falar do
brinquedo: quais foram os primeiros e quando passaram a ser produzidos?
Foi apenas a partir do século XIX que os brinquedos passaram a ser
produzidos por indústrias de brinquedos. Neste momento passaram a adquirir o
status de objeto que valesse produzir, pois, teria mercado para a venda.
BENJAMIN (1984) em seus estudos sobre brinquedos em algumas
sociedades européias e russas, cita que os brinquedos inicialmente não eram
produzidos por uma indústria exclusiva para este produto, mas os primeiros
brinquedos foram produzidos nas oficinas de entalhadores de madeira,
fundidores de estranho ou até mesmo em confeitarias, neste último caso
surgiram as famosas bonecas de açúcar.
Vários fatores podem ser atribuídos ao fato da fabricação do brinquedo
não ter sido inicialmente produto de uma indústria exclusiva para este produto;
um deles era a dificuldade de encontrar material para produzi-lo, sendo que
entre os utilizados na época, a madeira era o mais interessante pela sua
resistência e até mesmo pela capacidade de assimilar as cores.
Outro fator que pode ser colocado como fundamental para que os
primeiros brinquedos tenham sido mais próximos de objetos de adorno as
estantes do que efetivamente objetos para as crianças brincarem, é o fato de
que não existia muito conhecimento a respeito do período infantil. E com
relação ao brinquedo como ressalta, BENJAMIN, (1984), “acreditava-se
erroneamente que o conteúdo imaginário do brinquedo determinava a
brincadeira da criança, quando na verdade, dá-se o contrário”. (p. 69). É a
38
criança que muitas vezes determina a brincadeira e utiliza o brinquedo como
suporte de seu conteúdo imaginário.
Quanto mais atraente, no sentido de “bibelô”, mais frágil torna-se o
brinquedo e mais distante está de seu valor como instrumento de brincar, neste
caso, ele revela-se como objeto de projeção do adulto que na época poucos
instrumentos tinha para decifrar a respeito da maneira de brincar da criança.
Os brinquedos acabam revelando muito da forma com que os adultos
vêem as crianças e se hoje eles são coloridos, feitos dos mais variados
materiais, talvez, seja pelo fato de que como afirma BENJAMIN (1984): “o
brinquedo é condicionado pela cultura econômica e sobretudo técnica de
coletividades.” (p. 74)
Parece-nos interessante tentar analisar a relação que é dada ao
brinquedo e as atividades lúdicas em geral, de acordo com os valores culturais;
e perceber nos diferentes contextos o lugar da criança, seu direito de vivenciar
a infância a partir de questões econômicas e sociais nas diferentes culturas; e,
principalmente, que cuidados temos que ter em relação a realidade brasileira,
passando assim a falar sobre o brinquedo e a cultura.
4.2 – Brinquedo e Cultura
39
Talvez pareça estranho para alguns tentar fazer uma associação entre
brinquedo e cultura, já que este objeto sempre esteve associado a objetos sem
importância ou de pouco valor, apesar de que cada vez mais as indústrias de
brinquedos criam produtos novos com materiais diferentes e de visual
incomum.
É importante ressaltar aqui que este “pouco valor” do qual estamos
falando, não é o valor financeiro, pois com o constante aumento de
investimento nesta área de produção, tem crescido o número e a variedade
deste produto que acaba aparecendo com artefatos caríssimos e irresistíveis
as crianças que seduzidas pelo visual não resistem ao apelo de consumir tais
objetos.
O pouco valor dado ao brinquedo que estamos nos referindo aqui é
quanto ao seu papel social, que valor ele possui como objeto a ser consumido
pelos adultos, dentro de sua escala de prioridades? Quais os motivos e
critérios que os adultos utilizam atualmente para comprar brinquedos?
Para responder as perguntas acima, cabe perguntar primeiro lugar
porque o brinquedo passou ao longo destes anos de objeto decorativo a objeto
para crianças brincarem? Quais foram as ideologias que permitiram que as
indústrias de brinquedos crescessem e pudessem investir cada vez mais no
aperfeiçoamento da produção deste objeto?
Como já foi citado anteriormente, é importante não esquecermos que
inicialmente o brinquedo não surgiu direcionado para a criança brincar, foi a
partir da mudança de perspectiva do que é ser criança na visão do adulto, que
o brinquedo passou a ser produzido par o público infantil.
Se analisarmos o lugar da criança no contexto da Idade Média,
perceberemos que neste período, a infância não era percebida diferenciada,
por volta do século XII nem na arte medieval tentava-se representar a criança.
Esta questão talvez possa ser justificada pelo fato de, como ressalta ÀRIES,
40
(1981) “ a criança tinha uma passagem muito breve pela família e muito
insignificante para que tivesse tempo ou razão de forçar ou tocar a
sensibilidade”. (p. 10)
No período medieval a criança ao nascer não era amamentada pela
mãe, e sim por uma “mãe de leite”, mulheres que trabalhavam para a elite da
época e quer tinham esta função, depois de maiores e já com vestimentas
semelhantes a dos adultos, nem mesmo nesta fase tinham muita aproximação
com seus genitores.
Neste contexto, não poderiam existir brinquedos para as crianças, pois,
a vida infantil não era percebida e muito menos as suas necessidades
conhecidas e menos ainda a importância do brincar.
A partir da realidade mostrada acima o que precisa ficar claro é o papel
que os valores culturais assumem para uma determinada sociedade em um
certo momento histórico, e como estas questões irão refletir em todos os
âmbitos, influenciando a vida e os costumes das pessoas, inclusive a vida de
crianças e de sua realidade lúdica.
BROUGÉRE (1997) definindo cultura como “o conjunto de
significações produzidas pelo homem” (p. 8), coloca o brinquedo como um
objeto que também pode ajudar a decifrar costumes e valores de uma
determinada época. O autor coloca que “por ser um objeto portador de
significados rapidamente identificáveis, remete a elementos legíveis do
real ou do imaginário das crianças”. (p. 8)
Neste sentido o brinquedo possui um forte valor cultural, pois é na
brincadeira que a criança irá representar o mundo ao seu redor dentro do real e
da fantasia.
41
Por outra, o brinquedo sempre refletirá uma projeção que o adulto faz a
respeito da criança; e inclusive esta idéia pode ser confirmada nos detalhes
que certos brinquedos como: a cor azul para os meninos e a rosa para as
meninas, carrinhos aos meninos, bonecas e utensílios domésticos para as
meninas.
Atualmente, os valores culturais além de repassados para as crianças
através de brinquedos e jogos, também são repassados através dos meios de
comunicação. A televisão, o cinema, os computadores também dão subsídios
na construção do imaginário da criança. Neste momento, teremos que incluir
em nosso tema questões que também influenciam na construção de
brinquedos, como propagandas, brinquedos e jogos eletrônicos.
4.3 – Jogos Eletrônicos
Embora não possa ser classificada como jogo ou brinquedo, não
podemos deixar de tratar a televisão nesse contexto de brincar e consumir
42
dada a influência que tem no imaginário infantil. Esse eletrodoméstico na
atualidade é uma companhia constante no cotidiano das crianças que acabam
passando muitas horas de seus dias diante da “babá eletrônica”.
O termo “babá eletrônica” que costuma ser dado à televisão, designa-se
como controladora da criança, no sentido de que ocupa o seu tempo, deixando-
o protegida e quieta.
Este fato também surgiu por uma necessidade dos tempos modernos.
Depois da entrada no mercado de trabalho, as mães não dispõem do mesmo
tempo de antes para dar atenção aos filhos que precisam de companhia e de
estarem em locais seguros, já que as grandes metrópoles oferecem vários
perigos. Eis o lugar que acaba sendo ocupado pela televisão que passa a ser
de grande influenciadora da forma de ser e de brincar no cotidiano infantil.
Sabemos então que a televisão passou a ser uma necessidade e por
mais que gostemos ou não ela chegou e ficou nos lares da maioria das
famílias, com a mídia influenciando normas e estilos de vida para adultos e
crianças. Portanto, em que aspectos a televisão influência de forma positiva e
negativa na vida da criança?
Não há dúvida do grande papel exercido pela TV no universo lúdico das
crianças na atualidade, inclusive criando e influenciando brincadeiras
geracionais, compreendida apenas pelas crianças que compactuam de códigos
que só pertencem ao universo mirim de telespectadores de programas
televisivos.
Contudo, precisamos falar de uma cultura lúdica que possui certa
autonomia e um ritmo próprio dentro de uma cultura global específica, ao
apresentar, só terá influência sobre a criança a medida que ela se apropria,
incorporando seus elementos.
BROUGÉRE, (1997) afirma que:
43
“Na realidade, a televisão influencia as brincadeiras na medida em
que as crianças podem se apoderar dos temas propostos no quadro de
estruturas de brincadeiras usuais”. (p. 54)
E para poder se apoderar destes temas é necessário, justamente, que a
criança possa brincar com eles, e assim agir sobre o conteúdo recebido,
deixando da passividade para a ação.
É importante também lembrar a importância da TV e do cinema na
produção dos brinquedos. Cada vez mais os fabricantes produzem seus
produtos baseados nos temas e personagens que esses meios de
comunicação oferecem, e é através da manipulação desses objetos lúdicos
que a criança cria algo novo e pertence a ela, no momento em que brinca com
os conteúdos recebidos na TV.
É a oportunidade de agir sobre as informações televisivas que liberta a
criança de ser apenas um telespectador passivo diante do aparelho. Não há
dúvida que a TV oferece variados conteúdos as brincadeiras, porém, nem tudo
que a mídia oferece ao público infantil está relacionada com o seu
desenvolvimento saudável. Na verdade, é a brincadeira que fará com que a
criança neutralize parte do que irá receber, pois, o oferecido ao público na
maioria das vezes é produzido com a preocupação de ser vendável e não
necessariamente instrutivo.
Em condições semelhantes podemos passar a falar sobre os vídeo-
games e jogos de computador, que também estão ocupando cada vez mais o
tempo das crianças.
Com relação a atração que os vídeo-games e os jogos de computador
exercem sobre a criança, podemos inicialmente falar da possibilidade de
44
interação que esses jogos eletrônicos possuem, e que permitem com que a
criança imediatamente atue sobre o conteúdo oferecido pelo jogo.
Além da imagem em movimento, os sons e os conteúdos variados que a
televisão oferece, os jogos eletrônicos possibilitam a criança sentir-se
participante do contexto, podendo ganhar ou perder. Neste caso, é a sua
habilidade sobre o jogo que irá determinar o tempo em que irá interagir com a
máquina.
Identificamos neste momento um outro aspecto que estes jogos
oferecem que é a competição. Através da competição os jogos instigam os
jogadores a se aperfeiçoarem para que cada vez mais possam jogar por um
tempo maior.
Partindo deste raciocínio estes jogos podem ser considerados como
fundamentais no auxílio de certas habilidades relacionadas a coordenação
viso-motora, sendo úteis ao desenvolvimento da criança. Então, neste caso,
por que motivos alguns pais e responsáveis estão cada vez mais preocupados
com o grande interesse que a maioria das crianças apresentam por estes tipos
de jogos?
Um aspecto que ainda não foi mencionado é a violência que mostra-se
como tema principal na maioria dos jogos de vídeo-game e de computadores.
Uma das mais sérias questões que tem sido abordada a este respeito é a
banalização de cenas extremamente violentas que fazem parte do conteúdo
dos jogos eletrônicos, fazendo com que essas situações causem cada vez
menos impacto para as crianças, que brincam de combates, batalhas e guerra,
matando e morrendo com grandiosas habilidades para isso.
Mais uma vez citaremos o BROUGÈRE que vai nos dizer que “a guerra
e a violência são componentes de nossa cultura”. (p. 77). E em seguida, o
autor vai colocar a idéia de que a brincadeira também é uma confrontação com
45
a cultura, através dela a criança se relaciona com conteúdos culturais que ela
produz e transforma, apropriando-se assim desses conteúdos e lhes dando um
significado.
A partir deste raciocínio podemos colocar que os jogos de guerra
permitem a criança, de certa forma conviver com a violência presente em
nossas sociedades contemporâneas, lembrando que as batalhas e as guerras
sempre estiveram presentes, desde as sociedades mais primitivas. Na
verdade, o comportamento agressivo presente na natureza humana,
geralmente é utilizado para manter o poder e defender território.
Com isso, não queremos defender aqui a temática agressiva dos jogos
eletrônicos, mas deixar claro que o tema não está presente apenas nestes
tipos de atividades lúdicas.
É importante que saibamos que estes jogos fazem parte do universo
lúdico atual e que estarão cada vez mais presentes na vida das crianças. Serão
mais aperfeiçoados e a cada instante trazendo mais novidades. O mundo
virtual toma cada vez mais espaço e não podemos alienar as crianças deste
momento, porém como diria WAJSKOP (1990): “Quanto mais variadas sejam
as atividades da criança, tanto mais múltiplas serão as vias de
conhecimento a que ela terá acesso”.
Seguindo este mesmo raciocínio podemos dizer que mais perigoso do
que a temática violenta presente nestes jogos é o isolamento que ele
proporciona as crianças que passam grande parte de seu dia interagindo com
uma máquina e sem terem a oportunidade de interações com outras crianças.
Além deste aspecto, outra questão, é a limitada oportunidade de criar e
de construir coisas novas, uma vez que estes jogos oferecem poucas
oportunidades para a criança poder agir dentro do conteúdo oferecido.
46
Como percebemos neste capítulo, não temos como negar a forte
influência histórico-social de consumismo em nossa atualidade no modo de
brincar e produzir brinquedos. A todo instante, nossas crianças sofrem
influências de todas partes. Influências essas que interferem diretamente em
suas relações com o brincar. Caracterizando desta forma, a incapacidade de
dissociarmos Brincar e Consumir.
CONCLUSÃO
O objetivo desse trabalho foi o de refletir sobre o brincar, atividade essa
de extrema relevância para o desenvolvimento infantil, considerando a atual
concepção de infância engendrada em um contexto histórico-social
determinado onde impera a cultura do consumo.
Na busca de refletir criticamente sobre a concepção de infância própria
da atualidade, na intenção de pensar o brincar na sociedade vigente e
47
contribuir para o repensar desta prática, predominantemente infantil, concluo
que ato brincar é algo que deve ser levado muito a sério e que vem sendo
cruelmente manipulado pelo consumo desenfreado.
É necessário que seja redirecionado o olhar de pais, educadores e todos
que lidam direta ou indiretamente com crianças, a fim de enxergar os inúmeros
benefícios de se proporcionar ambientes e atitudes que favoreçam a
ludicidade, sem necessariamente que se sejam utilizados objetos de valores
consumistas, que visam estabelecer relações de status e afirmação no grupo,
entendendo que não necessariamente se deva consumir para brincar.
Não pretendo nesse trabalho descartar a importância dos parceiros
diretos do brincar (os brinquedos), no entanto a intenção é não compactuar
com a industrialização do brincar, compreendendo o valor histórico desses
objetos, porém não “engessando” a atividade do brincar, quando considerando-
as somente possível com a presença dos mesmos.
O enfoque principal que busquei dar a esse trabalho monográfico foi o
respeito a criança, que é um ser histórico-social, inserido totalmente em nossa
sociedade, e que, no entanto, deve ser respeitado como tal e não somente
contemplada como consumidora em potencial que é alvo de bombardeios
consumistas que comprometem um direito que lhes é assegurado, não só
moralmente, como legalmente, de ser criança, de viver com especificidades de
criança e que, entre outros direitos, tem o direito de brincar e ter esse ato
respeitado como algo sério, importante e que deve ser considerado como
primordial para seu desenvolvimento integral.
Nesse sentido, essa monografia pretende chamar atenção para as
crianças da atualidade que, devido aos apelos consumistas são vistas apenas
como “simples” consumidores em potencial e não como seres que devem ter
respeitadas suas experiências.
48
Proponho então um alerta geral às atitudes que comprometam seu pleno
desenvolvimento e que lhes sejam asseguradas as oportunidades de
ludicidade, buscando proporciona-las “curtir” a vida hoje, como crianças que
são e que isto concorra para que elas se constituam como sujeitos críticos,
criativos e autônomos com o discernimento para elaborar uma justa e mais
solidária sociedade.
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WAJSKOP, Gisela; Brincar na pré-escola / Coleção Questões de Nossa Época
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51
ÍNDICE
FOLHA DE ROSTO 2
AGRADECIMENTO 3
DEDICATÓRIA 4
RESUMO 5
METODOLOGIA 6
SUMÁRIO 7
INTRODUÇÃO 8
CAPÍTULO I
A CULTURA DO CONSUMO 11
CAPÍTULO II
A INFÂNCIA NA CULTURA DO CONSUMO 17
52
CAPÍTULO III
BRINCAR É COISA SÉRIA 26
3.1 – O Brincar: sua importância e seu valor 27
3.2 – Brinquedos: parceiros do brincar 30
CAPÍTULO IV
BRINCAR X CONSUMIR 34
4.1 – História Cultural do Brinquedo 36
4.2 – Brinquedo e Cultura 40
4.3 – Jogos Eletrônicos 43
CONCLUSÃO 48
BIBLIOGRAFIA 50
ÍNDICE 53
FOLHA DE AVALIAÇÃO 54
53
FOLHA DE AVALIAÇÃO
Nome da Instituição: UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES “PROJETO: A
VEZ DO MESTRE”
Título da Monografia: O BRINCAR NA CULTURA DO CONSUMO
Autor: EVANISE FELICIANO MATASSOLI DO NASCIMENTO
Data da entrega: 18/01/2005
Avaliado por: PROFESSORA: MARY SUE Conceito: